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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE INSTITUTO DE ARTE E COMUNICAÇÃO SOCIAL PEDRO HENRIQUE DA SILVA SANTOS Panorama da Indústria de efeitos visuais digitais: globalização dos meios de produção, revoluções tecnológicas e subsídios governamentais. Niterói 2016

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

INSTITUTO DE ARTE E COMUNICAÇÃO SOCIAL

PEDRO HENRIQUE DA SILVA SANTOS

Panorama da Indústria de efeitos visuais digitais: globalização dos meios

de produção, revoluções tecnológicas e subsídios governamentais.

Niterói

2016

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PEDRO HENRIQUE DA SILVA SANTOS

Panorama da Indústria de efeitos visuais digitais: globalização dos meios

de produção, revoluções tecnológicas e subsídios governamentais.

Projeto Experimental apresentado ao

Curso de Cinema e Audiovisual da

Universidade Federal Fluminense como

requisito obrigatório para a obtenção do

grau de Bacharelado em Cinema e

Audiovisual.

Orientador: Prof. Dr. Tunico Amâncio.

Niterói

2016

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Agradecimentos.

Agradeço à minha família, especialmente a meus pais, Pedro e Valdenice, pelo apoio,

incentivo e investimento que têm dado às minhas escolhas.

A meu professor Tunico Amâncio, que aceitou me orientar no meu projeto

monográfico.

À professora Eliane Ivo, que me indicou para o meu primeiro trabalho com efeitos

visuais.

À equipe de pós­produção da Conspiração Filmes, especialmente Claudio Peralta,

Adriana Basbaum, Luiza Waddington, Thiago Pires e Ronaldo Pucci, que formaram o

profissional que sou hoje.

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Resumo.

O presente estudo monográfico busca analisar a indústria de VFX (Efeitos Visuais

digitais) da revolução digital iniciada no final da década de 80 até à crise de 2013. Analisar o

processo histórico que ocasionou o êxodo dos grandes estúdios de VFX norte­americanos nos

anos 2000, os quais se espalharam ao redor do mundo, levando em consideração o

mapeamento dos suntuosos incentivos fiscais estatais concedidos por potências econômicas, a

fim de atrair a produção e a pós­produção de grandes “blockbusters” para seus territórios. 1

Perceber o papel dos efeitos visuais digitais em uma produção hollywoodiana no quesito

financeiro, artístico e produtivo, assim como o processo de digitalização pelo qual passou a

indústria na década de 1990 e as suas consequências, tais quais a globalização do fluxo de

trabalho e a ascensão da Oceania e Europa como players significativos no mercado mundial.

Com base na repercussão criada pela mídia hollywoodiana relevante e a movimentação nas

mídias sociais fomentada por blogueiros e figuras expressivas que defendem a causa, o estudo

retrata o panorama atual da indústria de VFX e como esse modelo de negócios se aloca no

processo produtivo cinematográfico “tent­pole” , ressaltando o poder do VFX na contenção 2

de custos, viabilização de uma produção suntuosa e aumento da bilheteria. Também queremos

frisar o pioneirismo da Industrial Light & Magic, atualmente o maior player do mercado, e

sua importância no surgimento dessa indústria até a consolidação dos três grandes estúdios de

efeitos visuais da década de 90: ILM, Digital Domain eRhythm & Hues e discutir produções

relevantes que foram disruptivas no aprimoramento artístico e tecnológico do setor.

Palavras­chave: Vfx, incentivos fiscais, Computação Gráfica, pós­produção digital, mercado

de efeitos visuais digitais.

1 Filme popular de alto orçamento e com altos retornos financeiros. 2 Produções com orçamentos acima de $100 milhões e com altos rendimentos ao redor do mundo.

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Sumário

1.0.Introdução………………………………………………………………………………..1

2.0. A importância dos efeitos visuais digitais para Hollywood.…………………..……....4

2.1. Efeitos visuais na economia de Hollywood.………………….………………….……… 4

3.0. O modelo de negócios por trás da indústria de efeitos visuais…………...……..….....9

3.1. Revolução tecnológica…………………………………………………………….….......9

3.2. A demanda por efeitos visuais…………………………………………………………...11

3.3. Margem de lucro para efeitos visuais e mercado. ……………………………………….13

4.0. Efeitos visuais e revolução digital…………………….………………………………..16

4.1. 1977 ­ Star Wars………………………………………………………………………….16

4.2. 1982 ­ Star Trek II: A ira de Kahn……………………………………………………….17

4.3. 1982 ­ Tron……………………………………………………………………………….18

4.4. 1984 ­ As Aventuras de André e Wally B………………………………………………..18

4.5. 1984 ­ O último guerreiro das estrelas…………………………………………………...18

4.6. 1985 ­ O Enigma da Pirâmide…………………………………………………………....19

4.7. 1989 ­ O Segredo do abismo……………………………………………………………..19

4.8. 1991 ­ Exterminador do futuro 2…………………………………………………………20

4.9. 1992 ­ O Passageiro do Futuro…………………………………………………………...20

4.10. 1993 ­ Jurassic Park…………………………………………………………………….21

4.11. 1994 ­ Forrest Gump…………………………………………………………………....21

4.12. 1996 ­ Independence Day………………………………………………………………22

4.13. 1997 ­ Titanic…………………………………………………………………………...22

4.14. 2000 ­ Mar em Fúria……………………………………………………………………23

4.15. 2001 ­ A trilogia de O Senhor dos Anéis……………………………………………….23

4.16. 2002 ­ Homem Aranha………………………………………………………………….24

4.17. 2003 ­ Piratas do Caribe………………………………………………………………...24

4.18. 2005 ­ King Kong…………………………………….……...…………………………25

4.19. 2007 ­ Transformers………………………………………...………………………......25

4.20. 2008 ­ O curioso caso de Benjamin Button…………………………………………….25

4.21. 2009 ­ Avatar…………………………………………………………………………....26

4.22. 2012 ­ A Vida de Pi……………………………………………………………………..27

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5.0. Globalização do VFX…………………………….……………………………………..29

5.1. Subsídios Fiscais na indústria cinematográfica……………………………………….....29

5.2. Como os Subsídios influenciam a indústria de Efeitos Visuais………………………….31

5.3. Guerra dos Subsídios…………………………………………………………………….32

5.4. Como Funcionam os Incentivos Fiscais………………………………………………….34

6.0. Considerações Finais…………………………………..…………………………..……38

7.0 Referências……………………………………………………………………………….41

7.1 Bibliografia……………………………………………………………………………….41

7.2 Webgrafia…………………………………………………………………………………41

7.3 Videografia…………………………………………………………………………....…..43

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1.0. Introdução.

A década de 90 é considerada a década da revolução digital dos meios produtivos, seja

na indústria automobilística, financeira, farmacêutica, construção civil, entre outras, quando o

computador revolucionou o fluxo de trabalho e a velocidade de concepção da indústria

manufatureira e de serviços. Na indústria cinematográfica, não foi diferente e a etapa onde

essa revolução se tornou mais significativa foi na pós­produção, onde o computador substituiu

as gigantescas “traquitanas” de efeitos óticos, simplificando e aperfeiçoando a cadeia

produtiva. E oferecendo aos produtores um nível de realismo nunca antes alcançado através

de efeitos óticos.

O processo de digitalização da indústria de VFX foi disruptiva na atividade

cinematográfica nos anos 90. Estúdios começaram a viabilizar produções suntuosas, onde o

VFX era usado na contenção de custos e concepção de imagens de realismo nunca antes

alcançados. O surgimento de produções disruptivas no processo cinematográfico e

tecnológico foi essencial na consolidação da indústria, mostrando sua força em atrair

bilheteria e inovar no campo da “mise en scène”. Exterminador do Futuro 2, Jurassic Park,

Titanic, Forrest Gump entre outras, foram produções que levaram o conceito de

“blockbusters” a outro patamar, e o que os diferencia dos grandes “blockbusters” da década

de 70 e 80, foi o uso intensivo de efeitos visuais digitais.

Com o passar do tempo, os custos de obtenção de ferramentas foram caindo devido à

ávida concorrência na indústria de “hardwares” e “softwares”; empresas tais como Silicon

Graphics, Sun Microsystem, HP, IBM, entre outras, competiam entre si tanto em qualidade

quanto em produtividade de seus equipamentos, e todas queriam provar ao mercado que suas

soluções valiam o custo benefício. A consequência dessa competição foi a queda significativa

de preços, aumento de qualidade operacional e a globalização da indústria de VFX. Vemos no

começo dos anos 2000 o surgimento de grandes estúdios de VFX fora dos Estados Unidos e o

“know­how” se espalhar pelo mundo, chegando ao Reino Unido, Oceania e Ásia.

Há de se notar que tal revolução digital não foi o único fator responsável pela

globalização da indústria de VFX; o surgimento na Europa de um mecanismo fiscal antigo e

crucial na proteção de produções locais e de relevância artística surgiu, porém para atrair

suntuosas produções hollywoodianas dispostas a gastar milhares de milhões em território

europeu. Foi com Harry Porter e o Prisioneiro de Azkaban (2004, dir. Afonso Cuarón), que

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os incentivos fiscais passaram a ser o coringa na voraz competição entre os estúdios de VFX.

No caso de Harry Porter, a Warner Bros, estúdio responsável pelo filme, deveria filmar e

finalizar boa parte de sua produção em território inglês caso quisesse se habilitar para receber

os incentivos fiscais. Consequentemente, tais incentivos foram peça chave na consolidação e

mapeamento de uma indústria cinematográfica mundo afora.

Para qualquer país desenvolvido, o surgimento de uma indústria de cinema saudável

economicamente é questão estratégica, levando em consideração o poder multiplicador

causado por uma produção relevante em seu território: indústria hoteleira, escritórios de

advocacia, restaurantes, figuração, maquiagem, aluguel de câmeras e equipamentos

cinematográficos, aluguel de veículos, ajudantes gerais, camareiras, costureiras, enfim, o

poder multiplicador recai sobre todos os níveis de formação profissional, levando em

consideração, que é uma indústria não poluente e de curto médio prazo. Porém, a eficácia

desses incentivos na consolidação de uma indústria saudável economicamente é colocada em

cheque, no momento em que tais benefícios criam um processo de submissão voraz da

indústria cinematográfica ao dinheiro do contribuinte. Os valores incentivados atualmente

chegam na casa dos milhões, tendo como grande beneficiário os grandes estúdios as “majors”,

que são os únicos financeiramente capazes de cumprir os requisitos mínimos necessários para

serem habilitadas em tais incentivos e que souberam barganhar, mundo afora, pelo aumento

dos benefícios fiscais, sob ameaça de alocação de suas produções, caso suas exigências fiscais

e políticas não sejam atendidas.

Não podemos culpar integralmente só o surgimento das leis de incentivo como o único

fator responsável pela atual situação dos estúdios de VFX. A má gestão e a consolidação de

um modelo de negócios falho têm de ser levados em consideração. Analisar situações onde

filmes lucraram milhões e deixaram estúdios de VFX com dívidas astronômicas é crucial para

entender o contexto. Tais episódios de bancarrotas se tornaram corriqueiros no vai e vem da

indústria de efeitos visuais mundial, vide o evento de maior repercussão para o setor: a

bancarrota do estúdio Rhythm & Hues em 2013; episódio evidenciado pela mídia devido aos

protestos na premiação do Oscar de 2013, onde artistas de VFX protestaram frente ao local da

premiação, o teatro Dolby, exigindo mudanças no modelo de negócios consolidado pelas

majors.

Com isso, o presente projeto pretende analisar o espectro de acontecimentos que

levaram a indústria à situação atual; traçar o histórico evolutivo e a consolidação dos

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principais “players”, analisando suas estruturas financeira e processual; esmiuçar o panorama

internacional e entender a economia de Hollywood, indagando sobre seus dividendos e

estrutura financeira.

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2.0. A importância dos efeitos visuais digitais para Hollywood.

2.1 Efeitos visuais na economia de Hollywood.

O modelo econômico protagonizado pelos grandes estúdios na consolidação de seu

conteúdo ao redor do mundo sofreu diversas implicações com o passar do tempo. Vemos na

década de 40 o ápice da verticalização econômica dos mesmos, quando controlavam desde o

financiamento, passando pela produção, distribuição e, para fechar a cadeia, a exibição. O

modelo de “star system” imperava forçando diretores, escritores e atores a se sujeitarem a

contratos exclusivos e longos.

Em 1950, através do episódio conhecido como US vs Paramount, a suprema corte

americana decidiu que as “majors” não poderiam possuir em seus modelos de negócios 1

cadeias de exibição. Isso mudaria o modo como os grandes filmes hollywoodianos eram

produzidos, distribuídos e exibidos; desintegrando um modelo de verticalização que

perdurava há 5 décadas. Na década subsequente, a consolidação da televisão afronta as

grandes companhias cinematográficas, criando uma opção a mais de entretenimento para os

espectadores. Tal contexto fez com que os grandes estúdios adotassem estratégias de

sobrevivência e uma postura mais “venture capitalists” , passando a financiar uma carteira de 2

conteúdos, distribuindo­os através de uma rede global de relacionamentos, logo passando a

administrar um portfólio especializado de gênero distintos, a fim de reduzir seus riscos e

auferir dividendos.

Não é de hoje que o modelo de negócios adotado pelos grandes estúdios é a

maximização dos lucros em cima da propriedade intelectual. Com a segmentação da

distribuição audiovisual em janelas, os estúdios passaram a explorar com estrita exclusividade

o conteúdo audiovisual em janelas subsequentes (cinema, home video, televisão, pay TV etc)

em prazos determinados, constituindo uma cadeia de fluxo de caixa contínuo e globalizado.

1 “Majors” é o termo que se refere aos maiores estúdios de cinema de Hollywood, cujas operações estão todas centradas desde a chamada Idade de Ouro dos anos 1930 e 1940 de Hollywood. Estes estúdios são: Universal, Walt Disney, Twenty Century Fox, Paramount, Sony e Warner Bros. 2 Financiadores que aportam recursos em firmas pequenas ou emergentes com grande potencial de crescimento.

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Para realizar tal intento, uma poderosa infraestrutura global é necessária a fim de administrar

e customizar o conteúdo para um lançamento global.

O impacto da perda de audiência não fora apenas no que diz respeito à operação. A

constituição demográfica do espectador hollywoodiano foi totalmente remodelada, pois com o

crescimento da popularidade da TV e seus subsequentes vertentes ( payTV, pay per view etc),

estas adquiriram barganha e capital ao negociar com as super estrelas e realizar super

espetáculos; com isso, espectadores mais velhos preferiam desfrutar de um bom

entretenimento na poltrona de casa. O fato é que Hollywood foi forçada a focar suas forças

em uma audiência mais nova e mais aberta ao novo. Pesquisas mostram que audiências abaixo

de 25 anos tendem a ouvir a música do momento, jogar games em computadores, consumir

conteúdos similares em livros, gibis e revistas, os quais fazem deles muito mais efetivos ao se

promoverem e interessarem­se mais por efeitos visuais e ação.

É nesse novo contexto que vemos o surgimento de novas franquias “tent­pole ”, 3

orçamento acima de 100 (cem) milhões, dominarem as bilheterias da década de 90 até os dias

de hoje (2016). Dentre as vinte maiores bilheterias segundo BoxOffice Mojo, tabela 2.1, é

fácil notar que a totalidade é composta por filmes onde o papel dos efeitos visuais é

primordial em sua narrativa e dramaticidade. E o mais importante a se notar é a ausência

quase que completa de algum grande ator ou atriz de renome na maioria desses filmes.

Leonardo DiCaprio não era uma estrela de Hollywood quando estrelou Titanic, seus ganhos

com o filme foram em torno de um milhão de dólares. O mesmo serve paraSam Worthington

estrelando Avatar, Chriss Pratt em Jurassic World e Shia LaBeouf em Transformers. Vin

Diesel estrelou um personagem secundário em o Resgate do Soldado Ryan, 1998, e

protagonizou o fracasso de bilheteria Eclipse Mortal, 2000, antes de estrelar a franquia

Velozes e Furiosos, a qual é recheada de efeitos visuais digitais. Hoje, todos esses atores

citados são estrelas hollywoodianas com salários superiores a dez milhões de dólares.

Na tabela 2.1, nas linhas em amarelo temos filmes que não necessitaram de um “star

system hollywodiano” para garantir suas bilheterias e que os efeitos visuais digitais foram

características cruciais no poder comercial.

3 Tentpole movies são filmes de orçamentos suntuosos, geralmente acima de $100 milhões e que trazem retornos financeiros significantes para os estúdios e seus investidores ao redor do mundo.

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Fonte: BoxofficeMojo

Novas franquias, tais como Velozes e Furiosos, Twilight, Hunger Games e

Transformers estabilizaram­se sem uma grande estrela por trás de seus lançamentos. E

grandes atores sabem que seus nomes impulsionam a bilheteria, mas recentes

desapontamentos como Cowboys & Aliens (Harrison Ford e Daniel Craig), R.I.P.D. (Jeff

Bridges) e Lone Ranger (Johnny Depp) estão mudando as perspectivas das altas comissões

pagas à grandes estrelas. A receita clássica do “blockbuster” havia mudado e filmes como

Tubarão e a Franquia Indiana Jones tornaram­se filmes eventos mais conhecidos como

“tent­pole movies”, tais como as franquias Transformers, Avatar, Iron Man etc. sendo uma

extensa fonte de dividendos hollywoodiana. Hoje de 60% a 70% da receita advinda da 4

4 Paper theatrical market statistics MPAA. 2015. p.4. www.mpaa.org/wp­content/uploads/2016/04/MPAA­Theatrical­Market­Statistics­2015_Final.pdf

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bilheteira vem do mercado internacional, logo o VFX é o principal veículo de promoção,

tornando­se uma nova linguagem internacional.

Licenciamento para tv a cabo, internet, desenvolvimento de brinquedos infantis,

vendas de DVD, locação de DVD, licenciamento para companhias aéreas, direitos de

pré­venda internacional, product placement, music records; enfim, esses são alguns do setores

que o licenciamento advindo do brand cinematográfico proporciona. Em 2012, esse tipo de

licenciamento faturou 49.3 bilhões de dólares com Disney dominando o mercado de

licenciamento de personagens faturando em torno de $39.4 bilhões de dólares. A Disney se

tornou o maior licenciador com marcas que vão desde Star Wars, Carros, Mickey e seus

amigos, Toy Story, Spider man etc. Em segundo lugar, temos a Warner com rendimentos em

torno de $6 Bilhões de dólares . 5

O alto custo de produção das franquias hollywoodianas fez com que os estúdios

diversifiquem seus custos de produção a fim de diversificarem seus riscos inerentes aos

grandes lançamentos. Não usar recursos próprios no financiamento de um filme, foi a

principal solução no modelo hollywoodiano de produção pós década de 90. Product

Placement , contratos de pré venda, fundos de hedge e subsídios governamentais são as 6 7

principais alternativas que os estúdios usam para diminuir seus riscos, possibilitando uma

cartela de investimentos em diversas outras alternativas.

Subsídios governamentais são a principal operação a ser questionada e avaliada nesse

presente projeto monográfico, pois sua consolidação como prática corriqueira no mercado de

filmes “tent­pole” foi o principal fator na retirada massiva de profissionais de efeitos visuais

dos EUA migrando para países tais como Nova Zelândia, Canadá e Inglaterra; consolidando

uma escala de produção global de “VFX”. A pós­produção de filmes de pequeno e médio

porte consolida em seu território uma indústria totalmente não poluente, de alta

empregabilidade e geração de renda a curto médio prazo, logo impulsionando a economia

local fortemente no conceito de uma indústria sem chaminés. Cidades como Wellington na

Nova Zelândia e Londres na Inglaterra, provaram do sabor do desenvolvimento impulsivo da

indústria de VFX. Ambas cidades oferecem subsídios governamentais para que filmes

5 ROSS Scott e GRAGE, Pierre (p. 30. 2014.) 6 Product Placement é a forma de inserir mensagens publicitárias de formas subtil no conteúdo de programas de televisão, filmes, games, revistas, rádios, eventos, etc, ao invés de simplesmente as exibir como anúncios comerciais. 7 Fundos de Hedges são fundos de investimentos que negociam retornos encima do backend gerado pela obra. Entre os principais estão: Annapurna, Legendary, Skydance e Relativity Media.

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realizarem seus efeitos visuais em suas empresas locais, atraindo produções tais como: O

Senhor dos Anéis, Wellington, e a série Harry Porter, Londres (Soho).

Um filme como Cleopatra, 1963, pode ser feito hoje com uma fração do custo de

produção ajustado pela inflação. Navios e cenários elaborados não tinham de ser mais

construídos para aparecerem realisticamente nas telas. Mesmo um número grande de pessoas

podia ser criado digitalmente por uma fração do custo, dispensando figurantes, diretores de

figuração e toda a logística envolvida. Peter Jackson em O Senhor dos Anéis e a trilogia

Hobbit provaram isso. Se James Cameron pudesse ter usado um Titanic todo em versão

digital, reduziria massivamente os custos de produção.

A verdade é que a tecnologia digital pode fazer quase tudo em uma convincente

qualidade realística. E o custo atrelado a isso gira em torno de um quinto até a metade do

custo de produção total do filme, levando uma média de 7 a 24 meses para ser concluído e

uma equipe em torno de 200 pessoas.

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3.0. O modelo de negócios por trás da indústria de efeitos visuais.

3.1. Revolução tecnológica.

A necessidade de alta performance e processamento no surgimento das primeiras

imagens computadorizadas fez com que surgissem alguns “players” com o modelo de

negócios voltado a atender a esta específica demanda. IRIS e Octane eram as duas soluções

mais frequentes no processamento de imagens digitais. Criados por uma companhia chamada

Silicon Graphics Inc., fundada em 1982 e especializada em construir computadores de alta

performance, as estações de trabalho SGI custavam em torno de $45.000 a $100.000.

O crescente desenvolvimento da indústria fez com que novos “players” voltados a

soluções “hardwares”, particularmente Sun Microsystem, surgissem no mercado e

ameaçassem a hegemonia da Silicon Graphics. Como uma solução para não perder espaço no

mercado, a SGI lançou uma nova ferramenta mais barata, em torno de $20.000, porém menos

potente chamada Eclipse. Tal iniciativa foi o primeiro sinal que mostrava o barateamento de

um componente vital à indústria de VFX, o “hardware”. E foi na década de 90 que a SGI

enfrentou sua maior competição no mercado de super computadores de pequeno porte: Sun

Microsystem, NeXT, Pixar, Microsoft e Intel Computers entraram na concorrência com

soluções de baixo custo. Em meio ao ambiente hostil, a SGI não viu outra alternativa a não ser

reduzir ainda mais seus preços. Porém, Windows NT e os computadores da HP e DELL eram

ainda muito mais baratos e não muito lentos.

Estúdios de efeitos visuais começaram a migrar de SGI/SUN Workstatios para Linux

ou Windows Intel Workstations. A SGI tentou se reestruturar várias vezes durante os anos

2000, mas falhou em seus novos nichos declarando falência em 2009. Já a Sun Microsystem

conseguiu restruturar seu modelo de negócios para servidores de alta performance e foi

vendida para a Oracle em 2010 por 7.4 bilhões. A quebra dessas duas companhias marcou o

fim da era dos computadores de alta performance dedicados exclusivamente à imagens

computadorizadas, influenciando de modo direto o modelo de negócios praticado pelas

empresas de VFX, até porque o alto custo das soluções hardware era uma variável importante

na margem de lucro alcançada pelas empresas pós­produtoras. Influenciando de forma direta a

concorrência em um mercado de prestação de serviços, que antes era fechado a um círculo

seleto com poder de investimento inicial.

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Em junção ao Hardware, há o software necessário na concepção da imagem digital.

No começo, as empresas de VFX disponíveis no mercado: Industrial Light & Magic, Dream

Quest Images e Boss Film tinham que desenvolver suas próprias ferramentas. Engenheiros,

matemáticos e artistas trabalhavam em conjunto para criar suas próprias soluções. Desde Star

Wars, a Industrial Light & Magic inovou nos efeitos visuais como ninguém, pois seu plano de

negócios foi desenvolvido levando em consideração as inovações tecnológicas em “hardware”

e “software”.

Essa conjuntura começou a mudar em 1984 com o surgimento da Wavefront

Technologies, uma companhia especializada em computação gráfica fundada por Bill Kovacs,

artista gráfico que trabalhou em Tron, 1982. O primeiro produto da Wavefront foi comprado

pela Universal Studios para sua série de televisão chamada Knight Rider, 1982­1986. Bill

Kovacs desenvolveu junto com quatro novos pioneiros: Jim Keating, John Grower, Marc

Sylvester e Roy A. Hall o primeiro visualizador 3D disponível comercialmente para

animações 3D, modelagem e composição.

Consequentemente quando Steve Jobs adquiriu a divisão de computação gráfica da

Lucas Filmes, Jobs rebatizou a empresa de Pixar e disponibilizou comercialmente sua solução

de renderização chamada Renderman e com o crescente mercado de softwares para VFX no 8

final dos anos 80, surgiram grandes competidores para disputar mercado com a Wavefront,

tais como: Alias e Softimage. Os produtos da Alias eram preferidos para algumas áreas de

modelagem e design, enquanto o Softimage tornou­se muito popular para animações 3D.

Softimage foi adotado pela ILM para as animações de Jurassic Park. Outros grandes

competidores: 3Ds Max da Autodesk e Prisma, futuro Houdini, da SideFX, seguiram na cola

da Wavefront.

Para consolidar o market share da SGI na indústria de VFX, a empresa anunciou a

compra da Wavefront Technologies, Inc. e a Alias Research, Inc. em 1995. Essas duas

companhias foram fundidas em uma única companhia chamada Alias/Wavefront. A fusão das

duas resultou em um software mais robusto, mais potente e mais fácil de aprender chamado

Maya, em 1998. Atualmente Maya é o software mais popular entre os estúdios de VFX.

8 Renderização é a etapa em que há o processamento final da imagem computadorizada, é nessa etapa em que a luz, textura e shading (reação da luz no elemento) do objeto são calculados.

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Devido à dura competição imposta pela conjuntura da época, Alias/Wavefront,

Autodesk, Softimage, Adobe e Side Effects contra atacaram abaixando os preços de suas

soluções em 3D para inflar seus lucros em volumes de vendas a fim de esmagar um ao outro.

Um mercado como esse é sempre bom para o consumidor. Para as companhias, isso significa

vender seus produtos com margens de lucro baixíssimas, tornando o modelo de negócios

insustentável.

SGI teve vários problemas e teve que vender a Alias a uma companhia de

investimentos chamada KKR Investments em 2004. Dois anos depois, a KKR vendeu a Alias 9

para a Autodesk por $197 milhões, adquirindo, também, a Softimage, em 2008, por $35

milhões. Em 2014, a Autodesk parou de desenvolver o Softimage devido à queda nas vendas

e interesse. Enquanto Maya e 3D max estão vivos e progressivamente atualizados pela

Autodesk. Atualmente só temos dois grandes concorrentes na indústria de softwares

High­End 3D: Side Effects e Autodesk, sendo muito difícil alcançar a Autodesk devido a suas

vantagens em desenvolvimento e a retenção das patentes mais importantes.

Durante um período de 20 anos nós vimos os preços dos “hardwares” de alta

performance serem reduzidos em 96%. Softwares 3D, tais como Maya caírem em 80% nos

últimos 10 anos. Nos primórdios do VFX, sabemos que os estúdios pagavam milhões para

desenvolver suas próprias soluções e no curso de 20 anos o custo dos softwares de VFX

caíram em torno de 96%. Tal situação fez com que surgissem “startups” ao redor do mundo 10

dedicadas ao ofício do VFX e competindo com os grandes estúdios de VFX por projetos de

pequeno a médio porte. E ao mesmo tempo em que a qualidade dos softwares vendidos

comercialmente crescia, dispensando a necessidade de desenvolver soluções pelas próprias

empresas de efeitos visuais, a arte do VFX não era mais um ofício fechado a um pequeno

círculo de cientistas, alterando a geografia do mercado.

3.2. A demanda por efeitos visuais.

A oportunidade trazida pela evolução dos efeitos visuais digitais é evidente. Cineastas

do mundo inteiro se apegam a oportunidades cinematográficas criadas principalmente pelos

9 KKR investments ­ Kohlberg Kravis Roberts 10 Startups são empresas jovens, inovadoras e com alto potencial de crescimento

11

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efeitos invisíveis. Hoje, este tipo de processo mudou a forma como cineastas desenham suas

produções por uma simples razão: conter custos.

Um dia de filmagem pode rapidamente custar milhares de dólares. Qualquer chuva

imprevista, engarrafamento, erro de continuidade, sujeira na lente, erros de luz, trepidação da

câmera podem ser salvos através dos ajustes perpetuados pelos efeitos invisíveis. Com isso,

os efeitos invisíveis são inerentes a qualquer produção de baixo a alto custo; e vão desde o

cenário de época criado digitalmente, que aos olhos do espectador se passa por algo real, à

cicatriz de um personagem importante para a narrativa. Podendo ir além, tal como o

rejuvenescimento de Jeff Bridges em Tron, 2010, ao Planeta Marte na qual o Personagem de

Matt Damon se encontra perdido em Perdido em Marte, 2015.

É obvio que grande demanda por efeitos visuais vem através dos filmes “tent­pole”, os

quais custam centenas de milhões de dólares e mantêm artistas do mundo inteiro ocupados

trabalhando em todos os fusos horários. Cenas de ação magníficas, destruições em massa,

robôs gigantes são o que filmes como Independence Day, Pacific Rim e Transformers têm a

oferecer. Vale lembrar que o principal alvo de Hollywood é uma plateia que adora essas

novidades.

O maior problema para a indústria de VFX é que os filmes “tent­pole”, os quais

ocupam boa parte das empresas e do orçamento, são disponibilizados por um pequeno número

de grandes companhiascomo clientes. Este oligopólio dos seis maiores estúdios: Disney, Fox,

Paramount, Sony, Universal e Warner possui um extenso poder em controlar os preços de

seus fornecedores.

A volatilidade do montante de trabalho disponível em um período particular para uma

empresa de efeitos visuais é altamente imprevisível. É impossível medir com precisão o

orçamento e o cronograma de um trabalho para os efeitos visuais. Estúdios atrasam o

greenlight de um filme o máximo possível enquanto tentam prever o comportamento do 11

consumidor vigente. Os hábitos de consumo de mídia mudam rapidamente, janelas para

lançamentos de filmes estão se estreitando, televisão, tv a cabo e locadoras estão migrando

para o “streaming” e os downloads. Os interesses em projetos multimilionários fazem com 12

11 Greenlighting é a etapa da produção em que o estúdio proponente da obra captou todos os recursos necessários para iniciar a produção. 12 Streaming é uma forma de distribuição de dados, geralmente de multimídia em uma rede através de pacotes. Exemplos: Netflix, Youtube, Hulu.

12

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que os custos de produção em bottom­line sejam atrasados o máximo possível. Custos de 13

marketing e distribuição de um filme são altos, e datas propícias para lançamentos são poucas.

Há oportunidades limitadas para pegar a audiência em grandes finais de semana, com isso a

estratégia dos estúdios é lançar poucos filmes “tent­poles” em vez de uma grande quantidade

de filmes de baixo orçamento. Esse contexto impacta toda a cadeia de produção e cria uma

grande demanda de trabalho a ser produzida em curto período. O trabalho uma vez entregue,

as empresas de VFX passam por períodos de seca antes do próximo filme entrar em

greenlight. Antigamente, as empresas de VFX eram capazes de prever cargas de trabalho para

os próximos seis/doze meses; hoje em dia, elas não conseguem prever no máximo os

próximos quatro meses. Ou seja, a alta volatilidade da carga de trabalho causa a escassez

temporária de artistas qualificados, restando para os que sobraram, uma massiva carga extra

de trabalho, as quais muitas vezes não são ressarcidas. O processo interativo de criar efeitos

visuais é completamente impreciso em termos de tempo.

A educação com que os diretores são instruídos a se relacionar com as empresas de

pós impacta diretamente no fluxo de trabalho. Muitas empresas de pós criticam estúdios por

não controlarem seus diretores no processo de pós­produção do mesmo modo que eles os

controlam na produção. Os estúdios reconhecem que muitos produtores e diretores não

conhecem o processo de se produzir efeitos visuais.

3.3. Margem de lucro para efeitos visuais e mercado.

Durante o início da década de 90, as margens de lucro para os serviços de VFX eram

consideradas baixas mas ainda sustentáveis. Um filme até então necessitava entre dez a vinte

artistas, em um ano de trabalho. Não havia muitas empresas de VFX com o potencial de

realizar cenas complexas e as cinco grandes pós­produtoras não sofriam com a competição.

Os grandes estúdios “majors” estavam realmente interessados em trabalhar com as novas

possibilidades e a audiência reagiu muito bem à novidade. Diretores queriam novos efeitos

visuais digitais em seus trailers, logo os estúdios fizeram o que toda grande companhia tenta

fazer: eles tentaram assumir o fornecimento dos serviços de VFX.

13 Bottom­line são custos relativos a pré­produção, ponto de partida.

13

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Primeiramente, os estúdios tentaram estabelecer seus próprios departamentos de VFX.

Mas logo, eles perceberam que tinham que igualar seus serviços ao das cinco maiores

empresas de VFX até então. Como resultado, os estúdios ainda dependiam dos serviços

prestados pelas cinco maiores.

Logo, devido ao sucesso dos filmes de VFX, os estúdios tinham mais filmes do que

eles podiam suportar em seus departamentos internos. Essa nova demanda fez surgir pequenas

empresas de VFX ao redor do mundo. “Hardwares” e “softwares” baratos ampliaram o

surgimento de novas empresas. Incrivelmente, a partir dos anos 2000, projetos ambiciosos

fizeram com que equipes de VFX crescessem de trinta para duzentos artistas trabalhando em

um único filme durante seis meses a um ano. Com esse novo cenário, milhões de dólares eram

gastos em pesquisa e desenvolvimento, fazendo com que esses departamentos de VFX

fechassem as portas no começo dos anos 2000 devido aos altos custos. Isso fez com que os

estúdios facilmente enviassem seus trabalhos para companhias de VFX fora dos Estados

Unidos.

Para conter custos, as “majors” começaram a usar estúdios de VFX de médio porte,

consequentemente as margens de lucro para serviços de VFX prestados caíram

vertiginosamente e os grandes estúdios de VFX foram forçados a melhorar a sua qualidade

ano após ano, logo sobrecarregando seu modelo de negócios com pesquisa e

desenvolvimento. Desde então, não é incomum para um grande estúdio de VFX uma margem

de 3 ­ 5 por cento de lucro.

O modelo de preço fixo é comumente citado como um método economicamente

inviável para as empresas de VFX. O método não funciona levando em consideração a

imprevisibilidade na concepção dos efeitos visuais, muitas vezes o caminho que os artistas

seguem, não necessariamente é o que o diretor havia pensado ou o próprio diretor muda de

ideia quando o trabalho já está avançado. As empresas de pós frequentemente não são pagas

quando essas alterações ocorrem. E para manter o “deadline” , há excessivas horas extras 14

para suprir o tempo perdido.

A demanda por serviços de VFX teve seu momento no retorno de Exterminador Do

Futuro 2 na década de 90. De 2000 até hoje, a demanda por VFX quadruplicou em apenas

uma década. Enquanto um grande projeto de VFX custava em torno de 10 milhões de dólares

na década de 90, hoje, um grande projeto de VFX custa em torno de 20% do filme e em

14 Data acordada para entrega do trabalho.

14

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alguns casos, 50% do custo inteiro de produção. Por exemplo os efeitos para o filme

Battleship, 2012, custaram cerca de 60% do custo de produção do filme, o custo total de

produção ficou em $205 milhões, logo $100 milhões foram necessários para se executar os

serviços de VFX. 15

O sucesso dos efeitos visuais nos cinemas foi levado eventualmente por filmes tais

como Transformers, Piratas do caribe, 2012, Pacific Rim, John Carter, Battleship etc. Estes

filmes geraram boas bilheterias, mas algumas análises recentes mostram alguns sinais de que

as franquias movidas a VFX estão enfrentando uma pequena decadência. Filmes tais como

John Carter, Battleship e Total Recall não performaram tão bem nas bilheterias em 2012. Em

2013, 47 Ronin, After Earth e Enders Games também não tiveram o mesmo sucesso. Por

enquanto só a Disney achou uma fórmula para trabalhar seus filmes dirigidos por VFX ­ os

filmes de super heróis da Marvel, mas a Marvel não tem produção suficiente para manter a

indústria inteira ocupada.

De acordo com a empresa indiana de consultoria A.T. kearny : há mais de quinhentas 16

companhias disputando espaço e a maioria delas se concentra em comerciais para televisão,

possuindo menos de dez funcionários e, considerando todo o atual contexto, as maiores

companhias de VFX recebem mais do que 50% de todo o trabalho disponível. Mas para

conseguir esses trabalhos, eles tem que competir contra as outras de forma agressiva. Às

vezes com margens de lucro baixíssimas ou mesmo negativas, forçando­as a lucrarem com o

volume, que significa que eles não chegam ao breakeven em cada filme, e sim, em mais de 17

um filme. Tal ambiente garante preços baixos e serviços de alta qualidade. Para permanecer

competitivo, os estúdios de efeitos visuais têm poucas escolhas.

15 ROSS, Scott e GRAGE, Pierre. 2014, p. 154 16 At Kearny Report: www.atkearney.com/documents/10192/765005/And_Action­Making_Money_in_the_Post­Production_Services_Industry.pdf/5190eb15­e320­4582­b0a3­a167233966d5 17 Breakeven é ponto de equilíbrio nos negócios em que não há perda nem ganho, nem lucro nem prejuízo.

15

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4.0. Efeitos visuais e revolução digital.

Nos primórdios da atividade cinematográfica, os efeitos especiais não possuíam a

intervenção digital proveniente da computação gráfica. Eles eram conhecidos como Prattical

Effects: tiros de armas, chuva, ventos, criaturas desumanas, fogo e explosões eram

reproduzidos no set de filmagem por algum perito em efeitos especiais físicos. Mais tarde,

introduziu­se as técnicas de Optical Effects, as quais usavam a manipulação ótica e a

intervenção diretamente na revelação do negativo. Estes tipos de efeitos visuais foram

perfeitos durante anos, mas nunca podiam alcançar o nível de realismo necessário para algum

projeto visionário.

Entender a gênese e a evolução dos efeitos visuais computadorizados é viajar pelas

grandes produções milionárias lançadas pós década de 70, as quais tornaram o cinema

hollywoodiano uma grandiosa cortina de espetáculos, remodelando o conceito de

“blockbuster” até então vigente. O surgimento das grandes franquias, a absorção de

pesquisadores da computação gráfica advindos de outros setores, tais como a indústria

automobilística ou a aviação e a megalomania de alguns diretores de cinema visionários são

fatores essenciais no desenvolvimento técnico e científico da indústria de efeitos visuais

digitais. Vale lembrar que as novas audiências sempre estão a procura de algo novo, algo

impossível, algo que desafie suas imaginações, mas antes de tudo, algo que soe realístico.

Hoje em dia, o realismo por trás de uma cena tornou­se a peça chave na confiabilidade de

determinada produção cinematográfica, mesmo que o enredo e a história não funcione. Foi

com isso que a indústria cinematográfica mundial percorreu um caminho em busca de

inovações tecnológicas que tragam mais veracidade à seus espetáculos.

Os filmes a seguir foram citados em ordem cronológica, cada um frisando seu papel

no desenvolvimento da indústria de computação gráfica e seu papel disruptivo na construção

diegética.

4.1. 1977 ­ Star Wars.

Nenhum estúdio aceitou produzir o projeto de Star Wars até a 20th Century Fox

aceitá­lo devido a personalidade do George Lucas. Depois de ver algumas imagens brutas, o

16

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estúdio passou a desacreditar que aquilo traria retorno a seus investimentos e para convencer

o estúdio a continuar tocando o projeto, George Lucas teve de abdicar de sua taxa de diretor.

Em troca, ele pegou todos os direitos de merchandising e das futuras sequências.

A maioria dos efeitos especiais de Star Wars foram efeitos óticos com uma exceção ­ o

primeiro exemplo de imagem 3D computadorizada usada em um filme. Bem antes do ataque a

estrela da morte, a audiência via algumas imagens formadas por vetores digitais no telão de

apresentação em uma sala tática, onde há uma reunião entre os pilotos, Han Solo, estrelado 18

por Harrison Ford, e Luke Skywalker, estrelado por Mark Hamill. George Lucas teve que

contratar o cientista da computação gráfica Larry Cuda, até então com 24 anos, para realizar a

tarefa de modelagem da estrela da morte em vetores digitais.

Em 1979, George Lucas começou uma divisão chamada Lucasfilm`s Computer

Division, contratando só os mais brilhantes e inteligentes pesquisadores da computação

gráfica que ele pudesse encontrar. Como cabeça dessa companhia, George Lucas contratou

Edwin Catmull, um gênio pioneiro no campo da computação gráfica. A divisão trabalhou com

pesquisas para solucionar projetos particulares, tais como a explosão da estrela da morte em

Star Wars o império contra ataca ou o nazista que derrete em Indiana Jones. Lucas deixou

Catmull pesquisar livremente o que quisesse. Como resultado, saíram novas tecnologias para

impressão de negativo, edição, som e computação gráfica.

4.2. 1982 ­ Star Trek II: A ira de Kahn.

Dirigido por Nicholas Meyer a produção de Star Trek II A ira de Kahn foi orçada em

11 milhões de dólares. A maior parte do filme foi feita usando efeitos óticos, porém para

apenas uma sequência, a divisão de pesquisa da Lucas Filmes recebeu a oportunidade de

demonstrar onde seus engenheiros poderiam chegar. A divisão criou uma sequência de um

minuto totalmente em computação gráfica chamada Genesis Effects . Essa foi a primeira 19

sequência inteiramente em computação gráfica mostrando a simulação de um planeta morto e,

posteriormente, preenchido com vida. Loren Carpenter um ex engenheiro da Boeing fez essa

sequência possível. Seu desenvolvimento na área de terrenos digitais, tecnologia usada para

criar a sequência, foi adotada mais tarde por inúmeros games.

18 Making of the Computer Graphics for Star Wars: www.youtube.com/watch?v=yMeSw00n3Ac. 19 Making of the Genesis Sequence from Star Trek II: www.youtube.com/watch?v=Qe9qSLYK5q4

17

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4.3. 1982 ­ Tron.

Lucas filmes não foi a única companhia a tentar inserir Computação Gráfica em

filmes. Um número significativo de cientistas juntou­se a Disney para trabalhar em um filme

chamado Tron, o qual foi lançado um pouco depois de Star Trek e ficou marcado por ser o

primeiro personagem em Computação Gráfica em um filme . 20

4.4. 1984 ­ As Aventuras de André e Wally B.

O Filme Tron inspirou o jovem animador da Disney John Lasseter. Lasseter

desenvolveu planos para fazer um filme animado baseado no livro The Brave little Toaster,

Disch Thomas, 1980. Sua idéia era fazer uma mistura de personagens feitos em animação

tradicional 2D com cenários gerados em Computação Gráfica 3D. Lasseter apresentou a ideia

para os executivos da Disney que não gostaram e o mandaram embora. Logo depois, Lasseter

fora contratado por Edwin Catmull em uma conferência sobre computação gráfica, a fim de

integrar a equipe da Lucas Film Computer Division.

Seu projeto cresceu e no final tudo se tornara 3D, incluindo os personagens. O filme

tinha complexos planos de fundo em 3D com luzes e cores inspiradas nas pinturas de

Maxfield Parrish . 21

4.5. 1984 ­ O último guerreiro das estrelas.

Uma companhia chamada Digital Productions criou a primeira imagem foto realística

em computação gráfica para o FilmeO último guerreiro das estrelas,1984, dirigido por Nick

Castle. A grande inovação por trás do filme foi que anteriormente as imagens

computadorizadas eram integradas tais como gráfico de vetores em Star Wars; sequências

curtas de Computação Gráfica tal qual Star Trek ou computação gráfica estilizada como em

Tron. Já em O último Guerreiro das Estrelas, a Computação Gráfica fora usada para criar

20 Tron, 1982, Dirigido por Steven Lisberger, EUA, Trailer: www.youtube.com/watch?v=3efV2wqEjEY 21 Trailer As Aventuras de André and Wally B. ­ www.youtube.com/watch?v=rQsCw1v­cEU.

18

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todas as espaçonaves, planetas e os hardwares de alta tecnologia integrados a atores filmados.

Quatro anos foram necessários para alcançar tal intento . 22

Infelizmente, a Digital Productions fechou suas portas em 1986 depois do sucesso de

seu trabalho em O Labirinto dirigido por Jim Henson, 2010, O ano em que faremos contato,

dirigido por Peter Hyams e o videocliple Hard Woman dos Rolling Stones. Esta é a primeira

vez que uma companhia quebra apesar do sucesso de seus produtos.

4.6. 1985 ­ O Enigma da Pirâmide.

Em 1985, a divisão de Computação Gráfica da Lucas Filmes produziu o que é

conhecido hoje como o primeiro personagem foto realístico gerado por computação gráfica e

animado para um filme. O vitral tornando­se um guerreiro composto por cacos de vidro

ganhou vida em o Enigma da Pirâmide, dirigido por Barry Levinson . 23

O personagem foi gerado usando inovadoras tecnologias de mapeamento de textura e

técnicas de renderização. Também fora o primeiro personagem gerado em computação gráfica

que teve de ser composto em imagens filmadas. A sequência de 36 segundos do filme levou

aproximadamente 6 meses para ser realizada.

4.7. 1989 ­ O Segredo do abismo.

O Segredo do abismo escrito e dirigido por James Cameron e lançado em 1989, foi

realmente um filme ambicioso. A história do filme foi ambientada embaixo da água. Para isto,

a equipe teve que construir em uma fábrica abandonada, dois tanques de água. Um dos

tanques foi o maior tanque de água potável do mundo.

Em 1989 ninguém tinha visto uma face totalmente gerada em computação gráfica. O

mais perto que chegamos até então foi em O Enigma da Pirâmide. James Cameron não só

queria uma face inteiramente em computação gráfica, mas também uma inteiramente feita de

22 Trailer O último guerreiro das estrelas, título original: The last Starfighter. Trailer ­ www.youtube.com/watch?v=H7NaxBxFWSo 23 O Enigma da Pirâmide, título original: The Young Sherlock Holmes, dirigido por Barry Levinson, VFX scene ­ www.youtube.com/watch?v=CT­qV41ovv4

19

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água. A criatura ficou conhecida como Pseudop e tornou­se o primeiro exemplo de água 24

gerada e animada por computação gráfica e composta em material filmado. A Industrial Light

& Magic recebeu um Academy Awards pelo trabalho.

4.8. 1991 ­ Exterminador do futuro 2.

A próxima grande inovação em efeitos visuais viria em Exterminador do Futuro 2.

Com os efeitos criados em O Segredo do Abismo, James Cameron podia demonstrar que a

tecnologia estava pronta para Exterminador do Futuro 2.

O personagem composto de metal líquido T­1000, estrelado por Robert Patrick, era

capaz de se metamorfosear em qualquer pessoa e objeto. Aproximadamente 300 cenas de

efeitos visuais, um total de 16 minutos. Com o filme, o departamento de computação gráfica

da Industrial Light & Magic, antigo departamento de Computação da Lucas Filmes, saltou de

6 para 36 pessoas.

4.9. 1992 ­ O Passageiro do Futuro.

A New Line Cinema comprou os direitos da história de O Passageiro do Futuro de

Stephen King e decidiu, com ela, reescrever um de seus roteiros que já estava em

pré­produção, contratando o diretor Brett Leonard para tocar o projeto.

As psicodélicas imagens geradas em computador iriam definir o ciberespaço e a

surreal realidade virtual de uma cena de sexo. Todas as animações digitais somavam nove

minutos. Xaos Inc e a Angel Studios tocaram o projeto de efeitos visuais . 25

Mais notadamente, O Passageiro do Futurofoi o primeiro filme a utilizar a técnica de

captura de movimento em suas animações de personagens. Com esta tecnologia, era possível

gravar os movimentos humanos através de sensores que cobriam o corpo do ator. Dez anos

depois, esta tecnologia foi aprimorada e usada em O Senhor dos Anéis.

24 O Segredo do Abismo, título original: The Abyss, 1989, EUA ­ Cena Pseudop link: www.youtube.com/watch?v=xNLtPLFECNw 25O Passageiro do futuro, título original: The Lawnmower Man, cena Link: www.youtube.com/watch?v=sYkgWJzJ6fE

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4.10. 1993 ­ Jurassic Park

Dirigido por Steven Spielberg, Jurassic Park mostrou 14 minutos de cenas com

dinossauros e só alguns poucos minutos foram usados dinossauros gerados por computação

gráfica. Originalmente, o plano era usar dinossauros inteiramente animados em stop motion , 26

mas a Industrial Light and Magic desenvolveu alguns testes, os quais provaram que eles

possuíam uma opção melhor, especialmente para cenas em que os dinossauros corriam. As

imagens geradas por computador fluíam mais realísticas e “animatronics” foram misturados 27

com imagens computadorizadas.

Os dinossauros gerados em computação gráfica foram os primeiros personagens com

com músculos texturizados de forma complexa. Diferentemente de O Enigma da Pirâmide,

que apresentava um personagem composto por uma superfície lisa, os dinossauros de Jurassic

Park apresentavam detalhes em suas musculaturas e anatomia; sendo a primeira vez em um

longa que a tecnologia foi usada para criar uma completa e detalhada criatura viva.

4.11. 1994 ­ Forrest Gump

Forrest Gump conta a história de um personagem, estrelado por Tom Hanks, que

presencia muitos eventos históricos reais. Para essas sequências, Robert Zemeckis, o diretor

do filme, usou material de arquivo e inseriu digitalmente o personagem deTom Hanks nessas

cenas.

Este tipo de efeito já tinha sido testado um ano antes emNa Linha de fogo, 1993,dir.:

Wolfgang Petersen. Em algumas sequencias, Clint Eastwood fora inserido em materiais de

arquivos de George Bush, Bill Clinton and John Kennedy.

Para Forrest Gump, este tipo de efeito foi levado a outro nível. Tom Hanks não só era

inserido nas filmagens históricas, como também interagia com elas, tal qual John F. Kennedy

e John Lennon. Para alcançar isso, Tom Hanks foi filmado contra o fundo azul e a Industrial

Light & Magic usou “softwares” próprios para compor Tom Hanks com as imagens

26 Stop Motion é uma técnica que utiliza a disposição sequencial de fotografias diferentes de um mesmo objeto inanimado para simular o seu movimento. 27 Animatronics são bonecos movidos eletronicamente.

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históricas. Técnicas de “morphing” foram usadas nas figuras históricas para fazer com que 28

eles falem sentenças diferentes dos materiais filmados.

4.12. 1996 ­ Independence Day

Dirigido por Roland Emmerich, Independence Day entrou em produção em 1994 e

tornando­se não só um filme de ficção científica, mas também uma grande obra de ação e

desastres.

A perfeição com a qual as miniaturas e as imagens computadorizadas foram integradas

são como nunca antes vistas, tendo mais trabalho com modelos de miniaturas do que qualquer

outro filme lançado até a presente data. O excessivo uso de miniaturas custou a maior parte do

valor de produção e imagens computadorizadas foram usadas para enaltecer o fantástico

trabalho de optical effects, incluindo aviões de combate, detritos , ataques “aliens”, misseis e

a famosa bola de luz.

4.13. 1997 ­ Titanic

Titanic foi um tremendo sucesso ao quebrar todos os recordes de bilheteria até então

existentes. O filme arrecadou mais de $2 bilhões ao redor do mundo e tornou­se, por um

longo tempo, o maior sucesso em bilheteria.

Apesar do sucesso mercadológico, é interessante notar que a Digital Domain

(principal empresa de VFX do filme) quase entrou em bancarrota por causa do filme. O

estúdio perdeu $3 milhões em Titanic. Tal situação aconteceu devido a algumas

circunstâncias desafortunadas ­ A companhia só recebia dividendos em um caminho que era o

contrato de prestação de serviços. Ela não recebia dividendos advindos da bilheteria ou dos

licenciamentos de revenda.

Talvez, a pior circunstância foi o fato de o cliente ser o cofundador da Digital Domain,

o qual fez com que a companhia se adaptasse a seu orçamento estipulado previamente para os

efeitos visuais. Digital Domain estimava que os custos para a pós produção deTitanic teriam

de ser 10 milhões a mais.

28 Morphing Morphing é uma técnica de efeitos visuais que muda uma imagem ou forma para outra através de uma transição suave. commons.wikimedia.org/wiki/File:Morphvideo­ape­bird­april12­2015.ogv

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Apesar de a Digital Domain não ter tido sucesso financeiro com Titanic;

artisticamente, Titanic pôs a companhia no mapa, inovando em muitos padrões, tais quais a

criação de água digital, dublês digitais e composição digital. O estúdio Digital Domain

ganhou o Academy Awards de melhor efeitos visuais em 1997.

4.14. 2000 ­ Mar em Fúria.

Mar em Fúria, título original The Perfect Storm, conta a história de uma barco

chamado Andrea Gail, o qual foi pego por uma tempestade em pleno mar aberto. Wolfgang

Petersen, famoso diretor Alemão, adaptou o livro para as telas. Nunca antes os espectadores

estiveram tão próximos de uma tempestade de gigantes proporções e novamente a Industrial

Light & Magic desenvolveu o projeto.

Os “close­ups” da água criada em computação gráfica para algumas cenas eram tão

realísticas que era impossível os espectadores dizerem a diferença entre a água real e a água

criada digitalmente. Até hoje, água digitalmente criada constitui um dos maiores desafios para

os artistas de efeitos visuais. Muita da água criada digitalmente em Titanic mostrava um

oceano calmo e parado. Já em Mar em Fúria, a água adquiria características e formas

agressivas, tais como borrifos e super ondas.

4.15. 2001 ­ A trilogia de O Senhor dos Anéis.

O começo da trilogia O Senhor dos Anéis iniciou­se com a produção Almas Gêmeas,

1994. O novo diretor neozelandês Peter Jackson formou um departamento de efeitos digitais

em sua companhia de efeitos especiais óticos para se responsabilizar pelos efeitos de

“morphing” e correção de cor exigidos pelo filme. Poucos anos depois, a empresa se divide

em dois grupos: Weta Workshop, para efeitos físicos e Weta Digital para efeitos digitais,

ambas em Wellington, Nova Zelândia.

Depois da pós­produção de Almas Gêmeas, Peter Jackson e seus sócios lutaram para

manter a companhia ocupada com projetos internacionais enquanto eles trabalham em seus

próprios projetos: o mockumentario Forgotten Silver (1995) e Os Espíritos (1996). Os

espíritos não foi um sucesso comercial, mas contribuiu para o crescimento da Weta Digital de

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um único computador para trinta e cinco computadores e artistas. O filme tornou­se uma

grande peça publicitária para o diretor e sua casa de efeitos visuais.

Primeiramente, Peter Jackson tentou alavancar o seu projeto sobreKing Kong, mas os

acordos com a Universal não deram certo. Felizmente ele estava trabalhando em outro projeto

que era uma versão filmada do épico de J.R.R. Tolkien O Senhor dos Anéis.

Peter Jackson sentia que com os novos desenvolvimentos da computação gráfica, seria

possível criar um filme de fantasia realístico e sério, logo convenceu a Miramax e a New Line

a comprarem os direitos da obra e usar a sua própria companhia para realizar os efeitos

digitais.

A grande inovação foram os exércitos digitais que possibilitaram batalhas em larga

escala entre o bem e o mal e o uso da captura de movimento para o personagem digital

Gollum. A própria Weta digital criou o sistema de captura com desconhecida precisão. O

realismo que o personagem Gollum fora criado em total computação gráfica foi disruptivo

para o setor de VFX mundial.

4.16. 2002 ­ Homem Aranha.

A Sony Pictures comprou os direitos de Spider Man um ano antes do lançamento de

X­men e encorajado pelo sucesso deste, o estúdio colocou Spider­man em produção. Para

dirigir o filme, a Sony contratou o diretor Sam Raimi.

As maior inovação em termos de efeitos visuais foi o personagem do homem aranha

em si mesmo. Seria impossível fazer isso com dublês. Sony Pictures e a Sony Imageworks

fizeram o trabalho.

4.17. 2003 ­ Piratas do Caribe.

A franquia Piratas do Caribe foi inspirada em um parque da Disney com o mesmo

nome e o estúdio, inicialmente, pretendia financiar Piratas do Caribe em um valor de $140

milhões. Eles sentiram que o gênero de pirata estava morto, mas decidiram partir para o

investimento arriscado sob o comando do produtor Jerry Bruckheimer e o diretor Gore

Verbinski

24

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Os impressionantes efeitos visuais digitais mostravam algumas transições de humanos

para esqueletos e as impressionantes paisagens adicionaram um novo nível de perfeição. Mais

uma vez a Industrial Light & Magic ganhou o Academy Awards pelo projeto.

4.18. 2005 ­ King Kong.

O sucesso financeiro alcançado pelos dois primeiros filmes de O Senhor dos Anéis

reacendeu a vontade de Peter Jackson em realizar o “remake” de King Kong.

Os efeitos visuais quebraram todos os recordes. Com 2510 cenas de efeitos visuais,

King Kong teve o maior número de cenas de efeitos visuais até então em um filme. Os

avanços obtidos na tecnologia da captura de movimento fizeram com que a performance do

gigante King Kong ficasse perfeita.

3.19. 2007 ­ Transformers.

Quando Michael Bay foi convidado por Spielberg, em 2005, para dirigir

Transformers, Bay primeiramente rejeitou o filme como um estúpido e bobo filme sobre

brinquedo. Mais tarde, como ele ainda sonhava em trabalhar com Spielberg, Bay topou

desenvolver a história.

O Produtor Steven Spielberg restringiu Michael Bay a usar computação gráfica apenas

para os robôs e os elementos de fundo nas cenas de ação.

A responsabilidade pelos efeitos visuais foi dada primeiramente à ILM e Digital

Domain. A ILM criou a famosa transição do carro Robô e as animações com impressionante

realismo, não havendo cortes para esconder as transições entre carros e robôs.

4.20. 2008 ­ O curioso caso de Benjamin Button

Dirigido por David Fincher, O Curioso caso de Benjamin Button é uma fantasia

dramática baseada em uma história de Scott Fitzgerald. A história é sobre um homem que

envelhece ao contrário.

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As filmagens começaram em 2006 e tiveram um total de 150 dias. Brad Pitt teve de

fazer muitas sessões de captura de movimento. Seu personagem seria visto em metamorfose

nascendo velho e morrendo bebê. Digital Domain, estúdio chamado para o projeto, usou um

sistema avançado de captura facial para ter a certeza que todos os detalhes fossem

reproduzidos com precisão. O resultado foi espetacularmente inovador e realístico.

4.21. 2009 ­ Avatar.

James Cameron escreveu o primeiro tratamento de Avatar em 1994 e pretendia

filmá­lo depois do lançamento de Titanic. Primeiramente a intenção de James Cameron era

produzir Avatar unindo sua produtora Lighting Entertainment, o estúdio Digital Domain e

Stam Winston Studios. Todos os três estúdios participariam da produção e pós­produção de

Titanic.

Quando a Digital Domain recebeu o script, era claro que era necessário o

desenvolvimento de novas tecnologias para fazer o filme acontecer. James Cameron e Digital

Domain pediram um investimento da 20th Century Fox para fazer testes comAvatar e a 20th

Century Fox pediu em troca que toda tecnologia criada pudesse ser usada pelo seu novo

estúdio adquirido pela distribuidora chamado VIFX, futuro Blue Sky Studios. Digital Domain

recusou. James Cameron sabia que o tempo iria sanar todas os seus problemas mediante ao

desenvolvimento tecnológico.

Em 2005, James Cameron decidiu reexplorar o mercado para ver se a tecnologia havia

avançado significativamente a ponto de realizar Avatar. Como já não era mais sócio da

Digital Domain, o diretor conversou com empresas importantes do mercado de VFX. O único

desafio deAvatar não era apenas o realismo computadorizado a se alcançar, mas sim o fato de

o filme ser filmado em 3D estereoscópico.

A tecnologia 3D existia desde 1922, mas não tinha evoluído à perfeição que Cameron

demandava para Avatar. Ele não teve escolha a não ser desenvolver seu próprio sistema de

captação estereoscópica ao lado de Vince Pace e a Sony. Uma nova câmera estéreo chamada

Fusion Camera System foi criada, permitindo ao diretor filmar imagens estereoscópicas

perfeitamente sincronizadas.

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Cameron estava confiante que o tempo deAvatar havia chegado. Ele aproximou­se da

20th Century Fox e convenceu­os a investir na pré­produção de Avatar. E para demonstrar

que os estúdios de efeitos visuais eram capazes de entregar a qualidade desejada para o filme,

ILM, Digital Domain e Weta Digital tiveram de trabalhar em cenas testes sendo a Weta

Digital o estúdio escolhido para fazer os efeitos visuais.

“Weta Digital provou­se um líder em efeitos visionários, especialmente na área de captação

de performance, o qual é uma grande parte do meu novo filme”

James Cameron 29

Uma das principais inovações, foi a invenção e o desenvolvimento de uma câmera

virtual para as cenas concebidas totalmente em computação gráfica. A câmera virtual é

melhor descrita como um monitor de mão que permite o diretor mover­se através do terreno

gerado em computação gráfica em tempo real. Esta técnica permitiu que Cameron dirigisse o

filme como se estivesse em um vídeo game. Atores vestiam roupas de captura de movimento

e Cameron via suas performances em seus personagens 3D através da câmera virtual . 30

Em abril de 2008 as filmagens começaram em Los Angeles e Wellington. A Weta

Digital teve que investir na sua estrutura computadorizada para a produção de Avatar. No

final de King Kong, as Renders Farms da Weta tinham aproximadamente 4.400 CPUs e 31

aproximadamente 100 TB de armazenamento. No final de Avatar, o poder de renderização

cresceu para 35.000 CPUs e mais do que 3 petabytes de storages. Vale lembrar que no final, a

Weta teve que renderizar cada quadro duas vezes por conta da estereoscopia.

Sob a supervisão de Joe Letteri, a Weta Digital teve de inovar em renderização,

shading , iluminação e captura de movimento. Através das muitas inovações em VFX, 32

personagens e ambientes computadorizados nunca soaram tão reais.

4.22. 2012 ­ A Vida de Pi.

29 James Cameron Signs Weta Up for Avatar ­ movieweb.com/james­cameron­signs­weta­up­for­avatar/ 30 Demonstração Avatar câmera virtual www.youtube.com/watch?v=Wy7IvrizRok 31 Renders Farms são computadores específicos para o processamento dos efeitos visuais. 32 Shading é o processo de simulação da luz ao reagir na textura do personagem digital, trazendo realismo ao objeto criado.

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A Vida de Pi dirigido por Ang Lee é um filme baseado no romance de Yann Martel. O

filme conta a história de um garoto indiano que sobrevive a um naufrágio encontrando­se

dentro de um bote salva vidas junto de um tigre, à deriva em pleno oceano pacífico. O filme

foi orçado em 120 milhões de dólares. Um gigantesco tanque de água foi construído em um

aeroporto abandonado. A filmagem principal do filme demorou três meses. Mas isso não é

nada comparado ao maior desafio até então: o desenvolvimento do tigre de bengala.

O estúdio de efeitos visuais Rhythm and Hues, o mesmo de Babe o porquinho

atrapalhado, 1995, gastou um ano na fase de pesquisa e desenvolvimento antes das filmagens

começarem. No total, a companhia trabalhou dois anos e quatro meses neste filme.

Água, Nuvens, ilhas, animais, o tigre de bengala, quase tudo em A Vide de Pi era

computação gráfica. O realismo com que A Vida de Pi fora criado engana qualquer

espectador. O Filme ganhou o Academy Awards de melhor efeitos visuais.

Contudo, o filme tornou­se conhecido na indústria não só pela perfeição pictórica de

suas imagens computadorizadas, mas também pela bancarrota do estúdio Rhythm & Hues.

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5.0. Globalização do VFX.

O pioneirismo executado pelos estúdios norte­americanos de efeitos visuais propiciou

um mercado sem competidores fora de seus territórios na década de 90 e começo dos anos

2000; mas a partir do momento em que os custos relacionados a “hardware” e “software”

caíram, novas boutiques especializadas em trabalhos pequenos, como comerciais de TV e 33

televisão, começaram a surgir no Reino Unido, Alemanha, França, Canadá, Austrália e Nova

Zelândia. Inicialmente, Hollywood ainda era inacessível devido à alta qualidade técnica e

artística demandada por seus maiores estúdios.

A expansão dos estúdios internacionais de VFX se deu com a contratação de mão de

obra com experiência em Hollywood. Altos salários e cargos de supervisão fizeram com que

vários profissionais migrassem dos Estados Unidos para a Europa e Oceania no final da

década de 90, difundindo o conhecimento do VFX ao redor do mundo com a ajuda da

internet.

O processo migratório até o final da década de 90 e começo dos anos 2000 não

implicava em problema algum para os grandes estúdios de VFX. Apesar das margens baixas,

as pós­produtoras ainda possuíam um modelo de negócios saudável, começando a se

preocupar a partir do momento em que surgiram os primeiros incentivos fiscais.

5.1 Subsídios Fiscais na indústria cinematográfica.

Subsídios estatais são uma estratégia governamental a fim de proteger da concorrência

estrangeira ou incentivar determinada indústria de um setor específico. Isenção de impostos,

abatimento de tarifas e concessões territoriais são algumas das medidas tomadas por governos

no incentivo a determinada atividade econômica. No escopo cinematográfico, os EUA são o

país mais prejudicado na guerra fiscal com a Europa, Oceania e Canadá no que diz respeito a

incentivos fiscais à indústria cinematográfica. Muitos “blockbusters Tent­pole” e companhias

de efeitos visuais migraram do território estadunidense nos últimos anos. Porém, levando a

questão dos incentivos a uma perspectiva econômica geral, de acordo com pesquisa realizada

33 Boutiques são pequenas empresas de pós­produção composta por 20 a 30 funcionários.

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pelo Jornal New York Times, os EUA aportam cerca de 80 bilhões de dólares em incentivos

para indústrias que vão desde o cinema, agricultura, serviços, manufatura e tecnologia . 34

O primeiro subsídio voltado à atividade cinematográfica aconteceu na Alemanha de

1917 com a fundação do Universum Film AG (UFA), com o objetivo de criar propaganda e

entretenimento. A partir da Segunda Guerra, os subsídios acabaram devido à crise 35

econômica, retornando apenas em 1967 em razão da competição feroz imposta pela televisão.

Com o surgimento da televisão em 1960 na Europa, a frequência dos espectadores nas

salas de cinema começou a cair. Os Estados Unidos tinham algumas vantagens em relação à

Europa: um mercado unido com uma população muito maior que a Europa falando uma única

língua, o fato da cultura americana amar ir ao cinema diferentemente da população europeia e

a qualidade dos filmes americanos serem muito superiores aos filmes europeus, havendo altos

investimentos em marketing, glamour e efeitos especiais.

Já os britânicos editaram a sua primeira medida de incentivo à indústria

cinematográfica em 1927 com o Cinematographers Trade Bill. A lei foi a primeira cota de

telas existente na indústria mundial, forçando exibidores e distribuidoras a reservar uma cota

mínima para o cinema britânico nacional. A lei começou obrigando uma reserva de 7.5% em

1927 partindo para 20% em 1936, incentivando um boom artificial na produção de filmes com

um ápice de 220 filmes em 1936 . Em 1937 a super produção na indústria cinematográfica 36

inglesa transformou­se em crise com várias produtoras entrando em falência em 1937. Como

resultado, a indústria inglesa ainda permanece totalmente dependente dos estúdios

americanos.

As medidas protecionistas perpetuadas pelos estados europeus tinham o principal

objetivo de fazer com que a indústria doméstica parasse de encolher, levando em

consideração a importância do cinema na matriz cultural de um país. Hoje em dia o cinema

hollywoodiano domina as bilheterias do Cinema Europeu com um Market Share em torno de

60/70%. 37

34 Fonte: www.nytimes.com/interactive/2012/12/01/us/government­incentives.html?ref=us&_r=1&#PA 35 Grage e Ross, p. 166, 2014. 36 Routledge, 2003 37 Paper: An overview of Europe's film industry. Fonte: http://www.europarl.europa.eu/RegData/etudes/BRIE/2014/545705/EPRS_BRI(2014)545705_REV1_EN.pdf

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5.2 Como os Subsídios influenciam a indústria de Efeitos Visuais.

Os subsídios estatais inicialmente visavam atrair a equipe de fotografia principal. Foi

em Harry Porter e o prisioneiro de Askaban, 2004, que a pós­produção passou a ser a política

desses subsídios. 75% de todo o trabalho de pós­produção tinha de ser feito no Reino Unido

como requerimento para a aplicação desses incentivos fiscais . Com isso, muitos efeitos 38

visuais saíram das mãos de empresas americanas. Não havia empresas de VFX significativas

na Inglaterra até então, mas a partir do momento em que os incentivos fiscais garantiram uma

sequência de 8 grandes Harry Porters de alto orçamento, as empresas nacionais cresceram e

puderam contratar mão de obra altamente qualificada. A Warner tinha tanto trabalho a ser

feito que eles construíram um estúdio em um velho aeródromo. Hoje em dia, o tamanho e a

experiência das companhias inglesas se igualam a muitas grandes companhias

norte­americanas. Esta mudança legislatória provocou um exponencial aumento na qualidade

técnica e artística da indústria inglesa de VFX, e outros governos, tais como Nova Zelândia,

Austrália, Canadá e Alemanha, seguiram o mesmo caminho.

O surgimento dos incentivos fez com que Hollywood fornecesse trabalhos para

companhias fora dos territórios americanos, fazendo com que empresas não americanas

crescessem em termos de qualidade técnica e artística. Já as empresas norte­americanas

tiveram de se adaptar à nova realidade. Industrial Light & Magic, Rhythm & Hues, Dream

Works e Digital Domain criaram escritórios satélites em áreas onde os subsídios fossem mais

vantajosos, levando consigo parte de força trabalho. Impossível uma companhia californiana

reduzir em 60% seus custos para continuar competitiva.

A anomalia econômica criada pelo repentino aparecimento dos subsídios em uma

região é feroz, já que uma crescente demanda por trabalhadores é saciada com a capacitação

de mão de obra local até o momento em que os subsídios deixam de ser vantajosos,

ocasionando a redução constante de projetos, posteriormente a redução salarial e demissão.

Frisando que os subsídios governamentais são pagos com recursos do contribuinte e, se há

lucros naquela produção beneficiada, os lucros ficam com o estúdio proponente da obra.

38 Grage e Ross, p. 179, 2014.

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Na maioria das vezes, esses incentivos vêm em forma de “tax credits” e só se 39

aplicam se a produtora proponente atingir certas condições orçamentárias. A grande questão é

que apenas os grandes estúdios são capazes de preencher tais condições, pois um valor

mínimo tem de ser gasto dentro do país girando em torno de milhões. E quão estável

economicamente é uma indústria local onde 75% do trabalho é criado por causa de subsídios

governamentais? Subsídios não são garantia de trabalho estável. Subsídios são controlados

por políticos que podem mudar de ideia.

5.3 Guerra dos Subsídios.

Os subsídios são essenciais para manter grandes corporações grandes e pequenas

corporações pequenas. Um grande dano é causado ao mercado local e global, porque em

nosso mundo globalizado, subsídios de diferentes nações estão competindo uns contra os

outros por grandes projetos. Já que a indústria cinematográfica é altamente móvel e os

principais estúdios cinematográficos, MGM, Paramount, Warner, Sony, Disney e Universal

não participam mais do processo de produção, focando forças no financiamento e

distribuição, usar os incentivos fiscais disponíveis ao redor do mundo é um eficiente caminho

na contenção de custos e aumento das margens de lucro.

O grande “player” no mercado dos incentivos fiscais é o Canadá, o qual introduziu

seus incentivos em 1997 . O resultado veio com empresas americanas migrando para o 40

território canadense, principalmente Vancouver e Montreal. Os Estados Unidos até então não

ofereciam programas de incentivos fiscais para produção cinematográfica, apenas algumas

locações tais como Nova York e Luisiana, porém não tão competitivos quanto Vancouver.

Com urbanização similar aos EUA, tendo o inglês como língua e muito próximo da

Califórnia, muitas produtoras e pós­produtoras moveram­se para as várias locações do

Canadá.

Estúdios de VFX americanos sentiram o impacto gerado pelos incentivos fiscais ao

redor do mundo. Desde os anos 2000, Los Angeles teve de assistir enquanto filmes migravam

para cidades tais como Vancouver, Wellington, Londres, Berlim e Praga. Digital Domain

39 Tax Credit é um modelo de incentivos que retorna um percentual do montante gasto no custo de produção na cidade escolhida. O percentual varia de cidade a cidade. Esse percentual é devolvido a produtora proponente, na maioria das vezes, em forma de um cheque. 40 Grage e Ross, p. 182, 2014.

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reorientou seu estúdio para Vancouver depois da falência. Industrial Light & Magic, de São

Francisco, moveu centenas de artistas para Vancouver, Londres e Singapura. DreamWorks

abriu escritórios na China e contratou equipes na Índia. Com o fechamento da Sony

Imageworks, Los Angeles perdeu uma das maiores companhias de efeitos do mercado para

Vancouver, em 2014. Outros estúdios que não operavam escritórios internacionais, tais como

Tippet Studios , tiveram de diminuir ou fechar as portas, tais como CafeFX e The 41 42

Orphanage . Em 2015 a indústria de VFX ficou chocada quando a DreamWorks anunciou o 43

fechamento de seu estúdio mais famoso, PDI DreamWorks em Redwood City California.

Califórnia perdeu 16.513 empregos na área cinematográfica entre 2004 a 2012, um declínio

de 11%, de acordo com o Federal Jobs Dara compilado pelo Milken Institute . 44

Enquanto isso, “lobbys” pró subsídios estão tendo que explicar suas suntuosas

contribuições econômicas aos filmes norte­americanos. Save BC Film, principal organização

política defensora dos incentivos no Canadá, combina esforços de mídia e relações públicas a

fim de aumentar os subsídios aos filmes de alto orçamento. A MPAA , nos EUA, age da 45

mesma forma com relatórios financeiros duvidosos e um programa de relações públicas

efetivo.

As razões para os incentivos são múltiplas. Uma grande produção também significa

um grande negócio. Figurantes e equipes de pós­produção significam um número abrangente

de pessoas. Serviços de alimentação, lojas locais, aluguel de câmeras, cabeleireiros,

escritórios de advocacia, turismo, restaurantes e bares não são as únicas empresas que se

impulsionam economicamente. Dois grandes quesitos na escolha da empresa de efeitos

visuais são: a capacidade da empresa de VFX em realizar o trabalho e os incentivos fiscais

provenientes daquela região. Como Canadá, Nova Zelândia, Austrália e Inglaterra possuem

grandes empresas de VFX capazes de realizar todo o tipo de trabalho, os quatro países se

revezam em grandes produções “Tent­pole” e aumento de subsídios.

41 Tradicional estúdio especializado em “Stop Motion” fundado por Phill Tippet em 1984. Trabalhou em filmes tais como Jurassic Park (1993), Robocop 2 (1990), Ghostbusters 2 (1989). Passou a trabalhar com computação gráfica a partir da década de 90. 42 CafeFX fundada em 1995 por Jeff Barnes e David Ebner fechou as portas em 2010. O Labirinto do Fauno, 2006, dirigido por Guilhermo del Toro é seu trabalho mais relevante. 43 The opharnage fundada em 1999 por Stu Maschwitz, Jonathan Rothbart e Scott Stewart fechou as portas em 2010. Dentre seus filmes estão: Superman Returns, Vanilla Sky, Sin City etc. 44 Report A Hollywood Exit, 2014, p. 09. Fonte: http://assets1b.milkeninstitute.org/assets/Publication/ResearchReport/PDF/A­Hollywood­Exit.pdf 45 A Motion Picture Association of America ou MPAA é uma entidade sem fins lucrativos com sede nos Estados Unidos formada para defender os interesses dos maiores estúdios produtores de filmes norte­americanos.

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Como dito anteriormente, o mercado de grandes produções é dominado por poucos

“players”. Apenas os grandes estúdios podem arcar com produções acima de 100 milhões de

dólares, com isso o poder de barganha frente aos países incentivadores da atividade

cinematográfica é muito superior. E para não perder uma produção relevante, países

tornam­se reféns das exigências, algumas vezes nada convencionais, dos grandes estúdios.

Nova Zelândia é um exemplo de país que se rendeu às exigências da Warner, a qual solicitou

que a Nova Zelândia promulgasse três leis contra a violação de direitos autorais através da

internet, tornando ilegal o maior site de pirataria de filmes americanos da época, armazenado

em território neozelandês, megaupload.com e a prisão de seu fundador, Kim Dotcom. Caso

contrário, o estúdio mudaria suas locações da trilogiaHobbit para a Austrália. Somando­se as

exigências legislativas citadas, o estado da Nova Zelândia arcou com aproximadamente $120

milhões para a trilogia.

5.4 Como Funcionam os Incentivos Fiscais.

Incentivos fiscais ressarcem uma porção qualificada do montante gasto na região

incentivada. Digamos que uma produção gaste um milhão em incentivos qualificados. Se eles

filmarem em uma locação onde há incentivos no valor total de 25% do valor gasto, a

produtora receberá de volta 250 mil dólares. Na maioria dos casos esse valor vem em cheque.

Cada país é diferente, mas quando a produção é finalizada, uma contabilidade é fornecida ao

estado, que é auditado internamente antes de qualquer cheque ou voucher ser lançado. Em

outros casos, a produtora receberá esse valor como um “tax credit” que eles então terão de 46

vender para uma companhia que queira usar esse crédito.

Quando o projeto cinematográfico é de grandes proporções, os estúdios levam em

consideração os custos de produção, mas nem sempre os estúdios vão aos fornecedores mais

baratos, pois dependendo do projeto, só as maiores pós­produtoras são capazes de realizá­los.

A empresa de VFX oferece seu preço sem qualquer dedução, mas ao receber o orçamento, o

estúdio deduz 30% dependendo do incentivo local. A empresa de VFX não recebe algum

46 Tax credit é um crédito fiscal recebido na forma de voucher. Esse voucher pode ser negociado por companhias locais ou seguradoras que queira usá­lo para abatimento de impostos. A negociação do valor desses vouchers é totalmente de acordo com o mercado.

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incentivo, quem acessa os incentivos são os estúdios através do orçamento fornecido pela

empresa de VFX local.

Espera­se que a produção ao desembarcar na cidade subsidiada impulsione

economicamente serviços correlatos tais como: empresas de táxi, escritórios de advocacia,

restaurantes, hotéis, serralherias etc. Estas atividades em si pagam impostos normalmente e

empregam uma parcela significativa da população local. Porem, a prática vem exibindo que

os subsídios não possuem o poder multiplicador que seus defensores vem argumentando.

Levando em consideração apenas o contexto norte­americano e a guerra travada entre os 39

estados para atrair grandes produções, auditorias efetuadas mostram que a maioria dos

subsídios oferecidos em seus territórios possuem retorno de 16 centavos por cada dólar gasto.

Luisiana por exemplo, a cada 1 dólar gasto com incentivo, recebe 15 centavos referente ao

poder multiplicador econômico , sendo que em 2013, o estado gastou em torno de 1 bilhão de 47

dólares de acordo com relatório da Motion Picture Association of America . A fim de ajustar 48

as contas públicas, o estado deLuisiana restringiu, em 2015, a 180 milhões de dólares o limite

a ser usado em incentivos ficais anualmente . O Massachussets Departament of Revenue 49

estimou que de cada dólar gasto em incentivos, o estado recebeu 13 centavos entre 2006 a

2011, com um custo bruto de $128.575 por cada posto de trabalho criado com incentivo fiscal

e o Departamento de Receita do estado reportou que, em 2012, apenas 50 milhões de 50

dólares de 304 milhões gastos pela indústria cinematográfica foram para fornecedores locais.

Em 2016, o estado do Alaska aprovou uma lei para acabar com os programas de lei de

incentivos devido à forte queda na produção de óleo e gás. De acordo com departamento de

comércio do Alaska, realizadores receberam aproximadamente 38 milhões em incentivos

fiscais entre junho de 2009 e Junho de 2013.

Movendo­se ao redor do mundo, os incentivos fiscais se concentram em sua maioria

na Europa, Austrália, Nova Zelândia e Canadá.

No Canadá, há três principais províncias no mercado de incentivos fiscais: British

Columbia, Ontario e Quebec. O Governo Canadense vê e acredita que as empresas de efeitos

47Louisiana Film Tax Credit ­ www.youtube.com/watch?v=j_CscbeaBRY

48 MPAA report, p. 10, Fonte: www.mpaa.org/wp­content/uploads/2015/04/Economic­Impacts­of­the­Louisiana­Motion­Picture­Investor­Tax­Credit1.pdf 49 Fonte:www.latimes.com/entertainment/envelope/cotown/la­et­ct­louisiana­film­tax­20150702­story.html 50 Fonte:www.latimes.com/entertainment/envelope/cotown/la­et­ct­fi­film­tax­credits­20140831­story.html

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visuais possuem os mais qualificados e bem pagos empregos. Créditos no Canadá são

cumulativos, logo o produtor pode somar múltiplos créditos e usando como exemplo um

projeto de um milhão de dólares; em British Columbia, tal produção receberia de volta

aproximadamente 330 mil dólares; em Ontário, com os créditos combinados, a produção

receberia de volta aproximadamente 437 mil dólares e em Quebec o retorno chegaria a mais

de 50% do custo de produção para em torno de 570 mil dólares.

Segue abaixo tabela contendo alguns países e suas medidas de incentivos:

Tabela 5.1

Fonte:www.epfinancialsolutions.com.

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A Tabela abaixo foi retirada da calculadora disponível no site da Film Commission

Creative BC, responsável por administrar os benefícios fiscais no território de British

Columbia, Canadá. Os cálculos levaram em consideração um filme com o orçamento de $10

milhões, onde $2 milhões foram gastos em efeitos visuais e dos 30 dias de filmagens, 20 dias

foram filmados fora de Vancouver em uma locação distante. No resultado, vimos que,

somando­se os incentivos fiscais federais e estaduais, temos uma abatimento acima de 50%

do valor de produção: $ 5.341,360 milhões.

TABELA 5.2

Fonte: www.creativebc.com/programs/tax­credits/film­incentive­bc/sample­tax­credit­calculator

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6.0. Considerações Finais

A raiz de todos os males que arrasa a indústria de efeitos visuais é o fato de a

indústria não receber por aquilo que desenvolve. Uma empresa de VFX é capaz de fazer o

impossível se tornar possível, resolver muitos problemas ocasionados na filmagem,

sequências nunca antes pensadas são capazes de serem produzidas de uma forma realística, o

custo do design de produção cai vertiginosamente, entre outras características que buscam a

redução dos custos de produção e a concepção da cena planejada.

O que vemos como problemas estruturais que paralisam o desenvolvimento da

indústria de VFX mundial são um modelo de negócios mal formulado e a concorrência

mundial desonesta catalisada pelos incentivos fiscais estatais ao redor do mundo. A Indústria

de efeitos precisa achar um caminho em termos de modelo de negócios e organização

estrutural. A globalização facilitou a prestação de serviços ao redor do mundo. Empresas

europeias subsidiadas conseguem, através de uma conexão com a internet, prestar serviços de

qualidade a empresas americanas. E isto acontece hoje com os EUA no que tange aos efeitos

visuais, uma fuga massiva de trabalho para países como a Nova Zelândia, Inglaterra e Canadá.

Hoje ocorre com os EUA, amanhã pode acontecer com esses países que hoje

incentivam. Países como Coreia do Sul ou Taiwan podem futuramente incentivar a produção

e a pós­produção em seus territórios, gerando um círculo vicioso, onde quem tiver uma

situação fiscal mais propícia, incentivará mais, consequentemente atraindo mais produções e

mão de obra qualificada. Por isso, o fim dos incentivos fiscais é um ponto fundamental na

reestruturação da indústria global de VFX, pois há atualmente um mercado artificial

fomentado por recursos advindos dos contribuintes, recursos que um dia podem acabar em

uma repentina crise financeira.

É evidente que para uma indústria cinematográfica saudável, custos de produção

devem ser reduzidos a fim de ampliar a margem de lucro líquido, o qual será reinvestido no

crescimento da empresa. Alguns custos estão atrelados à força da moeda local frente ao dólar,

por exemplo os custos de aquisição de equipamentos internacionais, já que nem todos os

países possuem uma indústria de equipamentos cinematográficos. Outros custos estão

relacionados a entraves estruturais de uma economia e também tem de ser repensados, tais

como: encargos trabalhistas na contratação de mão de obra, o qual resultará na aquisição de

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mais mão de obra qualificada a preço baixo; custos para a entrada de capital estrangeiro e

remessa de lucro, o qual facilitará a entrada de filmes/capital estrangeiros; custos de mão de

obra com alto nível educacional, que fortalecerá a pesquisa e desenvolvimento etc. Ou seja:

para uma indústria de efeitos visuais saudável, vários quesitos que são habituais em países

desenvolvidos economicamente são necessários.

O maior problema no cenário atual é a presença estatal atuando de forma corrosiva,

criando e consolidando monopólios na indústria de VFX mundo afora e influenciando na

ordem natural do mercado, desenvolvendo uma bolha. E no fundo, a presença estatal só está

servindo de alicerce para um perigoso mercado artificial formado por poucos filmes

“tent­poles” que só são possíveis graças aos incentivos estatais. Steven Spielberg e George

Lucas concordaram em um seminário na Universidade do Sul da Califórnia em junho de 2013

que os estúdios “majors” correm o risco de implodir devido as grandes apostas frustadas 51

que acreditariam.

Uma empresa com a estrutura da Weta Digital, entre 500 a 1000 funcionários, parque

tecnológico gigantesco e localizada na Nova Zelândia que é um país longe do grande centro

cinematográfico atual. Como essa empresa iria cobrir seus custos caso o governo da Nova

Zelândia decida que o montante gasto para trazer filmes internacionais seja usado na

construção de pontes, escolas ou mesmo usado na cinematografia nacional, a qual não é

relevante e muito menos capaz de fornecer bons trabalhos à Weta.

Financiamento estatal à atividade cinematográfica não é algo corrosivo para a

economia do audiovisual. Corrosivo é o estado priorizar grandes apostas no mercado sem

mesmo tirar qualquer retorno daquilo investido. O estado está atuando como catalisador desse

desequilíbrio global na indústria, onde todos perdem. A Organização Mundial do Comercio

seria o órgão onde esses incentivos fiscais podem ser julgados, mas pelo visto a OMC não

sabe que a indústria cinematográfica existe, consequentemente não sabendo da sua

importância e poder desenvolvimentista/tecnológico.

O exemplo do Brasil é primoroso, um fundo estatal, Fundo Setorial do Audiovisual,

de caráter rentista, ou seja: o fundo auferi retornos financeiros da obra investida por

determinado período, investindo exclusivamente em obras nacionais. Talvez os grandes

51 http://variety.com/2013/digital/news/lucas­spielberg­on­future­of­entertainment­1200496241/

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gargalos do Brasil sejam o modelo de negócios de nosso parque exibidor apostar apenas em

filmes “tent­poles” e a nossa burocracia e ineficiência tributária impedir o surgimento de

soluções que priorizem a distribuição de filmes de pequeno porte, mas isso não vem ao caso

no presente projeto.

Tal cenário é inapropriado para o profissional de VFX, o qual irá se mudar com a

família para regiões onde os incentivos fiscais sejam mais amigáveis aos estúdios. E vale

lembrar que crises mundiais vem e vão, e por conta disso as medidas de austeridade fiscal

surgem de forma repentina a fim de equalizar um provável rombo fiscal. Nesses ajustes

contábeis, as leis de incentivos são as primeiras medidas a serem reduzidas ou mesmo

cortadas. Os incentivos fiscais ofertados pela província canadense de British Columbia serão

reduzidos a partir de outubro de 2016 de 33% para 28% devido a um rigoroso ajuste fiscal 52

promovido pelo ministro das Finanças Michael de Jong. Os incentivos fiscais em British

Columbia subiram de $255 milhões em 2010 para $493 milhões em 2015. Massachusetts,

Luisiana, Massachusetts, Michigan, Maryland, Novo México, Nevada, Connecticut, Alaska,

Florida e a província de Quebec, Canadá, também reavaliaram e colocaram limites em seus

programas de incentivos fiscais para filmes.

52 http://www.vancitybuzz.com/2016/05/bc­film­tax­credits­changes/

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7.0. Referências

7.1. Bibliografia. GRAGE, Pierre e ROSS, Scott. Inside VFX: An Insider`s view into the visual effects and film Business. 2 ed. Los Angeles, EUA. CreateSpace Independent Publishing Platform. 2014. ULIN, Jeffrey C. The Business of Media Distribution: Monetizing Film, TV, and Video Content in an Online World (American Film Market Presents). 2 ed. Los Angeles, EUA. Focal Press. 2013. EPSTEIN, Edward Jay. The Hollywood Economist 2.0: The Hidden Financial Reality Behind the Movies. Edição reimpressa. Los Angeles, EUA. Melville House. 2012.

PRICE, David. A magia da Pixar. 1 ed. Elsevier Editora. 2009.

7.2. Webgrafia.

VFX Soldier. Quebec e as medidas de austeridade como um sinal do fim dos subsídios. VFXsoldier. Los Angeles. 05 de Junho de 2014. Los Angeles: Disponível em: https://vfxsoldier.wordpress.com/2014/06/05/quebec­austerity­measures­signal­end­of­film­and­game­subsidies/. Acesso em: 05 abr. 2016. CHAN, Kenneth. Luz, Câmera, adeus? O Governo de British Columbia corta os incentivos fiscais para filmes e efeitos visuais. Vancitybuzz. 02 Maio 2016. Disponível em: http://www.vancitybuzz.com/2016/05/bc­film­tax­credits­changes/. Acesso em: 05 abr. 2016. CHAN, Kenneth. 2015, um ano recorde para a indústria de filme e televisão de Vancouver. Vancitybuzz. 19 de fevereiro de 2016. Disponível em: http://www.vancitybuzz.com/2016/02/vancouver­film­industry­2015/. Acesso em: 05 abr. 2016. CHRISTIANSEN, Mark. O Modelo de negócios do VFX em 2014: uma entrevista com Scott Ross, Parte 1. Provideo Colition. 30 de maio de 2014. Disponível em: Parte1: http://www.provideocoalition.com/the­vfx­business­in­2014­an­interview­with­scott­ross­part­one/ Parte 2: http://www.provideocoalition.com/the­vfx­business­in­2014­an­interview­with­scott­ross­part­two/. Acesso em: 25 abr. 2016.

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SQUIRE, Scott. Risco e Subsídios. 17 de fevereiro de 2013. Effects Corner. Disponível em: http://effectscorner.blogspot.com.br/2013/02/risk­and­subsidies.html#.V0JIOZMrLYW. Acesso em: 10 Maio 2016. SQUIRE, Scott. Globalização e VFX. 10 de julho de 2010. Effects Corner. Disponível em: http://effectscorner.blogspot.com.br/2010/07/globalization­and­vfx.html#.V0JIOZMrLYW. Acesso em: 14 Maio 2016. BAKKER, Gerben. A história econômica do indústria internacional de filmes. Editado por Robert Whaples. 10 de fevereiro de 2008. Disponível em: http://eh.net/encyclopedia/the­economic­history­of­the­international­film­industry/. Acesso em: 20 Maio 2016. KARAGANIS, Joe. Mate os subsídios de Hobbit para salvar a terra regular. 04 de Dezembro de 2012. Bloomberg. Disponível em: http://www.bloomberg.com/view/articles/2012­12­04/kill­the­hobbit­subsidies­to­save­regular­earth. Acesso em: 28 Maio 2016. Ep Financial Solutions. Consultoria especializada em financiamento cinematográfico subsidiária da Entertainment Partner. Disponível em: www.epfinancialsolutions.com. KULISH, Nicholas e CIEPLY, Michael. Ao redor do mundo em um filme: o futuro global do financiamento cinematográfico. 05 de dezembro de 2011. New York Times. Disponível em: http://www.nytimes.com/2011/12/06/business/media/around­world­in­one­movie­film­financings­global­future.html?_r=1. Acesso em: 10 Junho 2016.

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www.theguardian.com/film/2013/feb/26/ang­lee­visual­effects­life­of­pi. Acesso em: 15

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7.3. Videografia.

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