UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAIBA CENTRO DE EDUCAÇÃO - … · A minha vó Maria (in memoriam), de...
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAIBA
CENTRO DE EDUCAÇÃO - CE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO – PPGE
OS EXERCÍCIOS NOS LIVROS DIDÁTICOS DE GEOGRAFIA
DESTINADOS AO ENSINO PRIMÁRIO NO BRASIL: UMA DISCUSSÃO
METODOLÓGICA (1880 – 1930)
JOSEANE ABÍLIO DE SOUSA FERREIRA
João Pessoa – PB
Maio de 2017
ii
JOSEANE ABÍLIO DE SOUSA FERREIRA
OS EXERCÍCIOS NOS LIVROS DIDÁTICOS DE GEOGRAFIA
DESTINADOS AO ENSINO PRIMÁRIO NO BRASIL: UMA DISCUSSÃO
METODOLÓGICA (1880 – 1930)
Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em
Educação da Universidade Federal da Paraíba
(PPGE/UFPB), como requisito para obtenção do título
de Doutora em Educação.
Orientadora: Maria Adailza Martins de Albuquerque
Linha de pesquisa: História da Educação
João Pessoa – PB
Maio de 2017
iii
Catalogação na Publicação
Seção de Catalogação e Classificação
CDU - 911:37(043) UFPB/BC
Ferreira, Joseane Abílio de Sousa. Os exercícios nos livros didáticos de geografia destinados ao
ensino primário no Brasil: uma discussão metodológica (1880 –
1930) / Joseane Abílio de Sousa Ferreira. - João Pessoa, 2017. 316 f. : il.
Orientadora: Maria Adailza Martins de Albuquerque. Tese (Doutorado) - UFPB/CE/PPGE
1. Livros didáticos - geografia. 2. Ensino de Geografia. 3. Métodos de ensino - exercício. I. Título.
F383e
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JOSEANE ABÍLIO DE SOUSA FERREIRA
OS EXERCÍCIOS NOS LIVROS DIDÁTICOS DE GEOGRAFIA DESTINADOS AO
ENSINO PRIMÁRIO NO BRASIL: UMA DISCUSSÃO METODOLÓGICA (1880 – 1930)
Banca examinadora
________________________________________________
Profª. Dra. Maria Adailza Martins de Albuquerque
Orientadora – PPGE/UFPB
_________________________________________________
Profª. Dra. Vera Teresa Valdemarin
Examinadora externa – UNESP
_________________________________________________
Profª. Dr. Manoel Fernandes de Sousa Neto
Examinador externo – USP
_________________________________________________
Prof. Dr. Matheus da Cruz e Zica
Examinador interno – PPGH/UFCG
_________________________________________________
Profª. Dra. Mauricéia Ananias
Examinadora interna – PPGE/UFPB
________________________________________________
Profª. Dra. Circe Maria Fernandes Bittencourt
Suplente externa – USP
_________________________________________________
Prof. Dr. Wojciech Andrzej Kulesza
Suplente interno – PPGE/UFPB
João Pessoa – PB
Maio de 2017
v
Dedico
Ao meu vozinho João (In memoriam), que foi sinônimo de amor, significado
eterno do amor de Deus por mim e por minha história. Obrigada, meu Deus,
pela oportunidade de amar e de ser amada dessa maneira. Só quem já viveu
um amor assim sabe do que falo e a profundidade da dor que carrego em
mim. Lembrarei eternamente de nossas conversas, quantos conselhos
inesquecíveis! Como eu gostava de ouvir as histórias de sua vida, histórias de
luta, de um homem que lutou com garra para educar e cuidar dos seus filhos.
Sou grata a Deus pela oportunidade de ser sua neta... Meu João, tenho muito
orgulho de você.
A você, vozinha Maria (In memoriam), por todo o amor que me deu. O meu
amor por você vai além da dor da separação e da saudade que ficou em meu
coração, pois, o amor que deixou em mim tem alimentado minha vida e me
feito caminhar sentindo tua presença e seu cheiro. Eternas saudades da minha
Maria... Da velhinha mais linda e mais cheirosa, dona do sorriso mais fofo e
do abraço mais aconchegante... Como sinto falta de tê-la comigo, de sua
alegria e da força que tinha para lutar pela vida. Guardarei em mim
lembranças que nem o tempo poderá apagar, pois cada lembrança é regada
do amor que transborda e se eterniza em mim.
A meu amigo Thiago Mamede (In memoriam), pela amizade de criança, pelos
s momentos compartilhados e por o tudo que vivemos juntos. As lágrimas são
inevitáveis, pois queria demais você aqui, para ser um dos primeiros a
comemorar minha conquista, mas a vida tem seus contrários, você não está
mais aqui, e a saudade transpassa meu ser. Porém, em Deus, nos avessos da
vida, eu te encontro, porque amor que é amor vai além da vida.
A vocês, com saudades eternas.
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AGRADECIMENTOS
É chegada a hora de agradecer... Meu coração é tomado de muitos sentimentos, e o amor
e a gratidão são os que mais transbordam.
Ah se esse papel fosse capaz de registar o som das minhas lágrimas ao escrever esses
agradecimentos, pois eu chorei sim, e como chorei, pois muitas lembranças tomaram conta do
meu coração. Nesse momento, passa um filme sobre tudo o que vivi e os caminhos que trilhei
para chegar aqui. Se valeram a pena? Valeram muito, e eu faria tudo de novo, pois foi uma
experiência maravilhosa! Até nos momentos difíceis, eu encontrei refúgio, amparo, forças e o
“abraço” necessário de Deus e dos meus, para alcançar meu sonho de concluir essa etapa da
minha vida.
Por isso, agradeço a Deus, por tanto cuidado e zelo durante toda a minha caminhada
acadêmica; por toda a graça, força, sabedoria e por sua presença constate em minha vida. Em
cada detalhe, o meu Deus se fez presente, sua mão me amparou e em seus braços encontrei
refúgio para seguir, mesmo quando os caminhos eram meio turvos e cinzentos. Pude ver sua
mão em cada momento, sendo o sustento que de tanto precisei... Obrigada, meu amado Deus,
por sonhar comigo, por permitir que tudo se realizasse de acordo com seus projetos.
Ao Espírito Santo, por ter me inspirado e sempre sussurrar ao meu ouvido “Eu estou
contigo”;
A minha mãe, Teca, pelo amor sem medida. Como descrever o tamanho desse amor eu
nem sei, apenas sinto... Só sei que é divina nossa troca de olhares, o gosto do abraço e a
suavidade da presença, quando você segura em minhas mãos, e eu me torno forte e percebo que
o amor que existe entre nós é algo mágico. Obrigada por ser tudo o que preciso, por me
compreender apenas quando me olha e por tudo o que me ensina a cada dia. Nosso amor é
sempre forte para suportar as lutas e as batalhas desta vida, pois, desde muito cedo, você lutou
por mim... Muito obrigada por tanto amor!
Ao meu vô João (in memoriam), por ter sido meu pai, meu exemplo de homem bom e
íntegro... Seu coração tão grande me ensinou tanto aqui na terra! Com você aprendi muitas
coisas, até na sua força de silenciar me ensinou. Obrigada por ter me educado, amado e cuidado
de mim! Foi tanto amor ofertado que nunca vai acabar e sempre terei um pouco de você em
mim. Sua voz suave ficará guardada para sempre em meu coração e outras lembranças que
jamais o tempo vai apagar. E as maiores delas são seu sorriso fácil e sua voz a me abençoar...
Você será um amor que jamais acabará em mim!
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A minha vó Maria (in memoriam), de quem sinto muitas saudades. Um ano sem seu
abraço, sem seu cheiro e sem seu sorriso. Minha vida está tão vazia sem sua presença. Como
desejei ter você aqui! Seu abraço seria meu maior presente, mas não estava nos planos de Deus.
Não encontro palavras para descrever a falta que você me faz... Apenas recordo-me do seu
amor, pois sei que metade do amor que está em mim foi você quem me deu. Te amarei por toda
a vida!
Ao meu padrinho, Elias Barreiro (in memoriam), por todo o carinho. Você deixou muitas
saudades... Guardarei em mim seus ensinamentos. Obrigada por tudo o já fez por minha mãe e
por mim. Você foi mais um presente de Deus.
Ao meu amor, Segundo Neto, por ter me amado e, muitas vezes, ter sido a força de que
eu precisava, ao me encorajar e me fazer ir, mesmo sem ter certeza. Um impulso para fortalecer
minha fé; por ter acreditado em mim muitas vezes mais do que eu mesma; por ter sido minha
força na fraqueza e meu amor quando eu mais precisei... Amar é isso, ser presença mesmo
quando estamos distantes. Você faz parte dessa caminhada, essa conquista tem muito de você,
em cada detalhe eu vejo seu amor me ajudando a seguir e a ser forte em cada etapa. Obrigada,
ainda, pela ajuda primorosa em minha pesquisa; por ter me acompanhado na USP; por ter ido
comigo aos arquivos e pela ajuda nas produções dos mapas. Muito obrigada, especialmente, por
todo amor ofertado, nos mais simples olhares e singelos gestos! Nosso amor me ensinou que o
amor verdadeiro nos leva a lugares onde, sozinhos, jamais chegaríamos, pois um amor assim
torna o caminho mais leve, mais seguro e cheio de sonhos.
Aos meus tios e tias, por acreditarem na minha capacidade de lutar e de buscar meus
sonhos. E cada um, a seu modo, ter sido força para eu continuar dando passos a caminho das
minhas vitórias... Obrigada de todo coração, Geuda, Cida, Rita, Mizinha, Eunice, Gracinha,
Jose, Enoque e Neto! Agradeço, especialmente, ao meu tio Neto, por ter contribuído com os
meus estudos e me dado apoio nos momentos difíceis. Obrigada por ser um anjo que Deus me
deu de presente!
Aos meus primos e primas, pelo amor de “irmãos”. Vocês são presentes do meu Deus,
com vocês aprendi e vivi muitas coisas maravilhosas. Em especial, aos meus amores Patrícia,
Juninho, Germânia (minha Juliana) e Jairinha, por terem sido tão presentes em minha vida,
sendo força nos momentos difíceis, e por terem me ajudado a caminhar, mesmo quando estava
um pouco mais duro de seguir. Vocês moram no meu coração, nunca poderei retribuir esse amor.
Ao meu amigo, Pe. Djacy, pela amizade de anos e por todo o carinho ofertado.
Nossa amizade é um presente de Deus. A você que, com muita simplicidade, me ajudou com o
viii
português e com outras tantas coisas. Por isso, guardo em meu coração tudo o que fez por mim,
por estar sempre por perto. Obrigada pela amizade e pelo carinho!
Ao meu amigo Thiago Mamede (in memoriam). Como esse título tem a sua cara! Às
vezes, me pego lembrando nossas conversas e de você me dizendo: “Essa minha amiga será
doutora, e eu terei orgulho de ter acompanhado as lutas e as conquistas dela.” Obrigada por ter
me ensinado, em 27 anos de vida, que as coisas mais bonitas da vida são riquezas que
guardamos no coração e na simplicidade dos momentos.
Aos meus afilhados, pelo sorriso fácil de cada um, pelo amor que demonstram em cada
gesto: Flavianne (meu primeiro amor), Stella Mary (minha moça bonita e fofa), Lázaro (meu
príncipe amado) e Tarsila (minha pequena e linda princesa);
Aos meus amores pequenos, Nicolas, Jhonatas, Lorenzo e Ana Beatriz, que deixam
minha vida mais cheia de amor, luz e felicidade. Obrigada por todo o carinho!
Aos meus amigos de infância, Sildely, Sílvia, Carlos Augusto, Joseânia, e a todos da casa
(Mamede), Maria do Socorro, Bruna, Jamerson, Dávilo, Daynny, Larícia, Cícero, Damiana...
Obrigada por todo o amor, pelas brincadeiras, pelas alegrias, pelos sorrisos e pelo
companheirismo;
Aos meus amigos que, mais de perto, dividiram detalhes dessa conquista: Vanderlúcia,
por ter sonhado comigo essa conquista e ter contribuído para que hoje tudo seja real;
Juberlândia, por ter me acolhido e me amado nos momentos difíceis; Francisco, por ter sido a
força e a referência do lugar onde eu queria chegar; Adriana, por sua lealdade e amor de amiga;
Danielle, pelo amor ofertado em cada gesto e em cada detalhe; Mônica, pelo sorriso de menina
e coração tão grande; Damiana, pelos laços de carinho e amor; Lívia, pelo abraço acolhedor;
Laila, pelo doce sorriso e pela amizade prestada; Valdenice, por seu sorriso fácil e pelo coração
tão generoso; Neguinho, pelas alegrias compartilhadas; Pedro, pelos gestos de carinho; Hosana,
por todo o amor que demonstra em cada gesto e palavra; Shirley (e toda a sua casa, em especial,
dona Graça), por sua amizade sincera e leal; Ladjane, por seu carinho e amizade em Deus;
Lucila, por todo o zelo com que cuida de nossa amizade e por sempre me alegrar; Izenilda, por
todos os momentos divididos e pelas boas risadas; Gerônimo, pelo sorriso fácil e pela
cumplicidade de sempre; Vantembergh, por todo o amor que encontramos nos laços de nossa
amizade; Cida, pelo amor e carinho dos laços construídos; Cícera, por tanta dedicação e amor,
serei grata eternamente por seu carinho. Muito obrigada a todos os amigos com que a vida me
presenteou!
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Aos amigos que a UFPB me deu, como o Professor Edson Guedes. Obrigada, meu
querido amigo, de quem tanto gosto, que respeito e guardo em um lugar especial do meu
coração. Obrigada por ter me dado o apoio de que tanto precisava, por ter me ajudado mesmo
quando não falou nada! Você foi uma inspiração na UFPB para minha vida, sobretudo, na
maneira como enxerga a vida e como ensina. Sempre aprendi e continuo aprendo com você,
meu professor, pois, para além da Academia, seu tão bondoso coração me ensina que o amor
que carregamos em nós é o mais importante e que os amigos são presentes de Deus em nossas
vidas.
A minha orientadora, a Professora Dadá Martins, pela parceria de seis anos na tarefa
prazerosa e árdua da Pós-graduação. Sou grata pelo companheirismo, por cada bronca e por
todos os ensinamentos, pois com você aprendi tantas coisas, entre elas, que a vida deve ser
regada de amor e de “coisas” que vão para além da Academia. Minha formação tem muito de
você, pois, nessa caminhada, sempre se dispôs a ajudar e a partilhar saberes. Com você
compartilhei alegrias, conquistas e lutas... Valeu pela cumplicidade e pela parceria de sempre.
A Vívian e a Aparecida, minhas amadas meninas, com quem dividi sorrisos, alegrias e
lágrimas e que, de um jeitinho discreto e suave, tocaram profundamente meu coração com o
sentimento de amizade. Vocês são um dos melhores presentes que UFPB me deu ao longo
desses onze anos de caminhada acadêmica.
A UFPB continua a me ofertar pérolas, mais amigos para eu amar e ser amada.
Obrigada, minha amada Angélica, por saber amar e ser amiga em todos os momentos; minha
doce Deusia, por ser uma pessoa que emana luz e amor; Rodrigo, meu anjo lindo, pelo sorriso
acolhedor e amoroso; Aldo, por todo o amor, pois, mesmo longe, nunca deixou acabar nosso
amor de amigo.
Aos amigos da turma 30 do Mestrado, com os quais estreitei os laços de amizade, e isso
foi muito bom! Valeu Francio, Kedna Karla, Kiara, Nayara, Daniela, Vivian, Adlene e a
Rodolfo, pelas boas risadas. Vocês fazem parte de mim, por isso serão meus amigos da vida
inteira. Nosso amor de amigos se renova a cada reencontro; a minha amada Ingrid, #09de maio,
por cada sorriso partilhado, pelo companheirismo e pelas conversas longas... Por alimentar
minha vida de amor e de carinho, com suavidade, regando as flores da nossa amizade; a Fagner,
meu filho querido, por todo carinho e amor que a mim dedica, por sempre me estender a mão; a
minha querida Clara, que, com seu sorriso fácil e sua doce presença, deixa meus dias mais
iluminados;
Ao anjo chamado Antônio Carvalho - foi isso que você foi para mim em 2010, quando
x
comecei o Mestrado na UFPB. Mesmo sem saber, você foi o amparo de que precisava naquele
momento, pois apenas com uma palavra e um simples olhar, depositou em mim uma confiança
que talvez nem merecesse, quando disse: “eu vendo fiado, sim, a você e mais, para me pagar
quando puder.” Essas palavras foram uma resposta a minha oração, foi mais uma vez Deus
enviando seus anjos para guardar e abençoar minha vida... Obrigada pelo carinho, por ter sido
força naquele momento difícil. Ninguém diria que, daquele encontro, nasceria uma linda
amizade que hoje continua a florir minha vida.
As minhas amigas Bruna, Damiana e Neusivânia, presentes de Deus em minha vida! Sou
grata pelo amor, pela amizade e por cada sorriso e abraço dado. Obrigada por vocês terem me
apoiado nos momentos difíceis, por todas as orações e por terem sido amigas de todas as horas!
Vocês exalam a essência do amor de Deus e são provas do cuidado dele por mim!
Ao Grupo de Pesquisa, Ciência, Educação e Sociedade e por ter me proporcionado
aprendizados diversos, por ter me formado como pesquisadora. Sou muito grata por todos os
espaços concedidos nessa minha caminhada, pelas experiências vivenciadas no PIBIC, nos
grupos de leitura, nos eventos realizados, nas conservas de final de tarde com meus colegas e
professores, entre outros momentos. Com o GPCES, muito aprendi, tanto academicamente
quanto pessoalmente. Grata eu sou, em especial, ao Professor Tek, por todas as portas abertas,
por ter me acolhido com amor e carinho. Guardarei lembranças do meu PIBIc para a vida toda,
pois aprendi com você, pelo ser humano que é pela forma como convive com seus pares e
partilha os conhecimentos acadêmicos;
Aos Professores Mateus Zica, Circe Bittencourt e Vera Valdemarin, por todas as
contribuições e conhecimentos partilhados no exame de qualificação;
Ao PPGE, em especial, aos professores que, carinhosamente, dividiram seus saberes e
aprendizados, e aos funcionários, pela dedicação e atenção;
À CAPES, pela bolsa de estudo concedida.
Meus sinceros agradecimentos!
xi
RESUMO
Ousar trilhar os caminhos da História da Educação é pensar que nossas produções fazem parte
dela, construindo seus marcos e temporalidades, ou seja, nossas produções estão imersas no
processo de organização do campo, marcado, recorrentemente, por tempos, espaços e marcos
instituídos pela própria História da Educação, que se constrói e se ergue por meio de áreas e de
especificidades do campo em cada período histórico. O estudo das disciplinas escolares se
configura como parte do estudo da cultura escolar, uma vez que o conhecimento escolar é uma
construção específica das práticas educativas da escola, porque tem características próprias e
apresenta outras formas de conhecimento (CHERVEL, 1990). Cientes da responsabilidade de
fazer estudos dessa natureza, dialogamos por meio de um tipo específico de material didático:
os livros didáticos de Geografia, tendo como objeto de estudo os exercícios. Em nossas
considerações, verificamos que esse tipo de impresso comporta saberes que advêm de instâncias
diversas, mas que estão entrelaçados nos movimentos de produção e construção desse objeto
material (BITTENCOURT, 2003) que, historicamente, é constituído de concepções pedagógicas
e de saberes da cultura escolar de determinado tempo (HÉBRARD, 1990). Assim, nossa
proposta de tese visou discutir sobre as metodologias aplicadas ao ensino primário da disciplina
Geografia, entre os anos de 1880 e de 1930, especificamente sobre o papel dos exercícios nos
livros, na tentativa de compreender como surgiram e de que forma interferem ou não na forma
de ensinar Geografia. Em nosso estudo, partimos do pressuposto de que os exercícios eram
indicados como um novo método de ensino para a escola como um todo e que, para a Geografia,
sua presença representou a busca de inovações metodológicas nos livros didáticos dessa
disciplina destinados ao ensino primário. Por isso, defendemos que os exercícios exerceram
uma função determinante na tentativa de substituir nos livros o texto marcado por perguntas e
respostas explícitas por um texto que, lentamente, passa a adotar os exercícios como uma
expressão dos métodos de ensino que podem interferir na proposta de tornar o ensino menos
decorativo e mnemônico. Em nossas análises, constatamos que, no contexto da escola primária,
os exercícios estiveram presentes como um complemento indispensável à composição dos livros
didáticos e, por conseguinte, ao ensino de Geografia e que o movimento de adoção dos
exercícios nos livros didáticos tinha como principal finalidade tentar introduzir nos textos
exercícios práticos e de observação que rompam com o método catecismo que predominava nos
livros e na escola. Em nossas considerações, reconhecemos e afirmamos o debate em prol da
inserção dos exercícios no ensino primário, e que, mesmo que lentamente, eles interferem na
composição das obras didáticas e na construção dos saberes geográficos. No entanto,
registramos que ainda é muito recorrente o emprego do método mnemônico, que marca a
cultura escolar primária com as permanências dos princípios dos métodos de memorização.
Palavras-chave: Livro didático; Ensino de Geografia; Métodos de ensino. Exercícios.
xii
ABSTRACT
When we dare to tread the paths of the History of Education is to think, as soon as we can, that
our productions are part of this History, building their marks and temporalities. It means that our
productions are immersed in the process of organization of this field, recurrently marked by
times, spaces and History of Education marks instituted itself that rises from areas and
specificities of the field in each historical period. The study of school disciplines is part of the
study of school culture, since school’s knowledge is a specific construction of the educational
practices of the school, because it has its own characteristics and, therefore, presents other forms
of knowledge (CHERVEL, 1990). Thus, aware of the responsibility of conducting studies of
this nature, we seek to discuss from a specific type of didactic material: the Geography
textbooks, having as object of study, the exercises. In our considerations, we find that this type
of book involves knowledge that comes from different instances, but they are intertwined in the
production's movements and constructions of this material object (BITTENCOURT, 2003),
which, historically, they're constituted from Pedagogical conceptions and knowledge of the
school culture of a certain time (HÉBRARD, 1990). So, our thesis proposal sought to discuss
the methodologies applied to primary education in the discipline Geography between the years
of 1880 and 1930, specifically about the role of exercises in textbooks, in an attempt to
understand how they arose and how they interfered or not in the way of teaching Geography. In
our study, we assumed that there was indication of the exercises as a new teaching method for
the school as a whole, and that their presence in Geography classes represented the search for
methodological innovations in Geography textbooks for primary education. Therefore, we hold
the statement that exercises had a decisive role in the attempt to replace the text marked by
explicit questions and answers in the books, by a text that slowly adopts the exercises as an
expression of teaching methods capable of interfering in the proposal to make teaching less
decorative and mnemonic. In our analyses, we verified that in the context of primary school, the
exercises were present as an indispensable complement in the composition of textbooks and,
therefore, in the teaching of Geography. Also, the idea of adoption the exercises in textbooks
had as main purpose the search to introduce practical exercises and of observation that could try
to break with the catechism method that prevailed in the books and in the school with a whole.
In our considerations, we recognize and affirm the debate in favor of the insertion of the
exercises in the primary education, and that these, even if slowly, interfere in the composition of
the didactic works and, consequently, in the construction of the geographical knowledge.
However, we noted that the presence of the mnemonic method, which marks the primary school
culture with the principles of memorization methods, was still very strong.
Keywords: Textbook; Teaching Geography; Teaching methods; Exercises.
xiii
LISTA DE ABREVIATURAS
Grupo de Pesquisa, Ciência, Educação e Sociedade GPCES
Instituto Histórico Geográfico Brasileiro IHGB
Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro SGRJ
Livros Escolares Brasileiros LIVRES
Institutos Históricos e Geográficos do Nordeste IHGNE
Faculdade de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo FAPESP
Universidade de São Paulo USP
Laboratório de Ensino e Materiais Didáticos LEMAD
Ministério da Educação MEC
xiv
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 - Texto organizado em forma de catecismo: perguntas em destaque e
respostas................................................................................................................................................. ....................29
Figura 02 - Texto contínuo, com conceitos destacados em itálico..............................................................................30
Figura 03 - Texto contínuo com destaque de conceitos ou conteúdos em negrito......................................................31
Figura 04 - Livro didático de Geografia publicado no Século XIX...........................................................................34
Figura 05 - Livros didáticos de Geografia publicados no início do Século XX.........................................................35
Figura 06 - Livros didáticos de Geografia publicados na década de 1920.................................................................36
Figura 07 – livro didático de Geografia publicado nos anos de 1920.........................................................................37
Figura 08 – Exemplo de modelos de exercícios comuns aos livros didáticos do período..........................................43
Figura 09 – Mapa de institucionalização jurídica e instauração dos Grupos Escolares no
Brasil.........................................................................................................................................................................108
Figura 10 – As finalidades do Parecer do Ensino Primário.................................................... ...................................127
Figura 11 - Parecer do Ensino Primário: definição e divisão das categorias da educação
primária..................................................................................................................... ................................................129
Figura 12a – Parecer do Ensino Primário: definições e organização do currículo da educação primária
elementar.................................................................................................................... ...............................................130
Figura 12b – Parecer do Ensino Primário: definições e organização do currículo da educação primária
elementar.................................................................................................................... ...............................................131
Figura 12c – Parecer do Ensino Primário: definições e organização do currículo da educação primária
elementar.................................................................................................................... ...............................................132
Figura 13 – A indicação das “Lições de coisas” como um método de ensino necessário a todas as
disciplinas....................................................................................................... ..........................................................134
Figura 14 - Página da obra “Lições de coisas” que traz a definição de método intuitivo.........................................135
Figura 15 - Quando a obra “Lições de coisas” traz recomendações sobre a importância do método
intuitivo.................................................................................................................... .................................................137
Figura 16a - Parecer do Conselho Superior da Instrução publicado nas páginas inicias da
obra......................................................................................................................... ..................................................146
Figura 16b - Parecer do Conselho Superior da Instrução publicado nas páginas inicias da
obra......................................................................................................................... ..................................................147
Figura 16c - Parecer do Conselho Superior da Instrução publicado nas páginas inicias da
obra......................................................................................................................... ..................................................148
Figura 17 - Detalhes das inovações dos elementos de caráter icnográfico elencados na capa do
livro........................................................................................................................ ...................................................149
Figura 18 - Exemplo do anúncio de livros didáticos na Livraria Francisco Alves...................................................152
Figura 19a - Enumeração dos aspectos gerais do Brasil................................................................. ..........................173
Figura 19b - Enumeração dos aspectos gerais do Brasil................................................................. ..........................174
Figura 20a - Exemplo de maior valorização de uma Geografia geral.......................................................................177
Figura 20b - Exemplo de maior valorização de uma Geografia geral.......................................................................178
Figura 20c - Exemplo de maior valorização de uma Geografia geral.......................................................................179
Figura 21 - A importância do desenho e dos exercícios cartográficos para o ensino de
Geografia................................................................................. ..................................................................................181
Figura 22 - Modelos de exercícios práticos de cartografia para o ensino primário..................................................184
Figura 23 - Descrição dos tipos de métodos adotados para o ensino da Geografia..................................................223
xv
Figura 24 - Indicação e definição do método expositivo............................................................... ...........................224
Figura 25 - Exemplo de texto com perguntas e respostas sobre conceitos básicos...................................................229
Figura 26 - Indicação do uso do Methodo Abbade Gaultier......................................................... .............................231
Figura 27 - Parecer expedido em 1º de dezembro de 1883............................................................ ...........................232
Figura 28 - Tipo de exercícicio denominado de
questionário...............................................................................................................................................................233
Figura 29 - Lições de Geografia na ponta da língua...................................................................... ...........................235
Figura 30 - Modelos de exercícios denominado de “recapitulação”.........................................................................236
Figura 31 - Modelos de exercícios mistos................................................................................................................236
Figura 32 - Modelos de exercícios problemas................................................................................ ..........................237
Figura 33 - Modelos de exercícios de observação....................................................................................................238
Figura 34 - Modelos de exercícios práticos.................................................................................. ............................238
Figura 35 - Modelos de como trabalhar os exercícios práticos de observação.........................................................240
Figura 36 - Exemplo de um texto marcado pela adoção de mais de um método de ensino.....................................241
Figura 37 - Exemplo dos primeiros textos que procuravam seguir a nova estrutura de redação dos textos
corridos..................................................................................................................... ................................................243
Figura 38 - Modelos de exercícios fáceis......................................................................................... ........................246
Figura 39 - Modelos de exercícios escriptos e oraes................................................................................................247
Figura 40 - Exercícios de cartografia............................................................................................. ..........................249
Figura 41 - Exemplos práticos de exercícios de Geografia........................................................... ...........................251
xvi
LISTA DE QUADROS
Quadro I: Trabalhos acadêmicos publicados no portal da Capes e em instituições acadêmicas em que os exercícios
são abordados com um dos aspectos gerais de uma
pesquisa......................................................................................................... ..............................................................93
Quadro II: Trabalhos acadêmicos publicados no portal da Capes e em instituições acadêmicas sobre os
exercícios.....................................................................................................................................................................94
SUMÁRIO
1ª parte - LIVRO DIDÁTICO E EXERCÍCIOS: ENUNCIAÇÕES CONCEITUAIS....................... 18
CAPÍTULO I: O DESPERTAR DA PESQUISA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS
ACERCA DA TESE ................................................................................................................................... 18
1.1 A tese e a emergência da pesquisa ..................................................................................................... 18
1.2 - Trilhas da pesquisa: a tese e os caminhos teórico-metodológicos ................................................. 29
CAPÍTULO II: SOBRE O OBJETO DE ESTUDO: INFERÊNCIAS E APROXIMAÇÕES TEÓRICAS
.................................................................................................................................................................... 52
2.1 A circulação dos impressos e sua relação com as práticas educativas: considerações acerca do
conceito e da produção do campo de estudo sobre o livro didático ...................................................... 52
2.1.1 A produção de saberes escolares: uma discussão a respeito dos exercícios nos livros didáticos como
uma expressão da cultura escolar ............................................................................................................... 68
2.2 Traçando um estado da arte: as pesquisas sobre exercícios nos livros didáticos .......................... 88
2ª parte - A ORGANIZAÇÃO DA ESCOLA PRIMÁRIA NO BRASIL: CONSIDERAÇÕES
SOBRE O ENSINO DE GEOGRAFIA .................................................................................................. 97
CAPÍTULO III: ORGANIZAÇÃO DA ESCOLA PRIMÁRIA NO BRASIL: OS TEMPOS, AS
METODOLOGIAS E A CULTURA ESCOLAR ....................................................................................... 97
3.1. A escola primária na Primeira República: entre a obrigatoriedade e a liberdade de ensino ...... 97
3.2. A organização pedagógica da escola primária no Brasil: uma discussão sobre os sentidos e os
métodos .................................................................................................................................................... 111
3.2.1 A construção do currículo da escola primária no Brasil por meio das “Lições de coisas” como um
método de ensino ...................................................................................................................................... 125
CAPÍTULO IV: GEOGRAFIA E CULTURA ESCOLAR: A ORGANIZAÇÃO DOS SABERES
GEOGRÁFICOS NOS LIVROS DIDÁTICOS DESTINADOS AO ENSINO PRIMÁRIO ................... 142
4.1. Livro didático de Geografia: traços da produção, da comercialização e da circulação............. 142
4.2. O ensino primário e as produções didáticas no Brasil no final do Século XIX e início do Século
XX: um enfoque sobre a disciplina escolar Geografia......................................................................... 157
4.2.1 A Geografia nos livros didáticos, nos debates educacionais e nos pareceres destinados à escola
primária: finalidades do ensino primário e da Geografia ......................................................................... 170
3ª parte - MÉTODOS DE ENSINO E EXERCÍCIOS NOS LIVROS DIDÁTICOS ........................ 196
CAPÍTULO V: MÉTODOS DE ENSINO NAS ESCOLAS PRIMÁRIAS: UM DEBATE CENTRADO
NO PROCESSO DE RENOVAÇÃO DOS MÉTODOS NO BRASIL .................................................... 196
5.1 Discussão sobre a renovação dos métodos no Brasil: as propostas pedagógicas e o legado de
Pestalozzi para o ensino de Geografia .................................................................................................. 196
5.2. A difusão dos métodos de ensino e a Escola Nova: um olhar sobre as produções didáticas e seus
autores ..................................................................................................................................................... 210
5.3 Os livros didáticos de Geografia e os exercícios: um debate sobre as concepções metodológicas
para o ensino primário ........................................................................................................................... 227
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................................. 255
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................................... 265
APÊNDICE ............................................................................................................................................. 283
18
1ª parte
LIVRO DIDÁTICO E EXERCÍCIOS: ENUNCIAÇÕES CONCEITUAIS
CAPÍTULO I: O DESPERTAR DA PESQUISA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
INTRODUTÓRIAS ACERCA DA TESE
1.1 A tese e a emergência da pesquisa
Se os conteúdos explícitos constituem o eixo central da disciplina
ensinada, o exercício é a contrapartida quase indispensável. Sem o
exercício e seu controle, não há fixação possível de uma disciplina
(CHERVEL, 1990, p. 204).
Compreender a importância de se discutir sobre as tramas do processo de
escolarização e sobre a importância dos exercícios como uma das formas de organizar
os métodos de ensino e registrá-las é o que propomos nesta pesquisa. A citação acima
nos inquieta, desde muito cedo, na caminhada acadêmica, nas primeiras leituras e nos
questionamentos que, outrora, ainda muito rasos, levaram-nos a indicações sobre os
exercícios e suas funções no processo de aprendizagem e na história das disciplinas
escolares, de modo particular, a disciplina Geografia.
O que deveria ser apenas uma simples pergunta de uma pesquisadora iniciante
revelou-se aos poucos, com reflexões mais aprofundadas, um insight importante para o
próprio estudo da tese que aqui propomos. Um estudo que, dentre outros apontamentos,
propôs-se a pensar: por que os exercícios nos livros didáticos1 de Geografia poderiam
implicar, entre outras funções, mudanças nas metodologias do Ensino Primário?
1 Aqui utilizamos a expressão ‘livro didático’ porque essa expressão é empregada, nos dias
atuais, para se referir aos livros utilizados na escola. Sabemos que, no Brasil, o uso dessa denominação é
apoiado pelo Decreto-Lei nº 1.006, de 30 de dezembro de 1938, que afirma: “Art. 2º Para os efeitos da
presente lei, são considerados livros didáticos os compêndios e os livros de leitura de classe. § 1º
Compêndios são os livros que exponham, total ou parcialmente, a matéria das disciplinas constantes nos
programas escolares. § 2º Livros de leitura de classe são os livros usados para leitura dos alunos em aula”.
Sabemos que outras denominações são atribuídas a esse recurso didático, especialmente em períodos
históricos anteriores à promulgação dessa lei, como compêndios, manuais escolares, rudimentos, tratados,
sistemas, catesistmo, livro de consulta, caderno, entre outros. Entretanto, para tornar nosso texto mais
didático, optamos por chamá-los de livros didáticos, inclusive os publicados em períodos anteriores a essa
lei. Só empregaremos outras denominações nas citações em que se utilizam outra expressão para se referir
a esse tipo de livro, tendo em vista nosso compromisso com os textos originais.
19
Assim, à medida que os contornos desta pesquisa foram se desenhando, fomos
nos questionando sobre o quanto tem sido desafiador estudar esse objeto, devido à falta
de referências e de estudos sobre ele, e o quanto esse questionamento passou a ser
constante nas reflexões e no foco da escrita do texto. Isso nos faz pensar nas
considerações de Ginzburg (1989) de que, como pesquisadores, devemos estar atentos
às informações consideradas “baixas”, as ditas sem muita importância, mas que podem
nos revelar detalhes fundamentais para a discussão no campo da História da Educação.
Enfatizamos que essas e outras questões compõem hoje o centro das
preocupações da prática historiográfica nesse campo de pesquisa, que vale salientar, tem
se alterado significativamente a partir das décadas finais do Século XX e contribuiu
para que os historiadores repensassem os deslocamentos no campo da História com a
inserção de novas abordagens, novos problemas e novos objetos (LUCA, 2010).
A face mais evidente do processo de alargamento do campo de atuação dos
historiadores se constitui na renovação temática, que é visível nos títulos das pesquisas
e nas formas de elaborar os aportes teóricos e metodológicos. Tais mudanças alteraram
o próprio fazer do historiador, que não se propõe a construir uma história global, mas
que, sobretudo, volta-se para o inconsciente, para as mentalidades e para os aspectos da
prática cotidiana que antes eram ausentes do território da História (LUCA, 2010).
Tem sido comum para os historiadores da educação brasileira o debate sobre a
formação desse campo por meio de possíveis arranjos dos modos de organizar a
educação, de pensar nos enfrentamentos, nas intervenções e nas acomodações que se
deram em meio às tensões, aos conflitos e às conformidades desde os primeiros traços
de educação no Brasil. Essa discussão nos leva a indagar sobre o papel que a
historiografia tem relegado às produções que partem de objetos, muitas vezes,
“ordinários”, mais que muito nos dizem sobre a cultura escolar de uma época. As
pesquisas apontam que são inegáveis as modificações nas abordagens acerca da história
dos materiais escolares, porque a produção historiográfica sobre eles e sobre os
impressos2 no Século XIX têm crescido e se tornando cada vez mais férteis no campo
da História da Educação.
2 A produção de qualquer impresso tem um “ciclo de vida comum”, que passa por um processo marcado
pelas “mãos” do escritor, do impressor, do editor, do livreiro, do distribuidor, do vendedor e do leitor.
Esses elementos são entendidos como fases que sofrem modificações ao longo do tempo bem como
sua relação com o sistema econômico, social, político e cultural (DARNTON, 1990).
20
A escolha dos exercícios nos livros didáticos de Geografia, como objeto de
investigação, resultou, dentre outros fatores, dos questionamentos que não puderam ser
respondidos e que resultaram de nossa pesquisa de Mestrado. Este trabalho, intitulado
Os exercícios nos livros didáticos de Geografia no Brasil: mudanças e permanências
(1880-1930), foi defendido em 2012, no Programa de Pós-graduação em Educação da
Universidade Federal da Paraíba – UFPB.
Em nossa pesquisa de Mestrado, estudar os exercícios em uma perspectiva
histórica nos permitiu reconhecer que ele - assim como os livros didáticos, os currículos
e os programas de ensino - exerceu um importante papel na construção dos saberes
escolares e se configura como uma fonte para o campo de estudo das disciplinas em
diferentes contextos históricos.
Em nossas análises, constatamos que os exercícios, historicamente, se
configuram como estratégias de ensino e de avaliação que têm desempenhado um papel
de destaque no processo de ensino e aprendizagem ao longo da História da Educação.
Em outras palavras, procuramos entender que, no Brasil, os exercícios que vêm nos
livros didáticos fazem parte de uma preocupação metodológica relacionada à
abordagem dos conteúdos que surgiu na escola a partir da década de 1880, por causa da
necessidade de as disciplinas vincularem seus conhecimentos às realidades dos alunos
(BITTENCOURT, 2004). Acerca do nosso objeto de pesquisa, no Mestrado, dispusemo-
nos a discutir sobre as implicações dos exercícios no ensino secundário e, agora, em
decorrência de algumas constatações deles como indicativos de um método advindo das
“Lições de coisas”3, verificamos como essas propostas se efetivaram ou não no ensino
primário.
O trabalho com o livro didático, como fonte de pesquisa, tem feito parte de
nossas escolhas desde que ingressamos no campo da História da Educação, ainda como
bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica - PIBIC4, e pelo
fato de termos discutido sobre esses impressos didáticos no trabalho de conclusão de
3Ver: CALKINS, N. A. Primeiras lições de coisas – Manual de Ensino Elementar. Calkins. Traduzido por
Ruy Barbosa. Impressa Nacional. Rio de Janeiro, 1886.
4.Trabalhamos com os materiais didáticos, especificamente com livro didático, no Projeto intitulado –
Materiais didáticos no ensino primário e normal da Paraíba (1886-1930), sob a orientação do Prof.º
Dr. Wojciech Andrzej Kulesza - UFPB.
21
curso5.
Assim, devido à relevância de se estudar o livro didático numa perspectiva
histórica e tendo em vista que o estudo poderá contribuir para entendermos as
peculiaridades do processo de escolarização brasileira, daremos continuidade ao tema, a
fim de compreender as estratégias de organização dos métodos de ensino, focalizando a
disciplina escolar Geografia no ensino primário no período em tela.
Assim, à medida que essa construção de argumentos para discutir sobre o tema
começava a se apresentar menos vaga e indeterminada em nossas “buscas”, indagamos
se estamos diante da chamada “euforia da ignorância”, ou seja, do que Ginzburg (2000,
p. 271) chama de algo que se desconhece totalmente (ou quase totalmente), mas sobre o
qual se está a ponto de descobrir e aprender. Seria, como afirma Ginzburg (1989), um
caminhar por meio de pistas e indícios que podem nos ajudar a desbravar partes do
objeto pesquisado, pois o conhecimento do historiador nunca é direto, ao contrário, é
indireto e indiciário.
Antes, porém, seria necessário transformar a “euforia da ignorância” em um
estudo aprofundado e com sustentação teórica. Sabe-se que, mesmo quando
conseguimos debater e traçamos o caminho da pesquisa, na fala, muitos são os
obstáculos a serem vencidos no momento ímpar da pesquisa, que é o da escrita. Era
preciso, pois, escrever, detalhar e dá sustentação teórica ao objeto de estudo e à opção
pela tese que escolhemos. Porém, uma pergunta tem nos acompanhado e nos
impulsionado: Como trabalhar no Doutorado com o mesmo objeto do Mestrado sem
perder o encanto de pesquisadora, sem repetir análises e dando sustentação à tese a
partir dos resultados já encontrados no Mestrado? Ou seja, como colocar em prática
uma história que tem se apresentado desafiadora e que não encontramos outros
trabalhos sobre a temática para nos ajudar em nossa trajetória? Às vezes, esses
questionamentos nos causaram angústia e nos levaram a pensar: teríamos escolhido uma
proposta de tese correta? Teria sido a temática escolhida superior às forças das
pesquisadoras?
5 Desenvolvemos um trabalho em que discutimos sobre o livro didático em uma perspectiva histórica, a
partir de sua importância como objeto de uso tanto do professor quanto do aluno. O trabalho tem o
seguinte título: Livro didático de Língua Portuguesa em debate: de 1980 aos dias atuais, sob a
orientação da Profª. Dra. Maria Lúcia da Silva Nunes, do Centro de Educação - UFPB.
22
Seguindo as tramas da pesquisa, sem a pretensão de responder a esses
questionamentos, mas focalizando a busca pela produção do nosso estudo, seguimos
afirmando que as discussões no Grupo de Pesquisa Ciência, Educação e Sociedade -
GPCES6, ao qual ingressamos a partir de 2006, foram indispensáveis no sentido de
amainar muitos desses dilemas e de descortinar um amplo campo de debates e
perspectivas de estudo na área. Além disso, enfatizamos as contribuições dos debates
realizados no grupo de leitura7 e os enfrentamentos teóricos sobre a história da
Educação e da Geografia.
Assim, a pesquisa proposta foi orientada por um problema que, aos nossos olhos,
expressava-se em forma de uma pergunta histórica específica: qual o papel dos
exercícios no processo de escolarização? Em outros termos, nosso estudo procurou
discutir sobre se essa bateria de exercícios que se acrescentava aos compêndios e,
consequentemente, às metodologias do ensino primário da época se configurava como
um novo método de ensino, em que se propunham exercícios mais práticos, no período
de 1880 a 1930.
Estabelecemos os anos de 1880 para definir o início da pesquisa porque esse
período marcou as discussões acerca da renovação dos métodos, tanto em nível nacional
quanto internacional. No que se refere às preocupações metodológicas para o ensino da
época, a partir da década de 1880, destacamos a difusão do método intuitivo e das
chamadas “Lições de coisas”8, em detrimento do ensino individual, simultâneo, mútuo
6 Afora subsidiar pesquisas de graduação e pós-graduação, promovendo o intercâmbio entre as áreas de
Geografia, História, Pedagogia e Arquitetura, o Grupo pretende contribuir para melhorar o ensino de
História e de Geografia nas escolas de ensino fundamental e médio da Paraíba. Além de formar
recursos humanos em nível de graduação e de pós-graduação, esse grupo pretende divulgar os
resultados das pesquisas através da produção de artigos e de comunicações para serem apresentados
em congressos científicos e publicados em revistas especializadas. Além disso, está sendo criado um
banco de dados, composto de documentos e objetos recolhidos. Tudo isso compõe o gérmen da futura
constituição de um Museu Pedagógico. O grupo pesquisa e discute sobre os seguintes temas: Ciência
e Educação Popular, Didática urbana, história das disciplinas escolares e história do ensino de
Ciências no Brasil.
7 Como parte integrante das atividades dos GPCES, e sob a coordenação da Profª Drª. Maria Adailza
Martins de Albuquerque, esse grupo tem como foco central promover debates sobre leituras que
contemplem os interesses de pesquisadores como: professores das Universidades e das escolas
públicas e privadas e alunos de Graduação, Mestrado e Doutorado, para discutir a respeito das leituras
realizadas sobre História da Educação e da Geografia, e suas correlações com os caminhos da
educação brasileira.
8 A discussão sobre o método intuitivo tem sido ampliada no campo da historiografia brasileira e tem nos
ajudado a desmistificar e desvendar questões sobre métodos de ensino e conteúdos escolares no
Brasil. Destacamos, entre as pesquisas, as contribuições de Valdemarin (2010). Nos debates acerca
23
ou misto, amplamente adotados nas escolas do Império. De acordo com Hébrard (2000),
o método intuitivo nasceu na Inglaterra e nos Estados Unidos, no Século XIX, com o
proposito de mudar não apenas as formas de ensinar, mas também as de aprender. No
final desse século, ele passou a compor os debates educacionais brasileiros e a
influenciar a escola primária em expansão.
Nesse momento, observamos, também, a crença no progresso da sociedade
brasileira expressa em uma ruptura metodológica e epistemológica no campo do ensino
que antecede a Proclamação da República no Brasil, com as reformas pedagógicas que
propunham a renovação dos métodos. Dentre as proposições destinadas ao ensino de
Geografia, os livros didáticos da época trazem um debate sobre a necessidade de incluir
um saber mais prático, apoiado nos elementos pedagógicos ofertados pela execução dos
exercícios práticos. Essa discussão marca, sobretudo, um momento de renovação da
cartografia escolar, uma das finalidades da Geografia no ensino primário.
Em outras palavras, podemos dizer que a década de 1880 é um marco
representativo para que possamos pensar sobre vários elementos que se expressam no
âmbito educacional, sobretudo no nível primário, e influenciam diretamente os livros
didáticos da época. Destacam-se, pois, as questões de cunho pedagógico, como as
transformações na disposição dos conteúdos e dos exercícios; as de cunho material e
icnográfico, tendo em vista as inovações, mesmo que tímidas, no domínio da imprensa e
no trato das questões de caráter político e ideológico, como a difusão das ideias
republicanas que eram uma das finalidades de alguns autores (ANGELO, 2014).
Quanto à década de 1930, como marco final da pesquisa, foi estabelecida porque
entendemos que, nesse período, foram se arrefecendo os debates e as proposições
metodológicas para a escola primária, pautados no método de ensino intuitivo, que foi,
paulatinamente, substituído pelas proposições da Escola Ativa e pelos princípios
pedagógicos pregados pelo Movimento da Escola Nova (VALDEMARIN, 2004). A
educação primária, a partir desse momento, passou a ser vista como a mola mestra do
projeto de Nação que Vargas tinha para o Brasil. Tal projeto visava, sobretudo, formar
dessa questão, encontramos autores que defendem que a adoção do método intuitivo, em algumas
escolas, seria a primeira entrada de proposições da Escola Nova no Brasil. Já para outros, com os
quais concordamos, seria um método que começa no Século XIX, com as chamadas “Lições de
coisas”. Ao longo do texto, tratamos dessa relação de uma forma mais específica, fazendo associações
a partir das fontes de pesquisa.
24
as crianças, desde os primeiros anos de escolarização, adequadamente para o novo
modelo social, político, cultural e econômico que o país adotara.
Nesse contexto, mas também sob uma forte influência europeia, a Geografia
escolar assumiu um novo papel na sociedade brasileira. Para isso, as proposições
científicas ou modernas passaram a ser valorizadas no ensino. É preciso entender que a
Escola Nova também trazia esse mesmo aparato científico e moderno, pois só assim é
que se pode compreender a relação entre a Geografia escolar e a Pedagogia. É um
movimento que inclui as disciplinas em geral, mas que apresenta especificidades no
caso da Geografia.
Essas inovações, tanto do ponto de vista pedagógico quanto geográfico,
influenciarão a formação de professores e parte dos livros didáticos publicados no Brasil
na época. No âmbito da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro, em 1926, foi criado
o primeiro Curso Livre de Formação de Professores de Geografia. Seus criadores,
envolvidos com os debates geográficos e educacionais que se desencadeavam entre os
intelectuais brasileiros, criticavam a Geografia que havia sido difundida apoiada em
práticas mnemônicas propagadas pelos livros didáticos e pelos professores em suas
práticas escolares. Assim, resolveram criar esse curso, destinado aos professores da
escola primária, onde essas inovações - de ordem metodológica e geográfica – deveriam
ser implantadas primeiro.
Nos debates subsequentes à década de 1930, foram criados os Cursos Superiores
de Geografia e História, que formavam profissionais especialistas na Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras, em 1934, e na Universidade do Brasil, em 1935. Esse
evento marcou, especialmente, a produção didática de Geografia, porquanto esse
período histórico foi um divisor de águas para o ensino dessa disciplina, caracterizado,
sobretudo, pela presença de exercícios que contribuíssem para tornar o seu ensino mais
“moderno”.
Em linhas gerais, o período estudado tem marcado grande parte das produções
da historiografia brasileira, e esses estudos têm sido pautados na ideia de que as
configurações representativas que marcam o período do final do Século XIX e o início
do Século XX resultaram de um processo histórico desenhado durante o período
oitocentista. Os estudiosos que discutem sobre esse marco temporal afirmam que,
embora o período em foco tenha promovido essas configurações específicas para a
25
época, elas também têm elos de continuidade com os velhos traços da Monarquia, pois
são muitas as permanências nesse momento de transição de regime político (GONDRA
& SCHNEIDER, 2011).
O recorte temporal que escolhemos para esta pesquisa procura valorizar os
elementos inerentes à cultura nos diferentes espaços e se desvincula de uma vertente
epistemológica que focaliza suas análises em um viés estruturalista cuja base envolve a
história política e as ideias (BURKE, 2008). A esse respeito, destacamos os estudos9 que
priorizam os marcos políticos como acontecimentos que devem ser compreendidos
como elemento determinante para entender todas as relações humanas. No entanto, tem
se renovado o quadro dos estudos que vêm afirmando que o emprego desses marcos e
os campos que eles demarcam são insuficientes para dar conta da complexidade dos
fatos e das ações sociais que marcam esse período histórico (GONDRA &
SCHNEIDER, 2011).
Devemos observar que, a partir de enfoques específicos, o que e como os
estudos desenvolvidos recentemente têm ajudado a confirmar ou a desmistificar a
escrita da História da Educação no que tange às abordagens que trabalham a partir desse
marco temporal com uma nova vertente10
. Nessa nova configuração dos estudos, as
rupturas ou mudanças, sejam elas postas pelo regime, pelas leis ou pela teoria, não
implicam, necessariamente, uma alteração nas relações sociais, devido à existência de
diferentes segmentos e sujeitos que atuam nos mais variados contextos históricos e
sociais (GONDRA & SCHUELER, 2008).
Em nossas investigações, constatamos que tem aumentado entre os
9
Como exemplo, temos os estudos de José Murilo de Carvalho (1993) e Ilmar de Mattos (1987), que são
interpretações consagradas sobre a história da construção do Estado brasileiro como resultado de uma
classe senhorial, articulada a partir de um jogo político em torno da coroa. Segundo Carvalho (1993),
havia uma unidade do território da ex-colônia portuguesa que foi obra de uma elite cuja formação
apresentava uma trajetória que era diferenciada das elites regionais. Na mesma vertente, Mattos
(1987) defende a ideia de que à medida que se construía o Estado nacional, essa classe senhorial
constituía-se como elite dirigente, a chamada elite Saquarema, que exercia uma centralização político-
administrativa por meio do governo geral (DOLHNIKOFF, 2003).
10 A esse respeito, convém lembrar o trabalho da pesquisadora Dolhnikoff (2003), que, ao contrário do
que defendem Carvalho (1993) e Mattos (1987), apresenta a seguinte tese: “As elites regionais
constituíram-se também em elite política, cujo desejo de autonomia não era sinônimo de uma suposta
miopia-localista e estava acoplado a um projeto político que acomodava as reinvindicações regionais
em um arranjo nacional” (p. 432). Segundo a autora, o que prevaleceu foi uma organização
institucional, que garantiu certa articulação em todo o território e preservou a autonomia da cada
província, sob a orientação do governo central.
26
pesquisadores o interesse pelo período compreendido entre o final do Século XIX e o
início do Século XX. Dentre outros interesses, os estudiosos que visam conhecer a
educação escolar ofertada no referido período buscam entendê-la a partir de sua relação
com o contexto histórico que se expressa como período de grande efervescência e de
transformações na sociedade mundial, de forma geral e, especialmente, no cenário
brasileiro.
Em âmbito nacional, havia uma tentativa de modificar a forma de pensar sobre o
ensino, em especial, no que se referia aos materiais didáticos e aos métodos. Era preciso
empregar uma metodologia que trabalhasse na perspectiva de integrar objetivos
pedagógicos e sociais, para possibilitar a constituição da nação brasileira. Nessa
perspectiva, esta tese se propôs a discutir sobre os principais eventos históricos que
aconteceram durante o período estudado, sobretudo, em matéria de educação, para
compreender o processo de renovação dos métodos, considerando os avanços e as
permanências dos questionamentos a respeito do nosso objeto de estudo. Diante disso,
destacamos nossa preocupação em identificar os aspectos que possam desvendar os
traços da cultura escolar expressos nas continuidades e nas descontinuidades do
processo de escolarização da época.
O objetivo geral deste trabalho foi o de analisar os exercícios em livros
didáticos, como uma expressão dos novos métodos destinados ao ensino primário de
Geografia. Para isso, elencamos os seguintes objetivos específicos: 1) desvendar os
saberes escolares de Geografia apresentados nos livros didáticos, formulados a partir
dos exercícios práticos; 2) investigar, no processo de construção do saber escolar do
ensino primário, como a Geografia é apresentada nos livros didáticos; 3) entender o
livro didático como fonte de historicidade para mapear o ensino primário entre os anos
de 1880 e de 1930.
Assim, cientes do zelo que os pesquisadores devem ter com o uso dos
documentos como fonte para a História da Educação, optamos por estudar os livros
didáticos como uma forma de compreender as tentativas de ordenar e de configurar o
ensino, sobretudo, a relação da produção dos livros com a cultura escolar, conduzindo e
conformando práticas diferenciadas nos tempos escolares. Em nossas considerações,
tomamos os livros didáticos como uma literatura que circulou nas escolas primárias em
conjunto com outros materiais didáticos, como: os cadernos de professores, os
27
catecismos, a Bíblia, a Constituição Nacional, os livros de leitura, entre outros.
Portanto, nosso foco não foi a adoção dos livros, mas as indicações das obras como
expressão dos diálogos entre os sujeitos envolvidos na renovação e na difusão dos
métodos e da disciplina escolar Geografia, o poder público e as normas estabelecidas
para o ensino dessa disciplina, bem como a inclusão de outras formas de promover o
ensino que não estão nas indicações ditas oficiais.
Compreendemos que o livro didático, historicamente, não é o único suporte
didático utilizado para formar e instruir o povo, contudo, entendemos que esse recurso
exerceu (e continua exercendo) uma centralidade no contexto escolar. Em nossa
pesquisa, isso foi observado, sobretudo nas obras destinadas ao ensino primário, quando
a produção desses livros é ampliada, e a escolarização no Brasil é expandida. Na
atualidade, esse recurso continua sendo um dos mais utilizados, porquanto embora as
escolas estejam imersas em uma sociedade que passa por uma grande revolução
tecnológica, com uma proliferação de diferentes recursos de informação, seus
professores e alunos continuam enfrentando limites para ter acesso a tais recursos, entre
outros fatores. Isso faz do livro um dos suportes didáticos mais usados e consultados.
Em nossa discussão, o livro didático é entendido um tipo de material da cultura
escolar utilizado por alunos e professores
Essa relação implica pelo menos dois leitores permanentes: aluno e
professor, que mantêm entre si uma relação de poder muito peculiar,
relação que vai caracterizar o livro como didático. Esse precisa ser
usado de forma sistemática, no ensino-aprendizagem de um
determinado objeto de estudo do conhecimento humano, geralmente já
consolidado como disciplina escolar. Didático, portanto, é o livro que
vai ser utilizado em aulas e cursos e que, provavelmente, foi escrito,
editado, vendido e comprado tendo em vista essa utilização escolar e
sistemática, visando ao aprendizado coletivo e orientado por um
professor (SANTOS, 2004, p. 10).
Essa definição nos fez compreender que estudar os livros didáticos, numa
perspectiva histórica, é uma forma de entender o papel que desempenham na formação
dos leitores, especialmente, de professores e de alunos. Por meio do estudo dos livros
didáticos, podem-se conhecer detalhes importantes da cultura escolar e dos saberes
escolares que, supostamente, não poderiam ser apreendidos a partir do estudo de outros
materiais didáticos. Os livros didáticos de Geografia foram para nossa tese uma “janela”
que se abriu para que pudéssemos compreender o processo de escolarização e discutir
28
diretamente sobre o papel dos exercícios na formação dos saberes escolares.
No próximo tópico, trataremos da tese, dos argumentos que embasaram o estudo
e das considerações acerca da trilha da pesquisa e do percurso metodológico.
29
1.2 - Trilhas da pesquisa: a tese e os caminhos teórico-metodológicos
Nossa proposta de tese buscou promover uma reconstrução histórica das
metodologias aplicadas ao ensino primário da disciplina Geografia entre os anos de
1880 e de 1930, com o fim de compreender como surgiram e de que forma se
processaram as transformações metodológicas de ensino, com a adoção dos exercícios
nos livros didáticos destinados a essa disciplina e publicados nesse período histórico.
Assim, para construir nossa tese, partimos de um argumento inicial que foi
delineado pelas análises dos livros didáticos de Geografia publicados no período em
tela. Por muito tempo, antes e ao longo do período estudado, os livros didáticos traziam,
em geral, uma estrutura organizada em forma de perguntas e respostas, denominada
pelos estudiosos de livros didáticos de catecismo, para facilitar o processo tradicional de
ensino baseado na memorização dos conteúdos. Nas edições mais antigas, as perguntas
que deveriam ser feitas pelos mestres eram escritas em negrito ou em itálico, seguida
pelas respostas, que deveriam ser ditadas mnemonicamente pelo aluno, conforme se
observa na figura a seguir:
Figura 01: Texto organizado em forma de catecismo: perguntas em destaque e respostas
Fonte: PINHEIRO, Manoel Pereira de Moraes - Elementos de Geographia universal – Geral do Brazil e
Especial de Pernambuco para a infância escolar da Província de Pernambuco. Recife: Typographia
Mercantil, 1875. Acervo: Gabinete Português de Leitura.
30
Essa estrutura passou a ser questionada por alguns autores de livros didáticos
publicados no período (ALBUQUERQUE, 2010) e resultou do contato deles com os
debates nacionais e/ou internacionais sobre a necessidade de inovar os métodos de
ensino. Quando esses autores mudaram a estrutura de seus textos, eles passaram a ser
escritos de forma corrida, sem a distinção explícita entre seu conceito e/ou o conteúdo.
Assim, devido às necessidades postas por essa inovação, as perguntas que eram o centro
do processo de ensino começaram, lentamente, a ser substituídas por textos corridos
descritivos, apesar de continuarem os destaques em itálico ou negrito para os conceitos.
Isso pode ser observado em livros com mais de uma edição ao longo dos anos, como
mostra esta figura:
Figura 02: Texto contínuo com conceitos destacados em itálico
Fonte: PEREIRA, Jeronimo Sodré. Compêndio de Geographia Elementar: especialmente do Brazil. 1884.
Acervo: Biblioteca Paulo Bourroul - FEUSP
Outra forma que os autores encontraram para suplantar o modelo de catecismo,
já criticado por alguns autores na época, foi recorrer ao texto corrido, porém sem deixar
31
as marcas do passado, ou seja, destacando em negrito os conceitos ou conteúdos que
deveriam ser ditados pelo professor. A figura abaixo ilustra essa assertiva:
Figura 03: Texto contínuo com destaque de conceitos ou conteúdos em negrito
Fonte: A. G. Lima. Noções de Geographia – I parte – Estado do Rio Grande do Sul, 1881.
Acervo: Biblioteca de livro didático da USP.
Esse argumento que ora utilizamos para pontuar nossa tese tem uma relação
direta com a organização dos conteúdos por meio do método expositivo, em detrimento
de um texto com base no formato de catecismo (perguntas e respostas). Isso pode ser
32
observado na obra Compêndio elementar de Geographia Geral e especial do Brasil, de
autoria do Thomaz Pompeu de Sousa Brasil, publicado em 1859. Esse autor demonstra
certa atenção ao debate sobre a inovação dos métodos, pois, embora essa obra seja
destinada ao ensino secundário, apresenta, na introdução, a mesma preocupação com as
concepções pedagógicas difundidas.
Também é possível relacionar tais mudanças com a introdução no Brasil e, mais
especificamente, na escola, a partir do final do Século XIX para o início do Século XX,
de uma Geografia científica em que a descrição passou a ser o centro do processo de
ensino, deixando para trás, lentamente, uma Geografia clássica apoiada em descrições e
relatos sem fundamentos científicos (CARVALHO, 1925; ISLER, 1973; ROCHA,
1996;). Com essas mudanças, os livros foram tomando uma nova configuração, ou seja,
deixando de trazer explicitamente a pergunta e a resposta como centro da redação dos
textos. Porém, não podemos negar que as perguntas e as respostas referentes aos
conceitos, mesmo que indiretamente, permanecem como centro do processo de ensino e
aprendizagem. Entretanto esse processo não pode ser observado somente como
decorrente da troca das perguntas por textos corridos. Há, no bojo dessas
transformações, um debate que vem provocando mudanças metodológicas mais
profundas na escola e, em especial, na relação entre o ensino e a aprendizagem. Assim,
entendemos que é preciso conhecer tais transformações para que possamos compreender
efetivamente a introdução dos exercícios nos livros didáticos de Geografia.
Consultando outro tipo de publicação, neste caso, os manuais destinados à
formação de professores – publicados, mais precisamente, no final do período estudado,
como os livros Como ensinar Geografia, de Firmino Proença, publicado em 1928, e a
obra Didática (nas escolas primárias), de João Augusto de Toledo, em 1930 –vimos
orientações metodológicas que sugerem a relação entre as inovações metodológicas e o
uso dos exercicios como práticas educativas inovadoras. As leituras nos fizeram
entender que essas obras apresentavam propostas didáticas que difundiam novas
concepções pedagógicas e, em algumas circunstâncias, na falta de um currículo para a
escola primária, conduziam a propagação das concepções teóricas e metodológicas e, a
partir delas, difundiam os exercícios.
Com base nesses argumentos foi que construímos nossa tese de que a introdução
de exercícios nos livros didáticos de Geografia destinados ao ensino primário, entre os
33
anos de 1880 e 1930, é um dos indicadores da introdução de novos métodos de ensino
na escola brasileira e representa a adoção de uma nova Geografia pelos autores. Os
exercícios passaram, inicialmente, a compor os livros como forma de substituir as
perguntas e as respostas explícitas que vinham no corpo do texto e que, lentamente,
passaram por um processo de modificação. Em um segundo momento, é pertinente
afirmar que os exercícios passaram a incentivar uma nova forma de ensinar e de estudar,
pois estimulariam o uso de novos mecanismos de leitura, de apreensão dos textos e de
formulação de respostas solicitadas aos alunos, já que elas não estão mais dadas
explicitamente ao longo do texto.
Para tanto, as impressões aqui contidas, entre outras fontes, tomam como base
central para a nossa pesquisa quatro obras selecionadas a partir da catalogação de 229
obras no geral (as destinadas ao ensino primário, os atlas e as que não apresentavam
uma destinação quanto ao nível de ensino) e, dentro desse universo, 131 livros didáticos
de Geografia destinados ao ensino primário, dos quais selecionamos para uma análise
mais apurada os que traziam diversos tipos de exercícios e que foram publicados no
período determinado para a pesquisa – escolhemos um livro publicado no Século XIX e
três no Século XX, um do início, e os outros dois da década de 1920, tendo em vista que
as transformações metodológicas foram difundidas mais expressivamente no final do
período. Outro elemento que pautou essa seleção foi a incorporação, nas obras, dos
debates sobre a produção didática que procurava romper com o modelo de catecismo,
ou seja, a estrutura textual montada a partir de perguntas e respostas, aderindo, portanto,
ao movimento de redefinição de questões de ordem metodológicas, que buscava,
sobretudo, propagar o debate dos exercícios para renovar as metodologias para o ensino
primário.
Em linhas gerais, essas obras foram elaboradas com base em uma Geografia
escolar difundida também em outros livros didáticos da época. Na comparação entre as
obras selecionadas, observamos diversidades na abordagem dos conteúdos, pautadas em
proposições científicas, em princípios religiosos ou em ideias nacionalistas. Notamos
ainda que tais obras valorizam mais os conteúdos sobre o Brasil do que os sobre países
estrangeiros.
Assim, com base nesses critérios, selecionamos as seguintes obras: Compêndio
de Geographia elementar: especialmente do Brazil, por Jeronimo Sodré Pereira,
34
publicada em 1884; Pequena Geografia da Infancia, de Dr. Joaquim Maria de Lacerda,
de 1913; Geographia Atlas: Curso elementar, publicada pela F. T. D, em 1923, e
Geographia, também publicada pela F. T. D. em 1923.
A primeira obra elencada é um livro didático de Geografia regional, publicado
na província da Bahia, que tem 162 páginas e está organizado em: Grammatica da
Geographia e Geographia Descriptiva, cada uma composta de primeira e segunda
parte, mede 16 centímetros de largura e 22 de altura, está em boas condições de leitura e
contém todas as páginas.
Figura 04: Livro didático de Geografia publicado no Século XIX
Fonte: PEREIRA, Jerônimo Sodré. Compêndio de Geographia elementar: especialmente do Brazil,
Bahia: S/Ed, 1884. A primeira edição foi publicada em 1875. Acervo: Biblioteca Paulo Bourroul, FEUSP.
O segundo livro que apresentamos foi publicado por uma das maiores editoras
de livros didáticos da época. Seu autor era muito prestigiado pelas escolas brasileiras. A
35
obra tem 128 páginas, mede 21 centímetros de altura e 14 de largura, encontra-se em
bom estado de conservação, com todas as páginas e todo o material adicional anunciado
na capa, que são seis belas cartas das cinco partes do mundo. Está organizada em seis
seções, que se dividem em geral e particular. Primeiro, temos a Geografia Geral e a
particular do mundo; depois, a Geografia do Brazil, dividida em: descripção geral e
descripção dos estados.
Figura 05: Livro didático de Geografia publicado no início do Século XX
Fonte: LACERDA, Joaquim Maria de. Pequena Geografia da Infancia. Rio de Janeiro: Francisco Alves,
1913. Acervo: LIVRES - Biblioteca do Livro Didático – FEUSP.
O terceiro livro selecionado não tem autor estabelecido. Foi escrito em uma
interface entre os preceitos da igreja católica, os interesses da editora e as proposições
metodológicas inovadoras da época. Tem 48 páginas e foi dividido em: Noções gerais
36
da Geographia, Globo terrestre, Geoggraphia Phisica e Geographia política. Na primeira
parte, a obra traz a Geografia do Brasil e apresenta o país estado por estado. A segunda é
voltada para a Geografia do mundo, em seis capítulos, e mede 22 centímetros de altura e
29 de largura.
Figura 06: Livros didáticos de Geografia publicados na década de 1920
Fonte: Capa do Atlas Geographia Atlas Curso elementar, por F. T. D. 1923. São Paulo: Livraria
Francisco Alves. Acervo: LIVRES - Biblioteca do Livro Didático – FEUSP.
O quarto livro didático de Geografia foi também publicado pela FTD e, como no
anterior, os autores são anônimos, o que indica uma política dessa editora para a questão
autoral. A obra apresenta as seguintes características: tem 112 páginas, foi dividida em
seis capítulos e uma Lição Complementar sobre a Palestina; mede 18 cm de altura e
12,5 cm de largura, está bem conservado e, em anexo, traz os mapas em preto e branco
anunciados na capa.
37
Figura 07 – Livro didático de Geografia publicado em 1920
Fonte: Geographia: Curso elementar. Rio de Janeiro/ São Paulo: F. T. D.,1923. Acervo: LIVRES -
Biblioteca do Livro Didático – FEUSP.
Além das questões supracitadas, consideramos que é importante incluir o debate
sobre o ensino de cartografia, sua normatização e as exigências legais sobre a inclusão
desse conteúdo nas aulas de Geografia do ensino primário, tendo em vista sua
importância para a Geografia escolar no período. Por essa razão, optamos pelo Altas de
Geografia, que traz esse debate e é todo organizado a partir de exercícios.
Para discutir sobre as indicações metodológicas, apoiamo-nos, principalmente,
no debate feito por alguns autores (CARVALHO, 1925; ROCHA, 1996) e no Parecer e
Projeto da Reforma do Ensino Primário de 1883, que concebe os exercícios como um
38
método e aponta a cartografia escolar como uma das finalidades da Geografia na escola
primária. Esse Parecer11
apresenta os conteúdos que serão tratados, as metodologias
adotadas e as finalidades da disciplina. Elaborado como um projeto de lei e apresentado
à Câmara em 12 de setembro de 1882, esse Parecer nunca foi aprovado nessa instituição
nem regulador da escola primária no país. Entretanto, foi referencial para os debates e
outras propostas de reformas educacionais (MACHADO, 1999; PERES, 2005;
BONATO, 2011) e o é para nosso trabalho, pois, a partir dele, podemos verificar grande
parte das propostas de inovação pensadas para a educação no período. Os Pareceres
desses autores destinados ao ensino secundário (1882) são utilizados com mais
frequência na literatura da História da Educação (SOUSA, 2008) e, em especial, na
História da Geografia Escolar (VLACH, 1988; ROCHA, 1996). O uso desse documento
destinado ao ensino primário nesta tese exerce o mesmo papel nas pesquisas
supracitadas, ou seja, é um referencial para as reformas que se desencadearam no
período em tela.
A análise desse documento nos possibilitou fazer afirmações a respeito de uma
legislação que visava introduzir um novo método de ensino na escola, preocupação que
também é apontada por outros autores de História da Educação (HÉBRARD, 1999;
SOUZA, 2000, 2011; VALDEMARIN, 2006, 2010) aos quais também recorremos para
essa análise. Do mesmo modo que observamos essa preocupação com a inovação
metodológica nos documentos, podemos observá-la na introdução de alguns livros
didáticos. Esse processo também é referido em uma literatura da época destinada aos
professores de Geografia, como os livros: A Educação Nacional, de José Veríssimo,
publicado em 1890, e Methodologia do Ensino Geographico, de Delgado de Carvalho,
de 1925.
Esses documentos nos possibilitaram relacionar quatro elementos para a
construção de nossa tese: os debates acerca da superação de uma escola tradicional, os
debates sobre a renovação da Geografia, a legislação a respeito da introdução de um
novo método de ensino para a escola e a adoção dessas inovações pelos autores de
livros didáticos. Esses elementos é que dão sustentação à tese e justificam a escolha do
11 Ver documento: BARBOSA, Ruy; ESPINOLA, Thomaz do Bomfim; VIANA; Ulisses
Machado. Reforma do ensino primario e varias instituições complementares da instrucção publica:
Parecer e projecto da Commissão de Instrucção Publica, de 1882 - Sessão de 12 de setembro de 1882.
Ruy Barbosa (relator). Typographia Nacional. Rio de Janeiro, 1883.
39
livro didático como o documento principal, porquanto pode expressar, em suas páginas,
o resultado desse processo de transformação, já que não temos mais como observar as
práticas escolares daquele período nem como consultar os professores que lecionaram
na época. No entanto, não estamos afirmando que todos os livros didáticos de Geografia
passaram a ser compostos segundo esses preceitos. É preciso entender que esse processo
é lento, como tudo o que diz respeito às transformações em âmbito educacional, e que
há uma série de sujeitos e interesses (econômicos, culturais, sociais etc.) envolvidos.
A proposta é de promover uma reflexão histórica sobre os livros didáticos de
Geografia destinados ao ensino primário, com base nas intenções e nos interesses
pedagógicos que estavam expressos na elaboração dos exercícios. O estudo discutiu
sobre essa metodologia de ensino, partindo das seguintes questões: A partir de quando
esses livros didáticos começaram a trazer exercícios? Por que somente em determinado
momento os exercícios passaram a compor os livros didáticos? Qual a finalidade de se
trabalhar com os exercícios? Como as novas metodologias expressaram a introdução de
uma abordagem moderna para a Geografia? Como os exercícios podem ou não ser
considerados parte de um novo método de ensino?
Nossos estudos partiram dos pressupostos teórico-metodológicos pautados na
história das disciplinas escolares. A leitura que fizemos visou discutir sobre a História
da Educação em seus diferentes tempos e espaços. Para tanto, recorremos a outros
significados e sentidos, para dar atenção às questões que, mesmo não sendo pontuais
para as grandes narrativas, poderiam nos ajudar a pensar sobre o processo histórico a
partir de seus descompassos, de suas descontinuidades e de outros contornos (VIDAL,
2005). Fazer história é uma forma de adentrar o processo de concepção dos indivíduos
formadores de opiniões, de ideias, de culturas, de formação social, para que ele
compreenda como atuam os diversos elementos formadores desses discursos e sua
relação com os outros (BENCOSTTA, 2010).
A esse respeito, Gondra (2006) enfatiza que, nesse fazer historiográfico, convém
pensar sobre os novos desafios, apontamentos e possibilidades postas para esse campo e
ir além dos balanços, pois, segundo esse pesquisador, na historiografia da educação
brasileira, há uma necessidade de ultrapassagem que poderá nos fazer enxergar outras
possibilidades e outras direções. Compreendemos que os exercícios, nos livros
didáticos, são elaborados a partir de finalidades e objetivos de aprendizagem, com base
40
em uma metodologia de ensino determinada. Assim, tomamos como objeto de estudo os
exercícios nos livros didáticos de Geografia, porque entendemos que eles são como
peças importantes para se compreender a noção de Geografia escolar e sua relação com
os discursos políticos, econômicos, culturais, entre outros, difundidos em determinado
período.
Em nossa pesquisa de Mestrado, encontramos algumas questões que nos
ajudaram a tecer as primeiras considerações sobre nosso argumento de tese, já que os
resultados alcançados nos possibilitaram elaborar questionamentos e impressões sobre a
presença dos exercícios no processo de escolarização. Ferreira (2012) assevera que
o conjunto de exercícios presentes nos livros didáticos de Geografia
são indícios do que o aluno deve aprender e como deve aprender. Se
analisados numa perspectiva histórica percebemos que esses se
destacam como estratégias de fixação do conteúdo e como
instrumento de verificação de aquisição do saber ensinado. O
exercício em geral é solicitado pelos professores como forma de fixar
ou reforçar a aprendizagem de algum ponto de uma disciplina
estudada. Cada exercício se caracteriza pela finalidade da ação
pedagógica executada em sala de aula. Partindo desse pressuposto
podemos sugerir que os exercícios fazem parte das culturas e das
práticas escolares. Os exercícios nos livros didáticos representavam e
representam metodologias que sugerem procedimentos a serem
executados pelos alunos, centralizam objetos mediadores do saber e
possibilitam modos de interação entre alunos, e desses com o
professor. Por isso, afirmamos: os exercícios podem ter desempenhado
um papel fundamental na aquisição dos conhecimentos. Entendemos
os exercícios como práticas pedagógicas para auxiliar, avaliar e
facilitar os procedimentos e competências dos alunos, além de serem
métodos que orientam o processo educativo com base nos objetivos de
realização de provas exames, atividades, aulas práticas, etc. O
conjunto de exercícios presentes nos livros didáticos indicam que
esses não são apenas elaborados para expor os conteúdos de uma
disciplina, pois, também é função desse recurso pedagógico propagar
as concepções de aprendizagem e metodologias de ensino. São
elementos que possibilitam acompanhar as estratégias adotadas pelos
professores e alunos nas práticas educativas, sejam institucionalizadas
ou não.
As colocações acima nos permitiram refletir sobre a associação entre os
exercícios e as atividades práticas propostas pelas novas metodologias de ensino,
aclamadas pelo debate sobre a renovação dos métodos que começou, no Brasil, a partir
dos anos oitocentos do Século XIX. O conhecimento precisava ser mais aplicável, e os
exercícios eram uma das formas de aproximar, tanto em sala de aula quanto extraclasse,
os conteúdos, os estudos e a aprendizagem.
41
Sobre a presença dos exercícios no processo de escolarização, eles faziam parte
de um debate das modificações na estrutura metodológica do ensino primário da época.
Essa inovação afetou os conteúdos (HÉBRARD, 1999). Assim, os exercícios nos livros
didáticos da época foram se transformando. Segundo Hébrard (1999, p. 50), “entre 1830
e 1880, os professores aperfeiçoaram, nas salas de aula, os exercícios que iriam
permanecer até o Século XX [...]”. Tal afirmação nos leva a inferir que a cultura escolar
tinha e tem uma dinâmica própria que, ao mesmo tempo em que intervém, submete-se
aos limites e às peculiaridades do espaço escolar (VALDEMARIN e SOUSA, 2000).
Há uma preocupação em identificar, em diferentes momentos históricos,
questões que revelam traços da cultura e dos saberes escolares (VIDAL, 2005a) e poder
traçar um panorama para perceber as possíveis mudanças e permanências no processo
de escolarização (BITTENCOURT, 1993). Os debates sobre a Nova História Cultural
influenciaram sobremaneira os estudos em História da Educação que vêm sendo
(re)construídos por meio de uma crescente produção historiográfica, temática e
teoricamente, diferenciada e fértil, ganhando novos contornos, novas perspectivas e
novos olhares (BURKE, 1992).
Gondra (2006), ao discutir sobre esses estudos, afirma que é fundamental pensar
no desafio da “escavação” e no “uso cauteloso da enxada” na arte de fazer História. Por
isso, chama à atenção em seus questionamentos para o esforço de reconhecer o velho,
ou seja, usar as tradições como condição para se pensar nas produções da historiografia
da educação brasileira. Para esse pesquisador, não devemos nos limitar às fronteiras do
campo brasileiro, pois isso nos restringe a alçar outros voos nos mais variados campos
da História da Educação,
[...] trata-se de pensar a escrita da História da Educação, desafiando as
fronteiras do já sabido para forjar o que ainda não foi pensando, não
foi expresso ou que merece ser mais bem discutido e, mantido no
horizonte de nossas reflexões (GONDRA, 2006, p. 166).
Esses novos estudos têm dirigido um olhar diferenciado para as fontes e as
produções históricas e procuram, em sua diversidade teórico-metodológica, trabalhar
com um novo registro dos acontecimentos considerados grandes marcos, para traçar
inter-relações, articulações e tensões com os fenômenos singulares, aparentemente
insignificantes, mas que muito podem nos ajudar a seguir a pista metodológica que cada
42
pesquisador procurar trilhar.
Seguindo esses apontamentos de Gondra (2006), compreendemos que o uso de
livros e materiais escolares, como fontes de pesquisa para a História da Educação, tem
sido intensificado pelos pesquisadores devido à sua importância para compreender a
abrangência do cotidiano da escola. Mais do que meios de difundir conhecimentos, os
materiais didáticos são artifícios que, basicamente, estão no centro das ações
pedagógicas e indicadores de saberes que podem direcionar o processo de aprendizagem
e, muitas vezes, limitam as possibilidades de se adquirir o saber. Por isso, direcionamos
nossas reflexões para os livros didáticos, que são adotados por diversos níveis de ensino
e compreendem documentos de análise no campo de pesquisa da História das
Disciplinas Escolares. Em outras palavras, desenvolver pesquisas sobre esses materiais
escolares significa dar mais atenção ao processo de propagação da cultura escolar.
Sob nosso ponto de vista, o livro didático é um objeto de expressão da cultura
escolar, registro de uma época ou de uma sociedade, um instrumento ou recurso didático
e, ao mesmo tempo, uma valiosa fonte de pesquisa histórica por meio da qual é possível
desvendar elementos da composição curricular. Também é revelador de metodologias,
de políticas disciplinares, de valores culturais, de interesses econômicos e sociais
estabelecidos a partir do poder exercido pela escola e de toda uma simbologia que a
envolve como instituição educativa. Em nossas pesquisas, buscamos compreender
problemas como: o processo de constituição ou os constituintes de uma disciplina
escolar, a escolarização dos saberes e a dinâmica de construção dos saberes e das
culturas escolares, seguindo, assim, o que nos adverte Bittencourt (2008).
Nos livros pesquisados, especificamente nos de Geografia, como demonstrado
na Figura 08, os exercícios passam a ser considerados como um componente do corpo
do texto didático, o que indica o caráter prático ou de sistematização do ensino da
Geografia. Essa sistematização está de acordo com os princípios das metodologias
adotadas. Vejamos um modelo dos exercícios comum às obras didáticas do ensino
primário do período estudado:
43
Figura 08 – Exemplo de modelos de exercícios comuns aos livros didáticos do período
Fonte: LACERDA, Joaquim Maria de Pequena Geografia da infância composta para o uso das escolas
primárias. São Paulo: Francisco Alves, 1913. Acervo: GPCES.
Como podemos ler nessa figura, as perguntas dos exercícios requerem dos
alunos que saibam descrever os conceitos estudados. Isso contribui para o processo de
memorização dos conteúdos geográficos abordados. Partindo dessa constatação e
corroborando o pensamento de Chervel (1990) e o de Bittencourt (2008), podemos
afirmar que os exercícios exerceram função importante para as disciplinas escolares no
período, tendo em vista o processo de formação e aceitação social de uma disciplina
escolar, porquanto são considerados como complementos indispensáveis ao processo de
ensino e aprendizagem.
Compreendendo que os exercícios tinham papel fulcral no ensino escolar,
acrescentamos que há uma relação entre eles e o processo de formação dos
conhecimentos de uma disciplina escolar.
Com o intuito de analisar a relação apontada e, devido às inovações
metodológicas propostas para o período, destacamos algumas questões que tiveram
implicações tanto para essas renovações quanto para a organização dos conhecimentos
da disciplina escolar Geografia: a política de controle social, as representações culturais
e os modelos político-econômicos presentes nos livros didáticos do ensino primário e
observados nos exercícios propostos pelos autores.
44
A pesquisa que ora apresentamos se insere nas discussões acerca da Geografia
escolar presente nos livros didáticos, tendo em vista o que ela representava para o
contexto da época (momento de transição entre o Império e a Primeira República), e
quais as possíveis articulações entre o ensino da Geografia escolar e a constituição dos
saberes escolares. No âmbito da historiografia da Educação, procuramos compreender o
desenvolvimento dos exercícios e relacioná-los com as proposições teóricas desse tipo
de obra elaboradas em diferentes épocas.
Compreendemos o livro didático como uma fonte histórica que pode revelar
traços da cultura escolar de seu tempo e que os saberes neles contidos são formulados a
partir de outras interações que se formam para materializar esses materiais escolares.
Pensando nisso, enfatizamos que o trabalho com essas fontes impulsiona a
problematização dos discursos documentais e sinaliza o confronto entre elas e as normas
para o ensino primário que interferiam na elaboração dos livros e nas práticas dos
professores. Por isso é importante pesquisar também sobre as Leis, os currículos ou
programas adotados para o ensino primário do período, que concebem os exercícios
como um complemento das disciplinas escolares. Para Chervel (1990),
os exercícios podem então se classificar em uma escala qualitativa; e a
história das disciplinas descobre uma tendência constante que elas
apresentam a melhorar a posição de suas baterias de exercícios.
Assim, a renovação pedagógica de 1880 proscreve os exercícios
“passivos” e dá preferência aos exercícios “ativos” (p. 204).
Em outras palavras, os exercícios são componentes básicos de uma disciplina
escolar e fazem parte de qualquer sequência didática sugerida no ambiente escolar
(FREITAS, 2009). Assim, nesse caminhar metodológico, promovemos uma discussão
acerca do entendimento dos exercícios como expressão dos novos métodos para o
Ensino Primário nas produções didáticas de Geografia, na propagação da cultura escolar
e no processo de organização do ensino da época, em especial, dessa disciplina.
Conduzida pela curiosidade de destrinchar o entrelaçamento das questões que
vão desenhando uma pesquisa, os caminhos, suas preocupações e suas finalidades, a
produção de nossa pesquisa visa traçar itinerários que não priorizam os indícios ditos
oficiais, mas, sobretudo, a importância dos pequenos detalhes e das sutilezas dos
discursos (GINZBURG, 1989). Na obra O Queijo e os Vermes (2006), esse autor nos
indica os detalhes sobre como produzir uma pesquisa e afirma que todo percurso
45
teórico-metodológico é traçado pelo pesquisador, que exprime suas inquietações e as
desconfianças desse atuar investigativo, e apresenta uma nova percepção de como
devemos pesquisar e as particularidades do fazer do historiador.
Dessa forma, procuramos entender o processo de inserção dos exercícios nesses
livros, com base na renovação pedagógica de 1880, que recomendava a adoção de
exercícios “ativos” não apenas a partir dos debates postos para organizar o ensino da
época e de como tomaram corpo nos textos dos livros. A proposta é de relacionar o
debate acerca dos exercícios com a Geografia escolar no Brasil e seus constituintes.
Para isso, recorremos a fontes como o Parecer do ensino primário, de 1883, e a
renomada obra Lições de coisas, que nos ajudaram a ler os exercícios nos livros
didáticos ou a falta deles no processo de construção do conhecimento geográfico.
Segundo Valdemarin (2004),
esse manual, marco significativo da tentativa de implantar o método
de ensino intuitivo no ensino brasileiro, que remonta ao decênio de
1880, expressa a pretensão de adotar um método didático consoante
com a renovação pedagógica em curso na Europa e nos Estados
Unidos da América, cujos efeitos poderiam ser irradiados para toda a
sociedade, implementando as transformações sociais, políticas e
econômicas almejadas nas ultimas décadas pelo Império. O discurso
político e educacional produzido nessa época estabelece estritos
vínculos entre as propostas de inovação metodológica e a difusão do
ideário liberal republicano, destacando-se a utilização das “lições de
coisas” ou método intuitivo como estratégia de intervenção na sala de
aula, lócus especifico da instrução e da mudança das práticas
pedagógicas, adequando a escola ao projeto político modernizador (p.
104).
Como referência para a elaboração dos livros didáticos do período, essa obra traz
as concepções gerais sobre como deve ser organizado o ensino por meio do debate da
renovação pedagógica. No decorrer do Século XIX, conteúdos e métodos de ensino
fizeram parte dos discursos que idealizavam a formação de professores no Brasil.
Assim, sabendo que os discursos nem sempre se efetivaram na prática, vimos que eles
serviram como modelos de representação para os ideais de saberes escolarizados,
visando à instrução pública durante todo o Século XIX (SOUZA, 2000).
As pesquisas que fizemos a respeito dos exercícios têm demonstrado que, de
fato, têm feito sentido as pistas e os indícios que temos persistido no fazer desta
pesquisa, tanto no que se refere à sustentação do nosso argumento de tese - por termos
46
percebido que, em uma perspectiva histórica dos exercícios, a pesquisa complementa os
traços da busca por entender alguns fios da escolarização Primária no Brasil – quanto à
delimitação do período estudado, que foi demarcado por nosso próprio objeto.
Em nossos estudos, procuramos entender a ligação entre os tempos e os espaços
escolares com as tramas das representações sociais, pois, como nos reporta Chartier
(1990), as práticas escolares são também práticas de ordenamento do mundo social. Isso
nos chama à atenção para articular esses traços da cultura escolar, expressos nos tempos,
nos espaços e na materialidade da escola (FRAGO, 1995; FARIA FILHO, 2000a), com
outras dimensões importantes do fenômeno educativo, que são, também, perspectivas de
investigação.
Faria Filho (2002) enfatiza que a ideia da manter a unidade territorial foi o
centro dos debates sobre a Constituição do Estado Imperial brasileiro. Esses debates
estavam fortemente associados à formação de cidadãos brasileiros, que, de fato,
despertassem para um sentimento de identidade com o território, fossem disciplinados,
adquirissem bons hábitos e defendessem os interesses da elite econômica brasileira.
Esses interesses eram fundamentados no mundo do trabalho, na ordem social e no
comprimento do dever (VEIGA, 2007). Como se pode observar, um projeto como esse
não poderia ser proposto ou implementado, sem recorrer à disciplina escolar Geografia.
O projeto de escola pensado para o Brasil Imperial visava formar cidadãos
brasileiros e constituir uma nação. Sobre esse aspecto, Gondra e Schueler (2008)
enfatizam que a invenção do Brasil e da escola constitui a integração de um conjunto de
ações articuladas no processo de construção do Estado imperial. Sobre isso, precisamos
atentar para ler essas articulações como
[...] processos de circulação de modelos de educação escolar, calcados
nos ideias de civilização e progresso, e considerar as experiências
históricas singulares de implementação numa sociedade mestiça, que
se apropriou de modelos estrangeiros no contexto de uma cultura
plural e híbrida. Com isso, é preciso perceber como o movimento dos
defensores do modelo escolar de educação para o Brasil do Século
XIX, o qual, em linhas gerais, implicou apropriação e remodelação de
espaço, conhecimentos e valores próprios de instituições e concepções
de educação, atuou no sentido de inventar e produzir a escola como
um lugar próprio, específico, destinado à educação de crianças e
jovens (GONDRA e SCHUELER, 2008, p. 20).
O trecho acima reforça o que vem sendo pesquisado e apontado por muitos
47
historiadores da Educação que têm se preocupado com os processos de constituição de
do espaço próprio da escola, o que Vicent, Lahire e Thin (2001) chamam de forma
escolar, ou seja, uma forma especificamente escolar de socialização da infância. Nas
palavras dos referidos autores, “a forma escolar não é somente um efeito, uma
consequência, mas participa dessa nova ordem” (p. 14). Eles referem que essa definição
nos permite entender a configuração e a difusão da instituição escolar no mundo
moderno, buscando pensar a escola como uma forma de escolarizar o social, isto é,
ampliar sua influência para além dos muros da escola.
Por isso, Gondra e Schueler (2008) definem o Oitocentos como um período fértil
de iniciativas, debates e práticas educativas, que foram elaborados em meio a tensões e
a disputas e que estavam ligados com os projetos de nação e da organização do Estado
brasileiro. Na mesma perspectiva dos autores supracitados, Vicent, Lahire e Thin (2001,
p. 30) chegam a afirmar que a ordem social e a escolar estão extremamente interligadas,
uma vez que
a codificação dos saberes e das práticas escolares torna possível uma
sistematização do ensino e, desse modo, permite a produção de efeitos
de socialização duráveis, registrados por todos os estudos elaborados
sobre os efeitos cognitivos da escola. A escola – como instituição na
qual se fazem presentes formas de relações sociais baseadas em um
enorme trabalho de objetivação e de codificação – é o lugar da
aprendizagem de formas de exercício do poder. Na escola, não se
obedece mais a uma pessoa, mas a regras supra-pessoais que se
impõem tanto aos alunos quanto aos mestres.
Para discutir com mais propriedade sobre a produção do lugar da escola, a noção
de cultura escolar é particularmente importante, porque nos permite articular, descrever
e analisar, de forma rica e complexa, os elementos e os fenômenos educativos expressos
ao longo do tempo. Aqui tomamos a cultura escolar como uma categoria teórica que, em
cada tempo histórico, possibilita-nos dialogar com os modos de socializar e de
escolarizar escola. Por isso, concordamos com Vidal (2005a, p. 24), quando faz a
seguinte reflexão sobre a cultura escolar:
É preciso reconhecer que a guarda dos objetos escolares, como globos,
carteiras, material dourado, projetor de slides, lanterna mágica,
sólidos, museus escolares, dentre outros muitos, é importante, na
compreensão de que os objetos portam pistas das múltiplas maneiras
48
como professores e alunos constituíram inteligibilidades e suscitam a
investigação sobre as diferenciadas formas de sua apropriação [...].
A citação acima retrata indícios das relações passadas dos sujeitos com a
materialidade escolar e se configuram para os pesquisadores como um meio de entender
a formalidade das práticas escolares, o que nos possibilita afirmar que as situações
pedagógicas se constroem a partir também das diferentes formas de socialização. Esses
autores fazem parte de um grupo que tem dirigido um novo olhar para a História da
Educação brasileira tomando a forma escolar como conceito e promovendo novos
estudos, que, em sua diversidade teórico-metodológica, têm apresentado considerações
relevantes acerca das possíveis generalizações centradas nos marcos rígidos e lineares,
nos supostos acontecimentos causadores dos insucessos das práticas educativas
brasileiras do Século XIX.
Partindo dessa perspectiva, indagar sobre as estratégias da escolarização
primária e centramos em suas finalidades e em questões específicas sobre a Geografia
escolar como: o que se deveria aprender? O que difundir e como ensinar Geografia no
ensino primário? Quais os materiais didáticos recomendados?
Nessa discussão, duas questões foram pontuais: o método utilizado e os saberes
propagados pela escola primária. Segundo Gondra e Schueler (2008), uma das
prioridades do Estado, no Império, era a formação do povo e a civilização do país. Para
isso, seria preciso pensar sobre como a educação deveria ser ofertada e organizada.
Ao definir o repertório de saberes da escola primária, o Estado
explicita o que pretende: agir sobre os meninos e meninas. Ação que
busca unificar a língua, selar ainda mais os vínculos do Estado com a
Igreja católica e criar uma história para o Brasil, sendo o texto da
Constituição uma peça-chave nesse projeto, a ponto de ser
recomendada, no corpo da lei, como leitura para as escolas de
primeiras letras (GONDRA E SCHUELER, 2008, p.54).
Além da tarefa de legislar e de selecionar funcionários para atuarem no projeto
de Educação Imperial, o Estado se utilizou de outros elementos, na tentativa de manter o
controle daquilo que deveria ser ensinado nas escolas. Dentre esses elementos,
destacam-se os livros didáticos, como podemos observar nas palavras de Vasconcelos
(2005, p. 199):
A Uniformidade e regularidade também visavam à difusão de
49
compêndios, traduzidos e impressos para a educação dos professores e
dos futuros cidadãos brasileiros aprovados e recomendados pelo
Estado, diferentemente daqueles usados na Casa, que eram escolhidos
seguindo a formação e a opção dos mestres. Na verdade, tanto a
interferência nos manuais, tornando-os diferenciados, quanto a
inspeção que é criada e ganha um quadro próprio de funcionários e
regulamentos para esse fim, têm como finalidade imediata de mandar
seus filhos à escola pública estatal.
Diante dessa realidade, convém nos reportar a Hobsbawn (1995), quando propõe
que pensemos sobre o político como um elemento fundamental na sociedade e na
história social. Nas décadas inicias do Século XIX, destacamos a interferência do
político legitimando a formação do incipiente Estado nacional e na organização da
ordem social, quando, em 1822, o Brasil se tornou independente, o que imprimiu uma
nova configuração social e educacional (ANANIAS, 2012).
A esse respeito, cabe lembrar os apontamentos de Koselleck (2006) ao afirmar
que devemos pensar no conceito a partir das práticas e das vivências. Por isso, o político
deve ser entendido pelo viés conceitual, e não, cronológico. Sobre a história conceitual,
podemos dizer que começou a ser utilizada entre os historiadores, que, entre as décadas
de 50 e 60 do Século XX, perceberam a insuficiência da história das ideias. Desse
modo, a história dos conceitos12
[...] começou como crítica à tradução descontextualizada de
expressões cronologicamente relacionadas ao campo semântico
constitucional; em seguida, essa especialização pretendeu uma crítica
à história das idéias, compreendida como um conjunto de grandezas
constantes, capaz de se articular em diferentes formas históricas sem
qualquer alteração essencial. Ambos os impulsos conduziram a uma
delimitação metodológica mais precisa, pois, ao longo da investigação
de um conceito, tornou-se possível investigar também o espaço da
experiência e o horizonte de expectativa associados a um determinado
período, ao mesmo tempo em que se investigava também a função
política e social desse mesmo conceito (KOSELLECK, 2006, p.104).
12
A história dos conceitos sofreu grande influência da língua alemã, pois foi em território alemão que
essa discussão se tornou mais frutífera, visto que a formação desse campo coincidiu com a emergência
do nazismo, um momento de crise do mundo liberal e burguês da época. Pesquisadores desse campo
afirmam que o momento mais fértil da história conceitual foi a partir dos anos de 1950 e coincidiu
com o fim do nazismo e da II Guerra. O historiador alemão, Reinhart Koselleck, foi o principal
expoente desse campo historiográfico, que ficou conhecido no mundo por sua tese de Doutorado,
intitulada: Crítica e crise: um estudo acerca da patogênese do mundo burguês, de 1954. Reinhart
Koselleck é, ainda hoje, um dos grandes nomes desse campo e foi um dos organizadores de um dos
dicionários mais importantes da história conceitual alemã.
50
É no sentido de investigar as funções do conceito na sociedade que temos
procurado trabalhar o político, pensando em sua relação com os sistemas de
representações que estão à frente de um país ou de grupos sociais que conduzem sua
ação e seu futuro. Nessa direção, temos feito todos os esforços possíveis para entender a
ação política como um elemento que está fortemente associado ao debate de unidade
territorial brasileira.
Segundo Veiga (2007), os modos de ensinar e de aprender no Período Imperial,
em especial, nas décadas finais do Século XIX, foram caracterizados por diferentes
modelos de organizar e transmitir os conteúdos, todos embasados na memorização,
cujos métodos são individual, simultâneo e mútuo. Nesse sentido, uma das principais
preocupações dos administradores encarregados dos projetos educacionais brasileiros,
no Século XIX e início do Século XX, centrava-se na redação dos livros didáticos.
Esses interesses envolviam questões como a difusão do nacionalismo patriótico, a
autoria desses livros e o público que ingressava nas escolas. O projeto de educação
integral republicano visava à promoção dos saberes elementares, às competências
básicas de leitura e de escrita e a uma formação moral e cívica, além da adoção do
método intuitivo e de livros didáticos.
Em nossa discussão, é preciso diferenciar o método intuitivo do ativo. De acordo
com o método intuitivo, o aprendizado se dava a partir da observação e da percepção de
cada aluno, isto é, aprendia-se através de uma “percepção sensível”. Tal método passou
a ser base na organização de escolas que se institucionalizaram na última década do
Século XIX. Já o método ativo se opunha à escola livresca, que “[...] se baseava no
ensino por informação, do que se podem depreender memorização e repetição e,
portanto, passividade do aluno na relação de ensino-aprendizagem” (VIDAL, 1999, p.
336). Tal método foi decorrente do movimento da Escola Ativa encabeçado no Brasil
por intelectuais que defendiam um ensino moderno, pautado na participação ativa do
aluno. A ideia era de tornar o ensino mais atrativo e eficaz.
Sobre a importância de discutirmos sobre o período estudado, embora tenha sido
crescente, nas últimas décadas, o número de pesquisas históricas que abordam esse
tempo da História, ainda tem muito para investigar e registrar sobre o Império e suas
modificações e permanências na transição para o regime republicano. Concordamos
com Gondra e Schueler (2008), quando afirmam que as pesquisas que trabalham com a
51
educação brasileira, no período do Império, precisam produzir abordagens históricas
que se distanciem de uma educação oitocentista que, “[...] via de regra, encontra-se
representada sob o signo do vazio, do atraso, das trevas ou das sombras” (GONDRA E
SCHUELER, 2008, p. 293).
Cientes de o quanto férteis e ricos são os acontecimentos dos Séculos XIX e os
anos iniciais do Século XX, e na tentativa de pensar sobre a educação e suas diferentes
formas de organização pedagógica, entendemos que os impressos são fontes que podem
nos dizer muito sobre os discursos, os valores, os silêncios e as práticas culturais dessa
época. Apesar da existência de projetos educacionais voltados para a difusão de uma
ideologia patriótica durante a primeira metade do Século XIX, a partir da segunda
metade desse século, em especial nas últimas décadas, foi que realmente esse
movimento tomou “corpo”. Isso é reflexo de um espraiamento do ensino primário pelo
território brasileiro, para abarcar outras camadas da sociedade que antes não tinham
acesso à escola.
Feitas as nossas considerações acerca da tese, dos seus principais argumentos e
da proposta de estudo como um todo, no segundo capítulo, aprofundaremos o nosso
estudo, apresentando as concepções teóricas que embasaram a tese e nos ajudaram a
olhar e a entender o objeto de estudo no amplo processo de escolarização.
52
CAPÍTULO II: SOBRE O OBJETO DE ESTUDO: INFERÊNCIAS E
APROXIMAÇÕES TEÓRICAS
Este capítulo foi divido em três partes. Trata, especificamente, da produção do
campo de estudo sobre livros didáticos e aponta que são importantes fontes para a
História da Educação. Ao fazer um levantamento das pesquisas que tomam o livro
didático como fonte ou como objeto, constatamos que os estudos da História da
Educação apontam, entre outras contribuições, para os aspectos internos da instituição
escolar (os modos de expressar a cultura escolar mais ampla). Isso nos permite dialogar
com as especificidades e as subjetividades dos processos de escolarização ao longo da
História da Educação.
2.1 A circulação dos impressos e sua relação com as práticas educativas:
considerações acerca do conceito e da produção do campo de estudo sobre o livro
didático
Discorrer sobre a circulação dos impressos13
, no Brasil oitocentista e meados do
Século XX, como é feito em nossa pesquisa de Doutorado, é trazer à tona traços do
chamado processo de circularidade cultural, evidenciando as peculiaridades de um país
marcado por tentativas de organizar o processo de escolarização que são influenciadas
fortemente por um fundo religioso.
Destacamos a década de 1970 como o berço dos deslocamentos e das alterações
nas formas de entender os impressos como objetos de estudo para a História da
Educação (LUCA, 2010). Na historiografia brasileira, mais especificamente nas
pesquisas sobre os anos finais do Império e os anos inicias da República, tem sido
recorrente o uso dos periódicos como fonte documental para analisar os discursos
públicos produzidos pela imprensa pedagógica que podem revelar traços da formação
da profissão docente, dos saberes escolares, das representações e das identidades
cidadãs. Neste trabalho, abordamos, mais especificamente, os saberes escolares.
A imprensa pedagógica, nesse período, era uma instância privilegiada para se
apreender como a escola primária foi organizada pedagogicamente, no que diz respeito
13 O termo “impresso” foi empregado devido ao período em estudo, já que, na época, tanto os livros
quanto outros materiais eram incluídos na modalidade de impresso.
53
à formação docente, entre outros temas. Uma questão que interessa mais de perto ao
nosso trabalho envolve “[...] as divergências a respeito dos múltiplos significados
possíveis de educação e de instrução primária; as distintas representações, apropriações
e práticas; os sentidos e as funções atribuídas ao ser professor e professora”
(SCHUELER, 2005, p. 381). Sobre esse aspecto, os estudiosos têm percebido que
desenvolver pesquisas que possam destrinchar as tramas desse momento da História é
fundamental para compreender as estratégias de organização, a civilidade, os modos e a
produção de ideias que foram gestadas nesse período e que formam as identidades do
nosso país. Apoiadas nessa premissa e visando discutir sobre nosso objeto de estudo,
concordamos com as colocações de Sena (2014, p.04), quando afirma:
O olhar atento sobre a imprensa permite verificar as diversas vozes
propaladas nele bem como diferentes escritos que se fazem presentes
[...] a imprensa nesse período, e em qualquer outro, deve ser
considerada como o lugar da recepção e difusão de discursos
múltiplos, onde e quando os debates culturais, políticos e literários se
criavam e/ou se firmavam através da escrita.
A autora nos convida a ler os impressos do Século XIX como a representação da
uma escrita de um tempo, uma vez que “[...] a imprensa no Império se apresenta como o
lugar de recepção e difusão do discurso da educação e instrução pública que circulava
entre diversos espaços sociais” (SENA, 2014, p. 19). Essa discussão é importante para a
História da Educação como um campo de estudo, no sentido de estimular reflexões
acerca da produção, da circulação e dos usos dos impressos, por meio da exploração
dessas fontes e da lapidação desses achados (NASCIMENTO e ALMEIDA, 2012).
Os estudos desenvolvidos sobre a história do livro e de outros impressos
apontam para as investigações sobre a cultura imprensa como
[...] a ponta de um iceberg para a apreensão de práticas culturais que
circularam nas sociedades ocidentais, pelo menos, nos últimos
quinhentos anos, quando os impressos imperaram como principal
ferramenta de disseminação cultural (NASCIMENTO e ALMEIDA,
2012, p.24).
Essa citação nos orienta sobre o papel da imprensa no Brasil, no período que
estudamos, de difundir as ideias consignadas nos impressos como fundamentais para
formar as identidades, os significados e os estereótipos construídos historicamente sobre
o que é ser cidadão. Essa colocação nos permite refletir, ainda, sobre a relação da
54
imprensa com o mundo dos livros, quando os tomamos como objetos culturais que
perpassam valores e modelos educacionais que foram repassados culturalmente
(BITTENCOURT, 2003).
Com base em nossas leituras, observamos que as pesquisas acerca da circulação
de livros escolares e outros impressos têm crescido no campo da História da Educação.
Entre os pesquisadores, tem sido cada vez mais recorrente analisar os impressos como
fontes ou objetos que podem indicar pistas das primeiras iniciativas do processo de
escolarização sobre os métodos, as disciplinas escolares e a cultura escolar. No caso das
pesquisas voltadas para o livro didático, vimos que há uma tendência crescente de
estudos que visam considerar os livros como objetos culturais que conservam pistas de
práticas educativas e revelam traços da organização pedagógica de uma época. Todavia,
a História da Educação brasileira ainda é carente de investigações sobre o livro didático,
o que pode configurar esse impresso como um objeto fértil para o campo. Seja como
fonte ou objeto de pesquisa, esse objeto nos possibilita, pelos seus próprios textos ou a
partir do estudo de sua materialidade ou de seus usos, conhecer os saberes e as ideias de
determinados grupos sociais (SCHUELER, 2005). No Brasil e no mundo, alguns grupos
vêm buscando criar acervos de livros escolares para possibilitar tais pesquisas, o que
tem surtido efeito, tendo em vista o crescimento delas em vários países e o
envolvimento de diversos grupos com temáticas referentes aos livros didáticos.
Em nossas pesquisas, constatamos que muitas instituições ou grupo de
pesquisadores que reconhecem a importância do livro como um documento histórico
(BITTENCOURT, 1993, 2008; CHOPPIN, 2004;) vêm não só investindo nas pesquisas
como também na preservação desses documentos. Dentre os pesquisadores que
produzem trabalhos sobre livros escolares, destacamos as contribuições do francês
Choppin (2004), tanto no que se refere à história dos livros didáticos quanto à
organização de acervos desses documentos históricos. Allain Choppin também criou e
organizou o EMMANUELLE, um Banco de dados do Instituto Nacional de Recherche
Pedagogique (INPR) da França, que disponibiliza uma consulta ampliada das edições
didáticas e dos livros escolares.
No Brasil, adotando como referência o Banco de dados EMMANUELLE e a
partir de um convênio com o INPR, foram criados, em 1994, o Banco de Dados do
Livro Escolar Brasileiro – LIVRES - e a Biblioteca do Livro Didático, vinculados à
55
Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo - FEUSP. Tal projeto tem se
empenhado em catalogar e fazer a guarda de livros didáticos14
. O acesso virtual a esse
acervo possibilita ao navegador da internet localizar livros depositados nas seguintes
bibliotecas: Biblioteca do Livro Didático da Biblioteca FEUSP; Biblioteca Municipal
Mário de Andrade de São Paulo; Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro; Biblioteca do
Colégio Pedro II – NUDOM - Rio de Janeiro; Biblioteca do CEALE da UFMG;
Biblioteca do Conjunto da Química da USP; Biblioteca da UNESP - Marília; e na
Biblioteca PUC - Minas Gerais.
Outro projeto que segue essa mesma linha é o acervo do Centro de
Alfabetização, Leitura e Escrita (CEALE), vinculado à Biblioteca da Faculdade de
Educação da UFMG, que tem como objetivo preservar uma gama de documentos
escolares, como livros didáticos e outros suportes didáticos15
. Ainda nessa mesma
perspectiva, temos como exemplo os acervos da Biblioteca do Livro Didático (BLD), da
Universidade de São Paulo, que sedia a Biblioteca Virtual do Livro Didático (LIVRES);
o Laboratório de Ensino e Material Didático (LEMAD); o Acervo de Cartilhas da
UFMG; e a Biblioteca do Grupo de Pesquisa, Ciência, Educação e Sociedade (GPCES),
instalada no Centro de Educação, na UFPB. Em âmbito internacional, destacamos as
iniciativas da Biblioteca Virtual EMANUELLE, que dispõe de um grande acervo de
livros didáticos franceses; a Biblioteca Virtual MANES, que contém um acervo de
publicações didáticas da Espanha e dos países da América Latina de língua espanhola; e
o Centro Internacional de Cultura Escolar – CEINCE, que realiza atividades de
investigativas a partir de três enfoques: memória da escola e do patrimônio educativo,
livros escolares e a relação entre a cultura escolar e a sociedade do conhecimento.
Os acervos supracitados vêm contribuindo expressivamente para o
desenvolvimento de pesquisas educacionais de caráter histórico e fornece um banco de
documentos para as investigações sobre a história das disciplinas escolares e sobre a
trajetória da profissionalização dos sujeitos da educação, além de pistas importantes
sobre as metodologias de ensino e as práticas escolares do passado, entre outros temas
14
Esse projeto tem orientado outros grupos de pesquisadores aqui no Brasil, como o GPCES e o
LEMAD, que já mencionamos ao definir os acervos pesquisados.
15 Esse acervo é composto de manuais de leitura, arquivos privados, cadernos de professores e de alunos,
cartilhas, livros infantis e de literatura, além de alguns cartazes e fotografias que retratam a história e o
cotidiano das salas de aula do início do Século XIX até a atualidade.
56
que abrangem seus objetivos.
Apresentados esses acervos, trazemos nossa posição teórica sobre a
conceituação do livro didático, ou seja, a partir de que conceito abordamos esse tipo de
impresso. E para compreendê-lo, é necessário discutir sobre ele historicamente. Se,
durante muito tempo, o livro didático foi exclusivamente um produto impresso,
atualmente, ele não se restringe mais a esse suporte. Além disso, o fato de as escolas
terem adotados diferentes livros com funções didáticas, como a bíblia, a Constituição,
romances, livros de viajantes, contos etc., que não foram pensados com essa função,
podem também trazer elementos complicadores para a sua conceituação.
Nesta pesquisa, não trabalhamos com livros que não sejam facilmente
identificados como didáticos, porquanto eles já foram criados com destino certo, a
escola. Já assumimos, no primeiro capítulo, que assim o iremos denominar por causa de
suas características, apesar de no período estudado terem outra denominação. Assim,
pelo tempo que trabalhamos com esse impresso, temos nos aproximado dos debates
sobre seu conceito e já o incorporamos em nossas pesquisas desde a graduação. Entre os
debates feitos nos grupos que constituíram os acervos mencionados, destacamos a
preocupação em conceituar o termo livro didático. Considerando as várias faces desse
suporte pedagógico, o grupo de pesquisadores criador do LIVRES adota o seguinte
conceito:
Livros escolares (ou livros didáticos) são todas as obras cuja intenção
original é explicitamente voltada para o uso pedagógico e essa
intenção é manifestada pelo seu autor ou editor. Nessa concepção se
inserem, além dos livros didáticos mais comuns, também
denominados de compêndios ou manuais escolares, as obras
conhecidas como paradidáticas, coletâneas de literatura produzidas
para as escolas e ainda Atlas, dicionários especialmente editados para
uso pedagógico16
.
Devido à abrangência desse conceito e às possibilidades de atualizá-lo de acordo
com as condições impostas e com as pesquisas que se pretendem desenvolver e ao uso
adequado que já foi feito dele por pesquisadores desse e de outros grupos e, por
16 Trecho copiado do Guia de Preenchimento da ficha do Banco de dados da LIVRES, p. 7, elaborado no
âmbito do projeto financiado pela FAPESP, Organização de Livros Didáticos, do Centro de Memória
da Educação – FEUSP.
57
satisfazer efetivamente a este estudo, adotamo-lo em nossa pesquisa, porque
entendemos que ele contempla as diversas modalidades de livros didáticos que
selecionamos para as análises. Some-se a isso o fato de já termos trabalhado com ele no
GPCES que, com o apoio do LIVRES, passou a adotar tal conceito e os procedimentos
de catalogação estabelecidos por seus pesquisadores, principalmente a ficha
catalográfica.
Nessa perspectiva, entendemos que eleger os impressos como fonte ou objeto de
pesquisa implica analisá-los como suporte material de práticas de leitura, a fim de
compreender sua materialidade, as formas por meio das quais ele chega ao leitor, bem
como seus suportes, meios de circulação e usos. A articulação desses requisitos para
pesquisar os impressos nos permite apontar o livro didático como tal suporte. Também
entendemos que ele guarda consigo indícios de um modelo de educação marcado por
uma organização pedagógica que indicava os conteúdos ensinados, os métodos adotados
e as formas de expressão dos textos (NASCIMENTO e ALMEIDA, 2012). Ou seja, o
livro, como qualquer outro impresso, é um objeto cultural que corporifica o saber. Por
essa razão, adotamos, nesta pesquisa, as recomendações de olhá-lo
[...] por dentro, buscando no texto, as mensagens expressas, indícios
das maneiras como eram transmitidas, considerando a materialidade
dos títulos e os conteúdos veiculados, [...] como instrumento de
difusão de saberes e práticas educacionais [...] por fora, buscando
características materiais, exige atenção quanto ao título, autor, editor,
quantidade de páginas, local de publicação, presença ou ausência de
ilustração, características gerais da capa, disposição gráfica da
primeira página, entre outros aspectos que podem delinear a análise no
decorrer da investigação (NASCIMENTO e ALMEIDA, 2012. p.25.).
Tais recomendações metodológicas nos ajudaram a elaborar perguntas sobre as
fontes e formular questionamentos a seu respeito. Também foram úteis nas análises e
inferências acerca do que nos apresenta essa fonte, por que, ao ser escolhida pelo
pesquisador, precisa ser lida e interpretada com atenção.
Se, de um lado, fomos buscar esses debates já sistematizados sobre como e o que
ler no livro didático, de outro, já encontramos referências à origem desse objeto a
respeito da questão que também nos interessam. Bittencourt (2008, p. 23) afirma que
a origem do livro didático está vinculada ao poder instituído. A
articulação da produção didática e o nascimento do sistema
educacional estabelecido pelo Estado distingue essa produção cultural
58
dos demais livros, nos quais há menor nitidez da interferência de
agentes externos em sua elaboração.
Desde sua origem, o livro didático se configurou como um recurso fundamental
para a prática escolar. Durante muito tempo, ele se destinou, especialmente, aos
professores, que tinham o controle sobre o uso do livro, e suas práticas e conteúdos
eram definidos por meio desse recurso didático, que funcionava como uma espécie de
currículo, função que pode ser vista até os dias atuais (ALBUQUERQUE, 2009).
Outra questão importante a respeito da pesquisa sobre livros didáticos é o seu
papel de difundir ideais. No caso da Geografia, devido às suas características, há grande
ênfase na difusão dos ideais defendidos pelo Estado nacional. Bittencourt (2004a), por
exemplo, ao destacar dois momentos da produção de livros didáticos no Brasil, adverte
que é no segundo (de 1870 a 1880) que os livros de Geografia passam a dar ênfase a
essa questão, já que, primeiro, no início do Século XIX, depois da implantação da
Imprensa Régia (BITTENCOURT, 2004a), os livros didáticos escritos no Brasil
passaram a trazer as marcas de modelos estrangeiros, como, por exemplo, da França e
da Alemanha, valorizando o conhecimento sobre esses países, assim como também era
comum a adoção de livros didáticos estrangeiros adaptados, traduzidos ou não (FARIA
FILHO, 2002a).
Ainda de acordo com Bittencourt (2004a), o segundo momento foi marcado por
uma produção legitimamente brasileira (1870 e 1880), quando os ideários liberais
educacionais passaram a ser difundidos com mais ênfase nessas obras didáticas, ou seja,
eram expressões das propostas de nacionalização que defendiam uma escola laica e
brasileira, preocupada com a construção de uma nacionalidade.
É preciso fazer uma ressalva sobre o que afirma Bittencourt (2004a) a respeito
da produção de livros didáticos no Brasil, pois, levando em consideração as pesquisas
mais recentes sobre esse tema, especificamente na Geografia, vemos que, tanto no
trabalho de Silva (2012), quanto no de Maia (2014), é a comprovação de que a produção
nacional é relevante, mesmo para o período em que Bittencourt afirma que ela é
pequena, ou seja, antes dos anos de 1870. Porém, continuaremos considerando como
válida a proposição dessa autora (2004) por dois motivos: primeiro, porque ela trata dos
livros didáticos em geral e, não, especificamente de uma disciplina; segundo porque há
nos livros didáticos de Geografia a ampliação do número de publicações brasileiras
59
depois desse período. Além disso, foi introduzida uma Geografia brasileira por
brasileiros, como advertia José Veríssimo (1985) sobre essa questão, nos idos de 1890.
Assim, entendemos que realmente houve uma transição do primeiro para o segundo
período depois dos anos de 1870.
Esse enfoque dado aos ideais nacionalistas pelos livros didáticos foi, durante
muito tempo, alvo das pesquisas a respeito desses recursos didáticos. A propósito,
Munakata, (2003a, p. 271), discutindo sobre o livro didático no Século XX, afirma:
Nos anos 70 e 80, um gênero literário fez relativo sucesso no Brasil: o
que se poderia denominar “As belas mentiras” [...] uma série de
pesquisas acadêmicas dedicaram-se a flagrar nos livros didáticos e
paradidáticos brasileiros a presença insidiosa da mentira, da
manipulação, do preconceito, da mistificação, da legitimação da
dominação e da exploração burguesas – em suma, da ideologia. [...]
Livro didático (e paradidático) era compreensivelmente objeto de
suspeição, do mesmo modo que era suspeita – e não sem razão – toda
a organização escolar consolidada pela ditadura.
O sucesso desse gênero literário, denominado de “As belas mentiras” estaria
associado às posições políticas de parte da sociedade que julgava ser fundamental
discutir sobre a Ditadura Militar no Brasil e criticá-la. Os principais livros didáticos
pesquisados foram os de História e os de Estudos Sociais, considerados como objetos de
veiculação da ideologia daquele regime político.
A década de 1990 foi a grande reveladora de novas problemáticas para o campo
de pesquisa da História da Educação, com destaque para as abordagens sobre livros
didáticos. A partir de então, os pesquisadores passaram a considerar o livro como um
produto que passa por todo um processo de produção, fabricação e comercialização do
mundo editorial, logo, torna-se uma mercadoria produzida para ser vendida
(MUNAKATA, 2003).
Como alvo de críticas ou de elogios, o livro didático tem provocado indagações
e questionamentos. Essa literatura didática é um tema que possibilita a realização de
uma análise interpretativa baseada em enfoques diversificados. Nas leituras que
fizemos, identificamos outra questão que diz respeito ao livro didático, ou seja, os usos
que se faz dele. Há mesmo divergências entre os professores quando se trata dessa
questão. Bittencourt (2008, p. 13), em suas pesquisas, descobre, inclusive, contradições
entre os professores em relação ao uso desses recursos didáticos na escola básica ao
60
enfatizar que, “para uma parcela de professores, o livro didático é considerado um
obstáculo ao aprendizado, instrumento de trabalho a ser descartado em sala de aula.
Para outros, ele é material fundamental ao qual o curso é totalmente subordinado”.
Como vemos, a utilização dos livros didáticos pode variar. Às vezes, são usados
por alunos ou professores para consultas; em outras situações, como currículo; na
preparação de aulas; na elaboração de planejamentos ou, ainda, como referência de
conteúdo, na elaboração de exercícios etc. Porém, o foco de nossa pesquisa não foi o
uso deles, só apontamos essa questão com o fim de compreender os estudos existentes
sobre o livro didático.
Compreendemos que a obra didática carrega uma série de particularidades e
características que são próprias desse tipo de literatura. O livro didático tem passado por
grandes modificações por ser um produto cultural que tem dado um retorno financeiro
significativo às editoras, considerando esse consumo em nível nacional, por causa do
grande número de escolas públicas e de alunos que têm acesso à escola na atualidade.
Salles (2010, p. 09 e 10) enfatiza que
o livro didático pode ser caracterizado, ainda, enquanto produto
mercadológico, uma vez que está inscrito em uma lógica mercantil de
produção e circulação, obedecendo, desse modo, às técnicas de
fabricação e comercialização, inerentes ao processo de
mercantilização. Tal perspectiva vem ganhando espaço em produções
acadêmicas, ainda mais porque o livro escolar representa, desde algum
tempo, um importante ramo para as editoras, e é, hoje,
indubitavelmente, a atividade mais rentável do setor editorial
brasileiro, cujo maior comprador é o Estado.
Como pudemos perceber, o livro didático deve ser entendido como uma
mercadoria que é produzida de acordo com as influências do mercado editorial.
Pesquisas recentes demonstram que essa relação interfere no resultado final do livro
escolar e na construção do saber escolar17.
Em nossas investigações, podemos inferir que, de maneira geral, esses materiais
didáticos aparecem nos estudos como um suporte pedagógico, um instrumento de
memorização, que atendiam aos primeiros modos de alfabetização estabelecidos com
base na trilogia ler-escreve-contar, estudada por Jean Hébrard (1999) que, interessado
17 A respeito das pesquisas que trabalham o livro didático como um produto mercadológico, consultar :
Gatti Jr. (2004) e Munakata (1997).
61
por pistas do processo de escolarização, retoma o Século XVI para refletir sobre as
relações do mundo da escrita e suas bases, em um cenário predominantemente religioso.
Como bem afirma Jean Hébrard (1999), o livro didático, tanto estudado a partir
das práticas de ensino voltadas para o ensino oral (escutar, memorizar, recitar) quanto
como guia didático em forma de texto escrito, que trazia, ao mesmo tempo, uma
identidade religiosa e cultural por meio de perguntas e respostas, possibilita-nos pensar
sobre o traçado de uma história eternizada nas páginas, nos indícios de saberes e nas
práticas educacionais postas em circulação no Brasil dos oitocentos e nos anos iniciais
do Século XX.
Podemos dizer que, dentro do projeto civilizador, os livros didáticos faziam parte
dos objetivos voltados para as ações da educação e contribuíam para fazer circularem
culturas, hábitos e valores que deveriam ser externados e adotados como prática de um
bom cidadão (BITTENCOURT, 2008; SOUZA e VALDEMARIN, 2000). Em outras
palavras, os livros didáticos estavam impregnados dos ideários da escola e da imprensa
que detinham o controle do conhecimento (BITTENCOURT, 2003; LUCA, 2010).
Chamamos à atenção para o papel da imprensa como um espaço de circulação de
ideias de cima para baixo e como um movimento que ocorria de baixo para cima, o que
justifica os questionamentos de Ginzburg, em “O queijo e os vermes” (1987), quando
aponta para o conceito de circularidade cultural. Aqui cabe apontar os diálogos
estabelecidos entre o Brasil e outros países, não só para entender o Brasil como um país
influenciado, mas também para perceber sua influência cultural em outros países.
Retomamos a questão da nacionalidade para afirmar que esse tema era
recorrente nos impressos, em que se falava da necessidade de unificar a nação e de criar
uma identidade nacional. Os jornais, os periódicos, as revistas, os livros escolares e
outros impressos eram produzidos com a finalidade de gestar na população a ideia de
pertencimento à nação, de constituir um território nacional e de falar um idioma
nacional.
Em nossa pesquisa, procuramos refletir, mesmo que brevemente, sobre a
circulação dos impressos, buscando pensá-los como objetos culturais que, em seu
tempo, foram produzidos por uma elite pensante, para difundir modelos, práticas,
valores e comportamentos necessários para a sociedade da época. O propósito principal
62
dessa discussão é de levantar questões, dúvidas, indagações e desconfianças a respeito
de como os impressos estiveram presentes de forma direta ou indireta nas práticas
culturais do Brasil.
Em nossas considerações sobre esse período histórico, procuramos fazer
questionamentos acerca da finalidade dos impressos e sobre o papel da imprensa de
promover, em seu tempo e a seu modo, a circulação da cultura, ou seja, o registro da
História. Os impressos tinham a função de propagar os modos como o povo era
civilizado e instruído e de discutir sobre eles. Ou seja, difundir regras de bons costumes
e hábitos de bom cidadão (LUCA, 2010).
De modo geral, os debates apresentados nos levaram a fazer questionamentos
que, direta ou indiretamente, orientaram nossa pesquisa e nosso olhar sobre o contexto
da produção de livros didáticos publicados e que circularam entre o Século XIX e nas
décadas iniciais do Século XX no Brasil. Ao longo do estudo, fomos construindo nossas
inferências acerca do tema, baseados em perguntas que foram elaboradas sem a
pretensão de obter respostas certeiras, mas que exerceram influência nas reflexões aqui
elaboradas. Foram estas as perguntas orientadoras: Será que a elaboração desses livros
era um projeto mais autoral ou já havia uma divisão de papéis a partir da organização
ainda incipiente das editoras (no período, poderiam ser livrarias, jornais, gráficas etc.)?
Como a influência estrangeira se configurava nessas publicações, já que, em geral, parte
dos livros que circulavam no Brasil advinha outros países? A partir de que momento as
influências nos livros didáticos dos métodos de ensino desenvolvidos fora do Brasil
começaram a ser observadas? Quem produzia as ideias que circulavam nos livros
didáticos? Seria o livro didático um veículo de controle e de conservação de valores
morais? Como as ideias eram expressas? E como descobrir os silêncios?
No que se refere aos trabalhos com os materiais didáticos no Século XIX,
partimos do pressuposto de que eles eram pensados para iluminar e formar ideias, isto é,
nesse período, as produções tinham, entre outras finalidades, a de imprimir a ideia de
pertencimento ao Brasil. Convém lembrar que, nesse momento, era preciso unificar a
língua e imprimir os ideais iluministas.
Historicamente, os livros didáticos podem ser compreendidos como textos e
impressos que agrupam fatores de natureza social e política. Para Batista (1999, p. 563),
“[...] a produção didática é, quase sempre, um campo em que o Estado atua diretamente.
63
É que esse campo e seu controle são objetos de disputas de diferentes e conflituosos
grupos de interesses (sociais, políticos, étnicos, culturais, econômicos)”. No caso do
período que estudamos, é evidente a atuação do Estado como uma instituição que
influencia diretamente a produção desse tipo de livro (BITTENCOURT, 2008).
Isso nos faz pensar sobre o lugar de produção dos manuais didáticos, as
concepções e os conhecimentos neles compilados com base em posicionamentos
teóricos e nos processos formativos institucionais, entendidos como um movimento que
está diretamente envolvido nesse processo de produção (VALDEMARIN, 2010). Nos
textos produzidos nos livros, as práticas do exercício da profissão e da experiência
pedagógica são associadas aos saberes emergentes que ganham significados e sentidos
próprios da arte de expressar a escrita e os modos de emprego de ideologias.
Os trabalhos de pesquisa sobre os autores eram feitos de forma independente,
sem a preocupação em estabelecer uma ligação entre o papel do autor e a produção da
obra. Para Chartier (1994), os estudos na perspectiva da história do livro e da leitura
foram os responsáveis por inibir o debate acerca da figura do autor. Ele enuncia que, na
literatura dos historiadores ingleses, o livro é visto como desconectado do leitor, da
figura do autor, enquanto na tradição da história social francesa, os livros até têm
leitores, no entanto também não se discute sobre o autor.
Ainda a respeito da ausência dos sujeitos produtores do texto, no que concerne
aos estudos sobre a história do livro, Chartier (1994, p. 34) sugere que atentemos para o
fato de que “[...] a história do livro tem sido praticada como se suas técnicas e
descobertas fossem irrelevantes para a história dos produtores de textos, ou como se
essa fosse destituída de qualquer importância para a compreensão das obras”. Para
Valdemarin (2010), ao produzir seus livros, os autores
[...] apresentam uma apropriação criativa, discursiva e instrumental
das teorias estrategicamente difundidas e, com isso, criam uma rede de
relações significativas. Ao estabelecer modos de emprego, fabricam
novos sentidos que combinam modos de pensar com sua utilização e,
além das sínteses teóricas, consideram a legislação e, principalmente,
fornecem aos professores um sentido de continuidade entre o que já
fazem e as inovações pretendidas, sem ameaça-los com a necessidade
de ruptura (p.130).
Entendemos que esses sujeitos se encontram em uma posição intermediária no
campo pedagógico, situados entre os teóricos e os professores, pois esses autores
64
alternam operações táticas e estratégicas advindas ora das apropriações de leitores, ora
da tentativa de imprimir novas práticas. Por isso, nos livros didáticos e por meio deles,
podemos, em muitos casos, identificar os lugares sociais (de onde escrevem e de onde
falam), os métodos adotados, a legislação da época e os saberes que circularam no
campo educacional, os explícitos e, algumas vezes, os que são discretamente
silenciados. A autora acrescenta que esses autores ocupam uma posição específica no
campo educacional. São leitores de bibliografia especializada e de conjunturas, com um
discurso que incorpora as palavras-chave da teoria, adota as expressões caracterizadoras
de determinadas concepções e, em um contexto de inovação, usam essas expressões
para ser identificados por elas (VALDEMARIN, 2010, p.130).
Na produção de livros, seus autores empregam operações das práticas
pedagógicas estabelecidas pela escola e as referências advindas das novas tendências
que surgem no campo teórico. Assim, identificamos a atuação dos autores inserida em
dois momentos distintos. O primeiro, em que suas ações são reguladas pelo campo
doutrinário, quando eles se apropriam do vocabulário e das tendências que estão em
voga e cumprem o carácter de inovação. E o segundo, por conjugar operações de
leitores e, quase sempre, de ex-professores e, a partir dessas referências, sem sair do seu
lugar de origem, agregar elementos próprios do seu lugar social, que são somados com a
pluralidade e a criatividade de um ser que é local, mas também plural, pois esses
sujeitos sociais dialogam com outras realidades e práticas culturais (VALDEMARIN,
2000).
Nesse debate, não podemos deixar de mencionar a preocupação em entender que
esses elementos que compõem a produção didática interferem diretamente nas
transformações e nas permanências voltadas para a formulação dos métodos e na oferta
de escolarização da população como um todo. A busca por um método de ensino melhor
vem de longas datas, e uma das principais questões apontadas é de que o método, por si
só, não ensina a ninguém e que, para ser executado, precisa de um sujeito, nesse caso, o
professor. Ou seja, trata de reconhecer a intensa interferência do Estado sem
desconsiderar a atuação de outras instituições que interferem diretamente em sua
elaboração, a saber: as editoras, os autores, os livreiros, e outros sujeitos que lidavam
diretamente com esses impressos na preparação de suas aulas ou em suas práticas nas
escolas.
65
Um dos sujeitos que atuam na produção do livro é o autor, que pode ser um elo
para as relações estabelecidas a partir de sua formação e de seu lugar social, com a
escolha de conteúdos, a perspectiva metodológica, os posicionamentos políticos, entre
outros, como o fez Ângelo (2014), que analisou essa relação. Esse não é nosso objetivo
específico, mas o debate pode nos ajudar no objeto de análise.
Bittencourt (2004a), em um texto em que analisa os autores e os livros didáticos
no Brasil18
, afirma que, primeiramente, podemos identificá-los como brasileiros que
pertenciam à elite intelectual e política. Com o tempo, essa tarefa foi delegada a outras
instâncias sociais, incluindo, então, os professores que eram consultores desse material.
De acordo com a mesma autora, no Brasil, há duas gerações de autores nas produções
didáticas:
[...] uma primeira “geração” a partir de 1827, autores preocupados
com a organização dos cursos secundários e superiores, apenas
esboçando algumas contribuições para o ensino de “primeiras letras”.
Uma segunda “geração” começou a se delinear em torno dos anos
1880, quando as transformações da política liberal e o tema do
nacionalismo se impuseram, gerando discussões sobre a necessidade
da disseminação do saber escolar para outros setores da sociedade,
ampliando e reformulando o conceito de “cidadão brasileiro”, criando-
se uma literatura que, sem abandonar o secundário, dedicaram-se à
constituição do saber da escola elementar. (BITTENCOURT 2004a, p.
480)
Segundo essa autora, os autores que formavam a primeira “geração” (1827)
compunham o grupo de intelectuais e políticos importantes atrelados aos interesses e ao
poder do Estado. Naquele momento, os projetos educacionais eram direcionados à
formação de uma elite brasileira que nascia, em especial, no Rio de Janeiro (capital do
Brasil nesse período) ou podia estudar nessa cidade. Isso significa que, em suas
produções didáticas, os autores difundiam o saber a ser ensinado aos filhos da elite que,
por conseguinte, formariam outras instâncias culturais. Isso explica que não era por
acaso que eles eram os autores de livros didáticos da época. Ninguém seria tão
adequado para cumprir tal tarefa como os grandes homens sábios que faziam parte do
Império (BITTENCOURT, 2004a). Nesse período, o ensino primário no país era pouco
18
Mais informações acerca dessa discussão, consultar: Autores e editores de compêndios e livros de
leitura (1810-1910). Educação e Pesquisa. São Paulo, n.3, p. 475-491, set./dez. 2004a, v. 30.
66
valorizado, porquanto se priorizavam o ensino secundário, o técnico e o superior, que
era restrito ou, pelo menos, mais acessível às classes sociais dominantes.
Bittencourt (2004a, p. 481-482) enfatiza também o papel de figuras que se
destacaram na autoria de livros, como, por exemplo, a participação de pessoas ligadas
ao Instituto Histórico e Geográfico do Brasil - IHGB, criado em 1838, e à Escola
Militar, que foi instalada na capital (Rio de Janeiro) do Brasil em 1810. A propósito da
Escola Militar, a autora esclarece:
[...] essa instituição teve que se haver com a questão dos compêndios a
serem adotados. [...] cuidou da oferta de textos escolares, embora com
produção reduzida nas primeiras décadas, no que se refere a trabalhos
didáticos próprios. Os lentes limitaram-se a realizar traduções, ou
adaptações de textos estrangeiros ou, preferencialmente, recorriam às
obras de Portugal. Entretanto, iniciando a década de 1840, durante as
disputas políticas e sociais da fase regencial, com a questão da
unidade nacional e a nova configuração do papel político dos
militares, houve a necessidade de uma produção de obras didáticas
locais, que deveriam se encarregar, entre outros aspectos, de esboçar
os contornos territoriais da nação independente. A escola Militar foi,
então, o lugar institucional responsável pelo aparecimento dos
primeiros compêndios dedicados ao ensino das disciplinas formadoras
da “nacionalidade”, especialmente história e geografia.
Diante do exposto, podemos afirmar que a Escola Militar foi uma instituição
escolar pioneira, talvez a primeira a produzir livros didáticos para formar a nação, sendo
uma das primeiras iniciativas a incluir, a partir de 1840, os brasileiros como autores
dessas obras. Contudo, só com a segunda “geração” - os professores como autores - que
esse movimento se expandiu, visando implantar sentimentos de pertencimento à pátria e
da ideologia nacionalista. Não esqueçamos que parte desses autores defendia a
República.
Na formação desse futuro cidadão, os professores e algumas disciplinas, como
Geografia, por exemplo, destacavam-se. Os mestres, por serem os principais
responsáveis pelo ensino primário, e a Geografia, por ser uma das disciplinas que mais
bem trabalhava o nacionalismo e difundia os valores morais e patrióticos para os alunos
e futuros cidadãos. Dentre as finalidades do ensino primário nesse contexto, a principal
era de “amoldar uma geração”, ou seja, nacionalizar e unificar os filhos dos imigrantes e
transformar todos os habitantes do Brasil em verdadeiros patriotas.
Para entender os livros didáticos do período estabelecido para esta pesquisa,
67
como documentos, recorremos a Le Goff (2013, p.103), segundo o qual o documento é
“[...] o resultado de uma montagem, consciente ou inconsciente, da história da época, da
sociedade que o produziu, mas também das épocas sucessivas durante as quais continua
a viver [...]”. Rodríguez (2004, p. 26) complementa que eles
[...] são elaborados por pessoas de épocas e grupos sociais diferentes,
e a produção dessas pessoas é permeada de elementos determinantes,
seja pelo cargo que ocupa ou pela sua própria inserção social. Em tal
sentido, o historiador deve ficar muito alerta e não pode esquecer o
contexto da produção dos textos.
Sendo assim, o pesquisador tem que considerar que a produção do documento
não se fecha em si mesma, ela está contextualizada e adquire conotação histórica de
uma realidade social, cultural e política de um tempo específico de uma produção
humana, seja ela material ou simbólica.
De certa forma, no Brasil dos fins do Século XIX e início do XX, não foi
diferente. Segundo Bittencourt (1993, p.30 e 31), apesar de ter permanecido a
concepção de que o livro didático era fundamental para o professor,
[…] era essencial garantir a difusão do veículo nação-território,
necessitando-se dos estudos de geografia para o conhecimento do
espaço físico do “país” e da História Nacional para legitimar as
formas de conquista do “continente que é o Brasil”. Os livros
didáticos deveriam sistematizar e divulgar tais conhecimentos e o
Estado incentivou uma produção local capaz de auxiliar a formação do
“sentimento nacionalista”, sem deixar, entretanto, que as futuras
gerações de letrados perdessem o sentimento de pertencer ao mundo
civilizado ocidental.
Corrêa e Valdemarin (2000) asseveram que isso significa dizer que o livro
didático também é portador de uma memória nacional, da história de uma nação. Com
efeito, parece-nos importante avançar nessa compreensão, principalmente porque a
autora adverte que não se pode perder de vista a existência da política do livro didático,
“[...] que significa não só o controle sobre os conteúdos escolares a serem ensinados e,
de certo modo, o controle sobre as práticas escolares, como também sobre a produção
desse tipo de livro” (Ibidem idem, p.17).
Para que possamos compreender o livro didático em sua completitude, devemos
observar e analisar seus vários elementos: título, autoria, editoras, local de publicação,
capa, destinação, pareceres, conteúdos, metodologias, abordagens, tipos de letra,
68
figuras, desenhos, mapas, gravuras, traduções, edições, circulação, marcas de uso, entre
outros elementos. Em nossa pesquisa, destacamos alguns desses elementos, em especial,
os que nos ajudaram a responder aos nossos questionamentos e dialogar com nosso
argumento de tese, a saber: destinação da obra, pareceres, textos introdutórios,
metodologias, figuras, exercícios (problemas, testes, questionários), mapas, entre outros
que nos possibilitaram construir a fundamentação teórico-metodológica.
A seguir, apresentamos algumas considerações sobre as aproximações teóricas
que dialogam com os conceitos que já pontuamos no posicionamento teórico e que
foram relevantes na elaboração mais consistente das constatações sobre nosso objeto de
estudo.
2.1.1 A produção de saberes escolares: uma discussão a respeito dos exercícios nos
livros didáticos como uma expressão da cultura escolar
A produção do saber a ser ensinado na escola é organizada com base nos saberes
e nos conhecimentos oriundos de diversos setores que, em cada geração, são
considerados como fundamentais para a formação cultural de uma sociedade.
Historicamente, as pesquisas que versam sobre esse tema visam entender os processos
que permeiam a formação dos saberes escolares e sua representatividade nas
transformações sociais.
Os estudos oriundos da História da Educação apontam, dentre outras
contribuições, para as peculiaridades e os aspectos internos da instituição escolar que
nos têm possibilitado compreender as complexidades e as subjetividades dos processos
de escolarização (VALDEMARIN e SOUSA, 2000). De acordo com Chervel (1990, p.
191), esses estudos têm contribuído de maneira significativa para as discussões que
buscam compreender a constituição das disciplinas escolares.
Cada época produziu sobre sua escola, sobre suas redes educacionais, sobre os
problemas pedagógicos, uma literatura frequentemente abundante: relatórios de
inspeção, projetos de reforma, artigos ou manuais de didática, prefácio de manuais,
polêmicas diversas, relatórios de presidentes de províncias e de presidentes de bancas,
debates parlamentares, textos jornalísticos etc. É essa literatura que, tanto quanto os
69
programas oficiais, esclarecia os mestres sobre sua função e que hoje nos dá uma chave
do problema.
Chervel (1990) adverte que o historiador que procura saber sobre as finalidades
da escola tem que estar ciente de que essa questão é um dos mais complexos e sutis
problemas da história do ensino, porquanto seu estudo depende, em parte, da história
das disciplinas, porque interage também com a estrutura social, familiar, política e
cultural de cada indivíduo e de cada momento histórico. Para o referido autor, “as
disciplinas escolares estão no centro desse dispositivo. Sua função consiste em cada
caso em colocar um conteúdo de instrução a serviço de uma finalidade educativa” (P.
188).
O estudo da história das disciplinas escolares centra-se na busca por traços do
seu objeto de estudo - a gênese, a função e o funcionamento das disciplinas - e pelos
constituintes de uma disciplina que são os conteúdos, os métodos de ensino e suas
finalidades (ALVES, 2012; CHERVEL, 1990). Por essa razão, afirmamos ser pertinente
pensar nas disciplinas escolares a partir de sua interação com os saberes escolares, uma
vez que “uma ‘disciplina’ é igualmente, para nós, em qualquer campo que se encontre
um modo de disciplinar o espírito, quer dizer de lhe dar os métodos e as regras para
abordar os diferentes domínios do pensamento, do conhecimento e da arte”
(CHERVEL, 1990, p. 180).
Para Bittencourt (2003, p. 29 e 30), a concepção de disciplina escolar
[...] está intimamente associada à de pedagogia e de escola e, portanto,
ao papel histórico de cada um desses componentes. Se concebermos a
disciplina escolar como produção coletiva das instituições de ensino,
isto significa que a pedagogia não pode ser entendida como uma
atividade limitada a produzir métodos para melhor entender transpor
conteúdos externos, simplificando da maneira mais adequada possível
os saberes eruditos ou acadêmicos.
Essa citação nos remete à discussão clássica sobre o campo da história das
disciplinas escolares. Os estudos e as pesquisas realizados nesse campo demonstram
que esse debate ocorre de forma conflituosa entre os dois grupos de pesquisadores: os
que defendem as disciplinas escolares como uma transposição didática e os que a veem
como produtoras de um conhecimento com certa autonomia.
O primeiro grupo a concebe como um saber oriundo da noosfera, constituído
70
pela produção do saber sábio e desenvolvido fora da escola, em especial, na Academia e
em outras instituições de pesquisa. Dentre os estudiosos que defendem as disciplinas
escolares nessa perspectiva, destaca-se o pesquisador francês Yves Chevallard (1998).
Segundo esse autor, a escola é parte de um sistema em que os saberes que ela veicula
são perpassados por agentes sociais externos à sala de aula, como a família, autores de
livros didáticos, inspetores e profissionais da Educação, que atuam intensamente,
criando estratégias de adaptação e circulação do conhecimento acadêmico na escola
(BITTENCOURT, 2004). No que se refere aos procedimentos didáticos utilizados no
processo de ensino e aprendizagem, como os conteúdos e os métodos, esse grupo afirma
que os conteúdos escolares são advindos, especialmente, das produções científicas, e os
métodos decorrem das técnicas pedagógicas originados na didática aplicada nesse
processo de transposição.
Chevallard (1991) entende que a ideia de “transposição didática” parte do
pressuposto de que o saber construído pelas disciplinas escolares é proveniente do saber
científico e legitimado por esse saber que lidera uma hierarquia em relação ao
conhecimento difundido pela escola. Em contrapartida às ideias de Yves Chevallard
(1991), pesquisadores como o inglês, Ivor Goodson (1990), e o francês, André Chervel
(1990), defendem que as disciplinas escolares não são um modelo estabelecido pela
transposição didática. Para esses autores, essa discussão envolve uma série de fatores e
uma diversidade de elementos entre o conhecimento científico e o escolar.
Para justificar tal afirmação, Goodson (1990) e Chervel (1990) alertam para o
que foi dito por Chevallard (1991) sobre a ideia implícita em sua obra de hierarquização
de que o saber é um suporte para a construção do saber social. Para esses autores, essa
discussão transcende problemas epistemológicos, e a compreensão desse conceito
mantém relação com o papel do conhecimento e com as esferas de poder em
determinados lugares ou espaços da sociedade.
Assim, o estudo da história das disciplinas escolares nos permite entender que
[...] o caráter eminentemente criativo do sistema escolar e, portanto, a
classificação no estatuto dos acessórios reflete a imagem de uma
escola encerrada na passividade, de uma escola receptáculo dos
subprodutos culturais da sociedade. Porque são criações espontâneas e
originais do sistema escolar é que as disciplinas merecem um interesse
todo particular. E porque o sistema escolar é detentor de um poder
criativo insuficientemente valorizado até aqui é que ele desempenha
71
na sociedade um papel o qual não se percebeu que era duplo: de fato
ele forma não somente os indivíduos, mas também uma cultura que
vem por sua vez penetrar, moldar, modificar a cultura da sociedade
global (CHERVEL, 1990, p. 184).
Com base nessa concepção de disciplina escolar, Chervel (1990) entende que o
saber escolar, juntamente com os professores e a sociedade, transforma o interior da
escola em um ambiente formador de culturas, um espaço com certa autonomia, cuja
função é de converter os elementos de combinação pedagógica que, muitas vezes,
encontram-se a serviço da função de instrução da escola, em métodos de ensino que
viabilizam uma finalidade educativa.
Considerando que a escola é um lócus de produção de conhecimento, as
disciplinas escolares atuam como agentes facilitadores do entendimento da relação entre
a escola e o saber cultural e devem ser compreendidas como parte integrante da cultura
escolar. Assim, os conteúdos escolares não são produzidos em um local e reproduzidos
em outro, pois o conhecimento escolar é uma construção específica das práticas
educativas da escola (MOREIRA e CANDAU, 2007). Então, como o conhecimento
escolar tem características próprias e, portanto, apresenta outras formas de
conhecimento, entendemos
[…] o conhecimento escolar como um tipo de conhecimento
produzido pelo sistema escolar e pelo contexto social e econômico
mais amplo, produção essa que se dá em meio a relações de poder
estabelecidas no aparelho escolar e entre esse aparelho e a sociedade
(SANTOS, 1995, p. 22).
Corroborando o entendimento dessa autora sobre conhecimento escolar,
entendemos que o conhecimento escolar é produzido por meio das relações de interação
entre sociedade e escola, entre as práticas e os saberes socialmente construídos. Em
outros termos, podemos dizer que a escola é permeada de outras formas de
conhecimento que se configuram em referenciais para formar o currículo (as instituições
produtoras do conhecimento científico, os movimentos sociais, o mundo do trabalho, as
novas tecnologias, as concepções de cidadania, entre outros). Isso quer dizer que
reconhecemos a escola como produtora de um saber escolar que se forma a partir da
concentração desses demais saberes imersos e resultantes das relações sociais.
72
Tal concepção não descarta as contribuições dos conhecimentos advindos das
disciplinas de referência19
, que são constituídas a partir da interação entre o
conhecimento acadêmico e as relações estabelecidas no interior da escola. Segundo
Chervel (1990, p. 207),
A disciplina escolar é então constituída por uma combinação, em proporções
variáveis, conforme o caso, de vários constituintes: um ensino de exposição, os
exercícios, as práticas de incitação e de motivação e um aparelho docimológico, os
quais, em cada estado da disciplina, funcionam evidentemente em estreite colaboração,
do mesmo modo que cada um deles está, à sua maneira, em ligação direta com as
finalidades.
Assim, se adotarmos a ideia de disciplina escolar como um conhecimento que
tem certo nível de autonomia, pressupomos que é preciso compreendê-la em uma
perspectiva histórica, para conhecer sua origem, sua evolução e identificar essas
transformações nos diversos materiais didáticos que foram e vêm sendo utilizados para
as aulas dessas disciplinas. De modo particular, concordamos com as ideias defendidas
por Chervel (1990) e Goodson (1990) de que essa discussão transcende problemas
epistemológicos, de forma que a compreensão desse conceito mantém relação com o
papel do conhecimento e com as esferas de poder em determinados lugares ou espaços
da sociedade.
Compreendemos o conhecimento escolar como a interação entre professores,
alunos, comunidade escolar, intelectuais e sociedade em geral (GOODSON, 1990).
Assim, o saber escolar, juntamente com os professores e a sociedade, transforma o
interior da escola em um ambiente formador de culturas, ou seja, um espaço autônomo
e, ao mesmo tempo, relacional. Em outras palavras, podemos dizer que a escola é um
ambiente capaz de produzir um conhecimento específico, e não, apenas, de transpor e
reproduzir um conhecimento oriundo das ciências eruditas e simplificá-lo para esse fim.
(CHERVEL, 1990).
Estudar as disciplinas escolares indica pontuar o estudo de sua forma e do seu
conteúdo, considerando a interação entre a prática e o processo em uma perspectiva
19
Termo utilizado por Chervel (1990) para se referir ao conhecimento científico ou erudito e ao saber
produzido pelas ciências nas Academias.
73
histórica, compreendendo o currículo como uma construção social (GOODSON, 2010).
Para esse autor, as disciplinas não se formam de modo isolado, mas por meio de
“amálgamas” que estão sujeitos às mudanças de subgrupos e tradições de indivíduos
sociais.
Sobre a formação dos saberes escolares e as implicações didático-pedagógicas
que lhes são atribuídas, Chervel (1990) e Goodson (1990) enfatizam que o tempo de
surgimento, de promoção e de permanência de uma disciplina escolar não é definido
somente pelas necessidades da comunidade escolar, mas também pelos interesses e
pelas determinações das esferas sociais e históricas.
Dominique Julia (2002) considera que as determinações do espaço são
fortemente influenciadas e marcadas por outras demandas sociais, que podem definir
papéis e finalidades nas práticas educativas. Esse autor entende que não devemos “[...]
pensar que uma disciplina não é ensinada porque não aparece nos programas escolares
ou porque não existem cátedras oficialmente com seu nome” (p.47).
Com base nisso, Chervel (1990, p. 190) procura diferenciar as finalidades reais
das finalidades de objetivo, mesmo quando elas aparecem misturadas nos textos
oficiais:
Deve, sobretudo [o historiador], tomar consciência de que uma
estipulação oficial, num decreto ou numa circular, visa
frequentemente, mesmo se ela é expressada em termos positivos,
corrigir um estado de coisa, modificar ou suprimir certas práticas, do
que sancionar oficialmente uma realidade. “Apenas o francês será
usado na escola”, estipula o regulamento modelo das escolas de 1851:
finalidade de objetivo. Trinta anos mais tarde ensinava-se ainda em
patois ou na língua regional.
Segundo o autor, as finalidades reais devem ser buscadas nos objetivos da
escola, e não, nas instâncias dos poderes públicos, levando em consideração que essas
finalidades não podem negar a “realidade pedagógica”. Por isso, o estudo das
disciplinas escolares deve ir além do estudo das metodologias e das ideias pedagógicas
e centrar-se nas investigações dos objetivos, nos programas oficiais de ensino e nos
planos de estudo para adentrar suas finalidades no espaço da sala de aula.
É importante frisar que os estudos acerca da história das disciplinas escolares
consideram que “a disciplina é aquilo que se ensina e ponto final” (CHERVEL, 1990, p.
74
178). Esse mesmo autor enuncia que o termo, no uso escolar, designou, na França, a
vigilância de condutas até o início do Século XX. Inspirado em Chervel (1990),
Dominique Julia (2002, p. 45) procura trabalhar as disciplinas escolares por meio de
finalidades, conteúdos e métodos e afirma que “[...] uma disciplina se define tanto por
suas finalidades quanto por seus conteúdos”. A esse respeito, esse mesmo autor adverte
que uma disciplina jamais caminha sozinha em uma escola. Ela se mantém solidária
com outras disciplinas, como as interligações da Geografia com a História, e comunga
da ideia de legitimar o espaço físico e a construção do pensamento de pertencimento a
uma nação.
A disciplina escolar é solidária também com os métodos de ensino. Isso é
evidente no modo como a Geografia se modifica quando precisa se adequar aos
princípios do método intuitivo e modificar sua forma de abordar os conteúdos e as
formas de exercitar para facilitar o aprendizado da referida disciplina. Ela também é
solidária no que diz respeito á produção dos materiais didáticos, que se encontram
associados aos conteúdos, aos métodos e aos objetivos das concepções de ensino de
uma época. Como exemplo, podemos citar o livro didático, que seria, para o autor,
elaborado a partir dessas conexões estabelecidas entre os dispositivos pedagógicos e os
elementos internos e externos da organização de uma disciplina escolar (CHERVEL,
1990). Para Julia (2002, p. 62), a disciplina escolar é solidária, enfim, com [...] toda uma
série de dispositivos pedagógicos menos formais, mas que contribuem para sua eficácia.
Com base nessa abordagem, podemos compreender que, historicamente, as
disciplinas vão sendo organizadas de acordo com os interesses e as finalidades que se
adequam e se enquadram em um movimento múltiplo e particular entre a escola e suas
representações (CHARTIER, 1991). Ainda segundo esse autor, os conhecimentos ou o
debate da constituição das disciplinas escolares se formam por meio de embates,
disputas metodológicas e conceituais, e, sobretudo, das tensões entre o político e as
representações sociais.
Assim, para um estudo aprofundado acerca dos conteúdos de uma disciplina
escolar, a cultura escolar é uma categoria de grande respaldo para nossas discussões.
Concordando também com Felgueiras (2010), entendemos que os estudos sobre cultura
escolar ajudam a compreender as relações na escola e os processos educativos e
organizacionais do espaço escolar. Frago (1995) adverte que as discussões sobre o
75
termo cultura escolar, como objeto de investigação histórica20
, ganharam mais espaço a
partir dos estudos voltados para a história das disciplinas escolares e do currículo
(GOODSON, 2010) e quando abordaram os diferentes materiais pedagógicos e saberes
escolares. Essas investigações foram fundamentais para analisar o processo de
escolarização e para entendermos as tradições, as rupturas, as continuidades, os tipos de
mudanças e de grandes permanências nos conteúdos de uma disciplina escolar, bem
como os processos de “disciplinarização” de um saber para se tornar matéria escolar
(FELGUEIRAS, 2010).
Os estudos sobre cultura escolar21
dirigiram um novo olhar sobre a instituição
escola (GONÇALVES e FARIA FILHO, 2005). Nesse diálogo da produção da pesquisa
sobre essa categoria, destacamos autores como: Dominique Julia, André Chervel, Jean-
Claude Forquin, Antônio Viñao Frago, Philippe Perrenoud, Jean Hébrard, Antônio
Nóvoa e Guy Vincent, Bernard Lahire e Daniel Thin, Vera Tereza Valdemarin, Rosa
Fátima de Souza, Farias Filho, Diana Vidal, entre outros. Esses pesquisadores
consideram que é possível, por meio dessa discussão ampla acerca da formação dos
saberes escolares e da cultura escolar, entender a relação que se estabelece entre os
materiais didáticos e as concepções políticas e práticas culturais. Assim,
compreendemos que a cultura escolar22
se configura como um relevante aporte teórico
20
Nesse campo de estudo, o termo cultura escolar tem se destacado, e o número de pesquisas sobre a
questão tem crescido na historiografia brasileira. Hoje é imprescindível abordar esse tema nas
investigações da História da Educação, especialmente, nas discussões que trazem à tona as
complexidades do universo escolar e as ações de sujeitos sociais que estão associados às práticas
escolares em determinado tempo histórico. Em nosso caso, o conceito de cultura escolar em
construção, como um conceito histórico, não será discutido como resultado da junção de variadas
formas de interpretação histórica que se dedicam a explicar como a cultura e suas representações se
manifestaram historicamente (BENCOSTTA, 2010). Em nossas inquirições, reconhecemos que o
emprego desse conceito permite tornar compreensíveis os inúmeros elementos que se relacionam
dentro do campo educacional, ampliando assim, os modos, os sentidos e as significações do que é
particular de ser escola (SOUSA, 2011; CHERVEL, 1990).
21 Os estudos sobre cultura escolar evidenciam a possibilidade de se usarem variadas fontes e se
apresentam associados a outras problemáticas que demandam reflexões sobre as diferentes abordagens
e as novas perspectivas de análises no campo de pesquisa da História da Educação (SOUZA, 2000;
VALDEMARIN, 2007).
22 Em nosso estudo acerca da história das disciplinas escolares, compete-nos apontar questões referentes
à cultura escolar, como uma categoria importante e necessária para se entenderem bem mais os
aspectos referentes ao livro didático como fonte e objeto de estudo. Convém enfatizar que os
conhecimentos escolares são transmitidos a partir de uma seleção daquilo que irá garantir a
perpetuação de determinada cultura (JULIA, 1993).
76
que pode oferecer meios de compreender a história das disciplinas escolares e sua
formação no processo educacional.
As pesquisas sobre História da Educação que discutem sobre essas questões
apontam que os pesquisadores têm se dividido em dois grupos: o primeiro visa
encontrar marcas teóricas que permitam, por meio da escrita histórica, articular o
passado e o manuseio das fontes históricas. O segundo tem a tarefa de localizar,
sistematizar e problematizar as fontes para os estudos sobre história da educação
(VIDAL, 2005). Entendemos que, através do fazer historiográfico, é possível, dentre
outras possibilidades, adentrar os processos de concepção dos indivíduos formadores de
opiniões, de ideias, de culturas, de formação social e compreender como atuam os
diversos elementos formadores desses discursos e sua relação com os outros
(BENCOSTTA, 2010).
Trazendo essa colocação de Bencostta (2010) para os debates a respeito da
formação do conceito de cultura escolar, vemos que, como afirma esse mesmo autor em
seus escritos, o conhecimento histórico e o conceito de cultura escolar se formam a
partir da reunião de conceitos, que podem ser convergentes ou não. Em síntese, o que
importa é que eles possibilitem o diálogo com o que vem sendo discutido.
Em nossas investigações, por meio das análises feitas nos livros didáticos,
tivemos a oportunidade de identificar algumas características do universo escolar, como
finalidades, objetivos e intencionalidades, e de perceber as interações entre as práticas
sociais e o espaço escolar e os movimentos de idas e vindas na interlocução desses
espaços formadores de opiniões, costumes, culturas, valores e identidades. Essas
interações marcam profundamente a organização e a produção dos saberes escolares.
Então, pensar na cultura escolar e na formação do seu conceito nos possibilita entender
os diversos modos como os indivíduos interagem com as diversificadas tradições
culturais presentes no processo de escolarização (VIDAL, 2005a).
Portanto nos apoiamos em uma definição que entende a cultura escolar como
uma forma que nos possibilita historicamente adentrar os discursos que permeiam o
campo dos sujeitos escolares, as dimensões espaço-temporais do ambiente escolar assim
os saberes, as sensibilidades, os valores e a materialidade do que é próprio da escola, ou
77
seja, pensar como determinadas práticas sociais recebem significados e efeitos escolares
(FARIA FILHO, 2007).
Os saberes escolares se organizam a partir de práticas de apropriação e
representação (CHARTIER, 1990) das tradições religiosas, dos costumes e dos valores
culturais que se encontram dispersos na história em diferentes tempos e espaços sociais
(FARIA FILHO, 2007). As práticas sociais e educativas oportunizam a produção de
novos sentidos e significados no processo de escolarização, portanto, na cultura escolar
de determinado período histórico.
Em nossas considerações sobre os espaços educativos, sobre os materiais
didáticos e sobre os diferentes elementos da cultura escolar, não podemos desconsiderar
os diversos sujeitos que atuam na esfera educacional para além das determinações
político-administrativas, considerando, portanto, a educação brasileira como um
processo que é marcado pelos traços da cultura escolar, pela ação de professores, de
alunos, da comunidade escolar e da sociedade, que participa, direta ou indiretamente, da
definição e da produção do lugar escola como tempo e espaço.
Nas palavras de Bencostta (2010), essa cultura escolar revela as “[...]
multiplicidades de interpretações capazes de apresentar fragmentos explicativos do
universo escolar, aptos a contribuir para o estudo dos fenômenos educacionais em seus
mais variados aspectos históricos” (p. 42). O autor sugere que fiquemos atentos à forma
de compreender o conceito de cultura escolar e aos conceitos históricos, porquanto estes
últimos são expressões dos acontecimentos sociais, políticos, culturais, religiosos e
econômicos que têm explicação em certa realidade histórica, que não se manifesta de
modo mecânico.
Para Vidal (2005a) e Faria Filho (2003), a categoria cultura escolar amplia nosso
entendimento por apontar os elementos externos à escola, por isso devemos pensar nas
formas de reproduzir essa cultura para além das incoerências e dos lugares comuns que
sejam internos à escola. No caso do Brasil, sentimos a necessidade de indagar a
propagação dessa cultura para além das tradições francesas e de compreender que
devemos considerar as influências de outros países, como as heranças culturais advindas
da Inglaterra e da Alemanha.
Nesse sentido, compreendemos que o conceito de cultura escolar se instituiu e se
78
institui a partir de diferentes perspectivas de estudos que abordam e reúnem outros
conceitos referentes aos processos educativos da instituição escolar. Por essa razão,
devemos pensar nessa associação de conceitos como uma forma de reunir diferentes
estudos já realizados e os que estão em processo, para estabelecer interpretações com
elementos do tempo e do espaço e eleger semelhanças e disparidades, com o fim de
persistir no próprio conceito que as reúne e as define (CORRÊA, 2000;
VALDEMARIN, 2007).
Essas análises, que se constituem a partir de novas perspectivas de investigação
e de interpretação e têm como referência a cultura escolar, oportunizam estudos tão
diferenciados como “[...] as práticas escolares de diversos conteúdos, os objetos
materiais, a arquitetura, os modos de pensar e a inculcação de comportamento, entre
outros, dando-lhes uma perspectiva comum, sem, no entanto, deixar de apreendê-los em
sua singularidade” (VALDEMARIN, 2007, p. 305 e 306).
Entendemos a cultura escolar como a que se adquire na escola, um conjunto de
normas e práticas originadas e difundidas segundo determinada finalidade de ordem
política, social ou religiosa. Sob nosso ponto de vista, a cultura escolar não é o ponto de
chegada, mas o ponto de partida de nossos questionamentos, como um modo de ter mais
respaldo para compreender o mais abrangente das riquezas da diversidade escolar.
Dominique Julia (1993, p. 15), com sua clássica definição de cultura escolar, tem
inspirado muitos estudiosos, porquanto a entende como
[...] um conjunto de normas que definem saberes a ensinar e condutas
a incorporar e um conjunto de práticas que permitem a transmissão
desses saberes e a incorporação desses comportamentos, normas e
práticas ordenadas de acordo com finalidades que podem variar
segundo as épocas (finalidades religiosas, sociopolíticas ou
simplesmente de socialização).
Descobrimos que três elementos são imprescindíveis para se pensar em sua
composição: o espaço, o currículo e o corpo docente. A análise dos mais variados
objetos - sejam os discursos ou os registros, como cadernetas, cadernos, canetas, livros e
suas marcas de uso - alarga as fontes e pode revelar-nos traços do cotidiano e da cultura.
Felgueiras (2010) assevera que, como uma sociedade organizada e parte da escola,
podemos criar, em tempo comum, a sociedade, que, por sua vez, é criada pela escola. A
79
partir dessas considerações, podemos afirmar que a cultura é parte integrante da escola e
que essas concepções socioculturais da escola e da cultura social em geral convertem-se
em cultura escolar.
Essa mesma autora reforça a colocação de Dominique Julia (1993), que entende
que o que define o escolar não é o espaço em si, mas a atividade e a relação entre os
professores e os alunos e que, portanto, é preciso pensar na cultura escolar atrelada não
somente à escola, mas também aos sujeitos agentes e produtores de culturas. Assim, a
autora interroga-se: podemos falar de cultura escolar ou cultura de escola? E adverte
que o conceito “escolar” tanto diz respeito à escola (entendida como local ou espaço da
vida escolar) quanto aos que a usam e nela atuam – os escolares e todos os que
desenvolvem sua atividade em seu quadro.
Partindo das colocações dessa autora, compreendemos que fazer História da
Educação hoje implica prestar atenção à densidade histórica do sistema educativo nos
contextos concretos de realização, expressos em uma cultura material que,
simultaneamente, traduz as concepções de uma sociedade e manifesta as condições em
que puderam ocorrer (FARIA FILHO, 2007).
Dando continuidade a esse debate, Valdemarin (2007, p. 317) afirma:
[...] o referencial teórico (de origem sociológica) que, na década de
1960, enfatizou o caráter reprodutor das desigualdades sociais na
instituição escolar, foi substituído, desde os anos de 1980, pela
tentativa de, não desconsiderando seus determinantes econômicos e
sociais, compreender a escola por dentro ou, para usar uma expressão
já incorporada ao léxico educacional, “desvendar a caixa-preta da
escola”.
Essas perspectivas de análises viabilizam-se, entres outros aspectos, da
fertilidade que o campo oferece, possibilitam o cruzamento de diferentes fontes e, por
conseguinte, ampliam os estudos que tratam dos livros didáticos. Podemos inferir que as
pesquisas acerca da cultura escolar possibilitam compreender o conceito de cultura
material, definida por Felgueiras (2010, p. 19) como o “conjunto de resultados
materiais, fruto de ações distintas inspiradas por uma mesma tradição”23
.
23
A esse respeito, ler Felgueiras, Margarida Louro – Materialidade da cultura escolar. A importância da
museologia na conservação/comunicação da herança educativa. In Pro-posições. Campinas:
UNICAMP. Vol. 16 nº 1, (2005), p. 93. Olha só existe uma obra de Felgueiras citada e é de 2010.
Inclua essa também nas referências.
80
Em outros termos, a cultura escolar24
deve ser entendida a partir do
funcionamento interno da escola e de sua capacidade de produzir um saber próprio que,
por sua vez, expande-se por toda a sociedade (CHERVEL, 1990). Nas palavras de
Felgueiras (2010, p. 17), o termo ‘cultura escolar’ deve ser pensado como a
[...] articulação de dois conceitos – cultura e escola – necessita que se
esclareça o acréscimo de significados que advém dessa relação, o seu
alcance e os seus limites, para que se possa criar um campo semântico
comum, que facilite a intercomunicabilidade das nossas pesquisas. Na
verdade, o tema [...] é hoje um lugar quase comum da historiografia da
educação. E digo “quase”, pois se o conceito é largamente invocado e
utilizado, a forma como o construímos e dele falamos revela
diferentes compromissos, significações, que o tornam perceptível
como realidade conceptual dissemelhante.
Portanto, entendemos a cultura escolar como uma categoria de estudo que se
manifesta de forma rica e complexa e é capaz de permitir o descortinar de questões
sobre os modos como a escola se mostra como instituição formadora de sujeitos.
Estudar os traços da cultura escolar tem possibilitado, dentre outras questões, estimular
o debate referente à escolarização dos saberes escolares, e para nossa pesquisa, tem nos
ajudado a desvelar os elementos “escondidos” da historiografia educacional brasileira
que podem ter relação direta com nossa tese.
Historicamente, a dinâmica interna da escola e os recursos metodológicos
estiveram articulados, complementaram-se e divergiram de acordo com diferentes
elementos que compõem a cultura escolar. Sobre a relação entre o livro didático e a
cultura escolar, Valdemarin (2007, p. 311) enuncia:
A análise do corpo dos manuais, de sua parte mais substancial,
permite, além de verificar, até mesmo visualizar a seleção cultural ali
levada a efeito. Trata-se de um recorte da cultura estabelecido a partir
da legislação em vigor, por meio da qual se constitui uma
reinterpretação configurada num currículo, por sua vez, desdobrado
em programas de ensino de cada um dos conteúdos.
24 A partir do final do Século XX, surgiu a designação história intelectual para verter uma história das
ideias, quando se sentiu que havia uma visão diferencial de cultura, que identificava suas
manifestações segundo gênero, idade e estratos sociais. Segundo Felgueiras (2010), foram os
antropólogos que desenvolveram o conceito de cultura numa acepção descritiva (todo o complexo que
compreende o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, o direito, os costumes e as outras capacidades
ou hábitos adquiridos pelo homem enquanto membro da sociedade). A expansão do conceito de
cultura que hoje assistimos é tributária dessa forma antropológica, que se aplica, inclusive, à cultura
escolar.
81
Os conteúdos abordados nos livros didáticos são o resultado de uma seleção de
conhecimentos que compõem as disciplinas, as quais formam parte do currículo escolar.
Compreender a formação dos saberes escolares e, portanto, de sua produção, bem como
as implicações didático-pedagógicas atribuídas a esses saberes, quando interpelados por
outras questões que são próprias do espaço escolar, contribui para que possamos
entender as interposições entre as transformações pedagógicas e suas imposições em
relação ao conhecimento a ser ensinado e perpetuado entre grupos sociais.
Os estudos sobre cultura escolar têm inspirado os pesquisadores que trabalham
com o livro didático como fonte de pesquisa para História da Educação. Os estudiosos
das mais variadas nacionalidades têm afirmado que discutir sobre o termo cultura
escolar é fundamental para entender bem mais os aspectos referentes ao livro didático.
Então, considerando que o livro didático ocupa um lugar privilegiado em nossas
discussões, retomaremos nossas considerações a respeito de seus conceitos e definições,
com os quais dialogamos ao longo da pesquisa, sobretudo, na argumentação da proposta
da tese. E tendo em vista as múltiplas facetas que caracterizam o livro didático ao longo
do tempo, entendemos que é importante pontuar questões referentes aos aspectos que
envolvem sua materialidade e sua função ideológicas, evidenciando o aspecto
documental que assumiu ao longo da história.
Historicamente, o livro didático tem sido considerado uma importante fonte
documental e objeto de estudo no campo investigativo das instituições escolares, dos
sujeitos da educação e das disciplinas escolares. Entre os pesquisadores desses grupos
que se ocupam de estudá-lo, a conceituação tem sido uma questão crucial e bem
complexa. E como os elementos que envolvem o entendimento desse conceito são
complexos, julgamos ser relevante citar as considerações de Batista a seu respeito
(1999, p. 450):
Uma conceituação do livro didático deve, desse modo, levar em conta
esses problemas, sob o risco de excluir do conceito – e, portanto, de
práticas de pesquisa e mesmo de documentação – não só materiais
pedagógico de fundamental importância como também fenômenos
mais amplos que marcam a relação da escala com tecnologias de
transmissão e preservação do conhecimento e da informação (a
escrita, o manuscrito, o impresso, por exemplo), assim como os
impactos dessas tecnologias no trabalho pedagógico, em suas
consequências culturais e cognitivas, em suas formas de organização.
82
Um dos fatores relevantes para ampliar o referido conceito é a preocupação em
valorizar os diferentes materiais existentes no contexto escolar, provocando estudos que
visem organizar acervos que considerem a diversidade de documentos representativos
que marcam a cultura material da escola. Para Choppin (2004, p. 549), a primeira
dificuldade enfrentada pelos pesquisadores é de definir esse recurso didático que, ao
longo do tempo, vem recebendo variadas denominações, apresentando diversidade do
vocábulo e nas inconstâncias em torno dos usos lexicais. Segundo esse autor, em grande
parte das línguas,
[...] o livro didático é designado de inúmeras maneiras, e nem sempre
é possível se explicar as características específicas que podem estar
relacionadas a cada uma das determinações, tanto mais que as
palavras quase sempre sobrevivem aquilo que elas designaram por um
determinado tempo.
Corroborando essa ideia de Choppin (2004), apontamos que essa problemática
pode ser identificada nas pesquisas que são feitas no Brasil. Em termos da variedade do
léxico, aqui entre nós, é bem comum quando nos reportamos ao Século XIX e aos anos
inicias do Século XX, quando há registros de que os livros destinados às escolas
brasileiras recebiam outras designações mais representativas que o termo livro didático.
Essa nomenclatura foi associada oficialmente a esse tipo de livro na década de 1930, a
partir das determinações postas no Decreto-Lei nº 1.006, de dezembro de 1938,
expressamente no Art. 2º:
Para os efeitos da presente lei, são considerados livros didáticos os
compêndios e os livros de leitura de classe. § 1º Compêndios são
livros que exponham, total ou parcialmente, a matéria das disciplinas
constantes dos programas escolares. § 2º Livros de leitura de classe
são os livros usados para leitura dos alunos em aula.
Sobre as prescrições dessa lei ou das legislações em geral, Bittencourt (1993)
avisa que, apesar de, no Brasil, o conceito formal de livro didático estar associado a esse
decreto, é importante ressaltar que, antes de sua promulgação, os livros já eram
referenciados em documentos oficiais. Então, considerando esses apontamentos,
entendemos que o conceito de livro didático, além de abranger os elementos internos à
língua, à etimologia dos vocábulos, organiza-se por meio de diferentes relações sociais,
políticas, religiosas, econômicas e culturais, que se constituem no âmbito educacional e
escolar. Sobre essas questões, adverte-nos Koselleck (2006, p. 98):
83
Sem conceitos comuns não pode haver uma sociedade e, sobretudo
não pode haver unidade de ação política. Por outro lado, os conceitos
fundamentam-se em sistemas político-sociais que são, de longe, mais
complexos do que faz supor sua compreensão como comunidades
linguísticas organizadas sob determinados conceitos-chave
Sobre essa consideração, em seus estudos, Bittencourt (2008) afirma que, no
Brasil, a produção didática não estava dissociada dos ideais e dos objetivos dos liberais,
ou seja, do contexto de uma época. Com as novas finalidades atribuídas à educação
primária nas sociedades modernas, o livro passou a ser considerado como “a carne” da
produção de livros. Segundo Bittencourt (2008), na década de 1880, predominavam nas
escolas brasileiras livros didáticos nacionais, ainda que, prioritariamente, fossem
impressos no exterior.
Em nossa tese, tomamos o livro didático como a fonte principal, porquanto o
compreendemos como um instrumento pedagógico de grande valia para as discussões
acerca da educação brasileira. Para isso, apoiamo-nos, principalmente, no conceito de
livros didáticos que nos apresenta Bittencourt (2003), ao afirmar que são recursos
pedagógicos que se configuram, historicamente, como impressos que podem revelar
traços da historiografia educacional.
De forma geral, os estudiosos de livros didáticos (BITTERCOURT, 1993, 2004;
CHOPPIN, 2002; MUNAKATA, 2001; MAGALHÃES, 2011) procuram configurá-los
como um veículo de transmissão dos valores e um instrumento facilitador da construção
e da formação social de um povo, porque
[...] a relação entre livro escolar e escolarização permite pensar na
possibilidade de uma aproximação maior do ponto de vista histórico
acerca da circulação de ideias sobre o que a escola deveria
transmitir/ensinar e, ao mesmo tempo, saber qual concepção educativa
estaria permeando a proposta de formação dos sujeitos escolares
(CORRÊA e VALDEMARIN, 2000, p.13).
O debate até aqui apresentado leva-nos a compreender que a utilização do livro
didático representa a mais significativa expressão do ensino, de suas teorias, concepções
pedagógicas e metodologias. Esse tipo de recurso é um forte indicador de interesses e
finalidades vinculadas ao currículo das instituições escolares (BITTENCOURT, 1993).
Em nossas considerações acerca do livro didático, chamamos à atenção para a
análise das múltiplas facetas inerentes ao livro, a qual deve ser problematizada e
84
ampliada tendo em vista os elementos históricos e sociais na construção do conceito
(KOSELLECK, 2006). Procuraremos, então, tal como sugere Bittencourt (2004),
demonstrar em nossas discussões as múltiplas relações de cunho social, político,
econômico e educacional e a influência de vários sujeitos na produção e na circulação
do livro didático.
Devido à sua ampla difusão, os livros didáticos cooperam decisivamente para
que determinadas interpretações se tornem hegemônicas na escola (VALDEMARIN,
2010). Para Chartier (1991), o livro didático25 conduz à prática educativa utilizando-se
de normas e representações, valores e condutas a serem inculcados pelos alunos.
Historicamente, tem-se mostrado revelador dos vestígios de uma pedagogia modeladora
de comportamentos e de valores aplicados à política educacional, tendo em vista que “a
história do livro didático permite vislumbrar indícios de seus usos (prescritos e efetivos)
e, assim, apreender aspectos das práticas escolares” (MUNAKATA, 2003. p. 10).
O livro didático tem por definição instruir o aluno em sua plenitude, ofertando
habilidades pedagógicas, físicas, cívicas e morais.
O livro escolar, ao fazer parte da cultura da escola, não integra essa
cultura arbitrariamente. É organizado, veiculado e utilizado com uma
intencionalidade, já que é portador de uma dimensão da cultura social
mais ampla. Por isso, esse tipo de material serve como instrumento,
por excelência, da análise sobre a “mediação” que a escola realiza
entre a sociedade e os sujeitos em formação, o que significa interpretar
parte de sua função social (CORRÊA e VALDEMARIN, 2000, p.19).
Assim, é preciso discutir sobre a elaboração e a produção do livro didático
partindo das combinações e das “mediações” sociais. Munakata (2003) e Valdemarin
(2007) acrescentam que esse recurso didático pode ser considerado como um objeto por
meio do qual se podem desvendar indícios da cultura escolar e relações com a política
de controle social, com as representações culturais e com os modelos políticos e
econômicos.
Segundo Chartier (1998), o livro didático reproduz valores e saberes inculcados
pela escola e transmite concepções, práticas e saberes escolares. Para esse autor, o livro
didático conduz à prática educativa utilizando-se de normas, valores e condutas a serem
25
É importante registrar que, em muitas realidades, os livros didáticos são o único recurso
didático utilizado na educação das classes populares e portadores das informações que possibilitam o
acesso dessa população ao mundo letrado.
85
assimilados pelos alunos. O estudo do livro pode esclarecer alguns aspectos da
organização do ensino e de sua intencionalidade em uma dada época (MUNAKATA,
2003).
Entendemos que o livro didático é um veículo de divulgação de normas sociais
as quais passam a determinar o que deve ser ensinado. Segundo Batista (1999, p. 566),
“[…] o livro escolar é um campo por excelência da ideologia e das lutas simbólicas e
revela sempre, pelas suas escolhas, um viés, um ponto de vista parcial e comprometido
sobre a sociedade, sobre seu passado, seu presente e seu futuro”.
Bittencourt (1993) assevera que o livro está muito longe de ser um simples
recurso didático a ser estudado, pois ao longo de sua história esse se configura em um
problema a ser desvendado e indagado, uma vez que, mesmo sendo um material
didático de comum uso pela escola, pouco se estudou sobre sua interferência na
formação dos saberes escolares.
Nossa pesquisa de Doutorado visou construir um referencial teórico-conceitual
histórico que nos permita compreender que os saberes escolares, de forma geral,
possibilitam mais aproximação entre o projeto de formação social e as concepções
educativas. Nesse quadro, ao livro didático era destinada a tarefa de organizar um
“conteúdo explícito”, fato que aproximava a produção do livro didático da história das
disciplinas escolares.
No Brasil, as pesquisas sobre a história das disciplinas escolares têm sido
desenvolvidas por autores que se interessam por uma matéria específica, pelos
estranhamentos e pelos interesses pela disciplina em que se formaram, ou ainda, pelos
problemas colocados hoje pelo ensino dessa disciplina (HÉBRARD, 1999). Com os
autores estrangeiros não acontece de outro modo, pois as pesquisas passam, atualmente,
por um forte desenvolvimento (FRAGO, 2008). Em seus estudos, os pesquisadores
penetram seu olhar nessas disciplinas
[...] por meio de compêndios adotados, movimento de criação,
extinção e novas nomenclaturas das cadeiras, pelos objetivos e
conteúdos, professores e livros didáticos, porém atentos sempre às
finalidades das disciplinas (ALVES, 2012, p. 142. Grifos nossos.).
A citação anterior coloca os livros didáticos como documentos que podem
revelar os objetivos, as identidades e as formas culturais que uma disciplina escolar
86
pode assumir ao longo dos anos. Os materiais didáticos, especialmente os livros, quando
indicados ou adotados para diversos níveis de ensino e para determinada disciplina,
compreendem um dos documentos de análise no campo de pesquisa da história das
disciplinas escolares.
Para Venturi e Gatti Jr. (2004), cada disciplina tem uma história própria, e para
compreender sua construção histórica, os pesquisadores utilizam diferentes vestígios.
Esses autores apontam os livros didáticos como objetos culturais que guardam
elementos que compõem a tradição didática de determinada disciplina. Esses autores,
que são importantes referências para os estudos sobre as disciplinas escolares e livros
didáticos, afirmam que
[...] a tarefa do pesquisador da história das disciplinas escolares é a de
realizar um trabalho investigativo sobre as metodologias, os
exercícios, as práticas de motivação, os materiais utilizados e os
conteúdos selecionados [...]. Esses aspectos estão em ligação direta
com as finalidades da disciplina. Isso leva o historiador das disciplinas
a utilizar documentos como, livros didáticos, arquivos escolares,
literatura pedagógica, documentação oficial do ensino e outras fontes
de pesquisa (VENTURI e GATTI JR, 2004, p. 69. Grifos nossos.).
Fazendo inferência nas nossas pesquisas, afirmamos que, em consulta a uma
parte dos livros didáticos publicados no Brasil entre o Século XIX e o início do Século
XX, observamos que, de fato, eles podem ser um elemento capaz de revelar a estrutura
didática de uma disciplina escolar. Ou seja, nos livros didáticos, podemos encontrar
indícios de como, ao longo da história, os modos de ensinar foram sendo organizados.
No que diz respeito a essa questão, nossas pesquisas a respeito dos livros
didáticos de Geografia do Ensino Primário revelam, cada vez mais, as diferenças entre
os livros destinados para cada nível de ensino. Sobre isso, nossos questionamentos
surgiram do contato com as obras destinadas ao Ensino Primário, que ora estão sendo
analisadas, quando necessário, comparadas com as destinadas ao nível secundário por
causa da familiaridade já adquirida com as inquirições realizadas no mestrado.
Pelo que temos investigado até o momento, as diferenças entre as obras são
relativas aos mais variados aspectos, a saber: a organização dos textos, a disposição dos
conteúdos e seus objetivos, a finalidade do ensino, as formas metodológicas para sua
execução e sua relação com a disciplina escolar Geografia. Alguns desses aspectos já
foram apresentados no capítulo anterior. Entendemos, pois, que existe uma
87
multiplicidade de textos didáticos, cada um com suas especificidades que atendem às
necessidades dos diversos leitores (aluno, professor e demais pessoas). De acordo com
Chartier (1990), ao conferir ao leitor a oportunidade de ler, o livro didático também abre
espaço para socializar e apreender o que foi lido. Essa formação de conceitos com base
na aquisição da leitura pode partir do individual para o coletivo ou vice-versa.
Para Bittencourt (2008), a história do livro no processo de aprendizagem está
vinculada a uma aprendizagem que envolvia leitura (texto) e oralidade e à presença e à
intervenção do professor como leitor individual e coletivo. É importante ressaltar que
também estavam atreladas às concepções de aprendizagem as imagens ou ilustrações
que serviam como suporte entre a lição escrita e a oralidade dos professores e o
desenvolvimento da capacidade de “memorizar”, porque
a memorização era a tônica do processo de aprendizado e era essa a
principal capacidade exigida dos alunos para o sucesso escolar.
Aprender era memorizar [...] Essa concepção de aprendizado,
fundamentada no desenvolvimento da capacidade do aluno de
memorizar, não foi ignorada pela obra didática. A memorização era
um pressuposto básico para a aprendizagem e o “saber de cor” se
impunha como método de ensino que autores buscavam incentivar
(Idem, p. 203).
O ensino centrava-se na prática de decorar e memorizar. As obras didáticas
também destinavam boa parte de seus textos ao exercício da memória. Os exercícios
portavam-se como uma boa técnica de memorização que garantia o sucesso da
aprendizagem. A esse respeito Bittencourt (2008, p. 219 e 220) ainda acrescenta:
[...] entre método “tradicional” e “método intuitivo”, o livro escolar
expressava, igualmente, as dificuldades na constituição de uma
sociedade letrada que vivia mergulhada na tradição da transmissão
oral. A memorização, base metodológica do ensino de uma sociedade
que estava enraizada em um aprendizado pela oralidade, impregnou a
construção dos livros escolares. O resultado dessa construção foi a
diferenciação das formas de recepção do público leitor frente a esse
material didático.
E é nesse contexto do final do Século XIX, dos debates sobre os métodos de
ensino, que notificamos que se dá o aparecimento de uma bateria de exercícios nos
livros didáticos para fundamentar os métodos de ensino. E esses surgiam não mais
limitados ao papel da memorização.
Assim, entendemos que o estudo do livro didático envolve diversas facetas que
88
ligam o livro ao mundo da cultura escolar e apontam novas perspectivas de análises
associadas ao campo de estudo da história das disciplinas escolares.
Além de todas as questões aqui apresentadas, pontuamos a importância do livro
didático para a formação do professor. Bittencourt (2008), em seus estudos, afirma que,
no final do Século XIX, “o livro era fundamental para a formação dos professores e para
garantir os diversos conhecimentos a serem divulgados pela escola (p.32)”. Com base
em todos esses debates apresentados, reafirmamos a relação intrínseca entre as
concepções de ensino, as produções didáticas e a formação dos saberes escolares.
Traçado esse debate sobre a organização dos saberes e sua relação com o nosso objeto
de estudo, apresentamos, a seguir, algumas considerações a respeito das pesquisas sobre
os exercícios nos livros didáticos.
2.2 Traçando um estado da arte: as pesquisas sobre exercícios nos livros didáticos
A realização de uma pesquisa de Doutorado requer, dentre outras tantas
exigências, um aprofundamento sobre a delimitação do objeto que se busca pesquisar.
Nosso intuito é de explorar o objeto de estudo, ou seja, os exercícios nos livros didáticos
de Geografia, para que ele nos ajude a responder às questões que formulamos no
decorrer da escrita. Porém, a busca por uma bibliografia representativa a respeito da
temática aqui estudada nos direciona para as produções acerca do ensino de Geografia e
para as pesquisas que adotam o livro didático como fonte e/ou objeto de investigação.
Portanto, antes de tratar do nosso objeto propriamente dito, apontaremos algumas
perspectivas de estudos centradas no próprio livro didático, como, por exemplo, as
pesquisas de caráter histórico e faremos um breve apanhado sobre as pesquisas voltadas
para o ensino de Geografia.
Segundo Munakata (2012), a abordagem histórica sobre o estudo do livro
didático se divide basicamente em duas vertentes que, embora estejam interligadas,
podem ser divididas: as que abrangem as pesquisas centradas na história/memória do
livro e da leitura e as que se inserem na perspectiva da história das disciplinas escolares.
De acordo com os estudos de Choppin (2004), apesar de, atualmente, os estudos
sobre o livro didático sejam um campo fértil de pesquisas, com domínio em vários
89
países simultaneamente, nas últimas décadas do Século XX, as produções ainda são
bem escassas e são poucas as que se preocupam em fazer uma síntese que abranja toda a
produção didática e os períodos históricos estudados. Em âmbito nacional, Moreira
(2012)26
evidencia essa mesma problemática e aponta a deficiência de grupos de
trabalhos destinados a escrever a história geral da literatura escolar aqui no Brasil.
Na realidade brasileira, até os anos de 1980, a realização de pesquisa científica
acerca do livro didático era quase nula, uma condição que estava integrada à ideia de
desprestígio inerente a esses livros durante o período da Ditadura Militar
(MUNAKATA, 2003a), ao atribuir-lhes a ideia de verdadeiros “vilões”, devido ao
desenvolvimento das análises acerca das críticas ideológicas dos conteúdos
(BITTENCOURT, 2011) da qual já tratamos. Nesse sentido, os primeiros enfoques
assumidos pelas pesquisas sobre o livro didático no país abordavam-nos a partir das
concepções ideológicas oficial e burguesa, nas ideias de falso e de correto, da
cientificidade ou da falta dela nesses livros (MUNAKATA, 2003a; BITTENCOURT,
2011). Recentemente, a partir da última década do Século XX e início do Século XXI,
os estudos que versam sobre tais obras assumiram direcionamentos diversificados, com
enfoques diferenciados em suas propostas de estudo. Munakata (2003a, p.7) refere que,
no início do Século XXI, “[...] já estão distantes os tempos em que se combatia o livro
didático do mesmo modo como se lutava contra a ditadura militar”.
Sobre tais pesquisas em uma perspectiva histórica, podemos assinalar o caráter
recente desses estudos tanto na realidade brasileira quanto na mundial. Munakata
(2012), ao fazer um balanço de alguns temas pesquisados, afirma que, na última década
do Século XX, houve um crescimento significativo dos estudos sobre essa perspectiva.
Como uma maneira de valorizar as discussões a respeito do livro didático, nesse
período, notificamos o surgimento de eventos específicos para debatê-lo, como o I
Encontro Internacional sobre Manuais Escolares, realizado em 1999, na Universidade
do Minho, em Portugal, com o tema Manuais escolares – Estatuto, funções, história - e
aqui no Brasil, o I Simpósio Internacional do livro didático, realizado na Universidade
de São Paulo – USP, em 2007, com o tema Educação e História.
26 A autora observa, ainda, a falta de um censo de livros didáticos produzidos no país, de inventários das
obras disponíveis, da evolução dos marcos legislativos e regulamentários das edições escolares, da
síntese de sua difusão, entre outros.
90
A expansão das investigações a respeito do livro didático, sob uma perspectiva
histórica, também pode ser observada nas discussões dos GTs em eventos científicos; na
criação de grupos de pesquisas e, recentemente, no interesse de pesquisadores em
organizar acervos e bibliotecas, como já apresentamos no tópico anterior.
Observamos, ainda, que novas temáticas passaram a fazer parte do universo das
pesquisas sobre o livro didático. As diferentes abordagens objetivam identificar as
múltiplas facetas inerentes a esse tipo de livro, pois, além de considerar as abordagens
pedagógicas e metodológicas, procuram abordar os sujeitos envolvidos em sua
elaboração e produção; a relação entre o livro e o Estado; o processo de circulação e de
aquisição e seus diferentes usos no contexto escolar. Recentemente, destacamos as
pesquisas voltadas para a história das disciplinas escolares (MUNAKATA, 2003;
BITTENCOURT, 2011; MOREIRA, 2012).
Essas novas abordagens foram introduzidas no Brasil a partir de um estudo
pioneiro de Circe Bittencourt, na década 1990, quando ela estudou a disciplina escolar
História, tendo como enfoque central o livro didático dessa disciplina. Sua tese tornou-
se uma importante referência, tanto no campo da História, quanto em outros campos
disciplinares na área da Educação, que procuram discutir sobre a construção dos saberes
de uma disciplina escolar. As contribuições dessa pesquisa residem, entre outros
aspectos, na elucidação de importantes elementos referentes ao livro didático e ao saber
escolar, evidenciando as tensões e as articulações entre ele e os interesses do Estado, o
mercado editorial e os autores responsáveis pela sua produção e os enfoques dados às
concepções ideológicas presentes na materialidade dos livros didáticos.
Assim, no Brasil, a produção bibliográfica, cujo foco de análise é o livro
didático, no âmbito de uma perspectiva histórica, parte das disciplinas escolares
específicas, como História, e as de Português e Geografia. Como nosso trabalho
também parte da perspectiva disciplinar e é centrado na Geografia escolar, achamos
necessário fazer um breve apanhado das pesquisas sobre o ensino de Geografia. Em
âmbito nacional, essas pesquisas vêm ganhando espaço nas últimas décadas do Século
XX, considerando as mais diferentes perspectivas e enfoques. Esse breve exercício de
análise da trajetória das pesquisas acadêmica sobre o ensino de Geografia no Brasil
91
toma como base o trabalho de Pinheiro (2005)27
, cujo foco é a catalogação da produção
de dissertações e teses produzidas entre 1967 e 2003. Em maço de 2016, Lana de Souza
Cavalcanti publicou um artigo com informações mais atualizadas sobre as dissertações e
as teses sobre temas nessa área. Entretanto nosso texto já se encontrava em fase final de
escrita e não havia mais tempo para incorporar as informações mais atualizadas.
Pinheiro (2005), em sua produção, destaca a presença dos seguintes eixos
temáticos como enfoque de pesquisa: formação de professores, conteúdo-método,
prática docente e educativa, representações espaciais, educação ambiental, estudos
sociais, formação de conceitos, currículos e programas, história da Geografia escolar e
livro didático.
Dentre os eixos suprarreferidos, os que tratam dos currículos e dos programas,
da história da Geografia escolar e do livro didático são os que mais nos chamam à
atenção, porque são trabalhos que versam sobre temáticas que estão relacionadas ao
nosso objeto de estudo. Em consulta ao trabalho desse autor, constatamos que tais
temáticas, ainda que lentamente, começam a parecer, e nelas, o livro didático de
Geografia passa a ser considerado como um objeto e/ou fonte de estudos para a história
da Geografia escolar28. Os currículos e os programas também aparecem como
documentos utilizados nas pesquisas que versam sobre a história dessa disciplina.
Em alguns casos, constatamos que há trabalhos, como o nosso, por exemplo, que
procuram usar os currículos ou programas de determinado nível de ensino, para ampliar
e discutir bem mais sobre o livro didático. Assim, consideramos que esses estudos têm
se configurado em campos investigativos que têm levantado questionamentos e
27 Ver trabalho completo em: PINHEIRO, Antônio Carlos. O ensino de Geografia no Brasil: catálogo de
dissertações e teses (1967 -2003). Goiânia: Ed. Vieira, 2005.
28 As pesquisas que versam sobre a história da Geografia escolar no Brasil se apresentam de modo bem
diversificado, tanto no que diz respeito aos enfoques temáticos, quanto à escolha das fontes de pesquisa e
aos posicionamentos teórico-metodológicos de cada autor. De acordo com a pesquisa apresentada por
Pinheiro (2005) sobre a história da Geografia escolar e que toma o livro didático como fonte e/ou objeto
de estudo, destacamos os seguintes trabalhos: Colesanti (1984); Pereira, (1989); Vlach (1988); Ferraz
(1995); Rocha (1996) e Campos (1997).
92
reflexões que podem orientar problematizações a respeito da história da Geografia
escolar.
Com a apresentação das pesquisas encontradas que se aproximam do nosso
objeto de estudo, podemos confirmar o caráter inédito e original do nosso trabalho e
afirmar que essa busca vem acontecendo desde a realização do Mestrado, quando
fizemos o levantamento das pesquisas sobre os exercícios nos livros didáticos de
Geografia e não foi encontrada nenhuma referência, seja em dissertação ou em tese e,
agora, no Doutorado, retomamos a pesquisa, com o intento de ampliar a investigação.
No Mestrado, ao fazer esse levantamento entre os anos de 2005 e 2010,
constatamos que, dos trabalhos encontrados sobre os exercícios ou exercícios nos livros
didáticos, de modo geral, só encontramos o de Itamar Freitas, escrito em 2009 e
defendido na Universidade Federal de Sergipe, e o de Marilu de Freitas de Faricelli, de
2005, defendido na Faculdade de Educação/PUC, em São Paulo. Mesmo assim, os dois
partem de outra perspectiva, o que ainda faz da nossa proposta de tese pioneira em
relação ao tema e ao campo da História da Educação brasileira.
Dando continuidade às investigações realizadas no Mestrado a respeito dos
exercícios, investimos em um levantamento bibliográfico do acervo acadêmico existente
sobre o tema, com o objetivo de fazer um apanhado das discussões concernentes aos
exercícios. Para isso, elegemos o site da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal
de Nível Superior (CAPES), especificamente no banco de teses e dissertações, para
sistematizar as informações. Devido ao registro de um pequeno número de teses e
dissertações acerca do assunto, resolvemos ampliar a busca para instituições acadêmicas
(especialmente nos Programas de Pós-graduação), anais de eventos, revistas científicas,
entre outros. No trabalho de busca, usamos os seguintes termos: exercícios; exercícios
nos livros didáticos, exercícios de Geografia e exercícios nos livros didáticos de
Geografia.
Avaliando as publicações apresentadas nos quadros I e II, vimos, de imediato,
que não existe pesquisa sobre os exercícios na perspectiva que abordamos, já que o
único registro é nossa pesquisa de Mestrado. Observemos os resultados apresentados:
93
QUADRO I
Trabalhos publicados no portal da Capes e em outras instituições e que versam
sobre exercícios
Modalidade Título Autores Ano Instituição
Doutorado
Coleção Sérgio Buarque
de Hollanda: livros
didáticos e ensino de
história
José Cássio Másculo 2008 PUC - SP
Artigo científico
Análise de um livro
didático em língua
portuguesa
Josefa Tapia Salzano 2010
Doutorado
Usos do livro didático de
alfabetização no primeiro
ano de ensino
fundamental: uma
abordagem etnográfica
Tamara Cardoso
André 2011 UFPR
Dissertação
Implantação da
matemática moderna nas
décadas de 1960 e 1970
no município de Pato
Branco - PR
Eunice Nunes
Dobrowolski 2011 UFPR
Dissertação
Reflexões sobre o ensino
da geometria em livros
didáticos à luz da teoria
das representações
semióticas segundo
Raymond Duval
Gabriela Teixeira
Kluppel 2012 UEPG
Dissertação
Análise dos conteúdos de
biotecnologia em livros
didáticos de Biologia
Erico Murilo Barros
de Carvalho 2012 UMC
Dissertação
Metáfora no ensino de
língua materna: em
busca de um novo
caminho
Maitê Moraes Gil 2012 UFRGS
Fonte: Elaborado a partir do banco de teses e dissertações do site da CAPES e outros espaços de registro
de pesquisas acadêmicas.
É possível observar uma tendência nas teses e nas dissertações antes
mencionadas, conforme a leitura dos resumos, a uma reflexão voltada para os exercícios
de um modo bem amplo, em que eles aparecem como um dos aspectos que podem ser
analisados ligados ao tema geral da pesquisa. Mesmo nessa busca mais ampla, ainda é
bem pequeno o número de pesquisas, pois só foram encontrados sete trabalhos, como
mostramos no quadro I.
Realizada a pesquisa mais geral, focalizamos nossas investigações para os
exercícios nos livros didáticos, nosso objetivo central nesse levantamento. Vejamos os
dados apresentados no quadro que segue:
94
QUADRO II
Trabalhos acadêmicos publicados no portal da Capes e em instituições acadêmicas
sobre os exercícios
Modalidade Título Autores Ano Instituição
Artigo científico
Exercícios de compreensão ou
copiação nos manuais de
ensino de língua?
Luiz Antônio
Marcuschi 1996 UNB - DF
Projeto de
pesquisa
As atividades nos livros
didáticos de história regional Itamar Freitas 2009
I Semana de Ensino
de História.
Mossoró/RN. 2009,
(CD ROM).
Livro Livros didáticos de História:
escolhas e utilizações Itamar Freitas 2009 EDUFRN
Artigo científico
O papel dos exercícios nas
práticas educacionais: uma
perspectiva histórica
Ana Maria Garcia
Moura 2010
IV Colóquio
Internacional
“Educação e
Contemporaneidade
”.
Laranjeira/SE
Artigo científico
Os exercícios nos livros
didáticos de História no ensino
fundamental: uma análise de
edições
Ana Maria Garcia
Moura e Carla
Karinne Santana de
Oliveira
2011
Anais Eletrônicos do
IX Encontro
Nacional dos
Pesquisadores do
Ensino de História.
Florianópolis/SC
Dissertação
Ensino e aprendizagem nos
livros didáticos de História
(1960/2000): que concepções
apontam os exercícios?
Ana Maria Garcia
Moura 2011 UFSE
Dissertação
Caderno de exercícios:
aprender, escrever e outras
fantasias entre Educação e
Filosofia
Luciana Kalil
Santos 2011 UERJ
Artigo científico
Os exercícios sobre leitura dos
textos, em livros didáticos - C
coleção aprendendo sempre,
no ensino fundamental
Érica Pires Conde e
Éridan Pires Conde
Rocha
UFPI - PI
Doutorado
Pontos de (re) visão e exploraç
ões historiográficas da aborda
gem regional: exercícios
a partir do Cariri
cearense (Século IXI e XX)
Maria Soares da
Cunha 2012 UFC
Dissertação
Os exercícios nos livros
didáticos de Geografia no
Brasil: mudanças e
permanências (1880-1930)
Joseane Abílio de
Sousa Ferreira 2012 UFPB
Artigo científico
Os exercícios nos livros
didáticos de História: objetos,
localização e formas de
denominar (1960-2000).
Ana Maria Garcia
Moura 2014 UFSE
Fonte: Elaborado a partir do banco de tese e dissertação do site da CAPES, grupos de trabalhos de
eventos acadêmicos e outros espaços de registro de pesquisas acadêmicas (a exemplos dos sites).
95
De maneira geral, entre os trabalhos catalogados, só o de Moura (2010 e 2011) e
o de Faricelli (2005), embora partam de perspectivas diferentes da nossa, podem
contribuir para as discussões sobre o nosso objeto de estudo, porque o estudo realizado
por Moura (2010 e 2011) analisa os exercícios em uma perspectiva histórica,
assinalando suas funções e finalidades nas práticas educativas; e o de Faricelli (2005)
traz uma abordagem a respeito da disciplina escolar História, em que analisou os
exercícios destinados às séries finais do ensino fundamental, a partir de categorias
baseadas no conhecimento histórico e nos processos cognitivos que os exercícios
realizam no processo de aprendizagem, além do enfoque dado à maneira como a
História se constituiu como uma disciplina escolar.
Nesse quadro II, destacamos, ainda, o trabalho de Freitas (2009) que, mesmo
não trazendo o nome exercícios nos títulos, examinou o PNLD 2007 e os exercícios
voltados para as séries iniciais do ensino fundamental e observa os livros com base em
seus aspectos pedagógicos e na quantidade de exercícios destinada para cada capítulo.
Os trabalhos de Freitas (2009) merecem destaque, também, porque fazem parte de um
projeto mais amplo, que procura trabalhar com os exercícios abordados nos livros
didáticos e tem gestado outras pesquisas e despertado outros pesquisadores para
discutirem sobre o papel dos exercícios, seja em uma disciplina escolar, seja em
qualquer sequência didática.
Continuando esse levantamento, decidimos fazer uma busca mais particular, ou
seja, no âmbito das produções acadêmicas do estado da Paraíba, especificamente nos
principais Programas de Pós-graduação em Educação, em Geografia e em História, a
saber: o Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal da Paraíba
(PPGE/UFPB); o Programa de Pós-graduação em Geografia (PPGG/UFPB), o
Programa de Pós-graduação em História (PPGH/UFPB), o Programa de Pós-graduação
em Educação da Universidade Federal de Campina Grande (PPGE/UFCG) e o
Programa de Pós-graduação em História da mesma Universidade (UFCG/PPGH).
A catalogação feita nesses programas só apontou nossa dissertação de Mestrado,
defendida em 2012, no Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade
Federal da Paraíba (PPGE/UFPB), o que justifica que, também em âmbito local, nossa
proposta de tese é inédita e original. É importante registrar que retomamos as pesquisas
no ano de 2016, e os resultados apontam os mesmos números que já enfatizamos aqui
96
nesse estado da arte de nosso trabalho.
Com esse levantamento, fechamos a primeira parte da pesquisa. No capítulo
seguinte, que já compõe a segunda parte da tese, versaremos sobre as discussões acerca
da escola primária, as estratégias, as finalidades e a função das metodologias no ensino
primário.
97
2ª parte
A ORGANIZAÇÃO DA ESCOLA PRIMÁRIA NO BRASIL: CONSIDERAÇÕES
SOBRE O ENSINO DE GEOGRAFIA
CAPÍTULO III: ORGANIZAÇÃO DA ESCOLA PRIMÁRIA NO BRASIL: OS
TEMPOS, AS METODOLOGIAS E A CULTURA ESCOLAR
Neste capítulo, trazemos uma discussão sobre a escola primária, no período de
transição do regime monárquico para o republicano, sobre como se constituiu, a
legislação da época e os embates políticos travados para configurar esse modelo de
escola no Brasil. Também tecemos algumas considerações sobre sua organização
pedagógica, sobre a forma como os currículos foram elaborados, os métodos de ensino e
as questões do currículo de Geografia e o relacionamos com a produção dos livros
destinados a essas escolas.
3.1. A escola primária na Primeira República: entre a obrigatoriedade e a
liberdade de ensino
A história do ensino primário, no Brasil, é uma questão discutida com frequência
entre os historiadores da História da Educação brasileira (SOUZA, 2000, 2012;
SAVIANI, 2006; ARAÚJO, 2012; FARIA FILHO, 2000). Os pesquisadores - cada um
de acordo com a finalidade de suas pesquisas e os pressupostos teórico-metodológicos,
procuram traçar um panorama das estratégias de funcionamento e sua consolidação em
diversos estados brasileiros29
.
No Brasil, o estudo sobre a história do ensino primário tem se configurado como
um palco que abriga discussões e interpelações epistemológicas de variados temas e
objetos de estudo no campo da História da Educação. As pesquisas sobre a escola
primária começaram a aumentar significativamente em 1990, sobretudo com as
investigações sobre a institucionalização dos grupos escolares e os meandros da cultura
escolar que marca as diversas práticas educativas e questões relacionadas à formação de
professores e sua profissionalização, além dos estudos sobre livros didáticos e métodos
29
Mais detalhes sobre esses estudos, consultar: ARAÚJO, José Carlos Souza, (Org.) et alii. Escola
Primária na Primeira República (1889-1930): subsídios para uma história comparada. Araraquara, SP:
Junqueira & Marin, 2012.
98
de ensino (BARRA, 2001; SOUZA, 2011).
Não pretendemos traçar um panorama da História da Educação, seus avanços e
entraves, tampouco fazer um balanço da configuração do campo, como alguns
pesquisadores têm se dedicado a fazer (SAVIANI, 1998; ALVES, 1998; CATANI e
FARIA FILHO, 2002), mas dialogar, no tempo histórico escolhido, com os vários
indícios da organização do campo, a partir desse período que abrange variadas
pesquisas e tem sido cada vez mais significativo nas tramas da História da Educação
(ARAÚJO, 2001).
Em suas pesquisas, os autores constataram que, no Ocidente, a partir do Século
XIX, a escola e as práticas de escolarização começaram a ser o centro dos debates para
construir e consolidar os chamados “estados-nações”. A difusão do sentido de
“civilização” estava estrategicamente associada ao projeto de escolarização, ou seja, ao
ensinamento dos conteúdos escolarizados30
. Para Souza (2011, p.341),
as primeiras tentativas de sistematização da instrução pública no
Brasil, durante o Oitocentos, ocorreram depois da transferência da
Corte portuguesa em 1808. Como se sabe, esse acontecimento político
e seus desdobramentos acarretaram mudanças significativas na
sociedade brasileira. Bastar assinalar algumas medidas de inegável
repercussão, como a abertura dos portos ao comércio internacional, a
criação da imprensa e de instituições culturais, como bibliotecas,
teatro, museu e, no campo da educação, a instalação de academias e
cursos superiores, além da elaboração de projetos de difusão da
instrução pública.
Esse cenário de modificações marca, sobretudo, as primeiras iniciativas das
elites imperiais de impulsionar o debate sobre a instrução pública. Era necessário pensar
em medidas político-administrativas para elaborar projetos de cunho social, político e
cultural voltados para os fins da difusão da instrução pública.
Como o Brasil se tornou independente de Portugal em 1822, era necessário que
se organizasse como Estado-nação, o que implicaria a promulgação de uma
Constituição própria, uma nova configuração política e social (SAVIANI, 2006; SILVA,
2007; SILVA e ANANIAS, 2011). As elites imperiais e seus dirigentes, na corte e nas
províncias, direcionaram suas ações, reforçando e difundindo o papel das pessoas,
30 Para tentar discutir sobre essa relação, apresentaremos, ainda neste tópico, um mapa que traz um
panorama da distribuição das escolas primárias em vários estados brasileiros, elaborado a partir do
trabalho organizado por: ARAÚJO, SOUZA e PINTO, 2012 e de PINHEIRO2002.
99
natural e hierarquicamente, de forma desigual, elegendo diferenças clássicas entre os
súditos, as elites e o povo (SILVA e ANANIAS, 2013).
Mesmo com a Constituição de 1824, com as primeiras tentativas de organizar a
instrução pública, a educação não apareceu com um direito dos súditos livres. Segundo
Silva (2007, p.236),
[...] a instrução primária gratuita a todos os cidadãos foi considerada
em uma breve linha no trigésimo segundo parágrafo (num total de 35),
do último artigo (o art. 179) pertencente ao último título da
Constituição de 1824 (o 8º) – no qual, junto com algumas Disposições
Gerais, foram tratados os Direitos civis e políticos dos cidadãos
brasileiros.
Podemos dizer que o dispositivo legal se referia muito mais aos modos
estamental, patriarcal, escravista e excludente, que determinavam o lugar social de
todos, do que aos pressupostos de liberdade. No Império brasileiro, os governos
provinciais nunca foram obrigados por lei a promover aulas e a ter professores para
determinadas localidades (SILVA, 2007). Com a independência política do Brasil, os
debates acerca da unidade territorial passaram a ser permeados pela centralização e pela
descentralização do poder, sob o preceito de conceder às províncias a autonomia ou de
deixar o poder concentrado nas mãos de uma elite senhorial e, ainda, sobre como
deveria ser a organização das Forças Armadas do país (SILVA e ANANIAS, 2011).
Com a primeira tentativa de organizar ensino, a Câmara dos Deputados resolveu
aprovar o projeto da escola elementar, que resultou na Lei 15 de outubro de 1827, que
determinava a criação das Escolas de Primeiras Letras (SAVIANI, 2006). Segundo esse
mesmo autor, a escola pública nacional poderia ter decorrido da aprovação dessa Lei,
porém, isso não aconteceu, porque houve uma emenda na Constituição de 1924 que fez
algumas alterações e adições na Constituição Política do Império. Essa única emenda
ficou conhecida como Ato Adicional de 1834, aprovado pela Lei nº 16, de 12 de agosto
de 183431
.
31 O Ato adicional, composto de 32 artigos, estabeleceu algumas modificações significativas,
principalmente no que se referiu ao Capítulo V da Constituição, que definia as atribuições dos
Conselhos Gerais de Província. Ele extinguiu os Conselhos Gerais das províncias e criou, em seu
lugar, as Assembleias Legislativas provinciais com poderes para legislar sobre economia, justiça,
educação, entre outros.
100
Sobre essa discussão, Faria Filho (2000, p.136) faz uma interessante observação,
quando afirma que a escola “[...] teve de inventar, de produzir seu próprio lugar, e o fez,
também, em íntimo diálogo com outras esferas e instituição da vida social”. Os
defensores da escola e de sua importância para o processo de civilização do povo
precisaram dialogar com os discursos políticos, culturais e sociais que permeavam a
vida social do Império. Eles tiveram de, lentamente, criar, remodelar, construir e se
apropriar das dimensões espaço-temporais do ambiente escolar e dos saberes, das
sensibilidades, dos valores e da materialidade do que é próprio da escola (FARIA
FILHO, 2007). E o autor continua:
O estado imperial brasileiro e as províncias do Império, sobretudo, a
partir do Ato Adicional de 1834, foram prodigiosos em estabelecer leis
referentes à instrução pública. No que se refere ao Estado Imperial, à
lei de 1827 sucederam-se várias outras com o intuito de normatizar a
instrução pública no Município da Corte. Tais leis acabavam, no
entanto, por ser, dentro de certos limites, uma referência para as
Províncias. No que concerne a essas últimas, a partir de 1835 e ao
longo de todo o Império, as assembleias províncias e todos os
presidentes das províncias, fizeram publicar um número significativo
de textos legais, levando-nos a acreditar que a normatização legal
constitui-se numa das principais formas de intervenção do Estado no
serviço de instrução (FARIA FILHO, 2000, p. 137).
Com a criação do Ato Adicional em 1834, ficou determinado que as escolas
primárias e secundárias ficariam sob a responsabilidade das províncias, ou seja, não se
tinha mais um projeto de escola pública nacional. Essa discussão sobre a educação e a
instrução das províncias nos remete às considerações da pesquisadora Dolhnikoff
(2003) sobre as determinações do Ato Adicional, no que se refere aos governos das
províncias, divididos em duas instâncias de poder: as assembleias legislativas e a
presidencial. A esse respeito, Silva e Ananias (2011, p. 117) enunciam que
o Ato Adicional de 1834 atendera a essa necessidade, pois, ao mesmo
tempo em que diminuía o poder exercido, representado pelo Coroa,
proibindo o uso do Poder Moderador e suprimindo ao Concelho de
Estado, continuava designando os presidentes das províncias.
Essa citação nos leva a identificar a interferência dos liberais na organização de
uma elite de âmbito provincial, ou seja, devemos relativizar essa autonomia dada às
101
províncias e, talvez, apontar, como faz Dolhnikoff (2003), para a formação da
identidade imperial, quando compreende que ela não pode ser apenas explicada pela
unidade de um projeto nacional que Mattos (1987) chama de federalismo ou de “Tempo
Saquarema”. Esse projeto exercia uma centralização político-administrativa por meio do
governo geral. Para a referida autora sua unidade era formada pelas partes de um todo
em um único governo, ou seja, a atuação dos grupos regionais acabou fazendo parte da
construção do Estado Nacional (DOLHNIKOFF, 2003).
O trecho acima nos leva a pensar nos arranjos e rearranjos presentes nas
articulações dos Governos Imperiais (SILVA, 2011) que, mesmo sendo herdeiro de uma
tradição jurídico-política (MATTOS, 1987), articulada em torno do poder central da
Coroa, foi marcada por arranjos que descentralizavam o poder do governo central.
Segundo Saviani (2006, p.17),
ao longo do Século XIX, o poder público foi normatizando, pela via
legal, os mecanismos de criação, organização e funcionamento de
escolas que, por esse aspecto, adquiriam o caráter de instrução
pública. Mas, de fato, essas escolas continuavam funcionando em
espaços privados, a saber, as próprias casas dos professores.
Essa característica apontada por Saviani (2006) apresenta indícios de como as
escolas primárias da época, de um modo geral, foram se organizando a partir das
indicações da constituição do Império brasileiro, ora pelas determinações de leis, ora
por iniciativas privadas. Não podemos deixar de ressaltar que todas as tentativas de
organizar o ensino primário foram marcadas, sobretudo, por práticas de continuidade e
descontinuidade, que podem ser identificadas (embora os registros dessa época sejam
bem esparsos) nos mais diversificados modelos de educação e instrução dos estados
brasileiros.
Souza (2006), ao discutir sobre as instalações da escola primária graduada,
afirma que a questão da universalização do ensino primário, no final do Século XIX, era
uma discussão que estava posta para muitos países europeus e para os Estados Unidos
da América. A respeito do Brasil, a autora reforça que políticos, intelectuais e
educadores pretendiam modernizar a educação e elevar o país ao patamar dos países
mais desenvolvidos.
Nesse contexto educacional, a importância do ensino nos debates políticos e
102
intelectuais da época foi sobremaneira ressaltada. Tem-se, nesse momento, um debate
que aponta para a necessidade de expandir as instituições de ensino, especialmente as
escolas de primeiras letras, para que outras camadas da população, até então destituídas
do acesso à escola elementar, tivessem o direito de frequentá-la (BITTENCOURT,
2004; 2008). Segundo Saviani (2006), com a criação da Lei do Ventre Livre, foram
instituídos vários estabelecimentos de ensino, tanto pela iniciativa do Estado quanto
pela sociedade civil em geral, ambos com o intuito de ofertar educação a um novo grupo
de alunos: os filhos de escravos, que passaram para a condição de cidadãos brasileiros,
de imigrantes e de índios. Ressaltamos, porém, que não entendemos esse momento
como uma ampliação de acesso pleno à escola, apenas apontamos uma alteração nos
frequentadores da escola primária.
Assim, temos os primeiros vestígios de democratização do Ensino Primário nas
capitais das diferentes províncias e principais vilas que não aparecem dissociadas de um
plano político (SOUZA, 2000; SAVIANI, 2006; VEIGA, 2007). Nas décadas finais do
Império, as discussões acerca da educação começaram a ter notoriedade, como nos
advoga Saviani (2006), quando afirma que, com a implantação dos grupos escolares,
estabeleceu-se a história da escola pública propriamente dita, com base nos ideários do
iluminismo republicano. Entre essas funções atribuídas à escola primária, destacamos a
preocupação com os materiais didáticos, sobretudo com os livros escolares ou
impressos que permeavam os espaços escolares.
Com o intuito de conhecer a história dos materiais didáticos que permearam os
espaços escolares no período estabelecido para esta pesquisa, assinalamos que, devido
às modificações acima relatadas no contexto educacional, o livro, atualmente
denominado de didático, aparece como um dos materiais que passa a exercer
centralidade nos espaços de promoção do ensino, por se configurar como um dos
objetos culturais que fazem parte da formação de um povo (SOUZA e VALDEMARIN,
2005)
Com base nos estudos de Souza (1998b; 2006)32, as “escolas centrais” foram
32
A referida autora, em sua tese de Doutorado, intitulada “Templos de civilização: um estudo sobre a
implantação dos grupos escolares no estado de São Paulo (1890-1910), defendida na Faculdade de
Educação da USP – SP: 1997”, apresenta, com ricos detalhes, o ordenamento legal sobre a instrução
no estado de São Paulo, as leis, os decretos e os regulamentos que determinaram a criação e o
funcionamento das escolas públicas. Chamamos à atenção para a criação do primeiro grupo escolar no
103
criadas no Brasil por via de um artifício legal, pela Lei nº 169, de 7/8/1893, que
determinava que, nas localidades onde houvesse mais de uma escola no raio de
obrigatoriedade escolar, o governo poderia autorizar o funcionamento delas em um só
prédio. Com o Decreto de nº 248, de 26/7/1894, o termo “escolas centrais” foi
substituído no regulamento da instrução pública pelo termo “grupo escolar” 33.
No Brasil, esse modelo de escola se configurou na difusão dos grupos escolares
em vários estados. De acordo com Souza (2011, p. 361),
a escola graduada reuniu, portanto, todos os princípios de
racionalização da organização pedagógica da escola primária em
debate e experimentação no Século XIX – padronização,
uniformização, controle, eficiência e rigidez disciplinar. Entende-se,
dessa maneira, por que esse modelo de escola foi bem sucedido em
todo o Ocidente, tornando-se o ideal de organização da escola pública.
Essa abordagem nos permite compreender os tempos escolares como
componentes de uma cultura escolar e apontar para o fato de que, historicamente, a
organização pedagógica da escola primária vai sendo constituída a partir de interesses e
de finalidades que se adequam a um movimento múltiplo e particular entre a escola e
suas representações (CHARTIER, 1991). Segundo Chartier (1991), os conhecimentos
ou o debate da constituição dos saberes pedagógicos se formam a partir de embates,
disputas metodológicas e conceituais e, sobretudo, das tensões entre o político e as
representações sociais.
Essa discussão nos levar a pensar em algumas colocações de Thompson (1998),
quando afirma que é preciso entender o processo de escolarização associado à história
das tradições e dos costumes. Por isso, esse importante historiador alerta que se devem
compreender as culturas escolares como um pressuposto, como o processo e o resultado
das experiências dos sujeitos e dos sentidos empregados ou compartilhados pelos que
fazem a escola. Há que se ressaltar que a escola não só organiza a cultura a ser
transmitida e a própria organização para fazer tal transmissão, como também produz
uma cultura escolar que é própria da escola e das relações de sua comunidade em cada
tempo histórico (CHERVEL, 1990).
Brasil, em São Paulo, no ano de 1893.
33 Aqui nos referimos à substituição oficialmente por Decreto, o que não implica que já em outras
localidades usassem essa denominação, tampouco, que, com a instituição do Decreto, o termo foi
adotado para o país.
104
A esse respeito, Souza (2008) menciona que a busca por indícios ou pistas sobre
as transformações da cultura escolar e da organização do trabalho escolar têm sido
dentro das investigações históricas, questões fundamentais para entendermos parte do
processo de escolarização. Nessas reflexões sobre a escola e suas diferentes formas de
se organizar, esses estudiosos procuram levar em consideração os diferentes tempos
históricos, as disparidades sociais e culturais, os costumes, as tradições (THOMPSON,
1998) e os traços da cultura escolar e da organização do ensino primário ou secundário.
A instituição escola passou a se organizar estrutural e pedagogicamente, foi
deixando de ser reconhecida a partir da denominação de cadeiras isoladas (PINHEIRO,
2002) e começou a se organizar de forma seriada, com definições de graus de ensino,
classes, disciplinas, prédios e tempo específico a permanecer na referida instituição.
A escola primária graduada, compreendendo a classificação
homogênea dos alunos, várias salas de aulas e vários professores, é
uma invenção recente na história da educação brasileira. Essa
modalidade de escola primária, denominada “grupo escolar”, foi
implantada pela primeira vez no país em 1883, no estado de São
Paulo, e representou uma das mais importantes inovações
educacionais ocorridas no final do Século passado (SOUZA, 2006,
p.35).
Os grupos escolares34
se configuraram em um modelo de organização do ensino
elementar mais racionalizado e padronizado, que se materializaram como símbolo da
escola primária (SAVIANI, 2006) no Brasil. Tratava-se de uma escola primária, que foi
(re) inventada com novas finalidades, outra organização de ensino e outra concepção
educacional, em que o método individual deu lugar ao ensino simultâneo; as cadeiras
isoladas35
foram, lentamente, sendo substituídas pela escola de muitos professores e de
34 As pesquisas sobre os grupos escolares têm se configurado em um número significativo no fazer
historiográfico da educação brasileira. Para citar alguns exemplos de trabalhos desenvolvidos nesse
campo de pesquisa, consultar: Souza (1998), Faria Filho (2000), Pinheiro (2002), entre outros
pesquisadores que se dedicam a estudar a história da educação de alguns estados brasileiros com a
presença dos grupos escolares.
35 Sobre a atuação das cadeiras isoladas, é importante enfatizar que, durante muito tempo, em muitos
estados brasileiros, os grupos escolares funcionaram em conjunto com as cadeiras isoladas. Essa
constatação nos leva a chamar à atenção para a diferença entre as determinações das leis e sua efetiva
prática, ou seja, as legislações, quando são postas em prática, levam um tempo.
105
várias classes; o método tradicional foi substituído pelo intuitivo, e os professores,
sobretudo as professoras, encontraram no Magistério primário uma profissão (SOUZA,
2006).
Em suas considerações acerca dessa discussão, Saviani (2008, p.172) se
preocupou em diferenciar as principais características da estrutura dos grupos escolares
e das cadeiras isoladas:
Cada grupo escolar tinha um diretor e tantos professores quantas
escolas tivessem sido reunidas para compô-lo. Na verdade essas
escolas isoladas, uma vez reunidas, deram origem, no interior dos
grupos escolares, às classes isoladas que por sua vez, correspondiam
às séries anuais. Portanto, as escolas isoladas eram não-seriadas, ao
passo que os grupos escolares eram seriados. Por isso esses grupos
eram também chamados de escolas graduadas, uma vez que o
agrupamento dos alunos se dava de acordo com o grau ou série em
que se situavam, o que implicava uma progressividade da
aprendizagem, isto é, os alunos passavam, gradativamente, da
primeira à segunda série e dessa à terceira até concluir a última série
(o quarto ano no caso da instrução pública paulista) com o que
concluíam o ensino primário.
Esse novo modelo de instituição escolar representava, como expressa Souza
(1998) em seus estudos, verdadeiros “templos de civilização”, que se configuravam
como parte do projeto de modernização do Brasil republicano, e trouxe uma nova
dinâmica de ensino que interferia diretamente no processo de organização de
modernidade dos estados brasileiros (idem, 1998). Segundo Pinheiro (2002, p.147),
[...] as escolas públicas passaram a ser utilizadas como veículo de
propaganda política, também servindo para marcar o poder das
oligarquias, cujos nomes seriam sempre lembrados, uma vez que os
suntuosos prédios escolares, principalmente os dos grupos escolares,
como visto, marcaram a nova feição urbana em pleno processo de
mudança e serviram, por conseguinte, para embelezar a cidade e dar-
lhe um ar de modernidade.
Souza (1998, p. 137) reforça a colocação de Pinheiro (2002), ao considerar o
processo de instituição dos grupos escolares como uma grande inovação para o país,
pois eles foram “[...] criados para reunir em um só prédio de quatro a dez escolas,
compreendidas no raio da obrigatoriedade escolar”.
As escolas públicas, assim como as igrejas, eram construídas estrategicamente
em locais onde residia a elite político-econômica, em geral, que se instalavam perto dos
106
prédios que sediavam os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. As construções
escolares eram pensadas como uma maneira de dar visibilidade à atuação do poder
público.
Nesse processo de implantação dessas instituições escolares, Faria Filho (1998),
ao estudar mais detalhadamente a escola primária de Minas Gerais, identificou os traços
da primeira cultura escolar desse estado e especificou algumas considerações a respeito
da cultura escolar que passaram a imprimir em cada estado brasileiro com pequenas
variações de um estado para outro. Entre os traços dessa cultura escolar, Faria Filho
(1998, p. 146 e 147) menciona:
a) a referência à escola (física e simbolicamente falando), como o
lugar mais apropriado para a formação das novas gerações; isso
implica, não custa dizer, afirmar a legitimidade da intervenção da
instituição escolar na sociedade e, ao mesmo tempo e por isso mesmo,
a sua inserção e autonomia nesse social;
b) o crescente distanciamento da cultura escolar da cultura daquelas
parcelas da população pobre que a ela, cada vez mais, passam a ter
acesso; de uma escola inserida numa cultura e dela fazendo parte, a
escola passa cada vez mais a significar uma instituição que visa não
fundamentalmente a transmitir a cultura às gerações mais novas, mas
a modificar a cultura de toda uma população, sendo as crianças elo de
ligação com as famílias e, ao mesmo tempo, como forma de atuação
sobre as mesmas;
c) não é uma cultura escolar que se articula em torno do
conhecimento, do saber, mas da possibilidade de construção de uma
instituição ordenadora do social e, portanto, produtora de novas
sensibilidades, sentimentos, valores, comportamentos e, também, de
novas formas de perceber, conhecer e transformar o mundo;
d) é uma cultura escolar que dialoga com a cultura urbana, criando
e/ou se apropriando de representações sobre o conjunto do social a
partir do seu lugar específico na cidade. É a cultura de uma escola que
se localiza, literal e simbolicamente, no centro, visando a influenciar
os "poderes constituídos" e, nesse movimento, constituir-se como um
poder de influência sobre os "outros", sobre aqueles que se localizam
na periferia;
e) finalmente, é uma cultura escolar, estruturada pela escrita e que se
utiliza, fundamentalmente, do texto escrito para estruturar as
representações sobre as relações sociais, sobre as sensibilidades e
valores, enfim, sobre a cultura, que constrói e faz circular entre os
habitantes da cidade (e do campo).
107
Nesse momento, temos uma nova cultura escolar que se desenhou em todo o
Brasil. Essas características impõem, necessariamente, o diálogo com as tradições e os
costumes do mundo físico, social e político dos sujeitos. A escola era, naquele
momento, uma instituição em processo de construção, que estava deixando de se
restringir aos ambientes das casas e das igrejas para ocupar as praças e as avenidas dos
espaços urbanos. A escola tornava-se pública, conhecida e reconhecida na cidade e
deixava de ser coisa do mundo do privado (da casa e, portanto, das práticas de uma
educação domestica). As instituições escolares influenciaram a construção do espaço
público por excelência: as cidades.
A moderna organização da escola primária se tornou para o Brasil e para outros
países um modelo cultural em circulação que, guardadas as peculiaridades de cada
localidade, era seguido para as instalações dessas escolas em todo o Brasil. Como um
projeto republicano, a escola primária teve um profundo significado político, social e
cultural, porque a educação popular tornou-se uma das bandeiras de luta dos liberais
republicanos (SOUZA, 2006).
Os grupos escolares foram concebidos e construídos como verdadeiros templos
do saber (SOUZA, 1998) e adotaram todo um conjunto de saberes e de projetos
político-educativos, de modo que, em cada estado brasileiro, a partir de iniciativas
locais, organizava-se para instaurar o ensino primário com base no modelo definitivo da
educação do Século XIX, que circulava no período da Primeira República: o das escolas
seriadas.
Em decorrência da descentralização marcante nesse período, cada
unidade federativa pôde configurar o seu sistema de instrução pública,
enquanto a partir dos anos 30 inicia-se o processo de crescente
centralização da educação nacional com a intervenção do governo
federal (ARAÚJO, 2012, p. 13).
Como podemos notar, eram evidentes os vínculos da escola moderna com a
República. Os republicanos propagavam o discurso de que, com a educação, a nação
chegaria ao progresso e a cultura disseminada na escola propiciaria unidade política e
aplicação de leis comuns. A questão educacional era uma preocupação permanente entre
os intelectuais e os partidos políticos da Primeira República, pois o domínio sobre a
educação era algo estratégico para consolidar um projeto de sociedade (VALLE, 1997).
Na tentativa de espacializar essa discussão, fizemos um mapa em que consta a
108
distribuição da institucionalização da escola graduada em vários estados brasileiros.
Esse mapa foi elaborado com base nos dados apresentados no trabalho organizado por
Araújo, Sousa e Pinto (2012) e nos do trabalho de Pinheiro (2002) sobre a instalação dos
grupos escolares aqui na Paraíba.
109
Figura 09 – Mapa de institucionalização jurídica e instauração dos Grupos Escolares no Brasil
Fonte: Araújo et al (2012); Pinheiro (2002)
Os dados expressos no mapa, como podemos observar, indicam as datas de
institucionalização da escola graduada nos estados. O movimento de instalação desses
110
grupos escolares acontece em quase todo o país, e poucos estados ficam de fora desse
projeto. São 12 grupos escolares criados no Brasil no período da Primeira República. De
um modo geral, a ordem de criação desses grupos é bem próxima uma da outra, pois os
intervalos de instalação de um estado para o outro são datados, geralmente, em períodos
máximos de quatro anos, como o estado de São Paulo para o Rio de Janeiro, por
exemplo.
O mapa acima apresenta um panorama geral de distribuição desse projeto
educacional republicano e nos ajuda a pensar sem como, estrategicamente, a educação
primária pública começou a demarcar seus espaços e a produzir os sentidos dessa nova
cultura escolar, imprimindo suas finalidades sociais, políticas e culturais em cada um
dos estados mencionados.
Nas palavras de Souza (2006, p. 79 e 80),
a implantação dessa nova modalidade de escola teve implicações
profundas na educação pública e na história da educação brasileira.
Introduziu e ajudou a introduzir uma série de modificações e
inovações no ensino primário, auxiliou na produção de uma nova
cultura escolar, repercutiu na cultura da sociedade mais ampla e
encarnou vários sentidos simbólicos da educação no meio urbano,
entre eles a consagração da República.
Souza (2006, p. 51) continua afirmando que, mesmo sendo de interesse do poder
público,
eram precárias as condições do ensino público na província de São
Paulo e em todo o Império durante o Século XIX. Havia poucas
escolas providas, funcionando em salas impróprias, com mobiliário e
materiais didáticos insuficientes; a maior parte dos professores era
formada por leigos que recebiam parcos salários. O desinteresse do
Poder Público pela educação elementar era desolador, o que explica o
florescimento das escolas particulares em todos os níveis de ensino.
Essa citação pode indicar ou dar pistas do motivo pelo qual, nesse
período, as escolas particulares confessionais e leigas que foram instaladas na segunda
metade do Século XIX terem crescido, já que os republicanos que atuavam no campo
educacional influenciaram, direta ou indiretamente, a procura de outras estratégias para
difundir as ideias de renovação do ensino como agentes do processo de construção da
política educacional desse novo regime político.
111
Essa nova configuração pedagógica de que nos fala Souza (2011) aconteceu
quando foram implantados a escola graduada e o ensino simultâneo e foi um desafio e
uma necessidade de difundir a escolarização do povo. A esse respeito, essa mesma
autora, em outro trabalho sobre as escolas graduadas, afirma que a criação dos grupos
escolares foi um modelo de modernização que circulou em vários países e imprimiu
uma nova cultura escolar lenta e gradual, marcada por diferentes momentos (SOUSA,
2011).
Feita essa discussão acerca da institucionalização da escola primária no Brasil,
agora nos deteremos à organização pedagógica, com foco no debate sobre os métodos
de ensino prescritos para o ensino primário da época. Esse debate tem como objetivo
nos ajudar a compreender nosso objeto de pesquisa e sua relação com os métodos de
ensino.
3.2. A organização pedagógica da escola primária no Brasil: uma discussão sobre
os sentidos e os métodos
Os anos de 1880 a 1930 guardam peculiaridades que nos ajudam a conhecer a
educação e a organização pedagógica da escola primária e a revelar uma dada
configuração da cultura escolar. Nesses anos, o Brasil e o mundo passavam por grandes
transformações, sobretudo no que diz respeito às questões relativas a mudança de século
e dos regimes governamentais (BARRA, 2001). De Império à República, de um regime
imperial aos tempos republicanos, de um debate precário sobre a organização da escola
a um novo século que trazia consigo ideias renovadoras para educação.
Ao discutir sobre a escola primária na Primeira República, Sousa (2012) traz
alguns apontamentos interessantes sobre as escolas públicas paulistas que podem nos
ajudar a pensar sobre o Ensino Primário em todo o Brasil. A autora faz referência ao
ciclo de reformas da instrução pública naquele estado e identifica, ao todo, quatro
reformas nos estatutos legais: “[...] em 1892 (Lei nº 88, de 8 de setembro), em 1920 (Lei
nº 1.750, de 8 de dezembro), em 1925 (Lei nº 2.095, de 24 de dezembro) e em 1927 (Lei
nº 2.269, de 31 de dezembro)” (SOUZA, 2012, p.29).
Em termos gerais, essas reformas visavam ampliar os programas de ensino,
modernizar e disseminar o Ensino Primário nos moldes do ideal de formação do cidadão
112
republicano. A primeira delas foi a reforma de 1892, que pode ser mais bem explicada a
partir de um conjunto de legislações, em forma de um pequeno ciclo de reformas, como
bem assinala Souza (2012, p. 29 e 30):
[...] iniciou em 1890 com a reorganização da Escola Normal da
Capital ampliando os programas e redefinindo o papel dos professores
e com a criação da Escola – Modelo destinada à prática de ensino dos
alunos mestres da Escola Normal fundamental nos modernos
processos pedagógicos. Na sequência, a lei da reforma da instrução
pública de 1892 e a legislação complementar que lhe seguiram
estruturam o ensino primário, criaram os grupos escolares – modelo
de escola considerando o mais avançado na época-, e adotaram o
método de ensino intuitivo, ícone da pedagogia moderna. No âmbito
do ensino secundário, foi prevista a criação de três ginásios públicos
para a formação científica e literária dos jovens e no âmbito do ensino
superior foi criada a Escola Politécnica.
Assim como em São Paulo, no Brasil, o ensino primário destaca-se também pela
criação dos grupos escolares (SOUZA, 1998; PINHEIRO, 2002) e pela adoção do
método intuitivo, que expressava a busca por renovar os métodos. Essas duas questões
nos interessam mais de perto, pois são centrais em nosso trabalho e permearão toda a
nossa discussão.
Em linhas gerais, podemos afirmar que os anos iniciais do Século XX foram
marcantes, do ponto de vista da organização do ensino primário, do normal e do
secundário no Brasil36
. Convém relembrar que as datas que estabelecemos como recorte
temporal são marcos que se efetivam em decorrência de processos desencadeados tanto
em período anterior quanto posterior à demarcação. É importante atentar para a
centralidade de São Paulo como referência de modernização educacional no Brasil,
conforme mostrado por Souza (2012).
Sobre a segunda reforma, conhecida como Reforma Sampaio Dória, que ocorreu
já no Século XX, especificamente em 1920, destacamos a autonomia didática concedida
aos professores primários, mas chamamos à atenção para a manutenção da prescrição do
36
Conforme ficou conhecido pela historiografia, esse período marca um tempo de mudanças, ou seja, de
grande efervescência, tanto no campo da política quanto no econômico, no social e no educacional.
Ressaltamos o campo político e o econômico, por serem muito visíveis as preocupações, a partir do então
presidente da República Getúlio Vargas, em tornar o Brasil um país industrial e desenvolvido. Para tanto,
o projeto de formar as crianças desde os primeiros anos de escolarização era uma das metas desse novo
modelo social e econômico do projeto de Nação que Vargas tinha para o Brasil. Ele se interessava pela
modernização da sociedade, por isso, a opção pela centralidade da educação, que implantaria um novo
ideal de controle sobre a sociedade.
113
método intuitivo, pois ficou determinado que,
nas escolas primárias, o método natural do ensino é a intuição, a lição
de coisas, contacto da inteligência com as realidades que se ensinam,
mediante a observação e a experimentação, feitas pelos alunos e
orientadas pelo professor. São expressamente banidas da escola as
tarefas de mera decoração, os processos que apelem exclusivamente
para a memória verbal, a substituição das coisas e fatos pelos livros,
que se devem apenas usar como auxiliar do ensino (art. 103, Decreto
n. 3. 356, de 31 de maio de 1921).
De acordo com Souza (2012), em linhas gerais, podemos afirmar que essa
mesma prescrição é reafirmada nas reformas posteriores (1925 e 1927) que acentuam o
método intuitivo como o marco da renovação pedagógica que prevaleceu durante toda a
Primeira República. Essa reforma nos interessa, também, por apontar as crises desse
modelo escolar paulista, que discutia sobre o analfabetismo como uma questão nacional,
pois, como esse era um dos maiores entraves do progresso do país, a meta era de
erradicar o analfabetismo infantil e universalizar o ensino primário. Essa discussão traz
questões pontuais sobre o ensino primário nos anos iniciais do Século XX. Em suas
pesquisas, Souza (2012, p. 32) considera como medida mais polêmica dessa reforma
[...] a implantação da escola alfabetizante de dois anos. O ensino
primário gratuito ficou reduzido às primeiras e segundas séries do
curso elementar, ministrado em escolas isoladas, reunidas e grupos
escolares. A obrigatoriedade escolar foi alterada abrangendo apenas
crianças de 9 a 10 anos. Os 3º e 4º anos do curso primário foram
transformados em ensino médio, podendo ser ministrado nas escolas
isoladas, reunidas e grupos escolares submetidos à taxação, exceto
para alunos reconhecidamente pobres.
Essa reforma foi muito criticada por diversos grupos sociais e educacionais, e
isso resultou, cinco anos depois (1925), em uma nova reforma, cujo propósito principal
era de reorganizar o modelo escolar paulista a partir das definições estabelecidas no
início da República. Entre as medidas tomadas pelo governo de Carlos de Campos,
estava a prioridade em substituir a escola alfabetizante pela educação integral e o ideal
da educação urbana desenvolvida especialmente nos grupos escolares.
Ainda nos anos 20, a Reforma de 1927, do governo de Júlio Prestes de
Albuquerque, trouxe duas modificações na estrutura da instrução pública paulista: a
alteração nos anos de duração do curso primário nas escolas rurais para dois anos e as
modificações no curso das escolas normais, que passavam a ser de três anos de duração
114
e tinham permissão para se equiparar com as escolas normais livres municipais e
particulares. Assim, pela primeira vez, era retirado o monopólio de São Paulo na
formação de professores.
Em outros termos, são possíveis relações e tensões entre o velho e o novo,
centradas nas perspectivas de mudanças e do moderno, que parecem transformar e
apagar o velho. São projeções próprias dos modos de ser e de se tornar escola,
modificando o espaço “[...] conferindo-lhe novos sentidos ao mesmo tempo em que se
delineiam os contornos de um modo de organização da escola” (BARRA, 2001, p.15),
que também se firmam nos traços silenciosos das permanências. Nas palavras de
Valdemarin (2010, p. 27 e 28),
novo é o lugar teórico produzido por um agente externo que deve ser
reconhecido pelo usuário tanto nos elementos familiares conservados
quanto nas inovações introduzidas. É, portanto, a partir de práticas
conhecidas que o novo adquire significado, como uma melhoria, um
avanço e um aperfeiçoamento, tendo em vista novos objetivos.
O trecho citado denota que o movimento de modernização educacional está
associado, no Brasil, ao período da Primeira República, quando a organização do campo
educacional tinha como referencial principal o “como educar”, baseado em “como
ensinar”, e no como devem ser “os procedimentos de ensinar”. Um exemplo disso foi a
publicação do Parecer da Reforma do Ensino Primário, em 1883, organizado pela
Commissão de Instrucção Pública, por Ruy Barbosa, Thomas do Bonfim Espínola e
Ulysses Machado Pereira Vianna. O relator desse projeto foi o deputado Rui Barbosa.
Esse, talvez, tenha sido um dos motivos de esse documento ter ficado conhecido entre
nós como os Pareceres de Ruy Barbosa37
.
37 Outro motivo de se atribuir a autoria do documento a Rui Barbosa foi sua forte atuação como
reformador do ensino e da sociedade, com propostas e projetos que visam promover o progresso do
homem e do país. Influenciado pelas ideias correntes no Século XIX, que atribuíam fundamental
importância à educação dentro da sociedade, ele preconizou a reforma social pela reforma da
educação. A educação era entendida por Rui Barbosa como uma necessidade social da qual o Brasil
não poderia se poupar. Porém ela não poderia ser dissociada de outras reformas sociais e políticas. A
reforma de ensino proposta por Rui Barbosa procurava preparar o homem para a vida, para o exercício
da cidadania e para o trabalho, seja na indústria ou no campo. Essa preparação requeria o
estabelecimento de um ensino diferente do que era ministrado até então, marcado, sobretudo, pela
retórica e pela memorização. Era preciso privilegiar novos conteúdos, como ginástica, desenho,
música, canto e, principalmente, o ensino de Ciências. Por acreditar que fora um equívoco da Reforma
Leôncio de Carvalho colocar as “Lições de coisas” como disciplina, Rui Barbosa defendia que o
método intuitivo atravessava todos os programas de ensino, por isso não poderia ser reduzido a uma
disciplina. Assim, com o propósito de discutir sobre essa questão, em 1886, Rui Barbosa traduziu a
115
Tais Pareceres sobre a Reforma do Ensino Primário38
, do Secundário e do
Superior39
originaram-se da análise do Decreto nº 7.247, de 19 de abril de 1879, da
Reforma Leôncio de Carvalho. Nos pareceres, seus autores destacaram a
responsabilidade do Estado com a Instrução Pública e apontaram que ele deveria
investir mais na educação. Para isso, seria preciso dispender de mais verbas para a
reforma do ensino. A instrução pública reconhecia, naquele momento histórico, as
vantagens de um Estado esclarecido e reforçava o fato de que todos os outros países
alargavam os orçamentos para as reformas de ensino. Para Souza (2000), as estratégias
dos propositores da reforma partiam de contundente desqualificação das escolas e das
práticas vigentes para a afirmação do novo.
De modo geral, embora não tenham sido aprovados na Câmara dos Deputados,
esses Pareceres foram elaborados e fundamentados com a pretensão de um projeto de lei
para o parlamento brasileiro. Esses documentos ficaram conhecidos, na época, como
projetos que podiam contribuir com o país, em termos de educação, e foram
apresentados por Leôncio de Carvalho para serem discutidos em sessão pública no
referido parlamento.
De acordo com Saviani (2008), o referido projeto nem chegou a ser discutido no
parlamento, porém sua leitura foi bastante significativa para pensarmos na educação
daquele tempo. Ruy Barbosa, como relator da Comissão de Instrução Pública, apresenta
dados no campo educacional que são
[...] significativos da situação do ensino primário. Eles apontam que
naquele ano o município da Corte possuía 96 escolas públicas
obra de Norman Allison Calkins, “Lições de coisas”, escrita em 1861. No entanto, ao falar da atuação
de Rui Barbosa como tradutor dessa obra e relator da Comissão de Instrução Pública da Câmara, não
podemos deixar de destacar algumas críticas sobre seus posicionamentos políticos e interesses
pessoais, como adverte Faria Filho (1999a). De acordo com esse autor (1999), Rui Barbosa não citou
Calkins em sua tradução por uma questão política, pois ele procurou não associar o livro de Calkins
ao texto da Reforma, porque queria que sua tradução fosse aceita para publicação, uma vez que Rui
passava por uma série de dificuldades financeiras. Portanto, observa-se aí uma tradução como um
negócio.
38 Ver documento: BARBOSA, Rui; ESPINOLA, Thomaz do Bomfim; VIANA; Ulisses Machado.
Reforma do Ensino Primário e várias instituições complementares da Instrução Pública: parecer e
projecto da Commissão de Instrucção Publica em 1882 - Sessão de 12 de setembro de 1882. Rui
Barbosa (relator). Typographia Nacional. Rio de Janeiro, 1883.
39 Ver documento: BARBOSA, Ruy; ESPINOLA, Thomaz do Bomfim; VIANA; Ulisses Machado.
Reforma do Ensino Secundário e Superior- Sessão de 13 de abril de 1882, apresentado no decênio de
1870 a 1880. Rui Barbosa (relator). Typographia Nacional. Rio de Janeiro, 1882.
116
primárias; dessas, 54 eram destinadas ao sexo masculino e 42 ao
“segundo sexo”. O número de matriculados do sexo masculino nas
escolas públicas era de 3.042, e nas escolas particulares de 2.592; para
o sexo feminino, era de 3.087 matrículas nas escolas públicas e 2.939
nas particulares. O número total de matriculados nas escolas públicas
era de 6.129 e, nas particulares, de 5.531, perfazendo um total de
11.660, para uma população de 312.554 pessoas livres (Barbosa, 1947,
p. 18-24). O que Rui Barbosa tenta mostrar é que nesse item, a
educação, [no município neutro] está atrasada em relação à média do
país, reforçando a necessidade de uma reforma educacional
(BONATO, 2011, p.02).
Tal parecer apresenta a realidade educacional de diversos países e o quanto de
dinheiro estava sendo investindo em educação, universidades e laboratórios. Para
sensibilizar a Câmara dos Deputados para aprová-lo, os autores se esforçaram para
apresentar, nos documentos, dados que reforçavam a ideia de que o Brasil ainda investia
muito pouco em educação e como ela poderia ser capaz de contribuir para “transformar
a sociedade” (SOUZA, 2000).
Segundo os referidos documentos, o princípio que regia a organização do
sistema de ensino em geral consistia em introduzir ciência desde o jardim de infância
até o ensino superior. Os Pareceres foram elaborados para servir de subsídio para a
discussão do projeto de Reforma do Ensino Primário e Secundário do Município da
Corte e Superior em todo o Império, em substituição à reforma instituída por Leôncio de
Carvalho de 1879. Esses Pareceres podem ser considerados como um projeto de
reforma global da educação brasileira (PEIXOTO, 1926). Como um verdadeiro tratado,
eles compreenderam praticamente todos os aspectos da educação: filosóficos, políticos,
administrativos, didáticos, psicológicos e metodológicos. Porém, mesmo sendo
reconhecido como tal, não se efetivou como lei para o ensino da época.
Sobre a reforma do ensino primário, Souza (2000) enfatiza que ela deveria
fundar uma nova realidade educacional. A favor de um ensino primário obrigatório, dos
sete aos catorze anos, gratuito e laico, o Parecer do ensino primário anunciava a
substituição da “Escola de Primeiras Letras” pela escola primária moderna, com um
ensino renovado, voltado para o progresso do país.
Outra evidência da relevância desses pareceres é a influência desse projeto na
elaboração dos livros didáticos, que passaram a ser produzidos com o objetivo de
orientar os trabalhos pedagógicos nos primeiros anos de organização da escola. Segundo
117
Valdemarin (2006), esses livros se preocupavam em trazer um conjunto de prescrições
metodológicas para o ensino, porque atendiam aos debates propagados pela concepção
de educação integral difundida em âmbito brasileiro acerca da renovação dos métodos.
Para Souza (2000, p. 14), a referida educação integral
[...] converteu-se no primeiro fundamento pedagógico sistemático para
a seleção dos conteúdos para a escola primária. A definição de uma
nova cultura escolar para o povo encontrou justificações filosóficas e
pedagógicas para amparar um projeto de fundo político e social.
Para se chegar a essa educação integral, era preciso integrar os aspectos físicos,
intelectuais e estéticos em um programa ampliado fundamentado em um método
baseado na intuição, na observação e no concreto – fundamentos do pensar racional e
positivo. Esse método, baseado na intuição, fundava-se na “Lição de coisas”, uma forma
de transformar essa educação em ensino integral.
Sobre essa discussão, Valdemarin (2010, p. 134) esclarece que “[...] a escola
primária deveria ter como objetivos à educação integral e a formação da nacionalidade,
estar integrada ao meio social e às necessidades da infância, segundo os preceitos
escolanovistas”. Essas considerações sobre como deveria ser a base para essa escola
integral nos leva a inferir sobre a relação desses princípios com as finalidades da
disciplina escolar Geografia, pois, naquele momento, tal disciplina cumpria exatamente
essas funções dentro do programa para o ensino da época.
Para Valdemarin (2006, p. 173), os princípios fundamentais das “Lições de
coisas” são: a percepção – imaginação e sensação; a atenção – observação e
comparação; e a classificação – raciocínio e conhecimento. Para essa autora,
as lições de coisas têm por objetivo educar os sentidos para a obtenção
do conhecimento, de modo que passe da intuição dos sentidos para a
intuição intelectual fazendo uso de objetos comuns, conhecidos pelas
crianças que frequentaram a escola, a fim de leva-las a ter deles uma
compreensão formal, lançando mão também de outros objetos criados
especificamente para o ensino, os objetos didáticos.
Segundo a autora, os defensores e divulgadores do método intuitivo no Brasil
argumentavam que seria preciso um espaço da sala de aula onde as diversas classes
pudessem fazer as “Lições de coisas”. Entre seus argumentos, os propagadores desse
118
método reconhecem que os sentidos40 são a porta de abertura para todo o conhecimento
(ACKERMAN, 1992).
Vejamos o que a obra “Lições de coisas” traz acerca dos sentidos: “É pelos
sentidos que nos advém o conhecimento do mundo material. Os primeiros objetos onde
se exercem as nossas faculdades, são as coisas e os phenomenos do mundo exterior”
(BARBOSA, 1886, p.01) 41. Essa obra traz exercícios para a educação dos sentidos e
afirma:
A importância de um apropriado cultivo dos sentidos por meio da
educação no seio da família é superior a todo encarecimento. É
exclusivamente pelos sentidos que a crença tem accesso ao mundo
material. Por essas portas e janelas do seu espirito é que ha-de prover
de todas as noções relativas ao mundo. Mas os sentidos carecem ser
cultivados, mediante exercícios que industriem o espirito em utilizar-
se deles com perspicácia e celebridade (BARBOSA, 1886, p.13) 42
.
Como exemplos, temos os exercícios destinados à educação doméstica dos
sentidos: os exercícios para educar a vista, o ouvido, o gosto, o olfato, o tato e a mão,
que aparecem na obra de forma detalhada, passo a passo, para que a instrução primária
possa inserir a aprendizagem a partir dos sentidos (ACKERMAN, 1992).
Ao contrário da tradição, que valoriza o ensino discursivo, que atua por raciocínio
40 Sobre essa questão, advertimos que essa ideia da discussão dos sentidos como uma forma de
apreender a realidade e abrir-se ao conhecimento não é um debate novo, uma vez que, em Aristóteles,
já se percebia que a realidade é apreendida pelos sentidos.
41 Sobre a tradução da obra “Lições de Coisas”, já há algum tempo, tem sido alvo de críticas e
curiosidade de alguns pesquisadores da História da Educação que tem se ocupado em discutir o papel
da tradução e seus interesses de acordo com cada sujeito ou grupo social. Nesse sentido, temos as
críticas levantadas por Fernando de Azevedo, na obra, “A cultura Brasileira”, quando tratou do final
do Império e disse que, ao transplantar o mais moderno dos métodos de ensino para a realidade
nacional por meio da tradução da obra “Lições de coisas” e dos Pareceres, Rui não se preocupou em
enfatizar que o Brasil não estava apto a receber esse modelo de educação e pelo fato de “As lições de
coisas” terem sido consideradas muito mais uma questão metodológica, que estava separada dos
fundamentos da educação primária. Nesse mesmo sentido, temos o trabalho de Faria Filho (1999a),
que discute sobre a história da tradução pedagógica no Brasil e, mais especificamente, questiona o
papel de Rui Barbosa como tradutor e as adaptações que fez na tentativa de implantar a reforma geral
da instrução brasileira. Entre outros questionamentos, Faria Filho (1999a) refere que precisamos olhar
para a atuação de Rui como um sujeito social que estava inserido num contexto intelectual e,
sobretudo, político. Ou seja, não podemos dissociar essa nova orientação pedagógica proposta por ele
dos seus interesses, da questão política e das estratégias pensadas e desenvolvidas para comercializar a
obra “Lições de coisas”. Nessa perspectiva, dentre outras finalidades e interesses, não podemos deixar
de registrar que temos que reconhecer também que Rui Barbosa foi herdeiro de uma tradição de
grandes nomes de didatas europeus e que teve uma atuação importante nos projetos de educação da
instrução brasileira.
42 A escrita foi mantida de acordo com a ortografia da época.
119
lógico e, portanto, é abstrato, busca-se começar a instrução primária educando a sensibilidade,
pela qual percebemos cores, formas, sons, luz etc. É essa que prepara e antecipa a intuição
intelectual, quando então percebemos as relações (de igualdade, causalidade etc.) entre as
coisas. Ou seja, rejeitando a educação livresca, a criança deveria aprender a ler o mundo visível,
pela observação e percepção das relações entre os fenômenos (ARANHA, 2006, p.232).
Na sala de aula, era preciso, primeiro, falar dos sentidos antes de aplicar
qualquer lição, porque os alunos apreenderiam o mundo por meio dos sentidos. Para
Ackermam (1992), pelos sentidos se definiam os limites da consciência para formar um
padrão significativo. Seriam eles os canais de apreensão da realidade, porque poderiam
oferecer “[...] milhares de informações ao cérebro, como se fossem microscópicas peças
de um quebra-cabeça” (ACKERMAM, 1992, p. 17).
A autora citada compreende os sentidos como a ação mais espontânea da
inteligência humana em direção à verdade na busca por aprender. O ensino por meio
desse método chamado “Lições de coisas” tem como princípio o aprendizado por meio
da observação do real e da experiência. Sobre essa discussão, Hébrard (2000, p. 116)
acrescenta que aprender através dos sentidos das coisas “[...] é aprender a ler no mundo
visível que nos cerca a evidência das relações que ligam, entre si, os objetos e os
fenômenos”.
Buisson (1911) afirma que não podemos tratar das “Lições de coisas” sem
mencionar as três acepções principais: disponibilizar um objeto concreto aos olhos do
aluno, para que ele adquira uma ideia abstrata da realidade; propiciar ao aluno discernir
as qualidades dos objetos por meio dos cinco sentidos (a chamada educação dos
sentidos), conhecer os objetos e os fatos por meio da natureza e apreender as coisas e
seus nomes, o fenômeno e o termo que o designa. Concordando com Buisson (1911),
Valdemarin (2006, p. 173) enuncia que
[...] as lições de coisas ou o método de ensino intuitivo têm os objetos
como suporte didático e os sentidos como os atributos humanos que
possibilitam a produção de ideias – a princípio concretas e que
ascendem à abstração – e que a educação deve focalizar elementos
presentes no dia-a-dia, próximos à criança, para leva-la à compreensão
das coisas comuns, unindo-se, na mesma definição, proposições sobre
o que ensinar e como ensinar.
De acordo com Valdemarin (2006), embora a expressão “Lições de coisas” seja
usada para indicar o método intuitivo, restringia-se a uma das disciplinas do currículo.
Em consulta ao Parecer do ensino primário, podemos constatar a crítica feita a essa ação
120
compartimentalizada das “Lições de coisas” em uma única disciplina, sem abranger
todo o ensino de forma geral. No Parecer, determinou-se que
a lição de coisas não é um assunto especial no plano de estudos: é um
método de estudo; não se circunscreve a uma secção do programa:
abrange o programa inteiro; não ocupa, na classe, um lugar separado,
como a leitura, a geografia, o cálculo, ou as ciências naturais: é o
processo geral, a que se devem subordinar todas as disciplinas
professadas na instrução elementar (BARBOSA, 1947, p.215).
Nessas discussões, a necessidade de uma renovação pedagógica era preciso e,
para isso, era imprescindível implantar um método de ensino que fosse capaz de efetivá-
la. Nesse período, foi organizada uma “Nova Pedagogia” que visava, sobretudo,
modificar o ensino que até então se baseava na memorização das fórmulas gramaticais,
do catecismo e da tabuada (SOUZA, 2008), e do ponto de vista da Geografia, a
predominância de nomenclaturas apoiadas no método analítico ou expositivo.
Tal debate teve força durante o decênio de 1880 – quando aclamava a pretensão
de adotar um método didático que pudesse ser associado ao processo de renovação
pedagógica que acontecia também na Europa e nos Estados Unidos da América. Nas
últimas décadas do Império, esse debate ganhou força, pois se pensava que os efeitos
dessa renovação metodológica na escola poderiam modernizar nossa sociedade e
estimular as transformações sociais, culturais, econômicas, políticas e educacionais tão
almejadas naquele momento histórico.
Para Valdemarin (2006, p. 90), as prescrições metodológicas para o ensino se
dividiam em lições, exercícios e atividades indicadas pela obra “Lições de coisas”,
configurando-se como um marco significativo da tentativa de se implantar no ensino
brasileiro o método intuitivo.
O discurso político e educacional produzido nessa época estabelece
estreitos vínculos entre as propostas de inovação metodológica e a
difusão do ideário liberal republicano, destacando-se a utilização das
lições de coisas ou método intuitivo como estratégia de intervenção na
sala de aula, lócus específico da instrução e da mudança das práticas
pedagógicas, adequando a escola ao projeto político modernizador.
Como se sabe, no projeto modernizador republicano, a escola foi se moldando,
revestindo-se de um novo discurso, que visava se projetar a partir da crítica do discurso
sobre que se tinha de velho em relação à organização do ensino, às práticas
121
pedagógicas, aos métodos e aos materiais de ensino, que se renovavam (pelo menos nos
debates), em especial, com propostas de inovar as metodologias. Embora essa discussão
acerca dos métodos de ensino tenha sido secundarizada, em decorrência dos vários
problemas de organização pedagógica considerados mais urgentes, está diretamente
associada ao projeto mais amplo de um modelo de organização da escola primária.
Como bem expressa Souza (2011, p.358 e 359),
No final do Século XIX, começaram a circular no Brasil novas ideias
de renovação da instrução primária. O método de ensino intuitivo foi
um dos marcos dessa renovação pedagógica estreitamente vinculado à
noção de desenvolvimento econômico e social.
A concepção de escola primária moderna era um discurso que circulava entre os
defensores dos princípios dessas inovações. Era necessário introduzir novos princípios
que considerassem a natureza do desenvolvimento infantil no processo de ensinar e de
aprender, a importância da observação e dos sentidos e como usar os objetos para
adquirir conhecimentos (SOUZA, 2011). Segundo essa mesma autora, foram as escolas
graduadas que mais bem catalisaram esse projeto de inovações quanto à organização
pedagógica da escola, portanto, um dos símbolos da modernização educacional.
A escola graduada43
é um modelo de organização da escola primária que surgiu
na Europa em meados do Século XIX (SOUZA, 2011). Segundo Frago (2003), a
graduação se apresenta nas várias salas de aula, cada uma com seu professor, um diretor,
séries e classes, o mais homogênea possível, e a organização do currículo graduada por
cursos. Esse mesmo autor acrescenta que devemos observar os aspectos pedagógicos e
arquitetônicos, porquanto são importantes para diferenciar a escola graduada da escola
singular e a organização pedagógica que ela propõe. Frago (2003, p. 77) explica da
seguinte maneira essa questão:
O primeiro {aspecto pedagógico} implicava a classificação dos alunos
em grupos o mais homogêneo possível a fim de facilitar o ensino
simultâneo, a fragmentação do currículo em graus e a especialização
ou divisão do trabalho dos professores. O segundo {aspectos
arquitetônicos} era a construção dos edifícios ad hoc com várias salas
43 Frago (2003), preocupado com algumas confusões frequentes no uso dos termos ‘graduação escolar’ e
‘escola graduada’, esclarece a diferença entres eles: graduação escolar é a segmentação da educação em
níveis primário, secundário e superior. Já escola graduada é um modelo de organização da escola primária
– símbolos da modernização educacional (exemplos: os grupos escolares aqui no Brasil).
122
de aulas e a atribuição a cada professor de uma sala de aula
independente sob supervisão de um diretor.
Pode-se dizer que a escola graduada permitiu que variados elementos da
organização pedagógica, que estavam em período de experimentação no Século XIX,
chegassem a um estágio racional. Segundo Souza (2011, p. 360),
a gramática espacial permitiu a distribuição dos alunos em classes e a
correspondência entre nível de adiantamento e espaço – cada classe
passa a ocupar uma sala de aula. Outro desdobramento importante foi
a divisão do trabalho docente – cada professor tornou-se responsável
por uma classe, isto é, por um grupo supostamente homogêneo de
alunos classificados por nível de adiantamento. Por sua vez, a
segmentação dos programas acompanhou a determinação temporal
regulariza – uniformizou-se a duração de séries ou seções
(inicialmente seis meses e posteriormente um ano) tempo no qual o
agrupamento de alunos deveria apreender as matérias designadas para
a classe e completar o nível apropriado de instrução determinado para
aquela série.
No Brasil, essa padronização e a divisão da organização pedagógica da escola
primária foram marcadas, sobretudo, pela ideia de que o progresso necessário para o
desenvolvimento da nação estava nos investimentos no ensino popular. Por isso, nesse
momento, identificamos a presença de ideias liberais, de modelos de modernização de
outros países reconhecidos como civilizados, que traçam separações quanto às
finalidades do ensino e a grande distinção entre educação para o povo e educação para
elites (SOUZA, 2008).
Nesse sentido, tínhamos as seguintes atribuições:
A escola primária, destinada à maioria da população, deveria difundir
os saberes elementares e os rudimentos das ciências físicas, naturais e
sócias, enquanto a escola secundária, atendendo as elites dirigentes e a
classe média em ascensão permaneceria como a guardiã da cultura
geral de carácter humanista. Dessa maneira, a formação do cidadão
republicano ancorou-se de um lado, nas possibilidades de integração
social pelo cultivo da formação cívico-patriótica, pela afirmação da
nação como projeto político e pela difusão de elementos das ciências,
das técnicas, das letras e das artes; de outro lado, na constituição de
culturas escolares distintas configuradas em diversos tipos de
estabelecimentos de ensino e em modos diferenciados de distribuição
e apropriação do conhecimento e de produção de disposições, de
percepções de mundo e de pessoas (SOUZA, 2008, p.19).
Essas colocações de Souza (2008) denotam que as primeiras décadas
123
republicanas foram um momento de redefinição dos conteúdos e das matérias escolares,
devido aos novos objetivos e às atribuições da educação popular. A vida social se
organizava, a cultura da vida moderna se espalhava, e uma das preocupações era a
necessidade de haver uma profunda transformação nos saberes úteis à educação do
povo. Os intelectuais e renovadores da educação, na tentativa de construir dispositivos
curriculares cada vez mais sistematizados, tentavam ordenar o tempo e as práticas
escolares da escola primária e definir o que e como ensinar ao povo, e os professores,
como sujeitos que mais participavam diretamente desse processo, tiveram que ampliar
seus conhecimentos para ensinar aos alunos.
No Brasil, no final do Século XIX, a partir de uma tendência internacional, esse
movimento chegou entre nós e promoveu modificações na escolarização elementar. Em
outros termos, podemos afirmar que a ampliação e a modernização dos programas
acompanharam a renovação didático-pedagógica, com destaque para a introdução da
Geografia no currículo primário.
Por toda parte, a língua materna, a matemática, as ciências, a história,
a geografia, a educação física, instrução moral e cívica, o desenho e os
trabalhos manuais foram considerados conteúdos válidos para a
instrução popular, adquirindo em cada país conotações peculiares
moldados pela realidade nacional. Esse enorme enriquecimento da
cultura escolar para o povo acarretou inúmeras implicações no que diz
respeito ao funcionamento das escolas e ao campo pedagógico. [...]
Formulações doutrinárias e prescrições metodológicas foram
constituindo uma rede de saberes sobre cada uma das matérias e uma
pedagogia normativa alimentou os cursos de formação de professores,
inspirou a produção de textos e fomentou um mercado editorial de
livros e periódicos educacionais especializados (SOUZA, 2008, p. 20
e 21).
Essas colocações reforçam as inquirições feitas por Bittencourt (2008) sobre a
comercialização do livro didático, que fez das décadas finais do Século XIX um período
em que a produção do livro didático aumentou e se reconheceu que esse produto
cultural é uma fonte de lucro para ampliar a escolarização de crianças e jovens das
classes populares. Assim, houve uma ligação entre os propósitos de uma educação de
um período, a divulgação de um novo padrão cultural e o desenvolvimento da indústria
do livro.
Sobre esse fato, Bittencourt (2008) afirma que, na década de 1880,
predominavam nas escolas brasileiras livros didáticos nacionais, ainda que,
124
prioritariamente, fossem impressos no exterior. Segundo essa pesquisadora, a produção
didática não estava dissociada dos ideais e dos objetivos dos liberais (BITTENCOURT,
2008). Nessa discussão, é preciso registrar que, segundo Hébrad (1990), até o Século
XVIII, predominava, nas escolas elementares, o ensino de leitura, baseado na
reprodução e na memorização das verdades religiosas. Segundo esse autor, como uma
quebra nessa estrutura curricular, temos a mudança cultural, que ocorreu no final do
Século XVIII, quando Jean Baptista de La Salle articulou para as escolas cristãs as
bases da catequese (recitação dos catecismos) com os saberes da língua vernácula
somado ao ensino das quatro operações (HÉBRAD, 1990). Assim, entendemos que a
organização da escola graduada deve ser compreendida nesse longo processo de
transformação da escola primária, marcado por inúmeros fatores de ordem pedagógica,
religiosa, cultural, estrutural e econômica, com destaque para o esforço dos professores
na dura tarefa de melhorar as condições do modo de ensinar.
Os pesquisadores que estudam a organização pedagógica têm sido categóricos
em afirmar que o Século XIX se configurou como um cenário de experimentação e
construção da escola graduada, fundada em uma política de educação popular produzida
no Brasil com base na crença no poder da escola. Para eles, essa é uma instituição capaz
de moralizar, civilizar e instruir o povo (GONDRA e SCHUELER, 2008). Esse
apontamento nos permite fazer alusão ao que Goodson (1990; 2010) fala sobre as
determinantes sociais e políticas que podem orientar a seleção cultural do processo de
construção do currículo.
Dando continuidade a esse debate, a seguir, discutiremos sobre a construção do
currículo da escola primária no Brasil, fazendo inferências a como esse debate sobre a
renovação dos métodos é marcado por uma cultura escolar que se redesenhou a partir do
método intuitivo.
125
3.2.1 A construção do currículo da escola primária no Brasil por meio das “Lições de
coisas” como um método de ensino
A discussão sobre a escolarização popular no período tratado por nós tem
suscitado questionamentos que podem contribuir para o debate sobre a organização
administrativa e didático-pedagógica do ensino primário. Como vimos, no Brasil, o
processo de renovação dos métodos começou a partir de 1880 e definiu como deveria
ser o processo de modernização educacional no país a partir das influências do contexto
internacional. Assim, temos um currículo44
da escola primária marcado expressamente
pela orientação das “Lições de coisas” (SOUZA, 2000).
Foi nesse contexto em que os mais variados temas sobre a organização da escola
tornaram-se objetos de reflexão e discussão político-administrativa e pedagógica. Entre
eles, o a democratização da cultura, a função política da escola, as finalidades dos
conteúdos e os meios de universalização da escola primária. Segundo Souza (2000), os
conteúdos e os métodos de ensino se destacam nos debates sobre a questão política da
educação popular, pois uma boa organização pedagógica da escola primária implicaria,
entre outras questões, “[...] um projeto político social civilizador, direcionado para a
construção da nação, a modernização do país e a moralização do povo” (SOUZA, 2000,
p. 9).
Sobre as reformas feitas na tentativa de definir um currículo para a escola
primária, em linhas gerais, nos anos iniciais da República, foi estabelecido o plano das
finalidades da escola a partir das indicações da Reforma Leôncio de Carvalho (1867-
1886), que, entre outras determinações, deu continuidade às implicações postas pela
Reforma Couto Ferraz (1854-1867)45
, de se manter a obrigatoriedade do ensino
primário para as crianças com idade “[...] dos 7 aos 14 anos (artigos 2º), a assistência do
Estado para os alunos pobres (idem), a organização da escola primária em dois graus
44 É importante mencionar que não tínhamos um currículo único para todo o Brasil, cada Província se
organizava para ofertar o ensino primário. Essa organização pedagógica procurava atender a um
projeto político-social mais amplo e pautado em interesses nacionais.
45 Sobre a Reforma Couto Ferraz, entre outras importantes providências, criou a Inspetoria Geral da
Instrução Primária e Secundária do Município da Corte, órgão que estava ligado ao Ministério do
Império e era destinado a fiscalizar e orientar o ensino público e particular dos níveis primário e
médio na cidade do Rio de Janeiro. Assim, o ensino foi dividido em dois níveis – o elementar e o
superior – a instrução primária gratuita, constitucionalmente prometida a todos.
126
com um currículo semelhante, levemente enriquecido (artigo 4º), e o serviço de
inspeção (artigo 13)”(SAVIANI, 2006, p. 26).
A reforma de Leôncio de Carvalho, embora radical, esteve em vigor
por pouco tempo, mas a discussão sobre a interferência ou não do
Estado continuou acesa. Por exemplo, Rui Barbosa atribuía ao Estado
a obrigação de tomar para si os cuidados com a educação, porque,
entre outras coisas, as escolas particulares se orientavam pelas leis do
mercado. Essas discussões repercutiram de maneira mais efetiva nos
primeiros anos da República (ARANHA, 1996, p.22).
Dentre as determinações determinadas pela Reforma Leôncio de Carvalho
(1867-1886), destacam-se o Decreto nº 7.247, de 19 de abril de 1879 que, de modo
geral, tinha como objetivo reformar o Ensino Primário e o Secundário do Município da
Corte e o Superior em todo o Império. Tal Decreto demarcava, dentre outras questões, o
crescimento do interesse pela instrução pública. Concordando com Faria Filho (1999),
essa questão nos remete à legislação da época, isto é, nos permite ler os Pareceres da
Reforma do Ensino Primário de 1883 como uma forma de imprimir uma prática
ordenadora das relações sociais.
De acordo com esse Decreto, para o ensino primário, foi determinado, ainda, que
a instrução religiosa seria facultativa. Quanto à coeducação, os meninos poderiam ser
matriculados nas escolas femininas. Em todas as escolas de Primeiro Grau do sexo
masculino, haveria cursos noturnos. Além disso, previu um sistema de preparação do
professor primário e definiu normas para o exercício da liberdade de ensinar. Assim,
ficou previsto que, com a duração de dois anos, as escolas do segundo grau dariam
continuidade às disciplinas do primeiro grau e introduziriam, além de outros conteúdos,
noções gerais dos deveres do homem e do cidadão, de lavoura e de horticultura, para a
economia doméstica das meninas, e a prática manual de ofícios, para os meninos.
Quanto aos métodos de ensino, de acordo com o Decreto de 1879, ficou
determinado que as Escolas Normais teriam como prática o ensino intuitivo ou as
chamadas “Lições de coisas”, que também passariam a ser uma prática no ensino
primário de forma geral. Com a adoção do método intuitivo, era preciso reorganizar o
programa da escola primária. De acordo com as ideias predominantes naquele momento
histórico, a ampliação do programa escolar teria como princípio a educação integral:
educação física, intelectual e moral.
127
Essa reorganização da escola primária passava, diretamente, pelos interesses
postos no Parecer do Ensino Primário, que, naquele momento, mesmo sem ter se
tornado lei, influenciou a educação primária da época. No documento supracitado, as
falas iniciais dos organizadores deixam claras as concepções e as propostas de pretensão
de intervenção na estrutura social e na organização de um debate de produção de
práticas socais. A figura seguinte retrata, em linhas gerais, a finalidade do Parecer em
sua página introdutória:
128
Figura 10 – As finalidades do Parecer do Ensino Primário
Fonte: Parecer do Ensino Primário elaborado pela Comissão de Instrução Pública em 1882, composta de
129
Ruy Barbosa, Thomaz do Bomfim e Viana Ulisses Machado, no ano de 1883.
Como podemos observar, as determinações do Parecer foram expressas como
uma forma discursiva de intervir socialmente na produção de práticas e concepções de
escola. Além disso, verificamos que as recomendações propostas para a década de 1880
eram bem evidentes quanto às indicações das leituras individuais e também havia as
recomendações para que fossem substituídas pelo método “Lições de coisas” ou método
intuitivo.
O currículo da escola primária foi se configurando, durante o Século XIX, como
um trabalho de adaptação das ciências naturais e sociais ao nível de habilidades das
crianças. De forma geral, as indicações metodológicas eram as “Lições de coisas”,
porquanto traziam noções elementares para o desenvolvimento das atividades que,
quase sempre, eram trabalhadas por meio de exercícios, desenvolvidos no âmbito da
sala de aula ou nas aulas extraescolares. Sobre a organização do currículo da escola
primária, Valdemarin (2010, p. 143) enfatiza:
O estudo da língua materna é o principal objeto de conhecimento da
escola primária. A criança deve aprender a expressar-se com correção
gramatical e exatidão das palavras auxiliada pela leitura de livros
recomendados. O ensino da gramática não deve centrar-se nas regras
mas no uso correto da linguagem falada e escrita, mesma orientação a
ser considerada no ensino do cálculo. Numa escala de importância,
após a linguagem e o cálculo vem a geografia, não como ciência
particular mas como descrição do mundo, que tem início pela
observação direta da escola e seus arredores, progredindo para as
atividades humanas e não somente para o relevo.
Na citação acima, a Geografia é indicada como a terceira disciplina mais
importante para o currículo do ensino primário. Esse fato pode ser atribuído ao papel
exercido por esse conhecimento naquele momento, especialmente para atender aos
anseios nacionalistas do período, e por essa disciplina propiciar uma aproximação entre
os preceitos teóricos das “Lições de coisas” e da escola com o ambiente infantil,
especialmente nas lições de cartografia, pois, do “[...] esboço cartográfico da própria
sala de aula, pode derivar para a localização da casa, do município e seus limites, do
estado e suas fronteiras, do país e da América do Sul e assim progressivamente”
130
(VALDEMARIN, 2010, p. 157).
Na figura 11, temos a definição que o referido Parecer apresenta sobre como
deveria ficar organizado o ensino primário a partir de categorias e a finalidade da escola
primária:
Figura 11 - Parecer do Ensino Primário: definição e divisão das categorias da educação primária
Fonte: Parecer do Ensino Primário, elaborado pela Comimisão de Instrução Publica em 1882, composta
por Ruy Barbosa, Thomaz do Bomfim e Viana Ulisses Machado, no ano de 1883.
A figura anterior traz a divisão da educação primária segundo as propostas desse
documento quanto às definições da instrução geral do ensino primário. Vejamos as
definições apontadas pelo mesmo documento sobre a organização do currículo da
131
educação primária, na sessão destinada à “Educação Primária Pública e seu Magistério”
do referido Parecer, expressa nas figuras a seguir:
Figura 12a – Parecer do Ensino Primário: definições e organização do currículo da Educação
Primária Elementar
132
Figura 12b – Parecer do Ensino Primário: definições e organização do currículo da Educação
Primária Elementar
133
Figura 12c – Parecer do Ensino Primário: definições e organização do currículo da educação
primária elementar
Fonte: Parecer do Ensino Primário, elaborado pela Comimisão de Instrução Publica em 1882, composta
por Rui Barbosa, Thomaz do Bomfim e Viana Ulisses Machado, no ano de 1883.
Na figura anterior, temos as determinações estabelecidas no referido documento
134
para a escola primária, que consiste, primeiramente, em promover um ensino com base
nos sentidos que fosse capaz de observar, apreciar, enunciar e executar os conteúdos.
Nessas recomendações sobre como deveria ser conduzido o ensino primário, temos as
indicações sobre os métodos de ensino que deveriam ser adotados, portanto,
determinados no axioma I, de que deveria ser excluído o ensino mecânico. Assim, todo
o processo deveria ser conduzido pela prática do método intuitivo, ou seja, a partir do
estudo das coisas e dos sentidos. A prática pedagógica passaria a ser fortemente
influenciada pelas implicações metodológicas do campo da Psicologia, nos
fundamentos dos estudos de Pestalozzi e Fröebel, que organiza o processo de ensino a
partir de uma série de exercícios úteis para a instrução elementar.
Ainda sobre as indicações dispostas nas figuras, vimos que, com a divisão da
escola elementar em primária, média e superior, também foi definido como a Geografia
deveria ser trabalhada na escola. No final desse tópico, retomaremos essa questão.
Nesse período, o Brasil se organizava tendo como referência ideias e modelos gestados
nos países considerados “civilizados”. As formas de organização escolar passaram,
nesse momento, a ser uma necessidade política e pedagógica, com o propósito de
repensar e organizar os métodos de ensino, a mobília escolar, o tempo escolar, os livros
e os manuais didáticos, a arquitetura, a ampliação dos programas de ensino visando
incluir novas disciplinas, matérias escolares, entre outros.
O propósito do Ensino Primário era de “[...] fundar uma nova realidade
educacional no país substituindo a inócua escola de primeiras letras, voltada para o
passado, pela escola primária moderna, com um ensino renovado e um programa
enciclopédico, direcionado para o progresso do país” (SOUZA, 2000, p.12).
Observemos o que diz o Parecer exatamente sobre a reforma do ensino no qual
aponta as “Lições de coisas” como um novo método que abrangerá todo o ensino.
135
Figura 13 – A indicação das “Lições de coisas” como um método de ensino necessário a todas as
disciplinas
Fonte: Parecer do Ensino Primário, elaborado pela Comimisão de Instrução Publica em 1882, composta
por Ruy Barbosa, Thomaz do Bomfim e Viana Ulisses Machado, no ano de 1883.
No referido Parecer do Ensino Primário, as “Lições de coisas” eram um
princípio geral, ou seja, abrangiam todo o Programa de Reforma, diferentemente das
indicações de “Lições de coisas” que, como já dito, no projeto de Reforma de Leôncio
136
de Carvalho, de 1879, aparecem como uma das matérias. De acordo com seus
formuladores, o método “Lições de coisas”, proposto para o Brasil, já havia sido
adotado em outros países há mais de 70 anos, como Alemanha, Suécia, França, Bélgica,
Itália e Estados Unidos, palco de desenvolvimento desse método.
É sobre esse contexto de difusão do método intuitivo que reforçamos nossa
tentativa de cruzar informações de estudos já consagrados entre nós, como é o caso das
“Lições de coisas”, de Valdemarin (2004), com uma das importantes fontes eleitas neste
trabalho, que é a obra “Primeiras lições de coisas”, de Calkins (1883). Vejamos a
definição de método intuitivo que a obra traz:
Figura 14: Página da obra “Lições de coisas”, que traz a definição de método intuitivo
Fonte: Primeiras lições de coisas – Manual de ensino elementar. N. A. Calkins. Traduzido por Rui
Barbosa. Impressa Nacional. Rio de Janeiro, 1886.
137
A figura anterior (figura13) mostra, passo a passo, o método intuitivo para
ensinar leitura e mostra que o ensino deveria ser conduzido pela observação dos objetos.
Para Valdemarin (2004), esse método é considerado como o caminho para educar por
meio dos sentidos, das coisas e das experiências de cada aluno, com lições que
abrangem o conteúdo a ser ensinado e como fazer em cada atividade por meio de
exercícios.
Nossa proposta é de discutir sobre o livro didático como um lugar de produção e
circulação de ideias e indagar sobre o lugar do leitor e o do autor (CERTEAU, 1994),
pois, nesse período, era comum a prática de reproduzir teorias por meio da produção
didática. Trata-se de compreender que os discursos veiculados nesses livros tinham o
objetivo de facilitar o acesso às inovações pretendidas e às práticas de sala de aula e que
as lições e os conteúdos presentes neles fazem parte da seletividade dos elementos e dos
saberes escolares de uma época (VALDEMARIN, 2010). A figura 15 traz as
recomendações que a obra “Lições de coisas” faz para os professores do ensino
primário quanto ao método intuitivo:
138
Figura 15 – Quando a obra “Lições de coisas” traz recomendações sobre a importância do
método intuitivo
Fonte: Primeiras lições de coisas – Manual de ensino elementar. N. A. Calkins. Traduzido por Rui
Barbosa. Impressa Nacional. Rio de Janeiro, 1886.
Ao longo de toda a obra, percebemos a preocupação dos autores com o trabalho
docente. Isso indica que o método intuitivo requer dos professores mais ânimo na
prática educativa, mais dedicação para ser um bom mestre capaz, pela vocação docente,
de trabalhar os princípios da educação integral. Na renovação do ensino proposta pelas
“Lições de coisas”, o corpo e o espírito eram compreendidos como indissociáveis.
139
De acordo com Souza (2000), tais indicações propunham uma nova cultura
escolar que se utilizou de discursos filosóficos e pedagógicos para dar sustentação a
esse projeto de fundo político e social. Ou seja, ensino primário deveria estar voltado
para disseminar os conhecimentos úteis, para formar os trabalhadores e proporcionar
instrução moral e cívica.
Sobre os saberes escolarizados e ensinados no Século XIX, Hébrard (1990)
refere que, além de ler, escrever e contar, escolarizavam-se os saberes sociais aplicados
ao ensino primário, entre eles, economia doméstica, música, canto, higiene, ginástica,
desenho, valores morais e cívicos, noções de horticultura, escrituração mercantil,
sistema de pesos e medidas, o trabalhos manuais, puericultura, entre outros
(HEBRARD, 1990).
No Parecer sobre a reforma do ensino primário, Rui Barbosa propôs
um programa enciclopédico tendo em vista a necessidade de
ampliação da cultura escolar para o povo, isto é, a formação de uma
classe trabalhadora conformada às exigências do desenvolvimento
econômico e social do país. Esse programa compreendia: educação
física, música e canto, desenho, língua materna, rudimentos das
ciências físicas e naturais, matemática e taquimetria, geografia e
cosmografia, história, rudimentos da economia política e cultura moral
e cívica (SOUZA, 2000, p.15).
Essa definição dos conhecimentos nos possibilita fazer duas colocações
importantes: que esse processo de organização das disciplinas estava fortemente
atrelado à metodologia de ensino proposta nos Pareceres e que esse nível de ensino se
constitui em saberes escolarizados, frutos do processo dinâmico de escolarização dos
conteúdos, de uma cultura escolar que é gerada na escola, ou seja, saberes escolares
organizados e produzidos a partir das disciplinas e sua relação com a escola
(CHERVEL, 1990).
Nessa discussão, é importante mencionar que esses saberes foram constituídos
em meio a enfrentamentos, como é comum em qualquer proposta metodológica que se
diz inovadora, pois ainda que se mantenha revestida de concepções antigas, para não
causar um estranhamento, os embates são inevitáveis. No Parecer do Ensino Primário,
são evidentes os embates para que as “Lições de coisas” fossem tomadas como um
método. Para Souza (2000, p. 22),
isso pode ser claramente observado em relação ao ensino da geografia
140
que foi apresentado por Rui como um desdobramento natural da lição
coisas, com ela se confundindo no início da escolarização e no espírito
de seus processos. Convinha, pois, que o ensino iniciasse pelas lições
de lugar, pelo conhecimento do meio mais próximo a escola, o bairro,
o distrito, para depois deter-se na província, no reino, nos outros
países. O método consistia em partir da observação, único recurso
capaz de dar concreticidade aos dados e às definições. Na
possibilidade da observação direta dos fenômenos, as lições deveriam
partir sempre do conhecido para o desconhecido utilizando objetos
familiares aos alunos.
Dito de outra forma, a Geografia seria ensinada a partir dos princípios básicos
das “Lições de coisas”, em que se deve partir da observação para se chegar ao concreto;
do conhecido para o desconhecido; do conhecimento do meio de vivência das crianças
para possíveis associações com o ambiente escolar e vice-versa. Na prática da sala de
aula,
trata-se, no entanto, de conhecer metodicamente os elementos já
familiares, nomeando-os claramente e ampliando-lhes as relações. As
observações provenientes de um passeio podem ter continuidade nas
atividades de desenho, na recapitulação de nomes e de imagens. O uso
de materiais diversificados é indispensável, porque as palavras
desligadas das ilustrações podem levar a falsas concepções sobre
conteúdos objetivos e esses materiais são as bases para a ampliação do
conhecimento (VALDEMARIN, 2010, p. 156).
Ainda em consulta ao Parecer nas páginas destinadas à Geografia, percebemos
que os mesmos procedimentos se aplicavam ao ensino da Astronomia, da Cartografia e
da Cosmografia. A Geografia se referia a todo o universo da natureza que se
descortinava, por isso “[...] era imprescindível estar atento ao método, ao uso de bons
livros e materiais didáticos, tais como planetários, globos terrestres, cartas em revelo,
cartas planas e cartas escolares parietais” (SOUZA, 2000, p. 22).
Acerca das indagações supracitadas, essa discussão nos permite questionar se e
como o método intuitivo pode ter influenciado a proposta de ensino de uma Geografia
moderna, ou seja, como a indicação metodológica desse método pode ter mostrado aos
professores novas maneiras de trabalhar a Geografia escolar, por meio de imagens,
mapas, projeções, exercícios, atividades práticas, aulas de campo, dentre outras. Essas e
outras questões nos ajudarão a pensar na Geografia escolar e em suas formas de
desenvolvimento no ensino primário e, sobretudo, de que maneira esse debate alcança
ou não as produções didáticas do período destinadas à educação primária.
141
Em nossas investigações, não interpretamos esse momento da Geografia escolar
como uma ruptura, mas como um arranjo desenhado por elementos novos e elementos
antigos, uma combinação necessária na busca por um lugar teórico produzido por
aqueles que compõem novos arranjos. Sobre essa discussão, Le Goff (2013) traz
considerações relevantes que nos ajudaram a compreender bem mais as relações entre
antigo e moderno, num movimento complexo das relações, pois,
[...] em primeiro lugar, porque cada um dos termos e conceitos
correspondentes nem sempre se opuseram um ao outro: “antigo” pode
ser substituído por “tradicional”, e moderno, por “recente” ou “novo”.
Em segundo lugar, porque qualquer um dos dois pode ser
acompanhado de conotações laudatórias, pejorativas ou neutras. (LE
GOFF, 2013, p.161-162).
Os apontamentos da citação podem ser associados ao movimento ocorrido na
Geografia, no processo de renovação dos métodos, em que os exercícios aparecem
como uma expressão deles, para tornar essa disciplina escolar mais moderna e mais
prática. Essa questão tem centralidade em nossas discussões e será detalhada no
transcorrer de nossa escrita, pois esse momento nos permitirá tecer considerações acerca
de questões como: o moderno, o novo e as inovações propostas para o ensino da
Geografia escolar na época e sua expressão nas produções didáticas.
No próximo capítulo, que fecha a segunda parte desta tese, traremos
considerações sobre a organização dos saberes geográficos nos livros didáticos,
especificamente, sobre os aspectos gerais que delinearam as finalidades da disciplina
Geografia para o ensino primário no período em questão.
142
CAPÍTULO IV: GEOGRAFIA E CULTURA ESCOLAR: A ORGANIZAÇÃO DOS
SABERES GEOGRÁFICOS NOS LIVROS DIDÁTICOS DESTINADOS AO
ENSINO PRIMÁRIO
Neste capítulo, trazemos uma discussão sobre os livros didáticos e seu processo
de produção e pensamos em sua relação com o mercado escolar, de acordo com os
interesses e as finalidades sociais e educacionais, porque as produções didáticas são
produzidas em um contexto que leva em consideração as condições de produção, a
comercialização e a circulação das obras em cada tempo histórico.
Também tratamos da presença dos saberes geográficos nos livros didáticos
destinados ao ensino primário, como foram se organizando e suas principais finalidades
na escola primária.
4.1. Livro didático de Geografia: traços da produção, da comercialização e da
circulação
Nosso olhar sobre o livro didático como fonte ou objeto de estudo considera
“[...] a multiplicidade dos agentes envolvidos em cada uma das etapas que marca a vida
de um livro escolar, desde sua concepção pelo autor, até seu descarte pelo professor”
(CHOPPIN, 2004, p.556) e que os elementos estratégicos de concepção, produção,
comercialização e circulação do livro didático são marcados pela influência direta dos
editores e do poder institucional.
Sobre a presença dos livros didáticos no Brasil, no período pesquisado,
constatamos que “[...] houve um aumento da circulação de material educacional
impresso (cartilhas, livros e periódicos especializados em educação) (VEIGA, 2007, p.
169)”. Nesse sentido, entendemos que o uso do material impresso assume um
importante papel no processo de ensino desde o início da escola moderna. Contudo, no
Brasil, a arte da impressão é de cunho relativamente tardio (TAMBARA, 2002). Com a
chegada da Família Real, o príncipe Regente Dom João trouxe, além da Biblioteca Real,
uma ordem para se instalar a Impressão Régia, que ocorreu em 1808, encarregada de
auxiliar na produção de materiais direcionados à educação pública e de tornar públicos
os documentos oficiais do Reino. A esse respeito, Ferreira (2011, p. 29) faz a seguinte
143
afirmação:
Revogada a proibição de imprimir, multiplicaram-se nas Províncias os
pequenos jornais e teve início também, a edição nacional de livros. Os
primeiros investidores do setor tinham como estratégia comercial
produzir de tudo um pouco: jornais, livros, revistas, almanaques,
cartazes, folhinhas e cartas de baralho. No entanto, importar os livros
de uso escolar portugueses era mais rápido, fácil e barato, o que
justifica o porquê de a escola brasileira, nesse período, ter uma reserva
de livros vindos de Portugal.
A última questão posta na citação justifica o motivo de a escola brasileira, nesse
período, ainda ter uma reserva de livros de origem portuguesa. Pelos mesmos motivos
citados, também não se pode negar que da França tanto vinham livros publicados em
francês, quanto livros brasileiros que foram enviados para publicação. Sobre essa
questão, ressaltamos que a indústria nacional ainda dava os primeiros passos e
enfrentava dificuldades para importar e fabricar papel, que era bem incipiente, os
equipamentos gráficos adequados praticamente não existiam, e a distribuição dos livros
dependia de um número muito reduzido de livrarias. Esse período foi marcado pela
atuação de livreiros-editores, portanto, não havia uma indústria editorial consolidada
(HALLEWELL, 2005).
Como já afirmamos no primeiro capítulo, ao longo do Século XIX, houve um
aumento da produção didática, porém esse não pode ser definido como um momento de
ampliação do acesso aos livros didáticos pelos alunos, porque, apesar da ampliação do
acesso ao ensino, esse livro ainda se configurava como um objeto para poucos devido
ao seu preço elevado (BITTENCOURT, 2008).
Assim, sobre o processo de impressão de livros didáticos no Brasil, a primeira
condição evidenciada diz respeito à precariedade das condições de impressão, o que
favorecia, direta ou indiretamente, o mercado estrangeiro. Por falta de papel, de
tecnologia ou de outros recursos, esses livros eram publicados por editoras estrangeiras.
Devido a isso, Hallewell (2005) chama à atenção para as editoras, como a Livraria
Francisco Alves, que estabelecia uma relação comercial efetiva de impressão de suas
obras no exterior.
Sobre a circulação de livros didáticos de Geografia, Silva (2012) nos leva a
afirmar que a pequena circulação e adoção dessas obras podem estar atreladas a outros
elementos. O primeiro é que, em momentos de reorientação do ensino, surgiam novas
144
propostas e, talvez, não se encontrassem no mercado livros brasileiros de Geografia que
se adequassem às novas exigências para o ensino de Geografia. A segunda hipótese é de
que “[...] as pequenas tiragens e o largo tempo para consumi-las, o que levava à
desatualização, ou mesmo à não reedição” (2012, p. 89).
Ressalte-se, no entanto, que o mercado de obras didáticas estrangeiras enxergou
um negócio propício à comercialização de livros didáticos no Brasil. Por isso
encontramos facilmente obras adaptadas ao contexto nacional entre os livros que
circulavam nesse período (ALBUQUERQUE, 2010). Assim, no Brasil, a indústria de
livros, mesmo incipiente, estabelece relações estreitas com o Estado, que apoia tais
indústrias e legisla sobre esse artefato cultural. A respeito da relação entre esses dois
sujeitos e o livro como “consumo cultural”46,
Bittencourt (2008, p. 63) explica:
As editoras, ao conquistarem o direito de fabricar e divulgar o livro
didático, cuidaram de transformá-lo em uma mercadoria inserida na
lógica capitalista. Para captar esse processo, buscamos seguir a
trajetória das principais editoras das obras didáticas acompanhando a
transformação do objeto cultural em bem de consumo em um produto
da indústria cultural destinado a ser consumido em larga escala e que
editores e autores têm interesse em comercializar, e como as demais
mercadorias que circulam no mercado passou a produzir lucro para as
empresas que se organizavam a partir do Século XIX. Para efetivar a
transformação de um material didático em produto de maior consumo
e simbólico da cultura escolar editores aproximaram-se do Estado,
engendrando atuações conjuntas em suas formas de circulação.
Estabeleceram-se entre ambos tramas, por intermédio das quais o livro
didático disseminou-se no quotidiano escolar, transformando-se no
principal instrumento do professor na transmissão do saber.
Com isso, compreende-se que a presença das editoras e, consequentemente, a
produção de livros, implica uma produção de obras didáticas atreladas à organização do
Estado, como também, aos interesses de construção dos saberes escolares.
Nas análises que já foram feitas sobre essas questões, também se pode observar
que os elementos mercadológicos de comercialização e divulgação dos livros didáticos
eram propagados em diferentes impressos, em muitas circunstâncias, nos próprios livros
didáticos. A estratégia de venda das editoras consistia em tentar, por meio dos
46
O termo ‘consumo cultural’ é empregado nesta tese, com base na definição de Certeau (1980, p.11),
como [...] uma produção racionalizada, expansionista, tanto quanto centralizada, estrondosa e espetacular,
corresponde outra produção qualificada como ‘consumo’. Ela é ardilosa, encontra-se dispersa, mas se
insinua por toda parte, silenciosa e quase invisível, uma vez que não assinala sua presença com produtos
próprios, mas com maneiras de utilizar os produtos impostos por uma ordem econômica dominante.
145
exemplares mais vendidos e de mais circulação, difundir tais artefatos culturais junto
com os professores. Outro fato observado e que nos interessa diz respeito à solicitação
desses materiais por professores por meio de ofícios enviados aos inspetores ou
diretores de instrução das Províncias. Nessas solicitações, eram pedidos livros didáticos
dos diversos conteúdos das disciplinas escolares e outras literaturas que pudessem
orientar suas práticas.
O aumento da produção, da circulação e do consumo de livros didáticos, no final
do Século XIX, ocorreu paralelamente à ampliação da produção de uma literatura
especializada destinada à formação de professores. Não podemos nos esquecer dos
debates acerca das inovações metodológicas que já apontamos no capítulo anterior e da
necessidade de transformar as práticas desse sujeito na escola. Sobre o estímulo ao
consumo do livro didático por parte das editoras, Bittencourt (2008, p. 176) relata:
As editoras, no final do Século XIX, incentivavam os professores a
comprar “livros úteis” para o aperfeiçoamento profissional deles,
oferecendo uma bibliografia mais variada, composta por livros
didáticos e uma literatura pedagógica especializada. Nas últimas
décadas do Século, iniciou-se um movimento por parte dos próprios
professores na difusão de obras especializadas e de caráter didático.
Essa forma de iniciativa ocorreu perante incipientes associações de
professores criadas para promoção de melhorias das condições de
trabalho e que incorporaram as questões de aperfeiçoamento docente,
responsabilizando-se algumas delas pela publicação de revistas
pedagógicas e criação de bibliotecas (BITTENCOURT, 2008, p.176).
Como se pode observar na citação, o final do Século XIX foi marcado, entre
outros grandes acontecimentos no campo educacional, por movimentações de
professores que se reuniam para lutar pela melhoria da classe e por um apoio didático-
pedagógico. Incluíam-se aí, livros que tratassem do aperfeiçoamento profissional. Ainda
nesse período, em janeiro de 1883, foi realizado o Congresso da Instrução do Rio de
Janeiro, quando vários documentos foram apresentados, e os professores tiveram a
oportunidade de avaliar e de reconhecer a importância do livro no processo de
escolarização.
As capas e as páginas iniciais e as finais dos livros didáticos passaram a servir de
suporte para todo tipo de propaganda necessária para divulgar a própria obra e de outras
editadas pela mesma editora, mesmo sendo de outros autores. Assim, nas capas, vinham
impressas chamadas referentes a aprovações por instituições públicas; a inovações
146
metodológicas ou de conteúdos; a título de outras obras da mesma ou de disciplinas
diferentes; à introdução de iconografias, mapas e imagens, entre outros elementos que
pudessem chamar à atenção do comprador da obra.
A divulgação, que visava promover e dar credibilidade às publicações didáticas,
era feita com o objetivo de mostrar a relação das produções didáticas com o poder
institucional e com o currículo oficial da época. Por isso é comum encontrar, na capa, na
contracapa ou nas páginas iniciais dessas obras informações indicando que ela foi
elaborada de acordo com os programas oficiais do período; que foi indicada por
estabelecimentos de renome, como o Colégio Pedro II, e lembretes de aprovação pelos
Conselhos de Instrução Pública (superior ou em nível provincial).
Como exemplos, encontramos as obras de Pereira (1884) e de Lacerda (1913),
que apresentam um leque de informações a serem discutidas, seja pelo víeis da
materialidade ou em uma perspectiva de análise dos conteúdos. Nas figuras seguintes,
visualizam-se, nas páginas iniciais, a publicação, na íntegra, do parecer de aprovação da
obra de Jerônimo Sodré Pereira (1884) com muitos elogios à obra e ao autor.
149
Figura 16c - Parecer do Conselho Superior da Instrução publicado nas páginas inicias da obra
Fonte: PEREIRA, Jerônimo Sodré. Compêndio de Geographia elementar: especialmente do Brazil.
Bahia:1884. Acervo: Biblioteca Paulo Bourroul, FEUSP.
Sobre esse Parecer, o Conselho Superior da Instrução Pública, representado pelo
150
relator, Dr. Francisco Rodrigues da Silva, faz uma advertência sutil sobre a expansão
dos conteúdos que abordassem os sentimentos nacionalistas, já que era uma das
exigências para o ensino como um todo, em especial, para o de Geografia. Porém, tal
Conselho considera que a obra em tela apresentou indicações suficientes no que se
refere às questões do amor à nação e às questões religiosas, por isso aprova a obra e
recomenda que seja utilizada nas escolas primárias.
Outra forma de usar a capa do livro didático como suporte de propaganda era a
difusão das inovações iconográficas presente naquela obra. Isso se pode observar na
figura 17, a seguir:
Figura 17: Detalhes das inovações dos elementos de caráter icnográfico elencados na capa do livro
Fonte: LACERDA, Joaquim Maria de. Pequena Geografia da Infância, 1913. Acervo: LIVRES -
Biblioteca do Livro Didático – FEUSP.
Nesse caso, esses destaques são dados de acordo com o destino das disciplinas.
No caso dos livros de Geografia, era comum as obras evidenciarem os aspectos acima
151
elencados. Em outros livros da mesma disciplina, encontramos indicações semelhantes
a essas, quase sempre destacando os lindos mapas coloridos (em alguns casos em
anexo) e as belas figuras e as cartas coloridas.
Outra evidência desse uso da capa é a inserção do termo novo ou novíssimo em
destaque. Os editores usavam essa estratégia como uma das formas de dizer que a obra
apresentava um caráter inovador. Esses termos podem ser observados nos títulos ou
subtítulos de obras como: Breves noções de Geographia e corographia do Brazil –
Formuladas de acordo com o novo programma de exames geraes de preparatórios, por
Joaquim José de Carvalho, 1883; o Novo Manual de Geographia: para uso das escolas
primarias – curso elementar, por FTD, 1907; Pontos de Geographia – De acordo com a
última Reforma em Minas e o Novo Programma Official, por Carlos Góes, 1918, e do
Novo Atlas universal, por André Perez Y. Marin, 188447
.
De acordo com Bittencourt (2008), o livro didático é um gênero que
constantemente se desatualiza em decorrência do movimento das propostas de
inovações pedagógicas, da abordagem dos conteúdos e das legislações educacionais.
Isso implica diretamente uma constante renovação na produção e comercialização dos
modelos, tipos e formatos desse objeto cultural. O uso desses termos tem se configurado
como mais uma das táticas usadas na comercialização dos livros, que apresentavam ao
leitor, textos “[...] aparentemente inovadores, mas que, na realidade, são meras
repetições dos mesmos livros” (BITTENCOURT, 2008, p. 83).
Essa questão apontada por Bittencourt (2008) aparece em nossas análises de
forma bem evidente, nas observações estabelecidas entre as estratégias de
comercialização e a discussão sobre inovação metodológica. Nos livros didáticos que
lemos, são notáveis os novos “arranjos” que os textos recebem em relação aos métodos,
quando, por exemplo, anunciam perspectivas inovadoras e, no corpo do texto, prevalece
o método de perguntas e respostas.
47
Todas essas obras aqui mencionadas fazem parte das catalogadas no Apêndice I.
152
Outra estratégia de comercialização utilizada pelo mercado editorial era a
divulgação de diversas obras didáticas ou de caráter metodológico nas páginas ou nas
capas finais. Nesse caso, o próprio livro exercia a função de divulgar outras obras do
mesmo autor e/ou de outros autores da mesma editora. Divulgavam-se informações a
respeito do preço das obras e os nomes dos jornais que divulgavam as publicações da
referida livraria/editora. Essa forma de divulgar era mais comum em editoras ou
livrarias de renome no mercado livreiro, como a B. L. Garnier e a Francisco Alves.
Como se pode observar Na figura seguinte, aparecem as obras, os valores e seu destino:
153
Figura 18: Exemplo do anúncio de livros didáticos na Livraria Francisco Alves
Fonte: NOVAES, Carlos. Chorographia do Brazil. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves – Paulo de
Azevedo & Cia., em 1923. Acervo pessoal da autora
154
Outra questão que diz respeito ao tema aqui tratado é a relação entre a
distribuição dos livros, as distâncias e a falta de comunicação entre as várias regiões
brasileiras no período da pesquisa. Por causa desse problema, as principais editoras do
Brasil estabeleceram o controle da produção e da distribuição instalando as próprias
livrarias. Nesses casos, seus donos eram conhecidos como livreiros-editores, uma vez
que exerciam a função de produzir e de difundir os livros e vendê-los ou seja,
desempenhavam o papel intermediário entre o autor e o público.
Na fase inicial das edições brasileiras, a circulação dos livros didáticos de
Geografia era restrita a alguns grupos sociais, a poucas instituições, a alguns
professores, a poucos leitores curiosos e a sócios de instituições, como o IHGB, ou de
províncias, a Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro, os clubes de literatura e o
Gabinete Português de Leitura, entre outros. As poucas livrarias existentes no país
também faziam circular parte dessas publicações, mas outra parte era mesmo
comercializada pelos próprios autores, que as vendiam com assinatura em cada livro,
para evitar o comércio de cópias piratas (ALBUQUEQUE, 2008). No entanto, com a
entrada das grandes editoras foi que esse processo se ampliou.
A esse respeito, destacamos o papel exercido pelos jornais e pelas revistas na função
de divulgar os livros didáticos da época. Nesse período, era comum circularem
informações sobre eles via tais meios de comunicação, que, durante muito tempo,
incumbiram-se de cumprir esse papel. Para além dos próprios livros, os autores e os
editores divulgavam em jornais e em revistas suas obras didáticas, apresentando notas
que traziam em destaque as inovações sobre os métodos ou concepções pedagógicas que
ajudavam a comercializar seus produtos (BITTENCOURT, 2008).
Essa estratégia de divulgação era uma forma que as editoras usavam para
investir. Elas também recorriam à divulgação dos nomes dos seus autores, em especial,
os que tinham mais influência social. Essa estratégia também se apoiava no papel que os
jornais exerciam na sociedade e em sua ampla circulação na sociedade letrada. Essa era
uma forma de divulgar bem mais seus produtos e de ampliar as vendas e a indicação
para o uso nas escolas. Com o tempo, essas estratégias ficaram mais especializadas e
destinadas a um público mais específico e mais interessado nesse tipo de obra.
Sobre essa questão, Bittencourt (2008) enfatiza a atuação da Revista Pedagógica
publicada pela livraria Francisco Alves, que divulgava listas de livros que estariam à
155
venda em suas livrarias. Essa prática adotada pela revista promovia uma crescente
aprovação e adoção das obras dessa editora pelas escolas. Bittencourt (2008) chama à
atenção para as relações existentes entre a revista e a produção de livros didáticos e
entre eles e a Livraria Francisco Alves. A mesma revista tinha como diretor e secretário
autores de livros didáticos, como Menezes Vieira e Felisberto R. P. de Carvalho, que
também eram contratados pela mesma editora. Além dessas questões relativas à
divulgação dos livros, havia, nesse processo, uma rede de relações que perpassavam os
interesses econômicos das editoras, ou seja, uma intrínseca e forte relação entre a
indústria cultural do mercado de livros e a atuação e a intervenção do Estado.
Ainda com o olhar atento aos destaques das capas dos livros que analisamos,
duas questões se destacam: a primeira diz respeito ao número de publicações de
Geografia em poucas editoras, e a segunda, à de informações, como a identificação do
nível de ensino a que se destinava a obra. A falta dos níveis de ensino pode estar
relacionada à falta de um sistema nacional de educação e de uma organização escolar
seriada, pois, como se sabe, só na década de 1930, com Getúlio Vargas, foi que se
começa a pensar na organização dos sistemas de ensino. Outra possibilidade que
encontramos como suposta resposta pode ser justificada pelo mercado, ou seja, a falta
de níveis de ensino na capa dos livros poderia ampliar o leque de pessoas que
comprariam as obras já que, em princípio, serviria para todas as séries do primário.
Fazendo um levantamento das editoras a partir do Apêndice (1), constatamos
que, do total de obras catalogadas (229), a Editora Francisco Alves48
se destaca, com 52
obras, seguida pela Editora B. L. Garnier49
, com 11 publicações.
Um fato que nos chamou à atenção, quando observávamos as editoras que mais
apareciam nos livros, foi o de que, nas leituras que fizemos da bibliografia de livros
didáticos, quase sempre encontramos relatos de grande atuação da Editora B. L. Garnier
nesse mercado. No entanto, em nossa pesquisa particular sobre nível primário, não
verificamos um registro de grande atuação dessa editora, como é comum em outros
trabalhos que se ocuparam de estudar a participação das editoras no mercado de livros.
48 Em nossas pesquisas, verificamos que, em muitos livros, essa editora aparece também como Livraria
Clássica de Alves e Cia. Supostamente, isso se deve ao seu crescimento no mercado e a sua parceria
com outras editoras.
49 Tal editora era também conhecida como “Os irmãos Garnier”, um dos principais grupos de livreiros e
editores do final do Século XIX no Brasil.
156
Diante do exposto, fazemos os seguintes questionamentos: Por que a Editora B. L.
Garnier pouco produziu para o ensino primário? Seria seu foco outro nível de ensino?
Ou porque, no universo de obras que catalogamos, não foram contempladas as
produções dessa editora? 50
Considerando esses delineamentos em torno “dos braços da produção” do livro
didático, sobretudo no que concerne às condições de produção, comercialização e
circulação das obras no período estudado, entendemos que, de modo geral, tais relações
foram apresentadas, entretanto não estão circunscritas a essas condições. Por isso, no
próximo tópico, discutiremos sobre outras questões relativas ao livro didático, partindo
do pressuposto de que as produções didáticas estavam sujeitas às influências das
concepções pedagógicas dispostas para o ensino primário. Então, podemos dizer que, no
caso dos livros de Geografia, a organização dos seus saberes perpassava diretamente as
concepções da Geografia do ensino primário, suas finalidades e as estratégias
metodológicas propostas para escola primária na época.
A seguir, apresentamos algumas considerações sobre a disciplina escolar e sua
relação com as produções didáticas no período pesquisado.
50 Esses questionamentos podem nos ajudar a pensar melhor no papel das editoras, porém, neste texto,
não foi possível respondê-las, mas ficam as indagações, que podem gestar mais pesquisas ou
complementar outras em andamento.
157
4.2. O ensino primário e as produções didáticas no Brasil no final do Século XIX e
início do Século XX: um enfoque sobre a disciplina escolar Geografia
Historicamente, os livros didáticos aparecem no centro de ações pedagógicas,
pois, desde suas primeiras impressões, podem ser definidos como textos que são
produzidos e impressos visando ao mercado escolar (MUNAKATA, 2001; BATISTA,
1999), mesmo quando não era bem estruturado e organizado, como ocorre nos dias
atuais.
Como temos anunciado em nossa tese, as produções didáticas não estavam nem
estão dissociadas de seu contexto. Sua elaboração, como nos afirmava Choppin (2004),
passa por diversas mãos. De acordo com Munakata (1997), o processo de produção do
livro é carregado de interesses e finalidades de um discurso educacional e social, que
está atrelado às indicações de fabricação e de comercialização, conforme já discutimos.
Sobre o período que estudamos, mais especificamente na Primeira República,
Bittencourt (2008) reforça que, mesmo com a organização da escola seriada e com os
grupos escolares, os discursos das autoridades ainda discorriam sobre a necessidade de
definir as atribuições para o grau elementar do ensino primário.
A instrução fundamentava-se nas ciências e caberia ao mestre difundi-
las. As ciências serviriam para capacitar o homem para uma sólida
organização da vida social, do trabalho “harmônico”, elevando a
inteligência dos indivíduos, mas eram impotentes para preencher os
ensinamentos morais necessários para atingir a grande “missão da
humanidade”. O progresso moral deveria se articular ao progresso
material e político, porque o espírito da civilização moderna era
eminentemente liberal e religioso (BITTENCOURT, 2008, p. 34).
No referido período, o Estado estava presente na organização do sistema
elementar de instrução pública, para garantir a uniformidade e a harmonia entre os
interesses daqueles que claramente regiam a rede pública de ensino, entre eles, os
legisladores, a Igreja e os discursos dos educadores.
O advento da República foi um momento propício para se discutir sobre as
mudanças e a permanência de um regime para outro, a partir do discurso do novo e do
158
moderno. Na República, as lideranças econômicas e políticas colocam a questão da
alfabetização do povo como uma condição para a participação popular nas práticas da
vida política do Brasil (SOUZA, 2008).
Os grupos dirigentes, cientes dos conflitos e dos descompassos na oferta da
instrução primária, eram unânimes em afirmar que “[...] a escola primária seria um
instrumento de moralização do povo” (BITTENCOURT, 2008, p.36). Essa concepção
de educação permeou as reformas para o ensino da época, porquanto uma parte dos
intelectuais que defendia esse projeto para o Brasil, ciente do poder da escola, queria
levar a instrução para a toda sociedade. Por isso, o critério da gratuidade passou a fazer
parte do discurso de uma parte das elites dirigentes da nação.
No Brasil, como já referimos neste trabalho, as discussões sobre a renovação do
ensino primário intensificaram-se nas décadas finais do Século XIX e imprimiram uma
concepção de educação que [...] encarnava o sentido de uma conformação completa do
indivíduo: intelecto, corpo e alma. Esperava-se, dessa maneira, forjar paras crianças um
novo ser social e adaptar o cidadão a uma nova sociedade (SOUZA, 2008, p. 34).
Aos sistemas nacionais de ensino incorporou-se uma cultura escolar que
produzia diversas implicações e conflitos no que diz respeito ao campo pedagógico e à
organização da escola. Para Souza (2008, p. 21), os “dispositivos curriculares cada vez
mais sistematizados buscaram ordenar o tempo e as práticas escolares, determinando o
que e como ensinar, e os professores tiveram que ampliar seus conhecimentos para
poder ensinar aos alunos”.
Esse contexto de mudança evidencia, dentre outras questões, a construção de um
projeto de sociedade moderna, do qual a escola elementar passou a ter prioridade. Por
essa razão, o que ensinar ao povo e como ensinar era uma preocupação e uma das
pautas principais de parte dos debates políticos. Como nos adverte Hobsbawn (2013),
era importante para nossa sociedade não só garantir o sucesso das ciências dos homens
cultos do período, mas também, sobretudo, assegurar que todas as atividades e modelos
culturais fossem subordinados a esses saberes.
A crença no poder da escola tornou-se a preocupação central do projeto
educacional republicano da sociedade brasileira. Então, caberia à escola primária ofertar
os valores e os saberes necessários às novas gerações. Em síntese, pode-se dizer que a
159
ampliação e a modernização das propostas de ensino perseguiram as indicações da
renovação didático-pedagógica e administrativa da escola primária. No regime
republicano, registrou-se uma expansão gradativa e continuada desse nível de
escolaridade, que atingiu vários estados brasileiros e continuou, ainda que de modo
mais moderado, até meados do Século XX (SOUZA, 2011).
De modo geral, segundo Souza (2000), deveria prevalecer, nas escolas primárias,
um sistema de ensino baseado em quatro elementos fundamentais: a avaliação, a
graduação em séries, os níveis de ensino e a disciplina dos alunos. Assim, recomendava-
se que, para executar o ensino simultâneo, era necessário expor os conteúdos e aplicar
os exercícios em silêncio, distribuir os alunos em classes e mantê-los em silêncio para
fazerem as tarefas.
Essa nova configuração proposta pelas modificações advindas da República nos
leva a refletir acerca das características gerais do funcionamento administrativo e
pedagógico das escolas primárias. Sobre isso, chamamos à atenção para o que nos diz
Souza (2008, p. 42):
Da perspectiva administrativa, ampliava as funções burocráticas,
exigindo um diretor responsável pela fiscalização das atividades
escolares, pelo controle dos professores e pela manutenção da ordem e
disciplina dos alunos. E, ainda, outros funcionamentos de apoio
administrativo como secretários, serventes e porteiros. Da perspectiva
pedagógica, ele implicou uma ordenação mais sistemática e regulada
do currículo com a distribuição dos conteúdos por séries, exigiu
mecanismos mais rígidos de avaliação dos alunos para a classificação
em classes e dispositivos minuciosos de controle do tempo (calendário
letivo e jornada escolar).
Esse modelo ideal de escola pública primária foi um desafio para as diferentes
realidades em que as escolas funcionavam, pois, em quase todos os aspectos, eram
comparadas suas condições materiais e pedagógicas, ancoradas em representações
contrastantes entre a superioridade dos grupos escolares e a simplicidade das escolas
isoladas.
As normas dos órgãos administrativos do ensino primário prescreviam os
aspectos de funcionamento da vida escolar, com regulamentos, pareceres e instruções de
funcionamento dessas instituições educativas. Dentre as exigências, destacamos as que
são relevantes para ampliar nossa discussão, ou seja, o controle sobre o exercício do
160
Magistério, expresso nas dificuldades dos professores quando da seleção dos materiais
didáticos e das estratégias na utilização dos métodos de ensino.
O livro didático se configurava como um recurso do ensino erudito, tanto por
preceder o currículo escolar quanto pela pequena expansão dos meios de comunicação.
Era usado sistematicamente por um grande número de professores, cuja ação tem lugar
de destaque na educação primária, pois, estrategicamente, a dinâmica da organização
pedagógica, marcada pela ação do professor, modifica a história da escola primária.
Em nossa investigação sobre os livros didáticos destinados à disciplina
Geografia, vimos que, em cada lição, ensinavam-se os passos que deveriam ser seguidos
pelos professores, o momento de suas falas e as dos alunos, a hora de recitar a lição,
tanto juntos quanto individualmente, e a resposta certa de cor em destaque. Assim, o
livro didático não só tinha a função de difundir conteúdos, mas também de ser
instrumentalizador do aprendizado do professor, para trabalhar com conteúdos e com os
métodos de ensino em sua prática docente.
Durante muito tempo, a produção do livro didático foi direcionada,
prioritariamente, para atender às necessidades dos professores (BITTENCOURT, 1993),
como suporte para assegurar o domínio dos conteúdos básicos de uma disciplina e,
sobretudo, para garantir a difusão de ideologias, de visões de mundo, entre outros. O
livro didático era usado por meio da ação do professor, porque, com o livro em mãos,
ele recitava ditados, estabelecia os tipos de exercício, selecionava conteúdos para
provas, estabelecia o que era certo e errado, e os alunos, seguindo suas determinações,
“copiavam trechos ou ouviam preleções” (BITTENCOURT, 1993, p.25). Porém, no
decorrer do Século XIX, as obras didáticas passaram a ser objeto de aprendizado de
crianças e adolescentes (BITTENCOURT, 2008), e apesar de, com o passar do tempo, o
aluno ter se tornado o destinatário privilegiado do livro didático, Bittencourt (1993)
assevera que, no Século XIX, ainda era comum os livros didáticos serem destinados
prioritariamente aos professores.
Essa destinação carrega orientações para os professores estabelecidas pelo livro
didático. No período pesquisado, também formam publicados manuais didáticos que
visavam à formação do professor primário. Esses livros passaram a nos interessar
porquanto difundiam os debates sobre metodologia de ensino para a escola primária e
nos ajudavam a compreender as metodologias e as contradições apresentadas quando do
161
emprego delas no ensino primário, em especial, no de Geografia.
Vejamos o trecho retirado de um manual didático do professor primário de
Theobaldo Miranda Santos:
Personalidade do professor primário: - focalizada a personalidade do
professor como figura central da atividade educativa, dois problemas
para logo se levantam: - quais as qualidades que o mesmo deve
possuir para o exercício perfeito da sua função? – qual o critério para
determinação dessas qualidades? Esses problemas foram estudados,
minuciosamente, por Schneider que assinalou três métodos para a
seleção das qualidades que um mestre modelar deve possuir: o método
histórico, o método dedutivo e o método indutivo (199-?, p. 13).
Nesse manual, está descrito, passo a passo, como deve se portar um professor da
escola primária para atender às finalidades e às exigências do ensino primário da época.
Além de descrever a personalidade do professor, o autor se ocupa de definir os objetivos
da escola primária e os métodos de ensino, ou seja, tem-se o foco para a orientação
metodológica do professor primário, em especial, quando assevera:
Os métodos de nada valem sem o espírito do educador para animá-los,
vivificá-los e fazê-los frutificar. E o valor e a eficácia de um método
pedagógico dependem, principalmente, da personalidade do professor,
que representa o fator fundamental de tôda ação educativa (SANTOS,
199-?, p. 13).
Falando com base no Manual do Professor Primário, é possível identificar
algumas aproximações em relação à definição dos métodos (recomendação do método
intuitivo) e ao próprio conceito de professor primário disposto na obra ‘Lições de
Coisas’, de Calkins. O trecho a seguir, retirado dessa obra, apresenta recomendações
bem próximas das que encontramos no manual supracitado, no que se refere à
preparação dos professores.
[...] tenho recommendado aos professores publicos primários que se
abstenham das lições individuaes, hoje em toda parte condenmadas, e
prefiram os exercicios em commum, afim de melhor ser aproveitado o
methodo intuitivo, o unico que deve ser adoptado nas escolas
primarias. Para execução dessas recommendações tenho encontrado,
além de varios embaraços materiaes, que pouco a pouco levarei ao
conhecimento de V. Ex., séria difficuldade na falta de preparação
technica do professorado. Um dos meios de mais prompta realização
para vencer essa difficuldade seria a divulgação de livros de
methodologia, onde os professores colhessem noções acertadas sobre
o uso dos processos intuitivos geralmente applicados nas escolas de
162
todos os povos cultos (Calkins, 1886).
Essa citação denota uma contradição entre a adoção do método intuitivo e o uso
de livros didáticos, tendo em vista que esse método de ensino privilegia a aprendizagem
a partir dos sentidos, das relações reais entre os sujeitos e os objetos da aprendizagem.
O uso dos livros que traziam os conteúdos prontos era realmente um contrassenso, uma
contradição. Por isso se estabelece um debate entre os que entendem a possibilidade de
adequar o método intuitivo ou “Lições de coisas” e o uso de livros escolares e os que
defendem a impossibilidade dessas práticas.
Ainda sobre as contradições, Bittencourt (2008, p.177), ao discutir sobre “os
usos dos livros didáticos”, especificamente, quando analisa os textos organizados pelos
professores para apresentar no “Congresso da Instrução do Rio de Janeiro de 1883”,
afirma:
Os textos apresentados para o Congresso registraram marcas de uma
tendência a renovações metodológicas introduzidas pelo “ensino
intuitivo”, com citações frequentes de obras de Froebel e Pestallozzi.
As inovações pedagógicas eram demonstradas pela introdução de
materiais didáticos “modernos”, sendo que o livro didático passava
por um momento de questionamentos, especificamente quando se
concebia a introdução das disciplinas de cunho “científico” para o
ensino primário e seu método “lições de coisas”.
Essa citação deixa claro que, ao mesmo tempo em que ocorre o processo de
renovação dos métodos, os livros didáticos para o ensino primário passam a ser
questionados. Em seus discursos, os professores estavam questionando que o ensino
intuitivo só poderia ser aplicado às disciplinas cujo objeto tivesse forma sensível, pois,
segundo eles, havia aquelas disciplinas em que o método intuitivo deveria ser aplicado
apenas por meio de alegorias.
Bittencourt (2008, p.177) continua afirmando que as propostas pedagógicas que
acatassem o método intuitivo estavam conferindo ao livro didático um papel secundário
na vida escolar, porém, nos discursos dos professores, podemos identificar um debate
marcado pela contradição:
[...] suas opiniões sobre métodos de ensino nas escolas primárias e a
adoção de compêndios, temas propostos para debate no malogrado
Congresso concordaram, majoritariamente, sobre a impossibilidade de
se abolir o livro na sala de aula, discordando de algumas propostas dos
defensores dos métodos “intuitivos”.
163
Tratava-se de uma crítica, de um lado, aos livros didáticos, por parte daqueles
que defendiam os métodos intuitivos e, de outro lado, o reconhecimento da importância
do livro nas práticas escolares pelos professores, ou seja, por aqueles que os utilizavam
em sala de aula ou para se formar (CHOPPIN, 2009, BITTENCOURT, 1993). Assim,
“[...] os referidos professores insistiam para que os livros fossem fiéis aos programas
estabelecidos demonstrado que esse material seria mais apropriado para o docente
preparar-se para o desempenho didático das matérias a serem ministradas”
(BITTENCOURT, 2008, p. 178).
Em virtude dos debates acerca da importância dos materiais escolares, os
professores defendiam que, para transmitir os conteúdos em sala de aula, era necessário
usar os livros didáticos, que deveriam ser a expressão dos programas e dos
conhecimentos essenciais para aprovação nos exames, cumprindo aqui, como já
mencionamos, a função referencial desempenhada pelo livro apontada por Choppin
(2002). Também constatamos que os administradores dos projetos educacionais
brasileiros se preocupavam com os conteúdos que os livros didáticos abordavam,
principalmente os voltados para difundir o nacionalismo, pensando a quem eram
destinadas essas obras e quais as intenções propostas.
Ressalte-se, no entanto, que, apesar desses debates que poderiam reduzir as
publicações de livros didáticos, tendo em vista as novas propostas metodológicas e sua
incongruência com o uso desse recurso didático, isso não se observa. Em vários estudos,
vem sendo comprovado que o número de publicações desses livros, no período
analisado, cresceu significativamente. Se, de um lado, na catalogação dos livros
didáticos de Geografia feitas por Bittencourt (2004a), Silva (2012) e Ângelo (2014) o
número maior de publicações se destina ao ensino secundário, de outro, a partir da
década de 1880, o número de publicações desses livros destinados à escola primária foi
ampliado. Nesse período, também cresceu o número de livros didáticos regionais
destinados ao ensino primário de Geografia, ou seja, publicados nas províncias por
autores locais ou que viviam fora, mas que tinham uma relação direta com a província
onde haviam nascido (ANGELO, 2014).
Essa ampliação do número de publicações destinadas às províncias pode estar
associada à própria organização desse nível de ensino no país ou, mais especificamente,
as consequências da implementação do Ato Adicional de 1834. Com essa legislação, as
164
províncias passaram a ter um relativo poder sobre a Instrução Pública e, no caso do
ensino primário, essa autonomia pode ser observada pela implementação de legislações
específicas que passaram a definir organizações diferentes para as escolas de cada uma
das províncias51
. É nesse embate que se estabelecem legislações específicas sobre livros
didáticos que se destinam a esse nível de escolaridade e que definem os conteúdos que
serão selecionados, a escolha de livros para as escolas públicas, entre outras
determinações. Entendemos que os autores tinham consciência de que o sucesso de suas
obras dependia da aceitação das autoridades e da aprovação dos professores. Segundo
Hallewell (2005), nesse período, a publicação de livros didáticos estava sendo
expandida em nível local, e alguns autores encomendavam individualmente a
publicação de suas obras didáticas, o que contribuía para valorizar o mercado local.
Acreditamos que, de modo geral, as produções que analisamos, destinadas ao
ensino primário, apresentam traços da Geografia que, possivelmente, fez parte dos
bancos escolares da época estudada. Sobre a Geografia escolar brasileira, no período
que pesquisamos, os pesquisadores, concordando ou discordando, partem da proposição
levantada por Vlach (2004) de que a Geografia era embasada em uma abordagem que
foi difundida na obra do Padre Manuel Aires de Casal, denominada de Corographia
Brasílica, publicada em 1817, e nas publicações do Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro – IHGB.
Com base nas análises que fizemos, podemos nos posicionar do lado dos
pesquisadores que defendem a necessidade de discutir sobre a colocação de Vlach
(2004), pois, com base nos livros didáticos do ensino primário desse período52
, vimos
que eles apresentam outras indicações. Vejamos o que diz a pesquisadora Albuquerque
(2009, p. 165) sobre isso:
51
A esse respeito, enfatizamos a criação de uma lei em 1875, na Província de Pernambuco, de número
1.143. Segundo Albuquerque (2009), tal lei, prescrita no [...] art. 33 S 7º, determinou às escolas
daquela província a obrigatoriedade do “[...] ensino dos elementos de Historia e Geographia
Universal. Historia e Geographia do Brazil, especialmente dessa província.” No ano seguinte, foi
publicado um livro didático de Geografia que trazia exatamente as determinações referidas na lei:
Elementos de Geographia universal - Geral do Brazil e especial de Pernambuco para a infância escolar
da província de Pernambuco, de autoria de Manuel Pereira de Moraes Pinheiro, editado pela
Typographia Mercantil”.
52 Nosso posicionamento está embasado em pesquisas que extrapolam ou se somam a nossa de tese, pois,
desde 2006 (falo especialmente eu, como aluna do PIBIc), estamos em contato com livros didáticos do
Século XIX que nos mostram iniciativas que põem em xeque ou provocam certa desconfiança sobre
essa afirmação de Vlach (2004).
165
Com base nos livros didáticos de geografia do Século XIX, que
estamos analisando há três anos, essa afirmação deve ser discutida,
pois temos encontrado uma série de autores de livros didáticos do
referido período que adotaram outros referenciais teóricos e bancos de
dados para a elaboração dos seus compêndios e manuais. Citaremos
aqui apenas um exemplo, para não nos estendermos muito. No
Compêndio Elementar de Geographia Geral e Especial do Brasil,
Thomaz Pompeu de Souza Brasil (1859) afirma usar como referência
teórica para a elaboração do seu compêndio as seguintes publicações:
Anuário de Garnier, Almanak de Gotha, Revista dos Dous Mundos,
Jornaes Literários e Scientíficos para a parte política do mundo. Para
explicar os fenômenos astronômicos e físicos, acrescentou notas
ilustrativas tiradas das obras de Humbolt, Ganot, Lecoq, Moureau de
Jones, Malte Brun, Bouvillet e outros. Sobre o Brasil, recorreu às
revistas do IHGB, mas também fez levantamentos junto aos
presidentes das províncias e a pessoas importantes, em virtude da
imprecisão dos dados existentes.
Essa citação nos leva a pensar sobre muitas questões, umas delas, a de que
devemos desconfiar das literaturas ditas oficiais, porque cada fonte histórica pode
relevar novos detalhes, que, a depender de cada realidade, podem influenciar ou colocar
em discussão determinado trabalho de pesquisa. Porém, é mister afirmar que, com base
em nossas pesquisas, os conteúdos de Geografia, no período em tela, poderiam, em
alguns livros didáticos, até tomar por base a obra de Aires de Casal, no entanto, outros
autores também eram utilizados como fonte de consulta para a elaboração de livros
didáticos. Assim, concordamos com Albuquerque (2009, p. 165), quando diz que “[...]
até mesmo revistas e jornais eram utilizados com essa finalidade. Não queremos aqui
dizer que a obra de Casal não foi referencial para o período, entretanto, ela e as revistas
do IHGB não eram as únicas fontes de consultas”.
Outra questão que merece destaque diz respeito ao debate sobre o nacionalismo
patriótico como tema da disciplina escolar Geografia. Os debates hoje publicados a
respeito desse tema baseiam-se em duas obras: na de Vlach (1988) e na de Rocha
(1996). A primeira defende que o nacionalismo patriótico, que foi um elemento
importante na composição da Geografia escolar, esteve presente entre os temas que
compõem os conteúdos dessa disciplina, desde a criação do Estado-nacional na Europa,
e alega esse enfoque para analisar a disciplina escolar aqui no Brasil. E a segunda,
discordando dessa primeira, afirma que a questão do nacionalismo só aparece como
uma finalidade da disciplina escolar Geografia a partir do momento em que se dá a
consolidação do projeto nacional das elites brasileiras, portanto, a partir da década de
166
1930.
A respeito desse debate, compreendemos que o nacionalismo patriótico passou a
incorporar o conteúdo do ensino dessa disciplina no momento em que a Geografia do
Brasil foi institucionalizada como disciplina, e as produções didáticas começaram a
tratar das questões relativas ao nosso país. Segundo Albuquerque (2009, p. 166), “[...]
esse debate foi introduzido na escola pelas publicações didáticas brasileiras. Pois,
enquanto os livros didáticos utilizados eram importados, adaptados ou traduzidos esses,
em geral, não traziam conteúdos sobre o Brasil e quando o faziam era de forma muito
superficial”. José Veríssimo (1985), em obra publicada em 1890, faz uma crítica à
Geografia que se difundia nos livros didáticos e adverte sobre a falta de uma
nomenclatura sobre o Brasil. Entretanto, é necessário observar os limites da crítica desse
autor, tendo em vista o acervo de publicações didáticas de Geografia do período. Silva
(2012) fez um levantamento extenso da bibliografia didática da Geografia (1814-1930)
e encontrou um número pequeno de livros traduzidos ou adaptados que circulavam no
país, a maioria escrita por brasileiros.
Considerando as pesquisas já desenvolvidas, é possível afirmar que, do final do
Século XIX para o início do seguinte, as publicações de livros didáticos de Geografia
brasileiros e estrangeiros adaptados ou traduzidos que tratavam sobre o Brasil tomaram
grande fôlego. Havia tantos livros de Geografia Geral, que passaram a incorporar em
suas páginas a corografia do Brasil e publicações em separado, especialmente do Brasil.
Mas, embora esses livros se destinassem mais ao ensino secundário, também foram
encontrados livros com essa estrutura destinados ao ensino primário53
.
Em linhas gerais, com base nas colocações supracitadas, podemos inferir que as
produções didáticas de Geografia do final do Século XIX podem ser compreendidas
como livros didáticos que ainda apreciavam conhecimentos geográficos sobre o
continente europeu. Entretanto a maioria deles já tratava com especificidade de
nomenclaturas recitadas a respeito das províncias brasileiras. Assim, difundiam uma
Geografia geral, fundamentada nos aspectos físicos, de localização, populacionais e
econômicos dos países daquele continente, que era seguida por uma corografia que
trazia os mesmos aspectos do Brasil.
53 Ver lista de livros publicados no período em Silva, 2012. P. 71 a 105.
167
Já no Século XX, especialmente, a partir das décadas de 1920 e 1930, a
preocupação com a renovação pedagógica passou a exercer centralidade nos discursos
políticos e no pensamento de alguns intelectuais, fomentando as políticas públicas de
educação (tanto para o ensino primário quanto para o secundário), que se configuravam
como projetos voltados para constituir uma sociedade moderna e republicana. Esses
projetos deram uma nova configuração ao processo de escolarização brasileira da escola
primária, que, mesmo de forma lenta, começou a ser desenhado a partir de fortes
evidências de permanência54
.
Sobre esse assunto, Rocha (1996) chama à atenção para o fato de que a década
de 1920, até meados da década de 1930, é considerada, na historiografia da educação,
como uma fase de constituição da modernidade educacional brasileira. Nessa
perspectiva, as mudanças no âmbito das políticas educacionais e dos métodos de ensino
influenciaram diretamente a seleção e a abordagem dos conteúdos das disciplinas e os
materiais de ensino utilizados nas escolas do período, como a produção e a circulação
do livro didático.
Observa-se, no Brasil, uma Geografia de cunho científico de orientação moderna
e, paralelamente, a incorporação das proposições da Pedagogia moderna que vão sendo
lentamente incorporadas aos currículos e aos livros didáticos com os debates
desencadeados por importantes intelectuais que atuavam também como professores do
ensino secundário, como Delgado de Carvalho, Raja Gabaglia, Manuel Said Ali Ida e
Everardo Backheuser. Parte deles se envolveu com a formação de professores primários,
em um Curso Livre ofertado pela Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro55
, e
publicou obras de cunho pedagógico, como Delgado de Carvalho (1925) e Backheuser
(1948).
Posteriormente, estabeleceu-se uma relação entre a Geografia escolar e a
acadêmica, com a implantação de cursos voltados para a formação de professores de
Geografia na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, em 1934, em São Paulo, e na
Universidade do Brasil, em 1935, no Rio de Janeiro (MACHADO, 2009) e, com isto o
estabelecimento de uma produção acadêmica no Brasil.
54 Para mais detalhes acerca dessa temática de instalação das escolas primárias em âmbito nacional,
consultar: ARAÚJO, SOUZA, e PINTO, 2012.
55 A partir de 1945, essa sociedade passou a se chamar Sociedade Brasileira de Geografia.
168
Assim, com base nessas afirmações, entendemos que se difundia uma Geografia
científica e moderna, porém, foi a partir da década de 1930 que se constituiu no país
uma Geografia acadêmica brasileira, resultante das produções dos seus primeiros
formandos. Nesse contexto, podemos afirmar que, no Brasil, a década de 1920 pode ser
considerada um marco de importantes transformações nas questões educacionais e na
disciplina escolar Geografia que, em certas circunstâncias, concretizaram-se e ganharam
mais forças com a institucionalização dessa ciência em âmbito acadêmico.
Diante desse panorama, compreendemos que o estatuto da Geografia acadêmica
passa, de certa maneira, a influenciar e indicar modificações para a Geografia em
âmbito escolar, ao mesmo tempo em que também interfere na composição e na
organização daquela, inclusive com autores de livro didático que atuavam nos dois
âmbitos, como Delgado de Carvalho e Aroldo de Azevedo. No entanto, isso não quer
dizer que, a partir desse momento, houve uma mudança na realidade do ensino de
Geografia nas escolas, ou seja, que as escolas passaram a acompanhar as tendências da
Geografia que foram implantadas nas universidades, principalmente em se tratando da
realidade da escola primária. Entretanto, não podemos desconsiderar que essa Geografia
moderna tenha trazido novas configurações para a formação de professores e para a
produção de materiais didáticos destinados a essa disciplina, como, por exemplo, o livro
didático56
.
O sopro da “orientação moderna”, introduzida sobretudo por Delgado
de Carvalho, somada ao sentimento de cansaço aferido pela Geografia
descritiva, a reorientação dos objetivos do ensino (ensino elementar
como formação, habilitação para o exercício de profissões técnicas e
outros), comporá um novo quadro didático para a Geografia. (SILVA,
2012, p. 382).
A produção didática da Geografia apontada pela autora começou a se destacar
nas décadas de 1920 e 1930, com as publicações de Raja Gabaglia, de Mário da Veiga
Cabral, do próprio Delgado de Carvalho e de Aroldo de Azevedo. Esses autores, dentre
outros dessa geração, publicaram obras didáticas de Geografia até, aproximadamente, a
segunda década do Século XX. Porém, é importante ressaltar que a maior parte dessas
56 Desse modo, o desenvolvimento de uma Geografia de base científica no Brasil também proporcionou
mudanças no perfil dos autores de livros didáticos de Geografia nesse período histórico, que
apontaram para o aparecimento de autores oriundos de uma formação diferente da que se destacou
durante as últimas décadas do Século XIX até, aproximadamente, a década de 1910. Passaram a
compor esse grupo sujeitos com uma formação mais específica na área de Geografia (SILVA, 2012).
169
obras se destinava ao ensino secundário, e não, ao ensino primário, mas a formação de
professores para o ensino primário era dada nas escolas normais que também adoravam
os livros didáticos destinados ao secundário. Destaque-se, ainda, o papel que parte
desses autores desempenhou nas transformações políticas educacionais e o fato de suas
proposições de inovação de cunho metodológico para o ensino de Geografia também
terem influenciado o ensino primário e, por conseguinte, as produções didáticas.
Como se pode observar, a Geografia escolar, nesse período, foi marcada,
teoricamente, pela influência de intelectuais que propunham rupturas com as
abordagens metodológicas tradicionais. Assim, dialogavam tanto com as proposições
modernas da Geografia quanto com as da Pedagogia, pois se apoiavam em proposições
metodológicas escolanovistas. Por isso recorriam, inclusive, aos exercícios como
propostas de inovações metodológicas para o ensino de Geografia.
A efervescência das ideias de Delgado de Carvalho e de outros intelectuais de
“orientação moderna”, no âmbito da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro, e
posteriormente, em 1934, na Associação dos Geógrafos Brasileiros, favoreceu a
institucionalização dos cursos superiores de Geografia em âmbito acadêmico, voltados
para a formação de professores de Geografia. Segundo Machado (2009), o curso do Rio
de Janeiro era mais voltado para essa formação, tendo em vista sua proximidade com os
objetivos estabelecidos pelo Governo Central, diferentemente de São Paulo, que tinha
propósitos mais regionais e estabelecia diálogos mais internacionais.
Esse novo cenário também está vinculado a um espraiamento maior das escolas
primárias por vários estados e importantes cidades do Brasil, o que leva um número
maior de crianças e jovens de classes menos favorecidas a ocupar os bancos escolares.
Esse novo público escolar demandava, dentre outras questões, a existência de livros
escolares com caráter ainda mais didáticos. Nesse sentido, uma questão fica evidente
quanto aos projetos direcionados às produções de obras didáticas publicadas no período
estudado - a renovação das metodologias de ensino. Convém lembrar que alguns autores
já citados buscam essas inovações pelos exercícios. Isso nos leva a entendê-los como
um novo modo de ensinar Geografia no ensino primário, centrando nosso olhar em
como essa metodologia é expressa nesses livros.
Nesse momento histórico, evidenciamos a organização de um novo projeto de
educação marcado pela institucionalização do sistema de ensino, em que o projeto
170
educacional ganhava novos contornos, e novas funções eram atribuídas à educação.
Temos o marco de um novo regime político, a Era Vargas, que começou em 1930 e foi
até 1945, quando o projeto de educação integrava em seus objetivos questões relativas à
vida humana e social.
Nesse sentido, inferimos que o contexto histórico e educacional representativo
do final do Século XIX e as três primeiras décadas do Século XX abrangeu um período
de importantes transformações, no âmbito da sociedade, da educação, das ideias
republicanas, das ideias pedagógicas, da escolarização e da disciplina Geografia,
influenciando a produção e a circulação dos livros didáticos e os métodos de ensino
utilizados para o ensino dessa disciplina.
Na perspectiva de continuar pensando na disciplina Geografia no contexto do
ensino primário, no próximo tópico, apresentamos alguns aspectos sobre a Geografia da
escola primária, com enfoque nas finalidades estabelecidas para o ensino dessa
disciplina.
4.2.1 A Geografia nos livros didáticos, nos debates educacionais e nos pareceres
destinados à escola primária: finalidades do ensino primário e da Geografia
Na fase inicial desta pesquisa, um dos propósitos da Geografia no ensino
primário era o de estimular a memorização das nomenclaturas referentes à natureza ou a
alguns aspectos humanos. Como já referimos, o universo da escola primária, os livros
didáticos, ocupavam lugar de destaque, pois eram a ferramenta que mais interferiam na
promoção das aulas de Geografia e das demais disciplinas.
Nessa fase, a maioria dos livros trazia uma Geografia que tinha pouca ou quase
nenhuma relação com a realidade dos alunos, da sociedade e de sua relação com a
natureza. Se, de um lado, ao longo de todo o período, os temas eram tratados de forma
estanque, e esse modelo se repetiu com as reformas implementadas no ensino primário,
de outro, algumas proposições de ordem metodológicas ou geográficas inovadoras
foram introduzidas nos livros didáticos dessa disciplina. No universo das obras
catalogadas (Apêndice 1), encontramos um número considerável de livros que seguem
as indicações dos documentos direcionados para orientar o ensino primário, cujas
171
introduções (em alguns casos) trazem referências às proposições metodológicas e de
caráter geográfico, que visavam romper com o princípio da memorização. Contudo,
essas propostas vão se dando muito lentamente, començando a aparecer em algumas
obras, e em outras, não.
Ao discutir sobre as finalidades da disciplina escolar Geografia, não podemos
deixar de pontuar que elas mudam conforme os modos de organização mais amplos da
escola primária e de acordo com as contribuições do ensino de Geografia para a
formação dos indivíduos em cada momento histórico. Estamos nos referido às
recomendações gerais propostas para o ensino elementar como um todo, visto que,
como bem nos lembra Carvalho (2003), apesar da grande centralização política e
administrativa do governo imperial, a educação primária não foi utilizada como
instrumento de socialização política, pois, desde 1834, ficou relegada às províncias e
aos municípios a organização dos currículos escolares, inclusive, no que se refere às
práticas de educação cívica.
Segundo Bittencourt (2008, p. 35), “existiam as leis, mas pouco se fazia
efetivamente para difundir a educação letrada escolar. Havia um descompasso entre a
magnitude das propostas relativas ao ensino primário e sua realização efetiva”. Em
outros termos, a autora entende esse momento de inovação no campo educacional para
além das propostas de mudanças, sobretudo, centrado nas dificuldades para efetivar as
propostas de ensino e nas permanências que marcam, principalmente, as práticas
escolares. No final do Século XIX, os debates sobre educação se evidenciaram na
sociedade, em especial, a partir dos anos de 1880, com as primeiras tentativas de
difundir as bases do regime replublicano, sobretudo quando se falava nas propostas de
educação e formação do povo brasileiro.
No que se refere à formação ofertada pelas disciplinas escolares, destacamos o
lugar que a Geografia ocupava nos debates educacionais e as atribuições dos saberes
disseminados por essa disciplina. Entre as finalidades elecandas para a Geografia no
ensino primário, destacam-se três nos livros analisados: eliminar a memorização como
centro do processo de ensino; aprender a desenhar mapas, para que os alunos possam
orientar-se com facilidade (ensino da cartografia escolar); e difundir o nacionalismo.
Apesar de as publicações didáticas nas províncias destinadas ao ensino primário
serem em maior número, essas finalidades também influenciavam os autores locais.
172
Assim, elas eram elencadas pelos autores com base nos debates sobre o ensino da
Geografia de cada província ou em nível nacional. Isso significa que, quando não havia
um currículo geral e oficial, a organização dos princípios do ensino primário era bem
particular para cada província. Isso definia o papel das disciplinas dentro da escola
primária e influenciava os autores de livros didáticos.
Nos livros didáticos, estava expressa não só a importância dos exercícios para o
desenho de mapas, como também sua importância para disseminar uma Geografia mais
voltada para os aspectos particulares do Brasil. Teoricamente, o foco estava na tentativa
de não mais entender a Geografia meramente como uma disciplina mnemônica, mas
como um ensino mais voltado para orientar e observar os fenômenos geográficos. Vale
ressaltar que, nos livros analisados, encontramos o discurso de romper com o princípio
da memorização, em especial, na introdução ou apresentação das obras. Esse discurso
era o foco da renovação dos métodos, mas, na escola, como um todo, ainda prevalecia o
ensino com base no método mnemônico.
No caso da Geografia, parte dos autores de livros didáticos destinados ao ensino
primário se envolve com tais inovações metodológicas e expressa o combate à
memorização na tentativa de atender às exigências desse debate. Como exemplo de
obras que visavam combater a ideia da memorização como centro do processo de
ensino, citamos os quatro livros que selecionamos para analisar: Sodré (1884), Lacerda
(1913), e dois sem autores publicados pela F. T. D. (1923), que, entre outros aspectos,
evidenciam um ensino capaz de abordar os conteúdos com base nas vivências, nos
saberes geográficos e nas concepções de mundo dos alunos. Entre os conteúdos
elencados, essas obras tratam da forma como alguns povos vivem, das relações dos
elementos naturais e da ação do homem na natureza. Nos três temas, é perceptível o
interesse por uma Geografia mais prática e mais relacionada com as vivências dos
alunos que trabalhasse seus conhecimentos a partir de exemplos mais concretos, menos
abstratos e sem deixar de propagar os sentimentos e as representações de nacionalismo.
No entanto, nossas análises demonstraram que a indicação dessas finalidades, em
especial, a primeira (superação da memorização), aparecia, muitas vezes, nas
introduções dos livros didáticos, mas não, no corpo do texto, pois os autores ainda
continuavam apegados a uma escrita que visava memorizar a nomenclatura de aspectos
gerais do Brasil ou de outros continentes e países.
173
Nas figuras seguintes, vemos contradições de um autor do período que, ao
mesmo tempo em que tenta inovar com um texto corrido e breves descrições de
aspectos da Geografia brasileira, recorre à memorização de nomenclaturas, como no
caso dos nomes das ilhas, dos rios e das montanhas. E isso, em um livro publicado no
início do Século XX, quando a superação da primeira finalidade já era um debate
recorrente entre aqueles que se preocupavam com a educação e, em especial com o
ensino de Geografia:
175
Figura 19b – Enumeração dos aspectos gerais do Brasil
Fonte: Pequena Geografia da Infancia (1913), por Dr. Joaquim Maria de Lacerda, publicado pela Editora
Francisco Alves - Acervo: LIVRES - Biblioteca do Livro Didático – FEUSP
176
Outra questão ainda permeia essa primeira finalidade: o debate a respeito do
processo de ensino partindo do geral para o particular ou do particular para o geral, que
se destacou na Europa desde o início do Século XIX. No Brasil, com as novas
proposições metodológicas difundidas no final desse século, a questão passou a compor
as proposições de inovações metodológicas. Para os debates da Pedagogia, o geral
refere-se aos conteúdos mais abstratos, e os específicos, aos mais concretos, como já
discutimos na primeira parte deste trabalho.
No caso da Geografia, ressaltamos, ainda, que os debates a respeito dessa
temática incorporam a questão escalar (local/global, Corografia/Cosmografia) e a
distinção entre a Geografia particular e a Geografia geral, que passaram a compor os
novos preceitos teóricos da disciplina no mesmo período. Carvalho (1925) sugere que é
necessário partir do que está mais perto do aluno (mais concreto), da Geografia
particular, para o que se encontra mais distante (mais abstrato), tratado tanto pela
Cosmografia quanto pela Geografia geral. Assim, a Corografia e a Geografia geral não
se diferenciam somente por uma questão de escala geográfica, mas também pelos
conteúdos, porque os conceitos são abstratos, e os aspectos geográficos locais,
observáveis, próximos, são concretos. Por exemplo, o conceito de rio é um conteúdo da
Geografia geral. O rio que passa ao lado da casa do aluno é um conteúdo concreto e
local, por isso deve ser o ponto de partida do ensino de Geografia.
Essas proposições - - pedagógicas ou geográficas - trazem um elemento novo
que visa superar a memorização. Na Geografia, a maioria das propostas de organização
dos conteúdos do início do Século XIX partia do geral para o particular, da Cosmografia
para a Corografia, de modo que os livros estrangeiros pouco tratavam da corografia do
Brasil. No entanto, como já afirmamos, isso foi mudando ao longo do período, e os
livros escritos no Brasil começaram a trazer, sistematicamente, elementos da Geografia
brasileira, mas com conteúdos organizados do geral para o particular. Assim, tratava-se,
respectivamente, dos conceitos, portanto, conteúdos da Geografia geral e depois dos
continentes, países do mundo, províncias do Brasil, conteúdos da corografia, do
particular, da descrição dos lugares.
Essas proposições marcaram significativamente o ensino primário, e as
propostas inovadoras difundiram a ideia de aproximar as crianças das características
mais concretas dessa disciplina, com os fatos, uma aproximação conduzida por dois
177
processos: observar e imaginar os fenômenos geográficos para trabalhar ou exercitar,
especialmente, a intuição, a percepção e a imaginação dos alunos. Já a Geografia geral
voltava-se para as questões conceituais, para as definições, para as leis e para os
princípios mais gerias da Ciência, apresentando às crianças um conhecimento
geográfico mais amplo.
Uma crítica pertinente entre os autores do período é referente ao fato de que
muitos professores e livros didáticos optavam por começar pelas noções gerais e
deixavam de aproveitar mais as oportunidades de trabalhar primeiro o raciocínio de seus
alunos, por meio do desenvolvimento das noções individuais. Durante muito tempo,
essa questão esteve associada à recomendação que fazia parte das indicações mais
gerais para a Educação como um todo. De acordo com alguns estudiosos, como
Carvalho (2003), por exemplo, em muitos casos os livros utilizados nas escolas
primárias não eram brasileiros, portanto, apresentavam pouca relação com a Geografia
nacional. Essa questão pode ser mais bem exemplificada com as críticas de José
Veríssimo (1890), quando trata, mais especificamente, da falta de um ensino de
Geografia mais voltado para questões que visassem à formação cívica e moral dos
brasileiros57
.
Assim, as tradições do passado; as práticas já incorporadas ao fazer pedagógico
de muitos professores que adotavam ou não tais livros didáticos; as proposições
metodológicas e geográficas inovadoras; as críticas à falta de conteúdos sobre o Brasil e
o afã de superar a memorização fizeram com que alguns autores introduzissem em
algumas de suas obras mudanças de forma contraditória, porque continuam partindo dos
conteúdos referentes à Geografia Geral e a incorporar algumas inovações com cautela.
Isso pode ser comprovado no sumário da obra de Pereira (1884), em que os conteúdos
seguem a estrutura de Geografia geral para a Corografia, no entanto a escola mundial
para a local é invertida. O autor introduz alguns conceitos gerais, segue com a
corografia das províncias brasileiras, seguida dos continentes, depois alguns países, e no
final, retorna à Geografia Geral, com a introdução de novos conceitos. Vejamos os
57 Como já fizemos antes, ressaltamos a necessidade de relativizar as colocações de Carvalho (2003) e de
Veríssimo (1890), concernentes à pequena quantidade de livros didáticos de Geografia escritos por
brasileiros, pois, com base na catalogação de Silva (2012), Ângelo (2014) e Maia (2014), observa-se
no período grande número de publicação desses livros, porém sua comercialização e circulação
poderiam ser restritas, de forma a serem desconhecidas pelos dois autores.
178
detalhes da disposição do índice da referida obra nas figuras seguintes:
Figura 20a - Exemplo de maior valorização de uma Geografia geral
180
Figura 20c - Exemplo de maior valorização de uma Geografia geral
Fonte: Geographia elementar: especialmente do Brazil, 1884, por Jerônimo Sodré Pereira. Acervo:
Biblioteca Paulo Bourroul, FEUSP. Acervo: Biblioteca de livro didático da USP.
Em nossas análises, constatamos que o maior número de obras de Geografia
181
destinadas ao ensino primário segue a estrutura dos conteúdos do geral para o particular
e introduzem, inicialmente, os conceitos e, depois, a nomenclatura e/ou a descrição
referente à escala mais ampla - continentes e países – para, em seguida, apresentar os
conteúdos abordados a partir de uma escala local - as províncias. Eram poucos os livros
que invertiam tal estrutura, visando superar a memorização dos conteúdos, pois partiam
do local e do concreto. No próximo capítulo, retomaremos essa questão a partir das
proposições de Pestalozzi.
Diante do exposto, afirmamos que o ensino primário de Geografia buscou, no
período analisado, superar o problema da memorização, apresentou algumas
contradições nessa busca, mas também permaneceu apoiado em um modelo de ensino
(mais clássico e mnemônico), que fundamentou, de maneira geral, os livros didáticos
até a década de 1930, quando essa disciplina começou a se organizar com outras
finalidades e outros interesses ligados à expansão do ensino no país e à difusão de ideias
renovadoras na educação (GONÇALVES e CHAVES, 1999).
No que diz respeito à segunda finalidade estabelecida no início deste texto - a
necessidade de valorizar o ensino de cartografia - ela pode ser observada tanto nos
livros didáticos quanto em outros documentos, como no Parecer de Rui Barbosa para o
Ensino Primário (1883).
Observe-se, na imagem a seguir, o que diz o referido documento, na sessão VII,
destinada aos Methodos e aos Programmas escolares, inciso 8º, a respeito da introdução
da cartografia no programa de Geografia:
182
Figura 21: A importância do desenho e dos exercícios cartográficos para o ensino de Geografia
Fonte: BARBOSA, Ruy; ESPINOLA, Thomaz do Bomfim; VIANA; Ulisses Machado. Reforma do
ensino primario e varias instituições complementares da instrucção publica: parecer e projecto da
Commissão de Instrucção Publica em 1882 - Sessão de 12 de setembro de 1882. Rui Barbosa (relator).
Typographia Nacional. Rio de Janeiro, 1883.
Nesse documento, ressalte-se a importância dos exercícios cartográficos para o
estudo dessa disciplina no ensino primário, que eram considerados fundamentais para a
execução das finalidades do ensino de Geografia. Assim, o uso da cartografia deveria
auxiliar os alunos nas aulas sobre orientação, com um suporte no aprendizado prático da
Geografia. Nesse trecho de Barbosa (1883), a cartografia é a parte central do ensino de
Geografia.
183
O principal objetivo não era de aperfeiçoar os desenhos dos mapas, mas,
sobretudo, de saber o que as crianças aprenderiam em cada lição de Geografia. Ao
afirmar que os exercícios cartográficos poderiam ser feitos com base na topografia da
escola ou da comunidade, o autor deixa clara uma questão que já discutimos - a
importância da escala local para o ensino de Geografia. Nesse caso, a representação da
escola cumpre exatamente as proposições metodológicas que defendem a importância
de se partir do concreto, da escala local para o geral, e do abstrato, para escalas
geográficas mais amplas.
O documento sugere, também, e tem como referência a escola prussiana, e a
representação espacial é a conclusão do trabalho do professor de Geografia. Os
conhecimentos adquiridos nos traços do mapa deveriam representar não só um saber
capaz de ser definido mentalmente, mas também um valor educativo na prática. Para a
época, essas proposições metodológicas de cartografia deveriam provocar mudanças,
entretanto, se observarmos com um olhar no presente, elas trazem em si também a
memorização, já que o aluno deveria desenhar o mapa com base no que havia
aprendido, e não, lê-lo. Portanto, não se pode criticar o período, tendo em vista que seria
um anacronismo de nossa parte.
Nas obras analisadas, a cartografia é definida na linguagem escolar como a arte
do desenho de mapas, sejam eles desenhados de memória, como cópia de outros
modelos, ou exercícios de mecanização, os chamados exercícios cartográficos. De modo
geral, mas especificamente na fase inicial do período que pesquisamos, os livros
didáticos reforçavam, logo na introdução dos textos, que os exercícios cartográficos
eram fundamentais para o ensino da Geografia (PINHEIRO, 1875), pois, entre outras
funções, auxiliavam o aluno a aprender e a memorizar as formas, as localizações, as
grandezas e as distâncias.
Além dos desenhos executados pelos alunos, a indicação do uso de atlas como
um complemento indispensável para fazer os exercícios cartográficos já era comum no
Brasil, desde o início do Século XIX, como se pode observar na tradução da obra de
Gaultier (1820), que oferece um atlas elaborado pelo mesmo autor. Apesar da sugestão
do uso desse recurso didático, as proposições metodológicas pautadas na memorização
continuavam.
184
Com a difusão das inovações metodológicas e os debates acerca da memorização
e de outros aspectos aqui já tratados, a cartografia foi exercendo um novo papel no livro
didático de Geografia. Dessa forma, a indicação dos exercícios cartográficos revela a
orientação de uma prática de ensino que ultrapassava a ideia de um aprendizado
vinculado apenas a enumerações de elementos geográficos e a áridas descrições, apesar
de ainda trazer em sua essência o sentido da memorização.
Quanto à disposição dos exercícios práticos de cartografia dispostos nos livros
didáticos, nesse período, era comum o professor solicitar o auxílio do dos atlas. Os tipos
de exercícios variavam de acordo com a concepção metodológica de cada autor. Ora
eles eram mais voltados para reforçar a memorização, ora para adquirir conhecimentos
de modo mais prático. Por isso, entendemos que as inovações não se configuram de
forma linear, elas aparecem em uma obra e em outras não, mesmo que publicadas em
períodos posteriores.
Na figura seguinte (figura 22), temos um exemplo de um tipo de exercício
direcionado para um conhecimento prático e bem avançado para a época, pois supera a
ideia de memorização para o ensino de Geografia. A partir da proposta de trabalhar com
a viagem figurada, o autor procura quebrar a ideia de repetição, comum a alguns
exercícios cartográficos da época. Isso pode ser observado nas recomendações iniciais,
em que ele sugere que não se repitam mais o Atlas nem as nomenclaturas.
185
Figura 22 - Modelos de exercícios práticos de cartografia para o ensino primário
Fonte: Geographia do Brasil, de Carlos Delgado de Carvalho - 1929. Acervo: LIVRES - Biblioteca do
Livro Didático – FEUSP
186
Nesse exemplo de exercícios, temos a construção do roteiro de uma viagem
apresentada a partir de duas possibilidades: uma rota, que pode ser percorrida pelo mar,
e outra, pela terra. Ao propor esse tipo de exercício, o autor trabalha a perspectiva da
construção do conhecimento, porque exige que o aluno use mapas específicos, leia-os,
localize os lugares e destaque a localização necessária para o percurso da viagem. O
livro também evidencia que é importante descrever detalhadamente os lugares partindo
dos aspectos históricos e geográficos das cidades. Ou seja, ao fazer esses exercícios, os
alunos podem ir além da visualização e da descrição dos lugares, a partir das referências
apontadas na escala do mapa. Esse tipo de exercício apresenta outra perspectiva de se
trabalhar com o atlas, diferentemente do que propunha muitos livros publicados no
período.
Assim como no parecer de Rui Barbosa (1883), os livros didáticos de Geografia,
ao longo do período estudado, propõem os exercícios cartográficos. No mesmo parecer,
os autores reconhecem que o desenho pode auxiliar o ensino de algumas disciplinas,
entre elas, a Geografia. Isso quer dizer que, se o desenho era um elemento fundamental
para o ensino da Geografia e, por conseguinte, tinha como auxílio principal os
exercícios, podemos inferir que fazem sentido nossas indagações sobre eles como parte
importante de uma nova metodologia de ensino. Assim, tanto os conhecimentos da
cartografia quanto os exercícios propostos deveriam apresentar uma ordem de estudos
que deveriam ir do mais fácil para o mais difícil, de modo que, a cada grau de
dificuldade, o professor traria uma cadeia contínua de esclarecimentos que competiam à
escola primária.
Com essas considerações, entendemos que essa nova vinculação da Geografia
com a cartografia também estava apoiada na primeira finalidade que estabelecemos no
início do texto - romper com a memorização pautada na nomenclatura. Essa proposta de
mudança de indicação metodológica não acontece descolada de um contexto mais geral,
pois, concomitantemente ao debate que apresentava a necessidade de difundir a primeira
e a segunda finalidade da Geografia, as funções da escola mudam ou, pelo menos,
pautam-se em outro discurso e com outros objetivos sociais.
Valle (1997) assevera que a instituição escola, socialmente, tem desempenhado
um papel de destaque nas concretizações e nas consolidações dos projetos de hegemonia
187
e de ideologia burguesa. Assim, essas ideias se tornam reais a partir dessa ideologia e
não nos permitem enxergar as raízes das contradições inerentes ao sistema que usa as
contradições para disfarçar e difundir suas ideologias (VALLE, 1997). Ao usar a
“disciplina” o sistema capitalista “cria” as instituições que se configuram como
estruturas que pretendem formar o corpo e a mente dos estudantes, controlando o espaço
(sala de aula) e criando estratégias que limitam e reprimem por meio de ações
pedagógicas. É nesse contexto em que, em nome da “ordem”, a escola põe em prática o
mecanismo político-pedagógico de controle.
A escola constitui relações sociais pautadas no “discurso da uniformização”, isto
é, a partir do poder do discurso, criam-se modelos, ditam-se regras e constroem-se
comportamentos de modo que se estabelecem formas únicas para entrar, sair,
comportar-se, falar, ser e estar. Quando fala do poder que permeia o espaço escolar,
Foucault (1979, p. 8) afirma que: “[...] o que faz com que o poder se mantenha e que
seja aceito é simplesmente que ele não pesa só como uma força que diz não, mas que de
fato ele permeia, produz coisas, induz ao prazer, forma saber, produz discurso (p. 8)”.
O período de transição do regime monárquico para o regime republicano marcou
o Brasil de diferentes modos e estimulou novos contextos. As transformações sociais se
intensificaram no país desde o período oitocentista, muitas vezes, trouxeram e, em
outras, apenas revestiram os novos debates com o discurso do novo regime. Entre as
primeiras, destacamos a transformação da sociedade escravocrata em sociedade do
trabalho livre, marcada, sobretudo, nos anos iniciais do Século XX, pela intensificação
das atividades capitalistas pautadas no processo de industrialização e de urbanização e
apoiadas no movimento higienista, no apelo ao civismo, entre outros. O cenário
emergente, a partir dessa nova configuração social, revela importantes modificações nas
bases culturais, econômicas, políticas e educacionais do nosso país. Essa discussão
acerca das novas atribuições sociais dadas à instituição escola tem uma relação direta
com a terceira finalidade posta para a Geografia - sua relação com a propagação do
nacionalismo ou com os simbolismos do nacionalismo.
Essa nova conjuntura se apresenta com a divulgação de ideais sobre a concepção
de uma escola que atenda a essas demandas e que se coadunassem com a nova
sociedade emergente, ou seja, uma nova geração, com o intuito de preparar os cidadãos
para atender às exigências do Estado republicano e do movimento de modernização que
188
adentrava o Brasil.
No que concerne ao termo “modernização”, Le Goff (2013) enfatiza que só é
possível entendê-lo considerando o contato entre os países desenvolvidos com os
atrasados socioeconomicamente. Sobre isso, é importante enfatizar que essas interações
e estratégias de projeção de modernização têm como base as relações de poder que se
estabelecem entre eles, marcadas, sobretudo, por conflitos, embates e silêncios.
A discussão sobre modernização nos levou a compreender o termo “moderno”
de acordo com Le Goff (2013), que o apresenta por meio de suas contradições, ao
avaliar que, se, de um lado, a modernização visa romper com o passado, de outro, esse
termo não está carregado de tantos sentidos de “novo” ou de inovação. Nessa discussão,
o referendado autor diz que é possível distinguir três tipos de modernização:
a) a modernização equilibrada, em que o êxito da penetração do
“moderno” não destruiu o valor do “antigo”; b) a modernização
conflitual, que, atingindo apenas uma parte da sociedade e ao tender
para o “moderno” criou conflitos graves com as tradições antigas; c) a
modernização por tentativas, que sob diversas formas, procura
conciliar “moderno” e “antigo”, não através de um novo equilíbrio
geral, mas por tentativas parciais. (LE GOFF, 2013, p.176-177).
No Brasil, essa modernização se deu no que se refere aos três tipos de
modernidade apresentados na citação acima, a partir de uma modernidade definida no
exemplo b, visto que, entre nós, não só no período que estudamos, temos o “moderno” e
o “antigo” numa tentativa de negar o primeiro em relação ao segundo, para afirmar um
grupo social ou as formas de governo (VIDAL, 1999).
Faria Filho (1998), ao estudar os traços da cultura da escola primária, traz
exemplo de como essa instituição foi sendo desenhada e pensada simbolicamente, a
partir das definições de moderno, das representações do que seria ser escola com base
nos debates republicanos. Esse mesmo autor também concorda com Le Goff (2013),
quando afirma que as tradições e os costumes antigos, silenciosa e conflituosamente,
foram construindo um ideal de modernidade de acordo com as finalidades e os
interesses de cada grupo social. Em suma, podemos dizer que, no Brasil, o processo de
modernização ocorreu de forma lenta, e se há uma datação que pode especificar tal
processo, seria o Segundo Reinado. Assim, é possível observar historicamente a
influência dos debates que vão desencadear essa modernização também nos livros
189
didáticos de Geografia da época.
Nos anos iniciais do Século XIX, os livros didáticos de Geografia traziam
sistematicamente impressos os ideais monarquistas. Eles eram expostos tanto na
introdução de tais publicações quanto no corpo do texto. Muitas dessas publicações
eram dedicadas ao Imperador, algumas delas com textos elogiosos sobre ele.
A partir de 1870 e 80, quando as publicações nacionais se avolumaram, esses
livros tanto os destinados ao ensino primário quanto ao secundário - apresentaram
evidências de ideias republicanas (ANGELO, 2014), expressadas por meio de inovações
de cunho pedagógico e científico, e de debates nacionalistas, com destaque para a
exploração e a valorização do território e de um projeto de educação nacional sob os
princípios liberais e positivistas. Assim, encontramos autores que continuam difundindo
a continuidade monarquista e os que defendem o republicanismo58
, o que demonstra
uma relação próxima entre a política e os livros didáticos dessa disciplina.
No Brasil, a construção da nacionalidade via representações da nação, segundo
José Murilo de Carvalho (2003), passou por transformações sistemáticas ao longo da
história, que também compuseram os conteúdos dos livros didáticos de Geografia. De
acordo com esse autor, a primeira figura a simbolizar a nação brasileira foi o índio, e
isso ficou marcado na literatura, no entanto, ele não compôs o acervo de livros escolares
dessa disciplina nas primeiras publicações nacionais. Carvalho (2003) acrescenta que o
segundo elemento a ser associado a essa função foi a natureza, que, durante décadas,
continuou a ser o elemento motivador do estímulo nacionalista para a Geografia. Depois
da Guerra do Paraguai, outro elemento passou a compor essa representação de nação - o
território. Gáudio e Braga (2007) asseveram que o “[...] território precisamente
demarcado e apropriado, além de historicamente associado a determinado povo se
constitui em um dos marcos materiais da ideologia nacional. Portanto, espera-se que
estados nacionais “possuam” um território demarcado e “um povo”, sobre o qual
determinado Estado exerça soberania, e que seja reconhecido como tal pelos demais
estados nacionais [...]”. Este último foi também incorporado pela Geografia escolar e
58 Alguns autores expressavam seu posicionamento político em outros impressos que circulavam no
período, como o renomado Professor-autor de livros didáticos de História e Geografia, Alfredo
Moreira Pinto, um republicano assumido e defensor do federalismo, que difundia suas ideias no
periódico A República, e foi um dos signatários do Manifesto Republicano, de 1870 (ANGELO,
2014).
190
adotado nos livros didáticos destinados à mocidade brasileira.
Segundo Gáudio e Braga (2007), entre nós, brasileiros, a construção da ideologia
nacional é marcada, principalmente, pelo ensino da Geografia. As autoras afirmam “[...]
isso com base na perenidade, no ensino dessa disciplina escolar, de temas como o
destaque atribuído à “nossa extensão territorial”, à exuberância de “nossa natureza” e,
somente depois, à discussão acerca da constituição do povo” (GÁUDIO e BRAGA,
2007, p. 181). Nessa mesma perspectiva, mas em período bem anterior, Carvalho (1925)
afirma que, no Brasil, tivemos uma representação ideológica de nacionalismos marcada
pela dominação de classe, em que o povo não participa das decisões, mas apenas assiste
aos “golpes” do governo como “bestializados”, como denominou Carvalho (2005a),
quando definiu a participação do povo na sistematização da ideologia nacional.
Acreditamos que, entre o final do Império e os anos inicias da década de 1930,
esses elementos representantes da nação foram, de certa forma, constituidores de
conteúdos destinados ao ensino de Geografia. É preciso acrescentar, ainda, que esses
elementos já eram temas abordados nos livros europeus que influenciaram, direta ou
indiretamente, as publicações didáticas brasileiras. Então, abordar contundentemente a
natureza não foi somente, como parece para alguns, uma cópia dos conteúdos abordados
pelos livros didáticos oriundos daquele continente, porque também estava de acordo
com os ideais que aqui se construíam em torno da nação. Essa relação é fundamental
para se compreender a afirmativa já tratada na tese de Valch (1988) e que continuou
sendo debatida posteriormente, porém sem levar em consideração os elementos sobre a
nacionalidade que ora apresentamos.
Assim, a escola, por meio de um conjunto de disciplinas destinadas ao
conhecimento sobre o Brasil, como a Geografia do Brasil, a História Nacional, a Língua
Portuguesa e a Literatura Brasileira, passou a exercer um importante papel na
propagação das ideias nacionalistas e, posteriormente, patrióticos, como apontam alguns
autores que, partindo de distintos posicionamentos e perspectivas teóricas, destacam a
Geografia do Brasil e a História nacional (VLACH, 1988; ROCHA, 1996;
BITTENCOURT, 2008; ALBUQUERQUE, 2011) como difusoras de ideais defendidos
pelos grupos sociais que estavam no poder ou por aqueles que, sendo autores e tendo
possibilidade de difundir suas ideias, também o faziam.
Saviani (2006) enuncia que as ideias republicanas foram amplamente difundidas
191
em âmbito nacional, durante esse período, especialmente nas escolas primárias. O
propósito era de construir uma nação moderna sob as concepções do iluminismo e do
liberalismo, visando formar um cidadão capaz de defender sua pátria, um novo homem
civilizado e profissionalmente capacitado para o mundo do trabalho (MORAES, 1991).
Sobre essa afirmação, Carvalho (2005a) diz que, durante todo o Século XIX, a
educação primária não foi utilizada como instrumento de socialização política, portanto,
não se portou como uma ferramenta eficaz para difundir esse ideal de cidadão nos
bancos escolares. Esse autor corrobora com Veríssimo (1890), quando esse enfatiza que
no período da Primeira República, a educação primária não apresentava uma concepção
de pátria, nem tão pouco ensinava educação moral e cívica, como aponta Vlach (1988),
quando discutiu que a Geografia tinha por finalidade difundir o nacionalismo patriótico.
De acordo com Carvalho (1994, p. 249), a proclamação da República foi um ato
político sem a participação do povo, um movimento nacional que se firmava pautado
em um discurso de uma nova forma de governo, que carregava
[...] os conflitos que seguiam a sua proclamação e à necessidade de
afirmar-se como nova forma de governo em oposição à monarquia
contribuíram para renovar o debate em torno do problema nacional.
Eliminada a dinastia portuguesa, o País ficava entregue a si mesmo, e
a pergunta sobre o que era esse País tornava-se mais premente.
Em outras palavras, podemos dizer que tivemos um “imaginário da República”,
como bem denomina Carvalho (1994, p. 255), pois a concepção de imagem positiva do
país, de sua gente e de sua história “[...] limitava-se à literatura infantil. Entre as elites,
seria considerada ingênua. O cientificismo responsável pelos determinismos
geográficos, climático e racial, ainda impedia que um país tropical e mestiço fosse visto
como competidor sério na corrida da civilização”.
Essa nova concepção de sociedade reclamava a presença de escolas, porquanto
desempenhavam um papel determinante no fortalecimento desse ideal de cidadão
definido pelo mundo do trabalho. No entanto, Saviani (2006) faz questão de mencionar
que, no “breve” Século XIX, sobretudo durante as primeiras décadas, as escolas
sofreram com a escassez de materiais didáticos. Bittencourt (2008) assevera que a
maioria dos alunos e, até, dos professores não tinha acesso a esse tipo de material, seja
pela falta de recursos financeiros desses sujeitos (o livro era um produto muito caro),
192
seja pelo fato de a aquisição desses materiais não fazer parte de uma política efetiva do
governo (ALBUQUERQUE, 2010).
Segundo Rocha (1996), nesse processo de instauração dos ideais liberais
republicanos, havia diversas tentativas de fundir, na sociedade brasileira, a hegemonia
da República por meio de várias instituições, como escolas, igrejas, poder político, isto
é, qualquer instituição que tivesse o poder de controlar e de criar novas visões de mundo
desempenhava importante papel social.
Cientes da importância das estratégias que a escola utilizava para difundir as
representações de formação dos sujeitos sociais e de que elas passam por modificações
ao longo tempo, entendemos que os debates que estavam em voga, no período que
compreende nossa pesquisa, passam diretamente pelos objetivos da educação escolar
republicana. Por isso, enfatizamos que pensar sobre o papel da Geografia nesses debates
é relacionar a influência dessa disciplina na constituição da cultura escolar que se
formou com base nos processos de socialização, apropriação e (re) invenção cultural no
processo de educação primária republicana.
Assim, temos a escola primária, por excelência, como lugar social de educação
da infância, como modelo ideal e hegemônico (GONDRA e SCHUELER, 2008) para
difundir os ideais burgueses que eram tão necessários para manter formas de dominação
e de controle social. Nesse sentido, destacamos o lugar ocupado pela Geografia no
fortalecimento desse debate, porque entendemos que, nesse processo de reconhecimento
e de apropriação do espaço dominar a natureza por parte do sistema capitalista e da
classe burguesa, a Geografia é reconhecida como uma das disciplinas que portavam um
saber que, por excelência, garantia essa dominação (MORAES, 1991).
Nesse contexto, o saber geográfico porta-se como subsídio da dominação, a
começar pelo enquadramento do homem em padrões, controlando espaço e tempo, para
dominar a sociedade e fortalecer o Estado burguês (VLACH, 1988). Ao longo do Século
XIX, o conhecimento geográfico foi se adequando às finalidades do processo de
escolarização mais amplo da sociedade e aos interesses de disseminar um discurso
marcado por uma cultura iluminada pela visão da elite ou dos seus setores de
dominação, ou seja, uma representação da cultura nacional (GÁUDIO e BRAGA,
2007).
193
Conforme observamos nos projetos educacionais que caracterizaram o Brasil
oitocentista e as primeiras décadas do Século XX, além de investir na formação de mão
de obra para servir ao mundo do trabalho, defendiam a formação de um cidadão
conhecedor do território nacional em suas dimensões históricas e geográficas. Nesse
caso, temos a proposta da inculcação de “representações do nacionalismo” pela via da
instituição escolar, que ia se modificando de acordo com os interesses de cada tempo, o
que demandava inovações nos materiais didáticos e nos constituintes da cultura escolar
da época como um todo.
Entre outros acontecimentos que marcaram o início do Século XX e que se
pautavam no nacionalismo, destacamos a atuação da Liga de Defesa Nacional no Rio de
Janeiro (1916) e a Liga Nacional em São Paulo (1917)
59. Chamamos à atenção para
esses fatos, sobretudo por tratarem mais diretamente das estratégias de ação para
propagar o nacionalismo no país, com exemplos claros do papel da Geografia nesse
contexto.
De acordo com Nagle (2001), o Estatuto da Primeira Liga objetivava defender a
ideia de coesão e integridade, na tentativa de difundir a instrução militar nas diversas
instituições, visando formar o trabalho nacional com base no civismo e no culto ao
heroísmo. Nas palavras de Nagle (2001), devemos
[...] manter a ideia de coesão e integridade nacional; defender o
trabalho nacional; avivar o estudo da história do Brasil e das tradições
brasileiras; promover o ensino da língua pátria nas escolas
estrangeiras existentes no país; propagar a educação popular e
profissional; difundir nas escolas o amor à justiça e o culto do
patriotismo; combater o analfabetismo (p.66).
Esses objetivos compunham o ideário de uma elite intelectual que conduzia,
direcionava e formava a mentalidade brasileira. Um dos focos era a alfabetização da
população, para contribuir com o progresso do país e, consequentemente, participar das
eleições. A segunda Liga Nacionalista seguia os princípios elencados pela Liga de
59 A finalidade principal dessas Ligas era de criar estratégias de ação para propagar o nacionalismo no
país. O princípio básico desses movimentos era o serviço militar, cujo objetivo era de proteger os
brasileiros em relação ao estrangeiro, e o foco estava no combate ao perigo interno. É importante
enfatizar que a primeira Liga influenciou e inspirou a criação da segunda, que lutava pelos mesmos
princípios, incorporando apenas alguns pontos como: combater a fraude nas eleições, manter a
obrigatoriedade do ensino da língua e uma história e uma Geografia da pátria nas escolas estrangeiras
que funcionassem em solo brasileiro.
194
Defesa Nacional, porém foram acrescentados os seguintes objetivos ao seu estatuto:
Lutar pela federação e unidade nacional, pela defesa nacional, pela
efetividade do voto, pelo desenvolvimento da educação cívica, da
educação primária, secundária e profissional. Mantêm-se o amor à
pátria e às tradições nacionais, a obrigatoriedade do ensino da língua,
da história e da geografia pátrias em escolas estrangeiras existentes no
país, a educação física, o escotismo, as linhas de tiro e o preparo
militar (NAGLE, 2001, p. 68 e 69).
Esse debate tinha como base as concepções do modelo escolanovista. Já na
década de 20 do Século XX, havia certa inversão nos debates educacionais, e o ensino
intuitivo, que liderava os assuntos pedagógicos, deu lugar à nova Pedagogia do
escolanovismo. Entre os debates postos, identificamos, na literatura educacional, a
emergência de uma pedagogia que se preocupava com o “concreto” e com a natureza
psicológica, no que tange à nova concepção de infância. Quanto ao papel ocupado pela
Psicologia, era bem comum ouvir falar em etapas do desenvolvimento do educando
visando à promoção da nova concepção de infância. Nessas discussões, ficou acordado
que seria preciso formar um educador de méritos, com a capacidade de teorizar a
escolarização.
Assim, no âmbito da educação, entre o final da década de 1930 e o início da
década de 1950, houve um equilíbrio entre a Pedagogia tradicional e a Pedagogia nova.
De acordo com Saviani (2008), a primeira estaria mais voltada para os interesses da
Igreja Católica, portanto visava promover uma educação religiosa, elitista e pautada
numa abordagem dos conteúdos desvinculada da realidade do aluno. E segunda, a
Educação Nova, estava direcionada para uma educação mais prática, voltada para
contato do aluno com a realidade. Essas duas correntes de pensamento pedagógico
influenciaram a produção didática de Geografia no período e as metodologias de ensino
que eram adotadas na escola. Nesse momento, a Geografia se direcionou a um novo
modelo de cidadão e a uma nova perspectiva de nacionalidade, ou seja, essa disciplina
passou a ter outras finalidades.
O governo de Getúlio Vargas preconizava a redução dos poderes da Igreja e
impunha ao Estado a tarefa de conduzir o processo educacional. Para isso, apoiou-se,
principalmente, na Educação Nova, que foi alvo de um conjunto de críticas por parte
dos defensores da Igreja como uma instituição que deveria conduzir o processo
195
educacional. Essas duas matrizes pedagógicas influenciaram, nesse contexto, o
estabelecimento de duas perspectivas para as abordagens nos livros didáticos de
Geografia - uma clássica e outra moderna (ROCHA, 1996).
Essa orientação moderna teve início com os Pareceres de Rui Barbosa, como já
discutimos neste trabalho e se desenvolveu a partir do livro didático Compêndio de
Geographia Elementar, de Manuel Said Ali Ida (1905), e se consolidou como proposta
metodológica com a publicação do livro Geographia do Brasil, de Carlos Miguel
Delgado de Carvalho (1913). Essas publicações indicam o início da segunda fase da
Geografia escolar no Brasil a partir dos livros didáticos, denominada de “Geografia(s)
Moderna(s)” (ROCHA, 1996).
Com essas considerações, entendemos que as discussões de ordem metodológica
tiveram impacto direto no campo educacional e se configuraram na elaboração de
projetos que visavam atingir toda a educação nacional. Quanto à produção dos materiais
didáticos, Bittencourt (2008) enfatiza que as concepções dos projetos de elaboração e
produção dos livros didáticos passam, cada vez mais, a propagar os ideais republicanos
e nacionalistas e a proporcionar um ensino de base positivista e cientificista a favor de
uma escola laica. Esses debates fortaleciam diretamente o círculo dos intelectuais
liberais e republicanos mais radicais, que defendiam a criação de um estado e uma
educação nacional. Nesse aspecto, também observamos as críticas ao conservadorismo e
ao estrangeirismo das obras didáticas que circularam nas escolas brasileiras nesse
período.
A seguir, no último capítulo da tese, apresentamos, mais detalhadamente, nossas
análises referentes à relação dos métodos de ensino, dos exercícios e dos livros didáticos
com a discussão mais ampla do processo de renovação dos métodos.
196
3ª parte
MÉTODOS DE ENSINO E EXERCÍCIOS NOS LIVROS DIDÁTICOS
CAPÍTULO V: MÉTODOS DE ENSINO NAS ESCOLAS PRIMÁRIAS: UM
DEBATE CENTRADO NO PROCESSO DE RENOVAÇÃO DOS MÉTODOS NO
BRASIL
5.1 Discussão sobre a renovação dos métodos no Brasil: as propostas pedagógicas e
o legado de Pestalozzi para o ensino de Geografia
Ao longo do processo de escolarização, os métodos de ensino tinham a função
de reconstruir os espaços e inventar novas sociabilidades. À proporção que a história de
um se fazia, inventava-se e recriava-se a formação do outro. Nesse caminhar da
escolarização, os debates sobre os métodos de ensino aparecem como uma estratégia
primordial da institucionalização da educação escolar e do início do discurso de
formação de professores no Brasil.
A difusão da escolarização, o aumento das funções a ela atribuída
(formação moral e instrução elementar) e a necessidade de formar
professores fomentaram o movimento de renovação pedagógica que
depositou no método de ensino as esperanças de realização dos
propósitos filosóficos e sociais consensualmente aceitos
(VALDEMARIN, 2010, p. 21).
Essa perspectiva de análise nos possibilitou compreender a história da escola a
partir da composição de mecanismos internos e de certa materialidade própria dela
assim como da construção da própria noção de educabilidade da infância e, ainda, da
produção de formas anteriores de educar e instruir as gerações (FARIA FILHO, 2002).
A escola, ao se compor como instituição responsável pela educação e pela instrução das
novas gerações, não assume essa tarefa de maneira tranquila e consensual, mas
conflituosa, procurando resgatar a concepção de infância de outros espaços-tempos
próprios de formação, notadamente a família, a religião e o mundo do trabalho.
Estudos mostram hoje que esses processos ocorreram de modo bem particular
nos diversos países do mundo ocidental e que, nos Séculos XVIII, XIX e XX, essa
discussão sofreu um impulso jamais visto e “[...] acabou por legar-nos uma tradição
cultural no que se refere a infância, escolarizada ou não (FARIA FILHO, ROSA e
197
INACIO, 2003, p. 01).
No nosso entendimento, mesmo sabendo que havia instituições escolares
anteriores ao início do Século XIX e que somos marcados pela cultura letrada do
Período Colonial, foi na pós-Independência que o processo de escolarização foi
impulsionado no Brasil. Nesse momento, são notórias as influências da instituição
escolar para além dos seus “muros”, a qual fez sentir seus traços e significados em
lugares onde ela não existia ou pelos sujeitos que não faziam parte desse universo. O
caminhar da ação escolar foi se propagando para toda a sociedade e passou a ser um
referencial importante para constituir ou definir identidades individuais e de grupos,
públicas e privadas, escolares e não escolares, entre outras.
Ao estudar a organização da escola, sobretudo a questão normativa,
compreendemos o espaço escolar como uma construção social advinda de preocupações
de diversas ordens, entre elas, a política e a administrativa, que acabaram por criar
escolas institucionalizadas e outras não institucionalizadas, assistemáticas, informais e
espontâneas. A implantação da escola como um lugar específico implica o processo de
escolarização com a inserção das novas gerações na cultura social, sobretudo, nas
práticas pedagógicas que se encontravam e se entrelaçavam entre alunos e professores.
Também requer considerações sobre as formas de ensinar e de organizar atreladas às
concepções pedagógicas.
A importância dos métodos de ensino foi algo discutido ao longo dos Séculos
XVII, XVIII e XIX e se estendeu até os dias atuais. Sua relevância, em períodos
anteriores, era tanto pela formação dos professores quanto pela aprendizagem das
crianças e dos jovens. Historicamente, os métodos podem ser definidos como síntese
das proposições teóricas e guia prático da profissão de ensinar (VALDEMARIN, 2010).
Quando falamos dos métodos presentes nos livros didáticos, dentre outras
questões, estamos reconhecendo-os como indicativos de concepções pedagógicas,
práticas e saberes escolares que são transmitidos pelos livros didáticos. Esse
apontamento nos leva a considerar o método como um dos elementos importantes para a
construção do saber escolar e um apoio na execução dos objetivos de uma disciplina
escolar. Essa colocação pode implicar a relação da escola com os métodos de ensino
como um amplo processo histórico de modificações da cultura escolar. Por isso,
Valdemarin (2006, p. 15), em suas reconhecidas pesquisas acerca dos métodos, enfatiza
198
que “[...] o método de ensino é apresentado como um conjunto de procedimentos
derivados de uma teoria do conhecimento que atribui aos sentidos o ponto de partida da
formação das ideias e dos pensamentos claros”.
Historicamente, a questão dos métodos de ensino se apresenta como
indissociável da organização pedagógica da escola, em especial, no que se refere ao
método como processo didático, como algo que lida diretamente com os termos ensino
e aprendizagem.
O método é, pois, uma aplicação dessa relação “ensino-
aprendizagem”. O termo é aplicado a uma infinidade de variedades ou
tipos. Em todos, porém, a função é a mesma e supõe: alguma coisa a
ensinar, alguém que ensine e o ensino para alguém. Essa constatação,
um tanto trivial, responde entretanto aos que julgam que, para ensinar,
não há métodos, mas apenas um bom conhecimento da matéria, por
parte de quem se propõe a ensiná-la (CARVALHO, 1957, p. 139 e
140).
Nas leituras, compreendemos que os métodos, especialmente no Século XIX,
exerciam centralidade nas discussões educacionais. Entre os estudiosos desse tema, tem
sido comum apontar o conceito de método e o que se entende por esse termo em dado
contexto (SOUSA, 2011).
Para situar nossa discussão acerca dos métodos, recorremos aos estudos sobre a
instrução pública de países da Europa, porque entendemos que eles se ampliaram
durante o Século XIX, devido aos avanços da industrialização. Um das exigências
impostas nesse período era a necessidade de formar mão de obra qualificada, e a escola
era responsável por tal processo. Assim, os debates sobre o ensino público ganharam
mais visibilidade e passaram a exigir um sistema educacional que atendesse aos
interesses políticos e sociais do período.
No caso específico da Europa, os estudiosos do período se preocupavam em
diferenciar o conceito de modo, métodos e processos de ensino. As pesquisas apontam
não só o desenvolvimento do campo pedagógico como uma imprecisão conceitual
devido às suas especificidades em cada momento histórico. Para Souza (2011, p. 339),
o conceito de modo estava fundamentado na ideia de organizar e
dirigir o ensino, em como agrupar os alunos e distribuir as matérias
colocando em discussão a organização pedagógica de maneira mais
abrangente. No Brasil, entretanto foi muito comum o uso do termo
método para se referir ao ensino individual, mútuo, simultâneo e
199
misto.
Com base nessa definição conceitual e devido à aproximação dos conceitos com
a aplicação dos termos ao longo da história no Brasil, entendemos que seria mais
apropriado usar em nossa tese esses dois termos com o mesmo sentido: modo e método.
No Brasil, é importante situar a emergência dos métodos associados à prática do
ensino individual e aos modos de organização da escola primária a partir de uma longa
tradição. Entendemos essa configuração pedagógica como um momento de constituição
de uma nova cultura escolar. A prática do ensino individual e mútuo, no Século XIX,
esteve presente tanto nas escolas públicas quanto nas particulares, no Brasil ou em
outros países do Ocidente (SOUZA, 2008).
Retomaremos a discussão que aponta para a organização pedagógica como um
processo histórico e cultural mais amplo, que está diretamente associada às finalidades
da escola e da escolarização. O termo escolarização perpassa toda a nossa tese, porque
acreditamos que, por meio de uma discussão desse termo no sentido mais abrangente
(seus múltiplos significados e diversificados fatores), temos chegado a detalhes do
nosso objeto de estudo que estão relacionados a esse termo e que marcam esse processo.
Isto é, temos compreendido que “os exercícios fazem parte de um amplo processo
histórico e cultural, o da escolarização” (MOURA, 2010, p.6). Em nossos estudos, o
termo escolarização tem dois sentidos, que estão intimamente interligados, ao longo dos
tempos, especialmente nos últimos dois séculos de nossa sociedade.
Primeiramente, o termo escolarização visa definir os processos e as políticas
relativas à “organização” de uma rede, ou, podemos dizer, de “redes”, de instituições
escolares (formais ou não), que tinham a função de promover o ensino elementar da
leitura, da escrita, do cálculo e, na maioria das vezes, da moral e da religião, em níveis
mais simplificados ou aprofundados. O termo escolarização, nesta pesquisa, é mais
voltado para a escola como uma instituição escolar.
Em outra perspectiva, entendemos a escolarização como a produção de
referências sociais que têm a escola como o eixo articulador de seus significados e
sentidos na forma escolar de socialização. Ou seja, nosso olhar se dirige às concepções
sociais, culturais e políticas da escolarização, às questões relacionadas ao processo de
letramento e ao reconhecimento ou não das competências culturais e políticas dos
200
diversos sujeitos sociais e da profissão docente.
Nessa discussão, para entender o fenômeno da escolarização em seu sentido
mais amplo, devemos considerar um tempo mais longo da nossa sociedade, como por
exemplo, os dois últimos séculos. Nesse tempo considerado longo, pudemos perceber,
com mais clareza, no diz que respeito à escola, que os diversos significados e variados
são fatores incisivos da mudança radical na sociedade do início do Século XIX - sem
escolas - para uma realidade de quase todas as nossas crianças do Século XXI – o
acesso à escola.
A esse respeito, vale a pena relembrar o que já apontou E. P. Thompson (1984),
ao enfatizar que, na transição de uma sociedade não escolarizada para uma escolarizada,
os embates e as tensões desse fato influenciam diretamente na totalidade do social, ou
seja, não apenas o que toca diretamente a escola, mas, sobretudo, nas mais profundas
práticas culturais e nos processos sociais. Assim, temos, mesmo que lentamente,
diversas modificações no cenário social, impulsionadas pelo impacto da escolarização:
formas de comunicações, gestando a constituição de sujeitos, passando por inevitáveis
dimensões materiais que promovem a vida humana e sua reprodução na sociedade
(FARIA FILHO, 2002).
A organização do espaço escolar é pensada de maneira detalhada e
estrategicamente articulada, ou seja, a instituição escolar não surge no vazio ou na
substituição de outras instituições.
Os defensores da escola e de sua importância no processo de
civilização do povo tiveram que, lentamente deslocar tradicionais
instituições de educação e instrução, apropriando-se, remodelando ou
recusando a tempos, a espaços, a conhecimentos, a sensibilidades e a
valores próprios às mesmas. Mas não apenas isso, a escola teve
também de inventar, de produzir, o seu lugar próprio, e o fez, também
em íntimo diálogo com outras esferas e instituições sociais (FARIA
FILHO, ROSA, INACIO, 2003, p. 14).
Essa colocação nos encaminha para reafirmar que era evidente a necessidade de
criar possibilidades que poderiam promover o acesso da população à escola,
especialmente para garantir a oferta de ler e de escrever, em que residia a maior das
preocupações de uma parte da intelectualidade a partir do final do Século XIX, mas que
se intensificou nos anos de 1920: a educação do povo. Então, educar o povo era o único
caminho para findar os traços de uma nova tradição que tinha como base a ordem, o
201
progresso e a civilização do povo brasileiro. Nessa tarefa, temos, de maneira evidente,
o reconhecimento do papel da escola primária.
[...] na formação do caráter e no desenvolvimento das virtudes morais
e sentimentos patrióticos fomentou e justificou as expectativas em
relação à sua institucionalização no período republicano. [...] A
história da escola primária guarda uma relação intrínseca com a
história do magistério primário. Formação, condições de ingresso na
carreira de trabalho, as lutas e a identidade profissional são
fundamentais para o entendimento da escola primária como instituição
(SOUZA; FARIA FILHO, 2006, p. 37 e 43).
Nesse chamado “lugar” de formação docente, destaca-se a questão do método de
ensino. Isso significa que o discurso fundador da formação docente passa diretamente
pelas estratégias e tentativas de promover e aperfeiçoar as metodologias de ensino. A
questão dos métodos é uma prioridade no domínio do espaço escolar pelo professor,
pois, através da organização do como ensinar, os professores poderiam habituar-se às
especificidades da forma escolar, dentre elas: os modos como os sujeitos se organizam
na vida social, as formas de transmitir os conhecimentos e o modo mais amplo de se
socializar específico da escola.
A chamada modernidade, que foi diluída ao longo dos Séculos XVII, XVIII e
XIX, trouxe proposições educacionais que elucidaram a importância do método de
ensino tanto para as questões voltadas para a formação de professores, quanto para as
que envolviam a aprendizagem das crianças e dos adultos. No entanto, no Século XX,
havia uma preocupação mais sistemática com a aprendizagem:
[...] as concepções pedagógicas deslocaram suas preocupações sobre o
ensino para as questões sobre como a criança aprende, emergindo aí
um primado dos fundamentos psicológicos da educação em
detrimento dos fundamentos filosóficos e didáticos, componentes
essenciais na elaboração de métodos de ensino. (VALDEMARIN,
2006, p. 01).
A problemática relativa a como ensinar, que também pode ser uma questão
referente aos métodos de ensino, foi considerada, no Século XIX, como uma temática
menos importante na escala dos problemas educacionais que merecem reflexão e debate
profícuo. Essa questão estava no cerne da modernidade, portanto, não poderia deixar de
ser um aspecto de destaque nas discussões concernentes aos processos de escolarização.
Ao longo do Século XX, houve uma aglutinação de problemáticas, pois, partir
202
das discussões sobre processos de aprendizagem do aluno, o conteúdo a ser ensinado e
os valores formativos foram elucidados, a abrangência do processo educativo diminuiu
e foi produzida uma cultura escolar menos rica e mais simplificada. Para traçar um
panorama dos métodos de ensino que definem a profissão de professor e o processo de
aprendizagem do aluno, apresentamos, de maneira genealógica, três importantes obras
importantes na organização das concepções pedagógicas modernas: no Século XVII, a
Didactica Magna, de João A. Comênio60
; no Século XVIII, o Emílio ou da Educação,
de Jean-Jacques Rousseau61
; e no final do Século XIX, Lições de Coisas, de Froebel62
e
Pestalozzi63
.
A obra Didactica Magna, publicada em 1670, continha as diretrizes gerais que
deveriam regimentar as bases da instituição escolar moderna e recomendações relativas
60
Jan Amos Komensky (em português Comênio) (1592-1670), nascido em Nivnice (então domínio dos
Habsburgos, hoje República Tcheca), ficou conhecido como o pai da Didática moderna. Sua educação
foi consumada na Universidade Calvinista de Herbron, na Alemanha, onde se graduou em Teologia e
consolidou seus conhecimentos culturais. Para Comênio, a educação deveria reafirmar a igualdade de
direito de todos os indivíduos, no que tange ao acesso à esfera do conhecimento. A educação
comeniana tinha como base uma concepção religiosa, pois entendia que todos deveriam ter direito a
educação porque todos eram filhos de Deus.
(http://educarparacrescer.abril.com.br/aprendizagem/grandes-pensadores. Acesso em: 20/08/2016).
61 Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) foi um filósofo que nasceu na Suíça e por lá ficou até os 16 anos
de idade. Foi um jovem que, logo cedo, teve que aprender a cuidar da própria vida, porque sua mãe
morreu quando ele ainda era bem jovem. Aos 30 anos, foi morar em Paris e lá começou seus primeiros
contatos com os filósofos iluministas e se interessou pelo estudo das fases da infância da criança. Para
Rousseau, a criança deveria ser educada, sobretudo, em liberdade e viver cada fase da infância na
plenitude de seus sentidos, pois, de acordo com sua concepção de educação, até os 12 anos, o ser
humano é praticamente constituído somente de sentidos, emoções e corpo físico. Tal pensador
defendia a formação do homem como cidadão, e para que isso acontecesse, a dimensão política era
algo fundamental para o desenvolvimento dos seus princípios de educação.
(http://educarparacrescer.abril.com.br/aprendizagem/grandes-pensadores. Acesso em: 15/07/2016).
62 Friedrich Froebel (1782-1860) foi um filósofo alemão que dizia que era por meio da educação que a
criança iria se reconhecer como um membro do todo. Foi ele um dos primeiros educadores a
considerar o início da infância como uma fase de importância decisiva na formação das pessoas, que a
natureza era a manifestação de Deus no mundo terreno e expressava a unidade de todas as coisas.
Froebel defendia a ideia de “aprender a aprender”. Segundo ele, a educação se desenvolvia
espontaneamente, ou seja, quanto mais ativa era a mente da criança, mais ela estava receptiva a novos
conhecimentos. Por causa de sua pedagogia, os jardins de infância rapidamente se espalharam pela
Europa e nos Estados Unidos e, mais tarde, foram incorporados aos preceitos educacionais do
filósofo John Dewey. (http://educarparacrescer.abril.com.br/aprendizagem/grandes-pensadores.
Acesso em: 17/07/2016).
63 Johann Heinrich Pestalozzi (1746-1827) foi um educador suíço, nascido em Zurich, cujo pensamento
foi influenciado pelas ideias de Rousseau, principalmente por fazer parte de um movimento romântico
e mais voltado para questões da natureza. Suas propostas pedagógicas circularam nas escolas da
Prússia, e foi significativa sua influência como pedagogo na reorganização dos métodos, em especial,
na difusão dos métodos pestalozzianos que atuaram diretamente na formação dos professores. Em
virtude da atuação direta desse pensador, a educação prussiana passou a ser chamada de sistema
escolar prussiano-pestalozziano. (http://educarparacrescer.abril.com.br/aprendizagem/grandes-
pensadores. Acesso em: 20/08/2016).
203
à transmissão do conhecimento – como uma proposta para todos os indivíduos. Assim,
caberia aos especialistas do campo da Educação procurar botar em prática
metodicamente as propostas do trabalho de Comênio, que, em seu tratado educacional,
apresenta a escola como um local específico para a educação dos jovens e adultos; o
professor, como portador do conhecimento e responsável por transmitir o conhecimento
como um conjunto de saberes culturalmente selecionado. Seu método de ensino trouxe
inovações que, até hoje, são consideradas fundamentais para se discutir sobre os modos
de ensinar.
Conhecido também como o iniciador da metodologia, Comênio recomendava
que os estudos tomassem como base os sentidos – as percepções sensoriais deveriam
preceder a compreensão das crianças. De forma geral, a educação comeniana tinha
como base uma concepção religiosa – todos deveriam ter direito a educação porque
todos são filhos de Deus.
Nesse momento, temos a emergência das discussões sobre o método para ensinar
e sua relevância para a construção da educação moderna. Nas palavras de Valdemarin
(2006, p. 02),
todas essas novas exigências postas pela sociedade e pela
complexidade da própria tarefa educativa têm no método de ensino
seu suporte: ele é o elemento, o saber que diferencia a docência das
outras profissões tornando-a específica. A tríade educacional é
composta pelo conteúdo a ser ensinado – a natureza – pelo aluno – do
qual se conhece o processo de aprendizagem – e pelo professor – o
portador do método que garante que os conteúdos serão ensinados aos
alunos.
Pelo método, temos a possibilidade de produzir as impressões dos sentidos, a
organização dos conteúdos a serem ensinados de acordo com a utilidade e o proveito
humano. O método preceitua, então, que é preciso observar as coisas, as formas de
impressionar os sentidos, que podem traçar um panorama das generalizações, diferentes
e semelhantes dos conteúdos, cujas variações e resultados serão constatados nas lições
que as crianças realizam na escola.
Dando continuidade às produções europeias sobre o pensamento pedagógico
moderno, no Século XVIII, destaca-se a publicação de outra obra, o Emílio ou da
Educação, de Jean-Jacques Rousseau, uma produção bem diferenciada da defendida por
Comênio. O principal aspecto de divergência diz respeito à concepção de política,
204
considerada como determinante para se entender esse tratado pedagógico, enquanto
Comênio entendia a educação como parte da religião. Em outras palavras, o projeto de
Rousseau é, sobretudo, um projeto político. Diferentemente dos princípios elencados
por Comênio, Rousseau traz outra configuração para educação – todos devem ser
educados para o exercício da cidadania, e a educação é um requisito para a igualdade
política64
. Outra diferença, é que o tratado pedagógico de Rousseau não é pensado para
ser desenvolvido nas escolas, porquanto traz concepções gerais e específicas vinculadas
a um projeto político mais amplo. Nessa obra, Rousseau almeja desenvolver um
trabalho de transformação social, pois nela está contida uma concepção de homem e de
sociedade, em que o modelo de educação centra-se no método, que é um elemento
essencial e determinante em sua concepção pedagógica.
Para Rousseau, o isolamento do educando da sociedade é um recurso essencial
para a formação do indivíduo que depende da capacidade do preceptor para descobrir a
função das atividades, isto é, o conhecimento precisa ser aplicado na vida do indivíduo.
Esse filósofo acreditava na experiência direta pelos sentidos e criticou os métodos que
circularam no Século XVIII. Para ele, cada disciplina deveria partir dos seus objetivos:
“A Geografia deveria, para êle, ser ensinada partindo do estudo local; a História só
deveria ser dada quando maduro o espírito; as línguas, por meio de conversação; as
Ciências, pela descoberta etc.” (CARVALHO, 1957, p. 141).
Essa questão foi fundamental para a educação brasileira no período que
estudamos. A organização dos conteúdos era tema de debates entre aqueles que se
preocupavam com o método de ensino na escola primária e estava posto para a
disciplina Geografia, devido às suas especificidades, que dizem respeito ao ponto de
referência de partida dos conteúdos. Iniciar o ensino a partir dos aspectos gerais em
direção aos particulares era uma característica metodológica que vinha sendo
questionada desde Comenius. E o contraponto dessa posição foi fundamental para os
debates relativos à superação da memorização para o ensino dessa disciplina.
Os autores Comênio e Rousseau reconhecem o método para ensinar como algo
definidor do trabalho docente. Para isso, ancoram-se numa concepção do conhecimento
64 Jean-Jacques Rousseau não toma a religiosidade como princípio central da sua obra, como o faz
Comênio. Mais detalhes sobre as diferenças entre esses dois tratados pedagógicos, consultar
Valdemarin (2000).
205
que tem nos sentidos humanos sua origem, em que decorrem procedimentos didáticos
propostos por cada um desses autores, cujos elementos decisivos para as práticas
educativas são a experiência a ser vivenciada e a atividade.
Já no Século XVIII, começaram a ser construídas as ideias mais incisivas do
pensamento de Pestalozzi sobre as transformações pedagógicas, que procurava partir
das contribuições da concepção de educação posta por Rousseau, ou seja, sua proposta
pedagógica prezava pela “[...] educação como um processo que deve seguir a natureza e
os princípios como da liberdade, da bondade inata do ser e da personalidade individual
de cada criança” (ZANATTA, 2005).
Por volta da metade do Século XIX, a concepção de conhecimento explicitada
por Comênio e Rousseau foi aceita tacitamente e difundida por educadores, com a
finalidade de renovar as práticas pedagógicas. Nesse contexto, a educação dos sentidos
é o objetivo mais importante. Essa discussão marcou o processo de escolarização da
instrução e, por conseguinte, a disseminação de escolas por vários lugares no Brasil
(VALDEMARIN, 2000).
Foi nesse contexto em que foi elaborado e divulgado o método de ensino
intuitivo65
, que visava educar pelos sentidos, para as coisas e pela experiência. Essa
prática pedagógica empregava os objetos didáticos que eram conhecidos pelos alunos
para promover a aprendizagem. Também conhecido como Lições de Coisas, baseou-se
no conhecimento humano, em que as noções e as percepções da existência de
semelhanças e diferenças entre os objetos são medidas por meio dos sentidos. Com a
função de orientar a prática pedagógica da escola elementar, o método de ensino
intuitivo apontou como centro das ações pedagógicas a proposição de exercícios, que
eram indicados para auxiliar as percepções gestadas pela memória para o
desenvolvimento humano.
A arte de como ensinar apresentava-se como um problema pedagógico central, e
os métodos tornaram-se as expectativas para a garantia de bons resultados, que
sintetizavam todos os elementos inerentes à tarefa educativa. Assim, entendemos que os
procedimentos didáticos se configuravam como traduções da teoria do conhecimento, a
partir de cada fase de desenvolvimento da criança.
65 No terceiro tópico do capítulo III, tratamos de forma mais aprofundada a discussão sobre o método
intuitivo ou “Lições de Coisas”.
206
Esse conjunto de regras vai se articulando para definir as orientações necessárias
à prática docente, visando produzir procedimentos capazes de provocar a aprendizagem
entre gerações mais novas. Os autores Froebel e Pestalozzi são conhecidos, entre os
estudiosos das formas de transmissão do conhecimento pelos métodos, como os
responsáveis pelas primeiras tentativas de sistematizar essas proposições teóricas.
Foram eles que procuraram inovar as práticas educativas em curso e adequar suas
experiências educacionais às concepções de infância difundidas naquele período, com
base nas percepções dos sentidos e da observação.
No Brasil, as ideias de Pestalozzi foram introduzidas por livros traduzidos na
época e, de algum modo, pelas adaptações de suas práticas educativas postas na obra
Lições de Coisas, traduzida por Rui Barbosa, conforme discutido neste trabalho. Rui
Barbosa também ficou conhecido entre nós como precursor de um processo didático
baseado na investigação e na experimentação.
As preocupações de Rui Barbosa voltaram-se para um método de
ensino e programas escolares capazes de suscitar o espírito científico,
a curiosidade e o gosto pela experimentação, sintonizados com as
diferentes etapas do desenvolvimento humano. O objetivo de Rui
Barbosa não era trazer apenas a contribuição de um formulário de
lições de coisas, mas documentar uma nova orientação pedagógica
desenvolvida nos países mais adiantados e colocar, pela primeira vez,
os mestres brasileiros em contato com as idéias pestalozzianas
(ZANATTA, 2005, p. 177).
Em outras palavras, podemos inferir que foram esses os motivos mais fortes que
motivaram Rui Barbosa a lutar pela reforma dos métodos. Ele entendia que era
necessário que a racionalidade dos métodos começasse desde a escola primária, visando
a um ensino cuja base fosse a investigação dos fatos, a classificação e a indução das
leis; a comparação por analogia e contraste e a capacidade de observar para ativar a
atividade intelectual das crianças.
Rui Barbosa, como membro do Instituto Histórico e Geográfico, era um dos
intelectuais do seu tempo que lutava pela inclusão do ensino de Geografia no grupo das
disciplinas que compunham o currículo do ensino primário e secundário. Por isso, é
comum encontrarmos pesquisas que o reconhecem como um dos precursores das bases
iniciais do ensino dessa disciplina, sobretudo, pela circulação de suas ideias e seu
envolvimento com os aspectos pedagógicos e didáticos para o ensino da Geografia.
207
Assim, formam constituídas novas perspectivas para o ensino de Geografia,
definidas com a aplicação do método intuitivo, que muito contribuiu para as propostas
metodológicas dessa disciplina, por meio do pensamento de Pestalozzi e de seus
fundamentos para a Educação. Isso foi fundamental para que elaborássemos um
questionamento que ocupa lugar central nesta tese, o destaque dado à Geografia quando
do avanço dessa proposta metodológica no Brasil, pois, “[...] dentre as disciplinas
escolares, a Geografia, em razão de sua própria singularidade e fascínio, destacava-se
como a mais indicada aos interesses e motivações do dinamismo psicológico e físico da
criança” (ZANATTA, 2005, p. 178), portanto, como a disciplina que mais se adequava à
discussão metodológica proposta para o ensino primário da época.
As propostas pedagógicas que compunham os debates entre o final do Século
XIX e os anos iniciais do Século XX, assinalam as contribuições de Pestalozzi acerca
das metodologias de ensino da Geografia, principalmente por entender a experiência e a
percepção sensorial como um processo ativo. Podemos dizer que a Geografia deve a
Pestalozzi a primeira tentativa de estabelecer seu ensino com base na intuição, porque
foi com base em suas ideais que foram elaborados os procedimentos fundamentais do
ensino de Geografia local, que já se falava desde Rousseau, pois, em sua mais famosa
obra, Emílio, encontra-se preconizado o ensino da Geografia local, quando advertia que
as lições de Geografia não deveriam começar pelo estudo dos globos e dos mapas, e que
a criança deveria aprender Geografia por meio do objeto mais próximo e da natureza.
No caso da Geografia, é perceptível, em algumas obras destinadas ao ensino
primário, a recorrência aos estudos de Pestalozzi, a quem foi atribuída a primeira
tentativa de estabelecer os princípios da intuição para o ensino dessa disciplina. Em
nossa pesquisa, temos constatado que muitos autores de livros didáticos e alguns
estudiosos da área afirmam que, antes dos estudos de Pestalozzi, estudar Geografia
limitava-se à tarefa de memorizar nomenclaturas referentes a países, a globos e a cartas.
Para Pestalozzi, o ensino da Geografia local deveria estabelecer “[...] como ponto de
partida o pequeno mundo da criança para o estudo dos fenômenos geográficos por
círculos concêntricos em que primeiro se apresentava ao aluno o “próximo” ou
concreto, para em seguida tratar de áreas distantes” (ZANATTA, 2005, p. 172). Como
no capítulo anterior, novamente enfatizamos o debate sobre a relação do método de
ensino com a Geografia escolar, visto que se acreditava que essa questão se resolveria
208
exclusivamente pela escala geográfica.
As ideias de Pestalozzi também podem ser denominadas de pedagogia intuitiva,
que se fundamentava, principalmente, na tentativa de oferecer capacidades de
desenvolver a percepção e a observação dos alunos.
Essa pedagogia fundamentava-se na psicologia sensualista, cujos
representantes afirmavam que toda a vida mental se estrutura
baseando-se nos dados dos sentidos, ou empregando um vocabulário
pedagógico, valendo-se do concreto. Considerando-se esses
fundamentos, pode-se adotar o conhecimento, até então abordado
independentemente da realidade, a partir da observação do real.
(ZANATTA, 2005, p.180).
Com Pestalozzi66
, inaugurou-se um debate sobre a Geografia local, e o mundo
da criança tornou-se o ponto de partida das discussões teóricas referentes à disciplina,
como a localização de sua casa, a escola, as terras circunvizinhas, os rios e os cursos das
águas, ou seja, primeiro, era preciso estudar os questionamentos das crianças com base
em seu entorno. Na Geografia, esse método era conhecido como ensino por meio de
círculos concêntricos, que consistia em ensinar ao aluno partindo do grau de
complexidade menor até o maior, começando a trabalhar os assuntos mais próximos de
sua realidade e alargando suas possibilidades de aprender até os conteúdos mais gerais
do globo terrestre, portanto, uma solução via escala geográfica.
Proença (1928) adverte que a observação direta do aluno sobre a natureza era de
fundamental importância para a realização do ensino da Geografia local:
Uma das condições de sucesso no estudo da geografia local é a
possibilidade de lições ao ar livre, no pátio da escola, nos arredores da
cidade e mesmo em pontos distantes da escola, porque as coisas e os
fatos devem ser observados in loco. Não quer isso dizer que o estudo
todo exija desenvolvimento fora da escola. Há lições formais e há
trabalhos de aplicação para serem realizados na sala de aula. Em
certos casos, contudo, torna-se indispensável a excursão (PROENÇA,
1928, p.51).
De acordo com Proença (1928), a observação direta dos fenômenos geográficos
deveria cumprir os procedimentos de localização, observação, medição e representação
de um local, e era de suma importância só definir cada objeto quando os alunos já
66
Temos uma literatura que informa que esse estudioso do campo da Educação iniciou seus estudos
geográficos no Instituto de Yverdon, quando se aproximou das noções básicas de Geografia política,
dos pontos de observação e do alcance do saber geográfico.
209
conhecessem os elementos que os compunham. Para esse autor, no ensino primário,
recomendava-se o “[...] estudo através da observação dos fatos da localidade do aluno.
Assim o aprendizado da geografia descritiva do mundo tem de ser precedido, pois, de
um estudo das coisas e fatos da própria localidade. É o que se chama geografia local”
(PROENÇA, 1928, p.37).
Em sua obra, “Como se ensinar geografia”, esse autor faz alusão às
contribuições de Pestalozzi para a Educação e para a Geografia. Quando se trata das
proposições teóricas do método intuitivo, ele aponta que é pelos sentidos que se aprende
Geografia e, consequentemente, o único caminho para conhecê-la é por meio da
observação, seja ela direta ou indireta. A esse respeito, ele acrescenta:
O método das lições de geografia elementar é o intuitivo, quer se trate
da geografia local, quer da regional. A diferença está apenas nisto: na
geografia local a intuição é direta; na geografia regional a intuição é
indireta. Num caso vê-se, examina-se, experimenta-se; em outro,
imagina-se (PROENÇA, 1928, p.45).
Essa assertiva tem relação direta com o método intuitivo e seus princípios,
especialmente nas recomendações de um ensino com base nos sentidos e na observação
das coisas e dos fatos. Sobre essa questão, Bonato (2011, p. 07) afirma que [...] era
necessária uma renovação pedagógica e, para isso, a implantação de um método de
ensino que fosse capaz de efetivá-la. Nessa perspectiva e no caso da Geografia em
particular, a indicação dos exercícios como um método capaz de propiciar essa
aproximação da criança com o objeto e as formas práticas de ensinar os conteúdos era
frequentemente citada, sobretudo nas denominações sobre método apresentadas por Rui
Barbosa (1883; 1886) ou dele em companhia de outros intelectuais.
Nesse contexto de descontentamento com os modos de ensinar, começou a
desapontar, na metade do Século XIX, o movimento pela renovação pedagógica, com o
fim de “[...] investir contra o caráter abstrato e pouco utilitário da instrução,
prescrevendo-lhe um novo método de ensino, novos materiais, a criação de museus
pedagógicos, variação de atividades, excursões pedagógicas, estudo do meio, entre
outras” (VALDEMARIN, 2004, p. 104).
Nesse sentido, pontuamos não só as contribuições do pensamento de Pestalozzi,
pois elas são inegáveis, mas também as críticas a essas propostas de ensino, que são
210
também contundentes, como seriam comuns a qualquer outra corrente teórica, pois, ao
que nos parece, as críticas e a negação do velho ou antigo são, quase sempre,
pressupostos para sustentar determinados grupos no controle e na busca por firmar e
propagar suas ideais no campo social e no cultural.
Ressaltamos a principal crítica de alguns pesquisadores à Pedagogia pestaloziana
referente à posição passiva do aluno no processo de assimilação do conhecimento, pois,
de modo geral, era o professor quem executava as operações na transmissão dos
conteúdos por meio dos sentidos. E, embora o centro dessa Pedagogia fossem o
concreto e as atividades práticas, o aluno não participava do processo, não interagia nem
se integrava de maneira reflexiva. As críticas também eram porque, mesmo com
propostas de trazer o ensino para moldes mais práticos, faltou um direcionamento que
possibilitasse o desenvolvimento do abstrato e, mais ainda, uma metodologia que não
mais se respaldasse na memorização de resumos, conceitos e nos mesmos
procedimentos que visavam encontrar soluções para os exercícios práticos.
Então, nessa perspectiva de contribuições e de críticas ao pensamento de
Pestalozzi, cabe-nos assumir que a percepção sensorial e o método intuitivo, guardadas
algumas proporções, trouxeram melhorias para a aquisição dos conhecimentos do
ensino primário e, em especial, o de Geografia.
A seguir, apresentamos algumas considerações sobre os métodos de ensino e a
Escola Nova, procurando discutir historicamente sobre esse movimento que marcou as
orientações pedagógicas e as produções didáticas no período posterior aos debates aqui
apresentados acerca do método intuitivo.
5.2. A difusão dos métodos de ensino e a Escola Nova: um olhar sobre as produções
didáticas e seus autores
Os métodos de ensino fazem parte da história da formação dos saberes escolares,
da organização pedagógica da escola e, por conseguinte, da constituição de uma
disciplina (SOUZA, 2011). Com base nessa afirmação, consideramos que os métodos de
ensino, como procedimentos didáticos, permeiam a relação entre as concepções do
espaço escolar e a ação dos professores, por meio de orientações pedagógicas
(ALBUQUERQUE, 2010). Ou seja, o método de ensino pode ser definido como um
211
conjunto de procedimentos reguladores que possibilitam que tal intento seja alcançado
no ensino de uma disciplina.
Alguns livros didáticos publicados a partir do segundo decênio do Século XX
traziam, em sua introdução - geralmente destinada ao leitor professor - orientações
pedagógicas que comungavam com as indicações do movimento de inovação em curso,
com concepções epistemológicas centradas “[...] em um conjunto de prescrições
metodológicas para o ensino, desdobrando-se em lições, exercícios e atividades”
(VALDEMARIN, 2006, p.89). Por isso entendemos que é necessário discutir sobre os
métodos de ensino e sobre a Escola Nova, apoiando-nos, entre outros documentos,
nesses livros como um dos elementos que podem nos indicar caminhos para
compreender como podemos difundir esses métodos destinados ao ensino primário.
Há uma relação direta entre o modo de produção didática e o campo de
propagação e difusão dos métodos de ensino. O Século XIX é considerado decisivo para
entendermos essas questões relativas aos modos de ensinar, como se deram as
organizações, e, sobretudo, por ser nesse período que identificamos, no Brasil, a
presença de vários métodos que perpassaram as escolas, entre eles: o individual67
, o
mútuo ou monitoral68
, o simultâneo, o intuitivo, o João de Deus69
etc. Podemos afirmar
que é no cerne dessas inovações que captamos traços dos novos significados conferidos
aos objetos utilizados para ensinar e de todo o cenário da ressignificação material das
escolas primárias.
Na análise do conjunto de livros didáticos destinados à escola primária
analisados nesta pesquisa, constatamos que seus autores demonstravam certa
67Tal método é considerado o mais antigo de todos. É aquele em que o professor ensina a cada menino, o
que podemos considerar como uma vantagem, já que o professor toma a lição dos alunos
individualmente. Suas principais desvantagens eram três: não podia ser aplicado em uma escola com
um grande número de alunos; muitas vezes, os alunos não recebiam a lição diretamente do professor,
mas de monitores, devido ao grande número de alunos, e a dificuldade de encontrar bons decoriões ou
monitores.
68 Conhecido como o método de Lancaster, que foi seu fundador. Nesse método, o mestre dava as lições
aos monitores, para que eles, seguindo a ideia passada pelo professor, ensinassem aos meninos da sua
classe. Esse método está voltado para os estudos elementares, a leitura, a escrita e o cálculo. Entre as
desvantagens apresentadas, destacamos a preparação que a escola deveria ter para trabalhar com esse
método e as dificuldades para encontrar monitores bem habilitados para substituírem um professor.
69 Esse método recebeu o nome do próprio autor e se preocupava com a forma de os alunos aprenderem a
ler. Pode ser chamado de método de alfabetização (como hoje conhecemos). Para que se chegasse ao
ensino da leitura, esse método recomendava algumas regras, que procuravam diferenciar nas letras o
valor e o nome das coisas.
212
preocupação com os métodos de ensino que, de maneira geral, já eram anunciados nos
prefácios ou nas introduções dos livros. Ao ler as indicações ou recomendações dos
métodos, logo percebemos que suas definições estão relacionadas aos preceitos que
regimentavam as escolas. Outra questão importante a ser destacada nos livros é que, em
muitos casos, temos a presença ou o uso dos métodos que coexistem, ou seja, a
indicação de dois ou mais métodos para os livros indicados para as escolas primárias.
Na tentativa de organizar os métodos mais indicados nos livros estudados,
destacamos os seguintes: o misto e simultâneo e o intuitivo são os que mais aparecem
nas indicações dos livros pesquisados. Começaremos, então, pelo misto e simultâneo.
De acordo com Faria Filho (2000), o método misto e simultâneo, como qualquer outra
teoria ou perspectiva pedagógica, surgiu nas discussões cujo foco eram os problemas
apresentados pelo método individual e a insatisfação com o método mútuo. Esses novos
métodos - o misto e o simultâneo - foram surgindo ao longo do Século XIX e estão
intrinsecamente vinculados à forma de organizar a sala de aula e a forma escolar
(VICENT, LAHIRE E THIN, 2001).
Tal método foi inspirado por Jean-Baptiste de La Salle e introduzido a partir de
1850, especialmente nas escolas primárias. Na prática, exigia que o professor fosse
capaz de instruir e dirigir simultaneamente todos os alunos da classe. O ensino era
ministrado de modo coletivo, e o professor apresentava aos alunos as lições de
determinada matéria. Na sala de aula, os alunos eram divididos quase que
homogeneamente e separados por grupos de acordo com o grau de instrução. Nesse
período, era comum se recomendar e definir os métodos para cada grau de ensino. Para
esse momento, a instrução acreditava que o melhor método era o simultâneo.
Como o professor era o agente de ensino, o mestre dirigia a escola sem nenhuma
ajuda. Sobre sua execução, referimos que, embora seja um ensino coletivo, o professor
precisava recorrer ao sistema individual, por causa das disparidades entre o grau de
instrução de cada aluno dentro da mesma sala. Outra desvantagem era o número de
alunos, pois, já que não havia ajudantes, deveria ser muito limitado. As classes deveriam
ser bem pequenas e heterogêneas, de modo que os meninos se encontravam em
diferentes graus de habilitação.
Décadas depois, já por volta de 1885, período em que o Regimento das Escolas
Primárias já deixava livre a escolha do método e demonstrava sua preocupação com os
213
métodos que circulavam nas escolas, houve discussões que introduziam o exercício das
“Lições de Coisas” pelos processos intuitivos. A seguir, apresentamos um exemplo de
uma obra destinada às escolas primárias da Província de Pernambuco que demostrava
que o método poderia ser um dos critérios de aprovação de um livro.
Da leitura do referido manuscripto avaliou a comissão a importância e
utilidade que deve ele trazer ao ensino nas escolas. Importância, pela
diversidade dos assumptos, referentes a vários ramos de
conhecimentos, com especialidade da nossa história pátria, e
principalmente dessa província: utilidade, pela fácil aquisição que
deles podem fazer as crianças, com o simples e ameno estylo em que
estam descriptos, prestando-se muito ainda ao mesmo das – Lições de
causas -, cujo exercício é hoje de tão reconhecido proveito.
(CAVALCANTI, 1880, s/p).
Essa citação foi retirada da obra Leituras Selectas para as Escolas Primárias, de
autoria de João Barbalho Uchôa Cavalcanti, publicada em Pernambuco no ano de 1880.
Nesse momento histórico, era evidente a preocupação com a produção de livros que
fossem circular nas escolas. Assim, “[...] se os livros trouxessem métodos considerados
não apropriados pelos conselhos responsáveis pela aprovação na época, os autores
poderiam ter seu livro reprovado e impedido de circular nas escolas” (ARANTES e
SILVA, 2008, p.05).
Como podemos perceber, o livro supracitado considera o método intuitivo
adequado, por isso, logo nas primeiras páginas, anuncia sua opção pelas “Lições de
coisas”. De acordo com Faria Filho (2000a), o método mútuo e o intuitivo não tiveram
sucesso porque não havia as condições necessárias para executá-los, como, por
exemplo, faltavam espaço e materiais didáticos e pedagógicos, além do problema da
formação dos professores. Em decorrência dessas dificuldades, o método mútuo deu
lugar, em várias províncias, aos chamados “métodos mistos” que, ora procuravam aliar
as vantagens do método individual às do método mútuo, ora seus aspectos positivos
com as inovações propostas pelo método simultâneo. Porém, apesar de tantas
dificuldades para executar os métodos, o intuitivo continuava sendo o mais indicado no
conjunto dos métodos definidos como “mistos”.
Entendemos que os modelos de organização pedagógica da escola primária
estavam atrelados a outras demandas sociais, porquanto as questões educacionais não
estavam – nem estão - dissociadas de seu contexto. Por isso, a seguir, discorreremos
214
sobre a Escola Nova e as transformações sociais desencadeadas a partir dos anos iniciais
do Século XX, já que a nação brasileira foi tomada por um movimento de novas ideias
nos planos cultural, educacional, social, político e econômico.
No final do Século XIX e início do XX, a Escola Nova atuou como um
movimento que tinha propostas de transformações sociais, pois trazia em seus discursos
indicações de inovações a partir da modernização70
. Sobre as modificações provocadas
por tal movimento, ressaltamos os discursos de progresso pregados pela Escola Nova,
porque, como é comum aos movimentos e às correntes teóricas, os discursos são
organizados e pensados em diferentes tempos, com interesses para demarcar seus
espaços na sociedade.
Sobre a atuação desse movimento, Valdemarin (2010), em seu estudo sobre as
“Lições de coisas”, especificamente nas análises feitas em três manuais didáticos,
voltados para a formação de professores, de autoria de João Toledo, a saber: Escola
brasileira (TOLEDO, 1925), Didáctica (nas escolas primárias) (TOLEDO, 1930) e
Planos de lição, Noções comuns (TOLEDO, 1934), mostra, em linhas gerais, como foi
sendo construída a apropriação discursiva dos principais conceitos da Escola Nova e
como podemos identificar a continuação de antigas práticas docentes prescritas a partir
dos novos princípios para o ensino primário, que combinam o velho e o novo de uma
maneira intencional e articulada (VALDEMARIN, 2010).
A fala da referida autora é comungada por Nagle (2001), quando afirma que o
movimento de inserção da Escola Nova no Brasil se organizou de modo contrário aos
relatos apresentados sobre outros países: “[...] o escolanovismo surgiu, primeiro, como
processo de especulação ou de teorização sobre a escolarização, para depois impregnar
as instituições escolares” (p. 241).
Nagle (2001) relaciona o escolanovismo ao liberalismo, porque “[...] o
70
Estamos nos referindo à literatura que afirma que a “penetração do escolanovismo” no Brasil pode ser
definida por duas fases: a primeira, que começou no final do Império e se estendeu até a segunda
metade do Século XX - a fase de propagação de novas ideias sobre a concepção de criança e dos
modos de aprender que começaram a ser introduzidas no debate educacional brasileiro (NAGLE,
2001; KULESZA, 2003). De acordo com Kulesza (2003), a primeira fase foi uma preparação do
terreno para a segunda, que começou nos anos de 1920, quando o movimento se difundiu e se firmou,
concretizando-se nos projetos de reforma educacional.
215
escolanovismo representou, ortodoxamente, o liberalismo no setor da escolarização” (p.
242). Ou seja, na Primeira República, pelos menos até a década de 1920, houve uma
preparação para difundir seus ideais na fase seguinte de sua atuação. A de 1920, o
movimento se fortaleceu, propagou-se e se firmou uma corrente educacional,
concretizando projetos de reformação educacional em várias regiões do país
(KULESZA, 2003). A partir de então, a Escola Nova procurou propagar e polarizar o
debate educacional brasileiro e colocar a “escola tradicional” no polo oposto. Temos
assim, de maneira evidente, um velho discurso se revestindo e se apropriando de um
novo, na tentativa de demarcar espaços no campo educacional e, por conseguinte, no
social e cultural de modo mais amplo (KULESZA, 2003).
Nesse processo, a organização dos saberes escolares também é vista como um
campo de disputa e de conflitos entre grupos, cada um tendo em vista seus interesses e
finalidades. Essas articulações, que entendemos como uma tradição pedagógica
(WILLIAMS, 1979), estruturam-se nas tradições seletivas de saberes que são
intencionalmente selecionados de acordo com seu reconhecimento social e cultural
(APPLE, 1982). Para Certeau (1994), tem-se o expresso movimento de uma inovação
infiltrada nos termos de uma tradição, ou seja, as concepções pedagógicas fazem parte
de um processo de idas e vindas, pois configuram suas bases nas produções anteriores,
nesse caso, o antigo, e projetam seus discursos em um novo, carregado de sentidos e
significados. Temos a formação de uma cultura escolar marcada por tempos próprios
determinados pelo espaço escolar e seus arredores, pelas inter-relações entre a escola e a
sociedade (SOUZA & VALDEMARIN, 2000).
Consideramos essas mudanças e inovações71
na perspectiva de Hobsbawm (1995
e 2013) e tentamos perceber aspectos peculiares desse pensar ou inventar da escola, que
tendem a permanecer tanto conjunturalmente quanto na longa duração do tempo,
determinando algumas tradições na sociedade. Essas tradições, não raramente
71 Na perspectiva de Hobsbawm (2013, p. 25), “a inovação pode acontecer de dois modos. Primeiro, o
que é definido oficialmente como ‘passado’ deve ser claramente uma seleção particular da infinidade
daquilo que é lembrado ou capaz de ser lembrado. Em toda sociedade, a abrangência desse passado
social formalizado depende, naturalmente, das circunstâncias. Mas sempre terá interstícios, ou seja,
matérias que não participam do sistema da história consciente na qual os homens incorporam, de um
modo ou de outro, o que consideram importante sobre sua sociedade. A inovação pode ocorrer, nesses
interstícios, desde que não afete automaticamente o sistema e, portanto, não se oponha
automaticamente à barreira”.
216
inventadas, encaminham-nos a observar as permanências ou continuidades em relação a
determinados aspectos políticos, sociais e culturais.
Segundo Hobsbawm (2013, p. 25), “teoricamente, cada geração copia e reproduz
sua predecessora até onde seja possível, e se considera em falta para com ela na medida
em que falha nesse intento”. Vejamos como isso é perceptível nas tentativas de criar,
recriar e inventar a escola, no conjunto de ideais escolanovistas que esteve presente na
construção da modernização da escolar primária.
Valdemarin (2010, p. 133), ao discutir, com base em Certeau (1994), sobre como
essas questões estavam postas no campo das produções didáticas, afirma:
[...] os manuais se inserem ora no campo das táticas (utilizam e
alteram), ora no campo das estratégicas (produzem, mapeiam e
impõem), dependendo da situação relacional. Apropriando-se das
referências contextuais e conjunturas, o autor elabora um produto
didático destinado a provocar mudanças no sistema investido da
autoridade proveniente da posição que ocupa nesse mesmo sistema –
dirigente e conhecedor do dia a dia escolar – que lhe permite, ao
mesmo tempo, acompanhar e afiançar a mudança. Nesse campo,
composto de táticas e de estratégicas, desenvolve-se também a teoria.
Assim, não se trata apenas de avaliar se as apropriações são coerentes
com as concepções teóricas que veiculam.
Trata-se de abranger o processo que, por meio de diferentes operações, ergue
uma versão que possa aproximar da realidade questões teóricas. Ao fazer esse arranjo,
os autores dos manuais passavam a operar uma seleção do novo com alguns elementos
que adquiriam significado próprio na continuação das práticas. Nesse momento,
reforçamos as evidências dos traços das permanências na propagação das ideias e na
conformação dos discursos. De forma ampla, entendemos que a produção pedagógica
da época tinha relação direta com a ideia de nação (GONDRA, 2007) e, sobretudo, com
os dispositivos permanentes de formação dos professores, dos modos de ensinar e das
ideias da Escola Nova.
Centrando nosso olhar, mais precisamente, para as intencionalidades e os
interesses que dialogam com a produção dos livros, corroboramos o pensamento de
Valdemarin (2010), quando adverte que, em uma pesquisa sobre livros didáticos, é
fundamental considerar os elementos internos (os pedagógicos) e os externos (os
políticos, sociais, econômicos e culturais) que perpassam esse processo. Daí decorre a
preocupação com o aspecto pedagógico, com as ideias veiculadas e sua expressão na
217
constituição dos métodos de ensino e nos modos de ensinar. Por isso, nas produções
pedagógicas, encontramos referências às práticas estabelecidas e às emergentes
dispersas no desenvolvimento da cultura pedagógica mais ampla (VALDEMARIN,
2010). Tais aspectos são predominantemente marcados pela influência decisiva dos
processos formativos que envolvem o trabalho docente, a formação de professor e as
práticas educativas e escolares.
Assim, por integrar um conjunto de ideias da cultura escolar, sobretudo nos
aspectos internos, os livros são objetos vinculados a uma cultura social mais ampla
(influência dos aspectos externos), que obedece a uma ordem composta de operações
articuladas e estrategicamente pensadas, por meio da qual se produzem ou procuram
produzir mudanças em uma dada realidade.
Assim sendo, manuais didáticos e coleções pedagógicas se inserem na
mesma premissa estratégica de moldar a mentalidade do leitor por
meio dos textos. No entanto, os manuais didáticos evidenciam que
seus autores não se apresentam para as concepções teóricas como
páginas em branco, mas se apropriaram delas com táticas de usuários,
o que não os impede de produzir material com o objetivo de moldar
cotidianamente os procedimentos de seus leitores (VALDEMARIN,
2010, p.133).
A produção dos manuais didáticos se insere num conjunto de fatores que
interagem ora no campo pedagógico, ora no campo da cultura mais ampla. Portanto, em
se tratando, mais especificamente, dos aspectos externos, podemos inferir que esses
objetos culturais integram, muitas vezes, elementos do campo das táticas (usando-as ou
as alterando) e do campo das estratégias (quando são capazes de produzir, mapear e
impor suas ideias) (CERTEAU, 1994).
Nesse campo de táticas e de estratégias (CERTEAU, 1994), desenvolve-se um
produto didático proposto, especialmente, para o dia a dia da escola, que se apropria
desse campo e reúne, seleciona e elabora referências contextuais e conjunturais que lhe
permite, ao mesmo tempo, desenvolver teorias, acompanhar e promover mudança no
sistema escolar.
Em nossas análises, ficou evidente o movimento de alguns autores brasileiros
para acompanhar os debates postos nos livros didáticos estrangeiros e, como autores e
elaboradores do currículo, traziam para o Brasil as discussões sobre um conhecimento
mais voltado para a prática, para o aluno exercitar o aprendizado. Como exemplo, temos
218
as publicações de Carvalho (1925), Proença (1928) e Toledo (1930) de livros didáticos
com indicações metodológicas para o período, com base nas indicações do método
ativo. Esses autores acompanhavam as discussões sobre o processo de renovação dos
métodos de ensino e o movimento escolanovista72
aqui no Brasil.
Feitas algumas ponderações acerca das interferências diretas e indiretas que
perpassam o campo das produções pedagógicas, não podemos deixar de explicar como
esse processo foi marcado pela difusão dos métodos e sua relação com os princípios da
Escola Nova. Sobre essas questões, destacamos o estudo de Valdemarin (2004) a
respeito das diferenças entre as concepções de conteúdo e de método de ensino entre as
proposições do método intuitivo e da Escola Nova.
Como já aludimos, uma das inovações que podemos associar ao método de
ensino intuitivo consistiu em considerar a centralidade dos objetos no processo de
aquisição do conhecimento. Já na pedagogia proposta pela Escola Nova, com fortes
críticas ao ensino intuitivo, tomou-se como referência o pensamento de John Dewey,
cujo objeto não é mais o ponto de partida, pois o foco agora é o problema, isto é, “[...] o
conhecimento que resultava da indagação geradora da reflexão que partia da experiência
do aluno” (SOUZA, 2013, p. 108).
De modo geral, para o campo pedagógico e, mais precisamente, para o método
de ensino intuitivo, os objetos e as coisas introduzidos na escola como objetos didáticos
tinham uma forte relação com a produção social e com a aplicação do conhecimento na
sociedade. Contudo, na proposição apresentada por John Dewey da Escola Nova, o
problema passou a ser o foco da percepção do indivíduo na sociedade onde ele está
inserido. Essa percepção depende das experiências já vivenciadas pelos sujeitos sociais
(VALDEMARIN, 2004). A esse respeito, Souza (2013, p.108) esclarece:
No método intuitivo, a seleção dos objetos, mesmo guardando
relações com a infância, resultava de uma escolha do adulto. Na
Escola Nova, os objetos de ensino são recursos auxiliares que devem
ser disponibilizados pela escola para favorecer a atividade do aluno.
72 O período da Segunda República foi fortemente marcado pelas ideias e pelo desejo de reconstruir
práticas educacionais defendidas pelo Manifesto dos Pioneiros (1932). É importante ressaltar que
encontramos em discursos de alguns estudiosos a reprodução ou a ideia de que a educação brasileira
só começara a partir de 1930, o que não é verdade, porquanto o que houve foi a institucionalização do
sistema de ensino, uma vez que já existia uma rede de escolarização: os grupos escolares, que
resultaram da reunião das cadeiras isoladas, uma prática comum do final do Século XIX e o início do
XX.
219
Portanto, na pedagogia nova, os objetos de ensino perdem a
centralidade adquirida na renovação pelas lições de coisas. Eles
deixam de ser condição para a aquisição do conhecimento e se
convertem em meios, componentes de um ambiente deliberadamente
organizado para fomentar experiências de aprendizagem.
Nessa citação, há apontamentos que indicam outras necessidades na estrutura
educacional que justificam certa diversificação de espaços e materiais como:
laboratórios, salas ambiente, museus, bibliotecas, hortas, jardins, auditórios e quadras de
esportes – ou seja, necessidades para que fossem desenvolvidas atividades de
experimentação do meio através de jogos e de brincadeiras.
A Escola Nova se consagrou como o ideário de renovação do ensino primário,
mais precisamente, a partir da década de 1920 (SOUZA, 2013). O final dos anos de
1920 e o início dos anos de 1930 são marcados pela promoção de reformas educacionais
em vários estados brasileiros. Essas reformas foram realizadas com base na moderna
Pedagogia, que sugeria não só mudanças metodológicas no ensino, mais também novas
finalidades para a área da Educação, para agregar a instituição escola aos projetos de
modernização e reconstrução social do Brasil.
Esse período histórico foi marcado, sobretudo, por inovações e reconfiguração
da organização da escola primária. Entre as modificações postas na renovação
educacional feita pela Escola Nova, destacamos dois aspectos que marcaram esse
momento: a chamada Escola Ativa, “[...] envolvendo formulações como a expansão do
ensino, a adoção dos centros de interesse, os métodos ativos, a ênfase em atividades
como excursões, salas ambiente, método de projetos, etc., e as instituições auxiliares da
escola” (SOUZA, 2013, p. 109), que podem ser: as bibliotecas, os museus, as
cooperativas (incluindo as associações de pais e mestres), a chamada caixa escolar, os
locais de assistência médica e dentária, os pelotões de saúde e as ligas de bondade.
Portanto, adotava-se um aparelhamento escolar mais aprimorado, inclusive na
incorporação de novas tecnologias da comunicação.
No Brasil, os renovadores da Escola Nova se destinaram a propagar os
princípios da pedagogia moderna por meio de diferentes estratégias, interesses e pontos
de vista. Educadores e intelectuais, como Fernando de Azevedo, Lourenço Filho, Anísio
Teixeira, Carneiro Leão, Mário Casassanta, entre outros, empenharam-se na tarefa de
reorganizar radicalmente o sistema educacional brasileiro apoiados nas novas
220
finalidades sociais da escola no país. De um lado, cabia ao grupo da Escola Nova
adaptar as crianças às necessidades da sociedade moderna, chamada de civilização em
transformação; de outro, ela precisaria estabelecer-se como em elemento de mudança no
campo social, como instrumento de intervenção e atuação nos processos sociais. Essa
compreensão da escola como instituição social foi declaradamente defendida no
documento do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova:
As instituições periescolares e postescolares, de caráter educativo ou
de assistência social, devem ser incorporadas em todos os systemas de
organização escolar para corrigirem essa insufficiencia social, cada
vez maior, das instituições educacionaes. [...] a escola deve utilizar,
em seu proveito, com a maior amplitude possível, todos os recursos
formidáveis, como a imprensa, o disco, o cinema e o radio, com que a
sciencia, multiplicando-lhe a efficacia, acudiu á obra de educação e
cultura e que assumem, em face das condições geográficas e da
extensão territorial do paiz, uma importância capital (MANIFESTO
DOS PIONEIROS DA ESCOLA NOVA, 1984, p. 423).
Ressalte-se, porém, que as inovações propostas pelos pioneiros não aconteciam
somente no campo das inovações nos usos de recursos didáticos, mas também no campo
no político, no administrativo e no metodológico. Sobre essa temática, nos anos de
1920, Araújo (2001, p. 10 e 11),
[...] os renovadores conquistaram e consolidaram uma hegemonia no
campo educacional em âmbito nacional, pela intensa atividade que
desenvolveram como idealizadores e organizadores dos sistemas
públicos de ensino e da pesquisa educacional, também, como
promotores de cursos, palestras, semanas de educação e da difusão de
uma vasta e diferenciada produção educacional através de obras
próprias ou coleções especializadas e, principalmente, como
organizadores das Conferências Nacionais de Educação. Polarizaram,
ainda, o debate sobre a escola pública, gratuita, laica e universal.
O movimento de modernização educacional, encabeçado pelos renovadores da
educação, no que diz respeito à organização do campo educacional, tinha como
principal referência as propostas oriundas do movimento escolanovista e da expansão da
Escola Ativa, o “como educar”, baseado no “como ensinar” e no como devem ser “os
procedimentos de ensinar”. Para Rocha (1996), esse momento foi uma fase de
constituição da modernidade educacional voltada para a constituição de uma sociedade
moderna e republicana, com projetos que deram uma nova configuração ao processo de
escolarização brasileira, mesmo que de forma lenta, evidenciando, portanto, as
221
permanências que são próprias desse e de outros processos históricos.
Em 1930, especialmente relativo ao modelo mais amplo da Educação, eram
visíveis as preocupações do então Presidente da República, Getúlio Vargas, em tornar o
Brasil um país industrial e desenvolvido pelas vias da educação primária. Logo após a
tomada de poder do Presidente, foi publicado o Decreto nº 19. 40273
, de 14 de
novembro de 1930, que criou o Ministério da Educação e Saúde, incumbido de todo o
estudo e das questões relativas ao ensino e à saúde pública, cuja finalidade era de de
controlar e incentivar, em todo o país, as vias de desenvolvimento dos problemas de
suma importância para o projeto de Nação de Vargas: a educação e a saúde
(SCHWARTZMAN, 1983, p.352). Esse novo Ministério passou a ser prioridade nas
metas para o progresso nacional. Nas palavras de Andreotti (2010, p.106), “[...] a
educação escolar foi considerada não apenas como propulsora do progresso e
instrumento de reconstrução nacional, em conformidade com as aspirações
republicanas, mas também como meio eficaz de promoção e ascensão social”.
Ainda com o propósito de estimular o processo de industrialização e de
desenvolver o país, em 1931, foi realizada a grande reforma educacional, que ficou
conhecida como Reforma Francisco Campos e que, de acordo com Andreotti (2010,
p.108), naquele momento,
[...] estruturou e centralizou, na administração federal, os cursos
superiores, adotando o regime universitário; organizou o ensino
secundário, dividindo-o em dois ciclos, um fundamental, de cinco
anos, e outro complementar, de dois anos, esse último voltado para
determinadas carreiras, ambos obrigatórios para o ingresso no ensino
superior e estruturou o ensino comercial nos níveis médio e superior.
O ensino primário ou elementar e as escolas normais não foram
afetados por essa reforma por serem de competência dos estados,
herança da legislação do Império e do caráter descentralizador da
República.
A autora, de certa maneira, tem razão ao dizer que o ensino primário não foi
afetado pela reforma, no entanto, se configurou como de suma importância para
apolítica educacional. Segundo Scwartzman (1983, p. 360), o ensino primário se
instituiu em “[...] uma política de maior esforço administrativo, de maiores
empreendimentos e realizações, de mais bem orientada organização”.
73
Para saber mais detalhes sobre o Decreto nº 19.402, de 14 de novembro de 1930,
<http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/d19402.pdf>.
222
Sobre a Reforma Francisco Campos, em suas diretrizes gerais, relacionadas ao
ensino primário, não foram incorporadas orientações específicas para esse nível de
ensino, no entanto, dentro das propostas do novo projeto da Nação como um todo, o
investimento no ensino primário foi essencial. Um exemplo disso foi o crescente
número de vagas nas escolas públicas primárias destinadas74
, em grande parte, às
camadas populares da sociedade, e o processo de expansão de grupos escolares no
Brasil.
Na década de 1930, destacaram-se a elaboração de um Plano Nacional de
Educação; a declaração, na Constituição de 1934, de gratuidade e de obrigatoriedade do
ensino elementar, além de muitas reformas educacionais, que ora partiam da iniciativa
da União, ora eram de responsabilidade dos estados. Porém, como em todos os
processos históricos, tal período foi marcado por intensos conflitos e calorosos embates.
No terreno educacional, Andreotti (2010, p.106) ressalta “[...] que envolveram
essencialmente, dois grupos principais: de um lado, os integrantes do movimento
escolanovista e, de outro, os setores conservadores da Igreja Católica”.
Sobre essa colocação da autora, um dos pontos importantes para a educação
como um todo e que atingiu sobremaneira o ensino primário foi o Manifesto dos
Pioneiros da Educação Nova75
, formado pela conhecida tríade - Lourenço Filho (que se
preocupou com as bases psicológicas do documento), Fernando de Azevedo (que
enfatizou as questões sociológicas) e Anísio Teixeira (que pensou nas bases filosóficas e
fortaleceu as políticas da renovação escolar), juntamente com outros acentuados
educadores, que construíram um novo cenário que visava propor intensas mudanças na
organização da educação nacional (SAVIANI, 2008). Em nosso recorte temporal,
entendemos que a Escola Nova teve uma forte atuação associada aos movimentos
políticos envolvidos na organização da educação nacional. Nesse sentido, a Escola
Nova, estrategicamente, foi se adequando e se aliando às bases filosóficas, sociológicas
e políticas dos processos de renovação e reestruturação do campo educacional, ou seja,
em cada momento histórico, esse movimento atrelava seus interesses às finalidades
74 A esse respeito, ler os clássicos estudos realizados por Romanelli (1978) e Ribeiro (1992).
75 A proposição para esse amplo e novo panorama educacional foi sistematizada em um dos
documentos mais importantes para a história da educação brasileira no período, o Manifesto dos
Pioneiros da Educação Nova, de 1932.
223
mais amplas da educação.
No que diz respeito às proposições metodológicas da Escola Nova nos livros
didáticos da época, podemos dizer que, de maneira geral, esse debate é pouco
contemplado nas obras estudadas, porque os livros pesquisados ainda estavam
fortemente marcados pelo método mnemônico e pela Geografia descritiva. Como
exemplos de autores que trabalham com esse método de perguntas e respostas, com um
texto mais marcado pela memorização de nomes de países, de rios e de continentes,
temos as obras: Geographia Elementar, de Novaes José Theodoro de Souza Lobo,
publicado em 1924; Geographia Primária: composto para o uso das Escolas Primárias,
de Dr. Carlos Novaes, publicado em 1892; e Novo Manual de Geographia: Curso
Elementar, publicado pela F.T.D, em 1907. Com essa constatação, convém admitir que
ainda era muito forte a presença desse método nas produções didáticas, com um ensino
cuja finalidade principal ainda era de repassar os conhecimentos geográficos por meio
do reforço dos princípios da memorização.
Contrárias a essa concepção metodológica acima descrita, algumas obras
procuravam romper com outro método de ensino que não se pautasse no método
catecismo. Para isso, organizavam os conteúdos pela indicação dos métodos adotados e
trabalhavam os conteúdos geográficos usando os métodos indicados pelo movimento
escolanovista.
Em nossa pesquisa, encontramos obras que, logo na contracapa, os autores
evidenciavam o tipo ou os tipos de métodos adotados, pois era comum a adoção de mais
de um método. Observe-se o que diz Pinheiro (1875) sobre o método, nas primeiras
páginas da sua obra:
224
Figura 23: Descrição dos tipos de métodos adotados para o ensino da Geografia
Fonte: PINHEIRO, Manoel Pereira de Moraes. Elementos da Geographia Geral do Brazil e especial de
Pernambuco. Recife, 1875. Acervo: GPCES.
Seguindo nessa mesma perspectiva, o livro de Amaral (1904) traz, na
contracapa, matérias de jornais que discorrem sobre o método expositivo em
substituição ao interrogativo, adotado pelo autor do livro:
225
Figura 24: Indicação e definição do método expositivo
Fonte: Geographia Elementar, de Tancredo do Amaral, de 1904 - Acervo pessoal da autora
Como se pode observar, a figura 24 mostra a importância dada ao método pelos
jornais da época, que traziam, inclusive, a definição do método adotado pelo autor,
assim como sua oposição em relação aos métodos mnemônicos adotados em obras
publicadas. Cabe ressaltar que esses debates voltados para as proposições
metodológicas da época estão associados ao processo de renovação dos métodos mais
amplos a que estava exposta a escola brasileira.
Concomitantemente a essas publicações, cresceu o número de manuais
destinados a orientar os professores de Geografia sobre a metodologia, como as obras de
Proença (1928) e Toledo (1930), que indicam um ensino com base nos pressupostos do
método intuitivo. Sugeriam que os conhecimentos geográficos fossem ensinados
partindo dos elementos mais próximos para os mais distantes, dos temas mais fácies
para os mais complexos e recomendavam que os professores do ensino primário
primeiro proporcionassem aos seus alunos a visualização das formas geográficas do seu
entorno, por meio dos círculos concêntricos.
226
Entre as recomendações apresentadas nas obras de Proença (1928) e de Toledo
(1930) referentes aos métodos de ensino, era perceptível o apelo para que o ensino
primário tivesse como base o método intuitivo e que ele fosse executado,
principalmente, por meio dos exercícios cartográficos e mais práticos. Tais autores, cada
um a seu modo, trazia suas preocupações sobre a finalidade do ensino da Geografia,
suas concepções pedagógicas e os métodos de ensino.
Em linhas gerais, o centro de interesse desses autores eram os métodos aplicados
ao ensino primário e as concepções pedagógicas voltadas para a escola primária. Em
nossas análises, verificamos que Proença e Toledo buscavam nos percussores da Escola
Nova, como Pestalozzi e Decroly, as inspirações para organizar propostas
metodológicas. Assim, tinha-se a proposta de um ensino que se pautava mais nos
métodos expositivos e na aplicação de exercícios práticos de Geografia.
Nesse sentido, destacamos a ênfase que Proença (1928) dava às contribuições de
Pestalozzi para que fosse possível trabalhar a Geografia sobre as bases da intuição, ou
seja, a partir dos princípios do método intuitivo. De acordo com esse autor, antes dos
estudos de Pestalozzi, a Geografia se limitava “a definições memorizadas e exercícios
nos globos e nas cartas” (PROENÇA, 1928, p.48). Para Proença, depois de Pestalozzi,
inaugurou-se a Geografia local:
É na natureza que a criança deve aprender geografia. A casa paterna,
as terras circunvizinhas, os cursos da água da região, a marcha do Sol
no céu, a orientação, eis os primeiros centros de interesse para a
criança. Depois viria o traçado da carta do terreno que se estudou
(PROENÇA, 1928, p. 48-9).
Essa questão apontada por Proença tem relação direta com as finalidades dos
exercícios no ensino primário e com as indicações dos seus modelos e tipos, pois as
proposições metodológicas consistiam em saber como os alunos deveriam praticar os
exercícios de Geografia, e como os exercícios poderiam contribuir para tornar o ensino
de Geografia menos decorativo. É dessa relação que tratamos no último tópico deste
capítulo e da tese.
227
5.3 Os livros didáticos de Geografia e os exercícios: um debate sobre as concepções
metodológicas para o ensino primário
Nos livros didáticos pesquisados, a denominação dos exercícios varia de acordo
com o autor ou a editora, com os níveis de ensino, com os objetivos pretendidos e com
os métodos adotados. Com base em nossas investigações, encontramos nove
denominações distintas para definir tais atividades: exercícios, recapitulação, exercícios
de observação, exercícios práticos e fáceis, exercícios escritos e orais, exercícios
mistos, problemas e questionários.
Para didatizar nossa análise, apresentamos, a seguir, uma tipologia dos
exercícios, que levou em consideração a nomenclatura adotada pelos autores, sua
localização nos livros e seus objetivos implícitos ou explícitos: exercícios no meio do
texto; exercícios no final de cada capítulo; exercícios orais e escritos - memorização
(com perguntas e respostas bem próximas, indicando que o professor deveria perguntar
oralmente aos alunos e pedir que escrevessem as respostas); exercícios práticos
(utilizados, em geral, para as aulas-passeio de Geografia ou nas práticas no bairro);
exercícios de orientação de desenhos e elaboração de mapas e exercícios cartográficos
(as cartas que ajudavam os alunos a fazerem seus mapas); exercícios de observação (a
partir da realidade, os alunos observavam os fenômenos geográficos); exercícios de
recapitulação (quando o livro, além das lições em formato de perguntas e respostas,
apresentava outras perguntas para reforçar a memorização); e textos organizados em
estrutura de exercícios (quando todo o livro aborda os conteúdos por meio de
exercícios).
Os diferentes tipos de exercício passam a ser incorporados no texto dos livros,
sobretudo, com a indicação de renovação metodológica posta expressamente nas
décadas finais do Século XIX, o que implica uma relação direta entre os exercícios, as
finalidades e os objetivos de uma disciplina, porque cada exercício tem seus objetivos, o
que se pretende com eles, o modo como devem ser aplicados, os recursos didáticos
utilizados, sobre como pegar no livro, como encontrar palavras-chaves no texto, enfim,
os detalhes necessários aos procedimentos na aplicação de determinado tipo de
exercício.
228
Os modelos de exercícios pertencentes a cada obra estão diretamente
relacionados aos objetivos estabelecidos pelos autores. A variação na tipologia dos
exercícios, em geral, estava diretamente associada à postura metodológica do autor.
Assim, pelos tipos de exercícios, pode-se até mesmo chegar ao método adotado na obra.
Em muitos casos, foi por meio dos exercícios que conseguimos identificar as
contradições sobre os métodos, pois os autores dos livros do período costumavam
anunciar que iriam trabalhar com uma perspectiva metodológica e, depois,
apresentavam outra filiação teórica tanto no corpo do texto quanto nos exercícios. Outra
questão importante que observamos a esse respeito foi o fato de tais posturas ocorrerem
ao longo de todo o período estudado, e tanto no final do Século XIX quanto no XX,
essas contradições se apresentam nos livros didáticos de Geografia. Isso nos leva a
inferir que os discursos de renovação só influenciavam uma parte dos autores.
É preciso retomar uma questão já discutida neste trabalho, nos primeiros
capítulos, para explicar, em parte, a persistência dos autores em manter a memorização
como centro do processo do ensino de Geografia. Como já foi discorrido em várias teses
e dissertações, quase todos os livros didáticos dessa disciplina, publicados no Brasil no
início do Século XIX, enfatizavam a memorização e seguiam o modelo de catecismo.
No Brasil, essa estrutura “impregnou” a literatura didática de Geografia por mais de um
século. Como parte do mesmo processo, foram adotadas em sala de aula, em
concordância com os métodos adotados na Europa e aqui difundidos, práticas escolares
fundadas na memorização. Assim, essa estrutura dos livros se relacionava diretamente
com as práticas escolares e era influenciada por elas. Desse modo, não era fácil para o
autor romper com modelos estabelecidos nem isso ocorria de forma rápida.
Outra questão importante que retomamos e que diz respeito à introdução dos
exercícios nos livros didáticos é a estrutura de redação dos textos que os compõem, em
especial, os destinados ao ensino de Geografia. Uma das marcas dos primeiros livros
didáticos brasileiros destinados ao ensino dessa disciplina era a redação em formato de
catecismo ou de perguntas e respostas. As perguntas, destacadas em itálico ou em
negrito, referiam-se, em geral, aos conceitos ou às nomenclaturas, e as respostas ou
definições seguiam tais perguntas e deveriam ser memorizadas pelos alunos. Como por
exemplo: O que é uma ilha? O que é um continente? O que é uma península? O que
estuda a Geografia? Como está dividida a Geografia?
229
Esse tipo de redação, que, nesta tese, também consideramos como um tipo de
exercício, pode ser encontrado em inúmeros livros didáticos publicados em todo o país,
no período estabelecido para a pesquisa, conforme se pode observar na imagem a
seguir:
230
Figura 25: Exemplo de texto com perguntas e respostas sobre conceitos básicos
Fonte: S/A. Geographia Curso elementar. Rio de Janeiro: F. T. D.,1923. Acervo: LIVRES - Biblioteca do
Livro Didático – FEUSP.
Sobre esses conceitos, era comum se repetirem na maioria das obras destinadas
ao ensino primário, porquanto eram considerados básicos para o ensino de Geografia.
231
Segundo Isler (1973), essa estrutura apoiava-se no método dialógico, ou também
conhecido como método de Abbade Gaultier, e por copiar o modelo dos pequenos livros
dedicados a difundir o catecismo católico76, passou a receber essa mesma
denominação, ou seja, um livro escrito em modelo de catecismo. A respeito da indicação
desse método nas obras didáticas, o estudo mostrou que, mesmo sendo um dos métodos
mais adotados ou indicados no período estudado para os livros destinados ao ensino
primário, só encontramos uma obra que indica, logo na capa, que adota o método de
Abbade Gaultier. Observemos essa postura do autor nesta figura:
76 Catecismo católico é um texto de referência, seguro e autêntico, para o ensino da doutrina católica, por
meio do qual se pode conhecer o que a Igreja professa e celebra, vive e reza em seu cotidiano. Nesse
livro, encontram-se orientações para o católico comprometido com sua fé. É também oferecido a todo
homem que deseja perguntar à Igreja e saber em que ela crê.
232
Figura 26: Indicação do uso do Methodo Abbade Gaultier
Fonte: MENEZES, de Estácio de Sá. Lições Elementares de Geographia – Segundo o Methodo Gaultier.
Rio de janeiro: Editora Garnier,1885. Acervo: Biblioteca Paulo Bourroul, FEUSP.
O autor Estácio de Sá e Menezes redigiu, no início da obra, uma justificava em
defesa da adoção desse método, que, para esse autor, era mais completo e levava
233
vantagens sobre todos os outros. Menezes refere que uma das inovações que sua obra
trouxe foi a substituição do método de catecismo pelas recapitulações, pois, ao
apresentar cada lição no formato de perguntas e respostas, logo em seguida, seria feita
uma recapitulação das perguntas. Para esse autor, tal método possibilitaria ao aluno do
ensino primário um aprendizado mais consistente das lições de Geografia.
Na figura abaixo, destacamos um parecer sobre essa obra que reforçava o fato de
o autor ter seguido as indicações de Gaultier.
Figura 27: Parecer expedido em 1º de dezembro de 1883
Fonte: MENEZES, Estácio de Sá. Lições Elementares de Geographia – Segundo o Methodo Gaultier. Rio
de janeiro: Editora Garnier, 1885. Acervo: Biblioteca Paulo Bourroul, FEUSP.
Em pesquisa recente, publicada em relatório, Albuquerque (2015) adverte que o
método adotado e difundido pelo livro Lições de Geographia, de Abbade Gaultier,
traduzido para o português, foi modificado. Nos originais franceses, para introduzir a
234
memorização, o autor trabalha com jogos infantis, para estimular as crianças a
brincarem no processo de ensino controlado pelo mestre. Na obra original, Albuquerque
recorre a três tipos diferentes de jogos, um para cada parte do livro, o que é negado ou
silenciado na tradução da sua obra para o Brasil. Tendo em vista os resultados desta
pesquisa, entendemos que Menezes (1885) havia recorrido a uma edição do livro de
Gaultier traduzido para o Brasil por uma Sociedade de Literatos Portugueses (edição de
1838) ou pelas edições já controladas por Irineu Roquete (1846, 1855, 1859, 1867 e
1878). O fato é que essa obra pode ter influenciado a escrita de livros didáticos
brasileiros, a partir de uma tradução que não trazia o cerne do debate difundido pelo
mestre francês.
Outras contradições foram observadas em uma parte dos livros analisados, que,
na introdução, anunciavam que a obra estaria de acordo com o debate de renovação dos
métodos - tornar a Geografia mais moderna por meio dos exercícios práticos
introduzindo a cartografia e, no corpo do texto, adotavam modelos de exercícios em
forma de questionários, com perguntas e respostas, que fortaleciam o tradicionalismo
nas atividades e visavam reforçar o ensino mnemônico. Assim, teoricamente, defendiam
uma finalidade específica – a de superar a memorização. No entanto, na prática,
reforçavam a posição contrária. Esse tipo de exercício é apresentado na figura abaixo:
Figura 28: Tipo de exercícicio denominado de questionário
Fonte: PEREIRA, Jerônimo Sodré. Compêndio de Geographia elementar: especialmente do Brazil. 1884.
Acervo: Biblioteca Paulo Bourroul, FEUSP.
235
Esses modelos de questionário - com perguntas e respostas - trazem indícios da
tradição de um discurso pedagógico fortemente marcado pela memorização e que se
sobrepõe ao debate sobre tornar o ensino mais prático. Em muitas obras, verificamos
que a finalidade da Geografia primária continuava a ser de propagar que só era capaz de
saber Geografia quem soubesse de cor as lições, ou seja, exigia-se dos alunos que
respondessem, “na ponta da língua” às perguntas dos conteúdos estudados. Para isso, os
exercícios baseados no modelo de catecismo eram um auxílio fundamental. Essa postura
pode ser observada até mesmo na capa de livros publicados já no Século XX, como se
observa na figura a seguir.
236
Figura 29: Lições de Geografia na ponta da língua
Fonte: Geographia: Curso elementar. Rio de Janeiro/ São Paulo: F. T. D, 1923. Acervo: LIVRES -
Biblioteca do Livro Didático – FEUSP
Outros tipos de exercícios encontrados nos livros analisados seguem nessa
mesma vertente, confirmando a contradição posta para os autores, pois procuravam
reforçar o ensino das lições de Geografia de maneira menos direcionada à memorização.
Porém isso dependeria da forma como o professor trabalhasse a atividade, pois, se
adotasse a consulta ao mapa, poderia contextualizar a leitura desse recurso didático.
237
Caso contrário, o mestre continuaria desenvolvendo estritamente a memorização. São
desse tipo os exercícios de recapitulação, os mistos e os problemas.
Nas imagens a seguir (figuras 30, 31 e 32), é possível observar esses tipos de
exercícios.
Figura 30: Modelos de exercícios denominados de “recapitulação”
Fonte: MENEZES, Estácio de Sá e. Lições Elementares de Geographia segundo o methodo Gaultier.
1885. Acervo: Biblioteca Paulo Bourroul, FEUSP.
Figura 31: Modelos de exercícios mixtos
Fonte: S/A. Novo Manual de Geogaphia – Curso Elementar para o uso das escolas primárias. São Paulo:
F.T.D., 1907. Acervo pessoal da autora.
238
Figura 32: Modelos de exercícios-problemas
Fonte: LACERDA, Joaquim Maria de. Curso Methodico de Geographia Physica, Política e Astronomica
– Composto para uso das escolas brazileiras, 1884. Biblioteca Paulo Bourroul, FEUSP.
Nesses exercícios, o objetivo não era só de memorizar, porque, para resolvê-los,
o aluno deveria fazer a parte prática solicitada e, com a ajuda do mapa, responder às
questões. Esse tipo de exercício era pouco comum nos livros pesquisados, mas foram
encontrados nos denominados de Altas, destinados ao ensino primário.
Se, de um lado, os exercícios apresentados se apoiavam direta ou indiretamente
na memorização, o que dificultava a difusão das finalidades estabelecidas pelos
estudiosos por parte dos autores e pelos defensores de um ensino inovador de
Geografia, de outro, encontramos autores mais sintonizados com esse debate, que
difundiam em seus livros os exercícios práticos e de observação, que podem ser
considerados como um modelo bem avançado para a época, porque proporcionavam
uma leitura atenta dos mapas e a observação dos fenômenos geográficos, ou seja, que se
trabalhasse partindo da realidade do aluno e fazendo conexões entre as escalas
geográficas.
239
Figura 33: Modelos de exercícios de observação
Fonte: LIMA, Affonso Guerreiro. Noções de Geographia – 1º parte – Estado do Rio Grande do Sul -
1911. Acervo pessoal da autora
Figura 34: Modelos de exercícios práticos
Fonte: GABAGLIA, Fernando Raja. Praticas de Geographia: para uso do Collégio Pedro II e no ensino
secundário e Normal77
. Rio de Janeiro, 192-? Acervo pessoal da autora
Entendemos que os exercícios, cada um de acordo com suas finalidades e tipos
de concepções metodológicas, modificaram a estrutura dos textos didáticos, porquanto
os autores desse tipo de literatura começam a introduzi-los em seus textos no afã de
inovar as metodologias por meio dos exercícios. Neste estudo, verificamos que os livros
didáticos de Geografia da época passaram a incorporar exercícios que estimulavam a
orientação e a observação dos fenômenos geográficos por meio dos sentidos e do ensino
77
É importante ressaltar que adotamos esta obra como fonte, porque orientações metodológicas
para os professores da Escola Normal, portanto, para os futuros professores das escolas primárias.
240
ativo. Para tanto, o autores tiveram que, primeiramente, modificar a estrutura de redação
dos seus livros, ou seja, passaram a definir uma posição específica para os exercícios no
corpo do texto. Então, pode-se afirmar que, observando a posição dos exercícios nos
livros, se ele é parte do texto, como os catecismos, ou se ele sai do corpo do texto para
compor uma parte específica da obra, pode ser um indicador da influência dos debates
sobre renovação dos métodos.
Na fase inicial das edições didáticas brasileiras, como já discorremos, todas as
obras didáticas destinadas ao ensino primário de Geografia eram organizadas por meio
de exercícios, os catecismos. Com a influência dos debates sobre a renovação dos
métodos, os exercícios, em parte dos livros publicados, passaram a compor uma posição
distinta no texto. Alguns autores os posicionavam no final de cada conteúdo trabalhado,
independentemente de ser ou não o final do capítulo ou da unidade, enquanto outros,
que ainda se apoiavam fortemente na memorização, posicionavam-nos no final dos
capítulos ou das unidades. A posição dos exercícios no corpo do texto tem uma relação
direta com o método e com as inovações adotadas na redação dos textos didáticos, tema
que abordaremos ainda neste tópico.
Como já discutido nos capítulos anteriores, a adoção de mais de um método na
escola brasileira foi uma prática tão recorrente que se denominou de método misto. Nos
livros que analisamos, também encontramos tal posicionamento, o que fundamenta
nossa posição acerca da relação entre a postura teórica dos autores de livros didáticos e
as práticas adotadas na escola. Ou seja, autores e professores trilhavam caminhos
próximos, pois um dependia do outro e o influenciava. Esse tipo de posicionamento é
encontrado na obra Noções de Geographia – 1º parte – Estado do Rio Grande do Sul, de
Affonso Guerreiro Lima, publicada em 1911. Na primeira parte da obra, encontra-se um
conjunto de exercícios práticos de observação, e na segunda, um texto mais estruturado
e exercícios com perguntas e respostas (método diálogo), nos moldes dos livros mais
antigos. Assim, tanto o autor mostrava um posicionamento inovador, quanto defendia
certo conservadorismo em relação ao método de ensino de Geografia, agradando a
professores com posicionamentos distintos.
Não se pode esquecer que o livro é uma mercadoria, e como tal, gera lucros para
editoras ou ganhos diretos para os autores, como os que financiavam a publicação das
próprias obras. No entanto, nem as editoras nem os autores iriam arriscar um
241
investimento de ordem econômica – seja pessoal ou empresarial – nem de ordem
cultural - a redação do próprio livro pelo autor.
Tal obra dispõe de exercícios de observação bem avançados para o período,
porquanto trabalham os conhecimentos geográficos com base na realidade e por meio da
observação. A seguir, apresentamos um exemplo de exercício prático e de observação:
Figura 35: Modelos de como trabalhar os exercícios práticos de observação
Fonte: Noções de Geographia – 1ª parte – Estado do Rio Grande do Sul, de Affonso Guerreiro
Lima, publicada em 1911. Acervo pessoal da autora.
242
Em sua obra, o autor Affonso Guerreiro Lima já apresenta ao leitor um texto
organizado em duas partes: a primeira voltada para a indicação de exercícios práticos de
observação, e a segunda, para a Geographia física, política e econômica do Brasil.
Nessa segunda parte, encontramos um texto mais inclinado para adotar o método
dialógico, pois, mesmo em forma de escrita corrida e descritiva, ainda há uma pergunta
e, em seguida, a resposta, com destaques em negrito. A figura 36 mostra essa estrutura:
Figura 36: Exemplo de um texto marcado pela adoção de mais de um método de ensino
Fonte: Noções de Geographia – 1º parte – Estado do Rio Grande do Sul, de Affonso Guerreiro
Lima, publicada em 1911. Acervo pessoal da autora.
Outra questão importante a ser abordada referente à adoção dos métodos no
243
período estudado é o fato de que, embora predominasse o método dialógico na cultura
escolar primária, era bem pequeno o número de autores que defendiam esse tipo de
método nos livros do ensino primário. Nas obras estudadas, era mais comum -
acreditamos que, devido ao debate em defesa da renovação metodológica - encontramos
a indicação do método expositivo, como vimos no exemplo dado na figura 24, retirada
da obra Geographia Elementar, de Tancredo do Amaral, publicada em 1904.
A esse respeito e com base em Bittencourt (2008), nos anos finais do Século
XIX, esse mesmo modelo de catecismo também foi adotado com outras finalidades,
entre elas, a de difundir o civismo, o nacionalismo e as atividades relativas à agricultura.
Outra questão importante a ressaltar é o fato de que, apesar de ser criticado por diversos
intelectuais, sobretudo os que defendiam mudanças metodológicas, esse modelo de livro
didático de Geografia perdurou por muito tempo. Ainda se encontram exemplares
publicados nas primeiras décadas do Século XX, como a obra citada na figura 36.
A partir de meados do Século XIX, em parte dos livros didáticos de Geografia,
esse modelo foi substituído por outro, denominado de método expositivo. Com essa
proposição, a memorização começou a ser criticada e, para romper com essa prática, os
autores que adotavam tais posturas passaram a escrever seus textos em outro formato e
assumiram teoricamente a descrição como uma ferramenta fundamental para o ensino
de Geografia. Esse debate tem relação com as novas proposições destinadas à Geografia
advindas da Europa – difundidas no Brasil pelo IHGB e por intelectuais que não
compunham o quadro dessa instituição – com os métodos de ensino e com as questões
políticas, conforme veremos a seguir, não necessariamente nessa ordem.
Uma evidência relativa à superação da memorização pode ser observada nos
livros em que os autores expressam, especialmente na parte introdutória, certa
preocupação em superar os modelos de redação em formato de catecismos e passam a
defender a introdução de textos corridos e menos descritivos.
Na análise das obras, vimos que essa preocupação trouxe algumas inovações
para os textos, ou, melhor dizendo, para sua estrutura. Alguns autores assumiram um
novo modelo de redação em seus livros, agora com breves descrições, sobretudo de
elementos naturais mais importantes e formulados em textos corridos. No entanto,
outros autores não abandonaram a antiga forma de destacar os conceitos em negrito ou
em itálico apoiada na difusão de nomenclaturas, apesar das breves descrições de
244
aspectos naturais mais importantes. Se, de um lado, isso demonstra que a memorização
continua sendo o centro da metodologia de ensino de Geografia, de outro, mostra uma
primeira tentativa de transformar o ensino dessa disciplina.
O livro de Carlos Novais, Geographia Primária, cujas marcas de uso são do ano
de 1902, e cuja data de publicação não sabemos ao certo, traz exatamente essa estrutura
de escrita, em que o conceito ou a nomenclatura vêm em negrito, e o texto, antes escrito
em forma de perguntas e de respostas, passou a ser redigido de forma corrido, em que o
ponto de é retirado da frase, que é transformada em uma afirmação. Veja-se esta
estrutura na imagem a seguir:
Figura 37: Exemplo dos primeiros textos que procuravam seguir a nova estrutura de redação dos
textos corridos
Fonte: Carlos Novais, Geographia Primária. Acervo da Biblioteca particular de Maria Adailza
Martins de Albuquerque
Thomaz Pompeu de Sousa Brasil, importante autor de livros didáticos de
Geografia destinados ao ensino secundário, entusiasta da disciplina e cujas obras foram
adotadas no Colégio Pedro II, foi grande defensor da mudança na redação dos textos
apoiada pelo método expositivo, em detrimento da redação dos conteúdos pautados no
método dialógico. Como importante autor de livros didáticos, já vinha discutindo sobre
245
essa questão com seus pares. A esse respeito, o senador Pompeu apontou para a
necessidade de inovar seu livro, Compêndio elementar de Geographia Geral e especial
do Brasil, especificamente na 3ª edição da obra publicada em 1859.
Como já enfatizamos, apesar das transformações trazidas por esse debate, as
marcas de permanência estão mais presentes do que as de mudanças. Essa nova forma
de redigir as produções didáticas se configura em expressões claras dos autores na
tentativa de romper com o modelo anterior. Em alguns casos, desejosos de atender às
exigências postas pelos debates de renovação dos métodos, esses autores anunciam nas
introduções de suas obras que não mais seguirão o “modelo tradicional”, que seus textos
passaram a ser organizados de forma corrida. No entanto, essas mudanças nem sempre
se efetivam na escrita do texto, embora haja uma tentativa, mas as descrições não são
profundas, e os conteúdos ficam delimitados pela nomenclatura.
A assunção de tal mudança na introdução dos seus livros, mesmo que não se
efetivasse de fato nos textos, pode ser justificada com algumas questões, a saber: a falta
de conhecimento dos autores, da própria Geografia descritiva com embasamentos
científicos, que já estava em voga na Europa e uma bibliografia que orientasse esse
modelo de escrita e os propósitos nele implícitos, como o combate à memorização.
Também constatamos que a inclusão desse discurso inovador, especialmente na
introdução desses livros didáticos de Geografia, pode ter sido uma estratégia para
cumprir exigências estabelecidas por critérios de avaliação das obras, para que fossem
adotadas nas escolas públicas.
Além dessas questões apontadas, havia outra de cunho político mais amplo,
como afirma Bittencourt (2008, p.47):
A escolha do método analítico na alfabetização, em oposição ao usual
método sintético, representava a posição dos grupos dos educadores
defensores de uma escola laica. Os seguidores desse método eram, em
sua maioria, republicanos com discursos voltados para uma
democratização do saber escolar e contrários ao espírito tradicional de
educação, com o ensino calcado em métodos da igreja.
Nessa citação, a autora apresenta um debate a que nos referimos em tópicos
anteriores, ou seja, os livros didáticos também expressam os posicionamentos políticos
dos autores. Em pesquisa realizada por Ângelo (2014), foi observado o posicionamento
dos defensores da monarquia e do republicanismo em inúmeros livros didáticos de
246
Geografia. No entanto, essa relação entre tais posicionamentos e a escolha dos métodos
não havia sido feita em seu trabalho. Essa perspectiva defendida por Bittencourt (2008)
possibilita uma análise mais ampla da relação entre os livros didáticos e as
metodologias destinadas ao ensino.
Ainda nos referindo à citação anterior, destacamos o embate entre os autores
conservadores, defensores dos métodos de ensino tradicionais, ligados à igreja e
pautados nos catecismos e os inovadores, defensores do republicanismo, da escola laica,
das inovações metodológicas que passaram a introduzir na elaboração de seus textos
novas proposições. Observe-se que Bittencourt (2008) está relacionando os métodos ao
processo de alfabetização, entretanto, é necessário entender que a escola primária, no
Império, tinha como propósito essa ação. Ou seja, apesar de esse debate metodológico
estar sendo o apoio para a alfabetização, ele também influencia os autores de livros
didáticos destinados às disciplinas que compunham a escola primária.
Essa afirmação pode ser observada em alguns livros publicados na época, como
as obras de Manuel Pinheiro (1875), Estácio de Sá e Menezes (1885), Novaes José
Theodoro de Souza Lobo (1924), Dr. Carlos Novaes (1892), entre outros, que
defendiam a adoção do método dialógico em detrimento do método expositivo. No
grupo daqueles que reforçavam o debate sobre a produção de um texto mais embasado
nos princípios do método expositivo, destacamos autores como: Thomaz Pompeu de
Sousa Brasil (1859), Manoel Pereira de Moraes Pinheiro (1875), Alfredo Moreira Pinto
(1894), Tancredo do Amaral (1904) e Affonso Guerreiro Lima (1911). Sobre as
publicações desses autores, é relevante reforçar que que aqui não está em jogo o
processo de silabação, mas a aprendizagem de conteúdos específicos de uma disciplina.
Esse embate, ao longo do período imperial, apoiou-se em duas perspectivas
metodológicas pouco assentadas em pedagogias modernas, como ocorreu
posteriormente, em especial, a partir do final do Século XIX, quando as influências
dessa ciência tomaram parte dos debates educacionais, e os métodos defendidos pelos
diversos grupos se apresentaram mais sistematizados. No entanto, acreditamos que essa
mudança foi uma das responsáveis pela introdução dos exercícios nos livros didáticos
de Geografia a partir dos anos de 1880. Com a adoção desse novo modelo de escrita e
os debates sobre a superação da memorização, as perguntas que antes faziam parte dos
textos foram retiradas deles. Isso significa que são necessárias formulações para orientar
247
o ensino. Esse processo envolveu perguntas feitas sobre o que o professor havia
ensinado e aplicado.
Mas é preciso observar que, com a introdução dos debates sobre os métodos
mais sistematizados, ou seja, o intuitivo, e depois, com as proposições do método ativo,
as atividades foram tomando novas configurações e diversidades que dependiam dos
objetivos dos processos de ensino e incorporando, inicialmente, as atividades escritas e
orais, os exercícios práticos e fáceis, os exercícios de observação e práticos, os escritos
e os orais, recapitulação etc., conforme apresentamos nos primeiros parágrafos deste
tópico. Esses tipos de exercício podem ser vistos nas imagens seguintes:
Figura 38: Modelos de exercícios fáceis
Fonte: LACERDA, Joaquim Maria de. Curso Methodico de Geographia Physica, Política e Astronomica
– Composto para uso das escolas brazileiras,1884. Biblioteca Paulo Bourroul, FEUSP.
248
Figura 39: Modelos de exercícios escriptos e oraes
Fonte: AMARAL, Tancredo do. Geographia elementar. 1904. Acervo da Biblioteca Paulo Bourroul,
FEUSP. Esses exercícios se repetem no S/A. Novo Manual de Geogaphia – Curso Elementar para o
uso das escolas primárias. São Paulo: F.T.D., 1907. Acervo pessoal da autora.
Nesse contexto de debates mais sistematizados sobre o método, quando as
proposições pedagógicas passam a circular bem mais no país e orientar as propostas de
mudanças educacionais, é que se vai observar um debate teórico que vincula o ensino de
Geografia aos métodos de ensino de forma mais sistemática e apoiada na Pedagogia,
porque, como já afirmamos, as primeiras transformações no ensino primário de
Geografia começaram com as proposições de Pestalozzi. Porém é com o método ativo
que o debate teórico sobre esse tema vai sendo central para o ensino dessa disciplina.
Vejamos o que diz, no início do Século XX, Delgado de Carvalho, que era
defensor fervoroso do ensino científico de Geografia, do método ativo, da formação
específica para professores da escola primária e autor de manual destinado ao ensino
dessa disciplina e de livro de didático para o ensino secundário:
Mas o que se destaca na geographias [...] norte-americanas e inglezas
e até certo ponto nas allemãs é o importante appendice que segue cada
capitulo com numerosos e valiosas questões oraes sobre o texto já
visto. São fontes discussões geographicas que solicitam a iniciativa do
alunno e provocam a sua actividade. Nos Estados Unidos chamam
isso manuaes ou lições de laboratorio de geographia physica. O cunho
pratico é a feição caracteristica dos livros didacticos inglezes
249
posteriores à reforma. (1925, p. 8 e 9)78
.
Essa proposição evidencia a possibilidade de os exercícios serem vistos como
elementos que podem propiciar a sistematização dos conteúdos no ensino da Geografia,
seja em atividades de cunho teórico ou prático. Entendemos que esses exercícios que
foram introduzidos nos compêndios e, consequentemente, as metodologias do ensino
primário que se configuravam eram expressões dos novos métodos de ensino
(FERREIRA, 2012). Assim, a metodologia de ensino do curso primário trazida nos
compêndios de Geografia, a partir de então, passou a ser mais focalizada nos exercícios.
Os exercícios fazem parte da longa tradição do ensino e suas concepções
didático-pedagógicas. Em nossas análises, defendemos que os processos de
transformação dos exercícios (formas e tipos) podem variar quando compõem o corpo
dos livros de Geografia na organização das disciplinas escolares (VALDEMARIN e
CORRÊA, 2000).
A integração entre a disciplina e os exercícios assegura um ensino apoiado em
determinados modelos, pois, muitas vezes, os exercícios é que dão forma à disciplina
escolar (FERREIRA, 2012). Assim, os conteúdos constituem os conhecimentos
sistematizados de uma disciplina e se articulam com os métodos de ensino e com os
processos de avaliação, em entram os exercícios. A disciplina escolar é constituída de
conceitos e conteúdos que são apresentados aos alunos, através de um ensino de
exposição e de esquemas comparativos ou de exercícios de fixação do saber ensinado
(BITTENCOURT, 1993).
Nesse contexto, os exercícios expressam as metodologias de ensino e as formas
como se avalia a aprendizagem dos alunos. Ou seja, os exercícios presentes nos livros
didáticos indicam que não são apenas elaborados para expor os conteúdos de uma
disciplina, pois, também é função sua propagar concepções pedagógicas, metodologias
de ensino, visões de mundo, ideologias, entre outros, difundidas como conhecimentos
que compõem a disciplina escolar.
Assim, os livros didáticos de Geografia passaram a incorporar exercícios que
estimulavam a orientação, com atividades que, quando feitas a partir da leitura de
78 A reforma a que se refere Delgado de Carvalho nessa citação foi organizada por Mackinder, defensor
do ensino de Geografia, responsável por adotá-la na escola e por criar cursos superiores na Inglaterra
(GOODSON, 1999).
250
mapas, sugeriam a superação da memorização. No entanto, se a atividade fosse feita na
falta deles, ela deixaria de cumprir seu propósito e se tornaria mnemônica. A imagem
seguinte mostra os exercícios que ensinam o aluno a ler mapas, mas que pode ser
utilizado de forma contrária ao proposto:
Figura 40: Exercícios de cartografia
Fonte: Alfredo Moreira Pinto Elementos de Cosmographia, por, 1894.
O referido livro é organizado por exercícios que tem por finalidade estimular o
aluno a leitura atenta dos mapas. Faculdade de Educação – UPS – Biblioteca Paulo
251
Bourroul.
A atividade descrita na figura 40 é um exemplo evidente dessa possibilidade
inerente ao livro didático, ou seja, mesmo que seu propósito não seja a memorização,
pode estimulá-la. Assim, definem-se o papel do professor nesse processo e o uso correto
de outros recursos didáticos em sala de aula necessários à superação da memorização
como finalidade dessa disciplina. Durante todo o período estudado e, mais
especificamente, depois de adotar os textos corridos e separá-los dos exercícios, os tipos
de atividades apoiados na memorização, em geral, solicitavam aos alunos
nomenclaturas, que, como estavam escritas em destaque no corpo do texto, entendia-se
que o processo de escrita das respostas dos alunos fora facilitado. Assim, eles só
precisavam encontrar as palavras-chaves e chegariam à resposta correta e,
consequentemente, à memorização dos conteúdos. Além disso, havia certa ordem de
disposição das perguntas e das respostas que seguia a mesma do texto.
Ressalte-se, todavia, que, para além da memorização por ela mesma, como
suporte para o ensino, com a adoção de novos métodos, em especial, o intuitivo, até os
exercícios passaram a ter outros propósitos. Como vimos, depois desses debates, uma
das funções dos exercícios seria de facilitar os procedimentos didáticos, utilizados de
acordo com a necessidade das disciplinas ou os assuntos específicos. No ensino
primário, com a adoção do método intuitivo, os exercícios passaram a fazer parte dos
procedimentos metodológicos e das sequências didáticas das disciplinas, conduzindo as
prescrições do que e de como ensinar, a partir das orientações dos livros que se
apoiavam nessa metodologia.
No exercício exposto na figura 41, vemos que a atividade sugere exatamente as
proposições feitas por esse método, ou seja, olhar o objeto real, vivenciá-lo, observá-lo
e intuir para, em seguida, o aluno aprender e responder. Aqui se destacam, inicialmente,
as relações topológicas elementares (dentro e fora, acima e abaixo, na frente e atrás,
perto e longe, sem levar em conta as distâncias) e, posteriormente, a introdução de
conceitos mais sistematizados, como os de localização, orientação, de escala
(proporcionalidade) e de representação, todos advindos da cartografia e necessários ao
desenvolvimento da leitura de mapas.
252
Figura 41: Exemplos práticos de exercícios de Geografia
Fonte: Noções de Geografia, por Affonso Guerreiro Lima – I parte – Estado do Rio Grande do Sul - Porto
Alegre: 1911. Acervo: GPCES
Aí estão modelos de exercícios do tipo prático, ou seja, que trabalham os
conhecimentos geográficos e as relações dos alunos com o espaço mais próximo e,
depois, com o mais distante, ou seja, da sala de aula, do prédio da escola e do caminho
percorrido entre a casa e a escola. Esse tipo de exercícios ainda é bem comum no ensino
de Geografia atual, pois permite ver, na prática, os saberes geográficos e como essa
disciplina pode ajudá-los na percepção do meio em que vivem. Assim, vale ressaltar que
253
essas indicações metodológicas ainda ocupam os nossos bancos escolares. Por isso
concordamos com Bittencourt (2008, p.193), quando afirma que “os exercícios
tornaram-se um complemento indispensável das obras didáticas e deles, muitas vezes,
dependia seu sucesso”.
Nesse exercício, também se observam a introdução dos círculos concêntricos, a
metodologia que foi adotada nas obras de Pestalozzi, e aprimoradas com o método
intuitivo, e a Escola Nova. Os círculos concêntricos, como já mencionamos, referem-se
à abordagem dos conteúdos do próximo para o distante, ou seja, de uma escala local - a
sala de aula - para a escola, que é seguida pela rua, e esta pelo bairro, pela cidade, pelo
estado, pelo país e pelo mundo consecutivamente. Essa estrutura de abordagem dos
conteúdos de Geografia tratava tais escalas de análise de forma isolada, sem mencionar
os eventos, os espaços e as relações entre eles. No entanto, nos livros analisados, não se
observa ainda essa estrutura de abordagem dos conhecimentos.
Nessa perspectiva, os exercícios seriam para a Geografia um auxilio primordial
nas aulas práticas, nos trabalhos de campo, nas excursões escolares e, sobretudo, nas
tarefas diárias, que buscavam repassar os conhecimentos básicos que os alunos do curso
primário deveriam saber sobre os conteúdos das disciplinas. A proposta que os autores
dos livros didáticos apresentavam era de que os professores recorressem aos exercícios
para tornar o ensino de Geografia menos mnemônico, com exercícios práticos sobre a
Geografia nacional. Essas proposições podem ser observadas em textos jornalísticos,
geralmente elogiosos, publicados nas páginas iniciais dos livros didáticos, como o fez
Jerônimo Sodré (1884, p. 13):
É que instruindo o menino estudioso, de hoje, futuro cidadão de
amanhã, no que d’essas materias mais lhe importa conhecer, não se
esquece e felizmente consegue o illustrado author da a seu livro uma
côr nacional, tornando-o, dest’arte, sympathico a todos que prezam e
amam o Brazil. Na segunda secção da geographia descriptiva não faz
o author do seu compendio uma arida e monotoma nomenclatura a
espaços ligada a uma ou outra notabilidade historica; porque sabe,
porque ensinou-lhe a experiência do ensino, que isto desgosta o
alumno, e cançando-lhe a memoria, fal-o olhar com tedio para uma
das mais bellas, variadas e uteis sciencias.
Ao publicar esse texto, Sodré procura chamar à atenção dos professores para
trabalharem os conhecimentos geográficos a partir de exemplos práticos, procurando
fazer com que os alunos partissem de sua experiência ou realidade e não só se
254
ocupassem de memorizar os fenômenos da Geografia. Nessa obra, em várias partes,
encontramos estratégias metodológicas propostas com base nos exercícios voltados para
a prática, que sugeriam procedimentos a serem realizados pelos alunos e pelos
professores, pois, muitas vezes, eram os exercícios que possibilitavam os modos de
interagir entre eles no momento mais prático das aulas.
Sob nosso ponto de vista, os exercícios exerceram nos livros didáticos a função
de um importante recurso didático e, no caso da Geografia, no afã de tornar a disciplina
mais prática, como um modelo prático, os exercícios introduziam as bases modernas
que direcionavam os modos de ensinar Geografia na Europa. Essa iniciativa marca a
cultura escolar do ensino primário e indica que, quando o processo de difusão dos
métodos interfere nas produções didáticas, provoca modificações diretas ou indiretas
nas concepções teóricas e práticas da disciplina escolar Geografia.
Esses diferentes tipos de exercício compunham os livros didáticos destinados à
escola primária e serviam de suporte para os professores nas aulas práticas, nas de
desenho e para os exercícios cartográficos. Estes últimos se apresentavam para o ensino
primário como instrumentos mobilizadores para ensinar Geografia, e os mapas, como
uma das formas de aguçar a facilidade inata das crianças de imaginar, de simbolizar e de
representar. Ou seja, pela representação gráfica, o aluno poderia elaborar e visualizar a
imagem, compreender o texto geográfico e executar os exercícios, sobretudo, os que
eram feitos por meio de desenhos.
Apesar das inovações metodológicas apresentadas e observadas na prática dos
exercícios, não se pode esquecer que as permanências, no que diz respeito às
finalidades, às intenções e às funções dos exercícios para a escola primária são comuns
a todo o período estudado, pois os livros trazem exercícios apoiados nos princípios da
memorização, mesmo quando já estavam em pauta indicações contrárias a uma
Geografia mnemônica. Aqui temos mais um indício dos traços da permanência das
práticas curriculares prescritas para o ensino primário, pois, mesmo com as indicações
de mudanças em relação à finalidade dos exercícios, nossas fontes demonstram que só
alguns livros didáticos passaram a adotar as novas perspectivas e não reforçavam o
princípio da memorização
255
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo nos possibilitou compreender que estudar os livros didáticos é pensar
nas “janelas” de conhecimentos que esses impressos deixam ou permitem que sejam
revelados e/ou, principalmente, nos elementos que, intencionalmente ou não, são
silenciados no registro impresso desse material. Partindo de uma perspectiva histórica,
nossa discussão lançou olhar para o passado, com o fim de entender, por meio das
representações mais “ordinárias” da cultura escolar, os detalhes que marcaram os
processos de escolarização primária e os modos de ensinar usando esses materiais
didáticos para o desempenho de tal função.
Neste trabalho, fizemos o que aconselha Nóvoa (1996), quando adverte que é
chegado o tempo de a História da Educação redirecionar o olhar para os aspectos
internos do trabalho escolar, sobretudo, para os momentos de conflito, de descompassos
e de rupturas que caracterizam o sistema educacional. Desse modo, acreditamos que os
resultados e as discussões aqui levantados ajudam a compreender os processos
educativos contemporâneos, porquanto comungamos da ideia de que muitas concepções
de educação atuais resultam das alianças e das práticas de um processo sociocultural e
histórico.
Em nossa tese, os termos ‘cultura escolar’ e ‘escolarização’, em suas múltiplas
instâncias, destacaram-se, quando falamos da formação dos saberes escolares, porque,
ao longo do tempo, a escola transmitiu e transmite ideologias e saberes em todo o
processo de escolarização primária. Além disso, procuramos entender a escola como
uma instituição capaz de promover um saber próprio, que se expressa nas diversas
formas de manifestação da cultura escolar de determinada época. Por essa razão,
apoiamo-nos na ideia de cultura e de concepções socioculturais como partes
complementares da escola, visto que as interações entre as diferentes expressões
culturais se convertem em cultura escolar.
Sobre os modos de ensinar, com base em nossas análises, em concordância com
Neves (2005), entendemos que nunca foram unânimes ou homogêneos e que, no
movimento de busca por inovações no campo dos métodos, a difusão e a adoção de
novas teorias se constituem com a desestabilização das bases do que estava instituído.
Isso se aplica bem às discussões que introduzem o debate centrado na proposição dos
256
exercícios para aprimorar o ensino primário. Assim, estudar o processo de difusão dos
métodos de ensino e sua incorporação nas produções pedagógicas foi uma operação
difícil de executar, devido à sua efemeridade e à localização no passado e ao fato de
esse campo investigativo ser um terreno bem fértil e de poucos trabalhos que se
ocuparam dessa temática.
Com o apoio de Chartier (2002), assumimos em nossa tese que o livro didático
é um objeto cultural diferente de outros suportes da cultura escrita, cuja coerência e
completude resultam de uma intenção intelectual e estética, ou seja, são, muitas vezes,
as relações de uso e de destino estabelecidas que determinam sua finalidade na escola e
na vida do professor e do aluno. Por isso, as pistas seguidas demonstraram que, nesses
tipos de material pedagógico, foram impressas diversificadas interpretações que, ao se
transformar em dispositivos modeladores de ação, registraram valores e práticas e
comunicaram sentidos e significados, dialogando com políticas públicas e com os
dispositivos sociais postos para a escolarização em suas diferentes formas, graus e
conteúdos a serem ensinados nas escolas naquele período histórico.
Nossas análises também confirmaram o que diz Hébrard (1990), que esse tipo de
impresso pedagógico agrega saberes que advêm de instâncias diversas, algumas vezes,
distantes, no entanto, entrelaçadas no momento da produção (DARNTON, 1990), nos
movimentos dos autores e nos demais aspectos que compõem o livro didático como um
objeto material, constituído, basicamente, de tinta e papel e que guarda as marcas de sua
produção e de seus usos (BITTENCOURT, 2003; MUNAKATA, 1997). Como foi
constatado na bibliografia consultada, havia, na escola, certa preocupação com a
superação dos modelos de ensino baseados no método lancasteriano. Depois que esse
método foi proibido, outras perspectivas metodológicas foram incorporadas à escola.
Inicialmente, vimos a presença dos métodos misto e simultâneo, que se apresentavam
dentro das propostas pedagógicas como uma tentativa de organizar os modos de ensinar,
já que o método individual e o mútuo não conseguiram responder às perspectivas ou
exigências para o ensino na época. Depois, precisamente no final do Século XIX, mas
em um movimento de mudanças e de permanência ou concomitância, foi divulgado o
método intuitivo, em paralelo à adoção, às críticas e aos debates acerca dos métodos
misto e simultâneo, que, de forma lenta e gradual, passaram (os três) a influenciar as
perspectivas metodológicas para todo o ensino.
257
Sobre a presença dos métodos nos livros didáticos de Geografia que
pesquisamos, os autores empregavam, nas primeiras obras publicadas do Século XIX, o
método dialógico. Porém, com a crítica a ele, lentamente foram incorporando o método
analítico ou expositivo e, com ele, a iniciativa de produzir textos corridos, com a
finalidade, pelo menos do ponto de vista do discurso, de que o aluno da escola primária
aprendesse Geografia não mais por meio da repetição e memorização dos fatos e
fenômenos geográficos. Como foi apresentado nos capítulos desta tese, esses dois
movimentos de renovação metodológica foram de suma importância para as
transformações dos exercícios nos livros didáticos dessa disciplina escolar.
Com base nessas descobertas, vimos que esse movimento de renovação
metodológica, mesmo lento, modificou os modos de produzir textos nos livros
didáticos, e, por conseguinte, a forma de ensinar Geografia no ensino primário. No
conjunto das obras analisadas, isso ocorria, ainda que só fosse quando os autores
defendiam a necessidade de recorrer aos exercícios como uma das formas de modificar
o ensino de Geografia.
Em nossas análises, percebemos os aspectos pedagógicos que compõem os
livros didáticos e as concepções de cada autor e, consequentemente, o modo como cada
obra apresentava as funções e as finalidades dos exercícios para o ensino de Geografia.
Outra questão importante nas obras são os aspectos pedagógicos na produção e na
apropriação das concepções culturais mais amplas, adquiridas, criadas e reinventadas
em cada período histórico.
Agora que estamos fechando este trabalho de pesquisa, retomamos nossa
dissertação para concluir aqui uma investigação iniciada lá. Ou seja, por meio dos
estudos dos livros didáticos de Geografia destinados ao ensino primário, concluímos
que os exercícios aparecem com mais frequência neles do que nos que são destinados ao
ensino secundário79
. Isso fica evidente quando se compara a quantidade de obras
catalogadas nos dois trabalhos, já que o critério em comum a eles foi a existência de
exercícios nos livros didáticos. No Mestrado, do universo pesquisado, foram 65 obras
79
Estamos apresentando essas impressões com base em uma comparação ampliada entre esta pesquisa e a
realização do Mestrado, com as obras destinadas ao ensino secundário, tendo como foco os exercícios,
a forma como surgem nos livros, seu papel e sua função e sua presença nos textos, que podem
modificar a forma de ensinar Geografia tanto no ensino primário quanto no secundário.
258
do ensino secundário, mas somente 12 apresentavam exercícios. Neste estudo do
Doutorado, foram reunidas 229 obras que continham exercícios, e dessas, 131
destinavam-se ao ensino primário e apresentavam exercícios. Com esses dados,
podemos inferir que os exercícios eram mais comuns nos livros destinados ao ensino
primário do que nos publicados para o secundário.
Então, devido à comprovação de que os exercícios eram efetivamente uma
expressão dos métodos, as inovações metodológicas postas pelos movimentos de
renovação influenciaram mais os autores que escreviam para o ensino primário, tendo
em vista as proposições para auxiliar bem mais o aprendizado das crianças.
Outro aspecto a ser mencionado diz respeito ao fato de termos compreendido a
relação entre os livros e as orientações sobre os procedimentos avaliativos para serem
executados pelos professores. Assim, os exercícios se tornaram uma expressão dos
métodos que orientavam a elaboração dos saberes geográficos nos livros didáticos dessa
disciplina e indicavam como os professores deveriam proceder na realização dos
exames, das atividades ou das aulas práticas de Geografia.
As produções didáticas de Geografia dos anos de 1880 aos anos de 1930
apresentam uma produção significativa de obras destinadas ao ensino primário com
exercícios na composição dos seus textos. Nessas obras, existem importantes elementos
acerca da centralidade reservada ao ensino de Geografia e suas principais finalidades no
currículo primário. Dentre os enfoques observados em nossas fontes, nos projetos de
reforma do ensino primário e nos manuais de metodologia do ensino dessa disciplina,
destacamos a predominância dos projetos voltados para difundir o nacionalismo
patriótico, que primavam pela exaltação dos elementos geográficos formadores do
território nacional. Quanto às preocupações com as propostas pedagógicas de cunho
metodológico, os autores embasavam suas produções em um discurso da inovação dos
métodos e apresentavam os exercícios com base nos princípios postos nas discussões
pautadas nos métodos misto, simultâneo e intuitivo, que, dentre outras coisas,
propunham um ensino embasado não só nos princípios da memorização.
A respeito das finalidades da Geografia do ensino primário, uma questão que
merece destaque nessa discussão é o papel exercido pelos livros didáticos na busca pelo
cumprimento dessas finalidades, posto que neles estavam contidas as indicações de
ensino da Geografia não mais voltado somente para memorizar nomes de países ou rios
259
mas mais direcionado para orientar e observar os fenômenos geográficos com base nas
vivências das crianças e de sua comunidade. Não podemos nos esquecer das
continuidades fundamentais para compreender todo o processo de constituição dessa
disciplina escolar.
Sobre a presença dos exercícios cartográficos, eram considerados fundamentais
para o desempenho dessas finalidades, em especial, para fazer mapas e desenhar as
cartas. Esses exercícios passaram a ser, teoricamente, o maior auxílio dos professores na
condução das aulas de Geografia do ensino primário e apoio no repasse dos conteúdos e
na elaboração dos conhecimentos geográficos.
Consideramos os métodos de ensino como procedimentos didáticos que
permearam as concepções teóricas e a ação dos professores através de orientações
pedagógicas próprias para o ensino primário, e os exercícios aparecem nos livros como
uma expressão deles. Nos livros didáticos, essas prescrições metodológicas
corroboravam o movimento de inovação pedagógica em curso e se configuravam como
um conjunto de lições e de exercícios, cada um partindo de seus objetivos e seguindo as
prescrições metodológicas que estavam em curso no período. Com base em nossas
análises, afirmamos que a presença dos exercícios no processo de escolarização
primária marcou as concepções metodológicas da disciplina escolar Geografia com o
debate das modificações na estrutura textos. Essa inovação afetou diretamente os
conteúdos.
Com essa constatação, afirmamos que, com a presença dos exercícios,
especialmente os apoiados pelos métodos intuitivo e ativo, vimos a indicação de um
ensino de cunho mais prático e moderno de Geografia. Por isso, o conjunto de
exercícios que se acrescentava aos livros didáticos no período pesquisado se
configurava como novas metodologias de ensino para a Geografia, e como os exercícios
eram uma expressão dos métodos, foram os meios para que os métodos fossem
aplicados no ensino da Geografia. Assim, houve uma modificação nas metodologias de
ensino do curso primário trazida nas produções didáticas de Geografia, em que os
exercícios ocupavam um lugar de destaque nas propostas de elaboração dos conteúdos.
Os exercícios fizeram parte dos procedimentos metodológicos e das sequências
didáticas da disciplina Geografia. Nos livros, eles aparecem como orientação básica
para conduzir as prescrições sobre o que e como ensinar Geografia no ensino primário.
260
Retomamos nossa proposta de tese e afirmamos que a introdução dos exercícios no
corpo dos livros didáticos de Geografia representou uma tentativa de alguns autores de
adotar as inovações metodológicas propostas diretamente pela recomendação dos
exercícios como uma expressão das orientações metodológicas do período estudado.
Neste trabalho, concluímos que os autores pretenderam usar os exercícios para
compor a estrutura dos livros como forma de substituir as perguntas e as respostas
explícitas, marcando não só as produções didáticas como também e, sobretudo, a cultura
escolar primária como um todo. Essa concepção pedagógica, que recomendava os
exercícios, tinha como princípio teórico o estudo acerca das percepções sensoriais, que
recomendavam que os estudos tomassem como base os sentidos, que deveriam preceder
a compreensão das crianças.
Sobre a educação dos sentidos, para a Geografia, de modo particular, a indicação
que mais interferiu na aprendizagem das crianças foi a possibilidade que os sentidos
ofertavam quando recorriam a lições que visavam apreender as evidências entre os
objetos e os fenômenos (HÉBRARD, 2000). Assim, os conhecimentos geográficos
presentes nos livros tomavam como base o método “Lições de coisas” ou método
intuitivo que, dentre outros princípios, prezava pelo aprendizado por meio da
observação do real e da experiência.
Em relação às influências diretas do método intuitivo no ensino da Geografia,
ele contribuiu significativamente para rever as metodologias adotadas por essa
disciplina, no que se refere às concepções do pensamento de Pestalozzi e seus
fundamentos gerais para a Educação. Em nossas análises, constatamos que, entre as
disciplinas escolares do período pesquisado, a Geografia foi a mais adequada para a
discussão metodológica proposta para o ensino primário da época, a partir dos
princípios defendidos por esse método, em função das habilidades necessárias ao
desenvolvimento dos conhecimentos inerentes a essa disciplina. A observação da
sociedade na relação com a natureza requer do aluno, a descrição e a representação, e
para que ele saiba usar as representações espaciais, precisa recorrer aos conhecimentos
cartográficos. Isso justifica a aproximação entre a Geografia e a cartografia nos
exercícios encontrados nos livros pautados nesse método de ensino.
Essa questão se justifica porque essa disciplina considera a experiência e a
percepção sensorial como um processo ativo em suas metodologias de ensino, o que
261
corrobora o que defendia Pestalozzi. Então, pontuamos que a Geografia se baseou nas
contribuições de Pestalozzi, que estabeleceu um ensino com base na intuição e na
observação. Pestalozzi influenciou também a elaboração dos procedimentos
fundamentais do ensino da Geografia local, segundo a qual a criança deveria aprender
Geografia a partir do objeto mais próximo e por meio das percepções da natureza.
O ensino de Geografia não mais deveria tomar como base o estudo dos globos e
a memorização de nomes de países. A recomendação era de que os exercícios fossem
adotados por meio de um método que contribuísse para explorar nas crianças não só o
acumulo de informações ou conteúdos, mas também, principalmente, desenvolver sua
capacidade de aprender por meio dos sentidos e da experiência.
Assim, entendemos os exercícios como uma metodologia usada para expor os
conteúdos da disciplina Geografia e reconhecemos seu papel como uma expressão dos
métodos, quando exerceram, dentro das propostas do ensino primário, a função de
propagar as concepções de aprendizagem que estavam em vigor no contexto estudado.
A presença dos exercícios nos livros didáticos da época transformou a estrutura do texto
organizado em perguntas e respostas, promovendo ou anunciando mudanças, ainda que
de forma lenta, por meio dos exercícios.
Portanto, as produções didáticas que visavam inserir os exercícios como uma
expressão do método como suporte para tornar o ensino da Geografia menos
mnemônico visavam atender às aclamações postas no debate de renovação pedagógica
proposto para a escola. Na história dessa disciplina, os exercícios desempenharam um
papel importante, na tentativa de interferir no modelo de perguntas e de respostas que
vigorava na época, pois, gradualmente, começavam a aparecer nos livros didáticos sob a
influência da perspectiva moderna. Assim, as produções didáticas destinadas ao nível
primário demonstram que os exercícios foram a expressão de uma nova metodologia de
ensino para a Geografia.
Verificamos que houve uma diversificação dos objetos utilizados para se ensinar
Geografia nas indicações que datam o início do Século XX, marcado pela
recomendação de modernas metodologias propostas nos livros didáticos, como o livro
“Methodologia do ensino geográfico - Introdução aos estudos de Geografia Moderna”,
de Delgado de Carvalho, publicado em 1925. Essa constatação pode indicar, dentre
outros fatores, que as dificuldades enfrentadas pela disciplina Geografia, nos dias atuais,
262
não podem mais se respaldar no discurso da carência de novas metodologias.
Convém, no entanto, lembrar que, apesar das inovações metodológicas e do
aumento expressivo de exercícios práticos nos livros didáticos, eles ainda eram vistos
como um trabalho de repetição e de memorização, que, mesmo em outra perspectiva,
tinham a função de exigir dos alunos que lessem atentamente as instruções e o texto
indicado, que encontrassem as respostas corretas, copiassem corretamente as respostas e
retivessem as informações principais trabalhadas pelo exercício. Ressaltamos que o
método mnemônico ainda era muito forte e marcava a cultura escolar primária, fazendo
com que a finalidade principal dos exercícios ainda fosse a de reforçar os princípios da
memorização.
Os resultados empreendidos nos levaram a considerar que nossos
questionamentos e as discussões têm relação direta com um processo maia amplo de
escrita e de leitura, que passa, diretamente, pelos espaços ocupados pelos livros. Nesse
sentido, compreendemos que a escrita e a leitura, cada um ao seu modo, são processos
cognitivos complexos, com múltiplas linguagens e infiltrados numa tradição e nos
costumes de uma época. Nos livros, há registros da escrita e da leitura de um tempo e de
uma tradição. Por isso, é interessante pensar nas relações de leitura e em sua
apropriação pelos leitores.
Assim, considerando os resultados alcançados e as conexões mais amplas
estabelecidas com as marcas da cultura escolar, que delimitam os modos de produzir e
de adquirir conhecimentos por meio dos livros, questionamos: Como nossos leitores
têm convivido com o aroma e o rastro da cultura escrita? Como as novas gerações têm
adentrado os arquivos e os acervos, em conjunto com os novos suportes de leitura?
Como a produção de livros tem se relacionado com o sistema de ensino “apostilado”
imposto para as diferentes realidades?
Com base nessas colocações, podemos pontuar o quanto o processo de formação
mais ampla da identidade de um povo passa diretamente por meio dos processos de
aquisição da leitura e da escrita. Entendemos que, numa perspectiva histórica, o estudo
sobre os materiais didáticos nos ajudou a compreender a sociedade de hoje,
considerando que ela vivencia espaços marcados por relações instauradas em redes de
conexões (SILVA, 2002). Essa discussão também nos levou a pensar sobre o mundo
digital e sobre como os livros impressos têm resistido às intertextualidades dos espaços
263
e convivido com elas.
Em nossa pesquisa, verificamos que estudar os livros didáticos por meio da
cultura escrita é refletir sobre as relações que se estabelecem entre as inovações e os
traços do passado. Nessa relação, precisamos entender que, na era de hibridismos80
,
vivenciada, atualmente, pela sociedade, precisamos pensar sobre a complementaridade
das coisas nas articulações que as informações estabelecem, sem, necessariamente,
pensar na dualidade e na anulação dos conhecimentos. Um exemplo disso é o uso das
bibliotecas que traz o aroma de passado, mas abriga leitores e usuários que, quase
sempre, trazem o cheiro da inovação. São espaços diferenciados com suas
particularidades, de modo que a inserção de práticas de inovação não implique a
rejeição do passado, ou seja, seus leitores não podem negar as tradições e os costumes
presentes naquele espaço e fora dele.
Em dias atuais, as bibliotecas continuam cheias de usuários que utilizam objetos
digitais e impressos do acervo. Logo, temos uma hibridização nos espaços, por isso
podemos inferir que os objetos “ditos novos” não anulam ou não substituem os
“velhos”. O que acontece é que eles vão se encaixando e, nesse processo, alguns passam
mais rápidos e outros permanecem e marcam nossas histórias. Acreditamos que os
suportes de leitura precisam formar um leitor expandido, capaz de transitar nesses
espaços sem desconsiderar os valores das coisas, pois os livros - analógicos ou digitais -
compõem traços do mundo do conhecimento.
Nessa perspectiva, consideramos o livro didático como um suporte informativo
que, apesar de presente no cotidiano escolar dos alunos e dos professores há, pelo
menos, dois séculos, ainda se configura como o único material didático que faz parte da
construção do mundo do conhecimento de muitos alunos. Por isso, afirmamos que esse
produto, que faz parte da indústria cultural e, portanto, é usado como ferramenta
80
A dimensão do conceito de hibridismo tem várias facetas que têm em comum a experiência da
oscilação e de diferentes linguagens. Para Lévy (1997), falar de hibridismo é pensar que “o espaço do
novo nomadismo não é o território geográfico nem o das instituições ou dos Estados, mas um espaço
invisível dos conhecimentos, dos saberes, das forças de pensamento no seio da qual se manifestam e
se alteram as qualidades do ser, os modos de fazer sociedade. Não são os organismos do poder, nem as
fronteiras disciplinares, nem as estatísticas dos mercados, mas sim o espaço qualitativo, dinâmico,
vivo, da humanidade que se inventa, ao mesmo tempo em que produz o seu mundo” (p. 17).
264
pedagógica ou não, compõe, junto com outros “suportes informativos”, como livros
paradidáticos, atlas, apostilas, cadernos, CDs e DVDs, e os materiais de computador,
como CD-ROMs, jogos etc., o grupo dos materiais pedagógicos que comunicam os
elementos do saber das disciplinas escolares. Historicamente, no processo de formação,
de repasse e de produção dos conhecimentos, esses suportes exerceram e exercem
funções determinantes, visto que valores e ideologias são transmitidos na escola o
tempo todo.
Assim, procurando relacionar essas inferências que elencamos com as
impressões obtidas acerca do nosso objeto de estudo, podemos afirmar que a formação
dos saberes escolares é marcada por um movimento de idas e vindas, por uma busca
constante por inovações que está, quase sempre, esbarrando-se no velho, que está
instituído nas mais diversas concepções pedagógicas. Isso quer dizer que nossa cultura
escolar, ao longo do tempo, vem trazendo traços de mudanças e permanências que não
devem ser analisadas separadamente da seleção que a escola faz para garantir a
perpetuação de costumes, valores e identidades, tampouco das diversificadas tradições
culturais presentes no processo de escolarização.
Considerando que a presença dos exercícios marca os traços da cultura escolar
primária, afirmamos que houve uma interação entre eles e o processo de formação dos
conhecimentos da disciplina escolar Geografia e que a concepção da disciplina escolar
Geografia está intimamente associada ao papel histórico exercido pela Pedagogia e pela
escola, e não, somente, à ideia de transposição de saberes ou métodos, que se integram e
resultam em uma produção coletiva dessas instâncias.
O estudo sobre os exercícios nos permitiu afirmar que eles desempenharam um
papel relevante na formação dos saberes da disciplina escolar Geografia e se
configuraram como uma expressão da metodologia que tinha, entre outras finalidades, a
de fixar o saber ensinado por meio de um ensino ora mais descritivo ora mais prático,
mas que não abria mão da indicação dos exercícios como subsídio necessário à
organização e à produção dos saberes geográficos da época.
265
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BARBOSA, Ruy; ESPINOLA, Thomaz do Bomfim; VIANA; Ulisses Machado.
Reforma do Ensino Secundário e Superior - Sessão de 13 de abril de 1882, apresentada
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BARBOSA, Rui. Reforma do ensino primário e várias instituições complementares da
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presidente de província. Coleção de Leis Império do Brasil do ano de 1834. Rio de
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Paulo: Typ. Do diário Official, 1921.
VARGAS, Getúlio. DECRETO-LEI N. 1.006 DE 30 DE DEZEMBRO DE 1938.
282
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emhttp://ihgp.net/catalogo_3o.htm.
Biblioteca Nacional de Maestro - Argentina. Disponível em http://www.bnm.me.gov.ar/.
Biblioteca Nacional de Portugal. Disponível em http://www.bnportugal.pt/.
Biblioteca digital do Senado Federal (seção de obras raras). Disponível em
http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/4.
284
O trabalho de catalogação das obras destinadas ao Ensino Primário e suas
classificações ou aquelas aqui por nós denominadas de não identificadas já vem sendo
organizado desde início da pesquisa de doutorado.
O processo de levantamento e catalogação das publicações entre os anos de
1880-1930, quando nos foi possível, foi feito por meio da fotografia ou fotocópia dos
detalhes da obra como: a capa, a contracapa, as primeiras folhas, os textos
complementares, e, em alguns casos, quando tivemos acesso, realizamos registro da
obra inteira. Alguns desses livros foram adquiridos em sebos, ou em bibliotecas
particulares, outros ainda conseguimos baixar da internet, em sites que se ocupam de
fazer a guarda desses materiais e disponibilizar para que outros pesquisadores tenham
acesso a essas fontes.
É bom enfocar que o nosso trabalho caminha junto com os trabalhos
desenvolvidos pelo o Grupo de Pesquisa Ciências, Educação e Sociedade – GPCES,
cujo principal objetivo é suscitar e subsidiar pesquisas de graduação e pós-graduação,
promovendo o intercâmbio entre as áreas de Geografia, História, Ciências, Pedagogia e
Arquitetura. Para isso, já foram organizados muitos projetos denominados projetos
guarda-chuva, que abrangia essas disciplinas e tinha como foco formar um banco de
dados dos livros didáticos catalogados nas bibliotecas da Paraíba (obras em geral dentro
do recorte temporal delimitado para pesquisa 1870 – 1940), depois se estendendo para
os IHGNE – Institutos Históricos e Geográficos do Nordeste.
Primeiro, gostaríamos de esclarecer ao leitor que para organização das obras
catalogadas, partimos da base de dois projetos que tem se dedicado a tarefa de criar,
alimentar e disponibilizar um banco de dados de livros didáticos. Faz-se importante
informar que devido o Projeto LIVRES ser referência aqui no Brasil desse tipo de
trabalho e pelas aproximações de algumas pesquisas ou experiências vividas de alguns
pesquisadores com esse projeto, o GPCES para catalogação dos livros didáticos faz uso
da ficha de catalogação elaborada pelo LIVRES.
O primeiro é o banco de dados da Biblioteca do Livro Didático e do banco
virtual de livros didáticos: Livros Escolares Brasileiros – LIVRES81
(1810 – 2005)
81
O banco de dados da LIVRES apresenta um variado e extenso catálogo de produções didáticas de
diferentes disciplinas desde o Século XIX até os dias atuais, além de preservar outras fontes
285
(http: //pajé.fe.usp.br/estrutura/livres/index.htm), locado na Faculdade de Educação da
USP. Tal projeto fora organizado pela Faculdade de Apoio à Pesquisa do Estado de São
Paulo – FAPESP. E o segundo foi a partir das atividades de catalogação do já
mencionado GPCES, que mesmo ainda que bem pequeno se comparado ao LIVRES,
que tem se dedicado a organizar na Paraíba o acervo de livros didáticos.
Para isso, inicialmente lançamos mão de catalogar e também fazermos pesquisas
de referências de livros didáticos do ensino primário que estivesse dentro do nosso
período de pesquisa (1880 – 1930), vale ressaltar que também listamos aqueles livros
didáticos que não estão definidos quanto ao nível de ensino, pois, nesses encontrarmos
indícios que podemos caracterizá-los como primários ou como livros utilizados ou
destinados a esse nível de ensino.
As pesquisas tiveram início no acervo de livros didáticos do GPCES, se
configurando no primeiro contato (com as fontes dessa pesquisa, pois, desde PIBIC que
já trabalhamos com os livros didáticos como fonte e objeto de pesquisa) com a
materialidade das fontes (obras didáticas), ou seja, um contato primordial para qualquer
uma pesquisa dessa natureza. O aproximar-se das fontes de pesquisas, nos permitiu e
tem permitido não só fazermos inferências com as colocações por nós feitas no decorrer
da pesquisa, mais, sobretudo, por se configurar num momento em que essas fontes
foram dadas a ler e cuidadosamente apreendidas por nós, que sabemos da relevância
desse momento e dos cuidados de se deve ter ao ler uma fonte histórica.
Sobre as atividades de catalogação no GPCES destacamos que o primeiro passo
foi listar os locais por nós pesquisados, inicialmente nos seguintes acervos: Biblioteca
da Universidade Federal da Paraíba - UFPB - coleções especiais, Biblioteca do IEP –
Instituto de Educação da Paraíba, Biblioteca do CENTEMAR – Biblioteca do
Seminário Arquidiocesano da Paraíba, Biblioteca do UNIPÊ – Centro Universitário de
João Pessoa, Biblioteca do CEFET/PB – Escola Técnica da Paraíba, hoje o IFPB –
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba, na FJA Fundação José
Américo e no Espaço Cultural – seção obras raras. Depois, fomos fazer um apanhado do
que os projetos que já tinha catalogado livros didáticos que pudesse nos interessar,
relacionadas à produção didática, documentos históricos como programas curriculares, legislação,
catálogo de editoras e bibliografia de pesquisas nacionais e internacionais sobre livro didático.
286
primeiros os projetos de iniciação científica – PIBICs82
e depois os projetos universais,
o das bibliotecas da Paraíba e dos Institutos Históricos e Geográficos do Nordeste83
.
O segundo passo foi realizado no acervo físico da Biblioteca de livro didático da
USP em abril de 2014. O momento oportunizou, entre outras questões, o contato com a
materialidade das obras desse acervo, pois, boa parte delas já havia sido catalogada no
acervo digital. Aqui cabe ressaltar que isso facilitou e ajudou demais na busca pelas
obras, pois, já com esse levantamento prévio de boa parte das obras coletas, ficava mais
fácil na hora de fotografar e selecionar o que nos interessava mais de perto em cada uma
delas. Vale lembrar que, no acervo físico da Biblioteca de Livro Didático da USP 84
, não
encontramos um número expressivo de livros destinados ao ensino primário, visto que,
a maioria deles estão dispersos nas outras bibliotecas vinculadas ao projeto LIVRES,
que não tivemos oportunidade de visitar, pois, fica em diferentes Estados brasileiros.
Em São Paulo além da Biblioteca de Livro Didático da USP, fomos a Biblioteca
Municipal Mário de Andrade e a Biblioteca Brasiliana e Guita José Mindlin – USP. O
proposito da visita as referidas biblioteca foi de termos acesso aos livros didáticos que
foram catalogados em conjunto com o LIVRES, porém, no caso da Biblioteca
Municipal Mário de Andrade, não tivemos acesso ao local, pois, o setor de obras raras
estava interditado. Já no caso da Biblioteca Brasiliana e Guita José Mindlin – USP,
tivemos acesso e realizamos a pesquisa de forma satisfatória.
O levantamento nos acervos digitais foi feito no catálogo do Banco de Dados de
Livros Escolares Brasileiros – LIVRES, a pesquisa foi realizada diretamente no site
(http: //pajé.fe.usp.br/estrutura/livres/index.htm), por ano, por vezes por autores e por
outras por título. A importância dada a esse site para nossa pesquisa se dá pelo fato
desse nos levar automaticamente aos acervos de outras bibliotecas e instituições
brasileira que trabalham com a temática discutida, pois o seu catálogo integra o acervo
82 Destaco aqui a minha participação no processo de catalogação desses livros para GPCES, enquanto
aluna e bolsista do PIBIC do projeto já mencionado na parte introdutória da pesquisa.
83 Aqui cabe enfatizar que fizemos parte e coletamos os dados in lócus da proposta de catalogação do
Projeto Universal Ensino de Geografia: materiais didáticos, currículos, autores e práticas escolares
(1860 a 1940), financiado pelo CNPq e coordenado pela professora Maria Adailza Martins de
Albuquerque.
84 Na pesquisa realizada na referida biblioteca, é importante também registrar a acolhida e importante
ajuda da bibliotecária Maria José, que com sua experiência de arquivo, nos ajudou na pesquisa. E
ainda, sua disponibilidade em ajudar nas pesquisas a distância, estreitando os laços entre a Paraíba e o
banco de dados digital da LIVRES.
287
da Biblioteca do Livro Didático da Biblioteca FEUSP; Biblioteca Municipal Mário de
Andrade de São Paulo; Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro; Biblioteca do Colégio
Pedro II – NUDOM do Rio de Janeiro; Biblioteca do CEALE da UFMG; Biblioteca da
UNESP - Marília; Biblioteca PUC - Minas Gerais e a Biblioteca Brasiliana - USP. Além
do site LIVRES também realizamos a pesquisa em outros endereços eletrônicos, a
exemplo o site do Laboratório de Ensino e Materiais Didáticos - LEMAD85
; Acervo de
obras raras da biblioteca do Senado Federal86
, dentre outros.
85
O referido Laboratório tem como coordenadores os professores: Silvia Basseto, Antônia Terra de
Calazans Fernandes, Mauricio Cardoso e Ana Maria de Almeida Camargo.
86 Aqui enfatizamos que a pesquisa em acervos (físicos ou digitais) não especializados em acervos
didáticos não é uma tarefa fácil, tendo em vista a variedade de fontes existentes nesses locais, e
também, em alguns casos, a falta de sistematização e organização dos tipos de fontes. Nos casos dos
acervos digitais, quando estávamos pesquisando por termos e expressões chaves que pudessem estar
associadas aos livros didáticos, a partir da grafia da época, como: compêndio, cosmographia,
geographia, geografia, chorographia, corographia, corográfica(o), dentre outros termos.
288
Quadro I – Obras didáticas destinadas ao Ensino Primário (1880 – 1930)
Título da obra
(subtítulo/outras
informações)
Autor (es) Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das
obras –
catálogo/referênc
ias
1 - Introdução
Corographica à
História do Brasil
Pedro
d’Alcântara
Bellegarde
Rio de
Janeiro:
1840
Typ. J. E. S.
Cabral
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
2 - Noções geraes
de Geographia
Universal:
contendo
particularmente a
Geographia do
Imperio do Brazil e
da provincia do
Amazonas
Raimundo
A. Nery
Paris:
França:188
?
Guillard,
Aillaud &
Cia
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
3 - Atlas do
Imperio do Brazil:
comprehendendo
as respectivas
divisões
administrativas,
ecclesiasticas,
eleitorais e
judiciarias
Candido
Mendes de
Almeida
Rio de
Janeiro:
1868
Lithographi
a do
Instituto
Philomathic
o
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
3 - Atlas do
Imperio do Brazil
Homem de
Mello;
Claudio
Lomellino
Carvalho;
Francisco
Antonio
Pimenta
Bueno;
Paulo
Robin
Rio de
Janeiro:
1882
Angelo
Agostini e
Paulo
Robin
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
4 - Breves noções
para se estudar
com methodo a
Geographia do
Brasil
J. Praxedes
P. Pacheco
Rio de
Janeiro:
1857
Typ. Imp. e
Const. de J.
Villeneuve e
Cia.
Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
5 - Chorographia
da provincia do
Ceará
José
Pompeu de
A. Cavalca
nti
Rio de
Janeiro:
1888
Imprensa
Nacional
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
6 - Chorographia
de Portugal
Bibliotheca
do Povo e
das Escolas
Lisboa:
Portugal:
1881. 1ª.
David
Corazzi
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
289
Título da obra
(subtítulo/outras
informações)
Autor (es) Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das
obras –
catálogo/referênc
ias
ed. de livros
didáticos -
LIVRES
7 - Chorographia
do Brazil
Bibliotheca
do Povo e
das Escolas
Lisboa:
Portugal:
1882
David
Corazzi
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
8 - Compendio de
Geographia da
Provincia do
Paraná: adaptado
ao ensino da
mocidade
brazileira, e
acompanhado de
cento e trinta notas
instructivas
Luiz de
França
Almeida e
Sá
Rio de
Janeiro:
1871
Eduardo &
Henrique
Laemmert
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
9 - Compendio
de Geographia
elementar:
especialmente do
Brazil
Jeronimo
Sodré
Pereira
Bahia:1884.
2ª. ed.
Lopes da
Silva Lima
& Amaral
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
10 - Compendio de
Geographia
Universal: especial
do Brazil e da
provincia de
Pernambuco
Salvador
Henrique
de
Albuquerqu
e
Rio de
Janeiro:
1880. 2ª.
ed.
Eduardo &
Henrique
Laemmert
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
11 - Compendio
elementar de
Geographia geral e
especial do Brasil
Thomaz
Pompêo de
Souza
Brasil
Rio de
Janeiro:
1864. 4ª.
ed.
Lambert Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
12 - Curso
methodico de
Geographia
physica, politica e
astronomica:
composto para uso
das escolas
brasileiras
Joaquim
Maria de
Lacerda
Rio de
Janeiro:
1884. 3ª.
ed.
B. L.
Garnier
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
13 - Geographia da
Provincia de S.
Paulo
Brigadeiro
José
Joaquim
Machado
de Oliveira
São Paulo:
1862
Typ.
Imparcial
de J. R.
Azevedo
Marques
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
14 – Geographia
das Provincias do
Brazil
Alfredo
Moreira
Pinto
Rio de
Janeiro:
1885. 2ª. ed.
Livraria
Nicolau
Alves; Alves
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
290
Título da obra
(subtítulo/outras
informações)
Autor (es) Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das
obras –
catálogo/referênc
ias
& C. de livros
didáticos -
LIVRES
15 - Geographia
Geral: descripção
das raças, religiões,
governos e estados
do globo
Bibliotheca
do Povo e
das Escolas
Lisboa:
Portugal:
1881 2ª. ed.
David
Corazzi
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
16 - Geographia
Physica
Maury; L.
A. da Costa
Aguiar
Rio de
janeiro:
1873
B.L.
Garnier
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
17 - Lições de
Corographia do
Brazil
Joaquim
Manoel de
Macedo
Rio de
Janeiro:
1877
B.L.
Garnier
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
18 - Licoes de
Goegraphia
Abbade
GAULTIE
R
Paris:
Lisboa:
1878
Guillard,
Aillaud&Ci
a
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
19 - Lições
elementares de
Geographia
segundo o methodo
Gaultier
Estacio de
Sá e
Menezes;
Luiz
Leopoldo
Fernandes
Pinheiro
Junior
Rio de
Janeiro:
1885. 4.ed.
B.L.
Garnier
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
20 - Noções de
Corographia do
Brazil
Joaquim
Manoel de
Macedo
-
1873
- Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
21 - Noções de
Geographia do
Brazil: para uso da
mocidade
brazileira
Manoel
José
Pereira
Frazão
Rio de
Janeiro:
1883
Typ.
Esperança
de J.
d'Aguiar &
C.
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
22 - Noções geraes
de Geographia
Universal:
contendo
particularmente a
Geographia do
Imperio do Brazil e
Raimundo
A. Nery
Paris:
Lisboa:
188-?
Guillard,
Aillaud &
Cia
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
291
Título da obra
(subtítulo/outras
informações)
Autor (es) Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das
obras –
catálogo/referênc
ias
da provincia do
Amazonas
23 - Novo Atlas
Universal
Anônimo
(Autor);
G. Lorsigno
l
Paris:
Lisboa:
1884
Guillard,
Aillaud &
Cia
Consulta Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
24 - Terra e os
Mares: divagações
scientificas
Bibliotheca
do Povo e
das Escolas
Lisboa:
Portugal:
1882
David
Corazzi
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
25 - Noções de
Geographia Geral
para o uso da
infancia
Alfredo
Moreira
Pinto
Rio de
Janeiro:
1885
Francisco
Alves
Manual Obra catalogada
pelo GPCES, no
projeto universal
de livros
catalogados nos
Institutos
Históricos e
Geográficos dos
Estados do
Nordeste –
Instituto
Histórico
Geográfico e
Antropológico do
Ceará –
Fortaleza.
26 - Geographia da
infância – para o
uso das escolas
Forjaz Coimbra:
1855. 2ª ed.
Imprensa
da
Universida
de de
Coimbra
Manual Obra catalogada
pelo GPCES, no
Gabinete
Português de
Leitura - GPL.
27 - Compêndio de
Geografia
Elementar I e II
Mario de
Vasconcelos
de Sá
Porto:
Lisboa,
Paris: 1921
Aillaud e
Bertrand/Li
vraria
Chardron,
De Lélo &
Irmãos
LTD
Manual Obra catalogada
pelo GPCES, no
Gabinete
Português de
Leitura - GPL.
28 - Compendio
elementar de
Geographia geral e
especial do Brasil
Tomás
Pompeo de
Souza
Brasil
Rio de
Janeiro:
1859. 3ª ed.
Aillaud e
Bertrand/Li
vraria
Chardron,
De Lélo &
Irmãos
LTD
Manual
Obra catalogada
pelo GPCES, no
Gabinete
Português de
Leitura - GPL.
29 - Geographia
elementar
adaptada às
Escolas Públicas
Tancredo
do Amaral
Rio de
Janeiro,
Paris: 1914.
4ª ed.
Francisco
Alves
Cia/Aillaud
Alves & Cia
Manual Obra catalogada
pelo GPCES, no
Gabinete
Português de
292
Título da obra
(subtítulo/outras
informações)
Autor (es) Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das
obras –
catálogo/referênc
ias
Primárias Leitura - GPL.
30 - Pequena
Geographia da
Infância –
composta para o
uso das escolas
primárias
Joaquim
Maria de
Lacerda
São Paulo,
Belorizonte
: 1926
Francisco
Alves
Manual Obra catalogada
pelo GPCES, no
Gabinete
Português de
Leitura - GPL.
31 - Compendio de
Geographia par o
uso das aulas de
primeiras letras
- Recife:
1836
typographi
a de Santos
Manual BN
32 - Compendio
elementar de
Geographia geral e
especial do Brasil
Tomás
Pompeo de
Souza
Brasil
Fortaleza:
1856. 2ª ed.
typographi
a de Santos
Manual Obra catalogada
pelo GPCES, no
Gabinete
Português de
Leitura - GPL.
33 - Elementos de
Geographia
Universal – Geral
do Brasil e especial
de Pernambuco
para a infância
escolar da
Província de
Pernambuco
Manoel
Pereira de
Morais
Pinheiro
Recife:
1875
Typographi
a Mercantil
Manual Obra catalogada
pelo GPCES, no
Gabinete
Português de
Leitura - GPL.
34 - Geographia do
Brasil – Adaptado
as escolas
primárias
Francisco
Manuel
Rapozo
D`Almeida
Bahia:
1864. 1 ed.
Typographi
a
Constitucio
nal de
França
Guerra
Manual Obra catalogada
pelo GPCES, no
Gabinete
Português de
Leitura - GPL.
35 - O Atlas
elementar de
Geographia
J. E. da
Silva
Lisboa
Recife:
1877
Typographi
a do Jornal
do Recife
Consulta Obra catalogada
pelo GPCES, no
Gabinete
Português de
Leitura - GPL.
36 - Lições da
Geographia geral
Thomas
Pompeu de
Souza
Brasil
188-? - Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
37 - Geographia
patria infantil-
Escripta em verso
para uso das
classes primarias
João
Baptista
Pires de
Castro
Lopes
188-? - Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
38 - Pequena
Geographia da
infancia: composta
para o uso das
escolas
Joaquim
Maria de
Lacerda
Rio de
Janeiro:
1880. 2ª ed.
96 p
B. L.
Garnier
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
39 - Pequena Joaquim Rio de B. L. Manual Referências do
293
Título da obra
(subtítulo/outras
informações)
Autor (es) Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das
obras –
catálogo/referênc
ias
Geographia da
infancia: composta
para o uso das
escolas
Maria de
Lacerda
Janeiro:
1884. 3ª ed.
96 p
Garnier catálogo
organizado por
Silva (2012)
40 - Pequena
Geographia da
infancia: composta
para o uso das
escolas –
Melhorada com
seis cartas
coloridas, das cinco
partes do mundo,
sendo a última
melhorada com
seis cartas, das
cinco partes do
mundo, sendo a
última um lindo
mappa do Brazil
Joaquim
Maria de
Lacerda
Rio de
Janeiro:
1887. 4ª ed.
96 p
B. L.
Garnier
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
41 - Pequena
Geographia da
infancia: composta
para o uso das
escolas
Joaquim
Maria de
Lacerda –
Corrigida e
actualizada
por Luiz
Leopoldo
Fernandes
Pinheiro
Rio de
Janeiro:
1890. 5ª ed.
97 p
B. L.
Garnier
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
Pequena
Geographia da
infancia para o uso
das escolas
primarias
Joaquim
Maria de
Lacerda –
Feita por
Luiz
Leopoldo
Fernandes
Pinheiro
Rio de
Janeiro:
1895. 5ª ed.
108 p
B. L.
Garnier
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
42 - Pequena
Geographia da
infancia: composta
para o uso das
escolas
Joaquim
Maria de
Lacerda –
Corrigida e
actualizada
por Luiz
Leopoldo
Fernandes
Pinheiro
Rio de
Janeiro:
1898. 5ª ed.
97 p
B. L.
Garnier
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
43 - Pequena
Geographia da
infancia para o uso
das escolas
primarias
Joaquim
Maria de
Lacerda
Rio de
Janeiro:
1908. 126
p
Francisco
Alves & Cia
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
44 - Pequena
Geographia da
infancia: composta
Joaquim
Maria de
Lacerda -
Rio de
Janeiro:
1910. 116
Livraria
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
294
Título da obra
(subtítulo/outras
informações)
Autor (es) Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das
obras –
catálogo/referênc
ias
para o uso das
escolas
Corrigida e
actualizada
Por João
Ribeiro
p Silva (2012)
45 - Pequena
Geographia da
infancia: composta
para o uso das
escolas
Joaquim
Maria de
Lacerda -
Corrigida e
actualizada
Por João
Ribeiro
Rio de
Janeiro:
1914. 116
p
Livraria
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
46 - Pequena
Geographia da
infancia: composta
para o uso das
escolas
Joaquim
Maria de
Lacerda -
Corrigida e
actualizada
Por João
Ribeiro
Rio de
Janeiro:
1915. 116
p
Livraria
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
47 - Pequena
Geographia da
infancia: composta
para o uso das
escolas
Joaquim
Maria de
Lacerda -
Corrigida e
actualizada
Por João
Ribeiro
Rio de
Janeiro:
1917. 116
p
Livraria
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
48 - Pequena
Geographia da
infancia: composta
para o uso das
escolas
Joaquim
Maria de
Lacerda -
Corrigida e
actualizada
Por João
Ribeiro
Rio de
Janeiro:
1918. 116
p
Livraria
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
49 - Pequena
Geographia da
infancia: composta
para o uso das
escolas –
Enriquecida com 8
bellas cartas
coloridas das cinco
partes do mundo e
um lindo mappa do
Brasil.
Joaquim
Maria de
Lacerda -
Corrigida e
actualizada
Por João
Ribeiro
Rio de
Janeiro:
1924. 116
p
Livraria
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
50 - Pequena
Geographia da
infancia: composta
para o uso das
escolas primarias –
Curso Primeiro
Joaquim
Maria de
Lacerda
Rio de
Janeiro:
1928. 118
p
Livraria
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
51 - Pequena
Geographia da
infancia: composta
para o uso das
escolas
Joaquim
Maria de
Lacerda
Rio de
Janeiro:
1930. 118
p
Livraria
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
295
Título da obra
(subtítulo/outras
informações)
Autor (es) Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das
obras –
catálogo/referênc
ias
52 - Noções
elementares de
Geographia,
compiladas para
uso das escolas
primarias – É
escrito de acordo
com os pontos de
Geographia, que
são hoje
preparatório para
a matricula de
primeiro anno do
Collegio de Pedro
II
Augusto
Emilio
Zuluar
Rio de
Janeiro:
1880. 123 p.
Livraria
Clássica de
N. Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
53 - Noções
elementares de
Geographia do
Brasil
Alfredo
Moreira
Pinto
Rio de
Janeiro:
1881
- Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
54 - Noções
elementares de
corographia do
Brazil, para uso
das escolas
primarias
Alfredo
Moreira
Pinto
Rio de
Janeiro:
1881
- Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
55 - Corographia
do Brasil.
Rudimentos:
Alfredo
Moreira
Pinto
Rio de
Janeiro:
1893
Livraria
Clássica de
Alves e Cia.
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
56 - Rudimentos de
Chorographia do
Brazil. Para uso
das escolas
primarias
Alfredo
Moreira
Pinto
Rio de
Janeiro:
Paris:1881
16 p.
Alves & C.
; Guillard,
Aillaud &
Cia
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
57 - Rudimentos de
Chorographia do
Brazil. Para uso
das escolas
primarias
Alfredo
Moreira
Pinto
Rio de
Janeiro:
Paris: 1891.
2ª ed. 6 p.
Livraria
Clássica da
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
58 - Rudimentos de
Chorographia do
Brazil. Para uso
das escolas
primarias
Alfredo
Moreira
Pinto
Rio de
Janeiro:
Paris: 1895.
3ª ed. 6 p.
Alves & C.
; Guillard,
Aillaud &
Cia
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
59 - Pequena
Geographia Brazil.
Meltodo intuitivo
para uso dos
alunos do curso
primário do
Externato Azurara
João José
Pereira de
Azurara
Santos- PB
1884
Typ. do
Diário de
Santos
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
60 - Noções
elementares de
Geographia do
Joaquim
José de
Carvalho
Rio de
Janeiro:
1885
- Manual Referências do
catálogo
organizado por
296
Título da obra
(subtítulo/outras
informações)
Autor (es) Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das
obras –
catálogo/referênc
ias
Brasil – Para uso
dos alunnos do
curso primário do
colégio Amorim
Carvalho e das
escolas do corpo
militar de policia
da corte.
74 p. Silva (2012)
61 - Epitome da
Geographia do
Brasil – Destinado
ao ensino primário
João de
Simas
Enéias
Rio de
Janeiro:
1888
99 p.
- Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
62 - Noções
geográficas e
históricas do
estado de
Pernambuco –
Compêndio
Adoptado pelo
Conselho litterario
para uso das
Escolas Primárias
do Estado de
Pernambuco
E. R. T.
Espirito
Santo
Recife:
1891
6ª ed.
Typographi
a d’A
Província
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
63 - Geographia
elementar,
adaptada às escolas
publicas primarias
– adoptado
unanimemente pelo
Conselho superior
das instrucção
publica de S.
Paulo, e adoptado
nas escolas
Tancredo
Leite do
Amaral
Coutinho
Rio de
Janeiro:
1892
78 p.
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
64 - Geographia
elementar,
adaptada às escolas
publicas primarias
Tancredo
Leite do
Amaral
Coutinho
Rio de
Janeiro:
1893
2ªed. Cor. e
aum.
213 p.
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
65 - Geographia
elementar,
adaptada às escolas
publicas primarias
Tancredo
Leite do
Amaral
Coutinho
Rio de
Janeiro:
1895
2ªed. Cor. e
aum.
213 p.
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
66 - Geographia
elementar,
adaptada às escolas
publicas primarias
– adoptado
unanimemente pelo
Conselho superior
Tancredo
Leite do
Amaral
Coutinho
Rio de
Janeiro:
1896
5ª ed.
Revista e
argumenta
da com 28
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
297
Título da obra
(subtítulo/outras
informações)
Autor (es) Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das
obras –
catálogo/referênc
ias
das instrucção
publica de S.
Paulo, e adoptado
nas escolas
artigos
213 p.
67 - Geographia
elementar,
adaptada às escolas
publicas primarias
Tancredo
Leite do
Amaral
Coutinho
Rio de
Janeiro:
1904
8ªed.
213 p.
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
68 - Geographia
elementar,
adaptada às escolas
publicas primarias
Tancredo
Leite do
Amaral
Coutinho
Rio de
Janeiro:
1907
10ª ed.
213 p.
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
69 - Geographia
elementar,
adaptada às escolas
publicas primarias
Tancredo
Leite do
Amaral
Coutinho
Rio de
Janeiro:
1909
11ª ed.
213 p.
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
70 - Geographia
primária:
composto para uso
das Escolas
Primárias
Carlos
Novaes
Rio de
Janeiro:
1892
164 p.
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
71 - Geographia
primária:
composto para uso
das Escolas
Primárias
Carlos
Novaes
Rio de
Janeiro:
1895
3ª ed.
162 p.
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
Geographia
primária:
composto para uso
das Escolas
Primárias
Carlos
Novaes
Rio de
Janeiro:
1900
6ª ed.
164 p.
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
72 - Geographia
primária:
composto para uso
das Escolas
Primárias
Carlos
Novaes
Rio de
Janeiro:
190-
12ª ed.
164 p.
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
73 - Geographia
especial do Pará –
Aprovada para uso
das escolas
primárias
Raimundo
Ciríaco
Alves da
Cunha
Pará: 1894
89 p.
Typographi
a e
encadernaç
ão da V.
Travessa
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
74 - Geographia
especial do Pará –
Aprovada para uso
das escolas
primárias
Raimundo
Ciríaco
Alves da
Cunha
Pará: 1898
2ª ed.
89 p.
Typographi
a e
encadernaç
ão da V.
Travessa
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
75 - Geographia
elementar –
Arthur
Thiré
Rio de
Janeiro:
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
298
Título da obra
(subtítulo/outras
informações)
Autor (es) Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das
obras –
catálogo/referênc
ias
Compendiada para
uso das escolas
primárias
1901
164 p.
organizado por
Silva (2012)
76 - Geographia
elementar –
Compendiada para
uso das escolas
primárias
Arthur
Thiré
Rio de
Janeiro:
1909
10ª ed.
164 p.
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
77 - Geographia
elementar –
Compendiada para
uso das escolas
primárias
Arthur
Thiré
Rio de
Janeiro:
1909
10ª ed.
164 p.
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
78 - Geographia
elementar –
Compendiada para
uso das escolas
primárias
Arthur
Thiré
Rio de
Janeiro:
1925
17ª ed.
173p.
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
79 - Geographia
elementar: para
uso das escolas
Primárias
M. Filho
Albuquerqu
e
Recife:
1914
233 p.
Imprensa
Industrial
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
80 - Curso
Elementar de
Geographia: para
uso das Escolas
Primárias
F.T.D. Rio de
Janeiro:
1914
48 p.
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
81 - Pontos de
Geographia para o
Estado de Minas –
2º, 3º e 4º anno
primário
Carlos Góes Bello
Horizonte:
1917
128 p.
Imprensa
Official de
Minas
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
82 - Pontos de
Geographia – 2º, 3º
e 4º anno primário
Carlos Góes Bello
Horizonte:
1924
2ª ed.
128 p.
Imprensa
Official de
Minas
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
83 - Pontos de
Geographia – De
acordo com a
última Reforma em
Minas e o Novo
Programma
Official (Decreto n
4930 de 6 de
fevereiro de 1918).
2º, 3º e 4º anno
primário. Para uso
dos Grupos
Escolares e Escolas
Singulares
Carlos Góes Bello
Horizonte:
1918
203 p.
Imprensa
Official de
Minas
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
85 - Manual de
Geographia
elementar e noções
O. de Souza
Reis
Rio de
Janeiro:
1918
Ed. do
Autor
Manual Referências do
catálogo
organizado por
299
Título da obra
(subtítulo/outras
informações)
Autor (es) Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das
obras –
catálogo/referênc
ias
rudimentares de
physiographia:
para uso das
classes superiores
das escolas
primárias e
princípios do
ensino secundário
2º ed.
119 p.
Silva (2012)
86 - Chorographia
do Districto
Federal – Manual
de Geographia das
escolas primárias
Curso
Complementar
O. de Souza
Reis
Rio de
Janeiro:
1921
2º ed.
151 p.
- Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
87 - Geographia –
Edição texto só,
para escolas
primárias
(Admissão ao curso
gymnasial)
25 mappas pretos
F.T.D. Rio de
Janeiro,
São Paulo:
1923
Livraria
Paulo de
Azevedo e
Cia
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
88 - Geographia
primaria
Mário da
Veiga
Cabral
Rio de
Janeiro:
1925
212 p.
Jacintho
Ribeiro dos
Santos
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
89 - Noções de
Geographia – III
Parte, Globo
Terrestre
Afonso
Guerreiro
Lima
Porto
Alegre:
1930
Globo Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
90 - Novo manual
de Geographia –
Curso elementar
para uso das
Escolas Primárias
F.T.D. São Paulo:
1907
- Manual Obra catalogada
no acervo
GPCES
91 - Compêndio de
Geographia
elementar
M. Said Ali Obs: a capa
do livro está
deteriorada
não
permitindo
ver
informaçõe
s refere ao
ano, local
de
publicação
e outras
informaçõe
s
- Manual Obra catalogada
no acervo
GPCES
92 - Elementar de
cosmographia
geral
Ezequiel de
Moraes
Leme
São Paulo,
Cayeiras,
Rio de
Janeiro e
Recife:
Comp.
Melhorame
ntos de São
Paulo
Manual Obra catalogada
no acervo
GPCES
300
Título da obra
(subtítulo/outras
informações)
Autor (es) Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das
obras –
catálogo/referênc
ias
1922
4ª edição
93 - Pequena
Geographia da
infância –
Composta para uso
das escolas
primárias
Joaquim
Maria de
Lacerda
Rio de
Janeiro e
Paris: 1913
Francisco
Alves
Manual Obra catalogada
no acervo
GPCES
94 - Geographia
especial –
Chorographia do
Brasil
Dr. Carlos
de Novaes
Bello
Horizonte:
1923
5ª edição
Livraria
Francisco
Alves
Manual Obra catalogada
no acervo
GPCES
95 - Geographia
Composta
primária para uso
das Escolas
Primárias
Dr. Carlos
de Novaes
Rio de
Janeiro e
Paris: 1982
9ª edição
Livraria
Francisco
Alves
Manual Obra catalogada
no acervo
GPCES
96 - Geographia
elementar
adaptada as escolas
primárias
Tancredo
do Amaral
Rio de
Janeiro,
Bello
Horizonte e
São Paulo:
1904
2ª edição
Livraria
Francisco
Alves & Cia
Manual Obra catalogada
no acervo
GPCES
97 - Geographia
elementar
José
Theodoro
de Souza
Lobo
(Organizaç
ão)
Porto
Alegre:
11ª edição
Manual Obra catalogada
no acervo
GPCES
98 - Geographia –
Curso elementar
F.T.D. Rio de
Janeiro,
São Paulo e
Bello
Horizonte
Edição
texto só,
para escolas
primárias
Nova
coleção de
livros
clássicos,
por F.T.D.
Manual Obra catalogada
no acervo
GPCES
99 - Geographia
pátria elementar
José Júlio
Augusto
Burgain
Rio de
Janeiro:
1885
110 páginas
B. L.
Garnier
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
100 - Geographia-
Atlas (Contendo
oito mapas seguida
d’um ligeiro esloço
chronologico da
historia do Brazil e
de algumas noções
de cosmographia,
dedicado à infância
Dr. Moreira
Pinto
Rio de
Janeiro:
1893
2ª edição
Livraria
Clássica de
Alves e Cia
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
Geographia
elementar
Elysio de
Araújo
Rio de
Janeiro:
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
301
Título da obra
(subtítulo/outras
informações)
Autor (es) Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das
obras –
catálogo/referênc
ias
1901
107 p.
organizado por
Silva (2012)
101 - Geographia
elementar –
Approvada
unanimamente
pelo Conselho
Superior de
Instrucção Publica
do Districto
Federal
Elysio de
Araújo
Rio de
Janeiro:
1910
4ª edição
140 p.
Livraria
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
102 - Geographia
elementar
Elysio de
Araújo
Rio de
Janeiro:
1924
107 p.
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
103 - Geographia
elementar
Elysio de
Araújo
Rio de
Janeiro:
1928
201 p.
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
104 - Compendio
de Geographia
elementar
Manuel
Said Ali
Rio de
Janeiro,
São Paulo:
1905
161 p.
Laemmert
& C.
Editores
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
105 - Curso
elementar de
Geographia Geral
Horacio
Scrosoppi
Rio de
Janeiro:
1905
390 p.
Francisco
Alves & Cia
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
106 - Curso
elementar de
Geographia Geral
Horacio
Scrosoppi
Rio de
Janeiro:
1912
5ª edição
396 p.
Francisco
Alves & Cia
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
107 - Curso
elementar de
Geographia Geral
Horacio
Scrosoppi
Rio de
Janeiro:
1922
555 p.
Paulo
Azevedo
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
108 - Curso
elementar de
Geographia Geral
Horacio
Scrosoppi
Rio de
Janeiro,
São Paulo:
1924
100 p.
Francisco
Alves & Cia
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
109 - Curso
Elementar de
Geographia
Themistocle
s Savio
Rio de
Janeiro:
1908
583 p.
Orosco
Impressores
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
110 - Curso
Elementar de
Geographia
Themistocle
s Savio
Rio de
Janeiro:
1909
2ª edição
433 p.
Heitor
Ribeiro &
Cia
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
111 - Curso
Elementar de
Geographia
Themistocle
s Savio
Rio de
Janeiro:
1914
Francisco
Alves & Cia
Manual Referências do
catálogo
organizado por
302
Título da obra
(subtítulo/outras
informações)
Autor (es) Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das
obras –
catálogo/referênc
ias
596 p. Silva (2012)
112- Geographia
elementar – com
gravuras e oito
mappas coloridos
Amélia de
Rezende
Martins
São Paulo,
Rio de
Janeiro:
1919
79 p.
Livraria
Francisco
Alves & Cia
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
113 - Geographia
elementar – com
gravuras e oito
mappas coloridos –
Approvada e
adoptada pela
instrucção Publica
do Distrito Federal
Amélia de
Rezende
Martins
São Paulo,
Rio de
Janeiro:
1926
11º mileiro
79 p.
Livraria
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
114 - Geographia
atlas: curso
elementar
F.T.D. Rio de
Janeiro:
1923
Livraria
Paulo de
Azevedo &
C.
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
115 - Geographia:
curso elementar
F.T.D. São Paulo:
1923
3 edição
110 p.
- Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
116 - Geographia
elementar
Carlos
Miguel
Delgado de
Carvalho
São Paulo:
1923
328 p.
Cia.
Melhorame
ntos
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
117 - Geographia
elementar
Carlos
Miguel
Delgado de
Carvalho
São Paulo:
1924
328 p.
Weizflog
Irmão
Incorp.
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
118 - Noções
preliminares de
Geographia –
Colligidas por uma
professora
primária
Uma
professora
Primária
[Pseud]
Campos:
1924
Ed. da Casa
“A Penna
de Bronze”
51 p.
- Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
Quadro II– Obras paradidáticas / livros de consulta destinados ao Ensino Primário (atlas e
dicionários geográficos)
Título da obra
(subtítulo/outras
informações)
Autor (es) Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das
obras –
catálogo/referênci
as
119 - Atlas do
Imperio do
Brazil:
comprehendendo
as respectivas
divisões
administrativas,
ecclesiasticas,
eleitorais e
judiciarias
Candido
Mendes de
Almeida
Rio de
Janeiro:
1868
Lithographia
do Instituto
Philomathico
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
303
Título da obra
(subtítulo/outras
informações)
Autor (es) Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das
obras –
catálogo/referênci
as
120 - Atlas do
Imperio do
Brazil
Homem de
Mello;
Claudio
Lomellino
Carvalho;
Francisco
Antonio
Pimenta
Bueno;
Paulo
Robin
Rio de
Janeiro:
1882
Angelo
Agostini e
Paulo Robin
Manual Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
121 - Novo Atlas
Universal
Anônimo
(Autor);
G. Lorsigno
l
Paris:
Lisboa: 1884
Guillard,
Aillaud &
Cia
Consulta Biblioteca do
Livro Didático e
do banco virtual
de livros
didáticos -
LIVRES
122 - O Atlas
elementar de
Geographia
J. E. da
Silva
Lisboa
Recife: 1877
Typographia
do Jornal do
Recife
Consulta Obra catalogada
pelo GPCES, no
Gabinete
Português de
Leitura - GPL.
123 -
Geographia-
Atlas (Contendo
oito mapas
seguida d’um
ligeiro esloço
chronologico da
historia do Brazil
e de algumas
noções de
cosmographia,
dedicado à
infância
Dr. Moreira
Pinto
Rio de
Janeiro:
1893
2ª edição
Livraria
Clássica de
Alves e Cia
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
124 - Geographia
elementar – com
gravuras e oito
mappas
coloridos
Amélia de
Rezende
Martins
São Paulo,
Rio de
Janeiro:
1919
79 p.
Livraria
Francisco
Alves & Cia
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
125 - Geographia
elementar – com
gravuras e oito
mappas
coloridos –
Approvada e
adoptada pela
instrucção
Publica do
Distrito Federal
Amélia de
Rezende
Martins
São Paulo,
Rio de
Janeiro:
1926
11º mileiro
79 p.
Livraria
Francisco
Alves
Manual Referências do
catálogo
organizado por
Silva (2012)
Geographia
atlas: curso
elementar
F.T.D. Rio de
Janeiro:
1923
Livraria
Paulo de
Azevedo &
Manual Referências do
catálogo
organizado por
304
Título da obra
(subtítulo/outras
informações)
Autor (es) Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das
obras –
catálogo/referênci
as
C. Silva (2012)
126 - Atlas de
Geographia
Universal –
Descrito e
ilustrado
Julio
Gaspar
Ferreira da
Costa
Lisboa: 1903 empresa
editora do
Atlas
Universal
Consulta Obra catalogada
pelo GPCES, no
Gabinete
Português de
Leitura - GPL.
127 - Novo Atlas
universal
MARIN,
André
Perez Y.
Paris/França
:1884
[s/ed.];
Guillard,
Aillaud &
Cia.
LIVRES
Biblioteca FEUSP
(Biblioteca Paulo
Bourroul)
128 - Pequeno
atlas de histórica
universal: curso
elementar para o
ensino do
primeiro grau
SILVA,
Olavo
Freire da
Rio de
Janeiro/RJ:
1910; [s/ed.];
Livraria
Clássica de
Francisco
Alves
Biblioteca
Nacional de
Maestros
129 - F.T.D
Geographia –
Atlas – livro II
F.T.D. São Paulo:
1910; [s/p];
[s/ed.];
1923; [s/ed.];
[s/l.]; [s/p.]
GPL: edição do
ano. 1910 (livro
II);
130 - Cartografia Antônio São
Paulo/SP:
19??;
[s/ed.];
Gráfica
Palmeiras
LIVRES:
Biblioteca FEUSP
– (Biblioteca do
Livro Didático)
131 -
Cartografia: 2º
caderno: mapas
– Brasil (vol. 2)
MUNHOZ,
M. e
Iracema
FOSTER,
Anita
São
Paulo/SP:
19??; [s/ed.];
Typ.
Paulista.
LIVRES:
Biblioteca FEUSP
– (Biblioteca do
Livro Didático)
305
Quadro III– Obras catalogadas para a pesquisa não identificadas quanto ao nível de ensino (1880 –
1930).
Título da obra
(subtítulo/outra
s informações)
Autor
(es)
Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das obras –
catálogo/referências
132 - Elementos
de Geographia
Moderna
Cosmografia
Pedro
José de
Abreu
Rio de
Janeiro:
1885
Editores
Soares e
Niemeyer
Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto
universal de livros
catalogados nos
Institutos Históricos e
Geográficos dos
Estados do Nordeste –
Instituto Histórico
Geográfico e
Antropológico do Ceará
– Fortaleza.
133 -
Geographia
Especial do
Ceará
João
Gonçalv
es Dias
Sobreira
Fortaleza:
1902. 4ª ed.
-Typ.
Econômica
Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto
universal de livros
catalogados nos
Institutos Históricos e
Geográficos dos
Estados do Nordeste –
Instituto Histórico
Geográfico e
Antropológico do Ceará
– Fortaleza.
134 -
Geographia das
Províncias
Desconh
ecido
1905. 5ª
edição
- Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto
universal de livros
catalogados nos
Institutos Históricos e
Geográficos dos
Estados do Nordeste –
Instituto Histórico
Geográfico e
Antropológico do Ceará
– Fortaleza.
135 -
Compendio de
Chorographia
do Brasil
Mario
de Veiga
Cabral
Rio de
janeiro: 1919.
4ª ed.
Livraria
Cruz
Coutinho
de Jacinto
Ribeiro
dos Santos
Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto
universal de livros
catalogados nos
Institutos Históricos e
Geográficos dos
Estados do Nordeste –
Instituto Histórico
Geográfico e
Antropológico do Ceará
– Fortaleza.
136 -
Chorographia
do Brazil
Antonio
A.
Borges
Reis
Bahia: 1920
Livraria
Catilina
Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto
universal de livros
catalogados nos
Institutos Históricos e
Geográficos dos
Estados do Nordeste –
Instituto Histórico
Geográfico e
Antropológico do Ceará
306
Título da obra
(subtítulo/outra
s informações)
Autor
(es)
Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das obras –
catálogo/referências
– Fortaleza.
137 - Lições de
Cosmografia
José de
Calazan
s
Rio de
Janeiro: 1922
Leuzinger Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto
universal de livros
catalogados nos
Institutos Históricos e
Geográficos dos
Estados do Nordeste –
IHGRN – Natal.
138 - Rio
Grande do
Norte
Augusto
Tavares
Lyra
Natal: 1912
Jornal do
comércio
Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto
universal de livros
catalogados nos
Institutos Históricos e
Geográficos dos
Estados do Nordeste –
IHGRN – Natal.
139 - O Rio
Grande do
Norte
Augusto
Tavares
Lyra
Rio de
Janeiro: 1912
Typografia
do Jornal
do
Commérci
o e Cia
Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto
universal de livros
catalogados nos
Institutos Históricos e
Geográficos dos
Estados do Nordeste –
IHGP – Paraíba.
140 - O Rio
Grande do
Norte – Ensaio
Chorográphico
Manuel
Dantas
Natal: 1918 Typográfia
D´a
Republica
Manual Obra do catálogo do
GPCES no projeto de
Iniciação Cientifica
PIBIC, pela
pesquisadora Dinaever
Lima de Moura, na
Biblioteca do Instituto
Histórico e Geográfico
da Paraíba – BIHGP.
Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto
universal de livros
catalogados nos
Institutos Históricos e
Geográficos dos
Estados do Nordeste –
IHGP – Paraíba.
141 - A pequena
Chorographia
do município de
Caruaru
G.
Malague
ta
Pontes e
Henriqu
e Pinto
Caruaru:
1871
Typografia
Movida a
Vapor
Freitas e
Azevedo
Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto
universal de livros
catalogados nos
Institutos Históricos e
Geográficos dos
Estados do Nordeste –
IHGP – Paraíba.
142 -
Geographia
Alagoana ou
Descrição
Thomas
do Bom-
fim
Espíndol
Maceió: 1871
Typografia
do Liberal
Manual Obra do catálogo
organizado pelo
GEPCES, no projeto de
Iniciação Cientifica
307
Título da obra
(subtítulo/outra
s informações)
Autor
(es)
Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das obras –
catálogo/referências
Physica Política
e Histórica da
Província das
Alagoas
a PIBIC, pela
pesquisadora Dinaever
Lima de Moura, Na
Biblioteca do Instituto
Histórico e Geográfico
da Paraíba – BIHGP.
Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto
universal de livros
catalogados nos
Institutos Históricos e
Geográficos dos
Estados do Nordeste –
IHGP – Paraíba.
143 - Geografia
do Brasil –
Corografia da
Paraíba
Figueira
Sampaio
Fortaleza:
186?
Edições
Figueira
Sampaio
Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto
universal de livros
catalogados nos
Institutos Históricos e
Geográficos dos
Estados do Nordeste –
IHGP – Paraíba.
144 –
Compendio de
Chorographia
do Brasil
Mario
Veiga
Cabral
Rio de
Janeiro: 1933.
20ª ed.
Livraria
Jacintho
Editora
Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto
universal de livros
catalogados nos
Institutos Históricos e
Geográficos dos
Estados do Nordeste –
IHGBA – Salvador.
145 -
Compendio de
Chorographia
do Brasil
Mario
Veiga
Cabral
Rio de
Janeiro: 1918.
3ª ed.
Jacintho
Ribeiro
dos Santos
Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto
universal de livros
catalogados nos
Institutos Históricos e
Geográficos dos
Estados do Nordeste –
IHGBA – Salvador.
146 - O Rio
Grande do
Norte
Augusto
Tavares
Lyra
Rio de
Janeiro: 1912
Jornal do
Comércio
Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto
universal de livros
catalogados nos
Institutos Históricos e
Geográficos dos
Estados do Nordeste –
IHGBA – Salvador.
147 - Lições de
Cosmografia
José
Calazan
s
Pinheiro
Rio de
Janeiro: 1922
Leuzinger Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto
universal de livros
catalogados nos
Institutos Históricos e
308
Título da obra
(subtítulo/outra
s informações)
Autor
(es)
Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das obras –
catálogo/referências
Geográficos dos
Estados do Nordeste –
IHGBA – Salvador.
148 - Geografia
da América
Antenor
de A.
Lima
Praia
Vermelha:
1883
Litografia Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto
universal de livros
catalogados nos
Institutos Históricos e
Geográficos dos
Estados do Nordeste –
IHGSE – Aracajú.
150 - Breve
tratado de
Corographia
portuguesa
Joaquim
Lopes de
Mello
Lisboa: 1851
Typ. De
Sotero
Antonio
Borges
Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no Gabinete
Português de Leitura -
GPL.
151 - Lições de
Geographia
Abbade
Guatier
Pariz: 1855.
2ª ed.
Pariz: 1878.
s/ed
Casa de
Vª. J. P.
Aillaud,
Monlon e
Cª.
Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no Gabinete
Português de Leitura -
GPL.
BMP
152 -
Compendio de
Geographia
Antonio
Manoel
dos
Ramos
Porto: 1889
Livraria
Portuense
Lopes &
Cia
Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no Gabinete
Português de Leitura -
GPL.
153 - Atlas de
Geographia
Universal –
Descrito e
ilustrado
Julio
Gaspar
Ferreira
da Costa
Lisboa: 1903 empresa
editora do
Atlas
Universal
Consulta Obra catalogada pelo
GPCES, no Gabinete
Português de Leitura -
GPL.
154 -
Compendio de
Corographia do
Brasil
Felician
o
Pinheiro
Bittenco
urt
Paris: 1922. 9ª
ed.
Typ.
Aillaud
Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no Gabinete
Português de Leitura -
GPL.
155 - Elementos
de Geografia
Moderna e
Cosmographia
P.
D`Abreu
Rio de
janeiro: 1882.
7ª ed.
Typograph
ia
Montenegr
o
Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no Gabinete
Português de Leitura -
GPL.
156 -
Geographia –
Altas – Livro II
Coleção
FTD
São Paulo:
1910
FTD
Consulta Obra catalogada pelo
GPCES, no Gabinete
Português de Leitura -
GPL.
157 -
Compendio de
Geografia
universal
Afonso
José de
Oliveira
Recife: 1836 Typograph
ia M. de
Faria
Manual BN
158 - Estudo
chorographico e
Social do Brasil
Florenti
no
Menezes
Aracajú: 1912
Typografia
Amaral
Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto De
iniciação científica
PIBIC, pela
pesquisadora Dinaever
Lima de Moura, na
309
Título da obra
(subtítulo/outra
s informações)
Autor
(es)
Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das obras –
catálogo/referências
Biblioteca do Instituto
Histórico e Geográfico
da Paraíba – BIHGP.
159 -
Physiografia de
Alagoas
Moreira
M. Silva
Maceió: 1919 Imprensa
Oficial
Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto De
iniciação científica
PIBIC, pela
pesquisadora Dinaever
Lima de Moura, na
Biblioteca do Instituto
Histórico e Geográfico
da Paraíba – BIHGP.
160 -Aspectos
do Piauhy
Abdias
Neves
Theresinha:
1926
Typografia
d´ “O
Piauhy”
Manual Obra catalogada pelo
GPCES, no projeto De
iniciação científica
PIBIC, pela
pesquisadora Dinaever
Lima de Moura, na
Biblioteca do Instituto
Histórico e Geográfico
da Paraíba – BIHGP.
161 - Terra
ilustrada:
Geographia
universal:
physica,
etnographica,
política,
econômica dos
cincos partes do
mundo.
F. I. C.
[Frere
Ignace
chaput],
Traduçã
o e
adaptaç
ão por
Eugenio
de
Barros
Raja
Gabagli
a
Rio de
Janeiro: 188-?
Livraria
Garnier
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
162 - Terra
ilustrada:
Geographia
universal:
physica,
etnographica,
política,
econômica dos
cincos partes do
mundo.
F. I. C.
[Frere
Ignace
chaput],
Traduçã
o e
adaptaç
ão por
Eugenio
de
Barros
Raja
Gabagli
a
Rio de
Janeiro: 1902
Livraria
Garnier
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
163 - Terra
ilustrada:
Geographia
universal:
physica,
etnographica,
política,
F. I. C.
[Frere
Ignace
chaput],
Traduçã
o e
adaptaç
Rio de
Janeiro: 1904
Livraria
Garnier
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
310
Título da obra
(subtítulo/outra
s informações)
Autor
(es)
Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das obras –
catálogo/referências
econômica dos
cincos partes do
mundo.
ão por
Eugenio
de
Barros
Raja
Gabagli
a
164 - Terra
ilustrada:
Geographia
universal:
physica,
etnographica,
política,
econômica dos
cincos partes do
mundo.
F. I. C.
[Frere
Ignace
chaput],
Traduçã
o e
adaptaç
ão por
Eugenio
de
Barros
Raja
Gabagli
a
Rio de
Janeiro: 1920
Livraria
Garnier
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
165 - Noções de
Geographia
astronómica
Alfredo
Moreira
Pinto
Rio de
Janeiro: 188-
?. 2ª ed.
- Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
166 -
Compendio de
noções de
Geographia
Doming
os
Theophil
o de
Carvalh
o Leal
Manaus: 188-
?
- Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
167 - Noções de
Geographia I
parte – Estado
do Rio Grande
do Sul
Afonso
Guerreir
o Lima
Porto Alegre,
Santa Maria e
Cruz Alta:
1911 (ano de
aprovação da
obra), 1917:
(ano de
publicação)
3ª edição
- Manual Obra catalogada no
acervo pessoal de
Ângelo
Geographia
Geral do Brasil
A. W.
Sellin
(traduzi
da e
consider
avelmen
te
argumen
tada)
Rio de
Janeiro: 1889
- Manual Biblioteca do Senado
Federal – seção de
obras raras
168 - Dicionário
Geographico
das Minas do
Brasil
Francisc
o
Ignacio
Ferreira
Rio de
Janeiro: 1885
- Manual Biblioteca do Senado
Federal – seção de
obras raras
169 -
Chorographia
da Província do
Ceará
José
Pompeu
de A.
Cavalca
Rio de
Janeiro: 1888
- Manual Biblioteca do Senado
Federal – seção de
obras raras
311
Título da obra
(subtítulo/outra
s informações)
Autor
(es)
Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das obras –
catálogo/referências
nte
170 - Noções de
Geographia
geral – para uso
da infância
Alfredo
Moreira
Pinto
Rio de
Janeiro: 1885
Livraria
Nicolau
Alves
Manual Biblioteca do Senado
Federal – seção de
obras raras
171 –
Geographia
primária
Dr.
Carlos
Novaes
Obs: a capa
do livro está
deteriorada
não
permitindo
ver
informações
refere ao ano,
local de
publicação e
outras
informações
Manual Obra catalogada no
acervo pessoal de
Ângelo
172 -
Compendio de
Geographia da
província de
Pernambuco
Manoel
Pereira
de
Moraes
188-
Mineo.
Inédito
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
173 -
Geographia
Physica –
Primeira Serie
de sciencias
naturais.
Opúsculos
elementares,
adaptados ao
portuguez
Archibal
d Geikie
–
traduzid
o e
adaptad
o de
Carlos
Jansen
Rio de
Janeiro, São
Paulo:1880
Laemmert
& Cia
Coleção
Biblioteca
do ensino
intuitivo
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
174 -
Geographia
Physica –
Primeira Serie
de sciencias
naturais.
Opúsculos
elementares,
adaptados ao
portuguez
Archibal
d Geikie
–
traduzid
o e
adaptad
o de
Carlos
Jansen
Rio de
Janeiro, São
Paulo:1882
2ªedição
Laemmert
& Cia
Coleção
Biblioteca
do ensino
intuitivo
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
175 -
Geographia do
Rio Grande do
Sul
Hilário
Ribeiro
Porto Alegre:
1880
50p.
Ed. Carlos
Pinto &
Cia
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
176 -
Geographia do
Rio Grande do
Sul
Hilário
Ribeiro
Porto Alegre:
1881
58p.
Typografia
da
Livraria
Americana
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
177 - Elementos
de Geographia
Physica
Compila
do
segundo
os
melhores
autores,
Rio de
Janeiro: 1880
215 p.
Typograph
ia de
Pinheiro &
Cia
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
312
Título da obra
(subtítulo/outra
s informações)
Autor
(es)
Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das obras –
catálogo/referências
por um
professo
r
178 - Elementos
de
cosmographia
Henriqu
e
Martins,
Augusto
Eduardo
(organiz
adores.)
Porto
Alegre:1881
96 p.
- Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
179 - Elementos
de
cosmographia
Henriqu
e
Martins,
Augusto
Eduardo
(org.)
Porto
Alegre:1882
108 p.
- Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
180 - Elementos
de
cosmographia
Henriqu
e
Martins,
Augusto
Eduardo
(org.)
Porto
Alegre:1897
3ª edição
160 p.
Cunha Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
181 - Elementos
de Geographia
Lemos
D’Sá
1882 - Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
182 -
Corographia do
Brasil
Viriato
Augusto
da Silva
Lisboa: 1882 - Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
183 - Breves
noções de
Geographia e
corographia do
Brazil –
Formuladas de
acordo com o
novo
programma de
exames geraes
de
preparatorios
Joaquim
José de
Carvalh
o
Rio de
Janeiro: 1883
127 p.
- Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
184 - Breves
licções de
Geographia e
Corographia do
brazil
Joaquim
Carvalh
o Filho
1883 Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
185 -
Corografia do
Brazil – Pontos
escritos de
Geographia
Henriqu
e
Martins
[August
o
Eduardo
]
Porto Alegre:
1883
78 p.
Editor
Rodolfo
José
Machado
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
186 - Elementos
de
Cosmographia
Affonso
José de
Sanctos
Rio de
Janeiro,
Paris: 1884
178 p.
Garnier Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
313
Título da obra
(subtítulo/outra
s informações)
Autor
(es)
Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das obras –
catálogo/referências
187 -
Compendio
elementar de
chorographia
do Brazil
Raul
Villa-
Lobos
Rio de
Janeiro: 1886
165 p.
Typograph
ia
Mont’Alve
rne
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
188 -
Compendio
elementar de
chorographia
do Brazil
Raul
Villa-
Lobos
Rio de
Janeiro: 1890
168 p.
2ª edição
Typograph
ia
Mont’Alve
rne
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
189 -
Compendio
elementar de
chorographia
do Brazil
Raul
Villa-
Lobos
Rio de
Janeiro: 1896
244 p.
3ª edição
Typograph
ia
Mont’Alve
rne
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
190 -
Compendio
elementar de
chorographia
do Brazil:
resumo
didactico
Raul
Villa-
Lobos
Rio de
Janeiro: 1901
234 p.
5ª edição –
Corr. e
aumentada
Laemmert
& C.
Editores
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
191 -
Compendio
elementar de
chorographia
do Brazil:
resumo
didactico
Raul
Villa-
Lobos
Rio de
Janeiro: 1906
234 p.
6ª edição –
Laemmert
& C.
Editores
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
192 - Elementos
de chorographia
do Brazil –
Compilados de
accôrdo com o
último
programma
para os exames
geraes
João
Arnoso
[Pedro
Moreira]
Maranhão:
1887
136 p.
- Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
193 - Pequena
Geographia da
Província do
Pará
Raymun
do
Cyiaco
da
Cunha
Pará: 1887
85 p.
Typograph
ia do
Diário de
Belém
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
194 - Curso de
Geographia
geral
Alfredo
Moreira
Pinto
Rio de
Janeiro: 1887
222 p.
Livraria
Classica de
Alves & C.
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
195 - Curso de
Geographia
geral
Alfredo
Moreira
Pinto
Rio de
Janeiro: 1893
256 p.
Livraria
Classica de
Alves & C.
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
196 - Curso de
Geographia
geral
Alfredo
Moreira
Pinto
Rio de
Janeiro: 1906
316 p.
Livraria
Classica de
Alves & C.
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
197 - Noções
elementares de
Geographia
geral e do
Lindolp
ho de
Siqueira
Bastos
Rio de
Janeiro: 1888
- Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
314
Título da obra
(subtítulo/outra
s informações)
Autor
(es)
Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das obras –
catálogo/referências
Brazil.
Especialmente
da província do
Paraná,
compiladas
para uso das
escolas daquela
província
198 - A
Chorographia
da província do
Ceará
José
Pompeu
de A.
Cavalca
nti
Rio de
Janeiro: 1888
317 p.
Imprensa
Nacional
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
199 -
Compêndio de
Geographia e
chronographia
do Brasil –
acompanhado
de três mappas
e de um índice
alphabetico
Manoel
Tomaz
Alves
Nogueir
a
(Leipzip
– F. A.
Brockha
us
1889
234 p.
- Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
200 - Elementos
de Geographia
do Brazil
Elesbão
Alves
Maya
189- - Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
201 - Pontos de
Geographia
Alfredo
Moreira
Pinto
(organiz
ados,
etc.)
Rio de
Janeiro: 189-
- Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
202 - Licções
elementares de
Geographia –
especialmente
do Amazonas
Goeth
Galvão
de
Carvalh
o
189- - Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
203 - Elementos
de Geographia
geral
Carlos
Melo
1893 - Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
204 - Elementos
de
Cosmographia
Alfredo
Moreira
Pinto
1894,
3ª edição
Livraria
Clássica de
Alves
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
205 - Licções de
Geographia
geral:
Geographia
especial
Carlos
Jorge
Sallaber
ry
Rio de
Janeiro: 1897
Jacintho
Ribeiro
dos Santos
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
206 - Licções de
Geographia
geral:
Geographia
especial
Carlos
Jorge
Sallaber
ry
Rio de
Janeiro: 1898
413 p.
Livraria
Cruz
Coutinho
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
207 - Lições de
Geographia
geral
Basilio
de
Magalhã
es
São Paulo:
1898
120 p.
Typograph
ia Aurora
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
315
Título da obra
(subtítulo/outra
s informações)
Autor
(es)
Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das obras –
catálogo/referências
208 -
Chorographia
do Brazil –
resumo
didactico
Raul
Villa-
Lobos
Rio de
Janeiro: 1901
4ª edição
245 p.
Laemmert
& C.
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
209 -
Geographia
especial ou
chorographia
do Brazil
Carlos
Novaes
Rio de
Janeiro: 1912
Livraria
Francisco
Alves &
Cia
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
210 -
Geographia
especial ou
chorographia
do Brazil
Carlos
Novaes
Rio de
Janeiro: 1923
5ª edição
328 p.
Livraria
Francisco
Alves
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
211 -
Geographia
especial ou
chorographia
do Brazil
Carlos
Novaes
Rio de
Janeiro: 1925
6ª edição
330 p.
Livraria
Francisco
Alves
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
212 –
Geographia
geral
Horacio
Scrosop
pi
Rio de
Janeiro, São
Paulo: 1915
5ª edição
553 p.
Livraria
Francisco
Alves
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
213 -
Compendio de
chorographia
do Brasil
Horacio
Scrosop
pi
Rio de
Janeiro, São
Paulo: 1921
5ª edição
553 p.
Livraria
Francisco
Alves
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
214 -
Compendio de
chorographia
do Brasil
Horacio
Scrosop
pi
Rio de
Janeiro, São
Paulo: 1923
5ª edição
553 p.
Livraria
Francisco
Alves
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
215 -
Compendio de
chorographia
do Brasil
Horacio
Scrosop
pi
Rio de
Janeiro, São
Paulo: 1927
5ª edição
556 p.
Livraria
Francisco
Alves
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
216 -
Compendio de
chorographia
do Brasil
Mário
da Veiga
Cabral
Cabral
Rio de
Janeiro: 1916
Editora
Paulo de
Azevedo
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
217 -
Compendio de
chorographia
do Brasil
Mário
da Veiga
Cabral
Cabral
Rio de
Janeiro: 1920
5ª edição
373 p.
Jacintho
Ribeiro
dos Santos
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
218 -
Compendio de
chorographia
do Brasil
Mário
da Veiga
Cabral
Cabral
Rio de
Janeiro: 1921
363 p.
Jacintho
Ribeiro
dos Santos
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
219 -
Compendio de
chorographia
do Brasil
Mário
da Veiga
Cabral
Cabral
Rio de
Janeiro: 1925
10ª edição
556 p.
Jacintho
Ribeiro
dos Santos
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
316
Título da obra
(subtítulo/outra
s informações)
Autor
(es)
Local:
data/edição
Editora/ Impressor/
gênero
Localização das obras –
catálogo/referências
220 -
Compendio de
chorographia
do Brasil
Mário
da Veiga
Cabral
Cabral
Rio de
Janeiro: 1926
363 p.
Jacintho
Ribeiro
dos Santos
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
221 -
Compendio de
chorographia
do Brasil
Mário
da Veiga
Cabral
Cabral
Rio de
Janeiro: 1927
633 p.
Jacintho
Ribeiro
dos Santos
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
222 -
Chorographia
do Brasil
Antonio
Alexand
re
Borges
dos Reis
Bahia: 1920 - Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
223 -
Compendio de
Geographia
Lucci L.
Schwalb
ach
1920 - Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
224 - Elementos
de
Cosmographia e
Geographia
geral
Ezequiel
de
Moraes
Leme
São Paulo:
1920
5ª edição
215 p.
Melhoram
entos
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
225 - Elementos
de
Cosmographia e
Geographia
geral
Ezequiel
de
Moraes
Leme
São Paulo:
1921
6ª edição
216 p.
Nacional Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
226 - Elementos
de
Cosmographia e
Geographia
geral
Ezequiel
de
Moraes
Leme
São Paulo:
1922
7ª edição
210 p.
Nacional Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
227 -
Geographia
geral
J.
Monteir
o F.
Oliveira
Rio de
Janeiro: 1921
446 p.
- Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
228 - Curso de
Geograpgia
geral
Mario
da Veiga
Cabral
Rio de
Janeiro: 1929
7ª edição
711 p.
J. R. dos
Santos
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)
229 - Curso de
Geograpgia
geral
Mario
da Veiga
Cabral
Rio de
Janeiro: 1931
724 p.
Livraria
Jacintho
Manual Referências do catálogo
organizado por Silva
(2012)