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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE – UFRN CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS – CCSA DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL – DESSO ARILANE LIMA DA COSTA A ASSISTÊNCIA ESTUDANTIL COMO FERRAMENTA DETERMINANTE PARA A GARANTIA DO DIREITO À EDUCAÇÃO: A REALIDADE DE ALUNAS MÃES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE (UFRN) NATAL- RN 2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE – UFRN

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS – CCSA

DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL – DESSO

ARILANE LIMA DA COSTA

A ASSISTÊNCIA ESTUDANTIL COMO FERRAMENTA DETERMINANTE PARA A GARANTIA DO DIREITO À EDUCAÇÃO: A REALIDADE DE ALUNAS MÃES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE (UFRN)

NATAL- RN

2017

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ARILANE LIMA DA COSTA

A ASSISTÊNCIA ESTUDANTIL COMO FERRAMENTA DETERMINANTE PARA A GARANTIA DO DIREITO À EDUCAÇÃO: A REALIDADE DE ALUNAS MÃES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE (UFRN)

Monografia apresentada ao Curso de Serviço Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Serviço Social.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Miriam de Oliveira Inácio.

NATAL - RN

2017

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A todas as mulheres que lutam

diariamente para subverter as

convenções sociais e alçar voos cada vez mais altos.

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AGRADECIMENTOS

A rotina de desenvolver uma pesquisa e escrever um trabalho como

esse é sem duvidas desgastante, mas o apoio de familiares e amigos a faz

mais leve. Quero agradecer imensamente a minha orientadora, Miriam Inácio, que foi uma das minhas inspirações para a aproximação com a temática do

gênero e que me guiou como ninguém nessa trajetória, o meu muito obrigada.

Quero expressar minha gratidão aos meus amigos, que desde o meu primeiro

semestre na universidade lidam com a minha ansiedade sobre o final desse

curso e que me apoiaram e me acalmaram durante a elaboração dessa

monografia. Ao meu companheiro pela paciência e carinho com os quais me ajudou a passar por esse momento. À minha mãe, irmãs e sobrinha por serem

a minha motivação diária e o maior exemplo de força e superação que eu

poderia ter, a minha militância feminista não poderia vir de outro lugar se não do esforço e da independência que transborda de vocês.

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RESUMO

O objetivo central da pesquisa aqui apresentada é analisar os impactos das políticas de assistência estudantil da UFRN na vida das alunas mães da instituição, principalmente ao que diz respeito à garantia de sua permanência no ensino superior. Busca-se com isso entender as dificuldades enfrentadas pelas alunas que têm filho(a)s e estão no ensino superior; conhecer a política de assistência estudantil, observando especificamente aquelas voltadas para estudantes mães e apreender o papel delas na garantia da permanência desse público na instituição. A pesquisa que aqui se realizou foi de natureza qualitativa e se apoiou no materialismo histórico dialético para observar os impactos e rebatimentos da sociedade capitalista e patriarcal na vida dessas estudantes. Nos debruçamos sobre o debate de gênero, nos atendo as barreiras colocadas pela sociedade patriarcal na vida das mulheres mães dentro da universidade, o que como vimos se faz como um desafio para que essas alunas permaneçam no ensino superior. Ademais, também nos ocupamos de entender os rebatimentos da política neoliberal na contrarreforma da educação e consequentemente as suas implicações para a política de assistência estudantil, que como vimos durante a pesquisa não está contemplando de maneira eficaz as alunas mães. Utilizamos a pesquisa bibliográfica e a aplicação de entrevista e de questionários para entender a realidade das alunas mães matriculadas nos cursos de Pedagogia, Serviço Social e Enfermagem com filho(a)s em idade de creche. Dessa forma, percebemos que mesmo sendo um público considerável dentro da universidade a melhoria da vida dessas alunas dentro da academia não tem sido alvo de debates e que a política de assistência estudantil (compensatória, focalista e seletiva) não atende as necessidades das alunas mães de modo a garantir-lhes a conclusão do curso com qualidade e dentro do prazo padrão. Contatamos nos dados colhidos nos questionários e nas entrevistas que mesmo fazendo parte dos critérios de renda instituídos pela PNAES e pela UFRN, a maioria das entrevistadas não eram beneficiadas pelo auxílio creche e que de forma unanime a opinião dessas alunas sobre essa política é de que o valor ofertado é muito ínfimo e que o ideal para elas seria que a instituição dispusesse de um espaço físico para acolher o(a)s filho(a)s das alunas. Mesmo que as mulheres já somem mais da metade das vagas no ensino superior e mesmo que a faixa etária dos jovens que ingressam na universidade coincida com a idade fértil dos jovens brasileiros a maternidade dentro da academia parece ser um assunto distante, pouco discutido e invisibilizado. É necessário ainda percorrer um longo caminho para se atingir o reconhecimento do campo da educação e dos espaços públicos como pertencentes às mulheres mães.

Palavras-chave: Patriarcado. Feminismo. Maternidade. Ensino Superior. Assistência Estudantil.

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ABSTRACT

The main goal of the research here presented is to analyze the impacts of UFRN’s student assistance policies in the lives of the student mothers of the institution, especially concerning the assurance of their staying in higher education. The objectives are the following: to understand the difficulties faced by the students who have children and are in higher education; to be familiar with the student assistance policy, observing specifically those oriented to student mothers; and to apprehend their paper in the assurance of this group staying in the institution. The research made was of a qualitative nature and relied on historical-dialectical materialism to observe the impacts and implications of capitalist patriarchal society on these students’ lives. We elaborate on the debate on gender, limiting ourselves to the barriers put by patriarchal society on the lives of student mothers inside the university, which, as we have seen, constitute a challenge for these students’ staying in higher education. Furthermore, we also take the time to understand the implications of neoliberal policy-making in the education counter-reform and, consequently, their implications to student assistance policy, which, as we saw during research, is not encompassing student mothers in an effective manner. We use bibliographical research and the application of interviews and questionnaire to understand the reality of student mothers enrolled in the Pedagogy, Social Work Studies and Nursing programs with children at childcare age. Thus, we realized that, even though they are a considerable public inside the university, the improvement of these students’ lives inside academia has not been target of debate, and that the student assistance policy (compensatory, focalist and selective) doesn’t attend to the needs of student mothers in order to assure their graduation with quality and in a reasonable timeframe. We observe in the data collected in questionnaires and interviews that, even though they meet the income criteria instituted by the PNAES and the UFRN, most interviewees were not benefitting of childcare aid, and that, in a unanimous manner, these student’s opinion on this aid was that the value offered is too little and that the ideal solution for them was for the institution to arrange a physical space in its premises to accommodate their children. Even though women account for over half of the higher education population, and the age bracket of young people who enter universities coincides with the fertile age bracket of young Brazilians, motherhood inside academia seems to be a distant topic, little discussed and made invisible. It is necessary still to traverse a long path to achieve recognition of the education field and the public spaces as belonging to student mothers.

Keywords: Patriarchy. Feminism. Motherhood. Higher education. Student Assistance.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Gráfico 1 – Idade das entrevistadas..................................................................39

Gráfico 2 – Estado civil das entrevistadas.........................................................40

Gráfico 3 – Parentes encarregados do cuidado das crianças na ausência da

mãe....................................................................................................................42

Gráfico 4 – Forma de ingresso das entrevistadas no ensino superior...............44

Gráfico 5 – Renda das entrevistadas em salários mínimos...............................45

Gráfico 6 – Renda per capita das entrevistadas................................................46

Gráfico 7 – Idade do(a)s filho(a)s das entrevistadas.........................................47

Figura 1 – Organograma da PROAE.................................................................79

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LISTA DE SIGLAS

AINDIFES – Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior

BM – Banco Mundial

BENFAM – Sociedade Civil Bem-Estar e Família no Brasil

CAPAP – Coordenadoria de Apoio Pedagógico e Ações de Permanência

CASE– Coordenadoria de Atenção à Saúde do Estudante

CONSAD – Conselho Nacional de Secretário de Estado da Administração

EMEUF – Encontro de Mulheres Estudantes da UFRN

FHC – Fernando Henrique Cardoso

FONAPRACE – Fórum Nacional de Pró-Reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis

IFES – Instituições Federais de Ensino Superior

INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira

LBT – Lésbicas, Bissexuais e Travestis/Transexuais/Transgênero

LGBT – Lésbicas, GAYS, Bissexuais e Travestis/Transexuais/Transgêneros

MEC – Ministério da Educação

NEI – Núcleo de Educação Infantil

ONU – Organização das Nações Unidas

OVEU – Observatório da Vida do Estudante Universitário

PNAD – Pesquisa Nacional de Amostras em Domicílio

PNAES – Programa Nacional de Assistência Estudantil

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PNE – Plano Nacional de Educação

PNDS – Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde

PROAE – Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis

PROUNI – Programa Universidade Para Todos

REUNI – Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades

SEADE – Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados

SIGAA – Sistema Integrado de Gestão de Atividades Acadêmicas.

SINASC – Sistema Nacional de Nascidos Vivos

UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro

UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte

UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO.................................................................................................1

2. FEMINISMO, PATRIARCADO E MATERNIDADE.........................................5

2.1. AS CONSTRUÇÕES DE GÊNERO E DO IDEAL MATERNO NA SOCIEDADE PATRIARCAL................................................................................5

2.2. OS MOVIMENTOS FEMINISTAS NAS LUTAS PELOS DIREITOS DAS MULHERES E À MATERNIDADE.....................................................................20

3. MULHERES NO ENSINO SUPERIOR: A TRAJETÓRIA DO ACESSO E DA PERMANÊNCIA DAS MULHERES NA UNIVERSIDADE................................32

3.1. A TRAJETÓRIA DO ACESSO DAS MULHERES À EDUCAÇÃO PRIMÁRIA E SUPERIOR NO BRASIL..............................................................32

3.2. ALUNAS E MÃES: CONHECENDO AS MÃES ESTUDANTES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE............................37

3.3. VEZ E VOZ: CONHECENDO A REALIDADE DAS ALUNAS MÃES.........48

4. REFLETINDO SOBRE A HISTÓRIA DAS POLÍTICAS DE ASSISTÊNCIA ESTUDANTIL....................................................................................................67

4.1. ASSISTÊNCIA ESTUDANTIL E CONTRARREFORMA DA EDUCAÇÃO: OS AVANÇOS DO NEOLIBERALISMO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR.............67

4.2. A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA ESTUDANTIL PARA MÃES ESTUDANTES NA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE..............................................................................................................77

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS..........................................................................88

REFERÊNCIAS.................................................................................................91

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1. INTRODUÇÃO.

Tendo proximidade com a militância nos movimentos feministas e

estudantis e sabendo das dificuldades postas às mulheres em virtude do

machismo não apenas na universidade, mas na sociedade como um todo,

surgiu o interesse pela temática das mulheres mães e da sua realidade no

ensino superior. Nos dias 19 e 20 de maio de 2016 ocorreu na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) o II Encontro de Mulheres Estudantes

da UFRN (EMEUF) que teve como temática “A Cultura Feminista Construindo a

Democracia”. Foram discutidos no evento os problemas enfrentados

cotidianamente pelas alunas mulheres dentro e fora da universidade e como o

feminismo tem se mostrado enquanto alternativa de enfrentamento e

construção de uma nova realidade para as mesmas. Ao final desse encontro

uma carta foi gerada. O documento foi entregue a reitora, aos diretores e

diretoras dos Centros, entre outras autoridades públicas. Nele havia inúmeras

reivindicações que foram apontadas e discutidas pelas estudantes, dentre elas

estavam: assistência estudantil para mulheres mães; investimento em

segurança pública dentro do campus; auxílio permanência e mais vagas na residência universitária para prevenir a evasão das alunas cotistas; disputa dos

espaços, principalmente nos cursos majoritariamente masculinos, como as

ciências exatas e tecnológicas, visando à garantia do respeito e da valorização

das mulheres nessas áreas; valorização da cultura negra e da produção de

conhecimento por esse segmento; mais espaço de discussão das mulheres

lésbicas, bissexuais e transexuais/transgênero (LBT); punição dos casos de racismo, machismo e lesbofobia, homofobia, bifobia, transfobia (LGBTfobia);

incentivo às disciplinas voltadas para discussão de gênero e sexualidade;

entre outras. Observa-se pelo conteúdo das reinvindicações que ser mulher e

universitária não tem sido uma atividade fácil de desempenhar e que ocupar

esse espaço pressupõe vivenciar uma série de opressões e dificuldades a

serem combatidas por meio de muita luta.

Percebemos que todos os itens contidos na carta chamam muita

atenção, mas um em especial se destaca em virtude da gritante invisibilidade e

da urgência da realização do seu debate. A situação das alunas mães é um

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2 assunto pouco ou quase nada discutido. Observamos não apenas nas

reinvindicações da Carta sobre a assistência estudantil para as mulheres mães,

mas também na realização de reuniões e rodas de conversa organizadas pelas

estudantes mães ao longo do ano de 2016 na UFRN que a universidade não

possui o mínimo para acolhê-las, a exemplo da falta de fraldários na UFRN,

dos números insuficientes de auxílio creche, da expulsão das residentes que

engravidam, da impossibilidade do acesso das alunas com os(as) filhos(as) ao Restaurante Universitário, entre outros.

Tais situações podem estar sendo acarretadas por uma visão machista

da maternidade, baseado em um ideal irreal daquilo que deve ou não ser, e

daquilo que deve ou não fazer uma mãe. A maternidade é vista

constantemente como um problema individual ou familiar e que deve ser

tratado nesse seio. São poucas as políticas e programas voltados para esse

público, ainda mais dentro da educação. É como se os espaços acadêmicos

não as pertencessem. A partir disso surgem os questionamentos: a

universidade tem pensado em políticas de permanência voltadas para as

estudantes mães? Se não, por quê? Quais os programas que elas podem

acessar? Quais os rebatimentos disso na vida acadêmica dessas mulheres? Na UFRN quais têm sido os impactos das políticas de assistência estudantil na

vida das alunas mães da instituição, principalmente no que diz respeito à

garantia de sua permanência no ensino superior?

Sendo assim, essa pesquisa busca responder tais perguntas e apontar a

educação enquanto campo pertencente às mulheres mães. É importante que

essas alunas ganhem visibilidade, que as instituições de ensino e o Estado possam pensar em políticas que garantam o seu acesso e permanência no

ensino superior, para que as mulheres não precisem optar entre suas carreiras

profissional e acadêmica e o seu direito reprodutivo. Ademais, a temática aqui

abordada se faz fundamental para instituir novos debates em torno do

feminismo, da maternidade e do direito a educação, sendo de grande

importância na construção da identidade das e dos profissionais do Serviço

Social que se inscreve enquanto profissão que possui em seu Projeto Ético-

Político pautas de luta em favor da classe trabalhadora, das minorias e grupos

historicamente excluídos e oprimidos, além de claro, ser composta em grande

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3 parte por mulheres e atender de maneira significativa um grupo de usuário(a)s

também composto em sua maioria pelo gênero feminino.

O objetivo central dessa pesquisa é então: analisar os impactos das

políticas de assistência estudantil da UFRN na vida das alunas mães da

instituição, principalmente no que diz respeito à garantia de sua permanência

no ensino superior. Dessa forma, busca-se: entender as dificuldades

enfrentadas pelas alunas que têm filho(a)s e estão no ensino superior, conhecer a política de assistência estudantil do campus – observando a

existência de políticas específicas voltadas para estudantes mães – e

apreender o papel das políticas de assistência estudantil para a permanência

das estudantes mães nas instituições de ensino.

Para isso, a pesquisa realizada foi de natureza qualitativa e se apoiará

no materialismo histórico dialético para observar os impactos e rebatimentos da

sociedade capitalista e patriarcal – que como sabemos dificulta e embarreira a

emancipação e liberdade das mulheres e dessas estudantes. O trabalho de

pesquisa bibliográfica e documental foi dividido em dois momentos. O primeiro

momento consistiu em pesquisa bibliográfica que foi direcionada para

levantamento de informações e apreensão do tema, sendo utilizada a revisão de bibliografias específicas como principal instrumento dessa fase; na pesquisa

documental foram analisados os editais, regimentos e resoluções dos

programas de assistência estudantil existentes na universidade.

A pesquisa de campo faz parte do segundo momento e serviu para

aproximação com a realidade das estudantes mães da UFRN. Os instrumentos

aqui utilizados foram o questionário e a entrevista semiestruturada que foram aplicados com 8 (oito) alunas que estevam cursando a graduação em Serviço

Social, Pedagogia ou Enfermagem e que possuíam filhos(as) com idades entre

0 e 6 anos. A entrevista serviu para coletar relatos e informações sobre esse

processo. As informações desejadas foram sobre as suas experiências como

mães e estudantes da universidade, bem como usuárias da política de

assistência estudantil. O questionário foi outro instrumento que serviu para dar

base à pesquisa, ajudando a traçar um perfil socioeconômico dessas alunas e

auxiliando na análise da realidade. Como não se tem dimensão do número de

alunas mães no campus, nem de sua distribuição entre os cursos e levando em

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4 consideração o pouco tempo hábil para esse levantamento, a pesquisa aqui

apresentada realizou-se nos curso de graduação em Serviço Social,

Enfermagem e Pedagogia. Por serem cursos majoritariamente femininos, a

probabilidade de encontrar alunas mães é maior. Isso facilitou a busca, que

pôde ser efetuada nos editais do auxílio creche divulgados na própria página

da universidade, por indicações de pessoas que conheciam alunas nessa

situação ou pela abordagem de alunas na instituição.

O trabalho será dividido então em três partes, a primeira abordará o

debate sobre feminismo, patriarcado e maternidade e analisará as construções

de gênero e do ideal materno na sociedade patriarcal, além de debater sobre

movimentos feministas e a luta pelo direito das mulheres e a maternidade. Na

segunda parte iremos tratar da trajetória das mulheres no ensino superior,

falando sobre o acesso e a permanência delas na universidade. Nesse capítulo

estarão contidos os resultados da pesquisa junto às alunas da UFRN. Em

seguida, na terceira parte, falaremos sobre a política de assistência estudantil

no contexto da contrarreforma da educação e dos avanços do neoliberalismo

no Brasil. Além disso, analisaremos dentro desse ponto as políticas de

assistência estudantil para as mães estudantes da UFRN e a sua eficácia na permanência dessas mulheres. Por fim, serão apresentadas as considerações

finais sobre a pesquisa.

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2. FEMINISMO, PATRIARCADO E MATERNIDADE.

Este capítulo abordará as discussões sobre os movimentos feministas,

gênero, patriarcado e maternidade. Seu objetivo central é analisar a posição

das mulheres na sociedade e os mecanismos de dominação e exploração aos

quais estão submetidas, bem como mostrar o poder da sua organização na

busca pela igualdade de direitos. O primeiro tópico deve apontar o debate

sobre as construções de gênero e da maternidade na sociedade patriarcal e como essas têm interferido no cotidiano das mulheres e no seu acesso ao

espaço público. No segundo tópico, almeja-se compreender os desafios, limites

e possibilidades da organização dos movimentos feministas, mais

especificamente as pautas sobre os direitos sexuais e reprodutivos.

2.1. AS CONSTRUÇÕES DE GÊNERO NA SOCIEDADE

PATRIARCAL E A MATERNIDADE.

A condição das mulheres no mundo está inteiramente relacionada aos

valores construídos e disseminados pela “ordem patriarcal de gênero”

(SAFFIOTI, 2004). É inevitável na abordagem dessa temática desvelar a

ideologia por trás dessas duas categorias. No livro “Gênero, patriarcado e

violência”, Heleieth Saffioti analisa os dois conceitos à luz do debate sobre a violência contra a mulher. Segundo a autora: o patriarcado pode ser

brevemente definido enquanto o “regime de dominação-exploração das

mulheres pelos homens” e o gênero como “a construção social do masculino e

do feminino” (SAFFIOTI, 2004, p. 44-55). Dessa forma, essas duas categorias

se completam na análise da posição das mulheres na sociedade.

Há várias teorias sobre a origem do patriarcado. A condição de subalternidade que hoje se apresenta às mulheres não é uma condição que se

expandiu ao longo de toda a história da humanidade, mas uma construção

recente datada de aproximadamente seis milênios, segundo aponta Saffioti

(1987). Engels, por exemplo, em sua obra “A origem da família, da

propriedade privada e do Estado”, publicada em 1884, propõe que o

patriarcado tem a sua gênese na mudança das relações sociais durante a

transição entre as sociedades primitivas e as sociedades que têm por base a

propriedade privada. A propriedade privada funda a família monogâmica no

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6 intuito de garantir ao Patriarca a segurança da transmissão de sua herança

apenas entre aqueles com os quais possui laços consanguíneos. Sendo

assim, a monogamia é projetada, como afirma Narvaz e Koller (2006) para

exercer o controle sobre o corpo e a sexualidade feminina, que é justamente

como mostra Saffioti (2004, p.49) “um dos elementos nucleares do patriarcado”

que assegura “a fidelidade da esposa a seu marido”.

Engels parte de uma concepção de que nas sociedades de coleta em que o comunismo primitivo se desenvolvia não existia um regime de exploração

e dominação entre homens e mulheres. O autor mostra que nessas sociedades

havia uma divisão de tarefas entre homens e mulheres, mas que essa não era

um pressuposto para valoração das atividades. Dessa forma, por exemplo, os

homens dividiam-se entre as atividades de caça e as mulheres de colheita, e

nem uma atividade ou outra possuía um valor maior diante do grupo. Alambert

(1980) sintetiza que Engels considerava que:

O fim do matriarcado coincidiu com o surgimento da divisão da sociedade em classes e consequentemente exploração do ser humano pelo ser humano e da mulher pelo homem; coincidiu com o surgimento de novos instrumentos de produção e com a família monogâmica. Antes desse momento histórico, as tarefas eram divididas, mas isso não representava privilégio ou desigualdade. A partir do surgimento da sociedade de classes, da propriedade, surgiu uma nova forma de atribuir valor, na qual aqueles que possuem os meios de produção dominam os que não possuem (ALAMBERT, 1980 apud BEZERRA ;VELOZO, 2015, p.37).

Conforme Bezerra; Velozo (2015), Alambert (1980) ressalta que a

análise de Engels possuía determinadas limitações que foram desveladas mais

tarde pela Antropologia, a qual afirma que “a dominação masculina sempre

existiu, e que Engels, provavelmente teria confundido o conceito de

matrilinearidade com o de matriarcado” (BEZERRA; VELOZO, 2015, p.38).

Estudos feitos pela Antropologia argumentam que “a origem da subordinação das mulheres está na divisão de papéis ocorrida ainda na sociedade primitiva

de caçadores-coletores” (SAFFIOTI, 2000 apud BEZERRA; VELOZO, 2015,

p.38). A divisão dos trabalhos baseadas na biologia dos sexos já era expressa

nesse período. As mulheres, em virtude da gravidez e da amamentação, não

eram permitidas à prática da caça, ficavam responsáveis pela colheita e pelos

trabalhos domésticos da tribo. Os homens eram incumbidos das atividades de

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7 caça, o que lhes expunha a situações de perigo que eram mais valorizadas

socialmente, ou seja, existia sim uma valoração das atividades compartilhadas

entre homens e mulheres (BEZERRA; VELOZO, 2015).

Bezerra; Velozo (2015) esclarecem que Vaitsman (1989) observa em

sua análise que Engels se referiu “à ‘comunidade primitiva’, como se houvesse

homogeneidade entre as definições desta, o que de fato não havia”

(VAISTMAN, 1989 apud BEZERRA; VELOZO, 2015, p. 42). A autora mostra que o que de fato existiu foram “diversos tipos de comunidade, com modos de

produção diferenciados” (VAITMAN, 1989 apud BEZERRA; VELOZO, 2015, p.

42). Ela argumenta que, diferente do que Engels pensou, a opressão das

mulheres não necessariamente está condicionada ao surgimento da

propriedade privada, podendo ela se estabelecer, para além disso, em

sociedade em que os meios de produção são coletivos. Há hoje o

conhecimento de diversas sociedades desse tipo, onde apesar dos meios de

produção serem socializados, a subordinação das mulheres ainda existe.

Diante disso, Vaistman (1989) considera que:

... se por um lado constatamos a impossibilidade de estabelecer a igualdade entre mulheres e homens sem que se estabeleça um sistema de propriedade social dos meios de produção, o fato de termos uma sociedade desse tipo não garante que a igualdade, automaticamente, acontecerá; ao contrário, temos constatado que, mesmo nas sociedades mais igualitárias, a diferença entre os sexos tem servido para atribuir, poder, status, riqueza (VAISTMAN, 1989 apud BEZERRA; VELOZO, 2015, p.42).

É mais adequado afirmar que o patriarcado e o capitalismo são aliados

no aprofundamento das desigualdades sociais. É de interesse do sistema

capitalista a perpetuação da ordem patriarcal, pois é através da subordinação

da mulher que o capitalismo expande “os níveis de exploração da classe

trabalhadora, composta tanto por homens quanto por mulheres” (BEZERRA;

VELOZO, 2015, p. 44).

Reiterando, o patriarcado está ancorado na opressão das mulheres

pelos homens e se baseia, de acordo com Johnson, “no controle e no medo,

atitude/sentimento que formam um círculo vicioso” (JOHNSON apud SAFFIOTI,

2004, p.21). Narvaz e Koller (2006) baseados em Millet (1970) e Scott (1995)

destacam os princípios básicos que regem o patriarcado: a subordinação da

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8 mulher, que em um arranjo hierárquico se encontra em uma posição de poder

menor que a do homem; e na subordinação dos jovens aos homens mais

velhos, que nessa hierarquia estão em um nível de poder mais elevado.

Portanto, no patriarcado a família se baseia nessa hierarquia que dá poder ao

homem sobre o(a)s filho(a)s e a esposa.

Ainda como nos explica Narvaz; Koller (2006) apoiadas em Millet (1970);

Scott (1995) no “patriarcado tradicional1” as filhas mulheres se encontram sobre o poder do pai até que se casem e passem, assim, a obedecer ao

marido. O direito sobre a mulher passa então de um homem ao outro.

Observamos que com a modernização do patriarcado essa dinâmica mudou: o

poder do pai não é mais uma referência, mas o poder conjugal concedido ao

marido ainda é uma prática recorrente e legitimada pela sociedade.

Diferente da categoria patriarcado, o gênero por si só não implica na

desigualdade entre homens e mulheres e permite pressupor a sua coexistência

sem que haja domínio de um sobre o outro (SAFFIOTI, 2004). A categoria

gênero é uma categoria de análise recente. Segundo Scott (1989), o gênero

parece ter surgido primeiro entre as feministas americanas que endossavam

que as distinções feitas entre homens e mulheres baseadas no sexo tinha um caráter fundamentalmente social, ou seja, eram distinções que emergiam de

uma construção social. Além disso, o termo surge como uma reinvindicação

das feministas contemporâneas por um campo de definição que explicasse as

desigualdades persistentes entre homens e mulheres, afirmando o caráter

inadequado das teorias que existiam para explicar esse fato. De maneira geral

o uso da palavra gênero pelas feministas passou a fazer referência à organização social da relação entre os sexos referindo-se “às relações entre

mulheres e homens, mulheres e mulheres, homens e homens” (CAMURÇA;

GOUVEIA, 2004, p.14).

1 Narvaz; Koller (2006) trazem em seu texto o “patriarcado tradicional” como aquele que se configura na transição entre poderes sobre a mulher que passa do pai para o marido, o que hoje não ocorre de maneira expressiva. Tal mudança não significando que as mulheres na contemporaneidade não estão expostas ao Patriarcado, ao contrário, o que as autoras esclarecem é que atualmente a mulher se encontra subordinada a figura do homem, principalmente a do marido, sem que a sua tutela tenha necessariamente sido passada pela figura do pai.

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Evidencia-se o caráter “neutro” que a categoria gênero pode assumir em

determinados empregos. Scott (1989, p.6) afirma que “o gênero parece

integrar-se na terminologia científica das ciências sociais e, por conseqüência,

dissociar-se da política – (pretensamente escandalosa) – do feminismo”.

Dessa forma, o uso dessa categoria pode não determinar

necessariamente uma posição em relação à situação de desigualdade social

em que as mulheres se encontram em detrimento dos homens. Diferente do termo patriarcado que determina uma posição política em relação à opressão

das mulheres, o “‘gênero’ inclui as mulheres sem as nomear, e parece assim

não se constituir em uma ameaça crítica” (SCOTT, 1989, p.6). Além disso, os

estudos de gênero implicam necessariamente nos estudos tanto dos homens

quanto das mulheres e invalidando a ideia desses dois sujeitos de maneira

isolada, afirmando que “estudar as mulheres de forma separada perpetua o

mito de que uma esfera, a experiência de um sexo, tem muito pouco ou nada a

ver com o outro sexo” (SCOTT, 1989, p.7). Outro ponto, segundo Scott (1989),

reside ainda no fato do termo gênero por si só não responder as questões que

apontam para as razões pelas quais as relações sociais entre feminino e

masculino são construídas da forma que são, como elas funcionam, ou como mudam. O termo isolado não possui “força de análise suficiente para interrogar

(e mudar) os paradigmas históricos existentes” (SCOTT, 1989, p.8).

Contudo, a categoria gênero é um conceito chave para “designar as

relações sociais entre os sexos” (SCOTT, 1989, p.7):

O seu uso rejeita explicitamente as justificativas biológicas, como aquelas que encontram um denominador comum para várias formas de subordinação no fato de que as mulheres têm filhos e que os homens têm uma força muscular superior. O gênero se torna, aliás, uma maneira de indicar as “construções sociais” – a criação inteiramente social das idéias sobre os papéis próprios aos homens e às mulheres. É uma maneira de se referir às origens exclusivamente sociais das identidades subjetivas dos homens e das mulheres (SCOTT, 1989, p.7).

O conceito de gênero nos permite a análise de um período histórico

muito maior que o patriarcado, que pode ser considerado como sendo “um

caso específico de relações de gênero” (SAFFIOTI, 2004, p.119). Os conceitos

e símbolos que envolvem a ideia de feminino e masculino sofrem modificações

o tempo inteiro, pois a categoria gênero não possui um caráter fixo e por isso

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10 pode ter várias representações ao longo da história. Em algumas sociedades

antigas, por exemplo, a figura feminina tinha uma posição central2. No período

paleolítico é possível encontrar representações divinas retratadas por meio de

esculturas ou pinturas de mulheres, que como assinala Oliveira (2005), “são

lidas e interpretadas [...] não somente como culto a fertilidade/maternidade,

mas como símbolos dos quais derivam a ideia de criadora do mundo, dona da

vida [...]” (OLIVEIRA, 2005 apud BRAGA et al., 2015, p.196).

Já em nossa sociedade nos deparamos com um desvio dessa

centralidade das mãos das mulheres para as dos homens. O papel de Deus

criador está sob a figura masculina. O homem, que antes desconhecia o seu

papel na reprodução, agora se coloca enquanto uma figura vital para o

processo da gestação. Eles assumem que sem eles as mulheres nada mais

podem fazer.

.... desacreditado o caráter mágico da reprodução feminina e descoberta a possibilidade de este fenômeno poder ser controlado como qualquer outro, estava desfeito o vínculo especial das mulheres com a força da vida universal, podendo os homens se colocar no centro do universo. Como portadores da semente que espalhavam nos passivos úteros das mulheres, os homens passaram a se considerar a fonte da vida (JOHNSON apud SAFFIOTI, 2004, p.121).

Constatamos as diferenças existentes entre uma sociedade primitiva e

uma sociedade moderna. Através desses exemplos a afirmativa anterior sobre

o caráter inconstante da categoria gênero é confirmada. Conforme Camurça,

Gouveia (2004):

Sendo o gênero uma construção social, ele não se apresenta sempre da mesma forma em todas as épocas e lugares, depende dos costumes de cada lugar, da experiência cotidiana das pessoas, variando de acordo com as leis, as religiões, a maneira de organizar a vida familiar, a vida política de cada

2 É significativo evidenciar que tal posição concedida à figura feminina não aponta para uma organização social com base matriarcal – ou seja, uma organização em que as mulheres detêm algum tipo de poder político, como vimos Engels abordar anteriormente – sendo preferível assumir que em tais círculos as mulheres possuíam uma determinada importância, mas que essa não presumia uma posição privilegiada em uma determinada hierarquia. Além disso, é importante ressaltar que não é possível a realização de nenhuma afirmação sobre a existência de qualquer tipo de igualdade de gênero nessas sociedades e que usá-las como exemplo só serve para destacar o caráter mutável dos símbolos atribuídos aos gêneros masculino e feminino.

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povo, ao longo da história. (CAMURÇA; GOUVEIA, 2004, p.13-14).

Mais do que isso, as relações de gênero são influenciadas pelas

contradições de classe social, questões étnico/racial e aspectos geracionais em

uma mesma sociedade e momento histórico:

As relações e as representações de gênero não variam apenas de um povo para outro, dentro de uma mesma sociedade elas também podem mudar, de acordo com a classe social da pessoa, da raça, da idade. É por isso que a situação das mulheres é muito diferente entre si, mesmo que todas elas compartilhem a vivência da discriminação e opressão. (CAMURÇA; GOUVEIA, 2004, p.13-14).

Sobre a utilização dos termos apresentados anteriormente, queremos

evidenciar a posição de Saffioti (2004), que afirma não defender o uso

exclusivo da categoria gênero em detrimento da categoria patriarcado, mas a

adesão conjunta das duas categorias. Fazendo as seguintes considerações

sobre o seu uso, admite o seguinte:

1. a utilidade do conceito de gênero, mesmo porque ele é muito mais amplo do que o de patriarcado, levando-se em conta os 250 mil anos, no mínimo, da humanidade;

2. o uso simultâneo dos conceitos de gênero e de patriarcado, já que um é genérico e o outro específico dos últimos seis ou sete milênios, o primeiro cobrindo toda a história e o segundo qualificando o primeiro ou, por economia, simplesmente a expressão patriarcado mitigado ou, ainda, meramente patriarcado;

3. a impossibilidade de aceitar, mantendo-se a coerência teórica, a redutora substituição de um conceito por outro, o que tem ocorrido nessa torrente bastante ideológica dos últimos dois decênios, quase três (SAFFIOTI, 2004, p.132).

Diante do que foi exposto sobre as duas categorias e entendendo que

tanto o termo patriarcado quanto o termo gênero possuem características importantes para a análise das opressões vivenciadas por nós mulheres,

adotaremos ao longo desse trabalho o uso de ambas as denominações, nos

referindo, dessa forma, a ordem patriarcal de gênero, conforme defende Saffioti

(2004).

Posto isso, cabe agora à discussão de maneira mais específica sobre

como as relações de gênero vêm sendo pautadas atualmente na sociedade

patriarcal. A construção das identidades de homens e mulheres, em nossa

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12 sociedade, desenvolve-se em torno de estereótipos que se baseiam na

subjugação destas por aqueles. É apresentado ainda na infância que meninos

e meninas possuem diferenças físicas, emocionais e intelectuais. Meninos são

fortes. Meninas são frágeis. Meninos são racionais, não demonstram fraqueza,

não choram. Meninas são emotivas, sensíveis. Meninos se dão bem nas áreas

que envolvem ciências, tecnologia, matemática. Meninas estão mais aptas para

atuarem em áreas que envolvam o cuidado, o ensino e que se aproximem das suas funções dentro do lar. Meninas e mulheres não possuem predisposição

para cargos de líderes, pois esses exigem firmeza, equilíbrio, características

consideradas masculinas. É socialmente esperado que as mulheres

enquadradas no padrão de feminilidade sejam afáveis, polidas, gentis,

resignadas, recatadas, que não causem desconforto, confrontem ou

questionem.

Todas essas características que diferem homens e mulheres são

comumente fundamentadas por argumentos baseados na biologia. As

diferenças fisiológicas e hormonais são usadas para legitimar preconceitos

pautados no senso comum, ignorando toda a carga sociocultural envolta

nessas relações. Conforme Camurça; Gouveia (2004):

É a partir da observação e do conhecimento das diferenças sexuais que a sociedade cria idéias sobre o que é um homem, o que é uma mulher, o que é masculino e o que é feminino, ou seja, as chamadas representações de gênero. Com isso, se estabelecem também as idéias de como deve ser a relação entre homem e mulher, a relação entre as mulheres e a relação entre os homens. Ou seja, a sociedade cria as relações de gênero. (CAMURÇA; GOUVEIA, 2004, p.12-13)

Segundo a ordem patriarcal de gênero as mulheres são menores e mais

fracas, possuidoras de menor força física e em virtude do útero e dos

hormônios liberados em seus corpos, são vistas como sujeitas a desequilíbrios

emocionais que as impedem de agir racionalmente. De acordo com esse

argumento, as mulheres devem limitar a sua participação na sociedade às suas

funções biológicas, ou seja, a maternidade. Se aos homens cabem os espaços

públicos e a função de trabalhar para prover o lar, então as mulheres, em

virtude do "dom" da gestação e a fragilidade associada a essa condição, têm

de se resumir às funções domésticas e ao cuidado e educação do(a)s filho(a)s.

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Como destaca Saffioti (1987) na obra “O poder do macho”, a sociedade

investe na naturalização do ambiente doméstico como atribuição da mulher e

associa tal atividade à maternidade. Assim como é natural para a mulher o

processo da gestação e do nascimento, deve ser natural a ela os afazeres do

lar. A autora ressalta ainda como contra argumento a esse fato a organização

de outras sociedades em torno da maternidade e da paternidade. Em algumas

tribos indígenas brasileiras, por exemplo, após o parto são as mulheres que voltam ao trabalho, enquanto os homens repousam. Percebemos, com isso, o

peso das construções sociais sobre os papéis atribuídos aos homens e

mulheres e a maternidade e paternidade, reforçando o argumento que indica

que aquilo que vemos hoje ser associado à masculinidade e a feminilidade

podem facilmente mudar de acordo com tempo e o lugar que observamos.

Outro discurso usado para reforçar padrões e fundamentar a dominação

masculina sobre as mulheres é o argumento da tradição cristã vinculado ao

pecado original. Eva, a primeira mulher, feita a partir de uma costela do

primeiro homem criado, Adão, induzida pela Serpente convence seu parceiro a

desobedecer às ordens divinas, fazendo-os ser amaldiçoados por Deus e

expulso do paraíso.

E à mulher disse: Multiplicarei grandemente a dor da tua conceição; em dor darás à luz filhos; e o teu desejo será para o teu marido, e ele te dominará. E ao homem disse: Porquanto deste ouvidos à voz de tua mulher, e comeste da árvore de que te ordenei dizendo: Não comerás dela; maldita é a terra por tua causa; em fadiga comerás dela todos os dias da tua vida. Ela te produzirá espinhos e abrolhos; e comerás das ervas do campo. Do suor do teu rosto comerás o teu pão, até que tornes à terra, porque dela foste tomado; porquanto és pó, e ao pó tornarás (BÍBLIA, Gênesis, 3, 16-19).

É aqui que surge a ideia de que a mulher é ardilosa, perigosa,

manipuladora e que o homem deve sempre vigiar para não cair nessas

artimanhas. Além disso, como indica Badinter (1985), recai sobre a mulher

características que denunciam a sua fraqueza diante das vaidades e tentações

do mundo, sendo culpada pela infelicidade de seu companheiro. À vista disso

ocorre:

A estigmatização da mulher (como dissimulada, portanto há necessidade de ser tutelada) através de dogmas religiosos reforça sua submissão aos interesses dos homens, limitando-a ao espaço privado, confinada aos trabalhos domésticos e aos

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cuidados dos filhos, submetida ao poder do pátria (CASTRO; GONÇALVES, 2015, p. 274).

O castigo da mulher é a sua sujeição, devendo permanecer tutelada

sobre a figura do homem e se resignar assumindo posturas que edifiquem a ele

e a sua família. Como oportunidade para se redimir do seu pecado, a mulher

tem como alternativa resignar-se em Maria, tornando-se obediente, casta,

dedicada e serva das vontades alheias a ela própria. As mulheres dividem-se então em pecadoras ou santas. Aquelas que se afastam do domínio dos

homens e se atrevem como Eva a desobedecê-los e agirem por sua vontade

são sumariamente rechaçadas. As que se aproximam do arquétipo de Maria e

cumprem o papel que lhes é imposto, de submeter-se ao poderio masculino,

são ovacionadas e recompensadas.

Assim somos divididas entre mocinhas e vilãs, ou ainda entre “umas” e “outras”. A “outra” é a figura muitas vezes desumanizada que proporciona

prazer ao homem sem qualquer reconhecimento ou vantagem social, ou seja,

não ganha títulos que possam ser exibidos em público como o de esposa ou

companheira como é concedido a “uma”. O que Saffioti (1987) destaca é que

nenhuma das duas desfruta de qualquer vantagem e mesmo a sociedade

querendo mostrar que são diferentes elas não passam de dois iguais que diferem apenas dos homens aos quais se submetem (SAFFIOTI, 1987). No

imaginário social existe o lugar da mulher para casar e o lugar da mulher para

uma noite. A mulher que possui liberdade e autonomia sobre seu corpo e suas

relações é comumente vista como uma mulher com menor valor, pois é

justamente mais difícil para o homem manter seu domínio sobre ela, tendo então que atribuir a essas, características negativas. Percebe-se uma tentativa

da sociedade de gerar uma competição entre as mulheres, fazendo-as achar

que são inimigas na busca pelo reconhecimento dos homens.

Outro ponto importante quando falamos de uma ordem patriarcal de

gênero e do lugar das mulheres e do feminino no mundo é a divisão sexual do

trabalho, no qual todo trabalho que permeia a maternidade e o cuidado do(a)s

filho(a)s é considerado como próprio das mulheres. A característica central

desse conceito é a:

designação prioritária dos homens à esfera produtiva e das mulheres à esfera reprodutiva e, simultaneamente, a

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apropriação pelos homens das funções com maior valor social adicionado... (HIRATA; KERGOAT, 2007, p.599).

Além disso, ela se estrutura em dois princípios organizadores: o primeiro

baseado na separação, em que existe o trabalho de homem e o trabalho de

mulher. E o segundo que tem base na hierarquia, em que o trabalho do homem

vale mais do que o trabalho da mulher. Como mostrado anteriormente essa

divisão também encontra bases no argumento construído em torno do sexo biológico em detrimento do gênero, fazendo com que as práticas sociais se

escrevam por meio de papéis que remetem ao destino natural do homem e da

mulher (HIRATA; KERGOAT, 2007).

...torna-se então coletivamente “evidente” que uma enorme massa de trabalho é efetuada gratuitamente pelas mulheres, que esse trabalho é invisível, que é realizado não para elas mesmas, mas para outros, e sempre em nome da natureza, do amor e do dever materno (HIRATA; KERGOAT, 2007, p.598).

Vemos que trabalhos desenvolvidos por mulheres costumam valer

menos do que os mesmos trabalhos desenvolvidos por homens, assim como

profissões ditas masculinas recebem mais do que as que ocupam áreas

consideradas femininas. São exemplos de cursos ditos femininos a Pedagogia, o Serviço Social e a Enfermagem. Já entre os masculinos, o Direito, a

Engenharia e a Medicina. Reparamos igualmente que os cursos que costumam

ter mais prestígio dentro das Universidades tendem a ser predominantemente

ocupados por homens, é o caso das áreas voltadas para a tecnologia e

ciências exatas.

Constatamos uma desvalorização do trabalho feminino. O trabalho

doméstico permanece majoritariamente sendo executado por mulheres, que

mesmo estando presente no mercado de trabalho, continuam a desempenhar

as duas atividades simultaneamente. A sociedade capitalista e patriarcal não

dá o valor devido ao trabalho doméstico e nega o seu lugar de importância

dentro da produção de capital.

É importante destacar que há uma parcela de mulheres que contam com

duplas ou triplas jornadas de trabalho, mas há também as que possuem o

privilégio de delegar as atividades domésticas a outro, ou como é mais comum,

a outra. Normalmente essa delegação de atividade é feita para mulheres em

situação sócio-econômica precária, pois como sabemos, o trabalho doméstico

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16 quando pago é uma atividade mal remunerada. Há então uma diferença muito

clara entre a jornada de trabalho das mulheres das classes trabalhadoras e a

jornada de trabalho das mulheres burguesas, da mesma forma, como há uma

diferença dos níveis de opressão que essas mulheres sofrem.

Chegamos, desse modo, à maternidade, parte do trabalho doméstico,

que é delegado exclusivamente às mulheres e que tem peso muito maior do

que o atribuído à paternidade. A maternidade, assim como o gênero, é uma construção, um papel social desempenhado pelas mulheres cujos valores são

atribuídos a partir de uma visão de ordem biológica sobre o que uma mãe deve

ou não ser, deve ou não fazer. Mais do que isso, é um atributo compulsório.

Numa sociedade patriarcal, a maternidade estaria inscrita na essência de todas

as mulheres. De acordo com essa ideologia, todas nós nascemos para sermos

mães e esse aparece como um desejo inerente a nossa condição. Não existe

para nós liberdade reprodutiva. Aquelas que teimam em exercer tal liberdade e

se recusam a cumprir o destino que a natureza as reservou são taxadas de

egoístas, acusadas de estar traindo a sua biologia e pior, se recusando a

aceitar o dom que lhe foi concedido, ignorando a sua predisposição para o

cuidado do(a) outro(a), a subserviência.

É ditado quando devemos ter filho(a)s, quantos devemos ter e como

deve ser a nossa postura enquanto mães. Claro, para a sociedade não basta

que a mulher cumpra o seu papel de reprodutora biológica, de gerar vida,

temos que fazê-lo de acordo com seus ideais. Devemos ser boas mães. Mães

que abdiquem dos seus desejos, das suas vontades em prol do bem-estar

do(a) filho(a). Quem nunca ouviu, ou até mesmo proferiu, a famosa frase: ser mãe é padecer no paraíso? É tecido na cabeça das mulheres que a

maternidade é um sofrimento que traz satisfação, uma dor que se compensa,

pois quem mais possui a capacidade de resignação necessária a essa função

se não nós, mulheres? É apontado que na natureza feminina está contido uma

espécie de amor, que difere de qualquer outro tipo.

O amor materno foi concebido por tanto tempo em termos de instinto que acreditamos facilmente que tal comportamento seja parte da natureza da mulher, seja qual for o tempo ou o meio que a cercam. [...] Sendo a procriação natural, imaginamos que aos fenômenos biológico e fisiológico da

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gravidez deve corresponder tal atitude maternal (BADINTER, 1985, p.20).

É esse amor imutável, incondicional, altruísta. A mãe ama independente

do que recebe em troca, seu sentimento não se modifica pelo tempo ou pela

distância e existe antes mesmo do nascimento, a partir do momento em que o

bebê ainda feto, se encontra crescendo em seu corpo. Elisabeth Badinter

discorda dessas afirmações; em “Um amor conquistado: o mito do amor materno” a autora rebate os argumentos que insistem em naturalizar o amor

das mães por seus(suas) filho(a)s como algo universal e inerente a todas as

mulheres, independentemente das condições. Com isso ela não quer dizer que

o amor materno não exista, mas que como qualquer outro sentimento precisa

de alguns requisitos para aflorar e que não necessariamente faça parte da

realidade de todas nós.

Quanto a mim, estou convencida de que o amor materno existe desde a origem dos tempos, mas não penso que exista necessariamente em todas as mulheres, nem mesmo que a espécie só sobreviva graças a ele. Primeiro, qualquer pessoa que não a mãe (o pai, a ama, etc.) pode “maternar” uma criança. Segundo, não é só o amor que leva a mulher a cumprir seus “deveres maternais”. A moral, os valores sociais, ou religiosos, podem ser incitadores tão poderosos quanto o desejo da mãe. É certo que a antiga divisão sexual do trabalho pesou muito na atribuição das funções da “maternagem” à mulher, e que, até ontem, esta se afigurava o mais puro produto da natureza. [...] O amor materno é apenas um sentimento humano. E como todo sentimento é incerto, frágil e imperfeito. Contrariamente aos preconceitos, ele talvez não esteja profundamente inscrito na natureza feminina. Observa-se a evolução das atitudes maternas, constata-se que o interesse e a dedicação à criança se manifestam ou não se manifestam (BADINTER, 1985, p.17-22).

Badinter (1985) aborda as mães da sociedade francesa de meados do

século XVIII, onde o hábito de entregar os bebês a amas de leite era

comumente utilizado por mulheres de todas as classes sociais. Nessa tradição,

os bebês logo que nascidos saíam do lado das suas mães para serem

amamentados por amas. As mulheres que possuíam nível social mais alto e

melhores condições financeiras pagavam criadas para ficar a sua disposição

em tempo integral para acompanhar o(a)s filho(a)s e amamentá-lo(a)s em suas

próprias residências. Já aquelas menos abastadas enviavam seus(suas)

filho(a)s para longe para serem amamentado(a)s por completas

desconhecidas. As crianças permaneciam com as amas até atingirem idade

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18 entre 4 e 5 anos, isso quando as crianças não morriam em decorrência dos

cuidados precários que recebiam – o que não gerava muita comoção da

família, que não hesitava em enviar o próximo herdeiro novamente para longe.

Mesmo as mães cujo(a)s filho(a)s permaneciam sobre o mesmo teto não

tinham o costume de dedicar-lhes o seu tempo, o que mostra que há uma

nítida diferença da posição das mulheres para com as crianças e daquilo que

era socialmente aceito. Hoje não é possível que uma mulher tome tal posição sem que seja acusada de irresponsável.

A preocupação com a condição da criança transforma-se ao longo dos

anos e ao final do século XVIII e início do século XIX3, já nós deparamos com

outra forma de lidar com esses pequenos indivíduos e suas necessidades.

Como nos mostra Badinter (1985, p.159) a criança muda de condição e

assume um potencial valor mercantil.

Como o senso da previsão e da antecipação se havia desenvolvido nos homens do fim de século, não se via mais na criança o fardo que ela representava a curto prazo, mas a força de produção que encarnava a longo prazo. Ela se transforma num investimento lucrativo para o Estado, que seria tolice e "imprevidência" negligenciar. Essa nova visão do ser humano em termos de mão-de-obra, lucro e riqueza, é a expressão do capitalismo nascente.

Em conjunto com essas transformações temos uma modificação

também da maternidade que ganha outro significado. Nos séculos citados há

uma grande valorização da amamentação, a figura da mãe passa a ter um

papel central na manutenção da vida e da saúde da criança e em sua educação. Dessa maneira:

Enriquecida de novos deveres, ela [a maternidade] se desdobrava além dos nove meses irredutíveis. Não só o trabalho materno não se podia concluir antes que a criança estivesse fisicamente fora de perigo, como logo se descobriu que a mãe devia igualmente assegurar a educação dos filhos e uma parte importante de sua formação intelectual (BADINTER, 1985, p.237).

Simone de Beauvoir na obra “O segundo sexo”, com a célebre frase

“ninguém nasce mulher: torna-se mulher” (BEAUVOIR, 2016, p.11), traz à tona 3 Nos séculos XVIII e XIX é datado o inicio da revolução industrial que tem por base um novo modo de produção de mercadorias que está ancorado na utilização de novas tecnologias em detrimento do manuseio artesanal – esse período inaugura a ascensão do capitalismo e as transformações na condição da criança, a qual Badinter (1985) se refere.

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19 o debate sobre a desconstrução do destino biológico atribuído à figura

feminina, argumentando que tudo aquilo que circunscreve o ser mulher é uma

construção da sociedade que baseia a identidade feminina na submissão ao

outro. Podemos afirmar que é através dessa construção e da criação do mito

do instinto materno que se baseia a exclusão das mulheres mães dos espaços

públicos. Como nos mostra Beauvoir (2016, p.277):

É precisamente o filho que, segundo a tradição, deve assegurar à mulher uma autonomia concreta que a dispense de se dedicar a qualquer outro fim. Se como esposa não é um indivíduo completo, ela se torna esse indivíduo como mãe: o filho é sua alegria e sua justificação. É por ele que ela acaba de se realizar sexual e socialmente; é, pois, por ele que a instituição do casamento assume um sentido e atinge seu objetivo.

Dessa forma, a mulher após ter filho(a)s não deve assumir

compromissos que a impeçam de garantir a educação e segurança desse(a)s.

“Não se pode ser mãe e outra coisa. O oficio materno não deixa um segundo

livre à mulher” (BADINTER, 1985, p.254). Aquelas que tentem fugir a isso

encontram no seu caminho barreiras, dificuldades e julgamentos. Não é

oferecido a elas alternativas para conciliarem a vida pública e privada. Por se

tratar de um ideal completamente banalizado, as mulheres mães são

invisibilizadas. Para a sociedade a mulher ainda deve priorizar o(a)s filho(a)s) e

a casa em detrimento de si mesma. É permitido hoje que a mulher ocupe

alguns espaços públicos, mas que não abandone as suas tantas outras

funções dentro do espaço doméstico.

Além disso, o sucesso e o fracasso do(a)s filho(a)s são intimamente

relacionado(a)s às mães. A sociedade as responsabiliza por traumas e

problemas desenvolvidos por esse(a)s.

...o filho será o sinal e o critério da sua virtude ou de seu vício, de sua vitória ou de seu fracasso. A boa mãe será recompensada e a má será punida na pessoa do filho. Uma vez que "o filho vale tanto quanto a mãe" e que a influência desta é absolutamente determinante, só depende dela que seu filho seja um grande homem ou um criminoso (BADINTER, 1985, p. 272).

Mesmo encontrando hoje uma mudança na participação e relação dos

homens com a paternidade a sociedade não atrela a esses a mesma responsabilidade. Badinter (1985) afirma que é bem vista a participação dos

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20 homens na criação do(a)s filho(a)s, mas que não é reservado para aqueles que

não fazem essa opção o mesmo julgamento que destinam as mães pouco

dedicadas, pois é ainda concebido que os cuidados com a criança é uma tarefa

destinada à mulher e que o pai é “antes seu colaborador do que seu associado

em igualdade de condições e, finalmente, de que a sua participação é menos

necessária, ou mais acessória” (BADINTER, 1985, p.286). Assim sendo, uma

mulher não pode nunca, sem ser julgada, optar por não ser a protagonista da criação do(a)s filho(a)s.

Diante do exposto, observamos que os obstáculos enfrentados por nós

mulheres para descontruir os símbolos e qualidades atribuídos a nós e

ocuparmos o lugar de protagonistas em nossas próprias vidas têm sido

inúmeros. O patriarcado tem buscado incansavelmente estratégias para nos

manter reclusas aos ambientes domésticos. O capitalismo alia-se a ele na

tentativa de lucrar ainda mais com a exploração de nossa força de trabalho,

tornando invisível todas as atividades aos quais nos dedicamos, como se elas

também não servissem a manutenção de seus interesses. Frente a isso, as

mulheres buscaram historicamente estratégias de combate às opressões e

explorações às quais estão sujeitas, dando forma àquilo que conhecemos por movimentos feministas, que lutam pela liberdade das mulheres e a construção

de novas identidades mais equitativas para todos. É desses movimentos que

trataremos no próximo item desse trabalho, discutindo a trajetória do

feminismo, a construção das lutas pelos direitos das mulheres e à maternidade

e os desafios e possiblidades enfrentados por essas.

2.2. OS MOVIMENTOS FEMINISTAS NAS LUTAS PELOS DIREITOS DAS MULHERES E À MATERNIDADE.

Os movimentos feministas se apresentam historicamente enquanto

alternativa de enfrentamento às desigualdades sofridas por nós, mulheres. São

movimentos sociais emancipatórios, em cuja organização encontramos uma

forma de levantar a nossa voz diante das opressões cotidianas. Ao longo da

história, várias foram aquelas que não se contentaram com a condição que

lhes era imposta e se opuseram contra aqueles que insistiam em cercear sua

liberdade, pagando por esse ato de coragem um preço muito caro (PINTO,

2010). Acusadas de bruxas, algumas foram queimadas, enforcadas e

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21 torturadas por transgredir as ordens da igreja e dos homens, provando, dessa

maneira, que a condição de subalternidade que as determinava nunca lhes foi

inata e que muitas mulheres a negaram mesmo que isso as custasse às

próprias vidas.

O termo feminismo em si é novo, o conceito só foi empregado no ano de

1911, nos Estados Unidos, para substituir as “expressões utilizadas no século XIX tais como movimento das mulheres e problemas das mulheres...”

(GARCIA, 2011, p.12, grifos do autor). O feminismo pode ser definido

enquanto:

...a tomada de consciência das mulheres como coletivo humano, da opressão, dominação e exploração de que foram e são objetos por parte do coletivo de homens no seio do patriarcado sob suas diferentes fases históricas, que as move em busca da liberdade de seu sexo e de todas as transformações da sociedade que sejam necessárias para este fim. Partindo desse princípio, o feminismo se articula como filosofia política e, ao mesmo tempo, como movimento social. (GARCIA, 2011, p.13)

Mesmo diante dessa parcela de mulheres que subvertiam a ordem social imposta, a primeira manifestação organizada daquilo que conhecemos

por feminismo aconteceu nas últimas décadas do século XIX, na Inglaterra – ao

que chamamos de primeira onda do feminismo.

A luta pelo sufrágio feminino foi a primeira amostra de reinvindicação de

direitos organizados por mulheres, seu objetivo era estender ao público

feminino o direito ao voto, que até então só era concedido aos homens. “As sufragetes, como ficaram conhecidas, promoveram grandes manifestações em

Londres, foram presas várias vezes, fizeram greves de fome” (PINTO, 2010,

p.15, grifo do autor). Em 1918, 21 anos depois da fundação da União Nacional

pelo Sufrágio Feminino, foi conquistado o direito ao voto no Reino Unido. Como

aponta Garcia (2011) mesmo que o movimento tenha adquirido

reconhecimento na reinvindicação ao voto feminino, a luta das sufragistas ia além e buscava igualdade entre homens e mulheres em todos os aspectos

“apelando à autêntica universalização dos valores democráticos e liberais”

(GARCIA, 2011, p.58). Essas viam no voto um primeiro passo para

modificações mais profundas de sua posição na sociedade, consideravam as

instituições políticas um espaço importante, no qual era imprescindível a

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22 ocupação e participação feminina. Ademais, “o voto era um meio de unir as

mulheres de opiniões políticas e classes sociais muito diferentes, já que todas

estavam excluídas por serem mulheres” (GARCIA, 2011, p.58-59).

No Brasil, a luta pelo sufrágio feminino se iniciou com a liderança de

Bertha Lutz e se consolidou em 1932 com a promulgação do direito ao voto

feminino no Novo Código Eleitoral Brasileiro (PINTO, 2010). Outras figuras

também somaram para construção de uma nova realidade para as mulheres. Nísia Floresta, por exemplo, marcou a educação igualitária e chegou a fundar

uma escola em que os currículos eram iguais para ambos os gêneros (BRABO

et. al., 2015). Nísia, anterior a Bertha, foi uma das pioneiras a se posicionar

pelo direito das mulheres.

Em sua segunda onda, o feminismo traz como marco teórico para a sua

nova fase a obra de Simone de Beauvoir, “O segundo sexo” – citada no item

anterior desse trabalho, lançado em 1949, que inicia o debate sobre a

construção social do ser mulher. Nessa segunda fase, na década de 1960, o

feminismo contesta “pela primeira vez [...] a questão das relações de poder

entre homens e mulheres”, (PINTO, 2010, p.16) debatendo um número mais

amplo de questões, tais como: sexualidade, direitos reprodutivos, trabalho, violência sexual e doméstica, entre outros. Observamos que esse momento

difere em muito da primeira onda, que estava inclinada sobre um número mais

reduzido de questões e circulava em torno dos aparatos legais que restringiam

a igualdade entre homens e mulheres.

No Brasil, é na década de 1970, no meio de um regime militar, que

constatamos os primeiros passos do feminismo enquanto movimento político organizado, quando mulheres “saíram às ruas na campanha pela anistia,

contra a violência e contra a carestia” (BRABO et. al., 2015, p.309).

Observamos que diferente de outros países, a conjuntura que as mulheres

encontravam no Brasil não era muito favorável, nem para elas nem para

qualquer movimento libertário, que era visto pelo governo ditador como um

perigo a ordem. Durante esse período algumas das mulheres exiladas do Brasil

pela ditadura se aproximaram do feminismo Europeu, fato que não foi bem

visto por seus companheiros que entendiam essa proximidade como uma

secundarização da pauta pela redemocratização – o que mostra que os

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23 homens, mesmo aqueles vinculados a grupos pela emancipação, não

compreendiam a importância e a relação da luta das mulheres com a luta pela

queda da ditadura (PINTO, 2010) Os atos organizados pelas mulheres só se

aprofundaram mais tarde na década seguinte com a queda da ditadura e a

volta da democracia, o que possibilitou a mobilização para o debate da

situação das mulheres brasileiras a fim de levantar demandas para serem

defendidas na construção da Constituinte (BRABO et. al., 2015).

É apenas durante os anos de 1980 que vemos as primeiras expressões

daquilo que seria a segunda onda do feminismo no Brasil (PINTO, 2010).

...o feminismo no Brasil entra em uma fase de grande efervescência na luta pelos direitos das mulheres: há inúmeros grupos e coletivos em todas as regiões tratando de uma gama muito ampla de temas – violência, sexualidade, direito ao trabalho, igualdade no casamento, direito à terra, direito à saúde materno-infantil, luta contra o racismo, opções sexuais (PINTO, 2010, p.17).

Apesar do feminismo mundialmente ter sua origem em grupos de

mulheres de classes mais privilegiadas, no Brasil, esse fato não impediu que os

grupos e coletivos formados aqui tivessem uma aproximação com as classes populares e as suas demandas, o que trouxe para o movimento novas ações,

discursos e percepções para ambos os lados (PINTO, 2010).

Nos anos 1990 nos deparamos com um avanço do Estado ao que diz

respeito às políticas pró-gênero, da criação de instituições e leis especificas

para as mulheres e suas demandas (BRABO et. al., 2015). Conforme nos

explica Brabo et. al. (2015) apoiando-se em Blay (1984), as mulheres

brasileiras se organizaram e passaram a agir contra as decisões do poder que

pudessem afetar suas vidas, se organizaram para construir um novo espaço

público do qual também fazem parte e questionaram as omissões das

instituições e organizações, e as discriminações difundidas e naturalizadas pela

sociedade machista, seja na mídia ou nas instituições de ensino. Nós ganhamos espaço no mercado de trabalho, nas instituições de ensino, já

chegamos a ser maioria nas Universidades e Instituições de Ensino Superior,

os coletivos de jovens feministas ganharam força e as articulações entre as

mulheres para mobilização por direitos cresceram.

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Apesar desses avanços, os movimentos feministas brasileiros ainda se

deparam com inúmeros desafios. Nós mulheres ainda sofremos

constantemente ataques aos nossos direitos, ainda nos deparamos com

diferenças dos salários entre homens e mulheres que ocupam o mesmo cargo;

nós ainda aparecemos majoritariamente como responsáveis pelas atividades

domésticas e o cuidado com o(a)s filho(a)s, somando, dessa maneira, duplas

ou triplas jornadas; poucas ocupam cargos de chefia e se concentram ainda nas profissões ditas femininas, que culturalmente recebem remunerações mais

baixas; são alvos da violência doméstica e do feminicidio, que possuem

números alarmantes; ainda brigamos para ter o direito ao aborto seguro e legal

para não morrer em camas de clínicas clandestinas. Vemos que todas essas

pautas estavam em questão nos grupos organizados nos anos 1980 e que

hoje, 37 anos depois, ainda nos vemos lutando para garantir esses direitos e,

mais, para não ter outros direitos cerceados. Como exemplo, podemos citar a

avaliação feita na II Conferência Nacional do I Plano Nacional de Políticas para

as Mulheres – realizada em Brasília no ano de 2007 – em que as principais

demandas em relação à institucionalização destas políticas e a sua

implementação foram apontadas por mais de 200 mil mulheres:

i) a inexistência de organismos de políticas para as mulheres em inúmeros governos estaduais e na maioria dos governos municipais; ii) o baixo orçamento para as políticas para as mulheres; iii) a criminalização do aborto; iv) a falta de dados e informações estratégicos para a tomada de decisões; v) a baixa incorporação da transversalidade de gênero nas políticas públicas; vi) a ausência de compartilhamento, entre mulheres e homens, das tarefas do trabalho doméstico e de cuidados; e vii) maior participação das mulheres nos espaços de poder e decisão. (BANDEIRA; MELO, 2010, p.41)

No Brasil contamos ainda com um crescente conservadorismo advindo

dos setores mais religiosos da política que se mobilizam constantemente para

embarreirar direitos e avanços no campo da igualdade de gênero. Ademais, o

avanço do neoliberalismo mina as políticas públicas e torna as ações cada vez

mais precarizadas e pontuais. Nesse sentido, Alvarez (2000) destaca a

ausência de políticas de gênero desenvolvidas pelo Estado.

O Estado muito fala de gênero e pouco faz para empoderar as mulheres [...] Apesar do papel importante das reivindicações feministas, tanto locais quanto globais para a promoção das normas nacionais e internacionais de gênero que indiretamente inspiram esses modernos discursos estatais pró-gênero, a

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incorporação das mulheres ao desenvolvimento nem sempre se inspirou no feminismo e sim nos pressupostos do capitalismo global. O que podemos constatar, no plano geral, é que os Estados modernos que se dizem receptivos à questão de gênero, ao mesmo tempo, promovem políticas públicas que pouco têm a ver com a equidade e com as demandas feministas (ALVAREZ, 2000, p.7 apud BRABO et. al. 2015, p.306-307).

Para se atingir verdadeiramente a equidade entre homens e mulheres

ainda teremos de trilhar um árduo e longo caminho, pois os desafios que

cercam os movimentos feministas não só no Brasil, mas no mundo, são

inúmeros e perpassam por questões culturais baseadas em valores machistas,

racistas e LGBTfóbicos (lesbofóbicos, homofóbicos, bifóbicos, transfóbicos), delegando para essas “minorias” a ausência de direitos civis, políticos, sociais

e humanos.

No que tange à pauta dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres

temos algumas considerações a fazer. O termo “direitos sexuais e

reprodutivos” foi formalizado, como mostra Diniz (2013) no “I Encontro

Internacional de Saúde da Mulher”, que se passou em Amsterdã, no ano de

1984. De acordo com a ONU (1994, parágrafo 7.3), os direitos sexuais e

reprodutivos estão ancorados:

...no reconhecimento do direito básico de todo casal e de todo indivíduo de decidir livre e responsavelmente sobre o número, o espaço e a oportunidade de ter filhos e de ter a informação e os meios de assim o fazer, e o direito de gozar do mais elevado padrão de saúde sexual e reprodutiva. Inclui também seu direito de tomar decisões sobre a reprodução, livre de discriminação, coerção ou violência, conforme expresso em documentos sobre direitos humanos (ONU, 1994, parágrafo 7.3 apud DINIZ 2013, p.158).

Mais tarde essa definição relatada no Programa de Ação de Cairo foi reafirmada na IV Conferência Internacional sobre a Mulher, realizada em 1995,

em Beijing, na China, ratificando a importância da autonomia da mulher sobre

seu corpo e do seu poder de decidir sobre a sua sexualidade e as questões

que a ela se relacionem, bem como a divisão da responsabilização entre

homens e mulheres (ou entre companheiro(a)s ainda que do mesmo

sexo/gênero) pelos comportamentos sexuais e as suas consequências (DINIZ, 2013).

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O debate sobre o aborto, por exemplo, é uma das pautas de suma

importância para se pensar os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres e

um ponto que não conseguimos alcançar ainda. É forte a negação a qualquer

custo do direito a escolha das mulheres de seguir ou não com uma gestação

indesejada. Percebemos o patriarcado agindo sobre a sexualidade feminina e

podando a autonomia das mulheres. Quando uma mulher engravida é vedada

a ela a interrupção da gravidez. Por vezes, a gestação é vista enquanto obrigação, uma responsabilidade adquirida durante a “opção” dessa mulher de

viver e expressar a sua sexualidade, ou seja, de optar ou não por ter relações

sexuais. Se por um lado, a conquista dos métodos contraceptivos inaugurou

uma nova fase da sexualidade feminina e possibilitou a separação da

maternidade da sexualidade, por outro trouxe a responsabilização da mulher

pelo uso desses métodos e suas possíveis falhas; o que hoje em dia se coloca

enquanto uma das pautas do feminismo é a desconstrução dessa

responsabilização e reafirmação da necessidade da legalização do aborto.

As razões práticas invocadas contra o aborto legal não tem nenhum peso; quanto às razões morais, reduzem-se ao velho argumento católico: o feto possui uma alma a que se veda o paraíso, suprimindo-o antes do batismo É de observar que a Igreja autoriza ocasionalmente a morte de homens feitos: nas guerras ou quando se trata de condenados a morte; reserva porém ao feto um humanitarismo intransigente (BEAUVOIR, 2016, p.281).

É notório hoje em dia a permanência dos mesmos traços que a autora

Simone de Beauvoir apresenta em seus argumento no segundo volume de “O segundo sexo” no discurso conservador brasileiro. É comum vermos aqueles

mesmo indivíduos que praguejam sobre a mulher que aborta serem

completamente favoráveis a instituição da pena de morte no país, aplaudirem o

genocídio da população negra nas periferias, a higienização das cidades por

meio do massacre a população de rua ou argumentarem a favor da “justiça”

feita com as próprias mãos quando a população prende e espanca em postes

públicos acusados de violar. Observamos nesse discurso que tais pessoas não

prezam verdadeiramente pela vida, ao contrário, elas prezam pela manutenção

da sujeição da mulher e do seu corpo ao Estado e à Igreja. É ignorado nesses

argumentos o índice de falha dos contraceptivos, o alto número de mulheres

pobres mortas em verdadeiros abatedouros que são as clínicas clandestinas de aborto. Fica claro, como argumenta Faria (2013), que não é garantida a

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27 laicidade do Estado e o reconhecimento do “direito das mulheres a decisões

livres e autônomas” (FARIA, 2013, p.185).

A maternidade – tema imprescindível para os pressupostos desse

trabalho – teve o seu debate dentro do feminismo iniciado entre o fim dos anos

1960 e metade dos anos 1980, quando ocorriam mudanças nas sociedades

ocidentais do pós-guerra que passavam pela aceleração da industrialização e

da urbanização, a crescente inserção das mulheres no mercado de trabalho e a possibilidade do controle da fecundidade por meio de contraceptivos, tal como

a pílula (SCAVONE, 2001, p.137).

Todos esses fatores contribuíram para o início da discussão sobre o

papel da maternidade na vida das mulheres, principalmente aqueles que dizem

respeito às novas tecnologias reprodutivas que trouxeram como contribuição

uma mudança no perfil da prática social da maternidade (SCAVONE, 2001).

Durante a segunda onda do feminismo e na emergência do questionamento do

determinismo biológico surgem os primeiros questionamentos sobre a forma

que a maternidade vinha sendo abordada. Como vimos no ponto anterior a

maternidade era vista como destino, um dom divino concedido a todas nós.

Iniciava-se, assim, o questionamento sobre esse determinismo e vinha à tona o caráter social da construção da maternidade. A crítica feminista apontava a

maternidade como um “elemento-chave para explicar a dominação de um sexo

sobre o outro” (SCAVONE, 2001, p.138), era esse elemento que reservava as

mulheres o enclausuramento ao ambiente doméstico. Com o início desse

debate e com a chegada de mecanismos de contracepção como a camisinha, a

pílula e o DIU, inaugura-se a oportunidade de negar a maternidade ou adiá-la o quanto quisermos. Afirmamos que não precisamos mais ser mães para nos

sentir completas ou felizes, que não dependemos mais desse fato para nos

sentirmos mais mulheres.

Como o âmbito dos movimentos feministas não é caracterizado por uma

homogeneidade de correntes ou ideias, mas sim pela pluralidade de

pensamentos sobre um mesmo tema, temos algumas concepções diferentes

sobre a maternidade. Segundo Scavone (2001), na emergência do debate sobre a maternidade temos inicialmente, no campo do movimento feminista

igualitário, o reconhecimento da maternidade enquanto um “handicap” ou

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28 “defeito natural”: uma parte da fisiologia feminina que a aprisiona ao ambiente

doméstico e consequentemente condiciona a sua submissão aos homens.

Logo, segundo essa corrente, ao renunciar a maternidade as mulheres

estariam rompendo com aquilo que é imposto pela sociedade patriarcal,

possibilitando para si novos caminhos.

Ainda conforme Scavone (2001), com o passar do impacto que a recusa

da maternidade acarretou, surgiram questionamentos dentro do movimento feminista sobre a validade do apagamento dessa parte da nossa identidade, se

realmente queríamos ser definidas sem a maternidade. Dentro desses

questionamento, surge sob a ótica da corrente do feminismo diferencialista a

negação do “handicap”. A maternidade passa então – ao contrário do que

ocorre dentro da corrente do feminismo igualitário – a ser valorizada e

“considerada como um poder insubstituível, o qual só as mulheres possuem e

os homens invejam” (IRIGARAY, 1981 apud SCAVONE, 2001, p.140).

Há uma tendência dentro dessa concepção, que inclusive vem se

espalhando atualmente, que é a de reconectar a mulher ao seu sagrado

feminino. É enaltecido o útero, os hormônios femininos, os ciclos menstruais e

a sua relação com a natureza. Há uma tentativa de restabelecer uma ligação entre a mulher e a gestação baseada na supervalorização do parto natural, da

amamentação, do vínculo mãe/bebê, entre outras coisas. Entende-se que tais

fatores tenham a sua importância para a criança e para a aceitação da mulher

com o seu corpo, mas que não deve ser abandonada a crítica ao

estabelecimento de novos padrões aos quais as mulheres e as mães têm de se

adequar para ter a sua mulheridade e maternidade reconhecidas.

Depois da afirmação da maternidade enquanto “defeito natural” e da

negação desse “defeito” dentro de algumas correntes do feminismo, temos,

finalmente, no terceiro momento da discussão da maternidade sob a perspectiva dos estudos de gênero, a desconstrução do “handicap”. Esse

terceiro momento mostra como o fato biológico da reprodução não determina a

posição social das mulheres, são as relações de dominação que atribuem um

significado social à maternidade (SCAVONE, 2001).

Apesar da crítica feminista ter partido da constatação da diferença biológica entre os sexos, considerando-a um defeito,

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ela acaba mostrando que a dominação de um sexo sobre o outro só pode ser explicada social e não biologicamente (FERRAND; LANGEVIN, 1990 apud SCAVONE, 2001, p.141).

É esse fator que queremos afirmar aqui, a maternidade e as práticas que

a circunscrevem nada mais são do que construções sociais que se modificam

constantemente na sociedade, como vimos Badinter (1985) afirmar no item

apresentado anteriormente. É desse pressuposto que partiremos para analisar a figura da mãe na nossa sociedade.

Percebemos que hoje cada vez mais mulheres têm optado por adiar a

maternidade ou até mesmo não ver essa como opção. Em dados da Sociedade

Civil Bem-Estar e Família no Brasil (BENFAM) e da Pesquisa Nacional de

Demografia e Saúde (PNDS) de 1997, Scavone (2001) mostra que entre as

mulheres brasileiras com idade entre 20 e 29 anos aproximadamente 24,3% já passaram por procedimento de esterilização, entre esse número 24% já

possuíam dois filhos e 3% possuíam um filho. Ainda segundo a mesma autora,

em pesquisa realizada pela Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados

(Fundação SEADE) de 1993, no Estado de São Paulo, as mulheres que têm

filhos entre as idades de 20 e 29 anos chega a 58,4% do número total da

população pesquisada, já as que optam por ter filhos entre os 35 e 39 anos chega a 6,5% dessa mesma população.

O número de filho(a)s também vem mudando, o que antes era expresso

por famílias numerosas chegando a até mais de três crianças, hoje é visto em

famílias pequenas com no máximo dois filho(a)s por casal. Segundo

BANDEIRA; MELO (2010) foi verificada na realidade brasileira uma expressiva

queda da taxa de fecundidade da população que passou de 5,8 filhos/as por

mulher em 1970 para 1,89 em 2008.

Alguns fatores provavelmente vêm interferindo na taxa de fecundidade

das mulheres. A autora DINIZ (2013) argumenta que as variáveis renda e

escolaridade têm sido fundamentais para as modificações dos padrões sexuais

e reprodutivos na vida das mulheres, sendo assim, o crescimento da sua participação no mercado de trabalho e na academia tem lhes ocasionado um

impasse, porque a maternidade torna-se “... um dilema para as mulheres que

querem seguir uma carreira profissional, já que, nas responsabilidades

parentais, ainda são elas as mais sobrecarregadas” (SCAVONE, 2001, p.145).

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30 Se uma mulher nutre o desejo de ser mãe e a vontade de ter uma carreira em

qualquer profissão ela se vê profundamente envolvida no dilema de ter que

optar entre uma e outra.

...apesar das inúmeras mudanças ocorridas na situação social das mulheres, a realização da maternidade ainda compromete consideravelmente as mulheres e revela uma face importante da lógica da razão androcêntrica. Com toda a certeza, a maternidade ainda separa as mulheres socialmente dos homens e pode até legitimar, em determinados contextos, a dominação masculina (SCAVONE, 2001, p.149-150).

O Estado se exime da responsabilidade de dar alternativas as mulheres

no que se refere ao seu direito sexual e reprodutivo. O aborto não é legalizado

e, por isso, não se torna uma opção segura para as mulheres. O uso do DIU vem sendo até hoje vedado a grande parte das mulheres, principalmente as

mais novas e sem filho(a)s. Os métodos de esterilização são usados muitas

vezes como estratégia para a higienização social, podando a sexualidade e o

poder de reprodução de mulheres das periferias. O número de creches é

escasso. Os períodos de licença maternidade e paternidade são extremamente

curtos, chegando a no máximo 6 (seis) meses para mulheres e 20 (vinte) dias para homens, variando nos serviço público e privado – podendo ser concedido

para o(a)s empregado(a)s de empresas privadas apenas o mínimo que é de 4

(quatro) meses para mulheres e de 5 (cinco) dias para homens – não sendo,

nem de longe, o suficiente para abarcar as mudanças e as necessidades que

um recém nascido traz consigo. Em resumo, não existem políticas de incentivo

ou de auxílio à maternidade. Além disso, é importante ressaltar que predomina

na sociedade uma cultura moralista patriarcal de responsabilização da mães

pelo estado de bem-estar do(a)s filho(a)s:

A impossibilidade de cumprir com a “maternidade normativa” é atribuída a uma falha individual, descolada do contexto histórico e social que a produziu. Ao depositarem individualmente na figura da mulher-mãe-trabalhadora a responsabilidade por sua condição de pobreza, de abandono e/ou negligência nos cuidados dos filhos e filhas, discursos científicos e sociais isentam os homens, o Estado e a comunidade de sua responsabilidade social (NARVAZ, 2005; SILVA, 1993; STREY, 2000 apud NARVAZ; KOLLER, 2006, p.52).

Dessa maneira, o Estado capitalista, no aprofundamento das políticas

neoliberais, vem se desresponsabilizando dos cuidados com as crianças, o que

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31 deveria ser expresso por um conjunto de cuidados coletivamente distribuídos

entre a família, a comunidade e o Estado, mas que acaba se resumindo

apenas a primeira esfera. A estratégia utilizada para isso é, como mostra Costa

(2002), a dissociação entre as esferas privadas e públicas, que nesse contexto:

...separa e opõe o mundo da cultura e da política, tido como masculino, daquele considerado natural, portanto, feminino, doméstico e despolitizado. As práticas de proteção primária, em grande parte a cargo das mulheres, tornadas naturais no âmbito das famílias e grupos de convívio, ficam ocultas (COSTA, 2002, p.302).

Diante do que foi apresentado observamos que as opressões

vivenciadas pelas mulheres são inúmeras e a sua organização por meio dos

movimentos feministas se faz enquanto um caminho vital para o seu enfrentamento. Mesmo esse sendo um movimento plural, heterogêneo, de

muitas cores, idades, formas e identidades, ele concentra o interesse em

comum pelo combate às desigualdades pautadas pelo ser mulher e na

construção de novas alternativas para a autonomia daquelas que foram

historicamente submetidas à dominação de outrem.

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3. MULHERES NO ENSINO SUPERIOR: A TRAJETÓRIA DO ACESSO E DA PERMANÊNCIA DAS MULHERES NA UNIVERSIDADE.

Esse capítulo objetiva introduzir a(o) leitor(a) a trajetória do acesso e da

permanência das mulheres no ensino superior, ponto importante para se

discutir o objetivo central da nossa pesquisa, que é o direito a educação das

estudantes mães da UFRN. Apresentaremos ao longo de dois tópicos os dados

da pesquisa colhidos a partir da aplicação dos questionários e das entrevistas semiestruturadas com mães estudantes dos cursos de Serviço Social,

Pedagogia e Enfermagem da UFRN. Conheceremos, dessa forma, o curso que

integram, o período a qual pertencem, a forma de ingresso delas na

universidade pública, sua cor/etnia, idade, orientação sexual. Saberemos se

elas trabalham, com o que trabalham, se seu(s) filho(s) faz(em) uso de creches

públicas. Vamos saber se essas mulheres têm feito parte de algum programa

ou projeto da assistência estudantil do campus e se esses programas têm sido

eficazes na garantia de sua permanência. Conheceremos a sua opinião sobre

maternidade e políticas de assistência estudantil, sua experiência com a

gestação durante a graduação, seu cotidiano e rotina na instituição. Dessa

forma, tentaremos entender quem é esse público, que tem tão pouca visibilidade, e nos aproximar daquilo que ele têm vivido na tentativa de

conciliar, nos dias de hoje, a maternidade e o ensino superior.

3.1. A TRAJETÓRIA DO ACESSO DAS MULHERES À EDUCAÇÃO

PRIMÁRIA E SUPERIOR NO BRASIL.

É notório que historicamente nós mulheres temos passado por um

processo de exclusão nos espaços que não dizem respeito ao ambiente doméstico e que o acesso a esses espaços só foi e é possível mediante duas

formas: por meio da mobilização e organização da luta das mulheres ou em

consonância com os interesses da sociedade capitalista patriarcal. Citamos

como exemplo da primeira forma, no tópico anterior sobre movimentos

feministas, o direito ao voto e a participação política. Já sobre o segundo modo,

podemos citar o acesso das mulheres a educação, que ao longo da história se

deu de forma precarizada e baseada no interesse dos homens, da Igreja e do

Estado.

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Como nos mostra Stamatto (2002) com base em Ribeiro (2000), desde

que os colonizadores chegaram ao Brasil o ensino se concentrou nas mãos da

Igreja. Tanto jesuítas quanto franciscanos se encarregavam de ministrar em

suas missões e nos colégios por eles fundados o ensino voltado à religião

(catequese). As primeiras escolas voltadas para o ensino da leitura e da escrita

eram reservadas exclusivamente para a elite masculina e branca, desta forma

apenas o ensino religioso era permitido às meninas. Ao que parece a primeira reinvindicação para o ingresso de meninas nas escolas de ler e escrever

vieram de índios brasileiros que achando injusta essa exclusão solicitaram ao

Pe. Manoel Nóbrega, jesuíta encarregado da primeira escola, a entrada de

suas filhas no ensino. O Padre chegou a enviar carta para a Rainha de

Portugal, Dona Catarina, mas não obteve sucesso, tendo o pedido negado sob

a alegação de que o acesso das mulheres indígenas à cultura da época

poderia apresentar consequências nefastas para a sociedade.

Ribeiro (2000), citado por Stamatto (2002), explica que na própria

Portugal do século XVI existiam poucas mulheres alfabetizadas e quando

eram, a pouco leitura que dominavam, servia apenas para a leitura de livros de

rezas e coisas relacionadas a religião. Qual seria então a utilidade de deixar mulheres “selvagens” de uma colônia que só servia para gerar lucro aos

portugueses, ter acesso a educação? Fica nítido que esse processo de

exclusão da educação que as mulheres passavam não estava restrito a

realidade do Brasil colônia e que se estendia também a outros países, pois

obviamente o acesso das mulheres a educação não apresentava nenhuma

utilidade, já que, como afirma Stamatto (2002), a sociedade concebia as mulheres apenas para o casamento, para a vida religiosa ou para o trabalho

doméstico/escravo, o que não demandava nenhum tipo de educação escolar.

A primeira legislação criada especificamente para tratar do ensino

primário foi implementada após a independência do Brasil “a lei de 15 de

outubro de 1827, conhecida como Lei Geral, [...] padronizou as escolas de

primeiras letras no país” (STAMATTO, 2002, p.5), mas ela não se reportou a

eliminação de qualquer discriminação da mulher, ao contrário, ela serviu para

reforçar e institucionalizar as desigualdades, dividindo as matérias ensinadas

aos meninos e as matérias ensinadas às meninas. Como indicado na

legislação, as meninas:

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34

não aprendiam todas as matérias ensinadas aos meninos, principalmente as consideradas mais racionais como a geometria, e em compensação deveriam aprender as ‘artes do lar’, as prendas domésticas (STAMATTO, 2002, p.5)

Sendo assim, o ensino voltado às mulheres não foi percebido como um

instrumento para inseri-las nos espaços públicos, mas para instrumentalizá-las

para serem donas de casa úteis. Lajolo; Zilberman, (2001) citado por Acordi (2007) explicam que durante o processo de europeização do Brasil – que

ocorria com o desligamento da colônia brasileira com a metrópole portuguesa –

o papel social da mulher sofreu modificações. O padrão para servir a nova elite

brasileira não era mais os das mulheres da casa grande, que como descrevia

alguns viajantes estrangeiros, eram “ignorantes e frívolas, mais violentas que

seus maridos, [...] desenvolviam atividades essencialmente coloniais e domésticas, como dar ordens aos negros, reger as atividades da casa, zelar

pelo bem-estar da família” (LAJOLO; ZILBERMAN, 2001 apud ACORDI, 2007,

p.835). Mesmo se encarregando das atividades domésticas, a maternidade, por

exemplo, era uma atividade que a mulher da casa grande delegava as

escravas negras – o que segundo a nova ordem burguesa que emergia deveria

mudar, pois o filho(a) deveria ser criado(a) junto à mãe, sem qualquer influência do(a)s escravo(a)s. Saindo das casas grandes a nova família

burguesa instalava-se nos sobrados das cidades, além de mudar de espaço

físico, o padrão estético exigido das mulheres também deveria ser outro:

A mulher precisou se transformar, antes pesada, feia de gestos rudes, ela teria de ter então o aspecto doentio idealizado pelo romantismo, cuja leveza e delicadeza dos atos eram imprescindíveis (ACORDI, 2007, p. 834).

Ademais, os costumes sociais se modificaram, a nova elite brasileira se

dedicava a saraus, jantares, festas, não era mais útil ao patriarca uma mulher

ignorante que não soubesse se portar em sociedade. A mulher carecia agora

de aprender bons modos e um pouco de música e literatura. Polida, a mulher

agora passa a apresentar-se como um adereço a ser exibido pelo marido nas

rodas da alta sociedade, sua educação se dará então não para pensar, mas

para não se tornar menos enfadonha.

Diante disso, como reitera Louro (2006), os homens detinham o direito a

frequentar os espaços públicos e a ocupar as instituições de ensino e postos

de trabalho, cabia à mulher apenas o ambiente doméstico. O que, é claro, se

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35 configurava de forma diferente entre as trabalhadoras e trabalhadores da

classe proletária e as negras e negros. Esses grupos foram excluídos por ainda

mais tempo do acesso ao ensino e já ocupavam, apesar de precariamente,

alguns postos de trabalho. É apenas sob influência de uma modernização

conservadora que o ingresso das mulheres ao ensino se inicia. A educação

não era voltada para a sua emancipação ou autonomia, muito menos sinalizava

alguma transformação nas bases desiguais das relações sociais de gênero fundadas na sociedade patriarcal. O seu ingresso no ensino mostrava a

necessidade de um novo padrão de mulher que servisse aos interesses dos

homens. Esposas e mães instrumentalizadas para cuidar do lar e educar os(as)

filhos(as). Dessa forma, o ensino regular era voltado para os cuidados

domésticos, sendo parte dos currículos das escolas para meninas matérias que

envolviam costura, culinária, puericultura, entre outras, enquanto a educação

dos meninos era voltada exclusivamente para leitura, escrita, matemática.

As meninas tinham então aulas em turmas separadas dos meninos.

Professoras mulheres lecionavam para as garotas e professores homens

ensinavam aos garotos, com isso, aos poucos, a mulher foi ganhando espaço

no magistério, mas essa atividade possuía inúmeras exigências de retidão na vida particular (STAMATTO, 2002). Algumas dessas exigências eram:

...boa conduta, normalmente atestada pelo pároco, [...] deveria ter uma certa idade, solicitar autorização do pai, ou marido se fosse casada, apresentar certidão de óbito se viúva, e, se separada, justificar sua separação comprovando o comportamento honrado (STAMATTO, 2002, p.6).

Dessa forma, a entrada das mulheres em um campo de trabalho não

apresentou qualquer tipo de indicação de uma maior autonomia ou liberdade,

ao contrário, elas ainda teriam de provar diante do Estado a sua honra e ter

autorização prévia do pai ou marido.

Pouco a pouco, concessões foram feitas às mulheres e transformadas em contingência. Da casa-grande para o sobrado, deste para a escola, em cada lugar a mulher desempenha uma função de retorno garantido ao patriarca e ao Estado (ACORDI, 2007, p. 836).

Com a unificação dos currículos escolares para meninos e meninas –

que como apontado no tópico anterior, teve a sua primeira experiência

desenvolvida por Nísia Floresta na fundação da primeira escola desse tipo –

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36 expandiu-se o número de mulheres lecionando. Além disso, como aponta

Louro (2006), o processo de urbanização e industrialização trouxe para os

homens novos campos de trabalho, fazendo-os aos poucos abandonarem a

atividade do magistério. Gradualmente o magistério foi moldando-se segundo

estereótipos que atribuíam à função do ensino a características femininas,

construía-se o discurso da “vocação natural”. As mulheres possuíam de acordo

com as afirmações de médicos, pais, clero e governantes “de mais coração e ternura, qualidades ‘naturais’ para os professores exercerem sua profissão”

(STAMATTO, 2002, p.7).

Na educação superior o acesso das mulheres ao ensino não se

configurou de maneira diferente, desenvolvendo-se também de forma tardia. A

participação feminina nas universidades e faculdades brasileiras só teve início

ao final do século XIX, autorizada por Dom Pedro II, com a Reforma Leôncio de

Carvalho instituída pelo Decreto nº 7.247, de abril de 1879, mas apenas no ano

de 1887, é que a primeira mulher se forma de fato em uma universidade

brasileira, Rita Lobato Velho Lopes, se formando em medicina pela faculdade

de medicina do estado da Bahia (SILVA, 2010).

De maneira expressiva a entrada das mulheres na universidade se deu por volta dos anos 1970, quando as instituições de ensino superior passaram

por um processo de expansão no país (SILVA, 2010), chegando atualmente a

ser maioria entre os alunos matriculados no ensino superior. Em 2005, por

exemplo, como aponta a pesquisa realizada pelo Instituto Nacional de Estudos

e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), lançada em 2007 no livro “A

mulher na educação superior brasileira: 1991-2005”, o número de mulheres matriculadas no ensino superior soma 55,9% do(a)s aluno(a)s, contra 44,1%

homens matriculados nos cursos superiores presenciais. Como podemos

observar as mulheres compõe um número considerável no ensino superior

brasileiro e como tal, devem ter suas necessidades, que são diferentes,

obviamente, das do público masculino, entendidas e discutidas no âmbito

acadêmico.

Durante o II EMEUF, que ocorreu entre os dias 19 e 20 de maio de 2016

na própria universidade e teve como tema “A Cultura Feminista Construindo a

Democracia”, algumas dessas necessidades foram discutidas. Em carta,

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37 gerada pelas organizadoras do evento, problemas enfrentados cotidianamente

pelas alunas dentro e fora da universidade foram elencados e entregues à

reitora, aos diretores e diretoras dos centros, entre outras autoridades públicas.

Algumas das reinvindicações giravam em torno: da assistência estudantil para

mulheres mães; do investimento em segurança pública dentro do campus; do

auxílio permanência e mais vagas na residência universitária para prevenir a

evasão das alunas cotistas; da disputa dos espaços, principalmente nos cursos majoritariamente masculinos, como as ciências exatas e tecnológicas, visando

à garantia do respeito e da valorização das mulheres nessas áreas; da

valorização da cultura negra e da produção de conhecimento por esse

segmento; de mais espaço de discussão das mulheres lésbicas, bissexuais e

travestis/transexuais/transgênero (LBT); da punição dos casos de racismo,

machismo e lesbofobia, homofobia, bifobia, transfobia (LGBTfobia); do

incentivo às disciplinas voltadas para discussão de gênero e sexualidade;

entre outras.

Observando a organização das alunas mães, ao longo do ano de 2016,

por meio de rodas de conversas, reuniões e encontros, como o citado, e a falta

de estrutura da própria universidade – que barra a entrada de alunas mães com seus filho(a)s no Restaurante Universitário, que não possui fraldários ou

creches para acolhê-las – é que reconhecemos que as suas demandas são

uma necessidade concreta e com pouca visibilidade na academia. Dessa

forma, entendendo a importância de cada uma dessas reclamações é que foi

pensada a pesquisa aqui apresentada e que tem por objetivo analisar os

impactos das políticas de assistência estudantil da UFRN na vida das alunas mães da instituição, principalmente no que diz respeito à garantia de sua

permanência no ensino superior. Buscamos entender as dificuldades

enfrentadas pelas alunas que têm filho(a)s e estão no ensino superior,

conhecer a política de assistência estudantil do campus – observando a

existência de políticas específicas voltadas para estudantes mães – e

apreender o papel das políticas de assistência estudantil para a permanência

das estudantes mães nas instituições de ensino. A seguir seguem os dados

colhidos durante a pesquisa.

3.2. ALUNAS E MÃES: CONHECENDO AS MÃES ESTUDANTES DA

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE.

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38

Para a realização desse trabalho optamos por escolher como público

alvo da nossa amostra as estudantes mães matriculadas nos cursos de

graduação em Pedagogia, Serviço Social4 e Enfermagem5, cursos onde a

presença feminina é majoritária e que por isso as chances de encontrar alunas

com filho(a)s seriam maiores. Inicialmente a ideia era entrevistar 10 alunas com

filho(a)s entre 0 e 3 anos. A busca por essas alunas seria feita através dos editais do auxílio creche, divulgados na própria página eletrônica da

universidade e que contém a lista de alunos concorrentes, além de por

indicações de pessoas que conheçam alunas nessa situação ou pela

abordagem de alunas na UFRN. Ao começar a procura por essas estudantes

percebemos que as crianças que pertenciam ao auxílio creche se encontravam

em uma faixa etária um pouco maior que vai de 0 a 6 anos, dessa forma,

optamos por não excluir as alunas que tivessem filho(a)s com mais de 3 anos e

fizessem parte da lista do auxílio creche. Além disso, as alunas do curso de

enfermagem encontradas na lista pertenciam ao campus de Santa Cruz, o que

impossibilitaria a entrevista. Fora isso, como o edital utilizado foi o do segundo

semestre letivo de 2016 – tendo em vista que esse é o edital mais recente – as alunas que mesmo formadas atualmente, no primeiro semestre de 2017, mas

que pertenciam a essa lista como alunas matriculadas, foram também

consideradas para a pesquisa. De fato ao todo foram entrevistadas 8 alunas,

entre os cursos de Serviço Social e Pedagogia com filho(a)s de 0 a 6 anos. Se

levarmos em consideração o tempo que as alunas mães dispõem já que lidam

com duplas ou até triplas jornadas – para aquelas que além de estudantes, mães, ainda são trabalhadoras – já é um número bastante significativo. Os

instrumentais utilizados foram a entrevista semiestruturada e o questionário –

4 Em dados do Observatório da Vida do Estudante Universitário (OVEU), entre os anos de 2006 e 2013, na análise do perfil do(a)s estudantes que ingressaram na UFRN por meio do vestibular, vemos que nos curso de Serviço Social e Pedagogia, por exemplo, o número de estudantes mulheres chega a 95% e 87% do total, respectivamente, um número muito alto que demonstra que a presença feminina nesses cursos é esmagadora em relação à presença masculina. 5 Em pesquisa realizada pelo INEP e citada anteriormente, observamos que o índice de mulheres nos cursos de Enfermagem e Pedagogia no ano de 2005, por exemplo, chega, respectivamente, a 82% e 91% do(a)s aluno(a)s matriculado(a)s, o que demonstra que apesar da participação feminina no ensino superior ter crescido demasiadamente a nossa sociedade ainda está organizada em torno da divisão sexual do trabalho e de estereótipos que balizam os papéis desempenhados por homes e mulheres. A participação feminina continua pequena nos cursos de engenharia e nas ciências da computação, seguindo resguardadas em profissões que por estarem associadas ao feminino recebem remunerações muito mais baixas.

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39 que deu base para a realização do perfil socioeconômico das alunas e que será

analisado nesse tópico.

Das 8 estudantes entrevistadas, 4 são dos curso de Serviço Social e

outras 4 do curso de Pedagogia, entre essas 7 ainda estão matriculadas e

cursando a graduação e 1 se formou no início de 2017. Entre as alunas 4 foram

encontradas no edital de 2016.2 do auxilio creche, sendo 2 beneficiadas com o

auxilio no valor de 100 reais, 1 indeferida e outra desclassificada. As outras 4 não tentaram concorrer ao auxilio e foram encontradas por meio de indicação

de pessoas que conviviam em sala de aula com elas. A idade das

entrevistadas varia entre 20 e 36 anos, como pode ser visto no gráfico 1, sendo

que 50% das entrevistadas tem entre 20 e 25 anos, 25% tem entre 26 e 29 anos e as outras 25% tem entre 30 e 36 anos.

Gráfico 1 – Idade das estudantes entrevistadas.

Fonte: pesquisa de campo realizada pela autora (2017).

Dessa forma, a maioria delas se encontra, segundo a Secretaria

Nacional da Juventude, entre a população jovem Brasileira que vai dos 15 aos 29 anos (BRASIL 2014). Quando a informação se refere ao estado civil das

candidatas podemos observar que a grande maioria se encontra em uma união

estável, 5 das entrevistadas, o que representa 62% do total, somando-se a 2

alunas divorciadas e apenas uma solteira, 38% da amostra, conforme

apresentado no gráfico 2, logo abaixo.

4

2 2

0

1

2

3

4

5

20 a 25 anos 26 a 29 anos 30 a 36 anos

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40

Gráfico 2 – Estado civil das estudantes entrevistadas.

Fonte: pesquisa de campo realizada pela autora (2017).

O que se assemelha com os dados divulgados em pesquisa de opinião

pública realizada pela Secretaria Nacional da Juventude, “agenda juventude

2013”, onde cerca de 32% dos jovens brasileiros residem com os companheiros, ou seja, se encontram casados ou em uma união. Além do que,

dentre as mulheres entrevistadas 54% afirmaram ter filho(a)s (BRASIL, 2014),

o que demonstra que o público de mães no Brasil é alto, ainda mais em idade

universitária. A pesquisa realizada pelo Fórum Nacional de Pró-Reitores de

Assuntos Estudantis (FONAPRACE) em conjunto com a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES), em

2014, que indicava o perfil socioeconômico e cultural do(a)s estudantes da

graduação das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES),

aproximadamente 70% do(a)s estudantes matriculado(a)s nas IFES tem idades

entre 20 e 29 anos. Observamos que esse é um número alto de aluno(a)s em

idade fértil, principalmente de mulheres, já que essas expressam mais da metade dos alunos da graduação. Sobre o número de graduandos com

filho(a)s, sabemos, ainda segundo a mesma pesquisa de 2014, que do total de

939.604 mil estudantes de graduação no Brasil, cerca de 110.659 possuem

filho(a)s, ou seja, aproximadamente 11% da população total dos estudantes.

Desse número, mais da metade, 60.497, são mulheres, sendo a maioria com

idade entre 18 e mais de 25 anos, que como mostramos é a população mais expressiva dentro das IFES. Sobre o estado civil das estudantes mães a

pesquisa indica que 18.745 dessas são solteiras – o que supera muito o

5

2

1

0

1

2

3

4

5

6

União Estável Divorciada Solteira

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41 número de homens solteiros, que é de 9.868 –, 25.512 casadas, 10.067 em

uma união estável, 5.479 divorciadas – também maior que o valor de homens

separados que é de 2.966 (FONAPARCE, 2014).

Na pesquisa “Mulheres Brasileiras e Gênero nos Espaços Público e

Privado”, da Fundação Perseu Abramo em conjunto com o Serviço Social do

Comércio (SESC), realizada em 2010, destacamos os dados referentes à

saúde reprodutiva e abortamento, que do total de mulheres entrevistadas cerca 71% afirmaram que têm/tiveram filho(a)s naturais, sendo 59% com idades

entre 19 e 30 anos, idades, que como vimos, são muito representativas no

universo de aluno(a)s das IFES (GODINHO; VENTURI, 2013). Dessa forma,

podemos afirmar que o número de alunos que têm ou podem vir a ter filho(a)s

durante o período da graduação se expressa grandemente e que tal fato não

pode ser desconsiderado das discussões acadêmicas, ao contrário, devem ser

incorporados a pautas que envolvam demandas para o desenvolvimento de

projetos e programas voltados para permanência estudantil das alunas mães.

Ainda conforme o FONAPRACE (2014), só no nordeste, cerca de 30.112

graduandos possuem de 1 a mais de 4 filho(a)s, o que representa quase 12%

do número total de estudantes da graduação, um valor muito representativo. Além desse fato, podemos ver também, conforme os dados, que na região

nordeste cerca de 105 alunos usam a creche da universidade, 447 utilizam

creche pública, 1.524 creches privadas, 16.220 recorrem a familiares, 786

deixam o(a)s filho(a)s com babás ou empregadas domésticas, 533 levam o(a)

filho(a) para a universidade e 819 os deixam sozinhos. Sendo assim, boa

partes do(a)s aluno(a)s têm de recorrer à iniciativa privada, a própria família ou a funcionárias remuneradas. É valido ressaltar que boa parte desse(a)s

estudantes, cerca de 49%, têm renda bruta em torno de 0 a 2 salários mínimos

(FONAPRACE, 2014), o que não representa uma renda alta. Dessa forma,

pagar uma creche privada ou um(a) funcionário(a) para cuidar do(a)s filho(a)s

pode comprometer uma grande parte da renda familiar. Dentre o universo de

graduandos com filho(a)s apenas um número pequeno dispõe de creches na

própria universidade ou instituições públicas – lembrando que a UFRN não

dispõe desse dispositivo e não reserva creches da universidade para o(a)s

aluno(a)s. Ademais, muito(a)s outro(a)s têm que levar o(a)s filho(a)s para a

universidade ou deixá-los sozinhos. Esses são números alarmantes que revela

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42 a situação a qual inúmeros alunos têm de se expor para continuar na

universidade e conciliar a graduação com a maternidade/paternidade.

Analisando a realidade das alunas mães da UFRN sobre o uso de

creche e aos cuidados de quem fica a criança na ausência da mãe e os

comparando com os dados citados anteriormente, vemos que metade das

entrevistadas faz uso de creches, sendo que apenas 1 faz uso de uma

instituição pública, 2 de instituições privadas e 1 de instituição privada com bolsa A outra metade das entrevistadas recorrem a parentes para ficar com

o(a)s filho(a)s. De maneira geral, esse fato ocorre mesmo entre as mães que

utilizam a creche, já que todas possuem o(a)s filho(a)s matriculados apenas em

tempo parcial, ou seja, durante apenas um período e precisam que durante os

outros turnos alguém olhe as crianças, como pode ser observado no gráfico a

seguir.

Gráfico 3 – Parentes encarregados do cuidado das crianças na ausência da mãe.

Fonte: pesquisa de campo realizada pela autora (2017).

Dentre as entrevistadas algumas possuíam apenas um parente para

incumbir o cuidado do(a)s filho(a)s e outras possuíam até duas pessoas na

qual poderia confiar essa função. 2 deixavam os filho(a)s apenas com o pai da

criança, 2 apenas com a avó materna da criança, 2 com o pai e com a avó

materna da criança, 1 com a avó materna e a avó paterna da criança e 1 com a

bisavó materna da criança.

Sobre os dados socioeconômicos dessas mulheres percebemos que em

sua maioria elas são naturais de Natal, apenas uma é natural de Pernambuco.

2 2 2

1 1

0

1

2

3

Pai Avó materna Pai e Avó materna Avó materna epaterna

Outros

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43 Residem desde a zona norte de natal (2 entrevistadas), até a região

metropolitana, como Parnamirim e São Gonçalo (3 entrevistadas), além das

regiões oeste (2 entrevistadas) e sul (1 entrevistada) da capital. De maneira

geral elas são provenientes de bairros distantes da UFRN.

As mulheres entrevistadas se identificam como negras (2) ou pardas (6),

o que inclusive é uma tendência expressiva entre o(a)s graduando(a)s das

IFES na região nordeste onde 49,33% do(a)s estudantes se identificam enquanto pardo(a)s e 12,94% enquanto negro(a)s, um aumento se

comparados aos dados de 2003, onde os números eram de 38,1% para

pardo(a)s e 8,6% para negro(a)s, o que pode expressar um crescimento da

população negra e parda no ensino superior (FONAPRACE, 2014). Esse

crescimento também pode ser observado nos dados disponíveis no OVEU, em

que no curso de Pedagogia da UFRN, por exemplo, dentre o(a)s aluno(a)s

ingressantes pelo vestibular, nos anos entre 2006 e 2013, o número de negros

e pardos chega a 46% e no curso de Serviço Social a 49%. É interessante

ressaltar que o número de estudantes que se consideram pardos é muito

superior ao número de estudantes que se consideram negros, sendo quatro

vezes maior o número daqueles que se consideram pardos.

De maneira mais expressiva as entrevistadas são heterossexuais

(apenas uma entrevistada se afirmou enquanto bissexual). Provenientes de

escolas públicas (6), apenas uma de escola privada e uma que cursou o ensino

médio parte em instituição pública, parte em privada. Como podemos observar

no curso de Serviço Social, que cerca 61% do(a)s estudantes cursaram todo o

ensino médio em escola pública, assim como essa tendência continua no curso de Pedagogia em que os números chegam a 57% (OVEU, de 2006 a 2013).

As formas de ingresso na universidade veriam entre o vestibular e o

Sistema de Seleção Unificada (SISU), 50% das alunas entrevistadas

ingressaram na UFRN por meio do SISU, 38% pelo vestibular e 12% de outras

formas.

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44

Gráfico 4 – Forma de ingresso das estudantes entrevistadas no ensino superior.

Fonte: pesquisa de campo realizada pela autora (2017).

Apesar de maneira unânime as entrevistadas se denominarem negras e

pardas e de grande parte delas terem concluído o ensino médio em escolas da

rede pública, fatores que compõe pelo menos um dos critérios para fazer uso

da política de cotas na UFRN, apenas 4 delas fizeram realmente uso desse

mecanismo e se utilizaram das cotas para alunos negros ou pardos,

provenientes de escolas públicas e com renda per capita de até um salário

mínimo e meio. Percebemos que o público que tem ingresso na universidade,

principalmente nos cursos de Pedagogia e Serviço Social, cursos das

entrevistadas, são alunos com um perfil socioeconômico prioritário – segundo as diretrizes da UFRN e do Plano Nacional de Assistência Estudantil (PNAES)

o(a)s aluno(a)s dentro do perfil socioeconômico indicado como prioritário são

aqueles provenientes de escolas da rede pública de ensino e/ou que possuem

renda per capita de até 1 salário mínimo e meio.

Segundo a renda, podemos perceber conforme o gráfico 5 que grande

parte das entrevistadas (87%) tem a renda familiar em torno de 1 até 2,5

salários mínimos e apenas uma (13%) tem a renda familiar maior do que 3

salários mínimos.

4

3

1

0

1

2

3

4

5

SISU Vestibular Outros

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45

Gráfico 5 – Renda das estudantes entrevistadas em salários mínimos.

Fonte: pesquisa de campo realizada pela autora (2017).

Os dados demonstrados não expressam uma renda alta, principalmente

se levarmos em consideração o número de pessoas que compõe o núcleo familiar. Metade das entrevistadas compõe famílias nucleares formadas por

seus companheiros e filho(a)s, já a outra metade pode ser denominada como

uma composição familiar extensa, que vai desde tio(a)s, avó(ô)s e primo(a)s,

até aquelas que não residem com os pais das crianças, mas com os seus

próprios pais e mães, ou as que convivem com ambos. De toda maneira, os

grupos são numerosos, apenas 3 são compostos por três pessoas, outros 3 por quatro pessoas, 1 por 5 pessoas e outro por 6 pessoas. É importante ressaltar

que os grupos com mais pessoas são o que possuem renda bruta menor. Além

disso, nenhuma das entrevistadas tem renda per capita igual a um salário

mínimo, sempre inferior, mesmo que existam aquelas que se aproximem um

pouco. Como podemos ver no gráfico 6, logo abaixo, sobre a renda per capita

das estudantes entrevistas temos 50% com renda per capita entre 150 e 450 reais, 25% entre 550 e 650 e 25% entre 750 à 850.

4

3

1

0

1

2

3

4

5

de 1 a 1,5 SM de 2 a 2,5 SM 3 ou mais de 3 SM

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46

Gráfico 6 – Renda per capita das estudantes entrevistadas.

Fonte: pesquisa de campo realizada pela autora (2017).

Renda muito aquém, principalmente para famílias com crianças, que possuem membros que fazem parte do ensino superior e que demandam

gastos extras com transporte, alimentação, material de estudos, entre outros.

Ainda de acordo com os dados do OVEU (de 2006 a 2013), nos cursos de

Pedagogia e Serviço Social juntos cerca de 20% do(a)s ingressantes entre

2006 e 2013, tinha renda familiar de até 1 salário mínimo, e 67% tinha renda

entre 1 e 5 salários. As famílias desses alunos eram numerosas, então mesmo aqueles que se encontram na faixa de 1 até 5 salário podem não

necessariamente representar uma situação financeira confortável. Dessa

forma, 40% do(a)s aluno(a)s moravam com famílias de 4 a 6 membros e 44%

moravam em famílias de 2 a 3 membros.

As entrevistadas possuem em sua maioria um(a) único(a) filho(a), 7 das

8 estudantes entrevistadas, sendo que apenas 1 possui 3. As idades das

crianças variam entre menos de 1 ano e 6 anos. Existem também 2 crianças

maiores, no caso da aluna com 3 filhos, que tem dois meninos com mais de 10

anos e uma menina pequena com apenas 2 anos. Sendo assim, 60% das

crianças têm de 0 a 3 anos, 20% de 4 a 6 anos e os outros 20% com mais de

10 anos.

2 2 2 2

0

1

2

3

de 150 a 250 reais de 350 a 450 reais 550 a 650 reais 750 a 850 reais

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47

Gráfico 7 – Idade do(a)s filho(a)s das estudantes entrevistadas.

Fonte: pesquisa de campo realizada pela autora (2017).

Três das mulheres entrevistadas trabalhavam fora do ambiente

doméstico e duas faziam parte da bolsa trabalho da instituição, que na UFRN é

chamada de bolsa de apoio técnico-administrativo. Dessa forma, percebemos

que mais da metade dessas estudantes ajudam a compor a renda familiar e

mesmo na graduação ainda tem que conciliar o(a)s filho(a)s com o trabalho.

Metade das alunas entrevistadas recebem/recebiam de algum tipo de auxilio da

universidade, a outra metade não tem nenhum, mesmo que como vimos, as

alunas se encontrem dentro do perfil socioeconômico indicado como prioritário.

Os auxílios dos quais as alunas fazem parte atualmente são: bolsa alimentação (3 alunas), apoio técnico administrativo (3 alunas). Lembrando que as alunas

podem fazer parte de mais de uma bolsa, então os números indicados levam

em consideração isso.

Como percebemos, mesmo tendo filho(a)s em idade de creche (0 a 6

anos) e estando dentro dos critérios, nenhuma das alunas está sendo

beneficiada pelo auxílio referente à creche no momento6, o que pode estar

influenciando na qualidade e no tempo que essas alunas têm levado para

concluir a graduação. As estudantes estão desde o 2º ao 10º período de curso,

6 Como a lista do auxílio consultada refere-se ao segundo semestre de 2016 e a entrevista foi realizada em maio de 2017 as alunas que por ora faziam parte do auxílio hoje já não fazem mais. Uma das alunas se formou no inicio desse ano e a outra não conseguiu enviar os documentos necessários para a renovação dentro do prazo estipulado pela universidade, perdendo assim o beneficio.

3 3

2 2

0

1

2

3

4

0 a 1 ano de 2 a 3 anos de 4 a 6 anos maiores de 10 anos

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48 algumas começando a vida acadêmica agora e outras terminando. A grande

maioria das alunas já trancou o curso e por isso está desnivelada e com a

conclusão atrasada em pelo menos um período, o que demonstra que não tem

sido uma atividade fácil conciliar a maternidade, o trabalho e a academia. No

próximo item, onde observaremos os dados das entrevistas, entenderemos

melhor como tem sido para essas alunas conciliar a graduação com a

maternidade.

3.3. VEZ E VOZ: CONHECENDO A REALIDADE DAS ALUNAS MÃES.

As perguntas que guiaram as entrevistas referem-se de forma mais

direta a relação das estudantes com a maternidade Diferente do questionário,

as alunas puderam contar mais sobre a sua experiência como alunas e mães

dentro e fora da UFRN, como enxergam a maternidade, as dificuldades que

percebem que enfrentam sendo alunas e mães, se fazem parte de programas

de assistência à permanência estudantil e o que pensam sobre esses

programas, quais as suas opiniões sobre a forma que a universidade lida com esse público, entre outras questões.

Sobre a experiência da gestação durante a graduação as respostas

variam, dentre as 8 alunas, 3 tiveram filho(a)s antes de entrar na graduação,

mas quando entraram na universidade as crianças ainda eram muito pequenas

variando entre 8 meses e 2 anos, ou seja, necessitavam de cuidados. 5 engravidaram durante a graduação, sendo que 3 dessas mulheres tiveram

complicações durante a gestação, o que se configura como um agravamento

da sua condição e por consequência das suas necessidade. De maneira geral

para essas mulheres que descobriram a maternidade durante o ensino superior

a gestação não foi uma atividade muito agradável, uma das entrevistadas,

aluna do curso de Pedagogia, que chamaremos por Helena7 inclusive descreve

a gestação durante a graduação como uma experiência traumática e aconselha

– mesmo sabendo que é algo que pode acontecer com qualquer uma, até com

aquelas que se previnem –outras alunas a tentar adiá-la ao máximo para

depois da graduação, pois é algo difícil de conciliar até mesmo para aquelas

que, como ela, teve ajuda dos parentes. Além disso, quando falamos do regime

7 Para preservar a identidade das alunas usaremos nomes fictícios para se referir a cada uma delas.

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49 de exercícios domiciliares, contido no Art. 263 do Regulamento dos Cursos

Regulares de Graduação da UFRN, onde tanto alunas mães, quanto outros

alunos passando por algum problema que os impossibilite de participar das

aulas presenciais podem acessar, poucos foram aquelas que obtiveram

informações sobre esse mecanismo e mesmo aquelas que tiveram passaram

por dificuldades, como nos descreve Nísia:

Quando descobri que estava grávida dele eu estava no segundo semestre, [...] eu tive um descolamento de placenta e precisei ficar afastada, o meu médico me deu um laudo e tudo mais e eu poderia ficar nesse EaD, digamos assim, mas ai eu acabei desistindo, porque assim é bem difícil, os professores tem que dar conta de todos os alunos e ainda dar conta de mim, então tem a questão da resposta, do e-mail e tudo mais. Então eu achei que pela qualidade do meu ensino era melhor eu parar e quando eu pudesse eu voltaria... (NÍSIA, PEDAGOGIA)

Além disso, o relato a seguir, é bem interessante e nos mostra que para

algumas alunas engravidar sem concluir a graduação pode ser algo que gera

desconforto e constrangimento, pois existe um novo ideal em nossa sociedade, onde as mulheres devem adiar a maternidade para um momento onde já possuam independência e estabilidade financeira.

...eu consegui esconder por muito tempo [a gravidez], na época eu não queria que ninguém ficasse sabendo, porque na minha concepção era uma coisa muito, tipo assim, não era legal, era errado. Até por influência da minha mãe mesmo ela disse “[...] você tem só que estudar, estudar, estudar e não pense em ter filho” e aconteceu. Eu acabei que fiquei constrangida e escondi, mas quando foi com oito para nove meses, não tinha mais como esconder [...]. Foi uma experiência que assim, como é que eu posso dizer? Foi tranquila entre aspas, entendeu? Tranquila assim para o ambiente no qual eu estava, mas pro meu psicológico não foi tranquilo (ÂNGELA, SERVIÇO SOCIAL).

Segundo Andrée Michel, citado por Badinter (1985, p.351) “quanto mais

jovens, instruídas e ativas são as mulheres, mais experimentam insatisfações

no casamento e menos associam à maternidade o êxito e a felicidade

feminina”. Dessa forma, com o passar dos anos as mulheres vêm se desassociando da obrigação da maternidade quando ainda muito novas,

embora saibamos que ainda é cobrado das mulheres que depois de certa idade

dediquem-se a construir uma família. Vemos que há dois lados nesse fato, é

ótimo ver que cada vez mais a sociedade tem validado o crescimento

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50 acadêmico e profissional das mulheres e que aos poucos a figura da mulher

destinada a(o)s filho(a)s e a casa vá se distanciando, mas é importante ter

sempre em foco a liberdade das mulheres para assumir as suas vidas, os seus

corpos e o direito de decidir quando julgam melhor ter ou não ter filho(a)s. É

preciso que a sociedade abra espaço também para acolher as mulheres que

optam pela maternidade, dando-as oportunidade para conciliar cada um dos

interesses e projetos. É preciso que as mulheres possam sim, ser mães e também profissionais bem sucedidas, pesquisadoras, estudantes. A

maternidade não pode continuar sendo vista como um empecilho para a

concretização de outras atividades. Como podemos ver no trecho retirado da revista Elle, nº 1354 e citado por Badinter (1985):

Teoricamente, uma mulher pode fazer tudo. Mas se ela quer criar uma família, deve estar pronta a sacrificar dez anos de sua vida [...]. Não vejo outro meio de ter êxito na educação dos filhos (revista Elle, nº 1354 apud BADINTER, 1985, p.328).

A visão predominante na sociedade é que em beneficio da educação

do(a)s filho(a)s, as mulheres que são mães abdiquem de uma parte de suas

vidas para dedicar-lhes. Como nos explica Badinter (1985) está impregnado no

imaginário social que a presença das mulheres em casa e a sua disponibilidade para os membros da família é o que promove a ordem do lar, sendo assim é pregado que o lugar das mães é junto do(a)s filho(a)s.

Para as alunas que passam por problemas de saúde durante a gravidez

a ida a universidade pode ser um grande desafio, as alunas Simone, do curso

de Pedagogia e Cora, do curso de Serviço Social, relatam que chegavam a

passar mal pelo campus, os enjoos e vômitos eram recorrentes, bem como os

desmaios, obrigando-as a concluir com dificuldade o semestre ou a se afastar.

No caso de Cora, por perder o prazo de trancamento ela teve de permanecer frequentando as aulas mesmo com bastante dificuldade, o que inclusive é uma

crítica dela a universidade, que em sua opinião não enxerga as particularidades

na hora de analisar, por exemplo, uma exceção nesse prazo e acaba não os

ajudando a aproveitar melhor a academia. Sobre o(a)s professore(a)s, ela afirma:

A experiência da gestação foi muito complicada, pela falta de apoio dos professores, a insensibilidade de muitos, mas em contrapartida também tem a humanização de muitos outros, não se pode generalizar, porque cada professor ele tem uma

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didática, ele tem um comportamento [...] então os professores por muitas vezes me apoiaram, poucos, poucos, me julgaram, me prejudicaram colocando faltas desnecessárias, faltas assim absurdas e assim, foi muito complicado pelo desgaste emocional a minha questão de saúde, que eu não imaginava que seria tão difícil... (CORA, SERVIÇO SOCIAL).

Observamos que a experiência de cada aluna na universidade depende

em muito do acolhimento do ambiente, do(a)s professore(a)s, do(a)s colegas

de sala, do acesso à informação o que pode dificultar ou facilitar um pouco

mais a vida de cada uma. De maneira unânime as entrevistadas responderam que não planejaram a gestação e que foi uma surpresa para elas se depararem

com esse fato, o que se assemelha bastante com o que Badinter (1985), nos

mostra, que cada vez mais mulheres têm adiado a maternidade, priorizando os estudos e o trabalho.

Sobre como essas mulheres vem enxergando a maternidade, temos

respostas bem diversas, mas que encontram um ponto em comum quando elas

afirmam que apesar das dificuldades não se arrependem de serem mães. A

maioria reconhece que a maternidade é uma grande responsabilidade e

inclusive, como podemos ver no depoimento de Cora, ela acabou sendo uma oportunidade de amadurecimento:

...eu não acredito que meu filho chegou em vão, talvez meu filho tenha vindo para me ensinar, para eu aprender, me objetivar na vida, “tipo”, tá na hora de você crescer, assumir responsabilidade e encarar para frente (CORA, SERVIÇO SOCIAL).

Outras observações interessantes podem ser vista na fala de Nísia e

Leila, que reclamam da romantização da maternidade e da pressão e

interferência da sociedade na criação do(a)s filho(a)s:

... assim eu gosto muito de ser mãe, mas eu não curto a maternidade, porque a gente não acerta, tudo que a gente tenta fazer tá errado por um lado ou por outro. Se você tá em casa com seu filho você não está fazendo nada, se você vai trabalhar você abandonou o seu filho, então é uma pressão da sociedade muito grande nessa questão da maternidade. As pessoas ficam interferindo na nossa “maternagem” o tempo inteiro, mas quase nunca tem alguém pra [sic] te oferecer ajuda. Então assim, eu amo ser mãe, mas a maternidade é assim bem cruel (NÍSIA, PEDAGOGIA).

Nossa! Pergunta bem difícil. Eu acho que a maternidade as pessoas romantizam muito ela, mas é uma coisa “mega” complicada, difícil, cansativa [...] porque, sei lá, a pessoa está

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envolvida em um misto de emoções e muita gente às vezes quer se meter e dar palpite, você tenta fazer as coisas do seu jeito, mas as pessoas falam “não, não é assim”... (LEILA, SERVIÇO SOCIAL).

Isso demostra que apesar do que afirma Badinter (1985) sobre as

mudanças nas relações atuais sobre a maternidade, ainda há um ideal imposto pela sociedade que insiste em fiscalizar a conduta de mães “boas” e “más”.

Assim ocorre um julgamento moralista daquelas que se afastam do(a)s

filho(a)s, o que gera inclusive um sentimento de culpa entre essas mulheres, como podemos ver no relato de Simone:

... o meu filho é tudo pra [sic] mim, ter hoje ele do meu lado é maravilhoso, mas se eu tivesse planejado eu não teria passado por tantos problemas e eu me culpo muito por não tá com ele, por ter que tá na bolsa, por ter que tá estudando e esse seria um tempo que eu poderia tá com ele, dando mais atenção. (SIMONE, PEDAGOGIA)

...você entra em crise de existência todo dia, porque você quer tá com ele, ainda mais ele que é pequeninho [...] Do começo, até hoje, eu me sinto uma péssima mãe, porque [...] assim, não sou eu que crio quem cria é a minha mãe e a minha sogra, então às vezes eu começo a chorar porque eu chego em casa e ele não quer ir pra [sic] casa comigo, ele quer ficar com as avós. No começo quando ele começou a falar ele não queria me chamar de mãe e assim é muito complicado, porque eu venho pra cá [sic] e eu fico pensando nele muitas vezes. (SIMONE, PEDAGOGIA)

Ainda sobre isso, mas já entrando na questão sobre as dificuldades que

essas mulheres enfrentam sendo alunas e mães, percebemos que o tempo é

uma das reclamações mais recorrentes das entrevistadas, além de não ter muitas vezes com quem deixar as crianças.

...era muito difícil pra [sic] conseguir fazer meus trabalhos, minhas coisas [...] de madrugada, quando ele ia dormir que eu consiga ler meus textos, fazer minhas coisas, porque é uma atenção integral que você tem que dar. É um trabalho que você não tem intervalo, 24 horas por dia você tá lá responsável por aquela criança, então pra [sic] lidar com tudo foi bem difícil, não sei como eu consegui, mas consegui (NÍSIA, PEDAGOGIA).

Além disso, é na universidade que muitas dessas mulheres enxergam uma possibilidade para dar aos seus filhos e filhas uma vida melhor, como

podemos ver no relato da estudante do curso de Pedagogia, Alexandra:

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...quando eu tenho que escolher entre ela e ter que estudar eu preciso, eu tenho que escolher estudar, porque eu só vou conseguir dar o melhor pra [sic] ela se eu me der bem na faculdade. (ALEXANDRA, PEDAGOGIA)

Dessa forma, a classe trabalhadora tem visto no ensino superior uma

possibilidade de ascensão econômica e estabilidade financeira. Através das

cotas esse público tem conseguido cada vez mais acessar esse ambiente, mas apesar disso, muitos membros dessa classe para se manter dentro da

universidade têm que conciliar os estudos com o trabalho, sendo a condição

financeira também uma das dificuldades das quais as estudantes mães tem

enfrentado para garantir a sua permanência.

...eu estou fazendo o meu TCC, eu iria concluir esse semestre agora, mas eu estou vendo que eu não vou conseguir concluir, porque eu tenho tripla função, né? Eu trabalho, eu estudo, tento fazer o TCC [...] e ainda tenho que ser mãe. Então assim, é [sic] muitas funções que você tem que realizar no prazo de tipo assim, 24 horas, e 24 horas não da pra [sic] fazer tudo ao mesmo tempo, entendeu? (ÂNGELA, SERVIÇO SOCIAL)

...como é que eu vou fazer pra [sic] estudar, trabalhar e cuidar? São três coisas que você tem que tá “ligada” [sic] ao mesmo tempo. (HELENA, PEDAGOGIA)

Observamos que em muitas das respostas ter que se dividir entre mais

de uma função é uma tarefa cansativa e que exige muito dessas mulheres.

Podemos comparar esses fatos aos dados da pesquisa da Doutora em Serviço

Social Cibele Henriques feita na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em 2016:

...as mães trabalhadoras bolsistas e negras dos cursos de Pedagogia e Serviço Social que conseguem cumprir os prazos têm que sacrificar a vida pessoal, pois, mais do que uma dupla jornada, elas realizam, na verdade, uma tripla jornada para dar conta do “conflito” Trabalho, Educação e Vida Familiar. (HENRIQUES, 2015, p. 75)

Para as alunas que precisam levar os seus filho(a)s para a

universidade há ainda outros empecilhos, tais como o espaço físico da

universidade que não comporta as crianças, ter que dividir a atenção entre as

aulas e o(a)s filho(a)s, duas coisas completamente incompatíveis e lidar com

professore(a)s que muitas vezes não entendem as suas ausências em aula ou

são inflexíveis com prazos de trabalhos e reposições de provas. Além disso, as

alunas que amamentam, por exemplo, passam por dificuldades quando tem

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54 que ficar longe do(a)s filho(a)s nos períodos de aulas, porque seus corpos

estão passando por um processo de mudanças que demanda que a criança

fique próximo da mãe, como podemos ver no depoimento de Cora:

...é uma luta assim diária, conseguir me manter no ensino superior. Depois que é mãe é muito difícil acordar cedo vim pra cá [sic]. A principio ele estava com seis meses, em fevereiro, começou a aula e ele só mamava, então o que acontecia? A aula começa às 7 da manhã, eu pago matéria até 12h40, eu ficava até 12h40 sem amamentar e então meu peito inchava, meu peito ficava quente, eu ficava em estado febril, ele lá gritando por mim, então por muito tempo, fevereiro, março eu saia daqui, inúmeras vezes o peito vazando e eu ficava cheia de leite e tinha que ir embora quase que correndo atrás dele. Eu meio que precisava dele perto de mim, entendeu? Pra [sic] ele tirar o leite. E assim muito difícil o inicio dessa separação minha e dele, passar, apesar de ser só um período, mas um período que é assim pra [sic] mim, longo. (CORA, SERVIÇO SOCIAL)

O relato de Leila nos chamou atenção e nos dá uma dimensão do que

pode ser o cotidiano de uma mulher, pertencente da classe trabalhadora, negra e moradora da periferia e os desafios que ela enfrenta ao tentar acessar o

ensino superior:

Quais as dificuldades que eu enfrento? Mulher, são várias, olhe... Primeiro, antes de tudo a gente tem que entender meu contexto. Eu sou uma aluna pobre, de baixa renda, que venho de um contexto familiar bem complicado e eu fui casada, com 18 anos e logo depois que eu casei, com um tempo, eu acho que com uns três, quatro, meses eu engravidei [...] e sabe? Foi aquele choque, porque eu tipo com 18 anos, tinha uma vida toda pela frente e ali lidando com uma gravidez, com cuidar de uma criança, porque eu sempre priorizei os meus estudos, e tipo, como é que eu ia agora estudar, conciliar os meus estudos com uma criança. Ai então nesse momento, nessa fase, eu achei que estava tudo acabado, que eu não ia conseguir nunca fazer uma graduação, entrar na universidade e estudar. [...] No segundo semestre eu consegui entrar aqui na graduação, mas ai vem todo o choque, todos os problemas que a pessoa enfrenta, porque em casa eu não consigo estudar de jeito nenhum. Ai minha estratégia era o que? Eu venho pra [sic] universidade de manhã, estudo, e a tarde vou pra [sic] aula. Ai eu vinha, mas não tinha com quem deixar a minha filha, porque minha mãe era doente, vivia entrando e saindo de hospital, meu ex-marido, na época, era terrível e pra [sic] ele quem tinha cuidar de criança era a mãe [...]. Ele nunca desencorajou, “não vai estudar, não”, mas também ele nunca disse “eu fico com nossa filha pra [sic] você estudar”, nunca [...] sempre foi difícil estudar em casa, pelo fato de que quando eu chego em casa eu não sou só mais uma estudante, quando eu chego em casa eu tenho de fazer as coisas, tinha que lavar roupa, fazer

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comida, cuidar de criança, sozinha, porque meu ex-marido ele dizia “se vira, você que é a dona da casa, você que tem que fazer”. Então eu nunca tinha tempo pra [sic] estudar em casa, não consegui de jeito nenhum, ai meu rendimento acadêmico péssimo, péssimo, péssimo, porque não tinha como, porque meu ex-marido era muito machista, então acabava que eu tinha que fazer tudo e o estudo que se virasse. [...] A maternidade de certa forma, ela atrapalhou os estudos sim, ainda atrapalha, mas, não que eu, tipo assim, esteja dizendo pra [sic] alguém “poxa, eu me arrependo de ter feito”, não, eu amo a minha filha, mas eu acho que eu fui muito precipitada. Tipo assim [sic], eu não esperei o momento certo[...] porque naquela época não tinha uma perspectiva de futuro, porque eu era carente, não tinha um bom estudo, então pessoa que é pobre, que mora em comunidade, quando chega no ensino médio ou abandona os estudos ou sabe, pronto, quando eu concluir, acabou, vou ter que procurar um emprego ou até mesmo já estudar e trabalhar, porque não tem como se virar. A gente que é de periferia, a gente sabe que a gente não consegue entrar numa universidade, que a universidade é tipo uma utopia pra [sic] gente. Então pra [sic] mim naquela época eu achava o que? Não vou conseguir nunca fazer uma graduação, e tal, mas ai quando o jogo virou, tudo mudou, consegui de fato entrar na graduação, ai sim, eu tive que de fato aprender a conciliar maternidade e minha vida com os estudos... (LEILA, SERVIÇO SOCIAL)

Percebemos que essa aluna tinha uma realidade muito distante do

ensino superior, que não acreditava no próprio ingresso na universidade e teve

que criar forçar para lutar contra o machismo do marido, a falta de

oportunidade e as limitações financeiras para aprender conciliar sozinha a

maternidade com a graduação, um desafio sem dúvida imenso e que poderia

ser menos pesado se ela tivesse ao seu dispor ajuda não apenas da família, mas da universidade e do próprio Estado.

Sobre se essas alunas já precisaram faltar aula por causa do(a)s

filho(a)s a resposta é unânime, todas, mesmo aquelas que dispõem de alguma

ajuda dos familiares ou dos pais das crianças, ou que tem acesso a creche

pelo menos em meio período precisaram alguma vez faltar aula. Os motivos

são diversos e vão desde problemas de saúde das crianças, indisponibilidade

do parente que se encarrega dos cuidados da criança na ausência da mãe,

entre outros. Sobre se as alunas já precisaram levar o(a)s filho(a)s para a

universidade as respostas variam, 5 das alunas já precisaram, Cora, inclusive

assume que na única vez que fez isso não conseguiu se concentrar em dar

atenção ao filho e a aula ao mesmo tempo. Outro ponto interessante em seu

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56 depoimento é como ela conta que se sentiu acolhida por uma de suas

professoras:

... eu falei que tinha filho e ela disse que quando houver a necessidade ele sempre será bem vindo. Foi um diferencial, porque só ela falou isso. É muito importante que ela falou isso, eu me senti bem acolhida por ela, por ela saber que ser mãe e estudante é difícil e mesmo assim ela dispor da sala dela, né? (CORA, SERVIÇO SOCIAL)

É interessante perceber como algo que parece tão pequeno pode fazer a

diferença para essas mulheres que estão passando pela graduação e pela

maternidade ao mesmo tempo. É importante que elas se sintam acolhidas pelo

ambiente e pelas pessoas, o que nem sempre ocorre, como vemos no

depoimento de Simone que gostaria de trazer o filho, mas se sente desconfortável e com medo da reação de alguns de seus professores:

Entre trazer ele e faltar aula eu prefiro faltar aula, porque assim tem professores que não entendem, no próprio curso de pedagogia já teve uma aluna que segundo ela passou por um constrangimento, o professor rebateu e disse que não foi um constrangimento, mas ele pediu pra [sic] que ela se retirasse com o filho da sala de aula. Então assim, pra [sic] ele não passar por isso eu prefiro faltar aula, levar falta do que trazer ele pra cá [sic], embora as vezes eu tenha muita vontade de trazer pra [sic] ele conhecer, as vezes ele pergunta onde é a minha escolinha, que ele sabe que eu venho pra [sic] escolinha, né? Ele tem curiosidade, às vezes eu tenho vontade de trazer, mas tenho medo de que alguns professores peçam pra [sic] ele sair. (SIMONE, PEDAGOGIA)

Quem compartilha desse sentimento também é a aluna Ângela, que

ficou dividida entre levar a filha para a universidade ou faltar aula e optou pela

segunda alternativa já que presenciou debates sobre o tema em questão e

também entende que podem haver professores que não gostem da presença

de crianças em suas aulas.

Sobre o trancamento do curso, vemos uma tendência entre as alunas,

principalmente as que estão no meio do curso. Dentre as entrevistadas, 5 já

trancaram o curso, seja por complicações durante a gravidez, seja para cuidar

do(a)s filho(a)s durante os primeiros meses, ou por problemas na família que

se somaram a maternidade. As outras 3 alunas que não trancaram confessam que a ideia já passou por suas cabeças e que o trancamento ou atraso do

curso é uma realidade por qual todas passam ou cogitam. Dentre as

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57 entrevistadas apenas 1 não está desnivelada, que é Alexandra que entrou no

curso mais recentemente e está apenas no segundo semestre da graduação.

... até hoje passa assim pela minha cabeça, mas tipo trancar o curso seria assim, pra [sic] mim, sinônimo de derrota, entendeu? Eu tento tirar, me motivar diariamente, criar forças dentro de mim pra [sic] que eu consiga concretizar, é...finalizar esse curso, até por uma questão pessoal, mesmo de provar que eu posso, que eu sou capaz, independente de ser mãe ou não (ÂNGELA, SERVIÇO SOCIAL).

Tive que trancar, porque diante da situação não podia conciliar e a maioria das mães teve que trancar [...], então acaba atrasando, acaba o IRA, o rendimento que cai tudo (HELENA, PEDAGOGIA).

Sobre ter passado por situações vexatórias ou inconvenientes na UFRN

por serem alunas e mães as respostas dividem-se: 3 alunas responderam que

sim, 1 respondeu que ainda não, o que dar a entender que ela sabe que não

está isenta de passar por isso, 1 também disse que não passou, mas que já

presenciou e outra (Alexandra )disse que não sentiu que a situação foi

inconveniente, mas que já ouviu algumas “piadas” de colegas de sala, por sua falta de tempo para fazer trabalhos em grupo fora do horário de aula, ou que

inclusive faz com que ela prefira fazer as atividades individualmente. Outras 3

responderam categoricamente que não passaram por nenhum situação. Sobre

as alunas que já passaram por tal situação temos os seguintes depoimentos:

... eu trouxe ela pra [sic] uma aula, precisei trazer porque era um prova, ela já estava grandinha, tinha eu acho que uns 3 anos, ai criança de 3 anos não tem como você dizer “filha, não fala agora não que a gente tá numa prova”, não tem como ela não entende, é pequena. Ai eu trouxe a criança, ela ficou conversando e pintando em sala de aula, ai simplesmente a professora disse “de quem é essa criança?” ai eu disse “é minha, por quê?” ai ela disse “ela está atrapalhando a aula, é melhor você ir lá pra [sic] fora com ela”. Isso durante a prova, e uma professora, ok, né? Ai vim pra [sic] fora com ela, quando as minhas amigas terminaram de fazer a prova, as primeiras que saíram ficaram com ela aqui fora e eu fui terminar de fazer a minha prova, isso uma situação “mega”, “mega” [sic] chata pra [sic] mim e desde esse tempo que eu tentava assistência e não conseguia, sabe? (LEILA, SERVIÇO SOCIAL)

... assim, as pessoas falam muito, entendeu? Mas assim eu nunca ouvi de professor, eu só ouvi uma vez, tipo [sic], eu falei que se eu não pudesse trazer meu filho eu não ia poder vim e ai a professora falou, “ah a gente pode testar pra [sic] ver se ele fica quietinho”, eu, professora, nenhuma criança fica quietinha. Ai eu tipo nem [sic] vim, porque eu me senti meio

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assim, eu senti que não era bem aceita lá naquele espaço e de colegas várias vezes... (NÍSIA, PEDAGOGIA)

A aluna Simone, nos conta duas situações: uma durante a gestação e

outra em seu resguardo:

...eu passei por um problema na gestação eu estava passando mal na sala, minha barriga ainda estava pequena, mas eu já estava com 3 meses e a professora disse que era mentira, que eu não estava gravida, que eu queria ir embora, ai eu comecei a passar mal e vomitei nos pés dela, ai foi que ela acreditou pediu inúmeras desculpas, mas assim, é complicado (SIMONE, PEDAGOGIA).

... a aluna tem direito a fazer trabalhos em casa e uma das professoras fez todo o acompanhamento mandava os trabalhos tudo direitinho e eu consegui concluir a disciplina dela, só que outra [...] ela não me passou o conteúdo. Faltando dois dias pra [sic] encerrar o semestre ela me mandou quatro textos pra [sic] fazer três relatórios, então eu reprovei na disciplina dela, porque eu não tinha condição de em 24h concluir tudo, porque assim, eu estava sozinha, eu passei o meu resguardo sozinha, não tinha como dar conta da criança, da casa, ainda mais ler quatro textos, fazer três relatórios e assim foi uma coisa acordada durante o semestre, inclusive antes de entrar no recesso eu já tinha conversado com ela anteriormente explicando que ia me matricular, mas enfim, eu reprovei, porque não tinha condições, ela só me mandou tudo de última hora mesmo eu tendo conversado com ela anteriormente, ter mando email, ter ligado, mas ela só me mandou nos últimos dias. Eu achei isso muito constrangedor, sendo que era um direito meu (SIMONE, PEDAGOGIA).

Dessa forma, temos uma aluna que teve sua gravidez questionada,

como se alguma mulher fosse mentir sobre uma gestação para não assistir

uma aula e que teve um direito seu violado durante a licença maternidade,

mecanismo que as alunas podem acessar para fazer trabalhos de disciplinas

nas quais se matricula em casa, o que demonstra a falta de preparo do(a)s

professore(a)s para lidar com essas alunas, o que deveria ser mais bem

explorado pela universidade. Sendo assim, além de escutar coisas dos colegas

em sala, que não compreendem as suas situações, essas mulheres ainda se

deparam com professore(a)s que também não são capacitado(a)s, talvez, se o debate sobre a maternidade fosse suscitado de maneira mais presente na

UFRN, as pessoas que compõem a academia começariam a ver as alunas

mães de uma outra maneira, como indivíduos com particularidades que devem

ser levadas em consideração pelo ambiente.

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Felizmente, podemos ver que as mulheres dentro da universidade

também são resistência e se organizam quando tem seus direitos suprimidos,

Helena nos conta que ao presenciar o caso da aluna expulsa de sala de aula

com a filha por um professor do curso de Pedagogia, as alunas não aceitaram

e reivindicaram o seu direito de ser mulher, mãe e estar dentro de uma sala de

aula:

Não, nenhuma. Mas presenciei, graças a deus não foi comigo, porque eu acho que eu não saberia lidar com a situação, mas querendo ou não foi muito constrangedor e todas nós mulheres a gente reenvidou, fomos atrás, a gente não aceitou isso (HELENA, PEDAGOGIA).

Sobre se sentirem excluídas ou privadas de alguma atividade as

respostas foram quase unânimes, exceto Cora, que voltou com o filho há pouco tempo para universidade e afirmou ainda não ter passado por situações

similares, mas que sabe que futuramente podem acontecer atividades das

quais não possa participar. Outras alunas responderam que não, mas logo em

seguida deram exemplos de atividades das quais não participam por terem

filho(a)s:

Não, só intercâmbio mesmo, que não tem como, né? Penso muito em fazer, mas também penso “tenho uma filha”, fora isso não. Eu acho que de fato as atividades que eu me senti privada de fazer, não foram por causa da minha filha, mas sim por causa da renda mesmo, que eu não tinha dinheiro pra [sic] pagar inscrição, não tinha dinheiro pra [sic] pagar o material, foram por causa disso, não por causa da minha filha (LEILA, SERVIÇO SOCIAL).

O que chama atenção no depoimento de Leila, é a afirmação dela sobre

a sua situação financeira que muitas vezes a impediu de participar de

atividades do que a maternidade em si. Com isso percebemos que muitas das

atividades que a academia oferece, não são para todo(a)s e que pessoas,

sejam por sua situação financeira, seja por terem filho(a)s, ou qualquer outro fator, se veem impossibilitadas de participar.

Outras estudantes citaram atividades, tais como de lazer, festas ou

atividades do gênero, manifestações e protestos relacionados a movimentos

sociais e movimentos estudantis, bem como visitas institucionais para fazer

trabalhos, aulas de campo, congressos, eventos, entre outros, justamente por

todo o tempo livre do qual dispõe ser dedicado aos filhos e filhas. Separamos

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60 esse relato muito interessante de uma das entrevistadas, sobre como se sente

pressionada quanto aos julgamentos externos e como isso a faz não participar

de determinadas atividades:

O tempo inteiro, até porque mesmo quando você pode fazer, você faz e tem toda aquele julgamento, aquela pressão sobre como e o que uma mãe pode ou não fazer. Até quando recentemente eu voltei a trabalhar, faz três semanas que ele entrou na escolinha e eu voltei a trabalhar e nossa, escutei muita coisa. “Tadinho” é a palavra que eu mais escuto, “tadinho, já tá na escola”, sendo que eu passei um ano inteiro com ele em casa e ninguém vê isso, entendeu? (NÍSIA, PEDAGOGIA)

Temos também aquelas que infelizmente naturalizam essa privação:

Assim, a partir do momento que você é mãe você tem que se privar de determinadas coisas, sejam fatores relacionados ao acadêmico, seja ao pessoal, a questão da liberdade de sair, né?... (ÂNGELA, SERVIÇO SOCIAL)

...às vezes eu quero ir pra [sic] um congresso e não posso, porque são muitos dias que eu vou ter que ficar longe dele, mas tem esse lado que é uma questão de escolha, mas assim, privada não (SIMONE, PEDAGOGIA).

Percebemos que os valores sociais estão impregnados de tal forma, que

muitas mulheres não se dão conta de que se recebessem o apoio devido tanto

do Estado, como da universidade da qual fazem parte – com a oferta de

creches para os seus filhos e filhas – elas não precisariam se privar de

participar de determinadas atividades, sejam elas dentro ou fora da

universidade. A mulher que é mãe não precisa ficar reclusa a casa e aos

cuidados do(a)s filho(a)s e pode muito bem, se for da sua vontade e dispondo

do auxílio necessário, conciliar os seus projetos de vida pessoal, familiar,

profissional e social.

Como podemos ver no relato da estudante Helena, ela passou durante muito tempo da sua graduação sem se dedicar aos eventos, congressos,

publicações e em seu último ano na universidade, quando conseguiu o auxílio

creche e outros auxílios e bolsas ela conseguiu de fato concretizar os seus

projetos acadêmicos:

Sim, congressos, eventos, eu queria muito participar, mas não tinha como por conta dele. É tanto que do último ano pra [sic] cá eu publiquei tanto, tudo que eu não tinha publicado na minha vida acadêmica, que até os professores diziam assim “tá

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bom, Helena, tá bom...”. Eu entrei em todos os eventos, mas era como se eu quisesse, tipo, sugar o máximo que eu não suguei no inicio do curso. Publiquei 17 artigos, participei de vários eventos, suguei todos os auxilio ano passado, auxilio viagem, tudo, viajei por conta própria também, pedi ajuda, como eu era bolsista uma professora me ajudou muito, então assim viajei muito, fiz muita coisa que durante o curso eu não fiz (HELENA, PEDAGOGIA).

Quando a pergunta é sobre se as mães estudantes acham que a

universidade está preparada para recebê-las as respostas são unânimes.

Todas as entrevistadas responderam que a UFRN não está preparada para

acolher mulheres com filho(a)s. Para muitas delas, o despreparo vai desde o

momento da gestação, pois como afirmam, a estrutura física da universidade não foi pensada para gestantes, a UFRN possui uma organização onde o

restaurante universitário, as bibliotecas, os pontos de ônibus, entre outro locais

que ficam longe dos setores de aulas. Os prédios contam com muitas

escadarias. Os estacionamentos ficam distantes e não contam, por exemplo,

com vagas reservadas para grávidas. O circular, ônibus da universidade, está

sempre muito cheio, principalmente nos horários de pico, o(a)s outro(a)s

aluno(a)s, muitas vezes, como afirma Helena não cedem o lugar para as

gestantes. As alunas reclamam da falta de acesso a informações sobre

auxílios, licenças, entre outros benefícios. Para elas as informações são pouco

divulgadas e na maioria das vezes elas não sabem aonde procurar essas

informações e nem encontram pessoas que as passe. Cora inclusive menciona

que durante a sua gestação tentou participar de um curso para mães de primeira viagem que estava sendo promovido pela UFRN, mas quando

procurou orientações para sua participação a mesma foi informada que o curso

estava disponível apenas para funcionário(a)s, o que a estudante entende

como uma exclusão das alunas que também deveriam ser um público alvo

dessas iniciativas. Tal fator pode demonstrar que para a universidade a

gravidez destina-se apenas para as mulheres que já possuam estabilidade, se

encontram empregadas e não para as estudantes. A aluna ainda afirma que

não sente que a universidade apoia as estudantes mães e que inclusive sente

por parte da instituição certa resistência ao acolhimento desse público, como

se a sua permanência no curso não fizesse, em suas palavras, diferença para

a universidade, o que faz com que a sua continuidade na graduação seja um desafio diário. Cora sente um profundo sentimento de abandono e omissão,

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62 para ela a UFRN não tem priorizado a qualidade do ensino e que em diversos

momentos quando ela percebeu seu rendimento acadêmico caindo e procurou apoio, só encontrou barreiras diante da burocracia da universidade.

Para as estudantes muitas coisas faltam para a universidade ser um ambiente acolhedor para elas e seus filhos e filhas. A estrutura física da UFRN,

não possui desde fraldários, que é o mínimo para essas mulheres a creches,

que seria na visão da maioria das entrevistadas o ideal para elas. As alunas

reclamam também da postura do(a)s professore(a)s diante de suas particularidades, dentro outras barreiras.

... Não tá preparada de jeito nenhum para atender esse público, mesmo porque quando a gente precisa faltar, que a criança tá doente, ou precisa levar no médico, os professores não tiram lá a sua falta, colocam mesmo, não justificam, então não tem preparo mesmo não (LEILA, SERVIÇO SOCIAL).

Eu acho que não, principalmente por alguns professores que não entendem alguns casos. Teve um caso em que a minha filha ficou doente, avisei ao professor que iria precisar faltar a prova e ele simplesmente ignorou, não leu meu e-mail, então eu fiquei em uma situação que eu tive que fazer reposição, porque não tinha outra forma de fazer ele entender minha situação. Então alguns professores não entendem o caso, fazem pouco caso de você, ignoram, como se você fosse uma coisa de outro mundo, então eu acho que falta algum preparo dos professores (ALEXANDRA, PEDAGOGIA).

No caso apresentado por Alexandra, observamos que segundo a

resolução nº 171 de 2013 do CONSEPE, que aprova o novo regulamento dos

cursos regulares de graduação da UFRN, o(a) estudante tem direito a repor

apenas uma unidade, sendo que a instituição possui o total de 3 unidades para compor a nota final do graduando durante o semestre letivo. De acordo com o

parágrafo 2, do Art. 110 presente na resolução citada:

§ 2º Em caso de não comparecimento a mais de uma avaliação, a avaliação de reposição substituirá a nota de apenas uma das unidades, permanecendo a nota 0 (zero) atribuída às demais avaliações em outras unidades.

Sendo assim, se Alexandra por algum motivo perdesse outra avaliação

ou tirasse uma nota inferior a 3,0 em outra unidade ela teria sido reprovada na

matéria em questão, sendo então prejudicada pelo regulamento.

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Mais ainda, para as alunas Nísia e Berenice, a universidade pode se

configurar enquanto um espaço elitista e não está preparado para receber

aluna(o)s com filho(a)s, mulheres ou pessoas mais velhas:

Nem um pouco, aqui é um ambiente elitista de muitas maneiras isso tá se desconstruindo, mas até se for parar pra [sic] pensar no horário, quem é que saindo do trabalho consegue chegar aqui 18h45? Se tem alguém que trabalha não consegue chegar aqui 18h45 é impossível, só se tiver carro, enfim essas coisas. Então assim, se você tem seu filho te vira, entendeu? A universidade não é um lugar pra [sic] você (NÍSIA, PEDAGOGIA).

De forma alguma, nem mães, nem mulheres, é difícil. A universidade tá feita pra [sic] aquela pessoa que sai do ensino médio e cai de paraquedas aqui, com tudo fresquinho na cabeça, aquela coisa toda. Gente mais velha, mãe, mulher, por ser mulher assim só, já é bem mais complicado, eu acho que é assim (BERENICE, SERVIÇO SOCIAL).

Percebemos que essas alunas possuem a consciência de que é difícil

para muitos que fazem parte da classe trabalhadora, que são mulheres, que

são negro(a)s, que tem filho(a)s acessar e permanecer no ensino superior; que

não foi um ambiente pensado para receber esse público e que hoje, mesmo

após uma expansão do acesso, as instituições ainda não se ajustaram a

necessidade desse público.

Quando perguntado, mesmo as que não participavam de nenhum auxílio

qual a opinião delas sobre a eficácia desses na permanência do(a)s aluno(a)s, as respostas compartilhavam de muitos pontos em comum. Para todas essas

alunas os auxílios eram bem vindos, eram uma “ajuda” para aquele(a)s que

precisavam, mas estavam muito longe do ideal, principalmente o auxílio

creche:

...100 reais não supre a necessidade nem de uma escola mais simples que seja, entendeu? E tem que aluna bolsista receber isso pra [sic] cuidar de uma criança. Acredito que seria ideal se tivesse na universidade um lugar pra [sic] essas alunas mães deixarem os filhos e pegar no final do dia, seria perfeito, mas claro que também necessitaria de todo um processo de seleção pra [sic] ver, mas que não fosse por sorteio que nem o NEI, que fosse mesmo por entrevista, reunião, que fosse visitar ver a realidade e acredito que cabe as assistentes sociais fazer isso (HELENA, PEDAGOGIA).

... o NEI eu acho que deveria ser uma escola exclusiva para os filhos de alunos, principalmente de mães estudantes que

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precisam vim estudar e muitas vezes não tem com quem deixar. Eu passei um sufoco, porque minha mãe trabalhava na época, minha sogra também trabalhava, ainda trabalha, mas a minha mãe teve que deixar o emprego pra [sic] ficar nesse período de pegar e deixar ele na escola, porque nós não temos condições de pagar o carro pra [sic] deixar e pegar e mesmo que deixe teria que ter alguém pra [sic] ficar com ele até eu chegar (SIMONE, PEDAGOGIA).

... eu acho que deveria ter no mínimo [...] uma vaga em uma creche para a criança, uma vaga assim em tempo integral. Vamos supor, o NEI [...], tem quantas mães aqui na universidade, vamos reservar no mínimo uma cota para essas mães que são alunas e que precisam, mas eles não fazem isso entendeu? Do mesmo jeito que eles não tão nem ai, só querem da no máximo um auxilio, que eu nem sei quanto é, mas eu sei que não é suficiente, não da pra [sic] pagar, porque se não me engano é 150, pouquíssimo, não da pra [sic] pagar uma escola que você precise deixar o seu filho em tempo integral e escola pública a gente sabe que não rola. Eu já tentei ali no NEI [...] na época que eu tentei era muita, muita, gente, você da o nome e eles fazem um sorteio [...] eu acho esse método muito errado, porque ai acaba entrando muita criança que tem condição, que tem como pagar uma escola particular, mas por causa de status quer colocar o filho no NEI [...], poxa, tem tanta gente que precisa, as mães que tem aula aqui. Seria muito mais vantajoso você vim pra [sic] universidade e trazer o filho. Deixa, quando vai embora leva, seria muito melhor pra [sic] essas pessoas, do que pra [sic] quem tem como pagar. E outro critério que eu acho que eles deveriam analisar é a questão da renda mesmo, e eles não fazem uma seleção com base em critérios, eles apenas sorteiam e pronto (LEILA, SERVIÇO SOCIAL).

... primeiro que eu não conheço ninguém daqui que tenha esse auxilio (creche), inclusive, eu já encontrei com outras mães aqui, quando você anda com bebê outras mães vem falar com você e falaram que já tentaram procurar ajuda e tudo mais e tipo bateram porta na cara [...]. É um inicio, né? Pra [sic] gente ter o mínimo de ajuda, mas não é o suficiente, entendeu? A gente precisa, toda mãe, todo pai, precisa de uma rede de apoio e isso vai muito além da assistência no sentido financeiro, isso é uma das coisas que talvez nem se precisasse se a gente tivesse essa rede de apoio, mas como mãe acaba sendo excluída e tipo assim se vira entendeu, eu não tenho que te dar ajuda, é tipo isso (NÍSIA, PEDAGOGIA).

... assim eu entendo a parte da universidade, tem o auxilio creche no valor de 100 reais, mas eu acho que pra [sic] uma mãe que estuda e precisa deixar o filho com alguém pra [sic] vim pra [sic] aula [...] essa assistência não chega a ser pelo menos 50%. E pra [sic] quem estuda a noite é pior, porque não tem creche, tem que ser alguém (ALEXANDRA, PEDAGOGIA).

... ninguém fica com um bebê, uma criança, por 100 reais. Não existe creche de 100 reais. Tudo bem que é um auxilio, mas pra [sic] quem não trabalha? Pra [sic] quem não tem outra

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forma... isso ai é só um complemento, né? É difícil, se não for à rede pública que é bem difícil de conseguir vaga tem que trazer (BERENICE, SERVIÇO SOCIAL).

Assim, ajuda muito, ajuda bastante, mas eu acho que não é o suficiente. Eu acho que tinha meios, inclusive mais baratos de ajudar as mães aqui dentro da universidade com tanto espaço que tem, com alunos de pedagogia inclusive que podiam, sei lá, fazer um experimento, criar uma escola voltada só pras [sic] alunas que tem filhos, mas assim, eu não vejo investimento nessa parte, eu não vejo força de vontade da própria universidade, eu não vejo que pensam nessa parte, sabe? Da mãe aluna. Eu acho que tinha meios muito mais fáceis e efetivos e mais rentáveis de poder lidar com essa situação. [...] eu sinto falta desse olhar pras [sic] mães. Eu conheço colegas que tem a maior dificuldade, tem uma menina na minha turma que ela tem a maior dificuldade de pagar matéria, porque ela trabalha e tem filho e mora lá na Redinha. Ai o deslocamento, a questão do trabalho, a questão de deixar o bebê dela que é ainda mais novo que o meu filho, eu acho que tem uns 2 anos, tem toda essa dificuldade, sabe? Porque se ela pudesse trazer ele eu acho que facilitava e assim como eu não me culparia tanto, porque eu estaria mais perto do meu filho e seria uma oportunidade das minhas colegas, assim como eu, poder colocar em prática o que a gente aprendeu (SIMONE, PEDAGOGIA).

Dessa forma, para elas o valor disposto pela universidade é muito baixo e o ideal seria que a instituição dispusesse de um espaço interno para acolher

o(a)s filho(a)s do(a)s estudantes. Como relata Helena, se a universidade

estivesse utilizando métodos realmente eficazes para garantir a permanência

das alunas, ela teria terminado o seu curso no prazo estipulado pelo programa,

o que não ocorreu e ela só se formou 1 ano depois, ou seja, o seu curso que

teria duração de 5 anos, levou 6 anos.

Outro fato que chama bastante atenção é o da burocracia pela qual as

estudantes passam para acessar o auxílio creche. Helena, por exemplo, tentou

por 4 semestres, e só conseguiu no seu último período de curso, ou seja,

quando seu filho, que nasceu durante a graduação completou 5 anos. Já

Simone, que recebeu o auxilio durante 1 semestre, quando seu filho já estava com 2 anos, perdeu a renovação do benefício por não conseguir enviar, dentro

dos prazos estipulados pela UFRN os documentos necessários – a aluna que

não possui internet em casa e também não conseguiu acessar pela

universidade perdeu o auxílio. Leila também nos conta como foi indeferida do

auxilio:

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... é muito complicado pra [sic] conseguir esses auxílios, muita burocracia e as vezes não rola, como é o caso que eu já tinha explicado a você, que eu tentei, mas só pelo fato da minha filha estudar um período na creche pública, eu não consegui, sendo que eu preciso tá aqui na universidade manhã e tarde[...] e não tenho esse respaldo por eles, ai eu fico assim. [...] E tipo assim, naquela época eles disseram “ela já estuda”,[...] sim, mas e os outros períodos que ela também precisa ficar com uma pessoa, que eu estou na universidade e não tem quem fique, só porque ela tá na escola um período você não vai conceder o auxilio? Então são vários fatores e por isso que eu digo que a universidade não tá preparada pra [sic] ajudar essas mães (LEILA, SERVIÇO SOCIAL).

... com relação à assistência sempre que eu ia procurar era muito difícil, melhorou de uns tempos pra cá [sic], porque pediam muitos documentos, ainda pedem, pedem uma bateria de documentos, tipo assim, até o documento da casa da minha avó pediram, se estivesse no nome do meu avô, eu tinha que levar o laudo que pede o óbito dele, entendeu? Então dificulta muito... (HELENA, PEDAGOGIA)

Percebemos que é um desafio para essas mulheres continuarem e

concluírem os seus cursos de graduação, vemos membros de famílias que já

não possuem uma renda familiar alta terem de abdicar do emprego para cuidar

das crianças para que as alunas possam dar continuidade aos seus estudos.

Vemos mulheres sofrendo com o distanciamento do(a)s filho(a)s, com a falta

de tempo para dedicar-lhes e mais do que isso, vemos uma política de permanência que não tem sido eficaz para atender as necessidades dessas

mulheres, o que não se resume a uma realidade da UFRN. Segundo HENRIQUES (2016, p.75):

Na UFRJ, no campo empírico, observou-se que a política de permanência existente para essas mulheres no âmbito educacional é insuficiente e não reduz a sobrecarga da dupla jornada, nem tampouco permite a diplomação dentro do prazo estabelecido. A falta de estudo minucioso sobre as condições de vida, trabalho e moradia das mulheres mães trabalhadoras negras que ousam sair de casa para estudar e trabalhar retarda a construção de políticas de permanência universitária que contemplem as necessidades das mulheres mães trabalhadoras e negras.

É urgente que se discutam políticas que supram verdadeiramente as

necessidades das estudantes mães, é preciso que se priorize o bem estar das

crianças e dessas mulheres, que se escute esse público que tanto tem para

falar e sabe muito bem o que quer, um espaço, dentro da universidade que

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67 acolha os seus filhos e filhas em tempo integral enquanto se dedicam a tentar

através dos estudos ascender e darem a ele(a)s um futuro melhor.

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4. REFLETINDO SOBRE A HISTÓRIA DAS POLÍTICAS DE ASSISTÊNCIA ESTUDANTIL.

Esse capítulo contará no seu primeiro tópico com o debate sobre as

políticas de assistência estudantil no Brasil. O seu objetivo principal é analisar a

história dessa política; entender como o Estado tem tratado a assistência

estudantil e quais têm sido as estratégias para garantir a permanência dos

estudantes no ensino superior. Analisaremos a Contrarreforma do Ensino superior sob a perspectiva do Neoliberalismo e os seus rebatimentos na

Assistência Estudantil – o que ao longo dos anos tem resultado no

sucateamento das políticas de Assistência Estudantil e da Educação Superior,

que se manifesta no crescimento dos investimentos em incentivo a iniciativa

privada e nos ataques aos programas e projetos de assistência observados nos

cortes de números de bolsas e nas condicionalidades e critérios cada vez mais

rígidos. No segundo tópico, buscaremos conhecer a assistência estudantil da

UFRN, mais especificamente quais têm sido os programas e projetos voltados

para a garantia da permanência das mulheres mães na universidade.

Analisaremos pela página da Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis (PROAE), os

regimentos e editais dos programas, as resoluções sobre os serviços oferecidos e as especialidades dos serviços de saúde. Dessa forma, por meio

do relato das estudantes mães e da análise da política de Assistência

Estudantil da universidade será possível traçar uma dimensão do alcance das

ações desenvolvidas pelo campus e a eficiência dessas políticas sobre as

necessidades das mulheres mães da instituição.

4.1. ASSISTÊNCIA ESTUDANTIL E CONTRARREFORMA DA EDUCAÇÃO: OS AVANÇOS DO NEOLIBERALISMO NA EDUCAÇÃO

SUPERIOR.

Historicamente o acesso ao ensino superior no Brasil foi uma atividade

destinada apenas aos membros da elite. Conforme Silveira (2012) sem

universidades alojadas no país, aqueles que possuíam condições enviavam os

seus filhos para estudarem em terras europeias, mas especificamente em

Portugal e na França. Com a chegada da família Real Portuguesa ao Brasil, em

1808, e com a pressão da elite brasileira é que começaram a aparecer as

primeiras iniciativas daquilo que podemos chamar de ensino superior no Brasil.

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69 De acordo com Aranha (2006); Colossi (2001), citados por Silveira (2012),

vários foram os estados que ganharam escolas de ensino superior como a

Escola Politécnica e a Academia Militar. As áreas de atuação eram diversas e

variava entre cursos de engenharia civil, medicina cirúrgica, agricultura,

química, economia, até cursos como matemática, filosofia e desenho. Além

disso, no ano de 1827 foi criado em São Paulo e Olinda os cursos de Ciências

Jurídicas. Ao todo, em 1889, a república desenvolveu cerca de 14 escolas de ensino superior.

Apesar disso, é apenas em 7 de setembro de 1920, com o Decreto nº

14.343, que se instituí a primeira universidade brasileira, localizada no Rio de

Janeiro, que reunia administrativamente essas faculdades profissionais pré-

existentes (SILVEIRA, 2012).

É durante o mandato do governo de Getúlio Vargas, com a reforma

promovida no ensino superior – chamada de Reforma Francisco Campos – ,

em 1931 , que a politica de assistência estudantil para os estudantes

universitários passa a ser reconhecida pelo Estado e é regulamentada pela

primeira vez no Brasil por meio do Decreto nº 19.85/031 (SILVEIRA, 2012). No

mesmo ano o governo estabelece também: o Ministério de Educação e Saúde e o Estatuto das Universidades Brasileiras, instituído pelo Decreto nº 19.851 de

abril de 1931, que “afirmava que a universidade poderia ser oficial, ou seja,

pública (federal, estadual ou municipal) ou livre, isto é, particular” (SOARES,

2002 apud SILVEIRA, 2012, p.30).

A assistência estudantil preconizada até pouco antes da década de 1960

era uma assistência pontual, destinada apenas aos alunos oriundos das classes mais baixas, como forma de dar suporte às suas “carências” e assim

possibilitar um melhor aproveitamento do ensino. Em 1961, com a Lei de

Diretrizes e Bases (LDB) / Lei nº4.024, é que a assistência estudantil passa a

ser vista de outra forma, ou seja, como um direito, inserido na política de

educação, para todos os estudantes que dela necessite e não mais como uma

ajuda. O artigo 168, da Constituição Federal de 1967, traz novamente a

educação como um direito de todos e cita pela primeira vez que ela deverá

assegurar a igualdade de oportunidades. Os anos da ditadura trazem consigo

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70 também uma expansão das vagas na universidade8, o que estava longe de

representar uma democratização do acesso no sentido de permitir que a classe

trabalhadora atingisse o ensino superior – especialmente o ensino superior

público – que continuava a se expressar em algo muito mais acessível à

realidade dos homens brancos e burgueses (SILVEIRA, 2012). Além disso,

conforme Silveira (2012) baseado em Lima (2002) a ditatura não apresentava

uma conjuntura favorável à educação e aos estudantes que tinham o seu direito reduzido a praticamente nada.

Dessa forma, as inciativas apresentadas para a assistência estudantil

até meados dos anos 1980 foram marcadas por poucas ações. Tendo em vista

que a educação superior era um privilégio de poucos, as ações de acesso e

permanência recebiam escassa atenção do governo e se resumiam a

intervenções pontuais relacionadas mais para os níveis básico e médio do

ensino (SILVEIRA, 2012).

A partir dos anos 1980, os anos da redemocratização do Brasil, que

libertou o país da ditadura, novas propostas para a política de educação

superior são apresentadas. Foi nessa década que a questão da permanência

universitária começou a ser debatida no meio acadêmico durante os Encontros Nacionais de Pró-Reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis e reuniões

realizadas pela ANDIFES (SILVEIRA, 2012).

Em 1987, no intuito de fortalecer as políticas de assistência estudantil,

houve a criação do FONAPRACE, que em conjunto com o ANDIFES, criado

também na mesma época reivindicavam a integração regional e nacional do

ensino superior, no sentido de:

...garantir a igualdade de oportunidade aos estudantes das IES, na perspectiva do direito social, além de proporcionar aos alunos as condições básicas para sua permanência e conclusão do curso, contribuindo e prevenindo a erradicação, a retenção e a evasão escolar decorrente das dificuldades socioeconômicas dos alunos de baixa condição socioeconômica (SILVEIRA, 2012).

8 Tal expansão, que como afirma Leher (2013), foi muito mais expressiva para as instituições de ensino privado, que teve um crescimento de cerca de 800% do número de vagas, entre os anos de 1960 e 1980, e que contou com um aumento de cerca de 63% do número de matrículas, na década de 1980, em detrimento das instituições públicas de ensino.

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Todas essas reinvindicações ganharam força com a promulgação da

Constituição Federal de 1988, que visava garantir a efetividade dos direitos

fundamentais e a prevalência dos princípios democráticos, assim como,

contemplava o processo de redemocratização da educação, por meio da

universalização do acesso e da gestão democrática centrada na formação do

cidadão (SILVEIRA, 2012).

Apesar da crítica à ditadura ter colocado em evidência o perverso modelo privado-mercantil, conforme mostra Leher (2013), os lucros do setor

privado, apesar da oferta de cursos, no total sem qualidade, ampliou-se

exponencialmente sob o manto da filantropia, por isso a luta da Constituinte

priorizou a alocação de verbas públicas para escolas públicas. No artigo 207 da

Constituição Federal de 1988 a universidade é consagrada como uma

instituição autônoma e referenciada conforme os princípios de

indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, entretanto, o artigo 209,

permite a atividade do ensino à iniciativa privada. Os artigos 150 e 213

consentem o repasse de recursos públicos para as instituições “sem fins

lucrativos”, o que mais tarde viria a mudar, permitindo também o repasse para

instituições com fins lucrativos.

A conjuntura dos anos 1980 em diante não era favorável, como afirma o

Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES)

(2007). O período após a promulgação da Constituição Federal de 1988 trouxe

consigo também as primeiras articulações do governo para atender as

exigências dos organismos internacionais, o que requeria algumas mudanças

na Carta Magna. Tal processo foi retardado em virtude da incapacidade do então presidente Collor de Mello em “liderar a aglutinação de forças políticas

que foi aguçada pela crise que paralisou seu governo até a cassação” (ANDES,

2007, p.11), mas retomado junto com a articulação do Plano Real, liderado por

Fernando Henrique Cardoso (FHC), ministro no governo de Itamar Franco,

tornando possível traçar uma ponte coesa entre as forças conservadoras e a

agenda neoliberal9 em pauta. Empossado presidente em 1995, FHC

9 De acordo com o ANDES (2007), a doutrina neoliberal citada diz respeito à substituição do conceito de “direito social” – previsto na constituição enquanto um direito de todos e dever do Estado – pelo conceito de “serviços sociais e científicos” – dentro desses serviços estão as escolas, universidades, centros de pesquisa científica e tecnologia, creches, hospitais, entre outros – que diferente da constituição não prevê a exclusividade do Estado ao que tange os

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72 encaminha a agenda citada e começa um processo de privatização e

terceirização dos serviços de infraestrutura geridos pelo Estado e das

instituições de saúde, educação, cultura, ciência e tecnologia, entre outras

(ANDES, 2007).

Dessa forma, ganha força também o discurso neoliberal de que o

modelo adotado para a educação superior, que tem como base a

indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão – e que inclusive não foi totalmente implementado – é muito caro, atrasado e obsoleto (ANDES, 2007).

Sobre isso, vemos como uma das linhas de atuação do Ministério da Educação

(MEC), durante o governo de FHC, a expansão do:

...sistema de ensino superior público por meio da otimização dos recursos disponíveis e da diversificação do atendimento, valorizando alternativas institucionais aos modelos existentes. (Brasil, 1995 p. 26 apud ANDES, 2007, p.14).

Ou seja, temos um alinhamento das propostas do MEC com as diretrizes

do Banco Mundial (BM) para a Reforma do Ensino Superior nos países em

desenvolvimento, como o incentivo das fontes de financiamento das

instituições (ANDES, 2007). Conforme Leher (1999, p.23) O BM “abraçou o

ideário neoliberal e, diante da vulnerabilidade dos países endividados, impôs drásticas reformas liberais (ajustes e reformas estruturais)”. Ainda conforme o

autor, como é o caso do Brasil, durante os anos 1980 o país ainda tentou

resistir ao intervencionismo e à imposição do neoliberalismo, mas logo se

submeteu aos “ditames dos ‘Novos Senhores do Mundo’” (LEHER, 1999, p.24),

principalmente nos governos de Collor e FHC.

Segundo a lógica neoliberal do BM, a educação dos países periféricos deve estar adequada a uma lógica que prioriza o ensino mecanicista,

minimalista e aligeirado, voltado apenas para a formação em massa de

indivíduos capazes de atuar segundo as necessidades do mercado de trabalho

e não para a formação crítica. Dessa forma:

A educação é o maior instrumento para o desenvolvimento econômico e social. Ela é central na estratégia do Banco Mundial para ajudar os países a reduzir a pobreza e promover níveis de vida para o crescimento sustentável e investimento

investimentos na infraestrutura e a execução desses serviços, que deveriam estar no âmago dos direitos sociais.

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no povo. Essa dupla estratégia requer a promoção do uso produtivo do trabalho (o principal bem do pobre) e proporcionar serviços sociais básicos para o pobre (WORLD BANK, 1990 apud LEHER, 1999, p.25)

Coraggio (1996), citado por Dourado (2002), aponta que os fundamentos

das políticas propostas pelo BM estavam voltados para o “reducionismo

economicista presentes nas proposições para área da educacional, cujo escopo se centra na visão unilateral de custos e benefícios” (CORAGGIO, 1996

apud DOURADO, 2002, p.239). À vista disso, tal noção de política se

estabelece:

...na defesa da descentralização dos sistemas (ênfase no localismo, desarticulação de setores organizados...); no desenvolvimento de capacidades básicas de aprendizagens necessárias às exigências do trabalho flexível; na realocação dos recursos públicos para a educação básica; na ênfase à avaliação e à eficiência, induzindo as instituições à concorrência; na implementação de programas compensatórios (programas de saúde e nutrição, por exemplo), onde se fizerem necessários; na capacitação docente em programas paliativos de formação em serviço, dentre outras orientações (CORAGGIO, 1996 apud DOURADO, 2002, p.239).

Sendo assim, uma das prioridades do BM é redefinir a autonomia das

universidades, o que implica no afastamento do Estado da gerência dessas

instituições (LEHER, 1999), o que vai incidir diretamente também nas políticas

de assistência estudantil, na carreira profissional dos professores das IFES e em suas condições de trabalho, além também no acesso e na permanência da

classe trabalhadora no ensino superior.

Nesse contexto, voltando um pouco para a trajetória da assistência

estudantil temos em 1990, a aprovação da nova Lei de Diretrizes e Bases da

Educação (LDB), que traz como perspectiva para assistência estudantil a

“igualdade de condições para o acesso e permanência na escola” (SILVEIRA, 2012, p.59). De acordo com Silveira (2012) citando o FONAPRACE (1997), é

quando o sistema educacional brasileiro passa por um processo de

democratização – expandido o acesso para aluno(a)s oriundo(a)s de famílias

de baixa renda – que o Estado passa a se comprometer com a oferta de

condições concretas para a permanência dos alunos nas instituições de ensino

superior.

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Surge a compressão de que as instituições não estavam preparadas

ainda para enfrentar esse novo público ingressante e que precisavam pensar

em estímulos a “formação cultural, visando obter, na conclusão do curso, a

minimização de diferenças presentes no início dele, houve a necessidade de

elaborar uma proposta de política de assistência ao estudante” (SILVEIRA,

2012).

Em 2007, o FONAPRACE – depois da realização de inúmeras pesquisas para traçar o perfil socioeconômico dos estudantes das IFES – em conjunto

com o ANDIFES, apresenta um novo Plano de Assistência Estudantil que tem

por objetivo a apresentação de diretrizes que norteiem as definições de

programas e projetos de assistência estudantil. Os princípios que regem o

Plano Nacional de Assistência Estudantil são:

I) a afirmação da educação superior como uma política de Estado; II) a gratuidade do ensino; III) a igualdade de condições para o acesso, a permanência e a conclusão de curso nas IFES; IV) a formação ampliada na sustentação do pleno desenvolvimento integral dos estudantes; V) a garantia da democratização e da qualidade dos serviços prestados à comunidade estudantil; VI) a liberdade de aprender, de ensinar, de pesquisar e de divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber; VII) a orientação humanística e a preparação para o exercício pleno da cidadania; VIII) a defesa em favor da justiça social e a eliminação de todas as formas de preconceitos; IX) o pluralismo de ideias e o reconhecimento da liberdade como valor ético central (BRASIL, 2007 apud SILVEIRA, 2012, p.67).

Seus objetivos gerais e específicos:

a) Gerais: Garantir o acesso, a permanência e a conclusão de cursos dos estudantes das IFES, na perspectiva da inclusão social, da formação ampliada, da produção de conhecimento, da melhoria do desempenho acadêmico e da qualidade de vida; Garantir que recursos extra-orçamentários da matriz orçamentária anual do MEC destinadas às IFES sejam exclusivos à assistência estudantil.

b) Específicos: Promover o acesso, a permanência e a conclusão de curso dos estudantes das IFES, na perspectiva da inclusão social e democratização do ensino; Viabilizar a igualdade de oportunidade aos estudantes das IFES, na perspectiva do direito social assegurado pela Carta Magna; Contribuir para aumentar a eficiência e a eficácia do sistema universitário, prevenindo e erradicando a retenção e a evasão; Redimensionar as ações desenvolvidas pelas instituições e consolidar programas e projetos, nas IFES, relacionados ao atendimento às necessidades apontadas nas pesquisas sobre o perfil do estudante de graduação, a partir das áreas

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estratégicas e linhas temáticas definidas; Adequar os programas e projetos articulados e integrados ao ensino, à pesquisa e à extensão; Assegurar aos estudantes os meios necessários ao pleno desempenho acadêmico; Promover e ampliar a formação integral dos estudantes, estimulando e desenvolvendo a criatividade, a reflexão crítica, as atividades e os intercâmbios: cultural, esportivo, artístico, político, científico e tecnológico; Consolidar a expansão de um sistema de informações sobre assistência estudantil por meio da adoção de indicadores quantitativos e qualitativos para análise das relações entre assistência e evasão, assistência e rendimento acadêmico; Viabilizar por meio das IFES uma estrutura organizacional, em nível de Pró-Reitoria com as finalidades específicas de definir e gerenciar os programas e projetos de assistência estudantil; Desenvolver parcerias com a representação estudantil, a área acadêmica e a sociedade civil, para implantação de projetos (BRASIL, 2007 apud SILVEIRA, 2012, p.67-68).

De acordo com Silveira (2012) baseada no documento do Plano

Nacional de Assistência Estudantil, as áreas estratégias da assistência

estudantil são: a permanência que tem como linha temática a moradia, a

alimentação, a saúde física e mental, o transporte, a creche e as condições

básicas para atender os portadores de necessidades especiais; desempenho

acadêmico que engloba as bolsas, os estágios remunerados, ensino de

línguas, inclusão digital, fomento à participação político-acadêmica e o acompanhamento psicopedagógico; cultura, lazer e esporte, que inclui o

acesso à informação e à difusão das manifestações artísticas e culturais, além

do acesso a ações de educação esportiva, recreativa e de lazer; por último,

temos a área dos assuntos da juventude que acolhe a orientação profissional

sobre o mercado de trabalho, prevenção de fatores de risco, meio ambiente,

política, ética e cidadania, bem como saúde, sexualidade e dependência química.

No mesmo ano que foi elaborado Plano Nacional de Assistência

Estudantil o Programa de Apoio e Planos de Reestruturação e Expansão das

Universidades Federais (REUNI) é instituído conforme o Decreto nº 6.096 de

abril de 2007, no governo de Luís Inácio Lula da Silva. (SILVEIRA, 2012) Como

nos mostra Lima (2009) os objetivos do REUNI são:

...elevar a taxa de conclusão dos cursos de graduação para 90%; aumentar o número de estudantes de graduação nas universidades federais; aumentar o número de alunos por professor em cada sala de aula da graduação; diversificar as modalidades dos cursos de graduação, através da

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flexibilização dos currículos, da criação dos cursos de curta duração e/ou ciclos (básico e profissional) e da educação a distância, incentivando a criação de um novo sistema de títulos e a mobilidade estudantil entre as instituições (públicas e/ou privadas) de ensino (LIMA, 2009, p.3).

Embora tais objetivos a primeira vista e sem uma análise profunda dos

seus impactos possam aparentar melhorias no acesso e na permanência dos

alunos, de fato, não é o que ocorre. Contamos com uma expansão das vagas

na universidade, mas que na verdade, da maneira que é colocado traz mais

prejuízos para formação profissional do que benefícios. Temos a precarização

do trabalho docente, que conta com cada vez mais aluno(a)s em sala de aula,

sem que se priorize a contratação de novo(a)s professore(a)s. Nos deparamos

com uma flexibilização dos currículos que não tem como alvo a excelência na formação profissional, mas sim o aligeiramento da formação e a propagação

das modalidades de ensino a distância, que afastam o(a)s aluno(a)s do

ambiente acadêmico, dos debates e discussões em detrimento de um ensino

mecanicista. Além disso, temos uma maior alocação de recursos públicos nas

instituições de caráter privado, revertidos em bolsas e financiamentos

estudantis que poderiam ser investidos no aprimoramento do acesso e da permanência da classe trabalhadora no ensino superior público e de qualidade.

Dessa forma, como afirma Lima (2009), os objetivos do REUNI estão em

consonância com as diretrizes do BM para os países da periferia do capitalismo. Algumas das prescrições do BM, contidas no documento La

enseñanza superior: las leciones derivadas de la experiência, de 1995, para o

ensino superior são claras, conforme explica Dourado (2002, p. 240), e se

debruçam sobre a:

1) privatização desse nível de ensino, sobretudo em países como o Brasil, que não conseguiram estabelecer políticas de expansão das oportunidades educacionais pautadas pela garantia de acesso e eqüidade ao ensino fundamental, bem como, pela garantia de um padrão de qualidade a esse nível de ensino; 2) estímulo à implementação de novas formas de regulação e gestão das instituições estatais, que permitam alterações e arranjos jurídico-institucionais, visando a busca de novas fontes de recursos junto a iniciativa privada sob o argumento da necessária diversificação das fontes de recursos; 3) aplicação de recursos públicos nas instituições privadas; 4) eliminação de gastos com políticas compensatórias (moradia, alimentação); 5) diversificação do ensino superior, por meio do

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incremento à expansão do número de instituições não-universitárias; entre outras.

Observamos no item 4, como uma das premissas, a

diminuição/eliminação dos gastos com as políticas de assistência estudantil,

realidade com o qual nos deparamos atualmente. As políticas de moradia e

alimentação, por exemplo, estão cada vez mais seletivas com processos e

exigências cada vez mais rígidos. Essas politicas vão dando lugar a uma priorização das bolsas trabalho dentro da universidade – que nada mais é do

que compensar o déficit do número de técnicos-administrativos por meio do

trabalho remunerado de estudantes em meio período. Como afirma Leite

(2012, p.468) “o que realmente salta aos olhos é a ocultação do trabalho sob a

legenda de bolsa”. O Estado une então o útil ao agradável e transforma as

políticas de permanência de mecanismos de defesa do direito a educação em mero aparelho para a validação do sucateamento das IFES.

Ainda no ano de 2007 o Ministério da Educação (MEC), por meio da

Portaria Normativa nº 39 de dezembro de 2007, institui o PNAES, que se

efetiva através “ações de assistência estudantil vinculada ao desenvolvimento

de atividades de ensino, pesquisa e extensão, e destina-se a estudantes

matriculados em cursos de graduação na modalidade presencial” das IFES (SILVEIRA, 2012, p.70). Os objetivos do Programa são:

I – democratizar as condições de permanência dos jovens na educação superior pública federal; II – minimizar os efeitos das desigualdades sociais e regionais na permanência e conclusão da educação superior; III – reduzir as taxas de retenção e evasão e IV – contribuir para a promoção da inclusão social pela educação (BRASIL, 2010 apud SILVEIRA, 2012, p.71).

O público alvo da PNAES é então prioritariamente os alunos

provenientes das escolas públicas e com renda per capita de até um salário

mínimo e meio. O que não se caracteriza por uma política universal e que

muito menos expressa a inclusão de uma parcela considerável de pessoas que

necessitam da assistência estudantil, já que em nova pesquisa realizada pela

FONAPRACE – encomendada pelo ANDIFES, em 2010 – percebemos que o

número de alunos que teriam direito segundo esses critérios é discrepante do

número de alunos que realmente fazem parte desse atendimento. Nos dados é

mostrado que apenas 12% dos estudantes que se encontram dentro dos

critérios do PNAES são contemplados com os programas estudantis, sendo

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78 que o número total desses estudantes chegam a somar 44% dos alunos das

IFES (SILVEIRA, 2012).

Temos assim, desde os anos 1990, aquilo que chamamos de

Contrarreforma do Ensino Superior, que se iniciou nos governos de Collor de

Mello e Fernando Henrique Cardoso e continuou a se aprofundar nos governos

de Lula e Dilma. Tanto o REUNI quanto a PNAES até podem parecer, sem

uma analise cuidadosa e profunda, atender as reinvindicações pautadas na defesa da “universidade pública, gratuita, laica e de qualidade socialmente

referenciada” bem como, na “recuperação/ampliação de políticas estudantis de

acesso e permanência...” (LEITE, 2012, p.456), mas tanto uma quanto outra

não expressa nenhuma mudança nos sentidos citados, ao contrário. O que

percebemos com esse suposto novo modelo de educação, em especial do

ensino superior é: o amoldamento da política educacional as exigências

requisitadas pelo mercado; a transformação das universidades em um grande

negócio global; a instituição de um novo modelo profissional direcionado para o mercado atual; e a imobilização de possíveis resistências ao status quo, na

medida em que retira a crítica e a reflexão do processo educativo, afastando a

instituições de um possível potencial emancipador (LEITE, 2012).

4.2. A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA ESTUDANTIL PARA MÃES

ESTUDANTES NA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE.

A Universidade Federal do Rio Grande do Norte, localizada em Natal, no

bairro de Lagoa Nova, segundo o documento UFRN em números, de 2012 a

2015, disponível em seu próprio sítio na internet, é uma instituição de ensino

pública, organizada sob a forma de autarquia de regime especial e mantida pelo Ministério da Educação. A UFRN foi criada em junho de 1958 pela Lei

Estadual nº 2.307 e federalizada em dezembro de 1960 de acordo com a Lei nº

3.849. A universidade, em 2015, possuía cerca de 102 cursos de graduação,

na modalidade presencial, com cerca de 27.865 alunos matriculados e 2.934

estudantes distribuídos entre os 11 cursos de graduação a distância. O corpo

de funcionários da UFRN contava, na época, com cerca 5.474 profissionais,

entre eles docentes permanentes do ensino superior, da educação básica e

técnico-administrativos.

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Sobre as ações de assistência estudantil do campus, segundo o

Relatório de Gestão (2015) a instituição recebe recursos custeados pelo

Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES), instituído por meio do

Decreto de Lei nº 7.234, de 19 de julho de 2010, além de dispor também de

recursos orçamentários próprios. As ações de assistência ao estudante são

administradas pela Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis (PROAE), que

conforme o Art. 154. do Regimento da PROAE, está diretamente subordinada a Reitoria e tem por finalidade o planejamento, a coordenação, a supervisão e a

execução das atividades de assistência ao estudante, articuladas com as

ações acadêmicas.

A PROAE, como pode se observar no organograma abaixo, possui entre

a sua estrutura administrativa: o Gabinete do Pró-Reitor; a Assessoria Técnica;

a Comissão de Assuntos Estudantis; a Diretoria de Assistência Estudantil; a

Diretoria de Atividades Estudantis; a Diretoria do Restaurante Universitário; e a

Secretaria Administrativa.

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Figura 1 – Organograma da PROAE.

Fonte: PROAE

Como se vê, a maioria das diretorias possui determinadas

coordenadorias que, por sua vez, possui determinados setores. A diretoria que

vamos nos ater para analisar a assistência oferecida ao estudante no que

tange a sua permanência no ensino superior é a Diretoria de Assistência Estudantil que possui três coordenadorias: a Coordenadoria de Apoio

Pedagógico e Ações de Permanência (CAPAP), que possui os setores de

orientação pedagógica, controle e avaliação de bolsas e o setor de seleção; a

Coordenadoria de Atenção à Saúde do Estudante (CASE), que conta com o

setor de psicologia e o setor de encaminhamento médico odontológico; e a

Coordenadoria de Gestão das Residências Universitárias. Conforme o Art. 164.

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81 da subseção IV, do Regimento da PROAE, tal diretoria tem por finalidade

orientar, organizar e supervisionar os serviços de assistência ao Estudante.

Suas competências segundo o Art. 166, da mesma subseção, são:

I – propor ao Pró-Reitor mecanismos para a promoção de ações afirmativas e de permanência para os alunos de condições sócio-econômicas desfavoráveis; II – observar os critérios de seleção de alunos considerados prioritários, de acordo com a legislação vigente; III – acompanhar o desempenho acadêmico dos alunos beneficiados com a assistência estudantil; IV – supervisionar as demais ações de assistência estudantil desenvolvidas pela Pró-Reitoria.

Ainda na mesma subseção do referido regimento o Art. 167 discorre

sobre as competências da CAPAP e seus setores:

Art. 167. À Coordenadoria de Apoio Pedagógico e Ações de Permanência compete: I – coordenar os setores de orientação pedagógica, de controle e avaliação de bolsas e de seleção; II – propor à Diretoria a atualização de critérios de avaliação e acompanhamento dos alunos beneficiados com programas de assistência; III – propor à Diretoria ações corretivas para os alunos com dificuldades de ordem pessoal e material para conclusão de curso.

§1o Ao Setor de Orientação Pedagógica compete: I – identificar alunos com diferentes graus de dificuldades de permanência e conclusão de curso; II – classificar, de acordo com os diferentes graus de dificuldades, os alunos que necessitam de acompanhamento pedagógico; III – encaminhar os alunos com dificuldades de aprendizado para os procedimentos adequados.

§2o Ao Setor de Controle e Avaliação de Bolsas compete: I – cadastrar nos sistemas de informação e gestão da Universidade os alunos candidatos aos programas de bolsas da UFRN; II – avaliar a situação sócio-econômica de cada aluno e realizar a classificação de acordo com os critérios das resoluções vigentes; III – controlar o quantitativo e a distribuição das bolsas de acordo com o orçamento estipulado pelo Conselho de Administração.

§3o Ao Setor de Seleção compete: I – selecionar os candidatos às bolsas, ouvido o Setor de Controle e Avaliação de Bolsas; II – entrevistar os candidatos para a devida comprovação de renda familiar, quando for o caso; III – encaminhar os bolsistas selecionados para as unidades solicitantes; IV – encaminhar a relação dos bolsistas para o setor de pagamento competente.

Diante disso, o atendimento a(o)s estudantes pelos programas e bolsas

disponíveis na UFRN então condicionados a determinados critérios, entre eles a avaliação socioeconômica dos candidatos, sendo assim, segundo o Relatório

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82 de Gestão da UFRN (2015), citando a Resolução 026/2009 do Conselho

Nacional de Secretário de Estado da Administração (CONSAD), de 20 de

agosto de 2009, que dispõe sobre o auxílio a estudantes, a UFRN prioriza a

concessão de bolsas para os alunos considerados por ela em vulnerabilidade

socioeconômica, ou seja, aqueles provenientes de famílias cuja renda per

capita seja igual ou inferior a um salário mínimo oficial. O que é um pouco

menor do que o disposto pela PNAES, em seu Art. 5º, que afirma que os alunos a serem atendidos prioritariamente pelos recursos por ele

disponibilizados, são aqueles preferencialmente oriundos da rede pública de

educação básica e que possuem renda familiar per capita de até um salário

mínimo e meio, mas sem prejuízo, aos requisitos fixados pelas IFES, que como

indica o parágrafo 2º da PNAES, cabe as IFES definirem os critérios e a

metodologia de seleção dos alunos a serem beneficiados.

Além disso, ainda de acordo com o Decreto de Lei nº 7.234, em seu Art.

3º: O PNAES deverá ser executado de maneira articulada com as atividades de

ensino, pesquisa e extensão, objetivando o atendimento de estudantes

regularmente matriculados em cursos de graduação presencial das IFES.

Ademais, as ações de assistência estudantil deverão ser desenvolvidas, conforme o Parágrafo 1º, nas áreas de: moradia estudantil; alimentação;

transporte; atenção à saúde; inclusão digital; cultura; esporte; creche; apoio

pedagógico; e acesso, participação e aprendizagem de estudantes com

deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades e

superdotação.

Na UFRN, de acordo com o Relatório de Gestão de 2015 os programas e as ações voltadas para a assistência estudantil são os seguintes:

o Bolsa alimentação que oferta refeições que incluem café da

manhã10, almoço e/ou jantar aos estudantes que possuem a

necessidade acadêmica de se manter em turnos consecutivos na

instituição. Em Natal (campus central), tal atendimento é feito pelo

Restaurante Universitário (RU), nos campi do CERES (Currais

Novos e Caicó) e da FACISA (Santa Cruz), onde não existe RU,

10 É importante ressaltar que o café da manhã é disponível apenas para os estudantes que residem na universidade, ou seja, aqueles que estão alojados na residência universitária.

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esse apoio é feito por meio da concessão de dois tipos de bolsa,

uma no valor de R$ 150,00, destinada a estudantes que ou já

recebem bolsa moradia ou residem em cidades próximas e têm

necessidades de permanecer em mais de um turno na Instituição

e outra, no valor de R$ 300,00, que é concedida aos estudantes

moradores das residências. O RU do campus central atende tanto

estudantes bolsistas quanto estudantes pagantes. Dessa forma, atualmente o valor da refeição custa R$ 7,00 reais, para alunos

com renda per capita superior a 3 salários mínimos, R$ 3, 00

reais para alunos com renda per capita entre 1,5 e 3 salários

mínimos, tendo subsidio parcial do valor da refeição e subsidio

total para aqueles com renda per capita inferior a 1,5 salário

(PATRIOTA, 2016).

o Bolsa Moradia que visa assegurar moradia aos estudantes que

são procedentes de cidades/estados diferentes daquelas onde se

localiza os campis da UFRN e que necessitam desta modalidade

de apoio para permanecer e concluir sua formação superior. A universidade tem hoje disponível cerca de 10 residências de

graduação distribuídas entre Natal (10), Currais Novos (1), Caicó

(1) e Santa Cruz (1), totalizando 774 vagas. Além disso, a

instituição conta também com 2 residências de pós-graduação

localizadas em Natal e que são mantidas com recursos próprios

da UFRN, já o PNAES só aloca verbas para atender os alunos da graduação presencial. A universidade conta também com a Bolsa

Residência, ou auxílio moradia, onde os estudantes que não são

contemplados com vagas nas residências recebem um auxílio-

moradia no valor de R$ 250,00.

o Bolsa de Apoio Técnico e Administrativo (Bolsa Trabalho),

utilizada pela UFRN como estratégia de subsidiar alunos na

permanência e conclusão de seu curso. Para isso a instituição

disponibiliza as bolsas por meio dos seus centros acadêmicos,

para ter acesso ao valor de R$ 400,00 reais o aluno necessita, como contrapartida, desenvolver de 12 a 20 horas semanais de

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atividades de trabalho, estabelecidas de acordo com

especificidade e o objetivo de cada setor.

o Auxílio transporte que conta com o apoio financeiro, na quantia de

R$ 100,00 aos estudantes da UFRN para custeio do transporte no trajeto casa/universidade e universidade/casa.

o Auxílio atleta que tem por objetivo o incentivo à participação de

atletas de alto rendimento esportivo nas seleções da UFRN, para

isso a universidade disponibiliza o valor de R$ 400,00 reais aos bolsistas;

o Bolsa acessibilidade trata de uma ação afirmativa desenvolvida

pela universidade com o objetivo de atender a estudantes com

deficiência física, sensorial, intelectual ou pessoas com

transtornos do espectro autista, com o intuito de ajuda-las com as

despesas referentes ao descolamento, bem como, a aquisição de

instrumentos pessoais que sejam indispensáveis para o apoio a

eles.

o Auxílio óculos que atende a estudantes, em primeira graduação,

que necessitem de subsídio para aquisição de óculos ou lentes

corretivas, por meio da disponibilização de recurso financeiro no

valor de R$ 200,00 (duzentos reais), desde que respeitado o intervalo de no mínimo 12 meses, ou seja, um ano de uma

solicitação a outra.

o Auxílio instrumental acadêmico é um recurso financeiro oferecido

como auxilio aos alunos do curso de odontologia para aquisição

dos instrumentais necessários a sua graduação.

o Apoio para a participação estudantil em eventos científicos,

acadêmicos e culturais que tem por objetivo o apoio a

participação dos estudantes da instituição em eventos regionais,

nacionais e, excepcionalmente, internacionais.

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o Bolsas acadêmicas que englobam bolsas de pesquisa, extensão,

monitoria e ações associadas (que unem as três modalidades) e

são apoiadas com recursos da assistência estudantil. As bolsas

são repassadas para as pró-reitorias acadêmicas que se

encarregam de distribui-las entre os docentes por meio de editais

de apoio a projetos nas áreas mencionadas. O valor mensal de

cada uma dessas bolsas é também, como na bolsa trabalho, de R$ 400,00.

o Auxílio Creche, que tem por objetivo ajudar aos alunos e alunas

da UFRN, em primeira graduação, com filho(a)s entre 0 a 6 anos de idade e legalmente sob sua responsabilidade, a custear as

despesas referentes a creche e/ou serviço similar. Para isso a

universidade disponibiliza durante os meses que correspondem

ao período acadêmico de aulas o valor de R$ 100,00 reais para

estudantes com um filho e R$ 200,00 reais para estudantes com

dois filhos – sendo que o segundo benefício está condicionado ao atendimento de todos os classificados na seleção, incluindo os

alunos na fila de espera, ou seja o beneficio só será concedido ao

segundo filho (máximo de benefícios) se não houver nenhum

outro aluno a ser contemplado.

Além das bolsas e auxílios citados, a UFRN também oferta um conjunto

de programas e ações contínuas, dentre as quais se destacam: programa de Atenção à Saúde Mental do Estudante; Plantão Psicológico; Grupos de Apoio

Terapêutico; Programa de Aconselhamento em Saúde; Projeto de Extensão

Hábitos de Estudo (PHE).

Há ainda especialidades médicas disponíveis nos serviços de saúde da

UFRN ofertados pela CASE para os estudantes, são elas: clínico geral;

ginecologista; oftalmologista; nutricionista; odontologista; psiquiatra. Bem

como, exames médicos e laboratoriais: raio-x coluna (lombar, dorsal e cervical);

cabeça; membro inferior; membro superior; pé; mão; pescoço; tórax;

ultrassonografia de mama; ultrassonografia transvaginal; mamografia; citologia

oncótica; audiometria; hemograma completo; TGO (transaminase glutâmico-

oxalacética); TGP (transaminase glutâmico pirúvica); PSA (antígeno prostático

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86 específico); PSO (pesquisa de sangue oculto nas fezes); triglicerídeos; glicose;

EAS urina; EPF fezes; creatinina; colesterol total;

Lembrando que todos os beneficiados devem estar dentro dos critérios

da universidade. Para ter acesso a atendimento médico e psicológico os

estudantes devem estar cadastrados no Cadastro Único11, disponível no

SIGAA 12 da UFRN. Para concorrer às bolsas e auxílios além de cadastrado os

estudantes devem realizar a inscrição on-line no período disponibilizado, anexar toda a documentação comprobatória exigida nos editais e participar da

entrevista social, também no período agendado. Além disso, há alguns critérios

gerais para concessão e renovação das bolsas na universidade, tais como: ser

aluno em situação de vulnerabilidade social, o que já foi citado; estar

regulamente matriculado em um número de disciplinas que permita o término

do curso dentro do limite máximo estipulado para integralização curricular do

discente; apresentar, a partir da data da concessão do auxílio, desempenho

acadêmico satisfatório; e para quem concorre a modalidade alimentação, é

necessário também, possuir atividades acadêmicas em turnos consecutivos na

UFRN. Todos esses critérios estão de acordo com o disposto na Resolução

022/1991 do CONSAD.

A titulo de informação os documentos gerais necessários para a maioria

das bolsas aqui citadas são, como disposto nos editais do Auxílio Alimentação

e Residência e nos editais do Auxílio Creche, Atleta e Óculos:

Documentos do candidato: RG ou Certidão de Nascimento; Carteira de Trabalho (página de identificação do trabalhador e página contrato de trabalho, mesmo sem registro de vínculo empregatício) ou Protocolo de entrada no documento; Certificado de conclusão ou Histórico Escolar do Ensino Médio ou Diploma de Graduação; Declaração de bolsista, apenas para alunos que desejam solicitar a BOLSA ALIMENTAÇÃO, contendo as seguintes informações: Tipo de bolsa (apoio técnico, pesquisa, extensão, monitoria, etc.), dias e turno em que desenvolve as atividades de bolsistas. (Caso seja Bolsista na UFRN)

Documentos da família: RG ou Certidão de Nascimento de todos os membros da família; Certidão de óbito do pai ou mãe, se for o caso; Certidão de casamento com averbação de divórcio (dos pais ou estudante), se for o caso; Comprovante

11 Trata-se de um instrumento de coleta de dados e informações que tem a função de identificar todas as famílias em situação de vulnerabilidade social. 12 Sistema Integrado de Gestão de Atividades Acadêmicas.

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de residência Exemplo: água, luz, telefone, IPTU, prestação do imóvel financiado); Se Imóvel alugado: contrato de aluguel ou último recibo de pagamento do aluguel; Comprovante de renda de todos os membros que trabalham. Podem ser utilizados como comprovação: a) Carteira de Trabalho - cópia das páginas de identificação do trabalhador, último contrato de trabalho e página com registro atualizado do salário referente ao ano de 2015; ou b) Contracheque ou holerite atualizado (outubro ou novembro ou dezembro); ou c) Última declaração de Imposto de Renda completa; d) Extrato de Benefício da Previdência Social atualizado; ou e) Guia de recolhimento do INSS atualizado; ou f) Declaração Comprobatória de Percepção de Rendimentos – DECORE, dos últimos três meses, feita por contador ou técnico contábil inscrito no CRC. Se tiver cargos de direção, apresentar Pró‐Labore; ou g) Declaração de renda informal (“bicos”) contendo a atividade que exerce e a remuneração, com assinatura reconhecida em cartório.

Outros documentos: Em caso de familiar com doença incapacitante ou uso contínuo de medicamentos: a) Laudo médico com CID (Código Internacional de Doenças), quando se tratar de doença crônica ou degenerativa; b) Comprovante de despesa com saúde, em caso de pessoas em tratamento. Em caso de Participação da família em Programas Sociais: a) Cartão do Programa Social em questão (Bolsa Família, Benefício de Prestação Continuada etc); b) Extrato atualizado de recebimento do benefício. (UFRN, 2015)

Uma lista extensa, que demonstra a burocracia enfrentada pelos alunos

para comprovarem a veracidade da sua necessidade. Além disso, há também

documentos específicos para algumas bolsas, como por exemplo, no caso do

auxílio óculos a receita atualizada e emitida por médico oftalmologista no prazo

de até três meses antes da data da entrevista, atestado de quitação de auxílios

financeiros recebidos anteriormente e um termo de compromisso e

responsabilidade de que o auxilio irá para a finalidade que se destina. Para o

auxílio atleta é necessário o currículo desportivo atualizado, comprovante da

federação atestando que o atleta é federado e matriculado em clube filiado,

declaração da divisão de atividades desportivas atestando que o aluno participa das seleções, avaliação médica e termo de compromisso e

responsabilidade. Para o auxílio creche, não seria diferente, é necessário além

da certidão de nascimento da criança uma declaração ou recibo de despesas

com creche, escola, babá ou cuidadora e o termo de responsabilidade.

Além de tudo o aluno tem o prazo de até 30 dias, depois do deposito

bancário, para prestar contas à universidade por meio de nota fiscal com CNPJ

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88 e o nome do beneficiário. Aqueles que tiverem despesas em um valor inferior

ao concedido deve inclusive, devolver a diferença.

Observamos no que tange ao auxílio creche, conforme indicado pelo

Relatório de Gestão da UFRN, que foi concedido, em 2015, a 68 estudantes o

benefício a um filho(a) e a 8 estudantes o benefício foi concedido a dois

filho(a)s. Em 2016, 66 alunos foram beneficiados com o auxílio, um pouco

menos do que o previsto em edital, já que a oferta era de bolsa para 100 estudantes com filho(a)s. Dos 100 alunos que concorreram – exatamente o

número limite de bolsas a serem concedidas – 34 foram desclassificados ou

tiveram o pedido indeferido, sendo 22 no primeiro caso e 12 no segundo caso.

É importante ressaltar, que o beneficio se encerra quando a criança completa 6

anos de idade e/ou quando já ocupa vaga em creche do munício ou no Núcleo

de Educação Infantil (NEI) da UFRN, sendo tal vaga integral ou não.

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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS.

Ao longo dessa pesquisa tínhamos o objetivo de analisar os impactos

das políticas de assistência estudantil da UFRN, na realidade das estudantes

mães da instituição, principalmente no que diz respeito à garantia de sua

permanência no ensino superior. Pretendíamos entender as dificuldades

enfrentadas pelas alunas, ao mesmo tempo em que conhecíamos as políticas

de assistência estudantil que o campus desenvolve para elas, compreendendo o seu papel na garantia da permanência desse público no ensino superior.

Tínhamos a curiosidade de entender e investigar os impactos da

contrarreforma do ensino superior e dos avanços do Estado neoliberal nas

políticas da assistência estudantil das IFES, além dos rebatimentos da

sociedade patriarcal de gênero e dos ideais de maternidade concebidos por

essa mesma sociedade na vida das mulheres mães e estudantes. Para isso,

utilizamos como método o materialismo histórico dialético para apoiar a nossa

pesquisa bibliográfica e análise dos resultados da entrevista semiestruturada e

do questionário que foram aplicados com as mães estudantes matriculadas nos

curso de Enfermagem, Pedagogia e Serviço Social com filho(a)s em idade de

creche, que vai do 0 aos 6 anos.

Percebemos ao longo do trabalho que a sociedade patriarcal de gênero

incide diretamente na vida das mulheres mães dentro da universidade, que a

visão machista de que lugar de mulher é em casa, cuidando do(a)s filho(a)s,

ainda impregna o imaginário social que possui um ideal de maternidade

baseado na abdicação, no sacrifício dos planos pessoais em nome da família.

É cobrada das mulheres mães uma postura onde essas sempre priorizem os filho(a)s em função de qualquer outra vontade e que se sintam culpadas, se as

coisas assim não forem feitas. Dessa forma, o Estado não se dedica a pensar

nas necessidades desse público dentro dos espaços públicos, pois a

concepção que se predomina é que o seu destino é o ambiente doméstico. São

poucas as vagas em creches públicas, são poucos os espaços que possuem

fraldários, isso inclui bancos e instituições públicas e privadas. Essa

negligência, obviamente tem se estendido as instituições de ensino, tanto de

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90 nível médio 13 quanto de nível superior, o que resulta muitas vezes na evasão

escolar14 das meninas e mulheres mães. Além de tudo, os programas e

projetos do governo que estão voltados para a assistência estudantil,

infelizmente, não tem obtido êxito e se encarregam mais de burocratizar e

impor condicionalidades ao acesso do que alcançar de fato o atendimento das

necessidades da classe trabalhadora dentro do ensino superior público. Como

vimos, a política neoliberal tem guiado a contrarreforma do ensino superior e se encarregado de velar de expansão o sucateamento da educação. Sendo

assim, constatamos que as políticas de assistência voltadas para as alunas

mães são praticamente inexistentes, além disso, a única bolsa disponível para

elas – o auxílio creche – como as mesmas relataram, tem um valor muito

ínfimo (100 reais), que não se encarrega em apoiar, de fato, financeiramente a

inserção das crianças em creches privadas, nem a subsidiar a contratação de

profissionais que se encarregam de cuidá-las.

Os dados colhidos revelaram que a idade média dos ingressantes da

universidade está de acordo com a média da idade fértil da população jovem

brasileira, ou seja, o(a)s jovens brasileiro(a)s ingressam no ensino superior

justamente quando estão mais propensos a terem filho(a)s. A UFRN, infelizmente, assim como as universidades brasileiras em geral não tem levado

em consideração tal fato e não investe nem na formação profissional, nem na

promoção do debate sobre a maternidade e muito menos em políticas que

possam garantir que esses jovens não abandonem a universidade. Dessa

forma, nos deparamos nos relatos das entrevistadas, com a falta de preparo de

professores e colegas para entender a sua situação que demanda necessidades diferentes e dificuldades para conciliar o tempo com as

atividades da academia, o cuidado do(a)s filho(a)s e da casa e muitas vezes,

também com o trabalho, o que acaba expondo as alunas mães a circunstâncias

que as deixam desconfortáveis. Além disso, percebemos que essas alunas em

sua maioria estão com os seus cursos atrasados. Elas não possuem

informações sobre os programas e mecanismos que podem acessar e mesmo 13 A gravidez na adolescência é uma realidade que assola, segundo dados do Sistema Nacional de Nascidos Vivos – Sinasc, do Ministério da Saúde, citados no relatório da UNICEF, sobre o direito de ser adolescente, em 2009, 290 mil meninas com idades entre 12 e 17 anos. 14 Em matéria publicada pelo G1, em dados expostos pela Pesquisa Nacional de Amostras em Domicílio (Pnad), por exemplo, aproximadamente 75% das adolescentes com filho(as)s se encontravam fora da escola, uma porcentagem muito alta que demonstra que o Estado tem falhado com essas jovens.

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91 aquelas que procuram pelas escassas políticas voltadas para as alunas mães

lidam com a burocracia da instituição e despreparo dos profissionais sejam eles

docentes ou servidores.

É muito importante deixar claro que de acordo com o que pudemos

analisar nos depoimentos das alunas mães, elas não se arrependem de serem

mães, elas são felizes tendo o amor dos seus filhos e filhas, mas é inegável

para elas que a tarefa da maternidade seria algo muito mais leve se a sociedade não as cobrasse tanto e se o Estado disponibilizasse creches em

tempo integral. É preciso eliminar de uma vez por todas a concepção de que

mulheres com filhos não são outra coisa além de mães. É preciso enxergar que

a maternidade pode sim vir acompanhada de outras funções, se assim for

desejado, que ela não precisa vir acompanhada de uma dedicação tão

exclusiva que seja necessário abdicar-se inclusive do trabalho, do lazer, dos

estudos. É preciso que a maternidade venha para somar na vida daquelas que

desejam ser mães e não para limitar, para podar. Como podemos perceber é

preciso que a Universidade enxergue as necessidades dessas alunas, é

preciso que as instituições se adaptem tanto fisicamente, melhorando o acesso

para gestantes, disponibilizando fraldários e creches próprias, quanto preparando o quadro de servidores e docentes para entender as peculiaridades

de alunos e alunas que tenham filho(a)s.

Ademais, almeja-se que esse trabalho contribua para a expansão do

debate a cerca do gênero e da desromantização da maternidade não apenas

dentro do curso de Serviço Social, mas em toda a academia. Que os dados

aqui colhidos sirvam como para que a UFRN aprimore as políticas e programas voltados para a assistência estudantil das alunas mães e que o cotidiano

dessas alunas não seja mais levado adiante como uma luta que essas

mulheres têm de travar diariamente para conquistar o seu espaço no mercado

de trabalho.

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