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0 UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MESTRADO EM EDUCAÇÃO RAFAEL DE OLIVEIRA SIMÕES PROGRAMA SEGUNDO TEMPO: avaliação de uma metodologia aplicada a partir de universidades (2003-2013) Recife 2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

MESTRADO EM EDUCAÇÃO

RAFAEL DE OLIVEIRA SIMÕES

PROGRAMA SEGUNDO TEMPO: avaliação de uma metodologia aplicada a

partir de universidades (2003-2013)

Recife

2017

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RAFAEL DE OLIVEIRA SIMÕES

PROGRAMA SEGUNDO TEMPO: avaliação de uma metodologia aplicada a partir de universidades (2003-2013)

Dissertação apresentada ao programa de Pós-graduação em Educação da Universidade federal de Pernambuco, como requisito para obtenção do grau de mestre em educação. Linha de Pesquisa: Teoria e História da Educação. Orientador: Prof. Dr. Vilde Gomes de Menezes.

Recife

2017

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Catalogação na fonte Bibliotecária Andréia Alcântara, CRB-4/1460

S593s Simões, Rafael de Oliveira. O segundo tempo da educação a partir da Universidade: avaliação

de uma breve trajetória (2003-2013) / Rafael de Oliveira Simões. – Recife, 2017. 168 f. : il. ; 30 cm. Orientador: Vilde Gomes de Menezes. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal de Pernambuco, CE. Programa de Pós-graduação em Educação, 2016. Inclui Referências e Apêndices.

1. Esporte. 2. Programa Segundo Tempo. 3. Inclusão social. 4. UFPE - Pós-graduação. I. Menezes, Vilde Gomes. II. Título.

796 CDD (23. ed.) UFPE (CE2017-83)

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RAFAEL DE OLIVEIRA SIMÕES

PROGRAMA SEGUNDO TEMPO: avaliação de uma metodologia aplicada a partir das universidades (2003-2013)

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação.

Aprovada em: 24/05/2017

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________________________________

Prof. Dr. Vilde Gomes de Menezes (Orientador)

Universidade Federal de Pernambuco

_________________________________________________________

Prof. Dr. Edílson Fernandes de Souza (Examinador Interno)

Universidade Federal de Pernambuco

_______________________________________________________________

Prof. Dr. Thiago Vasconcellos Modenesi (Examinador Externo)

Centro Universitário Guararapes – UniFG/Mestrado em Gestão Pública -UFPE

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Dedico este trabalho: A minha esposa, Helena Lemos Britto, companheira de vida, meus filhos Pedro e Eduardo. A minha mãe, Rejane Simões, meu irmão, Vinicius Simões, minhas tias professoras Evani e Enedi, tio Tarso, todos os primos e primas, demais familiares e amigos por terem participado de alguma forma e por se orgulharem desta conquista. A todos e todas que dedicam seu dia a dia para aprimorar as políticas públicas e construir uma sociedade mais justa, com igualdade de oportunidades para todos, fatores fundamentais de uma sociedade democrática. Dedico especialmente ao meu pai, Ademir Simões (in memória), meu grande incentivador e parceiro, aquele que se estivesse presente comemoraria esta conquista com grande entusiasmo.

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AGRADECIMENTOS

Ao Prof. Dr Vilde Menezes, meu orientador, pelo apoio, paciência,

credibilidade e compreensão fundamentais para a conclusão dessa jornada.

Aos membros das bancas de qualificação e examinadora Prof. Dr.

Edilson Fernandes, Prof. Dr. Thiago Modenesi, Prof. Dr. Henrique Kohl, Profª.

Drª Aurenea Maria de Oliveira e Prof. Dr. José Luis Simões pelas inúmeras

demonstrações de solidariedade e disposição em construir conhecimento.

Aos dedicados profissionais que dedicaram uma parte do seu tempo

para responderem ao questionário de pesquisa, Profª. Drª Cassia Damiani,

Prof. Dr. Amauri Aparecido de Oliveira, Prof. Msc. Amanda Patriarca, Profª. Drª

Andrea Alfama, Profª. Drª Andrea Ewerton e Ex-ministro do Esporte Orlando

Silva.

Aos Docentes do Programa de Pós-graduação do Centro de Educação,

em especial ao Prof. Dr. Alfredo Gomes, Profª. Drª Ana Lúcia Félix e Profª. Drª

Janete Lins de Oliveira, bem como meus companheiros de turma pelo apoio e

incentivo durante todo o curso, em especial, Amanda Gondim, Rosa Alícia,

Tiago Calábria, Natália Aguiar e Analice Silva.

Às servidoras da secretaria, Karla e Morgana, pela presteza, dedicação

e eficiência na parte administrativa.

A Ornella Mastroianni Lemos Britto, Ivone Barboza e Miyaco Ishida por

todo o apoio e carinho.

Ao amigo Condorito, entusiasta desde projeto em todas as suas fases.

A todos aqueles que contribuíram direta e indiretamente para a

realização desta dissertação.

Aos amigos queridos desse estado tão acolhedor chamado

Pernambuco.

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RESUMO

Esta pesquisa tem como principal objetivo geral verificar a forma que o Programa Segundo Tempo promove e educa, inserindo-o no processo histórico recente construído onde foi criado pelo Ministério do Esporte no ano de 2003. Nessa dissertação estudamos o Programa Segundo Tempo sediado em universidades, o fazemos em particular a partir de algumas experiências em universidades federais brasileiras, para tanto elegemos a Universidade Federal de São Paulo, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul e a Universidade Federal de Viçosa, todas com participação diferenciada na aplicação do Programa. Fazemos o debate sobre as possíveis mudanças ocorridas nos assistidos pelo mesmo, bem como na relação destes com a sociedade através da educação que lhes foi ofertada no Programa. Para tanto, utilizamos os conceitos de psicogênese e sociogênese de Norbert Elias. Isso se deu em nossa pesquisa a partir da análise da memória do Programa Segundo Tempo que aqui discutimos os dados. Entendemos o Programa Segundo Tempo como uma política pública de esporte com dimensão e abrangência, isso se reflete na quantidade de assistidos, núcleos, professores, alcance do programa em escala nacional e capilaridade adaptável e sensível as peculiaridades locais. Sendo assim, também são grandiosas as possibilidades educativas presentes em seus desdobramentos, com impacto social expressivo comprovado a partir dos dados do governo brasileiro no período dos governos Lula e Dilma (2003-2013) por nós aqui debatidos, em particular na análise a partir das práticas de interação e atividades cooperativas e pelas memórias das experiências que analisamos. Concluímos analisando a experiência, discutindo seus possíveis acerto e limitações e situando o potencial que a mesa pode ter como parte de alteração de perspectiva dos seus assistidos.

Palavras-chave: Programa Segundo Tempo. Esporte. Educação. Inclusão Social.

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RESUMEN

Esta investigación tiene como objetivo analizar las concepciones y sus interfaces educativas derivadas de la experiencia del Programa Segundo Tiempo, creado por el Ministerio de Deportes en 2003. Esta tesis estudia el Programa Segundo Tiempo basada en las universidades, lo hacen en privado a partir de algunas experiencias en las universidades federales brasileñas, hemos elegidos la Universidad Federal de São Paulo, la Universidad Federal de Rio Grande do Sul y la Universidad Federal de Viçosa, todo ello con la participación diferenciada en la aplicación del programa. Debatimos sobre posibles cambios en la asistencia de la misma, así como en su relación con la sociedad a través de la educación que se les ha ofrecido en el programa. Por lo tanto, utilizamos los conceptos de la psicogénesis y sociogénesis de Norbert Elias. La metodología aplicada ha sido analizar la memoria Programa Segundo Tiempo y sus datos. Entendemos el Programa Segundo Tempo como una política pública deportiva con dimensión y abrangencia, esto se refleja en el número de beneficiarios, centros, profesores, alcance del programa a escala nacional y las peculiaridades locales adaptables y sensibles. De esta manera las oportunidades educativas presentes son grandiosas para el desarrollo, con un impacto social significativo demostrado a partir de los datos del gobierno brasileño en el período de Lula y Dilma (2003-2013), principalmente en el análisis de prácticas de interacción, actividades de cooperación y en los recuerdos de las experiencias analizadas por nosotros. Concluímos que a través de las experiencias analisadas, donde hemos debatido sus posibles aciertos, limitaciones y situado el potencial que la misma puede alcanzar como parte de cambios de perspectiva de sus asistidos. Palabras-clave: Programa Segundo Tiempo. Deporte. Educación. Inclusión Social.

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LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS

SIGLAS NOMES OFICIAIS CD-ROMs Disco Compacto - Memória Somente de Leitura

CEFAN Centro de Educação Física Almirante Adalberto Nunes

CEMJ Centro de Memória da Juventude CPOR Centro de Preparação de Oficiais da Reserva

FACIBA Faculdade de Ciências da Bahia IES Instituição de Ensino Superior

IFES Instituto Federal de Ensino Superior ME Ministério do Esporte MEC Ministério da Educação NEE Núcleos de Esporte Educacional PELC Programa Esporte e Lazer na Cidade PNE Política Nacional de Esporte PROFESP O Programa Forças no Esporte

PST Programa Segundo Tempo SNELIS Secretaria Nacional de Esporte, Educação, Lazer e Inclusão

Social

SUS Sistema Único de Saúde

UFPE Universidade Federal de Pernambuco UFRGS Universidade Federal do Rio Grande do Sul UFV Universidade Federal de Viçosa UNESCO Organização das Nações Unidas para Educação, a Ciência e a

Cultura UNIFESP Universidade Federal de São Paulo VS Vida Saudável

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LISTA DE IMAGENS

Imagem 1 - Logomarca do Programa Segundo Tempo 91

Imagem 2 - Relação entre programação e interação com usuários –

Tipologia 99

Imagem 3 - Distribuição da população e da amostra de beneficiados

dos projetos do Programa Segundo Tempo 101

Imagem 4 - Distribuição da população e da amostra de beneficiados

dos projetos do Programa Esporte e Lazer na Cidade 102

Imagem 5 - Faixa etária dos beneficiados no Programa Segundo

Tempo 102

Imagem 6 - Atividades complementares – Modalidades não

esportivas 102

Imagem 7 - Foto com alunos do Programa Segundo Tempo para

pessoas com deficiência da UFPE 108

Imagem 8 - Alunos e monitores do Programa Segundo Tempo para

pessoas com deficiência executando atividade lúdica 110

Imagem 9 - Prática do yoga ao ar livre na Universidade Federal de

Viçosa 112

Imagem 10 - Atividade esportiva nas férias 114

Imagem 11 - Prática coletiva de atividade esportiva - Projeto Recreio 114

Imagem 12 - Prática esportiva com esportes adaptados para

deficientes físicos 115

Imagem 13 - Capacitação dos monitores 117

Imagem 14 - Atividade esportiva na periferia de São Paulo 118

Imagem 15 - Atividade lúdica com crianças 119

Imagem 16 - Programa Forças no Esporte 120

Imagem 17 - Atividade com mulheres na Universidade Federal do Rio

Grande do Sul 121

Imagem 18 - Atividades complementares do Programa Segundo

Tempo 121

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LISTA DE QUADRO

Quadro 1 - Cadastro da pesquisa 24

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 13

2 METODOLOGIA 23

2.1 ANÁLISE DE DADOS 28

2.2 O OLHAR DO MINISTÉRIO DO ESPORTE SOBRE O PST A

PARTIR DOS QUESTIONAMENTOS DE SEUS GESTORES 31

2.3 PROGRAMA SEGUNDO TEMPO: UM OLHAR CIENTÍFICO

PARA ESTA PRÁTICA NA FORMAÇÃO DA CRIANÇA E DO

ADOLESCENTE 35

3 DO SPORT AOS ESPORTES: HISTÓRIA E FUNDAMENTOS DE NOSSA PESQUISA 40

3.1 O INÍCIO DO ENTRELAÇAMENTO ENTRE ESPORTE E

EDUCAÇÃO 43

3.2 POPULAR E MASSIFICADO: ASSIM SURGE O ESPORTE

MODERNO 46

3.3 O ESPORTE COMO DIREITO DE TODOS E SUA DIMENSÃO

EDUCACIONAL 48

3.4 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 52

3.5 A SOCIOGÊNESE E PSICOGÊNESE ELIASIANA 61

3.6 HISTÓRIA DO TEMPO PRESENTE COMO INSTRUMENTO

DE ANÁLISE DO ESPORTE 81

4 O PROGRAMA SEGUNDO TEMPO, CONCEPÇÃO E HISTÓRIA 88

4.1 A EXPERIÊNCIA DO PST NAS IFES, O CASO UFPE 108

4.2 A EXPERIÊNCIA DO PST NAS IFES, O CASO UNIFESP,

UFRGS E UFV 110

5 CONSIDERAÇÕES 124

REFERÊNCIAS 129

ANEXO A - Modelo do Termo de Consentimento Livre e

Esclarecido 135

APÊNDICE A - Apresentação dos questionários 136

APÊNDICE B -- Questionário com o Deputado Federal por São 138

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Paulo e ex-ministro: Orlando Silva de Jesus Júnior APÊNDICE C - Questionário com o Professor Amauri Aparecido

Bássoli de Oliveira 143

APÊNDICE D - Questionário com a Professora Amanda Corrêa

Patriarca 149

APÊNDICE E - Questionário com a Professora Andréa

Carvalho Alfama 153

APÊNDICE F - Questionário com a Professora Andréa

Nascimento Ewerton 156

APÊNDICE G - Questionário com a Professora Cássia Damiani 161

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1 INTRODUÇÃO

A pesquisa aborda a importância da prática esportiva na educação e sua

relação com a cultura corporal, bem como na aplicação dos fundamentos

metodológicos do conhecimento na perspectiva da transformação dos

indivíduos sob a luz do Programa Segundo Tempo (PST), desenvolvido pelo

Ministério do Esporte (ME). O trabalho observa o marco de uma década a partir

da criação e aplicação do Programa, desse modo, o período se inicia em 2003

e termina no ano de 2013. A presente dissertação se insere no Núcleo de

Teoria e História da Educação do Programa de Pós-graduação da Universidade

Federal de Pernambuco (UFPE).

Tivemos como principal objetivo analisar as possibilidades educacionais

aplicadas a partir da experiência do executado na prática no PST, criado pelo

ME no ano de 2003.

Escolhemos esse período também pelo mesmo ser marcado pela

ascensão de uma figura oriunda das camadas mais humildes do país à

condição de Presidente da República. Com isso, foi inaugurado um novo ciclo

político no Brasil, representado pelo simbolismo da chegada de uma pessoa de

expressão popular ao poder.

A definição por esse tema se deu, em certa medida, pelo

desenvolvimento de minha vida. Tendo crescido na periferia, sido atleta de

futebol das categorias de base até a ascensão à categoria profissional (dos 9

até os 21 anos de idade), atuado no movimento estudantil e participado

ativamente da III Conferência Nacional do Esporte.

Tais ações me chamaram atenção e aguçaram minha curiosidade aos

efeitos sociais do binômio esporte e educação executados em grande escala

enquanto política pública.

Nos apoiamos na oportunidade que vivemos de interagir pessoalmente

em vários momentos com aqueles que se tornaram os dirigentes do Ministério

do Esporte no nascedouro do PST. No primeiro governo Lula da Silva e nos

anos subsequentes1.

1 Luís Inácio Lula da Silva foi eleito presidente do Brasil no ano de 2002, iniciando seu governo em 2003 e sendo reeleito em 2006, governando até 2010. Quem o sucedeu foi Dilma Vana

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Apoiados no estudo do objetivo geral e nos parâmetros apontados pelo

Ministério do Esporte desde o nascedouro do Programa, exploramos aqui a

análise das mudanças sociais inseridas no contexto de uma década que este

pode ter colaborado no acontecimento das mesmas junto a sociedade

brasileira.

Realizamos, a partir da análise das concepções metodológicas e suas

aplicações realizadas no escopo do Programa Segundo Tempo, a avaliação

dos impactos deste a partir das teorias eliasianas que se apoiam na

sociogênese e psicogênese. Buscamos assim, compreender as mudanças que

o PST pode ter impulsionado junto aos mais pobres da sociedade brasileira.

Observamos que o PST realiza atividades cooperativadas e coletivas

que não estimulam a competição, mas sim a interação e o combate ao

individualismo. Consideramos importante contraponto no contexto de uma

sociedade capitalista, cujo principal estímulo é a competição e o

comportamento individualista.

Nossa escolha sobre esse corte temporal (2003-2013) se deu devido ao

distanciamento, mas também por este Programa ter sido criado em 2003, com

as diretrizes construídas e explicitadas no Política Nacional de Esporte (PNE),

desde a sua concepção até a atualidade. Além disso, nossa pesquisa

contextualiza o PST como um todo em busca de melhor compreender sua

construção, desdobramentos e evolução na prática esportiva com interface

educacional.

Para tanto, faz-se necessário contextualizar e estabelecer uma linha de

análise histórica da prática esportiva em que focamos o estudo e sua relação

com o universo maior do tema analisado por nós aqui, no caso o processo de

educar, em particular no que emana das práticas pedagógicas do Programa.

Achamos relevante analisar um período em que o programa surge,

destacamos que os que elaboraram a proposta que levou à existência do

Programa naquele momento hoje já não se encontram mais à frente do

Ministério do Esporte. Portanto, há clara demonstração da perenidade do

mesmo, já que se tornou uma política pública aplicada por mais de uma década

pelo governo federal, resistente à transitoriedade dos governantes.

Roussef, sua aliada, que governou de 2011 a 2014, sendo reeleita e deu continuidade a inúmeros Programas criados no governo Lula da Silva, inclusive o PST.

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Ressaltamos aqui a importância de pesquisar um Programa que já tem

razoável experiência debatida e catalogada no repositório Vitor Marinho, sendo

fruto do debate da Política Nacional de Esporte (PNE). Inspirou a formação de

três versões metodológicas da aplicação de suas práticas pedagógicas

publicadas em forma de livros, bem como uma pesquisa que trata do seu

sistema de monitoramento e avaliação em conjunto com a análise de outros

programas e publicações com coletâneas de artigos que buscam aprofundar as

nuances do estudo da metodologia, modalidades esportivas e iniciativas

derivadas do PST.

Contextualizamos a seguir os principais momentos que conduziram o

esporte de sua origem ao esporte moderno, assim como identificamos os

conceitos, ideias e métodos que levaram ao casamento entre esporte e

educação, do ponto de vista do desenvolvimento histórico da sociedade e do

potencial que o primeiro tem de executar de maneira mais ampla o segundo,

construindo uma educação para além do convencional, além da sala de aula e

dos muros das escolas.

Nos propomos também a analisar aqui, de maneira objetiva e embasada

em dados, o percurso histórico e educacional do esporte no Brasil e como isso

foi sendo sistematizado e afunilado para a construção do conteúdo contido nos

parâmetros do Programa Segundo Tempo.

Discutimos em nossa pesquisa o contexto em que estava inserido o

Programa Segundo Tempo, seus propósitos na época de sua criação e o que

efetivamente se realizou e materializou na condição de política pública inclusiva

na área dos esportes e educação.

Bem como apresentaremos e analisaremos os fundamentos e métodos

pelos quais o Programa Segundo Tempo valoriza o nexo entre o esporte e a

educação, também promovendo uma relação diferenciada dos assistidos com o

corpo e formação dos aspectos corporais vinculados à construção de

referências educacionais presentes de sua execução.

Nesse sentido, essa pesquisa desenvolvida na forma de nossa

dissertação de mestrado, tem como objetivo geral verificar a forma que o

Programa Segundo Tempo promove e educa, inserindo-o no processo histórico

recente construído. A perspectiva esperada é a do desenvolvimento humano

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para formação e interação através da prática esportiva dos assistidos nos

núcleos das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES).

O Programa se apresenta como uma ferramenta educacional

diferenciada vinculando a relação do ser humano com seu corpo e com o meio.

Abordamos aspectos das teorias de Elias (1980; 1992; 1993; 1994; 2000) para

análise, principalmente os conceitos de sociogênese e psicogênese. A partir

deles entendemos as práticas pedagógicas do programa e seus

desdobramentos.

Analisamos tendo clara toda a história da educação vinculada ao

esporte, desde os tradicionais jogos estudantis e universitários até os

programas que antecederam o PST.

Questionamos com a professora Cássia Damiani, responsável pela

coordenação dos debates entre os professores que compunham o grupo de

trabalho no momento da elaboração no nascimento do mesmo e o ex-ministro

do Esporte Orlando Silva, Secretário Executivo do Ministério do Esporte

quando o Programa foi lançado.

Além destes, realizamos questionários com os professores Amauri

Bássoli, Andréa Ewerton, Andréa Alfama e Amanda Patriarca, todos atuantes

junto ao Ministério do Esporte no Governo Lula da Silva e Dilma Houseff.

Nos apoiamos no documento do Sistema de Monitoramento & Avaliação

dos Programas de Esporte e Lazer da Cidade e Segundo Tempo do Ministério

do Esporte (SOUZA et al, 2010) e nos debates presentes na obra Fundamentos

Pedagógicos do Programa Segundo Tempo: da reflexão à prática (OLIVEIRA;

PERIM, 2009).

Tais dados estão compilados em gravações, seguem de maneira

descritiva nos apêndices de nossa dissertação. Foram fruto de 15 visitas à

sede do Ministério do Esporte em Brasília nos anos de 2015 e 2016 e contato

com técnicos e assessores dos então ministros da pasta.

Apresentamos e analisamos também os resultados dos referidos

questionários, respondidos a partir de questões montadas em formulários

apropriados, feitas junto ao então ministro do esporte no momento em que foi

criado o referido programa.

Um de nossos objetivos específicos é verificar como este promove o

desenvolvimento humano e a mudança de perspectivas dentro do contexto

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social através da prática esportiva no ambiente universitário no Brasil e o

impacto disso junto aos que dele participam ou participaram, em que

perspectiva as educam ou educaram nesse processo.

Também se somam como objetivos específicos a análise dos registros

fotográficos, que refletem a contribuição para a prática esportiva no contexto

específico analisado, em 4 núcleos do Programa Segundo Tempo, situados na

Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Universidade Federal de São

Paulo (Unifesp), Universidade Federal de Viçosa (UFV), localizada no estado

de Minas Gerais e Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Além desses, analisamos também outros documentos fotográficos,

ligados a ações do Ministério do Esporte junto às Forças Armadas, Prefeituras

de algumas cidades e outras, junto às instituições sociais locais, na busca de

melhor embasar o alcance do PST e sua repercussão histórica com dimensão

nacional, absorvendo características locais e implementando diretrizes

nacionais, todas articuladas com universidades federais.

Fizemos nossa pesquisa em três etapas: a análise do que foi idealizado

sobre o tema PST, o debate do que depois foi estudado a partir do trabalho

pioneiro da UFRGS, instituição que iniciou esse processo e segue monitorando

o programa junto ao Ministério do Esporte até o presente momento e, por fim,

os resultados práticos do PST, a partir da sociogênese e psicogênese eliasiana.

Realizamos tal intento através do estudo dos documentos textos do

Ministério sobre o Programa e da análise do material colhido nos questionários,

somado à sistematização de dados realizada a partir da leitura das obras aqui

já citadas.

Dessa maneira, estruturamos nossa dissertação dividida em três

capítulos, que abrangem o conjunto do estudado e se propõe a funcionarem

como os elos que respondem ao problema de pesquisa.

No capítulo da nossa metodologia, trataremos da análise de conteúdo,

imagens e documentos que constituem o corpus de nosso trabalho,

impulsionando e delimitando as conclusões por nós aqui construídas. Também

nesse capítulo, apresentamos a análise de dados colhidos durante a pesquisa.

Apoiamos a mesma nas teorias de Minayo (1998), Barreto (2006) em particular,

na busca de entender como cuidar e aplicar os dados levantados.

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Em nossa dissertação que aqui introduzimos, decidimos fazê-lo pelo

olhar pedagógico, mas vinculado ao debate do indivíduo perante o todo

conduzido por Elias (1993) no sentido da sociogênese e da psicogênese. Esse

é o diferencial que buscamos aqui apresentar: o casamento da sociogênese e

psicogênese eliasiana com o debate das possibilidades pedagógicas de

inclusão e interação, feitos no transcorrer de nosso texto.

Entendemos, assim, que Elias apresenta o debate de que o

individualismo nas sociedades possui relação com não conseguir se encaixar,

não conseguir se sentir parte de algo. Esse é o fio da meada que aqui

perseguimos: a possibilidade de a pedagogia aplicada ao programa cumprir

essa função de ser um instrumento de inclusão e de interação entre os seus

participantes e como historicamente o Programa mudou os seus assistidos

para ampliarem suas possibilidades, visão de mundo e estímulos à interação.

Esse movimento contrário ao individualismo, contrário ao foco apenas

em si próprio, mas em si e no outro relacionado pelo esporte, pela interação,

pela competição saudável em busca da convergência entre os pares e não de

um resultado, é o que motiva nossa pesquisa, o que nos faz seguir adiante.

Na soma do debate dos indivíduos e da civilização eliasiana,

construímos perspectivas de pesquisa que possam contribuir com o debate das

ideias de Elias, aplicados à educação e também à inclusão dos indivíduos nas

sociedades a partir da interação esportiva no Programa Segundo Tempo.

A singularidade do Programa aparece pela sua busca a um público

menos assistido pelos diversos serviços ofertados pelos órgãos

governamentais, dos que em posição de menor possibilidades sociais, seja

isso materializado nos espaços esportivos a que estes não era disponibilizado

ou então na falta de qualquer outra relação com qualquer outro instrumento

cultural, social e que garantisse a relação com os demais membros da

sociedade em que viviam seus assistidos.

Mudanças de possibilidades, novas variáveis, uma miríade de potenciais

rumos que os que frequentam ou frequentaram o Programa possam acessar a

partir da interação e da inclusão que este pode proporcionar, isso nos motivou

e motiva a escrever essas linhas. O potencial dos programas nos parece

inegável, a sistemática das práticas esportivas mediada por uma pedagogia

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inclusiva e social possui destacada força e potencial para mudar contextos,

ampliar possibilidades, alterar visões.

Não discutimos uma, mas duas vertentes (educação e esporte) que

caminham juntas e podem sim ser uma alternativa formativa, informativa,

organizativa e de construção de perspectivas positivas para os indivíduos,

justamente quando esses são chamados a não serem meros indivíduos, mas a

colaborar entre si em um programa que dialoga com seu corpo, sua sociedade

e seu meio.

Analisa-se a marca da desigualdade, a força da exclusão em um mundo

que avançou tanto na economia, saúde, trabalho, educação, mas que ainda

assiste à existência de um fosso separando parcela da população que ostenta

indicadores sociais alarmantes e colocam em risco o bom desenvolvimento de

qualquer ser humano.

Tal marca aparece nos questionários, metade dos que colaboraram

justificam a criação do Programa Segundo Tempo dentro de um conjunto de

iniciativas impetradas no Governo Lula da Silva enquanto políticas públicas

focadas na intenção consciente de diminuir as desigualdades sociais do país

nas mais diversas frentes em que o governo federal poderia atuar e influenciar

naquele momento.

As desigualdades não são uma novidade histórica, mas se acentuaram e

adquiriram visibilidade no mundo atual, nisso colabora o avanço da internet e

todas as possibilidades que a mesma nos dá ao acessar realidades díspares,

até mesmo chocantes.

Essas desigualdades, que acreditamos poderem serem modificadas pela

ação de programas e iniciativas de políticas públicas, não são obras do acaso,

são construções sociais que resultam de um conjunto de relações,

principalmente políticas e econômicas. Em busca de uma solução para esses

problemas, as sociedades e governos se mobilizam, há convergência entre

programas sociais e iniciativas pedagógicas, uma alimenta e fortalece a outra,

não é diferente do Segundo Tempo, em nossa opinião.

Para corroborar nossa hipótese, a da possibilidade de mudanças

oriundas do Programa ao passar do tempo, algo que aparece de maneira

consciente e como proposta de ação de governo na concepção do mesmo,

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também fazemos a análise de fotografias e de imagens a partir das teorias de

Kossoy (2014) e de Santaella (2012).

Quisemos aqui buscar nos detalhes das imagens o reflexo das causas e

efeitos que o programa pode proporcionar aos seus assistidos a partir do olhar

científico aplicado sobre a análise de imagens desse tipo.

Nas imagens analisadas, ficam contidas partes da memória e da história

edificada pelo Programa Segundo Tempo. Ao analisar estas, tivemos acesso ao

que as palavras não permitem, chegamos mais além em nosso objeto de

pesquisa e conhecemos melhor os que aplicam e recebem o que se propõe o

Programa, em particular reforçando sua dimensão histórica e nacional.

Temos ciência que o casamento do processo educacional e o

pensamento eliasiano é tarefa complexa, por isso dispensamos parte larga de

nossa dissertação para realização dos debates e das categorias contidas nas

teorias do autor.

Para além disso, buscamos interface com o debate educacional a partir

de Brandão (2000) e demonstramos a possível articulação entre Nobert Elias

(1980; 1992; 1993; 1994; 2000) e a pedagogia e entre essa última e a busca do

rompimento com o indivíduo, apartado do mundo construído pela sociedade de

cada época.

Dito isto, nos propomos a experimentar, a construir argumentação

apoiada em teoria, no composto e construído pelos autores que aqui

colocamos para debater. A partir disso acreditamos colaborar com um novo

olhar sobre um tema já debatido a partir de outras perspectivas e nuances.

Também destacamos a partir das citações e dados do capítulo dois que

existe a possibilidade de tais programas terem colaborado em algum grau na

atenuação do tempo de exposição de crianças e jovens aos efeitos da violência

das cidades, dos problemas familiares, tráfico de entorpecentes, da falta de

comida e até mesmo de afeto, entre tantos outros elementos que se somam na

perspectiva da deterioração da dignidade do ser humano.

No capítulo três, discorreremos sobre a história do esporte, suas raízes,

principais teóricos e a evolução do mesmo, nossa proposta aqui é melhor

sustentar a relevância do Programa Segundo Tempo a partir do histórico

esportivo.

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A partir disto, entramos na nossa fundamentação teórica e seus

desdobramentos na construção do escopo de nossa dissertação, apresentando

os nossos autores e as ideias que sustentam nossa pesquisa. Ressaltaremos

os autores que são nosso referencial teórico, analisaremos a obra de Santaella

(2012), Elias (1993), Kossoy (2014) e as relações destas com o entendimento

do corpo, esporte, educação e sociedade.

Norbert Elias é nosso teórico-chave, a partir dos seus conceitos de

sociogênese e psicogênese vamos aqui debater a complexa relação de

sociedade e indivíduos e os impactos da mudança social sobre estes e destes

sobre a sociedade. Fizemos a ligação do nosso objeto com a importância e

possibilidades contidas nos estímulos externos e na construção do processo

disciplinar e das mudanças de hábitos e no corpo a partir de iniciativas

externas aos indivíduos.

Seguimos o capítulo quatro de nossa dissertação analisando o

Programa Segundo Tempo, como surge, desdobra e sua relação com a

educação, potencialidades, limitações e análises históricas e pedagógica.

Discutimos o foco da questão metodológica do Programa Segundo

Tempo, sua relação com a universidade, sua história construída na citada

relação, bem como a análise do mesmo a luz de teorias que discutem as

imagens.

Destarte, destacamos os conceitos de esporte moderno e esporte

educacional, as origens do nexo esporte e educação, a importância do esporte

no ambiente de educação das escolas e universidades como parte do processo

educacional e os fundamentos e conceitos trabalhados pelo PST correlatos à

educação.

Também em nossa pesquisa discutimos a relação dos conceitos

educacionais com a prática esportiva e fizemos a análise buscando comprovar

se a metodologia do Programa Segundo Tempo contribuiu e contribui

efetivamente para a mudança de perspectiva social de seus participantes e a

ampliação dos seus horizontes de possibilidades a partir da educação ali

desenvolvida.

A preservação do espaço da escola, representado na disciplina de

Educação Física e o entrelaçar deste espaço e das ações ali realizadas

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mostram o amálgama que foi se formando entre as iniciativas do ME e do

MEC.

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2 METODOLOGIA

Nesse capítulo, apresentaremos de maneira sistematizada e detalhada

nossa metodologia de pesquisa e a fundamentação teórica na qual é alicerçada

nossa dissertação.

Nossa pesquisa se apoia no material publicado pelo Governo Federal

(Manuais Metodológicos, a Política Nacional de Esporte) e as obras Programa

Segundo tempo: ensinando e aprendendo esportes no Programa Segundo

Tempo (2011), Recreio nas Férias (2013), Fundamentos Pedagógicos do

Programa Segundo Tempo: da reflexão à prática (2009) e Sistema de

Monitoramento & Avaliação dos Programas Esporte e Lazer da Cidade e

Segundo Tempo do Ministério do Esporte (2010) para orientar a implementação

do Programa Segundo Tempo.

Utilizamos aqui como fonte, análise documental de tipo qualitativa,

interpretando dados fornecidos pelo Ministério do Esporte. Essas informações

foram coletadas junto aos beneficiários do programa. Apresentaremos

parâmetros elaborados pelo órgão e articularemos esses elementos com a

análise de imagem e o debate sociológico eliasiano.

Nosso corte de pesquisa será a primeira década do Programa (2003-

2013), analisaremos os fundamentos pedagógicos do mesmo, as reflexões que

existem já estudadas sobre o mesmo, bem como a análise das práticas

esportivas por ele materializadas. Ressaltamos que a bibliografia sobre o tema

é farta e bastante acessível nos portais de agência de fomento de pesquisas

disponíveis por meio virtual e no repositório de teses da Universidade Federal

de Pernambuco (UFPE).

Foi nesse primeiro levantamento de pesquisa que tivemos os dados que

comprovaram ser possível ir além do já construído sobre a temática, que o

publicado até o momento e seu conteúdo poderiam nos oferecer mais e

poderiam seguir tendo relação com a educação.

Desta maneira, a análise das publicações e documentos foi feita a partir

de um olhar pedagógico, mas sem perder de vista a sua historicidade, já que

os documentos se encontram inseridos num complexo contexto político-social,

sendo agentes desse processo de normatização social.

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Como realizamos uma pesquisa no campo educacional e metodológico,

é de grande importância ampliar o uso das fontes. No caso da nossa pesquisa,

aqui confrontamos os seguintes tipos de fontes científicas: documentais e os

questionários respondidos.

Nessa perspectiva, o trabalho de pesquisa procura compreender o

contexto do período e suas características e limitações, sempre levando em

consideração que entendemos o programa como uma importante iniciativa e

estudamos especificamente as mudanças que este pode ter acarretado junto

aos seus usuários, em particular os que se encontravam em situação de

vulnerabilidade social ao ingressar.

As mudanças que aqui tratamos são no âmbito social e educacional

apoiadas nas teorias de Elias acerca da sociogênese e da psicogênese

apresentadas em particular nas suas obras O Processo Civilizador (1993),

volume I, e A Busca da Excitação (1992). Cabe dizer ainda que, como partimos de um “universo de documentos

de análise” (BARDIN, 2009, p.122), reconhecemos que para um trabalho mais

profícuo de análise de conteúdo é preciso restringir as amostragens.

Quadro 1 - Cadastro da pesquisa

DOCUMENTOS QUESTIONÁRIOS COM GESTORES

SÍTIOS ANÁLISES

- Livros - Documentos publicados pelo Ministério do Esporte

- Dep. Orlando Silva - Prof. Amauri Bássioli - Prof.ª Amanda Patriarca - Prof.ª Andréa Alfama - Prof.ª Andréa Ewerton - Prof.ª Cássia Damiani

- Ministério do Esporte - Blog do PST

- Documental - Fotográfica - Questionários respondidos

Fonte: a pesquisa, (2016).

Segundo a autora, “[...] a análise pode efetuar-se numa amostra desde

que o material a isso se preste. A amostragem diz-se rigorosa se a amostra for

uma parte representativa do universo inicial” (BARDIN, 2009, p.123).

Fazemos aqui a análise de conteúdo como técnica que utilizamos na

análise de dados, além de focarmos na categoria da análise do discurso de

Bardin (2009) a partir do levantado como dados e fontes de nossa pesquisa.

Partindo disso, nos apoiaremos nas teorias acerca de análise de

conteúdo de Bardin (2009) e da busca da circunscrição de um campo de

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pesquisa delimitado, seguindo o que indicam suas teorias, em particular

quando tratamos da análise prévia do material pesquisado:

Nem todo o material de análise é susceptível de dar lugar a uma amostragem, e, nesse caso, mais vale abstermos-nos e reduzir o próprio universo (e, portanto, o alcance da análise) se este for demasiado importante. (BARDIN, 2009, p.123).

A pré-análise seria a primeira fase desta organização de análise de

conteúdo objetiva buscar a sistematização para que nós, que aqui somos os

analistas, possamos conduzir as operações sucessivas de análise.

Assim, num plano inicial, nossa missão nesta primeira fase é, além da

escolha dos documentos a serem submetidos à análise, a formulação de

hipóteses para a elaboração de dados para a interpretação final.

Bardin (2009) está situada num processo de readequar a análise de

conteúdo a um novo momento, o momento histórico vinculado ao surgimento

de novas tecnologias com ênfase na discussão que envolvem as

comunicações entre pessoas e instrumentos comunicacionais. A autora se

insere na análise desse novo mundo de contextos pessoais potencializados

com aparatos eletrônicos cada vez mais individuais. A autora situa a análise de conteúdo no plano cronológico, remete o

leitor para alguns exemplos representativos daquilo que se pode pôr em prática

no campo da psicologia (principalmente em psicologia social) e da sociologia.

Mas, o que seria a análise do conteúdo na visão da autora? Para Bardin

(2009), a análise de conteúdo, enquanto método, torna-se um conjunto de

técnicas de análise das comunicações que utiliza procedimentos sistemáticos e

objetivos de descrição do conteúdo das mensagens.

Alguns exemplos elucidados na obra são simples e sem pretensões,

visam iniciar um investigador iniciante na tarefa seguinte: o jogo entre as

hipóteses, entre a ou as técnicas e a interpretação, “[...] isto porque a análise

de conteúdo se faz pela prática”. (BARDIN, 2009, p.51).

Sendo assim, analisar o Programa Segundo Tempo pela prática, pela

análise das práticas esportivas à luz do que se propõe em suas propostas

escritas que amparam os programas, estabelecendo hipóteses que aqui

buscaremos confirmação é o foco que buscamos dar no aspecto metodológico

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de nossa dissertação.

Acreditamos que a obra de Bardin (2009) possui uma ancoragem

consistente no rigor metodológico, com uma organização propícia à

compreensão aprofundada do método e, ao mesmo tempo, traz a nós

pesquisadores, um caminho multifacetado que caracteriza a análise de

conteúdo como um método que, historicamente e cotidianamente, produz

sentidos e significados na diversidade de amostragem presentes no mundo

acadêmico.

Aqui nos apoiamos na ideia da amostra, uma amostra específica e

delimitada que nos permita buscar resultados a partir de sua análise, em uma

construção científica que nos mostre as mudanças e permanências

decorrentes da inserção dos usuários no contexto do programa e as alterações

na sociogênese e na psicogênese que os insere e os cerca, respectivamente.

Em particular, acreditamos que a utilização das técnicas de análise de

conteúdo em investigações psicossociológicas, como propõe Bardin (2009) em

sua obra, está em perfeita sintonia com o debate que aqui propomos sobre

sociogênese e psicogênese eliasiana, o debate do aspecto social e psíquico

em diálogo, causando mudanças e novas construções de figuração a partir

destas.

A de se analisar aqui o que o Programa Segundo Tempo propunha na

época de sua criação e o que efetivamente se realizou e materializou enquanto

política pública inclusiva na área dos esportes e da educação.

Nossa metodologia para tanto será a de realizar análise de conteúdo do

material escrito analisado do Ministério do Esporte e dos questionários que

realizamos com esta finalidade, para tanto teremos como referencial Bardin

(2009).

A autora colabora na circunscrição do tema a ser pesquisado, na

maneira de escolher qual corte a ser estudado e analisado, ressalta a

importância de haver um corte e não fazermos a pesquisa em um universo

amplo demais.

Assim, Elias (1993) trata da relevância da psicologia social e histórica

como ferramenta que colabora na compreensão mais ampla dose seres

humanos inseridos nas sociedades:

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Permanece sem reconhecimento o fato de que uma psicologia social histórica, um estudo simultaneamente psicogenético e sociogenético, é necessária para traçar as conexões entre todas essas diferentes manifestações dos seres humanos. Os que se interessam pela história da sociedade, como os que estudam a história da mente, encaram a "sociedade" e o mundo das "ideias" como duas formações diferentes que pode haver sentido em separar. (ELIAS, 1993, 2v, p. 234-235).

Aportarmo-nos nessa análise foi crucial para demonstrar o êxito ou não

do Programa Segundo Tempo na condição de ferramenta inclusiva a partir de

métodos relacionados ao corpo e à interação entre seus atendidos com

perspectivas de ampliação de possibilidades e das novas relações em função

da sociedade que estão inseridos.

Na nossa pesquisa, no que tange ao método e técnicas, buscamos

aplicar a proposta de Bardin (2009), respectivamente: a organização da

análise, a codificação de resultados e as categorizações do nosso objeto de

pesquisa.

Para uma aplicabilidade coerente do método, de acordo com os

pressupostos de uma interpretação das mensagens e dos enunciados, a

análise de conteúdo deve ter como ponto de partida uma organização. As

diferentes fases da análise de conteúdo organizam-se em torno de três polos,

conforme Bardin (2009, p.121) "[...] a pré-análise, a exploração do material e

tratamento dos resultados: a inferência e a interpretação".

A busca da interpretação dessa realidade, contida no contexto específico

da análise dos núcleos do Programa Segundo Tempo que aqui analisamos é

feita de maneira cuidadosa ao entender que é parte de algo maior. Fazemos,

no entanto, um corte legítimo e científico da realidade do diálogo entre os

usuários do programa no seu principal público alvo, os que estão em situação

de vulnerabilidades e nos entorno dos locais que sediam os núcleos.

Partimos aqui da análise do que o Programa Segundo Tempo propunha

em sua origem e o que se efetivamente realizou e materializou enquanto

política pública inclusiva na área do esporte e da educação.

Fazemos o proposto aqui em três etapas: a análise do que foi idealizado

sobre o tema, o debate do que depois veio a ser estudado a partir do trabalho

pioneiro da UFRGS, que segue monitorando o mesmo junto ao Ministério do

Esporte até a data em que esta dissertação foi redigida e, por fim, os

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resultados práticos do PST a partir da sociogênese e psicogênese eliasiana.

Bardin (2009) colabora na circunscrição do tema a ser pesquisado, na

maneira de escolher qual corte a ser estudado e analisado, ressalta a

importância de haver um corte e não fazermos a pesquisa em um universo

amplo demais, sem delimitações claras que ajudem na cientificidade do

proposto.

2.1 ANÁLISE DE DADOS

Levantados os documentos e realizadas as transcrições das gravações

que registraram os depoimentos dos atores colaboradores, passamos à

organização e interpretação dos dados, para tanto, procuramos seguir as

orientações Minayo (1998). Segundo esta, o ponto de partida de uma análise é

a compreensão em si da fala e dos textos dos atores investigados.

Nesse sentido, a princípio, buscamos compreender as intencionalidades

e os significados presentes nas diretrizes mais gerais da política de Educação

Física, Esporte e Lazer. Seguindo os eixos temáticos que nortearam os

questionários, inicialmente confrontamos os depoimentos dos gestores com as

informações documentais, de forma a reconstituirmos o processo de

planejamento e elaboração do Programa Segundo Tempo.

Estes procedimentos possibilitaram as primeiras aproximações das

problemáticas significativas que influenciaram a construção do questionário.

Em seguida atribuímos códigos para garantir o sigilo da informação original dos

colaboradores e a maior liberdade nos mesmos perante as respostas.

Partindo do pressuposto de que as tônicas do programa em foco não

“falam por si”, sendo passíveis de interpretações e ressignificações, buscamos

apreender os significados atribuídos às mesmas pelos atores colaboradores.

Para isso, organizamos as percepções dos gestores em grupos de

tendências, através das quais tentamos analisar suas relações com

concepções de Educação Física e propostas de políticas públicas no setor.

Em um período de seis meses enviamos por e-mail um formulário

(questionário) com perguntas idênticas para todos os que pretendíamos

questionar nessa pesquisa. Após isso passamos a monitorar via telefone o

retorno das mesmas.

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Após receber todas, nenhum dos colaboradores se negou a responder,

fizemos a sistematização dos dados, comparação das respostas, construção

dos resultados a partir dessas.

Em um total de sete questões formuladas por nós obtivemos respostas

dos seis colaboradores para todas, a exceção de uma questão, a de número

sete, não respondida pelo ex-Ministro do Esporte e atual deputado federal

Orlando Silva.

Conhecemos todos os colaboradores pessoalmente, tivemos contato

com os mesmos enquanto prestador de serviço ao Ministério do Esporte e em

atividades acadêmicas na área do esporte.

Considerando a contribuição de Castro (1999) e estabelecendo

procedimentos alusivos à imparcialidade e confiabilidade, o estudo comportará

de maneira intencional ações de classificação metódica das respostas, vamos

articulá-las com a identificação destas relações e sequências repetitivas,

mediante o fracionamento do objeto em estudo sem, com isso, perder a

dimensão do todo. (Apud Menezes, 2009, p.14-15).

Partimos de Bardin (2004), analisamos o que os colaboradores possuem

em comum em suas respostas a respeito do Programa Segundo Tempo,

buscamos entender as minúcias das respostas, a identificação do conteúdo

das mensagens que nem todas as vezes são evidentes ao observador comum.

Vamos investigar a partir do que as respostas têm de convergente,

classificando o material, aqui buscamos os indicativos da direção para que

aponta o objeto, o fazemos a partir da análise do discurso desses.

Seguindo a orientação de Menezes (2009), observamos o que aponta

Castro (1999) acerca de cuidados com dados e sistematização de elementos

para estabelecer o foco da pesquisa:

Para tanto, encaminhou-se a fase de coleta dos dados baseada em devidos cuidados, com decisões, passos e procedimentos anotados com critério, conforme recomenda M. H. G. de Castro (1999), e, nesse sentido, organizada por aproximação temática. Desse modo, a observação exaustiva dos dados é a “coluna vertebral” para a análise e descrição do fenômeno da descentralização, das políticas e da gestão desportiva na referida região. (MENEZES, 2009, p.15)

Juntar e sistematizar o conjunto dos dados, posteriormente circunscrevê-

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los aos procedimentos por nós adotados, pode colaborar para evitar avaliações

superficiais e conclusões equivocadas, além de garantir mais precisão e a

precaução frente as possíveis generalizações.

Contribuíram para garantir a materialização das inferências e evitar

possíveis generalizações cabíveis com base nos resultados alcançados, a

serem discutidos e comparados com afirmações e posições de teorias e

autores afeitos ao tema em discussão.

Uma vez que os dados foram coletados, fizemos a revisão de nossas

fontes e reafirmação do problema de pesquisa, bem como dos objetivos da

mesma, inserimos tudo isso nos passos de nosso estudo:

a) Determinação do público a ser colaborador, que, neste caso, tratamos

de seis gestores com experiência profissional junto ao Ministério do

Esporte em vários e diferentes momentos, destacamos que quatro como

representantes do governo em funções de confiança e dois como técnicos

que ali atuaram cedidos por suas IFES;

b) Elaboramos o formulário de pesquisa com as questões, em um total de

sete, distribuídas por e-mail e recebidas em retorno também por e-mail,

mediada por contatos telefônicos entre os meses de retorno das mesmas;

c) Acredita-se que os instrumentos por nós escolhidos possuem

significativas vantagens e são adequados aos objetivos definidos para

nossa pesquisa, isso funcionou e foi operacional com o tempo efetivo

necessário e disponível para pesquisa e ferramentas que se mostraram

harmônicas para os fins propostos.

No desdobramento do que propomos, inspirados pela experiência de

Menezes (2009) em sua discussão acadêmica sobre o esporte, tomamos os

seguintes passos:

a) Identificação dos dados sobre os quais foram elaboradas as questões;

b) Seleção de quais perguntas devem por nós serem feitas, aqui as

contextualizamos, em particular, para atender a forma do questionário,

por e-mail, e ao tempo disponível também. Desdobramos isso na análise

dos dados obtidos;

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c) Análise das questões por nós formuladas com fins de analisar se

possuem redação clara ou se precisam passar por correções.

Para efetivar os questionários optamos por estabelecermos critérios que

nos ajudem a operar as mesmas: planejar e elaborar perguntas; estudar o perfil

e conhecimento prévio de cada um dos que buscamos questionar; realizar os

questionários por meio eletrônico, mediada na agilização da recepção e no

dirimir das dúvidas por contato telefônico; definimos os colaboradores a partir

da relação prévia que tivemos com todos e levamos em conta a autoridade que

os mesmos possuem com o tema-chave propostos na nossa pesquisa; garantir

uma quantidade de colaboradores satisfatória e ideal.

Nosso primeiro contato foi feito por meio de ligação telefônica, aqui

falamos do foco e intenção da nossa pesquisa, a dimensão técnica que

buscamos nesses e o compromisso de utilizar de maneira correta e

responsável as informações dadas pelos colaboradores.

Registramos também que o intervalo entre o envio das perguntas por e-

mail e monitoramento das dúvidas e respostas levou seis meses, o referido

monitoramento se deu por contato telefônico entre celulares e as respostas nos

foram devolvidas todas através de correio eletrônico.

2.2 O OLHAR DO MINISTÉRIO DO ESPORTE SOBRE O PST A PARTIR DOS

QUESTIONAMENTOS DE SEUS GESTORES

Nos chamou a atenção a profunda afinidade entre as respostas de cinco

dos colaboradores, com diferenciações claras apenas com o professor Alfa no

que tange ao papel do PST enquanto possível política pública que teria sido um

marco histórico na sua área. Todos os colaboradores concordam, menos o

Prof. Alfa que entende o mesmo não ter sido criado com essa intenção.

Na análise das demais respostas o que nos aparece de maneira

cristalina é que o PST foi criado enquanto uma iniciativa que buscava a

inclusão social, fazendo parte de uma ação de governo maior, comandada em

pessoa pelo então presidente da República, Luís Ignácio Lula da Silva.

O Prof. Beta segue no ME em função técnica até o presente ano de

2017, entende que o PST foi um marco histórico e uma política pública

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diferenciada criada.

Todos os colaboradores também atribuem às universidades o refinamento das

capacitações, a potencialização da proposta pedagógica inicial do PST e o

fornecimento da mão de obra qualificada para as equipes colaboradoras.

Mas, quando tratamos das universidades participando na implementação

do PST nos seus próprios espaços, todos também apontam que isso ficou

muito aquém do potencial que esse espaço possui. O Prof. Gama sinaliza que

falta mais empenho por parte dos gestores da IFES para garantir isso.

As universidades acabam por ser um espaço de refinamento do esporte

educacional e da garantia da participação de intelectuais da área, bem como

da formação destes a partir dessa interação também.

Ainda o Prof. Beta enxerga o PST como parte de um salto qualitativo no

âmbito das politicas públicas, reforçando nisso o caráter educacional do

esporte. Retoma o debate do PST nas universidades, o classifica como pouco

expressivo enquanto ação implementada nesses ambientes, diferente das

prefeituras que utilizaram o PST ao máximo.

O Prof. Alfa já entende que o PST colabora na busca da conquista da

cidadania, assim como os demais colaboradores, disponibilizando um legado

pedagógico e produção acadêmica, além da formação continuada de

profissionais.

Também faz questão de afirmar que o PST, quando criado, não possuía

a intenção e nem foi um marco na área dos esportes enquanto política pública,

na sua opinião.

Acredita que a academia legitima o Programa, porém destaca que os

gestores nem sempre acatam plenamente as orientações técnicas. Tal

afirmação se repete em todos os demais colaboradores, seja do ponto de vista

técnico ou mesmo na garantia do pleno cumprimento dos objetivos do

Programa pelos agentes políticos municipais.

O Professor Alfa destaca que a garantia do acesso ao esporte é um

direito garantido pela lei, que a ação do governo federal persegue a

materialização da garantia desse somada a formação pedagógica ampliada

dos que atuam nas equipes colaboradoras do PST.

Chama-nos à atenção a contradição que reserva a primeira versão do

PST, segundo o Professor Alfa a mesma foi bastante criticada nos meios

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acadêmicos e bem recebida pelas comunidades a quem foi ofertada.

O professor se soma e afina aos demais colaboradores ao afirmar que o

Programa se tornou exemplo de política pública, e que conseguiu com o passar

dos anos dar conta de um país amplo e heterogêneo como o Brasil.

Também nos marcou a afirmação do Professor Alfa de que, apesar de

toda a potencialidade, todo o refinamento técnico, todo o potencial acadêmico e

formativo do mesmo, alguns dos agentes do Programa ainda insistiam apenas

em proporcionar simples partidas de futebol entre os assistidos.

O Professor Alfa também faz questão de afirmar que a intenção do PST

nunca foi fortalecer as práticas esportivas no ambiente universitário, na sua

opinião ele não foi pensado com esse viés.

Quando analisamos o que nos apresenta como respostas o Prof. Delta

fica clara a convergência das mesmas com o Professor Primus, o Prof. Ômega

e a Prof. Gama.

Todos insistem que o PST é um marco na área, além disso, o Prof. Delta

destaca que a interface com a universidade garantiu a cientificidade do

Programa para além dos problemas inerentes ao poder público.

O Prof. Delta acredita que o PST colaborou na democratização e

universalização da prática esportiva, porém destaca que o Programa tem

problemas no seu alcance e na relação com o poder público. Destaca como

positivo a aprimoramento da prática esportiva no ambiente escolar e a interface

das ações de saúde com a população em geral.

O alcance do PST foi insuficiente no ambiente universitário, também

assim o pensa o Prof. Delta, algo que é uma marca dos resultados dos

questionários de todos os que analisamos.

O Professor Primus, afirma que o PST foi o primeiro programa de

esporte educacional, que aproveitou algo do seu antecessor, o chamado

Programa Esporte Solidário, e deu ênfase a implementação do mesmo no

ambiente escolar em parceria com o Ministério da Educação.

O colaborador afirma que as universidades só vieram a possuir um papel

destacado no PST no segundo momento do mesmo, após a primeira rodada de

implementação e elaboração deste, afirma que a academia foi decisiva na

formação dos grupos que atuam no PST enquanto formadores e monitores.

Também afirma que o PST se consolidou como um espaço de iniciação

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esportiva e formação continuada.

São problemas do PST a falta até o presente de um Sistema Nacional

de Esporte e o fato de a demanda por implementação de novos núcleos ser

sempre maior que a oferta dos mesmos pelo governo federal, afirma o

Professor Primus.

Primus é mais um dos colaboradores que afirma o ambiente universitário

como algo que fortaleceu as pesquisas sobre a temática do PST e também

como espaço de extensão e campo de formação acadêmica, mas não como

espaço pleno de realização do mesmo.

O Prof. Ômega se soma aos demais na afirmação do PST como um

marco inconteste na área esportiva enquanto nova política pública, a exceção

do Professor Alfa.

Chama a atenção no fato de as universidades terem tido função

estruturante no Programa Segundo Tempo. Respondeu de maneira

praticamente idêntica ao colaborador Primus a narrativa de um Programa que

buscou a inclusão social a partir de uma ação mais ampla de governo, também

o fez ao contextualizar o PST na escola sem concorrer com a prática de

Educação Física.

Damos destaque a resposta do Prof. Ômega sobre a intenção do PST

ter sim uma ênfase de implementação nas universidades na sua ideia inicial,

mas acabou não possuindo a abrangência e nem tendo a capacidade de fazê-

lo.

As IFES fortaleceram o Programa no conhecimento, na iniciação

cientifica e na geração de renda para os monitores por ela ofertados as ações

do PST junto as prefeituras, segundo o Prof. Ômega.

O Prof. Gama se soma aos outros colaboradores na direção do PST

enquanto parte de uma ação mais abrangente pensada pessoalmente pelo

então presidente Luís Ignácio Lula da Silva.

Diferente do colaborador Primus, o Prof. Gama afirma que as

universidades estiveram presentes no PST, na elaboração da metodologia do

mesmo, e que isso seria uma preocupação do Ministério do Esporte. Destaca a

metodologia do PST como algo que possui marca acadêmica universitária.

Articula o esporte como uma política pública de primeira grandeza,

somado a ser uma política de Estado destacada no Governo Lula da Silva e

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estando conectada a formação de um ensino de tipo integral nas escolas da

rede pública de ensino.

O Prof. Gama afirma que a falta do PST não ser uma lei até a atualidade

é um limitador do mesmo e que este também sofre com as limitações do

Estado brasileiro. Já como positivo, o acompanhamento pedagógico do mesmo

e o reconhecimento internacional que alcançou.

Por fim, quando tratamos do espaço universitário o Prof. Gama nos diz

que a dinâmica universitária choca com a do PST, acabou-se seguindo o

caminho de se valorizar os estudos sobre o tema, não sua implementação ali.

Curioso foi o dado que o mesmo nos deu de que a demanda por esporte

nas IFES é grande, mas não se consegue obter a vontade política dos gestores

das mesmas para tanto.

Concluímos aqui com a convergência sobre a politica pública enquanto

marco histórico e esportivo construído pelo PST, no entanto as respostas

apontaram no sentido oposto da relevância das universidades enquanto

espaço realizador do Programa, embora as mesmas sejam basilares e

indispensáveis na cientificidade e no aspecto acadêmico do mesmo, sem elas

o PST não teria chegado onde chegou.

O papel e limitações do Estado também precisa ser registrado, o mesmo

acaba por impedir a plena implementação da ação, a burocracia da máquina

estatal acaba por podar parte do potencial pleno do PST.

O Brasil, por sua dimensão e complexidade, acabou por criar uma

demanda sempre muito maior que a oferta feita pelo Ministério do Esporte,

desde o nascedouro do Programa, uma marca indelével de todas as respostas.

Qualidades e defeitos marcar o PST, mas é possível identificar que

todos os colaboradores entendem que o mesmo está já inscrito enquanto

política pública de Estado na área esportiva de maneira permanente.

2.3 PROGRAMA SEGUNDO TEMPO: UM OLHAR CIENTÍFICO PARA ESTA

PRÁTICA NA FORMAÇÃO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

[...] saberes produzidos e/ou transmitidos, em sua dinamicidade, efetivamente, tenham a responsabilidade de cultivar teorias e desenvolver práticas abertas, racionais, críticas, reflexivas, autocríticas, aptas a se auto reformar, que

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venham subsidiar situações ao aprendente e ao ensinamento para solucionar problemas no cotidiano. Teorias enraizadas à luz de paradigmas que permitam tratar o conhecimento complexo, perspectivando um processo de base para os enfrentamentos socioculturais, em que as emoções, prazeres e dignidade da pessoa em viver momentos de liberdade pelo domínio de práticas, produzam experiências de fluxo por lidar com desafios, resolver problemas e/ou descobrir algo novo, condições que faltam com mais frequência no tempo livre. (FRANÇA, 2005, p. 42).

Nos últimos anos, o Programa Segundo Tempo vem sendo utilizados

como estratégias nos mais variados contextos, entre eles: o escolar, o

organizacional, o esportivo e o comunitário. Nessa perspectiva entende-se a

política pública como uma opção na possibilidade de transformação social e na

inversão de valores sociais, que possivelmente esteja associada à constatação,

por parte da nossa sociedade, de que, nossas formas de vida coletivas

necessitam ser reequilibradas, e que os a realização de atividades sistemáticas

através de um programa social como o Segundo Tempo, coloca elementos

fundamentais para a consolidação desta transformação, tal como levanta Broto:

[...] joga-se para superar desafios e não para derrotar os outros; joga-se para gostar do jogo, pelo prazer do jogo. São jogos onde o esforço cooperativo é necessário para se atingir um objetivo comum e não para fins mutuamente exclusivos. (BROTTO, 2001, p. 54).

O Programa Segundo Tempo tem em sua essência o aperfeiçoamento

na aceitação, no envolvimento e na diversão e que tem como propósito mudar

as características de exclusão, seletividade, agressividade e exacerbação da

competitividade, predominantes na sociedade e nos jogos tradicionais, o

objetivo primordial é criar oportunidades para o aprendizado cooperativo e

interação cooperativa prazerosa. (BROTTO, 2001, p.123).

Reconhecendo a relevância do esporte enquanto fenômeno e sua

potencialidade são estruturados como intuito de diminuir a pressão excessiva

para a exclusão, onde o individualismo torna-se mais importante que a

cooperação, sendo assim o Programa Segundo Tempo, vem intencionalmente

romper com essas barreiras historicamente estabelecidas e a interação e a

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participação de todos, deixando externar a espontaneidade e a alegria nas

práticas de esporte.

Discutindo sobre o tema jogo, Brotto (2001) ressalta que os jogos, em,

estimulam o confronto e não o encontro, enfatizando o resultado numérico e a

vitória, o que produz mais perdedores do que vencedores, eliminando as

pessoas e a diversão, criando espaços de tensão e ilusão, não deixando opção

ou outras oportunidades de escolha.

Barreto (2006) evidencia que não é somente através da pratica esportiva

que os beneficiários passarão a ser cooperativas, pois existem fatores sócio-

político-econômicos que estruturam competitivamente a sociedade capitalista.

Entretanto, aponta para a possibilidade de mudanças na própria estrutura

social. Para isso, seria necessário iniciar a aprendizagem cooperativa com as

crianças pequenas, pois, quando são estimuladas a inversão de valores se

estabelece culturalmente, ocorre um aumento de interação social e promoção

de atitudes refletidas entre os participantes do programa.

A partir da fala dos atores colaboradores, foi possível destacar alguns

princípios trabalhados que são fundamentais para a consolidação dessa

mudança de perspectiva discutida ao longo do trabalho:

Inclusão: trabalhar com as pessoas procurando ampliar a participação e

a integração entre elas nos processos em curso; exemplo: numa situação

pedagógica em que vivenciamos a pratica da atividade é importante que os

alunos reconheçam que todos deverão participar mesmo aqueles que possuam

algum tipo de limitação, pois a prática da Educação Física não se restringe aos

mais aptos.

Coletividade: as conquistas e ganhos somente se realizam

coletivamente, reconhecendo a individualidade de cada um; exemplo: na

pratica das atividades é relevante que os alunos observem de maneira crítica

que todos possuem potencialidades e fraquezas, e que em conjunto podem ser

superadas ou somadas através de uma ajuda simultânea, resultando em

conquistas coletivas.

Igualdade de direitos e deveres: a participação e a responsabilidade

são asseguradas pela decisão, gestão e a repartição justa dos benefícios

promovidos pela atividade cooperativa; exemplo: através da prática das

atividades os beneficiários aprendem a respeitar regras (deveres) e exigi-las

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quando necessárias (direitos), tornando isso uma prática que condiciona seu

comportamento, auxiliando na vida em sociedade, uma vez que todo cidadão

tem direitos e deveres a serem cumpridos.

Desenvolvimento humano: o objetivo último da experiência da

atividade sistemática é o ser humano e o seu aprimoramento; exemplo: a

atividade esportiva corrobora para o desenvolvimento do caráter, autonomia e

criticidade das crianças e do adolescente, pois mesmo em situações adversas

as crianças são induzidas a lidar com questões com derrota e vitória, aspectos

esses que não se resumem apenas a sua participação e contribuição nos

resultados.

Processualidade: no desenvolvimento das atividades é privilegiado o

processo-os meios e não os fins; exemplo: Numa situação pedagógica em que

vivenciamos a prática de atividades é importante que os alunos reconheçam

que todos deverão participar mesmo aqueles que possuam algum tipo de

limitação, pois a prática da Educação Física não se restringe aos mais aptos

(SOLER, 2006).

Diante do exposto, conclui-se que um dos objetivos do esporte

educacional deve ser fazer com que os beneficiários aprendam a tratar o

cotidiano das atividades por meio das diferentes dimensões.

Partindo desse enfoque a atividade corporal, compreendendo-a de modo

mais amplo, conferindo-lhe maior abrangência, quando de sua utilização no

esporte educacional, poder-se-ão obter melhores condições e oportunidade de

oferecer aos que a praticam inúmeras formas de se trabalhar as manifestações

culturais de modo mais leve, mais espontâneo, mais criativo.

Dentro dessa compreensão, possibilita a maior valorização de elementos

lúdicos da cultura, alcançando uma formação mais crítica e criativa do homem.

É no brincar, e somente no brincar, que o indivíduo, a criança ou o adulto pode

ser criativo e utilizar sua personalidade integral: e é somente sendo criativo que

o homem conhece seu eu. (WINNICOTT, 1975, p.80).

Ao tratar conteúdos com ludicidade nas práticas dentro do universo do

Programa Segundo Tempo, o professor estará proporcionando um ambiente de

socialização, cooperação e autoconhecimento a seus beneficiários, onde a

criatividade se encontra presente no cotidiano, transformando esse espaço em

um lugar de encontro humano.

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Um Programa de políticas públicas com esse olhar, tem maior

possibilidade de atender as necessidades de seus beneficiários, uma vez que

estando esses desprovidos da necessidade de competir, de se firmar em

posições de destaque, vivenciam um comportamento que os leva a se

colocarem de maneira natural de frente as propostas que o professor

apresenta, agindo assim com naturalidade.

Dentro desse entendimento sobre o exercício de ensino-aprendizagem,

quanto mais espontânea e prazerosa for à atividade, melhores os resultados

que seus praticantes obterão.

O esporte é o elemento cultural básico estimulado e desenvolvido no Programa Segundo Tempo como forma de apropriação de conhecimento das crianças, adolescente e jovens. Essa apropriação se dará a partir da participação irrestrita e emancipada de todos que dele queiram participar. Assim, o seu desenvolvimento ocorre de forma a possibilitar que os participantes tenham consciência e domínio, o mais ampliado possível sobre as ações, e que consigam, sobre elas, se posicionar em relação às suas exigências físicas, motoras e cognitivas. Para tanto, o conhecimento adequado dos temas e seu planejamento e organização se colocam como vitais para sua consecução. (OLIVEIRA, 2011, p. 13).

Certo que um olhar crítico deste universo colabora para uma ação

transformadora da ação social e estimula o desejo de aprender, despertando a

motivação imprescindível no ato de construção do saber, o que significa

realmente educar, entendo ser o Programa Segundo Tempo um excelente viés

de intervenção social.

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3 DO SPORT AOS ESPORTES: HISTÓRIA E FUNDAMENTOS DE NOSSA PESQUISA

Nesse capítulo vamos apresentar a história do esporte e dos conceitos

fundantes do mesmo, bem como a evolução histórica que levou a elitização do

mesmo, paralela ao fortalecimento de políticas públicas de esporte indo na

contramão disso.

O termo sport foi adaptado pela língua inglesa do francês arcaico e

identificava de modo geral os jogos e passatempos praticados pela nobreza

britânica (Proni, 1998).

A Inglaterra é considerada como a pátria do esporte moderno não apenas porque os ingleses inventaram ou regulamentaram boa parte das modalidades esportivas hoje praticadas; é assim considerada também por ter introduzido uma série de inovações que mudaram a feição dos jogos e competições atléticas. Segundo ele, exemplos de novas ideias introduzidas são os obstáculos nas corridas (para incrementar a excitação até a linha final), a mensuração de disparidades (como nas apostas), os conceitos de “esporte amador” e “esporte limpo”, e a noção de recorde esportivo. Ainda mais profundas e difíceis de especificar são algumas bases conceituais latentes que estruturam o esporte moderno, como as concepções sobre a inteira submissão da vontade individual a um propósito coletivo (trabalho de equipe) e sobre os ganhos obtidos com planejamento de longo prazo. (PRONI, 1998, p. 27).

Cabe aqui destacar que Proni (1998) situa a mudança que o esporte vai

tendo como concepção e prática a partir do exemplo inglês e em como esses

foram dando singularidades a facetas e modalidades esportivas, na busca da

inclusão de parcelas da sociedade e de público para praticar e assistir aos

mesmos.

Todos esses novos elementos na vida pública desenvolveram-se na Inglaterra recebendo aprovação geral e aparentemente apartados da atividade econômica e política. Entretanto, para Mandell não pode ser coincidência que a Revolução Industrial tenha se desenvolvido ao mesmo tempo que se gestava o esporte moderno, no final do século XVIII e início do XIX. E, desde que as transformações econômicas têm bases sociais e ideológicas que as precedem, as acompanham e as sucedem, o mesmo deve valer para o esporte. Assim, tanto o aparecimento dos novos esportes como o dos novos modos de

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produção têm origens comuns no dinamismo da cultura inglesa. Ele ainda acrescenta: “E o esporte pode ser distinguido primeiro”. (PRONI, 1998, p. 27).

A sociedade e o homem mudam junto com a Revolução Industrial, há

um espraiamento de novas ideias e estas têm alcance social partindo do

debate de ideias, como bem diz o autor. Aqui se trata de outro tipo de

sociedade que vai se edificando e, como tal, precisa de outro tipo de esporte.

Outras fontes, no entanto, apontam o termo desport, também do francês

antigo, como verdadeira origem do termo sport, no inglês, tendo como

significado prazer, recreação e diversão e existindo como prática muito antes

disso:

Entretanto, não há como pensar no esporte sem entender as rupturas possibilitadas pela modernidade europeia nos jogos da Idade Media para transformá-los no esporte moderno. Foi com o surgimento da indústria, da ciência, da imprensa, com os movimentos intensos de urbanização e com a organização dos Estados Nacionais na Europa, que alguns dos jogos se transformaram em esporte. Nesse momento histórico, a Inglaterra se destacava com a força de sua economia, dominando o comércio, o transporte marítimo e o transporte ferroviário. No processo de se constituir como Estado nacional moderno, a Inglaterra se mobilizou para controlar a violência social, substituindo-a pela violência simbólica, por meio da esportivização dos jogos. (SOUZA et al, 2010, p. 39-40).

A alteração da utilização de uma proibição inglesa para controlar sua

sociedade que passava por transformações no processo capitalista de

industrialização estão materializadas no termo esportivização.

Essa esportivização, de acordo com Stigger (2005), ocorreu pela transformação dos valores e dos sentidos que norteavam os jogos, especialmente com a criação de regras universais, de entidades responsáveis pela determinação dessas regras e da organização do controle das competições. Assim, aquilo que é praticado hoje de forma similar em todo o mundo e que é chamado de “esporte” teve sua origem na Inglaterra e se propagou para outros países dada a enorme influência desse país, principalmente nas últimas décadas do século XIX e início do século XX. (SOUZA et al, 2010, p. 40).

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Aqui se dá a internacionalização do esporte e sua inserção na

modernidade como esporte moderno, fruto dessa nova realidade social e

política.

A internacionalização, portanto, é um marco definitivo na história do esporte e só foi possível pela institucionalização das modalidades esportivas, com a criação das confederações nacionais e das federações internacionais, além do Comitê Olímpico Internacional. Entretanto, a institucionalização do esporte moderno, de certa forma, rompeu com suas raízes populares, e as pessoas foram deixando de praticar esses jogos esportivizados, apenas acompanhando as competições como espectadores. Assim, segundo Gebara (2002), apesar do esporte moderno ter se transformado em fenômeno de massa por meio da imprensa, sua prática não se democratizou. (SOUZA et al, 2010, p.40).

Pesquisas que tratam da memória sobre o tema mostram a ligação

intrínseca entre o surgimento e fortalecimento do esporte brasileiro com a

organização e execução de jogos, principalmente de caráter escolar e nas

universidades de nosso país. Isso também deriva das mudanças

internacionais, tendo tido consequências locais:

Dessa forma, o esporte moderno se distanciou dos jogos antigos, pois tem como lógica a busca pelo resultado, pelo desempenho, pela eficiência, mediante a racionalização dos gestos corporais, que levou ao desenvolvimento de técnicas esportivas. Nessa direção, com a maior importância dada ao resultado, com a ênfase na busca pela vitória e no estabelecimento de recordes, essa supervalorização do rendimento e a possibilidade de alguém ser capaz de alcançá-lo passaram a servir de referência para a seleção daqueles que praticariam o esporte. (SOUZA et al, 2010, p.40-41).

O esporte vai se tornando mais e mais competição, isso se torna claro

com a consequente valorização das técnicas no esporte e na construção de

paradigmas de resultado, como aqui o autor descreve nas competições de

larga escala (olimpíadas, copas de futebol e outros) e no estabelecimento de

recordes como resultado de competições.

Entretanto, para a compreensão do esporte dos dias atuais, outras referências ainda são necessárias. Segundo Tubino

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(1992), a compreensão do fenômeno esportivo contemporâneo se relaciona ao seu uso como propaganda político-ideológica que tem como marco os Jogos Olímpicos de Berlim, em 1936. Além disso, a partir do fim da Segunda Guerra Mundial, o esporte se desenvolveu rumo à profissionalização, tendo como referência o processo de mercadorização que o transformou em produto e em vitrine. Entretanto, apesar de se transformar em mercadoria – e talvez por essa razão – e de fazer parte de uma indústria das mais importantes na economia de diversos países, dentre eles o Brasil, o esporte também passou a ser entendido como algo fundamental para a vida das pessoas, tanto para a sua vivência prática quanto para sua fruição e contemplação. (SOUZA et al, 2010, p.40-41).

O esporte foi rapidamente singularizado para o jeito brasileiro, acabou

sendo um importante meio de socialização e de ampliação de horizontes,

embora o fizesse inicialmente sem uma política governamental clara, um

enfoque construído pelo governo sobre o tema só virá depois da execução

concreta de um conjunto de atividades e competições que já cumpriam tal

função (PRONI, 1998).

Aqui em nosso país também é claro seu vínculo com a propaganda

política e ideológica. Um fato marcante em nosso país na Copa do Mundo de

futebol que ocorreu durante a ditadura militar brasileira e com vitória de nossa

seleção, utilizado largamente como propaganda do regime e do país.

3.1 O INÍCIO DO ENTRELAÇAMENTO ENTRE ESPORTE E EDUCAÇÃO

Como dissemos, na Idade Antiga, os Gregos já aferiam grande valor às

atividades físicas e práticas esportivas, não somente para a formação física,

mas também formação moral de seus cidadãos.

Foi na Grécia que surgiram os grandes pensadores, que contribuíram

com vários conceitos até hoje aceitos pela Educação Física e pela Pedagogia.

Grandes artistas e filósofos como Sócrates, Hipócrates, Platão e Aristóteles

criaram conceitos como o de equilíbrio entre corpo e espírito ou mente.

Também nasceram na Grécia os termos halteres, atleta, ginástica, pentatlo,

entre outros.

Após a tomada militar da Grécia pelos romanos, Roma absorveu a

cultura desta civilização, porém a Educação Física se caracterizou pelo espírito

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prático e utilitário, tendo assim uma visão voltada para a preparação dos

soldados e da população para a guerra (PRONI, 1998).

Na sequência, a Idade Média foi marcada pelo impacto do Cristianismo,

repleta de ascetismo. Mesmo com isso, estudantes continuavam a seguir as

teorias de Aristóteles, enriquecendo o patrimônio dos conhecimentos (Idem).

Nesta época, floresceu a arte gótica2, surgiram as primeiras

universidades, e com elas personalidades como São Tomás de Aquino.

Considerada como “a Idade das Trevas”, o culto ao corpo era tido pecado e

com isso houve uma grande decadência da Educação Física (KORSAKAS; DE

ROSE JUNIOR, 2002).

Os exercícios físicos ficaram circunscritos aos torneios que eram muito

sangrentos. No Renascimento, a Educação Física deu um salto em busca do

seu próprio conhecimento. O período da Renascença viria a fazer crescer

novamente a cultura ligada ao físico (KORSAKAS; DE ROSE JUNIOR, 2002).

A admiração e dedicação pela beleza do corpo, antes proibida, agora

renasce com grandes artistas, como Leonardo da Vinci (1432-1519). A

escultura de estátuas e a dissecação de cadáveres fizeram surgir a anatomia,

grande passo para a Educação Física e a Medicina (KORSAKAS; DE ROSE

JUNIOR, 2002).

A introdução da Educação Física na escola, no mesmo nível das

disciplinas tidas como intelectuais, se deve nesse período a Vittorino da Feltre

(1378-1466), que em 1423, fundou a escola “La Casa Giocosa” onde o

conteúdo programático incluía os exercícios físicos. (PEREIRA; MOULIN, 2006,

p.19-20).

O Iluminismo na Inglaterra era contra o abuso do poder no campo social.

Esse período trouxe novas ideias e, como destaque nessa época, temos dois

grandes nomes: Rousseau e Pestalozzi. Rousseau propôs a Educação Física

como necessária à educação física infantil, introduzida nas escolas. Já

Pestalozzi foi o primeiro educador a chamar a atenção para dois elementos 2 A arte gótica desenvolveu-se na Europa na última fase da Idade Média (séculos XII e XIV), num período de profundas transformações em que se assistiu à superação da sociedade feudal e à formação de novos centros de poder: as primeiras monarquias, as grandes cidades, o clero, as classes novas e ricas dos comerciantes e dos banqueiros. Tem início uma economia fundamentada no comércio, fazendo com que o centro da vida social se desloque do campo para a cidade e apareça a burguesia urbana. Disponível em https://www.historiadasartes.com/nomundo/arte-medieval/arte-gotica/, acessado em 20/05/2016.

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fundamentais na prática dos exercícios: a posição e a execução perfeitas, sem

os quais os praticantes não conseguiriam os objetivos visados.

Nota-se que o entrelaçamento entre esporte e educação é percebido

pelo homem há muito tempo e embora a própria concepção de esporte venha

sofrendo alterações ao longo dos anos, este tema ainda é bem atual e o papel

do esporte para a educação tem recebido importantes contribuições práticas e

teóricas. Na obra do Centro de Memória da Juventude (CEMJ), fica claro o

contexto social, econômico e político em que o esporte passou a frequentar a

escola:

Além de descrever o legado da cultura corporal, falar de esporte moderno significa falar, entre outras coisas, do instrumental civilizador e funcional que se forjou ao longo do desenvolvimento do modelo capitalista-urbano-industrial, na Inglaterra dos séculos XVII a XX. Concomitante ao monopólio e ao controle da violência física pelos Estados Nacionais, o esporte moderno, antes passatempo da nobreza inglesa, torna-se conteúdo educacional fundamental para preparar crianças e jovens para a nova sociedade capitalista em construção. (CEMJ, 2007, p. 31)

O feudalismo transita para o capitalismo com mudanças na relação entre

as pessoas como também nas de poder, mudança da matriz produtiva e

ressignificação da sociedade e de sua relação intraclasse.

Tal momento histórico, com o fortalecimento das relações entre patrões

e empregados nas fábricas emergentes, a demanda educacional advinda da

edificação das cidades e a busca de socialização e novas práticas no novo

contexto foram componentes decisivos para o surgimento do esporte moderno

e a tomada de foco na busca de um potencial educacional no esporte.

Pelas características desse período (como concorrência característica

do mercado, necessidade de respeito a regras e de conseguir trabalhar de

maneira coletiva e organizada) veio à luz o potencial educacional do esporte,

realizando-se principalmente “[...] através de fatores como o conhecimento e o

respeito às regras, a necessidade de aprender a conviver com a vitória e a

derrota e o aspecto disciplinador da violência e de comportamentos públicos

considerados inadequados” .(CEMJ 2007, p. 31).

Assim, o potencial educador do esporte tinha grande valia para o

sistema social em curso, pois a divisão social do trabalho e seus métodos de

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produção tinha no esporte o instrumento capaz de “treinar” as pessoas para as

novas necessidades do mundo do trabalho, ou seja, pessoas preparadas para

suportar longas jornadas de trabalho.

Aqui passamos a tratar das nuances do período, fatores que propiciaram

a massificação do esporte e a educação pelo mesmo. Disso tratam as obras

utilizadas em nossa pesquisa, em particular Tubino (2006), CEMJ (2007),

Borges e Buonicore (2007) e Elias (1993).

Como vimos, a massificação do esporte tinha um papel importante a

cumprir e o ambiente dessa massificação foi justamente as escolas publicas

inglesas do final do século XIX.

Dessa forma o esporte passou por um processo de proliferação para

outras camadas sociais. Apesar do aspecto socioeconômico dessa

massificação, ela ocorreu também com objetivos nobres. O responsável por ter

iniciado a utilização dos jogos populares ingleses em uma perspectiva

pedagógica foi Thomas Arnold.

Ele foi o pioneiro em reconhecer o esporte como meio de educação,

enfatizando a influencia dos jogos na promoção da lealdade, cooperação e

iniciativa. Além disso, a prática esportiva levada à escola cumpriu papel no

controle de doenças e na valorização e circulação na sociedade de conceitos

de higiene e saúde pública.

3.2 POPULAR E MASSIFICADO: ASSIM SURGE O ESPORTE MODERNO

O esporte nem sempre existiu com as características que o conhecemos

nos dias atuais. Para fazer essa reflexão, basta lembrarmos que vários clubes

de futebol que completaram seu centenário nesta década, portanto surgiram no

início do século XIX.

Dessa época para cá, não só o futebol e o esporte mudaram assim

como o Brasil e o mundo mudou. Dessa forma, o esporte, entendido como

expressão cultural da sociedade, vai se modificando à medida que se

modificam a organização social, política, cultural e econômica da sociedade.

Neste contexto, “[...] a Educação Física, o Esporte Moderno e o lazer

são frutos do processo de construção dos Estados Nacionais e dos direitos

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individuais, tanto na Europa quanto nas Américas, incluindo-se o Brasil”.

(CEMJ, 2007, p.27).

A partir do desenvolvimento da modernidade, que ocasionou

urbanização em medidas geométricas e significativas mudanças no processo

produtivo, foi-se necessário preparar os indivíduos para que pudessem superar

novos desafios. Assim, buscavam-se indivíduos:

Capazes de cuidar do próprio corpo, incorporando, além dos valores morais e éticos da razão, noções e competências em saúde, higiene e controle das pulsões violentas e da sexualidade, impulsionando assim o chamado Processo Civilizador. Buscava-se dessa forma preparar as pessoas para a produção, evitando doenças e amenizando os efeitos do cansaço oriundo dos movimentos repetitivos e das longas jornadas de trabalho. (CEMJ, 2007, p. 29).

Portanto o esporte cumpriu importante papel no sentido de influenciar

valores comportamentais, principalmente a partir da intensificação da

industrialização, que fez com que as pessoas passassem a viver em

conglomerados urbanos. A partir do meio do século XIX o esporte se difundiu

por toda a Europa, chegando em um segundo momento na Ásia e Américas.

Essa difusão aconteceu primeiramente conservando os valores da

aristocracia inglesa, para depois se popularizar e se profissionalizar. Um

exemplo que ilustra este fato foi a excursão de clubes de futebol da Inglaterra

entre o final do século XIX e o início do século XX.

Há um processo de popularização do esporte, em particular através do

futebol, marca do século XIX e XX.

Paralelamente a tudo isso, o esporte moderno tornou-se uma grande possibilidade de lazer e entretenimento para a população que passou a aglomerar-se nas grandes cidades em um processo contínuo de alteração do modelo rural para o urbano, movimento que atravessou os séculos XIX e XX. (CEMJ, 2007, p. 29).

Assim, o formato menos rígido e mais agradável ao praticante foi um

fator importante para a massificação e a adoção do esporte moderno. Dessa

forma, o esporte saiu dos domínios da nobreza inglesa, para ganhar o mundo,

se massificar e se popularizar. (PRONI, 1998).

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3.3 O ESPORTE COMO DIREITO DE TODOS E SUA DIMENSÃO

EDUCACIONAL

As práticas esportivas no sistema educacional nascem do período do

assim chamado esporte moderno. Apesar da massificação, a única dimensão

conhecida até então era a do esporte de rendimento.

Sobre isso, Tubino (2006) escreve que “[...] o Esporte de Desempenho

era, na verdade, o esporte que existia no mundo. Existia apenas a Recreação

fora disso. Todas as práticas esportivas, inclusive na escola, eram reproduções

simples do Esporte de Desempenho ou de rendimento” (TUBINO, 2006, p.5).

Tal concepção participa dos primeiros passos de atividades esportivas

vinculadas a educação e ao sistema educacional, a busca de uma rede

esportiva, apoiada inicialmente muito em competições e jogos no âmbito

estudantil.

Esse contexto influenciou decisivamente a implantação, em nosso país, das atividades esportivas ligadas ao sistema educacional – incluindo jogos e competições estudantis. Isso aconteceu durante os anos de chumbo do regime militar, quando o esporte passa a ganhar ênfase no meio educacional (BORGES; BUONICORE, 2007, p.20).

Ainda segundo Tubino (2006), seguindo o debate sobre as práticas

esportivas segue o diálogo do debate acerca do tema:

A educação voltada ao tecnicismo também se referenciava no esporte de alto nível. Evidente que já existiam competições escolares, mas foi a partir da década de 1960 que o Estado passou a priorizar a formação e os resultados esportivos de alto rendimento, considerando a escola o lócus desse processo. Também não há dúvida de que esse “despertar” para o esporte de rendimento no país está relacionado ao contexto internacional do esporte, que já era “palco” da Guerra Fria entre capitalismo e socialismo, e que os governos do ocidente e do leste europeu buscavam talentos e resultados esportivos para evidenciar supremacias ideológicas. Os governos dos países que não eram líderes no capitalismo e socialismo, por influência, passaram a buscar no esporte oportunidades de propaganda e publicidade de suas gestões. (TUBINO, 2006, p.7).

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Esse debate mostra o primeiro momento no Brasil com a vitória na

Copa, já citada por nós, e pelo investimento no resultado nos jogos de tipo

internacional. A virada desse tipo de política se dá com a edificação de

programas para além da busca do resultado de alto rendimento.

Há uma importante mudança de paradigma, na saída da busca do

resultado da equipe ou do individuo rumo a edificação de um esporte como

direito amplo de todos, um esporte pensado e constituído internacionalmente

em outra perspectiva.

As relações do Esporte com a Educação até 1985 foram muito tímidas, pois as competições esportivas escolares neste período limitaram-se a reproduzir o esporte de rendimento. A causa principal desta linha adotada no Esporte Escolar deve-se em muito ao apelo sistemático por medalhas e campeões (talentos) e à atuação equivocada dos órgãos públicos do Esporte (inclusive o MEC), que não relacionavam o esporte à educação, e sim a resultados (...). Apenas os discursos enalteciam os valores educativos do Esporte. (TUBINO, 2010, p.138).

Tubino (2010) nos mostra aqui o resultado desvinculado do processo

educativo, a competição na busca do estabelecimento de recordes e da

revelação de potenciais jovens com potenciais de disputa internacional, não há

de maneira sistemática o debate da inclusão aqui até o momento.

Em fins da década de 1970 começa a ganhar lugar uma reação crescente a esse modelo de prática esportiva. Essa reação teria seu ápice na célebre Carta Internacional de Educação Física e Esporte, lançada pela UNESCO em 1978. Após a publicação desse importante referencial, o esporte abandona o objetivo do rendimento como perspectiva única e passa ao paradigma do esporte como direito de todos. Com isso o esporte começava a ser compreendido no quadro dos direitos universais da pessoa humana, independente de estado físico, talento, sexo, faixa etária etc. Essa concepção avançada revolucionaria a prática esportiva e marcaria o surgimento do assim chamado Esporte Contemporâneo, que busca as formas pelas quais o direito ao esporte pode ser garantido para a população em geral. (BORGEs, BUONICORE, 2007, p.21).

A partir da Carta da UNESCO de 1978, o conceito de Esporte ganhou

uma nova abrangência social, e o direito às práticas esportivas passou a ser

exercido sob as formas de Esporte-Educação, Esporte-Lazer e Esporte de

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Desempenho. (TUBINO, 2010, p.36). Detalhando os aspectos do esporte-

educação, o autor prossegue:

Considerando definitivamente o Direito ao Esporte para Todos, a manifestação Esporte-Educação deve ser dividida em Esporte Educacional e Esporte Escolar. O Esporte Educacional, para todos, e independente de vocação, no sentido de favorecer as ações educativas que as práticas esportivas oferecem (respeitar as regras, aprender a ganhar e perder, recuperar-se após as derrotas, perceber o sentido de equipe etc.), apoiado pelos princípios socioeducativos (inclusão, participação, cooperação, corresponsabilidade, coeducação e outros). O Esporte Escolar aceita as vocações esportivas (possíveis talentos) e é destinado à utilização nas competições externas intercolegiais, nas quais os princípios soberanos são o Princípio do Desenvolvimento Esportivo e o Princípio do Desenvolvimento do Espírito Esportivo. No Esporte-Educação (Esporte Educacional e Esporte Escolar), o sentido será sempre o da formação, e a cidadania estará efetivamente na referência principal. (TUBINO, 2010, p.69).

A partir desses conceitos passamos a aprofundar o debate do esporte

considerando as peculiaridades brasileiras, inclusive das leis do país e das

características singulares de seu povo.

No Brasil, a Constituição Federal de 1988 foi o marco para a afirmação

do esporte como direito social. A Carta Magna brasileira menciona a existência

de atividades esportivas formais e não-formais e de caráter amador e

profissional. O grande avanço na chamada constituição cidadã é considerar a

prática esportiva como direito de todos e fator de promoção do bem-estar

social.

Aproximadamente dez anos depois do lançamento da Carta do Esporte

e da Educação Física da UNESCO, chegaram ao país os fundamentos que

passaram a nortear o esporte mundial.

Esses fundamentos influenciaram não só a constituição brasileira, mas

outras leis. O artigo 217 da constituição prevê “[...] a destinação de recursos

públicos para a promoção prioritária do desporto educacional e, em casos

específicos, para a do desporto de alto rendimento”. Porém, o artigo não trata

dos conceitos de esporte educacional e a Lei 9615/98, chamada Lei Pelé,

acaba regulamentando o artigo 217 e tratando das definições.

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Atualmente o conceito de esporte educacional constante na Lei Pelé é

definido por aquele que é

[...] praticado nos sistemas de ensino e em formas assistemáticas de educação, evitando-se a seletividade, a hipercompetitividade de seus praticantes, com a finalidade de alcançar o desenvolvimento integral do indivíduo e a sua formação para o exercício da cidadania e a prática do lazer. (BRASIL, 1998).

Essa definição representa um importante avanço, porém já não é

consenso na comunidade esportiva brasileira. Assim, a política setorial do

esporte educacional defende que é preciso ampliar esse conceito que, “[...] por

refletir determinações históricas, oculta o caráter de manifestação cultural do

esporte e impede a distinção de prioridades” - Política Setorial do Esporte

Educacional (BRASIL, 2005, p.6).

A Política Nacional do Esporte (PNE) propõe mudanças na legislação

vigente. Essa opinião é ressaltada nas resoluções da II Conferência Nacional

do Esporte que colocam a necessidade de:

[...] definir os diferentes conceitos das manifestações do Esporte que compõem o Sistema Nacional de Esporte e Lazer, coerentes com as orientações da Política Nacional do Esporte, que indica os limites dos conceitos em uso, e com a concepção do sistema que pretende construir – em encontro nacional próprio para essa finalidade (...), garantindo a representação e a participação popular e a representatividade de todos os estados da federação. Essa definição deve considerar o aparato legal existente, a Política Nacional do Esporte, o Relatório do I Fórum sobre o Sistema Nacional de Esporte e Lazer [...]. (BRASIL, 2005, p.12).

A III Conferência Nacional do Esporte, em seus documentos finais

aponta não só para a necessidade do desenvolvimento do Esporte

Educacional, mas também para a aprovação de Lei de reformulação do

Sistema Nacional do Esporte, apontando para a necessidade de adequar o

aparato normativo à realidade atual.

Sendo assim, concordamos com a afirmação de Oliveira e Perim (2009)

que segue e mostra a relevância da legislação. Deve ser entendida como mais

do que meramente o texto burocrático, principalmente como um processo de

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reconhecimento de direitos sociais e de legitimação da prática esportiva pela

nação.

Considerar o lazer e o esporte como direito social não é apenas uma questão legislativa, uma vez que implica demandas para sua legitimação não somente para o Estado, mas também para os sujeitos. Cabe ao Estado gerir políticas públicas contemplando ações ativas e efetivas de modo a garanti-las a sujeitos, que, por sua vez, precisam compreender o significado delas. Tornar-se um sujeito de direito é ter consciência da importância desses fenômenos na vida de cada um e também da coletividade, de modo a reivindica-los como se faz em relação à educação, saúde, moradia, segurança, dentre outros. Se o lazer e o esporte são direitos sociais, devemos lutar para que eles existam, de fato, na vida de todos, caso contrário, continuarão sendo um privilégio dos poucos que possuem os bens econômicos, culturais e educacionais para acessá-los. (SOUZA et al, 2010, p. 28).

A partir das informações e da história que o esporte perseguiu até aqui

passamos agora à nossa fundamentação teórica para enfrentar o problema de

pesquisa por nós proposto em nossa dissertação.

3.4 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Partimos aqui do debate da educação vinculado ao corpo, presente em

Elias (1980; 1992; 1993; 1994; 2000), o corpo, tão inexplorado anteriormente

na lógica do rompimento com as limitações sociais, da expressão dos desejos

e na revelação das personalidades de cada um, passa a ser revelado nos

programas sociais do governo federal, em particular no PST:

A civilização é efeito do recalque dos homens sobre as pulsões, o corpo, a necessidade e o desejo. Por mais discretas que sejam, a inscrição das regras sociais nos sujeitos produz mudanças na personalidade, nas manifestações pulsionais e nos desejos de cada um. Afirma Elias: "A estrutura da personalidade do indivíduo como um todo, necessária e constantemente muda com o código social de comportamento e a estrutura da sociedade". (ELIAS, 1993, p.189).

Dito isto, acreditamos que o PST colabora e funciona como um

instrumento educacional, como uma prática que constrói o aumento da

liberdade corporal e educa o homem numa nova perspectiva, contida nas

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diretivas do programa que aqui analisaremos, em consonância, inclusive, com

o debate feito na Política Nacional de Esporte do Brasil:

A PNE considera que esporte é condição essencial para o desenvolvimento humano, frequentemente negado, principalmente, às camadas de baixa renda. Nessa perspectiva, o esporte educacional deve ser compreendido para além da sua forma institucionalizada, ou seja, como toda forma de atividade física que contribua para a aptidão física, o bem-estar mental, a interação, a inclusão social e o exercício da cidadania. Consequentemente, assume como elementos indissociáveis de seu propósito pedagógico as atividades de lazer, recreação, práticas esportivas sistemáticas e/ou assistemáticas. Modalidades esportivas e jogos ou práticas corporais lúdicas da cultura brasileira, de formas a possibilitar ampla vivência e formação humana e de cidadania, sobretudo de crianças, adolescentes e jovens. (OLIVEIRA, 2009, p.9).

O esporte é um tema presente na obre de Elias e Dunning (1992) em

vários momentos, de grande relevância, em particular quando o relaciona com

o corpo e com os momentos, nos chama atenção o que faz na obra A Busca da

Excitação:

O esporte pode então ser utilizado como uma espécie de “laboratório natural” para a exploração de propriedades das relações sociais, pois a competição e a cooperação, o conflito e a harmonia, que parecem ser, segundo a lógica e os valores correntes, alternativas que se excluem mutuamente, mas que neste contexto, no que se refere à estrutura intrínseca do desporto, possuem uma interdependência evidente e muito complexa. (ELIAS; DUNNING, 1992, p.18-19)

Parece para nós que a afirmação de Elias e Dunning (1992) cabe como

uma luva ao debate que aqui propomos. Em particular, quando discutimos a

questão das relações sociais dadas no contexto do esporte, uma análise que

cabe ser realizada nos núcleos do Programa Segundo Tempo como espaço

propício a isso.

O esporte colabora no rompimento de uma rotina pesada, muda e

amplia perspectivas na visão eliasiana relacionadas ao contexto social

cotidiano. Dificultando a expressão dos sentimentos, os esportes dialogariam

na busca do novo no campo das sensações e do equilíbrio dos demais

aspectos do homem:

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A sociedade no seu processo civilizatório apresenta um campo de ação limitado quanto à conduta e expressividade de seus sentimentos, favorecendo o aparecimento da rotina na execução de diversas atividades sociais e profissionais. Esta mesma sociedade em oposição a essa rotina e stress desenvolve inúmeras atividades de lazer gerando novas sensações e tensões na busca pelo equilíbrio de suas ações. (ELIAS; DUNNING, 1992, p. 73).

Elias trata antes do descontrole das emoções, da quebra do formato das

cidades estabelecidas, para depois abordar o controle. Esse estaria ligada as

possibilidades da liberdade oferecida pela sensação de excitação, inclusive no

aspecto da sensação de fazer parte de uma equipe ou de vencer uma

competição:

Muitas dessas ocupações de lazer, entre os quais o desporto nas suas formas de prática ou de espetáculo, são consideradas como meios de produzir um descontrole de emoções agradável e controlado. Com frequência elas oferecem (embora nem sempre) tensões miméticas agradáveis que conduzem a uma excitação crescente e a um clímax de sentimentos de êxtase, com ajuda dos quais a tensão pode ser resolvida com facilidade, como no caso de sua equipa vencer uma prova desportiva. (ELIAS; DUNNING, 1992, p.73).

O autor aprofunda mais ainda o destaque do esporte ligado a tensão a

liberação do sentimento poder fluir mais, para isso é chave a atividade

esportiva, em particular coletiva. Isso quebra um contexto, amplia as

possibilidades:

O desporto, tal como outras atividades de lazer no seu quadro específico, pode evocar através dos seus desígnios, um tipo especial de tensão, um excitamento agradável e, assim, autorizar os sentimentos a fluírem mais livremente. Pode contribuir para perder, talvez para libertar, tensões provenientes do stress. O quadro do desporto, como o de muitas outras atividades de lazer, destina-se a movimentar, a estimular as emoções, a evocar tensões sob a forma de uma excitação controlada e bem equilibrada, sem riscos e tensões habitualmente relacionadas com o excitamento de outras situações da vida, uma excitação mimética que pode ser apreciada e que pode ter um efeito libertador, catártico, mesmo se a ressonância emocional ligada ao desígnio imaginário contiver, como habitualmente acontece, elementos de

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ansiedade, medo – ou desespero. (ELIAS; DUNNING,1992, p. 79).

No rumo do controle das emoções, da ampliação dos horizontes da

relação ser humano, seu corpo e seu comportamento, propomos analisar o

programa na ideia de que o mesmo pode ser um instrumento de inclusão, de

apresentação de novos parâmetros para aqueles que se constituem como seu

público-alvo.

O convívio com os outros, esse debate do coletivo formado por

indivíduos distintos somados movimenta a teoria eliasiana e reforça nosso

debate nesta dissertação: “Toda sociedade humana consiste em indivíduos

distintos e todo indivíduo humano só se humaniza ao aprender a agir, falar,

sentir no convívio com os outros” (ELIAS, 1993, p.67).

Sendo assim, ali temos o educando e o educador, a figura do que ensina

e do que aprende, para além do ambiente formal da sala de aula e do formato

professor e aluno tradicional.

Acreditamos que o Programa Segundo Tempo se insere na concepção

de educação para além dos muros da escola defendida por Brandão (2000)

quando discute os limites da educação escolar.

Mas também de uma educação para além do formal, que não busca a

mente dissociada do corpo, ao contrário, se apoia no segundo para ampliar

conceitos e perspectivas do primeiro a partir de conceitos e práticas esportivas

correlacionadas com a educação.

Compreendemos, a partir de Elias (1980; 1992; 1993; 1994; 2000), que

a forma como os sujeitos se comportam em sociedade é fortemente

influenciada pelas relações que estes sujeitos estabelecem uns com os outros,

com a sociedade na qual estão inseridos e com os mecanismos que eles

dispõem para controlar as suas emoções e impulsos mais instintivos, tudo isso

relacionado também com o meio físico, que se desenvolveu num processo

histórico e social.

Uma vez entendido que todas as sociedades constroem seus padrões

de comportamento através de um imbricado jogo de inter-relacionamento dos

seus sujeitos entre si, entre estes e o processo social e histórico da sua

sociedade, e entre as condições do espaço onde eles se situaram para se

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desenvolver, partimos para a construção do nosso trabalho a partir do

referencial teórico eliasiano.

Para analisar os dados e informações que coletamos o quadro teórico

que compomos partirá da teoria eliasiana do processo civilizador, que procura

entender os padrões de comportamento dos indivíduos e sociedades através

de um processo social e histórico.

Todos os indivíduos e sociedades forjam seus padrões de

comportamento sendo submetidos a “[...] instrumentos diretos de

‘condicionamento’ ou ‘modelagem’, de adaptação do indivíduo a esses modos

de comportamento que a estrutura e situação da sociedade onde vive tornam

necessários” (ELIAS, 1994, p.95). Isso implica dizer que, segundo Elias, todos

os indivíduos ocupam uma função que foi criada socialmente e que dela

depende o funcionamento da ordem social.

Até os famintos e sem tetos são produtos e componentes da ordem oculta que subjaz à confusão. Cada um dos passantes, em algum lugar, em algum momento, tem uma função, uma propriedade ou um trabalho específico, algum tipo de tarefa para os outros, ou uma função perdida, bens perdidos e um emprego perdido. (ELIAS, 1993, p.21).

Partindo de Elias, compreendemos que a estrutura social sobre as quais

os indivíduos e agrupamentos humanos são induzidos a se desenvolver

contribuem, sobre maneira, no padrão de comportamento desses indivíduos e

agrupamentos humanos.

Portanto, buscamos nesta pesquisa refletir acerca da estrutura social

presente na sociedade em que se aplica o Programa Segundo Tempo, para

criar o seu modo de ser e estar em sociedade, considerando que é a partir da

estrutura social em que vivem que os indivíduos selecionam seus valores e

desejos.

Conceitos como "indivíduo" e "sociedade" não dizem respeito a dois objetos que existiriam separadamente, mas a aspectos diferentes, embora inseparáveis, dos mesmos seres humanos, e que ambos os aspectos (e os seres humanos em geral) habitualmente participam de um processo de transformação estrutural. (ELIAS, 1993, p.220),

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É preciso considerar ainda que nenhum indivíduo, por mais astuto e

criativo que seja, e por maior que seja o seu acesso às oportunidades que

possibilitam o seu desenvolvimento, ele nunca estará completamente livre e

desconectado das influências do meio social em que vive:

Assim, cada pessoa singular está realmente presa; está presa por viver em permanente dependência funcional de outras; ela é um elo nas cadeias que ligam outras pessoas, assim como todas as demais, direta ou indiretamente, são elos nas cadeias que as prendem. (...) E é essa rede de funções que as pessoas desempenham umas em relação a outras, a ela e nada mais, que chamamos "sociedade". Ela representa um tipo especial de esfera. Suas estruturas são o que denominamos "estruturas sociais". (ELIAS, 1994, p. 23)

Destacamos aqui que, com relação à formação da personalidade dos

indivíduos e posição social, “[...] o que advém de sua constituição característica

depende da estrutura da sociedade em que ele cresce. Seu destino, como quer

que venha a ser revelado em seus pormenores, é, grosso modo, especifico de

cada sociedade” . (ELIAS, 1993, p.28).

Por outro lado, é preciso considerar que em nosso atual estágio

civilizacional, impera um alto grau de individualismo, onde foi construído a

percepção de que indivíduos e sociedades são algo distintos, e que os sujeitos

para conseguirem sucesso nos seus projetos pessoais e profissional

necessitam vencer uma barreira comum a todos que vivem em sociedade,

barreira esta que nada mais é do que a própria sociedade.

O abismo e o intenso conflito que as pessoas altamente individualizadas de nosso estágio de civilização sentem dentro de si são projetados no mundo por sua consciência. Em seu reflexo teórico, eles aparecem como um abismo existencial e um eterno conflito entre indivíduos e sociedade. (ELIAS, 1993, p. 32).

Programas como o Segundo Tempo colaboram na edificação das

práticas coletivas, na construção da melhor relação entre o homem e o meio

em que vive e, por fim, na construção de um processo educacional amplo na

busca da libertação do corpo e formação da mente.

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Partindo do entendimento de que o indivíduo cresce a partir de uma rede

de pessoas que existia antes dele para uma rede de pessoas que ele ajuda a

formar (ELIAS, 1993, p.35), as relações de solidariedade presentes em

programas de formação e construção esportiva e educacional são

indispensáveis no processo de crescimento dos seres humanos, reforçando a

função e força do poder público quando se propõe a fazer ações desse tipo

junto a parcelas largas da população.

Uma das condições fundamentais da existência humana é a presença

simultânea de diversas pessoas inter-relacionadas (ELIAS, 1993, p.27), e é

através destas inter-relações que os indivíduos estão constantemente

desenvolvendo e adquirindo novos valores e formando sua personalidade, ao

mesmo tempo que vão configurando a estrutura da sociedade na qual estão

inseridos.

Isso cabe no debate feito por nós a partir do Programa Segundo Tempo

enquanto uma iniciativa que possui carga de mudança social:

De modo geral, o Programa Segundo Tempo tem a responsabilidade social de servir como um espaço em que se possibilitem tais exercícios sociais, pois advoga a inclusão, a participação e a responsabilidade como metas a serem atingidas pelas suas ações. (OLIVEIRA, 2009, p.232).

O Programa Segundo Tempo é uma importante interface entre valores e

propostas sociais de forma e fundo esportivo e pedagógico ligada a

transmissão destes junto a extrato da população atendida pelo mesmo:

Todo processo de ensino-aprendizagem é constituído das relações que se estabelecem entre professor-aluno no ato de educar. Portanto, quando se ensina o esporte também se ensina pelo esporte. Isto é, no esporte, duas perspectivas pedagógicas complementam-se entre si: a) Ensinar o esporte – como proceder ao ensinar os esportes, qual a abordagem metodológica para se ensinar o esporte propriamente dito e, paralelamente, quando se ensina o esporte, ensinar mais do que o esporte. b) Ensinar pelo esporte – o esporte como meio para o desenvolvimento de competências, comportamentos, atitudes e valores. Quando se ensinam esportes, ensina-se também pelo esporte. O processo pedagógico se constitui em uma avenida de mão dupla, na qual ensinando pelo esporte se relaciona o

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conhecimento do esporte de forma crítica e reflexiva com os aspectos inerentes ao desenvolvimento da cidadania. A construção da cidadania só é possível a media que o professor relaciona, em suas práxis, ambas as formas de abordagem. (OLIVEIRA, 2009, p.163-164).

Esse processo de interação presente em Programas como o Segundo

Tempo, da construção da relação com o lazer e com a prática esportiva ligada

ao processo educacional em uma perspectiva mudancista nos indivíduos

norteia o nosso debate:

Para compreender a complexidade do processo ensino-aprendizagem do fenômeno esporte (pelas interações dos processos cognitivos, das habilidades, da tática, dos aspectos de interação social, de comportamentos, atitudes, valores), faz-se necessário aceitar que o iniciante necessita alcançar um mínimo de compreensão da lógica do jogo que se quer ensinar. Inexperiente, o aluno não tem uma clara compreensão da dinâmica do jogo, o que compromete sobremaneira sua efetiva participação. (OLIVEIRA, 2009, p.168).

Iniciativas como o PST se inserem na visão de Elias (1993) quando trata

que não podemos abordar o homem apenas pelo aspecto das ideias, que os

impulsos, sentimentos e aspectos físicos e seu respectivo controle são

fundamentais para a plena compreensão do homem:

[...] todas as investigações que consideram apenas a consciência do homem, sua "razão" ou "ideias", ignorando ao mesmo tempo a estrutura das pulsões, a direção e a forma de emoções e impulsos humanos, só podem ser, por princípio, um valor bastante limitado. Uma parte enorme do que é indispensável para compreender o homem escapa desse enfoque. A racionalização da atividade intelectual, bem como de todas as mudanças estruturais nas funções do ego e do superego, de todos esses níveis interdependentes da personalidade do homem, serão muito pouco acessíveis ao pensamento, enquanto as indagações se limitarem a mudanças nos aspectos intelectuais, a mudanças de ideias, e pouca atenção se der ao equilíbrio e padrão mutáveis das relações entre pulsões e sentimentos, por um lado, e o controle dos mesmos, por outro. (ELIAS, 1993, p. 236).

Em particular ao formar no sentido oposto ao individualismo

contemporâneo tão em voga e na ampliação das possibilidades da relação

entre o indivíduo e o corpo, e entre estes e o meio, mediado pela educação.

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O nosso atual estágio civilizacional e o padrão de racionalidade dele

resultante nos leva a pensar que somos os únicos responsáveis pela realidade

em que vivemos e que depende única e exclusivamente de nossas vontades e

iniciativas a transformação da realidade.

Da mesma forma que somos levados a acreditar que nossa

personalidade e individualidade são forjadas isentas de influências externas. “A

ideia de que pessoas ‘estranhas’ possam ser parte integrante da formação de

sua individualidade parece, hoje em dia, quase uma transgressão dos direitos

do sujeito sobre si mesmo” . (ELIAS, 1993, p.53).

Contudo, quanto mais desenvolvida a sociedade, tanto mais torna-se os

indivíduos interdependentes uns dos outros e é nesse jogo de

interdependência que se constitui o padrão de comportamento dos

agrupamentos humanos.

Ainda há nos dias de hoje uma disputa e separação entre indivíduos e

entre os indivíduos e a sociedade, gerando o desenvolvimento desequilibrado

entre a identidade-eu e a identidade-nós de cada indivíduo, que acaba por

produzir uma sociedade de conflitos, uma vez que, conforme nos diz Elias, “[...]

a sociedade, como sabemos, somos todos nós; é uma porção de pessoas

juntas” (ELIAS, 1993, p.13), trabalhando para a produção do todo social.

Na perspectiva adotada pelo Programa Segundo Tempo, ao possibilitar

momentos de interação e interdependência entre as pessoas o mesmo

colabora para o rompimento com o individualismo e o aprimoramento do

diálogo:

Ao seguirmos as recomendações dos professores Darido e Oliveira (2009) e iniciarmos e encerrarmos as aulas com os participantes dispostos em uma roda, criamos as condições favoráveis para que haja trocas de informações, confrontos de ideias e diálogos, para que se apresente e se discuta o que será ou o que foi vivenciado, para que se possa reconhecer os erros, os acertos e o que poderá ser utilizado em novas experiências e em novos desafios a serem vencidos. Deste modo, garantimos a participação ativa dos nossos alunos e ampliamos nossos conhecimentos sobre eles. Sim, porque quando explicitam suas opiniões também fornecem pistas acerca de sua visão de mundo e da cultura na qual estão inseridos. (OLIVEIRA, 2013, p.25).

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Dito isto, ele permite que os atores com quem a ação dialoga possam

interagir com outras realidades, culturas e valores, o que acaba por fornecer

um maior número de opções para que essas crianças, adolescentes e jovens

possam melhor desenvolver a sua personalidade.

Do mesmo modo, as ideias, convicções, afetos, necessidades e traços de caráter produzem-se no indivíduo mediante a interação com os outros, como coisas que compõem seu “eu” mais pessoal e nas quais se expressa, justamente por essas razões, a rede de relações de que ele emergiu e na qual penetra. E dessa maneira esse eu, essa “essência” pessoal, forma-se no entrelaçamento continuo de necessidades, num desejo e realização constante, numa alternância de dar e receber. (ELIAS, 1993, p.36).

O caráter educacional é apresentado na ação prática do Programa

materializando as diretrizes propostas e construindo um processo pedagógico

vinculado ao esporte, com potencial de transformação dos atores e de sua

percepção e interação com sua realidade.

Na sequência vinculamos o debate geral que fazemos acerca da teoria

eliasiana aos conceitos mais específicos e detalhados da sociogênese e da

psicogênese que aplicamos em nossa pesquisa.

3.5 A SOCIOGÊNESE E PSICOGÊNESE ELIASIANA

Esta seção tem como foco a psicogênese e a sociogênese para Elias e a

sua relação com a educação na construção do processo civilizatório. Os dois

termos, psicogênese e sociogênese, se referem a processos que ocorrem de

modo recíproco dentro dos processos históricos de longa duração.

Psicogênese e sociogênese vão se relacionar com as mudanças no

comportamento dos indivíduos, vão se moldando e se modificando de acordo

com a alteração dos fatos históricos e sociais, que acontecem no interior das

sociedades, são parte destacada das teorias desenvolvidas por Elias.

A teoria dos processos de civilização proposta por Elias, baseia-se na defesa de que, toda e qualquer transformação ocorrida na estrutura da personalidade do ser individual (psicogênese), produz uma série de transformações na estrutura social em que o indivíduo está inserido. Da mesma

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maneira, as diversas transformações que ocorrem constantemente nas estruturas das sociedades (sociogênese), especialmente nas relações sociais, produzem alterações nas estruturas de personalidades dos seres individuais que a compõem. (BRANDÃO, 2000, p.10-11).

A relevância dos estudos de Elias3 está na sua busca pela compreensão

do que o autor denominou processo civilizador e, consequentemente, na

tentativa de entender os problemas sociais como desdobramentos de uma

relação de interdependência entre o individuo e a sociedade.

De acordo com o que fora retratado por Gebara, Elias “[...] tem ajudado

os sociólogos brasileiros a avançar em relação a Marx inclusive incorporando

sua contribuição e por outro lado, evitando Foucault”.

Sendo assim, segundo o mesmo, estaria colaborando para “[...] evitar a

metafísica, mantendo-se uma perspectiva científica” (DUNNING, apud

GEBARA, 2005, p.78). Esse pensamento sobre a obra de Elias, em comum

com o pensado por Gebara, apoia-se no fato de que, se para os marxistas o

trabalho é a base fundamental para a compreensão dos fenômenos sociais e

históricos para Elias, como o próprio Gebara relata a visão é mais ampla, “se

além de produzir seus meios de subsistência, o homem não se defender, ele se

torna também caça alimento” (Idem).

Ou seja, para muito além das relações de produção, o homem vive em

teias de interdependência, e estas estão permanentemente em processo de

mudanças, rearticulando relações de poder entre os indivíduos e a sociedade.

De acordo com Gebara (2005), Eric Dunning ficou fascinado desde o

princípio pelas sínteses de Elias nas aproximações dos objetos. Em particular

pelo fato de estar procurando fazer “[...] um grande e tenaz esforço para

construir os fundamentos de uma síntese: de um lado, entre a Sociologia, a

Psicologia e a História; e de outro entre as ideias centrais de Comte, Marx,

Weber, Simmel, Mannheim e Freud”. (DUNNING, apud GEBARA, 2005, p.82).

O problema da civilização é tema central que motivava Elias em sua

larga produção acadêmica. No entanto, é fundamental registramos o fato de

que o fenômeno da civilização – objeto de investigação trabalhado

sistematicamente por Elias, recebeu certa influência de Alfred Weber – irmão

3 Op. cit.

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mais jovem de Max Weber - “[...] com quem Elias foi estudar sociologia em

Heidelberg entre 1925 e 1930” (WAIZBORT, 1997, p.29).

Desde pelo menos o início da década de 1920, “[...] todos os esforços de

A. Weber estavam centrados na análise da ‘civilização’"; o que significava, para

ele, “[...] compreender nada menos do que o ‘processo da civilização’, que

seria, justamente, objeto da sociologia”. (WAIZBORT, 1997, p.37).

Elias, como já assinala o título de seu livro, estava próximo dessas

ideias. O diferencial, no entanto, é apresentado no subtítulo. Nele aparece sua

originalidade: “investigações psicogenéticas e sociogenéticas”. Lido sob essa

perspectiva, o fenômeno ganha indubitavelmente contornos absolutamente

novos.

É justamente por essa perspectiva que a teoria dos processos

civilizadores colabora no caminho de entendermos como e por que as práticas

do esporte e do lazer se apresentam como questão relevante para a

compreensão das relações sociais.

Sendo assim, como descreve Elias e Dunning (1992), no prefácio da

obra "A Busca da Excitação", escrita em conjunto com Elias,

[...] o esporte pode ser utilizado como uma espécie de “laboratório natural” para a exploração de propriedades das relações sociais, como, por exemplo, a competição e a cooperação, o conflito e a harmonia, que parecem ser, segundo a lógica e os valores correntes, alternativas que se excluem mutuamente, mas que, neste contexto, no que se refere à estrutura intrínseca do esporte, possuem uma interdependência evidente e muito complexa. (ELIAS; DUNNING, 1992, p.18-19).

E isso é o que demonstram nitidamente os trabalhos incluídos no volume

citado acima, pois, trata-se de uma teoria que “permite avaliar o significado

social do esporte e que, nessa linha, se esforça, entre outras coisas, por

estabelecer os fundamentos da teoria sociológica das emoções” (ELIAS;

DUNNING, 1992, p.19).

Elias estava preocupado com as estruturas e mecanismos de regulação

e do controle dos afetos/impulsos, com a formação social do superego. Suas

análises abordam, principalmente, o processo da passagem dos mecanismos

de coação exteriores para mecanismos interiores, isso se dá em uma espécie

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de internalização de padrões de conduta, uma disciplinarização das emoções e

de si próprio.

Sendo assim, a psicogênese estaria relacionada ao desenvolvimento,

mas sempre dentro da perspectiva de longa duração, e das estruturas da

personalidade humana e as suas respectivas transformações do

comportamento.

A escolha dos materiais de análise é um dado bastante relevante no

trabalho de Elias. Ao preparar seu trabalho sobre a sociedade da corte, Elias

dialoga e se apoia nos manuais de etiqueta, com a regulação dos modos de se

comportar que esses continham.

Para tanto, ao estudar o processo civilizacional, ele utiliza um material

pouco convencional, e algumas vezes até inusitado, para apontar os

mecanismos de coação e auto-coação como, por exemplo, o uso dos talheres,

as restrições a cuspir, os hábitos higiênicos, etc.

Mas, principalmente nas investigações psicogenéticas, Elias demonstra

uma sensibilidade destacada e uma percepção muito atenta para os

microfenômenos. O resultado dessa percepção é uma conjugação original

entre as perspectivas micro e macrossociológicas em sua obra.

A sociogênese, por conseguinte, responde pelo desenvolvimento, mas

via de regra na perspectiva do longo prazo, das estruturas sociais. Elias, fruto

de uma época em ebulição, estava também preocupado com as

transformações da sociedade.

Há ainda, na maneira eliasiana de analisar, uma relação mútua de

dependência entre sociogênese e psicogênese. Estes seriam aspectos

interdependentes do mesmo desenvolvimento de longo prazo.

Construiu em seu trabalho a relação do processo da civilização com o

processo de formação e consolidação do Estado moderno. Um estudo que em

sua obra é visto como um processo, contínuo, porém de avanços e

retrocessos, e que caminha, destacadamente, rumo à centralização e à

monopolização do território, do uso da violência e do direito a cobrança de

impostos. O que implica, por conseguinte, num crescente grau de dependência

e funcionalização, coordenação, regulação e integração do conjunto dos

processos sociais.

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O autor se pauta nessas duas dimensões, sociogênese e psicogênese, e

em suas transformações do comportamento e das estruturas da personalidade,

e uma teoria da formação do Estado, enquanto teoria do desenvolvimento

social, aonde ambas em processo de interdependência e entrelaça, portanto, a

psicogênese do individuo com a sociogênese do Estado.

Os homens, nesta quadra, só aparecem enquanto pluralidade, e em

processo de configuração. Dessa forma, cabe a sociologia estudar este

processo, as configurações, ou seja, o todo, considerado enquanto processo, e

resultante das infinitas interdependências que se tecem sem para entre os

indivíduos. De acordo com Elias.

Não podemos imaginar uma pessoa isolada e absolutamente sozinha num mundo que é, e sempre foi, desligado dos outros. A imagem do homem que necessitamos para o estudo da sociologia não pode ser a da pessoa singular, do Homo Sociologicus. Tem que ser antes a de pessoas no plural; temos obviamente que começar com a imagem de uma multidão de pessoas, cada uma delas constituindo um processo aberto e interdependente. (ELIAS, 1980, p.132).

As configurações são, por consequência, modelos que nos permitem

pensar os processos sociais de longa duração enquanto mudanças estruturais

das configurações que vários homens interdependentes formam entre si.

O conceito de configurações nos serve, portanto de “[...] simples

instrumento conceitual que tem em vista afrouxar o constrangimento social de

falarmos e pensarmos como se o ‘individuo’ e a ‘sociedade’ fossem

antagônicos e diferentes” (ELIAS, 1980, p.141).

O conceito de configurações ou, teias de interdependência, ajuda a

entender o conceito eliasiano sobre a psicogênese e sociogênese, e também o

processo de interdependência entre ambos. Na verdade, são conceitos que se

interpenetram e complementam um ao outro todo o tempo.

O entendimento pleno desses conceitos fundamentais da teoria eliasiana

ajuda a entender o porquê de Elias (1993) demonstrar preocupação com as

mudanças do comportamento e com a estrutura da personalidade humana.

Para ele, essas mudanças são produtos de regulamentação e do

controle dos impulsos, o que culminaria em uma disciplinarização das

emoções. Não bastando, Elias também nos revela a crescente força dos

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mecanismos de controle ao nos mostrar que o controle tanto atua de fora para

dentro, controle exercido pelas estruturas sociais, como também e,

principalmente, a partir de dentro, controle exercido pelas estruturas sociais,

como também e, principalmente, a partir de dentro, um tipo de internalização

das formas de conduta.

Consequentemente, “[...] as transformações da consciência tanto são

históricas, no sentido de que sociedades inteiras passaram ou ainda passam

por elas atualmente, quanto pessoais, no sentido de que toda criança as

atravessa ao crescer”. (ELIAS, 1994, p.99-100).

Na teoria eliasiana, como se pode observar, também os conceitos se

encontram em processo de interdependência. A sociedade, para Elias (1994), é

o conjunto (em processo de coexistência e, de forma alguma edificante) aonde

indivíduo se encontra frente a um abismo intransponível.

Para ele: “[...] toda sociedade humana consiste em indivíduos distintos e

todo indivíduo humano só se humaniza ao aprender a agir, falar e sentir no

convívio com outros” (ELIAS, 1994, p.67). A sociedade sem o indivíduo ou o

indivíduo sem a sociedade é um absurdo na visão eliasiana.

Esses são para nós os conceitos-chave para se compreender os

estudos realizados sob a luz da teoria eliasiana. Sendo assim, ao se

acompanhar o processo civilizador e suas consequências, outros conceitos –

também de grande importância e, também interconectados, vão surgindo. O

mesmo acontece ao se verificar os estudos sobre as medidas criadas como

tentativa de restabelecer o equilíbrio para os problemas consequentes do

processo de civilização.

Para o estudo que aqui se realiza esses dois aspectos do processo

civilizador são de fundamental importância: o primeiro, porque vai mostrar que

o processo civilizador resulta não apenas em fatores positivos, mas também

em problemas, dos quais deveriam necessidades; o segundo, porque vai tratar

justamente dos mecanismos criados para o suprimento de tais necessidades, a

exemplo dos programas sociais, dentre os quais o estudado nesta pesquisa.

Dentre as consequências geradas pelo processo de civilização, a

individualização é um significativo ponto de partida para ingressar em seus

estudos. A individualização, de acordo com o conceito emprestado de Elias, diz

respeito ao isolamento do individuo ou, melhor dizendo, ao sentimento de

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isolamento, de estar essencialmente só – sentimento que se generaliza na

sociedade.

Para destacar essa individualização, Elias (1994) faz uso do termo

“estátuas pensantes”. Com essa narrativa alegórica ele se aproveita de um

determinado conjunto de elementos para evocar, por comparação, realidades

de ordem superior.

De acordo com Elias, a espécie de consciência a que essa parábola se

refere “certamente não é coisa do passado” (ELIAS, 1994, p.97). Para Elias,

O sentimento que ela expressa, do indivíduo que se sente especialmente só, a sensação de existir em isolamento, em oposição ao “mundo externo” das pessoas e das coisas, e de ser, “internamente”, algo para sempre separado do que existe “do lado de fora”, talvez até se encontre com frequência bem superior nas sociedades ocidentais de hoje do que em qualquer época do passado, mesmo na era da filosofia europeia clássica, poucos séculos atrás. (ELIAS, 1994, p.97).

A individualização, portanto, estaria muito mais ligada ao sentimento de

não pertencimento, e até mesmo estranheza para com aquilo que se vivencia,

fato fundamental em nosso estudo em que o Programa Segundo Tempo

colabora de maneira basilar na busca do pertencimento e na construção da

coletividade dialogada entre os participantes no mesmo.

O tipo de vida para o qual caminham as sociedades se revelou muito

intenso, veloz em todos os aspectos e também bastante impessoal. No

caminho dessa conclusão podemos também creditar a responsabilidade pelo

sentimento de insegurança que se acumula entre os indivíduos das sociedades

modernas, pois muitos dos laços que existiam em sociedades menos

desenvolvidas não mais são visíveis nesta época.

Algumas nuances acerca da psicogênese dos processos civilizatórios de

Elias (1993) estão explicitadas nos dois volumes do livro O Processo

Civilizador. Nestas obras, ele tem como essencial preocupação construir uma

teoria partindo da base dos dados empíricos apresentados no primeiro volume

e na primeira parte do segundo volume.

Dos dois volumes d’ O Processo Civilizador, tentando entender, a partir

de um modelo teórico, como se desenvolve no curso da história humana o

autor chamou a isso de processo civilizador e analisou como este processo

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muda o desenvolvimento do aparelho psíquico humano.

Analisamos aqui como o pensamento de Elias (1993) pode permitir

pensar a educação escolarizada ou com proposta de educar através da prática

esportiva, como propõe o Programa Segundo Tempo, a partir da teoria dos

processos civilizadores.

Destacamos a importância da escola como agência de modelação do

comportamento das pessoas e que vai ser bastante difundida no ocidente a

partir do século XVII, juntamente com a consolidação dos estados nacionais e

passa a ser responsável por funções que em outros períodos históricos coube

a família e a outras instituições da sociedade.

Mesmo Elias (1993) tendo escrito muitas obras, sobre vários temas, no

entanto, a educação não se encontra entre estes. Isto aparentemente pode ser

uma dificuldade, mas pode ser um desafio ao utilizar as teorias desenvolvidas

pelo autor como uma ferramenta teórica que possa ajudar-nos a compreender

o fenômeno educativo.

Segundo Brandão (2000) a ligação entre a Psicogênese e a

Sociogênese aparece em diversas obras de Elias, mas principalmente com

maior destaque no livro "O Processo Civilizador".

Ali se trata da relação entre duas dimensões: as transformações do

comportamento humano e das estruturas de personalidade dos indivíduos (a

psicogênese) e uma teoria do desenvolvimento social, do desenvolvimento do

estado e das nações (a sociogênese).

Brandão (2000) defende que para Elias (1992), a sociedade é a maior

expressão do conceito de figuração, ficando nítido que dentro desta grande

figuração encontramos figurações menores, mais precisas, a exemplo dos

conceitos de classe e das relações sociais entre grupos.

Também ressaltamos os aspectos em que Elias vai afirmar neste

conceito que os seres humanos não são unidades autônomas ou

independentes, ou seja, indivíduos, mas sim seres humanos que precisam um

dos outros, dependentes e ligados reciprocamente de modo bastante distintos

(BRANDÃO, 2000).

O conceito da interdependência que Elias propõe se refere ao conceito

de sociedade na medida em que este relaciona, em que cada indivíduo “é

tributário desde a infância de uma multidão de indivíduos interdependentes”

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que se relacionam de maneira intencional ou não intencional.

Sendo assim, a tarefa da sociologia configuracional seria entender de

que maneira e por quais razões os homens se unem entre si e formam grupos

dinâmicos e específicos em seu conjunto. Brandão (2000) afirma ainda que as

relações de interdependência têm duas características que devem ser

ressaltadas: quando estas são intencionais elas podem apresentar

consequências não intencionais, não planejadas, visto que o cruzamento de

ações de muitas pessoas emerge resultados que ninguém planejou.

Já a segunda característica é que dessas relações de interdependência

intencionais podem ter sido originadas de relações de interdependência

humanas não intencionais, cabe isso ao analisarmos programas como o

Segundo Tempo, uma interdependência que muda no decorrer do antes e da

aplicabilidade do PST.

Os conceitos da relação de interdependência e de figuração somente

podem ser entendidos a partir da discussão que Elias (2000) faz da teoria da

história, quando a analisa em relação quanto a sua direção inicialmente pré-

determinada.

Assim, Brandão (2000) passa a discutir a teoria da história utilizada por

Elias, se colocando contrário a duas correntes de análise histórica: “estatismo”

histórico e o relativismo histórico.

Para Elias (2000, p.88), o relativismo histórico é visto como método de

análise histórica, que vê somente a mudança constante, sem conseguir

alcançar a ordem subjacente a esta transformação e as leis que governam a

estrutura histórica e por “estatismo” histórico como método de análise histórica

que tende a descrever todos os movimentos históricos como algo estacionário

e sem evolução. Em contraposição a estas duas posições, Elias aponta uma

terceira que busca revelar a ordem subjacente às mudanças históricas, sua

mecânica e mecanismos concretos (BRANDÃO, 2000, p.88).

Sendo assim, a opção de Elias é pela utilização do método histórico da

longa duração. E adiante Brandão cita o próprio Elias ao afirmar que “[...]

algumas transformações sociais só acontecem – quando acontecem – após um

desenvolvimento que abarque várias gerações” (Idem, p.89).

A sociogênese é outro conceito fundante da teoria dos processos de

civilização de Elias, esta estabelece correspondência recíproca ao conceito de

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psicogênese, estão profundamente imbricadas.

Dito de outra forma, a sociogênese aborda as transformações sociais

que vão refletir nas estruturas psicológicas dos indivíduos, de forma que

modifiquem e influenciem as mesmas, isso em diálogo constante com as

transformações que se dão no campo psíquico como causa ou consequência

disso.

Segundo Brandão (2000), para dar destaque a estas relações, Elias vai

usar como exemplo a formação dos Estados Nacionais europeus a partir de

uma abordagem que vai considerar o percurso tomado por estas sociedades a

partir da sociedade guerreira, passando pela sociedade Feudal, sociedade de

Corte e sociedade Burguesa.

É nessa análise que ele vai procurar demonstrar as correlações entre as

transformações sociais que ocorrem nesses agrupamentos e as alterações na

estrutura psicológica dos indivíduos dessas mesmas sociedades analisadas.

Somente quando as sociedades conseguem atingir um razoável grau de pacificação interna, a partir do estancamento do que Elias chama de forças centrifugas, é que os contornos, daquilo que mais à frente será chamado de Estado nacional, começam a se delinear. Grosso modo, sem que isto signifique a eleição de uma causa inicial, Elias considera que a progressiva troca de práticas econômicas, de uma economia de troca para uma economia monetária, foi um dos principais elementos que, gradualmente, permitiu a formação dos primeiros exércitos nacionais, os quais, ao garantirem a consolidação de territórios, contribuíram para que houvesse períodos, cada vez maiores de relativa paz. (BRANDÃO, 2000, p.161).

Com a formação dos exércitos nacionais nestes contextos, o soberano

passa a estabelecer dois tipos de monopólio, o monopólio do uso da violência

física e o monopólio da tributação dos impostos, aumenta a robustez do

Estado.

Assim, o Estado passa a centralizar estas duas ações e ao mesmo

tempo garante os recursos econômicos e financeiros, bem como também

permite a pacificação interna da nação, para a sua própria sobrevivência

enquanto Estado.

Estes fatores somados a muitos outros vão permitir, segundo Elias

(1993), a constituição dos Estados europeus com características cada vez mais

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complexas, modernas e intrincadas.

Um aspecto relevante que deve se dar destaque é que a pacificação

interna das sociedades pressiona os indivíduos a que convivam pacificamente,

e esta pressão atua na transformação das suas maneiras de agir, sobre o seu

comportamento, criando o que Elias vai chamar de controle social.

Cabe aqui analisar as experiências de programas como o Segundo

Tempo a luz do controle social proposto por Elias em sua obra, se há ou não a

modelação dos seus usuários na perspectiva de aceitação, na busca de moldar

a partir do processo de se auto vigiar.

Para Brandão, analisando as teorias de Elias:

A partir desse controle social, o código de conduta, ou padrão de comportamento, das pessoas, é alterado lentamente, aumentando a necessidade de vigiar o seu próprio comportamento e modelando sua conduta através de controles mais elaborados e sutis. Essa necessidade em policiar o próprio comportamento é o controle das emoções, o qual se transforma, assumindo uma nova forma, em autocontrole, quando já está internalizado na pessoa. (BRANDÃO, 2000, p.171).

Brandão (2000) destaca ainda que, a partir de uma visão retroativa e

prospectiva das consequências do seu comportamento, isso levará a um

sentimento de previdência, ou seja, os indivíduos vão ter que se controlarem os

seus impulsos emocionais em função dos desdobramentos dos seus próprios

comportamentos, apontando para “uma mudança civilizadora do

comportamento”. (BRANDÃO, 2000).

Nesta direção, é importante dizer que o nível de controle das emoções

vai crescendo à medida que as sociedades vão evoluindo (embora Elias não

trate as transformações das sociedades necessariamente como um processo

de evolução, como aprofundaremos a seguir).

Na sociedade guerreira este controle era mais baixo que na sociedade

de corte feudal, pelo nível de pacificação deste momento histórico, fato singular

que o diferencia com profundidade do resto da história.

Assim como desta para a sociedade burguesa, embora saibamos que

Elias não dá um caráter evolucionista ao processo civilizatório, visto que vamos

encontrar em muitos momentos históricos vamos encontrar processos de

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descivilização:

Enquanto modificação da estrutura da personalidade dos indivíduos, o aumento no nível de controle dos impulsos individuais pode ser explicitado pelo controle exercido pelo Estado sobre o individuo, através de suas leis, ou também, pelo controle exercido por outros indivíduos dentro do convívio social, ou ainda, o controle exercido pelo próprio individuo sobre si mesmo, o chamado autocontrole. O processo de instalação e de desenvolvimento do autocontrole nos indivíduos acompanha as transformações ocorridas no desenvolvimento das sociedades. Um dos motivos apontados por Elias para o aumento do autocontrole foi à pressão da competição pelas diversas funções sociais. Na medida em que a sociedade se diferenciava, aumentava o número de funções sociais e o grau de dependência entre as pessoas, fazendo com que estas, cada vez mais, pautassem a sua conduta e seus hábitos em relações às outras. (BRANDÃO, 2000, p.173).

O processo do controle da conduta dos indivíduos se torna cada vez

mais induzido, ocorrendo desde os primeiros anos de vida, na própria infância,

de uma maneira irresistível na sociedade.

Neste processo parte de ações conscientes de autocontrole passam a

ser internalizadas de maneira inconsciente, automática. Esta mudança na

estrutura da personalidade dos indivíduos vai se constituindo como

característica de personalidades que passam a ser característicos de um

momento histórico determinado.

Tal processo modelará o comportamento das pessoas a partir de vários

elementos que citamos anteriormente, elementos sociais que vão modificar

comportamentos dos indivíduos em um nível psicológico.

Discutindo os indivíduos analisamos a mudança dos hábitos sócias a

partir de Elias também, abordando a aproximação das teorias das

transformações dos hábitos sociais e os desdobramentos que estas causam à

vida moderna. É possível dizermos que o entendimento dos fenômenos

vinculados as necessidades sociais e humanas passam pelo entendimento do

próprio processo civilizador.

Nosso estudo, que trata de aspectos vinculados ao comportamento ou

interesse humano, foi construído levando em consideração a sua interação

com a totalidade que constitui e é constituída pelo ser humano.

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Nessa nossa pesquisa passamos pela análise de alguns procedimentos

apontados por Elias. Estes se constituem nas maneiras de se evitar a

compartimentalização daquilo que para ser compreendido devidamente é

preciso ter sido estudado em seu contexto complexo.

O autor entende que para estudar as várias manifestações dos seres

humanos é preciso fazê-lo no bojo da relação entre a sociogênese e a

psicogênese. A preocupação de Elias está no estudo global dos seres humanos

como um todo, se afastando dos aspectos particulares.

[...] permanece sem reconhecimento o fato de que uma psicologia social histórica, um estudo simultaneamente psicogenético e sociogenético, é necessária para traçar as conexões entre todas essas diferentes manifestações dos seres humanos. Os que se interessam pela história da sociedade, como os que estudam a história da mente, encaram a “sociedade” e o mundo das “ideias” como duas formações diferentes que pode haver sentido em separar. (ELIAS, 1993, p. 234-235).

De acordo com Elias (1993), é como se historiadores e psicólogos

achassem que fossem a elaboração de ideias e pensamentos fora da

sociedade. E, não obstante, “[...] simplesmente discutem qual desses dois

reinos é mais ‘importante’, dizendo uns que são as ideias, sem a sociedade,

que põem esta última em movimento, e outros que é uma sociedade sem

ideias que deflagra as ideias”. (ELIAS, 1993, p.234-235).

A maneira que Elias executa sua organização teórica e metodológica

além de contribuir profundamente para este estudo, clareia quais os caminhos

e cuidados que ora tomamos em nosso trabalho.

Elias dá prioridade muito mais a síntese do que à análise e esforça-se

para

[...] evitar a compartimentalização das pessoas e das sociedades humanas segundo categorias como “econômico”, “político” e “social” – como se “o econômico” e “o político” não fizessem parte, de algum modo, da “sociedade” – ou “biológico”, “psicológico” e “sociológico” – como se as pessoas pudessem existir sem corpos, como se seus “espíritos” fossem de alguma maneira fenômenos não físicos ou biológicos, ou como se as “sociedades” pudessem existir, de certa forma, independentemente e separadas do homem e da mulher individuais que as constituem. (ELIAS; DUNNING. 1992, p.21).

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Nossa perspectiva aqui pensada para este estudo trata do fortalecimento

das atividades físicas com um olhar que leve em conta os fenômenos

biológicos, psicológicos e sociológicos relacionados ao desenvolvimento ao

longo do processo civilizador de determinadas necessidades, clareadas em

programas como o Segundo Tempo, um potencializador da sistematização da

busca por esses resultados no corpo e na formação do seu assistido através de

suas orientações pedagógicas e psicológicas.

Elias destaca em sua obra a importância da “psicologia social histórica”

para a superação da compartimentalização na formação do corpo, algo

bastante presente no PST.

Contudo, de acordo com Elias, a sociologia a situação é um importante

instrumento de análise que se junta a história. Tal fato, porém, só se verifica na

medida em que esta chega a se interessar por problemas históricos e aceita

“[...] sem reservas a linha divisória traçada pelo historiador entre a estrutura

aparentemente imutável do homem e suas diferentes manifestações” Elias

(1993, p.234).

Este, o caminho aqui adotado, porém tem que se passar pela

transposição da frágil barreira da ressignificação de conceitos, que obscurece e

distorce a compreensão da própria vida em sociedade.

Esta referida ressignificação “é um encorajamento constante a ideia de

que a sociedade é constituída por estruturas exteriores aos indivíduos. Ao

mesmo tempo são rodeados pela sociedade e separados dela por uma barreira

invisível (ELIAS, 1980).

Nesta quadra é necessário que se tenha clara a relação mútua entre a

sociogênese e a psicogênese, aspectos interdependentes do mesmo processo

de longo prazo. O objetivo implícito, ou até mesmo explicito, nas teorizações de

Elias é a contribuição para o desenvolvimento de uma síntese mais adequada

ao objeto, com base tanto na teoria quanto na observação, e para um retrato

das pessoas e da sociedade em que estas possam ser descritas como

realmente são e não como se supões que sejam. Ou seja, o aperfeiçoamento

de um método que seja adequado ao estudo da integração natural do nível

humano-social.

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Tal integração no nível-humano e social é por nós compreendida na

mediação aqui executada pelo Programa Segundo Tempo enquanto política

pública de esporte, mas com componentes pedagógicos em sua aplicação

constante.

Aqui se entende a relação do processo de longo prazo eliasiano

presentes na sociogênese e na psicogênese, ferramentas fundamentais

quando discutimos a sociedade em que o PST está inserido:

Ao se considerar os resultados esperados com a implantação dos núcleos do Programa Segundo Tempo, os impactos diretos desejados para seus participantes são a interação com sua realidade local e a melhoria da autoestima, das capacidades e habilidades motoras, das condições de saúde e do aumento do número de envolvidos com as atividades esportivas educacionais. Espera-se ainda, a melhoria da qualificação de professores e estagiários de Educação Física, Pedagogia ou Esporte envolvidos. Como impacto indireto, espera-se que a implantação dos núcleos gere a diminuição no enfrentamento de riscos sociais pelos participantes; a melhoria no rendimento escolar dos sujeitos envolvidos e, consequentemente, a diminuição da evasão escolar; a geração de novos empregos no setor de educação física e de esporte nos locais de abrangência do Programa; além da melhoria da infraestrutura esportiva no sistema de ensino público do país e nas comunidades em geral. (MINISTÉRIO DO ESPORTE, apud SOUZA et al, 2010, p. 24).

As mudanças que a mesma acarreta e passa ao mesmo tempo e a

batalha para superar certo idealismo na visão do que as suposições sociais e

de sociedade apontam, tudo isso como parte da edificação de um processo

civilizador contemporâneo.

O caminho demonstrado por Elias (1993, p.225-235) ao analisar o

processo civilizador é o de levar em consideração o processo de

interdependência e a dinâmica imanente das configurações. Pois, diz o autor:

[...] todas as investigações que consideram apenas a consciência do homem, sua “razão” ou “ideias”, ignorando ao mesmo tempo a estrutura das pulsões, a direção e a forma de emoções e impulsos humanos, só podem ser, por princípio, um valor bastante limitado. Uma parte enorme do que é indispensável para compreender o homem escapa desse enfoque. A racionalização da atividade intelectual, bem como de todas as mudanças estruturais nas funções do ego e do

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superego, de todos esses níveis interdependentes da personalidade do homem, serão muito pouco acessíveis ao pensamento, enquanto as indagações se limitarem as mudanças nos aspectos intelectuais, a mudanças de ideias, e pouca atenção se der ao equilíbrio e padrão mutáveis das relações entre pulsões e sentimentos, por um lado, e o controle dos mesmos, por outro. (ELIAS, 1993, p. 236).

Amparados nas ideias eliasianas aqui debatidas, consolida-se a

constatação de que para uma aproximação da compreensão do significado das

atividades de lazer (a exemplo do Programa Segundo Tempo) e,

principalmente, das atividades físicas em geral, é necessário muito mais do que

um estudo compartimentalizado.

É preciso levar-se em conta tanto as mudanças dos padrões de

comportamento social e relações sócio-humanas ao longo dos tempos quanto

apurar as consequências dessas mudanças: a direção e a forma das emoções

e impulsos humanos.

Sendo assim, aqui apresentamos dados sobre os problemas

civilizacionais, que, proporcionalmente a sua evolução, impuseram

transformações no comportamento humano/social rumo ao controle cada vez

maior sobre as formas de conduta.

Levantamos o debate se o PST se insere aqui, para nós sim, influenciou

e influência na construção da conduta, inclusive no afastamento da

marginalidade de parcela considerável da população, firmando-se como

alternativa sistematizada politica e pedagogicamente as deficiências sociais

presentes no mundo atual, podendo ser visto como um instrumento

potencializador de inclusão social e educacional:

Sobre o objetivo do Programa Segundo Tempo, que trata da diminuição da exposição aos riscos sociais, como as drogas, a prostituição, a gravidez precoce, a criminalidade e o trabalho infantil, que estão presentes, também, como impacto indireto esperado, foi questionado o que os beneficiados estariam fazendo se não estivessem participando das atividades do Programa. Em resposta a essa questão, 45,1% afirmaram que estariam brincando, 32,3% disseram que estariam sem fazer nada naquele momento, 10,4% utilizariam esse tempo para estudar e 7,3% afirmaram que estariam trabalhando. Com base nesses dados é possível verificar que a maioria dos beneficiados estaria ocupada em outras atividades (inclusive trabalhando) e que 32,3% estariam ociosos e, por

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consequência, mais expostos aos riscos acima citados. (SOUZA et al, 2010, p.131).

A teoria de Elias nos demonstra que, primeiramente por mecanismos de

coação exteriores, depois por mecanismos interiores, a evolução das

sociedades acarretou em uma internalização de padrões de conduta e em uma

disciplinarização crescente das emoções, a exemplo do que o PST pode

cumprir de papel.

O estudo desse controle e de suas consequências nas sociedades

contemporâneas pode ampliar o foco para aspectos ligados também ao

habitus, à própria rotina nas sociedades modernas e aos seus

desdobramentos.

Esses desdobramentos – a evolução civilizacional – mostraram uma

capacidade muito grande em tecer teias nas quais as pessoas se veem cada

vez mais comprometidas com atividades de caráter sério e de grande carga de

tensão.

Sendo assim, apoiado em Elias passamos a discutir o significado do

lazer. Para tanto entendemos estas atividades de lazer surgindo e evoluindo

amparadas por uma função implícita de equilíbrio entre esse tipo de tensão e

tensões prazerosas.

Citamos a seguir a articulação com o lazer vista por Oliveira (2009) no

PST para ajudar a ilustrar o debate que ora fazemos:

O pressuposto é simples e direto: as ações do Programa Segundo Tempo estão relacionadas ao lazer, já que se constituem fundamentalmente em uma possibilidade de intervenção no tempo livre de nosso público-alvo (afinal, lembremos, atuamos no contraturno escolar e aos finais de semana). Nessa medida, os profissionais envolvidos podem também ser considerados e entendidos como profissionais de lazer, como animadores culturais. O reconhecimento dessas dimensões, as peculiaridades e os desafios que se impõem são fundamentais para melhor alcance de nossos objetivos, para que possamos dar um salto de qualidade na forma de conceber nosso trabalho e nossas responsabilidades sociais. (OLIVEIRA, 2009, p. 46).

Aqui buscamos demonstrar que a grande carga de rotina, de controle e

de stress, e a falta de possibilidade de viver situações de emoções fortes e de

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satisfação são responsáveis pela potencialização da sensação de vazio, de

insatisfação e pela geração de necessidades específicas para esta situação

que podem ser superadas a partir de iniciativas como o Programa Segundo

Tempo.

Se considerarmos que a busca pela satisfação das necessidades é uma

mola propulsora para a evolução das sociedades, fundamenta-se de forma

plausível a interpretação de que as atividades de lazer evoluíram, e se

modificaram e/ou foram reestruturadas em função de seu papel frente as

necessidades humano-sociais.

Neste aspecto apresenta-se a visão de que elas se desenvolveram de

forma a satisfazer as mais diferentes facetas das necessidades geradas pela

vida em sociedade, aqui se inserem os programas sociais governamentais

mais diversos, embora só analisaremos o que nos propomos desde o começo:

o PST.

As transformações ocorridas no processo civilizacional resultaram não

apenas nos aspectos positivos – esta realidade é incontestável – mas também

em aspectos negativos, problemas com os quais as sociedades modernas

passaram a ter que conviver, como, por exemplo, o afastamento da natureza,

níveis bastante elevados de pressão, ritmos de vida estressantes, agitados,

corridos e também rotineiros.

A análise desse processo evolutivo dos aspectos negativos causados

pelo processo civilizacional, juntamente com o entendimento da função das

atividades de lazer para as sociedades de hoje nos permitem o reconhecimento

da condição indispensável das atividades físicas para que se satisfaça as

necessidades geradas por nossos mais diversos problemas.

Então analisemos, homens, mulheres e adolescentes que, na grande

maioria das vezes, enquadrados em um sistema social que determina

comportamentos e direciona as suas atitudes para eventual enquadramento,

podem ser identificados como modelos de uma vida ativa e sedentária, ao

mesmo tempo.

Dito de outra forma, o fato é que esse tipo de atividade de coletivização

esportiva sistematizada pelo PST desenvolvida dentro de segmentos sociais

específicos destaca-se porque é destinada as pessoas que vivem uma vida

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rotineira, com poucas oportunidades para atividades relativa destreza física,

pautadas em emoções e em meio a realização coletiva.

O Professor Oliveira nos apresenta o debate da ampliação dos

horizontes a partir de esporte no PST e a busca do programa como um

instrumento da construção do apreço pela prática esportiva e sua realização

coletiva:

No Programa Segundo Tempo propõe-se que os participantes aprendam mais do que esportes: aprendam a gostar de esportes. Para isso, inicia-se o processo de ensino-aprendizagem com a aprendizagem tática, integram-se jogos e brincadeiras populares e, paralelamente, complementam-se essas atividades com o processo de aprendizagem motora, ou seja, jogos e exercícios para desenvolver as capacidades coordenativas e as habilidades técnicas. (OLIVEIRA, 2009, p.199).

O Programa busca sempre se reciclar, se readaptar e moldar, coloca-se

sempre como algo surpreendente para seus assistidos, ao menos essa é a

expressão vista nas aulas.

As aulas do Programa Segundo Tempo devem ser diversificadas tanto quanto possível, ou seja, o aluno não pode chegar e achar que sempre haverá o mesmo jogo, a mesma atividade, sempre no mesmo espaço e com os mesmos materiais. Isso pode tornar a prática repetitiva e motivar apenas o grupo mais habilidoso e os que apreciam os “rachões”. Na verdade, aulas repetidas podem aumentar as chances de evasão dos participantes do Programa. A diversificação favorece a inclusão e autonomia dos alunos, dois aspectos fundamentais do Programa Segundo Tempo. A inclusão é facilitada, pois, à medida que há diversificação de práticas, há mais chance de identificação dos alunos com alguma atividade. (OLIVEIRA, 2009, p.220).

Essas pessoas estão, normalmente, habituadas ao conforto e a

segurança presentes na rotina estressante advinda do trabalho, raramente com

acesso a atividades físicas, muito menos sistemáticas, cotidianas e

acompanhadas.

O PST tem potencial para romper barreiras, não ser apenas um mero

adestrador ou um instrumento de inclusão na elite esportiva de competição,

como o esporte brasileiro já o foi, como afirma Oliveira:

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Um ponto de destaque nessa nova significação atribuída aos programas de esporte educacional de forma geral, e especificamente no Programa Segundo Tempo, é que a área ultrapassa a ideia única de estar voltada apenas para o ensino do gesto motor correto. Muito mais que isso, cabe ao professor problematizar, interpretar, relacionar, desenvolver com seus alunos as amplas manifestações da cultura corporal de tal forma que os alunos compreendam os sentidos e significados impregnados nessas práticas corporais. (OLIVEIRA, 2009, p.230).

A grande virada, segundo Oliveira (2009), é justamente o rompimento

com o processo de ensino repetitivo, se é que se pode chamar de ensino, na

busca do resultado e não da relação do corpo com a mente e com a sociedade.

Assim, o papel do Programa Segundo Tempo ultrapassa o ensinar esporte, ginástica, dança, jogos, atividades, rítmicas, expressivas e conhecimento sobre o próprio corpo para todos, em seus fundamentos e técnicas (dimensão procedimental). Inclui, ainda, os valores subjacentes, ou seja, quais atitudes os alunos devem ter nas e para as atividades corporais (dimensão atitudinal). Finalmente, busca garantir o direito do aluno e saber por que ele está realizando este ou aquele movimento, isto é, quais conceitos estão ligados àqueles procedimentos (dimensão conceitual). Dentro dessa concepção, acredita-se na necessidade da adoção de diferentes princípios metodológicos como inclusão e responsabilidade. (OLIVEIRA, 2009, p.230-231).

Aqui nos parece clara a necessidade da articulação com a educação, a

interface com a metodologia e com o ensino na busca de resultados para além

de medalhas e prêmios, há uma construção de processo que relaciona o

conceitual com o social.

O fato de se possibilitar que todos atuem e se sintam participes do processo disponibilizado pode contribuir substancialmente na adesão, no envolvimento e até mesmo no avanço das ações, pois isso poderá facilitar o envolvimento afetivo com a ação. Essa condição é imprescindível, porque dela pode-se chegar à segunda, que é a corresponsabilidade. Essa segunda condição só será conseguida se os participantes se sentirem envolvidos afetivamente com as ações propostas. Do contrário, haverá apenas corpos participando de ações sem que essas possam provocar mudanças significativas no cotidiano dos alunos. (OLIVEIRA, 2009, p.231).

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A partir do afirmado, encerramos esse capítulo e seguimos para o

capítulo três, em que discutiremos a história do PST, a construção de sua

concepção e a formatação do Programa, incluindo as características

metodológicas e pedagógicas do mesmo.

O faremos a partir das discussões que foram realizadas em vários

grupos e ambientes acadêmicos, mediados pelo Ministério do Esporte, na

busca da edificação do novo Programa, em sintonia com o que solicitava o

então presidente da República, Luís Inácio Lula da Silva.

3.6 HISTÓRIA DO TEMPO PRESENTE COMO INSTRUMENTO DE ANÁLISE

DO ESPORTE

No campo historiográfico especificamente a denominação história do

tempo presente convive com outras denominações que têm no recorte

temporal da contemporaneidade a sua marca.

Entre essas denominações estão história imediata, história

contemporânea, história recente e história atual. Todas, mesmo não tendo o

mesmo significado exatamente, fazem do passado recente o objeto de estudo

do pesquisador e são expressões da opção por uma temporalidade repleta de

dificuldades para demarcar datas e estabelecer limites cronológicos precisos e

definidos, vivenciamos isso ao buscar delimitar a pesquisa que aqui

executamos em particular.

Isto se dá porque a história do tempo presente se dedica, na maior parte

das vezes, a pesquisar e analisar experiências históricas específicas,

espacialmente delimitadas e, portanto, pouco compatíveis com critérios

universais e abrangentes de definições cronológicas, dito isto definimos aqui

em nossa dissertação a delimitação da mesma, optamos por uma década de

Programa Segundo Tempo.

Além das dificuldades que a delimitação temporal apresenta, outras

questões também colaboram para uma significação própria do regime de

historicidade do tempo presente, que supõe a consideração teórica e

metodológica das seguintes variáveis que enfrentamos na execução de nosso

trabalho: campo constitutivo e temporalidade, memória e retenção do passado

e pluralidade de fontes e procedimentos metodológicos.

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O que diferencia a história do tempo presente das temáticas históricas

longitudinais, é a proximidade nossa enquanto pesquisador em relação aos

acontecimentos, pois somos praticamente contemporâneos de nosso objeto de

estudo.

A configuração da história do tempo presente está relacionada

inexoravelmente à dimensão temporal presencial. Algumas de suas

características definidoras decorrem dessa matriz nuclear.

Seria possível dizer que há um marco de início do tempo presente?

Como determinar o quanto as mudanças e o movimento da história interferem

em sua delimitação temporal? Quais elementos interferem na metodologia de

nossa pesquisa e na seleção das fontes que serão investigadas e produzidas?

Essas são questões que o pesquisador que discute o tempo presente

não pode desconsiderar, pois decorre destas peculiaridades a dificuldade para

definir critérios precisos para definir o que é um passado recente, daí nossa

opção pelo corte temporal aqui estudado.

Se a definição cronológica de tempo presente for geracional, o tempo

pode se alargar um pouco mais, pois pessoas de gerações diferentes convivem

na dinâmica da história e deixam sua marca nas relações sociais, culturais,

políticas e econômicas constitutivas do próprio processo histórico e do tempo

do seu viver, analisamos os impactos do Programa justamente nessa

perspectiva, olhando para o que o antecedeu no Governo Fernando Henrique e

a sua aplicação, bem como a relação das gerações ali envolvidas.

A orientação que talvez deva prevalecer na definição temporal do tempo

presente é a da presença ativa de sujeitos protagonistas ou testemunhos do

passado que possam oferecer seus relatos e narrativas como fontes históricas

a serem analisadas por historiadores, em nosso trabalho situada na análise dos

discursos dos alunos, monitores, professores e gestores de esporte do

Governo Federal a época.

Ou seja, a existência de uma social viva é fundamental para definição

dos recortes temporais e dos campos constitutivos da história do tempo

presente. Na verdade, o tempo presente refere-se a um passado atual ou em

permanente processo de atualização.

Está inscrito nas experiências analisadas e intervém nas projeções de

futuro elaboradas por sujeitos ou comunidades. Nesse sentido, o regime de

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historicidade do tempo presente é bastante peculiar e inclui diferentes

dimensões, tais como: processo histórico marcado por experiências ainda

vivas, com tensões e repercussões de curto prazo; sujeitos históricos ainda

vivos e ativos; produção de fontes históricas inseridas nos processos de

transformação em curso; temporalidade em curso próximo ou contíguo ao da

pesquisa, todos aplicáveis em nossa pesquisa sobre o PST.

As mudanças que aconteceram no mundo ao final do último milênio,

além de terem remodelado as relações de poder no plano internacional, de

redefinirem padrões de gestão da economia e de incluírem expressões de

multiplicidade sociais e culturais, também afetaram o campo do conhecimento.

Nas ciências humanas e sociais as transformações foram

avassaladoras. Desmontaram certezas e abalaram os paradigmas da

modernidade fundamentados na construção de conhecimentos de base

estruturalista, totalizante e cientificista.

Esses movimentos de transformação do mundo acoplados a outras

tensões da pós-modernidade vieram acompanhados de uma busca ansiosa por

referências sólidas que inclui, também, novas formas de apropriações e usos

do passado, daí o estudo da história do tempo presente, aplicado ao esporte,

inclusive.

Buscam-se, simultaneamente, dois tipos de esteios: de um lado,

fundamentos para as identidades coletivas que parecem se dissolver frente a

um mudancismo cotidiano, crescente e inexorável, o PST é parte desse

processo; de outro, bases para construção de conhecimentos renovados e

atualizados nas áreas das humanidades, aonde o nosso objeto de pesquisa

também figura.

A história também foi colhida pela profundidade dessa virada na

epistemologia e procura atualizar seus métodos e adotar novas abordagens

que, entre outras iniciativas, tomam a história do tempo presente como um

novo fazer histórico, mais complexo e desafiador.

O conceito de memória não se apresenta simples para nós e se

conforma por múltiplos significados, tais como: o estabelecimento de nexos

entre o presente e experiências vividas no passado; capacidade de conservar

ou reter ideias previamente adquiridas; construção simbólica e elaboração de

sentidos para o que passou; atualização do passado no eterno presente,

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processo ativo de registro e transmissão de lembranças e de retenção do

esquecimento. (DELGADO, 2010; FRANCO E LEVÍN, 2007).

Pensadores e pesquisadores têm se dedicado a estudar a memória,

identificando-a de diferentes formas. É entendida como uma dialética da

presença e da ausência, e da organização do esquecimento (RICOEUR, 2007).

E pode ser ainda um registro de experiências e vivências, plenas de significado

(BENJAMIN, 1985). Essa dinâmica complexa, em que história e memória se

alimentam e simultaneamente se diferenciam, tem ensejado um diálogo fértil da

história com diferentes áreas de conhecimento como psicologia social,

antropologia, sociologia e ciência política. (DELGADO, 2010).

No último quadrante do século XX, ideias e empreendimentos referentes

à utilização de diversificados suportes da memória, voltados à retenção do

passado, ganharam projeção significativa nas comunidades acadêmicas e

também em diferentes organizações sociais e políticas. São iniciativas voltadas

à construção de referências e de fundamentos de identidades coletivas e

mesmo individuais, como as que analisamos no Programa Segundo Tempo e

seus usuários.

Esses entendimentos demonstram que trabalhar com a memória, seja

no campo da psicologia individual seja em sua dimensão coletiva, o que inclui

sua relação com a história, não é tarefa simples.

Na esfera da relação memória/ História do tempo presente ao menos

duas questões fundamentais merecem ser destacadas: a primeira diz respeito

à temporalidade, pois tanto a memória como a história do tempo presente são

construções presentificadas e, portanto, passíveis de atualizações e revisões,

não temos dúvida disso no que diz respeito a nossa pesquisa, de seu

ineditismo por um lado, mas das necessidades das atualizações do outro, ao

ganhar distanciamento histórico e ter contato com outras pesquisas na mesma

área.

A segunda refere-se às dimensões pública e privada da memória, de seu

registro, e do tempo necessário à sua disponibilização ao público de

pesquisadores como nós. A memória é uma dimensão que se refere tanto ao

privado, ou seja, a processos e modalidades estritamente individuais e

subjetivos de vinculações com o passado, o presente e o futuro, como à

dimensão pública, coletiva e intersubjetiva (FRANCO e LEVÍN, 2007, p.40).

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A dimensão pública da memória pode ser também entendida como

direito de cidadania, analisar programas sociais se insere nesse contexto,

colabora no debate do pertencimento e da edificação da cidadania.

Mas, sem levar em conta as discussões e polêmicas em torno dos usos

da memória coletiva em sua relação ainda que tensa e complexa com a

História, a memória é “[...] fundamento da história da humanidade e das

histórias específicas, nacionais, étnicas, religiosas, educacionais, associativas,

entre outras. Transcende o intervalo da existência individual e possibilita ao ser

social reviver e redimensionar significados e experiências” (DELGADO, 2010,

p.61).

A memória, portanto, é plena de substância social, é esta memória de

nossos colaboradores e dos dados pesquisados que aqui buscamos acessar,

analisar e potencializar a nossa pesquisa.

Esta fornece à história e às ciências sociais matéria-prima para

fundamentação de conhecimentos e também de identidades coletivas ou

individuais, inclusive os referentes ao homem como ser histórico.

Não é leviano afirmar que, ao longo de um processo que durou ao

menos um século, foi construído um consenso fortemente sedimentado sobre o

fato de que a pesquisa histórica pode ser fundamentada em uma pluralidade de

fontes que, como já analisado, podem incorporar a instância da memória em

suas dimensões coletiva e individual.

O mundo no qual vivemos produz em abundância diferentes recursos

documentais que enriquecem a produção do saber histórico e podem também

tornar mais vivo, interessante e instigante a construção de uma pesquisa como

a nossa. São eles, entre outros: documentos audiovisuais, imagens, escritos

literários, narrativas orais e escritas, charges, Disco Compacto - Memória

Somente de Leitura (CD-ROMs), filmes, documentários; diferentes suportes da

informática, plantas, mapas, atas, programas de rádio, peças publicitárias,

jornais, revistas, músicas, vestuário e peças de decoração de ambientes, entre

outros objetos da memória.

A título de exemplo, cabe ressaltar os registros iconográficos, estes

podem se constituir como rico recurso para pesquisas de pesquisadores em

encontrar o tempo que analisam pelo acesso a corpus documentais imagéticos.

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Isso porque a iconografia é um importante registro das ações dos

sujeitos históricos, públicos ou anônimos, em determinado tempo e espaço.

Como fontes históricas de grande potencialidade podem ativar e evocar

memórias, contribuindo para a pesquisa quer da micro, quer da macro-história,

pois fornecem informações não disponíveis nem acessíveis em outro suporte

documental, daí nossa opção pelo uso da análise de documentos fotográficos

em nossa pesquisa sobre o PST.

As fotografias e os filmes podem também sugerir ao historiador do

tempo presente algumas importantes indagações. Para quem a imagem é

destinada? Que opção política orientou a produção fotográfica ou filmográfica?

A que interesses busca atender a produção de imagens fixas ou em

movimento? Dessa forma, como qualquer documento de registro de memórias,

fotografias e filmes traduzem também concepções e conflitos, pois para além

de sua dimensão estética contêm sistemas de representações sociais.

A abrangência e variedade de temas que podem ser investigados por

pesquisadores que utilizam a história do tempo presente sugerem a

possibilidade de adoção de uma variedade de enfoques na construção de

análises e interpretações sobre as questões pesquisadas e estudadas.

Entre tantos, podem ser citados ao menos dois de grande importância e

atualidade. A história pública (consciência e a cultura histórica de um povo,

políticas de guarda e preservação de documentos públicos e acessibilidade a

esses documentos); e a história da vida privada (escala de microuniversos tais

como família, bairros, tribos urbanas, recantos individuais e privados, além de

costumes e valores específicos de pequenas comunidades), nossa temática

perpassa por esses dois campos.

Com nossa pesquisa acessamos documentos públicos, mas não só: o

cruzamos com a história particular dos que os elaboraram, dos que

fomentaram a política pública que analisamos em nossa dissertação.

Abordamos o assunto pelo olhar dos documentos, mas também pelo de

quem participou como parte do Programa, utilizamos as fontes nas mais

variadas possibilidades que nos permite a história do tempo presente enquanto

instrumento de análise do mundo contemporâneo.

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Nosso desafio aqui é o de coadunar a pesquisa do passado recente,

quase o hoje, com as ferramentas que o dialoguem com o passado mais

profundo, com as raízes as quais se vincula o PST e a sociedade brasileira.

Ao fazê-lo abordamos o processo de dessecamento histórico e cultural

do Programa Segundo Tempo em suas várias dimensões, camada a camada,

abordando plenamente e inserindo historicamente os dados e fontes da

pesquisa que executamos em nossa dissertação.

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4 O PROGRAMA SEGUNDO TEMPO: CONCEPÇÃO E HISTÓRIA

Nesse capítulo apresentaremos historicamente o Programa Segundo

Tempo, sua origem e as discussões que surgiram com sua criação, além de

explorarmos aspectos metodológicos e pedagógicos do mesmo.

A partir de uma afirmação categórica de Oliveira (2009) embasamos

nosso debate sobre a relevância, foco e público-alvo do Programa Segundo

Tempo, uma iniciativa com foco claro desde a sua concepção:

Para a efetivação de uma política pública de esporte e lazer frente a qual assume a posição de proponente, formulador e articulador, o Ministério do Esporte responsabiliza-se pela realização dos Programas que respondem às demandas sociais geradas num momento histórico de garantia e de ampliação do conjunto dos direitos constitucionais. (OLIVEIRA, 2009, p.7).

Isso se desdobra na seguinte afirmação acerca do papel que passa a

cumprir o Ministério do Esporte nestes programas, o PST se insere nessa

virada que ocorre no foco a ser seguido pelo ME após a posse do presidente

Lula da Silva:

E assim, Oliveira (2009) chega a uma das muitas definições do

Programa Segundo Tempo, inserido nesse novo contexto histórico, parte de

algo novo que tinha objetivo de colaborar na transformação de vidas:

O Segundo Tempo é um programa prioritário do governo federal que tem por objetivo democratizar o acesso à prática e à cultura do esporte de forma a promover o desenvolvimento integral de crianças, adolescentes e jovens, como fator de formação da cidadania e melhoria da qualidade de vida, prioritariamente daqueles que se encontram em áreas de vulnerabilidade social. (OLIVEIRA, 2009, p. 8).

Isso se desdobra a partir da análise da concepção do Programa e

mostra o público atingido pelo mesmo no passar dos anos, embora Oliveira

faça considerações acerca do alcance do mesmo:

Com essa compreensão do esporte, o Programa Segundo Tempo busca oferecer a prática esportiva ao seu público-alvo. Desde sua criação em 2003, o Programa já atendeu a mais de

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cinco milhões de crianças, adolescentes e jovens, com um investimento do governo federal de aproximadamente um bilhão de reais. Atualmente, o Programa atende simultaneamente aproximadamente 1,8 milhão de crianças, adolescentes e jovens distribuídos em torno de 1.300 municípios de todas as regiões do país. São números expressivos, mas ainda longe de serem significativos no universo de 51.5 milhões de potenciais beneficiados, considerando-se o total de alunos matriculados e 2010 na Educação Básica. (OLIVEIRA, 2009, p.9-10).

Considere-se o fato das informações do autor serem de 2009,

mostrando todo o alcance em escala e potencial que o Programa carrega

desde seu nascedouro, mas sem perder o foco que tais números não são ainda

o ideal, nem naquele momento, nem agora.

Para melhor entendermos o que motivou essa criação nos apoiamos no

debate acerca do esporte, citado nos documentos do Ministério do Esporte:

De acordo com o Manual que apresenta as Diretrizes e Orientações para o Estabelecimento de Parcerias e tendo como referência o direito constitucional ao esporte e ao lazer, conforme asseguram os art. 6o e 217 da Constituição Federal, o Programa Segundo Tempo, criado em 2003, se insere no âmbito das iniciativas governamentais que priorizam o fenômeno esportivo como potencializador de elementos educativos. Esses elementos educativos podem favorecer uma reflexão crítica sobre os diferentes contextos de riscos sociais, bem como minimizar o tempo de exposição de crianças e jovens aos efeitos nocivos da violência, dos desajustes familiares, do tráfico de drogas, das carências alimentares, da falta de afeto, dentre outros tantos que convergem para deteriorar a dignidade humana (MELO e DIAS, 2009). O Programa Segundo Tempo é uma iniciativa da Secretaria Nacional da Esporte Educacional (SNEED) e seus princípios norteadores, assim como o PELC4, se ancoram na política nacional de esporte e lazer da reversão do quadro atual de injustiça, exclusão, e vulnerabilidade social; do esporte e do lazer como direito de cada um e dever do Estado; da universalização e inclusão social e da democratização da gestão e da participação. O público-alvo do Programa são as crianças, os adolescentes e os jovens expostos a riscos sociais. Seu objetivo geral é democratizar o acesso à prática e à cultura do esporte de modo a promover o desenvolvimento integral desses sujeitos, como fator de formação da cidadania e melhoria da qualidade de vida, prioritariamente em áreas de vulnerabilidade social - Ministério do Esporte. (BRASIL, 2010).

4 Programa Esporte e Lazer na Cidade.

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Além disso, de acordo com seus objetivos específicos, o Programa deve:

Oferecer práticas esportivas educacionais, estimulando crianças e adolescentes a manter uma interação efetiva que contribua para o seu desenvolvimento integral; Oferecer condições adequadas para prática esportiva educacional de qualidade; Desenvolver valores sociais; Contribuir com a melhoria das capacidades físicas e habilidades motoras; Contribuir com a melhoria da qualidade de vida (auto estima, convívio, integração social e saúde) Contribuir para a diminuição da exposição aos riscos sociais (drogas, prostituição, gravidez precoce, criminalidade, trabalho infantil) e a conscientização da prática esportiva, assegurando o exercício da cidadania. (MINISTÉRIO DO ESPORTE, apud SOUZA et al, 2010, p.23-24).

Essas construções do Governo brasileiro nos anos de 2003 até 2013

precisam estar ancoradas no debate contemporâneo do esporte feito pelos

governantes no mundo dos séculos XX e XXI.

Sendo assim, a Carta Internacional de Educação Física e Esporte da

UNESCO, lançada em 1978, redimensionou o conceito de esporte, colocando

sua prática como direito fundamental de todos.

Além disso, passou a encarar a educação física e o esporte como parte

constituinte da educação e da cultura, devendo ajudar no desenvolvimento

humano e a favorecer a plena integração social.

As políticas desenvolvidas pelo Ministério do Esporte têm na inclusão

social parte relevante de suas ações, refletindo, portanto em grande medida a

concepção adotada pela UNESCO. Sobre isso, a Política Nacional do Esporte

diz o seguinte:

A garantia de acesso ao esporte será um poderoso instrumento de inclusão social, considerando sua importância no desenvolvimento integral do indivíduo e na formação da cidadania, favorecendo sua inserção na sociedade e ampliando sobremaneira suas possibilidades futuras - Política Nacional do Esporte. (BRASIL, 2005, p.22).

A materialização dos objetivos propostos na Política Nacional do Esporte

pode ser verificada no Programa Segundo Tempo. Segundo informações do

portal do Ministério do Esporte:

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O Segundo Tempo como Programa Estratégico do Governo Federal tem por objetivo democratizar o acesso à prática e à cultura do Esporte de forma a promover o desenvolvimento integral de crianças, adolescentes e jovens, como fator de formação da cidadania e melhoria da qualidade de vida, prioritariamente em áreas de vulnerabilidade social - Portal do Ministério do Esporte. (BRASIL, 2015, s/n).

No caso brasileiro, o Programa Segundo Tempo (PST) é a política

pública de maior envergadura na democratização do acesso ao esporte, tanto

na quantidade de recursos destinados, mas também no volume de projetos e

pessoas atendidas (SOUSA et al, 2010).

O Segundo Tempo surgiu como programa estratégico do Governo

Federal na gestão do presidente Luís Inácio Lula da Silva, desde o princípio

tinha por objetivo democratizar o acesso à prática e à cultura do Esporte de

forma a promover o desenvolvimento integral de crianças, adolescentes e

jovens, como fator de formação da cidadania e melhoria da qualidade de vida,

prioritariamente em áreas de vulnerabilidade social (BRASIL, 2011).

Logo em seu principio, desde sua elaboração, teve canais de ligação

com as universidades federais, passando na sequência a ser implementado

nos espaços físicos das mesmas e dialogando com seus arredores e alunos

também.

Imagem 1 - Logomarca do Programa Segundo Tempo

Fonte: Ministério do Esporte, Governo Federal, (2016).

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Além de democratizar5 o acesso à prática do esporte e aos benefícios à

saúde que vem dessa, o PST entende o esporte como um importante meio de

educação. Sendo assim, o mesmo está fundamentado na dimensão do esporte

educacional, de maneira que as práticas esportivas oferecidas por este

estimulem crianças e adolescentes a manter uma interação efetiva,

contribuindo para o seu desenvolvimento integral:

Como um programa de Esporte Educacional, o Segundo Tempo deve ser compreendido, segundo Filgueira, Perim e Oliveira (2009), para além da forma institucionalizada do esporte, tendo como referências a aptidão física, o bem-estar, a interação, a inclusão e a cidadania dos beneficiados. Segundo os referidos autores, o Programa Segundo Tempo atende atualmente cerca de um milhão de crianças, adolescentes e jovens, distribuídos em 1.300 municípios de todas as regiões do país. (SOUZA et al, 2010, p. 26).

Vale destacar que inclusive em sua logomarca, que aqui reproduzimos

na imagem 1, já se nota a proposta de atividades coletivas de interação, de

articular indivíduos em atividades esportivas com várias pessoas ao reproduzir

uma dupla, com ambos os gêneros representados no boneco de saia e no

outro com um boné, realizando uma prática com bola em que ambos interagem

com a mesma.

Justamente esse aspecto de interação que aqui analisamos e

dissecamos ao nos debruçarmos sobre o escrito acerca do PST e seus

desdobramentos pedagógicos junto aos seus assistidos é o que reforça o foco

de nossa pesquisa.

Um item central anunciado pelo programa nesse seu viés educativo é o

entendimento do esporte como espaço de formação de cidadãos e de

desenvolvimento da cidadania (BRASIL, 2010).

Entendendo que a qualidade pedagógica do ensino de atividades

esportivas educacionais é uma das metas propostas pelo PST. Para tanto, o

5 O termo democracia no entendimento do linguista Antônio Houaiss, recebe as seguintes conotações: 1) governo do povo, governo em que o povo exerce a soberania; 2) sistema político cujas ações atendem aos interesses populares, 3) governo no qual o povo toma as decisões importantes a respeito das políticas públicas, não de forma ocasional ou circunstancial, mas segundo princípios permanentes de legalidade, 4) sistema político comprometido com a igualdade ou com a distribuição equitativa do poder entre todos os cidadãos, 5) governo que acata a vontade da maioria da população, embora respeitando os direitos e a livre expressão da maioria. (HOUAISS, 2001, p. 935).

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Programa oferece processos de formação continuada e capacitação dos

professores e monitores que atuam no projeto, assim como materiais didáticos

e esportivos adequados e acompanhamento dos mesmos em execução por

meio de avaliações permanentes.

No ano de 2007, a SNELIS6 concentrou esforços na revisão das diretrizes operacionais e no processo de construção de sua Proposta Pedagógica, concebida a partir dessa compreensão de esporte educacional, visando ao estabelecimento de uma identidade nacional para o Programa e ao desenvolvimento de um novo modelo de capacitação. Esse modelo está mais adequado à sua realidade, em função das dificuldades identificadas no decorrer do processo de capacitação, na modalidade educação à distância, desenvolvido nos anos de 2004 a 2006. A essência do trabalho realizado pautou-se na necessidade de implementação das Diretrizes Pedagógicas, embasadas nos Fundamentos Pedagógicos para o Programa Segundo Tempo, e do novo modelo de capacitação que passou a ser obrigatório para todos os recursos humanos inseridos no Programa por meio de formação de multiplicadores, de forma presencial e descentralizada. De forma complementar, para dar suporte à materialização da proposta pedagógica, a SNELIS implementou, com apoio das Universidades, uma nova sistemática de acompanhamento pedagógico e administrativo dos convênios do PST. A nova sistemática é organizada a partir de uma rede de universidades que formam Equipes Colaboradoras (EC), num total de 19 Equipes, compostas por professores de 44 Instituições de Ensino Superior (IES) localizadas em todas as regiões do país, com 156 novos integrantes. Essa rede foi viabilizada pela parceria estabelecida com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), ampliada após a experiência bem-sucedida na realização do Processo de Capacitação dos Recursos Humanos envolvidos no PST. (OLIVEIRA, 2009, p.13-14).

Em seu desenvolvimento, desde sua criação até a atualidade, o PST é

estruturado por meio de Núcleos de Esporte que mantém a característica de

atender até 100 adolescentes e jovens que desenvolvem atividades esportivas

e complementares, tendo como diretrizes principais:

Atividades no contraturno escolar para os beneficiados, em espaços físicos específicos às atividades esportivas a serem desenvolvidas, podendo ser no ambiente da escola ou espaços comunitários (públicos ou privados);

6 Secretaria Nacional de Esporte, Educação, Lazer e Inclusão Social.

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Oferta a cada beneficiado de, no mínimo, 3 modalidades esportivas (2 coletivas e 1 individual) até os 15 anos completos e a partir desta idade a possibilidade de se ofertar apenas uma modalidade, de acordo com o interesse do beneficiado; Oferta a cada beneficiado de atividades esportivas com frequência mínima de 2 vezes na semana, e de 3 horas diárias ou 3 vezes na semana, e de 2 horas diárias. (BRASIL, 2012, p.13).

O Programa foi criado em 2003 e desde então já atendeu mais de cinco

milhões de crianças e jovens em todo o País. Tornada referência internacional

em termos de política social, o PST amplia as atividades pedagógicas para o

contra turno escolar, garantindo reforço alimentar, reforço escolar e atividades

esportivas.

Fortalece a capilaridade e a dimensão desses dados o apresentado no

prefácio da obra de mesmo nome, Programa Segundo Tempo, publicada em

2012 pelo Ministério do Esporte com vários organizadores:

É um programa de grandes dimensões, desde sua criação já atendeu mais de 5 milhões de beneficiados por meio da oferta de atividades esportivas nos atuais 6 mil Núcleos de Esporte Educacional, implantados em todos os Estados da federação e empregam em torno de 7 mil profissionais e 10 mil estudantes de Educação Física e Esporte. Além disso, em parceria com o MEC, oferece atividades esportivas educacionais em mais de 5.000 escolas públicas de Educação Básica com previsão de ampliação para 10.000 escolas, alcançando em 2012 a média de atendimento de 2 milhões de beneficiados. Com essa escala de atendimento e a crescente preocupação com a qualidade da prática esportiva oferecida aos seus beneficiados, voltada a formação cidadã, o Programa precisou se reinventar e se estruturar de forma a garantir as condições mínimas de acompanhamento à gestão, para que o crescimento quantitativo não comprometesse a sua evolução. (BRASIL, 2012, p.15).

A relevância dos números chama a atenção, em particular por serem

ainda de 2012, também destacamos que aqui fica ainda mais clara a interface

não só com a educação, mas também com a escola em si, parte dos

desdobramentos e integração do programa junto aos setores mais vulneráveis

da sociedade, vemos isso quando Oliveira (2009) trata desse foco presente nas

diretrizes da Secretaria Nacional de Esporte, Educação, Lazer e Inclusão

Social (SNELIS):

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Na compreensão da SNELIS, o caminho para democratização do esporte é a articulação entre o sistema educacional e o sistema esportivo, entendendo-a como essencial para assegurar a ampliação da participação de escolares, de todos os níveis de ensino, em atividades e eventos esportivos. Assim, há prioridade em articulação por parte dessa Secretaria em todas as ações que envolvam a escola e o esporte como um dos eixos norteadores. Enquanto caminha nesse sentido, nos últimos anos a gestão da SNELIS tem investido no aprimoramento do Programa Segundo Tempo, partindo da premissa de que tão importante quanto ampliar o número de beneficiados é qualificar o atendimento oferecido as crianças, aos adolescentes e jovens que integram o NEE das parcerias estabelecidas. (OLIVEIRA, 2009, p.10).

Bem como suas possibilidades de se readequar frente ao crescimento,

reflexo de uma politica pública pensada com potencial de se moldar ao

aumento da permeabilidade do mesmo junto aos setores mais vulneráveis, ao

fazê-lo apoiado na universidade ampliou a força técnica e acadêmica do

escopo do programa, em particular no aspecto pedagógico discutindo os

fundamentos do Programa e construindo metodologias mais aprofundadas para

capacitação dos Recursos Humanos envolvidos e no acompanhamento das

ações em que o programa se materializava nos Núcleos de Esporte

Educacional (NEE) de fato.

Também vejamos o que diz Oliveira (2009) sobre os Núcleos de Esporte

Educacional por nós já aqui mencionados, e o papel que estes se propõem a

cumprir:

Os NEE visam ocupar o tempo ocioso de crianças, adolescentes e jovens e oferecem, no contraturno escolar (no mínimo três vezes por semana, duas horas por dia em seu modelo padrão), atividades esportivas sob orientação de coordenadores e monitores de Educação Física e/ou Esporte, assim como atividades complementares sob a orientação de especialistas das temáticas ofertadas. As parcerias que viabilizam a implantação dos núcleos são definidas a partir do modelo de diretrizes apresentadas no Manual do Programa Segundo Tempo (PST) e da realidade local de cada projeto. De acordo com a evolução do Programa, o modelo e as diretrizes foram sendo modificados de modo a aprimorar todo o sistema. (OLIVEIRA, 2009, p.9).

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O Programa funciona através de núcleos de prática esportiva voltados

aos estudantes do ensino básico, estejam esses núcleos situados dentro das

escolas ou em outros espaços físicos, a exemplo das universidades federais.

Ao passar do tempo criaram-se várias versões do programa dialogando

com as realidades locais, exemplo disso são os núcleos em comunidades

indígenas e quilombolas, tal adaptação está presente na concepção do mesmo.

Programas como o Segundo Tempo se somam ao Vida Saudável (VS) e

ao Programa Esporte e Lazer na Cidade (PELC) que mostram iniciativas

governamentais. O foco em todos os programas é o fenômeno esportivo como

potencializador de elementos educativos que ajudam numa reflexão critica, no

estimulo a atividade coletiva e no combate ao individualismo:

Com esse propósito foi criado, também em 2003, o Programa Esporte e Lazer da Cidade (PELC) que visa, em síntese, suprir a carência de políticas públicas e sociais que atendam às crescentes necessidades e demandas da população por esporte recreativo e lazer, sobretudo daquelas em situações de vulnerabilidade social e econômica, que reforçam as condições de injustiça e exclusão social a que estão submetidas. Conforme o Ministério do Esporte, seus objetivos centrais são “ampliar, democratizar e universalizar o acesso à prática e ao conhecimento do esporte recreativo e de lazer, integrando suas ações às demais políticas públicas, favorecendo o desenvolvimento humano e a inclusão social. (SOUZA et al, 2010, p.17).

O PELC acabou por ter um desdobramento focado na reinserção dos

jovens oriundos do sistema prisional, inclusive explorando a interface com a

comunidade em que estes estavam inseridos antes e depois do

aprisionamento, ampliando a possibilidade de articulação entre os Programas e

o objetivo de inclusão que emana dos mesmos:

Outra possibilidade é a do Programa Nacional de Segurança com Cidadania (PRONASCI) /PELC, destinado aos jovens entre 15 e 24 anos, egressos do sistema prisional, bem como suas famílias e comunidades, que vivem em situações de vulnerabilidade social e econômica. Situações essas reforçadoras das condições de injustiças, violências e exclusão sociais a que esses jovens estão submetidos. O Programa visa à melhoria da qualidade de vida e ao reencontro com a autoestima. São previstas atividades especificas para esse público, como oficina de skate, hip-hop, música (de acordo com a cultura local), danças, grafitagem, parkour, cinema, teatro e

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eventos de esporte recreativo e de lazer organizados coletivamente como: mostras, passeios ciclísticos, festivais, encontros temáticos, sessões de cinema e outros. (SOUZA et al, 2010, p.20).

Por fim, há também a articulação com o Vida Saudável, focado em

pessoas de idade avançada, com interface também com as comunidades,

como os demais programas:

O público-alvo também é contemplado nos núcleos do projeto Vida Saudável, buscando o envolvimento direto de pessoas acima de 45 anos, especialmente as idosas, suas famílias e comunidades, incluindo pessoas com deficiência, em atividades sistemáticas como: oficinas de artesanato, danças, ginásticas, teatro, música, orientação à caminhada, capoeira, outras atividades conforme a cultura local e eventos de esporte recreativo e de lazer organizados coletivamente, tais como, encontros dançantes, temáticos, festivais, sessões de cinema e outros. O Programa incentiva e apoia a realização de eventos interdisciplinares de esporte e lazer, com caráter recreativo, que contemplem a ocupação do tempo e espaço de todos os beneficiados, por meio de ações transversais que envolvam temas afeitos ao meio ambiente, à educação, à cultura e à saúde, dentre outros. (SOUZA et al, 2010, p.20-21).

Inclusive as adaptações buscam também ocupar o tempo de recesso do

Programa, dando versões ainda mais lúdicas ao mesmo nos períodos que

equivalem as férias que ocorrem nos intervalos do período escolar regular,

esse foi chamado na criação de Recreio nas Férias:

O Recreio nas Férias visa um atendimento concentrado nos meses de férias escolares. A ideia é que durante o desenvolvimento do projeto os beneficiados sejam atendidos por cinco dias consecutivos, em período integral com as atividades recreativas, culturais, além das esportivas diferenciadas daquelas oferecidas nas aulas regulares do PST ao longo do ano. (OLIVEIRA, 2013, p.7).

As orientações para o estabelecimento de convênios do Segundo Tempo

estabelecem que os núcleos sejam grupos de cem crianças e/ou jovens, estes

devem ser orientados por um coordenador e um monitor, cabendo-lhes

desenvolver atividades esportivas e atividades complementares.

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Isso se dá apoiado no debate que Oliveira (2009) faz sobre uma

educação multifacetada, com amplas possibilidades:

A educação, como um processo de aprendizagem da cultura e de seus sistemas simbólicos, é multifacetada, ou seja, não se restringe a um momento particular e formal da vida humana, mas está diluída nos mais diferentes espaços de relações sociais, conformando condutas, divulgando normas, instaurando valores. No entanto, acreditamos que os espaços formais como a Escola e os programas sociais sistematizados, são espaços privilegiados de acesso ao conhecimento cientifico e cultural acumulado historicamente. De forma critica, esses programas possibilitam ao individuo perceber a si mesmo como sujeito nesse espaço de formação e, assim, pode relacionar os conhecimentos com suas experiências de vida. No Programa Segundo Tempo, considera-se a reflexão sobre o esporte como prática social e aprendizagem da cultura, como forma de educação que ocorre diuturnamente em diferentes espaços e tempos dentro e fora da escola. (OLIVEIRA, 2009, p.33-34).

A imagem 2 nos mostra que iniciativas de esporte, como o PST e o

PELC, se somam a outras iniciativas comunitárias e de saúde no que diz

respeito a uma maior interação com os usuários de programas, iniciativas ou

equipamentos públicos.

Destacamos que, no caso do esporte, o mesmo não possui o atrativo

financeiro direto que oferece o serviço de microempreendimentos e nem tão

pouco a relação imediata com a saúde oferecida na atenção básica oferecida

pelo Sistema Único de Saúde.

Ainda assim, o esporte possui um apelo e atratividade comprovada pelas

pesquisas, mostrando o alcance do mesmo e a perspectiva subjetiva da

mudança de vida em diversos aspectos que o mesmo pode oferecer, como

apresentado está na Política Nacional de Esporte.

O Esporte se tornou um sistema no Brasil, algo que também ocorre com

a saúde brasileira, e potencializa o alcance dos dois:

O Sistema Nacional de Esporte e Lazer é um arranjo político-institucional que organiza a oferta de bens e serviços, gestão e financiamento da política pública de esporte e lazer. Seu propósito é a garantia do direito. Outras políticas públicas também se organizam nesse formato, como a política pública de saúde – Sistema Único de Saúde – e a política de assistência social – Sistema Único De Assistência Social. Um

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dos princípios balizadores dessa política pública é o pacto federativo. A União, os Estados e os municípios tem obrigações na perspectiva da garantia do direito. Esse arcabouço que se estrutura no processo de implantação da política pública requer a adoção de mecanismos inovadores de gestão e legitimação. A realização de conferências em períodos de dois anos reitera o princípio da participação popular e social e difunde a compreensão desse direito social na sociedade. A mobilização de setores organizados e não organizados da sociedade em torno da agenda de esporte e lazer amplia as perspectivas da implantação e da cobertura da referida política pública. (SOUZA et al, 2010, p.153).

Esse referido arranjo acabou por melhorar, segundo Oliveira (2009) a

alocação de recursos e a maneira de gerir o esporte brasileiro no que tange

aos seus programas, bem como seu financiamento e coleta de resultados.

Imagem 2 - Relação entre programação e interação com usuários – Tipologia

Fonte: Elaborado por empresa de pesquisa contratada pelo Ministério do Esporte, com base em Nogueira, (1998).

Isso se aplica inclusive nos Núcleos de Esporte Educacional sediados

em universidades federais, como os que estudamos situados na Universidade

Federal de Pernambuco (UFPE) e demais Instituições Federais de Ensino

Superior (IFES), atendendo o público do entorno da instituição.

Como podemos ver na imagem 2, o PST é menos programável mas

possui alta interação com seus usuários junto com o Programa Esporte e Lazer

da Cidade e demais políticas esportivas que juntam ao disposto na saúde e nos

programas de promoção social.

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Deve ainda ser oferecido aos beneficiários o mínimo de três

modalidades esportivas, sendo pelo menos duas coletivas e uma individual.

Outra orientação é que o núcleo deve incluir a oferta de atividades

complementares (atividades educacionais, culturais, ambientais, dentre outras),

além do reforço alimentar através do lanche.

O Ministério do Esporte, lista como objetivos específicos do Segundo

Tempo:

Oferecer práticas esportivas educacionais, estimulando crianças e adolescentes a manter uma interação efetiva que contribua para o seu desenvolvimento integral; Oferecer condições adequadas para a prática esportiva educacional de qualidade; Desenvolver valores sociais; Contribuir para a melhoria das capacidades físicas e habilidades motoras; Contribuir para a melhoria da qualidade de vida (autoestima, convívio, integração social e saúde); Contribuir para a diminuição da exposição aos riscos sociais (drogas, prostituição, gravidez precoce, criminalidade, trabalho infantil e a conscientização da prática esportiva, assegurando o exercício da cidadania). (BRASIL, 2012,p.10).

Quando avaliamos os fundamentos metodológicos do Segundo Tempo,

constatamos que o programa persegue fortemente os valores da inclusão

social para o desenvolvimento humano, vinculados aos aspectos relativos ao

desenvolvimento da pessoa para o exercício pleno da cidadania. Assim, Melo e

Dias, in Fundamentos Pedagógicos do Programa Segundo Tempo, organizado

por Oliveira e Perim (2009) ressaltam:

Programas como o Pintando a Liberdade e Pintando a Cidadania, Esporte e Lazer na Cidade e, principalmente, o Segundo Tempo, mostram as iniciativas governamentais que priorizam o fenômeno esportivo como potencializador de elementos educativos que podem favorecer uma reflexão crítica sobre os diferentes contextos de riscos sociais, bem como minimizar o tempo de exposição de crianças e jovens aos efeitos nocivos da violência, dos desajustes familiares, do tráfico de drogas, das carências alimentares, da falta de afeto, entre outros tantos elementos que convergem para deteriorar a dignidade humana. (OLIVEIRA; PERIM, 2009, p.21).

Ainda analisando os fundamentos metodológicos que dão os contornos

do Programa Segundo Tempo, encontramos um trecho relevante que pode ser

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agrupado no ponto de inclusão social como um dos objetivos principais do

programa:

Se o Programa Segundo Tempo tem a “reversão do quadro atual de injustiça, exclusão e vulnerabilidade social” como um de seus princípios, nada mais justo que compreenda as crianças e os jovens como membros ativos da sociedade, bem como construtoras do seu tempo, pois podem transformar suas realidades a partir de um processo educacional multireferencial, em que o esporte passa a integrar o conjunto de ações que podem, dependendo da forma como são feitas as intervenções pedagógicas, promover uma leitura crítica da realidade, apontando para a construção de novas formas de existência. (OLIVEIRA; PERIM, 2009, p.24).

Em todo o referencial metodológico pesquisado do Programa Segundo

Tempo e seus fundamentos pedagógicos, percebemos que o principal objetivo

é alcançar o desenvolvimento humano das crianças e jovens beneficiados pelo

programa.

Através da participação nas atividades pedagógicas e práticas

esportivas, é possibilitado “[...] ao indivíduo perceber a si mesmo como sujeito

nesse espaço de formação e assim poder relacionar os conhecimentos com as

suas experiências de vida”. (OLIVEIRA; PERIM, 2009, p.34).

Imagem 3 – Distribuição da população e da amostra de beneficiados dos projetos do Programa Segundo Tempo

Fonte: Ministério de Esporte, (BRASIL, 2010).

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Imagem 4 – Distribuição da população e da amostra de beneficiados dos projetos do Programa Esporte e Lazer na Cidade

Fonte: Ministério de Esporte, (BRASIL, 2010).

Imagem 5 – Faixa etária dos beneficiados no Programa Segundo Tempo

Fonte: Ministério de Esporte, (BRASIL, 2010).

Imagem 6 – Atividades complementares – Modalidades não esportivas Fonte: Ministério de Esporte, (BRASIL, 2010).

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Objetivando avaliar e monitorar o Programa Segundo tempo, foi

realizada uma ampla pesquisa, publicada pelo Ministério do Esporte no ano de

2010. Gostaríamos de ressaltar dois aspectos importantes para a eficiência e

eficácia desse programa a seguir.

Primeiro com relação ao seu público alvo. Entre os colaboradores, todos

beneficiários do Segundo Tempo, verificou-se que 40,1% tinham renda familiar

até R$ 600,00 (seiscentos reais), enquanto 30% tinham renda familiar entre R$

601,00 (seiscentos e um reais) e R$1.250,00 (mil duzentos e cinquenta reais).

Apenas 4,1% tinham renda familiar maior que R$ 2.000,00 (dois mil reais). Em

média os participantes do programa possuem como renda média familiar

R$1.074,35 (SOUZA et al, 2010, p.119).

Embora seja evidente a preocupação do autor já naquela época com as

perspectivas e alcance do Programa:

Entretanto, é necessário refletir sobre a continuidade e o desenvolvimento do Programa em relação às crianças, adolescentes e jovens brasileiros, que também vivem na pobreza e não acessam o esporte e o lazer, e a outros que, por outras questões não relacionadas com a falta de recursos financeiros, também tem dificuldade em se apropriar desse direito. (SOUZA et al, 2010, p. 119).

A pesquisa apresentada por Sousa (2010) analisa os dados sobre

gênero, sendo clara a presença majoritariamente masculina e a preocupação

com metodologias que estimulem à inclusão feminina:

O público beneficiado é predominantemente masculino, com 66,5%, sendo apenas 33,5% do sexo feminino. Essa situação reproduz a trajetória histórica do esporte moderno que constituiu ao longo do tempo como um fenômeno essencialmente masculino. Nesse sentido, ao se considerar a inclusão das meninas e o seu acesso ao esporte como direito social, é necessário refletir sobre as modalidades oferecidas, as metodologias de ensino adotadas de modo a atender, também, a esse público. (SOUZA et al, 2010, p.117).

Um segundo aspecto, diz respeito às questões da influência do

Programa Segundo Tempo na vida dos beneficiados. Buscou-se verificar se

após o ingresso nas atividades a vida deles melhorou.

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Nesse sentido, 83,4% melhoraram sua autoestima e passaram a gostar

mais de si, 82,2% melhoraram seu convívio social e a relação com amigos,

enquanto 77% Passaram a ter maior capacidade de comunicação e de defesa

de ideias. Além disso, 77,7% responderam que aumentaram seu interesse

pelas atividades escolares, 74,9 melhoraram seu rendimento escolar e 73%

afirmaram que a convivência familiar melhorou após começar a participar do

Segundo Tempo. (Souza et al, 2010)

Ao serem perguntados se o principal benefício percebido pode ser

atribuído aos resultados a partir da participação no programa, 86,9%

identificaram algum benefício e apenas 13,1% não identificaram.

Entre os benefícios identificados, 29,4% são relativos ao

desenvolvimento pessoal. Como formação de valores, comportamento social,

civilidade, reflexões sobre os projetos de vida, entre outros aspectos que

identificam a relação do indivíduo com ele mesmo e com os outros.

Já 22,6% apontaram benefícios para o desenvolvimento da comunidade,

como diminuição à exposição ao risco e bom convívio social e familiar. A

melhoria na condição de saúde e qualidade de vida foi percebida por 16% dos

colaboradores, enquanto somente 10,4 % apontou a melhoria na prática

esportiva como o principal benefício do programa (Souza et al, 2010).

Levando em conta o desenvolvimento do esporte desde a antiguidade,

até o esporte moderno e contemporâneo, onde a prática esportiva é direito de

todos os cidadãos, o esporte no ambiente acadêmico e as políticas públicas

como o Programa Segundo Tempo cumprem um grande papel na educação e

na inclusão social para o desenvolvimento humano.

Pelos dados vistos à cima e por toda sua metodologia, nos parece que o

Segundo Tempo representa uma importante experiência do esporte como

prática social e aprendizagem da cultura, colocando seus objetivos e

fundamentos pedagógicos muito bem contextualizados a serviço do

desenvolvimento humano, conforme escreveu Barbieri, citado na revista

Mackenzie de Educação Física e Esporte, em 2002:

[...] A visão contemporâneo-integradora do esporte é aquela que, reconhecendo a necessidade premente [...] de ações que objetivem restaurar o humano do homem, concebe como sendo insubstituíveis o valor e a importância atribuídos à

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emancipação do homem, à sua autonomia, à sua participação efetiva na construção da realidade, ao desenvolvimento da sua autoestima, de sua criatividade, de seu autoconhecimento, de sua ludicidade, da sua capacidade de cooperar, bem como da preservação da sua identidade cultural. Admite a necessidade do desenvolvimento do esporte intrinsecamente relacionado à educação (significada como um processo do homem se fazer no mundo) e que se fundamente também numa relação de coeducação entre aqueles que, juntos, aprendem; se fundamente no respeito e na preservação da individualidade de cada um dos participantes desse processo em relação às diversas outras individualidades, tendo em vista o contexto uno e diverso no qual o homem está inserido. (KORSAKAS; DE ROSE JUNIOR, 2002, p.26).

É importante destacar que o programa vem acompanhado de atividades

complementares, como podemos ver na imagem 3, estas têm como destaque

os jogos e brincadeiras que dialogam bem com o esporte em si.

Mas as atividades complementares não param por aí, se somar outras

como a busca da profissão e mesmo o reforço escolar, uma clara

demonstração do esforço para coadunar o esporte com os demais aspectos

sociais que o assistido vive em seu cotidiano fora do programa.

Sendo assim, a seguir passaremos a desdobrar a análise do Programa

Segundo Tempo com foco nos núcleos situados nas universidades, ressaltando

que os referidos Núcleos possuem uma relevância diferenciada dentro do PST:

Refletir sobre o Programa Segundo Tempo exige uma busca por fundamentos que contribuam para sua compreensão, para a análise das ações realizadas nos seus núcleos e para a avaliação dos resultados obtidos com sua implantação. Nessa direção, uma primeira questão a ser considerada é a definição de que se trata de um programa de esporte educacional que, por sua vez, é definido como aquele praticado nos sistemas de ensino e em formas assistemáticas de educação, evitando a seletividade, a hipercompetitividade de seus praticantes, com a finalidade de alcançar o desenvolvimento integral do individuo e sua formação para o exercício da cidadania e a prática do lazer. A existência de uma explicação para a expressão “esporte educacional” no documento de referência do Programa parece indicar mais do que uma referência à legislação: um esforço no sentido de diferenciar esses esportes e de se vivenciar o fenômeno esportivo no Brasil. Na direção de compreender as possibilidades e os limites de um programa de esporte inserido em uma política pública é preciso discutir o esporte com base na sua compreensão como um fenômeno sócio-histórico culturalmente construído, sendo

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possível identificar suas raízes ao longo da história da humanidade. (SOUZA et al, 2010, p.39).

Para nós fica claro aqui a direção para além da competição, com

enfoque educacional que combata o processo de clivagem a partir da disputa,

justificando o termo “esporte educacional” de maneira mais clara:

Assim, o Programa Segundo Tempo se apresenta como uma iniciativa que tenta promover, ao mesmo tempo, o acesso ao esporte como direito social; a apropriação cultural esportiva; o desenvolvimento pessoal e social nas comunidades atendidas pelos núcleos; e a diminuição do contato de crianças e adolescentes beneficiados com os riscos relacionados à violência, às drogas e à fragilização do ambiente familiar, muito presentes nas comunidades mais vulneráveis do ponto de vista socioeconômico. (SOUZA et al, 2010, p.42-43).

É no enfoque do Programa, no que ele busca, que vai se adequando as

novas metodologias do mesmo, o novo conteúdo que vai sendo construído

para as aulas a partir do que tange a educação e sua característica

coletivizada:

Daí a necessidade de buscarem novas formas de trabalhar esse conteúdo nas aulas, evidenciando seu aspecto educacional, a participação coletiva e a cooperação entre os alunos como forma de criar possibilidades para um entendimento crítico da realidade esportiva, do corpo e do movimento. (MELO; DIAS, 2009, p.36).

Isso tudo articulando com o objetivo da formação do cidadão,

entendendo isso vinculado ao ser reflexivo que esse deve buscar ser, isso está

vinculado na concepção do como ensinar no PST:

Há também uma necessidade premente da área em apontar caminhos mais adequados sobre como fazer para formar cidadãos críticos e emancipados em programas de esporte educacional e, no caso específico desse texto, como ensinar no Programa Segundo Tempo. (DARIDO; OLIVEIRA, 2009, p. 207).

Daí nosso entendimento que essas considerações apontam e organizam

a metodologia que foi evoluindo com o passar dos anos no Programa Segundo

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Tempo, refinando a mesma para tentar colaborar na aproximação na formação

desse cidadão, de maneira lúdica, inventiva e adaptável, calcada nessa

metodologia:

Tendo em vista essas reflexões, o Segundo Tempo se apresenta como uma tentativa de construção de uma abordagem metodológica que permita que o esporte seja ensinado, efetivamente, a partir do seu entendimento como um direito de todos, na direção da inclusão, da cidadania e da cultura, mas que se configura como um grande desafio no sentido de mobilizar professores e monitores para que consigam superar as metodologias tradicionalmente utilizadas e que se remetem a uma concepção mais estrita do esporte, que não se alinha com o conceito de esporte educacional que fundamenta o Programa. (SOUZA et al, 2010, p. 131).

Afinal, o esporte está inserido na sociedade, e o cotidiano das

sociedades dos dias de hoje, com forte carga de individualismo, ausência de

tempo cada vez maior para recreação, vai na contramão do proposto pelo

Programa em suas diretrizes, o mesmo é uma inciativa que busca mudança,

transformação social, para tanto precisa ter dinâmicas e construções flexíveis

que colaborem com isso, em particular nos seus aspectos metodológicos e

pedagógicos:

A proposta do Programa Segundo Tempo para a “Organização e Desenvolvimento Pedagógico do Esporte” apoia-se em uma concepção pedagógica que relaciona as estruturas necessárias à compreensão do processo de ensino-aprendizagem: estrutura substantiva (o que aprender-ensinar), estrutura temporal (quando aprender-ensinar), estrutura metodológica (como aprender-ensinar). A concepção pedagógica relaciona-se com teorias desenvolvimentistas, porém não as “acata” em um sentido estrito; ao contrário, pelo referencial teórico da Teoria da Ação, na interação Pessoa-Tarefa-Ambiente, destaca-se a necessidade de se considerar a história do aprendizado e as influências do ambiente cultural e social das crianças e dos jovens participantes do Programa Segundo Tempo. O professor, conhecedor do local, saberá como introduzir os temas com seu grupo. (GRECO;SILVA;SANTOS, 2009, p. 198).

Estas iniciativas, a da execução e implantação do PST, acontecem em

espaços físicos determinados, com capilaridade nas comunidades nas suas

proximidade e possibilidade de comportarem os interessados. E que melhor

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espaço para o fazer do que o ofertado pelas universidades federais brasileiras

atingindo a população que vive no seu entorno?

4.1 A EXPERIÊNCIA DO PST NAS IFES: O CASO UFPE

Aqui passamos a focar nossa pesquisa nas experiências do Programa

junto a Universidade Federal de Pernambuco - UFPE, em dois de seus

núcleos, inclusive um que busca a inclusão das pessoas com deficiência.

Imagem 7 - Foto com alunos do Programa Segundo Tempo para Pessoas com Deficiência da UFPE

Fonte: Site: youtube.com, (2016).

Na imagem 7 vemos a participação das pessoas com deficiência nas

práticas esportivas no ginásio do Núcleo de Educação Física da Universidade

Federal de Pernambuco, o mesmo permite acesso ao núcleo mediante edital

de seleção que foca nas pessoas com deficiência de baixo poder aquisitivo.

A ideia, segundo o Edital 7 de 2015 divulgado no sítio da Universidade

Federal de Pernambuco (UFPE), era dar oportunidade de praticar várias

modalidades esportivas coletivas e individuais, colaborando com o

desenvolvimento e na experiência motora.

Também segundo o Edital 7 o foco se encontra nas pessoas que vivem

no entorno da Universidade Federal de Pernambuco com idade entre 6 a 24

anos. Há vagas nos mais diversos esportes: futebol de 5, atletismo e natação

para deficientes visuais e futebol de 7, vôlei sentado, atletismo, natação e

bocha para os demais tipos de deficiência.

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Tanto o núcleo do Programa Segundo Tempo sediado na UFPE como o

focado nas pessoas com deficiência são experiências com resultados obtidos,

uma comprovação é a potencial dessas iniciativas, ocorrendo na UFPE, com

várias turmas concluídas.

Na imagem 8 podemos observar a interação entre crianças,

adolescentes e adultos executando uma atividade não-esportiva, artística, em

meio as demais atividades do programa, conectando na lógica de ampliar a

relação com a sociedade e na perspectiva da interdisciplinaridade. Elias (1980)

aborda a questão da necessidade da relação entre as pessoas, da

necessidade de interação, sustentando que não existe um mundo isolado feito

de pessoas desconectadas e também isoladas. Programa como o aqui

estudado potencializa a interação: Não podemos imaginar uma pessoa isolada

e absolutamente sozinha num mundo que é, e sempre foi, desligado dos

outros.

A imagem do homem que necessitamos para o estudo da sociologia não pode ser o da pessoa singular, do Homo Sociologicus. Tem que ser antes o das pessoas no plural. Temos obviamente que começar com a imagem de uma multidão de pessoas, cada uma delas constituindo um processo aberto e interdependente. (ELIAS, 1980, p.132).

A interdependência de pessoas, singulares, mas também imbricadas

entre sim, é a contribuição eliasiana ao discutir no que tange a sociologia para

melhor compreendermos as mudanças e transformações que se dão no

individuo e na sociedade em que ele está inserido.

O Programa Segundo Tempo entra nos espaços que promovem a

interação de maneira acentuada a partir dos esportes e busca dar uma

dinâmica diferenciada aos conteúdos na busca de seus objetivos:

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Imagem 8 – Alunos e monitores do Programa Segundo Tempo para pessoas com deficiência executando atividade lúdica

Fonte: Site: youtube.com, (2016).

Por vezes, há uma simplificação exagerada no trato com os conteúdos da prática esportiva, empobrecendo o valor formativo e informativo que este possa ter. Explorar os conteúdos vinculados ao esporte e transcendê-los é um dos fundamentos básicos do Programa Segundo Tempo. Ao pretendermos emancipação e autonomia plena, restringir as práticas esportivas apenas às vivências, pouco contribuiremos para o objetivo maior do Programa Segundo Tempo. (OLIVEIRA et al, 2011, p.15).

Ambos os núcleos adquiriram características de comunidade sob vários

aspectos, mantém contatos e reuniões, mesmo os seus egressos, dialogam por

página criada especifica de rede social com essa finalidade e com a ideia de

divulgar as iniciativas dos núcleos para um público mais amplo.

4.2 A EXPERIÊNCIA DO PST NAS IFES: O CASO UNIFESP, UFRGS E UFV

Práticas coletivas, alongamentos, interação, relaxamento e ação, tudo

isso nos mais variados cenários e paisagens que aqui admiramos e analisamos

em fotografias colhidas pela página na internet no blog do Programa Segundo

Tempo, uma iniciativa que busca recolher semanalmente nuances e

experiências relatadas por seus professores e usuários por todo o país e que

se faz ativa até hoje.

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Acabamos por eleger estas fotografias como a melhor ferramenta para a

análise de conteúdo a partir do visual que poderíamos eleger como suporte do

debate a que nos propomos no escopo da nossa dissertação.

Aliás, não meras fotos ou fotografias, ao analisarmos as mesmas a

elevamos a categoria de documentos fotográficos, pelas possibilidades que

carregam e pela relevância histórica e para pesquisa que podem conter.

O fazemos aqui a partir do enfoque e método proposto por Boris Kossoy

(2014) e no pensamento de Santaella (2012) acerca da análise das imagens

em um determinado tempo e contexto proposto.

Aqui nos apoiamos no debate que Kossoy (2014) faz no uso de

fotografia como fonte a ser usada não só na pesquisa, mas mesmo na

interpretação de tipo históricas, aqui analisamos o documento fotográfico em si

e as relações com o mundo visível que nelas estão inscritas e circunscritas.

Em seu livro Fotografia & História o autor estabelece um conjunto de

princípios e uma proposta metodológica para realizar a investigação e a análise

crítica das fontes fotográficas que se configuram em documentos fotográficos.

Aqui são indicados caminhos para o exame de tipo técnico e para a

análise iconográfica dessa modalidade de fontes, assim como discutidas as

questões acerca da hermenêutica particular que as imagens necessitam para

sua compreensão interior.

Nessa linha o autor constrói uma interpretação iconológica para decifrar

aquilo que o fragmento visual não possui de claramente explícito no seu

conteúdo, o que está nas entrelinhas.

Além das questões teóricas e metodológicas analisadas por Kossoy

(2014) o esmo questiona a abordagem clássica feita na história da fotografia,

apoiada em uma tradição de tipo estética.

Damos ênfase também a necessidade de se investigar para que são

produzidas as imagens com fulcro metodológico e para a compreensão

histórica, se as mesmas foram deliberadamente pensadas assim.

Nessa linha demonstrou-se também o vínculo definitivo que existe entre

a evolução da fotografia nas suas mais diferentes manifestações e o contexto

histórico-cultural especifico em que ela tem seu lugar.

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Passamos a fazer a análise das fotos, configuradas como documentos

fotográficos e analisando a espontaneidade e características de contexto e

linguagem corporal de cada uma das analisadas.

Imagem 9 - Prática do yoga ao ar livre na Universidade Federal de Viçosa

Fonte: Site: memoriaspst.wordpress.com, (2016).

O PST é marcado pela variedade de possibilidades interativas para além

do tradicional do esporte, para além do futebol, vôlei, handebol e outros. A

busca de novas modalidades, do despertar da curiosidade dos assistidos, de

desvendar o novo na interação ultrapassando o formal nas atividades lúdicas

movimenta e potencializa as ações pedagógicas dos núcleos espalhados por

todo país.

Aqui passamos a analisar o caso da Universidade Federal de Viçosa,

localizada no estado de Minas Gerais, a mesma oferece inserido no Segundo

Tempo o yoga7 para adultos e idosos.

O objetivo desta modalidade vem ao encontro dos objetivos do

Programa Segundo Tempo que contribui com a prática na Universidade Federal

de Viçosa, a partir de aulas ao ar livre, contato direto com a natureza, através

do programa adaptados.

7 O Yoga é uma filosofia trazida da Índia e difundida no restante do mundo com o intuito de trazer mais consciência e qualidade de vida, através dos pensamentos, meditação, respiração e a prática das chamadas ásanas (atividades com o corpo, realizadas em aula). É uma palavra derivada do sânscrito que significa união (corpo e mente). Tal prática chegou ao Brasil por volta da década de 30 do século XX, porém só se tornou mais conhecida a partir da década de 60 do mesmo século. Existem várias linhas de yoga, porém com a mesma intenção/objetivo: entender o ser na sua essência e de forma integral, respeitando os limites de cada pessoa, entendendo seu contexto social, familiar de forma a facilitar a acessibilidade a pratica, independente de sua condição física.

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A imagem 9 retrata a prática do yoga ao ar livre, utilizando uma área

pública ao céu aberto, aqui também fica claro no documento fotográfico a

interação entre adultos e idosos na materialização da atividade.

Ao analisarmos a imagem 10 temos acesso ao registro de atividade

esportiva com bola em parcerias entre crianças do sexo masculino, dispostas

lado a lado revezam a bola em um ginásio coberto, destacamos o

pertencimento construído pelos uniformes ofertados pelo programa, a atividade

no caso pertence a um desdobramento do Programa ocorrido em tempos de

férias.

O Projeto Recreio surge nas férias afim de promover atividades para as

crianças em recesso escolar, no Programa Segundo Tempo. Desde 2009, o

objetivo é oferecer aos indivíduos que fazem parte do Programa, ou não,

atividades esportivas, recreativas, culturais e lúdicas, assim como proporcionar

o desenvolvimento de valores sociais, melhoria das capacidades físicas e

motoras, integração social e diminuir a exposição aos riscos sociais como a

prostituição, as drogas e a criminalidade inseridos no meio em que vivem.

No ano de 2015, várias atividades foram executadas nos núcleos de

atendimento. Em Maricá (RJ), foram atendidas mais de 1,4 mil crianças em 30

dias de Projeto, e entre as atividades propostas estavam um festival de pipas,

competições de várias modalidades esportivas, além de apresentações de

danças.

Na cidade de Andradina (São Paulo), a colônia de férias do programa de

inclusão social do Ministério do Esporte, mobilizou jovens de 06 aos 17 anos, e

finalizou as atividades com uma ida ao cinema com todos os participantes.

Já em Montes Claros (Minas Gerais), as atividades aconteceram no mês

de janeiro de 2015 e tiveram 2 mil crianças beneficiadas divididas nos 20

núcleos do município.

As equipes colaboradoras dos diversos núcleos espalhados pelo Brasil

organizam o Projeto Recreio nas Férias de acordo com as demandas e

particularidades dos locais que o adéquam ao contexto social e cultural de

cada região.

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Imagem 10 - Atividade esportiva nas férias

Fonte: Site: memoriaspst.wordpress.com, (2016).

As atividades podem ser implantadas em escolas, espaços de

convivência, centros esportivos, centros educacionais, entre outros e buscam

uma proposta diferente das atividades realizadas durante o ano no Programa

Segundo Tempo.

Imagem 11 - Prática coletiva de atividade esportiva - Projeto Recreio

Fonte: Site: memoriaspst.wordpress.com, (2016).

A análise de imagens da imagem 11 mostra um ginásio coberto na

cidade de Lima Duarte, interior de Minas Gerais e retrata prática coletiva de

atividade esportiva no período de férias no chamado Projeto Recreio, um

desdobramento do PST na região.

A marca da fotografia é a interação no círculo formado por mãos dadas

entre crianças, jovens e adultos e a interação entre assistidos pelo PST e

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comunidade, mostra a capilaridade do programa, inclusive fora do seu contexto

formal que, diga-se de passagem, já é bastante flexível. O professor local

Marcelo Teixeira destaca que suas experiências no PST são muito positivas:

O que mais me impressiona no PST é constatar como o projeto muda a vida das pessoas (sobretudo carentes), quando bem executado. Porém, minha melhor experiência foi com o Projeto Recreio nas Férias em Lima Duarte/MG (imagem 1), porque não apenas a comunidade do PST (beneficiados e RH) participou integralmente (100%), como também toda a cidade se envolveu. Várias crianças que não frequentavam o PST também aderiram às atividades. Foi incrível ver o alcance social atingido pelo projeto, mesmo em um período onde as pessoas costumam viajar ou apenas descansar. (MEMÓRIAS DO PROGRAMA SEGUNDO TEMPO, 2016).

Imagem 12 - Prática esportiva com esportes adaptados para deficientes físicos

Fonte: Site: memoriaspst.wordpress.com, (2016).

Na imagem 12, nos apresenta a retratação da prática esportiva com

esportes adaptados para deficientes físicos, mais uma vez se faz presente a

utilização de espaços já existentes para coletivização bem como a execução

das atividades de maneira coletiva.

O uso de quadras, cobertas ou não, é recorrente no programa, bem

como a utilização de espaços comunitários e de universidades federais. A

realização de atividades como a retratada na foto em que o basquete é

praticado por cadeirantes se insere na variedade e busca de adaptação do

programa a realidade de cada local.

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Segundo as diretrizes de 2013 contidas no documento Programa

Segundo Tempo – Esportes Adaptados:

As atividades esportivas oferecidas nos núcleos têm caráter educacional, objetivando o desenvolvimento integral da criança, do jovem e do adolescente com deficiência e/ou necessidade especial, tendo em vista favorecer sua consciência corporal, explorar seus limites, aumentas suas potencialidades, desenvolver seu espírito de cooperação mútua e solidariedade assim como o respeito coletivo. As atividades são organizadas em ciclos pedagógicos de acordo com o calendário escolar, e são divididas em modalidades coletivas, modalidades individuais e atividades complementares. Entre as modalidades coletivas estão: o futebol, o basquete sobre rodas, o golball, o handebol, entre outras. Algumas das modalidades individuais: raqueteball, tiro com arco, bocha paraolímpica, bocha de areia, entre outras. As atividades complementadas são as ações que abordam temáticas relacionadas à educação, à saúde, à cultura, ao meio ambiente, entre outras áreas como: Atividades Educacionais, Atividades Culturais, Atividades Orientadas à Saúde, Atividades Ambientais e Atividades com a Família. (BRASIL, 2012, p.4).

Mais uma vez é clara a interação entre a escola e sua rotina com o

esporte e as atividades complementares oferecidas pelo PST, além disso aqui

se apresenta uma larga variedade de modalidades coletivas estimulando a

interação.

Como já dissemos em capítulo anterior, o crescimento e consequente

aumento de capilaridade do PST levou ao aprimoramento pedagógico e

aumento exponencial no envolvimento de mestres e doutores no processo,

tanto em Educação Física como nas áreas afins.

A imagem 13 retrata da capacitação de monitores do programa, a

mesma ocorreu entre os dias 26 e 29 de março de 2015, nas cidades de

Uberaba (MG), Floriano (PI) e Japeri (RJ).

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Imagem 13 - Capacitação dos monitores

Fonte: Site: memoriaspst.wordpress.com, (2016).

Os cursos de capacitação pedagógica do Programa Segundo Tempo,

onde participaram monitores, coordenadores pedagógicos, coordenadores de

núcleo e coordenadores setoriais retrata uma capacitação que é feita de forma

regionalizada e presencial, em que todos os professores e coordenadores

devem, obrigatoriamente, passar por este processo de treinamento assim que

seu município ou estado formalizam convênio com o PST no Ministério do

Esporte.

Tal iniciativa é desenvolvida pelos consultores das equipes

colaboradoras e equipes pedagógicas vinculadas ao projeto em parceria com a

Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), e tem supervisão da

SNELIS do Ministério do Esporte.

Essa capacitação teve especificamente com objetivo principal a

discussão dos fundamentos defendidos pela SNELIS em relação ao esporte

educacional e sua efetivação no cotidiano dos grupos.

Alguns nos temas ministrados: Fundamentos do lazer, Fundamentos do

PST, Organização Pedagógica do Esporte, Aprendizagem Motora, Questão de

Deficiência, Corpo, Gênero e Sexualidade entre outros. As abordagens

pedagógicas, técnicas e de gestão são necessárias para o desenvolvimento

das ações do cotidiano dos núcleos. A SNELIS tem função destacada na efetivação do elaborado e proposto

pelo Ministério do Esporte do ponto de vista metodológico e pedagógico, da

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Politica Nacional de Esporte até o Núcleo Esportivo na ponta, é uma secretaria

fim no organograma do ME:

Para materialização do PNE, o Ministério do Esporte conta, em sua estrutura, com Secretarias finalísticas – entre elas a secretaria Nacional de Esporte, Educação, Lazer e Inclusão Social (SNELIS), à qual cabe a responsabilidade das politicas voltadas ao esporte educacional brasileiro. Assim, impõe-se a SNELIS, no âmbito de suas responsabilidades institucionais, um ambiente fortemente marcado pela transversalidade de suas ações e pela estreita articulação e alinhamento com as políticas públicas educacionais vigentes no país. O grande desafio da SNELIS é o fomento ao estabelecimento de políticas públicas de esporte educacional efetivas, desenvolvidas de forma abrangente e continuada, para que seus resultados possam ser avaliados e mensurados quanto à qualidade, eficácia e efetividade de seus objetivos. Assim, a valorização das parcerias institucionais com estados e municípios e as ações que envolvem as estruturas educacionais, nas três esferas, assumem caráter estratégico. Essa assertiva toma forma concreta a partir da execução do Programa Orçamentário Vivência e Iniciação Esportiva Educacional – Segundo Tempo, que tem por estratégia de funcionamento o estabelecimento de alianças e parcerias institucionais, mediante a descentralização da execução orçamentária e financeira para governos estaduais e municipais, organizações não governamentais e entidades nacionais e internacionais, públicas ou privadas, sem fins lucrativos. Por meio da celebração de convênios com o Ministério do Esporte, essas entidades se tornam responsáveis pela execução do Programa, que se dá pelo funcionamento de Núcleos de Esporte Educacional (NEE). (OLIVEIRA e PERIM, 2009, p.8).

Imagem 14 - Atividade esportiva na periferia de São Paulo

Fonte: Site: memoriaspst.wordpress.com, acessado em (2016).

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Imagem 15 - Atividade lúdica com crianças

Fonte: Site: memoriaspst.wordpress.com, (2016).

Nas imagens 14 e 15, retrata ação do Ministério do Esporte em conjunto

com a Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP e a Prefeitura de Embu

das Artes com iniciativas de inclusão na periferia da cidade.

A imagem 14 é claramente estético: as crianças posam claramente na

foto com as bolas em mãos ladeadas pelo professor, expressam no espaço da

quadra satisfação vista através dos sorrisos e mais uma vez se reforça a

sensação de coletividade entre eles pela proximidade física, e pelas mãos em

riste próximas umas as outras.

A professora atende crianças na imagem 15 e realiza atividade lúdica

com crianças, o documento fotográfico recai um pouco para o perfil estético,

pois é possível observar as crianças acenando para o fotógrafo, quebrando a

espontaneidade do mesmo.

É utilizado um campo de futebol de várzea como espaço das atividades

recreativas, uma forma constante adotada pelo PST nas comunidades em que

atuam, garante também a aproximação e até mesmo imersão na realidade

local. Na imagem 16, temos a materialização das parcerias do Programa

Segundo Tempo e do Programa Forças no Esporte (PROFESP), que é uma

fusão entre Forças Armadas, Ministério do Esporte, Ministério da Defesa e

Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.

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Imagem 16 - Programa Forças no Esporte

Fonte: Site: memoriaspst.wordpress.com, (2016).

Aqui temos a fotografia de uma das oficinas do Centro de Preparação de

Oficiais da Reserva (CPOR) e do Centro de Educação Física Almirante

Adalberto Nunes (CEFAN), que ministravam aulas de esportes variados além

de atividades de iniciação profissional. O PROFESP atualmente atende a 21

mil crianças, adolescentes e jovens em situação de vulnerabilidade social, em

89 municípios de 26 Estados brasileiros.

Em nosso documento fotográfico pré-adolescentes praticam atividades

marciais mediados pela professora em espaço das Forças Armadas brasileiras

sediado na capital do Rio de Janeiro.

O documento fotográfico da imagem 17 retrata uma foto não

espontânea, muito mais estética, das participantes de torneio. A atividade só

com mulheres foi realizada pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul

(UFRGS) em março de 2015.

Tal evento foi chamado Dia do Futebol Feminino, realizou-se com a

finalidade de reunir somente mulheres para um dia de lazer e descontração

com atividades físicas e brincadeiras, como futebol de campo, futebol de salão,

futsal e futevôlei. A atividade dialogou com ampliação para além do PST com

interface musical através da apresentação de banda formada por estudantes

da UFRGS, prática recorrente do programa.

Na imagem 18 retrata-se no documento fotográfico a chamada Casa

Brasil, localizada no Píer Mauá no centro do Rio de Janeiro durante exibição de

trechos do filme Mais forte que o Mundo, sobre a história do lutador José Aldo,

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dentre outras oficinas e palestras demonstrando o poder transformador do

esporte para as crianças envolvidas com o Programa Segundo Tempo.

Imagem 17 - Atividade com mulheres na Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Fonte: Site: memoriaspst.wordpress.com, (2016).

Imagem 18 - Atividades complementares do Programa Segundo Tempo

Fonte: Site: memoriaspst.wordpress.com, (2016).

Essa imagem, foi fotografada de maneira espontânea, não possui

enfoque estético e corrobora a visão do PST não se encerrando apenas na

prática das atividades esportivas coletivas, se desdobrando em atividades

complementares lúdicas variadas, a exemplo da exibição de um filme.

Ao oportunizar a ida ao cinema o Programa Segundo Tempo amplia as

possibilidades nos horizontes dos jovens, podemos observar no documento

fotográfico o comparecimento em massa dos estudantes e o interesse

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provavelmente provocado pelo novo espaço e a possibilidade de assistir algo

diferente, acessar o novo. Fizemos o esforço de reunir material fotográfico de

anos mais recentes, no caso 2015 e 2016, espalhados por vários estados

brasileiros.

O referido sítio que pesquisamos recolhe semanalmente todo o tipo de

atividade que possua interface com o PST nacionalmente e apresenta ao

público em geral essas mais variadas iniciativas.

A diversificação das atividades propostas no Programa, bem como o das

atividades complementares, chama-nos a atenção. O respeito e absorção da

realidade local é um importante potencializador para o reconhecimento dos

assistidos e monitores junto a sua comunidade, reforça o pertencimento e

facilita a interação em nossa opinião.

O crescimento do Programa permitiu interface com as mais diversas

representações da sociedade civil, mas também o fez com as Forças Armadas

e outros Ministérios para além do Esporte, a exemplo da Cultura e da

Educação, entre outros.

Os exemplos por nós analisados reforçam a perenidade do Programa e

o potencial que o mesmo possui para se aproximar do cumprimento dos

objetivos a ele proposto em suas diretrizes:

Já a permanência do PST por dez anos como uma ação governamental de esporte educacional representa uma ilustração clara de busca pelo desenvolvimento sustentável no contexto da promoção da cidadania. Se do ponto de vista da técnica o desenvolvimento leva a um processo de homogeneização, no que toca à dinâmica cultural, o desejável é manter a diversidade. Quando olhamos, portanto, ao longo do tempo de existência do PST, percebemos que existe aprimoramento operacional, pedagógico e político do programa, buscando homogeneizar em todos os núcleos do país um quadro de excelência ao mesmo tempo em que se estimula a diversificação de práticas corporais lúdicas, conforme as especificidades do contexto local. Para que o PST se sustente por mais dez anos, ele não pode abortar essa dinâmica. (OLIVEIRA; COUTINHO, 2013, p. 10).

Concluímos esse capítulo na intenção do cumprimento da análise das

experiências ocorridas nas universidades brasileiras na perspectiva da busca

da comprovação da aplicação do PST como importante instrumento na busca

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da mudança da relação dos indivíduos consigo próprios, entre si e com a

sociedade em que vivem.

Nesse capítulo fizemos análise das fotografias de experiências que

ocorreram e ocorrem do Programa Segundo Tempo em vários de seus núcleos,

distribuídos por diversas Instituições Federais do país, além de analisar e

explicar a história do PST da concepção à atualidade.

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5 CONSIDERAÇÕES O Programa Segundo Tempo é algo singular, enquanto uma política

pública de esporte que se materializa diretamente com a aprendizagem, mas

para que haja um eficiente resultado acerca de todo o procedimento lento de

desconstrução de pensamentos e ideias arraigadas nos beneficiários é algo

extremamente complexo que exige grande dedicação do professor.

Transformar as opiniões já estabelecidas pelos mesmo em algo atrativo

e interessante é um enorme desafio para uma proposta continuada de política

pública de esporte pensada nacionalmente e desenvolvida localmente em cada

Estado da federação, em cada município.

É necessário um conjunto com todo o sistema para repensar com

urgência novos caminhos na tentativa de demonstrar para seus alunos a

importância da prática esportiva na formação do cidadão.

O processo de motivação requer tempo, dedicação, paciência, atitudes

pedagógicas, técnicas, metodológicas e de saberes necessários para, se

possível, construir uma prática consolidada com as partes envolvidas, tanto dos

beneficiários, como dos professores, pais e gestores, apesar de que

mudanças de percepções formadas neste nível de ensino é uma tarefa um

tanto quando complicada, mas podemos partir do princípio de que estas

mudanças ocorram de forma gradual, em parceria entre todos que compõem o

universo, para que cada um se conscientize a respeito de seus papeis dentro

do feito como um todo, e que a finalidade do processo educacional seja

compreendida de forma eficaz, gerando a motivação do professor para que o

mesmo transmita a motivação para seus alunos.

O Segundo Tempo é um programa originado no Ministério do Esporte,

voltado para crianças, adolescentes e jovens entre 6 e 17 anos, estudantes da

rede pública de ensino e em áreas expostas a riscos sociais.

Os princípios que norteiam o Programa buscam a inclusão social, a

vivência junto a diversidade humana, o aprimoramento da consciência cidadã e

o exercício da democracia, através da realização de práticas pedagógicas

calcadas no esporte educacional.

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Este é entendido aqui como propiciador de consciência saudável via

práticas sociais que envolvam temas lúdicos da cultura corporal, com sentidos

e significados para quem os pratica.

É também uma ação estratégica do governo federal que tem por um dos

seus objetivos democratizar o acesso à prática e à cultura do esporte para

promover o desenvolvimento integral de crianças, adolescentes e jovens, isso

como fator de formação da cidadania e melhoria da qualidade de vida,

principalmente daqueles que se encontram em áreas de vulnerabilidade social.

Segundo o que consta no documento da Política Nacional do Esporte

(PNE), O Ministério do Esporte estabelece ligações com um universo composto

de crianças, jovens, adolescentes, adultos, idosos, com pessoas com

deficiências ou com necessidades educativas especiais, com o sistema

esportivo nacional e com o sistema educacional brasileiro que articula a

educação básica e superior.

A relevância desse universo, levando-se em consideração sua

complexidade, amplitude e heterogeneidade, exige do Ministério uma

responsabilidade social, que deve se concretizar em ações balizadas,

rigorosamente, por princípios humanísticos fundamentais, inequivocamente

democráticos (BRASIL, 2005).

O Programa incentiva o esporte como fator de desenvolvimento da

cidadania e da melhoria da qualidade de vida. Busca através de práticas

esportivas educacionais aperfeiçoar suas capacidades físicas e habilidades

motoras, melhorar a autoestima e cooperar para a redução da exposição aos

riscos sociais (drogas, prostituição, gravidez precoce, criminalidade e trabalho

infantil).

Sendo assim, o esporte educacional deve ser compreendido para além

de sua forma institucionalizada, ou seja, como toda e qualquer forma de

atividade física que contribua para a aptidão física, o bem-estar mental, a

interação, a inclusão social e o exercício da cidadania.

Consequentemente, assume como elementos indissociáveis de seu

propósito pedagógico as atividades de lazer, recreação, práticas esportivas

sistemáticas e/ou assistemáticas, modalidades esportivas e jogos ou práticas

corporais lúdicas da cultura brasileira, de forma a possibilitar ampla vivência e

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formação humana e de cidadania, sobretudo de crianças, adolescentes e

jovens.

O Programa Segundo Tempo, desde a sua criação em 2003, vem

pautando suas ações na concepção de uma sociedade igualitária, em qual

todas as pessoas devem ter o direito de acesso aos elementos fundamentais

para o desenvolvimento humano, usando o esporte como um desses

elementos, na constituição de suas intervenções com foco para crianças,

adolescentes e jovens que estão em situação de risco social.

Assim, para efetivarmos uma inclusão verdadeira pelo esporte,

deveremos buscar assumir novos olhares sobre todos os corpos, deficientes ou

não, e não exaltar tanto a dificuldade que se observa, mas principalmente as

potencialidades que cada um tem para se expressar.

Entendendo uma política pública de qualidade como um dos caminhos

para a democratização do esporte, a articulação entre o sistema educacional e

o sistema esportivo, é indispensável para assegurar a ampliação da

participação de estudantes de todos os níveis de ensino, em atividades e

eventos esportivos.

No Programa Segundo Tempo, entendemos que as oportunidades

devem sempre serem criadas. As ações metodológicas materializadas em

práticas pedagógicas precisam traduzir uma concepção do esporte plural e

devem também se valer de estratégias que garantam a participação de todos.

A intervenção profissional deve ser também orientada, fundamentada e

permanentemente avaliada, para que de fato possam transformar a realidade

social e o futuro da população, um dos enfoques do projeto.

O esporte na dimensão aqui proposta não pode ser visto como algo que

é um legado para poucos ou apenas para algumas parcelas da nossa

população, é preciso ir para além disso buscando aplicar o mais próximo do

plenamente o que o PST se propõe a ser.

O esporte precisa ganhar na vida cotidiana a dimensão que lhe permite

a Constituição do nosso país: como um direito. Assim como temos o direito à

moradia, assim como temos o direito à saúde, o direito à educação, o direito à

previdência social, o direito ao trabalho.

Assim como temos um conjunto de direitos, vários deles mais avançados

seja na dimensão das políticas públicas ou na própria percepção da população,

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o esporte tem de assegurar o seu papel no processo de desenvolvimento

humano, no processo de desenvolvimento do nosso país e na busca da

garantia do bem-estar e da qualidade de vida.

Se enxergamos o esporte a partir de uma visão sistêmica, que assume a

missão da universalização e que se impõe o desafio do acesso, que se coloca

o desafio de ser um direito social, é preciso discutir, de um lado, o papel da

escola e, de outro, o papel social dos clubes esportivos, muitos deles

sucateados ou então fechados em si mesmos, ou seja, com seus altos muros,

se resumindo aos seus praticantes ou associados que podem pagar por aquele

acesso.

Se o certo é partir dessas premissas aqui listadas, e se é certo

considerar que a escola tem papel determinante nisso, considerar que esse

sistema se estruture a partir da escola e do diálogo a partir dessa, é preciso

discutir o papel que tem a União, o papel que tem o Estado brasileiro no

fomento e no desenvolvimento do esporte, possibilitando o acesso à sua

prática em espaços variados adequados e com qualidade para toda uma

geração.

O esporte educa no Segundo Tempo, o faz para além do individualismo

e da competição predatória, aponta para o coletivo, para as práticas

compartilhadas e interdependentes na construção e execução das atividades

propostas no seio do programa.

Esse cenário, construído em escala nacional, com as mais variadas

nuances regionais, após mais de uma década de execução traz, na nossa

opinião, consequências já claras e com processo de enraizamento junto a

população por ele assistida e com aqueles que com elas se relacionam.

Há questões que aqui nos chamaram a atenção durante toda a

pesquisa, que são diferenciais para nós. Nos perguntamos o que poderíamos

lançar luz de diferente do que já foi estudado sobre esse tema, o Programa

Segundo Tempo?

Acreditamos que é possível fazer isso, justamente pelo tempo de seu

surgimento até os dias presentes as possibilidades são várias, por isso fizemos

opção por realçar o debate sobre o PST e a educação, mas não só.

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Não são pequenos os desafios da inclusão pelo esporte, mas o PST e

outras experiências vem percorrendo esse caminho a passos largos e

contribuindo em um mundo mais humano e justo, mesmo que relativamente.

Esse desafio, embora hoje possa trazer inúmeros resultados,

acreditamos que seja um desafio em construção, em permanente construção,

parte articulada a políticas públicas mais gerais.

Destacamos que tivemos dificuldades na obtenção de respostas junto

aos gestores de algumas universidades federais que tiveram experiência na

implementação do PST, apesar de vários contatos não nos oportunizaram os

dados para análise, o que prejudicou em certa mediada nossa pesquisa.

Agradecemos aos colaboradores, lançaram luz sobre vários temas,

fortaleceram a ideia do PST enquanto um marco das políticas públicas,

histórico e esportivo, apontaram as limitações com clareza e destacaram as

dificuldades das parcerias com as prefeituras e da interface com as

universidades para além do acadêmico.

O que se pretendeu nessa pesquisa foi despertar mais uma inquietação

na área da Educação e em outras que desejam vir à cooperação, contribuir

para um acervo referente ao tema Programa Segundo Tempo, além de

valorizar a utilização de uma ação de transformação como ferramenta social

que auxilia na formação de cidadãos, iniciando nas crianças e adolescentes em

situação de vulnerabilidade social.

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ANEXO A – Modelo do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Eu,

_______________________________________________________declaro,

por meio deste termo, que concordei em ser colaborador(a) na pesquisa

intitulada: PROGRAMA SEGUNDO TEMPO: avaliação de uma metodologia aplicada a partir das universidades (2003-2013), desenvolvida por Rafael de

Oliveira Simões. Fui informad0(a), ainda, de que a pesquisa é orientada pelo

Prof. Dr. Vilde Gomes de Menezes.

Afirmo que aceitei participar por minha própria vontade, sem receber

qualquer incentivo financeiro ou ter qualquer ônus e com a finalidade exclusiva

de colaborar para o sucesso da pesquisa. Fui informado(a) dos objetivos

estritamente acadêmicos do estudo, que, em linhas gerais é da TEÓRIA E

HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO.

Minha colaboração se fará de forma anônima ou não, por meio de

descrever o tipo de abordagem em questionário enviado por email, com

disponibilização de imagens, a partir da assinatura desta autorização. O acesso

e a análise dos dados coletados se farão apenas pelo pesquisador e o seu

orientador, podendo o mesmo ser divulgado afim de gerar fontes para futuras

pesquisas.

Fui ainda informado(a) de que posso me retirar desse estudo a qualquer

momento, sem sofrer quaisquer sanções ou constrangimentos.

Atesto recebimento de uma cópia assinada deste Termo de

Consentimento Livre e Esclarecido.

Recife, ____ de _________________ de _____ Assinatura do participante:______________________________________________ Assinatura do pesquisador:_____________________________________________

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APÊNDICE A - Apresentação dos questionários

Meu nome é Rafael Simões, estes questionários buscam levantar

informações e dados que contribuirão para a dissertação de mestrado que

apresentarei ao Núcleo de Teoria e História da Educação do Programa de Pós-

graduação em Educação da Universidade Federal de Pernambuco - UFPE,

como requisito final para obtenção de título de mestre sob orientação do

Professor Dr. Vilde Gomes de Menezes. É um prazer contar com sua

generosidade e qualificada colaboração neste trabalho

Para oportuna contextualização, segue no parágrafo seguinte o resumo

da dissertação:

Este trabalho tem como principal objetivo analisar historicamente as

concepções e aplicações metodológicas e suas interfaces educacionais obtidas

a partir da experiência do Programa Segundo Tempo (PST), criado pelo

Ministério do Esporte no ano de 2003. O Programa, que persiste até 2017 e

possui presença em todo território nacional, foi estudado aqui principalmente

em seus núcleos sediados em Instituições Federais de Ensino Superior, em

particular naquelas onde encontramos maior longevidade na aplicação do

Programa. Fazemos o debate sobre as mudanças ocorridas em seus

beneficiários e na sua relação com a sociedade através da educação. Para

tanto utilizamos os conceitos de psicogênese e sociogênese de Norbert Elias e

fazemos a discussão de controle e autocontrole a partir dessas categorias, isso

foi possível em nossa pesquisa a partir da análise da memória do PST

disponível em algumas Instituição de Ensino Superior (IES). Entendemos que

nunca antes na história brasileira ouve uma política pública de esporte com

esta escala e abrangência, isso se reflete na quantidade de assistidos, núcleos,

professores, alcance do programa em escala nacional e capilaridade adaptável

e sensível as peculiaridades locais. Sendo assim, também são grandiosas as

possibilidades educativas presentes em seus desdobramentos, com impacto

social expressivo comprovado a partir dos dados do governo brasileiro no

período das gestões do Presidente Lula da Silva e da Presidenta Dilma

Roussef, perfazendo o período pesquisado da primeira década de PST (2003-

2013). Ainda sobre a riqueza de possibilidades educativas advindas da

aplicação dos fundamentos metodológicos do Programa, em particular na

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análise a partir das práticas de interação e atividades cooperativas e pelas

memórias das experiências dos beneficiários dessa política pública.

De pronto, seguem as seguintes questões:

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APÊNDICE B - Questionário com o Deputado Federal por São Paulo e

ex-ministro: Orlando Silva de Jesus Júnior

1. O Programa Segundo Tempo pode ser considerado um

marco histórico para o Esporte Brasileiro? Por que? O PST é um marco histórico para o esporte brasileiro, por se tratar do

primeiro programa sobre esporte educacional, que guarda em seu conceito e

desenho a perspectiva de romper com a dicotomia entre formação esportiva e

o esporte de base para o alto rendimento, e tem em sua estrutura a

possibilidade de ganhar escala ampla para a democratização do acesso ao

esporte, nas escolas. A única maneira de se universalizar o acesso ao esporte,

o que aprendemos nas experiências internacionais, é organizar e oferecer o

esporte nas unidades escolares, o que foi feito com grande sucesso com a

parceria com o MEC, junto ao Programa Mais Educação. Essa fase do PST/ME

e PME/MEC, foi denominada de Esporte da Escola. Envolveu várias iniciativas,

inclusive uma revisão no material instrucional dos dois programas quanto ao

Projeto Pedagógico das escolas, quanto ao avanço conceitual sobre o esporte.

Para sua implantação, havia verba federal com capacitação e material

esportivo, repassado do FNDE, diretamente à escola. Esse modelo,

experimentado impactou no número de beneficiados, saltando de um milhão

para quatro milhões e meio, aproximadamente. A perspectiva seria de

implantar o PST em todas as escolas que aderiram ao Mais Educação – em

escolas de baixo IDEB.

2. Na sua opinião, qual a importância das Universidades para o nascimento do PST, como parceiras prioritárias na elaboração das metodologias e na aplicação e acompanhamento dos fundamentos metodológicos do Programa?

No momento do nascimento do PST, as universidades encontravam-se

um pouco distantes do ME, devido a sua recém-criação e por ausência de

diálogos e programas que fizessem tal aproximação ser mais sistemática e

orgânica. O Programa foi concebido por alguns gestores novos e do antigo

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quadro, de forma iterativa, assim respeitou-se parte da experiência anterior

com o Programa Esporte Solidário, nos mecanismos de funcionamento, e no

âmbito conceitual, com apoio de alguns especialistas acadêmicos, se

estruturou a conceituação e a metodologia, a formação dos coordenadores que

iriam atuar nos locais onde os núcleos seriam implantados. Em seguida, após

os primeiros resultados positivos do Programas, as universidades passaram a

ter um papel fundamental para preparar o material conceitual, avançando-se

nos conhecimentos referentes a formação esportiva, sem invadir o

conhecimento próprio da disciplina de Educação Física da escola, e sem a

especialização precoce para a aprendizagem das modalidades esportivas,

porém, com a preocupação da ampliação do repertório esportivo das diversas

modalidades existentes e pouco tratadas nas escolas. As universidades

contribuíram para a constituição de um sistema interno tanto para a formação

de quadros de coordenadores gerais e locais, com acompanhamento local e a

distância, quanto para a avaliação permanente e controle de dados do PST.

Hoje se tem um sistema amplo, ancorado por pessoal especializado, articulado

em rede para monitorar o Programa, a fase mais difícil de programas de larga

escala, no Brasil.

3. Quais foram as motivações para a criação de um programa no formato do Segundo tempo?

O princípio da inclusão social, orientado estrategicamente pelo

Presidente Lula da Silva, em seu primeiro mandato. Deveria o esporte, nesse

diapasão, propor um programa que se articulasse com as demais iniciativas

governamentais que oferecessem atividades da população que historicamente

esteve alijada do acesso de determinados direitos sociais. Além disso, o

compromisso daquela gestão em materializar os direitos sociais para toda a

população. Por fim, a necessidade de superar uma lacuna enorme do Estado

para com a população brasileira que era a exiguidade do esporte no âmbito

escolar, para além da educação física. Suspeitava-se por empiria que o índice

de pratica esportiva no pais, em especial, na faixa escolar, era muito baixo. O

PST nasceu assim, e foi sendo lapidado, crescendo e melhorando nos

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aspectos organizativos e conceituais, a ponto de ser considerado o maior

programa mundial de inclusão social pelo esporte.

4. Como foram pensadas as interfaces educacionais do PST? Quais os principais fatores que nortearam os avanços e ajustes da perspectiva metodológica do Programa ao longo de sua primeira década de implementação?

As principais interfaces foram o entendimento do papel do esporte da

escola como uma produção cultural da humanidade, com conhecimentos

significativos das práticas corporais necessários à complementação curricular e

a formação integral do estudante. No trato do esporte como seu conteúdo, o

PST avançou ao estabelecer limites e regras de convivência, na escola,

afirmando o seu caráter complementar e o respeito à disciplina de Educação

Física, um componente curricular obrigatório, que também envolve dentre os

seus conteúdos, o esporte. Outro aspecto central foi entender que a escola

pode dar condições e pode ser um campo de formação esportiva, também para

o estudante que queira e possa ingressar na base do esporte de alto

rendimento, com os atributos que essa atividade exige, em determinada fase

do desenvolvimento sem que se exija a super competitividade e alta

seletividade, mas um espaço de iniciação. Entendendo aqui, que o esporte de

alto rendimento é, sobremaneira, educativo. O PST teve como um de seus

principais avanços a participação no debate sobre um novo currículo, uma nova

escola, que propôs a ressignificação dos tempos e espaços educativos, que

incluiu o esporte como determinante na formação. Isso demarcou a parceria

com o Programa Mais Educação como forma de consolidar a escola em tempo

integral e integrado, nas escolas municipais e estaduais. E o esporte, na

perspectiva sociocultural, justificou sua importância como conteúdo educativo.

Outro avanço importante foi a consolidação como parte estruturante do

Programa a formação continuada presencial e em EAD e o acompanhamento

pedagógico pelas Universidades.

5. Pensando em um balanço da primeira década de execução do Programa, é possível apontar os fatores negativos e positivos sob o

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ponto de vista das expectativas e objetivos quando do lançamento do PST?

Positivos:

Esporte Educacional e Escolar ampliados enquanto Políticas Públicas

Aumento da capilaridade com abrangência nacional para o

enfrentamento das desigualdades regionais

Formação continuada de professores, monitores e gestores que atuaram

no programa

Acompanhamento pedagógico e administrativo das parcerias

Perspectiva intersetorial com os Programas: Mais Educação, Juventude

Viva, Jovem Aprendiz, entre outros

Negativos:

Demanda maior que a oferta, por limitação orçamentária

Dificuldades operacionais e legais dos parceiros para implementação

junto ao poder público local, especialmente para contratação de pessoal para

realização do Programa

Excessivas exigências burocráticas para a realização da parceria, desde

a celebração até a prestação de contas de convênios

A falta do Sistema Nacional do Esporte com definição de papéis,

agentes, competência e financiamento, envolvendo união, estados e

municípios e instituições privadas

Dificuldade de continuidade do Programa nas cidades, após o fim das

parcerias com a União.

6. A implementação do PST contribuiu para o fortalecimento da prática esportiva nas universidades? Por que?

Certamente contribuiu, sob dois aspectos. Ao tempo em que ampliou a

produção acadêmica do esporte educacional (conceitos, concepções e

orientações metodológicas) e apontou o tema como relevante objeto de

pesquisas em especializações, mestrados e doutorados, pode-se entender que

essa fundamentação promoveu o fortalecimento da prática esportiva nas

Universidades. Por outro lado, destaca-se em várias Instituições de Ensino

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Superior, a implantação do PST como projetos de extensão e campo de

formação acadêmica, o que concorreu para a ampliação do acesso à pratica

esportiva de universitários.

7. Por favor, se possível, liste suas tarefas e cargos exercidos no Ministério do Esporte, bem como o período de início e fim de cada atividade.

NÃO RESPONDEU

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APÊNDICE C - Questionário com o Professor Amauri Aparecido Bássoli de

Oliveira

1. O Programa Segundo Tempo pode ser considerado um marco histórico para o Esporte Brasileiro? Por que?

Não podemos dizer que o PST é um marco no Esporte Brasileiro,

mesmo porque a sua intenção não é essa. O objetivo maior do PST é se

colocar como um programa que estimule e contribua, por meio do esporte, a

conquista da cidadania e tudo que a cerca. Isso não se quer dizer que o

esporte educacional, sozinho, possa dar conta disso. A ideia é contribuir e

apoiar essa conquista, pois entendemos que o esporte em sua riqueza

pedagógica pode, com toda certeza, formar e informar com vistas a essa

contribuição social ampla.

Contudo, se olharmos para o todo do que foi produzido, por intermédio

do PST, podemos dizer que ele tem conseguido disponibilizar a comunidade

brasileira um legado pedagógico até então não existente sobre o esporte

educacional, ou seja, uma produção acadêmica muito consistente e que está

disponível a toda comunidade da área e comunidade interessada (são mais de

17 obras específicas relacionadas ao esporte educacional e suas

possibilidades pedagógicas). Houve a preocupação de se formar um

contingente de profissionais que teve a chance de uma formação sobre o

esporte e sua riqueza pedagógica (mais de 10 mil profissionais passaram pelos

processos de formação do PST), além de um processo de acompanhamento

até então não existente em programas sociais esportivos.

2. Na sua opinião, qual a importância das Universidades para o nascimento do PST, como parceiras prioritárias na elaboração das metodologias e na aplicação e acompanhamento dos fundamentos metodológicos do Programa?

A possibilidade de participação da academia nas políticas públicas do

esporte tem se constituído como uma janela de oportunidades para ambos os

lados, ou seja, tanto para nós da academia que aprendemos muito como se

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produz e se disponibiliza para a comunidade as políticas públicas (e todos (ou

quase todos) os seus entraves políticos para isso), assim como para os

gestores que assumem o esporte brasileiro. Muitas vezes os gestores não têm

relação nenhuma com o tema da pasta e isso fragiliza por completo a sua

gestão. A aproximação da academia e suas áreas especializadas contribuem

substancialmente para a qualificação das políticas públicas. Contudo, faz-se

necessário salientar que isso não garante essa qualidade almejada, pois nem

sempre os gestores acatam indicações técnicas e optam pela via da política e

as velhas práticas que conhecemos sobre os apadrinhamentos partidários e

coisas do gênero.

Em especial ao PST, podemos afirmar categoricamente que a

aproximação com a academia resultou num programa legitimado pela

comunidade da área e politicamente bem apresentado. Mas volto a salientar,

isso não garante sua permanência, o que exige vigilância de toda a categoria e

cobranças.

Mas as obras que hoje se tem disponíveis para todos se coloca, sem

dúvida, num marco para a área e representa muito bem essa importância de

aproximação entre os gestores públicos e a academia. Mais de 50 Instituições

de Ensino Superior participaram conosco dessa caminhada. Tivemos a

colaboração de mais de 300 profissionais vinculados aos cursos de Educação

Física – aqui incluídos os programas de pós-graduação lato e stricto-sensu do

país. Esses profissionais das mais diversas linhas da área conseguiram

aprender e disponibilizaram suas experiências nessa construção que

disponibilizamos a todos. Sem dúvida, essa foi uma ação imprescindível para o

sucesso atingido. Hoje temos vários cursos de formação da área que se

utilizam desses materiais pedagógicos do PST, assim como, muitas secretarias

de Estado e Município de Educação e Esporte espalhadas pelo nosso país.

3. Quais foram as motivações para a criação de um programa no formato do Segundo tempo?

A de disponibilizar para a nossa população um programa social esportivo

que pudesse contribuir com os ditames constitucionais de direito ao esporte e

lazer, assim como fazer dessa oportunidade um momento qualificado de

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formação pedagógica ampliada. Os objetivos de forma inicial foram muito

ambiciosos, mas reconfigurados com o tempo e alinhados ao tamanho das

possibilidades do programa e das possibilidades do esporte educacional.

4. Como foram pensadas as interfaces educacionais do PST? Quais os principais fatores que nortearam os avanços e ajustes da perspectiva metodológica do Programa ao longo de sua primeira década de implementação?

Como sabemos e defendemos, o esporte possui uma riqueza

pedagógica incomensurável. Entretanto, pouco fazemos uso dessa riqueza nas

práticas cotidianas da formação e da especialização esportiva. Alertar para

essa fragilidade foi uma das maiores intenções desde que chegamos na

secretaria. A área possui muitas linhas e é de conhecimento que elas pouco

dialogam. A tarefa foi a de aproveitar as riquezas pedagógicas e

conhecimentos dessas linhas e construir uma proposta que pudesse ser

socializada e subsidiar os profissionais da área no trabalho junto ao PST. Foi

um trabalho muito desgastante, mas muito rico como resultado.

Por fim, acabamos tendo um material pedagógico que aborda os

conhecimentos da antropologia, filosofia, desenvolvimento motor,

aprendizagem, questões da inclusão, gênero, metodologias de ensino,

aprendizagem qualificada do esporte, processos avaliativos e outros que

fecham o pacote pedagógico do programa. Essas áreas acabaram propiciando

a ampliação da visão dos gestores sobre o que pretendíamos com o Esporte

Educacional que é trabalhado no PST.

O que acabou norteando os avanços foi a persistência inicial do gestor

em acreditar na proposta e também defender a aproximação da academia

nessa empreita. O primeiro material construído teve muitas críticas (da própria

área, pois alguns se sentiram prejudicados pelo material disponibilizado

entendendo que faltou mais isso ou aquilo e que na visão deles não era certo e

assim por diante) e caso esse gestor não tivesse confiança teria abortado a

ideia dessa construção logo de início. Mas não foi o que aconteceu. Esse

mesmo material que teve críticas da área acadêmica (conforme citei) teve uma

aceitação enorme pela comunidade que está diretamente envolvida com o

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desenvolvimento do Esporte Educacional no cotidiano dos núcleos. Isso

reforçou enormemente a intenção de avançar e qualificar a cada dia o material,

fato esse que aconteceu logo na sequência. Depois de 2007 não se parou mais

de produzir e disponibilizar materiais de toda ordem sobre o esporte

educacional para a comunidade. Outros estão no forno e devem ser

disponibilizados ainda esse ano.

Podemos apontar como um fator muito forte, o envolvimento de

acadêmicos na organização e desenvolvimento da proposta pedagógica e suas

múltiplas possibilidades, levando para dentro da própria academia as

discussões e contribuições. Aprendemos muito com tudo isso e hoje podemos

dizer que temos um material mais próximo da realidade nacional e do

profissional que temos para desenvolver o Esporte Educacional nesse

programa social.

5. Pensando em um balanço da primeira década de execução do Programa, é possível apontar os fatores negativos e positivos sob o ponto de vista das expectativas e objetivos quando do lançamento do PST?

Vou resumir aqui em duas respostas

Positivo – o programa tem servido de exemplo de política pública.

Depois de vencidas as irregularidades por meio de um rígido controle que

construímos, acabamos virando referência de gestão pública para os órgãos de

controle. Fator muito positivo. Houve a disponibilidade de um programa com

proposta pedagógica reconhecida e consolidada junto ao Ministério do Esporte

e também no Ministério da Educação. A participação junto aos programas do

MEC foi por convite do próprio e não por oferta do ME. Isso foi muito

gratificante. Nunca tinha acontecido isso, pois os ministérios pouco dialogavam

em suas políticas. Mas isso precisa ser fortalecido. Conseguimos chegar a

todos os estados da federação, mas infelizmente não com o quantitativo de

atendimento almejado. Temos aprendido com isso também. O país é muito

grande e heterogêneo, as políticas públicas precisam considerar isso.

Ou seja, as expectativas foram mais do que atendidas, mas podem

avançar.

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Negativos – a falta de conhecimento dos gestores públicos e os

interesses políticos se sobrepondo aos interesses gerais da nossa população.

Esse tem sido um aprendizado muito dolorido. Infelizmente nessa organização

política que temos, pouco podemos fazer, o que nos resta (momentaneamente)

é ficar vigilantes e cobrar o atendimento do que deu certo. Mas reforço essa

opinião, não é tarefa fácil, pois o sujeito que senta no comando tem o poder de

simplesmente anular tudo que foi feito. Isso é inadmissível, mas uma realidade!

Outro ponto negativo que coloco é ainda a fragilidade da formação do

profissional de Educação Física e sua postura ética. Apesar de tudo o que é

disponibilizado a ele – material pedagógico, formação continuada via EAD,

formação presencial, acompanhamento pedagógico pelas Equipes

Colaboradoras e outras ações – ainda temos muito do famoso processo “rola

bola”! É muito triste afirmar isso, mas ainda é uma realidade. Nosso profissional

tem um canhão pedagógico em suas mãos e pouco uso faz dele. O esporte é

muito rico e não pode ser diminuído e relegado ao ensino de técnicas puras e

simplistas. Essa é uma tarefa que a área como um todo tem que trabalhar

melhor.

Mais um ponto muito complexo para as políticas públicas relacionadas a

convênios é a burocracia. A grande maioria dos municípios brasileiros tem

dificuldades em RH qualificado para atender a todas as exigências dos

processos de conveniamento com o órgão federal. Mas refuto que em muitos

casos essas exigências se fazem necessárias, pois do contrário as verbas

acabam se diluindo e não chegando até os que devem chegar. Mesmo assim

ainda temos problemas.

6. A implementação do PST contribuiu para o fortalecimento da prática esportiva nas universidades? Por que?

Não! Não tinha essa intenção também. O que foi é que vindo de

Universidade, vimos o que fizeram com as práticas esportivas, ou seja,

eliminaram. Então propusemos a criação do PST Universitário com o intuito de

estimular a volta dessas práticas que julgamos ser muito importantes para o

jovem universitário. Infelizmente os cortes de verbas não possibilitou voos mais

significativos do programa, assim como a burocracia das diversas IES para o

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desenvolvimento do programa. Mas ele ainda está disponível e estruturado,

continuamos persistentes na ideia. Entretanto, ainda com muito pouca inserção

nas universidades.

7. Por favor, se possível, liste suas tarefas e cargos exercidos no Ministério do Esporte, bem como o período de início e fim de cada atividade

Na verdade, não temos vínculo direto com o Ministério do Esporte.

Nosso vínculo é por intermédio de um projeto de extensão da UFRGS com

participação direta da Universidade Estadual de Maringá e Universidade

Estadual de Londrina. Nesse sentido, nos vinculamos e vinculamos todos os

demais docentes participantes do projeto (muitos participam e saem de acordo

com as demandas que temos). Elaboramos o projeto como forma de atender a

um pedido inicial do ME que era o de qualificar o PST e depois formos

reelaborando, pois foram surgindo novas demandas e projetos.

Nesse sentido, acabamos atuando por intermédio de nossas IES na

condição de colaboradores por meio desse projeto. Nossa função é atuar na

estruturação e desenvolvimento do esporte educacional e contribuir com a

SNELIS nessa estrutura das políticas públicas vinculadas. Em alguns

momentos temos participação mais efetiva, pois os gestores nos consideram e

aproveitam mais dessa possibilidade e em outros apenas damos conta de uma

ou outra tarefa. Tudo depende da visão que os gestores têm. Já passamos por

muitos cenários. Mas estamos confiantes de que as coisas possam melhorar.

Não está muito fácil não.

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APÊNDICE D - Questionário com a Professora Amanda Corrêa Patriarca

1. O Programa Segundo Tempo pode ser considerado um marco

histórico para o Esporte Brasileiro? Por que? Sim, o PST pode ser considerado um marco histórico para o Esporte

Brasileiro, pois é o pontapé inicial de uma política pública esportiva abrangente

que responde às demandas da própria Constituição Federal e, principalmente

uma política que não se preocupa somente com a ascensão esportiva do Brasil

enquanto uma potência em megaeventos. Mas principalmente, por olhar os

beneficiados – crianças, adolescentes e jovens em áreas de vulnerabilidade

social – como seres humanos. E, a proposta pedagógica desenvolvida ao longo

dos anos demonstra claramente essa preocupação na humanização do

beneficiado, não somente sua esportivização.

2. Na sua opinião, qual a importância das Universidades para o nascimento do PST, como parceiras prioritárias na elaboração das metodologias e na aplicação e acompanhamento dos fundamentos metodológicos do Programa?

A parceria com as Universidades se deu para responder à urgente

necessidade de capacitação e acompanhamento dos convênios que

desenvolviam as atividades. No princípio eram poucos parceiros que

acompanhavam todo o território nacional, disseminando a proposta

pedagógica, capacitando os professores/profissionais à frente do

desenvolvimento das atividades com os beneficiados. Como todos os

processos que envolveram o desenvolvimento do PST, esse também teve

algumas alterações. Criou-se uma teia/rede de parcerias com professores de

várias universidades para o melhor desenvolvimento das atividades, garantindo

também o respeito às diferenças regionais. Essa teia/rede foi denominada de

“Equipes Colaboradoras”, que eram responsáveis pela capacitação e

acompanhamento de todos os convênios que desenvolviam o PST em todo o

país. No ano de 2015, eram 14 Equipes, com 119 professores, todos

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vinculados a Instituições de Ensino Superior – tanto professores, quanto alunos

de programas de pós-graduação.

3. Quais foram as motivações para a criação de um programa no formato do Segundo tempo?

Desconheço as motivações políticas à época. No entanto, no quadro de

criação do Ministério do Esporte, contávamos com renomados intelectuais da

área da Educação Física, que se mostraram bastante interessados em

construir políticas públicas com viés progressista nas dimensões do esporte

educacional – PST – e, de participação – PELC. Dessa forma, penso que a

correlação de forças políticas e pedagógicas foi propícia para o

desenvolvimento de programas progressistas e que se preocupavam com a

formação humana/cidadã dos beneficiados, com propostas pedagógicas

concretas. Isso foi possível por se tratar de um Governo Federal progressista e

que concentrou esforços no desenvolvimento de políticas públicas de caráter

social.

4. Como foram pensadas as interfaces educacionais do PST? Quais os principais fatores que nortearam os avanços e ajustes da perspectiva metodológica do Programa ao longo de sua primeira década de implementação?

Não estive à frente dos trabalhos que envolveram a elaboração

pedagógico-metodológica do PST. Mas houve sempre o esforço de realizar

avaliações de todo o processo e a necessidade de alteração das propostas de

acordo com o tempo, para que, então a proposta pedagógica do PST pudesse

apresentar a maturidade conceitual que possui hoje.

5. Pensando em um balanço da primeira década de execução do Programa, é possível apontar os fatores negativos e positivos sob o ponto de vista das expectativas e objetivos quando do lançamento do PST?

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Não tenho condições de realizar tal avaliação por não ter feito parte da

gestão nesse período ou ter acesso às expectativas criadas quando de sua

elaboração. Mas como estudiosa da área, posso falar como professora que o

desenvolvimento do PST foi um salto qualitativo no âmbito das políticas

públicas, por ter focado o caráter educacional do esporte, por ter aberto portas

para milhões de crianças, adolescentes e jovens em áreas de vulnerabilidade

social, levando dignidade por meio do esporte. Sem cair nas falaciosas

afirmações de salvacionismo pelo esporte, pois esta não é uma regra, mas

uma exceção. Porém o esporte faz parte da humanização de nossa juventude

e, portanto, uma política pública que se preocupa com a forma como esse

esporte está sendo desenvolvido em todo o país, é de suma importância, por

considerar o beneficiado enquanto sujeito criador de sua própria história. Outra

característica importante da criação do PST foi a visibilidade enquanto política

formativa, a ponto de ter sido inserida em um programa de Educação Integral

do Ministério da Educação – Programa Mais Educação, por compreender o

importante papel do esporte e das práticas corporais na humanização e na

formação de um sujeito crítico, reflexivo e atuante em sua comunidade.

6. A implementação do PST contribuiu para o fortalecimento da prática esportiva nas universidades? Por que?

Menos do que gostaríamos. Embora as universidades tivessem tido um

grande protagonismo na elaboração e desenvolvimento pedagógico do PST ao

longo dos anos, o desenvolvimento do programa dentro das universidades não

foi tão expressivo quanto o desenvolvimento por prefeituras (por exemplo). Ou

quando este se desenvolveu, por inúmeras razões, não houve sua

continuidade. Mas grande parte dos atendimentos de excelência se deram

dentro de parcerias estabelecidas com Universidades.

7. Por favor, se possível, liste suas tarefas e cargos exercidos no Ministério do Esporte, bem como o período de início e fim de cada atividade.

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Estive no Ministério do Esporte por 2 momentos, ambos com vínculo de

bolsista pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), parceria

estabelecida com o ME para centralizar o acompanhamento pedagógico e

operacional do PST.

Em 2012 (até outubro de 2013) estive na CGAO – Coordenação Geral

de Acompanhamento Operacional – minha atividade era com os convênios em

desenvolvimento. Minha responsabilidade era a de orientar e acompanhar os

parceiros na execução física e financeira dos convênios, cabendo visitas in loco

quando necessário.

Em 2015 (até março de 2017) retorno ao ME na CGIPI – Coordenação

Geral de Implantação de Políticas Intersetoriais – mais tarde transformada em

CGEE – Coordenação Geral de Esporte e Educação. Esta coordenação era

responsável pela parte pedagógica com PST e pela parceria com o MEC,

através do Programa Mais Educação. Minha responsabilidade era dar suporte

pedagógico aos convênios do PST (quando necessário) e aos técnicos de

acompanhamento operacional (da CGAO), bem como comunicação direta com

os representantes das secretarias municipais e estaduais de educação para a

capacitação dos professores/profissionais que desenvolviam as atividades do

Programa Mais Educação – Atividade Esporte da Escola (Atletismo/Múltiplas

vivências esportivas). Essa capacitação se dava in loco, com viagens a todo o

Brasil para disseminar a proposta pedagógica desenvolvida a partir da proposta

do PST, bem como a distribuição de material pedagógico e o acompanhamento

dos professores das EC´s que auxiliavam no desenvolvimento das

capacitações presenciais e em EAD. Minhas atividades também se

direcionavam a qualquer atividade que envolvesse política de esporte

educacional, para além do PST e do Mais Educação.

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APÊNDICE E - Questionário com a Professora Andréa Carvalho Alfama

1. O Programa Segundo Tempo pode ser considerado um marco histórico para o Esporte Brasileiro? Por que?

Sim, pois pela primeira vez na história, e isto ocorreu a partir de 2003, o

esporte foi tratado como política de Estado. O Programa Segundo Tempo,

dado o alcance, capilaridade e objetivos, pode ser considerado um dos maiores

programas de esporte educacional do mundo.

2. Na sua opinião, qual a importância das Universidades para o nascimento do PST, como parceiras prioritárias na elaboração das metodologias e na aplicação e acompanhamento dos fundamentos metodológicos do Programa?

As universidades são parceiras na elaboração das metodologias,

aplicação e acompanhamento. Sem elas, o levantamento de dados, a

aplicação das metodologias corretas, e avaliações para o aperfeiçoamento do

programa não seria possível, dada a limitação de pessoal no Poder Executivo

para prestar este serviço à população. Ao mesmo tempo em que as

Universidades aferem de forma científica os índices sobre a aplicabilidade do

programa, contribui para reajustamento de diretrizes, avaliação de

experiências, e prestam um serviço de qualidade à população.

3. Quais foram as motivações para a criação de um programa no formato do Segundo tempo?

Acredito que, principalmente, democratização e universalização da

prática esportiva e promoção de saúde para aqueles que se encontram em

idade escolar.

4. Como foram pensadas as interfaces educacionais do PST? Quais os principais fatores que nortearam os avanços e ajustes da perspectiva

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metodológica do Programa ao longo de sua primeira década de implementação?

Exatamente nos princípios elencados na Lei 9.615/98, em seu art. 3°, I:

“Desporto educacional, praticado nos sistemas de ensino e em formas

assistemáticas de educação, evitando-se a seletividade, a hipercompetitividade

de seus praticantes, com a finalidade de alcançar o desenvolvimento integral

do indivíduo e a sua formação para o exercício da cidadania e a prática do

lazer”.

5. Pensando em um balanço da primeira década de execução do Programa, é possível apontar os fatores negativos e positivos sob o ponto de vista das expectativas e objetivos quando do lançamento do PST?

Fatores negativos: Alcance ainda pendente de aperfeiçoamentos,

dificuldades do Poder Público no tocante à fiscalização dos recursos

destinados ao Programa. Pontos Positivos: democratização e difusão da

prática esportiva nas escolas, promoção de saúde, bem-estar aos

participantes, participação das universidades na construção implementação e a

avaliação do programa.

6. A implementação do PST contribuiu para o fortalecimento da

prática esportiva nas universidades? Por que? Pela denominação da Lei 9.615/98 (Lei Pelé) o esporte educacional não

se limita à prática nas escolas de ensino fundamental e médio. À medida em

que há a difusão da prática esportiva para aqueles em idade escolar, com a

utilização de métodos, experimentação empírica, implementação de diretrizes

cientificamente aferidas, não há porque não as aplicar (resguardadas as

respectivas particularidades) no âmbito do esporte universitário, em pese este

alcance ainda ser insuficiente.

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7. Por favor, se possível, liste suas tarefas e cargos exercidos no Ministério do Esporte, bem como o período de início e fim de cada atividade.

Coordenadora de Orientações e Normas, Coordenadora de Pré-Análise

do Departamento de Incentivo e Fomento ao Esporte - DIFE (mai/2009-

mar/2012), Assessora do Diretor do Departamento de Gestão Interna - DGI

(mar/2012-jun/2013), Chefe de Gabinete da Secretaria Nacional de Educação,

Esporte, Lazer e Inclusão Social - SNELIS, (ago/2013-jan/2015).

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APÊNDICE F - Questionário com a Professora Andréa Nascimento Ewerton

1. O Programa Segundo Tempo pode ser considerado um marco histórico para o Esporte Brasileiro? Por que?

Sim, considero o Segundo Tempo um marco na medida em que pela

primeira vez chega em todos os Estados, foi um Programa Federal que em

uma de suas vertentes: Padrão, Forças no Esporte, Universitário, Navegar ou

Esporte da Escola em parceria com o MAIS EDUCAÇÃO, conseguiu ampliar a

abrangência de um programa Federal Esportivo na dimensão Educacional

chegando a mais da metade dos municípios brasileiros, atingindo a meta de

mais de 4 milhões de beneficiados entre os anos de 2004 a 2015. Números

antes nunca atingidos. E ainda considero marco a inovação na gestão e a

parceria com Universidades na elaboração, implementação, formação,

documentação e informação, acompanhamento e avaliação. Mais ainda se

torna marco por inovar em tecnologia de gestão, formação e avaliação de

Politicas Publicas. E foi um programa que gerou produção de conhecimento,

fomentando publicações e pesquisas e fortalecendo o papel das Universidades

na relação com gestores públicos de esporte e lazer. Acredito que as

Universidades têm um papel social de produção e difusão de conhecimento a

serviço da construção de mudanças significativas na vida das pessoas.

Quebrar a barreira e a distância entre o conhecimento produzido e socializado

e sua aplicabilidade na vida da população tem sido um desafio, e penso que foi

isso que essa parceria trouxe. Ganha a universidade, ganha os gestores

públicos de esporte e lazer, e a população tem assim seus direitos de forma

mais qualificada sendo atendidos. Não teríamos conseguindo implantar uma

rede tão capilar de documentação, monitoramento e formação de gestores,

professores e monitores senão fosse essa parceria. Além do forte impacto de

produção e difusão do conhecimento do campo da educação física e do

esporte educacional, geração de renda e incentivo a iniciação cientifica que

essa parceria possibilitou.

2. Na sua opinião, qual a importância das Universidades para o nascimento do PST, como parceiras prioritárias na elaboração das

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metodologias e na aplicação e acompanhamento dos fundamentos metodológicos do Programa?

Considero estruturante e estratégica a parceria com as Universidades,

penso que a Universidade se qualifica com a relação com as gestões públicas

a medida em que dá sentido e significado a sua produção e as gestões

públicas se qualificam a medida em que lançam mão da produção acadêmica e

da capilaridade das Universidades possibilitando assim elaborações e

aplicabilidades que estão conectadas a realidade das comunidades onde os

programas são implementados. Tornando a produção intelectual indissociável

das demandas da população e assim fortalecendo o fomento e difusão do

esporte e do lazer com direitos sociais e dever do Estado. E traçando o

caminho para que esporte e lazer passem a ser Politicas de Estado e não

apenas de mandatos governamentais.

3. Quais foram as motivações para a criação de um programa no formato do Segundo tempo?

A motivação foi a PRIORIDADE dada pela Gestão Federais no Governo

LULA DA SILVA de inclusão social, de inversão de prioridade, de garantia de

direitos. Neste sentido, a luz da própria Constituição Federal de 1988, que em

seus Arts 6º e 217º apontam o esporte como direito de cada um e dever do

Estado, e a Lei Pelé que define a priorização do Esporte Educacional, o

Estatuto da Criança e do Adolescente que também marcam a importância da

garantia do acesso ao esporte e ao lazer, podem ser consideradas bases

legais que motivaram a criação do Programa. Mas considero ainda o diálogo

com as gestões municipais e estaduais no sentido de criar um programa em

que as diferentes esferas pudessem de forma articulada e complementar

ampliar o acesso da população na faixa etária escolar ao esporte e ao lazer,

foram também motivadores da criação do PST. Sem esquecer que foi

significativo olhar para produção intelectual acerca da educação física, esporte

e lazer, também como referência na criação do programa.

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4. Como foram pensadas as interfaces educacionais do PST? Quais os principais fatores que nortearam os avanços e ajustes da perspectiva metodológica do Programa ao longo de sua primeira década de implementação?

Interfaces educacionais do PST, foram pensadas no sentido de perceber

o papel do esporte e do lazer para escolares, atentos a necessidade de não

confusão ou submissão ou substituição ao acesso à disciplinar curricular

Educação Física, atentos ainda a superação da supremacia das ciências da

saúde em detrimento aos conhecimentos da ciência das humanidades nas

práticas do esporte e do lazer, da supremacia do biológico sobre o social, da

influência e submissão aos ditames do esporte institucionalizado fortemente

traduzido pelos modelo de alto rendimento, a necessidade de romper a

monocultura do futebol, sendo necessário fomentar e difundir novas práticas

corporais e modalidades esportivas. Penso que foram essas interfaces e

concepções que levaram ao aprimoramento e ajustes da perspectiva

metodológica do Programa ao longo de sua primeira década de

implementação.

5. Pensando em um balanço da primeira década de execução do Programa, é possível apontar os fatores negativos e positivos sob o ponto de vista das expectativas e objetivos quando do lançamento do PST?

Sim, posso destacar como pontos positivos:

1- A ampliação e capilaridade do atendimento nos diversos Estados;

2- O aceno muito positivo dos gestores locais para implementação

do Programa;

3- A parceria com as Universidades;

4- O reconhecimento do Governo da relevância do Programa;

5- As ações intersetoriais que o programa traçou com a Educação,

Saúde, Cultura, Defesa e Segurança, Juventude, Direitos humanos,

Assistência Social;

6- A geração de emprego e renda;

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7- A produção acadêmica, fomento a iniciação científica, e

aprimoramento pedagógico e metodológico;

8- A Formação dos trabalhadores e demais gestores do programa.

Como pontos negativos:

1- Recursos ainda insuficientes para o atendimento da demanda

nacional;

2- Baixa capacidade técnica, orçamentária/financeira e de pessoal

nas gestões locais;

3- Dificuldades operacionais e burocráticas para estabelecimento

das parcerias locais;

4- Descontinuidade nas gestões quer seja Federal, Estadual e

Municipal;

5- Desigualdades regionais que dificultam acesso a informação e

implementação de programas.

6. A implementação do PST contribuiu para o fortalecimento da prática esportiva nas universidades? Por que?

Infelizmente a vertente do PST que poderia ampliar a prática esportiva

nas universidades não teve grande abrangência e capilaridade. Portanto esse

impacto não foi significativo. O que foi fortalecido nas Universidades com o

PST foi o campo de conhecimento, as práticas de iniciação científica e a

geração de renda aos estudantes que foram inseridos como monitores nas

centenas de parcerias do Programa pelo Brasil afora.

7. Por favor, se possível, liste suas tarefas e cargos exercidos no Ministério do Esporte bem como o período de início e fim de cada atividade.

De 2003 a 2006- Coordenadora geral de Programas Sociais DPSEL/

SNDEL o 2006 a 2008- Diretora de Programas Sociais DPSEL/SNDEL o 2004/

2006/2010 COORDENADORA DAS CONFERENCIAS NACIONAIS DO

ESPORTE o 2008- 2011- BOLSISTA UFRGS /ME Coordenadora de área da

parceria com o SEGUNTO TEMPO o 2011 - 2012 Coordenadora Geral de

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Acompanhamento Operacional DEGEP/SNELIS o 2013- 2015 Diretora dos

Programas Sociais DEDAP/SNELIS

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APÊNDICE G - Questionário com a Professora Cássia Damiani

1. O Programa Segundo Tempo pode ser considerado um marco histórico para o Esporte Brasileiro? Por que?

O Programa Segundo Tempo é de fato um marco para o esporte

brasileiro. Foi o primeiro e principal programa criado no Governo Lula da Silva,

sob a insígnia da inclusão social. O Ministro à época era Agnelo Queiroz, que

designou o então Secretário Nacional do Esporte, Orlando Silva a elaborar um

Programa que atendesse à demanda estratégica presidencial, que compusesse

com as demais áreas sociais, um esforço emergencial para possibilitar o

acesso às políticas públicas de diversos setores àqueles que historicamente

estavam aviltados de seus direitos. Dessa forma, o programa tinha que seguir

regras administrativas de legais existentes, ao tempo em que deveria ser

inovador para ampliar o acesso ao esporte, atendendo aos preceitos

constitucionais de predominância ao esporte educacional. O desafio foi muito

grande, pois foi necessário aproveitar a funcionalidade de programas

previamente existentes, como o Esporte Solidário e esporte na Escola, que

tinham abrangência limitada e focal, e dar amplitude nacional. O conceito do

programa foi elaborado com a colaboração de especialistas, e logo fora criado

um Curso de Especialização em EAD, em parceria com a UNB, para capacitar

os coordenadores e professores do Programa. Eu participei da elaboração da

primeira proposta de Diretrizes e ações da Política Nacional do Esporte, e do

PST como sendo o principal programa esportivo de inclusão social. No entanto,

muitos entraves foram aparecendo para que o mesmo ganhasse grande escala

nacional, uma delas era a baixa capacidade operacional dos municípios e

estados a cumprirem as regras formais para efetivar convênios com o

Ministério do Esporte. De partida, foi necessário deflagrar o programa

conveniando com as Organizações Não-Governamentais ONG.

Posteriormente, isso foi sendo superado, os as Unidades federativas foram se

capacitando para receber os demais programas federais e a maioria dos

convênios passou a ser efetuado com as mesmas.

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2. Na sua opinião, qual a importância das Universidades para o nascimento do PST, como parceiras prioritárias na elaboração das metodologias e na aplicação e acompanhamento dos fundamentos metodológicos do Programa?

Desde o início do PST as universidades se fizeram presentes, essa era

uma das preocupações do Secretário Nacional, que pouco tempo depois

tornou-se Secretário Executivo. Porém, houve uma participação muito grande

de gestores e especialistas que tinham experiência em outras áreas do

conhecimento, que foram valorizados. Esse ponto foi de fundamental

importância, ao meu ver, pois durante muito tempo a academia produz

conhecimento aparteada das necessidades objetivas da realidade, em especial

no esporte. Foi preciso que o estado provocasse as IES para que pautassem o

esporte, como área de atuação e intervenção acadêmica, seja para a produção

científica ou extensão universitária. No caso particular da metodologia do PST,

houve vários estágios na vida do programa. Em seu nascedouro, a academia

não foi decisiva ou prioritária para a elaboração metodológica. Valeu pela

urgência, a experiência dos membros da equipe gestora que já estava no

antigo Ministério de Turismo e Esporte, que se somou a alguns novos, seja

oriundo da academia ou de outros segmentos educacionais. Na partida, um

grupo adhoc também contribuiu com a elaboração dos conteúdos do Curso de

especialização em EAD, depois implementado pela UnB. Além do material

instrucional que foi produzido, com a participação de especialistas em

educação física, registra-se que não fora possível, naquele momento,

selecionar conteúdos que tivessem afinidade com teorias do conhecimento que

fundamentassem a pedagogia crítica, que tratassem o esporte de forma

avançada, que buscassem romper com a falsa dicotomia entre esporte

“educacional” e esporte de alto rendimento. Conforme o programa foi sendo

implantado, e a necessidade de acompanhamento pedagógico foi surgindo, os

materiais instrucionais foram sendo aperfeiçoados, e a abordagem

metodológica foi, na prática superando essa lacuna sobre o esporte que evita a

hipercompetitividade e a aprendizagem do esporte para a vida, inclusive para a

competição. Penso que teve dois saltos qualitativos, o primeiro grande avanço

foi a criação de uma rede nacional, a partir de uma universidade federal, a

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UFRGS, para garantir o acompanhamento do programa, desde a seleção dos

coordenadores, professores e estagiários à capacitação em serviço e a

avaliação do processo, continuamente – isso tudo com um sistema

informacional que desse segurança na obtenção dos dados. Além da revisão e

produção dos materiais didáticos e metodológicos, com a participação da

Universidade Estadual de Maringá UEM. O segundo, foi a instituição da

parceria com o Programa Mais Educação, que além de avançar no trato

intersetorial do programa com outras áreas, melhorou o conceito do programa,

delimitando-o em relação à disciplina de Educação Física, um componente

curricular da escola e ampliou, sobremaneira, a escala de atendimento do

programa nas escolas de baixo IDEB. Vale destacar, que o viés de inclusão

social, sempre presente no programa foi sendo aperfeiçoado, junto as outras

estratégias da Presidência da República, e incorporando a qualidade das

políticas exigidas pelos sujeitos de direito. Não bastava o acesso a prática

esportiva, mas uma prática qualificada que desse oportunidades para saídas

no mundo do esporte, muitos desses egressos partiram para a base do esporte

de alto rendimento, sem contradições com as práticas corporais

experimentadas no PST. Enfim, as universidades que se envolveram

diretamente com o programa, seja em sua parte metodológica, organizativa,

seja com a criação de núcleos do programa em seus campi, contribuíram muito

para tais avanços.

3. Quais foram as motivações para a criação de um programa no formato do Segundo tempo?

A principal motivação foi política, era preciso dar uma resposta eficaz

quanto a importância de o esporte tornar-se política pública de primeira

grandeza, fazendo-se cumprir o Art. 217 da Carta Magna, tão aviltada hoje em

dia. Outra motivação importante era a necessidade de superar políticas focais

para galgar um horizonte de universalidade para o acesso ao esporte.

Democratizar o acesso articulado com a inclusão social, essa foi uma marca

inicial que rendeu muitos louros ao programa, inclusive o reconhecimento pela

UNESCO de maior programa de inclusão esportiva o mundo. Havia outra

motivação mais técnica, que pude perceber na fase de implantação do

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programa, era a necessidade de entender a escola como um espaço em que o

esporte pudesse ser aprendido e praticado sem resistências ou preconceitos, e

assim se buscou romper a aparente contradição entre o esporte educacional e

o esporte de alto rendimento, praticado na escola. Essa abordagem surge

como resistência de diversos setores, ao processo tecnicista pelo qual passou

a disciplina de educação física à época da ditadura civil-militar, que deu caráter

utilitarista a essa disciplina, submetendo-a à lógica de aptidão e resultados

esportivos. Na cultura corporal brasileira houve uma ruptura entre as práticas

corporais e o esporte. Entendendo o esporte como a prática mais desenvolvida

nesse âmbito do conhecimento, o programa buscou reconciliar, no âmbito da

escola, a possibilidade de se participar das aulas de Educação Física e no

outro turno, fazer esporte, vivenciando, aprendendo a jogar e até se

preparando para ser um atleta, se possível. Esse foi o maior desafio, mas

suscitou grandes reflexões e debates, muito atuais, na academia. Muitas teses

acadêmicas foram produzidas sobre o programa, em todos os seus aspectos.

4. Como foram pensadas as interfaces educacionais do PST? Quais os principais fatores que nortearam os avanços e ajustes da perspectiva metodológica do Programa ao longo de sua primeira década de implementação?

A interface educacional do PST mais relevante foi ter o conteúdo

esporte, reconhecido no trato do conhecimento e na organização do espaço e

tempo escolar, redundando na articulação com o Programa Mais Educação

para viabilizar, nas escolas públicas dos municípios e estados, a chamada

escola em tempo integral com atividades integradas. Ou seja, o conteúdo

esporte, constou no debate e foi considerado sob uma dimensão mais ampla,

essencial na formação humana e conteúdo educativo. Isso se deu nas

discussões, país a dentro, sobre o novo currículo escolar, num momento em

que a escola estava se repensando como um todo – o que se chamou de uma

nova escola. Outro aspecto importante para se considerar as interfaces é o

esforço em tornar o Programa em política de estado, com todos os

mecanismos que os demais programas educacionais governamentais têm, um

sistema de informação, um sistema de avaliação e a para isso formação

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continuada, que combinou as modalidades presencial e EAD, a revisão

constante dos materiais pedagógicos e a revisão permanente da sua

metodologia, a partir de encontros regionais e nacionais com os coordenadores

e professores das universidades que estão envolvidas com o PST. Isso tudo é

subsidio para aperfeiçoar o acompanhamento pedagógico que é feito de forma

contínua pelas Universidades.

5. Pensando em um balanço da primeira década de execução do Programa, é possível apontar os fatores negativos e positivos sob o ponto de vista das expectativas e objetivos quando do lançamento do PST?

Os aspectos negativos que podem ser relatados são advindos mais da

limitação da estrutura do Estado do que do programa, em si.

Poderia elencar:

1) A inexistência de dispositivos legais que regrem os papéis,

competência e responsabilidades, hierarquia e o financiamento do esporte,

diante dos entes federativos e instituições privadas – ausência do Sistema

Nacional do Esporte

2) O programa não está regrado em lei, o que faculta a sua extinção, se

for a vontade de gestores

3) A baixa capacidade de universalizar o acesso ao esporte pelos

estudantes matriculados nas escolas públicas de ensino fundamental, em

especial, ensino médio

4) A interrupção da parceria com o MEC, em 2016, entre o PST e o Mais

Educação o que representou um retrocesso na intersetorialidade e ampliação

do programa

5) A baixa capacidade de se atender outras demandas do PST junto a

comunidades tradicionais, em especial, nas regiões menos desenvolvidas do

país

6) Os limites orçamentários impostos ao programa, devido aos diversos

contingenciamentos pelo déficit fiscal

7) Alta complexidade das exigências legais e administrativas para

formalização, execução e prestação de contas de convênios

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8) A dificuldade dos municípios e estados em firmar convênios com a

União, seja por baixa capacidade técnica para atender aos quesitos legais e

administrativos ou por inadimplência

Dos aspectos positivos, destaco:

1) Um programa reconhecido internacionalmente, com conteúdo e

metodologia sólidos e balizados pela academia e pela prática real

2) Afirmou a intersetorialidade com ouros programas governamentais,

como forma de ampliação e atenção a diversidade dos segmentos e setores

sociais, como juventude, universitários, militares, mulheres, indígenas,

quilombolas e ribeirinhos,

3) Demonstração cabal de que é possível universalizar a prática

esportiva, sem comprometer o Projeto Político Pedagógico da escola, pois

ampliou o acesso à prática esportiva na década analisada

4) Enfrentou e consolidou a formação continuada e em serviço, dos

quadros do PST com acompanhamento das universidades

5) Aperfeiçoou e manteve o acompanhamento pedagógico e

administrativo pelas universidades, servido de base para a avaliação do

programa e seus envolvidos

6. A implementação do PST contribuiu para o fortalecimento da prática esportiva nas universidades? Por que?

A minha percepção é que, nesse aspecto, o resultado ficou aquém do

esperado, seja porque o programa demorou muito tempo para ser

implementado nas universidades, para ampliar o acesso de estudantes a

prática esportiva, ou seja, porque a dinâmica universitária com características

auto-gestionárias se chocava com o modelo do PST, que precisou ser

remodelado para atender a essa necessidade, até sua implementação. A

adesão não foi massiva, como na Educação Básica. Porém, tornou-se um

programa modelo a ser seguido e implementado nas universidades, nesse

aspecto inovador, houve certamente uma contribuição, considerando que pela

pesquisa realizada pela ANDIFES, os universitários têm a prática esportiva

como a segunda demanda de atividades que gostariam de ter na sua

instituição, é possível unir a metodologia do PST Universitário, já aprovada por

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algumas IES, com a vontade política dos seus gestores, e implantarem o

programa. De outro ângulo, o PST passou a ser objeto de estudo nos principais

grupos de pesquisa que estudam o esporte, muita produção científica foi

gerada, e materiais foram propostos, essa também é uma forma de referendar

o interesse e o avanço do programa sobre a prática esportiva, inclusive em

outras áreas afins, para além dos cursos de Educação Física. Vimos, com a

preparação dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016 muitos estudos

fomentados pelo ME e CNPq, que geraram novos conhecimentos na área de

engenharia, administração, meio ambiente, saúde, tecnologia, esporte, entre

outras que contribuíram com o avanço sobre a área do esporte que puderam

incentivar a prática esportiva, inclusive de universitários, pela visibilidade que

esse tema ganhou.

7. Por favor, se possível, liste suas tarefas e cargos exercidos no Ministério do Esporte, bem como o período de início e fim de cada atividade.

1) Ocupei o cargo de Diretora do Departamento de Esporte Universitário,

na então Secretaria Nacional de Esporte Educacional, em 2005 - 2006.

Responsável pelo acompanhamento dos jogos escolares e jogos universitários,

nacionais e

Internacionais, bem como, pela elaboração da versão do PST

Universitário, e pela criação do fórum de gestores de esporte universitário, com

os dirigentes das Associações Atléticas Acadêmicas, Federações de Esporte

Universitário e a CBDU.

2) Assessora Especial do Ministro Orlando Silva, 2006 - 2008

responsável pela elaboração das políticas de esporte, pela articulação dessas

políticas com os segmentos esportivos constantes no Conselho Nacional do

Esporte e outras instâncias de diálogo, como a Conferência Nacional do

Esporte que coordenei a sistematização de conteúdos nas duas primeiras

edições. Também responsável por gerar conteúdos para as exposições do

ministro e de dirigentes. Membro do Conselho Nacional de Juventude.

3) Diretora de Programas, na Secretaria Executiva, 2008 – 2011,

responsável pela realização da terceira Conferência Nacional do Esporte que

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168

fiz a coordenação geral, pela elaboração das Mensagens Presidenciais anuais,

pela confecção dos relatórios de Gestão Anuais, pelos documentos de

transição de governo (Lula/Lula, Lula/Dilma), planejamento e representação do

ministério em câmaras, comissões e grupos de trabalho intersetoriais, palestras

nacionais e internacionais sobre as políticas públicas de esporte, elaboração de

artigos, livros e publicações institucionais.

4) Diretora de Planejamento e Gestão Estratégica, na Secretaria

Executiva, 2011 -2016, responsável pela inter-relação das atividades das

secretarias finalísticas, pela elaboração dos Planos de ação, relatórios anuais

de contas, mensagens Presidenciais, elaboração conceitual de novos

programas esportivos como a gestão compartilhada das Praças da Juventude,

posteriormente das PECs, junto ao Ministério da Cultura, o Centro de Iniciação

ao Esporte CIE. Diretora de Programa de cooperação internacional com a

Organização dos Estados Ibero-americanos, pelo Planejamento estratégico do

ME, montagem do escritório de gestão do ME, representante do ME em

comissões e conselhos intersetoriais, em especial sobre a questão de gênero e

a questão racial, com a SPM/PR e SEPPIR/PR. Membro do Conselho Nacional

do Esporte, autora do projeto e presidente do Comitê Gestor do Diagnóstico

Nacional do Esporte, coordenadora do Grupo de Trabalho sobre o Projeto de

Lei de Diretrizes e Bases do Sistema Nacional do Esporte, responsável pelo

controle do orçamento e finanças do Ministério do esporte, por elaborar as

propostas da Lei Orçamentária Anual, e por monitorar sua execução junto às

secretarias finalísticas, secretaria executiva e gabinete ministerial.

Acompanhamento e controle especial do orçamento e finanças dos projetos da

Copa do Mundo FIFA 2014 e dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016.

5) Secretária-Executiva substituta, até abril 2016, quando ocorreu o

golpe de estado sobre o legitimo governo democrático e popular, da Presidente

Dilma Roussef.