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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE DIREITO CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO TÂMSA SANTOS DA SILVA A SELETIVIDADE DO IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS: UMA ANÁLISE SOBRE A SUA VARIAÇÃO E AFERIÇÃO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA Salvador 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

FACULDADE DE DIREITO

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

TÂMSA SANTOS DA SILVA

A SELETIVIDADE DO IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS: UMA ANÁLISE SOBRE A SUA VARIAÇÃO E AFERIÇÃO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA

Salvador

2018

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TÂMSA SANTOS DA SILVA

A REGRESSIVIDADE DO IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS: UMA ANÁLISE SOBRE A SUA VARIAÇÃO E AFERIÇÃO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA

Monografia apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal da Bahia como um dos requisitos à obtenção do Grau de Bacharel em Direito, sob a orientação do Professor Homero Chiaraba Gouveia.

Salvador

2018

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TÂMSA SANTOS DA SILVA

A REGRESSIVIDADE DO IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS: UMA ANÁLISE SOBRE A SUA VARIAÇÃO E AFERIÇÃO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA

Monografia apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal da Bahia como um dos requisitos à obtenção do Grau de Bacharel em Direito, sob a orientação do Professor Homero Chiaraba Gouveia.

Aprovada em ____ de ____________________de 2018.

Banca Examinadora

Homero Chiaraba Gouveia – Orientador_______________________ Mestre em Direito e Doutorando pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) Iuri Mattos de Carvalho____________________________________ Mestre em Direito do Estado pela PUC-SP

Kleverton Bacelar_________________________________________ Mestre e Doutor pela Universidade Federal da Bahia (UFBA)

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Dedico este trabalho aos meus pais, que mesmo em meio a ausência de privilégios, me ensinaram a coragem e persistência.

Dedico à minha família, cada linha de esforço que me fez chegar até aqui e agradeço por cada palavra de estímulo e amor.

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AGRADECIMENTOS

Sou imensamente grata a Deus, que sempre silenciosamente me

direcionou e me deu mais do que merecia. Todas as pequenas conquistas que me

fizeram chegar até aqui são demonstração do Seu amor e cuidado imerecido. Pelas suas

mãos, sou filha dos melhores pais que eu poderia ter. Pessoas simples e corajosas, que

sempre lutaram por mim e me ensinaram a lutar, dignificando sempre a boa conduta e o

esforço que supera qualquer privilégio.

Sou resultado de muita insistência, amo, coragem e cuidado. Meus pais,

mesmo com suas limitações, foram meu porto e meus incentivadores.

Sou grata por cada amigo, por cada momento, por tudo que me fez chegar

aqui, pessoas das quais não pretendo desapegar, seguem comigo muito além desta

caminhada.

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SILVA, Tâmsa Santos. A regressividade do imposto sobre circulação de mercadorias e serviços: uma análise sobre a sua variação e aferição da capacidade contributiva 2018. Monografia (Bacharelado) – Faculdade de Direito, Universidade

Federal da Bahia, Salvador, 2018

RESUMO O presente projeto de monografia tem como finalidade precípua a análise do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS, considerando o princípio da seletividade aplicado a este imposto, determinação constitucional que, mediante escolha de critérios definidos, caberá ao legislador ordinário a diferenciação entre produtos sujeitos a maior ou menor tributação, tocando de forma específica o modo de aplicação da seletividade e a sua efetividade sobre este imposto para aferição da capacidade contributiva. O intuito é expor as características do ICMS e a regressividade de suas alíquotas, observando a arrecadação de pelo menos cinco estados brasileiros. Ademais, se pretende levantar algumas reflexões sobre a progressividade das alíquotas em razão da essencialidade do produto, observando quais camadas da população tem sido mais onerada pelo imposto. A finalidade precípua é refletir sobre o intento da tributação em onerar mais aquele que possui maior capacidade contributiva sem considerar apenas o tipo de consumo do contribuinte, garantindo o cotejo da sua real capacidade contributiva e dando efetividade à ideia de distribuição progressiva dos tributos. Palavras-chave: progressividade do ICMS. Regressividade do ICMS. Equidade tributária. Proporcionalidade. Seletividade da tributação.

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SILVA, Tâmsa Santos. The regressivity of the tax on the circulation of goods and services: an analysis of their variation and assessment of the tax capacity 2018. Monograph (Bachelor) - Faculty of Law, Federal University of Bahia, Salvador, 2018

ABSTRACT The main purpose of this monograph project is to analyze the Tax on the Circulation of Goods and Services (ICMS), considering the principle of selectivity applied to this tax, a constitutional determination that, by choosing defined criteria, it will be for the ordinary legislator to differentiate between products subject to greater or lesser taxation, touching in a specific way the way of applying the selectivity and its effectiveness on this tax for the assessment of the contributory capacity. The purpose is to expose the characteristics of the ICMS and the regressivity of its rates, observing the collection of at least five Brazilian states. In addition, it is intended to raise some reflections on the progressivity of the rates because of the essentiality of the product, observing which layers of the population has been more burdened by the tax. The main purpose is to reflect on the intent of taxation on taxing the one who has greater tax capacity without considering only the type of consumption of the taxpayer, ensuring the comparison of their actual taxable capacity and giving effectiveness to the idea of progressive distribution of taxes. Key-words: ICMS progressivity. Regressiveness of ICMS. Tax Equity. proportionality.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO.......................................................................................................09 2. O ICMS E SUAS ESPECIFICIDADES....................................................................11 2.1 . ASPECTOS CONSTITUCIONAIS DO IMPOSTO................................................. 11 2.2 . PRINCÍPIOS E REGRAS CONSTITUCIONAIS CORRELATAS.......................... 11 2.2.1 Princípio da legalidade....................................................................................... 12 2.2.2 Princípio da capacidade contributiva............................................................... 13 2.2.3 Princípio da seletividade.................................................................................... 15 2.2.4 Princípio da proporcionalidade..........................................................................17 2.2.5 Princípio da Não-Surpresa ................................................................................ 19 2.2.6 Princípio da progressividade/regressividade................................................... 20 2.2.7 Princípio da Não-Cumulatividade ..................................................................... 22 2.3 DESENHO INSTITUCIONAL DO ICMS .............................................................. 26 2.3.1 Critério material................................................................................................... 27 2.3.2 Critério temporal.................................................................................................. 29 2.3.3 Critério espacial................................................................................................... 31 2.3.4 Critério pessoal.................................................................................................... 33 2.3.5 Mandamento do ICMS........................................................................................ 35 2.3.5.1 Critério quantitativo............................................................................................... 36

3. CAPÍTULO II – EQUIDADE FISCAL E JUSTIÇA TRIBUTÁRIA NOS ESTADOS BRASILEIRO........................................................................................................38 3.1. ICMS E JUSTIÇA FISCAL .................................................................................... 39

3.2. PARTICIPAÇÃO DO ICMS NA ECONOMIA DOS ESTADOS BRASILEIROS ......44 3.3. ICMS E RENDA PER CAPTA NOS ESTADOS BRASILEIROS........................... 48

4. CAPÍTULO III – INEQUIDADE FISCAL ............................................................... 51 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 59

REFERÊNCIAS.....................................................................................................63

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1 INTRODUÇÃO

A tributação é um fenômeno que compreende não apenas o direito, mas

também possui um aspecto político e econômico. Para o direito, o poder de tributar é

entendido como um aglomerado de expectativas institucionalizadas que prenuncia como

os agentes devem proceder ante ao poder de tributar e as limitações a este poder,

estabelecendo as sanções pela inobservância dessas normas condicionais. Num

enfoque político, a tributação pode ser vista como uma escolha institucional de poder

tributar e escolher ou não pela instituição daquela prestação pecuniária; e por fim, sob

um viés econômico, a tributação pode ser entendida como um elemento atinente aos

agentes econômicos sobre os quais terão ou não, nas situações de produção,

acumulação e circulação de bens em uma dada sociedade, a incidência de um dado

imposto.

Os tributos possuem mais do que um perfil meramente arrecadatório, por

meio dele, o Estado, além de obter receita para o custeamento da coisa pública, é ainda

um meio idôneo para o estimulo ou não de uma conduta social, função conhecida como

a extrafiscalidade do tributo.

Muito embora o poder de tributar tenha sido outorgado ao Estado pelo

Poder Constituinte, este não foi concedido sem limitações, antes, a própria Constituição

estabelece princípios limitadores que deverão ser respeitados quando da criação de

cada taxa ou imposto, prevendo ainda, normas gerais para a criação destes tributos, por

meio da legislação infraconstitucional, qual seja, o Código Tributário Nacional.

O que este estudo pretende, é mais do que uma análise apenas jurídico-

tributária do sistema, mas uma análise sobre o impacto do sistema tributário nacional na

destruição de renda do Brasil e como a desigualdade econômica pode ou não ser

fomentada pela má distribuição do ônus fiscal.

Neste sentido, impõe considerar que a regressividade da tributação do

consumo no Brasil através do ICMS, é frequentemente apontada como uma das

questões que devem ser contempladas nas propostas de reforma tributária, porquanto,

em algumas situações não tem sido alcançada uma das mais importantes diretrizes

tributárias de onerar mais àqueles que possuem maior capacidade contributiva.

O peso da tributação indireta, que incide sobre o consumo, é muito maior

do que o da tributação direta, que incide sobre a renda e o patrimônio, tornando

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regressivo o efeito final do sistema tributário, conforme será demonstrado através deste

estudo, evidenciado que a parcela mais pobre da população brasileira termina por

suportar maior carga tributária do que a parcela mais abastada.

O objetivo central desse estudo consiste em responder a uma questão

simples, mas de extrema relevância no contexto ora descrito, buscando esclarecer se o

ICMS é ou não um imposto regressivo que onera mais pesadamente às classes baixas,

desrespeitando assim o princípio da capacidade contributiva.

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2 CAPÍTULO I - O ICMS E SUAS ESPECIFICIDADES

2.1 ASPECTOS CONSTITUCIONAIS DO IMPOSTO

O ICMS encontra-se genericamente previsto no art. 155, inciso II da

Constituição Federal, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993,

sendo um imposto de competência estadual e distrital, pelo que, os Estados e o Distrito

Federal podem institui-lo através de lei ordinária.

A Constituição não institui absolutamente nenhum tributo e por isso, ela

não tem o condão de criar o ICMS, sua redação apenas outorga competência aos entes

federativos, tendo por destinatário o legislador, e institui limitações e diretrizes para a

sua criação.

A prerrogativa tributária para a criação de leis e a consequente instituição

de tributos foi imposta constitucionalmente e segundo Carrazza (2010), ‟é a

possibilidade de criar, in abstracto, tributos, descrevendo, legislativamente, suas

hipóteses de incidência, seus sujeitos ativos, seus sujeitos passivos, suas bases de

cálculo e suas alíquotas”.

Com o intuito de executar a competência constitucionalmente atribuída, foi

editada a Lei Complementar nº 87/96, que complementou de modo geral os termos da

constituição, especificando as hipóteses tributáveis, os contribuintes e outros detalhes

do imposto, com a finalidade de facilitar o trabalho do legislador estadual, bem como, de

limitar e direcionar a sua atuação.

2.2 PRINCÍPIOS E REGRAS CORRELATOS

A instituição de um tributo, como sendo uma das atividades ordinárias do

estado, deve ser conduzida por princípios protetivos dos direitos da coletividade que será

onerada pelas suas disposições. Deste modo, a constituição vinculou a atuação fiscal

do estado à princípios essenciais, com observância cogente que funcionam como

verdadeiras condições para a instituição e cobrança do imposto. Alguns destes princípios

são comuns a toda e qualquer atuação estatal, como os princípios da legalidade,

proporcionalidade, razoabilidade, marcantes no Direito Administrativo. Outros são

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específicos da atividade tributária, como o princípio da anterioridade e da capacidade

contributiva.

2.2.1 Princípio da legalidade

O princípio da legalidade é um dos mais gerais do direito, sendo comum a

inúmeras áreas, visto que tem por finalidade limitar e condicionar o poder do Estado à

expressa previsão da lei, onde o Poder Público não pode extrapolar as permissões

estabelecidas no texto legal. Na seara tributária, não é diferente, este princípio possui

uma repercussão especial e surge como um condicionante a atividade tributária, que

obriga a instituição, majoração, extinção ou redução de tributos apenas pela via legal,

inviabilizando qualquer dose de discricionariedade, conforme o artigo 97 do CTN. Nesta

senda, assim estabelece a Constituição Federal:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;

A força deste princípio não comporta exceções, visto que até mesmo os

impostos criados em situação de guerra, exigem a atividade legislativa. Sobre a

legalidade, assim preceitua Brito (2014):

O princípio da legalidade diz respeito ao instrumento jurídico utilizado para a criação ou aumento dos tributos. Esse instrumento há de ser a lei. Não outro ato normativo. As ressalvas a esse princípio, portanto, dizem respeito ao instrumento jurídico. Implicam admitir-se o aumento de tributo por ato diverso da lei, bastando que esta estabeleça as condições e os limites dentro dos quais o Poder Executivo poderá alterar as alíquotas respectivas. O princípio da legalidade não diz respeito ao elemento cronológico. Nada tem a ver com o momento da criação, ou do aumento, e o momento da cobrança respectiva.

No entanto, a legalidade tributária é tensionada para permitir a criação de

tributos por meio do Poder Executivo através da edição de medidas, permissão

estabelecida pela própria constituição e que não deixa de comportar atividade legal, visto

que a exceção está prevista em lei e ainda, que a atuação do executivo acaba sendo em

certa medida, também legislativa, no uso de sua competência regulamentar subsidiária.

Sobre este tema, Baleeiro (2015) contribui afirmando que:

...o tributo constitui obrigação ex lege. Não há tributo sem lei que o decrete, definindo-lhe o fato gerador da obrigação fiscal. Esse fato

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gerador caracteriza cada tributo [...]. A lei criadora do tributo é a da pessoa jurídica constitucionalmente competente para decretá-lo, e só ela.

A legalidade é pressuposto relevantíssimo à democracia e se funda

principalmente no primado da segurança jurídica, onde Schoueri (2017) o reconhece

como antecedente ao próprio Estado Democrático de Direito. Sendo, pois, o direito de

tornar público e seguramente instituído de modo universal para todos os contribuintes, e

ainda, viabilizar a fiscalização do emprego dos recursos arrecadados.

2.2.2 Princípio da capacidade contributiva

Segundo Baleeiro (2015), um dos percursores do trato da capacidade

contributiva no Brasil, tendo desenvolvido o seu trabalho majoritariamente sob a égide

da Constituição de 1946, e atualizada pelo autor, com o advento da “Constituição” de

1969, o “embrião” da ideia de capacidade contributiva no ordenamento jurídico brasileiro

estava no artigo 179, inciso XV, da Constituição do Império de 1824. O doutrinador

decompõe a igualdade tributária em três princípios para o fim da justiça social através

da tributação: a personalização dos tributos; graduação e; capacidade contributiva.

Atualmente, ele encontra-se positivado no artigo 145, parágrafo 1º, da

Constituição Federal, que assim o estatui:

Art. 145 [...] § 1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte [...].

Nas palavras de Sousa (1981), a capacidade contributiva é definida como

“ a soma da riqueza disponível depois de satisfeitas as necessidades elementares da

existência, riqueza essa que pode ser absorvida pelo Estado sem reduzir o padrão de

vida do contribuinte e sem prejudicar as suas atividades econômicas. ”

A noção genérica do princípio da capacidade contributiva do sujeito passivo

está associada primordialmente ao princípio da igualdade, de modo que a modulação do

tributo deve corresponder à riqueza do contribuinte. Neste sentido, corrobora Costa

(2014):

A noção de igualdade está na essência do conceito de capacidade contributiva, que não pode ser dissociada daquela. Podemos dizer que a

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capacidade contributiva é um subprincípio, uma derivação do princípio da igualdade, irradiador de efeitos em todos os setores do Direito.

Quando se fala em capacidade contributiva, o primeiro termo se associa

irremediavelmente com a ideia de um “status” ostentado pelo indivíduo, ante o

preenchimento de condições fixadas pelo ordenamento jurídico, o que lhe outorga

aptidão para fruição de uma determinada posição. E é a consideração deste “status” que

fará com que a tributação seja justa ou não. De modo que, os contribuintes devem ser

tributados na proporção correspondente à sua aptidão. Nessas palavras posiciona-se

Machado (2007):

Aquele que tem maior capacidade contributiva deve pagar imposto maior, pois só assim estará sendo igualmente tributado. A igualdade consiste, no caso, na proporcionalidade da incidência à capacidade contributiva, em função da utilidade marginal da riqueza.

Os tributos não podem inviabilizar o exercício de quaisquer direitos

fundamentais, tampouco importar em confisco, devendo preservar mandamentos

constitucionais basilares como o direito à vida, liberdade, dignidade, em seus núcleos

essenciais, direito que não poderão ser infringidos por imposições fiscais, sob pena de

violar a dignidade da pessoa humana e é neste cenário que urge a necessidade de

observância da capacidade contributiva, porquanto onerar o contribuinte além do que

este pode suportar é submete-lo a situação de violação à sua dignidade e inviabilizar o

seu sustento básico.

Quanto à execução deste princípio, é forçoso ao ente instituidor do imposto

considerar a imunidade do mínimo vital, de modo a resguardar a sobrevivência do

indivíduo e ainda, observar todos os instrumentos de modulação do imposto de modo a

atingir cada contribuinte de modo adequado à sua riqueza, pois cada contribuinte possui

situações diversas.

2.2.3 Princípio da seletividade

O artigo 155, § 2º, III da Constituição Federal dispõe sobre a seletividade

do ICMS cujo estabelecimento é uma faculdade do poder público segundo a maior parte

da doutrina.

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Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: [...] § 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: [...] III - poderá ser seletivo, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços;

O princípio da seletividade é subordinado ao termo facultado, contudo, é

um instrumento indispensável para a modulação do ICMS de modo a alcançar às

diferentes capacidades contributivas. Este princípio tem o condão de promover distinção

ou um sistema de alíquotas desiguais, onde, segundo Baleeiro (2015), bens supérfluos

ou considerados dispensáveis para o mínimo de uma existência digna, serão alvo de

alíquotas mais vultosas que produtos considerados de primeira necessidade.

Por vedação do artigo 152 da Constituição Federal a essencialidade não

pode ser aferida pela mera destinação ou origem da mercadoria e sim considerando a

sua finalidade. Portanto, entende-se que, como o texto constitucional prevê

expressamente a necessidade de observância da essencialidade como critério da

variação de alíquotas propostas pela seletividade do ICMS, sendo cogente a sua

utilização, visto que a constituição não o determinou de forma aleatória.

Em outros termos, quando da análise das legislações estaduais

instituidoras do ICMS, se houverem alíquotas diferenciadas para mercadorias e serviços,

uma vez que se utiliza dessa variação, não é possível admitir que ela se dê em razão de

outro critério que não o da essencialidade, sob pena de tal diferenciação ser considerada

inconstitucional. Neste esteio, assim se posiciona Costa (2014):

A exigência do ICMS há de ser modulada consoante o grau de essencialidade da mercadoria ou serviço: quanto mais essenciais forem, menor deve ser a tributação; quanto menos essenciais, o imposto deve atingir as respectivas operações e prestações com maior intensidade. A essencialidade, assim entendida como a elevada importância da mercadoria ou serviço para o consumo, é o critério em função do qual a tributação pelo ICMS será modulada.

Muito embora a lei não estabeleça outro critério para a variação das

alíquotas que não o da essencialidade, Machado (2007), entende ser plenamente

possível a utilização de outros critérios, desde que não sejam instituídos de modo

arbitrário e estejam em consonância com a finalidade precípua de se respeitar a

capacidade contributiva e não seja perpetrada qualquer lesão ou prejuízo ao contribuinte

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protegido pela constituição. Contudo, este tema ainda é bastante controverso, sendo

apenas uma opinião pessoal do referido doutrinador.

Quanto a essencialidade a ser considerada para variação das alíquotas,

Baleeiro (2015) dá-nos uma ideia precisa do que vem a ser a essencialidade, quando

diz que:

A palavra essencialidade [...] refere-se à adequação do produto à vida do maior número dos habitantes do país. As mercadorias essenciais à existência civilizada deles devem ser tratadas mais suavemente ao passo que maiores alíquotas devem ser reservadas aos produtos de consumo restrito, isto é, o supérfluo das classes de maior poder aquisitivo. Geralmente são artigos mais raros e, por isso, mais caros. Do ponto de vista econômico, a norma inspira-se na utilidade marginal. Do ponto de vista político, reflete as tendências democráticas e até mesmo socialistas do mundo contemporâneo no qual os países civilizados seguem orientação idêntica.

A variação das alíquotas deve ser realizada primando sempre pela

realização dos princípios tributários e com a finalidade precípua de atingir os

contribuintes na medida de seu poder de contribuição, sendo seletivo, contudo, sem

inviabilizar o consumo. Neste esteio, cabíveis são as palavras de Baleeiro (2015):

Não podem ser cometidas arbitrariedades, como é o caso de serem estabelecidas alíquotas mais elevadas com o propósito precípuo de incrementar arrecadação do ICMS, relativamente a bens que não sejam de primeira necessidade” [...] “e nem com referência à fatores diferentes, geográficos ou políticos, uma vez que se tal distinção fosse permitida daria ensejo a possível favorecimento de uma região em detrimento de outras, contrariando o preceito constitucional que termina a uniformidade de tributos no território nacional.

A seletividade é forma utilizada pelo ordenamento tributário para proteger

o núcleo de consumo popular, buscando demonstrar que o que se pretende não é uma

arrecadação a todo custo, mas uma tributação justa. Carrazza (2010) assevera que as

mercadorias e os serviços de primeira necessidade devem, necessariamente, ser menos

onerados, que os supérfluos ou suntuários. Sendo que esta ideia pressupõe que,

minorando as alíquotas dos produtos de consumo básico, estará poupando o

consumidor de baixa capacidade econômica.

O princípio da seletividade não se confunde a progressividade das

alíquotas. Muito embora os dois princípios supracitados sejam instrumentos de execução

do princípio da capacidade contributiva, ambos diferem quanto a forma de alcance.

Assim esclarece Machado (2007):

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Progressivo é o imposto cuja alíquota cresce em função do crescimento de sua base de cálculo. Essa a progressividade ordinária, que atende ao princípio da capacidade contributiva. [...]. Seja como for, na progressividade tem-se que o imposto tem alíquotas que variam para mais em função de um elemento do fato gerador do imposto, em relação ao mesmo objeto tributado. Seletivo, por sua vez, é o imposto cujas alíquotas são diversas em razão da diversidade do objeto tributado.

Uma das dificuldades na efetivação da seletividade está em saber, com

objetividade, o que é produto essencial e o que é dispensável à uma vida

confortavelmente digna, pois essa noção guarda grande carga de subjetividade, não

podendo ser determinado pelo Estado de modo fidedigno. Contudo, o ordenamento

jurídico não prevê outro critério para o legislador infraconstitucional, que deverá se ater

a variação das alíquotas de modo vinculado à dispensabilidade ou não do produto,

majorando ou minorando a alíquota após essa valoração.

Por fim, ao analisar a essencialidade dos produtos que serão alvo da

variação da alíquota por esta razão, o legislador deve ainda se ater às condições sociais,

aos costumes e ao momento histórico da coletividade, onde Costa (2014) chama atenção

quando diz que “a noção de essencialidade há de ser aferida segundo as coordenadas

de tempo e espaço, vale dizer, à vista de dada sociedade e em determinado momento

histórico.”

2.2.4 Princípio da proporcionalidade

Este princípio tem o propósito de refrear os abusos do Estado no

desempenho de suas competências, classificando-se como instrumento de conferência

da constitucionalidade material da atuação do poder público. Neste passo, a prerrogativa

outorgada ao Estado, não lhe confere a faculdade de utiliza-lo como expediente de

supressão de direitos fundamentais constitucionalmente garantidos aos contribuintes.

A proporcionalidade pode ser entendida como uma balança ou até mesmo

como um filtro às atuações públicas, onde o Poder Público está obrigado a praticar atos

razoáveis e moderados. Quanto a este princípio, Schoeuri (2017) abaliza que a atuação

estatal, sobretudo quando se relaciona com a tributação, não pode ser desmedida,

porquanto esta competência acha-se estritamente subordinada ao princípio da

razoabilidade.

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O poder legiferante está essencialmente sujeito ao rigoroso cumprimento

da diretriz fundamental da proporcionalidade, sendo vedado abusos normativos e

normas irrazoáveis, de modo que, sejam frustradas a criação de norma arbitrárias. Sobre

este ponto, Paulsen (2017) contribui dizendo que:

A proporcionalidade somada ao respeito ao mínimo existencial e à capacidade contributiva são capazes de atingir o princípio da igualdade tributária e justiça fiscal, o que é desejo entre muitos estudiosos do direito tributário. Haverá, contudo, por muito tempo, o debate sobre a melhor forma de se atingir a justiça na tributação, pela proporcionalidade ou pela progressividade, o que deixa claro pelo menos uma coisa: que progressividade e capacidade contributiva não têm relação qualquer entre si.

A proporcionalidade constitui instrumento apto à solução de possíveis

conflitos normativos, onde demandará certo sopesamento dos interesses tutelados, de

modo a se conseguir escolher qual merece àquela tutela específica num dado momento.

Creton (2001) assevera que ‟essa relação de pertinência, adequação e conformidade

que une indiscutivelmente o fato gerador e a base de cálculo de qualquer tributo há de

pautar-se, é fácil de inferir, exatamente pelos princípios gerais da razoabilidade e da

proporcionalidade”.

O juízo de proporcionalidade será realizado mediante a utilização de três

critérios, que segundo Alexy (2002) são: “adequação, necessidade e proporcionalidade

em sentido estrito. ” A adequação consiste na aptidão da medida escolhida para a

promoção de um determinado fim. A necessidade é a imprescindibilidade da medida

para que o fim seja alcançado na ausência de outros meios menos restritivos, após um

juízo comparativo. E por fim, a proporcionalidade em sentido estrito, é o comando de

ponderação onde se faça o juízo de que o bem que se está promovendo supere o mal

que eventualmente possa ser causado. Portanto, a proporcionalidade deve ser aplicada

quando houver colisão concreta entre princípios e cabe ao Poder Público adotar uma

medida para a promoção de um deles, ante a utilização dos critérios supramencionados.

2.2.5 Princípio da Não-Surpresa

Consiste em um princípio que, embora não esteja expresso na constituição,

compreende duas importantes regras para a instituição do tributo, quais sejam, a

anterioridade de exercício fiscal e o prazo nonagesimal. Este princípio também funciona

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como condicionador da prerrogativa estatal, visto que é certo que o ente federativo tem

poder para tributar, contudo, este poder deve ser exercido dentro de lapsos razoáveis

para conhecimento e preparação do contribuinte. Assim se pronuncia Carvalho (2009):

Ora, se bem sopesarmos a conjugação desses dois condicionantes, teremos que inferir que as normas jurídicas que decretam tributo novo, ou nova faixa de incidência para tributo já existente, ou ainda que venham a aumentá-lo, como expressão econômica, devem sujeitar-se à resultante da combinação dos dois limites.

O princípio da Não-Surpresa é o responsável por impedir que a lei

instituidora de tributos não produza efeitos no mesmo momento da publicação, evitando

que os contribuintes sejam surpreendidos pela cobrança de um tributo que não tenha

sido instituído com uma margem de tempo razoável para sua programação econômica.

Esse princípio é instrumentalizado por meio da anterioridade e do prazo

nonagesimal. Ressalte-se que tais princípios não se aplicam a toda lei que altera a

tributação, mas sim somente a lei que aumenta ou cria tributo, considerando que, em

caso de redução, não há qualquer prejuízo ao contribuinte, podendo incidir no instante

da publicação da lei.

A anterioridade de exercício financeiro está prevista no artigo 50, III, alínea

b da Constituição federal e o prazo nonagesimal, no mesmo artigo, na alínea c. O

primeiro veda a cobrança de aumento tributário ou de um novo tributo no mesmo

exercício financeiro, que segundo Carvalho (2009) condiciona a vigência da lei que

institui ou aumenta tributo a se protrair para o ano seguinte ao de sua publicação,

porquanto o segundo, estabelece que, concomitante ao princípio da anterioridade, deve-

se ter um intervalo mínimo de 90 dias corridos desde a data da publicação da lei até a

cobrança do tributo majorado ou do novo tributo.

A imposição do lapso nonagesimal foi implementada por meio da Emenda

Constitucional n. 42, de 19 de dezembro de 2003, que acrescentou a alínea c ao inciso

III do art. 150 da Constituição após a percepção de que apenas o princípio da

anterioridade de exercício fiscal não estava sendo suficiente para assegurar o lapso

razoável para a adaptação dos contribuintes à criação ou majoração de um tributo. De

tal modo se manifesta Carvalho (2009) sobre a anterioridade nonagesimal:

Trata-se de novo requisito que se cumula ao princípio da anterioridade, já existente. Um tributo recém-instituído ou aumentado é exigível apenas no exercício financeiro seguinte e depois de passados noventa dias da sua instituição ou aumento, ficando excepcionados desta última exigência os impostos previstos no art. 153, I, II, III e V, da Carta Magna

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(II, IE, IR e IOF), os impostos extraordinários (art. 154, II), os empréstimos compulsórios criados nas hipóteses de calamidade pública ou guerra externa (art. 148, I), bem como a fixação das bases de cálculo do imposto sobre propriedade de veículos automotores (art. 155, III) e do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (art. 156, I).

A inobservância das regras contidas no princípio da não-surpresa não torna

a lei instituidora do tributo inconstitucional, muito menos torna o tributo inconstitucional,

mas sim torna a sua cobrança inconstitucional, porquanto, apenas a cobrança foi feita

violando ao princípio, pelo que, deverá se aguardar o lapso legal para a cobrança da

obrigação. Oportunas são as palavras de Melo (2002):

Os fatos futuros é que se encaixarão à nova previsão normativa tributária, sendo que os atos e fatos jurídicos anteriores foram plasmados em legislação existente, válida e eficaz, tomando-se uma aberração jurídica a consideração de lei posterior a situações consumadas e perfeitas. A finalidade deste postulado é conferir segurança jurídica às atividades do contribuinte, mediante planejamento prévio à ocorrência de fatos tributários, evitando-se a surpresa fiscal.

2.2.6 Princípio da progressividade

O princípio da progressividade do tributo é justificado pelo utilitarismo,

conceito segundo o qual a utilidade da renda após a incidência dos impostos ou a

diminuição desta utilidade deve ser a mesma para todos os contribuintes, de modo que,

nenhum deverá ser mais onerado do que o outro. Logo, todos os contribuintes devem

ter a mesma “perda” de capital em relação à renda que possuem.

Quanto a este princípio, a sua concretude é de fácil verificação, de modo

que não estará sendo progressiva caso o coeficiente de tributação seja superior ao da

renda. Assim, a oneração tributária não pode ignorar a situação econômica do

contribuinte, devendo ter como marco a renda que este ostenta e o quanto é viável ou

não comprometer parte daquela renda com a carga tributária. E deste modo, quando os

impostos estiverem afetando a renda mais do que o razoável, a tributação estará sendo

regressiva.

A progressividade tributária é um dos princípios que compõe o rol daqueles

que tem por finalidade viabilizar e efetivar o princípio da capacidade contributiva, na

medida em que há um simples agravamento do ônus tributário conforme muda a posição

financeira do contribuinte. Para Machado (2007), “progressividade dos impostos significa

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alíquotas diversas, crescentes na medida em que cresce a base de cálculo do imposto,

ou excepcionalmente um outro elemento eleito pelo legislador para esse fim. ”

Cumpre ressaltar que, progressividade não se confunde com

proporcionalidade. De acordo com Machado (2007), a principal função da

progressividade dos tributos é a redistribuição da riqueza: “com o tributo progressivo, o

que tem mais paga não apenas proporcionalmente mais, porém mais do que isto, paga

progressivamente mais”. Costa (2014), por sua vez, diferencia proporcionalidade e

progressividade, pontuando que, no primeiro caso, aplica-se uma alíquota única, que

permanece invariável. No caso da progressividade, a tributação é mais do que

proporcional, pois a alíquota, variável, cresce à medida que a base de incidência se

eleva. A progressividade melhor atende o princípio da capacidade contributiva (art. 145,

§ 1º, CF).

A ideia da proporcionalidade é a razão de que o imposto deve corresponder

ao poder econômico do contribuinte, não superando esta capacidade. Amaro (2016), por

sua vez, bem observou que “a proporcionalidade implica que riquezas maiores gerem

impostos proporcionalmente maiores (na razão direta da riqueza). Já a progressividade

faz com que a alíquota para as fatias mais altas da riqueza seja maior”.

Enquanto a progressividade busca a realização do preceito constitucional

da isonomia tributária, procurando promover a justiça fiscal ao conferir relevância às

características pessoais do contribuinte, na proporcionalidade a diferenciação das

alíquotas dá-se em razão proporcional à base de cálculo, como ocorre, por exemplo, no

caso do ICMS.

Tanto a aplicação da proporcionalidade como a da progressividade resulta

em tributo mais elevado, quanto maior for a base de cálculo. No entanto, a

proporcionalidade é obtida pela aplicação de uma alíquota única sobre base tributável

variável, enquanto que pela progressividade as alíquotas sofrem aumento, conforme

majoração da base tributável.

Por outro lado, a regressividade tributária consiste em onerar mais àqueles

que possuem menor capacidade contributiva. É o que ocorre por exemplo no ICMS, visto

que, as alíquotas de produtos essenciais como itens básicos da alimentação são iguais

para todos os consumidores, sejam eles com maior poder contributivo ou não. Nesta

situação, é perceptível que os consumidores de capacidade contributiva menor estarão

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suportando maior carga tributária em relação a sua capacidade do que àqueles que

possuem maior capacidade econômica. Assim Costa (2014) explica a regressividade:

A técnica da regressividade opõe-se à da progressividade, consistindo na diminuição da alíquota à medida que aumenta a base de cálculo. À vista do princípio da capacidade contributiva, diretriz fundamental dos impostos, sua aplicação está autorizada tão somente no contexto da tributação extrafiscal.

Nesta conjuntura, percebendo-se o fenômeno da regressividade, não

estará sendo violado apenas o princípio da progressividade, mas também os da

igualdade e da capacidade contributiva, porquanto permite igual tratamento para

contribuintes de situações econômicas distintas. Baleeiro (2015) afirma que a

regressividade, quando utilizada nos impostos puramente fiscais, resulta em clara

expressão de inconstitucionalidade e injustiça.

2.2.7 Princípio da Não-Cumulatividade

Este princípio encontra-se previsto no artigo 155, § 2º, incisos I e II da

Constituição Federal, onde o texto constitucional institui que deve ser compensado “o

que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de

serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação com o montante

cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outro Estado”; sendo assim, a pessoa física

ou jurídica somente recolherá a parcela que agregar ao produto. Consequentemente,

passa a existir um direito de crédito em favor dos contribuintes e contra os Estados e o

Distrito Federal. Cabível sobre este tema, a lucida explicação de Paulsen e Melo (2012):

Trata-se de direito público subjetivo oposto aos Estados, e ao DF, e que também constitui obrigação cometida ao contribuinte. O comando constitucional deve ser realizado tanto no lançamento do débito (operações mercantis e prestações de serviços de transporte e de comunicação), quanto na escrituração do crédito (aquisição de bens e serviços tributados). Como o débito deve ser exigido, lançado e satisfeito, o mesmo ocorre com o crédito, sem o que o princípio resultaria ineficaz, frustrando-se a dicção constitucional.

Ao sujeito passivo assegura-se o direito de creditar-se do imposto que já

foi cobrado em operações resultantes da entrada de mercadoria, real ou simbólica, no

estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente,

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ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de

comunicação. Nas palavras de Costa (2014) “a não cumulatividade visa impedir que o

imposto se torne um gravame cada vez mais oneroso nas várias operações de circulação

do produto. ”

O direito de compensação assegurado ao contribuinte, busca evitar uma

carga tributária exorbitante e que enriquece o poder público mais do que lhe é de direito,

porquanto é um direito de eficácia plena e de aplicabilidade imediata, que não pode ser

reduzido ou afastado, sob pena de inconstitucionalidade. Sobre este princípio, Carrazza

(2010) explica que, a Constituição ao prever a compensação, reconhece o direito de

abatimento ao sujeito passivo do ICMS, sendo este oponível quando o Poder Público

atuar de forma inconstitucional, seja na criação ou na cobrança do tributo.

À administração pública é forçoso o reconhecimento dos créditos já

adimplidos, devendo proceder com a apuração de quanto o contribuinte deverá pagar,

sendo descontado os pagamentos anteriores. Nesse mesmo sentido, Carvalho (2009)

manifesta-se afirmando que:

...o primado da não-cumulatividade é uma determinação constitucional que deve ser cumprida, assim por aqueles que dela se beneficiam, como pelos próprios agentes da Administração Pública. E tanto é verdade, que a prática reiterada pela aplicação cotidiana do plexo de normas relativas ao ICMS e ao IPI consagra a obrigatoriedade do funcionário, encarregado de apurar a quantia devida pelo ‘contribuinte’, de considerar-lhe os créditos, ainda que contra sua vontade.

Nestes termos, percebe-se que a não cumulatividade traduz-se

substancialmente no direito de compensação, que por todos deve ser observado, sob

pena de inconstitucionalidade, beneficiando tanto ao contribuinte quanto ao consumidor

final, a quem interessa arcar com um menor ônus tributário. Melo (2002) explica o direito

da não cumulatividade nestes termos: “significa que o valor tributário efetivamente

devido é aquele que resulta da compensação, entre os tributos incidentes nas

operações/serviços praticados pelo contribuinte, com as anteriores aquisições de bens

e serviços, num determinado período de tempo. ”

Não se pode olvidar que, o princípio da não cumulatividade consiste em

norma cogente, que busca garantir a neutralidade do ICMS nas diferentes fases da

cadeia produtiva, independentemente da quantidade de operações, pelo que, deve ser

compulsoriamente observado e incondicionado a qualquer autorização, seja ela

legislativa, judicial ou administrativa por parte da autoridade fazendária, permitindo,

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portanto, fruição imediata, pelo seu caráter de diretriz imperativa que confere direito

subjetivo ao contribuinte.

Consequentemente, o ICMS é comumente lembrado por ser um imposto

“não-cumulativo”, pelo fato de que, em cada prestação ou operação, assegura-se ao

contribuinte, um abatimento correspondente aos montantes cobrados nas operações ou

prestações anteriores. Quanto ao modo de implementação desta compensação,

Carrazza (2010) explica que: “A Constituição, ao aludir à ‘compensação’, consagrou a

ideia que a quantia a ser desembolsada pelo contribuinte é o resultado de uma subtração

em que o minuendo é o montante de imposto devido e o subtraendo é o montante de

imposto anteriormente cobrado”.

Com relação ao quantum a ser pago, é cabível considerar que, os

incentivos, isenções e outros benefícios relacionados ao ICMS concedidos mesmo sem

ser conveniados, não devem impedir o direito de crédito dos contribuintes. Ademais, é

irrelevante a origem dos créditos do ICMS, pelo que, para haver o direito de crédito do

contribuinte, não se faz necessário que os créditos sejam referentes à mesma

mercadoria ou serviço prestado, tendo em vista que a Constituição não faz qualquer

exigência nesse sentido.

O princípio da não-cumulatividade se relaciona diretamente com o Princípio

da vedação ao confisco. Isto porque, se em determinada operação, o ente tributante fixar

proibição ao aproveitamento dos créditos relativos às operações anteriores, estará

provocando efeito cumulativo e confiscatório. Efeito cumulativo porque ocasionará

aumento artificial no preço das mercadorias e serviços, prejudicando o consumidor final.

E efeito confiscatório porque sobre o mesmo preço incide mais de uma vez o mesmo

imposto, cobrando de cada um dos agentes do ciclo mais impostos do que o devido.

Destaque-se que, a intenção constitucional não tem por objetivo a divisão

do ônus da tributação, como entendem determinados doutrinadores, mas tão somente

obstar que a carga final seja acrescida pelas cargas tributárias que já recaíram em

momento anterior. No entanto, a doutrina não é consensual no que concerne a sua

posição acerca dos efeitos oriundos da não cumulatividade. Para Carrazza (2010), por

meio do princípio da não cumulatividade do ICMS, a Constituição favoreceu o

contribuinte de direito do ICMS, e simultaneamente, o contribuinte de fato, que é o

consumidor final, aquele a quem efetivamente interessa o arrefecimento da carga

tributária.

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Em contraposição ao pensamento de alguns doutrinadores, Machado

(2007) afirma que a não cumulatividade do ICMS representa uma imperfeição do sistema

tributário que é inteiramente inadequada para a realidade brasileira. Ele acredita ser algo

de dificultosa exequibilidade, considerando a quantidade de dispositivos inseridos na

Constituição para buscar regulamentar de modo correto a compensação do imposto em

cada operação, sopesando ainda a inconveniência da administração complexa do

imposto que demanda controles burocráticos e custosos para o fisco e para os

contribuintes, além da possibilidade de incorrer em fraude.

Muito embora as considerações do último autor sejam plausíveis, entende-

se que, em consonância com a primeira posição, tendo em vista que anteriormente,

quando da existência do IVC, este era cumulativo e onerava em demasiado o

consumidor final, a “inovação” da não cumulatividade trazida posteriormente,

demonstrou-se como alternativa mais justa e eficiente para o contribuinte.

Por fim, convém salientar que o Princípio da Não Cumulatividade configura

mais uma garantia ao contribuinte final, que é o consumidor de fato, para que ele não

venha a suportar uma carga tributária excessivamente onerosa, visando, portanto, maior

justiça tributária.

2.3 DESENHO INSTITUCIONAL DO ICMS

O ICMS é um imposto que deve ser instituído por lei estadual, deve

observar ao princípio da capacidade contributiva e da seletividade como instrumento

para justiça fiscal, deve ser ainda proporcional e progressivo, não cumulativo e ainda,

atender aos requisitos que proíbem a surpresa tributária.

Como já comentado, o art. 155 da CF outorga competência aos Estados e

ao Distrito Federal para a criação deste imposto, bem como, fixa limites para o seu

exercício. Ressalte-se que, ainda que operações relativas à circulação de mercadorias

e transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação se iniciem no exterior são

os Estados e o Distrito Federal os entes competentes para a instituição e recolhimento

do imposto.

Como estabelecido no próprio texto constitucional, a Lei Complementar nº

87/96 estabelece normas gerais para a instituição do imposto pelo ente competente,

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tendo esta sofrido algumas alterações pelas Leis Complementares nº 92/1997, 99/1999,

102/2000 e 114/2002. Frise-se que, apesar de a Lei complementar em comento possuir

detalhes específicos do ICMS, ela não cria o imposto, mas, se restringi a instituir normas

gerais para a criação por Lei específica.

Por ser um imposto predominantemente fiscal, sua finalidade é

majoritariamente arrecadatória, no entanto, a majoração ou diminuição de suas alíquotas

podem representar extrafiscalidade, no intuito de incentivar ou não certo consumo em

um dado momento. É considerado plurifásico, porquanto, em cada etapa da cadeia

produtiva haverá incidência desse imposto, podendo ser denominado de imposto não

cumulativo. Quanto ao modo de incidência, é analisado como um imposto indireto, visto

que sobre ele sucede a lógica de incidência na cadeia produtiva, sendo repassado ao

consumidor final.

Por se tratar de tributo estadual, as leis ordinárias podem variar quando da

fixação do critério material, pessoal, espacial, temporal e o mandamento. Tendo vista

este contexto, o presente trabalho procurou demonstrar a predominância do que está

inserido nas respectivas legislações dos entes estaduais da Federação, de acordo com

as limitações que estão previstas no texto constitucional e na Lei Complementar.

2.3.1 Critério material

Para compreensão da incidência do ICMS, primeiramente é necessário a

identificação do aspecto material, que representa o próprio verbo que delimita qual será

a ação executada pelo sujeito passivo para que haja incidência do imposto, em outros

termos, é a identificação da hipótese de incidência, que consiste em destacar a descrição

normativa de um fato previsto em lei, ou seja, a exposição prevista de forma hipotética,

prévia e abstrata, o que, nas palavras de Ataliba (2012), é “una e indivisível, sendo,

portanto, núcleo do tributo.”

O fato imponível é o próprio fato concreto, correspondente à hipótese

abstrata previamente estabelecida na norma, o que importará no nascimento da

obrigação tributária sempre que for efetivado. Brito (2014) aduz que a busca do fato

tributável, no uso da técnica da tipicidade, estabelece respeito à nucleação de uma

prestação coativa específica, de modo que, está tipicidade seja a mais delimitada

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possível, observando ainda todas as disposições constitucionais que pressupõem essa

nucleação, observando as normas jurídicas de natureza de princípios-garantia.

A hipótese de incidência está intimamente relacionada com o princípio da

legalidade, em sua acepção formal e material. Isto porque, a norma de incidência do

tributo advém da interpretação da lei, que é emanada do Poder Legislativo, daí a

legalidade formal. E a legalidade material sucede da necessidade de existir o encaixe do

fato da com a descrição normativa, sem espaço para discricionariedade, e para isso, é

necessária a existência de todos os critérios supracitados nos moldes previstos em lei.

Segundo Ataliba (2012), na construção da hipótese de incidência, o aspecto material é

o mais eminente, pois manifesta a sua substância, o que é determinante para definir a

espécie e subespécie do tributo em questão, bem como, serve de fundamento para que

sejam feitas suas classificações jurídicas.

É certo que, o critério material é componente determinante na

fenomenologia da subsunção que permitirá o nascimento da obrigação tributária. Sobre

este fenômeno, Carvalho (2009) explica que a subsunção ocorre quando o fato (fato

jurídico tributário constituído pela linguagem prescrita pelo direito positivo) guardar

absoluta identidade com o desenho normativo da hipótese (hipótese tributária) e assim,

sendo concreta esta subsunção, o tributo instala-se, automática e infalivelmente.

Afim de viabilizar a explicação de alguns conceitos, o ICMS pode ser divido

em: a) o ICMS sobre as operações relativas à circulação de mercadoria, b) o ICMS sobre

importação, c) o ICMS sobre a prestação de serviço de transporte interestadual e

intermunicipal, e d) o ICMS sobre a prestação de serviço de comunicação.

Quanto ao ICMS relativo à circulação de mercadoria, ponderoso elucidar

que, para o direito empresarial, mercadoria é o objeto da mercancia, de comércio,

envolvendo habitualidade ou intuito comercial. E, nas palavras de Paulsen (2017) “é o

bem corpóreo da atividade profissional do produtor, industrial e comerciante, tendo por

objeto a sua distribuição para consumo, compreendendo-se no estoque da empresa,

distinguindo-se das coisas que tenham qualificação diversa, como é o caso do ativo

permanente. ”

Dito isto, os estados brasileiros só têm competência para tributar operações

relativas a mercadorias, portanto eles só podem tributar operações nas quais aquele

bem seja vendido como mercadoria, como ato de comércio, com habitualidade e intuito

comercial. Nas lições de Carrazza (2010), para que um ato seja considerado uma

operação mercantil, especificamente, é necessário que seja pautado pelas regras de

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Direito Comercial, tenha sido realizado no âmbito de atividades empresariais, que

objetive o lucro, e, por fim, que tenha por objeto uma mercadoria.

A Súmula 166 do STJ estatui que as operações relativas à circulação de

mercadorias compreendem tão somente a circulação jurídica de mercadoria, não

incidindo o ICMS na simples circulação física. Em consequência desta imposição, os

bens transacionados ou transferidos por particulares, prestadores de serviço,

financeiras, dentre outros, sem traduzir-se em mercancia, ou não sendo negociados com

habitualidade, não são caracterizados como mercadoria. Deste modo, em relação às

operações relativas à circulação de mercadorias, só ocorrerá o fato gerador do ICMS se

houver mercadoria (objeto de mercancia) e se houver a circulação jurídica dessa

mercadoria.

No que concerne ao ICMS incidente sobre a importação, imperioso

considera que este engloba até mesmo as operações de circulação de mercadorias que

se iniciem no exterior, conforme disposição do art. 155, II, da CF/88. Nesse esteio, o

ICMS não incide sobre a mera entrada de mercadoria, ou seja, sobre a simples

importação, que é tributável apenas pela União. O ICMS importação recai sobre a

inclusão da mercadoria no ciclo econômico da empresa que a importa, com a finalidade

de comercialização.

Quanto ao ICMS sobre a prestação de serviços de transporte interestadual

e intermunicipal, insta expor a título de informação, que este derivou do antigo Imposto

Federal sobre Serviços de Transporte (ISTR) e incide sobre as prestações onerosas de

transporte interlocal, excluindo-se os transportes estritamente municipais.

Já o ICMS incidente sobre a prestação de serviço de comunicação recai

sobre a prestação onerosa de serviços de comunicação, ou seja, decorre de um contrato

oneroso de serviço, que tem por objeto a comunicação. Sobre esta hipótese de

incidência, Paulsen e Melo (2012) assim definem tais serviços:

Os serviços de telecomunicação compreendem a transmissão, emissão ou recepção de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza por fio, radioeletricidade, meios óticos, ou qualquer outro eletromagnético. [...] O Regulamento Geral dos Serviços de Telecomunicações dispõe que não caracterizam serviços de telecomunicações o provimento de capacidade de satélite, a atividade de habilitação ou de cadastro de usuário, e equipamento para acesso a serviços de telecomunicações, nem os denominados serviços de valor adicionado.

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Para que exista comunicação, é necessário a presença de um emissor e

um receptor reciprocamente identificados, trocando informações. Mas, a comunicação

tributável por meio do ICMS é a prestação onerosa do serviço de comunicação, sob

regime de direito privado, onde emissor e receptor são colocados efetivamente em

contato por um terceiro mediante pagamento, não bastando a mera disponibilização dos

meios mecânicos, eletrônicos ou técnicos, muito menos a mera celebração do contrato.

Por fim, é de extrema relevância para a delimitação do critério material,

reconhecer as circunstâncias de tempo e lugar, pois, sem estes aspectos, como bem

expõe Carvalho (2009) o perfil típico estaria imperfeito e inacabado, pois a descrição

normativa depende não só da descrição de um fato, mas também o tempo e lugar onde

este fato estará circunscrito.

2.3.2 Critério temporal

O critério temporal tem o intuito de apontar o momento em que se considera

consumado o fato imponível, para que se considere o surgimento da obrigação tributária.

Destaca Ataliba (2012) que, o critério temporal é relevante no que se refere a

constatação exata da lei aplicável ao caso, também para fins de respeito aos princípios

da irretroatividade e anterioridade, bem como, para que se viabilize a contagem dos

prazos decadenciais e prescricionais. Melo (2002) explica com indizível clareza este

aspecto:

O aspecto temporal consiste na fixação de um determinado momento em que se deve reputar acontecida a materialidade do tributo, tendo em vista que a norma deve conter a circunstância de tempo, certo e determinado. Embora a materialidade tributária possa ser composta, integrada, por diversos acontecimentos, tem que ser considerada una e incindível, razão pela qual é inadequada a classificação de fatos geradores simples ou complexos, instantâneos ou continuados. A incidência tributária ataca unicamente o resultado da materialidade, que, enquanto não verificada, não faz eclodir o tributo, desencadeando efeitos que lhe são pertinentes.

A lei ordinária dos Estados e do Distrito Federal é que determinará o

momento em que cada fato gerador será considerado consumado. Tratando-se do ICMS

sobre operações relativas à circulação de mercadorias, por exemplo, segundo Carrazza

(2010), pode ser o momento de entrada da mercadoria no estabelecimento, o momento

de saída da mercadoria do estabelecimento, ou também pode ser o momento de

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extração da nota fiscal. Ademais, Carrazza (2010) ressalta o direito subjetivo do

contribuinte a ser tributado exclusivamente após a ocorrência da operação mercantil,

quando houver transferência de titularidade da mercadoria.

Ante a imprescindibilidade da especificação do aspecto temporal do tributo,

este confere ao sujeito passivo direito subjetivo a apenas ser considerado devedor nesta

relação quando o fato tributável estiver implementado pelo critério temporal, onde surgirá

o liame que vinculará o sujeito passivo ao ativo. Refletindo sobre esse aspecto, Carvalho

(2009), se manifesta aduzindo a natural indispensabilidade de que a norma tributária

desponte o marco temporal em que se considerará por ocorrido o fato, permitindo aos

sujeitos da relação o preciso conhecimento do surgimento de seus direitos e obrigações.

O critério temporal da hipótese de incidência não pode, em hipótese

alguma, ser confundido com o prazo de recolhimento do tributo, visto que se tratam de

aspectos totalmente distintos. E neste sentido, assim Paulsen (2017) se manifesta:

...o aspecto temporal é a circunstância de tempo do aspecto material ou o momento em que, por ficção legal, visando à operacionalidade ou “praticabilidade” da tributação, é determinado que se considere ocorrido o fato gerador. O prazo de recolhimento, por sua vez, sequer integra a norma tributária impositiva: simplesmente explicita o momento em que deve ser cumprida a obrigação pecuniária surgida com a ocorrência do fato gerador.

O aspecto temporal é o direcionador do momento de nascimento da

obrigação tributária e possui considerável relevância tanto para o cálculo do montante

devido, quanto para a contabilização de prazos prescricionais e decadenciais, como

também para a determinação de qual regime legislativo regulamentará o fato oponível.

Sobre este aspecto, assim conclui Carvalho (2009):

é um grupo de indicações, contidas no suposto da regra, e que nos oferecem elementos para saber, com exatidão, em que preciso instante acontece o fato descrito, passando a existir o liame jurídico que amarra devedor e credor, em função de um objeto — o pagamento de certa prestação pecuniária.

2.3.3 Critério espacial

O critério espacial refere-se ao local onde o fato alcança os efeitos

estabelecidos pela norma e está prevista no artigo 11 da LC 87/96. Este aspecto consiste

na sinalização de lugar e circunstâncias abarcadas na hipótese de incidência do imposto

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e é de distinta relevância pois é através dele que se define qual o estado competente

para a cobrança do imposto, ou seja, qual o sujeito ativo desta obrigação, o que muitas

vezes gera disputa entre os estados, a conhecida “guerra fiscal”.

Este aspecto, ao definir o espaço onde se circunscreve a incidência do

tributo, é um limite facilitador da definição da competência, que como bem pontua

Schoueri (2017) apresenta ponderação sobre o estabelecimento de limites à dinâmica

da competência tributária, já que, de um lado, a lei poderá definir sua esfera de aplicação

expressamente de outro, na omissão legal, encontrar-se-á, igual limite ao próprio âmbito

de aplicação da legislação tributária.

A definição legal da hipótese de incidência, em consequência do Princípio

da Territorialidade presente no art. 102 do CTN, que vale como regulamento no direito

tributário, só prevê um fato como determinante no nascimento de uma obrigação, caso

este fato sobrevenha no domínio territorial de vigência da lei, ou seja, no espaço

correspondente à competência do legislador tributário. Sobre a definição do aspecto

espacial na lei, Costa (2014) assim se pronuncia:

O aspecto espacial pode experimentar distintos graus de normatividade. Há hipóteses em que se vislumbra apenas uma coordenada genérica de espaço, que coincide com a própria eficácia territorial da lei. É o que ocorre, por exemplo, com o IPI, pois a operação que tenha por objeto produto industrializado pode ocorrer em qualquer ponto do território nacional, coincidindo o critério geográfico com a eficácia territorial da lei federal.

Com efeito, em decorrência do aspecto espacial, a lei municipal só produz

efeitos no espaço municipal, a lei estadual, no Estado correspondente, e por fim, a lei

federal, com abrangência nacional. Por conseguinte, se um determinado fato, não se

consumar no lugar estabelecido em lei, mesmo que contenha todas as características

necessárias previstas na hipótese de incidência não será tributável. Para Melo (2002), o

aspecto espacial significa que “por uma situação natural, os fatos tributários ocorrem em

um determinado lugar, cumprindo ao legislador estabelecer o local em que, uma vez

acontecida a materialidade tributária, se repute devida a obrigação. ”

Em relação ao local de ocorrência do fato típico e tributável, Carvalho

(2009) explica que os elementos indicadores da condição de espaço das normas

tributárias, hão de guardar três modos de composição, que conduz a classificação do

tributo, podendo o grau de elaboração do critério espacial da respectiva hipótese

tributária ser mais ou menos detalhada. Ele considera que poderá o critério espacial

fazer menção a determinado local para a ocorrência do fato típico; poderá aludir a áreas

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específicas, de modo que o acontecimento apenas ocorrerá se dentro delas estiver

geograficamente contido; como também, poderá ser bem genérico, onde todo e qualquer

fato, que suceda sob o manto da vigência territorial da lei instituidora, estará apto a

desencadear seus efeitos peculiares.

O critério espacial no ICMS sobre operações relativas à circulação de

mercadorias é no Estado onde a operação mercantil ocorreu, mesmo que o destinatário

da mercadoria esteja em outro estado ou até no exterior. Isto porque, a Constituição

compatibilizou os limites geográficos da entidade tributante com o critério espacial de tal

tributo.

No ICMS importação, considera-se consumado o fato gerador do ICMS no

Estado onde tiver domicílio ou estabelecimento o destinatário final do produto importado.

O ICMS sobre a prestação de serviço de transporte interestadual e intermunicipal tem

seu fato gerador praticado no local onde teve início a prestação do serviço, então, deve

ser tributado o Estado em cujo transporte iniciou-se, ainda que sua prestação seja

concluída em outro Estado.

2.3.4 Critério pessoal

O aspecto pessoal refere-se à determinação dos sujeitos que figuram nos

dois polos da obrigação tributária. Isto é, ativo (quem cobra) e passivo (quem paga), em

outras palavras, são os sujeitos do vínculo, com interesses formalmente antagônicos,

cujo objeto é a prestação tributária. Na acepção de Ataliba (2012), este vínculo ‟consiste

numa conexão (relação de fato) entre o núcleo da hipótese de incidência e duas pessoas,

que serão erigidas, em virtude do fato imponível e por força da lei, em sujeitos da

obrigação. ”

Sobre o sujeito ativo da relação tributária, o Código Tributário Nacional

dispõe em seu artigo 119, que este polo é ocupado pela pessoa jurídica de direito público

a qual possui a atribuição de exigir seu cumprimento, ou seja, o Estado. Sendo que, no

caso do ICMS, como já comentado, o sujeito ativo é o ente estadual ou distrital e sujeito

passivo será a pessoa que executar o critério material deste imposto.

O sujeito ativo é o credor, a quem a lei atribui a exigibilidade do tributo. Tal

determinação só pode ser feita por meio de lei, é discricionária, mas restringe-se a uma

pessoa com finalidades públicas, e, em regra, pertence a pessoa constitucional titular da

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competência tributária. Sobre o aspecto pessoal, esclarecedoras são as palavras de

Melo (2002):

O ICMS é de competência dos Estados e do Distrito Federal, tendo como contribuintes (a) as pessoas que pratiquem operações relativas à circulação de mercadorias; (b) os importadores de mercadorias e bens de qualquer natureza, ainda que não sejam contribuintes habituais do imposto, e qualquer que seja a finalidade; (e) os prestadores de serviços de transporte interestadual e intermunicipal; e (d) os prestadores de serviço de comunicação.

O sujeito passivo é aquele que sofrerá decréscimo em seu patrimônio por

ter incorrido na execução do fato tributável. Nos termos de Ataliba (2012), o sujeito

passivo da obrigação ‟é a pessoa que fica na contingência legal de ter o comportamento

objeto da obrigação, em detrimento do próprio patrimônio e em favor do sujeito ativo”.

Quanto ao polo passivo do tributo, necessário pontuar que ele é pode ser

ocupado por pessoa natural ou física, e esta sujeição independe de capacidade civil.

Logo, mesmo sendo juridicamente incapaz para o Direito Civil, para o Direito Tributário

há plena capacidade jurídica, nos termos do art. 126, inc. I do CTN.

Em sendo o sujeito passivo do tributo pessoa jurídica, a capacidade desta

independe de sua constituição ser ou não regular, sendo suficiente a configuração de

uma unidade econômica ou profissional, conforme 126, inc. III do CTN. Deste modo, uma

sociedade comercial irregular, ou mesmo uma sociedade de fato, desde que seja uma

unidade econômica ou profissional, pode ser sujeito passivo do tributo, não havendo

qualquer modo de estas pessoas se esquivarem da obrigação.

O sujeito passivo pode ocupar a posição tanto de contribuinte (sujeito

passivo direto) como de apenas responsável (sujeito passivo indireto) pelo tributo.

Contribuinte é aquele que possui uma relação pessoal e direta com o fato gerador do

imposto, por exemplo, o proprietário de uma casa será considerado contribuinte do IPTU.

Assim Paulsen e Melo (2012) definem o contribuinte da relação tributária:

Contribuinte é qualquer pessoa, física ou jurídica, que realize, com habitualidade ou em volume que caracterize intuito comercial, operações de circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e prestações se iniciem no exterior. (...). Considera-se também contribuinte a pessoa física ou jurídica, ou mesmo o contribuinte não habitual, que realize operações de importação; seja destinatária de serviço prestado no exterior ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior; e adquira em licitação mercadorias apreendidas ou abandonadas.

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Por outro lado, o responsável é aquele que, embora não seja contribuinte

e não tenha relação pessoal com o fato gerador do imposto, a lei lhe atribui o dever de

pagar o tributo, em outras palavras, é um terceiro em relação ao fato jurídico tributário,

mas escolhido pela lei para responder pela quitação do tributo, o que ocorre por exemplo

quando o recolhimento do imposto de renda é feito pelo empregador, relação onde o

contribuinte é o empregado, contudo, quem recolhe e é responsável pelo imposto é o

empregador.

Há ainda possibilidade de haver substituição tributária, onde um terceiro,

mesmo não tendo incorrido na prática do fato gerador do imposto, possui um vínculo

com o contribuinte. Sobre a substituição tributária, clara são as palavras de Paulsen e

Melo (2012) ao explicar tal posição:

A substituição significa a imputação de responsabilidade por obrigação tributária de terceiro que não praticou o fato gerador, mas que tem vinculação com o efetivo contribuinte. O substituto tem que decorrer naturalmente do fato gerador tributário, da materialidade descrita (abstratamente) na norma jurídica, não podendo ser configurado por mera ficção do legislador. ” [...] O substituto deve inserir-se em uma realidade do sistema jurídico, permeada pelos princípios da segurança, certeza, e do direito de propriedade, uma vez que o patrimônio das pessoas somente pode ser desfalcado por fatos efetivamente realizados (ou cuja presunção seja evidente), e que contenham ínsita a capacidade contributiva.

Em respeito sobretudo ao princípio da legalidade, o sujeito passivo deve

estar bem definido na legislação ordinária, devendo inclusive especificar diretamente

qual o fato a ser consumado para que o sujeito seja considerado passivo na relação

tributária, inviabilizando qualquer margem de discricionariedade. Em suas lições, Brito

(2014), assevera que, enquanto sujeito ativo, o Estado possui ainda o poder de, como

administração pública, no particular da dinâmica tributária, liquidar a obrigação,

prerrogativa que implica no exercício de um direito potestativo, o que, nas demais

relações obrigacionais é específica do Poder Judiciário.

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2.3.5 Mandamento do ICMS

O mandamento do imposto consiste na descrição da obrigação de pagar,

e se subdivide em critério quantitativo e critério subjetivo. O primeiro compreende a base

de cálculo e a alíquota do tributo, e o segundo, compreende os sujeitos da relação

tributária. Os critérios citados possuem igual importância, ambos indispensáveis na

relação tributária. Isto porque, tão importando como quanto tem que se pagar, é a

informação de a quem deve-se pagar. Sendo imprescindíveis para a concretização do

vínculo obrigacional. Neste ponto, importante é a manifestação de Machado (2007):

A rigor, o que a lei deve prever não é apenas a hipótese de incidência, em todos os seus aspectos. Deve estabelecer tudo quanto seja necessário à existência da relação obrigacional tributária. Deve prever, portanto, a hipótese de incidência e o consequente mandamento. A descrição do fato temporal e da correspondente prestação, com todos os seus elementos essenciais, e ainda a sanção, para o caso de não prestação.

Os critérios do mandamento do ICMS são consequência da materialidade

reunida com todos os outros aspectos (temporal, espacial e pessoal), visto que, a

obrigação só surge com o cometimento da ação prevista ne lei como imponível, e só

será cobrado este imposto a quem direta (contribuinte) ou indiretamente (responsável)

possui ligação com este fato. No tocante ao estabelecimento do critério quantitativo

(base de cálculo e alíquota), imperioso se faz o comentário de Melo (2002) sobre o

assunto:

O mandamento constitucional indica os contribuintes e respectivos fatos geradores (hauridos de negócios mercantis ou civis), e, implicitamente, as bases de cálculo das contribuições (preços). No tocante à fixação da alíquota, o legislador deverá pautar-se pelo critério da razoabilidade, a fim de não prejudicar tais contribuintes (classes desfavorecidas), suas próprias atividades e subsistência familiar.

2.4.5.1 Critério quantitativo

Este aspecto possibilita a verificação do quantum devido pelo sujeito

passivo do tributo, e consequentemente, o valor que adentrará aos cofres públicos. Este

montante será obtido através da junção da base de cálculo e da alíquota. A base de

cálculo, segundo Ataliba (2012), é a “dimensão do aspecto material da hipótese de

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incidência” e para Melo (2002) “constitui a dimensão da obrigação pecuniária,

positivando o quantum devido pelo contribuinte/responsável, ou seja, o efetivo valor a

ser recolhido aos cofres públicos. ”

A base de cálculo do imposto possui o condão de quantificar a expressão

econômica do fato imponível que combinada com a alíquota resultará no montante a ser

pago à título de tributo. Sabiamente, Paulsen e Melo (2012) definem a base de cálculo

nestas palavras:

A base de cálculo é o valor da operação mercantil; é o preço dos serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação. Assim, o imposto não incide sobre serviços gratuitos, demandando sempre a onerosidade, reveladora da capacidade contributiva. [...] Somente devem integrar a base de cálculo os valores inerentes às mercadorias e/ou serviços de transporte e de comunicação, bem como os reajustes e acréscimos intrinsecamente vinculados a tais valores. Não deveriam ser incluídos elementos estranhos ao valor da operação ou do preço, porquanto correspondem a verbas que têm natureza diversa das operações mercantis e das prestações de serviços, não havendo fundamento para o ICMS ser calculado sobre meras entradas financeiras os créditos.

A base de cálculo pode ser definida ainda como um instrumento que

compõe o método de apuração do valor devido, e que para Carvalho (2009), possui três

funções:

a) função mensuradora, pois mede as reais proporções do fato; b) função objetiva, porque compõe a específica determinação da dívida; e c) função comparativa, porquanto, posta em comparação como critério material da hipótese, é capaz de confirmá-lo, infirmá-lo ou afirmar aquilo que consta do texto da lei, de modo obscuro.

É certo que a base de cálculo possui uma disposição central na hipótese

de incidência. Mas, não apenas a base de cálculo é necessária para quantificação do

imposto. A alíquota também se faz igualmente necessária, e nas palavras de Melo

(2002):

Representa um determinado percentual aplicável sobre a base de cálculo, em razão do que, para se apurar o ICMS, é necessário tomar como base de cálculo o valor das mercadorias, e aplicar um determinado percentual (18%, por exemplo), cujo resultado representará o efetivo ICMS incidente na operação mercantil.

A alíquota é definida na lei instituidora do imposto por cada ente

competente para sua instituição, se relacionando particularmente com cada produto,

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sendo exprimida em percentual e deve ser reunida à base de cálculo, formando uma

estrutura para a apuração do valor. Assim explica Carvalho (2009):

A alíquota é matéria submetida ao regime de reserva legal, integrando a estrutura da regra-modelo de incidência. Congregada à base de cálculo, dá a compostura numérica da dívida, produzindo o valor que pode ser exigido pelo sujeito ativo, em cumprimento da obrigação que nascera pelo acontecimento do fato típico.

A cobrança do tributo só pode ser realizada através da conjugação da

expressão econômica do fato (base de cálculo) com o percentual determinado pelo

Estado (alíquota). Em razão disso, estão totalmente ligados ao aspecto material do

tributo, aspecto que viabilizará a identificação dos sujeitos envolvidos e da ocorrência da

hipótese de incidência. Nesse sentido, Creton (2001) assevera que, ‟essa relação de

pertinência, adequação e conformidade que une indiscutivelmente o fato gerador e a

base de cálculo de qualquer tributo há de pautar-se, é fácil de inferir, exatamente pelos

princípios gerais da razoabilidade e da proporcionalidade. ”

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3 CAPÍTULO II – EQUIDADE FISCAL E JUSTIÇA TRIBUTÁRIA NOS ESTADOS

BRASILEIROS

3.1 ICMS E JUSTIÇA FISCAL

Ao estabelecer o Estado Democrático de Direito, a Constituição Federal,

instituiu princípios, direitos individuais e coletivos, e garantias fundamentais que

demandam atuações do Poder Público para a sua realização. Por outro lado, a

efetivação dos direitos outorgados pela constituição possui um custo que precisa ser

arcado pela coletividade e por isso se faz necessária a instituição dos impostos. Neste

interim, indispensáveis são as palavras de Baleeiro (2015) quando menciona que o

tributo é “vetusta e fiel sombra do poder político há mais de 20 séculos. Onde se ergue

um governante, ela se projeta sobre o solo de sua dominação. ”

O Estado Democrático pressupõe, necessariamente, além de outros

objetivos fundamentais, a persecução de justiça social, que implica em redistribuição de

renda e igualdade de oportunidades a todos os indivíduos. A tributação, para Piketty é

indispensável à lógica dos direitos universais que rege o desenvolvimento do Estado

fiscal e social moderno que coaduna perfeitamente com a ideia de arrecadação

proporcional ou progressiva. Nesta perspectiva, lúcidas são a palavras de Torres (2011):

...a relação tributária, por outro lado, aparece totalmente vinculada pelos direitos fundamentais, declarados na Constituição. Nasce, por força de lei, no espaço previamente aberto pela liberdade individual ao poder impositivo estatal. É rigidamente controlada pelas garantias dos direitos e pelos sistemas de princípios da segurança jurídica. Todas essas características fazem com que se neutralize a superioridade do Estado, decorrentes dos interesses gerais que representa, sem que, todavia, se prejudique a publicidade do vínculo jurídico.

A abrangência da justiça social, comporta ainda, a finalidade de alcançar

a todos de forma universal, atenuando as desigualdades regionais, conforme preconiza

os artigos 3º, inciso III e 170, inciso VII, de modo que todos sejam alcançados pelos

mesmo direitos e benefícios na mesma medida. Ratificando esta finalidade, Carrazza

(2010) assim se expressa: “ Deveras, todo o capítulo I do título II da Constituição

Brasileira delimita o exercício das competências tributárias das pessoas políticas,

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impedindo-as de ingressarem nas áreas reservadas aos direitos à vida, à liberdade, à

igualdade, à segurança e à propriedade dos contribuintes. ”

Incluída neste amplo objetivo de justiça social, está a justiça fiscal, que

busca efetivar a justiça material entre os indivíduos e se consubstancia na consideração

das diferenças existentes entre os contribuintes, com a finalidade de onerar cada

contribuinte na medida de sua condição contributiva com a finalidade de custear os

serviços públicos de modo a satisfazer os direitos básicos dos indivíduos, principalmente

dos que não podem arcar com serviços privados. Corroborando com estes termos,

mister citar Silva (1982) que assim se manifesta: “Recordamos o que certa vez

escrevemos: ´A justiça tributária é ainda um ideal a ser alcançado, não por si só, mas

em conexão com um sistema de justiça econômica e social`”

A oneração desmedida de contribuintes de baixa capacidade contributiva

é a principal causa da má redistribuição de renda e da má divisão dos custos públicos o

que acarreta ostensiva desigualdade social, porquanto, a distributividade e equidade são

pressupostos da justiça. Nestas palavras Carrazza (2010) explica que este princípio:

...hospeda-se nas dobras do princípio da igualdade e ajuda a realizar, no campo tributário, os ideais republicanos. Realmente, é justo e jurídico que, em termos econômicos, quem tem muito pague, proporcionalmente, mais impostos do que tem pouco. Quem tem maior riqueza deve, em termos proporcionais, pagar mais impostos do que tem menor riqueza. Noutras palavras, deve contribuir mais para a manutenção da coisa pública.

É inevitável tecer comentários sobre justiça fiscal sem sobrelevar o

princípio da capacidade contributiva e da igualdade, onde o Estado, através da

tributação, atua como interventor para minimizar as desigualdades sociais e regionais e

não as acentuar. É neste sentido que Pochmann (2008) entende que um sistema

tributário mais justo tende a proporcionar menor grau de concentração de renda.

O poder de tributar é logicamente um poder estatal que atua

majoritariamente com intuito fiscal, ou seja, arrecadatório. Como já dito, este poder está

submetido às restrições constitucionais, jamais devendo extrapolar os limites que

colocam em risco os direitos fundamentais dos indivíduos. Neste sentido, é de grande

valia ressaltar que todos esses direitos se sustentam no direito à liberdade e igualdade,

pelo que, Nogueira (2008) diz que a tributação não pode ser um instrumento de

submissão do homem, mas de sua plena libertação. E ainda neste sentido assim

Machado (2007) se manifesta sobre o assunto:

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Nos dias atuais, entretanto, já não é razoável admitir-se a relação tributária como relação de poder, e por isto mesmo devem ser rechaçadas as teses autoritaristas. A ideia de liberdade, que preside nos dias atuais a própria concepção do Estado, há de estar presente, sempre, também na relação de tributação.

O tributo não representa apenas um instrumento para a viabilização de

direitos, antes, reflete ainda um dever fundamental, na medida que integra a constituição

do indivíduo e da coletividade. Para Nabais (2004), o imposto não é mera manifestação

do poder público, tampouco apenas um encargo ao indivíduo, mas representa um

“contributo indispensável a uma vida em comum e próspera de todos os membros da

comunidade organizada em estado”.

Dentre as diversas hipóteses de tributação, os impostos incidentes sobre

o consumo é um dos que mais oneram a classe popular (Piketty, 2014), visto que há

uma considerável ineficácia em se agravar o encargo tributário proporcionalmente à

capacidade contributiva real, porquanto o reflexo da capacidade utilizado pelo sistema

tributário é o consumo, sem considerar quem consome e este é um dos problemas

capitais do ICMS. Sobre esta dificuldade em calcular a quantidade de riqueza ostentada

pelo contribuinte, Carvalho (2009) considera que:

Mensurar a possibilidade econômica de contribuir para o erário com o pagamento de tributos é o grande desafio de quantos lidam com esse delicado instrumento de satisfação dos interesses públicos e o modo como é avaliado o grau de refinamento dos vários sistemas de direito tributário.

Os impostos sobre o consumo são conhecidos também como impostos

“indiretos” que segundo Piketty (2014) são assim denominados pois não dependem

diretamente da renda ou do capital do contribuinte, sendo pagos de forma indireta, se

relacionando com o preço de venda. Ele assim considera e segue afirmando que os

impostos diretos e incidentes sobre a renda e sobre o patrimônio tendem a ser mais

justos e progressivos pois demonstram realmente a capacidade econômica e

contributiva de cada cidadão, enquanto a oneração do tipo de consumo demonstrado

pelo contribuinte, por si só, não demonstra a sua posição social, porquanto, diferentes

contribuintes, com poderes econômicos distintos, podem consumir e mesmo produto e

serem onerados em maior ou menor grau em relação à sua capacidade contributiva.

A inconsistência da aferição da capacidade contributiva pelos tributos

indiretos é algo que compõe a inequidade destes impostos. O Conselho (2009) é

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contundente ao frisar o não favorecimento da justiça fiscal por parte dos tributos

indiretos:

Os tributos diretos, incidentes sobre a renda e o patrimônio, favorecem a justiça fiscal à medida que permitem a graduação da carga tributária de acordo com as características socioeconômicas das famílias. Já os tributos indiretos, incidentes sobre o consumo, não oferecem as mesmas possibilidades. Por exemplo, uma pessoa que ganha um salário mínimo, ao adquirir uma geladeira, paga o mesmo montante de impostos que um cidadão com renda mais alta.

Um dos aspectos que inviabilizam a justiça fiscal na incidência do ICMS

é a técnica da seletividade, que segundo ALVES (2012) é muito menos eficaz em termos

distributivos do que a técnica da progressividade. E para Piketty (2014) “O imposto

progressivo exprime de certa forma um compromisso ideal entre justiça social e liberdade

individual. ”. É nesta linha que se posiciona Silveira (2010):

Para que os tributos diretos tenham efeitos distributivos, eles devem ser necessariamente progressivos, ou seja, as alíquotas devem crescer com a renda – que é base de incidência tributária. Ora, isto significa dizer que a tributação progressiva está em conformidade com a noção de capacidade de pagamento. Entretanto, na tributação indireta esta relação não é factível, uma vez que não se consegue pessoalizar – associar o tributo às características socioeconômicas do contribuinte –, pois sua base de incidência é o consumo ou as vendas em geral, aplicando-se alíquotas uniformes sobre as mercadorias. Resta somente a possibilidade de associação entre a renda das famílias e determinados perfis de consumo, ou seja, alguns grupos de produtos têm um peso maior no orçamento, a depender do nível de renda.

A ineficácia da aferição da capacidade contributiva pelo ICMS, resido no

fato de que os bens que compõem a necessidade básica consumidos pela população

com menor capacidade aquisitiva, é também consumido pela população com maior

poder aquisitivo, por tratar-se de produtos básicos. E, neste caso, as diferentes classes

econômicas acabam contribuindo com a mesma alíquota na tributação desses produtos,

sem considerar que, proporcionalmente, suas capacidades são distintas em relação à

renda disponível. Piketty (2014) segue ainda com uma relevante explicação:

Um imposto é progressivo quando sua taxa é mais alta para os mais ricos (aqueles que possuem uma renda, um capital ou um consumo mais elevado terão um imposto progressivo para a renda, o capital ou o consumo) e mais baixa para os mais humildes. Um imposto pode ser também regressivo, quando a taxa diminui para os mais ricos, seja porque eles conseguem escapar em parte ao regime normal (legalmente, por otimização fiscal, ou ilegalmente, por evasão) ou porque o regime normal prevê que o imposto seja regressivo.

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Esta seletividade cogente sobre o ICMS, é o modo utilizado pelo

ordenamento jurídico para realizar o princípio da capacidade contributiva, com a

finalidade de fazer do imposto um indutor de justiça social. Contudo, a eficácia destas

medidas tem refletido em questionamentos sobre se o ICMS tem mesmo atenuado as

desigualdades e funcionado como instrumento de redistribuição de renda e custeamento

de serviço público de qualidade. É neste sentido que o Conselho (2009) se posiciona

quanto ao sistema de arrecadação:

A questão é saber qual deve ser o tamanho da contribuição de cada indivíduo. Um princípio norteador é o da equidade, segundo o qual o ônus fiscal deve ser distribuído de maneira progressiva: aqueles que contam com maior nível de rendimento e estoque de riquezas devem contribuir proporcionalmente mais com o pagamento de tributos. Uma vez respeitado este princípio, o sistema de arrecadação, além de fornecer ao Estado os recursos necessários para a execução das políticas públicas, pode se converter em um poderoso instrumento de redistribuição de renda.

Outro ponto considerado deficiente em relação ao imposto incidente sobre

mercadorias e serviços é quanto à sua progressividade, princípio tributário que

estabelece a elevação gradativa das alíquotas em relação à capacidade econômica do

contribuinte. Não são poucos os estudos que demonstram que, ao contrário do que

propõe a progressividade da alíquota, o imposto tem sido mais oneroso para a parcela

com menor capacidade contributiva, onde o imposto tem alcançado mais pesadamente

a sua renda do que aos que possuem maior poder econômico. Confirmando tal

afirmação, assim se manifesta o IPEA (2009):

Não se deveria impor aos cidadãos de menor capacidade econômica [...] o mesmo esforço tributário exigido dos cidadãos de maior capacidade econômica. Nesse sentido, o sistema tributário deve buscar a progressividade – tributar mais os ricos do que os pobres [...]. Supondo, apenas para simplificar o raciocínio, que a regressividade no período não piorou nem recuou, mas apenas manteve-se a mesma, então poder-se-ia considerar que o ônus sofrido em cada faixa de renda também teve que crescer no mesmo ritmo. Ou seja, é provável que, se em 2004 a Carga Tributário Bruta sobre os que ganhavam até 2 s.m. foi de 48,8% da renda, em 2008 pode ter chegado aos 54%. Enquanto que, mantidas as proporções, os que ganham acima de 30 s.m. podem ter enfrentado em 2008 uma carga de 29%.

A regressividade é uma disfunção do sistema tributário é um dos fatores

responsáveis pela concentração de renda nacional e por este motivo, é prejudicial a um

estado fiscal justo e democrático, o que, segundo Piketty (2014) é uma ameaça à um

provável retorno de uma enorme concentração de capital. Sobre a regressividade, assim

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a define Maria (2010) “um tributo é regressivo quando guarda uma relação inversa com

o nível de renda do contribuinte. Na medida em sua renda aumenta, ele recolhe

relativamente menos. Portanto, eles prejudicam mais os contribuintes de menor poder

aquisitivo. ”

Muito embora a tributação progressiva sobre o consumo não seja de

simples exeqüibilidade, é o instrumento previsto pela constituição para a gradação do

imposto, sendo esta o mecanismo mais moral e equânime. Neste sentido, importante se

faz a colocação de Derzi e Almeida (2016):

...a progressividade do sistema tributário é imposição constitucional, e toda a produção de normas tributárias no direito brasileiro deve ser direcionada para atingir de forma mais agressiva a capacidade econômica da ínfima parcela componente da camada mais rica da população, e não o aumento da pressão tributária sobre as camadas componentes das classes de média e baixa renda. A ideia central é de que, após a tributação, a diminuição da renda disponível dos mais ricos seja progressivamente superior à diminuição da renda disponível das camadas mais pobres.

A ideia de progressão sobre oneração do consumo não deixa de ser uma

presunção, onde o sistema tributário, pressupõe que, um dado tipo de produto será

consumido por uma determinada classe e que em razão disso, se faz justa uma dada

alíquota. Todavia, presunções não são instrumentos seguros para a execução de justiça

fiscal. Contudo, demonstra-se totalmente incoerente ao princípio da igualdade e da

progressividade, onde é necessária a aferição da capacidade contributiva para a

modulação do tributo e, segundo Tipke (2002), uma séria avaliação da capacidade

econômica é fundamental para um direito tributário justo, possuindo um peso real e não

apenas hipotético, entendendo, pois, que presunções deste tipo são inconstitucionais.

Seguindo esta razão, oportuna é a colocação de Derzi e Almeida (2016):

...a presunção simplificadora que pressiona a incidência tributária para um nível inferior de riqueza que poderia ser captado termina por resultar em tributação regressiva. Quanto mais a riqueza do contribuinte se distancia da riqueza presumida maior será a regressividade, pois tanto o contribuinte que supera a presunção quanto aquele que apresenta uma riqueza próxima daquela presumida terão a mesma carga tributária decorrente da medida simplificadora.

Além dos problemas relacionados à má distributividade do encargo

tributário, o Conselho de Desenvolvimento Econômico de Social (2009), destaca outra

difícil questão pertinente ao sistema brasileiro de tributação que se refere ao baixo

retorno social sob a forma de provisão de bens e serviços essenciais. A atuação estatal

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deve devolver à coletividade a boa aplicação do tributo recolhido de modo a custear os

direitos e benefícios sociais, porquanto o poder público funciona como um administrador

fiscal à serviço da comunidade. Deste modo, a atuação do Estado deve ser pautada em

cobranças de modo equitativo a promover justiça fiscal (redistribuição de renda) e ao

mesmo tempo patrocinar direitos individuais e coletivos.

Apesar das críticas à oneração exacerbada da população de baixo poder

econômico, não se pretende que esta parcela deixe de exercer sua cidadania fiscal e de

contribuir para o custeio do serviço público visto que o tributo também deve reverberar

sobre os propósitos do Estado para a condição coletiva, outrossim, busca-se tão

somente que a contribuição seja equitativa, proporcional à capacidade contributiva de

cada indivíduo, de modo a funcionar verdadeiramente como instrumento de justiça fiscal

e atenuante das desigualdades sociais e regionais. Neste contexto, adequadamente de

manifesta Maria (2010):

...entre 1996 e 2003 a carga tributária foi maior e cresceu mais aceleradamente para os mais pobres do que para os mais ricos. Esta carga tributária é regressiva. As classes de menor poder aquisitivo financiam relativamente mais o Estado Brasileiro, com a população de baixa renda suportando uma elevada tributação indireta.

A cidadania tributária se consubstancia na consciência coletiva da

necessidade da contribuição para a satisfação de direitos fundamentais para

contemplação dos seus próprios interesses. E nestes termos, pode ser explicada como

a “conscientização do cidadão para o fato de que a necessária arrecadação de tributos

deve reverter-se em benefícios que cumpram o papel de atender às necessidades da

coletividade, reduzindo distâncias sociais” (Conselho, 2009). Outrossim, todos os

princípios limitadores ao estado possuem a finalidade de impedir que o custeio da coisa

pública venha onerar tão pesadamente o contribuinte, de modo que, inviabilize a sua via

privada e o seu próprio sustento.

Em suma, no tratamento da questão da equidade tributária, deve-se

perceber o seu vínculo tanto com a instrumentalização do imposto como meio de

redistribuição de renda, como a sua conexão com os gastos públicos, especialmente os

destinados a custear os serviços públicos. Silveira (2010) assim se expressa sobre este

duplo função do imposto:

A métrica da equidade é dada pela consonância entre o montante dos impostos pagos e os serviços recebidos, o que implica dizer que ela não depende somente da estrutura tributária, mas também de sua associação à estrutura dos gastos governamentais.

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3.2 PARTICIPAÇÃO DO ICMS NA ECONOMIA: UMA ANÁLISE SOBRE O ICMS O

PIB E A SUA RELAÇÃO COM O IDH NOS ESTADOS BRASILEIROS.

O ICMS é um imposto de caráter predominantemente fiscal, considerando

que, “não existe, entidade tributária que se possa dizer pura, no sentido de realizar tão

só a fiscalidade, ou, unicamente, a extrafiscalidade” (CARVALHO, 2009). Por esta razão,

o ICMS possui, como finalidade precípua, a arrecadação de finanças para composição

erário, viabilizando o custeio dos serviços públicos e o patrocínio de direitos. É neste

contexto que Machado (2007) esclarece que “o tributo é instrumento de transferência de

recursos financeiros do setor privado para o Estado. ” Sobre a fiscalidade, Carvalho

(2009) ainda explica que: Fala- -se, assim, em fiscalidade sempre que a organização jurídica do tributo denuncie que os objetivos que presidiram sua instituição, ou que governam certos aspectos da sua estrutura, estejam voltados ao fim exclusivo de abastecer os cofres públicos, sem que outros interesses — sociais, políticos ou econômicos — interfiram no direcionamento da atividade impositiva.

No caso do ICMS, a arrecadação está totalmente vinculada às operações

privadas, porquanto sua incidência está condicionada à circulação de mercadorias e

serviços. Deste modo, o ICMS possui uma significativa participação no produto interno

bruto (PIB) do Estado onde é arrecadado, implicando ainda, no PIB de dimensão

nacional. Pelo que, neste sentido são as palavras de Ellery e Nascimento (2017):

O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) é a principal fonte de financiamento dos estados brasileiros; nos últimos dez anos, a arrecadação total do ICMS foi de aproximadamente 7% do produto interno bruto (PIB) brasileiro.

Para análise das possíveis intervenções que o ICMS poderia causar na

economia, foram colhidos dados referentes à arrecadação total do ICMS por estado, a

quantificação da arrecadação do ICMS per capta, o ICMS em relação ao PIB de cada

unidade federativa, a arrecadação do ICMS em dimensão nacional, e por fim, o índice

de desenvolvimento humano de cada Estado (IDH), todo no período compreendido entre

2011 e 2015, onde a hipótese do estudo consiste na relação do ICMS com o

desenvolvimento econômico do estado e com o IDHM. Apesar de não haver

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constatações precisas sobre o perfil do desenvolvimento de cada estado em relação à

arrecadação do ICMS, serão feitas algumas conjecturas sobre os elementos constantes

nos dados levantados.

O IDH, índice de desenvolvimento humano utilizado no estudo, segundo

o Programa das Nações Unidas Para o Desenvolvimento – PNUD, consiste em “uma

medida resumida do progresso a longo prazo em três dimensões básicas do

desenvolvimento humano: renda, educação e saúde. ” Este índice foi criado por Mahbub

ul Haq com a colaboração do economista indiano Amartya Sen, com a pretensão de criar

um índice que seja uma medida geral, sintética, do desenvolvimento humano. Neste

contexto, segundo o PNUD (2013):

O IDH representa um índice-chave dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio das Nações Unidas e, no Brasil, tem sido utilizado pelo governo federal e por administrações regionais através do Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M).

O IDHM por sua vez, segundo o PNUD, representa “uma medida

composta de indicadores de três dimensões do desenvolvimento humano: longevidade,

educação e renda. O índice varia de 0 a 1. Quanto mais próximo de 1, maior o

desenvolvimento humano.” Este índice é composto por três dimensões do

desenvolvimento humano que são agrupados por meio da média geométrica, sendo

estes os elementos analisados: saúde, educação e renda (PNUD 2013).

Imagem 1: Dados calculados a partir da média de séries históricas referentes ao período 2011-2015. Fonte: Boletim de arrecadação do Conselho Nacional de Fazendo Pública – CONFAZ e IBGE.

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Ao verificar a planilha acima, constata-se que, em alguns estados, o IDHM

não acompanha o aumento do ICMS/PIB, havendo uma desproporção em relação aos

outros estados. É o que ocorre por exemplo nos estados do Amapá e Rondônia, onde o

ICMS/PIB correspondem a 23,58% e 24,68% respectivamente e possuem maior

arrecadação de ICMS per capta, contudo, possuem IDHM similares à média dos outros

estados, não importando deste modo, em maior IDHM por conta deste fator.

O IDHM mais elevado é o do Distrito Federal, que, no entanto, não é o

estado de maior arrecadação de ICMS, sendo esta posição ocupada por São Paulo,

Minas Gerais e Rio de Janeiro. O estado do Amazonas por sua vez, é o que ostenta

situação mais discrepante em relação aos outros estados. Apesar de ser o segundo

estado de menor arrecadação de ICMS (perdendo apenas para Roraima) e possuir o

menor ICMS/PIB e menor arrecadação ICMS per capta, não é o estado de menor IDHM,

posição ocupada pelo estado de Alagoas. Ressalte-se que, o Amazonas é o estado onde

o ICMS menos contribui para o PIB nacional, sendo insignificante em relação à

contribuição das outras unidades federativas.

Imagem 2: Arrecadação de ICMS per capta. Fonte: Boletim de arrecadação do Conselho Nacional de Fazendo Pública – CONFAZ.

Em contraposição ao estado do Amazonas que possui a menor

arrecadação per capta de ICMS, sendo quase dez vezes menor do que a média nacional,

o estado de Rondônia representa o maior recolhimento do imposto por contribuinte,

exorbitando em mais que o dobro da média do país. Merecendo atenção o fato de que

ambos estados pertencem à região norte, contudo, possuem diferenças expressivas,

ocupando os pontos extremos no quesito arrecadação.

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Na região Sul, a maior arrecadação total de ICMS está para o estado do

Rio grande do Sul, possuindo ainda, maior influência do ICMS no PIB estadual e

nacional. Entretanto, apesar de Santa Catarina ser o estado desta região com menor

arrecadação de ICMS, a arrecadação per capta é a mais elevada em comparação ao

Rio Grande do Sul e Paraná, e ainda, possui o maior IDHM desta região, o que

demonstra que não necessariamente a elevação de arrecadação de ICMS está

vinculado em todos os casos ao IDHM. Senão, vejamos o gráfico abaixo:

Imagem 3: Dados calculados a partir da média de séries históricas referentes ao período 2011-2015. Fonte: Boletim de arrecadação do Conselho Nacional de Fazendo Pública – CONFAZ.

No Centro Oeste, pode se notar que o Distrito Federal, apesar de ser o

IDHM mais alto na esfera nacional, demonstra uma baixa influência ICMS no PIB

nacional em comparação aos outros estados da sua região, correspondente à metade

do valor da média nacional, contudo, possui uma elevada contribuição per capta de

ICMS. O estado de Goiás por sua vez, evidencia a mais alta arrecadação do imposto na

sua região, possuindo ainda, uma contribuição per capta, bem como uma influência do

imposto no PIB do Brasil, acima da média nacional. O Mato Grosso possui uma baixa

arrecadação e a contribuição per capta supera a média nacional, sendo que, a

contribuição do ICMS deste estado no PIB nacional supera a média. E por último, o Mato

Grosso do Sul, possui uma baixa arrecadação, contudo, demonstra alta contribuição per

capta e uma elevada influencia no PIB nacional.

Os estados pertencentes à região sudeste, como já dito, são os que mais

arrecadam à título de ICMS, exceto o estado do Espírito Santo que se distancia

significativamente dos valores coletados pelos demais estados do Sudeste. Todavia, o

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IDHM do Espírito Santo acompanha a média de São Paulo e Rio de Janeiro e chega a

superar o IDHM de Minas Gerais.

Na região Nordeste, Sergipe é o estado que menos arrecada de ICMS,

porém, isto não induziu em nada no seu IDHM, visto que o estado de IDHM mais baixo

da região é o estado de Alagoas. O Maranhão, muito embora não seja o estão que menos

arrecada o imposto, é o estado de menor contribuição de ICMS per capta da região,

chegando à um número aproximadamente três vezes menor do que a média nacional.

No quesito arrecadação per capta de ICMS, no Nordeste, o Pernambuco é o estado que

se destaca. Quanto à arrecadação total, o estado da Bahia supera todos os outros

estados nordestinos, no entanto, o IDHM mais elevado da região é o do Rio Grande do

Norte.

Sobre os aspectos analisados, cabe tecer algumas considerações.

Inicialmente, a média da intervenção do ICMS no PIB nacional é de 6,83%, e percebe-

se que os estados que possuem diferença de acima de 0,5% para menos ou para mais,

são considerados uma exceção destoante ao cenário nacional, que é o caso dos estados

do Amazonas, Distrito Federal, Rio de Janeiro, Roraima e Pará. Importante salientar que

as diferenças são ainda mais discrepantes quando se observa que se tratam de estados

de diferentes regiões e com diferentes arrecadações de ICMS.

Outro ponto que merece atenção é quanto à influência da arrecadação

per capta de ICMS e a influência do imposto no PIB, que em alguns estados se percebe

que, quanto menos se eleva a influência do ICMS no PIB, mais há uma elevação do

IDHM em comparação aos outros, circunstância que se percebe nos estados do

Amazonas, Distrito Federal, Rio de Janeiro, Pará e Paraná, que inclusive, demonstram

uma interferência no PIB abaixo da média nacional.

Imagem 4: Arrecadação de ICMS per capta. Fonte: Boletim de arrecadação do Conselho Nacional de Fazendo Pública – CONFAZ.

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Por outro lado, apesar de este não ser um indício preciso para apontar a

causa da desigualdade, nota-se que, em alguns casos, quanto menor o IDHM, mais a

contribuição per capta do ICMS se distancia da média nacional, situação nítida nos

estados de Alagoas, Maranhão, Pará e Piauí, devendo levar-se em conta, no entanto, a

situação singular do estado do Amazonas que, apesar de apresentar uma contribuição

per capta de ICMS muito inferior à média nacional, não é o estado de menor IDHM.

Neste sentido, percebe-se a Influência da arrecadação per capta do

imposto e da sua intervenção no PIB sob o desenvolvimento humano regional. Em outro

passo, constata-se que o valor nominal arrecadado de ICMS não tem qualquer relação

com o IDHM. No entanto, quando a contribuição per capta do imposto é muito alta, há

uma tendência para a produção de desigualdade. É nesta conjuntura que a suposição

de que um estado com uma pesada contribuição per capta deste imposto indireto, tende

à inequidade fiscal, demonstrando o seu caráter regressivo.

Ainda sobre os aspectos de desenvolvimento, interessa fazer algumas

observações sobre o quesito renda que compõe a análise do IDHM. A renda per capta

de cada estado também é um fator hábil para análise das desigualdades regionais se

avaliada em conjunto com os dados acima apresentados, possibilitando analisar as

possíveis inequidades do ICMS. Neste aspecto, cabível o comentário do PNUD (2013): Internamente, o país ainda apresenta, hoje, grandes desigualdades. São vários Brasis dentro do Brasil. É possível encontrar municípios em que a renda per capita mensal é de aproximadamente R$ 1.700,00, e outros em que o cidadão ganha, em média, cerca de R$ 210,00. [...] Dentre eles, São Caetano do Sul (SP) é o município brasileiro que possui o maior IDHM Renda (0,891), que equivale a R$ 2.043,74 da renda per capita. Niterói (RJ) (0,887), Vitória (ES) (0,876) e Santana do Parnaíba (SP) (0,876), completam os maiores IDHM Renda do país. O IDHM Renda mais baixo foi observado em Marajá do Sena (MA) (0,400), o que correspondia a R$ 96,25 de renda per capita. Fernando Falcão (0,417), Belágua (0,417) e Cachoeira Grande (0,422), todos eles municípios maranhenses, completam a relação de municípios com os menores IDHM Renda do país.

Partindo por um critério regional, o PNUD (2013) afirma que na Região

Norte, somente 15 municípios estão no grupo dos municípios brasileiros com os maiores

IDHM Renda, e outros 16 estão no segundo grupo que possui um IDHM de 0,717 a

0,679. Os 93% dos municípios restantes estão bem abaixo desta média. Sendo que, os

mais elevados IDHM Renda da Região Norte foram observados em Palmas (TO), Porto

Velho (RO), Paraíso do Tocantins (TO) e Belém (PA).

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A Região Nordeste, por sua vez, segundo a mesma fonte, possui 925

municípios com os mais baixos IDHM Renda do Brasil. Somente 14 municípios da

Região Nordeste, encontram-se dentre os municípios brasileiros com os maiores IDHM

Renda do país, os quais estão localizados em Recife (PE), Aracajú (SE), Cabedelo (PE),

Fernando de Noronha (PE) e Lauro de Freitas (BA), o que corresponde a valores que

vão de uma renda per capita de R$1.144,26 no Recife a R$1.031,78, em Lauro de

Freitas. No entanto, nesta região apenas 12 municípios apresentam IDHM Renda acima

da média do Brasil, que é de 0,739, sendo que, o Estado do Maranhão tem os municípios

com os mais baixos IDHM Renda em dimensão nacional.

No Centro Oeste, apenas um município de toda a região, Japorã, se

encontra no grupo dos municípios brasileiros com o menor IDHM Renda do Brasil. Por

outro lado, 90 municípios da região, encontram-se no grupo de IDHM Renda mais

elevados do país. Os maiores IDHM Renda desta região são encontrados em Brasília

(DF), Goiânia (GO), Campos de Júlio (MT) e Cuiabá (MT), com valores de renda per

capita que variam de R$1.715,11, em Brasília, a R$1.161,49, para Cuiabá.

A Região Sudeste apresenta ao todo 445 municípios entre os mais altos

IDHM Renda do país. Sendo que, boa parte desses municípios estão localizados no

Estado de São Paulo e no Triângulo Mineiro. Em contrapartida, 45 municípios da região

estão entre os piores IDHM Renda do país. Ao passo que, os maiores IDHM Renda da

região correspondem aos mesmos municípios que possuem o maior IDHM Renda no

país: São Caetano do Sul (SP), Niterói (RJ), Vitória (ES) e Santana de Parnaíba (SP).

Na Região Sul, não apresenta nenhum município no grupo dos de menor

IDHM Renda no Brasil. Trata-se, na verdade, da região que apresenta maior percentual

de municípios com IDHM Renda elevado no país. Deste modo, aproximadamente 80%

dos municípios sulistas estão entre os municípios de mais elevada renda per capita do

país. Os maiores IDHM Renda da região são encontrados em Florianópolis (SC), Porto

Alegre (RS), Balneário Camburiú (SC) e Curitiba (PR), com valores de renda per capita

que chegam a R$1.798,12, em Florianópolis, e R$1.581,04, em Curitiba.

Todos estes dados possuem o intento de destacar as desigualdades

regionais do país e demonstrar a pouca eficiência da função do imposto de atuar

instrumento de redistribuição de renda nacional no atual sistema tributário. Ademais,

busca-se levar em conta ainda não apenas as diferenças inter-regionais, que

demonstram a pouca eficácia do objetivo fundamental de redução das desigualdades

regionais constante artigo 3º, inciso III da CF, mas também, lançar enfoque sobre as

desigualdades dos contribuintes dentro da mesma região, da mesma unidade federativa

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e que arcam com a mesma alíquota de impostos, situação que se agrava ainda mais

quando pensada no campo dos produtos básicos de sobrevivência, onde pessoas de

baixa renda e baixo desenvolvimento arcam com o mesmo ônus das superdesenvolvidas

e é este o cenário de inequidade fiscal.

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4 CAPÍTULO III – INEQUIDADE FISCAL

A equidade fiscal envolve tanto a isonomia na modulação da participação

do custeio do gasto público como na destinação dos benefícios e serviços públicos,

levando-se em conta a necessidade de atender aos direitos fundamentais daqueles que

não possuem fundos para garantir de modo privado uma vida digna com atenção à

saúde, educação entre outros. Neste sentido, Machado (2007) afirma que “a equidade é

a justiça no caso concreto”.

Uma das causas que tem levado à configuração da inequidade tributária,

ou seja, a ausência de equidade e justiça fiscal, é a alta tributação do consumo, que tem

onerado demasiadamente aos contribuintes muito além da sua capacidade contributiva.

Outro aspecto da inequidade fiscal é a disparidade das contribuições em

relação aos seus contribuintes, considerando a realidade de cada estado. Como

demonstrado, há regiões onde as rendas per captas possuem profundas desigualdades,

o que demonstra que as capacidades contributivas são consideravelmente diferentes,

não podendo haver equivalência de imposto sobre o consumo para esses indivíduos

quando consume produtos básicos, que, incontestavelmente fazem parte da rotina

básica de qualquer pessoa. Assim se manifesta Silveira (2010):

Sem dúvida, a atual composição da carga tributária bruta brasileira tem consequências desfavoráveis sobre aspectos desejáveis do ponto de vista econômico e social, visto que esta não se coaduna com os princípios da equidade, da competitividade e da neutralidade, que devem servir de orientação para um sistema tributário mais justo e racional.

A regressividade do ICMS é o principal fator de inequidade deste tributo,

em razão de que, por ser o ICMS um imposto indireto, termina em muito extrapolando à

real capacidade contributiva do indivíduo, favorecendo o empobrecimento desta classe

e favorecendo a concentração de renda. Segundo análise feita por Ribeiro (2010), “os

tributos de maior regressividade, medida em termos da concentração da renda

disponível, foram o ICMS, o IPI e o agregado PIS/COFINS”. E ainda considera que:

...os tributos indiretos mostraram-se regressivos em relação à renda líquida (isto é, a renda bruta familiar descontada a carga de tributos diretos). Para as famílias que ganhavam até dois salários mínimos, o total da carga indireta estava em torno de 27% da renda líquida. Nas famílias cujos recebimentos médios superavam 30 salários mínimos, os tributos indiretos representaram pouco mais de 7% de suas rendas líquidas. Assim, em seu conjunto, as evidências apontaram um caráter regressivo para uma parcela considerável da carga tributária bruta em 1995e 1996,

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o que contribuiria para a manutenção dos níveis de desigualdade de renda e pobreza observados no país naquele período. Outra faceta da regressividade dos tributos foi a evidência de que, sob o ponto de vista da origem dos recebimentos, as famílias assalariadas suportavam maior carga fiscal em relação às famílias cujos rendimentos principais eram provenientes de outras fontes (como o trabalho por conta própria, rendas de aluguéis e aplicações de capital e transferências).

A análise da progressividade ou da regressividade da carga tributária

bruta vão muito além de se verificar a participação dos tributos diretos e indiretos no total

das receitas arrecadadas (RIBEIRO, 2010). Ante esta perspectiva, a inequidade do

ICMS é exprimida na condição de, tratar contribuintes desiguais de maneira igual, ferindo

ao princípio da isonomia.

A finalidade da equidade é projetar-se como um sentido superior de

justiça e orientar não apenas o sistema tributário, mas todo o ordenamento, para a

construção de igualdade. É neste sentido que, o IPEA (2011) realizou um estudo no

lapso 2002-2003 e 2008-2009, e observou que, o redirecionamento do gasto social para

a parcela da população de renda mais baixa se aprofundou nos últimos anos.

Com fundamento na análise de dados do índice Gini e de outros aspectos

de desenvolvimento e de acesso à direitos básicos relacionados à qualidade de vida, o

IPEA (2011) demonstra uma tendência redistributiva na atuação do Estado brasileiro na

tentativa de atenuar as desigualdades causadas pela regressividade tributária através

de um gasto social direcionado ao atendimento e assistência desses contribuintes:

...a regressividade do sistema tributário (gerador de desigualdades) tem sido compensada pela progressividade do gasto social, notadamente os com educação e saúde públicas e as despesas previdenciária e assistencial. [...] os dados apontam que a ação do Estado na arrecadação e no gasto social tem importante impacto distributivo, em que se destacam positivamente a previdência social do regime geral (INSS), a educação e saúde públicas e a assistência social. Duas “parcelas" da renda, no entanto, apresentam perfis regressivos: de um lado, os tributos indiretos, com grande peso na renda... ...Apesar da regressividade na arrecadação tributária, o Estado tem procurado compensar essa deficiência com a redistribuição de recursos públicos para as camadas da população que mais pagam os impostos, especialmente durante os últimos anos. A regressividade da tributação indireta nas camadas pobres e intermediárias de renda é contrabalançada por recursos proporcionalmente maiores das políticas sociais.

Muito embora o IPEA tente demonstrar com este estudo que o problema

da injustiça tributária está sendo contornada com maior fomento da justiça social, deve

levar-se em conta que ele continua sendo injusto e que isso já é um fato incontroverso e

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que demanda correção do estado no ponto específico do problema e não apenas

tentativas de medidas para contornar ou compensar esta injustiça. Neste espeque, o

Conselho (2009) se posiciona:

Embora avancemos aumentando as coberturas das políticas públicas para o acesso dos cidadãos ao conjunto de seus direitos, isto não se expressa necessariamente na redução da distância entre os que mais têm oportunidades e os que têm menos. Aumentar as oportunidades para os que menos têm produz um resultado social que demonstra justiça na distribuição das riquezas produzidas pelo conjunto da sociedade.

Uma tributação iníqua e que sobrecarrega a renda da classe mais pobre

sempre será um problema social que só será corrigido por equilíbrio, proporcionalidade

e equidade na cobrança dos impostos, visto que, o custeio dos direitos deve estar

alinhado com a capacidade contributiva de cada indivíduo, e por mais que o Estado se

esmere na prestação de serviços, o contribuinte ainda deve estar obrigado a contribuir

apenas com o que for correspondente à sua capacidade.

O Conselho (2009) em seu relatório, afirma que no Brasil, quem ganha

até dois salários-mínimos paga 48,8% da sua renda em tributos. Quem ganha acima de

30 salários mínimos, paga 26,3% da sua renda em tributos. E esta é uma situação que

não pode ser corrigida apenas pelo direcionamento dos recursos públicos em

atendimento às necessidades da classe mais pobre, até porque, essa já é uma obrigação

do Estado e não se pode sacrificar a renda dos que menos tem em favor do custeamento

de direitos, pois deste modo, fica prejudicada a redistribuição de renda.

Menos otimista do que os dados trazidos pelo IPEA (2011), o Conselho

(2009) elenca alguns fatores que evidenciam a injustiça do sistema tributário, dentre eles,

o fato de o sistema ser regressivo e a carga tributária ser mal distribuída, de o retorno

social em relação à carga tributária é baixo e ainda, que inexiste cidadania tributária. É

neste sentido que a Câmara dos Deputados (2012) através da sua Comissão de

Finanças e Tributação se manifesta:

O sistema tributário pode e deve ser utilizado como instrumento de distribuição de renda, redução da pobreza e redistribuição de riqueza, pois, afinal, os recursos arrecadados junto à sociedade, via tributos, revertem em seu próprio benefício. Isto se faz via gastos sociais e também via tributação, cobrando mais impostos de quem tem mais capacidade contributiva e aliviando o peso dos mais pobres.

A tributação do consumo, como já é incontroverso, é um modelo de tributo

que pouco favorece a redistribuição de renda e que muitas vezes não alcança o

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consumidor em sua real capacidade contributiva, onerando em excesso classes que

deveriam ser protegidas da mão ambiciosa do estado, visto que, o tributo deve compor

o sentido de cidadania fiscal e não uma atribuição de um ônus insuportável ao

contribuinte. Confirmando tais colocações, são as palavras da Câmara dos Deputados

(2012) através da sua Comissão de Finanças e Tributação:

A tributação deve ser preferencialmente direta, de caráter pessoal e progressivo. Assim sendo, ela alcança a justiça social por meio de tratamento tributário equânime. [...] Tributos progressivos e diretos são preferíveis aos regressivos e indiretos por razões de neutralidade, eficiência e equidade. Tributo eficiente é aquele que não gera distorções no comportamento dos agentes econômicos quanto à alocação de recursos.

Os impostos de caráter meramente fiscais deveriam incidir

majoritariamente sobre a renda e sobre o patrimônio, que são de fato indicadores de

riqueza, e por outro lado, mitigando a tributação do consumo de modo a, possivelmente

até isentar os alimentos e produtos de primeira necessidade, que ao serem consumidos

não são capazes de indicar qualquer perfil de capacidade contributiva, visto que tratam

se de produtos de necessidade comum a todos os indivíduos. Neste esteio, imperioso o

comentário:

A carga de tributos sobre a renda é relativamente baixa, especialmente a do incidente sobre pessoas físicas, o mesmo podendo ser dito a respeito dos impostos sobre o patrimônio. [...] Além da participação da tributação da renda ser baixa no Brasil, ela se concentra nas pessoas jurídicas, o que afeta negativamente a competitividade dos produtores nacionais. O nível da tributação de pessoas físicas, reconhecidamente superior à de pessoas jurídicas seja em termos de eqüidade seja por seus efeitos econômicos, é extremamente baixo em comparação com padrões internacionais. (VARSANO; PESSOA, SILVA, AMORIM E RAIMUNDO, 1998)

O fato de a tributação sobre o consumo ser considerada exorbitante não

é uma questão nova, a muito tempo já se levantam dados sobre tais excessos e se

ressalta a necessidade de uma reforma tributária para reformulação deste imposto de

modo a redistribuir o ônus do consumo de forma mais equânime, fazendo com que esta

incida mais pesadamente em situações que claramente de tratem de uma demonstração

de um perfil econômico privilegiado. Vejamos o que Almeida (1995) destacou ainda na

década de 90, demonstrando que o problema do excesso da oneração do consumo já é

um problema que a muito persiste no Brasil:

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A tributação sobre o consumo no Brasil tem sido considerada excessiva. A imprensa divulgou, em agosto de 1994, o estudo desenvolvido pela Receita Federal comparando a estrutura tributária brasileira com a de sete países industrializados. Segundo o estudo, a tributação sobre o consumo em nosso país corresponde a 16,8 do PIB, significativamente superior às do EUA (5,5%), do Japão (5,3%) e da Alemanha (14,7%).

Quanto a seletividade do imposto como instrumento suficiente e eficaz

para a produção de progressividade no ICMS, segundo Rezende (1993), trata-se de um

discurso que não prospera, porquanto, o que se percebe é o constante aumento da

regressividade dos tributos incidentes sobre o consumo, decorrente de um elevado peso

de ICMS exercido sobre componente da cesta básica. Ainda destaca Rezende 1993),

que em um dado momento, as recomendações de política tributária, passaram a sugerir

a elevação da tributação sobre o consumo, como fonte de receita tributária, o que fez

com que o sistema tributário evidenciasse ainda mais a inequidade desta tributação.

Dar prioridade a instrumentos realizadores da equidade não resolverá

apenas uma questão fiscal, mas principalmente a questão social e econômica.

Considere-se ainda que esse tratamento diferenciado não deve ser restrito apenas às

pessoas físicas, mas estende-se ainda aos microempresários e as empresas de

pequeno porte, as quais também fazem jus a um tratamento diferenciado com vistas à

isonomia em relação às grandes empresas:

A equidade tributária resulta em redistribuição de renda, aumento da competitividade dos negócios, aquecimento da economia ampliando o poder de compra das populações mais pobres e o desenvolvimento do país. (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2012).

Ao pensar na equidade fiscal e consequentemente social, deve-se

considerar tanto a igualdade do indivíduo em relação a outro indivíduo, como também a

diminuição das desigualdades de região para região, em atendimento da constituição,

propiciando iguais condições de crescimento, o que garantirá um maior equilíbrio

socioeconômico do país. Consonantes com essa afirmação, são as palavras de Paes e

Siqueira (2008) que reconhecem que a existência de profundas desigualdades regionais

possui influência negativa sobre o desenvolvimento do país e sobre o bem-estar da sua

população, sendo um equívoco qualquer posição que despeje sua crença apenas no

mercado como elemento suficiente para induzir um processo de desenvolvimento e

superação das desigualdades regionais, porquanto a atuação do Estado é de extrema

relevância para superação dessas assimetrias.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do conteúdo abordado no presente trabalho, tem-se que,

inicialmente, foram tecidas as mais importantes características do ICMS, a fim de

possibilitar uma compreensão geral sobre o mesmo quanto à sua formulação, princípios

aplicáveis e demais desdobramentos.

Em poucas palavras, o ICMS é um imposto indireto, instituído por lei

estadual, vinculado a observância dos princípios da capacidade contributiva e da

seletividade, devendo ser ainda proporcional e progressivo, não cumulativo e ainda,

atender aos requisitos que proíbem a surpresa tributária, com o fito de ser ferramenta

para desconcentração de renda e majoritariamente arrecadatório, de modo a custear os

serviços públicos.

Geridos os principais aspectos do imposto, iniciou-se uma análise mais

específica dos reais aspectos do ICMS, a fim de fundamentar a ideia central do estudo

sobre a regressividade do imposto e a sua incapacidade de sofrer justa modulação em

respeito ao princípio da capacidade contributiva.

O desígnio maior do trabalho foi de apontar os aspectos mais críticos do

imposto que acabam por lhe fazer um difusor de desigualdade e injustiça fiscal,

rompendo totalmente com a finalidade para qual foi criado, alargando as desigualdades

regionais, sendo um expediente ineficaz de desconcentração de renda e incoerente com

a ideia de cidadania fiscal.

Com o subsídio dos dados relativos à arrecadação total do imposto em

cada estado, a contribuição per capta de ICMS, a influência do ICMS no PIB nacional, o

reflexo do ICMS na arrecadação nacional, e a relação do ICMS com o Índice de

Desenvolvimento Humano – IDH, referentes ao período compreendido entre 2011 e

2015, que permitiu a demonstração em números da proporção das desigualdades

regionais.

Apesar de não haver constatações precisas sobre o perfil do

desenvolvimento de cada estado em relação à arrecadação do ICMS, foram feitas

algumas conjecturas sobre os elementos constantes nos dados levantados onde a

hipótese do estudo foi confirmada de modo a permitir a conclusão de que há uma relação

do ICMS com o desenvolvimento econômico do estado e com o desenvolvimento

regional, bem como, concretizou a hipótese de regressividade do imposto,

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demonstrando a necessidade de minimizar esse problema quanto às condições pessoais

de cada contribuinte, bem como entre as regiões do país.

Após a análise desses dados, não foi de difícil percepção a ineficácia da

aferição da capacidade contributiva pelo ICMS, porquanto, os bens que compõem a

necessidade básica de qualquer indivíduo são onerados de forma igual, sem considerar

o perfil econômico de quem consome, fazendo com que os contribuintes de baixa

capacidade econômica sejam onerados mais pesadamente do que outros contribuintes

mais privilegiados. Neste caso, impor a mesma alíquota de imposto para contribuintes

diversos e que possuem renda profundamente distantes, é clara situação de inequidade

e regressividade tributária.

Por meio da apreciação desses dados, notou-se a Influência da

arrecadação per capta do imposto e da sua intervenção no PIB sob o desenvolvimento

humano regional, que por um lado, permitiu constara que o valor nominal arrecadado de

ICMS não tem qualquer relação com o IDHM, e que por outro, quando a contribuição per

capta do imposto é muito alta, há uma tendência para a produção de desigualdade social.

Em alguns estados se percebeu que, quanto menos se eleva a influência do ICMS no

PIB, mais há uma elevação do IDHM em comparação aos outros, o que ocorre por

exemplo nos estados do Amazonas, Distrito Federal, Rio de Janeiro, Pará e Paraná.

Este estudo permitiu ainda a compreensão de que, a renda per capta de

cada estado junto à proporção per capta de contribuição do ICMS em cada estado, é um

fator relevante para a constatação das desigualdades regionais e das inequidades que

o imposto apresenta para cada unidade da federação. E nesta conjuntura, percebeu-se

aspectos que fundamentam a afirmação de que um estado com uma pesada contribuição

per capta de ICMS, é tendente à inequidade fiscal, demonstrando o seu caráter

regressivo.

Asseverou-se ainda, que a oneração desmedida de contribuintes de baixa

capacidade contributiva é a principal causa da má redistribuição de renda, da má divisão

dos custos públicos e da perpetuação de desigualdades regionais entre as unidades da

federação, o que ocasiona em manifesta desigualdade social, porquanto, a

distributividade e equidade são pressupostos da justiça fiscal.

Todos estes dados foram salutares para demonstrar as desigualdades

regionais do país e o distanciamento o imposto da sua real função de atuar como

instrumento de redistribuição de renda e custear direitos.

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O cenário de inequidade fiscal é claro diante da ausência da devida

modulação do imposto para adequação às múltiplas capacidades contributivas dos

consumidores, sendo que, a tributação não pode ser orientada apenas pelo consumo

demonstrado pelo contribuinte que não necessariamente estará vinculado à sua

capacidade contributiva. Ademais, imperioso arrazoar ainda que o imposto não pode ser

inviabilizador de direitos, mas sim um expediente para satisfação de direitos de toda a

sociedade, atendendo majoritariamente aos direitos fundamentais.

Com tais considerações, o que se pretende não é um estímulo

irresponsável do consumo nem uma total desoneração deste, mas, tão somente, que os

contribuintes sejam onerados apenas quando o consumo puder efetivamente indicar

capacidade contributiva e não quando este consumo for restrito às necessidades básicas

de qualquer ser humano, onde não reside qualquer luxo ou privilégio.

Conclusão inevitável após este estudo, é quanto à necessidade de maior

oneração sobre a renda e sobre o patrimônio, de modo a compensar a necessidade fiscal

do estado, aliviando os impostos indiretos sobre o consumo de modo a reduzi a carga

tributária exorbitante suportada pela parcela da população de baixo poder econômico,

visto que, em muitas situações o consumo não é capaz de indicar qualquer capacidade

contributiva que justifique a incidência de tributos.

Quanto a seletividade do imposto como instrumento para a produção de

progressividade no ICMS, percebe-se que este não é suficiente para a justa

diferenciação das alíquotas do imposto, visto que ainda há uma considerável oneração

do ICMS sobre elementos essenciais e que compõem a cesta básica de qualquer

indivíduo comum, o que permite e a conclusão da necessidade de isenção da cesta

básica como modo de minorar a regressividade do ICMS para que assim, seja um

imposto equitativo.

Deste modo, premente se faz a necessidade de uma reforma tributária

sob o ICMS, ante a notória inequidade da tributação sobre os produtos básicos de

consumo e indispensáveis para qualquer indivíduo, uma vez que, o fato de consumi-los

não é, em qualquer hipótese, situação que demonstre qualquer aspecto financeiro do

indivíduo, porquanto, a simples incidência da seletividade sobre os produtos não é capaz

de modular o imposto de modo equânime, pelo que, se faz indispensável uma reforma

incisiva sobre o ICMS, de modo com que esse imposto venha realizar a justiça fiscal

pretendida pelo ordenamento e necessária para o cumprimento da justiça social.

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Por fim, salienta-se que o ICMS precisa ser modificado de modo a atingir

os objetivos constitucionais, tais como redistribuição de renda, erradicação da pobreza

e diminuição das desigualdades regionais, sendo coerente ao princípio da capacidade

contributiva e à finalidade maior de uma sociedade equitativa, onde o poder de tributar

seja limitado e planejado em consonância com a cidadania fiscal. Sendo que, a principal

modificação que este imposto precisa sofrer é quanto a desoneração dos produtos

essenciais e ainda, que haja uma minoração do interesse de arrecadação incidente

sobre o consumo, direcionando a fiscalidade para a demonstração de renda e patrimônio

que, sem dúvida, serão indicadores mais precisos de capacidade contributiva.

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