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UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL
CAMPUS DE ERECHIM
CURSO DE GEOGRAFIA-LICENCIATURA
DARLAN FABIANE
A GEOGRAFIA ECONÔMICA NA PRODUÇÃO CIENTÍFICA DO BOLETIM
GAÚCHO DE GEOGRAFIA NO PERÍODO DE 1974 A 1999: TEMÁTICAS,
ABORDAGENS E FASES
ERECHIM
2017
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DARLAN FABIANE
A GEOGRAFIA ECONÔMICA NA PRODUÇÃO CIENTÍFICA DO BOLETIM
GAÚCHO DE GEOGRAFIA NO PERÍODO DE 1974 A 1999: TEMÁTICAS,
ABORDAGENS E FASES
Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação
apresentado como requisito para obtenção de grau de
Licenciado em Geografia da Universidade Federal da
Fronteira Sul.
Orientador: Prof. Dr. Éverton de Moraes Kozenieski
ERECHIM
2017
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RESUMO
Este trabalho resgata aspectos da história da Geografia e, mais especificamente da Geografia
Econômica produzida e veiculada no Boletim Gaúcho de Geografia, no período de 1974 a
1999, a partir de uma pesquisa bibliográfica de natureza básica e caráter exploratório. Os
procedimentos metodológicos consistiram no acesso aos artigos disponíveis no endereço
eletrônico , e na seleção e análise das publicações referentes ao
campo da Geografia Econômica, objetivando identificar o perfil da Geografia Econômica
presente no Boletim Gaúcho de Geografia. No período em estudo, identificou-se como
principal temática a caracterização econômica de regiões e como abordagem predominante a
analítico-descritiva. Dentre os temas centrais ou fases da Geografia Econômica predominou a
organização do espaço. A temática comércio e a abordagem crítica ou dialética ganharam
maior destaque na década de 1990, sendo as questões relativas ao desenvolvimento e ao
subdesenvolvimento mais evidentes entre os anos de 1980 e 1989. O estudo envolveu 153
publicações, sendo 43 consideradas pertencentes à Geografia Econômica.
Palavras-chave: Geografia. Geografia Econômica. Boletim Gaúcho de Geografia.
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ABSTRACT
This work rescues aspects of the history of Geography, and more specifically of the Economic
Geography produced and published in the Gaucho Geography Bulletin, from 1974 to 1999,
based on a bibliographic research of basic nature and exploratory character. The
methodological procedures consisted of the access to the articles available at the electronic
address , and in the selection and analysis of publications related to
the Economic Geography field, aiming to identify the profile of Economic Geography present
in the Gaucho Geography Bulletin. In the period of study, was identified as the main theme
the economic characterization of regions, and as a predominant analytic-descriptive approach.
Among the central themes or phases of Economic Geography, the organization of space
predominated. The trade theme and the critical or dialectical approach gained greater
prominence in the 1990s, with issues regarding development and underdevelopment more
evident between the years 1980 and 1989. The study involved 153 publications, 43 being
considered belonging to Economic Geography.
Keywords: Geography. Economic Geography. Gaucho Geography Bulletin.
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LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 01 – Distribuição dos artigos publicados no BGG, período 1974-2016 32
Gráfico 02 – Percentual do total de artigos publicados no BGG, por década 33
Gráfico 03 – Artigos do BGG: número médio de páginas para cada ano 34
Gráfico 04 – Autores com mais de três artigos publicados no BGG, período 1974-
2016 35
Gráfico 05 – Distribuição dos autores com mais de 3 artigos publicados no BGG
(1974-2016), por instituição de ensino. 36
Gráfico 06 – Distribuição das temáticas da GE do BGG (1974-1999) 38
Gráfico 07 – Temáticas da GE do BGG na década de 1970 39
Gráfico 08 – Temáticas da GE do BGG na década de 1980 39
Gráfico 09 – Temáticas da GE do BGG na década de 1990 40
Gráfico 10 – Abordagens da GE do BGG (1974-1999), de acordo com Nunes
(2000) 41
Gráfico 11 – Abordagens da GE do BGG, por década, de acordo com Nunes
(2000) 41
Gráfico 12 – Abordagens da GE do BGG (1974-1990), de acordo com Alves
(2012) 42
Gráfico 13 – Os temas centrais da GE do BGG (1974-1999) 43
Gráfico 14 – A GE do BGG e as principais correntes da Geografia 45
Gráfico 15 – A GE do BGG e as principais correntes da Geografia, por década 45
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LISTA DE QUADROS E TABELAS
Quadro 01 – Definições de GE 29
Tabela 01 – Distribuição dos temas centrais da GE do BGG (1974-1999), por década 44
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LISTA DE SIGLAS
AGB – Associação dos Geógrafos Brasileiros
BGG – Boletim Gaúcho de Geografia
CNG – Conselho Nacional de Geografia
FEA – Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade
GE – Geografia Econômica
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IHGB – Instituto Histórico e Geográfico
RBG – Revista Brasileira de Geografia
RS – Rio Grande do Sul
SBG – Sociedade Brasileira de Geografia
UB – Universidade do Brasil
UDF – Universidade do Distrito Federal
UFF – Universidade Federal Fluminense
UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul
UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro
UFSM – Universidade Federal de Santa Maria
UGI – União Geográfica Internacional
UNIJUI – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul
URCAMP – Universidade da Região da Campanha
USP – Universidade de São Paulo
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SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 10
1.1 JUSTIFICATIVA ............................................................................................................................. 10
1.2 OBJETIVOS .................................................................................................................................... 11
1.2.1 Geral ............................................................................................................................................. 11
1.2.2 Específicos .................................................................................................................................... 11
1.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ..................................................................................... 11
2 REFERENCIAL TEÓRICO ............................................................................................................ 14
2.1 O PENSAMENTO GEOGRÁFICO: ANTECEDENTES DA GEOGRAFIA SISTEMATIZADA 14
2.2 A GEOGRAFIA SISTEMATIZADA .............................................................................................. 17
2.3 OS PRIMÓRDIOS DA GEOGRAFIA BRASILEIRA .................................................................... 21
2.4 A GEOGRAFIA ECONÔMICA ...................................................................................................... 24
2.5 A GEOGRAFIA ECONÔMICA NO BRASIL ................................................................................ 25
2.6 AS DEFINIÇÕES DE GEOGRAFIA ECONÔMICA ..................................................................... 29
2.7 CLASSIFICANDO TRABALHOS DE GEOGRAFIA ECONÔMICA .......................................... 30
3 A GEOGRAFIA ECONÔMICA DO BOLETIM GAÚCHO DE GEOGRAFIA (1974-1999) ... 32
3.1 O BOLETIM GAÚCHO DE GEOGRAFIA .................................................................................... 32
3.2 A GEOGRAFIA ECONÔMICA (1974-1999) ................................................................................. 37
3.2.1 As temáticas ................................................................................................................................. 37
3.2.2 As abordagens.............................................................................................................................. 40
3.2.3 As fases ou temas centrais .......................................................................................................... 43
3.2.4 A presença das principais correntes da Geografia ................................................................... 44
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................................... 47
REFERÊNCIAS ................................................................................................................................... 50
APÊNDICE I ........................................................................................................................................ 52
APÊNDICE II ....................................................................................................................................... 63
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1 INTRODUÇÃO
O conhecimento científico não é algo imutável. De tempos em tempos ocorrem
mudanças das teorias, dos métodos e das temáticas. O paradigma dominante entra em crise,
dando lugar a um novo paradigma, e o caminho seguido na busca da verdade científica passa
a ser outro.
Se o conhecimento científico muda, com o conhecimento geográfico não é diferente.
O conhecimento geográfico que na Grécia Antiga era do domínio da Filosofia, assume o
status de ciência no século XIX, a partir da adoção dos métodos científicos, e de lá para cá
continua sofrendo alterações, sendo que o estudo desta trajetória constitui um passo
importante para que se possa ter maior entendimento da história do pensamento geográfico.
Ao pesquisar a história do pensamento geográfico encontramos número considerável
de trabalhos, porém quando buscamos por uma subárea da Geografia e pelas produções
referentes ao estado do Rio Grande do Sul (RS), percebemos uma lacuna. Não existem
produções gaúchas relativas à trajetória da Geografia Econômica (GE).
A GE, sendo uma subárea da Geografia, também passou por mudanças gerais
permanecendo em sincronia com toda a ciência geográfica. Mudou em relação à metodologia
de pesquisa e em relação às temáticas e às abordagens. Neste sentido, considerando que existe
uma trajetória de mudanças na ciência, na Geografia e na GE, buscando refletir a respeito da
GE produzida no RS, interessa-nos saber: qual é o perfil da GE produzida e veiculada através
dos artigos publicados no Boletim Gaúcho de Geografia (BGG), no período de 1974 a 1999?
1.1 JUSTIFICATIVA
Optamos por estudar o campo da GE por entendermos que o aspecto econômico tem
sido cada vez mais importante e determinante no comportamento humano. Cada vez mais, as
decisões têm sido balizadas pela economia. Na medida em que os homens se concentram no
meio urbano, as temáticas relacionadas à GE se tornam mais importantes, uma vez que nas
cidades quase tudo tem o seu preço. Além disso, com a globalização dos mercados e a
transformação da agricultura voltada à produção de commodities, o meio rural também se
orienta a partir dos mercados nacionais e internacionais.
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O BGG “[...] é a publicação de caráter científico da Associação dos Geógrafos
Brasileiros - seção Porto Alegre, trazendo artigos, notas, resenhas e outros textos inéditos, de
interesse geográfico, escritos em português ou espanhol” (BOLETIM GAÚCHO DE
GEOGRAFIA, p. 1, 2017). Durante mais de quarenta anos, o periódico tem sido um dos
principais veículos de propagação do conhecimento geográfico no RS, trata-se de uma
publicação que é referência para a Geografia rio-grandense. Por meio do BGG podemos
identificar a trajetória da Geografia, com as mudanças ocorridas em relação às temáticas,
abordagens teórico-metodológicas e principais correntes do pensamento geográfico.
Os resultados desta pesquisa constituem uma primeira tentativa de classificação da GE
produzida no RS, uma vez que não encontramos trabalhos neste sentido. Esta contribuição
poderá incentivar estudos posteriores, no sentido de melhor classificar, valorizar e entender a
GE do BGG, aprofundando o conhecimento da história do pensamento geográfico.
1.2 OBJETIVOS
1.2.1 Geral
Compreender a trajetória da GE produzida e veiculada nos artigos publicados no
BGG, entre 1974 e 1999.
1.2.2 Específicos
Classificar os artigos publicados no BGG, entre 1974 e 1999, que possuem temáticas
relacionadas à GE;
Avaliar os artigos do campo da GE, dentro do período em estudo, quanto às suas
principais temáticas e abordagens teórico-metodológicas.
1.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Este estudo caracteriza-se como uma pesquisa bibliográfica de natureza básica e de
caráter exploratório, de acordo com o entendimento de Silva e Menezes (2005). Entendemos
por pesquisa bibliográfica, aquela que se utiliza de materiais já publicados, sendo de natureza
básica quando pretende trazer conhecimentos novos, mas não prevê uma aplicação prática de
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imediato para estes conhecimentos. Por ser uma pesquisa direcionada aos artigos do BGG, ou
seja, uma pesquisa bibliográfica, seu caráter se define como exploratório.
A primeira etapa do trabalho consistiu na aquisição dos artigos publicados no BGG
entre os anos de 1974 e 2016 disponíveis gratuitamente para “download” no endereço
eletrônico . Ao todo foram obtidos 380 artigos.
Obtidos os artigos, efetuamos a primeira filtragem, separando os trabalhos que
tratavam de aspectos relativos à geografia física (geologia, geomorfologia, hidrologia,
climatologia, cartografia, etc.), ao ensino de Geografia (estágio curricular, avaliação,
metodologia de ensino, etc.) e à Geografia de modo geral (conceitos, histórico do pensamento
geográfico, preservação de patrimônio, etc.), desde que o assunto não fosse relativo a questões
econômicas ou, obviamente, GE. Quanto aos trabalhos sobre aspectos ambientais e Geografia
Política, foram descartados aqueles que não discutiam questões econômicas em nenhuma
parte do artigo.
Descartamos, nesta etapa, também: a única publicação do ano de 1976 cujo título era
“Listagem das atividades científicas do II Encontro Nacional de Geógrafos”; de 1983 – “A
curva de Lorenz-Thofehrn”; de 1984 – “Origem e evolução da AGB no Rio Grande do Sul”;
de 1992 – “Entrevistas da Diretoria com sócios fundadores da AGB – PA”.
Nesta primeira filtragem, os artigos foram identificados a partir de seus títulos.
Procedemos, em seguida, uma breve leitura, em parte ou em todo o artigo, a fim de obter a
confirmação de que o texto poderia ser descartado. Os artigos retirados neste primeiro
momento são os que em nosso entender estão mais distante da GE e totalizam 67 em um total
de 154 trabalhos.
A segunda filtragem consistiu em definir se o artigo é da GE ou não, a partir da
definição de GE apresentada por Nunes (2000). Nesta etapa foram considerados válidos os
artigos onde se caracterizou “[...] a precedência do fato/evento econômico na determinação
dos processos e relações que produzem as diferentes formas espaciais” (NUNES, 2000, p. 31).
A segunda filtragem foi mais difícil. Encontramos artigos em que estava clara, logo no
começo do trabalho, a importância do econômico; ou seja, o autor do texto estava estudando
um processo/relação em que o aspecto econômico era o principal determinante. Entretanto,
alguns artigos precisaram ser lidos no todo e, inclusive, mais de uma vez e até com a ajuda do
orientador para que se pudesse definir se enquadraríamos como GE ou não. Nesta etapa foram
retirados mais 44 artigos.
Caracterizado como sendo da GE, procedemos à classificação do artigo em uma das
temáticas apresentadas por Nunes (2000) e em uma das abordagens apresentadas por Alves
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(2012). Cada artigo da GE, também foi classificado em uma das quatro fases da GE
apresentadas por Silva (1978) e em uma das três principais correntes geográficas apresentadas
por Moraes (2007).
O apêndice I apresenta a listagem dos artigos considerados válidos para este estudo e o
apêndice II traz a lista de artigos descartados.
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2 REFERENCIAL TEÓRICO
Este referencial teórico foi construído com a intenção de apresentar uma breve noção
da gênese, de quando e onde, a Geografia e a GE surgiram. Os autores foram selecionados a
partir da literatura em língua portuguesa que tivemos acesso. Tais pesquisadores representam,
sobretudo, o pensamento europeu, base para a Geografia produzida no Brasil.
Verificamos na gênese da Geografia Brasileira significativa influência da Escola
Francesa, embora o pensamento alemão e o norte americano também tenham contribuído.
Enquanto os franceses moldaram a Geografia Universitária, os alemães e norte-americanos
tiveram maior influência nos estudos feitos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE).
Quanto à GE, investigamos sua origem, seu desenvolvimento no Brasil e suas
definições. Identificamos, nos manuais de GE produzidos na segunda metade do século
passado, diferentes concepções a respeito do que se entende por GE, assim como um
deslocamento de foco da atividade industrial, passando pela preocupação com o
desenvolvimento, chegando ao final do século com uma preocupação em entender a
organização do espaço a partir das atividades econômicas.
2.1 O PENSAMENTO GEOGRÁFICO: ANTECEDENTES DA GEOGRAFIA
SISTEMATIZADA
A história da civilização ocidental aponta a Mesopotâmia como berço do pensamento
geográfico. Foram os mesopotâmios, mais especificamente os sumérios, que produziram o
primeiro mapa de que temos notícia. Para Lencioni (2003, p. 32): “Os sumerianos nos
deixaram como legado, o que podemos considerar como a primeira representação cartográfica
do mundo, um mapa de 2700 anos antes da era cristã.”
Embora os primeiros registros de estudos geográficos sejam atribuídos aos povos que
viveram entre os rios Tigre e Eufrates, foram os gregos que mais se destacaram no
desenvolvimento do pensamento geográfico e das ciências, ou daquilo que naqueles tempos
era chamado de Filosofia. Segundo Cavalcanti e Viadana (2010. p. 13): “À filosofia compete
explicar a realidade, dividida no domínio da natureza, do pensamento e da criação humana. A
partir dessa divisão foram surgindo as diversas ciências, repartindo o saber total da filosofia.”
Dentre os filósofos gregos estão vários nomes que contribuíram com a Geografia:
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- Pitágoras, no estudo da Geometria, formulou o célebre Teorema de Pitágoras.
Conceitos de esfera para a Terra, movimento de rotação, zonação climática,
mecanismos de eclipses da Lua.
[...]
- Anaximando de Mileto relatou viagens e fez o primeiro mapa marítimo.
- Tales de Mileto, localizou lugares. Fazia descrição desses lugares com
racionalismo.
- Erastósteles postulava a imagem geométrica da Terra, calculou sua circunferência
e estabeleceu o sistema de coordenadas (latitude, longitude).
- Aristarco de Samos foi o primeiro a dizer que o Sol é bem maior que a Terra e
que ela gira entorno dele.
- Ptolomeu, teoria geocêntrica. Tema retomado pela Igreja na Idade Média.
- Heródoto, historiador, descreveu as guerras entre gregos e persas. Viajou pelo
Egito e pela Babilônia e descreveu o que viu. Colocou os conhecimentos históricos
no contexto geográfico. O meio influencia o homem (concepções deterministas
recuperadas por Ratzel, naturalista alemão do século XIX).
- Aristóteles, [...]. Considerava a Terra uma esfera e apresentou o fato de que a
Terra projetava na Lua uma sombra redonda durante os eclipses.
- Dicearco, [...] foi o precursor do sistema de coordenadas geográficas que divide a
Terra em dois hemisférios através de uma linha equidistante do Norte e do Sul,
utilizada até hoje pela cartografia moderna (BECKER, 2006, p. 18).
Outro grego importante para o pensamento geográfico é Estrabão. Ruy Moreira
enfatiza a importância desse pensador na capa de seu livro: “Estrabão, ao criar a geografia no
século I, apresentou-a como um saber comprometido com a construção de um mundo
centrado na felicidade e na vida do homem” (MOREIRA, 2012, capa). Lencioni vai mais
longe, ela busca/cita um texto que teria sido escrito pelo próprio Estrabão:
A geografia, que nós nos propomos a estudar na presente obra, nos parece ser, como
algumas outras ciências, do domínio da filosofia, e mais de um fato nos autoriza a
pensar assim; de início, os primeiros autores que ousaram tratar da geografia eram
precisamente os filósofos: Homero, Anaximandro de Mileto, seu compatriota
Hecateu, Eratóstenes – a quem faremos observação em seguida – depois Demócrito,
Eudóxio, Dicearque, Éfora e muitos outros, enfim, mais recentemente, Erastóstenes,
Políbio, Posidônio, filósofos também os três. Em segundo lugar, a multiplicidade de
conhecimentos indispensáveis que conduz à semelhança é o compartilhar,
unicamente, no que diz respeito à contemplação das coisas divinas e humanas, quer
dizer, do objeto mesmo da filosofia. Enfim, a variedade de aplicações que é
suceptível à geografia, que pode servir, por sua vez, às necessidades dos povos e aos
interesses dos chefes e que tende a nos fazer melhor conhecer o céu, de início;
depois, todas as riquezas da terra e dos mares, tanto quanto dos animais e das
plantas, os frutos e os outros produtos próprios a cada lugar, essa variedade, dizemos
nós, implica que o geógrafo tenha esse mesmo espírito filosófico habituado a
meditar sobre a grande arte de viver e de ser feliz (ESTRABÃO, 1909 apud
LENCIONI, 2003, p. 45-46).
Pelo texto citado, percebemos a relação entre a Filosofia e a Geografia: a Geografia é
apresentada como uma divisão ou um campo de domínio da Filosofia. Estrabão entende assim
porque os primeiros gregos a estudar Geografia eram filósofos e porque Geografia e Filosofia
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dedicam-se ao estudo “das coisas divinas e humanas”, ou seja, compartilham do mesmo
objeto de estudo.
O filósofo Estrabão define a amplitude do campo de estudo e as aplicações da
Geografia e, ainda, a quem a Geografia serve. Observamos na afirmação de Estrabão algo
ainda atual, embora já tenham se passado, aproximadamente, dois milênios. Aqui também,
uma referência às “riquezas da terra e dos mares”, o que poderia ser relacionado à GE.
Fora da Grécia, até o século XV, o conhecimento geográfico se caracteriza
principalmente pelos relatos de viajantes, sobretudo, árabes como Al-Idrisi e Ibn Batutah. Os
árabes também foram importantes no estudo dos astros e na conservação de textos antigos,
que assim puderam chegar ao nosso conhecimento.
Por volta do século XV, a Geografia recebe influência da astronomia. Nicolau
Copérnico (1473-1543) apresenta a Teoria Heliocêntrica e Johannes Kepler (1571-1630)
descobre que as órbitas dos planetas são elípticas (LENCIONI, 2009). Além dos trabalhos de
Copérnico e Kepler, o estudo da posição dos astros é importante por servir de orientação aos
viajantes, principalmente, em alto mar.
Com as navegações portuguesas, os estudos de astronomia e cartografia tornam-se
necessários para orientar os navegadores. “Na região do Algarve, próximo à ponta de Sagres,
dom Henrique reuniu um grupo de estudiosos, como astrônomos, cartógrafos e pilotos, para
desenvolver estudos náuticos necessários às expedições marítimas. Era a chamada Escola de
Sagres” (BECKER, 2006, p. 44). A Escola de Sagres foi um marco importante para o
desenvolvimento da cartografia.
Outro destaque importante do século XVI é o trabalho do geógrafo e matemático
holandês Mercator (1512-1594). Segundo Lucci (1982, p. 11), Mercator “[...] criou o sistema
de projeção cilíndrica que nos dá uma das melhores e mais comuns formas de representação
da Terra: o mapa-múndi ou planisfério.” Os avanços na cartografia contribuem para novas
representações e compreensões geográficas do mundo.
É na Alemanha do século XVIII que surge a Geografia como campo/área do
conhecimento. Segundo Lencioni (2003, p. 78), “[...] Kant foi o inaugurador da disciplina de
Geografia, quando lecionava em Konigsberg.” A Geografia de Immanuel Kant é definida por
Ruy Moreira da seguinte forma:
A Geografia que Kant conhece é um agregado de conhecimentos empíricos de
todos os âmbitos, organizados em grupos de classificação, uma taxonomia do
mundo físico, no sentido aristotélico do termo, e por isso designada de Geografia
Física. Essa taxonomia é traduzida na forma de grandes paisagens da superfície
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terrestre, recortando-a em pedaços de espaço que fazem dela uma ampla corografia
(MOREIRA, 2010, p. 14, grifo nosso).
Moreira entende que Kant não provoca transformações significativas na Geografia,
mas prepara o terreno para que Ritter e Humboldt a transformem em uma ciência.
As teorias de Kant vão, assim, ser a base do nascimento da geografia moderna,
transferindo-lhe como paradigmas a noção do espaço como ordem espacial, a
superfície terrestre como campo da taxonomia (tomando os nichos territoriais como
critério, diferentemente da ordem lógica de Carl von Linné, conhecido com Lineu,
então em voga), a comparação como método e o sistema de agrupamento
taxonômico dos fenômenos por suas semelhanças e diferenças, que logo a seguir
Alexander Von Humboldt e Carl Ritter vão incorporar ao sistematizá-los como um
corpus discursivo, no começo do século XIX (MOREIRA, 2012, p. 22-23).
A partir de Humboldt e Ritter, se inaugura uma Geografia com viés científico. Uma
ciência que vai se consolidar com a incorporação dos cinco princípios balizadores dos
trabalhos de Geografia: extensão, analogia, causalidade, conexidade e atividade. Estes
princípios foram elaborados por representantes das escolas alemã e francesa (LUCCI, 1982;
ANDRADE, 1998). Os trabalhos de Kant, Humboldt, Ritter e Ratzel constituem a base da
ciência geográfica, uma ciência que logo em seguida vai receber, também, a contribuição dos
franceses, sobretudo, Paul Vidal de La Blache.
2.2 A GEOGRAFIA SISTEMATIZADA
As contribuições de Humboldt e Ritter são fundamentais para o surgimento da
Geografia sistematizada. Segundo Moraes (2007, p. 61): “As primeiras colocações, no sentido
de uma Geografia sistematizada, vão ser obra de dois autores prussianos ligados à
aristocracia: Alexandre von Humboldt, conselheiro do rei da Prússia, e Karl Ritter, tutor de
uma família de banqueiros.” Para Lencioni (2003, p. 91): “Enquanto Humboldt era um
homem rico, viajante e naturalista, utilizando-se de observações diretas nas suas reflexões,
Ritter foi, acima de tudo um professor, um homem de gabinete.” Humboldt se dedicou ao
estudo do cosmos e da Terra, enquanto Ritter dedicou-se ao estudo das particularidades dos
lugares (MORAES, 2007).
Após a sistematização, a Geografia se desenvolve, principalmente, em duas escolas: a
escola alemã que tem como principal expoente Friedrich Ratzel e a escola francesa centrada
na figura de Paul Vidal de La Blache. Ratzel se destaca pelas teorias do espaço vital e do
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determinismo geográfico, enquanto La Blache desenvolve a teoria do possibilismo
geográfico.
Segundo Becker (2006, p. 59): “O espaço vital representa uma proporção de equilíbrio
entre uma população de uma dada sociedade e os recursos disponíveis para suprir suas
necessidades, definindo assim suas necessidades de progredir e suas premências territoriais.”
Com esta teoria, Ratzel justifica o desejo alemão de conquistar mais território.
Quanto ao determinismo e ao possibilismo geográficos, são teorias que procuram
entender a relação homem-meio. Para Ratzel, o Homem é um ser passivo que tem suas
características definidas pelo meio onde vive, ou seja, o nível de desenvolvimento de uma
sociedade é determinado pelas características do meio onde ela está inserida. Já no
entendimento de La Blache, existe uma interação entre o Homem e o meio a partir da qual se
moldam as sociedades, ou seja, o Homem é um ser ativo (BECKER, 2006).
Para Lucci (1982), foram as escolas alemã e francesa que criaram os cinco princípios
balizadores dos trabalhos geográficos. No entendimento deste autor, o que dá à Geografia o
status de ciência é o obedecimento destes princípios, definidos como:
1. Princípio da Extensão – [...] o geógrafo deve localizar os fatos estudados, determinando-lhes a área geográfica.
2. Princípio da Analogia – o geógrafo deve comparar os fatos observados, retirando dessa observação as leis da Geografia Geral (Ritter).
3. Princípio da Causalidade – devem-se buscar as causas e examinar as consequências dos fatos observados (Ratzel).
4. Princípio da Conexidade – há estreita ligação entre os fatos geográficos, devendo ser observadas as suas conexões com fatos circunvizinhos (Vidal de La
Blache).
5. Princípio da Atividade – os fatos geográficos sofrem constante mutação e assim devem ser estudados e observados (LUCCI, 1982, p. 12).
Outra escola importante é a norte americana, representada, sobretudo, por Richard
Hartshorne. Este autor, influenciado pelo geógrafo alemão Alfred Hettner, divide a Geografia
em: Geografia Idiográfica (regional) e Geografia Nomotética (geral). Na definição de Becker
(2006, p. 68-69), a primeira seria uma Geografia “[...] singular (de um só lugar), porém
exaustiva (apreender vários elementos) o que levaria a um conhecimento profundo de
determinado local.” A segunda seria uma Geografia “[...] generalizadora, apesar de parcial,
fazendo análises tópicas e comparativas em vários lugares.”
Hartshorne é autor da teoria do racionalismo geográfico ou da Geografia Racionalista.
De acordo com Moraes (2007, p. 95): “O fato de se denominar racionalista esta corrente
advém de sua menor carga empirista, em relação às anteriores.” Para Becker (2006),
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Hartshorne é o geógrafo que faz a transição entre a Geografia Tradicional e as geografias
posteriores.
A Geografia Tradicional ou Geografia Clássica baseava-se nas ideias de Augusto
Comte (1798-1857). Comte defendia o método positivista, um método onde a observação dos
fatos/fenômenos era a única forma de conhecer a verdade. (BECKER, 2006).
De maneira geral, é na metade do século XX que a Geografia Tradicional começa a ser
questionada de uma forma mais intensa. Para Moraes:
A crise da Geografia Tradicional e o movimento de renovação a ela associado
começam a se manifestar já em meados da década de cinquenta e se desenvolvem
aceleradamente nos anos posteriores. A década de sessenta encontra as incertezas e
os questionamentos difundidos por vários pontos. A partir de 1970, a Geografia
Tradicional esta definitivamente enterrada; suas manifestações, dessa data em
diante, vão soar como sobrevivências, resquícios de um passado já superado. Instala-
se, de forma sólida, um tempo de críticas e de propostas no âmbito dessa disciplina
(MORAES, 2007, p. 103).
No entendimento de Antônio Carlos Robert Moraes (2007), embora esse movimento
renovador não tenha uma unidade, considerando propósitos e posicionamentos políticos, é
possível identificar duas linhas de pensamento principais: a Geografia Crítica e a Geografia
Pragmática.
Na afirmação de Moraes (2007, p. 111): “A Geografia Pragmática vai se substantivar
por algumas propostas diferenciadas.” A proposta inicial consiste em uma aproximação da
Geografia com a Matemática, sobretudo com a Estatística, recebendo a denominação de
Geografia Quantitativa. Moraes exemplifica o pensamento dos adeptos desta corrente:
Por exemplo, ao se estudar uma determinada região, a análise deveria começar pela
contagem dos elementos presentes (número de estabelecimentos agrícolas, total de
população, extensão, número e tamanho das vilas e cidades, etc.); este procedimento
forneceria tabelas numéricas de cada dado, as quais seriam trabalhadas
estatisticamente pelo computador (médias, variâncias, desvio-padrão, medianas,
etc.) e relacionadas (correlação simples e múltipla, regressão linear, covariância,
análise de agrupamento, etc.); ao final, surgiriam resultados numéricos, cuja
interpretação daria a explicação da região estudada (MORAES, 2007, p. 111).
Em um segundo momento, a Geografia Pragmática “[...] propõe o uso de modelos de
representação e explicação, no trato dos temas geográficos.” Surge assim, a Geografia
Modelística ou Sistêmica. “Os modelos originam-se basicamente na Economia, aparecendo,
por exemplo, na explicação da organização da agricultura, da formação das redes de cidades,
ou da localização industrial.” (MORAES, 2007, p. 112).
-
20
Segundo Moreira (2009), a Geografia Norte-Americana chamada de “New
Geography” começou com a quantificação, focando em seguida nos modelos e, em um
terceiro momento, passou a buscar o entendimento do espaço através da Teoria dos Sistemas.
Este autor percebe a existência de três fases distintas: Geografia Quantitativa, Geografia
Modelística, Geografia Sistêmica, respectivamente, nas décadas de 1940/1950, 1960 e 1970.
Quanto à Geografia Crítica, trata-se de um movimento que visa tornar públicas
determinadas práticas que escamoteiam a realidade, impedindo que a sociedade em geral
perceba a existência de um sistema de dominação presente nos discursos e práticas das
instituições como o Estado e a Escola. Para Moraes (2007, p. 119), “[...] o designativo de
crítica diz respeito, principalmente, a uma postura frente à realidade, frente à ordem
constituída.”
“Enfim, os geógrafos críticos apontaram a relação entre a Geografia e a superestrutura
da dominação de classe, na sociedade capitalista.” (MORAES, 2007, p. 120). Lacoste percebe
a existência de duas Geografias, sendo ambas utilizadas como instrumento de poder:
Desde o fim do século XIX pode-se considerar que existem duas geografias:
- uma, de origem antiga, a geografia dos Estados-maiores, é um conjunto de
representações cartográficas e de conhecimentos variados referentes ao espaço; esse
saber sincrético é claramente percebido como eminentemente estratégico pelas
minorias dirigentes que o utilizam como instrumento de poder.
- a outra geografia, a dos professores, que apareceu há menos de um século, se
tornou um discurso ideológico no qual uma das funções inconscientes, é a de
mascarar a importância estratégica dos raciocínios centrados no espaço. Não
somente essa geografia dos professores é extirpada de práticas políticas e militares
como de decisões econômicas (pois os professores nisso não tem participação), mas
ela dissimula, aos olhos da maioria, a eficácia dos instrumentos de poder que são as
análises espaciais. Por causa disso a minoria no poder tem consciência de sua
importância, é a única a utilizá-las em função dos seus próprios interesses e este
monopólio do saber é bem mais eficaz porque a maioria não dá nenhuma atenção a
uma disciplina que lhe parece tão perfeitamente ‘inútil’ (LACOSTE, 1989, p. 31,
grifo nosso).
A origem da Geografia Crítica está na Geografia Regional Francesa, sendo Lacoste
um dos autores do livro que dá nome à primeira manifestação da Geografia Crítica: a
Geografia Ativa. Os outros autores do livro, cujo título é “Geografia Ativa”, são P. George, R.
Guglielmo e B. Kayser (MORAES, 2007). Moraes afirma que:
[...] esta Geografia de denúncia não rompia, em termos metodológicos, com a
análise regional tradicional. Mantinha-se a tônica descritiva e empirista, apenas
passava-se a englobar no estudo tópicos por ela não abordados. Introduziam-se
novos temas, mantendo-se os procedimentos gerais da análise regional. [...]. A
manutenção da ótica empirista vedava a análise dos processos essenciais e a
explicação era sempre externa à Geografia. Poder-se-ia dizer que estes autores
-
21
tinham uma ética de esquerda, porém instrumentalizada numa epistemologia
positivista. Daí sua posterior superação (MORAES, 2007, p. 124-125).
Destas colocações todas, percebemos que a Geografia não encontra um caminho
definitivo, está sempre em busca de uma melhor maneira de entender/explicar o espaço
geográfico, principalmente quando se trata da Geografia Humana. Para Moreira (2010, p. 19):
“O modelito matemático da Física clássica parece se encaixar sob medida nas ações das
geografias físicas setoriais, mas o modelito institucional da Sociologia-Antropologia não
encontra um mesmo sucesso de aplicação nas geografias humanas setoriais.” Verificamos,
portanto, que a Geografia iniciada por Humboldt e Ritter assume diferentes características,
expressas em diferentes correntes e abordagens teórico-metodológicas.
Na sequência, procuraremos apresentar os elementos mais importantes na
configuração da Geografia Brasileira. Uma Geografia criada a partir do modelo francês, mas
que logo assume, também, algumas características dos pensamentos Alemão e norte
americano.
2.3 OS PRIMÓRDIOS DA GEOGRAFIA BRASILEIRA
Embora a criação do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) e da
Sociedade Brasileira de Geografia (SBG) ocorra ainda do século XIX, respectivamente, 1838
e 1883, é a partir da terceira década do século XX que a Geografia se torna um ramo do
conhecimento realmente importante no contexto nacional. Alguns nomes que se destacaram
na gênese da Geografia Brasileira são Manuel Aires de Casal, Carlos Delgado de Carvalho, os
professores franceses Pierre Monbein e Pierre Deffontaines, Francis Ruellan e Leo Waibel
(MOREIRA, 2009).
Aires de Casal era português e atuava no Rio de Janeiro com Capelão. Produziu, no
início do século XIX, uma obra intitulada “A corografia brasílica”, na qual reúne informações
e dados do Brasil daquela época (MOREIRA, 2009).
Delgado de Carvalho nasceu no final do século XIX (1884) e, estudando na França, no
início do século XX teve contato com a Geografia de La Blache. Em 1913, Carvalho fez uma
divisão do Brasil nas regiões: Meridional, Central, Setentrional, Oriental e Norte-oriental.
Esta divisão serviu de base para a regionalização do IBGE no ano de 1941. Escreveu algumas
obras, dentre as quais “Metodologia do ensino geográfico”, em 1925 e, no ano de 1935,
assumiu “[...] a cátedra de Geografia Humana da Universidade do Distrito Federal (UDF),
-
22
mais tarde transformada em Universidade do Brasil (UB) e hoje Universidade Federal do Rio
de Janeiro (UFRJ)” (MOREIRA, 2009, p. 31).
Deffontaines chegou ao Brasil no ano de 1934 e foi responsável pela criação dos
cursos de Geografia na Universidade de São Paulo (USP) e na UDF. Também atuou na
criação da Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB) e do Conselho Nacional de
Geografia (CNG). Voltou para a França no ano de 1938, deixando algumas obras como
“Geografia humana do Brasil”1.
Monbein chegou ao Brasil em 1935 para trabalhar na USP quando Deffontaines foi
para o Rio de Janeiro. Presidiu a AGB e atuou na criação do CNG. Ficou no Brasil até 1946 e
produziu várias obras. No entendimento de Ruy Moreira (2009, p. 33), “[...] é Monbein quem
traça o perfil da primeira geração de geógrafos de São Paulo, muitos dos quais vão substituí-
lo na USP quando regressa a seu país.”
Ruellan veio ao Brasil no ano de 1940 e trabalhou na UB e no IBGE. Seus trabalhos
estiveram relacionados à geomorfologia, escrevendo obras como “Evolução geomorfológica
da baía de Guanabara e das regiões vizinhas”, publicada na Revista Brasileira de Geografia
(RBG) de 1944, e “O escudo brasileiro e dobramentos de fundo”, em 1953. A primeira das
duas obras foi republicada na RBG, volume 50, número especial, no ano de 1988.
Waibel veio para o Brasil no ano de 1946. Trabalhou no IBGE e seus estudos foram
direcionados para a Geografia Agrária. Produziu vários textos que foram transformados em
livro no ano de 1958, cujo título era “Capítulos de geografia tropical e do Brasil”. Em 1949, a
RBG publicou “Princípios da colonização europeia no sul do Brasil”, obra republicada na
RBG de 1988 como um dos textos clássicos da Geografia.
Referindo-se à consolidação da Geografia Brasileira, Antunes destaca:
A armação de um aparato institucional dedicado a essa disciplina data da década de
1930 com a organização dos cursos universitários de Geografia em São Paulo (1934)
e no Rio de Janeiro (1935), a normatização da disciplina no ensino básico de alguns
Estados, a fundação da Associação dos Geógrafos Brasileiros (1934), a criação, pelo
Estado, do Conselho Nacional de Geografia (1937) e do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (1938). É correto afirmar que a criação dessas instituições se
coloca como estratégia utilizada na busca da cientificidade, da legitimidade e da
inserção da profissão na modernidade. Tais atos, interligados, rapidamente
conformam uma comunidade de geógrafos no país (ANTUNES, 2008, p. 32).
Ressaltando a importância da AGB, Cardoso faz a seguinte afirmação:
1 Publicada na Revista Brasileira de Geografia (RBG) de 1939, em forma de livro no ano de 1952 e, também, na RBG, volume 50, número especial, no ano de 1988.
-
23
A Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB) foi fundada, em São Paulo, em
1934, no mesmo ano em que se iniciavam os cursos de Geografia e História da
Universidade de São Paulo. [...] No trabalho de Carlos Augusto de Figueiredo
Monteiro (2002), o autor ressalta que a AGB é a associação que vai se articular com
outras instituições – universidades e o IBGE, formando o tripé da Geografia
brasileira no pós-1930 e que vai articular a comunidade de geógrafos no Brasil
(estudantes, professores e técnicos), desde sua fundação até os dias atuais
(CARDOSO, 2015, p. 85).
Com a criação da AGB surgem os boletins de Geografia estaduais que vão reunir o
conhecimento geográfico produzido em uma escala regional. No estado do Rio Grande do Sul
(RS), isso ocorre a partir da década de 1970, ou seja, é a partir de 1974 que ocorre a primeira
publicação do BGG.
Esta fase de consolidação da Geografia Brasileira tem seu reconhecimento a nível
internacional no ano de 1956, com a efetivação do congresso da União Geográfica
Internacional (UGI). O evento ocorreu no Rio de Janeiro e mobilizou geógrafos de diversas
instituições para a produção de obras que apresentassem o Brasil ao mundo. Os geógrafos
brasileiros e suas obras são relacionados abaixo:
Fernando F. M. de Almeida e Miguel Alves de Lima, do IBGE, escrevem o livro 1,
Planalto centro-ocidental e Pantanal mato-grossense; Ney Strauch, do IBGE, o
livro 2, Zona metalúrgica de Minas Gerais e vale do Rio Doce; Ary França, da USP,
o livro 3, A marcha do café e as frentes pioneiras; Aziz Ab’Saber, da USP e Nilo
Bernardes, do IBGE, o livro 4, Vale do Paraíba, serra da Mantiqueira e arredores
de São Paulo; Lysia Maria Cavalcanti Bernardes, do IBGE, o livro 5, Planície
litorânea e zona canavieira do estado do Rio de Janeiro; Alfredo Porto Domingues,
do IBGE, e Elza Coelho de Souza Keller, da USP, o livro 6, Bahia; Mário Lacerda
de Melo, de Pernambuco, o livro 7, Paisagens do Nordeste em Pernambuco e
Paraíba; Lucio de Castro Soares, do IBGE, o livro 8, Amazônia; e Orlando
Valverde, do IBGE, o livro 9, Planalto meridional do Brasil (MOREIRA, 2009, p.
35).
Percebemos que a Geografia Brasileira teve um grande desenvolvimento entre metade
da década de 1930 e metade da década de 1950, ou seja, muita coisa se fez neste período de
aproximadamente 20 anos. Autores que participaram do congresso da UGI, em 1956,
ganharam destaque nas décadas seguintes, como é o caso de Aziz Ab’Saber2 e Lysia
Bernardes3.
Tendo em vista a diversidade temática da Geografia produzida no Brasil a partir da
década de 1950, limitamos nosso foco de estudo à análise da GE, apresentando sua origem e
definição a partir de trabalhos, sobretudo, de autores brasileiros.
2 Domínios morfoclimáticos
3 Classificação climática do Brasil
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24
2.4 A GEOGRAFIA ECONÔMICA
Estudo feito por Nunes (2000) apontou a origem do vocábulo “Geografia Econômica”
nos trabalhos de um alemão chamado Gotz, no ano de 1882. A denominação teria surgido a
partir do termo “Geografia Comercial”. Nunes verificou que o vocábulo surgiu na Alemanha,
mas a base da GE foi construída a partir da Geografia Regional de Paul Vidal de La Blache.
Se o termo “Geografia Econômica” surgiu no final do século XIX, convém destacar
que Ritter já fazia uma Geografia que pode ser considerada como sendo econômica antes
disso, conforme afirmação de Pires do Rio (2012, p. 173): “Em um dos primeiros trabalhos de
geografia econômica, Carl Ritter (1779-1859) analisou os efeitos da navegação a vapor na
organização do espaço”.
Outro autor que defende a ideia de que foi Ritter o primeiro a fazer estudos de GE é
Claval (2005), para ele:
A geografia econômica apareceu na Alemanha sob a influência de Carl Ritter e se
desenvolveu desde o fim dos anos 1850. Seu objetivo era a descrição da
diferenciação de regiões econômicas num tempo onde as ferrovias e a navegação a
vapor abriram novas possibilidades de especialização produtiva (CLAVAL, 2005, p.
13).
Claval apresenta um histórico evolutivo da GE: ele faz uma comparação entre a GE do
século XIX, focada no princípio da analogia entre as regiões econômicas e no aspecto
descritivo, e a GE do final do século XX, direcionada ao estudo dos polos de crescimento,
globalização, crescimento das metrópoles, mobilidade e problemas ambientais, substituindo o
aspecto descritivo pela preocupação em entender mecanismos e processos.
A geografia econômica ficou muito tempo isolada da economia e do resto da
geografia. Ela se apresentava como uma descrição das atividades produtivas, dos
fluxos de bens e de grandes mercados. A situação começou a mudar há cinqüenta
anos atrás. A evolução se fez em duas fases: 1- Na primeira, o interesse ficou
centrado sobre a produção, mas o objetivo mudou. A explicação de mecanismos e de
processos de decisão substitui a descrição. Os problemas da polarização do
crescimento pareceram centrais nesse período. 2- Na segunda fase, a atenção se
abriu sobre novos problemas: a globalização, a metropolização, a mobilidade
crescente e suas conseqüências, as questões ambientais (CLAVAL, 2005, p. 23).
Pelas afirmações de Claval (2005), temos, então, uma GE que segue dois caminhos:
1º-vai da descrição para a explicação do fato econômico, pelo menos se compararmos o final
do século XIX com o final do século XX; 2º-vai da priorização da produção para a priorização
-
25
do consumo. O autor finaliza o artigo concebendo uma GE focada, principalmente, naquilo
que entendemos como uma cultura do consumismo:
O papel da geografia econômica no contexto das ciências econômicas é, hoje, maior
que no passado. Ela explora a influência da cultura no domínio do consumo, estuda
os circuitos econômicos “solidários” e de redistribuição; ela contribui também para
o estudo da flexibilidade e da metropolização (CLAVAL, 2005, p. 23).
Não é nosso interesse aprofundar o estudo da GE a nível geral/mundial. Na sequência,
vamos direcionar nosso foco para o Brasil. Já abordamos a gênese da Geografia Brasileira,
passaremos agora para a GE.
2.5 A GEOGRAFIA ECONÔMICA NO BRASIL
Ao tratar da GE produzida no Brasil, Silva (1978) identifica quatro temas gerais que
vão se impondo sucessivamente. A predominância de um dos quatro temas identifica, para
nós, um período ou fase da GE. Sendo assim, na primeira fase ocorre uma preocupação com
os recursos naturais e humanos (déc. 1940); na segunda, o foco dos estudos é a produção e a
circulação (déc. 1950); na terceira, ocorre uma preocupação com o desenvolvimento e o
subdesenvolvimento (déc. 1960/1970); na fase mais recente a GE brasileira preocupa-se,
sobretudo, com a organização do espaço (déc. 1970).
Silva (1978) cita exemplos de trabalhos característicos de cada período ou fase:
primeiro - “As bases geográficas da vida econômica” de Dirceu L. de Mattos; segundo -
“Geografia Econômica” de Pierre George; terceiro - os trabalhos de R. Haddock Lobo e de
Elian A. Lucci, ambos com o título “Geografia Econômica”; quarto - “Geografia Econômica”
de Manuel C. de Andrade.
De acordo com Silva (1978, p. 32, nota de rodapé), a obra de Mattos é inédita e
“Aborda sistematicamente as variáveis geográficas físicas e sua relação com o homem.” Para
quem estiver interessado no livro, recomendamos procurar a biblioteca da Universidade de
São Paulo (USP), Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA)4.
Dentre as obras apontadas por Armando Corrêa da Silva como referência das fases
pelas quais a GE passou, não nos foi possível ter acesso à obra da primeira fase. Sendo assim,
4 MATTOS, Dirceu Lino de. Bases geográficas da vida econômica. [S. l.: s. n.], 1970.
-
26
apresentamos, na sequência, algumas características das obras que tivemos acesso, ou seja:
George, Lobo, Lucci e Andrade.
Segundo George (1970, p. 9), a GE “[...] tem por objeto o estudo das formas de
produção, assim como o da localização do consumo dos diferentes produtos no âmbito
mundial.” Para ele, um estudo de GE leva em consideração aspectos culturais, descobertas
científicas e os sistemas definidores da política, da economia e das questões sociais. George
(1972, p. 93) afirma que a GE clássica inclui: “Geografia agrícola, geografia industrial,
geografia dos transportes e do comércio [...]”.
No entendimento de George (1970, p. 9-10): “Todo ensaio racional de Geografia
Econômica, portanto, se inicia por uma consideração sôbre [sic] a distribuição da população
do Globo e pelo exame das formas de produção e de consumo próprias aos diferentes grupos,
conforme a estrutura de sua economia.” O professor afirma que a GE deve direcionar sua
atenção, principalmente, na atividade industrial porque “[...] a chave dos mecanismos da
economia contemporânea é fornecida pelo conhecimento das formas de produção industrial e
das condições de seu desenvolvimento.”
De acordo com o professor Pierre George, a lógica do estudo da GE consiste em “[...]
analisar sucessivamente todos os fatos que exercem uma influência sôbre [sic] a repartição da
produção, sôbre [sic] a sua intensidade em cada região e sobre a distribuição do consumo,
relativamente à produção” (GEORGE, 1970, p. 11).
Ao tratar da GE, Lobo (1965, p. 15), propõe a superação do aspecto descritivo, que é
característica marcante da Geografia Clássica. No entendimento dele, a GE deve estudar uma
região ou nação no intuito de “compreender as causas da situação econômica” e “prever as
respectivas possibilidades de progresso e desenvolvimento”. Segundo ele:
Encontra-se superada a concepção de Geografia Econômica como simples
enunciado da distribuição das riquezas, das fontes e dos tipos de produção por
diferentes regiões. Semelhante ponto de vista, puramente descritivo vem sendo
substituído pela preocupação de compreender as causas da situação econômica, em
cada nação ou região, e também pelo interesse em prever as respectivas
possibilidades de progresso e desenvolvimento (LOBO, 1965, p. 15).
Lobo (1965) afirma que a Geografia já deu muita importância ao meio físico.
Geógrafos seguidores de Ratzel entendiam que os aspectos físicos de uma região eram os
principais determinantes do futuro econômico da população. O autor afirma que o meio físico
é importante, mas em um “[...] mesmo meio geográfico, a qualidade e quantidade de produção
-
27
e o grau de riqueza das populações podem variar muito, dependendo as variações, em grande
parte, de fatores históricos” (LOBO, 1965, p. 27).
Ao invés de classificar as populações mundiais em desenvolvidas e subdesenvolvidas,
Lobo (1965), prefere classificá-las dentro de quatro possibilidades: primitivas,
subdesenvolvidas, paradesenvolvidas e desenvolvidas. As populações primitivas são aquelas
que sobrevivem de caça, pesca, coleta, pastoreio e agricultura primitiva, tendo uma economia
de subsistência. Populações desenvolvidas e subdesenvolvidas se distinguem pela capacidade
técnica e industrialização, sendo alta nas primeiras e baixa nas segundas. As populações
paradesevolvidas possuem nível de capacidade técnica e desenvolvimento industrial médio,
situando-se entre as desenvolvidas e as subdesenvolvidas.
Para Lucci, a GE “[...] tem por objetivo o estudo das formas de produção, localização
e consumo dos diferentes produtos do meio natural em que vivemos” (LUCCI, 1975, p. 16).
Quanto às suas divisões, o autor afirma existirem diversas concepções, porém considerando
os aspectos de produção, distribuição, consumo, etnografia e sociologia, podemos fracioná-la
em:
a) Geografia da População – voltada principalmente para os problemas da
distribuição geográfica e estrutura da população.
b) Geografia Agrária – que procura descrever e interpretar os diferentes sistemas,
formas de cultura e atividades de criação de animais, as paisagens a que dão origem,
e as estruturas sobre que exercem influência.
c) Geografia Industrial – que aborda a distribuição geográfica dos complexos
industriais, relacionando-os com as paisagens por eles geradas, bem como
estudando-os em relação aos mercados de matéria-prima, de consumo e de mão-de-
obra.
d) Geografia dos Serviços – preocupa-se principalmente com a distribuição e
organização do comércio, transportes, educação, em áreas da superfície terrestre,
enfocando com maior destaque os aspectos urbanos.
e) Geografia Rural – dirige seus estudos para a área rural, o campo, analisando a
atuação dos diversos fatores humanos, principalmente aqueles que são considerados
qualitativos.
f) Geografia Urbana – que, como o próprio nome diz, volta-se para o estudo das
cidades em seus vários aspectos, tais como sua morfologia, atividades industriais e
de serviços. Preocupa-se, também, numa abordagem mais dinâmica, em estudar as
relações existentes entre as cidades e as áreas nas quais exercem influência e que,
por outro lado, delas dependem.
g) Geografia da Energia – que estuda as fontes de energia, suas formas de
exploração e grau de utilização e a influência do consumo e o seu significado na
vida do homem. (Ibid. p. 18, grifo nosso).
Referindo-se à classificação dos países em desenvolvidos e subdesenvolvidos, mesmo
afirmando que os termos ainda não estão bem definidos, Lucci (1975) entende como países
desenvolvidos os que tiveram maior desenvolvimento da atividade industrial. Para ele, o
desenvolvimento de um país está atrelado à disponibilidade de recursos naturais, humanos e
-
28
tecnológicos. Países deficientes em algum destes recursos, ou dependentes de outros países,
são subdesenvolvidos. De acordo com o autor, “subdesenvolvimento” é um termo que surgiu
na ONU, em 1949 e, por ser considerado áspero e insultuoso, está sendo substituído por “em
desenvolvimento”.
Para Andrade (1998, p. 23), a GE consiste em analisar “[...] a organização do espaço
em função da apropriação dos recursos naturais e da transformação dos bens em mercadorias,
em uma sociedade avançada [...]”. Na obra de Andrade5, observamos que a preocupação
central é a organização do espaço, conforme afirmação do autor:
[...] tivemos uma preocupação central de analisar as formas pelas quais o homem
vem ocupando o espaço terrestre e a utilização que vem fazendo dos recursos
disponíveis. Assim, o leitor verá como se distribuem os recursos pela superfície da
Terra e as formas de organização do espaço elaboradas em função da utilização
destes recursos pelo homem, espontânea ou planejadamente. (ANDRADE, 1998, p.
15).
Na atualidade, temos dificuldade em obter livros de GE produzidos em nosso país,
sendo que as produções encontradas não se preocupam em definir GE. Quando pesquisamos
por livros de GE nos endereços eletrônicos das livrarias, observamos que aparecem alguns
títulos, mas eles estão indisponíveis/esgotados ou, então, encontramos livros de autores que
não são formados em Geografia.
Exemplifica tal fato, o livro de Marcos Antônio de Moraes, “Geografia Econômica:
Brasil de colônia a colônia”. A obra é de 2010 e apresenta, basicamente, os ciclos econômicos
pelos quais o país passou e as políticas econômicas dos governos a partir de Getulio Vargas.
Não apresenta definição de GE. O autor possui graduação em ciências sociais e pós-
graduação em climatologia, tendo atuado no Ensino Médio e em cursos pré-vestibulares.
Embora os livros didáticos da educação básica tragam aspectos da economia, notamos
que a GE está sendo esquecida, uma vez que é difícil de encontrar produções específicas deste
ramo do conhecimento geográfico. A GE atual tem se apresentado como um amontoado de
informações econômicas sem discussão a respeito dos processos e relações envolvidos. Em
nosso país faltam autores que aprofundem a discussão e sejam referência segura dentro da
GE.
A definição de GE mais recente que encontramos, e que assumimos como base para a
elaboração desta pesquisa, defende que a GE estuda o fato econômico que determina a
organização do espaço. De acordo com Nunes (2000, p. 31): “A Geografia Econômica
5 “Geografia Econômica”, 12ª edição, publicada em 1998 e que é uma atualização do livro publicado no início da
década de 1970.
-
29
sustenta-se primeiramente por apresentar uma característica básica: a precedência do
fato/evento econômico na determinação dos processos e relações que produzem as diferentes
formas espaciais.”
Embora tenhamos decidido pela definição de Nunes (2000), vamos fazer mais alguns
comentários, referentes às definições, de modo que possamos perceber como elas se alteram
com o tempo.
2.6 AS DEFINIÇÕES DE GEOGRAFIA ECONÔMICA
No Quadro 01, procuramos resgatar as definições de GE apresentadas pelos autores
citados por Silva (1978) como representantes das fases 2, 3 e 4, pois entendemos que estes
autores são os principias representantes da GE produzida no Brasil. Além disso,
acrescentamos a definição de Nunes (2000) por tratar-se de uma definição mais recente.
Quadro 01 – Definições de GE
Autor Definição de geografia econômica Título/ano da publicação
[primeira edição
brasileira]
Pierre
George
“[...] tem por objeto o estudo das formas de
produção, assim como o da localização do
consumo dos diferentes produtos no âmbito
mundial.”
Geografia
Econômica/1970 (5. ed. da
2. ed. francesa de 1958)
[1961]
Roberto
Jorge
Haddock
Lobo
“Encontra-se superada a concepção de Geografia
Econômica como simples enunciado da
distribuição das riquezas, das fontes e dos tipos
de produção por diferentes regiões. Semelhante
ponto de vista, puramente descritivo vem sendo
substituído pela preocupação de compreender as
causas da situação econômica, em cada nação ou
região, e também pelo interesse em prever as
respectivas possibilidades de progresso e
desenvolvimento.”
Geografia
Econômica/1965 [1965]
Elian
Alabi
Lucci
“[...] tem por objetivo o estudo das formas de
produção, localização e consumo dos diferentes
produtos do meio natural em que vivemos.”
Geografia Econômica:
Geografia do
desenvolvimento
econômico mundial e do
Brasil/1975 (2. ed.) [1973]
Manuel
Correia
de
Andrade
“[...] analisa a organização do espaço em função
da apropriação dos recursos naturais e da
transformação dos bens em mercadorias, em
uma sociedade avançada [...]”
Geografia
Econômica/1998 (12. ed.)
[1973]
-
30
Flaviana
Gasparotti
Nunes
“A Geografia Econômica sustenta-se
primeiramente por apresentar uma característica
básica: a precedência do fato/evento econômico
na determinação dos processos e relações que
produzem as diferentes formas espaciais.”
A Geografia Econômica na
produção científica
acadêmica dos programas
de pós-graduação em
Geografia no estado de
São Paulo (1970 -
1998)/2000 [2000]
Fonte: George (1970); Lobo (1965); Lucci (1975); Andrade (1998); Nunes (2000). Organizado pelo autor.
Em um primeiro momento, observando as definições presentes no quadro, percebemos
que a palavra ou o termo chave da GE é “produção”. Trata-se da GE segunda fase, a geografia
de Pierre George, o qual se preocupa, sobretudo, com a atividade industrial.
A segunda definição traz a produção atrelada ao desenvolvimento. É a GE terceira fase
(SILVA, 1978), a fase em que as questões relativas ao desenvolvimento econômico são
centrais. Para Lobo, a geografia deve compreender as causas da situação econômica e prever
possibilidades de desenvolvimento.
Nas definições mais recentes percebemos que a GE procura entender a relação entre as
atividades produtivas e a organização do espaço. A GE estuda a organização do espaço a
partir das atividades econômicas. Nos trabalhos da GE, os fatos ou eventos econômicos são o
principal determinante da produção/organização do espaço.
Neste estudo, foram selecionados como sendo da GE, os artigos do BGG que se
enquadram da definição de GE apresentada por Nunes (2000).
2.7 CLASSIFICANDO TRABALHOS DE GEOGRAFIA ECONÔMICA
Definido um artigo como sendo da GE, enquadrando-o dentro de uma das temáticas
apresentadas por Nunes (2000): agricultura, indústria, comércio, migrações, relações de
trabalho, caracterização econômica de regiões, discussões teórico-metodológicas, transportes,
renda da terra urbana, artesanato/garimpo; procuramos classificá-lo em uma das três correntes
geográficas apresentadas por Moraes (2007) e em um dos quatro períodos ou fases da GE
propostos por Silva (1978).
Quanto às abordagens dos trabalhos, observamos que para Nunes (2000) são apenas
duas: analítico-descritiva ou empírico-analítica e crítica ou dialética. Sendo assim, e na
tentativa de irmos mais além, optamos por utilizar, também, o trabalho de Alves (2012). Este
-
31
autor estudou as abordagens metodológicas da geografia agrária clássica brasileira, no período
1941 a 1960, identificando onze abordagens diferentes: descritiva, histórica, estatística,
comparativa, causa-efeito, determinista, estatístico-fisionômico-ecológico, histórico-dialética,
neo-positivista, sociológica e sistemática.
Considerando que o trabalho de Alves (2012) trata de uma fração da GE (a Geografia
Agrária) e de um período anterior ao que nos propomos a estudar, torna-se necessário fazer
uma resalva: estamos generalizando as abordagens para toda a GE e identificando estas
abordagens em um período posterior (1974-1999).
-
32
3 A GEOGRAFIA ECONÔMICA DO BOLETIM GAÚCHO DE GEOGRAFIA (1974-
1999)
O Boletim Gaúcho de Geografia (BGG) é uma publicação na qual são veiculados
artigos de diferentes temáticas relacionadas à ciência geográfica. Deste modo, encontramos no
BGG pesquisas de diferentes campos da Geografia, dentre os quais está a GE.
3.1 O BOLETIM GAÚCHO DE GEOGRAFIA
O BGG surgiu em 1974 e até o ano de 2016 publicou 380 artigos distribuídos em 43
volumes. Durante o período 1974-2016, houve anos em que nada foi publicado e anos com
expressivo número de publicações. A quantidade de artigos publicados em cada ano pode ser
observada no Gráfico 01.
Gráfico 01 – Distribuição dos artigos publicados no BGG, período 1974-2016
Fonte: Boletim Gaúcho de Geografia (2017). Organizado pelo autor.
Ao analisarmos a distribuição dos artigos publicados no período de 1974 a 2016,
percebemos significativo aumento da quantidade de publicações de uma década para a
0 2 4 6 8
10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30 32 34 36 38
Nú
me
ro d
e a
rtig
os
Ano
-
33
seguinte, sendo 12 artigos na primeira (1974 a 1979), 56 na segunda (1980 a 1989), 86 na
terceira (1990 a 1999), 95 na quarta (2000 a 2009) e 131 na quinta década (2010 a 2016). Em
valores percentuais temos 3%, 15%, 23%, 25% e 34%, respectivamente, conforme Gráfico
02.
Gráfico 02 – Percentual do total de artigos publicados no BGG, por década
Fonte: Boletim Gaúcho de Geografia (2017). Organizado pelo autor.
Quanto ao número de páginas dos 380 artigos do BGG, calculando a média aritmética
simples e o coeficiente de variação, encontramos os valores: 14 e 46%, respectivamente.
Observando as médias de número de páginas dos artigos, ano a ano, percebemos, de modo
geral, que na década de 1990 os artigos possuíam quantitativo de páginas menor em relação às
décadas mais recentes, conforme Gráfico 03.
3%
15%
23%
25%
34% Década de 1970
Década de 1980
Década de 1990
Década de 2000
Década de 2010
-
34
Gráfico 03 – Artigos do BGG: número médio de páginas para cada ano
Fonte: Boletim Gaúcho de Geografia (2017). Organizado pelo autor.
Ao observar as publicações, percebemos que alguns autores se destacam, ou seja,
tiveram vários artigos publicados no BGG. Os autores com mais de três artigos publicados
são vinte e um, conforme Gráfico 04, sendo que a maioria está ou esteve vinculada à
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
20
.0
28
.7
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2
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.5
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.2
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.0
9.7
1
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7.4
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10
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.8 20
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Ano
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35
Gráfico 04 – Autores com mais de três artigos publicados no BGG, período 1974-2016
Fonte: Boletim Gaúcho de Geografia (2017). Organizado pelo autor.
Observando o Gráfico 04, constatamos que todos os autores com mais de cinco artigos
publicados no BGG estão ou estiveram vinculados à UFRGS. Dentre os vinte e um autores
apresentados, mais de 60% deles possuem ou possuíram vínculo com a UFRGS, sendo os
outros autores, representantes das instituições de ensino: UFSM, UFF, UNIJUÍ, UPF e
URCAMP.
A distribuição percentual dos autores com mais de 3 artigos publicados no BGG entre
1974 e 2016, por instituição de ensino, está representada no Gráfico 05. São 6 instituições
onde 66% dos autores pertencem à UFRGS, 14% pertencem à UFSM e os outros 20%
distribuem-se igualmente entre as outras 4 instituições (UFF, UNIJUÍ, UPF, URCAMP).
0
2
4
6
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12 N
úm
ero
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Autores
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Gráfico 05 – Distribuição dos autores com mais de 3 artigos publicados no BGG (1974-2016),
por instituição de ensino
Fonte: Boletim Gaúcho de Geografia (2017). Organizado pelo autor.
Quanto à estrutura dos artigos, observamos que os primeiros textos, sobretudo da
década de 1970, possuem estruturas variadas. Não apresentam resumo, alguns artigos
possuem qualificações do autor, enquanto outros não trazem estas informações. Os textos
podem apresentar introdução ou não. Considerações finais (ou conclusões) podem estar
presentes ou não, sendo que o número de páginas também é bastante variável: um artigo de
Álvaro L. Heidrich, publicado em 1979, possui 5 páginas, enquanto que um artigo de Raphael
Copstein, publicado em 1975, possui 45 páginas.
Com o passar do tempo, o BGG foi sendo melhor estruturado. A partir de 2002 os
artigos passam a apresentar resumo e a variabilidade em relação ao número de páginas dos
artigos diminui. Introdução e considerações finais (ou conclusões) tornam-se frequentes,
embora ainda não sejam padrão, pois dentre as publicações da década de 2010 ainda
encontramos artigos sem a presença de tópicos como considerações finais (ou conclusões)
e/ou introdução.
Feitas as considerações iniciais/gerais referentes ao BGG, passaremos ao estudo da GE
presente no boletim objeto deste estudo, a começar pela década de 1970. Lembramos que os
textos são considerados de GE ou não a partir da definição de GE apresentada por Nunes
(2000). Os textos selecionados foram classificados por temática (NUNES, 2000), abordagem
UFRGS 66%
UFSM 14%
UFF 5%
UNIJUÍ 5% UPF
5%
URCAMP 5%
-
37
(NUNES, 2000; ALVES, 2012), corrente do pensamento geográfico (MORAES, 2007) e fase
ou tema central da GE (SILVA, 1978).
3.2 A GEOGRAFIA ECONÔMICA (1974-1999)
De 1974 a 1999, o BGG publicou 154 artigos dentre os quais classificamos 43 como
sendo de GE, ou seja, considerando o período em estudo, a GE esteve presente em
aproximadamente 28% dos trabalhos.
3.2.1 As temáticas
No trabalho de Flaviana Gasparotti Nunes (2000) são apresentadas 25 temáticas
referentes à GE: relações de trabalho, migrações, caracterização econômica de regiões,
transportes, discussões teórico-metodológicas, artesanato/garimpo, renda da terra urbana, 7
temáticas relativas à agricultura (modernização, pequena produção, relações de trabalho,
quadros agrários e agrícolas – atividades, agricultura e produção do espaço, cooperativas,
agroindústria), 4 temáticas relativas à indústria (ramos, estudo de caso – local, distritos,
tecnopólos) e 7 temáticas relativas ao comércio (ambulante, shopping centers, atacado,
franquias, varejo, regional – estudo de caso, supermercados e entrepostos). Porém,
considerando que não foram encontradas todas as temáticas de agricultura, indústria e
comércio, optamos por representar no Gráfico 06, agricultura como sendo uma única
temática, procedendo da mesma forma para a indústria e para o comércio.
Observando o Gráfico 06, percebemos que a temática mais expressiva nos artigos de
GE analisados é “caracterização econômica de regiões”, correspondendo a 30% dos artigos.
Destacam-se também as temáticas: “migrações” e “agricultura”, com 14% dos trabalhos para
cada uma e “comércio”, correspondendo a 11% do total de trabalhos analisados. O tema
“transportes” aparece em 9% dos artigos e o tema “discussões teórico-metodológicas” em 7%
dos trabalhos. Os temas “indústria”, “renda da terra urbana” e “relações de trabalho”
correspondem, cada um, a 5% dos artigos. Percebemos, também, a ausência da temática
“artesanato/garimpo”, pois ela não foi encontrada em nenhum dos artigos analisados.
-
38
Gráfico 06 – Distribuição das temáticas da GE do BGG (1974-1999)
Fonte: Boletim Gaúcho de Geografia (2017). Organizado pelo autor.
Detalhando os assuntos relativos à agricultura, à indústria e ao comércio é possível
fazer as seguintes considerações: dentre os 6 trabalhos de GE referentes à agricultura, 3 foram
classificados como “agricultura e produção do espaço” e os outros 3 como “agricultura
(pequena produção)”; em relação à indústria, foram encontrados apenas 2 artigos, sendo 1
“indústria (tecnopólos)” e 1 “indústria (distritos)”; para o comércio, são 4 “comércio regional
(estudo de caso)” e 1 “comércio (shopping centers)”.
Comparando este estudo com o efetuado por Nunes (2000), no estado de São Paulo
(SP), percebemos nítida diferença: no RS a temática mais estudada não é agricultura. Se na
investigação feita nos trabalhos de pós-graduação da USP e da Universidade Estadual Paulista
(UNESP), no período de 1970 a 1998, a agricultura foi o tema mais estudado, no BGG, no
período de 1974 a 1999, a temática que mais aparece é caracterização econômica de regiões.
Dividindo os trabalhos por década, podemos dizer que a década de 1970 é de pouca
expressão, uma vez que são apenas 5 artigos, representando apenas duas temáticas. Nesta
década predominou a temática “caracterização econômica de regiões” (Gráfico 07).
Agricultura 14%
Indústria 5%
Comércio 11%
Migrações 14%
Caracterização Econômica de
regiões 30%
Transportes 9%
Discussões Teórico-
metodológicas 7%
Renda da terra urbana
5% Relações de trabalho
5%
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Gráfico 07 – Temáticas da GE do BGG na década de 1970
Fonte: Boletim Gaúcho de Geografia (2017). Organizado pelo autor.
A década de 1980 é a que apresenta maior número de artigos de GE. São 20 artigos em
um total de 56 artigos publicados no BGG. A temática “caracterização econômica de regiões”,
como na década anterior, é a mais expressiva, mas surgem outras temáticas. O tema
“agricultura” aparece como o segundo em ordem de importância, seguido de “discussões
teórico-metodológicas” e “migrações” (Gráfico 08).
Gráfico 08 – Temáticas da GE do BGG na década de 1980
Fonte: Boletim Gaúcho de Geografia (2017). Organizado pelo autor.
Já na década de 1990, a temática “caracterização econômica de regiões” perde
importância. Nesta década é a temática “comércio” que se destaca. Os temas “migrações” e
“caracterização econômica de regiões” aparecem em segundo lugar na ordem de importância.
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5
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40
Com um mesmo número de trabalhos, aparecem: “agricultura”, “transportes” e “renda da terra
urbana” (Gráfico 09).
Gráfico 09 – Temáticas da GE do BGG na década de 1990
Fonte: Boletim Gaúcho de Geografia (2017). Organizado pelo autor.
3.2.2 As abordagens
Como já afirmamos anteriormente, tratando-se de abordagens teórico-metodológicas,
estamos considerando duas propostas de classificação, começando pela proposta de Nunes
(2000). Esta autora considerou para a GE apenas duas abordagens: analítico-descritiva e
crítica ou dialética, identificando certa equivalência entre as duas abordagens nas dissertações
e teses produzidas no estado de São Paulo entre 1970 e 1998.
Comparando os resultados obtidos por Nunes (2000), no estudo da GE produzida nos
cursos de pós-graduação do estado de São Paulo, com a análise dos artigos do BGG feita por
nós, percebemos uma diferença: a predominância da abordagem analítico-descritiva nos
artigos do BGG. Este resultado pode ser observado no Gráfico 10.
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Gráfico 10 – Abordagens da GE do BGG (1974-1999), de acordo com Nunes (2000)
Fonte: Boletim Gaúcho de Geografia (2017). Organizado pelo autor.
Entretanto se considerarmos as abordagens por década, constatamos que na década de
1990 elas se equivalem (Gráfico 11). A abordagem crítica ou dialética surge na década de
1980 e se torna mais comum nos artigos de GE da década de 1990. Tanto no trabalho de
Nunes (2000), quanto em nosso trabalho, percebemos um crescimento da abordagem crítica
da década de 1980 para a década de 1990.
Gráfico 11 – Abordagens da GE do BGG, por década, de acordo com Nunes (2000)
Fonte: Boletim Gaúcho de Geografia (2017). Organizado pelo autor.
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Analítico-descritiva Crítica ou dialética
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Abordagem
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Déc. 1970 Déc. 1980 Déc. 1990
Analítico-descritiva
Crítica ou dialética
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42
Tomando por modelo o trabalho de Alves (2012), verificamos onze abordagens
diferentes: descritiva, histórica, estatística, comparativa, causa-efeito, determinista, estatístico-
fisionômico-ecológico, histórico-dialética, neo-positivista, sociológica, sistemática. Tais
abordagens constituem um detalhamento da abordagem analítico-descritiva apresentada por
Nunes (2000), pois em nossa análise consideramos todos os trabalhos de geografia crítica
como sendo de abordagem histórico-dialética. O Gráfico 12 apresenta as abordagens dos
artigos de GE do BGG, de acordo com Alves (2012).
Gráfico 12 – Abordagens da GE do BGG (1974-1990), de acordo com Alves (2012)
Fonte: Boletim Gaúcho de Geografia (2017). Organizado pelo autor.
Na análise dos artigos do BGG identificamos 8 das 11 abordagens apresentadas por
Alves (2012), os seja, não identificamos as abordagens determinista, sistemática e
sociológica. Entretanto, destacamos que esta pesquisa não tem a pretensão de encerrar o
assunto. Um estudo mais aprofundado, levando em consideração as referências utilizadas por
Alves (2012) e, talvez outros autores, poderia trazer resultados diferentes. Acreditamos que a
abordagem histórico-dialética poderia ser fracionada entre histórico-dialética e sociológica,
por exemplo.
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Nú
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Abordagem
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43
Pela definição apresentada por Alves (2012, p. 325), a abordagem sociológica tem seu
enfoque voltado “[...] para as análises da sociedade e das demandas da população, decorrente
das influências das outras áreas do conhecimento, ou seja, a inserção de teorias de outras
ciências na geografia, bem como o pluralismo metodológico adotado por alguns geógrafos.”
Pela definição considerada, ou seja, análise da sociedade a partir de outras ciências, não
classificamos nenhum artigo nesta abordagem.
De acordo com o autor que nos serve de base, a abordagem sistemática consiste em
“descrever a totalidade dos elementos regionais de forma sistemática e geral” e “a abordagem
determinista está centrada nas imposições que o meio físico exerce na constituição das
sociedades.” Em nosso entendimento, considerando estas definições, os trabalhos analisados
não tinham como principal abordagem o aspecto sistemático e nem o aspecto determinista.
3.2.3 As fases ou temas centrais
Como já afirmamos em nosso referencial teórico, a GE produzida no Brasil pode ser
classificada por temas centrais, fases ou períodos. Estes períodos estão presentes nos artigos
do BGG, principalmente o período ou fase mais recente. Observando o Gráfico 13,
percebemos que o tema central do último período da GE brasileira é o de maior expressão nos
artigos analisados.
Gráfico 13 – Os temas centrais da GE do BGG (1974-1999)
Fonte: Boletim Gaúcho de Geografia (2017). Organizado pelo autor.
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Recursos Prod. e Circ.
Desenv. Org. Esp.
Nú
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os
Fases ou temas centrais
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44
Se observarmos a GE do BGG por década, considerando o período em estudo,
identificamos a presença do tema “organização do espaço” nas três décadas, enquanto a
temática “desenvolvimento e subdesenvolvimento” aparece principalmente na década de
1980. Esta informação é evidenciada na Tabela 01.
Tabela 01 – Distribuição dos temas centrais da GE do BGG (1974-1999), por década
As fases da GE do BGG - Nº de artigos
Década Recursos naturais e humanos
Produção e Circulação
Desenvolvimento e subdesenvolvimento
Organização do Espaço
Total
70 0 0 0 5 5
80 1 0 10 9 20
90 0 0 5 13 18
Total 1 0 15 27 43
Fonte: Boletim Gaúcho de Geografia (2017). Organizado pelo autor.
Enquanto a fase caracterizada pelo estudo de questões relacionadas ao
desenvolvimento e subdesenvolvimento marcou a década de 1980, no BGG, o estudo da
organização do espaço perpassa as três décadas. Sendo assim, é correto afirmar que o tema
central da GE presente no BGG, entre 1974 e 1999, é a organização do espaço.
Quanto aos temas que, de acordo com Silva (1978), foram centrais na GE brasileira
das décadas de 1940 e 1950, percebemos que já não estão mais presentes. Os trabalhos de GE
focados nos recursos naturais e humanos ou na produção industrial são coisa do passado. A
presença do um art