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Recife 2014
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS
FACULDADE DE DIREITO DO RECIFE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO
Maria Andrade de Godoy Peixoto
A Análise Econômica do Direito no Tribunal de Contas da União: um estudo a partir da
fiscalização da PETROBRAS
Dissertação de Mestrado
Recife 2014
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS
FACULDADE DE DIREITO DO RECIFE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO
Maria Andrade de Godoy Peixoto
A Análise Econômica do Direito no Tribunal de Contas da União: um estudo a partir da
fiscalização da PETROBRAS
Dissertação de Mestrado
Maria Andrade de Godoy Peixoto
A Análise Econômica do Direito no Tribunal de Contas da União: um estudo a partir da
fiscalização da PETROBRAS
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Direito do Centro de Ciências Jurídicas/Faculdade de Direito do Recife da Universidade Federal de Pernambuco como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Direito. Área de concentração: Direito Público Linha de pesquisa: Estado, Regulação e Tributação Indutora
Orientador: Prof. Dr. Marcos Nóbrega Recife, 2014.
Catalogação na fonte Bibliotecária Eliane Ferreira Ribas CRB/4-832
P379a Peixoto, Maria Andrade de Godoy
A análise econômica do direito no Tribunal de Contas da União: uma análise a partir da fiscalização da PETROBRAS. – Recife: O Autor, 2014.
107 f. Orientador: Marcos Antônio Rios da Nóbrega. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal de Pernambuco. CCJ.
Programa de Pós-Graduação em Direito, 2014. Inclui bibliografia. 1. Petrobras. 2. Brasil. Tribunal de Contas da União. 3. Direito econômico. 4.
Brasil. [Constituição (1988). Emenda n. 9/95]. 5. Emenda constitucional - Brasil. 6. Monopólio - Quebra - Petrobras. 7. Petróleo e gás. 8. Brasil. [Lei n. 9.478, de 06 de agosto de 1997]. 9. Brasil. Agência Nacional do Petróleo. 10. Brasil. [Decreto n. 2.745/1998]. 11. Brasil. [Lei n. 8.666/1993]. 12. Eficiência (Direito). 13. Legitimidade (Direito). 14. Petróleo - Legislação - Brasil. I. Nóbrega, Marcos Antônio Rios da (Orientador). II. Título.
342 CDD (22. ed.) UFPE (BSCCJ2014-026)
Maria Andrade de Godoy Peixoto
A Análise Econômica do Direito no Tribunal de Contas da União: um estudo a partir da
fiscalização da PETROBRAS.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Direito da Faculdade de Direito do Recife / Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre. Área de concentração: Estado, Regulação e Tributação
Indutora Orientador: Prof. Dr. Marcos Nóbrega
A Banca Examinadora composta pelos professores abaixo, sob a presidência do primeiro, submeteu o candidato à defesa, em nível de Mestrado, a julgou nos seguintes termos:
MENÇÃO GERAL: APROVADA
Prof. Dr. Francisco de Queiroz Bezerra Cavalcanti (Presidente/UFPE)
Julgamento: Aprovada__________________________ Assinatura: _________________________
Prof. Dr. André Regis de Carvalho (1º Examinador externo/UFPE – CCSA)
Julgamento: Aprovada__________________________ Assinatura: _________________________
Prof. Dr. Gustavo Ferreira Santos (2º Examinador interno/UFPE)
Julgamento: Aprovada__________________________ Assinatura: _________________________
Recife, 01 de agosto de 2014.
Coordenador do Curso:
Prof. Dr. Cláudio Roberto Cintra Bezerra Brandão
A minha família,
AGRADECIMENTOS
Aos mestres com quem tive oportunidade de conviver ao longo dos últimos anos, agradeço imensamente pela referência, sempre presente, de dedicação e devoção ao conhecimento. Aos
ilustres professores que tive a honra de ver em minha banca examinadora, Prof. Francisco Queiroz, Prof. Gustavo Ferreira e Prof. André Regis, agradecerei a todo tempo a gentileza de prestigiarem o esforço de que resultou este trabalho. E meus mais sinceros agradecimentos ao
Prof. Marcos Nóbrega, mestre e orientador, por me apoiar nessa trajetória com tanto incentivo.
RESUMO
PEIXOTO, Maria Andrade de Godoy. A Análise Econômica do Direito no Tribunal de Contas da União: um estudo a partir da fiscalização da PETROBRAS. 2014. 108 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Programa de Pós-Graduação em Direito, Centro de Ciências Jurídicas / FDR, Universidade Federal de Pernambuco, 2014. A Emenda Constitucional 9/95 trouxe alterações no mercado de petróleo e gás no Brasil, permitindo o ingresso de novos players onde antes só havia o Estado. Essa mudança requereu uma nova leitura dos argumentos da eficiência e da economicidade pelo Tribunal de Contas da União – TCU. A partir do posicionamento do TCU no que toca a tais alterações legais, em especial à Lei do Petróleo e ao Regulamento do Procedimento Licitatório Simplificado da Petróleo Brasileiro S/A – PETROBRAS (RLSP), percebe-se uma inclinação do Tribunal em afastar o argumento da eficiência ou de ponderar os reais efeitos do afastamento do RLSP na PETROBRAS enquanto critério decisório. Apesar disso, partindo dos conceitos inerentes à Análise Econômica do Direito – AED, é possível afirmar que tanto a PETROBRAS quanto TCU já fazem uso da lógica da AED para fundamentar seus atos. Embora não haja definição uniforme, na doutrina ou jurisprudência nacionais, entre eficiência e economicidade, os julgados do TCU selecionados para análise demonstram que a Corte acolhe a importância de ambos para fins de avaliação da legitimidade do ato questionado. O que se nota, contudo, é que o conceito de eficiência, tal qual tecnicamente definido em AED, não é cotejado na sua profundidade por quaisquer das partes, o que sugere que o acolhimento da AED nessa área, com suas premissas e definições, poderá agregar maior tecnicidade às decisões. Palavras-chave: TCU; Análise Econômica do Direito; Petróleo e Gás; Eficiência; Economicidade.
ABSTRACT
PEIXOTO, Maria Andrade de Godoy. Economic Analysis of Law in Tribunal de Contas da União: auditions regarding PETROBRAS. 2014. 108 f. Dissertation (Master’s Degree of Law) – Programa de Pós-Graduação em Direito, Centro de Ciências Jurídicas / FDR, Universidade Federal de Pernambuco, 2014. The constitutional amendment nº 9/95 changed the oil and gas regulation in Brazil, enabling the presence of new players in a market dominated by Brazilian public company, Petróleo Brasileiro S/A – PETROBRAS. This change required a new insight over the arguments of efficiency and economy by Tribunal de Contas da União – TCU. understanding over this new regulation and the dispute that arouse from there, related to the question whether PETROBRAS should or shouldn’t obey the national (“Lei nº 8.666/93”) instead of its owns bidding legislation (Decree nº 2.745/98), and Court’s initial inclination not to take into account the efficiency criteria, become quite sensible on this debate. However, considering the Law and Economics premises and concepts, it is possible to affirm that both PETROBRAS and TCU already make use of Law and Economics’ logic to fundament its acts and decisions. Although the definitions of efficiency and economy are not clear, three selected TCU’s decisions show that the Court does consider the importance of both efficiency and economy in order to decide about the legitimacy of the audited act. One can see, however, that efficiency, as defined in Law and Economics, is not expressly mentioned in its proper depth by neither the involved parties, leading to the conclusion that the proper absorbance of Law and Economics in external auditing would increase the potential technical level of the discussion. Key-words: TCU; Law and Economics. Oil and Gas; Efficiency; Economy.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................................09 2 DA ABERTURA DE MERCADO .......................................................................................... 14 2.1 Dos motivos do Dec. 2.745/98: a quebra da exclusividade da Petrobras. ............................... 14 2.2 Das divergências acerca da aplicabilidade do RLSP ............................................................... 17 2.2.1 Dos argumentos contrários à aplicação do RLSP ................................................................. 18 2.2.2 Dos argumentos favoráveis à aplicação do RLSP ................................................................ 20 2.2.3 Posição do STF ..................................................................................................................... 21 2.3 Do afastamento do vetor econômico na definição do regime legal aplicável às contratações na PETROBRAS. ............................................................................................................................... 27 3 ANÁLISE ECONOMICA DAS DECISÕES DOS GESTORES .......................................... 34 3.1 Por que Análise Econômica do Direito?.................................................................................. 34 3.2 Dos modus operandi da AED .................................................................................................. 38 4 SOBRE A EFICIÊNCIA .......................................................................................................... 47 4.1 Regras e princípios: como trataremos os princípios da eficiência e da economicidade. ......... 47 4. 2 Diferença entre eficiência e economicidade .......................................................................... 52 4.3 Contraponto com o princípio da legalidade ............................................................................. 58 4. 4 Eficiência na AED .................................................................................................................. 61 5 DO PAPEL DO TCU NA FISCALIZAÇÃO DA PETROBRAS ......................................... 66 5.1 Da evolução do argumento da eficiência e da economicidade na jurisprudência do TCU ..... 66 5. 2 “Porque era a melhor”. ........................................................................................................... 71 5. 3 Clonagem na contratação........................................................................................................ 81 5.4 Economicidade não comprovada ............................................................................................. 89 6 CONCLUSÃO ........................................................................................................................... 97 7 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ........................................................................................ 99
1 INTRODUÇÃO
A chamada quebra do monopólio da PETRÓLEO BRASILEIRO S/A –
PETROBRAS, embora seja uma expressão que não resuma com clareza os efeitos da Emenda
Constitucional 9/95 e seja, do ponto de vista técnico, um tanto equivocada, chama a atenção para
o resultado prático que dela decorreu: a PETROBRAS deixaria de atuar com exclusividade no
setor de petróleo e gás no Brasil. Passados dezenove anos daquele que viria a ser considerado o
grande marco legal da mudança do mercado, já é possível perceber o seu reflexo nas contratações
correlatas.
Não poderia ser de outra forma, já que à iniciativa privada (nacional e
estrangeira) foi dada a tarefa de explorar as reservas de petróleo brasileiras e produzir num
regime de concorrência, homenageando a inovação tecnológica e a livre competição. Ocorre que
esse novo modelo, que aposta nos benefícios advindos do ingresso de novos participantes, exigiu
da Administração um esforço, também teórico, para garantir a regulação voltada para a
concorrência.
Em que pese a possível abrangência desses reflexos na sociedade, tanto do ponto
de vista econômico, quanto jurídico, o foco do presente trabalho será a análise do entendimento
do TCU na fiscalização do setor de petróleo e gás após a abertura do mercado, com especial
enfoque para os novos modelos teóricos que suportam a Análise Econômica do Direito, partindo
do conceito do princípio da eficiência.
Nesse panorama de abertura do mercado, em que se permite a participação de
investidores privados, ampliou-se também o papel do Tribunal de Contas da União na
fiscalização dos contratos celebrados pela estatal. Mesmo antes da abertura, o TCU já exercia sua
competência de fiscalização nos contratos firmados com a PETROBRAS, sociedade de economia
mista atuante com exclusividade antes da reforma do art. 177 da Constituição Federal de 1988.
Ainda o exerce, é fato. Ocorre que, após a edição da EC 9/95, a legislação nacional de petróleo e
gás foi alterada para dar forma à quebra da exclusividade apontada na Emenda. Significa,
portanto, que o Estado precisava preparar-se para conduzir a um só tempo a entrada de novos
participantes, mas também garantir a sobrevivência do representante do Estado nesse setor
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estratégico. Em outras palavras, foi necessária a introdução de normas que equilibrassem o
conjunto de forças então atuantes.
Em resumo, se é verdade que o terreno estava sendo preparado para viabilizar a
abertura do mercado, também o estava para garantir a participação da PETROBRAS. Assim, veio
a Lei 9.478/97, a Lei do Petróleo, que dispõe “sobre a política energética nacional, as atividades
relativas ao monopólio do petróleo, institui o Conselho Nacional de Política Energética e a
Agência Nacional do Petróleo e dá outras providências”.
Logo após a edição da Lei do Petróleo, com base seu art. 671, foi editado o
Decreto 2.745/98, conhecido como o Regulamento do Procedimento Licitatório Simplificado da
Petróleo Brasileiro S/A – PETROBRAS (RLSP). Se a PETROBRAS iria concorrer num mercado
aberto, não poderia fazê-lo com base na Lei de Licitações. Precisaria de um mecanismo mais ágil
para realizar suas contratações.
O quadro normativo apresentado até aqui surge bem delineado nas palavras de
DANIELA COUTO MARTINS2, que assim resume a evolução legislativa do monopólio da
União e a Lei do Petróleo:
A Lei 9.478/1997, conhecida como Lei do Petróleo, buscando implementar o disposto na Emenda Constitucional nº 9, de 1995, inaugurou nova fase da política energética brasileira, em que atividades relativas à exploração, produção, refino, transporte, importação e exportação de petróleo, derivados e gás natural, cujo exercício era até então permitido apenas à Petrobras, sociedade de economia mista, podem ser executadas por quaisquer empresas privadas, não obstante a manutenção do monopólio da União Federal sobre tais atividades. (...) A redação vigente do dispositivo constitucional representa mudança da política econômica anteriormente delineada para o setor (alteração efetivada pela Emenda Constitucional nº 9/1995), visto que a redação original do artigo 177 admitia a atuação de quaisquer empresas privadas somente nas atividades de distribuição e comercialização de combustíveis líquidos e gasosos.
Discorrendo sobre os desafios desse novo sistema, apresenta a Autora o
questionamento acerca da forma como seria realizada a transição para um sistema de atuação
competitiva. Assim se expressa3:
1 Art. 67. Os contratos celebrados pela PETROBRÁS, para aquisição de bens e serviços, serão precedidos de procedimento licitatório simplificado, a ser definido em decreto do Presidente da República. 2 MARTINS, Daniela Couto. A regulação na indústria do petróleo. Belo Horizonte: Ed. Fórum, 2006, p. 24. 3MARTINS, Daniela Couto, ob. Cit. (nota 2), p. 24.
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A Petrobras exerceu, desde a sua criação em 1953, pela Lei nº 2.004, todas as atividades que são objeto do monopólio estatal. Portanto, o desafio atual consiste na transição de um mercado monopolizado durante 44 anos para um mercado competitivo, mas que continua sujeito a controle estatal.
É nesse novo panorama legal que o trabalho dos técnicos do TCU se desenrola. E
aqui entra uma importante discussão teórica, a respeito da constitucionalidade do Dec. 2.745/98.
Para o TCU, o RLSP é inconstitucional e à PETROBRAS deve ser aplicada, na integralidade, a
Lei Geral de Licitações (Lei 8.666/93). Apesar de ser uma questão teórica e conceitual,
decorrente da mudança na política econômica e energética, o problema a respeito do modelo de
licitações na estatal reflete diretamente nos cálculos de eventuais superfaturamentos e
sobrepreços das obras conduzidas por ela. E assim a conhecida divergência de posicionamento
que afasta o TCU da PETROBRAS toma contornos concretos. A PETROBRAS obedece a Lei do
Petróleo e o RLSP e o TCU fiscaliza com base na Lei 8.666/93.
Com base nessa divergência inicial, o TCU já exarou diversas decisões que
analisam o modelo licitatório da PETROBRAS. Nela, além dos argumentos voltados puramente à
inconstitucionalidade do Decreto 2.745/98, já se pode notar uma análise mais aprofundada sobre
o papel que a Cia. exerce no cenário nacional, com vinculação direta à necessidade de eficiência
nas suas ações.
Desse questionamento inicial, apesar de ficar claro que PETROBRAS e TCU
têm visões diferentes sobre o modelo de contratação que deve ser seguido na estatal, já se pode
perceber uma evolução teórica no trato do argumento da eficiência nesta Corte de Contas, o que
lhe serviu, inclusive, para moldar a sua fiscalização junto à estatal.
Vários outros questionamentos polêmicos podem advir da simples aplicação do
Dec. 2.745/98 às licitações na PETROBRAS (pode o TCU exigir da PETROBRAS o
cumprimento da Lei de Licitações (8.666/93), mesmo após a edição do Dec. 2.745/98? Qual o
regime jurídico dos contratos firmados pela PETROBRAS? As sociedades de economia mista,
sem aporte da União, deveriam estar submetidas à fiscalização do TCU?). Contudo, o escopo
proposto do presente trabalho é um estudo voltado para o princípio da eficiência no TCU e para o
uso das ferramentas trazidas pela Análise Econômica do Direito nas suas decisões, e para isso
delimitou-se o setor de petróleo e gás como área de estudo. E a edição do Regulamento auxilia
igualmente na demarcação temporal da pesquisa, visto que inaugura um arcabouço legal
definidor dos contratos que se seguiram.
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Note-se que, apesar de premente ênfase ao princípio da eficiência, não foi
possível distanciá-lo claramente do princípio da economicidade – seja do ponto de vista
doutrinário, seja do jurisprudencial. Por essa razão, será fixada a premissa de que um ou outro
atendem ao objetivo final de garantir uma decisão a mais racional possível e, assim, aproximar o
a lógica do órgão de fiscalização ao modelo mental do gestor público que integre os quadros de
uma sociedade de economia mista, como a PETROBRAS. O assunto será devidamente abordado
mais à frente.
Para aprofundar o problema proposto, a pesquisa sugerida passará pela análise de
como os princípios da eficiência e da economicidade interferiram (e interferem) no atual
posicionamento da Corte na fiscalização dos contratos firmados pela PETROBRAS, tendo em
vista que esse é, como aqui será esmiuçado, o grande problema conceitual com efeitos concretos
nas fiscalizações do TCU na PETROBRAS.
A hipótese com que se trabalha, e que será a linha central da pesquisa, é haver
uma resistência à primazia do princípio da eficiência nas decisões do TCU, em especial no campo
proposto. Resistência, contudo, não significa completo afastamento, como será demonstrada na
análise de recentes decisões estudas ao final do trabalho. Alí, demonstraremos que o TCU e a
PETROBRAS fazem uso de argumentos próprios da Análise Econômica do Direito, ainda que
sem identificar perfeitamente os institutos. Mais ainda: traremos precedentes em que a
demonstração da eficiência e da economicidade tomaram contornos de principal argumento
definidor dos Votos exarados pelos Ministros da Corte.
Temos que, quanto mais incorporados os argumentos em prol da eficiência e da
economicidade, com a utilização de ferramentas próprias da Economia (nos moldes trazidos pela
Análise Econômica do Direito), mais tecnicidade terá o julgamento da ação dos gestores da
PETROBRAS na fiscalização realizada pelo TCU.
Dito isso, e para prosseguir com o aprofundamento da pesquisa, é necessário
destacar alguma premissas que servirão de fio condutor da hipótese acima. De início, como será
discutido ao longo do trabalho, essa diferença de concepção – RLPS ou Lei 8.666/93 - gera uma
série de questionamentos, voltados à fiscalização realizada pelo TCU. Note-se, contudo, que não
se abordará de forma exaustiva ou exclusiva o debate ao redor dessa divergência inicial. Isso
porque será nosso objetivo discutir se o TCU está respeitando o princípio da eficiência e da
economicidade na fiscalização dos contratos firmados após o Dec. 2.745/98, e como ele está
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abordando os assuntos que lhe chegam sob a ótica da Análise Econômica do Direito. Um das
premissas, portanto, é o fato de que há divergências teóricas basilares que separam o
entendimento dos técnicos do TCU daquele das equipes técnicas da PETROBRAS, como essa
divergência inicial, entre o RLSP e a Lei 8.666/93. É nessa condição - de divergência inicial -
que o tema será abordado.
Além disso, e de importância ainda maior, destacamos que o ponto de partida do
pensamento desenvolvido aqui é a necessidade de obtenção de lucro pela estatal, na sua
condição de sociedade de economia mista, constituída na forma de uma sociedade anônima de
capital aberto, com ações negociadas em bolsas de valores nacional e estrangeiras. A razão pela
qual se delimita essa premissa é a interferência que pode haver, na interpretação dos contratos
celebrados pela PETROBRAS, do entendimento de que o caráter lucrativo da estatal é secundário
frente às imposições do Estado que a controla. Em outras palavras, não será objeto da tese a
análise acerca da predominância de valores que devem nortear as ações dos gestores da
PETROBRAS – se a consecução do lucro ou se as coordenadas apontadas pelo Poder Executivo
Federal em prol da sociedade brasileira. Para o que será objeto de estudo, basta fixar que a
PETROBRAS é uma sociedade de economia mista, pessoa jurídica com natureza de direito
privado, parte da Administração Pública Indireta, exploradora da atividade econômica,
competindo com as demais em regime de livre mercado, e que, em razão disso, sua atividade
deve ser lucrativa, por definição.
Outra premissa fática igualmente apta a interferir na presente análise, e que,
portanto, merece vir aqui expressa, é a de que a empresa, para obter o lucro almejado, realiza
uma ponderação de custo benefício das suas decisões. Implica dizer que as opções negociais
adotadas pela PETROBRAS, tal qual por qualquer outra empresa cuja finalidade seja a obtenção
de lucro, passa pela análise dos custos inerentes às opções dadas. Não significa, por outro lado,
que essa ferramenta de auxílio à decisão do gestor (análise custo-benefício) pondere aspectos
meramente financeiros. É evidente que ela deve ser somada aos demais fatores decisórios que
influenciam na direção da empresa, inclusive à avaliação jurídica quanto à viabilidade de cada
uma das alternativas negociais à disposição do gestor.
Conforme será abordado ao longo do texto, nessa análise de custo-benefício
podem ser inseridos alguns fatores que não correspondem, a princípio, a valores monetários,
como, por exemplo, qualidade do serviço a ser contratado ou prazo para sua execução. Por outro
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lado, como esses fatores repercutem na vantajosidade da operação, são parte da ponderação da
análise custo-benefício. Para fins de fixação das premissas, o fato é que se precisa ter em mente
que o gestor público realiza a análise de custo-benefício em suas decisões, o que engloba a
avaliação jurídica e as demais que sejam aplicáveis ao caso.
No mais, registra-se desde já que o fator político que envolve a condução de
uma estatal não será considerado para fins desse estudo. É bastante razoável que as diretrizes de
atuação da PETROBRAS estejam alinhadas com as políticas traçadas pelo Governo Federal, e a
própria constituição do organograma da empresa reflete essa realidade, como se vê pela presença
de representantes de membros do alto escalão do Governo Federal no Conselho de Administração
da companhia. A razão pela qual se faz essa ressalva é diante do possível embate entre a natureza
jurídica da PETROBRAS, enquanto sociedade de economia mista exploradora da atividade
econômica, e a possível interferência política em suas estratégias negociais, ainda que lucrativas.
Esses são questionamentos externos à seara jurídica, relativamente comuns e facilmente
encontrados em críticas feitas à condução da política nacional.
Esse é um debate complexo e que ultrapassa os limites da nossa abordagem.
Portanto, consideraremos a questão como um fator exógeno e eventual impacto que tenha sobre
as decisões da empresa não será aqui abordado ou considerado.
Feita essa introdução, passa-se ao tópico seguinte, com a contextualização do
leitor no cenário legal em que a PETROBRAS está imersa, agregando-se a explicação do como e
por quê chegamos lá.
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2. DA ABERTURA DE MERCADO
2.1 Dos motivos do Dec. 2.745/98: a quebra da exclusividade da Petrobras.
Criada em 1953 pela Lei 2.004, a Petróleo Brasileiro S/A – PETROBRAS exerceu com
exclusividade e durante décadas todas as atividades de que são objeto o monopólio do Estado, na
área de petróleo e gás, previstas no art. 177 da Constituição Federal de 1988. O artigo, na sua
redação original, excetuava apenas as atividades de distribuição e comercialização de
combustíveis líquidos e gasosos, que poderiam ser exercidas por outras empresas privadas.
Então, em 1995, depois de atuar mais de 40 anos de forma exclusiva naquelas atividades
de petróleo e gás, sobreveio a alteração constitucional de maior repercussão no setor desde a
promulgação da Carta Constitucional. A Emenda Constitucional 9/95, fruto de uma política
nacional de abertura de mercado, iniciou uma nova fase para a produção energética do País. A
partir daí, a nova redação dada ao art. 177 da CRFB/88 viria a admitir que outras empresas
privadas pudessem exercer as atividades até então atribuídas com exclusividade à PETROBRAS.
Eis o teor atual do artigo, na parte que nos interessa:
Art. 177. Constituem monopólio da União: I - a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos; II - a refinação do petróleo nacional ou estrangeiro; III - a importação e exportação dos produtos e derivados básicos resultantes das atividades previstas nos incisos anteriores; IV - o transporte marítimo do petróleo bruto de origem nacional ou de derivados básicos de petróleo produzidos no País, bem assim o transporte, por meio de conduto, de petróleo bruto, seus derivados e gás natural de qualquer origem; V - a pesquisa, a lavra, o enriquecimento, o reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios e minerais nucleares e seus derivados, com exceção dos radioisótopos cuja produção, comercialização e utilização poderão ser autorizadas sob regime de permissão, conforme as alíneas b e c do inciso XXIII do caput do art. 21 desta Constituição Federal. § 1º A União poderá contratar com empresas estatais ou privadas a realização das atividades previstas nos incisos I a IV deste artigo observadas as condições estabelecidas em lei. § 2º A lei a que se refere o § 1º disporá sobre: I - a garantia do fornecimento dos derivados de petróleo em todo o território nacional; II - as condições de contratação; III - a estrutura e atribuições do órgão regulador do monopólio da União;
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§ 3º A lei disporá sobre o transporte e a utilização de materiais radioativos no território nacional. (...)
Pelo §1º do art. 177, a União poderia então contratar com empresas estatais ou privadas a
realização das atividades previstas nos incisos I a IV daquele artigo, “observadas as condições
estabelecidas em lei”. Para implementar a alteração constitucional, fazia-se necessária a
promulgação de uma lei, que veio na forma da Lei do Petróleo – Lei 9.478/97.
O art. 614, §1º, daquela lei deixa claro que a atuação da PETROBRAS, quanto às
atividades referidas naquele artigo, seriam desenvolvidas em caráter de livre competição com
outras empresas, em função das condições de mercado, obedecido o período de transição previsto
na mesma lei. Note-se que a Lei do Petróleo representou a transposição de um modelo para outro,
no que toca às atividades descritas no art. 177 da CRFB/88, daí a sua importância enquanto
marco legal dessas atividades.
ARAGÃO5 reforça essa previsão legal, indicando que a necessidade de conferir às estatais
a igualdade de condições para competir no mercado “pressupõe o tratamento especial de suas
atividades em comparação ao tratamento conferido aos demais órgãos e entidades da
Administração Pública.”
Com tão relevante papel, qual seja, funcionar como ferramenta de transição para um
mercado competitivo, a Lei do Petróleo dispõe ainda sobre a Agência Reguladora que atuará
sobre o setor, de forma que seu objeto inclui “a política energética nacional, as atividades
relativas ao monopólio do petróleo” e, ainda, a instituição do “Conselho Nacional de Política
Energética e a Agência Nacional do Petróleo e dá outras providências.”
Em relação especificamente à PETROBRAS, a Lei do Petróleo ajusta a sua natureza de
sociedade de economia mista a essa nova realidade de mercado aberto e prevê, em seu art. 67,
4 Art. 61. A Petróleo Brasileiro S.A. - PETROBRÁS é uma sociedade de economia mista vinculada ao Ministério de Minas e Energia, que tem como objeto a pesquisa, a lavra, a refinação, o processamento, o comércio e o transporte de petróleo proveniente de poço, de xisto ou de outras rochas, de seus derivados, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluidos, bem como quaisquer outras atividades correlatas ou afins, conforme definidas em lei. § 1º As atividades econômicas referidas neste artigo serão desenvolvidas pela PETROBRÁS em caráter de livre competição com outras empresas, em função das condições de mercado, observados o período de transição previsto no Capítulo X e os demais princípios e diretrizes desta Lei. § 2° A PETROBRÁS, diretamente ou por intermédio de suas subsidiárias, associada ou não a terceiros, poderá exercer, fora do território nacional, qualquer uma das atividades integrantes de seu objeto social. 5 ARAGÃO, Alexandre Santos de. Ob. Cit. (nota 5). p. 13.
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que a empresa terá um procedimento licitatório simplificado, a ser definido em decreto do
Presidente da República. Observe-se o teor do seu art. 67:
Art. 67. Os contratos celebrados pela PETROBRÁS, para aquisição de bens e serviços, serão precedidos de procedimento licitatório simplificado, a ser definido em decreto do Presidente da República.
Esse artigo guarda relação com o espírito das demais alterações legais levadas a efeito até
então: preparar a empresa para abertura do mercado.
Como já narrado na Introdução, em obediência à Lei do Petróleo, seguiu-se a edição do
Decreto 2.745/98, que “aprova o Regulamento do Procedimento Licitatório Simplificado da
Petróleo Brasileiro S.A. - PETROBRÁS previsto no art. 67 da Lei nº 9.478, de 6 de agosto de
1997”. É o chamado RLSP – Regulamento do Procedimento Licitatório da PETROBRAS.
Em resumo, na linha apresentada até aqui, temos que o Decreto 2.745/98 institui o
Regulamento do Procedimento Licitatório Simplificado da PETROBRAS, sendo decorrente da
previsão da Lei do Petróleo, no seu art. 67, que por sua vez implementa as alterações trazidas
pela Emenda Constitucional 9/95 na Constituição da República, em especial no seu art. 177.
Passando agora à análise do Decreto, vê-se expresso no item 10.1 que a PETROBRAS
poderia complementá-lo no que toca aos aspectos operacionais do processo, através de ato
interno da Diretoria Executiva. In litteris:
“CAPÍTULO X DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS 10.1 A disciplina estabelecida neste Regulamento poderá ser complementada, quanto aos aspectos operacionais, por ato interno da Diretoria Executiva da PETROBRÁS, previamente publicado no Diário Oficial da União, inclusive quanto à fixação das multas a que se refere a alínea "g" do subitem 7.1.3.”
E assim o foi na forma do Manual de Procedimentos Contratuais da PETROBRAS –
MPC, publicado no Diário Oficial em 15/12/2006. Vale acrescentar que o MPC sofreu recente
alteração, e conta com nova versão, publicada no DOU em 08/05/2013, sendo agora denominado
de Manual da Petrobras para Contratação.
Assim, a figura do MPC vem respaldada no Decreto 2.745/98 e acrescenta, na sua
“Motivação” inserida na versão inicial, a autorização do item 10.1, mas também a visível
demanda por adequação ao novo comando constitucional. Assim:
17
Dentro do novo posicionamento econômico do país, a nova regulamentação do setor petróleo norteou-se por princípios constitucionais afetos à ordem econômica (competitividade, livre iniciativa, livre concorrência, ...). Assim, a Lei nº 9.478/97 ofereceu um novo papel a ser desempenhado pela Petrobras no mercado, o qual impõe a ela não mais o exercício do monopólio estatal do petróleo, mas a participação como agente econômico de mercado com atuação empresarial plena. Para o efetivo cumprimento da nova missão, a Lei nº 9.478/97 determinou (art. 67) a aplicação à Petrobras de procedimentos licitatórios simplificados. Em face do art. 67, da Lei nº 9.478/97, bem como do art. 173, § 1º, da Constituição Federal, foi estabelecido o Regulamento do Procedimento Licitatório Simplificado da Petróleo Brasileiro S.A. - Petrobras, mediante aprovação contida no Decreto nº 2.745/98. O referido Regulamento (item 10.1) facultou a sua complementação, nos aspectos operacionais, por ato interno da Diretoria Executiva da Petrobras, motivando a elaboração, aprovação e utilização do presente Manual.
É visível, portanto, que o procedimento licitatório da PETROBRAS foi instituído para ser
deliberadamente diferenciado, adequando-se a natureza de sociedade de economia mista
exploradora da atividade econômica à abertura de mercado, no que lhe permite contratar de forma
mais próxima à realidade na qual está inserida.
No entanto, essa mudança legislativa, por mais que se adequasse aos objetivos explícitos
de inserir a PETROBRAS num mercado aberto, dentro de uma lógica prevista
constitucionalmente, não foi absorvida sem críticas. Ao contrário, há uma conhecida e profunda
divergência doutrinária quanto à constitucionalidade do Regulamento.
2.2 Das divergências acerca da aplicabilidade do RLSP
Ainda que não seja o escopo central da presente análise, o debate acerca da
constitucionalidade do Regulamento auxilia a compreensão das dificuldades práticas encontradas
pela PETROBRAS e seus gestores quando da condução dos procedimentos licitatórios e dos
contratos daí decorrentes, necessários à execução dos negócios da empresa. O debate auxilia,
principalmente, na introdução ao argumento da eficiência e da economicidade enquanto
importantes ferramentas para nortear as ações da estatal.
Em breves linhas, o dilema envolvendo a constitucionalidade do Dec. 2.745/98, texto que
traz o regime licitatório simplificado da Petróleo Brasileiro S/A - PETROBRAS, data da sua
edição e tem, portanto, mais de dez anos (quase vinte). Nesse período, autores de grande
18
importância no cenário nacional já se manifestaram sobre o assunto, alguns a favor, outros contra
o texto do Decreto, e, tendo o assunto chegado ao Supremo Tribunal Federal, também já se
conhece o entendimento (não definitivo) de boa parte dos Ministros sobre o tema.
Para a estatal, permanece o quadro de instabilidade decorrente do questionamento em si,
uma vez que, na ausência de decisão final favorável da Corte Suprema, é sempre possível que
advenha alguma insurgência contra o seu procedimento licitatório por qualquer um dos
interessados.
O caso da PETROBRAS é especialmente intrigante em razão da sua posição no mercado,
porque é uma sociedade de economia mista, com papéis negociados no Brasil e no exterior,
competindo com empresas privadas, essas muitas vezes sem qualquer participação do Estado na
sua composição. As suas concorrentes estão, portanto, mais livres de amarras legais nas suas
contratações, ao passo que ela, estatal, está submetida ao Dec. 2.745/98 – ou à Lei 8.666/93,
como querem aqueles que julgam o Decreto inconstitucional.
2.2.1 Dos argumentos contrários à aplicação do RLSP
Dentre os que comungam da tese da inconstitucionalidade do Dec. 2.745/98 está o
Tribunal de Contas da União, e, sendo ele o órgão de fiscalização externa que audita as
contratações da PETROBRAS, a incerteza e insegurança em torno das contratações são
certamente majoradas.
A Emenda Constitucional 19 – publicada em 1998 e posterior, portanto, à EC 9/95 -
alterou o art. 173 da Constituição Federal, que passou a ter a seguinte redação:
Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. § 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: (...) III - licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da administração pública;
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Foi alterada, assim, o §1º daquele artigo, cuja redação assim dispunha:
Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. § 1º - A empresa pública, a sociedade de economia mista e outras entidades que explorem atividade econômica sujeitam-se ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas e tributárias.
O §1º do artigo, na sua nova redação, passou a remeter à lei a disciplina do estatuto
jurídico da empresa pública e da sociedade de economia mista que explore atividade econômica,
devendo dispor sobre licitação e temas afins, como indicado no inciso III. Após 16 anos da
edição da Emenda, ainda não foi editada lei específica sobre o assunto.
A primeira crítica ao RLPS funda-se no argumento de que a sua inconstitucionalidade
residiria no fato de que ele foi veiculado por meio de Decreto, e não de lei. Seria, portanto, uma
inconstitucionalidade formal, por incompatibilidade com o art. 173 da CRFB/88. E a Lei do
Petróleo, sendo anterior à EC 19/98, não poderia ser a “lei” a que faz menção a nova redação do
art. 173 da CRFB/88. É a posição, por exemplo, do Prof. IVES GANDRA DA SILVA
MARTINS6, para quem a única lei que pode viger é a Lei 8.666/93, que teria, segundo o autor,
sido recepcionada pela EC 19/98.
Assim, o texto da Lei Geral de Licitações7, que, em seu art. 1º, parágrafo único, determina
que as sociedades de economia mista subordinam-se a seus comandos, seria plenamente aplicável
à estatal.
Com fulcro também nos argumentos acima, o Tribunal de Contas da União, na decisão
paradigma de nº 663/028, afastou a aplicação do Regulamento, expressando o seu entendimento
6MARTINS, Ives Grandra da Silva. In: Inconstitucionalidade do artigo 67 da Lei 9478/97 - Ilegalidade do Decreto n. 2745/98 em face da Lei n. 8666/93. Disponível em: <http://jusvi.com/pecas/2237>. Acesso em: 04 jul/2012, 2002. Para o autor: “A lei 9478/97, por ser anterior à E.C. n. 19/98, manifestamente não é a lei a que se refere, a mencionada alteração da lei suprema. A única lei, nos termos da ADIN n. 4/88 do STF, que pode viger, com eficácia da sinalização constitucional, é a da mesma n. 8666/93, recepcionada pela Emenda n. 19/98 até a produção da lei específica, a que se refere”. 7 Art. 1o Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Parágrafo único. Subordinam-se ao regime desta Lei, além dos órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
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pela sua inconstitucionalidade e determinando que, dali em diante, os gestores públicos se
abstivessem de utilizar aquele diploma legal. Eis parte do dispositivo da decisão:
8. Decisão: O Tribunal Pleno, diante das razões expostas pelo Relator, com fulcro no art. 71, IV, da Constituição Federal c/c art. 43, II, da Lei nº 8.443/92, DECIDE: 8.1. determinar à Petrobrás que se abstenha de aplicar às suas licitações e contratos o Decreto 2.745/98 e o artigo 67 da Lei 9.478/97, em razão de sua inconstitucionalidade, e observe os ditames da Lei 8.666/93 e o seu anterior regulamento próprio, até a edição da lei de que trata o § 1º do artigo 173 da Constituição Federal, na redação dada pela Emenda Constitucional 19/98; (...) 8.2. aceitar como legítimos os procedimentos praticados, no âmbito da Petrobrás, com arrimo nas referidas normas, ante a presunção de legalidade então operante; 8.3. dar ciência à Petrobrás do entendimento consignado no item 8.1 retro, alertando-a de que os atos doravante praticados com base nos referidos dispositivos serão considerados como irregulares por esta Corte e implicarão na responsabilização pessoal dos agentes que lhes derem causa, devendo a entidade valer-se, na realização de suas licitações e celebração de seus contratos, das prescrições contidas na Lei nº 8.666/93;
O TCU entendeu pela inconstitucionalidade formal do Regulamento e acrescentou que a
Lei do Petróleo não poderia ser considerada a lei a que faz menção o art. 173, §1º, da CRFB/88.
Com base nisso, entendeu-se haver a delegação legislativa imprópria, já que, como destacado
pelo Min. Relator em determinado trecho do voto, “o Decreto não regulamentou dispositivos: os
criou.”
Assim, em linhas gerais, o grande obstáculo à aceitação do Regulamento vem da sua
veiculação por meio de Decreto, quando o texto constitucional, no art. 173, §1º, remete à edição
de lei para disciplina da matéria, somado, ainda, ao fato de que o Regulamento teria disposto
sobre o assunto de forma exaustiva, e não de forma a simplesmente detalhar uma norma de
hierarquia superior.
2.2.2 Dos argumentos favoráveis à aplicação do RLSP
8BRASIL. Tribunal de Contas da União. Decisão nº 663/2002. Plenário. Relator: Ubiratan Aguiar. Sessão de 19/06/2002. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 08 jul. 2002.
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Há, por outro lado, correntes que caminham por linhas distintas para apoiar a
constitucionalidade do RLSP. A de maior alcance, todavia, é aquela que se inicia pela associação
do Dec. 2.745/98 e da Lei do Petróleo ao art. 177 da CRFB/88, citado parágrafos acima, e não ao
art. 173, §1º. Esse foi o entendimento presente no Parecer AC 15, da Advocacia Geral da União –
AGU9, publicado no Diário Oficial da União – DOU, em 19/07/2004.
Nesse particular, a alegação de que o art. 1º da Lei 8.666/93 submeteria as sociedades de
economia mista integralmente ao regime geral de licitações é afastado sob o fundamento de que
afrontaria o art. 173 da CRFB/88, já em sua redação original, tendo em vista a previsão de que as
estatais exploradoras da atividade econômica teriam o mesmo regime das empresas privadas.
Em Parecer sobre o assunto, ADILSON ABREU DALLARI10 reforça que a ressalva do
art. 173, §1º, III, já impediria que as sociedades de economia mistas exploradoras da atividade
econômica seguissem o mesmo regramento da Administração Pública Direta.
No Parecer de LUIS ROBERTO BARROSO11, tratando especificamente sobre esse
debate, o tema da delegação legislativa é analisado em detalhes, concluindo o autor, no ponto
central, que a disciplina de licitações não se submete à reserva de lei formal do art. 62, §1º, da
CRFB/88, nem à reserva absoluta de lei. E, sendo o Dec. 2.745/98 uma simplificação do
procedimento licitatório geral, veicularia apenas parâmetros de aplicação, sem ofensa aos
dispositivos constitucionais.
Outros pontos são analisados no Parecer acima, como a semelhança do art. 67 da Lei do
Petróleo ao art. 12312 da Lei de Licitações, que prevê uma delegação ao Poder Executivo para
regulamentar licitações no exterior, observando apenas os princípios gerais da Lei 8.666/93.
2.2.3 Posição do STF
9 Advocacia Geral da União. Parecer 15 AC. Publicado no DOU em 19/07/2004, p. 01. Disponível em: <http://www.agu.gov.br/sistemas/site/PaginasInternas/NormasInternas/AtoDetalhado.aspx?idAto=8434&ID_SITE>. Acesso em: 04/07/2012. 10 Apud BARROSO, Luis Roberto. Regime Jurídico da PETROBRAS, delegação legislativa e poder regulamentar: validade constitucional do procedimento licitatório simplificado instituído pelo Decreto n. 2.745/98. P. 08. Disponível em <http://s.conjur.com.br/dl/parecer-luis-roberto-barroso-procedimento.pdf>. Acesso em: 04/07/2012. 11 BARROSO, Luis Roberto. Regime Jurídico da PETROBRAS, delegação legislativa e poder regulamentar: validade constitucional do procedimento licitatório simplificado instituído pelo Decreto n. 2.745/98. P. 31. Disponível em <http://s.conjur.com.br/dl/parecer-luis-roberto-barroso-procedimento.pdf>. Acesso em: 04/07/2012. 12 BARROSO, Luis Roberto. Ob. Cit. (nota 12) p. 22.
22
No caso concreto, após a sedimentação do posicionamento do TCU sobre o assunto, a
PETROBRAS insurgiu-se contras as decisões finais daquela Corte, que encerravam os
procedimentos de tomada de contas, de forma que a discussão chegou ao Supremo Tribunal
Federal.
Além de apontar pela constitucionalidade do Regulamento, a estatal acrescentou outros
pontos, onde questionou a própria competência do TCU de declarar a inconstitucionalidade de
norma. Aqui, abriram-se dois argumentos: (i) impossibilidade de declaração de
inconstitucionalidade por órgão fracionário, em ofensa ao art. 97 da CRFB/88, com reiterada
jurisprudência sobre o assunto, consolidada na forma da Súmula Vinculante 1013, e (ii) invalidade
da Súmula 347 do STF14, por ter ela se baseado na Constituição Brasileira de 1963. A Defesa da
estatal remete também ao Parecer AC 15, da AGU, afirmando estar a ela submetida em razão do
art. 40, §1º, da Lei Complementar 73/93, o que lhe daria caráter vinculado.
Como dito, das decisões finais proferidas pelo TCU em seus procedimentos
administrativos, em que se decidiu pela inconstitucionalidade do RLSP, decorreu a impetração de
Mandados de Segurança dirigidos ao Supremo Tribunal Federal, com o objetivo de sustar o ato
impugnado. No entanto, as ações derivadas da decisão paradigma do TCU de nº 663/02 não
foram a primeira oportunidade em que o STF aprofundou sua análise sobre o regime próprio da
PETROBRAS.
Eis, por exemplo, a ementa do acórdão proferido em sede de Ação Direta de
Inconstitucionalidade nº 327315, de relatoria do Min. Eros Grau, julgado pelo Tribunal Pleno em
16/03/2005, em que restou consignada a necessidade de adequação do regime a que se submete a
PETROBRAS, na condição de exploradora da atividade econômica:
EMENTA: CONSTITUCIONAL. MONOPÓLIO. CONCEITO E CLASSIFICAÇÃO. PETRÓLEO, GÁS NATURAL E OUTROS HIDROCARBONETOS FLUÍDOS. BENS DE PROPRIEDADE EXCLUSIVA DA UNIÃO. ART. 20, DA CB/88. MONOPÓLIO DA ATIVIDADE DE EXPLORAÇÃO DO PETRÓLEO, DO GÁS NATURAL E DE OUTROS
13 “Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte.” 14 Tribunal de Contas - Apreciação da Constitucionalidade das Leis e dos Atos do Poder Público - O Tribunal de Contas, no exercício de suas atribuições, pode apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do poder público. 15 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidadeº 3273/2005. Relator: Carlos Britto. Sessão de 16/03/2005. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 02 mar. 2007.
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HIDROCARBONETOS FLUÍDOS. ART. 177, I a IV e §§ 1º E 2º, DA CB/88. REGIME DE MONOPÓLIO ESPECÍFICO EM RELAÇÃO AO ART. 176 DA CONSTITUIÇÃO. DISTINÇÃO ENTRE AS PROPRIEDADES A QUE RESPEITAM OS ARTS. 177 E 176, DA CB/88. PETROBRAS. SUJEIÇÃO AO REGIME JURÍDICO DAS EMPRESAS PRIVADAS [ART. 173, § 1º, II, DA CB/88]. EXPLORAÇÃO DE ATIVIDADE ECONÔMICA EM SENTIDO ESTRITO E PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO. ART. 26, § 3º, DA LEI N. 9.478/97. MATÉRIA DE LEI FEDERAL. ART. 60, CAPUT, DA LEI N. 9.478/97. CONSTITUCIONALIDADE. COMERCIALIZAÇÃO ADMINISTRADA POR AUTARQUIA FEDERAL [ANP]. EXPORTAÇÃO AUTORIZADA SOMENTE SE OBSERVADAS AS POLÍTICAS DO CNPE, APROVADAS PELO PRESIDENTE DA REPÚBLICA [ART. 84, II, DA CB/88]. (...) 14. A Petrobras não é prestadora de serviço público. Não pode ser concebida como delegada da União. Explora atividade econômica em sentido estrito, sujeitando-se ao regime jurídico das empresas privadas [§ 1º, II, do art. 173 da CB/88]. Atua em regime de competição com empresas privadas que se disponham a disputar, no âmbito de procedimentos licitatórios [art. 37, XXI, da CB/88], as contratações previstas no § 1º do art. 177 da Constituição do Brasil. 15. O art. 26, § 3º, da Lei n. 9.478/97, dá regulação ao chamado silêncio da Administração. Matéria infraconstitucional, sem ofensa direta à Constituição. 16. Os preceitos dos arts. 28, I e III; 43, parágrafo único; e 51, parágrafo único, da Lei n. 9.478/98 são próprios às contratações de que se cuida, admitidas expressamente pelo § 2º do art. 177 da CB. 17. A opção pelo tipo de contrato a ser celebrado com as empresas que vierem a atuar no mercado petrolífero não cabe ao Poder Judiciário: este não pode se imiscuir em decisões de caráter político. 18. Não há falar-se em inconstitucionalidade do art. 60, caput, da Lei n. 9.478/97. O preceito exige, para a exportação do produto da exploração da atividade petrolífera, seja atendido o disposto no art. 4º da Lei n. 8.176/91, observadas as políticas aprovadas pelo Presidente da República, propostas pelo Conselho Nacional de Política Energética - CNPE [art. 84, II, da CB/88]. 19. Ação direta julgada improcedente.
No precedente acima, portanto, o Tribunal já deixava claro que a PETROBRAS deveria
ser classificada como exploradora da atividade econômica, remetendo ao art. 173, §1º, II, da
CRFB/88.
A primeira manifestação do STF, de forma específica, sobre o Dec. 2.745/98, decorreu da
análise de Mandado de Segurança 25.888/DF16, impetrado contra decisão final do TCU na
Tomada de Contas - TC 008.210/2004-7. Na ocasião, o Min. Gilmar Mendes deferiu a liminar e
16 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança nº 25888/06. Relator: Ministro Gilmar Mendes. Sessão de 22/03/2006. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 29 mar. 2006.
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suspendeu, até final julgamento da ação, os efeitos da decisão proferida naqueles autos (Acórdão
39/2006).
Três meses depois, em outro Mandado de Segurança de mesma natureza, agora de nº
25.986/DF17, impetrado contra decisão final do TCU na Tomada de Contas 004.147/2004-3, o
Min. Celso de Mello também deferiu a liminar e suspendeu, até final julgamento da ação, os
efeitos das decisões proferidas naqueles autos (Acórdão 1.261/2004 e 139/2006).
Note-se que de cada decisão final do TCU, em desfavor da PETROBRAS, em que ficou
consignado o entendimento da Corte de Contas pela inconstitucionalidade do Dec. 2.745/98,
decorreu a impetração de um Mandado de Segurança dirigido ao STF, com a finalidade de sustar
os seus efeitos. E assim somam-se, até o momento, 1718 decisões monocráticas no mesmo
sentido, qual seja, pela possibilidade de adoção de regime simplificado trazido pelo Dec.
2.745/98.
Sendo a primeira delas aquela proferida nos autos do MS 25.888/DF, pelo Min. Gilmar
Mendes, os argumentos ali utilizados também o foram nas decisões posteriores, pelo que se
destaca, abaixo, a sua parte mais densa:
(...) DECISÃO: Trata-se de mandado de segurança, com pedido de medida liminar, impetrado pela Petróleo Brasileiro S.A. - PETROBRÁS, contra ato do Tribunal de Contas da União, consubstanciado em decisão que determinou à impetrante e seus gestores que se abstenham de aplicar o Regulamento de Procedimento Licitatório Simplificado, aprovado pelo Decreto n° 2.745, de 24/08/1998, do Exmo. Sr. Presidente da República. (...) Existe plausibilidade jurídica no pedido. A EC n° 9/95, apesar de ter mantido o monopólio estatal da atividade econômica relacionada ao petróleo e ao gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos, acabou com o monopólio do exercício dessa atividade. Em outros termos, a EC n° 9/95, ao alterar o texto constitucional de 1988, continuou a abrigar o monopólio da atividade do petróleo, porém, flexibilizou a sua execução, permitindo que empresas privadas participem dessa atividade econômica, mediante a celebração, com a União, de contratos administrativos de
17 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança nº 25986/06. Relator: Ministro Celso de Mello. Sessão de 21/06/2006. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 30 jun. 2006. 18 MS 31235-MC/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 26.03.2012, MS 26.873-MC/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe 16.12.2011, MS 29.468-MC/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 09.02.2011, MS 29326 MC/DF, Rel. Min. Carmen Lúcia, DJe 22.10.2010, MS 29.123-MC/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 8.9.2010; MS 28744-MC/DF, Rel. Min. Ellen Gracie, DJe 17.11.2010, MS 28.745-MC/DF, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 13.5.2010; MS 28.626-MC/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, DJ 5.3.2010; MS 28.252-MC/DF. Rel. Min. Eros Grau, DJ 29.9.2009; MS 27.796-MC/DF, Rel. Min. Ayres Britto, DJ 9.2.2009; MS 27.344-MC/DF, Rel. Min. Eros Grau, DJ 2.6.2008; MS 27.337-MC/DF, Rel. Min. Eros Grau, DJ 28.5.2008; MS 27.232-MC/DF, Rel. Min. Eros Grau, DJ 20.5.2008; MS 26.808-MC/DF, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 2.8.2007; MS 26.783-MC/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 1º.8.2007; e MS 25.986-ED-MC/DF, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 30.6.2006.
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concessão de exploração de bem público. Segundo o disposto no art. 177, § 1o, da Constituição, na redação da EC n° 9/95: "§ 1º A União poderá contratar com empresas estatais ou privadas a realização das atividades previstas nos incisos I a IV deste artigo, observadas as condições estabelecidas em lei". Dessa forma, embora submetidas ao regime de monopólio da União, as atividades de pesquisa, lavra, refinação, importação, exportação, transporte marítimo e transporte por meio de conduto (incisos I a IV do art. 177), podem ser exercidas por empresas estatais ou privadas num âmbito de livre concorrência. A hipótese prevista no art. 177, § 1o, da CRFB/88, que relativizou o monopólio do petróleo, remete à lei a disciplina dessa forma especial de contratação. A Lei n° 9.478/97, portanto, disciplina a matéria. Em seu artigo 67, deixa explícito que "os contratos celebrados pela Petrobrás, para aquisição de bens e serviços, serão precedidos de procedimento licitatório simplificado, a ser definido em decreto do Presidente da República". A matéria está regulamentada pelo Decreto n° 2.745, de 1998, o qual aprova o regulamento licitatório simplificado da Petrobrás. A submissão legal da Petrobrás a um regime diferenciado de licitação parece estar justificado pelo fato de que, com a relativização do monopólio do petróleo trazida pela EC n° 9/95, a empresa passou a exercer a atividade econômica de exploração do petróleo em regime de livre competição com as empresas privadas concessionárias da atividade, as quais, frise-se, não estão submetidas às regras rígidas de licitação e contratação da Lei n° 8.666/93. Lembre-se, nesse sentido, que a livre concorrência pressupõe a igualdade de condições entre os concorrentes. Assim, a declaração de inconstitucionalidade, pelo Tribunal de Contas da União, do art. 67 da Lei n° 9.478/97, e do Decreto n° 2.745/98, obrigando a Petrobrás, conseqüentemente, a cumprir as exigências da Lei n° 8.666/93, parece estar em confronto com normas constitucionais, mormente as que traduzem o princípio da legalidade, as que delimitam as competências do TCU (art. 71), assim como aquelas que conformam o regime de exploração da atividade econômica do petróleo (art. 177). Não me impressiona o teor da Súmula n° 347 desta Corte, segundo o qual "o Tribunal de Contas, o exercício de suas atribuições, pode apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do Poder Público". A referida regra sumular foi aprovada na Sessão Plenária de 13.12.1963, num contexto constitucional totalmente diferente do atual. Até o advento da Emenda Constitucional n° 16, de 1965, que introduziu em nosso sistema o controle abstrato de normas, admitia-se como legítima a recusa, por parte de órgãos não-jurisdicionais, à aplicação da lei considerada inconstitucional. No entanto, é preciso levar em conta que o texto constitucional de 1988 introduziu uma mudança radical no nosso sistema de controle de constitucionalidade. Em escritos doutrinários, tenho enfatizado que a ampla legitimação conferida ao controle abstrato, com a inevitável possibilidade de se submeter qualquer questão constitucional ao Supremo Tribunal Federal, operou uma mudança substancial no modelo de controle de constitucionalidade até então vigente no Brasil. Parece quase intuitivo que, ao ampliar, de forma significativa, o círculo de entes e órgãos legitimados a provocar o Supremo Tribunal Federal, no processo de controle abstrato de normas, acabou o constituinte por restringir, de maneira radical, a amplitude do controle difuso de constitucionalidade. A amplitude do direito de propositura faz com que até mesmo pleitos tipicamente individuais sejam submetidos ao Supremo Tribunal Federal mediante ação direta de inconstitucionalidade. Assim, o processo de controle abstrato de normas cumpre entre nós uma dupla função: atua tanto
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como instrumento de defesa da ordem objetiva, quanto como instrumento de defesa de posições subjetivas. Assim, a própria evolução do sistema de controle de constitucionalidade no Brasil, verificada desde então, está a demonstrar a necessidade de se reavaliar a subsistência da Súmula 347 em face da ordem constitucional instaurada com a Constituição de 1988. A urgência da pretensão cautelar também parece clara, diante das conseqüências de ordem econômica e política que serão suportadas pela impetrante caso tenha que cumprir imediatamente a decisão atacada. Tais fatores estão a indicar a necessidade da suspensão cautelar da decisão proferida pelo TCU, até o julgamento final deste mandado de segurança. Ante o exposto, defiro o pedido de medida liminar, para suspender os efeitos da decisão proferida pelo Tribunal de Contas da União (Acórdão n° 39/2006) no processo TC n° 008.210/2004-7 (Relatório de Auditoria). Comunique-se, com urgência. Requisitem-se informações ao Tribunal de Contas da União e à Advocacia-Geral da União. Após, dê-se vista dos autos à Procuradoria-Geral da República. Publique-se. Brasília, 22 de março de 2006. Ministro GILMAR MENDES Relator (grifou-se)
Há, ainda, o Recurso Extraordinário 441.280/RS19, antes na Relatoria do Min. Sepúlvida
Pertence, e hoje sob análise do Min. Dias Toffoli, em que figura como Recorrente a Frota de
Petroleiros do Sul LTDA e outros e como Recorrido a PETROBRAS. O julgamento do recurso
foi afetado ao Pleno, por decisão unânime proferida em 12/05/2009 e, em 03/08/2011, após voto
pelo não provimento do Recurso por parte do Relator, Min. Dias Toffoli, e pelo provimento, pelo
Min. Marco Aurélio, o Min. Luiz Fux solicitou vistas dos autos, com julgamento suspenso desde
então.
Com base nesse panorama, podem-se consolidar os argumentos já analisados pelo STF, de
onde se destacam os seguintes: (i) a Lei 9.478/97 disciplina o §1º do art. 177 da CRFB/88; (ii) o
art. 67 da Lei 9.478/97 deixa explícito que a PETROBRAS estará submetida a um regime
licitatório simplificado, o que está regulamentado no Dec. 2.745/98; (iii) a submissão da
PETROBRAS a um regime diferenciado está em consonância com a EC 09/95; (iv) a declaração
de inconstitucionalidade do Decreto pelo TCU afrontaria o principio da legalidade e os arts. 71 e
177 da CRFB/88; e (v) a Súmula 347 do STF20, por ter sido editada antes da instituição de um
regime abstrato de constitucionalidade, deve ter sua subsistência reavaliada.
19 Para acompanhar o andamento do Recurso, íntegra disponível em http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=2266991. 20 Interesse notar que esse julgado tem sido apontado como precedente de peso na discussão a respeito da validade da Súmula 347, sendo referência para a análise da possibilidade de declaração de inconstitucionalidade pelo TCU e seus limites. Nesse sentido, ver DESCHAMPS, Gustavo Coelho. Controle de constitucionalidade e tribunais de contas do Brasil. In Fórum de contratação e gestão pública. Belo Horizonte, v. 7, n. 84, dez./2008. Disponível em: <http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/30855>. Acesso em: 04/07/2012.
27
Como dito, essas premissas acompanham as decisões liminares proferidas pelo STF até o
momento, o que, apesar de não garantir uma decisão no mesmo sentido, ao menos indica a linha
possivelmente adotada pela Corte quando da análise definitiva do assunto.
2.3 Do afastamento do vetor econômico na definição do regime legal aplicável às contratações na PETROBRAS.
Como já apontado, o panorama de incerteza que acompanha a utilização do RLSP pela
estatal, e, em consequência, por aqueles que com ela firmam contratos, permanece desde a sua
edição. Agravou-se, em definitivo, com a consolidação do entendimento do TCU pela sua
inconstitucionalidade, acompanhado pela determinação, aos gestores, de que se abstivessem de
utilizar o RLSP para utilizar a Lei 8.666/93, sob pena de responsabilidade pessoal.
O que chama atenção em todo esse debate é o afastamento de questões reais - menos
jurídicas, mas nem por isso irrelevantes ao julgador – relativas às consequências da eventual
declaração de inconstitucionalidade do RLSP nas atividades da estatal, em especial se feitos nos
moldes traçados pelo TCU.
Embora o histórico das decisões do STF aponte para uma futura confirmação da
constitucionalidade do Decreto 2.745/98, é sempre possível que assim não seja, e venha a ser
afastado do ordenamento, no todo ou em parte, esse texto que traz o RLSP. Todavia, em sendo o
caso, os efeitos da decisão podem ser modulados, como já vem sendo feito mesmo em casos de
controle concreto. O próprio TCU, quando da sua decisão paradigma, também modulou os efeitos
do afastamento do RLSP para aceitar os atos realizados sob a égide do Decreto 2.745/98, até
aquele momento. Houve, portanto, uma preocupação com a presunção de constitucionalidade das
leis e com a segurança jurídica.
Noutro giro, não se pode dizer o mesmo, na Corte de Contas, quanto aos efeitos da
eventual submissão da estatal à Lei 8.666/93, fato esse que já consta das liminares deferidas pelo
STF. Não se pretende defender que os prejuízos ao funcionamento da estatal advindos do
cumprimento integral da Lei 8.666/93 sirvam, de forma exclusiva, para fundamentar a
constitucionalidade do RLSP. Por outro lado, causa estranheza imaginar que esse argumento
tenha tido tão pouca relevância para o convencimento do TCU e das teses, em geral, que
28
suportam a inconstitucionalidade do Decreto 2.745/98. Parece-nos um negligenciamento do
princípio da eficiência, positivado no art. 37 da CRFB/88.
Em Parecer constante da Tomada de Contas n. 010.115/2002-9, ADILSON ABREU
DALLARI 21 sustenta exatamente que, em havendo dúvida a respeito de qual lei ordinária deve
ser aplicada (Lei Geral de Licitações ou Lei do Petróleo), é preciso examinar qual delas mais se
adequa aos princípios constitucionais vigentes. Em suas palavras:
No caso em exame, diante de uma dúvida a respeito de qual lei ordinária deve ser aplicada (a Lei nº 8.666/93 ou a Lei nº 9.478/97) essa verificação sobe para um patamar mais alto: cabe examinar, no tocante às empresas estatais exploradoras de atividades econômicas, qual delas melhor se ajusta aos princípios constitucionais vigentes, considerando os fatos que levaram a uma alteração dos dispositivos constitucionais aplicáveis.
Vale ainda transcrever trecho do já citado Parecer AC 15, da AGU, que, analisando a
aplicabilidade do RLSP para as subsidiárias da PETROBRAS, expressou que impedir a utilização
do Dec. 2.745/98 pelas subsidiarias corresponderia a “condená-las a morte, lenta e
gradualmente”.
65. É, pois, completamente, ilógico excluir-se as subsidiárias da PETROBRAS - que, às vezes, atuam em um ambiente competitivo muito mais acirrado do que o da "holding", como é o caso, repita-se, da Petrobrás Distribuídora S/A - BR, do campo de aplicação do Decreto nº 2.745, de 1998, que aprova o Regulamento Licitatório Simplificado daquela empresa, onde, ao nosso ver, elas estão implicitamente contempladas. 66. Entender o contrário, é o mesmo que condená-las à morte , lenta e gradualmente, provocando, por via oblíqua, a insolvência da própria Petróleo Brasileiro S/A, de quem, como já demonstrado, à saciedade, são meras extensões. Melhor teria sido privatizá-las. A agonia e o sofrimento seriam menores.
Diga-se, portanto, que esse entendimento corrobora a conclusão de que a aplicação da Lei
Geral de Licitações à PETROBRAS viria em prejuízo à sua atuação competitiva. Nesse sentido,
21 Apud VIDIGAL, José Augusto Maciel. O controle externo exercido pelo Tribunal de Contas da União na visão do Supremo Tribunal Federal: o caso PETROBRAS. Disponível em: <http://portal2.tcu.gov.br/portal/pls/portal/docs/2057624.PDF>. Acesso em: 04/07/2012.
29
aplica-se ao caso concreto o entendimento de SUNDFELD22, tratando genericamente de
empresas estatais brasileiras, quando assim se manifesta:
A verdade é que a aplicação da Lei 8.666/93 às empresas estatais exploradoras de atividade econômica sempre se revelou problemática na prática, seja pela excessiva lentidão e onerosidade de seus ritos, como pela baixa economicidade de seus resultados. Inseridas, muitas vezes, em ambientes de livre concorrência, a Lei de Licitações sempre representou um ingrediente importante da baixa competitividade das estatais brasileiras vis-à-vis de empresas privadas libertas dos mesmos entraves burocráticos.
Com mais propriedade tal conclusão se aplica à PETROBRAS, especialmente se
considerado que o RLSP traz instrumentos inexistentes (ou ao menos não expressos) na Lei
8.666/93. Quando comparada à Lei 8.666/93, é visível que a preocupação do legislador em trazer
um modelo legal compatível com a atuação da PETROBRAS foi refletido no texto do RLSP.
Embora ele não seja confrontante com as linhas gerais da Lei Geral de Licitação, lhe é mais
flexível, dando à estatal maior poder decisório no que toca a seus procedimentos licitatórios.
Note-se, por exemplo, a possibilidade de contratação integrada indicada no item 1.9 do
RLSP. Tal hipótese é compatível com a espécie de investimento atualmente nos Planos de
Negócios da Cia., pelo vulto e pela especialização técnica, encontradas, por exemplo, na
construção de Usinas Termelétricas, Refinarias ou Unidades de Fertilizante. Nesses casos, é
comum identificar-se a existência de vantagem negocial, econômica e contratual de se deixar a
cargo da empresa contratada grande parte das etapas de concepção, construção e fornecimento de
equipamentos, desde a finalização dos projetos de engenharia até a sua fase de produção.
Eis a redação do item:
1.9 Sempre que economicamente recomendável, a PETROBRÁS poderá utilizar-se da contratação integrada, compreendendo realização de projeto básico e/ou detalhamento, realização de obras e serviços, montagem, execução de testes, pré-operação e todas as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto, com a solidez e segurança especificadas.
A contratação integrada acima descrita – que encontra mais de uma definição e tradução
na doutrina brasileira – permite que a PETROBRAS delegue à empresa contratada até mesmo a
22 SUNDFELD, Carlos Ari; SOUZA, Pagani Rodrigo. Licitações nas estatais: levando a natureza empresarial a sério. Revista de Direito Administrativo, n. 245, p. 23.
30
elaboração do Projeto Básico23, documento de Engenharia essencial para as etapas posteriores e
que traça as linhas gerias do objeto contratado. Com a adoção dessa modalidade de contratação, a
contratante pretende que a empresa contratada assuma a responsabilidade de todas as fases da
obra desse ponto em diante, aí incluídos os ricos de variação de quantidades estimadas.
Esse permissivo legal pode parecer pouco representativo da importância do RLSP. No
entanto, ele é extremamente relevante. Em determinados modelos de negócios, é essa condição
que irá determinar a própria viabilidade do negócio, pois aproxima a atuação da PETROBRAS
àquela praticada em âmbito internacional. Assim, fornecedores que atuam fora do Brasil, por
exemplo, podem apresentar aqui as soluções técnicas já usadas e conhecidas internacionalmente,
de forma que não só se garante a utilização de tecnologia conhecida, como se possibilita a
obtenção de um preço condizente com o cobrado das empresas concorrentes.
Além dessa possibilidade, o RLSP não traz à modalidade Convite as restrições presentes
na Lei 8.666/93. A PETROBRAS pode optar por instaurar um procedimento licitatório na
modalidade Convite sem que haja uma limitação de valor que enseje necessariamente a
instauração de uma Concorrência. Observe-se a redação do item 3.3 do RLSP:
Para a escolha da modalidade de licitação serão levados em conta, dentre outros, os seguintes fatores: a) necessidade de atingimento do segmento industrial, comercial ou de negócios correspondente à obra, serviço ou fornecimento a ser contratado; b) participação ampla dos detentores da capacitação, especialidade ou conhecimento pretendidos; c) satisfação dos prazos ou características especiais da contratação; d) garantia e segurança dos bens e serviços a serem oferecidos;
1. velocidade de decisão, eficiência e presteza da operação industrial, comercial ou de negócios pretendida;
f) peculidaridades da atividade e do mercado de petróleo; g) busca de padrões internacionais de qualidade e produtividade e aumento da eficiência; h) desempenho, qualidade e confiabilidade exigidos para os materiais e equipamentos; i) conhecimento do mercado fornecedor de materiais e equipamentos específicos da indústria de petróleo, permanentemente qualificados por mecanismos que
23 Para um conceito adequado de “Projeto Básico”, vide Resolução nº 361 do CONFEA. Eis a definição constante do art. 1º: Art. 1º - O Projeto Básico é o conjunto de elementos que define a obra, o serviço ou o complexo de obras e serviços que compõem o empreendimento, de tal modo que suas características básicas e desempenho almejado estejam perfeitamente definidos, possibilitando a estimativa de seu custo e prazo de execução.
31
verifiquem e certifiquem suas instalações, procedimentos e sistemas de qualidade, quando exigíveis.
Para a seleção da modalidade de licitação adequada, são ponderados, entre outros, o prazo
necessários para a contratação, as particularidades do mercado e a busca pelo aumento de
eficiência. A Lei 8.666/93, ao contrário, estabelece um valor fixo para a contratação que, uma vez
ultrapassado, requer necessariamente a instauração de Concorrência. Tal restrição está posta do
art. 22, que contém a seguinte redação:
Art. 22. São modalidades de licitação: I - concorrência; II - tomada de preços; III - convite; IV - concurso; V - leilão. § 1o Concorrência é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados
que, na fase inicial de habilitação preliminar, comprovem possuir os requisitos mínimos de qualificação exigidos no edital para execução de seu objeto.
(...) § 3o Convite é a modalidade de licitação entre interessados do ramo
pertinente ao seu objeto, cadastrados ou não, escolhidos e convidados em número mínimo de 3 (três) pela unidade administrativa, a qual afixará, em local apropriado, cópia do instrumento convocatório e o estenderá aos demais cadastrados na correspondente especialidade que manifestarem seu interesse com antecedência de até 24 (vinte e quatro) horas da apresentação das propostas.
(...)
Art. 23. As modalidades de licitação a que se referem os incisos I a III do artigo anterior serão determinadas em função dos seguintes limites, tendo em vista o valor estimado da contratação:
(...) I - para obras e serviços de engenharia: (Redação dada pela Lei nº 9.648, de
1998) a) convite - até R$ 150.000,00 (cento e cinqüenta mil reais); b) tomada de preços - até R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil
reais); c) concorrência: acima de R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil
reais); II - para compras e serviços não referidos no inciso anterior: a) convite - até R$ 80.000,00 (oitenta mil reais); b) tomada de preços - até R$ 650.000,00 (seiscentos e cinqüenta mil reais); c) concorrência - acima de R$ 650.000,00 (seiscentos e cinqüenta mil reais).
Caso a PETROBRAS estivesse submetida à Lei 8.666/93, todas as licitações em valor
superior a R$ 1.500.000,00 seguiriam a modalidade concorrência, mas complexa e demorada,
32
mesmo em casos em que o mercado não apresenta tanta competitividade (em razão da expertise
ou do vulto do investimento), levando a Cia. a se afastar ainda mais do mecanismo privado de
contratação e, em consequência, a arcar com os prejuízos daí advindos.
A regulação das hipóteses de dispensa de licitação também é diferenciada no RLSP. A Lei
de Licitações estabelece um limite legal para os casos de contratação direta por dispensa em
razão de pequeno valor, atrelando ao percentual de 10% previsto no art. 23, acima citado, na
forma do seu art. 24:
Art. 24. É dispensável a licitação: (...)
I - para obras e serviços de engenharia de valor até 10% (dez por cento) do limite previsto na alínea "a", do inciso I do artigo anterior, desde que não se refiram a parcelas de uma mesma obra ou serviço ou ainda para obras e serviços da mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente; (Redação dada pela Lei nº 9.648, de 1998)
II - para outros serviços e compras de valor até 10% (dez por cento) do limite previsto na alínea "a", do inciso II do artigo anterior e para alienações, nos casos previstos nesta Lei, desde que não se refiram a parcelas de um mesmo serviço, compra ou alienação de maior vulto que possa ser realizada de uma só vez; (Redação dada pela Lei nº 9.648, de 1998)
Já o RLPS, no seu item 2.4, remete à Diretoria Executiva da PETROBRAS a definição
das competências para os atos de dispensa de licitação. A Tabela de Limite de Competências da
Cia., por sua vez, define quais os limites de dispensa por valor, em coluna específica. Tal fato dá
à PETROBRAS a possibilidade de trazer o seu procedimento licitatório mais próximo à realidade
de mercado em que está inserida.
Por último – sem a pretensão de esgotar o assunto – pode-se citar a obrigação prevista no
art. 7º da Lei 8.666/9324, que determina que as obras e serviços somente poderão ser detalhados
24 Art. 7o As licitações para a execução de obras e para a prestação de serviços obedecerão ao disposto neste artigo e, em
particular, à seguinte seqüência: I - projeto básico; II - projeto executivo; III - execução das obras e serviços. § 1o A execução de cada etapa será obrigatoriamente precedida da conclusão e aprovação, pela autoridade competente, dos
trabalhos relativos às etapas anteriores, à exceção do projeto executivo, o qual poderá ser desenvolvido concomitantemente com a execução das obras e serviços, desde que também autorizado pela Administração.
§ 2o As obras e os serviços somente poderão ser licitados quando: I - houver projeto básico aprovado pela autoridade competente e disponível para exame dos interessados em participar do
processo licitatório; II - existir orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os seus custos unitários;
33
quando houver um projeto básico aprovado pela autoridade competente e disponível para exame
dos interessados, além de orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de
todos os seus custos unitários.
Ao contrário, o RLSP privilegiou o sigilo do orçamento, de forma a tornar a licitação mais
competitiva, permitindo que a PETROBRAS tenha ofertado o preço mais econômico,
modelagem essa que foi repetida no Regime Diferenciado de Contratação – RDC.
Todas essas nuanças, somadas às dificuldades e complexidades de aplicação da Lei
8.666/93, poderiam ter sido levadas em consideração quando da análise, pelo TCU, do regime
jurídico aplicável à PETROBRAS25.
E aqui está o ponto que conduzirá ao restante da exposição: a tomar pela narrativa que
envolve o embate entre TCU e PETROBRAS a respeito do RLSP e Lei Geral de Licitações, em
que se nota rara presença de ponderação quanto aos reais efeitos de uma decisão pelo afastamento
da RLSP, poder-se-ia concluir pela mesma direção no que pertine à fiscalização dos contratos
celebrados pela estatal. Afinal, se o argumento da eficiência e sua consequente ponderação
quantos aos efeitos práticos, mesmo quando apontados os riscos operacionais de submissão da
PETROBRAS à Lei 8.666/93, não foram suficientes para definir a posição do TCU, por que esse
mesmo argumento seria abordado enquanto vetor para aceitação das decisões dos gestores da Cia.
em outras oportunidades?
Não se quer, com isso, sugerir que o natural fosse que a equipe técnica do TCU afastasse
por completo qualquer menção à eficiência das operações da estatal na sua atividade
fiscalizatória: isso seria inconstitucional. Todavia, essa dúvida quanto à postura do Tribunal (se
alheio ou não aos reais efeitos de suas decisões na atuação da PETROBRAS; se resistente ou não
à análise mais pragmática das situações; se tendente ou não a equiparar a atuação da
PETROBRAS à atuação de mercado) nos servirá de ponto de partida para os benefícios da
análise econômica do direito aplicada à fiscalização externa.
25 Ainda que se trate de Projeto de Lei em discussão, vale mencionar o PL 559/13, que tem a pretensão de substituir a Lei 8.666/93, e que já passa a incorporar, com muitas adequações, algumas dos pontos positivos aqui mencionados, previstos no RLSP. Tal fato nos parece representar o reconhecimento de que o RLSP contém avanços, quando comparado à Lei 8.666/93.
34
3. ANÁLISE ECONOMICA DAS DECISÕES DOS GESTORES
3.1 Por que Análise Econômica do Direito?
A razão pela qual se optou por analisar a fiscalização externa a que está submetida a
PETROBRAS sob a ótica da Análise Econômica do Direito - AED é a utilidade que os seus
conceitos apresentam para a compreensão dos argumentos da estatal perante o TCU. Seja
partindo de teorias civilistas, seja partindo de noções doutrinárias próprias do Direito
Administrativo tradicional, é razoável sustentar que a AED fornece outros elementos e
ferramentas não totalmente exploradas até o momento, ferramentas essas que auxiliam na melhor
absorção da realidade dos contratos celebrados pela PETROBRAS.
Essa aproximação da realidade está na origem da AED. O seu nascimento, do ponto de
vista histórico, está ligado a uma reação, nos Estados Unidos, ao juspositivismo. Essa reação
decorreu, em parte, da percepção de que a leitura fria da legislação não seria capaz (sozinha) de
realizar a justiça social. O Direito posto mostrou-se insuficiente para representar os desejos
sociais e ficou aparente a necessidade de interdisciplinaridade entre áreas correlatas para a melhor
aplicação do Direito. O embate já estava posto, porque a estrutura de interpretação jurídica não
permitia o uso de ferramentas externas para o mundo jurídico, sob pena de ofensa à sua condição
de ciência.
Sabe-se que o papel do juspositivismo está intimamente ligado à cientificidade do Direito
e à intenção de se delimitar seu objeto de estudo com precisão, conferindo-lhe o status de
ciência26. Daí decorrem alguns pressupostos necessários para suportar essa conclusão, que se
resumem, basicamente, no fato de o Direito ser uma ação humana volitiva, com conteúdo
independente da moral, constituindo-se num sistema lógico fechado e coerente de regras, “da
qual a decisão jurídica correta sempre poderia ser inferida lógica e autonomamente do direito
posto. Nascia o ordenamento jurídico27”.
Note-se que essa postura de separação entre direito e as demais áreas do conhecimento
acabou por isolá-lo e impedir um diálogo produtivo com as áreas afins. Na mesma linha,
26 GICO JR, Ivo. Introdução ao Direito e Economia, In Direito e Economia no Brasil. Org. Luciano Benetti Timm. Atlas, São Paulo, 2012, p. 5. 27 GICO JR, Ivo. Ob. Cit. (nota 26). p. 5.
35
MEDEMA28 esclarece que essa ideia remonta a JOHN AUSTIN – seguido por HANS KELSEN,
com algumas divergências – para quem o Direito poderia ser estudado de forma sistematizada e
científica, e que seu teor deveria ter sustentação científica.
O clamor pela interdisciplinaridade foi a semente para a criação do Critical Legal Studies
e da AED, especialmente nos Estados Unidos da América. No Brasil, segundo IVO GICO JR29,
viu-se o surgimento do neoconstitucionalismo.
Nos Estados Unidos, a doutrina da AED contrapôs-se ao doutrinalismo (doctrinalism) de
CHRISTOPHER COLUMBUS LANGDELL, de grande importância naquele País. A
LANGDELL, então reitor da prestigiada Faculdade de Direito de Harvard, é atribuída a
formatação do modelo americano de ensino jurídico, baseado no estudo de casos e decisões
judiciais, que seriam, na sua interpretação, o método ideal para discernir o direito posto e aplicá-
lo no caso concreto. Nas palavras de MEDEMA30, numa tradução livre, “o objetivo da
interpretação legal tornou-se o de discernir a regra das decisões judiciais”.
Essa doutrina sofreu resistência do que ficou conhecido como “sociological
jurisprudence”, representada por OLIVER WENDELL HOLMES, ROSCOE POUND JR. e
BENJAMIM CARDOSO. De forma geral, as ideias aqui aglutinadas pendiam para uma maior
necessidade de aproximar o Direito das condições sociais, ainda que, para tanto, fosse necessária
uma aproximação com outras áreas do conhecimento. Assim, o magistrado deveria reconhecer as
condições sociais e econômicas que afetam a aplicação da lei e utilizar-se das ferramentas
necessárias para conhecer melhor essa realidade31.
Essas considerações, de cunho pragmático e social, assentaram o caminho para o
Realismo Jurídico32. Essa escola teve seu ápice em 1930 e representou o mais forte embate ao
doutrinalismo. O Realismo Jurídico trouxe em si a noção de que o Juiz tem um papel
fundamental no processo de decisão e que a aplicação dos precedentes de forma pura e isolada
não é verificada na realidade. Nas palavras da MEDEMA 33,
28 MEDEMA, Steven G. MERCURO, Nicholas. Economics and the Law: from Posner to Post-Modernism. Second Edition. New Jersey: Princeton Univesity Press, 2006, p. 8. Tradução livre. 29 GICO JR, Ivo. Ob. Cit. (nota 26). p. 7. 30 MEDEMA, Steven G. MERCURO. Ob. Cit. (nota 28). p. 10. No original: “the task of legal reasoning thus became that of discerning the doctrines from the judicial opinions”. 31 MEDEMA, Steven G. MERCURO. Ob. Cit. (nota 28). p. 12 32 MEDEMA, Steven G. MERCURO. Ob. Cit. (nota 28). p. 14 33 MEDEMA, Steven G. MERCURO. Ob. Cit. (nota 28). p. 15. No original: “The Realists rejected the existence of objectively determinable rights; the use of rigid legal rules, categories, and classification; appeals to the authority of the past – citations, eminent jurists, and classic treatises; and the logic of reasoning from precedent.”
36
os realistas rejeitavam a existência de direitos objetivamente determinados: o uso de normas rígidas, categorias e classificação; remissões para autoridades do passado – citações, juristas eminentes, e tratados clássicos, e a lógica de pensar através do precedente.
Daí resulta a conclusão de que o Direito deveria estar mais aberto às outras áreas do
conhecimento, para que os operadores – especialmente os Juízes – viessem a abordar nas suas
decisões as implicações econômicas, políticas e sociais da aplicação da lei, sem o véu da
interpretação lógica.34 O Realismo Jurídico, apesar da sua importância, não chegou a se
estabelecer como doutrina dominante e entrou em declínio nos anos 40. Passou por novo embate
do formalismo, agora com um viés processualista, reafirmando a autonomia da lei e alocando a
legitimidade da decisão na obediência ao processo previamente estabelecido.35 Firmou-se, assim,
por um período, um certo dualismo entre o doutrinalismo e “the legal process school”, ambas
tidas como insuficientes para preparar advogados a superar os obstáculos sociais visíveis nos
Estados Unidos dos anos 5036.
A desilusão com a autonomia da lei, naquela época, gerou uma série de movimentos
tendentes a associar o direito com outra área do conhecimento (“Law and ___”)37, na linha
deixada pelo Realismo Jurídico, de abrir o direito para a interferência de ciências afins.
No contexto brasileiro, o neoconstitucionalismo procurou superar o formalismo buscando
uma aplicação dos princípios constitucionais, implícitos ou explícitos, em substituição aos
conceitos metafísicos do jusnaturalismo38. Portanto, o fundamento de valor a guiar a aplicação do
direito estaria dentro do próprio ordenamento jurídico.
Ocorre, no entanto, que seja pela alternativa dada pelo neoconstitucionalismo, seja pelas
alternativas fornecidas pelas demais avaliações filosóficas em reação ao juspositivismo, instalou-
se certa insegurança quanto aos critérios passíveis de substituir a leitura fria da lei39. Ainda
segundo IVO GICO JR, o afastamento do formalismo, mesmo após a grande evolução das
ciências naturais no século XX, ainda não dava ao Direito a teorização necessária sobre o
comportamento humano. É nesse contexto que se faz presente a AED. 34 MEDEMA, Steven G. MERCURO. Ob. Cit. (nota 28). p. 16. ‘Eevry legal decision was understood to have social, ethical, political, and economic implications, and the Realist maintaindes that these should be recognized and explicitly dealt with by judges, not hidden behind a veil of logical reasoning”. 35 MEDEMA, Steven G. MERCURO. Ob. Cit. (nota 28)., p. 17. 36 MEDEMA, Steven G. MERCURO. Ob. Cit. (nota 28)., p. 19. 37 MEDEMA, Steven G. MERCURO. Ob. Cit. (nota 28). p. 17 38 GICO JR, Ivo. Ob. Cit. (nota 26). p. 8. 39 GICO JR, Ivo. Ob. Cit. (nota 26)., p. 10.
37
Segundo MEDEMA 40, várias escolas de pensamento tiveram como objeto aquilo que nos
Estados Unidos é conhecido como “Law and Economics”. Dentre eles se destacam a Escola de
Chicago, a Public Choice, Institutional law and economics e The new institutional law and
economics.
As expressões Análise Econômica do Direito – AED e Escola de Chicago são, no mais
das vezes, tomadas como sinônimos41. A primeira, no entanto, está mais ligada à doutrina de
CALABRESI, que defende a conciliação entre os cálculos econômicos e o mundo dos valores, ao
passo que a Escola de Chicago, que tem seu maior representante no Prof. RICHARD POSNER,
defende a falência da intervenção do Estado, numa postura liberal, enfocando a união entre a
Direito e Economia.
POSNER42 destaca que essa conexão entre a análise econômica e o comportamento
humano remonta a Jeremy Bentham, no início do século XIX, mas que recebeu pouca atenção do
mundo acadêmico até a publicação da obra de GARY BECKER43, The Economic Approach to
Human Behavior.
COOTER e ULLEN44 acrescentam que o uso da Economia no Direito restringia-se às
áreas como das leis antitruste ou regulação fiscal, por exemplo. No entanto, essa limitação teria
mudado drasticamente no início da década de 1960, “quando a análise econômica do direito se
expandiu, entrando em áreas tradicionais do direito, como propriedade, contratos, delitos civis,
direito e processo penal e direito constitucional.”
Para IVO GICO JR., a diferença entre a figura que essa reação tomou no Brasil
(neoconstitucionalismo) e a AED seria que a primeira não foca nas reais consequências da
aplicação da lei ou de uma decisão judicial. Nas suas palavras45:
40 MEDEMA, Steven G. MERCURO. Ob. Cit. (nota 28), p. 1. 41 FORGIONI, Paula A. Análise econômica do direito: paranóia ou mistificação?. Revista de direito mercantil, industrial, econômico e financeiro, v. 44, n. 139, p. 242, jul./set. 2008. 42 POSNER, Richard A. Economic Analysis of Law. Nova Iorque: Wolter Kluwer. 8a edição, 2010, p. 5. Estabelecendo os princípios fundamentais de Economia que servirão de base para a obra, o Autor destaca os seguintes: (i) a Lei da Demanda, (ii) Custo de oportunidade, (iii) a tendência dos recursos de se dirigirem ao seu uso mais valiosos e (iv) o equilíbrio. 43 BECKER, Gary S. The Economic Approach to Human Behavior. Chicago: The Universtity of Chicago Press, 1990. 44 COOTER Robert e ULLEN, Thomas. Direito e Economia. Porto Alegre: Bookman, 5a edição, 2010, p. 23-24. 45 GICO JR, Ivo. Ob. Cit. (nota 26). p. 10.
38
Apesar da clara preocupação com os valores, o neoconstitucionalismo não se preocupa suficientemente com as reais consequências de determinada lei ou decisão judicial. Não que ignore a realidade social em suas considerações, tão somente digo que seu foco tem sido elaborar justificativas teóricas e abstratas para a flexibilização da lei e sua compatibilização com princípios de conteúdo indeterminado, segundo algum critério de justiça, pretensamente racional e não voluntarista. O desenvolvimento de instrumentos analíticos capazes de auxiliar o intérprete a identificar, prever e mensurar tais consequências no mundo real é que foi epistemologicamente relegado a segundo plano ou para outros ramos do conhecimento humano com os quais o direito tradicionalmente não dialoga.
Nas palavras de GAROUPA46, reforçando a linha de pensamento do
neoconstitucionalismo, a sensação de negação de realidade “conduz a um processo de
deslegitimação democrática do poder judiciário que termina, frequentemente, em intervenções
redutoras pelo poder político”, processos esses que representam “assaltos à independência do
poder judiciário.”
A evolução do pensamento jurídico, portanto, tendente em ver benefícios no uso de
ferramentas de outras áreas do conhecimento, parece ser mais do que simples tendência teórica. É
factível que, no tempo, represente um meio de aperfeiçoamento do Direito.
3.2 Dos modus operandi da AED
A razão pela qual se optou, nesse trabalho, por abordar os temas aqui postos pela ótica da
Análise Econômica do Direito – temas esses que não se limitam, mas podem ser identificados,
entre outros, como a sistemática de condução dos contratos celebrados pela PETROBRAS e o
consequente modelo mental que suporta a atuação dos seus gestores, ligado à forma como o TCU
os fiscaliza – é a estreita ligação entre as ferramentas sugeridas na sistemática da AED e aquele
de fato conduzido pelos gestores, ainda que de forma intuitiva.
A AED se vale de ferramentas próprias da Economia para melhor compreender o Direito
e aperfeiçoar sua aplicação, sem se afastar do peso dado às reais consequências. Nas palavras de
IVO GICO JR47:
46 GAROUPA, Nuno. Combinar a economia e o direito: a análise económica do direito. Escola Superior de Tecnologia e Gestão do Instituto Politécnico de Beja. Disponível em: <http://www.estig.ipbeja.pt/>. Acesso em: 21 maio 2013. 47 GICO JR., Ivo. Metodologia e epistemologia da análise econômica do direito. Revista de direito bancário e do mercado de capitais, v. 13, n. 47, p. 26, jan./mar. 2010.
39
A Análise Econômica do Direito (AED), portanto, é o campo do conhecimento humano que tem por objetivo empregar os variados ferramentais teóricos e empíricos econômicos e das ciências afins para expandir a compreensão e o alcance do direito e aperfeiçoar o desenvolvimento, a aplicação e a avaliação de normas jurídicas, principalmente em relação a suas consequências.
Somente faz sentido abordar qualquer tema sob a ótica econômica quando se tem em
mente os postulados que lhe servem de base, tal qual muito bem posto por POSNER48, já na
introdução da sua obra Economic Analysis of Law, no sentido de que a Economia é a ciência da
escolha racional num ambiente em que os recursos são limitados em relação à vontade humana.
Nesse contexto, o papel da Economia, ainda segundo POSNER, seria o de explorar as
implicações da presunção de que as pessoas tendem a maximizar os seus próprios interesses, sua
satisfação, o seu resultado – ou, numa linguagem ainda mais isenta, sua utilidade.
Note-se que o conceito de utilidade, que dirige e condiciona a escolha do agente, não deve
ser confundido com rendimento, valor monetário, dinheiro. Cada agente atribui um determinado
valor às utilidades, que podem variar num universo infinito, indo desde o elemento tempo, até os
mais subjetivos, como amor e afeto, chegando no talvez mais concreto e comum, que é o
dinheiro.
Eis a explicação de GAROUPA49:
É importante notar que os critérios de bem-estar social são medidos em utilidade e não em rendimento. Falamos de desigualdade de utilidades e não de rendimento. Medir o bem-estar social por rendimento agregado ou distribuição de rendimento pressupõe outro tipo de hipóteses metodológicas que vão para além da análise de utilidades.
Ponto central para a melhor compreensão dessa leitura é a de que a utilidade não significa,
necessariamente, maior ganho financeiro: ao contrário, a utilidade pode ser representada por
diversos valores, razão pela qual esse mecanismo de pensamento é aplicável às mais diversas
áreas do comportamento, indo desde a natural negociação de contratos até a discussão quanto à
união de pessoas do mesmo sexo.
48 POSNER, Richard A. Economic Analysis of Law. Nova Iorque: Wolter Kluwer. 8a edição, 2010, p. 3-4. 49 GAROUPA, Nuno. Ob. Cit. (nota 44).
40
Como já dito aqui, o que chama a atenção dos profissionais do Direito e lhes abre um
novo horizonte pela frente são os métodos fornecidos pela Economia e sua grande aplicabilidade
no estudo jurídico. Nessa linha, explicam COOTER e ULLEN:
A economia proporcionou uma teoria científica para prever os efeitos das sanções legais sobre o comportamento. Para os economistas, as sanções se assemelham aos preços, e, presumivelmente, as pessoas reagem às sanções, em grande parte, da mesma maneira que reagem a preços. (...) A economia tem teorias matematicamente precisas (teoria do preço e teoria dos jogos) e métodos empiricamente sólidos (estatística e econometria) de análise dos efeitos dos preços sobre o comportamento. (...) Generalizando, podemos dizer que a economia fornece uma teoria comportamental para prever como as pessoas reagem às leis. Essa teoria, baseada em como as pessoas reagem a incentivos, suplanta a intuição da mesma maneira como a ciência suplanta o bom senso.
De fato, é recorrente a afirmação de que a Economia é uma ferramenta útil para a
descrição e compreensão do comportamento humano50, sendo essa umas justificativas para que se
aproxime o estudo do Direito da Economia.
Essa nova forma de ver as leis e sua aplicação, consolidada pela corrente da AED,
apresenta postulados que lhe são próprios, embora não exclusivos.
A segurança jurídica, por exemplo, que é citada como um dos principais pilares da AED,
segundo esclarece a PAULA FORGIONI, não poderia ser atribuído unicamente à AED, embora
lhe seja muito caro51. É possível, contudo, identificar os postulados gerais da AED, que
poderiam, segundo a apresentação da autora52, ser assim pontuados:
Dada a escassez de recursos, em face das necessidades humanas, sua alocação eficiente53 gerará o incremento do bem-estar e do fluxo de relações econômicas”.(...) “A alocação mais eficiente, por sua vez, é identificada com o chamado ótimo paretiano”. (...) “A forma mais eficiente de alocação de recursos é determinada pelo funcionamento do livre mercado, e não pela intervenção estatal.” (...) “Esse funcionamento do mercado pressupõe o maior grau possível de concorrência entre os agentes que nele atuam.” (...) “A formulação ou a interpretação/aplicação de textos normativos não podem ser influenciada por considerações desestabilizadoras e não-uniformes, tal como a busca do ideal de
50 TIMM, Luciano Benetti. MACHADO, Rafael Bicca. Direito, Mercado e Função Social. Disponível em: <http://www.estig.ipbeja.pt/~ac_direito/direito_mercado_funcao_social.pdf>. Acesso em 06/08/2013. 51 FORGIONI, Paula A. Ob. Cit. (nota 49). 52 FORGIONI, Paula A. Ob. Cit. (nota 49). 53 Vê-se que o conceito de eficiência é muito presente em diversos dos postulados acima. Tal assunto será tratado tópicos abaixo. Por ora, vale focar naquilo que destaca a AED, para que se possa seguir com a análise de sua aplicação no objeto do estudo.
41
justiça. O escopo do Direito deve ser determinável, sob pena de comprometimento da segurança e da previsibilidade (indispensáveis ao bom funcionamento do mercado)” (...) “O escopo (determinável e uniforme) do Direito é a busca da eficiência alocativa acima referida, atrelada sempre ao bem-estar do consumidor”.(...) “É legítimo que o foco do ordenamento jurídico repouse na eficiência alocativa (objetivamente determinável), porque resultante da consideração global das preferências individuais”.
Uma boa descrição resumida desses postulados está igualmente contida na lição de NUNO
GAROUPA54, que assim os coloca:
A Análise Econômica do Direito tem por base o método de trabalho da moderna microeconomia. Os agentes económicos comparam os benefícios e os custos das diferentes alternativas antes de tomar uma decisão, seja ela de natureza estritamente económica, seja ela de natureza social ou cultural. Estes benefícios e custos são avaliados segundo as preferências dos agentes e o conjunto de informação disponível no momento da avaliação. Esta análise custo-benefício é consequencialista porque tem em conta o que vai acontecer (em termos probabilísticos) depois de tomada a decisão, e não as causas que levaram à necessidade de tomar a decisão. Os agentes económicos preocupam-se com o futuro, e não com o passado (uma vez que este não pode ser modificado).”
É importante destacar uma singela, mas importante explicação de POSNER,
desmistificando a interpretação que a AED faz do comportamento humano, no ponto em que
reafirma que a Economia não atribui às pessoas, de forma determinística, a busca pela
maximização de riquezas. POSNER55 diz que o seu propósito não é reduzir o comportamento
humano a algum tipo de “inclinação biológica ou à faculdade da razão, e sim de elaborar e testar
modelos de comportamento humano com o objetivo de prever e (quando cabível) controlar esse
54 GAROUPA, Nuno. Ob. Cit. (nota 44). 55 POSNER, Richar A. Para além do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2009, p. 16. Pela importância do texto, segue ele transcrito: “Longe de ser reducionista com pensam seus detratores, a economia é uma ciência instrumental por excelência. Seu propósito não é reduzir o comportamento humano a algum tipo de inclinação biológica ou à faculdade da razão, nem muito menos provar que, nas profundezas de cada um de nós, comandando tudo, exista um detestável “homenzinho econômico”; mas, sim, elaborar e testar modelos de comportamento humano com o objetivo de prever e (quando cabível) controlar esse comportamento. A economia imagina o indivíduo não como “homem econômico”, mas como pragmatista; como alguém que baseia suas decisões não em custos irrecuperáveis – estes, ele os trata como águas passadas (“não chore sobre o leite derramado”) – mas nos custos e benefícios vinculados a linhas alternativas de ação que continuam em aberto. O indivíduo concebido pela economia não está comprometido com nenhuma meta restrita e egoísta, tal como a maximização de riqueza pecuniária. Não há nada na ciência econômica que determinem quais devem ser as metas de um indivíduo. Porém, quaisquer que sejam estas (algumas delas, ou mesmo todas, podem ser altruístas), presume-se que ele venha a persegui-las com as atenções voltadas para o futuro, comparando as oportunidade que se lhe apresentarem no momento em que for necessário fazer uma escolha.”
42
comportamento.” Continua afirmando que o homem concebido pela economia não é aquele que
necessariamente maximiza os recursos, mas que compara “as oportunidades que se lhe
apresentarem no momento em que for necessário fazer uma escolha”.
Colocados esses postulados, diga-se que sua aplicação pode ter diferentes conduções. Isso
porque a AED contém dois vetores de investigação: pode ter natureza positiva ou normativa56. A
análise positiva auxilia na compreensão da norma jurídica, passando pelo estudo das diferentes
consequências decorrentes de sua aplicação ou afastamento. Já a análise normativa pressupõe a
escolha da alternativa positiva mais eficiente, o que se conecta mais facilmente à atuação do
legislador, na posição de selecionar se essa ou aquela ação deve ser sancionada, premiada,
proibida.
Nas palavras de NUNO GAROUPA57:
A Análise Econômica do Direito, como disciplina do Direito, investiga a resposta a duas questões importantes: (a) uma questão positiva, qual o impacto das normas legais no comportamento dos agentes econômicos em termos das suas decisões e bem-estar; (b) uma questão normativa, quais as vantagens relativas de determinadas normas legais em termos de bem-estar social. Para responder a estas questões, a Análise Econômica do Direito aplica a metodologia da análise econômica.
MEDEMA58 acrescenta que nenhum desses usos é isento de questionamento. Uma das
críticas que se faz à análise positiva da eficiência é de que ela acabaria por consistir num filtro
que diminuiria outras importantes influências na legislação. No entanto, críticas à parte, a grande
defesa da AED é de que o uso de instrumentos advindos da Economia agrega um ponto de vista
que fornece maior claridade e, potencialmente, dá mais sustentação aos argumentos jurídicos.
Nesse mesmo sentido, COOTER e ULLEN59 esclarecem que os Juízes e os legisladores
precisam de um método para avaliar os efeitos das leis sobre os objetivos sociais que a sociedade
pretende atingir e a Economia o faz, pela avaliação da eficiência.
Ainda respondendo à pergunta de qual seria a serventia da análise econômica para o
Direito, PAULA FORGIONI60 aponta três utilidades cumulativas.
56 GICO JR., Ivo. Ob. Cit. (nota 47). 57 GAROUPA, Nuno. Ob. Cit. (nota 44). 58 MEDEMA, Steven G. MERCURO. Ob. Cit. (nota 28), p. 47. 59 COOTER Robert e ULLEN, Thomas. Ob. Cit. (nota 42). p. 26. 60 FORGIONI, Paula A. Ob. Cit. (nota 49), p. 244.
43
A primeira delas, que se identifica com a citação acima, de COOTER e ULLEN, é a de
que a AED permite a identificação dos efeitos da norma jurídica ou da decisão do caso concreto.
A segunda, que a AED pode explicar a razão “pela qual determinadas normas jurídicas
encontram lugar no ordenamento”. Por fim, ela estabelece a “pedra angular” do sistema jurídico,
que seria a eficiência econômica61.
Sobre o mesmo tema, o Prof. IVO GICO JR62 explica que uma das utilidades da AED é
fornecer ao Direito uma teoria sobre o comportamento humano, “na medida em que oferece um
instrumental teórico maduro que auxilia a compreensão dos fatos sociais”. Talvez a grande
diferença da análise econômica para os demais métodos já existentes é que a AED auxilia na
compreensão de como “os agentes responderão a potenciais alterações em suas estruturas de
incentivos”, nas palavras do citado professor.
Na mesma linha, BERNARDES e FLORENZANO63 demonstram que a AED pode ser
útil nas mais diversas áreas do Direito, como, por exemplo, no trato do Direito Processual, o que,
à primeira vista, pode parecer pouco provável. No entanto, em suas palavras:
Nesse sentido, é importante destacar as recentes alterações que vem reformando profundamente o nosso Código de Processo Civil. As reformas estão sendo inspiradas em critérios de eficiência econômica, pois é consenso que o processo judicial precisa ser economicamente viável e eficiente. Do contrário, também não haverá acesso à justiça.
Essa verificação auxilia-nos a perceber que a aplicação da análise econômica ao Direito
ainda está na sua fase inicial, diante do enorme potencial que se apresenta pela utilidade de suas
ferramentas.
E, enquanto ferramenta, a AED tem o objetivo de auxiliar na tomada racional de decisões
jurídicas64, mas agregando um ponto de vista – e uma metodologia – presente e própria da
Economia. Para o presente estudo, iremos abordar a decisão dos gestores (na acepção de
representantes das empresas estatais responsáveis pela gestão de contratos e pela adoção de
estratégias de negócios) e as decisões das autoridades fiscalizatórias, ainda que não se tratem
61 Em que pese não ser o momento de se aprofundar a questão, por fidelidade ao texto, ressalta-se que a própria autora afasta e rechaça esse último, novamente contrapondo-o à existência de valores protegidos constitucionalmente. 62 GAROUPA, Nuno. Ob. Cit. (nota 44). 63 BERNARDES, Patrícia; FLORENZANO, Vincenzo Demetrio. A moderna concepção de norma jurídica como estrutura de incentivos.Revista de Direito Público da Economia - RDPE. Belo Horizonte, n. 23, p. 155, jul./set 2008. 64 GICO JR., Ob. Cit (nota 47). p. 39.
44
decisões emanadas do Poder Judiciário, diante do teor jurídico que as acompanha e pelo fato de
estarem necessariamente vinculadas às normas aplicáveis, tanto de natureza pública, quanto
privada.
Dito isso, e valendo-nos novamente da sistematização trazida no texto de PAULA
FORGIONI65, identifica-se que as AED traz em si premissas que devem ser adotadas quando da
formulação de textos normativos ou da interpretação/aplicação do Direito.
Abandono do método clássico de análise jurídica, que considera apenas o prejuízo que uma parte causou a outra, para verificar em que medida ambas as partes causaram-se prejuízos, mutuamente.” (...) “O sistema jurídico deve proporcionar a redução dos custos de transação, facilitando as contratações entre os agentes econômicos. (...) “O aumento do grau de segurança e de previsibilidade jurídicas leva à diminuição dos custos de transação; nesse sentido, o Direito deve servir a aclarar o “marco regulatório”, diminuindo o risco a ser suportado pelos agentes econômicos.” (...) “A intervenção estatal (ou judicial) gera custos, que não podem ser desprezados pelos operadores do Direito, quer no momento da formulação dos textos normativos, quer da interpretação/aplicação do Direito.” (...) “Porque a intervenção estatal gera custos, deve, no máximo, ser admitida apenas quando necessária à neutralização das quatro falhas de mercado acima indicadas”.(...) “Normas jurídicas nada mais são que incentivos ou não-incentivos a que os agentes econômicos atuem de determinada forma. A sanção é simplesmente um preço que será valorado pelo agente econômico conforme a lógica do custo/benefício de seus possíveis comportamentos. (...) “O Direito não é permeado por outros valores que não a busca da eficiência alocativa: diz-se, então, dotado de neutralidade distributiva.
Já com base nessas diretrizes traçadas acima, é possível verificar uma certa reação à AED,
e à sua aplicação concreta.
PAULA FORGIONI66 mostra a sua posição quanto à justificativa para a reação à AED.
Trazendo os conhecidos exemplos de POSNER, dentre outros, a autora conclui que a
“repugnância” à aplicação da lógica de mercado em todas as situações esbarra na existência de
valores que não podem ser ignorados “no processo de criação do texto normativo e das normas
jurídicas”.
Por que, em certas situações, parece-nos correta a solução mais “econômica” e, em outras, essa hipótese causa-nos repugnância? Simplesmente porque – por mais doloroso que seja para o jurista admiti-lo – os exemplos lidam com diversos valores e preferências. (...) O que nos impede de adotar a solução
65 FORGIONI, Paula A. Ob. Cit (nota 49). p. 246. 66 FORGIONI, Paula A. Ob. Cit. (nota 49). p. 251.
45
proposta pela AED para todos esses exemplos é o fato de a nossa sociedade portar determinados valores – que resultam por consubstanciar princípios jurídicos – que não podem ser ignorados no processo de criação do texto normativo e das normas.
Dando seguimento a sua análise, a autora67 conclui que é preciso atentar quando da
adoção de interpretação segundo a AED, porque “um discurso “pró-concorrencial” e “pró-
mercado” pode ocultar, em alguns casos, a concepção do Direito como mero “vassalo dos
determinismos econômicos.”
Em conclusão, o operador do Direito, ao se deparar com a AED e com seus postulados, não pode ser movidos nem pela paranoia, nem pela mistificação: a relação entre o método jurídico e o método juseconômico deve ser de complementariedade e não de substituição ou oposição. Na ausência da correta compreensão da AED, de duas, uma: ou será desprezado instrumental apto a dar concreção aos princípios de nosso ordenamento jurídico, ou – o que é pior – a AED será tomada como remédio apto a solucionar todos os males, reduzindo o papel do Direito à simples reafirmação e legitimação dos determinismos econômicos.
Outra causa de certa reação contra a AED, bem apontada por GAROUPA68, que tenderia
a facilitar a sua aceitação nos países de common law, em oposição aos países de civil law, seriam
a maior busca pela realidade e a “under-theorizing” do direito costumeiro.
Uma das justificações mais popularizadas para esse difícil processo de expansão da Análise Económica do Direito é a dicotomia entre os países de common law e civil law (direito costumeiro vs. direito codificado). Essencialmente, o argumento diz que a Análise Económica do Direito é mais adequada para um sistema de direito costumeiro como o norte-americano, e menos útil num sistema de direito codificado como o português ou brasileiro. A tese baseia-se nas necessidades jurídicas de um poder judiciário mais realista e menos formalista, bem como naquilo que alguns autores caracterizam como um certo grau de under-theorizing do direito costumeiro (isto é, a ausência de uma teoria geral do direito nos países anglo-saxónicos).
É natural, igualmente, que parte dessa reação decorra das diferenças na formação dos
profissionais nessas áreas, Direito e Economia, o que resvala em mecanismos de trabalho e
approaches distintos. MEDEMA69 aponta, por exemplo, a tendência dedutiva dos economistas
67 FORGIONI, Paula A. Ob. Cit. (nota 49). p. 256. 68 GAROUPA, Nuno. Ob. Cit. (nota 44). 69 MEDEMA, Steven G. MERCURO, Nicholas. Ob. Cit. (nota 28). p. 43.
46
versus a tendência indutiva dos advogados: enquanto que os economistas analisam uma situação
partindo do particular para o geral, estabelecendo modelos e padrões de comportamento, os
advogados são instruídos, inclusive na sua formação profissional (diga-se, ainda, que com mais
ênfase em países de common law) a analisarem o caso concreto a partir de precedentes, numa
lógica majoritariamente indutiva.
O mesmo pensamento se aplica à visão ex post dos advogados, em contraponto à visão ex
ante dos economistas70. O papel mais desempenhado por advogados, embora não seja ele o único,
consiste em solucionar problemas já postos, conflitos existentes. Já o economista atua com mais
ênfase em momento anterior, em que as partes ainda podem estabelecer a melhor modelagem
para condução dos assuntos.
Todo o dito acima corrobora a pertinência da AED enquanto escola de pensamento que
possibilita a maior interação – mais do que isso: real aproximação – entre Direito e Economia,
com especial ênfase para a apreciação do caso concreto com o olhar voltado para a realidade.
Não, contudo, sem se atentar para a crítica de que ela pode não se constituir, em determinados
casos, em mecanismo adequado ao operador do Direito.
A partir desse ponto, passaremos a abordar como essa linha de pensamento está aderente
ao ordenamento jurídico brasileiro, que já conta com textos de lei (dentre eles, a Constituição
Federal), que viabilizam, com conforto e facilidade, a adoção de um raciocínio jurídico nesses
termos.
70 MEDEMA, Steven G. MERCURO, Nicholas. Ob. Cit. (nota 28). p. 43
47
4. SOBRE A EFICIÊNCIA
Como se pode ver pelas definições trazidas no capítulo anterior, o conceito de eficiência a
que se fez referência é basilar para a AED. É natural, contudo, que seja ele interpretado de formas
diferentes, seja pelas nuanças existentes nos diversos sistemas legais adotados pelos Países que o
reconhecem, seja pela polivalência inerente ao seu conceito.
O objetivo desse capítulo é de apresentar os conceitos reunidos da expressão eficiência,
bem como de contextualizar o panorama legal da eficiência do Brasil, enquanto princípio
constitucional positivado. Não se terá, contudo, um aprofundamento quanto à oposição entre
princípios e regras, ou mesmo de contraposição entre eficiência e economicidade. Ao contrário,
essas são questões aqui abordadas pela natural semelhança do tema e pelo reflexo do que se
encontra na doutrina: distinção pouco útil entre eficiência e economicidade e utilização
praticamente sobreposta.
Ao final desse tópico, espera-se que o leitor visualize o cenário nacional e como a
doutrina aplica, no Brasil, a ideia de eficiência, tão cara à AED.
4.1 Regras e princípios: como trataremos os princípios da eficiência e da economicidade.
A eficiência a que se fez referência no tópico anterior foi positivada no Brasil na forma de
princípio constitucional. Antes disso, já estava presente em norma específica, o que não retira a
importância e o significado decorrente da sua incorporação expressa na Constituição da
República.
Na forma do Decreto Lei 200/67, a “eficiência administrativa” já vinha expressa no art.
26,71 III, e de maneira indireta no art. 10072, enquanto motivo para demissão ou dispensa de
servidor efetivo ou estável. Na legislação infraconstitucional atual, a de maior relevância é a Lei
71 Art. 26. No que se refere à Administração Indireta, a supervisão ministerial visará a assegurar, essencialmente: I - A realização dos objetivos fixados nos atos de constituição da entidade. II - A harmonia com a política e a programação do Govêrno no setor de atuação da entidade. III - A eficiência administrativa. 72 Art. 100. Instaurar-se-á processo administrativo para a demissão ou dispensa de servidor efetivo ou estável, comprovadamente ineficiente no desempenho dos encargos que lhe competem ou desidioso no cumprimento de seus deveres.
48
9.784/99, que regula o procedimento administrativo federal, que traz o princípio da eficiência em
seu art. 2º73, como princípio de observância por toda a Administração Pública.
Não é unânime na doutrina o efeito que a Emenda Constitucional 19/98 teve em relação
ao peso do princípio da eficiência. Essa Emenda, que inseriu o princípio da eficiência no art. 3774
do texto constitucional, é vista por parte da doutrina como um reforço das preocupações da
Administração, “incrementando a mera reflexão estática sobre o adequado uso das suas
prerrogativas75”. Há, contudo, quem recuse à eficiência o papel de princípio, como é o caso do
Prof. EGON BOCKMAN MOREIRA76.
Também o princípio da economicidade está expresso na CRFB/88, em seu art. 70,
encontrando diversos exemplos de incorporação na legislação infraconstitucional, a exemplo da
própria Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União (Lei nº 8.443/92)77, especialmente nos
artigos 1º § 1º, 16, I, 38, IV, 43, II e 90 § 2º.
73 Art. 2o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência. 74 Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: 75 GABARDO, Emerson. Princípio constitucional da eficiência administrativa. São Paulo: Dialética, 2002, P. 96 76 Apud GABARDO, Emerson. Ob. Cit. (nota 75). p. 91. 77 Art. 1° Ao Tribunal de Contas da União, órgão de controle externo, compete, nos termos da Constituição Federal e na forma estabelecida nesta Lei: (...) § 1° No julgamento de contas e na fiscalização que lhe compete, o Tribunal decidirá sobre a legalidade, de legitimidade e a economicidade dos atos de gestão e das despesas deles decorrentes, bem como sobre a aplicação de subvenções e a renúncia de receitas. Art. 16. As contas serão julgadas: I - regulares, quando expressarem, de forma clara e objetiva, a exatidão dos demonstrativos contábeis, a legalidade, a legitimidade e a economicidade dos atos de gestão do responsável; (...) Art. 38. Compete, ainda, ao Tribunal: (...) IV - auditar, por solicitação da comissão a que se refere o art. 166, § 1°, da Constituição Federal, ou comissão técnica de qualquer das Casas do Congresso Nacional, projetos e programas autorizados na Lei orçamentária anual, avaliando os seus resultados quanto à eficácia, eficiência e economicidade. Art. 43. Ao proceder à fiscalização de que trata este capítulo, o Relator ou o Tribunal: (...) II - se verificar a ocorrência de irregularidade quanto à legitimidade ou economicidade, determinará a audiência do responsável para, no prazo estabelecido no Regimento Interno, apresentar razões de justificativa. Art. 90. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do Tribunal de Contas da União será exercida pelo Congresso Nacional, na forma definida no seu regimento comum. (...)
49
Nas palavras de BUGARIN78,
A qualificação da economicidade como um dos princípios constitucionais vetores (condutores) da atuação do controle externo da administração pública (CF, 70, caput) representa um marco teleológico de plena repercussão tanto no plano jurídico-constitucional, quanto no político-administrativo. Reflete e homenageia uma nova acepção do dever de bem agir do administrador público ao lado do já de há muito comentado dever de eficiência. É inegável, nesse contexto, que ao lado da preocupação com a legalidade, os vetores vinculados à repercussão social da ação estatal, tais como a eficiência e a economicidade, vêm crescendo de importância nas atividades do controle externo nos estados modernos.” – ver texto original.
Ainda que o objetivo do presente trabalho não seja o de refletir especificamente quanto ao
embate entre regras e princípios no que toca ao processo decisório, cumpre ao menos esclarecer o
que se tem em mente quando da menção à eficiência enquanto princípio constitucional. Não se
pode afastar por completo essa discussão, resumida em regra versus princípio, pelo fato concreto
de que os Tribunais Nacionais, em seus julgados, atendendo à positivação da eficiência enquanto
princípio, dão exemplo de decisões que não raro contrapõe a aplicação de regras e de princípios.
A essa contraposição, também é verdade, vêm se somando novas formas de pensar que,
ao invés de reforçar a distância entre um e outro, a diminuem. Os mecanismos de diferenciação
que auxiliam o aplicador do direito a diferenciar regras e princípios foram alinhados
principalmente por ROBERT ALEXY.
ALEXY 79 claramente pontua que existem formas diferentes de se analisar a dicotomia
entre regra e princípio. A primeira corrente entende que essa diferenciação de normas em regras e
princípios é naturalmente fadada ao fracasso, diante da diversidade existente. A segunda tese
aponta que a diferença entre ambos é somente de grau. A terceira, com a qual se filia, “sustenta
que as normas podem ser distinguidas em regras e princípios e que entre ambos não existe apenas
uma diferença gradual, mas uma diferença qualitativa. Essa tese é correta”.
§ 2° No relatório anual, o Tribunal apresentará análise da evolução dos custos de controle e de sua eficiência, eficácia e economicidade. 78 BUGARIN, Paulo Soares. O princípio constitucional da economicidade na jurisprudência do Tribunal de Contas da União. Editora Forum. 2ª edição, revista e ampliada. 2011, P. 95/96. 79 ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 90.
50
De forma sistemática, ÁVILA80 indica os critérios usualmente empregados para a
distinção de ambos, e destaca os seguintes: (i) caráter hipotético-condicional; (ii) modo final de
aplicação, (iii) relacionamento normativo; (iv) fundamento axiológico. Pelo primeiro deles,
baseado em DWORKIN, as regras seriam aplicadas ao modo “se, então”, enquanto que os
princípios apenas indicariam o fundamento a ser utilizado pelo aplicador para encontrar a regra
para o caso concreto. O segundo critério, do modo final de aplicação, reflete a vinculação das
regras ao modelo do tudo ou nada, ao passo que os princípios seriam passíveis de aplicação
gradual. O terceiro critério de relacionamento normativo diferencia as consequências do eventual
choque entre regras e princípios. A antinomia entre regras conduziria à declaração de invalidade
de uma delas, ao passo que o relacionamento entre os princípios “consiste num imbricamento,
solucionável mediante ponderação que atribua uma dimensão de peso a cada um deles”. Por fim,
o quarto critério, do fundamento axiológico das decisões, que atribui essa função aos princípios, e
não às regras.
O mesmo autor81 critica cada um desses critérios. Iniciando pelo que chama de hipotético-
condicional, explica que qualquer afirmação pode ser formulada dentro do modelo “se, então”.
Não poderia, portanto, servir-se como distinção entre princípio e regra. Analisando o critério de
aplicação, que requer o tudo-ou-nada na aplicação das regras, menciona que há casos em que a
aplicação revelou que determinada prescrição legal, tida por absoluta, foi superada por razões
contrárias não previstas na própria regra. Daí decorre sua conclusão de que tanto os princípios
quanto as regras “permitem a consideração de aspectos concretos e individuais82”. Em suas
palavras:
Vale dizer: a distinção entre os princípios e as regras não pode ser baseada no suposto método tudo ou nada de aplicação de regras, pois também elas precisam, para que sejam implementadas suas consequências, de um processo prévio – e, por vezes, longo e complexo como o dos princípios – de interpretação que demonstre quais as consequências que serão implementadas.
A terceira crítica diz respeito ao critério de solução de antinomia entre regras e choque de
princípios. ÁVILA83 esclarece que as ponderações de razões também são usadas na aplicação de
80 ÁVILA. Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 12ª, edição, ampliada. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 39. 81 ÁVILA. Humberto. Ob. Cit. (nota 76). p. 46. 82 ÁVILA. Humberto. Ob. Cit. (nota 76). p. 48. 83 ÁVILA. Humberto. Ob. Cit. (nota 76). p. 54.
51
regras, não se limitando à aplicação de princípios. A fixação de exceções às regras, igualmente,
partiria de um processo de valoração de razões, diante da existência de uma razão contrária a
superar axiologicamente a razão que fundamenta a própria regra. Nesses casos, “decide-se criar
uma exceção. Trata-se do mesmo processo de valoração de argumentos e contra-argumentos –
isto é, de ponderação.” Na mesma linha, no choque entre princípios, haverá casos em que um
deles será totalmente afastado, tal qual se faz com a exceção em relação à regra.
Essas considerações não conduzem à invalidação, do ponto de vista prático, da distinção
entre regras e princípios. No entanto, tendem a suavizar não só a efetiva validade dos critérios,
mais sua utilidade para o aplicador do Direito.
Nesse debate, tem ganhado relevo a participação do intérprete no processo de aplicação
das normas. Vejamos, por exemplo, a posição de HUMBERTO ÁVILA, que apresenta
entendimento de que a qualificação de normas enquanto princípios ou regras depende daquilo que
chama de colaboração constitutiva do intérprete84. Na mesma linha, MARCELO NEVES85,
indicando que, de antemão, “não se pode definir qual padrão constitui um princípio ou uma regra.
Vai depender do modo mediante o qual a norma será incorporada do ponto de vista funcional-
estrutural no processo argumentativo”.
A utilidade da distinção entre regras e princípio pode ser representada pela tarefa de
minorar o exercício do intérprete que, conhecendo se se trata de regra ou princípio, pode mais
facilmente estruturar sua argumentação86. Para tanto, é preciso reconhecer que – nas palavras de
ÁVILA 87:
Tanto as regras quanto os princípios possuem o mesmo conteúdo de dever-ser. A única distinção é quanto à determinação da prescrição de conduta que resulta da sua interpretação: os princípios não determinam diretamente (por isso prima facie) a conduta a ser seguida, apenas estabelecem fins normativos relevantes, cuja concretização depende mais intensamente de um ato institucional de aplicação que deverá encontrar o comportamento necessário à promoção do fim; as regras dependem de modo menos intenso de um ato institucional de aplicação nos casos normais, pois o comportamento já está previsto frontalmente pela norma.
84 ÁVILA. Humberto. Ob. Cit. (nota 76).p. 35. 85 NEVES, Marcelo. Entre Hilda e Hércules. Princípios e regras constitucionais. São Paulo: Martins Fontes, 2013, p. 103. 86 ÁVILA. Humberto. Ob. Cit. (nota 76).p. 65. 87 ÁVILA. Humberto. Ob. Cit. (nota 76).p. 63.
52
Toda a valorização dos princípios, em que eles são colocados como normas jurídicas
dotadas de efetividade, em MOREIRA NETO88, é visto como o que chama de fenômeno
juspolítico recente, ao lado da pluralidade das fontes normativas, da regulação autônoma e do
repensamento do poder reformador constitucional.
Pela breve apresentação da discussão teórica quanto às diferenças e aproximações entre
regras e princípios, fica claro que há certo consenso na doutrina, representado pelos autores
acima, em afirmar a força dos princípios jurídicos e sua importância no ordenamento jurídico.
Portanto, em que pese a diversidade de formas de diferenciá-los, não haverá impacto para a
aplicação dos postulados da eficiência e da economicidade o seu enquadramento enquanto regra
ou princípio (embora, conforme colocado, ambos são textualmente reconhecidos como
princípios). Em suma, dadas os aprofundamentos teóricos quanto à natureza dos princípios e das
regras, reconhece-se, para o presente fim, a força dos princípios jurídicos e possibilidade, no
ordenamento brasileiro, de sua imediata aplicação e reconhecimento.
4. 2 Diferença entre eficiência e economicidade
Como será visto mais à frente, não há uma clara distinção entre os princípios da eficiência
e da economicidade. Mas, para os fins aqui postos, basta estabelecermos que o ordenamento
jurídico nacional abarca ambos os princípios, que estão presentes na Constituição da República e
em leis extravagantes esparsas.
A grande dificuldade em tratar de eficiência reside na confusão conceitual que lhe cerca.
Ao discorrer sobre eficiência, é praticamente inevitável tratar de economicidade. As decisões
judiciais ou administrativas que se fundamentem em argumentos de eficiência são, no mais das
vezes, associadas à economicidade, e não há limite seguro para afastamento desses conceitos.
GUSTAVO LIMA89, avaliando os diferentes conceitos da economicidade, apresenta as
correntes por ele identificadas, apontando o que segue:
As conceituações pesquisadas podem ser resumidas em duas correntes: a primeira, conservadora, que salienta apenas o aspecto da modicidade dos gastos, a economia dos recursos; a segunda corrente enxerga a economicidade sob uma
88MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutações do Direito Público. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 111. 89 LIMA, Gustavo Massa Ferreira. O princípio constitucional da economicidade e o controle de desempenho pelos Tribunais de Contas. Belo Horizonte: Forum, 2010, p. 18.
53
perspectiva mais ampla, que, além de englobar a modicidade das despesas públicas, leva em conta o retorno social obtido com o dispêndio, ou seja, a relação custo-benefício social. Nesse estudo, o primeiro conceito é denominado de conceito restrito; e o segundo, de conceito amplo.
Note-se que o conceito de economicidade e o conceito de eficiência, como dito, não estão
claramente delineados, havendo correntes distintas para apresenta-los. O autor90 prossegue
indicando que a “confusão conceitual” ultrapassa ambos as ideias, para atingir também a
definição de eficácia.
Impende destacar, ainda a confusão conceitual que se avoluma ao se transmudar o objeto de estudo do locus científico do Direito para a Ciência da Administração. Nesse universo, analisando mais especificamente sob o prisma da auditoria pública, os conceitos de economia e de eficiência e eficácia são postos lado a lado, todos com significação própria tanto no âmbito nacional quanto internacional.
Como forma de exemplificar os diferentes conceitos de eficiência e economicidade nos
Tribunais de Contas, LIMA faz referência aos Manuais da INTOSAI - International
Organization of Supreme Audit Institutions, mais especificamente às Diretrizes para aplicação de
normas de auditoria operacional.91
Eis um trecho do documento em que se vê a definição de economia, eficiência e eficácia,
à luz dessa entidade:
Como descrito anteriormente, a auditoria de gestão se ocupa basicamente de examinar a economia, a eficiência e a eficácia. Em conformidade com as Normas de Auditoria (NA 1.0.40), cada auditoria de gestão pode ter como objetivo examinar um ou mais de um desses aspectos. Economia – reduzir custos De acordo com as Normas de Auditoria, economia significa reduzir ao mínimo o custo de aquisição dos recursos utilizados para realizar uma atividade, com a qualidade requerida. A economia somente poderá ser medida se existir um critério razoável — ou motivos — para fazê-lo. As auditorias da economia podem oferecer respostas a questões como as seguintes:
90 LIMA, Gustavo Massa Ferreira. Ob. Cit. (nota 89). p. 34. 91 INTOSAI – International Organization of Supreme Audit Institutions. Diretrizes para aplicação de normas de auditoria operacional. Tradução de Inaldo Paixão S. Araújo e Cristina Maria Cunha Guerreiro. Bahia: Tribunal de Contas do Estado da Bahia, 2005.
54
• Os meios escolhidos ou o equipamento adquirido — os inputs — representam o uso mais econômico dos recursos públicos? • Os recursos humanos, financeiros ou materiais têm sido utilizados de forma econômica? • As atividades gerenciais são realizadas em conformidade com os adequados princípios de administração e as políticas adequadas de gestão? Ainda que o conceito de economia esteja bem definido, não é tarefa fácil a conclusão de uma auditoria da economia. Constantemente representa uma tarefa desafiante para o auditor avaliar se os inputs adquiridos representam o uso mais econômico dos recursos públicos, se os recursos disponíveis são utilizados de maneira econômica, e se a qualidade e a quantidade dos “inputs” são coordenadas de forma ótima e adequada. Pode ser ainda mais difícil elaborar recomendações que reduzam os custos sem afetar a qualidade e a quantidade dos serviços prestados aos cidadãos. Eficiência – aproveitar da melhor maneira possível os recursos disponíveis A eficiência está relacionada com a economia. Também nesse caso a questão central se refere aos recursos utilizados. A pergunta principal é se esses recursos são empregados de maneira ótima ou satisfatória, ou se seriam alcançados os mesmos objetivos ou similares, do ponto de vista da qualidade e do prazo, com menos recursos. Estamos conseguindo o máximo de output — em termos de quantidade e qualidade — de nossos inputs e ações? A pergunta se refere à relação existente entre a qualidade e quantidade de serviços prestados, e as atividades e o custo dos recursos utilizados para produzi-los, com o objetivo de alcançar resultados. Sem dúvida, uma opinião sobre a eficiência sempre costuma ser relativa. São raras as ocasiões em que a ineficiência se apresenta de imediato. Pode- se formular juízo sobre a eficiência, utilizando-se uma comparação com atividades similares, com outros períodos de tempo ou com uma norma que tenha sido adotada de maneira explícita. Às vezes, a melhor prática é aplicável como norma. As avaliações da eficiência também podem basear-se em condições não relacionadas com normas específicas, por exemplo, quando as questões são tão complexas que não existem normas. Nesses casos, as avaliações têm que se basear nos melhores argumentos e informações disponíveis, em conformidade com as análises realizadas na auditoria. A auditoria da eficiência envolve aspectos como a comprovação de que: • são empregados de modo eficiente os recursos humanos, financeiros e outros; • os programas, entidades e atividades do setor público são geridos, regulados, organizados, executados, supervisionados e avaliados com eficiência; • as atividades das entidades públicas são coerentes com os objetivos e requisitos estipulados; • os serviços públicos são de boa qualidade, estão orientados para o cliente e são prestados no momento oportuno; e • os objetivos dos programas do setor público são realizados, observando-se uma relação custo-eficácia adequada.(...)
55
Em alguns casos pode ser difícil separar por completo os dois conceitos, eficiência e economia. (...) Em realidade, as auditorias de economia tendem a centrar-se nos três primeiros pontos enumerados. O conceito de eficiência se restringe basicamente à pergunta: os recursos são empregados de uma maneira ótima ou satisfatória? Por conseguinte, na maioria dos casos, a eficiência se especifica de duas maneiras possíveis: (i) se poderiam ter sido obtidos os mesmos resultados utilizando menos recursos, e (ii) se poderiam ter sido empregados os mesmos recursos para alcançar melhores resultados (em quantidade e qualidade).(...) Eficácia – alcançar os propósitos ou objetivos estipulados A eficácia constitui essencialmente um conceito de alcance de objetivos. Faz referência à relação existente entre os objetivos fixados, os produtos gerados e os objetivos alcançados. Estão sendo alcançados os objetivos estabelecidos de acordo com os meios empregados, os produtos obtidos e os efeitos observados? Os efeitos constatados são realmente conseqüência da política em questão, e não de outras circunstâncias? A eficácia consta de duas questões: são alcançados os objetivos da política? Isso pode ser atribuído à política implementada? Para julgar em que medida são alcançados os objetivos, é necessário que esses sejam formulados de modo que torne possível uma avaliação desse tipo. Isso não pode ser conseguido com objetivos vagos ou abstratos. Para julgar em que medida os acontecimentos observados correspondem de fato à política, requer-se a realização de uma comparação. (...) Na prática, tais comparações costumam ser difíceis de realizar, em parte porque, com freqüência, se carece de material de comparação. Nesses casos, existe a alternativa de avaliar a razoabilidade das premissas nas quais se baseia a política. (...) O auditor poderia avaliar ou medir a eficácia comparando os produtos — ou o “impacto”, ou o “estado de coisas” — com as metas estabelecidas nos objetivos da política. Esse enfoque freqüentemente é definido como análise do “alcance de objetivos”. (...) Embora uma auditoria em particular não tenha necessariamente que chegar a conclusões acerca desses três aspectos (ou seja, economia, eficiência e eficácia), pode não ser muito vantajoso o exame dos aspectos da economia ou da eficiência de atividades isoladas, se não é levada também em consideração — ainda que brevemente — sua eficácia. Por outro lado, em uma fiscalização da eficácia, é possível que o auditor também deseje levar em conta aspectos da economia e da eficiência: os produtos de uma entidade, atividade, programa ou operação que seja auditado, podem ter causado o impacto desejado, porém, os recursos empregados para alcançá-lo são utilizados de modo econômico e eficiente? (...)
56
A longa citação acima pode ser resumida, para os fins aqui postos, pelos seus trechos
destacados, que contém o conceito de cada um dos vocábulos – economia, eficiência e eficácia92.
O autor segue esclarecendo que se verifica um problema quando da transposição desses
conceitos, típicos da Ciência da Administração, para o Direito Constitucional. Na mesma linha,
afirma GABARDO93 que essa indefinição conceitual existe, mas que a constitucionalização desse
princípio evita que ele seja interpretado somente “enquanto “ente” da Ciência da Administração
ou Economia”.
O foco do trabalho de LIMA, aqui mencionado, é o princípio da economicidade. E com a
finalidade de deixar claro que a economia a que o texto acima faz referência não se identifica
perfeitamente com o conceito brasileiro de economicidade, LIMA94 conclui que
A expressão economia utilizada nas auditorias operacionais tem o objetivo de estabelecer um dos critérios de avaliação das políticas públicas. Portanto, economia, eficiência, eficácia e efetividade nada mais são do que critérios, medidas de aferição do resultado das políticas públicas para avaliar a economicidade dos gastos públicos.
Note-se, portanto, que a eficiência surgiu, nesse caso, enquanto um elemento para aferir a
economicidade do ato do gestor que esteja sob fiscalização externa, economicidade essa
positivada no texto constitucional brasileiro e que legitima a atuação do TCU.
LIMA segue indicando que esse conflito terminológico “nasce justamente dentro das
instituições encarregadas de levar a cabo tal controle externo: os Tribunais de Contas”,
corroborando a dificuldade posta acima de limitar com precisão o que seja enquadrado como
eficiência ou economicidade.
E, assim, define a sua concepção do que seja o princípio constitucional da economicidade:
Reforçamos, assim, a conceituação proposta no início deste trabalho: o princípio constitucional da economicidade é a norma constitucional que obriga o administrador público a perseguir o menor custo, na aquisição de insumos para a
92 LIMA pondera que o Tribunal de Contas Europeu está em consonância com esses conceitos. Vide LIMA, Gustavo Massa Ferreira. O princípio constitucional da economicidade e o controle de desempenho pelos Tribunais de Contas. Belo Horizonte: Forum, 2010, p. 35. 93 GABARDO, Emerson. Ob. Cit. (nota 75). p. 86. “Ainda que a eficiência, a priori, não seja considerada pela doutrina um conceito de origem jurídica, certamente que, após a sua constitucionalização, não se restringe a um “ente” da Ciência da Administração ou Economia” 94 LIMA, Gustavo. Ob. Cit. (Nota 89). p. 35.
57
Administração, bem como a buscar a maior quantidade e a melhor qualidade dos serviços prestados pela Administração.
A vinculação da atividade dos auditores do TCU à ideia de economicidade também está
posta em BUGARIN95, que remete à economicidade enquanto estratégia do constituinte
originário de fornecer uma fundamentação às decisões de alocação de recursos.
O que se quer nesse momento fixar é a ideia-chave de que economicidade reflete uma opção estratégica do constituinte de 1988 pela racional fundamentação das decisões politicamente motivadas concernentes à alocação do conjunto escasso de recursos públicos à disposição dos agentes delegados da sociedade, na sua primordial missão de atender, da melhor maneira possível, aos legítimos e urgente anseios individuais e coletivos presente me nossa perversa realidade socioeconômica.
Note-se, contudo, que o autor destaca a expressão “da melhor maneira possível” no seu
texto, de onde se pode questionar se essa não seria uma aproximação do conceito de
economicidade ao de eficiência, posto por LIMA, logo acima.
Afastando-se da ideia acima, GABARDO96 - após reforçar o tom multifacetado e
ambíguo do vocábulo eficiência – acrescenta que a economicidade não deve ser vista enquanto
sinônimo de eficiência, “mas como um dos aspectos que a determina, e nem sempre”.
GABARDO97 acrescenta que a análise custo-benefício pode fazer parte da ponderação da
economicidade do ato da administração, na medida em que o fator tempo pode ser valorado, de
forma a interferir no resultado econômico almejado.
Quanto à celeridade, esta é possível, até mesmo ser inserida na economicidade, pois referindo-se exclusivamente ao tempo, pode ter influência no resultado econômico (referente ao custo-benefício). E não é de se estranhar que possa ser equiparada à eficiência, pois a extemporaneidade, em grande número de vezes, pode tornar absolutamente inútil o resultado.
Corroborando a íntima ligação entre o princípio da eficiência e a economicidade dos atos
da Administração, GABARDO98 aponta que o princípio da eficiência, enquanto princípio
constitucional condicionante de toda a atividade do Estado, não está restrita “à imposição de
95 BUGARIN, Paulo Soares. Ob. Cit. (Nota 78). P. 105. 96 GABARDO, Emerson. Ob. Cit. (nota 75). p. 28. 97 GABARDO, Emerson. Ob. Cit. (nota 75). p. 29. 98 GABARDO, Emerson. Ob. Cit. (nota 75). p. 18.
58
meros critérios econômicos, pois é muito mais larga sua natureza e abrangência.” Significa dizer,
portanto, numa decorrência dessa afirmação, que a apuração da eficiência não está adstrita à mera
análise de critérios econômicos de uma operação. Emenda com a conclusão de que o “ambíguo
conteúdo terminológico inerente à expressão “eficiência”, que torna complexa a delimitação do
princípio, não é justificativa para a negação de sua normatividade jurídica99”.
Já é possível notar a íntima ligação entre o princípio da eficiência e o princípio da
economicidade, ligação essa que, na interpretação de GABARDO100, tem origem da importante
influência da teorização econômica de VILFRIDO PARETO, pensador que elaborou o conhecido
ponto de equilíbrio denominado “ótimo de Pareto”, que será melhor conceituado mais à frente. O
fato é que tal teoria indica uma imposição de possível limite à utilidade, na existência de um
formato teórico para a máxima satisfação das necessidades de uma das partes, sem prejuízo da
outra.
Pode-se ver, portanto, que os conceitos de eficiência e economicidade não são estanques e
distanciados: se por um lado, a eficiência pode ser apenas um dos elementos para configuração da
economicidade (como em LIMA), poderia se dar o contrário, de forma que a economicidade seria
apenas um dos fatores a conduzir à eficiência (como em GABARDO).
No entanto, acreditamos que um ou outro caminho permite a utilização da lógica da
relação custo-benefício pelo intérprete do Direito. Afinal, na avaliação de custo-benefício, é
possível identificar se os recursos foram gastos da melhor forma possível e se o resultado
pretendido pela Administração foi atingido.
Essa seria uma avaliação de eficiência ou de economicidade? Será um ou outro, a
depender da corrente adotada. A questão é: essa definição interfere na afirmação de que um ato
merece ser avaliado pela sua relação custo-benefício? Acreditamos que mais importante é definir
(i) que o ordenamento brasileiro já contempla mecanismos de vinculação do intérprete do Direito
à realidade posta e (ii) a eficiência da gestão pública é protegida juridicamente (seja na forma do
princípio da eficiência, seja na forma do princípio da economicidade).
4.3 Contraponto com o princípio da legalidade
99 GABARDO, Emerson. Ob. Cit. (nota 75). p. 22. 100 GABARDO, Emerson. Ob. Cit. (nota 75). p. 91
59
Nada disso afasta a discussão que contrapõe ambos os princípios – eficiência e
economicidade – e legalidade. A ênfase que se dá a um ou outro princípio é motivo de debate,
especialmente quando se tem em conta a avaliação de atuação da Administração Pública.
Para BUGARIN101, a inserção da economicidade enquanto vetor da atuação do controle
externo é significativa da nova acepção do “bem agir” do administrador, de forma que à já
existente preocupação com a legalidade, soma-se o cuidado com a repercussão social da ação
estatal, através dos vetores da economicidade e da eficiência.
A preocupação com a incorporação dos princípios no texto constitucional e o modo como
isso repercutiu no juspositivismo está explicada em EDILSON PEREIRA NOBRE JÚNIOR102,
para quem
(...) a Constituição de 1988 representou importante golpe no positivismo legalista, contribuindo para conduzir o foco dos aplicadores e estudiosos em direção ao reconhecimento dum novo padrão de legalidade, orientado pela ideia de justiça, no qual os princípios ocupam papel central.
E é assim, remetendo à aplicação de princípio, que ALEXANDRE DOS SANTOS
ARAGÃO103 lembra que o princípio da eficiência fornece à legalidade uma nova lógica,
“determinando a insurgência de uma legalidade finalística e material”, pelo que temos que, ainda
que se deva obediência às formalidades, especialmente se impostas pela CFRB/88, não pode ficar
segundo plano a aplicação dos princípios trazidos nesse mesmo texto constitucional.
É verdade que a incidência da eficiência e da economicidade apoiam-se, no mais das
vezes, numa visão pragmática do direito, que abarca cálculos de natureza econômica, por
exemplo, alinhando-se a uma tradição menos formalista do que aquela que acompanha a
evolução legislativa brasileira.
101 BUGARIN, Paulo Soares. Ob. Cit. (nota 78), p. 95-96. 102 NOBRE JÚNIOR, Edilson Pereira. Administração Pública, Legalidade e Pós-positivismo. Princípio da Legalidade: Da Dogmática Jurídica à Teoria do Direito. Coord. Cláudio Brandão, Francisco Cavalcanti e João Maurício Adeodato. Forense: Rio de Janeiro, 2009. 103 ARAGÃO, Alexandre Santos de. Interpretação consequencialista e análise econômica do direito público à luz dos princípios constitucionais da eficiência, in Interesse Público, ano 11, n. 57, set./out. 2009. Belo Horizonte: Fórum, 2009, p. 215.
60
Tratando do assunto, JOSÉ VICENTE SANTOS DE MENDONÇA104 esclarece que uma
das aplicações do princípio pragmatista, na qual deve sobrelevar a eficiência de uma solução, é o
caso já aqui tratado, da divergência entre RLSP e Lei 8.666/93. Nas palavras do autor,
Outro exemplo de incidência do princípio pragmatista, em que são consideradas todas as variáveis estratégicas, econômicas etc., e na qual sobreleva a eficiência de uma solução, é o caso do Decreto nº 2.745/98, que estabeleceu o regime licitatório simplificado da Petrobras, consoante permissão do art. 67 da Lei do Petróleo, em relação ao qual ainda persistem dúvidas, por parte do TCU, embora o STF já se posicione de modo favorável à sua constitucionalidade. Ora: imaginar que uma sociedade de economia mista que atua concorrencialmente deva se submeter a todas as minúcias da Lei nº 8.666/93, ou acreditar que a delegação do art. 67 é inválida (o que, na prática, acaba remetendo a Petrobras à Lei Geral de Licitações), é atuar de modo contrário ao que se espera de uma autoridade pragmaticamente responsável.
Adotando outro viés, MARÇAL105 esclarece que a economicidade não serve como
suporte para um ato “infringente das regras acerca de formalidade”. Como exemplo, cita a
impossibilidade, na sua visão, de se proceder à contratação direta, sem prévia licitação, fora das
hipóteses postas em lei, por mais vantajosa que ela seja.
Esse embate é facilmente verificado nos julgados do TCU. Mencionando o assunto,
BUGARIN106 reforça que o argumento da economicidade não legitima toda e qualquer escolha
do Estado, sendo, portanto, “insuficiente para validar um ato administrativo infringente das regras
acerca de formalidade”. Eis, na íntegra, seu entendimento:
Avalia-se a economicidade no momento da prática do ato, tendo em vista a circunstância e segundo os padrões normais de conduta. (...) O terceiro tópico característico se relaciona com as formalidades jurídicas. O Estado não está autorizado a escolher certa solução fundando-se exclusivamente no argumento da economicidade. Como regra, a máxima vantagem econômica é insuficiente para validar um ato administrativo infringente das regras acerca de formalidade. O exemplo mais evidente é o da contratação direta, sem prévia licitação: ainda que mais vantajosa, não pode ser adotada senão nas hipóteses autorizadas pela Lei.
104 MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma Proposta de “Princípio do Pragmatismo Jurídico” Útil à Interpretação de Casos Envolvendo o Direito do Petróleo. In Direito do Petróleo e de outras fontes de energia. Lúmen Júris: Rio de Janeiro, 2011, p. 195. 105 Apud BUGARIN, Paulo Soares.Ob. Cit. (nota 78). p. 123. 106 BUGARIN, Paulo Soares. Ob. Cit. (nota 78), p. 123.
61
Não se estranhe, portanto, a recorrente menção à legalidade como obstáculo à aplicação
do princípio da eficiência ou da economicidade. A lógica menos radical, todavia, permite uma
visão mais compreensiva do assunto e a colocação da legalidade como veículo, e não como
empecilho, à concretização dos demais princípios. Numa sistemática aderente à AED, a leitura da
lei se dá sob o prisma da eficiência e da economicidade, pelo que sua aplicação conjunta é não só
possível, como esperada.
4. 4 Eficiência na AED
Para MEDEMA107, a expressão economics, embutida em “Law and Economics”, consiste
basicamente nos conceitos estruturantes de eficiência de Pareto (Pareto efficiency in Exchange e
Paretto efficiency in production) e eficiência de Kaldor-Hicks. Antes mesmo de definir cada um
deles, os autores esclarecem que as diferentes correntes de AED podem dar pesos diversos a
essas definições. No entanto, pela importância que tem na interpretação da AED em geral, é
possível identificar os conceitos de eficiência acima como fundamentais para essa escola.
Note-se que uma das suposições que baseiam o bom funcionamento do mercado é o de
que a competição se dá de forma perfeita. Esse pressuposto é base para a conclusão de que todos
os fatores de produção de bens e serviços num mercado perfeitamente competitivo conduzem a
um resultado necessariamente eficiente108. A eficiência, nesse conceito, é o pareto-eficiente, em
que não é possível melhorar a situação de nenhuma das partes sem prejudicar a outra. É claro que
essa presunção sofre relativização diante, por exemplo, das falhas de mercado, outro conceito
igualmente relevante em Economia.
Para melhor entender a eficiência de Pareto, vale esclarecer que haverá um número
correspondente de situações pareto-eficientes tantas sejam as situações iniciais de alocação de
direitos. Quer-se com isso dizer que as avaliações de eficiência (pareto-eficiente) dependerão
sempre do cenário dado, que pode partir do pressuposto de que o direito reconhece o direito como
107 MEDEMA, Steven G. MERCURO, Nicholas. Ob. Cit. (nota 28). p. 20 108 MEDEMA, Steven G. MERCURO, Nicholas. Ob. Cit. (nota 28). p. 21.
62
sendo de A ou de B. Partindo-se da premissa A, a situação pareto-eficiente será a A’; partindo-se
da premissa B, a situação pareto-eficiente será a B’.109
Ainda segundo MEDEMA, a análise de eficiência de Pareto – assim como as demais
análises de eficiência – não traduzem um valor ético de distribuição de riqueza110.
Ao contrário de MEDEMA, que enfatiza a eficiência de Pareto, MATHIS111 entende que a
eficiência de Kaldor-Hicks exerce um papel ainda mais importante na AED. Na sua concepção, a
eficiência de Pareto seria adequada se estudada num cenário de liberdade de mercado, em que
cada participante é livre para escolher se participa ou não daquelas relações. No entanto, as leis
contém caráter coercitivo por natureza. Em razão disso, o conceito de eficiência de Pareto
precisaria ser flexibilizada antes de ser aplicado aos fenômenos legais.
Segundo MATHIS112, essa modificação ou flexibilização foi introduzida no final da
década de 30, através dos estudos do economista inglês Nicholas Kaldor, aplicados para o debate
acerca da “Corn Law” , legislação inglesa que protegia os agricultores locais da competição de
produtores estrangeiros. A questão central consistia em avaliar se a legislação deveria ser alterada
caso se alcançasse a conclusão de que ela traria benefício para a economia nacional, ainda que em
prejuízo dos tais agricultores locais.
Nicholas Kaldor e John R. Hicks propuseram que a alteração na lei protetiva seria a saída
mais benéfica para a sociedade, e que os prejuízos dos agricultores não consistiriam em
argumento suficiente para afastar essa alteração, uma vez que os seus prejuízos se mostravam
inferiores aos benefícios gerais considerados para todo o País. Nesse caso, a conclusão dos
economistas foi de que a lei poderia ser alterada, sem que fosse necessário que fosse compensada,
aos agricultores, qualquer espécie de perda. Nas palavras de MATHIS113,
Kaldor e Hicks transformam o critério de Pareto, que se desenvolveu em um modelo de mercado livre, em uma ferramenta que também pode ser aplicada num
109 MEDEMA, Steven G. MERCURO, Nicholas. Ob. Cit. (nota 28) p. 25. Nas suas palavras:“ (..) there are a number of Pareto-efficient states of the economy, each contigent upon the initial assignment of rights, and each of which is noncomparable to the others in terms of efficiency.” 110 MEDEMA, Steven G. MERCURO, Nicholas. Ob. Cit. (nota 28) p. 25 111 MATHIS, Klaus. Efficiency instead of Justice? Searching for the Philosophical Foundations of Economic Analysis of Law. Springer: Lucerne, 2009, p. 39. 112 MATHIS, Klaus. Ob. Cit. (nota 112). p. 39 113 No original: “Kaldor and Hicks transformed the Pareto criterion, which had developed out of the free market model, into a tool that can also be applied in the sphere of law, which is coercive in character. So the substance of the Kaldor-Hicks test is that every new allocation of property rights is acceptable as long as the gainers’ benefits outweigh the losers’ disadvantages.”
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esfera da lei, que é coercitiva por natureza. Assim, a substância do teste de Kaldor-Hicks é que toda nova alocação do direito de propriedade é aceitável desde que os benefícios dos ganhadores superem os prejuízos dos perdedores.
Na eficiência de Kaldor-Hicks, não se faz necessária nenhuma compensação efetiva: ela é
apenas potencial. Em outras palavras, bastaria que os ganhadores estivessem numa situação que
lhes permitisse compensar os perdedores e ainda obter vantagem na operação para que mudança
do status quo fosse justificada. A efetiva compensação não se mostraria necessária, num cenário
como esse. Assim, para o conceito de Kaldor-Hicks, a existência de maior benefício para uma das
partes já legitima a mudança do status quo.114
Ainda segundo MATHIS115, há na AED outra derivação da eficiência de Kaldor-Hicks,
elaborada por POSNER e denominada auction rule. Numa simplificação, a ideia de POSNER é a
de identificar a situação mais eficiente por meio de um leilão (auction), resultando daí que a
aquele que estiver disposto a dar o maior lance por aquele direito agregará mais utilidade a ele e,
assim, pela maximização da utilidade individual, garante-se que o direito seja fornecido a quem
mais valor dá a ele, criando uma situação eficiente.
MATHIS critica a alternativa de POSNER, apontando a grande dificuldade em identificar
a disposição das partes em pagar pelo direito questionado. Para ele, ou existe um mercado em que
o leilão é possível, e assim se conhece o interesse das partes no que está sendo questionado, ou o
mercado não existe, e simular um leilão seria simplismente inviável.
POSNER e ADLER116 acrescentam que alguns defendem que a chamada análise custo-
benefício, ou cost benefit analysis (CBA), seria uma derivação da eficiência de Kaldor-Hicks.
Discordando dessa posição, afirmam que a CBA não é idêntica ao teste de Kaldor-Hicks, sendo
mais poderosa do que ela porque permite que se utilize de valores monetários na comparação.
Nas suas palavras, “a análise de custo-benefício não é analiticamente idêntica aos critérios de
Kaldor-Hicks. Ela é mais poderosa do que esses critérios porque permite que utilizem de
dólares.”
Pelos exemplos dados, é possível perceber que a aplicação desses conceitos econômicos
na AED sofre visível simplificação. POSNER apresenta dois precedentes de legislação, tomando
como exemplo a atuação de Cortes e órgãos regulatórios americanos, para demonstrar isso. Trata 114 MATHIS, Klaus. Ob. Cit. (nota 112). p. 40 115 MATHIS, Klaus. Ob. Cit. (nota 112). p. 42 116 POSNER, Eric A. ADLER, Matthew D. New Foundations of Cost-Benefit Analysis. Cambridge: Harvard Press University, 2006, p. 21.
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dos Senate Bills de 1995 e de 1999, em que são utilizadas expressões que, na visão de
POSNER117, representariam a CBA.
Para o exemplo mais relevante, do ano de 1995, a proposta de legislação indicava que
uma regra não deveria ser promulgada exceto se a Agência Reguladora entendesse que o
potencial benefício para a sociedade, advindo daquela regra, superaria o potencial custo daquela
mesma regra. Já a proposta de 1999 daria às Cortes o poder de afastar a decisão das Agências,
caso o critério de decisão baseado na CBA não fosse comprovado.
Os autores esclarecem que os papéis das Cortes judiciais, nesses casos, não seria bem o de
refazer a análise de custo-benefício, até mesmo por falta de equipe especializada. No entanto,
caberia ao Judiciário zelar pela consistência das presunções, verificar omissões ou interpretação
distorcida dos dados. Para os autores118,
Se as Cortes tem o poder de rever a análise custo-benefício, daí decorrem diversas implicações. Primeiro, não importa para as Cortes que as agências usem o critério “correto” de avaliação para uma dada regulação, e sim que elas usem critérios de avaliação consistentes. Por exemplo, não deveria ser permitido a uma Agência valorar uma vida, para fins estatísticos, em U$ 7 milhões em uma regra específica, e depois em U$ 4 milhões em outra, embora ambos os valores estejam inseridos dentro de uma variação plausível. A razão pela qual as Cortes não devem ter o poder de impor o seu próprio critério de custo-benefício é que elas não tem expertise suficiente. As Cortes devem, contudo, exigir consistência por parte das Agências, porque a possibilidade de alterar as avaliações oportunisticamente pode diminuir o custo de determinadas regras que não trazem a maximização do bem estar social. As Cortes devem exigir consistência das agências no que toca a todo tipo de avaliação, incluindo itens como taxas de desconto. Do panorama da regulação, as Cortes devem também exigir consistência das agências entre si.
De toda forma, pode-se perceber que se caminha para um maior aprofundamento técnico
do conceito de eficiência quando visto pelo prisma da AED. Ao passo que a doutrina tradicional
117 POSNER, Eric A. ADLER, Matthew D. Ob. Cit. (Nota 116). p. 11. 118 POSNER, Eric A. ADLER, Matthew D. Ob. Cit. (Nota 116). p. 113. No original: “If courts are equipped to review CBA, several implications follow. First, it is not important for courts to insist that agencies use the “right” valuations for any giver regulation as that they use consistent valuations across regulations. For example, an agency should not be permitted to value a statistical life at $7 million in one regulation and then $4 million in another, even though both valuations are within the range of plausible valuations. The reason courts should not determine their own valuations is that they are insufficiently specialized. They should, nontheless, demand consistency on the part of the agencies, because the ability to change avaluations opportunalistically lowers the cost of issuing a plausible CBA of regulations that are not welfare maximazing. Courts should demand consistency within agencies for all kind of valuations, including items like discount rates. To the extent consistent within the statutory frameworks, courts should also demand consistency across agencies.”
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brasileira preocupa-se em conceituar e utilizar os princípios da eficiência e da economicidade de
forma fluida, não traduzida em dados comparativos, a AED, por incorporar mecanismos típicos
da Economia, agrega elementos técnicos a esse conceito de eficiência, seja utilizando-se da
eficiência de Pareto, seja da eficiência de Kaldor-Hicks.
Nas citações utilizadas até aqui, relativas à eficiência e à economicidade na doutrina
brasileira, bem como nos precedentes que serão abordados mais a frente, não se localiza qualquer
aproximação teórica mais aprofundada dos princípios da eficiência e da economicidade à
teorização brevemente apresentada nesse capítulo. Com isso, quer-se dizer que a aplicação do
princípio da eficiência e da economicidade, no País, não passa (ao menos de forma explícita) pelo
questionamento de sua concretização se deu em obediência ao formato proposto por Pareto ou
por Kaldor-Hicks.
Nada disso afasta a importância de se compreender que, em Economia, há estruturas
lógicas próprias que podem auxiliar o jurista a pesquisar melhor e mais profundamente se o ato
tal ou qual está revestido de economicidade e se é, ao final, eficiente. Com o presente tópico,
portanto, verifica-se que a AED tem, na sua base e origem, um arcabouço técnico que pode
fornecer mais rigidez teórica ao conceito de eficiência e que, quanto mais nos aproximamos da
AED, mais elementos são fornecidos para tanto.
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5. DO PAPEL DO TCU NA FISCALIZAÇÃO DA PETROBRAS
5.1 Da evolução do argumento da eficiência e da economicidade na jurisprudência do TCU
Com base na redação do art. 71 da Constituição da República, mais especificamente
baseado na presença da expressão “auxílio”, que qualifica a atuação do TCU junto ao Congresso
Nacional, MOREIRA NETO119 descreve que se pode daí depreender duas conclusões. A
primeira, de que o texto constitucional teria instituído uma distinção estrutural de cunho político
entre o Poder Legislativo e o TCU, estabelecendo entre ambos uma relação (não de hierarquia,
nem de paridade), mas de cooperação. A segunda conclusão seria de que essa função de
cooperação teria a mesma natureza política de controle externo exercido pelo Poder Legislativo.
É diante dessa distinção que o autor segue afirmando que as atribuições específicas
elencadas no texto constitucional podem ser examinadas, fazendo-se a distinção quanto à
cooperação é apenas técnica, ou seja, “quando o Tribunal atua como especialista no
processamento da legalidade e da economicidade dos dados contábeis financeiros, orçamentários
e patrimoniais”, ou quanto à cooperação de natureza política, ou seja, “quando o Tribunal atua na
avaliação da legitimidade dos dados operacionais da administração financeiro-orçamentária”,
emitindo decisões.
Mais à frente, o autor expressamente afasta a noção de que o TCU seja parte integrante do
Poder Legislativo. Ao contrário, reforça que a relação entre TCU e Legislativo é antes de
cooperação, e não de subordinação120. Não nega, contudo, que o TCU mantém o que chama de
“vinculação funcional” com o Legislativo, até mesmo por expressa previsão constitucional, aí
citando, por exemplo, diversos incisos do art. 71121 da Constituição da República.
É nesse cenário, de colaboração com o Poder Legislativo, que o TCU exerce a
fiscalização sob as empresas estatais. No entanto, essa fiscalização não abarca todas as suas
atividades. Já é assunto pacificado junto ao Supremo Tribunal Federal que as atividades-fim das
119 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Ob. Cit. (nota 84). p. 136. 120 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Ob. Cit. (nota 84). p. 144. 121 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Ob. Cit. (nota 84). p. 148.
67
empresas estatais exploradoras de atividade econômica não estão sujeitas à fiscalização do
TCU122.
Tratando do assunto, ARAGÃO123 acrescenta que as peculiaridades das estatais
exploradoras da atividade econômica hão de ser ponderadas quando da fiscalização de seus atos.
Em suas palavras:
(...) a própria Constituição Federal prevê a necessidade de as empresas públicas e sociedades de economia mista, considerando a sua natureza empresarial e finalidade econômica, não serem submetidas ao mesmo tipo e grau de controle externo a que são expostos os demais órgãos e entidades da Administração Pública, tendo em vista justamente o possível comprometimento da
competitividade, eficiência e agilidade da atuação dessas empresas no mercado.
E mais, indica124 que a especialização da atuação da empresa – o que se aplica com
bastante ênfase no caso da PETROBRAS – constitui-se igualmente em fator de ponderação a
reforçar a maior liberdade negocial da estatal.
É imprescindível que essas empresas tenham liberdade negocial, liberdade para assumir riscos e para realizar negócios que, a princípio, podem não parecer, sob a ótica dos Tribunais de Contas, os mais econômicos, mas que se fundamentam pela elevada especialização e know how dos dirigentes e demais agentes da empresa, sobretudo em um mercado tão específico.
Ainda abordando as especificidades da fiscalização realizadas nas sociedades de
economia mista, ARAGÃO125 destaca a importância das consequências das decisões não só no
plano jurídico, “mas também no plano dos fatos, notadamente as suas repercussões econômicas,
que são juridicizadas no conceito amplo de legalidade através, sobretudo, dos princípios da 122 RMS 17.949/DF, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/08/2005, DJ 26/09/2005, p. 271. Vide ementa: “MANDADO DE SEGURANÇA. SIGILO BANCÁRIO. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA EXPLORADORA DE ATIVIDADE ECONÔMICA. FISCALIZAÇÃO PELO TRIBUNAL DE CONTAS. FORNECIMENTO DE INFORMAÇÕES. SIGILO BANCÁRIO. CONTRATO ADMINISTRATIVO. OPERAÇÕES COMERCIAIS. 1. Não configura violação de sigilo bancário a intervenção dos Tribunais de Contas visando aferir a regularidade de contratos administrativos formalizados no âmbito das instituições financeiras exploradoras de atividade econômica. 2. Em se tratando de sociedades de economia mista ou de empresas públicas referidas no art. 173 da Constituição Federal, a fiscalização dos Tribunais de Contas não poderá abranger as atividades econômicas das instituições, ou seja, os atos realizados com vistas ao atingimento de seus objetivos comerciais. 3. Recurso ordinário parcialmente provido.” 123 ARAGÃO, Alexandre Santos de. Ob. Cit. (nota 05). p. 18. 124 ARAGÃO, Alexandre Santos de. Ob. Cit. (nota 05). p. 19. 125 ARAGÃO, Alexandre Santos de. Ob. Cit. (nota 05). p. 33.
68
economicidade e da eficiência (...)”. Continua afirmando que essa preocupação com a
repercussão das decisões no mundo dos fatos “se torna ainda mais relevante em se considerando
que a finalidade do controle exercido pelo TCU é justamente a proteção do erário e a garantia da
economicidade e eficiência dos atos públicos.”
Não se pode afirmar que as contratações realizadas pela PETROBRAS deveriam estar
fora do âmbito de fiscalização do TCU, já que, dentro da sistemática já avaliada pelo STF,
aquelas que não são consideradas voltadas para a atividade-fim (e sim atividade-meio)
permanecem sob fiscalização do Tribunal. No entanto, ainda nesse caso, não haveria motivos a
justificar o afastamento da lógica acima, que privilegia a economicidade e a eficiência, na
atuação da Corte de Contas.
É verdade, contudo, que os julgados do Tribunal de Contas da União são sensíveis aos
argumentos de valorização da eficiência e da economicidade, e os vêm incorporando, cada vez
mais, na sua análise, passando a fiscalizar o ato do gestor não só quanto ao fiel cumprimento da
lei, mas igualmente sob a ótica da sua economicidade e eficiência.
No entanto, os precedentes não são específicos o suficiente para que se conheça, com
precisão, a relevância que o TCU dá a esse argumento.
Um dos maiores embates, nesse assunto, é a conciliação de dois princípios
constitucionais: o princípio da legalidade e o princípio da economicidade. O primeiro está
expresso no art. 37126 da Constituição da República Federativo do Brasil de 1988 e indica que a
Administração Pública Indireta (onde a PETROBRAS está inserida) deve-lhe obediência. Já o
segundo está expresso no seu art. 70127, que determina que o controle externo (no caso da
PETROBRAS, o TCU) deve fiscalizar as entidades da Administração Indireta com base em
diversos princípios, dentre eles o da economicidade.
126 Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte (...) 127 Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder. Parágrafo único. Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
69
Esse é um exercício de subjetividade e ponderação que a jurisprudência do TCU ainda
não conseguiu afastar. Ao contrário, os precedentes não seguem uma mesma linha de pensamento
e é possível ver, em mais de uma ocasião, manifestações contraditórias.
Apesar dessa conhecida divergência, é fato que a economicidade e a eficiência vêm
ganhando força enquanto argumentos jurídicos (e técnicos), na linha da escola da AED, e já se
pode ver um crescente esforço da doutrina e da jurisprudência em agregarem esse ponto de vista
nitidamente mais pragmático. Os precedentes demonstram que a reação negativa antes causada
pela apresentação de argumentos puramente financeiros está sendo, pouco a pouco, diluída.
Em 1995, uma importante decisão do TCU chegou a estabelecer uma hierarquia entre os
princípios da legalidade, legitimidade e da economicidade. Naquela oportunidade, a
economicidade foi colocada em segundo plano e o ato fiscalizado foi tido por ilegal (apesar da
reiterada alegação de benefício econômico da decisão do gestor). Trata-se da Decisão 038/95128,
em que o Relator expressou que a avaliação da economicidade de um ato deve vir somente após o
exame de legalidade, e, nessa primeira etapa, não se poderiam considerar os possíveis efeitos
positivos financeiros daí advindos.
No entanto, já no ano seguinte, o TCU, por meio da Decisão 753/96129 – Plenário, acatou
uma contratação direta por dispensa de licitação, em extrapolação ao limite legal, com base na
economicidade.
128 BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão 38/1995. Plenário. Relator: Homero Santos. Sessão de 19/04/1995. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 09 maio 1995. Vide trecho destacado: "Data venia" do ilustre causídico, que subscreve a peça recursal, o § 1º do art. 1º da Lei nº 8.443/92, ao dispor sobre o conteúdo de mérito dos julgamentos desta Corte, longe de criar o dever de se examinar, necessariamente, os atos administrativos sob os prismas da legalidade, da legitimidade e da economicidade, indicou, em ordem lógica, os enfoques prioritários que deverão ser utilizados na formulação do juízo de mérito deste Tribunal. Isso, porque não há que falar em avaliação da legitimidade e de economicidade de ato administrativo manifestamente ilegal. Da mesma forma, dispensável seria a abordagem, sob prisma da economicidade, de ato ilegítimo. Vê-se, portanto, que a necessidade de se ferir o requisito de economicidade, tal como ventilado pelo embargante, faz-se despicienda "in casu", posto que as irregularidades mencionadas nas alíneas "a", "b" e "d" estão associadas, explicitamente, à violação das normas legais ali mencionadas.” 129 BRASIL. Tribunal de Contas da União. Decisão nº 753/1996. Plenário. Relator: Carlos Átila Álvares da Silva. Sessão de 20/11/1996. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 09 dezembro 1996. Vide trecho destacado: “(...) Contudo, peço vênia para dizer que a questão crucial no presente caso não mereceu, a meu juízo, a devida atenção nas peças que analisei. Trata-se da questão da economicidade. Admito, em concordância com o que apresenta em sua defesa a Construtora OAS, que não devemos supervalorizar, como se absoluto fosse, o princípio da legalidade, enfatizando em demasia os formalismos, mas, sim, compô-lo com o princípio da economicidade, num processo de concordância prática, no caso de um possível conflito de princípios constitucionais, conforme ensina o grande constitucionalista português, Gomes Canotilho. Esta, aliás, tem sido a tendência moderna deste Tribunal: evitar as preocupações excessivas com as formalidades e cuidar mais da correta aplicação dos recursos públicos, combatendo o desperdício e a corrupção (...)”
70
Em fiscalização envolvendo a PETROBRAS, no ano de 2004, o TCU entendeu pela
possibilidade de extrapolação do limite legal de 25% para celebração de aditivos, com base no
princípio da economicidade. No entanto, deixou consignado que embora “a Petrobrás deva
perseguir uma gestão econômica, não deve olvidar dos demais princípios que regulam a
contratação de obras, serviços e compras”. Nesse ponto, vale a transcrição de trecho de destaque
do Acórdão 643/04130 – Plenário:
7.2.2. Ultima ratio, o interesse público legítimo, o da coletividade - diverso do interesse da Administração - está substantivado no princípio da legalidade. Ao ser este conceito relaxado com a avocação de outros princípios, os mesmos devem ser sopesados. Isto porque a norma deriva de princípios. E, o Decreto n° 2.745/98 elenca no item 1.2 aqueles princípios que o norteiam, dos quais destacamos: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, igualdade, e economicidade. Deste modo, malgrado - conforme discorrido anteriormente - a Petrobrás deva perseguir uma gestão econômica, não deve olvidar dos demais princípios que regulam a contratação de obras, serviços e compras. Entendemos que, uma vez observados, poderia, no caso vertente, com arrimo na economicidade, exceder o limite legal permissivo. Este, parece-nos o ponto angular da situação em comento. Ou seja, a tese de defesa do princípio da economicidade só pode ser sustentada caso, além de cabalmente motivada, sejam os demais princípios preservados, em especial, os da impessoalidade, moralidade e igualdade.
Nos casos em que a entidade interessada é a PETROBRAS, há diversas decisões
relevantes e expressivas da forma como o TCU absorve o argumento pró-eficiência. Não é
possível – já vale alertar – afirmar que haja um tratamento de fato diferenciado, decorrente da sua
natureza de exploradora da atividade econômica. Não é igualmente possível confirmar que
qualquer ato, por mais contraditório que esteja em relação às normas postas, vá ser acolhido pura
e simplesmente pela sua comprovada economicidade e eficiência. Aliás, por coerência à
legislação nacional, nem se espera que assim seja. Contudo, como se poderá ver dos exemplos
abaixo, tanto a Estatal quanto a Corte de Contas já fazem uso da lógica defendida pela
corrente da AED, ainda que de forma não sistematizada e sem referência direta a essa escola.
Questionamos se o aprofundamento dos conceitos de AED e a utilização expressa de
instrumentos de avaliação de cunho econômico não trariam benefícios associados à fiscalização
externa.
130 BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 643/2004. Plenário. Relator: Ubiratan Aguiar. Sessão de 26/05/2004. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 09 junho 2004.
71
Vejamos.
5. 2 “Porque era a melhor”.
Nesse caso concreto131, trata-se de Representação autuada pela Secretaria de Controle
Externo no Estado do Espírito Santo – Secex/ES, por informações encaminhadas pelo Ministério
Público do Estado do Espírito Santo, “a partir de informação anônima no sentido de que o sócio-
gerente da empresa (...), teria se beneficiado de contratação emergencial com a Petróleo
Brasileiro S/A.” Com essa informação e por outras supostas irregularidades, o Ministério Público
entendeu necessário que o TCU procedesse ao “intenso trabalho de vistoria e fiscalização in
loco”. As informações foram autuadas como Representação junto ao TCU.
O Acórdão 7664/2010, de lavra da 1ª Câmara, narra que o corpo diretivo da Secex/ES
optou por colher as informações necessárias para o saneamento dos autos por meio de diligência.
Obtidas as informações complementares, o Auditor Federal de Controle Externo lotado na
unidade técnica analisou as questões, subdividindo-as, primeiramente, em três grandes pontos:
1ª Questão: ‗(...) existência de três outros instrumentos contratuais celebrados de forma simplificada (Cristal), em razão dos valores envolvidos‘ (fl.272); 2ª Questão: ‗(...) o sócio-gerente da empresa S[...], (...) teria se beneficiado de contratação emergencial com a Petróleo Brasileiro S/A.‘ (fl.271); 3ª Questão: ‗(...) o Ministério Público não dispõe de corpo técnico especializado para verificação eventual de ‗superfaturamento‘ em obras públicas.‘ (fl.276).
Para o trecho que aqui importa, cumpre apenas contextualizar a questão de nº 02. A
empresa originalmente vencedora de regular processo de licitação, aqui denominada “P[...]”, e
que estava prestando os serviços à PETROBRAS, teve o contrato rescindido por descumprimento
contratual, o que resultou na contratação direta da empresa aqui denominada “S[...]”, antes
131 BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 2302/2013. Plenário. Relator: Ministro Augusto Nardes. Sessão de 16/11/2010. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 22 novembro 2010. Vide trecho destacado: “1. O presente processo foi autuado como Representação, tendo em vista o encaminhamento pela 8ª Promotoria de Justiça Cível de Vitória, órgão do Ministério Público do Estado do Espírito Santo, do procedimento apuracional nº 164/2006‘ (fls. 271/275) e da documentação anexa (fls. 3/198 e 201/270), por meio do Ofício/8ª PCIV/Nº 132/08, de 17/3/2008 (fl. 02), noticiando a ocorrência de possíveis irregularidades em contratos firmados pela empresa Petróleo Brasileiro S/A. 2.”
72
subcontratada da P[...], para conclusão dos serviços. Portanto, de forma resumida (maiores
detalhes ao longo do texto), o questionamento da equipe técnica do TCU residia na possível
irregularidade da contratação direta por remanescente de obra, realizada pela PETROBRAS, após
a rescisão do contrato original.
O Auditor Federal de Controle Externo entendeu que se fazia necessária a apresentação de
subsídios complementares, o que foi confirmado pelo Gerente de Divisão da Secex/ES. Esse
último, em seu despacho, reforçou o seu entendimento de que o item 2.1, “i”, do Dec. 2.745/98,
permissivo legal utilizado como base para a contratação, requereria da PETROBRAS uma ampla
consulta ao mercado como antecedente necessário para a viabilização dessa modalidade de
contratação direta.
Eis a redação do item:
2.1 A licitação poderá ser dispensada nas seguintes hipóteses: (...) i) na contratação de remanescentes de obra, serviço ou fornecimento, desde que aceitas as mesmas condições do licitante vencedor, inclusive quanto ao preço, devidamente corrigido e mediante ampla consulta a empresas do ramo, participantes ou não da licitação anterior
Diante da ausência, nos autos, de comprovação da mencionada ampla consulta ao
mercado, o Gerente de Divisão da Secex/ES entendeu pertinente que se questionasse a
PETROBRAS quanto à “opção adotada, vez que negou vigência àquele dispositivo que
disciplinava os procedimentos a serem implementados para o caso de contratação de
remanescente de obra”. Ou seja, a PETROBRAS teria que, além de “justificar o porquê da
transgressão à norma citada”, demonstrar “que a decisão pela convocação da S[...], a partir,
repita-se, de ritualística destoante do que preceitua seu regramento próprio, não deu margem a
prejuízos aos cofres da Petrobras”.
(...) depreende-se do que se discutiu em reunião anterior (fl. 155 do Anexo 2) que a entidade recorreu ao disposto no subitem 11.2 do contrato então firmado com a P[...] – não dispomos do mesmo nos autos, mas provavelmente a redação é idêntica àquela constante de fl. 93 do mesmo anexo - para amparar a escolha da S[...] como a responsável pela execução do remanescente dos serviços. Por meio dele, concedeu-se à Contratante a prerrogativa de, uma vez rescindido o contrato, imitir-se na posse imediata e exclusiva dos serviços executados entregando-os a quem ela bem entendesse. Ocorre que, ao menos a princípio, a situação retratada não se amolda à figura da subcontratação, como referenciado
73
pelo sócio-administrador da P[...] na petição de fls. 128-9 do Anexo 2 - e é precisamente esse o ponto em que divergimos do pronunciamento do auditor -, mas sim à contratação de remanescentes de obra, consequência da dissolução antecipada do vínculo com aquela empresa, conclusão essa que encontra respaldo no depoimento prestado pelo Sr. (...) Diretor Técnico da S[...] (fls. 192-4 do v.p.). Logo, a estipulação contratual citada como fundamento para a seleção direta da S[...] (subitem 11.2) haveria, salvo melhor juízo, de ser interpretada à luz do subitem 2.1, alínea “i”, do Decreto nº 2.745/98, demandando da Unidade de Negócios da Petrobras no Estado a implementação das medidas ali discriminadas. Eis o teor do dispositivo em tela: ‗2.1. A licitação poderá ser dispensada nas seguintes hipóteses: [...] i) na contratação de remanescentes de obra, serviço ou fornecimento, desde que aceitas as mesmas condições do licitante vencedor, inclusive quanto ao preço, devidamente corrigido e mediante ampla consulta a empresas do ramo, participantes ou não da licitação anterior;‘ (grifamos) Deveria, pois, consultar as proponentes que tomaram parte no certame que culminou na seleção da P[...] [não se sabe se contou com a participação ou não da S[...]], obedecida a ordem de classificação, indagando-se-lhes se teriam interesse em dar seguimento às obras, remunerados os serviços pelo preço cotado pela licitante vencedora, devidamente atualizado para aquela data, estendendo-se a consulta a empresas do ramo que não tenham acorrido à licitação. Impõe-se, portanto, que se questione a direção do órgão acerca da opção adotada, vez que negou vigência àquele dispositivo que disciplinava os procedimentos a serem implementados para o caso de contratação de remanescente de obra. Tal medida pode ser levada a feito no bojo da inspeção que ao final propor-se-à. Afora ter de justificar o porquê da transgressão à norma citada, urge que se demonstre que a decisão pela convocação da S[...], a partir, repita-se, de ritualística destoante do que preceitua seu regramento próprio, não deu margem a prejuízos aos cofres da Petrobras. (...) À vista de todo o exposto, ao manifestar-se de acordo com a proposta de inspeção sugerida à fl. 314, advogo, na linha do raciocínio desenvolvido no presente despacho, que a fiscalização abranja, afora os pontos já elencados naquela proposição (item 19 e respectivos subitens), a investigação das razões da ausência de adoção das providências elencadas no subitem 2.1, alínea “i‘, do Decreto nº 2.745/98, optando por selecionar diretamente a empresa S[...] para realização do remanescente da obra e as vantagens para o órgão que advieram dessa postura, tomada pela Gerência de Ativo da Produção Norte Capixaba. (grifou-se)
A essa altura, a equipe técnica partia da premissa de que havia indícios de que as
condicionantes do item 2.1, “i”, do RLPS, haviam sido descumpridas, por ausência de ampla
consulta ao mercado. E como subsídio, já indicava a importância de a Contratante demonstrar a
inexistência de prejuízos – em outra leitura, a eficiência e a economicidade da medida.
O Titular da Secex/ES concordou com a realização da inspeção sugerida, acatando os
complementos sugeridos pelo Gerente de Divisão, gerando-se a emissão de Relatório,
posteriormente direcionado ao Gabinete do Min. Augusto Nardes. O Relatório, no que toca à
questão de nº 02, traz o histórico da contratação, noticiando que a empresa P[...], em carta à
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PETROBRAS, datada de 04/07/2003, informou o interesse em subcontratar a empresa S[...] para
realização da parte final da obra. Aproximadamente dois meses depois, “diante de
descumprimento de cláusulas contratuais e da paralisação unilateral das obras por parte da P[...],
a Petrobras, em ata de reunião, decidiu elaborar notificação à contratada para retomada dos
serviços em toda sua plenitude”, sob pena de rescisão do contrato. O Relatório segue narrando
que, na mesma ocasião, deliberou-se pela possibilidade de convidar a empresa S[...] para
continuar a execução dos serviços. Vide itens 5.3.9 até 5.3.11, mais representativos do que foi
posto no Relatório quanto a esse tópico:
5.3.9 O descumprimento do disposto no subitem 2.1, alínea “i”, do Decreto nº 2.745/98, transcrito no subitem 5.3.1, no que se refere à ampla consulta a empresas do ramo, inviabiliza a comparação dos preços reajustados do contrato inicial com os de mercado com a finalidade de avaliar a vantagem da manutenção das condições originais, além de representar afronta ao princípio da isonomia. O entendimento manifestado pela Petrobras nos autos (fl. 155 do Anexo 2), calcado em mera disposição contratual (subitem 11.2 do ajuste firmado com a PREMAV), no sentido de que poderia contratar quem bem entendesse, está claramente em conflito com o citado dispositivo, que exige a ampla consulta a empresas do ramo. No conflito entre um e outro deve prevalecer, por hierarquia, o consignado no decreto. 5.3.10. Ademais, o subitem 2.2 do mesmo decreto estabelece que: “A dispensa de licitação dependerá de exposição de motivos do titular da unidade administrativa interessada na contratação da obra, serviço ou compra em que sejam detalhadamente esclarecidos: (...) c) as razões da escolha da firma ou pessoa física a ser contratada; d) a justificativa do preço de contratação e a sua adequação ao mercado e à estimativa de custo da PETROBRÁS.‘
5.3.11. Os esclarecimentos exigidos nas alíneas “c” e “d” não foram identificados nos autos e nem apresentados por ocasião da fiscalização. Conclui-se, a princípio, haver indícios de direcionamento na contratação da S[...]. A consulta feita pela P[...] à Petrobras, antes da rescisão do contrato, acerca da possibilidade de subcontratação da S[...] para realizar serviços de pavimentação, não justifica, isoladamente, sem os ritos exigidos no Decreto nº 2.745/98, a decisão adotada pela entidade.
Diante disso, foi agendada uma audiência para oitiva dos gestores envolvidos, para que
explicassem os motivos de seus atos. Segundo o relato do Auditor Federal de Controle Externo,
que analisou as razões de justificativa apresentadas pelos responsáveis, um dos argumentos
utilizados na defesa dos gestores – que consideramos ser o viés condutor da tese de defesa – foi o
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de que a seleção da empresa baseou-se em razões objetivas132, considerando a economicidade da
medida. Ponderou-se que a empresa S[...] já se encontrava mobilizada no local (ou seja, já estava
fisicamente na área, com sua equipe e equipamentos), uma vez que já atuava como subcontratada
da P[...], essa condição permitiria que parte dos custos fosse excluída do preço (fator custo), bem
como que se pudesse dar sequência imediata às obras, com maior familiaridade da contratada
com a realidade da obra e consequente menor risco de questionamento dela quanto aos serviços
anteriores (fatores negociais).
O documento narra ainda que os gestores justificaram133 que o encerramento atípico de
um contrato “implica uma série de inconvenientes como o risco de descontinuidade e perda,
parcial ou integral, de etapas já realizadas”. Além disso, reconhece-se uma nítida “complexidade
técnica e gerencial em se modificar o executor da obra durante a execução”. Natural, igualmente,
132 “Questão 2: Ausência de adoção das providências elencadas no subitem 2.1, alínea “i”, do Decreto nº 2.745/98, optando por selecionar diretamente a empresa S[...] para realização do remanescente da obra, sem qualquer comprovação das vantagens que advieram para a entidade com a adoção dessa medida, tomada pela Gerência de Ativo da Produção Norte Capixaba, e no subitem 2.2, alíneas “c” e “d” do mesmo decreto, implicando fortes indícios de direcionamento. (...)Síntese das razões de justificativa: 2.39. Advogam que a escolha baseou-se em razões de ordem objetiva, considerando-se, inclusive, a economicidade que decorreu dessa postura, sendo fator determinante o fato de a empresa S[...] encontrar-se mobilizada e em plena atividade no local da obra, na qualidade de subcontratada da P[...], condição essa que permitia: a) amortecer alguns custos inerentes a uma nova contratação; b) dar sequência imediata à obra realizada em estrada que se mantinha em uso, prejudicando o transporte necessário à própria Companhia e acarretando até riscos de responsabilização perante terceiros (moradores e produtores locais); c) maior segurança quanto ao conhecimento da situação exata da obra e das complexidades em torno de sua execução; e, d) diminuir riscos quanto a questionamentos sobre erros da primeira contratada, com pleitos de revisão do equilíbrio econômico-financeiro e confusões futuras acerca da responsabilidade técnica.” 133 2.42. Não bastasse, aludem a agravantes – particularidades próprias – que existiram na situação concreta versada nos autos, a seguir listadas: a)a paralisação da obra prolongaria as dificuldades do trânsito e tráfego locais, potencializando os riscos de acidentes e os problemas de acesso a moradores e o escoamento da produção local; b)no mês de setembro/2003, quando da resilição do contrato, a obra se encontrava em estágio bastante delicado, com a imprimação praticamente concluída, restando apenas a colocação de camada asfáltica, donde o tempo que escoaria entre a realização de consulta a empresas do ramo e o reinício de atividades certamente comprometeria parte do serviço já realizado, estimando-se em R$ 224.068,71 os custos de refazimento; c) o período de paralisação para realização da consulta de preços não seria desprezível (calculam em 70 dias), já que seriam necessárias a consolidação das informações para orientar as empresas na elaboração de seus orçamentos; a identificação e convocação daquelas aptas e interessadas, adicionado ao fato de que, por tratar-se de remanescente de obra, as empresas se cercariam de cuidados especiais pelos riscos envolvidos em relação ao refazimento de algumas atividades, dilatando ainda mais o prazo para orçamentação, face ao rigor técnico exigido; e, por fim, a tramitação interna da contratação, com análises de documentos, relatórios, pareceres e aprovação pela autoridade competente; d)durante o tempo despendido até a resposta, não seria possível solicitar à subcontratada (S[...]), que permanecesse mobilizada em campo às suas expensas, com o que a Petrobras incorreria em custos adicionais, perdendo a oportunidade de firmar contrato com empresa que teria o custo de mobilização já amortizado. Adicionalmente, o pagamento dessa rubrica, em meio a uma consulta ao mercado, poderia soar como uma “subvenção‘, a violar o tratamento isonômico a ser conferido aos integrantes da cotação; e e) a capacidade de negociação da Petrobras – acaso a cotação fosse levada adiante – iria ocorrer em condições extremamente desfavoráveis, pois, ao perceberem a situação de exposição em que se encontrava a Companhia, qualquer empresa provavelmente elevaria seus preços.
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que tal situação conduza a um aumento de custo e atrasos no projeto, entre outros inconvenientes,
também citados pelos gestores.
Acrescentam ainda particularidades próprias na obra em questão, que incluíam as
dificuldades do trânsito e tráfego local, que decorriam da sua paralisação, potencializando os
riscos de acidentes. Quanto ao estágio da obra, os gestores apontaram que se tratava de ponto
delicado, “com a imprimação praticamente concluída, restando apenas a colocação de camada
asfáltica, donde o tempo que escoaria entre a realização de consulta a empresas do ramo e o
reinício de atividades certamente comprometeria parte do serviço já realizado”.
Acrescente-se que o prazo para a realização de uma ampla consulta também foi ponderado
no processo decisório, e, segundo o relato, foi estimado em aproximadamente 70 dias. É de se
considerar, ainda, a provável reação negativa do mercado diante da oferta desse serviço em
específico, já que se tratava de remanescente de obra, que requereria “cuidados especiais pelos
riscos envolvidos em relação ao refazimento de algumas atividades, dilatando ainda mais o prazo
para orçamentação, face ao rigor técnico exigido”.
Segundo o Relatório, os gestores ainda concluíram que parar a condução da obra e realizar
uma ampla consulta ao mercado significaria não utilizar os serviços pela S[...], e, em
consequência, determinar que a empresa se desmobilizasse. Isso impediria que a PETROBRAS
se valesse da redução de custo representada pela mobilização da empresa.
Outro fator negocial de grande relevância, igualmente levantado pelos gestores, foi a
afirmação de que essa situação específica da obra reduzia o seu poder de negociação. Em outras
palavras, o poder negocial da PETROBRAS não lhe era favorável, o que reduziria as chances de
um acordo vantajoso para a estatal em caso de ampla consulta ao mercado.
Os gestores apontaram também que a ampla consulta ao mercado somente tem sentido em
se tratando de pessoas em condições de igualdade134, o que não existia no caso, diante da
diferenciada situação em que a S[...] se encontrava.
134 2.43. Sob a ótica dos defendentes, a postura adotada foi bem mais satisfatória do ponto de vista gerencial. A empresa em questão estava não só mobilizada, mas em franca atividade há cerca de dois meses, executando parte expressiva da etapa restante, como se pode notar pelas fichas de registro de ocorrência desde 19/7/2003 (fls. 26-7 do Anexo 4). Além disso, fora avaliada como tecnicamente capacitada no momento da licitação – que resultou na contratação da P[...] -, conhecia, com precisão, a situação da obra sendo, de certa forma, corresponsável por ela, e estava disposta a dar-lhe prosseguimento imediato nas condições do contrato original, cujo preço mostrava-se economicamente adequado. Justamente por encontrar-se em situação objetivamente diferenciada de qualquer outra no tocante ao conhecimento específico sobre a execução da obra, a isonomia teria sido respeitada, dentro da concepção clássica de tratamento desigual aos desiguais.
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Por fim, tomando por base as premissas fáticas apontadas ao longo do processo, os
gestores defenderam que a realização de ampla consulta atentaria contra os princípios que
“norteiam as contratações pelas entidades administrativas, como a obtenção da proposta mais
vantajosa, porque, diante de todo o exposto, ensejaria perda de tempo e prejuízos econômicos à
Companhia e sociais”.
Quanto ao preço contratado135, considerando que foram mantidos aqueles anteriormente
fixados, os gestores apontaram que estaria garantia a compatibilidade com o valor de mercado,
uma vez que a tendência natural é de subida de preços, e não de diminuição.
Em síntese, o papel dos gestores responsáveis pela condução do contrato pode ser
resumida com o excerto abaixo, retirado do Acórdão 7664/2010:
“[...] a condição principal para a contratação de remanescente de obra é a manutenção das condições do contrato inicial, e que havia razões objetivas capazes de determinar que a melhor escolha para a continuidade recairia em uma empresa que já estivesse em atividade no local, com conhecimento específico da execução e cujo o trabalho era bem avaliado, a opção primeira foi a de negociar com a empresa S[...] a possibilidade de dar prosseguimento à obra nas condições do contrato original. Essa opção foi a primeira porque era indiscutivelmente a melhor.” (grifou-se)
A conclusão do Auditor Federal de Controle Externo da unidade instrutiva, após
ponderação sobre os argumentos dos gestores, foi pelo seu acolhimento, considerando-se
afastados os indícios de direcionamento suscitados inicialmente, e que motivaram as diligências
em questão. Entendeu, no entanto, que a PETROBRAS deveria ser alertada para que observasse o
disposto no item 2.2, “c”, do Decreto nº 2.745/98, ao proceder a dispensas de licitação para
contratação de remanescente de obra, o que significa registrar devidamente os motivos da
contratação direta e subordinar tal decisão à autoridade competente imediatamente superior.
2.44. Defendem que, frente às peculiaridades do caso, a consulta prévia prevista no item 2.1, “i‘, do Decreto nº 2.745/98 – que somente tem razão de ser para assegurar isonomia de oportunidade às empresas interessadas, igualdade essa, como dito, inexistente no caso -, atentaria até mesmo contra os princípios que norteiam as contratações pelas entidades administrativas, como a obtenção da proposta mais vantajosa, porque, diante de todo o exposto, ensejaria perda de tempo e prejuízos econômicos à Companhia e sociais. 135 2.45. Ressalvam, ainda, que não haveria dúvidas de que o preço do contrato extinto ainda continuava adequado, tornando despicienda a confirmação mediante consulta, porquanto os custos de obras dessa natureza só tendem a se elevar com o tempo, notadamente pelo cenário de aquecimento do mercado existente naquele momento, sem falar que os valores praticados resultaram de uma licitação altamente disputada, a qual acorreram doze empresas.
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Nota-se que o referido Auditor compreendeu que a particularidade de a Contratada estar
mobilizada no site consistia em informação de peso na tomada de decisão136. Igualmente
relevante para a formação do posicionamento do Auditor137 foi a conclusão de que a sua
contratação trouxe o benefício associado de mitigar os potenciais riscos que adviriam da
interrupção da obra. Em suas palavras:
2.49. Diante dos argumentos apresentados pelos responsáveis, é razoável admitir que, caso houvesse a paralisação temporária dos serviços para consulta prévia a empresas do ramo, diante do estágio em que a obra se encontrava, haveria riscos de comprometimento dos serviços já executados, o que representaria afronta ao princípio da economicidade, e de transtorno aos usuários dos trechos em obras.
A conclusão, portanto, foi de que as “questões de nº 2 e 3 revelaram-se improcedentes,
cabendo o acatamento das razões de justificativa apresentadas pelos responsáveis", sem prejuízo
da expedição dos alertas já mencionados acima, quanto às formalidade trazidas no item 2.2, “c”,
do RLPS.
O Voto138 do Min. Augusto Nardes confirmou o posicionamento do Sr. Auditor nesse
ponto, destacando que a suposta irregularidade de favorecimento foi afastada pela comprovação
de critério objetivo para a seleção da empresa, qual, seja, o fato de ela já estar mobilizada no
local.
Acolheu, portanto, a análise técnica quanto à economicidade da medida adotada pelos
gestores. Eis o trecho de maior destaque quanto a esse tópico:
18. Dessa forma, a unidade técnica considerou razoáveis as justificativas apresentadas pelos gestores da Petrobras, que alegaram que seria antieconômica, neste caso concreto, a possibilidade de desmobilizar a obra e iniciar um processo de escolha de outra empresa para o seu prosseguimento. Considerando tais elementos e o fato de não ter sido verificado
136 “Esclarece, ainda, que o objetivo do mencionado dispositivo seria o de garantir isonomia de oportunidades a potenciais interessados na execução dos serviços. Mas, no caso em tela, não teria ocorrido afronta à isonomia em razão de a empresa S[...] já estar prestando serviços no âmbito do contrato há dois meses. Essa particularidade deveria, de fato, ser considerada na decisão que viesse a ser tomada.” 137 “Esses riscos foram mitigados pelo fato de a empresa escolhida para a continuidade da obra já estar executando os serviços como subcontratada da empresa cujo contrato foi rescindido. Acrescente-se que, de fato, a empresa S[...] havia sido selecionada inicialmente para participar do Convite nº 177.8.42.01-1, em razão de estar instalada na região e de reunir acervo técnico compatível com o objeto licitado, mas não apresentou proposta.” 138 17. Quanto ao possível favorecimento da S[...], ou de seus diretores, restou patente das análises da Secex/ES, que o ponto chave da opção da Petrobras pela referida empresa, foi o fato de a mesma já se encontrar instalada no local da obra, posto que havia sido subcontratada anteriormente pela P[...].
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superfaturamento, julgo que a suspeita de favorecimento, de fato, não se confirmou nos autos.
Em razão disso, os Ministros do Tribunal de Contas da União acolheram as razões de
justificativa apresentadas pelos gestores, com base no art. 250, §1º, do Regimento Interno do
TCU, para a irregularidade descrita no item 6, alínea “b” do voto condutor (que tratava da
irregularidade nº 02: “ausência de adoção das providências elencadas no subitem 2.1, alínea “i”,
do Decreto nº 2.745/1998, optando por selecionar diretamente a empresa S[...] para realização do
remanescente da obra, sem qualquer comprovação das vantagens que advieram para a Entidade
com a adoção dessa medida, tomada pela Gerência de Ativo da Produção Norte Capixaba, e no
subitem 2.2, alíneas “c” e “d” do mesmo decreto, implicando fortes indícios de direcionamento”).
A votação contou com a participação do Min. Valmir Campelo como presidente e do Exmo.
Subprocurador Geral, Dr. Paulo Soares Bugarin.
Não é difícil perceber que a palavra “economicidade” figurou como elemento central para
a abordagem desse caso concreto. Foram exatas 20 ocorrências da expressão no Acórdão
7664/2010. Por outro lado, não se fez qualquer menção expressa à eficiência ou à análise custo-
benefício da operação. Significaria isso que os argumentos não foram analisados sob esse
prisma? Entendemos que não, por dois motivos.
O primeiro deles, como já afirmado tópicos acima, reside na confusão conceitual entre
economicidade e eficiência. A utilização de um ou outro se dá, muito comumente, de forma
cumulativa e alternativa, sem prejuízo da intenção do redator em traduzir o atendimento à
“melhor opção possível”. Portanto, a ausência da menção expressa à eficiência ou ao custo-
benefício da operação não enseja a conclusão de que sua contemplação não foi necessária à
decisão final do TCU.
O segundo deles, como detalharemos a seguir, reside na possibilidade de se identificar,
nessa decisão, a utilização de conceitos próprios da lógica da AED, ainda que forma pouco
sistematizada ou simplesmente embutida como justificativas técnica e fáticas que subsidiam a
decisão dos gestores. Isso permite a conclusão de que o caráter técnico das decisões e a
aproximação com a análise de cunho econômica vem conduzindo à utilização de conceitos
próprios da Análise Econômica do Direito, tanto pelos gestores da estatal, quanto pelo TCU.
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Note-se, por exemplo, o argumento dos gestores, no sentido de que a ampla consulta ao
mercado somente tem sentido em se tratando de pessoas em condições de igualdade139, o que não
existia no caso, diante da diferenciada situação em que a S[...] se encontrava. A afirmação foi
válida não só pelo benefício de preço, resultado da mobilização já realizada, mas também pelo
fato de que ela era conhecedora da obra e poderia, com isso, ter informações adicionais que as
demais empresas no mercado não disporiam.
É nítido que foi afastada, já na argumentação dos gestores, a falsa premissa de igualdade e
alinhamento de informação entre todas as empresas do mercado, o que possibilitaria, em tese,
uma concorrência competitiva entre eles. Se, nesse caso, uma delas já está à frente das demais,
em razão de situação fática precedente, representando ainda um benefício financeiro para a
empresa contratante, é natural e mesmo esperado dos gestores que esse desnivelamento de
informações, verificado na realidade, seja levado em conta no momento de decisão acerca da
melhor alternativa negocial a ser adotada. Tal conceito é conhecido da AED como assimetria de
informações, não aprofundado aqui por extrapolar o escopo do trabalho. No entanto, fica nítida a
maior aproximação dos argumentos técnicos à realidade posta, com tendência ao afastamento
de premissas teóricas não confirmadas no caso concreto.
Quer-se com isso dizer que não é possível aferir, com precisão, a eficiência e a
economicidade da operação se não se partir de um cenário real, e não idealizado. Nesse Acórdão,
foi ponderado, portanto, o efeito prático de uma condição pré-existente de mercado, o que pode
parecer pouco conservador, mas que se mostra extremamente aderente à lógica da AED.
Além disso, a todo momento, tanto os gestores, quanto a equipe técnica do TCU, ainda
que não o mencionassem, procederam a uma ponderação da relação custo-benefício da operação,
139 2.43. Sob a ótica dos defendentes, a postura adotada foi bem mais satisfatória do ponto de vista gerencial. A empresa em questão estava não só mobilizada, mas em franca atividade há cerca de dois meses, executando parte expressiva da etapa restante, como se pode notar pelas fichas de registro de ocorrência desde 19/7/2003 (fls. 26-7 do Anexo 4). Além disso, fora avaliada como tecnicamente capacitada no momento da licitação – que resultou na contratação da P[...] -, conhecia, com precisão, a situação da obra sendo, de certa forma, corresponsável por ela, e estava disposta a dar-lhe prosseguimento imediato nas condições do contrato original, cujo preço mostrava-se economicamente adequado. Justamente por encontrar-se em situação objetivamente diferenciada de qualquer outra no tocante ao conhecimento específico sobre a execução da obra, a isonomia teria sido respeitada, dentro da concepção clássica de tratamento desigual aos desiguais.
2.44. Defendem que, frente às peculiaridades do caso, a consulta prévia prevista no item 2.1, “i‘, do Decreto nº 2.745/98 – que somente tem razão de ser para assegurar isonomia de oportunidade às empresas interessadas, igualdade essa, como dito, inexistente no caso -, atentaria até mesmo contra os princípios que norteiam as contratações pelas entidades administrativas, como a obtenção da proposta mais vantajosa, porque, diante de todo o exposto, ensejaria perda de tempo e prejuízos econômicos à Companhia e sociais.
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contrapondo aqueles que seriam os benefícios dessa escolha, aqui incluídos os riscos econômicos
e negociais, com os possíveis prejuízos dela decorrentes.
Nesse ponto, o contra-argumento que poderia ser apresentado pelo TCU, a princípio e
sem prejuízo de outras linhas argumentativas, poderiam ser resumidos em dois grandes vetores:
(i) o primeiro, o risco sempre presente de que houvesse outra empresa no mercado, apta a
executar o serviço por preço mais vantajoso e em condições ainda mais benéficas para a estatal.
Ele foi mitigado, no seu limite, pela baixíssima probabilidade de ocorrência; (ii) o segundo, o
risco de caracterização da opção como ilegal, diante da possível interpretação rígida e legalista do
item 2.1, “i”, do RLSP, pelos órgãos de fiscalização, uma vez que foi afastado aquilo que seria,
de acordo com essa interpretação, uma condicionante para prosseguimento da contratação direta
descrita naquela alínea. Esse risco foi assumido pelos gestores quando da adoção da opção de
contratação direta da empresa efetivamente contratada. Foi mitigado, contudo, pela conclusão de
que “essa opção foi a primeira porque era indiscutivelmente a melhor”, conclusão essa
corroborada pelo TCU, após diligência na estatal e apuração do cenário fático apresentado pelos
gestores.
Sem prejuízo de críticas e desdobramentos advindos da conclusão alcançada pelo TCU -
dos quais destacamos a interpretação do que seja “ampla consulta”, que pode ter sentido diverso
daquele dado pelo TCU – é possível afirmar que ente fiscalizado e fiscalizador atentaram para a
demonstração da eficiência da operação, fator central do Acórdão avaliado.
Houve, nesse caso, presente e constante preocupação com a realidade da obra e dos
potenciais riscos da adoção de medida diversa daquela que foi tomada. Esse raciocínio se
coaduna com as premissas da análise econômica, mencionados no tópico 4 desse trabalho.
5. 3. Clonagem na contratação.
A PETROBRAS, por meio de sua subsidiária integral Petrobras Netherlands B.V.
(PNBV), realizou contratação direta para fins de construção da Plataforma P-56. O Acórdão140
2302/2013 informa que a equipe de fiscalização assinalou a existência, em síntese, de duas
impropriedades. A primeira delas – e que será a única aqui analisada – diz respeito à contratação
direta, por inexigibilidade de licitação, da construção da P-56, “sem a necessária demonstração da 140 BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 2302/2013. Plenário. Relator: Ministro José Múcio Monteiro. Sessão de 28/08/2013. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 04 setembro 2013.
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inviabilidade de competição”. A segunda irregularidade tratava de supostos obstáculos à
fiscalização, decorrentes da recusa da PETROBRAS em fornecer dados solicitados pelo TCU.
Em breve resumo, para fins de contextualização da primeira irregularidade, PETROBRAS
optou por proceder à contratação direta da P-56 com a mesma empresa que havia sido a
vencedora no certame anterior, promovido para a contratação da Plataforma P-51, com base no
item 2.3, “e”, do RLSP141. Durante o voto, essa alternativa foi chamada de “clonagem de
contratação”. Os principais argumentos utilizados a favor dos gestores e da Companhia foram
destacados no Acórdão, transcrevendo trechos do Relatório de Auditoria, como sendo os
seguintes:
Os argumentos favoráveis à clonagem de projeto e de contratação foram expostos nos documentos internos da Petrobras (DIP) listados à f. 23 do v.p., a seguir resumidos: a) redução drástica no prazo de implantação do projeto e de contratação (mais de 20 meses de ganho) pela utilização de projeto bastante detalhado da P-51, e, por conseguinte, antecipação de receita para a Petrobras em razão da complementação da curva de oferta de óleo alterada pelo atraso da P-55 e P-57; b) expectativa de obtenção de proposta mais vantajosa financeiramente com a cópia de projeto e redução significativa dos riscos envolvidos por falta de conhecimento prévio de todo o escopo de trabalho, consolidando todas as lições aprendidas nos projetos P-51 e P-52, o que permitiria a aferição das propostas pela Petrobras, principalmente com redução de custos de mobilização e desmobilização; c) possibilidade de balizamento dos preços para as futuras contratações; d) oportunidade de padronização de unidades dentro da Petrobras, com ganhos operacionais; e) contratação direta das mesmas empresas envolvidas no projeto e construção da P-51, que já detêm todo o conhecimento, permitiria redução na fase de projeto de engenharia, sem perda das lições aprendidas, mitigando contingências devido ao desconhecimento e riscos associados; f) impacto social negativo na região com a desmobilização de pessoal; g) possibilidade de perda de tempo assim como ocorrido com as contratações da P-55 e P-57, em que estão sendo realizados estudos para viabilizar a realização de novo certame; h) possibilidade de que a realização de licitação possa ocasionar a contratação por preços superiores aos obtidos pela inexigibilidade, ainda que com as mesmas empresas que participaram do projeto da P-51, em razão de terem conhecimento da situação atual de aquecimento de mercado, tendo em vista a possibilidade de estas restarem vencedores de uma licitação, ensejando atraso na contratação e proposta mais cara;
141 2.3 É inexigível a licitação, quando houver inviabilidade fática ou jurídica de competição, em especial: (...) e) para a contratação de serviços ou aquisição de bens, em situações atípicas de mercado em que, comprovadamente, a realização do procedimento licitatório não seja hábil a atender ao princípio da economicidade;
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i) ratificação do jurídico da Estatal acerca da inviabilidade fática e jurídica de competição, nos termos da alínea ‘e’ do subitem 2.3 do Regulamento Licitatório aprovado pelo Decreto 2.745/1998, o qual dispõe que é inexigível a licitação para a contratação de serviços ou aquisição de bens, em situações atípicas de mercado em que, comprovadamente, a realização do procedimento licitatório não seja hábil a atender ao princípio da economicidade.
Nessa decisão, vê-se que a opinião da equipe técnica foi diferente daquela proferida pelos
Ministros do TCU. Ao final, a argumentação dos gestores foi aceita, como se verá mais adiante.
No entanto, vale apresentar os diferentes pontos de vista do Tribunal sobre o assunto, bem como
a influência dos princípios da eficiência e da economicidade em cada uma das esferas.
Note-se, por exemplo, que o Parecer elaborado pela então 9ª Secex (atual Secretaria de
Controle Externo da Administração Indireta no Rio de Janeiro - SecexEstataisRJ), não deu
relevância aos benefícios decorrentes da redução de prazo da contratação, apontando o risco
(mencionado na análise do caso concreto anterior) de que esse argumento sirva, isoladamente,
para justificar qualquer contratação direta. Em suas palavras:
Em relação à questão do prazo, observou-se que sempre haverá antecipação de receita caso se contrate diretamente, em detrimento da licitação, não podendo isso ser tido como justificativa para não se licitar, pois, se assim fosse, restaria para sempre justificada a contratação direta no caso de plataformas que produzirão petróleo. (grifou-se)
Mais à frente, a equipe técnica destacou142 a ausência de comparativos técnicos que
comprovassem o prejuízo em se realizar uma licitação, o que, inclusive, foi solicitado
posteriormente por meio de Ofício da equipe de fiscalização. Acrescentou que a PETROBRAS
apresentou os cronogramas do Estudo de Viabilidade Técnica e Econômica – EVTE
contemplando algumas alternativas negociais, mas com a ausência da opção de licitar.
142 “Durante a auditoria, em reunião com os responsáveis, verificou-se que não houve uma comparação entre a situação de se contratar diretamente por meio da clonagem e a de se clonar o projeto e posteriormente se fazer a licitação. Houve apenas a comparação entre se contratar diretamente por meio da clonagem e de se fazer uma plataforma do tipo FPSO convertido. No caso concreto, a equipe solicitou essa quantificação objetiva da vantagem em função da antecipação da produção por meio de perguntas contidas nos Ofícios de Requisição 02-63/2008 e 04-63/2008 (fls. 14/15 e 29/31 do Anexo 3). No item ‘g.4’ do Ofício de Requisição 04-63/2008, fora solicitada a demonstração das vantagens com a antecipação da produção. A Petrobras mostrou a antecipação comparando a opção (i) clonagem do projeto da P-51 e da contratação com (ii) FPSO convertido. Mais uma vez, portanto, não evidenciou qualquer comparação com a hipótese de (iii) clonagem do projeto com posterior realização da licitação.” (grifou-se)
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Ainda sobre a questão do prazo, vale ressaltar que, em resposta ao item ‘f ‘do Ofício de Requisição 05-63/2008 (fls. 43/44 do Anexo 3), a Petrobras mostrou os cronogramas dos Estudos de Viabilidade Técnica e Econômica (EVTE), conceitual e básico (fls. 65/67 do Anexo 3). Percebe-se que o prazo da licitação seria apenas um pouco superior ao da negociação direta, pois a grande diferença estaria no prazo do EVTE Básico, que é de 56 dias, no caso de clonagem de projeto e de contratação, e de 245 dias no caso de licitação. Ressalta-se o fato de ter sido desconsiderada a possibilidade de uma clonagem apenas do projeto, o que, de forma semelhante, também acarretaria uma redução significativa no prazo do EVTE básico, diminuindo essa diferença.
O Auditor reforçou, portanto, o seu entendimento de que a PETROBRAS não estaria
preparada para decidir pela contratação direta, sem antes ter analisado a opção de “clonagem do
projeto” (no lugar de “clonagem de contratação”) no EVTE. Seguiu apontando que os
documentos que acompanharam a justificativa de contratação direta não demonstravam “de
maneira objetiva e quantitativa os impactos econômico-financeiros positivos” da contratação. Em
outras palavras, é possível se concluir que a análise da equipe técnica, nesse trecho, entendeu que
a análise custo-benefício favorável não estava plenamente demonstrada, uma vez que os
impactos positivos não estariam objetivamente quantificados. Eis o trecho do Relatório mais
representativo dessa conclusão:
Quanto ao fundamento legal, frise-se que, além dele, é necessária a comprovação de que a realização do procedimento licitatório não atenderia ao princípio da economicidade. Nesse sentido, constata-se que não foram encontrados, à época de realização da auditoria em 2008, nas pastas que compõem o processo de contratação direta da P-56 (EPC e dos módulos), DIP ou documentos equivalentes que comprovem de maneira objetiva e quantitativa os impactos econômico-financeiros positivos, conforme alegado pela engenharia da Petrobras na consulta ao jurídico feita no DIP ENGENHARIA/IEEPT/IEMS 16/2007. (grifou-se)
Por fim, o Relatório expressa a posição da equipe técnica quanto à contraposição do dever
de licitar e o de buscar a vantajosidade da proposta. O Auditor deixa transparecer sua
preocupação de que a comprovação de benefícios econômicos seja utilizado, como único vetor,
para afastamento do procedimento licitatório. Grifou-se o trecho mais representativo dessa
opinião logo abaixo:
Durante a execução daquela auditoria, a equipe da 1ª Secex constatou que o prazo da licitação estabelecido pelo setor de Contratações da Engenharia (SL/CONT) seria similar ao da contratação direta, cerca de oito meses e meio,
85
não levando em consideração o risco de cancelamento da licitação e a perda de tempo para se realizar depois a contratação direta. Não se pode esquecer de que a proposta mais vantajosa é um princípio a ser seguido juntamente com o da isonomia. É temeroso que este venha a ser colocado de lado em prol da busca única e exclusiva de benefícios econômico-financeiros. A licitação busca realizar dois fins, igualmente relevantes: o princípio da isonomia e a seleção da proposta mais vantajosa. Se prevalecesse exclusivamente a idéia da vantajosidade, a busca da vantagem poderia conduzir a Administração a opções arbitrárias ou abusivas. Enfim, poderia verificar-se confusão entre interesses primários e secundários da Administração. É certo que a Administração deverá obter a proposta mais vantajosa. Mas isso não é suficiente para validar a licitação.
Já concordando com a importância da preocupação acima, antecipa-se a seguinte
pergunta: significa dizer, portanto, que mesmo diante de estudos técnicos que demonstrem que a
licitação não poderia - ou ao menos teria reduzidas chances de – resultar na melhor contratação
para o ente estatal, ainda assim está ela obrigada a realizar um procedimento licitatório?
Antes de avaliar o assunto, prosseguimos trazendo a opinião do Min. José Múcio, Relator
do Acórdão, discordando do posicionamento do Auditor responsável, e destacando seu
entendimento de que a “clonagem de contratação”, e não apenas a “clonagem de projeto”,
poderia trazer os benefícios adicionais apresentados pelo gestor e que se revestiram como causa
para a contratação direta.
11. Não estou tão seguro de que o caminho proposto pela unidade técnica seria bem sucedido. Primeiro, deve-se compreender que, apesar de ser uma ótima ideia, a utilização dos projetos de uma plataforma para a execução de outra não significa a completa eliminação das etapas de desenvolvimento e dos custos a elas relacionados em todos os casos. Se outra empresa, distinta da autora do projeto da P-51, fosse contratada, ela teria que analisar e revisar todos os documentos técnicos, sob pena de submeter-se aos riscos inerentes de executar projeto desenvolvido por outra. Caso contrário, qualquer falha ou dano ocorrido durante a realização do objeto ou após sua entrega daria margem a discussão quanto à responsabilidade, entre a empresa projetista e a executora. 12. Além disso, plataformas de petróleo são estruturas complexas, compostas pela integração harmoniosa de vários subsistemas providos por diversos fabricantes, tais como geradores elétricos, motores, dessalinizadores etc. Caso esses subsistemas sejam contratados de fornecedores diferentes dos utilizados no projeto original, uma significativa parte do projeto executivo teria que ser refeita, em face da necessidade de adaptação dos desenhos às características dos novos equipamentos. Apenas como ilustração, a Petrobras informa que o projeto da P-56 gerou cerca de 12.800 documentos, dos quais 7.800 foram elaborados pelos fornecedores dos equipamentos e 5.000 pela projetista principal. 13. Percebe-se, portanto, que o reaproveitamento de projetos não assegura vantagens comerciais tão substanciais às outras empresas, não implicando
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diminuição de preços em grau tão elevado como esperado pela unidade técnica. Assim, no caso específico analisado nestes autos e em face das peculiares condições de mercado então existentes, não acredito que se possa afirmar com certeza que a licitação traria resultados mais vantajosos do ponto de vista econômico para a Petrobras.
Destaque-se novamente a conclusão final da citação, no sentido de que não se poderia
afirmar “com certeza que a licitação traria resultados mais vantajosos do ponto de vista
econômico para a Petrobras”. Prossegue repetindo que não foram encontrados indícios de
sobrepreço143, restando demonstrado que o parâmetro de preço da contratação demonstrou-se
vantajoso para a Companhia.
Abordando rapidamente a divergência entre RLPS e a Lei 8.666/93, o Relator144 concluiu
que apesar do posicionamento do Tribunal pela inconstitucionalidade do RLPS, “configurada a
existência de condições excepcionais que justificam a contratação direta realizada pela Petrobras,
por meio de sua subsidiária integral Petrobras Netherlands B.V.,” os argumentos dos gestores
deveriam ser acolhidos.
O Voto do Min. José Múcio foi complementado, após pedido de vista do Min. José Jorge,
que acrescentou preocupação mais alinhada àquelas apresentadas pelo Auditor responsável, no
sentido de não ser aceitável o argumento relativo à necessidade de antecipação de receita. Vê-se,
portanto, que na ponderação subjetiva quanto à força dessa alegação, o Min. José Jorge mostrou-
se refratário, nesse caso, à aceitação dos benefícios financeiros decorrentes da antecipação do
prazo de recebimento da P-56, sob o fundamento de que tal justificativa poderia “sempre
143 “14. Ainda sob esse prisma, é importante notar que, na contratação da P-56, foram utilizados como referenciais de preços os valores praticados na construção da P-51, o que se revela vantajoso quando se compara a realidade do mercado de petróleo e gás nos dois momentos. De acordo com o gráfico de fl. 29, anexo 6, quando a P-51 foi encomendada, o barril do petróleo era cotado em pouco mais de US$ 30,00. Em 2008, época da contratação em exame, o barril já era vendido a US$ 90,00, com reflexos no custo dos insumos da indústria petrolífera.15. Em consonância com essa constatação, a unidade técnica não apontou a existência de indícios de sobrepreços na contratação da P-56.” (grifou-se) 144“16. Por último, assinalo que, apesar de o Tribunal considerar o Decreto 2.745/1998 (que aprovou o Regulamento de Licitações da Petrobras) inconstitucional, a atuação dos gestores da empresa foi alicerçada no normativo, que autoriza a contratação direta em situações atípicas de mercado, conforme dispõe o seu subitem 2.3, abaixo reproduzido: “2.3 É inexigível a licitação, quando houver inviabilidade fática ou jurídica de competição, em especial: (...) e) para a contratação de serviços ou aquisição de bens, em situações atípicas de mercado em que, comprovadamente, a realização do procedimento licitatório não seja hábil a atender ao princípio da economicidade;” (grifei) 17. Nesse contexto, configurada a existência de condições excepcionais que justificam a contratação direta realizada pela Petrobras, por meio de sua subsidiária integral Petrobras Netherlands B.V., acredito que os argumentos apresentados pelos gestores possam ser acolhidos.” (grifou-se)
87
fundamentar a contratação direta no caso de plataformas produtoras de petróleo, conforme
alertado pela unidade técnica”.
Reconhecendo, contudo, a ausência de prejuízo para a Estatal, o Min. segue afirmando
que “o fato de tal procedimento não ter sido prejudicial para a empresa não significa dizer que a
opção foi a mais vantajosa”. E mais, ainda que essa opção fosse confirmada como a mais
vantajosa, “essa não pode ser a única condição a prevalecer em uma contratação com recursos
públicos, sob pena de induzir os gestores a ações arbitrárias e direcionadas a determinadas
empresas.”
Feito o alerta, o Min. Revisor aderiu ao voto do Min. Relator, no sentido de não aplicar
multa aos gestores em questão, mas defendeu que o Acórdão consignasse claramente a
excepcionalidade da medida, evitando que a PETROBRAS se valha dessa decisão para repetir a
adoção desse procedimento. Considerou necessária, também, que se desse ciência à
PETROBRAS da interpretação da Corte, no sentido de entender que a “inviabilidade de
competição é requisito indispensável para a contratação por inexigibilidade de licitação”, na
forma do item 2.3, “e”, do RLSP,
A recomendação foi acolhida pelo Min. Relator145, de forma que a redação final do
Acórdão contemplou a atual posição daqueles Ministros de que a inviabilidade de competição
seria indispensável para a contratação por inexigibilidade de licitação, na forma do 2.3, caput, do
RLPS.
9.1. acolher, em caráter excepcional, as razões de justificativa apresentadas pelos responsáveis; 9.2. dar ciência à Petrobras das seguintes ocorrências, para que adote as medidas corretivas cabíveis: 9.2.1. a inviabilidade de competição é requisito indispensável para a contratação por inexigibilidade de licitação, conforme previsto no art. 25, caput, da Lei 8.666/1993 e no art. 2.3, caput, do Regulamento do Procedimento Licitatório Simplificado, aprovado pelo Decreto 2.745/1998, devendo esta condição estar devidamente fundamentada no respectivo processo;
145 “21. Propõe o Ministro que fique claro na decisão a situação de excepcionalidade configurada neste processo, para que a Petrobras não possa, a posteriori, valer-se dessa liberalidade para adotar procedimentos semelhantes. Do mesmo modo, julga necessário dar ciência à empresa de que a inviabilidade de competição é requisito indispensável à contratação por inexigibilidade de licitação, nos termos do art. 25, caput, da Lei 8.666/1993, como também do art. 2.3, caput, do Regulamento do Procedimento Licitatório Simplificado da companhia, aprovado por meio do Decreto nº 2.745/1998, devendo esta condição restar devidamente fundamentada no respectivo processo.22. Por reconhecer a pertinência da preocupação externada pelo nobre colega, adoto integralmente os aditamentos por ele propostos, agradecendo-lhe pela proveitosa intervenção.”
88
Esse julgamento representa mais um exemplo de utilização da lógica da AED na
fiscalização do TCU. Não só pela recorrente menção à economicidade, mas pela importância
atribuída à realidade dos fatos e à análise custo-benefício, enquanto mecanismo de auxílio ao
gestor no processo decisório.
Não bastasse, também nesse caso, o TCU reconheceu a existência, - e, em consequência,
levou em consideração – de custos inerentes à troca de empresa contratada, representados, entre
outros, pelos custos adicionais146 decorrentes de retrabalhos147. Reconheceu, igualmente, que a
diminuição de risco da operação148, decorrente da manutenção da mesma empresa para clonagem
da contratação, traria benefícios associados e representados na redução do preço para a
PETROBRAS. O fato de uma nova empresa realizar projeto executado por outra representaria,
nesse caso, aumento dos chamados custos de transação a serem suportados pela nova contratada
e, em consequência, embutidos no preço ofertado (e também suportado) à PETROBRAS. Essa
ponderação demonstra o cuidado do Tribunal com a efetiva avaliação da realidade dos contratos e
sua busca pela comprovação da eficiência das decisões dos gestores.
Reforça-se, portanto, o ponto já trazido anteriormente, de que a eficiência e a
economicidade tem ganho relevo nas decisões do TCU, numa aplicação mais próxima àquela
posta pela AED, estando igualmente presente nas alegações dos gestores, ainda que de forma
implícita. Não há, portanto, negação a esses conceitos, muito menos quando relacionados ao
princípio da economicidade. Ocorre, todavia, que há considerável espaço para absorção mais
profunda da lógica da AED, como se mostra presente nesse caso.
Voltando, portanto, à provocação anterior, representada pelo questionamento quanto à
necessidade de realização de licitação, mesmo diante de estudos técnicos que demonstrem que a
licitação não poderia, ou teria reduzidas chances de resultar na melhor contratação para o ente
estatal, a lógica da AED permitira resposta divergente.
146 Entendemos que tais custos representam verdadeiros “custos de transação”, conceito inerente à AED, mas aqui não detalhado, em razão do escopo delimitado do trabalho. 147 Vide item 12 do Voto do Ministro Relator: “12. Além disso, plataformas de petróleo são estruturas complexas, compostas pela integração harmoniosa de vários subsistemas providos por diversos fabricantes, tais como geradores elétricos, motores, dessalinizadores etc. Caso esses subsistemas sejam contratados de fornecedores diferentes dos utilizados no projeto original, uma significativa parte do projeto executivo teria que ser refeita, em face da necessidade de adaptação dos desenhos às características dos novos equipamentos. Apenas como ilustração, a Petrobras informa que o projeto da P-56 gerou cerca de 12.800 documentos, dos quais 7.800 foram elaborados pelos fornecedores dos equipamentos e 5.000 pela projetista principal” 148 “Se outra empresa, distinta da autora do projeto da P-51, fosse contratada, ela teria que analisar e revisar todos os documentos técnicos, sob pena de submeter-se aos riscos inerentes de executar projeto desenvolvido por outra.”
89
Não sendo esse o objetivo específico desse trabalho, cumpre apenas insistir na pergunta
para ilustrar o ponto tão repetido até aqui. Se a eficiência e a economicidade são qualidades
esperada dos atos dos gestores, até que ponto não seria possível definir a ação ideal com base
nesses critérios? Sem a expectativa de esgotar o assunto, e novamente apenas para fins
ilustrativos, não seria possível afirmar que a obrigação de licitar, mesmo quando os custos e
potenciais prejuízos advindos da licitação não superam os benefícios da possível melhor
proposta, violaria o ímpeto natural dos gestores de buscar a melhor solução para a Companhia?
Mesmo em se tratando de uma empresa estatal exploradora da atividade econômica, que compete
em igualdade num mercado aberto, essa imposição se faz razoável?
Trouxemos esse caso concreto por entender que ele representa um avanço na
jurisprudência do Tribunal, no ponto em que reconhece a legitimidade da avaliação dos gestores
diante de fatos que demonstravam os benefícios econômicos e negociais da medida adotada. Por
outro lado, esse mesmo acórdão nos dá a oportunidade de verificar que há um espaço para
discussão ou mesmo evolução do assunto, especialmente se cotejados sob a ótica da AED,
cabendo, cada vez mais, a procura por critérios objetivos para a melhor avaliação das decisões
dos gestores públicos.
5.4 Economicidade não comprovada
O presente caso concreto aborda dois momentos distintos da apreciação do Tribunal
quanto a atos de gestores da PETROBRAS, especificamente quanto à celebração de aditivos
contratuais em percentual superior ao limite de 25% do valor do contrato, previsto no item 7.2,
“b”, do RLPS.
Trata-se de fiscalização incidente sobre diversos contratos, no bojo de levantamento de
auditoria voltada para o Sistema de Produção de Óleo e Gás Natural da Bacia de Campos. Foram
identificados achados distintos em cada um dos contratos, segundo se pode inferir do Acórdão
734/2013149, proferido pelo Plenário do TCU. No entanto, para os fins desse trabalho, os
comentários serão restritos ao achado identificado no Contrato “SAP 4600160724”, que tinha
149 BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 734/2013. Plenário. Relator: Ministro José Múcio Monteiro. Sessão de 03/04/2013. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 10 abril 2013.
90
como objeto, em síntese, a prestação de serviços, aí incluídos reparos, manutenção, programação
e controle, nas instalações da PETROBRAS em Macaé, a bordo das embarcações no píer, nas
unidades marítimas, e nas instalações dos portos, estaleiros e cais, localizados em Angra dos
Reis, Arraial do Cabo, Niterói e Rio de Janeiro (RJ) e Vitória do Espírito Santo (ES). O valor
original do contrato era de R$ 61.821.381,27 e, após a celebração dos aditivos, atingiu o valor de
R$ 167.299.266,96.
No Acórdão mencionado, foram acolhidas parcialmente as razões dos gestores, sendo-lhes
negado o mérito, contudo, no que toca à irregularidade aqui discutida, posicionamento somente
alterado após a oposição de Embargos de Declaração, conforme será posto a seguir. Segundo o
Relatório da equipe técnica (Secex/RJ), que segue transcrito no voto do Min. Relator, o Contrato
sofreu alterações formalizadas em três aditivos contratuais, até chegar a R$ 167.299.266,63, ou
seja, “170,61% acima do valor original, muito superior aos 25% permitidos, contrariando,
portanto, o disposto no art. 65, §§ 1º e 2º, da Lei 8.666/1993, e item 7.2, alínea ‘b’, do Decreto
2.745/1998”.
O Relatório narra o histórico de cada um dos aditivos, com as justificativas pertinentes,
para depois concluir pela inexistência, nos autos, de estudos ou pesquisas de preços que
demonstrassem que os preços praticados pelas empresas contratadas nos aditivos tenham sido
efetivamente vantajosos para a Petrobras, “mesmo tendo sido mantidos os preços inicialmente
estabelecidos, desconsiderados os reajustes contratuais”.
Os esclarecimentos dos gestores responsáveis foram pontuados no Relatório da seguinte
forma:
a) o 9º Termo Aditivo, de 31/5/2006, foi o único aditivo que teve por escopo o aumento de quantitativos; b) o 11º Termo Aditivo, de 7/12/2006, teve por escopo a adequação de projeto em função do incremento das exigências de certificadoras de classe para a aprovação das Estacas Tipo Torpedo a serem usadas nas novas UEP, tratando-se, portanto, de inovação tecnológica que, segundo acórdãos prolatados pela Egrégia Corte de Contas, pode ultrapassar o limite de 25% (Acórdão 1.329/2003-Plenário e Decisão 215/1999-Plenário); c) o 13º Termo Aditivo, de 13/7/2007, não seria um acréscimo contratual, mas sim um termo de prorrogação do contrato, não podendo ser incluído para configuração do limite estabelecido pelo Decreto 2.745/1998 (Regulamento do Procedimento Licitatório Simplificado da Petrobras); e d) as bases econômicas e contratuais do contrato foram mantidas
.
91
Apesar da afirmação dos gestores, indicando que os preços praticados nos Aditivos
seguiram os preços contratualmente previstos, a equipe de fiscalização rebateu o argumento
afirmando que:
a) tanto as alterações contratuais quantitativas quanto as unilaterais qualitativas estão sujeitas aos limites preestabelecidos no art. 65, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.666/1993, e jurisprudência desta Corte de Contas (Decisão 215/1999-TCU-Plenário); b) o item 8.1, alínea ‘b’, da Decisão 215/1999-TCU-Plenário, não se aplica ao 11º Termo Aditivo, de 7/12/2006, pelos motivos abaixo expostos: b.1) por ser um contrato de escopo amplo, não havia a menor hipótese do ajuste em questão ser rescindido (item 8.1, alínea ‘b’, inciso I, da Decisão 215/1999-TCU-Plenário); e b.2) não houve demonstração - na motivação do ato que autorizou o aditamento contratual que extrapolou os limites legais (11º Termo Aditivo, de 7/12/2006) – de que as consequências da outra alternativa, no caso a realização de outra licitação ou mesmo a contratação direta, importariam sacrifício insuportável à Petrobras, inclusive quanto à sua urgência e emergência, destacando-se que o novo projeto de Estaca Torpedo, ‘Torpedo Anchor T-98 - For Cast Steel Padeyes Tipe A’, elaborado pelo CENPES, foi apresentado em 10/5/2006, ou seja quase 7 meses antes da assinatura do ajuste supramencionado (item 8.1, alínea ‘b’, inciso VI, da Decisão 215/1999-TCU-Plenário), consoante jurisprudência desta Corte de Contas (Acórdão 1.022/2008-TCU-Plenário, Acórdão 336/2008-TCU-Plenário, Acórdão 2.079/2007-TCU-2ª Câmara, e Acórdão 1.887/2007-TCU-2ª Câmara).
E, especificamente quanto ao preço contratado:
c) as bases econômicas e contratuais do contrato, necessariamente, tinham que ser mantidas, em atendimento ao art. 65, § 1º, da Lei nº 8.666/1993.
Assim, mantidos os indicativos de irregularidade, foi proposta a realização de audiência
dos gestores responsáveis. Na ocasião, a Defesa demonstrou que o primeiro aditivo discutido
(Aditivo nº 09), que previu um aumento quantitativo no contrato, o fez no percentual de 15%,
respeitado, portanto, o limite legal. Já o segundo (Aditivo nº 11) previa alteração qualitativa - e
não quantitativa - que não deveria ser computada para fins de aferição do limite de 25%. Por fim,
o último aditivo (Aditivo nº 13), segundo a defesa, representou uma prorrogação de prazo por
mais cinco anos, com aumento correspondente de valor pelo período. Tal prorrogação, segundo
os gestores,
92
mostrava-se como a melhor alternativa para a companhia a luz dos Princípios da Legalidade, Economicidade e Eficiência, destacando-se que, sob aspecto da economicidade, as bases de preço de 5 (cinco) anos atrás foram mantidas e estariam defasadas em relação ao mercado, e que, sob o viés da eficiência, mostra o sucesso do escopo contratual executado pelas empresas
Novamente, a equipe técnica manteve seu posicionamento quanto à ausência de
justificativa suficiente para a realização de acréscimos de valores superiores ao limite de 25% do
valor do contrato.
De início, baseou-se nos critérios definidos no Acórdão paradigma de nº 215/99 do
Plenário da Corte, indicando que “tanto as alterações contratuais quantitativas quanto as
qualitativas, estão sujeitas aos limites estabelecidos no art. 65, §§ 1º e 2º, da Lei 8.666/1993”.
Aquele acórdão estabeleceu condicionantes para a legalidade da superação desse limite, dentre
elas:
I - não acarretar para a Administração encargos contratuais superiores aos oriundos de uma eventual rescisão contratual por razões de interesse público, acrescidos aos custos da elaboração de um novo procedimento licitatório; II - não possibilitar a inexecução contratual, à vista do nível de capacidade técnica e econômico-financeira do contratado; III - decorrer de fatos supervenientes que impliquem em dificuldades não previstas ou imprevisíveis por ocasião da contratação inicial.
Para a equipe técnica, tais condicionantes não teriam sido atendidas no caso concreto.
Inicialmente, pontuou que outras empresas poderiam ter assumido os serviços que foram objeto
de aditivo contratual, exemplificando que havia empresas capacitadas no próprio cadastro da
PETROBRAS150. A equipe técnica segue afirmando que inexistiria qualquer fato superveniente151
a justificar a celebração do aditivo, porque os fatores negociais apontados pela defesa já seriam
de conhecimento da PETROBRAS.
150 “6.14.3.2.1 possibilidade de inexecução contratual, tendo em vista a existência de outras empresas com capacidade para realizar o objeto do presente ajuste, destacando-se que, à época da realização do certame, 6 (seis) empresas, que já constavam no cadastro da Petrobras, no subitem 5.16.01, grupo ‘C’, Serviços de Inspeção e Manutenção de Equipamentos de Marinharia, foram convidadas, tendo sido apresentadas 3 (três) propostas válidas, conforme relatado no subitem 6.13.2.1.1 desta instrução;” 151 “6.14.3.1.2 fatos supervenientes, tendo em vista que a entrada de novos projetos de produção, os quais, certamente, já eram de pleno conhecimento da Petrobras, conforme justificado no subitem 6.14.2.2.3 supra, não podendo os mesmos ser caracterizados como não previstos ou imprevisíveis; e”
93
Segue indicando que a PETROBRAS não teria comprovado quais teriam sido as
consequência negativas “da outra alternativa”, que seria a realização de outra licitação. Em suas
palavras, não restou comprovado:
6.14.3.1.3 sacrifício insuportável para a Petrobras, tendo em vista que não houve demonstração de que as consequências da outra alternativa, no caso a realização de outra licitação, importaria sérias dificuldades, inclusive quanto à sua urgência e emergência, destacando-se, por oportuno, que os procedimentos para assinatura do 13º Termo Aditivo, de 17/7/2007, iniciaram-se 11 (onze) meses antes do término da vigência original, conforme Documento Interno do Sistema da Petrobras E&PSERV/US-SUB/ANC 64/2006, de 29/9/2006, tempo esse suficiente para realização de novo certame. 6.14.3.3 destaque-se, por fim, que não há quaisquer estudos que asseverem a economicidade e a eficiência da prorrogação contratual formalizada por meio do 13º Termo Aditivo, ainda que mantidas as bases de preços praticadas no início do contrato.
Em conclusão, a SECX/RJ recomenda que a PETROBRAS seja alertada de que “observe
que tanto as alterações contratuais quantitativas quanto as qualitativas estão sujeitas aos limites
estabelecidos no art. 65, §§ 1º e 2º, da Lei 8.666/1993”. Deixa de propor a aplicação de multa
para os gestores por considerar “o referido procedimento é usual na Petrobras”.
Adotando as premissas do Relatório de Auditoria, o Voto condutor baseou-se no
entendimento que, para a extrapolação do limite legal de 25%, seria necessária a comprovação,
por meio de estudo, da economicidade da medida.
Eis o trecho mais representativo do voto condutor:
Um dos pressupostos que definem a Decisão 215/1999-Plenário, mais importante e desprezado pelos contratantes, é “não acarretar para a Administração encargos contratuais superiores aos oriundos de uma eventual rescisão contratual por razões de interesse público, acrescidos aos custos da elaboração de um novo procedimento licitatório”. Percebe-se que um estudo comparando os custos de uma rescisão contratual mais de uma nova licitação com os custos da extrapolação contratual deve ser elaborado e demonstrar que é mais vantajoso economicamente para a Petrobras aditivar o contrato. Não houve, nem há, porém, essa preocupação por parte da empresa pública. Conforme a unidade técnica observou, trata-se de procedimento usual e não se pode admitir que a violação da legislação seja uma prática usual. O TCU pode multar o gestor público que pratica ato com grave infração à norma legal ou regulamentar. Isso significa que não multará quando a infração não for grave ou quando entender que não há culpabilidade suficiente do responsável. Entendo, no caso, que a habitualidade da conduta não pode ser circunstância atenuante, tampouco causa de diminuição de pena, pois o Gerente-Geral da Unidade de Serviços Submarinos da
94
Exploração e Produção é um profissional de alto nível técnico e gerencial que conhece as normas da empresa e tinha o dever profissional e legal de atuar conforme as normas da empresa e da lei. Nesse sentido, sou pela rejeição das razões de justificativa do responsável e pela aplicação da multa prevista no art. 58, inciso II, da Lei 8.443/1992.
A decisão, então, sofreu a oposição de Embargos de Declaração pelos gestores, que
apontaram contradição do voto quanto à sua responsabilidade pela celebração dos Aditivos
questionados. Isso porque a decisão utilizou como fundamento a afirmação de que haveria uma
prática usual na PETROBRAS de superação do limite de 25% indicado no item 7.2 do RLSP e,
na visão do gestor, se essa era uma premissa da decisão, tal deveria ser considerada em seu favor.
Na condição de gestor, seria esperado que ele seguisse aquilo que o TCU apontou como
“procedimento usual” da PETROBRAS. Nas suas palavras, “se havia um ‘procedimento usual’,
como apontado pela unidade técnica, o gestor tinha a obrigação profissional de segui-lo”.
Para reforçar seu argumento, mencionou o Parecer emitido pelo setor jurídico da
PETROBRAS:
No primeiro aditivo, o corpo jurídico chega ainda a afirmar que ‘a não realização do aditivo em questão levaria a uma nova licitação, o que, ao que parece, não seria vantajoso para a Companhia, já que a contratada, segundo a consulente, mantém os preços originais, obtidos em procedimento licitatório ocorrido em 2002, ressalvados, obviamente, os reajustes havidos no período, subentendido, portanto, pelas declarações do consulente, que mesmo com os reajustes, os preços mantêm-se vantajosos para a Petrobras. No caso sob exame, portanto, não há dúvidas de que o embargante seguiu o mandamento prescrito por V. Exa. no citado item 101. A postura conservadora de solicitar prévia manifestação do órgão jurídico da Companhia, conforme disciplinado no item 7.1.2 do Decreto Federal 2.745/1998 e no item 5.4.1.5 do Manual de Procedimentos Contratuais - MPC, demonstra a sua boa-fé na condução de suas atividades e na gestão dos recursos da Companhia (...)
Pela análise dos Embargos de Declaração, o dispositivo do acórdão foi alterado para
afastar a aplicação de multa ao gestor, não pela existência de contradição em seus termos, mas
pelo reconhecimento de que (i) nem todas as alterações procedidas mediante aditivo deveriam ser
consideradas para fins de cálculo do limite de 25% do item 7.2 do RLPS (embora a decisão faça
referência à Lei 8.666/93) e (ii) a economicidade da medida estaria comprovada.
Quanto ao primeiro item, o voto dos Embargos indica que um “novo exame dos autos
revela que o Contrato SAP 4600160724 foi aditivado para estender seu prazo por período igual
ao originariamente previsto, o que duplicou os serviços e o respectivo valor”. Em razão disso,
95
entendo que nem a renovação da prestação dos serviços então prorrogados “nem o resultado da
aplicação de índice de reajustamento como representativos de valores adicionados à composição
original do contrato” poderiam ser considerados para os fins do art. 65, §§ 1º e 2º, da Lei nº
8.666/1993.
Quanto ao segundo item, o voto passa a acolher como prova da economicidade da decisão
o fato de que os preços unitários negociados originalmente foram mantidos. Em suas palavras,
foram “mantidos os preços unitários iniciais, de 2002, que sofreram apenas atualização
monetária. Tal medida resultou em benefício à empresa, o que corroboram os pareceres jurídicos
trazidos pelo recorrente”.
A retirada de parte dos valores no cálculo dos 25% fez reduzir a superação do mesmo
limite drasticamente. Segundo o voto, “se retirados do cálculo do acréscimo os fatores relativos à
prorrogação e ao reajuste monetário, o aumento verdadeiramente de quantitativo fica em
aproximadamente 40%”. Diante desse novo cenário, a conclusão do Min. Relator foi de que, “em
que pese ainda superar o limite legal de 25%, creio que o excesso, no caso, pode ser relevado,
ponderada a vantagem econômica obtida com a prorrogação, conforme dito anteriormente”.
Assim, os Embargos foram acolhidos e a multa ao gestor foi excluída.
Na mesma linha das decisões anteriores, pode-se verificar que o ponto central do voto do
Min. Relator é a análise de custo-benefício dos aditivos fiscalizados. Nesse caso concreto, havia,
sem dúvida, uma discussão teórica a respeito dos limites postos pelo art. 65 da Lei 8.666/93,
especialmente no que diz respeito à definição de quais alterações contratuais devem ser
consideradas e quais devem ser desconsideradas para fins de apuração desse limite. Ressalte-se
que o assunto permanece não pacificado na jurisprudência do TCU ou na doutrina.
No entanto, chegada a discussão à sua reta final e uma vez definido que o limite de 25%
foi superado, o argumento-chave que determinou o afastamento da multa aos gestores
responsáveis pela celebração dos aditivos foi o entendimento de que estaria comprovada a
economicidade de sua decisão.
Embora essa avaliação não tenha sido de todo aprofundada, parece-nos que os Embargos
de Declaração não trouxeram propriamente novos elementos probatórios para análise. A
informação de maior relevo, na Defesa e nos Embargos de Declaração, relativa à economicidade
da decisão, é a de que os preços praticados nos contratos foram mantidos quando da celebração
96
dos aditivos, embora se pudesse perceber um aquecimento de mercado tendente à subida dos
preços praticados.
Ora, exceto em casos reconhecidamente excepcionais, em que o preço de determinado
produto seja diminuído com o transcurso do tempo, o curso natural é que os preços dos produtos
e dos serviços sofra elevação com o passar do tempo. Se o contrato sofre alterações tempos após
a sua assinatura, mas são mantidos os preços originais, é de se reconhecer, no mínimo, que há
uma presunção de que a medida tenha sido econômica.
Somado a isso, é possível supor - ainda que assim não tenha sido expresso na decisão –
que a existência de custos superiores, para a hipótese de instauração de uma nova licitação, foi
igualmente ponderada como argumento favorável aos gestores da estatal. Note-se que esse
pensamento surge numa citação ao Parecer Jurídico emitido pelo setor especializado da empresa,
o qual conclui que a necessidade de se iniciar um novo procedimento licitatório é um indicativo
de custos adicionais à mera prorrogação do contrato.
Essa decisão parece-nos um exemplo da avaliação feita pelo Tribunal da ratio do gestor,
mesmo em situação fática em que as informações que lhe servem de base não se mostram de todo
precisas. Mais ainda, reconhece-se aqui a impossibilidade de agregar informações que esgotem,
em absoluto, os estudos possíveis sobre qualquer assunto.
Nas palavras de MATHIS, “a racionalidade é limitada, e ela própria se limita. Isso se
explica pelo custo da informação: o fornecimento de informação não se faz sem custos; e para ser
completamente informado – se isso fosse possível – seria extremamente caro”. Essa lógica
permeou a decisão aqui avaliada, reconhecendo a existência de uma racionalidade limitada, que
faz uso das informações existentes e ao alcance, diante da impossibilidade de se conhecerem
todos os dados previamente a uma decisão que busque ser eficiente. Esse dado, real e concreto,
vem sendo absorvido nas decisões do TCU, em benefício de um julgamento mais técnico e mais
aproximado da efetividade152.
152 MATHIS, K. Ob. Cit. (nota 112). p. 39 . No original: “If the notion of rationality were to imply having complete information, then it would not be rational to be rational. The fact is, rationality is limited, and it limits itself. This is explained by the matter of information costs: information procurement is not a cost-free undertaking; and to be fully informed – if it were possible at all – would be unaffordably expensive. Information procurement is also subject to an economic calculus, in that the utility of each additional piece of information must be weighed up against its cost. A further difficulty is that often, the exact utility of a piece of information is only known once the information has been obtained. All the individual has to work with are expectations about the value of the information sought. Essentially, rationality means that an individual reacts systematically to changes in environmental conditions, i.e. not randomly and impetuously, but equally, not adhering strictly to predetermined rules. Nevertheless, such rules
97
6. CONCLUSÃO
Depois de apresentado o quadro legal em que está inserido o Dec. 2.745/98, onde foi
esclarecido que sua edição decorreu de uma opção do legislador de abrir o mercado de petróleo e
gás, permitindo que empresas privadas sejam contratadas pela União para explorar as atividades
do setor, foi apresenta a discussão a respeito da sua constitucionalidade, com argumentos pro e
contra o seu afastamento. Chegando ao STF, vários dos Ministros já proferiram votos favoráveis
à manutenção do RLSP, indicando ser a Lei 8.666/93 incompatível com o regime da
PETROBRAS, somando-se, ate o momento, 17 liminares nesse sentido.
No entanto, o questionamento que aqui se busca está na falta de ponderação - na visão da
autora, insuficiente – que o princípio da eficiência tem no debate, especialmente junto ao TCU.
Como mencionado acima, o STF já sinalizou pela compreensão da especificidade da estatal
enquanto exploradora da atividade econômica e consequente necessidade de um regime de
contratação mais célere. No entanto, o mesmo não ocorre na mesma velocidade junto ao TCU,
que resiste, nesse e em outros debates, em dar maior peso à eficiência ou à economicidade
quando contraposto com a leitura fria da legislação.
Apesar dessa ideia inicial, de que o principio da eficiência é subdimensionado nos casos
em apreciação junto ao TCU, tal não implica em afirmar que seja ele negado nos julgados
daquela Corte. Como demonstraram os precedentes trazidos como exemplo, é evidente a cautela
da equipe técnica em procurar subsídios claros e objetivos que demonstrem a economicidade dos
atos fiscalizados.
Pode-se perceber que se caminha para um maior aprofundamento técnico do conceito de
eficiência quando visto pelo prisma da AED. Como já dito, ao passo que a doutrina tradicional
brasileira preocupa-se em conceituar e utilizar os princípios da eficiência e da economicidade de
forma fluida, não traduzida em dados comparativos, a AED, por incorporar mecanismos típicos
da Economia, agrega elementos técnicos a esse conceito de eficiência, seja utilizando-se da
eficiência de Pareto, seja da eficiência de Kaldor-Hicks.
can be useful since they diminish information and decision-making costs. Hence it can be rational to adhere to tried-and-tested rules in certain typical situations.”
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Nos julgados avaliados, apesar da constante menção à eficiência e à economicidade, não
se localiza identificação expressa desses argumentos com o modelo sua concretização trazido por
Pareto ou por Kaldor-Hicks. Todavia, a simples valorização dos argumentos e a constante busca
com a verificação de dados reais, em prol de uma melhor fiscalização, já caminham para a maior
tecnicidade das decisões dos órgãos de fiscalização.
Nada disso afasta a importância de se compreender que, em Economia, há estruturas
lógicas próprias que podem auxiliar o jurista a pesquisar melhor e mais profundamente se o ato
tal ou qual está revestido de economicidade e se é, ao final, eficiente.
Portanto, não se espere da Corte de Contas uma postura radical, no sentido de dar à lei
interpretação favorável à economicidade e à eficiência enquanto vetores inabaláveis, porque
haverá, certamente, limitações a sua aplicabilidade. É desejável, também, que assim o seja. Mas
já se pode adiantar que o modelo mental de gestores de uma empresa estatal, exploradora da
atividade econômica, em transição para um mercado competitivo, como é o caso da
PETROBRAS, está aderente à eficiência, à economicidade e à análise custo-benefício. Mais
ainda: a sua decisão deverá ser voltada à concretização desses vetores de eficiência e
economicidade, apontada como resultado da análise custo-benefício, em respeito à sua finalidade
lucrativa.
Essa lógica, própria da AED, já está refletida nos julgados do TCU e na argumentação dos
gestores, de forma difusa e implícita. Defendemos que a percepção de que esse mecanismo já está
em uso é um passo importante o maior rigor nos conceitos que lhes são caros e auxiliam na
tecnicidade das decisões, o que deverá caminhar para a incorporação dos mecanismos da AED na
fiscalização externa, tornando o seu resultado cada vez mais concreto.
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