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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
CENTRO DE EDUCAÇÃO
PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
CURSO DE MESTRADO
LINHA DE PESQUISA: EDUCAÇÃO E LINGUAGEM
O USO DE RECURSOS DIDÁTICOS E OS DIREITOS DE APRENDIZAGEM
DE APROPRIAÇÃO DO SISTEMA DE ESCRITA ALFABÉTICA POR
PROFESSORES DO 1º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL
RECIFE
2016
ERIKA SOUZA VIEIRA
O USO DE RECURSOS DIDÁTICOS E OS DIREITOS DE APRENDIZAGEM
DE APROPRIAÇÃO DO SISTEMA DE ESCRITA ALFABÉTICA POR
PROFESSORES DO 1º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação da Universidade Federal de
Pernambuco, na Linha de Pesquisa Educação e
Linguagem, como requisito parcial à obtenção do
grau de Mestre em Educação.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Ana Cláudia Rodrigues
Gonçalves Pessoa
RECIFE
2016
ERIKA SOUZA VIEIRA
O USO DE RECURSOS DIDÁTICOS E OS DIREITOS DE APRENDIZAGEM DE
APROPRIAÇÃO DO SISTEMA DE ESCRITA ALFABÉTICA POR PROFESSORES
DO 1º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação.
Aprovada em: 30/09/2016.
BANCA EXAMINADORA
__________________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Ana Cláudia Rodrigues Gonçalves Pessoa (Orientadora)
Universidade Federal de Pernambuco
Prof.ª Dr.ª Leila Nascimento da Silva (Examinadora Externa)
Universidade Federal Rural de Pernambuco
Profª. Drª. Maria Lúcia Ferreira de Figueiredo Barbosa (Examinadora Interna)
Universidade Federal de Pernambuco
Dedico esta Dissertação a Deus pelas bênçãos concedidas, pelo renovo diário, pelo
amor, pelo cuidado, por me presentear com uma família maravilhosa e por me ensinar,
todos os dias, que sem fé nada somos. ―Tu és fiel, Senhor, fiel a mim‖.
AGRADECIMENTOS
À minha mãe, Leda Leão pelo amor incondicional, por ser minha melhor amiga, pela
torcida, por compreender minhas ausências, por apoiar minhas escolhas e por todas as
ligações carregadas de alegria e amor.
À minha tia Lucineide Leão pelo amor incondicional, por todas as orações, pela fé
inabalável, por estar ao meu lado nos momentos difíceis, por segurar minha mão e pelo
cuidado sem fim.
Aos meus avós, Aristóteles Ferreira (em memória) e Amara de Andrade Leão pelo
amor, pela torcida e pela saudade eterna. Vocês representam amor e sabedoria em
minha vida.
Aos meus irmãos, Thiago Luís e Lucas Roberto pelo amor e cuidado durante toda a
minha vida. Por todas as vezes que você, Thiago, trouxe calma para minhas ansiedades,
por todas as vezes que largou tudo e veio ao meu encontro, por me ensinar sobre a vida,
pelo incentivo, pelo otimismo e pelas leituras, junto comigo, desta Dissertação. Eu amo
vocês!
À minha família, tios, tias, primos, primas, a tio Guego, a tia Bel, a Yasmin Leão,
Priscila Leão e Mônica Fonseca Leão pelas conversas, pela torcida e por todo amor.
À minha querida orientadora, Prof.ª Dr.ª Ana Cláudia Rodrigues Gonçalves Pessoa
por esses anos de parceria, por acreditar, por esperar, pela leveza, pelas leituras
atenciosas, pelos conselhos, pelas contribuições, pela compreensão em relação ao meu
ritmo de trabalho e pela disponibilidade de sempre. Aprendo muito com você.
À minha querida Prof.ª Dr.ª Telma Ferraz Leal pela leitura atenciosa deste estudo no
momento da qualificação, pelas contribuições, por ter dito o primeiro ―sim‖ para mim,
pelas janelas abertas e por ser uma inspiração nesta trajetória acadêmica.
À querida Prof.ª Dr.ª Leila Nascimento da Silva pelas contribuições, pela leitura
atenciosa do trabalho desde o momento da qualificação e por ser um exemplo de pessoa
e profissional a ser seguido.
À querida Prof.ª Dr.ª Maria Lúcia Figueiredo por ter aceitado o convite, pela leitura
atenciosa, pelas contribuições e por me dizer, inúmeras vezes, em conversas cheias de
otimismo, que todo esse processo vale a pena.
À minha querida amiga Juliana de Melo Lima por ter sido minha companheira fiel em
todos os momentos desta pesquisa, por escutar minhas angústias e ansiedades, por todas
as vezes que afirmou que este ciclo seria finalizado, pelas vibrações, por pensar, junto
comigo, sobre esta Dissertação, por me ajudar a crescer e por me ensinar sobre a vida.
Você é minha amiga-irmã.
Aos meus professores do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE/UFPE)
Artur Gomes de Morais, Telma Ferraz Leal, Janete Lins, Eliana Albuquerque e
Magna Cruz pelos ensinamentos e pelas aprendizagens construídas.
Aos colegas da turma 32 do Mestrado em Educação do Programa de Pós-Graduação em
Educação (PPGE/UFPE), Mayara Palácio, Mariana Maris, Kátia Neves,
Washington Ferreira, Letícia Mello e Cinara Menezes pelas aprendizagens
construídas, pelos seminários, pelos momentos de parceria, pelos sorrisos e pelos cafés.
Aos integrantes do grupo de pesquisa intitulado ―Pacto Nacional pela Alfabetização na
Idade Certa: formação de professores e impactos sobre a prática docente‖, coordenado
pelas Professoras Telma Ferraz Leal, Ana Claudia Rodrigues Gonçalves Pessoa e
Ester Calland de Sousa Rosa pelas discussões e pelos aprendizados.
À minha irmã Aluska Raquelly Vieira por ter ressurgido em minha vida, pela gentileza
e leveza dos nossos encontros, pelo amor e pela torcida.
À minha amiga Edenice Cavalcanti pelo amor construído desde a graduação, por ser
minha amiga-irmã, pela parceria, pela torcida e por compreender minhas ausências. Eu
amo você.
Aos meus amigos Marcília Elane, Júlia Souza, Amanda Ferreira, Lis Lino,
Carolina Sá, Karla Souza, Dayane Santos, Adeline, Jéssica Albuquerque, Lays
Cândido, Rielda Albuquerque, Bruna Herculano e Cézar Amorim pelas palavras de
conforto, pela torcida e por todo afeto.
À minha amiga, Cristiana Vasconcelos pelos abraços matinais, pela torcida, pelo
carinho e por me dizer, em cada encontro nosso, que a vida pode ser leve.
Aos meus amigos construídos nesses dois anos, Diego Alexandre, Mayara Palácio e
Mariana Maris, pelos encontros, pelos sorrisos francos, pela torcida, pela escuta, pela
entrega e pelo amor, proporcionando leveza durante esta trajetória.
Às minhas amigas Janeide Marinho e Gisela de Mello pela amizade sincera e torcida
fiel.
Às minhas amigas Sabrina Figueiredo e Marília pelas orações, pelas conversas, pelas
mensagens otimistas, pelas risadas e pela amizade.
À minha querida Rose Battaglia, por me ensinar, em cada encontro nosso, que a vida
pode ser leve e grandiosa, pelo entusiasmo e por me ajudar a ser uma pessoa melhor.
Ao ministério Déboras – Mães que oram pelos filhos, especialmente a Adak
Marques pelas orações, pela palavra amiga e por dizer, inúmeras vezes, que Deus
estava segurando minha mão.
Aos meus queridos alunos pelas aprendizagens e pelos sorrisos sinceros e cheios de
carinho e por conviverem, em muitas situações, com uma professora ―que corria contra
o tempo‖.
A todos os funcionários da Escola Municipal Prof.ª Almerinda Umbelino de Barros, em
especial a Andréa Oliveira, Alrides França, Sulene Julião, Silvânia, Anunciada,
Pedro, Alexandre, Rafaela Cybelle e Antônio pelas palavras de conforto nessa
caminhada.
A todos os integrantes do Centro de Estudos em Educação e Linguagem
(CEEL/UFPE), espaço de muita aprendizagem para minha formação profissional.
À Facepe pelo apoio financeiro durante o período do mestrado.
Por fim, agradeço a todos que, de alguma forma, contribuíram para elaboração desta
Dissertação. Muito obrigada!
―Hoje me sinto mais forte
Mais feliz, quem sabe
Só levo a certeza
De que muito pouco sei
Ou nada sei
Conhecer as manhas
E as manhãs
O sabor das massas
E das maçãs
É preciso amor
Pra poder pulsar
É preciso paz pra poder sorrir
É preciso a chuva para florir
Penso que cumprir a vida
Seja simplesmente
Compreender a marcha
E ir tocando em frente...‖.
(Almir Sater)
RESUMO
Este estudo teve o objetivo de analisar o uso dos recursos didáticos distribuídos pelo
Ministério de Educação para contemplar os direitos de aprendizagem referentes à
apropriação do Sistema de Escrita Alfabética (SEA) por professores do 1º ano do
Ensino Fundamental. Especificamente, buscamos: (1) Investigar se os direitos de
aprendizagem, especificamente os referentes à apropriação do sistema de escrita
alfabética, são referências para prática dos professores; (2) Verificar a frequência com
que são utilizados o livro didático de Letramento e Alfabetização, os jogos de
alfabetização, as obras complementares e as obras literárias, tomando como referência
os direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita alfabética; (3)
Identificar os direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita
alfabética contemplados nas práticas dos professores em situações de uso do livro
didático de letramento e alfabetização, dos jogos de alfabetização, das obras
complementares e das obras literárias; (4) Analisar as atividades de apropriação do
sistema de escrita alfabética desenvolvidas pelas professoras em situações de uso do
livro didático de Letramento e Alfabetização, dos jogos de alfabetização, das obras
complementares e das obras literárias. Os procedimentos metodológicos foram:
observação da prática, entrevistas e minientrevistas ao final das aulas observadas de
duas professoras do 1º ano do ciclo de alfabetização, dos municípios de Camaragibe e
Jaboatão dos Guararapes, em Pernambuco. Realizamos observações de 10 aulas de cada
docente. As entrevistas foram realizadas antes de iniciarmos o processo de observação,
neste caso, a entrevista inicial e ao final das aulas observadas para compreender alguns
elementos das práticas. Nesta pesquisa, dialogamos com alguns autores da área de
alfabetização, tais como: Ferreiro (1985), Ferreiro e Teberosky (1985; 1989), Mortatti
(2000), Chartier (2000), Morais e Leal (2010), Morais (2012), Soares (2010), dentre
outros, e autores que discutem sobre recursos didáticos, a saber: Zabala (1998),
Bittencourt (2004), Leal e Silva (2011), Lajolo (1996), Kishimoto (2003), dentre outros.
Os dados mostraram que os direitos de aprendizagem, especificamente, os relacionados
com a apropriação do sistema de escrita alfabética, são referencias para as práticas das
duas professoras. Durante as observações das práticas das docentes, identificamos que
as professoras utilizam diversos recursos didáticos em suas aulas com o objetivo de
ensinar o sistema de escrita alfabética, inclusive, identificamos que o livro didático de
Letramento e Alfabetização, os jogos de alfabetização, as obras complementares e as
obras literárias foram utilizados com essa finalidade. A partir das análises dos relatórios
de observação, vimos que cada uma das docentes priorizou determinado recurso
distribuído como política nacional com o objetivo de concretizar suas intenções
educativas e promover atividades em busca de auxiliar o processo de alfabetização das
crianças.
Palavras-chaves: Recursos didáticos. Apropriação do Sistema de escrita. Prática
docente.
ABSTRACT
This study aimed to analyze the use of educational resources distributed by the Ministry
of Education to contemplate the learning of rights related to the recognition of
Alphabetic Writing System for teachers of 1st grade of elementary school. Specifically,
we seek to: (1) To investigate whether the rights of learning, specifically those relating
to the ownership of the alphabetic writing system are references to teachers' practice; (2)
Check the frequency with which they used the textbook literacy and literacy, literacy
games, additional works and literary works, with reference to the learning of rights
relating to the ownership of the alphabetic writing system; (3) Identify the learning of
rights related to the recognition of alphabetic writing system included in teachers'
practices in use situations of textbook literacy and literacy, literacy games, the
complementary works and literary works; (4) analyze the ownership activities of the
alphabetic writing system developed by the teachers in use situations of textbook
literacy and literacy, literacy games, the complementary works and literary works. The
methodological procedures were: observation of practice, interviews and
minientrevistas the end of the classes observed two teachers of the 1st year of the
literacy cycle, the cities of Camaragibe and Jaboatão dos Guararapes, in Pernambuco.
We conducted observations of 10 lessons each teacher. The interviews were conducted
before starting the process of observation in this case, the initial interview and at the end
of the classes observed to understand some elements of practice. In this research, we
dialogue with some authors literacy area, such as: Ferreiro (1985), Ferreiro and
Teberosky (1985; 1989), Mortatti (2000), Chartier (2000), Morais and Leal (2010),
Mitchell (2012) Soares (2010), among others, and authors who discuss teaching
resources, namely: Zabala (1998), Bittencourt (2004), Leal and Silva (2011), Lajolo
(1996), Kishimoto (2003), among others. The data showed that the rights of learning,
specifically, those related to ownership of the alphabetic writing system, are references
to the practices of two teachers. During the observations of the practices of teachers, we
identified that the teachers use different teaching resources in their classes in order to
teach the alphabetic writing system, even identify the textbook literacy and literacy,
literacy games, additional works and literary works were used for this purpose. From
the analysis of sighting reports, we saw that each of the teachers gave priority given
resource distributed as national policy in order to achieve their educational intentions
and promote activities seeking to assist the literacy process of children.
Keywords: Teaching resources. Writing system ownership. Teaching practice.
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 - Formação e tempo de experiência das professoras participantes da
pesquisa...........................................................................................................................91
Quadro 02 - Perfil das turmas........................................................................................ 92
Quadro 03 - Cronograma das observações de aula ....................................................... 97
Quadro 04 - Modelo de quadro de análise dos direitos de aprendizagem referente à
apropriação do Sistema de Escrita Alfabética contemplados em situações de uso dos
recursos distribuídos pelo Ministério de Educação........................................................99
Quadro 05 - Frequência dos recursos didáticos utilizados nas aulas para contemplar os
direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita alfabética
(SEA).............................................................................................................................115
Quadro 06 - Direitos de aprendizagem referentes à apropriação do Sistema de Escrita
Alfabética (SEA) mobilizados nas aulas pelas professoras a partir do uso do livro
didático de Letramento e Alfabetização.......................................................................124
Quadro 07 - Direitos de aprendizagem referentes à apropriação do Sistema de Escrita
Alfabética (SEA) mobilizados nas aulas pelas professoras a partir do uso dos jogos de
alfabetização.................................................................................................................167
Quadro 08 - Direitos de aprendizagem referentes à apropriação do Sistema de Escrita
Alfabética (SEA) mobilizados nas aulas pelas professoras a partir do uso das obras
complementares............................................................................................................187
Quadros 09 - Direitos de aprendizagem referentes à apropriação do Sistema de Escrita
Alfabética (SEA) mobilizados nas aulas pelas professoras a partir do uso das obras
literárias distribuídas pelo PNBE e PNAIC – Alfabetização na Idade
Certa..............................................................................................................................221
Quadro 10 - Direitos de aprendizagem de apropriação do Sistema de Escrita Alfabética
contemplados pelas professoras em situações de uso dos recursos didáticos distribuídos
pelo Ministério de Educação........................................................................................234
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO....................................................................................................... 14
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA.......................................................................... 23
2.1 O processo de alfabetização: algumas reflexões................................................ 23
2.1.1. Concepções sobre alfabetização: algumas reflexões ........................................... 23
2.1.2 Uma breve abordagem sobre os métodos de alfabetização................................... 30
2.1.3 As contribuições da psicogênese no processo de alfabetização............................ 36
2.1.4 As contribuições da consciência fonológica na alfabetização................................41
2.1.5 Uma breve discussão sobre os direitos de aprendizagem voltados para apropriação
do Sistema de Escrita Alfabética.................................................................................. 44
2.2 Recursos didáticos na alfabetização...................................................................... 56
2.2.1 Recursos didáticos utilizados no ensino do Sistema de Escrita Alfabética.......... 60
2.2.2 Os livros didáticos de alfabetização distribuídos pelo Programa Nacional do Livro
Didático (PNLD): caracterização e algumas pesquisas................................................. 61
2.2.3 Os jogos de alfabetização: caracterização e alguns estudos................................. 68
2.2.4 O PNLD obras complementares: caracterização e alguns estudos...................... 73
2.2.5 O PNBE e PNLD PNAIC na distribuição de obras literárias: caracterização e
alguns estudos............................................................................................................... 78
3 PERCURSO METODOLÓGICO............................................................................ 84
3.1 As escolas e os sujeitos de pesquisa......................................................................... 88
3.1.1 A caracterização dos sujeitos de pesquisa............................................................ 88
3.1.2 As escolas............................................................................................................. 92
3.2 Procedimentos de pesquisa...................................................................................... 94
3.2.1 Observação de aulas.............................................................................................. 94
3.2.2 Entrevistas semiestruturadas e minientrevistas..................................................... 99
3.3 Procedimentos de análise de dados....................................................................... 101
4 A APRECIAÇÃO DAS PROFESSORAS SOBRE OS DIREITOS DE
APRENDIZAGEM REFERENTES À APROPRIAÇÃO DO SISTEMA DE
ESCRITA
ALFABÉTICA........................................................................................................... 103
5 FREQUÊNCIA DOS RECURSOS DIDÁTICOS UTILIZADOS PELAS
PROFESSORAS NO ENSINO DOS DIREITOS DE APRENDIZAGEM
REFERENTES À APROPRIAÇÃO DO SISTEMA DE ESCRITA
ALFABÉTICA.......................................................................................................... 112
6. RECURSOS DIDÁTICOS DISTRIBUÍDOS PELO MINISTÉRIO DE
EDUCAÇÃO NO ENSINO DOS DIREITOS DE APRENDIZAGEM
REFERENTES À APROPRIAÇÃO DO SISTEMA DE ESCRITA
ALFABÉTICA............................................................................................................ 122
6.1 O uso do livro didático......................................................................................... 123
6.1.1 Direito: escrever o próprio nome........................................................................ 125
6.1.2 Direito: reconhecer e nomear as letras do alfabeto.............................................. 129
6.1.3 Direito: reconhecer diferentes tipos de letras em textos de diferentes gêneros e
suportes textuais........................................................................................................... 135
6.1.4 Direito: compreender que palavras diferentes compartilham certas letras.......... 138
6.1.5 Direito: perceber que palavras variam quanto número, repertório e ordem das
letras...............................................................................................................................141
6.1.6 Direito: segmentar oralmente as palavras e comparecer palavras quanto ao
tamanho........................................................................................................................ 144
6.1.7 Direito: identificar semelhanças sonoras em sílabas e em rimas........................ 146
6.1.8 Direitos: reconhecer que as sílabas quanto às suas composições e o de perceber
que as vogais estão presentes em todas as sílabas........................................................ 153
6.1.9 Direitos: ler, ajustando a pauta sonora ao escrito e o de dominar as
correspondências entre letras ou grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a ler
palavras e textos............................................................................................................ 157
6.1.10 Direito: dominar as correspondências entre letras ou grupos de letras e seu valor
sonoro, de modo a escrever palavras e textos.............................................................. 161
6.2 O uso dos jogos de alfabetização........................................................................ 165
6.3 O uso das obras complementares...................................................................... 185
6.4 O uso das obras literárias................................................................................... 219
6.5 Síntese dos direitos de aprendizagem referentes à apropriação do Sistema de
Escrita Alfabética contemplados a partir do uso dos recursos didáticos distribuídos
pelo Ministério de Educação.................................................................................... 232
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................. 238
REFERÊNCIAS......................................................................................................... 244
APÊNDICES.............................................................................................................. 252
14
1 INTRODUÇÃO
A alfabetização é um direito que precisa ser assegurado aos indivíduos, pois
possibilita o uso e acesso às demandas sociais e, consequentemente, o exercício à
cidadania. As crianças, desde muito cedo, têm contato com práticas de leitura e escrita.
Isso nos leva a crer que no dia a dia, esses aprendizes observam as palavras presentes
nos diversos suportes e gêneros textuais e, não só começam a compreender a função da
leitura e da escrita, como também a constroem hipóteses sobre o funcionamento do
sistema de escrita alfabética (doravante SEA). Por isso, diversos autores, rompendo com
a visão associacionista/empirista de alfabetização, defendem que as crianças devem
vivenciar situações didáticas em que as propriedades e convenções do sistema de escrita
e as práticas sociais sejam tomadas como objeto de ensino.
Entretanto, sinalizamos que há diversas formas de conceber a alfabetização. Leal
e Albuquerque (2004), Brandão e Rosa (2005), Frade (2005), Albuquerque, Morais e
Ferreira (2008), Cruz (2008), Batista e Monteiro (2009), Morais (2012) et al saem em
defesa de que as crianças precisam vivenciar, desde a Educação Infantil, práticas
autênticas de leitura e produção de textos orais e escritos e, paralelamente, a este
contato, participar de práticas ancoradas no trabalho sistemático dos princípios e
convenções do sistema de escrita alfabética.
Em convergência com esses autores, consideramos, nesta pesquisa, a concepção
de alfabetização desta forma, intitulada como alfabetização na perspectiva do
letramento.
Iniciativas promovidas pelo Ministério Educação, a partir da implantação de
políticas públicas, têm sido promovidas com base na referida concepção de
alfabetização, como, por exemplo, a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos,
implantado em 2010, nas escolas públicas do país. Essa política engloba as crianças de
seis anos na educação básica e tem como um dos pressupostos básicos possibilitar um
maior contato dos educandos com os conteúdos abordados na escola, respeitando as
especificidades e o tempo de aprendizagem dos estudantes (BRASIL, 2007).
Subjacente a tal política de ampliação do ensino está o desenvolvimento do ciclo
de alfabetização, destinado aos anos iniciais do Ensino Fundamental (1º, 2º e 3º ano),
que promove a elaboração de metas, capacidades e objetivos específicos para cada ano
de ensino, com base nos diversos componentes curriculares. Desse modo, em busca de
atender às exigências presentes no cenário educacional, o Ministério de Educação vem,
15
ao longo dos anos, investindo na elaboração de programas de formação continuada de
professores alfabetizadores, como o Pró – Letramento e o Pacto Nacional de
Alfabetização na Idade Certa (PNAIC).
Além das políticas de formação continuada, presenciamos, no contexto atual, um
crescente aumento de programas de distribuição de recursos didáticos destinados às
escolas públicas do país, tais como: o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), o
Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) – Acervos complementares, o Programa
Nacional do Livro Didático: alfabetização na idade certa (PNLD Pnaic) e o Programa
Nacional Biblioteca na Escola (PNBE). Tais programas têm proporcionado, ao longo
dos anos, uma melhora na qualidade dos recursos didáticos que chegam às escolas,
tendo em vista que são avaliados por profissionais da área antes de compor os acervos
desses programas. E, com esses recursos, os docentes podem promover situações de
ensino com intuito de alfabetizar as crianças.
Pesquisas desenvolvidas por Pinton (2013) e Almeida (2012) pontuam que os
livros didáticos de Letramento e alfabetização distribuídos e avaliados pelo PNLD têm
sido utilizados pelos professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental para ensinar
as propriedades do sistema de escrita alfabética. Outros estudos, como os realizados por
Morais e Albuquerque (2011) sinalizam que esses livros didáticos sofreram, ao longo
dos anos, mudanças significativas impulsionadas por diversas pesquisas de diferentes
áreas de ensino. De acordo com esses autores, esse tipo de recurso passou a apresentar
atividades que contemplam a alfabetização na perspectiva do letramento, tendo em vista
que o próprio Guia de Livros Didáticos – PNLD 2010 elencou como prioridade:
Durante o processo de alfabetização, o objetivo central da análise e da
reflexão sobre a língua e a linguagem é o de permitir ao aluno o
efetivo domínio da escrita alfabética. Para tanto, é preciso que as
atividades relativas a esse eixo explorem sistematicamente o conjunto
de relações que se estabelecem entre a pauta sonora do português e os
recursos disponíveis na escrita alfabética (BRASIL – MEC, 2009, p.
24-25).
Além dos livros didáticos, outros tipos de recursos têm sido utilizados por
docentes nos anos iniciais do Ensino Fundamental com diferentes finalidades. Tais
recursos podem ser elaborados pelos professores, a partir de suas concepções e seus
modos de construção, assim como por instituições, editoras e equipes de universidades,
16
como, por exemplo, os jogos de alfabetização que chegam às escolas públicas por meio
do Governo Federal.
A pesquisa desenvolvida por Albuquerque (2014) evidenciou que diversos
professores de uma rede de ensino conheciam e utilizavam em suas aulas obras
pertencentes ao PNLD – Acervos Complementares para promover situações didáticas
voltadas para o eixo de leitura. Além das obras complementares, durante o período de
observação das jornadas de aula, a pesquisadora percebeu que outros recursos, como,
por exemplo, as obras literárias, pertencentes ao acervo do PNBE, os jogos de
alfabetização, distribuídos pelo Governo Federal, e recursos didáticos selecionados e/ou
elaborados pelas docentes também foram utilizados para contemplar outros eixos que
compõem o currículo de Língua Portuguesa.
A partir dos dados apresentados acima, evidenciamos que diversos recursos
didáticos, distribuídos por programas elaborados pelo Ministério de Educação, têm
ocupado a sala de aula e, consequentemente, têm sido objeto de uso dos professores
para concretizar suas intenções educativas.
De acordo com o Guia de livros didáticos PNLD – 2016 cabem às escolas
garantir aos estudantes a vivência sistemática, familiarizando esses aprendizes com os
aspectos da cultura letrada, pois, espera-se, ao final do ciclo de alfabetização, ―o (re)
conhecimento das funções sociais da escrita, o domínio dos códigos e convenções
constitutivos do sistema alfabético de escrita; o desenvolvimento de competências e
habilidades básicas envolvidas na leitura e na produção de textos‖ (p.10, BRASIL,
2015).
Conforme foi sinalizado, os jogos de alfabetização são recursos didáticos que
chegam às escolas públicas do país, desde 2010, através do Ministério de Educação.
Junto com esses jogos vêm o manual didático elencando que esses recursos são
classificados em três grandes blocos: jogos que contemplam a consciência fonológica,
sem fazer relação com a escrita; jogos que priorizam os princípios do sistema de escrita
alfabética e jogos que podem ajudar os aprendizes a sistematizar as correspondências
grafofônicas (LEAL, ALBUQUERQUE e RIOS, 2005).
As obras complementares são também recursos que chegam às escolas desde
2010 acompanhadas do manual intitulado ―Acervos Complementares – Alfabetização e
letramento nas diferentes áreas do conhecimento‖. De acordo com o manual, essas obras
podem servir como instrumento de suporte ao universo da cultura escrita e cultura
letrada, a formação do leitor, ao ensino-aprendizagem dos diversos conteúdos ancorados
17
aos componentes curriculares e, além disso, podem ser utilizadas como apoio para o
processo de alfabetização dos estudantes (BRASIL, 2012).
Além dos acervos complementares, obras literárias vêm chegando às escolas
públicas do país por meio do PNBE e do PNLD Pnaic. O primeiro programa é
responsável por distribuir obras literárias para compor o acervo das bibliotecas. Apesar
de serem livros destinados às bibliotecas, nada impede que o docente faça uso deste tipo
de recurso para realizar ações didáticas na sala de aula. O segundo programa citado é
formado por obras literárias que podem contribuir na promoção de práticas de
alfabetização e letramento.
Vê-se, pois, que há diferentes programas de distribuição de recursos didáticos
promovidos pelo Ministério de Educação para as escolas públicas do país que podem
subsidiar as práticas dos professores do ciclo da alfabetização.
Numa tentativa de subsidiar as práticas dos professores alfabetizadores, o
Ministério de Educação, elaborou, em parceria com as universidades, o PNAIC,
destinado aos docentes do 1º, 2º e 3º ano do Ensino Fundamental. Esse programa de
formação continuada está baseado em quatro eixos de atuação, a saber: na formação
continuada para os professores alfabetizadores e orientadores de estudo, no processo de
avaliação do ciclo de alfabetização, na gestão, controle e mobilização dos envolvidos no
processo e nos diversos recursos didáticos (obras pedagógicas, livros literários, jogos e
tecnologias educacionais) que vem chegando às escolas públicas do país (BRASIL,
2012). É nesse quarto eixo de atuação que esse estudo está situado.
Outro pressuposto básico presente em tal programa, fundamentado nas
Diretrizes da Resolução Nº 7, de 14 de dezembro de 2010, do Conselho Nacional da
Educação, é que o Ensino Fundamental é um direito de todos os indivíduos e que cabe
ao estado garanti-lo com qualidade e de forma gratuita (BRASIL, 2012). O PNAIC é
formado por cadernos que tratam de diversas temáticas sobre alfabetização, de modo a
contemplar cada eixo de atuação do referido programa. Dentre as temáticas abordadas,
destacamos a que trata sobre os direitos de aprendizagem, uma vez que são lançadas
com o objetivo de auxiliar os professores em seu fazer docente, de modo que possam
perceber as metas que seus alunos precisam atingir em cada ano de ensino.
Nos cadernos de formação desse programa os direitos de aprendizagem são
apresentados e destinados às crianças do ciclo de alfabetização, tendo em vista que é
dever da escola garanti-los aos aprendizes. De acordo com esse programa, os alunos do
1º do Ensino Fundamental precisam participar de ações didáticas em que o sistema de
18
escrita seja tomado como objeto de ensino, considerando também as práticas de
letramento (BRASIL, 2012).
A partir dos dados revelados acima é possível perceber que há um investimento
destinado às escolas públicas, além de políticas de formação continuada, em programas
de distribuição de diversos recursos didáticos. No entanto, a existência de diversos
recursos para auxiliar no processo de alfabetização na escola pode não estar sendo
suficiente, pois os dados estatísticos ainda apontam grandes preocupações referentes à
aprendizagem das crianças em relação ao sistema de escrita alfabética.
Os resultados do IDEB1 em 2014 sinalizam, assim como nos anos anteriores,
que houve o cumprimento das metas previstas para o ensino de Língua Portuguesa em
relação à primeira etapa do Ensino Fundamental (BRASIL, 2015). No entanto, mesmo
diante de avanços conquistados no campo da alfabetização e dos possíveis
cumprimentos das metas previstas, os dados com base nos censos revelam:
Em 1940, a taxa de analfabetismo entre jovens e adultos brasileiros
alcançava a incrível proporção de 64, 9 por cento. Trinta anos depois,
em 1970, tal índice tinha encolhido para 33,6 por cento e, em 2000,
para 13,6 por cento (site do IBGE). Hoje, as estatísticas mais recentes,
reveladas pelo IBGE a partir do censo de 2010, indicam que teríamos
9,6 por cento da população com idade acima de 15 anos analfabeta, o
que, em termos relativos, significa que estamos em muito pior
situação que países latinos - americanos como o Uruguai (1,7 por
cento de analfabetos), a Argentina (2,4 por cento), o Chile (2,95 por
cento), o Paraguai (4,7 por cento) e a Colômbia (5,9 por cento)
(MORAIS, 2012, p.21).
Esses dados revelam que, apesar do crescente investimento do Governo Federal
em programas de distribuição de recursos didáticos voltados para a alfabetização e
letramento, ainda é preocupante o número de crianças que concluem a primeira etapa do
Ensino Fundamentam sem ler e escrever com autonomia. Diante disso, levantamos
alguns questionamentos, tais como: há, no espaço escolar, vários recursos didáticos que
podem auxiliar o professor no processo de ensino do sistema de escrita alfabética, por
que muitos alunos ainda têm chegado à segunda etapa do Ensino Fundamental sem
dominar efetivamente a leitura e a escrita? As pesquisas apontam que os recursos
didáticos ancorados aos programas do Ministério de Educação têm chegado às escolas
públicas, será que eles vêm sendo utilizados pelos docentes nos momentos de ensino do
1 Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, criado pelo INEP/MEC em 2007. O IDEB é um indicador do SAEB, Sistema de
Avaliação da Educação Básica, que é composto, por sua vez, por um conjunto de avaliações externas em larga escala.
19
sistema de escrita alfabética? Estariam esses recursos auxiliando os alunos a
aprenderem a língua materna? Até que ponto o uso dos recursos didáticos auxilia no
processo de ensino e aprendizagem do sistema de escrita alfabética?
Nessa pesquisa, iremos investigar os livros didáticos de Letramento e
Alfabetização, os jogos de alfabetização, as obras complementares e as obras literárias
estão sendo utilizados e como estão sendo utilizados pelos professores investigados. O
desenvolvimento dessa pesquisa faz-se necessário, pois, apesar de nos últimos anos,
percebemos um aumento no quantitativo de estudos que refletem sobre o uso de
recursos na sala de aula, ainda observamos que há pouco investimento de estudos
ancorados nos recursos didáticos distribuídos pelo Ministério de Educação.
Para tanto, realizamos um levantamento bibliográfico de pesquisas
desenvolvidas nos últimos anos em anais de congressos envolvendo estudos sobre o uso
de recursos didáticos na sala de aula para ensinar o sistema de escrita alfabética aos
alunos.
Em um levantamento realizado no GT102 da ANPED, nas reuniões de anuais de
2005 a 2015, identificamos 10 artigos que discutem como alguns recursos didáticos,
entre eles, os livros didáticos de Língua Portuguesa, as coleções de alfabetização, os
livros literários e as cartilhas, foram utilizados para mobilizar conhecimentos
relacionados a algum dos eixos que compõem o currículo de Língua Portuguesa. A
partir desse levantamento, podemos perceber que não houve pesquisas publicadas nesse
congresso com foco nos outros recursos foco dessa pesquisa, tais como: os jogos de
alfabetização e as obras complementares.
Nos trabalhos publicados no 16º, 17º e 18º Congresso de Leitura no Brasil
(COLE) identificamos diversas pesquisas voltadas para o uso do livro didático no
ensino da língua materna, totalizando 36 trabalhos com foco no livro didático. Dentre
esses trinta e seis trabalhos, três pesquisas envolviam o uso e a avaliação dos livros
didáticos de alfabetização de jovens e adultos aprovados pelo PNLA – 2007. Além das
pesquisas voltadas para o livro didático, encontramos sete trabalhos com foco em outros
recursos didáticos, sendo seis estudos envolvendo o uso de jogos voltados com o
objetivo de explorar outros componentes curriculares, além de Língua Portuguesa, e
uma pesquisa que discutia políticas públicas de distribuição de obras literárias. Na 18º
2 GT pesquisado: Alfabetização, leitura e escrita.
20
edição do referido congresso encontramos um estudo voltada para o uso das obras
complementares com foco no eixo de leitura.
No II Congresso Brasileiro de Alfabetização (CONBAlf), realizado em 2015,
identificamos 13 trabalhos apresentados que contemplavam algum tipo de recurso
didático. Dos treze estudos, três exploravam o uso de jogos na alfabetização e uma
pesquisa investigou o que os professores dizem em relação às obras complementares.
Ao fazer um levantamento bibliográfico em algumas revistas científicas
Cadernos de Pesquisa da Fundação Carlos Chagas (FCC), Educação em Revista
(UFMG) e Revista Brasileira de Educação (ANPED), período de 2006 a 2016,
identificamos poucos artigos com foco nos recursos didáticos, totalizando 11 pesquisas
ao longo desses dez anos. Duas delas, publicadas na FCC, envolviam a análise de livros
didáticos em etapas diferentes do Ensino Fundamental. Três artigos, presentes na revista
da UFMG, tinham foco no livro didático, sendo um trabalho voltado para o livro de
Biologia, utilizado no Ensino Médio, outro com foco no livro didático de alfabetização
e na formação do leitor e outro artigo envolvendo o uso do computador como um
recurso didático na alfabetização. Na Revista Brasileira de Educação identificamos 6
(seis) artigos, sendo quatro com foco em livros didáticos destinados ao Ensino Médio, a
EJA e aos componentes curriculares de matemática e história. Desse total, dois
trabalhos envolviam outros recursos didáticos, a saber: um sobre o uso do jogo na
Educação Infantil e outro sobre a história das Cartilhas intituladas como Ada e Edu,
distribuídas em Mato Grosso no ano de 1977.
A partir do levantamento bibliográfico realizado acima é possível perceber que
diversas pesquisas avaliam os livros didáticos de Língua Portuguesa e o uso desse tipo
de recurso pelo professor em sua prática para explorar os diferentes eixos da língua.
Entretanto, ainda é pequeno o volume de estudos voltados para o uso de outros recursos
didáticos distribuídos pelo Governo Federal, tais como: os jogos de alfabetização, as
obras complementares e as obras literárias.
Nesse sentido, torna-se importante se debruçar sobre esses recursos que vêm
chegando às escolas públicas do país e podem, dessa forma, auxiliar no processo de
alfabetização das crianças que estão nos anos iniciais da primeira etapa do Ensino
Fundamental, tendo em vista que o domínio da leitura e da escrita é um direito que deve
ser assegurado a esses aprendizes. Diante disso, levantamos o seguinte questionamento:
como os professores têm utilizado os livros didáticos de Letramento e Alfabetização, os
jogos de alfabetização, as obras complementares e as obras literárias para contemplar os
21
direitos de aprendizagem de apropriação do sistema de escrita alfabética? Para tanto,
desenvolvemos essa pesquisa em busca de responder as seguintes indagações:
Os direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita
alfabética são referências para as práticas das professoras investigadas?
O livro didático de Letramento e Alfabetização, os jogos de alfabetização, as
obras complementares e as obras literárias são utilizados para contemplar os
direitos de aprendizagem referentes à apropriação do SEA? Com que
frequência?
Quais direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita
foram explorados em situações de uso do livro didático de Letramento e
Alfabetização, dos jogos de alfabetização, das obras complementares e das obras
literárias?
Como foram desenvolvidas as atividades de apropriação do sistema de escrita
alfabética em situações de uso do livro didático de Letramento e Alfabetização,
dos jogos de alfabetização, das obras complementares e das obras literárias?
Desse modo, objetivamos nessa pesquisa analisar como professores do 1º ano do
Ensino Fundamental utilizam o livro didático de Letramento e Alfabetização, os jogos
de alfabetização, as obras complementares e as obras literárias para contemplar os
direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita alfabética.
Especificamente, pretendemos:
Investigar se os direitos de aprendizagem, especificamente os referentes à
apropriação do sistema de escrita alfabética, são referências para prática dos
professores;
Verificar a frequência com que são utilizados o livro didático de Letramento e
Alfabetização, os jogos de alfabetização, as obras complementares e as obras
literárias, tomando como referência os direitos de aprendizagem referentes à
apropriação do sistema de escrita alfabética;
Identificar os direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de
escrita alfabética contemplados nas práticas dos professores em situações de uso
do livro didático de letramento e alfabetização, dos jogos de alfabetização, das
obras complementares e das obras literárias;
22
Analisar as atividades de apropriação do sistema de escrita alfabética
desenvolvidas pelas professoras em situações de uso do livro didático de
Letramento e Alfabetização, dos jogos de alfabetização, das obras
complementares e das obras literárias.
Diante de tais objetivos, organizamos nossa discussão em 7 capítulos. No capítulo 2,
apresentamos o referencial teórico, organizado em dois tópicos e subtópicos. No
primeiro tópico, abordamos alguns estudos e teorias que influenciaram a forma de
conceber o ensino da língua escrita, refletimos sobre algumas concepções de
alfabetização e saímos em defesa da alfabetização na perspectiva do letramento, dando
respaldo aos diversos recursos didáticos ancorados as diversas formas de conceber a
aquisição da língua escrita. No segundo tópico, discutimos o uso dos recursos didáticos
nas aulas dos professores alfabetizadores e apresentamos algumas pesquisas, tomando
como referência o livro didático de Letramento e Alfabetização, os jogos de
alfabetização, as obras complementares e as obras literárias.
No capítulo 3, apresentamos os procedimentos metodológicos utilizados nesse
estudo, de acordo com os objetivos propostos.
Nos capítulos 4, 5 e 6, abordamos as análises dos dados dessa Dissertação. No
capítulo 4, analisamos a entrevista inicial realizada com cada uma das professoras
investigadas em busca de compreender a apreciação das mesmas em relação aos direitos
de aprendizagem referentes à apropriação do Sistema de Escrita Alfabética. No capítulo
5, a partir dos relatórios de observação, tecemos uma discussão em torno dos recursos
didáticos presentes nas práticas das professoras que tinham o objetivo de contemplar
algum direito de aprendizagem com foco na apropriação do SEA. Por isso,
apresentamos a frequência com que os recursos, inclusive os que são investigados nesse
estudo, foram utilizados em sala de aula. No capítulo 6, com base nos dados presentes
nos relatórios de observação e nas entrevistas realizadas no final das aulas,
identificamos os direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita
considerando o uso de cada um dos recursos discutidos nessa pesquisa e analisamos as
situações didáticas de forma detalhada.
Por fim, no capítulo 7, tecemos algumas discussões em torno das considerações
finais dessa Dissertação.
23
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 O processo de alfabetização: algumas reflexões
Coerente com o nosso objeto de estudo em analisar o uso dos recursos didáticos
distribuídos pelo Ministério de Educação, considerando as situações de ensino em que
os direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita alfabética são
explorados, sentimos a necessidade de contemplar algumas teorias que poderão ajudar a
compreendermos as práticas de professores alfabetizadores.
Assim, neste tópico discutiremos acerca das concepções e práticas de
alfabetização, buscando aprofundar algumas temáticas relacionadas a esse processo e
que ainda são alvos de pesquisas e intensos debates entre teóricos: algumas concepções
de alfabetização presentes no contexto atual; Os métodos de alfabetização; A teoria da
psicogênese da escrita; As contribuições da consciência fonológica; Os direitos de
aprendizagem voltados para o processo de alfabetização.
2.1.1 Concepções sobre alfabetização: algumas reflexões
Há, no contexto atual, diversas concepções de alfabetização presentes no cenário
educacional. Tais concepções promovem debates e embates sobre a aquisição da língua
escrita e, muitas vezes, dão subsídios à produção de diferentes recursos didáticos
destinados aos anos iniciais do Ensino Fundamental. Dessa forma, enfatizamos que,
embora venha sendo muito discutido, ainda não temos um consenso em relação ao
que/como ensinar na alfabetização e a quais recursos podem auxiliar os docentes na
ação didática de alfabetizar. A seguir, em busca de compreendermos algumas dessas
concepções, apresentaremos quatro formas de conceber o ensino da língua materna.
Uma primeira concepção de ensino na alfabetização que pode subsidiar as
práticas docentes, ancorada nos métodos sintéticos (fônico e silábico) e analíticos,
considera o sistema alfabético como um código e, para tanto, a alfabetização está
relacionada ao processo de codificação e decodificação. Nesta concepção de ensino, as
cartilhas, as fichas de atividades com foco nos padrões silábicos elaboradas pelo próprio
docente e os textos ―sem sentido‖, desconsiderando as diversas práticas sociais, são os
recursos didáticos priorizados na sala de aula. A partir desses recursos, o professor
promove o ensino pautado no treino e na memorização dos fonemas e padrões silábicos,
24
sem articular aos diversos gêneros textuais e as atividades de leitura e produção de
textos.
Portanto, conforme já anunciamos, nesta primeira concepção de ensino, a
alfabetização não está vinculada às atividades de leitura e produção de textos reais. Ou
seja, há uma ―preocupação‖ em possibilitar aos aprendizes o domínio do código, neste
caso, o alfabeto, por meio dos recursos didáticos estruturados (cartilhas, fichas de
atividades e livros didáticos ancorados na perspectiva tradicional).
Uma segunda concepção de ensino na alfabetização foi impulsionada a partir da
difusão dos estudos de Emília Ferreiro e Teberosky, na década de 80, através da
Psicogênese da escrita, com os pressupostos teóricos do construtivismo de Piaget. Nesta
concepção, os métodos sintéticos e analíticos são fortemente criticados e intitulados
como tradicionais. Isso acontece porque a teoria da psicogênese da escrita traz uma
nova perspectiva na forma de conceber o aluno, o professor e o sistema de escrita
alfabética, influenciando as práticas docentes, apesar de não assumir que as habilidades
de consciência fonológica podem contribuir para o avanço dos aprendizes em suas
hipóteses de escrita.
Nesse contexto, é válido salientar que a interpretação equivocada sobre o
construtivismo contribui para uma visão errônea no modo de conceber o ensino e a
aprendizagem do sistema de escrita alfabética.
De acordo com Micotti (2014, p. 196):
Na introdução do construtivismo no sistema de ensino, ganhou mais
visibilidade a classificação dos procedimentos vistos como
inadequados à nova proposta do que a sua orientação pedagógica
propriamente dita. Por exemplo, foi bastante veiculada a ideia de que
não caberia trabalhar a escrita convencional, já que o uso de cartilhas,
utilizadas nos antigos métodos de ensino, não corresponde a
procedimento adequado à perspectiva interacionista. Algumas
distorções podiam ser observadas, como o descarte do princípio da
interação das crianças com materiais e recursos humanos, dentre os
quais o professor, a favor de postura epistemológica centrada no
sujeito do aprendizado com pouco ou sem o aporte do ensino.
Desse modo, é possível perceber que nesta segunda concepção acredita-se que
os aprendizes ―sozinhos‖ desvendam o complexo sistema de escrita alfabética sem a
necessidade, neste caso, do ensino sistemático. Além disso, destacamos que os
professores, diante da difusão das pesquisas sobre a psicogênese da escrita, passaram a
avaliar e compreender o percurso das crianças em relação à apropriação do sistema de
25
escrita, mas, por outro lado, ficaram sem saber o que fazer para que as mesmas avancem
na compreensão do sistema, tendo em vista que os padrões silábicos e os textos
cartilhados foram recursos duramente criticados nessa forma de conceber a
alfabetização.
Segundo Weisz (2014), o construtivismo de piagetiano com base na teoria da
psicogênese da língua escrita é muito comentado e citado no cenário educacional,
porém pouco é compreendido pelos professores. Ainda de acordo com esta autora, as
pesquisas desenvolvidas por Ferreiro e seus colaboradores são resumidas as hipóteses
de escrita, como se fossem apenas ―uma mera sequência de etapas, de níveis que o
aluno deveria ser ensinado a vencer‖ (WEISZ, 2014, p.160).
Essa falta de propriedade e má compreensão dos pressupostos do construtivismo,
especificamente a respeito da psicogênese da língua escrita, levaram muitos docentes a
acreditar em práticas ―espontaneístas‖, de modo a pensar que ―desde que haja
informação disponível e espaço/condições para a reflexão sobre o sistema de escrita, os
alunos constroem os procedimentos de análise necessários para que a alfabetização se
realize‖ (WEISZ, 2014, p. 166).
Além dos desdobramentos do construtivismo no campo da alfabetização, o
surgimento das discussões em torno do letramento no Brasil, em meados da década de
1980, foi também outro fenômeno que promoveu forte impacto na forma de conceber a
aquisição da língua escrita, influenciando na construção de uma nova concepção de
ensino categorizada, nesse subtópico, como a terceira concepção de alfabetização.
De acordo com Soares (2010), esse fenômeno pode ser interpretado a partir de
vários pontos de vista: antropológico, linguístico e psicológico. Na dimensão
antropológica, o letramento é definido como cultura escrita. Na interpretação linguística
relaciona-se com as dimensões da língua escrita, ou seja, considera as práticas da
escrita. E por último, a dimensão psicológica relaciona-se com a capacidade cognitiva
de compreender e produzir textos escritos.
Do ponto de vista educacional, especificamente no contexto brasileiro,
"letramento designa as habilidades de leitura e escrita de crianças, jovens ou adultos, em
práticas sociais que envolvem a língua escrita" (SOARES, 2010, p. 57). Esse é o
conceito que vai caracterizar a discussão deste fenômeno no cenário educacional.
Nos países de língua inglesa, o surgimento da palavra literacy - definida como
algo que vai além do domínio da tecnologia da escrita - estabelece uma relação
antagônica com a apropriação do sistema alfabético. Neste contexto, o letramento é
26
concebido como um fenômeno diferente da aprendizagem da escrita. Segundo a autora,
tais países dissociam o conceito de letramento e alfabetização, mas estabelecem uma
relação de interdependência entre esses dois processos e apontam o uso de tal fenômeno
no plural literacies tem sido cada vez mais recorrente (SOARES, 2010).
No contexto brasileiro, a relação da alfabetização com o letramento tem
promovido algumas compreensões divergentes em torno do conceito desses dois
processos, o que impacta diretamente na prática docente.
De acordo com Soares (2010), uma primeira compreensão desses processos,
impulsionada pelos estudos de Ferreiro (1985) e seus colaboradores, considera a
alfabetização em sentido mais amplo, valoriza as práticas sociais e não apenas a
reflexão do sistema de escrita alfabética. Neste contexto, a palavra letramento é
dispensada, tendo em vista que o significado da alfabetização dá conta dos pressupostos
que envolvem o letramento. Uma segunda compreensão estabelece uma rejeição em
torno da palavra alfabetização, com a ideia de que seu conceito é insuficiente para dar
conta da aprendizagem da leitura e da escrita. Desse modo, esta abordagem defende o
contato com as práticas sociais, através das atividades de leitura e produção de textos,
sem intervenções sistemáticas em relação aos princípios e convenções do sistema, como
suficiente para promover o domínio do sistema de escrita alfabética.
Tais compreensões, impulsionadas pela difusão dos estudos de letramento no
Brasil, contribuíram para construção dessa terceira concepção de ensino na
alfabetização. Nela, as especificidades do sistema alfabético são desconsideradas no
ensino, importando, apenas, o contato com os diversos gêneros textuais presentes na
sociedade, como se a apropriação do sistema de escrita fosse plenamente garantida a
partir da vivência exclusiva com as práticas sociais. O professor ao se ancorar nessa
forma de conceber o ensino da alfabetização desconsidera que os princípios e
convenções do sistema de escrita sejam conhecimentos complexos. Sendo assim, os
princípios que envolvem o sistema alfabético não são ensinados de forma sistemática na
prática docente.
Uma quarta concepção de ensino na alfabetização presente neste campo repleto
de embates, defende a alfabetização e o letramento como processos cognitivos
diferentes, mas indissociáveis e que estabelecem uma relação mútua.
De acordo com Soares (2004, p. 97):
É necessário reconhecer que alfabetização – entendida como a
aquisição do sistema convencional de escrita – distingue-se de
27
letramento – entendido como o desenvolvimento de comportamentos e
habilidades de uso competente da leitura e da escrita em práticas
sociais: distinguem-se tanto em relação aos objetos de conhecimento
quanto em relação aos processos cognitivos e linguísticos de
aprendizagem e, portanto, também de ensino desses diferentes objetos.
De acordo com essa concepção de ensino, é necessário reconhecer as
especificidades de cada um desses fenômenos, tanto a alfabetização como o letramento,
em busca de promover situações didáticas que ampliem o conhecimento dos aprendizes
sobre esses dois objetos de conhecimento.
Nesta Dissertação, defendemos essa concepção de ensino na alfabetização que
considera o contato com as práticas sociais, através das atividades de leitura e de
produção de textos de modo simultâneo ao tratamento reflexivo e sistemático dos
princípios e convenções que envolvem o sistema de escrita alfabética (SOARES, 2004,
ALBUQUERQUE, SANTOS, 2005, MORAIS, ALBUQUERQUE, 2006, CRUZ, 2008,
BRANDÃO, LEAL, 2010, ALBUQUERQUE, MORAIS, FERREIRA, 2010, MORAIS,
2012).
Ao tomarmos como base essa concepção de ensino, não estamos de modo algum
concordando que:
[...] utilizar a leitura de diferentes textos apenas como pretexto para o
trabalho com palavras, que após escolhidas do texto, são divididas em
sílabas para depois ser trabalhadas valendo-se do estudo das famílias
(ou padrões) silábicas. Ou ainda, cair-se em outro extremo. Acreditar
que, apenas com a oportunização da leitura e produção coletiva dos
textos, os alunos que ainda não dominam o sistema de escrita podem
vir a, sozinhos, apropriar-se desse conhecimento. (SANTOS e
ALBUQUERQUE, 2005, p.97).
Por isso, concordamos com Morais (2005) e Morais e Leal (2010) que o sistema
de escrita alfabética envolve uma série de propriedades e convenções que precisam ser
tomadas como objeto de ensino pelos professores. De igual modo, concordamos com
Morais (2012) que para torna-se alfabético, o aprendiz precisa compreender que:
1. Escreve-se com letras que não podem ser inventadas, que têm um
repertório finito e que são diferentes de números e de outros
símbolos;
2. As letras têm formatos fixos e pequenas variações produzem
mudanças em sua identidade (p, q, b, d), embora uma letra assuma
formatos variados (P, p, P, p);
3. A ordem das letras no interior da palavra não pode ser mudada;
28
4. Uma letra pode se repetir no interior de uma palavra e em
diferentes palavras, ao mesmo tempo em que distintas palavras
compartilham as mesmas letras.
5. Nem todas as letras podem ocupar certas posições no interior das
palavras e nem todas as letras podem vir juntas de quaisquer
outras.
6. As letras notam ou substituem a pauta sonora das palavras que
pronunciamos e nunca levam em conta as características físicas ou
funcionais dos referentes que substituem.
7. As letras notam segmentos sonoros menores que as sílabas orais
que pronunciamos.
8. As letras têm valores sonoros fixos, apesar de muitas terem mais
de um valor sonoro e certos sons poderem ser notados com mais
de uma letra.
9. Além de letras, na escrita de palavras, usam-se, também, algumas
marcas (acentos) que podem modificar a tonicidade ou o som das
letras ou sílabas onde aparecem.
10. As sílabas podem variar quanto às combinações entre consoantes
e vogais (CV, CCV, CVV, CVC, V, VC, VCC, CCVCC...), mas a
estrutura predominante no português é a sílaba CV (consoante –
vogal), e todas as sílabas do português contêm, ao menos, uma
vogal (p.51).
Tais princípios parecem óbvios para os sujeitos alfabetizados, mas isso não é o
que acontece com os aprendizes que estão no processo de alfabetização. Quem ainda
não domina o sistema alfabético precisa que esses conhecimentos sejam sistematizados,
embora saibamos que os aprendizes elaboram hipóteses sobre o sistema de escrita antes
de estar alfabetizados.
Essa quarta concepção de ensino na alfabetização, defendida nesta pesquisa, é
conhecida como alfabetização na perspectiva do letramento.
A pesquisa desenvolvida por Leal, Brandão, Almeida e Vieira (2014) mostrou
que os documentos curriculares municipais e estaduais pertencentes ao Brasil não
apresentam uma unidade na defesa das concepções de ensino na alfabetização. Neste
estudo foram analisadas 26 propostas curriculares de Língua Portuguesa destinadas ao
Ensino Fundamental, sendo 12 pertencentes às secretarias municipais e 14 às secretarias
estaduais.
Neste estudo, as pesquisadoras enquadraram as concepções sobre o ensino da
língua escrita, encontradas nos documentos curriculares analisados, em três tendências.
Na Tendência 1 foram identificados 8 documentos curriculares referentes ao
Ensino Fundamental, sendo 3 municipais e 5 estaduais, o equivalente a 30, 8% das
propostas analisadas. Essa tendência concebe o processo de alfabetização por meio
exclusivo da imersão das atividades de leitura e produção de textos, acreditando que o
29
contato dos aprendizes com as práticas sociais promove a aprendizagem do sistema de
escrita. Minimiza-se ―a importância da reflexão sobre as unidades que compõem as
palavras (sílabas, letras), assim como a legitimidade de um trabalho mais focado na
aprendizagem do sistema de escrita alfabética‖ (LEAL, BRANDÃO, ALMEIDA e
VIEIRA, 2014, p.239).
Na Tendência 2 foi identificado um documento curricular estadual, o equivalente
a 3,8% dos documentos analisados. Nessa tendência a escrita é concebida como um
código e, portanto, não é formado por propriedades complexas, conforme é pregado nos
métodos tradicionais. Desse modo, é defendido o ensino sistemático com base no
treinamento e na memorização das sílabas ou dos padrões silábicos através de recursos
didáticos estruturados e textos criados exclusivamente para alfabetizar, desconsiderando
os diversos gêneros textuais.
Na Tendência 3 foram identificados 17 documentos curriculares, sendo 9
municipais e 9 estaduais, o equivalente a 65,4% das propostas analisas. Esses dados
revelam que a maioria dos documentos investigados defendia os pressupostos teóricos
pregados por esta tendência. Segundo essa tendência, as práticas de ensino ancoradas as
práticas sociais, associada às atividades de leitura e de produção de textos, e as
propostas sistemáticas em torno das propriedades do sistema de escrita alfabética
precisam estar presentes nas salas de aula de alfabetização.
Desse modo, foi possível perceber que, mesmo diante de uma falta de consenso
sobre como conceber o ensino na alfabetização, mais de 65% dos documentos
analisados consideram a alfabetização na perspectiva do letramento.
Conforme mencionamos, nesta Dissertação, defendemos a concepção da
alfabetização na perspectiva do letramento. Para tanto, sabemos para promover o ensino
nessa perspectiva o professor precisa ter clareza a respeito dos conhecimentos que os
alunos precisam dominar em cada ano de ensino para que ao final do ciclo de
alfabetização leiam e escrevam com autonomia.
No subtópico a seguir, apresentaremos uma breve discussão sobre os métodos de
alfabetização e os recursos didáticos utilizados no processo de ensino do sistema de
escrita subjacentes a cada um desses métodos.
30
2.1.2 Uma breve abordagem sobre os métodos de alfabetização
Conforme já anunciamos no subtópico anterior, no decorrer da história da
educação, o cenário escolar, especificamente as concepções em torno do ensino da
leitura e da escrita foram alvos de inúmeras mudanças, sendo caracterizadas como
inovações pedagógicas (CHARTIER, 2000). De acordo com Chartier (2000), tais
inovações, também consideradas invenções técnicas, foram criadas com o objetivo de
promover o ensino da língua escrita e, ao longo do tempo, foram julgadas pelos efeitos
que produziam.
No contexto da alfabetização, as inovações, sobretudo a criação dos métodos
pedagógicos, surgiram em diferentes momentos históricos com a finalidade de
promover o ensino eficaz da leitura e da escrita para às crianças e, até os dias atuais,
ainda respaldam as práticas pedagógicas de muitos docentes.
O nascimento dos métodos de ensino e até mesmo a substituição de um método
por outro, marcado por um processo de ―inovação‖, promoveu intensos debates na
história da alfabetização. Isso porque a escola, até os dias atuais, não tem conseguido
cumprir efetivamente seu papel social de promover um ensino de qualidade para os
aprendizes. Inclusive, o grupo social que mais tem sofrido com a ineficácia da escola e
com o fracasso na alfabetização são os menos favorecidos economicamente, ou seja, as
crianças, os jovens e adultos pobres (CARRAHER, 1986, MORAIS, 2012).
Na tentativa de promover práticas de ensino eficazes que rompessem com o
fracasso na alfabetização, surgiram no Brasil, em meados do século XIX, impulsionados
pelo processo de institucionalização da escola, os métodos de ensino de leitura e escrita
(MORTATTI, 2000, MORAIS, 2005).
Nesse período a discussão sobre o uso de métodos no processo de alfabetização
foi definida como ―querela dos métodos‖ ou ―guerra entre os métodos‖ (MORTATTI,
2000, CHARTIER, 2011). Desde o surgimento desses métodos, intensificou-se na
sociedade brasileira um enorme debate em torno de qual método seria mais eficaz para a
aprendizagem do sistema de escrita alfabética.
De acordo com Mortatti (2000) e Morais (2012) esses métodos estão ancorados
numa perspectiva tradicional de ensino, pois consideram a aprendizagem da leitura e da
escrita a partir da repetição de procedimentos, com base na crença em processos lineares
em que primeiro se ensina "o código" para depois promover o ensino de leitura através
de atividades mecânicas sem considerar as práticas sociais. Ao adotar esses métodos,
31
cabe ao professor realizar fielmente as atividades presentes nas cartilhas que são, nessa
concepção de ensino, consideradas excelentes recursos didáticos para a alfabetização.
Com base nesses autores, reafirmamos que esses métodos de ensino são
pautados em propostas que não consideram a complexidade das propriedades que
envolvem o sistema alfabético, os diversos gêneros textuais e, além disso, pontuamos
que as cartilhas limitam as possiblidades de reflexão sobre o sistema de escrita
alfabética, conforme podemos visualizar nas figuras 01 e 02:
Figuras 01 e 02 - Imagem extraída do livro ―Os sentidos da alfabetização‖ de Maria do Rosário
Mortatti. Na esquerda, foto da cartilha Caminho Suave, de Branca Alves de Lima (8.ed.1954).
Na direita, capa da cartilha Pipoca, de Paulo Nunes de Almeida (23.ed.1989).
Ainda em consonância com Morais (2012), afirmamos que, ao longo da história,
o uso dos métodos tradicionais contribuiu para promoção do fracasso na alfabetização,
uma vez que o pressuposto básico que norteia um método é ancorado na visão
empirista/associacionista de aprendizagem. Segundo esse autor, essa visão considera o
aprendiz como uma tábula rasa, como se o sujeito não construísse hipóteses sobre o
funcionamento do sistema de escrita. Além disso, valoriza a repetição e a cópia de letras
e padrões silábicos, com base no princípio da memorização das relações letra/som,
conforme podemos visualizar nas figuras 01 e 02.
Por trás desses métodos tradicionais há uma concepção de ensino que considera
a escrita como um código. Sobre essa concepção, Silva (2014, p. 100) complementa
dizendo que:
A língua escrita era concebida como um código de transcrição gráfica
das unidades sonoras, que seria aprendido por meio da repetição e da
memorização; os aprendizes eram vistos como seres que nada sabiam
sobre a escrita e que só seriam autorizados a ter contato com textos
―de verdade‖, na escola, quando estivessem alfabetizados; e,
32
finalmente, o professor era tratado como um mero executor de passos
a serem rigidamente seguidos.
Os métodos tradicionais são divididos em dois grandes grupos, a saber:
sintéticos e analíticos. Tais métodos ditavam o caminho a ser seguido pelo professor
que desejasse promover a alfabetização dos alunos. Através das lições presentes nas
cartilhas, recurso didático predominante na época, os aprendizes eram levados a copiar e
cobrir, de modo exaustivo, letras e padrões silábicos, considerando frases
descontextualizadas e ausência de textos reais.
De acordo com Morais (2012, p. 38), os docentes que seguiam os métodos
―acreditavam que uma boa cartilha, com um plano de ensino bem controlado, seria uma
garantia de alunos alfabetizados ao final do ano, desde que estivessem aptos, no início
do ano letivo, a usufruir dos ensinamentos daquele material‖.
No caso dos métodos sintéticos, as propostas de ensino da leitura e da escrita
acontecem através das unidades menores para as maiores, ou seja, primeiro são
trabalhadas as letras, os fonemas e as sílabas até chegar às frases. Tudo depende de qual
método sintético está especificamente em foco, uma vez que podem ser divididos em
três tipos: alfabéticos, fônicos e silábicos. Mesmo apresentando algumas
especificidades, os métodos que compõem esse grupo apresentam pressupostos comuns,
como o princípio da memorização e da repetição, variando apenas as unidades
dependendo do tipo do método, ou seja, o processo de alfabetização pode iniciar pelo
trabalho com as letras, pelo treino fonêmico ou por meio dos padrões silábicos. Segundo
Morais, Albuquerque e Leal (2005, p. 18), ―propostas de ensino baseadas nesses
métodos partem do pressuposto de que a aprendizagem é mais fácil quando se parte de
unidades mais elementares e simples (em geral sem sentido), para, em seguida,
apresentar unidades inteiras e significativas‖.
Conforme foi dito acima, especificamente as concepções de ensino baseadas no
método fônico e silábico, mais presentes no contexto brasileiro, consideram que a
aprendizagem deve acontecer de forma gradativa, das unidades menores (letras e
fonemas) para as maiores (sílabas). No método fônico, os aprendizes são levados a
dividir e segmentar os fonemas que compõem as palavras isoladamente como se isso
fosse requisito para a alfabetização. Na proposta silábica, acredita-se que a repetição
exaustiva e memorização dos padrões silábicos possibilitam o domínio da leitura e
33
escrita. Percebe-se, dessa forma, que essas propostas de ensino não consideram, de
forma efetiva, o trabalho com o uso da leitura e escrita articulando as práticas sociais.
Nessa perspectiva, o professor concebe o processo de ensino com a visão de
adulto já alfabetizado (visão adultocêntrica) e não pensa nas inúmeras propriedades e
convenções que precisam ser ensinadas, tendo em vista que o sistema de escrita,
diferentemente do código, não dispõem de elementos e relações pré-determinados
(FERREIRO, 1985).
Contrariando o que é defendido pelos adeptos do método fônico, Morais (2005,
2012) e Silva (2014) apontam que as habilidades de segmentação dos fonemas não são
requisitos para a aprendizagem do sistema de escrita. Desse modo, apontam que o
tratamento de tais habilidades não auxiliam os alunos no processo de alfabetização, pelo
contrário, expõem os aprendizes a rituais difíceis de treino fonêmico que, muitas vezes,
são impossíveis de serem realizados por adultos alfabetizados.
Conforme foi mencionado, há também os métodos analíticos, divididos em três
tipos, a saber: a palavração, a sentenciação e o global ou dos contos. Nesses métodos a
forma de ensinar a escrita é feita pelo caminho inverso dos métodos sintéticos, pois
começam por unidades maiores (palavras, frases, pequenos textos) até chegar às
unidades menores (sílabas, letras e fonemas). No método de palavração, o aprendiz
memoriza determinado número de palavras para estabelecer relações entre elas e
descobrir o funcionamento do código. No método da sentenciação o procedimento de
ensino é o mesmo, mas o que entra em evidência são as lições que envolvem a
memorização de sentenças completas para depois analisar as unidades menores
(palavras, sílabas e letras). O método global mantém a mesma lógica dos que foram
citados, mas acrescenta os textos artificiais e descontextualizados como importantes
instrumentos para aprendizagem da escrita. Essa forma de conceber o ensino interpreta
o sistema de escrita alfabética como um código, agindo de modo a não considerar a
complexidade que envolve esse objeto de conhecimento. Nessa concepção, o professor
não promove situações didáticas em que os alunos possam refletir sobre as propriedades
e convenções que envolvem o sistema alfabético e nem possibilitam o contato com as
práticas sociais.
Subjacente à concepção dos métodos tradicionais está a necessidade dos
aprendizes alcançarem um ―estado de prontidão‖, ou seja, momento em que o sujeito
está ―pronto‖ para começar a aprender a escrita, através das intervenções do professor
(CARRAHER, 1986, FERREIRO, 1985, MORAIS, 2012). Para saber se as crianças
34
atingiam esse estado eram realizados testes que privilegiavam as habilidades de
percepção motora, discriminação visual e auditiva, por meio de atividades de ―cobrir‖ e
―ligar pontinhos‖. Nesse sentido, durante muito tempo, as escolas aplicaram testes de
prontidão aos alunos no final da educação infantil para saber se os mesmos estavam
aptos para iniciar o processo de alfabetização. Segundo Morais (2005):
[...] tudo era concebido como se não houvesse um cérebro mediando o
que a mão traçava e o que a boca pronunciava. Mais que isso, não se
considerava que a escrita alfabética consistia num sistema com
propriedades que o aluno precisaria compreender. Assim, acreditava-
se que tal ―prontidão‖ seria o requisito para o aluno usufruir do ensino
que lhe era oferecido, o qual, por sua vez, dependeria do emprego de
um ―bom método‖ (p. 39-40).
Desse modo, é possível concluir que durante muito tempo o ensino da língua
escrita esteve relacionado, exclusivamente, ao uso desses métodos como fórmula para o
sucesso na alfabetização e, ainda nos dias atuais, as concepções de ensino que são
subsídios a esses métodos estão presentes nas escolas brasileiras. Ou seja, ainda
presenciamos situações didáticas em que a aprendizagem do sistema de escrita
alfabética acontece por meio da memorização e dos treinos repetitivos das relações
grafemas/fonemas.
De acordo com Chartier (2011, p.96-97), os métodos eram concebidos como
―um conjunto de princípios e escolhas teóricas para guiar a ação, [...] na escola, um
método é um guia pedagógico, regido para o professor‖ e, buscavam, dessa forma,
prescrever a ―fórmula do sucesso‖ para o ensino da leitura e da escrita. Segundo esta
autora, os métodos representaram na época que foram promovidos uma ―transformação
pedagógica‖. Muitos dos métodos tradicionais desenvolviam-se através de exercícios
que consideravam o ensino de forma gradativa, primeiramente o contato com as sílabas,
depois com as palavras até que chegassem às frases.
Com o tempo os métodos enquadrados como tradicionais não conseguiram
atingir o grau de ―eficácia‖ desejado, pelo contrário, formavam indivíduos que eram
incapazes de compreender textos simples presentes na esfera social, ou seja, apenas
―decodificavam‖, mas não conseguiam compreender uma mensagem escrita. Isso
aconteceu porque a exigência social passou a ser outra: a leitura associada à
compreensão do que estava sendo lido. É nesse contexto que os recursos didáticos
subjacentes a essas propostas de ensino, nesse caso os manuais de leitura, são
35
fortemente criticados. Tem-se nesse momento, a constatação do fracasso no ensino da
leitura e a partir daí surgem os questionamentos pontuando que as ―inovações
pedagógicas‖ poderiam não estar contribuindo para o avanço dos aprendizes
(CHARTIER, 2000).
A indagação que ganha espaço nas discussões é a seguinte: ―de quem é a culpa
dos alunos não aprenderem a ler?‖. É nesse contexto que, considerando a dimensão
pedagógica, as escolas, os métodos e os professores passam a ser responsabilizados por
tal fracasso.
Sobre esse aspecto, Chartier (2000) salienta que ao invés de culpar a escola, os
métodos e os professores sobre o fracasso no processo de alfabetização é preciso
analisar melhor a realidade escolar, buscando compreendê-la. A autora ainda aponta que
tais ―inovações‖ não aparecem de imediato no cotidiano da sala de aula, pois a adesão
das novas propostas de ensino dependerá da eficácia que o docente vê sobre elas. Ou
seja, os professores fazem suas escolhas pedagógicas em busca de concretizar suas
intenções educativas na medida em que veem funcionalidade nos métodos de ensino
propostos pelos ―inovadores‖.
Em busca de contribuir para erradicar tal fracasso alguns países na Europa uma
nova abordagem surgiu com o objetivo de garantir aos aprendizes a compreensão de
textos. Foi nesse contexto que nasceu uma nova proposta de ensino baseada no
―reconhecimento visual das palavras, sem análise, que se apoia teoricamente na
psicologia da percepção ―global‖ das formas‖ (CHARTIER, 2000, p. 10). Desse modo,
emergiu uma abordagem contrária à sintética, sendo definida como global, uma vez que
pressupõe o ensino da leitura a partir das unidades maiores (a palavra inteira). Com o
tempo, tal proposta de ensino também foi questionada, o que possibilitou a difusão do
método fônico em alguns países, como nos Estados Unidos.
Diante disso, percebe-se que a história do ensino da leitura e da escrita, tanto no
Brasil como em outros países, foi marcada pela adesão de métodos que propagavam o
sucesso na alfabetização. Entretanto, é válido destacar que a concepção sobre o que é
estar alfabetizado modificou ao longo dos anos, sobretudo com a difusão das pesquisas
na área que levantavam diversos questionamentos. De acordo com Chartier (2000),
esses questionamentos contribuíram para caracterizar esses métodos numa tendência
tradicional de conceber o ensino.
De acordo com o que anunciamos no subtópico anterior, no Brasil, na década de
80, as pesquisas de Ferreiro e Teberosky (1985) sobre a psicogênese da escrita
36
provocam uma mudança de paradigma na forma de conceber a alfabetização. Muda-se o
foco da discussão de como se deve ensinar para a tentativa de compreender como as
crianças aprendem/pensam a escrita. Com base nos pressupostos difundidos por tais
pesquisas, dando respaldo as contribuições da teoria psicogenética, que o próximo
subtópico está organizado.
2.1.3 As contribuições da psicogênese no processo de alfabetização
Como sinalizamos no subtópico anterior, no início dos anos 80, os métodos
tradicionais de ensino, utilizados rigidamente pelos professores, e os testes de prontidão
foram alvo de intensas críticas impulsionadas pelas pesquisas de Ferreiro, Teberosky
(1989) e colaboradores sobre a psicogênese da escrita que passaram a ser difundidas no
Brasil.
A difusão dos estudos da psicogênese promoveu mudança de paradigma na
forma de conceber o ensino da leitura e da escrita. Através dessas pesquisas, ancoradas
no construtivismo de Piaget, vimos o nascimento das críticas a respeito da perspectiva
tradicional de ensino propostas pelos métodos de alfabetização.
A partir daí, o ensino com base na repetição e memorização de padrões silábicos,
através das cartilhas sem respaldo às práticas sociais e a propagação de que o aprendiz é
um mero receptor e/ou sujeito passivo no processo de aprendizagem passou a ser
fortemente questionados pelos estudiosos da teoria psicogenética. É justamente nesse
período que os recursos didáticos, sobretudo as cartilhas utilizadas para promover o
ensino da leitura e da escrita receberam inúmeras críticas.
Os pressupostos da psicogênese da escrita trazem um novo olhar para três
elementos, denominado por Ferreiro (1985) de tríade, são eles: o sistema de
representação da linguagem, as concepções das crianças sobre a escrita e as percepções
dos que ensinam, nesse caso, os professores. O primeiro elemento dessa tríade defende
que a escrita não é um código e, pelo contrário, afirma que é um sistema de
representação notacional.
Em segundo plano, surge uma nova interpretação sobre como as crianças
aprendem e a defesa de que esses aprendizes elaboram hipóteses de escrita antes mesmo
de estar alfabetizados.
37
O terceiro elemento que compõe essa tríade são as concepções dos professores
sobre o sistema de escrita alfabética, tendo em vista que a concepção do docente a
respeito desse objeto de conhecimento interferirá em sua forma de ensinar. A seguir,
discutiremos, de forma mais detalhada, cada elemento que compõe essa tríade.
Conforme foi discutido no tópico anterior, sabemos que os métodos tradicionais
de ensino reduzem a escrita a um código, sem considerar que o domínio do sistema de
escrita alfabética envolve o domínio de diversas propriedades. Em contrapartida, os
estudos baseados na teoria da psicogênese da escrita nos ajudam a compreender que a
escrita é um sistema de representação complexo, formado por princípios e convenções
que precisam ser tomados como objeto de ensino.
Diante disso, é possível afirmar que o sistema de escrita pode ser compreendido
de duas formas diferentes. De um lado, está a ideia da aquisição de um código de
transcrição e do outro a defesa do sistema de escrita como um sistema de representação
notacional. E, conforme sinalizamos, a forma como o professor concebe o sistema
alfabético relaciona-se com suas ações didáticas e pedagógicas na sala de aula.
A respeito dessa relação dicotômica, Ferreiro e Teberosky (1984), Ferreiro
(1985) e Morais (2012) salientam que essas duas formas de conceber a escrita alfabética
tem implicações no ensino e na aprendizagem desse objeto de conhecimento, tendo em
vista que:
A consequência última desta dicotomia se exprime em termos ainda
mais dramáticos: se a escrita é concebida como um código de
transcrição, sua aprendizagem é concebida como aquisição de uma
técnica; se a escrita é concebida como um sistema de representação,
sua aprendizagem se converte na apropriação de um novo objeto de
conhecimento, ou seja, em uma aprendizagem conceitual
(FERREIRO, 1985, p.09).
Conceber a escrita como um sistema de representação significa, de certa forma,
considerar que a aprendizagem desse objeto de conhecimento envolvem duas questões
conceituais.
Segundo Ferreiro (2011), as duas questões conceituais que os aprendizes
precisam compreender são: o que a escrita representa/nota? E como a escrita cria suas
representações/notações? Na primeira pergunta as crianças precisam compreender que a
escrita tem relação com os significantes orais (relação da escrita com a pauta sonora).
Na segunda é preciso compreender como se dá o funcionamento da escrita, perceber que
38
as palavras são formadas por unidades menores (sílabas e letras), entender que as
palavras são escritas com diferentes estruturas silábicas, compreender que para escrever
palavras diferentes é preciso pensar no repertório, na ordem e quantidade das letras.
Essas duas questões conceituais não são claras para as crianças que estão
iniciando o processo de alfabetização, tendo em vista que esses aprendizes não sabem o
que a escrita nota e nem como acontece essa notação. As hipóteses que as crianças
elaboram até perceber o funcionamento do sistema de escrita dependem do nível que se
encontram em relação à compreensão do sistema de escrita. Diante disso, corroboramos
com Ferreiro (1982) e Morais (2012) que as crianças buscam compreender essas duas
dimensões, os conceitos e as convenções que a natureza do sistema de escrita alfabética.
Sobre os conceitos e convenções que envolvem o SEA, Morais (2012) destaca que:
Os primeiros conceituais têm a ver com as duas questões [...], que
remetem ―à natureza profunda‖ do processo de representação
simbólica (ou notação). Os segundos, como o próprio nome diz, têm a
ver com as convenções, que poderiam ser alteradas por acordo social,
sem que a natureza alfabética do sistema fosse mudada: escrevemos,
nas línguas com alfabeto latino, da esquerda para a direita, geralmente
de cima para baixo, deixamos espaços entre as palavras escritas e
usamos apenas certas letras que, ao longo da história, foram
escolhidas para substituir determinados sons (p.50).
Diante dos diversos princípios e convenções que envolvem o sistema de escrita
alfabética, defendemos, nesta Dissertação, a escrita como um sistema notacional dotado
de propriedades e convenções que precisam ser ensinados de forma sistemática. Desse
modo, pontuamos que é papel dos professores auxiliar os aprendizes na empreitada pela
descoberta do domínio do sistema de escrita, proporcionando momentos em que eles
sejam levados a compreender os vários princípios que envolvem o sistema alfabético,
por meio de diversos recursos didáticos.
De acordo com Ferreiro (2011), é possível interpretar de duas formas os
registros das crianças quando elas são solicitadas a escrever uma sequência de palavras.
Uma dessas formas está relacionada com os aspectos gráficos que têm a ver com a
segmentação entre as palavras, a qualidade do traço, a forma que escrevem (da esquerda
para a direita) e etc. E a outra forma, definida como os aspectos constitutivos, está
relacionada com as concepções dos aprendizes e todo processo evolutivo até a
fonetização da escrita. A concepção tradicional de interpretar o ensino da escrita para as
39
crianças dá um enorme respaldo aos aspectos gráficos, sem levar em consideração o
complexo percurso que os indivíduos percorrem até escrevem de modo convencional.
Contrariando a perspectiva tradicional de conceber os escritos dos aprendizes, de
modo a considerar os aspectos constitutivos, os estudos de Ferreiro e Teberosky (1984)
evidenciaram que durante a aprendizagem do sistema de escrita alfabética as crianças,
jovens ou os adultos elaboram hipóteses sobre esse objeto de conhecimento, passando,
dessa forma, por diferentes fases que foram denominadas de pré-silábica, silábica,
silábico-alfabética e alfabética.
Num momento inicial, chamado de fase pré-silábica, os aprendizes ainda não
buscam relações entre a escrita e pauta sonora. Eles muitas vezes acreditam que
escrever é o mesmo que desenhar, ou seja, não conseguem diferenciar o modo de
representação não icônico do icônico. Nessa hipótese, os indivíduos passam por um
processo em que utilizam números e letras indistintamente, ou que usam letras, mas sem
estabelecer critérios que evidenciem reflexões sonoras das palavras.
Para uma criança que está nessa fase, a escrita de uma palavra pode ocupar toda
a página ou ser feita com apenas uma letra ou várias letras sem uma correspondência
quantitativa e nem qualitativa com as partes que compõem a escrita convencional.
Nessa fase, os aprendizes acreditam que a escrita da palavra tem relação com o tamanho
ou o formato dos objetos (realismo nominal). Quando compreendem que a escrita é
outra forma de representação, buscam entender como é essa representação.
Inicialmente, por meio de muito esforço, pensam na escrita com base nos critérios
intrafigurais que são formados pelo eixo de quantidade (ideia de que as palavras, para
serem lidas, precisam ter uma quantidade mínima de letras/no mínimo três) e pelo eixo
de qualidade (preocupação com a variação interna das letras na composição de uma
palavra). Outro esforço cognitivo acontece em seguida, esse relacionado com os
critérios de diferenciação entre as escritas, chamado de interfigurais que também são
formados pelo eixo de quantidade (variação da quantidade de letras de uma palavra para
outra) e pelo eixo de qualidade (preocupação com a variação do repertório de letras de
uma palavra para outra).
Gradativamente, as crianças começam a perceber que precisam refletir sobre as
relações entre o som e a escrita para entender como funciona o SEA. A criança, então,
começa a descobrir que a quantidade de letras com que se vai escrever uma palavra
pode ter correspondência com a quantidade de partes que se reconhece na emissão oral.
40
Percebendo que as palavras são constituídas de sílabas, passam a realizar segmentação
silábica e atribuir uma letra para cada uma dessas partes da palavra.
Segundo Ferreiro e Teberosky (1984), a criança que está na fase pré-silábica
pode pensar apenas do ponto de vista da quantidade de letras a serem utilizadas,
colocando aleatoriamente uma letra para cada sílaba ou pode realizar algumas análises
qualitativas, utilizando letras que fazem parte das sílabas que pretende representar.
Posteriormente, as crianças começam a entender que as sílabas contêm mais de
uma letra, embora não sejam consistentes nessa representação, oscilando entre
representar algumas sílabas com uma letra e outras com mais de uma letra. Esse estágio
de transição é chamado de silábico-alfabético. Nessa fase, o aprendiz compreende que a
letra representa partes menores que as sílabas – os fonemas – chegando à fase
alfabética. Nesse momento, ele é capaz de realizar relações mais consistentes entre a
escrita e a pauta sonora. É importante ressaltar que atingir a hipótese alfabética não
significa estar alfabetizado, pois, de acordo com Morais (2012), nessa última fase, os
aprendizes têm o novo conflito para dar conta, buscam compreender as regras
ortográficas que também estão atreladas com a escrita da língua materna.
No que se refere às percepções dos professores sobre ensino, terceiro elemento
que também compõe a tríade definida nos estudos de Ferreiro (2011), se o educador
compreende a escrita como um código, isso influenciará seu trabalho em sala de aula
acarretando uma intervenção didática com ênfase em atividades de memorização de
letras e sílabas e não em propostas de atividades reflexivas em que tais conhecimentos
sejam mobilizados. Mas se a escrita é interpretada como um objeto de conhecimento de
natureza complexa percebe-se a importância de promoção de ações problematizadoras
em busca de auxiliar os estudantes no desenvolvimento dos processos cognitivos que
envolvem o sistema alfabético.
Esses dois modos de conceber a alfabetização (aprendizagem de um código X
aprendizagem de um sistema notacional de representação) acarretam na seleção de
diferentes recursos didáticos e diferentes modos de utilizá-los em sala de aula.
A teoria psicogenética além de contribuir com uma nova visão para os três
elementos da tríade que envolve o processo de alfabetização (o sistema de escrita, as
concepções das crianças e as percepções do professor), provocou algumas mudanças
voltadas para o ensino da leitura e da escrita.
Nesse sentido, foram promovidos discursos com foco na superação da visão
adultocêntrica de ensino, a crítica incisiva aos métodos tradicionais, a desconsideração
41
do estado de prontidão e a relevância das práticas sociais presentes no cotidiano dos
sujeitos antes do ensino formal. No entanto, sabemos que tais contribuições não
garantiram que o fracasso na alfabetização fosse superado nas escolas.
O que vimos no contexto escolar foi o surgimento de algumas interpretações
errôneas sobre os estudos de Ferreiro e Teberosky (1984) como a falta de objetivos
claros no ensino do sistema de escrita e, com a ausência dos métodos, a carência de uma
metodologia voltada para o ensino sistemático da língua materna, pois se propagou a
falsa ideia de que os aprendizes, considerados sujeitos ativos no processo de
aprendizagem, descobririam sozinhos os princípios que envolvem o sistema alfabético.
Associado à discussão da psicogênese é possível citar os estudos sobre
consciência fonológica também auxiliaram na forma de conceber o processo de
alfabetização.
No próximo subtópico, discutiremos as contribuições das pesquisas sobre
consciência fonológica no processo de alfabetização.
2.1.4 As contribuições da consciência fonológica na alfabetização
Os estudos que relacionam o papel da consciência fonológica e a alfabetização,
sobretudo a aprendizagem do sistema de escrita, tiveram início na década de 70. Desde
aquele momento até os dias atuais, diversos debates sobre essa relação ganharam
respaldo no cenário educacional.
Freitas (2004:179) denomina consciência fonológica como a ―habilidade do ser
humano de refletir conscientemente sobre os sons da fala‖, podendo acontecer no nível
das sílabas, das unidades intra-silábicas e no nível dos fonemas.
Segundo Barrera (2003), consciência fonológica é a capacidade de refletir sobre
os segmentos da linguagem oral e as características sonoras da palavra (tamanho,
semelhança, diferença), bem como manipular fonemas, sílabas e rimas.
Em busca de perceber como se dá a relação da consciência fonológica e a
apropriação do sistema de escrita alfabética, estudiosos da área realizaram pesquisas
empiristas, por meio de testes envolvendo treino silábico e fonêmico.
É nesse contexto que surgem três grandes concepções com base nos estudos
realizados pelos teóricos que investigam o tema. Uma primeira, defendida por Bradley e
Bryant (1983) e Lundberg (1988), considera a consciência fonológica como pré-
requisito para a aquisição da escrita. Isso significa dizer que para dominar o sistema de
42
escrita alfabética o indivíduo precisa, necessariamente, ter desenvolvido a consciência
fonológica. Em contrapartida, uma segunda compreensão, defendida por José Morais,
Cary, Alegria, Bertelson (1979), segue em defesa de que a alfabetização proporciona o
desenvolvimento da consciência fonológica, passando a ser uma consequência da
alfabetização. Por fim, uma terceira concepção, mais aceita pelos estudiosos da área e
difundida do que as anteriores, fundamentada em Gathercole e Baddeley (1993), afirma
a existência de uma relação recíproca entre o desenvolvimento da consciência
fonológica e o processo de alfabetização.
Barrera (2003) explica que as concepções apontadas pelos teóricos divergem
porque as pesquisas foram realizadas com distintas habilidades de consciência
fonológica. Isso significa dizer que um grupo de pesquisadores fez uso de atividades
voltadas para a compreensão das rimas e aliterações, esses, por sua vez, concluíram que
tais competências são requisito para a alfabetização, por se tratar de capacidades
desenvolvidas por aprendizes que ainda estão no processo de aquisição da língua
escrita. Já os teóricos que consideram a consciência fonológica como consequência da
alfabetização realizaram pesquisas com base em atividades que envolvem o acréscimo,
retirada e segmentação de fonemas. Trata-se, nesse caso, de habilidades mais abstratas e
difíceis de serem assimiladas por crianças, jovens ou adultas que ainda não dominam o
sistema de escrita.
Desse modo, Bryant e Bradley (1995) e Bowey (1994) apud Barrera (2003:74)
passaram a defender ―a ideia da existência de diferentes níveis de consciência
fonológica, alguns dos quais provavelmente precedem a aquisição da linguagem escrita,
enquanto outros parecem ser mais um resultado dessa aquisição‖.
Mesmo diante de um campo cheio de divergências, teóricos como Goigoux e
Cèbe (2003) e Morais (2005), evidenciaram que a consciência fonológica está
relacionada com um conjunto de habilidades metafonológicas importantes para o
processo de alfabetização.
De acordo com Morais (2005), vários teóricos explicam o que significa
consciência fonológica. Entretanto, segundo esse teórico, algumas concepções tendem a
restringir o significado de consciência fonológica apenas às atividades que envolvem a
manipulação dos fonemas. Desse modo, divergindo da forma restrita de conceber esse
tema, Morais (2010, p. 75) afirma que a consciência fonológica é um conjunto de
habilidades que envolvem a reflexão das unidades sonoras da língua, conforme pode ser
visto abaixo:
43
Por isso, usamos o termo ―habilidades metafonológicas‖, no plural,
em vez de ―habilidade metafonológica‖, no singular. Dentre as
diversas capacidades metafonológicas existentes, encontramos, por
exemplo, a identificação e produção de rimas ou de aliterações, a
contagem dos fonemas ou sílabas das palavras, a segmentação de
palavras em fonemas ou sílabas, a adição subtração ou substituição de
sons, a comparação de palavras quanto ao número de sílabas ou de
fonemas.
No que se refere ao tratamento dessas habilidades, Morais (2005) afirma que
nem todas são necessárias para o processo de aquisição da língua escrita. De acordo
com esse autor, muitos teóricos têm a concepção errônea de que as habilidades no nível
dos fonemas, que muitas vezes não são desenvolvidas nem por indivíduos já
alfabetizados, são requisito para a aprendizagem do sistema de escrita alfabética.
Em consonância com os pressupostos defendidos pelo referido autor, a pesquisa
de Leite (2011) também aponta que as habilidades de consciência fonológica com foco
no tratamento dos fonemas não são requisito para a alfabetização. Pelo contrário, esse
estudo sinaliza o quanto os alunos pertencentes a hipóteses de escrita avançadas
sentiram dificuldades em resolver as atividades que envolviam a consciência dos
fonemas.
Segundo Morais (2012), as crianças precisam refletir sobre as unidades sonoras
das palavras, segmentar oralmente as palavras, refletir sobre a quantidade de sílabas e
reconhecer rimas e aliterações presentes em palavras para que possam avançar em suas
hipóteses de escrita. Isso significa dizer que ao promover atividades que envolvam o
trabalho dessas habilidades o docente estará promovendo situações em que os
aprendizes reflitam sobre o funcionamento da escrita alfabética. No entanto, é
importante salientar que essas capacidades metafonológicas não são suficientes para que
os aprendizes tornem-se alfabéticos.
Com base nos pressupostos defendidos pela psicogênese da escrita, por meio dos
estudos de Ferreiro e Teberosky (1984), na hipótese pré-silábica, por exemplo, a criança
não faz relação da escrita com a pauta sonora. Nesse sentido, de acordo com Morais
(2012), a habilidade de segmentar oralmente as palavras é a que precisa ser mais
explorada pelos aprendizes. Para que as crianças avancem na compreensão do sistema
de escrita e atinja uma hipótese silábica e alfabética é necessário que algumas
habilidades de consciência fonológica sejam desenvolvidas além da habilidade de
segmentar oralmente as sílabas. Na hipótese silábica, fase em que os aprendizes marcam
44
um símbolo para cada sílaba da palavra, é preciso que os educandos reflitam sobre a
quantidade de sílabas orais presentes na palavra. Ao chegar à hipótese silábica, silábico-
alfabética e alfabética os aprendizes reconhecem com mais propriedade as palavras que
começam com a mesma sílaba inicial e as rimas, podendo, dessa forma, construir
palavras que rimem com outras. Já a habilidade de reconhecer palavras que
compartilham o mesmo fonema inicial apresenta uma maior complexidade, sendo desse
modo, mais difícil de ser dominada. (MORAIS, 2012).
Nesse sentido, concordamos com Ferreiro e Teberosky (1979) que a
aprendizagem da notação alfabética envolve um percurso complexo para o aprendiz.
Concordamos, ainda, com base nos pressupostos defendidos por Morais (2012), que o
desenvolvimento de algumas habilidades de consciência fonológica é necessário para
que as crianças, jovens e adultos compreendam os princípios que envolvem o sistema
alfabético e, consequentemente, avancem nas hipóteses de escrita.
A seguir, no próximo subtópico, detalharemos alguns conhecimentos
interpretados como direitos de aprendizagens importantes para aquisição da língua
materna.
2.1.5 Uma breve discussão sobre os Direitos de aprendizagem voltados para
apropriação do Sistema de Escrita Alfabética
Iniciativas promovidas pelo Ministério de Educação através de leis, reformas,
planos, projetos e políticas têm sido elaboradas com o objetivo de discutir e,
consequentemente, subsidiar os três primeiros anos do Ensino Fundamental. Ações
como essas se tornam necessárias, tendo em vista que ainda presenciamos alunos
concluindo a educação básica sem usar de modo efetivo a leitura e a escrita para atender
suas demandas sociais. Mesmo diante dessas iniciativas que promovem o debate em
torno da aquisição da Língua Portuguesa ainda não temos, na atual conjuntura, um
documento oficial voltado diretamente para a alfabetização. Além disso, conforme
mencionamos no tópico anterior, não há uma única forma de conceber a aquisição da
língua escrita.
Diante disso, corroboramos com Cruz (2012) que um documento oficial
referente à alfabetização, elencando os conhecimentos mínimos, daria um norte aos
municípios na estruturação de suas propostas curriculares. Por outro lado, não podemos
negar que alguns documentos já elaborados, tais como: as Diretrizes Curriculares
45
Nacionais (doravante DCN) e os Parâmetros Curriculares Nacionais (doravante PCNs)
de Língua Portuguesa para o 1º e 2º ciclos podem subsidiar os municípios na elaboração
das metas necessárias para o domínio da leitura e da escrita. No entanto, é importante
ressaltar que tais documentos trazem pressupostos mais gerais sobre o ensino da língua
materna.
Por isso, consideramos que uma ―base curricular comum referente à
alfabetização‖ daria um parâmetro aos gestores e professores sobre os conhecimentos e
capacidades básicas a serem garantidos no final de cada ano que corresponde aos três
anos iniciais do Ensino Fundamental (CRUZ, 2012).
Além disso, pontuamos, conforme mencionado no tópico anterior, que para ler e
escrever com autonomia os aprendizes precisam compreender diversas propriedades que
envolvem o sistema de escrita alfabética. Diante disto, consideramos que os
conhecimentos subjacentes ao domínio do sistema de escrita alfabética precisam ser
garantidos aos alunos, tendo em vista que:
A alfabetização é um direito humano fundamental de natureza social.
O não atendimento a esse direito social produz duplo efeito: de um
lado, coloca o Estado na condição de devedor; de outro, coloca não só
os jovens e adultos, mas ainda as crianças e adolescentes que não
tenham sido alfabetizadas na idade própria, em condição de credores
em relação ao Estado. Se condições adversas respondem pela não
efetivação desse direito mais que identificar causas de um suposto
―fracasso‖ (que não importa se postas nas crianças, no corpo docente,
na escola, no sistema escolar, na família...), cabe cobrar do Estado a
criação das condições objetivas de realização, mesmo que tardia desse
direito (FERRARO, 2014, p. 85).
Ao defendermos o domínio da leitura e da escrita como um direito,
consideramos que, para garanti-lo, faz-se necessário um documento norteador
apresentando expectativas de aprendizagem a serem ensinadas nos anos iniciais do
Ensino Fundamental. Não estamos com isso defendendo a prescrição de ―fórmulas‖ que
o professor alfabetizador deve seguir, pelo contrário, expomos a necessidade de um
documento norteador, considerando a progressão no ensino da leitura e da escrita em
cada ano que corresponde ao ciclo de alfabetização.
Conforme anunciamos, essa defesa é urgente e necessária, tendo em vista que a
aprendizagem da leitura e da escrita garante ao indivíduo ―direito de participação na
46
produção da cultura e da linguagem, como um direito, enfim, de produção de sentidos
para o presente e o futuro‖ (MORTATTI, 2000, p. 304).
Dessa forma, é válido ressaltar que, além de um documento norteador, é preciso
ter metas claras para os anos iniciais do Ensino Fundamental.
Além de Mortatti (2000), alguns estudos vêm enfatizando a falta de metas e,
consequentemente, a ausência de progressão no ensino no ciclo da alfabetização têm
comprometido a aprendizagem das crianças. A seguir, descreveremos alguns desses
estudos.
A pesquisa realizada por Oliveira (2010) investigou se havia progressão nas
atividades de Língua Portuguesa realizadas no interior do ciclo da alfabetização. Em
busca de compreender tal objetivo foram realizadas entrevistas e observações das
práticas de nove professores, de três instituições do município de Recife, sendo três de
cada escola completando o 1º ciclo. Os dados dessa pesquisa evidenciaram que não
havia progressão no interior do ciclo no que se refere às atividades voltadas para o
desenvolvimento da leitura, da produção de textos e da apropriação do sistema de
escrita alfabética. Além disso, a pesquisadora sinalizou que houve escassez de
atividades centradas no desenvolvimento do eixo de produção de textos nas turmas de
1º e 2º anos. Já as atividades referentes à apropriação do SEA estiveram mais presentes
nas turmas de 1º ano. Em contrapartida, foi possível perceber similaridades no perfil das
turmas de 1º e 3º anos, evidenciando a ausência de progressão no ciclo. Esses dados
revelaram a falta de clareza dos docentes investigados em relação às atividades a serem
realizadas em cada ano que corresponde aos três primeiros anos do Ensino
Fundamental. Desse modo, a pesquisa sinalizou que é preciso caminhar rumo a um
currículo que não só garanta o avanço na escolarização, mas que esclareça ao professor
alfabetizador os conhecimentos e capacidades básicas que os alunos precisam dominar
no final de cada ano do ciclo de alfabetização.
A pesquisa desenvolvida por Frigotto (2005) teve como um dos objetivos
compreender as estratégias pedagógicas utilizadas pelas professoras para o ensino da
leitura e da escrita em três turmas de 1º ciclo numa escola pública do município de
Niterói/RJ. Para tanto, foram realizadas observações e entrevistas com as professoras
em busca de compreender como eram constituídas as rotinas das mesmas no regime
ciclado. Os dados deste estudo evidenciaram que as práticas referentes à leitura e à
escrita eram muito incipientes e não consideravam as práticas sociais. Tais dados
sinalizavam que as escolas organizadas em ciclos mantinham a mesma estrutura do
47
regime seriado, a única diferença era que havia a promoção automática dos alunos até o
final do terceiro ano, sem pensar no currículo que atendesse as demandas do regime
ciclado, ou seja, em respeito aos tempos de aprendizagem e considerando a progressão
no ensino da leitura e da alfabetização.
Em outro estudo, Cruz (2012) investigou a fabricação das práticas de
alfabetização pelas professoras e a apropriação da escrita e da leitura pelos alunos que
estão nos três anos iniciais em duas escolas (organizadas em série e ciclos) com intuito
de analisar as práticas das professoras e as orientações políticas dos municípios
investigados. Participaram da pesquisa seis docentes que faziam parte dos três anos
iniciais do Ensino Fundamental e seus alunos. Como percurso metodológico foi
desenvolvido a análise documental das propostas curriculares dos municípios
investigados referente à alfabetização, entrevistas, observações das aulas e a aplicação
de diagnose de leitura e escrita com os alunos no início, no meio e no final do ano. Os
resultados revelaram que, no que se refere à análise das propostas curriculares, o
município de Camaragibe que corresponde à escola com regime seriado apresenta os
conhecimentos e as expectativas de aprendizagem voltadas para cada ano
correspondente ao ciclo de alfabetização. Já a escola correspondente ao município de
Recife (regime ciclado) não apresentava orientações sistemáticas para os professores e
esses, por sua vez, não tinham clareza sobre os conhecimentos que os alunos
precisavam dominar em cada ano correspondente ao ciclo de alfabetização. Mesmo
diante de diferentes propostas curriculares, foi possível perceber que as professoras
tinham práticas ancoradas na perspectiva alfabetizar letrando. Além disso, foi possível
perceber que as crianças de ambas as escolas avançaram em relação à apropriação do
sistema de escrita alfabética ao longo do ano. Entretanto, ressaltamos que as docentes da
escola do município de Recife explicitaram que a ausência na proposta curricular de
metas de ensino para cada ano na alfabetização dificultava sua prática em sala de aula,
pois as mesmas não tinham clareza sobre quais os conhecimentos deveriam ensinar em
cada ano.
Nesse sentido, reiteramos que é preciso estabelecer metas para cada ano que
compõe o ciclo de alfabetização, de modo que o professor tenha clareza do que as
crianças precisam aprender em cada ano de ensino (BATISTA, 2005; MORAIS, 2012;
CRUZ, 2012).
Dentre alguns documentos e programas elaborados pelo Ministério de Educação
que podem subsidiar o professor pertencente ao ciclo de alfabetização, destacamos os
48
manuais dos Acervos Complementares – alfabetização e letramento nas diferentes
áreas do conhecimento (BRASIL, 2010; 2012) e com o Edital do PNLD 2015
(Programa Nacional do Livro Didático). Os pressupostos teóricos subjacentes a esses
documentos e programas serão discutidos no próximo capítulo.
Além desses documentos e programas, o professor alfabetizador da rede de
pública de ensino pode contar com as Diretrizes Curriculares Nacionais 3, os PCNs de
Língua Portuguesa para o 1º e 2º ciclos, ambos anunciados anteriormente, o documento
intitulado Ensino Fundamental de nove anos: orientações para Inclusão da Criança de
seis anos de idade (BRASIL, 2007), o Programa de formação continuada dos
anos/series iniciais do Ensino Fundamental: Alfabetização e Linguagem (Pró-
letramento) (BRASIL, 2007) e o Programa de formação continuada Pacto Nacional
pela Alfabetização na Idade Certa - PNAIC (BRASIL, 2012). A seguir, detalharemos
os pressupostos teóricos do documento intitulado Ensino Fundamental de nove anos:
orientações para Inclusão da Criança de seis anos de idade e dos dois programas de
formação continuada que foram mencionados.
O documento Ensino Fundamental de nove anos – orientações para a inclusão
da criança de seis anos de idade foi elaborado pelo Ministério de Educação em 2007
visando ―fortalecer um processo de debate com professores e gestores sobre a infância
na educação básica‖ (BRASIL, 2007, p.6) e com objetivo de contribuir para o
―desenvolvimento e a aprendizagem das crianças de seis anos de idade ingressantes no
ensino fundamental de nove anos, sem perder de vista a abrangência da infância de seis
a dez anos de idade nessa etapa de ensino‖ (BRASIL, 2007, p.6).
De acordo com este documento, a ampliação do Ensino Fundamental para nove
anos significa pensar também na qualificação do ensino e, consequentemente, da
aprendizagem da alfabetização e letramento (BRASIL, 2007). Além disso, salienta a
urgência em repensar todo o Ensino Fundamental e, inclusive ―os espaços educativos,
os materiais didáticos, o mobiliário e os equipamentos precisam ser prensados para
atender as crianças com essa nova faixa etária do ensino fundamental‖ (BRASIL, 2007,
p. 8).
O Programa de Formação Continuada de Professores dos Anos/Séries Iniciais
do Ensino Fundamental (alfabetização e linguagem) denominado Pró-letramento foi
3 Documento que orienta a organização das propostas curriculares referentes ao Ensino Fundamental nos
diferentes sistemas de ensino.
49
proposto pelo Ministério de Educação e Cultura (MEC), em 2007, buscando promover
políticas públicas para subsidiar a prática docente. Nele era anunciado a importância das
capacidades a serem desenvolvidas pelos aprendizes nos anos iniciais do Ensino
Fundamental, também definidas como os conhecimentos e atitudes a serem
desenvolvidos pelos alunos que estavam no ciclo de alfabetização.
O material do programa é formado por sete fascículos, dentre eles o intitulado
―Capacidades linguísticas: alfabetização e letramento‖ em que são apresentados
quadros, divididos em cinco eixos voltados para o ensino de Língua Portuguesa, a saber:
compreensão e valorização da cultura escrita, apropriação do sistema de escrita, leitura,
produção escrita e desenvolvimento da oralidade. Nesses quadros também foram
expostas as habilidades a serem dominadas pelos alunos e juntos a elas estão às letras I
(significa capacidade a ser introduzida), T (significa capacidade a ser trabalhada
sistematicamente), C (significa capacidade a ser consolidada) e R (significa capacidade
a ser retomada) que variam de acordo com o ano de ensino. No quadro abaixo vemos o
eixo de compreensão e valorização da cultura escrita.
Figura - 03 – Quadro I: Compreensão e valorização da cultura escrita
50
De acordo com o quadro 1 (figura 03), os professores devem propiciar aos
alunos o contato das práticas sociais aos educandos em sala, de modo a promover
situações didáticas em que os estudantes sejam levados a valorizar os modos de
produção, de circulação e fazer uso das funções sociais da escrita desde o 1º ano do
Ensino Fundamental.
Na figura 04 (quadro 2), intitulada Apropriação do Sistema de Escrita Alfabética
podemos observar abaixo:
Figura 04 – Quadro II: Apropriação do Sistema de Escrita Alfabética. (Fonte: Brasil, 2008).
51
A partir do quadro II (figura 04), é possível perceber algumas metas voltadas
para o 1º, 2° e 3º ano do Ensino Fundamental no que se refere à apropriação do sistema
de escrita alfabética. Como podemos ver as capacidades de diferenciar entre a escrita e
outras formas gráficas, compreender a orientação e o alinhamento da escrita, a função
de segmentação dos espaços em branco e da pontuação no final da frase são
conhecimentos que precisam ser introduzidos, trabalhados e consolidados no 1º ano e
nos 2º e 3º anos retomados. A capacidade de reconhecer a semelhanças entre as
unidades silábicas, nas rimas e terminações das palavras também são conhecimentos
que precisam ser introduzidos, trabalhados e consolidados no 1º ano. Já no 2º ano
precisam ser trabalhados novamente e retomados no 3º ano do Ensino Fundamental. As
capacidades que envolvem o conhecimento do alfabeto, tais como: a compreensão da
categorização gráfica das letras e o reconhecimento e uso dos diferentes tipos de letras
como também a compreensão da natureza alfabética do sistema de escrita são
conhecimentos que precisam ser introduzidos e trabalhados no 1º ano, trabalhados e
consolidados no 2º e retomados no 3º ano do Ensino Fundamental. Já o domínio das
relações entre grafemas e fonemas, nesse caso, as regularidades deve ser introduzido no
1º ano e trabalhado e consolidado nos 2º e 3ºanos. No que se refere às irregularidades
podemos introduzir no 1º e 2º ano e trabalhar no 2ºe 3º anos.
Os quadros com as habilidades presentes nesse fascículo sinalizam a existência
de uma progressão nos conhecimentos sobre o sistema de escrita alfabética a serem
assimilados pelos alunos. Além de considerar a importância da progressão dos
conhecimentos relacionados à aprendizagem da língua materna, esse programa de
formação continuada ressaltava a necessidade de se ter objetivos bem definidos para
cada ano que compõe o ciclo de alfabetização. Nesse sentido, cabe ao docente propor
situações didáticas que possibilitem que aos educandos à aprendizagem das habilidades
esperadas para cada ano de ensino (BRASIL, 2007).
Outro programa de formação continuada elaborado pelo Ministério de Educação
que pode subsidiar a prática do professor alfabetização é o Programa Pacto Nacional
pela Alfabetização na Idade Certa – PNAIC. Este programa formação continuada foi
elaborado em 2012 em parceria as universidades, estados e municípios com o objetivo
de alfabetizar as crianças até os oito anos de idade é destinado aos professores
pertencentes ao ciclo de alfabetização (1º a 3º ano do Ensino Fundamental). De acordo
com o Caderno de apresentação associado a este programa o Pacto acontece com base
em quatro eixos de atuação:
52
1. Formação continuada presencial para os professores
alfabetizadores e seus orientadores de estudo;
2. Materiais didáticos, obras literárias, obras de apoio pedagógico,
jogos e tecnologias educacionais;
3. Avaliações sistemáticas;
4. Gestão, controle social e mobilização (BRASIL, 2012, p. 05).
De modo geral, este programa busca desenvolver estratégias para contribuir na
qualidade do ensino nos anos iniciais de escolarização.
No Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) são elencados
os direitos gerais de aprendizagem de Língua Portuguesa que estão divididos nos eixos
de ensino, a saber: leitura, produção de textos escritos, oralidade e análise linguística,
este último, dividido em dois blocos: discursividade, textualidade e normatividade e
apropriação do sistema de escrita alfabética. Neste programa, os eixos de ensino da
língua materna são abordados em quadros que têm uma coluna para cada etapa escolar
do ciclo da alfabetização. Assim como já anunciado no Pró-letramento, tais quadros
também são preenchidos com as letras I (indica conhecimento a ser introduzido), A
(indica conhecimento a ser aprofundado) e C (indica que o conhecimento deve ser
consolidado). Desse modo, tem-se o pressuposto de que ―determinado conhecimento ou
capacidade pode ser introduzido em um ano e aprofundado em anos seguintes. A
consolidação também pode ocorrer em mais de um ano escolar dado que há
aprendizagens que exigem um tempo maior para a apropriação‖ (BRASIL, 2012, p.31).
É válido destacar que, de acordo com os pressupostos do Pacto, a aprendizagem
do sistema de escrita alfabética e seu uso de modo que atenda às necessidades na
sociedade envolve o domínio de uma série de direitos de aprendizagem de Língua
Portuguesa que estão relacionados com os quatro eixos de ensino já descritos acima.
Diante disso, nota-se que tais direitos de aprendizagem estão intimamente relacionados
com as habilidades linguísticas apresentadas pelo Pró-letramento. No Pacto há a
delimitação de ―diferentes conhecimentos e capacidades básicas que estão subjacentes
aos direitos‖ (BRASIL, 2012, p. 31).
A seguir, expomos os quadros de conhecimentos e capacidades específicos
referentes ao eixo de análise linguística.
53
Figura 05 – Quadro referente ao eixo de análise linguística: discursividade, textualidade e
normatividade.
O quadro correspondente à figura 05 apresenta quinze conhecimentos e
capacidades básicas intituladas como direitos de aprendizagens, voltados para o eixo de
análise linguística, destinado aos estudantes pertencentes ao ciclo de alfabetização.
Alguns conhecimentos precisam ser introduzidos no primeiro ano do Ensino
Fundamental e, consequentemente, aprofundados e consolidados nos dois próximos
anos. Outros direitos, segundo as orientações do PNAIC, precisam ser introduzidos,
54
aprofundados e consolidados em todos os anos, ou seja, no 1º, 2º e 3º anos. Há também
direitos que apresentam uma maior complexidade, por isso devem ser introduzidos a
partir do 2º ano do Ensino Fundamental e aprofundado e consolidado nos demais anos.
De modo geral, os conhecimentos expostos estão ancorados com os direitos de
conhecer os diferentes gêneros textuais, compreender o contexto de produção que os
gêneros textuais podem ser elaborados, vivenciar situações didáticas com foco nas
regularidades e irregulares (noções introdutórias sobre ortografia) e usar a concordância
nominal e verbal no texto, pontuando o mesmo.
Figura 06 – Quadro referente ao eixo de análise linguística: apropriação do Sistema de Escrita
Alfabética.
55
Na figura 06, apresentamos o quadro com quinze direitos de aprendizagem
referentes à apropriação do sistema de escrita alfabética. É válido destacar que no
quadro são expostos conhecimentos e capacidades básicas que os alunos pertencentes ao
ciclo da alfabetização precisam dominar para ler e escrever com autonomia. Como
podemos observar, a maior parte dos direitos, segundo o PNAIC, devem ser
introduzidos, aprofundados e consolidados no 1º ano do Ensino Fundamental. Ou seja,
os pressupostos do Pacto pontuam muitos desses direitos devem estar garantidos aos
alunos no início do 2º ano do ciclo de alfabetização. Apenas quatro direitos de
aprendizagem, a saber: reconhecer diferentes tipos de letras em textos de diferentes
gêneros e suportes textuais, usar diferentes tipos de letras em situações de escrita de
palavras e textos, dominar as correspondências entre letras ou grupos de letras e seu
valor sonoro, de modo a ler palavras e textos e o de dominar as correspondências entre
letras ou grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a escrever palavras e textos,
precisam ser aprofundados e consolidados nos anos posteriores ao 1º ano do Ensino
Fundamental.
A seguir, no segundo tópico desse capítulo, abordaremos como o uso de recursos
didáticos no ciclo de alfabetização podem subsidiar os professores na mobilização dos
direitos de aprendizagem referentes à apropriação do SEA.
56
2.2 Recursos didáticos na alfabetização
No tópico anterior, discutimos algumas concepções de alfabetização presentes
no contexto atual, os métodos tradicionais de alfabetização, as contribuições da
psicogênese da escrita para o campo da alfabetização, os estudos que relacionam
consciência fonológica e alfabetização e os conhecimentos que precisam ser garantidos
aos aprendizes em processo de alfabetização intitulados como direitos e aprendizagem.
Neste tópico, abordaremos alguns recursos didáticos utilizados pelos professores
alfabetizadores em sala de aula, considerando os recursos foco desta pesquisa. Por isso,
como ponto de partida, apresentaremos alguns programas de distribuição de recursos
para as escolas públicas do país, tais como: Programa Nacional do Livro Didático
(PNLD), PNLD – Acervos complementares, Programa Nacional da Alfabetização na
Idade Certa (PNAIC) e Programa Nacional da Biblioteca na Escola (PNBE).
Subjacentes a esses programas estão alguns recursos didáticos foco deste estudo, a
saber: o livro didático de Letramento e Alfabetização, os jogos de alfabetização, as
obras complementares e as obras literárias.
Nesta Dissertação, saímos em defesa da perspectiva sociointeracionista, tendo
em vista que consideramos a concepção de ensino voltada para alfabetização pautada no
letramento. Defendemos tal perspectiva, pois a mesma considera, como um dos seus
princípios, a interação entre o professor e os alunos no processo de ensino e
aprendizagem. Além da interação, os aprendizes são vistos como sujeitos ativos na
construção do conhecimento. Outro princípio que rege essa perspectiva é
desenvolvimento histórico do sujeito. Para ela, esse desenvolvimento ocorre do social
para o individual. Ou seja, a criança desenvolve seus saberes em diferentes áreas se
estiver inserida no meio social.
Com base nesses princípios, consideramos que o sistema de escrita é um objeto
de conhecimento complexo que pode ser compreendido a partir da interação,
considerando os saberes e as hipóteses que os aprendizes elaboram sobre o mesmo.
Nesse processo, defendemos que as diversas propriedades e capacidades que regem o
sistema de escrita alfabética, denominadas como direitos de aprendizagem, precisam ser
garantidas aos alunos no ciclo de alfabetização.
57
Para desenvolver uma prática ancorada na perspectiva sociointeracionista da
língua, considerando a alfabetização na perspectiva do letramento, cabe ao professor,
inicialmente, definir os conhecimentos que deseja ensinar e, além disso:
Considerando todas essas dimensões do ciclo de alfabetização, é
preciso planejar, com cuidado, as ações a serem desenvolvidas. O
planejamento contempla não apenas o tempo a ser usado e as
atividades a serem desenvolvidas, como também os modos como os
estudantes serão agrupados, o tipo de mediação a ser adotado e os
recursos didáticos adequados ao que se quer ensinar (BRASIL, 2012,
p. 15).
A escolha de recursos didáticos adequados ao que se deseja ensinar não é uma
tarefa fácil para o docente. Inclusive, a seleção desses recursos está relacionada com a
concepção de ensino do professor e com os objetivos didáticos e os conteúdos traçados
inicialmente por este sujeito.
Nesse processo, consideramos imprescindível planejar situações de ensino para
selecionar previamente os recursos didáticos a serem utilizados nas aulas, tendo em
vista que o planejamento pode auxiliar o professor em suas intenções educativas. Sobre
isso, Leal e Rodrigues (2011, p. 97) apontam que:
É o planejamento que pode garantir que o dia a dia da sala de aula seja
mais atraente e promova aprendizagens mais significativas. Para que
isso ocorra, é preciso facilitar o acesso a variados materiais escritos
que circulam na sociedade, tais como os jornais, as revisitas, os
cartazes, os panfletos, as embalagens. Em suma, qualquer portador
textual que possa ser objeto de atenção pode ter seu espaço na sala de
aula.
Por isso, defendemos que, através do planejamento, o professor pode pensar e
selecionar previamente os recursos didáticos a serem utilizados nas aulas, levando em
consideração os objetivos de ensino e os conteúdos traçados e, além disso, a concepção
de ensino que norteia sua prática pedagógica.
Segundo Freitas (2007), os recursos didáticos da escola são os materiais
utilizados pelos docentes com a função de facilitar o seu fazer pedagógico, de
possibilitar a aprendizagem dos alunos em relação aos diversos conteúdos abordados e
de concretizar as intenções educativas do professor.
Muitos desses recursos, a saber: fichas de atividade, jogos didáticos, cartazes,
alfabetos e materiais que estimulam a reflexão das palavras podem ser produzidos pelo
próprio docente. Outros, já estão disponíveis na escola, tais como: televisão,
58
computador, panfletos, cartazes e etc. Além desses, vêm chegando às escolas públicas
do país, por meio de programas de distribuição de materiais didáticos elaborados pelo
Ministério de Educação, outros recursos, tais como: livros didáticos, livros do universo
literário, livros diversificados, livros de divulgação científica, biografias, dicionários,
jogos de alfabetização e etc. (BRASIL, 2012).
Tais recursos didáticos têm sido nos dias de hoje objeto de preocupação de
gestores no âmbito das unidades escolares, secretarias municipais, estaduais,
universidades públicas e Ministério de Educação. Dessa forma, observamos, nas últimas
décadas, o aumento de iniciativas do governo federal relativas ao desenvolvimento de
programas de políticas de distribuição de recursos didáticos para as escolas públicas do
país, por meio dos programas citados, a saber: Programa Nacional do Livro Didático
(PNLD), composto também pelas coleções dos acervos complementares e dicionários,
Programa Nacional da Biblioteca na Escola (PNBE) e jogos de alfabetização.
Os professores podem, ou não, lançar mão desses recursos para alfabetizar e
podem utilizá-los de diferentes maneiras, dependendo de suas concepções sobre os
processos de aprendizagem, pois, como afirmam Leal e Silva (2011, p. 04), os recursos
didáticos são a materialização da prática docente:
As escolhas dos materiais que vamos utilizar em sala de aula estão
intrinsecamente relacionadas aos nossos objetivos didáticos, às nossas
concepções sobre quais são as melhores situações de ensino. Os
recursos didáticos não são acessórios de nossa ação docente, são a
materialização dela.
Conforme já sinalizamos, na abordagem empirista/associacionista da língua os
métodos tradicionais são concebidos pelos professores como métodos eficazes para o
ensino na alfabetização dos aprendizes. Nesses métodos um dos recursos priorizados
pelo docente, no processo de ensino da leitura e da escrita, são as cartilhas ou atividades
que apresentam a mesma estrutura das cartilhas, conforme apresentamos nas figuras 01
e 02.
Em divergência à abordagem empirista/associacionista está à concepção
sociointeracionista da língua que considera a alfabetização na perspectiva do
letramento. Nesta concepção de ensino, as cartilhas não os recursos didáticos
privilegiados pelos docentes, pelo contrário, pensam em recursos que possibilitem aos
alunos o contato sistemático com as especificidades do sistema de escrita alfabética e,
paralelamente, tenham acesso aos diversos gêneros textuais.
59
Entretanto, convém destacar que o uso exclusivo de recursos didáticos ancorados
numa concepção sociointeracionista da língua não garantem que os professores realizem
práticas de ensino baseadas na alfabetização na perspectiva do letramento. Com isso,
consideramos que a escolha e o uso de recursos ancorados numa concepção alfabetizar
letrando são iniciativas importantes a serem feitas pelo professor, mas, é preciso
sinalizar que, essas ações não são suficientes para que a referida concepção de ensino
seja posta efetivamente em prática na sala de aula. Todavia, Zabala (1998, p. 175)
considera que:
A complexidade da tarefa educativa nos exige dispor de instrumentos
e recursos que favoreçam a tarefa de ensinar. Em todo caso, são
necessários materiais que estejam a serviço de nossas propostas
didáticas e não o contrário; que não suplantem a dimensão estratégica
e criativa dos professores, mas que incentivem.
Nesta Dissertação, buscamos analisar as situações didáticas promovidas pelas
docentes investigadas a partir do uso de recursos didáticos distribuídos pelo Ministério
de Educação. Tais recursos estão ancorados na concepção da alfabetização na
perspectiva do letramento. Entretanto, lançamos a seguinte indagação: será que as
professores investigados utilizam esses recursos ancorados na concepção alfabetizar
letrando? Qual a relação entre os recursos didáticos selecionados e utilizados pelas
docentes e suas concepções de alfabetização? Será que esses recursos distribuídos pelo
Ministério de Educação, ancorados numa perspectiva sociointeracionista, são utilizados
de forma mais tradicional?
Para tanto, discutiremos neste tópico recursos didáticos que podem auxiliar a
prática do professor no processo de alfabetização das crianças, especificamente, no
ensino das propriedades que regem o sistema de escrita alfabética. Nesta pesquisa,
debruçaremos nosso olhar para alguns recursos didáticos distribuídos pelo Ministério de
Educação, mas não desconsideramos que outros recursos, tanto os disponíveis na escola
como os produzidos pelos docentes, podem também contribuir para a exploração dos
conhecimentos do sistema alfabético. Para aprofundar nossa discussão apresentaremos,
no subtópico seguinte, reflexões em torno dos recursos didáticos no ensino da língua
escrita.
60
2.2.1 Recursos didáticos utilizados no ensino do Sistema de Escrita Alfabética
De acordo com o que mencionamos, os recursos didáticos podem ser aliados das
práticas dos professores no ensino dos princípios do sistema de escrita alfabética. Para
tanto, vimos também que o processo de seleção e uso dos recursos não é uma tarefa
fácil para os docentes e, além disso, está diretamente relacionada com a concepção de
alfabetização dos educadores. Por isso, sinalizamos que os professores precisam refletir
a respeito dos critérios de escolha desses recursos.
Com base numa abordagem sociointeracionista da língua, Leal, Albuquerque e
Morais (2007, p. 70) sinalizam que os professores e professoras precisam:
Refletir sobre o papel do contato dos estudantes com diferentes textos,
em atividades de leitura e escrita realizadas dentro e fora da escola.
No entanto, é preciso recordar que esse contato por si só, sem
mediação, não garante que nossas crianças e nossos jovens se
alfabetizem, ou seja, que se apropriem do Sistema de Escrita
Alfabética.
Além disso, com base no Guia de livros didáticos PNLD 2016: Alfabetização e
Letramento e Língua Portuguesa/ensino nos anos iniciais o Ensino Fundamental
precisa propiciar aos alunos ―o domínio da escrita alfabética e a proficiência em leitura
e escrita, no que diz respeito a gêneros discursivos e tipos de texto representativos das
principais funções da escrita em diferentes esferas de atividade social‖ (BRASIL, 2015,
p. 13).
No dia a dia da sala de aula, os professores, com intuito de promover situações
didáticas em que as propriedades do sistema alfabético sejam exploradas, podem
produzir e selecionar recursos variados. Para tanto, sabemos que, no contexto atual,
alguns programas de distribuição de recursos didáticos podem auxiliar os docentes na
empreitada de alfabetizar os aprendizes. No contexto atual, programas elaborados pelo
Ministério de Educação, destinados às escolas públicas do país, sobretudo para o ciclo
de alfabetização (1º, 2º e 3º ano do Ensino Fundamental), podem subsidiar os
professores na concretização de suas intenções educativas.
O estudo de Gama (2014) buscou compreender a relação dos processos de
formação continuada e a construção das práticas docentes de professoras
alfabetizadoras. Participaram dessa pesquisa duas professoras que lecionavam a turma
do 2º ano do Ensino Fundamental no município de Camaragibe/PE. Os instrumentos de
61
coleta foram: entrevistas, observação de inspiração etnográfica e entrevistas de
Autoconfrontação. Um dos objetivos da pesquisa foi identificar, na rotina das
professoras investigadas, atividades relacionadas com os diferentes eixos da língua
portuguesa (análise linguística, leitura, produção de textos e oralidade). A partir das
observações, foi possível perceber que as professoras faziam uso de diversos recursos
didáticos em sua prática a fim concretizar suas intenções pedagógicas. Dentre eles, os
jogos de alfabetização distribuídos pelo Ministério de Educação, com o objetivo de
trabalhar o sistema de escrita alfabética. Uma das professoras fez uso de um livro que
pertence ao PNLD Acervo complementar e pontou que as obras são excelentes para
serem trabalhadas em sala. As fichas de atividades com foco no ensino do SEA, as
cruzadinhas, os textos lacunados, os ditados e os passatempos também contemplados na
prática das professoras. Junto a essas atividades de apropriação do sistema de escrita
alfabética foi também explorado, pelas docentes, a leitura e produção de textos de
diversos gêneros textuais. Foi possível concluir, a partir desse estudo, que ambas
estabeleciam em suas práticas atividades que privilegiavam o trabalho sistemático do
sistema de escrita de modo simultâneo ao tratamento dos gêneros textuais por meio de
atividades de leitura e produção de textos.
Dentre os programas responsáveis pela distribuição de recursos didáticos às
escolas públicas, temos, na atual conjuntura, o Programa Nacional do Livro Didático
(PNLD), o PNLD – Acervos Complementares, o Programa Pacto Nacional pela
Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) e Programa Nacional da Biblioteca na Escola
(PNBE). A partir desses programas são distribuídos livros didáticos, obras pedagógicas
e obras literárias. Além desses recursos, o Ministério de Educação distribui caixas de
jogos de alfabetização para auxiliar os professores do 1º ciclo do Ensino Fundamental
no ensino da escrita.
A seguir apresentaremos esses Programas, bem como os recursos didáticos
distribuídos por eles e as pesquisas que sinalizam o uso desses recursos com foco na
apropriação do SEA.
2.2.2 Os livros didáticos de alfabetização distribuídos pelo Programa Nacional do
Livro Didático (PNLD): caracterização e algumas pesquisas
Ao longo dos anos, os livros didáticos têm sido recursos priorizados pelos
professores em suas aulas. Todavia, convém ressaltar que esse tipo de recurso sofreu,
62
nos últimos anos, profundas mudanças (FERREIRA, ALBUQUERQUE, CABRAL e
TAVARES, 2009; MORAIS e ALBUQUERQUE, 2011). Segundo Zabala (1996, p.
169) ―vários trabalhos apontam que é muito frequente que os professores ―sigam‖ o
livro para estruturar suas aulas‖.
Bittencourt (2004, p. 72 e 73) salienta que:
O livro didático tem sido, desde o século XIX, o principal instrumento
de trabalho dos professores e alunos, sendo utilizado nas mais
variadas salas de aula e condições pedagógicas, servindo como
mediador entre a proposta oficial do poder expressa nos programas
curriculares e o conhecimento escolar ensinado pelo professor.
De acordo com Zabala (1996, p. 174), ―os livros didáticos, que são veiculadores
de mensagens, atuam como transmissores de determinadas visões da sociedade, da
história e da cultura‖.
Nessa perspectiva, sabemos que esse tipo de recurso, sobretudo, os Livros
Didáticos de Alfabetização (LDAs), foram, durante muito tempo, ancorados na
perspectiva epistemológica de tipo associacionista-empirista, com base na repetição de
exercícios semelhantes e memorização dos padrões silábicos, concebendo o sistema de
escrita alfabética como um código e, portanto, foram materiais que reproduziram
princípios presentes nas cartilhas.
Na década de 1980, tanto as práticas de alfabetização, baseadas numa concepção
tradicional, quanto os livros articulados a essa forma de conceber o ensino foram
profundamente criticados, pois apresentavam textos sem sentido, ―pseudotextos‖ e
atividades propunham cópias e repetições dos padrões silábicos. Com esses livros em
mãos, os docentes procuravam realizar fielmente todas as atividades propostas,
seguindo o ―passo a passo‖ em busca de ensinar a leitura e a escrita aos aprendizes. Tais
críticas foram impulsionadas pela difusão das pesquisas respaldadas no construtivismo,
dos pressupostos da teoria da Psicogênese da língua escrita e dos demais estudos na área
de alfabetização.
De acordo com Zabala (1996, p. 174), as críticas em torno dos conteúdos dos
livros didáticos ocorreram com base no seguinte pressuposto:
Os livros didáticos, apesar de grande quantidade de informação que
contém, não podem oferecer toda a informação necessária para
garantir a comparação. Portanto, a seleção das informações transforma
em determinante não tanto o que expõe, mas o que deixa de lado.
63
Na década de 1990, com o objetivo de promover a qualificação dos livros
didáticos, o Ministério de Educação, a partir da instituição do Programa Nacional do
Livro Didático (PNLD), os pesquisadores, especialistas da área e professores de
universidades foram habilitados a elencar os critérios de avaliação, avaliar e selecionar
as coleções de livros didáticos de alfabetização. Essa iniciativa foi importante, tendo em
vista que contribuiu para promover modificações no livro didático, de modo a romper
com as propostas presentes nas cartilhas, ancoradas nos métodos tradicionais,
predominantes nesse tipo de recurso. No PNLD, os livros são avaliados de três em três
anos e, as obras que se enquadram nos critérios solicitados pelo programa são
recomendadas e apresentadas no Guia de Livros Didáticos. Nesse sentido, os
professores que atuam nas escolas públicas do país podem selecionar o livro a ser
utilizado, tendo como base as informações contidas neste Guia.
De acordo com Lajolo (1996, p. 9):
A escolha e uso de livro didático precisam resultar do exercício
consciente da liberdade do professor no planejamento cuidadoso das
atividades escolares, o que reforçará a posição de sujeito do professor
em todas as práticas que constituem sua tarefa docente, em cujo dia-a-
dia ele reescreve o livro didático, reafirmando-se, neste gesto, sujeito
de sua prática pedagógica e um quase co-autor do livro.
Além desses aspectos, Lajolo (1996, p. 04-05) destaque que:
[...] para ser considerado didático, um livro precisa ser usado, de
forma sistemática, no ensino-aprendizagem de um determinado objeto
do conhecimento humano, geralmente já consolidado como disciplina
escolar. Além disso, o livro didático caracteriza-se ainda por ser
passível de uso na situação específica da escola, isto é, de aprendizado
coletivo e orientado por um professor.
Desde sua implantação o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD),
programa responsável pela avaliação e distribuição de livros didáticos aos estudantes
das escolas públicas, passou por vários aperfeiçoamentos e mudanças que tiveram
implicações nas coleções de livros didáticos. No que se refere às coleções voltadas para
o ensino da leitura e da escrita, tais mudanças também ocorreram de natureza
pedagógica, impulsionadas pela difusão das pesquisas na área de alfabetização.
A pesquisa desenvolvida por Morais e Albuquerque (2004) analisou como os
livros didáticos de alfabetização submetidos ao PNLD 2004 estavam concebendo as
64
novas teorias que estavam sendo difundidas no ensino da leitura e da escrita. Para tanto,
foram analisados 6 (seis) livros didáticos de alfabetização com foco na apropriação do
sistema de escrita alfabética, sendo 3 (três) obras classificadas como recomendados e 3
(três) livros classificados como recomendados com ressalvas. Os dados revelaram os
seguintes aspectos, divididos em sete pontos: (1) os livros avaliados privilegiavam as
atividades de leitura e produção de textos e, quando tratavam a apropriação do sistema
escrita apresentavam atividades com foco nas ―letras‖ e ―palavras‖. De acordo com os
pesquisadores, os autores dos livros pareciam não explorar as sílabas nas atividades em
busca de não remeter as cartilhas de alfabetização, presentes nos métodos tradicionais;
(2) os livros avaliados não apresentavam atividades com foco na reflexão
metalinguística, sem explorar atividades que pudessem auxiliar os estudantes no
desenvolvimento das habilidades fonológicas. Dessa forma, foram encontradas poucas
atividades envolvendo rimas e aliterações; (3) os livros abordavam poucos textos curtos,
como, por exemplo: parlendas, trava-língua e cantigas de roda. Segundo os
pesquisadores, nesses gêneros os alunos podem refletir sobre as rimas presentes, pode
também comparar as partes escritas com as partes faladas das palavras; (4) os livros
avaliados desconsideram a heterogeneidade dos alunos em relação à compreensão do
SEA; (5) os livros apresentavam uma uniformização em relação às tarefas de exploração
dos nomes próprios, com foco na localização das letras no interior das palavras sem
explorar o quantitativo das letras e sílabas e a sonoridade das mesmas. Além disso, os
livros, de modo geral, priorizavam esses tipos de atividades nas duas primeiras unidades
do livro, como se todos os estudantes se apropriassem desse conhecimento ao mesmo
tempo; (6) os livros não consideravam a heterogeneidade em relação aos demais eixos
da língua, a saber: leitura e produção de textos. Desse modo, as últimas unidades dos
livros traziam diversas atividades envolvendo os dois eixos citados; (7) Os livros tinham
uma dificuldade em articular atividades que envolviam as dimensões a respeitos das
propriedades do sistema de escrita com as dimensões do letramento.
De modo geral, os dados revelaram que os autores de livros de alfabetização,
provavelmente influenciados pelas pesquisas envolvendo o letramento e na tentativa de
romper com pressupostos presentes nas cartilhas, contemplavam mais atividades com
foco nas práticas sociais, de modo a considerar, de forma mais efetiva, o eixo de leitura
e de produção de textos. Nesse sentido, foi possível perceber que esses livros não
estavam apresentando atividades que davam subsídios para o tratamento sistemático das
especificidades que regem o sistema alfabético (MORAIS, ALBUQUERQUE, 2004).
65
A pesquisa realizada por Ferreira, Albuquerque, Cabral e Tavares (2009)
analisou, de forma comparativa, as principais mudanças ocorridas em cinco livros
didáticos de alfabetização a partir das versões apresentadas no PNLD 2004 e PNLD
2007. De modo específico, as pesquisadoras analisaram a influências das teorias e
estudos na área de alfabetização em livros didáticos recomendados pelo PNLD 2004 e
pelo PNLD 2007. Além disso, classificaram as atividades voltadas para a apropriação
do sistema de escrita alfabética presentes em alguns livros recomendados pelo PNLD
2004 e pelo PNLD 2007. Para tanto, foram analisados 5 (cinco) livros, tanto no PNLD
2004 como no PNLD 2007, de modo comparativo, com intuito de compreender os
objetivos específicos citados anteriormente. Os dados revelaram que desde o PNLD
2004 os livros avaliados não apresentavam os pressupostos presentes nas antigas
cartilhas de alfabetização, ou seja, não abordavam propostas enfadonhas de cópia dos
padrões silábicos e não tinham textos artificiais, predominantes nos materiais ancorados
nos métodos tradicionais. As teorias baseadas na Psicogênese da língua escrita, os
estudos envolvendo o letramento e as pesquisas com foco na prática dos professores,
especificamente voltando-se para o uso do livro didático na sala de aula foram
elementos que contribuíram para a melhoria do livro didático de alfabetização no PNLD
2007. Desse modo, as pesquisadoras salientaram que houve um avanço nos livros de
alfabetização do PNLD 2007 em relação ao PNLD 2004. Segundo elas, houve uma
iniciativa dos autores dos livros em equilibrar as atividades que davam subsídios ao
tratamento sistemático das propriedades que envolvem o sistema de escrita alfabética
com as atividades relacionadas aos diversos gêneros textuais, a partir de atividades de
leitura e produção de textos (FERREIRA, ALBUQUERQUE, CABRAL, TAVARES,
2009).
Morais e Albuquerque (2011) pontuam que algumas mudanças no PNLD 2010,
na área de linguagem, foram impulsionadas pela ampliação do Ensino Fundamental para
nove anos que ocorreu, efetivamente, em 2010. De acordo com o Guia de Livros
Didáticos – PNLD 2010, o referido programa distribuiu uma coleção de alfabetização,
com dois volumes e uma coleção de Língua Portuguesa, destinada aos alunos do 3º até o
5º do Ensino Fundamental.
No que se refere ao sistema de escrita alfabética, com base no Guia de Livros
didáticos – PNLD 2010, uma boa coleção de alfabetização precisa equilibrar as
atividades envolvendo o eixo de leitura, produção de textos e apropriação do sistema de
escrita alfabética. Para tanto, em relação à apropriação do SEA, um bom livro precisa
66
possibilitar aos alunos o domínio dos princípios que envolvem o sistema alfabético,
mas, além disso, que os educandos consolidem as correspondências grafofônicas
(MORAIS, ALBUQUERQUE, 2011).
Segundo Morais e Albuquerque (2011, p. 147), as coleções aprovadas no PNLD
2010 possuem diversas atividades que podem auxiliar os estudantes na compreensão
dos princípios alfabéticos, tendo em vista que a partir da avaliação desse tipo de recurso
foi possível identificar atividades de:
Exploração das letras do alfabeto, identificação de letras em palavras,
contagem de letras e sílabas de palavras, identificação de unidades
sonoras das palavras (sílabas, rimas, fonemas), comparação de
palavras quanto à presença de letras ou unidades sonoras (sílabas,
rimas, fonemas) iguais, formação de palavras a partir de letras ou
sílabas dadas, exploração de diferentes tipos de letras, exploração de
palavras estáveis, dentre outras.
No PNLD 2016, os livros aprovados foram distribuídos para os estudantes
pertencentes ao Ensino Fundamental, sendo a primeira etapa a de ―Letramento e
Alfabetização‖, destinados aos alunos de 6, 7 e 8 anos, correspondentes ao 1º, 2º e 3º
ano. Na segunda etapa, foram distribuídos livros de Língua Portuguesa para as crianças
de 9 e 10 anos, correspondentes ao 4º e 5º ano do Ensino Fundamental. De acordo com
o Guia de Livros Didáticos do PNLD 2016, os livros destinados aos três primeiros anos,
precisam articular as dimensões da alfabetização e do letramento, de modo a articular
essas dimensões em um único processo, a saber: (1) possibilitar o contato com as
práticas sociais, considerando a leitura e a escrita na compreensão da cultura letrada; (2)
possibilitar a compreensão da natureza e do funcionamento do sistema alfabético
(BRASIL, 2015).
Além das mudanças que ocorreram nos livros didáticos de alfabetização o modo
como o professor se relaciona com este recurso também sofreu alteração com o tempo.
Se antes, o docente seguia rigidamente o que estava proposto nas antigas cartilhas, com
a difusão de diversas pesquisas na área da alfabetização e as mudanças nos livros
didáticos, vimos que os professores passaram a estabelecer uma relação de autonomia
com o livro didático. Nesse sentido, concordamos com Albuquerque, Morais e Ferreira
(2008), Albuquerque e Morais (2011) e Almeida (2012) que, com o tempo, os
educadores passaram a estabelecer uma relação autônoma no uso dos livros didáticos de
alfabetização, vendo este recurso como um suporte para organizar sua prática e, em
67
muitas situações, reformulando as atividades presentes nos livros em busca de atingir
seus objetivos.
O estudo desenvolvido por Almeida (2012) teve como objetivo geral
compreender a relação que o professor alfabetizador estabelece com os recursos
didáticos que chegam às escolas públicas. Dentre esses recursos, o livro didático de
Letramento e Alfabetização foi levado em consideração, tendo em vista que foi um dos
materiais utilizados pelos professores. Essa pesquisa foi de abordagem qualitativa e os
procedimentos metodológicos foram: questionários, entrevistas e observação da prática
de docentes pertencentes aos anos iniciais do Ensino Fundamental na rede pública
municipal de Praia Grande, localizada no estado de São Paulo. Um dos aspectos
concluídos revelam que os professores estabeleceram uma relação de autonomia com o
livro didático e demais recursos utilizados em suas aulas para organizar sua prática.
A pesquisa realizada por Pinton (2013) teve como objetivo analisar o uso que
uma professora alfabetizadora do 1º ano do Ensino Fundamental fazia de um livro
didático de Letramento e Alfabetização aprovado pelo PNLD 2010. Para tanto, neste
estudo, de abordagem qualitativa, foram realizadas observações das aulas e entrevistas
com da docente investigada. Os resultados da pesquisa revelaram que a professora
utilizava o livro didático era utilizado exclusivamente para o tratamento da apropriação
do SEA. Em contrapartida, a educadora não fazia uso desse recurso para contemplar as
dimensões do letramento. Desse modo, foi possível concluir que a professora, a partir
do livro didático, não conseguia mobilizar de forma articulada a alfabetização e o
letramento.
Neste tópico, apresentamos como o livro didático de alfabetização foi concebido
ao longo dos anos. Além disso, destacamos, de modo geral, como a instituição do
PNLD, promovida pelo Ministério de Educação, contribuiu para promoção de
mudanças neste recurso didático. Outros aspectos também forma destacados, tais como:
(1) a relação que o professor estabelece com o livro didático no processo de
alfabetização; (2) o uso dos livros didáticos pelos professores para auxiliar os alunos no
processo de alfabetização e letramento.
A seguir, abordaremos outro recurso distribuído pelo Governo Federal, os jogos
de alfabetização. Na sequência, serão discutidas algumas pesquisas envolvendo o uso
desses recursos na sala de aula.
68
2.2.3 Os jogos de alfabetização: caracterização e alguns estudos
O uso do jogo na escola permite que as crianças, jovens ou adultos construam
conhecimentos diversos de forma lúdica. Brincando os aprendizes vivenciam situações
diversas, estabelecem papéis sociais, respeitam regras, buscam superar os obstáculos e
aprendem através da interação com o outro. É por isso que a utilização desse tipo de
recurso didático é importante na sala de aula. No entanto, seu uso, assim como os
demais recursos disponíveis na escola ou como os recursos elaborados e/ou
selecionados pelos docentes, requer, como ponto de partida, o planejamento prévio das
ações a serem realizadas. Dessa forma, defendemos que através do planejamento o
professor pode refletir e formular seus objetivos de ensino e reconstruir suas estratégias
didáticas, tendo como foco a aprendizagem dos alunos.
Segundo Nery (2007, p. 111):
O planejamento da escola contempla, assim, desde os critérios de
organização das crianças em classes ou turmas, a definição de
objetivos, por série ou ano, bem como o planejamento do tempo,
espaço e materiais considerados nas diferentes atividades e seus
modos de organização: hora da sala de aula, brincadeiras livres, hora
da refeição, saídas didáticas, atividades permanentes, sequências
didáticas, atividades de sistematização, projetos, etc.
Nesse sentido, os jogos devem estar inseridos nas rotinas dos professores
tomando como princípio o planejamento prévio. Esses são recursos que auxiliam, de
forma divertida e motivadora, na liberdade de expressão e criação do ser humano. Tanto
o brinquedo e, a ação propriamente dita, a brincadeira podem favorecer as crianças,
jovens ou adultos nos aspectos físicos, cognitivos, sociais e didáticos.
Os aspectos físicos estão relacionados com o desenvolvimento das habilidades
motoras e corporal. Os benefícios cognitivos são promovidos através da participação
dos indivíduos no jogo, como o desenvolvimento da atenção, da memória e da
desinibição. Os aspectos sociais são construídos através da construção dos papéis que as
crianças e jovens exercem na brincadeira, como, por exemplo, o respeito e a interação.
Em relação aos aspectos didáticos, ressaltamos que têm relação com os três aspectos
citados e, além disso, a função de contemplar e despertar o interesse dos alunos pelos
conteúdos curriculares (BRASIL, 2012).
69
De acordo com Brougère (1998) e Kishimoto (2006) a palavra ―jogo‖ possui um
sentido polissêmico e pode estar relacionada a uma brincadeira, a um tipo de esporte ou
até mesmo a um sinal de astúcia de determinado indivíduo. Kishimoto (2003) passou a
utilizar a palavra ―jogo‖ para designar o instrumento ou objeto (brinquedo) como
também a brincadeira. Segundo este autor, é preciso promover momentos lúdicos na
esfera educacional, pois ao brincar, as crianças criam estratégias, representam funções
sociais e aprendem por meio delas.
Kishimoto (2003) e Silva e Morais (2011) afirmam o ato de jogar é uma ação
cultural inerente à atividade humana. Para esses autores, brincar auxilia no
desenvolvimento dos indivíduos, por isso, é importante inserir na escola os jogos
tradicionais, a saber: esconde-esconde, amarelinha, pega-pega, passa anel e os jogos de
regras, tais como: baralho, dominó, batalha naval, xadrez e outros.
Leontiev (1988) dividiu os jogos em dois grandes grupos intitulados: jogos de
enredo e jogos de regras. Nos jogos de enredo, os indivíduos podem exercer papéis
presentes na sociedade, imitar situações que acontecem na realidade e vivenciar
momentos de faz-de-conta. Esse tipo de jogo possibilita ―que as crianças experimentem
a vida em sociedade e exerçam papéis sociais diversos, de modo que as regras sociais
são o alicerce da brincadeira‖ (LEAL, ALBUQUERQUE e LEITE, 2005, p.114).
Os jogos de regras, como o próprio nome diz, são subsidiados pelas regras, mas
podem ter, paralelamente, uma função didática. A partir desse tipo de jogo, a criança
reflete a respeito de diversos conteúdos referentes aos componentes curriculares,
participa do meio social e compreende regras que fazem parte do seu mundo exterior e,
após a vivência com esse tipo de jogos, passa a fazer parte do seu mundo interior. O
tabuleiro de xadrez e o dominó são exemplos de jogos de regras (KISHIMOTO, 2003).
Esses dois tipos de jogos têm uma dimensão educativa. Entretanto, os jogos de
regras, especificamente, os de cunho didático têm a finalidade de contemplar de forma
mais direta algum conteúdo específico. Um exemplo de jogos de regras, de cunho
didático, são os jogos voltados para a alfabetização.
Nesta Dissertação, analisaremos o uso de jogos de regras, de cunho didático,
intitulados como jogos didáticos. De acordo com Borba (2006), os jogos didáticos dão
subsídios para mobilização de algum conhecimento específico, tendo a supervisão do
professor. Silvia e Morais (2011) afirmam que esses jogos ―têm finalidades voltadas
para a aprendizagem de conceitos e habilidades relativos ao currículo das diferentes
áreas de conhecimento‖ (p. 14). Entretanto, não desconsideramos a importância dos
70
demais tipos de jogos, tendo em vista que também auxiliam no desenvolvimento dos
indivíduos.
Os jogos didáticos podem atuar como ótimos recursos para a prática pedagógica,
tendo em vista que, a partir de intervenções sistemáticas realizadas pelo docente,
contribuem como excelentes aliados para construção do conhecimento das crianças.
Através deles também é possível contemplar elementos que envolvem os princípios
voltados para o sistema de escrita alfabética. No entanto, é válido ressaltar que o uso
desse tipo de jogo, por si só, não traz conhecimentos prontos ou acabados (LEAL,
ALBUQUERQUE, LEITE, 2005). Ainda de acordo com as pesquisadoras, o uso
exclusivo desses jogos não dá conta de todas as demandas relacionadas aos diversos
objetos de conhecimento. Segundo Kishimoto (2003):
A utilização do jogo potencializa a exploração e a construção do
conhecimento, por contar com a motivação interna, típica do lúdico,
mas o trabalho pedagógico requer a oferta de estímulos externos e a
influência de parceiros bem como a sistematização de conceitos em
outras situações que não jogos (p.37-38).
No ensino da leitura e da escrita, os jogos voltados para a alfabetização têm sido
recomendados com intuito de auxiliar na aprendizagem das especificidades que regem o
sistema de escrita alfabética. Leal, Albuquerque e Leite (2005), considerando os
princípios que regem o SEA, categorizaram os jogos voltados para a alfabetização em
três grupos, a saber: (1) Jogos voltados para promoção de atividade de análise
fonológica, sem fazer correspondência com a escrita – auxiliam a perceber que a
lógica do sistema de escrita se dá entre as letras e a pauta sonora, a pensar sobre os sons
e os segmentos sonoros das palavras; (2) Jogos voltados para a reflexão das
propriedades do sistema de escrita alfabética – auxiliam a compreender o
funcionamento do SEA, de modo a perceber que as unidades sonoras estão relacionadas
às atividades gráficas; (3) Jogos voltados para a sistematização das
correspondências grafofônicas – auxiliam no processo de consolidação das
correspondências grafofônicas, de modo a ler e escrever com autonomia.
Levando em consideração essas três categorias de jogos voltados para o ensino
da leitura e da escrita, o Ministério de Educação, desde 2010, iniciou a distribuição da
caixa dos jogos de alfabetização para as turmas de 1°, 2º e 3º do Ensino Fundamental. A
caixa contém 10 jogos, divididos por Leal, Albuquerque e Leite (2005) nos três grupos
citados. No primeiro grupo são cinco (5) jogos intitulados: Bingo dos sons iniciais,
71
Caça rimas, Dado sonoro, Trinca mágica e Batalha de palavras, ou seja, jogos com
foco nas habilidades fonológicas, sem fazer correspondência com a escrita. No segundo
grupo são quatro (4) jogos, com foco nos princípios subjacentes ao sistema de escrita
alfabética, são eles: Mais uma, Troca de letras, Bingo da letra inicial e Palavra dentro
de palavra. No terceiro e último bloco tem um (1) jogo intitulado Quem escreve sou eu,
ou seja, jogos com foco na consolidação das correspondências grafofônicas (BRASIL,
2009). A seguir, nas figuras 07 e 08, podemos visualizar a caixa dos jogos e os dez
jogos citados acima.
Figura 07 e 08 – Caixa dos jogos de alfabetização e os 10 jogos inclusos na caixa.
Os jogos de alfabetização também são conhecidos como jogos de palavras, tendo
em vista que podem favorecer a aprendizagem das crianças em processo de aquisição do
SEA. Silva e Morais (2011, p. 24) salientam que os jogos de palavras podem subsidiar
os professores na promoção de situações didáticas em que os princípios do sistema
alfabético sejam explorados de forma prazerosa, considerando a dimensão lúdica.
Segundo os autores, esses ―jogos de linguagem, tão frequentes nas mais variadas
culturas, permitem introduzir na sala de aula um espaço de prazer e de ampliação das
capacidades humanas de lidar com a linguagem numa dimensão estética, gráfica e
sonora‖.
Pessoa e Melo (2011) afirmam que os jogos podem ser poderosos aliados no
ensino sistemático da ortografia. Diante disso, cabe ao professor possibilitar momentos
em que os alunos reflitam sobre as regularidades e irregularidades da Língua Portuguesa
de forma lúdica e prazerosa.
Em consonância com esses autores, sinalizamos que o uso de jogos didáticos nas
práticas escolares pode não só contribuir para o tratamento dos conteúdos direcionados
à Língua Portuguesa e demais componentes curriculares, como também pode auxiliar na
72
exploração das especificidades do sistema de escrita e dos conhecimentos relativos à
ortografia.
Algumas pesquisas têm investigado o uso dos jogos didáticos, sobretudo os
jogos voltados para a alfabetização, com crianças, jovens e adultos e, além disso, têm
revelado como os professores fazem uso desse tipo de recurso em suas práticas.
A pesquisa desenvolvida por Bezerra (2008) sinalizou que o uso de jogos
didáticos de análise fonológica na sala de aula pode ter um papel extremamente
relevante para auxiliar na exploração das habilidades de consciência fonológica. Este
trabalho analisou sistematicamente o percurso de seis duplas de crianças, entre cinco e
sete anos, pertencentes ao Grupo V e o 1º ano do Ensino Fundamental, em uma escola
pública localizada no município de Recife, ao longo de três sessões com quatro jogos de
análise fonológica, considerando os conhecimentos fonológicos e os níveis de escrita
das crianças investigadas. Os jogos utilizados neste estudo contemplavam diferentes
habilidades de consciência fonológica, a saber: segmentação oral das sílabas e
comparação do tamanho de palavras, identificação das sílabas iniciais, rimas e fonemas
no início das palavras. Um dos resultados apresentados nesta pesquisa revelou, ao final
das sessões com os jogos, um grande progresso em todas as crianças participantes do
estudo na avaliação da escrita e nos conhecimentos sobre habilidades fonológicas em
relação aos resultados obtidos no exame inicial. De acordo com essa pesquisadora, o
uso de jogos de análise fonológica e, consequentemente, reflexão sobre as habilidades
de consciência fonológica, não devem ser propostos como uma atividade solitária. Para
ela, os professores, as demais crianças na sala e os outros recursos didáticos têm um
papel importante na compreensão, por parte dos alunos, das habilidades de consciência
fonológica e, consequentemente, avanço nas hipóteses de escrita.
Pessoa, Lino e Silva (2014) investigaram o uso de jogos voltados para o
tratamento do sistema de escrita alfabética por professores pertencentes ao 1º ciclo do
Ensino Fundamental (ciclo de alfabetização), considerando as estratégias didáticas
mobilizadas pelos docentes em processo de formação continuada. Essa pesquisa
envolveu três professores, sendo um de cada ano do ciclo da alfabetização (1º ao 3º
ano). Foram observadas ao todo 30 aulas, sendo 10 aulas de cada docente. De acordo
com essas pesquisadoras, o uso de jogos na sala de aula não pode ser considerado de
forma menos sistemática, ao contrário, a utilização desses jogos, voltados para
alfabetização, pode ser uma possibilidade lúdica de refletir sobre o sistema de escrita
73
alfabética, considerando esse tipo de recurso que faz parte da vida das crianças e de suas
práticas sociais.
Os jogos também têm sido utilizados em turmas de Educação de Jovens e
Adultos (EJA) com o intuito de possibilitar o avanço dos estudantes em relação às
hipóteses de escrita.
O estudo desenvolvido por Azevedo (2012) teve como um dos objetivos
investigar se a aplicação de jogos de alfabetização favorecia o processo de
aprendizagem do sistema notacional, levando os alunos de duas turmas do 1º módulo da
Educação de Jovens e Adultos a avançar na compreensão de alguns princípios do
sistema de escrita e, consequentemente, progredir em seus níveis de escrita. Para tanto,
foram realizadas dezesseis (16) sessões de jogos de alfabetização em cada turma,
localizadas na cidade de Vitória de Santo Antão/PE. Além de realizar as sessões dos
jogos, a pesquisadora aplicou duas diagnoses, uma no início da pesquisa, antes das
sessões, e outra após a vivência dos jogos. Os dados revelaram que a maioria dos alunos
avançou consideravelmente em suas hipóteses de escrita entre a primeira e a última
coleta e apontaram que os avanços dos alunos estavam relacionados com suas
frequências nas aulas e nas participações das sessões dos jogos aplicados. Além desses
resultados, de acordo com a pesquisadora, a aplicação de jogos de alfabetização nas
turmas influenciou de certa forma, as práticas das professoras que lecionavam nessas
turmas, pois as docentes, durante a aplicação dos jogos, passaram realizar outras
atividades que tinham objetivos didáticos similares aos jogos aplicados. Esses dados
sinalizam que a aplicação dos jogos refletiu positivamente não só para a aprendizagem
dos alunos, como também para a prática das professoras.
No próximo subtópico, abordaremos o uso das obras complementares por
professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental.
2.2.4 O PNLD obras complementares: caracterização e alguns estudos
A implantação do Ensino Fundamental de nove anos, em 2010, contribuiu para
elaboração de políticas de distribuição de recursos didáticos destinados as escolas
públicas do país. Conforme mencionamos em tópicos anteriores, tais políticas foram
criadas com o objetivo de subsidiar a prática docente e auxiliar na aprendizagem dos
alunos, de modo a atender cada etapa de ensino, sobretudo as demandas do ciclo de
74
alfabetização. Por isso, o Ministério de Educação criou mais um programa, em 2010,
denominado Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) Obras complementares.
O referido programa é responsável pela distribuição de obras pedagógicas
relacionadas às grandes áreas do conhecimento (Linguagens e códigos, Ciências da
Natureza e matemática e Ciências humanas).
Segundo o documento Acervos complementares – Alfabetização e Letramento
nas áreas do conhecimento (manual que acompanha os acervos), as obras foram
elaboradas com o intuito de subsidiar o processo de alfabetização e formação do leitor,
possibilitar o contato dos alunos ao mundo da escrita e o acesso à cultura letrada e
auxiliar no ensino dos conteúdos das disciplinas curriculares, tendo em vista que são
livros que trazem, muitas vezes, de forma lúdica, conhecimentos aos componentes
curriculares de história, ciências, geografia, matemática e língua portuguesa. Além
disso, esses livros podem ser como aliados, um material complementar, aos recursos
didáticos que já fazem parte da cultura escolar, como, por exemplo, o livro didático.
Para isto, o professor precisa planejar situações didáticas envolvendo o uso dessas obras
com outros recursos já consolidados em sua prática, tendo o objetivo de ensinar algum
conteúdo específico (BRASIL, 2012).
Segundo o manual dos acervos complementares:
Esses materiais não são chamados de complementares por acaso: sua
função é a de oferecer a professores e alunos alternativas de trabalho e
formas de acesso a conteúdos curriculares que as coleções didáticas
não trazem. Tomando o letramento e as alfabetizações como foco da
escolarização inicial [...] (BRASIL, 2009, p. 9).
A primeira edição do PNLD Obras complementares foi realizada em 2010, com
livros destinados aos alunos do 1º e 2º ano do Ensino Fundamental. Neste período, esses
dois primeiros anos eram considerados como ciclo de alfabetização. Em 2013, na
segunda edição do programa, foram distribuídas obras para o 1º, 2º e 3º ano do Ensino
Fundamental. Como podemos observar, neste ano, houve a ampliação do programa que
passou a ser destinado aos estudantes do 3º ano. Tal ampliação do programa teve como
princípio o trabalho sistemático e reflexivo da alfabetização e letramento neste ciclo de
aprendizagem. Nas figuras abaixo podemos visualizar as capas dos manuais referentes
ao ano de 2010 e 2010 e um livro pertencente ao acervo de 2013.
75
Figura 09, 10 e 11 - Manual de acervos complementares/2010, Manual de acervos complementares/ 2013
e Livro pertencente ao acervo PNLD – Obras Complementares de 2013.
Leal e Rodrigues (2011) participaram de um trabalho de avaliação de livros
destinados aos alunos do 1° e 2º ano do Ensino Fundamental. Para tanto, foi construído
uma taxonomia das obras analisadas. Ao todo, na primeira edição do programa, foram
analisados 936 livros. A partir das análises, foram selecionadas 150 obras, divididas em
sete tipos, a saber: (1) livros de divulgação do saber científico/ obras didáticas; (2)
biografias; (3) livros instrucionais; (4) livros de cantigas, parlendas, trava-línguas e jogo
de palavras; (5) livros de palavras; (6) livros de imagens; (7) livros de histórias, com
foco em conteúdos curriculares.
Desses sete tipos de livros, dois dão subsídios para o professor, de forma mais
direta, mobilizar conhecimentos que envolvem a apropriação do sistema de escrita, são
eles: os livros de cantigas, parlendas, trava-língua e jogo de palavras e os livros de
palavras. Por isso, nesta Dissertação, discutiremos esses dois tipos. Entretanto, nada
impede o docente de, independentemente do tipo de livro, planejar situações didáticas a
partir das obras complementares com o objetivo de alfabetizar as crianças. Mas algumas
obras dão mais subsídios para o tratamento do sistema de escrita alfabética.
Os livros de cantigas, parlendas, trava-língua e jogo de palavras possibilitam que
as crianças brinquem com os sons representados pelas palavras e tenham acesso aos
gêneros textuais que circulam na sociedade. Em algumas situações, esses gêneros são
passados de uma geração a outra e em outros casos são assimilados mais facilmente
pelas crianças por meio de momentos lúdicos. Recursos desse tipo são importantes na
sala de aula tendo em vista que:
76
Livros que contemplam, em seus textos, brincadeiras com palavras
(poemas, trava-línguas, parlendas, história, etc.), por meio da presença
de rimas, aliterações e repetição de palavras, podem possibilitar uma
reflexão sobre semelhanças gráficas e sonoras (das partes escritas e
faladas) das palavras. São livros interessantes, que instigam as
crianças a estabelecerem relações entre palavras e que possuem textos
de fácil memorização. O fato de conterem textos que brincam com a
linguagem ajuda os aprendizes a exercitar uma atividade de reflexão
sobre as palavras. Por outro lado, o fato de muitos daqueles textos
passarem a ser conhecidos de cor, pelas crianças, favorece a reflexão
sobre as relações entre o que falamos e o que escrevemos. (BRASIL,
2009, p. 46).
Os livros de palavras são recursos que pode auxiliar o docente no processo de
ensino do sistema de escrita alfabética, pois:
Os ―livros de palavras‖, por assim dizer, que trazem, em ordem
alfabética, listas de palavras seguidas de suas respectivas ilustrações e,
algumas vezes, também de outras palavras da mesma família,
permitindo comparações sistemáticas entre os aspectos sonoros,
gráficos e semânticos, responsáveis pelas semelhanças e diferenças
que se estabelecem entre elas. Com a sua decisiva atuação, e em uso
articulado às coleções didáticas, esses livros poderão ajudar o aluno a
inferir as correspondências entre fonemas e grafemas próprias do
nosso sistema de escrita. (BRASIL, 2009, p.11).
De acordo com Leal e Rodrigues (2011), esses recursos são instrumentos
valiosos para os docentes e, a partir de uma situação didática planejada, podem
proporcionar as crianças aprendizagens relacionadas aos diferentes componentes
curriculares. Essas autoras ainda sinalizam a ampliação e diversificação dos recursos
didáticos em busca de atingir os objetivos traçados.
A pesquisa realizada por Soares, Vieira e Leal (2013) investigou o uso das obras
complementares, com foco na apropriação do sistema de escrita alfabética, numa turma
de 1º ano do Ensino Fundamental. Neste estudo, um dos objetivos específicos foi
identificar os tipos de atividades, com foco na apropriação do sistema de escrita,
desenvolvidas em situações de uso das obras complementares. Em busca de
compreender os objetivos traçados, foram realizadas entrevistas e dez (10) observações
das jornadas de aula de uma professora do 1º ano do 1º ciclo que atuava na Rede pública
de Camaragibe/PE.
Os dados apontaram que as obras complementares foram utilizadas pela docente
para explorar a dimensão do funcionamento do sistema de escrita e, paralelamente, a
dimensão que envolve os sentidos dos textos, sobretudo as práticas sociais. Também foi
77
possível perceber que uma das obras utilizadas pela professora, intitulada como ―A, E, I,
O, U‖ de Ângela- Lago e Zoé Rios, pertence ao grupo de livros de cantigas, parlendas,
trava-línguas, jogo de palavras, conforme as categorias elaboradas pelos estudos de Leal
e Rodrigues (2011).
De acordo com Soares, Vieira e Leal (2013), a situação didática promovida pela
professora a partir da referida obra complementar explorou uma maior diversidade de
atividades voltadas na apropriação do SEA do que as situações de ensino promovidas a
partir das outras obras complementares. Segundo as pesquisadoras, isso foi possível
porque a obra citada possui recursos estéticos e lúdicos que suscitam a reflexão das
semelhanças gráficas e sonoras entre as palavras.
Nesta pesquisa, a partir do uso da obra ―A, E, I, O, U‖ de Ângela- Lago e Zoé
Rios, a professora, segundo as pesquisadoras, contemplou cinco tipos de atividades, a
saber: atividades de reflexão fonológica, de comparação entre palavras escritas, de
permuta, inserção ou retirada de letras e sílabas para formação de novas palavras, de
leitura e escrita de palavras.
Esses dados revelam que as obras complementares são instrumentos importantes
para promover momentos de reflexão sobre o sistema de escrita e, além disso,
contemplam as práticas sociais. Ou seja, são recursos que contribuem paras promoção
de práticas ancoradas na alfabetização na perspectiva do letramento.
A pesquisa desenvolvida por Albuquerque (2014) investigou o uso dos acervos
complementares do PNLD em turmas do 2º ano do Ensino Fundamental com foco no
ensino da leitura. Especificamente, este estudo traçou os objetivos de: (1) investigar se
os professores do 2º ano do 2º ciclo da alfabetização, pertencentes à rede municipal de
Camaragibe/PE, conheciam e/ou utilizavam as obras complementares; (2) identificar os
objetivos didáticos subjacentes às obras complementares. Para tanto, foram aplicados
questionários com 31 professores do 2º ano do Ensino Fundamental da rede municipal
de Camaragibe/PE. Em seguida, foram selecionados dois sujeitos e, na sequência houve
a realização de entrevistas e observações de jornadas completas de aula de cada
professora.
Albuquerque (2014) constatou que os professores conheciam e utilizavam as
obras complementares em suas aulas com objetivo de ensinar a apropriação do sistema
de escrita e o eixo de leitura. Nas situações de uso das obras, a pesquisadora ressaltou
que os demais eixos da Língua Portuguesa e diversos componentes curriculares também
foram contemplados. Os resultados apontaram que as obras foram recursos importantes
78
para promover ensino da leitura e o uso desse tipo de recurso pelas professoras
investigadas foi de acordo com as concepções de ensino das mesmas.
A seguir, no próximo subtópico, teceremos discussões em torno do uso das
obras literárias distribuídas pelo Programa Nacional da Biblioteca na Escola (PNBE) e
pelo Programa Nacional do Livro Didático – Alfabetização na Idade Certa
(PNLD/PNAIC) presentes nas práticas dos docentes dos anos iniciais do Ensino
Fundamental.
2.2.5 O PNBE e o PNLD PNAIC na distribuição de obras literárias: caracterização
e alguns estudos
De acordo com Hofling (2001), iniciativas realizadas pelo Estado, através da
promoção de políticas públicas são ações importantes na sociedade, tendo em vista que
são necessárias para minimizar as desigualdades socioeconômicas. Segundo a autora, as
políticas públicas são pensadas para promover a eficácia em determinada área.
É nesse contexto que o Ministério de Educação vem, ao longo dos anos,
promovendo políticas públicas por meio de programas de distribuição de recursos
didáticos. Dentre os programas elaborados pelo Governo Federal, destacaremos, neste
tópico, o Programa Nacional da Biblioteca na Escola (doravante PNBE) e o PNLD/
Alfabetização na Idade Certa (PNLD PNAIC). Ambos os programas têm a função
possibilitar o acesso à cultura e incentivo à leitura aos estudantes.
O PNBE, desde sua implantação em 1997, passou por diversas modificações.
Nos dias atuais, o Programa tem sido responsável pela distribuição de obras literárias e
de pesquisa para os estudantes e professores de escolas públicas do país. Nas últimas
edições, a distribuição e, consequentemente, o atendimento às escolas públicas vêm
acontecendo de forma alternada, ora são atendidas as escolas de Educação Infantil, do
Ensino Fundamental (de 1º ao 5º ano) e de Educação de Jovens e Adultos (EJA), ora são
contempladas escolas de Ensino Fundamental (6º ao 9º) e de Ensino Médio, englobando
toda a educação básica. Isso revela que o referido programa atende, de forma universal,
as escolas públicas do país registradas no Censo Escolar.
Na configuração atual, o Programa é dividido em três modalidades, as saber:
PNBE Literário, PNBE Periódicos e PNBE Professor. Na primeira modalidade, as
obras distribuídas são formadas por diferentes gêneros, tais como: poemas, cantigas,
parlendas, prosas, contos, adivinhas, biografias, histórias em quadrinhos e etc. Esta
79
modalidade também engloba livros de imagens. Com isto, é possível perceber que as
obras pertencentes ao PNBE Literário podem ser recursos importantes para a promoção
de situações didáticas voltadas para a mobilização dos conhecimentos relativos ao
sistema de escrita alfabética. A segunda modalidade, o PNBE Periódicos, é responsável
por distribuir os periódicos às escolas públicas do país, atendendo da Educação Infantil
ao Ensino Médio. A terceira modalidade, o PNBE Professor, é formada por obras
pedagógicas com objetivo de promover suporte aos professores nas dimensões do
trabalho pedagógico.
Antes de chegar às escolas, as obras vinculadas ao PNBE passam por um longo
processo de avaliação. Inicialmente, as editoras inscrevem seus livros no Programa. Em
seguida, as obras inscritas são avaliadas e selecionadas por uma equipe de especialistas
vinculados às universidades, de acordo com os critérios estipulados pelo Programa.
Após a avaliação, as obras são selecionadas, distribuídas às instituições escolares e
destinadas às bibliotecas das escolas com a função de proporcionar aos estudantes e
professores recursos para a leitura literária e a ampliação de conhecimentos diversos.
Com base na configuração e no funcionamento deste Programa, podemos
perceber que esta política é importante tanto para o aluno como para o professor. Em
relação aos estudantes, esses recursos podem favorecer a ampliação das aprendizagens,
possibilitar o acesso ao universo literário e despertar o prazer pela leitura. Já os
docentes, estes, por sua vez, podem também ampliar seus conhecimentos e refletir sobre
elementos da prática pedagógica.
Além do PNBE, em 2013, o Fundo de Nacional de Desenvolvimento da
Educação (FNDE) em parceria com a Secretaria de Educação Básica (SEB/MEC)
elaborou o PNLD/ Alfabetização na Idade Certa (PNLD/PNAIC) para distribuir obras
literárias, destinadas aos alunos pertencentes ao ciclo de alfabetização. Mas só em 2014
houve o lançamento do Edital público de convocação para inscrição e seleção de obras
de literatura, através PNLD PNAIC. A seguir, podemos visualizar duas obras, sendo
uma pertencente ao acervo do PNBE e outra ao acervo do PNLD PNAIC. A partir das
figuras de cada um dos livros, é possível observar, do lado direito de cada obra, uma
etiqueta com o nome do programa que estão vinculados.
80
Figura 12 e 13 – Livro pertencente ao acervo do PNBE e livro pertencente ao acervo do PNLD PNAIC.
As obras selecionadas pelo PNLD PNAIC são destinadas aos estudantes do 1º,
2º e 3º ano do Ensino Fundamental e têm o objetivo de contribuir para a alfabetização e
letramento dos aprendizes. De acordo com o Edital, as obras foram selecionadas com
base em duas naturezas:
a) Obras com níveis de complexidade léxica e sintática adequados a
crianças em fase inicial de alfabetização e letramento, atendendo a
alunos do 1º ano em fase inicial de aprendizagem do sistema
alfabético de escrita e de letramento, e a alunos dos 2º e 3º anos, em
fase de aquisição de autonomia de leitura e escrita; b) Obras que se
destinam à leitura oral do professor, propiciando contato com textos
literários mais longos e de maior complexidade, com os objetivos de
introduzir as crianças na cultura literária da infância, e de desenvolver
o interesse e gosto pela leitura de fruição (BRASIL, 2013, p. 17).
Segundo o Guia – Literatura na Hora Certa do PNLD PNAIC, o programa
conta 210 livros que são agrupados em seis (06) acervos, cada um, formado por trinta e
cinco (35) livros. Dos seis (06) acervos que compõe esse Programa, dois (02) são
destinadas às crianças do 1º ano, dois (02) aos alunos do 2º ano e os outros dois (02) são
voltados para os estudantes do último ano do primeiro ciclo de alfabetização. Ainda de
acordo com o Guia, os acervos foram elaborados com base em três categorias, a saber:
livros formados por parlendas, cantigas, trava-língua, adivinhas, poesias, poemas e etc.;
livros formados por textos em prosa, os clássicos da literatura infantil e as lendas; livros
formados apenas por ilustrações e imagens. Portanto, o Programa conta com dois (02)
acervos para cada uma das categorias citadas (BRASIL, 2015).
As obras articuladas ao PNLD PNAIC buscam contribuir para o processo de
alfabetização e letramento e pensadas para promover o ―incentivo ao gosto literário, à
imaginação, à ampliação das referencias culturais e às formas – plurais e diversas – de
81
leitura das palavras, das imagens e dos símbolos, por meio da leitura do mundo‖
(BRASIL, 2015, p. 07).
Diferente do PNBE, em que as obras literárias são destinadas às bibliotecas da
escola, os acervos distribuídos pelo PNLD PNAIC devem ser armazenados nas salas de
aula, nos ―cantinhos de leitura‖ produzidos pelos docentes. Desta forma, as obras
destinadas às salas de aulas das turmas dos três primeiros anos do Ensino Fundamental
podem ficar à vista e à mão dos estudantes, de modo possibilitem aos mesmos o
manuseio dos livros. Para docente, os livros literários armazenados em sala podem ser
poderosos aliados no processo de alfabetização e letramento e na promoção de situações
didáticas envolvendo conteúdos curriculares diversos.
Algumas pesquisas têm investigado o uso de obras literárias, ancoradas ao
PNBE e ao PNLD PNAIC, em turmas dos anos iniciais do Ensino Fundamental. É o que
apresentaremos a seguir.
A pesquisa desenvolvida por Bastos (2016) investigou práticas de três
professoras, sendo uma de cada etapa do ciclo de alfabetização, pertencentes ao PNAIC,
na área de Linguagem, quanto à utilização dos acervos das obras do PNLD Obras
Complementares e do PNLD Alfabetização na Idade Certa. Esse estudo foi realizado em
três escolas estaduais de Rondonópolis, em Mato Grosso, e os procedimentos de coleta
foram: entrevista, questionário, observação das práticas das professoras e análise
documental. A partir desses instrumentos, a pesquisadora buscou compreender como as
professoras investigadas, em processo de formação, neste caso, o PNAIC, na área de
Linguagem, fazem uso dos acervos ancorados ao PNLD Obras Complementares e o
PNLD Alfabetização na Idade Certa – PNAIC.
Nessa pesquisa, os dados revelaram que os acervos, vinculados aos referidos
programas, foco de investigação, foram utilizados com frequências variadas pelas
professoras e com diferentes objetivos didáticos, dando enfoque ao tratamento da
apropriação do Sistema de Escrita Alfabética (SEA), a leitura e a produção de textos.
Além desses dados, as professoras alfabetizadoras apontaram nas entrevistas realizadas
que houve mudanças em suas práticas após os encontros de formação do PNAIC.
Esses dados revelam que os livros ancorados aos programas podem ser
utilizados com diferentes finalidades, inclusive com o foco no trabalho da apropriação
do SEA.
A pesquisa desenvolvida por Cirino (2015) investigou o uso das obras literárias
do Programa Nacional Biblioteca na Escola (PNBE) nos anos finais do Ensino
82
Fundamental. Desse modo, analisou, de forma detalhada, como tais obras eram
utilizadas por estudantes do 5º ano. Nesse estudo, a pesquisadora caracterizou o
Programa, sinalizando as políticas públicas voltadas para o eixo de leitura e promoveu
discussão em torno da formação do leitor, visando perceber os subsídios e impasses
presentes em escolas municipais na cidade de Ipameri, em Goiás. Para investigar os
objetivos traçados, foram realizadas observações, registros em diário de campo e
entrevistas semiestruturadas com professores, diretores e demais funcionários da escola.
Os instrumentos de coleta foram traçados com o objetivo de responder o seguinte
questionamento: como escolas públicas de, localizadas em Ipameri/Goiás estão se
apropriando das obras literárias distribuídas pelo PNBE para garantir a formação do
leitor com os estudantes do 5º ano do Ensino Fundamental?
Os resultados apontaram que os professores e demais funcionários das escolas
investigadas não têm se apropriado de forma efetiva a respeito dos acervos do PNBE
que vêm chegando às instituições escolares. Essa falta de compreensão, em relação aos
acervos e aos objetivos do Programa, tem comprometido o trabalho de formação de
leitores no 5º ano do Ensino Fundamental. Por isso, Cirino (2015) ressalta que é preciso
estabelecer um trabalho consistente nas escolas, de modo que os objetivos do Programa
sejam discutidos de forma efetiva para que os estudantes vivenciem situações de ensino
com foco no letramento literário.
Ao longo deste tópico, apresentamos algumas pesquisas com foco nos recursos
didáticos distribuídos às escolas públicas, através de programas elaborados pelo
Ministério de Educação. Os estudos abordados mostraram que os professores dos anos
iniciais do Ensino Fundamental fazem uso de diversos recursos em suas práticas com
diferentes objetivos didáticos, sobretudo com o intuito de ensinar o sistema de escrita
alfabética de modo simultâneo às práticas sociais.
Nas pesquisas apresentadas, vimos que o livro didático de Letramento e
Alfabetização passou por várias mudanças ao longo dos anos e, hoje em dia, tem sido
um instrumento utilizado pelos docentes para alfabetizar as crianças a partir do 1º ano
do Ensino Fundamental. Além dos livros didáticos, abordamos pesquisas em que jogos
de análise fonológica, inclusive os jogos distribuídos pelo Ministério de Educação,
foram utilizados pelas professoras para auxiliar as crianças no avanço das hipóteses de
escrita e, consequentemente, avanço na compreensão das propriedades que regem o
sistema alfabético. Os estudos também sinalizaram que as obras complementares e as
83
obras literárias têm sido utilizadas por professoras através da promoção de situações
didáticas que priorizam a alfabetização na perspectiva do letramento.
Como é possível observar, vimos que diferentes pesquisas abordam que os livros
didáticos de Letramento e Alfabetização, os jogos de alfabetização, as obras
complementares e as obras literárias têm sido recursos utilizados pelos docentes na
concretização de suas ações educativas, sobretudo para alfabetizar os aprendizes. No
entanto, pontuamos que a maioria das pesquisas apresentadas tinha o foco em um dos
recursos didáticos citados. Apenas um dos estudos tinha o foco nas obras
complementares e nas obras literárias distribuídas pelo PNLD/Alfabetização na Idade
Certa.
Por isso, esse estudo apresenta aproximações e distanciamentos com as
pesquisas apresentadas. Aproximações, do ponto de vista dos recursos didáticos que são
abordados e, alguns casos, por apresentar o tratamento do sistema de escrita alfabética.
Distanciamentos, porque, nesta pesquisa, temos o objetivo de analisar como os
professores utilizam todos os recursos didáticos discutidos nos tópicos deste capítulo,
em busca de ensinar os direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de
escrita alfabética.
No próximo capítulo, abordaremos, de forma detalhada, o percurso
metodológico realizado nessa pesquisa.
84
3 PERCURSO METODOLÓGICO
Neste capítulo, apresentamos o percurso metodológico adotado na referida
pesquisa, a descrição do campo de investigação, a caracterização dos sujeitos
investigados e os procedimentos de coleta e a análise dos dados.
De acordo com o que foi exposto na Introdução deste estudo, buscamos analisar,
de modo geral, como professores do 1º ano do Ensino Fundamental utilizam o livro
didático de Letramento e Alfabetização, os jogos de alfabetização, as obras
complementares e as obras literárias para contemplar os direitos de aprendizagem
referentes à apropriação do sistema de escrita alfabética. Além disso, traçamos os
seguintes objetivos específicos, já mencionados anteriormente:
Investigar se os direitos de aprendizagem, especificamente os referentes à
apropriação do sistema de escrita alfabética, são referências para as professoras;
Verificar a frequência com que são utilizados o livro didático de Letramento e
Alfabetização, os jogos de alfabetização, as obras complementares e as obras
literárias, tomando como referência os direitos de aprendizagem referentes à
apropriação do sistema de escrita alfabética;
Identificar os direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de
escrita alfabética contemplados nas práticas dos professores em situações de uso
do livro didático de letramento e alfabetização, dos jogos de alfabetização, das
obras complementares e das obras literárias;
Analisar as atividades de apropriação do sistema de escrita alfabética
desenvolvidas pelas professoras em situações de uso do livro didático de
Letramento e Alfabetização, dos jogos de alfabetização, das obras
complementares e das obras literárias.
Coerentemente com os objetivos citados, fizemos a escolha metodológica pela
investigação quanti-qualitativa. Desse modo, analisamos aspectos quantitativos das
práticas investigadas, tais como a frequência de uso dos recursos didáticos citados
durante as aulas observadas e a recorrência dos direitos de aprendizagem referentes à
apropriação do sistema de escrita alfabética contemplados pelas professoras em
situações de uso dos referidos recursos didáticos, evidenciando a incidência dos
85
mesmos. Dessa forma, acreditamos que os dados quantitativos contribuíram para
compreendermos os aspectos qualitativos das práticas das docentes observadas.
Para tanto, consideramos que a abordagem qualitativa adéqua-se à problemática
de nossa pesquisa, dando mais subsídios para respondermos os questionamentos já
apresentados na Introdução desta Dissertação. Denzin e Lincoln (2006, p. 17) destacam
que:
A pesquisa qualitativa é uma atividade situada que localiza o
observador no mundo. Consiste em um conjunto de práticas materiais
e interpretativas que dão visibilidade ao mundo. Essas práticas
transformam o mundo em uma série de representações, incluindo as
notas de campo, as entrevistas, as conversas, as fotografias, as
gravações, os lembretes. Nesse nível, a pesquisa qualitativa envolve
uma abordagem naturalista, interpretativa, para o mundo, o que
significa que seus pesquisadores estudam as coisas em seus cenários
naturais, tentando entender, ou interpretar, os fenômenos em termos
dos significativos que as pessoas a elas conferem.
De acordo com Bodgan e Biklen (1994), esse tipo de abordagem possui cinco
características que serão resumidas a seguir:
1. Na investigação qualitativa a fonte direta dos dados é o ambiente natural
Nesta abordagem o investigador busca inserir-se no campo de pesquisa, seja
escola ou qualquer outra instituição por uma grande quantidade de tempo na tentativa de
coletar os dados necessários para compreensão do seu objeto. Através disso, os
investigadores concebem que seu objeto é bem mais compreendido quando analisado
nos locais que eles de fato acontecem. Tal análise não pode acontecer dissociada do
contexto mais geral em que os sujeitos estão inseridos, pois os comportamentos
humanos são influenciados por tais contextos. Esse procedimento é de suma
importância para que o significado dos resultados não seja perdido de vista. Nessa
abordagem, os equipamentos de coleta podem ser os gravadores e as câmeras ou até
mesmo o caderno de anotações. Numa etapa seguinte, depois que os dados são
coletados, o investigador faz a organização e análise necessária em busca dos
resultados.
De acordo com Bodgan e Biklen (1994, p. 17):
A investigação qualitativa é frequentemente designada por
naturalística, porque o investigador frequenta os locais em que
naturalmente se verificam os fenômenos nos quais está interessado,
86
incidindo os dados recolhidos nos comportamentos naturais das
pessoas: conversar, visitar, observar, comer, etc.
No referido estudo, debruçaremos o olhar atento para as salas de aulas
observadas, considerando o contexto que elas estão inseridas, com o objetivo de
perceber como as interações entre os sujeitos investigados ocorrem nesses espaços.
2. A investigação qualitativa é descritiva
Nesse tipo de abordagem o investigador precisar fazer a transcrição dos dados
coletados no contato direto com o campo de pesquisa. Tais dados são, na maioria das
vezes, transcrições de observações e entrevistas, mas incluem também fotografias,
vídeos e outros registros. Para que não seja perdido de vista nenhum detalhe do local
investigado, cabe ao pesquisador observar minunciosamente tudo que acontece no
espaço onde os dados são coletados. Os resultados das pesquisas que optam por esse
tipo de abordagem são, por sua vez, formados por narrativas extensas e citações
minuciosas das informações adquiridas na coleta de dados.
Nesta pesquisa, a análise e os resultados dos dados foram descritos
detalhadamente e fundamentados com os extratos de transcrições das aulas e das
entrevistas realizadas.
3. Os investigadores qualitativos interessam-se mais pelo processo do que
simplesmente pelos resultados
Na abordagem qualitativa, o pesquisador preocupa-se com o processo de
interação entre dos sujeitos investigados. Há um trabalho de perceber como se dá as
relações para que o objeto seja compreendido.
Coerentemente com o nosso objeto de estudo, observamos as práticas dos
professores investigados, com um olhar atento para os recursos didáticos utilizados em
sala pelos docentes, sobretudo, o livro didático de Letramento e Alfabetização, os jogos
de alfabetização, as obras complementares e as obras literárias, levando em
consideração as situações didáticas em que esses recursos foram utilizados para
contemplar os direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita
alfabética.
87
4. Os investigadores qualitativos tendem a analisar os seus dados de forma
indutiva
No processo de análise dos dados, os investigadores organizam seus dados de
modo que as informações recolhidas sejam reagrupadas em categorias. É desta forma
que os resultados sobre determinado objeto vão sendo construídos, a partir da seleção e
organização das informações coletadas. Essa opção de análise foi utilizada nesta
Dissertação.
5. O significado é de importância vital na abordagem qualitativa
Os investigadores estão preocupados em compreender quais são as perspectivas
consideradas pelos sujeitos investigados na tentativa de compreender as relações
subjacentes ao seu objeto. De acordo com Bogdan e Bilken (op.cit, p. 51):
Os investigadores qualitativos estabelecem estratégias e
procedimentos que lhes permitam tomar em consideração as
experiências do ponto de vista do informador. O processo de
condução de investigação qualitativa reflete uma espécie de diálogo
entre os investigadores e os respectivos sujeitos, dado estes não serem
abordados por aqueles de forma neutra.
Nesta pesquisa, detemos o olhar para os recursos didáticos que vêm chegando às
escolas públicas do país, especificamente, o livro didático de Letramento e
Alfabetização, os jogos de alfabetização, as obras complementares e as obras literárias
em busca de analisar se as professoras investigadas fazem uso dos mesmos em suas
aulas para mobilizar os direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de
escrita alfabética. De acordo com a discussão realizada anteriormente, tais recursos
didáticos podem ser excelentes instrumentos para subsidiar a prática docente e, além
disso, podem ser utilizados para promover momentos de reflexão sobre o SEA de forma
lúdica e prazerosa. Desse modo, resta saber se os referidos recursos, distribuídos por
programas elaborados pelo Ministério de Educação, têm sido utilizados em sala de aula
para garantir aos aprendizes o direito de compreender e dominar o sistema alfabético.
Nessa perspectiva, esperamos que esse estudo possa contribuir para o
conhecimento e reflexão sobre as práticas dos professores pertencentes à primeira etapa
88
do Ensino Fundamental, levando em consideração o uso de recursos didáticos por esses
docentes em sala de aula, sobretudo, os recursos foco de análise nesta pesquisa, com
intuito de promover ações didáticas que auxiliem os alunos no domínio princípios do
sistema de escrita.
3.1 As escolas e os sujeitos de pesquisa
3.1.1 A caracterização dos sujeitos de pesquisa
Nesta pesquisa selecionamos duas professoras do 1º ano do Ensino Fundamental
com base nos dois critérios, a saber: estar participando das formações do Pacto Nacional
para Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) desde 2013 e ter, no mínimo, três anos de
experiência no ciclo de alfabetização.
A formação continuada do Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa é
realizada por integrantes das secretarias de educação. Nesta formação, os orientadores
de estudos são orientados por formadores vinculados à universidade e ministram a
formação em seus municípios para os professores alfabetizadores do 1º ao 3º ano do
Ensino Fundamental. É válido destacar que para participar desta pesquisa os docentes
poderiam atuar no PNAIC como professor (a) alfabetizador (a) ou até mesmo como
orientador (a) de estudos, necessitando, é claro, estarem inseridos em sala de aula.
Desse modo, o que procuramos foram professores vinculados à formação, pois
queríamos sujeitos que tivessem acesso ao que estava sendo abordado nas formações.
Esses critérios foram traçados, pois os cadernos e os encontros de formação do Pacto
discutem situações didáticas ancoradas aos recursos distribuídos pelo Ministério de
Educação e apresentam a discussão sobre os quadros com os direitos de aprendizagem
de Língua Portuguesa, sobretudo, os direitos referentes à apropriação do sistema de
escrita alfabética, foco desta pesquisa.
O 1º ano do Ensino Fundamental foi escolhido tendo em vista que, conforme
anunciamos, este estudo está voltado para os direitos de aprendizagem referentes à
apropriação do SEA que, em sua maioria, precisam ser garantidos aos estudantes
pertencentes a esse ano de ensino. Ou seja, cabe ao professor, introduzir, aprofundar e
consolidar vários conhecimentos relacionados aos direitos do sistema de escrita
alfabética no primeiro ano do ciclo de alfabetização.
Após traçarmos os critérios de escolha dos sujeitos, procuramos professores que
se enquadravam nesses critérios. Pesquisamos escolas e docentes que tinham aderido às
89
formações do PNAIC até encontrar professores que estavam dentro dos critérios
estabelecidos e que, consequentemente, desejavam participar da pesquisa.
No processo de escolha, tivemos acesso a uma professora que atendia aos
critérios elencados nesse estudo através da pesquisa intitulada ―Pacto Nacional pela
Alfabetização na Idade Certa: formação de professores e impactos sobre a prática
docente‖ 4. Essa era uma das docentes que já tinha suas aulas observadas pelos
integrantes do grupo de pesquisa, sendo, dessa forma, colaboradora de outras pesquisas.
Desde o primeiro contato, a educadora mostrou interesse em participar deste estudo. Por
isso, sabendo que ela atuava como professora alfabetizadora na formação continuada do
Pacto desde 2013 e, além disso, atendia aos critérios elencados previamente,
selecionamos a educadora como um de nossos sujeitos. Nessa pesquisa, optamos por
não revelar a identidade dos sujeitos envolvidos, desse modo, mantemos o anonimato,
nomeando-a como professora A.
Em seguida, fomos aos encontros de formação dos orientadores de estudos do
Pacto, realizado em 2015, com o objetivo de encontrar outro sujeito para participar da
pesquisa. Durante um dos encontros de formação, conversamos com algumas
orientadoras de estudos e uma delas mostrou interesse colaborar com esta pesquisa. A
orientadora de estudos que despertou o desejo em participar deste estudo atuava como
professora do 1º ano do Ensino Fundamental numa rede pública. Essa docente também
revelou que havia participado das formações do PNAIC como professora alfabetizadora
nos dois primeiros anos (2013 e 2014) e em 2015 iniciou sua atuação como orientadora
de estudos. Essa docente foi nossa segunda escolha e, para manter o anonimato,
nomeamos como professora B.
A professora A e seus 25 (vinte e cinco) alunos não apresentaram nenhum
comportamento de resistência em relação à presença da observadora nas aulas. Pelo
contrário, essa docente e seus alunos atuaram como colaboradores da pesquisa,
possibilitando um estreitamento entre o pesquisador com a educadora e os estudantes.
4 Projeto de pesquisa coordenado pelas professoras da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE):
Telma Ferraz Leal, Ana Cláudia Rodrigues Gonçalves Pessoa e Ester Calland. Alunos do programa de
Pós-Graduação (PPGE/UFPE) do curso de Doutorado e Mestrado também participam desse grupo de
pesquisa. Além deles, estudantes do curso de graduação em Pedagogia na UFPE e alunos de iniciação
científica também atuam nesse projeto.
90
No ano de 2015 em que ocorreu o processo de coleta de dados, essa docente lecionava
apenas no turno da manhã, em uma turma de 1º ano do Ensino Fundamental.
A professora B e seus 20 (vinte) estudantes também não demonstraram nenhuma
resistência no que diz respeito à presença da observadora no ambiente da sala. Tanto
essa docente como os estudantes colaboraram com o processo de coleta de dados.
Diferente da professora A, essa docente lecionava em duas redes de ensino pública,
sendo uma no turno da manhã e outra no turno da tarde. Nossa coleta com essa
educadora ocorreu no turno da tarde, com a turma do 1º ano do 1º ciclo.
No quadro 01, podemos visualizar o perfil das duas professoras participantes da
pesquisa.
Quadro 01 - Formação e tempo de experiência das professoras participantes da pesquisa
Formação/ Experiência profissional
na área de educação Professora A Professora B
Ensino Médio Magistério ---
Graduação
Psicologia (instituição
privada: UNICAP)
Pedagogia (instituição
pública: UFPE) Pedagogia (situação
atual: em andamentos/
instituição privada:
UNINTER)
Pós-Graduação
Psicopedagogia
(instituição privada:
FATEC)
Gestão em coordenação
(instituição: UFPE)
Quantidade de anos de experiência
como docente
13 anos 05 anos
Quantidade de anos de experiência no
ciclo de alfabetização
08 anos 03 anos
Quantidade de ano em experiência na
rede municipal
08 anos 03 anos
Atuação em outra escola Não Sim (atua em outra rede
municipal)
Exerce outra atividade profissional Não Não
Situação de trabalho na rede Funcionária efetiva Funcionária efetiva
Com base nas informações sobre a formação e experiência profissional das
professoras podemos ver algumas similaridades e diferenças. Ambas possuem em suas
formações o curso de graduação, de pós-graduação, nesse caso, cada uma tem
especialização, e fazem parte do quadro de funcionários com enquadramento de vínculo
efetivo das redes públicas de ensino que atuam.
Quanto às diferenças, destacamos que apenas a professora A tem em sua
formação inicial o curso de magistério no nível médio. Além disso, as docentes
91
apresentam diferentes graduações e pós-graduações, sendo a professora A formada em
psicologia e a professora B licenciada em pedagogia. Outro aspecto divergente é o
tempo de experiência como docente, enquanto a professora A tem 13 (treze) anos de
experiência a professora B tem 5 (cinco) anos.
É válido informar que os oito anos de atuação na rede pública da professora A
foi lecionando turmas do 1º ano do Ensino Fundamental. Segundo essa docente, ela
nunca acompanhou sua turma até o 3º ano do ciclo de alfabetização, embora seja uma
orientação discutida no programa de formação continuada do PNAIC.
A professora B, conforme podemos ver no Quadro 01, tem apenas três anos de
experiência em escolas públicas. Durante esses três anos a docente atuou em outros anos
correspondentes ao ciclo de alfabetização, além do 1º ano do Ensino Fundamental.
A seguir, apresentamos algumas informações das turmas investigadas.
Quadro 02 – Perfil das turmas
Perfil das turmas Professora A Professora B
Quantidade de alunos
matriculados na turma
25 estudantes
20 estudantes
Faixa etária dos alunos 6 a 7 anos 6 a 7 anos
Características dos
alunos
A maioria dos estudantes
demonstrava estar em processo
de apropriação do sistema de
escrita alfabética. A partir das
indagações realizadas em sala
percebemos que poucos alunos,
conseguiam estabelecer relação
da pauta sonora ao registro
escrito, de modo a estabelecer
relação grafofônica, dando
indícios de que estavam nas
hipóteses mais iniciais do
sistema de escrita.
Havia um estudante com
deficiência na turma
(deficiência: autismo).
De modo geral, os alunos
tinham uma relação de respeito
com os colegas da turma com a
professora.
Um número de estudantes
demonstrava estar em processo
de apropriação do sistema de
escrita alfabética. A partir das
indagações promovidas pela
professora em sala percebemos
que uns alunos conseguiam
estabelecer relação da pauta
sonora ao registro escrito, de
modo a estabelecer relação
grafofônica e ler de forma
convencional.
Não havia estudantes com
deficiência na turma.
De modo geral, eram estudantes
muito agitados e agressivos uns
com os colegas de sala. Era
preciso a intervenção da
professora em vários momentos
em sala para chamar a atenção
dos aprendizes.
92
3.1.2 As escolas
O campo de nossa investigação abrange duas escolas públicas. Uma pertencente
ao município de Camaragibe e outra ao município de Jaboatão dos Guararapes. Cada
uma das docentes atuava em uma das escolas, sendo a professora A pertencente ao
município de Camaragibe e a professora B pertencente ao município de Jaboatão dos
Guararapes.
A escola municipal, localizada em Camaragibe, pertence a um bairro próximo ao
centro da cidade. Segundo a diretora, a instituição atende o Ensino Fundamental (1º ao
5º ano) e a Educação de Jovens e Adultos (EJA).
Quanto ao espaço físico, a escola localizada no município de Camaragibe
possuía biblioteca, mas, durante o período de coleta de dados, a escola estava no
período de reforma. Desse modo, algumas salas que não eram salas de aula tinham se
tornado salas de aula. Inclusive, a turma da professora que coletamos os dados estava na
sala da biblioteca que virou, temporariamente, sala de aula. Durante a coleta de dados,
presenciamos os momentos da reforma que estava sendo realizada na escola, mas isso
não comprometeu as observações das aulas. Também havia sala de recursos para o
Atendimento Educacional Especializado (AEE), mas estava, temporariamente, sendo
utilizada como sala de aula por conta da reforma. A escola contava com um pequeno
pátio onde os alunos brincavam durante o recreio e realizavam a merenda. Havia
também uma cozinha, local onde a merenda ficava armazenada.
Haviam salas climatizadas, mas a maioria contava apenas com ventiladores. As
salas possuíam uma boa mobília com cadeiras em bom estado para os estudantes e
professora. A sala da turma que observamos possuía uma boa ventilação e iluminação.
Além disso, o espaço físico da sala acomodava bem o número de alunos matriculados.
Conforme anunciamos, esses estudantes estavam, temporariamente, acomodados na sala
da biblioteca. Por isso, a sala era repleta de livros pertencentes a diversos acervos
enviados pelo Ministério de Educação e pelos programas municipais promovidos pela
prefeitura. Nas Figuras 07 e 08, podemos visualizar como os livros eram armazenados
na sala. É válido destacar em muitos dias, presenciamos momentos em que os
estudantes pegavam os livros expostos em sala para ler. Isso ocorria quando haviam
finalizado as atividades propostas pela docente e em momentos que tinham interesse
sobre determinada obra.
93
Figura 14 e 15 – Livros presentes na sala de aula da turma da professora A.
A escola municipal, localizada em Jaboatão dos Guararapes, pertencia ao um
bairro com características periféricas. Segundo uma das gestoras, a instituição escolar
funcionava nos turnos manhã, tarde e no horário intermediário funcionava o projeto
Mais Educação. A escola atende de 1º ao 5º do Ensino Fundamental.
Na primeira ida à escola constatamos o pequeno espaço físico da mesma. Na
escola não havia sala de biblioteca e sala de recursos destinada ao AEE. Segundo a
gestora, quando as professoras queriam realizar algum momento de contação de
histórias elas podiam contar com um espaço no pátio e espalhar tatames e/ou cadeiras
para acomodar os alunos. Havia uma cozinha na escola, mas não havia refeitório, por
isso a merenda era servida aos alunos na sala de aula.
As salas de aula da escola não eram climatizadas e possuíam apenas
ventiladores. De modo geral, as salas apresentavam um pequeno espaço físico para
comportar o quantitativo de estudantes. As mobílias (cadeiras e mesas) eram individuais
e não estavam em bom estado para acomodar os alunos e funcionários da escola. A sala
da turma que observamos era muito pequena para comportar o quantitativo de alunos,
sem, ao menos, possibilitar que as crianças circulassem na própria sala. Para a
professora ficava destinado apenas uma mesa, pois não havia espaço para colocar uma
cadeira para a docente. Não havia armários na sala e a educadora guardava seus
materiais em um armário que ficava no pátio da escola. As paredes da sala também
necessitavam de pinturas e nela vimos muitos cartazes produzidos pelos alunos e outros
elaborados pela professora para organizar sua rotina, conforme está apresentado nas
figuras 09, 10 e 11.
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Figura 16, 17 e 18 – Cartazes presentes na sala da professora B.
3.2 Procedimentos de pesquisa
Com base na abordagem metodológica mencionada acima e em busca de
responder os objetivos traçados nesta pesquisa, realizamos os seguintes procedimentos
de pesquisa com o intuito de compreendermos nosso objeto de estudo:
Observação de aulas
Entrevistas semiestruturadas com as professoras
Minientrevistas após as aulas
A seguir, detalhamos cada procedimento/etapa de pesquisa realizado, os critérios
de escolha dos professores investigados, bem como a caracterização dos docentes
escolhidos, das escolas e de cada turma observada.
3.2.1 Observação de aulas
O procedimento de observação é a parte mais complexa e importante da coleta
de dados, tendo em vista que possibilita ―checar, na prática, a sinceridade de certas
respostas que, às vezes, são dadas para causar boa impressão, como também, permite
identificar comportamentos não-intencionais ou inconscientes‖ (ALVES – MAZZOTTI
e GEWANDSZNAJDER, 2001, p. 164). Esse tipo de procedimento é uma das técnicas
mais utilizada nas pesquisas qualitativas e permite o acompanhamento por parte do
pesquisador/investigador dos sujeitos, interpretando e realizando inferências sobre o
comportamento e ações dos mesmos. De acordo com Marcone e Lakatos (2007, p.193):
95
[...] a observação ajuda o pesquisador a identificar e a obter provas a
respeito de objetivos sobre os quais os indivíduos não têm
consciência, mas que orientam seu comportamento. Desempenha
papel importante nos processos observacionais, no contexto da
descoberta, e obriga o investigador a um contato mais direto com a
realidade. É o ponto de partida da investigação social.
Segundo essas autoras, esse instrumento de coleta oferece vantagens e
limitações. Vantagens, segundo elas, porque essa técnica permite meios diretos para
estudar diversos fenômenos, permite coletar dados sobre um conjunto de atitudes
comportamentais e, além disso, possibilita evidenciar dados não captados por meio de
entrevistas e questionários. Quanto às limitações, as autoras também pontuam:
a) o observado tende a criar impressões favoráveis ou desfavoráveis
no observador; b) a ocorrência espontânea não pode ser prevista, o que
impede, muitas vezes, o observador de presenciar o fato; c) fatores
imprevistos podem interferir na tarefa do pesquisador; d) a duração
dos acontecimentos é variável: pode ser rápida ou demorada e os fatos
podem ocorrer simultaneamente; nos dois casos torna-se difícil a
coleta dos dados; e) vários aspectos da vida cotidiana, particular,
podem não ser acessíveis ao pesquisador (MARCONE e LAKATOS,
2007, p.193).
Concordamos com as autoras essas limitações podem, de fato, acontecer no
momento de coleta dos dados. Consideramos também que a técnica adotada pode
modificar o comportamento do observado. Logo, o observador pode deixar de
presenciar fatos que, sem a presença do pesquisador, ocorreriam naturalmente. Por isso
que, além do registro das situações didáticas que aconteciam nas jornadas de aula,
recorremos ao uso de um gravador na sala, tendo, é claro, a permissão dos docentes e da
gestão da escola.
Outro episódio que pode acontecer é a alteração no tempo dos acontecimentos,
pois determinados fatos podem ser rápidos ou demorados e outros podem ainda
acontecer simultaneamente, dificultando o olhar do pesquisador no momento da
observação. Além desses, outros imprevistos podem ser vivenciados.
Tendo consciência das limitações e imprevistos que podem acontecer ao
utilizarmos esse instrumento de coleta de dados, assumimos uma relação ética,
respeitosa e de confiança com os sujeitos de pesquisa durante o período de observação
das aulas. Desse modo, acreditamos que as relações construídas com os sujeitos
investigados foram de suma importância para realizarmos a coleta de dados.
96
Durante as observações, não intervimos nas jornadas de aula das professoras,
nem fornecemos respostas aos estudantes (observação não-intervencionista).
Sabendo que o referido instrumento de coleta pode possibilitar aproximação
entre pesquisador e os sujeitos investigados, realizamos a observação de duas turmas do
1º ano do Ensino Fundamental, totalizando 20 jornadas de aula, sendo 10 turnos
completos de aula de cada turma, independentemente dos horários em que foram
explorados outros componentes curriculares diferentes de Língua Portuguesa.
Nossa previsão inicial foi observar dias seguidos, pois um de nossos objetivos
foi investigar a frequência com que o livro didático de Letramento e Alfabetização, os
jogos de alfabetização, as obras complementares e as obras literárias foram utilizados
pelas docentes nas aulas. Por isso, agendamos previamente os dias que foram
observados, com base na presença das docentes na escola e disponibilidade das mesmas.
No quadro 03, podemos visualizar o cronograma de observação das aulas.
Quadro 03: Cronograma das observações de aula
Nº da
aula
Datas e dias observados
Turma A
Turma B
1 17/08/2015 (Segunda-feira) 08/09/2015 (Terça-feira)
2 19/08/2015 (Quarta-feira) 09/09/2015 (Quarta-feira)
3 20/08/2015 (Quinta-feira) 10/09/2015 (Quinta-feira)
4 21/08/2015 (Sexta-feira) 14/09/2015 (Segunda-feira)
5 24/08/2015 (Segunda-feira) 15/09/2015 (Terça-feira)
6 26/08/2015 (Quarta-feira) 16/09/2015 (Quarta-feira)
7 27/08/2015 (Quinta-feira) 17/09/2015 (Quinta-feira)
8 28/08/2015 (Sexta-feira) 18/09/2015 (Sexta-feira)
9 02/09/2015 (Quarta-feira) 21/09/2015 (Segunda-feira)
10 03/09/2015 (Quinta-feira) 22/09/2015 (Terça-feira)
Com base no quadro 03, é possível perceber que foram observadas 10 jornadas
de aula em cada turma no início do segundo semestre de 2015. Inicialmente, realizamos
o período de coleta na turma A de 17/08 a 03/09/15 e, em seguida, observamos os
turnos completos na turma B de 08/09 a 22/09/15.
97
Durante o período de observação das aulas na turma A, conforme esperado, nos
deparamos com imprevistos em 4 dias. Dois dias previstos para coleta de dados foram
desmarcados, pois a docente estava participando uma formação continuada sobre
Educação Especial organizada pela Secretaria de Educação. Um dos dias a educadora
estava participando de uma reunião organizada pela escola para escolha do livro
didático e em outro dia a professora não compareceu à escola por motivo de saúde.
No que se refere à turma B, não vivenciamos imprevistos. Todos os dias de aula
marcados, previamente, com esta docente foram observados. Inclusive, uma das
jornadas de aula coletadas não foi apresentada no quadro 03, pois em nosso processo
metodológico elencamos 10 jornadas de aula de cada docente.
No momento da observação foram gravados os turnos completos de aula e as
ações didáticas elaboradas pelas docentes foram registradas no caderno de campo
destinado a cada professora. Todo registro realizado levou em consideração nosso
objeto de estudo. Também fotografamos as atividades realizadas pelas educadoras. Os
gravadores ficaram bem próximos as docentes investigadas. Com os registros nos
cadernos de campo, pois foi utilizado um caderno para cada docente, elaboramos os
relatórios de observação.
Além de registrar, nos relatórios de observação os registros presentes nos
cadernos de campo, inserimos a transcrição integral das jornadas de aula observadas,
levando em consideração as situações didáticas em que os recursos distribuídos pelo
Ministério de Educação foram utilizados pelas docentes. As fotos registradas das duas
turmas também foram inseridas nos relatórios de observação.
Em seguida, analisamos os relatórios de aulas que as docentes fizeram uso dos
recursos didáticos foco dessa pesquisa, cruzando as informações com os direitos de
aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita alfabética que foram
mobilizados a partir do uso de tais recursos. Desse modo, informamos que os próprios
direitos de aprendizagem voltados para a apropriação do SEA, elencados no caderno de
formação do PNAIC, formaram nossas categorias de análise.
Durante o tratamento dos dados, percebemos que algumas situações didáticas
não contemplavam integralmente determinado direito de aprendizagem, por exemplo,
no direito conhecer a ordem alfabética e seus usos em diferentes gêneros, há duas
dimensões que precisam ser garantidas aos alunos, tanto o conhecimento da ordem
alfabética, como o uso dessa ordem em vários suportes e gêneros textuais que são
organizados a partir deste princípio. Dessa forma, se as professoras investigadas
98
contemplassem pelo menos uma das dimensões, consideramos que elas mobilizaram o
direito, mesmo sem explorar todos os conhecimentos que estão imbricados a esse
direito. Desse modo, uma de nossas opções metodológicas foi categorizar as ações
didáticas nos direitos que tinham alguma relação, por isso explicitamos, quando
necessário, as dimensões dos direitos que não foram explorados pelas professoras.
A seguir, o modelo de quadro que realizamos o levantamento dos direitos de
aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita alfabética contemplados em
situações de uso dos recursos didáticos foco de análise nessa pesquisa.
Quadro 04: Modelo de quadro de análise dos direitos de aprendizagem referente à apropriação
do Sistema de Escrita Alfabética contemplados em situações de uso dos recursos distribuídos
pelo Ministério de Educação.
Direito de aprendizagem Recurso
didático
Extrato de
aula
Aula
1. Escrever o próprio nome
2. Reconhecer e nomear as letras do alfabeto
3. Diferenciar letras de números e outros símbolos
4. Conhecer a ordem alfabética e seus usos em diferentes
gêneros
5. Reconhecer diferentes tipos de letras em textos de
diferentes gêneros e suportes textuais
6. Usar diferentes tipos de letras em situações de escrita de
palavras e textos
7. Compreender que palavras diferentes compartilham
certas letras
8. Perceber que palavras variam quanto ao número,
repertório e ordem das letras
9. Segmentar oralmente as sílabas de palavras e comparar
palavras quanto ao tamanho
10. Identificar semelhanças sonoras em sílabas e em rimas
11. Reconhecer que as sílabas variam quanto às suas
composições
12. Perceber que as vogais estão presentes em todas as
sílabas
13. Ler, ajustando a pauta sonora ao escrito
14. Dominar as correspondências entre letras ou grupos de
letras e seu valor sonoro, de modo a ler palavras e textos
99
15. Dominar as correspondências entre letras ou grupos de
letras e seu valor sonoro, de modo a escrever palavras e
textos
3.2.2 Entrevistas semiestruturadas e minientrevistas
A entrevista é um procedimento que possibilita uma aproximação entre o
pesquisador e os possíveis sujeitos de pesquisa, promovendo o contato com o contexto
que os mesmos estão inseridos. Segundo Marconi e Lakatos (1990) ―a entrevista é um
encontro entre duas pessoas, a fim de que uma delas obtenha informações a respeito de
determinado assunto, mediante uma conversação de natureza profissional‖ (p.84). Nesta
pesquisa realizamos entrevistas com as professoras em dois momentos. Inicialmente,
fizemos uma entrevista inicial com as docentes e outra ao final de cada jornada de aula,
intituladas como minientrevistas.
De acordo com Szymanski (2008, p.14) a entrevista tem um caráter social
caracterizado pelo contato entre o entrevistador e entrevistado, pois:
A entrevista se torna um momento de organização de ideias e de
construção de um discurso para um interlocutor, o que já caracteriza o
caráter de recorte da experiência e reafirma a situação de interação
como geradora de um discurso particularizado. Esse processo
interativo complexo tem um caráter reflexivo, num intercâmbio
contínuo entre significados e o sistema de crenças e valores,
perpassados pelas emoções e sentimentos dos protagonistas.
Por isso, buscamos estabelecer uma interação entre o entrevistador e o
entrevistado, tentando buscar uma situação de conforto para o entrevistador, tendo em
vista que ―quando o entrevistador consegue estabelecer certa relação de confiança com
o entrevistado, pode obter informações que de outra maneira talvez não fossem
possíveis‖ (MARCONI: LAKATOS, 2006, p. 96).
Entretanto, assim como na técnica da observação, ao optarmos pelas entrevistas
no processo de coleta de dados, corremos o risco do ocultamento ou manipulação dos
dados, pois os sujeitos entrevistados podem supervalorizar ou desvalorizar fatos
ocorridos na organização que atuam, nesse caso, a instituição escolar. Por isso, levando
em considerações os objetivos traçados nesta pesquisa, optamos pelo uso de desse
procedimento associado à técnica de observação, conforme mencionamos.
Em busca de compreender nossos objetivos de pesquisa adotamos as entrevistas
semiestruturadas. Segundo Moreira e Caleffe (2008, p. 169), nesse tipo de técnica torna-
100
se possível ter ―certo tipo de controle sobre a conversação, embora se permita ao
entrevistado alguma liberdade. Ela também oferece uma oportunidade para esclarecer
qualquer tipo de resposta quando for necessário‖.
Para registrar as entrevistas utilizamos o gravador durante todo o procedimento,
pois nosso objetivo foi de registrar o que as professoras pensam e compreendem sobre o
uso dos recursos didáticos distribuídos pelo Ministério de Educação para mobilizar os
direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita alfabética. De
acordo com Moreira e Caleffe (2008) essa é umas das possibilidades de registro de
entrevistas, através do uso do gravador. Também buscamos nesse momento, promover
uma conversa com as professoras de modo mais informal para que ambas sentissem à
vontade em responder as perguntas.
Após ter ciência que as professoras enquadravam-se nos critérios que elencamos
para nossos sujeitos de pesquisa, agendamos uma visita na escola de cada docente para
realizar a entrevista inicial. Nesse encontro, perguntamos se as docentes tinham
interesse em participar da pesquisa. E, após a confirmação de cada professora, pedimos
a permissão para utilizar o material coletado em nosso estudo. Segue o roteiro da
entrevista inicial abaixo:
Como você faz para alfabetizar os alunos?
Quais recursos didáticos você utiliza para contemplar o sistema de escrita
alfabética?
Dos recursos que você citou quais você utiliza com maior frequência? Por quê?
Você conhece as obras complementares? Onde são guardados na sua escola?
Você sabe como as obras complementares estão organizadas? Você já teve
acesso ao manual do referido acervo?
Você utiliza essas obras? Com que frequência? Com que objetivo?
Você costuma utilizar os jogos de alfabetização distribuídos pelo Ministério de
Educação? Com que frequência? Com que objetivo?
Você conhece os direitos de aprendizagem de Língua Portuguesa discutidos no
PNAIC? Como você faz para ensiná-los aos seus alunos?
Você trabalha alguns desses direitos com seus alunos? (Apresentar aos
professores o quadro)
Os direitos de aprendizagem de apropriação do sistema de escrita alfabética
discutidos no Pacto Nacional da Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) servem
como referência para a sua prática?
Você concorda com esses direitos de aprendizagens? Como você faz para
garanti-los em suas aulas?
101
O roteiro de entrevista inicial acima foi importante para a escolha dos sujeitos,
pois além dos critérios elencados para escolha das professoras, precisávamos ter ciência,
inicialmente, de dois aspectos: a) se as educadoras faziam uso dos recursos didáticos
distribuídos pelo Ministério de Educação em suas aulas; b) se as professoras conheciam
e como concebiam os direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de
escrita alfabética. Esses dois aspectos precisavam ser revelados inicialmente, pois tem
relação direta com os objetivos deste estudo.
As minientrevistas foram realizadas no final de cada jornada de aula, pois
buscamos, através deste procedimento, compreender melhor determinadas ações
realizadas pelas professoras durante as aulas. Para tanto, tínhamos um roteiro que
norteava essa entrevista, a saber: a) Você conseguiu executar tudo que planejou para
essa aula? O que não foi possível fazer? Por quê?; b) Quais foram seus objetivos para
aula de hoje? Você conseguiu alcançar tais objetivos?; c) Quais foram os recursos
didáticos que mais contribuíram para essa aula? Além das perguntas traçadas nesse
roteiro geral, realizamos outras, fizemos adaptações com base nos aspectos que surgiam
nas aulas, pois isso tais entrevistas constituíram-se como semiestruturadas.
Utilizamos como instrumento metodológico entrevistas semiestruturadas para
compreender determinadas ações realizadas pelo professor durante as aulas observadas.
Esse instrumento de coleta será analisado juntamente com as observações das práticas
docentes em busca de compreender os percursos e escolhas realizados pelos sujeitos no
seu fazer cotidiano. Conforme já foi dito, essas entrevistas serão realizadas no final da
observação de cada aula, a fim de entender as situações didáticas realizadas pelos
professores.
3.3 Análise dos dados
Na fase de análise, utilizamos quadros contendo categorias que foram elaboradas
com base nos dados e nas reflexões do levantamento e estudo sobre o tema desta
pesquisa. Para tanto, utilizamos a trajetória de análise de conteúdo temática, pois,
conforme, aponta Bardin (1979), trabalhar com análise temática ―consiste em descobrir
os ―núcleos de sentido‖ que compõem a comunicação e cuja presença, ou frequência de
aparição pode significar alguma coisa para o objetivo analítico escolhido‖ (p.105).
Seguindo o percurso defendido por Bardin (1979) dividimos nossa análise em
102
três etapas: (1) Pré-análise, (2) Exploração do material escolhido, nesse caso, dos
trechos das entrevistas e das observações e (3) tratamento dos resultados, por meio da
interpretação e inferência dos dados coletados.
É valido destacar que antes de iniciarmos o processo de coleta de dados nas
instituições entregamos um documento em cada Secretaria de Educação solicitando a
entrada para realizar a pesquisa na escola de cada professora. No documento
apresentamos o título da pesquisa, os recursos que seriam utilizados durante as
observações (gravador, máquina fotográfica e caderno de campo) e as atividades que
realizaríamos em sala. Só iniciamos a coleta de dados após a autorização concedida
pelas secretarias de educação e pela da gestão das escolas.
Consideramos as análises relevantes, pois há, no contexto atual, iniciativas
promovidas pelo Ministério de Educação, através da elaboração de programas de
distribuição de recursos didáticos, que podem oferecer subsídios à prática pedagógica
no âmbito da alfabetização na perspectiva do letramento.
As discussões dos resultados dessa pesquisa serão apresentadas nos próximos
três capítulos de acordo com os objetivos elencados. No capítulo 4, os dados das
entrevistas das professoras investigadas, realizadas no final das aulas, serão discutidos.
No capítulo 5, a partir dos relatórios de observação, abordaremos a frequência de uso
dos recursos didáticos nas práticas das docentes, tomando como referência a
mobilização dos direitos de aprendizagem referentes à apropriação do SEA. No capítulo
6, dividido em quatro tópicos, analisaremos o uso de cada tipo de recurso didático
contemplado nessa pesquisa utilizado pelas professoras para explorar os direitos de
aprendizagem referentes ao sistema alfabético.
103
4 A APRECIAÇÃO DAS PROFESSORAS SOBRE OS DIREITOS DE
APRENDIZAGEM REFERENTES À APROPRIAÇÃO DO SISTEMA DE
ESCRITA ALFABÉTICA
Neste capítulo, abordaremos as análises das entrevistas realizadas com as
docentes em busca de compreender se os conhecimentos subjacentes aos direitos de
aprendizagem de Língua Portuguesa apresentados no PNAIC, especificamente, os
relacionados à apropriação do Sistema de Escrita Alfabética (doravante SEA) são
tomados como objeto de ensino em suas práticas. Outro ponto desta análise é investigar
como as professoras avaliam os direitos de aprendizagem referentes à apropriação do
SEA.
Conforme discutimos no capítulo 2 dessa Dissertação, os direitos de
aprendizagem são as capacidades básicas e os conhecimentos relacionados aos diversos
componentes curriculares. Tais conhecimentos foram traçados com o objetivo de
atender as exigências previstas nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para o
Ensino Fundamental de nove anos e, por isso, podem ser considerados como metas de
ensino nos anos iniciais de escolarização. Para tanto, temos clareza de que os direitos de
aprendizagem não correspondem ao currículo em sua totalidade. Entretanto, destacamos
que as professoras investigadas estavam inseridas no programa de formação do Pacto
Nacional pela Alfabetização na Idade Certa que promove discussões em torno dos
direitos de aprendizagem voltados para os estudantes no ciclo de alfabetização.
Algumas pesquisas realizadas, tanto em escolas regidas pelo sistema seriado
quanto pelo sistema ciclado, têm evidenciado que ausência de metas e expectativas de
aprendizagem tem comprometido o ensino e a aquisição da leitura e da escrita
(OLIVEIRA, 2010; CRUZ 2012; PINESSO, 2006; FRIGOTTO, 2005). Dessa forma,
consideramos que é preciso ter clareza sobre o que ensinar em cada etapa dos anos
iniciais do Ensino Fundamental, de modo a considerar a progressão no ensino em busca
da reversão desses resultados apontados pelas pesquisas.
Na busca pela clareza sobre o que ensinar no ciclo da alfabetização, ressaltamos
que os direitos de aprendizagem, elencados no caderno de formação do Pacto intitulado
―Currículo na alfabetização: concepções e princípios‖ (BRASIL, 2012), podem
subsidiar as práticas dos professores no que se refere à progressão do ensino e da
aprendizagem dos alunos. Por isso, elencamos como um dos objetivos desta
Dissertação: investigar se os direitos de aprendizagem, especificamente os que estão
104
relacionados à apropriação do Sistema de Escrita Alfabética, são referências para prática
das professoras. Para tanto, levantamos alguns questionamentos: qual a opinião das
docentes sobre os direitos de aprendizagem referentes à apropriação do SEA? As
professoras buscam contemplá-los em suas aulas?
Durante a entrevista inicial, as docentes foram solicitadas a responder se
conheciam e/ou concordavam com os direitos de aprendizagem referentes à apropriação
do SEA. Sobre esses dois aspectos, a professora A revelou:
E – Você conhece os direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita
alfabética do PNAIC?
P – Do PNAIC, né? A gente trabalhou nos encontros de formação.
E – Você concorda com esses direitos de aprendizagens?
Eu concordo, eu acho que estão de acordo com o que as crianças têm que aprender. São bem
baseados na proposta, né? São praticamente iguais. Eu acho que são importantes porque são
direitos que fazem com que a gente, por exemplo, você vê um por um e vê que tem que dar isso.
Antes quando não tinha proposta, você às vezes pode deixar passar alguma coisa batida e com
aquilo ali escrito, dizendo tudo que a criança deve aprender fica mais fácil. Aí você dá uma lida
e diz: eu não trabalhei isso. Aí você volta e trabalha. Eu não garanti isso, a criança não aprendeu
isso ainda e no primeiro ano é para estar sabendo isso e não sabe. Aí você vai e volta. Eu acho
que são importantes.
(Entrevista inicial, professora A)
Segundo o depoimento da professora A os direitos de aprendizagem referentes à
apropriação do SEA apresentam os conhecimentos que precisam ser garantidos aos
alunos. Além disso, a educadora pontuou que esses direitos estão em consonância com
as metas de ensino elencadas na proposta curricular do município, sinalizando a
importância de um documento para nortear o que é preciso ensinar aos aprendizes em
cada ano de forma detalhada, o que possibilita um melhor monitoramento sobre o que é
ensinado.
A professora B, por sua vez, diante das mesmas perguntas, respondeu:
E – Você conhece os direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita
alfabética do PNAIC?
P – Conheço.
E – Você concorda com esses direitos de aprendizagens?
P – Assim, eu concordo. Eu acho fantástico assim, quando até a proposta pedagógica mudou e
encaixou a questão da análise linguística, né? Eles são fantásticos! No caso eles dão um norte,
eles delimitam. Eles delimitam, nem além e nem aquém. Mas você pode ir além. Se os alunos já
alcançaram os do primeiro ano, você pode avançar. Pode ir avançando. Essa é a minha
perspectiva. Eu não vou tolher, porque tem criança que já sabe ler. Então, ela lê, ela fala. Então,
eu faço outras perguntas mais aprofundadas sobre o texto e ela já me diz. Enquanto o outro não
me diz, mas eu não vou deixar de perguntar. Eu vou avançar. Essa é a minha perspectiva. Minha
perspectiva é avançar.
(Entrevista inicial, Professora B)
105
De acordo com a professora B os direitos de aprendizagem referentes à
apropriação do SEA também demarcam os conhecimentos básicos que precisam ser
tomados como objeto de ensino em sala e norteiam a prática dos professores dos anos
iniciais de escolarização. Esta docente ainda sinalizou que a partir desses direitos o
professor pode progredir e contemplar outros objetivos em sala, na medida em que os
alunos dominam os direitos previstos para o 1º ano do Ensino Fundamental.
Nos depoimentos acima, as professoras evidenciaram que os conhecimentos
específicos subjacentes aos direitos de aprendizagem de apropriação do Sistema de
Escrita Alfabética são importantes, pois dão subsídios para suas práticas, apresentando o
que é preciso garantir aos aprendizes em cada ano de ensino que corresponde ao ciclo
de alfabetização. Sobre isso, Batista et al (2005) destacam que é importante oferecer aos
professores dos anos iniciais de escolarização a discussão e reflexão daquilo que precisa
ser assegurado às crianças, tendo como parâmetro a progressão dos conhecimentos a
serem dominados em cada ano de ensino, pois:
Com isso, busca-se possibilitar ao docente uma visualização mais
clara dos objetivos de seu trabalho em sala de aula e das metas que
deve procurar atingir. Noutras palavras, definindo o que as crianças
precisam aprender, a cada ano, se estará também, ao mesmo tempo,
estabelecendo o que deve ser ensinado (BATISTA et al, 2005, p. 13).
Os dados também revelaram que as professoras sentem a necessidade de algo
que norteiem suas práticas e, por isso, os direitos de aprendizagem dão um suporte aos
docentes.
De acordo com o capítulo 2 desta Dissertação, os direitos são apresentados em
quadros nos cadernos de formação do PNAIC, divididos por cada ano de ensino
correspondente ao ciclo de alfabetização. Em cada quadro há os conhecimentos
referentes aos três anos do Ensino Fundamental que precisam ser garantidos aos alunos.
Nos quadros, é possível perceber que há a existência da progressão de conhecimentos
para que no último ano do 1º ciclo, os estudantes leiam e escrevam com autonomia,
estando plenamente alfabetizado. Dessa forma, consideramos que a forma com que os
direitos de aprendizagem são abordados pode também oferecer esse suporte as práticas
docentes.
Além das perguntas já mencionadas, as docentes também foram solicitadas a
responder se os direitos de aprendizagem de apropriação do SEA são referências para
suas práticas. Sobre esse aspecto, a professora A respondeu:
106
E – Os direitos de aprendizagem de apropriação do sistema de escrita alfabética servem como
referência para a sua prática?
P – Servem. Servem sim, porque é a partir deles que a gente pode elaborar uma aula e fazer
tudo com eles. É como eu disse... Ver o que a criança aprendeu e o que ela não aprendeu e o que
é importante que ela aprenda naquela idade, naquela série, né?
(Entrevista inicial, professora A)
Para a professora A os direitos referentes à apropriação do sistema de escrita
são referências para sua prática e, a partir deles, o professor pode planejar suas aulas,
avaliar os alunos e ter ciência dos conhecimentos que os educandos precisam aprender
em cada ano de ensino.
Sobre o planejamento, Nery (2007) afirma que este é um instrumento
imprescindível para organização do trabalho pedagógico na sala de aula. Oliveira (1992,
p.76) também pontua que ―o estabelecimento de uma sequência básica de atividades
diárias, a ―rotina‖, é útil para orientar a criança a perceber a relação espaço-tempo,
podendo aos poucos rever o funcionamento dos horários‖.
A professora B, ao responder se os direitos de aprendizagem de apropriação do
SEA são referências para sua prática, revelou:
E – E esses direitos dão de certa um...
P – Um norte! Até porque tem essa delimitação por ano, porque é ciclo, mas você tem a
competência a ser construída, aprofundada, consolidada em cada ano. Eu tenho que respeitar e
fazer valer isso, porque senão eu vou atropelar os outros anos.
E – Então, esses direitos são referência para a sua prática?
P – Para mim são! Para mim são referências, porque é a partir deles que eu vou me norteando.
Porque senão você esquece. Você acaba dando prioridade a uma coisa só. Escrita, escrita,
escrever, escrever e o resto? Que não é só isso, né?
(Entrevista inicial, professora B)
Segundo a professora B os direitos relacionados à apropriação do SEA norteiam
a sua prática de ensino. Além disso, a educadora sinalizou que a delimitação por ano,
neste caso, o 1º, 2º e 3º ano do Ensino Fundamental, dos direitos de apropriação da
escrita alfabética e a indicação do que é necessário I (introduzir), A (aprofundar) e C
(consolidar) no ciclo de alfabetização auxilia o professor a garantir os conhecimentos
que precisam ser construídos aos alunos na etapa escolar certa. Também podemos
observar o reconhecimento da educadora a respeito dos direitos de aprendizagens que
precisam ser garantidos no sistema ciclado, rompendo, desta forma, com a ideia de que
o ciclo está ancorado na progressão automática dos estudantes. Nesse sentido,
concordamos com Freitas (2002, p. 15) ao afirmar que:
Os ciclos devem ser mecanismos de resistência à lógica seriada. Mas devem
ser vistos como oportunidade para se elevar a conscientização e a atuação dos
professores, alunos e pais, retirando-os do senso comum e revelando as reais
107
travas para o desenvolvimento da escola e da sociedade e não apenas serem
vistos como uma ―solução‖ técnico-pedagógica para a repetência.
Portanto, a concepção de ciclos está ancorada numa proposta de organização do
ensino que assegura à continuidade das aprendizagens, a flexibilidade do currículo, a
ampliação do tempo de aprendizagens entre outros aspectos (OLIVEIRA, 2010).
Na sequência, a professora B pontuou que as capacidades básicas e os
conhecimentos subjacentes a esses direitos voltados para sistema de escrita alfabética
dão um norte para o seu fazer docente e auxiliam os educadores a perceber os outros
eixos da língua materna, não focando apenas na apropriação do sistema, assim como os
direitos dos outros componentes que os aprendizes precisam ter domínio no 1º ano do
ciclo de alfabetização.
Como podemos observar, os depoimentos das professoras investigadas revelam
que elas conheciam, concordavam e tomavam como referência em suas práticas os
direitos de aprendizagem de apropriação do sistema de escrita alfabética. Diante disto,
coube também saber como elas faziam para ensinar esses direitos relacionados aos
princípios do sistema alfabético aos seus alunos. Sobre isso, a professora A respondeu:
E – E como você faz para ensinar esses direitos aos seus alunos?
P – Assim, você lê e elabora atividades de acordo com os direitos, né? Olhando o livro,
atividades xerocadas, o quadro e as atividades que contemplem os direitos. Vai trabalhando até
as crianças se apropriarem.
(Entrevista inicial, professora A)
Neste depoimento, observamos que a docente afirma que produz atividades e
seleciona diversos recursos didáticos com o objetivo de contemplar os direitos de
aprendizagem relacionados ao sistema de escrita alfabética até os alunos dominarem tais
conhecimentos.
A professora B, diante da mesma pergunta, afirmou:
E – Como é que você faz para ensinar esses direitos aos seus alunos?
P – Olhe, eu planejo minhas aulas semanais e procuro encaixar em cada dia... Assim, dá ênfase
a várias coisas. Porque no decorrer do tempo, a gente fica só na escrita (apropriação). O tempo
vai passando e a gente não percebe. Então, eu procuro ver nos exercícios que eu proponho
abordar a questão da linguagem, da oralidade, da escrita e da análise para eu poder distribuir
isso direito, porque senão você acaba se perdendo. Se não tiver bem planejado, bem assim...
(Entrevista inicial, professora B)
Neste relato a educadora pontuou que é necessário planejar suas aulas e é esse o
modo que considera seguro para garantir os direitos de todos os eixos da Língua
Portuguesa, pois reconhece que há uma tendência para o trabalho com a apropriação do
108
sistema de escrita. Durante a continuação da entrevista é possível perceber a
confirmação da docente sobre esse aspecto, conforme podemos observar abaixo:
E – Você diz que acaba dando mais foco... Se não estiver com tudo organizado você acaba
dando a...
P – A escrita...
E – Dando mais prioridade a apropriação do sistema de escrita?
P – Isso, dando mais ênfase às convenções da escrita.
E – E os outros eixos vão...
P – Vão ficando meio de lado. Porque você precisa perceber. Quando eu planejo uma atividade,
eu planejo nesse foco. Esse aqui vai ser análise linguística. É preciso perceber esse contexto,
perceber tudo isso.
(Entrevista inicial, professora B)
De acordo com a professora B é o planejamento que auxilia o docente a
diversificar as situações de ensino em busca de contemplar os demais eixos da língua
materna sem ficar apenas restrito aos conhecimentos relativos ao sistema de escrita
alfabética. Sobre isso, concordamos com Leal (2011) que a tarefa de planejar é
importante não só porque auxilia os docentes na construção de situações didáticas
diversas, mas também porque, a partir desta ação, o professor reflete, avalia e melhora
sua prática. Esta autora ainda pontua que ―para planejarmos melhor, precisamos
também ter consciência das nossas metas, precisamos ter conhecimento sobre a proposta
curricular que orienta nossa rede de ensino ou nossa escola, precisamos saber
diagnosticar as necessidades dos alunos‖ (LEAL, 2010, p.96 e 97).
No que se refere às metas de ensino, a professora B afirmou que obteve clareza
sobre os conhecimentos básicos subjacentes aos direitos de aprendizagem referentes à
apropriação do SEA após os encontros de formação do PNAIC, conforme podemos
observar no extrato da entrevista abaixo:
E – E esses direitos antes do Pacto eles...
P – Eles não eram bem claros.
E – Não eram?
P – Não eram para mim. Até porque eu só tenho cinco anos de rede. Para mim não eram. Até a
própria rede, ela não tinha essa clareza. Tinha aquele currículo norteador e pronto.
(Entrevista inicial, professora B)
Além de afirmar que o PNAIC esclareceu os conhecimentos referentes à
apropriação do sistema de escrita alfabética, a professora B pontuou que a rede ensino
e a própria escola não tinham clareza sobre esses conhecimentos e que, inclusive, a
proposta curricular do município não proporcionava esse esclarecimento. Sobre isso,
109
ressaltamos que a ausência de metas pode trazer algumas implicações para a prática
docente, como, por exemplo, contribuir para que os professores tomem como
parâmetros outros elementos, a saber: os conteúdos selecionados pelos livros didáticos
ou até mesmo pelos sistemas de avaliação.
Diante disso, corroboramos com Morais (2012) ao afirmar que as redes de
ensino precisam estabelecer metas de ensino referentes à alfabetização, pois ―se cabe ao
MEC promover esse debate no âmbito federal, recordemos que os municípios têm
autonomia e a responsabilidade de estabelecer seus currículos‖ (p.126).
A pesquisa desenvolvida por Frigotto (2005) revelou que os professores e
funcionários de uma escola pública, localizada no município de Niterói/RJ, regidos pelo
sistema ciclado, também não tinham clareza a respeito das metas de ensino. Esse estudo
buscou analisar as estratégias pedagógicas utilizadas por professores para o ensino da
leitura e escrita. A pesquisa foi desenvolvida com a participação de três docentes, sendo
uma de cada ano do 1º ciclo, da mesma escola. Para investigar esse objeto, foram
observadas três turmas que correspondem aos anos iniciais do Ensino Fundamental.
Além da observação das práticas das professoras, foram realizadas entrevistas com
todos os alunos e professores das referidas turmas, com a diretora e com a equipe
técnica da escola. Também foram recolhidas as produções dos estudantes das turmas
observadas.
Os dados revelaram que havia uma falta de comprometimento da Secretaria
Municipal de Educação no processo de implantação do ciclo na escola estudada. Os
professores da escola, por sua vez, também explicitaram não se identificar com a
implantação dos ciclos. Além disso, nas entrevistas, os docentes afirmaram que o
regime ciclado foi imposto pela Secretaria, sem o fornecimento de orientações para os
professores a respeito dessa nova organização. Através das observações das rotinas
pedagógicas das três professoras, a pesquisadora afirmou que não houve mudanças
significativas nas práticas docentes, de modo a considerar a nova estrutura organizada
por ciclos. De acordo com a pesquisadora, esses dados revelam que na escola
investigada percebe-se a mesma lógica do ensino da escola seriada, constatando que não
havia mudanças nas práticas das professoras observadas. Para a pesquisadora, o que
havia sido implantado na escola era apenas a promoção automática dos estudantes, sem
mudança de postura nas práticas de ensino e na forma de conceber o processo de
aprendizagem.
110
Desse modo, afirmamos que organizar o sistema escolar em ciclos significa
romper com a postura ancorada na progressão automática e compreender que é preciso
respeitar o tempo de aprendizagem dos estudantes, estabelecer objetivos claros de
ensino e promover situações didáticas em busca de garantir os conhecimentos traçados
para os estudantes de acordo com cada ano do ciclo de alfabetização.
As docentes também foram solicitadas a responder como avaliam os direitos de
aprendizagem de apropriação do sistema de escrita alfabética. Sobre este aspecto, a
professora A reafirmou que os conhecimentos sobre o sistema alfabético explícitos no
quadro presente no caderno intitulado Currículo na alfabetização: concepções e
princípios dão subsídios às práticas dos professores. Já a professora B diante da mesma
pergunta revelou:
E – A gente já acabou meio que conversando sobre isso... Como é que você avalia esses direitos
de aprendizagem?
P – Eu tenho um olhar maior para Língua Portuguesa e Matemática. Eu digo que sempre
trabalho os dois e aí eu incluo a Geografia e os outros também. Os outros a gente tem na
proposta pedagógica curricular do município bem destrinchado... Eles acabam meio que
reforçando sempre a Língua Portuguesa. Porque tem a questão da identidade, a questão da
construção do reconhecimento da identidade e por aí vai, né? Tem o ser social, tem o ser
histórico em história. E a gente vai acabando passando por tudo isso transversalmente. Não que
História e Geografia sejam transversais. Não é! Mas a gente acaba passando eles por dentro das
competências de Matemática e de português. Dos direitos de matemática e português que você
acaba contemplando de um modo geral. Eu percebo assim.
(Entrevista inicial, professora B)
Como podemos perceber a professora B não fez uma apreciação específica
sobre a avaliação dos direitos voltados para a apropriação do sistema de escrita
alfabética. Entretanto, observamos que a mesma destacou alguns elementos que
merecem ser discutidos, tais como: o privilégio para Língua Portuguesa e Matemática
em detrimento dos demais componentes curriculares, uma vez que, segundo ela, há uma
cobrança em torno dos conhecimentos relacionados a esses dois componentes. Uma das
hipóteses que levantamos sobre as avaliações externas, como, por exemplo, a Provinha
Brasil5, é que essas podem influenciar, de certa forma, a prática dessa docente. Isso
5 É uma avaliação diagnóstica aplicada duas vezes ao ano (no início e no final do ano letivo) aos
estudantes do 2º ano do Ensino Fundamental pertencentes às escolas públicas do país e tem o objetivo de
investigar as habilidades relativas à alfabetização e letramento na área de Língua Portuguesa e
Matemática (Fonte: http://portal.inep.gov.br/web/provinha-brasil).
111
pode estar relacionado com a falta de objetivos claros, por isso, muitos professores
podem ter como parâmetro as avaliações externas.
Outro aspecto levantado pela professora B foi que os direitos de aprendizagem
de Língua Portuguesa e Matemática podem contemplar os demais conteúdos das
disciplinas que compõem o currículo. Sobre este aspecto, ressaltamos que os
componentes de História, Geografia, Artes e Ciências também apresentam
conhecimentos básicos que precisam ser garantidos aos aprendizes no ciclo da
alfabetização. Desta forma, interpretamos como um equívoco considerar que apenas os
direitos referentes à Língua Portuguesa e Matemática possam englobar os
conhecimentos a ser assegurados aos estudantes nos anos iniciais de escolarização.
A partir dos depoimentos acima podemos perceber que os direitos de
aprendizagem voltados para a aquisição do sistema de escrita alfabética são tomados
como objeto de ensino pelas professoras investigadas. Os dados ainda revelaram que as
docentes fazem associações dos direitos com as metas de ensino presentes na proposta
curricular dos municípios em que as escolas pertencem.
Conforme foi explicitado no capítulo do percurso metodológico, a professora A
atuava no município de Camaragibe e a professora B no município de Jaboatão dos
Guararapes. Em linhas gerais, destacamos que a proposta curricular do município de
Camaragibe apresenta metas e habilidades de ensino em quadros detalhadas para cada
ano do Ensino Fundamental. Ou seja, é um documento em que o docente encontra
objetivos claros para cada estudante. Já a proposta curricular do município de Jaboatão
dos Guararapes aborda conhecimentos e concepções mais gerais voltadas para os
educandos do Ensino Fundamental, sem o detalhamento do que é preciso ensinar em
cada ano.
As docentes também sinalizaram que a forma como os conhecimentos e
capacidades básicas a ser garantidos aos alunos são expostos direcionam as práticas
alfabetizadoras, situando o que é preciso avaliar e ensinar aos educandos.
Para aprofundar nossas análises, veremos no próximo capítulo quais recursos
didáticos foram utilizados pelas professoras para contemplar os direitos de
aprendizagem referentes à apropriação do Sistema de Escrita Alfabética, dando respaldo
para os recursos distribuídos pelo Ministério de Educação, foco dessa pesquisa.
112
5 FREQUÊNCIA DE USO DOS RECURSOS DIDÁTICOS UTILIZADOS PELAS
PROFESSORAS NO ENSINO DOS DIREITOS DE APRENDIZAGEM
REFERENTES À APROPRIAÇÃO DO SISTEMA DE ESCRITA ALFABÉTICA
No capítulo anterior, as professoras revelaram que os direitos de aprendizagem
são referências para suas práticas e, além disso, avaliaram positivamente esses direitos.
Segundo as educadoras, os direitos norteiam a prática pedagógica, sinalizando o que
cada criança, no ciclo de alfabetização, precisa dominar, de acordo com o ano de ensino.
Com isso, as docentes afirmaram que os direitos, sobretudo, os referentes à apropriação
do SEA, são tomados como objeto de ensino em suas aulas e, portanto, norteiam
também as dimensões do planejamento pedagógico.
Neste capítulo, apresentaremos o levantamento dos recursos didáticos utilizados
nas aulas das docentes investigadas, tomando como referência as situações de uso
voltadas para a reflexão dos princípios e propriedades do sistema de escrita. Desse
modo, verificamos a frequência com que o livro didático de Letramento e
Alfabetização, os jogos de alfabetização, as obras complementares e as obras literárias
ancoradas ao PNBE e ao acervo PNLD/PNAIC foram utilizados na mobilização dos
direitos de aprendizagem relativos à apropriação do Sistema de Escrita Alfabética.
A partir dos relatórios de observação das aulas (10 de cada docente),
constatamos que as professoras contemplaram os conhecimentos que regem o sistema
de escrita alfabética em todas as jornadas de aula observadas através do uso de diversos
recursos didáticos. Dos recursos utilizados pelas docentes, uns pertenciam aos
programas de distribuição de materiais didáticos vinculados ao Ministério de Educação
e outros foram elaborados e/ou selecionados pelas educadoras para serem utilizados em
sala, a saber: fichas de atividade, cartazes, jogos didáticos, crachás e etc. Além desses
recursos, as docentes também promoveram situações de reflexão sobre a língua escrita a
partir da seleção e uso de livros de literatura (diversos), jornais, panfletos e do caderno
escolar. Esses dados revelam que as docentes diversificaram os recursos em suas aulas
com o objetivo de favorecer a aprendizagem dos estudantes em relação aos
conhecimentos necessários para o domínio do sistema de escrita.
Em divergência a esses dados, a pesquisa desenvolvida por Souza (2007)
identificou pouca diversificação de recursos nas aulas de uma professora do 1º ano do
Ensino Fundamental, no município de Natal/RN. De acordo com esta pesquisadora a
docente observada limitou-se ao uso de fichas mimeografadas em suas aulas com o
113
objetivo de ensinar o sistema de escrita alfabética. Segundo a pesquisadora, essas fichas
eram produzidas e/ou selecionadas a partir de algumas coleções de alfabetização
presentes na escola ou, até mesmo, faziam parte do acervo da docente. Souza (2007)
ainda destacou que as fichas mimeografadas utilizadas pela professora estavam
ancoradas em propostas tradicionais de alfabetização, com pressupostos abordados nos
métodos sintéticos e analíticos.
O estudo desenvolvido por Almeida (2012) apresentou resultados diferentes aos
de Souza (2007) em relação à diversificação dos recursos didáticos. Segundo Almeida
(2012), a professora do 1º ano do Ensino Fundamental pertencente à Rede Municipal de
Tiradentes (RMT), localizada em Minas Gerais, utilizava diferentes recursos didáticos
em suas aulas com o objetivo de alfabetizar os estudantes. Entretanto, a pesquisadora
também sinalizou que, apesar de apresentar materiais variados nas aulas, a docente
utilizou com frequência atividades de folhas mimeografadas ancoradas em propostas
sintéticas de alfabetização, selecionadas através da consulta de coletâneas presentes na
escola e no arquivo pessoal da professora.
Albuquerque (2014), Soares, Vieira e Leal (2014) apontaram que professoras
dos anos iniciais do Ensino Fundamental, no município de Camaragibe/PE, também
diversificavam os recursos em suas aulas com o objetivo de promover situações
didáticas voltadas para o eixo de leitura e a apropriação do sistema de escrita alfabética.
Os dados desses estudos também revelaram que havia a predominância de alguns
recursos nas práticas das docentes, tais como: as obras complementares, as fichas de
atividades e o caderno escolar.
A partir dos estudos apresentados, podemos considerar que há uma tendência
das pesquisas mais recentes em mostrar que os professores têm diversificado os
recursos didáticos em suas aulas. Uma das pistas para compreender o uso de diferentes
materiais no cotidiano da sala de aula pelos docentes pode estar relacionada com a
ampliação e elaboração de programas de distribuição de recursos didáticos destinados às
escolas públicas do país. Também foi possível perceber, em algumas práticas, o
predomínio de determinado recurso didático.
Dessa forma, com base nessas pesquisas, consideramos que os professores
podem ou não utilizar recursos variados. O que define as escolhas do docente são seus
objetivos didáticos e sua concepção de ensino. Nessa perspectiva, salientamos que
apenas a variação de recursos no cotidiano da prática docente não garante a
aprendizagem dos estudantes. Momentos com mediações em torno das especificidades
114
do que está sendo ensinado podem favorecer a aprendizagem do sistema de escrita
alfabética.
Nesta Dissertação, conforme mencionamos ao longo dos capítulos, nossas
análises estão centradas no livro didático de Letramento e Alfabetização, nos jogos de
alfabetização, nas obras complementares e nas obras literárias. Entretanto,
identificaremos também a frequência dos demais recursos didáticos não vinculados ao
Ministério de Educação presentes nas práticas das professoras. Esses dados serão
relevantes para termos um parâmetro sobre os materiais que foram priorizados pelas
docentes nas aulas.
No quadro 05 apresentamos a frequência dos recursos utilizados pelas
professoras para mobilizar os direitos de aprendizagem referentes à apropriação do
sistema de escrita alfabética.
Quadro 05 - Frequência dos recursos didáticos utilizados nas aulas para contemplar os
direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita alfabética (SEA)
Recursos didáticos
Professora A
Professora B
Nº das aulas Nº das aulas
Ficha de atividade 01, 02, 03, 04, 05, 06, 07, 08,
09 e 10
01, 02, 06, 07, 08 e 09
Livros diversos 08 e 10 01, 02, 03, 04 e 08
Jogos diversos --- 07
Cartazes 08 01 e 10
Caderno escolar
01
01, 02, 03, 04, 05, 06, 07, 08,
09 e 10
Livro didático de Letramento
e Alfabetização
01, 02, 05 e 09
01, 02, 06, 07 e 10
Jogos de alfabetização 09 07
Obras Complementares 03, 05, 06, 07 e 08 06
Obras literárias 01 04 e 09
Nº das aulas sem uso dos
recursos vinculados ao MEC
04 e 10
03 e 08
Total de aulas com uso de
recursos vinculados ao MEC
com foco nos direitos de
apropriação do SEA
08
07
A partir dos dados apresentados no quadro 05, podemos perceber que diversos
recursos foram utilizados pelas professoras para promover os direitos de apropriação do
Sistema de Escrita Alfabética. Além dos recursos expostos, ressaltamos que as docentes
fizeram uso de outros materiais durante as situações didáticas voltadas para a
115
exploração do sistema alfabético, por isso, apesar de não explicitar no quadro 05,
ressaltamos que o uso do quadro, jornais, revistas, relógios, vídeos, crachás e
calendários estiveram presentes nas aulas das educadoras.
Os dados também revelam que as professoras selecionaram e/ou elaboraram
recursos sem vinculação aos programas do Ministério de Educação. Identificamos na
prática da professora A o uso das fichas de atividade, dos livros diversos, dos cartazes e
do caderno escolar. Como podemos perceber, houve um predomínio das fichas de
atividades, sendo utilizadas nas dez (10) aulas observadas.
As fichas de atividades utilizadas pela professora A foram, em algumas
situações, selecionadas e, em outros momentos, produzidas pela própria docente para
contemplar seus objetivos didáticos. Durante as observações das aulas da docente, foi
possível perceber que esse recurso já estava consolidado em sua prática e, além disso, a
educadora demonstrou sentir-se à vontade em utilizar esse tipo de material em sala.
Identificamos na prática da professora B recursos sem relação com os programas
do Ministério de Educação, tais como: fichas de atividades, livros diversos, jogos
diversos, cartazes e o caderno escolar. Em relação ao uso desses recursos, o caderno
escolar obteve a maior frequência, tendo em vista que esteve presente nas dez (10)
jornadas de aula observadas. Esses dados revelam que o uso do caderno escolar já
estava consolidado na prática dessa educadora.
Os recursos disponibilizados pelo Ministério de Educação foram utilizados pelas
docentes na maioria das aulas observadas para contemplar os direitos de aprendizagem
de apropriação do SEA. Identificamos nas aulas das docentes os quatro tipos de
recursos foco de investigação nesta Dissertação: o livro didático de Letramento e
Alfabetização, os jogos de alfabetização, as obras complementares e obras literárias.
Nas aulas da professora A podemos perceber que as obras complementares
foram utilizadas em cincos aulas, o livro didático de Letramento e Alfabetização em
quatro aulas e os jogos de alfabetização e as obras literárias em uma das dez jornadas de
aula observadas.
No que se refere à professora B, constatamos que o livro didático de Letramento
e Alfabetização foi utilizado em cinco aulas. As obras literárias foram utilizadas em
duas aulas, os jogos de alfabetização e as obras complementares em uma aula das dez
aulas observadas, tomando como referência os conhecimentos voltados para os direitos
de aprendizagem voltados para a apropriação do SEA.
116
Esses dados revelam que dois tipos de recursos vinculados ao Ministério de
Educação foram mais frequentes nas aulas observadas, a saber: as obras
complementares na prática da professora A e o livro didático de Letramento e
Alfabetização nas aulas da professora B. A predominância desses recursos nas práticas
das professoras também foi revelada por elas durante a entrevista inicial.
Ao perguntamos a professora A quais eram os recursos utilizados em sua prática
para refletir sobre os princípios do sistema de escrita ela revelou:
E – Quais os materiais que você utiliza para auxiliar nesse processo de
apropriação do sistema de escrita alfabética? Quais são os recursos
didáticos?
P – São os livros... Assim os livrinhos. Eu leio um livro, aí tiro uma
palavra do livro e vou fazendo com eles.
E – Que livros são esses? É qualquer livro?
P – É qualquer um. É qualquer um de historinha. Aí eu retiro uma
palavra e trabalho com eles as palavras. Escrevo as palavras no
quadro, faço uma análise de como a palavra é escrita para eles irem
pelo menos ter uma noção, né? E... Acho que é isso.
E – Você opta por um livro que tem parlendas e rimas? Ou faz uma
escolha a partir da temática que você está trabalhando?
P – Depende da temática porque vê... Cada bimestre a gente trabalha
alguns gêneros textuais... Esse negócio que eu disse de pegar as
palavras tem vez que eu faço só com o livro da leitura deleite. Faço a
leitura deleite e pego umas palavrinhas da história para trabalhar. E
quando é de pegar com a temática a gente vai de acordo com bimestre.
(Entrevista inicial, professora A).
Conforme podemos observar no fragmento da entrevista, a professora A já
anunciava que costuma ler as histórias presentes nos livros e, a partir desta situação
didática, buscava promover reflexões sobre a composição de algumas palavras presentes
na obra lida. Esta educadora ainda salienta que faz também a seleção e uso desses
recursos para articular com as temáticas que são abordadas em sala.
Durante a entrevista inicial, a professora B nos deu indício de que utilizava o
livro didático com frequência nas aulas, conforme podemos observar no fragmento
abaixo:
E – Quais são os recursos didáticos que você costuma utilizar nas suas
aulas para ensinar o sistema de escrita alfabética?
P – Eu utilizo o livro didático. A gente tem dois do ―Porta Aberta‖, o
de matemática e o de português. Eu assim utilizo textos da tradição
117
oral, que o próprio livro do ―Porta Aberta‖ já traz. Cantigas de roda,
traz também o folclore. Eu pesquiso também, trago outros textos.
E – Qual é o recurso didático que você utiliza com mais frequência
para refletir sobre o sistema alfabético?
P – O que eu mais uso são os textos que eu pego... Eu vim utilizar
mais o livro didático deles no segundo semestre.
E – Antes do segundo semestre você não utilizava o livro didático em
sala?
P – Não. Eu sempre utilizei na sala, mas levar para casa, com alguma
tarefa de casa só após o segundo semestre. (Entrevista inicial,
professora B).
Nesse depoimento, a professora B menciona que faz uso o livro didático e
afirma recorrer a outras fontes para pesquisar textos em busca de promover reflexões
em torno do sistema de escrita.
A seguir, discutiremos como as professoras utilizaram os recursos didáticos
distribuídos pelo Ministério de Educação, foco dessa pesquisa. Entretanto, sinalizamos
que esta discussão ocorrerá de modo geral e, no próximo capítulo trataremos de cada
recurso de forma mais detalhada e aprofundada, tomando como referência os direitos de
aprendizagem voltados para a apropriação do SEA.
A partir das observações das aulas, verificamos que nas situações de uso do livro
didático de Letramento e Alfabetização da professora A, os estudantes foram levados a
reconhecer e nomear as letras do alfabeto, a perceber que as sílabas variavam quanto às
suas composições, a identificar as rimas presentes em palavras, a perceber que as
palavras podem compartilhar algumas letras, a ler palavras e lista de palavras e a
escrever os nomes dos objetos solicitados nas atividades do livro.
Em relação ao uso do livro didático de Letramento e Alfabetização pela
professora B observamos que ela promoveu reflexões em torno do reconhecimento e
nomeação das letras do alfabeto, da segmentação oral das sílabas de palavras, da
identificação das semelhanças sonoras presente nas palavras, da percepção de que
palavras diferentes podem compartilhar certas letras, da comparação de palavras
diferentes quanto ao número, repertório e ordem das letras, do reconhecimento de
diferentes estruturas silábicas e da leitura e escrita de diversas palavras e do nome
próprio.
Diante disto, constatamos que o livro didático ainda tem sido um recurso que os
professores lançam mão com certa frequência em sala de aula. Segundo Ferreira,
Albuquerque, Cabral e Tavares (2009) e Morais e Albuquerque (2011) a frequência de
118
uso do livro voltado para alfabetização pelos docentes foi potencializada pelas
mudanças ocorridas, ao longo dos anos, nesse tipo de material. Tais mudanças foram
impulsionadas pelos os critérios de escolha e do processo de avaliação promovido pelo
PNLD.
Nas situações de uso dos jogos de alfabetização, a professora A promoveu
reflexões em torno das letras do alfabeto, da identificação de semelhanças sonoras
presentes em sílabas e em rimas, da compreensão de que palavras diferentes podem
compartilhar certas letras e da percepção de que palavras distintas variam quanto ao
número, repertório e ordem das letras. Cabe ainda destacar que esta educadora, após o
uso desse recurso, elaborou 02 (duas) fichas de atividades articuladas ao jogo para
serem desenvolvidas em sala.
A professora B, ao utilizar um dos jogos de alfabetização, explorou o
reconhecimento e nomeação das letras do alfabeto, a segmentação oral das sílabas de
palavras e a percepção de que palavras distintas podem variar quanto ao número,
repertório e ordem das letras. Ainda na aula 07 (sete), antes de utilizar um dos jogos de
alfabetização, a docente fez uso de um jogo, confeccionado por ela mesma, que tinha
articulação com o jogo distribuído pelo MEC.
Como podemos perceber, apesar da baixa frequência dos jogos de alfabetização
durante o período das nossas observações, as docentes promoveram várias reflexões
sobre o sistema de escrita a partir deste recurso. Além disso, notamos que as educadoras
elaboraram outros recursos (fichas de atividades e, inclusive, outro jogo) para utilizar
em sala, relacionados aos jogos de alfabetização.
O uso das obras complementares com foco no processo de apropriação do SEA
foi realizado pelas professoras. No que se refere a professora A, identificamos as obras
Que horas são?6, Delícias e Gostosuras, ABC dos animais, Era uma vez 1, 2, 3 e Cores
em cordel durante as aulas. Através desses recursos, esta docente mobilizou algumas
reflexões em torno da ordem alfabética, do reconhecimento e nomeação das letras do
alfabeto, da identificação das semelhanças sonoras presentes nas palavras e solicitou
que os alunos lessem o título de algumas obras. Albuquerque (2014) e Soares, Vieira e
Leal (2014) também evidenciam a utilização das obras complementares por professoras
dos anos iniciais do Ensino Fundamental com esta finalidade.
6 O livro Que horas são? faz parte do acervo do Programa Nacional do Livro Didático - PNLD 2010.
Texto & imagem: Guto Lins.
119
A professora B utilizou as obras complementares de forma mais restrita quanto
ao tratamento do sistema de escrita alfabética, mas, a partir desse tipo de recurso,
mobilizou direitos de aprendizagem. As obras intituladas ―A economia de Maria” e
―Clact... Clact... Clact...” foram utilizadas por esta docente com diferentes objetivos.
Na aula 05 (cinco), a obra ―A economia de Maria” foi utilizada para mobilizar o eixo de
leitura e o componente curricular de matemática. Na aula 06 (seis) essa mesma obra foi
retomada pela docente e, a partir das intervenções promovidas pela professora, houve a
mobilização de direitos de aprendizagem referentes à apropriação do SEA, além da
exploração do eixo de leitura.
Quanto à obra ―Clact... Clact... Clact...”, utilizada na aula 09 (nove), a
professora B contemplou o eixo de leitura e o componente curricular de artes, sem
promover nenhum trabalho direcionado à reflexão do SEA.
As obras literárias distribuídas a partir dos programas do PNBE e PNLD PNAIC
também foram recursos utilizados pelas educadoras para mobilizar situações de ensino
voltadas para compreensão da língua materna.
Durante o uso da obra literária Chapeuzinho Vermelho – Uma aventura
borbulhante, a professora A solicitou que os estudantes lessem o título da obra. Essa
obra pertence ao acervo PNLD PNAIC que destina obras literárias para sala de aula.
Através dessa iniciativa, o referido programa facilita na inserção desse tipo de recurso
nas situações de ensino, tendo em vista que ficam mais acessíveis para os professores e
crianças.
A professora B, a partir da obra Se um gato for... e da obra Um avião e uma
viola, explorou o reconhecimento e nomeação das letras do alfabeto, a identificação das
rimas presentes na obra e solicitou que os alunos realizassem a leitura do título junto
com do primeiro livro citado. Além de mobilizar esses conhecimentos, a professora
produziu uma ficha de atividade a partir da história de um dos livros. De acordo com
Santos e Albuquerque (2005):
Os livros de literatura estão cada vez mais presentes na escola e
podem ser lidos em uma atividade de leitura deleite, na qual se pode
explorar não só a temática do livro, mas o jogo de linguagem presente
neles, levando o aluno a tentar lê-los sozinho, identificando palavras
que já conseguem ler e refletindo sobre algumas delas (p. 105).
Ainda com base no quadro 05, percebemos que a professora A diversificou os
recursos distribuídos pelo Ministério de Educação nas aulas 01(um), 05 (cinco) e 09
(nove), utilizando dois recursos por aula e, através deles, direitos de aprendizagem
120
voltados para a apropriação do SEA foram mobilizados. Na primeira aula fez uso do
livro didático de Letramento e Alfabetização e do livro Chapeuzinho Vermelho – Uma
aventura borbulhante. Na quinta aula utilizou o livro didático de Letramento e
Alfabetização e a obra Delícias e Gostosura e na aula 09 (nove) usou o livro didático de
Letramento e Alfabetização e o jogo Bingo da Letra Inicial.
Desse modo, consideramos que as situações de diversificação foram importantes
porque houve uma tentativa por parte da docente em variar as estratégias didáticas de
exploração em relação ao sistema de escrita e de mobilizar os conteúdos que precisam
ser abordados em sala. No entanto, destacamos que em um dos momentos,
especificamente, na aula 05 (cinco), o uso da obra ―Delícias e Gostosuras” não estava
previsto no planejamento da professora, conforme podemos observar no seu depoimento
abaixo:
E – Os alunos pediram para você ler o livro Delícias e Gostosuras?
P – Não. Eu não lembro mais... Só lembro que eu dei para eles na
época e não consegui o livro que eu queria na época. Aí quando eu
consegui essa semana aí eu li. Eu estava com ele no armário essa
semana sendo que eu esquecia todo dia. Aí quando foi hoje, foi uma
coincidência assim. Aí quando ele (aluno) abriu naquela página do
livro, eu me lembrei do livro. Aí eu contei, mas não foi nada
contextualizado, nem estava planejado. (Entrevista final, realizada na
aula 05, professora A)
Como podemos observar, na entrevista, realizada no final da aula, a docente
revelou que a leitura da obra foi motivada porque um dos alunos abriu o livro didático
de Letramento e Alfabetização na página que tinha a capa da obra complementar. Isso
evidencia que a partir de um recurso, outros podem ser indicados, o que pode trazer
novas possibilidades para o planejamento dos professores.
A professora B diversificou os recursos tomados como política nacional apenas
na aula 07, fazendo uso do livro didático de Letramento e Alfabetização e do jogo
intitulado Troca Letras. A partir das observações, percebemos que havia uma relação
entre uma das atividades do livro didático e do jogo, tendo em vista que contemplavam
a retirada e imersão de letras com objetivo de formar novas palavras.
Com base nos dados apresentados, podemos perceber que diferentes recursos são
utilizados pelos professores para promoção de situações didáticas voltadas para
compreensão do sistema de escrita. Nesse processo, destacamos que os programas de
distribuição de recursos didáticos vinculados ao Ministério de Educação ocupam um
121
papel importante na distribuição e qualidade dos materiais que têm chegado às salas de
aula.
No próximo capítulo, analisaremos, de forma detalhada, o uso do livro didático
de Letramento e Alfabetização, dos jogos de alfabetização, das obras complementares e
das obras literárias, tomando como parâmetro os direitos de aprendizagem referentes à
apropriação do sistema de escrita alfabética.
122
6 RECURSOS DIDÁTICOS DISTRIBUÍDOS PELO MINISTÉRIO DE
EDUCAÇÃO NO ENSINO DOS DIREITOS DE APRENDIZAGEM
REFERENTES À APROPRIAÇÃO DO SISTEMA DE ESCRITA ALFABÉTICA
No capítulo anterior, vimos que as professoras fizeram uso de diversos recursos
didáticos em busca de concretizar suas intenções educativas em relação ao sistema
alfabético. Inclusive, os recursos distribuídos pelo Ministério de Educação, como o livro
didático de Letramento e Alfabetização, os jogos de alfabetização, as obras
complementares e as obras literárias que pertencem ao PNLD/PNAIC e ao PNBE foram
utilizadas pelas docentes para contemplar os direitos de aprendizagem referentes à
apropriação do Sistema de Escrita Alfabética.
Diante disso, levantamos dois questionamentos necessários para refletir sobre as
práticas das docentes e, consequentemente, compreender nosso objeto de pesquisa, a
saber: quais direitos referentes à apropriação do sistema de escrita alfabética foram
mobilizados pelas professoras a partir do uso dos recursos didáticos foco desta
pesquisa? Como as professoras realizaram as atividades a partir dos recursos
distribuídos pelo Ministério de educação em busca de contemplar os direitos de
aprendizagem referentes à apropriação do SEA?
Para tanto, os objetivos que serão discutidos neste capítulo são: identificar quais
direitos de aprendizagem relacionados à apropriação do Sistema de Escrita Alfabética
são contemplados nas práticas das professoras em situações de uso do livro didático de
Letramento e Alfabetização, dos jogos de alfabetização, das obras complementares e
das obras literários e analisar as atividades de apropriação do sistema de escrita
alfabética desenvolvidas pelas professoras em situações de uso do livro didático de
Letramento e Alfabetização, dos jogos de alfabetização, das obras complementares e
das obras literárias.
Em busca de aprofundar nossas análises, identificaremos os direitos de
aprendizagem voltados para a apropriação do SEA, tomando como referência os
recursos foco desta pesquisa. Além disso, analisaremos as situações didáticas e,
consequentemente, as atividades em que esses direitos foram mobilizados.
A partir das análises foi possível perceber que as situações de ensino e as
atividades promovidas pelas professoras, a partir do uso dos recursos didáticos
investigados nesta pesquisa, em muitos momentos, exploravam mais de um direito de
aprendizagem. Além disso, temos clareza de que as docentes ao realizarem uma
123
atividade podiam levar a reflexão, por parte dos alunos, de vários conhecimentos sobre
os princípios do SEA, ainda que as docentes, durante as aulas, não verbalizassem para
os alunos que estavam enfatizando determinados conhecimentos relacionados a algum
direito de aprendizagem específico.
Além disso, é importante afirmar que ao mencionarmos que as professoras não
contemplaram determinado direito de aprendizagem, estamos levando em consideração
as situações didáticas desenvolvidas a partir dos recursos investigados neste estudo. Ou
seja, isso significa dizer que as docentes, a partir de outros recursos didáticos
selecionados e/ou produzidos, podem ter proporcionado reflexões para contemplar
determinado direito.
Para facilitar a discussão, organizamos este capítulo em quatro tópicos. Portanto,
analisamos o uso de cada recurso didático separadamente, a partir da seguinte ordem: os
livros didáticos de Letramento e Alfabetização, os jogos de alfabetização, as obras
complementares e as obras literárias.
6.1 O uso do livro didático de Letramento e Alfabetização
Nesse tópico, apresentamos o levantamento dos direitos de aprendizagem
referentes à apropriação do Sistema de Escrita Alfabética contemplados nas aulas de
cada professora a partir do uso do livro didático de Letramento e Alfabetização.
No quadro 06, é possível visualizar os direitos de aprendizagem referentes à
apropriação do SEA mobilizados pelas professoras a partir do uso do Livro didático.
Quadro 06 - Direitos de aprendizagem referentes à apropriação do Sistema de Escrita Alfabética
(SEA) mobilizados nas aulas pelas professoras a partir do uso do livro didático de Letramento e
Alfabetização.
Direitos de aprendizagem
Aulas
Professora A Professora B
Escrever o próprio nome --- 06
Reconhecer e nomear as letras do alfabeto 02, 09 e 05 01, 02, 06, 07 e 10
Reconhecer diferentes tipos de letras em textos
de diferentes gêneros e suportes textuais
---
02
Compreender que palavras diferentes
compartilham certas letras
02
01, 02 e 06
Perceber que palavras variam quanto ao
número, repertório e ordem das letras
---
02, 06 e 07
Segmentar oralmente as sílabas de palavras e
comparar palavras quanto ao tamanho
---
01
Identificar semelhanças sonoras em sílabas e
em rimas
02
02, 06 e 07
124
Reconhecer que as sílabas variam quanto às
suas composições
02 e 09
01
Perceber que as vogais estão presentes em
todas as sílabas
02 e 09
01
Ler, ajustando a pauta sonora ao escrito 01,02 e 09 01, 06, 07 e 10
Dominar as correspondências entre letras ou
grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a
ler palavras e textos
01,02 e 09
01, 06, 07 e 10
Dominar as correspondências entre letras ou
grupos de letras e seu valor sonoro, de modo
escrever palavras e textos
02
06, 07 e 10
Frequência de direitos contemplados pelas
professoras a partir do uso do livro didático
08
12
Nos dados apresentados no quadro 06, identificamos que doze direitos de
aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita alfabética foram
contemplados em situações de uso do livro didático de Letramento e Alfabetização.
Identificamos oito direitos na prática da professora A e doze nas aulas da professora B.
Ao analisar as práticas das docentes, percebemos que a professora A mobilizou
em uma mesma aula de um a oito direitos através do uso do livro didático. A professora
B, a partir do uso do mesmo recurso didático, contemplou numa única aula de quatro a
oito direitos de aprendizagem. As atividades realizadas pelas docentes, em muitas
situações, davam subsídios para mobilização de mais de um direito voltado para
apropriação do SEA e envolviam, inclusive, outros eixos da Língua Portuguesa.
Esses dados revelaram que os livros didáticos de Letramento e Alfabetização
foram recursos que subsidiaram as intenções educativas das docentes no que se refere
ao tratamento dos conhecimentos necessários para a apropriação do sistema de escrita.
O direito de diferenciar letras de números e outros símbolos, conhecer a ordem
alfabética e seus usos em diferentes gêneros e usar diferentes tipos de letras em
situações de escrita de palavras e textos não foram contemplados pelas docentes nas
situações de uso do livro didático de Letramento e Alfabetização, por isso não
explicitamos no quadro 02.
Ao mapear as práticas das docentes, também constatamos que a professora A
não utilizou o livro didático para promover situações de ensino em torno da escrita do
próprio nome, do reconhecimento de diferentes tipos de letras em textos de diferentes
gêneros e suportes textuais, da percepção de que palavras variam quanto ao número,
repertório e ordem das letras e da segmentação oral das sílabas de palavras e
comparação das palavras quanto ao tamanho.
125
A seguir detalharemos as situações didáticas, a partir dos momentos de uso do
livro didático de Letramento e Alfabetização, tomando como parâmetro os direitos de
aprendizagem referentes à apropriação do SEA. É importante ressaltar que a análise
deste recurso foi organizada pelos direitos de aprendizagem, seguindo a ordem
apresentada no quadro 06.
Desse modo, organizamos cada direito em um tópico para facilitar a leitura.
Entretanto, ressaltamos que alguns direitos foram agrupados e analisados em um único
tópico porque consideramos que a situação didática e/ou atividade contemplava
simultaneamente os conhecimentos relacionados aos direitos presentes no mesmo
tópico, por isso decidimos agrupá-los. Iniciaremos a discussão pelo direito de escrever o
próprio nome.
6.1.1 Direito: escrever o próprio nome
No quadro 06, identificamos que o direito de escrever o próprio nome foi
contemplado através do livro didático de Letramento e Alfabetização em uma aula. A
professora A não promoveu situações didáticas em torno da escrita do próprio nome
através do livro didático e a professora B contemplou esse direito apenas na aula 06
(seis).
É importante ressaltar que, durante o período de observação das aulas, as
docentes promoveram situações didáticas em que os estudantes foram levados a
escrever o próprio nome em fichas de atividades ou em outros recursos com o objetivo
de identificar o material entregue. No entanto, conforme anunciamos no início deste
capítulo, analisaremos apenas as situações de didáticas promovidas através dos recursos
didáticos foco de investigação nessa pesquisa.
Diante disso, pontuamos que a mobilização desse direito é importante para os
aprendizes que estão em processo de alfabetização, pois atividades em torno do próprio
nome e das palavras estáveis possibilitam a construção de um repertório de palavras que
fazem parte do universo das crianças. Através da escrita do próprio nome, as crianças
podem conhecer e ampliar o repertório de letras do alfabeto e, além disso, relacionar as
semelhanças sonoras e gráficas do próprio nome com outras palavras.
Nessa perspectiva, corroboramos com o que é defendido por Albuquerque e
Leite (2010) ao afirmarem que ―se acompanharmos o desenvolvimento das crianças,
podemos observar que, ainda muito pequenas, elas já apresentam um interesse crescente
126
para a aprendizagem das letras, principalmente aquelas relacionadas às letras do seu
nome e dos seus familiares‖ (p.93). Isso talvez aconteça porque as crianças estão
imersas no mundo letrado e, em alguns casos, as mesmas começam a ser despertadas
para existência das letras do seu nome desde muito cedo.
A seguir, podemos visualizar na figura 19 a atividade do livro didático de
Letramento e Alfabetização realizada pela professora B para contemplar esse direito de
aprendizagem.
Figura 19 – Atividade do livro didático de Letramento e Alfabetização
Como podemos visualizar na figura 19, essa atividade envolve a escrita do
próprio nome e a escolha e escrita do nome de um colega da turma que não rime com o
nome escrito inicialmente. O comando da atividade exige que os alunos reflitam sobre
as letras e seu valor sonoro para escrever o próprio nome, comparem o próprio nome
com o do colega escolhido para saber se existem semelhanças sonoras presentes no final
dos nomes e pensem nas letras e seu valor sonoro para escrever o nome do colega
escolhido.
É importante ressaltar que antes das crianças serem solicitadas a responder essa
atividade, a professora leu junto com os estudantes o trecho do poema ―Rima ou
combina?‖ de Marta Lagarta e perguntou aos mesmos quais palavras rimavam, mas não
combinavam e quais palavras não rimavam, mas combinavam. A seguir, detalharemos
melhor essa atividade, pois, a partir dela, outros direitos de aprendizagem foram
mobilizados.
No momento da realização dessa atividade (figura 12), os estudantes estavam
organizados individualmente com as cadeiras formando fileiras. Inclusive, ressaltamos
que o espaço físico da sala era muito pequeno para comportar o quantitativo de alunos e
127
possibilitar outros tipos de agrupamentos. Dessa forma, com os alunos organizados
individualmente, a professora B leu o enunciado da questão para os estudantes e deu as
orientações para a realização da atividade, conforme podemos observar no extrato de
aula abaixo:
P – Agora complete escrevendo e use seu nome e de um colega seu. Você vai escrever seu nome
todinho aqui! Bora?
A – O que tia?
P – Seu nome aqui! Bora? Seu nome! Escreve seu nome aqui, os dois primeiros!
A – É o nome completo!
P – São os dois nomes só!
A – Eu vou colocar completo!
P – Sem crachá! Você vai pensar no seu nome!
A – Eu vou fazer todo!
P – Então, tem de pensar na letra do nome! Não, só os dois primeiros!
A – Vou fazer o nome completo!
(...)
P – Agora, você vai colocar o seu nome... Olha para o quadro! Aqui! Agora você vai escolher o
nome de um colega e vai colocar na linha debaixo! O nome de um colega!
(...)
P – Ei, é só para escrever! Olha, você vai olhar pelo livro do colega e vai colocar! (na capa do
livro havia uma ficha com o nome) Olha o dela que está perto! É quem está perto do outro! É
quem está perto do outro! Vai olhar no livro do colega que está perto do outro!
(...)
P – Agora vejam só! Vejam só! Eu vou ler um livro! Agora vejam só, vejam só! Eu vou ler
como ficou! Eu vou ler! Bora lá? Vejam só! Olha, só! Presta atenção! Lucas Ferreira não rima
com... Olha! Quando a gente botou o nome do colega ficou assim, olha. Lucas Ferreira não rima
com Alan Pereira de Monte... Não rimou! Alan Pereira de Monte não rima com Lucas Ferreira!
Deixa eu ler outra, deixa eu ver. Aí ficou assim, olha. Alan Pereira do Monte não rima com
Lucas Ferreira! Não rima! Esse ficou assim... Isaura Lira não rima com Pâmela Camile!
(Aula 06, professora B)
No fragmento da aula 06 (seis) percebemos que a docente, ao explicar a
atividade, informou que os alunos deveriam escrever o próprio nome e o de um colega
da turma. Em seguida, a educadora solicitou aos alunos a escrita do nome completo e,
na sequência, deu uma nova orientação, pedindo que os estudantes escrevessem os dois
primeiros nomes correspondentes ao próprio nome sem o auxílio do crachá ou ficha de
nome.
No segundo momento da atividade, após os alunos escreverem o próprio nome
na primeira lacuna da questão, a docente orientou os aprendizes a escolher o nome de
um dos colegas de sala para copiar na segunda lacuna da atividade, tendo o auxílio da
128
ficha de identificação, presente na capa do livro didático, que tinha o nome e sobrenome
de cada estudante. De acordo com a orientação dada pela a educadora, o aluno deveria
escolher o colega que estivesse próximo a ele na sala para facilitar na cópia do nome do
colega, tendo em vista que os estudantes iriam consultar a ficha de identificação
(presente na capa do livro didático).
No terceiro momento da atividade, após a escrita do próprio nome pelos alunos e
cópia do nome do colega, a docente fez a leitura de algumas respostas presentes nos
livros dos alunos com o objetivo de fazer a correção coletiva da atividade.
Nessa situação didática, observamos que a professora possibilitou que os alunos
pensassem nas letras que correspondem ao próprio nome e seu valor sonoro, pois os
estudantes foram desafiados a escrever sem o auxílio da ficha do nome. Também
notamos que os alunos ficaram entusiasmados para escrever o nome completo,
mostrando que já dominavam o direito de escrever o próprio nome.
Durante a mediação dessa situação de ensino, também percebemos que a
solicitação da escrita do nome e sobrenome do aluno e do colega, a não explicitação de
que o nome do colega escolhido não poderia rimar com o nome do aluno, conforme é
detalhado no livro didático, e a orientação para que os estudantes escolhessem o colega
que estivesse mais próximo foram alguns encaminhamentos feitos pela professora que
podem ter comprometido a interpretação dos alunos com relação à atividade.
Nesse estudo, consideramos que os alunos do 1º ano do Ensino Fundamental
precisam vivenciar momentos de escrita do nome completo, pois subjacente a esse
conhecimento está o direito de escrever o próprio nome que precisa ser introduzido,
aprofundado e consolidado nessa etapa de ensino. Entretanto, vimos que, nessa
atividade, a solicitação da escrita do nome completo e/ou do nome e o sobrenome
dificultou a comparação entre o nome do aluno e o do colega escolhido e,
consequentemente, não contribuiu para que os alunos identificassem, caso houvesse,
semelhanças sonoras no final dos nomes.
Uma estratégia que podia ser realizada pela docente para auxiliar os estudantes,
na comparação entre os nomes, seria a escrita apenas do primeiro nome do aluno e do
colega escolhido. Além disso, a docente também poderia solicitar aos alunos que
pronunciassem em voz alta o nome do colega para verificar se os estudantes estariam
levando em consideração as semelhanças sonoras, nesse caso, as rimas.
Além da escrita do nome junto com o sobrenome dos alunos não facilitar na
identificação das rimas dos nomes, pontuamos que a educadora deveria ter explicado
129
aos estudantes, no comando da atividade, que o nome do colega escolhido não poderia
rimar com o próprio nome do estudante. Pois, conforme visualizamos, no fragmento da
aula 06 (seis), a professora só fez menção de que os nomes dos alunos não poderiam
rimar no momento da correção coletiva. Também percebemos que a estratégia da
docente em solicitar aos alunos a cópia do nome do colega que estivesse próximo
poderia ocasionar a escolha e a cópia de um nome que rimasse com o próprio nome do
aluno.
A seguir, analisaremos situações didáticas em que o direito de reconhecer e
nomear as letras do alfabeto foi contemplado.
6.1.2 Direito: reconhecer e nomear as letras do alfabeto
Como podemos observar no quadro 06, esse direito foi contemplado em três
aulas da professora A e cinco aulas da professora B.
Na prática da professora A, observamos que nas aulas 02 (dois), 05 (cinco) e 09
(nove) a docente explorou o direito reconhecer e nomear as letras do alfabeto a partir de
perguntas realizadas aos alunos sobre quais eram as letras que formavam as sílabas de
palavras presentes nas atividades do livro didático. Nessas situações de ensino, a
docente fez a mediação das atividades e registrou no quadro as respostas dos estudantes.
Em todos esses momentos, os alunos estavam organizados em duplas. A seguir,
detalharemos a aula 02 (dois) para compreendermos como a docente mobilizou esse
direito com os alunos.
Figura 20 – Atividade do livro didático de Letramento e Alfabetização
130
Nessa atividade do livro didático os alunos precisavam refletir sobre as letras
que formavam as palavras jipe, janela, caju e caramujo e escrever uma letra em cada
quadradinho. Através desse recurso, os estudantes podem ser levados a estabelecer
relação letra-som, refletir sobre as letras que formavam os nomes dos desenhos e
escrever esses nomes, tendo o quantitativo de quadradinhos como auxílio para o
processo de escrita.
No fragmento da aula abaixo podemos observar como a professora mediou essa
atividade e contemplou o direito de aprendizagem discutido nesse tópico.
P – Todo mundo já fez o nome ―JIPE‖? Como é JI?
Alunos – J e I!
P – Como é ―PE‖?
A – P e E!
A – Como é que faz ―P‖?
P – ―P‖ de pato, sabe como é não?! Eu vou de banca em banca para ver... Esse último é
caramujo.
A – Caramujo?
P – Olha, tem gente que está fazendo errado. Jipe é assim, JI-PE. Tem gente que está colocando
o ―B‖ no lugar do ―PE‖. Agora janela, janela é fácil, fácil. Vamos lá? Como é ―JA‖?
A – G e A!
A – J e A!
P: J e A! Botem aí, ―JA‖ de janela. Como é ―NE‖?
Alunos – N e E!
P – N e E! Botem aí, ―JA-NE‖. N e E! ―N‖ de navio!
A – E agora, tia?! Está faltando qual letra?
P – Pense!
A – Bota um ―E‖.
P – Nossa amiga aqui já disse, olha. JA-NE...
A – Ja-ne-la.
A – L e A.
P – Pronto, botem aí. Agora vamos para ―CAJU‖.
A – Eu já sei!
P – Como é ―ca‖?
A – C e A!
P – Vamos lá, JA-NE-LA. Escreveu janela? Agora ―CAJU‖ como é ―CA‖?
A – C e A.
P – Coloquem aí, C e A. Como é ―JU‖ de caju?
A – G e U!
A – J e U.
P – Não é com ―G‖!
Alunos – J e U!
P –J e U, ca-ju. Vamos para CA-RA-MU-JO? Vocês vão me dizer. Como é ―CA‖?
A – C e A.
P – Como é ―RA‖?
Alunos – R e A!
P – Como é ―MU‖?
Alunos –M e U!
P – CA-RA-MU...
A – JO!
P – Como é ―JO‖?
131
A – G e O!
P – Nada é...
Alunos – J e O!
P – Nada é com ―G‖ aí! Então, escrevam aí, olha. CA-RA-MU-JO! De novo, eu vou repetir para
quem não conseguiu pegar. Como é ―CA‖?
Alunos – ―C e A!‖.
P – Como é ―RA‖?
A – R e A.
P – CA-RA-MU… Como é ―MU‖?
A – ―M e U‖.
P – CA-RA-MU-JO! Como é ―JO‖?
Alunos – J e O!
(Aula 02, professora A)
Como podemos observar no extrato da aula 02 (dois), a docente segmentou
oralmente as sílabas das palavras presente na atividade e perguntou aos alunos o nome
das letras que formavam as sílabas. Em alguns momentos, percebemos que a resposta
dos alunos foi baseada no nome da letra, por isso responderam G e A para representar a
sílaba JA, G e U para a sílaba JU e G e O para sílaba JO, conforme podemos observar
em JANELA, CAJU e CARAMUJO.
De acordo com Cardoso-Martins e Batista (2005, p. 331) isso acontece porque
os nomes das letras podem ser ―ouvidos‖, com certa frequência, na pronúncia das
palavras. Segundo essas autoras, ―esse é o caso, por exemplo, da palavra bola, em que
tanto o nome da letra ―o‖ como o nome da letra ―a‖ são claramente escutados na
pronúncia da palavra‖.
No que se refere à exploração do direito de aprendizagem discutido nesse tópico,
consideramos que, através dessa atividade, os alunos refletiram e nomearam as letras
que formavam as palavras. Além de reconhecermos que a docente promoveu uma
situação didática em que as crianças foram levadas a nomear as letras do alfabeto,
percebemos, em alguns momentos, a partir das respostas das mesmas, que elas
compreendiam o princípio de que as letras representam ou notam a pauta sonora das
palavras que falamos e, por isso, estabeleceram relação letra-som, colocando uma letra
para cada fonema com o objetivo de escrever os nomes das figuras presentes na
atividade (MORAIS, 2012). Ou seja, identificamos que os alunos dominavam
conhecimentos relacionados aos aspectos conceituais do sistema alfabético, mas
destacamos que eles ainda apresentavam conflitos por estabelecer uma relação direta do
nome da letra com o som representado pela sílaba, trocando o ―J‖ pelo ―G‖.
Morais (2012) afirma que esses conflitos ocorrem com os aprendizes que estão
em processo de alfabetização, pois, apesar de dominarem vários princípios do sistema
132
de escrita, ainda não compreendem as convenções som-grafia e, por isso, cometem erros
ortográficos.
As situações didáticas promovidas pela professora B com foco no
reconhecimento e nomeação das letras do alfabeto ocorreram em cinco das dez aulas
observadas através do uso do livro didático de Letramento e Alfabetização. Na aula 01
(um) a docente solicitou que os alunos identificassem a letra inicial e final nas palavras
da atividade, na aula 02 (dois) os estudantes foram levados a refletir e nomear as letras
que formavam as sílabas das palavras, nas aulas 06 (seis) e 07 (sete) os discentes
identificaram e retiraram algumas letras nas palavras com objetivo de formar novas
palavras e na aula 10 (dez) os estudantes nomearam as letras das palavras que
representavam as respostas das adivinhas presentes na atividade do livro didático.
Das cinco aulas em que esse direito foi contemplado, escolhemos a atividade do
livro didático realizada na aula 01 (um), conforme podemos visualizar na Figura 21.
Figura 21– Atividade no livro didático de Letramento e Alfabetização
Como podemos observar, essa atividade é formada por duas orientações. Na
primeira orientação os alunos precisavam ler as palavras e desenhar o nome das frutas
que faltam. No segundo momento, de acordo com a legenda da atividade, os estudantes
deveriam circular a primeira letra do nome das frutas com a cor vermelha e a última
letra com a cor azul. Nesta atividade, os aprendizes têm acesso à figura e o nome das
frutas manga, cacau e banana. Com a figura e o nome das frutas os discentes podem
visualizar como essas palavras são grafadas. Nas frutas caju, coco e jaca, que não tem
133
figuras, os alunos vão precisar ler essas palavras para descobrir a fruta que precisa ser
desenhada. O segundo momento da atividade pode auxiliar os aprendizes que estão nos
níveis mais iniciais de compreensão do sistema de escrita alfabética a identificar e
nomear as letras iniciais e finais das palavras que correspondem ao nome das frutas.
No momento que a professora B realizou essa atividade os alunos estavam
organizados individualmente e cada um estava com o seu livro didático. No início dessa
atividade a docente perguntou aos alunos o nome das frutas, solicitando a leitura
coletiva das palavras que não tinham a ilustração e os estudantes que já conseguiam ler
responderam o nome das frutas. Nesse momento, a docente copiou o nome das frutas no
quadro e voltou a ler as palavras registradas. Com essa ação, a educadora favoreceu os
alunos que não conseguiam ler, pois chamou a atenção dos mesmos para a percepção da
palavra escrita, de modo a relacionar com a palavra falada.
Após a leitura do nome das frutas em voz alta com o auxílio da docente, os
aprendizes fizeram o desenho das frutas que faltavam. Na sequência, a educadora
explicou aos estudantes como localizar a letra inicial e final das palavras e, em seguida,
a partir da leitura das palavras, fez perguntas aos alunos, levando em consideração o
reconhecimento e nomeação das letras iniciais e finais dos nomes das frutas.
Para ilustrar como a professora B contemplou o direito de aprendizagem
discutido nesse subtópico apresentamos o fragmento da aula 01 (um) abaixo:
P – Na primeira letra, na primeira que começa. O nome manga! Qual é a primeira letra da
manga?
A – M!
A – M!
P – Circula o M, circula o M.
A – Já circulei já.
(...)
P – O primeiro com o nome caju... A primeira letra do nome caju. Circula! A primeira letra do
nome caju!
A – C!
P – A primeira! Circula!
A – C!
P – E a primeira letra do nome ―CACAU‖?
A – C!
P – Circula a primeira letra do ―cacau‖!
A – J! O outro é J!
P – Psiu, silêncio! Um momentinho. Qual a primeira letra do nome coco? Circula!
A – C!
A – Eu já terminei tudinho.
P – E a primeira letra do nome ba-na-na? Circula!
134
A – B!
P – Muito bem! A primeira letra do nome...
A – J!
P – Jaca! J!
A – Eu já circulei.
A – Circulei.
P – Na última vai ser um ―X‖. Aí é para marcar um ―X‖ na última letra da palavra manga! Qual
é a palavra qual é?
A – A!
(Aula 01, Professora B)
No extrato de aula acima, podemos perceber que a docente realizou várias
perguntas em torno da letra inicial e final do nome das frutas, promovendo, dessa forma,
situações de didáticas em que os alunos foram solicitados a nomear algumas letras do
alfabeto.
A partir do fragmento dessa aula, também observamos que a professora não
seguiu fielmente a legenda proposta pelo livro didático, pois solicitou que os alunos
circulassem com lápis a primeira letra e marcassem um ―X‖ na última letra das palavras.
A partir desses dados, consideramos que as duas docentes promoveram situações
didáticas favoráveis para construção do conhecimento em torno das letras do alfabeto.
Sobre esse aspecto, Albuquerque e Leite (2010) pontuam que reconhecer e
nomear as letras do alfabeto é uma habilidade que pode ser dominada pelos aprendizes
independente de estarem alfabetizados. Por outro lado, as autoras pontuam que:
O conhecimento das letras se não é um fator determinante no processo
de apropriação da escrita, com certeza pode contribuir na medida em
que os alunos, ao interagirem em diferentes situações de escrita e uso
das letras, começam a perceber as propriedades do nosso sistema de
escrita alfabética no que se refere ao uso das letras para representar a
sequência sonora das palavras com as quais convivem. (p.97)
Assim como as autoras, concordamos que o conhecimento em torno das letras
pode auxiliar os alunos no processo de reflexão das propriedades que envolvem o
sistema de escrita, por isso cabe ao docente planejar situações didáticas que explorem
essa habilidade, tendo em vista que, a partir delas, os educandos podem avançar na
aquisição da língua materna.
A seguir, analisaremos situações de ensino em que o direito de reconhecer
diferentes tipos de letras em textos de diferentes gêneros e suportes textuais foi
explorado.
135
6.1.3 Direito: reconhecer diferentes tipos de letras em textos de diferentes gêneros e
suportes textuais
O direito de reconhecer diferentes tipos de letras em textos de diferentes gêneros
e suportes textuais foi contemplado apenas pela professora B, na aula 02 (dois), a partir
do livro didático de Letramento e Alfabetização.
Na figura 22, podemos visualizar a atividade do livro didático que a docente
utilizou para explorar os formatos variados que uma mesma letra pode apresentar.
Figura 22 – Atividade do livro didático de Letramento e Alfabetização
Essa atividade é formada por duas questões: na primeira questão há duas
perguntas que buscam sondar os conhecimentos prévios dos alunos a respeito da
temática que será tratada na questão seguinte; Na segunda questão, há o trecho da
cantiga popular ―Roda Pião‖ para que os estudantes cantem junto com o professor e
demais colegas da turma o gênero textual apresentado. Também podemos perceber na
página do livro que a letra ―P‖ é exposta na versão maiúscula e minúscula e em
diferentes formatos.
Conforme mencionamos, o uso dessa atividade ocorreu na aula 02 (dois) e
através desse recurso a professora fez algumas indagações, referindo-se a cantiga
presente no LD: ―O que é que está dizendo aqui nesse texto? O que é que está dizendo?
Isso é o que?”. Após ouvir as respostas dos estudantes, a docente pontuou que o texto
era uma música e uma brincadeira infantil. Na sequência, com os discentes organizados
136
individualmente, a educadora enfatizou a palavra ―pião‖ e perguntou aos mesmos que
outras palavras têm o P de ―pião‖. Em seguida, a professora registrou no quadro as
respostas dos educandos, produzindo uma lista de palavras em que a letra ―P‖ estava
presente.
Como podemos observar a produção coletiva da lista de palavras não foi uma
atividade proposta pelo livro didático. No entanto, compreendemos que esse foi o
recurso que subsidiou essa situação de ensino.
Ao realizar essa atividade percebemos que a professora levou os alunos a pensar
nas letras e seu valor sonoro com o objetivo de escrever palavras e, além disso,
propiciou momentos de reflexão em torno dos diversos tipos de letras. O fragmento da
aula abaixo ilustra como a docente explorou o direito discutido nesse subtópico.
P – Agora eu posso escrever... Silêncio, por favor! Agora eu posso escrever com essa letra
bastão ou com o ―p‖ assim, olha. Assim com o ―P‖ e assim com o ―A‖. É a letra com a
outra forma. Mas é o mesmo ―P‖ e o mesmo ―a‖. Vocês lembram que a gente já estudou que a
letra pode apresentar várias formas? Eu tenho o ―P‖ assim, eu tenho o ―p‖ assim, eu tenho o
―P‖ assim, eu tenho esse ―P‖ do livro, eu tenho ―P‖ maiúsculo... Então, cada letra do alfabeto a
gente pode escrever de formas diferentes. Eu tenho o ―N‖ assim, o ―n‖ assim, assim e
assim. Quatro tipos da mesma letra. (Nesse momento a professora registrou no quadro
diferentes tipos de letras)
A – Tia, eu tenho mais uma...
A – Tia, paleta!
A – Tia, pipa!
P – Vamos refletir sobre ela...
A – Pipa, peteca.
(Aula 02, professora B)
No fragmento dessa aula, percebemos que a professora explicou aos alunos que
uma letra pode ser representada por formatos diversos (maiúscula, minúscula, bastão e
etc.). Leal e Morais (2010) afirmam que esse é um dos conhecimentos a importante para
ser contemplado no processo de alfabetização.
Batista (2005) e Morais (2012) afirmam que, do ponto de vista da leitura, as
letras de imprensa maiúscula são mais fáceis de serem reconhecidas e, do ponto de vista
da escrita, são mais simples de serem traçadas pelos alunos que estão no processo inicial
de alfabetização.
Assim como esses autores, concordamos que as letras escritas em imprensa
maiúscula facilitam o reconhecimento das mesmas e, consequentemente, favorecem
durante os momentos de leitura. Entretanto, não podemos negar que, desde muito cedo,
inclusive antes de chegar à escola, os alunos têm contato com os diferentes tipos de
137
letras. Isso porque as variações das mesmas, sejam as letras de imprensa ou cursivas,
estão presentes nos diversos gêneros e suportes textuais que circulam na sociedade
(BATISTA, 2005, ALBUQUERQUE e LEITE, 2010, MORAIS, 2012).
Nesse sentido, é importante que os educandos compreendam que uma letra pode
ser representada na forma maiúscula ou minúscula e que ―as letras têm formatos fixos e
pequenas variações produzem mudanças em sua identidade (p, q, b, d), embora uma
letra assuma formatos variados (P, p, P, p)‖ (MORAIS, 2012, p.51), conforme foi
explorado pela professora.
No entanto, ressaltamos que a reflexão sobre os tipos de letras em torno dos
diversos gêneros e suportes textuais não foi promovida pela docente. Desse modo,
concordamos com Batista (2005, p.47) que é preciso:
Propiciar aos alunos o manuseio de escritos diversos, impressos e
manuscritos, perguntando-lhes em que gêneros de texto e em que
suportes existentes na sociedade se podem encontrar exemplos de
cada tipo de escrita, pedindo lhes que classifiquem as letras quanto a
suas características gráficas. Com isso, além de lidar com a
diversidade de tipos de letras, o professor estará criando oportunidades
para que os alunos ampliem seus conhecimentos sobre a natureza e
usos sociais da escrita no mundo letrado.
Diante disso, reiteramos que os aprendizes em processo de alfabetização
precisam refletir sobre a diversificação de tipos de letras a partir dos diferentes gêneros
e suportes textuais que circulam socialmente, pois os formatos das letras estão,
geralmente, ligados aos gêneros textuais específicos. Nessa perspectiva, consideramos
que esse é um aspecto que pode ser explorado através das práticas sociais, tendo em
vista que, por exemplo, um bilhete é escrito, provavelmente, com letra cursiva e as
Histórias em Quadrinhos (HQ) são escritas com letras maiúsculas em bastão. Portanto,
consideramos que a partir da exploração das práticas sociais os professores podem
chamar a atenção das crianças para percepção dessas diferenças.
A seguir, detalharemos as situações didáticas com foco no direito de
compreender que palavras diferentes compartilham certas letras.
138
6.1.4 Direito: compreender que palavras diferentes compartilham certas letras
Um dos conhecimentos que os alunos em processo de alfabetização precisam
compreender é que palavras diferentes podem compartilham certas letras. Identificamos
nas práticas das docentes que o direito de compreender que palavras diferentes
compartilham certas letras foi privilegiado durante as aulas através das situações de uso
do livro didático.
Na prática da professora A, observamos que esse direito de aprendizagem foi
explorado na aula 02 (dois) a partir da atividade exposta na figura 23.
Figura 23 – Atividade do livro didático de Letramento e Alfabetização
Nessa atividade os alunos precisavam encontrar a palavra intrusa presente em
cada lista dos quadros e, em seguida, o professor, segundo à orientação da atividade,
deveria promover uma discussão com a turma sobre o porquê das palavras encontradas
serem intrusas.
Como podemos perceber, as orientações dadas na atividade não estão voltadas
para percepção de que palavras diferentes compartilham certas letras, o livro está
levando em conta a categoria semântica. O primeiro quadro deveria ser composto por
nomes de pessoas, o segundo por nome de animais e o terceiro por nome de frutas. A
atividade, por si só, poderia induzir o aluno ao erro no terceiro quadro, pois o aluno
poderia achar que CAJU seria intrusa por começar com uma letra diferente das demais
palavras do quadro.
Apesar da orientação da atividade estar voltada para as questões semânticas,
enquadramos no trabalho com o direito perceber que palavras diferentes compartilham
certas letras porque a professora, durante a mediação da atividade, também contemplou
o direito discutido nesse tópico. Isso nos dá um indício de que o docente pode
139
extrapolar as orientações dadas nas atividades do livro didático e, com isso, fazer
intervenções sobre o conhecimento que deseja explorar.
Ao iniciar essa atividade a professora A informou aos alunos que em cada lista
havia uma palavra intrusa que precisava ser descoberta e, em seguida, solicitou aos
mesmos a leitura das palavras. Nesse momento, os estudantes que já conseguiam ler,
estabelecendo a relação da pauta sonora ao escrito, fizeram a leitura das palavras e
descobriram com facilidade qual era a palavra intrusa em cada lista. Além da
―descoberta‖ da palavra, a docente perguntou aos educandos porque as palavras eram
intrusas e os mesmos responderam fazendo relação ao grupo semântico a que pertencem
as palavras. Após promover essas discussões, a educadora levou os alunos a perceber
que palavras diferentes podem compartilhar certas letras, conforme podemos observar
no fragmento da aula 02 (dois):
P – O que é que essas palavras têm de igual. Todas têm. Tem uma coisa igual em todas as
palavras. Quem sabe me dizer o que é?
A – janela!
P – Eu quero saber. Olhem para elas aí.
Aluno – Joelho!
P – Todas têm joelho? Todo mundo olhando para elas. O que é que elas têm de igual? Todas
têm uma coisa!
A – Duas terminam com ―A‖.
A – E duas com ―J‖.
P – Todas têm uma coisa igual.
A – ―J‖.
P – ―J‖, muito bem. Todas têm a letra ―J‖, minha gente.
(Aula 02, professora A)
No fragmento de aula acima observamos que a docente perguntou aos alunos o
que as palavras da lista tinham em comum, referindo-se ao fato de todas terem a letra
―J‖. Também notamos que os estudantes perceberam que, além da ―J‖, a letra ―A‖ se
repetia nas palavras.
Na prática da professora B percebemos que os alunos foram levados a refletir
sobre o direito de compreender que palavras diferentes compartilham certas letras nas
aulas 01 (um), 02 (dois) e 06 (seis) através do livro didático. Para mobilizar esse direito
a docente realizou na aula 01 (um) uma atividade de identificação de palavras que
compartilham da mesma letra inicial e final. Na aula 02 (dois) esse direito foi
contemplado durante a produção coletiva de uma lista de palavras e na aula 06 (seis)
através de uma atividade de identificação de rimas em poemas.
140
Para compreendermos como a professora B explorou esse direito detalharemos
os encaminhamentos feitos por ela na aula 01 (um). Nessa aula, a docente realizou com
os alunos a atividade apresentada na figura 24, conforme podemos observar abaixo:
Figura 24 – Atividade do livro didático de Letramento e Alfabetização
De acordo com as orientações da atividade, os estudantes precisam organizar as
palavras manga, caju, cacau, coco, banana e jaca no quadro, copiando as palavras que
começam com a mesma letra na primeira coluna e as palavras que terminam com a
mesma letra na segunda coluna. É importante destacar que a proposta da atividade
apresentava duas palavras (cacau e caju) que compartilhavam a mesma letra inicial e
final, o que poderia promover confusão no momento da discussão em sala.
Durante a realização dessa atividade a educadora perguntou aos alunos os nomes
das frutas que iniciavam e terminavam com a mesma letra. Em seguida, a partir das
respostas dos aprendizes, organizou as palavras caju, cacau e coco na primeira coluna e
manga, banana e jaca na segunda coluna. O fragmento da aula 01 (um) evidencia que a
docente levou os alunos a refletir sobre o conhecimento de que palavras diferentes
compartilham certas letras, conforme podemos observar abaixo:
P – Aqui vocês vão escrever as palavras que começam com a mesma letra e terminam com a
mesma letra.
(...)
A – Tia?
A – Jaca!
P – Quem começa com a mesma letra aqui? Quem começa com a mesma letra?
A – Caju!
P – Caju... E o que mais?
A – Cacau!
P – Você vai escrever essas três. Você vai escrever essa, essa e essa que começa com a mesma
letra. C, c e c.
141
(...)
P – Caju começa com ―c‖, cacau e coco. A mesma letra!
A – Eu já sei!
A – Eu também!
P – São os que terminam com a mesma letrinha, olha. Manga, banana e jaca. Esse aqui olha...
Esses daqui... Que começa com a letra C. E aqui, olha. Manga, banana e jaca são para esse
quadradinho aqui... Esses começam com a mesma letra. Aqui, olha, começa com a mesma letra
e aqui terminam com a mesma letra. Começam com as letras iguais. Olha aqui! As três iguais e
termina com a letra igual. Igual, igual e igual. As outras começam com ―C‖. Aqui, todas
terminam com ―A‖. Letras iguais no começo, no início e letras iguais no final.
(Aula 01, professora B)
A partir do fragmento de aula acima, identificamos que os alunos são levados a
perceber que as palavras das atividades compartilham a mesma letra inicial e final, por
isso consideramos que o direito de aprendizagem discutido nesse subtópico foi
mobilizado pela docente,
A seguir, analisaremos situações didáticas em que o direito de perceber que
palavras variam quanto ao número, repertório e ordem das letras foi contemplado.
6.1.5 Direito: perceber que palavras variam quanto ao número, repertório e ordem
das letras
Um dos conhecimentos que os aprendizes precisam dominar, no processo de
alfabetização, é o de perceber que palavras variam quanto ao número, repertório e
ordem das letras. Para tanto, cabe ao professor promover diversas situações didáticas em
que os estudantes sejam levados a contar, identificar e perceber a ordem e o repertório
das letras nas palavras.
Durante o período de observação, percebemos que apenas a professora B
contemplou esse direito de aprendizagem através de atividades voltadas para a reflexão
sobre o repertório e ordem das letras presentes no livro didático. Para compreendermos
como a exploração desse direito de aprendizagem ocorreu na prática da professora B,
apresentamos a atividade (Figura 25) realizada na aula 07 (sete).
142
Figura 25 – Atividade do livro didático de Letramento e Alfabetização
Nessa atividade os estudantes precisam copiar em cada lacuna as palavras
correspondentes ao nome dos objetos, retirando a letra em destaque na cor vermelha,
com o objetivo de formar novas palavras e, em seguida, produzir um desenho dentro do
quadrado para representar a nova palavra formada.
É importante destacar que tal atividade foi realizada, inicialmente, na aula 06
(seis) e retomada na aula 07 (sete). Segundo a docente, foi preciso retomar a atividade,
pois alguns alunos não prestaram atenção e muitos não haviam concluído na aula 06
(seis). Uma das hipóteses que levantamos para os estudantes se comportarem desta
forma, ficando desatentos, pode estar relacionada com o quantitativo de atividades que
já haviam sido realizadas na aula 06 (seis).
No fragmento da aula 07 (sete), a partir da atividade apresentada na figura 25,
podemos perceber como a educadora contemplou o direito discutido nesse subtópico:
P – A gente está vendo a lição da letrinha...
Alunos – P!
P – Da letrinha...
Alunos – P!
P – A gente viu que se a gente mudar de posição o que é que acontece? Se a gente mudar uma
letrinha ou mudar de posição o que é que acontece? A gente viu o que?
(...)
P – Olha para cá! Essa letrinha está vermelha e diz assim: ―escreva a palavra tirando a letrinha
que está em vermelho‖.
A – F!
143
P – Tirando a letrinha que está em vermelho... E o que é que a gente fez? A gente vai escrever.
Silêncio! Só a minha voz! A gente vai escrever! Eu escrevi, mas a gente não vai ter essa letrinha
que ele pediu para tirar. Que letrinha é essa?
Alunos – I!
P – Então eu tenho ―pi-ano‖.
A – Piano!
P – Pra-to! Pos-te! Eu vou escrever sem essa letrinha... Como é que vai ficar? Olha, qual é a
letra que eu vou botar? Qual é a letra que eu vou botar?
A – O!
A – P!
P – P e depois?
Alunos – A!
P – Para virar... ―A‖ e depois?
A – N!
Alunos – O!
Alunos – Pa-no!
P – Formou qual?
A – Pano!
P – Então, se a gente tirar uma letrinha a gente muda a palavra. Era piano... Mas o que
aconteceu?
A – Piano!
P – Formou o que?
A – Formou pano! P e A!
P – Eu tinha pra-to! Pra! Que letrinha é essa?
A – R!
P – Eu vou escrever sem o R agora...
A – P!
P – Isso! P e o que mais?
A – A!
P – A!
A – T!
A – O!
P – O!
A – To!
P – Se a gente tira uma letra a gente muda uma palavra. Pa...
A – To!
P – E agora? Esse aqui é para tirar qual letra?
A – S!
A – P, o...
P – P e O... T e...
Alunos – E!
Alunos – Pote!
P – Olha só, é por isso que quando a gente vai escrever a palavrinha ou o nome da figura eu não
posso mudar a ordem das letras. Se eu tenho BO-LA, B, O, L e A. Eu só posso escrever nessa
ordem, se eu troco a letra eu mudo a palavra. Se eu trocar a letra eu mudo a palavra, se eu tiro a
letra eu também mudo a palavra. Se eu tirar uma letra eu também mudo a palavra, vira outra
palavra. Se eu trocar a posição da letra eu também posso transformar em outra palavra.
(Aula 07, professora B)
No fragmento da aula, podemos perceber que a educadora levou os alunos a
reconhecer e nomear as letras do alfabeto presentes na atividade e, além disso,
promoveu reflexões em torno do repertório e da ordem que as letras podem vir nas
palavras. Também percebemos que a professora enfatizou o princípio de que a ordem
144
das letras é importante para definição das palavras. O exemplo da palavra ―BOLA‖
mencionado pela própria docente evidencia que é preciso estar atento para ordem das
letras, uma vez que, a partir das letras B, O, L e A, também podemos formar a palavra
―LOBA‖. Nesse momento, os alunos também perceberam que a retirada de uma letra na
palavra pode transformá-la em outra.
A seguir, analisaremos ações didáticas em que o direito de segmentar oralmente
as palavras e comparar palavras quanto ao tamanho foi mobilizado.
6.1.6 Direito: segmentar oralmente as palavras e comparar palavras quanto ao
tamanho
As situações didáticas envolvendo o direito de segmentar oralmente as palavras
e comparar palavras quanto ao tamanho são importantes para os alunos que estão em
processo de apropriação do sistema de escrita alfabética, pois auxiliam os mesmos a
compreender que as palavras são formadas por unidades menores (sílabas) e contribuem
para os estudantes que estão nas etapas iniciais de alfabetização, possibilitando o avanço
dos mesmos em suas hipóteses de escrita.
Como podemos observar no quadro 06, a professora A não contemplou esse
direito a partir das situações de uso do livro didático. Já a professora B explorou esse
direito em apenas uma aula através do livro didático. Entretanto, ressaltamos que esse
foi um direito explorado em outras situações de ensino promovidas pela professora B,
tomando como referência recursos didáticos não distribuídos pelo Ministério de
Educação.
Para contemplar o direito discutido nesse subtópico, a docente realizou junto
com os alunos a segmentação oral das palavras manga, caju, cacau, coco, banana e
jaca através da atividade do livro didático (Figura 21), já citada anteriormente. O
extrato da aula 01 (um) ilustra como essa docente mobilizou o conhecimento que
envolve a segmentação oral das sílabas das palavras.
P – Vamos dividir olha... Ca-ju! Quantas sílabas?
Alunos – Duas! Duas! P – Olhe para seu livrinho! Vamos pensar na palavra e na sílaba. Preste atenção que você não
erra. Você fica conversando aí erra.
A – Eu não tenho lápis nem borracha não!
P – Olha só, tem gente que não está fazendo correto que eu já olhei. Eu tenho que dividir a
palavra. Presta atenção! Não é só circular não! O próximo quem vai ler é... Vamos ler! Presta
atenção!
145
(...)
A – Ca-cau!
P – O que é isso aqui?
A – C e A! C e A!
A – C e A!
P – Primeiro se pensa antes de falar. Ca...
Alunos – Cacau!
P – Olha, qual é a palavrinha?
A – Cacau!
A – Cacau!
A – Cacau!
P – Ca-cau!
A – C!
P – Ca-cau! Quantas?
A – Três!
A – Duas!
A – É três! É três né, tia? É três, tia!
P – Olha, a gente não fala ca-ca-u, não! A gente fala cacau! Ca-cau! Olha, ca-cau! O próximo
aqui...
A – É cacau é?
A – Tia, co-co!
P – Co-co! A gente está falando de fruta. Co-co, co-co! Co-co! Co-co! Duas sílabas aqui. A
gente vai ver... Co-co!
A – Coco!
(...)
P – A próxima frutinha é? A próxima quem é?
A – Banana!
P – A próxima quem é?
A – Banana!
A – Banana!
P – Banana! Ba-na-na!
A – Eu já dividi!
P – Quantos pedacinhos?
A – Quatro!
A – Três!
A – Três!
P – Ba-na-na!
A – Três!
P – Três! Banana!
(Aula, 01, professora B)
Como podemos identificar no fragmento da aula 01 (um), durante a leitura do
nome das frutas, a docente solicitou aos alunos a segmentação oral das sílabas que
compõe as palavras e fez a reflexão sobre a quantidade de sílabas presente no nome das
frutas. Nessa ação didática, a professora estava atenta às respostas dos alunos, fazendo
intervenções sobre a quantidade de sílabas presente nas palavras, como, por exemplo,
em ―cacau‖.
146
Outro aspecto que merece ser destacado é o fato de a docente ter realizado a
segmentação oral das palavras mesmo sem a atividade do livro didático ter apresentado
essa finalidade. Mais uma vez percebemos que a professora B extrapolou as orientações
propostas pela atividade do livro didático em busca de contemplar os seus objetivos de
ensino. Ao analisarmos outras situações didáticas promovidas pela professora B
percebemos que a promoção de novas orientações, para além do que era solicitado no
livro didático, era algo recorrente na prática dessa docente. Diante disso, não podemos
deixar de negar que essa forma de conduzir as atividades pode ser muito enriquecedora
para as crianças que estão em processo de aquisição do sistema alfabético, pois
possibilita que as mesmas reflitam sobre diversos conhecimentos e propriedades
vinculadas ao sistema de escrita alfabética.
A seguir, analisaremos situações de ensino em que o direito de identificar
semelhanças sonoras em sílabas e em rimas foi mobilizado.
6.1.7 Direito: identificar semelhanças sonoras em sílabas e em rimas
As docentes promoveram situações didáticas voltadas para o direito de
identificar semelhanças sonoras em sílabas e em rimas em quatro aulas, sendo uma da
professora A e três da professora B.
Na prática da professora A percebemos que esse direito foi contemplado apenas
na aula 02 (dois) através da atividade apresentada na figura 26.
Figura 26 – Atividade no livro didático de Letramento e Alfabetização
A atividade acima é formada por duas questões e, a partir deles, os aprendizes
podem ser levados a refletir sobre os sons finais (rimas) e iniciais (aliterações). No
147
quesito nº 02 o desafio é identificar as palavras que não rimam com ―jacaré‖ e, para
isto, torna-se necessário analisar quais palavras rimam com o nome deste animal. A
partir do quesito nº 03, o professor pode levar os alunos a comparar a semelhança
gráfica e sonora dos nomes próprios JOSÉ e JÚLIA, tendo em vista que compartilham
do mesmo fonema inicial.
No momento em que a professora A realizou a referida atividade do livro
didático os alunos estavam agrupados em duplas. Durante as observações, percebemos
que esse tipo de agrupamento esteve presente em quase todas as aulas. Possivelmente,
esse tipo de organização não era formado pela docente com fins didáticos, pois, em
muitos momentos, foi possível perceber que a educadora não circulava entre os alunos e
também não estimulava de forma direta a interação entre as duplas. Quando as crianças
entravam em sala, no turno da manhã, se dirigiam para as cadeiras já organizadas em
duplas sem ter, necessariamente, a intervenção da professora. Ou seja, os alunos
sentavam nas cadeiras de forma aleatória e depois ouviam as orientações da docente a
respeito da aula. Uma das hipóteses que levantamos para que as cadeiras sempre
estivessem organizadas da mesma forma, nesse caso, em duplas, pode estar relacionada
com o espaço físico da sala versus o quantitativo de estudantes. Desse modo, a
manutenção das cadeiras da mesma forma poderia ser uma tentativa da docente em
acomodar várias crianças e o total de mobiliário na sala.
No início da atividade acima, a docente fez a leitura das palavras presentes no
quesito nº 02 e, em seguida, realizou perguntas com o objetivo de saber se os alunos
identificavam as palavras da atividade que rimavam com ―jacaré‖. Posteriormente, a
partir das respostas dos discentes, a educadora registrou no quadro as palavras que não
rimavam com o animal elencado na atividade para que os estudantes pintassem os
quadrinhos. No momento seguinte, a docente leu o enunciado do quesito nº 03 e, em
seguida, deu pistas para que os alunos descobrissem as sílabas que faltavam para
completar os dois nomes próprios presentes na atividade.
Como é possível perceber, a própria natureza da atividade contempla as
semelhanças sonoras em sílabas e em rimas, podendo, desta forma, ser um recurso
favorável para promoção de reflexões sistemáticas em torno dos conhecimentos que
envolvem o direito de aprendizagem discutido nesse tópico.
No fragmento da aula 02 (dois), podemos observar como a docente explorou o
direito discutido nesse tópico através dessa atividade do livro didático.
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P – Aí, ele está pedindo... Leia essas palavras que estão nesses quadrinhos e pinte as que não
rimam com o nome...
A – Jacaré!
P – Ja-ca-ré! A gente vai ler as palavras... O que terminar parecido com JACARÉ a gente não
vai pintar, está certo?! Jacaré e chulé parecem?
P – Não parece o final?
Alunos – Parece!
P – Se eu falar ―jacaré‖ e ―Kauã‖? Parece?
Alunos – Não!
P – E jacaré e Yarley? Parecem?
Alunos – Não!
P – E se eu falar ―jacaré‖ e ―até‖? Parece?
Alunos – Parece!
P – Porque os dois terminam com ―É‖, né?! Então, vamos lá, jacaré e chulé... Parecem?
Alunos – Parece!
P – Parece! Jacaré e chulé! E os dois terminam com ―É‖ acentuado, olha! Eles têm o finalzinho
igualzinho. Se eu quiser rimar, olha, o jacaré tem chulé! Não rima?!
A – E café também!
P – E o café também! O jacaré toma café! Rimou?
Alunos – Rimou!
P – Então, não pinta e não pinta. Agora, eu quero ver com a palavra ―você‖. Vamos lá, o
―jacaré‖ e ―você!‖ Rimam?
Alunos – Não!
P – Por quê? Porque, olha, ―ja-ca-ré‖ o som é bem aberto e ―vo-cê‖ é fechado, aí não rima.
Pintem aí a palavra ―você‖.
A – Aonde?
P – Onde tem a palavra ―vo-cê‖ pinta. Vamos continuar, o jacaré tem um buscapé. Rima?
A – Rima!
P – Rima! Então, não pinta. Agora, o jacaré é um jiló. Rima?
Alunos – Não!
P – Não, porque não termina igual, né?! Então, pinta a palavra ―jiló‖. Agora, jacaré rima com
até?
A – Não.
P – Vamos ver, olhem aí!
Alunos – Rima!
P – Jacaré e até! Então não pintem. E jacaré rima com mané? Se eu falar o jacaré rima com
mané? Rima?
A – Não!
P – Rima!
Alunos – Rima!
P – Porque os dois têm a mesma terminação, olha. JA-CA-RÉ e MA-NÉ! Agora se eu falar,
―jacaré‖ e ―Amanda‖? Rima?
Alunos – Não!
P – Porque tem a terminação diferente. Vamos outro aqui, jacaré e chapéu!
Alunos – não.
P – Não rima porque termina com ―U‖, né? Então, pinta o chapéu! E por último, jacaré rima
com pé?
A – Rima!
A – Rima!
P – Não pinta também!
A – Professora é para pintar o chapéu?
P – É! Você, chapéu e jiló!
A – Eu vou pintar ―você‖.
A – São só os que não rimam.
(Aula 02, professora A)
149
No fragmento de aula acima, percebemos que a docente promoveu uma
discussão em torno das rimas. Para explorar esse conhecimento ela perguntou aos
alunos se as palavras ―jacaré‖ e ―chulé‖ rimavam e, em seguida, a partir das respostas
dos discentes, perguntou se ―jacaré‖ rimava com o nome de alguns estudantes. Nesse
momento, a educadora promoveu intervenções em sala para que os alunos
compreendessem porque determinadas palavras rimavam ou não com o nome do animal
explícito na atividade.
Dessa forma, consideramos que a escolha e uso dessa atividade do livro didático
foram favoráveis, pois possibilitou que os estudantes percebessem que palavras
diferentes podem possuir partes sonoras iguais, nesse caso as rimas.
Para promover uma maior sistematização em torno desse conhecimento, a
educadora poderia sinalizar que os sons iguais presentes nas palavras têm, na maioria
das vezes, relação com as letras que são grafadas. Ou seja, palavras que apresentam
semelhanças sonoras geralmente compartilham as mesmas letras. Além disso, a docente
poderia promover intervenções em que os estudantes fossem solicitados a explicitar
outras palavras que rimavam com ―jacaré‖ e compará-las quanto às semelhanças
gráficas.
Na prática da professora B evidenciamos que o direito de identificar
semelhanças sonoras em sílabas e em rimas através das situações de uso do livro
didático foi contemplado em mais aulas do que a professora A. Identificamos nas aulas
02 (dois), 06 (seis) e 07 (sete) da professora B situações didáticas voltadas para
exploração desse direito. É importante ressaltar que, durante essas situações de ensino, a
docente fez a mediação das atividades e organizou os alunos em dupla.
Na aula 02 (dois), a educadora possibilitou que os alunos refletissem sobre as
semelhanças sonoras presentes em sílabas através da produção coletiva de uma lista de
palavras. Na aula 06 (seis) e 07 (sete) a docente realizou atividades do livro didático
voltadas para identificação e produção de rimas em poemas e escrita de palavras em
lacunas.
Em busca de compreendermos mais detalhadamente como a professora B
promoveu intervenções em sala para contemplar o direito de aprendizagem que vem
sendo discutido nesse tópico, detalharemos a atividade desenvolvida na aula 06 (seis),
conforme podemos observar na figura 27.
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Figura 27 – Atividade no livro didático de Letramento e Alfabetização
Fonte: Vieira (2015)
A atividade acima é formada por dois quesitos. No primeiro, o quesito nº 09,
segundo as orientações do livro didático, o professor pode ler o trecho do poema ―Rima
ou combina?‖ e, em seguida, pode sugerir aos alunos a leitura coletiva com os demais
colegas da turma e a comparação das palavras quanto às semelhanças sonoras e gráficas.
Ainda nesse quesito, observamos a presença de ilustrações que podem dar pistas aos
alunos que estão nas hipóteses de escrita mais iniciais sobre o que está sendo exposto no
trecho do poema. O quesito nº 10 envolve a escrita do nome das figuras em cada lacuna
da atividade. Com esse recurso, o professor pode promover um trabalho envolvendo a
comparação das palavras quanto às semelhanças sonoras e possibilitar discussões em
que os aprendizes resgatem seus conhecimentos prévios e realizem inferências com o
objetivo de compreender porque as palavras combinam ou não. Inclusive, essas foram
intervenções feitas pela professora B.
O fragmento da aula 06 (seis) ilustra como a docente realizou a atividade que foi
apresentada acima e contemplou o direito de aprendizagem que vem sendo discutido.
P – Aqui está dizendo assim: acompanhe a leitura e depois leia o poema! O poema daqui já vai
ter as rimas!
(...)
P – Que desenho eu tenho aí? Que desenho eu tenho aí? Bora?
Alunos – Rato!
P – A palavrinha rato no poema ela vai rimar com o que? Rato rima com? Olha o desenho, olha
o desenho! Rato rima com...
151
Alunos – Gato!
P – Vaca não rima com...
A – Pá!
P – O que é que tem na xícara? Veja o que rima e o que não rima. Rato rima com?
Aluno – Gato!
A – Gato! Gato! Isso é uma feijoada! (a resposta do aluno referindo-se a ilustração do café)
P – Você vai olhar e vai circular as palavras que rimam... Bora?
A – Pão rima com...
P – Rato rima com...
A – Gato!
P – Circulem a palavrinha gato e a palavrinha rato! Circulem aí no livro... Rato rima com gato!
Rima, mas não combina! Ele diz que rato rima com gato, diz que rima, mas não combina!
A – Gato rima...
P – Rimou? Circulou? Estou vendo, viu? Estou vendo!
A – Tia? Tia?
P – Circulou? Todo mundo repete! Rato rima com gato, rima, mas não combina! Todo mundo
repete!
A – Rato rima com gato!
P – Vaca não rima com café! Não rima, mas combina! Você procura a palavra vaca e vai passar
um traço embaixo, depois vai procurar a que não rima! Vaca não rima com café! Achou?
Achou?
A – Achei!
P – Aqui rima e aqui rima!
A – Gato e rato!
P – Rato e gato! Circulou? Circulou?
(...)
P – Bora? No dez está dizendo... Eu tenho o tracinho aí, tem o pião... Está vendo o tracinho aí?
É para escrever o nome pião!
(...)
P – Pião rima com... Qual é o outro desenho?
A – Pão!
(...)
P – Olha, por que rima? Olha, rima são os sons iguais!
A – Rima, mas não combina.
P – Presta atenção! Quando a gente fala PIÃO e PÃO. Pião e pão! Qual é a letrinha que está
igual aqui nas duas palavras?
Alunos – P, p, p!
A – O ―a‖ e ―o‖!
A – O ―ão‖!
P – ÃO, ÃO! Aqui na sala alguém tem o nome? Alguém tem o nome que rima com ―ÃO‖?
Tem nome que rima com ―ÃO‖?
A – Pião!
A – Pão!
P – Alguém tem o nome que rima com ―ÃO‖? Qual é o nome?
A – João!
P – Olha aqui, João e pão! ÃO! ÃO! ÃO! Por isso que rima... ÃO! ÃO! ÃO! Completou a
palavra que rima?
A – Eêêê!
P – É o som igual! Todo mundo vai repetir agora! Rato rima com gato!
152
A – Rato rima com gato!
P – Rato e gato! O mesmo pedacinho! Gato e rato! Mesma palavrinha, mesma letrinha e mesmo
som! Vaca não rima com café! Vaca não combina com café! Vejam aí que vaca não rima com
café! Por que não rima?
Alunos – Porque não tem as mesmas letras!
P – Não tem as mesmas letras! No final, no final, olha. Gato e rato! A mesma letra no final e o
mesmo som! Pião, pão e João! A mesma letra no final e o mesmo som! Mas quando chega em
vaca e café e carro não rima!
(...)
P – Pá rima com Pó?
Alunos – Não!
Professora – Por que não rima?
A – Porque não tem a letra P!
A – Por que não tem ―o‖.
P – Porque não tem o final! Porque elas são diferentes! A rima só acontece quando a letrinha é
igual no final da palavra. No final da palavra rima gato e pato! No final rima! Aqui, olha, ―A‖ e
―O‖. Letra diferente no final não rima!
(Aula 06, professora B)
No fragmento da aula acima, percebemos que a docente, após ter lido o
enunciado do quesito nº 09, informou, de imediato, aos alunos que havia rimas no
trecho do poema intitulado ―Rima ou combina?‖. Em seguida, a educadora perguntou
aos aprendizes quais eram as figuras presentes na atividade para que eles identificassem
as palavras que rimavam no poema. Posteriormente, orientou os discentes a circular as
palavras ―rato‖ e ―gato‖. Depois que os estudantes circularam as duas palavras que
rimavam, a docente informou que era para sublinhar as palavras ―vaca‖ e ―café‖.
No quesito nº 10 a educadora auxiliou os alunos na escrita do nome dos objetos
ilustrados na atividade através de perguntas sobre as letras que compõem as palavras
―pião‖, ―pão‖ e ―pá‖.
Durante a realização dessa atividade, observamos que a professora elaborou
novas orientações, além do que estava previsto no livro didático, com o objetivo de
promover situações didáticas voltadas para o reconhecimento e identificação das
semelhanças sonoras no final das palavras (rimas) e em torno das correspondências
entre as letras e seu valor sonoro com a finalidade de escrever as palavras solicitadas na
atividade.
Não restam dúvidas que essa situação de ensino foi importante para os alunos
que estão em processo de apropriação do sistema de escrita alfabética, tendo em vista
que, a partir dela, os aprendizes podem ter refletido sobre vários conhecimentos
imbricados aos direitos de aprendizagem que os estudantes que estão no 1º ano do
153
Ensino Fundamental precisam dominar. No entanto, salientamos que a docente não
promoveu discussões em torno do reconhecimento do gênero textual (suas
características e finalidades) e seu contexto de produção. Pelo contrário, já anunciou, no
momento da leitura do enunciado do quesito nº 09, que os aprendizes encontrariam
rimas sem refletir sobre o poema que seria lido.
No fragmento da aula 06 (seis) também percebemos que a professora afirmou
que a rima só acontece quando as letras são iguais no final. Entretanto, sabemos que
algumas rimas não são representadas pelas mesmas letras (exemplifique).
A seguir, analisaremos as situações de ensino em que os direitos de reconhecer
que as sílabas variam quanto às suas composições e o de perceber que as vogais estão
presentes em todas as sílabas foram mobilizados.
6.1.8 Direitos: reconhecer que as sílabas variam quanto às suas composições e o de
perceber que as vogais estão presentes em todas as sílabas
Nessa seção, discutiremos os direitos de reconhecer que as sílabas variam quanto
às suas composições e o de perceber que as vogais estão presentes em todas as sílabas,
pois consideramos que as atividades realizadas pelas professoras contemplavam, de
forma simultânea, os dois direitos de aprendizagem.
O reconhecimento de que as sílabas variam quanto às suas composições e o de
perceber que as vogais estão presentes em todas as sílabas são conhecimentos que os
aprendizes, em processo de alfabetização, precisam dominar, tendo em vista que
auxiliam na compreensão do sistema de escrita alfabética. Para tanto, cabem aos
docentes promover situações de ensino sistemático em busca de garantir aos alunos tais
direito às crianças.
Como podemos observar no quadro 06, esses direitos foram contemplados pelas
educadoras em três aulas através do uso do livro didático de Letramento e
Alfabetização, sendo duas aulas da professora A e uma da professora B.
Durante as observações, percebemos que a professora A realizou na aula 02
(dois) uma atividade do livro didático que envolvia a ordenação das sílabas com
objetivo de formar palavras e na aula 09 (nove) realizou outra atividade em que os
estudantes foram desafiados a substituir os símbolos por sílabas para formar palavras. A
154
seguir, detalharemos como essa docente contemplou esse direito na aula 02 (dois)
através da atividade apresentada na figura 28.
Figura 28 - Atividade do livro didático de Letramento e Alfabetização
O objetivo dessa atividade está voltado para a ordenação das sílabas em busca de
formar o nome de quatro animais, embora o enunciado da questão não explicite isso
com clareza. Através do uso desse recurso, o professor pode também auxiliar os
estudantes a ter consciência de que as palavras são formadas por unidades menores
(sílabas) e, além disso, pode promover reflexões em torno das diferentes estruturas
silábicas que compõem as palavras listadas.
No momento de realização dessa atividade em sala, a professora optou por
manter os alunos organizados em duplas e fez toda a mediação da atividade. O
fragmento da aula 02 (dois) ilustra como a docente conduziu a atividade e,
consequentemente, contemplou os dois direitos de aprendizagem discutidos nesse
tópico.
P – Vê só, a menina está fazendo um monte de bolhinhas, está certo? Das bolhas que ela está
soprando tem umas sílabas saindo. Vocês estão vendo?
Alunos – Humrrum.
P – Ela sopra umas bolhinhas...
A – E tem os nomes.
P – E tem umas sílabas, ok?!
A – JA-BU-TI!
A – JA-BU-LI!
P – Aí na primeira tem ―JA‖.
A – ―J e A‖
P – Aqui em cima tem que sílaba?
Alunos – B e U.
P – BU! B e U!
A – JABUTI!
155
P – E aqui embaixo tem que sílaba?
Alunos – TI!
P – Ti! Como é ―ti‖?
A – T e I.
P – Formou que nome?
Alunos – JABUTI!
P – Jabuti. Então, escrevam o nome lá embaixo na linha.
(...)
P – Vamos lá, outro nome?! Depois a menina soltou outra bolhinha e veio sílabas de novo.
A – M e E.
P – ―M e E‖ faz como?
A – ME!
P – Aqui é M e E e N, ―MEN‖.
A – Amém!
P – Depois tem o ―T e O‖. ―T e O‖ faz como?
Alunos – TO!
P – TO! E depois tem o...
A – ―J e U‖
P – Que faz como?
A – JU!
P – Quem sabe que nome forma?
A – Júlia!
P – Essas sílabas aí!
A – Juju!
P – Se fosse ―Juju‖ seria J e U e J e U.
A – Júlia.
P – Se fosse ―Júlia‖ seria J e U mais L e I e A. Quem consegue ler para mim?
A – Jabuti.
P – Juntando essas daqui a gente forma que nome?
A – JU-MEN...
A – TO!
A – MEN-TO-JU!
P – Eu vou ajudar vocês. É o nome de um animal.
A – Leão!
A – Macaco!
A – Cachorro!
P – Por acaso, aqui tem ―CA‖ de cachorro para ser cachorro?
Alunos – Não!
P – Tem que ser com essas letras daqui, olha.
A – Macaco!
P – Macaco não porque macaco começa com ―MA‖. Eu vou ajudar de novo vocês. Começa com
―JU‖.
A – Juliana!
P – Juliana é um animal?
Alunos – Não!
A – Jumento!
P – Jumento! Muito bem! JU-MEN-TO. Agora, olha. A menina soltou mais letrinhas ainda.
Bora ver? Nessa aqui debaixo ela soltou JA, CO e RU Qual foi o nome que formou?
A – Jacora!
P – Existe ―jacora‖?
Alunos – Não!
Alunos – Coragem!
P – É o nome de um animal também.
156
A – JA-CO!
A – Jacaré.
A – Jacaraco!
P – Tem que usar só essas sílabas aqui.
A – CORAJA!
P – Só pode usar o JA, CO e RU. Só esses daí.
A – Jacora.
P – Só que ―jacora‖ não é o nome de um animal.
A – Jacoja!
A – Cora!
A – Coruja!
P – Muito bem! Coruja! CO-RU-JA! E o último, quais são as sílabas? Me digam.
A – ―A‖, ―JI‖ e ―BOI‖!
P – A...
A – Jiboia!
P – JI-BOI-A! Qual é o nome?
Alunos – Jiboia!
P – Esse foi fácil, não foi?!
A – Fácil, fácil!
(Aula 02, professora A)
No fragmento da aula 02 (dois), observamos que os estudantes realizaram a
leitura das sílabas que formavam o nome dos animais na atividade e, em seguida,
explicitaram as letras que compõem cada sílaba. Também percebemos que a professora
fez perguntas com o intuito de que os alunos ordenassem as sílabas e,
consequentemente, realizassem a leitura das palavras presentes na atividade.
Nessa situação didática os estudantes, além de compreender que as palavras são
formadas por sílabas, puderam também refletir sobre as diferentes composições
silábicas presentes nas palavras ―jabuti, jumento, coruja e jiboia‖ e perceber que as
vogais estão presentes em todas as sílabas.
No que se refere à prática da professora B, percebemos que os direitos de
reconhecer que as sílabas variam quanto às suas composições e o de perceber que as
vogais estão presentes em todas as sílabas foram mobilizados pela docente através do
livro didático de Letramento e Alfabetização apenas na aula 01 (um).
A atividade do LD utilizada pela professora B foi apresentada na figura 14.
Através desse recurso, a educadora segmentou oralmente, junto com os alunos, as
palavras (nome das frutas) em sílabas. Posteriormente, registrou as palavras
segmentadas no quadro e depois chamou a atenção dos estudantes para o quantitativo de
letras que uma das sílabas apresentava. No fragmento de aula 01 (um), podemos
perceber como a docente explorou os conhecimentos que envolvem os dois direitos
discutidos.
157
P – Presta atenção em cada letrinha. Cada letrinha forma a sílaba. Ba-na-na! Co-co! Man-ga!
Tem três olha! Presta atenção! Caju! Presta atenção que tem sílaba que tem três, olha: man-ga!
Ca-ju! Co-co! Ba-na-na! O próximo quadradinho é qual é? Vamos ler, vamos ler? Tem aqui,
olha. Que palavra é essa? Vamos ver?
A – Caju!
P – Ju? Não tem ―Ju‖ aqui. Você só pode ler...
A – Ja-ca!
A – Jaca!
A – Jaca!
A – Jaca!
A – Eu falei primeiro!
P – Por que jaca? Porque tem o J e tem o A. J e A só pode ser ―ja‖, não pode ser je, nem ji, nem
jo e nem ju. Ja!
(Aula 01, Professora B)
Nessa situação didática a professora explicou aos alunos que as sílabas podem
variar quanto ao quantitativo de letras, conforme é possível observar no exemplo da
palavra ―manga‖. Dessa forma, consideramos que houve uma tentativa da docente em
promover reflexões em torno da quantidade de letras, no entanto não houve
intervenções mais direta em torno das combinações entre consoantes, vogais e
semivogais (CV, CCV, CVSv, CVvV, V, CCVCC...) que podem aparecer nas palavras.
A seguir apresentaremos as situações didáticas em que os direitos de ler,
ajustando a pauta sonora ao escrito e o de dominar as correspondências entre letras ou
grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a ler palavras e textos foram tomados
como objeto de ensino pelas professoras através do livro didático de Letramento e
Alfabetização.
6.1.9 Direitos: ler, ajustando a pauta sonora ao escrito e o de dominar as
correspondências entre letras ou grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a ler
palavras e textos
Ler, ajustando a pauta sonora ao escrito e dominar as correspondências entre
letras ou grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a ler palavras e textos são direitos
que estão totalmente relacionados, por isso mapeamos no quadro 06 as aulas em que os
alunos foram solicitados a ler a partir das situações de uso do livro didático de
Letramento e Alfabetização.
Como podemos observar, identificamos na prática da professora A três aulas em
que os direitos discutidos nesse tópico foram explorados. Na aula 01 (um), os alunos
foram convidados a ler o título de uma notícia apresentada no LD, na aula 02 (dois) a
158
educadora solicitou a leitura de palavras e na aula 09 (nove) pediu que os discentes
realizassem a leitura de um trava-língua. Em todas essas situações didáticas a docente
manteve os alunos organizados em duplas.
Para compreendermos como a professora A mobilizou esses direitos,
apresentamos a atividade realizada na aula 09 (nove), conforme podemos visualizar na
figura 29.
Figura 29 – Atividade no Livro didático de Letramento e Alfabetização
Nesta atividade temos o gênero textual (trava-língua) do ―Tatu‖ e logo abaixo
encontramos duas perguntas que estão relacionadas com as características deste gênero.
Durante a aula 09 (nove), percebemos que a professora A solicitou aos alunos a
leitura do gênero apresentado na atividade. O fragmento da aula abaixo ilustra as
intervenções da educadora na situação de uso deste recurso.
P – Qual é o nome desse texto aí? Quem consegue ler para mim?
A – Tatu!
A – Tatu!
A – Tatu!
P – E a primeira palavra para mim, olha. É essa aqui...
A – A-lô!
P – Alô, muito bem! Lê para mim?
A – A-lô tatu! Ta-qui não... Ta-tu não tá, mas a mu-lher...
P – Mulher do... Vai, termina. Quem quer terminar para mim?
(...)
A – O ta-tu...
P – Tando.
A – É a mes-ma...
P – Mesmo.
A – Mes-mo que o ta-tu tá.
159
P – Muito bem! Olha, Yarley leu para mim assim, olha. Alô? O tatu está ai? Não! O tatu não tá,
mas a mulher do tatu tando é o mesmo que o tatu tá.
A – Professora, o tatu tem naquele jogo do ABC... (Nesse momento, o aluno relembra a leitura
do livro “ABC dos animais” – obra complementar).
A – O tatu...
A – O jogo não, o livro do ABC.
A – A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, L, M, N, O, P, Q...
A – Esse negócio aí...
(Aula 09, professora A)
Como podemos observar no fragmento da aula 09 (nove), a docente solicitou
que os estudantes lessem o trava-língua presente no livro didático. Intervenções como
essas são importantes para os aprendizes que estão em processo de alfabetização, tendo
em vista que desafiam os indivíduos a compreender e dominar as correspondências
entre letras e seu valor sonoro. Também percebemos que o momento de leitura foi
promovido a partir de textos reais, nesse caso, de tradição popular.
A partir da análise, ressaltamos que, apesar da atividade apresentar alguns
elementos como, por exemplo, as perguntas a respeito do gênero apresentado, a
professora não promoveu discussões em torno da esfera de circulação, da finalidade e
das características do gênero textual lido.
No que se refere à prática da professora B também percebemos que os direitos
de ler, ajustando o escrito a pauta sonora e dominar as correspondências entre letras ou
grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a ler palavras e textos foram contemplados
nas aulas 01 (um), 07 (sete) e 10 (dez).
Na aula 01 a docente pediu que os alunos realizassem a leitura das palavras
presentes na atividade, na aula 07 os estudantes foram desafiados a ler estrofes de
poema apresentado no LD e na aula 10 realizaram a leitura de palavras que
correspondiam às respostas das adivinhas.
Na situação didática promovida pela docente na aula 07 através da atividade
apresentada a seguir (figura 30), podemos perceber como os dois direitos foram
contemplados em sala.
160
Figura 30 – Atividade do Livro didático de Alfabetização e Letramento
P – É a página 131! É a página 131!
A – Deixa eu ler?
A – Tia!
P – Comecei! Qual é o seu? Vamos pensar nas palavrinhas? Nesse quadradinho número 09...
Olha só, cada um vai olhar para o seu livro e vai um quadradinho que está aqui com o número
09 que tem nessa página. Leia a primeira estrofe do poema, leia a primeira estrofe do poema. No
quadradinho amarelinho você vai ler sozinho. Bora? No quadradinho amarelinho lendo, o
quadradinho amarelinho começou! Aqui, olha. Leia o seu, leia o seu. Aqui! Leia! Leu? O que é
que está escrito aí nesse quadradinho?
A – Tatu!
P – O tatu fez o que? É para ler! Fez o que? Ela vai ler! Silêncio!
A – Ta-tu...
P – Ela vai ler! Só quero ouvir a voz dela!
A – Ela vai ler o poema!
P – Vamos lá...
A – Tia! Tia!
P – Só quero ouvir a voz dela. Silêncio!
A – Um tatu de tatu... Não está nem aí.
P – Olha aí, estão vendo? Sentem! Ela vai ler de novo porque eu não ouvi. Silêncio! Ela vai ler
de novo, viu? Agora a gente tem que continuar a leitura!
A – Um tatu de Tatuí não está nem aí.
P – Olha aí! Obrigada.
A – Nem aí!
P – Todo mundo falando agora!
Alunos – Um tatu de...
P – De Tatuí...
Alunos – De Tatuí...
P – Não está...
Alunos – Não está...
P – Nem aí!
Alunos – Nem aí!
A – Nem aí!
P – As palavras rimaram?
Alunos – Rimaram!
P – Olha só! O tatu de Tatuí não está nem aí!
A – Nem aí!
P – Rimou ou não rimou?
A – Rimou!
P – Quais palavrinhas rimaram? Quais as palavras rimaram?
A – Tatu!
161
A – Tatu e Tatuí!
P – Circula a palavra TATU... Circula primeiro a palavra TATUÍ e AÍ. O tatu de Tatuí...
A – Aonde, tia?
P – Não está nem aí! No quadradinho amarelo! No quadradinho amarelo! No quadradinho
amarelo! O tatu de Tatuí não está nem aí! Agora...
A – Tia!
P – Agora a gente vai pensar nas outras atividades.
(Aula 07, professora B)
No fragmento da aula acima, os estudantes foram convidados a ler a estrofe do
poema presente na atividade do livro. Além de promover situações de ensino em torno
da leitura de palavras a educadora explorou alguns elementos presentes no texto, como,
por exemplo, as rimas.
Conforme sinalizamos, a partir de uma única atividade, vários direitos podem ser
mobilizados. Em relação às análises do uso do livro didático de Letramento e
Alfabetização, optamos por organizar as discussões por direito de aprendizagem com o
objetivo de apresentar, de forma mais detalhada, como cada direito foi contemplado
pelas professoras.
A seguir discutiremos o direito de aprendizagem de dominar as
correspondências entre letras ou grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a escrever
palavras e textos.
6.1.10 Direito: dominar as correspondências entre letras ou grupos de letras e seu
valor sonoro, de modo a escrever palavras e textos
Dominar as correspondências entre letras ou grupos de letras e seu valor sonoro,
de modo a escrever palavras e textos é um direito de aprendizagem que deve ser
introduzido, aprofundado com os alunos do 1º ano do Ensino Fundamental e
consolidado nos outros dois anos que compõem o ciclo da alfabetização. Para tanto,
cabe aos docentes promover situações de ensino voltadas para a reflexão das
propriedades que envolvem o SEA com o intuito de que os aprendizes avancem em suas
hipóteses de escrita e, finalmente, escrevam, de modo convencional, palavras e textos.
Corroboramos com Morais (2012) que ―as atividades de escrita de palavras (e de
frases e textos) são também atividades de leitura, porque, enquanto vão construindo
notações, seus autores tendem a reler o já produzido‖ (p. 156). No entanto, nesse
momento, optamos por apresentar os direitos de aprendizagem com foco na leitura
separado desse direito que envolve a escrita de palavras e textos.
162
Na prática da professora A, observamos que, durante a aula 02 (dois), houve
uma atividade de escrita de palavras através do uso do livro didático de Letramento e
Alfabetização. Lembramos que tal atividade já foi analisada anteriormente, tendo em
vista que, a partir dela, os alunos foram levados a nomear as letras que correspondiam
ao nome dos desenhos listados no livro. Nesse momento, os educandos foram
solicitados a estabelecer as correspondências entre grupos de letras e seu valor sonoro
com o objetivo de escrever o nome dos desenhos (JIPE, JANELA, CAJU e
CARAMUJO).
Durante as observações, identificamos em três aulas da professora B, situações
didáticas em que os alunos foram convidados a escrever palavras. Na aula 06 (seis) e 07
(sete), a docente pediu que os alunos escrevessem palavras em lacunas com o objetivo
de completar os poemas apresentados no livro didático. Na aula 06 os estudantes
tiveram o auxílio das figuras correspondentes às palavras que precisam ser escritas. Na
aula 07, os alunos escolheram, coletivamente, palavras para rimar com as palavras
presentes no poema e, em seguida, escreveram nas lacunas. Durante essas duas aulas,
observamos que a educadora auxiliou os alunos no momento da escrita, registrando no
quadro as palavras que precisavam ser escritas na atividade.
Na aula 10 (dez) os aprendizes foram convidados a escrever as palavras ―rádio‖
e ―rodo‖ e, posteriormente, selecionaram a palavra ―rádio‖ e formularam, com auxílio
da professora, uma frase com esta palavra. Na figura 31, podemos visualizar a atividade
realizada nessa aula.
Figura 31 – Atividade no livro didático de Letramento e Alfabetização
P – Agora nós vamos escrever o nome do rádio. Como é que se escreve?
A – R e A...
P – R e A. E quem mais? Di, di, di!
163
Alunos – D e I!
P – O!
A – O!
P – Rádio! Escreve!
A – Onde?
P – Na linha que está embaixo na cesta com as frutas do lado. Agora como é o nome do rodo?
Rodo! Como é que se escreve?
Alunos – Ro!
P – RO como é RO?
A – R e O!
P – Como é RO?
A – R e O!
P – RO-DO! Do, do, do!
Alunos – D e O! D e O!
P – Mas o nome é RO-DO ou RÔDO? Rô, rô!
Alunos – Rôdo!
P – Tem o que em cima do O?
A – Tem um chapéu!
A – Um chapéu!
A – Um chapéu!
A – É o acento, tia!
P – Rô, rô, rô! Se não fica ―RO-DO‖. O chapéu é o acento circunflexo. A gente diz chapéu
porque ele parece com um chapéu, mas o nome não é chapéu porque a letrinha não tem cabeça
para a gente botar na letrinha o chapéu. Aí ele é o circunflexo que parece o chapéu. A gente fala
que é chapéu! Rô, rô!
(Aula 10, professora B)
Como podemos observar no fragmento de aula acima, durante essa atividade, os
alunos foram solicitados a escrever as palavras ―RÁDIO‖ e ―RODO‖ e,
consequentemente, a dominar as correspondências entre letras e seu valor sonoro.
Entretanto, ressaltamos que a docente, ao responder essa atividade, acentuou
incorretamente a palavra ―RODO‖, informando aos estudantes que no primeiro ―O‖
havia o acento circunflexo.
Ao longo desse tópico, podemos perceber que o livro didático (LD) de
Letramento e Alfabetização foi um recurso utilizado com frequência nas práticas das
professoras investigadas. A partir das análises das situações de ensino, constatamos que
as docentes se relacionavam de forma autônoma com o LD e faziam ajustes e
extrapolações nas atividades presentes nesse recurso.
Na prática da professora B identificamos uma maior promoção de ajustes e
extrapolações nas atividades do LD em relação aos dados observados na prática da
professora A. Dessa forma, percebemos que a professora B promoveu mais
intervenções, extrapolando, muitas vezes, o que era solicitado no enunciado das
questões e, consequentemente, explorando uma maior diversidade de princípios
relativos ao SEA.
164
De modo geral, destacamos que as docentes, sobretudo a professora B, priorizou
o livro didático em suas aulas de forma autônoma e com frequência na sala de aula.
A partir das análises dos dados, constatamos que o livro didático foi utilizado
pelas professoras de forma relacionada com outros recursos utilizados em sala.
Entretanto, identificamos na prática da professora A aproximações a uma proposta
disciplinar, norteada, inclusive pelo LD. A professora B, apesar de não ter exposto
claramente nenhum projeto e sequência didática, buscou, em sala de aula, articular as
atividades umas com as outras.
Dessa forma, consideramos, de modo geral, que o recurso didático discutido
nesse tópico subsidiou as práticas docentes na promoção de situações didáticas que
exploravam os direitos de aprendizagem voltados para a apropriação do Sistema de
Escrita Alfabética.
Ao longo das observações, vimos que o livro didático de Alfabetização e
Letramento esteve presente na rotina das aulas das docentes. Entretanto, a professora A
tinha uma preocupação, inclusive, explicitada pela mesma em algumas das entrevistas
realizadas ao final das aulas, em terminar todas as atividades do livro didático, seguindo
à risca ao que era proposto. A professora B, por sua vez, afirmou que passou a utilizar
esse recurso apenas no segundo semestre, pois considerou que nessa fase do ano os
alunos estavam prontos para acompanhar as atividades propostas livro. Além disso, a
partir do detalhamento das situações didáticas acima, vimos que a professora B
costumava extrapolar as questões do livro didático com perguntas e propostas que não
estavam explícitas nas atividades do livro.
De acordo com Morais e Albuquerque (2011), ao longo dos anos, sobretudo nas
últimas edições, as coleções aprovadas no PNLD passaram a equilibrar melhor as
atividades com foco na apropriação dos princípios alfabéticos com as atividades
voltadas para as dimensões do letramento, a partir da exploração do eixo de leitura e
produção de textos. Com isso, podemos perceber que, a partir de tais mudanças, as
coleções de livro didático de alfabetização têm ocupado espaço na sala de aula, agindo
como suporte para os professores e alunos no processo de ensino e aprendizagem.
No próximo tópico, analisaremos o uso dos jogos de alfabetização durante as
aulas das professoras investigadas.
165
6.2 O uso dos jogos de alfabetização
No tópico anterior, vimos como o livro didático de Letramento e Alfabetização
pode ser um recurso facilitador da prática docente e da aprendizagem dos alunos. Além
deste recurso, sabemos que o professor pode elaborar e utilizar outros materiais em suas
aulas com o intuito de alcançar seus objetivos de ensino. Um dos recursos foco de
investigação dessa pesquisa utilizado pelas professoras, durante as jornadas de aulas
observadas, foram os jogos de alfabetização distribuídos pelo Ministério de Educação.
A partir desses jogos de alfabetização os alunos podem, de forma lúdica, refletir
sobre as unidades sonoras presentes nas palavras, os princípios que envolvem o sistema
de escrita e consolidar as correspondências grafofônicas sem ser levados a realizar
treinos enfadonhos dos padrões silábicos, conforme é representando nas cartilhas de
alfabetização. Entretanto, sabemos que, aliado às potencialidades desses recursos, o
professor também precisa assumir o seu papel e fazer as intervenções necessárias aos
aprendizes de modo a levá-los a refletir sobre os objetivos didáticos que envolvem cada
jogo. Dessa forma, concordamos com Kishimoto (2006, p. 37) que:
A utilização do jogo potencializa a exploração e construção do
conhecimento, por contar com a motivação interna, típica do lúdico,
mas o trabalho pedagógico requer a oferta de estímulos externos e a
influência de parceiros bem como a sistematização de conceitos em
outras situações que não jogos.
Diante disto, ressaltamos que durante as situações de uso do jogo o professor
deve participar como um mediador, elaborando perguntas pertinentes para que os
aprendizes mobilizem seus saberes.
Neste tópico abordamos o levantamento dos direitos de aprendizagem de
apropriação do sistema de escrita alfabética contemplados nas aulas de cada professora
a partir do uso dos jogos de alfabetização distribuídos pelo MEC.
O quadro 07 apresenta os direitos de aprendizagem referentes à apropriação do
SEA mobilizados pelas docentes nos momentos de uso dos jogos de alfabetização.
166
Quadro 07 - Direitos de aprendizagem referentes à apropriação do Sistema de Escrita
Alfabética (SEA) mobilizados nas aulas pelas professoras a partir do uso dos jogos de
alfabetização.
Direitos de aprendizagem
Aulas com uso dos jogos
Professora A Professora B
Reconhecer e nomear as letras do alfabeto 09 07
Compreender que palavras diferentes
compartilham certas letras
09
07
Perceber que palavras variam quanto ao
número, repertório e ordem das letras
09
07
Segmentar oralmente as sílabas de palavras e
comparar palavras quanto ao tamanho
---
07
Identificar semelhanças sonoras em sílabas e
em rimas
09
07
Ler, ajustando a pauta sonora ao escrito 09 07
Dominar as correspondências entre letras e
grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a
ler palavras e textos
09
07
Dominar as correspondências entre letras ou
grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a
escrever palavras e textos
---
07
Quantitativo de direitos contemplados pelas
professoras a partir do uso dos jogos de
alfabetização
06
08
Durante o período de observação, identificamos que os jogos de alfabetização
distribuídos pelo Ministério foram utilizados em apenas uma aula de cada professora.
Esse dado revela que esses recursos didáticos foram pouco priorizados pelas docentes,
inclusive, quando comparamos com a frequência dos outros tipos de recursos utilizados
nas aulas para explorar o sistema de escrita alfabética, como, por exemplo, os livros
didáticos, as obras complementares e os livros literários.
A pesquisa desenvolvida por Pessoa, Lino e Silva (2015) também revelou que os
jogos voltados para a alfabetização foram pouco priorizados durante o período de
observação na prática de duas professoras: uma pertencente ao 2º ano do Ensino
Fundamental do município de Recife/PE e outra docente do 3º ano do EF do município
de Jaboatão dos Guararapes/PE. Esse estudo foi realizado com três docentes, sendo uma
de cada ano do ciclo de alfabetização. A professora do 1º ano do Ensino Fundamental
utilizou jogos que davam subsídios para a apropriação do sistema de escrita alfabética
em sete das dez aulas observadas. Já docente do 2º ano do EF utilizou em duas aulas e a
do 3º ano do EF utilizou em apenas uma aula.
Como é possível observar, as professoras investigadas na pesquisa desenvolvida
por Pessoa, Lino e Silva (2015) apresentaram variações quanto à frequência de jogos
167
nas aulas. Além disso, as pesquisadoras revelaram que houve a ausência de intervenções
sistemáticas nas situações de uso dos jogos voltados para reflexão do sistema de escrita
alfabética.
Propiciar o contato dos alunos com os jogos de alfabetização pode ser mais uma
oportunidade de levar os educandos elaborarem hipóteses, construir aprendizagens e
consolidar seus saberes sobre o sistema de escrita alfabética. Entretanto, conforme já
anunciamos anteriormente, reiteramos que a mediação docente é imprescindível nas
situações de uso dos jogos, tendo em vista que cabe ao professor enriquecer esses
momentos através da promoção de intervenções desafiadoras para que os direitos
referentes à apropriação do sistema de escrita alfabética sejam garantidos aos
estudantes.
Em relação às observações das jornadas de aula com uso de jogos, percebemos
que alguns direitos de aprendizagem, tais como: escrever o próprio nome, diferenciar
letras de números e outros símbolos, conhecer a ordem alfabética e seus usos em
diferentes gêneros, reconhecer diferentes tipos de letras em textos de diferentes gêneros
e suportes textuais, usar diferentes tipos de letras em situações de escrita de palavras e
textos, reconhecer que as sílabas variam quanto às suas composições, perceber que as
vogais estão presentes em todas as sílabas não foram contemplados nas situações de uso
dos jogos de alfabetização, por isso não elencamos no quadro 07.
Na prática da professora A, identificamos que houve a exploração de seis
direitos de aprendizagem relacionados à apropriação do SEA através de um dos jogos
de alfabetização. O jogo utilizado por esta docente foi o Bingo Letra Inicial7.
De acordo com o manual didático, o jogo Bingo Letra Inicial pode auxiliar na
reflexão do sistema de escrita alfabética e seus objetivos didáticos são: conhecer o nome
das letras do alfabeto, compreender que as sílabas são formadas por unidades menores,
compreender que, via de regra, a cada fonema, corresponde uma letra ou um conjunto
de letras (dígrafos), identificar o fonema inicial das palavras, estabelecer a
correspondência grafofônica (letra inicial e fonema inicial), comparar palavras que
possuem unidades sonoras semelhantes, perceber que palavras que possuem uma
mesma sequência de sons tendem a ser escritas com a mesma sequência de letras
(BRANDÃO, FERREIRA ET AL. 2009, p. 63).
7 Jogo de alfabetização distribuído para as escolas públicas do país pelo Ministério de Educação (MEC).
168
Segundo as orientações propostas no manual didático dos jogos de alfabetização,
esse jogo pode ser realizado individualmente ou em duplas, com uma média de quatro a
nove jogadores ou duplas. Os materiais que compõe o jogo são: nove cartelas, cada uma
com três figuras e suas respectivas palavras faltando a letra inicial, fichas com as letras
que completam as palavras presentes na cartela e um saco escuro para colocar as letras.
Durante o jogo, o aluno ou a dupla, precisa completar com as letras que formam cada
palavra na cartela. Vence quem completar primeiro a cartela, estabelecendo as
correspondências grafofônicas corretas (BRANDÃO, FERREIRA ET AL. 2009, p. 65).
A seguir, detalharemos como ocorreu a mediação deste recurso e como os
direitos referentes à apropriação do sistema de escrita alfabética foram contemplados
pela docente.
Na aula 09 (nove) a docente aparelhou as cadeiras da sala, formando um único
círculo e depois organizou os estudantes em duplas. Em seguida, entregou uma cartela
para cada dupla e deu início ao jogo Bingo Letra Inicial. Nas figuras 32, 33 e 34
podemos observar a caixa e duas cartelas deste jogo.
Figura 32, 33 e 34 – Caixa e cartelas do jogo Bingo Letra Inicial
Após entregar uma cartela para cada dupla a docente perguntou aos alunos o
nome das figuras que estavam sendo representadas. No fragmento da aula abaixo
podemos perceber como ocorreu esse momento.
Conversa com os alunos antes de iniciar o jogo
P – Posso começar? Presta atenção!
A – O que é isso daqui?
A – Oba! Um jogo!
A – Eu quero um com figura.
P – Eu vou dar uma cartelinha para duas pessoas. Presta atenção!
169
A – Para mim?
A – Como é o nome disso?
P – Pronto? Coloca a cartelinha no meio. Coloca! Coloquem a cartelinha no meio que é para
dois.
(...)
P – Eu quero que vocês me digam quais são os nomes, quais são os desenhos que têm na sua
cartelinha, certo?
A – Gato, pato e rato!
P – Gato, pato e rato! Agora vocês, bora!
A – É, tem... O que é isso aqui?
A – Tem... O que é isso?
P – Tela, vela e cela! E a tua?
A – Gato, rato...
P – Na dela tem meia, veia e teia.
T – (Risos)
(...)
P – Muito bem! Na sua e na dele? Qual é?
A – Madeira, folha...
P – Madeira não! Rolha...
A – Folha e bolha!
T – (Risos)
P – E bolha! E a de vocês dois?
A – Cachorro!
P – Cachorro não! Cão...
A – Cão, mão...
P – Mão e pão! E na de vocês duas?
A – Canela, vela...
(Aula 9, professora A)
Como podemos perceber, os alunos apresentaram dúvidas a respeito de algumas
figuras presentes nas cartelas, por isso consideramos que a estratégia da professora em
explorar as ilustrações das cartelas foi de suma importância para iniciar o jogo, pois os
alunos apresentaram dúvidas sobre o nome das figuras. Segundo Brandão, Ferreira et al
(2000, p.24):
Antes de começar a jogada, é fundamental que todos os participantes
se ponham de acordo sobre os nomes das figuras. Como uma mesma
ilustração pode nos remeter a diferentes denominações (fogo ou
fogueira, chapa ou dentadura, por exemplo), é preciso que todos usem
o mesmo nome, ao analisarem as palavras em pauta.
Depois de conversar com os alunos sobre as figuras presentes nas cartelas do
jogo a docente perguntou aos mesmos qual era a letra inicial que faltava para completar
as palavras de cada cartela, conforme está explícito no fragmento da aula abaixo:
170
Conversa com os alunos sobre as letras que faltam para completar as palavras das
cartelas (antes de iniciar o jogo)
P – Vocês notaram que nessas cartelinhas que eu dei para vocês tem uma coisa que é bem
parecida?
A – Não!
A – As letras do nome são todas iguais.
P – Chega! Só tem tu mesmo para me salvar.
A – As letras são todas repetidas!
P – As letras no final são iguais, mas tem uma coisa aí, minha gente.
A – A letra!
P – A letra da frente vai ser diferente, porque, por exemplo, no de Maria e no de Gabrielly tem
assim, olha: ―ato, ato, ato e ato. Gato, pato e rato‖. Só que a primeira letrinha de gato é a mesma
de pato?
Alunos: Não!
P – Por que gato começa com qual letra? E pato?
A – Com ―p‖!
P – E rato?
A – Com ―ra‖!
A – R!
P – Com ―R‖! Então, o que vai mudar nesse jogo é....
A – As letras...
P – As letras iniciais! Será a primeira letrinha de cada palavra. A dele tem ―arro, arro, arro‖.
Então tem carro... Começa com que letra?
A – ―Ca‖!
A – C!
P – C! Depois tem jarro. Começa com que letra?
A – ―Ja‖!
A – G!
A – G!
A – É o ―j‖!
P – J! E depois tem barro. Começa com que letra?
A – Ba!
A – B e A!
A – B!
P – B!
A – A!
P – A? É ―b‖! Depois tem a de Sandyley, olha. Tela, como é tela?
A – T!
A – E!
P – T! Depois tem vela.
A – V!
P – E depois tem cela!
A – C!
P – Agora o de Kimberly. O de Kimberly tem ―meia‖.
A – Me!
A – E!
A – M!
P – M! Veia, veia!
Alunos: V!
P – E teia de aranha? Te-i-a!
A – T!
P – T! O de Josué tem... Vê, olha. Mola, cola e bola! Cola começa com que letra?
A – C!
P – C! E bola!
171
A – B e O!
P – B! Só é a primeira letra. E mola?
A – Mo!
Alunos – M!
P – A de Gustavo tem rolha. Não, deixa eu dizer tem rolha, bolha e folha! Com é rolha?
A – R!
P – E folha?
A – C!
A – V!
A – A!
A – F!
P – E bolha?
A – B!
P – B! Bora vê o de Sandyley... Panela?
A – P!
P – P! Peraê, rapidinho. ―Anela, anela e anela‖. Então, Caio, as três palavras terminam com
anela, anela, anela.
A – P, p, p!
P – Panela?
A – Pa!
A – P!
P – E janela?
A – J!
P – J! E canela?
A – C!
A – A!
P – Aqui, olha, é ão, ão e ão, quais os nomes?
A – Leão!
A – Le! L e E!
A – L!
P – Cão? Como é cão?
A – C!
P – C!
A – Cadê, tia?
P – Mão?
A – M!
P – E pão?
A – P!
P– P! Só falta o de Ana Clara. O de Ana Clara é aca, aca, aca. E faca?
A – F!
P– F! E jaca?
A – J!
P– E maca?
A – M!
(Aula 09, professora A)
No fragmento da aula 09, podemos perceber que a docente perguntou aos alunos
qual era a letra inicial que faltava para completar as palavras das cartelas antes de iniciar
o jogo, antecipando as respostas que deveriam ser vivenciadas durante o jogo. Nesse
momento, alguns dos alunos responderam a sílaba inicial ao invés da letra inicial.
Os estudos desenvolvidos por Barrera (2003) nos dão pistas para
compreendermos porque, quando questionados sobre a letra inicial das palavras, os
172
aprendizes responderam o som representado pela sílaba. De acordo com as autoras,
desde muito cedo, mesmo antes de frequentarem a escola, as crianças são capazes de
dominar algumas habilidades de consciência fonológica como, por exemplo, a que
envolve a reflexão das sílabas.
Também foi possível perceber que alguns dos alunos responderam que a letra
inicial da palavra ―jarro‖ era a letra ―G‖.
Conforme destacamos, nesse fragmento de aula, a professora, através de uma
conversa inicial com alunos, antecipou o momento que deveria ser vivenciado durante o
jogo, possibilitando que cada dupla soubesse as letras necessárias para completar as
palavras e vencer o jogo.
Na conversa inicial, antes de iniciar o jogo, percebemos que a educadora
explorou os direitos de identificar as semelhanças sonoras em sílabas e em rimas,
reconhecer e nomear as letras do alfabeto e compreender que palavras diferentes podem
compartilhar certas letras.
Após essa conversa, a docente finalmente iniciou o jogo com os alunos. O
fragmento de aula abaixo ilustra esse momento:
Durante o jogo
P – Quem preencher primeiro as três palavras ganha, está certo? Letra V! Quem tem alguma
coisa na cartela que começa com ―V‖?
A – Eu não tenho!
A – Ele tem!
P – Não é para dizer a do outro, pois cada um vai olhar a sua cartela.
A – Eu não tenho não!
A – Eu não tenho também não.
P – Ninguém tem?
A – Eu só tenho pato e rato!
P – Ninguém tem nada que comece com ―V‖?
A – Ele tem...
P – Não tem? Você tem é?
A – Tenho não.
P – Tem certeza? Ninguém tem? Eu não acredito, eu me lembro de ter falado um ―V‖ aí. O ―v‖
de alguma coisa. Vai ficar aqui, olha. Porque ninguém disse que tem, depois eu vou ver quem
esqueceu de dizer. Vamos lá! Agora quem tem alguma coisa com ―T‖?
A – Eu não tenho!
A – Eu tenho!
P – Tu tens o que? É tela?
A – Ela tem vela!
P – Nem dizendo, né?! O ―v‖ está aqui, viu? Quem tiver alguma coisa com ―v‖, me diz que eu
vou dizer.
A – Eu não tenho!
A – Nem eu!
A – Nem eu!
173
P – Quem tem alguma coisa com ―R‖?
A – É eu!
A – É eu!
P – Ele disse primeiro!
P – Qual é no seu? Como você sabe que é com ―R‖?
A – É porque tem o...
P – É com ―R‖ mesmo, está certo. Como é o nome disso?
A – É...
P – É uma rolha! Como tu sabias que era com ―R‖?
A – A senhora disse também!
A – De novo!
P – Ele decorou que era com ―R‖...
P – Quem tem alguma coisa com ―C‖?
A – Eu!
A – Eu!
A – Eu também tenho!
A – Eu tenho!
P – Cão! Tem que dizer rápido porque tem várias pessoas também. Quem tem alguma palavra
que começa com ―P‖?
A – Eu!
A – Eu aqui!
P – Qual é? Panela! Muito bem! Tem que ser rápido. Quem é que tem alguma palavra que
começa com ―M‖?
A – Eu!
A – Bolha!
A – Eu não tenho!
P – Renan, você tem alguma com ―M‖? Bola ou mola? Dá na mão de Renan também, Josué.
Quem tem... Presta atenção! Olha para o seu! Eu vou dizer... Oi? Tem com ―V‖ é? Eita, ela
descobriu, olha.
A – Eu sabia! Eu ia dizer a ela.
(...)
P – Quem tem uma palavra com a letra ―S‖?
Alunos: Euuu!
P – ―S‖ é cela é? Cela é com C.
A – Eu tenho uma!
P – É com C também!
P – Agora, quem tem uma palavra que começa com a letra ―M‖ de macaco?
(Aula 9, professora A)
Durante o jogo a professora fez o sorteio da ficha com a letra e falou em voz alta
o nome da letra sorteada. Em alguns momentos os alunos mostraram interesse pelas
fichas e em outros não. Quando a dupla pedia a ficha com a letra sorteada a docente
fazia a conferência na cartela para saber se a letra completava o nome de alguma figura.
Em alguns momentos, observamos que a educadora informou aos alunos qual era
palavra que eles deveriam colocar a ficha sorteada, limitando esse desafio que envolvia
o jogo. Essa estratégia realizada pela docente facilitou o jogo para os estudantes, pois
eles poderiam solicitar uma letra que fosse útil, mas no momento de posicionar a ficha
poderiam confundir e não estabelecer a correspondência grafofônica corretamente.
174
Também presenciamos momentos em a docente promoveu perguntas para as duplas
sobre a palavra que iniciava com a letra sorteada.
Um aspecto que poderia ser promovido pela docente seria a reflexão sobre os
possíveis erros dos alunos, como, por exemplo, no momento que um dos alunos
associou o nome da letra S ao da letra C de ―cela‖.
Os estudos desenvolvidos por Cardoso-Martins e Batista (2005, p. 330) apontam
que existe uma relação estreita entre o conhecimento do nome das letras e a
aprendizagem do princípio alfabético. Segundo as autoras, a ―existência de uma relação
entre o conhecimento do nome das letras e a aprendizagem da leitura e da escrita tem a
ver com fato de que os nomes das letras são, com frequência, escutados na pronúncia
das palavras‖.
No momento final do jogo, a docente recapitulou o nome das figuras de algumas
cartelas e chamou a atenção dos alunos para a letra inicial e a terminação das palavras,
tendo em vista que apresentavam as mesmas letras. O fragmento de aula abaixo ilustra
esse momento:
Conversa após o final do jogo
P: O de Ana Clara era faca, jaca e maca. Era ―f‖, ―J‖ e ―n‖. Aca, aca e aca! Todos têm a mesma
terminação, só a primeira letrinha. O dela era anela, anela, anela. P de panela, J de janela e C de
canela.
A: Tia e a gente?
P: E o dos meninos... Olha o dos meninos! Presta atenção, ão, ão e ão. Cão, mão e pão! O de...
Era olha, olha e olha. Rolha, folha e bolha.
A: Bola!
P: Ola, ola e ola! Cola que era com C, bola com B e mola com M. O de Gabriela e Maria era
ato, ato, ato. Gato com G, pato com P e rato com R. O de Yarley era arro, arro e arro. Carro,
jarro e barro! O de Lucas era ela, ela e ela. Tela com T, vela com V e cela com C. O de
Kimberley era eia, eia e eia. Presta atenção, Gustavo. Eia, eia e eia. Meia, veia e teia.
(Aula 9, professora A)
Como podemos perceber, a situação de uso desse jogo foi favorável para que os
alunos refletissem sobre o sistema de escrita de forma lúdica. Entretanto, consideramos
que a docente poderia ter explorado mais os conhecimentos dos estudantes durante a
mediação do jogo sem fornecer muitas respostas a respeito da letra inicial que faltava
para completar as palavras da cartela, o que não favorecia momentos de reflexão por
parte dos alunos. Após essa conversa final sobre as palavras presentes nas cartelas a
educadora entregou a ficha de atividade abaixo:
175
Figura 35 – Ficha de atividade 1 após o jogo Bingo Letra Inicial
Nessa atividade os alunos foram desafiados a completar algumas palavras com a
letra inicial, seguindo a mesma lógica do Bingo Letra Inicial. Como podemos observar,
a maioria das palavras foram vivenciadas durante o jogo e outras foram incorporadas a
atividade. Nesse momento, os estudantes permaneceram com o mesmo agrupamento
anterior (em duplas), mas fizeram poucas consultas entre si. Observamos que os alunos
optaram por consultar a professora para tirar as dúvidas a respeito dos nomes das figuras
que não estavam conseguindo visualizar. Na Figura 36 podemos perceber que a
visualização de algumas figuras ficou comprometida, o que provocou várias dúvidas
nos estudantes.
Figura 36 – Ficha de atividade 2 após o jogo Bingo Letra Inicial
176
Depois que a docente realizou a Ficha de atividade 1 (figura 35), ela entregou
essa atividade que é formada por duas questões. Na primeira questão os alunos
precisavam copiar na primeira coluna palavras presentes no jogo Bingo Letra Inicial,
depois, nas colunas seguintes, deveriam copiar a letra inicial, a letra final e a quantidade
de letra de cada palavra. Na segunda questão as crianças deveriam escrever, com auxílio
da figura, palavras que foram vivenciadas no jogo. Percebemos que a professora fez a
seleção de palavras que rimavam, conforme podemos ver: GATO/ RATO/PATO e
BOLA/COLA/MOLA.
No início dessa atividade a educadora perguntou aos alunos o nome dos objetos
presentes nas cartelas do jogo Bingo Letra Inicial e, em seguida, registrou as respostas
no quadro, formando uma lista de palavras. Após esse momento, os educandos foram
solicitados a copiar as palavras (PANELA, JACA, FACA, RATO, BOLA, JANELA,
GATO, FOLHA e BOLHA) na primeira coluna da ficha de atividade (figura 35). Nas
colunas seguintes os alunos escreveram a letra inicial, a letra final e, por último,
colocaram a quantidade de letras presente em cada palavra da lista.
Essa sequência de atividade demonstrou que a professora A planejou
previamente fichas de atividades articuladas ao jogo Bingo Letra Inicial, realizou
momentos de reflexões sobre o sistema de escrita alfabética. Além disso, vimos que a
educadora propôs novos desafios para os aprendizes como, por exemplo, a escrita de
palavras vivenciadas no jogo com o auxílio das figuras.
A professora B também fez uso de um dos jogos de alfabetização apenas na aula
07 (sete). O jogo utilizado por esta docente foi o jogo Troca Letras 8 e seus objetivos
didáticos são: conhecer as letras do alfabeto e seus nomes, compreender que as sílabas
são formadas por unidades menores, compreender que, cada fonema, corresponde a uma
letra ou um conjunto de letras (dígrafos), compreender que, ser trocarmos uma letra,
transformamos uma palavra em outra palavra; compreender que a ordem em que os
fonemas são pronunciados corresponde à ordem em que as letras são registradas no
papel, obdecendo, geralmente, ao sentido esquerda-direita, comparar palavras,
identificando semelhanças e diferenças sonoras entre elas e estabelecer correspondência
grafofônica (BRANDÃO, FERREIRA ET AL. 2009).
Segundo o manual didático dos jogos de alfabetização esse jogo pode ser
realizado em grupo, podendo o professor, dependendo do quantitativo de alunos, formar
8 Jogo de alfabetização distribuído para as escolas públicas do país pelo Ministério de Educação (MEC).
177
dois, três ou quatro grupos. Os componentes desse recurso são: um quadro de pregas, 20
fichas com figuras (sendo 10 pares de figuras com palavras semelhantes, apresentando
diferença em apenas uma das letras, como, por exemplo: PÁ/PÉ, MAPA/MALA,
FACA/FADA, BOLA/BOLO, DADO/DEDO, PATO/RATO e etc.) e fichas com letras.
O manual orienta o professor a fixar o quadro com pregas no quadro, colocar cinco
fichas de figuras e formar as palavras correspondentes a essas figuras. As demais fichas
com letras podem ser expostas numa mesa. O manual também propõe que o docente
coloque, em cima de uma das fichas, outra ficha em que a palavra é semelhante, por
exemplo: se no quadro tem a figura da FADA, a educadora pode colocar a palavra
FACA e, em seguida, pode perguntar para a turma: ―qual letra devo trocar para que a
palavra FADA vire FACA?‖. Dessa forma, o grupo que está na vez jogar pode refletir
sobre a letra que precisa ser modificada com o objetivo de formar uma nova palavra. Se
o grupo acertar, ganha cinco pontos e o professor dá sequência ao jogo. Vence o jogo o
grupo que acertar a maior quantidade de palavras formadas a partir da troca de letras.
Esse jogo foi utilizado pela professora B na aula 07 (sete). Durante essa aula a
docente retomou uma atividade do livro didático de Letramento e Alfabetização que
abordava a retirada de uma letra numa palavra pode transformá-la em outra. Nessa
atividade os alunos transformaram a palavra PIANO em PANO, PRATO em PATO e
POSTE em POTE.
Após esse momento, a professora pegou um jogo elaborado por ela, intitulado
como Preguicinha, conforme podemos visualizar nas figuras 37, 38 e 39.
Figuras 37, 38 e 39 – Jogo produzido pela Professora B intitulado Preguicinha
Com esse recurso em mãos a docente mudou as letras iniciais e solicitou aos
alunos a leitura da ficha para que eles percebessem que as palavras estavam sendo
178
modificadas. Nesse momento, a professora enfatizou que a mudança na letra inicial
pode transformar uma palavra em outra. Esse foi um dos recursos que favoreceu a
aprendizagem dos estudantes em relação ao funcionamento do sistema de escrita
alfabética. Entretanto, faz-se necessário destacar que o recurso não tinha características
de um jogo, com regras, para ser intitulado como tal.
Depois de refletir com as crianças sobre as palavras JANELA, PANELA e
CANELA a docente iniciou o jogo Troca Letras. Nesse momento, a educadora colou o
quadro de pregas no quadro (figura 40) e voltou a enfatizar o princípio de que a troca de
uma letra numa palavra pode transformá-la em outra.
Figura 40 – Quadro de pregas do jogo Troca Letras
Conversa antes do início do jogo
P – Outra coisa agora... Presta atenção! Olha para cá! Veja! A gente também tem outras
palavras, que a gente troca a letra inicial e as outras letras ficam iguais e a gente vai mudando...
Por exemplo...
A – E a do livro, tia?
P – A gente vai fazer já, já! Olha só, olha só! Eu vou botar isso aqui... O que é que está escrito
aqui? O que é que é que está escrito aqui?
Alunos: Ca-ra-col...
P – Não! Começa com que letra?
A – A...
A – T!
A – O!
P – Eu tenho ―ato‖! Olha o que vai acontecer... Se eu botar essa daqui, se eu botar esse R aqui
vai ficar o que?
A – Ra-to!
P – Agora eu tenho ―ato‖ de novo! Eu posso botar outra letra e formar outra palavra? Qual?
A – G, g, g!
P – Se eu botar o G vira o que?
Alunos: Gato!
P – Qual é a letra que eu posso botar aqui e formar outra? Se eu botar aqui ―ato‖ de novo qual é
a letra que...
A – P! P de pato!
179
A – Tia, a letra P! Tia, P!
P – Nós temos... Com G virou gato, com P virou pato. Augusto, qual é a última letra que eu
posso aqui diferente dessas duas e formar outra palavra? Qual? Qual? Qual é a letrinha que eu
posso botar aqui? Eu tenho gato... Qual é a letra que eu posso botar?
A – P!
A – P de pato!
P – Como gente?
Alunos: P!
P – Se eu botar o P? Se eu tirar o P?
A – Pato!
P – Eu tenho aqui, olha... Eu tento ato, ato, ato. A gente escreveu gato... Presta atenção! Botou o
P e virou pato! Qual é a outra letrinha que eu posso botar aqui para virar outra palavra?
(...)
P – Vejam bem...
A – É ―t‖!
A – É ―t‖ de tatu!
P – Sofia falou o ―T‖ virou o que? Virou o que?
A – Tatu!
P – Virou isso aqui, olha.
Alunos: Mão!
P – Quando pega é o? Ta-to!
Alunos: Tato!
P – Olha aqui, olha. A mão é o tato! Então a gente percebeu que... A gente percebeu que se eu
troco a letra eu posso... Agora eu queria que todos ficassem sentados que eu vou colar...
(Aula 07, professora B)
Nesse momento, a docente fixou o quadro de pregas no quadro e fez algumas
perguntas aos estudantes considerando a troca de letra inicial nas palavras. Para iniciar
essa reflexão a educadora formou a palavra ATO com as fichas com letras do jogo e, em
seguida, perguntou aos alunos qual palavra havia formado ao colocar a letra R na frente
do ATO. Posteriormente, a professora formou as palavras RATO, GATO e PATO e
chamou atenção dos alunos para a terminação dessas palavras, enfatizando que a
diferença entre elas era apenas a letra inicial. Como é possível observar, apesar de a
docente estar utilizando os materiais do jogo ela ainda não havia explicado como seria a
dinâmica do jogo para os alunos.
A partir dessa sequência de atividades percebemos que a docente utilizou o jogo
Troca Letras para reforçar o mesmo conhecimento que havia sido enfatizado no jogo
Preguicinha (recurso elaborado por ela mesma) e, por isso, chamou a atenção dos
alunos apenas para a troca da letra inicial das palavras.
Início do jogo Troca Letras (momento que a professora forma as palavras: BOLA, GATO,
MALA, COLA e RATO)
180
P – A partir de agora, a palavra que formar vai ser escrito no caderno. Eu quero ver quem é que
vai formar as palavras com as letras corretas. Eu vou entregar duas letras a cada um! Fecha o
livrinho!
A – Oô tia, ele quer pegar meu jogo!
P – Vocês vão formar as palavras. São três para cada um!
A – Oô tiaa!
P – Olha para frente! Olha para frente! A gente vai formar, a gente vai formar as palavras que
estão aqui...
A – Só uma!
P – Posso? Vou formar! Eu quero que vocês sentem para a gente observar as figuras! Eu vou
começar! Eu só quero ouvir a minha voz! Só vou ouvir a minha voz! Todo mundo vai olhar para
ali...
(...)
P – Veja... Vamos olhar para essas palavras! Vamos contar as sílabas. Bora?
Alunos – Bo-la!
Alunos – Ga-to!
P – Duas sílabas!
Alunos – Ma-la!
P – Duas sílabas!
Alunos – Co-la!
P – Duas sílabas!
Alunos – Ra-to!
P – A gente agora... Qual é a primeira letra da bola?
A – B!
A – B!
A – B de bola! B de bola! B de bola! B de bola!
P – B, b! Então, a gente tem que colocar B aqui, olha. Venha botar seu B. Vamos formar essas
palavras. Depois do B qual é a letra?
Alunos – O!
P – o, bo!
A – Ela já tem!
P – Ela agora! Presta atenção! Depois é o ―LA‖, ―LA‖, ―LA‖.
Alunos – L e A!
P – Sem gritar, meu amor! L? Ela tem...
A – Tia!
A – João tem, João tem!
P – Bote o L. Aqui, aqui. Deixa eu pensar... A gente tem ―bol‖ está faltando o que?
Alunos – A!
P – Mas vê tem outra palavra também. Aí completou bola! Próxima palavra qual é?
A – Eu!
A – Gato!
P – Mostra aí, será que é essa? Qual é a letra?
A – A!
P – Olha, o G de ga-to!
A – Ga, ga!
A – Ga-to!
(...)
P – Olha para cá para a gente ver o que aconteceu! Silêncio!
A – Tia, vai cair!
181
P – Agora a gente viu que se eu trocar uma letra vira outra palavra. Aqui a gente viu. Vai fazer
o que? Vai pegar o caderninho e vai escrever essas 4 palavrinhas no caderno.
A – De classe?
P – De classe!
A – Eu tia!
P – Bora? Bora? Vai escrever essas palavras! Bora? Terminou já? Vão escrever esse daqui, vão
escrever essas quatro palavras! Pegue seu caderninho! Enquanto vocês escrevem eu vou
organizar aqui essas coisas. Escrevam aqui essas quatro palavras e pensem como é que a gente
pode transformar essas palavras em outras palavras. Escreveu já? Faz assim, olha... Cinco
palavrinhas!
(Aula 07, professora B)
A partir do fragmento acima podemos perceber que a professora separou as
fichas com as figuras BOLA, GATO, MALA, COLA e RATO e, em seguida, colocou
no quadro de pregas. Em seguida, pediu que os alunos nomeassem essas figuras e
depois promoveu uma discussão em torno da segmentação oral das palavras
correspondentes as figuras. Nesse momento, a professora perguntou aos alunos que
letras eram responsáveis para formar o nome das figuras e, a partir das respostas dos
educandos, formou as palavras. Posteriormente, ela pediu que os aprendizes copiassem
no caderno as cinco palavras formadas e pensassem nas palavras que poderiam formar.
Depois que os alunos copiaram as palavras: BOLA, GATO, MALA, COLA e RATO a docente
dá sequência ao jogo
P – Vamos pensar sobre essas palavras e transformar elas em outras palavras mudando apenas
uma letra! A gente vai trocar apenas uma letra de cada palavra, a gente vai trocar apenas uma
letra em cada palavra e vai se transformar em outra palavra. Aí a gente vai fazer... Vamos ver!
Aí depois tem a tarefa na folhinha! Vou pegar a outra tarefinha... A gente ficou de escolher qual
é a letra que a gente pode trocar. Aí ele vai formar o nome de outra figura.
A – Figura!
A – Olha onde eu estou!
P – Vamos? Agora eu só quero ouvir a minha voz. Vamos pensar... Cada um segura a sua letra.
Vamos pensar! Eu tenho aqui que palavra? Essa é a primeira letra, né? Eu quero trocar essa letra
por outra, eu vou tirar o B...
(...)
P – Eu nem falei ainda... 1, 2,3,4... Bora? Olhem para mim! Eu tirei o B e não quero mais a
palavra bola. Qual é a letra que eu posso botar para formar para formar outra palavra? Bota a
letra aqui! Bota a letra aqui!
A – Tia! Tiaa!
P – Silêncio! Se eu botar aqui... Bora pensar?! Aqui tem ―ola‖, ―ola‖ é o que? Qual é? Mostrem
as letras que vocês têm. Cadê as letras que ainda tem? Mostrem as letras!
A – Eu tenho uma aqui, olha! ―GA‖!
P – Cadê? Mostra! Eu vou fazer uma coisa... Eu tirei o B daqui. Se eu botar o B aqui vai virar o
que? Olha para mim! Olha, eu estou trocando a letra! O ―b‖ saiu daqui porque era ―bola‖. Eu
não quero mais ―bola‖, tirei a ―bola‖, mas o ―B‖ vai sair para cá. Vai ficar que palavra?
182
A – Eita!
A – Bola, bola, bola, bola!
P – Vai ficar qual?
A – Bala!
P – Então, nessa palavra daqui... Bola, gato... Era o que antes? Mala!
A – Mala!
A – Cola!
P – Cola!
A – Pato!
P – Mala virou o que mala? Mala virou o que?
A – Bola!
P – Eu tinha bola... Olha para cá! Olhou para cá! Todos olhando! Que é isso daqui?
A – Bola!
P – Pão! O que é isso aqui?
A – Pão!
A – Bola!
P – Bo-la! Eu não quero ―bola‖. Desci o B para cá. Formou qual?
A – Bala!
P – Ba-la! Então, ―ma-la‖ que era aqui ―mala‖ se transformou em bala! Por quê? Por que eu
troquei a letra B! Você vai circular o M e colocar a palavra que se transformou! Circula o M que
eu troquei e escreve bala! Botou? Botou? Vamos? Agora vou fazer outra troca, vamos ver no
que dá. Se eu botar o M para cá, o rato vem aqui para cima, olha. Se eu fizer assim, olha. Que
nome é esse agora?
A – Cola!
P – Cola! Quem tem a letrinha M aí?
A – Eu!
A – N, tia?
A – Eu!
P – Eu só quero M.
A – Eu!
A – Eu tenho esse daqui!
P – Eu só quero M!
A – Tia, olha o meu!
A – Tia, tia, tia!
P – Alguém tem M?
A – Ela, tia! Ela!
A – Tem ―ÃO‖!
P – Não é esse não!
A – Ele tem! N de navio ele tem!
P – M! M, olha a boca, olha a boca.
A – A tua tem M.
P – Vou deixar aqui atrás.
A – Tia, deixa eu ver se no dele tem!
P – Só tem um, Olha, só tem um, olha. Se eu pegar esse M que estava em MALA olha só no
que vai se transformar... Eu vou colocar esse M na frente de bola. Virou o que?
A – Bola!
A – Bola, mola!
P – Virou o que?
A – Moda!
P – Não! Virou o que?
A – Bo-la!
183
A – Mo-la! Mola!
A – Mola!
P – Cola, cola, transformou-se em MO-LA!
(Aula 07, professora B)
Durante o uso do jogo Troca Letras, percebemos, a partir dos fragmentos de
aula, que a professora fez adaptações a esse jogo e, apesar de mencionar que a troca de
letras pode mudar as palavras, não seguiu as regras propostas pelo manual didático dos
jogos de alfabetização.
Na sala de aula, sabemos que o professor pode elaborar diversas estratégias com
o intuito de atingir vários objetivos didáticos. Em muitos casos, como, por exemplo, no
uso dos jogos de alfabetização o docente faz adaptações na forma de utilizar, sem seguir
necessariamente as regras propostas no manual didático. No caso específico do extrato
de aula acima, vimos que as adaptações feitas pela educadora no momento de uso do
jogo foram importantes para que as crianças refletissem sobre a composição das
palavras e, além disso, percebesse que a mudança da letra inicial das palavras pode
transformar uma palavra em outra.
Durante a mediação do jogo, percebemos que a professora entregou três fichas
com letras a cada aluno sem organizar os jogadores em grupo, conforme sugerido pelo
manual didático dos jogos. Nesse momento, a docente selecionou apenas as figuras
BOLA, GATO, MALA, COLA e RATO para que os estudantes formassem com as
fichas com letras o nome dessas figuras.
Nessa situação didática, a professora solicitou aos alunos a cópia das palavras
que haviam sido formadas no quadro de pregas e, em seguida, formou novas palavras a
partir das palavras (BOLA, GATO, MALA, COLA e RATO). Nesse momento,
percebemos que a docente desceu a letra B da palavra BOLA e colocou em cima do M
da palavra MALA e perguntou aos alunos que palavra formou. Na situação seguinte a
docente desceu o M de MALA e colocou em cima do C de COLA e perguntou aos
alunos que palavra formou. Em seguida, perguntou aos alunos que letra poderia ficar no
lugar do B de BOLA e formar uma nova palavra. Como os estudantes não deram
nenhuma opção, a educadora pediu que os mesmos mostrassem as fichas com letras e
ressaltou que faltavam letras no jogo. Nesse momento, uns dos alunos falou que tinha a
letra L e a professora colocou em cima da letra B de BOLA, formando a palavra LOLA.
Em seguida a docente perguntou aos alunos se essa palavra poderia ser o apelido ou
nome de alguma coisa e eles informaram que era o nome de um personagem do
184
desenho. Diante disso, evidenciamos que esse nome tinha um significado para as
crianças.
Na quarta transformação a docente subiu o R da palavra RATO para colocou em
cima do G de GATO e perguntou aos alunos que palavra havia formado. Nesse
momento, observamos que a docente formou uma palavra que já havia sido escrita pelos
alunos no primeiro momento. No último momento, a docente perguntou aos alunos
quem tinham a letra T para colocar em cima do R de RATO e deu pistas aos alunos de
que palavra formaria.
A partir dos dados apresentados acima, podemos perceber que o uso dos jogos
de alfabetização distribuídos pelo Ministério de Educação proporcionou momentos de
reflexão sobre a língua escrita e, consequentemente, a mobilização de diversos direitos
de aprendizagem referentes à apropriação do sistema alfabético. Entretanto, ressaltamos
que esses recursos precisam ser mais priorizados pelos docentes em suas aulas.
Na prática da professora A, através do jogo Bingo Letra Inicial, houve a
exploração dos direitos reconhecer e nomear as letras do alfabeto, compreender que
palavras diferentes compartilham certas letras, perceber que palavras variam quanto ao
número, repertório e ordem das letras, identificar semelhanças sonoras em sílabas e em
rimas, ler, ajustando a pauta sonora ao escrito e dominar as correspondências entre
letras e grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a ler palavras e textos.
Na análise da situação didática realizada a partir do referido jogo, percebemos
que a professora A deu indícios de que planejou essa ação de ensino. Esses indícios
puderam ser concretizados através dos dados coletados na entrevista, realizada ao final
da aula em que o jogo Bingo Letra Inicial foi utilizado. Nessa entrevista, a docente
revelou que as duas fichas de atividades realizadas após o jogo e articuladas ao mesmo
foram produzidas previamente por ela com o objetivo de explorar os princípios que
regem o sistema de escrita que haviam sido introduzidos pelo jogo. Entretanto,
destacamos que no momento desse recurso a educadora forneceu muitas respostas aos
alunos, limitando os momentos de reflexão sobre o sistema de escrita.
Na prática da professora B identificamos que a docente utilizou outros recursos
associados ao jogo Troca Letras, como, por exemplo, o jogo Preguicinha (figuras 36, 37
e 38), para contemplar o sistema de escrita. O uso de outros recursos relacionados aos
jogos de alfabetização também foi um aspecto presente na prática da professora A. A
diferença foi que esta última, conforme destacamos, produziu fichas de atividades.
185
Esses dados revelam iniciativas de ambas as docentes em produzir recursos
relacionados aos jogos de alfabetização.
A partir do jogo Troca Letras, pudemos perceber que a docente contemplou
diversos direitos de aprendizagem, a saber: reconhecer e nomear as letras do alfabeto,
compreender que palavras diferentes compartilham certas letras, perceber que palavras
variam quanto ao número, repertório e ordem das letras, segmentar oralmente as sílabas
de palavras e comparar palavras quanto ao tamanho, identificar semelhanças sonoras em
sílabas e em rimas, ler, ajustando a pauta sonora ao escrito, dominar as
correspondências entre letras e grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a ler
palavras e textos e dominar as correspondências entre letras ou grupos de letras e seu
valor sonoro, de modo a escrever palavras e textos.
Na situação de uso do jogo Troca Letras, identificamos que a professora B
elaborou novas orientações sem priorizar todas as regras, as orientações e o
agrupamento proposto pelo manual didático dos jogos de alfabetização. A partir desses
dados, constatamos que o professor pode reconfigurar os recursos, sobretudo os jogos
de alfabetização que chegam às escolas públicas, e utilizar da forma como acham mais
confortável em busca de concretizar suas intenções educativas.
Quanto às novas orientações promovidas pela professora B, ressaltamos que as
mesmas foram favoráveis para a promoção de momentos de reflexão sobre os princípios
que regem o sistema de escrita alfabética.
No próximo tópico, analisaremos as situações didáticas envolvendo os acervos
complementares.
6.3 O uso das obras complementares
No tópico anterior discutimos as situações de uso dos jogos de alfabetização
distribuídos pelo MEC promovidas pelas professoras investigadas para contemplar os
direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita alfabética.
Os dados revelaram que as docentes utilizaram os jogos de alfabetização para
contemplar vários direitos de apropriação do sistema de escrita alfabética. Entretanto,
percebemos que esses recursos foram utilizados com baixa frequência durante o período
de observação das aulas.
Nesse tópico temos o objetivo de identificar quais direitos de aprendizagem
relacionados à apropriação do sistema de escrita alfabética são contemplados nas
186
práticas das professoras em situações de uso das obras complementares do PNLD. No
quadro 08 podemos visualizar os direitos de apropriação do sistema de escrita alfabética
que foram explorados pelas docentes.
Quadro 08 - Direitos de aprendizagem referentes à apropriação do Sistema de Escrita
Alfabética (SEA) mobilizados nas aulas pelas professoras a partir do uso das obras
complementares.
Direitos de aprendizagem
Aulas
Professora A Professora B
Reconhecer e nomear as letras do alfabeto 03 e 06 --
Conhecer a ordem alfabética e seus usos em
diferentes gêneros
06
--
Identificar semelhanças sonoras em sílabas e
em rimas
05, 06 e 08
--
Reconhecer que as sílabas variam quanto às
suas composições
06
--
Ler, ajustando a pauta sonora ao escrito 03, 05, 06 e 07 06
Dominar as correspondências entre letras ou
grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a
ler palavras e textos
03, 05, 06 e 07
06
Quantitativo de direitos contemplados pelas
professoras a partir do uso das obras
complementares
06
02
Durante o período de observação, constatamos que as professoras investigadas
utilizaram em suas aulas as obras complementares para contemplar os direitos de
aprendizagem de apropriação do sistema de escrita alfabética. Identificamos na prática
da professora A cinco direitos de aprendizagem. Nas aulas da professora B dois direitos
foram explorados.
Alguns direitos não foram contemplados, tais como: escrever o próprio nome,
diferenciar letras de números e outros símbolos, reconhecer diferentes tipos de letras em
textos de diferentes gêneros e suportes textuais, usar diferentes tipos de letras em
situações de escrita de palavras e textos, compreender que palavras diferentes
compartilham certas letras, perceber que palavras diferentes variam quanto ao número,
repertório e ordem das letras, segmentar oralmente as sílabas de palavras e comparar as
palavras quanto ao tamanho, reconhecer que as sílabas variam quanto às suas
composições, perceber que as vogais estão presentes em todas as sílabas e dominar as
correspondências entre letras ou grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a escrever
palavras e textos.
187
Na prática da professora A identificamos o uso das obras complementares nas
aulas 03, 05, 06, 07 e 08, ou seja, em cinco das dez jornadas de aulas observadas.
Durante essas aulas, constatamos que as obras foram utilizadas por esta docente com
objetivo de explorar o eixo de leitura e o de apropriação do sistema de escrita alfabética
e, além disso, para mobilizar conhecimentos relacionados aos conteúdos abordados
nessas obras que estavam ancorados em outros componentes curriculares.
Na aula 03 a professora A fez uso da obra Que horas são? que pertence ao
acervo de 2010. No início desta aula, após dar bom dia aos estudantes, a docente pegou
a obra e solicitou aos educandos a leitura do título do livro. Nesse momento, os
estudantes estavam sentados nas cadeiras que eram diariamente organizadas em duplas.
No fragmento de aula abaixo podemos observar como a docente solicitou aos
aprendizes a leitura do título e, através dessa ação, contemplou três direitos de
aprendizagem voltados para o eixo de apropriação do sistema de escrita alfabética.
Figura 41 – Capa do Livro Que horas são? que pertence ao acervo do PNLD/2010
P – Quem consegue ler para mim esse nome?
A – Ho-ras!
P – Que coisa linda! Só que o nome do livro não é horas. Tem o nome horas, mas não é só
horas, mas eu vou botar o nome dele aqui no quadro para saber quem consegue ler para mim.
A – O, Q...
A – Q, O...
A – Que ho-ras! Que horas!
Alunos – Que ho-ras são!
Alunos – Que horas são!
P – Que horas são!
P – Bora lá?! Vocês já leram para mim. Estão de parabéns! Agora eu vou ler o livro e todo
mundo vai ficar em silêncio. Não precisa de lápis agora. É prestando atenção, está certo?!
Começou!
(Professora A, aula 03)
188
No fragmento de aula acima podemos constatar que a professora solicitou aos
alunos a leitura do título da obra e, após a solicitação, um dos estudantes leu a palavra
―horas‖. Nesse momento, a docente copiou no quadro o título da obra e voltou a pedir
aos aprendizes para fazer a leitura. A cópia do título da obra no quadro pela educadora
contribuiu para que os alunos percebessem que o nome da obra era composto por mais
palavras. A partir dessa estratégia, os alunos nomearam algumas letras do alfabeto e
outros aprendizes, possivelmente, mais avançados em seus níveis de escrita, realizaram
a leitura do que havia sido registrado no quadro pela educadora. Diante disto,
consideramos que essa situação didática promovida pela docente contemplou os direitos
de aprendizagem de reconhecer e nomear as letras do alfabeto, ler, ajustando a pauta
sonora ao escrito e dominar as correspondências entre letras ou grupos de letras e seu
valor sonoro, de modo a ler palavras e textos.
Após a leitura da obra a docente pegou o relógio da sala e iniciou uma conversa
com a turma sobre como ver a hora. Em seguida, desenhou relógios no quadro com os
ponteiros e perguntou a alguns alunos a hora que estava sendo representada em cada
relógio. Depois de ensinar aos estudantes como ver a hora e promover algumas
perguntas a eles, a professora realizou duas fichas de atividades e uma atividade do livro
didático de matemática envolvendo esse conteúdo sobre medida do tempo. Nesse caso,
percebemos que a obra complementar foi um recurso utilizado para introduzir a
temática que seria abordada na aula. A entrevista realizada no final da aula com essa
professora também nos dá subsídios para essa conclusão, conforme podemos observar
abaixo:
E – Quais foram os recursos didáticos que mais contribuíram para sua
aula?
P – O relógio e o livro porque deu uma iniciada.
E – Qual livro?
P – Esse livro de horas.
E – Por que você achou que o uso dessa obra complementar foi
importante?
P – Eu acho importante porque você não começa o assunto do nada.
Você lê um livrinho para abrir o assunto, né?! Eu gosto de botar um
livrinho para começar o assunto para não começar o assunto sem
nenhum norte.
(Professora A, Entrevista realizada no final da aula 03)
Como vimos, a docente utilizou essa obra complementar com objetivo de
introduzir o assunto que seria abordado em sala sobre medida de tempo (horas). E, além
189
disso, promoveu uma situação didática que contemplou alguns direitos de
aprendizagem.
Na aula 05 a professora A fez a leitura da obra Delícias e gostosuras que
pertence ao acervo de 2012. Quando essa aula iniciou a docente pediu aos alunos para
pegar o livro didático de Letramento e Alfabetização e abrir na página 181. Nesse
momento, a educadora perguntou aos alunos como era o nome desse livro didático e os
estudantes responderam que era o livro de português. Em seguida, a professora
perguntou aos estudantes quais letras formavam a palavra (português) e, na medida em
que as crianças falaram as letras, ela registrou no quadro. Enquanto os alunos
procuravam a página solicitada pela docente uma das crianças passou pela página do
livro que podemos visualizar na Figura 42 abaixo:
Figura 42 – página 86 do livro de Letramento e Alfabetização
Nesse momento, após visualizar essa página, a professora foi no armário onde
guardava vários materiais da escola e pegou a obra complementar Delícias e gostosuras.
Na sequência convidou os alunos para ler o título da obra, o nome da autora e da
ilustradora, conforme podemos visualizar no fragmento de aula abaixo:
Figura 43 – Capa do livro Delícias e gostosuras que pertence ao PNLD/2012
190
P – Olha, vocês lembram que a gente já falou da capa desse livro uma vez? Faz tempo já.
Alunos – Foi!
A – É igual a que tem no livro.
P – É igual a que tem livro. Coloquem aí na página, porque daqui a pouco a gente faz a tarefa. É
rapidinho.
A – Cadê?
A – Já passou!
P – Deixa a gente lê, só para eu não esquecer de ler para vocês. É a página 86. Eu vou de banca
em banca colocar.
A – É ―Delícias e gos-to-su-ras‖.
A – É ―Delícia gostosura!‖.
A – Delícias e gostosuras.
P – É essa mesmo. Pronto? Todo mundo já colocou? Quem consegue ler o nome para mim?
Alunos: ―Delícias e gostosuras‖.
P – Ixe Maria, que tanto menino inteligente! Quem consegue ler para mim o nome da autora do
livro?
A – Maria Machado!
A – Ana Maria Machado!
P – Muito bem, Ana Maria Machado! E quem consegue ler para mim o nome da mulher que fez
o desenho do livro, a ilustradora?
A – Dá para ler não!
A – Lu...
P – Dá para ler não é? Dá para ler sim. É uma palavra com ―D‖.
A – DE-NI-CE!
P – Denise, muito bem!
A – Fra...
P – Fraifeld!
(Professora A, aula 05)
No fragmento dessa aula, podemos perceber que a docente afirmou ter realizado
a atividade do livro (figura 42) que explorava a capa da obra Delícias e gostosuras.
Nesse momento, a professora deu uma nova orientação aos alunos e pediu aos mesmos
para abrir o livro didático de Letramento e Alfabetização na página 86. Quando todas as
crianças localizaram essa página do livro a docente perguntou qual era o título da obra
e, em seguida, solicitou a leitura do nome da autora e da ilustradora da obra.
Nessa situação didática, consideramos que os direitos de ler, ajustando a pauta
sonora ao escrito e de dominar as correspondências entre letras ou grupos de letras e seu
valor sonoro, de modo a ler palavras e textos foram mobilizados pela professora.
Também observamos que a educadora costumava solicitar aos alunos a leitura dos
títulos dos livros que escolhia para ler em sala.
Durante a leitura dessa obra o direito de identificar semelhanças sonoras em
sílabas e em rimas também foi contemplado pela docente. É o que podemos observar no
fragmento de aula abaixo.
191
P – Bora lá? A gente vai ler um livro que a gente já tinha visto antes, tá? A capa dele tu
lembras? Só que eu não tinha o livro, aí eu consegui com tia Carmem. Aí só para a gente
relembrar, tá? Eu vou começar! ―Delícias e gostosuras! Se Isadora passa a noite lá na casa da
avó dela, de manhã logo que acorda ela toma mingau com canela. E se Henrique vem juntando,
seu Nicolau quer mingau! Já que vai ouvir, traz logo a colher de pau‖. Olha, rima aqui, olha.
Vocês notaram que rima?
Alunos – Eu quero ver! Eu quero ver!
P – Depois eu deixo vocês verem. ―Como a história dos ursos. Pode está frio ou bem quente,
mas é sempre uma delícia que enche a barriga da gente. Depois de café com leite, torrada ou
geleia, às vezes, tem ovo frito. Não é uma boa ideia?!‖.
A – É!
P – Olha, rima, olha. Geleia com ideia! Quente com gente!
A – Deixa eu ver, tia.
P – ―Papai gosta de espinafre, Puf é doidinho por mel e tem quem adore repolho feito a mãe da
Rapunzel‖. Mel rimou com Rapunzel. Que legal, eu nunca tinha visto esse livro, rapaz.
A – Tia, deixa eu ver.
P – ―Mas uma coisa eu garanto, disso eu tenho bem certeza, a Isadora e o Henrique são loucos
por sobremesa‖. Certeza rima com...
Alunos: Sobremesa!
P – Sobremesa! ―Lá vem a avô da Isadora com o seu samurá na mão. Ela disse que está trazendo
empadinha de camarão‖. Mão rima com...
Alunos: Pão!
P – Camarão! Rima com pão também, mas não aqui, né?!
A – Deixa eu ver, tia.
P – ―Ai, ai, ai, ai, minha azeitona. Ai, ai, ai, ai, minha empadinha. Quem foi que pôs a mão
sabendo que tu és minha?‖. Empadinha rima com minha! ―Esse milho amarelinho cabe aqui na
minha mão, papagaio come milho quem não come é gavião!‖. Mão com gavião! ―Cheiro bom
de carne seca...‖. Só fala de comida esse livro, né?! Me dá uma fome, né?! ―Cheiro bom de
carne seca na panela de feijão, eu já estou com muita fome que nem a do ratão‖. Feijão rima
com ratão!
A – Tia, quando a senhora terminar eu posso olhar?
A – Tia, eu também posso olhar?
A – Eu também?
P – ―Se eu fosse a Branca de neve não comia a maçã, mas não ia resistir ao quibe de hortelã‖.
A – Cadê, tia?
P – ―Pois eu prefiro salada com tomate bem vermelho, assim eu fico mais linda quando me
olhar no espelho‖.
A – Cadê, tia?
P – Vermelho rima com...
Alunos: Espelho.
P – Espelho! ―Brincam, corre, vêm cantando, vou para casa agora eu vou... era pouco e acabou‖.
Vou rima com...
A – Vou!
P – Acabou! ―Faz um suco de mamão, de melão com melancia, bem doce sinhá, bem doce
sinhá, bem doce sinhá Maria!‖. Melancia rima com Maria! ―Quem nunca comeu melado,
quando come se lambuza, quem nunca corta com a faca, se confunde quando usa!‖. Lambuza
rima com usa!
A – Tia, deixa eu olhar.
P – ―Eu enrolo o macarrão no garfo bem apertado, mas, às vezes, escorrega e eu fico
atrapalhado!‖ Apertado rimou com...
A – folgado!
P – Atrapalhado! ―Por que essa boca tão grande? É para comer bolo melhor, de coco, de
mandioca, quero o pedaço maior! Abre a oca e fecha os olhos, o avô do menino diz, surpresa de
chocolate cada um fica feliz. Em festa de aniversário é uma grande comilança, vamos todos
192
cirandar, vem um monte de criança! Vem vitória, vem Larissa, Pedro, Miguel e Janaina. Todos
cantam parabéns, muito menino e menina‖.
A – Larissa é nome da minha irmã.
A – Larissa é o nome da minha prima.
P – ―João e Maria acharam lá no meio da floresta uma casa de chocolates e agora é um bolo de
festa, mas não tem bruxa nenhuma, dá para comer inteiro com pipoca e brigadeiro, cachorro
quente e cajuzinho‖.
A – O que é cajuzinho?
A – Deixa eu ver, tia!
P – É tipo um brigadeiro só que em forma de caju.
A – Caju!
P – ―A Isadora comeu três cachorros de uma vez, mas só comeu as salsichas, senão não comia
três‖.
A – (risos)
P – Vez rimou com três! ―O Henrique pegou os pães, depois abraçou a irmão e ainda ganhou
um beijo.‖. Queijo rimou com...
Alunos: Beijo!
P – Beijo! E acabou!
A – Cadê, tia? Deixa eu olhar!
P – Ana Maria Machado é assim aqui, a mulher que escreveu a história e Denise Fraifeld, olha
aqui, olha, é mulher que desenhou a história.
A – Eu posso ver?
A – Deixa eu ver, tia.
P – Depois. Eu vou botar aqui, eu vou deixar aqui fácil e depois vocês vão ver. Agora a gente
vai fazer uma tarefa, foi rapidinho, só para relembrar!
A – Oôh tia, bota aqui
(Professora A, aula 05)
A partir do fragmento de aula podemos destacar alguns aspectos durante a
leitura da obra, tais como: a exploração e identificação das palavras que rimavam na
história, o entusiasmo dos alunos para ver as ilustrações do livro, o elogio explícito que
a professora fez a obra e o envolvimento dos alunos no momento da história. A seguir,
comentaremos cada um desses aspectos.
Nessa situação didática a docente chamou a atenção das crianças para as rimas
presentes na história. Houve momentos em que a professora mencionou as palavras que
rimavam no livro e em outras situações os próprios estudantes identificaram as palavras
que apresentavam semelhanças sonoras.
Outro aspecto que merece destaque foi o entusiasmo dos alunos durante a leitura
da obra. Em vários momentos os estudantes pediram para a professora mostrar as
ilustrações, mas ela optou por contar a história sem possibilitar que os alunos
visualizassem as ilustrações presentes na obra. No fragmento de aula acima, podemos
observar como as crianças desejavam ver as ilustrações do livro.
No momento da leitura também percebemos que a docente fez elogios à obra,
mostrando que estava gostando do que estava sendo lido. Uma das hipóteses que
193
levantamos é que a educadora pode ter gostado da opção do livro apresentar palavras
que rimam, pois esse recurso proporcionou, durante a leitura, um momento lúdico para
as crianças.
Diante disto, podemos afirmar que a educadora explorou o direito de identificar
semelhanças sonoras em sílabas e em rimas. A partir dessa situação didática também foi
possível perceber que os alunos mostraram dominar esse direito, pois explicitaram, sem
apresentar dificuldades, as palavras que rimavam na história do livro. Entretanto,
destacamos que outros possíveis desdobramentos com foco nas palavras que
apresentavam semelhanças sonoras (rimas e aliterações) não foram promovidos pela
docente, tais como: a produção de uma lista de palavras que rimavam com as palavras
contidas no livro e a escolha de uma palavra presente na história do livro e escrita de
outra palavra que iniciava com o mesmo som da que havia sido escolhida.
Nessa situação de uso da referida obra complementar consideramos que o
objetivo didático da professora esteve mais direcionado para leitura deleite. Na
entrevista realizada no final da aula podemos evidenciar que o uso desse recurso não foi
planejado pela educadora, conforme está explícito a seguir:
P – Foram os alunos que pediram para você ler o livro Delícias e
gostosuras foi?
E – Não. Eu só lembro que eu dei na época (referindo-se a atividade
do livro didático de Alfabetização e Letramento) e não consegui o
livro que eu queria na época. Aí quando eu consegui essa semana aí eu
li. Eu estava com ele no armário essa semana, sendo que eu esquecia
todo dia. Aí quando foi hoje, foi uma coincidência assim... Ele (aluno)
abriu naquela página do livro, aí eu me lembrei do livro. Foi isso! Aí
eu contei, mas não foi nada contextualizado e nem estava planejado.
(Professora A, Entrevista realizada no final da aula 05).
Na entrevista acima a educadora afirmou que o seu objetivo era de utilizar o
livro Delícias e gostosuras no momento em que realizou a atividade do livro didático
(figura 43), mas a professora não tinha essa obra na época. Como foi possível perceber
o que resgatou a memória da docente em relação à obra complementar foi o fato de um
aluno abrir na página do livro didático que havia a capa da obra. No relato da entrevista
da docente também podemos constatar que a leitura da obra foi realizada sem nenhum
planejamento prévio.
Na aula 06 a professora A também fez uso de outra obra complementar. Dessa
vez, o livro escolhido pela docente foi o ABC dos animais. Antes de iniciar a leitura
194
dessa obra a educadora conduziu os alunos para fora da sala e agrupou-os em círculo.
Como podemos perceber, esse tipo de agrupamento se diferenciou dos demais
realizados por essa professora nas situações de uso das obras complementares. Em
seguida, a docente iniciou a leitura em voz alta da história do livro.
Na figura 44 temos a capa da obra complementar e, em seguida, o fragmento de
aula ilustrando as orientações feitas pela docente nesse momento.
Figura 44 – Capa do livro ABC dos Animais que pertence ao PNLD/2012
P – Venham aqui para frente comigo para fazer um círculo. Posso começar a ler?
Alunos – Pode!
P – Aí, a partir de agora ninguém fala, está bom?
Alunos – ABC, ABC!
P – ABC!
A – ABCDE...
P – ABC de que?
A – Do sapo!
A – Dos animais!
P – Dos animais! Tem aqui, olha?! Eu vou ler bem baixinho, está certo? Para ver se vocês ficam
em silêncio. Aqui tem umas placas educativas antes de a gente começar o livro que diz:
mamíferos, aves, anfíbios, répteis e insetos. Certo? Eu vou dizer o que é cada um.
A – Eu conheço muita coisa.
(Professora A, aula 06)
No fragmento acima foi possível observar que os alunos iniciaram a leitura do
título do livro no momento que a docente expôs a obra complementar. Além dos
aprendizes iniciarem a leitura do livro, um dos estudantes começou a explicitar as letras
do alfabeto levando em consideração a ordem alfabética. Diante disso, percebemos que
o próprio título do livro contribuiu para que um dos aprendizes explicitasse as letras
seguindo a sequência alfabética. Também foi possível perceber que um dos alunos que,
possivelmente, não estabelecia relação grafofônica relacionou a ilustração presente na
capa do livro com o título da obra complementar. Isso nos dá pistas de que os estudantes
195
apresentavam conhecimentos distintos em relação ao sistema de escrita alfabética e
usavam diferentes estratégias para responder as perguntas realizadas pela professora.
Nessa sequência didática os alunos demonstraram, mesmo sem a solicitação da
professora, dominar alguns conhecimentos relacionados ao sistema de escrita alfabética.
O reconhecimento e nomeação das letras do alfabeto e o conhecimento da ordem
alfabética, nesse caso, sem a percepção dos usos da ordem alfabética em diferentes
gêneros foram direitos de aprendizagem que os estudantes mostravam dominar. Além
desses conhecimentos um dos alunos estabeleceu relação letra-som na leitura das
palavras ―dos animais‖, por isso interpretamos que este aprendiz dominava o direito de
ler, ajustando a pauta sonora ao escrito e o direito de dominar as correspondências entre
letras ou grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a ler palavras e textos. É
importante destacar que não presenciamos, durante o período de observação, situações
de ensino em que esse estudante leu textos, mas, como podemos perceber, esse aprendiz
mostrou dominar conhecimentos que envolvem esses dois direitos de aprendizagem.
Ainda com base no fragmento de aula exposto podemos observar que um dos
alunos afirmou que tinha conhecimento sobre a temática abordada no livro. Entretanto,
mesmo diante dessa explicitação do estudante, a docente não promoveu perguntas para
o aluno com o objetivo de explorar a temática.
Após essa conversa inicial em que os alunos tiveram contato com a capa do livro
ABC dos animais a professora iniciou a leitura em voz alta da história. Nesse momento,
a docente leu e explicou informações presentes no livro sobre as características e
diferenças das classes de animais vertebrados (mamíferos, aves, anfíbios e répteis) e,
com a participação dos aprendizes, mencionou alguns exemplos de animais vertebrados
que pertencem a cada classe de animais mencionada acima. Em seguida, a docente leu
em voz alta a história presente no livro.
Nessa situação didática observamos que a docente iniciou lendo minuciosamente
o livro escolhido. Entretanto, houve um momento que a professora desistiu da leitura e
passou apenas a apresentar os animais presentes na história do livro, salientando a letra
inicial do nome de cada animal. Em algumas situações também presenciamos que, além
de apresentar e mencionar a letra inicial correspondente ao nome dos animais, a
educadora explicitou algumas características do animal que estava sendo apresentado. O
fragmento de aula abaixo ilustra como ocorreu esse momento.
196
P – Agora eu vou ler para vocês um pouquinho de cada animal, está certo?
A – É a arara.
P – O nome dela é aratinga! Vamos ler sobre ela? Pode? Vamos lá, aratinga... As arantingas são
aves. As aratingas amam acordar nas árvores. Agora esse daqui...
A – Beija-flor.
P – ―B‖ de beija-flor. Vamos lá, beija-flor. B de beija-flor. O primeiro animal começa com que
letra?
Alunos – B!
Alunos – A!
P – E o segundo animal?
Alunos – B!
P – B de beija-flor! Os beija-flores são bonitos e os seus bicos bicam com as...
A – Cadê?
A – Eles pegam a flor.
P – Da flor, né? O ―C‖... E tem uma coisa que eu me esqueci de dizer a vocês... Cada letrinha
tem como fazer com a mão...
(...)
P – É uma iguana! ―I‖ é para uma iguana. As iguanas são inteligentes e irresistíveis. Eu não vou
ler o resto não... E esse aqui, quem sabe?
Alunos – Jacaré!
A – J é ―ji‖.
P – J de jacaré! Vamos passar para o outro?
P – Quem sabe esse bicho bonitinho aqui, olha. Começa com ―K‖.
A – Saguim!
A – Preguiça!
A – Avestruz!
Alunos – A preguiça!
A – Tia, minha mãe tem um boneco desse...
P – E tu sabe como é o nome dele?
A – Minha mãe sabe, mas eu...
P – É um Koala! Koala começa com...
A – Começa com ―K‖.
A – ―K e O‖.
P – Vamos ver o outro aqui...
Alunos – Leão!
P – O leão começa com a letra...
Alunos – L!
A – ―L e I‖.
P – E esse aqui?
A – Macaco!
A – Macaco dourado!
P – Não é macaco dourado. É o mico leão dourado e começa com a letra...
A – Mi!
A – M!
P – M! ―Mi‖ não! ―Mi‖ não é letra, ―mi‖ é sílaba!
A – É ―m‖ e ―i‖.
P – E esse aqui? Esse aqui nem eu conhecia...
(...)
P – Onça! É uma onça pintada! E esse aqui...
Alunos – É...
Alunos – É um papagaio!
A – Louro!
P – É um papagaio! Olha só, tem gente que está dizendo louro, mas não pode ser louro.
197
A – É arara!
P – Não é arara porque não começa com ―A‖. Começa com que letra?
Alunos – P!
P – P de que? ―P‖ de papagaio! Esse daqui também é difícil, olha. Quem sabe?
A – É...
P – Quati! Quati!
(...)
P – Esse aqui?
Alunos – Tucano!
P – Tucano começa com a letra?
A – ―T‖.
A – ―TU‖
P – T! Toda vez você está dizendo a sílaba. E esse aqui começa com o que...
Alunos – U!
P – U de urso! Urso polar! E esse aqui?
(...)
P – E por último é a ―zebra‖ com ―Z‖. Agora vê, presta atenção o que eu vou falar para vocês.
Vocês notaram que esse livro tem um animal para cada letra?
A – Tem.
(Professora A, aula 06)
O extrato de aula acima ilustra momentos da leitura realizada pela docente a
respeito da obra ABC dos animais. Nessa situação de ensino, podemos perceber que a
professora explorou a letra inicial do nome dos animais apresentados no livro e, por
isso, evidenciamos que o direito de reconhecer e nomear as letras do alfabeto foi
bastante mobilizado por esta educadora durante a leitura em voz alta da história.
A exploração do direito de reconhecer e nomear as letras do alfabeto foi
facilitada porque a obra complementar escolhida pela professora faz parte do grupo de
livros que, segundo manual dos Acervos Complementares, são enquadrados na tipologia
de ―livros de palavras, livros de imagens com legenda, livros com textos rimados de
apresentação das letras do alfabeto‖ (BRASIL, 2012, p. 27).
Dessa forma, evidenciamos que a própria organização do livro, apresentando
nomes de animais (da letra A até a Z) pertencentes à classe de vertebrados, contribuiu
para mobilização desse direito de aprendizagem.
Nessa situação de ensino também evidenciamos que outros conhecimentos
necessários para compreensão do sistema de escrita alfabética foram mobilizados pela
professora. Em alguns momentos, a partir da apresentação dos animais presentes no
livro pela docente, foi possível perceber que os alunos, possivelmente os mais
avançados em relação ao sistema de escrita alfabética, detalhavam as letras que
formavam a sílaba inicial do nome dos animais. Com a explicitação desse conhecimento
198
os estudantes podiam atentar para a composição das sílabas e, consequentemente,
refletir sobre o direito de reconhecer que as sílabas variam quanto às suas composições.
Em outras situações, observamos que no momento que a docente apresentava os
animais alguns alunos esforçaram-se para estabelecer a correspondência letra-som e ler
o nome que estava exposto no livro. Situações de ensino como essa foram importantes,
pois os estudantes foram instigados a ler e, por isso, afirmamos que os direitos de ler,
ajustando a pauta sonora ao escrito e o de dominar as correspondências entre letras ou
grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a ler palavras e textos foram contemplados
nessa situação de ensino.
No fragmento de aula acima também foi possível perceber que outros alunos,
possivelmente menos avançados em relação à compreensão do sistema alfabético de
escrita responderam às perguntas da docente em relação ao nome dos animais presentes
no livro apenas com base nas ilustrações, sem fazer relação letra-som.
Além de auxiliar nos conhecimentos relacionados ao sistema de escrita
alfabética observamos que a docente buscou, minimamente, explorar conhecimentos
relacionados à história do livro e elaborou perguntas de sondagem dos conhecimentos
prévios dos alunos.
Com relação à obra complementar, percebemos que esse livro sinalizava junto
com a apresentação de cada animal como representar cada letra do alfabeto na língua de
sinais. No fragmento de aula acima, observamos uma tentativa da docente em explorar
também esses conhecimentos com os aprendizes.
Como é possível perceber, a escolha e uso do livro pela professora foram
importantes para mobilizar conhecimentos que envolvem o sistema de escrita alfabética
e, além disso, contemplou o componente curricular de Ciências da Natureza ao explorar
as características das diferentes classes de animais vertebrados. Entretanto, faz-se
necessário destacar que a docente sinalizou por dois momentos, durante a leitura da
obra, não estar gostando do livro escolhido. Isso nos deu pistas de que a professora pode
não ter feito uma leitura minuciosa da história do livro no momento do planejamento.
Após o momento da leitura da obra complementar a docente optou por retomar o
nome dos animais apresentados na história, seguindo a ordem alfabética. Nesse
momento, os estudantes foram solicitados pela docente a informar o nome do animal a
partir da letra inicial. O fragmento de aula abaixo ilustra como ocorreu esse momento.
199
P – Eu vou passar e vocês vão dizer está certo?
Alunos – Está!
P – Qual é o animal que tem com a letra ―a‖?
Alunos – Arara!
P – Aratinga! Qual é o animal que tem com a letra ―b‖?
A – Beija-flor!
Alunos – Beija-flor!
P – Qual é o animal com a letra ―c‖?
Alunos – Cachorro!
P – Qual é o animal com a letra ―d‖?
A – Dro...
P – Dromedário! Qual é o animal com a letra ―e‖?
Alunos – Elefante!
(...)
(Professora A, aula 06)
Nesse momento de retomada do livro pela docente percebemos que os alunos
realizaram diferentes estratégias para responder as perguntas feitas pela professora.
Desse modo, observamos que houve uma tentativa dos estudantes em relacionar as
letras iniciais mencionadas pela educadora com os animais presentes no livro e com
outros animais que, em alguns momentos, tinham a mesma semelhança sonora inicial.
Também foi possível perceber, conforme já mencionamos anteriormente, que algumas
crianças, possivelmente menos avançadas em relação ao sistema de escrita alfabética,
responderam o nome dos animais com base nas ilustrações presentes no livro e,
consequentemente, a partir dos seus conhecimentos prévios, sem estabelecer relação
grafofônica com que estava registrado na obra complementar. Nessas situações,
observamos que a professora chamou a atenção das crianças para a letra inicial do nome
dos animais com o objetivo de que as mesmas respondessem às perguntas estabelecendo
relação letra-som.
Com base nas intervenções realizadas pela professora, nessa situação didática,
compreendemos que os direitos de ler, ajustando a pauta sonora ao escrito e o de
dominar as correspondências entre letras ou grupos de letras e seu valor sonoro, de
modo a ler palavras e textos foram contemplados. Entretanto, não podemos
desconsiderar a hipótese de que os estudantes podem também ter respondido o nome
dos animais corretamente, de acordo com a letra mencionada pela professora, por
lembrar o nome dos animais, tendo em vista que já tinham tido o primeiro contato com
essa obra no momento da primeira leitura.
No fragmento de aula acima ainda foi possível perceber que, em alguns
momentos, a professora fez as perguntas e, em seguida, respondeu, enfatizando o nome
200
que estava registrado na obra. Nessas situações observamos que, em alguns momentos,
faltou paciência por parte da docente em esperar que os alunos lessem ou descobrissem
o nome do animal através de pistas dadas pela própria educadora.
Após a leitura e retomada do nome dos animais presentes na obra a professora
organizou os alunos e conduziu-os para dentro da sala. Na sala os estudantes sentaram
em suas respectivas cadeiras que estavam aparelhadas em duplas, como normalmente
foram organizadas durante o período de observação. Nesse momento, com os alunos já
acomodados em sala, a docente passou com uma sacola de banca em banca e pediu para
cada criança retirar uma ficha de dentro da sacola e tentar ler silenciosamente o que
estava registrado na ficha. Em cada ficha havia o nome de um animal presente na obra
lida anteriormente. Isso significa dizer que havia 26 fichas com nome de um animal
vertebrado, sendo uma ficha para cada letra do alfabeto, ou seja, da letra A até a Z.
Durante o período de observação foi possível perceber que a proposta dessa
atividade pela docente despertou a curiosidade nos alunos para descobrir o nome do
animal registrado na ficha. Uns estudantes, inclusive, tentaram ler a partir dos
conhecimentos que já dominavam sobre o funcionamento do sistema de escrita e outros
solicitaram aos colegas, mais avançados em relação ao domínio do sistema alfabético,
uma ajuda para ―ler‖ o nome do animal escrito na ficha.
Quando todos os estudantes presentes em sala estavam com uma ficha, a docente
informou aos educandos que iria registrar as letras no quadro seguindo a ordem
alfabética. Dito isto, a professora escreveu no quadro a letra A e, em seguida, perguntou
quem dos alunos estava com a ficha que tinha o animal que inicia com a referida letra.
Nesse momento, após ter acesso à ficha com o nome do animal que inicia com a letra A,
a educadora fixou a ficha embaixo da letra supracitada. O mesmo procedimento
aconteceu com as demais letras do alfabeto. A figura 45 e fragmento de aula abaixo
ilustram detalhadamente essa situação de ensino.
201
Figura 45 – Atividade realizada a partir da obra ABC dos animais.
P – O nome que vocês estão é o nome de algum animal que estava no livrinho que a gente leu.
Vamos lá... Quem já leu o seu? Quem já leu fica em silêncio para que o amigo leia. Eu falei que
não podia conversar. Posso começar?
Alunos – Pode!
P – A gente pode... Eu vou escrever todas as letras aqui no quadro... E quando eu falar ―quem é
que tem um animal com tal letra?‖ Aí vocês vão vir aqui na frente para dizer ―tia, cola o meu
que é o meu que começa com essa letra‖. Eu vou começar agora, mas só que eu quero todo
mundo em silêncio. Vou começar. Eu disse que cada um vai ler o seu. Vamos lá, quem é que
pegou um animal que começa com a letra ―a‖?
A – Aaaa...
P – Qual era o animal do texto que começava com a letra ―a‖? Qual era?
A – Arara!
P – Não era arara!
A – Cachorro!
P – Cachorro começa com ―a‖?
A – Não!
A – Não! Começa com ―c‖.
P – E qual era o animal do texto que começava com ―a‖? Lá do livrinho...
A – Não.
A – Beija-flor!
A – Koala!
P – Koala? Eita, ficou comigo, olha. Ninguém pegou essa ficha. O animal era a-ra-tin-ga!
Aratinga que começa com ―a‖. Era aratinga! Agora, quem é que está com o animal que começa
com a letra ―b‖?
A – Elefante!
P – Está comigo de novo a ficha. É beija-flor! E começa com?
Alunos – B!
P – B!
A – De novo, tia?
P – Não foi... Eu fiquei com os dois! Agora, quem é que tem um animal que começa com a letra
―c‖?
A – Cachorro!
P – Muito bem! Você vai me dizer o seu animal, está bom? Quando você chegar aqui! Como ele
fez e falou ―cachorro‖. Quem é que está com o animal... Vamos lá, quem é que está com o
animal, A, B, C...
A – D!
P – Quem é que está com o animal que começa com ―d‖?
A – Eu!
202
P – E como é o nome do seu animal?
A – Dromedário!
P – Dromedário! Muito bem. Eu disse que era para cada um tentar ler o seu. Não é para pedir
ao amigo não...
A – Eu não consigo ler não, tia.
P – Quem é que está com o animal que começa com a letra ―e‖?
A – Ele!
A – Eu achei!
P – Como é o nome do seu animal?
A – É elefante!
A – Elefante!
P – Traz a ficha com o nome do seu animal. Eita, qual é a próxima letra que eu não sei.
Alunos – F!
P – F? Vamos ver. A, B, C, D, E...
Alunos – F!
P – Quem é que tem um animal com a letra ―f‖? Sou eu!
A – De novo?
P – Qual é o animal? Quem consegue ler?
A – FOR-MI-GA!
A – Formiga!
A – Formiga!
P – Começa com a letra ―f‖. Depois da letra ―f‖ qual é a letra?
A – ―I‖!
A – A, B, C, D, E, F e G!
A – G!
(...)
P – KO-A-LA! Koala! Depois do ―k‖ qual é a letra?
A – A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, L... É ―L‖!
P – L! Você está de parabéns! Quem que tem um animal com a letra ―L‖? Quem que tem um
animal com a letra ―L‖? Você tem com essa letrinha aqui?
A – Ele está com ela aqui.
P – O seu animal começa com essa letra? Cada um fez o seu. Agora é a vez dele. O seu animal
começa com essa letra? Veja aí para mim, por favor. O seu começa com essa letra? Você sabe
qual é essa letra? Qual é o nome dela?
A – Eu não sei.
P – O nome dessa letrinha aqui é letra ―L‖. Me dê o seu. É ―l‖ de que? Sabe dizer o nome?
A – Não.
P – L de leão!
A – Leão!
A – Le-ão!
P – Depois de ―L‖ é que letra?
(...)
P – Eu vou botar o ―P‖ logo porque já disseram. Quem é que tem um animal com ―O‖? Qual é o
seu animal? Começa com ―o‖ qual é o nome dele?
A – É ovo! Eu sei é ovo!
P – Nossa amiga disse que era onça...
A – Onça pintada!
P – Onça pintada! Está certo. Começa com ―o‖. E com ―p‖ quem é que tem um animal que
começa com ―P‖?
(Professora A, aula 06)
203
Como podemos observar a docente explicou o funcionamento da atividade para
os alunos e, em seguida, perguntou o nome dos animais corresponde à letra que estava
sendo anunciada. Conforme foi mencionado, nessa situação didática a professora
explicitou as letras com ênfase na ordem alfabética e solicitou aos estudantes a leitura
do nome das fichas.
Nos momentos que as crianças estabeleceram a relação letra-som e explicitaram
outras palavras que tinham a mesma letra inicial anunciada pela educadora
identificamos pouca valorização das respostas dos estudantes por parte da professora.
Esses dados revelam que os estudantes apresentavam conhecimentos
relacionados aos direitos de aprendizagem de sistema de escrita alfabética, tais como:
reconhecer e nomear as letras do alfabeto, identificar as semelhanças sonoras em sílabas
e em rimas; conhecer a ordem alfabética e seus usos em diferentes gêneros, ler,
ajustando a pauta sonora ao escrito e dominar as correspondências entre letras ou grupos
de letras e seu valor sonoro, de modo a ler palavras e textos.
Diante disto, destacamos que situações didáticas dessa natureza são importantes
no processo de alfabetização, pois, a partir delas, as crianças dos anos iniciais do Ensino
Fundamental, podem refletir sobre os direitos de aprendizagem já citados e,
consequentemente, consolidá-los.
A forma como a professora contemplou os direitos de aprendizagem citados foi
importante para os alunos que estão em processo de alfabetização, pois possibilitou que
os mesmos refletissem sobre vários conhecimentos que envolvem o sistema de escrita.
Por outro lado, vale ressaltar que, mesmo diante de uma situação de ensino
favorável para aprendizagem dos direitos mencionados acima, destacamos que houve
uma falta de cautela por parte da docente, uma vez que a mesma, em alguns momentos,
não esperou a fala das crianças na hora em que fazia as perguntas sobre o nome dos
animais. Em outras situações, a docente não fez intervenções nos momentos em que os
estudantes explicitaram o nome de animais e de outras palavras que não iniciavam com
a letra que estava sendo anunciada por ela, ou seja, sem relacionar e identificar a
semelhança sonora no início das palavras.
Além disso, percebemos que o planejamento dessa atividade em torno das fichas
do nome dos animais requeria o quantitativo de 26 alunos, tendo em vista que o nosso
alfabeto é formado por 26 letras. Entretanto, como vimos, a docente não tinha esse
número de estudantes em sala e, por isso, teve que realizar momentos de improviso
nessa situação de ensino.
204
Com base numa concepção de alfabetização na perspectiva do letramento
consideramos também que a professora poderia realizar outros encaminhamentos a
partir dessa obra complementar e das fichas com o nome dos animais.
Um dos encaminhamentos que poderiam ser realizados pela docente seria a
produção de uma lista com os nomes dos animais presentes na obra, levando em
consideração a ordem alfabética. Além disso, a docente também poderia misturar as
fichas com o nome dos animais e solicitar aos alunos organização das mesmas de
acordo com princípio da ordem alfabética. Em seguida, poderia propor aos alunos a
produção coletiva de uma lista de palavras com o nome de outros animais, considerando
a ordem alfabética.
Uma forma de mobilizar o conhecimento da ordem alfabética com o uso dos
gêneros textuais seria através da produção de um glossário para compor o acervo da
biblioteca da escola com alguns nomes dos animais (vivenciados na obra
complementar) que os estudantes não conheciam, como, por exemplo, ARATINGA,
DROMEDÁRIO, IGUANA, KOALA, NUTRIA, WALLABY, XEXÉU e YARK. No
primeiro momento, a professora apresentaria para os aprendizes como os glossários são
organizados e, em seguida, poderia solicitar que os mesmos realizassem pesquisas sobre
os animais escolhidos. Na sequência, com base nas informações contidas na obra
complementar e nas pesquisas realizadas, os alunos escreveriam um texto, tendo a
professora como escriba, com as principais características de cada animal selecionado
para compor o glossário. No momento da confecção desse gênero a docente poderia
expor que o nome dos animais junto com suas características seria exposto no glossário
com base no princípio da ordem alfabética.
É importante destacar que, na promoção da situação didática sugerida acima, a
docente levaria os estudantes a refletir sobre a ordem alfabética, levando em
consideração um gênero textual que é organizado com base nesse princípio.
Na aula 07 a professora A fez uso da obra Era uma vez... 1, 2, 3 em sala. O
livro escolhido pela docente apresenta os números de 1 a 10 na ordem crescente e
decrescente e, junto a essa apresentação, articula a temática dos contos de fadas.
Durante essa aula, observamos que a educadora primeiramente realizou atividades no
livro didático de matemática envolvendo os números naturais e a introdução dos
conceitos de subtração. Em seguida, organizou os estudantes para o horário da merenda
e recreio. No retorno para a sala a docente fez uso dessa obra.
205
Durante a entrevista realizada no final da aula 07 a docente revelou que o livro
Era uma vez... 1, 2, 3 foi selecionado porque estava relacionado com os objetivos da
aula. Durante a aula, a docente contemplou os números naturais e introduziu noções
sobre subtração. Além disso, a educadora sinalizou que estava contemplando o gênero
conto de fadas, pois, de acordo com o planejamento proposto pela prefeitura, era um dos
gêneros que deveria ser contemplado em sala naquele Bimestre do ano letivo. Isso nos
dá pistas de que os critérios de escolha dessa obra complementar foram ancorados no
conteúdo referente ao componente curricular de matemática que foi abordado na aula e
no gênero textual que já estava sendo priorizado pela educadora nas demais aulas.
No momento que a professora pegou essa obra complementar os estudantes
estavam sentados nas cadeiras enfileiradas que eram diariamente organizadas em
duplas. Diante disso, destacamos que a docente optou por esse tipo de agrupamento que,
inclusive, foi o mais comum durante o período de observação das jornadas de aula.
Ao utilizar a obra complementar supracitada a docente fez algumas solicitações
em comum ao que já havia realizado nos outros momentos em que fez uso desse tipo de
recurso. O fragmento de aula abaixo ilustra como a docente solicitou aos aprendizes a
leitura do título e, através dessa ação, contemplou dois direitos de aprendizagem
voltados para o eixo de apropriação do sistema de escrita alfabética.
Figura 46 - Capa do livro Era uma vez... 1, 2, 3 que pertence ao PNLD/2012.
P – Posso começar? Eu vou escrever o nome do livro aqui e quero que vocês leiam para mim.
Posso? O nome do livro é esse aqui, olha. Quem consegue ler para mim?
A – Ovinhos dourados!
A – Ovinho dourado!
A – Ovinho dourado!
A – E-ra...
A – O lobo mau!
A – Era uma vez! Era uma vez!
A – Era uma vez!
A – O lobo mau!
A – Era uma vez! Era uma vez 1, 2, 3! Era uma vez 1, 2, 3!
P – Era uma vez 1, 2, 3! Posso? Vamos lá? Vocês acham que esse livro vai falar sobre o que?
A – Sobre os números!
206
P – Vai falar sobre os números? Alguém mais tem alguma opinião?
A – Vai falar de ovo, de ovo!
P – Vai falar sobre um ovo? Vamos ver...
A – Vai falar sobre um dinossauro.
P – Vai falar sobre o ovo do dinossauro? Vamos ver. Teve gente que disse que esse livro vai
falar sobre ovos de dinossauros e teve gente que disse que esse livro vai falar sobre ―contas de
menos‖. Vamos começar para a gente ver quem acertou?
A – É do ovo!
A – Dinossauro!
A – De um dinossauro, olha aí.
P – Agora eu vou ler ele bem baixinho para vocês, tá?
A – Tia, depois a senhora deixa eu ler?
P – Vou começar! A partir de agora vocês só vão falar se for para perguntar sobre o livro. Está
certo?
A – Dinossauro!
P – Vou começar... ―Era uma vez 1, 2, 3‖...
(Professora A, aula 07)
No fragmento de aula acima percebemos que a docente escreveu o título do livro
no quadro e solicitou aos alunos a leitura do mesmo. A cópia do título no quadro e a
solicitação da leitura do título da obra foram estratégias realizadas pela professora
durante o uso do livro Era uma vez 1, 2, 3. Em outras situações de ensino também
identificamos que tais estratégias foram contempladas, por exemplo, conforme
analisamos, na aula 03, através do uso da obra Que horas são?. Diante disso,
identificamos que essas foram estratégias recorrentes na prática dessa professora nas
situações de uso das obras complementares e de outros recursos didáticos, como, por
exemplo, o livro didático.
Nessa situação didática também consideramos que a pergunta ―Quem consegue
ler para mim?‖ feita pela docente incentivou os estudantes mais avançados em relação
ao sistema de escrita alfabética a realizar a leitura do título da obra complementar, por
isso, categorizamos que essa situação de ensino contribuiu para mobilizar o direito de
aprendizagem de ler, ajustando a pauta sonora ao escrito e a dominar as
correspondências entre letras e grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a ler
palavras e textos.
Durante a pergunta realizada pela docente que foi apresentada acima
observamos que alguns alunos responderam com base no que estava representado na
ilustração da capa do livro. Esses dados revelam que os estudantes, possivelmente
menos avançados em relação ao sistema de escrita alfabética, elaboraram hipóteses para
responder essa pergunta feita pela professora, por ainda não conseguir ler, ajustando a
pauta sonora ao escrito.
207
Por outro lado, com base no fragmento de aula exposto, também podemos
perceber que um dos alunos, diante da pergunta anunciada acima, mostrou que
dominava as correspondências entre grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a ler
palavras.
No momento que um dos alunos leu o título da obra em voz alta a professora
realizou algumas perguntas voltadas para antecipação de sentidos e ativação dos
conhecimentos prévios relativos à obra que seria lida. Diante disso, constatamos que
tais perguntas davam subsídios para a mobilização dos direitos de aprendizagem
voltados para o eixo de leitura. Tais direitos não serão discutidos, pois esse estudo está
ancorado apenas nos direitos de aprendizagem de apropriação do sistema de escrita
alfabética.
A partir do fragmento de aula apresentado acima também foi possível perceber
que os alunos mostraram curiosidade e entusiasmo antes e durante da leitura da obra
complementar. Durante a leitura a docente manteve seu foco em intervenções voltadas
para a exploração das histórias referentes aos contos de fadas abordados no livro.
Segundo a professora, tais intervenções foram necessárias, pois estavam articuladas com
os conteúdos referentes ao Bimestre.
Na aula 08 a professora A utilizou a obra complementar intitulada Cores em
Cordel. De acordo com o manual dos acervos complementares – Alfabetização e
Letramento nas diferentes áreas do conhecimento esse livro oportuniza as crianças um
mergulho ao universo das cores através da literatura de cordel e também apresenta uma
linguagem poética e crítica organizada por rimas e versos (BRASIL, 2012).
Nessa aula a docente reuniu seus alunos com os demais estudantes de duas
turmas de 1º ano do Ensino Fundamental pertencentes à escola campo de observação
para assistir o vídeo referente ao livro ―Bom dia, todas as cores!‖ de Ruth Rocha.
Depois que os alunos assistiram ao vídeo a professora colocou mais outros dois vídeos
informativos envolvendo as cores primárias e secundárias. Após vivenciar esse
momento, a docente iniciou a leitura da obra Cores em Cordel.
Esses dados nos dão pistas de que os critérios de escolha e uso dessa obra
estavam ancorados no componente curricular de artes que, inclusive, foi um dos
componentes mais contemplados na aula. Outro aspecto que merece destaque foi mais
claramente compreendido durante a entrevista realizada no final da aula, pois, a partir
deste instrumento de coleta, percebemos uma tendência da docente em explicitar,
durante a pergunta direcionada aos objetivos da aula, que sua prática estava mais
208
ancorada numa perspectiva disciplinar. No fragmento da entrevista abaixo é possível
evidenciar essa perspectiva.
E – Você conseguiu realizar todos os objetivos elencados para aula de
hoje?
P – Hoje foi português e artes. Aí em artes a gente deu as cores
primárias e secundárias e em português eu dei um conto de cinderela.
(Professora A, Entrevista realizada no final da aula 08).
Como podemos perceber no fragmento da entrevista realizada ao final da aula, a
docente explicitou que nessa aula seus objetivos estavam voltados em dois componentes
curriculares, aproximando-se, dessa forma, de uma perspectiva mais disciplinar do que
ancorada em projetos e sequências didáticas.
No momento que docente utilizou essa obra complementar estavam presentes na
sala três turmas de 1º ano do Ensino Fundamental, pois a ela recebeu em sua sala alunos
de outras duas turmas da escola. Os estudantes estavam sentados em cadeiras
enfileiradas que eram diariamente organizadas em duplas. Diante disso, voltamos a
informar que esse tipo de agrupamento de alunos foi o mais comum na prática da
prática da durante o período de observação das jornadas de aulas.
Durante a leitura dessa obra observamos que alguns dos alunos identificaram as
palavras que apresentavam semelhanças sonoras na história lida. Isso foi possível
porque, conforme anunciamos, a obra era formada por rimas. Diante disso,
consideramos que o direito de identificar semelhanças sonoras em sílabas e em rimas foi
mobilizado nessa situação didática.
Figura 47 - Capa do livro Cores em Cordel que pertence ao PNLD/2012.
P – Eu vou ler uma historinha para vocês.
A – Oba!
A – Eita, que historinha é?
P – É essa aqui, olha.
A – Das cores!
P – Olha o nome da história... Cores em cordel, quem escreveu foi Maria Augusta de Medeiros
estão vendo? Vamos lá ver o que é que esse livro vai trazer? Ele traz aqui, olha as cores
primárias. Vocês sabem quais são as cores primárias?
209
A – azul, vermelho, verde e amarelo.
P – Olha aí! Vamos ver se é? Vamos ver se são essas cores primárias?
A – Vermelho, azul e amarelo. P – A primeira cor que ele traz aqui, olha, é o vermelho!
A – Vermelho!
P – E tem assim, olha. O vermelho, o vermelho é uma cor quente, cor do fogo no fogão. É
também a cor do molho que acompanha o macarrão pra se comer no domingo na hora da
refeição. Tem o vermelho da raiva e o vermelho envergonhado e vermelho na geleia de
morango açucarado.
A – Rimou! P – E vermelho no joelho quando ele fica ralado.
A – Eu já sei, isso aí é um poema.
A – Rimou esse!
P – O vermelho é a cor do sangue, seja do bicho ou da gente. Quem diz que tem sangue azul
mente para ser diferente. Mas é bicho como um bicho e gente como a gente. Estão vendo? A
primeira cor que a gente viu de cor primária qual era?
A – Vermelho! (Professora A, aula 08)
Com base no fragmento de aula acima, podemos perceber que, inicialmente, a
docente anunciou que faria a leitura de uma história para os estudantes. Nesse momento,
alguns alunos explicitaram interesse e entusiasmo para ouvir a história que seria lida
pela professora.
Durante a apresentação do livro, especificamente o momento antes da leitura,
observamos que a professora relacionou a história da obra com os dois vídeos assistidos
pelos alunos. Conforme explicitamos, esses vídeos abordavam as cores primárias e
secundárias. Então, nesse momento inicial, percebemos a intenção da professora em
articular a obra complementar com o que estava sendo discutido na aula. Intenções
como essa também foram presenciadas em outras aulas em que a docente fez uso das
obras complementares. Desse modo, afirmamos que havia uma tendência por parte da
professora A em escolher e utilizar obras que estavam relacionadas com o tema de sua
aula.
Nessa situação didática também presenciamos que alguns dos estudantes
identificaram palavras que apresentavam semelhanças sonoras. Além de explicitar esse
conhecimento, um dos alunos relacionou a presença das rimas no texto dessa obra com
o gênero textual poema que apresenta, normalmente, esse recurso linguístico. Durante
as explicitações dos alunos a respeito das rimas identificamos que não houve
intervenções por parte da docente em explorar esses conhecimentos. No entanto, apesar
de a professora não problematizar as respostas dos alunos, consideramos que a escolha e
a leitura em voz alta dessa obra formada por versos rimados possibilitaram que os
estudantes que já compreendiam o porquê das palavras rimarem explicitassem esse
210
conhecimento. Diante disso, consideramos que essa situação didática foi importante
para mobilizar o direito de identificar as semelhanças sonoras em sílabas e em rimas.
Ainda no momento da leitura da obra destacamos que a docente poderia ter
promovido intervenções com o objetivo de comparar o gênero explicitado por um dos
estudantes (poema) com a história que eles estavam ouvindo, tendo em vista que a
história da obra apresentava características de um cordel.
Os dados apresentados acima nos dão pistas de que a intenção da docente foi em
explorar, durante a leitura da obra, as cores, sobretudo as cores primárias e secundárias
em detrimento das intervenções voltadas para as semelhanças sonoras presentes nas
palavras (rimas e aliterações).
As análises das situações de uso das obras complementares pela professora A
revelaram que as obras foram utilizadas com diferentes objetivos didáticos. Durante o
uso dos livros Que Horas são?, Era uma vez... 1, 2, 3 e Cores em Cordel percebemos
que a escolha e uso dessas obras pela docente estiveram mais relacionadas com o
componente curricular de matemática e artes, respectivamente. Na situação de uso da
obra ABC dos animais observamos que a docente explorou de forma mais direcionada
conhecimentos relacionados ao sistema de escrita alfabética e mobilizou conhecimentos
referentes ao componente curricular de Ciências da Natureza. Apenas na situação de uso
do livro Delícias e Gostosuras identificamos que a escolha desse recurso se deu de
modo mais improvisado e, conforme foi explícito pela professora, de forma não
planejada.
A partir dos dados apresentados pela professora A também observamos que as
situações didáticas envolvendo as obras complementares foram importantes para
mobilizar vários direitos de aprendizagem. Conforme anunciamos, detalhamos apenas
os direitos de apropriação do sistema de escrita alfabética, pois estão ancorados com os
objetivos dessa pesquisa. Desse modo, identificamos os direitos de reconhecer e nomear
as letras do alfabeto, conhecer a ordem alfabética e seus usos em diferentes gêneros,
identificar semelhanças sonoras em sílabas e em rimas, reconhecer que as sílabas
variam quanto às suas composições, ler, ajustando a pauta sonora ao escrito e o de
dominar as correspondências entre letras ou grupos de letras e seu valor sonoro, de
modo a ler palavras e textos.
Na prática da professora B identificamos o uso das obras complementares nas
aulas 05, 06 e 09, ou seja, em três das dez jornadas de aulas observadas. Durante essas
aulas, observamos que os livros foram utilizados por esta docente com objetivo de
211
explorar o eixo de leitura, o de apropriação e, além disso, para contemplar
conhecimentos relacionados aos conteúdos abordados nessas obras, inclusive ancorados
ao componente curricular de matemática. Entretanto, nas situações de uso das obras
complementares, especificamente nas aulas 05 e 09 não percebemos a intenção por
parte da docente em promover intervenções que pudessem auxiliar na mobilização de
algum direito de aprendizagem de apropriação do sistema de escrita alfabética. A seguir,
apresentaremos como se deu cada situação didática envolvendo as obras
complementares utilizadas por essa professora.
Na aula 05 a referida docente utilizou a obra complementar intitulada A
economia de Maria. Segundo o manual dos acervos complementares – Alfabetização e
Letramento nas diferentes áreas do conhecimento essa obra narra a história de duas
irmãs que receberam um cofrinho para guardar dinheiro. Ao iniciar a história o leitor
percebe que uma das irmãs gastou toda a sua economia armazenada no cofrinho e, por
isso, resolveu pedir dinheiro emprestado a sua irmã para comprar os objetos que
desejava. Através dessa situação, o leitor pode perceber a relação de amor e amizade
entre as irmãs. A obra também pode induzir o leitor, a partir de uma situação com
elementos do universo infantil, a realizar reflexões sobre situações de compra, vendas,
empréstimos e dívidas de forma bem-humorada (BRASIL, 2012).
Durante essa aula percebemos que a professora leu em voz alta o livro A
economia de Maria para os estudantes após realizar a oração com os mesmos. A oração
era uma ação realizada pela docente no início de cada aula. No momento da leitura do
livro os alunos estavam organizados individualmente com as cadeiras enfileiradas.
Conforme detalhamos, em outras situações didáticas analisadas, percebemos que esse
foi o único tipo de agrupamento proposto pela professora durante o período de
observação. Uma das hipóteses que levantamos é que a escolha desse tipo de
agrupamento esteja relacionada com o tamanho do espaço físico da sala que era muito
reduzido para o quantitativo de alunos matriculados.
Durante a leitura dessa obra a docente promoveu intervenções que podem ser
enquadradas nos direitos de aprendizagem de leitura e também explorou o sistema
monetário com os estudantes, conteúdo pertencente ao componente curricular de
matemática. Inclusive no início da leitura, no momento da apresentação da capa, as
intervenções promovidas pela professora foram voltadas para o componente curricular
de matemática. A seguir, detalhamos a figura 48 com a capa dessa obra e o fragmento
de aula abaixo ilustra como ocorreu esse momento.
212
Figura 48 - Capa do livro A economia de Maria que pertence ao PNLD/2012.
P – Eu trouxe esse livrinho! Esse livrinho é muito interessante. Vamos sentar para ouvir?
Alunos – (risos)
P – Vejam... Aqui não tem graça nenhuma.
Alunos – (risos)
P – O nome desse livrinho... Posso? Posso? Posso? Vamos? Vamos? Veja só... A economia de
Maria, a economia de Maria. Olha, fala Maria... Olhando para a capa a gente vê quantas pessoas
na capa?
Alunos – Duas!
P – Tem quantas?
A – Duas!
A – Três!
P – A economia de Maria, de Maria. São duas! Maria tem uma irmã.
A – São duas!
Alunos – São gêmeas.
P – Elas são iguaizinhas. Vamos ver o que Maria conseguiu fazer?
A – Era uma vez um...
P – Comecei! Se eu ver uma conversa, eu paro o livro e não continuo. Se eu ouvir uma palavra
antes de eu terminar eu paro e não continuo. Vamos prestar atenção! Cristian? Vamos?
Comecei! A economia de Maria! Helena e Maria ganharam cofrinhos no dia das crianças para
economizar e guardar com as palavras mágicas. Na vida das gêmeas tem sempre alguém que
gosta de gastar e tem sempre alguém gosta de economizar. O importante é ter equilíbrio entre
economizar e gastar.
A – Cadê, tia? Eu não vi não.
P – A outra falou tem tanta coisa que eu gostaria de comprar, minha lista é tão comprida que
nem cabe na minha cabeça. Helena ficou pensando, ficou pensando e disse assim: ―não vejo a
hora de colocar moedas nele!‖ e Maria também queria um copo cheio de moedas. Uma está
pensando em gastar e fez até uma lista de tudo que ela (Helena) quer comprar e a outra menina
Maria ficou pensando numa família de porquinhos que ela quer encher de moedas... Vamos ver
no que vai dar essa história...
(...)
A – Ela é destruidora, velho!
P – E pediu dinheiro emprestado a irmã. O dela ficou vazio e ela pensou: ―vou pedir dinheiro
emprestado a minha irmã‖. Então, disse a Maria que precisava comprar o carimbo e o iôiôiô que
canta. Você pode me emprestar um pouco do seu dinheiro para mim?
A – Posso não...
(Professora B, aula 05)
213
O fragmento de aula acima revela que os alunos acharam engraçado o momento
que a professora apresentou a capa do livro, provavelmente, por conta da ilustração.
Durante a apresentação da capa do livro a docente fez a leitura do título e, em seguida,
perguntou aos estudantes o quantitativo de pessoas presentes na ilustração da capa.
Esses dados revelam que a professora buscou explorar aspectos presentes na capa que
não estavam relacionados com os direitos de aprendizagem de apropriação do sistema
de escrita alfabética.
No momento que a professora informou que iniciaria a história do livro um dos
alunos articulou com a expressão ―era uma vez‖ que, geralmente, representa o início dos
contos. Durante a leitura, identificamos que a docente fez a leitura quase sem
interrupções e buscou ressaltar aspectos voltados para a importância de se ter um
equilíbrio financeiro no convívio social e para situações de compra e venda. Os alunos,
por sua vez, diante dessa situação didática, mostraram-se atentos durante a história.
Após a leitura dessa obra a docente realizou um jogo intitulado Troca Números
que foi confeccionado por ela mesma. Durante a aula, percebemos que o jogo estava
articulado com a obra complementar. Depois de vivenciar o jogo com os alunos a
professora realizou uma atividade envolvendo o sistema monetário. Em seguida, a
docente retomou a história do livro para os estudantes, só que dessa vez, recapitulou a
história com suas palavras, sem fazer a leitura literal. No final da aula a professora
registrou no quadro uma tarefa articulada com a obra complementar para ser resolvida
pelos estudantes em casa.
Diante disso, evidenciamos que na prática da professora B, assim como na
prática da professora A, houve a mobilização de situações didáticas, a partir de uma
obra complementar, que tinham o objetivo de explorar de forma mais direcionada outros
componentes curriculares, nesse caso, componente curricular de matemática.
No início da jornada da aula 06 a professora B voltou a utilizar a obra intitulada
A economia de Maria. Nessa aula a docente acomodou os alunos em sala no horário da
chegada e organizou os mesmos individualmente em cadeiras enfileiradas. Em seguida,
a professora retomou elementos discutidos nessa obra complementar. No momento da
retomada da leitura da obra a professora perguntou aos alunos qual era o título do livro,
conforme ilustra o fragmento de aula abaixo.
P – Vamos começar de onde a gente parou! Vamos começar de onde a gente parou! Sentem e se
organizem! Vejam só ontem nós começamos com que livrinho? Vamos retomar com a gente
estava fazendo. Olha só, como é nome desse livro que a gente viu ontem?
214
A – João e Maria!
A – A economia de Maria!
P – Só tem ele é? Só ele estava aqui ontem? Foi isso que a gente aprendeu foi?
A – Maria e Helena!
P – Quem são as meninas?
A – Maria e Helena!
Alunos – Maria e Helena!
P – Elas faziam o que? É uma historinha que conta o que aqui?
A – Sobre o din...
P – Sobre o que? Sobre o dinheiro!
A – Dinheiro!
A – Dinheiro!
P – Agora não é hora de desenhar não guarde tudo. Guarde tudo, por favor! Essa historinha
conta uma história de que?
A – De dinheiro!
P – De como utilizar o dinheiro! E que a gente deve fazer economia porque se a gente não
economizar hoje... Quando a gente precisar amanhã a gente tem! Não é verdade? Eu passei para
a casa uma atividade que foi sobre o livro. Vamos ver essa atividade.
A – Eu não vim ontem não!
P – Todo mundo vai abrir o caderninho na atividade de ontem naquela tarefinha, na tarefinha de
ontem. Você eu sei! Abrir na tarefinha de casa para a gente ver esse problema! A de ontem!
A – Oô tia!
A – A de ontem?
A – Eu não vim ontem!
P – Enquanto organiza aí... Silêncio! Eu quero a página aberta.
(Professora B, aula 06)
No fragmento de aula acima é possível visualizar que a professora perguntou aos
alunos qual era o nome da obra lida no dia anterior. Diante dessa pergunta, observamos
que um dos alunos respondeu ―João e Maria‖, possivelmente, com base nas leituras
anteriores feitas pela docente e sem estabelecer relação letra-som. Além desse aluno,
identificamos que outro estudante também respondeu a docente estabelecendo relação
entre a pauta sonora e o registro escrito. Desse modo, diferente de como se deu a
mediação desse livro pela professora nos outros dois momentos anteriores, percebemos
que, dessa vez, a docente optou em perguntar aos estudantes o nome da obra, por isso
consideramos que ela, a partir dessa situação didática, contemplou os direitos de
aprendizagem de ler, ajustando a pauta sonora ao escrito e o de dominar as
correspondências entre letras ou grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a ler
palavras e textos.
Durante essa situação didática, conforme é possível visualizar no fragmento de
aula acima, a professora apenas retomou alguns fatos ocorridos na história da obra, sem
fazer a leitura da mesma. Esses dados nos dão pistas de que a retomada dessa história
pela docente foi realizada com o objetivo de recapitular a atividade que havia sido
215
realizada pelos alunos em casa. Após retomar essa atividade a professora fez a correção
coletiva e, em seguida, registrou no quadro outra atividade envolvendo o sistema
monetário.
Na aula 09 essa professora fez uso de outra obra complementar. Dessa vez, a
escolha da docente foi o livro intitulado Clact... clact... clact. De acordo com o Manual
de Acervos Complementares – Alfabetização e letramento nas diferentes áreas do
conhecimento essa obra apresenta um monólogo de uma tesoura que encontra papéis
coloridos e começa a organizá-los. Com esse livro os estudantes podem refletir sobre
lateralidade e as cores. Além disso, introduz momentos de reflexão a respeito das
figuras geométricas planas (BRASIL, 2010).
No início da jornada da aula 09 a docente acomodou os estudantes na sala e
manteve o mesmo agrupamento das demais aulas observadas, ou seja, os alunos foram
organizados individualmente com as cadeiras enfileiradas. Após acomodar os discentes
em sala a professora fez uma oração com os mesmos e, em seguida, iniciou a leitura em
voz alta da história do referido livro. Com a obra em mãos, a docente promoveu
perguntas mais direcionadas para a ilustração da capa do livro. Esse tipo de abordagem
da capa do livro também foi promovido pela docente em outras situações didáticas,
como, por exemplo, na situação de uso da obra A economia de Maria. Diante disso,
constatamos que esse tipo de abordagem da capa dos livros lidos, com um olhar mais
direcionado para a ilustração, foi uma estratégia mais recorrente na prática dessa
professora. A figura 49 ilustra a capa dessa obra e no fragmento de aula abaixo podemos
observar como se deu essa situação didática.
Figura 49: Capa do livro Clact... clact... clact que pertence ao PNLD/2010.
P – Olha só, esse livrinho... O que é que tem na capa dele? O que é que tem na capa dele?
A – Tesoura e papel colorido!
A – Lombriga!
A – Tesoura e papel colorido!
P – Olha só, o que é que tem na capa desse livro?
216
Alunos – Tesoura e papel colorido!
P – Papel colorido! Esse papel como está? Como está esse papel?
A – Dobrado!
P – Como está esse papel colorido?
Alunos – Cortado!
P – Está cortado! O que será que aconteceu com esse papel?
A – A tesoura pegou e cortou!
P – Será? Vamos ver?
A – A tesoura comeu!
A – A tesoura torou!
A – A tesoura comeu, comeu!
P – Vamos? A historinha desse livro se chama Clact...Clact...Clact... O título do livro é
Clact...Clact...Clact...
A – Clact...Clact...Clact...
P – Esse nomezinho aqui é o título do livro, olha. O título: Clact...Clact...Clact...
(...)
A – É!
P – A ideia! Vamos começar? Agora eu só vou ler quando eu não ouvir mais nenhuma vozinha.
Vamos ver quem escreveu esse livro, quem escreveu foi Liliana e Michele. As duas escreveram
esse livrinho!
A – Liliana e Michele!
P – Vou começar! Comecei! Olha só... Um dia uma tesoura encontrou um monte de papel
picado, que horror, ela pensou. Eu nunca teria feito um serviço tão mal feito, mas o papel já
estava picado e não tinha como fazer isso outra vez. Foi então que a tesoura achou que, pelo
menos, poderia por ordem naquilo. Cortou os pedaços de papel em várias flores e todas as flores
estavam mis-tu-ra-das!
A – Eu sei!
(...)
P – A tesoura olhou e disse o seguinte: Clact...Clact...Clact! Quero que os amarelos formem um
círculo! E os amarelos foram e formaram um círculo!
A – Parece um sol!
P – Clact! (Ela falou). Parece uma bola (falou a tesoura). Que não se deu por satisfeita, que
novamente: Clact...Clact...Clact! Quero que os azuis formem um quadrado!
A – Tia!
P – E os azuis formaram um quadrado! Ela olhou e fez: Clact! Que coisa horrorosa! Falou a
tesoura que não se deu por satisfeita. Ela olhou, olhou e fez: Clact...Clact...Clact! Quero que os
vermelhos formem um...
A – Triângulo!
P – Triângulo! E os vermelhos formaram um triângulo! Ela olhou e disse assim: Clact! É isso
que é um triângulo?
A – É!
P – É isso é um triângulo eu sou um cerrote!
(...)
A – kkkkkkkkkk...
Alunos – Êeeeee! Uuuh!
P – É hora de ouvir!
A – Pega a tesoura!
P – A tesoura tinha o que?
A – Papel!
217
A – Papel colorido!
P – A tesoura... Ela queria organizar! A tesoura queria o que?
A – Organizar!
(...)
P – A gente aprendeu o que com essa história?
A – Nada!
P – Aprendeu o que com ela?
A – Para pegar o papel, para pegar o papel, tia.
P – Ela não ficou satisfeita. Ela não respeitou as diferenças dos papéis que eles só conseguiam
se arrumar desse jeito. Ela não respeitou o limite... Esse livrinho aqui é só para a gente perceber
que a gente precisa... A gente precisa de que? A gente precisa de que? De or-ga-ni-za-ção!
A – Or-ga-ni-za-ção!
P – Precisa de organização!
(...)
P – É como na escola, a gente precisa de organização para fazer todos os trabalhos bem feitos.
Não é verdade?
A – É!
(Professora B, aula 09)
Conforme já anunciamos, no momento inicial de uso dessa obra complementar,
a docente optou, inicialmente, por explorar a capa do livro. Nesse momento, foi possível
observar que, a partir das perguntas promovidas pela professora, os alunos elaboraram
suas hipóteses sobre o que estaria registrado na capa do livro. Nessa situação didática,
identificamos que o uso dessa obra esteve mais relacionado com os direitos de
aprendizagem de leitura e sobre elementos da história que foram retomados pela
docente. Diante disso, não conseguimos mapear nenhuma intervenção da professora
nessa situação de ensino que pudessem proporcionar momentos de reflexão e
exploração a respeito dos direitos de aprendizagem de apropriação do sistema de escrita
alfabética.
Segundo o Manual de Acervos Complementares – Alfabetização e letramento
nas diferentes áreas do conhecimento (BRASIL, 2010) e, com base no fragmento do
extrato de aula, essa obra complementar contempla os conteúdos como lateralidade, as
cores e a formação de figuras geométricas planas. Entretanto, durante e após a leitura da
obra, a docente relacionou os elementos da história com a importância de ser
organizado, ressaltando que a personagem (tesoura) nunca estava satisfeita com a
organização dos papéis. Diante disso, identificamos que os reais elementos da história
articulados com o componente curricular de matemática não foram mobilizados pela
educadora. Uma das hipóteses que levantamos sobre essa situação de ensino é que,
218
possivelmente, a professora, no momento de planejamento e escolha desse recurso
didático, pode não ter consultado o manual das obras complementares que traz
informações sobre esse livro.
Com relação aos objetivos didáticos referentes à leitura dessa obra foi possível
observar, durante a entrevista realizada ao final da aula, que a docente utilizou esse
recurso para realizar uma leitura deleite. Além disso, a partir da observação da jornada
dessa aula, identificamos que essa obra não estava relacionada com os outros
encaminhamentos realizados pela docente durante essa aula.
As análises das situações de uso das obras complementares pela professora B
revelaram que as obras foram utilizadas com diferentes objetivos didáticos. Durante as
situações de ensino a partir da obra A economia de Maria e Clact... clact... clact foi
possível observar que a escolha e uso desses livros pela professora B esteve mais
relacionado com o componente curricular de matemática, assim como em algumas
situações de uso das obras complementares pela professora A.
A partir dos dados apresentados pela professora B também foi possível perceber
que a situação didática envolvendo o uso de uma das obras complementares foi
importante para contemplar os direitos de aprendizagem de Língua Portuguesa.
Explicitamos nesse tópico, apenas os direitos de apropriação do sistema de escrita
alfabética, pois fazem parte dos objetivos dessa pesquisa. Diante disso, destacamos os
direitos de ler, ajustando a pauta sonora ao escrito e dominar as correspondências entre
letras ou grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a ler palavras e textos que,
conforme anunciamos, foram mobilizados apenas na aula 06 dessa docente.
Ao longo desse tópico, foi possível observar que as obras complementares foram
utilizadas por ambas as professoras para explorar conhecimentos relativos ao sistema de
escrita alfabética. Além de utilizar esse tipo de recurso com essa finalidade, as
professoras contemplaram o eixo de leitura e, além disso, outros componentes
curriculares ancorados as obras.
Ao analisarmos os dados, identificamos que a professora A utilizou as obras
complementares com mais frequência nas aulas do que a professora B. Com base nos
relatórios de observação, percebemos que a professora A, através das obras, explorou
uma diversidade maior de direitos de aprendizagem do que a professora B.
A pesquisa desenvolvida por Albuquerque (2014) também revelou que os
professores pertencentes à rede municipal de ensino de Camaragibe/PE conheciam e
faziam uso dos acervos complementares em suas aulas com diferentes objetivos
219
didáticos, inclusive, para contemplar o eixo de leitura e os conhecimentos que envolvem
o sistema de escrita.
A seguir analisaremos as situações de uso das obras literárias ancoradas ao
PNBE e PNAIC – Alfabetização na Idade Certa utilizados pelas professoras.
6.4 O uso das obras literárias
Neste tópico, temos o objetivo de identificar quais direitos de aprendizagem
relacionados à apropriação do sistema de escrita alfabética foram contemplados nas
práticas das professoras em situações de uso das obras literárias distribuídas pelo PNBE
e/ou Acervo PNAIC – Alfabetização na Idade Certa.
De acordo com Leal, Albuquerque e Morais (2007, p. 72 e 73) a leitura do texto
literário significa uma fonte de prazer para os estudantes e, por isso:
Precisa, portanto, ser considerada como meio para garantir o direito ao
lazer das crianças e dos adolescentes; a leitura do texto literário
promove no ser humano a fantasia, conduzindo-o ao mundo do sonho;
possibilita, ainda, que os valores e os papéis sociais sejam
ressiginificados, influenciando a construção da identidade; por fim,
sem termos a pretensão de esgotar tais razões, promove a motivação
para que as crianças e adolescentes aprendam a ler e possibilita inseri-
los em comunidades de leitores.
Ao apresentar os direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema
de escrita alfabética, não estamos desconsiderando o papel do texto literário como fonte
de prazer, mas, pelo contrário, acreditamos que esses textos e, consequentemente, as
obras literárias possam contribuir para que as crianças aprendam a ler, observando o
escrito e as ilustrações. Diante disso, concordamos que situações de interação
desenvolvidas a partir de obras literárias possam contribuir para que estudantes
construam ideias sobre o que é ler e escrever (LEAL, ALBUQUERQUE e MORAIS,
2007).
A seguir, apresentamos os direitos referentes à apropriação do SEA
contemplados pelas professoras.
220
Quadros 09 - Direitos de aprendizagem referentes à apropriação do Sistema de Escrita
Alfabética (SEA) mobilizados nas aulas pelas professoras a partir do uso das obras literárias
distribuídas pelo PNBE e PNAIC – Alfabetização na Idade Certa.
Direitos de aprendizagem
Aulas
Professora A Professora B
Reconhecer e nomear as letras do alfabeto 01 04 e 09
Compreender que palavras diferentes
compartilham certas letras
-- 09
Identificar semelhanças sonoras em sílabas e
em rimas
--
09
Segmentar oralmente as sílabas das palavras e
comparar palavras ao tamanho
09
Reconhecer que as sílabas variam quanto às
suas composições
--
09
Perceber que as vogais estão presentes em
todas as sílabas
--
09
Ler, ajustando a pauta sonora ao escrito 01 04 e 09
Dominar as correspondências entre letras ou
grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a
ler palavras e textos
01
04 e 09
Quantitativo de direitos contemplados pelas
professoras a partir do uso das obras
complementares
03
08
A partir dos dados apresentados no quadro 09, podemos evidenciar que as
professoras investigadas utilizaram obras literárias pertencentes aos acervos de
programas de distribuição de recursos didáticos do Ministério da Educação para
contemplar direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita
alfabética. Na prática da professora A foram contemplados três direitos de
aprendizagem. Nas aulas da professora B identificamos oito direitos.
No que se refere à prática da professora A, identificamos o uso de obras
literárias pertencentes aos acervos de programas de distribuição de recursos didáticos do
Ministério de Educação em uma das dez jornadas de aulas observadas: 01,
contemplando, conforme podemos visualizar acima, três direitos de aprendizagem.
Outros livros literários não pertencentes ao acervo dos programas vinculados ao
Ministério de Educação também foram utilizados por essa docente nas aulas 08 e 10.
Entretanto, de acordo com o objetivo desse tópico, detalhamos apenas as situações
didáticas desenvolvidas a partir das obras literárias que pertencem ao PNBE e PNAIC –
Alfabetização na Idade Certa.
221
Na prática da professora B observamos o uso de obras literárias pertencentes aos
acervos de programas de distribuição de recursos didáticos do Ministério da Educação
em duas das dez jornadas de aulas observadas: 04 e 09. A partir do uso dessas obras, de
acordo com o quadro 09, essa docente contemplou oito direitos. Durante o período de
observação das aulas dessa docente percebemos o uso de obras literárias que não
pertencem aos acervos disponibilizados pelo Ministério de Educação em quatro das dez
aulas observadas: 01, 02, 03 e 07. Inclusive, em uma dessas aulas, mais de uma obra foi
utilizada em uma única aula.
O uso das obras literárias pela professora A esteve voltado para a leitura deleite
durante a aula e teve o intuito também de contemplar um dos gêneros textuais, nesse
caso, o conto de fadas, que foi um dos gêneros traçados no planejamento do bimestre.
Durante a aula 01 a professora A fez uso da obra intitulada Chapeuzinho
Vermelho – Uma aventura borbulhante. A leitura dessa obra ocorreu após o horário da
merenda e do recreio dos alunos. Quando os estudantes chegaram à sala a docente pediu
que os mesmos sentassem nas cadeiras que estavam enfileiradas e organizadas em
duplas e, em seguida, pegou a referida obra literária para ler em voz alta para os
educandos. Com a obra em mãos, a professora perguntou aos alunos quem conseguia ler
o título do livro em voz alta. Essa foi uma estratégia também utilizada pela docente em
outras situações didáticas envolvendo as obras complementares e, a partir dela, alguns
direitos de aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita alfabética foram
mobilizados. A seguir, podemos visualizar a figura 50 com a capa da referida obra e o
fragmento de aula, ilustrando os conhecimentos contemplados sobre o sistema
alfabético.
Figura 50 – Capa do livro Chapeuzinho Vermelho – Uma aventura borbulhante (Acervo/PNAIC
– Alfabetização na Idade Certa).
222
P – Eu vou ler para vocês uma história chamada... Quem consegue ler para mim?
A – CHA-PE-U!
A – A!
A – CHA!
P – Quem leu ―CHA‖? Está de parabéns!
A – CHA-PE-U. Chapéu, Z...
A – Z!
A – Chapeuzinho!
A – VER-ME-LHO!
Alunos – Chapeuzinho vermelho, chapeuzinho vermelho, chapeuzinho vermelho!
A – Chapeuzinho vermelho, tia!
P – Posso começar?!
A – Pode!
P – Vamos lá! Chapeuzinho vermelho – uma aventura borbulhante. Quem rescreveu esse livro
foi uma pessoa chamada Linns Roberts e quem desenhou ele foi David Roberts. Só que...
A – David?
P – Só que... Escuta. Só que não foi esse homem que escreveu essa história, ele já ouviu que é
uma história muito antiga e fez uma releitura, uma história, um reconto. Ele está contando para
a gente só que não foi ele que inventou, está certo?! Vamos ouvir e prestar atenção.
(Professora A, aula 01)
No fragmento de aula acima é possível perceber que ao solicitar a leitura do
título da obra literária a docente possibilitou que os alunos, possivelmente, pertencentes
a hipóteses mais avançadas em relação ao sistema de escrita alfabética, lessem,
ajustando a pauta sonora ao escrito e dominassem as correspondências entre letras ou
grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a ler palavras, nesse caso, o título do livro
apresentado. Além de contemplar esses dois direitos, a professora, ao apresentar o livro
na sala, contribuiu para que os estudantes, possivelmente, menos avançados em relação
ao sistema de escrita alfabética, nomeassem algumas letras que estavam presentes no
título da obra. A partir dessa ação, percebemos que, embora a docente não tenha
perguntado o nome das letras que formavam o título da obra, os aprendizes explicitaram
o nome de algumas dessas letras, conforme é possível visualizar no extrato de aula
acima. Por isso, consideramos que alguns alunos, na tentativa de responder o nome do
título do livro com base em seus conhecimentos prévios, explicitaram o nome de
algumas letras presentes no título da obra. Diante disso, podemos afirmar que propiciar
aos estudantes o contato com diferentes suportes e gêneros textuais em sala de aula pode
contribuir para que esses aprendizes identifiquem e nomeiem as letras do alfabeto.
Situações de ensino como essas podem auxiliar tanto os alunos mais avançados
em relação à compreensão do SEA a mobilizar os direitos de ler, ajustando a pauta
sonora ao escrito e o de dominar as correspondências entre letras ou grupos de letras, de
modo a ler palavras e textos como os estudantes pertencentes à fase inicial de
compreensão do sistema alfabético e com pouco domínio sobre o repertório de letras do
223
alfabeto, pois esses últimos podem reconhecer e explicitar o nome das letras
apresentadas ao prestar atenção ao escrito e as ilustrações presentes na capa da obra. Por
isso, também consideramos que o direito de reconhecer e nomear as letras do alfabeto
foi contemplado nessa situação didática.
A partir do extrato da aula também percebemos que os alunos leram em voz alta
―Chapeuzinho vermelho‖ que corresponde a uma parte do título da obra, sem mencionar
a parte ―uma aventura borbulhante‖ que também compõe o título do referido livro.
Durante a leitura os alunos mostraram entusiasmo pela história da obra e, em
vários momentos, pediram a docente para ver as ilustrações do livro. Nesse momento, a
professora também fez algumas perguntas sobre a história.
Após a leitura, a docente realizou algumas perguntas sobre a história lida e
entregou uma ficha de atividade que não estava relacionada com livro. Isso nos deu
pistas de que o livro foi utilizado como leitura deleite e sua escolha esteve relacionada
por se tratar de um conto de fadas, tendo em vista que a própria docente afirmou,
durante uma das entrevistas, que esse era um dos gêneros que estavam sendo
priorizados em suas aulas.
Na prática da professora A também percebemos o uso de outros livros literários
não pertencentes ao acervo do PNBE e PNAIC – Alfabetização na Idade Certa nas aulas
08 e 10. Os livros utilizados pela docente foram ―Cinderela‖ e ―Alice no país da
maravilha‖ que também contemplavam um dos gêneros priorizados nas aulas da
professora, nesse caso, o conto de fadas. Durante uma das situações didáticas a docente
realizou uma ficha de atividade envolvendo elementos da história do conto da
―Cinderela‖ e na outra situação de ensino, a partir da obra ―Alice no país da maravilha‖,
a educadora utilizou a obra com o objetivo de realizar a leitura deleite.
Durante o período de observação da professora B, as obras literárias também
foram utilizadas para contemplar os direitos de aprendizagem referentes à apropriação
do sistema de escrita alfabética.
Na aula 04 a professora B fez a leitura em voz alta da obra Se um gato for... de
Marcelo Cipis. A leitura desse livro foi realizada no início da aula após o momento da
organização dos alunos em sala e oração com mesmos. Nessa situação didática os
estudantes estavam sentados em cadeiras organizadas em fileiras e de forma individual.
Conforme mencionamos em outros tópicos de análise, esse foi o único tipo de
agrupamento feito pela professora durante o período de observação das jornadas de
aula. A escolha por esse tipo de agrupamento pode estar relacionada com o espaço
224
físico da sala de aula que, por ser muito pequeno, dificultava a organização dos alunos
em outros possíveis agrupamentos.
O uso do referido livro ocorreu no início da aula, após o momento da oração que
foi uma prática realizada por essa professora no começo de todas as aulas observadas.
Depois da leitura dessa obra, a docente fez a contagem dos alunos com auxílio dos
mesmos e, em seguida, pegou outro livro que não faz parte do acervo disponibilizado
pelo Ministério de Educação para escolas públicas e fez a leitura em voz alta. Esse
último livro escolhido e utilizado pela docente falava sobre os diferentes tipos de meios
de transportes. Após a leitura desse segundo livro, a professora pediu que os alunos
mencionassem o nome dos meios de transportes abordados no livro e, a partir das
respostas dos estudantes, produziu coletivamente uma lista de palavras com o nome dos
meios de transportes abordados nesse livro. Em seguida, a docente convidou as crianças
a refletir sobre as palavras presentes na lista. Para isso, leu o nome de cada meio de
transporte registrado no quadro, segmentou oralmente as sílabas dessas palavras e
contabilizou as sílabas.
A partir desse relato, consideramos que a obra Se um gato for... foi utilizada pela
docente com o objetivo de realizar uma leitura deleite e não com a finalidade de
explorar conhecimentos ancorados com as especificidades do sistema de escrita
alfabética. No entanto, apesar de dar indícios de que esse não foi seu principal objetivo,
na situação didática de uso dessa obra, observamos que a docente mobilizou direitos de
aprendizagem referentes à apropriação do SEA. A seguir, apresentamos a figura 51 com
a capa da obra literária citada e o fragmento da aula em que tais direitos foram
contemplados.
Figura 51 – Capa do livro Se um gato for...
(Acervo/PNAIC – Alfabetização na Idade Certa).
225
P – Vamos, olha só... Eu trouxe este livrinho que eu peguei na outra escola. Eu
achei interessante. O que é que vocês tão vendo na capa? Falem baixinho!
Alunos – Gato!
A – Um rato roeu a roupa do rei de Roma.
P – Vamos ler aqui...
A – Oôô...
P – Oóó não!
Alunos – S, E, O...
P – Se o...
A – O...
P – Ga...
Alunos – Gato for...
P – Olhem, os três pontinhos, esses três pontinhos é a reticência. Está dizendo assim... Olha, ―se
um gato for‖ não completa a frase, você imagina o resto com a sua cabecinha. Olha ―se um gato
for...‖ você é que pensa... É você que imagina, se ele for o que? Se ele for embora... Se um
gato for o que?
A – For um tigre!
P – Se ele for um tigre, talvez ele seja um tigre. Se um gato for...
A – Um leão!
A – Uma onça preta!
P – Se um gato for...
A – Uma beta!
P – Se um gato for...
A – Uma chupeta!
A – Tia, tia!
A – Tia, tia!
P – Uma gata?
A – Uma gata, uma gata!
P – E se esse gato for uma pessoa?
A – Pessoa!
A – Se for uma escada...
P – Se esse gato for um pássaro e ele voar?! Então, toda vez que na frase vim, no final da frase
vier essas três bolinhas, três pontinhos, reticências é porque está incompleto, o pensamento não
completou. Eu vou ver, mas vou ter que imaginar o livro. Eu vou usar minha cabecinha, o
autor não escreveu aqui não.
A – Tia, o corpo dele é igual o de uma escada?
P – Será? Eu nunca vi isso. Vamos descobrir os detalhes?! Se um gato for... Quem escreveu foi
Marcelo Cipis, Marcelo Cipis!
A – Cipis!
P – C, I, P, I e S. Cipis! Eu estou lendo, mas deve se pronunciar de outro jeito. Posso ou eu
vou guardar porque tem gente escrevendo aí. Eu não vou ler, não é, Jamerson?
A – Sou eu não, tia. Eu estou desenhando.
P – É! Então feche e guarde que agora é hora de ouvir primeiro essa leitura, depois que será o
calendário, porque ela é muito interessante. ―Se um gato for, se um gato for...‖.
(Professora B, aula 04)
Na situação didática, ilustrada no fragmento de aula acima, podemos perceber
que a docente convidou os alunos para ler o título da obra literária. A partir desta ação,
consideramos que a professora mobilizou os direitos de ler, ajustando a pauta sonora ao
escrito e o de dominar as correspondências entre letras ou grupos de letras e seu valor
sonoro, de modo a ler palavras e textos.
226
Nesse momento, foi possível observar que alguns estudantes já estabeleciam
relação letra-som e, consequentemente, estavam em hipóteses de escrita mais
avançadas. Já outros alunos, ao serem solicitados a ler o título da obra, explicitaram o
nome de algumas letras presentes no título do livro. Isso nos dá pistas de que esses
estudantes ainda não sabiam ler de forma convencional, ajustando a pauta sonora ao
registro escrito.
Através dessas intervenções promovidas em sala, percebemos que, assim como
os alunos da professora A, os estudantes da professora B também apresentavam uma
heterogeneidade em relação à compreensão do sistema de escrita alfabética. Isso ficou
claro quando a professora B solicitou aos aprendizes a leitura do título do livro e alguns,
nesse momento, explicitaram o nome das letras que formavam o título. A partir desta
ação, também consideramos que essa situação didática foi importante para mobilizar o
direito de reconhecer e nomear as letras do alfabeto.
No extrato de aula acima, os alunos, ao responderem a professora, dão pistas de
que apresentam dificuldades para ler o título da obra, ajustando a pauta sonora ao
registro escrito. Além disso, outro grupo de estudantes explicitou apenas algumas letras
que compõem o título do livro, dando pistas de que não conseguiam ler de forma
convencional.
Mesmo diante dessas dificuldades, que os aprendizes, aparentemente, mostraram
ter, podemos perceber que a docente promoveu uma conversa sobre o uso de reticências
e induziu os estudantes a levantarem hipóteses a respeito das possibilidades que o gato
(personagem da história da obra) poderia ser. Desse modo, constatamos que, apesar de
contemplar os direitos referentes à apropriação do SEA descritos acima, a docente
optou, nessa situação didática, por discutir, de forma mais direta, elementos
relacionados com a história do livro.
Na aula 09 a professora B fez uso de outra obra literária. Dessa vez, o livro
utilizado pela docente pertencia ao acervo do PNBE referente ao ano de 2009. A obra
escolhida foi Um avião e uma viola de Ana Maria Machado. No início dessa aula, a
professora fez a oração com os alunos e, em seguida, leu em voz alta a obra
complementar Clact... Clact... Clact... (mencionada no tópico anterior). É importante
lembrar que as situações didáticas desenvolvidas a partir das obras complementares
foram analisadas no tópico anterior, em que apresentamos os direitos de aprendizagem
referentes à apropriação do SEA mobilizados pelas professoras em situações de uso
desses recursos.
227
Após ler a obra complementar, a docente explicou aos estudantes as atividades
que seriam realizadas durante a aula e, na sequência, pegou o livro Um avião e uma
viola e fez a leitura em voz alta para os aprendizes.
Durante a leitura, os alunos estavam organizados individualmente em cadeiras
enfileiradas e mostraram entusiasmo pelo que estava sendo lido pela professora. No
momento da leitura, eles perceberam que algumas palavras presentes na história
apresentavam semelhanças sonoras. A percepção dos estudantes em relação às
semelhanças sonoras ocorreu mais nas situações em que as palavras rimavam. Já as
semelhanças sonoras entre as palavras no nível da sílaba que, necessariamente, não
eram rimas, não foram sinalizadas pelas crianças, mas a educadora enfatizou durante a
sua mediação.
Após a leitura e retomada do livro, a docente iniciou uma conversa sobre as
semelhanças sonoras das palavras presentes na história da obra. Nesse momento foi
possível observar que o objetivo didático da docente, ao utilizar essa obra, foi promover
uma reflexão sobre as semelhanças sonoras de algumas palavras presentes na história.
Distinguindo, dessa forma, da situação de ensino desenvolvida na aula 04 (a partir da
obra literária Se um gato for...) que foi utilizada para contemplar o momento da leitura
deleite. A seguir, apresentamos a figura 52 com a capa do referido livro e o extrato da
aula em que a docente iniciou a discussão a respeito das semelhanças sonoras presentes
nas palavras, mobilizando, dessa forma, alguns direitos de aprendizagem referentes à
apropriação do sistema de escrita alfabética.
Figura 52 – Capa do livro Um avião e uma viola
(Acervo/PNBE 2009).
P – Vocês perceberam que aqui nessa historinha tem palavras parecidas?
Alunos – Tem!
P – Tem palavras que rimam no final?
A – Sim!
P – Do som da palavra! E ora elas têm o som no meio da palavra. O mesmo só em uma e em
outra. Por exemplo, vamos ver... Presta atenção! Depois não vai saber fazer a tarefa! Vamos
228
perceber o que a gente está vendo. A gente estudou a rima e a rima é o som igual no final. Nós
estudamos o som inicial, trocava a letra e mudava a palavra e estudamos o som final. Quando o
som final é o mesmo do que esse aqui, olha, dança, trança, festança e criança é uma rima porque
tem no final o som igual! Mesmo som, mesma letra, olha... A, N, Ç e A, A, N, Ç e A, N, Ç e A,
A, N, Ç e A. O mesmo som final em todas as palavras. Eu vou escrever no quadro para a gente
olhar, vê. Trança, olha aqui! Olha, trança, dança, olha. Prestem atenção na letrinha. Trança,
festança, olha, festança e criança. Só para a gente vê aqui. Eu vou pegar outro lápis! Olha, presta
atenção! Rima é o som final, é o mesmo som final. Se eu tenho o mesmo som, obrigatoriamente
vai ser a mesma letrinha. Se eu tenho o mesmo som, é porque eu tenho a mesma letra. Olha,
tran-ça! Olha aqui, olha. Olha só, vamos ver esse, tran-ça! Que letrinha é?
A – A, N, Ç...
A – C de cedilha!
P – Ç e A! De novo, olha. A, N, Ç e A.
Alunos – A, N, Ç e A.
P – A, N, Ç e A. Mesma letra, mesmo som! Mesma letra, mesmo som!
A – Mesmo som!
P – Aqui na frente vamos ver... Tran-ça!
A – Trança!
P – Vamos falar?
A – Trança!
P – Trança!
A – Trança!
P – Aqui primeiro trança!
Alunos – Tran-ça!
P – Dan-ça!
Alunos – Dança!
P – Festança!
Alunos – Festança!
P – Criança!
A – Criança!
P – Olha... ANÇA, ANÇA, ANÇA e ANÇA no final! Rimam! E aqui nesse livrinho nós temos
outra parte. De quê? Os sons são os mesmos! Mas eles estão nos meios das palavras ou estão no
final! No final a gente chama rima! E aqui é no meio, olha. No meio das palavras. Olha, MAS-
CA-RA-DO! CA-RAM-BO-LAS!
A – Mascarado! Carambolas!
P – Repetiu a mesma sílaba dentro da palavra. Estão percebendo? MasCARA, CARAmbolas!
Tirando o M. CARA e CARA! Dentro da palavra! A mesma sílaba! Mesma sílaba, mesmo som
e a mesma letra se repete. Deixa eu dizer outro, olha, MA-MÃO e MÃO! Rimou! Só final igual
rima! Só final igual rima! Esse aqui, olha... MA-TA-GAL!
A – Matagal!
P – TAGA-RE-LA! Olha o som! MaTAGAl! Olha o pedacinho igual a esse aqui, olha.
TAGArela e maTAGAl!
A – T e A!
A – Matagal!
P – Aqui é TAGA e aqui é TAGA! T, A, G e A.
(Professora B, aula 09)
O fragmento de aula acima ilustra a conversa que a professora realizou com os
alunos após a leitura da referida obra literária. Optamos por expor essa parte do extrato
de aula, pois nele a docente mobilizou vários direitos de aprendizagem referentes à
apropriação do sistema de escrita alfabética.
229
Inicialmente, destacamos o objetivo da educadora em explorar, após a leitura do
livro, as semelhanças sonoras das palavras presentes na história e conceituar o que é
compreendido como rimas.
Quando a leitura da obra foi finalizada, percebemos que os alunos mostraram
entusiasmo em participar das intervenções promovidas pela docente. Um dos primeiros
conhecimentos destacados pela professora foram as rimas. Nessa situação didática, a
docente informou que já havia explorado esse conhecimento e, em seguida, destacou
que as rimas são representadas pela semelhança sonora no final das palavras. Para
aprofundar essa discussão, a professora registrou no quadro quatro palavras retiradas da
história do livro: TRANÇA, FESTANÇA, DANÇA e CRIANÇA. Quando essas palavras
foram registradas no quadro, a docente perguntou aos estudantes o nome de algumas
letras presentes nessas palavras e, os alunos, por sua vez, responderam. Diante disso,
consideramos que essa ação foi importante, pois os aprendizes identificaram algumas
letras do alfabeto, contemplando, dessa forma, o direito de reconhecer e nomear as
letras do alfabeto. Além disso, os estudantes puderam perceber que as palavras
registradas no quadro tinham letras em comum, mobilizando, desse modo, o direito de
compreender que palavras diferentes compartilham certas letras.
Nessa situação de ensino também foi possível observar que a docente sinalizou,
em vários momentos, que as palavras registradas no quadro rimavam porque
apresentavam o mesmo som final e, consequentemente, as mesmas letras, embora,
saibamos que isso não é uma regra para definir palavras que rimam. Desse modo,
consideramos que a professora contemplou o direito de identificar semelhanças sonoras
em sílabas e em rimas. Além desse direito, observamos, durante essa mediação, que
educadora leu junto com os alunos o nome de cada uma das quatro palavras registradas
no quadro, sinalizando no quadro as palavras e sílabas que estavam sendo lidas. Por
isso, consideramos que os direitos de ler, ajustando a pauta sonora ao escrito e o de
dominar as correspondências entre letras e grupo de letras e seu valor sonoro, de modo a
ler palavras e textos também foram mobilizados por essa educadora. É importante
destacar que não presenciamos, durante o período de observação das jornadas de aulas,
momentos em que os estudantes dessa turma foram solicitados a ler textos ou trechos da
história das obras literárias utilizadas pela professora, mas, nessa pesquisa, optamos por
apresentar os direitos de aprendizagem como eles são expostos nos cadernos de
formação do PNAIC.
230
Após refletir no quadro sobre as quatro palavras apresentadas acima, a docente
mencionou e segmentou oralmente outras palavras presentes na história da obra,
sinalizando para os estudantes as sílabas que formavam tais palavras. Por isso,
consideramos que a professora contemplou o direito de segmentar oralmente as sílabas
das palavras e comparar palavras ao tamanho. A partir do fragmento de aula acima,
podemos perceber que a professora não solicitou, explicitamente, que os alunos
comparassem palavras quanto ao tamanho, mas não descartamos a hipótese de que,
através dessas intervenções, os alunos possam ter percebido tal conhecimento.
Entretanto, voltamos a informar que preservamos a redação de cada direito de
aprendizagem.
Ainda com base no extrato de aula, foi possível observar que, após segmentar
oralmente algumas sílabas de palavras presentes na história da obra, um dos alunos
mencionou as letras que formavam uma das sílabas dessas palavras e, em seguida, a
docente enfatizou a resposta do estudante, explicitando as letras que formavam
determinadas sílabas.
Situações como essas podem contribuir para que os aprendizes reflitam sobre as
diferentes composições das sílabas de palavras, por isso, consideramos que a educadora
contemplou o direito de reconhecer que as sílabas variam quanto às suas composições e
o de perceber que as vogais estão presentes em todas as sílabas.
Como podemos observar, a professora B refletiu sobre várias palavras presentes
na situação de uso da obra Um avião e uma viola, dando subsídios para que as crianças
pudessem refletir a respeito de vários conhecimentos ancorados aos direitos de
aprendizagem referentes à apropriação do SEA.
Além da reflexão das palavras apresentadas acima, a docente elaborou uma ficha
de atividade articulada ao referido livro. A partir dessa ação, podemos perceber que, em
algumas situações didáticas, seja com uma obra complementar ou uma obra literária,
tanto a professora A como a professora B optaram por produzir fichas de atividades
articuladas ao uso desses livros, tendo como um dos objetivos explorar conhecimentos
relativos ao sistema de escrita alfabética. A seguir, apresentamos a figura 53 com a ficha
de atividade produzida pela docente relacionada à obra literária.
231
Figura 53 – Ficha de atividade elaborada a partir da obra Um avião e uma viola.
Na ficha de atividade apresentada acima a docente registrou alguns versos da
história do livro, destacou algumas palavras e pediu que os estudantes circulassem as
sílabas em comum nas palavras destacadas. Conforme podemos observar no enunciado
da atividade, a docente solicitou que os alunos observassem as sílabas em comum das
palavras destacadas em cada verso. No entanto, durante a mediação dessa atividade, a
professora fez confusões em vários momentos e divergiu do enunciado, pedido que os
estudantes circulassem as letras compartilhadas entre as palavras destacadas no verso,
sem mencionar as sílabas, conforme está explicito no enunciado.
Nas situações didáticas desenvolvidas pelas professoras observamos que as
obras literárias foram utilizadas com a finalidade de realizar a leitura deleite e para
contemplar conhecimentos sobre o sistema de escrita alfabética. Das três situações de
ensino analisadas acima, duas esteve mais voltada para a leitura deleite, embora tenha
mobilizado direitos de aprendizagem referentes à apropriação do SEA.
A situação didática realizada pela professora B a partir da obra Um avião e uma
viola de Ana Maria Machado foi mais direcionada para a reflexão das semelhanças
sonoras em sílabas e em rimas. Nesse momento, percebemos que o texto literário pode
ter sido escolhido pela docente por apresentar palavras que tinham semelhanças sonoras
e, dessa forma, ser um recurso que iria auxiliar suas intenções educativas. Conforme
sinalizamos no quadro 09, essa situação de ensino contemplou vários direitos de
aprendizagem, no entanto, convém explicitar que, durante a mediação dessa atividade, a
docente pediu que os alunos circulassem as sílabas em comum nas palavras destacadas,
232
mas, em várias situações, confundiu as sílabas com as letras que as palavras destacadas
compartilhavam. No momento da conversa sobre as rimas, essa professora também
optou por definir o conceito de rimas, sem priorizar os conhecimentos prévios dos
alunos.
Ao longo desse tópico, vimos que as professoras utilizaram as obras literárias
com foco mais voltado para a leitura deleite, o que também é muito positivo para
formação leitora das crianças. De fato, com as obras do PNBE, esse é o tipo de trabalho
esperado, tendo em vista que são obras literárias destinadas para as escolas com esse
objetivo. Mas nada impende que o docente faça intervenções com foco na apropriação
do sistema de escrita alfabética. Desse modo, identificamos que houve uma menor
diversidade na exploração dos direitos de aprendizagem referentes à apropriação do
SEA. Esses dados foram mais fortemente revelados na prática da professora A que
contemplou apenas os direitos de reconhecer e nomear as letras do alfabeto, ler,
ajustando a pauta sonora ao escrito e o de dominar as correspondências entre letras ou
grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a ler palavras e textos a partir de uma obra
literária, em uma única aula.
Na prática da professora B, identificamos uma maior diversidade dos direitos de
aprendizagem a partir das situações de uso das obras literárias, inclusive, vimos que os
livros literários foram utilizados de forma articulada com outros recursos produzidos
pela docente, como, por exemplo, a ficha de atividade ancorada a obra Um avião e uma
viola de Ana Maria Machado (figura 53).
No próximo tópico, retomaremos os direitos de aprendizagem relativos ao SEA
mobilizados a partir do uso dos recursos didáticos distribuídos pelo Ministério de
Educação.
6.5 Síntese dos direitos de aprendizagem referentes à apropriação do Sistema de
Escrita Alfabética contemplados a partir do uso dos recursos didáticos distribuídos
pelo Ministério de Educação
No tópico anterior, analisamos separadamente as situações de uso do livro
didático de Letramento e Alfabetização, dos jogos de alfabetização, das obras
complementares e das obras literárias vinculadas ao PNBE e PNAIC – Alfabetização na
Idade Certa.
233
A partir dessas análises, identificamos os direitos de aprendizagem referentes à
apropriação do SEA mobilizados através das situações de uso desses recursos.
No quadro 10, abaixo, é possível perceber que em uma única aula vários direitos
de aprendizagem foram mobilizados a partir das situações de uso dos recursos didáticos
distribuídos pelo Ministério de Educação. Além disso, identificamos que, geralmente,
uma situação de uso dos referidos recursos didáticos contemplava mais de um direito de
aprendizagem.
Quadro 10 - Direitos de aprendizagem de apropriação do Sistema de Escrita Alfabética
contemplados pelas professoras em situações de uso dos recursos didáticos distribuídos pelo
Ministério de Educação.
Direitos de aprendizagem
Livro didático
Jogos de
alfabetização
Obras
Complementares
Obras
literárias
Nº das aulas que foram contemplados
A B A B A B A B
1. Escrever o próprio nome 06
2. Reconhecer e nomear as letras
do alfabeto
02, 09
e 05
01, 02,
06, 07
e 10
09
07
03 e 06
01
04 e
09
3. Conhecer a ordem alfabética e
seus usos em diferentes gêneros
06
4. Reconhecer diferentes tipos
de letras em textos de diferentes
gêneros e suportes textuais
02
5. Compreender que palavras
diferentes compartilham certas
letras
02
01, 02
e 06
09
07
09
6. Perceber que palavras variam
quanto ao número, repertório e
ordem das letras
02, 06
e 07
09
07
7. Segmentar oralmente as
sílabas de palavras e comparar
palavras quanto ao tamanho
01
07
8. Identificar semelhanças
sonoras em sílabas e em rimas
02
02, 06
e 07
09
07
05, 06 e
08
09
9. Reconhecer que as sílabas
variam quanto às suas
composições
02 e
09
01
06
09
10. Perceber que as vogais estão
presentes em todas as sílabas
02 e
09
01
09
11. Ler, ajustando a pauta
sonora ao escrito
01,02
e 09
01, 06,
07 e
10
09
07
03, 05,
06 e 07
06
01
04 e
09
12. Dominar as
correspondências entre letras ou
grupos de letras e seu valor
01, 02
01, 06,
07 e
10
07
03, 05,
06 e 07
06
01
04 e
234
sonoro, de modo a ler palavras e
textos
e 03 10 09
13. Dominar as
correspondências entre letras ou
grupos de letras e seu valor
sonoro, de modo escrever
palavras e textos
02
06, 07
e 10
07
Total de direitos contemplados
pelas professoras por recurso
08
12
06
08
06
02
03
07
Legenda: A – professora A, B – professora B.
Os dados do quadro 10 evidenciam que 13 (treze) dos 15 (quinze) direitos de
aprendizagem referentes à apropriação do Sistema de Escrita Alfabética elencados no
Caderno intitulado ―Currículo na alfabetização: Concepções e princípios‖ (BRASIL,
2012) foram mobilizados pelas professoras investigadas em situações de uso dos
recursos didáticos distribuídos pelo Ministério de Educação.
Durante o período de observação das aulas, dois (02) direitos de aprendizagem
não foram explorados por ambas docentes em situações de uso dos recursos discutidos
nesta pesquisa, a saber: diferenciar letras de números e outros símbolos e usar diferentes
tipos de letras em situações de escrita de palavras e textos.
Uma hipótese que levantamos para a não mobilização do direito de diferenciar
letras de números e outros símbolos durantes as aulas observadas está relacionada com
o fato desse conhecimento já ter sido, possivelmente, garantido a maioria dos alunos em
momentos anteriores. Conforme apresentamos na metodologia desta Dissertação, não
aplicamos diagnoses para identificar os níveis de escrita das crianças pertencentes às
duas turmas, mas, levantamos essa hipótese com base nas discussões realizadas em sala
entre as professoras e os estudantes.
Outro indício que nos levou mencionar a referida hipótese está relacionado com
fato de identificarmos que os direitos de ler, ajustando a pauta sonora ao escrito e o de
dominar as correspondências entre letras ou grupo de letras e seu valor sonoro, de modo
a ler palavras e textos terem sido explorados com grande frequência nas aulas, num total
de 11 das 20 jornadas de aula observadas, sendo 07 (sete) aulas pela professora A e 04
(quatro) aulas pela professora B. Isso nos dá pistas de que os estudantes, mesmo sem ler
e escrever com autonomia, já diferenciavam letras de números e outros símbolos.
O uso de diferentes tipos de letras em situações de escrita de palavras e textos foi
um direito não priorizado nas situações didáticas promovidas pelas docentes durante o
período de observação.
235
Na prática da professora A, identificamos 10 (dez) direitos de aprendizagem.
Desses 10 (dez) direitos, 08 (oito) foram mobilizados através do uso do livro didático de
Letramento e Alfabetização, 06 (seis) foram explorados a partir das situações de uso dos
os jogos de alfabetização e das obras complementares, considerando cada um desses
recursos, e 03 (três) foram contemplados nos momentos de uso das obras literárias.
Esses dados revelam que essa docente explorou uma maior diversidade de direitos
através do uso do livro didático de Letramento e Alfabetização, se comparada com a
professora B.
A partir desses dados, podemos constatar que o livro didático de Letramento e
Alfabetização subsidiou a prática docente no âmbito da alfabetização, especificamente
na promoção de para ações voltadas a reflexão sobre o sistema de escrita alfabética.
No que se refere à prática da professora B, identificamos um total de 12 (doze)
direitos de aprendizagem. Desse total, 12 (doze) direitos foram explorados em situações
de uso do livro didático de Letramento e Alfabetização, 08 (oito) foram contemplados
no uso dos jogos de alfabetização, 07 (sete) a partir do uso das obras literárias e 02
(dois) através do uso das obras complementares.
Mais uma vez o livro didático de Letramento e Alfabetização foi o recurso
utilizado por esta docente que mobilizou uma maior diversidade de direitos de
aprendizagem. Em contrapartida, identificamos um trabalho menos presente com as
obras complementares em relação ao tratamento das propriedades que regem o sistema
de escrita alfabética. No entanto, destacamos que, a partir de outros livros pertencentes à
escola e/ou ao acervo pessoal da docente, sem vinculação com os programas vinculados
ao Ministério de Educação, houve a promoção de situações de ensino com foco em
diversos direitos de aprendizagem referentes à apropriação do SEA. A produção de
listas de palavras e a segmentação oral das palavras das listas em sílabas foram algumas
das atividades promovidas a partir do uso desses recursos.
As pesquisas desenvolvidas por Morais e Albuquerque (2004), Ferreira,
Albuquerque, Cabral e Tavares (2009) e Morais e Albuquerque (2011) apontam que, ao
longo dos anos, o livro didático destinado à alfabetização sofreu várias mudanças
oriundas dos estudos realizados e das difusões das teorias da Psicogênese da Língua
Escrita e das pesquisas sobre o letramento. Além disso, os critérios estabelecidos pelo
PNLD tinham o objetivo de selecionar um livro que pudesse, de fato, subsidiar as
práticas dos professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental no processo de
apropriação do sistema de escrita. Dessa forma, podemos perceber que esses dados
236
foram evidenciados durantes as observações, tendo em vista que as professoras
sentiram-se à vontade em utilizar o livro didático em sala, mostrando que este era um
recurso já consolidado em suas práticas. Além disso, as docentes recorreram a esse tipo
de recurso de forma autônoma, acrescentando, em vários momentos, reflexões as
questões do livro didático, sem se limitar apenas ao comando das atividades, com o
objetivo de explorar o sistema alfabético.
A pesquisa desenvolvida por Almeida (2012) também sinalizou que os
professores utilizam diferentes livros didáticos com frequência em suas aulas. Segundo
essa pesquisadora, o uso desses livros didáticos não significou que os docentes
apresentavam total dependência desses recursos no seu fazer cotidiano, pelo contrário,
indicaram que muitos deles utilizam o livro didático com autonomia e com o intuito de
complementar e enriquecer o trabalho desenvolvido em sala de aula.
Em relação à mediação das atividades promovidas pelas professoras
identificamos que ambas as docentes buscaram sistematizar os conhecimentos relativos
ao sistema de escrita em suas aulas a partir dos recursos foco dessa pesquisa.
Na prática da professora B, percebemos uma discussão, de forma mais
sistemática, nas propriedades que regem o sistema alfabético, de modo a considerar a
alfabetização na perspectiva do letramento. Consequentemente, identificamos nas aulas
dessa docente a exploração de uma diversidade maior de direitos de aprendizagem
referentes à apropriação do SEA a partir das situações de uso do livro didático de
Letramento e Alfabetização, dos jogos de alfabetização e das obras literárias do que nas
aulas da professora A. Esse dado só não ocorreu nas situações de uso das obras
complementares, pois, de acordo com o que foi exposto, esse tipo de recurso foi
utilizado com outras finalidades e, além disso, obteve baixa frequência nas aulas dessa
docente.
Em relação à prática da professora A, observamos que a educadora considerou,
em várias situações didáticas, o sistema alfabético como objeto de ensino. Para tanto, a
docente promoveu situações de ensino a partir dos quatro recursos investigados nessa
pesquisa. Entretanto, identificamos que as atividades promovidas por essa docente
apresentavam aproximações a uma postura mais disciplinar, norteada pelos livros
didáticos.
Os dados revelam que havia uma preocupação da professora B em aproveitar
mais as situações didáticas a partir do uso dos recursos foco dessa pesquisa para
sistematizar o ensino dos conhecimentos relativos ao sistema de escrita. As hipóteses
237
que levantamos para essa postura da docente podem estar vinculadas com sua própria
prática, sua formação e a necessidade de seus alunos em relação ao domínio do sistema
alfabético.
Enfim, apesar de haver um esforço das duas professoras em ensinar as crianças o
sistema de escrita alfabética, várias ressalvas foram sinalizadas. Por isso, consideramos
a necessidade de subsidiar as práticas dessas docentes a partir de programas de
formação continuada que possam auxiliar o professor no processo de alfabetização.
Mesmo diante das ressalvas, consideramos que o livro didático de Letramento e
Alfabetização, os jogos de alfabetização, as obras complementares e as obras literárias
foram proporcionaram momentos de aprendizagens significativas nas práticas das
docentes, não somente em relação ao sistema de escrita alfabética e à Língua
Portuguesa, mas também a outros componentes curriculares.
238
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo desse trabalho, buscamos analisar como professores do 1º ano do
Ensino Fundamental utilizam o livro didático de Letramento e Alfabetização, os jogos
de alfabetização, as obras complementares e as obras literárias para contemplar os
direitos de aprendizagem referentes à apropriação do Sistema de Escrita Alfabética. A
partir desse objetivo geral, elencamos quatro objetivos específicos com o intuito de
compreendermos o nosso objeto de pesquisa.
Antes de sintetizarmos nossos dados, informamos que não tivemos a intenção de
propor generalizações, pois nosso estudo foi realizado com apenas duas professoras. No
entanto, consideramos os dados apresentados relevantes para pensarmos sobre as
práticas docentes no âmbito da alfabetização.
Em relação ao objetivo de investigar se os direitos de aprendizagem,
especificamente os referentes à apropriação do sistema de escrita alfabética, são
referências para as professoras, constatamos, a partir da entrevista inicial realizada com
cada uma das docentes, que elas conhecem e concordam com os direitos de
aprendizagem, destacando que são importantes para nortear suas práticas.
Com base nos dados da entrevista, foi possível perceber que a professora A
associou os direitos de aprendizagem discutidos nos cadernos do PNAIC com os
conhecimentos presentes na proposta curricular do seu município, afirmando que ambos
estavam em consonância e eram, praticamente, iguais. Já a professora B, por sua vez,
afirmou que os direitos de aprendizagem, bem como os conhecimentos específicos
sobre o que ensinar em relação ao sistema de escrita alfabética, não eram claros para ela
antes dos encontros de formação do Pacto.
Segundo a professora B, as discussões em torno do que ensinar em relação ao
sistema de escrita não eram esclarecidas nem pela própria rede de ensino, inclusive, a
proposta curricular do município apresentava orientações mais gerais, sem especificar
os conhecimentos voltados para o SEA a serem garantidos às crianças no ciclo de
alfabetização.
Na entrevista inicial, também foi possível perceber que ambas as professoras
avaliaram positivamente os direitos de aprendizagem, pontuando que eles contribuem
no processo de planejamento e na promoção de situações didáticas na sala de aula.
Em relação ao objetivo de verificar a frequência com que são utilizados o livro
didático de Letramento e Alfabetização, os jogos de alfabetização, as obras
239
complementares e as obras literárias, tomando como referência os direitos de
aprendizagem referentes à apropriação do sistema de escrita alfabética; identificamos
que as docentes exploraram o sistema de escrita alfabética nas 20 jornadas de aula
observadas a partir de diversos recursos didáticos, inclusive, por meio dos recursos
distribuídos através de políticas nacionais.
Dentre os recursos didáticos não oriundos de políticas nacionais pontuamos que
as fichas de atividades e o caderno escolar foram os instrumentos utilizados com maior
frequência pelas docentes, sendo as primeiras priorizadas nas aulas da professora A e o
segundo pela professora B.
No que se refere aos recursos distribuídos a partir das políticas nacionais,
identificamos, em 16 (dezesseis) das 20 (vinte) jornadas de aula observadas, o uso dos
quatros recursos foco desse estudo para ensinar as propriedades que regem o SEA,
sendo 08 (oito) aulas da professora A e 08 (oito) aulas da professora B. A partir desses
resultados, constatamos que em 04 (quatro) aulas, sendo 02 (duas) da professora A e 02
(duas) da professora B, não foram utilizados nenhum dos recursos investigados nessa
pesquisa, mas conforme sinalizamos as docentes, nessas aulas, promoveram situações
didáticas em que o sistema de escrita alfabética foi tomado como objeto de ensino.
Na prática da professora A, identificamos que as obras complementares foram
utilizadas em cincos aulas, o livro didático de Letramento e Alfabetização em quatro
aulas e os jogos de alfabetização e as obras literárias em uma das dez jornadas de aula
observadas com foco no ensino do sistema alfabético.
Em relação à prática da professora B, constatamos que o livro didático de
Letramento e Alfabetização foi utilizado em cinco aulas. As obras literárias foram
utilizadas em duas aulas, os jogos de alfabetização e as obras complementares em uma
aula das dez aulas observadas, tomando como referência os conhecimentos voltados
para os direitos de aprendizagem voltados para a apropriação do SEA.
A partir desses resultados, constatamos que dois tipos de recursos vinculados ao
Ministério de Educação foram mais frequentes nas aulas observadas, com o objetivo de
contemplar os direitos de aprendizagens voltados para a apropriação do sistema de
escrita, são eles: as obras complementares na prática da professora A e o livro didático
de Letramento e Alfabetização nas aulas da professora B.
Em relação ao objetivo identificar os direitos de aprendizagem referentes à
apropriação do sistema de escrita alfabética contemplados nas práticas dos professores
em situações de uso do livro didático de letramento e alfabetização, dos jogos de
240
alfabetização, das obras complementares e das obras literárias, foi possível perceber que
a professora B explorou uma diversidade maior de direitos do que a professora A,
embora tenha se limitado mais ao uso do livro didático de Letramento e Alfabetização
para mobilizar tais direitos.
Reconhecer e nomear as letras do alfabeto, conhecer a ordem alfabética e seus
usos em diferentes gêneros, compreender que palavras diferentes compartilham certas
letras, perceber que palavras variam quanto ao número, repertório e ordem das letras,
identificar semelhanças sonoras em sílabas e em rimas, reconhecer que as sílabas
variam quanto às suas composições, perceber que as vogais estão presentes em todas as
sílabas, ler, ajustando a pauta sonora ao escrito, dominar as correspondências entre
letras ou grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a ler palavras e textos e dominar
as correspondências entre letras ou grupos de letras e seu valor sonoro, de modo
escrever palavras e textos foram os direitos de aprendizagem contemplados pela
professora A através do uso dos quatro recursos investigados nessa pesquisa.
Escrever o próprio nome, reconhecer e nomear as letras do alfabeto, reconhecer
diferentes tipos de letras em texto de diferentes gêneros e suportes textuais,
compreender que palavras diferentes compartilham certas letras, perceber que palavras
variam quanto ao número, repertório e ordem das letras, segmentar oralmente as sílabas
de palavras e comparar palavras quanto ao tamanho, identificar semelhanças sonoras em
sílabas e em rimas, reconhecer que as sílabas variam quanto às suas composições,
perceber que as vogais estão presentes em todas as sílabas, ler, ajustando a pauta sonora
ao escrito, dominar as correspondência entre letras ou grupos de letras e seu valor
sonoro, de modo a ler palavras e textos e dominar as correspondências entre letras ou
grupos de letras e seu valor sonoro, de modo a escrever palavras e textos foram os
direitos de aprendizagem contemplados pela professora B a partir do uso dos recursos
distribuídos pelo Ministério de Educação.
Ao analisarmos as atividades desenvolvidas pelas professoras em situações de
uso do livro didático de letramento e alfabetização, das obras complementares, dos
livros literários e dos jogos de alfabetização, percebemos que esses recursos foram
instrumentos importantes para auxiliar as aulas das professoras em relação ao ensino do
sistema de escrita alfabética. Tais dados também foram evidenciados na pesquisa
desenvolvida por Morais e Albuquerque (2011).
Nas situações de uso do livro didático percebemos uma tendência da professora
B em extrapolar as solicitações presentes nos enunciados das questões do livro e,
241
consequentemente, explorar uma maior diversidade de direitos de aprendizagem
referentes ao sistema de escrita do que a professora A.
A partir dos relatórios de observação das aulas, constatamos que o uso do livro
didático nas práticas das docentes estava relacionado com os demais recursos utilizados
em sala. Entretanto, identificamos uma aproximação à proposta disciplinar, norteada,
inclusive pelo LD, na prática da professora A. Já a professora B, apesar de não ter
exposto claramente nenhum projeto e sequência didática, buscou articular as atividades
do livro didático com os demais materiais utilizados em sala de aula.
De modo geral, constatamos que as docentes se relacionavam de forma autêntica
com o livro didático de Letramento e Alfabetização em busca de concretizar suas
intenções educativas.
Nas situações de uso dos jogos de alfabetização, apesar da baixa frequência nas
aulas, a exploração de diversos direitos de aprendizagem referentes à apropriação do
SEA. Além da diversidade dos direitos, constatamos que as professoras utilizaram esses
recursos de forma autônoma e articulada com os demais materiais em sala de aula.
Ao analisarmos a prática da professora A, percebemos que o uso de um dos
jogos de alfabetização, realizado coletivamente, foi feito de forma planejada. Esse dado
foi esclarecido na entrevista realizada no final da aula em que o jogo foi utilizado, pois,
nesse momento, a docente revelou que produziu fichas de atividades ancoradas ao jogo
com o objetivo de sistematizar os conhecimentos mobilizados por esse recurso.
Entretanto, destacamos que a educadora forneceu muitas respostas aos alunos, limitando
os momentos de reflexão sobre o sistema de escrita.
Na análise da situação didática do referido jogo, a professora A deu indícios de
que planejou essa ação de ensino. Na entrevista realizada ao final da aula, a docente
revelou que as duas fichas de atividades realizadas após o jogo e articuladas ao mesmo
foram produzidas previamente por ela com o objetivo de explorar os princípios que
regem o sistema de escrita. Entretanto, destacamos que no momento do jogo a
educadora forneceu muitas respostas aos alunos, limitando os momentos de reflexão
sobre o sistema de escrita.
No que se refere à professora B, percebemos que o uso de um dos jogos de
alfabetização foi utilizado em sala de forma articulada aos outros recursos selecionados
e/ou produzidos por essa professora com o objetivo de promover momentos
significativos de reflexão em torno do sistema de escrita alfabética. Conforme
mencionamos, o uso de outros recursos em sala relacionados aos jogos de alfabetização
242
também foi um aspecto presente na prática da professora A. No estudo desenvolvido
por Soares, Vieira e Leal (2013), também foi possível constatar que a professora
investigada utilizou um dos jogos de alfabetização de forma articulada aos outros
recursos didáticos.
Ao utilizar a situação didática envolvendo o jogo de alfabetização na prática da
professora B, identificamos que a mesma não seguiu as regras propostas e não realizou
as intervenções e o agrupamento das crianças sugerido pelo manual. Nesse momento,
vimos que essa docente elaborou novas orientações. Esses dados revelam que as
professoras reconfiguram os recursos e utilizam da forma que sentem mais conforto e
com o objetivo de concretizar suas intenções educativas Diante disso, destacamos que
as novas orientações promovidas por esta docente foram favoráveis para promoção de
situações de ensino favoráveis a reflexão dos princípios que regem o sistema alfabético.
Em relação ao uso das obras complementares, percebemos que ambas as
professoras fizeram uso desse recurso para explorar conhecimentos relativos ao sistema
de escrita alfabética. No entanto, presenciamos um maior engajamento da professora A
no uso das obras que pertencem aos acervos complementares em relação à professora B,
sobretudo na exploração dos direitos de aprendizagem.
A partir da análise das práticas docentes, foi possível observar que o uso das
obras complementares, além de serem utilizadas na promoção de situações didáticas
voltadas para a reflexão do SEA, contemplou o eixo da leitura e de diversos
componentes curriculares. Albuquerque (2014) também revelou que os professores
pertencentes à rede municipal de ensino de Camaragibe/PE conheciam e faziam uso dos
acervos complementares em suas aulas com diferentes objetivos didáticos, inclusive,
para contemplar o eixo de leitura e os conhecimentos que envolvem o sistema de
escrita.
As obras literárias também foram recursos importantes para mobilizar
conhecimentos relativos ao SEA. Entretanto, identificamos que as docentes fizeram uso
desses recursos com foco voltado para leitura deleite.
Desse modo, foi possível concluir que o livro didático de Letramento e
Alfabetização, os jogos de alfabetização, as obras complementares e as obras literárias
são recursos didáticos potencialmente ricos para dinamizar o ensino do sistema de
escrita alfabética nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Além de apontarmos essas
conclusões, destacamos que os direitos de aprendizagem referentes à apropriação do
SEA são tomados como objeto de ensino pelas professoras.
243
A partir dessa investigação, foi possível compreender alguns elementos da
prática docente e um pouco da difícil tarefa de alfabetizar. Dessa forma, vimos que no
1º ano do Ensino Fundamental os conhecimentos que envolvem o sistema de escrita
alfabética foram contemplados em todas as aulas. Logo, é possível perceber que as duas
professoras consideram como de suma importância explorar e sistematizar tais
conhecimentos diariamente em busca de alfabetizar seus alunos.
Durante a análise e discussão dos dados, emergiram algumas questões que
exigem um novo olhar sobre esse e outros dados: Por que alguns recursos distribuídos
através de políticas nacionais, como, por exemplo, os jogos de alfabetização,
distribuídos desde 2010, são tão pouco utilizados pelos professores dos anos iniciais do
Ensino Fundamental? Por que, apesar das discussões em torno dos projetos didáticos e
sequências didáticas, a ação do professor ainda é tão norteada por atividades
esporádicas e, além disso, centrada numa postura disciplinar?
Com base em nossas análises, vimos que as professoras priorizaram o tratamento
do sistema de escrita alfabética. Entretanto, em relação aos outros eixos de ensino
indagamos: Os recursos didáticos distribuídos pelo Ministério de Educação têm sido
utilizados pelos professores do ciclo da alfabetização para contemplar os direitos de
aprendizagem referentes à leitura e a produção de textos?
Essas são algumas das questões que emergiram ao longo de nossas análises e,
portanto, precisam ser objeto de atenção em outras pesquisas.
244
REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE, Eliana B. C; LEITE, Tânia M. R. Explorando as letras na Educação
Infantil. In: BRANDÃO, Ana C. P; ROSA, Ester C. S (org.). Ler e escrever na
Educação Infantil: discutindo práticas pedagógicas. – Belo Horizonte: Autêntica
Editora, 2010.
ALBUQUERQUE, Eliana Borges Correia de; MORAIS, Artur Gomes de; FERREIRA,
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252
APÊNDICE A – Roteiro da entrevista inicial com as professoras
Como você faz para alfabetizar os alunos?
Quais recursos didáticos você utiliza para contemplar o sistema de escrita
alfabética?
Dos recursos que você citou quais você utiliza com maior frequência? Por quê?
Você conhece as obras complementares? Onde são guardados na sua escola?
Você sabe como as obras complementares estão organizadas? Você já teve
acesso ao manual do referido acervo?
Você utiliza essas obras? Com que frequência? Com que objetivo?
Você costuma utilizar os jogos de alfabetização distribuídos pelo Ministério de
Educação? Com que frequência? Com que objetivo?
Você conhece os direitos de aprendizagem de Língua Portuguesa discutidos no
PNAIC? Como você faz para ensiná-los aos seus alunos?
Você trabalha alguns desses direitos com seus alunos? (Apresentar aos
professores o quadro)
Os direitos de aprendizagem de apropriação do sistema de escrita alfabética
discutidos no Pacto Nacional da Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) servem
como referência para a sua prática?
Você concorda com esses direitos de aprendizagens? Como você faz para
garanti-los em suas aulas?
253
APÊNDICE B – Roteiro das Minientrevistas com as professoras
1- Você conseguiu executar tudo o que planejou para essa aula? O que não foi
possível fazer?
2- Quais foram seus objetivos? Você conseguiu alcançar tais objetivos? Por quê?
3- Que estratégias (dinâmicas) foram utilizadas na aula que mais contribuíram para
atingir seus objetivos?
4- Quais foram os materiais didáticos que mais ajudaram você na aula de hoje?
254
APÊNDICE C – Modelo de relatório de observação das aulas das professoras
Observação de aula n. XXX
Pesquisador/es
Observação n.
Data
Escola/cidade
Professora
Turma
Número de
alunos presentes
Registro das atividades realizadas:
Início
(hora/min)
Atividade realizada/ forma de condução da
professora
Eixo de ensino
de LP
trabalhado
Registro do que foi anotado no quadro:
Plano de aula
Atividade de classe
Tarefa para casa
Outro
Recursos didáticos utilizados durante a aula:
Nome dos recursos
didáticos
Livro didático
Livro de Obras
Complementares
Livro de literatura
Jogos de alfabetização
do Ministério de
Educação
Ficha de atividade
Caderno das crianças
Cartazes
255
Eixos da língua portuguesa trabalhados na aula:
Eixo Atividade realizada
Leitura
Produção
Textual
Análise
lingüística
Oralidade
Formas de organização do trabalho pedagógico:
Formas de OTP Atividade realizada
Atividade permanente
Sequencia didática
Projeto didático
Evento
Aula fora da sala de
aula
Atividade em duplas
Atividade em grupos
Atividade em roda
Atividade de livre
escolha
Registro de diálogos (transcrição da aula):
Impressões gerais da aula:
Recursos didáticos distribuídos pelo governo
federal utilizados na aula XXX
Direitos de aprendizagem de apropriação
contemplados
256
APÊNDICE D
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
CENTRO DE EDUCAÇÃO
DEPARTAMENTO DE MÉTODOS E TÉCNICAS DE ENSINO
Recife, XXX de XXX de XXX.
De: Ana Cláudia Rodrigues Gonçalves Pessoa
Para: Secretaria de Educação do Município XXXXXX
Ilustríssima Sr.ª Secretária XXXXXXX,
Cumprimentando-a cordialmente, vimos, por meio deste, solicitar o
encaminhamento da aluna Erika Souza Vieira, inscrita no CPF sob nº 084.155.914-70,
portadora da cédula de identidade nº 8.060.644, expedida pela SDS/PE, regularmente
matriculada no Curso de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Educação
(PPGE/UFPE) para realização de atividades de pesquisa, por meio de observações da
prática docente, na escola Municipal XXXXXXX.
Aproveitamos para informar que tais atividades fazem parte do procedimento de
coleta de dados da pesquisa intitulada: ―O uso de recursos didáticos e os direitos de
aprendizagem de apropriação do Sistema de Escrita Alfabética por professores do
1º ano do Ensino Fundamental‖, sob a orientação da Prof.ª Dr. Ana Cláudia
Rodrigues Gonçalves Pessoa.
Desde já, agradecemos a acolhida de nossa aluna, colocamo-nos à disposição
para maiores esclarecimentos.
Atenciosamente,
__________________________________________________________
Ana Cláudia Rodrigues Gonçalves Pessoa
Orientadora da Pesquisa