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0 UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS CURSO DE HISTÓRIA RAIMUNDO DENIZAR DOS SANTOS PIRES A PROFISSÃO DE PESCADOR NO MUNICÍPIO DE ACARAÚ-CE (1996 2013) SOBRAL 2013

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UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS

CURSO DE HISTÓRIA

RAIMUNDO DENIZAR DOS SANTOS PIRES

A PROFISSÃO DE PESCADOR NO MUNICÍPIO DE ACARAÚ-CE

(1996 – 2013)

SOBRAL – 2013

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RAIMUNDO DENIZAR DOS SANTOS PIRES

A PROFISSÃO DE PESCADOR NO MUNICÍPIO DE ACARAÚ-CE

(1996 – 2013)

Monografia apresentada ao Curso de História da Universidade

Estadual Vale do Acaraú - UVA, como parte das exigências para

obtenção do Título de Graduado em História, sob a orientação

do Professor Ms.Carlos Augusto Pereira dos Santos.

SOBRAL - 2013

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RAIMUNDO DENIZAR DOS SANTOS PIRES

A PROFISSÃO DE PESCADOR NO MUNICÍPIO DE ACARAÚ-CE

(1996 – 2013)

Monografia apresentada ao curso de História da Universidade Estadual Vale do

Acaraú - UVA, como parte das exigências para obtenção do titulo de Graduado em

História.

____________________________________________________________

Raimundo Denizar dos Santos Pires

Monografia aprovada em: ________/_______/_______

Orientador:__________________________________________ Professor Msc. Carlos Augusto Pereira dos Santos

1º Examinador: _______________________________________________

Professora Esp. Francisca Elzenita Alexandre

2º Examinador:________________________________________

Professora Msc. Luciana de Moura Ferreira

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Dedico este trabalho em primeiro lugar a Deus, por ter me dado dom

do conhecimento e do discernimento na construção desta pesquisa; à

minha família, que me incentivou para que eu conseguisse realizar

meus sonhos, a todos os professores desde o Ensino Fundamental

até aqui na Faculdade, que juntos comigo caminharam nesta

empreitada. Em especial aos meus amigos que hoje estão juntos de

Deus, são eles Carlão, Germano e Valdir.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço de forma especial a Deus, pela gratuidade em me ajudar nos momentos

mais difíceis desta caminhada acadêmica (e não só nestes), já que em muitos

momentos pensei em desistir e ele me deu forças para continuar vencer com muita

persistência. Agora sei que o quanto vale a pena correr atrás de nossos objetivos.

A minha família, meu pai Raimundo Nonato Pires, a minha mãe Maria José dos

Santos Pires, a quem eu devo tudo, as minhas irmãs, aos meus sobrinhos, a minha

esposa Sandra e a minha razão de viver, minha filhinha Kiara Sany.

Sou grato a todos os meus professores que me ensinaram no Colégio Virgem

Poderosa, por darem comigo o passo inicial desta caminhada e aos meus queridos

professores da Universidade Estadual Vale do Acaraú por amadurecerem meus

pensamentos e ideias.

Ao meu orientador, o professor Carlos Augusto, por ter me auxiliado no êxito deste

trabalho e também pela sua gratuidade e dedicação.

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“É no momento em que tomo consciência de minha

finitude que cada instante de minha vida se carrega

de todo o peso do meu destino. Cada um dos meus

atos se inscreve nele como uma peça nova de uma

edificação irreversível que continua por toda a

duração de minha existência, deixando-me cada

vez mais com o gosto de inacabado”.

Louis-Vicent Thomas

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RESUMO

Neste trabalho de pesquisa busco conhecer e interpretar o modo de vida dos

pescadores no município de Acaraú-Ce, analisando o processo de construção de

sua identidade a partir do contexto social que estão inseridos, quais são os fatores

socioeconômicos ligados à pesca, bem como o papel da sociedade e do Estado em

relação à pesca. Por ser filho de pescador procuro me envolver nesta pesquisa para

entender como é o “mundo” dos pescadores acarauenses, suas alegrias, suas

dificuldades, sua memória, sua cultura diante da prática pesqueira, afinal este tema

também faz parte de minha História. Através desta pesquisa pude conhecer um

pouco da História do município de Acaraú, seu o processo de desenvolvimento

social tendo na pesca, atualmente, seu maior elemento econômico. Conversei com

pessoas ligadas ao tema da pesquisa, pude aprender muito com eles, afinal nós

sempre aprendemos, pois como dizia Paulo Freire “Ninguém ignora tudo. Ninguém

sabe tudo. Todos nós sabemos alguma coisa. Todos nós ignoramos alguma coisa.

Por isso aprendemos sempre”.

Palavras - chaves: Pescador, Pesca, Sociedade, Economia, História.

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ABSTRACT

In this research sought to understand and interpret the livelihood of fishermen in the

city of Acaraú-Ce, analyzing the process of building their cultural identity from the

social context they are inserted, who are the social, cultural, economic, linked to

fishing, and the role of society and the state in relation to fishing. As the son of a

fisherman tried to get involved in this research is to understand how the "world" of

fishermen acarauenses, their joys, their difficulties, their memories, their knowledge

on the practice of fishing, after all this theme is also part of my history. Through this

research I got to know a bit of history of the Municipality of Acaraú, its the process of

social development and fisheries, currently its largest economic element. I talked with

people linked to the topic of research, I learned a lot from them, after all we always

learned, because as Paulo Freire said, "Nobody knows nothing. Nobody knows

everything. We all know something. All we ignore something. So always learn.

Key - words: Fisherman, Fishing, Society, Economics, History

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 10

CAPITULO I - ACARAÚ: ENTRE A TERRA E O MAR ....................................................... 16

1.1. SOB OS OLHARES DO RIO ACARAÚ ..................................................................... 17

1.2. ECONOMIA ACARAUENSE ANTES E DEPOIS DA PESCA .................................... 21

1.3. A FIGURA DO PESCADOR DESCRITA NA LITERATURA ...................................... 28

CAPITULO II - PESCADOR NO MUNICÍPIO DE ACARAÚ ................................................ 33

2.1. ANÁLISE SOCIAL DO PESCADOR ACARAUENSE ................................................ 33

2.2. SITUAÇÃO ECONÔMICA DO PESCADOR ACARAUENSE .................................... 38

2.2.1. SEGURO-DESEMPREGO ........................................................................................ 43

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 48

BIBLIOGRÀFIA .................................................................................................................. 50

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INTRODUÇÃO

“O arquétipo do homem litorâneo cearense é o jangadeiro. Tal como o sertanejo,

acima de tudo um forte. Em sua jangada, íntima montaria, vai domando ‘verdes

mares bravios’ até desaparecer além do horizonte. Até voltar dia ou dias depois. Ou

não.”

Alexandre Barbalho, in Mar de Luz

Os filhos vêem nos pais um exemplo a seguir e comigo não é diferente.

No meu caso ainda é maior por ser o único filho entre cinco do Senhor Raimundo

Nonato Pires, ex-pescador e atualmente aposentado.

Em agosto de 1996, numa das inúmeras viagens ao mar que meu pai

fazia a embarcação pelo qual pescava foi pega na lateral por um navio de grande

porte, daqueles cargueiros, no mar de Camocim – CE. De repente a embarcação

estava completamente cheia d’água e todos os tripulantes do barco

desesperadamente pensavam em que fazer. Então decidiram, se apoiando em

tambores e em caixa de isopor, esperar resgate.

O tempo foi passando, o medo de aparecer tubarão e devorá-los foi

surgindo. Então na ânsia de morrerem decidiram ir nadando mar adentro, guiados

somente por Deus, em busca de socorro. Passados três dias e três noites a

tripulação foi salva por um barco, que tinha como nome Papa Léguas que estava

pescando nos arredores.

Decorrente este episódio ocorrido na vida do meu pai, que em 2006,

completando dez anos do naufrágio, ele me pediu para fazer um livro; porém devido

a condições financeiras não pude escrever. Em 2007 ao ingressar no curso de

História da Universidade Estadual Vale do Acaraú - UVA e saber que teria que fazer

um trabalho de pesquisa logo percebo que era a oportunidade de homenagear essa

pessoa que pra mim é um batalhador e um lutador e ter como tema o pescador.

O tema da minha pesquisa é A PROFISSÃO DE PESCADOR NO MUNICÍPIO DE

ACARAÚ - CE onde abordo a questão do pescador: Quem é esse profissional? Como

vive? Onde vive? Quais as suas relações com o meio social que está inserido? Qual

a importância que a sociedade e os órgãos governamentais dão ao pescador?

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E dentro destas perguntas tento compreender como se dá a construção

da identidade cultural deste profissional e como este se entende como representante

da economia local.

Para tanto a “identidade cultural é um conjunto vivo de relações sociais e

patrimônios simbólicos historicamente compartilhados que estabelece a comunhão

de determinados valores entre os membros de uma sociedade. Sendo um conceito

de trânsito intenso e tamanha complexidade, podemos compreender a constituição

de uma identidade em manifestações que podem envolver um amplo número de

situações que vão desde a fala até a participação em certos eventos.” 1

O conceito de identidade está relacionado a uma identidade não só

cultural, mas também social, onde a mesma é feita de afirmativas e negativas, a

partir dos posicionamentos dos indivíduos diante das situações do cotidiano. Uma

pessoa cria sua identidade ao se posicionar diante das instituições, ao responder às

situações sociais mais importantes da sociedade: como um indivíduo entende o

casamento, a Igreja, a moralidade, a arte, as leis, etc.; é o que define sua identidade

social.

Já sobre cultura para “não como entende o senso comum, mas como uma

ideia abrangente. A cultura manifesta-se espacialmente e permite a elaboração de

mapas de significados que incluem representações gráficas do que é [...] lembrado,

imaginado e contemplado [...] material ou imaterial, real ou desejado, do todo ou da

parte [...] vivenciado ou projetado” (COSGROVE, 2000, p.2)

Entende-se, portanto nas palavras de COSGROVE que cultura é o

conjunto de experiências e vivências adquiridas pelo homem enquanto

sujeito/integrante social, criando assim sua identidade.

No caso do pescador por estar dentro de um espaço onde ele é inserido

ainda muito jovem tudo que ele vive e aprende acaba influenciando na sua

identidade e na maneira de se relacionar com o meio natural e social contribuindo

para a formação de sua cultura. As práticas socioculturais do pescador, conhecido

como “gente da terra/mar” dão-lhe características identitárias e culturais, pois

passam a ser uma das dimensões da vida social dos pescadores, um espaço de

crenças, mitos e utopias, e adquirem valor simbólico e material para a reprodução da

condição humana dos pescadores.

1 http://www.mundoeducacao.com.br/sociologia/identidade-cultural.htm

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Para chegar ao meu objetivo utilizei como embasamento teórico mais

fontes orais e entrevistas com pescadores, ex-pescadores e com pessoas que direta

e indiretamente está ligada à pesca.

Usei fontes escritas, pesquisei em livros, artigos acadêmicos, mas

trabalhei mais com História Oral porque o tema por mim escolhido se torna bem

mais interessante se for trabalhado oralmente, já que me inseri dentro da “vida” dos

pescadores. Também o fato de não ter muita fonte escrita me fez optar ainda mais

pela oralidade. Evidente que sabia das dificuldades que teria pela frente, mas resolvi

seguir em frente. Essa oralidade que é colocada aqui foi colhida através de

entrevistas junto aos depoentes.

Alguém pode indagar se é verdade ou não o que aparece na pesquisa,

mas como descreve Portelli, não existem “falsas” fontes orais, veja: “Fontes orais

são aceitáveis mais com muita credibilidade diferente. A importância do testemunho

oral pode se situar não em sua aderência ao fato, mas de preferência em seu

afastamento dele, como imaginação, simbolismo e desejo de emergir. Por isso não

há “falsas” fontes orais”.2

Por meio das entrevistas pude perceber como a pesca é vista. Por isso

que utilizei a fala como minha fonte principal de pesquisa, por se tratar de um

recurso metodológico onde o pesquisador, subsidiado por um roteiro elaborado

preliminarmente, coloca questões acerca do contexto em pesquisa para os sujeitos

pesquisados. Para além de uma mera coleta de informações, onde se obtém

respostas para determinadas perguntas, a entrevista é uma relação social marcada

pelo dialogo entre sujeitos (o que pesquisa e os que se propõem a colaborar na

pesquisa).

Ao todo realizei nove entrevistas sendo com: o ex- pescador que hoje

está aposentado Senhor Raimundo Nonato Pires, a sua esposa Senhora Maria

José, o proprietário de barco Aluísio Oliveira, o mestre de barco Marcos Sebastião, o

ex-pescador que atualmente trabalha numa empresa de camarão José Inácio

Rodrigues, a responsável pelo SINE IDT em Acaraú a Senhorita Inês Araújo.

Entrevistei também o trapicheiro Francisco Cipião, o ex- pescador Raimundo Alves

da Silva, e finalizando minhas entrevistas entrevistei a Presidente da Colônia de

Pescadores de Acaraú Maria Luziara Rocha. 2 PORTELLI, Alessandro. O que faz a história oral diferente. Projeto História, São Paulo, (14)fev.1997, PP.17

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Marquei com todos os dias que faríamos as entrevistas, bem como tratei

de explicar o assunto que iríamos abordar, ressaltando que respeitaríamos seus

depoimentos e opiniões sobre o que seria discutido. Todas as entrevistas foram

feitas a conhecidos meus até porque algumas perguntas que eu diria polêmicas

poderiam ser mal interpretadas, podendo haver divergências por alguma das partes.

Uma das perguntas polêmicas foi a que eu fiz ao Senhor Aluísio do porque dele não

pagar melhor aos pescadores. Sua resposta eu discutirei mais adiante.

A pesquisa preservou o que foi considerado fundamental desde o início:

dar voz aos trabalhadores desse setor. Apesar da sua expressividade numérica no

Ceará, são poucos os estudos que narram a(s) história(s) dos pescadores. Paul

Thompson nos lembra:

"Reconhecendo grupos importantes de pessoas que haviam estado ignoradas, dá-

se início a um processo cumulativo de transformações. Amplia-se e se enriquece o

próprio campo de produção histórica; e ao mesmo tempo sua mensagem social se

modifica. Para ser claro, a história se torna mais democrática, (...) as testemunhas

podem agora ser convocadas também de entre as classes subalternas, os

desprivilegiados e os derrotados. Isso propicia uma reconstrução mais realista e

mais imparcial do passado, uma contestação ao relato tido como verdadeiro.” 3

Há um aspecto fundamental que permeia este trabalho de pesquisa

que é a importância do pescador em Acaraú. Pesavento chama de “História do

tempo presente”, onde os acontecimentos estão ainda a se desenvolver e onde o

historiador é contemporâneo e, de certa forma, testemunha ocular de um

processo que ainda se desdobra e do que não se conhece o término4. A referida

autora sustenta que:

“O método fornece ao historiador meios de controle e verificação, possibilitando

uma maneira de mostrar, com segurança e seriedade, o caminho percorrido, desde

a pergunta formulada à pesquisa de arquivo, assim como a estratégia pela qual fez

a fonte falar, produzindo sentidos e revelações que ele transformou em texto”. 5

3 THOMPSON, Paul, A voz do Passado: História Oral, Paz e Terra, São Paulo, 1992. 4 PESAVENTO, Sandra Jatahy, História e História Cultural, Autêntica, Belo Horizonte, 2003. 5 PESAVENTO, Sandra Jatahy, Op. cit.

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Partidária da Historia Cultural como instrumento para entendimento do

objeto estudado, Pesavento chama atenção para necessidade de se detectar as

“modalidades identitárias” quando se estuda determinada comunidade ou

sociedade. Para ela, a identidade “se constrói em torno de elementos de

positividade, que agreguem as pessoas em torno de atributos e características

valorizados, que rendam reconhecimento social a seus detentores. Assumir uma

identidade implica encontrar gratificação com esse endosso. A identidade deve

apresentar um capital simbólico de valoração positiva, deve atrair a adesão, ir ao

encontro das necessidades mais intrínsecas do ser humano de adaptar-se e ser

reconhecido socialmente” 6

A monografia está estruturada em dois capítulos. O Primeiro Capítulo é

intitulado em “Acaraú: entre a terra e o mar” onde são trabalhadas as seguintes

questões: breve Historiografia do município de Acaraú; análise da importância que o

Rio Acaraú tem para com a cidade de Acaraú, haja vista que o Rio dá nome ao

Município, explorando toda sua extensão, acidentes geográficos e a riqueza que ele

“faz nascer” para o Município. Também contêm um breve conhecimento da

economia acarauense antes e a partir da pesca, todos os seus sujeitos/agentes e as

atividades exploradas.

Ainda neste capítulo tento mostrar que apesar de ser uma atividade

cansativa, desvalorizada tanto pela sociedade como pelo Estado, os agentes desta

profissão gostam da atividade: “Ser pescador é sentir prazer”, assim descreve

Marcos Sebastião um dos entrevistados. Através da Literatura, pude utilizar poemas

e obras literárias de três grandes escritores brasileiros da Escola Literária

Modernista: Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira e Jorge Amado7 para

trazer para dentro da pesquisa como é todo o contexto social vivido pelo pescador e

6Id. Ibidem, mas identidade também deve ser vista como algo que somente seja válido de

reafirmação se for voltada para fora, para dialogar com o ‘outro’, com o diferente (Guatari/Rolinik). 7Carlos Drummond de Andrade mineiro de Itabira – MG, é considerado um dos maiores representantes da Literatura Brasileira do século XX, é dele um dos livros mais famosos Alguma Poesia (1930). Manuel Bandeira pernambucano de Recife é também considerado um dos percussores do Modernismo Brasileiro, uma das suas principais obras é o Carnaval (1919). Jorge Amado baiano de Itabuna é considerado um dos mais famosos e traduzidos escritores brasileiros de todos os tempos, suas obras Gabriela, cravo e canela (1958) e Dona Flor e seus Dois Maridos (1967) viraram novela da Rede Globo.

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como a figura do pescador é vista a partir dos gêneros literários. Isto é, fazendo uma

relação entre a literatura e o tema pescador.

O Segundo Capítulo tem como título: “Pescador no Município de

Acaraú”. Neste Capítulo tento compreender como se deu o processo de localização

do pescador em Acaraú, onde estes profissionais viviam e vivem até hoje. Procuro

entender como é a relação entre pescador e natureza, com o seu próprio ambiente

de trabalho e com as práticas econômicas que sua profissão, quer queira ou não,

está inserida.

Neste capítulo há também uma análise de quanto o capitalismo, como

prática econômica, está engajado no meio pesqueiro e como a pesca se sobressai

dentro deste engajamento e o que os pescadores ganham ou perdem com isto, uma

vez que é através do trabalho que se obtém a “produção” que movimenta a

sociedade capitalista. Nesta parte do trabalho recordo os pensamentos de Karl

Marx, “onde o caráter social da produção se expressa pela divisão técnica do

trabalho, organização metódica existente no interior de cada empresa, fábrica, etc.

que impõe aos trabalhadores uma atuação solidária e coordenada”.

Apesar dessas características da produção, os meios de produção

constituem propriedade privada do capitalista. O produto do trabalho social, portanto,

se incorpora a essa propriedade privada. Segundo o marxismo, o que gera valor é a

parte do capital investida em força de trabalho, isto é, o capital variável. “A diferença

entre o capital investido na produção e o valor de venda dos produtos, a mais-valia

(lucro), apropriada pelo capitalista, não é outra coisa além de valor criado pelo

trabalho”.8

Outro questionamento é qual a visão dos órgãos governamentais, a da

Colônia de Pescadores e a da própria sociedade em relação a esta figura que é o

pescador no município acarauense.

8 http://br.answers.yahoo.com/question/index?qid=20081016190409AAyS8qW

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CAPÍTULO I - ACARAÚ: ENTRE A TERRA E O MAR

Acaraú é um município do Estado do Ceará localizado próximo ao Rio

que leva o nome da cidade. A cidade sobrevive da agricultura, da pecuária, do

comércio e principalmente da pesca, tema central deste trabalho. De acordo com o

último censo realizado pelo IBGE em 2010 a população acarauense é de 57.512

habitantes distribuídos numa área de 842, 884 km² na sede e em seus três distritos:

Aranaú, Juritianha e Lagoa do Carneiro.

O nome Acaraú é um nome indígena existindo pelo menos duas

hipóteses sobre seu sentido: seria resultado da fusão de Acará (Garça) e Hu (Água),

significado, portanto, "Rio das Garças" a outra seria de origem tupi, como resultado

da fusão de aka'ra (acará) e 'y (água, rio) significando, portanto, "rio dos acarás".9

A cidade que atualmente tem sede administrativa na Rua Capitão

Humberto Moura pertenceu ao município de Sobral até o dia 31 de julho de 1949.

Isto porque o então Presidente da Província do Ceará Dr. Fausto Augusto de Aguiar,

sancionou a Lei nº 480, outorgando autonomia política e administrativa da cidade,

que hoje é uma das mais importantes da região Norte do Estado do Ceará.

A primeira denominação de Acaraú foi Porto dos Barcos do Acaracú ou

simplesmente Porto dos Barcos. Algum tempo depois passou a chamar-se Barra de

Acaracú. Entretanto, ao tempo das charqueadas10 e durante alguns decênios depois,

deu-se a então povoação, o nome de Oficinas, para depois voltar à primitiva

denominação de Barra do Acaracú, até que a Lei nº 1814, de 22 de janeiro de 1879,

sancionada pelo Dr. José Júlio de Albuquerque Barros, então Presidente da

Província do Ceará, outorgou-lhe o nome oficial e definitivo de Acaraú. Com a

titulação de município no dia 1º de outubro de 1950 aconteceu uma eleição para

quem seriam os primeiros governantes acarauenses, onde nesta eleição foi

escolhido José Vitor Memória como Presidente da Câmara e cumulativamente o

primeiro Prefeito da cidade, já que na época o Presidente da Câmara exercia os dois

cargos.

Segundo o historiador Nicodemos Araújo o historiador Antônio Bezerra

quando visitou a cidade, em 1884, assim se expressou: “Para quem entra pelo lado

9 Araújo, Nicodemos: Município de Acaraú – Notas para a sua História. 10 No começo do século XVIII o município produziu muito carne seca (charque) principalmente para Pernambuco, por isso deste nome.

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Sul, deleita a presença das frondes do coqueiral dominando irregularmente o teto da

casaria, e os altos lençóis de areia mais fazem realçar a faixa sombreada e terna do

mangue, ao Nordeste e ao Oeste, circunscrevendo o horizonte, onde a água do rio

reflete, com mais ou menos vivacidade, a cor opalizada do céu”.

1.1 SOB OS OLHARES DO RIO ACARAÚ

Falar do município de Acaraú em relação à pesca é por obrigação nos

referirmos ao Rio Acaraú, acidente geográfico que de certo modo contempla toda a

região do Baixo Acaraú.11

O Rio Acaraú é o segundo maior Rio do Ceará e o terceiro do Nordeste.

Seu grande curso atinge 320 quilômetros, com vazão anual média de 1.800.000.000

metros cúbicos. Sua nascente vem da Serra das Matas, percorrendo toda a região

Norte do Estado banhando os municípios de: Tamboril, Macanaú, Groaíras, Sobral,

Santana do Acaraú, Morrinhos, Marco, Cruz, Bela Cruz e Acaraú, até desembocar

no Oceano Atlântico.

Jurandir Pires Ferreira em sua obra intitulada de: Enciclopédia dos

Municípios Brasileiros denomina o Rio Acaraú com a seguinte frase: “Caminho

natural das terras sem fim do vale do Acaraú”.12 O Rio Acaraú tem como principais

afluentes os rios Macacos, Feitosa, Jucurutu, Madeiras e Caibros (pela direita), os

rios Jatobá, Juré, Jaibara e Aracati – mirim (pela esquerda). Em seu trabalho de

conclusão de curso Elisenrique13relata que em 1774 é feita a primeira tentativa de

colonização do Rio Acaraú. O Sargento-mor Leonardo de Sá penetra pelo interior

desta região em viagem de reconhecimento de terreno que deseja solicitar por

sesmaria e no desejo de civilizar e domar os aborígenes.

O Rio Acaraú sempre foi usado para plantações de milho, batata e

hortaliças em geral pelos povos que moravam as suas margens. Em conversa tida

com a Dona Maria José dos Santos Pires,14 minha mãe, ela contou que muitos dos

acarauenses utilizavam o Rio para as diversas atividades, desde um simples lavar

11Região onde ficam localizados os seguintes municípios: Acaraú, Itarema, Jijoca de Jericoacoara, Cruz, Bela Cruz, Morrinhos, Marco e Santana do Acaraú 12 Ferreira, Jurandir Pires. Enciclopédia dos Municípios Brasileiros. Volume XVI. Rio de Janeiro, 29 de maio de1959, p.227 13Linhares, Elisenrique: Rio Acaraú de Corpo e Alma. UVA. Sobral, 2003. 14 Entrevista realizada em março de 2011

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roupa a criação de gado, como fazia há pouco tempo um senhor chamado Zé da

Marli (como mostra a figura abaixo), mas com o aumento do nível do rio ele teve que

mudar sua criação.

As palavras de minha mãe ao falar do Rio condizem com ao trecho de

uma reportagem do jornal Expresso do Norte, que diz: “Era alegre o nosso rio, pelas

manhãs, com suas bordas repletas de lavadeiras. As roupas dos moradores eram

em grande parte lavadas no rio e, diferente do aroma que trazem hoje, produzidos

por uma grande quantidade de sabões em pó, este era puro do sabão em barra, do

Sol e da água...” 15

Já hoje, infelizmente o Rio Acaraú, na cidade de Acaraú, está sendo

usado por criadores de camarões, que estão desmatando o mangue para fazer

viveiros, para atender a um modelo de sociedade, que tem como principal premissa

a obtenção do lucro, desconsiderando nesse caso as questões ambientais, uma vez

que nessas ações muitos peixes, caranguejos e outros animais que precisam do

mangue estão morrendo.

Não é só em Acaraú que o Rio está sendo destruído para outros devidos

fins, prejudicando assim àquelas pessoas que dele precisam. A professora Geni

Rosa Duarte no seu trabalho Conflitos, identidades e meio ambiente:

Pescadores em Guairá - PR descreve que devido o surgimento de uma Ponte que

liga a cidade de Guairá ao Mato Grosso do Sul, aumentou-se o fluxo turístico, porém

acabou prejudicando o Rio Paraná, como a mesma relata no depoimento de um 15 Expresso do Norte, ano I, nº10. Sobral-Ce, 2 a 8 de julho de 2002, p.6.

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pescador local: “Quando estouraram as pedras da rocha aí do Rio Paraná, quer

dizer que a pedra, o veneno da bomba, ela... Ela acompanhou a pedra, né, ela vai

acompanhando a pedra é aonde que os peixes desapareceu do rio, se afastou, e

tudo com um toque vai, se afasta mesmo (...) de primeiro tinha peixe, depois

destruiu nosso peixinho, destruiu a rocha aí, que acabo com o peixe aí...

O Rio Acaraú é um local de diversão e lazer para toda a população

acarauense, que nos feriados e finais de semana vão com toda a família para a

camboa comer peixe, siri e curtir o por do sol. Mas nos últimos anos a presença de

frequentadores diminuiu muito devido a poluição e o descaso com o Rio. Muitos dos

moradores que moram às margens do Rio, por suas casas não terem saneamento

básico ou uma coleta de lixo regular estão, de forma irresponsável, jogando restos

de resíduos residenciais no Rio, como também as empresas que vivem da pesca.

A sociedade em geral tem que tomar consciência de que o Rio Acaraú, de

certa forma, contribui não só para a economia do Município, mas também à cultura,

à história e à identidade do seu povo. O Estado e as autoridades competentes têm

que cumprir o seu papel para evitarem que este descaso prejudique ainda mais o

Rio e consequentemente quem dele necessita. Nicodemos Araujo16 citando as

palavras de Rui Barbosa costumava dizer que os povos vivem da sua tradição.

Quando a perdem, com a memória e respeito, a sua história está condenada a

perecer. De certa forma, o que Nicodemos Araújo fala tem muita verdade. O povo

acarauense “gira” em torno do Rio, que deu origem ao nome do município, não

preservá-lo é destruir seu elo de existência, às suas raízes. Afinal, muitos pais de

família tiram seu sustento daquilo que o Rio oferece.

Pessoalmente posso falar do Rio Acaraú, pois meu pai era pescador e

atualmente está aposentado. Toda vez que ele chegava do mar, eu ia correndo

buscá-lo. Quando ele tinha tempo me levava para pescar no mangue, no próprio

Rio. Nos finais de semana eu e toda a minha família íamos para camboa passar o

dia. Era uma alegria só.

Portanto falar do Rio Acaraú é tentar construir uma memória de

identidade, onde nele vivi grandes momentos de minha infância e de minha

adolescência: andar de barco e de canoa, jogar bola quando na maré baixa, tentar

16 Escritor, poeta, memorialista acarauense

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atravessar o outro lado do Rio, esperar pacientemente o peixe beliscar a isca,

paquerar com as meninas que também frequentavam são lembranças que vou levar

para o resto de minha vida. Contudo, o Rio Acaraú não deve ser apenas um

instrumento pelo qual o pescador retira sua fonte de renda, o sustento de sua

família, mas deve ser um símbolo de preservação. De amor a própria terra!

Amor este que Nicodemos Araújo, usando as palavras de Raquel de

Queiroz diz “que Conhecer é amar, mormente quando o que se ama é a nossa

terra”. E em consonância a estas palavras relato duas estrofes do Hino do Acaraú:

Entre o Mangue da cor da esperança

Passa o Rio que a cidade limita.

E, bem perto, entre as ondas se lança

Num painel de beleza infinita.

Exaltando esta terra tão boa,

No murmulho tão velho e tão novo

Alto hino o oceano entoa

Em dueto com seu nobre povo.

As lembranças, portanto, devem permanecer no imaginário da população,

como componente que busca a preservação de uma cultura que vincula o homem as

suas raízes; o que está representado na ligação dos moradores com o Rio.

O momento no qual o Rio Acaraú se lança ao encontro do Oceano

Atlântico, perto do Mosqueiro17, se apresenta como se estivesse correndo para os

braços do pai e no envolver de um fenômeno magnífico suas águas se deixam fundir

criando uma “pororoca” 18. O encontro das águas do Rio Acaraú com o Oceano é

chamado na cidade pelos pescadores de Boca da Barra.

Podemos perceber então que O Rio Acaraú faz parte da cultura e da

própria identidade do povo acarauense, e muita desta cultura e identidade está

inserida no imaginário dos pescadores e de seus familiares, afinal a maioria dos

“usuários” deste Rio são pescadores ou pessoas ligadas a eles.

No tocante à identidade, que se quer neste trabalho, é buscar

simbolicamente elementos que retratem a identificação social, já que esta se

17 É o local, onde muitos acarauenses no final de ano vão passar o Revellon. 18 Pororoca é um fenômeno natural caracterizado por grandes e violentas ondas que são formadas a partir do encontro das águas do mar com as águas do rio.

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expressa através do território, ou seja, dentro de uma relação de apropriação que se

dá tanto no campo das ideias quanto no da realidade concreta e simbólica. As

identidades sociais, puramente simbólicas, são produzidas como representações da

realidade de um reconhecimento social da diferença: “as marcas da identidade não

estão inscritas no real, embora os elementos sobre os quais as representações de

identidade são construídas sejam dele selecionados”. (PENHA, 1992, p.167)

1.2 ECONOMIA ACARAUENSE ANTES E DEPOIS DA PESCA

Desde quando pertencia a Sobral a base da economia acarauense era

praticamente a agricultura, a pecuária e a pesca. Tanto a agricultura, a pecuária e a

pesca são atividades que o povo acarauense herdou de seus primeiros povoadores

que segundo Barão de Studart19 seus fundadores e primeiros habitantes foram

pescadores vindos do Sul e comerciantes vindos do Rio Grande do Norte.

Pero Vaz de Caminha em sua famosa carta ao rei de Portugal já dizia que

o Brasil era uma terra que “em que se plantando tudo dá”. No Acaraú não é

diferente. Desde sua origem a agricultura era o principal esteio da estabilidade

econômica do município até porque a proximidade do rio possibilitava o uso de suas

águas para o cultivo do feijão, do milho e da mandioca. Segundo Nicodemos Araújo

os primeiros habitantes acarauenses se fixaram as margens do Rio Acaraú e

utilizando as águas deste rio começaram o cultivo da terra na lavoura, onde oitenta

por cento da população acarauense vivia da agricultura, somente com o crescimento

do setor pesqueiro na metade do século XX que este quadro mudou. Contudo ainda

hoje há muitas famílias que dependem do cultivo do solo para sobreviver.

A primeira organização ou agremiação fundada no município voltada à

agricultura com o objetivo de favorecer os lavradores foi a Associação Agropecuária

de Curral Velho, sob a presidência de Antônio Ferreira Sales, fundada a 15 de

março de 1950 e que, praticamente, não funcionou. Atualmente existe o Sindicato

dos Trabalhadores Rurais com três mil associados.20

19 Trecho retirado da obra Araújo, Nicodemos Araújo. Município de Acaraú

20 FONTE: Sindicato dos Agricultores Rurais (ano 2012)

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Em concomitância com a agricultura, a pecuária sempre foi um dos

fatores principais de prosperidade do povo acarauense, desde os albores de seu

povoamento. Aliás, neste município a criação de animais era exercida quase sempre

conjuntamente com a agricultura, sendo uma o complemento da outra. Neste

contexto podemos até nos recordar da importância do Rio Nilo para o Egito e dos

Rios Tigre e Eufrates para a Mesopotâmia, onde estes rios contribuíram para

florescimento socioeconômico dos povos egípcio e mesopotâmico.

Com relação ainda a pecuária, o Acaraú foi local de instalação de duas

fábricas de charque (carne seca) no século XVIII, onde a primeira foi instalada em

1745, no hoje Bairro de Outra Banda e a outra posteriormente, também no mesmo

Bairro, na atual Rua Santo Antônio. 21Nicodemos Araújo vem dizer que:

A indústria saladeril ou de carne cerca preparada, embora tenha durado aqui apenas

meio século, isto é, de 1740 a 1790, proporcionou neste município um grande

movimento, com marcantes reflexos em sua vida econômica e lucros magníficos para

aqueles que a exploravam, quer em sua fabricação, quer em sua comercialização.

O escritor Renato Braga, referindo-se ao efeito das charqueadas no Acaraú, informa,

em seu Dicionário Geográfico e Histórico do Ceará, página 41, que “quando surgiu a

indústria da carne-seca, em torno da qual girou toda a economia setecentista do

Nordeste pastoril, coube a esse lugarejo centralizá-la ao norte da Capitania. Para

tanto lhe permitia sua excepcional situação geográfica”. Devido a esse período de

produção das charqueadas, que muito da sua produção era enviada para

Pernambuco, Bahia e outros destinos, a cidade de Acaraú ficou conhecida como

Oficinas.

Inicialmente, os primeiros habitantes de Acaraú procuravam o Bairro de

Outra Banda com a intenção de descarregar as mercadorias vindas do município de

Sobral, pois ali dava para aportar embarcações menores, como jangadas e botes.

E assim, ao mesmo tempo em que foi se formando a população

acarauense, a agricultura e a pecuária eram as atividades econômicas mais

praticadas pelos seus habitantes. A pesca era praticada por um mínimo de sua

população, aliás, a mais carente. Tudo indica que o principal motivo da pesca ter

21 As duas fábricas de charque deram lugar anos depois, respectivamente, a Firma João Jaime S/A e ao comércio do Major Domingos Alves Ferreira, que eram grandes empresários da cidade.

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sido pouco praticada nos primeiros anos do município foi devido à falta de material

disponível e de poucas embarcações.

Entre outras fontes econômicas do município de Acaraú antes da pesca

se tornar sua principal atividade houve a produção da cera da carnaúba, como

descreve o Historiador Raimundo Girão, em História Econômica do Ceará, pág. 373:

“dizem que do mesmo pau (carnaúba) costumam extrair hua espécie de cêra, porém

ainda não vi. Dá huas frutas a semelhança das nossas azeitonas grandes, que são

de grande recurso para os pobres, que delas se sustentam no tempo da seca, que é

o maior flagelo deste sertão.”

Como falado anteriormente a pesca foi pouco praticada nos primeiros

anos do município devido a fatores como à falta de material disponível e de poucas

embarcações. E que era utilizada frequentemente apenas pelos ribeirinhos, já

acostumados a pescar e catar os frutos marítimos. Entre os aparelhos de pesca

mais comum no início da atividade pesqueira estão o anzol, o curral, o manzuá, a

tarrafa e o quixó. E que a prática atual de pesca utilizada, não se sabe bem em que

ano começou.

Stuart Hall destaca que “viver da pesca é o índice geral com que se

qualifica o pescador, enquanto representante de uma “espécie” que gira em torno da

vivência do mar adquirindo uma maneira peculiar de vida. Tornando um ser diferente

dos outros.22

A proximidade com o mar sempre teve a sua influência no

desenvolvimento econômico dos países. Desde vários séculos, que esta

proximidade tem constituído um fator de desenvolvimento econômico, na medida em

que facilitou a comunicação e as trocas comerciais entre os continentes. Um

exemplo são as antigas civilizações do Crescente Fértil, como a Mesopotâmia e o

Egito. Os países que possuíam faixa costeira aproveitaram este recurso e

desenvolveram, a partir daí, atividades econômicas. Os países localizados no

interior dos continentes (ou seja, não possuíam faixa costeira e que estavam muito

afastados do mar), tiveram de procurar outras fontes de riqueza e, para ter acesso

aos recursos marítimos, recorrem à sua importação, sendo, por isso, mais caros.

22 Hall, Stuart: A questão da Identidade cultural. 2ªed. Rio de Janeiro. 1998.

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No município de Acaraú, como nas civilizações do Crescente Fértil, a

localização próxima ao mar, como podemos ver na figura abaixo, contribuiu para o

surgimento da população e consequentemente para o fortalecimento da pesca na

cidade.

FONTE: http://engeletrica.sobral.ufc.br/images/mapa_01.png

E é da pesca que muitos dos seus habitantes conseguem o sustento de

suas famílias: ora seja no alto mar pescando peixes de grande porte como cavala,

pargo, bonito ou lagosta, tubarão, polvo, etc. ora no próprio Rio Acaraú pescando

peixes de pequeno porte como sardinha, bagre, salema, tainha e catando siris,

caranguejos, maria-farinhas e sururus, entre outros.

Eduardo Schiavone Cardoso23 nos diz que a prática pesqueira remonta a

períodos pré- históricos quando do estabelecimento dos primeiros agrupamentos

humanos no território terrestre. Nos sambaquis espalhados pelo litoral, os vestígios

arqueológicos apontam para o uso que as populações ancestrais faziam do mar

para compor sua dieta alimentar. Conchas, carapaças de crustáceos, espinhas de

peixe e ostras revelam uma dieta baseada na pesca e na coleta de frutos do mar,

praticadas pelos grupos pré-históricos que habitavam o litoral brasileiro.

23 Cardoso, Eduardo Schiavone. Trabalho e pesca: Apontamentos para a investigação. Departamento de Geociências – CCNE/UFSM Pós-doutorando – Geografia – FCT – UNESP.

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As populações indígenas habitantes da zona costeira também faziam uso

do mar para obtenção de alimentos. A presença ainda hoje de embarcações como a

canoa e a jangada, as redes tecidas com fibras vegetais, algumas armadilhas para a

captura de pescado e a cestaria empregada nas pescarias atuais, com maior ou

menor transformação, revelam a herança deixada pelas diversas nações indígenas

na cultura da pesca brasileira.

No Brasil colonial, a pesca abastecia parte dos núcleos urbanos e ao

longo dos espaços não urbanizados complementava as atividades de pequenos

agricultores e extratores litorâneos e ribeirinhos, presentes ainda hoje em algumas

áreas do país.

Silva (1988) ao tratar dos pescadores na história do Brasil aponta para a

formação, em algumas localidades, de uma categoria de pescadores especializados

já no Brasil Colônia, dentre os quais escravos pescadores. O mesmo autor descreve

os pesqueiros reais da Amazônia, identificados pela produção realizada por

indígenas que era destinada à administração colonial. Porém, é a pesca da baleia

que ganhou maior visibilidade entre as pescarias antigas no Brasil. Organizada em

feitorias e armações, a atividade baleeira forneceu carne, toucinho e azeite para

iluminação pública por mais de dois séculos.

Por este mar aberto que se deu a fixação dos primeiros centros urbanos e

de pequenas vilas e localidades de populações mestiças de europeus, indígenas e

africanos, o que levou a uma das primeiras e ininterruptas atividades econômicas do

Brasil: a pesca24

No município de Acaraú de todas as receitas que o mar oferece a pesca

da lagosta é com certeza a mais rentável. Segundo alguns produtores de lagosta em

2004 o Acaraú foi a cidade que mais produziu o crustáceo no Ceará. A pesca

comercial de lagosta é uma modalidade relativamente recente na atividade

pesqueira do Brasil. Pesquisadores concordam em afirmar que a pesca da lagosta

para fins comerciais teve início, no Ceará, em 1955, "utilizando típicas embarcações

24 MUNIZ, Túlio de Souza. O Ouro do Mar. Do surgimento da indústria da pesca da lagosta no Brasil à condição do pescador artesanal na História do tempo presente (1955-2000). Uma narrativa sócio-histórica marítima. / Túlio de Souza Muniz – Fortaleza. Dissertação de Mestrado em História Social – Universidade Federal.

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de pesca artesanal do Nordeste brasileiro, de baixo rendimento e raio de ação muito

limitada, que operavam usando côvos (manzuás) e jererés” 25.

A pesca da lagosta foi introduzida na cidade acarauense na metade do

século XX em meados de novembro de 1961, no porto de Cacimbas, Ilha dos

Coqueiros, Volta do Rio e Almofala (Almofala pertence hoje ao município de

Itarema). Atualmente o bairro de Outra Banda é o maior centro de desembarque do

município, onde foram construídos trapiches, destinados às embarcações que ali

ancoram diariamente.

No início a exploração lagosteira era praticada em sua totalidade com

jangadas e botes a vela, embarcações típicas da pesca artesanal, que faziam

viagens diárias e desembarcavam com lagostas ainda vivas. Hoje as embarcações

seguem um padrão nacional, tanto para embarcações de médio ou grande porte. As

embarcações de médio porte têm entre 10 e 15 metros de comprimento, já os de

grande porte têm mais de 15 metros de comprimento.

De acordo com a Colônia dos Pescadores de Acaraú são mais de 400

embarcações e 1800 pescadores cadastrados na mesma26·. Entretanto nem todos

recebem os benefícios que deveriam receber. Irei discutir estas questões no próximo

capítulo.

Segundo o ex-trapicheiro27Francisco Cipião normalmente, uma tripulação

é composta por seis integrantes, onde todos contribuem para o sucesso em alto

mar. Sendo que estes têm atividades específicas: O responsável pela embarcação é

o mestre que dirige o barco e dá ordens ao grupo, o motorista que cuida da

manutenção da embarcação especificamente na parte do barco chamada de

comando, o geleiro que cuida da parte de refrigeração da produção e o cozinheiro

que prepara a comida e os outros dois somente pescam. Contudo todos participam

do ato de pescar.

25 PAIVA, Melquíades Pinto (org.), Pescarias experimentais de lagostas com redes de espera no estado do Ceará, Brasil, Labomar, Fortaleza, 1973. 26 Fonte: Colônia dos Pescadores de Acaraú Z-2. ( ano 2011). 27 Trapicheiro é a pessoa que trabalha no trapiche, ajudando os pescadores nas suas atividades, seja no descarrego do barco ou carregamento ou na pintura, no concerto das embarcações. Esta entrevista foi dada em abril de 2011.

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Os objetos mais utilizados na pesca em Acaraú são o manzuá e a rede de

espera ou arrastão. O Manzuá é uma armadilha fixa, com armação de Madeira

(marmeleiro ou mangue) em formato hexagonal, revestida com tela de arame

galvanizado número 18 ou nylon e malhas medindo 50 mm entre nós. Possui uma

abertura na face anterior (sanga) confeccionada com fio poliamida 210/18 ou cana

brava. Considerando-se os hábitos das diversas regiões, este aparelho apresenta

diferentes formatos. Embora tenha sido introduzida pela pesca industrial na captura

da lagosta, a armadilha se assemelha a um cesto de palha de origem indígena que

tinha esse nome, Manzuá. 28

Conhecida como caçoeira, as redes de espera ou de arrastão possuem

as seguintes características: confeccionadas com nylon multifilamento (poliamida

210/12-24), com ou sem nó, malha estirada de 130 a 140 mm, 15 malhas de altura e

um entralhamento em torno de 50%. Com a finalidade de mantê-la aberta, em cada

rede lançada são colocados cinco a sete calões (pedaço de madeira de 1,20m de

comprimento por 30 mm de diâmetro) os quais são amarrados na tralha superior e

inferior. Atualmente a caçoeira é proibida pelo IBAMA, por degradar o ecossistema

marinho, principalmente o das algas.

Para aumentar o leito do Rio Acaraú, no município acarauense, em

meados dos anos 90, o então prefeito João Jaime Ferreira Gomes iria fazer uma

drenagem, onde seria possível ancorar navios de grande porte e assim as vendas

pesqueiras, principalmente de lagosta, do Município iriam aumentar bastante.

Entretanto no ano de 1998, João Jaime é assassinado e seus projetos não foram

concluídos.

Não no município de Acaraú, mas em geral em todo espaço brasileiro que

possua rio ou acesso ao mar a atividade pesqueira é uma das atividades

econômicas mais praticadas. Como no caso da Amazônia. A pesca na Amazônia é

uma das atividades humanas de maior relevância na região, significando fonte de

alimento, comércio, e lazer especialmente para as populações que residem às

margens dos lagos, e paranás da Amazônia. De acordo com Maia (2009) o pescado

é destacadamente a principal fonte protéica na alimentação das populações

ribeirinhas. Com a transformação tecnológica ocorrida no setor após a década de 60

28 FONTE: www.jangadabrasil.com.br

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e as mudanças societárias ocorridas com a instalação da Zona Franca de Manaus,

as atividades pesqueiras tiveram seu valor econômico, político e social, estendido e

intensificado.

1.3 A FIGURA DO PESCADOR DESCRITA NA LITERATURA

Aos onze anos de idade comecei a sentir gosto pela Literatura, com isso

comecei a escrever contos, cartas de amor e principalmente poesias e no ano de

2005 publiquei o livro Minhas Primeiras Poesias. Para mim a Literatura é capaz de

levar o escritor, o leitor, as pessoas de forma geral a terem uma imagem construtiva

do mundo, pois através dos romances, dos contos, dos versos somos capazes de

escrever o que sentimos e o que percebemos de tudo que está ao nosso redor.

A História são os fatos ocorridos ao longo dos tempos referente a toda

atividade de existência humana. Como o homem sempre sentiu necessidade de

expressar seus sentimentos, buscou na Literatura uma arte na qual pudesse

manifestar suas opiniões, desejos, frustrações, etc. A literatura, por sua vez, é uma

arte verbal, em que o autor dotado de uma percepção aguçada, vive, observa,

questiona, sente seu espaço, em função disso, tem um poder imensurável para

captar a realidade através dos sentimentos. Usando sua imaginação criadora faz a

leitura sensível do real, portanto atribuindo um novo significado à realidade,

reelaborando uma nova realidade por intermédio de uma linguagem diferenciada,

pela ornamentação, escolha e seleção criativa dos códigos linguísticos.

A compreensão de que a literatura é, além de um fenômeno estético, uma

manifestação cultural, portanto uma possibilidade de registro do movimento que

realiza o homem na sua historicidade, seus anseios e sua visão de mundo, tem

permitido ao historiador assumi-la como espaço de pesquisa. Nesse sentido, história

e literatura tem se misturado de tal forma que somente por meio dos sentidos

criados por elas para dialogar com determinados contextos históricos em dado

tempo é que seja possível caracterizar cada uma delas.

Em relação a isso Trouche (2006) coloca: [...] entende serem a escrita da

história assim como da literatura, antes de tudo, discursos. Ficção e história

constituem sistemas de significação pelos quais damos sentido ao passado. São a

partir de tais discursos que o homem reconstrói seu futuro.

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E o que dizer do poeta, escritor, cronista e considerado o maior poeta

brasileiro, o mineiro Carlos Drummond de Andrade que retratava a vida e todo o seu

contexto de forma espetacular, quase sempre com uma visão crítica e construtiva? A

Rosa do Povo é um de seus poemas muito conhecido e comentado. A Rosa nesse

poema funciona como metáfora do entendimento universal, dos valores da

democracia e da liberdade, valores típicos da modernidade no século 20. Drummond

usou este poema para fazer uma crítica ao autoritarismo do Estado Novo e da

Segunda Guerra Mundial.

Outro poeta Modernista Manuel Bandeira também nas suas poesias

construía uma discussão poética do contexto social de nossas cidades

contemporâneas, cuja temática centra-se na denúncia dos problemas de

desigualdade social do país, bem como os aspectos que abalavam o mundo. Os

autores dessa tendência reabilitaram o verso e o lirismo e utilizaram referências e

linguagem mais próxima do cotidiano, fazendo da poesia um instrumento de

participação social e política.

A seguir há o poema O bicho de autoria de Manuel Bandeira onde ele

denuncia a realidade social vivida pelo Brasil no começo do século XX, bem como

as condições humanas vividas pelo povo. E não deixa de ser, em muitos casos,

também em Acaraú, a vida que muitos pescadores levam. Haja vista que conheço

pescadores que já passaram fome por não conseguirem vaga nos barcos ou devido

a pescarias ruins.

O bicho

Vi ontem um bicho

Na imundície do pátio,

Catando comida entre os detritos.

Quando achava alguma coisa,

Não examinava nem cheirava:

Engolia com voracidade.

O bicho não era um cão.

Não era um gato.

Não era um rato.

O bicho, meu Deus, era um homem.

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Muitos escritores trouxeram para a Literatura a vida dos pescadores. O

escritor baiano Jorge Amado na sua obra Mar Morto descreve com grande detalhe a

vida do "povo do mar", a morte sempre latente, náufragos e amores; retrata as

dificuldades da vida no cais para os que vivem do mar, as crenças do povo do cais,

a cultura...

Essa obra é uma obra socialista, regionalista e romancista. Ela conta a

história do amor entre Guma e Lívia. O romance se passa numa cidade baiana.

Guma é órfão de pai e sua mãe, a quem ele só viu uma vez na infância, era mulher

da vida, ele fora criado por seu tio Francisco, quem tudo lhe ensinou. Desde muito

jovem Guma já manejava um saveiro. Lívia era órfã de pais e fora criada por seus

tios, vira a região do cais à procura de seu irmão Rodolfo. E conhecera Guma por

ele ter salvado a vida de seus tios, era muito jovem ainda, mas quando percebeu

que amava Guma resolveu lutar por seu amor, que não era aprovado por seus tios.

Eles lutam juntos e conseguem se casar. Lívia sofre, por não aceitar a

vida do cais, não aceitar que um dia Guma se vá com Iemanjá29, por vezes Lívia até

odiava Iemanjá. Os dias de Lívia são de aflição e espera, espera que um dia Guma

não volte. Lívia descobre que espera um filho de Guma, e ele explode de alegria

quando recebe a notícia, mas sofre por temer ter que deixar sua amada e seu filho.

A notícia do naufrágio do Valente assusta Lívia que acaba por dar a luz ao seu filho

prematuro e Guma sobrevive, salvo por José Manoel.

A vida deles então se torna mais difícil sem o Valente, e Lívia tem

esperança de que Guma abandone a vida do cais e associe-se a seu tio na

quitanda. Mas Guma consegue comprar outro barco com ajuda de Dr. Rodrigo e faz

promessas a Lívia de que juntará um dinheiro para poder entrar como sócio de seu

tio, Lívia passa seus dias mais aliviada. A vida para os homens do cais fica muito

difícil e Guma começa a trabalhar carregando contrabando para poder arrumar

dinheiro. Com o dinheiro conseguido ele paga o Paquete voador e numa noite

tempestuosa de contrabando, sem Lívia esperar, ele morre. Lívia não chora, suas

lágrimas secam, e do mar que ela tanto sentia ódio e de onde ela tenta fugir, não

consegue se afastar por que é lá que Guma está: no Mar Morto.

29 Jorge Amado era simpatizante do Candomblé, religião oriunda da África e trazida pelos escravos, e Iemanjá era um orixá, que para os católicos é como se fosse um santo. A Iemanjá para esta religião era a mãe do Mar, protetora dos pescadores.

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Em Mar Morto, homens e mulheres do cais da Bahia vivem a cada dia

como se fosse o último, cuja paixão e trabalho, instinto e sobrevivência se conjugam

de maneira trágica. Trazendo para a realidade dos pescadores, a obra de Jorge

Amado condiz exatamente como é ser pescador: o pescador se lança ao mar na

busca de trazer à família seu sustento, ficando sempre a mercê da sorte e dos

“deuses”, deixa em “terra” seus sonhos, seus filhos e tudo que construiu durante a

vida, na esperança de voltar um dia.

A obra Mar Morto de Jorge Amado literalmente traz para os leitores como

é o “mundo” das pessoas que vivem diretamente e indiretamente do mar. A

personagem Lívia, esposa de Guma vive diariamente a angústia de ver seu marido ir

ao mar na incerteza de não vê-lo mais. Como no caso de umas famílias

acarauenses, que perderam seus entes queridos num naufrágio ocorrido no ano

passado, no romance acontece o mesmo com o personagem Guma que apesar da

difícil vida marítima não consegue viver sem o mar e é numa das viagens ao mar

que seu destino é selado e acaba perecendo nas águas de Iemanjá.

Contudo apesar das adversidades, dos problemas enfrentados, do não

reconhecimento maior da sociedade, ser pescador tem seu lado prazeroso. Pode-se

notar no depoimento que Marcos Sebastião da Silva me concedeu numa entrevista:

A profissão tem lá seus problemas, suas dificuldades. Passamos dias só vendo água e

as mesmas pessoas. Ficamos longe de nossa família e de nossos filhos. É uma batalha

diária e desgastante. Vamos para o mar, mas não sabemos se voltamos. Entretanto

observar a natureza, o nascer e o pôr-do-sol não têm preço... a beleza que Deus nos

oferece é muito prazeroso. ”30

Marcos Sebastião começou a trabalhar como pescador desde os 13 anos

de idade e no decorrer de suas atividades marítimas criou uma grande relação com

o mar, afinal segundo ele foi trabalhando no mar que ele pôde sustentar sua família

e comprar sua casa.

Na entrevista que tive com o ex-pescador o Senhor Raimundo Alves da

Silva, que também começou sua vida como pescador ainda adolescente (aos 17

anos) o sentimento que o mesmo tem não é diferente:

30 Entrevista realizada em 22 de novembro de 2011

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32

“Comecei minha vida no mar ainda muito novo, foi meu pai que me levou. Acho bom a

arte de pescador. Não daria conta de trabalhar em outras profissões. Não me vejo sem

ter sido um pescador. Sinto saudade quando eu era pescador, quando puxava a rede ou

o anzol e vinha um monte de peixe, lagosta. Nasci pra ser pescador”.31

As palavras do Senhor Raimundo Alves da Silva podem ser ligadas com

as palavras do ex- jogador do Internacional e da Seleção Brasileira Paulo Roberto

Falcão quando parou de jogar futebol. Falcão disse no programa Bem Amigos do

canal Sportv que o homem morre uma só vez, o jogador de futebol morre duas

vezes, a primeira quando para de jogar futebol.

Falcão disse isto porque do mesmo jeito que o pescador, o jogador de

futebol começa na profissão também muito cedo, até mais prematuramente do que o

pescador. E é difícil parar, porque nasce aí uma relação, uma intimidade, uma

independência, e também a única coisa que o jogador de futebol sabe fazer é jogar

futebol, do mesmo jeito é o pescador. Ele só sabe pescar e nada mais. Todos os

pescadores que tive oportunidade de conversar, sem exclusão, mesmo com todas

as dificuldades e a desvalorização do profissional gostam da profissão.

Onde o espaço de pesca é correlacionado não com espaços de produção,

mas com espaços de vivência e interações com o meio físico-natural, místicos;

criando o processo de identidade desse povo, que segundo Claval (2001) é a:

Soma dos comportamentos, dos saberes, das técnicas, dos conhecimentos e dos

valores acumulados pelos indivíduos durante suas vidas e, em uma outra escala, pelo

conjunto dos grupos de que fazem parte. A cultura é a herança transmitida de uma

geração a outra. Ela tem suas raízes num passado longínquo, que mergulha no território

onde seus mortos são enterrados e onde seus deuses se manifestaram (2001.p.63).

O grande período passado no mar, as dificuldades enfrentadas, os

perigos sofridos, o pouco tempo para a família, a baixa remuneração poderiam ser

fatores que levassem os pescadores a não se sentirem orgulhosos de sua profissão.

Porém em cada palavra, gesto e ação praticados pelos entrevistados, eu pude

concluir, que por passarem a maior parte de suas vidas dentro de um barco à deriva,

tendo o mar como companhia tornasse impossível não se criar laços estreitos de

afinidade, e de uma própria construção de uma identidade voltada para a vida

marítima, já que muitos escolhem ser pescador por não ter outra profissão.

31 Entrevista realizada no dia 4 de junho de 2012

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33

CAPITULO II PESCADOR NO MUNICÍPIO DE ACARAÚ

2.1 ANÁLISE SOCIAL DO PESCADOR ACARAUENSE

Os primeiros habitantes acarauenses como mencionei antes foram

pescadores que vieram do Sul, onde se instalaram nas ribeirinhas do Rio Acaraú no

Porto de Cacimbas. Lá construíram suas moradias passando a residir. Com o

aumento populacional, seus descendentes começam a migrar pra outras regiões do

município colaborando para o surgimento do primeiro bairro acarauense: Outra

Banda.

Ainda hoje há uma grande concentração de pescadores ou familiares

morando nos quatro cantos da cidade; seja na divisa com o município de Cruz, na

localidade de Coroa Grande; seja na divisa com o município de Itarema, na

localidade de Volta do Rio; seja nas proximidades dos bairros de Outra Banda,

Perseguidas ou nas praias acarauenses. No bairro onde eu moro que é a Travessa

Mongubas moram muitos pescadores entre eles meu tio Benedito Fortunato, meu

cunhado Marcos Sebastião e meus primos Leonardo Rodrigues e Elissandro

Rodrigues.

A profissão de pescador é de significativa importância para o

desenvolvimento do município, pois além de oferecer à população os produtos

marítimos proporciona àqueles que não possuem renda ou um trabalho com

remuneração fixa um meio de ganhar dinheiro e de sustentar suas famílias.

O pescador é visto como o profissional que tem como centro de trabalho

um conhecimento adquirido sobre a natureza, cujo mesmo a explora de diversas

formas para sobreviver no alto mar. Essa apropriação de conhecimento se realiza no

processo de trabalho e o ultrapassa, pois inspira também modos de ser e de

estabelecer relações sociais, de construir família e de organizar trabalho, sendo

assim um “particularismo da gente do mar”.

A história vivida dos pescadores do oceano/mar é relacionada com o

distanciamento da “terra enquanto espaço de trabalho e vida e com apropriação

econômica e sociocultural do meio marinho, tanto os pescadores artesanais quanto

os vinculados à pesca empresarial – capitalista” (DIEGUES, 1995, p. 30).

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34

O cidadão que se torna pescador logo cedo vai adquirindo conhecimentos

e conceitos sobre sua profissão. Os ensinamentos pertinentes a este tipo de

atividade não se aprende em nenhuma instituição de ensino, o profissional pescador

vai adquirindo os conhecimentos de sua profissão durante as experiências vividas e

as viagens dadas no mar.

Um ponto peculiar de minha pesquisa foi exatamente saber quem são

essas pessoas que escolheram a pesca como atividade profissional, essas pessoas

que criaram raízes e uma história. Onde o escritor Hobsbawm afirma: “ao rememorar

a história da gente comum, não estamos meramente tentando conferir-lhe um

significado político retrospectivo que nem sempre teve, estamos tentando, mais

genericamente, explorar uma dimensão desconhecida do passado.”

Encontro nas palavras de Hobsbawm a “hereditariedade” da pesca, onde

em sua maioria a atividade pesqueira é passada de geração em geração, como no

caso do entrevistado Raimundo Alves, que começou na profissão por influência de

seu pai. E que a maioria dos filhos de pescadores também acabam se tornando

pescadores, criando assim uma herança cultural dentro da família.

A relação do pescador com a parte material da atividade pesqueira é

dinâmica e avessa. Apresenta-se não tipicamente capitalista, mas torna-se

tipicamente capitalista ao se deparar com trabalhadores subordinados ao trabalho

remunerado pelo patrão (proprietário de empresas e armadores), isto é, a atividade

pesqueira é caracterizada como uma atividade doméstica onde o pescador pesca no

mar aquilo que possa lhe sustentar, mas com a inclusão das relações comerciais

oriundas desta atividade acaba se adequando a novos moldes, porque nesse

modelo, os detentores dos meios de produção controlam todas as etapas do

processo produtivo, criando mecanismos que favoreçam sua manutenção.

Surge assim um valor de troca como a relação quantitativa, a proporção

em que valores de uso de espécie diferente se trocam entre si, relação que varia

constantemente com o tempo e o lugar. O valor de troca parece, portanto, qualquer

coisa de arbitrário e de puramente relativo; um valor de troca intrínseco, imanente à

mercadoria, onde ambos dependem um do outro para “sobreviver”. (Le Trosne, De

l’intérêt social, in Physiocrates, Ed.Daire, Paris, 1846, p. 889).

O sistema capitalista, de principio eminentemente privatista, ampliando

seu raio de influencia sobre estas áreas, já a partir de finais do século XIX, inicia

uma ação exploratória com base no lucro, pressionando e abrindo focos de tensão

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sobre os nativos povos do mar. Estes sempre vistos pelo sistema “como preguiçosos

e indolentes” (MADRUGA, 1992: 61-63).

Ao se apropriar dos recursos do oceano/mar, ambiente físico de

profundezas e alterações sazonais (tempestades), renováveis e móveis; os

pescadores realizam em sua prática socioeconômica uma gestão de pesca, que

combina o ato da captura à ação da racionalidade dos recursos. Essa prática opera-

se, enquanto apropriação econômica e cultural do meio, atrelada ao particularismo,

investido ao pescador e à sua comunidade.

No Acaraú a categoria que se enquadra na maioria dos pescadores é a

pesca artesanal. A pesca artesanal é um tipo de pesca caracterizada principalmente

pela mão-de-obra, com embarcações de pequeno porte, sua área de atuação está

na proximidade da costa e nos rios e lagos e os equipamentos variam de acordo

com a espécie a se capturar. Assumindo assim um importante papel

socioeconômico na ocupação de mão-de-obra, geração de renda e oferta de

alimentos à população. A pesca artesanal ocorre de uma falência na economia dos

ciclos cafeeiro e açucareiro do Brasil Colônia e, também, devido à necessidade de

exploração de outros meios que não fossem os recursos de flora e fauna litorâneas,

como o palmito, a caxeta e os animais de caça. (DIEGUES, 1973).

Os pescadores e pescadoras artesanais têm um tradicional modo de viver

e de lidar com a natureza. A pesca é mais que uma profissão, é um modo de vida,

uma cultura onde o trabalho é livre e tem um regime autônomo e coletivo, que extrai

da natureza somente o que ela é capaz de repor. Possui relação com a natureza,

que contem uma espiritualidade e uma mística que suscita o respeito e o cuidado.

Para o pescador a pesca faz parte de sua vida, o exemplo é o meu pai que mesmo

aposentado não sai do cais do porto.

Sendo assim, o homem pescador é aquele que tem no ato de capturar ou

extrair organismos aquáticos a sua principal fonte de trabalho. Estabelecendo uma

relação entre a técnica de pescar e a execução do trabalho, os saberes de

comunidades tradicionais baseiam-se em um entendimento de experiências nas

relações com a natureza:

(...) Mas todas as atividades produtivas contêm e combinam formas materiais e

simbólicas com as quais os grupos humanos agem sobre o território. O trabalho que

recria continuamente essas relações reúne aspectos visíveis e invisíveis, daí porque está

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longe de ser uma realidade simplesmente econômica. Nas sociedades ditas

“tradicionais” e no seio de certos grupos agro-extrativos, o trabalho encerra dimensões

múltiplas, reunindo elementos técnicos com o mágico, o ritual, e enfim, o simbólico

(CASTRO In: DIEGUES, 2001, p. 167).

A identificação com a natureza faz parte da memória e dos lugares da

terra e da água necessários a reprodução física e cultural das populações

pesqueiras. A característica principal do Ser do Pescador é sua originalidade, seu

modo de viver e de se relacionar com a natureza, onde possui valores próprios e

desenvolve técnicas que garantem a sustentabilidade da família e dos estoques

pesqueiros. São famílias donas de seus meios de produção, possuem os

equipamentos necessários a pesca, como redes, pequenas embarcações e motores,

bem como a força de trabalho, que são dados pela família ou por grupos de trabalho

coletivo, sendo também unidade de produção, de consumo e de partilha.

Contudo no município também está inserida a pesca industrial, existindo a

produção capitalista ou empresarial. A pesca capitalista ou empresarial é a inclusão

da produção dos armadores de pesca (donos de mais de uma embarcação), e das

empresas de pesca, além de embarcações com aparatos tecnológicos e com todo

um suporte industrial de produção, armazenamento, logística e distribuição, que é o

caso da firma J e S dos irmãos Júnior e Sales.

“A pesca industrial é caracterizada pela concentração de investimentos em instalações

terrestres, operando com métodos e aparelhagem de pesca mais moderna, utilizando-se

de embarcações com maior autonomia, cuja grande parte da produção é destinada ao

mercado externo. A pesca artesanal utiliza uma tecnologia bastante rudimentar e de

baixa produtividade, cuja produção varia desde a simples atividade de subsistência até

aquela que sofre o processo de comercialização e é destinada basicamente ao

abastecimento do mercado interno”.32

Quem trabalha no mar é parte integrante da natureza, pois no convívio

com a natureza acaba se identificando com o meio natural, como por exemplo:

muitos pescadores se orientam no mar através da lua, através da maré, etc. Hoje os

pescadores, passaram a utilizar o GPS, “Antes ninguém ia para o mar sem conhecer

32 Plano Estadual do Desenvolvimento da Pesca do Ceará, - 1980-1985, SUDEPE, in FELISMINO, Pedro Henrique de M., MOREIRA, Fernanda Mara Penaforte e SANTOS, João Bosco Feitosa (elaboradores), A s Condições de Trabalho e as Repercussões na Vida e na Saúde dos Pescadores do Estado do Ceara, SINE-CE, Fortaleza, 1989.

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os pontos de pesca através dos sinais da natureza, como as fases da Lua, da maré,

do pôr-do-sol. Hoje, houve existe a inserção de outros mecanismos de orientação.

Muitos de nós usamos o aparelho de GPS para se orientar”. Essas são palavras do

meu mestre de barco Marcos Sebastião da Silva.

Por ser uma atividade que tira do pescador, durante toda a pesca anual,

de seu convívio familiar, deu para perceber nas entrevistas realizadas que os

pescadores se sentem como uma família, gerando entre eles um laço de

camaradagem e de companheirismo, fazendo do mar seu próprio lar. Meu padrinho

José Inácio Rodrigues, na entrevista que lhe fiz brincou dizendo que quando

pescava conhecia mais seus companheiros do que sua própria família.

As palavras de meu padrinho condizem com a minha experiência, já que

na minha infância, meu pai não teve muitas oportunidades para ver meu

desenvolvimento, pois mal chegava e depois de três ou quatro dias voltava ao mar.

Recordo que quando ele chegava de viagem era uma alegria tremenda. Adorava

quando ia me buscar na escola, passear comigo pelo cais do porto, pescar siri nos

dias de folga. Aproveitava o bastante até porque eu sabia que de três a quatro dias

meu pai estaria voltando para o mar e só retornaria depois de um mês, isso

dependendo da produção ou da comida. Porque se a produção estivesse fraca ou se

ainda tivesse comida para amais alguns dias a viagem se prolongava.

Aprendi, com Michel de Certeau, que “o cotidiano é aquilo que nos é dado

cada dia (ou que nos cabe em partilha), nos pressiona dia após dia, nos oprime, pois

existe uma opressão no presente. [...] O cotidiano é aquilo que nos prende

intimamente, a partir do interior. [...] É uma história a caminho de nós mesmos,

quase em retirada, às vezes velada. Talvez não seja inútil sublinhar a importância do

domínio desta história “irracional”, ou desta ‘não história’, como o diz ainda A.

Dupont. O que interessa ao historiador do cotidiano é o Invisível...” (CERTEAU,

1996, p. 31).

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38

2.2 SITUAÇÃO ECONÔMICA DO PESCADOR ACARAUENSE

O pescador é aquele profissional que pesca que vive da pesca33. Neste

tópico produzo uma análise econômica do pescador no município de Acaraú que

tanto produz no Rio Acaraú como no Oceano Atlântico, criando assim uma relação

de dependência e de ambientação, onde emprega força de trabalho, cuja produção

destina-se tanto à família como à comercialização. Tenta-se analisar o estado atual

da atividade e o significado cultural no universo dos pescadores, como atividade

geradora de trabalho e renda, que absorve um contingente expressivo de

trabalhadores dentro de um território (espaço).

Território este que historicamente tem sido pensado, definido e delimitado

a partir das relações de poder e que com a globalização essas relações de poder se

acentuaram cada vez mais, tornando a força de trabalho num objeto de submissão.

Milton Santos destaca que:

(...) no começo da vida o homem organizando a produção, organizava a vida social e

organizava o espaço, na medida de suas próprias forças, necessidades e desejos, [...]

essa evolução culmina, na fase atual, onde a economia se tornou mundializada, e todas

as sociedades terminaram por adotar, de forma mais ou menos total, de maneira mais ou

menos explícita, um modelo técnico único que se sobrepõe à multiplicidade de recursos

naturais e humanos. (SANTOS, 1998, p. 18)

Por falta de gestão apropriada, do monitoramento dos estoques

pesqueiros, do baixo desenvolvimento tecnológico e da infra-estrutura de recursos

para aquisição de barcos com maior capacidade de ação, a pesca vive num

descompasso de ordem econômica que tem refletido no processo identitário e no

significado cultural, representado.

Este caso não acontece exclusivamente em Acaraú não, no Estado do

Rio Grande do Norte os pescadores potiguares estão tendo as mesmas dificuldades

que os acarauenses:

33 FONTE: http://WWW.dicionarioweb.com.br/pescado

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(...) É conhecido que a pesca está envolvida no problema global de escassez de

alimento. Mas esta escassez é produzida pelas ações de uso irracional, do recurso

natural que são os estoques pesqueiros. No início da década de 1980, empresas

modernas se instalam no Estado, trazendo embarcações equipada e pessoal qualificado

para pescar em água de grande profundidade. Entretanto, diversos fatores apontam a

formação do descompasso – sobre pesca em certas áreas; baixo rendimento das

unidades produtoras; tecnologia e o sistema de comercialização que fragilizam o setor

pesqueiro. (...) 34

A situação é tão preocupante que o Governo vem tentando criar métodos

e políticas públicas diversas para tentar melhorar o setor pesqueiro em nível

nacional (veremos estas práticas mais adiante). A profissão de pescador em quase

todo território nacional relaciona-se através de intermediários, onde estes

comercializam a produção realizada, no município de Acaraú não é diferente.

Para (SILVA, 1982) “intermediário/atravessador” é o agente econômico,

que age neste processo, atuando como financiador/fornecedor de insumos com

garantia da compra da produção do pescado – um processo espoliativo dos

pescadores, tendo como objetivo a manutenção das vantagens do poder econômico

dos intermediários/atravessadores frente à incerteza da pesca para os produtores.

Um exemplo é que quando a tripulação chega do mar logo se apresenta o

proprietário da embarcação como também vários profissionais intencionados a

comprar a produção, seja ela de peixe, lagosta ou outros produtos marítimos, para

revenderem. Na maioria dos casos a produção é vendida para donos de firmas e

empresas locais. O empresário mais conhecido é o Zezinho Louzada, mas há outros

donos de firmas como os irmãos Junior e Sávio, donos da firma Acaraú Pesca,

citados anteriormente.

O sistema de “distribuição e comercialização do pescado obedece a uma

trama complexa, denominada de canais de comercialização que têm inicio na área

de produção, passando pelos intermediários/atravessadores, chegando finalmente

ao varejista/consumidores” (SILVA, 1982, p.81).

34 FONTE: PESCA ARTESANAL – CONFLITO, CULTURA E IDENTIDADE: O CASO POTIGUAR - Desenvolvido sob a égide da Base de Pesquisa Estudo Urbanos e Regionais. Participou como bolsista Alexsandro Pereira Patrício.

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Em todas as entrevistas realizadas os entrevistados falaram que a maioria

ou todos os pescadores acarauenses não trabalham de carteira assinada. Isto se

deve pela produção ser basicamente através de intermediação e também pela

imprevisibilidade de produção, ficando difícil qualquer pescador receber um

pagamento ou salário fixo.

A imprevisibilidade de produção ocorre por três fatores: aos fatores

naturais, humanos e econômicos, já que a pesca é uma profissão imprevisível e que

depende e muito do “sucesso” destes fatores mencionados:

1- Os fatores naturais como o vento, a chuva, as tempestades

atrapalham na captura do pescado principalmente entre os meses de Agosto a

Novembro, quando o mar fica mais agitado acarretando riscos à tripulação.

2- Os fatores humanos é a degradação que o homem vem

causando ao meio ambiente, principalmente pela poluição e a caça predatória,

no caso do Acaraú o crescimento excessivo de viveiros de camarão vem

desmatando o mangue e matando todas as espécies marinhas que dependem

deste bioma, como o caranguejo, a maria-farinha e o sururu. Já no alto mar o

uso das caçoeiras ou redes de arrastão vem contribuindo para a destruição das

algas marinhas (alimento de muitos tipos de peixes) e para a captura de lagostas

de pequeno porte.

3- O fator econômico está relacionado no que Marx nos diz, “que a

produção implica dois grandes setores: o dos meios de produção e dos de

consumo, dos quais o primeiro é o mais importante”. Neste caso como a pesca

não implica numa produção constante fica difícil o pescador ser remunerado com

carteira assinada ou ter salário fixo, até porque a pesca não dá garantia daquilo

que o proprietário da embarcação irá gastar em contratar um profissional em

torno de todos os tramites legais sem contar do alto custo que uma viagem ao

mar leva.

Com isso o pescador é retrato do seu trabalho realizado no mar, sendo

pago como chamamos de trabalhador avulso, recebendo pagamento por aquilo que

produz. O Senhor Aluísio Oliveira possui uma embarcação e numa entrevista35 que

35 Entrevista realizada no dia 22 de novembro de 2011

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tive com ele o mesmo explicou detalhadamente como funciona o pagamento de

seus pescadores. Antes de a tripulação ir ao mar todos os tripulantes recebem uma

quantia X (quantia que no meio marítimo é chamado de vale) que é descontada da

produção realizada por cada um. A quantia varia, não tendo um valor fixo. Quando a

tripulação chega do mar os pescadores recebem o saldo, saldo este que é a

diferença daquilo produzido subtraído do vale. Como isso se dá?

Normalmente os pescadores em Acaraú recebem 10% da produção (fora

o mestre que sozinho ganha 15%), isto é, se uma embarcação tiver cinco

pescadores, exceto o mestre, cada um fica com 2%. Então vamos fazer uma

simulação de quanto um pescador ganharia numa viagem ao mar tendo como base

a entrevista realizada com o Senhor Aluisio e com o produto mais pescado e

valorizado em Acaraú, que é a lagosta. Atualmente o preço da lagosta custa entre

sessenta ou quarenta reais o quilo, em anos anteriores já chegou ao preço de cento

e vinte reais.

Vamos supor que os pescadores da embarcação do Senhor Aluísio

Oliveira pescaram mil quilos de lagosta e que o quilo (Kg) está custando quarenta

reais e que o vale foi de trezentos reais. A produção toda foi de quarenta mil reais.

Os pescadores recebem 10% então eles ficam com quatro mil da produção. Quatro

mil dividido por cinco, cada pescador fica com oitocentos reais. Entretanto este valor

subtraído do vale de trezentos reais resta apenas quinhentos reais como saldo. Isto

tudo se a produção for de mil quilos, onde nos dias de hoje está muito difícil ter esta

produção.

Questionando o Senhor Aluísio Oliveira se a porcentagem dada aos

pescadores não era muito pouco, o mesmo falou que no seu caso particularmente

era impossível aumentar devido aos gastos que uma embarcação tem por viagem

dada ao mar. Dos setenta e cinco por cento que lhe resta é destinado ao

abastecimento, à manutenção, ao pagamento do vigia (inclusive é meu pai), como

também pagar o vale da próxima viagem.

Nas palavras do Senhor Aluísio Oliveira, percebo que o profissional dos

mares recebe muito pouco por tudo aquilo que envolve sua profissão: antes de ir

para o mar o pescador tem que carregar o barco com mantimentos, organizar as

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redes ou os manzuais, encher o frigorífico de gelo, etc. No mar as atividades não

têm hora para começar nem para terminar, duram às vezes dezesseis vinte horas de

serviço.

O Capitalismo é um sistema que “vive” do lucro, que objetiva transformar

o trabalho em capital, onde trabalhador e empregador estão inseridos dentro deste

ciclo. O trabalhador empresta seu trabalho materializado em troca de dinheiro e o

empregador precisa deste trabalho materializado para gerar o mesmo dinheiro ou o

capital sempre num processo de produção. Pensando nisto Marx vai dizer que:

No processo de produção efetivo, o trabalho se converte realmente em capital, mas essa

conversão depende da troca originária entre dinheiro e força de trabalho. Só em virtude

dessa conversão direta de trabalho em trabalho materializado pertencente não ao

trabalhador e sim ao capitalista é que o dinheiro se converte em capital, inclusive à parte

dele que assumiu a forma de meios de produção, de condições de trabalho. Antes, o

dinheiro - exista na própria forma ou na forma de mercadorias (produtos) adequadas

para servir de meios de produção de novas mercadorias - é capital apenas em si36

O trabalho do pescador pode ser comparado com o trabalho no interior

das fábricas durante o processo da Revolução Industrial, quando ambos

trabalhavam exaustivamente e ganhavam miseravelmente:

As fábricas não eram ambientes adequados de trabalho, tinham péssimas condições

de iluminação e ventilação. Não havia medidas nem equipamentos de segurança para os

operários, muitos se acidentavam e contraíam graves doenças. A média de vida dos

trabalhadores era muito baixa comparada à de hoje. A jornada de trabalho chegava até

16 horas por dia, sem direito a descansos e férias. Os salários eram baixíssimos,

garantindo ainda mais lucros aos proprietários, e a disciplina era rigorosa para manter o

aumento da produção. Os trabalhadores não tinham direitos e nem o amparo social.37

O mundo do pescador não é distante da realidade das fábricas: no alto

mar o pescador tem por dia uma média de cinco a seis horas de descanso, sendo

que o resto é de dedicação ao trabalho. Logo as duas ou três da manhã o material

de pesca é arriado ao mar. Aí toda a tripulação chefiada pelo mestre e guiada por

uma sonda sai deixando o material por toda a área escolhida para trabalhar durante

todo aquele dia. Depois de arriar o material por um longo percurso é hora de fazer a

36FONTE: http://www.histedbr.fae.unicamp.br/acer_fontes/acer_marx/tme_01.pdf 37FONTE: http://revolucao-industrial.info/mos/view/As_fábricas_e_os_trabalhadores

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volta e ver o que foi pescado com a ajuda do navegador, fazendo isto repetidas

vezes. Muitas embarcações não têm equipamentos de segurança adequados à

prática marítima e quando tem são de péssimas condições. Quando termina a pesca

da Lagosta começa a pesca do peixe, num intervalo muito pequeno.

Ao contrário do trabalho na fábrica, os serviços só seriam subsumidos

formalmente pelo capital: “(...) a maior parte destes trabalhadores [produtivos nos

serviços], do ponto de vista da forma, apenas se submetem formalmente ao capital

(...)” (MARX, 1985, p. 115). A produção capitalista não é apenas produção de

mercadorias, é essencialmente produção de mais-valia. O trabalhador produz não

para si, mas para o capital. Não basta, portanto, que produza em geral. Ele tem de

produzir mais-valia. Apenas é produtivo o trabalhador que produz mais-valia para o

capitalista ou serve à autovalorização do capital. (MARX, 1984, p. 105)

Os pescadores no transcorrer de suas atividades profissionais acabam

superando muitas adversidades como o sol castigante, o vento forte, a má

remuneração, a saudade da família e sobre tudo os problemas de saúde causados

pela profissão. Antes mesmo dos quarenta anos a sua pele já está toda enrugada e

envelhecida, seus olhos apresentam diversas enfermidades, principalmente

cataratas.

Em relação às doenças causadas no mar, O Senhor Raimundo Nonato

Pires abandonou a vida de pescador por não aguentar mais levantar peso devido as

dores na coluna. O mesmo aconteceu com meu vizinho e ex-pescador Raimundo

Alves, que aos quarenta e seis anos de idade teve que se ausentar do mar e hoje

vive encostado recebendo auxilio doença do INSS. Meu padrinho José Inácio

Rodrigues no ano de 2009 teve que se operar da visão, pois devido a salinização e

as noites mal dormidas estava ficando cego, ele também deixou de ser pescador.

2.2.1 SEGURO-DESEMPREGO

Em períodos pré-determinados, o pescador artesanal fica proibido de

exercer sua atividade, denominada como defeso. Esses períodos são fixados pelo

Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA),

por meio de Instrumento Normativo Publicado no Diário Oficial da União.

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Para compensar a interrupção da atividade pesqueira o Governo Federal,

através do Ministério do Trabalho, concede o benefício do Seguro-Desemprego aos

pescadores profissionais que exerçam sua atividade de forma artesanal. Para ter

direito, é necessária a apresentação de documentos como carteira de identidade ou

outro documento que comprove, de forma inequívoca, a identidade do cidadão,

registro geral de pesca atualizado, emitido pela Secretaria Especial de Aquicultura e

Pesca (SEAP), com antecedência mínima de um ano da data do início do defeso;

possuir inscrição no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) como segurado

especial; e possuir atestado da Colônia de Pescadores a que esteja filiado com

jurisdição sobre a área onde atue o pescador artesanal.

Seguro-Desemprego é o pagamento da assistência temporária, não

inferior a um salário mínimo, concedida ao trabalhador desempregado previamente

habilitado. O Seguro-Desemprego, um dos mais importantes direitos dos

trabalhadores brasileiros, eu beneficio que oferece auxilio em dinheiro por um

período determinado, no caso do pescador depois da pesca da lagosta (período

denominado de defeso do crustáceo) e durante a pesca do peixe. Para o pescador o

total de seis parcelas.

O Seguro- Desemprego, embora previsto na Constituição Brasileira desde

1946, foi efetivamente instituído por meio do Decreto-Lei 2.284, de março de 1986, e

regulamentado pelo decreto 92.608, de 30 de abril do mesmo ano. Em 1988, com a

entrada em vigor da nova Constituição Federal, o benefício passa a ser assegurado

como direito constitucional dos trabalhadores em situação de desemprego

involuntário, podemos observar no artigo7º que trata o seguinte: Art.7º. São direitos

dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua

condição social: (...) II – seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário.38

A partir de 20 de dezembro de 1991, com a publicação de Lei n° 8.287, o

benefício passa a ser estendido aos pescadores profissionais que exercem suas

atividades de forma artesanal, individualmente ou em regime de economia familiar,

38 FONTE: o Seguro- Defeso no Ceará. Relatório das Ações de 2011. O Pescador, o Meio, o benefício. SINE/CE-IDT, MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL

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sem contratação de terceiros, durante o período de proibição de atividade

pesqueira39, instituído pelo IBAMA, para a preservação da espécie.

Para entendermos melhor como funciona o Seguro-desemprego dos

pescadores procurei a agente municipal do SINE-IDT a senhora Inês Araujo, que é

responsável pelo seguro em Acaraú para explicar melhor. Abaixo há um trecho da

entrevista que tive com a mesma:40

“Dois anos atrás o pescador para fazer o seguro precisava ser filiado a Colônia, hoje não

precisa mais. Para receber o pescador precisa ter uma carteirinha expedida pela SEAP

de pelo menos um ano como também uma carteirinha da Marinha. O pescador precisa

pagar uma taxa ao INSS e ter em mãos uma licença da embarcação que trabalha. Esta

licença é dada pela marinha e comprova que a embarcação é legalizada. Se o pescador

não estiver trabalhando em nenhuma embarcação, precisa arranjar uma para assim

fazer o Seguro. O pescador também necessita ter trabalhado no ano que pretende

receber o benefício.”

Atualmente para se fazer o seguro não precisa ser filiado a Colônia dos

Pescadores porque muitas pessoas que não eram pescadores estavam se filiando e

recebendo o benefício, pois não tinha uma fiscalização maior. Este problema

acontece só no Acaraú ou no Ceará não, acontece no país inteiro.

As Secretarias Estaduais do Trabalho e as Superintendências Regionais do Trabalho (SRTE) são responsáveis pela habilitação dos pescadores ao benefício do seguro-desemprego. Apesar de todas as exigências de documentos feitas para habilitar o pescador artesanal a receber o seguro-desemprego, denúncias de fraude são recorrentes. Para o combate e prevenção às fraudes, a Instrução Normativa prevê, em seu Art 32, que o MTE celebrará diretamente ou por intermédio das SRTE, Termo de Cooperação Técnica com o Ministério Público do Trabalho com o objetivo de promover ações para o aperfeiçoamento do processo de recepção do requerimento do seguro-desemprego artesanal.41

Para o pescador acarauense fazer o seguro é uma recompensa pelo ano

que trabalhou e que se dedicou a atividade. Contudo não é bem assim! As licenças

das embarcações e as vagas são limitadas. No município quem tem uma só

embarcação é enquadrado na pesca artesanal e por isso pode também fazer o

Seguro, mesmo não sendo um pescador profissional, passando a ser considerado

39O período de proibição de atividade pesqueira é em relação a pesca da lagosta, que é do dia 1° de dezembro a 31 de maio, conhecido como período de defeso ou desova do crustáceo. 40 Entrevista realizada no dia 13 de dezembro de 2011. 41 http://www.fonset.org.br/2012/03/denuncias-de-fraude-no-seguro-desemprego-do-pescador-preocupam-secretarias-do-trabalho.

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não pescador, mas integrante da pesca. Com isso sobram poucas vagas para quem

realmente é o verdadeiro profissional desta categoria.

Como são obrigados a dar aos pescadores de sua tripulação, por ser

normalmente um trabalhador avulso, os proprietários das embarcações acabam

vendendo as licenças por preços absurdos, chegando a pedir até três parcelas pela

liberação. Que no meu ver é um desrespeito com a lei e com o próprio pescador. Por

ser um direito do pescador deveria ter uma fiscalização melhor, um cadastramento

mais eficaz e um número maior de licenças de acordo com o numero de pescadores

de cada município. A entidade responsável para representar os pescadores são as

Colônias dos Pescadores. As Colônias de Pescadores42 constituem uma forma de

associativismo predominante na pesca artesanal e tem como papel assegurar os

direitos e deveres do pescador. Em Acaraú a responsabilidade fica por conta da

Colônia Z-2, presidida pela Maria Luziara Rocha Vasconcelos.

Na cidade há uma grande reclamação por parte dos pescadores em

relação à Colônia. Muitos pescadores reclamam que como Sindicato da categoria,

deveria melhor cuidar dos interesses dos pescadores, até porque mensalmente

quem é filiado paga a quantia de 11 reais e com essa contribuição os pescadores

acreditam que deveriam bem ser mais assistidos. Devido as reclamações dos

pescadores, inclusive dos próprios entrevistados pescadores, foi que no dia 31 de

outubro de 2012 que tive uma entrevista com a presidente da Colônia dos

pescadores de Acaraú a Senhora Maria Luziara, onde a mesma cita o seguinte:

A Colônia dos Pescadores atualmente tem vários projetos: um é em Barrinha, onde é um

projeto de comercialização e beneficiamento de algas; temos outro nos açudes de

Piranhas, Bailarina e Bal onde foram colocados três milhões de ovinos, em parceria com

a Secretaria de Agricultura e Pesca. Na Localidade de Espraiado há um Projeto que não

foi concretizado por falta de interesse da Gestão Municipal, que era ter um Odontólogo

para atender duas vezes por semana as dificuldades bucais dos pescadores e

marisqueiras. Já que a Colônia tem um Consultório dentário completo que não funciona

porque a situação financeira da Entidade não dá para pagar um salário para um dentista.

42 As Colônias de Pescadores tiveram origem em uma missão da Marinha de Guerra do Brasil, realizada na década de 1920, com o objetivo de ocupar o litoral do país. Nesta época, a Marinha percorreu toda a costa, inclusive os trechos navegáveis dos principais rios, orientando e organizando os pescadores em associações. Assim, os pescadores passaram a ter a sua primeira organização de ordem social no âmbito estadual, as Colônias estão filiadas a Federação Estadual da Pesca, esta por sua vez está ligada a Marinha.

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Até concordo com a presidente em dizer que faltou “interesse” da Gestão

Municipal (2009- 2012) em ajudar no Projeto da Localidade de Espraiado, mas dizer

que a Entidade não tem condições em pagar um salário a um dentista, não

concordo. Pois a mesma disse que são cadastrados 1.800 pescadores e 650

marisqueiras, e que a mensalidade é de onze reais. Sendo assim por mês entra na

Colônia vinte e seis mil e novecentos e cinquenta reais, creio que daria pagar um

salário a um dentista, pois não precisaria alugar um consultório completo, já que

segundo ela a Colônia já dispõe.

Ainda continuando a entrevista a perguntei qual era realmente a missão

da Colônia e a presidente respondeu que a missão da Colônia dos Pescadores é

representar a categoria profissional nas discussões junto ao poder público em todos

os assuntos de interesse da classe dos associados. Servir de elemento de ligação

entre os associados e o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) e aos

demais órgãos públicos municipais, estaduais e federais (...), auxiliar os pescadores

sobre a venda e a conservação do pescado, e o respeito ao meio ambiente.

Ana Fani (2005) nos diz que “A cidade aparece como materialidade,

produto do processo de trabalho, de sua divisão técnica, mas também da divisão

social. É materialização de relações da história dos homens, normatizada por

ideologias; é forma de pensar, sentir, consumir, é modo de vida, de uma vida

contraditória”

A autora quer dizer que o homem é um produto material do espaço social

medido pelo trabalho. Talvez isso explique o porquê que na cidade de Acaraú o

pescador é visto apenas como parte de um modelo econômico, voltado para a

produção de produtos marítimos e não como agente social e cultural. Que muitas

vezes é por ser encarado apenas como personagem materialista do processo

econômico do município, que ele (pescador) é marginalizado. Contudo o papel do

pescador, enquanto produto material do espaço que o mesmo faz parte, o lhe

transforma no construtor não somente da economia acarauense como também da

Cultura, da Identidade e da História de Acaraú. E assim como Euclides da Cunha

disse no seu livro Os sertões que o sertanejo é antes de tudo um forte, por que não

o pescador também?

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao chegar ao término desse trabalho só tenho uma conclusão: “a mente

que se abre a uma nova ideia jamais voltará ao seu tamanho original” (Albert

Einstein). Se os objetivos propunham identificar o pescador acarauense, seus

anseios, seu elo que liga sua pessoa e a sua prática profissional a sociedade

acarauense, conhecer um pouco sobre o processo da pesca no município de Acaraú

– CE as falas contidas em algumas páginas dessa monografia e as discussões feitas

através dos autores aqui mencionados fico satisfeito com o conhecimento aqui

produzido.

Contudo, diante disso, tenho a certeza de que muitas considerações

devem ser ainda exploradas nesse campo com o intuito de cada vez mais se chegar

a novas categorias de análises e de saber, bem como cada vez mais conhecer

minhas próprias raízes. Espero numa outra etapa da minha vida acadêmica, poder

vislumbrar um pouco mais desse trabalho, acredito que há muito ainda para se

desenvolver, haja vista que o processo de construção de um saber histórico através

da pesquisa nunca se dará por acabado.

Considerando que mesmo sob a aparência de simplicidade como as

coisas cotidianas acontecem, numa etnografia nos damos conta da complexidade

dos acontecimentos e de como as relações são construídas, e aí o pesquisador se

vê diante de diversas categorias que precisam ser analisadas para que se possa

compreender o que os indivíduos estão de fato querendo dizer, além de considerar

também as posturas tomadas no âmbito de suas atividades, tudo isso faz parte de

um universo grandioso de informações importantes, alicerces da descrição densa

(GEERTZ, 1989).

O tema central da pesquisa está inserido dentro de uma proposta de

atuação e engajamento dos sujeitos sociais em iniciativas municipais, estaduais,

federais para buscarem políticas públicas que melhor trabalhem a questão da pesca

em todas as esferas do país. Associados a esses segmentos estão também as

empresas, os agentes capitalistas, cuja contribuição vem em conformidade com que

elas podem melhor remunerar e/ou garantir uma condição melhor ao pescador e ao

modelo econômico aqui comentado. Haja vista que o nosso país possui um litoral de

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7.408 quilômetros de extensão ou 9.198 quilômetros se forem computadas todas as

reentrâncias43, onde este litoral é mal aproveitado e mal administrado, e que os

agentes pesqueiros tenham mais valor e participem das decisões que afetam direta

e indiretamente suas vidas.

Confesso que me engajei de corpo e alma nesta pesquisa, afinal, antes

de ser pesquisador, sou um agente que transita neste meio e sou também “fruto”

deste meio, não vos esqueçamos que sou filho de pescador; jamais me esquecerei

dos minutos que tive com os entrevistados, como eles abordaram seus pontos de

vista sobre o tema ali discutido.

Espero que inicialmente tenha podido contribuir com essa pesquisa,

desejo que um dia ao lerem esse trabalho tenham a percepção da importância do

pescador não só para a pesca em si, não só para a economia do município de

Acaraú, mas para o próprio processo de construção da História, da Cultura e da

Identidade do povo acarauense.

E que outros pesquisadores, acadêmicos possam pesquisar, aprofundar e

fazer uma análise crítica do tema pescador, pois pelo que pude perceber ainda é um

tema pouco pesquisado. Até no município de Acaraú quase nada tem de registros

bibliográficos sobre o pescador, a não ser na Colônia dos Pescadores, e até lá são

registros de documentos dos filiados e/ou livros que o Governo manda, mas em

relação aos pescadores nativos absolutamente nada.

Espero que a pesquisa possa de certa forma contribuir para o

desenvolvimento de outras pesquisas voltadas à pesca e para a relevância sócio-

cultural que o “homem do mar” tem não só para Acaraú para todo o país.

43 Fonte: http://www.oragoo.net/qual-e-a-extensao-do-litoral-brasileiro

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Fonte: http://www.oragoo.net/qual-e-a-extensao-do-litoral-brasileiro.

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Fortaleza, 1989.

SINDICATO DOS TRABALHADORES RURAIS DE ACARAÚ-CE.

ENTREVISTAS

RAIMUNDO NONATO PIRES: ex-pescador (entrevista realizada em abril de 2011)

MARIA JOSÉ DOS SANTOS PIRES: dona de casa (entrevista realizada em junho de

2011).

FRANCISCO DA COSTA CIPIÃO: ex- trapicheiro (entrevista realizada em junho de

2011).

ALUÍSIO OLIVEIRA: dono de barco (entrevista realizada em dezembro de 2011).

MARCOS SEBASTIÃO DA SILVA: mestre de barco: (entrevista realizada em

dezembro de 2011).

JOSÉ INÁCIO RODRIGUES: ex-pescador (entrevista realizada em março de 2012).

INÊS ARAÚJO: responsável pelo SINE IDT em Acaraú (entrevista realizada em

março de 2012).

RAIMUNDO ALVES DA SILVA: ex-pescador (entrevista realizada em abril de 2012).

MARIA LUZIARA ROCHA VASCONCELOS (entrevista realizada em outubro de

2012).