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Universidade Estadual de Goiás UnU - Goiás Revista Visão Acadêmica Revista Eletrônica Ano 2 - nº 5 Novembro de 2012 ISSN 2177 7276

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  • Universidade Estadual de Gois

    UnU - Gois

    Revista Viso Acadmica

    Revista Eletrnica

    Ano 2 - n 5

    Novembro de 2012

    ISSN 2177 7276

    http://images.google.com.br/imgres?imgurl=http://www.ccvalg.pt/astronomia/historia/galileu_galilei/sidereus_nuncius.gif&imgrefurl=http://www.ccvalg.pt/astronomia/historia/galileu_galilei.htm&usg=__7Chw8qb8nApPy_oFfG1x3oFfFJY=&h=699&w=427&sz=275&hl=pt-BR&start=50&tbnid=-vcGpC-Fj81dGM:&tbnh=139&tbnw=85&prev=/images?q=galileu&gbv=2&ndsp=20&hl=pt-BR&sa=N&http://images.google.com.br/imgres?imgurl=http://www.windows.ucar.edu/moon/images/galmoonmed.jpg&imgrefurl=http://ciencianamidia.wordpress.com/category/curiosidades/&usg=__Vp-0vgNyN7uNRrWx1a0MF3cugy4=&h=524&w=352&sz=269&hl=pt-BR&start=216&um=1&tbnid=Q5vwP2Z0ZK2wfM:&tbnh=132&tbnw=89&prev=/images?q="imagens+cient%C3%ADficas"&ndsp=20&hl=pt-BR&rlz=1G1GGLQ_PT-BRBR301&sa=N&start=http://images.google.com.br/imgres?imgurl=http://2.bp.blogspot.com/_VRpy3eu_Kfk/SfDpBYSmCII/AAAAAAAAEu8/LvN9eKkZWCA/s400/minas-cacapava+202.jpg&imgrefurl=http://www.pedrohauck.net/2009/04/voltando-ao-brasil.html&usg=__fED4gbEHdzWkDTG4ZIlAVUvIMGY=&h=300&w=400&sz=29&hl=pt-BR&start=62&tbnid=XawJJaHzj3V7DM:&tbnh=93&tbnw=124&prev=/images?q=planta%C3%A7%C3%B5es&gbv=2&ndsp=20&hl=pt-BR&sa=N&http://images.google.com.br/imgres?imgurl=http://confins.revues.org/docannexe/image/5724/img-9-small480.jpg&imgrefurl=http://confins.revues.org/index5724.html&usg=__2ByVQ5hI3EDKzEsOeWpiuvxigYY=&h=632&w=480&sz=62&hl=pt-BR&start=101&um=1&tbnid=3nTd2_VnyxE82M:&tbnh=137&tbnw=104&prev=/images?q="imagens+cient%C3%ADficas"&ndsp=20&hl=pt-BR&rlz=1G1GGLQ_PT-BRBR301&sa=N&start=http://images.google.com.br/imgres?imgurl=http://www.estudeonline.net/fotos/dna.png&imgrefurl=http://www.estudeonline.net/revisao_detalhe.aspx?cod=135&usg=__oU1Z2CQhtngT1neFNFrHJENYeHc=&h=476&w=330&sz=36&hl=pt-BR&start=150&tbnid=cbvj487OXGYB8M:&tbnh=129&tbnw=89&prev=/images?q=fotos+transg%C3%AAnicos&gbv=2&ndsp=20&hl=pt-BR&sa=N&s

  • Revista Viso Acadmica; Universidade Estadual de Gois;

    Novembro de 2012; ISSN 21777276; Cidade de Gois; www.coracoralina.ueg.br

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    Dados da Publicao

    Revista Viso Acadmica

    Ano 2 - n 5 - Novembro de 2012

    Revista Eletrnica - Periodicidade Semestral

    ISSN 2177 7276

    Contato e Acesso

    Principal: [email protected]

    Alternativo: [email protected]

    Acesso via stio

    http//:www.coracoralina.ueg.br

    Expediente

    Universidade Estadual de Gois ( UEG)

    Reitor: Haroldo Reimer

    Unidade Universitria de Gois

    Diretor da Unidade: Flvio Antnio dos Santos

    Av. Deusdete Ferreira de Moura S/N Centro

    Cidade de Gois- GO - CEP 76.600

    Conselho Editorial

    Auristela Afonso da Costa - UEG Gois

    Clovis Carvalho Britto - UEG Gois

    Eleone Ferraz de Assis - UEG-Gois

    Itelvides Jos de Morais - UEG Gois

    Luciano Feliciano de Lima - UNESP/SP - UEG Gois

    Raquel Miranda Barbosa - UEG Gois

    Conselho Consultivo

    Ademar Azevedo Soares Jnior (UEG - Goinia/ESEFFEGO)

    Carla Rosane Mendanha da Cunha (FMB - GO)

    Clia Sebastiana Silva (UFG - Goinia)

    Cristina Helou Gomide (UFG - Gois)

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    Deis Elucy Siqueira (Universidade de Braslia - UnB)

    Ebe Maria de Lima Siqueira (UFG - Goinia /UEG)

    Eduardo Gonalves Rocha (UFG - Gois)

    Eduardo Jos Reinato (PUC - GO)

    Francisco Alberto Severo de Almeida (UEG - Ensino a Distncia)

    Hamilton Barbosa Napolitano (UEG - Anpolis/UnUCET)

    Jackeline Silva Alves (UEG - Morrinhos)

    Marta de Paiva Macdo (UEG - Morrinhos)

    Ricardo Trevisan (UnB - FAU)

    Rogria Luzia Wolpp Gonalves (UEG - Itabera)

    Sheila Luciano Alves (PUC - GO)

    Valdeniza Maria Lopes da Barra (UFG - Goinia)

    Membros do Conselho Consultivo Convidados Para a Edio

    Rubens de Freitas Benevides (UFG - Catalo)

    Paula Reis de Miranda (Instituto de Educao Cincia e Tecnologia - MG)

    Maria Eugnia Curado (UEG - cidade de Gois)

    Robson Rodrigues Gomes Filho (UEG - Unidade de Morrinhos)

    Paula Roberta Chagas (UEG - Unidade de Morrinhos)

    Administrao

    Alair Di Silva Peres (UEG - cidade de Gois)

    Correo Gramatical e Ortogrfica Pelos Graduandos

    Lvia Rodrigues Barbosa (UEG - Letras - cidade de Gois)

    Ivani Peixoto dos Santos (UEG - Letras - cidade de Gois)

    Juliana de Ftima Ananias de Jesus (UEG - Letras - cidade de Gois)

    Formatao e Diagramao

    Guido de Oliveira Carvalho (UEG - cidade de Gois).

    Itelvides Jos de Morais (UEG - cidade de Gois)

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    Informaes Gerais

    A revista especializada na publicao de artigos cientficos escritos com participao direta de

    graduandos. Sendo que as referncias de autoria so da poca em que o artigo foi enviado para

    apreciao.

    O contedo dos artigos no necessariamente representa os pontos de vista dos organizadores do

    peridico

    Editorial

    Meio de divulgao da produo cientfica de graduandos dos diferentes ramos o principal motivo

    da organizao da Revista Viso Acadmica. De fato no faltam revistas cientficas dispostas a abrir

    algum espao para publicaes de graduandos. Porm, frente ao volume das produes este espao

    aqum do necessrio e nem sempre trabalhos de boa qualidade escritos por graduandos

    conseguem ser divulgados com rapidez. Por isso inteno da Viso Acadmica se voltar

    principalmente para este segmento de pesquisadores. Contribuindo para que as universidades

    continuem a ser local de formao e divulgao de ideias de pensadores com senso crtico. Crtico

    em relao s suas prprias crenas e as dos demais membros das sociedades.

    Cidade de Gois, Novembro de 2012, Conselho Editorial

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    A Paleografia e os registros de batismo de Morrinhos Gois, de 1876 a 1881 ... 6 Wesley Ribeiro Alves Gabriela Alves Toledo Maria Luza Cruvinel de Menzes

    A Funo do pedaggico-moralista da literatura em o Demnio Familiar de Jos de Alencar ... 19 Renato Garcia Cardoso

    Educao ambiental como instrumento para preservao e proteo do meio ambiente: aspectos pedaggicos e jurdicos ... 32 Willian Flgge Carvalho

    A Matemtica e o currculo integrado no Curso Tcnico em Agropecuria ... 43 Thais Aparecida Pacheco Josislei de Passos Vieira

    Paula Reis de Miranda

    Prticas escolares no ensino de Lngua materna: um olhar sobre a metodologia do professor ... 55 Andr Fernandes Maia de Medeiros

    Incluso pela Lei: analisando as polticas pblicas Na/Para/Sobre a educao inclusiva ... 63 Addan Tritty Rezende de Souza

    A Msica Independente no Brasil: Constituio, Festivais e Expresses ... 86 Isabella Ceclia do Nascimento

    Riscos ocupacionais de uma amostra dos profissionais da beleza do municpio de Goinia-GO ... 102 Karla Alade Pereira Garcia Cleonice Fernandes Bento Kleber Frana Costa

    A Imigrao italiana, sculos XIX-XX, em Nova Veneza-GO: contribuies para a cultura ... 116 Iraci Garbim de Souza

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    A Paleografia e os registros de batismo de Morrinhos Gois, de 1876 a 1881 Wesley Ribeiro Alves

    1

    Gabriela Alves Toledo Maria Luza Cruvinel de Menzes

    Resumo A Paleografia uma cincia que surgiu na Idade Moderna, durante a Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), em que a Europa estava imersa numa profunda crise relativa s propriedades privadas, sendo esta ferramenta usada como forma de se comprovar a autenticidade dos documentos que comprovavam tais propriedades. No Brasil, a partir de 1950, encontramos a Paleografia sendo ministrada como disciplina do curso de Histria, na USP, evidenciando o fato de que em nosso pas, a Paleografia , basicamente, uma atividade prpria da Cincia Histrica. Este artigo discute a relao da Histria com os documentos escritos, discutindo a importncia do documento escrito e da Paleografia para as Cincias Humanas e Sociais na atualidade, apontando os desafios e as possibilidades desta linha de pesquisa. Em seguida, analisamos o Livro 01 de Batismo da Parquia Nossa Senhora do Carmo, com assentamentos de 1876 a 1881 que trazem informaes acerca da dinmica populacional de Morrinhos no final do Sculo XIX. Para tanto, descrevemos o processo de reconhecimento, escolha, digitalizao e transcrio do Livro de Batismo da Parquia Nossa Senhora do Carmo, discutindo sobre as dificuldades encontradas neste processo.

    Palavras Chave: Paleografia. Transcrio. Morrinhos. Livro de Batismo.

    Introduo

    Surgida na Idade Moderna, a Paleografia uma cincia que tem ajudado, de maneira

    especial, as Cincias Humanas e Sociais a produzirem conhecimento, sobretudo,

    possibilitando que estas acessem tempos mais remotos, uma vez que os documentos

    escritos constituem uma importante fonte de informao, ao lado das descobertas

    arqueolgicas e da Histria Cultural.

    Localizada no Sul de Gois, Morrinhos uma das mais antigas cidades da regio,

    sendo uma das primeiras a serem povoadas na regio e exercendo no incio do Sculo XX

    grande influncia na poltica e cultura do Estado de Gois.

    Este artigo, por sua vez, visa apontar as caractersticas dos documentos manuscritos

    de Morrinhos, do final do sculo XIX. Especificamente, analisa o Livro 01 de Batismo da

    Parquia Nossa Senhora do Carmo, que traz assentamentos de 1876 a 1881. Para tanto,

    digitalizamos o referido livro e o transcrevemos, com o auxlio de uma planilha eletrnica.

    1 Wesley Ribeiro Alves, Gabriela Alves Toledo e Maria Luza Cruvinel de Menzes so graduandos do curso de Histria da UEG na Unidade de Morrinhos. A indicao para a publicao deste artigo assim como as orientaes para sua confeco, so do professor Mestre Robson Rodrigues Gomes Filho e professora doutoranda Paula Roberta Chagas da UEG, Unidade de Morrinhos.

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    O Documento escrito e a produo do conhecimento

    Vrios fatores influenciam o historiador na escolha dos mtodos de pesquisa que

    adotar, dos documentos histricos que analisar, das etapas a serem empreendidas para

    apreenso das fontes de pesquisa. Neste sentido, o posicionamento terico do pesquisador

    muito importante, bem como o prprio objeto de pesquisa e os problemas que ele suscita

    so pontos importantes que influenciam seu trabalho.

    As Cincias Sociais tambm valorizam o documento escrito na produo do

    conhecimento:

    [...] o documento escrito constitui uma fonte extremamente preciosa para todo

    pesquisador nas cincias sociais. Ele , evidentemente, insubstituvel em qualquer

    reconstituio referente a um passado relativamente distante, pois no raro que

    ele represente a quase totalidade dos vestgios da atividade humana em

    determinadas pocas. Alm disso, muito frequentemente, ele permanece como o

    nico testemunho de atividades particulares ocorridas num passado recente

    (CELLARD apud S-SILVA, et al. 2009: 02).

    Assim, quanto mais antigo o objeto de pesquisa em Cincias Sociais, tanto mais

    importante ser o documento escrito na produo do conhecimento. E mesmo nas

    pesquisas com objetos mais recentes o documento escrito tem sua importncia consagrada

    neste ramo do saber, o que no entanto no simplifica a tarefa de classificar o trabalho com

    documentos escritos:

    No uma categoria distinta e bem reconhecida, como a pesquisa survey e a

    observao participante. Dificilmente pode ser considerada como considerada

    como constituindo um mtodo, uma vez que dizer que se utilizar documentos

    no dizer nada sobre como eles sero utilizados (S-SILVA, et al. 2009: 03).

    Apesar da dificuldade narrada por alguns pesquisadores em nomear esta forma de

    lidar com os documentos escritos, o termo Pesquisa Documental parece ser o mais utilizado

    na definio desta forma de produo do conhecimento.

    Desta forma, entendemos que o documento escrito ainda tem papel forte na

    produo do conhecimento das Cincias Sociais, seja por seu uso quase obrigatrio para

    tempos mais remotos. Seja porque a cada dia uma maior quantidade de documentos fica

    disponvel a inmeros pesquisadores, diante do avano da internet e de outros meios de

    comunicao.

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    Por sua vez, Samara e Tupy (2007) se dedicam a analisar o uso do documento escrito

    na Cincia Histrica. Segundo elas, durante a primeira metade do sculo XX o conhecimento

    histrico era dependente do documento escrito, a ponto de alguns historiadores afirmarem:

    A Histria se faz com documentos. Documentos so os traos que deixaram os

    pensamentos e os atos dos homens do passado. Entre os pensamentos e os atos

    dos homens, poucos h que deixam traos visveis... [...] Por falta de documentos, a

    Histria de enormes perodos do passado da humanidade ficar sempre

    desconhecida. Porque nada supre os documentos: onde no h documentos no

    h Histria (LANGLOIS; SEIGNOBOS apud SAMARA; TUPY, 2007: 17).

    Assim, durante anos a produo do conhecimento histrico esteve atrelada aos

    documentos escritos, sendo estes condio indispensvel para o conhecimento das

    sociedades antigas. Samara e Tupy (2007) entendem que tal perspectiva comeou a mudar a

    partir do momento no qual se percebeu que no apenas a Histria busca a explicao dos

    fatos sociais, o que levou os historiadores a valorizarem a interdisciplinaridade, os mtodos

    e tcnicas de outras reas, como forma de apreenso do passado. Assim, a noo de

    documento histrico foi transformada, incluindo outras fontes como as arqueolgicas,

    objetos e materiais, e mais recentemente, a prpria memria dos indivduos (atravs de

    linhas de pesquisa, como a Histria Oral) tem sido passvel de anlise histrica.

    No entanto, o documento escrito sempre teve um papel importante na Histria:

    Independentemente de seu propsito original, do sentido essencial de sua

    elaborao, os documentos impressos e/ou manuscritos vinham sendo

    considerados, por excelncia, as fontes principais de estudos e de pesquisas

    histricas. Sujeitos identificao e anlise de diferentes olhares, sob diversas

    abordagens, em temporalidades distintas, permitiam aos historiadores uma

    ininterrupta reinveno do passado, o constante refazer da busca de sentido para o

    mundo em que viviam. Como origem fundamental da narrativa histrica, os

    documentos deviam ser apreendidos como resultado de um trabalho humano que,

    ao registrar mensagens emitidas por quem o criava, podia traduzir, embora de

    modo fragmentado, uma aproximao parcial os vestgios de um fato, de um

    acontecimento, de uma experincia vivida, de objetos ou, at mesmo, de

    impresses e de sensaes (SAMARA; TUPY, 2007: 18).

    Desta forma, os documentos escritos (como toda forma de documento histrico) so

    registros do passado, no entanto, por si s no traz muitas informaes sobre o passado, a

    menos que o historiador saiba fazer as perguntas corretas e utilizar os mtodos apropriados

    no desenvolvimento de sua pesquisa. Neste sentido, a Paleografia e a Diplomtica se

    revelam ferramentas importantes para o desenvolvimento do conhecimento histrico:

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    Uma nfase maior foi dada Paleografia e Diplomtica cujas metodologias e

    tcnicas cientficas garantiram a busca, a coleta e a recuperao de registros

    manuscritos, pois a leitura, a decifrao de seu contedo e a autenticidade dos

    documentos constituiria, a primeira tarefa do historiador. [...] A primeira delas a

    Paleografia pode ser associada leitura, transcrio e interpretao de

    formas grficas antigas; e a segunda a Diplomtica detm-se, por sua vez, na

    veracidade e na autenticidade de um manuscrito, analisando onde o mesmo foi

    produzido, quais os indivduos que o redigiram e em que momento isso ocorreu

    (SAMARA, TUPY, 2007: 25).

    Assim, a Histria pode se valer dos mtodos da Paleografia e da Diplomtica para

    transcrever, garantir a autenticidade dos documentos analisados, e assim produzir o

    conhecimento histrico. Portanto, o documento escrito tem um papel inestimvel na

    Histria, sendo uma das principais fontes de informaes do passado.

    A Edio de manuscritos no Brasil

    Segundo Cambraia (apud TONIAZZO et al. 2009), h diversas formas de tornar

    acessvel ao pblico um texto, sendo importante, para tanto, a escolha do tipo adequado de

    edio a ser utilizado, pois cada um tem caractersticas prprias, desde a edio fac-similar,

    em que o grau de interveno do editor nulo, at a interpretativa, marcada por forte

    interveno deste.

    Editando um manuscrito de 1885 e outro de 1895, do Arquivo Pblico Municipal de

    Cceres-MT, Toniazzo et al. (2009) optam pelo mtodo fac-similar e pelo mtodo

    semidiplomtica. A edio fac-similar ou foto-mecnica entendida como a fotografia do

    texto, reproduzindo com fidelidade as caractersticas do texto original, uma vez que a

    semidiplomtica representa uma tentativa de melhoramento do texto, com a diviso das

    palavras, o desdobramento das abreviaturas, buscando eliminar as dificuldades de natureza

    paleogrfica suscitadas pela escritura.

    Toniazzo et al. (2009) aponta algumas orientaes para a edio semidiplomtica de

    documentos: manter-se a ortografia, a acentuao, as maisculas e as minsculas devem ser

    mantidas conforme grafados no original, as abreviaturas devem ser desdobradas e as letras

    omitidas marcadas em itlico. Eles ainda afirmam que a anlise paleogrfica, minuciosa por

    natureza, requer dedicao e muitas horas de trabalho, por parte do pesquisador, exigindo

    um olhar atento para cada palavra do texto.

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    A tarefa da paleografia se inicia com a coleta de documento, tarefa que requer

    pacincia, uma vez que devem ser consultados bibliotecas, mosteiros, parquias,

    observando cada caracterstica das letras e da forma de escrita.

    Historicamente, Toniazzo et al. (2009) situam a consolidao da Paleografia como

    fruto da necessidade criada pela Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), durante a qual

    comeou a surgir uma srie de dvidas acerca da propriedade de terras e castelos. Os juzes

    para se livrarem dos documentos falsos, passaram a analisar minuciosamente os

    documentos de propriedade. Assim, a Paleografia surge com o objetivo de determinar o

    auto, o tempo e o lugar em que dado documento foi escrito, fornecendo ao perito as

    ferramentas indispensveis para se distinguir os documentos verdadeiros e autnticos, dos

    falsos, deturpados, apcrifos. Como ctedra, a Paleografia surge primeiro na Alemanha, nas

    escolas de Filosofia e Letras. No Brasil, os estudos paleogrficos surgiram no final do sculo

    XIX e incio do XX, os estudos paleogrficos desenvolveram-se inicialmente graas iniciativa

    particular dos historiadores. Apenas em 1952, na Universidade de So Paulo USP, a

    Paleografia surge como disciplina do curso de Histria. Segundo Blanco (apud TONIAZZO,

    2009), so finalidades da Paleografia:

    Ensinar a ler corretamente e sem erros todo tipo de documento, tanto antigo, quanto

    moderno;

    Dar a conhecer a evoluo da escrita atravs dos tempos, das naes e dos indivduos;

    Determinar o autor, o tempo e o lugar em que o documento foi escrito;

    Fornecer ao perito os conhecimentos indispensveis para saber distinguir os

    documentos verdadeiros e autnticos dos falsos, deturpados, adulterados, etc.;

    Descrever as letras (forma, traado, ngulo, mdulo, peso);

    Descrever os sinais braquigrficos (abreviaturas) atribuindo-lhes significado exato e

    completo;

    Descrever os sinais etigmolgicos (pontuao).

    Atualmente, o Arquivo Pblico de So Paulo um dos principais divulgadores da

    paleografia, bem como uma das instituies que mais busca coletar e organizar documentos

    escritos no Brasil.

    Em geral, a maior parte dos locais que possuem documentos passveis de anlise

    paleogrfica tem ligao com Igrejas ou aos rgos da Justia, como fruns. A maior parte

    destes lugares no oferece condies mnimas de conservao dos documentos histricos,

    alm de carecerem de maior sistematizao e organizao.

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    A Questo das Abreviaturas na Paleografia Brasileira

    Uma das maiores preocupaes dos palegrafos diz respeito questo das

    abreviaturas. Flexor (2010), afirma que em sua experincia de contato com manuscritos dos

    sculos XVI a XIX, as abreviaturas se mostraram uma grande dificuldade para quem se

    dispe a ler e extrair dados para suas pesquisas.

    Neste sentido, a pesquisadora, empreendeu, em parceria com outros pesquisadores,

    um trabalho com vistas a elaborar uma lista das abreviaturas mais comumente usadas nos

    documentos histricos do Brasil, num projeto iniciado em 1963.

    Em 1990, esta lista j contava com cerca de 20 mil abreviaturas simples, alm de um

    grande nmero de expresses abreviadas, como aquelas constantes nos protocolos de

    saudaes nomes de instituies, expresses jurdicas, cargos pblicos, civis, militares ou

    eclesisticos.

    Em 2004, uma terceira edio da lista de abreviaturas contava com 25 mil

    abreviaturas, sem contar as expresses de endereamento, subscrio, topnimos, entre

    outros. Tanto a segunda como a terceira edio so frutos de consultas aos arquivos

    pblicos do Arquivo do Estado de So Paulo, Arquivo da Prefeitura Municipal de So Paulo,

    Arquivo Pblico do Estado da Bahia, Diviso de Arquivo da Prefeitura Municipal do Salvador

    (Fundao Gregrio de Mattos), Arquivo da cidade de Cachoeira/Bahia e Instituto Histrico e

    Geogrfico de Sergipe, Instituto Histrico e Geogrfico Brasileiro, Biblioteca e Arquivo

    Nacional, do Rio de Janeiro, Arquivo da Santa Casa da Misericrdia, Instituto Geogrfico e

    Histrico da Bahia, Arquivo Pblico do Estado e Casa da Memria de Curitiba, do Paran,

    documentao manuscrita de propriedade da Universidade Catlica de Gois, Instituto de

    Estudos Brasileiros, da USP, diversos arquivos de instituies religiosas de Salvador, etc.,

    segundo Flexor (2010).

    Basicamente, existem trs tipos de abreviaturas, segundo Flexor (2010): as siglas

    simples (quando indicadas apenas por letras como, por exemplo, ONU Organizao das

    Naes Unidas, CNBB Conferncia Nacional dos Bispos do Brasil), siglas reduplicadas ( nas

    quais a letra repetida para significar o plural das palavras representadas, ou quando, na

    palavra, a letra encontrada pelo menos duas vezes como em SS santssimo, RR

    reverendssimo), alm de siglas compostas (quando so formadas pelas duas ou trs

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    primeiras letras da palavra, por palavras dominantes do vocbulo ou expresso, como

    exemplo MOBRAL Movimento Brasileiro de Alfabetizao e PETROBRAS Petrleo do

    Brasil, cujo uso mais recente).

    O Livro de Batismo da Parquia Nossa Senhora do Carmo de Morrinhos

    Srgio Nadalin (2004) entende que a Igreja Catlica Romana, seguida posteriormente

    pelas denominaes protestantes, anunciou precocemente uma das caractersticas da

    modernidade. Desde o Conclio de Trento (1545-1563) instituiu formas de controle da sua

    populao, definindo normas para padronizar os registros dos principais sacramentos que

    marcam os momentos da vida dos catlicos.

    Dessa maneira, os padres foram ensinados como registrar os Batismos (e mais

    tarde a Crisma), os Matrimnios e os Sepultamentos. Tais normas foram

    completadas no sculo XVIII, por ocasio da instituio do Rituale Romanum que,

    alm de definir como fazer tais assentamentos, ensinava a fazer contagens

    peridicas dos paroquianos (NADALIN, 2004: 40).

    Desta forma, a Igreja tinha a preocupao de garantir que os registros da vida de seus

    fiis seguissem um mesmo padro. No Brasil - colnia, a Arquidiocese de Salvador da Bahia

    exercia a jurisdio sobre toda a Igreja da Amrica portuguesa, definindo as regras a serem

    adotadas nos assentamentos paroquiais.

    O sacramento do batismo esteve ligado sade do corpo e da alma dos fiis, por

    isso, a preocupao de se batizar o mais rpido possvel as crianas, de preferncia at o

    oitavo dia. O batismo devia ser ministrado na igreja, ainda que o batismo em casa fosse

    permitido, em caso de necessidade segundo Nadalin (2004). Passado o risco de morte da

    criana, a mesma deveria ser levada para a igreja, a fim de receber os Santos leos.

    Assim, o batismo uma etapa importante da vida dos indivduos catlicos e durante

    o Brasil - colnia e o Brasil Imprio, a Igreja Catlica era a religio oficial e a nica instituio

    a realizar os registros de nascimento, matrimnio e falecimento dos brasileiros.

    Localizada na cidade de Morrinhos, na regio Sul de Gois, a Parquia Nossa Senhora

    do Carmo foi fundada em 30 de julho de 1845, sendo este o ano em que se comemora a

    fundao da cidade de Morrinhos (no entanto, celebra-se a data em 16 de julho, dia da

    Padroeira da cidade, Nossa Senhora do Carmo).

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    No Arquivo Paroquial, encontram-se documentos de casamento mais antigos a partir

    de 1836, e de Batismo a partir de 1876. O livro Tombo mais antigo da Parquia traz

    informaes a partir de 1916.

    Escolhemos analisar o Livro 1 de Batismo, com documentos de 1876 a 1881, por este

    ser o livro mais antigo que encontramos no arquivo paroquial. Optamos por fotografar as

    pginas do referido livro e por transcrever as informaes nele contidas com o auxlio de um

    software de planilha eletrnica, uma vez que se trata de uma documentao seriada com

    diversas informaes, como o nome da pessoa que foi batizada, nome dos pais e padrinhos,

    data da celebrao, o padre que ministrou este sacramento, em alguns casos, a igreja, a data

    e local de nascimento do batizando, bem como o nome dos avs.

    O livro traz assentamentos de batismo realizados por dois padres, Pe. Antonio

    Francisco do Nascimento, nos registros que vo de 1876 a 25 de agosto de 1878, e do

    Cnego Jos Olyntho da Silva, a partir de 15 de fevereiro de 1880. Ao todo, foram transcritos

    os 396 assentamentos de batismo contidos nas 71 folhas do Livro de Batismo analisado.

    Caractersticas dos Assentamentos do Pe. Antonio Francisco do Nascimento

    Para exemplificar, transcrevemos o assentamento de batismo de Pedro, realizado em

    20 de agosto de 1876:

    Aos vinte dias do mez de Agosto de mil e oitocentos e setenta e seis, Baptizei

    solemnemente e puz os santos olios ao inocente Pedro, filho legitimo de Alexandre

    Antonio de Oliveira e Francisca Maria de Menezes, neto pela parte paterna de

    Francisco Antonio de Olveira e Maria Perpetua de Santa Ritta, e pela parte materna

    de Luis Antonio de Castilho, Maria Luiza de Menezes, foram padrinhos, Francisco

    Luis de Castilho e Anna Maria da Conceio. Doque para constar mandei fazer este

    assento.

    O Vigo Col. P. Antonio Francisco do Nascimento (F007-V).

    Normalmente, o padre Antonio Francisco do Nascimento, descreve o nome dos pais,

    dos padrinhos, e em alguns casos informa o nome dos avs dos catecmenos. Os

    assentamentos informam se o catecmeno filho de pais casados, se filho apenas da me

    (filiao maternal) ou se filho de casais que no contraram matrimnio (filiao natural).

    Enquanto os assentamentos so grafados com tinta escura, a assinatura do Pe.

    Antonio Francisco do Nascimento feita com tinta mais clara e as letras maisculas so

    menos desenhadas que as usadas no corpo do assentamento.

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    Durante o processo de transcrio, apenas trs nomes de batizados foram marcados

    como ilegveis, porque uma vez que a grafia utilizada pelo padre estava com alguns borres,

    ao passo que em dez nomes ficamos com dvidas acerca da grafia correta dos nomes.

    Caractersticas dos assentados do Congo Jos Olyntho da Silva

    Segue a transcrio de um dos assentamentos de Batismo do Congo Jos O. Silva:

    Aos vinte e nove dias do mez dAgosto, do anno do Senhor de mil oitocentos e

    oitenta, baptizei e ps os Santos Olios a inocente Francisca, filha legitima de Lazaro

    Gonsalves da Roza e de sua mulher Delfina Roza de So Jos, nascida nove de

    julho deste anno, na fazenda da Santa Roza, desta Freguesia de Morrinhos, foram

    padrinhos Ja Luiz de Souza e Roza Anna Silveira da Conceio e para constar fiz

    este assento.

    Conego Jos Olyntho da Silva (F059-F).

    Ao contrrio do Pe. Antnio Francisco do Nascimento, o Cnego Jos Olyntho da Silva

    preocupa-se com dados mais detalhados do catecmeno, como o local e a data de

    nascimento.

    No entanto, apenas nos primeiros registros do ano de 1881 que o cnego Jos

    Olyntho deixa explcito no Livro que os batizados ocorreram na Igreja Matriz de Nossa

    Senhora do Carmo, ficando a maior parte dos registros sem tal informao (ao contrrio dos

    registros do Pe. Antnio Francisco, em que esta informao est presente na maior parte

    dos registros).

    Alm disso, o cnego Jos Olyntho no faz menes a nomes dos avs dos

    catecmenos, prtica comum (apesar de no estar presente em todos os registros) nos

    documentos do Pe. Antnio Francisco.

    A mesma tinta usada na escrita do assentamento usada na assinatura, bem como a

    mesma inclinao e traados das letras, o que nos leva a imaginar que, enquanto Pe.

    Antnio Francisco escrevia todos os termos e s ento os assinava, o Cnego Jos Olyntho

    pareceu escrever cada termo e assin-los logo em seguida.

    A Transcrio do Livro de Batismo da Parquia Nossa Senhora do Carmo

    No dia 15 de agosto de 2012 visitamos a Parquia Nossa Senhora do Carmo a fim de

    conhecermos o arquivo paroquial. Na oportunidade, foi-nos apresentado o mesmo e nos

    deram livre acesso documentao. O arquivo paroquial fica no andar superior do Escritrio

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    Paroquial, num armrio de ao. A documentao a partir de 1900 est bem organizada e

    conservada, todos organizados em seus respectivos livros, ao passo que a documentao

    mais antiga ainda carece de organizao mais sistmica, e muitos documentos apresentam

    sinais de corroso e da ao do tempo, tornando sua anlise extremamente complicada.

    Nesta primeira visita tomamos conhecimento do Livro que est sendo analisado e

    traamos a partir dali nosso plano de trabalho. Uma semana depois, no dia 22 de agosto de

    2012, munidos de uma cmera digital de 14 megapixels, de mscaras e luvas cirrgicas para

    a proteo dos documentos e dos pesquisadores, retornamos aos arquivos paroquiais, onde

    fotografamos as pginas do Livro 1 de Batismo.

    Em seguida, como dito, com o auxlio de um software de edio de planilhas

    eletrnicas, transcrevemos os dados dos assentamentos de batismo, perfazendo um total de

    396 linhas e 21 colunas.

    medida que nos acostumamos com a grafia dos padres, a transcrio foi se

    tornando mais fcil, motivo pelo qual aps uma primeira transcrio, realizamos uma reviso

    geral na planilha, a fim de identificarmos palavras que no primeiro momento foram

    consideradas dbias ou de grafia ilegvel.

    As primeiras pginas do livro encontram-se muito corrodas, ao passo que a capa do

    livro uma pasta de adio bem posterior redao dos assentamentos, no sendo, no

    entanto, possvel determinar em que ano ela foi anexada s pginas do livro. Nesta capa

    improvisada, encontra-se coladas, na parte interna, folhas do jornal da arquidiocese de

    Gois, do ano de 1940, o que talvez indique a pasta que serve como capa deste livro tenha

    sido afixada aps este ano.

    A primeira pgina manuscrita (que fala do encerramento do livro), no entanto traz

    uma informao contraditria em relao natureza do livro:

    Autorizado pelo Exmo. e Revmo. Snr. Bispo Diocesano, encerro este livro que

    servira para o registro dos casamentos desta frequezia de Nossa Senhora das

    Dores de Caldas Novas. Contem 200 folhas por mim numeradas e rubricadas com o

    sobre nome que uso P. Calzada.

    Caldas Novas 6 de Maio de 1907

    O Vigario P. Julio Calzada (F001-F)

    Assim, o livro que analisamos traz uma parte que pertence a um livro de casamento

    da Parquia Nossa Senhora das Dores, do municpio vizinho a Morrinhos, Caldas Novas e que

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    fizera at o ano de 1911, parte do municpio de Morrinhos. Uma posterior pesquisa nos

    demais livros e folhas do arquivo pode nos ajudar a entender o motivo desta pgina

    intrigante estar neste livro de batismo.

    Outra pgina, esta sim, escrita pelo Padre Antnio Francisco do Nascimento parece

    ser a primeira pgina do livro de Batismos:

    Livro de Assentamentos de Batizados

    Parochia de N. Sra do Carmo de 1876-1880 (F003-F).

    Esta inscrio, por sua vez, nos leva a crer que o livro de batismo, da maneira como

    chegou s nossas mos , como j nos sugere a capa, uma montagem feita, ao menos,

    sessenta anos depois dos assentamentos.

    Dificuldades na Transcrio do Livro de Batismos

    A primeira dificuldade que notamos no processo de transcrio do livro de Batismo

    foi nos adaptar ortografia da poca em que o documento foi escrito, uma vez que h em

    ns uma tendncia natural a grafarmos os nomes e expresses de acordo com as normas

    gramaticais atualmente vigentes.

    Neste sentido, incorramos no risco de transcrevermos Ana, tal qual escrevemos

    hoje, e no Anna, como era grafada no final do sculo XIX no Brasil. Neste mesmo sentido,

    palavras que atualmente tm acento grfico e que antigamente no o tinham tambm

    mereceram especial cuidado, como o nome Antnio, que nos vem grafado Antonio.

    Ambos os padres no usam muitas abreviaes, o que facilitou nossa tarefa de

    transcrever o Livro de Batismos. Alm das abreviaes para vigrio (Vig), padre (P.), a

    abreviatura para dona (D.) tambm foi usada nos assentamentos de batismo.

    Quanto transcrio de nomes, no houve grandes dificuldades, uma vez que a

    maioria dos nomes de uso recorrente ainda hoje. O nome que mais nos chamou a ateno,

    no entanto, foi Messias, que aparece em registros de 01 de abril de 1877 (F017-F), 02 de

    outubro de 1877 (F031-F) e em 06 de janeiro de 1881 (F065-F) em ambos os casos usados

    como nome feminino. O nome Messias ainda aparece num assentamento de 16 de maio de

    1878 (F040-F), no entanto como nome masculino. A existncia deste nome nos mostrou que

    Messias um nome feminino de uso comum na regio de Gois, neste perodo.

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    Algumas pginas do Livro de Batismo encontravam-se com a tinta mais fraca, como

    o caso das pginas F041-F, F041-V, F044-F, o que tambm dificultou nosso trabalho de

    transcrio. O uso da letra y em palavras como Olyntho, tambm exigiu de ns uma maior

    ateno no processo de transcrio.

    Em paralelo, a existncia de alguns sobrenomes de uso muito difundido em

    Morrinhos, como os sobrenomes do Carmo, de Jesus, das Dores, Ritta, facilitou no somente

    o processo de transcrio, como tambm a identificao de outras letras e palavras

    similares.

    Concluso

    Atravs da experincia da transcrio do Livro de Batismos da Parquia Nossa

    Senhora do Carmo, referente aos anos de 1876 a 1881 ns percebemos que a paleografia

    uma arte de difcil e exigente, que no entanto, nos oferece preciosas informaes acerca da

    sociedade e da cultura em que o documento foi produzido.

    Se por um lado, o advento da datilografia e, mais recentemente, da informtica

    diminuram a importncia dos documentos manuscritos, por outro lado, estes so uma

    importante ferramenta que tem ajudado os pesquisadores a melhor sistematizar e

    compartilhar informaes e arquivos de diferentes perodos e regies, assim como j o faz o

    Arquivo Pblico de So Paulo.

    Nossa experincia com os documentos de batismo da Parquia de Nossa Senhora do

    Carmo nos fez evidenciar a importncia do estabelecimento, com urgncia, de um Centro de

    Documentao que trate os documentos desta que uma das mais antigas e importantes

    cidades do Sul do Estado de Gois. Garantindo cincia histrica a possibilidade de analisar

    documentos nunca antes analisados, preservando o patrimnio histrico-cultural de

    Morrinhos, bem como contribuindo para a preservao da memria morrinhense.

    Referncias

    FLEXOR, M. Abreviaturas de Manuscritos dos Sculo XVI ao XIX. Vitria: IV Congresso Nacional de Arquivologia, 2010.

    NADALIN, S. Histria e Demografia Elementos para um Dilogo. Campinas: Associao Brasileira de Estudos Populacionais ABEP, 2004.

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    S-SILVA, J; ALMEIDA, C; GUINDANI, J. Pesquisa documental: pistas tericas e metodolgicas. Revista Brasileira de Histria & Cincias Sociais. Ano I, Nmero I Julho de 2009.

    SAMARA, E; TUPY, I. Histria & Documento e metodologia de pesquisa. Belo Horizonte: Autntica, 2007.

    TONIAZZO, C; ANDRADE, E; KRAUSE, M. Edio de Manuscritos: Caractersticas Paleogrficas. Cuiab: Polifonia, N 19, 2009, p. 43-58.

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    A Funo do pedaggico-moralista da literatura em o Demnio Familiar de Jos de Alencar Renato Garcia Cardoso

    2

    Palavra puxa palavra, uma ideia traz outra, e assim se faz um livro, um governo, ou uma revoluo. Machado de Assis

    Resumo No sentido de que: Silva (1973) aponta literatura diversas funcionalidades, como a pedaggico-moralista, que tem o intuito de moldar o carter do leitor e defende ainda que o drama seja uma arte de comunicao; o Romantismo manifesta um ideal de reforma social e tem como grande representante Jos de Alencar; analisamos sua pea teatral O demnio familiar, por meio de pesquisa bibliogrfica e aplicao na obra, investigando a presena da funo pedaggico-moralista da literatura na mesma. E uma vez que fica evidente a inteno tica do escritor ao redigir a comdia, pudemos verificar que essa funo se faz autntica na narrativa.

    Palavras-chave: Jos de Alencar. Pedaggico-moralista.

    Literatura conceito polmico

    A tarefa de definir literatura complexa, vrias tm sido as tentativas por diversos

    estudiosos, sem chegar ao consenso. Portanto, o presente trabalho, apresenta um breve

    esboo sobre o estudo da definio da Literatura, e sobre as funes literrias, com foco na

    funo pedaggico-moralista.

    Eagleton (2006) salienta que muitas so as tentativas em definir literatura, cita a

    possibilidade de defini-la como escrita imaginativa, no sentido de fico, porm se

    refletirmos acerca de toda literatura, veremos que tal definio no procede.

    A distino entre fato e fico, portanto, no muito suficiente. Os romances e as

    notcias no eram claramente factuais, nem claramente fictcios, a distino feita a elas no

    se aplica. Lembra o Gnese obra lida como fato por alguns e como fico por outros, que a

    literatura inclui muito da leitura fatual, e as histrias em quadrinhos e os romances so

    obras fictcias, porm nem sempre consideradas como literrias.

    De acordo com Eagleton (2006), podemos pensar na literatura menos como uma

    qualidade inerente, ou como um conjunto de qualidades evidenciadas por certos tipos de

    escritos. No existe uma essncia da literatura. Qualquer fragmento de escrita pode ser

    lido no - pragmaticamente.

    2 Renato Garcia Cardoso acadmico do Curso de Licenciatura em Letras da Universidade Estadual de Gois,

    Unidade de Gois. Professora indicadora do artigo Doutora Maria Eugnia Curado, do curso de Letras da UEG,

    UnU cidade de Gois.

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    Eagleton (2006) defende que se no possvel ver a literatura como uma categoria

    objetiva, descritiva, tambm no possvel dizer que a literatura apenas aquilo que,

    caprichosamente, queremos chamar de literatura. Isso porque no h nada de caprichoso

    nesses tipos de juzos de valor: eles tm suas razes em estrutura mais profundas de crenas,

    to evidentes e inabalveis quanto o edifcio do Empire State. Portanto, o que descobrimos

    at agora no apenas que a literatura no existe da mesma maneira que os insetos, e que

    os juzos de valor que a constituem so historicamente variveis, mas que esses juzos tm,

    eles prprios, uma estreita relao com as ideologias sociais.

    Souza (2007) salienta que se a pergunta: o que literatura? for feita a uma pessoa

    que, mesmo que seja interessada por livros e no seja da rea de Letras, causar embarao

    ao destinatrio da pergunta. A resposta ser no sentido de que a literatura uma obra

    escrita, um romance, livros de poesias, livros de contos e outros.

    A mesma pergunta, se feita aos que se ocupam profissionalmente com a literatura,

    tambm seria embaraosa. No por ser impertinente ou sem sentido, nem porque sua

    resposta seja bvia; ao contrrio, a perturbao do interrogado derivar de sua familiaridade

    com o carter complexo da questo proposta.

    As Funes da Literatura: funo Pedaggico-Moralista

    Silva (1973) confere literatura funo poltico-social, a literatura com a funo

    pedaggico-moralista, aquela que molda quem l. Seriam por exemplo, as fbulas. Critica

    a literatura entendida segundo critrios de valor de Sartre.

    Destaca a Literatura Comprometida, em defesa de determinados valores morais,

    polticos e sociais, nasce de uma deciso livre do escritor; a Literatura Planificada ou Dirigida,

    os valores a defender so impostos; Plato, em seu moralismo esttico busca em Scrates

    suas reflexes. Scrates reduz o conceito de beleza utilidade. As coisas belas se identificam

    com as coisas de boa utilidade. Neste sentido, a literatura se direciona em algo pedaggico.

    O estudioso defende que o problema das relaes da literatura com a moral insere-se

    logicamente no quadro mais amplo das relaes da literatura com a utilidade, conclui pela

    impossibilidade de associar os valores literrios a valores morais. Gautier, citado por Silva

    (1973) observa que este af moralizante no possui qualquer dimenso universalista.

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    Os romnticos tinham oposto, s exigncias moralizantes de recorte tradicionalista,

    uma moral baseada na intensidade da paixo e dos sentimentos e nos direitos e deveres da

    decorrentes: os defensores da arte pela arte adotam antes uma atitude de cabal

    amoralismo.

    No movimento literrio que na segunda metade do sculo XVI se desenvolveu em

    torno da Potica, encontramos duas representaes da catarse: uma interpretao moralista

    e uma interpretao mitridtica.

    Gneros Literrios: drama e romantismo

    Silva (1973) salienta que a lrica, com efeito, no representa o mundo exterior o

    objetivo, nem a interao do homem e deste mesmo mundo, assim se distinguindo

    fundamentalmente da narrativa e do drama.

    A poesia lrica no nasce do anseio ou da necessidade de descrever o real que se

    estende perante o eu, nem do desejo de criar sujeitos independentes do eu do poeta lrico.

    A lrica enraza-se na revelao e no aprofundamento do prprio eu, na imposio do ritmo,

    da tonalidade, das dimenses, enfim, desse mesmo eu, a toda a realidade.

    Tanto o romance como o drama apresentam personagens situadas num determinado

    contexto, em certo lugar e em certa poca, mantendo entre si mtuas relaes de harmonia,

    de conflito, etc. Estas personagens revelam-se atravs de uma srie de acontecimentos,

    podendo contar-se a histria de um romance ou de um drama, mas nunca de um poema

    lrico.

    O drama, por sua vez, procura representar tambm a totalidade da vida, mas atravs

    de aes humanas que se opem, de forma que o fulcro daquela totalidade reside na coliso

    dramtica. A verdadeira unidade de sentido dramtica no pode derivar seno do

    movimento total, o que significa que o conflito deve encontrar a sua explicao exaustiva

    nas circunstncias em que se produz.

    Deste modo, a profuso de figuras, de incidentes e de coisas que caracterizam o

    romance, no existe no drama, onde tudo se subordina s exigncias da dinmica do

    conflito, a atmosfera do drama rarefeita, as figuras suprfluas so eliminadas, os episdios

    laterais abolidos, defrontando-se as personagens necessrias e desenvolvendo-se entre elas

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    uma ao que conduz sem desvios ao conflito. O gnero dramtico que se manifesta atravs

    do trgico e do cmico, representa o conflito do homem em seu mundo.

    Segundo Aristteles citado por Moura (2009), a comdia a imitao de maus

    costumes, no, contudo de toda sorte de vcios, mas s daquela parte do ignominioso que

    o ridculo. O riso a sua energia e deve ser combinado com a intriga ou com a observao

    moral.

    Romantismo

    O Romantismo se originou na Alemanha e Inglaterra em fins do sculo XVIII e se

    desenvolveu no Brasil no sculo XIX, constituindo o verdadeiro perodo de nossa literatura, a

    poesia enriqueceu-se admiravelmente, criaram-se o romance e o teatro nacionais e formou-

    se pela primeira vez, um razovel pblico leitor.

    A marca principal da poesia romntica a expresso plena dos sentimentos pessoais,

    com autores voltados para seu mundo interior e fazendo da literatura um meio de desabafo

    e confisso. Essa nsia de libertao, que nasce no interior do poeta, em determinado

    momento alcana tambm o nvel social, com o artista romntico colocando-se como porta-

    voz dos oprimidos e usando seu talento para protestar contra as injustias sociais, ao

    mesmo tempo em que valoriza a ptria.

    De acordo com Abdala Jnior (1986), o projeto nacional do Romantismo inclua a

    criao de um teatro brasileiro. O autor destaca as principais peas do teatro romntico:

    Antnio Jos ou o poeta e a Inquisio, primeira tragdia de assunto nacional, de Gonalves

    de Magalhes; O juiz de paz da roa, O Judas em sbado de Aleluia, O Novio, de Martins

    Pena; Cames e o jau, de Casimiro de Abreu; Leonor de Mendona, de Gonalves Dias,

    escrita na juventude do escritor; e O demnio familiar, de Jos de Alencar.

    Jos de Alencar

    Jos Martiniano de Alencar nasce a 1 de maro de 1829, em Mecejana, Cear. Filho de

    Jos Martiniano de Alencar (ex-padre) e Ana Josefina. O pai, por amor de sua me,

    abandonou o sacerdcio quando conheceu sua prima para se casarem.

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    Em 1832, o pai eleito senador, e, dois anos depois, em 1834, torna-se presidente da

    provncia do Cear, cargo que deixa em 1837, dirigindo-se no ano seguinte, em 1838, ao Rio

    de Janeiro. Alencar viaja com o pai.

    Em 1840, Alencar completa sua instruo primria, e em 1844, aos 15 anos, inscreve-

    se nos cursos preparatrios Faculdade de Direito de So Paulo. Datam de seus anos de

    faculdade as primeiras publicaes de Alencar. Com outros primeiranistas da faculdade

    funda uma revista semanal Ensaios Literrios.

    Em 1848, aos 18 anos, transfere-se para a Faculdade de Direito de Olinda. Nessa

    poca comea a redigir dois romances histricos: A Alma de Lzaro e O Ermito da Glria.

    Em fins deste mesmo ano, manifestam-se os primeiros sinais de tuberculose que acabariam

    por mat-lo. obrigado a voltar a So Paulo, onde se forma em 1850.

    Em 1851, aos 22 anos, Alencar inicia-se na profisso de advogado, que exercer at o

    fim da vida, com raras interrupes. Instalado no Rio de Janeiro, Alencar convidado por seu

    ex-colega de faculdade, Francisco Otaviano, a colaborar no jornal Correio Mercantil.

    Alencar estria como jornalista aos 25 anos, em 1854, e faz muito sucesso. Tanto,

    que no ano seguinte, gerente e redator-chefe de outro jornal, O Dirio do Rio de Janeiro,

    onde publica folhetins sobre fatos variados e uma srie de crticas ao poema sob o

    pseudnimo de Ig. Vrias.

    Em 1857, o sucesso de O Guarani leva Alencar a tentar o mesmo sucesso no teatro.

    Escreve uma opereta, Noite de So Joo e duas comdias, Verso e Reverso e O demnio

    familiar.

    Em 1860, estria o drama Me. A seguir, Alencar viaja para o Cear, candidata-se a

    deputado pelo Partido Conservador e eleito. Comea ento a carreira poltica. Em 1861,

    estreia na tribuna parlamentar. Em 1862, escreve Lucola e o primeiro volume de As Minas

    de Prata.

    Em 1864, casa-se com Ana Cochrane, filha de um mdico homeopata ingls, da

    mesma famlia do Almirante Cochrane, heri da luta pela Independncia.

    Em 1868, aos 39 anos, Alencar torna-se Ministro da Justia. No ano seguinte,

    candidata-se ao Senado e obtm o primeiro lugar. Deixa o Ministrio e volta Cmara em

    oposio ao Imperador, que veta seu nome ao Senado. O veto do Imperador encerra sua

    carreira poltica e desencantado, se volta para a literatura.

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    Em 1877, Alencar viaja Europa em tratamento de sade, mas no consegue se

    recuperar. Volta ao Rio, onde morre a 12 de setembro do mesmo ano, aos 48 anos.

    Relembrando Alencar, escreve Machado de Assis: Tinha-lhe afeto, conhecia-o desde o

    tempo em que ele ria, no me podia acostumar ideia de que a trivialidade da morte

    houvesse desfeito esse artista fadado para distribuir a vida.

    Beraldo (1980) destaca a literatura e sua funo social, os escritores daquele tempo

    sentiam-se no dever de exaltar a terra e conscientizar os leitores da realidade em que

    viviam. Ora, Alencar, como nenhum outro, tinha conscincia desse papel da literatura.

    Alencar idealizou a realidade, embora em menor grau. As personagens principais dos

    romances histricos, indianistas e regionalistas, tm um porte herico: so personagens

    inteirias, sem vacilao ou hesitao, possuem todas as caractersticas dos heris;

    encarnam todas as virtudes fsicas e morais; o mal no os atinge.

    Abdala Jnior (1986) destaca Jos de Alencar como maior ficcionista romntico

    brasileiro, que pretendia formar uma literatura autenticamente brasileira, e de certa forma,

    conseguiu realizar seu objetivo, uma vez que seu conjunto de obras de fico constitui o

    panorama histrico do Brasil.

    Ressalta que o escritor destacou-se entre os intelectuais de seu tempo, acreditou na

    funo literria como criadora de uma conscincia. No s teve muito presente essa

    funo, como trabalhou no sentido de revel-la.

    Abdala Jnior (1986) cita que sua vasta obra, composta de 21 romances e mais 8

    peas teatrais, alguns ensaios crtico-literrios e escritos polticos, atesta um escritor

    esforado em retratar o pas, ou ainda compreend-lo em sua diversidade. Como romntico,

    Alencar no poderia deixar de visitar a Histria e dela haurir temas para sua obra.

    Segundo Tufano (1983), Jos de Alencar o mais importante prosador do

    Romantismo, tendo inclusive lutado pela criao de uma lngua literria mais prxima do

    falar brasileiro.

    Salienta que sua obra romanesca vasta, abrangendo todas as tendncias

    desenvolvidas na poca. Em seu conjunto de obras, merecem destaque os romances sociais,

    em que o autor faz uma representao bastante crtica das relaes humanas na sociedade

    carioca da poca.

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    E apesar dos ingredientes sentimentais e dos arranjos para que tudo termine com um

    final feliz, Alencar pe a nu a hipocrisia e a corrupo das classes altas, que se mostram

    preocupadas apenas com a ostentao do luxo e a manuteno de seus privilgios.

    O Demnio familiar

    O demnio familiar uma pea teatral do escritor brasileiro Jos de Alencar escrita

    em 1857, uma comdia em quatro atos, um drama de costumes leve. O moleque escravo

    domstico Pedro tece uma srie de armaes sem medir consequncias, a fim de casar seus

    patres com pessoas abastadas e realizar seu sonho de ser cocheiro de um rico senhor.

    Segundo Bosi (1994) caberia a Jos de Alencar insistir na dose de brasilidade que

    esse drama de costumes deveria conter. Para tanto, comps Verso e Reverso, pea ligeira de

    ambientao carioca, e O demnio familiar, comdia em que os vaivens da intriga so obra

    de um escravo, moleque enredador e ambicioso.

    Embora o mau carter de Pedro, o demnio familiar, seja o piv dos embaraos de

    uma famlia de bem, no se pode, na anlise desta comdia, forar a nota do preconceito,

    ao menos enquanto consciente.

    No ltimo ato, o moleque alforriado para que, fora da irresponsabilidade em que

    vivera como escravo possa escolher honradamente seu caminho:

    Toma: a tua carta de liberdade, ela ser a tua punio de hoje em diante, porque as tuas faltas recairo unicamente sobre ti; porque a moral e a lei te pediro uma conta severa de tuas aes. Livre, sentirs a necessidade do trabalho honesto e apreciars os nobres sentimentos que hoje no compreendes. (PEDRO beija-lhe a mo.). (ALENCAR, 2003, p. 90-91)

    Para Bosi (1994), essa, naturalmente, a inteno tica de Alencar ao redigir a

    comdia. O que ficou, porm, foi a figura do moleque irrecupervel: Pedro apenas mudar

    de senhor, realizando seu sonho dourado ser cocheiro de um rico major, funo que

    permitir zombar com desprezo os cocheiros de aluguel. Ficou o esteretipo, vivo na cultura

    escravocrata brasileira, do negrinho maroto, astuto, no fundo cnico por incapacidade de

    coerncia moral: imagem que deixa entrever um preconceito mais tenaz, porque latente.

    De acordo com Beraldo (1980) nos romances urbanos que Alencar consegue criar

    os seus melhores personagens, extremamente complexas, em que o bem e o mal se

    entrelaam. E destaca a pea O demnio familiar, o demnio Pedro, moleque escravo

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    que provoca os acontecimentos da histria, enreda os brancos. Ao final, Pedro alforriado,

    e a pea termina com o antigo senhor de Pedro falando em liberdade e responsabilidade.

    Moura (2009) cita que era costume que as famlias mantivessem em seu seio familiar

    um moleque escravo com entrada e sada franqueada em casa. Este moleque geralmente

    participava da intimidade familiar, transitava pela casa, alimentava-se das refeies dos

    senhores, partilhava das brincadeiras das crianas da casa. No caso da pea de Alencar, este

    moleque Pedro, ambicioso e estrategista. Esta incapacidade de coerncia moral

    transforma Pedro num ser inconsequente que s pensa em seu projeto: ser cocheiro de um

    rico senhor:

    PEDRO - Oh! Trata muito bem, mas Pedro queria que senhor tivesse muito dinheiro e comprasse carro bem bonito para...

    EDUARDO - Para... Dize!

    PEDRO - Para Pedro ser cocheiro de senhor!

    EDUARDO - Ento a razo nica de tudo isto o desejo que tens de ser cocheiro?

    PEDRO - Sim, senhor!

    EDUARDO (rindo-se) - Muito bem! Assim, pouco te importava que eu ficasse mal com uma pessoa que estimava; que me casasse com uma velha ridcula, contanto que governasses dois cavalos em um carro! Tens razo!... E eu ainda devo dar-me por muito feliz, que fosse esse o motivo que te obrigasse a trair a minha confiana. (ALENCAR, 2003, p. 35-36)

    Para atingir seu objetivo, Pedro promove uma srie de mal-entendidos:

    enreda uns contra os outros; troca os versos destinados a Henriqueta com os da viva e vice-

    versa; tenta aproximar Eduardo e a viva; induz Carlotinha a mandar uma flor a Alfredo;

    mente a Azevedo a respeito de Henriqueta; entre outras. Para Moura (2009), o autor leva o receptor a refletir sobre valores morais e humanos

    daquela sociedade. Com esta inteno, at certo ponto moralizadora, faz Eduardo dar a

    carta de Alforria a Pedro:

    EDUARDO - Por que, minha irm? Todos devemos perdoar-nos mutuamente; todos

    somos culpados por havermos acreditado ou consentido no fato primeiro, que a

    causa de tudo isto. O nico inocente aquele que no tem imputao, e que fez

    apenas uma travessura de criana, levado pelo instinto da amizade. Eu o corrijo,

    fazendo do autmato um homem; restituo-o sociedade, porm expulso-o do seio

    de minha famlia e fecho-lhe para sempre a porta de minha casa. (A PEDRO) Toma:

    a tua carta de liberdade, ela ser a tua punio de hoje em diante, porque as tuas

    faltas recairo unicamente sobre ti; porque a moral e a lei te pediro uma conta

    severa de tuas aes. Livre, sentirs a necessidade do trabalho honesto e

    apreciars os nobres sentimentos que hoje no compreendes. (PEDRO beija-lhe a

    mo.) (ALENCAR, 2003, p. 90-91)

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    De acordo Moura (2009) se observarmos mais atentamente a pea O demnio

    familiar, poderemos verificar que alguns detalhes se encaixam nas caractersticas do teatro

    romntico moderno.

    Um importante aspecto a ser observado so os valores sociais e humanos que

    norteiam a sociedade, em especial uma famlia de bem. Estas mensagens vm atravs das

    palavras de Eduardo nas vrias situaes criadas. Por exemplo, quando fala sua irm sobre

    o papel do irmo no seio familiar, deixa implcita a condio da mulher frgil que necessita

    da proteo do homem numa sociedade patriarcal:

    EDUARDO - Mais um motivo. Um irmo, Carlotinha, para sua irm menos do que

    uma me, porm mais do que um pai; tem menos ternura do que uma, e inspira

    menos respeito do que o outro. Quando Deus o colocou na famlia a par dessas

    almas puras e inocentes como a tua, deu-lhe uma misso bem delicada; ordenou-

    lhe que moderasse para sua irm a excessiva austeridade de seu pai e a ternura

    muitas vezes exagerada de sua me; ele homem e moo,conhece o mundo,

    porm tambm compreende o corao de uma menina, que sempre um mito

    para os velhos j esquecidos de sua mocidade. Portanto, a quem melhor podes

    contar um segredo do que a mim?

    CARLOTINHA - verdade, suas palavras me decidem. Voc meu irmo, e o chefe

    da nossa famlia, desde que perdemos nosso pai. Devo dizer-lhe tudo; tem o direito

    de repreender-me! (ALENCAR, 2003, p. 38-39)

    Moura (2009) salienta que valores morais tambm so veiculados pelas palavras de

    Eduardo quando discute a questo do casamento com Azevedo, que se revela um sujeito

    mau carter:

    AZEVEDO - Decerto!... Uma mulher indispensvel, e uma mulher bonita!... o

    meio pelo qual um homem se distingue no grand monde!... Um crculo de

    adoradores cerca imediatamente a senhora elegante, espirituosa, que fez a sua

    apario nos sales de uma maneira deslumbrante! Os elogios, a admirao, a

    considerao social acompanharo na sua ascenso esse astro luminoso, cuja

    cauda uma crinolina, e cujo brilho vem da casa do Valais ou da Berat, custa de

    alguns contos de ris! Ora, como no matrimnio existe a comunho de corpo e de

    bens, os apaixonados da mulher tornam-se amigos do marido, e vice-versa; o

    triunfo que tem a beleza de uma, lana um reflexo sobre a posio do outro. E

    assim consegue-se tudo!

    EDUARDO - Tu gracejas, Azevedo; no possvel que um homem aceite

    dignamente esse papel. A mulher no , nem deve ser, um objeto de ostentao

    que se traga como um alfinete de brilhante ou uma jia qualquer para chamar a

    ateno! (ALENCAR, 2003, p. 23-24)

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    Segundo Moura (2009), contata-se durante o desenrolar da trama, que atravs das

    palavras de Eduardo, no papel de bom moo, o autor manda seus recadinhos aos

    espectadores ou leitores. As falas desta personagem so geralmente longas e recheadas de

    lies.

    Estas lies versam sobre os costumes de ento, como a famlia ser vista com um

    templo, o templo da felicidade domstica; a manuteno dos costumes que fazem manter

    a famlia unida, o respeito palavra dada e escolha dos filhos em relao ao matrimnio; a

    confiana no poder da educao oferecida pelos pais aos filhos; a paz estabelecida no seio

    familiar. Eduardo o porta-voz das mensagens do autor, mas com o cuidado de no

    melindrar espectadores ou leitores com suas reflexes morais.

    Uemori (2004) cita que Jos de Alencar, abordou o tema da escravido em sua pea

    O demnio familiar. Tentou mostrar a relao de escravos e senhores no mbito familiar.

    Surpreende a presena de um escravo, no caso o menino Pedro, nessa obra, j que os negros

    estiveram praticamente ausentes nos outros trabalhos do autor. Quando apareciam eram

    personagens secundrios, de pouqussima relevncia para a trama. Compreende-se essa

    ausncia quando se sabe que escravos e escravido eram termos proibidos nos textos

    oficiais e nas obras literrias durante o Romantismo.

    O estudioso defende que na obra de Alencar a famlia ocupa um lugar importante,

    bem como os que querem desagreg-la. Em O demnio familiar o inimigo no um

    invasor, mas est dentro da famlia e escravo. O moleque Pedro no a personagem tpica

    do escravo fiel e resignado e nem o escravo vingativo e cruel, dois esteretipos da poca;

    nem o servial autmato cumpridor de ordens. Ele malandro, intrigueiro, alcoviteiro,

    egosta, interesseiro, mentiroso que manipula o seu senhor (Eduardo) e as outras

    personagens brancas.

    Eduardo, cansado das diabruras do moleque, aplica-lhe um castigo: liberta-o. Visava,

    mediante esse ato, estabelecer a hierarquia e expulsar o demnio familiar; portanto, no a

    palmatria que corrigir Pedro. A alforria tinha dois objetivos: punir e educar. A expulso

    salva a famlia e transforma Pedro de escravo em cidado. A mudana na ordem jurdica o

    obrigar a ser responsvel pelos seus atos, dando-lhe o sentido de obrigao moral.

    De acordo com Uemori (2004), na obra literria de Alencar existem vrios

    demnios ameaando a famlia e o carter nacional brasileiro. O casamento por interesse,

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    a influncia estrangeira e a corrupo moral introduzida pelos escravos. Alencar queria

    salvar a famlia patriarcal pela alforria.

    O Demnio Familiar: uma anlise Pedaggico-Moralista

    Uma breve anlise se faz pertinente no sentido de estabelecer um dilogo entre o

    estudo da obra e das teorias mencionadas. Destacaremos algumas ideias importantes:

    Silva (1973) confere literatura funo poltico-social, a literatura com a funo

    pedaggica moralista, que molda quem l. Seriam por exemplo, as fbulas. Critica a

    literatura entendida segundo critrios de valor de Sartre. Salienta a Literatura

    Comprometida, em defesa de determinados valores morais, polticos e sociais, nasce de uma

    deciso livre do escritor; Literatura Planificada ou Dirigida, os valores a defender so

    impostos; Plato, em seu moralismo esttico busca em Scrates suas reflexes. Scrates

    reduz o conceito de beleza utilidade. As coisas belas se identificam com as coisas de boa

    utilidade.

    Romantismo, movimento que expressa um forte engajamento na reforma social e ao

    qual Jos de Alencar se destaca como representante. Neste sentido, Tufano (1983) salienta

    que sua obra romanesca vasta, abrangendo diferentes tendncias desenvolvidas na poca.

    Em seu conjunto de obras, merecem destaque os romances sociais, em que o autor faz uma

    representao bastante crtica das relaes humanas na sociedade carioca da poca. Apesar

    dos ingredientes sentimentais e dos arranjos para que tudo termine com um final feliz,

    Alencar pe a nu a hipocrisia e a corrupo das classes altas, que se mostram preocupadas

    apenas com a ostentao do luxo e a manuteno de seus privilgios.

    De acordo Moura (2009), contata-se durante o desenrolar da trama, que atravs das

    palavras de Eduardo, no papel de bom moo, Jos de Alencar manda seus recadinhos aos

    espectadores ou leitores. As falas desta personagem so geralmente longas e recheadas de

    lies.

    Uemori (2004) defende que na obra de Alencar a famlia ocupa um lugar importante,

    bem como os que querem desagreg-la. Em O demnio familiar o inimigo no um

    invasor, mas est dentro da famlia e escravo.

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    Bosi (1994) destaca no ltimo ato, o momento em que o moleque alforriado para

    que, fora da irresponsabilidade em que vivera como escravo possa escolher honradamente

    seu caminho:

    Toma: a tua carta de liberdade, ela ser a tua punio de hoje em diante, porque as tuas faltas recairo unicamente sobre ti; porque a moral e a lei te pediro uma conta severa de tuas aes. Livre, sentirs a necessidade do trabalho honesto e apreciars os nobres sentimentos que hoje no compreendes. (PEDRO beija-lhe a mo.). (ALENCAR, 2003, p. 90-91)

    Defende que essa, naturalmente, era a inteno tica de Alencar ao redigir a

    comdia.

    E Para Uemori (2004), a alforria tinha dois objetivos: punir e educar. A expulso salva

    a famlia e transforma Pedro de escravo em cidado. A mudana na ordem jurdica o

    obrigar a ser responsvel pelos seus atos, dando-lhe o sentido de obrigao moral.

    Concluso

    Na perspectiva de que o resultado deste estudo possa contribuir para ampliao e

    aprofundamento aos estudos literrios. Analisamos a pea teatral O demnio familiar,

    uma das obras do grande representante do Romantismo, Jos de Alencar. Investigando a

    presena de uma das funes da literatura apontadas por Silva (1973), esta, a funo

    pedaggico-moralista.

    O estudo da obra em questo foi desenvolvido de forma gradativa, a realizao desta

    pesquisa de carter terico, por meio de pesquisa bibliogrfica, com cotejamento da teoria

    e aplicao na obra em questo.

    Neste sentido, uma vez que, segundo Silva (1973), as coisas belas se identificam com as

    coisas de boa utilidade, a literatura se direciona em algo pedaggico. Confere literatura

    funo poltico-social, a literatura com a funo pedaggico-moralista, aquela que molda

    quem l.

    Moura (2009) defende que na trama, atravs das palavras de Eduardo, no papel de

    bom moo, o autor manda seus recadinhos aos espectadores ou leitores. As falas desta

    personagem so geralmente longas e recheadas de lies.

    Para Uemori (2004), a alforria tinha dois objetivos: punir e educar. A expulso salva a

    famlia e transforma Pedro de escravo em cidado. A mudana na ordem jurdica o obrigar

    a ser responsvel pelos seus atos, dando-lhe o sentido de obrigao moral.

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    E Bosi (1994) destaca no ltimo ato, o momento em que o moleque alforriado para

    que, fora da irresponsabilidade em que vivera como escravo possa escolher honradamente

    seu caminho:

    Toma: a tua carta de liberdade, ela ser a tua punio de hoje em diante, porque as tuas faltas recairo unicamente sobre ti; porque a moral e a lei te pediro uma conta severa de tuas aes. Livre, sentirs a necessidade do trabalho honesto e apreciars os nobres sentimentos que hoje no compreendes. (PEDRO beija-lhe a mo.). (ALENCAR, 2003, p. 90-91)

    Defendendo que essa, naturalmente, era a inteno tica de Jos de Alencar ao

    redigir a comdia.

    Assim, com esta pesquisa, atravs do cotejamento terico e aplicao na obra,

    embasados nas teorias mencionadas, podemos verificar que a funo pedaggico-moralista

    da literatura se faz autntica em O demnio familiar, de Jos de Alencar.

    Referncias ABDALA JUNIOR, B. Tempos da literatura brasileira. 2. ed. tica, 1986.

    ALENCAR, J. O demnio familiar. 2. ed. Campinas, SP: Pontes, Editora Kelps, 2003.

    BERALDO, J. Literatura comentada. So Paulo: Educao Abril, 1980.

    BOSI, A. Histria Concisa da Literatura Brasileira. 32. ed. So Paulo: Cultrix, 1994.

    CALDIN, C. A leitura como funo pedaggica: o literrio na escola. Rev. ACB: Biblioteconomia em Santa Catarina, v. 7, n. 1, p. 22-33, 2002.

    EAGLETON, T. Teoria da Literatura. Uma introduo. Trad. Waltensir Dutra. 6. ed. So Paulo: Martins Fontes, 2006.

    PLATO. A Repblica: [ou sobre a justia, dilogo poltico]. Traduo Anna Lia Amaral de Almeida Prado. So Paulo: Martins Fontes, 2006.

    SILVA, V. Teoria da Literatura. 3. ed. Coimbra: Livraria Almeida, 1973.

    SOUZA, R. Teoria da Literatura. 10. ed. So Paulo, tica: 2007.

    TUFANO, D. Estudos de literatura brasileira. 3. ed. Moderna, 1983.

    UEMORI, C. Escravido, nacionalidade e mestios polticos. Lutas Sociais, n. 11/12, p. 85-97, 2004.

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    Educao ambiental como instrumento para preservao e proteo do meio ambiente: aspectos pedaggicos e jurdicos Willian Flgge Carvalho

    3

    Resumo O presente trabalho tem por objetivo demonstrar a relevncia da educao ambiental como instrumento positivo e eficaz para a preservao e proteo do meio ambiente. Atravs de pesquisas bibliogrficas apresentam-se alguns dos principais pontos que auxiliam para o estudo e compreenso do tema, tais como: movimentos internacionais propulsores da tutela ambiental no mundo, a legislao nacional como mecanismo para se difundir e inserir a educao ambiental no mbito escolar, os Parmetros Curriculares Nacionais (PCNs) exibindo o meio ambiente como tema transversal para a educao ptria, a interdisciplinaridade integrando diversos saberes e melhorando o entendimento sobre a problemtica das questes ambientais e, a educao ambiental como utenslio para a tutela natural. No mais, sublinha-se a essencialidade da educao voltada aos temas ecolgicos como pilar para educar e conscientizar cidados sobre a imprescindibilidade do meio ambiente. Palavras-chave: Educao Ambiental. Meio Ambiente. Tutela. Escola.

    Introduo

    Fora pela realizao de movimentos internacionais relacionados ao meio ambiente

    que se percebeu, face difusividade planetria que obtiveram, a necessidade de um mtodo

    que, antes de tudo, conscientizasse e oferecesse aos indivduos informaes sobre

    problemas ambientais. Haja vista estarem as atividades antrpicas em um contexto global

    ocasionando desde priscas eras o extermnio de recursos naturais em diversas regies do

    planeta.

    Nessa senda, elaboram-se continuamente inmeros mecanismos de tutela ao meio

    ecolgico visando frear o processo de degradao do meio ambiente. Dentre os

    instrumentos criados para preservar e proteger o referido meio, encontra-se a educao

    ambiental, que progressivamente tem ganhando fora e espao no Brasil com a edio de

    leis e outras regras governamentais ao mbito educacional.

    Nesse palco, a educao ambiental insere-se como tipo de educao poltica, no

    sentido de que ela reivindica e prepara os cidados para exigir justia social, cidadania

    nacional e planetria, autogesto e tica nas relaes sociais e com a natureza (REIGOTA,

    1996, p. 10).

    3 Willian Flgge Carvalho graduando do 10 perodo do curso de Direito da Faculdade de Jussara FAJ, da

    cidade de Jussara, Gois. Professor indicador doutor Clovis Carvalho Britto, Universidade de Braslia

    UNB/UEG.

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    A maioria destes trabalhos aponta primordialmente fatos externos, notadamente

    intergovernamentais realizados pelas Naes Unidas que cooperaram para a construo da

    educao em comento, derribando a ideia de uma educao ambiental nacional destituda

    de influncias aliengenas. No mais, enfatiza-se o avano legislativo vernculo, bem como as

    polticas pblicas em geral relevantes formao e insero desse tipo de educao nas

    escolas e no meio social. Tambm, observa-se que a educao ambiental deve ligar-se

    transversalidade e interdisciplinaridade, levando em conta serem diretrizes adotadas pelo

    sistema de ensino que a permitem disseminar e ser aplicada sociedade em geral. Salienta-

    se ainda que a efetividade da citada educao se sujeita participao de diversos atores

    sociais, como escola e comunidade, o que promove o roto paulatino do arcaico modelo

    formal de ensino.

    Desta feita, com o propsito de elucidar o tema educao ambiental e expor a

    proeminncia da questo face aos problemas ambientais vividos pelo mundo,

    particularmente por nosso pas, que este trabalho direciona-se ao esclarecimento da

    temtica, a fim de propiciar estudo e conhecimento.

    Educao ambiental: alguns passos para a universalidade

    Os movimentos ecologistas estrearam no mundo em pocas que no muito se distam

    dessa. Tiveram origem em um momento da histria recente em que a utopia e as energias

    para transformao da sociedade estavam em alta (CARVALHO, 2011, p. 46). Na Europa,

    especialmente em Paris Frana, e nos Estados Unidos, nos anos de 1960, clamava-se por

    um planeta mais azul (CASCINO, 1999, p. 31). As manifestaes ideolgicas e as

    reivindicaes por direitos diferenciados no continente europeu e americano cooperaram

    para a edificao de uma preocupao ambiental que logo se ramificaria pelo mundo. No

    Brasil, no muito diferente, at a segunda metade do perodo novecentista (1960),

    prevalecia a convico de que seriam infinitas as fontes de recursos naturais e de que o

    livre mercado maximizaria o bem-estar social (TACHIZAWA, 2006, p. 44).

    Hodiernamente, com a disseminao de pesquisas e estudos cientficos cada vez mais

    acessveis s pessoas de todo mundo, a mentalidade arcaica alimentada at 1960 vem sendo

    dirimida, e, por consequncia, instituindo-se gradativamente um novo modelo de

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    conscientizao. Os movimentos internacionais realizados pela Organizao das Naes

    Unidas ONU em beneplcito do meio ambiente constituem mecanismos importantes que

    contribuem para o influxo de novos mtodos de tutela ao meio natural.

    Em 1972, em Estocolmo Sucia realizou-se o primeiro grande movimento

    internacional em prol do meio ambiente. A Conferncia das Naes Unidas sobre Meio

    Ambiente Humano, conhecida como Conferncia de Estocolmo, contribuiu de maneira

    importante para gerar um novo entendimento sobre os problemas ambientais e a maneira

    como a sociedade prev sua subsistncia (CAMPOS; NETO; SHIGUNOV, 2009, p. 60).

    Destaca-se, entretanto, que durante a constncia de Estocolmo, elaborou-se o documento

    intitulado: Declarao de Estocolmo sobre o Meio Ambiente Humano, o qual trouxe

    expressamente 26 (vinte e seis) princpios. Enquanto o princpio 19 (dezenove) do citado

    documento fomentou a necessidade da insero da educao ambiental como instrumento

    a incentivar e fortalecer a proteo do meio ambiente, devendo ser exercida por todos os

    integrantes da sociedade.

    Em 1975, a United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization

    UNESCO, rgo da ONU incumbido de promover e divulgar questes educacionais atravs de

    reunies e seminrios internacionais, organizou na Iugoslvia, em Belgrado, a reunio de

    especialistas em educao, biologia, geografia e histria, e entre outros (REIGOTA, 1996, p.

    16), com o intuito de se definir pressupostos norteadores para a educao ambiental no

    mundo. Atravs da Carta de Belgrado (CASCINO, 1999, p. 55), fixaram-se alguns objetivos

    que colocaram a educao ambiental como meio de conhecimento e soluo para diversos

    problemas ambientais.

    Em 1982, a partir da avaliao dos dez anos ps-Estocolmo, orientada pelo PNUMA,

    foi constituda, em Nairbi, no Qunia, a Comisso Mundial de Meio Ambiente e

    Desenvolvimento *...+ (MASCARENHAS, 2008, p. 25), a qual foi implementada no ano

    seguinte pela ONU e teve como meta estabelecer discusses e metas entre os Estados para a

    proteo climtica, enaltecendo a preocupao com o meio ambiente e com estudos sua

    tutela em todo planeta. Anote-se que em 1987, como fator categrico de sua realizao,

    fora criado o Relatrio Brundtland, alcunhado como Nosso Futuro Comum, publicado em

    1988 para propagar o entendimento do *...+ desenvolvimento sustentvel como o que

    realiza as necessidades do presente sem comprometer a habilidade das futuras geraes de

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    as satisfazerem, prioriza as camadas mais pobres da populao e estabelece condies

    bsicas para o desenvolvimento e a conservao dos ecossistemas (MASCARENHAS, 2008,

    p. 26).

    No ano de 1992, a Assembleia Geral da ONU realizou no Rio de Janeiro Brasil, a

    Conferncia das Naes Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD),

    conhecida tambm como Rio-92, ECO-92 ou Cpula da Terra. Pelo encontro dos Estados,

    houve a criao de *...+ importantes documentos como a Agenda 21 [...+ (MASCARENHAS,

    2008, p. 29). A Agenda 21 traou estratgias e metas globais para a criao de mecanismos

    de desenvolvimento sustentvel e ao estabelecimento de polticas para sua efetivao.

    Sobreleva mencionar, entretanto, que apesar da paulatina pulverizao de iniciativas

    em prol do meio ambiente ocorridas mundialmente desde a dcada de 1960, a Educao

    Ambiental (EA) somente ganhou prestgio e comeou a efetivamente propagar-se e se tornar

    mecanismo hbil proteo ecolgica no estrado interno dos Estados, com o advento da

    Conferncia Intergovernamental sobre Educao Ambiental em 1977, realizada em Tbilisi,

    Gergia (ex-URSS).

    [...] inicia-se um amplo processo em nvel global orientado para criar as condies que formem uma nova conscincia sobre o valor da natureza e para reorientar a produo de conhecimento baseada nos mtodos da interdisciplinaridade e nos princpios da complexidade. Esse campo educativo tem sido fertilizado transversalmente, e isso tem possibilitado a realizao de experincias concretas de educao ambiental de forma criativa e inovadora por diversos segmentos da populao e em diversos nveis de formao (JACOBI, 2003, p. 190).

    De fato, as bases da educao ambiental encontram-se nos eventos internacionais

    produzidos pela Organizao das Naes Unidas, especialmente pelos movimentos

    supramencionados, os quais criaram inmeras diretrizes para a construo de um modelo

    social que levasse em conta o bem-estar humano, alcanando uma situao ideal de justia

    social, para a humanidade, na qual o desenvolvimento scio-econmico, em bases

    eqitativas, estaria em harmonia com os sistemas de suporte da vida na Terra (CORDANI,

    1995, p. 14). Inobstante, as normas decorrentes dos eventos serviram para a mundializao

    da proteo e preservao ambiental, j que muitos Estados, como o Brasil, tornaram-se

    pactuantes dos tratados institudos pelas aes intergovernamentais.

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    Legislao brasileira e diretrizes governamentais para a insero da educao ambiental nas escolas

    No mbito nacional, a influncia dos movimentos externos, como os j mencionados,

    contriburam para a produo de polticas pblicas e eventos no governamentais sobre

    educao ambiental. A legislao ptria, grande modelo da insero de parmetros

    internacionais no ordenamento interno, vem se desenvolvendo concomitante aos novos

    paradigmas da educao, criando mecanismos para a implementao da educao

    ambiental nas escolas.

    Em 1981, a Lei n 6.938 Poltica Nacional do Meio Ambiente , de maneira indita,

    atravs de seu artigo 2, inciso X, incluiu a educao ambiental em todos os nveis de ensino,

    compreendendo tambm a comunidade na participao ativa para a defesa do meio

    ambiente. Todavia, foi com a promulgao da Lex Magna em 1988 que a educao

    ambiental ganhou relevncia e alicerce constitucional para se desenvolver nacionalmente.

    A Constituio vigente buscou trazer a conscincia ecolgica ao povo, titular do

    direito ao meio ambiente, permitindo a efetivao do princpio da participao na

    salvaguarda desse direito (FIORILLO, 2011, p. 126). Por meio do artigo 225, pargrafo 1, e

    inciso VI, do referido diploma, admitiu-se que a educao ambiental fosse utilizada como

    instrumento de tutela ao meio natural. Ademais, a nova ordem de leis superiores fundou o

    Estado Democrtico de Direito baseado na cidadania e dignidade da pessoa humana (artigo

    1, incisos II e III, da CF), por onde a educao tornou-se meio indispensvel para resguard-

    las e promov-las, visto ser um direito de todos e dever do Estado e da famlia, conforme

    preconiza o artigo 205, da Carta da Repblica, in verbis:

    A educao, direito de todos e dever do Estado e da famlia, ser promovida e incentivada com a colaborao da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exerccio da cidadania e sua qualificao para o trabalho (BRASIL, 1988).

    Desse modo, com o vigor da Carta Poltica de 1988 inmeros projetos, eventos e leis

    multiplicaram-se pelo pas, unindo preservao e proteo ambiental necessidade de uma

    educao que considerasse o meio ecolgico parte intrnseca para a formao de indivduos,

    ou seja, um tipo de ensino que alimentasse o ideal de sujeito ecolgico *...+, contribuindo

    para uma cidadania ambientalmente sustentvel (CARVALHO, 2011, p. 69 e 106).

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    Em 1992, por exemplo, durante a realizao da ECO-92, surgiu com objetivos

    especficos o evento no governamental conhecido como Frum Global, o qual reuniu

    diversas Organizaes no Governamentais ONGs, e vrios movimentos sociais ligados ao

    meio ambiente. Como fruto significativo do evento, elaborou-se o Tratado de Educao

    Ambiental para Sociedades Sustentveis, o qual pretendeu abarcar os princpios

    estabelecidos em Tbilisi 1977 (CASCINO, 1999, p. 45). Em verdade, o documento causou

    efeitos positivos no campo educacional e pedaggico brasileiro. Sobre o assunto, Carvalho

    (2011) aponta o seguinte:

    Esse tratado est na base da formao da Rede Brasileira de Educao Ambiental, bem como das diversas redes estaduais, que formam grande articulao de entidades no governamentais, escolas, universidades, e pessoas que querem fortalecer as diferentes aes, atividades, programas e polticas em EA. Essa aposta na formao de novas atitudes e posturas ambientais como algo que deveria integrar a educao de todos os cidados passou a fazer parte do campo educacional propriamente dito e das preocupaes das polticas pblicas. Essa compreenso foi ratificada pela Poltica Nacional da Educao Ambiental [...] (CARVALHO, 2011, p. 54).

    A Poltica Nacional da Educao Ambiental Lei n 9.795/99 , regulamentada pelo

    Decreto 4.281/02, veio reforar e estabelecer metas concretas educao