UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA INSTITUTO DE … · Bacharel em Geologia, Universidade Federal da...

71
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS CURSO DE GEOLOGIA IARA MARIA RODRIGUES BRASILEIRO ANÁLISE SEDIMENTOLÓGICA E ESTRATIGRÁFICA DA FORMAÇÃO SERGI, CAMPO DOM JOÃO, BACIA DO RECÔNCAVO, BAHIA, BRASIL Salvador 2014

Transcript of UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA INSTITUTO DE … · Bacharel em Geologia, Universidade Federal da...

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS CURSO DE GEOLOGIA

IARA MARIA RODRIGUES BRASILEIRO

ANÁLISE SEDIMENTOLÓGICA E ESTRATIGRÁFICA DA

FORMAÇÃO SERGI, CAMPO DOM JOÃO, BACIA DO

RECÔNCAVO, BAHIA, BRASIL

Salvador

2014

1

IARA MARIA RODRIGUES BRASILEIRO

ANÁLISE SEDIMENTOLÓGICA E ESTRATIGRÁFICA DE

TESTEMUNHOS DA FORMAÇÃO SERGI, CAMPO DOM

JOÃO, BACIA DO RECÔNCAVO, BAHIA, BRASIL

Monografia apresentada ao Curso de Geologia,

Instituto de Geociências, Universidade Federal da

Bahia, como requisito parcial para obtenção do grau

de Bacharel em Geologia.

Orientador: Prof. Dr. Carlson de Matos Maia Leite

Salvador Salvador

2012

Salvador

2014

2

TERMO DE APROVAÇÃO

AP

IARA MARIA RODRIGUES BRASILEIRO

Salvador, janeiro de 2014

ANÁLISE SEDIMENTOLÓGICA E ESTRATIGRÁFICA DA FORMAÇÃO SERGI, CAMPO DOM JOÃO, BACIA DO

RECÔNCAVO, BAHIA, BRASIL

Trabalho Final de Graduação aprovado como requisito parcial para obtenção do grau de

Bacharel em Geologia, Universidade Federal da Bahia, pela seguinte banca examinadora:

________________________________________________________________

1° Examinador – Dr. Carlson de Matos Maia Leite

IGEO - UFBA/PETROBRAS

________________________________________________________________

2° Examinador – Geólogo Cícero da Paixão Pereira

ANP - UFBA

________________________________________________________________

3° Examinador – MSc. Edson Souza Medeiros

PETROBRAS/Salvador

3

À todos que contribuíram direta ou indiretamente

Com a minha formação acadêmica.

4

AGRADECIMENTOS

A minha família que sempre me apoiou nas escolhas tomadas.

Aos meus filhos Iago e Liz pelo incentivo e carinho sempre dispensado.

Agradeço ao meu orientador Carlson que teve papel importante na elaboração deste

trabalho, pela sua dedicação em me orientar, pelos esclarecimentos e correções sugeridas.

Aos colegas e amigos da Petrobras, em especial ao pessoal do Laboratório de

Sedimentologia e Estratigrafia que ajudaram muito no meu trabalho de forma direta ou

indireta: Edson Medeiros, Flávio, Rodrigo, Alessandra, Lucinha, Mirian, Nelma, Soninha,

Dora, Claudineuza, Iguatemi, Adilson, Thiago, Ju, Val e Edson Cosme. Ao gerente do setor

de Sedimentologia e Estratigrafia da UO-BA/EXP, Márcio, por autorizar a utilização do

espaço e os dados internos o que me permitiu a execução deste trabalho..

Agradeço ao gerente João Batista, do setor de Avaliação e Acompanhamento

Geológico de Poço da UO-BA/EXP, setor que trabalho, pelo apoio que me possibilitou a

conclusão do curso assim como aos colegas da AAG em especial à Aline, Lene e Ná.

Aos professores que me orientaram ao longo do curso.

Bom, a todos que torceram por mim, “muito obrigada”!

5

"No mistério do sem-fim equilibra-se

um planeta. E no planeta um jardim e

no jardim um canteiro no canteiro uma

violeta e sobre ela o dia inteiro entre o

planeta e o sem-fim a asa de uma

borboleta”.(Cecília Meireles)

6

RESUMO

A Formação Sergi, abrange uma sucessão fluvial-eólica-lacustre do Jurássico Superior da

Bacia do Recôncavo e evoluiu durante a fase de tectônica e sedimentação pré-rifte da bacia.

Suas sequências deposicionais de origem flúvio- eólica são essencialmente compostas por

arenitos finos a conglomeráticos. O objetivo principal desta monografia é fornecer uma

análise sedimentológica e estratigráfica detalhada de 45 metros de testemunhos da Formação

Sergi amostrados no compartimento sul da Bacia do Recôncavo, em um poço no Campo de

Dom João. Os aspectos do reservatório também são discutidos na monografia. Foram

identificadas quatro associações de fácies nos testemunhos descritos: eólico seco, eólico

úmido, fluvial efêmero e fluvial entrelaçado perene. Este último é sub-dividido em barra

longitudinal, canal e planície fluvial. Estas fácies foram relacionadas à duas das três

sequências deposicionais da Formação Sergi, adotando-se a proposta de Scherer et all (2005,

2007); a sequência II, que compreende a associação de fácies fluviais entrelaçadas e a

sequência III, que ocorre na porção superior do intervalo estudado, caracterizada pelos

depósitos fluviais efêmeros e eólicos. Foram constatados alguns intervalos com boas

condições permo-porosas, corroborando com o potencial de reservatório de toda a unidade,

caracterizadas por menor cimentação carbonática e menor argilosidade..

Palavras-chave: testemunho, Formação Sergi, Campo Dom João, Bacia do Recôncavo.

7

ABSTRACT

The Sergi Formation encompasses an upper Jurassic fluvial-eolian-lacustre sucession, in the

Reconcavo Basin and evolved during the stage of pre -rift tectonic-sedimentation of this

basin. Their depositional sequences deposits of fluvial- aeolian are, essentially composed of

fine to conglomeratic sandstones . The main goal of this monography is to provide a detailed

sedimentologic and stratigraphic analysis of 45 meters of cores of Sergi Formation sampled in

the south portion of the Reconcavo Basin in Dom João Field. The reservoir aspects of

sucession are also discussed in the monography Four facies associations has been

discriminated withim the study cores: dry aeolion, humid aeolion, ephemeral fluvial,

perennial fluvial. The latter being subdivided in longitudinal bar, channel and fluvial plain

facies associations. These facies has been to two of the three depositional sequences of the

Sergi Formation after Scherer et al (2005, 2007): sequence II, that consists of perennial

braided fluvial facies association; and sequence III, which occurs in the upper portion of the

studied cores characterized by ephemeral fluvial and eolian deposits. Some intervals with

good permo - porous conditions, corroborates the potential reservoir of the sandstones and is

related to less cements of carbonate and clay-minerals.

Key-words: core, Sergi Formation, Dom João Field, Recôncavo Basin.

8

LISTA DE FIGURAS

Figura 1-1. Localização limites e arcabouço estrutural da Bacia do Recôncavo. ................... 14

Figura 2-1. Seção esquemática na direção NW-SE da Bacia do Recôncavo, ilustrando a

morfologia de meio graben com as bordas flexural (oeste) e falhada (leste) e mergulho

preferencial das camadas para sudeste. ................................................................................. 17

Figura 2-2. Carta estratigráfica da Bacia do Recôncavo com destaque para a Formação Sergi.

............................................................................................................................................ 18

Figura 2-3. Paleoambiente deposicional da Bacia do Recôncavo durante o estágio pré-rifte

(Modificado de MEDEIROS & PONTE ,1981 apud MAGNAVITA, 2005) ......................... 19

Figura 2-4. Paleoambiente deposicional da Bacia do recôncavo durante o estágio rifte

(Modificado de MEDEIROS & PONTE, 1981 apud MAGNAVITA,2005). ......................... 21

Figura 2-5. Modelo deposicional de seção sin-rifte fazendo alusão à deposição da Formação

Taquipe (Figueiredo et al, 1994, apud Gontijo, 2011). ......................................................... 22

Figura 2-6. a) Mapa simplificado do arcabouço estrutural da Bacia do Recôncavo com as

principais estruturas rúpteis associadas; b) Seções geológicas esquemáticas; c) Seção ao longo

do strike da Falha de Salvador. ............................................................................................. 25

Figura 2-7. Campos de produção de óleo e gás da Bacia do Recôncavo. Em destaque o Campo

de Dom João. ....................................................................................................................... 28

Figura 3-1. Tipos morfológicos básicos de canais fluviais (Modificado de MIALL, 1977 apud

SCHERER, 2008) ................................................................................................................ 31

Figura 3-2. Perfil de equilíbrio de sistemas fluviais que corresponde ao nível de base

estratigráfico em sucessões aluviais...................................................................................... 34

Figura 3-3. Modelo hipotético destacando a criação de espaço e acomodação resultante de

uma subida do perfil de equilíbrio. ....................................................................................... 34

Figura 3-4. Variações das zonas interdunas de acordo com o nível de saturação de areia, sendo

classificadas em zonas subsaturadas, metassaturadas e saturadas. ......................................... 36

Figura 3-5. Três estágios de desenvolvimento de um pavimento de deflação. A) Deflação

inicial dos sedimentos arenosos; B) Concentração dos clastos a medida que ocorre deflação;

C) Término da deflação em decorrência do recobrimento do substrato por clastos. ............... 37

Figura 3-6. Quatro estágios do desenvolvimento de um ventifacto. O clasto torna-se um

ventifacto entre o estágio A e B. ........................................................................................... 38

9

Figura 3-7. Tipos de transporte eólico, compreendendo saltação, rolamento e suspensão. ..... 38

Figura 3-8. Apresentação básica do sistema eólico, mostrando o nível freático e as variações

de comportamento do sistema a partir dessa superfície. ( Modificado de KOCUREK &

HAVHLM, 1993 ). ............................................................................................................... 39

Figura 3-9. Representação esquemática de acumulação eólica. A acumulação acontece quando

o balanço é positivo, ou seja, o volume de sedimentos que entra (Qi) em uma área é maior que

o volume que sai da mesma área (Qo). ................................................................................. 41

Figura 3-10. Representação esquemática dos principais elementos que controlam a

acumulação e preservação de sedimentos em sistemas eólicos secos. ................................... 41

Figura 3-11. Representação esquemática dos principais elementos que controlam a

acumulação e preservação de sedimentos em sistemas eólicos úmidos. ................................ 42

Figura 3-12. Transição entre sistemas eólicos úmidos e secos, marcada por um aumento na

disponibilidade de areia. ....................................................................................................... 43

Figura 3-13. Representação esquemática dos conceitos de acumulação, espaço de acumulação

e espaço de preservação. ...................................................................................................... 43

Figura 4-1. Morfologia e elementos internos de canais fluviais entrelaçados (Coleman, 1969).

O corte a-a' ressalta uma diminuição da largura no aprofundamento do canal principal. Na

seção b-b' são evidenciadas inúmeras barras e ilhas internas ao canal principal, segmentando-

o em fluxos secundários mais rasos. ..................................................................................... 52

Figura 4-2. Anasete mostrando análise sedimentológica do poço em estudo no campo de Dom

João. .................................................................................................................................... 62

10

LISTA DE FOTOS

Foto 4-1. Arenito conglomerático com seixos de quartzo e concreções silicosas. .................. 47

Foto 4-2.Arenito conglomerático apresentando manchas de óleo castanho escura. ................ 48

Foto 4-3. Arenito apresentando estrutura mosqueada. ........................................................... 49

Foto 4-4. Arenito apresentando níveis calcíticos preenchendo microfraturas. ....................... 50

Foto 4-5. Paleossolo arenoso com concreções centimétricas de calcrete e silcrete. ................ 51

Foto 4-6. Paleossolo arenoso apresentando calcrete e silcrete e localmente manchas de óleo

castanho escuro. ................................................................................................................... 53

Foto 4-7. Arenito conglomerático com clastos de argila e manchado de óleo. ....................... 55

Foto 4-8. Paleossolo arenoso com concreções carbonáticas e níveis de calcrete .................... 56

Foto 4-9. Arenito saturado em óleo com estratificação cruzada de baixo ângulo com

laminação pin-stripe. ............................................................................................................ 58

Foto 4-10. Testemunho 2 - Arenito saturado em óleo castanho escuro. ................................. 59

Foto 4-11. Arenito apresentando estratificações cruzadas e estrutura de bioturbação. ........... 60

11

LISTA DE TABELAS

Tabela 4-1: Tabela com as convenções utilizadas ................................................................. 44

Tabela 4-2: Litofácies descritas nos testemunhos da Formação Sergi no Campo Dom João. . 45

12

SUMÁRIO

CAPÍTULO 1 - INTRODUÇÃO ..................................................................................................................13

1.1. OBJETIVOS ............................................................................................................................................15 1.2. JUSTIFICATIVAS ....................................................................................................................................15 1.3. MÉTODO DE TRABALHO ........................................................................................................................16

1.3.1. Pesquisa bibliográfica ..................................................................................................................16 1.3.2. Aquisição de dados .......................................................................................................................16 1.3.3. Tratamento de dados .....................................................................................................................16

CAPÍTULO 2 - GEOLOGIA REGIONAL .................................................................................................17

2.1. Estratigrafia ....................................................................................................................................17 2.1.1. Embasamento ..............................................................................................................................18 2.1.2. Supersequência Paleozóica ..........................................................................................................18 2.1.3. Supersequência Pré-Rifte .............................................................................................................19 2.1.4. Supersequência Rifte ...................................................................................................................20

2.2. A FORMAÇÃO SERGI E O CAMPO DOM JOÃO ...........................................................................................25

CAPÍTULO 3 - FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ......................................................................................29

3.1. SISTEMAS FLUVIAIS ..............................................................................................................................29 3.1.1. Processos fluviais .........................................................................................................................29

3.1.1.1. Erosão fluvial ........................................................................................................................................ 29 3.1.1.2. Transporte e deposição fluvial ............................................................................................................... 30

3.1.2. Classificação dos canais fluviais ..................................................................................................31 3.1.2.1. Rios entrelaçados (braided rivers) .......................................................................................................... 31 3.1.2.2. Rios retilíneos (straight rivers) .............................................................................................................. 32 3.1.2.3. Rios anastomosados (anastomosed rivers) .............................................................................................. 32 3.1.2.4. Rios meandrantes (meandering rivers) ................................................................................................... 32

3.1.3. Acumulação fluvial .......................................................................................................................33 3.2. SISTEMAS EÓLICOS ...............................................................................................................................34

3.2.1. Morfologia e tamanho das acumulações de areia ..........................................................................35 3.2.1.1. Lençóis de areia .................................................................................................................................... 35 3.2.1.2. Campos de dunas................................................................................................................................... 35

3.2.2. Processos eólicos ..........................................................................................................................37 Transporte eólico .............................................................................................................................................. 38 3.2.3. Deposição eólica ...................................................................................................................................... 39

3.2.4. Acumulação e tipos de sistemas eólicos .........................................................................................40 3.2.4.1. Sistemas eólicos secos ........................................................................................................................... 41 3.2.4.2. Sistemas eólicos úmidos ........................................................................................................................ 42 3.2.4.3. Sistemas eólicos estabilizados ................................................................................................................ 42

3.2.5. Preservação de sistemas eólicos ....................................................................................................42

CAPÍTULO 4 - ANÁLISE SEDIMENTOLÓGICA DE TESTEMUNHOS ...............................................44

DA FORMAÇÃO SERGI NO CAMPO DOM JOÃO ..................................................................................44

4.1. FÁCIES SEDIMENTARES ..........................................................................................................................44 4.2. ASSOCIAÇÃO DE FÁCIES ........................................................................................................................46

4.2.1. Associação de Fácies Fluvial Entrelaçado Perene .........................................................................46 4.2.3. Associação de Fácies Planície Fluvial...........................................................................................53 4.2.4. Associação de Fácies Fluvial Efêmero ..........................................................................................54 4.2.1. Associação de Fácies Eólico Seco .................................................................................................57 4.2.2. Associações de Fácies Eólico Úmido .............................................................................................60

4.3. SEQUÊNCIAS DEPOSICIONAIS .................................................................................................................61

CAPÍTULO 5 - CONCLUSÕES ..................................................................................................................63

REFERÊNCIAS ............................................................................................................................................64

13

CAPÍTULO 1 - INTRODUÇÃO

A Bacia do Recôncavo localiza-se no centro-leste do Estado da Bahia, onde ocupa

uma área com cerca de 11500km2

e sua orientação geral segue o trend NE-SW. Seus limites

são representados, a norte e noroeste, pelo Alto de Aporá; pelo sistema de falhas da Barra, a

sul; pelo sistema de falhas de Salvador, a leste; e, a oeste, pela Falha de Maragogipe (Figura

1.1) (MILHOMEM et al., 2003; SILVA et al., 2007).

Segundo Magnavita et al. (2005), a Bacia do Recôncavo faz parte do sistema de riftes

intracontinentais Recôncavo-Tucano-Jatobá formado através de campos de tensões

responsáveis pela ruptura do supercontinente Gondwana durante o Eocretáceo e que

promoveu a abertura do Oceano Atlântico Sul.

Segundo Silva et al. (2007), o preenchimento da Bacia do Recôncavo se deu através

de deposição de sequências sedimentares nos estágios pré-rifte, sin-rifte e pós-rifte.

A Formação Sergi foi depositada durante a fase pré-rifte da evolução da Bacia. É

representada por sequências de origem flúvio-lacustre-eólica, que englobam arenitos finos a

conglomeráticos (SCHERER et al., 2005, 2007). Esta formação constitui principal

reservatório da Bacia do Recôncavo.

Estudos mais atuais (SCHERER et al, 2005,2007) subdividem a Formação Sergi em

três sequências deposicionais. A sequência I é composta dominantemente por depósitos

fluviais efêmeros e eólicos, predominando arenitos finos a médios, maciços ou laminados; a

sequência II é composta por arenitos grossos à conglomeráticos com estratificações cruzadas

acanaladas a planares depositados por sistemas fluviais entrelaçados perenes; e a sequência III

é representada por arenitos finos a médios com laminações de baixo ângulo de marcas

onduladas, eólicas, intercalados com arenitos de mesma granulometria, maciços ou com

estratificações plano paralelas, depositados por canais fluviais efêmeros.

14

Figura 1-1. Localização limites e arcabouço estrutural da Bacia do Recôncavo.

Fonte: Santos (1998, apud Oliveira 2005).

15

1.1. Objetivos

O trabalho aqui apresentado tem como objetivo geral realizar as descrições

faciológicas de testemunhos da Formação Sergi amostrados em um poço no Campo Dom

João, para interpretação dos seus ambientes deposicionais segundo as sequências

sedimentares definidas por SCHERER et al, 2005. Ao mesmo tempo, serão discutidos os

aspectos de reservatórios das associações de fácies aqui interpretadas.

Os principais objetivos específicos são:

i) identificar litologias, estruturas e texturas sedimentares;

ii) caracterizar as associações faciológicas;

iii) identificar os ambientes deposicionais;

iv) correlacionar perfil-rocha;

v) discutir os aspectos de permoporosidade dos reservatórios.

1.2. Justificativas

A Formação Sergi constitui o principal reservatório de hidrocarbonetos da Bacia do

Recôncavo apresentando ainda um grande potencial para contribuir com o aumento de

produção nos campos petrolíferos da Bahia. O Campo Dom João constitui um importante

campo de produção explorado pela Petrobras.

Este estudo contribuirá com informações acerca das características de reservatório da

Formação Sergi no Campo de Dom João. Além disso, contribuirá com a atualização do banco

de dados da Petrobrás de acordo com os procedimentos atuais da empresa.

16

1.3. Método de Trabalho

A metodologia aplicada neste estudo foi dividida em pesquisa bibliográfica, aquisição

de dados e tratamento de dados.

1.3.1. Pesquisa bibliográfica

Esta etapa consistiu no estudo de textos relacionados à Bacia do Recôncavo, à

evolução e estratigrafia da Formação Sergi, ao Campo de Dom João e sistemas deposicionais

eólicos e fluviais. Esta etapa perdurou durante toda a realização da monografia.

1.3.2. Aquisição de dados

A análise dos testemunhos foi realizada no Laboratório de Sedimentologia e

Estratigrafia da Petrobras, Unidade de Operações da Bahia (UO-BA). Durante esta fase,

foram selecionados intervalos de testemunhos para serem fotografados, a fim de ilustrar

características observadas.

Nesta etapa foram observadas as características dos testemunhos, tais como:

composição, cor, granulometria, organização interna, espessura, estimativa de percentagem de

cimento, argilosidade e presença de hidrocarbonetos. Os testemunhos foram descritos

utilizando o programa Anasete – Análise Sequencial de Testemunhos –, de propriedade da

Petrobras.

1.3.3. Tratamento de dados

Nesta etapa, os dados adquiridos na fase anterior foram integrados e interpretados. As

litofácies sedimentares foram individualizadas levando em consideração suas características

quanto à geometria, composição, granulometria e estruturas sedimentares.

Foram identificadas associações de fácies, possibilitando interpretar o ambiente de

sedimentação. Sendo assim, cada fácies dentro da associação representa um determinado

processo deposicional (ETCHEBEHERE & SAAD, 2003).

Em anexo está representado o resultado da descrição dos testemunhos do poço em

análise, no programa Anasete.

17

CAPÍTULO 2 - GEOLOGIA REGIONAL

A Bacia do Recôncavo ocupa uma área de aproximadamente 11.500km² e exibe uma

geometria de meio-grabén de direção NE-SW. Seus limites são representados, a norte e

noroeste, pelo Alto de Aporá; pelo sistema de falhas da Barra (Figura 2.1), a sul; pelo sistema

de falhas de Salvador, a leste; e, a oeste, pela Falha de Maragogipe (SILVA et al., 2007;

MILHOMEM et al., 2003).

A arquitetura básica da Bacia do Recôncavo é de semigráben (Figura 2.1), resultante

dos esforços distensionais sobre um embasamento pré-cambriano heterogêneo, com borda

falhada (sistema de falhas de Salvador), a sudeste, e flexural, a oeste (PEDREIRA et al.,

2003; MILHOMEM et al., 2003; MAGNAVITA et al., 2005; SILVA et al., 2007).

Figura 2-1. Seção esquemática na direção NW-SE da Bacia do Recôncavo, ilustrando a morfologia de meio graben com as bordas flexural (oeste) e falhada (leste) e mergulho preferencial das camadas para sudeste.

Fonte: Milhomem et al. (2003).

2.1. Estratigrafia

A carta estratigráfica da Bacia do Recôncavo (Figura 2.2) foi readaptada em uma nova

proposta onde foram incorporadas algumas modificações, baseadas nos trabalhos de Netto e

Oliveira (1985) e Aguiar e Mato (1990).

Não houve mudanças nas unidades bioestratigráficas e cronoestratigráficas, porém

houve uma melhor caracterização das relações laterais e cronológicas entre as diferentes

unidades, dando maior clareza à história do preenchimento da bacia (SILVA et. al., 2007).

18

Figura 2-2. Carta estratigráfica da Bacia do Recôncavo com destaque para a Formação Sergi.

Fonte: Silva et al., 2007

2.1.1. Embasamento

O embasamento da Bacia do Recôncavo é constituído predominantemente por

gnaisses granulíticos arqueanos pertencentes ao Cinturão Itabuna-Salvador-Curaçá a oeste e

sudoeste; e pelo cinturão granulítico-anfibolítico Salvador-Esplanada, a leste-nordeste; por

gnaisses e anfibolitos arqueanos com intrusões de granitos paleoproterozóicos que constituem

o Bloco Serrinha, a noroeste-oeste e por rochas metassedimentares neoproterozóicas do

Grupo Estância, a norte.

2.1.2. Supersequência Paleozóica

Os sedimentos da sequência paleozóica estão basicamente representados pelos

membros Pedrão (inferior) e Cazumba (superior) da Formação Afligidos.

O Membro Pedrão é constituído por arenitos com granulometria fina a muito fina,

coloração cinza-claro a bege, apresentando feições que sugerem retrabalhamento por ondas,

19

intercalados por evaporitos, siltitos e laminitos microbiais e no Membro Cazumba

predominam pelitos e lamitos avermelhados lacustres, com nódulos de anidrita na base de

acordo com Caixeta et al. (1994), Milhomem et al. (2003) e Silva et al. (2007),

Segundo Aguiar & Mato (1990, apud Silva et al., 2007), as associações faciológicas

que caracterizam esta supersequência paleozóica têm uma tendência regressiva com transição

de uma sedimentação marinha rasa marginal a bacias evaporíticas isoladas em ambientes de

sabkha continental e lacustre.

2.1.3. Supersequência Pré-Rifte

A sedimentação nesta fase está relacionada ao estágio inicial da flexura da crosta

continental em resposta aos esforços que originaram o sistema de riftes. Segundo Silva et al.

(2007), esta sedimentação engloba três grandes ciclos flúvio-eólicos, separados por

transgressões lacustres, que resultaram que resultaram na deposição, da base para o topo, das

formações Aliança e Sergi, do Grupo Brotas (Andar Dom João); e das formações Itaparica e

Água Grande (Andar Rio da Serra inferior), do Grupo Santo Amaro (Figura 2.3).

Figura 2-3. Paleoambiente deposicional da Bacia do Recôncavo durante o estágio pré-rifte (Modificado de MEDEIROS & PONTE ,1981 apud MAGNAVITA, 2005)

A Formação Aliança está sobreposta à Formação Afligidos, cujo contato é discordante

na maior parte da Bacia do Recôncavo, e é representada pelos Membros Boipeba e Capianga,

conforme pode ser verificado na carta estratigráfica (Figura 2.2). O Membro Boipeba consiste

de rochas sedimentares de origem flúvio-eólica-lacustre e é composto por arenito arcoseano

20

com coloração marrom avermelhada, granulometria fina a média e estratificação cruzada,

enquanto que o Membro Capianga é constituído por folhelhos vermelho acastanhados de

origem lacustre.

A Formação Sergi consiste em arenitos cinza-esverdeados a avermelhados com

granulometria fina a conglomerática e estratificação cruzada com intercalações de folhelhos

vermelhos a cinza-esverdeados (CAIXETA et al., 1994). Foi depositada concordantemente

sobre a Formação Aliança. Caracterizam sistemas eólicos, intercalados por fluviais efêmeros e

entrelaçados (SCHERER et al., 2005).

A Formação Itaparica é a unidade basal do Grupo Santo Amaro. Está depositada

concordantemente sobre a Formação Sergi e é compreendida por folhelhos marrom a cinza-

oliva de origem lacustre e siltitos com raras intercalações de arenitos finos. É interpretada

como sendo formada em ambiente lacustre com pequenas incursões fluviais (ALMEIDA,

2004, apud SANTOS, 2011).

A Formação Água Grande é representada por arenito cinza-claro a esverdeado, com

granulometria de fino a grosso e estratificação cruzada acanalada, sendo interpretada por

Barroso & Rivas (1984 apud CAIXETA et al., 1994) como deposição por sistemas fluviais

com retrabalhamento eólico. O contato superior com a Formação Candeias é discordante.

2.1.4. Supersequência Rifte

O início do rifteamento está relacionado à transgressão regional que sobrepõe os

pelitos lacustres do Membro Tauá à fácies eólicas presentes no topo da Formação Água

Grande. Essa transgressão, segundo CAIXETA et al, (1994) está marcada por uma importante

mudança climática, de árido para úmido e a um incremento nas taxas de subsidência, com

distensão da crosta sob atividade moderada. Compreende as formações Candeias,

Maracangalha, Marfim, Pojuca, Taquipe, São Sebastião e Salvador, como pode ser visto na

carta estratigráfica anteriormente apresentada (Figura 2.2).

Segundo Magnavita et al. (2005), dois sistemas progradantes preencheram a Bacia do

Recôncavo durante a fase rifte: i) fluvio-deltáico-lacustre (longitudinal a oblíquo), oriundo da

Bacia do Tucano que depositou folhelhos e arenitos, incluindo turbiditos e depósitos de

escorregamento, constituindo as formações Candeias e Maracangalha (Grupo Santo Amaro),

Marfim, Pojuca e Taquipe (Grupo Ilhas) e por fim a Formação São Sebastião (Grupo

Massacará) depositada em ambiente fluvio-deltáico (Figura 2.4); ii) sistema de leques

deltaicos, localizado transversalmente à bacia, que foi depositado em leques conglomeráticos

21

subaquáticos derivados da erosão do bloco alto da falha de borda, o qual constitui a Formação

Salvador que, devido a seu evento deposicional está presente em todo o evento rifte da bacia.

Figura 2-4. Paleoambiente deposicional da Bacia do recôncavo durante o estágio rifte (Modificado de MEDEIROS & PONTE, 1981 apud MAGNAVITA,2005).

A Formação Candeias, depositada discordantemente sobre a Formação Água Grande,

é constituída por pelitos escuros, compreendendo o Membro Tauá, e folhelhos e lamitos

cinza-esverdeados intercalados com camadas de calcilutito e de arenitos turbidíticos, que

abrangem o Membro Gomo (CAIXETA et al., 1994; MILHOMEM et al., 2003).

A Formação Maracangalha possui contato basal discordante com a Formação

Candeias e se caracteriza por pelitos cinza-escuros e pacotes espessos de arenitos maciços e

fluidizados relacionados a processos gravitacionais sub-aquosos que constituem os membros

Caruaçu e Pitanga (MAGNAVITA et al., 2005).

A Formação Marfim é constituída por arenitos com granulometria fina a média, bem

selecionados, cinza-claros, apresentando intercalações com folhelhos cinza esverdeados,

possui contato basal gradativo interdigitado ou concordante com a Formação Maracangalha

(VIANA et al., 1971, apud CAIXETA et al., 1994). O Membro Catu, que faz parte desta

formação, representa níveis arenosos bem caracterizados e posicionados através de marcos

elétricos.

22

A Formação Pojuca está sobreposta à Formação Marfim e é constituída por

intercalações de arenitos cinza muito finos a médios, folhelhos cinza-esverdeados, siltitos

cinza-claros e calcários castanhos. Possui o Membro Santiago, que compreende uma camada

de arenito fino bem demarcada por finos níveis calcários e vários corpos arenosos (CAIXETA

et al., 1994).

A Formação Taquipe (Figura 2.5) é composta por folhelhos cinza com lentes de

arenitos muito finos, maciços (NETTO et al., 1984, apud CAIXETA et al., 1994), além de

siltitos e, subordinadamente, conglomerados, margas e calcarenitos ostracodais

(MILHOMEM et al., 2003). Esta sequência corresponde a uma feição erosiva em forma de

cânion alongada na direção norte-sul e presente na porção centro-oeste da Bacia do

Recôncavo. Desta forma, a Formação Taquipe está justaposta à Formação Pojuca em

discordância erosiva, sendo recoberta concordantemente pela mesma.

Figura 2-5. Modelo deposicional de seção sin-rifte fazendo alusão à deposição da Formação Taquipe (Figueiredo et al, 1994, apud Gontijo, 2011).

A Formação São Sebastião é constituída por arenito com granulometria grossa,

amarelo-avermelhado e intercalações de argila síltica e foi depositada por sistemas fluviais,

deltaicos e lacustres, que encerram o assoreamento da Bacia do Recôncavo, (CAIXETA et al.,

1994).

23

A Formação Salvador está associada aos sistemas deltáicos sin-tectônicos relacionados

ao sistema de falhas de Salvador (MILHOMEM et al., 2003) e é caracterizada por

conglomerados e arenitos provenientes da borda falhada à leste da Bacia do Recôncavo,

presentes durante todo o estágio sin-rifte.

2.1.5. Supersequência Pós-Rifte

A fase pós-rifte corresponde ao Andar Alagoas, que se estende do Aptiano ao Albiano

Inferior.

Segundo Magnavita et al. (2005), a fase pós-rifte é representada por depósitos aluviais

de conglomerados, arenitos e, subordinadamente, folhelhos e calcários que compõem a

Formação Marizal. Sua deposição ocorreu numa depressão do tipo sinéclise, quando houve

uma subsidência térmica pós-rifte. Uma discordância angular separa esta fase da anterior (sin-

rifte).

2.1.6. Arcabouço Estrutural

A Bacia do Recôncavo compõe a porção sul do rifte intracontinental Recôncavo-

Tucano-Jatobá, que se desenvolveu sobre um complexo mosaico de terrenos de idade

predominantemente Pré-Cambriana.

De norte para sul, o maciço Alagoas-Pernambuco (Bacia de Jatobá), o Sistema de

Dobramentos Sergipano (Bacia do Tucano Norte), o Cráton de São Francisco (bacias de

Tucano Central e Sul e Recôncavo) servem de embasamento para o Rifte.

As estruturas desse embasamento exerceram forte influência na geometria final do

arcabouço da bacia, controlando a orientação das zonas de falha, dos altos do embasamento

como também das zonas de acomodação (SZATMARI et al., 1984; MILANI, 1987 e

MAGNAVITA & CUPERTINO, 1988 in RODRIGUES, 1990). Como resultado, a Bacia do

Recôncavo herdou uma forma alongada segundo N30E, produto da ação tectônica formadora

e deformadora da Bacia, bem como das heterogeneidades de seu substrato.

A Bacia está limitada à leste pelo sistemas de falhas de Salvador, com direção N30ºE e

seu rejeito total é de cerca de 6.0 quilômetros, e à oeste é limitada pelo sistema de falhas de

Maragogipe, com mesma direção porém com rejeitos inferiores à 500 mestros. Ao norte é

separada da Bacia de Tucano pelo Alto de Aporá e ao sul é separada da Bacia de Camamu

pela Falha da Barra e os falhamentos que lhe dão continuidade para sudeste, (BRUHN, 1985).

24

O sistema de falhas NE divide a bacia em área que foram relativamente estáveis,

configurando patamares adjacentes aos grandes baixos regionais, onde se destacam o Baixo

de Camaçari e o Baixo de Miranga (Figura 2.6) (SANTOS et al., 1990).

O trend geral dos blocos que constituem a Bacia do Recôncavo é interrompido por

outro sistema de falhamentos, de direção N40°W, que tem como principais representantes as

Falhas de Mata-Catu e Itanagra-Araçás, interpretadas como falhas de transferência que

acomodaram diferentes taxas de estiramento crustal durante o desenvolvimento da bacia

(SANTOS et al., 1990).

25

Figura 2-6. a) Mapa simplificado do arcabouço estrutural da Bacia do Recôncavo com as principais estruturas rúpteis associadas; b) Seções geológicas esquemáticas; c) Seção ao longo do strike da Falha de Salvador.

Fonte: Destro et al. (2003, apud Santos, 2011).

2.2. A Formação Sergi e o Campo Dom João

A Formação Sergi acumulou-se em grande bacia (depressão afro-brasileira) que cobria

uma extensa área do nordeste brasileiro, estendendo-se inclusive ao continente africano, sendo

26

constituído essencialmente por depósitos fluviais e eólicos (Küchle et al. 2011). Ocorre nas

Bacias do Recôncavo, Tucano, Jatobá e Camamu-Almada.

A ampla ocorrência e espessura desta unidade, associada à alta permeabilidade e

porosidade dos arenitos, confere-lhe o status de maior reservatório na Bacia do Recôncavo.

Todavia, sua ocorrência em superfície está restrita às bordas norte e oeste, sendo que os

estratos estão inclinados regionalmente para leste (MILANI, 1987, apud SCHERER et al.,

2005).

A Formação Sergi foi subdividida em três sequências deposicionais, limitadas por

discordâncias regionais (Scherer et al. 2005, 2007).

A sequência I, basal, é composta pelas associações de fácies fluviais efêmeros e fácies

eólicas. Os pacotes fluviais são compostos por arenitos finos a médios, maciços ou

estratificados (estratificação cruzada acanalada, estratificação cruzada de baixo ângulo e/ou

laminação plano-paralela), que são limitados por superfícies erosivas cobertas por

conglomerados intraformacionais. Os estratos fluviais indicam uma paleocorrente média para

NE.

Os depósitos eólicos da sequência I são compostos por lençóis de areia com

laminações horizontais e por depósitos de dunas com estratificação cruzada. Os lençóis de

areia compreendem arenitos finos a médios, bem selecionados, com estratificações sub-

horizontais de baixo ângulo e/ou laminações transladantes. Os depósitos de dunas são

caracterizados por arenitos médios a grossos com cruzadas de grande porte, por vezes

maciços ou fluidizados. Nas porções basal e intermediária dos pacotes flúvio-eólicos há

ocorrência de pelitos lacustres maciços ou finamente laminados.

A incidência do retrabalhamento eólico e a presença bastante comum de horizontes

com nódulos de caliches e silcretes, em meio às seqüências deposicionais, atestam a

dominância de um clima árido durante a deposição do Sergi (De Ros, 1986; Figueiredo et al.,

1994). Por outro lado, a presença constante de pelitos lacustres em meio à Seqüência I indica

intervalos de condições relativamente mais úmidas, marcados provavelmente por uma subida

do lençol freático e conseqüente afogamento de áreas da bacia.

A sequência II é representada por uma associação tipicamente fluvial de fácies

arenosas, composta por arenitos grossos a conglomeráticos, formando ciclos com

granodecrescência ascendente com 1 a 5 metros de espessura. Estes arenitos são interpretados

como depósitos de canais fluviais entrelaçados, perenes, com significativa variação de

descarga, cujo fluxo era para NW. Por vezes ocorrem pelitos que separam os corpos arenosos.

No topo da sequência II ocasionalmente ocorrem níveis de paleoalteração, e o limite superior

27

dessa sequência é marcado pelo recobrimento desses depósitos fluviais pelos depósitos

eólicos da sequência III.

A sequência III é representada pelos arenitos eólicos no topo da Formação Sergi,

caracterizada por arenitos finos a médios com marcas onduladas eólicas. Estes arenitos foram

depositados em lençóis de areia eólicos ou em cruzados tangenciais, estratos compostos por

lâminas de fluxo de grãos e marcas onduladas, constituindo depósitos residuais de dunas

eólicas. Intercalados a estes depósitos ocorrem arenitos de mesma granulometria, maciços e

com estratificação plano-paralela e, mais raramente, com estratificação cruzada acanalada,

interpretados como depósitos fluviais efêmeros. Essa sequência marca um retorno de

condições deposicionais semelhantes à sequência I, porém com um domínio dos processos

eólicos, sendo raros os sedimentos fluviais e inexistentes os depósitos lacustres.

O Campo de Dom João, descoberto em 1947, está localizado nas proximidades do

município de São Francisco do Conde, na parte sudoeste da Bacia do Recôncavo (Figura 2.7).

Dois terços do campo estão imersos nas águas da Baía de Todos os Santos, sendo dividido em

Dom João Mar e Dom João Terra. As acumulações presentes nesse campo são rasas, situadas

entre 160 e 375 metros de profundidade. Na extremidade norte do campo, a Formação Sergi

possui espessura de 280 metros e, na porção sul, 460 metros (GHIGNONE, 1978).

A estrutura do campo é um horst alongado a SSW-NNE com cerca de 24 km de

comprimento, possuindo de 1 a 3,5 km de largura. As principais falhas limitantes possuem

rejeitos entre 100 e 500 metros e o mergulho da Formação Sergi não ultrapassa 5° para NE

(GHIGNONE, 1978).

28

Figura 2-7. Campos de produção de óleo e gás da Bacia do Recôncavo. Em destaque o Campo de Dom João.

Fonte: Petrobras (apud Gontijo, 2011).

29

CAPÍTULO 3 - FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A Formação Sergi é constituída, predominantemente, por sedimentos oriundos de

sistemas fluviais e eólicos, assim, neste capítulo, serão abordados os principais processos

associados a estes sistemas.

3.1. Sistemas Fluviais

Os rios são cursos naturais de água doce, na maioria das vezes com canais definidos e

fluxo permanente ou sazonal que migra em direção a um oceano, lago ou outro rio. Dada a

sua capacidade de erosão, transporte e deposição, os rios são uns dos principais agentes dos

processos exógenos.

3.1.1. Processos fluviais

Segundo Scherer (2004, 2008), as relações entre os processos erosivos e deposicionais

configuram as características gerais dos sistemas fluviais e a interação destes processos

fluviais erosivos e de transporte e deposição resulta na morfologia aluvial.

3.1.1.1. Erosão fluvial

Os principais processos erosivos em sistemas fluviais são a incisão e migração lateral.

A incisão é a erosão vertical do substrato, promovendo um aprofundamento do canal,

podendo estar associada a um progressivo aumento da descarga devido a mudanças climáticas

ou a um rebaixamento do perfil de equilíbrio (natureza alocíclica). Pode estar associada

também ao deslocamento de canais fluviais decorrentes de processos hidrodinâmicos e

geomorfológicos internos à planície aluvial (natureza autocíclica). A taxa de erosão devido a

migração lateral ocorre em canais com alta sinuosidade, onde o banco externo do meandro

sofre contínua erosão.

30

3.1.1.2. Transporte e deposição fluvial

Fluxo de detritos, carga de fundo e carga de suspensão são os mecanismos de

transporte e deposição dos sedimentos de origem fluvial.

Fluxo de detritos

São fluxos plásticos, laminares, ricos em sedimentos, onde a quantidade de água

existente nos poros é baixa. O movimento acontece quando grande quantidade de sedimentos

é mobilizada por liquefação em uma superfície inclinada, podendo tornar-se turbulento em

decorrência da diminuição de viscosidade. O fluxo de detritos gera depósitos mal

selecionados, clastos cujos tamanhos variam de grânulos a blocos podendo apresentar

orientação incipiente e matriz areno-síltica-argilosa.

Carga de fundo

É a principal forma de transporte fluvial, ocorre por correntes trativas, onde os grãos

são carreados ao longo do leito do rio através de arrasto e rolamento (grãos maiores) e

saltação (grãos menores).

O movimento de areia resulta numa série de tipos de formas de leito, cuja morfologia é

controlada pela profundidade da lâmina d’água associada à granulometria e à velocidade do

fluxo. Em condições de baixa velocidade do fluxo e fração granulométrica entre silte e areia

fina desenvolvem-se marcas onduladas, formas de leito com altura máxima de 5cm e

comprimento de onda inferior a 0,5m. Com o aumento progressivo da velocidade do fluxo

ocorre a formação de dunas subaquáticas (SCHERER, 2008).

Carga de suspensão

O material é transportado em suspensão em decorrência da turbulência do fluxo.

Predomina a carga sedimentar síltico-argilosa, cuja deposição ocorre em regiões de baixa

energia através de assentamento gravitacional de partículas. A interação dos processos de

tração e suspensão gera marcas onduladas cavalgantes (climbing ripples), quanto maior a

tração, menor será o ângulo de cavalgamento das marcas onduladas.

31

3.1.2. Classificação dos canais fluviais

A classificação dos sistemas fluviais baseia-se dominantemente nas

características dos seus canais, levando em conta a carga sedimentar transportada e a

morfologia. No primeiro caso, Schumm (1972, apud SCHERER, 2004, 2008) classificou os

rios em carga de fundo (bed-load), carga mista (mixed-load) e carga de suspensão

(suspended-load).

Com base na morfologia dos canais, os rios podem ser classificados em entrelaçado,

meandrante, anastomosado e reto (LEOPOLD & WOLMAN, 1957; MIALL, 1977; RUST,

1978 apud SCHERER, 2008) (Figura 3.1).

Figura 3-1. Tipos morfológicos básicos de canais fluviais (Modificado de MIALL, 1977 apud SCHERER, 2008)

3.1.2.1. Rios entrelaçados (braided rivers)

Os rios entrelaçados formam uma rede de canais interconectados separados por barras

arenosas e/ou cascalhosas longitudinais e transversais que migram no sentido do fluxo. Os

depósitos de planície de inundação são restritos. Constituem rios de carga de fundo com

geometria em lençol, onde o preenchimento é complexo e bastante diversificado. A Formação

de canais entrelaçados é favorecida pela presença de fortes declividades, abundância de carga

de fundo de granulação grossa, grande variabilidade na descarga e facilidade de erosão das

margens.

Durante períodos de diminuição da velocidade do fluxo, a deposição da carga de fundo

no canal fluvial propicia o desenvolvimento de barras que obstruem a corrente e ramificam-

32

na, processo facilitado quando as margens são facilmente erodíveis, com consequente

aumento do suprimento detrítico (MIALL, 1981 apud RICCOMINI & COIMBRA, 1993).

A sedimentação nos canais entrelaçados é, principalmente, ao longo de barras

longitudinais e transversais. Os sedimentos geralmente são compostos por areia de

granulometria média a grossa e cascalho, sendo que argila e silte são raramente preservados

dentro desses sistemas. O contato basal e superior com outras fácies é frequentemente abrupto

(BROWN & FISHER, 1976).

3.1.2.2. Rios retilíneos (straight rivers)

Os rios retilíneos são pouco frequentes na natureza e podem apresentar sedimentos

diversos. Geralmente são canais poucos extensos e controlados por sistemas de

falhas/fraturas. Segundo SCHERER (2004, 2008) constituem canais simples, com flancos

estáveis e limitados por diques marginais.

3.1.2.3. Rios anastomosados (anastomosed rivers)

São caracterizados por uma rede interconectada de canais separados por áreas de

planície de inundação. Os canais são dominados por sedimentos de granulometria fina, sendo

classificados como rios de carga em suspensão, segundo Schumm (1972). Suas margens são,

coesas e vegetadas, ocasionando alta estabilidade aos canais, o que reduz a migração lateral

(SCHERER, 2004, 2008).

3.1.2.4. Rios meandrantes (meandering rivers)

Este padrão é caracterizado pela alta sinuosidade, pouca variação na descarga,

geometria em lençol, altas taxas de migração e carga mista. A formação de canais

meandrantes ocorre pela erosão e transporte de sedimentos na porção externa do meandro,

onde a velocidade de fluxo é maior e a deposição do sedimento ocorre na parte interna do

meandro seguinte, onde a velocidade de fluxo é menor

33

Rios efêmeros

Os rios efêmeros se formam geralmente após chuvas com inundações rápidas sendo

alimentados por água de escoamento superficial. São característicos de regiões áridas e semi-

áridas. Os depósitos de canais fluviais efêmeros são pouco espessos em comparação com os

depósitos de canais perenes, sendo que apresentam várias classes granulométricas.

Nos estágios finais da inundação podem desenvolver dunas e marcas onduladas sob o

regime de fluxo inferior, onde ocorre uma rápida desaceleração da corrente. Desta forma, um

evento de inundação tende a formar um ciclo com progressiva diminuição de granulometria e

ocorrência de estruturas geradas em condições de regime de fluxo inferior em direção ao topo.

(SCHERER, 2008).

3.1.3. Acumulação fluvial

O principal mecanismo controlador da preservação dos sedimentos depositados em

contextos continentais é a variação das taxas de criação de espaço de acomodação ao longo do

tempo. Jervey (1988, apud SHANLEY & McCABE, 1994) descreveu que o espaço de

acomodação é o espaço disponível para potencial acumulação de sedimentos..

O nível de base estratigráfico em ambientes aluviais é determinado pelo

comportamento do perfil de equilíbrio (Figuras 3.2 e 3.3) que é representado pelo balanço

entre erosão e deposição, onde o contexto em que a energia necessária para transportar

sedimentos é balanceada pela energia potencial liberada pelo fluxo, sendo que o rio não sofre

agradação e nem degradação.

Os períodos de acumulação e erosão fluviais de uma determinada área são

determinados pelo comportamento do perfil de equilíbrio. Durante os intervalos de subida do

perfil de equilíbrio haverá agradação (acumulação fluvial), enquanto que os processos de

erosão e degradação fluvial associam-se a intervalos de rebaixamento do perfil de equilíbrio

(Figuras 3.2 e 3.3).

O perfi de equilíbrio é controlado pela tectônica, o clima e o nível do mar.

34

Figura 3-2. Perfil de equilíbrio de sistemas fluviais que corresponde ao nível de base estratigráfico em sucessões aluviais.

Fonte: Modificado de Dalrymple (1998, apud SCHERER, 2004).

Figura 3-3. Modelo hipotético destacando a criação de espaço e acomodação resultante de uma subida do perfil de

equilíbrio.

Fonte: Modificado de Dalrymple (1998, apud SCHERER, 2004).

3.2. Sistemas Eólicos

Os sistemas deposicionais eólicos têm o vento como principal agente geológico

responsável pela erosão, transporte e deposição de sedimentos expostos à ação atmosférica. O

nível de base da atuação é definido pelo nível freático, abaixo do qual o vento não atua.

Observa-se uma grande atuação dos sistemas eólicos nos desertos, onde o nível

freático é profundo. O vento também atua como importante agente geológico em ambientes

costeiros devido a ocorrência de correntes atmosféricas geradas a partir do contraste de calor

específico e do aquecimento diferencial entre continente e oceano, especialmente em áreas

onde ocorre um alto suprimento de areia (GIANNINI et al., 2008).

35

3.2.1. Morfologia e tamanho das acumulações de areia

Segundo sua morfologia, as acumulações de areia podem ser divididas em dois tipos

básicos: lençóis de areia (sand sheets) e campos de dunas (dune fields), subdivididas em

dunas e interdunas , de acordo com Giannini et al. (2008). Em escalas centimétricas, ainda

existem as marcas onduladas que constituem formas de leito que podem se desenvolver em

lençóis de areia, interdunas e dunas. O desenvolvimento dessas formas está relacionado a

alguns fatores, tais como regime de vento, taxa de acumulação de areia e tamanho de grãos

(LANCASTER, 1988, apud SCHERER, 2004).

3.2.1.1. Lençóis de areia

São massas de areia eólica em movimento sem superposição de dunas com faces de

avalanche (GIANNINI et al., 2008). A estrutura mais comum desses depósitos são as

estratificações planas, de baixo ângulo, com alternância de granulometria. Kocurek & Nielson

(1986 apud GIANINNI et al., 2008), atribuem um ou mais, dentre cinco fatores, que

favorecem a formação de lençóis de areia e obstruem a formação de dunas: granulação grossa,

cimentação superficial, nível elevado do lençol freático, enchentes periódicas e cobertura

vegetal.

3.2.1.2. Campos de dunas

São grandes massas individuais de areias em movimento, sendo constituídas de dunas

eólicas simples, compostas, cavalgantes e coalescentes entre as quais podem existir áreas de

interdunas.

As dunas eólicas são formas de leito onduladas, predominantemente assimétricas,

produzidas onde existe um suprimento suficiente de areia, ventos para transportar os grãos e

condições que promovam a deposição do sedimento transportado (LANCASTER, 2005). A

assimetria caracteriza-se por inclinação maior no lado sotavento que no lado barlavento.

As dunas possuem comprimento de ondas variando de 3 a 500 metros e altura de 0,1 a

100 metros. São chamadas de draa as formas de leito maiores que as dunas, com

comprimento de onda de 300 a 500 metros e altura de 20 a 450 metros.

36

As dunas eólicas podem ser classificadas de acordo com dois esquemas independentes

entre si: morfológico (MCKEE, 1979, apud SCHERER, 2004) e morfodinâmico (HUNTER et

al., 1983, apud SCHERER, 2004).

A classificação morfológica leva em consideração as características geométricas,

como a sinuosidade da crista, números de faces frontais e presença ou ausência de dunas

superpostas. O principal controle dos tipos de dunas é a variação na direção do regime do

vento e, subordinadamente, alguns fatores contribuem para a morfologia, tais como tamanho

dos grãos, cobertura vegetal e suprimento de sedimentos.

A classificação morfodinâmica se baseia no posicionamento das formas de leito em

relação ao vetor médio dos ventos de uma determinada área.

As regiões de interdunas apresentam diferentes geometrias de acordo com a forma das

dunas. São zonas onde atuam processos eólicos e não-eólicos, predominantemente erosivos e

dominantemente deposicionais.

A extensão das interdunas depende da saturação de areia do sistema, sendo

classificadas em zonas subsaturadas, metassaturadas e supersaturadas (Figura 3.4) (Wilson,

1971, apud SCHERER, 2004). As zonas saturadas são caracterizadas por uma cobertura total

de areia e as interdunas consistem em pequenas depressões entre a face frontal da duna

anterior e o dorso da duna subseqüente. As zonas metassaturadas são áreas com uma

cobertura incompleta de areia, caracterizadas por amplas regiões de interduna plana e as zonas

subsaturadas são áreas onde o fluxo de areia é inferior ao valor crítico necessário para o

embrionamento das formas de leito. As interdunas deposicionais podem ser secas, quando a

superfície deposicional é seca, úmida, sob condições de lençol freático próximo à superfície

deposicional, ou encharcada, marcada por inundações periódicas por fluxos fluviais ou nível

do lençol freático alto (SCHERER, 2004).

Figura 3-4. Variações das zonas interdunas de acordo com o nível de saturação de areia, sendo classificadas em

zonas subsaturadas, metassaturadas e saturadas.

Fonte: Wilson (1971, apud SCHERER, 2004).

37

3.2.2. Processos eólicos

Os processos envolvidos na formação de depósitos eólicos são basicamente: erosão,

transporte e deposição pela ação do vento.

Erosão

A erosão promovida pelo vento é característica de ambiente com ausência de

vegetação e baixa umidade do solo, colaborando com a diminuição da coesão dos grãos e

conseguindo remover e transportar grande quantidade de material.

A deflação é a principal forma de erosão promovida pelo vento, pois a competência

baixa do vento carreia os sedimentos de granulação fina (silte e areia) promovendo uma

seleção dos grãos transportados e deixando um pavimento de grãos mais grossos (grânulos e

seixos) (Figura 3.5).

Figura 3-5. Três estágios de desenvolvimento de um pavimento de deflação. A) Deflação inicial dos sedimentos arenosos; B) Concentração dos clastos a medida que ocorre deflação; C) Término da deflação em decorrência do

recobrimento do substrato por clastos.

Fonte: Scherer (2004).

Outra importante forma de erosão eólica é a abrasão que a consiste no desgaste

mecânico de partículas transportadas pelo vento devido ao choque entre elas. Denomina-se

ventifacto qualquer clasto que tenha sido facetado e/ou abrasado por partículas transportadas

pelo vento, sendo que as faces abrasadas são inclinadas para o sentido contrário do vento

(Figura 3.6).

38

Figura 3-6. Quatro estágios do desenvolvimento de um ventifacto. O clasto torna-se um ventifacto entre o estágio A e B.

Fonte: Scherer (2004).

Transporte eólico

O transporte pelo do vento se dá através de saltação, suspensão e rolamento (Figura

3.7) que dependem, dentre outros fatores, do tamanho da partícula, da tensão do cisalhamento

do vento e da intensidade da turbulência (LANCASTER, 2005).

Figura 3-7. Tipos de transporte eólico, compreendendo saltação, rolamento e suspensão.

Fonte: Modificado de Silva (2009).

Os grãos de tamanho areia muito fina a fina são transportados principalmente por

saltação, no qual descrevem uma trajetória parabólica. Quando a tensão de cisalhamento do

vento alcança um valor crítico, alguns grãos começam a mover-se para frente e se chocam

com outros grãos que se encontram imóveis. O impacto proporciona que os grãos sejam

arremessados para cima, onde penetram em espaços com velocidades maiores, perfazendo um

caminho parabólico. Ao caírem, chocam-se com outras partículas, sendo que as que possuem

granulometria semelhante ampliam o processo de saltação (SCHERER, 2004).

39

As partículas de tamanho areia muito fina e silte são transportadas através de

suspensão e são mantidas no ar pela turbulência no vento, podendo atingir longas distâncias.

Os grãos em saltação se chocam com os grãos maiores que estão no substrato. Desta

forma, os grãos de granulometria grossa respondem ao impacto arrastando-se pela superfície,

evidenciando o processo de rolamento, gerando uma reação em cadeia (SILVA, 2009).

3.2.3. Deposição eólica

A deposição dos sedimentos pela ação do vento se dá através de três mecanismos:

cavalgamento de marcas onduladas, queda de grãos e fluxo de grãos (fluxo de

escorregamento).

Cavalgamento de marcas onduladas (climbing ripples)

As marcas onduladas formadas na superfície dos sedimentos em resposta à ação do

vento podem cavalgar umas sobre as outras ocorrendo em decorrência da saltação e suspensão

dos grãos, que predominam sobre os mecanismos trativos que aplainam o substrato. Como

consequência, a preservação da crista e do lado barlavento (Figura 3.8) das marcas onduladas

é favorecida e as mesmas apresentam facilidade para cavalgar (GIANNINI et al., 2008).

Figura 3-8. Apresentação básica do sistema eólico, mostrando o nível freático e as variações de comportamento do sistema a partir dessa superfície. ( Modificado de KOCUREK & HAVHLM, 1993 ).

40

Queda de grãos (grainfall)

Os sedimentos transportados em suspensão no lado sotavento (Figura 3.8), encontram

uma região hidrodinamicamente protegida e sofrem rápida desaceleração e a deposição tende

a ser macissa. Esta deposição ocorre preferencialmente na face frontal da duna pelo fato de

desenvolver uma zona de separação de fluxo, onde os grãos são depositados por queda livre

(SCHERER, 2004).

Fluxo de grãos (grainflow)

O fluxo de grãos se dá pela concentração de grãos maiores e mais pesados por saltação

na crista e na parte superior e mais íngreme do flanco de sotavento.

O processo gravitacional ocorre através de sucessivas colisões entre os grãos

adjacentes, mecanismo conhecido como pressão dispersiva (GIANNINI et al., 2008). Este

mecanismo de interação intergranular atua quando a areia encontra-se incoesa (seca), sendo

depositada em forma de lobos linguóides. No caso em que a areia apresenta-se coesa, ou seja,

com certo grau de umidade, a deposição ocorre por slide e slump, onde os blocos escorregam

ao longo da superfície de deslizamento (SCHERER, 2004).

3.2.4. Acumulação e tipos de sistemas eólicos

A acumulação eólica refere-se à deposição do total de sedimentos através do tempo,

gerando um corpo tridimensional de estratos que podem ser incorporados no registro

geológico (Kocurek & Havholm, 1993 apud Tomazelli, 1990). Vários são os fatores que

favorecem a deposição da carga arenosa; a presença de obstáculos pode ocasionar uma

pertubação no fluxo do ar, produzindo zonas favoráveis a deposição de sedimentos. Dentre os

obstáculos encontrados, o mais comum nas regiões costeiras é a vegetação, que controla a

formação das dunas de sombra.

Para que haja acumulação é necessário que o volume que entra seja maior que o

volume que sai de um determinado sistema eólico (Figura 3.9). Quando esse balanço é neutro

ou negativo, desenvolvem-se superfícies de bypass ou de erosão, respectivamente. Além

disso, é necessário que ocorra migração e cavalgamento de dunas eólicas em relação à

superfície de acumulação.

41

Figura 3-9. Representação esquemática de acumulação eólica. A acumulação acontece quando o balanço é positivo, ou seja, o volume de sedimentos que entra (Qi) em uma área é maior que o volume que sai da mesma área (Qo).

Fonte: Kocurek e Havholm (1993, apud OLIVEIRA, 2005).

Os sistemas eólicos foram classificados em secos, úmidos e estabilizados, nos quais os

dois primeiros são os tipos mais comuns na natureza (KOCUREK & HAVHOLM, 1993).

3.2.4.1. Sistemas eólicos secos

Os sistemas eólicos secos são caracterizados pelo nível do lençol freático e sua franja

de capilaridade abaixo da superfície de deposição. Os processos de erosão e estabilização são

regidos por fatores aerodinâmicos e aporte sedimentar.

É necessário que haja um decréscimo na taxa de transporte e/ou decréscimo na

concentração com o tempo para que as condições de saturação de superfície deposicional

sejam alcançadas e ocorra acumulação em um sistema eólico seco (KOCUREK &

HAVHOLM, 1993). O espaço de acumulação e a preservação de sedimentos em sistemas

eólicos secos são controlados pela subsidência da bacia (Figura 3.10).

Figura 3-10. Representação esquemática dos principais elementos que controlam a acumulação e preservação de sedimentos em sistemas eólicos secos.

Fonte: Kocurek & Havholm (1993, apud OLIVEIRA, 2005).

42

3.2.4.2. Sistemas eólicos úmidos

Nos sistemas eólicos úmidos, o nível do lençol freático e sua franja de capilaridade

encontram-se na superfície de deposição ou próximos dela. A presença da água diminui o

potencial erosivo e a quantidade de sedimentos que podem ser transportados pelo vento

(KOCUREK & HAVHOLM, 1993).

O espaço de acumulação e a preservação de sedimentos nestes sistemas são

controlados pela taxa de subsidência e nível do lençol freático (Figura 3.11), sendo este

influenciado por mudanças climáticas, variações do nível do mar e subsidência da bacia. A

transição de um sistema eólico úmido para seco se dá pelo incremento de sedimentos (Figura

3.12) (SCHERER, 2004).

Figura 3-11. Representação esquemática dos principais elementos que controlam a acumulação e preservação de sedimentos em sistemas eólicos úmidos.

Fonte: Kocurek & Havholm (1993, apud OLIVEIRA, 2005).

3.2.4.3. Sistemas eólicos estabilizados

Os sistemas eólicos estabilizados sofrem ação de fatores estabilizados que atuam

simultaneamente ao transporte, deposição e acumulação de sedimentos sem afetar o sistema

na íntegra. Estes fatores são a vegetação, umidade do substrato, cimentação, filmes de lama e

depósitos residuais de cascalho (lags).

3.2.5. Preservação de sistemas eólicos

As acumulações eólicas, para serem incorporadas no registro geológico, necessitam de

um conjunto de processos que proporcionem a sua preservação, sendo que o espaço de

acumulação e a preservação nem sempre são coincidentes nesses sistemas (Figura 3.13)

(KOCUREK & HAVHOLM, 1993).

43

Figura 3-12. Transição entre sistemas eólicos úmidos e secos, marcada por um aumento na disponibilidade de areia.

Fonte: Kocurek & Havholm (1993, apud SCHERER, 2004).

Figura 3-13. Representação esquemática dos conceitos de acumulação, espaço de acumulação e espaço de preservação.

Fonte: Kocurek & Havholm (1993, apud OLIVEIRA, 2005).

Os três principais fatores que promovem a preservação de estratos eólicos são:

subsidência da acumulação abaixo do nível de base de erosão, que pode ser controlada por

tectonismo, carga sedimentar e/ou compactação; incorporação da acumulação dentro da zona

saturada devido à subida (relativa ou absoluta) do nível do lençol freático ocasionada por

mudanças climáticas ou nível eustático em regiões costeiras; e desenvolvimento de superfícies

de estabilização que aumentem a resistência à erosão (KOCUREK & HAVHOLM, 1993.).

44

CAPÍTULO 4 - ANÁLISE SEDIMENTOLÓGICA DE TESTEMUNHOS

DA FORMAÇÃO SERGI NO CAMPO DOM JOÃO

Neste capítulo serão apresentadas as descrições e interpretações das litofácies e

associações de fácies observadas nos testemunhos da Formação Sergi no Campo Dom João,

Bacia do Recôncavo.

4.1. Fácies sedimentares

Fácies sedimentares é o conjunto de características de uma rocha ou de sedimentos no

que se refere à composição mineralógica e texturas, próprias de determinado ambiente ou

bacia e seu estudo está ligado a determinação de sistemas deposicionais.

A observação e descrição das associações de fácies é um método muito utilizado em

análises sedimentológicas e tem como objetivo principal a reconstituição e distribuição

temporal e espacial dos sistemas deposicionais envolvidos, levando em consideração os

padrões organizacionais de litofácies reconhecidos na literatura.

No presente estudo foram identificadas nove litofácies, que incluem arenitos,

conglomerados e paleossolos, apresentadas na Tabela 4.1. Para suas descrições, são utilizadas

nomenclaturas nas quais as duas primeiras letras maiúsculas correspondem à litologia, no

caso, AR igual a arenito, as duas próximas letras antes do hífen correspondem à granulometria

e as letras que se encontram após o hífen correspondem à estrutura observada.

Tabela 4-1: Tabela com as convenções utilizadas

LITOLOGIA GRANULOMETRIA ESTRUTURA/OUTROS

AR Arenito F Fino ag Argiloso

M Médio cb Concreções carbonáticas

G Grosso cs Concreções silicosas

g Muito grosso ma Maciço

C Conglomerático ps paleossolo

xb Estratificação cruzada de baixo ângulo

45

Tabela 4-2: Litofácies descritas nos testemunhos da Formação Sergi no Campo Dom João.

Fácies Frequência Descrição Processo Sedimentar

ARC-xb 23,3%

Arenito conglomerático, cinza amarelado, mal selecionado, com grão de

quartzo sub-arredondados a sub-angulares, argiloso, localmente calcítico,

localmente apresentando estratificações cruzadas de baixo ângulo, semi-

friável.

Fluxo de detritos coesivos (alta

densidade) sob condições sub-

aquosas.

ARC 1,9% Arenito conglomerático, composto por seixos de quartzo sub-arredondados

a sub-angulosos, semi-friável.

Depósitos residuais de leito de

canais.

ARFg-ag 25,6% Arenito fino a muito grosso, mal selecionado, sub-arredondado a sub-

anguloso, muito argiloso, semi-friável.

Migração de formas de leito quase

planas sob regime intermediário

superior

ARFg-cs 1,3% Arenito fino a muito grosso, mal selecionado, sub-arredondado, pouco

argiloso, levemente calcítico, com concreções silicosas, semi-friável.

Migração de formas de leito quase

planas sob regime intermediário

superior

ARFg-ma 1,9% Arenito fino a muito grosso, mal selecionado, sub-arredondado a sub-

anguloso, pouco argiloso, calcítico, maciço, compacto.

Rápida desaceleração de fluxos

gravitacionais sub-aquosos.

ARFg-xbcb 2,6% Arenito fino a muito grosso, mal selecionado, sub-arredondado a sub-

anguloso, argiloso, estratificação cruzada de baixo ângulo e concreções

carbonáticas, semi-friável

Migração de formas de leito quase

planas (transição entre regime de

fluxo inferior e superior)

ARM-xb 30,1% Arenito médio cinza claro, bem selecionado, sub-arredondado a sub-

anguloso, apresentando estratificações cruzadas de baixo ângulo, semi-

friável.

Migração de formas de leito quase

planas formadas pela agradação de

marcas onduladas eólicas.

ARM-cb 3,3% Arenito médio, bem selecionado, sub-arredondado, pouco argiloso, com

concreções carbonáticas, semi-friável.

Exposição ou flutuação do nível

freático na zona meteórica.

ARFG-ps 10,0% Paleossolo arenoso fino a grosso, mal selecionado, sub-arredondado,

argiloso, localmente mosqueado, com concreções milimétricas de calcrete e

silcrete, semi-friável

Baixa taxa de agradação sedimentar

e pedogênese silmultâneas.

46

4.2. Associação de Fácies

De acordo com a identificação das litofácies e seus padrões organizacionais em

associações de fácies, é possível a interpretação dos ambientes deposicionais. Foram

determinadas seis associações de fácies: planície fluvial, fluvial efêmero, eólico seco, eólico

úmido, fluvial entrelaçado perene de canal e de barras longitudinais.

4.2.1. Associação de Fácies Fluvial Entrelaçado Perene

Esta associação de fácies predomina nos testemunhos descritos (Figura 4.2),

perfazendo aproximadamente 57,56% do total. Possui limite superior com a associação de

fácies fluvial efêmero e constitui a base do intervalo testemunhado. Os depósitos de canais e

de barras longitudinais pertencem à fácies fluvial entrelaçado perene.

A associação de fácies fluvial perene de canal corresponde a 32,97% do percentual

total do testemunho descrito e é composta pelas fácies ARC-xb, predominantemente, e pela

fácies ARFg-ag. A fácies ARC-xb é representada por arenitos cinza amarelados

conglomeráticos com matriz muito grossa e arcabouço constituído por seixos de quartzo, mal

selecionados, com concreções silicosas (Foto 4.1), sub-arredondados, argilosos, levemente

calcítico, com estratificação cruzada de baixo ângulo, apresentando localmente manchas de

óleo castanho escuro (Foto 4.2). A fácies ARFg-ag é composta por arenito médio a muito

grosso, coloração amarela pálida, mal selecionados, com grãos de quartzo sub-arredondados

argiloso, apresentando localmente estrutura mosqueada (Foto 4.3). Esta estrutura mosqueada é

formada pelo preenchimento dos poros do arenito pela argila eodiagenética e logo após a

infiltração de fluido rico em cimento carbonático preenchendo os espaços vazios não

preenchidos pela argila.

47

Foto 4-1. Arenito conglomerático com seixos de quartzo e concreções silicosas.

48

Foto 4-2.Arenito conglomerático apresentando manchas de óleo castanho escura.

49

Foto 4-3. Arenito apresentando estrutura mosqueada.

A associação de fácies perene de barras longitudinais é composta pelas fácies ARM-xb

(predominantemente), ARFG-ps e ARM-cb. A fácies ARM-xb é representada por arenito

cinza, de granulometria média, bem selecionado, sub-arredondado, apresentando

estratificações cruzadas de baixo ângulo e localmente estratificação cruzada acanalada e

níveis calcíticos preenchendo micro-fraturas deformadas (Foto 4.4), semi-friável.

A fácies ARFG-ps é composta por paleossolo arenoso de fino a grosso, apresenta

coloração variando de vermelho acinzentado a amarelo e concreções centimétricas de calcrete

e silcrete (Foto 4.5). A fácies ARM-cb é composta por arenito médio, cinza amarelado, bem

selecionado, com concreções carbonáticas, argiloso, semi-friável.

50

Foto 4-4. Arenito apresentando níveis calcíticos preenchendo microfraturas.

51

Foto 4-5. Paleossolo arenoso com concreções centimétricas de calcrete e silcrete.

Rios entrelaçados possuem baixa sinuosidade, são amplos e rasos e

geomorfologicamente são de alta energia e de declividade mais acentuada, com variabilidade

no escoamento e onde o suprimento sedimentar é grande (Collinson, 1996).

Segundo Coleman (1969), a morfologia dos canais em sistema fluvial entrelaçados se

caracteriza pelas sucessivas bifurcações ou convergências do fluxo ao redor de barras e ilhas

internas (Figura 4.1). O produto final de sistemas fluviais entrelaçados mostra uma difusa rede

de canais amalgamados, multilaterais e multiepisódicos preenchidos, preferencialmente, por

sedimentos grossos, com pouca preservação de finos da planície de inundação fluvial e áreas

de overbanks.

52

Figura 4-1. Morfologia e elementos internos de canais fluviais entrelaçados (Coleman, 1969). O corte a-a' ressalta uma diminuição da largura no aprofundamento do canal principal. Na seção b-b' são evidenciadas inúmeras barras e ilhas internas ao canal principal, segmentando-o em fluxos secundários mais rasos.

As estruturas preservadas nos depósitos dessa unidade indicam o predomínio de

processos trativos junto ao leito dos rios. A estratificação cruzada de baixo ângulo reproduz a

migração de dunas no interior dos canais, por vezes associadas a condições estáveis de fluxo,

em períodos de incremento da descarga e maior aporte sedimentar.

A argilosidade dos arenitos, por vezes verificada nessa unidade, pode ser explicada

pela infiltração mecânica de argilas detríticas através de processos gravitacionais logo após a

deposição. Neste caso, a sua percolação é facilitada pela granulometria dos arenitos, que

apresentam poros mais significativos. Segundo estudos petrológicos realizados por diversos

autores nos reservatórios da Formação Sergi, a infiltração de argilas constitui o evento

diagenético de maior impacto nas suas qualidades permo-porosas (NETTO et al., 1982; DE

ROS, 1985; PINHO, 1987; RODRIGUES, 1990; todos apud OLIVEIRA, 2005).

Sugerem, ainda, um comportamento cíclico com variações na descarga e/ou na

velocidade do fluxo. A continuidade constatada da organização interna e a ausência de feições

que indicam exposições subaéreas prolongadas (paleossolo, retrabalhamento eólico, etc.)

revelam que os canais estavam submetidos à presença regular de água. Portanto, diante dos

argumentos apresentados, pode ser inferido um ambiente fluvial entrelaçado perene.

A presença de concreções carbonáticas permite sugerir avulsões ou extravasamento do

fluxo contido nos canais, com competência para erodir os sedimentos acumulados nas áreas

externas aos canais (planície fluvial). Por serem frágeis ou reativos à dissolução, é previsível

que o transporte destas concreções deu-se a curtas distâncias.

53

4.2.3. Associação de Fácies Planície Fluvial

A esta associação de fácies de planície fluvial estão relacionadas as litofácies ARFG-

ps e ARF-xbcb São representadas por paleossolo arenoso verde amarelado, de granulometria

variando de fino a grosso e arenitos finos. Apresentam localmente concreções centimétricas

de calcrete e silcrete e alguns pontos manchas de óleo castanho escuro (Foto 4.6), maciço.

Os pacotes desta associação de fácies compreendem a 10,93% do testemunho,

apresenta espessura de 1,7m e intercalam-se com arenitos de granulometria média, bem

selecionados, semi-friáveis.

Foto 4-6. Paleossolo arenoso apresentando calcrete e silcrete e localmente manchas de óleo castanho escuro.

54

Interpretação

Os sedimentos descritos encontram-se delimitando as sequências de deposição de

sedimentos, Sequência II e III, como pode ser observado na figura 4.2. Corresponde a um

hiato de tempo com muito baixa taxa de deposição de sedimentos proporcionando a formação

do paleossolo arenoso.

A formação de paleossolos demanda muito tempo, na ordem de milhares de anos

(MIDDLETON & BLAKEY, 1983; WRIGHT & TUCKER, 1991; apud OLIVEIRA, 2005).

O seu desenvolvimento é favorecido em áreas alcançadas por fluxos enfraquecidos em

posição distal ou topograficamente mais elevado que os canais. As concreções calcíferas

verificadas podem ser resultantes de exposições ou subida do nível do lençol freático.

4.2.4. Associação de Fácies Fluvial Efêmero

Esta associação de fácies compreende as litofácies ARFg-ma, ARM-xb, ARC, ARFg-

ag, ARFg-cs e ARFG-ps. Estes depósitos representam aproximadamente 12,32% das rochas

observadas.

Os arenitos maciços, ARFg-ma, ocorrem apenas no topo do testemunho descrito,

possuem granulometria variando de fina a grossa, apresentando granodecrescência

ascendente. São mal selecionados, argilosos, com grão de quartzo e feldspatos sub-

arredondados. Observa-se presença de concreções carbonáticas e cimentação calcítica.

A litofácies ARM-xb é representada por arenitos com estratificação cruzada de baixo

ângulo. Ocorrem com maior frequência nas profundidades iniciais do poço, intercalado com

os arenitos bem selecionados do sistema eólico. Apresentam tons acastanhado devido à

presença de óleo.

A litofácies ARC é representada por arenitos conglomeráticos com intraclastos de

argila cinza amarelado, mal selecionado, muito argiloso, pouco calcítico, localmente

manchado de óleo (Foto 4.7).

Ao longo dos testemunhos descritos, observa-se a litofácies ARFg-cs onde é comum a

presença de concreções carbonáticas e silicosas variados tamanhos (milimétricos a

centimétricos) e formação de níveis de paleossolo incipiente representado pela litofácies

ARFG-ps composta por grãos de areia, com concreções de silcrete, argiloso, apresentando

bioturbações (Foto 4.8).

55

Foto 4-7. Arenito conglomerático com clastos de argila e manchado de óleo.

56

Foto 4-8. Paleossolo arenoso com concreções carbonáticas.e níveis de calcrete

Interpretação

Segundo Picard & High (1973 apud OLIVEIRA, 2005), correntes fluviais efêmeras

têm origem associada a rápidas chuvas torrenciais que se notabilizam pela alternância de

breves períodos de atividade plena com prolongados intervalos áridos que provocam o

esgotamento do fluxo superficial. Esses sistemas tendem a ter uma disponibilidade sedimentar

alta e grande poder de transporte.

As estratificações cruzadas de baixo ângulo na maioria das vezes são formados em

cursos d’água rasos em regime de fluxo intermediário a superior. Essa organização interna

está associada à migração de dunas subaquosas com relevo muito baixo (levemente

inclinadas), sendo muito comuns em fluxos fluviais efêmeros.

57

Os arenitos maciços estão associados à rápida desaceleração de um fluxo sub-aquoso

concentrado e turbulento devido à instabilidade gravitacional. Os arenitos argilosos estão

associados ao assentamento de partículas nos estágios finais das cheias.

Os arenitos conglomeráticos podem estar relacionados a intensidade das torrentes

episódicas que mobiliza sedimentos grossos.

4.2.1. Associação de Fácies Eólico Seco

Os sedimentos da associação de fácies eólico seco estão localizados no topo do

intervalo testemunhado perfazendo aproximadamente 5,49% do intervalo total. Composto

pela litofácies ARM-xb, representadas por arenitos de coloração acastanhada, médios, bem

selecionados, sub-arredondados a arredondados, argilosos. Localmente observam-se

estratificações cruzadas de baixo ângulo com lâminas de estruturas tipo pin-stripe (Foto 4.9).

A partir de 0,3m do topo do testemunho 2 (Foto 4.10), o arenito encontra-se saturado em óleo

castanho escuro, apresentando corte imediato aureolar e não foi observada fluorescência,

provavelmente pelo tempo que se passou desde que o poço foi testemunhado.

Interpretação

Reconhecer estruturas em testemunhos é uma tarefa dificultada devido ao pequeno

diâmetro da seção amostrada, em torno de 10 cm. Os sedimentos descritos posicionam-se no

topo da Formação Sergi. A feição pin-stripe (risca de agulha) é gerada pelo cavalgamento em

ângulo subcrítico, sub-aéreo, de pequenas ripples inversamente gradadas, em cujas cristas há

excesso de areia fina a média e nas suas calhas encontram-se os sedimentos de granulometria

menor (silte e areia muito fina. A estratificação cruzada de baixo ângulo está associada ao

registro de depósitos de lençóis de areias eólicos. Formam-se pela migração e cavalgamento

de marcas onduladas transladantes sub-críticas e pelo mecanismo de saltação e rastejamento

de grãos sobre a superfície deposicional quase plana (NETTO et al., 1982; DE ROS, 1985;

PINHO, 1987; RODRIGUES, 1990; todos apud OLIVEIRA, 2005).

58

Foto 4-9. Arenito saturado em óleo com estratificação cruzada de baixo ângulo com laminação pin-stripe.

59

Foto 4-10. Testemunho 2 - Arenito saturado em óleo castanho escuro.

60

4.2.2. Associações de Fácies Eólico Úmido

A associação de fácies eólico úmido ocorre em 13,71% do intervalo total descrito, e

constituída essencialmente pela litofácies ARM-xb, composta por arenito médio, marrom

escuro, bem selecionado, com grãos de quartzo e feldspato sub-arredondados a arredondados,

argiloso e saturado de óleo castanho escuro com corte imediato aureolar. Apresenta

estratificações cruzadas de baixo ângulo localmente com lâminas de estruturas tipo grain-flow

e estruturas de biotubação (Foto 4.11).

Foto 4-11. Arenito apresentando estratificações cruzadas e estrutura de bioturbação.

61

Interpretação

Esta litofácies foi identificada como eólica devido à algumas características básicas,

tipo: boa seleção, arredondamento, ausência de intraclastos. A estratificação cruzada de baixo

ângulo é gerada pela migração e cavalgamento de marcas onduladas transladantes e pelo

mecanismo de saltação e rastejamento de grãos sobre uma superfície deposicional quase

nivelada, sub-aérea.

A estrutura de grain-flow, observada no testemunho descrito têm gênese associada aos

processos gravitacionais que ocorrem na face de escorregamento de dunas eólicas, os

sedimentos mais pesados (mais grossos) transportados tendem a se concentrarem por saltação

na crista e na parte superior mais íngreme da porção frontal da duna (KOCUREK &

HAVHOLM, 1993).

4.3. Sequências Deposicionais

O testemunho selecionado para este estudo apresenta intervalos sem material

recuperado ou extraviado, o que dificultou um pouco a continuidade da descrição. Foi feita

relação entre os atributos encontrados e o conhecimento atual sobre a Formação Sergi.

A partir das características composicionais, texturais, estruturais e das associações de

fácies interpretadas nos testemunhos do poço em estudo, foram identificadas duas das três

sequências da Formação Sergi, conforme os trabalhos de Scherer et al. (2005, 2007) e de

Oliveira (2005). A sequência II foi identificada em 63% e a sequência III em 37% do

intervalo total descrito, como observado na Figura 4.2, representando o resultado obtido no

programa ANASETE.

A sequência II é marcada, principalmente, por ter granulometria mal selecionada,

variando de fina a conglomerática e organização interna dos estratos e o contato com a

unidade superior é discordante. Ocorre na base do intervalo descrito e perfaz 30,2m do

intervalo total. Esta unidade é constituída pela associação de fácies fluvial entrelaçado perene

de barras longitudinais, fluvial perene de canal e planície fluvial.

A sequência III ocorre na porção superior do intervalo analisado ocupando a espessura

de 17,8m da Formação Sergi. É constituída pela associação de eólico seco, eólico úmido e

fácies fluvial efêmero. É representada por arenitos bem selecionados com estratificações

cruzadas de baixo ângulo.

62

Figura 4-2. Anasete mostrando análise sedimentológica do poço em estudo no campo de Dom João.

LEGENDA – AMBIENTES DEPOSICIONAIS

Fluvial Perene Entrelaçado de Canal

Fluvial Perene Entrelaçado de Barras Longitudinais Fluvial Efêmero

Planície Fluvial Eólico Úmido

Eólico Seco

63

CAPÍTULO 5 - CONCLUSÕES

A Formação Sergi é composta, essencialmente, por arenitos com características

variadas, desde finos e argilosos a muito grossos e conglomeráticos, mal selecionados.

Com base em estudos realizados, foram observadas nove litofácies que, quando

relacionadas geneticamente, nos indicam a presença de seis associações de fácies, a saber:

eólico seco, eólico úmido, fluvial efêmero, planície fluvial de fluvial entrelaçado perene,

fluvial entrelaçado perene de barras longitudinais e fluvial entrelaçado perene de canal.

Foram identificadas, nos testemunhos, duas sequências deposicionais na Formação

Sergi, as Sequências II e III. A Sequência II é bem evidenciada pelos arenitos com

granulometria mais grossa e ocupa a maior parte do testemunho, indo até a base do mesmo. É

representada pelos depósitos fluviais perene entrelaçados e planície fluvial. A sequência III

ocorre no topo do intervalo descrito e é composta por depósitos fluviais efêmeros e eólicos

úmido e seco. Observa-se um nível de paleossolo que marca a discordância entre as duas

sequências.

A disposição das sequências foi controlada pela história climática durante o período de

deposição e na relação entre as taxas de geração de espaço de acomodação e de suprimento

sedimentar. A sequência II corresponde à condições perenes mais úmidas e sem grandes

flutuações na descarga. A sequência III corresponde à sistemas deposicionais eólicos,

característicos de ambientes semi-áridos a hiper-áridos.

Observa-se que a Formação Sergi, apresenta alguns intervalos com boas características

permo-porosas, principalmente no intervalo de sistema deposicional eólico, enfatizando o seu

potencial de reservatório.

Foi possível, através do programa ANASETE, fazer a correlação rocha-perfil do poço

estudado.

REFERÊNCIAS

BROWN, L. P.; FISHER, W. L. Ancient Fluvial/Delta Systems in the Exploration and

Production of Oil, Gas and other Mineral Resources. Austin, Texas: [s.n.], 1976. 161p.

CAIXETA, J. M.; BUENO, J. V.; MAGNAVITA, L. P.; FEIJÓ, F. J. Bacias do Recôncavo, Tucano

e Jatobá. Boletim de Geociências da Petrobras, Rio de Janeiro, v. 8, n. 1, p.163-172,

jan./mar. 1994.

COLEMAN, J. M. Brahmaputra River: channel processes and sedimentation. Sedimentary

Geology, Amsterdam, v. 3, p. 129-239, 1969.

ETCHEBEHERE, M. L.; SAAD, A. R. Fácies e associações de fácies em depósitos

Neoquaternários de terraço na Bacia Rio do Peixe, região ocidental paulista. Revista de

Geociências – UNESP, São Paulo, v. 22, n. 1, p. 5-16, 2003. Disponível em:

<http://drifte.rc.unesp.br/revistageociencias/22_1/1.PDF>. Acesso: 26 mar. 2012.

GHIGNONE, J. I. Geologia dos Sedimentos Fanerozoicos do Estado da Bahia. In: INDA, H. A. V.

(Org.). Geologia e Recursos Minerais do Estado da Bahia – textos básicos. v.1. Salvador:

Governo do Estado da Bahia, Secretaria das Minas e Energia, Coordenação da Produção

Mineral, 1979. p. 23-117.

GIANNINI, P. C. F.; ASSINE, M. L.; SAWAKUCHI, A. O. Ambientes Eólicos. In: PEDREIRA, A.

J. C. L.; ARAGÃO, M. A. N. F.; MAGALHÃES, A. J. C (Orgs.). Ambientes de

Sedimentação Siliciclástica do Brasil. São Paulo: Beca-BALL Edições, 2008. p. 73-101.

KOCUREK, G.; HAVHOLM, K. G. Eolian Sequence Stratigraphy – a conceptual framework. In:

WEIMER, P.; POSAMENTIER, H. (Eds.). Siliciclast Sequence Stratigraphy – recent

developments and applications. Tulsa, USA, American Association of Petroleum Geologists

Bulletin (AAPG), v. 58, 1993. p. 393-409.

LANCASTER, N. Aeolian erosion, transport and deposition. In: SELLEY, R. C.; ROBIN, L.;

COCKS, M.; PLIMER, I. R. (Eds.). Encyclopedia of Geology. Oxford: Elsevier, 2005. p.

612-627

MAGNAVITA, L. P.; SILVA, R. R.; SANCHES, C. P. Roteiros geológicos: Guia de Campo da

Bacia do Recôncavo, NE do Brasil. Boletim de Geociências da Petrobras – bacias rifte, Rio

de Janeiro, v. 13, n. 2, p.301-334, maio/nov. 2005.

MIALL, A. D. The geology of fluvial deposits: sedimentary facies, basin analysis and petroleum

geology. 4 ed. New York: Springer – Verlag, 1996. 582 p

MILHOMEM, P. S.; MAMAN, E. J.; OLIVEIRA, F. M.; CARVALHO, M. S. S.; SOUZA-LIMA,

W. Bacia do Recôncavo. Bacias Sedimentares Brasileiras. Fundação Paleontológica

Phoenix, [s.l.], ano 5, n 51, mar. 2003. Disponível em:

<http://www.phoenix.org.br/Phoenix51_Mar03.html>. Acesso em: 22 mar. 2012.

MOHRIAK, W. U. Bacias sedimentares da margem continental brasileira. In: BIZZI, L. A;

SCHOBBENHAUS, C.; VIDOTTI, R. M.; GONÇALVES, J. H. (Eds.). Geologia, Tectônica

e Recursos Minerais do Brasil: textos, mapas & SIG. Brasília: CPRM – Serviço Geológico

do Brasil , 2003. cap. 3, p. 87-94.

MORAES, M. A. S.; GABAGLIA, G. P. R. Arenitos Eólicos Intercalados em Sequências Fluviais:

critérios para o reconhecimento. In: Congresso Brasileiro de Geologia, 34, 1986, Goiânia,

Goiás. Anais...Goiânia: [s.n.], 1986, p. 246-261.

NORTH, C. P.; TAYLOR, K. S. Ephemeral-Fluvial Deposits: integrated outcrop and simulation

studies reveal complexity. American Association of Petroleum Geologists Bulletin

(AAPG), [s.l.], v. 80, n. 6, p. 811-830, jun. 1996.

OLIVEIRA, F. M. Análise estratigráfica da Formação Sergi, Campo de Fazenda Bálsamo,

Bacia do Recôncavo, Bahia. 2005. 192p. Dissertação (mestrado) - Instituto de Geociências,

Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, 2005.

PEDREIRA, A. J.; LOPES, R. C.; VASCONCELOS, A. M.; BAHIA, R. B. C. Bacias sedimentares

paleozoicas e meso-cenozoicas interiores. In: BIZZI, L. A; SCHOBBENHAUS, C.;

VIDOTTI, R. M.; GONÇALVES, J. H. (Eds.). Geologia, Tectônica e Recursos Minerais do

Brasil: textos, mapas & SIG. Brasília: CPRM – Serviço Geológico do Brasil , 2003. cap. 2,

p. 55-85.

RICCOMINI, C; COIMBRA, A.M. Sedimentação em rios entrelaçados e anastomosados. Boletim IG-

USP: São Paulo, v. 6, p. 1-44, 1993.

SANTOS, N. L. Estudo dos sentidos de fluxos gravitacionais da Formação Maracangalha

(Eocretácio), Bom Despacho, NNE da Ilha de Itaparica, Bahia, Brasil. 2011. 72p.

Monografia (graduação) - Instituto de Geociências – Universidade Federal da Bahia (UFBA),

Salvador, 2011.

SCHERER, C. M. S. Sedimentologia e Estratigrafia de Sistemas Fluviais e Eólicos. 2004. 130p.

Apostila - Instituto de Geociências, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS),

Porto Alegre, 2004.

SCHERER, C. M. S.; LAVINA, E. L. C.; FILHO, D. C. D.; OLIVEIRA, F. M.; BONGIOLO, D. E.;

AGUIAR, E. D. Evolução estratigráfica da sucessão flúvio-eólica-lacustre da Formação Sergi,

Bacia do Recôncavo, Brazil. In: Congresso Brasileiro de P&D em Petróleo e Gás, 3, 2005,

Salvador. Anais...Salvador: [s.n.], 2005. 5p.

SCHERER, C. M. S. Ambientes Fluviais. In: PEDREIRA, A. J. C. L.; ARAGÃO, M. A. N. F.;

MAGALHÃES, A. J. C (Orgs.). Ambientes de Sedimentação Siliciclástica do Brasil. São

Paulo: Beca-BALL Edições, 2008. p. 103-130.

SHANLEY, K. W.; McCABE, P. L. Perspectives on the Sequence Stratigraphy of Continental

Strata. American Association of Petroleum Geologists Bulletin (AAPG), [s.l.], v. 78, n. 4,

p. 544-568, abr. 1994.

SILVA, O. B.; CAIXETA, J. M.; MILHOMEM, P. S.; KOSIN, M. D. Bacia do Recôncavo. Boletim

de Geociências da Petrobras – cartas estratigráficas, Rio de Janeiro, v. 15, n. 2, p. 423-

431, maio/nov. 2007.

SILVA, L. S. Análise Sedimentológica e Petrológica da Formação Sergi Próximo da Falha de

Maragogipe em São Roque do Paraguaçu, Bacia do Recôncavo – BA. 2009. 99p. Monografia

(graduação) - Instituto de Geociências, Universidade Federal da Bahia (UFBA) Salvador,

2009.

ANEXO – Análise Sequencial de Testemunhos (Anasete) do poço do Campo de

Dom João

LEGENDA – AMBIENTES DEPOSICIONAIS

Fluvial Efêmero Planície Fluvial

Eólico Úmido

Eólico Seco

LEGENDA – AMBIENTES DEPOSICIONAIS

Fluvial Perene Entrelaçado de Canal

Fluvial Perene Entrelaçado de Barras Longitudinais Fluvial Efêmero Planície Fluvial

LEGENDA – AMBIENTES DEPOSICIONAIS

Fluvial Perene Entrelaçado de Canal

Fluvial Perene Entrelaçado de Barras Longitudinais Planície Fluvial

LEGENDA – AMBIENTES DEPOSICIONAIS

Fluvial Perene Entrelaçado de Canal

Fluvial Perene Entrelaçado de Barras Longitudinais