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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA Caracterização de aspectos da cognição social, habilidades sociais e funções executivas de crianças diagnosticadas com Transtorno Autista e Transtorno de Asperger Samantha Santos de Albuquerque Maranhão Natal 2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA

Caracterização de aspectos da cognição social, habilidades sociais e funções

executivas de crianças diagnosticadas com Transtorno Autista e Transtorno de

Asperger

Samantha Santos de Albuquerque Maranhão

Natal

2014

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Samantha Santos de Albuquerque Maranhão

Caracterização de aspectos da cognição social, habilidades sociais e funções

executivas de crianças diagnosticadas com Transtorno Autista e Transtorno de

Asperger

Dissertação elaborada sob orientação da

Profª. Drª. Izabel Hazin e apresentada ao

Programa de Pós-Graduação em Psicologia

da Universidade Federal do Rio Grande do

Norte, como requisito parcial para a

obtenção do título de Mestre e Psicologia.

Natal

2014

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Agradecimentos

À Nossa Senhora, por sempre iluminar e abençoar meus passos;

Aos meus pais, meu porto seguro, cujo imenso apoio fez valer cada segundo desse

percurso;

Ao meu marido, cujo imenso apoio e experiência no âmbito acadêmico trouxeram

contribuições importantes para o delineamento da dissertação;

A minha orientadora Izabel Hazin pela competência e profissionalismo com que conduziu

este trabalho, sem, no entanto, esquecer-se da delicadeza, do incentivo e do carinho que

permeiam as relações entre sujeitos;

Aos colegas do Laboratório de Pesquisa e Extensão em Neuropsicologia (LAPEN),

especialmente as integrantes Artemis de Paula e Priscila Magualhães com quem compartilhei

momentos árduos e de conquistas deste percurso;

Aos meus amigos de graduação, em especial Miliana Galvão, Nívia Andrade e Rafaele

Pinheiro. Antes mesmo de ingressar na Pós-graduação em Psicologia, compartilhávamos

angústias e sonhos;

As crianças participantes e pais pela disponibilidade e convivência durante os meses de

realização do estudo;

Ao Núcleo de Atendimento Neuropsicológico Infantil Interdisciplinar (NANI), pela ajuda

com a correção dos questionários do Child Behavior Checklist (CBCL), em especial à

professora Cláudia Berlim de Mello e à André Luiz Sousa;

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pela

concessão da bolsa de estudos e pelo apoio e incentivo à pesquisa.

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Sumário

Lista de Tabelas ......................................................................................................................... 6

Lista de Figuras .......................................................................................................................... 9

Lista de Siglas e Abreviaturas .................................................................................................. 12

RESUMO ................................................................................................................................. 13

ABSTRACT ............................................................................................................................. 14

Considerações iniciais:............................................................................................................. 15

Capítulo 1: O Autismo e o percurso histórico do conceito diagnóstico .................................. 21

Capítulo 2: O perfil neuropsicológico do Transtorno Autista e Transtorno de Asperger . 34

Capítulo 3: A defectologia de Vygotsky e reflexões sobre o conceito diagnóstico do Autismo

.................................................................................................................................................. 57

Capítulo 4: Neuropsicologia – fragmentos históricos e premissas de base ............................. 60

Capítulo 5: A neuropsicologia de Luria (1902-1977) .......................................................... 64

Capítulo 6: A neuropsicologia de Luria e contribuições para o delineamento do desenho

metodológico da dissertação em vigor ..................................................................................... 68

Objetivos: ................................................................................................................................. 73

Método: .................................................................................................................................... 74

Resultados: ............................................................................................................................... 90

Criança 1 – Pseudônimo Andy – Transtorno Autista: ............................................................. 90

Criança 2 – Pseudônimo Cauê – Transtorno Autista ............................................................. 113

Criança 3 – Pseudônimo Amy Rose – Transtorno Autista: ................................................... 133

Criança 4 – Pseudônimo Jake – Transtorno de Asperger: ..................................................... 154

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Criança 5 – Pseudônimo Hugo – Transtorno de Asperger: ................................................... 174

Criança 6 – Pseudônimo Max – Transtorno de Asperger: ..................................................... 195

Discussão: .............................................................................................................................. 217

Considerações finais: ............................................................................................................. 242

Referências bibliográficas:..................................................................................................... 244

Anexos ................................................................................................................................... 256

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Lista de Tabelas

Tabela 1: características das crianças avaliadas ....................................................................... 74

Tabela 2: instrumentos utilizados ............................................................................................ 76

Tabela 3: domínios cognitivos e testes do NEPSY-II utilizados na pesquisa .......................... 86

Tabela 4: resultados quantitativos de Andy no MPCR .......................................................... 101

Tabela 5: resultados quantitativos de Andy na prova de atenção auditiva e conjunto de

respostas (NEPSY-II)............................................................................................................. 102

Tabela 6: resultados quantitativos de Andy na prova Classificando Animais (NEPSY-II) .. 103

Tabela 7: resultados quantitativos de Andy na prova Fluência de Desenhos (NEPSY-II) .... 103

Tabela 8: resultados quantitativos de Andy na prova Inibindo Resposta (NEPSY-II) .......... 103

Tabela 9: resultados quantitativos de Andy na prova Relógios (NEPSY-II)......................... 104

Tabela 10: resultados quantitativos de Andy na prova Teoria da Mente (NEPSY-II) .......... 109

Tabela 11: resultados quantitativos do Cauê no MPCR ........................................................ 123

Tabela 12: resultados quantitativos do Cauê na prova de atenção auditiva e conjunto de

respostas (NEPSY-II)............................................................................................................. 125

Tabela 13: resultados quantitativos do Cauê na prova Classificando Aninais (NEPSY-II) .. 125

Tabela 14: resultados quantitativos do Cauê na prova Fluência de Desenhos (NEPSY-II) .. 126

Tabela 15: resultados quantitativos do Cauê na prova Inibindo Resposta (NEPSY-II) ........ 126

Tabela 16: resultados quantitativos do Cauê na prova Relógios (NEPSY-II) ....................... 127

Tabela 17: resultados quantitativos do Cauê na prova Teoria da Mente (NEPSY-II) ........... 131

Tabela 18: resultados quantitativos da Amy no MPCR ......................................................... 142

Tabela 19: resultados quantitativos da Amy na prova Atenção Auditiva e Conjunto de

Respostas (NEPSY-II) ........................................................................................................... 144

Tabela 20: resultados quantitativos da Amy na prova Classificando Animais (NEPSY-II) . 144

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Tabela 21: resultados quantitativos da Amy na prova Fluência de Desenhos (NEPSY-II) ... 145

Tabela 22: resultados quantitativos da Amy na prova Inibindo Resposta (NEPSY-II) ......... 145

Tabela 23: resultados quantitativos da Amy na prova Relógios (NEPSY-II) ....................... 146

Tabela 24: resultados quantitativos da Amy na prova Teoria da Mente (NEPSY-II) ........... 151

Tabela 25: resultados quantitativos do Jake no MPCR ......................................................... 162

Tabela 26: resultados quantitativos do Jake na prova Atenção Auditiva e Conjunto de

Respostas (NEPSY-II) ........................................................................................................... 164

Tabela 27: resultados quantitativos do Jake na prova Classificando Animais (NEPSY-II) .. 164

Tabela 28: resultados quantitativos do Jake na prova Fluência de Desenhos (NEPSY-II) ... 164

Tabela 29: resultados quantitativos do Jake na prova Inibindo Resposta (NEPSY-II) ......... 165

Tabela 30: resultados quantitativos do Jake na prova Relógios (NEPSY-II) ........................ 166

Tabela 31: resultados quantitativos do Jake na IMHSC-Del-Prette (Perfil Geral) ................ 169

Tabela 32: resultados quantitativos do Jake na IMHSC-Del-Prette (Indicadores e Reações)

................................................................................................................................................ 169

Tabela 33: resultados quantitativos do Jake na IMHSC-Del-Prette (Indicadores e Reações –

subescalas) ............................................................................................................................. 169

Tabela 34: resultados quantitativos do Jake na IMHSC-Del-Prette (Indicadores e Reações –

valor de cada item) ................................................................................................................. 171

Tabela 35: resultados quantitativos do Jake na prova Teoria da Mente (NEPSY-II) ............ 171

Tabela 36: resultados quantitativos do Hugo no MPCR ........................................................ 183

Tabela 37: resultados quantitativos do Hugo na prova Atenção Auditiva e Conjunto de

Respostas (NEPSY-II) ........................................................................................................... 184

Tabela 38: resultados quantitativos do Hugo no Classificando Animais .............................. 184

Tabela 39: resultados quantitativos do Hugo na prova Fluência de Desenhos (NEPSY-II) . 185

Tabela 40: resultados quantitativos do Hugo na prova Inibindo Respostas (NEPSY-II) ...... 185

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Tabela 41: resultados quantitativos do Hugo na prova Relógios (NEPSY-II) ...................... 186

Tabela 42: resultados quantitativos de Hugo no IMHSC-Del-Prette – Perfil Geral .............. 189

Tabela 43: resultados quantitativos do Hugo no IMHSC-Del-Prette – Indicadores e Reações

................................................................................................................................................ 189

Tabela 44: resultados quantitativos do Hugo no IMHSC-Del-Prette – Indicadores e Reações,

subescalas ............................................................................................................................... 189

Tabela 45: resultados quantitativos do Hugo no IMHSC-Del-Prette – Indicadores e Reações,

valor de cada item .................................................................................................................. 191

Tabela 46: resultados quantitativos do Hugo na prova Teoria da Mente (NEPSY-II) .......... 192

Tabela 47: resultados quantitativos do Max no MPCR ......................................................... 204

Tabela 48: resultados quantitativos do Max na prova Atenção Auditiva e Conjunto de

Respostas (NEPSY-II) ........................................................................................................... 205

Tabela 49: resultados quantitativos do Max na prova Classificando Animais (NEPSY-II) .. 206

Tabela 50: resultados quantitativos do Max na prova Fluência de Desenhos (NEPSY-II) ... 206

Tabela 51: resultados quantitativos do Max na prova Inibindo Respostas (NEPSY-II)........ 206

Tabela 52: resultados quantitativos do Max na prova Relógios (NEPSY-II) ........................ 207

Tabela 53: quantitativos na prova Teoria da Mente (NEPSY-II) .......................................... 214

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Lista de Figuras

Figura 1: Hans Asperger em atendimento clínico.................................................................... 25

Figura 2: Diagrama de Luria .................................................................................................... 70

Figura 3: exemplo de um problema do MPCR série Ab .......................................................... 78

Figura 4: exemplo do teste teoria da mente, tarefa contextual ................................................ 83

Figura 5: extrato do desenho figurativo produzido por Andy.................................................. 95

Figura 6: desenho com tema “Eu e minha família”, produzido por Andy ............................... 95

Figura 7: resultado do Andy na Escala de Competências Sociais (CBCL) ............................. 97

Figura 8: resultado do Andy na Escala de Síndromes (CBCL) ............................................... 98

Figura 9: resultado do Andy na Escala de Problemas Totais (CBCL) .................................... 99

Figura 10: resultado do Andy na Escala Orientada pelo DSM-IV (CBCL) .......................... 100

Figura 11: extrato do teste Fluência de Desenhos (NEPSY-II), parte estruturara, produzido

por Andy ................................................................................................................................ 106

Figura 12: extrato do teste Fluência de Desenhos (NESPY-II), parte aleatória, produzido por

Andy ....................................................................................................................................... 106

Figura 13: extrato do teste Relógios (NEPSY-II), item 1, produzido por Andy ................... 107

Figura 14: extrato do teste Relógios (NEPSY-II), itens 9 e 10, produzido por Andy ........... 108

Figura 15: desenho história do Cauê com tema “Eu e minha família” .................................. 116

Figura 16: desenho história do Cauê com tema “Eu e minha escola” ................................... 117

Figura 17: resultado do Cauê na Escala de Competências Sociais (CBCL) .......................... 119

Figura 18: resultado do Cauê na Escala de Síndromes (CBCL) ............................................ 120

Figura 19: resultado do Cauê na Escala de Problemas Totais (CBCL) ................................. 121

Figura 20: resultado do Cauê na Escala Orientada pelo DSM-IV (CBCL) ........................... 122

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Figura 21: extrato do item 8, série B, respondido por Cauê no MPCR ................................. 124

Figura 22: extrato dos itens 1 e 2 (teste Relógios, NEPSY-II) produzido por Cauê – horários

de 3h e 11:10h ........................................................................................................................ 129

Figura 23: dos itens 3 e 4 (teste Relógios, NEPSY-II) produzido por Cauê ......................... 130

Figura 24: extrato dos itens 9 e 10 (teste Relógios, NEPSY-II) produzido por Cauê ........... 130

Figura 25: desenho história da Amy com o tema "Eu e minha família" ................................ 137

Figura 26: desenho história da Amy com o tema "Eu e minha escola" ................................. 138

Figura 27: resultado da Amy na Escala de Competências Sociais (CBCL) .......................... 139

Figura 28: resultado da Amy na Escala de Síndromes (CBCL) ............................................ 140

Figura 29: resultado da Amy na Escala de Problemas Totais (CBCL) .................................. 140

Figura 30: resultado da Amy na Escala de Orientada pelo DSM-IV (CBCL) ....................... 142

Figura 31: extrato do teste Fluência de Desenho, parte estruturada, produzido por Amy ..... 148

Figura 32: extrato do teste Relógios, item 2, produzido por Amy – horário 11:10 ............... 149

Figura 33: extrato do teste Relógios, itens 3 e 4, produzido por Amy .................................. 150

Figura 34: extrato do teste Relógios, itens 9 e 10, produzido por Amy ................................ 151

Figura 35: resultado do Jake na Escala de Competências Sociais (CBCL) ........................... 158

Figura 36: resultado do Jake na Escala de Síndromes (CBCL) ............................................. 159

Figura 37: resultado do Jake na Escala de Problemas Totais (CBCL) .................................. 160

Figura 38: resultado do Jake na Escala Orientada pelo DSM-IV (CBCL) ............................ 162

Figura 39: extrato do item 1, teste Relógios (NEPSY-II), produzido por Jake – horário 3h . 168

Figura 40: desenho livro produzido por Jake, animal ............................................................ 168

Figura 41: desenho livro produzido por Jake, Angry Birds ................................................... 169

Figura 42: desenho do Hugo com tema “Eu e minha escola”................................................ 177

Figura 43: desenho do Hugo com tema “Eu e minha família” .............................................. 178

Figura 44: resultado do Hugo na Escala de Competências Sociais ....................................... 180

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Figura 45: resultado do Hugo na Escala de Síndromes ......................................................... 181

Figura 46: resultado do Hugo na Escala de Problemas Totais (CBCL) ................................ 181

Figura 47: resultado do Hugo na Escala Orientada pelo DSM-IV (CBCL) .......................... 182

Figura 48: extrato do teste Relógios (NEPSY-II), item 2, produzido por Hugo ................... 188

Figura 49: extrato do teste Relógios (NEPSY-II), itens 9 e 10, produzido por Hugo ........... 189

Figura 50: desenho história do Max sobre o tema "Eu e minha família" .............................. 198

Figura 51: resultado do Max na Escala de Competências Sociais (CBCL) ........................... 201

Figura 52: resultado do Max na Escala de Síndromes (CBCL) ............................................. 202

Figura 53: resultado do Max na Escala de Problemas Totais (CBCL) .................................. 202

Figura 54: resultado do Max na Escala Orientada pelo DSM-IV(CBCL) ............................. 203

Figura 55: extrato do Max referente aos itens 9 e 10 do teste Relógios (NEPSY-II) ............ 210

Figura 56: parágrafo produzido pelo Max sobre o tema “Eu e minha escola” ...................... 211

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Lista de Siglas e Abreviaturas

CID Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde

CBCL Child Behavior Checklist

DSM Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais

DSM-IV-TR Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – 4ª edição revisada

DSM-V Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – 5ª edição

IMHSC-Del-Prette Inventário Multimídia de Habilidades Sociais para Crianças

MPCR Matrizes Progressivas Coloridas de Raven

NEPSY-II A Developmental Neuropsychological Assessment – 2ª edição

TA Transtorno de Asperger

TEA Transtorno do Espectro do Autismo

TGD Transtorno Global do Desenvolvimento

SEPA Serviço de Psicologia Aplicada da UFRN

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Resumo

O ano de 2013 marca o 70º aniversário da descrição clássica de Leo Kanner sobre o Autismo.

Em 1994, na quarta edição do Manual Diagnostico e Estatístico de Transtornos Mentais

(DSM), o autismo foi incluído em uma nova classe diagnóstica denominada Transtornos

Globais do Desenvolvimento (TGD), os quais incluem: o Transtorno Autista, Transtorno de

Rett, Transtorno Desintegrativo da Infância, Transtorno Global do Desenvolvimento sem

outra especificação e o Transtorno de Asperger. O DSM apresenta critérios bem específicos

que diferenciam os TGD, no entanto, estudos médicos discutem se o Transtorno de Asperger

(TA) compõe o Transtorno Autista, ou se é qualitativamente distinto. Discute-se a reduzida

validação empírica dos critérios diagnósticos concernentes ao TA. Nessa perspectiva, o DSM

ganhou uma quinta e polêmica revisão no ano de 2013. A polêmica mudança centra-se na

substituição de uma análise diagnóstica categorial para uma abordagem dimensional, a qual

evidencia que a maior parte dos problemas psicopatológicos da infância e adolescência

manifesta-se em um contínuo de frequência e intensidade. Diante da mudança na quinta

edição do DSM, o presente estudo deparou-se com a problemática identificada no âmbito

clínico e científico, qual seja, a heterogeneidade sintomática presente no espectro autista e,

por conseguinte, as dissonâncias no estabelecimento de características clínicas e

neuropsicológicas do espectro. Amparado pelo legado teórico de Luria, buscou-se clarificar o

perfil da cognição social, comportamento, sócio afetividade e funções executivas em crianças

com diagnóstico de Transtorno Autista e Transtorno de Asperger, conforme critérios

estabelecidos pelo quarta edição revisada do DSM. Para operacionalização dos objetivos

propostos, propôs-se estudo multicasos de seis crianças. O processo avaliativo foi composto

por anamnese com os pais, entrevista com a escola e protocolo avaliativo composto por

tarefas qualitativas e instrumentos psicométricos. A avaliação neuropsicológica realizada foi

guiada pela análise clínica-processual, conforme pressuposto teórico de Luria. No tocante aos

resultados, foi possível identificar dificuldades nos relacionamentos sociais e no cotidiano

escolar das crianças avaliadas. De modo interdependente, falhas na teoria da mente, nas

funções executivas e na linguagem versam como principais fragilidades neuropsicológicas

dos grupos clínicos vigentes, notadamente do grupo que compõe o Transtorno Autista. Os

resultados encontrados demonstram que a cognição social e a habilidade social estão

altamente relacionadas. Ainda que se reconheçam as limitações inerentes à proposição de

pesquisas neuropsicológicas de vertente clínica/sócio histórica, acredita-se que o desenho

metodológico possibilitou compreender características neuropsicológicas das crianças

avaliadas, sem limitar-se à mera descrição. Espera-se que pais, profissionais clínicos e

instituições sociais, como a escola, compreendam a forma de individuação do TGD,

antes de classificarem ou proporem tratamentos as crianças.

Palavras-chave: Psicologia Sócio Histórica, Luria, Espectro Autista, Avaliação

Neuropsicológica

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Abstract

The year 2013 marks the 70th anniversary of the classic description by Leo Kanner on

Autism. In 1994, the fourth edition of the Diagnostic and Statistical Manual of Mental

Disorders (DSM), the autism was included in a new diagnostic class called Pervasive

Developmental Disorders (PDD), which include: Autistic Disorder, Rett's Disorder,

Childhood Disintegrative Disorder, Pervasive Developmental Disorder not otherwise

specified and Asperger's Disorder. The DSM has very specific criteria that differentiate IGT,

however, medical studies discuss whether Asperger's Disorder (TA) consists Autistic

Disorder, or if it is qualitatively distinct. Discusses the reduced empirical validation of

diagnoses pertaining to the TA. In this perspective, the fifth DSM won a controversial

revision in 2013. The controversial change focuses on the replacement of a categorical

diagnostic analysis for a dimensional approach, which shows that most of the

psychopathological problems of childhood and adolescence manifested in a continuum of

frequency and intensity. Given the change in the fifth edition of the DSM, the present study

was faced with the problems identified in the clinical and scientific scope, ie, symptomatic

heterogeneity present in the autistic spectrum and, therefore, the dissonances in establishing

clinical and neuropsychological characteristics spectrum. Upheld by the theoretical legacy of

Luria, we sought to clarify the profile of social cognition, behavior, social affection and

executive functions in children diagnosed with Autistic Disorder and Asperger's Disorder,

according to criteria established by the revised fourth edition of the DSM. Although they

acknowledge the limitations inherent in the proposition of clinical neuropsychological

research strand / historical partner, it is believed that the study design allowed us to

understand neuropsychological characteristics, without limiting himself to the mere

description. For operationalization of the proposed objectives, we proposed multi-case study

of six children. The evaluation process consisted of anamnesis with parents, interviews with

school and evaluative protocol using qualitative tasks and psychometric instruments.

Neuropsychological validation was performed guided by clinical-procedural analysis as

theoretical assumption of Luria. Regarding the results, it was possible to identify difficulties

in social relationships and in everyday school life of children assessed. Versam main

neuropsychological weaknesses in existing clinical groups, especially the group that makes

up Autistic Disorder. The results show that social cognition and social skills are highly

related. It is hoped that parents, clinicians and social institutions such as school, understand

how the individuation of TGD before classifying children or propose treatments.

Keywords: Historical-Cultural Psychology, Luria, Autistic Spectrum, Neuropsychological

Assessment

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Considerações iniciais:

Quem pode traçar, em um arco-íris, uma linha que marca o fim do tom violeta e o

começo do tom laranja? A diferença de cor é muito clara, mas quem pode dizer qual o lugar

exato em que um se torna o outro? (Melville, 1891, p. 233).

O ano de 2013 marca o 70º aniversário da descrição clássica de Leo Kanner sobre o

Autismo. Os nomes “autismo” e “autista” derivam do grego “autos”, que significa eu/self. O

termo “autismo” foi utilizado pela primeira vez em 1911, quando Eugen Bleuler o

empregou para descrever uma característica específica da esquizofrenia, segundo a qual

um indivíduo se recolheria do mundo exterior para se refugiar em si mesmo (Frith, 2003;

Pacheco, 2012; Sicile-Kira, 2003).

Baseado na esquizofrenia descrita por Bleuler, em 1943, o chefe do serviço de psiquiatria

infantil do Johns Hopkins Hospital de Baltimore, Leo Kanner, publicou artigo intitulado “Os

distúrbios autísticos do contato afetivo”. Ele descreveu onze crianças, cujo distúrbio

patognomônico seria “a incapacidade de se relacionarem de maneira normal com pessoas e

situações, desde o princípio de suas vidas” (Kanner, 1943, p. 242).

Durante a década de 1970, tornou-se claro que o autismo era uma condição distinta da

esquizofrenia, com forte componentes genéticos e neurobiológicos. Na época, o extenso

trabalho empírico visando à construção e validação de critérios diagnósticos explícitos

resultou na descrição do autismo na terceira edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de

Transtornos Mentais - DSM (Volkmar, Reichow, & McPartland, 2012).

Tanto na primeira (1952) quanto na segunda (1968) edição do DSM, os termos "autismo"

e "autista" designavam comportamentos típicos da esquizofrenia. Em 1980, a terceira edição

do manual introduziu o termo “Autismo Infantil”. Já em 1994, na quarta edição do DSM, o

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autismo foi incluído em uma nova classe diagnóstica denominada Transtornos Globais do

Desenvolvimento (TGD), os quais incluem: o Transtorno Autista, Transtorno de Rett,

Transtorno Desintegrativo da Infância, Transtorno Global do Desenvolvimento sem outra

especificação e o Transtorno de Asperger (APA, 1994).

Desde então, o Transtorno de Asperger (TA) emerge como categoria diagnóstica dos

TGD. A congruência dos critérios clínicos com o CID-10 desencadeou uma explosão de

publicações científicas (350 em 1993 para mais de 2100 em 2011), sem perder de vista o

crescente interesse pelo estudo do TA. Kite, Gullifer and Tyson (2013) informam que, até o

início de 2012, havia no Google mais de 9¹/² milhões de tópicos sobre o TA (Mahjouri &

Lord, 2012; Volkmar, 2013; Volkmar & Reichow, 2013).

Rutter (2005) ressalta a ampliação do diagnóstico do autismo nos últimos quarenta anos.

Esta mudança ocorreu não pela determinação de características sintomatológicas de um único

distúrbio, mas pela introdução da ideia de um espectro, conhecido como Autism Spectrum

Disorder (ASD), ou Transtorno do Espectro do Autismo (TEA).

Nesta perspectiva, o DSM ganhou uma quinta e polêmica revisão no ano de 2013. A

polêmica mudança centra-se na substituição de uma análise diagnóstica categorial para uma

abordagem dimensional, a qual evidencia que a maior parte dos problemas psicopatológicos

da infância e adolescência manifesta-se em um continuum de frequência e intensidade. Assim

como Melville (1891) discute os nuances nas delimitações das cores do arco-íris, a

abordagem dimensional leva à reflexão do modo pelo qual será possível discernir os nuances

de grupos clínicos e, consequentemente, as repercussões para a sociedade.

A abordagem dimensional do DSM-V propõe evidenciar um continuum de frequência e

intensidade de características clínicas autistas. Conforme Rutter (2011), a mudança está

relacionada à constituição diagnóstica do espectro autista, cuja caracterização clínica

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contínua substitui a atual diferenciação diagnóstica dos Transtornos Globais do

Desenvolvimento (DSM-IV).

Desde a década de 1940, descrições clínicas dos TGD esbarram-se na heterogeneidade

sintomática. O acervo histórico demonstra que, de modo independente, Kanner (1943) e

Asperger (1944) apresentaram denominações homônimas para descrições peculiares de

crianças em faixa etárias aproximadas. Enquanto o pediatra austríaco com interesse em

educação especial, Hans Asperger, denominou suas descrições como “psicopatia autística”;

Kanner (1943) as denominou de “distúrbio autístico inato do contato afetivo” (Editorial Brain

and Cognition, 2006; E. Salle, Sukiennik, A. Salle, Onófrio, & Zuchi, 2005; Montero, 2009;

Sanders, 2009; Schwartzman, Orsati, & Macedo, 2008).

Ambos descreveram pacientes com alterações do comportamento, da linguagem e das

habilidades cognitivas imprescindíveis para aprendizagem e interação social, porém, as

tentativas iniciais de comparar as duas condições foram difíceis devido às grandes diferenças

nos pacientes descritos. A conceitualização de Asperger foi influenciada pelos relatos de

esquizofrenia e de transtornos de personalidade, ao passo que Kanner foi influenciado pelo

trabalho de Arnold Gesell e sua abordagem de desenvolvimento (Editorial Brain and

Cognition, 2006; E. Salle et al., 2005; Frith, 2004; Klin, 2006; Klin, Pauls, Schultz, &

Volkmar, 2005; Montero, 2009; Sanders, 2009).

O DSM-IV e CID-10 apresentam critérios bem específicos que diferenciam os

Transtornos Globais/Invasivos do Desenvolvimento; bem como há definição consensual para

o Transtorno de Asperger (TA). No entanto, estudos médicos discutem se o TA compõe o

Transtorno Autista, ou se é qualitativamente distinto. Discute-se a reduzida validação

empírica dos critérios diagnósticos concernentes ao TA (Editorial Brain and Cognition, 2006;

Frith, 2004; Klin, 2006; Klin et al., 2005; Leão & Aguiar, 2005; Montero, 2009; Sanders,

2009; Schnur, 2005; Schwartzman et al., 2008; Planche & Lemonnier, 2012).

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Diante da mudança no DSM-V, o presente estudo depara-se com a problemática

identificada no âmbito clínico e científico, qual seja, a heterogeneidade sintomática presente

no espectro autista e, por conseguinte, as dissonâncias no estabelecimento de características

clínicas e neuropsicológicas do espectro (Assumpção, 2005; Carmargos, 2005; Editorial

Brain and Cognition, 2006; Frith, 2004; Klin, 2006; Klin et al., 2005; Sanders, 2009; Schnur,

2005; Schwartzman et al., 2008; Planche & Lemonnier, 2012).

Isto posto, o presente estudo teve como objetivo avaliar aspectos da cognição social,

habilidades sociais e funções executivas de crianças com diagnóstico de Transtorno Autista e

Transtorno de Asperger, conforme os critérios estabelecidos pela quarta edição revisada do

DSM (DSM-IV-TR).

De acordo com Sasson, Nowlin and Pinkham (2013) a cognição social denota processos

cognitivos que mediam experiências sociais. Trata-se da decodificação, processamento e

interpretação de informações sociais associadas, por exemplo, a linguagem corporal,

reconhecimento de faces, reconhecimento de emoções e teoria da mente.

A cognição social entrelaça-se com capacidade de inferir representações mentais em

estreita relação com a linguagem, reconhecimento de emoções e funções executivas,

notadamente quando exigidos dentro de um contexto dinâmico pautado em relações sociais

(Baron-Cohen, 1995).

Por sua vez, entende-se por habilidades sociais um conjunto de habilidades interpessoais

que aumentam a eficácia de um indivíduo em situações sociais. Constituem comportamentos

sociais habilidosos ou não habilidosos. Níveis elevados de habilidades sociais levam ao maior

sucesso no relacionamento com os colegas e ambientes acadêmicos, ao passo que déficits de

habilidades sociais têm sido associados a uma série de comportamentos mal adaptativos

(Lamont & Horn, 2013).

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Sasson e colaboradores (2013) demonstraram que a cognição social e a habilidade social

estão altamente correlacionadas. Déficits em habilidades associadas à cognição social

(reconhecimento de emoções e teoria da mente, por exemplo) constituem significativa

contribuição para a baixa qualidade das habilidades sociais de indivíduos inseridos no

espectro autista. Eles ainda ratificam Baron-Cohen (1995) ao relevar que tal correlação não

depende do desempenho intelectivo.

Destarte, amparado pelo legado teórico de Luria e Vygotsky, buscou-se clarificar

aspectos da cognição social, das habilidades sociais e funções executivas característicos do

Transtorno Autista e do Transtorno de Asperger. Ainda que se reconheçam as limitações

inerentes à proposição de pesquisas neuropsicológicas de vertente clínica/sócio histórica,

acredita-se que o desenho metodológico possibilitou compreender características

neuropsicológicas, sem limitar-se à mera descrição.

Posteriormente, avançou-se para análises explicativas, que tentaram abarcar a

complexidade do fenômeno investigado a partir da utilização de um sistema nervoso

conceitual, cuja perspectiva processual e dialógica norteará possíveis integrações do

desenvolvimento individual com particularidades do contexto sócio-histórico-cultural

(Akhutina & Pylaeva, 2011; Freitas, 2002; Haase et al., 2008; Hazin et al., 2010).

Destaca-se a importância deste estudo para profissionais, familiares e indivíduos

diagnosticados com Transtorno Autista ou Transtorno de Asperger (DSM-IV-TR). Acredita-

se que a apresentação dos pontos fortes, fracos e característicos dos transtornos citados

favoreça o delineamento de intervenções clínicas, sob as quais há a preocupação de dissociar

a gravidade do sintoma do comprometimento funcional; sem perder de vista considerações

acerca das potencialidades que o indivíduo possui para exercer, ou lapidar, sua participação

em atividades cotidianas (Novelli & Canon, 2012).

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Como parte complementar, espera-se que a presente pesquisa também tenha contribuído

para problematizar os critérios clínicos vigentes no DSM-V para o diagnóstico do Transtorno

do Espectro do Autismo.

Almeja-se que os resultados obtidos por este estudo constituam massa crítica importante

para proposição de discussões nacionais acerca da sensibilidade e especificidade do DSM-IV-

TR e DSM-V; sobretudo em virtude da atual polêmica diante à eliminação da distinção entre

Transtorno Autista e Transtorno de Asperger para diagnóstico do Transtorno do Espectro do

Autismo.

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Capítulo 1: O Autismo e o percurso histórico do conceito diagnóstico

A apreciação da história permite visualizar o processo de descoberta e aprimoramento das

características comportamentais congruentes ao autismo. Relatos de crianças com

características comportamentais consonantes ao que atualmente denomina-se espectro autista

advêm dos primórdios da civilização escrita (Rosenberg, 2011).

Os contos de fada, antes de ser a antítese do real, compõem a forma de interpretar a

realidade. No início do século XVII, há a identificação de contos de fada europeus e chineses

que remetem histórias homônimas de enfants fadas (The changeling) – crianças, comumente

do sexo masculino, raptadas por fadas ou gnomos. Nesses contos, a criança é raptada e

substituída por outra idêntica fisicamente, porém, oposta no modo de ser e estar no mundo.

Tal rapto ocorreria quando a criança ainda era pequena e a mãe não o notaria imediatamente.

Com decorrer do tempo, ela estranharia, pois a criança deixaria de ser afetiva e passaria a

ignorá-la (Rosenberg, 2011).

Em 1801, foi encontrado nos boques de Caune, na região de Aveyron (França), um

menino de 11 a 12 anos de idade que andava nu em meio aos lobos com os quais vivia. Aos

cuidados do médico Jean Marc Itard, o menino recebeu o nome de Victor de Aveyron

(L‘enfant sauvage), cujas descrições clínicas assemelham-se a um caso típico do Transtorno

Autista (DSM-IV-TR), bem como faz valer a discussão sobre a importância da linguagem

para a constituição da subjetividade do ser humano.

Em 1809, John Haslam publicou suas “observações sobre a loucura e a melancolia”

(idem). Neste livro há a descrição de casos clínicos sobre crianças, dentre os quais destaca-se

o caso de W.H. – menino de aproximadamente 7 anos de idade que começou a falar após o

quarto ano de vida e, aos 5 anos, falava como se tivesse de 2 a 3 anos de idade. W.H. se

mantinha distante das crianças de sua idade; não brincava com elas; e apresentava ecolalia

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tardia a respeito de seus soldados de chumbo. No livro em questão, Haslam (1809) também

se refere a uma criança agressiva e incontrolável que rasgava roupas, quebrava todos os

objetos que lhe eram apresentados e se opunha a comer. Conforme o autor, esta criança agia

como se fosse surda e de forma opositora.

Em 1832, Anselm Ritter Von Feuerbach relata o caso de Kaspar Hauser, intitulado “crime

na alma de um homem” (idem). O autor descreve com objetividade o estranho

comportamento de Kaspar – menino de aproximadamente 16 anos de idade que vivera em um

porão isolado sem contato verbal com outros indivíduos. Segundo descrições de Feuerbach

(1832), Kaspar não conseguia estabelecer diálogo por longo período de tempo, mas repetia a

frase: “quero ser um cavaleiro como meu pai”.

Nos primórdios da psiquiatria, na virada do século XVIII para o XIX, o diagnóstico de

“idiotia” embasava o campo da psicopatologia de crianças e adolescentes. A idiotia pode ser

considerada a condição clínica precursora, não só da atual deficiência intelectiva, mas

também das psicoses infantis, da esquizofrenia infantil e do Transtorno do Espectro do

Autismo – DSM-V (Bercherie, 2001).

A partir do século XX, os psiquiatras passam a destacar as particularidades do que

denominaram “demências precoces e precocíssimas” (idem). Pode-se considerar que as

primeiras descrições de psicoses especificamente infantis incluíram a dementia precocissima,

pelo italiano De Sanctis, em 1906 e 1908, e a dementia infantilis pelo austríaco Heller, em

1908. Ambas tendo como referência a dementia praecox do alemão Emil Kraepelin (Kanner,

1971; Wing, 1997).

Em 1911, o psiquiatra suíço Eugen Bleuler apresentou e discutiu seis casos clínicos

denominados de esquizofrenia infantil, nos quais os sintomas emergiam antes da puberdade,

assim como incluíam alterações no comportamento, falta de conexão emocional e ausência de

integração com o ambiente. Eugen Bleuler empregou o termo autismo para descrever uma

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característica específica da esquizofrenia, segundo a qual um indivíduo se recolheria do

mundo exterior para se refugiar em si mesmo.

Baseado na esquizofrenia descrita por Bleuler, em 1943, o chefe do serviço de psiquiatria

infantil do Johns Hopkins Hospital de Baltimore, Leo Kanner, publicou artigo intitulado “Os

distúrbios autísticos do contato afetivo”. Ele descreveu onze crianças, cujo distúrbio

patognomônico seria “a incapacidade de se relacionarem de maneira normal com pessoas e

situações, desde o princípio de suas vidas” (Kanner, 1943, p. 242).

Tais crianças eram descritas como apresentando “isolamento autístico extremo” (idem).

Ao catalogar relatos dos pais dessas crianças, Kanner concluiu que, desde os primeiros anos

de vida, elas negligenciam, ignoram ou recusam o contato com o ambiente. As mães

comumente recordavam que o filho não apresentara atitude corporal antecipatória, ou seja,

não inclinara o rosto nem movera os ombros antes de ser levado ao colo. De modo geral, os

problemas na aquisição da fala costumavam retratar os primeiros sinais inequívocos de que

algo estava errado (Kanner, 1943).

A linguagem verbal não tinha função comunicativa. Há descrição de reunião de palavras

sem ordenação e aparentemente sem sentido, ou de repetições de informações decoradas,

como listas de animais, presidentes ou trechos de poemas. As crianças também tinham

dificuldades em generalizar conceitos, tendendo a usá-los de modo literal e associados ao

contexto no qual foram ouvidos pela primeira vez. Até os cinco ou seis anos de idade,

apresentavam ecolalia e não usavam o pronome ‘eu’ para se referirem a si mesmas. Para

manifestarem um desejo ou aquiescência repetiam, com a mesma entonação, a frase ou

pergunta que haviam escutado de outrem (Kanner, 1943).

Segundo Kanner (1943), tudo que vinha do exterior era experimentado por essas crianças

como uma “intrusão assustadora” (ibidem), o que explicava não só a tendência a ignorar o

que lhes era perguntado, mas também a recusa de alimentos e o desespero provocado por

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barulhos fortes ou objetos em movimento. Os ruídos ou movimentos repetidos produzidos

por elas próprias, entretanto, não eram acompanhados de manifestações de desespero. Kanner

(1943) descreveu um “desejo obsessivo e ansioso pela manutenção da uniformidade”

(ibidem), levando à preferência por tudo que se mostrava repetitivo, rotineiro e esquemático.

Havia sempre uma boa relação com os objetos, especialmente aqueles que não

modificavam sua aparência e posição. As relações com as pessoas, por outro lado, estavam

gravemente perturbadas. Por vezes, se dirigia a partes do corpo dos outros, com o objetivo de

retirar um pé ou um braço que funcionava como obstáculo ao que queria alcançar. Não

olhavam os outros no rosto. Aparentemente não se interessavam pelo que os adultos

conversavam.

Todavia, no decorrer do artigo, Kanner (1943) contrapunha-se sobre as origens do quadro

clínico. Defendia uma “incapacidade inata de estabelecer o contato afetivo habitual e

biologicamente previsto com as pessoas, exatamente como as outras crianças vêm ao mundo

com deficiências físicas ou intelectuais inatas” (ibidem). Por outro lado, sugeriu que os

problemas dos filhos teriam alguma articulação com a personalidade dos pais e o tipo de

relações precoces estabelecidas entre eles e a criança.

Um ano após a publicação de Kanner, o pediatra austríaco, Hans Asperger (1906-1980),

junto com colaboradores do Hospital Universitário Infantil de Viena, desenvolveu ambicioso

programa de reabilitação pautado na terapia da linguagem, da representação teatral e da

educação física. Asperger (1944) seguiu o termo “Autismo” sugerido por Bleuler e publicou

trabalho intitulado “die autistischen psichopathen im kindersalter” (psicopatia autística

infantil, também discutida como personalidade autista na infância). A partir de observações

clínicas de quatro crianças, Asperger (1944) indicou grupo clínico, cujo acentuado

isolamento social despertou atenção para a necessidade de proposições em educação especial

(Asperger, 1944; Montero, 2009).

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Asperger (1944) acreditava que as proposições em educação especial deveriam embasar-

se em um planejamento adequado, norteado pelo conhecimento profundo da condição clínica.

Para tanto, ele descreveu crianças que demonstraram problemas de integração social e

comunicação não-verbal (tanto gestos, como tom afetivo de voz), associada à

comunicação verbal idiossincrática, qual seja, inclinação para o uso de fala prolixa em

monólogo; tendência ao formalismo (como se fossem “pequenos professores”) e

intelectualização das emoções. Segundo o pediatra austríaco, essas crianças eram retraídas ou

alheias; possuíam interesses incomuns e circunscritos, inabilidade de explicar e predizer

comportamentos de outras pessoas, bem como histórico de aquisição atrasada de habilidades

motoras em contraponto ao não atraso clinicamente importante na aquisição da linguagem

(Asperger, 1944; Frith, 2004; Klin, 2006; Klin, Volkmar, & Sparrow, 2000).

Asperger salientou a natureza familiar da condição e, inclusive, sugeriu a hipótese de

transmissão dos traços de personalidade ligada ao sexo masculino. Ele observou que tais

crianças possuíam melhor desempenho escolar, quando guiadas por seus próprios interesses

especiais e quando havia utilização de métodos pedagógicos mais objetivos (Asperger, 1994;

Frith, 2004).

Figura 1: Hans Asperger em atendimento clínico

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Apesar das contribuições relevantes, o trabalho de Hans Asperger ganhou visibilidade no

mundo anglófono quase quarenta anos depois, quando a psiquiatra inglesa Lorna Wing

publicou trabalho intitulado “Asperger’s Syndrome” (Wing, 1981).

Wing and Gould (1979) organizaram observações sistemáticas de casos clínicos com

sintomas similares descritos por Asperger. Ainda que os critérios de validação tenham sido

dissonantes ao trabalho do pediatra austríaco, o estudo inseriu o conceito de espectro autista e

despertou, na comunidade científica internacional, o interesse em desenvolver estudos

comparativos atrelando as contribuições de Kanner (1943) e Asperger (1944).

O trabalho original de Hans Asperger foi traduzido para o inglês por Uta Frith (1991). A

tradução literal permitiu compreender que tanto os conceitos de Kanner, quanto Asperger

diferem do conceito clínico de esquizofrenia, bem como permitiu clarificar pontos comuns e

divergentes entre as contribuições dos dois teóricos.

Durante o período da década de 1990 e, início do século XXI, estudos médicos discutem

se o Transtorno de Asperger (TA) compõe o Transtorno Autista, ou se é qualitativamente

distinto. Discute-se a reduzida validação empírica dos critérios diagnósticos concernentes ao

TA. Estudos genéticos reforçam a discussão ao apontar a expressividade clínica variável do

Transtorno Autista – o mesmo genótipo pode produzir fenótipos de maior ou menor

gravidade, dificultando, portanto, procedimentos de diagnóstico-padrão robustos e, por

conseguinte, prognóstico e intervenção apropriados ao TA (Frith, 2004; Klin, 2006; Klin et

al., 2005; Schwartzman et al., 2008).

Convém ressaltar um elemento a mais neste debate acerca das dificuldades de

caracterização dos sintomas clínicos diferenciadores das duas condições clínicas supracitadas.

Em 1970, Elizabeth Newson referiu-se a pessoas autistas mais capazes e, a partir da década

de 80, surgiu o termo Autismo de Alto-funcionamento (AAF) para designar uma forma de

Transtorno Autista sem deficiência intelectiva, mas com claro atraso ou impacto na aquisição

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da linguagem em estágios iniciais do desenvolvimento (Klin et al., 1995; Nydén et al., 1999;

Planche & Lemonnier, 2012).

Diante à problematização, a quinta versão do DSM (DSM-V), lançada em 2013, entra em

vigor com a denominação Transtornos do Espectro Autista (TEA). Tal perspectiva propõe

evidenciar um continuum de frequência e intensidade de características clínicas autistas. A

partir de então, a constituição diagnóstica será pautada na caracterização clínica contínua do

espectro, a qual substitui a atual categorização diagnóstica dos Transtornos Globais do

Desenvolvimento – TGD (DSM-IV-TR).

Estudos recentes evidenciam prevalência do diagnóstico de Transtorno Autista, a partir

dos critérios do DSM-IV-TR, aproximado a 4.1/10.000 indivíduos, ao passo que o

diagnosticado do Transtorno do Espectro do Autismo, critérios do DSM-V, aproxima-se de

70/10.000 indivíduos (Mahjouri & Lord, 2012).

No Brasil, estima-se 2 milhões de Autistas, 80% deles sem diagnóstico. Se forem

utilizados os critérios descritos no DSM-IV, edição revisada (DSM-IV-TR), há prevalência

de 1:2000 para o Transtorno Autista e, quando associado ao Transtorno de Asperger, tal

prevalência praticamente dobra (Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da

República, 2012).

Um dos primeiros estudos internacionais sobre os novos critérios clínicos para o TEA

revela que, aproximadamente, 80% dos casos clínicos inseridos nos TGD não atendem aos

critérios diagnósticos para o TEA. Destes, 75% correspondem ao Transtorno de Asperger

(Mahjouri & Lord, 2012; Volkmar, 2013).

Especialistas temem que a eliminação da diferenciação entre Transtorno Autista e

Transtorno de Asperger prejudique a investigação de casos clínicos: “O risco é que os

pacientes sejam classificados com uma rotulação patológica muitas vezes equivocada”, alerta

a psicóloga Cristina Keiko (dezembro, 2012).

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Em contraponto, Williams et al. (2008) realizou pesquisa documental com 466

prontuários registrados por profissionais da saúde, destes 348 casos relevantes para análise

dos TGD. A pesquisa revela que 44% das crianças atendem aos critérios diagnósticos do

Transtorno de Asperger, ou do TGD sem outra especificação; mas estão diagnosticadas com

Transtorno Autista.

Wilkinson (2012) defende que os critérios para o Transtorno de Asperger são

consistentes, quando há consenso entre profissionais especializados e capacitados para

diferencia-los dentre os subtipos de funcionamento cognitivo mais elevado do Transtorno

Autista.

Estudos científicos especializados estão em vigor a fim de discutir critérios clínicos

passíveis de distinguir o Autismo de Alto-funcionamento do Transtorno de Asperger (Klin,

Volkmar, Sparrow, Cicchetti, & Rourke, 1995; Nydén, Gillberg, Hjelmquist, & Heiman,

1999; Planche & Lemonnier, 2012).

Planche and Lemonnier (2012) realizaram estudo empírico transversal, cujo objetivo foi

investigar se crianças com Transtorno de Asperger possuem perfil cognitivo diferente do de

crianças com Autismo de Alto-funcionamento. Para tanto, avaliaram trinta crianças, sendo

quinze com diagnóstico de Transtorno de Asperger e quinze com Autismo de Alto-

funcionamento. Dentre os instrumentos de pesquisa, utilizaram a terceira edição da escala

Wechsler de inteligência para crianças (WISC-III).

A discussão do estudo põe em xeque à similaridade do perfil neuropsicológico ao

apresentar diferença significativa entre o perfil cognitivo do Transtorno de Asperger e do

Autismo de Alto-funcionamento. Identificaram que, apesar de não apresentarem diferença

significativa no desempenho intelectivo global, os grupos clínicos divergem nos domínios

verbal e não-verbal. Enquanto o grupo do Transtorno de Asperger apresentou desempenho

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intelectivo verbal maior do que o não-verbal, o grupo com Autismo de Alto-funcionamento

contrapõe-se.

Na análise dos subtestes que compõem o domínio verbal da WISC-III (Informação,

Semelhanças, Aritmética, Vocabulário, Compreensão e Dígitos), o grupo clínico do

Transtorno de Asperger destaca-se nos subtestes Informações, Compreensão e Aritmética.

Tal resultado legitima a inexistência de atraso clinicamente importante na linguagem, uma

vez que a execução das tarefas pressupõe o desenvolvimento da linguagem verbal.

Em contrapartida, o grupo clínico com Autismo de Alto-funcionamento possui baixo

desempenho no domínio verbal, porque, segundo os pesquisadores, as crianças desse grupo

adquirem linguagem funcional – a partir de certa idade cronológica, elas adquirem expressão

verbal, mas a dificuldade na habilidade de compreensão verbal persiste.

Planche and Lemonnier (2012) constataram que o grupo clínico com Autismo de Alto-

funcionamento destaca-se no domínio não-verbal da WISC-III. Tal grupo clínico possui forte

habilidade cognitiva na percepção visual; processamento simultâneo de estímulos

visoespaciais; forte habilidade na capacidade de organização e síntese perceptual; bem como

formação de conceito por raciocínio visoespacial.

O grupo clínico com Transtorno de Asperger e o com Autismo de Alto-funcionamento

aproximam-se no tocante a dificuldades em habilidades motoras. Embora dificuldades

motoras raramente tenham sido operacionalmente definidas ou descritas de forma

sistemática, Klin e colaboradores (1995; 2006) reforçam déficits em habilidades motoras

amplas e finas, notadamente no grupo com Transtorno de Asperger, cujas dificuldades

repercutem na falta de jeito motor, comumente caracterizada clinicamente.

Planche and Lemonnier (2012) defendem que crianças com quadro clínico de Autismo de

Alto-funcionamento podem tornar-se semelhante ao Transtorno de Asperger na vida adulta,

especialmente quando desenvolvem habilidades de linguagem fluente.

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Klin e colaboradores (1995) também investigaram a validade clínica do Transtorno de

Asperger, comparando os perfis neuropsicológicos dessa condição clínica com o do Autismo

de Alto-funcionamento. Para tanto, seguiram procedimento diagnóstico rigoroso a partir dos

critérios clínicos definidos pela CID-10. Os grupos de pesquisa tinham idades compatíveis e

distribuição controlada do desempenho intelectivo.

Os resultados indicaram diferença significativa em onze funções neuropsicológicas entre

o Transtorno de Asperger e o Autismo de Alto-funcionamento. Segundo a pesquisa, enquanto

o grupo com Transtorno de Asperger possui desempenho intelectivo maior no domínio

verbal, o grupo com Autismo de Alto-funcionamento possui desempenho intelectivo maior

no domínio não-verbal.

Frith (2004) afirma a necessidade de esclarecer a natureza do Transtorno de Asperger

(TA), a partir o curso desenvolvimental do transtorno. Em média, o conjunto de sintomas

característico do TA aparece muito mais tarde do que no Autismo de Alto-funcionamento.

Howlin and Ashgarian (1999) verificaram que a idade média para diagnóstico de Autismo de

Alto-funcionamento foi de aproximadamente cinco anos e cinco meses, enquanto o TA foi

diagnosticado por volta dos onze anos de idade.

Ambos os grupos reconheciam anormalidades no âmbito das interações sociais, todavia,

pais e professores de crianças com TA eram menos propensos a preocupações intensas, em

virtude das habilidades verbais preservadas (Frith, 2004).

Stichter, O’Connor, Herzog, Lierheimer and McGhee (2012) destacam que o Transtorno

de Asperger e o Autismo de Alto-funcionamento convergem em déficits qualitativos nas

habilidades sociais e emocionais. Em ambos os grupos clínicos há comprometimento

qualitativo em habilidades sociais, ou seja, na habilidade de se engajar em interações sociais,

sucessivamente e independentemente; estabelecer e manter relações com os outros; bem

como entender necessidades e desejos dentro de um contexto.

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Por outro lado, Klin e colaboradores (1995) ressaltaram a diferenciação clínica entre o

Transtorno de Asperger (TA) e Autismo de Alto-funcionamento, na medida em que

pontuaram similaridades do perfil neuropsicológico do Transtorno de Asperger com o

Transtorno Não-Verbal de Aprendizagem (TNVA).

O TNVA constitui-se por alterações cognitivas decorrentes do comprometimento da

substância branca e do hemisfério direito. Acredita-se que o comprometimento do hemisfério

direito é condição necessária, enquanto o comprometimento da substância branca é condição

suficiente para a ocorrência das manifestações do TNVA. O transtorno é caracterizado por

dificuldades específicas de aprendizagem decorrentes de déficits cognitivos que envolvem

habilidades como psicomotricidade; processamento visoespacial; caligrafia; prosódia e

pragmática; aritmética; exploração do ambiente e adaptação à novidade (Haase et al., 2005).

A denominação TNVA e sua caracterização sindrômica são derivadas dos estudos do

neuropsicólogo Byron Rourke, da Universidade de Windsor, Canadá. Não existem estudos

populacionais sobre a prevalência do TNVA, mas estima-se que as crianças com transtornos

de aprendizagem correspondam a 10% da população em idade escolar.

O principal motivo de encaminhamento no TNVA são as dificuldades de aprendizagem,

as quais constituem um enigma para os educadores e profissionais de saúde. As dificuldades

visoespaciais, de comportamento e de socialização são frequentemente observadas e relatadas

pelos pais e educadores. Pode haver história prévia de dificuldades de desenvolvimento na

primeira infância, inclusive, atraso na aquisição da linguagem com posterior compensação.

As crianças com TNVA comumente são descritas como tímidas, ingênuas e sem malícia.

Apresentam dificuldades para compreender os aspectos implícitos na interação social e na

linguagem, principalmente a linguagem metafórica, a ironia e o sarcasmo. Todavia, é

imperativo frisar que o perfil neuropsicológico do Transtorno Asperger aproxima-se do

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TNVA, mas distancia-se ao se investigar o curso clínico e a etiologia dos quadros em questão

(Planche & Lemonnier, 2012).

Enquanto no TNVA as alterações cognitivas são decorrentes do comprometimento da

substância branca e do hemisfério direito; a etiologia do Transtorno de Asperger (TA) ainda é

desconhecida. O diagnóstico do TA é predominantemente clínico e baseado em critérios

definidos pelo CID-10 e/ou DSM-IV-TR, ao passo que o TNVA não se insere nos manuais

classificatórios de transtornos mentais. Asperger (1944) notou predisposição familiar na

natureza das características, com um padrão masculino de transmissão, em contraponto, o

TNVA possui características clínicas atreladas a quadros lesionais ou disfuncionais no

hemisfério direito (Foster & King, 2003; Leão & Aguiar, 2005; Rinehart, Bradshaw,

Brereton, & Tonge, 2002; Schwartzman et al., 2008).

Apesar dos estudos científicos elucidados, Dra. Francesca Happé (2011), colaboradora do

DSM-V para proposição dos critérios do Transtorno do Espectro do Autismo, declarou que,

até o momento, não há robustas pesquisas capazes de evidenciar a distinção diagnóstica entre

Autismo e Asperger. A revisão de literatura desenhada por ela indica proporção de 1:5

estudos que evidenciam diferença significativa entre o Transtorno Autista e Transtorno de

Asperger (Editorial J Psychiatry, 2013).

A decisão de eliminar a distinção entre Transtorno Autista e Transtorno de Asperger

desencadeou discussões no âmbito sociocultural. Muitas pessoas diagnosticadas com

Transtorno de Asperger não se denominam autistas. Para além de uma concepção

psiquiátrica, o grupo clínico em vigor comumente se designa “Aspie”: grupo sociocultural

implicado com um modo de ser e estar no mundo qualitativamente diferente (observar

websites como: aspieweb.net, wrongplanet.net, ou aspieworld.net).

Kite et al. (2013) preocupam-se com o possível estigma social para com o grupo “Aspie”.

Eles analisaram respostas de questionários, estruturados na escala Likert, as quais reuniam a

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opinião de 547 profissionais sobre a possível diluição do diagnóstico Transtorno de Asperger

no Transtorno do Espectro do Autismo. Destes, aproximadamente metade demonstrou

insatisfação com a mudança; 22% apoiaram, enquanto 28% manifestaram incerteza.

A maioria dos profissionais insatisfeitos com a mudança compõe a área da saúde e da

educação. Eles argumentam o impacto da alteração sobre a percepção do Transtorno Autista e

Asperger. Para eles, são conceitos diagnósticos diferentes sob os quais subjaz características

clínicas dissonantes e, por conseguinte, necessidades interventivas diferenciadas. Ademais,

eles defendem que o termo Autismo tem um impacto maior sobre o indivíduo e a família do

que o termo Asperger. Segundo Kite et al. (2013), comumente há pior estigma social para

com aqueles denominados autistas.

Em contrapartida, os profissionais defensores da mudança argumentam que o conceito de

Transtorno do Espectro do Autismo torna-se condição sine qua non para eliminar percepções

tendenciosas entre rótulos de Autistas e Asperges. Ademais, eles defendem que a nova

proposição diagnóstica introduz descrições clínicas detalhadas, passíveis de aferir níveis de

gravidade dentro do espectro.

Em suma, do percurso histórico do conceito diagnóstico do autismo parece emergir

desconcertos e fascinação em torno do termo variabilidade. Há variabilidade nas taxas de

prevalência, variabilidade entre os diagnósticos médicos e intervenções educacionais;

variabilidade em pesquisas que buscam entender a sensibilidade e especificidade das edições

classificatórias imbricadas com o diagnóstico clínico do autismo (Mahjouri & Lord, 2012).

É factível perceber que o percurso histórico está imbricado com um universo imbuído de

fascinantes peculiaridades. Para além de esforços taxonômicos, o autismo e seu percurso

histórico refletem a intrigante complexidade e sofisticação de um ser humano atravessado por

um transtorno do desenvolvimento.

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Capítulo 2: O perfil neuropsicológico do Transtorno Autista e Transtorno de

Asperger

Conforme exposto anteriormente, a quarta edição do DSM inseriu o autismo em uma

nova classe diagnóstica denominada Transtornos Globais do Desenvolvimento (TGD), os

quais incluem: o Transtorno Autista, Transtorno de Asperger, Transtorno de Rett, Transtorno

Desintegrativo da Infância e o Transtorno Global do Desenvolvimento sem outra

especificação (APA, 1994).

Para o diagnóstico de Transtorno Autista exige-se presença de comprometimento

qualitativo da interação social, comunicação, assim como padrões restritos e repetitivos de

comportamento, interesses e atividades. Indivíduos que atendem ao diagnóstico têm total de

seis (ou mais) características clínicas, sendo pelo menos duas no critério de interação social,

uma no de comunicação, bem como uma no de padrões restritos e repetitivos de

comportamento, interesses e atividades. Ademais, deve-se apresentar atrasos ou

funcionamento anormal em pelo menos uma das seguintes áreas, com início antes dos 3 anos

de idade: 1) interação social, 2) linguagem para fins de comunicação social ou 3) jogos

imaginativos ou simbólicos (APA, 2002).

O diagnóstico do Transtorno de Asperger abarca comprometimento qualitativo da

interação social e no desenvolvimento de padrões restritos e repetitivos de comportamento,

interesses e atividades. Em contraste com o Transtorno Autista, não há atrasos ou desvios

clinicamente significativos na aquisição da linguagem, embora aspectos mais sutis de

comunicação social possam ser afetados. Ademais, durante os 3 primeiros anos de vida, não

ocorrem atrasos clinicamente significativos no desenvolvimento cognitivo, o que, por

conseguinte, desencadeia curiosidade normal diante do ambiente ou na aquisição de

habilidades de aprendizagem e comportamentos adaptativos próprios da idade (APA, 2002).

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Em contraponto ao Transtorno de Asperger, o Transtorno de Rett caracteriza-se por um

grave comprometimento no desenvolvimento da linguagem expressiva e receptiva. Descrito

por Rett em 1966, através de estudo com gêmeas univitelinas, o transtorno caracteriza-se pelo

desenvolvimento de múltiplos déficits específicos, após um período de funcionamento

normal durante os primeiros anos de vida. Após o período de desenvolvimento normal há

desaceleração do crescimento cefálico, perda de habilidades manuais voluntárias, perda do

envolvimento social no início do transtorno e incoordenação da marcha ou movimentos do

tronco. O Rett tem sido diagnosticado apenas no sexo feminino e está tipicamente associado

com deficiência cognitiva grave ou profunda. A etiologia genética específica foi determinada

(APA, 2012; Volkmar et al., 2012).

O Transtorno Desintegrativo da Infância, também denominado síndrome de Heller

(1908), constitui-se por um prolongado período de desenvolvimento típico (normalmente 3

ou 4 anos) seguido de deterioração drástica no desenvolvimento da comunicação verbal e

não-verbal, relacionamentos sociais, jogos e comportamento adaptativo próprios da idade. Os

indivíduos afetados exibem déficits sociais, comunicativos e comportamentais geralmente

observados no Transtorno Autista. Ocasionalmente pode está associado à condição médica

geral (como leucodistrofia metacromática), mas robustas pesquisas não afirmam a condição

como aspecto essencial ao transtorno (APA, 2002; Volkmar et al., 2012).

Por sua vez, o TGD sem outra especificação caracteriza-se por comprometimento grave e

global do desenvolvimento da interação social recíproca, ou de habilidades de comunicação

receptiva e expressiva, ou comprometimento de estereotipias de comportamento, interesses e

atividades. Para tanto, os critérios do Transtorno Autista não devem ser satisfeitos, em virtude

da idade tardia de seu início, quadro com sintomatologia atípica, sintomatologia subliminar

ou todas acima (APA, 2002).

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O TGD revela-se como transtorno mental. Os transtornos mentais são categorias

descritivas e não explicativas ou etiológicas. Constituem expressão clínica mental imbricada

com alterações da experiência subjetiva e do comportamento que se manifestam

independentemente das causas subjacentes, sejam estas biológicas, psicológicas ou sociais.

Constituem alterações qualitativas da vida subjetiva ou do comportamento de modo atípico

ao esperado pela sociedade e cultura a qual pertence o indivíduo (Ministério da Saúde, 2013).

O TGD também se constitui como “transtorno do desenvolvimento”, cuja perspectiva

abarca basicamente duas vertentes: específico ou global. Os transtornos específicos do

desenvolvimento constituem aqueles que afetam o funcionamento psíquico ou cognitivo de

forma circunscrita – todos os transtornos de aprendizagem, por exemplo. Já os transtornos

globais do desenvolvimento afetam uma ampla gama de funções psíquicas, sendo também

conhecidos como transtornos invasivos ou abrangentes do desenvolvimento.

Para além de um conceito arcaico acerca do desenvolvimento como processo

fundamentalmente determinista e de base estritamente genética; considera-se a perspectiva

contemporânea da psicopatologia do desenvolvimento, qual seja, compreender o

desenvolvimento como processo resultante de uma intrincada e complexa interação entre

fatores genéticos e sócio-culturais, sendo estes últimos tanto de natureza psicossocial quanto

ecológica.

Nesta perspectiva, o neurodesenvolvimento da criança não é um processo contínuo e

homogêneo. Depende da interação entre os múltiplos fatores de crescimento neuronal

diferencial das várias áreas cerebrais, do grau de mielinização das estruturas cerebrais, do

desenvolvimento cerebral pré-natal e das possibilidades que têm o cérebro em

desenvolvimento para reorganizar seus múltiplos padrões de respostas e conexões mediante a

experiência (Muzskat, 2006).

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Desta forma, o conceito de (neuro)desenvolvimento não pode ser dissociado do conceito

de plasticidade. À medida que o desenvolvimento cumpre o seu percurso, diferentes

potenciais de modificabilidade se expressam no cérebro devido à experiência (Muzskat,

2006). Pressupõe o estabelecimento de uma relação de aprendizagem e comunicação

constante entre o organismo e o meio ambiente em que este se desenvolve, ou para o qual se

direciona. Inter-relação esta que desencadeia modificações na estrutura física e funcional

(incluindo-se os padrões maturacionais e ontogenéticos), modificando, assim, as conexões de

acordo com as várias influências socioculturais e ambientais.

Acredita-se que o TGD é uma espécie de “pane” neurofisiológica que cria obstáculos para

o processamento cerebral. Se considerarmos o desenvolvimento ontogenético pelo princípio

de crescimento ascendente e sobreposto das zonas corticais, provavelmente, há modificações

no desenvolvimento de uma zona cortical elementar de atividade mental, a qual desencadeia

efeito secundário, ou sistêmico, no desenvolvimento de zonas corticais superiores sobrepostas

a essa atividade elementar (Luria, 1981).

Como a trama de fina renda, onde ao se modificar um elo há o risco de desmanchar todo

o desenho, possivelmente, nas manifestações clínicas dos transtornos globais do

desenvolvimento subjaz um processo atípico ou prejudicial que atravessa e “reconfigura” o

(neuro)desenvolvimento típico.

Achados neuroanatômicos e neurofisiológicos:

No tocante ao Transtorno Autista, Machado e colaboradores (2003) encontraram

alterações anatômicas em 75% do grupo clínico infanto-juvenil (0 a 19 anos de idade).

Estudos neuropatológicos indicaram que indivíduos diagnosticados com Transtorno Autista

possuem comprometimentos no desenvolvimento associados a impactos na maturação do

sistema nervoso central. Tais estudos revelaram alterações microscópicas na organização e

proliferação celular localizadas nos circuitos do sistema límbico, cerebelar, hipocampo, lobo

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temporal e lobo frontal. Frequentemente há redução de volume cerebral à custa da atrofia do

lobo frontal e da região fronto-temporal (Campos, 2005; Carmargos, 2005; Machado et al.,

2003).

Comumente verifica-se redução no número e tamanho das células neuronais do complexo

hipocampal, amigdala e corpo mamilar, além de alterações da árvore dendrítica do

hipocampo. O cerebelo pode apresentar hipoplasia global ou seletiva do vermis neocerebelar

associada, ou não, a outras malformações do sistema nervoso central (Campos, 2005;

Carmargos, 2005; Machado et al., 2003).

O comprometimento de áreas associativas, no que diz respeito às sinapses, organização

neuronal, conexões entre diversos circuitos e distribuição do fluxo sanguíneo, também

desempenha importante papel no Transtorno Autista (Campos, 2005; Castelli, Frith, Happe,

& U. Frith, 2002).

Levy, Mandell, Schultz (2010) propõem que o autismo está relacionado a uma desordem

na organização cortical que, por conseguinte, desencadeia comprometimento neuronal no

processamento de informações do sistema nervoso central (desde a organização de

conectividade sináptica até a estrutura cerebral).

De forma geral, as principais regiões cerebrais disfuncionais no Autismo são os lóbulos

frontais, os quais têm amplas conexões recíprocas com o hipocampo (memória), lobo

temporal/ sistema límbico e amígdala (envolvidos na memória e afetividade) e cerebelo

(envolvido na afetividade, cognição, atenção) (Lyons & Fitzgerald, 2004).

Dentre as alterações funcionais, as mais frequentes estão associadas à hipoconcentração

do radiofármaco no córtex frontal esquerdo e no lobo temporal esquerdo. Silva e

colaboradores (2013) verificaram baixa conectividade funcional em virtude de diferentes

padrões na ativação e no tempo de sincronização da rede cortical anterior.

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Schultz e colaboradores (2000) chamam a atenção para ressonâncias magnéticas

funcionais de crianças com Transtorno de Asperger. O estudo sugere que durante a

identificação de expressões faciais há mais atividade no gyrus temporal inferior, em

detrimento da menor atividade no gyrus fusiforme. Enquanto esta área está implicada com a

discriminação do rosto humano, aquela é responsável pela discriminação de objetos. Nesta

perspectiva, o estudo reafirma o comportamento já observado nos indivíduos com Transtorno

de Asperger – maior interesse pelos objetos, em detrimento das relações humanas

(Carmargos, 2005; Castelli et al., 2002; Frith, 2004).

Apesar da presença dessas alterações anátomo-funcionais serem frequentes, o diagnóstico

do Transtorno Autista e Transtorno de Asperger continuam sendo prioritariamente clínico,

uma vez que as características clínicas não são completamente explicadas por estas

alterações, bem como pela constatação que tais alterações não estão presentes em 100% dos

casos.

Tanto o Transtorno Autista, quanto o Transtorno de Asperger, desvelam alterações

qualitativas da experiência subjetiva e dos processos cognitivos envolvidos na interação

social, na comunicação e em padrões restritos, repetitivos e estereotipados de

comportamento, interesses e atividades (APA, 2002).

O autismo constitui-se como transtorno do desenvolvimento com forte indício de

componente genético. Entretanto, apesar dos estudos sugerirem alterações na região

intergênica entre caderina 9 e 10, bem como variações nos cromossomos 2,3,5,7,16,22 e X; a

etiologia continua desconhecida (Lyons & Fitzgerald, 2004; Pacheco, 2012).

Aspectos comportamentais:

Por meio de observações clínicas sistemáticas e longitudinais, Messinger (2012)

comparou crianças sem histórico familiar de Transtorno Autista, com crianças autistas. Ele

observou a presença de falhas gestuais nos primeiros meses de vida a partir da observação do

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modo pelo qual os bebês autistas olhavam para os objetos, pediam o que desejavam, ou como

reagiam quando apontavam para alguma direção. Tais bebês apresentaram sinais mais

evidentes de autismo, após os 2 anos e meio de idade.

Outro comportamento indicativo de características clínicas do Transtorno Autista é a

aceitação do colo de qualquer pessoa. Comumente, a partir dos 8 meses, a criança tende a

estranhar quem não é do seu convívio e até chora demonstrando aparente insatisfação. Uma

criança autista sugere sentir-se confortável com qualquer pessoa.

O choro quase ininterrupto, uma inquietação constante, ou ao contrário, uma aparente

apatia exacerbada, também despertam a atenção. É importante observar, inclusive, se o

pequeno se incomoda com o toque, com alguns sons e com certas texturas de alimentos (o

que comumente dificulta a transição do leite materno para as comidas sólidas). Quando as

crianças estão mais velhas, os pais geralmente observam ausência da fala, uma aparente

surdez e os movimentos pendulares estereotipados de tronco, mãos e cabeça.

Desde os primeiros anos de vida, as crianças autistas podem demonstrar um

comprometimento na reciprocidade social. Comumente verifica-se aparente ausência de

necessidade de aconchego, ausência de elevação dos braços (como antecipação a ser pego no

colo), falta de imitação da fala ou dos gestos, falha em apontar ou mostrar objetos para os

outros e peculiar contato visual. Comumente as crianças procuram o objeto/evento de

interesse, mas não há partilha social do mesmo. Frequentemente demonstram não responder

ao nome próprio, especialmente quando há envolvimento excessivo no que estão fazendo

(Grossman, Carter, & Vokmar, 1997).

Em contraponto, Frith (2004) sugere árdua tarefa de identificação do Transtorno de

Asperger (TA) ainda na primeira infância, porque, à primeira vista, crianças com TA parecem

mais avançadas do que seus pares, notadamente quando o desempenho intelectivo está acima

da média esperada para faixa etária.

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É sabido que crianças com Asperger têm grandes dificuldades para estabelecer

brincadeiras com seus pares. Pesquisas de cunho clínico indicam que fracassos duradouros

em interações sociais de indivíduos com TA, normalmente estão atrelados a comportamentos

autênticos e falhas na empatia. A própria brincadeira de inventar um mundo paralelo e de

brincar com personagens imaginários estão distantes do perfil do TA, marcado pela rigidez e

concretude do pensamento lógico (Frith, 2004; Klin, 2006).

Klin, Jones, Schultz, Volkmar and Cohen (2002) indicam que crianças com TA são

isoladas pelos pares porque possuem dificuldade no manejo social, em virtude da inabilidade

de compreender que outras pessoas têm pensamentos e sentimentos diferentes dos seus.

Em diferentes níveis de severidade, crianças com Transtorno Autista ou Transtorno de

Asperger possuem comprometimento qualitativo da interação social e comunicação. Haase,

Freitas, Natale, Teodoro e Pinheiro (2005) definem a mente autista como o resultado de um

cérebro que se desenvolve “solipsisticamente” fechado sobre si mesmo. De modo

interdependente, falhas na teoria da mente, nas funções executivas e na linguagem versam

como principais fragilidades neuropsicológicas dos grupos clínicos vigentes (Champagne-

lavau & Joanette, 2009).

Habilidades Sociais e Teoria da mente:

A Teoria da Mente remete à capacidade de entender ações alheias não só pela leitura de

movimentos corporais, mas também de ações intencionais, a partir da atribuição a terceiros

de atitudes proposicionais, isto é, crenças, desejos, pensamentos e intenções. Neste

sentido, dirige-se o comportamento e torna-o previsível o que, em última análise,

caracteriza o processo de mentalização (Rizzolatti & Sinigaglia, 2007).

Por meio da Teoria da Mente o ser humano consegue negociar, enganar, ensinar,

demonstrar, reconhecer emoções complexas e manipular pensamentos permitindo uma

previsão comportamental baseada no mecanismo de inferência de emoções e crenças com

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consideráveis probabilidades de acerto. Este processador constituir-se-ia, em síntese, de um

mecanismo gerador de representações mentais acerca de estados mentais.

Nitrini (2002) advoga que o processamento da Teoria da Mente (ToM) contempla uma

teoria, porque os estados mentais não são diretamente observáveis e, por conseguinte, torna-

se necessário fazer inferências (teorizações) sobre o comportamento dos outros. Por outro

lado, Tonelli (2011) afirma que há uma habilidade mental automática para se atribuir

estados mentais a si mesmo e a outros indivíduos, com a finalidade principal de

compreensão e predição de seus comportamentos. Tonelli (2011) prefere utilizar os termos

“mentalização” ou “adoção de uma postura intencional” (Dennett, 1987).

Tonelli (2011) apresenta o nome de ToM implícita (ToMi) à habilidade de inferência de

estados mentais, a qual permite um processamento rápido das informações oriundas do

ambiente social; e o nome de ToM explícita (ToMe) à capacidade de aprender as regras do

jogo social, de forma a otimizar o convívio com outros seres humanos. Estudos sobre a

Teoria da Mente estão presentes no âmbito da Psicologia Evolucionista, Psicologia do

Desenvolvimento e da Psicologia Cognitiva.

A Teoria da Mente pode ser compreendida como a resultante de um novo emprego de

habilidades cognitivas pré-existentes. Isto é, a evolução pode ter exercido pressão para que o

cérebro ancestral recrutasse sistemas neurais originalmente envolvidos com outras funções e

os utilizasse como substrato para os futuros circuitos de processamento ToM. Não é à toa que

as funções cerebrais comumente atribuídas às origens da habilidade da Teoria da Mente são a

percepção visual, de movimento, a capacidade de atenção visual compartilhada e a habilidade

de representar ações objetivo-dirigidas (Frith & Frith, 1999).

Enquanto a Psicologia Evolutiva tenta situar o momento no qual a Teoria da Mente surge

dentro da escala filogenética. A Psicologia do Desenvolvimento versa em situar o momento

no qual tal habilidade emerge dentro da ontogênese humana.

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O enfoque investigativo (tanto empírico quanto teórico) da Psicologia do

Desenvolvimento sobre a Teoria da Mente recai mormente sobre aspectos da origem desta

habilidade nas crianças (em que idade ela surgiria) e de seu desenvolvimento nas mesmas.

Diversas são as habilidades que parecem atestar o aparecimento da Teoria da Mente no

desenvolvimento infantil. Os bebês comumente possuem atenção visual compartilhada ao

demonstrarem peculiar interesse por rostos, particularmente os olhos e a direção do olhar de

terceiros. Ao redor dos 18 meses de vida, a criança geralmente sorri como resposta a um

sorriso ou verbalização de outrem. Em tal fato subjaz a atenção conjunta, também designada

como atenção compartilhada, cuja habilidade em partilhar com o outro acerca de um objeto

ou acontecimento esboça a habilidade de construir representações mentais objetivo-dirigidas

(Baron-Cohen, 1989; 1996).

Aproximadamente dos 4 até os 6 anos de idade, a criança desenvolve a habilidade de

representar a relação entre os estados mentais de duas ou mais pessoas. Neste período, ela

adquire a habilidade de fingir num contexto de uma brincadeira ou jogo (como numa

brincadeira de faz-de-conta) e, portanto, adquire a capacidade de teorizar a respeito da mente

dos outros.

A capacidade de acerto nas tarefas de crenças falsas, a utilização dos verbos mentais (tais

como acreditar, pensar, entender, conhecer), a capacidade de diferenciar estados físicos de

mentais (o concreto que pode ser tocado e o abstrato que pode ser pensado); também seriam

indicadores da presença de Teoria da Mente nas crianças acima de 6 anos.

Hutchins, Prelock, and Bonazinga (2012) catalogaram características clínicas da teoria da

mente, por período do desenvolvimento infantil. Similar ao exposto, eles verificaram estágios

iniciais atrelados á atenção compartilhada, seguido do estágio da “crença”, onde a criança

torna-se apta a diferenciar o real do faz-de-conta e se permite ao acesso da imaginação e

simbolização.

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Dos 4 aos 6 nos de idade, verificaram o desenvolvimento da segunda ordem da teoria da

mente, "crença sobre crença", onde as crianças são capazes de atribuir estados mentais a

outras pessoas (o outro também pensa ou tem "crença") e adquirem a habilidade de inferir

sobre os estados mentais do outro. Em última instância, os pesquisadores também verificaram

o surgimento da terceira ordem de estados mentais, "crença sobre crença sobre crença", na

qual crianças conseguem estabelecer a crença do outro sobre minha crença. Neste estágio

torna-se possível a auto percepção de sentimentos e características pessoais, bem como o

aprimoramento da empatia.

Ao apresentar o estágio operacional, Piaget (1929) sugere a presença característica do

raciocínio reversível, o qual proporciona o pensamento baseado em operações mentais e, por

conseguinte, torna a criança apta para resolução de problemas matemáticos a nível abstrato;

para além do concreto, para além do perceptível na realidade. De acordo com Guttenplan

(1996), tal constructo remete ao moderno conceito da Teoria da Mente, na medida em que se

torna possível atrelar o raciocínio reversível à competência da representação mental. Ambos

forjam uma divisão entre subjetividade e objetividade, entre o que é verdade para minha

mente e o que é verdade para a realidade.

Tal constructo Piagetiano também remete ao percurso desenvolvimental da Teoria da

Mente, ao delinear que o controle sobre as representações perceptivas frequentemente advém

quando a criança abandona o estágio do egocentrismo, em favor do outro (não

necessariamente outro indivíduo, mas a consideração de outra realidade para além da

própria). Nesta perspectiva, a criança supera a leitura mental de seu próprio conhecimento,

assimilando que o objeto não é mais o que aparenta ser.

No final da década de 1970, a Psicologia Cognitiva propõe estudos dedicados a

desenvolver modelos explicativos para a Teoria da Mente. Baron-Cohen (1996) postulou a

existência de quatro módulos cerebrais inter-relacionados para produção do sistema de

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“leitura mental” do ser humano. Nesta perspectiva, representações mentais podem ser

consideradas “cópias” do mundo, geradas a partir de circuitos cerebrais que computam a

informação sobre o meio ambiente conduzida pelos órgãos do sentido (Gazzaniga, Ivry, &

Mangun, 2006).

As representações mentais de estados mentais são modelos das mentes de terceiros (e

da própria mente) e participam do planejamento dos comportamentos a serem adotados

diante da interação com outros humanos. A maneira pela qual tais representações são

geradas ainda é motivo de controvérsia entre autores, que se dividem, basicamente, em três

grupos, a saber, teoria-teoria, teoria da simulação e teoria modular.

A “Teoria-Teoria” postula que o processamento ToM se desenvolve a partir de uma

capacidade de simulação dos estados mentais de terceiros, possível graças à apreciação

dos próprios estados mentais. A “Teoria da Simulação” considera a experiência individual

essencial para configuração das habilidades ToM. Tal concepção advoga que as habilidades

ToM se configuram a partir do contínuo aprendizado adquirido através do convívio social.

Por sua vez, a “Teoria Modular”, a qual não valoriza o papel da experiência no

desenvolvimento da Teoria da Mente, propõe a existência de “módulos” cerebrais

configurados de maneira inata para a atribuição de estados mentais.

O teórico modular Alan Leslie (1994) advoga que as representações de estados mentais,

geradas pelo processador ToM, poderiam ser incluídas em três categorias distintas, quais

sejam, representações de estados mentais volitivos, perceptuais e epistêmicos.

Neste sentido, o desenvolvimento da teoria da mente estaria associado com a perspectiva

de crescimento ascendente e sobreposto das zonas corticais e, consequentemente, das

estruturas cerebrais imbricadas com a atividade mental dessa habilidade cognitiva. Enquanto

os estágios iniciais de desenvolvimento da teoria da mente repousam sobre uma base mais

elementar e depende de uma função básica (como atenção seletiva e percepção visual, por

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exemplo); em estágios subsequentes, ela não só adquire complexidade, mas também começa

a ser desempenhada com a participação estreita de formas de atividade estruturalmente

superiores, tais como a linguagem e funções executivas (Luria, 1981).

Em crianças com perfil comportamental compatível com o Transtorno Autista, o

comprometimento do desenvolvimento da Teoria da Mente é passível de observação desde a

primeira infância.

Baron-Cohen (1995) cunhou o termo “cegueira mental” para descrever os déficits

apresentados por indivíduos autistas no processamento ToM, isto é, na capacidade de inferir

ou atribuir estados mentais a terceiros, comprometendo sua capacidade de interagir

socialmente.

Sabe-se que a maioria das crianças diagnósticas com Transtorno Autista apresenta um

atraso no desenvolvimento de habilidades ToM em relação a crianças com desenvolvimento

típico. A razão pela qual o atraso ocorre está atrelada ao prejuízo na configuração da ToMi,

em favor da ToMe (Tonelli, 2011).

Conforme Joseph & Flusberg (2004), o comprometimento da interação social no

Transtorno Autista não está diretamente relacionado com o impacto na habilidade de

representar estados mentais. O comprometimento parece advir da dificuldade de interpretar e

inferir acerca de estados mentais de outras pessoas.

Stichter, O’Connor, Herzog, Lierheimer and McGhee (2012) destacam o

comprometimento qualitativo em habilidades sociais, ou seja, na habilidade de se engajar em

interações sociais, sucessivamente e independentemente; estabelecer e manter relações com

os outros; bem como entender necessidades e desejos dentro de um contexto.

Nesta perspectiva, comprometimentos qualitativos da interação social estariam

relacionados à estados mentais epistêmicos, em detrimentos dos perceptivos e volitivos.

Destarte, Joseph and Tager-Flusberg (2004) advogam que crianças autistas teriam

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comprometimento na cognição social, em detrimento da percepção social. Esta está

imbricada com representações mentais guiadas pelo rastreamento perceptual e motor. Por sua

vez, a cognição social entrelaça-se com capacidade de inferir representações mentais em

estreita relação com a linguagem, reconhecimento de emoções e funções executivas,

notadamente quando exigidos dentro de um contexto dinâmico pautado em relações sociais

(Baron-Cohen, 1994).

De forma geral, estudos no âmbito da Cognição Social ainda questionam como

operacionalizar o conceito de atribuição de intenções (ou Teoria da Mente), de tal maneira

que ele pudesse ser testado.

Diversos grupos de pesquisa têm utilizado diferentes métodos. A história de Sally-Anne, o

teste visual Smarties e teste John and Mary são alguns dos mais utilizados para avaliar a

capacidade de detecção de uma falsa crença. Ressalta-se que o último avalia falsas crenças de

segunda ordem, ou seja, falsas crenças que alguém pode ter em relação às crenças de outra

pessoa.

Alguns autores têm utilizado vinhetas compostas por cartoons ou desenhos de cenários

ToM mais complexos – envolvendo cooperação, sabotagem e traição entre os protagonistas.

Associados, ou não, a tarefas ToM verbais, os mais populares são Hinting Task (HT), o Eyes

Test (ET) e o Faux Pas Test (FPT).

Para além do envolvimento diferencial de hemisfério esquerdo (sistema fonológico e

semântico, por exemplo) e direito (associação de funções cognitivas e afetivas), imagens de

ressonâncias funcional revelam extensa rede neural implicada na cognição social.

Estudos recentes utilizam o termo Inteligência Emocional (IE) para designar um conjunto

de habilidades cognitivas inter-relacionadas. Caracteriza-se por capacidades que incluem o

reconhecimento dos significados da emoção e as complexas relações entre emoção e

raciocínio, bem como raciocínio e resolução de problemas subsidiados pela interação social.

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A IE correlaciona-se positivamente com a empatia, satisfação com a vida e interações sociais

bem-sucedidas.

Montgomery, Stoesz and Mccrimmon (2013) conceituam dois componentes da IE, quais

sejam, capacidade e traço, os quais soam distintos do conceito de personalidade e

desempenho intelectivo global. Traços da IE remetem a uma série de competências

relacionadas com a emoção que podem incluir características como otimismo,

autoconhecimento, autoestima e autocriticas.

Embora estudos sobre a Teoria da Mente e Funções Executivas forneçam valiosas

informações sobre a natureza do Transtorno Autista e Transtorno de Asperger, em geral, estes

constructos têm limitações concernentes à predição de comprometimento social,

principalmente para o Transtorno de Asperger.

Nesta perspectiva, estudos recentes indicam que jovens adultos com Transtorno de

Asperger demonstram relações interpessoais não duradouras em virtude falhas no traço da IE.

Portanto, Montgomery (2013) sugere a inclusão da IE em futuros estudos neuropsicológicos,

voltados para investigação dos impactos na habilidade social de indivíduos com Transtorno

de Asperger.

Salienta-se que tais hipóteses de comprometimento cognitivo não pretendem contemplar

categorias diagnósticas. Conforme Nitrini (2002), no âmbito clínico tais fragilidades

cognitivas permitem sugerir perfil neuropsicológico compatível com os grupos clínicos

supracitados, mas não justificam a existência de toda uma entidade.

É importante frisar que nenhuma das fragilidades cognitivas supracitadas é exclusiva do

Autismo ou Asperger. Estudos neuropsicológicos revelam impacto semelhante em grupos

clínicos como o Transtorno de Déficit de Atenção e Retardo Mental (DSM-IV-TR). Portanto,

faz-se necessário a compreensão do modo pelo qual tais funções cognitivas sobressaltam-se

em manifestações clínicas específicas de cada caso clínico.

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Funções executivas:

As funções executivas correspondem a conjunto de habilidades que, de forma integrada,

permite ao indivíduo direcionar comportamentos a metas, avaliar a eficiência e adequação

desses comportamentos, abandonar estratégias ineficazes em prol de outras mais eficientes e,

deste modo, resolver problemas imediatos, de médio e longo prazo (Robinson, Goddard,

Dritschel, Wisley, & Howlin, 2009). Dentre as funções executivas, destaca-se a flexibilidade

cognitiva, controle inibitório, planejamento e memória operacional.

Estudos com crianças com Transtorno Autista e Asperger sugerem que entraves na

flexibilidade cognitiva explicariam a presença de padrões restritos de interesses e atividades,

bem como a dificuldade de considerar diferentes possibilidades. A necessidade de uma rotina

estruturada e de previsibilidade faz com que as crianças inseridas no Transtorno Autista, ou

Asperger, tenham dificuldade em adaptar-se a novas situações, implicando em ajustamento

da dinâmica familiar e escolar.

Substanciais estudos neuropsicológicos argumentam o entrelaçamento das funções

executivas com a teoria da mente. Conforme Joseph and Tager-Flusberg (2004), a memória

operacional e o controle inibitório podem mediar ou, pelo menos, fornecer necessárias

condições para o sucesso da teoria da mente. Tal perspectiva ganha força à medida que se

verifica acertos nas tarefas de crenças falsas, quando o indivíduo consegue manter uma falsa

representação de um dado estado de coisas na memória operacional, bem como consegue

resistir à tendência normal de atribuir estados mentais a partir de uma realidade

predominante.

A memória operacional mantém uma representação mental e, simultaneamente, coordena

diversas representações em um sistema temporário de armazenamento. Por sua vez, o

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controle inibitório inibe outras representações a fim de manter um curso de ação flexível e

adaptado às circunstâncias (Ozonoff, Pennington, & Rogers, 1991).

Estudos neuropsicológicos concernentes ao Transtorno de Asperger comumente verificam

que crianças e adolescentes possuem dificuldades em atividades que envolvem as funções

executivas e teoria da mente, apenas, quando requeridos em situações de exposição social

e/ou conversação. Channon, Charman, Heap, Crawford and Rios (2001) verificaram que

crianças com Transtorno de Asperger possuem dificuldades na resolução de problemas

sociais, especialmente por não conseguirem lembrar-se de fatos sociais pertinentes à

resolução.

Questiona-se se as funções executivas são primordiais para o bom desempenho em tarefas

da teoria da mente, ou se elas estão mais envolvidas no desenvolvimento conceitual

necessário para compreensão representacional da mente. Pesquisas neste âmbito são

dissonantes. Todavia, a discussão lança luz sobre um funcionamento cerebral sistêmico, cuja

dinamicidade e complexidade fazem valer reflexões do modo pelo qual ocorre o

(neuro)desenvolvimento ontogenético de funções neuropsicológicas.

Os lobos frontais, área cerebral envolvida com o funcionamento executivo, são

caracterizados por Goldberg (2002, p.13) como “a mais recente realização na evolução do

sistema nervoso”. São uma das últimas regiões do córtex cerebral a se desenvolver,

evolutivamente e ontologicamente, e por possuírem o padrão mais complexo de

circunvolunções corticais que qualquer outra região do cérebro (Fuster, 2001; Damasio &

Anderson, 1945).

Anatomicamente, os lobos frontais são uma enorme área cerebral anterior à fissura

rolândica e acima da fissura silviana. De acordo com uma categorização anátomo-funcional,

o córtex frontal é subdividido em três áreas, quais sejam, córtex pré-central (área 4 de

Brodmann), que constitui a área motora primária; córtex pré-motor (área 6), que inclui a área

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motora suplementar na face interna dos hemisférios e a área de Broca (área 44); bem como o

córtex pré-frontal. O córtex pré-frontal (CPF), mais especificamente, corresponde às regiões

dorsolateral, órbito-frontal e mesial (Lezak, Howieson, & Loring, 2004; Mello, 2008; Poletti,

2010).

Ao tentar compreender os processos mentais subjacentes à relação entre teoria da mente e

funções executivas, estudos apontam a região órbito-frontal como diretamente relacionada

com a regulação do processamento de informações sociais. Tais estudos indicam que

processos mentais subjacentes à habilidade de explicar e predizer comportamentos de outras

pessoas, por atribuir seus estados mentais e intenções, estão associados ao aumento da

densidade de matéria cinzenta no córtex órbito-frontal, gânglios basais e polos temporais.

Destarte, as pesquisas neuropsicológicas indicam que além da forte conexão com a amígdala

e o sistema límbico, o córtex órbito-frontal participa do circuito fronto-estriatal responsável

pelo processamento de informações sociais (Ardila, 2008; Lebreton et al., 2009; Powell et al.,

2010).

Teoria da coerência central:

Indivíduos com Transtorno Autista e Transtorno de Asperger apresentam tendência para

focar detalhes em detrimento das informações que perpassam o contexto da troca social. Em

diferentes níveis, problemas específicos com integração de informações diversas prejudica a

capacidade de compreensão global de um contexto, ou seja, prejudica a "coerência central"

do âmbito posto.

Designada de Teoria da Coerência Central, a falha na coerência central de um contexto

constitui-se como outra teoria que tenta explicar o comprometimento qualitativo da interação

social e comunicação no autismo. Caracteriza-se como a escassa capacidade de integrar

informações em um todo coerente em nível perceptual e conceitual.

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Falhas na coerência central estariam subjacentes à dificuldades apresentada por crianças

com autismo para identificar o rosto humano a partir do arranjo espacial de olhos, nariz e

boca. Também explicariam o motivo pelo qual há insuficiente compreensão do significado

global de uma história/piada, ou quando demonstram não responder ao chamado de seu nome

próprio, especialmente quando há envolvimento excessivo no que estão fazendo. O

processamento de informações parece ser preferencialmente local, ao invés de global.

Estudos especializados sugerem correlação positiva entre falhas na teoria da mente e

teoria da coerência central. Outros correlacionam com o controle inibitório, mas, de forma

geral, não há estudos substanciais sobre a temática (Beaumont & Newcombe, 2006; Jarrold,

Butler, Cottington & Jimenez, 2000). Mecanismos neurológicos subjacentes à falhas na

coerência central são escassos. Piven et al. (1995) propõem anormalidades difusas da

estrutura cerebral, citando provas de crescimento excessivo do cérebro.

Linguagem:

Faz-se relevante frisar que o processo de aquisição da linguagem verbal envolve a

integração de níveis de desenvolvimento interdependentes, a saber, o sistema fonológico

(percepção e produção de sons para formar palavras); o semântico (respeita as palavras e seu

significado); o pragmático (uso comunicativo da linguagem no contexto social) e o

gramatical ou morfológico (compreende as regras sintáticas e morfológicas para combinar

palavras em frases compreensíveis).

Estados mentais epistêmicos, os quais remetem à segunda e à terceira ordem da teoria da

mente, envolvem a habilidade de monitorar componentes subjetivos do próprio estado mental

e de outrem. Quando o indivíduo oferece uma nova informação relacionada com

preocupações sobre outrem, ou sobre tema relevante para o contexto de conversação, por

exemplo, há habilidade da Teoria da Mente imbricada com a linguagem verbal (Joseph &

Tager-Flusberg, 2004).

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Lyons and Fitzgerald (2004) asseguram que, no discurso de um indivíduo, a

autoconsciência do locutor é uma fonte de conhecimento desconhecida para o alocutário.

Durante conversação recíproca, a tomada de consciência do falante e a capacidade de avaliar

o interesse do ouvinte, sem dúvida, requerem uma compreensão representacional de outros

estados mentais.

Frith (2004), ao catalogar autobiografias de indivíduos com Transtorno de Asperger,

informa que os mesmos possuem dificuldade na conversação recíproca, porque comumente

não compartilham conhecimentos com os outros. Ou seja, falam sobre eles mesmos e suas

experiências, mas não indicam curiosidade sobre o conhecimento do que os outros pensam ou

sentem. Geralmente são hostis, porque é difícil realizar atividades que os outros solicitam,

notadamente quando estas são incompatíveis com os seus interesses.

Champagne-Lavau and Joanette (2009) discutem a relação entre a linguagem pragmática,

funções executivas e teoria da mente. Sugere-se que o desenvolvimento da linguagem

pragmática solicita sofisticadas habilidades da Teoria da Mente, mas acredita-se que as

funções executivas, sozinhas, podem ser melhores preditores de diferentes padrões de déficits

da linguagem pragmática.

Ironia, metáfora e pedidos indiretos, por exemplo, compõem aspectos pragmáticos da

linguagem. Tal habilidade exige ir além do significado literal a fim de compreender a

intenção do falante em um determinado contexto e, por conseguinte, decidir se a sentença

significa o que é dito ou se vai além, como no caso do pedido indireito.

A interpretação pragmática, processamento da linguagem não-literal, por exemplo,

solicita um exercício de teoria da mente à medida que se infere sobre o estado mental do

alocutário. Assim, um déficit na decodificação de tais inferências pode resultar em um

prejuízo no processamento da linguagem não-literal.

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A capacidade de distinguir uma piada de uma mentira, por exemplo, apoia-se na segunda

e terceira ordem da teoria da mente. A segunda ordem, "crença sobre crença", se faz presente

quando o alocutário pretende identificar o que locutor realmente transmite. Para tanto, torna-

se mister a correta interpretação do significado do enunciado através da correta compreensão

das intenções do locutor. Ou seja, exige o reconhecimento de que os outros têm crenças que

podem ser diferentes das suas próprias.

Por sua vez, a terceira ordem da teoria da mente, "crença sobre crença sobre crença" se

faz presente no momento em que o locutor sabe que o alocutário identificou que o enunciado

é irônico ou falso.

No tocante às funções executivas, déficits no controle inibitório levariam à deficiência da

supressão de múltiplas interpretações, tornando-se difícil escolher o sentido correto da

linguagem não-literal. Neste sentido, o controle inibitório permitiria suprimir interpretações

irrelevantes ou embaraçosos, em favor daquelas que são mais apropriadas no/para o contexto.

De acordo com Champagne-Lavau and Joanette (2009), falhas na flexibilidade cognitiva,

ou pensamento perseverante, sugere fixação rígida no sentido literal, a qual comumente

acarreta dificuldade de conceber significados alternativos adequados ao contexto.

Joseph and Flusberg (2004) advogam que as funções executivas (planejamento, memória

operacional, controle inibitório, flexibilidade cognitiva) contribuem para a linguagem

pragmática ao permitir que uma pessoa reflita e raciocine, a fim de planejar contribuições

para o discurso em curso. Além disso, o funcionamento integrado das habilidades executivas

permitiria a manutenção e atualização da conversação em curso, sem perder de vista

informações relevantes advindas da manipulação de fatos na memória operacional e da

inibição de respostas que estão fora do tema.

O estudo encontrou correlação positiva entre funções executivas e teoria da mente como

preditores da severidade de sintomas do Transtorno Autista. De acordo com o nível de

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desenvolvimento da linguagem, a relação entre teoria da mente e funções executivas possui

significativa variação na comunicação, mas não na interação social ou nos padrões

comportamentais repetitivos.

Portanto, ressalta-se a importância da linguagem como preditor do nível de severidade do

transtorno. Conforme González Rey (2005):

“A linguagem, portanto, não apresenta heurístico ilimitado no que concerne à

compreensão dos processos envolvidos na constituição da subjetividade. Nesse

sentido, a questão da emoção tem sido apontada [...] como fundamental tanto para a

compreensão dos processos semióticos envolvidos na constituição da

subjetividade [...] como para o entendimento da subjetividade. Isso significa que, ao

mesmo tempo que compartilhamos emoções, como medo e raiva, com os demais

animais, estas adquirem uma nova configuração entre os humanos.[...]. Isso

parece sugerir que a emoção entre os seres humanos consiste em um fenômeno

resultante da intrínseca interação entre componentes biológicos (resultantes da

história filogenética) e culturais, [...] incluindo diferenciadas dimensões da

subjetividade, [...].” [González Rey, 2005, p.150; grifos próprios].

É sabido que o Transtorno Autista pode desencadear atraso ou funcionamento anormal na

linguagem para fins de comunicação, com início antes dos 3 anos de idade. No Transtorno de

Asperger não existe atraso geral clinicamente importante na linguagem, mas estudos

neuropsicológicos argumentam que tal definição ampla dificulta critérios diagnósticos-

padrão.

Diante da problemática, Bennett e colaboradores (2008) identificaram, em crianças de 6 a

8 anos de idade com Transtorno de Asperger (TA), déficits na linguagem pragmática, em

contraponto ao desenvolvimento adequado da linguagem semântica, uso da gramática e

sintaxe. Embora anormalidades na linguagem não sejam comuns em indivíduos com TA, há

padrões de comunicação peculiares ao subgrupo clínico. Klin (2006) destaca a prosódia

pobre, espectro restrito de padrões de entonação, pobre modulação do volume da fala, bem

como frequente possibilidade de estilo de fala em monólogo.

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Isto posto, observa-se que os grupos clínicos vigentes possuem uma relação peculiar com

a linguagem. Relação esta que evidencia diferenças significativas em relação aos indivíduos

considerados com desenvolvimento típico, mas que não deixa de ser um fenômeno humano,

e, como tal, apresenta as suas peculiaridades e diferenças. Conforme Lins, Carvalho e

Pernambuco (2006), caminho pelo qual a linguagem emerge e se desenvolve representa a

existência de uma persistente, e até mesmo profunda, singularidade autista.

Os indivíduos com Transtorno de Asperger frequentemente têm sido associados à

disfunção do hemisfério direito em funções atribuídas à visoespacialidade. Em contraponto, o

Transtorno Autista tem sido associado com disfunção do hemisfério esquerdo em funções

tradicionalmente atribuídas a linguagem e processamento sequencial.

O atraso ou funcionamento anormal na linguagem para fins de comunicação (sistema

fonológico, semântico e gramatical) aparece predominantemente no Transtorno Autista,

enquanto o comprometimento da linguagem pragmática, relacionada ao hemisfério direito,

frequentemente sobressalta no Transtorno de Asperger.

Estudos de lateralização sugerem que quase todas as operações mentais envolvidas na

cognição social, a saber, habilidades linguísticas, linguagem pragmática, teoria da mente,

funções executivas, memória episódica, auto consciência e teoria da coerência central estão

prejudicadas em indivíduos com Autismo e, em menor nível de severidade, em indivíduos

com Asperger.

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Capítulo 3: A defectologia de Vygotsky e reflexões sobre o conceito diagnóstico do

Autismo

Lev Semenovich Vygotsky, Alexei Nikolaivich Leontiev e Alexsandr Romanovich Luria

formaram a tríade científica na qual buscava firmar a premissa sustentadora da psicologia

Sócio-Histórico-Cultural, a saber, a problematização acerca do papel dos meios culturais para

o desenvolvimento das funções psicológicas complexas (Hazin et al., 2010).

Para a presente pesquisa, Vygotsky desvela-se como referência teórica na área da

defectologia, cuja perspectiva proporciona rever e compreender o conceito do patológico e a

definição diagnóstica.

A defectologia Vygotskiana defende a relação dialética entre indivíduo e sociedade numa

perspectiva analítico-histórica. Nesta perspectiva, o desenvolvimento atravessado por uma

deficiência produz, em certo sentido, dificuldades na inserção cultural, ou melhor, na

adaptação do sujeito aos padrões culturais dominantes. Assim sendo, as limitações das

pessoas consideradas deficientes estão diretamente relacionadas, construídas e estabelecidas

pelo social.

A concepção quantitativa da deficiência está baseada numa visão de desenvolvimento

como algo "natural", onde o crescimento é quantitativo e embasado no aumento das funções

psicológicas e orgânicas que já estão pré-determinadas pelo biológico. Em contraponto, a

defectologia Vygotskyana baseia-se em uma concepção de desenvolvimento qualitativo,

onde, segundo W. Stern, citado por Vygotsky (1989), seria “uma cadeia de metamorfose”.

Tal concepção qualitativa lança luz sobre a singularidade do indivíduo, cuja peculiaridade

representaria um desenvolvimento qualitativamente diferente.

Conforme Vygotsky (1983),

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“Uma criança, cujo crescimento foi atravessado por uma deficiência, representa um tipo

de desenvolvimento qualitativamente diferente e único. [...] Se uma criança cega ou surda

atinge o mesmo nível de desenvolvimento de uma criança sem alterações neurológicas, ela o

faz de outra maneira, por outro percurso, por outros meios [...].” (Vygotsky, 1983, trecho

adaptado, grifos próprios).

Destarte, a deficiência possui função paradoxal: ao mesmo tempo em que dificultaria o

trilhar em caminhos similares aos das crianças típicas na obtenção dos fins pretendidos;

estimularia a busca de outros caminhos, conduzindo-a aos processos compensatórios.

Portanto, indivíduos atravessados por uma deficiência podem se engajar numa via

compensatória, alcançando um desenvolvimento qualitativamente diferente.

A compensação pressupõe estimular capacidades a partir da deficiência. Tal perspectiva

compensatória propicia um desenvolvimento por caminhos não-convencionais, os quais

constituem vias alternativas de ação, passíveis de decorrer em (re)criações, (re)construções,

(res)significações.

A lei compensatória não substitui, mas origina uma formação psicológica secundária. Ou

seja, a ação do defeito na personalidade da pessoa deficiente, acaba sendo secundária,

indireta, pois o indivíduo não está reduzido às suas limitações, apesar de perceber as

dificuldades que resultam dele, ou melhor, as consequências sociais de ser diferente.

Em artigo publicado na década de 1980, “Problemas Fundamentais da Defectologia

Contemporânea”, Vygotsky (1989) argumenta a necessidade de uma nova direção na

investigação patológica. Sugere que a ciência deve dominar e explicar as diferentes formas de

desenvolvimento infantil, estabelecer os ciclos e as mudanças deste desenvolvimento, bem

como suas variações e seus níveis em sua diversidade.

Vygotsky defendeu a concepção social acerca da deficiência, criticando os métodos

psicológicos de investigação baseados numa concepção quantitativa de desenvolvimento

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infantil. Segundo ele, este tipo de caracterização somente considera o grau da redução

causada pelo problema, esquecendo-se da estrutura e do funcionamento da personalidade -

forma de subjetividade - originada por este problema.

A defectologia de Vygotsky faz valer reflexões sobre o conceito diagnóstico do autismo,

na medida em que permite refletir o modo pelo qual se concebe o quadro clínico e,

consequentemente, subsidia propostas de intervenções clínicas e pedagógicas.

Para Vygotsky (1989), a defectologia firma-se como ciência que estudar seus

fenômenos e processos numa perspectiva qualitativa. Tal perspectiva solicita a ousada

tentativa de refletir sobre o lugar do autismo no âmbito clínico e da pesquisa, no sentido de

verificar se as proposições vão contribuir para a descoberta caminhos isotrópicos. Ou seja,

“vias colaterais de desenvolvimento cultural” (Vygotsky: 1989, pág.43).

Vygotsky (1989) solicita ir além de fundamentos e princípios clínico-pedagógicos

mecanizados. Sua proposição vai ao encontro da descoberta de vias entendidas como

compensatórias, em contraposição ao reforço do defeito, cuja formação psicológica

secundária pode culminar em sentimento de inferioridade, menos-valia.

Em suma, vale ressaltar a premissa de que o sujeito considerado deficiente atinge o

desenvolvimento de funções elementares em funções complexas, porém por caminhos

diferentes do desenvolvimento considerado típico. Trata-se, então, de um trabalho complexo

voltado para o reconhecimento da diferença e criação de condições propicias ao

desenvolvimento, ou lapidação, de funções psicológicas complexas.

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Capítulo 4: Neuropsicologia – fragmentos históricos e premissas de base

Além das contribuições de Vygotsky no âmbito da defectologia, o aparato teórico

fundamentador desta pesquisa será a neuropsicologia Sócio-Histórico-Cultural, em especial,

aquela avançada pelo legado teórico de Alexandr Romanovich Luria (1902-1977) e suas

aplicações práticas decorrentes do seu programa científico.

No início do século XX, na Rússia posteriormente intitulada URSS, Lev Semenovich

Vygotsky, Alexei Nikolaivich Leontiev e Alexsandr Romanovich Luria formaram a tríade

científica na qual buscava ir além da dicotomia vigente na psicologia europeia entre

psicólogos naturalistas e fenomenólogos (Hazin et al., 2010).

No âmbito da história da Psicologia, a tríade possibilitou reflexões teóricas que iam de

encontro à Psicologia Científica (amparada por estudo correlacional e experimental), bem

como à Psicologia Compreensiva – amparada pela fenomenologia e hermenêutica (Cornejo,

2005).

A perspectiva Sócio-Histórico-Cultural foi além do reducionismo das concepções

empiristas e idealistas, na medida em que tentava compreender como processos naturais, tais

como maturação física e mecanismos sensoriais, interagem com a cultura para construção das

funções psicológicas complexas (Akhutina & Pylaeva, 2011; Freitas, 2002; Hazin et al.,

2010; Luria, 1992).

Com premissas epistemológicas do materialismo histórico-dialético, a psicologia Sócio-

Histórico-Cultural define o homem como ser construído e constitutivo dos significados

acumulados historicamente e socialmente compartilhados. Graças à linguagem, o homem é

construído por significados imbricados nas relações dinâmicas e interdependentes com a

sociedade, a cultura e a história. Mas, ao mesmo tempo, é temporal no espaço e em suas

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ações, devido à capacidade autocrítica de refletir e problematizar o que foi feito no passado e

o que está sendo feito no presente. Há intenção permanente de promover um ciclo virtuoso de

destituir o instituído, em busca da evolução pessoal e histórico-cultural (González Rey,

2005).

À perspectiva teórica inaugurada pela psicologia Sócio-Histórico-Cultural subjazem

quatro premissas de base. A primeira defende que a inserção em ambiente sócio-histórico-

cultural tem implicações diretas sobre a estruturação das funções psicológicas superiores em

estágios relacionados, à medida que se processa a imersão nas práticas socioculturais. A

segunda informa que as funções psicológicas superiores, embora tenham suporte biológico

irrefutável, não podem ser compreendidas como produto biológico direto. Tal premissa

converge com a terceira, a qual argumenta que o funcionamento psicológico complexo está

fundamentado nas relações sociais estabelecidas entre o sujeito e o mundo, imersos em uma

dimensão histórica e cultural (Eilam, 2003; Hazin et al., 2010).

Já a quarta premissa, relaciona-se ao papel do universo simbólico na constituição do ser

humano. Argumenta-se que as relações estabelecidas entre o indivíduo e o mundo não são

diretas, mas requerem que a ação do primeiro sobre/com o segundo seja mediada por

instrumentos, signos e sistemas simbólicos, notadamente a linguagem verbal (Hazin & Meira,

2004; Oliveira, 2000; Vygotsky, 1991; Vygotsky & Luria, 1996).

Destarte, o desenvolvimento humano não é embasado por processo contínuo e

homogêneo, uma vez que se pressupõe o estabelecimento de uma relação de aprendizagem e

comunicação constante entre o organismo e o contexto sócio-histórico-cultural em que este se

desenvolve, ou para o qual se direciona. Acredita-se que a interdependência natureza/cultura,

mediada por instrumentos, signos e sistema simbólico, desencadeia modificações estruturais e

funcionais, tendo em vista as possibilidades de redefinições sinápticas mediante influencias

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socioculturais e ambientais (Ciasca, Guimarães, & Tabaquim, 2006; Eilam, 2003; Muszkat,

2006).

As quatro premissas supracitadas permitem compreender o desenvolvimento humano a

partir de níveis de análise distintos, porém complementares. A saber, o nível histórico,

filogenético, ontogenético e microgenético (Oliveira, 2000; Vygotsky, 1991; Vygotsky &

Luria, 1996).

O nível histórico refere-se às aquisições sociais, históricas e culturais da humanidade, da

comunidade e do momento histórico no qual se revela a ação humana. O filogenético versa

pelo desenvolvimento das espécies e às especificidades de cada uma destas. Neste nível,

pensar sobre o universo simbólico como constituinte do ser humano, necessariamente implica

pensar sobre o salto qualitativo que o homem deu, enquanto espécie animal (Cornejo, 2005;

Hazin et al., 2010).

O nível ontogenético refere-se ao desenvolvimento cognitivo, comportamental e

socioafetivo dos sujeitos, contemplando as mudanças estruturais e funcionais que ocorrem ao

longo da vida. Parte-se do pressuposto que os estágios de internalização, atravessados nas

relações interdependentes entre homem e contexto sociocultural, gradativamente, permitem

que funções elementares transformem-se em funções qualitativamente diferentes (Hazin et

al., 2010).

O desenvolvimento ontogenético debruça-se sobre a compreensão da linha natural de

desenvolvimento (curso maturacional) imbricada à linha cultural. Nesta perspectiva, admite-

se que, após imersão no universo simbólico, os processos psicológicos inferiores,

inicialmente independentes (funcionamento unimodal), são agregados a redes complexas

capazes de produzir significados (funcionamento polimodal) e, consequentemente,

possibilitam a emergência da consciência (Hazin et al., 2010; Vygotsky, 1991).

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Neste nível é factível perceber que percepções sensoriais transformam-se em ideias,

conceitos e pensamentos, permitindo o distanciamento das contingências do aqui e agora para

uma dimensão mais reflexiva, intencional e transformadora (González Rey, 2005; Hazin et

al., 2010; Luria, 1981; Mello, 2008).

Conforme Freitas (2002), a psicologia Sócio-Histórico-Cultural procura refletir o

indivíduo em sua totalidade, articulando dialeticamente os aspectos externos com os internos,

considerando a relação do sujeito com a sociedade à qual pertence. Assim, sua preocupação

central é encontrar métodos que possibilitem estudar o ser humano como unidade de corpo e

mente, ser biológico e ser social, membro da espécie humana e participante do processo

histórico. A perspectiva teórica em questão fornece subsídios para a integração complementar

da perspectiva nomotética e idiográfica no desenho metodológico de pesquisas, assim como

agrega a dimensão sociocultural no processo de pesquisa e nas propostas de intervenções

clínicas/neuropsicológicas (Haase et al., 2008; Hazin et al., 2010).

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Capítulo 5: A neuropsicologia de Luria (1902-1977)

Luria dedicou-se a assistir pacientes acometidos por lesões cerebrais, notadamente após a

Segunda Guerra Mundial. (Hazin et al., 2010; Luria, 1981). O objetivo maior da

neuropsicologia por ele avançada era compreender o curso da dissolução das funções

psicológicas superiores nos quadros de lesão e/ou disfunção cerebral (congênita ou

adquirida). Tal posicionamento implica na defesa que funções psicológicas superiores são

formadas ao longo da ontogênse, possuem origem social, bem como são complexas e

hierarquizadas em suas estruturas (Luria, 1981).

As contribuições teóricas lurianas emergiram em pleno impasse científico entre

perspectivas localizacionistas e antilocalizacionistas. Neste âmbito, Luria impulsiona um

salto qualitativo na discussão, ao refletir o papel das estruturas cerebrais sobre o

funcionamento psicológico superior a partir da revisão dos conceitos de função, localização e

sintoma (Luria, 1981).

No tocante ao conceito de função, Luria defende que não há como delimitá-la a uma

determinada área do córtex cerebral. Em contraponto à concepção de função atrelada a um

tecido particular (como a secreção de bile atrelada à função do fígado, por exemplo), as

funções cognitivas devem ser concebidas como sistemas funcionais. Tal concepção corrobora

com a ideia de que formas superiores do funcionamento constituem complexas redes

funcionais estruturadas, a partir da mediação da cultura e dos significados historicamente

acumulados e transmitidos (Luria, 1981).

O princípio de sistema funcional imprime a complexidade da estruturação e organização

cerebral inaugurada pelo princípio da organização extracortical das funções mentais

complexas. Neste sentido, a internalização de fatores externos, em especial os mediadores

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simbólicos, tem papel decisivo na organização funcional dos sistemas cerebrais. E, portanto,

permite inferir que o curso maturacional, preestabelecido geneticamente e universalmente

determinado em âmbito filogenético, pode sofrer variabilidade em virtude da influência

cultural (Hazin et al., 2010; Luria, 1981).

Os sistemas funcionais são essencialmente dinâmicos, permitindo a utilização de

mecanismos diversos (variáveis) para a realização de uma tarefa constante (invariável) que

almeja um resultado também constante (invariável) (Luria, 1981). Tal proposição evidencia

que o ser humano pode utilizar diversos caminhos para atingir o desenvolvimento e a

aprendizagem – premissa fundamental do modelo de reabilitação luriano (Hazin et al., 2010;

Luria, 1981).

Revisar o conceito de função também implica rever o conceito de localização. Sabe-se

que a aprendizagem, a inserção em meio sociocultural e/ou disfunções/lesões cerebrais

podem reorganizar conexões sinápticas, o crescimento de espículas dendríticas, a

conformação de macroproteínas das membranas pós-sinápticas, os neurotransmissores e

neuromoduladores, bem como as áreas sinápticas funcionais. Desse modo, a “localização”

dos processos psicológicos superiores é dinâmica, havendo deslocamento dos sistemas

funcionais ao longo da ontogênese (Hazin et al., 2010; Luria, 1981; Mello, Miranda, &

Muzskat, 2006; Muzskat, 2006).

Assim, o conceito de localização é substituído pelo de zonas funcionais, as quais, ao

longo da ontogênese, organizam-se em grupos de áreas corticais que são reestruturadas em

processos superiores e reorganizadas de modo interfuncional por meio de estágios

subsequentes, ascendentes e sobrepostos (Hazin et al., 2010; Luria, 1981).

De modo geral, no primeiro estágio há desenvolvimento das capacidades de alerta e

focalização atencional. No segundo há coordenação progressiva entre áreas motoras e

sensoriais primárias. No terceiro verifica-se desenvolvimento das áreas sensórias e motoras

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secundárias, bem como lateralização progressiva das funções linguísticas. No quarto observa-

se maturação das áreas terciárias relacionadas aos lobos parietal, temporal e occipital

(integração intermodal). E, por sua vez, no quinto estágio há maturação progressiva das áreas

pré-frontais (Luria, 1981).

Compreender que os sistemas de zonas funcionais operam em concerto complexo e

hierarquizado implica compreender que as repercussões neuropsicológicas decorrentes das

lesões ou alterações cerebrais, especialmente na infância, dependem de diversos fatores em

complexa interação (Luria, 1981).

Nesta perspectiva, a natureza, localização e extensão da alteração cerebral, a idade, o

contexto maturacional do Sistema Nervoso Central (SNC), a inserção sociocultural da

criança, dentre outros fatores, irão exercer importante papel no processo de organização do

cérebro, determinando o curso de seu desenvolvimento em condições patológicas.

As presentes considerações também implicam redefinições para o conceito de sintoma,

“perda de função” ou disfunção, em casos de lesão ou alteração do funcionamento cerebral.

Como as funções cognitivas superiores são realizadas por sistemas funcionais complexos,

organizados por grupos de áreas corticais que operam em concerto, um sintoma decorrente de

lesão ou disfunção não forneceria, por si só, informações acerca da sua localização. Neste

sentido, o sistema funcional como um todo pode ser prejudicado de diferentes formas em

diferentes pontos, tornando-se essencial a qualificação detalhada do sintoma observado

(Hazin et al., 2010; Luria, 1981).

Embora o sistema funcional não possua localização cortical específica, sabe-se que

existem áreas corticais importantes para cada um dos sistemas funcionais. Luria propõe uma

nova organização das funções cognitivas superiores, que pode ser subdividida em três

unidades, as quais regem simultaneamente o complexo funcionamento cerebral. A primeira

unidade seria responsável pela regulação do tono ou vigília; a segunda unidade seria

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receptora e teria o papel de manter contato com o mundo externo, armazenando e

processando informações que chegam através dos canais sensoriais e; a terceira unidade seria

efetora e estaria responsável pela programação, regulação e verificação da atividade mental

(Luria, 1981). Tais unidades funcionais encontram-se organizadas de forma hierárquica em

três zonas corticais: primária, secundária e terciária as quais apresentam complexidade

crescente (Machado, 2002).

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Capítulo 6: A neuropsicologia de Luria e contribuições para o delineamento do

desenho metodológico da dissertação em vigor

O legado teórico de Luria levou à proposição de uma nova metodologia de investigação

da organização e funcionamento cerebral em condições de normalidade e de patologia, bem

como de proposição de programa de reabilitação para pacientes com lesões e disfunções

cerebrais.

Embora sua experiência tenha sido com pacientes adultos acometidos por lesões cerebrais

focais, a presente pesquisa propõe adequar o método de Luria para intervenções

neuropsicológicas infanto-juvenis. Sobressalta-se que tal esforço não é pautado na mera

transposição do método Luriano para a população infanto-juvenil. O desenho metodológico

dessa pesquisa busca considerar a dinâmica do funcionamento cognitivo infanto-juvenil no

transcurso da maturação do sistema nervoso central e na inserção em ambiente sociocultural

específico, complementando o trabalho de Luria com conhecimentos contemporâneos acerca

da neuropsicologia do desenvolvimento (Hazin et al., 2010; Muszkat, 2006).

Em primeira instância, é preciso relembrar os desdobramentos de sua obra para a

neuropsicologia clínica:

1) a elevação do papel atribuído à dimensão sociocultural no contexto do

neurodesenvolvimento e no processo de reabilitação dos diversos quadros de lesões e/ou

disfunções cerebrais;

2) a construção de novo método de diagnóstico neuropsicológico para pacientes com

lesões cerebrais, a partir da integração complementar de aspectos qualitativos e quantitativos,

transpondo a ênfase da avaliação do produto para o processo. Nesta perspectiva, os

instrumentos avaliativos seriam uma maneira pragmática para adquirir amostras

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comportamentais e devem ser sempre utilizados dentro do contexto avaliativo. É cabível

afirmar que reduzir o diagnóstico neuropsicológico à testagem é um equívoco, sendo

imprescindível a análise das estratégias utilizadas, em detrimento de resultados brutos;

3) a proposição de programas de reabilitação neuropsicológica que ultrapassam os limites

impostos pela organização espontânea do sistema nervoso, abre espaço para a incorporação

de recursos auxiliares da cultura – as chamadas “próteses culturais” – que permitem ao

sujeito construir caminhos alternativos que o auxiliem a transformar o negativo da deficiência

no positivo da compensação (Hazin et al., 2010).

O diagnóstico neuropsicológico prioriza a identificação das funções cognitivas mais

afetadas. A metodologia proposta por Luria pressupõe a análise qualitativa do sintoma

investigado, sendo requerida a realização de análise sindrômica, através da investigação,

análise e comparação de alterações primárias (aquelas imediatamente relacionadas ao fator

deficitário) e secundárias (aquelas que surgem em decorrência da organização sistêmica das

funções psicológicas superiores) (Glozman, 1999). Destarte, a mera descrição do sintoma não

é suficiente para esta investigação, fazendo-se necessária uma especificação da estrutura

exata do sintoma, tendo em vista que sintomas aparentemente idênticos podem ter diferentes

causas patológicas (Eilam, 2003).

É sabido que a perspectiva epistemológica subjacente ao legado teórico de Luria autoriza

a integração complementar da perspectiva quantitativa e qualitativa no desenho metodológico

de pesquisa.

A pesquisa em questão lançou como hipótese a existência de diferenças no perfil

neuropsicológico de crianças com diagnóstico de Transtorno Autista ou Transtorno de

Asperger, conforme quarta edição revisada do DSM (DSM-IV-TR).

Para tanto, pretendeu-se seguir diagrama de processo diagnóstico e interventivo proposto

por Luria. A figura 2 o apresenta de forma esquemática.

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O presente estudo desenvolveu anamnese integrada a componentes da Classificação

Internacional de Funcionalidade (CIF), o Child Behavior Checklist (CBCL) e tarefas

qualitativas a fim de contemplar a avaliação comportamental e sócio afetiva dos participantes

da pesquisa.

Nesta perspectiva, pretendeu-se obter análise qualitativa do sintoma amparada pelo

histórico clínico e curso desenvolvimental dos grupos clínicos supracitados, bem como se

pretende identificar comprometimentos na capacidade funcional e/ou o impacto da doença

sobre essa capacidade, sem perder de vista as potencialidades que os grupos possuem para

exercer, ou lapidar, sua participação em atividades cotidianas (Luria, 1981; Muszkat, 2006;

Novelli & Canon 2012).

Em seguida, tornou-se necessário a avaliação quantitativa. Neste contexto, destaca-se a

avaliação neuropsicológica amparada por dados quantitativos, com vistas à investigação do

funcionamento cognitivo global do paciente. As tarefas propostas não podem estar limitadas

à investigação de uma única função, uma vez que o transtorno pode consistir de sintomas

que, à primeira vista, podem parecer heterogêneos, mas, de fato, podem estar vinculados a

uma só área cerebral constituinte de diversos sistemas funcionais (Eilam, 2003).

Figura 2: Diagrama de Luria

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A presente pesquisa propôs contemplar a avaliação quantitativa do sintoma por meio de

protocolo avaliativo composto por instrumentos de cunho nomotético-nomológico, cujo

desempenho do participante de pesquisa é comparado a um referencial normativo

populacional, comumente por meio de testes psicométricos. A fim de revelar as causas exatas

dos déficits em uma habilidade específica, o protocolo em questão possui instrumentos que

abarcam ampla variedade de funções, das quais, à primeira vista, não parecem diretamente

relacionadas com o prejuízo aparente.

Pretende-se verificar quais tarefas os grupos clínicos têm mais dificuldades e, desse

modo, pretende-se contribuir para construção de recursos interventivos pautados pelo

delineamento de características peculiares aos grupos clínicos supracitados.

O legado teórico de Luria, para pesquisas neuropsicológicas de vertente clínica, solicita

análise e interpretação dos resultados de modo a elevar o papel atribuído à dimensão

sociocultural no contexto do (neuro)desenvolvimento; assim como solicita a construção de

uma metodologia que transponha a ênfase do produto para o processo.

É cabível afirmar que reduzir a pesquisa neuropsicológica de cunho Sócio-Histórico-

Cultural à testagem é um equívoco. Torna-se imprescindível a análise das estratégias

utilizadas pelos participantes da pesquisa, em detrimento de resultados dos instrumentos

normatizados.

Neste sentido, a dissertação de mestrado em questão envolve a consideração de um

continuum entre informações quantitativas (oriundas de escores produzidos por testes

psicométricos) e informações qualitativas (obtidas através da observação e análise do

processo avaliativo, dos tipos de erros produzidos e da antecipação de estratégias dos

participantes da pesquisa, durante o processo avaliativo). Ressalta-se, nesse sentido, a

avaliação qualitativa da atividade (Eilam, 2003; Glozman, 1999).

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A fim de contemplar esta etapa, a pesquisa em questão propõe que todas as sessões

avaliativas sejam filmadas. Pretende-se preestabelecer comportamentos-alvo de análises (tais

como contato visual, elementos verbais e não-verbais de comunicação e contato afetivo

estabelecido), sem perder de vista registros de cunho clínico e observações sistemáticas

concernentes à postura dos grupos clínicos supracitados.

Espera-se que esta avaliação qualitativa da atividade contribua para a caracterização de

aspectos cognitivos, comportamentais e socioafetivos do Transtorno Autista e Transtorno de

Asperger.

O objetivo principal do perfil neuropsicológico detalhado é o planejamento de um

Programa de Intervenção. Para Luria, a reabilitação de uma função mental é possível por

meio da reconstrução ou reorganização estrutural do sistema funcional afetado. Esta

reconstrução pode se dar por três formas distintas: 1) reorganização cerebral espontânea; 2)

compensação e; 3) inserção de recursos auxiliares externos que substituam habilidades

comprometidas, conhecidos como “próteses culturais” (Eilam, 2003).

Apesar da proposta não contemplar o curso operacional da presente pesquisa, espera-se

que os resultados e análises realizadas possam constituir massa crítica importante para futuras

proposições de intervenções clínicas e educacionais aos grupos clínicos em questão.

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Objetivos:

Objetivo geral:

Caracterizar aspectos da cognição social, habilidades sociais e funcionamento

executivo dos subgrupos clínicos de crianças diagnosticadas com Transtorno Autista e

Transtorno de Asperger.

Objetivos específicos:

Avaliar a inteligência fluida, funções executivas, teoria da mente, habilidades sociais,

do comportamento e afetividade de crianças diagnosticadas com Transtorno Autista e

Transtorno de Asperger;

Realizar análise clínica-processual das atividades das crianças dos dois subgrupos

clínicos ao longo da execução das tarefas propostas.

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Método:

Para operacionalização dos objetivos propostos, adotou-se estudo de caso múltiplos, por

meio do seguinte arranjo operacional:

10.1 Participantes:

Participaram do estudo seis crianças, sendo três com diagnóstico de Transtorno Autista e

três com Transtorno de Asperger.

Os critérios de inclusão foram: 1) diagnóstico emitido por neuropediatra ou psiquiatra

infantil que acompanha a criança; 2) inserção na rede regular de ensino; 3) idade entre sete e

doze anos, independente do nível de escolaridade; 4) autorização dos responsáveis legais,

através do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Ressalta-se que a faixa de idade delimitada no critério de inclusão permite a utilização de

testes psicométricos normatizados para crianças em idade escolar. Como critérios de exclusão

prevaleceram algumas patologias ou condições que pudessem falsear o diagnóstico de

Transtorno Autista ou Transtorno de Asperger, tais como síndrome do X-frágil; Transtorno

da Linguagem Expressiva ou Transtorno Misto da Linguagem Receptivo-Expressiva;

Mutismo Seletivo; ou ainda acentuado comprometimento na acuidade auditiva e visual.

As características das crianças estão resumidas da tabela 1 abaixo:

Tabela 1: características das crianças avaliadas

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A presente pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFRN (CAAE:

11701312.9.0000.5537), cumprindo, portanto, com os aspectos éticos pertinentes à

investigação envolvendo seres humanos, conforme a Resolução nº 466/2012 do Conselho

Nacional de Saúde (2012).

Salienta-se que os resultados ora apresentados são um recorte de conjunto de dados maior

a ser discutido em sua totalidade em doutoramento futuro. A pesquisa cumpriu com todas as

etapas previstas na metodologia luriana, etapas estas caracterizadas anteriormente. Entretanto,

diante da limitação de tempo imposta pelo mestrado (24 meses) foram analisados neste

estudo os dados oriundos da etapa 1 (análise qualitativa do sintoma), dados parciais da etapa

2 (análise quantitativa do sintoma) circunscritos à avaliação da inteligência fluida,

funcionamento executivo, teoria da mente, habilidades sociais, comportamento e afetividade.

Assim como, dados da etapa 3 (análise procedural da atividade) referente aos instrumentos da

etapa 2.

10.2: Instrumentos e Técnicas:

Diagnostico Participante Sexo Idade Tipo de

escola

Nível de

escolaridade

Idade do

diagnóstico

Transtorno

Autista

Andy Masculino 8 anos e 2

meses

Pública 2º ano do Ensino

Fundamental

7 anos

Cauê Masculino 10 anos e

0 meses

Privada 2º ano do Ensino

Fundamental

8 anos

Amy Rose Feminino 9 anos e

10 meses

Privada 3º ano do Ensino

Fundamental

8 anos

Transtorno

de

Asperger

Jake Masculino 10 anos e

3 meses

Pública 5º ano do Ensino

Fundamental

10 anos

Hugo Masculino 7 anos e

11 meses

Pública 2º ano do Ensino

Fundamental

7 anos

Max Masculino 11 anos e

7 meses

Privada 6º ano do Ensino

Fundamental

6 anos

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A tabela 2 apresenta o protocolo global de avaliação neuropsicológica utilizado nas etapas

1 e 2, sendo este constituído por provas quantitativas e qualitativas. Destaca-se em azul os

instrumentos e tarefas cujo desempenhos serão alvo de análise neste documento.

As avaliações foram realizadas no SEPA (Serviço de Psicologia Aplicada – clínica escola

do curso de Psicologia da UFRN), em aproximadamente 8 sessões individuais de 50 minutos

cada. Os instrumentos utilizados são apresentados na tabela 2 a seguir:

Tabela 2: instrumentos utilizados

Avaliação cognitiva

Função neuropsicológica Instrumentos

Desempenho intelectivo

Escala Wechsler de Inteligência para crianças,

terceira edição (WISC-III);

Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR)

Atenção seletiva e

alternada

Teste de Atenção por Cancelamento (Capovilla &

Montiel, 2007);

Teste de Trilhas Coloridas

Sistema mnemônico

Teste de aprendizagem auditivo-verbal de Rey

(RAVLT);

Teste de Memória Lógica ou de Recordação de

Histórias;

Span Auditivo de Palavras em Sentenças (Neupsilin

Adulto);

Subteste Dígitos (WISC-III);

Teste de fluência verbal semântica (animais, frutas e

roupas);

Teste de fluência verbal fonológica (FAM)

Visoespacialidade e

Visoconstrução

Figuras Complexas de Rey;

Subtestes Cubos e Arranjo de Figuras (WISC-III)

Linguagem Processamento de Inferências (Neupsilin Adulto);

Provas de Avaliação dos Processos de Leitura

(PROLEC)

Funções executivas A Developmental Neuropsychological Assessment

(segunda edição, NEPSY-II)

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Avaliação de habilidades sociais

A Developmental Neuropsychological Assessment (segunda edição, NEPSY-II)

Inventário Multimídia de Habilidades Sociais para Crianças (IMHSC-Del-Prette)

Avaliação comportamental

Child Behavior Checklist (CBCL)

Avaliação emocional

Desenho história com tema: “Eu e minha família”; “Eu e minha escola”

Segue descrição dos instrumentos utilizados, assim como os objetivos do estudo ao

escolher cada um destes instrumentos.

Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR):

Embora controverso, a revisão de literatura do presente estudo aponta publicações

científicas que trazem a severidade do quadro clínico do espectro autista atrelado ao

desempenho intelectivo e idade.

A avaliação intelectual comumente constitui-se como recurso valioso a pesquisas

neuropsicológicas de cunho clínico. Estudos recentes buscam pontos convergentes entre

inteligência e funções executivas, uma vez que, juntos, refletem proposições teóricas

frutíferas no âmbito da pesquisa clínica (Brydges, Reid, Fox, & Anderson, 2012).

Quando comparado a outros instrumentos, o MPCR possui a vantagem de não depender

da fala para a execução da tarefa e emissão das respostas. O teste investiga a capacidade

de estabelecer comparações, o desenvolvimento do pensamento lógico, assim como o

raciocínio analítico e a capacidade de raciocinar por analogia (Albuquerque, 1996). Tal

instrumento traz a ele subjacente a teoria do fator geral de inteligência (fator “g”) e investiga

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a capacidade edutiva, ou seja, a capacidade de extrair novos insights (compreensões) e

informações do que já é percebido ou conhecido.

Os itens do MPCR são apresentados sob a forma de desenhos ou matrizes nos quais falta

uma parte. A tarefa da criança consiste em escolher, entre as alternativas colocadas na metade

inferior da página, a que completa corretamente o desenho. A escala contém 36 itens

divididos em três séries: A, Ab e B. Os 12 itens de cada série estão dispostos em ordem de

dificuldade crescente. A maioria dos itens está impresso com fundos coloridos, o que os torna

mais atraentes para crianças. A avaliação é feita através de um crivo ou chave de correção. Os

totais parciais de cada série permitem determinar a consistência da pontuação, que indica a

validade do resultado. O total de acertos é convertido em percentil, de acordo com a faixa

etária e tipo de escola da criança avaliada.

Figura 3: exemplo de um problema do MPCR série Ab

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O teste MPCR vem sendo bastante utilizado em amostras de indivíduos com

deficiência intelectual, em grande parte devido a sua rápida e fácil administração, além da sua

maior independência das habilidades psicomotoras e verbais.

Para além do percentil, a escolha do MPCR está atrelada à possibilidade de análises

qualitativas do modo pelo qual as crianças realizaram o teste, notadamente concernente ao

tipo de erro produzido. De certo modo, o tipo de erro cometido fornece indicadores

qualitativos da natureza das dificuldades subjacentes à avaliação intelectual e, por

conseguinte, propicia escolher outros instrumentos avaliativos direcionados à investigação

robusta das dificuldades delineadas (Angelini et al., 1999).

Raven, Court e Raven (1990) (citado por Albuquerque, 1996), consideraram que os erros

efetuados poderiam ser agrupados nas seguintes categorias:

I - Erros de Diferença:

1. A alternativa selecionada não contém nenhuma figura semelhante ao padrão a

completar;

2. A alternativa selecionada é irrelevante em relação ao padrão a completar.

II - Erros de Individuação Inadequada:

1. A alternativa escolhida está contaminada por irrelevâncias e distorções;

2. A alternativa selecionada combina figuras irrelevantes;

3. A alternativa contém metade ou a totalidade do padrão a completar.

III - Erros de Repetição do Padrão:

1. A alternativa selecionada reproduz o padrão situado acima e à esquerda do espaço a

completar;

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80

2. A alternativa selecionada reproduz o padrão situado exatamente acima do espaço a

completar;

3. A alternativa selecionada reproduz o padrão situado exatamente à esquerda do espaço

a completar.

IV- Correlato Incompleto:

1. A figura está orientada incorretamente;

2. Está incompleta, mas correta até esse ponto.

V- Figura Correlativa:

1. Completa o padrão tanto horizontalmente como verticalmente.

A Developmental Neuropsychological Assessment (segunda edição, NEPSY-II):

A segunda edição da Avaliação Neuropsicológica do Desenvolvimento, originalmente

publicada por Korkman, Kirk e Kemp (2007), encontra-se em processo de validação para o

Brasil. O NEPSY-II já foi traduzido e adaptado. Atualmente está em fase de normatização,

sendo o estudo coordenado no Brasil pela Profa. Dra. Nayara Argollo da Universidade

Federal da Bahia (UFBA) em parceria com a Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).

O NEPSY é o resultado de um longo percurso de tentativas psicométricas voltadas para

aplicação dos métodos de Luria na população infantil. O instrumento integra alguns aspectos

importantes da abordagem teórica de Luria com abordagens contemporâneas da avaliação

neuropsicológica infantil.

O instrumento destaca-se em escala internacional por contemplar aspectos central da

teoria Luriana, a saber, a análise dos processos cognitivos compreendidos como sistemas

funcionais, tornando-se essencial a qualificação detalhada do sintoma observado por um

sistema interligado de sub-processos, ou componentes, em uma variável dinâmica. Nesta

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perspectiva, o NEPSY permite a avaliação da criança transpondo a ênfase do produto para o

processo avaliativo (Korkman, 1999; Shayer, 2007).

Trata-se de bateria neuropsicológica ampla voltada para avaliação das funções

neuropsicológicas de crianças em idade pré-escolar e escolar (3-16 anos de idade). Constitui-

se de 32 subtestes que permitem a administração de subtestes específicos, grupos de

subtestes, ou a bateria inteira. O NEPSY-II é dividido em seis domínios: atenção/funções

executivas, linguagem, processamento visoespacial, sensório-motor, memória e

aprendizagem, percepção social.

A escolha do NEPS-II pauta-se pela perspectiva teórica subjacente à construção do

instrumento e por permitir a avaliação do domínio da atenção/funções executivas, bem como

medidas de percepção social. Tais domínios são associados a déficits específicos na criança

com Transtorno Autista e Transtorno de Asperger, conforme literatura prévia. Até o presente

momento, alguns estudos internacionais independentes têm utilizado uma seleção de

subtestes do NEPSY-II para avaliar funções cognitivas específicas concernentes aos quadros

clínicos citados (Narzisi Muratori, Calderoni, Fabbro, & Urgesi, 2013). Estes são

apresentados a seguir.

Domínio Atenção e Funções Executivas:

Constitui-se por seis testes, mas o presente estudo contemplou cinco destes. Foi excluído

o teste estátua, uma vez que o mesmo foi desenvolvido para ser aplicado a crianças na faixa

etária de 3-6 anos, sendo esta não contemplada na pesquisa em questão.

O teste de atenção auditiva e conjunto de respostas possui duas etapas: na primeira a

criança escuta uma série de palavras e, quando ela ouve a palavra-alvo, deve apontar para o

círculo apropriado. A etapa objetiva avaliar a atenção auditiva seletiva e sustentada. Por sua

vez, a segunda etapa requer escutar uma série de palavras, tocar em distintos círculos diante

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de palavras-alvo diferentes da cor dos círculos. Tal etapa visa avaliar flexibilidade mental,

inibição de resposta e memória operacional para matéria verbal.

Classificando animais requer classificar os cartões em dois grupos de quatro cartas, cada

um usando vários critérios de classificação. O teste fluência de desenhos investiga fluência

visomotora para gerar desenhos originais, na medida em que ela é convidada a gerar projetos

gráficos originais, conectando até cinco pontos apresentados em um conjunto estruturado,

depois, aleatório.

O teste inibindo respostas avalia a capacidade de inibir respostas automáticas e alternar

entre respostas congruentes ou incongruentes durante nomeação de estímulos visuais. Neste

há três etapas: na primeira a criança é convidada a nomear a forma de quadrados e círculos,

ou a direção para cima ou para baixo de flechas. A segunda avalia o controle inibitório, à

medida que a criança precisa nomear de maneira invertida a forma ou direção da flecha, ou

seja, precisa inibir respostas automáticas em favor de respostas novas. A terceira etapa

investiga a flexibilidade mental, uma vez que requer a nomenclatura congruente ou

incongruente à resposta de acordo com a cor do estímulo.

Por fim o relógios avalia planejamento e organização visoespacial, percepção visual e

conceito de tempo, à medida que se solicita ler ou desenhar a hora apresentada por meio de

relógios analógicos ou digitais.

Domínio Percepção Social:

O domínio da percepção social no NEPSY-II é investigado através de dois testes:

reconhecendo emoções e teoria da mente. Para este estudo foi utilizado o subteste da teoria

da mente, que por sua vez, contempla duas tarefas, quais sejam:

1) Teoria da mente, tarefa verbal: apresentam-se descrições verbais ou pictóricas de

algumas situações sociais. A partir de então, são feitas perguntas sobre tais

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situações que requerem o conhecimento do ponto de vista dos personagens

apresentados;

2) Teoria da mente, tarefa contextual: avalia a capacidade de entender como certas

emoções estão ligadas a determinadas situações sociais. Em quatro tarefas

diferentes, a criança é convidada a reconhecer a expressão emocional (feliz, triste,

raiva, medo, nojo, neutro) a partir de fotografias de rostos de crianças.

Ressalta-se que a vertente verbal contempla adaptações de tarefas clássicas,

internacionalmente utilizadas, para avaliação da teoria da mente. Tendo em vista a faixa

etária dos participantes da pesquisa, o presente estudo incluiu tarefas da vertente verbal, cujas

propostas inserem o público infanto-juvenil entre as faixas etárias de 9 a 16 anos.

Os itens 6, 7 e 8 constituem tarefas de falsa crença, cujo objetivo é investigar a primeira,

segunda e terceira ordem da teoria da mente. No item 6, por exemplo, apresentam-se duas

caixas de embalagem de cubos à criança. Logo em seguida, pergunta-se sobre seu conteúdo.

A mesma responde imediatamente: “cubos/blocos”. Em seguida, a embalagem é aberta e é

mostrada a criança que, na realidade, ela contém vários lápis, ao invés de cubos/blocos.

Então, pergunta-se a criança o que ela acha que um suposto amigo (para o qual nada foi dito a

respeito do conteúdo da embalagem) responderá sobre o que há naquela embalagem de

cubos/blocos.

Figura 4: exemplo do teste teoria da mente, tarefa contextual Figura 4: exemplo da tarefa contextual do teste teoria da mente

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A situação reporta-se ao teste de Smarties (Hogrefe, Wimmer, & Perner, 1986), bem

como ilustra a falsa crença sustentada pelo suposto amigo, ou seja, a de que ambas as caixas

contém o mesmo conteúdo, pois ele não viu previamente o que está vinculado às respectivas

caixas. Nessa situação, a criança precisa imaginar um amigo e atribuir uma crença sobre a

compreensão/atitude do mesmo. Caso acerte, pode-se sugerir que ela atingiu o primeiro

estágio do desenvolvimento da teoria da mente (crença), tornando-se apta a diferenciar o real

do faz-de-conta e permitindo o acesso à imaginação e simbolização de crenças.

O item 7 avalia a segunda ordem da teoria da mente, quando a criança interpreta o

significado do enunciado e, por conseguinte, consegue atribuir correta compreensão (crença)

sobre a atitude do personagem Beto. Beto é uma criança que tem muita dificuldade com a

escrita. Na mesma tarde em que não foi bem na prova escrita da escola, ele foi à casa da sua

amiga Carol, onde foi convidado a brincar com um jogo de escrever palavras. Após convite,

Beto decidiu voltar para casa.

Aqui, a criança precisa se colocar no lugar de um personagem da história e atribuir uma

crença sobre a atitude do mesmo. Caso acerte, sugere-se que ela atingiu o segundo estágio do

desenvolvimento da teoria da mente (crença sobre a crença), no qual as crianças adquirem a

habilidade de inferir sobre os estados mentais do outro.

Por sua vez, o item 8 avalia a terceira ordem da teoria da mente, quando a criança precisa

inferir sobre a crença das personagens Adriana e Raquel em relação aos os personagens

Rodrigo e Paulo. Ou seja, verifica-se a "crença sobre crença sobre a crença", quando a

criança interpreta o significado do enunciado e, por conseguinte, consegue atribuir correta

compreensão do pensamento de Adriana e Raquel sobre Rodrigo e Paulo.

A história versa sobre quatro amigos que vão ao parque de diversões. Adriana e Raquel

decidem brincar no carrossel, enquanto Rodrigo e Paulo optam pela roda-gigante. Ao

chegarem ao local da roda-gigante, a fila estava tão grande que os meninos decidiram ir

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brincar na casa-mal-assombrada, sem avisar as meninas. Nesse sentido, Adriana e Raquel

sustentam uma falsa crença acerca do lugar onde os amigos encontram-se, isto é, elas pensam

que Rodrigo e Paulo estão na roda-gigante. A compreensão da falsa crença é acessada através

da pergunta: “Quando Adriana e Raquel terminaram no carrossel, aonde elas foram procurar

os meninos, na casa-mal-assombrada ou na roda-gigante?”.

No item 9 a criança olha para a foto de um menino designado por Henrique. Nela,

Henrique está vestido com roupa de adulto (paletó e gravata), usa óculos, segura papéis e

uma mala. Quando a foto é apresentada pergunta-se à criança do quê Henrique está

brincando, investiga-se a habilidade de distinguir aparência-realidade através da

representação mental da criança sobre a foto.

O item 10 é composto por uma vinheta apresentada na forma de texto. Nesta, descreve-se

uma situação na qual um dos personagens aparece tomando uma atitude, cuja compreensão

por parte da criança ouvinte só torna-se possível quando ela consegue inferir o estado mental

da personagem naquela situação.

O item 14 é semelhante, porém com maior nível de complexidade. Neste, descreve-se

uma situação congênere à anterior, na qual a criança ouvinte só identifica o disfarce de um

dos personagens e só consegue compreender a expressão facial do outro personagem, se

compreender a história e inferir estados mentais dos personagens adscritos. Ambas as

vinhetas remetem ao teste Hinting (Corcoran, Mercer, & Frith, 1995) e ao teste Faux Pas

(Stone, Baron-Cohen, & Knight, 1998), tarefas clássicas que pretendem investigar a

habilidade de inferência de estados mentais.

Os itens 11 e 12 propõem a compreensão de imagem e texto com duplo-sentido. No

primeiro há a imagem de um bule que parece uma maçã, onde se pretende avaliar

representações mentais guiadas pelo rastreamento perceptual. O segundo há um texto

apresentado com auxílio de uma imagem. A criança é convidada a interpretar o termo “ponto

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final” na seguinte situação: “Os alunos da professora Regina estão fazendo presentes para as

crianças de um orfanato. Estava na hora do recreio. A professora Regina disse: meninos,

precisamos colocar um ponto final nos trabalhos.”

Por fim, os itens 13 e 15 propõem interpretação de provérbios populares na sociedade

brasileira. Ambos com auxílio de imagem, a criança é convidada a interpretar a expressão

“cara de uma, focinho da outra” e “gato e sapato”, nas respectivas situações:

1. Item 13: “Denise e Emília são irmãs. Mamãe diz que elas são cara de uma,

focinho da outra.”;

2. Item 15: “Oscar disse: Mãe, tio Carlos está vindo me pegar para tomar sorvete!

Mamãe sorriu e disse: Oscar, você faz seu tio Carlos de gato e sapato.”.

Por sua vez, a segunda vertente de avaliação (teoria da mente, tarefa contextual) sugere

estruturação semelhante ao teste Eyes (Baron-Cohen, Wheelwright, Hill, Raste, & Plumb,

2001). Tal teste contempla tarefa composta (verbal e não verbal) baseada na avaliação da

capacidade de descrição de estados mentais, a partir da observação de fotografias das regiões

em torno dos olhos de pessoas desconhecidas. A descrição de estado mental é feita através da

melhor opção de descritor dentre quatro possibilidades apresentadas por fotografia.

Tabela 3: domínios cognitivos e testes do NEPSY-II utilizados na pesquisa

Domínio Teste Idade (anos)

Atenção/

Funções executivas

Atenção auditiva conjunto de repostas 5-16 anos

Classificando animais 7-16 anos

Fluência em desenhos 5-12 anos

Inibindo respostas

Relógios

5-16 anos

7-16 anos

Percepção social Teoria da mente 3-16 anos

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Inventário Multimídia de Habilidades Sociais para Crianças (IMHSC-Del-Prette):

O IMHSC-Del-Prette consiste de um conjunto de materiais para avaliação de habilidades

sociais de crianças em faixa etária correspondente à primeira fase do Ensino Fundamental (7

a 12 anos).

O instrumento apresenta três grandes grupos de reações sociais, quais sejam:

1. Reações habilidosas: comportamentos apresentados pela pessoa para lidar com

demandas interativas do seu ambiente;

2. Reações não-habilidosas:

a. Passivas: comportamentos que predominantemente se expressam na forma

encoberta de incômodo, mágoa, ressentimento, ansiedade e/ou por meio de

esquiva ou fuga das demandas interpessoais;

b. Ativas: comportamentos que predominantemente se expressam na forma de

agressividade física ou verbal, negativismo, ironia, coerção.

Para tanto, o IMHSC-Del-Prette apresenta situações compatíveis com reações de

empatia/civilidade, assertividade de enfretamento, autocontrole e participação, sendo

avaliadas pelas crianças de acordo com a frequência de emissão da reação, adequação

atribuída à reação e dificuldade de emissão da reação.

A apuração dos resultados envolve protocolos que analisam as reações habilidosas ou não

habilidosas gerais da criança, sem perder de vista o possível caráter situacional das

habilidades sociais.

A escolha do instrumento justifica-se pela possibilidade de analisar habilidades sociais do

grupo clínico investigado de forma semelhante à realidade, uma vez que o sistema multimídia

agrega situações e reações em vídeo, equivalentes ao ambiente escolar. O programa é

interativo e a criança pode responder diretamente clicando o mouse do computador.

Child Behavior Checklist (CBCL):

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O CBCL constitui-se como questionário traduzido e adaptado para o português do Brasil,

com fins de utilização em pesquisa que propõe a avaliação de competências sociais e

problemas comportamentais em indivíduos de 4 a 18 anos, a partir de informações fornecidas

pelos pais ou responsáveis diretos.

Adaptado para o Brasil por Bordin, Mari e Caeiro (1995), o CBCL caracteriza-se como

questionário composto por 138 itens divididos em onze categorias. Dessas, três originam a

Escala de Competência Social e as demais compõem a Escala de Problemas

Comportamentais.

A primeira escala, Escala de Competência Social, objetiva identificar problemas no

desempenho de atividades e nos aspectos relacionados à sociabilidade e à escolaridade.

Obtém-se informações sobre o envolvimento da criança em diversas atividades (brincadeiras,

jogos, execução de tarefas), participação em grupos, relacionamento com pessoas (familiares,

amigos), independência no brincar e desempenho escolar (Borsa & Nunes, 2008).

A segunda escala, Escala de Problemas Comportamentais, se subdivide em duas, quais

sejam, Escala de Problemas de Comportamento Internalizante e Externalizante.

Esta inclui padrões comportamentais manifestos e desajustados, como agressividade,

agitação psicomotora e comportamento delinquente, correspondendo às classificações de

Comportamento de Quebrar Regras/Delinquencial e Comportamento Agressivo.

Aquela abarca padrões comportamentais privados desajustados, correspondendo às

classificações de Ansiedade/Depressão, Isolamento/Depressão, Queixas Somáticas,

Problemas Sociais, Problemas de Pensamento, Problemas de Atenção.

O CBCL ainda inclui a Escala de Síndromes e a Escala Orientada pelo DSM-IV, onde os

dados para classificação remetem a perfis clínicos do DSM-IV.

A escolha pela aplicação do CBCL justifica-se pela sua larga utilização em pesquisas

voltadas para avaliação do comportamento infanto-juvenil, em virtude de caracterizar-se

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como instrumento eficaz para quantificar as respostas de pais ou responsáveis legais.

Ademais, o rigor metodológico do instrumento torna-o sensível para utilização no âmbito

clínico e científico (Borsa &Nunes, 2008).

Desenho história com tema:

O desenho história com tema é uma técnica projetiva utilizada como meio auxiliar

para o conhecimento da dinâmica psíquica no diagnóstico psicológico. A técnica possibilita

uma exploração ampla da personalidade e destaca aspectos da dinâmica emocional. Segundo

Trinca (1997), os desenhos livres associados a histórias constituem um instrumento para

obtenção de informações sobre a personalidade que não são facilmente detectáveis pela

entrevista psicológica.

A aplicação da técnica é bastante simples, podendo ser individual ou coletiva, com

qualquer faixa etária, de qualquer nível intelectual e socioeconômico. O material consiste em

folhas de papel em branco sem pauta e lápis para os desenhos. Primeiramente é pedido à

criança que faça um desenho relacionado com o tema em estudo. Após o desenho, solicita-se

ao avaliando que conte uma história associada ao estímulo. As temáticas utilizadas para a

presente pesquisa foram: “Eu e minha família” e “Eu e minha escola”.

A escolha pela utilização deste teste deve-se à necessidade de investigar os

aspectos afetivos das crianças inseridas nos quadros clínicos do Autismo ou Asperger. Além

disto, sabe-se que as associações livres tendem a se dirigir a setores em que o indivíduo é

emocionalmente mais sensível.

Desta forma, a utilização desta técnica permite vislumbrar a expressão de aspectos da

dinâmica emocional da criança.

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Resultados:

A seguir serão apresentados os resultados encontrados na avaliação neuropsicológica de

cada criança avaliada, as quais, por sigilo ético, serão designadas por pseudônimos. Para fins

didáticos, os resultados serão apresentados por domínios investigados.

Criança 1 – Pseudônimo Andy – Transtorno Autista:

Andy é uma criança do sexo masculino, com oito anos e dois meses de idade no momento

da avaliação neuropsicológica. Destaca-se que o pseudônimo Andy remete ao personagem que

compõe o atual tema de interesse da criança, a saber, o desenho animado Toy Story.

Etapa 1 – Análise qualitativa do sintoma:

ANAMNESE COM A MÃE DO ANDY:

As informações registradas sobre o histórico clínico do Andy foram fornecidas pela

progenitora, durante entrevista clínica no mês de abril de 2013. O parto foi normal, porém

“complicado” (sic). Não há lembranças sobre os primeiros dias e meses de vida do pequeno,

mas o histórico clínico refuta a presença de intercorrências clínicas graves.

Em relação ao histórico clínico, o teste do pezinho, realizado em fevereiro de 2005, não

sugeriu anormalidades. A avaliação auditiva, realizada em abril de 2012, indica “integridade

auditiva das vias retrococleares bilateralmente” (idem). Por fim, a pesquisa molecular de X-

Frágil, realizada em maio de 2012, indica normalidade, assim como o exame do cariótipo

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com banda G, também realizado em maio de 2012, informa que “não há alteração

cromossômica numérica e/ou estrutural nas metáfases analisadas” (ibidem).

O relato da progenitora sugere que a linguagem de Andy encontra-se preservada na

dimensão receptiva. Todavia, aspectos do desenvolvimento da linguagem expressiva

merecem detalhamento. Segundo progenitora, ele tinha aproximadamente 3 anos de idade,

quando disse, pela primeira vez, palavras com significado, para além de “mamã” ou “papá”.

Por volta dos 5 anos de idade, Andy começou a aprimorar o uso da linguagem expressiva, na

medida em que falava algo com significado que envolvesse juntar palavras, isto é, usar frases

com 2 ou 3 palavras.

Andy possui pronuncia de fácil entendimento, mas ainda há alguns sons que ele não

consegue dizer muito bem. Ele é uma criança que não constrói frases narrativas para relatar

como foi o dia na escola, por exemplo. Geralmente traz frases curtas e objetivas como:

“pintei uma bola”, “brinquei com Alexandro”, mas, em todo caso, “só fala se alguém

perguntar” (sic), informa a mãe.

Comumente fala sozinho e gesticula de acordo com situações vivenciadas em desenhos

animados prediletos. Às vezes, usa frases de forma inapropriada ou sem significado. Ainda

não há conversação recíproca, na qual compreende e responde sobre tópicos que lhe sejam

propostos; bem como ainda não há relatos de conversação demonstrando interesse nos outros.

Conforme informações proferidas pela mãe, há momentos nos quais Andy emite perguntas ou

afirmações inadequadas. Geralmente, não regula o tom da voz, repete o que o outro fala,

repete várias vezes o que chama a atenção.

De modo geral, Andy se ampara muito bem na comunicação não-verbal. Ele fala nome de

pessoas familiares, expressa concordância e discordância, responde a perguntas fechadas do

tipo sim/não. Todavia, possui dificuldade para explicar como se faz algum procedimento,

seguir instruções e, geralmente, possui entraves para compreender significado não literal.

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Frequentemente, utiliza fala e gestos dos personagens de desenhos animados prediletos,

sem perder de vista a imitação do tom da voz. Apesar de atualmente utilizar a fala para se

comunicar e expressar desejos, quando pequeno, utilizava o corpo de outrem para comunicar

algo.

Observa-se interesse pela brincadeira de montar quebra-cabeça de animais e desenhos

animados do Pica Pau, Tom e Jerry e, primordialmente, o Toy Story. Não há relatos que

sugiram presença de brincadeira simbólica. A mãe do Andy relata uso repetitivo de objetos

por parte do filho.

Ademais, há relato de dificuldades com pequenas alterações na rotina ou no ambiente que

o rodeia. Segundo progenitora, Andy apresentou febre emocional ao mudar a rotina do

interior do Estado para a capital Natal. Ela o considera desorganizado, mas ao mesmo tempo,

reconhece que o filho não gosta que ninguém mexa nos objetos pessoais dele, por exemplo.

Andy demonstra ficar com raiva, quando o pai tira o brinquedo do lugar. Geralmente chora

quando tentam mudar a rotina/objetos dele.

Andy consegue expressar seus sentimentos. Comumente diz quando está triste. Quando

alegre, geralmente abraça aqueles que o rodeiam e diz: “eu gosto de você”. Observa-se

dificuldade para ingestão de alimentos novos. No tocante às interações sociais, a mãe queixa-

se da dificuldade de Andy para estabelecer brincadeiras com seus pares, notadamente em

âmbito escolar. Observa-se comprometimento qualitativo da interação social, manifestado

por fracasso em desenvolver relacionamentos apropriados ao nível de desenvolvimento com

seus pares; e ausência de tentativas espontâneas de compartilhar prazer, interesses ou

realizações com outras pessoas.

Filho único, Andy cresceu no interior do Rio Grande do Norte sem acesso a

acompanhamento sistemático com profissionais da área da saúde. Quando ele completou três

anos de idade, a mãe começou a compará-lo a prima de idade próxima e, por conseguinte,

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observar diferenças qualitativas no âmbito do desenvolvimento da linguagem verbal, tais

como: não contar histórias e não elaborar frases longas, aparentemente, Andy falava sem

intenção comunicativa.

Andy ingressou na escola com 4 anos de idade. As dificuldades globais no processo de

aprendizagem, atrelado à aparente diferença qualitativa no âmbito do desenvolvimento da

linguagem verbal, suscitaram questionamentos familiares sobre a possibilidade de quadro

clínico subjacente. Andy percorreu a educação infantil com dificuldades de aprendizagem e

socialização, mas os recursos financeiros restritos adiaram planos de vir à capital do Estado a

fim de investigar com maior profundidade as dificuldades recorrentes.

O diagnóstico de Transtorno Autista foi emito por neuropediatra da rede particular de

saúde da capital Potiguar, quando Andy completou 7 anos de idade.

A progenitora afirma que sempre desconfiou que o filho tivesse algum quadro clínico

subjacente ao modo peculiar de ser e estar no mundo. Andy sempre foi designado por

familiares distantes e colegas de sala como criança “doida” e preguiçosa. Embora

importunada, a mãe do Andy confessa que a escassez de conhecimento teórico e prático sobre

temáticas psiquiátricas impossibilitaram clarificar a terceiros os comportamentos do filho.

Ela descreve características atuais marcantes na criança, quais sejam, dificuldade na

comunicação verbal; comportamento compulsivo e ritualístico; gritos constantes,

notadamente em momentos opositores aos seus interesses; agressividade aparentemente sem

motivos; alimentação seletiva; dificuldade de interação social duradoura, especialmente entre

pares; risos aparentemente sem motivos; repetição de palavras e ações vistas em desenhos

animados apreciados por ele; dificuldade de entender regras e aparente escassez da

brincadeira simbólica, ao afirmar que o filho “não sabe brincar” (sic).

Até o momento da presente avaliação neuropsicológica, Andy é designado como criança

dispersa que possui dificuldade global de aprendizagem. Ele ainda não sabe ler, mas escreve

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o nome próprio e reconhece as letras do alfabeto. No momento em vigor, cursa o segundo ano

do Ensino Fundamental em escola pública do interior do Estado. Há histórico de repetição de

ano (repetiu o 1ª ano do ensino fundamental, duas vezes) e é acompanhado em aula de

reforço escolar há quatro anos.

Devido à distância geográfica da escola, informações sobre o Andy, enquanto aluno,

foram fornecidas por relatório escolar. Segundo relatório da professora que o acompanha há

quatro anos:

“Andy não se concentra nas tarefas que está realizando e necessita de

sistemáticas mediações em todas as atividades escolares propostas. Identifica e

escreve as letras do alfabeto (...), após a leitura e exploração de um texto, consegue

identificar algumas palavras solicitadas, mas não consegue ler. O segundo semestre

escolar foi marcado por avanços significativos. Andy consegue transcrever da lousa

para o caderno, escreve o nome próprio completo” (sic).

Em suma, Andy mora em uma cidade estimada em trinta mil habitantes, mas grande

parcela da comunidade onde reside o conhece e oferece apoio para participação e

envolvimento em tarefas cotidianas. Diariamente, Andy possui autonomia para comprar pão e

leite, por exemplo.

DESENHO HISTÓRIA COM TEMA:

Destaca-se que o desenho história de Andy caracteriza-se por desenhos figurativos

constituídos por figura agregada. Conforme figura 5, observa-se a organização da estrutura

cabeça/corpo, mas verifica-se cabeça e olhos desproporcionalmente grandes em comparação

com o resto da figura. Salienta-se que a capacidade de lidar com proporção ao representar

algo começa a surgir aproximadamente aos oito anos de idade (Piaget & Inhelder, 1956).

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Ainda não se observam

diferenciações dos personagens gráficos. Adicionalmente, dificuldades visuoespaciais,

associadas à cabeça e olhos desproporcionalmente grandes em comparação com o resto da

figura, parecem interferir na elaboração do desenho figurativo de Andy (observar figura 6).

Figura 6: desenho com tema “Eu e minha

família”, produzido por Andy

A dificuldade de

Figura 5: extrato do desenho figurativo produzido por Andy

Page 96: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO … · Figura 3: exemplo de um problema do MPCR série Ab ... Figura 11: extrato do teste Fluência de Desenhos (NEPSY-II), parte estruturara,

96

comunicação verbal de Andy é um empecilho à produção narrativa da técnica do desenho

história com tema. Ele desenhou o tema “Eu e minha família”, mas recusou-se a discorrer

sobre o tema “Eu e minha escola”.

Conforme figura 10, apresentada anteriormente, o desenho com tema “Eu e minha

família” foi caracterizado pela presença da criança e seus pais. Não se verifica acabamento

diferenciado da figura humana, mas Andy coloca as letras iniciais do nome próprio de cada

membro familiar na tentativa de oferecer diferenciações para as suas representações gráficas.

Salienta-se que, ao apresentar-se enquanto membro da família, ele falou seu nome próprio,

em detrimento do uso do pronome pessoal “eu”.

Possivelmente, Andy recusou-se a realizar o desenho história com tema “Eu e minha

escola” devido à aparente escassez de vínculos e vivências significativas neste âmbito.

RESULTADO DO CBCL (RESPONDIDO PELA MÃE DE ANDY):

A primeira escala fornecida pela CBCL refere-se à Escala de Competência Social,

relacionada a problemas no desempenho de variadas atividades (brincadeiras, jogos, execução

de tarefas), no relacionamento com pessoas (familiares, amigos) e desempenho escolar (Borsa

& Nunes, 2008).

Conforme figura 7, o comportamento de Andy foi classificado como clínico na Escala de

Competências Sociais, assim como em todas as esferas da referida escala. Conforme

informações elucidadas pela progenitora, Andy não estabelece brincadeiras com seus pares,

notadamente em âmbito escolar. Ele não possui amigos, não há relatos que sugiram presença

de brincadeira simbólica e participação em atividades esportivas. Ademais, há histórico de

repetência escolar e, até o momento da presente avaliação, embora soubesse escrever o nome

próprio e reconhecer as letras do alfabeto, ele ainda não sabia ler.

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97

Figura 7: resultado do Andy na Escala de Competências Sociais (CBCL)

Na segunda escala fornecida pelo CBCL, a Escala de Síndromes (figura 8), Andy

enquadra-se nas categorias clínicas compatíveis com Isolamento/Depressão, Problemas

Sociais, Problemas de Pensamento e Problemas Atencionais, sem perder de vista a faixa

limítrofe para Ansiedade/Depressão, Comportamentos Agressivos e comportamentos que

tendem à

quebra de

regras.

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98

Figura 8: resultado do Andy na Escala de Síndromes (CBCL)

Aqui, verifica-se aproximação dos resultados com o discurso da progenitora ao lembrar

que ela descreveu características atuais marcantes no filho, quais sejam, gritos constantes,

notadamente em momentos opositores aos seus interesses; agressividade aparentemente sem

motivos; dificuldade de interação social duradoura, especialmente entre pares; risos

aparentemente sem motivos; dificuldade de entender regras e comportamento disperso.

Andy obteve classificação clínica na Escala de Problemas Total, tendo em vista o

enquadramento clínico para Problemas Internalizantes e Externalizantes (escala derivada do

CBCL, observar figura 9).

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99

Figura 9: resultado do Andy na Escala de Problemas Totais (CBCL)

Em última análise, na Escala Orientada pelo DSM-IV, onde os dados para classificação

remetem perfis clínicos do DSM-IV, Andy obteve resultado compatível com a categoria

clínica circunscrita a problemas de ansiedade, problemas opositores-desafiadores e problemas

de conduta, sem perder de vista a faixa limítrofe para problemas de hiperatividade/déficit

atencional. Sobressaltam-se quadros clínicos de comportamento obsessivo-compulsivo e de

estresse pós-traumático.

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Figura 10: resultado do Andy na Escala Orientada pelo DSM-IV (CBCL)

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101

A grande parte dos resultados encontrados no CBCL consona com aspectos específicos

apontados pela anamnese de Andy, mas destaca-se aqui que alguns resultados clínicos,

podem ter sido potencializados pela dificuldade de compreensão das perguntas.

Etapas 2 e 3 – Análise Quantitativa do Sintoma e Análise Qualitativa da Atividade:

INTELIGÊNCIA FLUÍDA:

a. Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR):

Tabela 4: resultados quantitativos de Andy no MPCR

A Ab B

Soma 07 04 04

Consistência 07 04 04

Discrepância 0 0 0

Somatório Percentil1 Classificação

15 30 III-

(Intelectualmente médio)

No Teste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR), o desempenho de Andy

foi classificado como intelectualmente médio. Ele obteve somatório de 15 pontos (pontuação

máxima = 36 pontos), sem discrepância nas respectivas séries A, Ab, B.

Ao analisar o tipo de erro cometido, ocorreram 5 erros na série A e 8 erros nas séries

consecutivas (Ab e B). Verificam-se erros predominantemente do tipo repetição do padrão.

Andy frequentemente cometeu erro do tipo III (g), ou seja, repetição do padrão

imediatamente acima do espaço a ser preenchido.

1 Percentil de acordo com a população geral

Page 102: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO … · Figura 3: exemplo de um problema do MPCR série Ab ... Figura 11: extrato do teste Fluência de Desenhos (NEPSY-II), parte estruturara,

102

Tal resultado sugere respostas impulsivas associadas a comportamento perseverativo,

apontando para dificuldades no funcionamento executivo, notadamente nas habilidades de

flexibilidade mental.

FUNÇÕES EXECUTIVAS:

a. NEPSY-II, provas do domínio da atenção e funções executivas:

Valores de referência:

Tabela 5: resultados quantitativos de Andy na prova de atenção auditiva e conjunto de respostas (NEPSY-

II)

Atenção auditiva e conjunto de respostas

Parte 1

Acertos Erros de

ação

Erros de

omissão

Erros de

inibição

15 34 12 03

Escore

ponderado/percentil

Percentil Percentil Percentil AA Combinado –

Escore ponderado

01 <2% 2-5% 2-5% 01

Parte 2

Acertos Erros de Erros de Erros de

Escore Ponderado Percentil Classificação

13 – 19 >75% Acima do nível esperado

08 – 12 26 - 75% Nível esperado (Média)

6 – 7 11 - 25% Limítrofe

4 – 5 3 – 10% Abaixo do nível esperado

1 – 3 <2% Muito abaixo do nível esperado

Page 103: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO … · Figura 3: exemplo de um problema do MPCR série Ab ... Figura 11: extrato do teste Fluência de Desenhos (NEPSY-II), parte estruturara,

103

ação omissão inibição

07 21 08 11

Escore

ponderado/percentil

Percentil Percentil Percentil CR Combinado –

Escore ponderado

01 <2% 26-50% 2-5% 01

Tabela 6: resultados quantitativos de Andy na prova Classificando Animais (NEPSY-II)

Classificando animais

Erros originais Erros repetidos Total de erros Acertos

0 02 02 0

Percentil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

51-75% 11-25% 26-50% 03 04

Tabela 7: resultados quantitativos de Andy na prova Fluência de Desenhos (NEPSY-II)

Fluência de desenhos

Estruturada Aleatória Total

03 02 05

Percentagem acumulada Percentagem acumulada Escore ponderado

4-5 <3 02

Tabela 8: resultados quantitativos de Andy na prova Inibindo Resposta (NEPSY-II)

Inibindo resposta

Não se aplica

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104

Tabela 9: resultados quantitativos de Andy na prova Relógios (NEPSY-II)

Relógios

Escore total Escore ponderado

18 01

De forma geral, o desempenho de Andy nas provas do domínio da atenção e funções

executivas do NEPSY-II sugere dificuldades significativas no funcionamento executivo.

No teste Atenção Auditiva e Conjunto de Respostas, seu desempenho foi classificado

como muito abaixo do nível esperado para sua faixa etária nas partes 1 e 2 (respectivo escore

combinado equivalente a 01 ponto). Em ambas as etapas, a criança obteve baixo número de

acertos, seguido de acentuado número de erros nas três vertentes analisadas, a saber, erros de

ação, omissão e inibição.

Nesse sentido, verifica-se que Andy apresenta dificuldade contínua na ação de escutar a

palavra-alvo de cor para apontar o círculo da cor correspondente na parte 1 e, por

conseguinte, flexibilizar ou inibir o toque a fim de emitir resposta congruente à regra de

manter ou alternar o círculo da cor correspondente à palavra-alvo na parte 2.

Aqui, adverte-se para a possibilidade de dificuldade na compreensão verbal das regras

ouvidas para execução da tarefa, ou ainda sugere-se a presença de déficits na atenção auditiva

seletiva e sustentada. Acredita-se que dificuldades associadas aos substratos cognitivos

básicos, como a atenção, culminaram em entraves nas habilidades cognitivas superiores que

as têm como substrato, como as funções executivas, notadamente no funcionamento do

controle inibitório e flexibilidade mental.

Tais hipóteses ganham força ao verificar que Andy não conseguiu concluir o teste

Inibindo Respostas. O teste é constituído por dois itens fragmentados em três etapas. No

primeiro a criança precisa nomear formas para, posteriormente, inibir e mudar o estímulo

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“forma” de acordo com as regras elucidadas no manual do NEPSY-II. O segundo item, setas,

constitui-se de três etapas, sendo congênere ao primeiro item.

O cômputo final dos resultados do teste referido exige a integralização das três etapas

constituintes dos itens 1 (formas) e 2 (setas). Andy nomeou a forma de quadrados e círculos,

bem como concluiu a etapa de nomeação invertida da forma com tempo de execução de 65

segundos e integralização de 11 erros, desses 06 auto-corrigidos e 05 não corrigidos. Todavia,

ele recusou a tarefa (exaustivamente) explicada de flexibilizar a nomenclatura da forma e, por

conseguinte, recusou as três etapas constituintes do item 2 (setas).

Nessa perspectiva, não foi possível obter o cômputo final dos resultados de Andy no teste

Inibindo Respostas. A análise qualitativa da atividade permite vislumbrar dificuldades na

atenção sustentada e nas funções executivas (notadamente no funcionamento da flexibilidade

mental), subjacente à dificuldade de compreensão verbal. Verifica-se que Andy segue as

instruções propostas, fato que o levou à execução das etapas de nomeação e inibição do item

1 do teste Inibindo Respostas. Contudo, verifica-se dificuldade exaustiva nas atividades

subsidiadas por habilidades de flexibilidade mental e devida continuação em itens

posteriores, passível de sugerir entraves na atenção sustentada e funções executivas.

A hipótese de dificuldades na flexibilidade mental também emerge ao analisar o

desempenho de Andy nos testes Classificando Animais e Fluência de Desenhos.

No primeiro, ele encontra-se abaixo do nível esperado para sua faixa etária (escore

combinado equivalente a 04 pontos). Aqui, verifica-se acentuado número de erros por padrão

de repetição. Andy persistiu em repetir a categorização de animais que andam e voam, em

detrimento da presença de acertos.

No segundo, ele obteve desempenho muito abaixo do nível esperado (integralização de 05

produções, equivalente a 02 pontos ponderados). Verifica-se baixo número de produções, em

contraponto ao acentuado número de erros, mais uma vez, por padrão de repetição. Conforme

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extrato, Andy segue com 3 desenhos repetidos na série estruturada e prossegue com maior

intensidade na séria aleatória, onde há registro de 4 desenhos repetidos (observa figuras 11 e

12).

Figura 11: extrato do teste Fluência de Desenhos (NEPSY-II), parte estruturara, produzido por Andy

Figura 12: extrato do teste Fluência de Desenhos (NESPY-II), parte aleatória, produzido por Andy

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107

Por fim, o desempenho de Andy no teste Relógios sugere que ele ainda não domina o

conceito de tempo (não acertou os itens voltadas para nomeação da hora), assim como

adverte para a possibilidade de presença de dificuldades em atividades subsidiadas por

habilidades visuoespaciais e visuoconstrutivas.

Andy obteve desempenho muito abaixo do esperado no referido teste. Conforme figura

13, no item 1, por exemplo, há contorno fechado que remete à recuperação mnemônica de um

relógio analógico, entretanto, traços gráficos aleatórios em detrimento da presença de

números sugerem que ele ainda não apresenta conceito de tempo, ou possui dificuldades nas

habilidades visuoespaciais e visuoconstrutivas.

De acordo com Maia (2010), a habilidade visuoespacial envolve pensar em imagens,

transformar e recriar aspectos do mundo visual e espacial. Habilidades relacionadas à rotação

mental, percepção espacial e visualização espacial estão envolvidas na visuoespacialidade.

Por sua vez, dificuldades visuoconstrutivas estão associadas a entraves de traduzir uma

percepção visual em ação motora adequada.

Figura 13: extrato do teste Relógios (NEPSY-II), item 1, produzido por Andy

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Dificuldades visuoespaciais e visuoconstrutivas parecem repercutir nos itens 9 e 10 do

teste, por exemplo, nos quais Andy copia os relógios analógicos, mas observa-se números

desproporcionais organizados de forma assimétrica, bem como ponteiros desproporcionais

inseridos em contornos que não os acomodam de modo adequado. Observar figura 14.

HABILIDADES SOCIAIS E ASPECTOS SOCIOAFETIVOS:

a. Inventário Multimídia de Habilidades Sociais (IMHSC-Del-Prette): não se aplica;

b. NEPSY-II, provas do domínio da percepção social:

Figura 14: extrato do teste Relógios (NEPSY-II), itens 9 e 10, produzido por Andy

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Tabela 10: resultados quantitativos de Andy na prova Teoria da Mente (NEPSY-II)

Teoria da mente

Tarefa verbal

Escore Percentil

06 < 2%

Tarefa contextual

Escore

02

Escore total Escore ponderado/Percentil

08 < 2

A aplicação do Inventário Multimídia de Habilidades Sociais (IMHSC-Del-Prette) foi

iniciada com as perguntas do Perfil Geral, em que a criança assiste a três reações e

posteriormente escolhe aquela considerada adequada.

O avaliador optou por interromper a aplicação do IMHSC-Del-Prette, ao observar o

comportamento disperso de Andy, atrelado às respostas impulsivas, semelhantes a padrão de

perseveração (persistia em assinalar a alternativa “A” das reações propostas). Ressalta-se que

o comportamento disperso estava associado à brincadeira com o Buzz Lightyear, boneco do

desenho Toy Story que o acompanhava em todas as sessões avaliativas. Andy pegava o

boneco e sugeria ecolalia diferida da fala de personagens do desenho animado citado.

Exemplos foram apresentados, auxílios de execução foram propostos, mas a criança

prosseguiu com dificuldade na execução da atividade. Quando o avaliador propôs a

finalização da mesma, Andy disse: “muito difícil” (sic).

Para além da avaliação de habilidades sociais, percebe-se aqui a dificuldade de

engajamento e, possivelmente, de compreensão do inventário (mesmo com auxílio de

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110

recursos audiovisuais e multimídia). Nesse sentido, adaptações de situações hipotéticas do

IMHSC-Del-Prette foram propostas na tentativa de investigar habilidades sociais da criança.

Situações específicas do IMHSC-Del-Prette foram adaptadas, recorrendo-se à presença

presença dos personagens do Toy Story (desenho predileto da criança) envolvidos em

contextos sociais semelhantes à versão original do instrumento. Habilidades de

empatia/civilidade, assertividade de enfrentamento, autocontrole e participação foram

avaliadas de modo qualitativo, a partir das seguintes proposições:

- Juntar-se a um grupo em brincadeiras (habilidade de participação, adaptada do item 1):

Sr. Cabeça de Batata e o Porquinho estão brincando de futebol. Buzz quer brincar também. O

que Buzz vai fazer?;

a) Fica esperando Sr. Cabeça de Batata e o Porquinho o convidarem para brincar de futebol;

b) Chega perto do Sr. Cabeça de Batata e o do Porquinho e se auto convida para brincar de

futebol;

c) Puxa a bola de futebol do Sr. Cabeça de Batata e o do Porquinho e diz: “agora é minha

vez!”.

- Pedir mudança de comportamento (habilidade de assertividade de enfretamento, adaptada

do item 05):

Sr. Cabeça de Batata e Buzz estão assistindo aula, quando Buzz começar a cutucar o Sr.

Cabeça querendo conversar. O que Buzz vai fazer?

a) Mesmo com vontade de prestar atenção na professora, Buzz vira-se para ouvir o que o Sr.

Cabeça de Batata tem a dizer;

b) Buzz diz ao Sr. Cabeça de Batata que depois escuta o que ele tem a dizer, porque, no

momento, ele quer prestar atenção na explicação da professora;

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111

c) Buzz diz ao Sr. Cabeça de Batata: “Cala a boca!! Não está vendo que você está

atrapalhando?!”.

- Oferecer ajuda (habilidade de empatia/civilidade, adaptada do item 10):

O Sr. Cabeça de Batata vê o amigo Buzz querendo subir os degraus da escada da escola, mas

o Buzz está com uma perna quebrada. O que o Sr. Cabeça de Batata vai fazer?

a) Passa pelo Buzz e não tá nem ai;

b) Diz ao Buzz: “quebrou a perna, foi? Bem feito! Ninguém mandou você jogar futebol. Ra-

ra-ra”;

c) O Sr. Cabeça de Batata oferece ajuda ao amigo Buzz para subir os degraus da escada.

- Aceitar gozações (habilidade de autocontrole, adaptada do item 15):

Buzz precisa usar óculos de grau. Quando ele chega à escola, todos os amigos começam a

dizer: “quatro olhos! Quatro olhos!”. O que Buzz vai fazer?:

a) Fica calado, apenas ouvindo os amigos o chamarem de quatro olhos. Mas, ao mesmo

tempo, pensa: “ai que saco! Bem que eu não queria vir à escola de óculos.”;

b) Fica calado e pensa: “já já eles param. Vão se acostumar com o meu óculos”;

c) Olha para os amigos e diz: “feios, chatos! Vocês são chatos!”.

As situações escolhidas do IMHSC-Del-Prette não seguiram critérios de inclusão. A

escolha foi aleatória e apresenta situações aparentemente comuns ao universo de diversas

crianças. Tais adaptações seguem com os mesmos personagens na tentativa de evitar

substituições que vão de encontro à dificuldade de flexibilidade mental: função executiva

aparentemente frágil no funcionamento executivo de Andy. Na tentativa de facilitar o

engajamento e motivação da criança na atividade proposta, o Buzz foi inserido nas situações,

porque ele acompanhou Andy em todos os encontros avaliativos.

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As situações hipotéticas foram propostas de forma lúdica, mas sobressaltou a aparente

dificuldade de Andy na linguagem receptiva e expressiva. Ele demonstrou engajamento na

proposição, mas frequentemente emitia ecolalia imediata da fala do avaliador, ou ainda trazia,

em frases curtas e pontuais, relatos de vivências pessoais, o que por sua vez sugere adequado

desenvolvimento da memória episódica. Por exemplo, ao ouvir a adaptação do item 1, Andy

respondeu:

- Andy: “O que Buzz vai fazer? Fazer.” (sic);

- O avaliador prosseguiu: “a) Buzz vai ficar esperando Sr. Cabeça de Batata e o Porquinho o

convidarem para brincar de futebol?”;

- Andy: “Futebol. Lá em Pau dos Ferros2 Andy joga futebol. Na fazenda. É.” (sic).

Semelhante ao IMHSC-Del-Prette, Andy demonstrou comportamento disperso na tarefa

de teoria da mente do NEPSY-II. Ele encontra-se muito abaixo do nível esperado para sua

faixa etária. Entretanto, a análise qualitativa da atividade permite vislumbrar maior

engajamento em itens de perguntas curtas, subsidiados por imagens visuais ou auxílio de

objetos concretos (item 5 e 6, por exemplo), em detrimento dos itens longos, apresentados

sem auxílio de imagens (item 10, por exemplo).

Aqui, para além da avaliação da teoria da mente, sugere-se que Andy demonstra

beneficiar-se de atividades permeadas por informações objetivas e pontuais, subsidiadas por

estímulos visuais ou objetos concretos.

Como os itens verbais exigem que a criança escute toda a história, para depois responder

a perguntas específicas, indica-se que a dificuldade de Andy pode estar atrelada à carência de

estratégias para manipular e manter, mentalmente, a história narrada (memória operacional

para material verbal). Possivelmente, ele possui span mnésico pequeno (capacidade limitada

de armazenamento na memória de curto prazo) e, por conseguinte, beneficia-se de

2 Cidade onde Andy reside.

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solicitações curtas. O reduzido tempo de manutenção do foco atencional sobre estímulo-alvo,

também podem ter-se constituído como barreira à execução das tarefas propostas.

Criança 2 – Pseudônimo Cauê – Transtorno Autista

Cauê é uma criança do sexo masculino, com dez anos de idade no momento da avaliação

neuropsicológica. A criança foi diagnosticada com Transtorno Autista (DSM-IV-TR) por

neuropediatra, aos 8 anos de idade. Cauê chegou ao SEPA encaminhado pela escola regular,

que demonstra intensa preocupação com a necessidade de elaborar planejamento pedagógico

condizente com o perfil neuropsicológico da criança.

Etapa 1 – Análise qualitativa do sintoma:

ANAMNESE COM OS PAIS DE CAUÊ:

As informações registradas sobre o histórico clínico do Cauê foram fornecidas pelos pais

da criança, durante entrevista clínica realizada em maio de 2013. O relato dos pais sugere

forte vínculo afetivo na relação pais-filho, entretanto, há pontos de vista dissonantes atrelados

ao perfil comportamental do Cauê.

A mãe associa o perfil comportamental e socioafetivo do filho ao quadro clínico indicado

por neuropediatra. O pai, por sua vez, parece resistir à aceitação do diagnóstico clínico. Leitor

fluente de publicações científicas, no decorrer da entrevista clínica, frequentemente atrelou

atitudes e dificuldades do filho a justificativas de causa-efeito.

Como consequência, eles sugerem assumir papéis desarmônicos na relação pais-filho. A

progenitora frequentemente ressalta perfil materno acolhedor e protetor, como se as

dificuldades do filho fossem específicas do quadro clínico e, portanto, passíveis de encobrir

com atitudes de aceitação. Por outro lado, o progenitor tem perfil associado ao rigor

educacional, como se as dificuldades do filho fossem passíveis de superação por meio de

intenso treino.

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114

Por exemplo, enquanto o pai reconhece as dificildades de aprendizagem do Cauê, mas

acredita que as mesmas podem ser superadas com horário de estudo intensificado, a mãe

também sugere reconhecer tais dificuldades, entretanto, flexibiliza o horário de estudo posto.

Concernente ao desenvolvimento de Cauê, o pré-natal foi realizado adequadamente. O

parto foi normal, sem intercorrência clínica. Conforme relato do pai, o desenvolvimento das

habilidades motoras e linguísticas ocorreu dentro da faixa etária esperada. A queixa de atraso

circunscreve ao desenvolvimento da linguagem expressiva, a qual, segundo o pai, deve-se ao

comprometimento na articulação dos movimentos orofaciais que compõem a fala

oral/expressiva, sugerido por profissional da fonoaudiologia.

Cauê é uma criança que sempre gostou de brinquedos de montar e desmontar. Não gosta

de brinquedos convencionais e tem preferência por brincadeiras relacionadas ao ambiente da

construção civil. Como o pai trabalha na área, o discurso do mesmo indica que Cauê aprecia

manipular diferentes tipos de materiais do contexto em vigor. Ele é descrito como criança que

possui curiosidade aguçada pelo ambiente, mas que não gosta de barulho e lugares agitados.

Não há queixas relativas aos padrões de sono e alimentação.

No tocante ao desenvolvimento escolar, Cauê passou dois anos sem frequentar

instituições escolares, porque teve dificuldades de adaptação ao contexto de ensino-

aprendizagem oferecido. Nesse período, a criança foi acompanhada por psicopedagoga, que

sinalizava a presença de entraves na aprendizagem da leitura e escrita.

No momento da avaliação neuropsicológica, Cauê cursava o 2º ano do Ensino

Fundamental em uma escola particular do município de Natal-RN. Dentre as informações

decorrentes da entrevista na instituição, destaca-se: a dificuldades em manter interação social

por longo período de tempo, bem como o comportamento rigidamente rotineiro. Por

exemplo, todos os dias, ele precisa olhar todos os ralos dos banheiros e inspecionar a área de

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115

lazer da escola. Quando a necessidade não é atendida, frequentemente há comprometimento

da atenção concentrada durante as aulas.

Ademais, Cauê foi designado como um aluno que não demonstra motivação durante

realização de atividades que não despertam seu interesse, notadamente aquelas voltadas para

leitura e escrita. Comumente ele chora e não se engaja em atividades escolares com maior

grau de dificuldade.

Durante anamnese, os pais informaram que Cauê frequentemente queixa-se de dores de

cabeça. Ele utiliza óculos com grau 4,5 devido à cicatriz na mácula do olho direito. Cauê é

apresentado como filho que possui comportamentos “opositores-desafiadores” (sic) e que se

sente “frustrado/culpado” (sic) em circunstâncias nas quais reconhece seus erros. Por

exemplo, ele comumente coloca a mão na tomada ou termina de rasgar camisas que estão

furadas, mas, depois, olha para os pais e diz: “Não. Não pode não.” (sic).

Ressalta-se que a expressão “comportamento opositor-desafiador” advém de psicólogo

clínico que acompanhou Cauê por aproximadamente dois meses. A hipótese foi sugerida pelo

profissional e, por conseguinte, passou a integrar o vocabulário dos pais para designar

comportamentos, tais como os supracitados.

Em relação ao histórico clínico, o exame Bera (Audiometria de Tronco Encefálico),

realizado em fevereiro de 2010, conclui que há “integridade auditiva das vias retrococleares

bilateralmente” (idem). Também em fevereiro de 2010, Cauê foi submetido à

eletroencefalografia em vigília. Apesar das condições técnicas pouco satisfatórias, uma vez

que estava inquieto e pouco cooperante, o resultado do exame conclui “ausência de

potenciais epileptogênicos” (idem).

O exame de X-Frágil por pesquisa PCR, realizado em novembro de 2010, aponta para

ausência de expansão no Locus FRAXA, excluindo, portanto, o diagnóstico de Síndrome do

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116

X-Frágil. No mesmo período, o exame de cariótipo (pareamento cromossômico – banda G)

eliminou a possibilidade de células com aberração cromossômica.

No mais, dois exames neurológicos foram realizados, quais sejam, tomografia

computadorizada crânio-encefálica (realizado em janeiro de 2011) e ressonância magnética

crânio-encefálica (realizado em abril de 2011). O primeiro indica a presença de calcificações

intracranianas, considerando a hipótese de angiomas múltiplos, todavia, o segundo exame

indica parâmetros dentro da normalidade. Conforme impressão diagnóstica do exame: “as

calcificações vistas em tomografia anterior praticamente não têm expressão à ressonância

magnética” (idem).

DESENHO HISTÓRIA COM TEMA:

O desenho história de Cauê caracteriza-se por desenhos figurativos, ou seja, há a busca de

semelhança intencional entre o desenho e a figura que quer representar. De acordo com a

figura 15, o desenho da figura humana encontra-se em fase de verticalização da figura-girino:

a região da cabeça representa apenas a cabeça, as pernas representam uma forma de tronco e

pernas indistintos, e os braços são ligados a essas linhas verticais (Grieg, 2004).

Figura 15: desenho história do Cauê com tema “Eu e minha família”

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117

A dificuldade de comunicação verbal de Cauê trouxe barreiras à construção narrativa do

desenho história com tema. Ele desenhou os temas solicitados, quais sejam, “Eu e minha

família”, “Eu e minha escola”, mas a apresentação verbal do desenho foi incentivada pelo

avaliador. Ele trouxe frases curtas e descritivas do desenho, por exemplo, “Cauê, na escola”

(sic), “Chegando à escola, bolsa” (sic). “Cauê, a mãe e o pai do Cauê” (sic). É interessante

notar que ele compreende o pronome Eu, já que realiza os desenhos sugeridos incluindo-se

em todos eles, mas não utiliza esse mesmo pronome na construção de suas narrativas,

recorrendo ao nome próprio para se auto-referir nos desenhos.

Conforme a figura 15, apresentada anteriormente, o desenho história com tema “Eu e

minha família” foi caracterizado pela presença da criança, pais e círculos ao lado das figuras

humanas. Verifica-se acabamento diferenciado da figura humana por meio de cores, mas o

formato do rosto e corpo segue mesmo padrão.

O desenho com tema “Eu e minha escola” constituiu-se por apresentação da estrutura

física da escola (observar figura 16). Cauê encontra-se sozinho no desenho. Em entrevista

com a professora da criança, ela confirma que Cauê é isolado dos pares. Ele é o único menino

da sala e, além disso, o padrão repetitivo de atividade (olhar ralos do banheiro e área de lazer)

impede aproximação dos pares no intervalo.

Figura 16: desenho história do Cauê com tema “Eu e minha escola”

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118

A professora relata que frequentemente Cauê possui dificuldades para interagir

socialmente por longo período de tempo, geralmente não compartilha interesses e atividades

com os pares. Os pais afirmaram que Cauê diz: “A casa. A casa da menina da sala. Cauê

quer conhecer” (sic), mas a colega de sala parece que não sabe de tal desejo. Os pais

confirmaram que ele não tem amigos. O aniversário da criança sempre foi comemorado

apenas com a presença dos pais e avós paternos.

Os pais sugerem que ainda não despertaram para proposições que impulsionem a

participação/inserção social do Cauê. Eles frequentemente evitam ir a festas de datas

comemorativas da escola, como a festa de São João, por exemplo. Eles quase não saem para

passear nos finais de semana e, quando saem, preferem ir a lugares sem a presença de

crianças.

Em horário livre, frequentemente Cauê cria tubulações com pedaços de canos dispostos

na casa. Ele possui conhecimento aguçado sobre materiais de construção. Fato que o leva a

descrever a matéria-prima de diversos objetos da escola, por exemplo, sabe que a proteção da

lâmpada é feita de plástico. Através da sensibilidade tátil, Cauê tenta diferenciar objetos

ásperos e lisos presentes no carro.

Até o momento da avaliação neuropsicológica, a criança não estava em acompanhamento

multiprofissional. No final do processo avaliativo (novembro de 2013), os pais informaram

que Cauê aprendeu a identificar o dia da semana e a data correspondente ao ano de 2013, sem

olhar o calendário. Por exemplo, se perguntar a ele em que dia da semana caiu 20 de

fevereiro de 2013, ele responderá de modo assertivo, sem auxílio do calendário (informa os

pais). Tal depoimento sugere alto funcionamento específico da memória.

RESPOSTA DO CBCL (RESPONDIDO PELO PAI DE CAUÊ):

A primeira escala fornecida pela CBCL refere-se à Escala de Competência Social,

relacionada a problemas no desempenho de variadas atividades (brincadeiras, jogos, execução

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119

de tarefas), no relacionamento com pessoas (familiares, amigos) e desempenho escolar (Borsa

& Nunes, 2008).

Conforme a figura 17, o comportamento de Cauê foi classificado como clínico na Escala

de Competências Sociais, notadamente na esfera de desempenho escolar. Conforme

informações elucidadas pelo pai, ele não estabelece brincadeiras com seus pares, notadamente

em âmbito escolar. Ademais, até o momento da presente avaliação, o progenitor trazia relatos

que sugerem intensas expectativas sobre a aprendizagem escolar do filho, o que

provavelmente culminou no destaque clínico para o âmbito do desempenho escolar: “Cauê

tem tudo para ser um grande engenheiro, só precisa estudar mais” (sic), relata o pai.

Figura 17: resultado do Cauê na Escala de Competências Sociais (CBCL)

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120

Na segunda escala fornecida pelo CBCL, a Escala de Síndromes (figura 18), a análise do

comportamento de Cauê enquadrou-se nas categorias clínicas compatíveis com

Isolamento/Depressão, sem perder de vista a faixa limítrofe para Complicações Somáticas,

Problemas de Pensamento, Problemas Atencionais.

Figura 18: resultado do Cauê na Escala de Síndromes (CBCL)

Aqui, verificam-se aproximações com o discurso do progenitor ao lembrar que ele

descreveu características atuais marcantes no filho, quais sejam, dificuldade de interação

social duradoura; dificuldade de entender regras e comportamento disperso.

As complicações somáticas possivelmente remetem às dificuldades vivenciadas pelo pai

em relação à aceitação da gravidade do quadro clínico do filho. Até o momento da presente

avaliação neuropsicológica, ele resistia ao diagnóstico, emitido por neuropediatra. Conforme

anamnese, leitor fluente de publicações científicas, o progenitor do Cauê frequentemente

atrelou atitudes e dificuldades do filho a justificativas de causa-efeito.

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121

Cauê obteve classificação clínica na Escala de Problemas Totais, tendo em vista o

enquadramento clínico para Problemas Internalizantes e limítrofe para Problemas

Externalizantes (escala derivada do CBCL, observar figura 19).

Figura 19: resultado do Cauê na Escala de Problemas Totais (CBCL)

Em última análise, na Escala Orientada pelo DSM-IV, onde os dados para classificação

remetem a perfis clínicos do DSM-IV, Cauê obteve resultado compatível com a categoria

clínica circunscrita a problemas opositores-desafiadores, encontrando-se na faixa limítrofe

para problemas de ansiedade e problemas somáticos. Sobressaltam-se quadros clínicos de

comportamento obsessivo-compulsivo e de estresse pós-traumático, sem perder de vista a

faixa limítrofe para baixa velocidade de processamento cognitivo.

A maioria dos resultados encontrados no CBCL consona com aspectos específicos

apontados na anamnese do Cauê. Contudo, salientam-se alguns resultados clínicos,

provavelmente, associados e potencializados pelas dificuldades de compreensão das

perguntas.

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122

Figura 20: resultado do Cauê na Escala Orientada pelo DSM-IV (CBCL)

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Etapas 2 e 3 – Análise Quantitativa do Sintoma e Análise Qualitativa da Atividade:

INTELIGÊNCIA FLUÍDA:

a. Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR):

Tabela 11: resultados quantitativos do Cauê no MPCR

A Ab B

Soma 07 08 06

Consistência 09 07 05

Discrepância -2 +1 +1

Somatório Percentil3 Classificação

21 40 III-

(Intelectualmente médio)

No Teste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR), Cauê apresenta

desempenho intelectivo na média esperada para sua faixa etária. Ele obteve somatório de 21

pontos (pontuação máxima = 36 pontos), com discrepâncias de -2; +1; +1, nas respectivas

séries A, Ab, B.

Ao analisar o tipo de erro cometido, ocorreram 5 erros na série A (itens 7, 8, 9, 11 e 12),

predominantemente do tipo individuação inadequada e correlato incompleto caracterizar. Na

série Ab, Cauê cometeu 4 erros (itens 2, 10, 11 e 12), sendo três do tipo III (repetição de

padrão). E na série B, ele obteve 7 erros nos últimos sete itens, também predominantemente

do tipo III.

Tais resultados sugerem um padrão de perseveração das respostas, apontando para

dificuldades no funcionamento executivo, notadamente nas habilidades de flexibilidade

3 Percentil de acordo com a população geral

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124

mental. Cauê frequentemente cometia erro do tipo III (h), ou seja, repetição do padrão

imediatamente à esquerda do espaço a ser preenchido, conforme figura 21.

Figura 21: extrato do item 8, série B, respondido por Cauê no MPCR

FUNÇÕES EXECUTIVAS:

a. NEPSY-II, provas do domínio da atenção e funções executivas:

Valores de referência:

Escore Ponderado Percentil Classificação

13 – 19 >75% Acima do nível esperado

08 – 12 26 - 75% Nível esperado (Média)

6 – 7 11 - 25% Limítrofe

4 – 5 3 – 10% Abaixo do nível esperado

1 – 3 <2% Muito abaixo do nível esperado

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125

Tabela 12: resultados quantitativos do Cauê na prova de atenção auditiva e conjunto de respostas

(NEPSY-II)

Atenção auditiva e conjunto de respostas

Parte 1

Acertos Erros de

ação

Erros de

omissão

Erros de

inibição

19 0 10 07

Escore

ponderado/percentil

Percentil Percentil Percentil AA Combinado –

Escore ponderado

01 51-75% <2% 2-5% 04

Parte 2

Acertos Erros de

ação

Erros de

omissão

Erros de

inibição

23 02 11 01

Escore

ponderado/percentil

Percentil Percentil Percentil CR Combinado –

Escore ponderado

03 51-75% 6-10% >75% 08

Tabela 13: resultados quantitativos do Cauê na prova Classificando Aninais (NEPSY-II)

Classificando animais

Erros originais Erros repetidos Total de erros Acertos

0 02 02 02

Percentil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

51-75% 11-25% 26-50% 05 05

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Tabela 14: resultados quantitativos do Cauê na prova Fluência de Desenhos (NEPSY-II)

Fluência de desenhos

Estruturada Aleatória Total

05 08 13

Percentagem acumulada Percentagem acumulada Escore ponderado

6-8 7-8 04

Tabela 15: resultados quantitativos do Cauê na prova Inibindo Resposta (NEPSY-II)

Inibindo respostas

Parte 1

Erros não-

corrigidos

Erros auto-

corrigidos

Erros total Tempo

05 0 05 119”

Percentil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

<2% 51-75% <2% 01 01

Parte 2

Erros não-

corrigidos

Erros auto-

corrigidos

Erros total Tempo

06 0 06 163”

Percetil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

2-5% >75% 11-25% 01 06

Parte 3

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127

Erros não-

corrigidos

Erros auto-

corrigidos

Erros total Tempo

04 0 04 356”

Percentil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

26-50% >75% 51-75% 01 07

Erro (total – Partes 1, 2 e 3) = 15 02

Tabela 16: resultados quantitativos do Cauê na prova Relógios (NEPSY-II)

Relógios

Escore total Escore ponderado

65 09

De forma geral, o desempenho de Cauê nas provas do domínio da atenção e funções

executivas do NEPSY-II denota dificuldades significativas no funcionamento executivo.

No teste Atenção Auditiva e Conjunto de Respostas, Cauê obteve desempenho abaixo do

nível esperado para sua faixa etária na parte 1 (escore combinado equivalente a 04 pontos). Na

parte 2, seu desempenho atinge patamares condizentes com a média esperada (escore

combinado equivalente a 08 pontos).

Verifica-se acentuado número de erros de omissão em ambas as etapas (10 e 11,

respectivamente), bem como acentuado número de erros de inibição na primeira etapa, com

diminuição do cômputo na segunda etapa (07 pontos na parte 1; 01 ponto na parte 2).

Nesse sentido, parece que Cauê ouvia uma determinada palavra-alvo, mas continuamente

omitia-se a apontar para o círculo da cor congruente (erro de omissão) nas etapas 1 e 2.

Todavia, na etapa 2, ele demonstrou decréscimo de erros de inibição, ou seja, houve

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aprimoramento da habilidade para inibir o toque a fim de emitir resposta congruente à regra

de manter ou alternar o círculo da cor correspondente à palavra-alvo (erro de inibição).

Diante do acentuado número de omissões retratadas, adverte-se para a possibilidade de

dificuldade de atenção auditiva sustentada, associada a dificuldades no controle inibitório.

Presença de dificuldades de atenção sustentada parecem plausíveis à medida que se observa

comportamento disperso de Cauê, durante processo avaliativo, notadamente em atividades de

cunho verbal. Em entrevista escolar, a professora do ano letivo de 2013 trouxe como queixa

central o seu comportamento disperso em sala de aula.

No teste Inibindo Respostas, verifica-se que a criança apresenta melhora atrelada à

continuação da tarefa (escore combinado de 01, 06 e 07 nas respectivas etapas 01, 02, 03),

provavelmente em virtude do maior engajamento observado na execução da atividade.

Cauê não apresenta grande oscilação no cômputo total de erros, entretanto, em todas as

etapas, verifica-se que ele ultrapassa o tempo de execução normatizado para sua faixa etária

(escore ponderado igual a 01 ponto), notadamente na etapa 3, onde integralizou a tarefa em

365 segundos. Em todas as etapas, verifica-se que ele acerta as respostas, mas o tempo de

execução ultrapassa o limite esperado para sua faixa etária.

Destarte, sugere-se que ele apresenta estilo de trabalho lento devido à preocupação de

obter respostas adequadas em atividades subsidiadas por pontos frágeis do seu funcionamento

cognitivo. Em análise pormenorizada, o maior tempo de execução da etapa 3, quando

comparado à etapa 2, torna plausível a hipótese de maior dificuldade em atividades

subsidiadas pela flexibilidade mental, do que pelo controle inibitório.

A hipótese de dificuldade na flexibilidade mental também emerge nos testes Classificando

Animais e Fluência de Desenhos, onde Cauê obteve escore ponderado 05 e 04,

respetivamente. Na análise qualitativa da atividade torna-se possível perceber perseveração na

classificação por cor e número, bem como repetição na produção de desenhos aleatórios. O

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desempenho abaixo do nível esperado nos testes referidos corrobora com padrão repetitivo de

resposta observado em diversas atividades propostas ao longo do processo avaliativo,

especialmente no MPCR.

Conforme relato dos pais, Cauê frequentemente possui dificuldades para lidar com

alterações e variações na rotina. A criança possui diversos tipos de roupa, mas, segundo os

pais, o filho só usa uma determinada calça jeans e alterna o uso de duas camisas na cor preta.

Todos os dias antes do almoço precisa tomar e servir água com vitamina C. Ao finalizar

consumo do produto, retira o rótulo da embalagem e o guarda em uma caixa (Cauê possui

mais de 30 embalagens armazenadas). Em âmbito escolar, todos os dias, Cauê vai a secretaria

tomar água, e, ao chegar à sala de aula, senta na mesma cadeira (não há marcação prévia das

cadeiras por parte da professora).

Por fim, o desempenho dentro da média esperada no teste Relógios denota desenvoltura

em atividades permeadas por habilidades visuoespaciais e visuoconstrutivas. Cauê obteve

escore total equivalente a 65 pontos e escore ponderado situado em 09 pontos. Tal

desempenho remete a percentil no intervalo de 26-75, classificado na média esperada para

faixa etária. Nos itens 1 e 2 (figura 22), ele desenha relógios analógicos imbricados com

organização visuoespacial, mas observa-se ponteiro de minuto em lugar errado.

Figura 22: extrato dos itens 1 e 2 (teste Relógios, NEPSY-II) produzido por Cauê – horários de 3h e 11:10h

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A sinalização do ponteiro de minuto continuou errada nos itens 3 e 4, seguido de

identificação equivocada do horário disposto nos itens 6, 7, 8 e 9. Conforme figura 23, Cauê

acerta o ponteiro da hora, mas erra o ponteiro do minuto em todos os itens supracitados.

A partir dos resultados pode-se sugerir que Cauê possui grande habilidade visuoespacial e

visuoconstrutiva, mas sugere-se que ainda não internalizou adequadamente o conceito de

tempo. É interessante notar que nos itens 9 e 10 (figura 24), onde a criança copia os relógios

analógicos, seu desempenho é adequado e preciso.

Figura 23: dos itens 3 e 4 (teste Relógios, NEPSY-II) produzido por Cauê

Figura 24: extrato dos itens 9 e 10 (teste Relógios, NEPSY-II) produzido por Cauê

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HABILIDADES SOCIAIS E ASPECTOS SOCIOAFETIVOS:

a.Inventário Multimídia de Habilidades Sociais (IMHSC-Del-Prette): não se aplica;

b.NEPSY-II, provas do domínio da percepção social:

Tabela 17: resultados quantitativos do Cauê na prova Teoria da Mente (NEPSY-II)

Teoria da mente

Tarefa verbal

Escore Percentil

11 < 2%

Tarefa contextual

Escore

02

Escore total Escore ponderado/Percentil

13 < 2

A aplicação do Inventário Multimídia de Habilidades Sociais (IMHSC-Del-Prette) foi

iniciada com as perguntas do Perfil Geral, em que a criança assiste a três reações e

posteriormente escolhe aquela considerada adequada.

O avaliador optou por interromper a aplicação do IMHSC-Del-Prette, ao observar

dificuldade de engajamento na atividade. O comportamento disperso estava associado à

brincadeira com o estojo de lápis presente sobre a mesa avaliativa. Cauê demonstrou maior

interesse em organizar os lápis de modo simétrico em linha paralela, em detrimento de

assistir aos vídeos selecionados do IMHSC-Del-Prette.

Para além da avaliação de habilidades sociais, mais uma vez, percebe-se aqui a

dificuldade na atenção auditiva sustentada, mesmo com auxílio de recursos audiovisuais e

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multimídia. Nesse sentido, adaptações de situações hipotéticas do IMHSC-Del-Prette foram

propostas na tentativa de investigar habilidades sociais da criança.

Situações específicas do IMHSC-Del-Prette foram adaptadas. Congênere ao proposto a

Andy (criança 1 da presente pesquisa), habilidades de empatia/civilidade, assertividade de

enfrentamento, autocontrole e participação foram avaliadas de modo qualitativo.

As situações escolhidas do IMHSC-Del-Prette não seguiram critérios de inclusão. Foram

utilizados os mesmos itens adaptados e apresentados a Andy (criança 1 da presente

pesquisa). Na tentativa de facilitar o engajamento e motivação da criança na atividade

proposta, os nomes de colegas da sala de aula do Cauê foram inseridos nas situações, porque,

durante encontros avaliativos, ele comumente falava de especificamente de dois colegas. As

situações hipotéticas foram propostas de forma lúdica, mas sobressaltou a sua aparente

dificuldade na linguagem receptiva e expressiva. Ele demonstrou engajamento na proposta,

mas frequentemente emitia ecolalia imediata da fala do avaliador.

Semelhante ao que ocorreu com IMHSC-Del-Prette, Cauê demonstrou comportamento

disperso na tarefa de teoria da mente do NEPSY-II. Ele encontra-se muito abaixo do nível

esperado para sua faixa etária. Entretanto, a análise qualitativa da atividade permite

vislumbrar maior engajamento em itens de perguntas curtas, subsidiados por imagens (itens 5

e 9, por exemplo), em detrimento dos itens longos, apresentados sem auxílio de imagens

(item 10 e 14, por exemplo).

Como os itens verbais exigem que a criança escute toda a história, para depois responder

a perguntas específicas, indica-se que a dificuldade de Cauê pode estar atrelada à carência de

estratégias mentais para manipular e manter, mentalmente, a história narrada (memória

operacional para material verbal). Possivelmente, ele possui span mnésico pequeno

(capacidade limitada de armazenamento na memória de curto prazo) e, por conseguinte,

beneficia-se de solicitações curtas.

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A sugestiva dificuldade na compreensão contextual evidencia-se na tarefa contextual da

teoria da mente. Aqui, ele diferencia as expressões emocionais propostas (feliz, triste, raiva,

medo, nojo, neutro), mas sugere dificuldade para entender as situações sociais. Por exemplo,

no item 20 onde a personagem Júlia deveria se sentir triste porque o colega comeu todos os

biscoitos, Cauê optou pelo rosto feliz. Ao ser questionado acerca da escolha, ele emitiu

resposta sugestiva de que a Júlia estava feliz, porque ofereceu biscoitos ao amigo e ele

aceitou: “Ela tirou o biscoito, ele comeu” (sic), informa Cauê ao avaliador.

Criança 3 – Pseudônimo Amy Rose – Transtorno Autista:

Amy é uma criança do sexo feminino, com nove anos e dez meses de idade no momento

da avaliação neuropsicológica. Amy foi encaminhada por neuropediatra com o diagóstico de

Transtorno Autista. Destaca-se que o pseudônimo Amy remete ao personagem que compõe o

atual tema de interesse da criança, a saber, o desenho animado Sonic.

Etapa 1 – Análise qualitativa do sintoma:

ANAMNESE COM OS PAIS DE AMY:

As informações registradas sobre o histórico clínico de Amy foram fornecidas pelos pais

da criança, durante entrevista clínica realizada em agosto de 2013. O relato sugere forte

vínculo afetivo na relação pais-filha. Os pais são dedicados a proporcionar avanços

acadêmicos e sociais para ela. Amy ganhou uma irmã no percurso do processo avaliativo, mas

não há evidências de alterações comprometedoras na dinâmica da relação familiar.

Amy nasceu por parto cesáreo, após 9 meses de gestação. O pré-natal foi realizado

adequadamente, sem nenhuma intercorrência clínica no período pré e pós-natal.

Aproximadamente com 1 ano de idade, Amy começou a andar. Os pais não notaram nenhum

atraso no desenvolvimento motor: o engatinhar e o andar aconteceram dentro da faixa etária

esperada. Aos 2 anos de idade, quando a criança entrou na escola, eles começaram a comparar

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Amy com outras crianças e, desse modo, começaram a perceber que ela repetia informações e

não apresentava fala articulada (não formava frases).

Aos 3 anos de idade, a escola solicitou avaliação neurológica. O exame de audiometria,

realizado no período em questão, não evidenciou alterações auditivas. Na mesma época, Amy

recebeu atendimento multiprofissional (fonoaudióloga, terapeuta ocupacional, psicóloga e

neurologista) na Unidade de Referência Estadual para atendimento a crianças e adolescentes

portadores de deficiências físicas, mentais, sensoriais ou múltiplas do Rio Grande do Norte.

O acompanhamento foi sistemático, mas a equipe multiprofissional em questão optou por

não evidenciar diagnóstico clínico. Preocupados com o sugestivo atraso no desenvolvimento

da linguagem verbal da Amy, os pais decidiram procurar outro neuropediatra, este levantou a

hipótese de Transtorno da Linguagem Expressiva, encaminhando a criança para profissional

especializado em fonoaudiologia, cujo trabalho interventivo foi realizado por

aproximadamente, 12 meses.

Os pais interromperam por conta própria o acompanhamento fonoaudiólogico, porque

características comportamentais da filha suscitaram dúvidas sobre a hipótese diagnóstica

evidenciada pela neuropediatra. Dentre as características, destaca-se expressão verbal

destoante dos pares, movimentos estereotipados com as mãos, isolamento social, interesse

restrito e intenso por determinado desenho animado. Decidiram levar Amy para outro

neuropediatra, que o Transtorno autista. Nesse período ela estava com 8 anos de idade.

Por ocasião da entrevista clínica em questão, a principal queixa dos pais centrava-se no

atraso do desenvolvimento da linguagem verbal da Amy. De acordo com eles, ela não mantém

conversação por longo período de tempo e é “desajeitada” (sic) para falar com os outros

“como se não soubesse conversar” (sic). “No período próximo ao carnaval, Amy encontrou,

por acaso, com uma colega de sala no shopping. Ai, imediatamente, disse: qual fantasia?

Vermelha?” (sic). Os pais afirmam que frequentemente ela chega para alguém e diz: “quem é

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você?” (sic). Comumente eles precisam intermediar as suas conversações com outras crianças

– “geralmente a gente ajuda a outra criança a entender o que Amy quer dizer” (sic).

A mãe afirma ter vivenciado momentos embaraçosos com a filha, porque ela não soube

mentir, “disfarçar” (sic). Por exemplo, no dia da colação de grau da mãe, Amy disse, diante

os familiares, que a mãe estava semelhante a um pinguim.

Os pais também destacaram a dificuldade de Amy para interpretar o sentido não-literal de

determinadas situações. Certo dia, o pai pegou a sandália e, com raiva, disse: sabe o que é

isso?. Ela respondeu: uma sandália. De acordo com o contexto, o pai esperava uma reação

diferente por parte da filha: “esperava que ela fosse reagir como as demais crianças reagem –

se sentindo acuada e com medo de levar uma palmada. Amy nem percebeu o que eu pretendia

fazer com aquela sandália na mão” (sic).

Frequentemente, a criança não sabe quando está de castigo. “Estou de castigo?” (sic).

“Vocês estão com raiva de mim?” (sic), pergunta Amy aos pais. Ela frequentemente precisa

do feedback dos pais para compreender situações congêneres.

Amy possui movimentos estereotipados (movimenta as mãos, gira as mãos), desde os 3

anos de idade (aproximadamente). Atualmente, os pais afirmam que, quando percebem o

movimento, ela tenta “disfarçar” (sic) dizendo que está dançando. Eles observam que os

movimentos comumente acontecem quando ela está ansiosa e/ou estressada.

Amy fica muito ansiosa perante eventos sociais que aparentemente despertam prazer:

“Amy tem muita ansiedade para eventos. No período próximo ao carnaval, ela repete várias

vezes: carnaval? Qual fantasia?” (sic), informa a mãe.

Por outro lado, os pais destacaram que a filha possui “muita noção espacial” (sic) – “Amy

sabe direitinho os lugares onde anda” (sic). O pai confirma que Amy possui muita

dificuldade de aprendizagem, mas evidencia que a repetição proporciona o armazenamento de

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136

informações com maior qualidade – “noto que Amy aprende mais quando repito a mesma

informação várias vezes” (sic).

Amy estuda há 3 anos na mesma escola particular do município de Natal-RN (contados do

momento da avaliação em questão). Atualmente cursa o 3º ano do Ensino Fundamental I,

reconhece letras e sílabas, mas ainda não sabe ler. Ressalta-se que ela estuda em uma sala de

aula onde predomina meninos.

A mãe observa que a filha possui “dificuldade excessiva” (sic) para entender conceitos

abstratos – possui dificuldade para compreender o conceito de bairro, por exemplo. A

progenitora relata que ela memoriza textos “ao ponto de passar a ideia de que está lendo tudo

direitinho” (sic). Ela é designada como estudante que gosta de repetir as coisas. Copia textos,

mas escreve com letra bastão.

Designada como criança detalhista e perfeccionista, Amy gosta de ballet e não vai ao

ensaio com os acessórios incompletos. Certo dia, ela exigiu voltar em casa porque havia

esquecido a tiara que compõe a roupa do ballet.

DESENHO HISTÓRIA COM TEMA:

Destaca-se que o desenho história de Amy caracteriza-se por desenhos figurativos, ou

seja, há a busca intencional de reproduzir a semelhança entre o desenho e a figura que quer

representar. De acordo com imagem ilustrativa, sugere-se que ela estrutura o desenho das

personagens com cabeça e corpo, acompanhado de sugestiva clivagem funcional da

condensação de figuras continentes e irradiantes que parecem ter constituído a figura-girino

da Amy Ainda não se observa a presença de diferenciações dos personagens gráficos (Grieg,

2004).

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137

A dificuldade de comunicação verbal trouxe barreiras para a produção narrativa do

desenho história com tema. Conforme figura 25, o desenho com tema “Eu e minha família”

foi caracterizado pela presença da criança e pais. Verifica-se acabamento diferenciado dos

personagens gráficos, mas o formato do corpo segue mesmo padrão. Ao apresentar a família,

Amy fala seu nome próprio, em detrimento do uso dos pronomes pessoais: “Amy, mãe e pai

de Amy” (sic). Tal fato evidencia-se em outros momentos do processo avaliativo, nos quais

verificou-se que Amy não utiliza os pronomes eu-você (“Amy ganhou. Samantha perdeu” –

sic).

Figura 25: desenho história da Amy com o tema "Eu e minha família"

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Figura 26: desenho história da Amy com o tema "Eu e minha escola"

O desenho com tema “Eu e minha escola” (figura 26, apresentada anteriormente)

constituiu-se por reprodução de colegas da sala de aula. Ao apresentar o desenho, Amy disse:

“qual o nome daquela menina? Amy na escola brinca de boneca.” (sic).

Em entrevista com a professora da criança, ela confirma que Amy não é isolada dos pares,

mas apresenta sugestivas dificuldades atreladas à cognição social, estas impedem o

estabelecimento de interações sociais duradouras. A docente relata que, frequentemente, Amy

compartilha seu interesse intenso e circunscrito ao desenho Sonic, mas a especificidade

temática e recorrente frequência interrompem o compartilhar social com os pares.

Destaca-se o salto qualitativo de Amy, identificado pela família e escola, quando

decidiram colocar a criança em uma sala com maior número de meninas. Desde então, todos

afirmam que Amy interage muito mais, porque se permite o compartilhamento de bonecas,

por exemplo.

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139

Amy reside no munícipio de Natal, os pais possuem forte vínculo afetivo com a criança e

a escola particular regular demonstra preocupação com o planejamento e execução de

propostas pedagógicas condizentes ao perfil neuropsicológico da criança.

Destaca-se preocupação com o processo de alfabetização da Amy. Os pais solicitaram

reunião com equipe pedagógica a fim de suscitar discussão diante à proposta de trabalho

interventivo diferenciado e de qualidade para a criança. Ficou acordado acompanhamento

com fonoaudiólogo especializado com o objetivo de auxiliar no seu processo de alfabetização.

RESPOSTA DO CBCL (RESPONDIDO PELA MÃE DE AMY):

A primeira escala fornecida pela CBCL refere-se à Escala de Competência Social,

relacionada a problemas no desempenho de variadas atividades (brincadeiras, jogos, execução

de tarefas), no relacionamento com pessoas (familiares, amigos) e desempenho escolar (Borsa

& Nunes, 2008).

Conforme figura 27, o comportamento de Amy foi classificado como clínico na Escala de

Competências Sociais, notadamente nas esferas de relacionamento com pessoas (familiares,

amigos) e desempenho escolar. Conforme informações fornecidas pelos pais, Amy não

estabelece brincadeiras com seus pares, notadamente em âmbito escolar.

Figura 27: resultado da Amy na Escala de Competências Sociais (CBCL)

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140

Na segunda escala fornecida pelo CBCL, a Escala de Síndromes (figura 28), o

comportamento de Amy não se enquadrou nas categorias clínicas sugeridas. Congruente, na

Escala de Problemas Totais, ela não obteve pontuações condizentes com grupos clínicos para

Problemas Internalizantes e Externalizantes (escala derivada do CBCL, observar figura 29).

Figura 28: resultado da Amy na Escala de Síndromes (CBCL)

Figura 29: resultado da Amy na Escala de Problemas Totais (CBCL)

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141

De forma análoga, não foram identificadas características clínicas significativas na Escala

Orientada pelo DSM-IV (figura 30), exceto para problemas de comportamento obsessivo-

compulsivo, no qual há resultado limítrofe.

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142

Figura 30: resultado da Amy na Escala de Orientada pelo DSM-IV (CBCL)

Etapas 2 e 3 – Análise Quantitativa do Sintoma e Análise Qualitativa da Atividade:

INTELIGÊNCIA FLUÍDA:

a. Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR):

Tabela 18: resultados quantitativos da Amy no MPCR

A Ab B

Soma 09 07 05

Consistência 09 07 05

Discrepância 0 0 0

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143

Somatório Percentil4 Classificação

21 50 III+

(Intelectualmente médio)

No Teste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR), Amy apresenta

desempenho intelectivo na média esperada para sua faixa etária. Ela obteve somatório de 21

pontos (pontuação máxima = 36 pontos), com discrepâncias de zero, nas respectivas séries A,

Ab, B.

Ao analisar o tipo de erro cometido, verifica-se a ocorrência de 3 erros na série A (itens 9,

11, 12), predominantemente do tipo individuação inadequada/correlato incompleto e repetição

do padrão por perseveração. Na série Ab, Amy cometeu 5 erros (itens 8 a 12), todos do tipo

III (repetição de padrão). Por sua vez, na série B, ela obteve 7 erros nos últimos sete itens,

também predominantemente do tipo III.

Tais resultados sugerem presença de padrão de perseveração das respostas, apontando

para dificuldades no funcionamento executivo, notadamente nas habilidades de flexibilidade

mental. Amy frequentemente cometeu erros do tipo III (h), ou seja, repetição do padrão

imediatamente à esquerda do espaço a ser preenchido, conforme figura 15, apresentada

anteriormente.

FUNÇÕES EXECUTIVAS:

b. NEPSY-II, provas do domínio da atenção e funções executivas:

Valores de referência:

4 Percentil de acordo com a população geral

Escore Ponderado Percentil Classificação

13 – 19 >75% Acima do nível esperado

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144

Tabela 19: resultados quantitativos da Amy na prova Atenção Auditiva e Conjunto de Respostas

(NEPSY-II)

Atenção auditiva e conjunto de respostas

Parte 1

Acertos Erros de

ação

Erros de

omissão

Erros de

inibição

25 0 03 0

Escore

ponderado/percentil

Percentil Percentil Percentil AA Combinado –

Escore ponderado

06 51-75% 11-25% 26-50% 07

Parte 2

Acertos Erros de

ação

Erros de

omissão

Erros de

inibição

06 30 21 0

Escore

ponderado/percentil

Percentil Percentil Percentil CR Combinado –

Escore ponderado

01 <2% <2% >75% 01

Tabela 20: resultados quantitativos da Amy na prova Classificando Animais (NEPSY-II)

Classificando animais

Erros originais Erros repetidos Total de erros Acertos

0 03 03 01

08 – 12 26 - 75% Nível esperado (Média)

6 – 7 11 - 25% Limítrofe

4 – 5 3 – 10% Abaixo do nível esperado

1 – 3 <2% Muito abaixo do nível esperado

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145

Percentil

Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

51-75% 6-10% 26-50% 04 05

Tabela 21: resultados quantitativos da Amy na prova Fluência de Desenhos (NEPSY-II)

Fluência de desenhos

Estruturada Aleatória Total

01 02 03

Percentagem acumulada

Percentagem acumulada Escore ponderado

<4 <3 01

Tabela 22: resultados quantitativos da Amy na prova Inibindo Resposta (NEPSY-II)

Inibindo resposta

Parte 1

Erros não-

corrigidos

Erros auto-

corrigidos

Erros total Tempo

02 0 02 168”

Percentil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

6-10% >75% 26-50% 01 06

Parte 2

Erros não-

corrigidos

Erros auto-

corrigidos

Erros total Tempo

13 02 15 315”

Percentil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

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<2% 51-75% <2% 01 01

Parte 3

Erros não-

corrigidos

Erros auto-

corrigidos

Erros total Tempo

35 02 37 319”

Percentil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

<2% 51-75% <2% 01 01

Erro (total – Partes 1, 2 e 3) = 54 01

Tabela 23: resultados quantitativos da Amy na prova Relógios (NEPSY-II)

Relógios

Escore total Escore ponderado

39 01

De forma geral, o desempenho da Amy nas provas do domínio da atenção e funções

executivas do NEPSY-II denota dificuldades significativas no funcionamento executivo.

No teste Atenção Auditiva e Conjunto de Respostas, Amy obteve desempenho

classificado como limítrofe na parte 1 (escore combinado equivalente a 07 pontos). Na parte

2, seu desempenho decresce tornando-se muito abaixo do esperado (escore combinado igual a

01 ponto).

Nessa última parte, verifica-se acentuado número de erros de ação e omissão (30 e 21,

respectivamente). Ou seja, ela frequentemente ouvia uma determinada palavra e apontava de

modo aleatório para uma cor (erro de ação), ou ainda omitia-se em flexibilizar ou inibir o

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147

toque a fim de emitir resposta congruente à regra de manter ou alternar o círculo da cor

correspondente à palavra-alvo (erro de omissão).

Aqui, adverte-se para a possibilidade de adequada compreensão verbal, atenção auditiva

seletiva e sustentada, mas entraves significativos nas funções executivas, notadamente no

funcionamento do controle inibitório e flexibilidade mental. Tal hipótese ganha força ao

analisar o desempenho de Amy no teste Inibindo Resposta. Verifica-se que ela obteve

desempenho muito abaixo do nível esperado nas etapas 2 e 3 do teste (somatório total de 15 e

37 erros, respectivamente), mas encontra-se na média esperada para faixa etária na etapa 1

(somatório total de 2 erros). Verifica-se acentuado número de erros não-corrigidos nas etapas

2 e 3 (13 e 35, respectivamente). Entretanto, a análise qualitativa do processo de execução da

etapa 3 merece ressalvas.

Conforme descrição do teste Inibindo Respostas (Anexos), o mesmo é constituído por dois

itens (formas e setas) fragmentados em três etapas. Na terceira etapa de ambos os itens, a

criança é convidada a fornecer nomenclatura congruente ou incongruente da forma (quadrado

ou círculo) e, posteriormente, da direção da seta (para cima ou para baixo), de acordo com a

cor do estímulo.

A análise da etapa 3 de ambos os itens (forma e setas) sugere que Amy tentou mudar a

resposta, mas tal tentativa fracassou por fixar-se na cor preta. Ela obteve acertos aleatórios à

medida que respondia a forma ou direção da seta, quando as mesmas estavam na cor preta.

Quando errava, Amy repetia três vezes: “vamos conseguir” (sic).

Tal tentativa de acerto parece ter predominado ao longo da execução da atividade. Amy

obteve desempenho muito abaixo do esperado no tocante ao tempo de execução necessário

para integralizar cada etapa do teste. Logo, sugere-se estilo de trabalho lento na tentativa de

obter respostas adequadas.

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A hipótese de dificuldades na flexibilidade mental também emerge ao analisar o

desempenho de Amy nos testes Classificando Animais e Fluência de Desenhos. Em ambos,

ela obteve desempenho abaixo do esperado para sua faixa etária.

Na análise qualitativa das atividades citadas percebe-se perseveração na classificação por

chuva e sol, bem como repetição na produção de desenhos estruturados e aleatórios, conforme

figura 31.

Destaca-se que no Classificando Animais, o avaliador proporcionou um exemplo extra de

classificação, qual seja, figuras com borda e sem borda nas margens das peças, mas as

categorizações de Amy ficaram circunscritas a padrão repetitivo de classificação.

O desempenho abaixo do nível esperado nos testes referidos corrobora com padrão

repetitivo de resposta observado em diversas atividades propostas ao longo do processo

avaliativo, especialmente no MPCR.

Figura 31: extrato do teste Fluência de Desenho, parte estruturada, produzido por Amy

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Dificuldades no funcionamento executivo, notadamente nas habilidades de flexibilidade

cognitiva, parecem repercutir no cotidiano da criança. Convém relembrar que Amy não vai

ao ensaio do ballet se os acessórios estiverem incompletos. Conforme anamnese, certo dia, ela

firmou em voltar ao seu lar, porque, quando chegou ao local do ensaio, percebeu que havia

esquecido a tiara que compõe a roupa do ballet.

Por fim, o desempenho de Amy no teste Relógios sugere presença de dificuldades

visuoespaciais. Nesse, ela obteve desempenho muito abaixo do esperado para sua faixa etária

(P < 2), tendo em vista escore total equivalente a 39 pontos e escore ponderado situado em 01

ponto.

Nos itens 1 e 2, Amy desenha relógios analógicos com presença de números, contorno e

ponteiros, mas observa-se falhas à medida que se verifica contorno aberto e assimétrico,

números e ponteiros desproporcionais.

Figura 32: extrato do teste Relógios, item 2, produzido por Amy – horário 11:10

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Nos itens 3 e 4 (figura 33), os números encontram-se distribuídos de modo assimétrico e

desproporcional em relação ao contorno. Congênere, nos itens 9 e 10 (figura 34), Amy

reproduziu por cópia os relógios analógicos dispostos, todavia, verifica-se dificuldades em

habilidades relacionadas à rotação mental, percepção espacial e visualização espacial

envolvidas na visuoespacialidade.

Rotação mental entende-se a capacidade de rotacionar, torcer ou inverter objetos tri (ou bi)

dimensionais. A percepção espacial está associada à habilidade de definir relações espaciais a

partir de informações visuais. Por sua vez, a visualização espacial ocorre na resolução de

problemas visuais complexos relativos às partes internas de uma imagem (Maia, 2010).

Figura 33: extrato do teste Relógios, itens 3 e 4, produzido por Amy

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Figura 34: extrato do teste Relógios, itens 9 e 10, produzido por Amy

HABILIDADES SOCIAIS E ASPECTOS SOCIOAFETIVOS:

a.Inventário Multimídia de Habilidades Sociais (IMHSC-Del-Prette): não se aplica;

b.NEPSY-II, provas do domínio da percepção social:

Tabela 24: resultados quantitativos da Amy na prova Teoria da Mente (NEPSY-II)

Teoria da mente

Tarefa verbal

Escore Percentil

08 < 2%

Tarefa contextual

Escore

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152

04

Escore total Escore ponderado/Percentil

12 < 2

A aplicação do Inventário Multimídia de Habilidades Sociais (IMHSC-Del-Prette) foi

iniciada com as perguntas do Perfil Geral, em que a criança assiste a três reações e

posteriormente escolhe aquela considerada adequada.

O avaliador optou por interromper a aplicação do IMHSC-Del-Prette, ao observar a

dificuldade de Amy para compreender o contexto e, por conseguinte, atender à demanda

subjacente. Por exemplo, no item 1, cuja proposição é avaliar a habilidade de participação

(juntar-se a um grupo em brincadeiras), Amy disse: “a menina vai brincar” (sic), mas não

escolheu a reação. Embora o avaliador tenha (exaustivamente) explicado a tarefa, a análise

qualitativa da atividade sugere que ela o esperava para assinalar a reação (A, B ou C).

Hipótese plausível ao verificar que, após apresentação das respectivas reações, Amy pegava

na mão do avaliador e a levava ao mouse.

Para além da avaliação de habilidades sociais, percebe-se aqui a dificuldade na

compreensão das instruções do inventário (mesmo com auxílio de recursos audiovisuais e

multimídia). Nesse sentido, adaptações de situações hipotéticas do IMHSC-Del-Prette foram

propostas na tentativa de investigar as habilidades sociais da criança. Situações específicas

foram adaptadas incluindo a presença dos personagens do Sonic: desenho predileto da criança.

As situações escolhidas do IMHSC-Del-Prette (habilidades de empatia/civilidade,

assertividade de enfrentamento, autocontrole e participação foram avaliadas de modo

qualitativo) não seguiram critérios de inclusão. Optou-se por apresentar os mesmos itens

utilizados com Andy (criança 1 da presente pesquisa).

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As situações hipotéticas foram propostas de forma lúdica, mas sobressaltou a aparente

dificuldade de Amy na linguagem receptiva e expressiva. Ela demonstrou engajamento na

proposta, mas frequentemente emitia ecolalia imediata da fala do avaliador. Por exemplo, no

item 1, o avaliador perguntou à Amy:

- O que o Sonic vai fazer?

- Amy: “Fazer.” (sic);

- O avaliador prosseguiu: “a) Sonic vai ficar esperando Helen e Tails o convidarem para

brincar de futebol?”;

- Amy: “Vai. Vamos brincar?!” (sic). Aqui, sugere-se que Amy apoiou-se em tom de voz

sugestivo de ecolalia. Imediatamente, ela pegou o seu boneco Sonic e desencadeou ecolalia

diferida da fala de personagens do desenho animado citado.

Conforme elucidações da professora que a acompanha no ano letivo de 2013, congruente a

execução do IMHSC-Del-Prette, Amy demonstra muita dificuldade para compreender o

contexto e, por conseguinte, inferir demandas subjacentes, notadamente durante relações

interpessoais. Apesar da dificuldade, Amy parece apoiar-se na criação de estratégias

compensatórias: certo dia, ela solicitou a ajuda da professora perguntando o motivo pelo qual

os colegas estavam rindo em uma determinada situação no contexto da sala de aula.

Na tarefa de teoria da mente do NEPSY-II, Amy obteve desempenho muito abaixo do

nível esperado para sua faixa etária. Semelhante ao IMHSC-Del-Prette, ela demonstrou

dificuldade na compreensão contextual, bem como dificuldade de produzir respostas a nível

abstrato. No item 5, por exemplo, sugere-se elaboração de resposta amparada na percepção

visual. Amy respondeu: “Silvia. Ela está abraçando um golfinho” (sic). No item 6, Amy

respondeu “lápis” (sic), mas após o avaliador questionar como o suposto amigo sabe que tem

lápis, ela respondeu: “Ah. Então tem cubos” (sic).

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154

A aparente dificuldade de compreensão do contexto sobressalta na tarefa contextual da

teoria da mente. Nessa, ela diferencia as expressões emocionais propostas (feliz, triste, raiva,

medo, nojo, neutro), mas apresenta dificuldade para entender as situações sociais. Por

exemplo, no item 20 onde a personagem Júlia deveria se sentir triste porque o colega comeu

todos os biscoitos, Amy optou pelo rosto feliz. Ao questionar a escolha, ela respondeu: “Feliz.

Júlia come os biscoitos” (sic).

Criança 4 – Pseudônimo Jake – Transtorno de Asperger:

Jake é uma criança do sexo masculino, com dez anos e três meses de idade no momento

da avaliação neuropsicológica, diagnosticado pela neuropediatra com Transtorno de Asperger

(DSM-IV-TR). Destaca-se que o pseudônimo Jake remete ao personagem que compõe o atual

tema de interesse da criança, a saber, o Angry Birds.

Etapa 1 – Análise qualitativa do sintoma:

ANAMNESE COM A MÃE DE JAKE:

As informações registradas sobre o histórico clínico de Jake foram fornecidas pela mãe da

criança, durante entrevista clínica no mês de março de 2013.

Jake nasceu por parto cesáreo, após 9 meses de gestação. O pré-natal foi realizado

adequadamente, sem nenhuma intercorrência clínica no período pós-natal. O relato da

progenitora não sugere que o filho possui atraso importante do desenvolvimento da linguagem

receptiva e expressiva. Inicialmente, ele apoiava-se na comunicação não-verbal para solicitar

algo e, aproximadamente com 2 anos de idade, começou a utilizar cerca de 2 palavras e, logo

em seguida, frases para se comunicar com outrem. Nesse período, Jake foi diagnosticado com

disfemia e, por conseguinte, foi submetido a tratamento de aproximadamente dois anos com

fonoaudiólogo especializado em aprimorar a fluência da fala.

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Conversações recíprocas são estabelecidas quando o assunto desperta o interesse de Jake.

Diálogos sobre assuntos corriqueiros do cotiando são frágeis. A mãe afirma que busca saber

como foi o dia na escola, mas frequentemente ele emite respostas concisas. Também são raras

as conversações demonstrando interesse nos outros. Comumente ele parece interessado em

ouvir e falar apenas acerca dos temas do seu interesse, primordialmente sobre o jogo Angry

Birds.

Não há informações concernentes à presença de neologismos ou linguagem

idiossincrática. Há histórico sugestivo de ecolalia imediata, expressões estereotipadas ou

ecolalia diferida. Segundo progenitora, Jake persiste emitindo frases associadas a

personagens dos filmes infantis apreciados por ele: “ele decora a fala dos personagens e

durante o dia fica falando as frases de forma igualzinha” (sic), informa a mãe. Comumente

fala de modo rebuscado “como se fosse um adulto” (sic) sobre temas circunscritos ao seu

interesse, notadamente acerca de Ciências, Dinossauros e, primordialmente, Angry Birds.

Quando pequeno, a brincadeira simbólica parecia rara. A mãe afirma que incentivava

brincadeiras implicadas com a imaginação, mas Jake não demonstrava interesse: “tentava

brincar de super-heróis, mas meu filho nunca demonstrou ter prazer na brincadeira. Sempre

preferia assistir os mesmos DVDs ou brincar de montar e desmontar objetos, sempre com

muito cuidado.” (sic).

A mãe afirma que o filho sempre demonstrou aguçado interesse por temas específicos.

Quando pequeno, foram os dinossauros, depois, se interessou pelo Scooby Doo e todos os

temas associados: “ele adorava colecionar tudo que envolvesse o Scooby Doo. Achava

interessante o quanto ele era determinado a saber tudo e ter tudo sobre o desenho animado.”

(sic).

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Pouco tempo depois, Jake transferiu o interesse do Scooby Doo para o Ben 10, inclusive,

queria ter o cabelo igual ao do personagem. Atualmente, o maior interesse são as Ciências e o

Angry Birds: “Jake sabe tudo que você possa imaginar sobre esse jogo. Talvez esteja ai o

problema de interação dele, porque ele só quer falar sobre isso na escola. Ninguém aguenta

mais” (sic), relata a progenitora.

Salienta-se dificuldades para flexibilizar os horários de dormir e o lugar de sentar na

cadeira que compõe a mesa de alimentação familiar. Segundo progenitora, Jake exige dormir

no mesmo horário e sentar-se na mesma cadeira, diariamente.

Jake demonstra grande sensibilidade a ruídos. Quando o barulho está intenso na sala de

aula, por exemplo, ele comumente põe um livro aberto sobre a cabeça na tentativa de isolar

os ouvidos dos ruídos.

Perfeccionista e detalhista, Jake elabora desenhos temáticos sobre o Angry Birds com

grande riqueza de detalhes. Comumente substitui as atividades escolares semanais pelo

desenho dos personagens do jogo citado.

Ele é designado pela mãe como criança “reservada/fechada” (sic), prefere estar com

pessoas mais velhas, tem mudanças repentinas de humor, tende a não se relacionar com os

pares; assim como é “extremamente ansioso” (sic) – comumente mexe a boca e possui hábito

de roer as cutículas das unhas.

Em entrevista com a escola regular da criança, as professoras que o acompanham relatam

que Jake possui repertório restrito de conversações, notadamente sobre o Angry Birds. Ele

não demonstra interesse por estabelecer interações sociais duradouras com os pares. Além

disso, demonstra movimentos ritualísticos, quais sejam, alongar a cabeça e braços, bem como

girar o pescoço do lado esquerdo para o direito, antes de iniciar a execução de atividades.

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157

As características comportamentais susceptíveis ao diagnóstico clínico tornaram-se

evidentes quando a criança começou a recusar permanecer na escola. O isolamento social

gerou desconfianças ainda no período da educação infantil, mas a intensificação do

retraimento nas relações interpessoais, durante o Ensino Fundamental I, despertou

preocupações maiores, notadamente em termos de possível quadro clínico subjacente.

Motivada por professores que acompanham o estudante no ano letivo de 2013, a mãe do

Jake resolveu levá-lo ao serviço clínico do curso de Psicologia de uma instituição particular

do município de Natal, sendo posteriormente encaminhada para a neuropediatra.

Jake foi submetido a exames de audiometria e eletroencefalograma, realizados no mês de

fevereiro de 2013, cujos resultados refutam a presença de alterações auditivas ou no padrão

eletroencefalográfico cerebral.

O diagnóstico de Transtorno de Asperger, emitido um mês antes da presente avaliação

neuropsicológica, despertou interesse materno pela pesquisa científica, mas o pai recusa-se a

aceitar o quadro clínico. Atualmente, a dificuldade de aceitação paterna do Transtorno de

Asperger desencadeia recorrentes discussões na relação conjugal, as quais geram barreiras

frente à proposição de inserção de Jake em intervencão multidisciplinar de saúde, ou ainda

em propostas de inclusão escolar condizentes com o seu perfil clínico.

DESENHO HISTÓRIA COM TEMA:

Torna-se imperativo frisar que a criança recusou-se a realizar o desenho história com

tema. O avaliador solicitou os desenhos temáticos “Eu e minha família”, “Eu e minha escola”,

entretanto, Jake recusou o convite justificando que só está apto para desenhar personagens ou

animais do Angry Birds. Aqui, o intenso e restrito interesse pelo jogo sugere adesão inflexível

a novas proposições gráficas, ou ainda desvela a dificuldade para projetar aspectos da

dinâmica emocional diretamente envolvidos com os contextos solicitados. Tal hipótese ganha

força ao analisar a auto avaliação da criança no IMHSC-Del-Prette (posteriormente

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158

detalhado), notoriamente concernente aos resultados compatíveis com problemas

internalizantes em demandas de empatia/civilidade e participação social.

RESPOSTA DO CBCL (RESPONDIDO PELA MÃE DE JAKE):

A primeira escala fornecida pela CBCL refere-se à Escala de Competência Social,

relacionada a problemas no desempenho de variadas atividades (brincadeiras, jogos, execução

de tarefas), no relacionamento com pessoas (familiares, amigos) e desempenho escolar (Borsa

& Nunes, 2008).

Conforme figura 35, o comportamento de Jake foi classificado como clínico na Escala de

Competências Sociais. Destaca-se o componente relacionamento social, cujo resultado situa a

criança na faixa clínica, em contraponto aos demais componentes (diversas atividades e

atividades escolares), nos quais ele se encontra dentro do padrão de normalidade.

Na segunda escala fornecida pelo CBCL, a Escala de Síndromes (figura 36), ele

enquadra-se nas categorias clínicas compatíveis com Ansiedade/Depressão,

Figura 35: resultado do Jake na Escala de Competências Sociais (CBCL)

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159

Isolamento/Depressão e Problemas de Pensamento, sem perder de vista a faixa limítrofe para

Complicações Somáticas, Problemas Atencionais e Comportamentos Agressivos.

Figura 36: resultado do Jake na Escala de Síndromes (CBCL)

Congênere aos resultados sugestivos de problemas internalizantes no IMHSC-Del-Prette,

Jake obteve classificação clínica na Escala de Problemas Internalizantes do CBCL,

encontrando-se na faixa limítrofe para Problemas Externalizantes (escala derivada do CBCL,

observar figura 37).

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160

Figura 37: resultado do Jake na Escala de Problemas Totais (CBCL)

Em última análise, na Escala Orientada pelo DSM-IV, onde os dados para classificação

remetem a perfis clínicos do DSM-IV, Jake obteve resultado compatível com a categoria

clínica circunscrita a problemas de afetividade e ansiedade, baixa velocidade de

processamento cognitivo, comportamentos obsessivos-compulsivos e problemas de estresse

pós-traumático.

A maioria dos resultados encontrados no CBCL consonam com aspectos específicos

apontados durante apresentação do processo avaliativo do Jake. É reconhecida a intensa

dificuldade da criança para estabelecer e manter relações interpessoais duradouras. São raras

as conversações demonstrando interesse nos outros. Comumente Jake parece interessado em

ouvir falar acerca dos temas do seu interesse e frequentemente emite reações não habilidosas

ativas frente às situações permeadas por brincadeiras de duplo-sentido e/ou irônicas.

Contudo, ressalta-se que o perfil avançado pelos resultados pode ter sofrido a interferência

da recência do diagnóstico de Jake. O resultado do CBCL está diretamente atrelado ao

discurso dos pais acerca da criança, refletindo a postura destes diante do quadro clínico do

filho, o que por vezes aumenta ou diminui o impacto de suas sintomatologias. No caso de

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161

Jake, o CBCL foi respondido pela mãe, a qual recebeu diagnóstico clínico do filho há

aproximados dois meses, o que pode ter comprometido a compreensão das perguntas,

dificultando a identificação entre o que pode ou não ser considerado típico do transtorno.

Problemas de ansiedade, por exemplo, possivelmente correspondem ao comportamento

“extremamente ansioso” (sic) retratado pela progenitora da criança em entrevista clínica.

Comumente Jake mexe a boca e possui hábito de roer as cutículas das unhas.

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162

Figura 38: resultado do Jake na Escala Orientada pelo DSM-IV (CBCL)

Etapas 2 e 3 – Análise Quantitativa do Sintoma e Análise Qualitativa da Atividade:

INTELIGÊNCIA FLUÍDA:

a. Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR):

Tabela 25: resultados quantitativos do Jake no MPCR

A Ab B

Soma 09 10 12

Consistência 11 10 10

Discrepância -2 0 +2

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163

Somatório Percentil5 Classificação

31 80-90 II

(Definitivamente acima da média na

capacidade intelectual)

No Teste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR), o desempenho de Jake

foi classificado como capacidade intelectual definitivamente acima da média esperada para

sua faixa etária. Ele obteve somatório de 31 pontos (pontuação máxima = 36 pontos), com

discrepâncias -2, 0, +2, nas respectivas séries A, Ab, B. Em contraponto a ausência de erros

na série B, Jake obteve três erros na série A e dois na série Ab, predominantemente por

repetição do padrão imediatamente acima do espaço a ser preenchido ou imediatamente à

esquerda do espaço a ser preenchido.

FUNÇÕES EXECUTIVAS:

b.NEPSY-II, provas do domínio da atenção e funções executivas:

Valores de referência:

5 Percentil de acordo com a população geral

Escore Ponderado Percentil Classificação

13 – 19 >75% Acima do nível esperado

08 – 12 26 - 75% Nível esperado (Média)

6 – 7 11 - 25% Limítrofe

4 – 5 3 – 10% Abaixo do nível esperado

1 – 3 <2% Muito abaixo do nível esperado

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164

Tabela 26: resultados quantitativos do Jake na prova Atenção Auditiva e Conjunto de Respostas (NEPSY-

II)

Atenção auditiva e conjunto de respostas

Parte 1

Acertos Erros de

ação

Erros de

omissão

Erros de

inibição

30 0 0 02

Escore

ponderado/percentil

Percentil Percentil Percentil AA Combinado –

Escore ponderado

13 51-75% >75% 2-5% 13

Parte 2

Acertos Erros de

ação

Erros de

omissão

Erros de

inibição

28 04 05 03

Escore

ponderado/percentil

Percentil Percentil Percentil CR Combinado –

Escore ponderado

05 26-50% 26-50% 26-50% 07

Tabela 27: resultados quantitativos do Jake na prova Classificando Animais (NEPSY-II)

Classificando animais

Erros originais Erros repetidos Total de erros Acertos

01 03 04 02

Percentil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

26-50% 6-10% 11-25% 05 04

Tabela 28: resultados quantitativos do Jake na prova Fluência de Desenhos (NEPSY-II)

Fluência de desenhos

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165

Estruturada Aleatória Total

09 11 20

Percentagem acumulada Percentagem acumulada Escore ponderado

7-8 6-8 07

Tabela 29: resultados quantitativos do Jake na prova Inibindo Resposta (NEPSY-II)

Inibindo resposta

Parte 1

Erros não-

corrigidos

Erros auto-

corrigidos

Erros total Tempo

0 0 0 52”

Percentil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

51-75% 51-75% >75% 09 13

Parte 2

Erros não-

corrigidos

Erros auto-

corrigidos

Erros total Tempo

15 03 18 96”

Percentil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

<2% 26-50% <2% 06 03

Parte 3

Erros não-

corrigidos

Erros auto-

corrigidos

Erros total Tempo

01 15 16 163”

Percentil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

51-75% <2% 2-5% 05 03

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166

Erro total (Parte 1,2 e 3): 34 02

Tabela 30: resultados quantitativos do Jake na prova Relógios (NEPSY-II)

Relógios

Escore total Escore ponderado

66 09

No teste Atenção Auditiva e Conjunto de Respostas, Jake obteve desempenho acima do

nível esperado para sua faixa etária na parte 1, em contraponto ao desempenho limítrofe na

parte 2 (escore combinado equivalente a 13 e 07 pontos, respectivamente).

Em consonância, verifica-se desempenho acima do nível esperado na etapa 1 do teste

Inibindo Respostas, associada a desempenho muito abaixo do esperado nas etapas 2 e 3 do

referido teste. Nessas últimas etapas, Jake obteve escore combinado equivalente a 03 pontos

(P < 2). Na etapa 2, obteve número acentuado de erros não-corrigidos (total de 18 erros,

desses 15 não-corrigidos). Na etapa 3, a dificuldade prossegue com total de 16 erros, sendo 15

auto-corrigidos.

O acentuado número de erros não-corrigidos na etapa 2 corrobora com a aparente

impulsividade de Jake diante da nomeação de maneira invertida da forma ou direção da seta.

Por sua vez, o acentuado número de erros auto-corrigidos na etapa 3 sugere auto

monitoramento, identificação e controle das dificuldades para flexibilizar a resposta de

acordo com a cor do estímulo. Porém, o monitoramento repercute sobre a velocidade de

execução, o que implica na constante ultrapassagem do tempo permitido para realizar a

atividade.

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167

A hipótese de dificuldades na flexibilidade mental ganha força ao analisar o desempenho

de Jake no teste Classificando Animais. Ele encontra-se abaixo do nível esperado para sua

faixa etária devido ao elevado número de erros predominantemente repetitivos (escore

combinado igual a 04 pontos). Jake persiste em repetir a categorização de cores e tamanhos,

em detrimento da realização de classificações originais passíveis de aumentar o seu escore de

acertos no referido teste.

No teste Fluência de Desenhos, ele obteve desempenho limítrofe (20 acertos, 7 pontos

ponderados, percentil situado no intervalo de 11-25). Verifica-se baixo número de produções,

sem registro de erros por repetição ou falhas no traço gráfico. Jake demonstra acurácia e

perfeccionismo na execução da cópia do símbolo gráfico, destarte, acredita-se que ele

precisaria de mais tempo para aumentar a pontuação nesse teste.

Produções gráficas marcadas pelo perfeccionismo parecem repercutir na produção de

relógios analógicos da criança. No teste Relógios, o seu desempenho esteve dentro da média

esperada para sua faixa etária (09 pontos ponderados).

Na análise qualitativa das atividades propostas, verifica-se produção de relógios

analógicos com a presença de números bem localizados e corretamente sequenciados,

contornos simétricos que permitem acomodar adequadamente os números; bem como

ponteiros proporcionais corretamente conectados aos números do horário preestabelecido

(observar figura 39).

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168

Figura 39: extrato do item 1, teste Relógios (NEPSY-II), produzido por Jake – horário 3h

O perfeccionismo e acurácia das produções gráficas de Jake também aparecem no

desenho livre. De acordo com imagens ilustrativas (figuras 40 e 41), a representação do

animal ajusta-se ao corte e perfil do corpo com as patas e o rabo. Há inclusão de orelhas,

focinho e cabeça.

Identifica-se desenvolvimento adequado das habilidades visuoespaciais,

visuoconstrutivas e de motricidade fina, associadas ao perfeccionismo da representação

gráfica.

Figura 40: desenho livro produzido por Jake, animal

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169

HABILIDADES SOCIAIS E ASPECTOS SOCIOAFETIVOS:

a. Inventário Multimídia de Habilidades Sociais de Crianças (IMHSC-Del-Prette):

Tabela 31: resultados quantitativos do Jake na IMHSC-Del-Prette (Perfil Geral)

Tabela 32: resultados quantitativos do Jake na IMHSC-Del-Prette (Indicadores e Reações)

Tabela 33: resultados quantitativos do Jake na IMHSC-Del-Prette (Indicadores e Reações – subescalas)

PERFIL GERAL (em %)

Avaliador Tipo de reação

Habilidosa

s

NH

Passivas

NH Ativas

Criança 23,81% 47,62% 28,57%

Professor

INDICADORES E REAÇÕES (Valor médio para os

21 itens)*

Indicadores Avaliador Tipo de reação

Figura 41: desenho livro produzido por Jake, Angry Birds

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Habilidosa NH Passiva NH Ativa

Freqüência Criança 0,48 1,24 0,24

Professor

Adequação Criança 2,00 0,95 0,86

Professor

Dificuldade Criança 1,62 - -

Importância Professor - -

INDICADORES E REAÇÕES (Valor médio nas subescalas)

SUBESCALAS

Indicadores Reações Avaliador Empatia

Civilidade

Assertividade

enfrentamento

Autocontr

ole

Participação

Frequência Habilidosa Criança 0,38 0,20 1,00 0,33

Professor

NH passiva Criança 1,75 0,80 0,50 1,33

Professor

NH Ativa Criança 0,00 0,60 0,25 0,33

Professor

Adequação Habilidosa Criança 2,00 2,00 2,00 2,00

Professor

NH passiva Criança 1,00 1,20 0,75 0,67

Professor

NH Ativa Criança 0,38 1,00 1,50 1,33

Professor

Dificuldade Habilidosa Criança 1,63 2,00 0,75 2,00

Importância Professor

* Os resultados abaixo do intervalo [-1dp<média>+1dp] foram destacados em AMARELO

os acima do intervalo

foram

destacado

s em VERDE

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171

Tabela 34: resultados quantitativos do Jake na IMHSC-Del-Prette (Indicadores e Reações –valor de cada item)

b. NEPSY-II, provas do domínio da percepção social:

Tabela 35: resultados quantitativos do Jake na prova Teoria da Mente (NEPSY-II)

Teoria da mente

Tarefa verbal

Escore Percentil

17 26-50

Tarefa contextual

Escore

6

Escore total Escore ponderado/Percentil

23 26-50

A aplicação do Inventário Multimídia de Habilidades Sociais (IMHSC-Del-Prette) foi

iniciada com as perguntas do Perfil Geral, seguido de auto avaliações, nas quais a criança era

A D F I E H P A H P A

6.Pedir desculpas C

10.Oferecer ajuda C

13.Responder pergunta da professora C

14.Fazer pergunta à professora

16.Agradecer um elogio C

18.Consolar o colega C

19.Elogiar o objeto do colega C

21.Defender o colega C

3.Expressar desagrado

5.Pedir mudança comportamento C

11.Propor nova brincadeira C

17.Resistir à pressão do grupo

20.Defender-se de acusações injustas

2.Recusar pedido de colega

7.Demonstrar espírito esportivo

9.Negociar, convencer C

15.Aceitar gozações

1.Juntar-se a um grupo em brincadeiras

8.Mediar conflitos entre colegas C

13.Responder pergunta da professora C

4.Pedir ajuda ao colega em classe C

12.Perguntar (questionar) C

Empatia e civilidade

Assertividade de

enfrentamento

Autocontrole

Participação

Não fatores

INDICADORES E REAÇÕES (Valor de cada item)

SUBESCALAS HABILIDADESTipo de Déficit

Reação não

habilidosaCSC CSP

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172

convidada a informar a frequência, adequação e dificuldade implicada em cada reação

apresentada.

A auto avaliação geral de Jake indica uma proporção de reações habilidosas, não

habilidosas passivas e não habilidosas ativas semelhantes à da amostra de referência. Em

termos de frequência das reações, indica repertório social abaixo do esperado para sua faixa

etária nas reações habilidosas, mas dentro do esperado para as não habilidosas passivas e

ativas.

Os escores gerais de dificuldade para apresentar reações habilidosas são sugestivos de

déficits de fluência, ou seja, quando comparado à amostra normativa, ele apresenta essas

reações com maior frequência do que as crianças da amostra de referência. A análise dos

escores nos subgrupos de habilidades (subescalas) sugere que Jake apresenta dificuldade para

lidar com algumas das situações retratadas.

Na auto avaliação das reações habilidosas, o seu desempenho social situou-se abaixo da

média para empatia/civilidade, assertividade/enfrentamento e participação, sugerindo

dificuldade acima da média para as respectivas reações citadas.

Na auto avaliação das reações não habilidosas, Jake apresenta quantitativo acima da média

para as reações não habilidosas ativas de autocontrole. Conforme relato da progenitora, ele

comumente tende às reações de agressão verbal para com os pares, notadamente em

momentos marcados por brincadeiras de duplo-sentido ou ironias: “meu filho sofre muito na

escola, porque leva tudo ao pé da letra. Fica muito irritado quando alguém brinca com ele.

Peço para relevar, mas não tem jeito” (sic), informa a mãe.

Examinando-se os indicativos de problemas de comportamento com base nas reações não

habilidosas, os resultados sugerem problemas internalizantes em 13 itens. Os indicativos de

problemas internalizantes ocorrem para todas as demandas de empatia/civilidade, exceto fazer

perguntas à professora. Todas as demandas de participação, exceto juntar-se a um grupo em

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173

brincadeiras. Vale ressaltar ainda problemas internalizantes a demandas de negociar e

convencer, como por exemplo propor uma nova brincadeira.

Em termos de compreensão social, em especial sobre o que é esperado ou valorizado em

seu ambiente, Jake apresenta a tendência geral da maioria das crianças: considerar mais

adequadas as reações habilidosas. Embora valorize um número importante de reações não

habilidosas ativas, essas continuam em terceiro lugar frente à compreensão social sobre o que

é esperado ou valorizado em seu ambiente.

Na tarefa de teoria da mente do NEPSY-II, Jake apresenta resultado dentro da média

esperada para sua faixa etária (total de 23 pontos, percentil situado no intervalo de 26-50).

Destacam-se os itens 14 e 15. No primeiro, cuja tarefa propõe inferir estados mentais dos

personagens descritos, Jake não soube informar o porquê da vovó sorrir para si mesma

quando abraçou a Ovelhinha Laura. Apesar do avaliador fornecer detalhes sobre a história,

Jake continuou sem entender o motivo pelo qual a vovó sorriu: “não sei. Realmente não sei”

(sic), informa a criança ao avaliador.

No segundo, cuja tarefa propõe interpretação do provérbio “fazer o outro de gato e

sapato”, Jake trouxe descrição marcada pelo rigor formal, sugerindo dificuldade para lidar

com tal provérbio de forma intuitiva e espontânea: “gato é um animal de estimação; sapato é

uma peça de vestuário. Talvez, a frase represente fazer do tio ora um animal de estimação

frágil e dependente, ora uma peça de vestuário passível de descartar, descartável” (sic),

responde Jake. Esta hipótese ganha força com a interpretação literal de imagem com duplo-

sentido presente no item 11. Jake olha para o bule que parece uma maçã, mas prioriza afirmar

que está diante uma “chaleira” (sic), ou seja, sugere-se que ele considera apenas o bule em

detrimento da possibilidade de considerá-la igualmente a imagem de uma maçã.

Nesse sentido, o desempenho mediano na tarefa da teoria da mente precisa ser

considerado com ressalvas, identifica-se dificuldade significativa ao lidar com situações

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174

ambíguas, que exigem abstração e flexibilização do pensamento, seja para ultrapassar a

informação literal de um provérbio, ou para considerar a ambiguidade de um objeto que pode

assumir diferentes configurações.

Criança 5 – Pseudônimo Hugo – Transtorno de Asperger:

Hugo é uma criança do sexo masculino, com sete anos e onze meses de idade no

momento da avaliação neuropsicológica. O diagnóstico de TA foi dado pela neuropediatra

que o acompanha.

Etapa 1 – Análise qualitativa do sintoma:

ANAMNESE COM A MÃE DE HUGO:

As informações registradas sobre o histórico clínico de Hugo foram fornecidas pela mãe

da criança, durante entrevista clínica realizada em setembro de 2013. O relato indica forte

vínculo afetivo na relação mãe-filho. A mãe trabalha, aproximadamente, oito horas por dia e é

provedora do lar. Apesar das dificuldades financeiras, torna-se notório o esforço da provedora

para transformar a renda familiar em benefício para o aprimoramento das habilidades sociais e

linguísticas da criança. Até o momento da presente avaliação, Hugo estava em

acompanhamento com fonoaudiólogo e neuropediatra na rede particular de saúde, bem como

praticava caratê.

Hugo nasceu de parto cesáreo, após 9 meses de gestação. O pré-natal foi realizado

adequadamente, sem nenhuma intercorrência clínica no período pós-natal. Ele não apresenta

alterações em exames de audiometria e neurológicos, realizados no mês de junho de 2013.

De acordo com a mãe, nos primeiros meses de vida, ele foi uma criança muito quieta: não

chorava, não balbuciava. Começou a andar com aproximadamente 1 ano e 6 meses. Ainda

não consegue amarrar o cadarço dos tênis, pedalar bicicleta, cortar papel com tesoura e

escrever com letra cursiva. Concernente ao desenvolvimento da linguagem verbal, Hugo

apoiava-se na comunicação não-verbal para solicitar algo e, aproximadamente com 3 anos de

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175

idade, começou a utilizar cerca de 2 palavras e, logo em seguida, frases para se comunicar

com outrem.

Conversações recíprocas são estabelecidas quando o assunto desperta o interesse do

Hugo. Diálogos sobre assuntos corriqueiros do cotiando são frágeis. A mãe afirma que busca

saber como foi o dia na escola, mas ele frequentemente emite respostas concisas e

monossilábicas. Também são raras conversações demonstrando interesse nos outros.

Comumente ele parece interessado em ouvir falar apenas acerca dos temas do seu interesse,

bem como as suas perguntas estão circunscritas a temáticas consideradas relevantes,

primordialmente sobre caratê. Não há informações concernentes à presença de neologismos

ou linguagem idiossincrática. Não há histórico sugestivo de ecolalia imediata, expressões

estereotipadas ou ecolalia diferida.

Quando pequeno, adorava assistir aos mesmos vídeos de desenhos animados e, sempre

suspendia o filme para repetir as mesmas cenas. Hugo é filho único e não possui primos ou

amigos familiares próximos. Ele mora sozinho com a mãe e a prima de dezenove anos, cujo

horário flexível de estudos possibilita passar o dia com a criança, enquanto a mãe trabalha.

As características comportamentais susceptíveis ao diagnóstico clínico tornaram-se

evidentes, quando a criança ingressou na escola. A mãe começou a compará-lo com as

demais crianças e, por conseguinte, perceber o quanto ele agredia os colegas, porque tinha

dificuldade para se comunicar verbalmente. Motivada por colegas de trabalho, a progenitora

decidiu procurar neuropediatra especializado a fim de investigar a dificuldade de

comunicação e socialização do filho. Desde então, Hugo foi diagnosticado com Transtorno de

Asperger e, segundo ela, a relação mãe-filho evoluiu de modo importante:

“eu brigava muito com meu filho, porque ele tinha manias, tinha dificuldade

de comer e, principalmente, porque ele não entendia quando eu brigava com ele. Isso

me tirava do sério, mas depois do diagnóstico e ler muito sobre, descobri que preciso

entender como meu filho é para poder ajudá-lo, ao invés de brigar” (sic).

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176

Ressalta-se que Hugo foi diagnosticado há aproximados 7 meses antes da avaliação

neuropsicológica em vigor. A mãe sugere que o diagnóstico clínico clarificou o modo pelo

qual o filho interage e comporta-se, mas existem muitas dúvidas sobre o futuro da criança.

As manias sobressaltadas são uma preocupação da mãe. Hugo repete os mesmos

desenhos animados. Ademais, todos os dias, antes da mãe sair para o trabalho, Hugo a elogia

dizendo: “mãe você está linda. Bom trabalho” (sic). Ela afirma adorar ouvir a frase, mas

confessa que a repetição diária desperta preocupações atreladas à possível constituição de um

ritual.

Hugo é seletivo para com a alimentação, uma vez que não come frutas e verduras, bem

como não aceita alimentos que precisam de muita mastigação (carnes, por exemplo). Muitas

vezes, ele pergunta se a mãe está triste pelo fato dela não estar sorrindo. Assiste filmes de

terror, mas não demonstra medo das cenas. Comumente rir.

Hugo é designado como filho carinhoso, ainda que com dificuldades para demonstrar

seus sentimentos. A mãe preocupa-se com o futuro da criança no sentido de uma possível

“aversão aos sentimentos” (sic) ou eterna dificuldade de identificação das emoções

adequadas às circunstâncias postas. Muito preocupada, atualmente ela tenta explicar ao filho

o motivo pelo qual chora ou sorrir, o que o tem levado a questionar com mais frequência os

motivos subjacentes ao choro ou riso da mãe.

No tocante ao âmbito escolar, Hugo lê com dificuldade e não brinca com os pares. No

momento da avaliação em vigor, ele cursava o 2º ano do Ensino Fundamental I em escola

pública onde, segundo progenitora, não há esclarecimentos sobre o Transtorno de Asperger.

Por iniciativa da mãe, duas vezes por semana, ele tem acompanhamento extraescolar na

tentativa de atenuar a atual dificuldade de leitura e escrita.

Certo dia, a mãe do Hugo optou por destinar o dinheiro da feira alimentar para comprar o

lanche desejado pelo filho, porque ele ajudou o colega de turma a consertar um brinquedo.

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177

Segundo o relato, ela deixou Hugo escolher o lanche e ainda esclareceu para a criança o

redirecionamento do dinheiro. Embora reconhecesse que o valor redirecionado fosse fazer

falta, ela acreditou que o elogio e as compensações esclarecidas poderiam favorecer a

manutenção de boas atitudes e comportamentos do filho.

Ele é descrito como uma criança colaborativa e organizada. Gosta de estar em diferentes

âmbitos sociais e, atualmente, encontra-se com interesse restrito e intenso pelo caratê – atual

modalidade esportiva praticada pela criança na tentativa de lapidar habilidades motoras em

concordância com a interação social, informa a mãe.

DESENHO HISTÓRIA COM TEMA:

De acordo com a figura 42, o desenho da figura humana está na fase de verticalização da

figura-girino: a região da cabeça representa apenas a cabeça, as pernas representam uma

forma de tronco e pernas indistintos, e os braços são ligados a essas linhas verticais. O

desenho da casa remete ao domínio recém-adquirido do retângulo e triângulo, também

constituído por pequena figura fechada que ocupa o lugar de porta e janelas (Grieg, 2004).

Conforme figura 43, o desenho com tema “Eu e minha família” foi caracterizado pela

presença da criança, mãe e prima. Não se verifica acabamento diferenciado da figura humana

e o formato do rosto/corpo segue mesmo padrão. Ademais, ao apresentar a família, observa-se

que Hugo utiliza pronome pessoal da primeira pessoa do singular (eu) para referir-se a si

mesmo.

Figura 42: desenho do Hugo com tema “Eu e minha escola”

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178

Figura 43: desenho do Hugo com tema “Eu e minha família”

O desenho com tema “Eu e minha escola” (figura 42, apresentada anteriormente)

constituiu-se por apresentação da estrutura física da escola. Hugo encontra-se sozinho no

desenho. Em entrevista com a professora da criança, ela confirma o seu isolamento em

relação aos pares.

Diante da dificuldade de interação social, a mãe de Hugo propôs a prática do caratê como

modalidade esportiva com potencial para impulsionar a participação social do filho. Todavia,

o esporte despertou a curiosidade e o intenso interesse da criança ao ponto de contribuir para

o isolamento social, uma vez que constitui o único tema que ele deseja partilhar com os

colegas.

Conforme resultados do IMHSC-Del-Prette (posteriormente detalhados), Hugo apresenta

dificuldade significativa para efetuar ações que envolvem empatia/civilidade e participação.

Ou seja, ele frequentemente possui entraves em situações onde habilidades de afirmação,

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179

defesa de direito e autoestima tornam-se imprescindíveis. Dificuldades em envolver-se e

comprometer-se com o contexto social também são significativas.

RESPOSTA DO CBCL (RESPONDIDO PELA MÃE DE HUGO):

A primeira escala fornecida pela CBCL refere-se à Escala de Competência Social,

relacionada a problemas no desempenho de variadas atividades (brincadeiras, jogos,

execução de tarefas), no relacionamento com pessoas (familiares, amigos) e desempenho

escolar (Borsa & Nunes, 2008).

Conforme figura 44, o comportamento de Hugo foi classificado como clínico na Escala

de Competências Sociais. Nos componentes atrelados às diversas atividades e atividades

escolares ele situa-se na faixa clínica, no componente relacionamento social ele se encontra

na faixa limítrofe. Tal perfil corrobora com relatos fornecidos pela progenitora. Hugo é

designado como bom aluno, não possui amigos próximos, mas encontra-se fascinado pela

prática do caratê.

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180

Na segunda escala fornecida pelo CBCL, a Escala de Síndromes (figura 45), Hugo

enquadra-se nas categorias clínicas compatíveis com Isolamento/Depressão e Problemas de

Pensamento, sem perder de vista a faixa limítrofe para Problemas Sociais.

Figura 44: resultado do Hugo na Escala de Competências Sociais

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181

Figura 45: resultado do Hugo na Escala de Síndromes

Congênere aos resultados sugestivos de problemas internalizantes no IMHSC-Del-Prette,

Hugo obteve classificação clínica na Escala de Problemas Internalizantes do CBCL (escala

derivada do CBCL, observar figura 46).

Figura 46: resultado do Hugo na Escala de Problemas Totais (CBCL)

Em última análise, na Escala Orientada pelo DSM-IV, onde os dados para classificação

remetem a perfis clínicos do DSM-IV, Hugo obteve resultado compatível com a categoria

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182

clínica circunscrita à baixa velocidade de processamento cognitivo. Possivelmente, a tal perfil

clínico subjaz dificuldades na motricidade fina e coordenação motora apontadas, nos testes de

fluência de desenhos e relógios do NEPSY-II.

Figura 47: resultado do Hugo na Escala Orientada pelo DSM-IV (CBCL)

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183

Etapas 2 e 3 – Análise Quantitativa do Sintoma e Análise Qualitativa da Atividade:

INTELIGÊNCIA FLUÍDA:

a. Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR):

Tabela 36: resultados quantitativos do Hugo no MPCR

A Ab B

Soma 10 10 06

Consistência 10 09 07

Discrepância 0 +1 -1

Somatório Percentil6 Classificação

26 80-90

II

(Definitivamente acima da média na

capacidade intelectual)

No Teste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR), Hugo apresenta

capacidade intelectual definitivamente acima da média esperada para sua faixa etária. Ele

obteve somatório de 26 pontos (pontuação máxima = 36 pontos), com discrepâncias 0, +1, -1

nas respectivas séries A, Ab, B. Verifica-se dois erros nas respectivas séries A e Ab,

acompanhados de 6 erros na série B, todos predominantemente por repetição do padrão.

FUNÇÕES EXECUTIVAS:

b. NEPSY-II, provas do domínio da atenção e funções executivas:

6 Percentil de acordo com a população geral

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184

Valores de referência:

Tabela 37: resultados quantitativos do Hugo na prova Atenção Auditiva e Conjunto de Respostas

(NEPSY-II)

Atenção auditiva e conjunto de respostas

Parte 1

Acertos Erros de

ação

Erros de

omissão

Erros de

inibição

22 09 04 02

Escore

ponderado/percentil

Percentil Percentil Percentil AA Combinado –

Escore ponderado

05 2-5% 26-50% 6-10% 03

Parte 2

Acertos Erros de

ação

Erros de

omissão

Erros de

inibição

21 06 06 0

Escore

ponderado/percentil

Percentil Percentil Percentil CR Combinado –

Escore ponderado

06 26-50% 51-75% >75% 07

Tabela 38: resultados quantitativos do Hugo no Classificando Animais

Escore Ponderado Percentil Classificação

13 – 19 >75% Acima do nível esperado

08 – 12 26 - 75% Nível esperado (Média)

6 – 7 11 - 25% Limítrofe

4 – 5 3 – 10% Abaixo do nível esperado

1 – 3 <2% Muito abaixo do nível esperado

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185

Classificando animais

Erros originais Erros repetidos Total de erros Acertos

03 0 03 02

Percentil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

6-10% >75% 26-50% 06 06

Tabela 39: resultados quantitativos do Hugo na prova Fluência de Desenhos (NEPSY-II)

Fluência de desenhos

Estruturada Aleatória Total

06 07 13

Percentagem acumulada Percentagem acumulada Escore ponderado

4 4-5 07

Tabela 40: resultados quantitativos do Hugo na prova Inibindo Respostas (NEPSY-II)

Inibindo Respostas

Parte 1

Erros não-

corrigidos

Erros auto-

corrigidos

Erros total Tempo

0 0 0 55”

Percentil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

51-75% >75% >75% 11 14

Parte 2

Erros não- Erros auto- Erros total Tempo

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186

corrigidos corrigidos

05 02 08 127”

Percentil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

11-25% 51-75% 11-25% 06 06

Parte 3

Erros não-

corrigidos

Erros auto-

corrigidos

Erros total Tempo

18 06 24 167”

Percentil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

11-25% 11-25% 11-25% 07 06

Erro total (Parte 1,2 e 3): 32 06

Tabela 41: resultados quantitativos do Hugo na prova Relógios (NEPSY-II)

Relógios

Escore total Escore ponderado

24 01

De forma geral, o desempenho de Hugo nas provas do domínio da atenção e funções

executivas do NEPSY-II sugere dificuldades no funcionamento executivo.

No teste Atenção Auditiva e Conjunto de Respostas, Hugo obteve desempenho muito

abaixo do nível esperado para sua faixa etária na parte 1 (escore combinado equivalente a 03

pontos). Destaca-se elevado número de erros de ação (09 erros, percentil situado no intervalo

2-5, classificado como muito abaixo do nível esperado), ou seja, frequentemente ele ouvia

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187

uma determinada palavra e apontava de modo aleatório para uma cor. Na parte 2, embora com

menor número de erros (ação, inibição e omissão), seu desempenho continua classificado

como limítrofe ao esperado para sua faixa etária (escore combinado equivalente a 07 pontos).

Em consonância, verifica-se desempenho limítrofe nas etapas 2 e 3 do teste Inibindo

Respostas. Em ambas as etapas, ele obteve escore combinado equivalente a 06 pontos,

percentil situado no intervalo de 11-25.

Ressalta-se que na etapa 2, Hugo obteve número acentuado de erros predominantemente

do tipo não-corrigidos (total de 08 erros, desses 05 não-corrigidos), prosseguido com maior

intensidade na etapa 3 (total de 24 erros, sendo 18 não-corrigidos). Nessa perspectiva, sugere-

se a presença de dificuldades no funcionamento executivo atreladas ao controle inibitório e,

notadamente à flexibilidade mental.

No teste Classificando Animais, Hugo também obteve desempenho limítrofe ao esperado

para sua faixa etária (escore combinado igual a 06 pontos), tendo em vista 03 erros originais,

em contraponto a 2 acertos.

No teste Fluência de Desenhos, mais uma vez, o obteve desempenho limítrofe (13 acertos,

7 pontos ponderados, percentil situado no intervalo de 11-25). Aqui, provavelmente, ele

precisaria de mais tempo para aumentar a pontuação, devido ao baixo número de produções,

mas sem registro de erros por repetição ou falhas no traço gráfico.

Salienta-se que, como dito anteriormente, a criança ainda não consegue amarrar o cadarço

dos tênis, pedalar bicicleta, cortar papel com tesoura e escrever com letra cursiva. Tais

dificuldades despertam hipótese de comprometimentos na coordenação motora do Hugo.

No teste Relógios, destaca-se que Hugo ainda não possui desenvolvido o conceito de

tempo (não acertou os itens relacionados à nomeação de horas). Hipótese reforçada ao

analisar a sinalização inadequada dos ponteiros nos desenhos gráficos de relógios analógicos

solicitados pelo teste.

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188

Tal dificuldade pode ter comprometido a produção de relógios analógicos do Hugo,

entretanto, a análise qualitativa da atividade sugere que ele copia os relógios analógicos, mas

com presença de números desproporcionais organizados de forma assimétrica, bem como

ponteiros desproporcionais inseridos em contornos que não os acomodam de modo adequado.

Observar figuras 48 e 49.

No teste relógios, Hugo obteve desempenho muito abaixo do nível esperado para sua faixa

etária (percentil menor do que 2), tendo em vista escore total equivalente a 24 pontos e escore

ponderado situado em 01 ponto.

Conforme figura 48, nos itens 1 e 2, ele desenha relógios analógicos com números mal

localizados, contorno assimétrico e ponteiros desproporcionais.

Figura 48: extrato do teste Relógios (NEPSY-II), item 2, produzido por Hugo

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Especialmente na cópia dos relógios presentes nos 9 e 10, observa-se que Hugo sugere

dificuldade em habilidades visuopesaciais e de planejamento, uma vez que as relações

espaciais encontram-se dissonantes aos pontos de referência das imagens (relógios para

cópia). A cópia dos relógios analógicos também vislumbra dificuldade de planejamento ao

verificar que Hugo ainda não segue a sequência numérica disposta para cópia.

HABILIDADES SOCIAIS E ASPECTOS SOCIOAFETIVOS:

a.Inventário Multimídia de Habilidades Sociais de Crianças (IMHSC-Del-Prette):

Tabela 42: resultados quantitativos de Hugo no IMHSC-Del-Prette – Perfil Geral

Tabela 43: resultados quantitativos do Hugo no IMHSC-Del-Prette – Indicadores e Reações

Tabela 44: resultados quantitativos do Hugo no IMHSC-Del-Prette – Indicadores e Reações, subescalas

Figura 49: extrato do teste Relógios (NEPSY-II), itens 9 e 10, produzido por Hugo

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PERFIL GERAL (em %)

Avaliad

or

Tipo de reação

Habilidos

as

NH

Passivas

NH

Ativas

Criança 71,43% 14,29% 14,29%

Professor

INDICADORES E REAÇÕES (Valor médio

para os 21 itens)*

Indicadores Avaliado

r

Tipo de reação

Habilidosa NH

Passiva

NH Ativa

Freqüência Criança 0,86 1,19 0,33

Professor

Adequação Criança 1,86 1,33 0,43

Professor

Dificuldade Criança 1,05 - -

Importância Professor - -

INDICADORES E REAÇÕES (Valor médio nas subescalas)

SUBESCALAS

Indicadores Reações Avaliador Empatia

Civilidade

Assertividade

enfrentamento

Autocontr

ole

Participação

Freqüência Habilidosa Criança 0,88 0,80 1,50 0,00

Professor

NH

passiva

Criança 1,13 1,00 0,75 2,00

Professor

NH

Ativa

Criança 0,00 0,60 0,75 0,33

Professor

Adequação Habilidosa Criança 2,00 1,60 2,00 2,00

Professor

NH passiva Criança 1,63 0,60 1,75 1,00

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Professor

NH Ativa Criança 0,00 0,80 1,00 0,33

Professor

Dificuld

ade

Habilidosa Criança 1,25 0,80 0,50 2,00

Importâ

ncia Professor

* Os resultados abaixo do intervalo [-

1dp<média>+1dp] foram destacados em

AMAREL

O os acima do intervalo foram

destacad

os em VERDE

Tabela 45: resultados quantitativos do Hugo no IMHSC-Del-Prette – Indicadores e Reações, valor de cada item

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b.NEPSY-II, provas do domínio da percepção social:

Tabela 46: resultados quantitativos do Hugo na prova Teoria da Mente (NEPSY-II)

Teoria da mente

Tarefa verbal

Escore Percentil

06 <2

Tarefa contextual

Escore

03

Escore total Escore ponderado/Percentil

09 <2

A aplicação do Inventário Multimídia de Habilidades Sociais (IMHSC-Del-Prette) foi

iniciada com as perguntas do Perfil Geral, seguido de auto avaliações, nas quais a criança era

A D F I E H P A H P A

6.Pedir desculpas

10.Oferecer ajuda C

13.Responder pergunta da professora C

14.Fazer pergunta à professora

16.Agradecer um elogio

18.Consolar o colega C

19.Elogiar o objeto do colega

21.Defender o colega

3.Expressar desagrado C

5.Pedir mudança comportamento C

11.Propor nova brincadeira C

17.Resistir à pressão do grupo

20.Defender-se de acusações injustas

2.Recusar pedido de colega C

7.Demonstrar espírito esportivo

9.Negociar, convencer C

15.Aceitar gozações

1.Juntar-se a um grupo em brincadeiras C

8.Mediar conflitos entre colegas C

13.Responder pergunta da professora C

4.Pedir ajuda ao colega em classe C

12.Perguntar (questionar) C

Empatia e civilidade

Assertividade de

enfrentamento

Autocontrole

Participação

Não fatores

INDICADORES E REAÇÕES (Valor de cada item)

SUBESCALAS HABILIDADESTipo de Déficit

Reação não

habilidosaCSC CSP

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convidada a informar a frequência, adequação e dificuldade implicada em cada reação

apresentada.

A auto avaliação geral de Hugo indica uma proporção de reações habilidosas, não

habilidosas passivas e não habilidosas ativas semelhantes à da amostra de referência. Em

termos de frequência das reações, a auto avaliação de Hugo indica repertório social dentro do

esperado para sua faixa etária nas reações habilidosas, não habilidosas passivas e não

habilidosas ativas.

Os escores gerais de adequação mostram reações não habilidosas passivas acima da

média, em contraponto às reações habilidosas e não habilidosas ativas, as quais se encontram

na média. Por sua vez, os escores gerais de dificuldade para apresentar reações habilidosas

não são sugestivos de déficits de fluência, ou seja, quando comparado à amostra normativa,

ele apresenta essas reações sem dificuldade aparente.

A análise dos escores nos subgrupos de habilidades (subescalas) sugere que Hugo

apresenta dificuldade para lidar com algumas das situações retratadas. Na auto avaliação das

reações habilidosas, o desempenho social de Hugo situa-se abaixo da média para

empatia/civilidade e participação, cuja auto avaliação de dificuldade indica dificuldade acima

da média para as reações citadas. Na auto avaliação das reações não habilidosas, ele

apresenta-se acima da média para as reações não habilidosas passivas de participação.

Examinando-se os indicativos de problemas de comportamento com base nas reações não

habilidosas, os resultados sugerem problemas internalizantes em 11 itens. Portanto, os

indicativos de problemas internalizantes ocorrem para as demandas de oferecer ajuda,

responder pergunta da professora, consolar colega, expressar desagrado, propor nova

brincadeira, negociar e convencer, juntar-se a um grupo em brincadeiras, mediar conflitos

entre colegas, pedir ajuda ao colega em classe, perguntar (questionar).

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Em termos de compreensão social sobre o que é esperado ou valorizado em seu

ambiente, Hugo apresenta a tendência geral da maioria das crianças: considerar mais

adequadas as reações habilidosas, situando em segundo lugar as não habilidosas passivas e

em terceiro as ativas.

Na análise qualitativa da atividade, Hugo demonstra dificuldade para imaginar

situação hipotética e, por conseguinte, colocar-se no lugar de outrem. Por exemplo, no item

15, cuja situação propõe avaliar o autocontrole na demanda de aceitar gozações, Hugo diz:

“não sei responder, porque não uso óculos” (sic).

Na tarefa de teoria da mente do NEPSY-II, Hugo obteve desempenho muito abaixo do

esperado para sua faixa etária (total de 09 pontos, percentil menor do que 2). Demonstra

apoiar-se em imagens visuais. No item 5, por exemplo, sugere-se resposta amparada na

percepção visual. Ele respondeu: “Silvia. Ela está abraçando um golfinho” (sic). Ademais,

observam-se os itens 13 e 15 que propõem interpretação de provérbios populares na sociedade

brasileira. Apesar dos mesmos apresentarem auxílio de imagem, Hugo respondeu: “não sei.

Nunca ouvi falar” (sic), sugerindo dificuldade para lidar com com a dimensão inferencial da

linguagem.

No desenho história com tema, Hugo desenhou os temas solicitados, quais sejam, “Eu e

minha família”, “Eu e minha escola”, mas a apresentação verbal do desenho foi incentivada

pelo avaliador. Ele produziu frases curtas e descritivas do desenho, por exemplo, “Estou na

escola” (sic), “Eu, minha mãe e minha prima em casa” (sic).

Tal fato reforça relato da mãe, o qual afirma que diálogos sobre assuntos corriqueiros do

cotiando são frágeis. Comumente, Hugo emite respostas concisas e monossilábicas, por

exemplo.

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Criança 6 – Pseudônimo Max – Transtorno de Asperger:

Max é uma criança do sexo masculino, com onze anos e sete meses de idade no momento

da avaliação neuropsicológica. O diagnóstico de Asperger foi fornecido pela neuropediatra

que o acompanha de modo sistemático. Destaca-se que o pseudônimo Max remete a um dos

integrantes do atual tema de interesse da criança, a saber, Big Brother Brasil.

Etapa 1 – Análise qualitativa do sintoma:

ANAMNESE COM A MÃE DE MAX:

As informações registradas sobre o histórico clínico de Max foram fornecidas pela mãe da

criança, durante entrevista clínica realizada em fevereiro de 2013. O relato indica forte

vínculo afetivo na relação mãe-filho. A mãe de Max dedica-se à inserção da criança em

equipe multiprofissional a fim de fomentar o desenvolvimento de habilidades sociais e

linguísticas da criança. Até o momento da presente avaliação, Max estava em

acompanhamento com fonoaudiólogo, psicólogo clínico e neuropediatra na rede particular de

saúde.

Max nasceu de parto cesáreo, após 8 meses de gestação. O pré-natal foi realizado

adequadamente, sem nenhuma intercorrência clínica no período pós-natal. Nos primeiros

meses de vida, foi uma criança muito quieta: não chorava, era “todo molengo” (sic). Ele

começou a andar e falar palavras isoladas (como mamãe) aproximadamente com 1 ano de

idade. Aos 3 anos de idade, começou a ler sozinho, mas ainda por volta dos 4-5 anos de idade,

poucos entendiam o que ele falava. Aos 5 anos, a comunicação social da criança melhorou,

ainda que por meio do uso de palavras isoladas.

A mãe de Max afirma que o filho sempre utilizou gestos para se comunicar e

frequentemente repetia histórias dos desenhos favoritos. Quando pequeno, adorava

brincadeiras de montar e para onde fosse tinha que levar as peças de armação. Ela relembra

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196

que Max tinha “manias” (sic), dentre elas, todas as roupas e objetos pessoais tinham que ser

na cor amarela.

Ele também associava pessoas a números específicos de repetição, por exemplo, antes de

estabelecer comunicação com a mãe, Max repetia a palavra “mãe”, três vezes: “mãe, mãe,

mãe vou à escola hoje à tarde” (sic). Max não sabia o nome próprio dos colegas de sala, mas

os associava ao número da lista de chamada.

Ele obteve diagnóstico clínico de Transtorno de Asperger aos 6 anos de idade. A mãe

relata que foi difícil perceber o atraso no desenvolvimento, porque Max era filho único até

então. As características comportamentais concernentes ao diagnóstico clínico tornaram-se

evidentes quando a criança ingressou na escola. A instituição começou a desconfiar de

possível quadro clínico, uma vez que Max frequentemente não respondia à professora, nem

olhava nos olhos dos outros, “como se estivesse no mundo dele”, informa a mãe (sic).

No período em questão, a mãe começou a observar que o filho confundia-se com a

colocação do pronome na frase, por exemplo, ele dizia: “filho, eu vou sair” (sic). Max

perguntava: “eu”? (sic). Como se o “eu” presente na frase da mãe, se referisse a ele, Max. Ou

seja, a criança confundiu o “eu”, pronome pessoal da primeira pessoa do singular, com o

“você”, pronome de tratamento pessoal. Seu uso verbal se dá na segunda pessoa, porém,

conjugado como a terceira pessoa (ele).

Max demorou a compreender o conceito de tempo e comumente confundia claro/escuro.

No momento da presente avaliação, apresentava dificuldades para entender antônimo. O

discurso da mãe sugere que ele precisa de um tempo específico para responder a perguntas,

muitas deles, sobre o cotidiano escolar – “eu faço uma pergunta a Max, mas ele demora um

tempinho para me responder. Às vezes, isso me tira do sério” (sic).

Certo dia, Max demonstrou estar muito chateado com a mãe porque ele solicitou pegar

um lápis que estava em cima da mesa, quando, na verdade, o mesmo estava embaixo da

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mesa. Segundo relato, Max ficou “paralisado” (sic) tentando entender o que realmente a mãe

queria, já que o objeto não estava no lugar indicado. Também em certo dia, Max demonstrou

estar “transtornado” (sic), porque, brincando, a mãe o chamou de papagaio. Ele já solicitou

substituir psicólogo clínico que o acompanhava, porque, sem autorização, o profissional

pegou um pouco da pipoca que o Max estava comendo.

Max é designado como tendo dificuldades para demonstrar sentimentos. Certo dia, ele

ficou sem entender o motivo pelo qual uma criança chorava pele morte de um gato: “por que

ele chora? Todo mundo, inclusive animais, morrem!” (sic), disse Max. Ele possui

dificuldades para reconhecer quando a mãe está triste. Frequentemente confunde tristeza com

cansaço: “às vezes, eu chego em casa cansada, mas Max acha que estou triste. Para ele,

inveja, raiva, ódio e tristeza é uma coisa só” (sic), informa a mãe.

Max começou a ler com 3 anos de idade. As dificuldades escolares atuais circunscrevem-

se à aparente incredulidade sobre frequentes brincadeiras irônicas dos pares para com ele.

Max ainda adora relacionar pessoas a números. A mãe afirma que ele demonstra interesse

intenso pelo Big Brother Brasil, programa de entretenimento vinculado a uma rede de

televisão brasileira.

Max é descrito como criança que não se opõe ao estabelecimento de relações, gosta de

estar em diferentes âmbitos sociais e é um aluno colaborativo, mas apresenta dificuldades

para ler os contextos, o que culmina com posturas, por parte dos colegas, sugestivas de

bullying.

DESENHO HISTÓRIA COM TEMA:

Concernente ao desenho história com tema “eu e minha família”, verifica-se desenhos

figurativos constituídos por personagens com cabeça e corpo, acompanhado de sugestiva

clivagem funcional da condensação de figuras continentes e irradiantes que haviam

constituído a figura-girino do Max (Grieg, 2004).

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198

Conforme figura 50, ainda não se observa traços precisos, e diferenciações dos

personagens gráficos ocorrem no rosto, acompanhado pelo nome próprio de cada membro

familiar representado.

Figura 50: desenho história do Max sobre o tema "Eu e minha família"

No desenho história com tema, Max desenhou o tema “Eu e minha família”, mas recusou

o desenho “Eu e minha escola”. Conforme figura 50, o desenho história com tema “Eu e

minha família” foi caracterizado pela presença da criança, pais e irmão caçula. Verifica-se

acabamento diferenciado dos personagens gráficos, mas o formato do corpo segue mesmo

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padrão. Ao apresentar a família, Max utiliza o pronome pessoal da primeira pessoa do

singular (eu) para referir-se a si mesmo. Tal fato evidencia-se em outros momentos do

processo avaliativo, nos quais Max diferencia os pronomes eu-você: “Eu acertei a tarefa que

você passou?” (sic), pergunta ele ao avaliador.

Contudo, no tema “Eu e minha escola”, Max optou por escrever o seguinte parágrafo:

“Tenho muitos amigos na escola, ainda bem, pois nasci com Síndrome de

Asperger, e minha mãe tinha medo disso. Na escola eu sou bom em muitas matérias,

as professoras são legais, a sala é bonita, tem ar-condicionado. Eu sou do 6º ano A.

Sou muito inteligente” (sic).

No trecho em questão predomina a descrição da estrutura física da escola e de como Max

é caracterizado enquanto aluno. Ele afirma saber do diagnóstico de Transtorno de Asperger,

diz ter muitos amigos, mas, em seguida, apresenta o medo da mãe atrelado à possibilidade

oposta (não ter amigos).

Conforme anamnese, a mãe tenta clarificar situações, expressões, sugestivas de bullying.

Embora precise de certo tempo para entender, quando compreende, a mãe afirma que o filho

consegue perceber melhor as situações negativas que podem perpassar o seu cotidiano

escolar.

O avaliador perguntou a Max o que ele comumente faz com os amigos na escola. A

criança respondeu que frequentemente ajuda os colegas na realização de atividades escolares

e avisa aos amigos desinformados quando tem prova.

Em entrevista escolar, a coordenadora responsável pelo 6º ano do Ensino Fundamental

relatou situação na qual Max sugere não ter compreendido o contexto posto. Certo dia,

colegas da sala de aula estavam programando atividades de lazer para o final de semana. Max

ouviu a conversa e, empolgado, informou a coordenadora o que iria fazer no final de semana.

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200

Desconfiada, a profissional conversou com um dos colegas de turma do Max, quando soube

que ele não foi efetivamente convidado, nem o envolveram nos detalhes da programação.

A coordenadora afirma que Max frequentemente é isolado dos pares nas atividades de

lazer, mas ele frequentemente está envolvido em atividades escolares (atividade em grupo,

por exemplo). A mãe acredita que os pares o envolvem em atividades escolares, porque

frequentemente Max as efetiva com qualidade, mas afirma que comumente precisa ligar para

as demais mães de crianças que estudam com ele, a fim de ter certeza se o filho foi convidado

para programação de lazer.

Conforme resultados do IMHSC-Del-Prette (posteriormente detalhado), Max indica

dificuldade significativa para agir em situações que envolvem empatia/civilidade e

participação. Ou seja, ele frequentemente possui entraves em contextos onde habilidades de

afirmação, defesa de direito e autoestima tornam-se imprescindíveis. Dificuldades em

envolver-se e comprometer-se com o contexto social também são significativas.

RESPOSTA DO CBCL (RESPONDIDO PELA MÃE DE MAX):

Em todas as escalas fornecidas pelo CBCL, o comportamento de Max pode ser

classificado como Clínica, Limítrofe ou Não-Clínica, segundo amostra normativa de pares de

Achenbach (1991, citado por Garzuzi, 2009). No entanto, torna-se imperativo frisar que tais

classificações não configuram um diagnóstico, apenas circunscrevem a categoria na qual a

criança ou adolescente encontra-se, conforme respostas fornecidas pelos pais ou responsáveis

legais.

A primeira escala fornecida pela CBCL refere-se à Escala de Competência Social,

relacionada a problemas no desempenho de variadas atividades (brincadeiras, jogos,

execução de tarefas), no relacionamento com pessoas (familiares, amigos) e desempenho

escolar (Borsa & Nunes, 2008).

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201

Conforme figura 51, Max classificou-se na faixa clínica no relacionamento social, na

faixa limítrofe nas diversas atividades e não-clínica nas atividades escolares, classificando-se

como clínico na Escala de Competências Totais.

Figura 51: resultado do Max na Escala de Competências Sociais (CBCL)

De acordo com informações fornecidas pela sua mãe, Max é designado como bom aluno,

comumente colabora na resolução de atividades escolares realizadas em grupo, mas não

possui amigos próximos, nem é convidado para programações de lazer propostas entre os

pares.

Na segunda escala fornecida pelo CBCL, a Escala de Síndromes (figura 52), Max

enquadra-se nas categorias clínicas compatíveis com Ansiedade/Depressão e Problemas de

Pensamento, sem perder de vista a faixa limítrofe para Isolamento/Depressão.

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202

Congênere aos resultados sugestivos de problemas internalizantes no SMHSC-Del-Prette,

Max obteve classificação clínica na Escala de Problemas Internalizantes do CBCL (escala

derivada do CBCL, observar figura 53).

Figura 53: resultado do Max na Escala de Problemas Totais (CBCL)

Figura 52: resultado do Max na Escala de Síndromes (CBCL)

Page 203: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO … · Figura 3: exemplo de um problema do MPCR série Ab ... Figura 11: extrato do teste Fluência de Desenhos (NEPSY-II), parte estruturara,

203

Em última análise, na Escala Orientada pelo DSM-IV, onde os dados para classificação

remetem a perfis clínicos do DSM-IV, Max obteve resultado compatível com a categoria

clínica para problemas de ansiedade e problemas obsessivos-compulsivos. Observar figura

54.

Figura 54: resultado do Max na Escala Orientada pelo DSM-IV(CBCL)

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204

Etapas 2 e 3 – Análise Quantitativa do Sintoma e Análise Qualitativa da Atividade:

INTELIGÊNCIA FLUÍDA:

a. Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR):

Tabela 47: resultados quantitativos do Max no MPCR

A Ab B

Soma 11 11 12

Consistência 12 11 11

Discrepância -1 0 +1

Somatório Percentil7 Classificação

34 90

II+

(Definitivamente acima da média na

capacidade intelectual)

No Teste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR), a capacidade

intelectiva de Max foi classificado coma definitivamente acima da média esperada para sua

faixa etária. Ele obteve somatório de 34 pontos (pontuação máxima = 36 pontos), com

discrepâncias -1, 0, +1, nas respectivas séries A, Ab, B.

Verifica-se ausência de erro na série B e apenas 1 erro nas respectivas séries A e Ab

(ambos no item 12). Na série A, obteve erro por repetição do padrão, enquanto na série Ab,

obteve erro por individuação inadequada.

7 Percentil de acordo com a população geral

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205

FUNÇÕES EXECUTIVAS:

b. NEPSY-II, provas do domínio da atenção e funções executivas:

Valores de referência:

Tabela 48: resultados quantitativos do Max na prova Atenção Auditiva e Conjunto de Respostas (NEPSY-II)

Atenção auditiva e conjunto de respostas

Parte 1

Acertos Erros de

ação

Erros de

omissão

Erros de

inibição

30 0 0 0

Escore

ponderado/percentil

Percentil Percentil Percentil AA Combinado –

Escore ponderado

12 51-75% 51-75% 26-50% 12

Parte 2

Acertos Erros de

ação

Erros de

omissão

Erros de

inibição

36 0 0 0

Escore Percentil Percentil Percentil CR Combinado –

Escore Ponderado Percentil Classificação

13 – 19 >75% Acima do nível esperado

08 – 12 26 - 75% Nível esperado (Média)

6 – 7 11 - 25% Limítrofe

4 – 5 3 – 10% Abaixo do nível esperado

1 – 3 <2% Muito abaixo do nível esperado

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206

ponderado/percentil Escore ponderado

14 >75% >75% >75% 14

Tabela 49: resultados quantitativos do Max na prova Classificando Animais (NEPSY-II)

Classificando animais

Erros originais Erros repetidos Total de erros Acertos

02 04 06 06

Percentil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

6-10% 2-5% 2-5% 09 07

Tabela 50: resultados quantitativos do Max na prova Fluência de Desenhos (NEPSY-II)

Fluência de desenhos

Estruturada Aleatória Total

14 11 25

Percentagem acumulada Percentagem acumulada Escore ponderado

9-10 8 09

Tabela 51: resultados quantitativos do Max na prova Inibindo Respostas (NEPSY-II)

Inibindo resposta

Parte 1

Erros não-

corrigidos

Erros auto-

corrigidos

Erros total Tempo

0 0 0 50”

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207

Percentil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

51-75% 51-75% >75% 08 12

Parte 2

Erros não-

corrigidos

Erros auto-

corrigidos

Erros total Tempo

0 02 02 127”

Percentil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

51-75% 26-50% 51-75% 01 07

Parte 3

Erros não-

corrigidos

Erros auto-

corrigidos

Erros total Tempo

0 06 06 167”

Percentil Percentil Percentil Escore

ponderado

Escore

combinado

>75% 11-25% 51-75% 01 07

Erro total (Parte 1,2 e 3): 08 10

Tabela 52: resultados quantitativos do Max na prova Relógios (NEPSY-II)

Relógios

Escore total Escore ponderado

69 10

No teste Atenção Auditiva e Conjunto de Respostas, Max obteve desempenho dentro da

média esperada para sua faixa etária na parte 1 (escore combinado equivalente a 12 pontos).

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208

Na parte 2, seu desempenho cresce, sendo classificado como acima do nível esperado (escore

combinado equivalente a 14 pontos).

Em contraponto, no teste Inibindo Resposta, Max obteve desempenho de acordo com a

média esperada para sua faixa etária na etapa 1 (escore combinado igual a 12 pontos), ao

passo que obteve desempenho limítrofe nas etapas 2 e 3 (em ambas, escore combinado

equivalente a 07 pontos). Verifica-se aumento crescente do cômputo de erros totais. Enquanto

na etapa 2 Max obteve 02 erros auto-corrigidos; na etapa 3, o número de erros auto-corrigidos

ascende para 06. Os erros auto-corrigidos nas etapas 2 e 3 sugerem auto monitoramento do

suposto entrave de inibir e, notadamente, flexibilizar a resposta de acordo com a cor do

estímulo. Embora demonstre maior dificuldade para flexibilizar a resposta, parece que a auto

supervisão minimiza possíveis desvios do seu comportamento em relação à meta desejada.

A análise da atividade de Max aponta para grande consumo de tempo na execução da

tarefa. Identifica-se um maior número de erros auto-corrigidos e o maior tempo de execução

na etapa 3, quando comparado à etapa 2. Tais achados sugerem maior dificuldade em

atividades subsidiadas pela flexibilidade mental do que pelo controle inibitório.

Tal hipótese ganha força ao analisar extratos de diálogos do processo avaliativo. Certa

sessão, Max sugeriu estar desenvolvendo capacidade para inibir comportamentos

inadequados:

“Minha psicóloga disse que eu tenho alguns comportamentos estereotipados

como falar baixinho tudo que escuto e repetir o que os outros falam. Na escola me

chamam de gravador, mas eu estou melhorando. Acho que controlo mais o que quero

falar” (sic).

Em contraposição, dificuldades de flexibilidade mental parecem repercutir com maior

frequência no cotidiano da criança. A mãe informa a necessidade de rotina e de

previsibilidade do filho, sem perder de vista o quanto ele fica “irritado” (sic) quando há

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209

alterações ou variações. Ele apresenta ritual para vestir a farda da escola, todos os dias, Max

segue a sequência: camisa, calça, meia e tênis.

A hipótese de dificuldades na flexibilidade mental é corroborada pelo desempenho

limítrofe obtido no teste Classificando Animais (escore combinado equivalente a 7 pontos).

Apesar de obter 6 acertos (escore ponderado igual a 09 pontos, percentil situado no intervalo

de 26-75), verifica-se número compatível de erros repetidos (06 erros, percentil situado no

intervalo de 2-5). Max persistia nas classificações sol/chuva e nos animais cachorro, peixe e

pássaro.

No teste Fluência de Desenhos, Max obteve desempenho dentro da média esperada para

sua faixa etária (25 acertos, 9 pontos ponderados, percentil situado no intervalo de 26-75).

Verifica-se fluência visomotora para gerar desenhos originais, congruente com a fluência

verbal, primordialmente observada na interação social da criança, durante processo

avaliativo.

No teste Relógios, Max obteve desempenho dentro do esperado para sua faixa etária

(percentil entre 26-75), tendo em vista escore total equivalente a 69 pontos e escore

ponderado situado em 10 pontos.

A análise qualitativa de atividade sugere adequado desenvolvimento de habilidades

visuoespaciais. Max possui conceito de tempo e destaca-se nos itens 9 e 10, onde ele copia

relógios analógicos com presença de números, contorno e ponteiros de acordo com a imagem

de referência.

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Figura 55: extrato do Max referente aos itens 9 e 10 do teste Relógios (NEPSY-II)

Contudo, a escrita do Max leva à hipótese de falhas na coordenação motora e motricidade

fina. Conforme figura 56, esta se encontra caracterizada por letras pouco diferenciadas, mal

elaboradas e mal proporcionadas.

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Figura 56: parágrafo produzido pelo Max sobre o tema “Eu e minha escola”

HABILIDADES SOCIAIS E ASPECTOS SOCIOAFETIVOS:

a. Inventário Multimídia de Habilidades Sociais de Crianças (IMHSC-Del-Prette):

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PERFIL GERAL (em %)

Avaliador Tipo de reação

Habilidosas NH Passivas NH Ativas

Criança 66,67% 14,29% 19,05%

Professor

INDICADORES E REAÇÕES (Valor médio para os 21 itens)*

Indicadores Avaliador Tipo de reação

Habilidosa NH Passiva NH Ativa

Frequência Criança 0,86 0,86 0,10

Professor

Adequação Criança 2,00 0,95 0,10

Professor

Dificuldade Criança 1,14 - -

Importância Professor - -

INDICADORES E REAÇÕES (Valor médio nas subescalas)

SUBESCALAS

Indicadores Reações Avaliador Empatia Civilidade Assertividade

enfrentament

o

Autocontrol

e

Participaçã

o

Frequência Habilidosa Criança 1,00 1,00 0,75 0,67

Professor

NH passiva Criança 0,63 1,00 0,75 2,00

Professor

NH Ativa Criança 0,00 0,00 0,00 0,67

Professor

Adequação Habilidosa Criança 2,00 2,00 2,00 2,00

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Professor

NH passiva Criança 0,88 1,20 1,00 1,00

Professor

NH Ativa Criança 0,00 0,00 0,00 0,67

Professor

Dificuldade Habilidosa Criança 1,13 1,00 1,00 1,33

Importância Professor

* Os resultados abaixo do intervalo [-1dp<média>+1dp] foram

destacados em AMARELO . Os acima do intervalo foram

destacados em VERDE

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b. NEPSY-II, provas do domínio da percepção social:

Tabela 53: quantitativos na prova Teoria da Mente (NEPSY-II)

Teoria da mente

Tarefa verbal

Escore Percentil

19 26-50

Tarefa contextual

Escore

06

Escore total Escore ponderado/Percentil

25 51-75

A D F I E H P A H P A

6.Pedir desculpas

10.Oferecer ajuda C

13.Responder pergunta da professora C

14.Fazer pergunta à professora

16.Agradecer um elogio

18.Consolar o colega

19.Elogiar o objeto do colega

21.Defender o colega

3.Expressar desagrado

5.Pedir mudança comportamento

11.Propor nova brincadeira C

17.Resistir à pressão do grupo

20.Defender-se de acusações injustas

2.Recusar pedido de colega C

7.Demonstrar espírito esportivo

9.Negociar, convencer

15.Aceitar gozações

1.Juntar-se a um grupo em brincadeiras C C

8.Mediar conflitos entre colegas C

13.Responder pergunta da professora C

4.Pedir ajuda ao colega em classe

12.Perguntar (questionar)

Empatia e civilidade

Assertividade de

enfrentamento

Autocontrole

Participação

Não fatores

INDICADORES E REAÇÕES (Valor de cada item)

SUBESCALAS HABILIDADESTipo de Déficit

Reação não

habilidosaCSC CSP

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A aplicação do Inventário Multimídia de Habilidades Sociais (IMHSC-Del-Prette) foi

iniciada com as perguntas do Perfil Geral, seguido de auto avaliações, das quais a criança era

convidada a informar a frequência, adequação e dificuldade implicada em cada reação

apresentada.

A auto avaliação geral de Max indica uma proporção de reações habilidosas, não

habilidosas passivas e não habilidosas ativas semelhantes à da amostra de referência. Em

termos de frequência e adequação das reações, a auto avaliação de Max indica repertório

social dentro do esperado para sua faixa etária nas reações habilidosas, não habilidosas

passivas e não habilidosas ativas.

Os escores gerais de dificuldade para apresentar reações habilidosas não são sugestivos de

déficits de fluência, ou seja, quando comparado à amostra normativa, ele apresenta essas

reações sem dificuldade aparente. Todavia, a análise dos escores nos subgrupos de

habilidades (subescalas) sugere que ele apresenta dificuldade de lidar com algumas situações

retratadas.

Na auto avaliação das reações habilidosas, o desempenho social de Max situa-se abaixo

da média para empatia/civilidade e participação, cuja auto avaliação de dificuldade indica

dificuldade acima da média para as reações citadas. Na auto avaliação das reações não

habilidosas, Max apresenta-se acima da média para as reações não habilidosas passivas de

participação.

Examinando-se os indicativos de problemas de comportamento com base nas reações não

habilidosas, os resultados sugerem problemas internalizantes em 7 itens, ocorrendo para as

demandas de oferecer ajuda, responder pergunta da professora, propor nova brincadeira,

recusar pedido de colega, juntar-se a um grupo em brincadeiras, mediar conflitos entre

colegas, responder pergunta da professora.

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Em termos de compreensão social sobre o que é esperado ou valorizado em seu ambiente,

Max apresenta a tendência geral da maioria das crianças: considerar mais adequadas as

reações habilidosas, situando em segundo lugar as não habilidosas passivas e em terceiro as

ativas.

Na tarefa de teoria da mente do NEPSY-II, Max apresenta-se dentro da média esperada

para sua faixa etária (total de 25 pontos, percentil situado no intervalo de 51-75). Destaca-se

o item 14, cuja tarefa propõe inferir estados mentais dos personagens descritos, para assim, a

criança identificar o disfarce de um dos personagens e compreender a expressão facial do

outro personagem.

Max não soube informar quem era o urso estranho com pelo de ovelha, bem como por

que a vovó sorriu para si mesma quando abraçou Laura. Após a finalização da atividade, o

avaliador explicou quem era o urso estranho, e apesar de fornecer detalhes sobre a história,

Max continuou sem entender o motivo pelo qual a vovó sorriu: “ela estava feliz, porque a

Ovelhinha Laura sobreviveu” (sic).

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Discussão:

Diante dos objetivos propostos para o presente estudo, foi possível avançar na direção de

estabelecimento de perfil da cognição social, comportamento, socioafetividade e funções

executivas em crianças com Transtorno Autista e Transtorno de Asperger.

Em primeira instância, merece constatação o desempenho definidamente acima da média

na capacidade intelectual das crianças diagnosticadas com Transtorno de Asperger e

desempenho intelectualmente médio das crianças diagnosticadas com Transtorno Autista, de

acordo com resultados obtidos no teste Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR).

O MPCR constitui-se como teste de raciocínio espacial abstrato. Stevenson and

Gernsbacher (2013), destacam que indivíduos com autismo apresentam bom desempenho no

Matrizes. Nesse, comumente crianças autistas são mais precisas do que as crianças não-

autistas.

Os autores propuseram investigar as potencialidades e fragilidades em indivíduos autistas

e não-autistas, a partir do desempenho obtido em 12 testes que variaram segundo o nível de

raciocínio (concreto ou abstrato) e domínio (espacial, numérico versus verbal).

Como resultado, verificaram que crianças autistas tiveram um desempenho

significativamente melhor em testes subsidiados pelo raciocínio espacial abstrato do que em

testes subsidiados por raciocínio espacial concreto. Nessa perspectiva, o estudo refuta a

hipótese de que o bom desempenho no MPCR está associado à memorização ou ao

processamento concreto.

Desde muito cedo na vida, crianças autistas são consideravelmente mais receptivas aos

estímulos espaciais abstratos do que crianças não-autistas. Pierce, Conant, Hazin, Stoner and

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218

Desmond (2011) constataram que crianças autistas dividem seu tempo examinando estímulos

espaciais abstratos uniformes (em um lado do monitor do computador) e vídeos de crianças

desconhecidas (do outro lado lateral do monitor). Normalmente, crianças com

desenvolvimento típico ou marcadas por outras patologias olham ocasionalmente os estímulos

espaciais abstratos. Adultos autistas também expressam preferência por representações

espaciais em comparação às representações verbais.

Apesar do bom desempenho obtido no MPCR, destaca-se a série B do teste, em que todas

as crianças diagnosticadas com Transtorno Autista erram os 7 últimos itens. Ao verificar o

tipo de erro cometido, verifica-se que, frequentemente, elas cometeram erro do tipo III (g ou

h), ou seja, repetição do padrão imediatamente acima do espaço a ser preenchido (III-g), ou

repetição do padrão imediatamente à esquerda do espaço a ser preenchido (III-h).

Embora as crianças diagnosticadas com Transtorno de Asperger apresentem número de

erro do tipo III em menor proporção, ambos os grupos clínicos da pesquisa sugerem um

padrão de perseveração das respostas, apontando para dificuldades no funcionamento

executivo, notadamente nas habilidades de flexibilidade mental.

As funções executivas e a inteligência são primordiais para o sucesso em muitas das

atividades diárias. Brydges, Reid, Fox and Anderson (2012) propuseram estudo empírico

firmado em investigar a associação entre inteligência e funcionamento executivo em 215

crianças com idade entre 7 anos 1 mês e 9 anos 11 meses. Para tanto, consideraram como

funções executivas a memória operacional, controle inibitório e flexibilidade mental, bem

como diferenciações entre inteligência fluida e cristalizada.

Embora cada constructo (funções executivas, inteligência fluida e cristalizada) seja

dissociável no decorrer do desenvolvimento infantil, as funções executivas parecem

essencialmente unitárias e igualmente relacionadas com os dois tipos de inteligência, até

aproximadamente os 7 anos de idade.

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219

Os autores sugerem que o funcionamento executivo e a inteligência começam a se

dissociar entre as idades de 7 e 9 anos. Quando comparado aos adultos, o controle inibitório,

flexibilidade mental e memória operacional parecem constituir uma unidade funcional em

crianças dessa faixa etária (Miyake et al ., 2000).

Diferenciações entre tais funções executivas seriam mais aparentes em crianças a partir

dos 9 anos de idade. O estudo constatou que os dois tipos de inteligência (fluida e cristalizada)

são passíveis de diferenciações numa fase mais precoce do que as funções executivas, mas

essas parecem constituir preditor importante para os dois tipos de inteligência citados,

notadamente a inteligência fluida.

O processo de diferenciação precoce dos tipos de inteligência recorre ao percurso

maturacional do sistema nervoso central.

Os lobos frontais são caracterizados por Goldberg (2002, p.13) como “a mais recente

realização na evolução do sistema nervoso”. São caracterizados dessa forma por serem uma

das últimas regiões do córtex cerebral a se desenvolver, filo e ontogeneticamente.

Provavelmente, diferenciações nas áreas de ativação neural distinguem os tipos de inteligência

de modo precoce, porque enquanto às funções executivas são predominantemente associadas

à ativação do córtex pré-frontal; estudos de neuroimagem apontam que a inteligência

cristalizada e fluida estão associadas à ativação de regiões frontais e não frontais (Geary,

2005).

Com o advento de rápidas transformações no funcionamento frontal entre 7 e 9 anos de

idade surge à hipótese de as funções executivas se dissociam da inteligência fluida e

cristalizada, mas podem aprimorá-las (Friedman et al., 2006).

Tal hipótese emerge ao observar que crianças mais velhas obtiveram melhor desempenho

em testes de inteligência e funções executivas, do que as mais jovens. Pesquisas anteriores

descobriram que crianças entre 7 e 11 anos de idade apresentam melhora significativa na

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220

velocidade de processamento, no uso de estratégias, memória operacional, controle inibitório

e flexibilidade mental em tarefas que envolvem a avaliação de inteligência (Best et al., 2009;

Cattell, 1967).

Enquanto as funções executivas e inteligência fluida são predominantemente associadas à

ativação do córtex pré-frontal, a inteligência cristalizada está predominantemente associada

com a ativação das regiões parietais. Nesse sentido, acredita-se que a inteligência fluida

encontra-se mais fortemente interligada às funções executivas, quando comparado à

inteligência cristalizada (Duncan & Owen, 2000; Casey et al., 2000).

O MPCR constitui-se como teste de inteligência fluida subsidiado por raciocínio espacial

abstrato. Embora o desempenho dos grupos clínicos da presente pesquisa situem-se dentro da

média esperada, sugere-se que o mesmo poderia ter sido ainda melhor, se não houvesse

dificuldades na flexibilidade mental subjacentes à execução do MPCR.

No domínio da atenção/funções executivas, os grupos clínicos do Transtorno de Asperger

e Transtorno Autista aproximam-se em termos de dificuldades no funcionamento executivo e

atencional.

O grupo do Transtorno Autista encontra-se com resultados situados entre as faixas muito

abaixo do esperado - limítrofe, em todos os testes circunscritos ao domínio da atenção/funções

executivas. Tais resultados aproximam-se do estudo recente publicado por Narzisi, Muratori,

Calderoni, Fabbro and Urgesi (2013), cujo perfil neuropsicológico de crianças com Autismo

de Alto-funcionamento converge para déficits nos testes de Atenção Auditiva e Conjunto de

Respostas, Inibindo Respostas e Classificação de Animais do NESPY-II.

Tal padrão de dificuldades atencionais e no funcionamento executivo é largamente

consistente com pesquisas neuropsicológicas que, desde a primeira versão do NEPSY,

buscam evidenciar o perfil cognitivo de crianças inseridas no Transtorno Autista (José et al.

2005; Hooper et al., 2006; Korkman et al., 1998).

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221

Destaca-se o estudo de Joseph e colaboradores (2005), cuja investigação neuropsicológica

de crianças autistas permitiu evidenciar défices em todos os três domínios das funções

executivas avaliadas, quais sejam, memória operacional, controle inibitório e planejamento.

Vários estudos apontam disfunções executivas em crianças autistas, quando comparado

com outros grupos clínicos ou com crianças em desenvolvimento típico (Ozonoff et al., 1991;

Verte et al., 2005).

No grupo do Transtorno de Asperger, destacam-se dificuldades no funcionamento

executivo atrelado ao controle inibitório e, notadamente, a flexibilidade mental. O teste

Atenção Auditiva e Conjunto de Respostas, bem como o teste Inibindo Respostas demonstram

sensibilidade à avaliação de domínios específicos das funções executivas. Verifica-se que as

crianças inseridas no Transtorno de Asperger possuem desempenho dentro da média esperada

nas etapas de nomeação, em contraponto ao decréscimo nas etapas voltadas para avaliação do

controle inibitório e flexibilidade mental nos respectivos instrumentos avaliativos.

O grupo clínico do Transtorno Autista e Transtorno de Asperger da presente pesquisa

evidenciam impacto na flexibilidade mental ao associar o baixo desempenho na etapa 3 do

teste Inibindo Resposta com o alto número de classificações repetidas no teste Classificando

Animais. Embora o grupo do Transtorno Autista demonstre maior comprometimento, é

factível perceber entraves na flexibilidade mental no grupo do Transtorno de Asperger.

Max e Jake (crianças inseridas no Transtorno de Asperger) clarificam a hipótese de

dificuldades na flexibilidade mental ao verificar o respectivo desempenho limítrofe e abaixo

do esperado obtido no teste Classificando Animais (escore combinado equivalente a 7 e 4

pontos, respectivamente). Apesar de o Max obter 6 acertos (escore ponderado igual a 09

pontos, percentil situado no intervalo de 26-75), verifica-se número compatível de erros

repetidos (06 erros, percentil situado no intervalo de 2-5). Max persistia nas classificações

sol/chuva e nos animais cachorro, peixe e pássaro.

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222

Por sua vez, Jake obteve elevado número de erros predominantemente repetitivos (escore

combinado igual a 04 pontos). Ele persistia em repetir a categorização de cores e tamanhos,

em detrimento às classificações originais passíveis de aumentar o desempenho da criança no

referido teste.

Dificuldades na flexibilidade mental tornam-se evidentes em ambos os grupos clínicos, ao

observar padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses e atividades em todas as

crianças participantes. Andy é fascinado pelo Toy Story; Cauê por materiais de construção;

Amy pelo desenho Sonic; Jake pelo Angry Birds; Hugo pelo caratê e Max pelo Big Brother

Brasil.

Em todos os casos clínicos, há relato sugestivo de necessidade de rotina e de

previsibilidade do(a) filho(a), sem perder de vista o quanto eles ficam aparentemente irritados,

quando há alterações ou variações. Embora consonem diante à dificuldade na flexibilidade

mental, no grupo do Transtorno Autista, o comprometimento parece mais evidente em termos

funcionais.

Os responsáveis pelas crianças autistas enfatizam o quanto a necessidade de rotina e

previsibilidade é transparente para terceiros. A escola do Cauê, por exemplo, já entende a

necessidade cotidiana da criança olhar ralos do banheiro e área de lazer no horário do

intervalo escolar. Andy e Amy (crianças inseridas no Transtorno Autista) possuem ecolalia

diferida dos desenhos animados prediletos (Toy Story e Sonic), bem como frequentemente

levam os bonecos Buzz Lightyear/ Sonic para os diversos âmbitos onde estão inseridos.

Tanto a mãe do Andy, quanto os pais da Amy sempre desconfiaram de quadro clínico

subjacente aos comportamentos e interesses restritos e repetitivos, antes mesmo do

diagnóstico clínico confirmado, talvez, pela clara evidência de idiossincrasia comportamental.

Já os responsáveis pelas crianças aspergers enfatizam a necessidade de compreensão de

terceiros frente à dificuldade de flexibilidade mental. Em todos os relatos, terceiros

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frequentemente designam as crianças como “mimadas” (sic). Max, por exemplo, ainda adora

relacionar pessoas a números e apresenta recorrente ritual de vestir a farda da escola, sem

mudar a sequência: camisa, calça, meia e tênis. Todavia, terceiros parecem criticar a atitude

da criança, aparentemente destoante frente à fluência verbal aguçada e vocabulário amplo.

Os próprios responsáveis pelas crianças afirmaram que muitos dos comportamentos e

atitudes dos filhos clarificaram, após emissão do diagnóstico clínico de Transtorno de

Asperger. Para a maioria, as características comportamentais susceptíveis ao diagnóstico

clínico tornaram-se evidentes, quando as crianças ingressaram na escola.

Tal constatação remete ao estudo de Frith (2004), o qual sugere a árdua tarefa de

identificação clínica do Transtorno de Asperger ainda na primeira infância, notadamente

quando a linguagem expressiva não apresenta atrasos importantes e o desempenho intelectivo

é alto.

As dificuldades de flexibilidade mental parecem sutis a terceiros, provavelmente, pela

habilidade de auto monitoramento observada na maioria das crianças aspergers. Os erros

auto-corrigidos na etapa 3 do teste Inibindo Resposta sugerem auto monitoramento do suposto

entrave de flexibilizar a resposta de acordo com a cor do estímulo. Embora Max e Jake

demonstrem maior dificuldade para flexibilizar a resposta, parece que a auto supervisão

acompanha possíveis desvios do próprio comportamento em relação à meta desejada.

A tentativa de acerto aparentemente reverberou no longo período de tempo utilizado para

execução da etapa 3 do teste Inibindo Resposta. Em ambas as etapas, verifica-se que eles

acertam as respostas, mas o tempo de execução ultrapassa o limite esperado para sua faixa

etária.

Nas provas do domínio da atenção e funções executivas do NEPSY-II, dificuldades na

flexibilidade mental também parecem mais evidentes no grupo clínico do Transtorno Autista.

Para além da dificuldade no teste Atenção Auditiva e Conjunto de Resposta, bem como no

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Inibindo Resposta, a maioria das crianças autistas participantes apresentaram desempenho

abaixo do esperado no teste Classificando Animais e Fluência de Desenhos.

Na análise qualitativa das atividades citadas percebe-se perseveração na classificação, bem

como repetição na produção de desenhos estruturados e aleatórios.

Por sua vez, o grupo clínico do Transtorno de Asperger não apresenta padrão de produção

repetitivo no teste Fluência de Desenhos. Nesse, verifica-se baixo número de produções, sem

registro de erros por repetição. Nas crianças aspergers predomina a acuidade e o

perfeccionismo na cópia do símbolo gráfico, provavelmente, elas precisariam de mais tempo

para aumentar a pontuação nesse teste.

Tal hipótese remete ao trabalho de Planche and Lemonnier (2012), cujos resultados

apontam para baixa velocidade de processamento na WISC-III, devido à acuidade e

perfeccionismo na cópia do símbolo gráfico do subteste Código de crianças com Transtorno

de Asperger.

Apesar do grupo clínico do Transtorno Autista sugerir maior comprometimento da

flexibilidade mental, tentativas de mudanças parecem sobressaltar em duas, das três crianças

avaliadas. Na etapa 3 do teste Inibindo Resposta, Cauê e Amy ultrapassaram o tempo de

execução normatizado para sua faixa etária. Eles integralizaram a tarefa em 365 e 319

segundos, respectivamente.

Cauê mudava a nomenclatura conforme solicitado pela atividade, mas parava e pensava

por longo período de tempo, antes de emitir resposta. Amy, por sua vez, quando errava,

repetia três vezes: “vamos conseguir” (sic). Destarte, sugere-se que eles apresentam estilo de

trabalho lento devido à tentativa de obter respostas adequadas em atividades subsidiadas por

pontos frágeis do seu funcionamento cognitivo.

Ressalta-se que os pais de Cauê e Amy convergem em termos de proposições

interventivas que tentam atenuar entraves do perfil neuropsicológico do Transtorno Autista

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nos filhos. O pai do Cauê preza pelo rigor educacional, como se as dificuldades do filho

fossem passíveis de superação por meio de intenso treino. Os pais da Amy observam as

características clínicas da filha e, no cotidiano, tentam proporcionar intervenções

diferenciadas à criança.

De modo geral, os resultados de pesquisas tem sido consistentes em apontar

comprometimento no funcionamento executivo em indivíduos com Transtorno Global do

Desenvolvimento (TGD). Yerys, Hepburn, Pennington and Rogers (2007) objetivaram

verificar se os déficits executivos estariam já presentes em crianças autistas antes dos três

anos de idade a fim de determinar se tais déficits seriam secundários ao transtorno ou se

deveriam ser referidos como fatores de risco cognitivo.

Os autores concluem que o prejuízo executivo parece não ser primário ou causal ao

autismo e que tais déficits aumentam com a progressão da idade nesta população

(Yerys et al., 2007).

Narzisi e colaboradores (2013), propuseram investigação neuropsicológica de crianças

com Autismo de Alto-funcionamento através do NEPSY – II, cuja avaliação neuropsicológica

torna possível identificar padrões específicos de déficits primários e secundários (Luria 1962).

O estudo sugere que dificuldades associadas aos substratos cognitivos básicos,

culminaram em entraves nas habilidades cognitivas superiores que as têm como substrato,

como as funções executivas. Eles descobriram que as crianças com maior comprometimento

na expressão verbal, habilidades sensório-motora e percepção social obtiverem pior

desempenho nas tarefas de funções executivas e memória verbal.

Congruente, Joseph e colaboradores (2005) advogam que o baixo desempenho das

crianças autistas nas tarefas de funções executivas pode está associado ao comprometimento

na fala (comunicação verbal) para manter a resposta arbitrária dos testes de Atenção Auditiva

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226

e Conjunto de Respostas, bem como Inibindo Respostas. Ambos avaliam funções executivas

mediadas pela expressão verbal.

É factível perceber que as crianças autistas da presente pesquisa possuem histórico de

atraso no desenvolvimento da linguagem verbal. Andy e Amy, por exemplo, apresentaram

falas marcada por ecolalia imediata ou diferida, durante processo avaliativo.

No tocante ao teste Relógios do NEPSY-II, quatro das seis crianças avaliadas convergem

na aparente dificuldade visuoespacial. Tais entraves parecem repercutir na elaboração de

números e ponteiros desproporcionais inseridos em contornos que não os acomodam de modo

adequado. Dificuldades na coordenação motora e motricidade fina também emergem na

maioria das crianças avaliadas. Tais entraves parecem repercutir no âmbito escolar, ao

verificar que, quando alfabetizadas, as crianças apresentam dificuldade de escrita em letra

cursiva. As letras são pouco diferenciadas, mal elaboradas e mal proporcionadas.

Todas as crianças avaliadas possuem fechamento correto do círculo, sendo esse um marco

de referência significativo na evolução da habilidade gráfica por parte da criança, passível de

averiguação por volta dos 3 anos de idade.

A crescente habilidade na manipulação do ambiente e a consciência da necessidade dessa

manipulação, ambas tanto do ponto de vista físico como psicológico, propiciam o

aparecimento de dedos e mãos, muitas vezes por volta dos cinco, seis anos de idade. A mão é

inicialmente desenhada como um círculo, sendo os dedos indicados como linhas retas

unidimensionais presas em volta do círculo. Os pés tendem a surgir um pouco depois, sendo

também frequentemente representados em uma dimensão.

Na presente pesquisa, os desenhos figurativos não apresentaram mãos, dedos e pés.

Predominaram desenhos em fase de verticalização da figura-girino; ou ainda desenhos

constituídos por personagens com cabeça e corpo, acompanhado de sugestiva clivagem

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funcional da condensação de figuras continentes e irradiantes que haviam constituído a figura-

girino (Grieg, 2004).

A evolução do desenho da figura humana perpassa pela síntese da figura-girino,

verticalização, organização cabeça/corpo, aperfeiçoamento e acabamento do casal bem

diferenciado.

A fase de verticalização da figura-girino pode ser esperada por volta dos 4 anos e meio de

idade. Posteriormente, observa-se a organização da estrutura cabeça/corpo, a partir da

aquisição da figura agregada que será, a partir de então, progressivamente aperfeiçoada. A

clivagem funcional da condensação de figuras continentes e irradiantes constitui uma das

primeiras etapas de representação da figura humana agregada (Grieg, 2004).

Muito pouco se sabe sobre o desenvolvimento de habilidades de desenho em crianças com

autismo e sobre os diferentes fatores que podem afetar a configuração de desenhos humanos e

não-humanos. Além disso, não há evidências das estratégias que as crianças participantes

empregaram na realização de seus desenhos.

Como Freeman (1987, p. 127) salienta: "O que observamos na página é o resultado de um

grande trabalho mental (...) nós não podemos fazer inferências diretas sobre os desenhos das

crianças com a natureza de representações que podem estar por trás deles”.

Para além da análise do desenvolvimento progressivo das habilidades de desenho, crianças

com autismo possuem dificuldades cognitivas subjacentes à representação da figura humana.

Fein, Lucci and Waterhouse (1990) investigaram 34 jovens com autismo e os compararam

com 33 jovens em desenvolvimento típico. Eles relataram que os participantes com autismo

eram significativamente mais propensos a apresentar sobreposição em seu desenho da figura

humana. Houve uma tendência para os participantes com autismo para fragmentar os seus

desenhos da figura humana em comparação com o grupo controle.

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228

Nesse sentido, os pesquisadores sugeriram que crianças com autismo podem não ter a

capacidade de compreender ou conceber a figura humana como uma integração de partes para

formar um todo. Para eles, a figura humana torna-se semelhante a um desenho geométrico,

arbitrariamente produzido com um possível viés local para informações de processamento

visual.

Conforme Lee and Hobson (2006), provavelmente o desenho da figura humana representa

um “esquema” que a criança autista possui. Como o percurso desenvolvimental, tal esquema

prossegue em um estilo processual que pode ser modificado de acordo com a flexibilidade

mental e desempenho intelectivo da criança.

Conforme Planche and Lemonnier (2011), crianças com Autismo de Alto-funcionamento

possuem integridade no processamento visuoespacial, em contraponto à entraves no

processamento sensório-motor. Nesse sentido, as crianças parecem priorizar configurações

pontuais em detrimento de um processamento abrangente, subsidiado pela coordenação

motora.

Em consonância com Luria (1962), o estudo de Planche and Lemonnier (2011) sugere que

dificuldades associadas aos substratos cognitivos básicos, como o processamento de

informações cinestésicas, podem culminar em entraves nas habilidades cognitivas superiores

que as têm como substrato, necessárias para delineamento gráfico de desenhos.

É sabido que crianças do espectro autista podem apresentar alterações na integração

sensorial e na propriocepção (Hermelin & O'Connor, 1970). Conforme Salowitz e

colaboradores (2013), as crianças do espectro autista apresentam importante anormalidade no

traçado de desenhos atrelado a défices específicos de orientação da mão à forma, durante

delineamento gráfico.

Lee and Hobson (2006) advogam que crianças autistas têm uma auto-concepção limitada,

em virtude de seu envolvimento emocional limitado e falhas na teoria da mente. Destarte, a

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escassa propensão para perceber e assimilar as atitudes dos outros, atrelado a escassa auto-

representação, leva a hipótese de entraves na construção de desenhos da figura humana.

No tocante à avaliação da teoria da mente, todas as crianças do grupo clínico do

Transtorno Autista obtiveram desempenho muito abaixo do esperado na tarefa da teoria da

mente do NESPY-II.

Tal resultado converge com estudo de Korkman e colaboradores (2007), cujos resultados

apontam pontuações mais baixas para crianças com Autismo de Alto-funcionamento nas

provas do domínio da percepção social do NEPSY-II, quando comparado ao grupo controle.

O estudo de Narzisi e colaboradores (2013) também aponta dificuldade nas tarefas da

teoria da mente do NEPSY-II em crianças com Autismo de Alto-funcionamento. Entretanto, o

baixo desempenho na tarefa contextual da teoria da mente diverge do estudo citado, mas

converge com o estudo Da Fonseca et al. (2008), o qual revela que crianças com Autismo de

Alto-funcionamento conseguem usar pistas contextuais para reconhecer objetos, mas não

emoções.

Na presente pesquisa, sugere-se que os elementos contextuais (a situação social)

dificultaram o processamento do correspondente estado emocional (foto do rosto humano).

Aqui, a inclinação para analisar detalhes, típica do Autismo (Baron-Cohen 2010), parece que

intensificou a atenção às pistas contextuais de situações sociais, em detrimento do

reconhecimento de estados emocionais apropriados.

Estudos especializados sugerem correlação positiva entre falhas na teoria da mente e

teoria da coerência central (Beaumont & Newcombe, 2006; Jarrold, Butler, Cottington &

Jimenez, 2000).

A dificuldade encontrada na tarefa contextual da teoria da mente do NESPY-II encontra-

se congruente a pesquisas que indicam a tendência de crianças autistas em focar detalhes em

detrimento das informações que perpassam o contexto da troca social. Em diferentes níveis,

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problemas específicos com integração de informações diversas prejudica a capacidade de

compreensão global de um contexto, ou seja, prejudica a "coerência central" do âmbito posto.

Embora com dificuldades de coerência central evidentes, destaca-se iminente criação de

estratégias compensatórias por um dos participantes diagnosticado com Transtorno Autista, a

saber, a Amy. Até o momento da presente avaliação, ela frequentemente perguntava a

professora o(s) motivo(s) subjacente(s) à situações ímpares/incomuns no contexto da sala de

aula.

Para além de dificuldades na teoria da mente, ressaltam-se entraves linguagem verbal e

funções executivas. Possivelmente, o baixo desempenho obtido na tarefa da teoria da mente

do NEPSY-II origina-se ou intensifica-se devido ao atraso na linguagem e déficits nas funções

executivas, observados primordialmente no grupo clínico com Transtorno Autista.

Conforme Champagne-Lavau and Joanette (2009), para obter desempenho de acordo com

o esperado em tarefas da teoria da mente, torna-se mister a correta interpretação do

significado do enunciado, para posteriormente, obter correta compreensão de inferências de

estados mentais.

Nessa perspectiva, o desempenho de crianças em um determinado domínio cognitivo,

como a teoria da mente, pode ser influenciado por outros domínios cognitivos. Narzisi e

colaboradores (2013) advogam que o comprometimento nas funções executivas em crianças

com Autismo de Alto-funcionamento corrobora com o baixo desempenho em outras provas

do NEPSY-II. Provas do domínio da percepção social foram associadas ao funcionamento

executivo.

Vale ressaltar associações entre o estágio operacional proposto por Piaget (1929) e o

percurso desenvolvimental da Teoria da Mente. De acordo com Guttenplan (1996), o estágio

operacional remete ao moderno conceito da Teoria da Mente, na medida em que se torna

possível atrelar o raciocínio reversível à competência da representação mental. Ambos forjam

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uma divisão entre subjetividade e objetividade, entre o que é verdade para minha mente e o

que é verdade para a realidade.

Aqui, é imperativo frisar o quanto as crianças diagnosticadas com Transtorno Autista

ainda demonstraram apoiar-se em estratégias visuais, perceptíveis na realidade. A dificuldade

de resolução das situações do Inventário Multimídia de Habilidades Sociais (IMHSC-Del-

Prette), bem como o maior engajamento em tarefas verbais da teoria da mente subsidiadas por

imagens visuais, parecem refletir tendência a estados mentais momentâneos em detrimento do

raciocínio reversível (Piaget, 1929).

Nesse sentido, ressalta-se o estudo de Joseph and Tager-Flusberg (2004), o qual remete ao

entrelaçamento das funções executivas e teoria da mente. Sugere-se que a memória

operacional e o controle inibitório podem mediar ou, pelo menos, fornecer necessárias

condições para o sucesso da teoria da mente. Tal perspectiva ganha força à medida que se

verifica acertos nas tarefas de crenças falsas, quando o indivíduo consegue manter uma falsa

representação de um dado estado de coisas na memória operacional, bem como consegue

resistir à tendência normal de atribuir estados mentais a partir de uma realidade predominante.

Crianças em idade pré-escolar ingressam no estágio pré-operatório, caracterizado pela

emergência do pensamento simbólico e representacional. Tal período converge com o

desenvolvimento do terceiro estágio proposto por Luria (1973), o qual emerge após o

desenvolvimento das áreas sensoriais e motoras secundárias. Nesse estágio, por exemplo,

ocorre a lateralização progressiva das funções de linguagem no hemisfério esquerdo, sobre a

qual habilita a criança a significar suas experiências (Garcia, 2011).

Na presente pesquisa, as crianças com Transtorno Autista demonstram atraso no

desenvolvimento da linguagem verbal e conceptualização a nível abstrato. Frequentemente

elucidam ecolalia imediata ou diferida, comunicam-se por meio de frases curtas e pontuais

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que comumente inviabilizam construção de frases narrativas, passíveis de emergir vivências

do cotidiano.

Dificuldades de conceptualização a nível abstrato remetem à mãe da Amy, por exemplo.

Ela relata que a filha possui “dificuldade excessiva” (sic) para entender conceitos abstratos,

tais como o conceito de bairro.

É sabido que o Transtorno Autista converge para alterações em múltiplos sistemas

cerebrais (Frith 2004; Mundy e Sigman, 2006). Conforme estudos de neuroimagem, o cérebro

de crianças com Autismo de Alto-funcionamento apresenta indícios de alterações não

limitadas às regiões ou circuitos específicos, passíveis de uma insuficiência cerebral global

(Müller, 2007).

Hazlett e colaboradores (2005) verificaram resultados de ressonância magnética estrutural,

dos quais apontam consistente redução do volume cerebral total em pacientes com Autismo

de Alto-funcionamento, concernente a matéria branca e cinzenta. Tais alterações são

particularmente visíveis em regiões frontais e temporais de crianças autistas, com relativa

compensação do lobo occipital.

Estudos de ressonância magnética funcional apontam a conectividade alterada entre várias

áreas cerebrais, durante realização de tarefas com maior nível de complexidade. Tal fato

reforça a hipótese de que déficit no processamento cognitivo de funções mentais superiores

pode refletir conectividade reduzida entre áreas imprescindíveis do cérebro.

Nessa perspectiva, reforça-se dois princípios do legado teórico de Luria (1902-1977),

quais sejam, a estrutura sistêmica, assim como a organização e localização dinâmica das

funções mentais superiores.

Em contraponto ao grupo clínico do Transtorno Autista, duas das três crianças

participantes diagnosticadas com Transtorno de Asperger encontram-se dentro da média

esperada na tarefa da teoria da mente do NESPY-II. Embora com desempenho de acordo com

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o esperado, sobressaltam-se aparente dificuldade na teoria da mente diante de demandas

contextuais e resolução de problemas que exigem interações sociais.

Max, por exemplo, apresenta-se dentro da média esperada para sua faixa etária na tarefa

da teoria da mente do NESPY-II, mas as dificuldades escolares atuais circunscrevem à

aparente incredulidade sobre frequentes brincadeiras irônicas dos pares para com ele.

Conforme anamnese, a mãe tenta clarificar situações, expressões, sugestivas de bullying.

Embora precise de certo tempo para entender, quando compreende, a mãe afirma que o filho

consegue perceber melhor as situações negativas que podem perpassar o seu cotidiano

escolar.

Jake, por sua vez, tende às reações de agressão verbal para com os pares, notadamente em

momentos marcados por brincadeiras de duplo-sentido ou irônicas: “meu filho sofre muito na

escola, porque leva tudo ao pé da letra. Fica muito irritado quando alguém brinca com ele.

Peço para relevar, mas não tem jeito” (sic), informa a mãe da criança.

Entraves na cognição social, notadamente quando solicitada no contexto dinâmico pautado

em relações sociais, parecem repercutir na auto avaliação do Inventário Multimídia de

Habilidades Sociais de Crianças (IMHSC-Del-Prette) e no desenho história com tema das

crianças aspergers.

Em termos de compreensão social, a maioria das crianças aspergers apresenta a tendência

geral das crianças em desenvolvimento típico: consideram mais adequadas as reações

habilidosas, situando em segundo lugar as não habilidosas passivas e em terceiro as ativas.

Todavia, na auto avaliação das reações habilidosas, o desempenho social situa-se abaixo

da média para empatia/civilidade, assertividade/enfrentamento e participação. Verifica-se

dificuldade acima da média para as reações citadas, sem perder de vista indícios de problemas

internalizantes.

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234

Acerca do desenho história com tema, duas das três crianças aspergers recusaram o

desenho temático “Eu e minha escola”. Provavelmente, tal fato desvela a dificuldade das

crianças em projetar aspectos da dinâmica emocional imbricados no contexto solicitado.

Elas frequentemente são isoladas dos pares nas atividades de lazer, frequentemente

parecem imergir em situações desrespeitosas e embaraçosas, sem ter plena consciência; ou

ainda demonstram intensa dificuldade em estabelecer e manter relações interpessoais

duradouras. São raras conversações demonstrando interesse nos outros. Comumente elas

parecem interessadas em ouvir falar acerca dos temas do seu interesse e frequentemente

emitem reações não habilidosas ativas frente às situações permeadas por brincadeiras de

duplo-sentido e/ou irônicas.

Tal fato remete aos estudos propostos por Frith (2004) e Klin (2006). Ambas as

investigações indicam que fracassos duradouros em interações sociais de indivíduos com

Transtorno de Asperger (TA), normalmente estão atrelados a comportamentos autênticos e

falhas na empatia.

Klin, Jones, Schultz, Volkmar and Cohen (2002) indicam que crianças com TA são

isoladas pelos pares porque possuem dificuldade no manejo social, em virtude da inabilidade

de compreender que outras pessoas têm pensamentos e sentimentos diferentes dos seus.

O bom desempenho na tarefa da teoria da mente do NESPY-II, em contraponto à entraves

na dinâmica social, encontra-se consistente com a literatura neuropsicológica, a qual

demonstra que muitos indivíduos com Transtorno de Asperger têm a teoria da mente

relativamente intacta (quando comparado a crianças com Transtorno Autista) ou encontram-se

aptas a obter bom desempenho em tarefas laboratoriais/experimentais da teoria da mente

(Bowler, 1992; Ziatas, Durkin e Pratt, 1998).

Montgomery, Stoesz and McCrimmon (2012) constaram que adolescentes e adultos com

Transtorno de Asperger (TA) possuem entraves nas interações sociais reais imbricadas com

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235

trocas emocionais. De forma geral, jovens adultos com TA têm o conhecimento e capacidade

cognitiva de raciocinar informações emocionais, mas demonstram entraves na aplicação social

desse conhecimento.

Os primeiros estudos sobre a teoria da mente de indivíduos com Transtorno de Asperger

retrataram que eles possuem bom desempenho em tarefas experimentais/laboratoriais, ao

passo da aplicação em vivências sociais (Bowler, 1992; Ozonoff , Rogers e Pennington,

1991).

Sasson e colaboradores (2013) demonstraram que a cognição social e a habilidade social

estão altamente correlacionadas. Déficits em habilidades associadas à cognição social

(reconhecimento de emoções e teoria da mente, por exemplo) constituem significativa

contribuição para a baixa qualidade das habilidades sociais de indivíduos inseridos no

espectro autista. Eles ainda ratificam Baron-Cohen (1995) ao relevar que tal correlação não

depende do desempenho intelectivo.

Critérios diagnósticos atuais distinguem o Transtorno de Asperger do Transtorno Autista

com base em competências linguísticas. O desenvolvimento da linguagem verbal constitui-se

como preditor para o bom desempenho em tarefas da teoria de mente. Na presente pesquisa,

as crianças com Transtorno de Asperger não sugerem atraso importante no desenvolvimento

da linguagem verbal. Em dissonância com o grupo Autista, elas demonstram fluência verbal

marcada por fala rebuscada e vocabulário amplo.

Há evidências substanciais de que a teoria mente pode está lateralizada no hemisfério

cerebral direito.

Goel and Dolan (2001) sugerem sistemas diferenciais subjacentes ao processamento

cognitivo e apreciação do humor. Eles acreditam na viabilidade de separar piadas de aspectos

afetivos. Aqui, torna-se plausível a possibilidade de entender a piada, sem acha-la engraçada.

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236

Tradicionalmente, o hemisfério esquerdo encontra-se associado ao plano analítico, ao

passo que o direito associa-se ao plano sintético, holístico e intuitivo (Kolb & Whishaw,

1996). O hemisfério esquerdo parece envolvido na interpretação cognitiva do humor,

enquanto o hemisfério direito sugere envolver-se em aspectos afetivos.

Além disso, o sistema límbico, particularmente a amígdala, também desempenha um papel

importante no processo de respostas emocionais. Pacientes acometidos por lesões bilaterais da

amígdala encontram-se com comprometimento no reconhecimento de expressões faciais e

vocalização de emoções (Adolphs, Tranel, Damasio, & Damasio, 1994; Young et al., 1995).

Castelli et al. (2002) e Frith (2004) advogam para falhas na ativação top-down (áreas

frontais são ativadas primeiro), em contraponto a adequada ativação bottom-up (áreas

posteriores são ativadas primeiro). Tal constatação remete a fraquíssimas conexões entre

regiões do córtex extra estriado e regiões fronto-temporais, o que, por conseguinte,

desencadeia a análise das partes, em detrimento do todo complexo. Ou seja, indivíduos do

espectro autista tendem a compreender estímulos complexos, estratificam detalhes físicos,

possuem hiper ou hipo estimulação sensorial, mas comumente apresentam entraves na

compreensão de atitudes e emoções complexas, notadamente evidentes em inter-relações

pessoais dinâmicas.

Tais achados clarificam o motivo pelo qual as crianças com Transtorno de Asperger

contrapõem-se na utilização da teoria da mente (bom desempenho nas tarefas do NEPSY-II,

ao passo de entraves nas situações sociais). Também se torna possível compreender o motivo

pelo qual elas demonstraram entraves para lidar com provérbios de forma intuitiva e

espontânea, tais como os itens 13 e 15 da tarefa verbal da teoria da mente, vinculada ao

NEPSY-II.

Entraves para lidar com provérbios, frases de duplo-sentido ou ironias transpõem para o

cotidiano, ao verificar que Hugo dificilmente identifica quando a mãe está brigando com ele,

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237

por exemplo. Max já esteve “transtornado” (sic), porque, brincando, a mãe o chamou de

papagaio. Jake, por sua vez, tende às reações de agressão verbal para com os pares,

notadamente em momentos marcados por brincadeiras de duplo-sentido ou irônicas.

Em última instância, merece destaque a análise do CBCL. Todas as crianças participantes

receberam classificação clínica na Escala de Competências Sociais. Tal categorização consona

com o perfil comportamental e socioafetivo evidenciado na presente pesquisa e na literatura

especializada sobre o espectro autista.

Em diferentes níveis de severidade, crianças com Transtorno Autista ou Transtorno de

Asperger possuem comprometimento qualitativo da interação social e comunicação. Haase,

Freitas, Natale, Teodoro e Pinheiro (2005) definem a mente autista como o resultado de um

cérebro que se desenvolve “solipsisticamente” fechado sobre si mesmo. De modo

interdependente, falhas na teoria da mente, nas funções executivas e na linguagem versam

como principais fragilidades neuropsicológicas dos grupos clínicos vigentes e, por

conseguinte, repercutem nas competências sociais dos grupos clínicos citados (Champagne-

Lavau & Joanette, 2009).

Na segunda escala fornecida pelo CBCL, a Escala de Síndromes, destacam-se:

problemas de pensamento, problemas atencionais, isolamento social/depressão, em maior

proporção do que ansiedade/depressão.

Possivelmente, problemas de pensamento circunscrevem dificuldades na conceptualização

a nível abstrato, ou ainda entraves na interpretação não-literal, passíveis de averiguação na

literatura e no cotiando das crianças avaliadas.

Embora os pais da Amy não a tenha classificado na faixa clínica para problemas de

pensamento, a dificuldade da criança em interpretar o sentido não-literal de determinadas

situações sugere dificuldade de pensamento identificada nas demais crianças participantes. O

pai da Amy, por exemplo, ao segurar uma sandália da mão, esperava uma reação diferente por

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238

parte da filha: “esperava que ela fosse reagir como as demais crianças reagem – se sentindo

acuada e com medo de levar uma palmada. Amy nem percebeu o que eu pretendia fazer com

aquela sandália na mão” (sic).

Problemas atencionais provavelmente remetem a dificuldades de atenção sustentada,

passíveis sugerir ao analisar a dificuldade nas provas do domínio da atenção e funções

executivas em todas as crianças avaliadas na presente pesquisa. Entraves cognitivos atrelados

ao subsistema da memória operacional lançam luz para características comportamentais

congêneres ao comportamento predominantemente desatento sugerido pelos pais das crianças

avaliadas.

Em última análise, o isolamento social/depressão, em maior proporção do que

ansiedade/depressão, remete a estudos neuropsicológicos, notadamente sobre o Transtorno de

Asperger.

As crianças com Transtorno de Asperger frequentemente são isoladas dos pares nas

atividades de lazer. São raras conversações demonstrando interesse nos outros. Comumente

elas parecem interessadas em ouvir falar acerca dos temas do seu interesse.

Conforme Frith (2004) e Klin (2006) fracassos duradouros em interações sociais de

indivíduos com Transtorno de Asperger (TA), normalmente estão atrelados a comportamentos

autênticos e falhas na empatia. Contudo, sobressalta-se a possibilidade de sofrimento psíquico

frente à dificuldade no manejo social, notadamente de crianças com desempenho intelectivo

alto. Torna-se passível lembrar que Max e Jake, ambos com desempenho intelectivo alto e

com Transtorno de Asperger, recusaram-se a executar o desenho história com tema: eu e

minha escola.

Tal possibilidade de sofrimento parece clarificar-se em Max. No momento da avaliação

neuropsicológica, a mãe tentava evidenciar situações, expressões, sugestivas de bullying. Max

solicitava explicações detalhadas, no nível do concreto, perceptível na realidade. Embora

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239

precisasse de certo tempo para entender, quando compreendia, a mãe afirmava que o filho

conseguia perceber melhor as situações negativas que poderiam perpassar o seu cotidiano

escolar.

Em última análise, na Escala Orientada pelo DSM-IV, merece ressalvas o quadro clínico

de comportamento obsessivo-compulsivo, firmado pela maioria dos pais que responderam ao

CBCL. Aqui, torna-se plausível a diferenciação entre movimentos repetitivos e estereotipados

do comportamento obsessivo-compulsivo, possivelmente embaçado pela semelhança clínica.

O Transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) constitui-se no DSM como transtorno de

ansiedade associado a obsessões e rituais específicos que tendem a atenuar o nível de

ansiedade exacerbado.

No entanto, Bartz and Hollander (2006) detabem a nosologia do TOC. Um dos motivos do

debate associa-se com as características heterogêneas dos pacientes com o quadro clínico. Os

autores advogam pela sobreposição entre os transtornos de ansiedade e o transtorno do

espectro do autismo (TEA). Muitos pacientes com TOC são caracterizados por

comportamentos repetitivos assim como pacientes do espectro autista também o são.

Ivarsson and Melin (2008) apontam para diferenças neuropsicológicas subjacentes aos

comportamentos repetitivos no TOC e no TEA. Para os autores, o comportamento do TOC

pretende aliviar altos níveis de ansiedade, desgosto, sentimentos desagradáveis ou um

pensamento negativo. Ainda na infância, a consciência desse estado é uma característica

marcante do TOC. Em contraponto, tais sentimentos e pensamentos negativos são escassos no

TEA.

Provavelmente, os movimentos estereotipados advêm do impacto no processamento

sensorial decorrente da hiperestimulação ou hipoestimulação do ambiente. Ou seja,

argumenta-se que o movimento estereotipado pode auxiliar a manutenção de um estado de

estimulação ideal, ou homeostático, em um organismo acometido por desintegração sensorial.

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A literatura especializada adverte a possibilidade do desenvolvimento de estratégias de

enfretamento naturalmente inadequadas para compensar o desequilíbrio sensorial. Nessa

perspectiva, a desintegração sensorial subjaz padrões restritos e repetitivos de comportamento,

interesses e atividades, passíveis de emergir em maneirismos motores estereotipados e

repetitivos (p. ex., agitar ou torcer mãos ou dedos, ou movimentos complexos de todo o

corpo).

Salienta-se que o cômputo dos resultados do CBCL é resultante das informações

fornecidas pelos pais ou responsáveis diretos da criança. Para além de refutar ou confirmar

informações compiladas do CBCL, destacam-se alguns resultados clínicos, provavelmente,

embaçados pela dificuldade de compreensão das perguntas, ou ainda pelas possíveis dúvidas

frente às características comportamentais clínicas.

A maioria dos pais entrevistados possui a criança participante como filho(a) único(a).

Alguns receberam diagnóstico clínico meses antes da participação na presente pesquisa,

enquanto outros sugerem resistir à aceitação ou divulgação do diagnóstico clínico.

Tal fato promove pontos de vista dissonantes atrelados ao perfil comportamental da

criança. Essa hipótese ganha força ao reanalisar concepções e, por conseguinte, atitudes

destoantes dos pais para com o filho imerso em um diagnóstico clínico.

Os pais do Cauê são aqueles que mais ilustram tal hipótese. Enquanto a mãe associa o

perfil comportamental e socioafetivo do filho ao quadro clínico indicado por neuropediatra. O

pai, por sua vez, sugere resistir à aceitação do diagnóstico clínico. Leitor fluente de

publicações científicas, no decorrer da entrevista clínica, frequentemente atrelou atitudes e

dificuldades do filho a justificativas de causa-efeito, das quais parecem recorrer ao trajeto

doença-tratamento-cura.

Como consequência, eles sugerem assumir papéis desarmônicos na relação pais-filho. A

progenitora frequentemente ressalta perfil materno acolhedor e protetor, como se as

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241

dificuldades do filho fossem específicas do quadro clínico e, portanto, passíveis de encobrir

com atitudes de aceitação. Por outro lado, o progenitor salienta perfil paterno associado ao

rigor educacional, como se as dificuldades do filho fossem passíveis de superação por meio de

intenso treino.

Por outro lado, a aceitação do diagnóstico clínico parece auxiliar na compreensão das

atitudes e comportamentos da criança inserida em um transtorno do desenvolvimento e, por

conseguinte, beneficiar a relação familiar. Conforme elucidado pela mãe do Hugo:

“eu brigava muito com meu filho, porque ele tinha manias, tinha dificuldade

de comer e, principalmente, porque ele não entendia quando eu brigava com ele. Isso

me tirava do sério, mas depois do diagnóstico e ler muito sobre, descobri que preciso

entender como meu filho é para poder ajudá-lo, ao invés de brigar” (sic).

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Considerações finais:

A presente pesquisa buscou estabelecer perfil de funcionamento neuropsicológico de

crianças diagnosticadas com Autismo e Transtorno de Asperger. O estudo multicasos foi

realizado a partir da proposta metodológica de investigação de Luria. Foram

investigados os domínios da cognição social e funções executivas.

Em consonância com o diagrama do processo avaliativo proposta por Luria, a

análise qualitativa do sintoma (Etapa 1) indicou a presença de dificuldades nos

relacionamentos sociais e no cotidiano escolar das crianças avaliadas. Por sua vez, a

análise quantitativa do sintoma (Etapa 2) indicou que, de modo interdependente, falhas na

teoria da mente, nas funções executivas e na linguagem despontam como principais

fragilidades neuropsicológicas dos grupos clínicos vigentes, notadamente do grupo que

compõe o Transtorno Autista.

Cabe ressaltar que um indivíduo com um transtorno global do desenvolvimento se

constitui de forma específica e, portanto, apresenta uma forma específica de interação

social e verbal. Sugere-se que pais, profissionais clínicos e instituições sociais, como a

escola, compreendam a forma de individuação do TGD, antes de classificarem as

crianças ou proporem tratamentos.

Sugere-se futuras investigações que se proponham a investigar as características

cognitivas, comportamentais e socioafetivas consonantes e dissonantes do Transtorno

Autista e Transtorno de Asperger. Tal proposição enriquece a compreensão do perfil

neuropsicológico dos grupos clínicos em questão.

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Embora uma larga gama de estudos recentes proporcione a compreensão do perfil

neuropsicológico do Autismo e Asperger, sugere-se que mais pesquisas confluam na

compreensão rebuscada do perfil neuropsicológico característico dessas populações, sem

perder de vista elucidações frente à sensibilidade e especificidade do DSM-V para o

TEA.

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ANEXOS

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257

Anexo 1

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)

Esclarecimentos

Estamos solicitando a você a autorização para que o menor pelo qual você é

responsável participe da pesquisa: “Caracterização do fenótipo neuropsicológico de

crianças e adolescentes inseridos no Espectro Autista: um estudo multicaso”8.

A pesquisa em questão tem como pesquisador responsável a mestranda Samantha

Maranhão, aluna do Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal do

Rio Grande do Norte e vinculada ao Laboratório de Pesquisa e Extensão em Neuropsicologia

(LAPEN/UFRN), coordenado pela professora Dra. Izabel Hazin.

A pesquisa tem como objetivo principal ajudar no desenvolvimento e aprendizagem

das crianças e adolescentes do espectro autista. De maneira geral, o fenótipo

neuropsicológico é a caracterização do perfil cognitivo, comportamental e socioafetivo de

uma pessoa. Para obter este perfil torna-se necessário a avaliação neuropsicológica, que por

sua vez, constitui-se como procedimento investigativo realizado com a ajuda de tarefas

desenvolvidas para crianças e adolescentes da idade do menor pelo qual você é responsável.

O motivo que nos leva a fazer este estudo é o problema identificado tanto na prática

clínica, quanto na literatura médica e neuropsicológica, qual seja, proporcionar diagnóstico

precoce e tratamento adequado do espectro, cuja heterogeneidade de sintomas dificulta os

profissionais da saúde e da educação identificar se o quadro clínico confere com o

diagnóstico de espectro autista.

Caso você decida autorizar, ele(a) será submetido à avaliação neuropsicológica:

procedimento que utiliza testes psicológicos e tarefas qualitativas parecidas com atividades

feitas em sala de aula e com jogos. Tais tarefas ajudam a compreender melhor como estão as

chamadas funções cognitivas, como por exemplo, a atenção e a memória, tão importantes na

aprendizagem; bem como ajudam a compreender melhor o motivo pelo qual ele(a) possui

determinados tipos de comportamento ou de interação social. As tarefas previstas serão

aplicadas individualmente. Pretedemos concluir a avaliação de cada participante em quatro

(4) encontros, com duração média de sessenta (60) minutos.

Pretendemos obter imagens dos encontros avaliativos a fim de conseguir dados

clínicos acerca de como o menor consegue fazer e de que forma ele faz as tarefas. Para tanto,

8 O título da dissertação foi alterado no decorrer da pesquisa

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258

pretendemos que os encontros avaliativos sejam videogravados. A autorização específica

para isso será entregue em forma de outro TCLE.

A aplicação das tarefas não apresenta nenhum risco conhecido para a saúde física e/ou

mental. Durante a realização dos testes psicológicos e tarefas qualitativas a previsão de riscos

é mínima, ou seja, o risco que ele(a) corre é semelhante àquele sentido num exame

psicológico de rotina.

Pode acontecer um desconforto, caso ele(a) não saiba como resolver os testes ou

tarefas propostas que será minimizado quando o pesquisador informar que a pesquisa não

pretende julgar erros, mas na verdade, pretende analisar que estratégias o menor utilizar para

tentar minimizar, ou superar, as dificuldades encontradas durante a execução da atividade

proposta.

Ao final do processo avaliativo, ele (a) terá como benefício a elaboração de um laudo

psicológico, cujo objetivo é proporcionar um mapeamento do funcionamento cognitivo,

comportamental e socioafetivo do individuo. Destacam-se seus pontos fortes e fracos, assim

como as estratégias desenvolvidas para resolver atividades, uma vez que o processo

avaliativo busca compreender o que o individuo consegue fazer e de que forma ele faz as

tarefas e testes propostos. Desse modo, o laudo proporciona melhor compreensão acerca do

impacto do quadro clínico sobre o desenvolvimento, a aprendizagem e a qualidade de vida do

menor.

Em caso de algum problema que ele(a) possa ter, relacionado com a pesquisa, ele(a)

terá direito a assistência gratuita que será prestada pelo Laboratório de Pesquisa e Extensão

em Neuropsicologia (LAPEN/UFRN). O mesmo possui trabalhos de extensão à comunidade,

os quais agregam assistência às escolares e responsáveis em casos de dúvidas relacionadas ao

laudo psicológico.

Durante todo o período da pesquisa você poderá tirar suas dúvidas ligando para

professora Izabel Hazin (telefone), ou para aluna Samantha Maranhão (telefone).

Você tem o direito de recusar sua autorização, em qualquer fase da pesquisa, sem

nenhum prejuízo para você e para ele(a).

Os dados que ele(a) irá nos fornecer serão confidenciais e serão divulgados apenas em

congressos ou publicações científicas, não havendo divulgação de nenhum dado que possa

identificá-lo(a). Esses dados serão guardados pelo pesquisador responsável por essa pesquisa

em local seguro e por um período de cinco (5) anos.

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Se você tiver algum gasto pela participação dele(a) nessa pesquisa, ele será assumido

pelo pesquisador e reembolsado para você. Se ele(a) sofrer algum dano comprovadamente

decorrente desta pesquisa, ele(a) será indenizado.

Consentimento livre e esclarecido

Eu,____________________________________________________, representante

legal do menor _________________________________________________________,

autorizo sua participação na pesquisa “Caracterização do fenótipo neuropsicológico de

crianças e adolescentes inseridos no Espectro Autista: um estudo multicaso”.

Esta autorização foi concedida após os esclarecimentos que recebi sobre os objetivos,

importância e o modo como os dados serão coletados, por ter entendido os riscos,

desconfortos e benefícios que essa pesquisa pode trazer para ele(a) e também por ter

compreendido todos os direitos que ele(a) terá como participante e eu como seu representante

legal.

Autorizo, ainda, a publicação das informações fornecidas por ele(a) em congressos

e/ou publicações científicas, desde que os dados apresentados não possam identificá-lo(a).

Natal, (data).

Assinatura do representante legal

Assinatura do pesquisador responsável

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Anexo 2

TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA USO DE IMAGENS (VÍDEOS)

Eu,_____________________________________________________________,

AUTORIZO a Profª Dra. Izabel Hazin, coordenadora da pesquisa intitulada: “Caracterização

do fenótipo neuropsicológico de crianças e adolescentes diagnosticados com transtorno de

Asperger: um estudo multicasos” a fixar, armazenar e exibir a minha imagem por meio de

vídeo com o fim específico de inseri-la nas informações que serão geradas na pesquisa, aqui

citada, e em outras publicações dela decorrentes, quais sejam: revistas científicas, congressos

e jornais.

A presente autorização abrange, exclusivamente, o uso de minha imagem para os fins

aqui estabelecidos e deverá sempre preservar o meu anonimato. Qualquer outra forma de

utilização e/ou reprodução deverá ser por mim autorizada.

O pesquisador responsável, Samantha Maranhão, assegurou-me que os dados serão

armazenados em meio de ferramentas informatizadas, sob sua responsabilidade, por 5 anos, e

após esse período, serão destruídas.

Assegurou-me, também, que serei livre para interromper minha participação na

pesquisa a qualquer momento e/ou solicitar a posse de minhas imagens.

Natal (data).

Assinatura do participante da pesquisa

Assinatura e carimbo do pesquisador responsável

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Anexo 3

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Anexo 4

Roteiro de Observação nas Escolas e Entrevista com os profissionais

ROTEIRO DE OBSERVAÇÃO DO ALUNO NO COTIDIANO DA ESCOLA

1. O aluno interage com as pessoas da comunidade escolar?

a) Professores

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b) Alunos

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c) Outros (pais de alunos, merendeira, vigia, auxiliar administrativo, serviço geral,

diretor)?

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2. O aluno demonstra compreender e realiza as atividades do cotidiano da escola?

Precisa de adaptações para realizá-las (de conteúdo, da forma, do tempo, dos objetos)?

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3. O aluno realiza as tarefas no tempo planejado para sua execução (atividades em sala

de aula, na merenda, no banheiro, no parque)?

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4. Quais as atividades do aluno durante o intervalo?

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5. No geral, como tem sido o desenvolvimento acadêmico do aluno? Quais são as

maiores dificuldades enfrentadas?

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