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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO UNIDADE ACADEMICA DE GARANHUNS CURSO DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA Alex de Araujo Lima AS CONCEPÇÕES DO EDUCANDO DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS SOBRE O USO DE JOGOS DE ALFABETIZAÇÃO NA SALA DE AULA Garanhuns 2015

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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO

UNIDADE ACADEMICA DE GARANHUNS

CURSO DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA

Alex de Araujo Lima

AS CONCEPÇÕES DO EDUCANDO DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

SOBRE O USO DE JOGOS DE ALFABETIZAÇÃO NA SALA DE AULA

Garanhuns 2015

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Alex de Araujo Lima

AS CONCEPÇÕES DO EDUCANDO DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

SOBRE O USO DE JOGOS DE ALFABETIZAÇÃO NA SALA DE AULA

Trabalho de Conclusão de curso apresentado como requisito parcial para a obtenção do título de Licenciado em Pedagogia, pelo Curso de Licenciatura em Pedagogia da Universidade Federal Rural de Pernambuco, Unidade Acadêmica de Garanhuns. Orientadora: Profa. Dra. Leila Nascimento da Silva.

Garanhuns 2015

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Ficha Catalográfica

Setor de Processos Técnicos da Biblioteca Setorial UFRPE/UAG

CDD: 371.3

1. Educação de Jovens e Adultos

2. Jogos de Alfabetização

3. Avaliações dos educandos

I. Silva, Leila Nascimento da

II. Título

L732c Lima, Alex de Araujo

As concepções do educando da educação de jovens

e adultos sobre o uso de jogos de alfabetização na sala de

aula / Alex de Araujo Lima. – Garanhuns, 2015.

65f.

Orientadora: Leila Nascimento da Silva.

Monografia (Curso Licenciatura em Pedagogia) –

Universidade Federal Rural de Pernambuco-Unidade

Acadêmica de Garanhuns, 2015.

Bibliografias

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Dedico este trabalho ao Sagrado Coração

de Jesus e à minha querida mãe Zenaide.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, principalmente, a Deus por está sempre presente na minha vida e

pela oportunidade de vivenciar essa etapa.

Expresso meu agradecimento ao Curso de Licenciatura em Pedagogia da

UAG e aos profissionais que integram o corpo docente. Em especial Marlene Ogliari,

Alzenir Silva, Robson Oliveira, Heloísa Bastos, Robson Eugênio, Norma

Vasconcelos, José Mariel e Valéria Barza.

Agradeço aos meus pais, Aguinaldo Lima e Zenaide Lima, à minha irmã

Amanda Lima, minha querida Viviane Gomes e toda minha família, pela educação,

amor, incentivo e apoio nessa caminhada. Vocês foram peças essenciais nessa

jornada.

À minha orientadora, Leila Nascimento, pelo apoio, carinho, dedicação e

atenção. Sua ajuda foi fundamentalmente importante para o desenvolvimento e

conclusão deste trabalho. Grato pela amizade!

Aos amigos de faculdade, Juliana Souza, Vanessa Maria, Eliane Salvador,

Arlam Pontes, Gerciane Ramos, Idaiana Lima, Edivanilson Mota, aos que não

mencionei, pelos momentos de descontrações e alegrias. Em particular aos amigos

Charliel Couto e Vanessa Brandão, amizades que cultivo desde os primeiros dias na

faculdade, obrigado por estarem presente em momentos de felicidade e

perseverança.

A todos que contribuíram direta ou indiretamente meus sinceros

agradecimentos!

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RESUMO

Atividades pedagógicas que envolvem o uso de jogos de alfabetização, em turmas de educandos jovens e adultos, podem mobilizar diferentes situações, demandas cognitivas e possibilitar a construção/reconstrução do saber. Desse modo, devemos buscar compreender as concepções deles sobre o uso dessas ferramentas pedagógicas, por isso, nos propomos a analisar as concepções dos educandos da EJA sobre o uso de jogos de alfabetização no processo de aprendizagem, na primeira fase. Para tanto, buscamos: identificar quais as possíveis contribuições que os educandos da EJA apontam sobre o uso dos jogos de alfabetização, no processo de aprendizagem; identificar os principais aspectos apontados pelos educandos em relação à mediação do educador no trabalho com jogos de alfabetização. Realizou-se entre os meses de março a junho, uma pesquisa-ação com educandos da primeira fase da EJA, na qual foi aplicada uma diagnose de escrita para identificar as hipóteses de escrita, elaboramos os jogos de alfabetização, foi planejada a intervenção com o docente e realizadas entrevistas com os educandos. Os resultados evidenciaram que os educandos concebem a utilização de jogos como: veículos de inclusão que criar momentos de troca de conhecimentos; experiências prazerosas que podem motivar e facilitar a aprendizagem; e uma forma diferente de ensinar, aprender e divertir. Além disso, consideram que não existem restrições para o uso dos jogos na sala de aula, percebem as possíveis funções lúdica e educativa dos jogos e atribuem o papel de mediador ao educador.

Palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos. Jogos de Alfabetização.

Avaliações dos educandos

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 8

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ............................................................................. 11

2.1 REVISITANDO BREVEMENTE O PERCURSO DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO BRASIL: DIRECIONANDO NOSSO OLHAR .................................... 11

2.2 A IMPORTÂNCIA DE ESCUTAR AS EXPECTATIVAS DOS EDUCANDOS DA EJA ............................................................................................................................ 16

2.3 O PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO: UMA NOVA FORMA DE CONCEBER .. 18

2.4 O PROCESSO EVOLUTIVO DE APROPRIAÇÃO DOS CONHECIMENTOS DO SISTEMA DE ESCRITA ALFABÉTICA ..................................................................... 21

2.5 JOGOS DE ALFABETIZAÇÃO ............................................................................ 25

2.5.1 Experiências com jogos de alfabetização na EJA ....................................... 28

3 METODOLOGIA .................................................................................................... 31

3.1 CARACTERÍSTICAS DO CAMPO DE PESQUISA E DOS SUJEITOS............... 32

3.2 PROCEDIMENTOS ............................................................................................. 33

3.2.1 Observações iniciais e a aplicação de uma diagnose de escrita ............... 34

3.2.2 Elaboração dos jogos de alfabetização para a Educação de Jovens e Adultos ..................................................................................................................... 34

3.2.3 Aplicação dos jogos....................................................................................... 41

3.2.4 Entrevistas com os educandos ..................................................................... 42

4 ANÁLISE DOS DADOS ......................................................................................... 44

4.1 VIVENCIAR EXPERIÊNCIAS COM JOGOS? ..................................................... 46

4.2 JOVENS E ADULTOS BRINCANDO COM JOGOS? ......................................... 51

4.3 DIVERTIR E AO MESMO TEMPO ENSINAR ..................................................... 54

4.4 APRENDEMOS ALGO? ...................................................................................... 55

4.5 OS MEDIADORES DAS APRENDIZAGENS ...................................................... 57

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 59

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 61

APÊNDICE A – DIAGNOSE DE ESCRITA............................................................... 65

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1 INTRODUÇÃO

Os movimentos sociais e as reivindicações da sociedade civil, na década de

1980, lutaram para a construção de um ensino público, universalizado e de

qualidade para todos os brasileiros. Essas lutas influenciaram direta e indiretamente

na promulgação da Constituição Federal de 1988 e na elaboração da Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LEI nº 9.394/1996) que define a

Educação como um direto de todos os brasileiros, inclusive para aqueles que não

tiveram acesso na idade prevista ou oportunidade de continuidade, isto é, a

educação destinada a jovens e adultos.

Quando nos reportamos a Educação de Jovens e Adultos (EJA), estamos nos

referindo a sujeitos que por razões de ordem social, cultural e/ou econômica não

tiveram acesso à escolarização e buscam a primeira ou uma nova oportunidade de

inclusão.

Nessa perspectiva, ressaltamos que para pensar em uma educação, que vise

potencializar a formação transformadora, devemos refletir sobre o processo de

ensino e de aprendizagem desses educandos. Assim, devemos considerar três

campos que contribuem para a definição de seu lugar social: a condição de não

crianças, a condição de excluídos da escola e a condição de membros de

determinados grupos culturais (OLIVEIRA, 1999).

Essas condições demonstram que o educando da EJA tem especificidades no

modo de aprender e, principalmente, que trazem consigo características

socioculturais do grupo em que está inserido, o que faz dele alguém portador de

uma cultura e de saberes. Portanto, o contexto escolar deve possibilitar uma relação

intrínseca entre os saberes do educando e os saberes escolares.

Conforme Amorim (2009), os jovens e adultos que buscam retomar ou

começar a escolarização são motivados pela vontade de aprender e se desenvolver

socialmente. Almejam uma qualificação ou promoção profissional, e, principalmente,

aprender a ler e a escrever para ganhar autonomia e se inserir na sociedade, para

proporcionar uma qualidade de vida melhor para sua família.

Um processo de ensino-aprendizagem significativo na EJA presume um elo

entre os objetivos educacionais e as expectativas dos educandos. Portanto, é

fundamental perceber as concepções deles sobre como aprendem, pois escutar

seus interesses e desejos pode auxiliar no processo de alfabetização. Nesse

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sentido, o presente trabalho buscou responder um questionamento: Quais as

concepções dos educandos sobre o uso de jogos de alfabetização no processo de

aprendizagem, da primeira fase da EJA?

Segundo Leal (2004), Morais e Albuquerque (2004), e Soares (2006), a

alfabetização, atualmente, é um período de aprendizagem de conceitos complexos

(sistema de escrita alfabética) e desenvolvimento da capacidade de compreender e

produzir textos. Portanto, com práticas de leitura e escrita, os indivíduos têm a

oportunidade de vivenciar eventos sociais mediados pela escrita – a perspectiva de

alfabetizar letrando.

Nesse contexto, o processo de alfabetização deve ser construído com base

nas experiências culturais para criar possibilidades de produção e construção de

conhecimento. Sendo assim, é importante pensar em atividades que exijam

diferentes demandas cognitivas, mobilizem diferentes situações e possibilitem que o

educando construa seu próprio saber, como, por exemplo, o uso de jogos educativos

de alfabetização.

Acreditamos que os jogos de alfabetização podem se constituir como um

recurso pedagógico para a aprendizagem, pois possibilitam que os educandos não

apenas entendam a lógica da escrita, mas consolidem o que já aprenderam (LEAL;

ALBUQUERQUE; LEITE, 2005).

Entretanto, consideramos que existem dificuldades em realizar práticas

pedagógicas que abordem a função lúdica e educativa dos jogos na EJA. Uma

dessas dificuldades se fundamenta pela infantilização do ensino, geralmente,

encontrada no trabalho com essas turmas (AZEVEDO, 2012). Portanto, é preciso

reconhecer que essa é uma modalidade com especificidades que necessitam ser

consideradas.

O jogo educativo é caracterizado como um material ou situação que visa à

apropriação de conteúdos específicos ou ao desenvolvimento de habilidades

intelectuais. Alguns estudiosos (LEAL; ALBUQUERQUE; LEITE, 2005; KISHIMOTO,

2009; MARCELLINO, 2009) consideram o jogo como um veículo de expressão,

inserção e socialização das práticas culturais, e destacam que a partir das funções

lúdicas crianças, jovens e adultos se engajam num mundo imaginário regido por

regras construídas a partir das vivências sociais, ou seja, os jogos são expressões

da cultura dos povos.

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Pode-se considerar o jogo educativo como uma fonte de prazer e

aprendizagem. Portanto, é necessário o equilíbrio da função lúdica e da função

educativa. Entende-se o lúdico como um componente da cultura historicamente

situada (MARCELLINO, 2009), ou seja, como um produto e processo das práticas

socioculturais. Por meio dele, o sujeito tem a oportunidade de constatar os erros ou

lacunas, favorecendo a tomada de consciência que é necessária para a

construção/reconstrução do conhecimento.

Nesse sentido, os estudos e pesquisas sobre o uso de jogos alfabéticos na

EJA são de extrema importância, pois o jogo permite ao educando adquirir

habilidades para aprofundar seu conhecimento. O desenvolvimento desse estudo

pode contribuir para formações de novos profissionais interessados em atuar nessa

modalidade de ensino e também auxiliar as Secretárias Estaduais e Municipais de

Educação a pensarem uma formação continuada para os educadores da EJA,

através da qual possa se refletir sobre o papel dos jogos de alfabetização nas

turmas da EJA.

Diante desse panorama, são necessários mais estudos aprofundados sobre a

concepção do educando da EJA com relação à utilização de jogos de alfabetização

em sala de aula. Com isso, nosso objetivo geral foi analisar as concepções dos

educandos da EJA sobre o uso de jogos de alfabetização no processo de

aprendizagem, na primeira fase. Para tanto, os objetos específicos foram: a)

identificar quais as possíveis contribuições que os educandos da EJA apontam

sobre o uso dos jogos de alfabetização, no processo de aprendizagem; b) identificar

os principais aspectos apontados pelos educandos em relação à mediação do

educador no trabalho com jogos de alfabetização.

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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 REVISITANDO BREVEMENTE O PERCURSO DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E

ADULTOS NO BRASIL: DIRECIONANDO NOSSO OLHAR

No Brasil, não é recente a preocupação com o processo formativo de pessoas

jovens e adultas não alfabetizadas. Desde a chegada dos colonizadores

portugueses, a ação educativa do ensinar a ler e escrever aos adultos constituiu

uma das atuações prioritárias no interior do projeto de colonização. Embora, nesse

período, o sistema de ensino dos jesuítas priorizasse sua ação junto às crianças, os

adultos eram submetidos a uma intensa ação cultural e educacional (GALVÃO;

SOARES, 2004).

Observa-se que, posteriormente a expulsão dos jesuítas, não houve

experiências sistemáticas e significativas com a alfabetização de pessoas jovens e

adultas. Somente encontramos, no período Imperial, registros expressivos no âmbito

legislativo, no qual, de acordo com Haddad e Di Pierro (2000), a primeira

Constituição brasileira (1824) firmou a garantia de uma instrução primária e gratuita

para todos os cidadãos (assim, também para os adultos). Entretanto, pouco ou

quase nada foi realizado neste sentido.

O resultado de todo esse descaso e despreocupação com a formação dos

não alfabetizados é que ao final dos períodos Colonial, Imperial e início da República

poucos sabiam ler e escrever. Galvão e Soares (2004) afirmam que:

[...] o censo de 1890 mostrava que mais de 80% da população brasileira era analfabeta o que gerou, entre os intelectuais brasileiros, um sentimento de “vergonha”, diante dos países “adiantados. Isso significava que de cada 10 brasileiros só dois conseguiam ler uma carta, um documento, um jornal ou um livro. Os demais dependiam de alguém para decifrar o que estava em qualquer texto. (p. 37)

Até o início da década de 1940, esse percentual se manteve praticamente

estático. Ao final desta década, a educação de jovens e adultos passou a se firmar

como uma problemática da política nacional. Assim, o Estado aumentou suas

atribuições e responsabilidades com as verbas de financiamentos e as atuações

estratégicas em todo o território.

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Esse enfrentamento das questões educacionais, relacionadas aos jovens e

adultos não alfabetizados, recebeu influencias do movimento internacional de

Educação de Base para todos (que iniciou com o final da II Guerra Mundial). Essas

circunstâncias influenciaram as mobilizações sociais em prol da educação das

massas.

Ao passo que se buscava o progresso social e o desenvolvimento sócio

econômico do país, tornava-se imprescindível pensar em políticas significativas de

educação de pessoas jovens e adultas, assim, no final da década de 1940 e no

início de 1950, se inicia no país movimentos de campanhas de alfabetização de

massas, principalmente nas localidades rurais (PEREIRA, 2007).

Os esforços mobilizados com as campanhas, durantes essas décadas, pouco

realizaram em termos concretos (GALVÃO; SOARES, 2004), devido ao insuficiente

comprometimento político, a despreocupação com a formação dos professores e as

concepções político-pedagógicas.

No entanto, paralelamente à ação governamental, emergem em alguns

lugares do território nacional, em especial no Nordeste, os movimentos de educação

e cultura popular1. Um movimento de grande notoriedade na época foi o ocorrido em

Recife, conhecido como Movimento de Cultura Popular (MCP). Esse movimento teve

início na década de 1960, foi inspirado nas ideias de Paulo Freire e tinha como

intenção levar a todas as pessoas a cultura popularmente produzida, trabalhar com

educação politizadora de conscientização, cultura popular, e, principalmente,

resgatar nas pessoas o seu potencial criador (GALVÃO; SOARES, 2004; PEREIRA,

2007).

A conjuntura idealizada nesses movimentos da sociedade civil buscava a

alteração do quadro socioeconômico e político do país. A expressividade e

notoriedade dos movimentos de cultura popular foram bastante significativas para a

Educação de jovens e adultos.

Haddad e Di Pierro (2000, p.111) denominam esse momento histórico como

“um período de luzes para a educação de adultos”. A força das ideias pedagógicas

de Paulo Freire de conscientização, problematização e transformação ganham

amplitude nacional. E no ano de 1963, Paulo Freire assumiu a responsabilidade de

1 Para saber mais sobre esses movimentos visite a web página <http://forumeja.org.br/edupopular>.

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elaborar o Programa Nacional de Alfabetização junto ao Ministério da Educação

(GALVÃO; SOARES, 2004).

Entretanto, a implantação desse programa nacional e os funcionamentos dos

movimentos de educação e cultura popular foram interrompidos com o golpe militar

de 1964. De acordo com Pereira (2007), no período militar:

As ideias políticas discutidas nos grupos de alfabetização de adultos poderiam dificultar o processo de dominação pretendido; por esse motivo, logo após o golpe militar, inicia-se o desaparecimento dos grupos de educação de adultos com práticas conscientizadoras. (p. 57)

Como solução estratégica para responder as necessidades formativas dos

cidadãos e neutralizar as ações dos movimentos populares, o governo militar cria,

em 1967, o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL). O MOBRAL é criado,

sobretudo, com objetivos políticos de conscientização cívica para um capitalismo

autoritário e uma alfabetização, praticamente, de “desenhar palavras”.

Desse modo, na implantação do MOBRAL se desenvolvia um trabalho

“conscientizador”, porém com uma filosofia totalmente diferente daquela realizada

pelos movimentos de educação e cultura popular, antes de 1964, pois esse

movimento (MOBRAL) fazia abertas restrições à concepção política-filosófica de

Paulo Freire, assim, falavam de conscientização cívica em busca da “ordem” e do

“progresso” (PEREIRA, 2007).

Com o fim do Regime Militar e início da Nova República, em 1985, o

MOBRAL é extinto, para substituí-lo cria-se a Fundação Educar (Fundação Nacional

para Educação de Jovens e Adultos). A Fundação Educar, diferentemente do

MOBRAL, passou a fazer parte do Ministério da Educação, no entanto, apenas

exercia a função de supervisionar e acompanhar a execução de programas

(GALVÃO; SOARES, 2004; PEREIRA, 2007).

Essa política teve curta duração e a alfabetização de pessoas jovens e

adultas não se firmaram como prioridade. O governo Collor extinguiu a Fundação

Educar e não criou nada para substituí-la. “A partir de então, o governo federal

ausenta-se como articulador nacional e indutor de uma política de alfabetização de

jovens e adultos” (GALVÃO; SOARES, 2004, p. 47).

Nesse período, de redemocratização, também é marcado pela afirmação da

Educação de Jovens e Adultos (EJA) no plano legislativo. A afirmação jurídica foi

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resultado das reivindicações da sociedade civil e dos movimentos sociais, na década

de 1980, que lutaram para a construção de um ensino público, universalizado e de

qualidade para todos os brasileiros, inclusive para os jovens e adultos.

Essas reivindicações influenciaram, direta e indiretamente, na promulgação

da Constituição Federal de 1988 e na elaboração da Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional de 1996 (LEI nº 9.394/1996), que estabelece como modalidade

de ensino a EJA (Educação de Jovens e Adultos). Ou seja, a Educação é

assegurada como direito, inclusive para aqueles que não tiveram acesso ou

oportunidade de continuidade dos estudos na idade prevista.

Entretanto, apesar dessa segurança normativa, a EJA ainda se configura pela

contradição entre a identidade teórico-metodológica e seus aspectos legais. Nesse

sentido, percebemos que, mesmo depois do seu reconhecimento, a EJA foi se

construindo mais por políticas desenvolvimentistas do que por uma preocupação

com o processo formativo do cidadão (SENA; SOUZA, 2013). Pois,

“tradicionalmente, no Brasil, o governo federal tem assumido, não de maneira

exclusiva, a responsabilidade por campanhas e programas de alfabetização de

adultos” (HADDAD, 2009, p. 360).

Diante disso, percebe-se que não há uma preocupação específica com a EJA

e que essas políticas, com baixo nível de financiamento, acabam estimulando

programas de curta duração que oferecem a população uma ilusão de melhoria de

vida pela aquisição de certos conhecimentos, mas não costumam modificar,

totalmente, a realidade social desses educandos.

De acordo com Azevedo (2012), essas campanhas e documentos oficiais

ainda percebem a EJA com uma modalidade específica que se propõe a atender,

essencialmente, um público ao qual foi negado o direito da Educação, sejam pelas

inadequações do sistema de ensino e/ou condições socioeconômicas.

No entanto, a EJA não pode ser percebida, somente, como uma questão

etária e/ou ressarcimento de um direito outrora negado. Deve-se refletir sobre como

esses educandos pensam e aprendem para que a Educação possibilite a

inclusão/formação de sujeitos participativos na sociedade.

Educar para a inclusão significa, então, potencializar a formação de sujeitos em uma práxis transformadora. A educação de adultos tem uma longa tradição – talvez para potencializar e atualizar – no interesse de produzir subjetividades, onde o desenvolvimento e a melhora progressiva das condições de vida sejam orientados por um horizonte de justiça. Significa

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uma proposta que potencializa a consolidação de identidades, individuais e coletivas, superando a perspectiva de um humanitarismo assistencial, que surge às vezes em atualizadas modalidades de ressonâncias progressistas. (RODRIGUEZ, 2009, p. 327)

Assim, ressaltamos que para pensar em uma educação, que vise

potencializar a formação transformadora, é fundamental considerar as

características socioculturais e, principalmente, as peculiaridades desses sujeitos

portadores de cultura e de saberes.

Portanto, para refletir sobre o processo de ensino e de aprendizagem desses

educandos devemos considerar três campos que contribuem para a definição de seu

lugar social: a condição de não crianças, a condição de excluídos da escola e a

condição de membros de determinados grupos culturais (OLIVEIRA, 1999).

Entender o educando da EJA como não criança é essencial, pois ele está

inserido no mundo do trabalho e das relações interpessoais e, diferentemente das

crianças, traz consigo uma história mais longa de experiências, conhecimentos

acumulados e reflexões sobre o mundo externo. Isto é, os jovens e adultos trazem

consigo diferentes habilidades e uma maior capacidade de reflexão sobre

conhecimento e seus processos de aprendizagem.

A condição de excluídos da escola está explícita nos currículos, programas e

métodos de ensino que foram originalmente pensados para crianças e adolescentes.

Além disso, a condição de pertencente a um grupo cultural demonstra que o

educando têm especificidades e traz consigo conhecimentos.

Nesse sentido, um ensino e uma aprendizagem significativos nessa

modalidade de ensino presumem um elo entre os objetivos educacionais e as

expectativas dos educando. Portanto, é fundamental perceber a concepção deles

sobre como aprendem. A sistematização de experiências do cotidiano escolar é uma

fonte inesgotável de produção de conhecimentos (RODRIGUEZ, 2009).

Entendemos que os jovens e adultos que retomam ou começam a

escolarização são motivados pela vontade de aprender a ler e escrever, para

conseguirem uma valorização social e profissional. A forma como esses saberes

serão trabalhados definirá a relação do educando com a escolarização. Portanto,

escutar os interesses e desejos do educando pode auxiliar no processo de

alfabetização.

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2.2 A IMPORTÂNCIA DE ESCUTAR AS EXPECTATIVAS DOS EDUCANDOS DA

EJA

Ao escutar as ideias dos educandos de como e por que aprendem, podemos

refletir e elaborar proposições sobre as concepções deles em relação às

metodologias usadas nas aulas, as interpretações das atividades, as avaliações da

postura do educador, suas participações no grupo, entre outras. Portanto, conhecer

as concepções pode auxiliar no processo de ensino e aprendizagem.

Quando possibilitamos que o educando opine, reflita e avalie o seu próprio

percurso escolar estamos inserindo-o, efetivamente, no seu processo de ensino e

aprendizagem. Assim, suas percepções representaram avaliações de situações

propostas para que ele aprenda e posicionamentos sobre conteúdos.

Nessa perspectiva, o educando pode perceber e avaliar as práticas

pedagógicas, ressaltando aspectos importantes, como: a motivação para a

aprendizagem, as formas de interação entre educador-educando e educando-

educando; e os objetivos didáticos das atividades (LIMA, 2011).

Consideramos que as concepções dos educandos podem representar os

interesses, envolvimentos, opiniões, desejos e, sobretudo, uma reflexão crítica dos

diferentes aspectos da rotina pedagógica. Assim, para possibilitar um contexto de

práticas significativas na EJA devemos conhecer suas perspectivas sobre a escola e

o que esperam aprender.

A pesquisa desenvolvida por Amorim (2009) aponta que as principais

expectativas dos educandos da EJA em relação à escola é que através da ação de

estudar consigam maiores chances de inserção no mercado de trabalho, participar

de práticas sociais de leitura e escrita, adquirir autonomia para realizar determinadas

atividades diárias, ampliar suas participações nas práticas religiosas, familiares,

trabalhistas em que a escrita é presente.

Dessa forma, percebemos que o educando ao iniciar ou regressar a

escolarização manifesta, sobretudo, a vontade de dominar a leitura e escrita para

ganhar autonomia em situações sociais, almejar qualificações e colocações

profissionais, uma qualidade de vida melhor e, principalmente, superar o estigma

preconceituoso de não ser alfabetizado.

De acordo com Amorim (2009), em relação ao que desejam aprender na

escola, os educandos da EJA revelam interesses por temáticas voltadas às

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profissões, várias áreas do conhecimento (matemática, história, ciências e

geografia) e, especialmente, os componentes curriculares de Língua Portuguesa. A

autora observou que as expectativas dos educandos, sobre o que querem aprender

da língua, revelam algumas competências dos eixos de leitura, escrita e oralidade:

[...] em relação à aprendizagem da leitura, verificamos que diferentes focos e interesses foram contemplados, tais como: (1) a apropriação de habilidades de leitura para ler com autonomia em situações do cotidiano; (2) a aquisição da leitura para participar de diferentes situações, ampliando conhecimentos, e, consequentemente, tendo maiores chances de se inserir no mercado do trabalho, espaços religiosos, enfim, espaços sociais diversos; (3) compreensão aprofundada dos textos, evidenciando, nas situações sociais, que detém saberes e é capaz de influenciar outras pessoas por meio de suas habilidades; (4) domínio da leitura para que a sociedade o reconheça como uma pessoa capaz, valorizando-a e respeitando-a. [...] Em relação aos desejos dos alunos em relação à escrita, constatamos que alguns entrevistados buscam também uma diversidade de interesses: (1) a aquisição de habilidades de escrita para fazer uso autônomo da mesma em situações reais de uso no ambiente profissional, familiar, dentre outros, e consequentemente, participar de espaços sociais diversos; (2) o domínio da norma padrão para o desenvolvimento de uma “escrita correta” para maior valorização de seus escritos e, assim, menor distanciamento frente ao prestígio atribuído à pessoa que domina a norma padrão; (3) a habilidade de usar a escrita para expressar seus sentimentos, desejos emoções, em escritos poéticos e diários pessoais; (4) a habilidade de usar a escrita com autonomia para garantir sua intimidade em situações de interação em que deseja sigilo e recatamento. [...] No que concerne à oralidade, identificamos nas falas dos sujeitos da pesquisa dois focos: (1) o anseio de aprender a “falar correto”, de acordo com a situação de interlocução, pois o desenvolvimento da variedade culta, ou seja, que a forma de falar também confere posição social aos indivíduos; (2) o desejo de “falar correto” por não valorização das variações dialetais e crença de que falar certo é falar de acordo com norma de prestígio, corroborando para a construção de uma imagem marginalizada das pessoas que manifestam suas diferentes maneiras de falar. (p. 92-94)

Portanto, observa-se que as expectativas dos jovens e adultos sobre esses

eixos da língua portuguesa, apontam que ao aprender e dominar as habilidades de

leitura, escrita e oralidade o educando espera uma participação mais ativa em certas

práticas sociais e maior aceitação social. Em outras palavras, o educando deseja

ampliar suas habilidades sobre a língua e construir/reconstruir uma nova

autoimagem social.

Nesse sentido, as expectativas dos educandos nos sinalizam para a

necessidade de revermos o conceito de alfabetização e tornarmos o aprendizado da

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língua portuguesa mais útil para a vida do educando, ou seja, dar um significado

maior ao que é vivenciado em sala de aula. No tópico seguinte, discutiremos os

avanços nessa área de Alfabetização e como uma nova forma de concebê-la foi

emergindo a partir das demandas sociais e de pressões sociais em busca de uma

educação de qualidade para todos.

2.3 O PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO: UMA NOVA FORMA DE CONCEBER

A expectativa do educando é que através da escolarização se tenha a

oportunidade de dominar com autonomia as práticas sociais de leitura e de escrita.

Ao entrar no universo escolar sua motivação principal é aprender ler e escrever,

mas, sobretudo, ganhar autonomia nas situações em que a escrita está presente,

almejar uma qualificação/promoção profissional, ter acesso aos bens socioculturais

e proporcionar uma qualidade de vida melhor para sua família (AMORIM, 2009).

O processo de alfabetização, desse modo, tem um papel importante na vida

do educando. Assim, devemos refletir e reinterpretar sobre o sentido de estar

alfabetizado. Alguns pesquisadores, com seus estudos (MORAIS; ALBUQUERQUE,

2004; GALVÃO; LEAL, 2005; SOARES, 2006; ALBUQUERQUE, 2007; SANTOS;

ALBUQUERQUE, 2007; ALBUQUERQUE; MORAIS; FERREIRA, 2013), nos ajudam

a entender essa nova forma de conceber a alfabetização.

Observamos que as definições do conceito de alfabetização sofreram

alterações ao longo da história. Por exemplo, no Brasil, até a década de 1940, era

considerado alfabetizado quem declarasse e comprovasse saber ler e escrever seu

próprio nome, a partir da década de 1950, e até meados do ano 2000, os

instrumentos passaram a considerar alfabetizado aquele fosse capaz de ler e

escrever um bilhete simples (MORAIS; ALBUQUERQUE, 2004).

Essas mudanças corroboraram para a ampliação da concepção de

alfabetização que passou a ser concebida como a inserção no mundo da escrita

pela a apropriação de um sistema.

Nesse sentido, concebemos a alfabetização como o processo de apropriação

da escrita alfabética, ou seja, um período de aprendizagem de conceitos complexos

(sistema de escrita alfabética) e desenvolvimento da capacidade de compreender e

produzir textos (ALBUQUERQUE; MORAIS; FERREIRA, 2013).

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Com o uso efetivo das práticas sociais da leitura e da escrita, os indivíduos

têm a oportunidade de vivenciar eventos sociais, em diferentes contextos, mediados

pela escrita, esse fenômeno é chamado de letramento.

De acordo com Soares (2006, p. 35): “Na verdade, a palavra letramento é

uma tradução para o português da palavra inglesa literacy.”. Que significa o estado

ou condição que assume aquele que aprende a ler e escrever. Conforme explicitam

alguns trabalhos (MORAIS; ALBUQUERQUE, 2004; ALBUQUERQUE; MORAIS;

FERREIRA, 2013) a palavra literacy engloba todo o complexo processo de

alfabetização, mas, no Brasil, o letramento não substituiu a palavra alfabetização, ao

contrário, o termo letramento aparece associado à alfabetização (ALBUQUERQUE,

2007).

Ressaltamos que em práticas pedagógicas de leitura e escrita desenvolvidas,

com educando da EJA, torna-se essencial entender a perspectiva do alfabetizar

letrando. Santos e Albuquerque (2007, p. 98) afirmam que:

Alfabetizar letrando é, portanto, oportunizar situações de aprendizagem da língua escrita nas quais o aprendiz tenha acesso aos textos e a situações sociais de uso deles, mas que seja levado a construir a compreensão acerca do funcionamento do sistema de escrita alfabético.

Quando adotarmos esse posicionamento de que alfabetizar e letrar,

simultaneamente, possibilitamos uma aprendizagem significativa ao educando da

EJA, criamos oposição à visão tradicional de que no processo de alfabetização em

primeiro lugar se aprende a codificar e decodificar palavras, para depois ler e

escrever efetivamente (MORAIS; ALBUQUERQUE, 2004).

Assim, não podemos desenvolver as atividades de alfabetização e letramento

baseados, somente, em métodos tradicionais2 (sintéticos, analíticos e analítico-

sintéticos), mas, sim, em práticas e metodologias pedagogicamente ajustados aos

contextos em que, para que e por que se aplicam (GALVÃO; LEAL, 2005).

2 Segundo Galvão e Leal (2005) os métodos de alfabetização se dividem em três grandes grupos: os

métodos sintéticos pressupõem o início da aprendizagem a partir dos elementos estruturantes mais simples (letras, fonemas ou sílabas) através de sucessivas ligações, que levariam os aprendizes a ler palavras, frases e textos. Por exemplo, nos métodos silábicos os aprendizes só eram chamados a formar palavras que fossem compostas de padrões silábicos trabalhados; os métodos analíticos propõem um ensino que parte das unidades significativas da linguagem (palavras, frases ou pequenos textos), para depois analisar as partes menores (letras e sílabas); os métodos analítico-sintéticos pressupõem que o processo de aprendizagem de um estágio de conhecimentos global (palavras, frases, textos), em seguida, passa para um estágio analítico-sintético de decomposição das palavras em letras e/ou sílabas, para com estas formar novas palavras.

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Historicamente as práticas pedagógicas na EJA tem se constituído em

atividade de codificação, decodificação e memorização das letras e das famílias

silábicas (AZEVEDO, 2012). Um método no qual o professor alfabetiza “usando

cartilhas” e o educando recebe as informações.

No entanto, como vimos no tópico anterior, às expectativas dos educando vão

muito além da apropriação de um sistema de escrita. Eles buscam, sobretudo,

ampliar suas capacidades de produção e compreensão de textos escritos e orais, o

que nos leva a considerar, como prioridade, a proposta de alfabetizar e letrar

simultaneamente (AZEVEDO, 2012).

Na busca de uma construção de práticas que abordem essas duas dimensões

da aprendizagem da língua, o educador deve estar atento a necessidade de

organizar uma rotina pedagógica que contemple o trabalho com a leitura e produção

de diferentes textos e o trabalho sistemático no eixo da apropriação da escrita

alfabética. Essa tarefa específica de apropriação pode estar relacionada à

exploração de palavras presentes em alguns textos e/ou podem se relacionar a

outras atividades, por exemplo, as que envolvem jogos (FERREIRA;

ALBUQUERQUE, 2013).

O trabalho de apropriação da escrita alfabética, nessa concepção, deve ser

construído com base nas experiências culturais para criar possibilidades de

produção e construção de conhecimento. Desse modo, é importante pensar em

atividades sistemáticas que exijam diferentes demandas cognitivas, mobilizem

diferentes situações e possibilite que o educando, ativamente, construa seu próprio

saber.

Ao discutir a importância da sistematização da prática pedagógica na ação do

educador no processo de aprendizagem dos princípios básicos do Sistema de

Escrita Alfabética (SEA), Leal (2004, p. 78) aponta que:

[...] é de fundamental importância que, na escolarização inicial, sejam encaminhadas atividades de apropriação do sistema alfabético simultaneamente às atividades de apropriação dos usos e das funções sociais da escrita, com reflexões acerca dos diversos gêneros de textos que circulam socialmente.

Nesse sentido, o domínio do funcionamento do sistema alfabético possibilita

aos educandos autonomia nos eventos sociais de leitura e escrita. Um trabalho

pedagógico que envolva situações didáticas para apropriação do SEA, com

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sequência de atividades planejadas, pode contribuir para o ensino e aprendizagem

desses conhecimentos.

2.4 O PROCESSO EVOLUTIVO DE APROPRIAÇÃO DOS CONHECIMENTOS DO

SISTEMA DE ESCRITA ALFABÉTICA

Nas práticas de apropriação do sistema de escrita alfabética, devemos

reconhecer que esse sistema é, em sim, um objeto de conhecimento – um sistema

notacional. Assim, a aprendizagem desse objeto não se restringe a aquisição de um

código, mas envolve aprendizagens conceituais (MORAIS, 2005).

Consideramos que ao desvendar a lógica do funcionamento da escrita

alfabética o educando realiza um intenso trabalho cognitivo. Alguns estudos

(MORAIS; ALBUQUERQUE, 2004; MORAIS, 2012; LEAL; MORAIS, 2013) sobre a

teoria da psicogênese da escrita – de Emília Ferreiro e Ana Teberosky – ajuda-nos a

entender os aspectos construtivos desse processo de aprendizagem, e pontos

essenciais na compreensão de que alfabetizar-se é se apropriar de um sistema

notacional.

Considerando que a tarefa do alfabetizando não é aprender um código, mas

se apropriar de um sistema, Morais (2012), ressalta dois pontos fundamentais para

entendermos a teoria da psicogênese:

Em primeiro lugar, precisamos reconhecer que, para o aprendiz de escrita alfabética, as “regras de funcionamento” ou propriedades do sistema não estão já “disponíveis”, “dadas” ou “prontas” na sua mente. [...] não faz sentido, para a maioria dos aprendizes, numa etapa inicial, ficar pronunciando fonemas isolados e repetindo a leitura de sílabas ou de palavras que começam com aqueles fonemas. [...] Em segundo lugar, a teoria da psicogênese da escrita mostra que, assim como a humanidade levou muito tempo para inventar o sistema alfabético, após ter usado outros sistemas de escrita (sistemas pictográficos, ideográficos, silábicos etc.), a internalização das regras e convenções do alfabeto não é algo que se dá da noite para o dia, nem pela mera acumulação de informações que a escola transmite, prontas, para o alfabetizando. (p. 48)

Nessa perspectiva, para dominar o SEA os educandos precisam concentrar

seus esforços para desvendar e compreender a lógica desse sistema. Para

compreender as propriedades básicas do sistema alfabético de escrita (LEAL, 2004;

MORAIS, 2012; LEAL; MORAIS, 2013) os sujeitos precisam perceber que:

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a) Escreve-se com letras que não podem ser inventadas, que têm um repertório

finito e que são diferentes de números e outros símbolos;

b) As letras têm formatos fixos e pequenas variações produzem mudanças na

identidade das mesmas (p, q, b, d), embora uma letra assuma formatos

variados (P, p, P, p);

c) A ordem das letras no interior da palavra não pode se mudado;

d) Uma letra pode se repetir no interior da palavra e em diferentes palavras, ao

mesmo tempo em que distintas palavras compartilham as mesmas letras;

e) Nem todas as letras podem vir juntas de outras e nem todas podem ocupar

certas posições no interior das palavras;

f) As letras notam a pauta sonora e não as características físicas ou funcionais

dos referentes que substituem;

g) As letras notam segmentos sonoros menores que as sílabas orais

pronunciadas;

h) As letras valores sonoros fixos, apesar de muitas terem mais de um valor

sonoro e certos sons poderem ser notados com mais de uma letra;

i) Além de letras, na escrita de palavras usam-se, também, algumas marcas

(acentos) que podem modificar a tonicidade ou som das letras ou sílabas;

j) As sílabas podem variar quando às combinações entre consoantes e vogais

(CV, CCV, CVV, CVC, V, VC, VCC, CCVCC...), mas a estrutura predominante

no português é a sílaba CV (consoante-vogal), e todas as sílabas do

português contêm, ao menos, uma vogal.

Assim, consideramos que a sistematização didática de apropriação do SEA

deve ser construída com base nas experiências socioculturais, respeitando as

especificidades dos educandos jovens e adultos, criando possibilidades de

construção e reconstrução de conhecimentos.

Portanto, em qualquer etapa do processo de apropriação o educando precisa

compreender duas questões principais. Desse modo, para alguns autores (MORAIS,

2005; MORAIS 2012; LEAL; MORAIS, 2013) os esforços pedagógicos devem

envolver duas questões conceituais: o que a escrita representa/nota? E como a

escrita cria representações/notações?

Sobre a primeira pergunta sabemos que de início as crianças, jovens e

adultos não sabem que a escrita representa/nota a pauta sonora das palavras e,

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com relação à segunda, o que conseguem, geralmente, é perceber que para

escrever palavras diferentes precisamos variar as formas gráficas (MORAIS, 2012).

Ao consideramos esse percurso evolutivo, vivido pelo educando, torna-se

fundamental refletir sobre como se estrutura as etapas/hipóteses. Ferreiro e

Teberosky (1985) desenvolveram uma sequência de estágios de escrita. Alguns

estudiosos (FERREIRO; TEBEROSKY, 1985; LEAL, 2004; COUTINHO, 2005;

MORAIS, 2012; LEAL; MORAIS, 2013) aprofundaram e classificam as fases

(etapa/estágio de escrita) em quatro grupos: pré-silábica, silábica, silábico-alfabética

e alfabética.

Na fase pré-silábica, o educando ainda não entendeu que a escrita nota ou

registra a pauta sonora das palavras. No percurso evolutivo de apropriação, os

educandos produzem garatujas, rabiscos parecidos com letras e letras sem relações

com a palavra. Na busca de compreender a lógica do sistema, eles começam a

descobrir quais são as unidades sonoras que correspondem ás unidades gráficas

(LEAL; MORAIS, 2013).

De acordo com Morais (2012), nesse processo o educando tenta registrar

características físicas ou funcionais dos objetos (realismo nominal),

progressivamente, expressa tentativas de diferenciar as palavras entre si,

formulando hipótese de quantidade mínima (o registro das palavras tem quantidades

especificas de letras) e hipótese de variedade de letras (as palavras são registradas

com letras diferentes). Assim, à medida que os educandos começam a evidenciar

conhecimentos acerca de correspondências letra-som avançam na fase de escrita.

Na fase silábica, observamos que os educandos tentam escrever as partes

orais que pronunciam, isto é, registram as palavras dividindo-as em sílabas e

buscando fazer correspondência grafofônicas, começando a compreender que a

escrita nota a pauta sonora das palavras (MORAIS, 2012).

Exemplificando, o educando pode inserir sílabas que sugere preocupação

com correspondências grafofônicas, mas não há indício de uma preocupação em

marcar cada sílaba (silábica inicial). Na sequência, passa por um período (silábica

quantitativa) de preocupação exclusivamente quantitativa, percebem que as

palavras podem ser segmentadas em sílabas, então coloca qualquer letra para

representar as sílabas. Simultaneamente, passa a demonstrar preocupações com a

correspondência som-grafia, colocando letras que tenham relação com os sons

representados (silábica qualitativa) (LEAL, 2004; LEAL; MORAIS, 2013).

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A fase silábico-alfabética é um período de transição, no qual, o educando

descobre que a escrita alfabética nota as partes das palavras que falamos,

compreende que não se coloca uma letra para cada sílaba, mas que é preciso pôr

os “pedacinhos menores” das palavras (MORAIS, 2012).

Assim, os educandos começam a refletir sobre o interior das sílabas orais,

buscando notar os pequenos sons (fonemas), nessa ação eles começam a escrever

palavras e “esquecem” algumas letras. No entanto, essa fase deve ser considerada

como um avanço conceitual, pois eles estão tentando representar mais letras que no

estágio anterior.

Na fase alfabética é possível perceber que ele se apropriou dos princípios

gerais do SEA, embora, ao escrever, o educando cometa vários erros ortográficos.

Ao representar as palavras ele busca fazer, de modo mais consistente, todas as

correspondências grafofônicas. A partir dessa apropriação se inicia o longo período

de consolidação das convenções som-grafia e aprendizagem da norma ortográfica

(LEAL; MORAIS, 2013).

Consideramos que ao conhecer os estágios e os princípios do SEA, podemos

possibilitar aos jovens e adultos, que iniciam ou retomam sua trajetória escolar,

contextos significativos de aprendizagem. Assim sendo, planejando de maneira

sistemática e individual as intervenções pedagógicas podemos contribuir com a

autonomia dos educandos nas práticas sociais de leitura e escrita.

Segundo Leal e Morais (2013) muitos jovens e adultos da EJA, na maior parte

dos casos, encontram-se já numa fase de escrita avançada (silábico-alfabética e/ou

alfabética). Portanto, os educadores precisam planejar intervenções que ajudem os

educados a desenvolver as habilidades de leitura e produção de textos e,

principalmente, consolidar e organizar seus conhecimentos sobre a escrita.

Nesse sentido, ao diagnosticar as hipóteses dos educandos da EJA podemos

criar possibilidades mais significativas de consolidação, produção, construção e

reconstrução de conhecimento, assim, reafirmamos que o processo de ensino e

aprendizagem deve ser construído com base nas especificidades e nas vivências

culturais dos educandos. Desse modo, as atividades podem ser pensadas para

exigir diferentes demandas cognitivas, possibilitar e mobilizar diferentes situações

construtivas de conhecimento. Assim, acreditamos que jogos de alfabetização

podem auxiliar nessa tarefa.

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2.5 JOGOS DE ALFABETIZAÇÃO

Considera-se o jogo como um rico recurso pedagógico no processo de

alfabetização de jovens e adultos. Usando-o, adequadamente, possibilita-se que os

educandos vivenciem situações didáticas que contemplam os diferentes níveis de

conhecimento sobre o sistema alfabético de escrita. Assim sendo, abordaremos

concisamente algumas características dos jogos e sua relação com a educação e,

sobretudo, sua importância no processo de alfabetização de jovens e adultos.

Inicialmente, destacamos que os jogos são elementos motivadores e

facilitadores do processo de aprendizagem, formas de manifestações e expressão

de práticas culturais da sociedade, atividades lúdicas nas quais sujeitos se inserem

num mundo imaginário próprio, um veículo que auxilia a construção de

conhecimento e de regras sociais de convívio.

Dessa forma, sabe-se que os jogos estão presentes na vida dos educandos

(crianças, jovens, adultos e idosos) e são utilizados como instrumentos de diversão,

lazer e prazer. Portanto, os jogos são práticas culturais dotadas de historicidade

podendo assumir, dependendo do lugar e da época, múltiplas significações (LEAL;

ALBUQUERQUE; LEITE, 2005; KISHIMOTO, 2009).

Leal, Albuquerque e Leite (2005) discutindo sobre a historicidade, dos jogos

educativos no desenvolvimento humano, apresentam a delimitação dos grupos

principais – os jogos de enredo e os jogos de regras. No primeiro grupo, os

participantes representam uma situação da realidade, imaginam, narram e vivenciam

histórias (por exemplo, o jogo de faz-de-conta). No segundo, a situação imaginária

está implícita e as regras orientam as ações, assim, os participantes centram a

atenção na finalidade e no atendimento das regras.

As regras compartilhadas nos jogos ajudam no desenvolvimento,

aprendizagem e compreensão dos conhecimentos que estão sendo trabalhados.

Nesse sentindo, consideramos que os jogos de regras como um recurso pedagógico

pode possibilitar o desenvolvimento do educando no processo de alfabetização.

Kishimoto (2009) apresenta no seu trabalho cinco pontos comuns que

interligam a grande família dos jogos: a) a liberdade de ação do jogador, a

motivação interna e a ação lúdica (prazer ou desprazer); b) as regras implícitas ou

explícitas; c) relevância do brincar e a incerteza do resultado; d) a não literalidade

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(quando a realidade interna predomina), imaginação e representação da realidade;

e) contextualização no tempo e no espaço.

Essas questões sinalizadas proporcionam as distinções entre jogo, brinquedo

e brincadeira, pois conhecendo os traços comuns característicos dos jogos podemos

situa-lo no contexto da educação. Para a autora, supracitada, o jogo, ao longo da

história, adquiriu varias funções na educação, sendo usado para: recreação,

favorecer o ensino de conteúdos escolares, diagnosticar personalidades infantis,

trabalhar princípios de moral e ética, e ajudar o desenvolvimento social.

No entanto, atualmente, o jogo na educação é concebido como recurso

pedagógico que potencializa a exploração, construção e reconstrução do

conhecimento. Podendo assumir duas funções: a lúdica e a educativa. Na função

lúdica, o jogo propicia diversão, prazer (ou desprazer) quando escolhido

voluntariamente. Na função educativa, o jogo ensina qualquer coisa que complete o

educando em seus conhecimentos e sua apreensão do mundo (KISHIMOTO, 2009).

Portanto, devemos buscar o equilíbrio entre essas funções, pois elas se

constituem como práticas indissociáveis. O jogo educativo é uma fonte de prazer e

de aprendizagem, já o lúdico é um componente da cultura historicamente situada

(MARCELLINO, 2009), Nessa perspectiva, o aprendizado com jogos, no contexto

escolar, é um produto e processo socioculturais, no qual, por meio dele o sujeito tem

a oportunidade de constatar os erros ou lacunas, favorecendo a tomada de

consciência que é necessária para a construção do conhecimento.

Dessa forma, reafirmamos que o trabalho com jogos de alfabetização (jogo de

regras) apresenta uma grande potencialidade para a aprendizagem da língua e,

possibilitam a vivência de dimensões lúdicas e desenvolvimento humano, elementos

essenciais às práticas escolares (BRANDÃO et al., 2009).

Os jogos de alfabetização não são objetos que trazem conhecimentos prontos

e acabados, ao contrário, são instrumentos que trazem em si um saber potencial

que pode ser explorado, através deles o educador pode criar situações que

possibilitem a sistematização e reflexão dos conhecimentos, implícitos nos jogos

(LEAL; ALBUQUERQUE; LEITE, 2005).

Ao falar sobre a relevância dos jogos de alfabetização na EJA, Azevedo

(2012) ressalta que:

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[...] os jovens e adultos podem se apropriar da linguagem, formulando hipóteses, confrontando-as, confirmando-as ou as corrigindo, através da interação e interlocução com seus colegas, seus professores e outros partícipes da atividade. Este recurso pode servir para revelar aquilo que o aluno já sabe, os caminhos que percorreu até chegar àquela determinada resposta, seu processo de construção do conhecimento, o que o aluno ainda não sabe e sua necessidade de superação, através dos esclarecimentos verbais sobre determinadas respostas, que podem ser solicitadas pelas professoras. (p. 55)

Nesse contexto, os jogos podem se constituir como um recurso para a

aprendizagem, pois possibilitam que os educandos não apenas entendam a lógica

da escrita, mas consolidem o que já aprenderam e troquem experiências. Portanto, o

jogo se caracteriza como uma atividade sistemática, um elemento motivador e

facilitador do processo de alfabetização.

Conforme Leal, Albuquerque e Leite (2005), os jogos usados no processo de

alfabetização são divididos em três grupos: 1) jogos de análise fonológica, aqueles

que inserem atividades de análise fonológica sem fazer correspondência com a

escrita; 2) jogos que ajudam a refletir sobre os princípios do sistema alfabético, os

que levam a refletir sobre os princípios do sistema alfabético, ajudando os

educandos a pensar sobre as correspondências grafofônicas; 3) jogos que ajudam a

sistematizar as correspondências grafofônicas e a desenvolver fluência de leitura, os

que ajudam a consolidar as correspondências grafofônicas.

Uma rotina didática de apropriação da escrita, organizada na dimensão do

alfabetizar letrando, considera-se relevante também proporcionar a vivência de jogos

que explorem os princípios básicos do SEA. Ao jogar o participante pode

compreender as propriedades e internalizar suas regras, para reconstruir seu

conhecimento sobre o sistema.

Nesse contexto, quando pensamos em atividades (LEAL, 2004; LEAL;

MORAIS, 2013a) com: familiarização das letras; construção de palavras estáveis;

reflexão fonológica; composição e decomposição de palavras; comparação entre

palavras escritas; escrita de palavras através do preenchimento de lacunas; inserção

ou retiradas de letras e sílabas para formação de novas palavras; ordenação de

letras e sílabas; leitura de palavras; e escrita de palavras. Pode-se complementar as

práticas pedagógicas com os jogos de alfabetização, que considerem as

especificidades (a condição de não crianças, a condição de excluídos da escola e a

condição de membros de determinados grupos culturais) e possibilitem situações

construtivas de conhecimento.

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Nessa perspectiva, enfatizamos que os jogos de alfabetização podem se

constituir como um recurso pedagógico para a aprendizagem, pois possibilitam que

os educandos da EJA não apenas entendam a lógica da escrita, mas consolidem o

que já aprenderam. Assim, necessitamos aprofundar os estudos com relação às

concepções dos educandos da EJA sobre o uso de jogos no processo de

aprendizagem.

2.5.1 Experiências com jogos de alfabetização na EJA

Os estudos e pesquisas sobre as experiências com jogos de alfabetização,

para o ensino e aprendizagem, de pessoas jovens e adultas são escassos. Por

exemplo, ao realizarmos um levantamento na principal reunião nacional de

educadores e pesquisadores da educação brasileira, promovido pela a Associação

Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação – ANPED3 –constatamos

esse fato.

Analisamos os trabalhos aprovados para publicação e apresentação dos

Grupos de Trabalhos “Alfabetização, Leitura e Escrita” e “Educação de Pessoas

Jovens e Adultas”, das cinco últimas reuniões nacionais4 (36ª, 35ª, 34ª, 33ª e 32ª) e

não encontramos trabalhos que tivessem como objetivo principal investigar o uso de

jogos de alfabetização na EJA.

No entanto, se pode encontrar, em algumas bibliografias acadêmicas, embora

não tivessem com foco principal abordar essa questão, recomendações e

orientações, ou até relatos que fazem menções de que educadores realizaram

experiências com jogos nas suas práticas pedagógicas (ALBUQUERQUE; LEAL,

2004; LEAL; ALBUQUERQUE, 2013).

Ao fazermos a leitura do trabalho de Albuquerque e Ferreira (2008), que

realizaram uma pesquisa para analisar as práticas de alfabetização de professores

de EJA e como elas se relacionam com a proposta pedagógica do Programa Brasil

Alfabetizado da cidade do Recife, observamos a citação/menção de experiências

3 A ANPED é uma associação sem fins lucrativos que congrega programas de pós-graduação stricto

sensu em educação, professores e estudantes vinculados a estes programas e demais pesquisadores da área. Ela tem por finalidade o desenvolvimento da ciência, da educação e da cultura, dentro dos princípios da participação democrática, da liberdade e da justiça social. Disponível em: <http://www.anped.org.br/> 4 Fonte disponível em: <http://www.anped.org.br/reunioes-cientificas/nacionais>

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com jogos de alfabetização na apresentação dos dados relativos à prática e rotina

das educadoras:

Ainda para trabalhar com as características do SEA, a professora realizava muitas atividades de jogos. A partir das observações feitas e do depoimento dos alunos, tais atividades eram sempre bem-vindas. A participação da turma nesses momentos era intensa. Esses jogos eram realizados tanto coletivamente, como no caso do jogo da forca, como em pequenos grupos. A professora falou, em conversa informal, que planeja sua aula tentando contemplar aquilo que os alunos mais gostam de realizar, como os jogos.

(ALBUQUERQUE; FERREIRA, 2008, p. 434)

Evidências como essas têm demonstrado que os jogos são recursos que

oferecem situações de aprendizagem, também, em turma de EJA. Consideramos

que pesquisas e estudos aprofundados sobre utilização de atividades que envolvam

esse recurso didático podem auxiliar o trabalho e, principalmente, entender as

concepções dos educandos da EJA sobre o uso de jogos em sala de aula.

Azevedo (2012), em sua pesquisa de mestrado, investigou a contribuição de

atividades metalinguísticas, aplicadas através de jogos de alfabetização na EJA, e

as possíveis implicações que a inserção dessas atividades trouxe para as práticas

pedagógicas dos educadores. O estudo foi realizado com duas turmas de EJA. Seu

encaminhamento metodológico aconteceu da seguinte forma: aplicação de

diagnoses, uma no início e outra no final da pesquisa; aplicação e reaplicação de

oito jogos, em dezesseis sessões; observação das aulas antes e depois das

sessões; e entrevistas com os educandos e educadores. Os resultados principais

mostraram que houve avanços consideráveis nos níveis de escrita, na maioria dos

educandos; a inserção dessas atividades influenciou nas práticas pedagógicas das

educadoras, que passaram a inserir algumas atividades baseadas nos jogos

aplicados; e essas atividades repercutiram positivamente nas aprendizagens e nas

motivações dos educandos.

Nesse sentido, percebemos que os jogos de alfabetização contribuem para a

aprendizagem, dos educandos da EJA, sobre o sistema de escrita, através de

atividades lúdicas (sem infantilização), nas quais seus interesses e desejos são

respeitados. Assim, nosso trabalho enfatizou a investigação e análise das

concepções dos educandos da EJA sobre o uso de jogos no processo de

aprendizagem, a fim de, identificarmos quais as possíveis contribuições que os

educandos apontam sobre esse uso e sobre a mediação do professor nesse

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trabalho. Dessa forma, esperamos que esse estudo possa contribuir para formações

de novos profissionais e auxiliar as secretárias de educação a pensarem formações

continuadas, direcionada aos educadores, que reflitam sobre o papel dos jogos nas

turmas da EJA.

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31

3 METODOLOGIA

Para alcançar os objetivos propostos nesta pesquisa utilizamos algumas

técnicas da pesquisa-ação, pois pretendíamos estimular a ocorrência de um

fenômeno para estudar as concepções dos educandos. De acordo com Thiollent

(1988, apud OLIVEIRA, 2008), a pesquisa-ação é um tipo de investigação empírica

que é entendida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a

resolução de um problema coletivo, no qual os pesquisadores e os participantes

estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo.

Em outras palavras, a pesquisa-ação é aquela que visa intervir na situação,

com vistas a modificá-la. Assim, ao mesmo tempo em que realiza um diagnóstico e a

análise de uma determinada situação, a pesquisa-ação propõe ao conjunto de

sujeitos envolvidos, mudanças que levem a uma reflexão e aprimoramento das

práticas analisadas (SEVERINO, 2007).

Portanto, buscamos de maneira intencional intervir no ambiente pesquisado,

através do planejamento e vivência de jogos didáticos, com a finalidade de estudar

as concepções dos educandos sobre o uso destes jogos que favoreçam a

apropriação do SEA (Sistema de Escrita Alfabética).

Para analisar as concepções dos educandos da EJA sobre o uso de jogos de

alfabetização no processo de aprendizagem, utilizamos dois instrumentos de coleta

de dados que nos permitiu um contato com o fenômeno estudado e a compreensão

sobre um determinado assunto, a observação participante e entrevistas

semiestruturada.

Na observação participante, o pesquisador interage com o contexto

pesquisado, estabelecendo uma relação direta com grupos ou pessoas e

acompanha situações formais ou informais interrogando os participantes sobre as

ações e seus significados por processo de diálogo (OLIVEIRA, 2008).

A entrevista semiestruturada é aquela que se desenrola a partir de um

esquema estabelecido previamente e que permite ao entrevistador adaptações ao

longo do processo. Laville e Dionne (1999) apontam que, a partir da entrevista, o

indivíduo pode formular uma resposta pessoal e emitir uma ideia do que realmente

pensa, e, principalmente, expressar suas opiniões através da fala.

Empregamos, como aporte metodológico, a análise de conteúdo com a

intenção de abranger e viabilizar o trabalho de compreensão, interpretação e

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inferência dos dados coletados. Conforme Bardin (2009), a análise de conteúdo é

um conjunto de técnicas de análise das comunicações que visa obter, por

procedimentos sistemáticos e objetivos, uma descrição do conteúdo das

mensagens.

Os conteúdos podem ser aqueles já dados nas diferentes formas de

comunicação e interlocução, bem como aqueles alcançados a partir de depoimentos

e entrevistas (SEVERINO, 2007), como no nosso caso. Ou seja, esse tratamento

metodológico envolve a análise do conteúdo das linguagens, expressões verbais e

mensagens que são vistas com indicador de um significado.

Desse modo, foi possível identificar quais as possíveis contribuições que os

educandos apontam sobre o uso dos jogos de alfabetização no processo de

aprendizagem, bem como, identificar os principais aspectos apontados com em

relação à mediação do educador no trabalho.

Na sequência, descreveremos a delimitação do campo de pesquisa, as

características dos sujeitos envolvidos e os procedimentos metodológicos adotados.

3.1 CARACTERÍSTICAS DO CAMPO DE PESQUISA E DOS SUJEITOS

Inicialmente, definimos um perfil para a turma que pretendíamos pesquisar.

Estabelecemos critérios que viabilizassem o desenvolvimento da pesquisa, a saber:

a escola deveria ser da rede pública de ensino; o regente da turma deveria ser

alfabetizador e efetivo da rede; ter formação adequada para atuar na modalidade da

EJA; e os educandos deveriam estar no processo inicial da alfabetização, na

primeira fase ou 1ª e 2ª séries.

Entramos em contato com a Secretaria Municipal de Educação de

Garanhuns-PE que disponibilizou uma relação das escolas que ofereciam essa

modalidade de ensino e os critérios anteriormente mencionados. Dessa forma,

escolhemos uma escola, situada no Bairro da Boa Vista, que funciona nos três

turnos, durante os horários da manhã e tarde oferece os anos iniciais do Ensino

Fundamental e a noite a modalidade de Educação de Jovens e Adultos (primeira

fase ou 1ª e 2ª séries, segunda fase ou 3ª e 4ª séries, terceira fase ou 5ª e 6ª

séries).

O educador da turma da primeira fase, na qual realizamos a pesquisa, tinha

42 anos de idade e 25 anos de experiência na educação. Era formado em

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Licenciatura em Pedagogia (2003) e tinha especialização em Psicopedagogia

(2005). Já havia atuado na Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino

Superior. Em 2014, ano que realizamos a pesquisa, atuava como coordenador

pedagógico, em uma escola particular no horário diurno, e como alfabetizador de

pessoas jovens e adultas há três anos.

A turma pesquisada era formada por vinte e três (23) educandos,

frequentando, quinze (15) homens e oito (8) mulheres. Dezessete sujeitos

trabalhavam em diferentes profissões (doméstica, pedreiro, auxiliar de construção,

mecânico e pintor), alguns eram aposentados (3) e outros somente estudavam (3).

Com relação à faixa etária: cinco tinham entre 14 a 25 anos; nove entre 26 a

50 anos; e nove mais de 51 anos. Desses, treze educandos já haviam estudado

quando criança e dez nunca haviam estudado. Os níveis de escrita dos educandos

variavam entre: pré-silábico, silábico de qualidade, silábico-alfabético e alfabético de

escrita, sendo que a maioria estava nesse último nível, como demonstraremos nos

tópicos seguintes.

3.2 PROCEDIMENTOS

Como explicamos anteriormente, estimulamos a ocorrência de um fenômeno

(jogos pensados para jovens e adultos) para estudar as concepções dos envolvidos.

Sabemos que as práticas que envolvem jogos de alfabetização na EJA não ocorrem

assiduamente (AZEVEDO, 2012). Desse modo, planejamos uma sequência didática

que envolvesse jogos de alfabetização pensados para EJA, que, sobretudo,

respeitassem as especificidades e características dessa modalidade de ensino.

Nesse sentido, esquematizamos uma trajetória para coletarmos os dados

entre os meses de Março a Junho de 2014. Definimos etapas sequenciais para

desenvolvimento do nosso estudo: primeiramente, tivemos um contato com a

direção da escola, em seguida, com o educador e educandos envolvidos;

posteriormente, observamos no ambiente pesquisado e aplicamos uma diagnose

para identificarmos os níveis de escrita dos educandos e, assim, melhor planejar a

intervenção com o docente; planejamos, elaboramos e aplicamos os jogos de

alfabetização com o docente; e por fim, realizamos as entrevistas com os

educandos. A seguir a descrição das principais etapas.

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3.2.1 Observações iniciais e a aplicação de uma diagnose de escrita

Buscamos nesta etapa conhecer a dinâmica da turma pesquisada.

Preferimos, primeiramente, explicitar aos sujeitos envolvidos que estávamos

desenvolvendo um trabalho com fins científicos, convidando-os a participarem

voluntariamente e que garantiríamos o anonimato e proteção das pessoas e

instituição envolvidas. Todos aceitaram a proposta.

Realizamos três observações, durante duas semanas, para nos

familiarizarmos com o ambiente, conhecer o perfil do educando e conhecer: as

relações interpessoais entre os educandos e educador (amizade, conflito), a

participação dos educandos na aula e as formas de diálogo entre educando,

educador e conhecimento.

Essa etapa nos ajudou a elaborar as situações didáticas, com os jogos, que

respeitassem as especificidades dos educandos (OLIVEIRA, 1999), evitassem

situações de conflito ou desordem durante aplicação dos jogos.

Aplicamos nos dois últimos dias, das observações iniciais, uma diagnose com

o objetivo de identificar as hipóteses de escrita (FERREIRO; TEBEROSKY, 1985) e

planejar jogos adequados à necessidade de aprendizagem dos educandos. Essa

diagnose (Apêndice A) era composta de nove figuras, na qual o individuo deveria

escrever abaixo da figura o nome destas. As palavras variavam em quantidade de

sílabas (monossílabas, dissílabas, trissílabas e polissílabas).

Ao analisarmos as diagnoses percebemos que: três educandos estavam no

nível pré-silábico; três no nível silábico de qualidade; quatro no nível silábico-

alfabético; e dez no nível alfabético, mas com várias dificuldades ainda.

Assim, dividimos os educandos em dois grupos, os que estavam nos níveis

pré-silábico e silábico de qualidade, e os outros que estavam nos níveis silábico-

alfabético e alfabético. Essa divisão serviu com referencial para planejarmos os

jogos e as intervenções.

3.2.2 Elaboração dos jogos de alfabetização para a Educação de Jovens e

Adultos

A partir das necessidades de aprendizagem apontadas nas diagnoses

elaboramos jogos de alfabetização para os educandos. Esses jogos foram

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inspirados nos propostos por Azevedo (2012) e do Kit de Jogos de Alfabetização

distribuídos pelo Ministério da Educação5 (dos quais modificamos imagens, palavras,

regras e etc.). Ressaltamos que elaboramos jogos que: respeitassem as

especificidades dos educandos (OLIVEIRA, 1999); contemplassem palavras do

cotidiano e figuras não infantilizadas; explorassem a reflexão dos princípios do

sistema de escrita (LEAL, 2004; MORAIS, 2012; LEAL; MORAIS, 2013).

A sistemática da elaboração ocorreu da seguinte forma: o pesquisador

elaborava (ou adequava) as regras e os objetivos didáticos, discutia com sua

professora orientadora a concepção do jogo, confeccionava os componentes dos

jogos, apresentava e explicava ao educador as finalidades, considerava os possíveis

apontamentos e considerações, caso fosse necessário fazia os ajustes.

Ressaltamos que esses encontros com o educador aconteceram antes da

aplicação dos jogos, em dois encontros, nos horários proposto por ele e que essa

situação ajudou na desenvoltura da aplicação dos jogos. A seguir apresentamos os

jogos elaborados:

a) Bingo das sílabas iniciais

FINALIDADE DO JOGO: vence o jogo quem primeiro completar a sua cartela,

marcando todas as figuras.

PARTICIPANTES: 1 a 26 jogadores.

COMPONENTES: 26 cartelas com seis figuras (cada cartela) e as palavras escritas

correspondentes às figuras; 35 fichas com palavras escritas; um saco para guardar

as fichas de palavras.

REGRAS: cada jogador recebe uma cartela; o educador sorteia uma ficha do saco e

lê a palavra em voz alta; os jogadores que tiverem, em sua cartela, uma figura cujo

nome comece com a sílaba da palavra chamada, deverá marcá-la; o jogo termina

quando um jogador marcar todas as palavras de sua cartela.

PALAVRAS DAS FICHAS: avião, bacia, bico, cabelo, coração, comprar, cego,

chapéu, chulé, dentista, estrela, fazenda, fogo, gado, igual, ladeira, lotação, marido,

merenda, ovelha, palito, pedra, rato, reboque, sala, tigela, telegrama, vento, veículo,

vaca, bota.

5 O Kit de jogos de alfabetização foi elaborado pelo Centro de Estudos em Educação e Linguagem

(CEEL) da Universidade Federal de Pernambuco, em 2008.

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PALAVRAS DAS CARTELAS: alianças, anel, abacate, abacaxi, batata, barata, baú,

bola, botijão, bolacha, boca, bicicleta, bigode, bilhete, capacete, cachorro, casa,

cavalo, cadeira, caderno, cobra, copo, colher, computador, cebola, celular, chave,

charuto, chaleira, chuveiro, chupeta, chuva, chuchu, dentadura, dente, espelho,

escola, escada, escapamento, faca, fábrica, farinha, fogão, fogueira, gafanhoto,

galo, galinha, igreja, ilha, lápis, laranja, lobo, maçã, mala, macaco, médico,

melancia, ovo, olho, pato, parafuso, pedreiro, pé, pena, rádio, revista, relógio,

revólver, sapato, sabão, tijolo, telefone, tesoura, televisão, teclado, ventilador, vela,

vassoura.

Figura 1: Bingo das sílabas iniciais. Design editado no PowerPoint (Microsoft Office), imagens retiradas da internet e impressas em papel cartão.

b) Escrevendo as palavras

FINALIDADE DO JOGO: ganha o jogo quem conseguir escrever mais palavras

corretamente.

PARTICIPANTES: 4 jogadores ou 4 duplas

COMPONENTES: 1 dado de 8 lados; 4 cartelas diferentes (sem as palavras

escritas) com 8 figuras numeradas; 4 cartelas de correção (com as palavras

escritas).

REGRAS: colocam-se as cartelas (sem as palavras escritas) no centro da mesa,

virada para cima, e deixa-se a cartelas (com as palavras escritas) de correção

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correspondente virada para baixo; cada jogador deve ter um papel e lápis para

escrever as palavras durante o jogo; o educador ou os jogadores decidem quantas

partidas serão jogadas; decide-se quem começará o jogo; o primeiro jogador lança o

dado. O número indicado no dado irá apontar o número da figura da cartela cuja

palavra deverá ser escrita pelo jogador; o jogador escrever a palavra em seu papel,

sem mostrar para o colega, e passa o dado para o jogador seguinte; o mesmo

procedimento é seguido pelos demais jogadores. O jogador que escrever mais

palavras corretamente ganhará o jogo.

PALAVRAS DAS CARTELAS: fogão, vassoura, faca, chuveiro, batata, relógio, mala,

televisão; celular, sapato, tijolo, escada, computador, botijão, bola, vela; boca,

galinha, chapéu, gafanhoto, maçã, rádio, parafuso, dente; macaco, ventilador,

bigode, capacete, farinha, sabão, aliança, colher.

Figura 2: Escrevendo as palavras. Design editado no PowerPoint (Microsoft Office), imagens retiradas da internet e impressas em papel cartão.

c) Quais são as letras?

FINALIDADE DO JOGO: vence o jogo a equipe que fizer mais pontos ao final.

PARTICIPANTES: equipes com 4 ou 6 jogadores

COMPONENTES: 8 envelopes cor de rosa, cada envelope com um cartão-pergunta,

no qual será necessário subtrair letra(s) para formar uma nova palavra; 8 envelopes

verde, cada envelope com um cartão-pergunta, no qual será necessário adicionar

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letra(s) para formar uma nova palavra; 8 envelopes azul, cada envelope com um

cartão-pergunta no qual será necessário trocar letra(s) para formar uma nova

palavra.

REGRAS: as equipes decidem a ordem de início por sorteio; a equipe que iniciar

escolhe uma cor de envelope e tenta responder a pergunta; o educador deve

cronometrar um tempo para resposta (3 minutos); o educador deve escrever no

quadro a primeira palavra, para que os educandos visualizem e elabore suas

hipóteses para a palavra (resposta) e, também escrever no quadro as respostas

para corrigi-las (caso seja necessário); cada equipe tem uma chance para

responder, caso não consiga o educador deve perguntar se a outra equipe que sabe

a resposta. Se isso ocorrer ganha o ponto a outra equipe que responder

corretamente; marca-se ponto para a equipe que acertar a pergunta. O jogo termina

quando uma equipe acertar o maior número de perguntas.

PALAVRAS DOS ENVELOPES: lista de adição de letras: mola-esmola, asa-casa,

pia-piano, cola-escola, alho-galho, pote-ponte, pato-prato, ovo-povo; lista de

subtração de letras: sapato-pato, favela-vela, chuva-uva, lampião-pião, mamão-mão,

perna-pena, sacola-cola, cebola-bola; lista de troca de letras: pilha-filha, mão-pão,

vaca-faca, dente-pente, porta-torta, canela-panela, queijo-beijo, boneca-caneca.

Figura 3: Quais são as letras? Exemplo dos cartões perguntas dos envelopes. Design editado no Word (Microsoft Office).

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d) Stop!

FINALIDADE DO JOGO: vence o jogo quem primeiro relacionar corretamente as

figuras com as palavras.

PARTICIPANTES: em dupla ou quarteto.

COMPONENTES: 4 cartelas diferentes contendo oito palavras (sem as figuras); 32

figuras.

REGRAS: cada jogar recebe uma cartela (as cartelas dos jogadores devem ser

diferentes) e um envelope com 8 figuras; cada jogar deve relacionar a figura com a

palavra correspondente; quando o jogar relacionar todas as palavras e figuras deve

falar “Stop!”, em seguida, o educador confere com os outros jogadores se está

correta a ordem (figura e escrita), caso não o jogo continua; ganha o jogo quem

primeiro relacionar todas as palavras e figuras.

PALAVRAS DAS CARTELAS: tesoura, pincel, avião, bolo, pé, caneca, cadeira,

geladeira; sofá, sol, bicicleta, carro, garrafa, telefone, dominó, pente; mão, moto,

chave, camisa, sabonete, panela, dinheiro, café; pão, mesa, torneira, cama,

ventilador, galinha, celular, parafuso.

Figura 4: Stop! Design editado no PowerPoint (Microsoft Office), imagens retiradas da internet e impressas em papel cartão.

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e) Baralho das Rimas

FINALIDADE DO JOGO: ganha quem formar duas trincas de cartas contendo figuras

de palavras que rimam.

PARTICIPANTES: 4 ou 5 jogadores.

COMPOSIÇÃO: 36 cartas com figuras (12 trincas de cartas contendo figuras de

palavras que rimam).

REGRAS: cada jogador recebe 6 cartas e o restante delas fica num “monte”, no

centro da mesa, com a face voltada para baixo; decide-se quem irá começar a

partida por meio de sorteio; o primeiro jogador inicia, pegando uma carta e

descartando outra; o jogador seguinte decide se pega a carta do monte ou a carta

deixada pelo jogador anterior. No caso de fazer essa última opção, só poderá retirar

a última carta jogada e não as que estiverem abaixo dela; o jogo prossegue até que

um dos jogadores faça duas trincas com três cartas de figuras, cujos nomes rimam.

PALAVRAS DAS CARTAS: cadeira-mamadeira-fogueira; caneta-borboleta-chupeta;

pente-dente-presente; panela-janela-fivela; fogão-mamão-mão; pato-rato-gato;

pincel-anel-pastel; bola-cola-mola; tesoura-vassoura-cenoura; sapato-gato-prato;

faca-jaca-vaca; pão-botijão-violão.

Figura 4: Baralho das rimas. Exemplo das cartas. Design editado no PowerPoint (Microsoft Office), imagens retiradas da internet e impressas em papel cartão.

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f) Adedonha das Sílabas

FINALIDADE DO JOGO: ganha quem escrever mais palavras (corretas) que

comecem com as sílabas sorteadas.

PARTICIPANTES: individual ou dupla.

COMPOSIÇÃO: 25 fichas de sílabas.

REGRAS: cada jogador ou dupla deverá escolher uma folha para escrever as

palavras; o educador sorteará uma sílaba e os educandos deverão escrever

palavras que comecem com a mesma sílaba inicial; depois de todas as sílabas

serem sorteadas o educador deverá conferir com os educandos se a escrita está

correta; ganha o jogo quem escrever a maior quantidade de palavras corretas.

LISTA DE SÍLABAS: A; BA; BE; BO; CA; CO; DA; DE; VE; ES; FA ; FO; GA; JA; LA;

LO; MA; ME; NA; NE; RA; AS; TI; TE; VA.

Figura 4: Adedonha das sílabas. Exemplo das cartas. Design editado no Word (Microsoft Office).

3.2.3 Aplicação dos jogos

Realizamos seis sessões de jogos, duas por semana, de aproximadamente

60 minutos cada uma. Em cada semana eram vivenciados dois jogos diferentes,

respectivamente nessa ordem: Bingo das sílabas iniciais e Escrevendo as palavras;

Quais são as letras? e Stop!; Baralho das rimas e Adedonha das Sílabas.

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Antes de iniciar o jogo, explicávamos para os educandos as regras de

funcionamento do jogo e tirávamos as possíveis dúvidas. Ressaltamos que caso

fosse necessário o pesquisador e/ou educador faziam a releitura das regras.

Como os jogos eram aplicados duas vezes, em única semana, o pesquisador

e educador combinaram que, na primeira sessão, o pesquisador assumiria a postura

de protagonista, explicando as regras e conduzindo à situação didática, e o

educador ficaria no papel de coadjuvante, cooperando com a atividade. Na segunda

sessão da semana os papeis se invertiam.

Essa dinâmica permitiu que o educador, embora esse não fosse o nosso

objetivo, se envolvesse nas situações didáticas e, possivelmente, refletisse sobre

sua prática pedagógica.

Outro aspecto que temos que frisar sobre a aplicação é que inicialmente

tínhamos planejados para que os jogos fossem vivenciados por grupos distintos

(agrupados por níveis de escrita), mas como uma sugestão dos próprios educandos,

todos jogaram os mesmos jogos. No próximo capítulo abordaremos essa questão.

As frequências dos educandos nas sessões foram consideravelmente boas,

de modo que 61% da turma participaram de mais de quatro sessões, ou seja, quase

70% dos momentos de vivência.

3.2.4 Entrevistas com os educandos

Usamos as frequências nas sessões como critério para selecionar os

educandos que participariam das entrevistas. Assim, escolhemos os dez educandos

que participaram de mais sessões e vivenciaram experiências com todos os jogos.

Enfatizamos que optamos por não selecionar para entrevista dois educandos

com necessidades educacionais especiais (autismo e deficiência mental), que

participaram de todas as sessões. A justificativa pela não participação desses

sujeitos foi que consideramos a hipótese de que a situação da entrevista poderia

coloca-los em ocasiões de stress ou desconforto.

Realizamos as entrevistas com o intuito de identificar quais as possíveis

contribuições que os educandos apontavam sobre o uso dos jogos e os principais

aspectos com relação à mediação do educador, para assim tercemos considerações

sobre as concepções dos educandos sobre o uso dos jogos.

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Criamos uma tabela, com o objetivo de ajudar o leitor a perceber e diferenciar

os depoimentos, na qual, é possível perceber o nível de escrita e a frequência de

participação nas sessões.

Tabela 1 – Nível de escrita e frequência nas sessões

Entrevistados Nível de Escrita 1ª 2ª 3ª 4ª 5ª 6ª

Educando 1 Alfabético X X X X X

Educando 2 Alfabético X X X X X X

Educando 3 Silábico-Qualidade X X X X

Educando 4 Silábico-Qualidade X X X X X X

Educando 5 Alfabético X X X X X

Educando 6 Pré-Silábico X X X X X X

Educando 7 Alfabético X X X X

Educando 8 Silábico-Qualidade X X X X X X

Educando 9 Alfabético X X X X X

Educando 10 Alfabético X X X X

Essas entrevistas foram realizadas individualmente, gravadas em

equipamento de áudio-gravação e depois transcritas.

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4 ANÁLISE DOS DADOS

Organizamos os depoimentos dos entrevistados em cinco partes. Antes,

porém faremos alguns breves comentários sobre as sessões de jogos para

situarmos o leitor da vivência e entendimento dos conteúdos expressos nos

depoimentos dos entrevistados.

Como mencionamos anteriormente, os jogos foram elaborados para atender

as necessidades de aprendizagem apontadas pelos educandos. Os jogos de

alfabetização aplicados foram de análise fonológica, para reflexão sobre os

princípios do sistema alfabético e para consolidação das correspondências

grafofônicas (LEAL; ALBUQUERQUE; LEITE, 2005).

A dinâmica organizacional das sessões permitiu que os jogos pudessem ser

vivenciados duas vezes e que o pesquisador e educador alternassem a função de

condução das atividades. Os jogos só iniciavam depois da aceitação das regras

pelos envolvidos.

Na primeira semana vivenciamos os jogos “Bingo das sílabas iniciais” e

“Escrevendo as palavras”. O primeiro foi jogado individualmente, os educandos não

tiveram dificuldades para entender as regras e foram jogadas duas rodadas. O

segundo foi jogado em grupos de quatro educandos, os grupos eram agrupados por

proximidade do nível escrita, as regras precisaram ser enfatizadas para alguns

grupos, fizemos o desdobramento pedagógico nos grupos com níveis iniciais de

escrita, por exemplo, em alguns grupos os educandos deveriam escrever quatro ou

três palavras, e, foram jogadas duas rodadas.

Nas sessões da segunda semana foram vivenciados os jogos “Quais são as

letras?” e “Stop!”. Dividimos a turma em dois grupos para jogar o primeiro jogo, os

grupos eram formados por educandos com níveis heterogêneos de escrita, os

jogadores responderam em média duas perguntas, as regras foram aceitas e

jogaram-se duas rodadas. No segundo dividimos a turma em duplas, essas tinham

proximidades no nível de escrita, foram vivenciadas quatro rodadas (a pedidos dos

educandos) e as regras facilmente aceitas.

Nas últimas sessões vivenciamos os jogos “Baralho das rimas” e “Adedonha

das Sílabas”. No primeiro organizamos grupos de quatro e cinco, os educandos

estavam com níveis de escrita parecidos, as regras foram aceitas, os grupos com

níveis de escrita mais avançados jogaram mais de seis rodadas e os com níveis

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iniciais jogaram duas rodadas. O último jogo foi jogado individualmente, fizemos

alguns desdobramentos pedagógicos, por exemplo: os educandos em níveis mais

avançados tentavam escrever o máximo de palavras que sabiam, os outros

escreviam uma única palavra, ganhava os jogadores que escreviam o maior número

de palavras corretamente. Foram jogadas duas rodadas.

Como frisamos no capítulo anterior os educandos manifestaram o desejo de

participar de todos os jogos. Embora, esses jogos tivessem sido planejados para

grupos com necessidades de aprendizagem diferentes, consideramos que os

educandos, mesmo estando em níveis de escrita diferentes, puderam aprofundar e

consolidar seus conhecimentos sobre os princípios do sistema alfabético de escrita

(LEAL, 2004; MORAIS, 2012; LEAL; MORAIS, 2013).

Nesse sentido, consideramos que as variações pedagógicas ocorridas

durante as sessões permitiu que os educandos vivenciassem experiências

sistemáticas e significativas de aprendizagem.

Outra inferência que podemos fazer desse posicionamento dos educandos é

que as situações pedagógicas que envolvem os jogos na EJA devem, sobretudo,

serem veículos de integração e inclusão. Permitir que os educandos participassem

de todas as situações didáticas significa potencializar a formação desses sujeitos

numa perspectiva transformadora (RODRIGUEZ, 2009).

Como observamos em alguns estudos (HADDAD E DI PIERO, 2000;

PEREIRA, 2007; AMORIM, 2009; RODRIGUEZ, 2009; AZEVEDO, 2012; SENA E

SOUZA, 2013), as pessoas jovens e adultas que retomam ou iniciam a

escolarização por razões de ordem social, cultural, político e/ou econômico foram

privadas e excluídas do acesso à escola. Assim, a escola deve possibilitar a

inclusão, aprendizagem e desenvolvimento social.

Nesse sentido, os apontamentos iniciais dos educandos nos ensinam que as

práticas pedagógicas na EJA devem mobilizar situações de inclusão. O jogar é uma

prática cultural dotada de historicidade e assume múltiplas significações (LEAL;

ALBUQUERQUE; LEITE, 2005; KISHIMOTO, 2009). Na educação de pessoas

jovens e adultas o jogo pode contribuir para a superação de estigmas

preconceituosos. Assim, enfatizamos, inicialmente, que os educandos apontam que

os jogos são veículos de integração.

Nos tópicos seguintes explicitamos as análises realizadas a partir das

entrevistas.

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4.1 VIVENCIAR EXPERIÊNCIAS COM JOGOS?

Ao serem indagados sobre como foi vivenciar experiências com jogos na sala

de aula e a adequação da atividade para turmas da Educação de Jovens e Adultos,

todos os dez educandos entrevistados ressaltaram como positivo a utilização de

jogos, afirmaram ter gostado da experiência e que esta foi muito prazerosa.

Realizamos uma análise mais minuciosa das respostas dadas a esse

questionamento para encontrar aspectos, ressaltados pelos educandos, que

justificassem a relevância dos jogos na sala de aula. Assim, encontramos, na visão

deles, quatro aspectos levantados sobre os jogos. Em algumas situações aconteceu

do mesmo educando citar mais de um argumento a favor. A saber:

1) O jogo pode motivar a aprendizagem dos educandos;

2) O jogo pode facilitar a aprendizagem dos educandos;

3) O jogo é uma forma diferente de ensinar;

4) O jogo pode favorecer a troca de conhecimentos entre os educandos.

Quatro sujeitos (educandos 1, 4, 7 e 8) sinalizaram em seus depoimentos que

o uso do jogo pode ser um motivador para a aprendizagem dos educandos.

Foi bastante boa! Pelo mesmo a pessoa aprendi mais. Eu gostei mesmo da experiência com os jogos. A pessoa fica com a mente querendo aprender mais, estimula mais a mente e você vai desenrolando mais. (EDUCANDO 1) É boa pra a pessoa, eu achei! Porque é um motivo pra você aprender. Por exemplo, gostei do jogo que pareci baralho. (EDUCANDO 4) [...] É uma coisa atrativa, que ali você está fazendo de tudo. Porque você durante o dia tem muito serviço de casa e quando chega à escola tem os jogos, uma coisa divertida que vai distraído. (EDUCANDO 7) Rapaz, eu achei importante, muito bom! A gente trabalhou com ele observando aquelas palavra, eu achei interessante. Você trouxe aquela coisa muito importante pra nós. Eu achei bom! E abriu mais a mente da gente, a gente ficou mais curioso pra saber mais, aprender mais aquelas palavra. Aqueles jogo foi bom, assim, todo mundo pensava que era “jogo”, mas eu fiquei, assim consciente que era jogos pra a gente puxar pela aquela palavras, pra ir se declarando e puxando mais. Eu achei interessante e achei bom! Despertou minha curiosidade. Eu fiquei pensando “aquele menino trouxe aquele joguinho pra nós” e abriu mesmo a mente da pessoa. Foi dez! (EDUCANDO 8)

Os educandos 1 e 4 explicitam em seus depoimentos que a experiência foi

boa e que motivaram suas vontades de aprender. O educando 1, expressou, ainda,

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que com os jogos percebeu que estava “desenrolando mais”, isto é, atentou para o

fato que poderia está construindo/reconstruindo conhecimento.

Como citamos no referencial teórico, os jogos são elementos motivadores do

processo de aprendizagem e atividades lúdicas que auxilia a construção de

conhecimento. Os argumentos dos educandos indicam que os jogos são percebidos

nessa perspectiva.

Dessa forma, as vivências das atividades parecem expressar momentos em

que houve a potencialização das aprendizagens, por meio de uma didática que

proporcionou a construção e reconstrução de conhecimentos, foi prazerosa e

ensinou algo (KISHIMOTO, 2009).

O educando 7 faz parte de um perfil comumente encontrado em turmas de

EJA, pessoas que exercem no horário diurno algum tipo de trabalho ou serviço. Ele

relata que os jogos são atrativos, pois divertem, distraem e motivam a participação

nas atividades escolares.

Essa preposição indica que a reflexão sobre a definição do lugar social do

educando é algo que não pode ser desprezado (OLIVEIRA, 1999). Assim,

ponderamos que para desenvolvimento de atividades motivadoras, a partir de jogos,

é imprescindível considerar que os sujeitos da EJA estão inseridos no mundo do

trabalho, das relações interpessoais, traz consigo uma história e saberes.

Observamos no depoimento do educando 8 outro aspecto motivador, na sua

visão, os jogos apresentaram uma possibilidade de aprendizagem, porque

despertam a curiosidade pelo conhecimento. Analisando detalhadamente os trechos

da fala do educando é possível perceber que havia uma consciência de que a

atividade era para motivar a aprendizagem.

Em seu estudo, Azevedo (2012) ponderou que os educandos se sentiram

mais motivados porque, mesmo tento consciência de que ainda não dominava

convencionalmente a escrita, puderam comparar seus desempenhos a cada rodada

e/ou sessão.

Esse argumento reforça o que Kishimoto (2009, p.37) vem afirmando de que:

“a utilização do jogo potencializa a exploração e construção do conhecimento, por

contar com a motivação interna”.

Sete sujeitos entrevistados (educandos 1, 2, 3, 4, 6, 8 e 10) ressaltaram que

os jogos facilitaram a aprendizagem, revelando que muitas vezes eles apresentavam

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dificuldades em aprender, mas por meio dos jogos a atividade se torna mais

acessível.

[...] diante de nós ali bom mesmo o jogo. O que mais você gostou? Principalmente das palavra, porque você ia forcando aprender a escrever (EDUCANDO 1). [...] até desenvolvendo mais a mente, porque a mente do velho é mais parada [risos] e pra desenvolver mais a mente é bom (EDUCANDO 2). Eu achei fácil. Porque, assim achei fácil lê os nome, assim acertar com os nome com as figuras [falando sobre o jogo ‘3’ stop!]. Eu gostei daquele! Por quê? As vez assim, pra eu que não sei lê, vou lê um nome e não acerto, mas com a figurinha foi mais fácil eu acertar os nome . (EDUCANDO 3) Pode eu acho. Porque a pessoa tá aprendendo mais as coisas, como se aprendesse mais com a brincadeira. (EDUCANDO 4) O jogo foi bom, foi realmente bom! Jogos ótimo! Eu passei um tempo bom estudando no Simôa [outra escola], foi quatro ano, nunca tinha visto isso, foi bom porque tem uma atenção melhor e aprende mais. (EDUCANDO 6) A gente vai se interessando naquilo ali, juntar aquelas palavra, aí o cara vai pegando na mente e vai devolvendo no caderno (EDUCANDO 8). Aprendi coisa nova, né? Muitas letra que eu não conhecia, aprendi a conhecer e desenvolveu mais minha leitura. Eu acho! Porque eu tinha muita dificuldade, né? Eu trocava as letra aí depois dos jogos eu comecei a perceber que ao invés de eu botar o “a” eu botava o “e” e onde precisava do “e” eu botava o “i”. Fui percebendo nos jogos as letras, eu achei que eu melhorei um pouco. Foi a primeira vez que eu joguei assim. (EDUCANDO 10)

O educando 1 menciona que a atividade com jogos direcionou sua

aprendizagem para a habilidade de escrever. Como citamos no referencial teórico

umas das expectativas dos educandos da EJA ao começarem ou retomarem os

estudos é que aprendam a escrever. O educando percebeu que os jogos eram para

apropriação do sistema de escrita e que facilitavam esse processo.

Como sabemos os educandos têm expectativas com relação a habilidades de

escrita, porque deseja fazer seu uso autônomo e participar de eventos sociais em

que ela está presente (AMORIM, 2009).

Nesse sentindo, podemos identificar nas ideias apresentada pelo educando

que os jogos estavam facilitando sua aprendizagem do eixo da língua portuguesa

que tanto deseja aprender.

O educando 2 chama a atenção para que os sujeitos da EJA têm

singularidades no seu modo de aprender e que os jogos contribuíram para o seu

desenvolvimento.

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Desse modo, considerar as condições específicas dos educandos, apontadas

por Oliveira (1999), implica pensar que devemos conceber nas propostas

pedagógicas e métodos de ensino que as pessoas jovens e adultas têm

especificidades nos seus modos de pensar, pertencem a grupos culturais

particulares e, sobretudo, não são crianças.

Percebemos nos depoimentos dos educandos 4 e 8 que a aprendizagem se

tornou mais compreensível, porque foi mais interessante aprender através de uma

situação prazerosa. Esse depoimento reforça com vemos debatendo de que essas

atividades promoveram aprendizagens, porque respeitaram as especificidades dos

educandos.

De acordo com Azevedo (2012) atender as especificidades dos educandos

implica mostrar que é possível promover atividades lúdicas para esse público, que

também facilitem e promovam o desenvolvimento de suas aprendizagens.

Esses momentos lúdicos, criado por meio dos jogos, foram considerados

como significativo para o educando 6. Ele expressou que, embora já tivesse estudo

e vivenciado outras experiências educativas, essa havia sido facilitadora, porque o

ajudou a aprender mais.

Os educandos 3 e 10 também demonstram que as atividades contribuíram

como facilitadoras, ressaltando que os jogos colaboraram para o entendimento de

algumas dificuldades e ajudaram a desenvolver habilidades de leitura e escrita.

Podemos considerar que os jogos, nas visões dos educandos, foram

motivadores e facilitadores, porque foram construídos com base nas experiências

culturais e criaram possibilidades de aprendizagem. Nesse sentido, como

mencionamos no referencial teórico, os jogos foram atividades sistemáticas que

exigiram diferentes demandas cognitivas, mobilizaram diferentes situações e

possibilitaram construção de saber (LEAL; ALBUQUERQUE; LEITE, 2005).

Quatro sujeitos (educandos 2, 5, 7 e 9) comentaram que os jogos se

mostraram como uma forma diferente de ensinar. Alguns chegaram a falar que

nunca tinham vivenciado jogos na sala de aula.

Pode sim! Porque é um divertimento, até a mente “desparece” mais [palavra usado no sentido relaxamento]. E não é uma coisa proibida, a atividade que você não tinha na sala de aula já apareceu [...] (EDUCANDO 2).

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Foi bacana, gostei! É faltava isso também, conhecer algumas coisa boa também, alguma coisa diferente, umas coisa nova. Eu não só gostei do trabalho, como da experiência, dos jogos, das explicações, eu sinto saudade dos jogos. (EDUCANDO 5) Foi muito bom! Porque a gente aprendeu as letra com as figuras, assim diferente. E os grupo, porque a gente ficou muito junta com os grupo é uma coisa divertida, uma coisa nova. Eu nunca imaginei na minha vida fazer isso, mas foi muito bom. Como você imaginou? Que só era sentada e quadro, eu só imaginei isso, aí depois você chegou com essas brincadeira foi muito bom, muito bom mesmo! (EDUCANDO 7). Há início ali eu achei interessante, porque através do jogo a gente descobri frase, nome e através do jogo pra mim é muito importante, porque é um conhecimento que a gente vai aprendendo cada dia. É um conhecimento diferente, que através daquele conhecimento a gente vai decifrando alguma coisa (EDUCANDO 9).

Na visão do educando 2, os jogos podem causar sensações de prazer e

divertimento, assim não existem restrições para o seu uso na sala de aula. O

educando 5 comenta que os jogos são “coisas novas” e que sentiu saudades das

atividades. Nesse sentido, observamos que os jogos representaram uma forma

diferente de ensinar, que ainda não haviam sido vivenciadas pelos educandos e que

os contextos lúdicos criados pelos jogos ajudam no ensino.

O educando 9 considerou os jogos interessantes por apresentarem uma

forma diferente de aprender. Para o educando 7, os jogos também são formas

diferentes de aprender e ensinar, porque oportuniza o contato com os outros. O que

chama a atenção nesse depoimento é que para o entrevistado os jogos

possibilitaram a amplitude da visão sobre a escola. Ele percebe que brincar também

é uma forma de aprender.

De acordo com Amorim (2009, p. 49), os anseios e “desejos de aprender

nesse espaço institucional não estão dissociados das práticas nas quais esses

indivíduos estão inseridos ou de seus interesses particulares”. Como citamos no

capítulo anterior, alguns dos sujeitos envolvidos na pesquisa nunca haviam

frequentado a escola. E que as principais expectativas dos educandos da EJA são

que a escola lhe possibilite maiores chances de inserção no mercado de trabalho,

participar de práticas sociais de leitura e escrita, adquirir autonomia em algumas

práticas sociais.

Por fim, dois educandos destacaram em seus depoimentos que o uso dos

jogos favorece as trocas de conhecimentos entre os educandos. Através do trabalho

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em equipe, um educando que domina mais um conceito ajuda o outro a participar do

jogo e acertar na sua vez.

Foi boa! Pelo mesmo deu uma coisa que eu não sabia. Aí pelo menos peguei um “macete”. Gostei, foi bom! O que mais o senhor gostou? Assim, até o sistema que era em quatro o grupo, e um dava opinião pra o outro, e o outro vai e assim nós aprende a fazer aquela “coleção” [pode está se referindo as combinações de alguns jogos] do jogo marcando ponto. Foi bom! Porque um foi aprendendo um com o outro que não “sabe” (EDUCANDO 2). Sim! Brincar com os colegas e em grupo. Foi ótimo, foi maravilhoso eu gostei! Assim a pessoa quando não sabe, sempre tem um que ensine aquele que ainda não tá preparado, entendeu? Aí você ensina uma pessoa que não sabe, quer dizer que você tá aprendendo mais ainda em vez de você ensinar tá aprendendo (EDUCANDO 5).

O educando 2 destaca que gostou dos jogos, principalmente, da forma de

jogar, pois proporcionou a interação entre os educandos. Para ele, essa

interatividade representou uma forma de aprendizagem. Também podemos observar

esse aspecto interativo dos jogos no depoimento do educando 5, no qual, ele

ressalta que as situações vivenciadas nas atividades permitiram que os educandos

trocassem informações, criassem respostas para seus possíveis erros e

aprendessem uns com os outros.

As concepções dos educandos apontam, inicialmente, para que as atividades

com jogos podem ser motivadoras, facilitadoras, apresentar uma forma diferente de

ensinar e aprender, possibilitar a troca de conhecimentos e, principalmente ser uma

vivência adequada e prazerosa a turma de pessoas jovens e adultas.

4.2 JOVENS E ADULTOS BRINCANDO COM JOGOS?

Todos os sujeitos consideraram que uma turma de pessoas jovens e adultas

pode brincar com jogos na sala de aula. Novamente, em seus depoimentos,

observamos emergir as quatro justificativas dadas na questão anterior sobre a

importância do uso dos jogos.

Os educandos afirmaram que os jogos são bem vindos em turmas de EJA e

que por meio deles sentiram uma motivação “extra” para o seu desenvolvimento.

Como podemos observar no depoimento do educando 8:

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Eu penso que pode! Porque é um jogo que, assim a gente vai se desenvolvendo mais, assim vai puxando pela aquele jogo e aquele jogo vai puxando uma coisa e outra e aquilo vai entrando na mente da pessoa (EDUCANDO 8).

Alguns educandos novamente consideraram que as situações didáticas

criadas pelos jogos facilitam à aprendizagem e dão pareceres favoráveis à utilização

dos jogos. Como no caso, do educando 6 que comentou que o fator que facilitou a

sua aprendizagem foi a diversão presente nas atividades pedagógicas com jogos. E

do educando 10 que mencionou que os jogou favoreceram a descoberta de novos

conhecimentos. A saber:

Pode, certamente! Porque é uma diversão já da aula mesmo, uma diversão que aprende mais (EDUCANDO 6). Pode! Porque se descobri cada vez mais, eu acho. Como se fosse uma brincadeira e fosse como dando mais, favorecendo a pessoa forçar a mente descobrir mais coisa (EDUCANDO 10).

Observamos os depoimentos dos educandos que independente do nível de

escrita os jogos foram responsáveis pela motivação e facilitação da aprendizagem,

porque apresentaram uma forma diferente de vivenciar a escolarização. Azevedo

(2012), em seu trabalhou, também percebeu o mesmo fenômeno e destacou que os

jogos proporcionam momentos de equilibração das possíveis desigualdades.

Contudo, percebemos que, através dessas atividades, os alunos, independente de seus níveis de escrita ou dos “rótulos” lhes atribuídos pelas professoras, por serem expostos a uma mesma situação de aprendizagem, na qual tinham que ajudar os colegas apontados pelas professoras como “mais avançados”, sentiram-se mais confiantes e mais dispostos a tentar produzir suas notações, sem se importar com os possíveis erros cometidos ou com as diferenças entre suas notações e a de seus colegas (p. 165).

Nesse sentido, notamos que os jogos colocam os educandos na mesma

situação de aprendizagem. O educando 7 sinalizou para a perspectiva de que os

jogos são formas diferentes de ensinar em turmas de EJA, ressaltando os jogos não

só motivam e facilitam, mas também estimulam a vivência de situação prazerosas.

Como observamos a seguir:

Sim! Porque as vez você vem do dia-a-dia muito cansada e com isso [jogos] a mente da gente vai. E quando a gente chega na escola não é aquela coisa só escrever ou então ficar parada. Mas é uma coisa que relaxa e

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distrai a gente, e ao mesmo tempo, que a gente tá distraindo e tá aprendendo (EDUCANDO 7).

Vemos que para o educando 7 a dinâmica criada pelo jogo se apresentou

como uma alternativa prazerosa e propiciadora de aprendizagem, na qual através

dela, perspectivas sobre o aprender foram ampliadas. Essa nova perspectiva sobre

as formas de aprender também foram mencionadas no depoimento do educando 5

quando destacou as possíveis trocas de conhecimentos proporcionadas pelos jogos.

Outro aspecto relevante, presente nos depoimentos dos educandos, é de

considerar que a utilização de jogos no processo de alfabetização não se tornou

uma atividade infantilizada, como ficou mais evidente no depoimento a seguir.

Esses jogos que nós jogamos o senhor acha que foram infantis? Não! Aquele pra mim foi pra adulto, até demais. As palavra, os termo das palavra dá pra gente. (EDUCANDO 9)

Os argumentos do educando explicitam que os jogos eram adequados às

especificidades da EJA. Isso reflete nossa preocupação em apresentar jogos que

fossem compostos de imagens, designer e palavras dos seus contextos.

Consideramos que essa preocupação possibilitou aos educandos perceberem que

os jogos foram criados exclusivamente para pessoas jovens e adultas.

Azevedo (2012, p.57) considera que:

[...] os jogos podem ser considerados importantes instrumentos de aprendizagem, visto que podem se tornar, muitas vezes, um elemento motivador e facilitador do processo de alfabetização desses alunos, porém, sendo trabalhados na perspectiva de não infantilizar esses alunos, mas tornar o aprendizado mais concreto e significativo.

Essa colocação ressalta o que estamos defendo nesse trabalho de que os

jogos propostos para EJA devem, principalmente, considerar os três campos que

contribuem para a definição do lugar social do educando: a condição de não

crianças, a condição de excluídos da escola e a condição de membros de

determinados grupos culturais (OLIVEIRA, 1999).

Como ressalta os depoimentos dos educandos os jogos serão interessantes

se forem adequados às necessidades educativas e as especificidades.

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4.3 DIVERTIR E AO MESMO TEMPO ENSINAR

Ao serem questionados sobre a possível função dos jogos na sala de aula,

todos os educandos conseguiram perceber que o objetivo era, sobretudo, didático,

mas destacaram que havia também o propósito de divertimento.

Como veremos em seus depoimentos, os educandos parecem perceber que

os jogos foram concebidos e propostos como recurso pedagógicos que

potencializam a exploração e construção de conhecimentos. Em outras palavras,

eles atentaram para os fatos que os jogos proporcionam diversão e que ensinam

algum conhecimento. Ou seja, as funções lúdica e educativa (KISHIMOTO, 2009).

Alguns educandos comentaram que perceberam que as atividades eram de

ensino e aprendizagem, pois jogando compreendeu alguns princípios da formação

de palavras e leitura. Ressaltaram que as atividades divertiam por proporcionarem

momentos de interação com o grupo. Como observamos no depoimento a seguir:

Ele é um divertimento e uma atividade também ele faz as duas parte, ele tanto faz uma atividade daquilo que você tem mais como avançar, como ele é um divertimento em grupo. [...] Eu acho que aprendi varias coisa, assim, as palavra pra você formar as palavra, aí quer dizer que é um letra que você não sabia formar a palavra, por causa de uma letra que você não sabia que existia, aí através do jogo [possivelmente se referindo ao jogo ‘3’ qual são as letras?] você descobri aquela letra que dá para você formar várias palavras (EDUCANDO 2).

Como sabemos, os educandos da EJA têm a expectativa que ao começarem

ou regressarem os estudos escolares consigam aprender. Parece-nos que,

possivelmente, quando as funções didáticas estão mais explícitas, os educandos

ficam mais motivados a participarem, porque têm seus anseios respondidos.

O depoimento do educando 7 expressa esse sentido de resposta a

necessidade de aprender:

Sim! Pela uma parte a gente estava aprendendo e pela uma parte a gente estava aprendendo, distraído a mente. [...] É por que assim tudo era para ensinar a gente ler e escrever. A gente tava jogando, mas tudo era para a gente aprender a ler e escrever. Porque no mesmo tempo que a gente estava ali se distraído e brincando e ali você tava tentando fazer as palavras e vendo as letras (EDUCANDO 7).

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Como observamos o educando reafirma e seu depoimento estava se

divertindo, mas que, sobretudo, estava aprendendo algo sobre as habilidades de ler

e escrever.

Consideramos que a explicitação da função didática faz com que os

educandos compreendam que os jogos apresentam uma alternativa favorecedora de

aprendizagem. Assim, os jogos são uma das alternativas metodológicas para

ampliação das práticas de leitura e escrita e oferecem oportunidades aos educandos

para alcançar alguns dos seus objetivos de dominar com autonomia as práticas

sociais de leitura e escrita (AMORIM, 2009).

Essa consciência das funções lúdicas e didáticas dos jogos, possivelmente,

contribuiu para o engajamento na atividade. O educando 8 sinaliza que estava com

dúvidas sobre a função dos jogos, mas que posteriormente ficou consciente de que

estava participando de atividades que divertiam e ensinavam.

Eu achei que era pra divertimento, assim, bom, eu mesmo fiquei ansioso dizendo “esse jogo é pra um divertimento? Ou como que é?”, aí, depois que eu vir e disse “isso daí não pra um divertimento e no mesmo instante é também” porque a gente se divertiu um com o outro, debateu um com o outro e fica se divertindo, mas é pra a gente puxar pra a leitura (EDUCANDO 8).

Até aqueles que primeiro disseram que era para aprender, no final terminaram

dizendo que era para as duas funções e vice-versa.

Não! Era pra aprender mais sobre a leitura, uma diversão que ao mesmo tempo ensino, sabe? (EDUCANDO 9).

Consideramos que ao perceber as funções dos jogos os educandos

atentaram para o entendimento de que as atividades poderiam tornar o aprendizado

da língua mais útil e significativo. Assim, observaram seus processos de

alfabetização não estavam restritos ao aprender a codificar e decodificar palavras,

mas, sim, oportunizava-os a construir a compreensão acerca do funcionamento do

sistema de escrita alfabético (MORAIS; ALBUQUERQUE, 2004; GALVÃO; LEAL,

2005; SANTOS; ALBUQUERQUE, 2007).

4.4 APRENDEMOS ALGO?

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Em vários depoimentos os educandos conseguiram expressar as possíveis

aprendizagens conquistadas ao longo das atividades envolvendo os jogos, tais como

reconhecer as algumas letras (educandos 3 e 10), enriquecer o vocabulário

(educando 4), formação de palavras (educandos 1 e 8), ler palavras (educandos 9 e

1o).

Sim! Eu aprendi a reconhecer as letra naquele das figurinha. Através das fotos “encaixar” no lugar certo, esse foi bom (EDUCANDO 3). Ainda continua nas letra, né? Porque eu fazia os nome, mas não sabia o significado daqueles nomes, quais era as letras que tava faltando, qual era o acento, eu não sabia e ali abriu mais minha mente e eu fui descobrindo o significado das palavra (EDUCANDO 10).

O educando 3 apresenta um exemplo, no qual percebeu que estava,

possivelmente, aprendendo a relacionar imagem-palavras. Com se através dos

jogos tivesse conseguido reconhecer algumas letras, sílabas e palavras. Como o

educando 10 que citou que embora já tivesse escrito outras palavras não tinha

consciência do que estava representando, no entanto, com a ação percebeu alguns

princípios do sistema de escrita que desconsiderava antes.

Observamos que os educandos consideraram que os jogos apresentaram

palavras que contribuíram para a ampliação de seu vocabulário. Como no caso do

educando 4 que, embora conhecesse os objetos, descobriu por meio dos jogos

como escrever seus nomes. A saber:

Nos que a pessoa tava jogando e aprendendo os nome das coisa, assim ventilador, mesa, cadeira eu não sabia antes e agora eu consigo saber, eu nunca tinha escrito esses nomes das coisa (EDUCANDO 4).

Os educandos consideraram que os jogos também contribuíram para a

percepção sobre a formação das palavras, como nos casos a seguir:

[...] fazer as palavra que as vez você ia escrever uma palavra, faltava cinco ou seis letra e você “passava”, mas com o jogo você tentava forçar. Como nas palavra ventilador e telefone, você viu a foto do objeto e a palavra escrita, isso ajudou! (EDUCANDO 1).

Rapaz! Eu aprendi assim a juntar aquelas palavra, aí eu digo “mais repara o jogo não é uma brincadeira, é pra a gente ir decorando na cabeça aquelas palavra importante”. Eu achei que com o jogo muito importante porque a gente aprendeu aquelas palavra e se desenvolveu. Rapaz, com o jogo eu não aprendi tudo não, mas alguma coisa a gente aprendeu (EDUCANDO 8).

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Os educandos comentaram que os jogos apresentaram possibilidade de

escrever novas palavras e que como alguns jogos tinham a figura e a escrita da

palavra, era possível ter consciência da omissão de algumas letras.

Observamos em alguns depoimentos que os jogos estavam contribuindo para

a apropriação das habilidades de leitura com autonomia. As atividades possibilitaram

que as expectativas sobre a compreensão autônoma de algumas palavras fosse

possível. Como vemos os depoimentos seguintes:

Com certeza eu conseguir aprende aqueles nomes das coisa, daqueles animal eu não sabia de nada, eu ainda me lembro. Eu me lembro tinha “lobo”, me lembro do “telefone”, eu não sabia antes, com o jogo eu descobrir. [risos] Teve uma palavra que eu não conseguir decifrar, mas depois eu conseguir foi a “mão” [risos]. É conseguir! (EDUCANDO 9)

Porque era para desenvolver a leitura da gente, quais era as letra que a gente tava se enrolando. Por exemplo, naquele negócio de palavras se eu fosse trocar as figuras eu não tava prestando atenção, agora como eu tava olhando ou o final ou o começo das palavra, das letras, dos nome aí eu tava botando tudo certo. Eu acho que é ao mesmo tempo uma brincadeira e um ensino. Por exemplo, no do baralho [jogo ‘5’ baralho das rimas] eu me embaralhei muito, mas naquele que era pra identificar “os nome” e botar cada “imagenzinha” no seu quadradinho [jogo ‘4’ stop!] eu gostei. (EDUCANDO 10)

Notamos que os depoimentos expressam uma sensação de contentamento

por conseguirem aprender algo através jogos. Consideramos que os depoimentos

expressam que, nas visões dos educandos, os jogos contribuíram para a

aprendizagem dos princípios básicos do sistema de escrita alfabética, porque

ajudaram os educandos a concentrar seus esforços para desvendar e compreender

a lógica desse sistema (LEAL, 2004; MORAIS, 2012; LEAL; MORAIS, 2013).

4.5 OS MEDIADORES DAS APRENDIZAGENS

Todos os educandos reconheceram que o pesquisador e o educador estavam

ali para mediar o processo, ajudar na construção dos conhecimentos e os discentes

valorizavam muito essa postura. Isso fica claro nos depoimentos dados:

Como um juiz no jogo pra você saber onde tá errando, aonde não tá, o juiz tá ali pra ensinar a mesma coisa do professor que tá sempre pronto pra ensinar (EDUCANDO 2).

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Pelo o que eu me lembro vocês sempre prestava atenção nos jogo. Quando surgia uma dúvida, eu chamava a professora, e ela sempre tirava a dúvida (EDUCANDO 6). Ficava com a gente ajudando, explicava como era os joguinhos e tirava as dúvida (EDUCANDO 7).

Notamos, nos depoimentos, que os educandos entendem que o papel do

educador e pesquisador é de mediadores do processo, colaborando para o

andamento e conduzindo as situações para atingir os objetivos didáticos propostos.

Alguns educandos referiram momentos em que podemos perceber a postura

de mediação das atividades, na qual o pesquisador e educador colaboraram de

maneira imprescindível para o andamento dos jogos, com incentivos, tirando

possíveis dúvidas, explicandos a ocorrência de algumas situações. A saber:

Rapaz, vocês explicava a gente, dava aquelas explicação pra nós [as regras]. Quando surgia alguma dúvida nós perguntava “como é isso aqui?”, aí vocês vinha e explicava. Agora se vocês não tivesse ficava difícil pra nós jogar. Como era que nós jogaria sem ter uma ajuda do professor? [...] Eu achei que vocês tava ajudando, porque a gente ficava jogando, escrevendo palavras e quebrando a cabeça e vocês ficava dizendo “vá tentando que você vai conseguir”. Eu achei que vocês ajudava bastante. (EDUCANDO 8). Quando a gente não conseguia os nomes, precisava de um acento, sempre vocês ia ajudando a mente da pessoa há tirava a duvida da gente. Porque pra mim tava certo, mas quando eu tirava a dúvida viu que tava faltando alguma coisa. Se vocês não tivesse quando a gente tivesse dificuldade como ia saber se tava certo ou errado (EDUCANDO 10).

Conforme Brandão et al. (2009), nas atividades com jogos, o educador

continua sendo um mediador das relações e precisa movimentar as situações

didáticas em função dos seus educandos. Ou seja, a postura mediadora ajuda o

educador a avaliar se esses recursos são interessantes, se atente as necessidades

dos sujeitos e planejar ações sistemáticas para possibilitar a aprendizagem.

Ao perceberam que o pesquisador e educador estavam mediando o processo,

os educandos estavam avaliando as práticas pedagógicas (LIMA, 2011). Ou seja,

estavam avaliando sobre como os educadores podem motivar as aprendizagens, as

formas de interação entre o educador e educandos e os objetivos didáticos

propostos pelo docente.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Desenvolvemos este trabalho com o objetivo de analisar as concepções dos

educandos da EJA sobre o uso de jogos de alfabetização no processo de

aprendizagem. Assim, planejamos e vivenciamos jogos didáticos que favorecem a

apropriação do sistema de escrita alfabética para analisar as concepções dos

educandos da EJA sobre a utilização dos jogos.

As primeiras considerações dos educandos revelam que as atividades

pedagógicas que utilizam jogos devem construir espaços de inclusão. Esse dado foi

constatado no posicionamento dos educandos, que desejaram participar de todas as

situações didáticas. Nesse sentido, consideramos que as experiências pedagógicas

sistemáticas que envolvem jogos devem ser vivenciadas como veículo de integração

e equilibração das possíveis desigualdades. O educando ao jogar deve, sobretudo,

sentir-se incluído.

Ao analisar os depoimentos percebemos alguns aspectos que compõem as

concepções dos educandos sobre os jogos de alfabetização. Todos consideram

como adequada, positiva e prazerosa a utilização dos jogos, ressaltaram que os

mesmos foram motivadores, facilitadores, apresentando uma forma diferente de

ensinar e promoveram o intercambio de conhecimento.

Consideramos que os educandos elencaram essas preposições porque

perceberam que as situações didáticas foram construídas com base nas

experiências culturais e criaram possibilidades de aprendizagem. Assim, as

concepções apontam que os jogos utilizados foram atividades sistemáticas com

objetivos pedagógicos, exigiram habilidades cognitivas e mobilizaram diferentes

situações de aprendizagem, além de auxiliar na construção/reconstrução de

conhecimento sobre o sistema de escrita.

Os educandos consideraram os jogos utilizados como interessantes, pois

estavam adequados às necessidades educativas e as especificidades. Essa

colocação revela que, nas concepções dos educandos, os jogos respeitaram a

condição de não crianças, de excluídos da escola e de membros de determinados

grupos culturais. Outro dado revelado é que os educandos conseguiram perceber as

funções lúdicas e didáticas dos jogos. Parece-nos que quando os propósitos de

divertir e aprender estão claramente expostos, possivelmente, os educandos ficam

mais motivados a participarem, pois têm suas expectativas respondidas.

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Concebem que os jogos didáticos proporcionam diversão, mas ao mesmo

tempo pode ensinar algum conhecimento. Percebemos isso em vários depoimentos

que expressaram uma sensação de contentamento por conseguirem aprender algo

através jogos.

Sobre os principais aspectos apontados pelos educandos em relação ao

trabalho pedagógico do docente, consideramos que, nas visões deles, o educador é

responsável pela mediação do processo de aprendizagem. Assim, existe uma

valorização da postura mediadora durante a utilização dos jogos, concebendo como

imprescindível a mediação para o andamento das atividades.

Em síntese, esses dados apresentados nos direcionam a entender algumas

características das concepções dos educandos sobre o uso dos jogos. Inicialmente,

que as atividades pedagógicas que envolvem os jogos na EJA devem, sobretudo,

serem veículos de integração. As experiências adequadas e vivenciadas com jogos

são prazerosas, podem motivar e facilitar o aprendizado, apresentar uma forma

diferente de ensinar e aprender, e em alguns casos criar momentos de troca de

conhecimentos. Desse modo, consideram que não existem restrições para o uso na

sala de aula, percebem as possíveis funções lúdica e educativa dos jogos, pois

compreendem que estão se divertindo e aprendendo algo, e também, atribui o papel

de mediador ao educador.

Dessa forma, consideramos que ainda existe muito a conhecer e estudar

sobre a utilização dos jogos de alfabetização nas turmas de pessoas jovens e

adultas. Que efeitos as utilização de jogos poderia causar nas práticas dos

educadores de EJA? Será que a utilização por período longo contribuiria para o

processo de alfabetização? Como produzir mais jogos que contribuíssem para a

alfabetização? Será que o jogo pode amenizar a evasão na EJA? São perguntas

que podem contribuir para possíveis estudos que ajudem as formações de

profissionais e auxiliem secretárias de educação a planejarem formações

continuadas direcionadas aos educadores para que reflitam sobre o papel dos jogos

nas turmas da EJA.

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APÊNDICE A – DIAGNOSE DE ESCRITA

DIAGNOSE DE ESCRITA

NOME: ___________________________________________________________

1) VAMOS FAZER UM DITADO MUDO. OBSERVE AS FIGURAS ABAIXO E

ESCREVA OS SEUS NOMES:

_________________

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