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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE Decanato de Pesquisa e Pós-Graduação
ALESSANDRA MARA CORNAZZANI SALES
DO REGIME JURÍDICO PARTIDÁRIO
NA DEMOCRACIA BRASILEIRA
São Paulo
2016
ALESSANDRA MARA CORNAZZANI SALES
DO REGIME JURÍDICO PARTIDÁRIO
NA DEMOCRACIA BRASILEIRA
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Direito
Político e Econômico da Universidade
Presbiteriana Mackenzie, como requisito
parcial para a obtenção do título de
Mestre em Direito.
ORIENTADORA: Profa. Dra. Monica Herman Salem Caggiano
São Paulo
2016
ALESSANDRA MARA CORNAZZANI SALES
DO REGIME JURÍDICO PARTIDÁRIO NA DEMOCRACIA BRASILEIRA
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Direito
Político e Econômico da Universidade
Presbiteriana Mackenzie, como requisito
parcial para a obtenção do título de
Mestre em Direito.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Monica Herman
Salem Caggiano
Aprovada em
BANCA EXAMINADORA
_______________________________________________ Prof.ª Dr.ª Monica Herman Salem Caggiano
Universidade Presbiteriana Mackenzie
_______________________________________________ Prof. Dr Cláudio Salvador Lembo
Universidade Presbiteriana Mackenzie
_______________________________________________ Prof.ª Dr.ª Eunice Aparecida de Jesus Prudente
Universidade de São Paulo
Às minhas pérolas Gabriela, Cristian e
Patrick que com inesgotável paciência
souberam compreender minhas
ausências, irradiando todas as energias
joviais possíveis para que este trabalho
fosse concluído.
AGRADECIMENTOS
À Deus, minha fonte eterna de vida e luz, por mais essa conquista.
Aos meus pais, meus referenciais, pelo incentivo e apoio constantes.
Aos meus irmãos, cunhados e sobrinhos, família linda, pela companhia e
alegria que de perto ou de longe nunca faltaram. Patrícia, em especial, pelo carinho
na revisão deste trabalho. Eliana, co-irmã querida, pelo alicerce cotidiano.
À Prof.ª Dr.ª Monica Herman, minha inestimável Orientadora, pela
coragem de me guiar na vida acadêmica, externando preocupação singular e
constante nos estudos realizados, instigando o fomento por novas leituras e
acompanhando, sem poupar esforços, as reflexões que lhe apresentava.
Ao Prof. Dr. Cláudio Lembo, pela memorável oportunidade de ser sua
aluna e receber, com privilégio, ensinamentos tão importantes que jamais deixarão
de fazer parte dos meus estudos.
À Prof.ª Dr.ª Eunice Prudente, pelo apreço às valiosas ponderações feitas
na etapa prévia de Qualificação, que sem dúvida alguma foram impactantes no
desenvolvimento e conclusão desta pesquisa científica.
Às amigas, jovens doutoras, Vivian e Ana Paula, pelo compatilhamento no
aprendizado, confidencialidades, incentivos mútuos e companheirismo desde o início
de nossa trilha acadêmica. Raquel, minha alma gêmea, sobretudo na convivência e
divisão das atividades mackenzistas. Álvaro e Vanessa, pelas alegres coincidências
e acentuada confiança. Sandra, pela lealdade que não tem fim.
Aos colegas de trabalho, pelos ouvidos sempre pacientes às minhas
angústias, proferindo palavras de consolo com o objetivo de minimizar todo e
qualquer efeito negativo decorrente das fadigas do dia a dia. Fábio e Rodrigo, pelo
profissionalismo e incansável auxílio na movimentação das causas judicantes,
principalmente quando minhas ausências eram inevitáveis. Bárbara, Adriano e
Simone, pela feliz convivência e laços jamais imaginados, jamais esperados.
À todos os demais colegas que, independentemente da citação direta
proferida neste momento, estiveram ainda assim presentes durante toda esta
jornada laboral, acreditando no seu resultado.
Muito obrigada.
“A felicidade é como as folhas de uma árvore
no outono: algumas caem, mas sabe-se que
outras nascerão no lugar”
(GSGarcia)
RESUMO
Três minirreformas eleitorais foram implementadas pelo ordenamento jurídico
brasileiro com o escopo de alterar disposições referentes ao Código Eleitoral, à Lei
dos Partidos Políticos e à Lei das Eleições. Regulamentaram, de certo modo, a
dinâmica, organização e funcionamento dos partidos políticos. A recente Lei Federal
nº 13.165/15 reintroduziu novos mecanismos para serem observados pelos partidos
políticos, v.g., limite de gastos e financiamento das campanhas eleitorais,
procedimentos administrativos perante a Justiça Eleitoral, filiação partidária,
propaganda eleitoral, participação feminina, prestação de contas, registro de
candidaturas etc. Além disso, três Propostas de Emenda à Constituição tramitam
nas Casas Legislativas Federais, abarcando estes e outros mais variados
mecanismos; contudo, alguns já previamente rejeitados, como a adoção do sistema
proporcional de lista e majoritário distrital, a cláusula de desempenho, as coligações
proporcionais e o tempo de mandato. Certo é que, a cada nova legislatura, referidos
temas têm retornado à pauta do dia como forma de atender o desapreço popular
pelo processo eleitoral e partidário vigentes, e os partidos políticos acabam
assumindo o epicentro dessa discussão. Até podem, segundo o momento histórico-
político vivenciado, perder o viço, mas jamais a vida eterna. Afinal, são eles os
responsáveis diretos pela implementação do processo de representação política,
importando no canal de ascensão legítima pelo poder e exercício pleno da
democracia. Sustentam-na, de fato. E é pela importância que assumem no cenário
eleitoral contemporâneo, especialmente no brasileiro, que recebem os partidos
políticos a presente homenagem, devidamente acompanhada das irresignações à
imposição de mecanismos limitadores da sua atuação funcional pelo regime jurídico
em vigor, ainda que repetidos sejam os modelos de ação restritiva sofridos no
passado.
Palavras-chaves: Partidos Políticos. Reforma Política. Democracia Representativa.
Regime Jurídico Eleitoral-Partidário no Império e na República Brasileira.
RIASSUNTO
Tre mini riforme elettorali sono state introdotte dall'ordinamento giuridico Brasiliano
con lo scopo di alterare disposizioni che si riferivano al Codice Elettorale, alla legge
sui partiti politici ed alla legge sulle elezioni. Hanno regolamentato, in un certo modo,
la dinamica, organizzazione e funzionamento dei partiti politici. La recente legge
federale n. 13165/15, ha reintrodotto nuovi meccanismi che i partiti politici devono
osservare, v.g. limita le spese e finanziamento delle campagne elettorali,
procedimenti amministrativi davanti alla giustizia elettorale, filiazione al partito,
propaganda elettorale, partecipazione femminile, rendiconto delle spese, registro
delle candidature etc. Oltro a questo, tre proposte di modifica costituzionale sono all
esame del parlamento, comprendendo queste ed altri più svariati meccanismi; nel
frattempo, alcuni già precedentemente rigettati, come l’introduzione del sistema
proporzionale della lista e maggioritario distrettuale, la clausola dell esecuzione, le
alleanze proporzionali ed il tempo del mandato. Certo è che, ogni nuova legislatura, i
citati temi sono ritornati di attualità come risposta all allontanamento popolare dal
processo elettorale e dei partiti vigenti, ed i partiti politici finiscono assumendo
l’epicentro di questa discussione. Possono anche, dato il momento storico-politico
vissuto, perdere il vizio, ma giammai la vita eterna. Infine, sono loro i diretti
responsabili per l’introduzione del processo di rappresentanza politica , importando
nel cammino dell ascensione legittima al potere e esercizio pieno della democrazia.
Si supportano di fatto. Ed è per la importanza che assumono nella scena elettorale
contemporanea, specialmente in quella brasiliana, che ricevono i partiti politici il
presente omaggio, meritatamente accompagnato dalla rivolta alla imposizione dei
meccanismi limitativi della sua attuazione funzionale da parte del regime giuridico in
vigore, nonostante siano ripetuti i modelli restrittivi sofferti nel passato.
Parole chiavi: Partiti Politici. Riforma Politica. Democrazia Rappresentativa. Regime
Giuridico Elettorale-Dei Partiti durante l’Impero e nella Repubblica Brasiliana
ABSTRACT
Three minor electoral reforms have been enacted by Brazilian judicial order with the
purpose of modifying provisions referring to the Electoral Code, the Law of Political
Parties and the Election Law. These have, to some extent, regulated the dynamic,
organisation and the functioning of political parties. The recent Federal Law No.
13.165/15 re-introduced new mechanisms to be observed by the political parties, viz
spending limits and financing of electoral campaigns, administrative procedures
before the Electoral Court, party affiliation, electoral propaganda, the participation of
women, accountability, candidate registration etc. In addition, three Proposals for
Amending the Constitution are going through the Federal Legislative Houses,
incorporating the latter and other more varied mechanisms; some which had
nevertheless previously been rejected, such as the adoption of a proportional list
system and majority per district, the performance clause, proportional coalitions and
length of mandate. It is true that with each new legislature, the aforementioned
subjects have found their way back onto the agenda as a means of addressing
popular discontent with the electoral and party processes in force. Political parties
have ended up taking centre stage in this discussion. They may even, if the recent
historical-political experience is anything to go by, lose their vigour but not their
eternal life. Ultimately, they are the ones who are directly responsible for the
implementation of the process of political representation, recognising the importance
of coming to power via the legitimate channel and the full exercise of democracy.
They support it in fact. And it is for the importance they take on the contemporary
electoral scene, especially in the case of Brazil, that political parties receive the
present homage, duly accompanied by the rejection of the imposition of mechanisms
restricting their functional activities by the current legal system, even if the models of
restrictive action undergone in the past are repeated.
Key words: Political Parties. Political Reform. Representative Democracy. Imperial
and Republican Electoral and Party Legal System.
LISTA DE TABELAS Tabela 1 Vínculo partidário dos candidatos eleitos à Presidência da República no
período da Primeira República ............................................................... 117
Tabela 2 Apresentação e situação jurídica dos partidos políticos no período de
1945 a 1964 ........................................................................................... 137
Tabela 3 Apresentação e situação jurídica dos partidos políticos no período de
1964 a 1979 ........................................................................................... 146
Tabela 4 Partidos políticos com participação ativa nas eleições do período de
1982 a 2006 ........................................................................................... 158
Tabela 5 Registro dos partidos políticos e atual configuração partidária .............. 159
Tabela 6 Agremiações partidárias formadas entre 2006 e 2015 ........................... 162
Tabela 7 PEC 182/2007, aprovada em primeiro turno da Câmara dos
Deputados.......................................................................................... 183
LISTA DE ABREVIATURAS
AC Ato Complementar
ADB Aliança Democrática Brasileira (1945-1964)
ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade
AI Ato Institucional
AIB Aliança Integralista Brasileira
AIPB Ação Imperial Patrianovista Brasileira
ANL Aliança Nacional Libertadora
ARENA Aliança Renovadora Nacional (1964-1985)
ASD Aliança Social Democrata (1945-1964)
CDU União Democrata-Cristã
CFOAB Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil
CNOP Comissão Nacional de Organização Provisória
CNPJ Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica
CSD Confraternização Social Democrata (1945-1964)
DC Democracia Cristã Italiana
DEM Partido Democratas
Dep Deputado
EC Emenda Constitucional
EMA Emenda Aglutinativa
Labour Party Partido Trabalhista Britânico
LOPP Lei Orgânica dos Partidos Políticos
MDB Movimento Democrático Brasileiro (1964-1985)
MTR Movimento Trabalhista Renovador (1945-1964)
NEPEC Núcleo Eleitoral Pró-Emancipação Carioca (1945-1964)
NOVO Partido Novo
PAN Partido Agrário Nacional (1945-1964)
PBV Partido da Boa Vontade (1945-1964)
PC Partido Comunista (desde Império)
PC do B Partido Comunista do Brasil
PCB Partido Constitucionalista Brasileiro (1945-1964)
PCB Partido Comunista Brasileiro (ex-PC)
PCF Partido Comunista Francês
PCI Partido Comunista Italiano
PCO Partido da Causa Operária
PD Partido Democrático
PDC Partido Democrata Cristão (desde 1945-1964)
PDP Partido Democrático Progressista (1945-1964)
PDS Partido Democrata Social
PDT Partido Democrático Trabalhista
PEC Proposta de Emenda Constitucional
PEN Partido Ecológico Nacional
PFL Partido da Frente Liberal
PGT Partido Geral dos Trabalhadores
PHS Partido Humanista da Solidariedade
PIAD Partido Industrial Agrícola Democrático (1945-1964)
PJ Partido da Juventude
PL Partido Liberal (1985-2006)
PL Partido Libertador (1945-1964)
PL Projeto de Lei
PLIC Partido da Lavoura, Indústria e Comércio (1945-1964)
PLS Projeto de Lei do Senado
PMB Partido da Mulher Brasileira
PMDB Partido do Movimento Democrático Brasileiro
PMN Partido da Mobilização Nacional
PMR Partido Municipalista Renovador
PN Partido Nacionalista (1964-1985)
PNC Partido Nacional Classista (1945-1964)
PNE Partido Nacional Evolucionista (1945-1964)
PNPD Partido Nacional Popular Democrático (1945-1964)
POPSF Organização Político-Social Feminina (1945-1964)
POT Partido Orientador Trabalhista (1945-1964)
PP Partido Popular
PP Partido Progressista (1982-2006)
PP Partido Progressista (desde 2003)
PPB Partido Progressista Brasileiro (desde 1996)
PPB Partido Proletário do Brasil (1945-1964)
PPL Partido da Pátria Livre
PPP Partido Popular Progressista (1945-1964)
PPR Partido Progressista Reformador (1992)
PPR Partido Progressista Renovador
PPS Partido Popular Sindicalista (1945-1964)
PPS Partido Popular Socialista (1982-2006)
PR Partido da República (desde 2006)
PR Partido Regenerador (1945-1964)
PR Partido Republicano (1945-1964)
PRB Partido Republicano Brasileiro (desde 1982-2006)
PRB Partido Ruralista Brasileiro (1945-1964)
PRD Partido Republicano Democrático (1945-1964)
PRF Partido Republicano Federal
PRM Partido Republicano Mineiro (Império)
PRN Partido da Reconstrução Nacional
PRONA Partido da Reedificação da Ordem Nacional
PROS Partido Republicano da Ordem Social
PRP Partido da Representação Popular (1945-1964)
PRP Partido Republicano Paulista (Império)
PRP Partido Republicano Progressista
PRProg Partido Republicano Progressista
PRR Partido Republicano Riograndense
PRT Partido Republicano Trabalhista (1945-1964)
PRT Partido Revolucionário dos Trabalhadores (atual PSTU)
PRT Partido Rural Trabalhista (1945-1964)
PRTB Partido Renovador Trabalhista Brasileiro
PS do B Partido Socialista do Brasil (1945-1964)
PSB Partido Socialista Brasileiro (desde 1945-1964)
PSC Partido Social Cristão (desde 1982-2006)
PSC Partido Socialista Cristão (1945-1964)
PSD Partido Social Democrático (desde 1945-1964)
PSDB Partido da Social Democracia Brasileira
PSDC Partido Social Democrata Cristão
PSI Partido Socialista Italiano
PSL Partido Social Liberal
PSN Partido Social Nacionalista
PSN Partido Solidarista Nacional (Partido da Solidariedade Nacional)
PSOL Partido Socialismo e Liberdade
PSP Partido Social Progressista (1945-1964)
PST Partido Social Trabalhista (desde 1945-1964)
PSTU Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado
PT Partido dos Trabalhadores
PT do B Partido Trabalhista do Brasil
PTB Partido Trabalhista Brasileiro
PTC Partido Trabalhista Cristão
PTN Partido Trabalhista Nacional (desde 1945-1964)
PTR Partido Trabalhista Renovador (até 1992)
PTR Partido Trabalhista Republicano (1964-1985)
PV Partido Verde
REDE Rede Sustentabilidade
SBT Substitutivo
SD Solidariedade
SFIO Seção Francesa da Internacional Operária
SPD Partido Socialdemocrata Alemão
STF Supremo Tribunal Federal
TRE Tribunal Regional Eleitoral
TSE Tribunal Superior Eleitoral
UDN União Democrática Nacional
UNT União Nacional do Trabalho (1945-1964)
USDH União Social pelos Direitos do Homem (1945-1964)
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ............................................................................................... 17
2. ANOTAÇÕES PRELIMINARES ..................................................................... 24
2.1 EVOLUÇÃO E GRAUS DA DEMOCRACIA .................................................... 24
2.2 O DINAMISMO DA REPRESENTAÇÃO POLÍTICA NA FÓRMULA
DEMOCRÁTICA ............................................................................................. 30
2.2.1 A importância dos Parlamentos e a presença dos Partidos
Políticos .................................................................................................. 38
2.3 A DEMOCRACIA BRASILEIRA ...................................................................... 42
3. PARTIDOS POLÍTICOS ................................................................................. 49
3.1. ORIGEM E INSTITUCIONALIZAÇÃO ............................................................ 49
3.1.1. Natureza Jurídica ................................................................................... 63
3.1.2. Legitimidade jurídico-constitucional ........................................................ 67
3.2. SISTEMA DE PARTIDOS ............................................................................... 70
3.2.1. Sistema Partidário X Regimes de Governo ............................................ 72
3.2.2. Alianças ou Coligações Eleitorais .......................................................... 77
3.3. O PODER DAS ELITES NO SISTEMA PARTIDÁRIO .................................... 80
3.3.1. Governo da Maioria X Participação da Minoria ...................................... 88
4. PARTIDOS POLÍTICOS NO BRASIL ............................................................ 91
4.1. PARTIDOS POLÍTICOS NO IMPÉRIO ........................................................... 93
4.2. PARTIDOS POLÍTICOS NA REPÚBLICA .................................................... 107
4.2.1. A Primeira República (1889-1930) ....................................................... 110
4.2.2. O Golpe de Estado (1930-1945) .......................................................... 119
4.2.3. A Redemocratização (1945-1964) ........................................................ 128
4.2.4. O Período Militar (1964-1985) .............................................................. 143
4.2.5 A Nova República (1985-2016) ............................................................ 157
5. REFORMA POLÍTICA NO ESPECTRO ELEITORAL-PARTIDÁRIO .......... 165
5.1. MINIRREFORMAS ELEITORAIS ................................................................. 166
5.2. PROPOSTAS DE EMENDAS CONSTITUCIONAIS ..................................... 179
6. CONCLUSÃO ............................................................................................... 187
7. REFERÊNCIAS ............................................................................................ 191
17
1. INTRODUÇÃO
Na vertente de uma democracia representativa, a regência dos negócios
governamentais cabe aos representantes eleitos pelo povo. Detentores de
mandatos, assumem a responsabilidade de conduzir, politicamente, os interesses
gerais desse povo.
Filiados a partidos políticos, coligados ou não, é pelo pleito eleitoral
realizado sob forma livre, igualitária e competitiva que alcançam o poder, seja para
chefiar o Governo, seja para guardar assento em qualquer das cadeiras dos
Parlamentos.
Assim, não só a democracia corresponde, verdadeiramente, “à exigência
de sintonia entre a atuação governamental e a preferência dos cidadãos”1, como, na
contemporaneidade, essa sintonia encontrou no polo da representação política o
modo legítimo para a sua efetivação e, nos partidos políticos, o veículo necessário e
preferencial para a titularidade da representação política.
Historicamente, conforme lembrado por CAGGIANO2, os partidos
ganharam espaços e fortalecimento com a nova concepção de Estado trazida pelos
movimentos revolucionários do século XVIII. Foi a pessoa do novo soberano, o
povo, que fomentou a instalação de um instrumento mais apto à concretização da
competição política no Estado Liberal e em formação, de modo que agregadas
fossem suas características próprias e diferenciadas: “difuso, temporal, composto,
variável e com mandato revogável”3.
Segundo a autora, embora houvessem manifestações bastante refratárias
e de silêncio à figura dos partidos políticos no final do século XIX e início do século
XX, os períodos de reconstrução democrática decorrentes do segundo conflito bélico
mundial – décadas de 50 e 60 do século XX – teriam marcado o momento de maior
reflexão à importância e aptidão do partido político na promoção do desenvolvimento
da democracia e correspondente legitimação do poder pela via eleitoral.
1 CAGGIANO, Monica Herman Salem. Sistemas Eleitorais X Representação Política. Brasília: Senado Federal, Centro Gráfico, 1987. p.15.
2 CAGGIANO, Monica Herman Salem. É possível reinventar o Partido?: o Partido Político no século
XXI. Disponível em: <http://www.cepes.org.br/home/index.php?option=com_content&view= article&id=364:e-possivel-reinventar-o-Partido-&catid=35:artigos&Itemid=55>. Acesso em: 03 jun. 2014.
3 CAGGIANO, ibidem, p.10
18
O constitucionalismo norte-americano, no século XIX, foi o primeiro a
mostrar os primeiros sinais de reconhecimento legal aos partidos políticos nos
Estados da Califórnia e de Nova Iorque. Na França, embora existente legislação
específica à formação de associações desde 1901, o reconhecimento dos partidos,
enquanto entidades político-partidárias, ocorreu apenas em 1910. No mesmo
sentido, se delineou a formação dos grupos parlamentares e comitês eleitorais nas
eleições gerais de 1837 e 1869 na Espanha, que faziam alusão à formação de
partidos informais até efetiva regularização a partir de 1931. Na América Latina,
especificamente na Argentina, é possível ver a presença marcante dos partidos
políticos com a União Cívica Radical (UCR) em 1890 até verdadeira conquista do
status constitucional em 1934, assim como na história do Chile, com o Partido
Radical em 1863; México, com o sistema único no século XIX; Peru, com o Partido
Civilista em 1895 e o Partido Democrático de Piérola de 1912; e em Cuba, com o
sistema bipartidário no século XIX4.
No Brasil, o período colonial teria marcado a formação de dois grupos
opositores: os monarquistas, que sustentavam a instalação de uma monarquia
constitucional sob regência do Imperador Dom Pedro I, e dos exaltados e
moderados ou independentes, que reclamavam o fortalecimento dos poderes locais
e provinciais até a instalação dos dois primeiros partidos políticos no período
imperial, o Partido Liberal em 1831 e o Partido Conservador em 18375. Na doutrina
de LEMBO, verifica-se que os primeiros vereadores à Câmara Municipal de São
Vicente já teriam se instalado em 1532, fruto do processo eleitoral que vinha sendo
comandado pelas determinações das Ordenações Manuelinas6.
Enfim, na democracia brasileira atual, os partidos políticos tornaram-se os
únicos entes da sociedade organizada a conquistar o exercício da ação política,
mesmo diante de tantos outros grupos voluntários por ela também criados. Não
apenas se consagraram os responsáveis pela formatação do sistema partidário de
sustentação das bases democráticas como, indiretamente, colaboraram com o
desenho do sistema eleitoral a ser praticado. Com este, em verdade, se interliga o
4 CAGGIANO, Monica Herman Salem. É possível reinventar o Partido?: o Partido Político no século
XXI. Disponível em: <http://www.cepes.org.br/home/index.php?option=com_content&view= article&id=364:e-possivel-reinventar-o-Partido-&catid=35:artigos&Itemid=55>. Acesso em: 03 jun. 2014, p. 5-7.
5CAGGIANO, ibidem, p.7.
6 LEMBO, Cláudio (Coord.); CAGGIANO, Monica Herman S. (Org.). Cronologia básica do Direito
Eleitoral Brasileiro. In: O voto nas Américas. Barueri/SP: CEPES/Manole, 2008. p. 73.
19
sistema de partidos, em constante processo de realimentação um do outro, sendo
plenamente possível distanciar a expressão da vontade popular dos grupos políticos
que a articulam, consoante delineado por FERREIRA FILHO, porém jamais o
inverso, justamente porque eleições na democracia contemporânea importam,
irremediavelmente, em partidos7. Afinal, das lições de DUVERGER também se extrai
que “o desenvolvimento dos partidos políticos transformou, profundamente, a
estrutura dos regimes políticos”8.
No entanto, porque plasmados em ambientes envoltos pelo fenômeno da
corrupção, um estigma do qual não lhe é exclusivo mas apenas inclusivo e familiar,
sofrem os partidos políticos constantes ataques que acabam por contaminar a sua
imagem e, consequentemente, a própria democracia que sustentam. Com isso,
mergulham no rótulo de fragilidades e de desconfiança por minimamente se
distanciarem da condição de partido pasteurizado, ou seja, de partido livre de
impurezas, como assinalado por CAGGIANO9. De fato, seguindo o pensamento da
autora, tais efeitos perversos, em verdade, não fomentam a exterminação dos
partidos, senão a promoção de controles passíveis de lhes alertar quanto ao dever
de fiel desempenho de suas tarefas.
Por esse vetor central, várias são as aclamações por reformas políticas.
Para a sociedade, o modelo eleitoral-partidário existente não mais agrada.
Daí a primeira questão que se coloca ao examinar o regime partidário
brasileiro, neste trabalho, é se uma modificação na organização e no funcionamento
dos partidos políticos geraria impacto de melhoria do regime democrático pré-
estabelecido, já que se encontram intrinsecamente ligados.
A segunda questão está no quão valoroso se colocaria o quadro de
reformas políticas que se vivencia, notadamente seus reflexos frente à idealização
de um modelo mais resolutivo ao vigente, capaz de proporcionar um exercício da
democracia representativa mais escorreito.
7 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Democracia, Partidos e Sistema Eleitoral. In CAGGIANO,
Monica Herman Salem (Coord.); MESSA, Ana Flávia; MENEZES DE ALMEIDA, Fernando Dias (Org.). Direito Eleitoral em Debate: estudos em homenagem a Cláudio Lembo. São Paulo: Saraiva, 2013, p 367-395.
8 DUVERGER, Maurice. Os Partidos políticos. 2ª ed. Tradução de Cristiano Monteiro Oiticica. Revisão técnica de Gilberto Velho. Rio de Janeiro: Zahar; Brasília: Universidade de Brasília, 1980. p. 386.
9 CAGGIANO, Monica Herman Salem. É possível reinventar o Partido?: o Partido Político no século
XXI. Disponível em: <http://www.cepes.org.br/home/index.php?option=com_content&view= article&id=364:e-possivel-reinventar-o-Partido-&catid=35:artigos&Itemid=55>. Acesso em: 03 jun.2014, p. 21.
20
Até o momento, nas casas legislativas federais, inúmeras são as
propostas de modificação do ordenamento jurídico-constitucional vigente em matéria
eleitoral. Mesmo tendo sido objeto de arquivamento, propostas são constantemente
reavivadas, integrando novas postulações como apensos. Na essência, pouco,
senão quase nada, inovam. Experiências do passado permanecem em discussão,
como o voto majoritário (conjugado ou não com o proporcional) para o Legislativo10,
o voto proporcional com lista fechada11, o voto distrital12, a candidatura avulsa13 e a
duração dos mandatos eletivos14.
Algumas arriscam repaginar o sistema vigente, propondo o financiamento
público às campanhas majoritárias15, a possibilidade de coligações eleitorais apenas
nas eleições majoritárias16, o voto facultativo17, a coincidência dos mandatos eletivos
em âmbito nacional com os mandatos dos demais entes federativos18, o voto distrital
misto19, a elegibilidade de determinados cargos políticos sob novos parâmetros de
idade20, a supressão do quociente eleitoral e introdução do sistema majoritário nas
eleições proporcionais21, a instituição de cláusula de desempenho aos partidos
10
P.E.C. nº 54/2007; P.E.C. nº 258/2013, de autoria do Deputado Marcus Pestana – PSDB/MG, apensada à P.E.C. 182/07.
11 P.E.C nº 43/11, P.L.S. nº 293/11 e P.L. nº 4.636/2009, apensado ao P.L. nº 2.887/00.
12 P.E.C. nº 133/2003, do Deputado Jaime Martins (PL/MG); P.E.C. nº 585/2006, do Deputado
Arnaldo Madeira (PSDB/SP). 13
P.E.C. nº 229/08 – Dep. Leo Alcântara (PR/CE). 14
P.E.C. nº 211/95, do Deputado José Janene (PP/PR); P.E.C. nº 337/96, do Deputado Raul Belém (PFL/MG); P.E.C. nº 283/2000, do Deputado José Índio (PMDB/SP).
15 P.L. 1538/07, do Deputado Alexandre Silveira (PPS-MG).
16 P.E.C. 14/2015, epigrafada originariamente com o nº 40/2011, de autoria do Senado Federal,
devidamente encaminhada, por ofício, pelo Presidente Senador Renan Calheiros e apensada à P.E.C. nº 182/07.
17 P.E.C.s nºs 70/1999, do Deputado Ary Kara (PPB/SP) e 430/2005, do Deputado Moreira Franco
(PMDB/RJ); P.E.C. nº 444/2014, do Deputado Leonardo Picciani (PMDB/RJ). 18
P.E.C. nº 211/1995, do Deputado José Janene (PP/PR); P.E.C. 6/2003, do Deputado Maurício Rands (PT/PE); P.E.C. nº 19/2003, do Deputado Dilceu Sperafico (PPB/PR); P.E.C. nº 77/2007, do Deputado Carlos Brandão (PSDB/MA); P.E.C. nº 220/08, do Deputado Jovair Arantes (PTB/GO).
19 P.E.C. nº 10/95, Dep. Adhemar de Barros Filho (PPB/SP), com apensos P.E.C. nº 133/03, P.E.C. nº
585/06, P.E.C. nº 523/06 e P.E.C. nº 365/09; P.E.C. nº 168/1995, do Deputado Mendonça Filho (DEM/PE); P.E.C. nº 289/1995, do Deputado Osvaldo Reis (PPB/TO).
20 P.E.C. nº 20/2007, da Deputada Manuela D’ávila (PCdoB/RS); P.E.C. nº 220/2008, do Deputado
Jovair Arantes (PTB/GO); P.E.C. nº 168/2012, do Deputado Wilson Filho (PMDB/PB). 21
P.E.C. nº 294/2000, do Deputado De Velasco (PSL/SP); P.E.C. nº 105/2007, do Deputado Mário Negromonte (PP/BA); P.E.C. nº 3/2015, do Deputado Miro Teixeira (PROS/RJ).
21
políticos e de um sistema eleitoral com quota para mulheres22 e a revogabilidade do
mandato eletivo (recall)23.
Outras conferem a um ato normativo determinado apenas status
constitucional, como é o caso da fidelidade partidária já disciplinada pela Resolução
nº 22.260 do Tribunal Superior Eleitoral24, ou a inversa derrogação desse status, a
exemplo do fim da reeleição aos cargos majoritários, assegurada por força da
Emenda Constitucional nº 16/9725 e da supressão de limite de Deputados para cada
ente da Federação (de oito a setenta), determinada pelo art. 45, §1º da Constituição
Federal26.
De qualquer modo, é inegável: todas, direta ou indiretamente, interferem
na formação do sistema partidário ao seu tempo.
Concessa venia, imprescindível se faz apenas enxergar se a aplicação do
novo ou do “velho renovado” adapta-se ao status do ordenamento jurídico-
constitucional vigente, por seus próprios fundamentos.
De nada adianta, conforme lembrado por NUNES LEAL27, insistir na
repetição de um regime político já experimentado e não bem sucedido no passado28,
ou, então, de acordo com o destacado por OLIVEIRA VIANNA29, copiar modelo
22
Ofício nº 02/11 – CRP do Senador Francisco Dornelles, Presidente da Comissão, que deu ensejo à formação das PECs nºs 37 a 42/2011 e PLS nºs 265 a 267/2011; em relação à candidatura avulsa, destaca-se a P.E.C. nº 06/2015, proposta pelo Senador Reguffe do PDT-DF, favorável à candidatura avulsa para os cargos majoritários e proporcionais daqueles que obtiverem apoio e assinatura de, pelo menos, 1% do eleitor municipal, estadual ou nacional.
23 P.E.C. nº 08/2015, de autoria do Senador Reguffe e outros.
24 P.E.C. nº 60/1995, do Deputado Silvio Torres (PSDB/SP); P.E.C. nº 90/1995, do Deputado Paulo
Gouvêa (PFL/SC); P.E.C. nº 242/2000, do Deputado Mauro Benevides (PMSB/CE); P.E.C. nº 182/2007, do Senador Marco Maciel – DEM/PE, que segue apensada de vários outros projetos de Emenda à Constituição, editados no período de 1995 a 2012.
25 P.E.C. nº 19/2003, já destacada; P.E.C. nº 246/2004, do Deputado Jutahy Júnior (PSDB/BA) e
P.E.C. nº 72/2007, do Deputado Regis de Oliveira (PSC/SP); P.E.C. nº 160/2007, do Deputado Renato Molling (PP/RS).
26 P.E.C. nº 476/2001, do Deputado José Carlos Aleluia (PFL/BA); P.E.C. nº 485/2002, do Deputado
João Eduardo Dado (Bloco-PDT/SP); P.E.C. n º 223/2008, do Deputado Antonio Carlos Mendes Thame (PSDB/SP).
27 NUNES LEAL, Victor. Coronelismo, enxada e voto: o Município e o regime representativo no Brasil.
3ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997. p. 266-267. 28
Como destacado por NUNES (ibidem), eleição direta e indireta, voto devassável e sigiloso, circunscrições eleitorais amplas e restritas, divididas em distritos com, inclusive, a indicação de deputado único, escrutínio de lista, voto uninominal, lista incompleta, voto cumulativo, representação proporcional, já repetidas na República e mal sucedidas no Império.
29 Em 1922, quando da edição de sua obra “O idealismo: na evolução politica do Imperio e da
Republica” [sic], OLIVEIRA VIANNA diferenciava entre duas as espécies de idealismo, ambas firmadas sob conceito absolutamente antagônico: o “utópico”, que não se fundaria na experiência, e o “orgânico”, que nasceriam da própria evolução da sociedade, por suas aspirações e atividades apoiadas na experiência e orientadas pela observação do povo e do meio, representando visões antecipadas da realidade futura. Sua indignação pautava-se exatamente no fato de o Brasil, a um século de sua independência, não ter ainda conseguido realizar a definitiva organização social e
22
estrangeirista, provido de realidade sociocultural absolutamente adversa da
apresentada em solo doméstico.
Toda modificação exige cautela e reflexão, especialmente no que tange
ao resguardo da liberdade de expressão política, a pedra angular do ambiente
democrático.
Entender como se constituem os partidos políticos, sua organização,
funcionamento e evolução no tempo e espaço é fundamental para afinar a
compreensão de que forma eles se interagem no espectro da democracia
representativa, reafirmando sua importância e essencialidade.
ARRIAGADA30, num artigo sobre partidos políticos e crises de
representatividade especificamente na democracia chilena, não poupou esforços em
destacar que “os partidos políticos não vão desaparecer, porque se desaparecerem
desaparece também a democracia; é inconcebível uma democracia sem partidos. O
que pode desaparecer é o sistema de partidos que existe hoje em dia”31, porque, da
mesma forma que nasce e se consolida, também morre e surge outro novo.
Nesse contexto é que se propõe estudar o regime jurídico dos partidos
políticos na democracia brasileira. Para tanto, foi dividido referido trabalho de
pesquisa em quatro capítulos.
O primeiro cuidará dos elementos que justificam a expressão e, portanto,
a operacionalização da democracia, enquanto alicerce que é do presente trabalho
de pesquisa. A preocupação não se direciona em verificar a forma de criação
particularizada de cada regime democrático, segundo o viés social e suas
vicissitudes em comparação aos demais regimes autocráticos de governo, mas o
modo como a democracia e seu sistema representativo, uma vez implantados, se
sustentam e sobrevivem no ambiente que melhor reflete as decisões do povo – o
Parlamento – e também pelos principais atores na organização dessas
manifestações – os Partidos Políticos. Nesse sentido é que a democracia brasileira
também será examinada, na sequência e em subcapítulo próprio.
política de seu povo, concepção clara de sua estrutura, sua mentalidade, seu viver, suas crises e suas endemias naturais e sociais, mas por “obras feitas” de outros povos mais senhores da sua dignidade.
30 ARRIAGADA, Genaro. Partidos políticos y crisis de representatividad. In CHILE. ODCA –
Organização Democrata Cristã da América. La Reforma de Los Partidos Políticos. Santiago: Konrad-Adenauer-Stiftung, 2003. p. 55.
31 Tradução livre do texto original: “los partidos políticos no van a desaparecer, porque si
desaparecen, desaparece la democracia también; es inconcebible uma democracia sin partidos. Lo que sí puede desaparecer es el sistema de partidos que existe hoy em día”.
23
O segundo capítulo trará uma releitura sobre os partidos políticos,
iniciando os estudos de sua origem e formação em conjunto à integração que
possuem com o ambiente externo, merecendo também destaque a forma pela qual
se estruturaram e se institucionalizaram ao longo do tempo. Destaques receberão os
diversos arranjos políticos – alianças, coligações etc. – existentes à legitimação do
exercício da ação política.
O terceiro capítulo, por sua vez, se ocupará de examinar a entrada dos
partidos políticos em solo brasileiro, melhor dizendo, a formatação do sistema
partidário conforme o desenho assumido pelo sistema eleitoral de cada momento
histórico.
O quarto e último capítulo restringir-se-á a pontuar os aspectos da
reforma política e sua incidência, direta ou indireta, no regime jurídico dos partidos
políticos, examinando os pontos que insinuam plena inovação ou, simplesmente,
copiam modelos de insucesso do passado brasileiro ou de estrangeirismos
desprovidos do real conhecimento das necessidades e prioridades do povo face ao
meio em que vive.
Não há, aqui, qualquer pretensão de se esgotar a matéria, senão, apenas,
disponibilizar uma pesquisa sobre o regime jurídico do atual sistema partidário
brasileiro e um comparativo com os regimes jurídicos já adotados, proporcionando,
com isso, hipótese de contribuição às reflexões futuras, discutidas sobretudo em
sede das inúmeras reformas políticas que se sucedem, de modo que o foco da
democracia representativa, pelo sistema de partidos, não perca seu viço.
24
2. ANOTAÇÕES PRELIMINARES
A representação política, o ambiente parlamentar e os partidos políticos
são as ferramentas basilares à operacionalização de qualquer ambiente
democrático.
Nesse sentido, DUVERGER32 não poderia ter sido mais didático ao
apontar quais seriam os vetores do regime democrático, correlacionando-os, in
verbis:
É a seguinte a definição mais simples e mais realista de democracia:
regime em que os governantes são escolhidos pelos governados, por
intermédio de eleições honestas e livres. Sobre esse mecanismo de
escolha, os juristas, após os filósofos do século XVIII, desenvolveram
uma teoria de representação, o eleitor dando ao eleito mandato para
falar e agir em seu nome; dessa maneira, o Parlamento, mandatário
da nação, exprime a soberania nacional. O fato da eleição, como a
doutrina da representação, foram profundamente transformados pelo
desenvolvimento dos Partidos. Não se trata doravante de um diálogo
entre eleitor e eleito, Nação e Parlamento: um terceiro se introduziu
entre eles, que modifica, radicalmente, a natureza de suas relações.
Pela importância, melhor dizendo, pelo alicerce com que referidos temas
dão suporte à presente dissertação, não se poderia deixar de reservar um capítulo
próprio, e obviamente inaugural, para o tratamento da dinâmica do regime
democrático de governo, notadamente, os seus graus, a representação política e o
ambiente parlamentar, inclusive em solo brasileiro.
2.1 EVOLUÇÃO E GRAUS DA DEMOCRACIA
Viver a sociedade e em sociedade, participando direta e indiretamente,
opinando e decidindo sobre seu destino, com direitos e liberdades plenamente
32
DUVERGER, Maurice. Os Partidos políticos. 2ª ed. Tradução de Cristiano Monteiro Oiticica. Revisão técnica de Gilberto Velho. Rio de Janeiro: Zahar; Brasília: Universidade de Brasília, 1980. p. 387.
25
assegurados e em igualdade de condições é a fórmula que o ambiente democrático
efetivamente instituiu para a regência do poder soberano no Estado de Direito.
Decisão ampla, de natureza coletiva, vinculada a todo o corpo social,
proferida por uma maioria representada a partir de eleições amplas, igualitárias e
constantes consolida, por fim, os elementos essenciais à sua caracterização.
Para BOBBIO33, a democracia exige um elemento que vai além dessas
regras: “é preciso que aqueles que são chamados a decidir ou a eleger os que
deverão decidir sejam colocados diante de alternativas reais e postos em condição
de poder escolher entre uma e outra”. Somente assim, com garantia dos direitos de
livre manifestação de opinião, de reunião e de associação é que os mecanismos
caracterizadores do regime democrático estariam plenamente consolidados.
Fato é que, em suma, nenhuma outra fórmula política à regência de um
governo, até o momento, conseguiu atingir esse ideal comum ou sequer a ele propor
melhorias.
A democracia tem sido o palco exclusivo das liberdades. É fato.
Quer-se crer que, por essa razão, tenha se tornado o modelo de
referência para muitos povos, para muitas outras Nações.
Sua origem remonta à Grécia antiga, Atenas. Por dois séculos, desde as
reformas de Clístenes, 509 a. C., à paz de 322 a. C., durante a vida e pensamento
filosófico de Platão (429-347 a.C.), Sócrates (470-399 a.C.) e Aristóteles (384-322 a.
C.), até a transformação das instituições políticas por Antípatro, o general da
Macedônia e apoiador dos reis Filipe II e Alexandre (o Grande), a democracia foi
estabelecida como o primeiro modelo de governabilidade, assim permanecendo
durante todo o limiar do século XVIII34.
A etimolologia do termo “democracia” combina os radicais gregos demo e
kracia, significando, respectivamente, povo e governo e, portanto, a ideia de um
governo feito por seu próprio povo.
De fato, fazendo-se um comparativo entre as três atuais, e mais comuns,
formas de regime de governo, verifica-se que nem o regime autoritário nem o
totalitário conseguem alcançar o ideal proposto para um regime democrático.
33
BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. 6ª ed. Tradução de Marco Aurélio Nogueira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997 (Coleção Pensamento Crítico: vol. 63). p. 19/20.
34 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 36ª ed., São Paulo:
Saraiva, 2010. p. 109.
26
FERREIRA FILHO35, com a didática que lhe é peculiar, envolvendo as
interfaces da força política encontrada em cada regime de governo, além de também
reafirmar que no regime democrático as liberdades de expressão e de
compartilhamento de informações, estabelecidas “com o objetivo de propiciar a
disputa, a intervalos regulares, entre líderes e partidos a fim de alcançar o poder por
meios não violentos” estão presentes, lembrou que no regime autoritário, embora
existente um pluralismo político, a manifestação é limitada a um grupo governante,
consolidado “dentro de limites mal definidos, conquanto previsíveis”, desprovido de
uma ideologia elaborada e de uma mobilização política significativa, e no regime
totalitário, a ideologia oficial nenhuma liberdade de manifestação resguarda ao
cidadão, senão ao “partido político único, de massa, que controla toda a mobilização
política e o poder concentrado em mãos de um pequeno grupo que não pode ser
afastado do poder por meios institucionalizados e pacíficos”.
Em outras palavras, o espaço de governabilidade proferido por uma
minoria no poder é o que caracteriza a forma aristocrática de governo, quer seja por
seu regime autoritário ou totalitário de governo, denotando traços, de fato,
verdadeiramente distantes ao comportamento das liberdades pacíficas que são
asseguradas em um ambiente democrático.
ROUSSEAU36, considerado o pai da democracia moderna, critica apenas
a forma como se quer assentir a democracia: pelo viés da representação política.
Por acreditar que à soberania não se cabe qualquer forma de representação, em
razão disso sustenta que uma verdadeira democracia, em regra, nunca existiu e
nunca existirá, na medida em que, para sua compatibilidade, há a necessidade de
se pressupor um Estado pequeno e pobre. Caso contrário, a degenerescência
natural do governo o remete não apenas à aristocracia, mas também ao pendor
natural da realeza de uma monarquia, sem a mínima possibilidade de volta. In
verbis:
O governo, com efeito, só muda de forma quando, perdida a
elasticidade da mola, esta o deixa excessivamente enfraquecido para
poder conservar aquela. Ora, se se estendendo, ela afrouxasse mais
ainda, sua força se tornaria inteiramente nula e ela não teria
condições de subsistir. É necessário, pois, remontar e comprimir a
35
FERREIRA FILHO, ibidem, p. 105. 36
ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social. Tradução de Rolando Roque da Silva. Edição eletrônica: Ridendo Castigat Moraes, 2002 [c2001]. Versão para e-book, p. 111.
27
mola, à medida que esta cede; de outro modo, o Estado que ela
sustém desabaria em ruína.
Entretanto, por mais que ROUSSEAU considerasse a verdadeira
democracia impraticável, questionando, em especial, o seu funcionamento pelo viés
da representação política ou, ainda, defendesse a impossibilidade da soberania ser
representada, haja vista institucionalizar uma submissão completa da vontade geral
dos súditos à vontade particular do soberano, tanto a ideia de democracia
representativa quanto o seu exercício pleno quebraram barreiras, fazendo-se
predominar em praticamente todos os povos. Se bem ou mal, conforme também
refletido por BOBBIO, se verdadeiramente cumprido, teria sido o ideal democrático
pela “democracia real”37, ela existiu e sobreviveu com os seus defeitos.
Consoante ASSIS BRASIL38, o ideal democrático só avançou porque
consolidava, de fato, o regime das liberdades e dos direitos, individuais e coletivos.
Nas suas observações:
Seja como fôr, e apezar de quaesquer anathemas que contra a
democracia se vibrem, é facto positivo que as nações livres do nosso
tempo revelam todas, por signaes evidentes, indole democratica. Por
toda parte o povo é chamado a influir na constituição dos orgams do
governo e administração; por toda parte perdem terreno os ultimos
laivos de dominação pessoal, e os próprios individuos que se
levantam para repellir a palavra democracia, não raro, são os
primeiros em reclamar contra as intrusões do despotismo e em favor
da liberdade. [sic]
37
Segundo BOBBIO (1997, p. 22/33), seis promessas de uma democracia ideal não foram cumpridas pela democracia real. A primeira se destaca no campo da distribuição do poder, haja vista a criação de grupos contrapostos e concorrentes protagonizando a disputa do poder em lugar da unidade ideal de participação que devia ter sido mantida para cada indivíduo; outra, diz respeito à representação, que acabou sendo desvirtuada do fluxo de defesa dos interesses da Nação para atender os interesses particulares do grupo representado; a terceira, é relativa à permanência do poder oligárquico de uma minoria monopolizando o poder, recebendo dele suas vantagens e direcionando a vida privada da maioria que de seus desígnios depende; outra, é a incapacidade de ter ocupado todos os espaços, sem que o indivíduo fosse visto enquanto fiel trabalhador, estudante, soldado, consumidor, doente etc., mas simplesmente no seu papel geral de cidadão, com possibilidade, espaços gerais, para exercer o seu direito de participação plena; a quinta, reflete a promessa de se eliminar o poder invisível, aquele decorrente de “máfia, camorra, lojas maçônicas anômalas, serviços secretos incontroláveis e acobertadores dos subversivos que deveriam combater” (ibidem, p. 29); a última, relaciona-se com a educação para a cidadania.
38 ASSIS BRASIL, Joaquim Francisco de. A democracia representativa na República (antologia).
Brasília: Conselho Editorial do Senado Federal, 1998. p. 16-17.
28
Nesse sentido, DALLARI39, além de afirmar que a única relação existente
entre a democracia antiga e a moderna seria “a noção de governo do povo” e não,
exatamente, “a noção do povo que deveria governar”, o Estado Democrático
moderno teria nascido das irresignações contra o absolutismo, “sobretudo através
da afirmação dos direitos naturais da pessoa humana”, justamente porque tem por
fundamento a razão de resguardar “a supremacia da vontade popular”, “a
preservação da liberdade” e “a igualdade de direitos”.
Para TILLY40, o exame do vigor de uma democracia o levou, sem poupar
esforços, a registrar que sua plenitude só é alcançada se significativas mudanças na
forma do relacionamento político entre o Estado e seus cidadãos vierem a ser
promovidas. De modo que implantados, e consequentemente alicerçados, devem
ser os instrumentos jurídicos que garantam consultas amplas, igualitárias, protegidas
e mutuamente vinculantes. A contrario sensu, qualquer forma de descrédito nessa
relação, vale dizer, na integração harmoniosa desses vetores, o reflexo imediato
será o da sua desdemocratização.
Para o autor, o exame de uma democracia vai além. Não deve ser visto
apenas a partir do atendimento de pré-requisitos estanques e englobados de uma
lista estática.
Tomando-se por base a doutrina da “democracia poliárquica” de Robert
Alan Dahl, que preordena a necessidade de atendimento a todas as seis instituições
do regime de governo para que democrático seja ele considerado, que são “oficiais
eleitos; eleições livres, justas e frequentes; liberdade de expressão; fontes de
informação alternativas; autonomia associativa; e cidadania inclusiva”41, na visão de
TILLY, o critério que deve ser adotado para se verificar o status de um regime
democrático como, inclusive, proposta de melhoria a essa doutrina poliárquica é a
sua definição orientada pelo processo. Vale dizer, in verbis:
Se queremos ter informações sobre as causas e os efeitos da
democratização ou desdemocratização, não temos outra escolha
senão reconhecê-los como processos contínuos, e não apenas como
simples passos em um caminho que leva numa ou noutra direção.
39
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 32ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 146/150.
40 TILLY, Charles. Democracia. Petrópolis/RJ: Vozes, 2013. p. 15-64.
41 TILLY, Ibidem, p. 24.
29
Em suma, para propósitos comparativos e explicativos, não podemos
ficar apenas com uma checklist de variáveis cruciais42.
De modo que os juízos envolvidos no comportamento que um Estado
deve ter em relação às demandas de seus cidadãos para que consolidados sejam
os elementos do ideal democrático consistentes na amplitude, igualdade, proteção e
caráter mutualmente vinculante das consultas, para TILLY43, em primeiro lugar,
indispensável verificar “qual a extensão da manifestação desses conjuntos de
demandas”; na sequência, “quão equitativamente diferentes grupos de cidadãos
experienciam a tradução de suas demandas em ação do Estado”; assim como “em
que extensão a própria extensão das demandas recebe a proteção política do
Estado”; e, por fim, “o quanto o processo de tradução envolve ambos os lados, os
cidadãos e o Estado”.
Havendo qualquer fragilidade nesse engendramento de consultas amplas,
igualitárias, protegidas e mutuamente vinculantes, o regime democrático se
submeteria, quando muito, a um processo que ele convencionou chamar de
desdemocratização. Na hipótese desse Estado mergulhar em um período
autocrático, sinalizando o início de um viés negativo ao processo de democratização
anteriormente conquistado, numa visão bastante otimista, TILLY defende a
possibilidade de sua reoxigenação, com restabelecimento do status quo ante, ou,
até mesmo, alcance de melhorias democráticas jamais experimentadas.
Por consultas e participação política ativa dos cidadãos nos negócios do
Estado, tem-se então a assertiva de que eleições amplas e igualitárias, livres, justas
e frequentes são elementos próprios do regime democrático, apenas dele.
Assim foi como se mostrou a democracia desde a sua raiz: da experiência
encontrada no modelo dito direto ateniense aos modelos liberais de democracia
representativa dos séculos XVIII e XIX e, subsequentemente, contemporâneos,
listados por CASTANHO44 como, resumidamente, a democracia elitista de Joseph
Alois Schumpeter, a democracia pluralista de Robert Alan Dahl, as teorias
democráticas de Giovanni Sartori, a visão de Estado e de democracia por Norberto
Bobbio, a democracia deliberativa de Jügen Habermas, a democracia participativa
42
TILLY, Charles. Democracia. Petrópolis/RJ: Vozes, 2013. p. 24. 43
TILLY, ibidem, p. 27-28. 44
CASTANHO, Maria Augusta Ferreira da Silva. E-Democracia: a democracia do futuro?. Dissertação (Mestrado em Direito Político e Econômico). Universidade Presbiteriana Mackenzie: Faculdade de Direito. São Paulo, 2009.
30
de Carole Pateman, a democracia semidireta e, ainda, as democracias de natureza
liberal, marxista, popular, providencialista, industrial, partidária, plebiscitária, dualista,
de referência e eletrônica (e-democracia).
LIJPHART45 vai além, demonstrando, a partir de trinta e seis modelos
democráticos diversos, as múltiplas maneiras de funcionamento e desempenho de
uma democracia, segundo suas instituições governamentais e, notadamente,
concentração de poder.
Afinal, consoante enfatizado por CASTANHO46, a igualdade política assim
como o privilégio dado às liberdades pela democracia do século XVIII foi assentida
no século seguinte, especificamente no momento de institucionalização das
democracias modernas, quando países mais evoluídos já iniciavam a adoção de um
sistema eleitoral institucionalizado por instrumentos “como o sufrágio universal,
sistema partidário, eleições periódicas e confiáveis e respeito aos direitos
individuais”.
Mesmo com prós e contras, a democracia constitui um ambiente sedutor,
sedutor pelas liberdades que assegura existirem.
2.2 O DINAMISMO DA REPRESENTAÇÃO POLÍTICA NA FÓRMULA DEMOCRÁTICA
O sistema representativo tem ligadura imediata com a democracia desde
sua origem, no local considerado como o berço da civilização ocidental e palco de
atuação de um dos principais líderes democráticos da História, o estadista Péricles
(499-429 a. C.): Atenas, na Grécia antiga.
45
Concluiu pela existência e distribuição da organização política, e, portanto, do poder, sob duas vertentes distintas: a primeira, a partir da seara de um modelo majoritário, tencionado a conduzir o poder à regência de um único partido e, consequentemente, à formação de um legislativo bipartidário, capaz de proporcionar melhor condição de governabilidade ao país; e, a segunda, a partir de um modelo consensual, ou consociativo, de concentração do poder nas forças multipartidárias que se encontram espalhadas no legislativo e que, para condição de governabilidade, acaba exigindo a formação de uma base de apoio integrada pela maioria, em consórcio ou coalizão, de partidos (LIJPHART, Arend. Modelos de Democracia: desempenho e padrões de governo em 36 países. Tradução de Roberto Franco. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003).
46 CASTANHO, Maria Augusta Ferreira da Silva. E-Democracia: a democracia do futuro?. Dissertação
(Mestrado em Direito Político e Econômico). Universidade Presbiteriana Mackenzie: Faculdade de Direito. São Paulo, 2009. p. 48.
31
De acordo com o rememorado por FERREIRA FILHO47, o povo se reunia
em assembleia na praça central denominada Ágora, para discutir e deliberar sobre
questões fundamentais da comunidade local, escolhendo o seu governante por
sorteio, e não por eleição, por acreditar ser esse o meio mais legítimo – e isonômico
– de seleção e funcionamento da democracia dita direta. A governabilidade local,
portanto, a ele era confiada.
MONTESQUIEU, analisando as leis que impactavam diretamente a
natureza do governo, já havia alertado que numa democracia:
[...] o povo é admirável quando escolhe aqueles aos quais deve
delegar uma parte de sua autoridade. Ele deve ser determinado
apenas por coisas que não pode ignorar e por fatos que se
encontram à vista, pois todas essas coisas são fatos sobre os quais
se está mais bem informado em praça pública do que um monarca
em seu palácio48.
Forçoso reconhecer que, mesmo no modo da democracia direta
ateniense, dava-se início, portanto, ao processo de governabilidade legitimado pelo
viés da representação política.
TILLY49 aferia a história de modo contrário.
É um feroz contestador à inserção da civilização ateniense como sendo a
precursora na criação e implantação da democracia, de modo que autorizado fosse
o recebimento do status de ancestral das democracias modernas. Assim o faz em
decorrência das deficiências vistas no modo de constituição da representação
política, já que o exercício dos direitos políticos se concentrava nas mãos de poucos
cidadãos, assim considerados os homens adultos, livres e proprietários dos
escravos que integravam aproximadamente a metade da população ateniense.
Para TILLY, a Europa e a América do Norte, especificamente no período
do século XVIII, é que deveriam representar os lugares centrais de implantação da
democracia, por terem sido as pioneiras à criação de instituições que assegurassem
o pleno exercício do direito de participação política na democracia representativa, ao
promoverem significativas mudanças na forma de relacionamento político entre
47
. FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. A Democracia no Limiar do Século XXI. São Paulo: Saraiva: 2001. p. 15.
48 MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Baron de. O Espírito das Leis. Tradução Cristina Murachco.
2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1996. 2ª tiragem: 2000. p. 20. 49
TILLY, Charles. Democracia. Petrópolis/RJ: Vozes, 2013. p. 39-43.
32
Estado e seus cidadãos, consolidando os instrumentos jurídicos que garantiam
efetivamente o engendramento de “consultas amplas, igualitárias, protegidas e
mutuamente vinculantes”.
Entretanto, com todo o respeito, por mais simplista que pudesse revelar o
modo de participação política ateniense, conforme dito por ASSIS BRASIL50, tratava-
se de um modelo que se encontrava no seu estado puro, atravessando período
rudimentar, porém com capacidade plena para corresponder ao paradigma da
democracia moderna.
Assim, o que se verifica das acepções doutrinárias em torno do
nascedouro de uma democracia é que o sistema representativo, provavelmente já
existente, diga-se de passagem, evoluiu pari passu ao desenvolvimento e
maturidade do corpo social, trazendo uma consequência natural aos regimes
democráticos: sua repaginação.
Acredita-se que o modo de representação política engendrada a cada
período democrático tenha sido o veículo motor responsável por essa evolução,
essa repaginação.
Para DALLARI51, a supremacia da vontade popular, enquanto um dos
pilares de sustentação do Estado Democrático, é que teria colocado o problema da
participação popular no governo, “suscitando acesas controvérsias e dando margem
às mais variadas experiências, tanto no tocante à representatividade, quanto à
extensão do direito de sufrágio e aos sistemas eleitorais e partidários”.
Daí porque é possível concluir que a democracia e a representação
política na contemporaneidade caminham juntas, por estrita dependência sua.
A representação política operacionaliza-se pela via da delegação de
poderes que é outorga a uma pessoa por outrem. É um instrumento de substituição
da pessoa na expectativa de que a representante, em seu nome, pratique os atos
que lhes foram autorizados.
Tem seu conceito originário no Direito Privado, especificamente no Direito
Civil, nas causas de sucessão, vale dizer, de substituição da pessoa do falecido com
a convocação de seus herdeiros ou sucessores para que façam jus ao direito à
herança. Sob denominação de mandato, também é um instrumento de uso no
50
ASSIS BRASIL, Joaquim Francisco de. A democracia representativa na República (antologia). Brasília: Conselho Editorial do Senado Federal, 1998, p. 17.
51 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 32ª ed. São Paulo: Saraiva,
2015. p. 150.
33
Direito Comercial, especificamente na realização de negócios por outrem, o legítimo
comerciante, para terceiros52.
A acepção primitiva, privada, do mandato era o de ser um contrato
firmado pelo ônus da amizade, com fundamento na lealdade e fidelidade do amigo, a
exemplo da defesa criminal advogada pelo romano Marco Túlio Cícero, no Pro
Roscio Amerino53 e a ação do jurista romano Prudentissimus Julius Paulus,
conhecido como simplesmente Paulo, no Digesto54.
Na seara do Direito Público, o mandato é a forma utilizada pelo Direito
Internacional Público para que o Estado soberano, por via da representação
diplomática, possa exercer suas finalidades na vida internacional e,
consequentemente, na sociedade dos Estados.
No Direito Constitucional de certas nações, conforme assinala DE
PLÁCIDO E SILVA, ganha contorno de destaque na representação das minorias em
um regime eleitoral, visto que “assegura a certas classes ou organizações políticas,
o direito de elegerem seus candidatos aos corpos legislativos ou eletivos, mesmo
que não consigam o número de votos necessários para composição de uma
maioria”55.
Enfim, a força dos poderes conferidos no mandato é que legitima a
efetividade da representação.
Embora reconheça DALLARI56 haver na doutrina divergência quanto à
acepção do uso do termo “mandato político”, posto considerar imprópria a
transposição de um instituto do direito privado à seara do direito público, a seu ver,
referida denominação é plenamente aceitável, na medida em que alguns mandatos
utilizados para a representação política popular guardavam, também, natureza
contratual, com plena coincidência de origem, como, por exemplo, o mandato
imperativo.
Independentemente deste fato, sustenta o autor, o mandato político
possui características peculiares suficientes a lhe conferir autonomia plena,
52
DE PLÁCIDO E SILVA. Vocabulário Jurídico. 12ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993 (4º vol.). p. 103/104.
53 CARPINETTI, Luís Carlos Lima. A defesa de Sexto Róscio Amerino. Cadernos do CNLF, vol. XII, nº
13. Rio de Janeiro: CIFEFIL, 2009. Disponível em: < http://www.filologia.org.br/xiicnlf/13/02.pdf>. Acesso em: 20-fev-2016.
54 DE PLÁCIDO E SILVA, ibidem, 3º vol., p. 137/147.
55 DE PLÁCIDO E SILVA, loc.cit.
56 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 32ª ed. São Paulo: Saraiva,
2015. p. 158.
34
desvinculada da origem privada, que são: (1) a expressão da vontade popular de
toda a circunscrição eleitoral pelo mandatário onde foi candidato para tomada de
decisões, embora eleito por uma parte deste povo, desvinculando-se, assim, o
mandato do número de votos obtidos pelo mandatário; (2) a autonomia e a
independência do mandatário de decidir em nome do povo, praticando ato que
deverá ser por todos obrigatoriamente atendido; (3) o caráter geral aos poderes
recebidos pelo mandato, dentro da esfera de competência do cargo para o qual o
mandatário foi eleito; (4) a irresponsabilidade do mandatário de dizer porque optou
por uma ou por outra orientação no momento de sua decisão; e (5) a
irrevogabilidade do mandato conferido por prazo determinado, salvo os casos de
aplicabilidade do instituto do recall visto em alguns Estados norte-americanos “e é
de alcance muito restrito, não chegando a desfigurar o princípio geral da
irrevogabilidade”57.
Ganhando novos contornos e naturezas jurídicas distintas a cada
momento de consagração da democracia, quatro núcleos diferenciados de mandato
representativo foram experimentados até se chegar à formula contemporânea
vigente. Foram eles: mandato imperativo, mandato deliberativo, mandato por
investidura e mandato por delegação.
Nas ponderações de CAGGIANO58 é que se busca a síntese do
necessário, suficiente à compreensão e distinção de cada uma dessas formas de
mandato na consolidação da representação política.
A seu ver, a primeira forma de mandato existente era o mandato
representativo imperativo, que consagrava a linha de pensamento de Jean Jacques
Rousseau. Correspondia àquela no qual o representante, ora mandatário, se limitava
a atender a vontade do grupo por ele representado. Pronunciava-se exclusivamente
sobre as questões predeterminadas por esse grupo, assumindo o compromisso de
prestar contas de suas atividades, sob pena de destituição do cargo de mandatário a
qualquer momento. Referido mandatário era concebido como simples procurador
dos interesses da sua comunidade nomeante59.
57
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 32ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 158.
58CAGGIANO, Monica Herman Salem. Sistemas Eleitorais X Representação Política. Brasília: Senado
Federal, Centro Gráfico, 1987. p. 17-25. 59
Id. FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 36ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010. p. 112.
35
A segunda forma de mandato seria o mandato deliberativo, sustentado na
doutrina do abade Emmanuel Joseph Sieyès. Introduzida era a ideia de mandato
livre, pautada na doutrina da soberania nacional, de representação de uma
coletividade e não mais de um cidadão. Sua origem decorria dos movimentos
revolucionários do século XVIII, consistindo na apresentação de um mandato
“desvinculado da vontade do grupo que elege o representante, podendo este decidir
as questões nacionais livremente, sem imposições quanto ao atendimento de
instruções de antemão estabelecidas”60. Para esse modelo representativo, na voz de
CANOTILHO61, “a representação política tem como ponto de partida a teoria da
soberania nacional e a soberania nacional conduz ao governo representativo”.
A terceira forma de mandato representativo, prossegue CAGGIANO62,
seria o mandato por investidura, que ganhava vez a partir da institucionalização do
partido político e da importante missão que assumia como colaborador direto no
processo de seleção do governante. Trazia, à guisa de linha de comando, uma nova
forma de exteriorização das opiniões pelo cidadão, qual seja, a de jungir a
composição governamental não mais às ordens exclusivas dos eleitos, mas também
às ordens ditadas por seus partidos. Assim, reforçou a autora63, ex vi:
Ao Partido, no novo contexto, compete: não só o enquadramento dos
eleitores/representados como o dos eleitos/representantes, os dois
polos da equação que se estabelece no jogo da conquista e do
exercício do poder no ambiente das sociedades.
De outro lado e com fundamento nas lições de Maurice Hauriou,
CAGGIANO complementou informando que a delegação de poderes da Nação para
o Governo não era suficiente para equilibrar e harmonizar a comunidade social,
senão a articulação de dois poderes distintos e opostos, o majoritário, ou da Nação,
e o poder minoritário, ou do Governo. Melhor dizendo:
(...) o representante resta investido do poder de querer pelo todo,
incorreto qualquer vínculo jurídico entre a vontade do eleitor,
expressa pelo sufrágio, e a atuação do parlamentar. Como explicam
60
CAGGIANO, Monica Herman Salem. Sistemas Eleitorais X Representação Política. Brasília: Senado Federal, Centro Gráfico, 1987. p. 17.
61 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª
ed.Coimbra: Almedina, 2000. p. 113. 62
CAGGIANO, loc.cit. 63
CAGGIANO, ibidem, p. 17-18.
36
Hauriou – Gicquel – Gélard, ao examinarem a posição do insigne
mestre de Toulouse, os representantes não são comparáveis a
mandatários, aproximando-se mais da figura dos gerants d’affaires,
que podem ser submetidos a controles e, sobretudo, afastados pelo
titular – a Nação64.
A quarta e última expressão dada pelos germânicos à representação
política, aos mandatos representativos, extraiu-se da doutrina de Georg Jellinek e
Léon Duguit, firmada a partir da ideia de instituição jurídica, exatamente onde a
pessoa coletiva passava a ser defendida por órgãos – pessoas jurídicas –
incumbidas do exercício de uma função específica a favor daquela coletividade
social. Uma visão positivista do mandato representativo, fundamentada na
solidariedade social, que via no Parlamento a configuração de órgão direto da Nação
e indireto do Estado65.
Assim, em síntese, verifica-se que, com o aperfeiçoamento do processo
de representação política, as Instituições Políticas acabaram culminando no palco
imediato à tomada de decisão dos negócios públicos. Devem atuar em favor da
coletividade, mediante o exercício de mandato político por representantes
devidamente eleitos, sob a condução natural de um partido político.
Na visão de ASSIS BRASIL66:
O mandato político é uma verdadeira procuração. Se o mandatário
ou procurador não cumprir bem os seus deveres, se não curar
convenientemente dos negócios do mandante, este tem o direito
incontestável de cassar-lhe o mandato, de retirar-lhe a sua confiança,
de anular a procuração.
Aliás, vale registrar, que o faz – o representante político – por via da lei.
A lei, em todos esses mecanismos de representação política foi, é, e
sempre será o veículo condutor à definição da organização política de um Estado e,
consequentemente, à gestão dos atos de política pública. Sob responsabilidade do
representante eleito, preferentemente em qualquer das cadeiras do Parlamento, está
a elaboração das leis e sua inserção no ordenamento jurídico.
64
CAGGIANO, Monica Herman Salem. Sistemas Eleitorais X Representação Política. Brasília: Senado Federal, Centro Gráfico, 1987. p. 24.
65 CAGGIANO, ibidem, p. 24-25.
66 ASSIS BRASIL, Joaquim Francisco de. A democracia representativa na República (antologia).
Brasília: Conselho Editorial do Senado Federal, 1998. p. 84.
37
Afinal, enquanto norma jurídica escrita, obrigatória e coercitiva, ou seja,
jungida ao cumprimento e obediência por todos, tem sua formulação derivada de ato
solene firmado por aquele que cumpre mandato, que é “autoridade constituída, em
função de um poder, que lhe é delegado pela soberania popular, que nela reside a
suprema força do Estado”67.
Na esteira do regime político e sua concretização, MONTESQUIEU68, ao
dissertar sobre a importância das leis na democracia, já pontuava a importância
daquelas atinentes ao exercício do direito de sufrágio, informando que “é tão
importante regulamentar como, por quem, para quem, sobre o que os sufrágios
devem ser dados, quanto é numa monarquia saber qual é o monarca e de que
maneira deve governar”.
E, KELSEN69, in verbis:
A democracia moderna é o sistema de produção das normas da
ordenação que confia tal tarefa a um corpo (parlamento) eletivo, com
a base mais ampla possível (sufrágio universal) e com método
eleitoral proporcional (mesmo sem pretensões de representação) e
que funciona, via de regra, segundo o princípio da maioria simples.
Consoante assinalado por ASSIS BRASIL70, não obstante chamasse
Democracia ao “(...) facto de tomar o povo parte effectiva no estabelecimento das
leis e na designação dos funcionários que têm de executal-as e de administrar a
cousa publica” [sic], o povo, tomado em massa, se mostrava incapaz de fazer leis,
governar e, especialmente, administrar seus negócios públicos, senão pelo corpo de
representantes por ele eleito.
Afinal, BOBBIO também reforça que o comportamento eleitoral depende
da lei para a sua existência, e, consequentemente, da regulamentação do processo
eleitoral para que o jogo político democrático se operacionalize71.
67
DE PLÁCIDO E SILVA,. Vocabulário Jurídico. 4v. Rio de Janeiro: Forense, 1993, pág. 62. 68
MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Baron de. O Espírito das Leis. Tradução Cristina Murachco. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1996. 2ª tiragem: 2000. p. 7.
69 KELSEN, Hans. A democracia. Tradução de Ivone Castilho Benedetti [et al.]. 2ª ed. São Paulo:
Martins Fontes, 2000. p. 13. 70
ASSIS BRASIL, Joaquim Francisco de. A democracia representativa na República (antologia). Brasília: Conselho Editorial do Senado Federal, 1998. p. 15.
71 BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. 6ª ed. Tradução de
Marco Aurélio Nogueira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997 (Coleção Pensamento Crítico: vol. 63). p. 68-69.
38
Assim, nessa senda, são por essas razões que acabaram recebendo o
Parlamento – enquanto local apropriado às discussões e deliberações de questões
relacionadas à vida social e ao controle das ações governamentais – e os partidos
políticos – “(...) corpos formados a partir do tecido social que desempenham a
função de canalizar as aspirações e projetos políticos de determinada gama de
indivíduos, organizando-os para o fim de alcançar o exercício direto do poder”72 –
visibilidades singulares no contexto do sistema eleitoral-representativo.
2.2.1 A importância dos Parlamentos e a presença dos Partidos Políticos
Procurando contextualizar historicamente os Parlamentos democráticos,
sua origem, ao menos, formação embrionária, LEMBO73, na síntese do necessário,
elucidou, in verbis:
Lutero rompe com o Papado e Calvino elabora o modelo
deuteronômico de governo, que se rege, consequentemente, pelo
livro do Deuteronômio, integrante do Testamento Hebreu.
Essa forma de governo – deuteronômico – se estabelece por meio de
assembleias, os presbitérios. Essa figura foi a célula dos parlamentos
democráticos da modernidade, ou seja, das câmaras municipais,
assembleias estaduais, Câmara Federal e Senado da República, na
formatação federativa brasileira.
Vê-se, assim, que muito antes da clássica doutrina da Tripartição de
Poderes do Estado, propagada por Montesquieu, sob a inspiração dos filósofos
Aristóteles e Locke, o Parlamento já havia ganhado forma, ainda que de modo
tímido.
Sua existência, por pressuposto, tinha uma razão única: a de abrigar os
diversos grupos que a sociedade começava a desenvolver para que regidos fossem
os seus negócios públicos e em seu nome. Ou seja, os grupos intelectuais,
sociedades ou associações populares de diversas ordens, inclusive de natureza
sindical, que se reuniam para compartilhar tendências políticas similares, adstritas
72
TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 758. 73
LEMBO, Claudio. A pessoa: seus direitos. Barueri/SP: Manole, 2007. p. 24.
39
por vezes aos problemas das mesmas regiões ou, simplesmente, angariar fundos
para a realização de campanhas políticas futuras. Era como se denominavam “as
facções que dividiam as antigas repúblicas e os clãs que se agrupavam em torno do
Condottiere na Itália renascentista”74.
Personificado pelo Estado de Direito no Poder Legislativo, a
responsabilidade do Parlamento consiste em editar leis, por via dos representantes
nele contidos e segundo a confiança recebida do povo que os elegeu.
Afinal, já garantia LOCKE75 que “o poder legislativo é o poder supremo
em toda comunidade civil, quer seja ele confiado a uma ou mais pessoas, quer seja
permanente ou intermitente”; portanto, tem a competência de legislar na medida
estabelecida pelo povo.
Os partidos políticos foram constituídos nesse espectro político,
consolidando a evolução da representação política proporcionada pelos grupos
seletivos e organizados que a própria sociedade criou.
Ademais, conforme rememorado por FERREIRA FILHO, o
reconhecimento e a legitimidade de grupos políticos, enquanto pessoa jurídica
portadora de direitos e obrigações, na qualidade de corpos intermediários à relação
Estado “versus” cidadão, para em nome do povo e pelo povo realizar o governo para
o povo, é traço característico da Democracia ocidental contemporânea76.
Referendavam-se, segundo CAGGIANO, como o “fiel canalizador das
tendências básicas da vontade nacional e relevante instrumento de seleção dos
representantes do povo” no funcionamento e na estruturação do poder político,
justamente porque, conforme observações de Karl Loewenstein, consistiria o partido
político o fator indispensável ao poder e, de outro lado, consoante sustentado por
Pinto Ferreira, reclamava a democracia, inevitavelmente, a composição de um
Estado de Partidos para seu regular desenvolvimento77.
74
CAGGIANO, Monica Herman Salem. Sistemas Eleitorais X Representação Política. Brasília: Senado Federal, Centro Gráfico, 1987. p.181-182.
75 LOCKE, John. Segundo Tratado sobre o Governo. Tradução de Magda Lopes e Marisa Lobo da
Costa. Editora Vozes: [s.d.] (Clube do Livro Liberal). p. 71-74. 76
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Os Partidos Políticos nas Constituições Democráticas: o Estatuto Constitucional dos Partidos Políticos no Brasil, na Itália, na Alemanha e na França. Imprensa da Universidade de Minas Gerais: Revista Brasileira de Estudos Políticos; Estudos Sociais e Políticos, vol. 26, 1966. p. 52.
77 CAGGIANO, Monica Herman Salem. Finanças Partidárias. 1980. Dissertação (Mestrado em Direito
Constitucional) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 1980. p. 1-14.
40
Pela oportunidade, não se poderia deixar de trazer à colação o
pensamento de JEHÁ em face do momento de formação dos partidos políticos. A
seu ver, não teriam nascido por derivação obrigatória dos Parlamentos, embora com
eles guardassem relação preferencial, mas da reivindicação pela criação de
instituições representativas, no bojo das tendências de opiniões, clubes populares,
associações de pensamento e grupos parlamentares78.
Sem embargo ao posicionamento apresentado, contudo, o sentimento
que se abstrai, materializado em igualdade de condições para todos os estudiosos, é
que os partidos políticos teriam se desenvolvido e evoluído no bojo da
representação política, conquistando espaços cada vez mais significativos no
Parlamento e se tornando, dentro do cenário político estatal democrático, a principal
peça do xadrez.
De acordo com o assinalado por FERREIRA FILHO79, assumiram uma
função delicada e importante como canal oficial de expressão da opinião pública,
capaz de mostrar ao eleitorado quais as opções políticas possíveis e por quais
pessoas seriam capazes a sua realização.
Independentemente do regime de governo implantado, quiçá o
democrático, a presença dos partidos políticos se impõe tal qual condição sine qua
non à animosidade do objetivo principal de qualquer sistema: legitimar a conquista
do Poder.
Afinal, não apenas “os regimes democráticos contemporâneos têm como
um de seus principais requisitos a liberdade de organização partidária”80, assim,
também, os regimes autocráticos contemporâneos, mesmo de base totalitária,
ganharam novos aliados: a institucionalização dos partidos únicos.
De outro lado, não obstante sejam bastante criticados, porque expostos
estariam, ou efetivamente estão, à possível formação de oligarquias internas, isto é,
sob comando limitado às ordens de alguns poucos e poderosos representantes que
o integram ou, então, expostos estariam aos processos de corrupção ou como
instrumentos de poder econômico, na qualidade de objeto de manipulação pelo
78
JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 19.
79 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 36ª ed., São Paulo:
Saraiva, 2010. p. 113 e 150. 80
SCHMITT, Rogério. Partidos Políticos no Brasil (1945-2000). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000. p.7.
41
financiador que assume a propagação de sua imagem e de seus integrantes, os
partidos políticos contém virtudes que não merecem ser desconsideradas.
JEHÁ81 revigora pensamento de Hofmeister ao destacar que “em todos os
lugares, os partidos políticos fazem parte do grupo de instituições decisivas dos
sistemas democráticos”, do mesmo modo que o de Hans Kelsen ao enfatizar que “só
a ilusão ou a hipocrisia pode acreditar que a democracia seria possível sem partidos
políticos”.
Independentemente das considerações contrárias que se queira firmar,
face à tendência de defesa de interesses particulares e não nacionais –
consideradas por BOBBIO82 como falsas, senão ridículas, “cada membro do
parlamento representa antes de tudo o próprio Partido, assim como, num estado de
camadas, o delegado representava antes de tudo os interesses da própria camada”
–, não havia outra alternativa factível para o canal da representação política.
BOBBIO vai além. Sem desmerecer a importância do Parlamento e o
princípio da representação política nele assentado, diz que o Estado representativo
propriamente dito é aquele no qual “as principais deliberações políticas são tomadas
por representantes eleitos, importando pouco se os órgãos de decisão são o
parlamento, o presidente da república, o parlamento mais os conselhos regionais
etc.”83.
Nas considerações de JEHÁ84:
Os partidos políticos, neste diapasão, surgem como alternativa à
racionalização do processo de governo e de identificação entre
eleitor e eleito. Entretanto, para se firmar como alternativa válida, o
partido deve ser capaz de se depurar de seus vícios e ostentar uma
estrutura interna democrática e livre de corrupção. Deve ainda ser
financiado nos termos da lei, respeitar os demais partidos e os
direitos fundamentais do homem, além de atuar permanentemente
em prol da formação política do povo, com fundamento de ideais
democráticos e buscando o poder pelo convencimento e pelo voto e
nunca pela força.
81
JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 27.
82 BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. 6ª ed. Tradução de
Marco Aurélio Nogueira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997 (Coleção Pensamento Crítico: vol. 63). p.138.
83 BOBBIO, ibidem, p. 44.
84 JEHÁ, loc.cit., p. 27-28.
42
Para ele, trata-se do jogo político democrático. A democracia, por
característica própria, exige consenso na periodicidade de eleições livres por
sufrágio universal, destacando-se os partidos políticos como seus atores principais e
o processo eleitoral o modo principal de se fazer política.
Em resumo, portanto, mesmo com todas as vicissitudes históricas
enfrentadas, tendo inclusive significado organizações hostis e de existência
duramente criticada até o advento do período revolucionário do século XVIII, pelo
próprio desenho do Estado Moderno, que se seguia desprovido da figura do
soberano e substituído pela do povo, as agremiações partidárias foram tomando
formas e funções cada vez mais importantes no processo da representação política,
assumindo corpo de partidos políticos e o cerne da operacionalização do poder no
cenário político.
Nesse sentido, consoante explicam CAGGIANO e LEMBO85, as virtudes
conquistadas pelos partidos políticos foram as de verdadeiros responsáveis por
assegurar uma seleção, ainda que ilusória, entre diferentes alternativas; oferecer
certa organicidade na administração do Estado; realizar sondagens responsáveis do
eleitorado; reduzir a complexidade da escolha entre diversas opções eleitorais e,
enfim, exercer o papel de mediador na política, funcionando como sistema de
frenagem das pressões eleitorais sobre o polo governamental. E mais:
consubstanciaram-se, efetivamente, num dos principais elementos de
robustecimento das práticas democráticas, já assinaladas na doutrina de Hans
Kelsen, aliás, precursora do reconhecimento à existência de um Estado de Partidos.
2.3 A DEMOCRACIA BRASILEIRA
O sentimento democrático em solo brasileiro ganhou espaços com as
forças liberais reclamadas em face da descentralização e não sufocamento das
autonomias regionais sedimentadas desde o período colonial. A forma unitária de
85
CAGGIANO, Monica Herman Salem; LEMBO, Cláudio. Dos Direitos Políticos. In TANAKA, Sônia Yuriko Kanashiro (Coord.); PIRES, Antônio Cecílio Moreira et al. Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2009, p.290/356. p. 328-329.
43
Estado e o regime monárquico de Governo estavam com os idas contados.
Sobreviveram até 188986.
Conforme lembrado por AFONSO DA SILVA87, os ideais republicanos já
podiam ser vistos na Inconfidência Mineira e Revolução Pernambucana de 1817.
Ganharam força com os federalistas que surgiram na Constituinte de 1823 e
permaneceram durante todo o Império. Mesmo após a efetivação de várias
rebeliões, tais quais a “Balaiada”, a “Cabanada” e a “Sabinada”, a monarquia
federalista, também pensada em 1831, não foi conquistada, mas, sim, apenas certa
descentralização do poder com o Ato Adicional de 1834, embora esvaziado com a lei
de interpretação de 1840. Ganhou brilho com a “República de Piratini”, ressurgindo
com maior ênfase em 1870.
Assim, embora reclamada há quase sessenta anos pelos liberais, durante
praticamente todo o período imperial, a democracia, vista “como regime político que
melhor assegura os direitos humanos fundamentais”, se desenvolveu na República,
especificamente na estruturação do Estado pelo princípio constitucional do
federalismo88.
De outro lado, analisando-se por seu vigor, da mesma forma que os
casos analisados por TILLY89, o Brasil, durante todo o seu processo de
86
Decreto nº 1, de 15 de novembro de 1889: “Proclama provisoriamente e decreto como fórma de governo da Nação Brazileira a Republica Federativa, e estabelece as normas pelas quaes se devem reger os Estados Federaes” [sic].
87 AFONSO DA SILVA, José. Curso de Direito Constitucional Positivo. 38ª ed. São Paulo: Malheiros,
2015. p. 78-79. 88
AFONSO DA SILVA, José. Curso de Direito Constitucional Positivo. 38ª ed. São Paulo: Malheiros, 2015. p. 79.
89 TILLY, Charles. Democracia. Petrópolis/RJ: Vozes, 2013.p.15-92. Referido autor utiliza-se da
classificação dos direitos políticos e liberdades civis num Estado de Direito, proferidos pelo organismo Freedom House, que é uma instituição americana, nova-iorquina, de monitoramento da democracia nos países de reconhecimento pleno, para classificar o grau democrático de um Estado. Fundamentalmente ele faz um comparativo dos índices apresentados pelo Freddom House ao longo da evolução democrática de cada país, em particular, de forma ativa e constante, para então diagnosticar a qualidade da democracia. A seu ver, é necessário analisar a extensão na qual o Estado se comporta em face das demandas expressadas por seus cidadãos, mediante a checagem dos seguintes elementos: (1) amplitude, ou seja, se os direitos políticos são extensivos a um pequeno grupo social, embora todos se relacionem com o Estado, ou a todos, com amplo resguardo ao direito de cidadania; (2) igualdade, vale dizer, se apenas uma categoria de cidadãos é enquadrada em ordens hierarquizadas bem definidas e com obrigações e direitos muito desiguais do todo, ou se todos, naturais e naturalizados, possuem os mesmos direitos; (3) proteção, isto é, se pelo Estado é usado o poder para punir inimigos e premiar amigos ou se todos os cidadãos são tratados com direito ao processo público e correto; e (4) caráter mutuamente vinculante, quer dizer, se persuasão, ameaças ou uso de influência de terceiros são usados para se conseguir alguma coisa ou se a concessão de benefícios aos cidadãos são proporcionadas pelo Estado mediante obrigações claras. Como bem destacou: “Nessa perspectiva simplificada, um regime é democrático na medida em que as relações políticas entre o Estado e seus cidadãos engendram consultas amplas, igualitárias, protegidas e mutuamente vinculantes. A
44
democratização, registrou graus de desdemocratização, dois mais significativos nos
períodos de 1930 a 1945, quando da regência do governo por Getúlio Vargas que
beirava grande semelhança a uma forma de governo autoritário, e 1964 a 1985,
durante o predomínio do regime militar90.
Independentemente deste fato, a liberdade de participação nas decisões
políticas foi plenamente resgatada, segundo princípios e ideais consolidados na
ordem constitucional e mantidos vivos até os dias de hoje, reafirmando o otimismo
de TILLY de que a qualquer tempo é possível o retorno do processo democrático.
A representação política em solo brasileiro, do contrário, sempre existiu,
acompanhando a democracia desde os seus primórdios, embora sob várias formas
de participação política.
CARVALHO91 assinalou que a monarquia, ao seguir a direção europeia
de natureza monárquica na época da independência e não a sugestão republicana
do modelo norte-americano, subsidiou-se não apenas da tradição colonial
portuguesa, assim como das pressões da Santa Aliança para se formar, mas
também da influência mediadora da Inglaterra, institucionalizando a ideia do
liberalismo francês pós-revolucionário da monarquia constitucional que, por si só,
exigia “a presença de um governo representativo baseado no voto dos cidadãos e
na separação dos poderes políticos”.
A representação política no Brasil remonta o período colonial, embora
tratada com mais enfoque a partir do Império.
A crítica feita por CARVALHO92, por exemplo, é que o sistema de
representação política, garantido no Império, não diferia do sistema praticado no
período colonial, já que não houve qualquer alteração na condição de ser cidadão.
Os cidadãos da época, em sua grande maioria, mantinham-se sem saber qual era o
significado de um governo representativo; vale dizer, mais de 90% da população no
democratização significa um movimento real no sentido de promover uma consulta mais ampla, mais igualitária, mais protegida e mais vinculante. Então, obviamente, a desdemocratização significa um movimento real no sentido de uma consulta mais estreita, mais injusta, menos protegida e menos vinculante.” (TILLY, op.cit., p.28).
90 A destacar o período conhecido como a Era Vargas, de governabilidade centralizada na pessoa do
Presidente da República, Getúlio Vargas, e que se consolidaram, resumidamente, no Governo Provisório (1930 a 1934), Governo Constitucional (1934 a 1937) e Estado Novo (1937 a 1945); na sequência, o Golpe de Estado de 1964 que deu início à instauração de um regime militar, cujo fim se deu apenas em 1985.
91 CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 2ª ed., Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2002. p.28/29. 92
CARVALHO, loc.cit.
45
Império vivia em áreas rurais e era influenciada pelos proprietários que, em sua
grande maioria, se inseriam no patamar de 85% da população considerada
analfabeta. Os votantes urbanos, em sua maioria, “eram funcionários públicos
controlados pelo governo”93. Todos deviam subserviência ao tratamento exigido pela
Guarda Nacional, que era formada por oficiais indicados pelo governo central e
extraídos da elite local.
A consequência do processo eleitoral, na visão do autor, era inevitável:
O votante não agia como parte de uma sociedade política, de um
partido político, mas como dependente de um chefe local, ao qual
obedecia com maior ou menor fidelidade. O voto era um ato de
obediência forçada ou, na melhor das hipóteses, um ato de lealdade
e de gratidão.94
PIMENTA BUENO95 não deixava dúvidas quanto à permanência da teoria
da representação política na fase imperial. Pertencia a representação nacional ao
Imperador e à Assembleia Geral Legislativa tal qual condição lógica e nacional.
Aquele, assumindo a representação do poder, “a magestade da nação, no imperio e
fóra delle” [sic] e esta, a expressão da soberania nacional, com a incumbência de
criar o direito, as obrigações e as penas, regulando os outros poderes e os cidadãos,
enfim, a sociedade.
De fato os direitos políticos do cidadão vieram regulados na própria
Constituição Federal outorgada em 25 de março de 1824. “Podiam votar todos os
homens de 25 anos ou mais que tivessem renda mínima de 100 mil-réis” e fossem
cidadãos ou, ainda, que provassem independência econômica aos 21 anos,
cumulativamente com a condição de ser pai de família, oficial militar, bacharel,
clérigo ou empregado público. Excluídos, obrigatoriamente, os escravos, que não
eram considerados cidadãos, e as mulheres.
Nas eleições gerais, o processo eleitoral indireto era feito em dois turnos.
Primeiramente escolhidos eram os eleitores pelos votantes, respeitada a “proporção
de um eleitor para cada 100 domicílios”. Na sequência, os eleitores com renda de
200 mil-réis elegiam os deputados para o exercício de mandato de quatro anos, e os
93
CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 2ª ed., Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2002. p.28/29. 94
CARVALHO, ibidem, p. 35. 95
PIMENTA BUENO. José Antonio. Direito Publico Brazileiro e analyse da Constituição do Imperio. Rio de Janeiro: Typographia Imp.e Const. de J.Villeneuve E C.: 1857. p.27-48.
46
senadores, que ainda passavam por uma lista tríplice selecionada pelo Imperador
segundo a opção do candidato de sua preferência, para assumirem o exercício de
um mandato vitalício. As eleições locais de vereadores e juízes de paz ocorriam em
um só turno, enquanto os presidentes das províncias eram nomeados pelo governo
central96.
Satisfatória ou não, a democracia representativa brasileira existia, sendo
inaugurada a partir de um modelo censitário e restrito de sufrágio, ao menos, e com
certeza, no período imperial.
Outra crítica chancelada pela doutrina, dentro desse período histórico, diz
respeito à incerteza de se realmente autônomos eram os poderes de regência do
Estado nas funções constitucionais recebidas.
É que embora existisse a clara subdivisão dos poderes Executivo,
Legislativo e Judiciário no Império Brasileiro, a regência de toda a organização
política se consolidava no poder central do Imperador, com quase exclusividade.
Muito além de escolher e nomear os dirigentes das províncias, escolher e
nomear o chefe de polícia, provendo-lhe de atribuições de polícia local e de funções
judiciais até 1870, e nomear os juízes de direito e promotores públicos a partir desta
data, ao Imperador a ordem constitucional também conferia poderes excepcionais,
nominalmente constituídos como Poder Moderador para dissolver a Câmara ou adiar
ou convocar sessões, bem como escolher, em lista tríplice, os senadores,
interferindo diretamente no Poder Legislativo. Pelo Poder Moderador, os
magistrados podiam ser suspensos, os Ministros de Estado, então nomeados,
podiam ser exonerados a qualquer tempo e as províncias podiam ser regidas e
controladas segundo seus desígnios97.
Apenas para registrar, a província é a forma como o Estado se subdividia
no Império. Conforme bem destacado por PIMENTA BUENO98, não tinha o condão
de interferir na unidade do Estado, mas distribuir os órgãos da administração a fim
de que a extensão de centros de serviços fossem mais proximamente
disponibilizados aos seus habitantes. In verbis:
96
CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 2ª ed., Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. p.32.
97 AFONSO DA SILVA, José. Curso de Direito Constitucional Positivo. 38ª ed. São Paulo: Malheiros,
2015. p. 78-79. 98
PIMENTA BUENO. José Antonio. Direito Publico Brazileiro e analyse da Constituição do Imperio. Rio de Janeiro: Typographia Imp.e Const. de J.Villeneuve E C.: 1857. p. 22.
47
A divisão do imperio em provincias, qual existia ao tempo em que foi
promulgada a nossa lei fundamental, assim como a actual, não é
nem devia ser de ordem constitucional; não são Estados distinctos,
ou federados, sim circumscripções territoriaes, unidades locaes, ou
parciaes, de uma só e mesma unidade geral. São centros de vida, de
ordem, e de acção administrativa, partes integrantes do imperio,
como a constituição expressamente reconhece; podem pois ser sub-
divididas segundo exigir o bem do Estado. [sic]
De fato, PIMENTA BUENO lembrou que a separação do poder,
notadamente do poder legislativo, se justificava por não ser adequado acumular o
poder de quem cria a lei com o poder de quem executa a lei, tanto no sentido geral
ou coletivo quanto no sentido do interesse individual ou civil, sob pena de se
consagrar numa acumulação irracional. Nas suas palavras, portanto,
Dividem-se, e separão-se para evitar a confusão, o olvido dos
negocios do Estado, e dos direitos nacionaes, para impedir a
precipitação, o erro, o excesso; para que se aproveitem todas as
intelligencias e forças na elevação do edificio social, no
desenvolvimento da prosperidade brazileira. São actividades
parallellas que convergem para uma só e gloriosa missão. [sic]99
E, de outro lado, sob a ótica do autor, devia se harmonizar com os demais
poderes, conferindo, como o fez à Coroa, assento nas funções desempenhadas por
suas duas câmaras de representação política, a de deputados e a de senadores ou
senado, in verbis, “assim, e com toda a sabedoria, foi o poder legislativo brazileiro
delegado á assembléa geral com a sancção do imperador” [sic]100.
Independentemente de uma análise mais cuidadosa em face da
interferência de um poder sobre o outro, já que este trabalho não tem o condão de
explorar essa temática, o que se quis destacar nas considerações acima é a
ressonância no polo da representação política que o Parlamento teve desde o início
do processo de descolonização brasileira.
Não se movimentou sozinho, mas com a integração de partidos políticos,
refletindo a instituição política e coletiva que é e que, na visão de PIMENTA
99
PIMENTA BUENO. José Antonio. Direito Publico Brazileiro e analyse da Constituição do Imperio. Rio de Janeiro: Typographia Imp.e Const. de J.Villeneuve E C.: 1857. p.33-36.
100 PIMENTA BUENO, ibidem, p. 49-50.
48
BUENO101, necessariamente, deve ser “composto de ramos diversos e
independentes”. Por motivar este trabalho de pesquisa, os partidos políticos em solo
brasileiro constituir-se-ão objeto de análise em capítulo próprio e subsequente, com
destaque tanto para a sua formação quanto para o comportamento do sistema
partidário a cada regime jurídico implantado.
101
PIMENTA BUENO. José Antonio. Direito Publico Brazileiro e analyse da Constituição do Imperio. Rio de Janeiro: Typographia Imp.e Const. de J.Villeneuve E C.: 1857. p. 48.
49
3. PARTIDOS POLÍTICOS
Após breves considerações em face do ambiente democrático, com
destaque, em especial, à importância que os partidos políticos assumem no espectro
do alicerce de sua sustentação que é a representação política, propõe-se, neste
capítulo, iniciar uma pesquisa sobre sua formação, com abordagem às formas de
institucionalização, tratamento na ordem jurídica, organização e funcionamento.
Propõe-se, assim, a divisão dos trabalhos em três subcapítulos: origem e
institucionalização, os processos de oligarquização e a operacionalização de um
sistema de partidos.
3.1. ORIGEM E INSTITUCIONALIZAÇÃO
Consoante destacado por ARINOS102, o momento correto à recepção da
terminologia “partidos políticos” enquanto verdadeiros organismos políticos de
representação popular, tal qual concebida na atualidade, remonta o último quartel do
século XVII: “(...) em Atenas, a organização dos poderes do Estado nada tinha a ver
com partidos, nem com algo que deles se aproximasse”.
De modo que, o uso da expressão “partido democrático” ou “partido
popular”, por oposição a “partido dos ricos” ou “partido dos nobres” nas traduções
feitas à Constituição de Atenas, por exemplo, em verdade, eram figurativas.
A governabilidade se firmava pela Assembleia do Povo, que era o órgão
da democracia direta onde todos politicamente capazes atuavam, pela presença do
Conselho dos Quatrocentos (depois dos Quinhentos) e dos Archontes que
significavam, respectivamente, espécies de assembleia representativa e de poder
executivo. “Foi sob o reinado da rainha Ana (1702-1714) que se afirmou com mais
segurança a necessidade de ser partidário o próprio Governo, o princípio de
governar a Coroa com o Partido que, no Parlamento, representasse maior parcela
da opinião”103.
102
ARINOS DE MELO FRANCO. Afonso. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1980. p. 9.
103 WILLIAM ANSON. Loi et Pratique Constitutionnelles de l’Angleterre. Tr.Fr. Ed. Briard, Paris, 1905, vol II, p. 45 e ss. apud ARINOS, op.cit. p. 12.
50
Na Inglaterra, em meados do século XVI, a nomenclatura “partidos”
também se figurava expressão doutrinária entendida como, simplesmente, a mais
adequada, dada a falta de outra melhor. Isto porque os reveses ingleses denotavam
conspirações e lutas contra as prerrogativas da Coroa e a defesa dos direitos do
Parlamento, significando, em verdade, reações sociais de natureza religiosa e não
política, “de reação do puritanismo contra o precedente predomínio papista nos
negócios do Estado”104.
Acreditava ARINOS105 que as forças sociais e históricas eram muito mais
amplas que as engendradas pelas lutas políticas de um partido político propriamente
dito, não obstante a formação dos dois grandes grupos de disputa pelo poder, que
seriam os “tories” (os representantes do remanescente feudalismo agrário e
defensores das prerrogativas régias) e os “whigs” (os representantes urbanos e
capitalistas, que embora também monarquistas, reclamavam por interesses novos e
liberais), evidenciassem, de fato, mecanismos embrionários à manifestação da ideia
de Partido Conservador e de Partido Liberal que viriam a se consagrar apenas no
século XIX, ainda assim, após longo período de adaptação e, inclusive, instalação
do Reform Bill de 1832.
Mas, afinal, quando e de que modo surgem os partidos políticos?
DUVERGER106 teoriza duas formas distintas para que uma base
partidária se origine e produza efeitos plenos no campo político: uma interna, ou
como por ele próprio dito “de criação eleitoral e parlamentar”; outra externa, vale
dizer, “de criação externa”.
Para o autor, a criação do partido político sob o ciclo “eleitoral e
parlamentar” guarda espectro na ligadura intrínseca e imediata que tem com os
grupos parlamentares – organismos originados das antigas “facções” ideológicas da
sociedade, não organizadas e de natureza local à defesa de seus interesses
próprios – e seus comitês eleitorais, nesta exata sequência.
Ou seja, grupos da elite parlamentar que se reuniam em Assembleias
hereditárias ou cooptadas, tanto em uma Câmara autocrática quanto em uma
104
ARINOS DE MELO FRANCO. Afonso. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1980. p. 11
105 ARINOS, ibidem.
106 DUVERGER, Maurice. Os Partidos políticos. 2ª ed. Tradução de Cristiano Monteiro Oiticica. Revisão técnica de Gilberto Velho. Rio de Janeiro: Zahar; Brasília: Universidade de Brasília, 1980. p.19-33.
51
Câmara eleita ou em qualquer lugar107 para conduzirem matérias eleitorais e
parlamentares.
E, ainda, comitês eleitorais, que passavam a ser obrigatoriamente
constituídos sempre quando verificado um alargamento do sufrágio popular (do
sufrágio restrito, controlável, para o sufrágio universal) e, com isso, verificada fosse a
necessidade de se criar locais próprios e mais próximos para controlar os anseios
trazidos pelos novos eleitores que, fundamentalmente, reclamavam por sentimentos
sociais igualitários e eliminação das elites tradicionais. A criação desses comitês
eleitorais consistiam, tendencialmente, em iniciativa da esquerda que, além de
oportunizar à sociedade novos núcleos elitizados, demonstrava-lhes também deter o
mesmo prestígio dos antigos.
Assim, explica DUVERGER108, que o século XIX seria o período de
criação desses comitês eleitorais, exatamente quando, por exemplo, na Inglaterra,
não era bem quisto um candidato que se apresentasse sozinho para o sufrágio
universal frente a outro indicado por um grupo, ainda que de apenas amigos.
De qualquer modo, sustentava que era necessária a integração dessas
duas “células mater”, grupos da elite parlamentar pré-existentes, interessada em se
manter no cenário eleitoral, e comitês eleitorais para a criação de um partido político
e, consequentemente, de um sistema de partidos devidamente organizado.
De outro lado, DUVERGER109 também se deparou com a existência de
grupos da sociedade civil que, diferentemente dos grupos de “criação eleitoral e
parlamentar”, eram preexistentes e organizados, mas não desempenhavam
atividades de matéria eleitoral e parlamentar. Eram grupos que acabavam se
tornando, posteriormente, os “braços” de representação política direta dos seus
segmentos, vale dizer, das categorias de base, “de massas”, de trabalhadores.
Preferiu, assim, denominá-los como grupos “de criação externa”.
Tiveram aparição com mais intensidade a partir de 1900, dentro de uma
concepção de partido do tipo moderno, e, curiosamente, com características mais
centralizadas, coerentes e disciplinadas do que os partidos originados no ciclo 107
Por exemplo, quando a transferência das reuniões das Assembleias provinciais francesas em torno da Constituinte de 1789 havia sido de Versalhes para Paris, os deputados bretões não tiveram outra alternativa senão trocar as salas de café pelo refeitório de um convento, dada a ausência de outro lugar mais adequado (DUVERGER, Maurice. Os Partidos políticos. 2ª ed. Tradução de Cristiano Monteiro Oiticica. Revisão técnica de Gilberto Velho. Rio de Janeiro: Zahar; Brasília: Universidade de Brasília, 1980. p.19-33).
108 DUVERGER, loc.cit.
109 DUVERGER, loc.cit.
52
“eleitoral e parlamentar”, ainda que em graus distintos, como o caso dos
agrupamentos capitalistas que se apresentavam menos centralizados que os
partidos trabalhistas e estes, por sua vez, menos centralizados que os partidos
comunistas.
Para exemplificá-los, destacou os inúmeros partidos operários ou
socialistas, costumeiramente formados pelos sindicatos, como, por exemplo, (1) o
Partido Trabalhista Britânico, criado por decisão do sindicato e participação do
“Partido Trabalhista Independente” e do grupo de intelectuais socialistas “Sociedade
Fabiana”, já existentes; (2) os partidos agrários, formados por influência dos
sindicatos agrícolas, com participação de cooperativas e/ou agrupamentos
profissionais camponeses, vistos em várias democracias escandinavas, além da
Europa Central, Suíça, Austrália, Canadá e Estados Unidos; (3) a formação do
Labour Party pelas sociedades de pensamento do século XVIII e agrupamentos
intelectuais; (4) os primeiros partidos de esquerda, derivados das associações
estudantis e agrupamentos universitários participantes dos movimentos populares
do século XIX na Europa; (5) a influência da maçonaria na criação do Partido
Radical na França e dos partidos liberais na Europa; (6) os partidos de natureza
religiosa, influenciados pelas Igrejas ou diversas outras seitas religiosas, como o
Partido “anti-revolucionário” dos calvinistas dos Países Baixos, o Partido “cristão
histórico” dos protestantes mais intransigentes, os Partidos cristãos anteriores a
1914 e respectivos partidos democrata-cristãos contemporâneos e o Partido
conservador católico belga; e (7) os partidos de direita, derivados de agrupamentos
industriais e comerciais, como o Partido Conservador canadense de 1854.
Destacou, também, os partidos derivados das associações de antigos
combatentes, como o “Partido Social Francês”, advindo da associação “Cruz de
Fogo”, não obstante, em fase posterior, tivesse se revestido com as características
de uma “liga”, ou seja, grupos associados que se infiltravam no campo eleitoral e
parlamentar não para indicar candidatos às eleições, mas para tumultuar esse
processo, já que carregavam ideais absolutamente antiparlamentares e contrários à
democracia. Quando transformadas em partidos, visavam à conquista do poder sem,
contudo, perder as formas extremistas de origem, v.g., os partidos fascistas ou
pseudofascistas, a merecer destaque o Partido Fascista iltaliano.
E, ainda, os partidos que, da mesma forma àqueles influenciados pelas
“ligas”, tiveram sua origem nas sociedades secretas e agrupamentos clandestinos,
53
como o caso do “Movimento Republicano Popular”, na França; do “Partido
Democrata-Cristão”, na Itália; e do “Partido Comunista”, na União Soviética.
Contudo, no que tange ao funcionamento político parlamentar, para
DUVERGER os partidos originários de uma criação “externa” se apresentavam com
menor influência e preponderância no ambiente eleitoral e parlamentar que os
partidos de “criação eleitoral e parlamentar” propriamente ditos. Isto porque:
Os partidos criados de fora manifestam a seu respeito um desapego
muito maior que os nutridos no serralho e nascidos à sua sombra.
Para estes últimos, [partidos de criação eleitoral e parlamentar],
conquistar assentos nas assembléias políticas é o essencial da vida
do partido, sua razão de ser e o objetivo supremo da sua existência.
Para os primeiros, ao contrário, a luta eleitoral e parlamentar
permanece muito importante, mas ela não é senão um dos
elementos da ação geral do partido, um dos meios que ele emprega
dentre outros, para realizar seus fins políticos110.
PANEBIANCO111, de outro lado, sugere outra leitura em face da origem
dos partidos políticos.
Sua proposta ignora se um partido seria embrionado por organizações pré
ou não existentes, e jungidas ou não ao desenvolvimento de atividades eleitoral e
parlamentar. Foca as atenções na força dos grupos de sua liderança e no modo
como essas lideranças trabalham, internamente, para manter a organização viva.
Sua reflexão é, portanto, muito mais acentuada no grau de
institucionalização e, subsequentemente, de organização de uma agremiação
partidária, com verificação direta do comportamento e da linha de comando adotada
pelo líder ou pelo grupo de dirigentes que a criou. Assim, institucionalmente, o que
há são partidos governistas, de oposição ou carismáticos, fortes ou fracos, passíveis
ou não de transformação estrutural.
De modo que um partido “de criação externa”, ou seja, um “partido de
massa”, aparentemente considerado de menor influência político-parlamentar, pode,
a depender da posição institucional alcançada no tempo, inverter o jogo, tornando-se
um partido forte sem qualquer perda da história do seu passado e vice-versa.
110
DUVERGER, Maurice. Os Partidos políticos. 2ª ed. Tradução de Cristiano Monteiro Oiticica. Revisão técnica de Gilberto Velho. Rio de Janeiro: Zahar; Brasília: Universidade de Brasília, 1980. p. 32.
111 PANEBIANCO, Angelo. Modelos de Partido: organização e poder nos partidos políticos. Tradução de Denise Agostinetti. Revisão por Karina Jannini. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p. 3-126.
54
Afinal, independentemente da genética e respectiva consolidação do
partido político no tecido social, e mesmo diante das variáveis enfrentadas e
absorvidas no tempo e no espaço112 – que, muitas vezes, pode lhe obrigar a se
reestruturar por completo113 –, as características originárias da institucionalização
partidária, ou seja, das modalidades que a solidificam propriamente dita, jamais são
perdidas: “toda organização traz consigo a marca das suas modalidades de
formação e das principais decisões político-administrativas de seus fundadores, as
decisões que ‘modelaram’ a organização”114. Nenhuma instituição foge, totalmente,
de seu passado, “por mais forte que seja a renovação da liderança, profundas as
mudanças no corpo da organização e radical a ‘sucessão dos fins’, não
desaparecerão os traços, sempre visíveis e numerosos, do ‘modelo originário’ da
organização”115.
Pensando sobre a proposta de origem de um partido político, formulada
por DUVERGER, em suma, PANEBIANCO verifica que um partido de “criação
eleitoral e parlamentar” pode apresentar semelhança organizativa muito mais
próxima de um partido de “criação externa” do que de um partido de mesma origem,
ou seja, “de criação eleitoral e parlamentar” e vice-versa.
Ademais, importante assinalar que PANEBIANCO, em nenhum momento,
desfaz ou critica negativamente a principiologia apresentada por DUVERGER. Pelo
contrário: tanto quanto o mestre, reconhece que há, de fato, uma dificuldade imensa
em se definir um modelo estático-teórico e único capaz de explicar, com tamanha
112
“Um partido, como qualquer organização, é uma estrutura em movimento que sofre evoluções, que se modifica no tempo e que reage às mudanças externas, à modificação dos ‘ambientes’ nos quais está inserido e atua. É possível afirmar que os fatores de maior incidência na ordem organizativa dos partidos, que explicam sua fisionomia e seu funcionamento, são a sua história organizativa (o seu passado) e as relações que ele estabelece com os seus inconstantes ambientes externos” (PANEBIANCO, Angelo. Modelos de Partido: organização e poder nos partidos políticos. Tradução de Denise Agostinetti. Revisão por Karina Jannini. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p. 91).
113 “Duas teses, essencialmente, disputam o campo nos julgamentos dos historiadores e dos cientistas políticos sobre os processos de mudança que, às vezes, os partidos experimentam. A primeira é que a mudança organizativa deve ser interpretada como o efeito, totalmente previsto e desejado, de decisões do grupo dirigente, voltadas para melhorar o ‘rendimento’ da organização. A segunda é que a mudança é o efeito da sucessão das gerações.” (PANEBIANCO, op.cit., 506-507). A maior causa à reestruturação partidária é vista quando não estável, coesa, a sua coalização dominante (liderança ou corpo de líderes), sequencialmente atingida por: (1) uma crise organizativa, desencadeada por forte pressão do ambiente externo, na arena eleitoral; (2) uma desagregação da coalização dominante (liderança ou corpo de líderes), com a substituição do grupo dirigente; ou, ainda, (3) uma proposta de reestruturação organizativa, com mudança da fisionomia da organização partidária.
114 PANEBIANCO, op.cit., p. 92-93.
115 PANEBIANCO, op.cit., p.508.
55
precisão e suficiência, a forma como um partido político nasce; isso, justamente,
porque as diversidades sociológicas e teleológicas com as quais as organizações,
de um modo geral, passam, são inúmeras.
A seu ver, o ambiente exterior com o qual o partido deve conviver no jogo
político pela disputa de poder também se apresenta como uma das ferramentas de
análise à criação de uma agremiação partidária, embora não a única e nem a
principal delas.
Preliminarmente, sugere a análise de vetores que precedem a ideia de
criação do partido político, denominando-os “recursos do poder” e que seriam seis:
(1) “a competência”, no caso, do poder e expertise do especialista em bem manejar
as relações político-organizativas internas, de divisão dos trabalhos, e externas, de
trabalho político-parlamentar qualificado, controlando habilmente uma importante
zona de incerteza (ambiente institucional e parlamentar); (2) “as relações com o
ambiente”, ou seja, de bem desenvolver tarefas de gestão tanto em face do seu
futuro andamento no “mercado” quanto de definição de estratégias para enfrentar os
humores eleitorais, procurando controlar outra importante zona de incerteza
(ambiente político-eleitoral); (3) “a comunicação”, enquanto canal de circulação de
informações entre os agentes envolvidos na sua formação; (4) “as regras formais”,
com o estabelecimento dos locais de negociação e demais jogos de poder entre os
agentes organizativos, ou seja, o “campo do jogo”, contidos, preferentemente, nos
seus estatutos; (5) “os financiamentos”, segundo o controle dos canais de obtenção
do dinheiro indispensável à vida e funcionamento do partido, quer seja advindo de
um único financiador externo ou de vários, por via de afiliações, campanhas de
autofinanciamento etc; e, por fim, (6) “o recrutamento”, dos atores do poder
organizativo, com definição dos limites de atuação de cada um e da estrutura
organizativa de oportunidades, segundo cada “carreira” interna.
Sem embargo à conclusão de que todos esses vetores devam atuar
cumulativamente na seara de um partido, para o autor é a partir da “competência”,
vale dizer, do poder dos líderes da organização – que pode ser um único, a justificar
a formação de um partido por ele tipificado como “carismático”116, ou um grupo
116
Aquele que se relaciona simbioticamente com a pessoa de seu fundador, o seu líder, garantindo identidade própria (coalização dominante e coesa na sua pessoa), bem como a presença das características de uma organização centralizada em grau máximo, com natureza sempre em negação aos partidos existentes, independentemente da orientação ideológica estabelecida por seu líder (se conservador ou progressista, revolucionário ou reacionário, liberal ou socialista...).
56
restrito, formatado segundo sua “coalização dominante”117 – onde a liderança,
legitimamente constituída, acaba tendo que assumir uma função ainda maior e
primordial, qual seja, a de manter a estabilidade organizativa, conservando as linhas
de autoridade interna do partido, tanto frente às possíveis ameaças movidas pelos
vetores “das relações com o ambiente”, consequentemente agitadas pelas elites
internas minoritárias, quanto às provenientes “do recrutamento”, caso não fortalecido
consiga ser o partido com o seu inevitável crescimento.
Seria também a partir desta mesma “competência”, segundo a fisionomia
da sua coalizão dominante (liderança ou corpo de líderes), que um partido político
ganharia identidade própria, consagrando-se como instituição forte ou fraca. Vale
dizer, fraca, se institucionalmente originada de “facções”, ou seja, de grupos de
elevada organização, encontradas em todos os níveis hierárquicos do partido, ou
seja, do ápice à base de um partido118 ou em grupos geograficamente concentrados
e organizados apenas na periferia, que acabem atribuindo ao partido uma
característica de instituição pouco coesa, porque internamente dividida por várias
facções, todas ou algumas em clima de competição de poder constante sem que
nenhuma delas se predisponha a perder sua própria individualidade. Forte, se o
partido político for originado de “tendências”, ou seja, de grupos que se qualificam
apenas por um consenso de ideias, provenientes de organização, ou organizações
fracas, mas que, quando institucionalizados, conferem ao partido uma característica
de institucionalização forte, dada a coesão linear e horizontal que procuram firmar,
principalmente no núcleo de coalizão dominante (liderança ou corpo de líderes).
A partir destes conceitos, fortes então se evidenciam muito mais os
partidos de oposição do que os partidos governistas, embora seja plenamente
possível enxergar a ótica invertida deste sistema. Conforme bem sintetizado por
PANEBIANCO119:
Como exemplo, destacou o Partido Gaullista (União pela Nova República – UNR) da V República Francesa, que teria nascido da fusão de uma pluralidade de movimentos e grupos sociais, e o Partido Nazista (Partido Nacional Socialista Alemão – MSDAP) do período weimariano (PANEBIANCO, Angelo. Modelos de Partido: organização e poder nos partidos políticos. Tradução de Denise Agostinetti. Revisão por Karina Jannini. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p.271-308).
117 Nomenclatura que prefere adotar aos fenômenos similares atribuídos e denominados por Michels como “oligarquia”, Duverger como “círculo interno” e Ostrogorski e Weger como “ditadura cesarista-plebiscitária” (PANEBIANCO, ibidem, p. 72).
118 Vale dizer, “verdadeiras facções ou ‘facções nacionais’ ” (PANEBIANCO, ibidem, p. 75).
119 PANEBIANCO, ibidem, p.127-128.
57
Convencionou-se que as características organizativas dos partidos
que experimentam longos períodos na oposição no curso de sua
história são diferentes daquelas dos partidos que gozam de uma
longa permanência no governo. Os partidos do primeiro tipo
precisam muito mais do que os segundos de uma organização forte e
sólida. Esses partidos não podem se apoiar na burocracia estatal,
não podem utilizar o Estado e seus aparatos pro domo sua, nem
dispõem normalmente do abundante apoio financeiro que os grupos
de interesse reservam aos partidos governistas. Só podem contar, ou
ao menos em grande parte, consigo mesmos. Fortalecer a própria
organização, colocá-la em condição de mobilizar com eficácia e
continuidade os defensores do partido é o único caminho possível,
na maior parte dos casos, para superar a desvantagem na disputa
com os partidos governistas. Por sua vez, a situação no caso dos
partidos governistas é oposta. Esses partidos têm uma multiplicidade
de recursos públicos à disposição, para serem usados na disputa
política, e, geralmente, esses recursos costumam ser um substituto
eficaz da mobilização por meio da organização partidária. Seguindo
esse raciocínio, devemos esperar, portanto, que os partidos que
nascem e se consolidam na oposição tendem mais facilmente a se
tornar instituições fortes. Devemos esperar também que os partidos
que conquistam o governo nacional logo após a sua fundação e que,
a partir dessa posição, experimentam a consolidação organizativa,
tendem mais facilmente a se tornar instituições fracas. Geralmente é
assim.
De outro lado, também é certo que uma organização com forte
institucionalização reage muito melhor aos desafios com o ambiente que encontra,
porque os instrumentos de defesa sobre essa zona de incerteza se concentram no
“centro”. Na organização com fraca institucionalização, essa premissa ocorre de
modo absolutamente inverso, justamente porque as zonas de incertezas não se
concentram no “centro”, mas dispersas por toda a estrutura do partido, nas suas
diversas subáreas, dificultando a ação dos seus instrumentos de controle e de
defesa. Isso não quer dizer que a instituição fraca tendencie a desaparecer mais
facilmente. Pelo contrário: suportam melhor a crise, porque a relativa autonomia das
suas subáreas permite isolar o problema com maior facilidade, combatendo-o na
raiz, enquanto que, por ser alto o nível de sistematicidade da instituição forte,
qualquer desequilíbrio numa parte da organização, imediata repercussão em todas
as outras sofrerá, desestabilizando-a com maior veemência120.
120
PANEBIANCO, Angelo. Modelos de Partido: organização e poder nos Partidos políticos. Tradução de Denise Agostinetti. Revisão por Karina Jannini. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p.108.
58
Para sustentação de sua teoria, PANEBIANCO, nesse sentido, realizou
um estudo minucioso nos partidos de oposição, que nasceram e se criaram nesse
ambiente político, mas experimentaram uma institucionalização forte: (1) o Partido
Socialdemocrata Alemão – SPD, primeiro partido de massa da Europa, “partido
operário”, que não foi patrocinado na origem por qualquer organização preexistente,
nem se encontrava sob controle de outra organização qualquer; (2) o Partido
Comunista Francês – PCF, que nasceu da cisão de Tours em 1920, mas teria se
consolidado após dez anos, segundo as diretrizes e submissão da organização
patrocinadora Comintern; e (3) o Partido Comunista Italiano – PCI, que também teve
seu nascimento “acompanhado de um processo de bolchevização conduzido pelo
grupo Gramsci-Togliatti, em sintonia com o Comintern”121 assim como o PCF,
apresentando uma legitimação “externa” nas várias estruturas locais reorganizadas
do Partido Socialista Italiano - PSI e cisão de Livorno, embora seu processo de
formação tivesse sido interrompido com o nascimento do regime fascista.
Ainda na categoria dos partidos de oposição, mesmo após longa fase
neste ambiente político, assinalou os partidos com institucionalização fraca,
justamente porque não teriam conseguido se desvencilhar das características do
seu modelo originário: (1) o Partido Trabalhista Britânico – Labour Party, sucessor
imediato do Independent Labour Party (1893-1900) e respectiva integração com as
Unions, governadas fundamentalmente pelos ferroviários, além de várias outras
filiadas, como o movimento cooperativo e a Sociedade Fabiana; (2) a Seção
Francesa da Internacional Operária – SFIO, também de natureza socialista, que teria
se formado após longa gestação de cinco organizações autônomas122, heterogêneas
entre si e que haviam se alocado em diferentes partes da sua estrutura
organizacional. Chegou a ser reestruturada com a cisão comunista de 1920,
diminuindo significativamente o seu tamanho; (3) o Partido Socialista Italiano – PSI,
que como a SFIO, teria adotado o partido de oposição de institucionalização forte
SPD como modelo, sem, entretanto, conseguir ser nada além de um rascunho da
organização socialista alemã, com formação a partir da fusão de uma pluralidade de
organizações locais preexistentes.
121
PANEBIANCO, Angelo. Modelos de Partido: organização e poder nos Partidos políticos. Tradução de Denise Agostinetti. Revisão por Karina Jannini. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p. 152.
122 “Os guesdistes, já Partido Operário Francês (POF), seguidores de Jules Guesde, de orientação marxista; os possibilistes, de Paul Brousse; os allemandistes, de Jean Allemand; os blanquistes, liderados por Edouard Vaillant; os socialistes indépendants, de Jean Jaurès e Alexander Millerand” (PANEBIANCO, op.cit., p. 181).
59
Migrando-se, nesse ínterim, à análise dos partidos governistas,
PANEBIANCO123 examinou o modo de estruturação de três partidos que teriam
nascido sob forte institucionalização, embora nem todos tivessem conseguido se
manter sob essa mesma forma organizativa: (1) a União Democrata-Cristã – CDU,
partido novo e de base pluriconfessional, porque formado por católicos e
protestantes, alheio a qualquer correspondência com o antigo Zentrum católico, mas
que, pela extrema dependência com o seu ambiente externo e total ausência de
coesão na coalisão dominante, justificava sua condução à categoria de partidos de
fraca institucionalização; (2) a Democracia Cristã italiana – DC, braço secular de
uma instituição religiosa, nascido por ela, portanto, de natureza monoconfessional,
sucessora do Partido Popular (1919-1926), que também apresentava extrema
dependência com o seu ambiente externo, além de uma coalização dominante
fragmentada, convivendo com a institucionalização de vidas facciosas internas que a
levaram a se transformar numa instituição fraca; (3) o Partido Conservador britânico,
de dominação de uma facção parlamentar elitizada, central e preexistente que,
embora várias vezes fora do governo central, jamais teria deixado de ser um partido
sob base de institucionalização forte.
Os partidos carismáticos, por sua vez, por jamais terem experimentado
uma coalização dominante estável e coesa, senão absolutamente instável nos
limites determinados por seu único líder, sempre se colocaram como organizações
de fraca institucionalização.
LEMBO124, numa visão mais tipológica dos partidos políticos, explica que,
originariamente, as bases partidárias se consolidavam sob três formatações
partidárias distintas.
Os “partidos de quadros”, também conhecidos como “partidos de
notáveis”, que teriam origem tanto no campo liberal quanto no conservador, e
atividades associativas desprovidas de adesões populares, senão de
personalidades, “as quais funcionam, politicamente, em regra, em torno de suas
próprias atividades privadas”125.
123
PANEBIANCO, Angelo. Modelos de Partido: organização e poder nos partidos políticos. Tradução de Denise Agostinetti. Revisão por Karina Jannini. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p. 213-270.
124 LEMBO, Cláudio. Participação Política e Assistência Simples no Direito Eleitoral. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991. p.65-66.
125 LEMBO, loc.cit.
60
Os “partidos de massas”, de outro lado, que se consolidavam no campo
socialista, reproduzindo uma forma de associação costumeiramente enraizada em
estruturas sindicais, com o apoio de grandes concentrações populares e de
militantes que, entretanto, por sua marginalidade, nenhuma possibilidade “de
participar das decisões dos órgãos partidários” teriam.
E os “partidos anacrônicos”, ou seja, os partidos de formação comunista e
fascista, que possuíam hierarquia estruturada sob forma bastante assemelhada às
dos organismos militares e, embora utilizassem de ações políticas liberais dentro de
um sistema democrático, defendiam, em verdade, a extinção da vida parlamentar
“nos moldes contemporâneos” e do pluralismo partidário.
Explicitando a característica intrínseca de cada partido anacrônico,
sintetizou LEMBO:
Os comunistas atuavam, em sua tipologia clássica, por intermédio de
células fechadas, compostas, em regra, de pessoas que agiam no
interior de um organismo estanque. Estas, por sua vez, se
introduziam no interior de locais de trabalho, buscando atuar na
captação de recursos e em ação de proselitismo. Isto permitia atos
políticos tradicionais e se, necessário, atos de violência.
Os fascistas – e o partido nacional-socialista – concebiam, sem
qualquer preocupação de imagem, estruturas partidárias calcadas na
hierarquia militar, conferindo aos órgãos partidários denominações
castrenses (v.g.: milícias, formadas por esquadras, secções,
companhias, batalhões, regimentos, brigadas e divisões)126.
Mutatis mutandis, embora de difícil cronologia a adoção de uma única
teoria ao surgimento dos partidos políticos, o que se pode aferir das convicções dos
juristas destacados é que, independentemente da estrutura adotada e modificações
que, institucionalmente, possam apresentar ao longo do tempo de exercício da ação
política, é o ambiente externo o responsável pela sua formação, quer seja na pessoa
das associações políticas preexistentes, quer seja na pessoa das associações
políticas derivadas de entidades de classe organizadas; afinal, são os partidos
políticos os instrumentos essenciais à operacionalização da representação política.
ARINOS, numa visão prática e simplista do que podia se ter como partido
político em formação, enfatizou:
126
LEMBO, Cláudio. Participação Política e Assistência Simples no Direito Eleitoral. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991. p. 65.
61
E o curioso é que tal movimento de arregimentação partidária se
processava independentemente e mesmo, até certo ponto, contra a
convicção dos principais chefes políticos, que viam nos partidos em
formação expedientes transitórios para a movimentação da política
em face de certas dificuldades, mas não esperavam, nem
desejavam, que eles se transformassem em organizações
permanentes127.
De outro lado, analisando-se o momento histórico de formação das
agremiações partidárias, tem-se que, em solo norte-americano, remonta o início de
sua vida republicana, com a manifestação clara das forças que deveriam compor os
futuros partidos na Convenção de 1787 e, posteriormente, sua real vida política na
luta eleitoral entre John Adams e Tomas Jefferson em 1796128.
Em solo europeu, ARINOS129 oferece a seguinte catalogação à formação
político-partidária francesa, belga, italiana, alemã e espanhola.
Na França, o processo ditatorial bonapartista, em pleno período
revolucionário, teria se revelado a causa à formação tardia dos partidos políticos na
concepção moderna. Os clubes e associações políticas até então existentes, a
merecer destaque a “Sociedade dos Amigos da Constituição” que, posteriormente,
teria se transformado no “Clube dos Jacobinos”, desenvolvendo trabalhos diários de
debates e apresentação de opiniões por todos os seus deputados, mantiveram-se
assim até o período da Restauração, de 1814 a 1830. Apenas sob a regência da
Carta Constitucional de 04 de junho de 1814, outorgada por Luís XVIII, é que o
Partido Conservador e o Partido Liberal teriam iniciado suas atividades, embora sob
referidas “formas toscas” de ser, já que se fazia necessária a arregimentação
127
ARINOS DE MELO FRANCO. Afonso. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1980. p. 13.
128 Na disputa eleitoral entre o então presidente federalista (transformado em Partido Republicano) John Adams (1797-1801) e seu vice, o democrata-republicano (com denominação posteriormente consolidada em Partido Democrata) Thomas Jefferson, este assumiu a presidência para o período de 1801-1809, por ter sido vencedor em 8 Estados com o percentual de votação de 61,4% contra 7 Estados e um percentual de votação de 38,6% e, ainda, por também ter recebido voto de confiança da Câmara dos Representantes no desempate promovido contra o seu companheiro de chapa Aaron Burr, que, embora preferido por grande parte dos Federalistas que compunham referido Parlamento e eram os responsáveis pela indicação do presidente sempre que dois candidatos obtivessem a maioria dos votos eleitorais (Artigo II, Seção 1 da Constituição Norte-Americana), acabou tomando assento na vice-presidência por ter ficado em segundo lugar graças ao convencimento na escolha de Jefferson trabalhada pelo líder do Partido Federalista, Alexander Hamilton.
129 ARINOS, ibidem, p. 13 e ss.
62
partidária caso quisessem, de fato, participar do Governo de Gabinete no recém
instaurado sistema parlamentar de governo.
A composição dessas bases partidárias francesas apresentava-se da
seguinte forma: o Partido Conservador, também conhecido como “ultra”, por políticos
ultrarrealistas, reacionários e leais defensores do fim virtual do sistema
representativo e consequente retorno ao regime aristocrático abolido pela
Revolução130; e o Partido Liberal, denominado originalmente como “independentes”
e integrado de um grupo progressista heterogêneo, totalmente reprimido dos
quadros parlamentares, “que abrigava republicanos, como Benjamin Constant, e
monarquistas constitucionais, como La Fayette”131 e se viam obrigados à imersão no
campo da ilegalidade, em sociedade secretas, para a sua sobrevivência.
Na Bélgica, a ação dos partidos políticos teria sido experimentada no
período pós-Revolução, em 1830, tanto pela influência do seu partido político forte, o
Partido Católico, de base religiosa e holandesa, dada a visível opressão que exercia
o rei calvinista de Orange sobre a consciência católica belga, quanto pela influência
do Partido Liberal, formado pelos livre-pensadores e representantes da esquerda do
Congresso; e finalmente pelo ínfimo Partido Unionista, formado pela mescla de
católicos e livre-pensadores.
Na Itália, antes mesmo do estabelecimento de seu constitucionalismo
com a unificação política e proclamação do Reino da Itália pela lei de 27 de março
de 1861, confirmada em 1870, e, especificamente no período de vigência do
estatuto sardo-piemontês de 1848, que teria sido baseado tanto na Constituição
francesa de 1830 quanto na belga de 1831, enquanto a organização estatal se
processava de modo gradativo pelos reinos de Piemonte e Sardenha, era possível
verificar a existência dos Partidos Clericais, de extrema direita; dos Partidos
Democráticos, de extrema esquerda; e dos Partidos Conservadores e Liberais-
Progressistas, de centro.
A Alemanha, pelas mesmas razões históricas conturbadas de
organização e, consequentemente, unificação estatal que teria ocorrido apenas no
século XIX por insistência e vitória do então primeiro ministro da Prússia, Otto
Leopold von Bismarck-Schönhausen (1861-1871), e futuro primeiro chanceler do
130
Daí a razão para a institucionalização de “medidas cada vez mais restritivas das liberdades de imprensa, de ensino, de consciência e outras” (ARINOS DE MELO FRANCO. Afonso. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1980. p. 17).
131 ARINOS, ibidem.
63
Império Alemão (1871-1890) nas guerras estabelecidas contra a Dinamarca, o
Império Austro-Húngaro e a França, embora consistisse numa Nação tão antiga
quanto à italiana, com herança intelectual política de tendência liberal e
conservadora, a presença dos então Partidos Conservador e Liberal teve início
apenas com a revolução liberal-esquerdista de 1848, mais notadamente com a
promulgação da Constituição da Prússia em 1850.
Os esforços ao surgimento de grupos mais radicais, de naturezas
progressistas e democráticas, contudo, logo teriam se exaurido com a vitória do
militarismo prussiano e a obra bismarkiana, pautada na permanência do governo
monárquico constitucional de representação absolutamente autoritária e
conservadora da unidade nacional alemã.
Por fim, na Espanha, quando ainda se lutava pela liberdade de
consciência religiosa no século XIX, exatamente como na França no século XVIII, o
tratamento mais efetivo à formação de partidos políticos se deu apenas com a
revolução de 1868, que deu ensejo à institucionalização da Constituição de 1869 e,
consequentemente, do sufrágio universal e, portanto, do regime representativo.
Em Portugal, o reconhecimento dos partidos políticos em âmbito
constitucional teria ocorrido apenas em 1976, quando da completa substituição do
regime autoritário, antipartidário e antipluralista de 1930 pela “democracia com
partidos”132.
No Brasil, a criação de cada uma das agremiações partidárias remonta o
Império, consistindo objeto a ser tratado no capítulo seguinte deste trabalho de
pesquisa.
3.1.1. Natureza Jurídica
Sociologicamente, conforme afirmado por FERREIRA FILHO133, os
partidos políticos são considerados “comunidades”, ou seja, grupo de integração das
132
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª ed.Coimbra: Almedina, 2000. p. 316.
133 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Os Partidos Políticos nas Constituições Democráticas: o Estatuto Constitucional dos Partidos Políticos no Brasil, na Itália, na Alemanha e na França.
64
aspirações individuais da sociedade; ou, então, consoante apontado por Hauriou,
“instituição”, que, por si só, exige do ordenamento jurídico a missão de “encará-los
sob pena de construírem sem alicerces”.
Politicamente, complementa o autor, resumem-se como meras frações do
povo, de cidadãos associados que recebem desse povo as atribuições necessárias
para o exercício de suas funções (direito francês), ou instituições sem personalidade
jurídica, incumbidas do exercício das funções públicas, sem serem consideradas
órgãos do Estado (direito italiano).
Do ponto de vista jurídico, acabam se qualificando como instituições, de
direito público ou privado, segundo a disposição na ordem jurídica vigente (direito
brasileiro), por vezes, correlacionadas à forma de constituição de uma autarquia,
com particularidades inversas, apenas. Melhor explicitando a partir dos
apontamentos do autor:
A autarquia depende do govêrno. Surja ela de uma descentralização,
venha ela do setor privado por uma encampação ou por uma
desapropriação, seja maior ou menor a autonomia de sua direção,
não há autarquia independente do govêrno. Ao contrário, na
Democracia ocidental, e muito mais na Democracia marxista, é o
partido que subordina a si o governante. Não é êle, por assim dizer,
um instrumento do govêrno, mas é o govêrno que é seu instrumento.
Ou, ao menos, o govêrno só é govêrno porque foi partido. [sic]134.
Segundo CAGGIANO135, as teses acerca da natureza jurídica de um
partido político não são uniformes. Pelo contrário. Apresentam-se em polos
diametralmente opostos. Para alguns, tratar-se-iam de organizações extraídas do
grupo social, de frações do povo, que eram observadas pelo Estado com
indiferença, mas nunca por ele próprio combatidas. Citando Marcel Prélot, destacou
que se equiparavam a agrupamentos políticos com função de cooperação à
expressão do sufrágio, sem, contudo, ter capacidade de “representar um verdadeiro
instrumento vinculativo entre o eleitor e eleito”136. Para outros, numa concepção
Imprensa da Universidade de Minas Gerais: Revista Brasileira de Estudos Políticos; Estudos Sociais e Políticos, vol. 26, 1966. p.155-156.
134 FERREIRA FILHO, ibidem, p.71-72.
135 CAGGIANO, Monica Herman Salem. Finanças Partidárias. 1980. Dissertação (Mestrado em Direito Constitucional) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 1980. p.74-82.
136 CAGGIANO, ibidem, p. 75-76.
65
mais moderna, seriam institutos de direito público, porque provenientes de uma
vontade estatal.
Refinando sua pesquisa, CAGGIANO verificou que no ordenamento
jurídico italiano os partidos políticos não apresentavam personalidade jurídica
própria; permaneciam regidos pelas regras de direito privado, sendo considerados,
pela Carta Constitucional, como meros colaboradores da determinação política
nacional, desprovidos de qualquer monopólio político137. Pelo direito germânico, os
partidos políticos eram submetidos à simples condição de intermediários entre o
povo e o Estado, com o objetivo de apenas canalizar a vontade política do povo138.
O ordenamento jurídico uruguaio é que teria sido o primeiro a integrar os partidos
políticos dentro do processo governamental numa democracia fundamentada pelos
preceitos da Constituição de 1917, assim como o direito brasileiro a reconhecê-lo
como pessoa jurídica de direito público interno em 1971, pelo art. 2º da Lei nº 5.682,
de 20 de junho. Enfatizou, in verbis:
E, mais, abandonando a posição original, severamente criticada pelo
Prof. FERREIRA FILHO, por conduzir à mera ficção a personalidade
jurídica que lhe fora outorgada, a nova redação oferecida pela Lei nº
6.767, de 20 de dezembro de 1979 retira toda e qualquer
possibilidade de se falar em fenômeno partidário como mero
consectário da liberdade de associação, posto que não mais se
refere à ação do partido como ‘exercida... em nome dos cidadãos
que o integram’, limitando-se a prescrever: “Art. 3º - A ação dos
partidos será exercida em âmbito nacional, de acordo com seu
estatuto e programa, sem vinculação, de qualquer natureza, com
governos, entidades ou partidos estrangeiros”139.
Na ordem constitucional portuguesa, CANOTILHO140 explica que, embora
fossem considerados por alguns como órgão do Estado, na verdade não eram; da
mesma forma que também não eram órgãos do povo, sequer titulares de Poderes
137
No mesmo sentido, segundo FERREIRA FILHO (1966, p. 65), seriam as “associações ‘non riconosciutte’, regulamentadas pelos artigos 36, 37 e 38 do Código Civil”.
138 Desempenhavam papel de colaborador na formação da vontade política do povo, situando-se num patamar de ordem pré-governamental e não efetivamente governamental. “Devem despertar a opinião política, esclarecendo-a sôbre os problemas apresentados e desmembrar as possíveis soluções em opções simples, ao alcance do homem comum, a fim de que a decisão possa surgir do povo” [sic], como também destacado por FERREIRA FILHO (1966, p. 65).
139 CAGGIANO, Monica Herman Salem. Finanças Partidárias. 1980. Dissertação (Mestrado em Direito Constitucional) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 1980. p. 79-80.
140 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª ed. Coimbra: Almedina, 2000. p. 316.
66
do Estado ou, então, “corporações de direito público”. Eram “associações privadas
com funções constitucionais”, preservadas segundo a liberdade de formação e de
consideração como direito fundamental, detentor de privilégios estatutários em
relação ao direito geral das associações ditado pela Constituição Federal.
Enfim, LEMBO141 coloca uma pá de cal nas diversas naturezas jurídicas
dos partidos políticos, expondo, didaticamente:
- órgão do Estado, como ocorre ainda hoje na União Soviética;
- ente público autárquico, teoria contestada porque os partidos não
se encontram sujeitos a nenhuma diretiva estatal nas democracias
ocidentais consolidadas142;
- associação de fato, carente, pois, de personalidade jurídica;
- pessoa jurídica de direito público com objetivos cívicos e coletivos.
No Brasil, a configuração legal dada aos partidos políticos pela
Constituição Federal atual, de 1988, é de pessoa jurídica de direito privado,
adquirida “mediante inserção de seus atos constitutivos nas notas dos cartórios dos
registros de títulos e documentos, verificando-se, a posteriori, o registro dos seus
estatutos – não, portanto, dos atos constitutivos – junto ao Tribunal Superior
Eleitoral, como ensina Monica Herman Salem Caggiano, interpretando o art. 17 e
seus parágrafos da Constituição de 1988”143.
Nem sempre foi assim. No período militar precedente (1964-1985), a
configuração do partido político era de pessoa jurídica de direito público interno144,
assim se mantendo com a edição da segunda Lei Orgânica dos Partidos Políticos,
Lei nº 5.682, de 21 de julho de 1971145. Apenas a partir da terceira, e atual, Lei
Orgânica dos Partidos Políticos, Lei nº 9.096, de 19 de setembro de 1995, é que o
regime jurídico correspondente passou a ser o de direito privado146.
141
LEMBO, Cláudio. Participação Política e Assistência Simples no Direito Eleitoral. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991. p.61.
142 Senão apenas submissas aos órgãos de controle externo – Tribunais Eleitorais e Tribunal de Contas da União – para aferição do dever de cumprimento da lei e dos princípios democráticos, conforme acréscimo ressalvado em nota de rodapé pelo próprio autor.
143 LEMBO, Cláudio. Participação Política e Assistência Simples no Direito Eleitoral. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991. p.60.
144 Segundo o art. 2º da Lei nº 4.740, de 15 de julho de 1965, a primeira Lei Orgânica dos Partidos Políticos, in verbis, “os partidos políticos, pessoas jurídicas de direito público interno, destinam-se a assegurar, no interêsse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo”.
145 Com redação proferida nos exatos termos a do art. 2º da Lei nº 4740/65, revogada.
146 Ex vi, art. 1º: “o partido político, pessoa jurídica de direito privado, destina-se a assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e a defender os direitos fundamentais definidos na Constituição Federal”.
67
3.1.2. Legitimidade jurídico-constitucional
De qualquer modo, independentemente do panorama histórico de
formação partidária, fato é que, conforme destacado por CAGGIANO147, as primeiras
normas de regulamentação dessas agremiações partidárias teriam surgido apenas
no séc. XIX, nos Estados da Califórnia e de Nova Iorque, e a institucionalização da
vida política em si, com reprodução nos ordenamentos jurídicos em nível mundial,
no início do século XX.
Afinal, conforme registros de DUVERGER148, até 1850 nenhum outro país
do mundo teria conhecido partidos políticos na forma e acepção moderna que o
termo “partido político” traz, senão apenas a partir de 1950, quando teria se
evidenciado o seu funcionamento na maior parte das nações civilizadas, enquanto
outras se esforçavam em também imitá-las.
Enfim, a história mostra que a criação e a evolução do governo
representativo, em substituição aos impérios monárquicos vigentes, providos de
poder eminentemente autocrático, operacionalizaram-se graças à criação e o
fortalecimento das agremiações partidárias que, a cada passo, ganhavam força
política no bojo dos Parlamentos locais, especialmente, a partir dos ideais e
lideranças sustentadas por notáveis, exigindo, para harmonia de todo esse sistema
– eleitoral e partidário – a edição de normas de regulamentação própria.
Nesse sentido é a doutrina de FERREIRA FILHO149. Segundo o autor, na
sequência à Primeira Guerra Mundial é que o partido político teria se consagrado
como um dos instrumentos de fundamental importância à racionalização do Poder
nas novas democracias da Europa central e oriental, que adotavam o sistema de
representação proporcional em suas constituições, conquistando reconhecimento
como tal pelo direito público. Mesmo com a preponderância subsequente de regimes
“fortes”, a merecer destaque o nazismo, o fascismo, a longa e sangrenta guerra civil
147
CAGGIANO, Monica Herman Salem. Sistemas Eleitorais X Representação Política. Brasília: Senado Federal, Centro Gráfico, 1987. p.181-182.
148 DUVERGER, Maurice. Os Partidos políticos. 2ª ed. Tradução de Cristiano Monteiro Oiticica. Revisão técnica de Gilberto Velho. Rio de Janeiro: Zahar; Brasília: Universidade de Brasília, 1980. p.19-33.
149 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Os Partidos Políticos nas Constituições Democráticas: o Estatuto Constitucional dos Partidos Políticos no Brasil, na Itália, na Alemanha e na França. Imprensa da Universidade de Minas Gerais: Revista Brasileira de Estudos Políticos; Estudos Sociais e Políticos, vol. 26, 1966. p. 26-27.
68
espanhola e, inclusive, o período do golpe de Estado no Brasil, no pós-Segunda
Guerra Mundial, referida tendência de racionalização do Poder com a presença e
participação dos partidos políticos não teria, ainda, se findado; pelo contrário,
conquistou espaços mais importantes, tendo sido agraciado com um tratamento
constitucional genuíno. Segundo suas acepções, portanto:
No seio das Assembléias, os partidos tinham boa audiência. Na
França, haviam desempenhado papel importante na Resistência e –
é preciso acentuá-lo – a Assembléia constituinte fôra eleita pela
representação proporcional, com listas bloqueadas. Na Itália, a
recordação das lutas contra Mussolini dava prestígio às organizações
políticas, notadamente de extrema esquerda. No Brasil, onde não se
conheciam os seus malefícios, senão por ouvir dizer, os partidos
multiplicavam-se, sob a bandeira da representação proporcional. Não
sòmente os partidos tinham sobrevivido à catástrofe (do que se
duvidava, por volta de 1939) mas ainda prosperavam. [sic]150
No que tange à legitimidade jurídico-constitucional, as primeiras Leis
Fundamentais que teriam conferido aos partidos políticos “status” constitucional
seriam as Constituições Brasileira, de 18 de setembro de 1946, a Italiana, de 27 de
dezembro de 1947, e a Alemã, de 23 de maio de 1949151.
No Brasil, a preocupação pautava-se em repelir a eventual criação de
partidos políticos contrários aos preceitos democráticos, à garantia dos direitos
fundamentais e ao princípio da pluralidade partidária, com limitação de ação política
e sem qualquer regulamentação de ordem constitucional. “Sem dúvida alguma, o
constituinte visava ao Partido Comunista, cujo candidato à presidência da República
havia obtido, em dezembro de 1945, cêrca de 10% dos votos e que, um ano mais
tarde, já estava fora da lei”. [sic]152
Na Itália, o texto constitucional fez expressa menção negativa à instituição
de associações políticas paramilitares e também reconstituição do Partido Fascista,
150
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Os Partidos Políticos nas Constituições Democráticas: o Estatuto Constitucional dos Partidos Políticos no Brasil, na Itália, na Alemanha e na França. Imprensa da Universidade de Minas Gerais: Revista Brasileira de Estudos Políticos; Estudos Sociais e Políticos, vol. 26, 1966. p. 26-27.
151 FERREIRA FILHO, ibidem, p.31-33.
152 Segundo FERREIRA FILHO (1966, loc.cit.), referida vedação teria sido consignada expressamente no art. 141, §13, juntamente com a atribuição do Tribunal Eleitoral de registrar e dissolver os partidos desconformes aos preceitos constitucionais (art. 119, inciso I) que, aliás, também constava da Constituição Federal de 1934, com vigência plena até o golpe de Estado, ocorrido em novembro de 1937.
69
assegurando o direito de associação política e o papel dos partidos políticos junto ao
Estado, cuja finalidade é a de concorrer à determinação da política nacional153.
Na Alemanha, por fim, é que teria se firmado o mais completo estatuto
constitucional dos partidos políticos em vigência, com tratamentos específicos em
face do programa, da atividade, da organização e das finanças partidárias154.
No entanto, apenas as Constituições Federais brasileira e italiana é que
tiveram a cautela de tratar do direito parlamentar dos partidos políticos, garantindo-
lhes (no Brasil155), ou, ainda, aos grupos parlamentares (na Itália156), o direito de
representação proporcional nas Comissões, embora, consoante enfatizado por
FERREIRA FILHO157, os grupos parlamentares não deviam ser confundidos com os
partidos políticos, porque, diferentemente destes, constituíam agregados transitórios
de representantes que se reuniam para uma finalidade ou motivo qualquer,
significando, por vezes, a expressão de um partido e não de grupos
verdadeiramente pluripartidaristas, a exemplo dos regulamentados na França.
A primeira Constituição Francesa a proporcionar “status” constitucional
aos Partidos Políticos, por sua vez, teria sido a Lei Fundamental da V República,
elaborada pelo General e Presidente francês Charles André Joseph Marie de Gaulle,
em 3 de junho de 1958, e aprovada, por referendum, em 28 de setembro do mesmo
ano. O projeto esboçado pela Comissão de Constituição, submetido para aprovação
da Assembleia Constituinte de 1945, quando da elaboração da Lei Fundamental da
153
Respectivamente, no art. 18, item XII das Disposições Transitórias Finais, e no art. 49. 154
Itens 1 a 3 do art. 21. 155
Ex vi art. 40, parágrafo único: “a cada uma das Câmaras compete dispor, em Regimento interno, sobre sua organização, polícia, criação e provimento de cargos. Na constituição das Comissões, assegurar-se-á, tanto quanto possível, a representação proporcional dos Partidos nacionais que participem da respectiva Câmara.”
156 Art. 72: “Ogni disegno di legge, presentato ad una Camera e', secondo le norme del suo regolamento, esaminato da una commissione e poi dalla Camera stessa, che l'approva articolo per articolo e con votazione finale. Il regolamento stabilisce procedimenti abbreviati per i disegni di legge dei quali e' dichiarata l'urgenza. Puo' altresi' stabilire in quali casi e forme l'esame e l'approvazione dei disegni di legge sono deferiti a commissioni, anche permanenti, composte in modo da rispecchiare la proporzione dei gruppi parlamentari. (...)”. Vale dizer: “Cada projeto de lei apresentado a uma Câmara será, segundo as normas do seu regulamento interno, examinado por uma Comissão e, na sequência, pela própria Câmara, que aprovará artigo por artigo, em votação final. O regulamento estabelecerá procedimentos mais céleres para as propostas de leis das quais seja declarada urgente. Poderá também estabelecer em quais casos e formas os exames e as aprovações dos projetos de leis serão deferidos pela comissão, inclusive as permanentes, compostas de tal modo que reflitam as proporções [a representação proporcional] dos grupos parlamentares. (...)” (tradução livre).
157 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Os Partidos Políticos nas Constituições Democráticas: o Estatuto Constitucional dos Partidos Políticos no Brasil, na Itália, na Alemanha e na França. Imprensa da Universidade de Minas Gerais: Revista Brasileira de Estudos Políticos; Estudos Sociais e Políticos, vol. 26, 1966. p.123-124.
70
IV República Francesa, até tentara inserir o princípio do pluralismo partidário e a
interdição do partido único, reproduzindo o desejo de alguns membros da
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, porém sem êxito. Alguns
dispositivos chegaram a tratar indiretamente de matérias afetas aos grupos
parlamentares, como também eram referidos os partidos políticos158.
De qualquer modo, conforme destacado por LEMBO159, pela relevância
assumida no quadro das instituições políticas, “nos principais documentos
constitucionais ocidentais há dispositivos específicos sobre os partidos políticos”.
3.2. SISTEMA DE PARTIDOS
Os partidos políticos alcançaram posição privilegiada no Estado
contemporâneo, notadamente no exercício do poder político dos candidatos
escolhidos pelo sufrágio. É fato.
Mais que isso: nos regimes democráticos tiveram que aprender a lidar
com as identidades e os antagonismos entre si, aceitando, inclusive, a recomposição
interna ou formação de alianças para a conquista de uma cadeira no Parlamento na
competição eleitoral.
Afinal, o sistema é dinâmico. Exige dos atores que o implementam
constantes adequações ou adaptações à novas realidades, de acordo com o
anotado por JEHÁ160:
No século XX, um novo embate econômico, materializado pelo
sucesso da Revolução Russa de 1917, espraiou-se, a partir de
então, para o campo das disputas políticas de todo o mundo e, em
certa medida, substituiu pelas ideias de direita versus esquerda, de
capitalismo versus comunismo, a divisão dos parlamentos e a
rotulagem dos políticos típica do período anterior. Os conservadores
158
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Os Partidos Políticos nas Constituições Democráticas: o Estatuto Constitucional dos Partidos Políticos no Brasil, na Itália, na Alemanha e na França. Imprensa da Universidade de Minas Gerais: Revista Brasileira de Estudos Políticos; Estudos Sociais e Políticos, vol. 26, 1966. p. 29-30.
159 LEMBO, Cláudio. Participação Política e Assistência Simples no Direito Eleitoral. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991. p. 58-59.
160 JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 126.
71
passaram a ser os direitistas, defensores dos valores sociais
tradicionais e do sistema capitalista de livre mercado, e os liberais
passaram a ser os esquerdistas, defensores dos ideais comunistas
ou socialistas de controle sobre os meios de produção e de
igualdade entre as classes sociais. [...] Durante estas duas fases
pelas quais passou a forma partidária de se organizar o poder, é
perceptível a forte presença de elementos ideológicos antagônicos
próprios na plataforma e na agenda dos atores políticos. Nestes dois
momentos, os papéis dos atores competitivos eram mais ou menos
claros. O antagonismo permitia a simplificação das questões
colocadas ao eleitorado.
Os partidos políticos estão presentes em qualquer modelo de sistema
eleitoral: majoritário ou proporcional. Neste, assumindo o papel de bem e fielmente
representar todos os grupos sociais, como se espelho destes fossem (monopólio
partidário); naquele, com alternância do poder e oportunidade de robustecimento da
oposição em face do governo161.
E, ademais, dentro de todo o contexto histórico vivificado, sobretudo no
período contemporâneo, o que se nota, de fato, é que os partidos políticos vêm
assumindo uma tendência de se transformarem em titulares do monopólio eleitoral,
na medida em que vêm se tornando os “personagens indispensáveis da cena
política, no exercício de função mediadora ou de intermediação”162.
De modo que, em síntese, à integração de todos esses fenômenos com
dependência e interação direta dos partidos políticos é que a doutrina qualificou
denominar como “Sistema de Partidos” ou “Estado de Partidos”.
Trata-se, assim, da “variável que intermedeia entre partido ou partidos
políticos e sistema político”, conforme assinalado por PASQUINO163, com base na
conclusão da doutrina de Riggs que já propunha a síntese do necessário, qual seja,
“o sistema de partido é qualquer sistema que legitime a escolha de um poder
executivo através de votações e que compreenda eleitores, um ou mais partidos e
uma assembléia.” [sic]
161
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª ed. Coimbra: Almedina, 2000. p. 307.
162 LEMBO, Cláudio. Participação Política e Assistência Simples no Direito Eleitoral. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991. p. 59.
163 PASQUINO, Gianfranco. Sistemas de Partido. In BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. Tradução de Carmen C.Varriale... [et al.]; coordenação da tradução João Ferreira, revisão geral João Ferreira e Luis Guerreiro Pinto Cascais. 7ª ed. Brasília, DF: Editora Universidade de Brasílio, 1995. 2v, p. 1168.
72
No diapasão de um ambiente democrático, CAGGIANO164 foi enfática,
lembrando que a formação do “Sistema de Partidos” ou do “Estado de Partidos”,
inevitavelmente, é pela democracia reclamada.
Sob qualquer ótica, partidos surgem, partidos se desfazem; partidos se
fundem, partidos se cindem; ideologias são claras, outras plasmadas num limbo de
mistérios, todos juntos e misturados. O ambiente interfere, influenciando
significativamente na forma de apresentação do regime partidário: do eleitorado,
com as influências de restrição ou extensão do sufrágio, às novas perspectivas
sociais e econômicas, assim como modificações, bruscas ou elastificadas, do
sistema eleitoral.
A cada circunstância, uma nova lei, um novo regimento partidário, um
novo modo de dizer os mecanismos à conquista do Poder, de encarar os desafios
eleitorais e parlamentares. Por todos esses fatores, inevitavelmente, o regime
jurídico dos partidos políticos sofre alterações, aprimoramentos ou
desaperfeiçoamentos.
3.2.1. Sistema Partidário X Regimes de Governo
Mais que investigar a construção e respectivas particularidades de uma
formação partidária, segundo a história, sua dimensão e alianças que acabam
assumindo no cenário eleitoral ao longo do tempo, consoante diversidade de formas
partidárias apresentadas por Maurice Duverger e interferências parlamentares e
extraparlamentares na organização das bases partidárias segundo Angelo
Panebianco165, é verificar que não há um estereótipo fechado acerca de qual
sistema partidário seria mais adequado a ser aplicado em determinado regime de
governo e seu sistema eleitoral.
O que se constatou que é a cada sistema eleitoral, inclusive de base
autocrática, a construção de um sistema partidário sempre se mostrou presente e
164
CAGGIANO, Monica Herman Salem. Oposição na Política: propostas para uma rearquitetura da democracia. São Paulo: Agnelotti, 1995. p. 77.
165 Detalhadas no subcapítulo 3.1 (origem e institucionalização) anterior, deste trabalho de pesquisa.
73
necessário para a sua regência na era contemporânea, independentemente da
forma assumida: unipartidária, bipartidária ou multipartidária. Isso é fato.
Analisando-se o unipartidarismo, por exemplo, que sinaliza o regime de
um partido único, ou de um “partido carismático” de acordo com o assinalado por
PANEBIANCO166, até o advento do século XIX, nenhuma autocracia, sobretudo de
base totalitária, se movimentava por via de partido político; era absolutamente
dispensável. Com o avanço da história, uma nova perspectiva à regência dos velhos
sistemas ditatoriais mundiais surgiu: o seu apoiamento técnico em um partido único
de forma absolutamente novidadeira. Assim foi na Alemanha e na Itália, por
exemplo, tal como em muitas outras democracias que experimentaram um regime
ditatorial em algum momento histórico.
Sob outro ponto de vista, oportuno trazer à colação as anotações de
DUVERGER167 à formação da base unipartidária, de que, sob o ponto de vista
estrutural, referidos partidos únicos não difeririam, em nada, da estrutura
apresentada por qualquer outro partido. Em regra, apenas revelam a adaptação
“ditatorial” da forma de partido nascida sob a moldura democrática, atingindo o seu
objetivo único e fundamental que é o de espalhar ao público as palavras de ordem
do ditador, garantindo-lhe a propaganda governamental.
Outra questão interessante a ser registrada nas construções
unipartidaristas é que, como bem colocado por CAGGIANO168, são absolutamente
refratários a qualquer forma de oposição institucionalizada, além de não tolerarem
qualquer forma de minorias.
Nos demais sistemas eleitorais, as tendências se distribuem entre o
bipartidarismo e o polipartidarismo (multipartidarismo), não obstante as democracias
contemporâneas terem registrado, praticamente, o predomínio deste modelo de
sistema partidário.
Em relação ao bipartidarismo, também conhecido como “dualismo de
partidos”, onde a aproximação lógica da ideia de governo versus oposição como
caracterização de um sistema de alternância de poder melhor identificada,
166
PANEBIANCO, Angelo. Modelos de Partido: organização e poder nos Partidos políticos. Tradução de Denise Agostinetti. Revisão por Karina Jannini. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p. 271-308.
167 DUVERGER, Maurice. Os Partidos políticos. 2ª ed. Tradução de Cristiano Monteiro Oiticica. Revisão técnica de Gilberto Velho. Rio de Janeiro: Zahar; Brasília: Universidade de Brasília, 1980. p.290-297.
168
168 CAGGIANO, Monica Herman Salem. Oposição na Política: propostas para uma rearquitetura
da democracia. São Paulo: Agnelotti, 1995. p. 84-85.
74
interessante registrar que, para parte da doutrina, consistia num fenômeno
sustentado no sistema anglo-saxão.
Países da América Latina, por exemplo, não apenas apresentaram uma
tendência ao bipartidarismo em meados da década de 50 do século passado169,
como assim permaneceram até os dias atuais. Nos estudos de SAÉZ170, tanto a
Costa Rica, quanto Honduras e Paraguai, que apresentavam uma média de partidos
com representação no parlamento de, respectivamente, 2,2; 2,0; e 2,2, no início da
década de 90, assim permaneceram durante toda essa década, vale dizer, com 2,3;
2,1; e 2,0 partidos políticos. O bipartidarismo, para estes casos, mostrou-se
razoavelmente estagnado.
Em outros países latinos, em sentido oposto, o bipartidarismo acabou
evoluindo para um multipartidarismo. No trabalho de SAÉZ171, verifica-se, por
exemplo, que a Colômbia, o México e a Nicarágua, que apresentavam uma média
de partidos políticos com assento no Legislativo, na primeira década de 90, de 2,2;
2,2; e 2,0, respectivamente, acabaram registrando clara evolução para o
multipartidarismo, com 2,9; 2,4; e 3,3 partidos políticos, respectivamente, revelando
a tendência eleitoral para a qual caminha a América Latina.
O bipartidarismo, de certa forma, autoriza a formação de partidos
majoritários, com dimensões fortes, de destaque e dominação. Trata-se daqueles
partidos que, devido sua doutrina e modo de aplicação de seus ideais perante seu
eleitorado, facilmente alcança uma dimensão tamanha que o conserva com a
maioria da representação política se comparado com o partido político adversário.
Até é possível que, num momento histórico outro, perca essa posição. Porém, no
bipartidarismo, esse efeito pode ser excepcional e temporário. No multipartidarismo,
a recíproca não é a mesma: conforme enfatizado por DUVERGER172, “em regime de
multipartidarimo, fundado no sistema proporcional ou nos dois turnos, essa
reviravolta [perda da dominação] significa, em geral, o fim do domínio.”.
Na atualidade, o bipartidarismo se mostrou a razão de muitas poucas
democracias. Com o surgimento dos partidos socialistas no final do século XIX e
169
Exemplo do Uruguai, como mencionado por DUVERGER (op.cit., p. 246-247) e no Brasil (1965-1979), como será melhor explicitado no capítulo seguinte deste trabalho de pesquisa.
170 SÁEZ, Manuel Alcántara/FREIDENBERG, Flávia. Partidos políticos na América Latina. OPINIÃO PÚBLICA, Campinas, vol. VIII, nº 2, 2002. p.145-146.
171 SÁEZ /FREIDENBERG, ibidem.
172 DUVERGER, Maurice. Os Partidos políticos. 2ª ed. Tradução de Cristiano Monteiro Oiticica. Revisão técnica de Gilberto Velho. Rio de Janeiro: Zahar; Brasília: Universidade de Brasília, 1980. p.342-343.
75
início do século XX, o que se identificou foi a formação de uma terceira plataforma
partidária em sistemas eleitorais como da Austrália, Inglaterra, Bélgica, Suécia e
Nova Zelândia, assim como, também, o aparecimento de uma pluralidade de
partidos de direita em outros inúmeros países, como a França, a Alemanha imperial
e weimariana, os Países Baixos e a Itália, dando-se fim à institucionalização e
regência de um sistema eleitoral fundamentado sob base bipartidária173.
De fato, em um ambiente democrático, o multipartidarismo vem ganhando
espaços mais significativos.
É que, tecnicamente, no processo de representação proporcional, o
bipartidarismo não se sustenta. Este é o seu freio. De acordo com o concluído por
DUVERGER174, “o regime proporcionalista atenua, por vezes, o multipartidarismo,
sem nunca o suprimir, sem nunca chegar ao bipartidarismo”, como, por exemplo, a
reorganização das bases partidárias por processos de fusão, com o objetivo de se
fortalecerem175. A sua tendência encontra ressonância mais pacificada apenas no
sistema eleitoral majoritário de um turno. O majoritário de dois turnos ou, ainda, na
representação proporcional, guardam características que exigem, com muito mais
facilidade, a implementação do sistema plural de partidos.
Fato é que o multipartidarismo absorve, facilmente, o modo de
organização e funcionamento num ambiente democrático com muito mais facilidade
que qualquer outro sistema partidário. Segundo DUVERGER176, o multipartidarismo,
via de regra, pode se apresentar de uma forma ordenada e limitada, com
características marcadas pela realização de escrutínios uninominais, de lista, ou de
uma forma anárquica e desordenada, ou, ainda, de uma forma mista, intermediária.
Embora sua matriz sinalize novos meios de tratamento da oposição, não exatamente
com contrariedade, segundo a “política de adversários” que fundamenta o sistema
173
DUVERGER, Maurice. Os Partidos políticos. 2ª ed. Tradução de Cristiano Monteiro Oiticica. Revisão técnica de Gilberto Velho. Rio de Janeiro: Zahar; Brasília: Universidade de Brasília, 1980. p.264-274.
174 DUVERGER, ibidem, p. 283.
175 Como foi o caso da aglutinação dos socialistas na Itália em 1919, da mesma forma como a redução do número de partidos de bases de direita e do centro, com a “unificação das classes médias e ‘burguesas’ em torno dos partidos católicos, na França, em 1945, e na Itália, em 1920 e 1945; e, igualmente, a respectiva unificação em torno dos partidos fascistas na Itália e, principalmente, na Alemanha” (DUVERGER,1980, p. 283). FERREIRA FILHO (1966, p. 154), ao examinar a forma multipartidária brasileira faz uma interessante reflexão: alerta que a expectativa de que a redução dos partidos contribuiria para uma mudança na vida política é ilusória, haja vista o Brasil não ser provido de partidários com conteúdo programático e o seu sistema de partidos não ser coeso, homogêneo e disciplinado, exatamente como os casos da Grã-Bretanha e dos Estados Unidos.
176 DUVERGER, Maurice, ibidem, p.275.
76
bipartidário, o multipartidarismo autoriza a adoção de “uma linha de ação mediativa,
de integração, que no bipartidarismo inexiste”177.
De outro lado, parte da doutrina repudia esta forma de pluralismo.
FERREIRA FILHO178, a partir das expressões de Manoilesco, expôs como sendo
dois os “graves inconvenientes” apresentados pelo multipartidarismo: o primeiro
consistiria numa falsa concepção de atendimento da vontade geral, mas de
vontades coletivas particularizadas, propriamente ditas; o segundo macularia o
direcionamento da busca do bem comum pelo governante, porque o tendenciaria em
desviar o foco do bem comum para se preocupar com outras questões políticas e
suas, em particular.
Contudo, independentemente destes fatores, uma característica
fundamental que o multipartidarismo traz à representação proporcional é o
engendramento de partidos novos, tanto de grande e significativa dimensão, ou seja,
de maior influência perante a opinião pública (seu eleitorado) ou expressão política
perante os demais atores governamentais e parlamentares, quanto de menor
influência eleitoral, os chamados “pequenos partidos” 179. A estes a preocupação de
se manterem no cenário político é constante, mesmo porque contribuem para a
prospecção e, portanto, oxigenação da democracia.
“Grupúsculos”, conforme denominado por DUVERGER180 que, em
verdade, “nunca têm mais do que representação numérica muito fraca no
Parlamento, não parecendo, pois, capazes de desempenhar papel governamental
ou oposicional importante”. Podem se apresentar como partidos de personalidades,
ou seja, de meros “grupos parlamentares sem organização partidária real no país” e
que se mantêm como sendo de base governista, formados por deputados
177
CAGGIANO, Monica Herman Salem. Oposição na Política: propostas para uma rearquitetura da democracia. São Paulo: Agnelotti, 1995. p. 79.
178 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Os Partidos Políticos nas Constituições Democráticas: o Estatuto Constitucional dos Partidos Políticos no Brasil, na Itália, na Alemanha e na França. Imprensa da Universidade de Minas Gerais: Revista Brasileira de Estudos Políticos; Estudos Sociais e Políticos, vol. 26, 1966. p. 85-86.
179 Pela oportunidade não se poderia deixar de trazer à colação o curioso diagnóstico feito por PANEBIANCO (2005, p. 352-353) quando da análise da dimensão de um partido político. Para o autor, o número de votos, de filiados ou de membros da organização nem sempre reproduzem a força eleitoral que se imagina. Tratam-se, em verdade, de critérios de medição absolutamente distintos, enquanto: “há casos de partidos ‘grandes’ sob o ponto de vista eleitoral e, ao mesmo tempo, ‘pequenos’ do ponto de vista das filiações. Nos anos 50, a CDU era muito ‘menor’ do que o SPD em termos de filiados, mas muito ‘maior’ em termos de votos”.
180 DUVERGER, Maurice. Os Partidos políticos. 2ª ed. Tradução de Cristiano Monteiro Oiticica. Revisão técnica de Gilberto Velho. Rio de Janeiro: Zahar; Brasília: Universidade de Brasília, 1980. p.324.
77
indisciplinados; ou, então, partidos de minorias independentes, organizados e
estruturalmente criados como um partido “de massa” – ditos “satélites, que gravitam
em torno de certo astro poderoso” –, em regra, de base oposicionista e
caracterizados por autorizarem, ou não, sua filiação a qualquer outro grande partido.
Ainda assim não são menos importantes. Pelo contrário. A depender da
situação do processo eleitoral, podem ser decisivos: ser os verdadeiros
responsáveis na competição eleitoral, invertendo, por completo, a regra do jogo ao
conferir ao adversário a posição de vencedor almejada. Ou seja, in verbis:
Os pequenos partidos, excepcionalmente, podem ocupar posição de
árbitro, que lhe dá considerável influência, seja no plano eleitoral,
seja no plano parlamentar. Em escrutínio majoritário de um só turno,
podem alterar, completamente, a representação, se os dois grandes
partidos têm um número de votos tão aproximados que bastem
alguns sufrágios dados a um pequeno para deslocar a vitória. Tal
posição de árbitro é ainda mais grave no plano parlamentar, desde
que a diferença entre a maioria e minoria seja tão fraca que o
deslocamento do pequeno partido se torne suficiente para alterar o
equilíbrio da Assembléia. Então, o destino do país passa a depender
de grupo acentuadamente minoritário e profundamente diferente do
conjunto da comodidade nacional (se se trata de partido de minoria
permanente). Não se pode governar sem o seu apoio e o seu apoio
complemente aqueles que o aceitam.181 [sic]
Assim, o sistema de partidos, de certo modo, qualifica-se no sistema
eleitoral, indicando o cenário partidário que o eleitorado irá participar no exercício do
sufrágio. Nasce e evolui naturalmente no seu tempo, sendo, sempre que instigado,
convidado a se adaptar à eventuais modificações, severas ou não, justamente
porque tanto quanto a representação proporcional mostra-se sensível às mudanças
de opiniões.
3.2.2. Alianças ou Coligações Eleitorais
Alianças eleitorais (ou coligações partidárias), muitas vezes, se colocam
como mecanismos necessários à conquista do poder. Dentre as principais 181
DUVERGER, Maurice. Os Partidos políticos. 2ª ed. Tradução de Cristiano Monteiro Oiticica. Revisão técnica de Gilberto Velho. Rio de Janeiro: Zahar; Brasília: Universidade de Brasília, 1980. p.328-329.
78
características lançadas na doutrina de DUVERGER182, podem ser
operacionalizadas tanto de forma desordenada e provisória, com a simples intenção
de interagir, sustentando ou derrubando as forças governamentais, quanto de modo
sólida e duradoura, desenvolvendo atividades bastante próximas às realizadas por
um superpartido.
São também admitidas tanto no bipartidarismo, quanto no
multipartidarismo. Da mesma forma que, numa representação proporcional, podem
ser firmadas nas eleições por escrutínio majoritário de um (alianças muito fortes) ou
de dois turnos (alianças estreitas).
Podem, além disso, ganhar assento nos parlamentos ou nos governos,
porém, se não existir solidariedade entre os partidos aliados quando das eleições,
posteriormente essa mesma solidariedade na plataforma governamental ou
parlamentar restará absolutamente enfraquecida, com atribuição de
responsabilidade de um ao outro sempre que atos impopulares ocorrerem.
Por fim, ainda que pareça estranho, a conjunção dos extremos (direita e
esquerda), embora rara, pode ocorrer sempre que o objetivo a ser alcançado seja
firmar oposição aos moderados, geralmente ao regime de governo.
Para PANEBIANCO183, a aliança entre partidos não implica num modo
positivo de operação eleitoral. Pelo contrário: prejudica a estabilidade dos partidos,
porque aumenta a incerteza ambiental, tornando a “aliança entre os competidores
necessariamente precária”.
A seu ver, a única exceção à regra, que poderia implicar num ambiente
estável para ambos os partidos aliados, seria, numa primeira vertente, se os
envolvidos possuíssem ideologias próximas, com público fiel (eleitores), que
configurassem aos partidos aparência de verdadeiros competidores, como, por
exemplo, “o caso da aliança entre um partido socialista (território de caça: operários
e empregados) e um partido de ‘nova esquerda’ (território de caça: estudantes e
intelectuais de orientação radical)”184. Numa segunda vertente, quando a
institucionalização de um dos partidos é fraco o suficiente que se torne “incapaz de
182
DUVERGER, Maurice. Os Partidos políticos. 2ª ed. Tradução de Cristiano Monteiro Oiticica. Revisão técnica de Gilberto Velho. Rio de Janeiro: Zahar; Brasília: Universidade de Brasília, 1980. p. 358.
183 PANEBIANCO, Angelo. Modelos de Partido: organização e poder nos Partidos políticos. Tradução de Denise Agostinetti. Revisão por Karina Jannini. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p.431.
184 PANEBIANCO, ibidem.
79
exercer uma atração efetiva sobre o território de caça do outro partido”185,
desconfigurando qualquer ameaça ao partido forte. De modo que, em ambos os
casos, “não estando ameaçada, por razões opostas, a estabilidade de nenhum dos
dois parceiros, a aliança também se mostrará estável”186.
No Brasil, as alianças partidárias são admitidas tanto nas eleições
majoritárias quanto nas proporcionais. Chegaram a sofrer, no início deste século,
significativa restrição por ato exarado do Tribunal Superior Eleitoral que, em clara
ação de ativismo judicial, confirmada posteriormente pelo Supremo Tribunal Federal,
teria determinado que a mesma plataforma de coligação partidária firmada nas
eleições nacionais fosse obedecida nos pleitos eleitorais estaduais, distrital e
municipais.
Melhor explicitando tal fato, segundo enfatizado por REIS187, a celeuma
desse fenômeno conhecido como a “verticalização” das coligações partidárias, durou
anos. In verbis:
Desde 2002 até 2006 o tema passou pelo Judiciário, pelo Legislativo
e de volta ao Judiciário. Os magistrados preferem chamá-la de
“princípio da coerência nas coligações partidárias”. Existia, já em
2002, norma prevendo a coerência – entre eleições majoritárias e
proporcionais de uma mesma circunscrição – o que, de início, foi
interpretada como rígida. A interpretação evoluiu para uma versão
diferente, que permitia combinações nas eleições estaduais, embora
ainda orientasse-as pelas nacionais, com exceção dos partidos
“solteiros” ou que não participavam da eleição nacional.
O advento da verticalização veio com a interpretação pouco usual de
“circunscrição”. A simultaneidade das eleições nacionais e estaduais
causou uma ilusão nos magistrados: a de que haveria qualquer
relação de pertinência entre as circunscrições nacional e estaduais.
A circunscrição está ligada a um pleito e não a vários. Em eleições
nacionais, há uma circunscrição nacional. Em eleições estaduais,
várias (27). Elas existiriam mesmo que os pleitos não fossem
simultâneos, como hoje acontece no Brasil. Os magistrados,
contudo, criaram uma relação de pertinência: as estaduais estão
contidas na nacional. Esse seria o principal motivo para haver a
verticalização.188
185
PANEBIANCO, Angelo. Modelos de Partido: organização e poder nos Partidos políticos. Tradução de Denise Agostinetti. Revisão por Karina Jannini. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p. 431.
186 PANEBIANCO, ibidem.
187 REIS, Daniel Gustavo Falcão Pimentel dos. O ativismo judicial no Brasil : o caso da verticalização. 2014. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2014. p.291.
188 REIS, ibidem.
80
No exercício da função consultiva resguardada ao Tribunal Superior
Eleitoral pelo Código Eleitoral189, referida matéria foi regulamentada em âmbito da
Resolução nº 21.002, editada em 26 de fevereiro de 2002190 e considerada com
força normativa pela Resolução nº 20.993, exarada na mesma data.
Embora expurgada do ordenamento jurídico, a “verticalização” deferida
pelo TSE com a edição da Emenda Constitucional nº 52, promulgada em 08 de
março de 2006, pelo Supremo Tribunal Federal, na Ação Direta de
Inconstitucionalidade nº 3685 – Distrito Federal, sob relatoria da Ministra Cármen
Lúcia, a retroação de efeitos às eleições de 2002, constante do art. 2º, não foi
acolhida, juntamente com a sua aplicabilidade ao pleito eleitoral de 2006, por
maioria, vencidos os votos dos Ministros Marco Aurélio e Sepúlveda Pertence191.
3.3. O PODER DAS ELITES NO SISTEMA PARTIDÁRIO
O poder das elites, ou a Teoria das Elites, consubstancia o fenômeno da
concentração do poder nas mãos de uma minoria – eleita – que monopoliza a
regência do governo da maioria – eleitora. Trata-se de um fenômeno classicamente
conceituado por Gaetano Mosca no final de 1895192, tida, em regra, como causa
recorrente e maléfica para a sociedade.
Estrutura-se não simplesmente pela existência de um núcleo restrito de
pessoas da classe política dominando o poder em sobreposição aos interesses de
189
Art. 23: “Compete, ainda, privativamente, ao Tribunal Superior”; (...) inciso IX: “expedir as instruções que julgar convenientes à execução deste Código”.
190 Por derivação da Consulta nº 715 – Brasília/DF, relatada pelo Ministro Jacy Garcia Vieira, a Resolução nº 21002/02 foi editada por decisão da maioria, vencidos os Ministros Sepúlveda Pertence e Sálvio de Figueiredo, com ementa firmada nos seguintes termos: “Consulta. Coligações. Os partidos políticos que ajustarem coligação para eleição de presidente da República não poderão formar coligações para eleição de governador de estado ou do Distrito Federal, senador, deputado federal e deputado estadual ou distrital com outros partidos políticos que tenham, isoladamente ou em aliança diversa, lançado candidato à eleição presidencial. Consulta respondida negativamente.”
191 Com julgamento em 22 de março de 2006 e acórdão publicado em 10 de agosto subsequente, “o Tribunal, por maioria, julgou procedente a ação para fixar que o § 1º do artigo 17 da Constituição, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 52, de 8 de março de 2006, não se aplica às eleições de 2006, remanescendo aplicável à tal eleição a redação original do mesmo artigo”. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/peticaoInicial/verPeticaoInicial.asp? base=ADIN&s1=3685&processo=3685>. Acesso em 25-jan-2016.
192 Data de publicação da sua obra Elementi di scienza politica, como prefaciado pelo próprio autor na segunda edição concebida em 1925.
81
uma sociedade, já que tal evento não figurava novidade alguma, mas na força que
essa classe política assumia por ser organizada, homogênea e solidária “contra a
mais numerosa, dividida, desarticulada, dispersa e desagregada classe dirigida”193,
que era a maioria.
Para melhor compreender esse fenômeno social, MOSCA194 explicitou
que, inevitavelmente, a tendência encontrada em todos os organismos políticos de
todas as sociedades, principalmente naquelas de desenvolvimento tão medíocre,
porque similares aos primórdios da civilização, é a formação de duas classes
bastante distintas: a dos governantes e a dos governados. Uma menos numerosa,
minoria, que adentra as funções políticas dessa sociedade para monopolizar o poder
e usufruir todos os benefícios do poder conquistado, em condição de exclusividade.
Outra bem mais numerosa, maioria, que é diretamente regulada, por vezes, de
modo arbitrário e violento por aquela, a classe detentora das funções políticas da
sociedade.
Na prática, ambas são interdependentes uma da outra. Enquanto a
maioria é convencida de receber dos governantes que integram a minoria, ao menos
aparentemente os meios materiais de subsistência, esta espera que a maioria lhe
resguarde a sua própria sobrevida.
Segundo o autor, essa minoria se compõe de indivíduos guarnecidos de
certa superioridade material, intelectual e moral que exerce uma força
verdadeiramente irresistível sobre cada indivíduo da maioria, assumindo o patamar
de classe dirigente. Por ser minoria, consegue ser organizada, sinalizando um
atributo significativo que, exatamente, a maioria não consegue alcançar, afinal, são
cem e não mil195.
Os principais vetores que denotariam a formação e evolução das minorias
no âmbito da sociedade se extrairiam dos núcleos militares e, subsequentemente,
193
BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. 7ª ed. Tradução de Carmen C.Varriale... [et al.]; coordenação da tradução João Ferreira, revisão geral João Ferreira e Luis Guerreiro Pinto Cascais. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1995. 1º vol, p.386.
194 MOSCA, Gaetano. Elementi di Scienza Politica. 4ª ed. Bari/Itália: Gius.Laterza &Figli, 1947. v.1;MOSCA, 1947, v.1., p. 78-107. No mesmo sentido: MOSCA, Gaetano. Teorica dei Governi e Governo Parlamentare: studi storici e sociali. 2ªed. Milano: Soc.An.Instituto Editoriale Scientifico, 1925, p. 19 e ss.
195 MOSCA, Gaetano. Elementi di Scienza Politica. 4ª ed. Bari/Itália: Gius.Laterza &Figli, 1947. v.1; MOSCA, 1947, v.1., p. 84 e ss.
82
das bases eclesiásticas e de consanguinidade, exatamente como visto desde os
primórdios da Índia, no Império Romano, nos demais povos da Idade Média etc.
Num panorama histórico e em apertada síntese, nas sociedades
primitivas, os dirigentes militares tinham fácil acesso à classe política devido ao
status excepcional de “guerreira” que a atividade ressoava em face da própria
multidão, pacífica. Facilmente tornavam-se classe dominante, detentora de terras e
do poder político. Por ser o poder produto da riqueza, na medida em que a
civilização progredia a transformação social era de mutação desse valor militar inicial
pelo valor da força de uma pessoa rica. Passo seguinte, em razão da significativa
importância que ganhavam as crenças religiosas numa sociedade, mesma força e
poder adquiriam os ministros dos cultos, assim como a energia passada aos
descendentes da classe governante, justificando a formação e o poder das
aristocracias hereditárias.
Enfim, MOSCA, ao descrever de que forma é escolhido um deputado pela
maioria dos eleitores, concluiu que numa eleição não são os eleitores que o elegem,
mas o deputado, pelo núcleo dos seus próprios amigos, que se faz eleger, a partir
da simples imposição de vontade que depositam na maioria desorganizada,
influenciando suas escolhas196. A recíproca é verdadeira em relação aos partidos
políticos que, num sistema parlamentar, para alcançarem o sucesso, também se
investem da necessidade de serem bem organizados197.
PARETO198, motivado na Teoria das Elites de MOSCA, relacionou o
poder da elite política, ou aristocracia, com o grau de superioridade de sua riqueza.
Para ele, a desigualdade natural que cada indivíduo tem na sociedade depende do
comparativo da atividade profissional exercida por cada um, melhor dizendo, do grau
de superioridade de sua riqueza, se verdadeiramente integrante de uma elite ou não.
Fato é que várias são as denominações chanceladas pela doutrina em
face dessa elite dirigente, todas apresentando o mesmo significado.
196
“Ad ogni modo questo è sicuro che uma candidatura è sempre l’opera di un gruppo di persone riunite per um intento comune, di una minoranza organizzata, que, come sempre, fatalmente e necessariamente s’impone alle maggioranze disorganizzate.”, melhor dizendo, “De qualquer forma, é certo que uma candidatura é sempre o trabalho de um grupo de pessoas reunidas por um objetivo comum, de uma minoria organizada que, como sempre, inevitavelmente e necessariamente se impõe às maiorias desorganizadas” (tradução livre). Cf. MOSCA, 1925, p. 250-252.
197 MOSCA, ibidem, p. 268-269.
198 PARETO, Vilfredo. Les Systèmes Socialistes. Paris/França: V.Giard & E.Brière, 1902. p. 54/55.
83
Além das denominações de “Classe Política” ou “Minoria Governante”, por
MOSCA ou, ainda, “Aristocracia” ou “Classe Eleita” por PARETO, BOBBIO, por sua
vez, lembra que Aristóteles já definia como oligarquia o fenômeno do mau governo,
por simplesmente ser de poucos.
No pós-Segunda Guerra Mundial, a oligarquia era tomada como um
fenômeno da aristocracia, e não do regime democrático199, não obstante, para os
países do Terceiro Mundo acabara se evidenciando como uma ferramenta
indispensável para a seguridade do progresso social. Nesse sentido foram as
observações de BOBBIO200:
É de fato de observar que, em vez de ser acusada de buscar apenas
o próprio interesse, a Oligarquia dominante nos países em vias de
desenvolvimento é considerada como o único grupo de poder capaz
de promover os interesses nacionais, desde que seja tido como
interesse nacional o abrir caminho ao processo de modernização.
Para a compreensão do necessário, destacou que a própria etimologia da
palavra “oligarquia” já a assinava como “governo de poucos”, num significado que,
conforme os clássicos pensamentos da filosofia política, assumia a ênfase ainda
negativa de “governo dos ricos”, porque, uma vez organizado ou elitizado, esse
governo é que ditava o caminho de muitos201.
MICHELS, no mesmo sentido, ao atribuir a essa minoria de poder o nome
de “Oligarquia”, identificou a presença desse fenômeno não apenas no bojo da
formação e evolução de uma sociedade, como também das organizações como um
todo, notadamente, dos próprios partidos políticos. In verbis:
Em qualquer organização, trate-se de um partido político, de uma
união profissional, ou de qualquer outra associação do tipo, a
tendência aristocrática manifesta-se muito claramente. O mecanismo
da organização, ao mesmo tempo em que confere solidez estrutural,
conduz a sérias mudanças na massa organizada, invertendo
completamente a posição respectiva de líderes e liderados. Como
199
BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. 7ª ed. Tradução de Carmen C.Varriale... [et al.]; coordenação da tradução João Ferreira, revisão geral João Ferreira e Luis Guerreiro Pinto Cascais. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1995, 2ºvol. p.836.
200 Cf. BOBBIO, 1995, 2ºvol., p. 837.
201 BOBBIO, ibidem, p. 185.
84
resultado da organização, todo partido ou associação profissional
divide-se em uma minoria dirigente e uma maioria dirigida. 202
DUVERGER203, reforçando o particular exame dessa teoria sobre as
agremiações partidárias, asseverou culminar a oligarquia numa “casta mais ou
menos fechada”, num “círculo interior” de difícil acesso, motivadas, muitas vezes, por
certo conservadorismo do próprio corpo de eleitores que não aceita novas
fisionomias, senão os velhos chefes.
A seu ver, para ser candidato, todo interessado deve enfrentar a primeira
peneira de seleção e indicação ao processo eleitoral: a aprovação de seu nome
pelos comitês dos partidos políticos, especificamente por seus dirigentes,
considerados o “Círculo Interior” ou “Círculo Interno”. A única exceção admitida a
essa regra é quando a pessoa do candidato exerce papel fundamental numa eleição
com prospecção muito maior que o próprio comitê eleitoral, que, em razão disso,
acaba autorizando a sua abertura interna para a circulação das elites.
Com isso, o fenômeno das oligarquias, na visão de DUVERGER,204
triunfa em qualquer sistema eleitoral (unitário, bipartidário ou multipartidário), do
mesmo modo que no sistema proporcional com lista bloqueada, justamente onde o
oferecimento de uma relação exata dos candidatos às eleições pela base partidária,
sem direito à escolhas ou modificações, é realizada.
Admite ressonância tanto na pessoa dos chefes dirigentes, por meio dos
denominados camarilhas ou clãs (grupos que se utilizam da solidariedade pessoal
para estabelecer influências exteriores), ou, ainda, das “equipes de direção”
(personalidades que não se utilizam de influência pessoal, mas se desenvolvem na
horizontalidade), quanto na instituição (burocracia).
Mas, de outro lado, tende ao envelhecimento, exigindo dos quadros
partidários esforço para a sua constante renovação, através da quebra de
paradigmas e preconceitos mediante a abertura de espaços para que novas
fisionomias sejam lançadas, permitindo o rejuvenescimento do círculo interno com
segurança sem a desconfiança dos eleitores.
202
MICHELS, Robert. Sociologia dos Partidos Políticos. Tradução de Arthur Claudon. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1982 (Coleção Pensamentos Políticos). p.15/16 e 300.
203 DUVERGER, Maurice. Os Partidos políticos. 2ª ed. Tradução de Cristiano Monteiro Oiticica. Revisão técnica de Gilberto Velho. Rio de Janeiro: Zahar; Brasília: Universidade de Brasília, 1980. p.188.
204 DUVERGER, ibidem.
85
Para PANEBIANCO205, a “Coalização Dominante” se forma quando o
único líder dispõe de poder absoluto e negocia constantemente com os demais
agentes organizativos da base partidária o controle das zonas de incerteza, vale
dizer, das diversas expressões e opiniões propagadas tanto no ambiente interno
quanto no ambiente externo. Ele, líder, é o “centro de uma coalizão de forças
internas do partido, com as quais deve, ao menos numa certa medida, estabelecer
acordos”206. Sua função primordial é buscar a estabilidade organizativa, mantendo a
ordem negociada, vale dizer, “uma ordem que depende do equilíbrio entre forças e
questões diversificadas”207.
De outro lado, ainda, sustenta PANEBIANCO que nem sempre o poder
organizativo de um partido político está no seu interior, nos cargos internos ou
parlamentares, como sugerido pelas doutrinas da “oligarquia” e do “círculo interno” e
exemplificado na consolidação do Labour Party britânico, onde era possível ver a
convergência de forças tanto dos líderes mais poderosos da anterior Trade Unions
quanto dos setores “centristas” do grupo parlamentar, “reunidos em torno do líder do
partido”208 que o compunham.
Em alguns casos, o poder organizativo dessa “coalizão dominante”
perpassava os limites internos do próprio partido, sendo vista na presença de líderes
nacionais e líderes intermediários e/ou locais, notadamente quando em formação
estava um partido político. Exemplificando na estrutura da SFIO francesa209, que
contribuiu para a formação do Partido Comunista Francês – PCF, lembra que a
coalizão dominante pode se dar por um complexo canal de convergências e fusões
de setores centristas, bem como expulsões de alas de extrema direita e extrema
esquerda. Por suas próprias palavras, então:
No entanto, é preciso notar que o nascimento do PCF contém um
forte elemento de ambigüidade: a maioria dos congressistas da SFIO
presentes em Tours não vota as 21 condições de Lênin. Limita-se,
em vez disso, a votar (3.208 votos contra 1.022) a moção Cachin-
Frossard a favor da adesão à III Internacional. O embate entre
205
PANEBIANCO, Angelo. Modelos de Partido: organização e poder nos Partidos políticos. Tradução de Denise Agostinetti. Revisão por Karina Jannini. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p. 72-88.
206 PANEBIANCO, ibidem, p. 72-73.
207 PANEBIANCO, ibidem, p. 87.
208 PANEBIANCO, loc.cit.
209 “Section Fraçaise de l’Internationale Ouvrière (Seção Francesa da Internacional Operária) que, pela maioria de seus congressistas, juntamente com a cisão de Tours, em 1920, e a participação de um grupo “bolchevique” formam o Partido Comunista Francês – PCF (PANEBIANCO, loc.cit.).
86
“bolcheviques” e “socialistas de esquerda” começa somente a partir
de então.
Esses dois grupos levaram consigo a maioria dos quadros e dos
filiados da antiga SFIO à III Internacional e, juntos, conduziram os
primeiros momentos de vida do recém-nascido partido. Mas, sob a
pressão do Comintern, a aliança se rompe e tem início o conflito
aberto entre o grupo “centrista” (liderado por Frossard, primeiro-
secretário do partido) e o grupo “bolchevique” (liderado por Boris
Souvarine, Fernand Loriot e outros). Frossard é obrigado a se demitir
e, com outros “centristas” que com ele procuraram reconduzir o
partido à situação pré-Tours (isto é, a uma nova unificação com o
que restava da SFIO), abandona a organização. O grupo “centrista”
se divide em dois: a ala de direita, capitaneada por Frossard, sai; a
ala de esquerda torna a reunir-se aos “bolcheviques”. Em seguida,
com o expurgo dos grupos mais sectários (de extrema esquerda), o
partido está pronto para iniciar o processo de bolchevização.210 [sic]
Assim, acreditando que seria a fisionomia da Coalizão Dominante a
responsável por distinguir a ordem organizativa de um partido político, sugere
PANEBIANCO211, para a sua identificação, que examinados, individualmente e em
cada base partidária, seja “o seu grau de coesão interna, o seu grau de estabilidade
e o mapa do poder organizativo”.
Utilizando-se dos conceitos tradicionais da Teoria das Elites do poder,
explica que uma Coalizão Dominante pode tanto se apresentar como (1)
“Oligarquia”, ou seja, como um modo de dominação titularizado pela influência
desproporcional de um pequeno grupo (os dirigentes e seus responsáveis
supremos: os oligarcas) sobre as decisões coletivas de todo o grupo; quanto como
(2) “Monocracia”, vale dizer, como poder de dominação impulsionada por uma única
pessoa sobre as decisões coletivas do seu grupo e que atribui a essa pessoa a
identidade da organização; ou, ainda, como (3) “Poliarquia”, isto é, como regência da
organização coordenada em dois ou mais grupos, sem que, individualmente,
consigam propagar mesmo controle hegemônico.
Aplicando sua teoria na do clássico debate da Oligarquia, a Coalizão
Dominante mostra-se coesa e estável e a institucionalização (a forma como a
organização se solidifica) forte, tanto quanto na Monocracia, embora para este
conceito de poder, em razão da sua própria particularidade em torno do único líder,
210
PANEBIANCO, Angelo. Modelos de Partido: organização e poder nos Partidos políticos. Tradução de Denise Agostinetti. Revisão por Karina Jannini. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p.146.
211 PANEBIANCO, ibidem, p. 74-75.
87
também é possível se consagrar com a ausência de institucionalização. A Poliarquia,
de outro lado, desencadeia a existência de Coalizões Dominantes divididas, estáveis
ou não, evidenciando-se sempre em organizações com fraco processo de
institucionalização212.
De qualquer modo, independentemente da forma como essas elites
dirigentes são tratadas pela doutrina, fato é que, infelizmente, um lado corrosivo,
deturpante à formação partidária, produzem tais fenômenos na prática. Consoante
assinalado por FERREIRA FILHO213, a oligarquização partidária falseia a vontade
geral, porque induz essa vontade geral a escolher a “elite” política que a explorará
no futuro. Atinge, em cheio, os ânimos da sociedade, ferindo os interesses e ideais
que a democracia sustenta. “É a transformação da vida pública em jôgo
decepcionante que conduz depressa a de interêsse pelos negócios públicos, a
pouco caso pela ‘res publica’, fato mortal para a democracia” [sic].
Assim, como visto, os partidos políticos à sombra desse efeito se colocam
como também protagonistas, justamente porque não estão livres de interferir ou
sofrer as interferências do poder do grupo dominante que faz questão de
monopolizar o jogo político, inclusive sob o ponto de vista “intra” partido político.
Ledo engano imaginar que ilesa passaria a sociedade brasileira dos
desígnios e influências das classes políticas elitizadas e dominantes. Nas
observações de CARVALHO214, a elite política se formava por consequência da
própria estrutura estatal e não exatamente por decorrência de uma demanda social.
Mesmo na passagem do Império, quando aparentemente destituídas haviam sido,
logo retornaram na presença dos próprios líderes da elite passada. Exemplo disso
foram os líderes republicanos que fundamentaram o novo regime de governo sem
que perdida fosse sua força remanescente da elite imperial: Prudente de Moraes,
Campos Sales, Afonso Pena, Rodrigues Alves etc. Em todos os momentos era
possível verificar sua presença e prestígio, influenciando e dominando o poder.
212
Sobre institucionalização forte e fraca, importante anotar os destaques tratados no subcapítulo 3.1 “Origem e Institucionalização”, anterior, deste trabalho de pesquisa.
213 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Os Partidos Políticos nas Constituições Democráticas: o Estatuto Constitucional dos Partidos Políticos no Brasil, na Itália, na Alemanha e na França. Imprensa da Universidade de Minas Gerais: Revista Brasileira de Estudos Políticos; Estudos Sociais e Políticos, vol. 26, 1966. p. 58-59.
214 CARVALHO, José Murilo de. A Construção da ordem: a elite política imperial. Rio de Janeiro: Campus, 1980 (Contribuições em Ciências Sociais,vol.8). p. 23-49.
88
3.3.1. Governo da Maioria X Participação da Minoria
De outro lado, na democracia contemporânea, ainda que preocupante
possa se firmar a inevitável formação das elites no jogo político, o princípio que
prevalece é o do pluralismo político.
CAGGIANO215 não poupa esforços ao frisar que na fórmula democrática,
“a decisão política encontra sua origem genética nos destinatários do poder, no
povo”, consagrando ao pluralismo político sua indisponibilidade e à livre
manifestação das opções políticas o seu resguardo, “de sorte que o polo da tomada
das decisões venha a espelhar as perspectivas da comunidade”.
Para NASPOLINI216, a concepção pluralista das sociedades modernas já
tornara os partidos políticos objetos de estudo central, justamente por considerá-los
a instância mais representativa, o sujeito pluralista por excelência que, além de
contribuir com a realização de eleições periódicas e com o processo de
democratização, firma o resgate da participação política individual no interior da
organização coletiva, da própria sociedade.
De qualquer modo, no jogo eleitoral, inexoravelmente, a competição pelo
poder, culmina na apresentação, ao final, do vencedor, ou vencedores, sempre.
Os partidos políticos, em alianças ou não, enquanto atores principais que
são nesse processo eleitoral, têm uma função primordial: a de promover esforços
significativos para apresentar seus candidatos ao corpo de eleitores, convencendo-
os da melhor opção à consolidação da representação política no governo.
Ainda que se possa imaginar factível uma linearidade na preferência dos
candidatos em disputa, a ponto de se distribuir o quantitativo de votos do eleitorado
em margens muito justas para cada concorrente, no fim, a maioria é quem decide. É
quem proclama o vencedor. No ambiente democrático, ela sempre terá razão.
Independentemente do comportamento eleitoral apresentar com clareza e ao final o
lado vencedor e o lado perdedor, ambos devem ser respeitados, cada qual na
proporção de suas conquistas.
215
CAGGIANO, Monica Herman Salem. Democracia X Constitucionalismo: um navio à deriva? Cadernos de Pós-Graduação em Direito: estudos e documentos de trabalho, Comissão de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da USP. São Paulo, n.1, 2011. p. 3.
216 NASPOLINI, Samuel Dal-Farra. Pluralismo Político: subsídios para análise dos sistemas partidário e eleitoral brasileiros em face da Constituição Federal. Curitiba-PR: Juruá Editora, 2006.
89
Para SARTORI217, a relação maioria-minoria se torna preocupante
quando as forças empreendidas no jogo político das eleições pela maioria, porque
superiores, se tornam extremadas a ponto de aniquilar a participação das minorias
da condição de legítimos atores do direito de se oporem, de serem oposição. A seu
ver, qualquer forma de repressão ou hostilização a esse direito na regra da maioria,
o sentido constitucional da expressão conceituada por Tocqueville e, posteriormente,
por Stuart Mill de “tirania da maioria” se evidencia, merecendo especial atenção por
exigir que contida, controlada, seja efetivamente. Ao elucidar os vários significados da relação maioria-minoria, deixa claro
que sobre cada perspectiva, muito embora nenhuma relação direta apresentem,
aparentemente, ao fenômeno da “tirania da maioria”, indiretamente a atingem,
justificando a cautela que se deve ter na ponderação das causas e efeitos.
Na ordem constitucional propriamente dita, o direito da minoria de fazer
oposição é claramente identificado, devendo ser resguardado e respeitado. Afinal,
“no contexto constitucional, a preocupação é com as minorias, e não com as
maiorias”218, razão pela qual o princípio da maioria não pode se apresentar com
poderes excessivos, ilimitados ou absolutos. Deve se configurar numa aplicação
moderada, sob o viés de um princípio da maioria limitada.
Sob o ponto de vista eleitoral, vale dizer, quando a relação maioria-
minoria é verificada a partir do ato de votar no processo eleitoral, identificando com
clareza o eleitor que está do lado do vencedor e o eleitor que está do lado do
perdedor, que “joga fora” o seu voto por absoluta falta de valor na seara política,
referido conceito ganha relevância quando o princípio da maioria se depara com a
constituição de uma maioria governamental. Isto porque se aplicado o princípio da
maioria em níveis sucessivos, os seus múltiplos estágios são capazes de eliminar
uma a uma as diversas minorias existentes que, em regra, se somadas, representam
a constituição da maioria do corpo eleitoral e, respectivamente, da sociedade como
um todo. “No fim do processo, pode ser que também uma minoria numérica de
cidadãos emerja, a nível governamental, como a maioria vencedora”219, tornando-se
a maioria, apenas, a maior minoria.
217
SARTORI, Giovanni. A teoria da democracia revisada: o debate contemporâneo” Volume I. Tradução de Dinah de Abreu Azevedo. Série Fundamentos, nº 104. São Paulo: Ática, 1994. p. 184-189.
218 SARTORI, ibidem, p. 184.
219 SARTORI, ibidem, p. 188.
90
E, finalmente, no contexto social, a preocupação que se coloca é sempre
quando o princípio da maioria acaba legitimando a tirania social, ou seja, a relação
da sociedade com o indivíduo, como teorizado por Tocqueville e Mill, agravando-a. A
antítese entre a maioria e a liberdade do indivíduo deve ser preservada e não o
fomento da imposição de ideias e práticas tendenciadas pela sociedade ao livre
arbítrio do indivíduo.
Enfim, toda e qualquer forma de manifestação de maiorias, quer seja da
sociedade como um todo, definido como um conjunto de “agregados efêmeros”, quer
seja dentro de um corpo institucionalizado – um governo, um partido, um
parlamento, etc. –, definido como “unidade operante coesa e identificável”, a
conclusão que SARTORI220 chega é que evitada deve ser a concessão de “todo o
poder” tanto às maiorias quanto às minorias. Isto porque, consoante palavras do
próprio autor, “ao longo do processo eleitoral de votação, maiorias concretas
produzem minorias concretas, que por sua vez são submetidas ao critério de maioria
– e isso ocorre em todos os níveis, do eleitorado de massa ao governo” (op.cit., p.
189), configurando-se o peso da tirania da maioria numa realidade fática e
premente.
220
Giovanni. A teoria da democracia revisada: o debate contemporâneo” Volume I. Tradução de Dinah de Abreu Azevedo. Série Fundamentos, nº 104. São Paulo: Ática, 1994. p. 189.
91
4. PARTIDOS POLÍTICOS NO BRASIL
No Brasil, o termo “partido político” teria surgiu antes mesmo da
Independência, com os precedentes grupos e associações políticas que lutavam
pela predominância dos interesses sociais sobre quaisquer outros.
Em verdade, tratavam-se de meras facções, grupos políticos, e não
efetivamente de “partidos políticos”, já que, para estes era necessária a
preponderância de uma Constituição própria e até mesmo de um regime
representativo, com funcionamento parlamentar, para que existissem; o que, na
época, não havia221.
De fato, normas de regência colonial até anunciavam a indicação pelo
Príncipe Regente de políticos, deputados, para o exercício de atividades
administrativas222, que, em verdade, mais pareciam, nesse primeiro momento
histórico, tratarem-se de funcionários efetivos do Reino, jungidos à mesma
nomenclatura de “deputados” do que deputados representantes do povo em
exercício nos Parlamentos, como na atualidade223.
Havia apenas um sentimento histórico pela existência de partidos
políticos.
O jornal “Correio Braziliense”, em edição de janeiro de 1822, fazia
referência ao Partido da Independência, afirmando que consistiam, em verdade,
221
ARINOS DE MELO FRANCO. Afonso. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1980. p. 25.
222 Alguns exemplos iniciais são possíveis serem destacados, como (1) o Decreto de 23 de fevereiro de 1808, que nomeou o Deputado e Secretário da Mesa da Inspeção da Agricultura e Comércio da Cidade da Bahia, José da Silva Lisboa, para a cadeira de ciência econômica na cidade do Rio de Janeiro; aliás a decisão nº 17 – Guerra – de 24 de junho de 1808, que tratou do estabelecimento da Junta de Direção da Impressão Régia, dando-lhe o regimento provisório previu: “é Sua Alteza Real servido nomear os Deputados das Mesas da Inspecção do Rio de Janeiro e Bahia, o Doutor Marianno José Pereira da Fonseca e José da Silva Lisboa, para que juntos com Vm. formem a direcção que deve regular o sobredito estabelecimento, na forma e modo que se contém nas instrucções que remetto juntamente com este Aviso (...)” (sic- g.n.); (2) o Decreto de 29 de junho de 1808, que nomeou o Deputado da Bulla da Cruzada, Fr. José de Moraes, para o cargo de Comissário Geral; etc.
223 Segundo o Alvará de 22 de abril de 1808, que criou um Tribunal na Cidade do Rio de Janeiro, denominado “Mesa do Desembargo do Paço e da Consciência e Ordens”, havia a previsão em sua estrutura de pessoal de Deputados (item II), com renumeração salarial (dito “ordenado”) previamente estabelecida e em conjunto com os ordenados do Presidente e dos Desembargados respectivos (item X, “1:600$000”). No mesmo sentido, Alvará de 23 de agosto de 1808, que criou o Tribunal denominado “Real Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegação deste Estado e Domínios Ultramarinhos”, previa a indicação de Deputados e de Secretário-Deputado para o exercício de atividades submetidas a um “ordenado anual”.
92
muito mais tendências liberais ou conservadoras de cada deputado, individualmente,
do que efetiva concepção de grupo224.
A qualidade e o atributo de representantes do povo, propriamente ditos,
passaram a ser nitidamente identificados, apenas, nos escritos subsequentes, em
especial no Ato da Proclamação, de 13 de julho de 1821, firmado pelas Cortes
Gerais e Extraordinárias da Nação Portuguesa aos habitantes do Brasil.
Além das considerações acerca da adoção de uma Constituição Política
futura e de avocação dos deputados brasileiros para completarem o quadro da
representação nacional, auxiliando e deliberando sobre as tarefas pertinentes à
consolidação da vontade coletiva pela liberdade e independência, extrai-se, ao final,
deste Ato de 1821, in verbis:
Brazileíros! Nossos destinos estão ligados: vossos irmãos não se
reputarão livres, sem que vós o sejaes tambem: vivei certos disso; e
convencei-vos de que os seus Deputados, como representantes de
toda a nação, estão promptos a sacrificar até a. sua propria
exístencía para que ella seja tão livre e tão feliz, quanto o póde e o
merece ser. [sic]
Ainda assim não se tratavam de partidos políticos, mas de representantes
políticos que começavam a ganhar conotação de representantes do povo, sob a
roupagem de defensores de interesses coletivos.
A formação partidária ganha legitimidade e, portanto, status jurídico-
constitucional a partir do período imperial. Mostrou força política desde então, quase
preponderante em todos os momentos da história brasileira. Contribuíram,
certamente, no estabelecimento dos regimes eleitorais, apresentando vida,
organização, dimensões, fusões e cisões segundo o ambiente social e parlamentar
vivenciados. Repetiu origens e movimentações intrapartidárias muito próximas às
descortinadas pela doutrina clássica225.
Em razão disso, por todas as diversidades encontradas, nada mais justo
se faz o exame particularizado deste tema – partido político – em solo brasileiro, no
que se propõe a abordagem por dois subcapítulos distintos, um para o Império e
224
VILELA, Renata Rocha. Partidos políticos e regulamentação: limites e benefícios da legislação partidária no Brasil. 2014. Dissertação (Mestrado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2014. p. 14.
225 A merecerem destaque as doutrinas de Maurice Duverger, Angelo Panebianco, Cláudio Lembo e
Afonso Arinos tratadas no terceiro capítulo deste trabalho de dissertação.
93
outro para a República, cada qual cuidando do ambiente (sistema eleitoral vigente);
do respectivo processo de institucionalização partidária (modo de organização e de
solidificação do sistema partidário), notadamente, das agremiações partidárias de
maior ênfase no período; e, por fim, o regime jurídico adotado.
4.1. PARTIDOS POLÍTICOS NO IMPÉRIO
No período imperial brasileiro, os grupos ou facções já existentes desde o
Brasil Colônia, que se formavam em torno da Constituinte de 1823, defendiam ideais
de força absolutamente opostas. Para ARINOS226, três bases políticas diversas
preponderavam.
A primeira inclinava-se ao interesse de um fortalecimento do poder da
Coroa, eram monarquistas providos de interesses bastante conservadores, como
José Bonifácio, que sustentava a bandeira pela ordem constitucional. Pautava-se,
em sua maioria, por juízes de primeira instância, jurisconsultos e altos
representantes da Igreja acima dos cinquenta anos de idade227.
A segunda, proferida por deputados titulados como “exaltados” ou
democratas228, firmava-se a partir de um sentimento vasto por liberdade,
defendendo a limitação do poder real, como era o caso da emenda proposta por
Ferreira França, com sustentação por um governo federalista, mesmo diante da
inexistência de ambiente favorável a essa proposta. Constituía-se de uma minoria,
formada pelo clero e por pequenos proprietários rurais.
A terceira sustentava posição de centro, cujos seguidores acabavam
sendo considerados independentes e defensores de uma doutrina moderada,
voltada para uma constitucionalização de direitos sem que prejudicado fosse o poder
e a governabilidade do Monarca.
226
ARINOS DE MELO FRANCO. Afonso. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1980. p. 26-28
227 Otávio Tarquínio de Sousa, apud ARINOS, ob.cit., p. 26
228 Ainda assim inscritos sob várias denominações distintas, por ARINOS (1980, p. 27/28) ou nas bases de sua pesquisa, como “puros”, “anarquistas”, “republicanos” ou ainda “revolucionários”, juntamente, com os grupos declarados “moderados” e os “restauradores” ou “corcundas” assumiam agrupamentos de denominação genérica de Grupos de Oposição, desprovidos de qualquer base eleitoral, com força principal não efetivamente em eleitores, mas “numa imprensa efêmera e desatinada” [sic].
94
Assim, no Império é que a vida político-partidária em si começa a tomar
forma, precisamente, a partir da abertura da primeira sessão preparatória da
Câmara dos Deputados, em 29 de abril de 1826, e da primeira sessão legislativa da
Assembleia Geral Legislativa, composta pela Câmara dos Deputados e pela Câmara
dos Senadores, em 06 de maio do mesmo ano. “Antes dessas datas, havia somente
deputados brasileiros eleitos para participar das Cortes Gerais Portuguesas de 1820,
sem que eles tivessem influência no processo legislativo brasileiro”229.
Importante ponderar que se legalizaram, efetivamente, apenas no
Segundo Reinado (1840-1889).
De início, eram dois: o Partido Liberal e o Partido Conservador que
começaram a se desenvolver, para alguns doutrinadores, em meados de 1831; para
outros, apenas no período da reação monárquica de 1837 ou, melhor dizendo, na
legislatura parlamentar de 1838.
Segundo ARINOS230 (op.cit., p. 25):
Foi sob a égide desta lei [a Constituição outorgada de 1824],
reformada em 1834, no sentido liberal, pelo chamado Ato Adicional
(nome imitado ao modelo napoleônico dos Cem Dias) e restaurada
no sentido conservador pela lei de 12 de maio de 1840, que
interpretou aquele Ato, que se processaram a arregimentação e a
vida dos Partidos políticos no Império.
Relata o autor que o Partido Liberal, antes mesmo do Partido
Conservador, teria tomado corpo com os movimentos liberais de revolta ao
absolutismo e de introdução por uma reforma constitucional de teor federativo que
se instalava nas Províncias do Primeiro Império, especificamente logo após a
Abdicação de Dom Pedro I. Revelavam-se grupos políticos de ideologia liberal ou
republicana que teriam se formado antes mesmo da Revolução de 7 de abril de
1831 e não a partir dela, como sustentado por Américo Brasiliense231.
229
VILELA, Renata Rocha. Partidos políticos e regulamentação: limites e benefícios da legislação partidária no Brasil. 2014. Dissertação (Mestrado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2014. p. 15.
230 ARINOS DE MELO FRANCO. Afonso. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1980. p. 25.
231 Joaquim Nabuco, aos dois, divergia; acreditava que tanto o Partido Liberal quanto o Partido Conservador teriam se formado apenas com a reação monárquica de 1837, por vezes, com a formação da legislatura de 1838 e não em momento distinto (ARINOS, 1980, p. 28-30).
95
Embora o federalismo no Brasil Império não tivesse encontrado espaço
suficiente para prosseguimento, assim como os esforços à finalização do Poder
Moderador232 e à institucionalização de um Senado eletivo e temporário233, a
concentração e a organização política liberal estabelecida desde a apresentação do
projeto de reforma em 1831 teriam sido vitoriosas com a edição do Ato Adicional,
pela maioria, de 1834234. Assim se verificava a conquista com a instalação do Poder
Legislativo Provincial, tão reclamado, e a extinção do Conselho de Estado – embora
de forma temporária, já que restabelecido teria sido referido Conselho em 1841, com
a Lei nº 234 de 23 de novembro.
Os liberais que representavam os interesses da burguesia urbana, do
capitalismo comercial e dos progressistas intelectuais escritores, jornalistas,
professores e magistrados, a merecer destaque Aureliano, Alves Branco, Limpo de
Abreu, Montezuma, Castro e Silva e Chichorro, acabaram predominando na Câmara
e nos sucessivos Gabinetes desde o Ministério de 10 de outubro de 1833 até o de
19 de setembro de 1837, consolidando a existência do Partido Liberal235.
Entretanto, as interferências desagregadoras e anárquicas que passaram
a sofrer, somadas à formação da legislatura de 1838-1841 na entrada do Segundo
Império por conservadores ligados aos interesses agrários, em especial dos
lavradores de café do sul – que teria se tornado a base econômica nacional,
suplantando o açúcar do norte –, motivaram a origem e a formação subsequente de
232
A lista dos poderes políticos no Império enumerava-se em Poder Legislativo, Poder Moderador, Poder Executivo e Poder Judicial, todos sendo expressão natural e necessária da soberania nacional. A novidade, se comparada à estrutura da clássica tripartição de poderes, foi a criação do Poder Moderador que, segundo PIMENTA BUENO (1857, p. 31), em quase todas as constituições faz parte do poder executivo. De acordo com o enfatizado pelo autor, “enfim, a conveniencia de que exista um poder legitimo que incessantemente vele sobre a manutenção da independencia, equilibrio e harmonia dos outros poderes politicos, dá nascimento ao que é denominado moderador” [sic].
233 Afinal, a Constituição Federal de 1824, outorgada pelo Imperador, teria legalizado o estamento público-burocrático da criação do seu Poder Moderador, de um Conselho de Estado e um Senado vitalício (CAVALCANTI, 1975, p. 52 e ss.)
234 A Lei nº 16, de 12 de agosto de 1834, que tinha a intenção de estabelecer um impulso liberal mais moderado. Fato é que devido à ausência de um processo de institucionalização entre as elites de diferentes níveis de um mesmo movimento, acabou fortalecendo ainda mais as elites de nível intermediário, caudilhas, locais, existentes nas províncias, mantendo-as na centralização federativa. Os órgãos de representação política, as Assembleias Provinciais, receberam atribuições legislativas e de controles que predominavam, inclusive, na nomeação dos Presidentes da Província, exigindo de todos que seguissem exatamente as ordens do governo central, sob pena de vigorosa resistência, com aparência absoluta de legalidade (CAVALCANTI, 1975, p. 54-55).
235 Gabinetes no período imperial brasileiro, constituídos nos Ministérios, condizem à nomenclatura apresentada pela doutrina para explicar como se operacionalizava a regência do governo estabelecido no período do Império Brasileiro.
96
outra agremiação partidária: o Partido Conservador. Conforme assinalado por
ARINOS:
Era chegado o momento de liberais da direita e antigos
restauradores da esquerda se unirem num pensamento comum de
ordem pública e de defesa dos grandes interesses econômicos
ligados à lavoura. Este é o movimento de formação do Partido
Conservador, que, tendo à frente o inquieto Vasconcelos, nasceu sob
o signo mais feliz para um Partido de ordem: o signo da conservação
que não rejeita o progresso236.
Forte defensor da monarquia, o Partido Conservador logo ganhou
simpatia e, em razão disso, assentos nos Gabinetes do Imperador, destacando-se
com força e poder muito maiores que os do Partido Liberal.
Obviamente que a discórdia surgiria, mergulhando a política brasileira no
período da Conciliação. Vale dizer, num período que teve início em 1847, com a
instalação, pelo Imperador, de um Conselho de Ministros misto, composto por
políticos liberais e conservadores, justamente para controlar a acirrada disputa de
poder que se fomentava237.
Entretanto, mesmo diante da tentativa do Imperador de se estabelecer um
Gabinete Liberal – o Governo de Paula Souza, como ficou conhecido à época238 –,
para apaziguarem os ânimos dos liberais, sua preocupação com a chegada de
236
ARINOS DE MELO FRANCO. Afonso. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1980. p. 34.
237 Referido Conselho era regido por um Presidente, criado segundo o Decreto nº 523, em 20 de julho do mesmo ano. Nesse contexto, consagrava-se a implantação de um sistema parlamentarista ao regime monárquico de governo, que permanecera vigente até a adoção do sistema presidencialista pelo regime republicano, iniciado em 15 de novembro de 1889 e legitimado com a Constituição Republicana de 1891.
238 Os Gabinetes do Império consistiam numa denominação dada ao conjunto dos Ministérios (Secretarias de Estado) que o integravam. No segundo Reinado, compunha-se do Presidente do Conselho de Ministros (também nominado como “Chefe do Gabinete”, “Presidente do Gabinete” ou, verdadeiramente, “Primeiro-Ministro”), criado pelo Decreto 523/1847 e respectivos Secretários de Estado. Inicialmente, integravam o Gabinete seis Secretarias de Estado: a Secretaria de Estado de Negócios do Império; a Secretaria de Estado de Negócios Estrangeiros; a Secretaria de Estado de Negócios da Fazenda; a Secretaria de Estado de Negócios da Justiça; a Secretaria de Estado de Negócios da Guerra e a Secretaria de Estado de Negócios da Marinha. Em 28 de julho de 1860, com o Decreto nº 1067, outra Secretaria foi criada, a Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas. Era costume denominar cada Gabinete a partir de um “apelido” extraído do nome do Presidente do Conselho de Ministros. Tanto quanto o Gabinete de Paula Souza, ocupado pelo ex-Deputado e Senador pela Província de São Paulo, Francisco de Paula Souza e Mello (na grafia original de seu nome), em 31 de maio de 1848, também é possível extrair da doutrina especializada (NABUCO, s/d) citações como o Gabinete Paraná, que faz referência ao período em que o Marquês do Paraná, Honório Hermeto Carneiro Leão, teria sido Primeiro-Ministro (6 de setembro de 1853), Gabinete Ferraz, do ex-promotor de Justiça, Juiz de Direito e Presidente da Província do Rio Grande do Sul Ângelo Moniz da Silva Ferraz (1859-1861).
97
eventuais reflexos da Revolução de 1848, na França, consistentes numa explosão
republicana e, consequentemente, fim da monarquia, forçaram-lhe a substituir
referido Gabinete Liberal pelo Gabinete Conservador de Olinda239, abrindo margem
à luta, sanguinolenta, de Praia, em Pernambuco.
O auge do Ministério da Conciliação foi em 1853 e perdurou até 1858.
Mas, consoante ARINOS240, naquele momento histórico “a situação geral
do país (...) não suscitava nem alimentava teses divisionistas”, não se justificando a
permanência de um processo violento para viabilizar os interesses da ala
progressista da burguesia, que além de pertencer a uma mesma classe social não
tinham problemas em choque.
Valem os parênteses: mesmo com os antagonismos partidários da época,
curioso verificar que as alianças partidárias já eram pensadas e praticadas desde
então na história brasileira. Provavelmente não da mesma forma àquelas verificadas
nos dias atuais, mas, inegavelmente, existiam. A esse fato, insta destacar a doutrina
de ARINOS241, notadamente sobre os comentários acerca do ambiente favorável
provocado na Câmara em 1850, pela chegada de “um daqueles momentos de
estabilidade em que o liberal se confundia com o conservador”. Somente após dez
anos é que o restabelecimento das identidades partidárias alcançaria êxito,
revertendo o quadro anterior: o triunvirato liberal, formado por Teófilo Ottoni,
Francisco Otaviano e Saldanha Marinho, se sagrava vencedor nas eleições de 1860,
equilibrando as forças com o “famoso triunvirato conservador que, dizia-se, por
tantos anos governara o Império: Eusébio, Itaboraí, Uruguai”.
A formação dos partidos políticos não se limitou à ideologia dessas duas
frentes partidárias, liberal e conservadora, apenas.
Com o pós-eleição de 1860, quatro novas agremiações partidárias se
firmaram: o Partido Progressista, o Novo Partido Liberal, o Partido Liberal Radical e
o Partido Republicano.
239
Como explicitado ao final da nota de rodapé anterior, tratava-se de um Gabinete que levava o nome do Marquês de Olinda, Pedro de Araújo Lima, o então Presidente do Conselho de Ministros, nomeado em 4 de maio de 1857.
240 ARINOS DE MELO FRANCO. Afonso. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1980. p. 38-39.
241 ARINOS, ibidem, p. 39.
98
O Novo Partido Liberal e o Partido Republicano, segundo ARINOS242,
teriam se formado a partir dos movimentos de esquerda, inclusive porque
“prosseguia, dentro dos quadros parlamentares, a evolução para a esquerda que
levou da Conciliação ao Progressista, deste ao liberalismo radical de 1868, até que a
ala esquerda deste último se tornou solidamente republicana”.
Enfim, o Partido Progressista era formado por integrantes das alas liberais
e de dissidentes conservadores, considerados moderados. Antes mesmo de se
formar partido era conhecido como a “Liga”, a “Liga Progressista”, fruto da liquidação
da Conciliação. Nasceu exatamente durante a legislatura de 1861. Sustentava,
como objetivo de organização estatal e sistema político propriamente dito, a
oposição pela reforma da Constituição, pela eleição direta, pela descentralização
política e pelo exclusivismo nos cargos públicos. Defendia, de outro lado, a
regeneração do sistema representativo e parlamentar a partir da implantação em
definitivo da divisão de poderes políticos, a responsabilização dos ministros de
Estado pelos atos do Poder Moderador, a defesa dos direitos e interesses locais da
província e do município, a reforma e correta execução da lei eleitoral com garantia
de qualificações verdadeiras, a eleição com garantia à real expressão da vontade
nacional e representação das minorias, dentre outros.
O Partido Liberal-Radical e o Novo Partido Liberal, embora este em
menor dimensão, “se assemelhavam muito mais a facções mais progressistas do
Partido Liberal então existente do que a qualquer outra coisa.”243
O Novo Partido Liberal teve sua formação em 1869, a partir da união de
liberais históricos e progressistas insatisfeitos com a dissolução, pelo Imperador, em
1868, do Ministério Progressista criado em 1866. Eram considerados centro-liberais
e, assim como os progressistas, também defendiam a responsabilização dos
ministros pelos atos do Poder Moderador. Constituíam projetos seus a
descentralização política nos moldes das condições sustentadas pelo Ato Adicional
de 1834244; a supressão da vitaliciedade dos senadores e sua incompatibilidade,
242
ARINOS DE MELO FRANCO. Afonso. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1980. p. 42.
243 JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 46.
244 O Ato Adicional de 1834, que consistiu na edição da Lei nº 16, em 12 de agosto, foi conquistado por forte pressão dos setores políticos liberais. Tinha por objetivo promover a alteração da Constituição Política do Império e na Lei de 12 de outubro de 1832, de modo que garantida fosse maior autonomia às Províncias, inclusive para a criação de Assembleias Legislativas próprias, no
99
juntamente com os deputados, de exercerem diversos cargos públicos; a reforma
eleitoral por eleições diretas na Corte, nas capitais das províncias e nas cidades
integradas por mais de 10 mil almas; e a independência do Poder Judiciário, dentre
outras prerrogativas. Seus integrantes foram os fundadores do Clube da Reforma e
do Jornal Reforma, ambos na Capital do Império, jungidos ao poder de difusão de
seus ideais.
O Partido Liberal Radical, por sua vez, foi constituído em 1868, no ano
anterior ao Novo Partido Liberal. Sustentavam ideias ainda mais ousadas, como a
extinção, de vez, do Poder Moderador, e não simplesmente a imposição de
responsabilidades aos Ministros pelos atos do Imperador. Proclamavam, também, a
eletividade dos senadores e a implementação de mandatos por tempo determinado,
assim como dos Presidentes das Províncias. Reclamavam, tal qual o Novo Partido
Liberal, a instituição do sufrágio direto e generalizado, dentre outros.
Em 1870, final do Império, nasceu o Partido Republicano,
especificamente em 3 de dezembro, com o famoso texto “Manifesto Republicano”,
apresentado na primeira edição do jornal “A República” por um grupo de políticos
paulistas liderados pelos fundadores do Clube Republicano, Quintino Bocaiúva e
Saldanha Marinho. Foi o primeiro e principal organismo partidário formado com o
intuito de se combater a monarquia, num período em que o governo imperial sofria
sucessivas crises e a política cafeeira da região sul brasileira o inverso: forte
ascensão e destaque. Os liberais descontentes com a queda do Gabinete Liberal de
1868 defendiam ideais positivistas, republicanos e federalistas, justamente porque
acreditavam serem esses os caminhos à verdadeira representação política e não a
monarquia. Raízes dessa base partidária logo se fincaram no Partido Republicano
Paulista – PRP, fundado em 03 de julho de 1873, na Convenção de Itu, em São
Paulo e no Partido Republicano Mineiro – PRM, instituído em 1888.
Importante destacar que embora existentes, a doutrina apontava os
partidos políticos como instituições minoritárias, sem vínculo popular. Isso porque a
representação política se ligava, como já ressaltado, à vontade do Imperador,
especificamente nas nomeações por ele promovidas a partir dos candidatos
lugar dos Conselhos Gerais existentes, dotadas de atribuições administrativas e legislativas bastante significativas. Na prática, não teria trazido a efetividade esperada: o poder centralizador do Imperador permanecia na pessoa dos Presidentes Provinciais que nomeava e a quem todos deviam obediência.
100
sugeridos pelos chefes dos partidos políticos ou, ainda, por seus candidatos
próprios. Conforme anotado por CAVALCANTI245:
No que toca aos partidos políticos, sabe-se que, no decorrer da
Conciliação, eles haviam, de certa forma, se desvinculado de seus
pressupostos socioeconômicos, visto que, de resto, tais
pressupostos estavam coincididos e harmonizados. Por isso, tem
razão Faoro quando diz que os partidos, naquele período de
Conciliação, constituída “instituições minoritárias, sem vínculo
popular, cuja autoridade se formava pela ligação com o imperador.”.
Para compreender respectiva fragilidade partidária, conveniente se faz,
ainda que em breves linhas, traçar as características do sistema eleitoral da época.
Nada se mostrava favorável à constituição de um sistema de partidos com
seriedade.
As eleições se processavam de modo indireto ou de duplo grau, porque “a
massa dos cidadãos ativos ou qualificados246, reunida em assembléias paroquiais,
escolhia os eleitores de Província e, estes, por sua vez, escolhiam os representantes
da nação e da Província” [sic].
E, além disso, o sistema eleitoral, durante praticamente todo o Império,
obedecia ao modo distrital, de divisão das Províncias em círculos eleitorais para
cada tipo de eleição (deputado geral ou deputado provincial), segundo os critérios da
lei247. Adotava-se o modo distrital puro, majoritário de eleição248.
245
CAVALCANTI, Themistocles Brandão (Diretor de Pesquisa); CINTRA, Miguel Ulhôa; MARINHO, Armando de Oliveira; AZEVEDO, Helvécio de Oliveira (Pesquisadores). O voto distrital no Brasil: estudo em torno da conveniência e da viabilidade sua adoção. Rio de Janeiro: FGV, 1975. p. 64.
246 Que jamais podiam ser da natureza escrava ou do sexo feminino, exatamente como era normalmente estabelecido em todo o mundo, assim como os mendigos e os civilmente incapazes (CAVALCANTI, 1975, p. 65).
247 O Decreto Lei nº 842, de 19 de setembro de 1855, que teria introduzido o Sistema Distrital no Brasil, conhecido como a “Lei dos Círculos”, dividiu as Províncias em distritos uninominais, conferindo, em outras palavras, o direito de um deputado geral, apenas, ser eleito por distrito (aquele que obtivesse a maioria absoluta dos votos, se existente mais de um candidato concorrendo por círculo, ou escolhesse o distrito ou círculo que iria representar, caso se elegesse em mais de um círculo) e um ou mais deputados distritais serem eleitos para as Assembleias Provinciais, já que “a divisão dos círculos era outra e, dependendo do quociente eleitoral, poderia haver mais de um deputado por distrito, o que ocorria na maioria dos casos” (CAVALCANTI, op.cit., p. 78). O objetivo era manter o esquema clássico de representação no Legislativo desde então, qual seja, “impedir que as maiorias provinciais esmagassem as maiorias locais e parciais” (CAVALCANTI, ibidem). Além de existirem impedimentos a certos agentes para se elegerem, porque considerados incompatíveis com o exercício da atividade legislativa, na apuração de votos o governo também manipulava a outra parcela do problema, garantindo-se um triunfo seguro, invariavelmente.
248 CAVALCANTI, ibidem, p. 77.
101
Quando não processado pelo voto distrital, o sistema eleitoral se
consolidava nos termos dos mandos e dos desmandos desejados pelo Imperador. O
Poder Moderador, previsto na Constituição Federal de 1824 e a ele atribuído,
conferia poderes suficientes para emitir decisão final sobre qualquer matéria,
inclusive sobre ponderações contrárias do Legislativo, proferidas no regime de
governo parlamentarista vigente à época.
Assim, no período do Primeiro Império, as eleições se fundamentavam em
listas fechadas, apresentadas por cada partido, com possibilidade de interpretação
dos votos considerados duvidosos e de conteúdo incerto. As alterações que se
reputavam conveniente para a sustentação do Governo eram realizadas a qualquer
tempo. Essa fase, conhecida como “eleições por chusmas”, favorecia a fraude,
principalmente porque “as eleições eram feitas por agentes administrativos
nomeados pelo Governo, pelo Gabinete que estava no poder”249 que, de outro lado,
aplicavam a força para coagir o eleitorado, “fazendo com que, durante o Império, as
eleições ganhassem, desde o pleito de 13 de outubro de 1840, a alcunha de
‘eleições do cacete’, que produziam câmaras unânimes em perfeita harmonia com o
Gabinete”250. Pelo Governo, eram nomeados os presidentes das províncias, também
com poderes para chefiar os Comandantes Militares da região251, assim como os
magistrados e o clero. E as eleições eram manipuladas pelo Ministério da Justiça.
No Segundo Império é que o sistema distrital se consagrava, em especial,
no período da Conciliação.
Foi introduzido em 1853, por sugestão do Marquês de Paraná, Presidente
do Ministério Paraná (ou Gabinete Paraná, como também era conhecido) que
sustentava a eleição em distritos, ou círculos, de um deputado na Câmara dos
Deputados, sagrando-se vencedor os beneficiários da maioria de votos. Embora os
conservadores se mostrassem irresignados com essa proposta, porque acreditavam
que assim o Parlamento podia perder sua natureza de órgão de notáveis com a
eleição de opositores, funcionários subalternos que viessem a se favorecer por
influências locais, por 54 votos contra 36, o Decreto Lei nº 842, de 19 de setembro
de 1855, conhecido como a “Lei dos Círculos”, foi sancionado.
249
HORBACH, Carlos Bastide. O parlamentarismo no Império do Brasil (II): representação e democracia. Senado Federal/Revista de Informação Legislativa: v. 44, nº 174 (abr./jun. 2007). p. 216.
250 HORBACH, ibidem.
251 Art. 102, item IV, da Constituição Política do Império do Brasil, de 1824: prover todos os empregos civis e políticos do Império.
102
De qualquer modo, esse novo modo de eleições não interrompia o
controle do “rei”. Apenas as pessoas qualificadas pela lei, consideradas não
impedidas ou sob margem de incompatibilidade ao exercício da atividade
legislativa252, podiam receber votos.
Nas elucidações de CAVALCANTI253, os proprietários rurais que
integravam os gabinetes liberais ou os ministérios conservadores, ou disputavam
eles próprios as eleições ou patrocinavam a candidatura de políticos que com eles
mantinham uma relação clientelística ou de troca de favores entre o coronel e o
político. “Na situação geral que se criou àquela época, o senhor rural vencia a
eleição na medida em que os gabinetes, nomeados pelo poder moderador num
sistema aproximado de rodízio, fossem ou não de sua afiliação” e, pela força que
assumiam, inevitavelmente conduziam o “bom” direcionamento das disputas
eleitorais locais, segundo sempre a vontade do Imperador.
O que não se imaginava era que a prática de uma liberdade eleitoral,
consentida pelo próprio Imperador, contra ele se rebelaria.
Consoante asseverado por HORBACH254, diagnosticava-se, na primeira
eleição sob a regência do sistema distrital (de 1856), o inesperado: a derrota do
Governo em vários círculos pelos reformadores (os liberais), permitindo a formação
de minorias partidárias na Câmara. Um ponto positivo.
O ponto negativo é que, nem com isso, vale dizer, com “a falta de
adaptação do esquema de fraude ante a nova realidade”255 o controle deixou de se
concentrar nas mãos do Imperador.
Bastou uma eleição para que as forças regionais que regiam os
pleitos aprendessem como agir sob o regime que se instaurara,
fazendo com que a lei de 19 de setembro de 1855, apesar de
cumprida fielmente, não atingisse os seus objetivos. Dessarte,
252
E que eram os presidentes de Províncias e seus secretários, os comandantes de armas e generais em chefe, os inspetores da Fazenda geral e provincial, os chefes de polícia, os delegados e subdelegados de polícia e os juízes de direito (que, até a Lei dos Círculos podiam ser votados para as Assembleias Provinciais, para deputados gerais e senadores nos colégios eleitorais dos distritos em que atuavam), os desembargadores, os bispos e os vigários (CAVALCANTI, 1975, p. 69).
253 CAVALCANTI, Themistocles Brandão (Diretor de Pesquisa); CINTRA, Miguel Ulhôa; MARINHO, Armando de Oliveira; AZEVEDO, Helvécio de Oliveira (Pesquisadores). O voto distrital no Brasil: estudo em torno da conveniência e da viabilidade sua adoção. Rio de Janeiro: FGV, 1975. p. 75.
254 HORBACH, Carlos Bastide. O parlamentarismo no Império do Brasil (II): representação e democracia. Senado Federal/Revista de Informação Legislativa: v. 44, nº 174 (abr./jun. 2007). p. 218-219.
255 HORBACH, 2007, ibidem.
103
passaram os reformadores liberais a imaginar um novo vestido, esse
mais elaborado e de difícil aceitação tanto por parte dos
conservadores quanto do Imperador: a eleição direta256.
Em razão disso, em 1860, a “Lei dos Círculos” foi remodelada.
Sendo chamada por alguns como a segunda “Lei dos Círculos”, o Decreto
Lei nº 1.082, em 18 de agosto, ampliou os círculos/distritos eleitorais, garantindo a
representatividade por até três deputados257.
Entretanto, por preponderar um espírito reformador ainda mais forte,
proclamando por eleições diretas com a eliminação dos dois graus de votação e dos
colégios eleitorais, na tentativa de serem solucionadas as fraudes eleitorais, com,
inclusive, adesão dos conservadores a esses novos ideais, nem a nova lei foi
suficiente para manter o sistema de controle imperial.
Nesse contexto, não havia outra saída, senão abolir o sistema distrital.
Isso ocorreu com a edição da “Lei do Terço”, Decreto Lei nº 2.675, de 20 de outubro
de 1875258.
A eleição em círculos de três deputados se manteve, porém sob o viés de
um sistema de voto incompleto, onde apenas um terço era conferido à
representação das minorias259. A magistratura passou a intervir no alistamento
eleitoral e no julgamento de questões eleitorais, com novas definições em relação às
incompatibilidades eleitorais e parlamentares.
Por pressões externas de diversas ordens e sem condições políticas de
manter o sistema eleitoral no patamar em que se encontrava, o Conselheiro José
Antônio Saraiva foi convidado a compor o Ministério com a missão exclusiva de
reformar o sistema eleitoral vigente, implantando o processo de eleições diretas.
Sugeriu o retorno do voto distrital, no final do período imperial e, portanto,
do regime monárquico parlamentarista vigente. O Decreto Lei nº 3.029, de 9 de
janeiro de 1881, que levou o seu nome – “Lei Saraiva”, também conhecida como “Lei
do Censo”, foi redigida pelo Deputado Rui Barbosa. Restabeleceu a eleição por
256
HORBACH, Carlos Bastide. O parlamentarismo no Império do Brasil (II): representação e democracia. Senado Federal/Revista de Informação Legislativa: v. 44, nº 174 (abr./jun. 2007). p. 219.
257 Ex vi art. 1º, §2º da citada Lei 1.082/60.
258 Com início pontual no Gabinete São Vicente, em 29 de setembro de 1870, proposição em 1874, durante o Gabinete Rio Branco e aprovação na sessão seguinte, em 1875, pelo Gabinete Caxias-Cotegipe (HORBACH, loc.cit.).
259 HORBACH, loc.cit.
104
círculos/distritos de um deputado, regulamentou as incompatibilidades, introduziu
penalidades rígidas às eventuais fraudes, alargou o voto ao naturalizado, acatólicos
e libertos, introduziu os títulos eleitorais e implementou a Justiça Eleitoral260.
Numa comparação ou verificação de compatibilidades entre o sistema
eleitoral e o sistema partidário, Francisco Belisário Soares de Sousa261 sustentou
que a aplicação do voto distrital a partir da “Lei dos Círculos”, em verdade,
caracterizava a deterioração do partido político por quatro razões elementares.
A primeira, porque evidenciava clara quebra à disciplina partidária. “A
candidatura desamparada pelos chefes de partido não tinha probabilidade de
vingar”262, em qualquer das eleições que fosse, na de centro ou nas provinciais, já
que o regime era absolutamente tirano, sem qualquer mobilidade à escolha do
candidato que não fosse aquele indicado na lista (chapa) organizada pelos diretores
de partido.
A segunda, porque era possível identificar um nítido enfraquecimento dos
partidos, diante da dificuldade plena de se mostrarem unidos e compactos, com
ideias próprias e tendências conhecidas e dirigidas por pessoas de destaque na
política, a exemplo da postura partidária existente em qualquer sistema parlamentar.
Os partidos apresentavam-se divididos em grupos, “em conventículos de meia dúzia
de indivíduos, sem nexo, sem ligação, sem interesses comuns e traços de união”263;
pior, com membros do mesmo partido se dilacerando por intrigas e egoísmos
individuais que, inevitavelmente, atingiam a sua estrutura como um todo.
A terceira, porque induzia o surgimento de siglas partidárias por “elites
não ressocializadas na subcultura da alta elite política”264, que tinham o único
objetivo de alcançar o poder de representação popular para atendimento dos
interesses dos chefes do partido e não da sociedade.
E a quarta, e última, razão elementar à deterioração do partido político no
sistema eleitoral do período imperial se justificava por haver motivação muito maior
260
HORBACH, Carlos Bastide. O parlamentarismo no Império do Brasil (II): representação e democracia. Senado Federal/Revista de Informação Legislativa: v. 44, nº 174 (abr./jun. 2007). p. 219.
261 CAVALCANTI, Themistocles Brandão (Diretor de Pesquisa); CINTRA, Miguel Ulhôa; MARINHO, Armando de Oliveira; AZEVEDO, Helvécio de Oliveira (Pesquisadores). O voto distrital no Brasil: estudo em torno da conveniência e da viabilidade sua adoção. Rio de Janeiro: FGV, 1975. p. 89-91.
262 CAVALCANTI, ibidem.
263 CAVALCANTI, ibidem.
264 CAVALCANTI, ibidem.
105
em se substituir os partidos nacionais pelas facções parlamentares pluripartidárias
dos Gabinetes, que aqui se criavam sob a forma de partidos políticos, sem qualquer
conhecimento da sociedade, inclusive, apenas para permanecer na regência desse
gabinete.
Enfim, a institucionalização de partidos políticos no Império seguia sem
qualquer proposta ideológica formada a partir dos anseios da própria sociedade,
mas na forma imposta pelo ambiente eleitoral-parlamentar de se alcançar o prestígio
do poder.
A par de existirem correntes favoráveis ao estabelecimento do voto
distrital, que acreditavam referenciar esse modelo à aproximação do eleitor ao seu
candidato e futuro representante político, contribuindo com a existência de uma
campanha menos penosa ao candidato já que não precisaria correr todo o Estado
em busca de votos, mas apenas o território do seu distrito, para CUNHA265, o
sistema distrital, puro ou misto, apresenta efeitos negativos muito maiores, inclusive,
na esfera dos partidos políticos. Ex vi:
a) subtrai representação às minorias; b) leva com o tempo à extinção dos partidos menores e à construção, de fato, de um sistema bi ou oligopartidário; c) favorece o partido da situação e prejudica a oposição; d) fortalece o caciquismo político; e) regionaliza as eleições, afastando do debate os grandes temas políticos e nacionais; f) expõe o sistema, como um todo, a maior grau de corrupção. [sic]
HORBACH266, em sentido contrário, destacando as considerações de
Pimenta Bueno, o Marquês de São Vicente, exaradas em 1857, assinalou o principal
benefício do sistema distrital no Império: a representação da oposição. Havia a
formação de maiorias distritais a partir de todos os interesses e opiniões da
sociedade, sem que aniquiladas fossem as maiorias provinciais.
Enfim, independentemente da classificação que se queira adotar ao
sistema eleitoral implantado no período imperial, se três, de acordo com o sugerido
por HORBACH, ou cinco, conforme didaticamente exposto por JEHÁ267, fato é que
265
CUNHA, Sérgio Sérvulo da. O que é voto distrital. Porto Alegre: S.A. Fabris, 1991. p. 24. 266
HORBACH, Carlos Bastide. O parlamentarismo no Império do Brasil (II): representação e democracia. Senado Federal/Revista de Informação Legislativa: v. 44, nº 174 (abr./jun. 2007). p. 218.
267 JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 35.
106
significativa influência tiveram as agremiações partidárias na composição do arranjo
político-governamental do Império, essencialmente, os dois maiores partidos
políticos: o conservador e o liberal. Afinal, juntamente com o Imperador Regente, se
mantinham no poder em alternância quase que modo equilibrado.
Acompanhando o quadro ilustrativo apresentado por JEHÁ268 em face do
proposto por Vamireh Chacon, a situação encontrada nos Gabinetes indicados pelo
Imperador, era, in verbis:
06/09/1853 a 04/05/1857 – Conciliação;
04/05/1857 a 24/05/1862 – Conservadores;
24 a 30/05/1862 – Liberais;
30/05/1862 a 15/08/1864 – Conservadores;
15/08/1864 a 12/05/1865 – Liberais;
12/05/1865 a 03/12/1866 – Conservadores;
03/12/1866 a 16/07/1868 – Liberais;
16/07/1868 a 05/01/1878 – Conservadores;
05/01/1878 a 20/08/1885 – Liberais;
20/08/1885 a 07/06/1889 – Conservadores;
07/06/1889 a 15/11/1889 – Liberais.
De modo que, embora para alguns juristas os partidos políticos pudessem
ser considerados como correntes minoritárias sem qualquer expressão política e
popular, sua evolução histórica demonstrou que, mesmo de forma primitiva, se
colocavam como instrumentos fundamentais ao descortínio de uma nova proposta
de governo, uma nova forma de Estado.
Além da contemplação do direito de expressão da minoria num regime
político de base parlamentarista e, eminentemente, monárquico, foram capazes de
promover a reforma da monarquia.
Conforme assinalado por JEHÁ269, foi exatamente a partir dos ideais dos
Partidos Republicanos e do Partido Liberal-Radical que, juntamente com os setores
importantes do Exército, o fim do Império foi selado, alcançando-se a proclamação
da República e a instituição do federalismo.
Os partidos políticos estiveram presentes e assim permaneceram ainda
que para dar sustentação às oligarquias locais na formação do poder central. Aliás,
268
JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 35.
269 JEHÁ, ibidem, p.48.
107
conforme dito por HORBACH270, “num sistema de ‘voto de cabresto’, que nada mais
era do que um anúncio do Coronelismo típico da República que se aproximava”.
Concluindo e, em síntese, a base partidária embrionada no período
colonial, foi consolidada como “partido político” no Primeiro Reinado, ganhando
legalização apenas no Segundo Reinado. Num Estado de natureza parlamentar e
monárquica, as duas principais agremiações, de base elitista, Partido Liberal e
Partido Conservador, que competiam por espaços nos Ministérios, dividiram o
ambiente parlamentar com, pelo menos, outras quatro agremiações partidárias de
menor influência (Partido Progressista, Novo Partido Liberal, Partido Liberal Radical
e Partido Republicano), todas de natureza regionalizada e não nacionalizada,
instaladas num sistema eleitoral distrital à base de sufrágio restrito.
Em relação ao sistema distrital, mesmo com a identificação de pontos
negativos à aplicação das duas edições da “Lei dos Círculos” e, posteriormente à
“Lei Saraiva”, referido sistema eleitoral também permaneceu vigente no Brasil
durante toda a República Velha, como se verá na primeira parte do subcapítulo
seguinte.
4.2. PARTIDOS POLÍTICOS NA REPÚBLICA
A vontade política descortinada na República era a de uma
governabilidade federalista por um sistema de partidos políticos com vida e regência
em âmbito nacional, e não mais, exclusivamente provincial271, como vista no
Império.
Para ARINOS272, a própria falta de um revezamento espontâneo de poder
no Império entre os partidos políticos, decorrente certamente da fragilidade que os
revestiam na prática e das mazelas insculpidas no sufrágio, já teria sido suficiente
para demonstrar um sentimento muito mais federalista do que de sustentação por
270
HORBACH, Carlos Bastide. O parlamentarismo no Império do Brasil (II): representação e democracia. Senado Federal/Revista de Informação Legislativa: v. 44, nº 174 (abr./jun. 2007), págs. 213-231. p.220.
271 Província era a forma de divisão territorial adotada no Império, consoante Constituição Federal de 1824 que, no período republicano, passaram a ser denominadas Estados.
272 ARINOS DE MELO FRANCO. Afonso. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1980, p.54.
108
qualquer base partidária. Afinal, “o desprestígio dos partidos imperiais era completo
ao fim do reinado”.
Entretanto, fato é que, infelizmente, até o advento da Constituinte de
1945, quando se tentavam reerguer as agremiações partidárias da decisão de
extinção sofrida em 1937, o sentimento por mudança na política governamental e
maior efetividade às instituições demorou bastante para se consolidar. Por longo
tempo, o sistema partidário se manteve com características bastante semelhantes às
vistas no Império.
CAMPELLO DE SOUZA273 oferece uma leitura à restauração democrática
de 1945 que bem reflete a causa para tanta dificuldade: não havia oxigenação nos
grupos de poder.
Com a deposição do Presidente Getúlio Vargas, a luta pela
redemocratização no país dirigia-se, em grande parte, pela mesma elite política que
comandava o regime deposto e que sustentava ter encontrado na doutrina antiliberal
a solução para os problemas brasileiros, quais sejam, formas de governo marcadas
com a dissociação da agremiação partidária das arenas de decisão governamental.
Assim, os partidos políticos permaneciam sob forte domínio de uma oligarquia
regionalizada. Nada havia sido alterado até o advento do Estado Novo (1937-1945).
A partir desse período, até conseguiram vivenciar a primeira experiência
com uma democracia representativa, deflagrada por um sufrágio quase universal274
e competição em “seis eleições para o Congresso Nacional e quatro eleições
presidenciais, além dos pleitos nas esferas regional (governador e deputados
estaduais) e local (prefeitos e vereadores)”275. Porém, essa liberdade, menos
vigiada, durou pouco.
Os partidos políticos foram extintos com o advento de um Golpe de
Estado e vigência de um regime militar, autoritário, na Quarta República (1964-
1985), presenciando eleições indiretas para Presidente, com nomeação de
Interventores nos Estados e indicação de Prefeitos nos Municípios, além da
instalação de um sistema bipartidário, por longos vinte anos.
273
CAMPELLO DE SOUZA, Maria do Carmo Carvalho. Estado e partidos políticos no Brasil (1930 a 1964). São Paulo: Alfa-Omega, 1976. p. 63-82.
274 Porque ainda havia a proibição de voto ao analfabeto e o Partido Comunista se encontrava na ilegalidade desde 1947 (SCHITT, 2000, p. 11).
275 SCHMITT, Rogério. Partidos Políticos no Brasil (1945-2000). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000. p.8.
109
Somente com a Quinta República (1985 até hoje) é que as eleições
diretas foram resgatadas, assim como a autonomia e efetividade dos partidos
políticos na segunda, e, por enquanto, atual e última experiência democrática
representativa, agora realizada por sufrágio universal.
Enfim, ao se tornarem o principal eixo de ligadura ao exercício da
cidadania no ambiente democrático, mérito que não se pode deixar de reconhecer,
sua existência, vida e atividade passaram a ser reguladas por normas legais
específicas até que adentradas no seio constitucional fossem.
Consoante assinalado por CAGGIANO276, as primeiras referências legais
dos partidos políticos no ordenamento jurídico brasileiro foi o Código Eleitoral de
1932, editado pelo Decreto nº 21.076, em 24 de fevereiro. Ganhou status
constitucional com a Carta Política de 1934, perdeu com a de 1937 (exatamente
com o advento do Golpe de Estado), recuperou com a Constituição de 1945 (com o
advento do art. 141, §13) e desapareceu um pouco antes da Constituição de 1967,
com o Ato Institucional nº 2 de 27 de outubro de 1965.
Segundo a autora, até a edição do primeiro estatuto partidário nacional,
que ocorrera com a Lei nº 4.740, de 15 de julho de 1965 (conhecida como Lei
Orgânica dos Partidos Políticos - LOPP), as questões partidárias eram solucionadas
com os diplomas eleitorais periodicamente editados, citando, para tanto, e em nota
de rodapé, a Lei nº 48, de 4 de maio de 1935; o Decreto-Lei nº 7.586 , de 28 de maio
de 1945; e a Lei nº 1.164, de 24 de julho de 1950. Juntamente com a Lei nº 5.682,
de 21 de julho de 1971, a citada LOPP, além da preocupação em sistematizar os
partidos políticos, teria também se preocupado em disciplinar os problemas
atinentes à gerência dos recursos financeiros, coibindo-se a provocação de um
processo de desigualdades entre partidos e candidatos a incidência da força do
poder econômico.
JEHÁ277, do mesmo modo, destacou vários outros regulamentos e
instruções de sistematização das operações eleitorais no período republicano,
demonstrando, com isso, o quanto incerta permanecia a situação política, de
regência do poder, na República, tanto quanto o vivenciado no Império.
276
CAGGIANO, Monica Herman Salem. Finanças Partidárias. 1980. Dissertação (Mestrado em Direito Constitucional) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 1980. p. 109-117.
277 JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009.p. 36.
110
De modo que, merecem também destaque o Decreto 200-A, de 8 de
fevereiro de 1890, conhecido como “Regulamento Lobo”; o Decreto nº 511, de 23 de
junho de 1890, denominado “Regulamento Alvim”; a Lei nº 35, de 26 de janeiro de
1892; a Lei nº 1.269, de 15 de outubro de 1904, considerada a “Lei Rosa e Silva” e a
Lei nº 3.208, de 27 de dezembro de 1916. Nesse deslinde, merecem ainda citação a
também lei eleitoral transitória ou emergencial de nº 86, de 6 de setembro de 1947
(juntamente com o Decreto-Lei nº 7.586/45, já assinalado); o Código Eleitoral
republicano, prescrito na Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965 (juntamente com o
Decreto nº 21.076/32, a Lei nº 48, de 4 de maio de 1935 e a Lei 1.164/50,
anteriormente citados); a atual Lei Orgânica dos Partidos Políticos, Lei nº 9.096, de
19 de setembro de 1995 (juntamente com a Lei nº 4.740/65 e a Lei nº 5.682/71, já
mencionadas); e o Ato Complementar nº 4, de 20 de novembro de 1965, que
instituíra, inusitadamente, o bipartidarismo no Brasil.
Condição mais estável à normatização político-eleitoral brasileira parece
se evidenciar, de fato, após a promulgação da Constituição Federal de 1988,
notadamente com a edição da Lei Orgânica dos Partidos Políticos (Lei nº 9.096), em
1995, e da Lei das Eleições (Lei nº 9.504), em 1997278.
Enfim, com o intuito de oferecer mesma leitura à apresentada para o
período imperial, segue a pesquisa com destaque às diversas nuances legais
vivenciadas na institucionalização dos partidos políticos dentro do quadro histórico
político-social encontrado e seus sistemas eleitorais.
4.2.1. A Primeira República (1889-1930)
Também didaticamente assinalada como “República Velha”, a Primeira
República foi marcada pela política do café-com-leite, que garantia a
governabilidade central com o revezamento de Presidentes dos Estados de São
Paulo, o mais rico na produção do café, e de Minas Gerais, o grande produtor de
leite.
278
REIS, Daniel Gustavo Falcão Pimentel dos. O ativismo judicial no Brasil : o caso da verticalização. 2014. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2014.
111
Os partidos do Império, o Partido Conservador e o Partido Liberal
deixaram de existir. As forças políticas conservadoras e liberais derivadas do
processo revolucionário foram absorvidas pelos Partidos Republicanos.
Dentro do inevitável, tal qual o quadro apresentado no período imperial,
mantinha-se o descarado revezamento de poder pelas oligarquias partidárias das
elites agrárias sobressalentes no Partido Republicano Paulista – PRP e no Partido
Republicano Mineiro – PRM, nesse primeiro momento da história. Importante
destacar que o Partido Republicano Riograndense – PRR, do Rio Grande do Sul,
também existia, embora sem força política significativa, tal qual a apresentada pelo
PRP e pelo PRM.
Mesmo sofrendo com a influência do coronelismo, que fomentava a
prática pelo direcionamento do voto do eleitorado aos interesses dos coronéis279;
com a política dos Estados ou dos governadores, que resguardava a base
governista nacional e regional mediante troca de favores recíprocos; e com o
fracassado predomínio do movimento tenentista, instalado pelo exército, a quebra de
paradigmas voltada à busca pela formação de partidos políticos de caráter nacional
era bastante tímida, quase nula.
De qualquer modo, estabelecidos já haviam sido o Partido Republicano
Federal de Francisco Glicério, o Partido Republicano Conservador, de Pinheiro
Machado, a merecer destaque Quintino Bocaiúva, e o Partido Republicano Liberal,
de Rui Barbosa, fundados por convenções nacionais em 1910 e 1913,
respectivamente. Enfim, nenhum deles deixou rastros. Assim como nenhuma das
outras coligações de força política no preparo de sucessões presidenciais, como a
Campanha Civilista de Rui Barbosa contra o Marechal Hermes; a Reação
Republicana, de sustentação de Nilo Peçanha contra Artur Bernardes; e a Aliança
Liberal, composta de nomes como Júlio Prestes e Getúlio Vargas280. Sequer o
Partido Democrático Nacional que tentava se formar a partir das bases democráticas
paulistas e mineiras obteve êxito281.
279
A bem da verdade, mantinha o mesmo tratamento dado por eles, então proprietários de terra, desde o Império.
280 ARINOS DE MELO FRANCO. Afonso. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1980. p. 56.
281 JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 52.
112
Aliás, importante realçar que o Partido Democrático Nacional, idealizado
em 1927 com a finalidade de combater as práticas eleitorais fraudulentas mediante a
convocação dos democratas de todos os Estados, assumiu papel fundamental no
final desse primeiro período republicano brasileiro. Foi o grande incentivador à
propagação de uma reforma eleitoral que fosse capaz de implantar no ordenamento
jurídico nova linguagem ao processo eleitoral existente. Fruto desse trabalho foi a
edição do primeiro Código Eleitoral, o Decreto nº 21.076, de 24 de fevereiro de 1932,
que não apenas viria a consagrar, em definitivo, o sistema proporcional de
representação política no decorrer de toda a República, como afastava, de vez, a
aplicabilidade do sistema distrital282, introduzindo, ainda, o voto secreto e a Justiça
Eleitoral283, dentre outros benefícios. Não obstante tal fato, conforme já destacado,
referida agremiação partidária também não teve sobrevida como partido de base
nacional.
O Partido Comunista também surgira na República, sob forte concepção
de partido de base nacional. Acompanhando o movimento comunista mundial, sua
composição em solo doméstico também se apresentava com traços
preponderantemente anarquistas, trazidos e difundidos pelos imigrantes que
compunham a massa operária nacional mais evoluída. Propugnava o fortalecimento
do anarcossindicalismo de base ítalo-ibérica, sustentando que a tomada de poder
devia se dar pela classe operária e com a adoção do sistema socialista, já que seria
esta a única forma de se minimizar a miséria e a desigualdade social. Composto por
pequenos e intelectuais burgueses, infiltrados na imprensa por publicações
efêmeras como “O Movimento Comunista” e “A Voz do Povo”, foi embrionado em
Porto Alegre, em 1918, sob a chancela de “União Maximalista” e constituído apenas
em 1921, no Rio de Janeiro.
Em março de 1922, num congresso em Niterói, presentes já estavam
delegados do Partido Comunista instalados no Rio, Niterói, São Paulo, Santos,
Cruzeiro, Juiz de Fora, Recife e Porto Alegre para a sua correspondente fundação
como pessoa jurídica oficialmente registrada segundo o Código Civil284.
282
Implantado no Império e implementado pela “Lei Rosa e Silva”, a Lei nº 1.269, de 15 de novembro de 1904 (arts. 58 e 90) até então vigente.
283 Enquanto órgão provido de ação fiscalizatória, sob o aspecto eminentemente formal que age mediante provocação de terceiros legitimados e não mediante diligência estatutária própria (CAGGIANO, 1980, p. 64).
284 ARINOS DE MELO FRANCO. Afonso. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1980. p. 92-101.
113
Na história brasileira, o Partido Comunista foi o único partido de
institucionalização forte que resistiu aos vários entraves dos regimes políticos
vigentes. Sobreviveu até os dias atuais, mesmo tendo passado longo período na
ilegalidade. Em razão da sua particularidade, valem os parênteses para explicitar o
caminho trilhado.
Foi oposição ao Golpe de Estado de 1930 e à Aliança Liberal. Integrou a
organização de caráter popular “Aliança Nacional Libertadora” em 1935, mas caiu na
clandestinidade dois anos após a entrada do Estado Novo (1937-1945), em 7 de
maio de 1947, quando teve o seu registro eleitoral junto ao Tribunal Superior
Eleitoral cancelado e os seus parlamentares, eleitos, cassados285, a partir da Lei nº
211, de 7 de janeiro de 1948286. Isso porque seus ideais socialistas inspiravam temor
às classes dirigentes elitizadas brasileiras na medida em que ocorriam
concomitantemente à formação das ondas anticomunistas reavivadas com a Guerra
Fria, instalada pelas duas grandes potências econômicas da época, Estados Unidos
e União das Repúblicas Socialistas Soviéticas – URSS.
Na verdade, por receber orientação e contribuição pecuniária do partido
comunista soviético, contrariando disposição do art. 26 do Decreto Lei nº 9258, de
14 de maio de 1946, de nada adiantaram os esforços precedentes que se
convolavam em provar a adequabilidade do seu programa partidário aos métodos
285
A decisão de supressão do Partido Comunista no Tribunal Superior Eleitoral seguiu por maioria, de três votos favoráveis e dois votos contrários; a cassação dos parlamentares respectivos pelas Casas Legislativas se iniciou em setembro de 1947, tendo merecido voto contrário à cassação por Afonso Arinos, representante da UDN na Comissão de Justiça da Câmara, mas voto favorável no projeto da Comissão de Justiça do Senado, a partir dos esforços do Senador Ivo D’Aquino (PSD-SC) que acabou prevalecendo na Câmara dos Deputados, por força da bancada do PSD e de pequenos partidos de apoio, já que a UDN havia se dividido exatamente ao meio e o PTB se inclinava à rejeição, implicando em 179 votos favoráveis contra 74 do total de 243 deputados participantes (CAMPELLO DE SOUZA, 1976, p. 118).
286 Referida lei foi editada com o objetivo exclusivo de dissolver o Partido Comunista Brasileiro. Não estabelecia regra geral e inaugurava matéria não tratada no Código Eleitoral, nem da Constituição Federal de 1946. A extinção do mandato só ocorria aos parlamentares pertencentes a partido dissolvido e não a parlamentar de um partido que se dissolve ou se adere a outro (art. 150). Como realçado por FERREIRA FILHO (1966, P. 109), “a extinção é declarada pela mesa dos corpos legislativos de que fazem parte os parlamentares. Ela é de jure, não depende de decisão da Justiça Eleitoral, nem de considerações de oportunidade, por parte da mesa das Câmaras, que devem declará-la. Essa Lei contudo não prevê a substituição dos parlamentares. Outra lei (nº 648 de 10 de março de 1949) veio estabelecer as normas referentes à substituição dos deputados e do senador que pertenciam ao Partido Comunista, dissolvido pelo Tribunal Superior Eleitoral, em 7 de maio de 1947 (resolução nº 1841). Essas normas estipulavam que os votos recebidos pelo Partido Comunista seriam considerados nulos, e que o quociente eleitoral seria calculado novamente. Quanto ao Senador, eleito pelo escrutínio majoritário, seria substituído pelo candidato que houvesse tido o maior número de votos, depois dêle.” [sic].
114
democráticos brasileiros, com abandono expresso dos princípios marxistas-leninistas
de origem.
Com fundamento no art. 141, §13, da Constituição Federal de 1946, sob a
acusação de que “a) o partido seria uma organização internacional orientada e a
serviço do comunismo marxista-leninista da União Soviética; b) em caso de guerra
contra aquele país, os comunistas ficariam contra o Brasil (Processo nº 411/412-
Distrito Federal)”287, acabaram se submetendo à clandestinidade, vivendo
ilegalmente até o próximo período multipartidário instalado a partir de 1980288.
Foi, de fato, o partido político que mais resistira em solo doméstico às
mudanças histórico-políticas vivenciadas, notadamente no curso dos dois momentos
ditatoriais brasileiros.
De outro lado, ainda, assim como a formação da velha base partidária no
Império, com a entrada da República o processo governamental permanecia
reservado ao poder das oligarquias regionais e, novamente, de modo “desigual”.
Embora legalizados e socialmente descentralizados, os governos estaduais
ganharam a autonomia que tanto reclamavam no Império, entretanto, apenas os
Estados mais importantes, assim classificados aqueles com desenvolvimento
econômico, população e posição geográfica de destaque, assumiam o poder central,
sempre.
Segundo afirmado por CAVALCANTI289, não existiam várias elites sociais
como no Império, mas a dominação de um único estrato social que significava muito
mais que uma elite. Além disso, juntamente aos republicanos paulistas e mineiros, a
essa dominação também se ligava o estamento militar, revolucionário.
No que tange ao sistema eleitoral da época, o modelo distrital uninominal
estabelecido pela “Lei Saraiva”, Decreto Lei nº 3.029, de 9 de janeiro de 1881, sob a
forma de eleição direta, inaugurou o modo de eleição na República, embora na visão
287
JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 76.
288 Por maioria de votos, vencidos os Ministros Relator Sá Filho e Ribeiro da Costa, a decisão do Tribunal Superior Eleitoral seguiu pela cassação do seu registro, conforme Resolução nº 1841, de 7 de maio de 1947, não tendo sido, ainda, conhecido o Recurso Extraordinário Eleitoral nº 12.369 – DF ajuizado perante o Supremo Tribunal Federal – STF, de relatoria do Ministro Laudo de Camargo.
289 CAVALCANTI, Themistocles Brandão (Diretor de Pesquisa); CINTRA, Miguel Ulhôa; MARINHO, Armando de Oliveira; AZEVEDO, Helvécio de Oliveira (Pesquisadores). O voto distrital no Brasil: estudo em torno da conveniência e da viabilidade sua adoção. Rio de Janeiro: FGV, 1975. p. 112.
115
de CAVALCANTI290, nunca tivesse sido efetivamente aplicado, mesmo com a
oligarquia plenamente firmada. A seu ver, a entrada efusiva do liberalismo no século
XVIII, impregnando profunda cultura “circunstancial” mundial a toda autocracia
ocidental ou oriental que se viu obrigada, em graus variáveis, a esse tipo de
ambiguidade, era o que justificava a sua teoria.
De qualquer modo, referida lei – a Lei Saraiva – teve seu escopo alargado
pela Lei nº 35, de 26 de janeiro de 1892291, que autorizava a eleição de três
deputados por distrito eleitoral, na mesma proporção à circunstância apresentada
pela segunda “Lei dos Círculos” – o Decreto Lei nº 1082, de 18 de agosto de 1860.
Os distritos eram os mesmos nas eleições federais aos apresentados
para as eleições estaduais, variando apenas a distribuição de candidatos por
distritos, que se operacionalizava de modo absolutamente aleatório, porque
dependentes das relações entre as facções coronelísticas, qualidade das lideranças
etc.292.
E, com isso, o processo eleitoral se mantinha sob controle, sob domínio.
Duas eram as ferramentas mais usuais para se forjar o processo eleitoral,
aplicadas cada vez que maior destaque recebia a oposição. A primeira prosperava-
se com a manipulação da oligarquia assentada sob ares de plena legalidade, ou
seja, mediante instauração de procedimentos regulares, em ata, no horário
preordenado e conforme as leis, regulamentos e avisos do governo que,
popularmente, ficaram conhecidas como eleições feitas a “bico de pena”. A segunda
movia-se por processo de “degola” ou de “terceiro escrutínio”, como também era
conhecida, consistindo na diplomação de candidato ao cargo eletivo que mais
agradasse a oligarquia e não que tivesse sido o mais votado pela opinião pública,
justificando, de outro lado, sua aplicação, caso sem sucesso tivessem sido as forças
convergentes à produção de alistamentos falsificados ou, ainda, as pressões e
violências sobre os eleitores ou os vícios e as fraudes praticadas na apuração dos
votos.
290
CAVALCANTI, Themistocles Brandão (Diretor de Pesquisa); CINTRA, Miguel Ulhôa; MARINHO, Armando de Oliveira; AZEVEDO, Helvécio de Oliveira (Pesquisadores). O voto distrital no Brasil: estudo em torno da conveniência e da viabilidade sua adoção. Rio de Janeiro: FGV, 1975. p. 111.
291 Na sequência, importante destacar a Lei 1.269, de 15 de novembro de 1904 (conhecida como “Lei Rosa e Silva”); Lei 3.139, de 2 de agosto de 1916, que versou sobre o tríplice alistamento; e Lei 3.208, de 27 de dezembro de 1916.
292 CAVALCANTI, ibidem, p. 206.
116
De modo que o poder obedecia aos interesses preordenados das
oligarquias locais, estaduais, mostrando que a ideia de criação de partidos políticos
nacionais pelos revolucionários, certamente, seria postergada e ao sistema eleitoral
distrital nenhum interesse havia em modificá-lo, justamente porque a manipulação
do resultado pelas correntes coronelísticas era o que interessava. Afinal, “as chefias
oligárquicas de nível estadual dos estados mais desenvolvidos, e apenas nesses,
tinham os partidos republicanos para coordenar suas disputas particularistas”.293
No que tange ao sistema partidário propriamente dito, como refletido por
JEHÁ294, aos partidos políticos não remanescia legislação própria que resguardasse
sua existência, nem a Constituição de 1891 os agasalhava. Sequer havia a
obrigatoriedade de filiação partidária como condição de elegibilidade, na medida em
que a Lei nº 35, de 26 de janeiro de 1892, especialmente seu art. 29, nada dizia.
Além disso, o Decreto do Governo Provisório nº 6, de 19 de novembro de 1889, ao
extinguir a reserva censitária para os fins de alistamento eleitoral, teria exigido do
cidadão, para o ingresso no cenário político, apenas o simples gozo dos direitos civis
e políticos e a compreensão mínima da leitura e da escrita.
Nesse contexto, entretanto, mesmo diante de um desapreço aos partidos
políticos, eles se recriaram nas bases entendidas satisfatórias às forças políticas
conservadoras e liberais existentes na época e, ademais, nem a doutrina
especializada nem a legislação preponderante prenunciavam qualquer possibilidade
de candidaturas avulsas, a exemplo do modelo eleitoral autorizado e aplicado no
pós-Revolução – ou Golpe – de 1930.
Fazendo uma digressão em face dos Presidentes da República e da
respectiva agremiação partidária, com destaque àqueles que se sagraram
vencedores em eleições diretas, verifica-se que, bem ou mal, sob a vestimenta de
um partido político, praticamente todos eles se encontravam. Eis a sequência
presidencial relatada:
293
CAVALCANTI, Themistocles Brandão (Diretor de Pesquisa); CINTRA, Miguel Ulhôa; MARINHO, Armando de Oliveira; AZEVEDO, Helvécio de Oliveira (Pesquisadores). O voto distrital no Brasil: estudo em torno da conveniência e da viabilidade sua adoção. Rio de Janeiro: FGV, 1975. p. 206.
294 JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 48-50.
117
Tabela 1 - Vínculo e evolução partidária dos candidatos eleitos à Presidência da República no período da Primeira República
Período da
Presidência
Presidente da
República
Vinculo e Evolução Partidária
15.11.1889
25.02.1891
Marechal Manoel
Deodoro da Fonseca
Ingresso por eleição indireta, após ser alçado à
chefia do governo provisório pelas forças
revolucionárias.
25.02.1891
15.11.1894
Marechal Floriano
Vieira Peixoto
Assume a Presidência, por também eleição
indireta, para conclusão do mandato
presidencial renunciado por seu antecessor.
15.11.1894
15.11.1898
Prudente José de
Morais e Barros
Ingresso por eleição direta. Filiado ao Partido
Republicano Paulista - PRP em 1876 e ao
Partido Republicano desde 1885-1886. Eleições
diretas.
15.11.1898
15.11.1902
Manoel Ferraz de
Campos Salles
Ingresso por eleição direta. Filiado ao Partido
Liberal desde 1868-1869 e ao Partido
Republicano desde 1872.
15.11.1902
15.11.1906
Francisco de Paula
Rodrigues Alves
Ingresso por eleição direta. Filiado ao Partido
Conservador desde 1872 e ao Partido
Republicano Paulista – PRP desde 1893.
15.11.1906
15.11.1910
Affonso Augusto
Moreira Penna
Ingresso por eleição direta. Filiado ao Partido
Liberal desde 1874. Ex-Deputado provincial e
geral, ex-Senador da Constituinte Mineira, ex-
Senador Estadual, por duas legislaturas, Vice-
Presidente do Governo Rodrigues Alves.
Nilo Procópio Peçanha Ingresso por eleição direta. Fundador do Partido
Republicano Fluminense em 1888 e desde
então filiado a esse partido até 1921, ao
concorrer à Presidência da República pela
legenda da Reação Republicana.
15.11.1910
15.11.1914
Marechal Hermes
Rodrigues da Fonseca
Ingresso por eleição direta. Fundador do Partido
Republicano Conservador em 1910.
15.11.1914
15.11.1918
Wenceslau Braz
Pereira Gomes
Ingresso por eleição direta. Filiado ao Partido
Republicano Mineiro – PRM desde 1892.
15.11.1918
15.11.1922
Delfim Moreira da
Costa Ribeiro
Ingresso por eleição direta. Filiado na Chapa do
ex-Presidente Rodrigues Alves.
Epitácio Lindolfo da
Silva Pessoa
Ingresso por eleição direta. Ex-Deputado à
Assembleia Nacional Constituinte (1890-1891) e
Deputado Federal, por duas legislaturas, a partir
de 1891.
15.11.1922
15.11.1926
Arthur da Silva
Bernardes
Ingresso por eleição direta. Filiado ao Partido
Republicano Mineiro – PRM desde 1905; ao
Partido Social Nacionalista – PSN, em 1932,
com breve retorno ao PRM; Fundador do Partido
Republicano – PR em 1945.
(“continuar”)
118
Tabela 1 - Vínculo e evolução partidária dos candidatos eleitos à Presidência da República
no período da Primeira República (“continuação”)
Período da
Presidência
Presidente da
República
Vinculo e Evolução Partidária
15.11.1926
15.11.1930
Washington Luís
Pereira de Sousa
Ingresso por eleição direta. Filiado ao Partido
Republicano Federal – PRF a partir de 1897; ao
Partido da Lavoura a partir de 1900; e ao Partido
Republicano Paulista – PRP a partir de 1904.
Eleito,
proclamado,
mas não
empossado
Júlio Prestes de
Albuquerque
Filiado ao Partido Republicano Paulista – PRP a
partir de 1909; à União Democrática Nacional –
UDN a partir de 1945.
Fonte: Biblioteca da Presidência da República, 2015295 (adaptada)
Ou seja, os partidos políticos se apresentavam como o meio legítimo e
viável à agregação das forças necessárias de ação política à obtenção do poder.
CAVALCANTI296, ao comentar sobre o processo de eleição e sua
legislação por distritos na República Velha, admitia a existência de um subsistema
eleitoral “formal” e legal, composto pelo conjunto de leis eleitorais e disposições
regimentais internas da Câmara dos Deputados. Apenas destacava que
condicionado à sua aplicação existia um outro subsistema ainda maior, de natureza
absolutamente “informal” ou extralegal. Referenciava-se à força política do detentor
de poder, alcançada pela vitória de uma, ou algumas, bases partidárias sobre
outras. Tanto é verdade que a doutrina não cansava de relatar o quão manipulado
era o processo eleitoral da época por interesses que, indiretamente, se mostravam
como interesses de bases partidárias.
Assim, ainda que indiretamente, verifica-se que a figura do partido político
estava sempre presente.
Ademais, a ausência de norma de regulamentação e de vinculação da
atividade partidária ao processo eleitoral, nesse primeiro momento republicano, não
denotava perigo à “política dos governadores” ou “política dos Estados” que
predominava em face do revezamento do poder central pelas forças oligárquicas
295
BRASIL. BIBLIOTECA DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Disponível em: <www.biblioteca.presidencia.gov.br/pagina-inicial-3>. Acesso em: 18-out-2015.
296 CAVALCANTI, Themistocles Brandão (Diretor de Pesquisa); CINTRA, Miguel Ulhôa; MARINHO, Armando de Oliveira; AZEVEDO, Helvécio de Oliveira (Pesquisadores). O voto distrital no Brasil: estudo em torno da conveniência e da viabilidade sua adoção. Rio de Janeiro: FGV, 1975. p. 203.
119
paulistas e mineiras. Os partidos políticos existiam extra legem e usavam suas
forças no ambiente de competição política.
O quadro político começou a sofrer transformações exatamente quando a
oposição começou a se fortalecer.
Os reflexos causados com a quebra da bolsa de valores de Nova Iorque
em 1929 e, consequentemente, queda da exportação do café pelo principal agente
financeiro, os Estados Unidos, levaram os grandes produtores oligárquicos
regionais, em especial São Paulo, a dependerem das medidas de controle de preços
e de moratória de suas dívidas pelo governo federal. Sofreram, com isso,
desprestígios significativos que ensejaram o natural enfraquecimento das
agremiações partidárias estaduais pelas forças oposicionistas existentes. A ausência
de normatização específica aos partidos políticos os levou à falência, em vários
momentos da história republicana brasileira seguinte.
4.2.2. O Golpe de Estado (1930-1945)
A “política dos governadores” ou “política café com leite” ou “política dos
Estados” estava com os dias contados. A debelação ocorreu justamente no
momento em que a oligarquia paulista se desprestigiava com a queda da importação
do café pelos Estados Unidos após 1929. O então Presidente Republicano, o
paulista Washington Luís, decidiu desrespeitar a aliança mantida com Minas Gerais
na sucessão presidencial, indicando outro paulista para o pleito eleitoral seguinte,
Júlio Prestes. A oposição se uniu: formou a Aliança Liberal com a união dos Partidos
Republicanos Mineiro, Gaúcho e Paraibano; ganhou simpatia das bases militares
nacionais; indicou o candidato gaúcho Getúlio Vargas; porém, perdeu nas urnas.
Irresignados, por pressão política, conquistaram a deposição de Júlio Prestes e a
indicação de uma junta militar em seu lugar para a regência imediata do governo
que, na sequência, declarava Getúlio Vargas como Presidente provisório.
O que se evidenciou, neste momento histórico, foi uma completa ruptura
institucional marcada, inclusive, com a definitiva entrada das massas populares
urbanas no cenário político e que, de certo modo, já vinham sendo alimentadas com
as revoltas “tenentistas” estabelecidas nos anos 1920.
120
Enfim, nascia a Segunda República, com o primeiro Golpe de Estado.
Embora a ideia pela formação de partidos nacionais se mantivesse
reavivada, na prática, nenhuma alteração significativa teria havido. As agremiações
estaduais mantidas durante toda a República Velha permaneceram297, porém, sem
se imaginar estarem as mesmas com os dias de vida contados.
Por simples arbítrio do governo provisório, ao Presidente foi confiado o
exercício discricionário de todas as funções dos Poderes Executivo e Legislativo até
a reorganização constitucional que viria a ser firmada por Assembleia Constituinte
eleita. Resultado disso foi a dissolução do Congresso Nacional, assim como das
Assembleias Legislativas Estaduais, Câmaras ou Assembleias Municipais e
quaisquer outros órgãos legislativos e deliberativos existentes nos Estados, Distrito
Federal, Municípios ou Território do Acre. Interventores estaduais foram nomeados,
com atribuições específicas à indicação dos prefeitos municipais, que também se
investiam das funções executivas e legislativas locais com a missão de propagar os
atos emanados exclusivamente do governo central298.
Infelizmente, ainda que não se quisesse admitir, embora em ambiente
democrático, assim chancelado pela Constituição Federal, em verdade, o que a
realidade – democrática, vale frisar – brasileira vivenciava, na prática, era a regência
e construção de um governo autocrático, de base autoritária.
São Paulo, inconformado com o quadro político que se instalava,
reclamou pela promulgação de uma nova Constituição Federal, nos termos da
promessa feita pelo governo provisório. Deflagrou, aos 9 de julho de 1932, a
Revolução Constitucionalista, tornando-se o palco da luta armada contra o governo
federal e as tropas “legalistas” do resto do país, mesmo diante da garantia de
realização de eleições à Assembleia Nacional Constituinte para o dia 3 de maio do
ano seguinte299. Embora derrotado, a concepção política sustentada foi vitoriosa,
com a convocação, em definitivo, do pleito eleitoral esperado. No comando dessas
ações revolucionárias estava a aliança política formada meses antes, em fevereiro,
pelos dois principais partidos políticos, o Partido Republicano Paulista – PRP, que
297
CAMPELLO DE SOUZA, Maria do Carmo Carvalho. Estado e partidos políticos no Brasil (1930 a 1964). São Paulo: Alfa-Omega, 1976. p. 81.
298 Art. 1º do Decreto nº 19.398, de 11 de novembro de 1930.
299 Decreto nº 21.402, de 14 de maio de 1932.
121
perdera domínio com a Revolução de 1930, e o Partido Democrático – PD300, que
vinha se deteriorando por conta de um desentendimento com as forças tenentistas,
notadamente com o interventor federal no Estado, o tenente João Alberto.
Nesse contexto, consoante bem destacado por JEHÁ301, não havia
ambiente de disputa pelos cargos públicos, não havia qualquer espaço à formação
de partidos políticos que canalizassem as opiniões populares à competição eleitoral
pelo poder.
Mais que isso, havia um Código Eleitoral, recém-editado pelo Decreto nº
21.076, de 24 de fevereiro de 1932, que, de certo modo, inaugurava uma trajetória
legislativa aos partidos políticos brasileiros, embora de forma um pouco enviesada já
que inseria todas as agremiações políticas numa mesma vala302. Não lhes conferiu a
prerrogativa de monopólio de filiação aos interessados em participar dos pleitos
eleitorais subsequentes. Com isso, consagrava-se em solo doméstico a
possibilidade de candidaturas avulsas.
A candidatura avulsa encontrava-se autorizada no art. 58, nº1303,
parágrafo único, do citado Código Eleitoral de 1932, in verbis:
“Processa-se a representação proporcional nos termos seguintes [...]
É permitido a qualquer partido, aliança de partidos, ou grupo de cem
eleitores, no mínimo, registrar, no Tribunal Regional, até cinco dias
antes da eleição, a lista de seus candidatos, encimada por uma
legenda. [...] Considera-se avulso o candidato que não conste de lista
registrada”304.
Para participar da competição eleitoral bastava o cumprimento de uma
única exigência: o registro do pedido devidamente acompanhado de um quórum
300
Tratava-se de um partido formado pela cisão do Partido Republicano Paulista, “com características um pouco mais liberais do que sua conservadora matriz” (KAREPOVS, 2006, p. 170)
301 JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 58.
302 JEHÁ, ibidem.
303 Epigrafado como “§1º” no Decreto.
304 As eleições se processavam em dois turnos de votação, simultâneos e expressos em uma só cédula, sagrando-se vencedor em primeiro turno o candidato que alcançasse o quociente eleitoral e o quociente partidário, conforme a combinação prescrita no mencionado art. 58, nºs. 5, 6 e 7, subsequentes (epigrafados na redação do Decreto como §§5º, 6º e 7º), e, em segundo turno, os demais candidatos mais votados até o limite de vagas disponíveis e não preenchidas com a apuração precedente, de primeiro turno (n.8 – ou §8º como na redação original – do mesmo diploma legal).
122
mínimo de cem eleitores, até cinco dias antes da realização das eleições no Tribunal
Regional.
Todos, sem exceção, por seus fiscais, adquiriam também o direito de
acompanhar o processo eleitoral na integralidade, inclusive os “candidatos” não
registrados que, embora desautorizados a participar dos pleitos eleitorais, viessem a
requerer a prerrogativa fiscalizatória por escrito, devidamente acompanhada da
assinatura, com firma reconhecida, de pelo menos cinquenta eleitores (art. 101, §1º).
A Constituição Federal promulgada em 1934 recepcionou esse sistema
eleitoral. Conferiu “‘status’ constitucional” às agremiações partidárias, sem extinguir
os partidos políticos estaduais. Importante registrar que, em verdade, não disciplinou
sobre os partidos políticos de modo direto, apenas teria proibido qualquer atividade
político-partidária aos magistrados (art. 66), assim como consignado expressa
previsão de perda de cargo público ao funcionário que se valesse de ato de
autoridade em favor de partido político ou exercesse pressão partidária sobre os
seus subordinados (art. 170, 9º). De outro lado, referida Carta Constitucional
também não desautorizava a possibilidade plena de candidatura avulsa.
Sequer a Lei nº 48, de 4 de maio de 1935, que tratava da modificação do
Código Eleitoral de 1932305, fez qualquer remissão contrária à candidatura avulsa.
Pelo contrário. Apenas redefiniu o quórum mínimo de eleitores para cinquenta, nas
eleições municipais, e duzentos, nas eleições estadual e federal, quando do registro
de pedido de candidatura perante, respectivamente, o juízo eleitoral da zona ou do
Tribunal Regional, dentro dos cinco ou quinze dias da abertura do pleito eleitoral.
De qualquer modo, essa nova legislação também assinalava benefícios
aos partidos políticos. Além de exigir que o quórum mínimo de eleitores para o
pedido e registro de candidatura devesse ser conferido pela numeração do título de
eleitor e com a limitação de um único requerimento por eleitor (art. 84 ao 88), os
candidatos filiados a partidos políticos não podiam pertencer a mais de uma
legenda, exceto quando dois ou mais partidos firmassem requerimento nesse
sentido, em petição conjunta (art. 87). Os partidos ganharam tratamento em capítulo
305
Embora o Código Eleitoral de 1932 tivesse sido revogado expressamente em 1991, pelo Anexo IV - fls. 32 - do Decreto nº 11, de 18 de janeiro, tacitamente, de certo, já teria sido pela Lei nº 48, de 4 de maio de 1935 já que, ao restabelecer as novas diretrizes ao alistamento e ao processo eleitoral na íntegra, repaginando a atuação da Justiça Eleitoral, consignou, em seu art. 217: “Ficam revogadas todas as disposições concernentes à matéria eleitoral, mantidos, entretanto, os cargos e respectivos vencimentos até hoje legalmente criados, desde que não prejudicados por dispositivos deste Codigo”[sic].
123
próprio (título II, capítulo I): podiam participar do pleito eleitoral como partidos
políticos com registro em definitivo ou, simplesmente, com registro provisório. Para
registro prévio e definitivo junto ao Tribunal Superior e aos Tribunais Regionais das
regiões em que processavam sua constituição, denominação, orientação política e
órgãos representativos bastava a demonstração de um quórum mínimo de
quinhentos eleitores; para registro provisório, esse quórum mínimo caía para 200
eleitores, exigindo-se apenas a apresentação de candidatos previamente registrados
(art. 166) e o início de seu processo de registro da personalidade jurídica na forma
exigida pelo Código Civil de 1917306.
Assim, como consequência às benesses da lei, obviamente que as
agremiações políticas acabaram se multiplicando a todo instante, perfazendo,
segundo ARINOS307, o estranho mosaico da representação nacional, com
formações partidárias sob várias e diferentes formas de constituição jurídica,
inclusive de recepção às composições partidárias estaduais do jeito antigo.
De modo que, mais uma vez, não teria se evidenciado “uma real ruptura
com o regionalismo predominante na República anterior”. Os mesmos grupos, com
os mesmos vícios e oportunismos e, apenas, nomes diferentes permaneciam308.
Nessa esteira caminhava o posicionamento de JEHÁ309, in verbis, “entre
as eleições de 1933 e o início do Estado Novo, em 1937, o sistema partidário
brasileiro permaneceu fincado em bases essencialmente regionais”. Assim como de
CAMPELLO310: “permaneciam, é certo, as agremiações estaduais, que não
ultrapassavam, nem pretendiam ultrapassar, as fronteiras de seus respectivos
estados”.
De modo que, fazendo uma leitura dos partidos políticos estaduais da
época, segundo ARINOS311, havia a “Chapa Única” de São Paulo, o mais forte,
306
O registro provisório do partido político teve fim na expressa disposição do art 17 da Lei nº 5.682, de 21 de julho de 1971, a primeira Lei Orgânica dos Partidos Políticos. Cf. ARINOS, op.cit., p. 99.
307 ARINOS DE MELO FRANCO. Afonso. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1980. p. 64.
308 VILELA, Renata Rocha. Partidos políticos e regulamentação: limites e benefícios da legislação partidária no Brasil. 2014. Dissertação (Mestrado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2014. p. 30.
309 JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 60.
310 CAMPELLO DE SOUZA, Maria do Carmo Carvalho. Estado e partidos políticos no Brasil (1930 a 1964). São Paulo: Alfa-Omega, 1976. p. 81.
311 ARINOS, ibidem, p. 65.
124
filiado na orientação da Segunda Internacional312; o Partido Republicano Mineiro; o
Libertador e o Partido Republicano Liberal, ambos do Rio Grande do Sul; o Partido
Socialista Brasileiro, distribuído por diversos Estados, cada qual adotando o nome
das Unidades Federativas na sequência à denominação do partido e defendendo os
direitos do trabalho e das classes trabalhadoras.
Havia também o Partido Popular Paulista, cuja origem derivava das
estruturas político-partidárias da “Legião Revolucionária de São Paulo” que os
“tenentes” criaram já nos anos 1920 para a consecução dos seus objetivos313.
JEHÁ314 acrescentou a esse rol o Partido Progressista na Paraíba e em
Minas Gerais, o Partido Social Nacionalista em Minas Gerais, o Partido Nacional em
Alagoas, o Partido Nacionalista e o Partido Popular no Rio Grande do Norte, o
Partido Nacional Socialista no Piauí, o Partido Popular Radical no Rio de Janeiro, o
Partido Liberal no Paraná, Santa Catarina, Pará e Mato Grosso, o Partido
Republicano Social em Pernambuco e o Partido Social Democrático no Ceará, em
Pernambuco, Bahia, Espírito Santo e Paraná.
Lembrou, também, das entidades profissionais com assento reservado na
Câmara dos Deputados, devidamente organizadas sob as bandeiras do Partido da
Lavoura em São Paulo e no Espírito Santo e do Partido Economista no Distrito
Federal, além das listas avulsas que concorriam às eleições e que se distribuíam na
“Lista Hugo Napoleão” no Piauí, “Liberdade e Civismo” em Sergipe, “A Bahia é a
Bahia”, “Por Santa Catarina”, a “Chapa Única” em Goiás, a “Frente Única” no Rio
Grande do Sul, a “Trabalhador, ocupa teu posto” em Pernambuco e a “Ação Imperial
Patrianovista Brasileira” - AIPB, de defesa pela restauração da monarquia, em São
Paulo.
312
A “Chapa Única por São Paulo” teria se formado em 1933, imediatamente à convocação da Assembleia Nacional Constituinte, pelas forças organizadoras da Frente Única Paulista que havia sido composta por integrantes dos Partidos Democrático (PD) e Republicano Paulista (PRP), responsáveis pela articulação da Revolução Constitucionalista de 1932 em São Paulo. Elegeu 17 (dezessete) deputados federais.
313 Consistia no movimento político-militar liderado por jovens oficiais brasileiros que se encontravam ressentidos com a política do Governo, notadamente face o descaso das condições do Exército, tanto em relação ao não investimento com o profissionalismo da tropa, progressão das carreiras profissionais, notadamente dos tenentes, e institucionalização de meios físicos e materiais para o regular exercício das atividades (atendimento médico, armamento etc), como destacado por BARROS (op.cit., 2005). Consistiu num movimento de forte arregimentação de massas urbanas, que logo mais tomaria forma ainda mais evidente nas manifestações populares arregimentadas pelos diversos partidos de esquerda a partir de 1930.
314 JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p.62.
125
Enfim, todos com traços eminentemente regionalizados.
Os partidos políticos de extensão nacional até surgiram, juntamente, com
essa miscigenação ao processo de apadrinhamento dos partidos regionalizados,
autorizado pelo sistema eleitoral.
VILELA315, a esse passo, assinalou a criação das seguintes agremiações
partidárias: a Aliança Nacional Libertadora – ANL, liderada por Luís Carlos Prestes e
a Aliança Integralista Brasileira – AIB, liderada por Plínio Salgado, além do Partido
Comunista Brasileiro – PCB, que, na verdade, já atuava no cenário brasileiro desde
1922, chegando a ter inclusive ligação com a Aliança Nacional Libertadora – ANL
para que não se disseminasse, em 1935316. Enfatizou que ambos os movimentos
fomentados pela ANL e AIB foram relevantes para o “ressurgimento do enfoque
nacional dos partidos e o engajamento da população nas questões políticas”,
descortinando sucesso na motivação para “o golpe do Estado Novo e o
recrudescimento do governo varguista”317.
A Aliança Integralista Brasileira, ou Partido Integralista como nominado
por ARINOS, foi formada e reconhecida legalmente em 1933. Sustentava ideais
antidemocráticos e antipartidários dentro da “corrente brasileira do fascismo
mundial” que representavam. Filiavam-se à ideia de restauração de valores que
haviam sido degradados pela modernidade e só seriam capazes de serem
preservados diante de um Estado forte o suficiente à contenção das lutas de classes
incitadas pelos comunistas. Em razão dessa ideologia, logo ganhou simpatia do
governo central.
A Aliança Nacional Libertadora, por sua vez, foi oficialmente constituída
em 1935 como resposta aos ideais fascistas proclamados pela Aliança Integralista
Brasileira. Com pensamento contrário aos ideais imperialistas, constituía-se de
comunistas, socialistas e “tenentes” insatisfeitos com o governo varguista e sua
aproximação aos grupos oligárquicos afastados do poder central. Defendia ideais
progressistas, de esquerda, e modernizadores que culminaram na defesa e
organização da classe operária por via de sindicatos e em diversas regiões e setores
da sociedade. Luís Carlos Prestes, no seu retorno clandestino ao Brasil e missão de
315
VILELA, Renata Rocha. Partidos políticos e regulamentação: limites e benefícios da legislação partidária no Brasil. 2014. Dissertação (Mestrado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2014.p.24.
316 Ex vi anotações firmadas no subcapítulo anterior, “A Primeira República”, deste trabalho de pesquisa.
317 VILELA, loc.cit.
126
se estabelecer um seguimento da Internacional Comunista no país com a
instauração de um governo nacional-revolucionário, filiou-se ao movimento que
ganhava musculatura popular cada vez mais acentuada. Em 1935, o grande levante
popular conhecido como a Intentona Comunista, articulado nos municípios do Rio de
Janeiro, Natal e Recife, foi o suficiente para sua dissolução que se prosperou pelo
próprio governo central, não apenas com domínio da situação, mas também
perseguição de seus líderes repressores.
Todos, entretanto, tiveram vida curta.
O próprio Partido Socialista Brasileiro durou um pouco mais de um ano.
As “legiões revolucionárias” dos tenentistas fracassaram, assim como o Partido
Agrário, “articulado por Góes Monteiro e João Alberto” e o Clube Três de Outubro,
na forma e função de partido político e que acabara sendo absorvido pela política
getulista, pelo integralismo ou pelo comunismo318. Os partidos conhecidos como
superestatais – Partido Integralista e Partido Comunista – também não conseguiram
sobreviver.
É que sob a regência da Constituição de 1937, apelidada de Polaca e
consolidada num momento histórico de forte influência do fascismo vitorioso em
âmbito internacional, os partidos políticos foram dissolvidos pelo Decreto-Lei nº 37,
de 2 de dezembro.
Instalava-se na história brasileira uma Carta Constitucional de raiz
autoritária, que concentrava todo o poder político nas mãos do Presidente da
República, permitindo, por ordem sua, fechar o Congresso Nacional, as Assembleias
Estaduais e as Câmaras Municipais, como, aliás, foi feito.
Além disso, a Constituição de 1937 vinculava o Poder Judiciário ao Poder
Executivo e consolidava em definitivo a presença dos interventores na regência dos
governos locais e subsequentemente na designação dos prefeitos municipais para
fiel observância das diretrizes do governo central.
Preocupado com a perda da presidência, Getúlio Vargas justificou seus
atos num suposto pretexto de tomada do poder pelos comunistas, inclusive pelo
candidato apoiado por seus sindicatos, José Américo de Almeida.
Nesse contexto, portanto, é que se firmou o fechamento do Congresso, a
suspensão da Constituição e a extinção dos partidos políticos, inclusive da Aliança
318
CAMPELLO DE SOUZA, Maria do Carmo Carvalho. Estado e partidos políticos no Brasil (1930 a 1964). São Paulo: Alfa-Omega, 1976. p. 81.
127
Nacional Libertadora – ANL, ainda que em momento posterior319. Chancelava-se
repúdio absoluto a qualquer recepção constitucional dessa matéria, na contramão de
direção ao que a Constituição Federal de 1934, anterior, ainda que de modo indireto,
havia assegurado: o status constitucional aos partidos políticos.
Assim agiu, haja vista as irresignações das agremiações partidárias aos
interesses do governo central, vistas, de plano, nas justificativas apresentadas no
preâmbulo do Decreto-Lei nº 37/37. In verbis:
CONSIDERANDO, além disso, que os partidos políticos até então
existentes não possuíam conteúdo programático nacional ou
esposavam ideologias e doutrinas contrárias aos postulados do novo
regime, pretendendo a transformação radical da ordem social,
alterando a estrutura e ameaçando as tradições do povo brasileiro,
em desacôrdo com as circunstâncias reais da sociedade política e
civil;
CONSIDERANDO que o novo regime, fundado em nome da Nação
para atender às suas aspirações e necessidades, deve estar em
contato direto com o povo, sôbre posto às lutas partidárias de
qualquer ordem, independendo da consulta de agrupamentos,
partidos ou organizações, ostensiva ou disfarçadamente destinados
à conquista do poder público.
O próprio Partido Integralista, conforme rememorado por ARINOS320,
tentou levar o governo à deposição em 11 de maio de 1938. Sem sucesso, não
obstante, dois dias após, o Presidente tivesse iniciado uma campanha para
sustentar a necessidade de se substituir os partidos políticos dissolvidos por um
instrumento de ação civil, algo como uma organização nacional, que fosse capaz de
apoiar o regime autoritário implantado.
Foi o que ocorreu, em 27 de maio, por sugestão do Interventor do Rio de
Janeiro, em discurso solene e público, no lançamento do projeto da “Legião Cívica
Brasileira”.
Esta organização não podia ser copiada claramente dos partidos
fascistas, porque era exatamente um partido fascista que ela
pretendia combater. Por outro lado, urgia não despertar as
319
Apenas o Partido Comunista Brasileiro – PCB conseguiu sobreviver, clandestinamente, por meio de uma Comissão Nacional de Organização Provisória – CNOP articulada por seus membros da Bahia e de São Paulo.
320 ARINOS DE MELO FRANCO. Afonso. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1980. p. 76-77.
128
susceptibilidades das classes armadas, conferindo-lhe o caráter
para-militar.
Daí ter-se pensado numa solução intermédia, preparatória, que
viesse dispor as coisas para a organização futura. Essa solução era
a Legião Cívica, no fundo do núcleo inicial, o ponto de saída para um
partido único, adaptação brasileira dos partidos do mesmo gênero
que pululavam em tantos países da Europa, da Ibéria aos Balkans.321
[sic]
Propunha-se a criação de um partido único para sustentação do seu
regime autoritário. Nada feito. A ideia de unipartidarismo não vingou, haja vista o
repúdio das Forças Armadas, especificamente, do Exército, que não aceitavam
subordinação a qualquer partido político, já que isso significaria perda de autonomia.
4.2.3. A Redemocratização (1945-1964)
Do ponto de vista histórico, nascia para o Brasil o que fora
convencionalmente chamado de Estado Novo: um período de reconstrução das
bases democráticas no rearranjo político governamental. A Terceira República.
Seguindo o mesmo descortínio mundial de repulsa aos regimes
nazifascistas, autoritários e totalitários, ruídos com o fim da Segunda Guerra Mundial
pelos países aliados vitoriosos, o Presidente Getúlio Vargas, pressionado, decretou
a anistia dos presos políticos, pelo Decreto 7.474, de 18 de abril de 1945, e
convocou eleições presidenciais e legislativas no mesmo ano, pela Lei
Constitucional nº 9, de 28 de fevereiro, o Ato Adicional que promovera diversas
alterações no texto da Constituição Federal de 1937.
Nesse contexto, restabelecidas foram as agremiações partidárias, por via
do Decreto-Lei nº 7.586, de 28 de maio de 1945322, o novo Código Eleitoral, batizado
como “Lei Agamenon”, em referência e homenagem à participação do Ministro de
321
ARINOS DE MELO FRANCO. Afonso. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1980. p. 77.
322 Assim como, também, e na sequência, pelo Decreto-Lei nº 8.157, de 03 de novembro de 1945.
129
Justiça Agamenon Magalhães, também responsável pela nomeação da Comissão
designada a sua confecção323.
Com a revogação expressa do Decreto-Lei anterior, de nº 37/1937, que
extinguira os partidos políticos em seu art. 142, a “Lei Agamenon” tratou dos partidos
políticos em capítulo à parte, determinando sua criação, agora em âmbito nacional e
não mais regional, mediante adesão de, no mínimo, dez mil assinaturas de eleitores
distribuídos em pelo menos cinco Estados, cada qual com o mínimo de quinhentas
assinaturas (art. 109). Dispôs também sobre novas diretrizes ao alistamento eleitoral
e ao processo e controle das eleições, estabelecendo, de imediato, a data de 2 de
dezembro de 1945324 para a realização das eleições presidenciais, do Conselho
Federal e da Câmara dos Deputados e a data de 6 de maio de 1946 para as
eleições de Governadores dos Estados e membros das Assembleias Legislativas
(art. 136).
Outros vários pontos positivos ao sistema partidário no ordenamento
jurídico brasileiro foram trazidos pela “Lei Agamenon”. Em síntese, além de encerrar
a política dos governadores, com a vedação de partidos estaduais, teria colocado
uma pá de cal na trajetória das oligarquias regionais e, especialmente, em qualquer
hipótese de admissibilidade à candidatura avulsa. Exigiu, expressamente, a
obrigatória filiação a partido político ou a aliança de partidos caso eventual candidato
manifestasse interesse em concorrer nos pleitos eleitorais subsequentes (art. 39).
Em âmbito local, autorizava apenas a instalação de Diretórios dos
partidos políticos, desde que devidamente registrados no Tribunal Regional do
Estado correspondente (art. 110).
Era proibido um candidato concorrer por mais de um partido ou coligação
partidária aos cargos regidos pelo princípio proporcional, exceto para os cargos
regidos pelo princípio majoritário, onde era autorizado a concorrer simultaneamente
para os cargos de presidente, senador e deputado federal num mesmo Estado ou
em mais de um Estado (arts. 39 a 42).
Além disso, ao vedar o registro de partido com programa contrário aos
princípios democráticos ou aos direitos fundamentais do homem,
323
José Linhares, como Presidente, e Vicente Piragibe, Lafayette Andrada, Miranda Valverde e Hahneman Guimarães, como membros.
324 Receando a hipótese do novo Presidente eleito promover alterações nos interventores em exercício nos estados, as eleições estaduais acabaram sendo antecipadas para a mesma data da eleição federal, 2 de dezembro de 1945.
130
constitucionalmente assegurados, a “Lei Agamenon” desencadeou o cancelamento
de quinze partidos provisórios dentre os trinta e um existentes, além da supressão
do Partido Comunista pelo Tribunal Superior Eleitoral e da cassação de seus
parlamentares pela Lei nº 211, de 7 de janeiro de 1948.
Privilegiou, por fim, os partidos políticos no tratamento do “mecanismo das
sobras”. O Código Eleitoral precedente, instituído pelo Decreto nº 21.076, de 24 de
fevereiro de 1932, ao criar o sistema de representação proporcional, havia
determinado que o processo de eleição fosse processado por dois turnos
simultâneos de votação, em uma só cédula. Em primeiro turno, estariam eleitos os
candidatos que obtivessem, num primeiro momento, sucesso no quociente eleitoral,
ou seja, no resultado da divisão do total de eleitores participantes do pleito eleitoral
com o número de lugares a serem preenchidos no círculo eleitoral e, num segundo
momento, eleitos seriam aqueles que fossem vitoriosos no resultado obtido pela
divisão do quociente eleitoral com o número de votos conquistados pela legenda,
desprezando-se em ambos as frações (quociente partidário). No segundo turno de
votação, por sua vez, eleitos seriam todos “os outros candidatos mais votados, até
serem preenchidos os lugares que não o foram no primeiro turno” (art. 58, item 8º).
Criou, assim, um novo tratamento ao popular “mecanismo das sobras”.
De fato, é inegável admitir o quão valorosas foram as disposições do
Código Eleitoral prescrito pelo Decreto-Lei nº 7.586/45, a “Lei Agamenon”, para a
legitimidade das agremiações partidárias.
No que tange ao “mecanismo das sobras”, CAMPELLO DE SOUZA325
repudiava, veementemente, a inovação implementada, por acreditar que promovia
distorções significativas no sistema de representação política, privilegiando-se
partidos políticos específicos.
Nesse contexto, entendia que o Partido Social Democrático – PSD se
favorecia em âmbito nacional, assim como a UDN em alguns poucos Estados, e o
Partido Trabalhista Brasileiro – PTB e o Partido Comunista – PC no Distrito Federal.
Além disso, por autorizar um candidato a concorrer a um mesmo cargo político em
diversos estados, naqueles em que fosse vencedor também conseguia garantir a
elegibilidade de vários outros candidatos de menor expressão política que, por si só,
jamais se sagrariam vencedores no quociente eleitoral e no quociente partidário pela
325
CAMPELLO DE SOUZA, Maria do Carmo Carvalho. Estado e partidos políticos no Brasil (1930 a 1964). São Paulo: Alfa-Omega, 1976. p. 120.
131
quantidade de votos recebida. Como exemplo, destacou a candidatura de Getúlio
Vargas ao Senado por cinco estados e a Deputado Federal em nove estados,
lembrando que ele teria sido vencedor, respectivamente, em dois e sete estados,
beneficiando uma lista interminável de candidatos escassamente votados pelo
cômputo do “mecanismo das sobras”. In verbis:
Como candidato a deputado federal, Getúlio teve 116.712 votos no
Distrito Federal; 119.055 em São Paulo, 11.291 no Rio Grande do
Sul, onde se elegeu Senador com 461.913 votos; 32.012 em Minas
Gerais. Além disso, foi o único deputado eleito pelo PTB na Bahia,
com 10.032 votos; no Rio de Janeiro, com 20.745; e no Paraná, com
8.648 votos. Graças ao mecanismo das sobras, deram-se casos
como o de Barreto Pinto, eleito pelo PTB do Distrito Federal com 537
votos. (Fonte: T.S.E. Dados estatísticos, 1964).326
Enfim, sem embargo aos efeitos produzidos ao sistema eleitoral por esse
novo “mecanismo das sobras”, examinando-se a formação do sistema de partidos
da época é possível destacar que reorganizados foram: o Partido Social
Democrático – PSD, que já havia publicado o seu estatuto partidário em 9 de maio
de 1944; assim como a União Democrática Nacional – UDN, registrada em 10 de
novembro de 1944, embora com atividade social manifestada desde abril do mesmo
ano; e o Partido Trabalhista Brasileiro – PTB, além do já existente, e renovado,
Partido Comunista Brasileiro – PCB, embora dois anos após, em 1947, tivesse
retornado à clandestinidade, até 1980327.
O Partido Social Democrático – PSD consagrou-se como o maior partido
do Estado Novo ou da Terceira República. Conseguira se organizar em todos os
Estados para as eleições de 1945, atendendo os prescritos da Lei 7.586/45, a “Lei
Agamenon”. Teve formação na base varguista implantada pelos núcleos estatais de
interventorias, a partir da idealização e institucionalização proposta pelo interventor
mineiro Benedito Valadares. Elegeu o candidato à Presidência da República General
Eurico Dutra, em 02 de dezembro de 1945, com o total de 55,3% dos votos.
Influenciou fortemente a feitura da nova Constituição Federal, já que conquistara
326
CAMPELLO DE SOUZA, Maria do Carmo Carvalho. Estado e partidos políticos no Brasil (1930 a 1964). São Paulo: Alfa-Omega, 1976. p. 120.
327 De qualquer modo, interessante as observações de JEHÁ (2009, p. 76) em face do destaque que o Partido Comunista Brasileiro havia alcançado com as eleições de 1945. Teria obtido sucesso em 5% dos votos para a Câmara dos Deputados, assumindo 14 cadeiras legislativas e sucesso em quase 10% dos votos nas eleições presidenciais com o seu candidato Uedo Fiúza.
132
maioria absoluta na Assembleia Constituinte de 1946, mantendo-se, inclusive, como
a maior bancada no Congresso Nacional328. Defendia ideais liberais, numa versão
mais atualizada e melhorada em relação ao Partido Republicano – PR da Primeira
República, porém sob mesma bandeira do oficialismo intransigente e da política do
governismo fiel, de predomínio rural e semirrural, absolutamente conservadores e
ordeiros, e não reformistas. Afinal, conforme rememorado por FERREIRA FILHO329,
era um partido das “camadas mais tradicionalistas das vilas do sertão, dos
latifundiários, dos grandes cafeicultores, dos plantadores de algodão, cana, cacau,
dos criadores de gado, mas também, em São Paulo e no Rio, de uma burguesia
industrial quase ‘neutralista’”.
A União Democrática Nacional – UDN foi embrionada de modo
clandestino por diversos e miscigenados grupos dos setores urbanos, antigas
oligarquias tradicionais, liberais, socialistas e economistas que se apresentavam
absolutamente contrários ao regime varguista330. Nesse deslinde encontravam-se os
colaboradores com o desfecho da Revolução de 1930, mas que, pelo próprio
Presidente, haviam sido traídos, ou os que com ele se desentenderam, ou aqueles
que haviam assinado o “Manifesto dos Mineiros”, ou, ainda, os que não teriam
aceitado a organização firmada sob a Constituição de 1937331. Para se adaptar à
“Lei Agamenon”, tiveram que se associar a outras agremiações, quais sejam, o
Partido Republicano, Partido Libertador e Esquerda Democrática, fomentando,
segundo destacado por CAMPELLO DE SOUZA “a ladainha do ‘amorfismo
ideológico e programático’ tão cara ao jornalismo político brasileiro”332. Com o seu
registro oficial em 31 de outubro de 1945, pela Resolução TSE nº 296, passaram a
representar a base empresarial sediada no liberalismo da classe média urbana e
política mais culta das grandes cidades, robustecida de tendências renovadoras e
progressistas, além da alta burguesia, dos latifundiários, dos industriais e dos
328
VILELA, Renata Rocha. Partidos políticos e regulamentação: limites e benefícios da legislação partidária no Brasil. 2014. Dissertação (Mestrado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2014. p. 32.
329 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Os Partidos Políticos nas Constituições Democráticas: o Estatuto Constitucional dos Partidos Políticos no Brasil, na Itália, na Alemanha e na França. Imprensa da Universidade de Minas Gerais: Revista Brasileira de Estudos Políticos; Estudos Sociais e Políticos, vol. 26, 1966. p. 62.
330 Com o mesmo detalhamento, FERREIRA FILHO (ibidem), lembrou se tratar de um partido mais ou menos liberal, “apoiado pela burguesia culta das cidades, mas nos lugarejos do interior é o partido do ‘coronel’, que não pôde ou que não quis filiar-se ao PSD, antes que seu rival direto o fizesse.”.
331 CAMPELLO DE SOUZA, Maria do Carmo Carvalho. Estado e partidos políticos no Brasil (1930 a 1964). São Paulo: Alfa-Omega, 1976. p. 108-115.
332 CAMPELLO DE SOUZA, ibidem.
133
grandes proprietários, não obstante também congregassem eleitorado rural e
semirrural, progressistas. Formava o núcleo de oposição ao interventorismo e ao
nacionalismo e de defesa da abertura de investimentos internacionais, com
organizações já previstas junto aos diretórios nos Estados de Minas Gerais, São
Paulo, Rio Grande do Sul, Bahia e Rio de Janeiro. Segundo SCHMITT333, foi a
segunda maior agremiação, com a segunda maior bancada no Congresso Nacional
até 1962.
O Partido Trabalhista Brasileiro – PTB, assim como o PSD, foi
concretizado por simpatizantes do governo provenientes dos sindicatos e dos
quadros do Ministério do Trabalho, tanto de setores organizados quanto urbanos.
Era o seu fiel escudeiro, apoiando os candidatos pessedistas na disputa das
eleições presidenciais de 1945, 1955 e 1960334. Diferenciava-se apenas no modo de
estruturação intrapartidária que, em razão do modo hierarquizado, centralizado e
antidemocrático de ser, além de prejudicar a plena autonomia dos seus diretórios
estaduais e municipais, nas eleições de 1945 teria conseguido concorrer para a
Câmara dos Deputados em apenas quatorze unidades da federação. Em razão das
propostas reformistas, populistas e nacionalistas que defendiam, significativo
crescimento experimentaram no segundo governo de Getúlio Vargas, quando
reeleito Presidente da República por essa legenda nas eleições de 1950335. Também
elegera Jango para a vice-presidência por dois pleitos consecutivos (1955 e 1960,
com 44,3% e 41,3 dos votos, respectivamente)336. Constituiu a terceira maior
bancada partidária que mais cresceu do ponto de vista eleitoral, suplantando a UDN
em 1962.
De acordo com o lembrado por ARINOS337, importante também destacar
a existência, na sequência, do Partido Socialista Brasileiro – PSB, ex-esquerda
democrática, de caráter intelectual forte melhor definido que o dos udenistas (UDN)
333
SCHMITT, Rogério. Partidos Políticos no Brasil (1945-2000). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000. p.15-16.
334 SCHMITT, ibidem, p.17
335 Devido à forte pressão dos liberais integrantes da UDN, dos militares anticomunistas e dos empresários ligados ao capital externo que buscavam a renúncia do Presidente, Getúlio Vargas se suicidou, desencadeando a obrigatória abertura de novo pleito eleitoral. Em razão da comoção popular instalada em face do titulado “herói popular”, restaram vencedores os candidatos getulistas Juscelino Kubitschek (PSD) para a Presidência da República e o ex-Ministro do Trabalho João Goulart (PTB) para a Vice-Presidência da República (VILELA, 2014, p. 35).
336 SCHMITT, loc.cit.
337 ARINOS DE MELO FRANCO. Afonso. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1980. p.91.
134
e representação da posição socialista democrática, embora com dificuldades de
penetração na massa popular, na classe trabalhadora, de base eminentemente
comunista. E o Partido Trabalhista, com base eleitoral sólida, formada a partir do
proletariado menos esclarecido, “presos à tradição da propaganda ditatorial e
levados, por patriotismo ou outras razões, a não votar com os comunistas”338 que,
de um modo geral, os hostilizavam, tanto quanto os socialistas em geral.
Segundo JEHÁ339, o PSB constituía-se de setores restritos e homogêneos
da intelectualidade moderada de esquerda, tendo sido “espremido eleitoralmente, à
direita, pela UDN, com quem disputava no terreno do liberalismo político, e, à
esquerda, pelo PCB e até pelo PTB, com quem competia no campo do liberalismo
econômico e social”.
Embora o PSD, a UDN e o PTB disputassem a preferência do eleitorado,
comandando o cenário político no período de 1945 a 1964, JEHÁ também
acrescentou a existência do Partido Republicano – PR e do Partido Social
Progressista – PSP, além de várias outras legendas menos expressivas,
consideradas “nanicas” e criadas em face da permissão conferida pelo sistema
proporcional da “Lei Agamenon” (art. 38, §1º), que seriam:
(...) o Partido Democrata Cristão – PDC, surgido na onda da
democracia cristã que se espalhou pelo mundo após o final da 2ª
Guerra Mundial; o Partido Libertador – PL, fundado sob a influência
da história do gaúcho Raul Pilla, federalista e libertador desde antes
de 1930; o Partido da Representação Popular – PRP, rescaldo
integralista, fundado por Plínio Salgado, pelo qual concorreu à
presidência em 1955; o Partido Trabalhista Nacional – PTN, o Partido
Orientador Trabalhista – POT e o Partido Proletário do Brasil – PPB
(...) formados com objetivos muito semelhantes de explorar a retórica
social que já estava tão em moda no período; o Partido Republicano
Trabalhista – PRT, também formado sob a moda trabalhista e sem
qualquer preocupação com um discurso próprio; o Partido Social
Trabalhista – PST, mera dissidência pessedista criada para
acomodar o maranhense Vitorino Freire para a disputa pela vice-
presidência da República e, 1950, quando o PSD decidiu lançar
Altino Arantes para concorrer ao cargo; o Movimento Trabalhista
Renovador – MTR, criado pelo gaúcho Milton Ferrari para concorrer
338
ARINOS DE MELO FRANCO. Afonso. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1980. p.91.
339 JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 77.
135
à vice-presidência da República, em 1960, quando a aliança que
lançou Jânio Quadros (PDC/UDN) dividiu-se na definição do
candidato a vice e assistiu ao lançamento da candidatura do udenista
Milton Campos; o Partido da Boa Vontade (PBV), liderado a partir do
Rio de Janeiro por Alziro Zarur, que se desgastou em função do
apoio dado ao golpismo lacerdista; e o Partido Republicano
Democrático – PRD, “ressuscitando o discurso pseudo-avançado
socialmente e ironizado por Osório Borba já na Constituinte de
1933/1934”.340
Na síntese do necessário, tem-se que o Partido Republicano – PR
também gravitava na base partidária do oficialismo do governo federal. Constituía-se
de origem rural e semirrural, com orientação conservadora e características bastante
próximas do PSD, daí porque, em razão da força política apresentada por esta
agremiação partidária, tinha o seu desempenho bastante ofuscado.
Não exatamente ofuscado, mas nitidamente fraco era como se mostrava,
por sua vez, o desempenho do Partido Social Progressista – PSP. Originado da
fusão do Partido Popular Sindicalista – PPS, do Partido Republicano Progressista –
PRProg e do Partido Agrário Nacional – PAN, nas eleições de 1945, por exemplo,
não havia conseguido ocupar uma cadeira na Câmara dos Deputados, sequer obter
sucesso na indicação de um candidato à Presidência da República, exatamente
como proposto pelo PAN.
O Partido Socialista Brasileiro – PSB também integrava uma legenda de
dissidentes da União Democrática Nacional – UDN, que teria se consolidado a partir
das eleições de 1950 como a quarta maior força política nacional, sob a liderança do
paulista Ademar de Barros341.
Para SCHMITT342, a classificação subsequente às três maiores bancadas
partidárias teria sido: (1) o PSP, com a quarta maior legenda, porque, embora com
base eleitoral mais concentrada em São Paulo, sob a liderança de Ademar de
Barros, governador paulista por dois mandatos, teria conquistado efetivamente a
terceira posição nas eleições à presidência de 1955 e 1960, com 25,8% e 18,8% dos
votos, respectivamente, além de ter elegido o potiguar João Café Filho à vice-
340
JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 78.
341 JEHÁ, ibidem.
342 SCHMITT, Rogério. Partidos Políticos no Brasil (1945-2000). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000. p.18-19.
136
presidência em 1950, com 35,1% dos votos, e conquistar o terceiro lugar da vice-
presidência de 1955 com o deputado federal distrital Dalton Coelho (13,9% dos
votos); (2) o PR, com a quinta maior legenda e base eleitoral concentrada em Minas
Gerais e Bahia, havia integrado praticamente todos os Ministérios; (3) o PDC, com a
sexta maior legenda, concentrava-se no Paraná, onde elegeu Nei Braga para
governador em 1960, Pernambuco e São Paulo, alcançando a quinta posição na
Câmara dos Deputados em 1962 e a presidência com Jânio Quadros em 1960, com
48,3% de votos; (4) o PTN, com a sétima maior sigla, detinha a sexta maior bancada
de deputados federais; (5) o Partido Libertador – PL evidenciava-se a oitava maior
legenda; e o (6) PST, a nona maior sigla, com o senador maranhense Vitorino Freire
no quarto lugar da vice-presidência de 1950, com 7,6% dos votos, e Miguel Arraes
no Governo de Pernambuco em 1962.
Na sequência, o autor ainda destacou o PSB, com o ex-deputado federal
alagoano Aurélio Viana alcançando o Senado pela Guanabara em 1962; o PRP,
com o paulista Plínio Salgado, em quarto lugar na eleição presidencial de 1955, com
8,3% de votos; o PRT, dissidente do PTB, com a única cadeira no Senado
conquistada pelo carioca Aarão Steinbruch; e o PCB, com a quarta maior bancada
na Câmara dos Deputados (14 deputados), além de Luiz Carlos Prestes no Senado
Federal e Yedo Fiúza no terceiro lugar das eleições presidenciais, com 9,7% de
votos.
Do ponto de vista ideológico, distribuindo-se as siglas no eixo esquerda-
direita, SCHMITT343 sustentou como legendas de centro o PSD, o principal à
legitimação democrática, assim como o PDC e o PL. A UDN ocupava
incontroversamente a direita, consistindo num partido de apoio ao governo e não ao
regime democrático propriamente dito, assim como o PR e o PRP. A esquerda, por
sua vez, tinha a posição hegemonizada no PTB, assim como no PCB, no PSP e nas
pequenas siglas trabalhistas PTN, PSP, PRT e MTR.
Em suma, portanto, as agremiações partidárias que teriam se
institucionalizado, com, inclusive, atendimento aos pressupostos legais controlados
pela Justiça Eleitoral nesse período de abertura à democracia representativa teriam
sido:
343
SCHMITT, Rogério. Partidos Políticos no Brasil (1945-2000). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000. p. 26-27.
137
Tabela 2 - Apresentação e situação jurídica dos partidos políticos no período de 1945 a
1964
Partido/Sigla Sede Registro
União Nacional do
Trabalho - UNT
Rio de Janeiro Deferido provisoriamente em 11.9.1945, porém
cancelado em 4.5.1948.
Partido Nacional
Evolucionista –
PNE
Rio de Janeiro Deferido provisoriamente em 19.10.1945, após
atendimento de diligência; cancelado em
4.5.1948.
Partido
Democrático
Progressista – PDP
Rio de Janeiro Deferido provisoriamente em 15.9.1945;
cancelado em 20.4.1948.
Partido da
Lavoura, Indústria
e Comércio – PLIC
Distrito
Federal
Deferido provisoriamente em 20.4.1945, porém
cancelado em 13.5.1948.
Partido Republicano
– PR
Rio de Janeiro
Deferido provisoriamente em 21.8.1945 e,
definitivamente, em 6.11.1945 (Resolução TSE
nº 308); extinto pelo Ato Institucional nº 2, com
arquivamento de seus registros, fusão e
reorganização em 8.11.1965 (Resolução TSE nº
7.764).
Partido Socialista
Cristão – PSC
Rio de Janeiro Deferido provisoriamente em 29.9.1945, porém
cancelado em 4.5.1948.
Partido de
Representação
Popular – PRP
Rio de Janeiro
Deferido provisoriamente em 9.10.1945 e,
definitivamente, em 10.11.1945; extinto pelo Ato
Institucional nº 2, com arquivamento de seus
registros, fusão e reorganização em 8.11.1965
(Resolução TSE nº 7.764).
Partido Socialista
do Brasil – PS do B
Distrito
Federal
Indeferido o registro provisório por ausência de
quantitativo mínimo de dez mil eleitores,
subscritores, exigido pela lei. Arquivado em
29.6.1946.
Partido Democrata
Cristão – PDC
São Paulo
Deferido provisoriamente em 6.11.1945 e,
definitivamente, em 12.11.1945; extinto pelo Ato
Institucional nº 2, com arquivamento de seus
registros, fusão e reorganização em 8.11.1965
(Resolução TSE nº 7.764).
Partido Libertador –
PL
Porto Alegre -
RS
Deferido provisoriamente em 27.9.1945 e,
definitivamente, em 10.11.1945; extinto pelo Ato
Institucional nº 2, com arquivamento de seus
registros, fusão e reorganização em 8.11.1965
(Resolução TSE nº 7.764).
(“continuar”)
138
Tabela 2 - Apresentação e situação jurídica dos partidos políticos no período de 1945 a
1964 (“continuação”)
Partido/Sigla Sede Registro
Partido Industrial
Agrícola
Democrático –
PIAD
Rio de Janeiro
Deferido provisoriamente em 2.10.1945, porém
cancelado em 4.5.1948.
Partido Comunista
do Brasil - PCB
Rio de Janeiro
Deferido provisoriamente, após modificação
estatutária, em 27.10.1945 e, definitivamente,
em 10.11.1945; após denúncia para sua
cassação, apresentação de defesa e exames da
Procuradoria Geral Eleitoral – PGE, o registro do
PCB foi cancelado em 7.5.1947 (Resolução TSE
nº 1.841).
Partido Nacional
Classista - PNC
Rio de Janeiro Deferido provisoriamente em 4.10.1945; porém,
cancelado em 3.5.1948.
Confraternização
Social Democrata -
CSD
Rio de Janeiro Deferido provisoriamente em 9.10.1945.
Partido Rural
Trabalhista – PRT
(antigo Partido
Republicano
Trabalhista, ex-
Partido
Republicano
Democrático)
Rio de Janeiro
Deferido provisoriamente em 7.8.1945 e
definitivamente em 16.11.1945, o PRD obteve
autorização para modificar sua legenda para
Partido Republicano Trabalhista – PRT em
18.1.1949 e para Partido Rural Trabalhista, de
mesma sigla, em 17.11.1961. Por força do Ato
Institucional nº 2, teve seus registros, fusão e
reorganização arquivados em 8.11.1965
(Resolução TSE nº 7.764).
Núcleo Eleitoral
Pró-Emancipação
Carioca - NEPEC
Rio de Janeiro
Indeferido o registro em 9.8.1945, tendo em vista
a ausência de prova de aquisição de
personalidade jurídica; de indicação clara e
precisa do programa partidário em seu estatuto;
de representação nacional e atendimento dos
requisitos legais.
Aliança Social
Democrata - ASD
Rio de Janeiro Deferido em 1.9.1945, porém cancelado em
4.5.1948.
Partido Social
Progressista - PSP
Rio de Janeiro Deferido provisoriamente em 6.8.1946, após
aprovação do pedido de fusão dos Partidos
Popular Sindicalista, Republicano Progressista e
Agrário Nacional em 24.6.1946. Extinto pelo Ato
Institucional nº 2, com arquivamento de seus
registros, fusão e reorganização em 8.11.1965
(Resolução TSE nº 7.764).
(“continuar”)
139
Tabela 2 - Apresentação e situação jurídica dos partidos políticos no período de 1945 a
1964 (“continuação”)
Partido/Sigla Sede Registro
Partido Agrário
Nacional – PAN
(fusão no PSP)
São Paulo -
SP
Deferido provisoriamente em 2.10.1945 e,
definitivamente, em 16.11.1945; porém cancelado
o seu registro em razão da fusão ao Partido
Social Progressista – PSP em 6.8.1946.
Partido
Republicano
Progressista – PRP
(fusão no PSP)
São Paulo –
SP
Deferido provisoriamente em 15.9.1945 e
definitivamente em 10.11.1945; porém cancelado
o seu registro em razão da fusão ao Partido
Social Progressista em 6.8.1946.
Partido Popular
Sindicalista – PPS
(fusão no PSP)
Rio de Janeiro
Deferido provisoriamente em 2.10.1945 e
definitivamente em 6.11.1945; porém cancelado o
seu registro em razão da fusão ao Partido Social
Progressista em 6.8.1946.
Partido
Regenerador – PR
Rio de Janeiro Deferido provisoriamente em 3.9.1946, porém
cancelado em 4.5.1948.
Partido Social
Democrático – PSD
Rio de Janeiro
Deferido provisoriamente em 21.8.1945 e,
definitivamente, em 25.10.1945; extinto pelo Ato
Institucional nº 2, com arquivamento de seus
registros, fusão e reorganização em 8.11.1965
(Resolução TSE nº 7.764).
Organização
Político-Social
Feminina - POPSF
Rio de Janeiro
Solicitação de registro realizada em 15.9.1945,
com conversão em diligência pelo Tribunal
Superior Eleitoral – TSE em 25.9.1945.
União Democrática
Nacional - UDN
Rio de Janeiro
Deferido provisoriamente em 25.9.1945 e,
definitivamente, em 31.10.1945; extinto pelo Ato
Institucional nº 2, com arquivamento de seus
registros, fusão e reorganização em 8.11.1965
(Resolução TSE nº 7.764).
Partido Orientador
Trabalhista - POT
Rio de Janeiro
Deferido provisoriamente em 4.10.1945 e,
definitivamente, em 1.10.1946; porém,
cancelado o seu registro em 12.10.1951, tendo
em vista a ausência de representante eleito em
qualquer das vagas legislativas no Congresso
Nacional, no pleito de 3 de outubro de 1950.
Partido Socialista
Brasileiro – PSB
(antigo Partido da
Esquerda
Democrática)
Rio de Janeiro
Deferido em 25.09.1945 o Partido da Esquerda
Democrática, assim como a alteração estatutária
e de modificação da legenda para Partido
Socialista Brasileiro – PSB em 6.8.1947. Extinto
pelo Ato Institucional nº 2, com arquivamento de
seus registros, fusão e reorganização em
8.11.1965 (Resolução TSE nº 7.764).
(“continuar”)
140
Tabela 2 - Apresentação e situação jurídica dos partidos políticos no período de 1945 a
1964 (“continuação”)
Partido/Sigla Sede Registro
União Social pelos
Direitos do Homem
- USDH
São Paulo -
SP
Deferido provisoriamente em 18.9.1945;
indeferido o pedido de registro definitivo em
16.11.1946 e cancelado o registro provisório em
3.5.1948, por não atendimento aos preceitos do
Decreto-Lei 9.258, de 14 de maio de 1946.
Partido Trabalhista
Nacional - PTN
Rio de Janeiro
Deferido em 6.10.1945 e definitivamente em
22.10.1946; extinto pelo Ato Institucional nº 2,
com arquivamento de seus registros, fusão e
reorganização em 8.11.1965 (Resolução TSE nº
7.764).
Partido Nacional
Popular
Democrático -
PNPD
Distrito
Federal
Deferido provisoriamente em 11.9.1945; porém,
cancelado em 3.5.1948, por falta de atendimento
ao Decreto-Lei 9.258, de 14 de maio de 1946.
Partido Social
Trabalhista – PST
(antigo Partido
Proletário do
Brasil)
Rio de Janeiro
Deferido o registro provisório do Partido Proletário
do Brasil em 27.3.1945 e definitivo em
17.12.1946, assim como a alteração de sua
legenda para Partido Social Trabalhista em
24.7.1947. Extinto pelo Ato Institucional nº 2, com
arquivamento de seus registros, fusão e
reorganização em 8.11.1965 (Resolução TSE nº
7.764).
Partido Popular
Progressista - PPP
Rio de Janeiro Indeferido em 28.6.1949, por considerá-lo
substituto do extinto Partido Comunista do Brasil.
Partido Ruralista
Brasileiro - PRB
Rio de Janeiro
Deferido provisoriamente em 31.7.1950, com
ressalvas (promoção da reforma estatutária, com
supressão das falhas assinaladas pela
Procuradoria Geral Eleitoral – PGE). Cancelado o
registro provisório em 3.1.1952, por
desatendimento ao art. 148, parágrafo único, do
Código Eleitoral.
Partido
Constitucionalista
Brasileiro - PCB
Rio de Janeiro
Indeferido em 17.7.1952, por, em especial,
ausência de aquisição de personalidade jurídica e
inscrição de seu estatuto no registro civil das
pessoas jurídicas.
Aliança
Democrática
Brasileira - ADB
Rio de Janeiro
Indeferido em 15.9.1961, por ausência de
quantidade mínima de dez mil eleitores
subscritores, exigidos pela lei.
Fonte: TSE, 2015 344 (elaborada pela autora)
344
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral – TSE. Disponível em: <www.tse.jus.br/partidos/partidos-politicos/registros-de-partidos-politicos-1945-a-1979.htm>. Acesso em 7 de nov. de 2015.
141
Ou seja, das trinta e cinco agremiações partidárias que solicitaram o
registro junto ao Tribunal Superior Eleitoral – TSE, apenas quatro foram indeferidas
e doze (devidamente negritadas no quadro ilustrativo acima) obtiveram êxito até a
determinação de sua extinção em 1965, pelo Ato Institucional nº 2.
Enfim, após várias redações e emendas, o texto em definitivo da
Constituição de 1946 seguiu com o amplo acolhimento do sufrágio universal e direto,
o voto secreto, a representação política por via dos partidos políticos, sua
consagração como partidos de caráter nacional (art. 134), e o sistema proporcional
de eleição às Casas Legislativas (art. 56). Defendeu a representação proporcional
dos partidos políticos junto às comissões permanentes do Congresso (art. 40), seu
direito, enquanto pessoa jurídica, de isenção de impostos por qualquer ente
federativo (art. 31, alínea “b”) e de possibilidade de consolidação como acionista de
sociedades anônimas proprietárias de empresas jornalísticas e de radiodifusão (art.
160). Só nada disse em face do papel dos partidos políticos propriamente ditos.
Reintroduziu no texto constitucional a Justiça Eleitoral, criada pelo Código
Eleitoral de 1932 (Decreto nº 21.076, de 24 de fevereiro), inserida na Constituição de
1934 e suprimida na Constituição de 1937. Este, enquanto órgão provido de ação
fiscalizatória sob o aspecto eminentemente formal, que age mediante provocação de
terceiros legitimados e não mediante diligência estatutária própria345, recebeu da
ordem constitucional independência funcional e poderes para controlar os partidos
políticos, defendendo-os contra o arbitrário, como modo de preservar a ordem
democrática346.
Há quem diga que tivesse consistido referido período histórico brasileiro o
mais rico ao exercício da democracia pelos partidos políticos, justamente porque o
polo da competição política estaria ampla e livremente garantido a eles por lei,
expressando um cenário político que até então não havia se visto em solo
doméstico: o de monopólio das candidaturas.
Precedentemente aos apontamentos pertinentes à entrada do período
militar de 1964-1985, é conveniente ponderar, em breves linhas históricas, que em
1961, o presidente Jânio Quadros (PTN), inusitadamente, renunciava ao poder,
345
CAGGIANO, Monica Herman Salem. Finanças Partidárias. 1980. Dissertação (Mestrado em Direito Constitucional) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 1980. p. 64.
346 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Os Partidos Políticos nas Constituições Democráticas: o Estatuto Constitucional dos Partidos Políticos no Brasil, na Itália, na Alemanha e na França. Imprensa da Universidade de Minas Gerais: Revista Brasileira de Estudos Políticos; Estudos Sociais e Políticos, vol. 26, 1966.p. 61.
142
exigindo de João Goulart (PTB), seu vice, a assunção imediata. Conservadores
presentes na elite dominante e nas Forças Armadas mostravam-se contrários à
posse de Jango, como era popularmente conhecido, haja vista as tendências
políticas de esquerda que acreditavam ser por ele sustentadas. De outro lado, um
movimento de resistência, que defendia a “campanha legalista” pela posse de Jango
e teria se iniciado no Rio Grande do Sul a partir da liderança de Leonel Brizola
(PTB), com simpatizantes em todos os demais Estados brasileiros, inclusive em
setores das Forças Armadas, se consolidou, criando impasse ainda maior ao
processo de governabilidade.
O modo de solução à crise institucional firmada pelo Congresso Nacional
foi a redução dos poderes constitucionais do Presidente da República mediante o
estabelecimento de um regime parlamentar de governo, transferindo-se vários
poderes seus para um presidente do Conselho de Ministros.
O regime parlamentar foi instituído pela Emenda Constitucional nº 4, de 2
de setembro de 1961, porém, em um pouco mais de um ano, foi dissolvido pela
Emenda Constitucional nº 6, de 23 de janeiro de 1963. É que, sem maioria e com
dificuldades para a aprovação de seus projetos, valendo-se de uma estratégia
populista, Jango, que havia tomado posse em 7 de setembro de 1961, determinou a
realização de um referendo popular no dia 6 de janeiro de 1963 para a escolha do
regime de governo347, vencendo o retorno ao Presidencialismo por adesão de 80%
dos eleitores.
Temerosos à institucionalização de um regime socialista, o aumento das
tensões sociais e políticas acabaram legitimando a formação do golpe militar em 31
de março de 1964, liderada pelos generais Carlos Luís Guedes e Olímpio Mourão
Filho, provocando a deposição de Jango da Presidência. Auro Soares de Moura
Andrade, presidente do Senado Federal, na reunião conjunta do Congresso
Nacional em 2 de abril de 1964, declarou vaga a Presidência, investindo neste cargo
o presidente da Câmara dos Deputados, o Deputado Ranieri Mazzili.
Iniciava-se um novo período autocrático no sistema brasileiro, de base
militar, reconhecida, entretanto, por inúmeros estudiosos, como civil-militar.
347
Ex vi art. 2º da Lei Complementar nº 2, de 16 de setembro de 1962, ao Ato Adicional.
143
4.2.4. O Período Militar (1964-1985)
A entrada do governo militar marcou o fim das conquistas democráticas.
Atos Institucionais passaram a ser adotados como instrumentos legítimos à
governabilidade, implementando restrições máximas a qualquer forma de
participação popular, mesmo que constitucionalmente garantida, e, principalmente, a
manifestações em oposição ao regime militar vigente.
Iniciava-se a Quarta República, com o primeiro militar a assumir a
Presidência da República no período de 1964 a 1967: o Marechal Humberto de
Alencar Castello Branco.
De imediato, com o intuito de legitimar o Poder das Forças Armadas, a
primeira medida adotada pelo regime autoritário foi suspender os direitos políticos de
qualquer cidadão por dez anos e a cassação de mandatos parlamentares, em
qualquer nível, pelo Comando Supremo da Revolução, quando no interesse da paz
e da honra nacional348. Referida determinação teve início com o Ato Institucional nº 1
(AI-1), editado em 9 de abril de 1964 e perdurando até 1979.
Até esse momento, de outro lado, aparentemente, nenhuma alteração
teriam sofrido os partidos políticos, sobretudo porque mantido teria sido o texto
constitucional e o próprio calendário eleitoral pelo próprio AI-1.
Os reveses do regime autoritário começaram a surtir efeitos a partir da
vigência do novo Código Eleitoral, a Lei nº 4.737, e da primeira Lei Orgânica dos
Partidos Políticos, a Lei 4.740, ambas editadas em 15 de julho de 1965. Na verdade,
a partir dos reflexos apresentados pelo sistema partidário vigente, mesmo frente à
vigência destes textos legais.
Registre-se que o novo Código Eleitoral, embora não precisasse uma
data limite específica, havia determinado que cada legenda partidária se
reorganizasse, corrigindo seu registro junto ao Tribunal Superior Eleitoral – TSE com
a prova da personalidade jurídica de direito público interno, assinatura de pelo
348
Ato Institucional nº 1 (AI-1), de 9 de abril de 1964, que dispôs sobre “a manutenção da Constituição Federal de 1946 e as Constituições Estaduais e respectivas Emendas, com as modificações introduzidas pelo Poder Constituinte originário da revolução Vitoriosa”, teve vigência até 31 de janeiro de 1966: “Art. 10 - No interesse da paz e da honra nacional, e sem as limitações previstas na Constituição, os Comandantes-em-Chefe, que editam o presente Ato, poderão suspender os direitos políticos pelo prazo de dez (10) anos e cassar mandatos legislativos federais, estaduais e municipais, excluída a apreciação judicial desses atos.”
144
menos 101 membros fundadores e aprovação originária de pelo menos 3% do
eleitorado votante na última eleição geral para a Câmara dos Deputados,
devidamente distribuídos em 11 ou mais Estados, com o mínimo de 2% em cada
um, até doze meses da data de seu registro.
Nenhuma hipótese à realização de registro provisório fora autorizada e,
pior, segundo destacado por SCHMITT349, cancelados seriam os partidos que não
conseguissem eleger pelo menos 12 deputados federais em, no mínimo, sete
Estados da Federação, mesmo que cumpridas tivessem sido as determinações
prévias ao novo registro.
Em momento subsequente, a primeira Lei Orgânica dos Partidos Políticos
não piorou a situação, mas também não ajudou, quiçá às expectativas do próprio
governo. Consignou, apenas, que as regras do novo Código Eleitoral não fossem
aplicadas ao pleito eleitoral previsto para ocorrer em três meses: as eleições para
governadores estaduais, de 1965.
Os reflexos negativos apresentaram o desfecho inesperado ao governo:
dos candidatos apoiados, derrota em quatro Estados, notadamente nos dois dos
mais importantes que, anteriormente, já eram governados por apoiadores do Golpe
de 1964. De acordo com o explicitado por SCHMITT350:
Em Minas Gerais, venceu o veterano deputado federal pessedista
Israel Pinheiro, com o decisivo apoio de Juscelino Kubitschek. Na
Guanabara, o PSD conduziu o ex-prefeito carioca Francisco Negrão
de Lima ao governo estadual, em aliança com o PTB. Estes
resultados, favoráveis à oposição ao regime militar foram
significativos não apenas pela importância estratégica dos dois
estados, mas também porque ambos eram até então governados por
civis que apoiaram o golpe de 1964: Magalhães Pinto e Carlos
Lacerda, respectivamente.
Referidas eleições acabaram se tornando o último processo eleitoral
realizado com a participação do quadro partidário formado na Terceira República.
Quanto aos partidos políticos, a consequência inevitável: foram extintos,
com a edição do Ato Institucional nº 2 (AI-2), em 27 de outubro de 1965, e a
349
SCHMITT, Rogério. Partidos Políticos no Brasil (1945-2000). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000. p.29.
350 SCHMITT, ibidem, p. 30.
145
autorização para que as novas bases partidárias que se intencionassem firmar
deveriam atender às exigências da Lei Orgânica dos Partidos Políticos351.
Pelo AI-2, importante acrescentar que a suspensão dos direitos políticos
veio agravada com a cessação dos privilégios de foro por prerrogativa de função
legislativa, bem como a suspensão dos direitos de votar e ser votado em qualquer
eleição sindical e de exercer qualquer atividade ou manifestação de natureza
política, em âmbito de direito público ou privado, sob pena de aplicação, como
medida de segurança à preservação da ordem política e social, a liberdade vigiada,
a proibição de frequentar determinados lugares e o domicílio determinado (art. 16).
O objetivo, obviamente, era expurgar todos aqueles que fossem contrários ao
regime autoritário devidamente instalado.
Embora vedada expressamente pelo Código Eleitoral, a criação de partido
provisório, até que os novos partidos políticos se constituíssem legitimamente, foi
autorizada pelo Ato Complementar nº 4, de 20 de novembro de 1965, in verbis:
“aos membros efetivos do Congresso Nacional, em número não
inferior a 120 deputados e 20 senadores, caberá a iniciativa de
promover a criação, dentro do prazo de 45 dias, de organizações que
terão, nos têrmos do presente Ato, atribuições de partidos políticos
enquanto êstes não se constituírem” 352 [sic]
SCHMITT353 lembra que existia quórum parlamentar suficiente para a
criação de pelo menos três partidos, inclusive, na medida em que a Câmara dos
Deputados era composta por 409 deputados federais e o Senado Federal por 66
senadores. Entretanto, a fragmentação partidária não era o foco do regime, assim
como o partido único, senão, exclusivamente, o bipartidarismo. Foi o que ocorreu.
Duas agremiações partidárias da ala de esquerda, compostas por
integrantes nacionalistas não tão fervorosos354, se reorganizaram com ideais
preponderantemente opostos: a Aliança Renovadora Nacional – Arena, aliada ao
351
Ex vi “Art. 18 – Ficam extintos os atuais Partidos Políticos e cancelados os respectivos registros. Parágrafo único – Para a organização dos novos Partidos são mantidas as exigências da Lei nº 4740, de 15 de julho de 1965, e suas modificações.”
352 O prazo de 45 dias foi prorrogado para 15 de março de 1966 pelo art. 1º do Ato Complementar nº 6, de 3 de janeiro de 1966.
353 SCHMITT, Rogério. Partidos Políticos no Brasil (1945-2000). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000. p.32.
354 Já que os políticos de extrema esquerda e nacionalistas haviam sido cassados por ordem dos AI nºs 1 e 2.
146
regime militar e composta da maioria conservada da União Democrática Nacional –
UDN e de alguns outros do Partido Social Democrático – PSD. O Movimento
Democrático Brasileiro – MDB evidenciou-se a oposição consentida, tendo como
participantes as alas de centro-esquerda e liberal-democratas dos partidos extintos.
Ao partido governista, ARENA, portanto, a maioria das bancadas de
praticamente todas as legendas extintas o compuseram, consistindo,
aproximadamente 3/5 da Câmara dos Deputados e 2/3 do Senado Federal,
enquanto que à oposição, o MDB, apenas congressistas do PTB, PSB e MTR o
apoiavam, destacando-se que, para o Senado, o atendimento exato foi de 20
senadores tal como imposto pelo Ato Complementar 4/65.
O sistema partidário assim permaneceu durante todo o período militar,
embora até fosse possível verificar alguns esforços, junto ao Tribunal Superior
Eleitoral, de se registrar pelo menos cinco outras novas legendas, como
demonstrado no quadro ilustrativo seguinte.
Tabela 3 - Apresentação e situação jurídica dos partidos políticos no período de 1964 a 1979
Partido/Sigla Sede Condição do Registro
Aliança
Renovadora
Nacional - ARENA
Rio de Janeiro
Deferido provisoriamente em 24.3.1966 e
definitivamente como partido político em 7.3.1967;
porém, extinto em 15.2.1980, juntamente com o
Movimento Democrático Brasileiro, em razão do
parágrafo único do art. 2º da Lei nº 6.767, de 20 de
dezembro de 1979.
Movimento
Democrático
Brasileiro - MDB
Deferido o registro como organização em
24.3.1966 e como partido político em 1.3.1967;
porém, extinto em 15.2.1980, juntamente com a
Aliança Renovadora Nacional – ARENA, em razão
do parágrafo único do art. 2º da Lei nº 6.767, de 20
de dezembro de 1979.
Movimento
Trabalhista
Renovador - MTR
Rio de Janeiro
Deferido em 20.9.1961, porém extinto pelo Ato
Institucional nº 2, com arquivamento de seus
registros, fusão e reorganização em 8.11.1965
(Resolução TSE nº 7.764).
Partido
Comunista
Brasileiro - PCB
Guanabara
Considerado, em 8.10.1968, prejudicado o novo
pedido para registro, datado de 2.7.1962, porque
inconstitucional o pedido e inadmissível sua
legalidade diante do atual regime bipartidário.
(“continuar”)
147
Tabela 3 - Apresentação e situação jurídica dos partidos políticos no período de 1964 a
1979 (“continuação”)
Partido/Sigla Sede Condição do Registro
Partido da Boa
Vontade - PBV
Guanabara
Deferido em 24.6.1965, porém extinto pelo Ato
Institucional nº 2, com arquivamento de seus
registros, fusão e reorganização em 8.11.1965
(Resolução TSE nº 7.764).
Partido
Trabalhista
Republicano -
PTR
Arquivado em 11.11.1965, haja vista a disposição
do Ato Institucional nº 2 (Resolução TSE nº 7.771).
Partido
Nacionalista - PN
Brasília - DF
Arquivado em 18.3.1980, haja vista a ausência, em
especial, de registro como pessoa jurídica
(Resolução TSE nº 10.804).
Fonte: TSE, 2015 355 (elaborada pela autora)
De todo modo, a intenção do governo militar era exatamente formar um
sistema bipartidário que mantivesse, sob seu pleno domínio, o controle das forças
políticas, de uma direita governista e uma esquerda confiável. Sequer o Partido
Comunista conseguira revalidar seu novo pedido de registro.
Fato é que os primeiros Atos Institucionais editados no interregno dos
dois primeiros anos de vigência do regime militar356 impuseram, além das restrições
políticas de natureza eleitoral-parlamentar, várias outras restrições institucionais,
afrontando diretamente o livre exercício dos demais Poderes, a saber, em síntese:
(1) a eleição indireta, com votação nominal, para Presidente da República e,
subsequentemente, para governador, na sequência à admissão de processo de
intervenção federal nos Estados; (2) a suspensão da vitaliciedade aos magistrados e
da estabilidade aos servidores públicos por seis meses; (3) a nomeação de prefeitos
das capitais, com direito à eleição direta e por maioria simples apenas aos cargos de
prefeitos das demais cidades; (4) a aprovação de projetos de lei pelo Congresso
355
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral – TSE. Disponível em: <www.tse.jus.br/partidos/partidos-politicos/registros-de-partidos-politicos-1945-a-1979.htm>. Acesso em 7 de nov. de 2015.
356 Ato Institucional nº 2 (AI-2), de 27 de outubro de 1965, estabelecendo a manutenção da Constituição Federal de 1946, as Constituições Estaduais e respectivas Emendas, com as alterações introduzidas pelo Poder Constituinte, originário da Revolução de 31.03.1964, teve vigência até 15 de março de 1967; Ato Institucional nº 3 (AI-3), de 5 de fevereiro de 1966, que fixava data para as eleições de 1966 e dispunha sobre as eleições indiretas para governador e nomeações de prefeitos das capitais estaduais, sem período máximo de vigência, como estabelecido nos AIs precedentes; Ato Institucional nº 4 (AI-4), de 7 de dezembro de 1966, que convocava o Congresso Nacional para, em reunião extraordinária a se firmar no período de 12 de dezembro de 1966 a 24 de janeiro de 1967, discutisse, votasse e promulgasse o novo projeto de Constituição Federal proposto pelo Presidente da República.
148
Nacional em períodos previamente estabelecidos (inicialmente de 60 dias – 30 na
Câmara dos Deputados e 30 no Senado –, posteriormente, em 90 dias, com
distribuição de 45 dias para cada Casa Legislativa), sob pena de aprovação tácita;
(5) a definição de atribuições e limitações ao Poder Judiciário; e, ainda, (6) a
possibilidade de imposição de recesso parlamentar pelo próprio Presidente da
República, em todos os níveis e em estado de sítio ou fora dele, com avocação para
si do poder de legislar sobre toda e qualquer matéria.
Pelo Ato Institucional nº 4 (AI-4), editado em 7 de dezembro de 1966,o
Congresso Nacional foi convocado para votar e promulgar a nova Constituição
Federal357. Prescreveu medidas ainda mais severas ao modo de organização,
funcionamento e extinção dos partidos políticos já estabelecidas na primeira Lei
Orgânica dos Partidos Políticos – Lei 4.740/65. Juntamente com o status
constitucional conferido, de outro lado, (1) proibia qualquer forma de composição de
coligações partidárias358; (2) como cláusula de desempenho ou de barreira, exigia a
aprovação de 10% do eleitorado votante na última eleição geral para a Câmara dos
Deputados, devidamente distribuídos em dois terços dos Estados, “com o mínimo de
sete por cento em cada um deles, bem assim dez por cento de Deputados, em, pelo
menos, um terço dos Estados, e dez por cento de Senadores”359; (3) obrigava sua
constituição como pessoa jurídica nos órgãos competentes e aprovação para
atuação permanente pelo Tribunal Superior Eleitoral – TSE.
O Marechal Artur da Costa e Silva (Arena) assumiu a Presidência da
República para o biênio de 1967 a 1969, editando o Ato Institucional nº 5 (AI-5), em
13 de dezembro de 1968. Era considerado o mais violento ato à garantia do
exercício da cidadania e à preservação das instituições políticas. Em síntese,
consideradas ainda as ampliações de suas disposições pelo Ato Institucional nº 6
(AI-6), de 1º de fevereiro de 1966, restaram: (1) suspensas as garantias do “habeas
corpus” para determinados crimes e a consagração de poder absoluto ao Presidente
da República para decretar Estado de Sítio; (2) autorizada a intervenção federal sem
qualquer limite constitucional; (3) suspensos, em definitivo, os direitos políticos, com
severa restrição ao exercício de qualquer direito público ou privado; (4) cassados os
mandatos eletivos, com resguardo do direito à percepção da parcela fixa dos
357
Constituição Federal promulgada em 24 de janeiro de 1967. 358
Art. 149, inciso VIII. 359
Art. 149, inciso VII.
149
subsídios concernentes aos cargos eletivos exercidos até o momento (art. 2º, §2º);
(5) autorizada a determinação de recesso, pelo Presidente da República, do
Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas e das Câmaras Municipais, com
avocação para si do poder de legislar; e, enfim, (6) excluídos de apreciação judicial
todo e qualquer ato normativo editado pelo Presidente da República.
O Congresso Nacional foi fechado em 13 de dezembro de 1968, pelo Ato
Complementar nº 38, editado na mesma data do AI-5, in verbis: “Nos têrmos do art.
2º e seus parágrafos, do Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968, fica
decretado o recesso do Congresso Nacional, a partir desta data” (art. 1º, sic).
O retorno de suas atividades parlamentares ocorreu dois anos após,
graças à suspensão, a partir de 22 de outubro de 1970, do Ato Complementar nº 38
pelo Ato Complementar nº 72, de 15 de outubro de 1969. Havia, em verdade, o
objetivo de convocá-lo para a realização, em dez dias, das eleições do Presidente e
Vice-Presidente da República, conforme Ato Complementar nº 73, editado no
mesmo dia360.
No que tange à cláusula de desempenho ou de barreira ao funcionamento
dos partidos políticos, a Emenda Constitucional nº 01, de 17 de outubro de 1969,
chegou a minimizar o rigor da redação original da Constituição Federal de 1967,
reduzindo a demonstração de apoiamento para 5% do total do eleitorado votante na
última eleição geral para a Câmara dos Deputados, devidamente distribuído em sete
360
Aliás, desde a edição do AI-5, em 1968, vários e subsequentes recessos do Congresso Nacional foram impostos pelo Presidente da República, v.g., o Ato Complementar (AC) nº 102, de 1º de abril de 1977 (com atividades retornadas após quinze dias, por força do AC nº 103, de 14 de abril do mesmo ano). Referida medida centralizadora era praticada pelo Presidente da República sobre qualquer Instituição Legislativa em âmbito nacional. Exemplos disso foram os: (1) AC nº 47, de 7 de fevereiro de 1969, às Assembleias Legislativas dos Estados da Guanabara, Pernambuco, Rio de Janeiro, São Paulo e Sergipe, reconstituídas pelos ACs nºs 83 ao 89, todos de 1970; (2) AC nº 49, de 27 de fevereiro de 1969, às Assembleias Legislativas dos Estados de Goiás e do Pará, reconstituídas pelos ACs nºs 80 e 90, ambos de 1970; (3) AC nº 53, de 8 de maio de 1969, às Câmaras Municipais de Santos (SP), Nova Iguaçu (RJ) e Santarém (PA), reconstituídas pelos ACs 87, 92 e 91, todos de 1970; (4) AC nº 55, de 4 de junho de 1969, à Câmara Municipal de Santana do Livramento (RS), reconstituída pelo AC nº 93/70; (5) AC nº 58, de 24 de julho de 1969, à Câmara Municipal de Itú (SP), reconstituída pelo AC nº 81/70; (6) AC nº 67, de 22 de setembro de 1969, à Câmara Municipal de Pariquera-Açu (SP), reconstituída pelo AC nº 79/70; (7) AC nº 68, de 29 de setembro de 1969, à Câmara Municipal de Sobral (CE), reconstituída pelo AC nº 82/70; (8) AC nº 69, de 6 de outubro de 1969, à Câmara Municipal de São João do Meriti (RJ), reconstituída pelo AC nº 94/70; (9) AC nº 70, de 6 de outubro de 1969, à Câmara Municipal de Fortaleza (CE), reconstituída pelo AC nº 86/1970; (10) AC nº 95, de 8 de junho de 1972, à Câmara Municipal de Rio Grande (RS), reconstituída pelo AC nº 97/1973); (11) AC nº 96, de 27 de julho de 1972, à Câmara Municipal de Marabá (PA), reconstituída pelo AC nº 97/1973; (12) AC nº 100, de 3 de dezembro de 1976, à Câmara Municipal de Alenquer (PA), reconstituída pelo AC nº 101, de 18 de janeiro de 1976.
150
ou mais Estados, com um mínimo de 7% em cada um361. Com seu texto repetido no
art. 7º da segunda Lei Orgânica dos Partidos Políticos – Lei 5.682/71, JEHÁ362
enfatizou que, na prática, nenhuma outra legenda teria conseguido se organizar
frente ao monopólio político que se mantinha sustentado nas duas principais bases
partidárias, ARENA e MDB, “até que, na década de 1980, o regime fosse uma vez
mais aberto e todas as liberdades civis e políticas fossem restituídas aos cidadãos”.
Importante assinalar, também, que a Emenda Constitucional nº 01/69 teria
sido o primeiro instrumento a consagrar no ordenamento jurídico brasileiro o instituto
da fidelidade partidária em seu art. 152, parágrafo único, ao prever a possibilidade
de perda de mandato parlamentar ao político que, por atitudes ou pelo voto, viesse a
se opor às diretrizes legitimamente estabelecidas pelos órgãos de direção partidária
ou deixasse o partido sob cuja legenda foi eleito363. Disciplinando a matéria, a
segunda Lei Orgânica dos Partidos Políticos se tornou o primeiro regulamento
ordinário a dispor de um capítulo próprio sobre a “perda do mandato por infidelidade
partidária” (arts. 72 a 81), além das condições de filiação partidária e de constituição
e organização dos partidos propriamente ditas.
Até então, para a base militar governista, o cenário político parecia
estável e controlado, ao menos até 1974. Na verdade, não era.
Desde a posse e presidência do General Ernesto Geisel (1974-1979), as
bases militares, que já não se mostravam mais tão homogêneas, acabaram, por
medida do Presidente, sofrendo uma distensão política lenta e gradual, de leve
abertura às medidas de restrição de direitos impostas anteriormente.
Gradualmente, foram promovidos o “fim do AI-5364, o fim da censura
prévia, o restabelecimento do habeas corpus para crimes políticos, a atenuação da
Lei de Segurança Nacional e a permissão da volta de 120 exilados políticos”365.
Sem querer admitir eventual perda de controle, o governo militar editou a
Lei nº 6.339, em 1º de julho de 1976, também conhecida como “Lei Falcão”, na
tentativa de barrar o acesso dos candidatos aos sistemas de rádio e de televisão.
Autorizou tão somente que os partidos políticos apresentassem o nome, o número, o
361
Art. 152, inciso VII, da E.C. nº 01/69. 362
JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 89.
363 Ao partido político era resguardado o direito de reclamar pelo mandato parlamentar, mediante representação junto à Justiça Eleitoral, e ao político o direito de ampla defesa de processo regular.
364 Decretado oficialmente pela Emenda Constitucional nº 11, de 13 de outubro de 1978.
365 BRASIL, TSE, 2014.
151
currículo dos candidatos e a foto, quando realizada a propaganda televisiva, dos
candidatos pelos partidos políticos. O Congresso Nacional permanecia fechado, por
determinação do Presidente, haja vista a dificuldade de aprovação de algumas
alterações constitucionais.
Mesmo sob forte resistência, nem assim a oposição deixou de crescer.
Ganhou visibilidade com a crise do petróleo em 1973 e,
consequentemente, a diminuição abrupta dos índices de crescimento do PIB, o
aumento do desemprego, da inflação e das contestações ao regime.
Em 1974, por exemplo, o MDB, embora em pleito isolado, derrubara, em
número absoluto de votos, o partido governista na disputa pelas vagas na Câmara,
preenchendo 16 cadeiras no Senado, das 22 disputadas, e 172 na Câmara dos
Deputados contra 192 obtidas pela ARENA366.
Segundo assinalado por SCHMITT367, 1974 foi um grande divisor de
águas do bipartidarismo brasileiro. A oposição obtivera um resultado surpreendente,
assim como o divisor paritário de cadeiras na Câmara dos Deputados nas eleições
de 1978: ARENA, 231 (55%), e MDB, 189 (45%).
O governo tentou, ainda, conter a oposição editando o “Pacote de Abril”
em 1977, implementando: (1) a eleição indireta, firmada por um colégio eleitoral,
para a nomeação de senadores, os chamados “senadores biônicos”, como forma
eficaz de obstaculizar o Movimento Democrático Brasileiro – MDB à obtenção de
maioria no Senado Federal; (2) o estabelecimento de um critério de representação
parlamentar em bases desiguais, com maior quantidade de assentos reservada aos
deputados da região nordeste e menor aos deputados da região centro-sul; e (3) a
extensão do mandato presidencial para seis anos, ao invés de cinco.
Ainda, determinou o fechamento do Congresso Nacional368 por 15 dias
em 1978, revogando a exigência de maioria de dois terços para a aprovação de
366
JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 91.
367 SCHMITT, Rogério. Partidos Políticos no Brasil (1945-2000). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000. p.45.
368 Aliás, desde a edição do AI-5, em 1968, vários e subsequentes recessos do Congresso Nacional foram impostos pelo Presidente da República, v.g. o Ato Complementar nº 102, de 1º de abril de 1977 (com atividades retornadas após quinze dias fechado, por força do Ato Complementar nº 103, de 14 de abril do mesmo ano). Referida medida centralizadora era praticada pelo Presidente da República não exclusivamente em face do Congresso Nacional, mas também sobre qualquer outra Instituição Legislativa em âmbito nacional, como, por exemplo, o Ato Complementar nº 100, de 3 de dezembro de 1976, que havia decretado o recesso da Câmara de Vereadores do
152
emendas constitucionais como meio de burlar os entraves que vinha sofrendo com o
crescimento da base oposicionista do MDB369.
Entretanto, nada disso foi suficiente.
Conforme destacado por JEHÁ370:
Embora o “pacote de abril” tenha sido bem sucedido em conter um
avanço ainda maior do MDB no Congresso Nacional nas eleições de
1978, não foi suficiente para diminuir a sua importância conquistada
no pleito de 1974. Ademais a crise que enterrou o “milagre
econômico” em inflação e estagnação não dava sinais de trégua. O
fim do regime autoritário já estava sentenciado. Faltava apenas
definir o como e o quando.
No dia 13 de outubro de 1978, o fim do AI-5 foi consagrado com a edição
da Emenda Constitucional nº 11, assim como de todos os demais Atos Institucionais
editados pelo governo (art. 3º). Com vigência estabelecida para o 1º de janeiro de
1979, as restrições à censura prévia sobre os meios de comunicação que existiam, a
restauração do instituto do “habeas corpus” para os crimes políticos e a atenuação
da Lei de Segurança Nacional, autorizando o retorno de 120 exilados políticos,
foram assegurados371.
Os “senadores biônicos” não se sustentaram.
Pela Emenda Constitucional nº 15, editada em 19 de novembro de 1980,
referidos mandatos foram extintos em definitivo, na medida em que, para o exercício
do cargo, passava a ser obrigatória a realização de eleições em sufrágio universal,
voto direto e secreto, sob o sistema majoritário de eleição e condição de
elegibilidade apenas aos candidatos em pleno gozo dos direitos políticos e com, no
mínimo, trinta e cinco anos de idade372. Constitucionalizava-se disposição já dada
pela Lei 6.534 em 26 de maio de 1978 à redação dos arts. arts. 82 e 83 do Código
Eleitoral (Lei 4.737/65).
Município de Alenquer, Estado do Pará (com atividades retornadas apenas em fevereiro de 1977, por força do Ato Complementar nº 101, de 18 de janeiro de 1976).
369 VILELA, Renata Rocha. Partidos políticos e regulamentação: limites e benefícios da legislação partidária no Brasil. 2014. Dissertação (Mestrado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2014. p. 49-50.
370 JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 92.
371 VILELA, loc.cit., p. 47.
372 Conforme nova redação dada ao art. 41 da Constituição Federal de 1967.
153
O bipartidarismo também não prosperou. Prevaleceu até 1979,
notadamente, até a Lei 6.767, editada em 20 de dezembro deste ano, com o intuito
de, inclusive, modificar dispositivos da segunda Lei Orgânica dos Partidos Políticos,
a Lei nº 5.682/71. Foi extinto, expressamente, pelo art. 2º respectivo, in verbis:
Art. 2º Ficam extintos os partidos criados como organizações, com
base no Ato Complementar nº 4, de 20 de novembro de 1965, e
transformados em partidos de acordo com a Lei nº 4.740, de 15 de
julho de 1965, por não preencherem, para seu funcionamento, os
requisitos estabelecidos nesta Lei.
Parágrafo único – Na hipótese deste artigo, o Tribunal Superior
Eleitoral, de ofício, no prazo de 15 (quinze) dias, processará o
cancelamento do registro do partido.
Além disso, referida norma também permitia que as novas agremiações
partidárias se formassem com a designação de “partido” (art. 5º, §1º), desde que
sem o uso à representatividade de credos religiosos ou de sentimentos de raça ou
classe.
Embora mantida a cláusula de desempenho ou de barreira ao
funcionamento partidário, exigindo-se apoiamento do eleitorado em percentual maior
ao estabelecido pela legislação anterior, ou seja, de 3% para, no mínimo, 5% dos
votantes na última eleição geral para a Câmara dos Deputados, de outro lado, a
abrangência desse eleitorado se fazia suficiente em apenas 9 Estados, com o
mínimo de 3% em cada um deles, e não mais em pelo menos 11 Estados com o
mínimo de 2% em cada um deles. E, ainda, um partido político superaria a cláusula
de desempenho ou de barreira se demonstrasse, de imediato, possuir, quando de
sua constituição e dentre seus fundadores signatários, pelo menos 10% de
representantes no Congresso Nacional.
Por fim, permitia a lei que até o final da legislatura, março de 1983,
“qualquer número de congressistas poderia se agrupar em blocos parlamentares e
requerer o registro de partido político”373.
Não tão otimista assim, JEHÁ374 (op.cit., p. 96), na prática, sustentava que
essa segunda alteração constitucional (EC 11/78), em verdade, conferia um
373
SCHMITT, Rogério. Partidos Políticos no Brasil (1945-2000). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000. p.48.
154
tratamento mais rígido e dificultoso à formação de um partido político. Não obstante
tal fato, de outro lado, reconheceu, expressamente, ter sido possível a
institucionalização de seis novas legendas partidárias a partir das duas extintas, a
saber:
(...) o Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB, como a
singeleza da mudança de sua denominação já denuncia, foi o
sucessor direto do MDB; o Partido Democrata Social – PDS foi, em
contraposição, o herdeiro direto da ARENA não só por ter-lhe
sucedido no abrigo da maioria dos políticos que se alinhavam nas
fileiras de sua antecessora, mas também por ter assumido o papel de
instrumento de suporte político do governo; o Partido Democrático
Trabalhista – P DT, fundado por Leonel Brizola; o Partido Trabalhista
Brasileiro – PTB, reorganizado sob o comando de Ivete Vargas; o
Partido dos Trabalhadores – PT, liderado pelo metalúrgico e
sindicalista do ABC paulista, Luiz Inácio Lula da Silva; e o Partido
Popular – PP, organizado por Tancredo Neves para abrigar
tendências centristas da política nacional, mas que, logo em seguida,
seria incorporado ao PMDB.
Conveniente concluir também que a Lei nº 6.767/79, dentro do cenário
político de início ao restabelecimento do multipartidarismo, além de relativizar os
efeitos da cláusula de desempenho ou barreira aos partidos políticos, autorizou o
candidato eleito a se migrar para outra legenda partidária desde que dela tivesse
participado como fundador, por uma vez durante um quadriênio (art. 72), não se
caracterizando referida atitude hipótese de infidelidade partidária.
Com a Lei nº 6.978, de 19 de janeiro de 1982, conhecida como “Pacote
de Novembro”375, e alterações promovidas pela Lei nº 7.015, editada em 16 de julho
do mesmo ano, além do governador e vice-governador e dos senadores e suplentes,
os deputados federais e estaduais, prefeito, vice-prefeito e vereadores, de modo
simultâneo, deviam ser escolhidos em processo de eleições diretas e gerais, a
serem realizadas no dia 15 de novembro subsequente.
Além disso, na tentativa do governo militar de resgatar sua credibilidade,
impôs aos partidos políticos, e como condição plena à participação no pleito eleitoral
374
JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 96.
375 Editada em janeiro com a edição de novas regras ao processo eleitoral, que se firmaria em 15 de novembro do mesmo ano, no que se acredita a razão para ter recebido o codinome “pacote de novembro”. Cf. ANGELO, 2008, p. 138.
155
de 1982, a obrigatoriedade de apresentação de chapas completas para todos os
cargos, tanto em nível estadual quanto municipal e a vedação de coligações; aos
eleitores impôs, por sua vez, a proibição de escolha de candidatos de partidos
distintos e de votação em legenda, sob pena de nulidade do seu sufrágio na
integralidade, ou seja, para todos os cargos escolhidos.
Como resultado para as eleições da Câmara dos Deputados, embora
apenas o PMDB e o PDS tivessem conseguido concorrer em todos os Estados, o PT
em apenas 23 deles, o PDT em 13 e o PTB em 10, ainda assim, dos 22
governadores eleitos, dez integravam a base de oposição: 9 do PMDB, incluindo
Tancredo Neves por Minas Gerais e Franco Montoro por São Paulo, e 1 do PDT,
Leonel Brizola, pelo Rio de Janeiro.376
SCHMITT377 lembra que a reformulação do sistema partidário teria levado
quase um semestre para se formar, mas que, dos seis partidos políticos organizados
no Congresso e registrados no Tribunal Superior Eleitoral, cinco estão em pleno
funcionamento até hoje e o sexto teve vida curta, não chegando a participar de
eleições; este último seria o PP, justamente porque, em razão das restrições do
“Pacote de Novembro”, em especial, vinculação do voto pelo eleitor e exigência de
lançamento de candidatos para todos os cargos, por decisão de sua convenção
nacional, visando sua própria sobrevivência, a legenda foi extinta com a fusão ao
PMDB, retornando a sua origem.
Em apertada síntese, a composição das seis legendas partidárias
apresentar-se-ia da seguinte forma: grande maioria dos parlamentares da ARENA
teria migrado para o Partido Democrático Social – PDS, do mesmo modo que o
Partido do Movimento Democrático Brasileiro teria sido o sucessor do MDB,
constituindo, ambos, as duas agremiações partidárias que se tornariam o núcleo do
novo multipartidarismo brasileiro até 1985. O Partido Popular – PP, de centro, reunia
dissidentes da ARENA e moderados do MDB, com Tancredo Neves e Magalhães
Pinto entre seus líderes. O Partido dos Trabalhadores – PT, proveniente do novo
sindicalismo paulista dos anos 70, “foi a única legenda cujas lideranças mais
376
JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 98.
377 SCHMITT, Rogério. Partidos Políticos no Brasil (1945-2000). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000. p.48.
156
expressivas não se encontravam na classe política tradicional”378, que, como o PCB,
surgiu fora das instituições parlamentares, no seio da sociedade e de baixo para
cima. O novo Partido Trabalhista Brasileiro – PTB, liderado por Ivete Vargas, tentava
resgatar a tradicional legenda com integrantes da linha moderada do antigo partido.
Leonel Brizola, num sentimento reformista, foi o fundador do Partido Democrático
Trabalhista – PDT.
Após a reforma partidária de 1979-1980, o novo quadro partidário
apresentava-se composto por “um partido grande hegemônico (o PDS), dois partidos
de magnitude intermediária (PMDB e PP), e três pequenos partidos residuais (PDT,
PTB e PT) que sequer obtiveram representação no Senado Federal”379.
Preocupados com eventual restabelecimento de um bipartidarismo virtual
a partir do fortalecimento do PMDB com a fusão do PP, de um lado, vivificando a
figura do MDB, e do PDS, de outro lado, restabelecendo a imagem da ARENA,
embora, na prática, o bipartidarismo informal tivesse ocorrido, em virtude de ainda
viger a cláusula de desempenho ou de barreira ao funcionamento partidário da
segunda Lei Orgânica dos Partidos Políticos – LOPP, em 29 de junho de 1982, com
a Emenda Constitucional nº 22, a aplicabilidade dessa regra legal foi afastada para o
próximo pleito eleitoral, trazendo significativo e importante avanço na sobrevivência
dos partidos menores que, certamente, não teriam tido essa mesma trilha se vigente
as determinações da LOPP. Aliás, extraindo-se de SCHMITT380, “esse talvez tenha
sido o único casuísmo político do regime autoritário que teve consequências
democráticas, pois preservou o pluralismo partidário em gestação”.
Enfim, o que se evidenciava, de fato, era uma lenta perda de controle das
instituições políticas pelo governo militar, tendo configurado o ano de 1982, sem
dúvida, a marca de um efetivo esgotamento do regime imposto.
378
SCHMITT, Rogério. Partidos Políticos no Brasil (1945-2000). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000. p. 49.
379 SCHMITT, ibidem, p. 50.
380 SCHMITT, ibidem, p. 56.
157
4.2.5 A Nova República (1985-2016)
Em 15 de janeiro de 1985, o civil peemedebista Tancredo Neves foi eleito
por um Colégio Eleitoral ao cargo de Presidente da República381, graças à Aliança
Democrática feita pelo PMDB com dissidentes do PDS382, a Frente Liberal, que não
apoiava a candidatura do deputado federal paulista Paulo Maluf à Presidência.
Embora eleito, não assumiu o cargo presidencial em razão de grave doença
contraída dias antes de sua posse.
Devido a este fato e em cumprimento ao disposto pela Constituição
Federal, a regência do cargo deveria ser passada, interinamente, ao vice-presidente
eleito, José Sarney, que assumiu o cargo em 15 de março e, após, de forma
definitiva, em 21 de abril, em virtude da morte do presidente eleito Tancredo Neves.
Este novo mandato foi o responsável por reinaugurar o processo de
redemocratização, reafirmando não apenas a garantia de direitos e liberdades, em
especial, de expressão de pensamento e liberdade de manifestação, como, também,
o resgate à legitimidade do pluralismo político, em outras palavras, à consagração
do exercício dos direitos políticos plenos de toda a sociedade a partir do sistema
multipartidário de representação política.
Segundo JEHÁ383, no período de 1982 a 1985, o cenário político anunciou
a formação de mais de 90 legendas, embora apenas 27 tivessem se mantido ativas
e apenas um número limitado dessas legendas apresentasse, no jogo político,
relevância eleitoral. Examinando a planilha de estudo oferecida pelo autor, de 1982
a 2006, verifica-se, de fato, o seguinte panorama eleitoral:
381
Vitória de Tancredo Neves com 480 votos contra 180 de Paulo Maluf, além das 17 abstenções e 9 ausências (SCHMITT, 2000, p. 60).
382 Dissidência liderada pelo vice-presidente Aureliano Chaves, senador Marco Maciel e senador maranhense José Sarney (SCHMITT, op.cit., p. 59).
383 JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 100-101.
158
Tabela 4 - Partidos políticos com participação ativa nas eleições do período de 1982 a 2006
Legenda Partidária Participação
Eleitoral
Partido Progressista – PP(1)
Partido Democrático Trabalhista - PDT
Partido dos Trabalhadores - PT
Partido Trabalhista Brasileiro – PTB(2)
Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB
1982 e ss.
Partido Social Cristão – PSC
Partido Popular Socialista – PPS(3)
Partido Comunista do Brasil – PC do B
Partido Democratas – DEM(4)
Partido Trabalhista Cristão – PTC(5)
Partido Socialista Brasileiro – PSB
1985 e ss.
Partido da Mobilização Nacional – PMN (exceto 1994)
Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB 1988 e ss.
Partido Republicano Progressista – PRP (exceto 1989)
Partido Verde – PV (exceto 1990)
Partido Republicano – PR(6) 1989 e ss.
Partido Trabalhista do Brasil – PT do B 1990 e ss.
Partido Comunista Brasileiro – PCB(7) 1992 e ss.
Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado –
PSTU(8)
1994 e ss.
Partido Trabalhista Nacional – PTN
Partido Social Democrata Cristão – PSDC(9)
Partido Renovador Trabalhista Brasileiro – PRTB
Partido da Causa Operária – PCO
1996 e ss.
Partido Social Liberal – PSL (exceto 1998)
Partido Humanista da Solidariedade – PHS(10) (exceto 2000)
Partido Republicano Brasileiro – PRB(11)
Partido Socialismo e Liberdade – PSOL
2006.
Fonte: JEHÁ, 2009 (adaptada)
(1) Ex-PDS e PPR e nova nomenclatura do PPB. (2) Ex-PSD e com a incorporação do PAN. (3) Ex-PCB (1985-1992). (4) Nova nomenclatura (2007) do PFL. (5) Nova nomenclatura do PJ e do PRN. (6) Fusão do PRONA (1989) com o PL (1985, incorporado pelo PST e PGT). (7) Refundado e sob nova nomenclatura do PC. (8) Nova nomenclatura do PRT. (9) Nova nomenclatura do PDC. (10) Nova nomenclatura do PSN. (11) Nova nomenclatura do PMR.
159
Todas as legendas partidárias ilustradas teriam conseguido promover
seus registros provisório e definitivo junto ao Tribunal Superior Eleitoral – TSE no
tempo de formação mínimo de doze meses, como exigido pela Lei nº 5.682/71, e
com a adequação dos Estatutos Partidários às diretrizes de organização e criação
da nova, e vigente, Lei nº 9.096/95. Considerando, ainda, eventuais e significativas
modificações de nomenclatura ou de cisão, fusão e criação de nova legenda
partidária, o quadro ilustrativo de criação dessas vinte e sete legendas é o seguinte:
Tabela 5 - Registro dos partidos políticos e atual configuração partidária
Partido
Sigla
Registros
provisório e
definitivo
Adaptação do
estatuto à Lei
9095/95
EVENTUAL MODIFICAÇÃO
Partido do Movimento
Democrático
Brasileiro
PMDB
6.5.1980 e
30.6.1981
23.5.1996 (Resolução/TSE
nº 19.563)
Partido Trabalhista
Brasileiro
PTB
12.5.1980 e
3.11.1981
9.12.1997 (Resolução/TSE
nº 21.350)
Incorporação do PSD (20.2.2003)
Incorporação do PAN (15.3.2007)
Partido Democrático
Trabalhista
PDT
16.9.1980 e
10.11.1981
22.4.1997 (Resolução/TSE
nº 19.844)
Partido dos
Trabalhadores
PT
1.12.1980 e
11.2.1982
26.4.1996 (Resolução/TSE
nº 19.530)
(ex-) Partido da
Frente Liberal
PFL
9.7.1985 e
11.9.1986
12.3.1996 (Resolução/TSE
nº 19.463)
(nova nomenclatura) Partido
Democratas - DEM (12.6.2007)
Partido Social Cristão
PSC (2)
9.7.1985 e
29.3.1990
21.3.1996 (Resolução/TSE
nº 19.478)
(ex-) Partido
Democrata Cristão
PDC
17.8.1985 e
5.8.1997
11.4.1998 (Resolução/TSE
nº 19.891)
(nova nomenclatura) Partido
Social Democrata Cristão –
PSDC (17.8.1985)
Partido Comunista do
Brasil
PC do B
7.4.1987 e
23.6.1988
9.4.1996 (Resolução/TSE
nº 19.498)
(“continuar”)
160
Tabela 5 - Registro dos partidos políticos e atual configuração partidária (“continuação”)
Partido
Sigla
Registros
provisório e
definitivo
Adaptação do
estatuto à Lei
9095/95
EVENTUAL MODIFICAÇÃO
Partido Socialista
Brasileiro
PSB
21.4.1987 e
1.7.1988
1.8.1996 (Resolução/TSE
nº 19.659)
(ex-) Partido da
Juventude
PJ (2)
3.12.1987 e
22.2.1990
9.12.1997 (Resolução/TSE
nº 20.044)
(ex-) Partido da Reconstrução
Nacional – PRN (11.5.1989)
(nova nomenclatura) Partido
Trabalhista Cristão – PTC (24.4.2001)
(ex-) Partido
Comunista Brasileiro
PCB
(refundado)
17.12.1987 e
6.3.1990
14.5.1996 (Resolução/TSE
nº 19.551)
(nova nomenclatura) Partido
Popular Socialista – PPS (19.3.1992)
Partido da Social
Democracia Brasileira
PSDB
6.7.1988 e
24.8.1989
25.4.1996 (Resolução/TSE
nº 19.531)
Partido da
Mobilização Nacional
PMN
30.6.1989 e
25.10.1990
7.5.1996 (Resolução/TSE
nº 19.543)
Partido Republicano
Progressista
PRP
17.8.1989 e
29.10.1991
27.11.1997 (Resolução/TSE
nº 20.032)
Partido Verde
PV
20.8.1991 e
30.9.1993
21.5.1996 (Resolução/TSE
nº 19.559)
Partido Trabalhista do
Brasil
PT do B
3.12.1991 e
11.10.1994
1.8.1996 (Resolução/TSE
nº 19.568)
(ex-) Partido
Revolucionário dos
Trabalhadores
PRT
8.6.1993 e
19.12.1995
25.11.1997 (Resolução/TSE
nº 20.025)
(nova nomenclatura) Partido
Socialista dos Trabalhadores
Unificado – PSTU (30.9.1993)
Partido Comunista
Brasileiro
PCB
19.8.1993 e
9.5.1996
Requerido no
processo de
registro definitivo
Partido Social Liberal
PSL
19.12.1994 e
2.6.1998
19.3.1998 (Resolução/TSE
nº 20.131)
Partido Renovador
Trabalhista Brasileiro
PRTB
28.3.1995 e
18.2.1997
27.11.1997 (Resolução/TSE
nº 20.031)
(“continuar”)
161
Tabela 5 - Registro dos partidos políticos e atual configuração partidária (“continuação”)
Partido
Sigla
Registros
provisório e
definitivo
Adaptação do
estatuto à Lei
9095/95
EVENTUAL MODIFICAÇÃO
Partido Trabalhista
Nacional
PTN
29.6.1995 e
2.10.1997
19.8.1997 (Resolução/TSE
nº 19.935)
(ex-) Partido
Solidarista Nacional
PSN
19.9.1995 e
20.3.1997
21.5.1996 e
25.6.1996 (Resoluções/TSE
nº 19.560 e
19.634)
(ex-) Partido da Solidariedade
Nacional – PSN (19.2.1998)
(nova nomenclatura) Partido
Humanista da Solidariedade -
PHS (30.5.2000)
Partido da Causa
Operária
PCO
7.12.1995 e
30.9.1997
25.11.1997 (Resolução/TSE
nº 19.981)
(ex-) Partido
Progressista
Brasileiro
PPB (1)
30.4.1996 (Resolução/TSE
nº 19.536)
(nova nomenclatura)
Partido Progressista – PP (29.5.2003)
(ex-) Partido
Republicano
Brasileiro
PRB
Estatuto aprovado em
25.8.2005 (Resolução/TSE nº 22.167)
(ex-) Partido Municipalista
Renovador – PMR (11.3.2006)
(retorno da nomenclatura
original) Partido Republicano
Brasileiro – PRB (13.8.2009)
Partido Socialismo e
Liberdade
PSOL
Estatuto aprovado em
15.9.2005 (Resolução/TSE nº 22.083)
Partido da República
PR
Estatuto aprovado em
7.11.2006 (Resolução/TSE nº 22.504)
Fusão do Partido Liberal – PL
com o Partido de Reedificação
da Ordem Nacional – PRONA
Fonte: TSE, 2015384
(elaborada pela autora)
(1) O Partido Progressista Brasileiro – PPB havia se formado em 16.11.1995 (Resolução/TSE nº 19.386), a partir da fusão do Partido Progressista – PP (constituído da evolução da ARENA de 1965 ao Partido Democrático Social – PDS em 1980, e posterior fusão com o Partido Democrata Cristão – PDC em 1988 e 1992) com o Partido Progressista Reformador – PPR (constituído a partir da incorporação do Partido Social Trabalhista – PST ao Partido Trabalhista Renovador – PTR em 1992), realizada em 1993/1994.
(2) Partido político autorizado a concorrer nas eleições de 15.11.1985, por decisão do Tribunal Superior Eleitoral, devidamente publicada no Diário da Justiça.
Além delas, a partir de 2006, importante registrar que outras oito
agremiações partidárias foram formatadas, conforme ilustrado a seguir, perfazendo
384
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral – TSE. Disponível em: <www.tse.jus.br/partidos/partidos-politicos/registros-de-partidos-politicos-1945-a-1979.htm>. Acesso em 7 de nov. de 2015.
162
o total de 35 (trinta e cinco) legendas ativas em condições de filiação e de registro
de candidatura no cenário eleitoral atual:
Tabela 6 - Agremiações partidárias formadas entre 2006 e 2015
Partido Sigla
Registro Definitivo
Observações Gerais
Partido Social Democrático -
PSD
Estatuto aprovado em 27.9.2011
(Acórdão nº 141.796 do TSE)
Com alteração estatutária deferida parcialmente pelo TSE, em 6 de maio
de 2014, prevendo, dentre outras disposições, acréscimo da sigla “PSD
55”.
Partido da Pátria Livre- PPL
Estatuto aprovado em 4.10.2011
(Acórdão nº 142.658 do TSE)
Partido Ecológico Nacional -
PEN
Estatuto aprovado em 19.6.2012
(Acórdão nº 153.572 do TSE)
Com alteração estatutária deferida parcialmente pelo TSE em 16.6.2014, prevendo, dentre outras disposições,
modificar sua sigla para “PEN51”.
Partido Republicano da Ordem Social -
PROS
Estatuto aprovado em 24.9.2013
(Acórdão nº 141.796 do TSE)
Solidariedade - SD
Estatuto aprovado em 7.11.2012
(Acórdão de 24.9.2013)
Partido Novo - NOVO
Estatuto aprovado em 15.9.2015
Rede Sustentabilidade -
REDE
Estatuto aprovado em 22.9.2015
Partido da Mulher Brasileira -
PMB
Estatuto aprovado em 29.9.2015
Fonte: TSE, 2015385 (elaborada pela autora)
Sob o ponto de vista constitucional, o espectro de abertura do sistema
multipartidário na criação de partidos políticos que teve início notadamente com as
Emendas Constitucionais nº 01/1969 e nº 11/1978, acabou se robustecendo ainda
mais com edição da Emenda Constitucional nº 25, de 15 de maio de 1985.
Como terceiro e último instrumento constitucional de reforma da
organização e funcionamento dos partidos políticos, o fundamento no “regime
representativo e democrático, baseado na pluralidade dos partidos e garantia dos
direitos humanos fundamentais” já previsto anteriormente, foi mantido, agora sob 385
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral – TSE. Disponível em: <www.tse.jus.br/partidos/partidos-politicos/registros-de-partidos-politicos-1945-a-1979.htm>. Acesso em 7 de nov. de 2015.
163
redação no caput do mesmo art. 152386. Sofreu acréscimo do resguardo da
Soberania Nacional, assim como da obrigatoriedade de aquisição de personalidade
jurídica mediante registro dos estatutos partidários no Tribunal Superior Eleitoral. A
proibição de subordinação a entidades ou governos estrangeiros387 também
permaneceu no texto constitucional, devidamente acrescido da vedação de uso de
organização paramilitar pelos partidos políticos e da garantia de direito de livre
associação por qualquer cidadão.
A cláusula de desempenho ou de barreira ao funcionamento da
agremiação partidária foi bastante suavizada pela redação do §1º do art. 152, que
estabeleceu para o direito de representação parlamentar a conquista de uma
votação de pelo menos 3% do eleitorado, apurados em eleição geral para a Câmara
dos Deputados e distribuídos em, pelo menos, cinco Estados, com o mínimo de 2%
do eleitorado de cada um deles.
A grande novidade apresentada pela Emenda Constitucional nº 25 de
1985 foi a possibilidade de o candidato eleito migrar para qualquer partido
remanescente, caso o seu não atingisse o percentual mínimo de cláusula de
desempenho ou de barreira necessária à preservação do direito de representação
em qualquer das casas do Congresso Nacional, justificando hipótese única de
fidelidade partidária, já que qualquer outra hipótese de perda de mandato, como
previsto pela Emenda Constitucional nº 1 de 1969 e pela Emenda Constitucional nº
11, de 1978, deixava de constar do texto constitucional.
A legislação ordinária pertinente ao processo eleitoral também inovou,
fortalecendo os partidos políticos com a vedação de registro de candidatos em
sublegendas e a autorização de coligações partidárias nas eleições de prefeito e
vereadores; regulamentou a propaganda eleitoral nas emissoras de rádio e de
televisão; permitiu a participação de partidos em formação naquele pleito eleitoral,
desde que encaminhados o programa e o estatuto pertinente até 15 de julho à
Justiça Eleitoral e, em âmbito nacional, desde que tivessem constituído Comissões
Diretoras Regionais Provisórias em, no mínimo, cinco Estados388. Estas foram as
386
Art. 152, §1º, inciso I, introduzido pela Emenda Constitucional nº 11/1978, que reproduzia mesma redação do inciso I do mesmo art. 152 na redação dada pela Emenda Constitucional nº 1/1969 e do inciso I do art. 149 da Constituição Federal de 1967.
387 Existente desde a redação do art. 149, incisos II e III da Constituição Federal de 1967.
388 VILELA, Renata Rocha. Partidos políticos e regulamentação: limites e benefícios da legislação partidária no Brasil. 2014. Dissertação (Mestrado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2014. p. 54.
164
significativas contribuições conferidas pela Lei nº 7.454, de 30 de dezembro de
1985, às disposições do Código Eleitoral, Lei nº 4.737/65, com aplicabilidade
prevista para as eleições estaduais, distrital e municipais, além de senadores e
deputados federais que se firmariam no ano seguinte.
A Constituição Federal de 1988, seguindo o tratamento conferido pela
Constituição de 1967 e Emenda Constitucional de 1969, manteve o tratamento dos
partidos políticos sob sua guarda, ampliando significativamente sua proteção em
face do direito de autonomia partidária, tanto quanto a dos consagrados direitos aos
recursos do fundo partidário, acesso à propaganda gratuita de rádio e televisão e,
em passo seguinte, a fidelidade partidária e a formação das coligações eleitorais,
com a promulgação da Emenda Constitucional nº 52, em 8 de março de 2006.
Importantes normas infraconstitucionais também foram editadas a partir
da década de 90 do século passado, como a nova Lei dos Partidos Políticos, Lei nº
9096, de 19 de setembro de 1995, e a Lei das Eleições, Lei nº 9.504, de 30 de
setembro de 1997, que muito contribuiu ao juspositivismo brasileiro, porque marcou
o encerramento de um hábito que havia na edição de sucessivas normas eleitorais a
cada pleito eleitoral que se realizava389.
Para REIS390, referidas normas contribuíram veementemente para o fim
da notória instabilidade normativa no campo político-eleitoral em solo doméstico, não
obstante, como reconhecido por ele próprio, e objeto de exame na parte final deste
trabalho de pesquisa, inúmeras são as irresignações em sede constitucional, ou não,
sobre o processo eleitoral e partidário vigentes, justificando as várias propostas de
alteração da legislação eleitoral em debate nas duas Casas Legislativas Federais.
389
Como, por exemplo, a Lei nº 7.664, de 29 de junho de 1988, que estabelecia as normas para a realização das eleições municipais de 1988, assim como a Lei nº 8.214, de 24 de julho de 1991 e a Lei nº 9.100, de 29 de setembro de 1995, de mesmo tratamento em relação às eleições municipais de 1992 e 1996, respectivamente.
390 REIS, Daniel Gustavo Falcão Pimentel dos. O ativismo judicial no Brasil: o caso da verticalização. 2014. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2014.
165
5. REFORMA POLÍTICA NO ESPECTRO ELEITORAL-PARTIDÁRIO
A partir do momento que a matéria eleitoral passou a ser recepcionada
integralmente pela Constituição Federal e, ainda, os partidos políticos passaram a
ser os detentores da prerrogativa da candidatura no processo eleitoral brasileiro,
impossível existirem modificações na legislação eleitoral que não atinjam o sistema
partidário vigente, propondo novos mecanismos ao modo de funcionamento e,
principalmente, modo de interação com o ambiente eleitoral-parlamentar.
Como ilustrado na introdução deste trabalho de pesquisa, inúmeros
Projetos de Lei e Propostas de Emenda à Constituição Federal permanecem em
debate em ambas as casas legislativas do Congresso Nacional.
Excluindo-se as matérias relacionadas à Justiça Eleitoral e ao modo de
condução do sufrágio eleitoral, notadamente se por voto facultativo ou obrigatório,
todas as demais, seguramente, a maioria, interferem na dinâmica, organização e
funcionamento dos partidos políticos em ambiente eleitoral e parlamentar.
Até o fechamento deste trabalho de pesquisa (17/06/2016), por exemplo,
na pauta da reunião de 15/06/2016 da Comissão de Constituição, Justiça e
Cidadania do Senado Federal, em fase de conclusão estava o Projeto de Lei nº 663,
de 30 de setembro de 2015, de autoria do Senador Aécio Neves (PSDB/MG),
pertinente à alteração da Lei dos Partidos Políticos e da Lei das Eleições “para
proibir, em período próximo às eleições, doações a candidatos e partidos políticos
por servidores ocupantes de cargo em comissão ou função de confiança”391
O que se proporá neste capítulo é a análise das minirreformas eleitorais
propostas em face da Lei nº 4737/65, que instituiu o Código Eleitoral, da Lei nº
9096/95 (Lei dos Partidos Políticos) e da Lei nº 9504/77 (Lei das Eleições), e das
propostas de Emenda Constitucional em tramitação, não obstante haja ciência de
que várias outras leis ordinárias, editadas com o escopo de também alterar o texto
legal de uma ou outra norma de regência citada, foram, em igualdade de condições,
tão significativas à organização das agremiações partidárias quanto às apresentadas
pelas leis tituladas como minirreformas eleitorais. Nesse sentido, v.g., veja-se o teor
391
Explicação da ementa do PLS 663/2015, registrada pelo Senado Federal. Disponível em:
<www25.senado.leg.br>. Acesso em: 13-jun-2016. Julgamento adiado.
166
da Lei 13.107, de 24 de março de 2015, que dispôs sobre a fusão de partidos
políticos.
De outro lado, ainda, é também fundamental registrar que embora a
preocupação tivesse se limitado no comportamento dos prescritivos legais
propriamente ditos, algumas, dentre as inúmeras, decisões judiciais e resoluções da
Justiça Eleitoral que também apresentam significativos impactos à operacionalzação
das agremiações partidárias não poderiam deixar de serem relatadas, ainda que de
modo bastante sucinto.
5.1. MINIRREFORMAS ELEITORAIS
Três propostas de reforma eleitoral foram editadas no curso do atual
ordenamento jurídico brasileiro, propondo alterações significativas nas legislações
de base: Lei nº 4737/65 (Código Eleitoral), Lei nº 9096/95 (Lei dos Partidos Políticos)
e Lei nº 9504/77 (Lei das Eleições).
A primeira minirreforma eleitoral foi firmada pela Lei 12.034, de 29 de
setembro de 2009. Decorreu do Projeto de Lei nº 5498, apresentado pelos
Deputados Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), Cândido Vacarezza (PT-SP), José
Aníbal (PSDB-SP), Ronaldo Caiado (DEM-GO), Rodrigo Rollemberg (PSB-DF),
Sandro Mabel (PR-GO), Mário Negromonte (PP-BA), Brizola Neto (PDT-RJ), Sarney
Filho (PV-MA), Fernando Coruja (PPS-SC), Daniel Almeida (PCdoB-BA), Hugo Leal
(PSC-RJ), Carlos Willian (PT-MG), Alice Portugal (PCdoB-BA) e Henrique Fontana
(PT-RS), em 30 de junho de 2009.
Propunha, inicialmente, alterações apenas na Lei dos Partidos Políticos e
na Lei das Eleições, regulamentando o uso da internet nas campanhas eleitorais e o
recebimento de doação de recursos pela via eletrônica (web). Preocupou-se em
dispor, inclusive, sobre o tratamento a ser deferido no emprego irregular de
trucagem ou montagem das mídias eletrônicas realizadas, além de, também, instituir
o voto impresso para conferência com os da urna eletrônica.
Após as devidas análises, notadamente face à proposta de alterações no
Código Eleitoral feitas pelo Senado Federal, a redação definitiva seguiu para sanção
presidencial, retornando com os seguintes vetos parciais: (1) supressão da proposta
167
de controle das matérias eleitorais veiculadas na internet, porque atentatória à
liberdade de manifestação do pensamento, sem que ainda qualquer identidade
houvesse entre a rede mundial de computadores e os sistemas concessionados de
radiodifusão a merecer referidas matérias tratamento isonômico de veiculação; (2)
supressão da autorização de parcelamento de multa eleitoral pela Receita Federal,
dada a ausência de competência do referido Órgão para dispor sobre assunto
absolutamente desprovido de natureza tributária; e (3) supressão de qualquer forma
de cálculo à compensação fiscal recebida pelas emissoras de rádio e televisão por
cederem o horário gratuito à veiculação de propaganda eleitoral, dada a falta de
fundamento.
Embora autorizada pelo art. 5º da Lei nº 12.034/09, a emissão de voto
impresso nas urnas eletrônicas foi considerada inconstitucional pelo Supremo
Tribunal Federal apenas em 6 de novembro de 2013, por decisão unânime, proferida
nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4543 - Distrito Federal, sob a
relatoria da Ministra Cármen Lúcia392.
De outra ordem, ainda, a presente minirreforma implementou novas
condutas – obrigações e responsabilidades – às agremiações partidárias frente ao
(1) programa, seus registros estatutários e modo de realização e processamento das
coligações partidárias; (2) processo de filiação partidária; (3) disponibilidade do
Fundo Partidário; (3) uso das despesas e respectivo modo de prestação de contas
junto ao Tribunal Superior Eleitoral393; (4) formatação dos programas partidários
gratuitos transmitidos pelas emissoras de rádio e de televisão; (5) disponibilidade
sobre a abertura e o controle das contas bancárias eleitorais, inclusive por parte dos
candidatos à eleição; (6) autorização, operacionalização e limite das doações feitas
por pessoas físicas, assim como de entidades esportivas receptoras ou não de
recursos públicos, inclusive aos candidatos à eleição; (7) período para realização,
modo e veiculação das propagandas eleitorais físicas e de mídia impressa e
392
Embora com efeitos produzidos a partir de 13 de outubro de 2014, momento da publicação do v. Acórdão.
393 Aos processos de melhoria no funcionamento da Justiça Eleitoral, determinou que os Tribunais Regionais Eleitorais encaminhassem os dados dos candidatos às eleições ao Tribunal Superior Eleitoral.
168
eletrônica (rádio, televisão e internet)394; e (8) obrigatoriedade do comitê eleitoral e
do candidato à inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica – CNPJ.
A segunda minirreforma eleitoral foi introduzida pela Lei nº 12.891, de 11
de dezembro de 2013, a partir do Projeto de Lei do Senado nº 441, proposto pelo
Senador Romero Jucá (PMDB-RR)395, em 5 de dezembro de 2012.
Objetivava-se a diminuição dos gastos com as campanhas eleitorais,
assinalando prazos para: (1) o novo período de escolha dos candidatos pelo partido
e de deliberação das coligações, registrados na Justiça Eleitoral396; (2) as condições
à emissão das certidões de quitação eleitoral; e (3) os Tribunais Regionais Eleitorais
para encaminhamento da relação e dados dos candidatos às eleições ao Tribunal
Superior Eleitoral. Além disso, também dispôs em face da (4) inclusão de material
impresso de qualquer natureza no limite de gastos com a campanha eleitoral; (5)
formatação, com descrição do local, para a divulgação do material utilizado como
propaganda eleitoral, assim como a veiculação da propaganda eleitoral na internet;
(6) elaboração de plano de mídia pelas emissoras de televisão e pelos partidos junto
à Justiça Eleitoral; e (7) período de proibição de participação de candidatos em
inaugurações de obras públicas.
O texto final editado contemplou, também, a regulamentação (1) da
responsabilidade solidária dos candidatos e de seus partidos na veiculação de
propaganda eleitoral e pagamento de multa; (2) dos recursos em face dos casos de
inexigibilidade ou falta de elegibilidade para participação dos pleitos eleitorais
subsequentes; (3) da autonomia partidária na definição do cronograma de suas
atividades eleitorais de campanha; (4) da hipótese de incidência da responsabilidade
civil e trabalhista do partido político; (5) de acréscimo às circunstâncias legais de
cancelamento imediato de filiação partidária; (6) de modo de processamento da
fiscalização da escrituração contábil e da prestação de contas do partido e das
394
À participação eleitoral, incluiu a autorização do voto em trânsito e, no que tange ao processamento das ações eleitorais, determinou a não sujeição da matéria eleitoral à ação civil pública, prescrita na Lei nº 7347/85.
395 Na Câmara dos Deputados, referido Projeto de Lei recebeu a numeração 6397/2013.
396 Que passou de 10 a 30 de junho (20 dias), segundo redação original do art. 8º da Lei nº 9.504/97 (Lei das Eleições) para 12 a 30 de junho (18 dias). O §1º do citado art. 8º, ademais, obrigava o partido político a assegurar a candidatura de Deputados (Federal e Estadual ou Distrital) e de Vereadores que tivessem exercido o mesmo mandato eletivo em qualquer período da legislatura na qual se processam as eleições. Esta determinação legal está com eficácia suspensa por decisão, em sede liminar e por maioria, do Supremo Tribunal Federal na ADI 2530- Distrito Federal, de relatoria do Ministro Celso de Mello (vencido o Ministro e Vice-Presidente Ilmar Galvão), deferida em 24/04/2002 e publicada em 21/11/2003. O feito encontra-se no aguardo de julgamento final.
169
despesas de campanha eleitoral pela Justiça Eleitoral; (7) da não sujeição, à Lei de
Licitações e Contratações com o Poder Público, das despesas realizadas pelo
partido político; (8) do prazo de entrega dos materiais de áudio e vídeo a serem
inseridos na propaganda partidária de rádio e de televisão; (9) de realização dos
planos amostrais das pesquisas de opinião pública tanto em relação às eleições
quanto aos candidatos; (10) das penalidades, inclusive por reincidência, ao partido
ou coligação que realizar propaganda eleitoral em desacordo com a lei; (11) do
credenciamento dos fiscais e dos delegados dos partidos e das coligações nas
eleições; (12) dos limites e regras à contratação de pessoal nas campanhas
eleitorais397.
De outro lado, apresentou nova regulamentação a alguns dispositivos que
já haviam sido tratados, especialmente, na minirreforma eleitoral anterior, como o
caso: (1) da abertura e do controle das contas bancárias eleitorais de qualquer
comitê financeiro ou candidato à eleição, escolhido em convenção; (2) das doações
eleitorais aos candidatos, partidos políticos e comitês eleitorais; (3) dos prazos e das
condições à divulgação na rede mundial de computadores (internet) dos recursos
em dinheiro ou estimáveis recebidos para financiamento da campanha e respectivos
gastos em “sítios” da Justiça Eleitoral, tanto pelos candidatos quanto pelos partidos
e respectivas coligações; (4) da prestação de contas das sobras de recursos não
utilizados na campanha e (5) das hipóteses de configuração de propaganda eleitoral.
Após o cumprimento da sanção/veto presidencial no processo legislativo
desta minirreforma eleitoral, suprimidas foram as exigências de sanções ao repasse
de novas quotas do Fundo Partidário aos beneficiários, em razão do entendimento
de que tal medida reduziria a eficácia das atividades fiscalizatórias da Justiça
Eleitoral, prejudicando a transparência na aplicação desses recursos. E, ainda,
vetada também foi a proibição de veiculação de propaganda eleitoral em bens
particulares sem o devido e expresso consentimento, haja vista a afronta à liberdade
de manifestação em face das convicções político-partidárias que essa medida
provocaria.
A terceira e última legislação a tratar de uma minirreforma eleitoral, com
vigência recentemente editada, é a Lei nº 13.165, de 29 de setembro de 2015,
397
Sem alterar a incidência da matéria eleitoral na lei da ação civil pública, como determinado na minirreforma anterior, proposta pela Lei nº 12.034/09, excetuou apenas a sujeição dos candidatos a estas ações judiciais a qualquer circunstância que não compreendessem o desrespeito aos limites e às regras para a contratação de pessoal nas campanhas eleitorais.
170
decorrente do Projeto de Lei nº 5.735, apresentado em 06 de junho de 2013 pelos
Deputados Ilário Marques (PT-CE), Marcelo Castro (PMDB-PI), Anthony Garotinho
(PR-RJ) e Daniel Almeida (PCdoB-BA)398.
Além de reintroduzir novos mecanismos para o limite de gastos de
campanha eleitoral e, portanto, controle das receitas e despesas do partido, das
coligações partidárias e dos candidatos à eleição, redisciplinando, em especial, as
proposições já formuladas pela legislação infraconstitucional e minirreformas
anteriores, dispôs, também, sobre os procedimentos administrativos dos partidos
políticos e incentivos da participação feminina no processo eleitoral,
“complementando a reforma das instituições político-eleitorais do País” (art. 1º, in
fine).
De fato, analisando-se a legislação no que tange à operacionalização do
sufrágio, importantes garantias ao direito de voto foram asseguradas, como (1) a
autorização para que policiais militares em serviço também possam votar fora da sua
seção eleitoral; e (2) a extensão do voto em trânsito para os cargos majoritários e
proporcionais de âmbito estadual, distrital e federal nos municípios com mais de cem
mil eleitores.
Com relação ao funcionamento da Justiça Eleitoral, as seguintes
disposições foram reajustadas: (1) o prazo dos Tribunais Regionais Eleitorais para
encaminhamento da relação e dados dos candidatos em disputa ao Tribunal
Superior Eleitoral, que passou de 45 dias para 20 dias; (2) a tramitação e a
publicação das prestações de contas pela Justiça Eleitoral; (3) o prazo para a
Justiça Eleitoral divulgar em mídia eletrônica os comunicados, boletins e instruções
ao eleitorado e de incentivo da participação feminina na política; (4) o modo de
tramitação processual dos processos perante a Justiça Eleitoral; e (5) a forma de
julgamento dos processos de cassação de registro, anulação geral de eleições ou
perda de diplomação nos Tribunais Regionais Eleitorais.
Os candidatos às eleições, por sua vez, devem tomar cautela com as
novas regulamentações proferidas em face: (1) da modificação do prazo mínimo de
filiação partidária para participarem dos pleitos eleitorais subsequentes, que, de um
ano passou para seis meses, mantendo-se apenas o mínimo de um ano de domicílio
398
Chegou a ser arquivada em 31 de janeiro de 2015, com reativação apenas no dia 09 de fevereiro subsequente, pela proposição nº 325/2015 do Deputado Daniel Almeida. No Senado Federal, foi renumerado sob a ordem 75/2015.
171
eleitoral no local que pretenda se candidatar; (2) da permanência à obrigatoriedade
de se inscreverem no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica – CNPJ, exceto de
seus comitês financeiros; (3) da extensão do limite de doação pecuniária às
campanhas em 10% dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior,
uniformizando-se o tratamento que já é assegurado ao terceiro interessado399; (4)
das prestações de contas de campanha nas eleições majoritária ou proporcional,
uma vez que passarão a serem feitas pelo candidato e não mais pelo comitê
financeiro; (5) da atenção do limite máximo admitido para cada cargo eletivo de
contratações de pessoas físicas à prestação de serviços nas campanhas eleitorais,
que, aliás, deverão ser cadastradas como contribuintes individuais para fins de
seguridade e previdência social; e (6) do prazo obrigatório para desligamento das
atividades como apresentador ou comentarista em programa midiático, sob pena de
incidência de multa e cancelamento do registro da candidatura.
Várias inovações foram disciplinadas pela lei, principalmente, com relação
ao processo eleitoral: (1) o encerramento das contas eleitorais pelos bancos e o
encaminhamento do saldo existente ao órgão de direção indicado pelo partido; (2) o
cômputo do quociente partidário na distribuição das vagas parlamentares
remanescentes (sobras) na eleição proporcional e o modo de seleção dos suplentes
na representação partidária; (3) o processamento das eleições majoritárias que
vierem a ser declaradas prejudicadas; (4) a não realização, no primeiro semestre do
ano eleitoral e por servidor público, de despesa com publicidade governamental que
venha a suplantar o valor médio dos gastos realizados nos três últimos anos; (5) a
instituição de uma cláusula de desempenho individual de candidatura às eleições
proporcionais, correspondente ao mínimo de 10% do quociente eleitoral para que o
candidato possa ser considerado eleito; (6) a possibilidade de exceção da idade
mínima para a elegibilidade ser computada na data da posse, se fixada em dezoito
anos com aferição na data-limite para o pedido de registro; (7) o prazo para que a
Justiça Eleitoral forneça o número de registro de CNPJ aos candidatos que vierem a
requerer o registro da sua candidatura; (8) a possibilidade de extensão aos partidos
políticos das sanções aplicadas aos seus candidatos, por descumprimento da Lei
das Eleições, exclusivamente, se comprovada a sua participação no ato de
399
As únicas exceções a essa regra se dará caso os terceiros-doadores interessados apresentem bem móvel ou imóvel que seja de sua propriedade e contenha valor não superior a R$80 mil ou, ainda, em se tratando de recursos próprios do candidato, desde que o limite mínimo de gastos admitido para cada cargo eletivo, pela lei, seja respeitado.
172
ilegalidade; (9) a suspensão do direito às cotas do Fundo Partidário e incidência de
penalidades ao partido que não realize a devida prestação de contas; (10) as
circunstâncias de incidência das responsabilidades civil e criminal dos dirigentes
partidários e aos atos ilícitos praticados pelos partidos políticos decorrentes da
desaprovação das contas partidárias; e (11) o conjunto probatório que passa a ser
admitido na defesa nos processos eleitorais de perda do mandato.
Por fim, e diretamente aos partidos políticos, atenção foi especialmente
apresentada na redefinição: (1) do período para processamento de escolha dos
candidatos pelo partido, realização de convenções e, também, deliberação das
coligações400; (2) do quantitativo mínimo e prazo para registro de candidatos por
partido e por coligação nas eleições proporcionais, devidamente averbado pela
Justiça Eleitoral; (3) do limite de gastos de campanha, que passará a ser definido
pelo Tribunal Superior Eleitoral e não mais informado pelo candidato, partido ou
coligação aos respectivos Tribunais Regionais Eleitorais, assim como as regras para
o seu processamento; (4) do responsável pelo repasse de recursos de campanha
aos candidatos à eleição (que eram os comitês financeiros e passarão a ser os
próprios partidos); (5) do solicitante para abertura das contas bancárias eleitorais
(que era o comitê financeiro ou candidato e passará a ser o partido ou candidato);
(6) do prazo de divulgação pelos partidos políticos, coligações e candidatos dos
recursos recebidos para financiamento de campanha no site da Justiça Eleitoral401;
(7) dos requisitos processuais, prazos, hipóteses de permissão (bens particulares) e
vedação (equipamentos públicos), antecipação e duração das propagandas
eleitorais (que passou de 5 de julho para 15 de agosto), sob pena de multa
pecuniária; (8) do estabelecimento de representação parlamentar mínima de nove
deputados para que o partido tenha direito à participação nos debates transmitidos
pelas emissoras de rádio e de televisão; (9) do prazo e condições para a
transmissão da propaganda eleitoral gratuita pelas emissoras de rádio e de televisão
400
No texto original da Lei nº 9.504/97 (Lei das Eleições), o período era de 10 a 30 de junho (20 dias). Passou a ser de 12 a 30 de junho (18 dias) com a segunda minirreforma eleitoral (Lei nº 12.891/2013). Atualmente, limita-se no intervalo de 20 de julho a 5 de agosto (dezesseis dias).
401 Segundo a Lei nº 11.300, de 10 de maio de 2006, que alterou a Lei nº 9.504/97 (Lei das Eleições), dispondo sobre novos procedimentos à propaganda, financiamento e prestação de contas das despesas com campanhas eleitorais, o prazo de divulgação era de 6 de agosto a 6 de setembro. Com a segunda minirreforma eleitoral, Lei nº 12.891/13, esse prazo passou para 8 de agosto a 8 de setembro. Com esta lei, referido prazo passou a ser de 72 horas da data de recebimento pela Justiça Eleitoral, além de corresponder o dia 15 de setembro como a data exata para publicação das transferências dos Fundos Partidários, dos financiamentos pecuniários recebidos e gastos realizados.
173
de cada cargo eletivo, respeitada a distribuição de 90% do tempo programado para
os partidos e coligações com representação parlamentar e 10% para os demais402;
(10) de destinação mínima de 30% do prazo de propaganda eleitoral das eleições
majoritárias à apresentação dos candidatos concorrentes aos cargos de vice ou
suplentes de Senador; (11) do período para encaminhamento à Justiça Eleitoral da
relação dos seus filiados, candidatos à eleição; (12) da destinação de parcela do
Fundo Partidário para a participação política das mulheres, com, inclusive, definição
de percentual mínimo e máximo para as três eleições seguintes, sob pena de
congelamento do saldo existente em conta específica para uso futuro e destinado,
exclusivamente, para mesma finalidade.
Cinco dispositivos foram vetados pela Presidência da República, segundo
a Mensagem nº 358, datada de 29 de setembro de 2015.
Os três primeiros403 diziam respeito ao financiamento de campanha
eleitoral por doações de pessoas jurídicas.
Na redação original da norma legal, havia autorização para essa forma de
financiamento de campanha eleitoral caso estas fossem realizadas aos partidos
políticos ou comitês financeiros, na ordem de até 2% do faturamento bruto do ano
anterior e limite máximo de R$ 20 milhões ou, então, 0,5% do faturamento bruto se
feita a apenas um partido político. Proibia, apenas, que referidas doações fossem
realizadas por empresas que mantivessem contratos de execução de obras com a
Administração Pública no mesmo local de circunscrição da doação ou, ainda,
diretamente a candidatos, mesmo que na forma de publicidade. Em qualquer caso,
submetia a empresa à incidência de multa e/ou proibição de participar de licitações
públicas ou celebrar contratos com o poder público pelo período de cinco anos.
Em razão da decisão pela maioria de votos, exarada nos autos da Ação
Direta de Inconstitucionalidade nº 4650-Distrito Federal do Supremo Tribunal
Federal, de relatoria do Ministro Luiz Fux404, que versou sobre matéria eleitoral de
402
Às eleições majoritárias, a distribuição dos 90% do tempo total da transmissão da propaganda eleitoral para os casos das coligações partidárias ficou reservada exclusivamente aos seis maiores partidos.
403 O inciso XII e os §§2º e 3º do art. 24, assim como os arts. 24-A e 24-B, todos da Lei nº 9.504/97 inseridos no Projeto de Lei por seu art. 2º (Lei das Eleições).
404 Referida ADI havia sido distribuída pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – CFOAB em 05 de setembro de 2011, contra dispositivos da Lei nº 9.504/97 (Lei das Eleições) e da Lei nº 9.096/95 (Lei dos Partidos Políticos) que autorizavam a doação, por pessoas jurídicas, a campanhas eleitorais e a partidos políticos. Duas Audiências Públicas foram realizadas em junho de 2013. Submetida a julgamento em 11 de dezembro de 2013, o Ministro Relator entendeu pela inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, nas partes em que eram permitidas as
174
mesma natureza, o veto presidencial entendeu por bem seguir mesma orientação da
Corte Suprema, no sentido da inadmissibilidade dessas doações, sob qualquer
ordem, por denotarem fatos contrários à igualdade política e aos princípios
republicano e democrático, com aplicação imediata às eleições de 2016,
independentemente do cumprimento do princípio da anualidade.
Os dois últimos405 tratavam da impressão do voto da urna eletrônica.
Foram vetados, em razão do posicionamento desfavorável do Tribunal Superior
Eleitoral que assinalou custos elevados para a sua adoção, no importe aproximado
de R$ 1,8 milhões, ocasionando não apenas impacto bastante elevado à
previsibilidade orçamentária para o exercício contábil como também
descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal e da Lei de Diretrizes
Orçamentárias de 2015. Com a sua apreciação em sessão conjunta de deputados e
senadores, no entanto, referido veto acabou sendo rejeitado, seguindo a
promulgação da lei com a redação original formatada no então Projeto de Lei nº
5.735/13.
Importante também assinalar que contra a última minirreforma eleitoral,
qual seja, a Lei nº 13.165/15, quatro Ações Diretas de Inconstitucionalidade
encontram-se em tramitação no Supremo Tribunal Federal até o momento.
A primeira é a ADI 5394-Distrito Federal, protocolizada em 02 de outubro
de 2015, pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – CFOAB e
distribuída à relatoria do Ministro Teori Zavascki406. O dispositivo legal questionado é
doações contestadas, com recomendação para que o Congresso Nacional editasse em 24 meses novo texto para definição de limites de doação, assim como de uso de recursos próprios pelos candidatos, sob pena de, em caráter de excepcionalidade, ser assumida esta competência pelo Superior Tribunal Eleitoral. Acompanharam o Relator, os Ministros Presidente Joaquim Barbosa (à época) e Dias Toffoli, sem modulação de efeitos. Após voto-vista, o Ministro Teori Zavascki, em 2 de abril de 2014, julgou pela improcedência da ação e o Ministro Marco Aurélio pela também procedência parcial. O Ministro Ricardo Lewandowski acompanhou o Relator, com reserva a pronunciamento futuro em face da modulação de efeitos. Após concessão de vistas, o Ministro Gilmar Mendes acompanhou o Ministro Teori Zavascki pela improcedência da ação, juntamente com o Ministro Celso de Mello. Pela inconstitucionalidade, também seguiram os votos dos Ministros Rosa Weber, Cármem Lúcia e Luís Roberto Barroso. Conclusivamente, em 16 de setembro, referida ADI foi julgada procedente, pela maioria (8X3), sem que a declaração de inconstitucional às doações de pessoas jurídicas nas campanhas eleitorais, atingissem, prejudicando, as contribuições das pessoas físicas, com a modulação de efeitos da sentença para que, de imediato, seja aplicada às eleições de 2016.
405 O art. 59-A da Lei nº 9.504/97, inserido pelo art. 2º do Projeto de Lei e seu art. 12.
406 Juízo considerado prevento, tendo em vista a relatoria já concedida ao Ministro Teori Zavascki na ADI 4989-Distrito Federal, ajuizada em 17 de junho de 2013 pelo Procurador-Geral da República, questionando a nova redação dada pela Lei nº 11.300/06 ao art. 28, §4º da Lei das Eleições, na particularidade da expressão “somente na prestação de contas final de que tratam os incisos III e IV do art. 29 desta Lei”. Referida ação também aguarda julgamento de pedido liminar e de mérito.
175
a redação introduzida pelo §12 ao art. 28 da Lei das Eleições que autoriza, no
processo de prestações de contas, o registro das transferências de doações pelos
partidos aos candidatos como sendo, simplesmente, transferência dos partidos, e
nos registros dos partidos como sendo, simplesmente, transferência aos candidatos,
sem qualquer individualização dos doadores.
Em 12 de novembro de 2015, pelo Pleno, foi deferido o pedido liminar,
suspendendo, por unanimidade, até o julgamento final da ação, a eficácia da
expressão “sem individualização dos doadores”, assim como, por voto da maioria,
vencido apenas o Ministro Marco Aurélio, a concessão dos efeitos ex tunc à decisão.
A segunda é a ADI 5398-Distrito Federal, ajuizada pelo partido político
Rede Sustentabilidade em 15 de outubro de 2015 e distribuída à relatoria do Ministro
Roberto Barroso. Devido à introdução do art. 22-A na Lei dos Partidos Políticos,
estabelecendo a perda do cargo eletivo sempre que houver a desfiliação partidária
por qualquer das razões, sem justa causa, elencadas na lei407, pede-se a
inconstitucionalidade parcial do presente dispositivo legal, sem redução de texto,
para que a desfiliação em razão da criação de novo partido político não seja
considerada uma das hipóteses de justa causa propriamente dita.
Embora referida tônica à desfiliação partidária já tivesse sido consagrada
pela Resolução TSE nº 22.610/07 (art. 1º, §1º, inciso II), havia, de outro lado,
consentimento do próprio TSE, expressado na Consulta nº 755-35, que autorizava a
não incidência da norma caso a migração ao partido novo ocorresse no prazo
razoável de 30 dias da data do registro do seu estatuto partidário. Para a REDE,
autora da referida ADI, a ausência de qualquer período de transição na norma, nos
termos da permissão já assinalada pela jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral,
ofende os princípios democrático, do pluralismo político, da livre criação de partidos,
da segurança jurídica, do direito adquirido e da irretroatividade das normas
sancionadoras, justificando os seus fundamentos e pedidos.
Em decisão monocrática, de 11 de novembro, a medida cautelar
reclamada foi parcialmente deferida, referendada pelo Pleno, para apenas
“determinar a devolução integral do prazo de 30 (trinta) dias para filiações aos
407
Que, segundo os incisos do parágrafo único do art. 22-A questionados, seriam: “mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário; grave discriminação política pessoal; mudança de partido efetuada durante o período de trinta dias que antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição, majoritário ou proporcional, ao término do mandato vigente.”.
176
partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral até a data da entrada em vigor da
Lei nº 13.165/2015”. Conclusivamente, entendeu-se não estar assegurada às novas
agremiações partidárias a viabilidade de maior participação na distribuição do fundo
partidário e na propaganda eleitoral, notadamente ao horário gratuito de rádio e
televisão para as eleições municipais de 2016, assim como, consequentemente, ao
regular funcionamento parlamentar. In verbis:
29. Em primeiro lugar, impede-se que a representatividade do
parlamentar migrante seja computada pela nova legenda. Nos
termos da legislação eleitoral, a distribuição proporcional dos
recursos do fundo partidário e da propaganda eleitoral gratuita na TV
e no rádio (direito de antena) se dá de acordo com a representação
do partido político na Câmara dos Deputados (art. 47, § 2º, da Lei nº
9.504/1997 e art. 41-A da Lei nº 9.096/1995). E, conforme este STF
assentou no julgamento das ADIs 4.430 e 4.795, as novas legendas
levam consigo a representatividade dos deputados federais que para
ela migrarem diretamente dos partidos pelos quais foram eleitos. O
mesmo vale para a propaganda partidária, que, na regulamentação
atual, somente é assegurada aos partidos com pelo menos um
representante em qualquer das Casas do Congresso Nacional (cf.
art. 49 da Lei nº 9.096/1995, aplicável aos partidos recém-criados,
por força do Acórdão TSE, de 06.11.2012, na Propaganda Partidária
nº 1458).
30. Por esses motivos, impedir a filiação desses parlamentares aos
novos partidos sem perda de cargo inviabiliza que tais agremiações
tenham, desde já, direito à realização de propaganda partidária e de
maior participação na distribuição do fundo partidário e do horário de
propaganda eleitoral gratuita para as eleições municipais de 2016.
Considerando-se que as próximas eleições para a Câmara dos
Deputados e para o Senado Federal somente ocorrerão em 2018, a
abertura da “janela” de desfiliação, prevista no art. 22-A Lei nº
13.165/2015, somente ocorreria em março de 2018. Assim, pela
disciplina hoje vigente, nenhum deputado federal poderia migrar para
as legendas recém-fundadas, levando consigo sua
representatividade.
31. Em segundo lugar, a nova norma causa embaraço ao
funcionamento parlamentar dos novos partidos. É que somente com
a migração de parlamentares podem as legendas recém-criadas
obter, desde a sua criação, funcionamento parlamentar, i.e, o direito
de se fazerem representar nas casas legislativas, organizando-se em
bancadas, sob a direção de um líder, e participando das suas
diversas instâncias. Constata-se, assim, inequívoco periculum in
mora, apto a justificar a concessão de medida cautelar.
177
Aguarda-se exame de mérito408.
A terceira é a ADI 5420-Distrito Federal, ajuizada em 23 de novembro de
2015 pelo Procurador-Geral da República e distribuída à relatoria do Ministro Dias
Tóffoli. Postula-se a inconstitucionalidade da nova redação conferida ao art. 109,
incisos I a III, do Código Eleitoral, que, fundamentalmente, confere novo modo de
aplicação dos quocientes eleitoral e partidário na distribuição, logo, preenchimento,
das vagas parlamentares nas eleições proporcionais, ferindo os princípios do regime
representativo e do sistema de representação proporcional, assegurados pelo art. 1º,
parágrafo único, c.c. art. 45, caput e §1º, parte inicial, ambos da Constituição
Federal.
Sustenta a inconstitucionalidade na instituição de um divisor fixo, de
sucessivas aplicações, à distribuição das cadeiras parlamentares pelos partidos
políticos, antes inexistente409. A partir da nova redação da Lei nº 13.165/15, a
consideração do quociente partidário passaria a ser novamente exigido todas as
vezes que fosse calculada a atribuição das vagas remanescentes. Na prática, tal
procedimento confere inevitável vantagem – monopólio – sobre todas as vagas
remanescentes ao partido ou coligação que obtivesse a maior média já nessa
primeira operação de cálculo do quociente partidário às “sobras” de vagas.
Além disso, outra inconstitucionalidade estaria na imposição de limite
mínimo de 10% do quociente eleitoral às agremiações para que viessem a ter direito
à partilha e, portanto, à disputa das vagas remanescentes.
Em 4 de dezembro de 2015, decisão monocrática deferiu, parcialmente, o
pedido liminar reclamado, suspendendo, com efeito ex tunc, a eficácia apenas da
expressão “número de lugares definido para o partido pelo cálculo do quociente
partidário do art. 107”, mantendo-se o critério do cálculo legal vigente anteriormente.
Aguarda-se julgamento final410.
Por fim, a quarta e última ação é a ADI nº 5423-Distrito Federal,
protocolizada em 26 de novembro de 2015, pelo Partido Humanista da Solidariedade
408
Autos conclusos à relatoria desde 26/11/2015, 409
O art. 109, inciso I, do Código Eleitoral, na sua redação original, determinava que as sobras fossem ocupadas pela divisão do “número de votos válidos atribuídos a cada Partido ou coligação de Partidos pelo número de lugares por ele obtido, mais um”; com a nova redação apresentada pela Lei nº 13.165/15, essa divisão passaria a se vincular ao cômputo do quociente partidário, ou seja, “número de lugares definido para o partido pelo cálculo do quociente partidário do art. 107”.
410 Em 18/03/2016 foi prolatado despacho de autorização à prestação de informações pelos
requeridos e subsequente concessão de vista dos autos ao Advogado-Geral da União e ao Procurador-Geral da República.
178
– PHS, Partido Republicano Progressista – PRP, Partido Trabalhista Cristão – PTC e
Partido Trabalhista Nacional – PTN e distribuída à relatoria do Ministro Dias Tóffoli.
Inconformam-se os Autores com a restrição imposta ao direito de participação dos
partidos políticos menores nas mídias de rádio e de televisão, tanto nos debates
quanto na propaganda eleitoral gratuita411, asseverando-se referido ato claro
tratamento diferenciado ao pluripartidarismo, além de discriminatório. Em flagrante
afronta aos princípios constitucionais republicanos e da isonomia e da
proporcionalidade, chances à continuidade na disputa eleitoral teriam apenas os
partidos políticos enquadrados nas primeira e segunda classes. Enquanto estes se
tornariam ainda mais fortes, as agremiações partidárias menores morreriam por
inanição, prejudicando a representação proporcional com a consequente e inevitável
liquidação das minorias partidárias. Pedem a inconstitucionalidade, com prévio
deferimento de pedido liminar à suspensão dos efeitos ex tunc dos dispositivos
legais questionados até decisão de mérito. Liminar indeferida em decisão
monocrática exarada em 19 de dezembro de 2015412.
Fato é que, em suma, esta última minirreforma eleitoral, recém-editada,
objeto ainda de análise nas várias Ações Diretas de Inconstitucionalidade acima
descritas, constituiu fruto de toda a movimentação parlamentar iniciada,
fundamentalmente, no pós-movimentos sociais de junho de 2013413. Não apenas a
legislação infraconstitucional foi colocada em debate (com, aliás, conclusão dos
411
Sub judice, assinalaram a nova redação ao art. 46 da Lei nº 9.504/97 que, à obrigatoriedade de representação parlamentar para a participação nos debates transmitidos pelas emissoras de rádio e de televisão, só poderão exercer referido direito os partidos políticos que tiverem um mínimo de nove deputados em atividade. E, ainda, a nova redação conferida ao art. 47 subsequente, onde, para também terem direito à transmissão da propaganda eleitoral gratuita nas emissoras de rádio e de televisão em qualquer dos cargos eletivos nas eleições majoritárias e proporcionais, além da nova distribuição do tempo programado para os partidos e coligações que é de 90% àqueles com representação parlamentar e 10% aos restantes, nas eleições majoritárias, apenas poderão exercer referido direito as seis maiores bancadas partidárias das coligações realizadas.
412 Em 26/02/2016 foi prolatado despacho de autorização à prestação de informações pelos
requeridos e subsequente concessão de vista dos autos ao Advogado-Geral da União e ao Procurador-Geral da República
413 Movimentos sociais que, em verdade, levavam a bandeira de protesto contra o aumento das passagens de ônibus em vários municípios brasileiros e acabou evoluindo numa jornada de protestos multifacetados, incluindo-se temas de irresignação por uma reforma política. Nesse sentido, destacam-se as reportagens, por exemplo: “Relembre: jornada de protestos de junho completa um ano”, in BRASIL, EBC, disponível em: <www.ebc.com.br/cidadania/2014/06/protestos-completam-um-ano-e-violencia-policial-se-repete>, acesso em: 10-jan-2015; “O Brasil foi às ruas em junho de 2013: no mês que entrou para a História do país, protestos convocados por redes sociais, sem o comando tradicional de partidos, sindicatos e UNE, reuniram mais de 1,5 milhão de pessoas”, in BRASIL, O Globo, disponível em: <acervo.oglobo.globo.com/fatos-historicos/o-brasil-foi-as-ruas-em-junho-de-2013-12500090>, acesso em: 10-jan-2015; etc.
179
trabalhos e edição da Lei nº 13.165/15, acima examinada), como também a reforma
de dispositivos constitucionais permanece em tramitação nas Casas Legislativas do
Congresso Nacional para discussão e julgamento.
5.2. PROPOSTAS DE EMENDAS CONSTITUCIONAIS
Além das medidas atinentes à minirreforma eleitoral, já analisada e
promulgada na Lei nº 13.165/15, em processamento também estão, ao menos, três
Propostas de Emenda à Constituição referentes à reforma política.
São elas a (1) PEC nº 23/2007, do Senado Federal, enviada para a
Câmara dos Deputados e registrada sob o nº 182/2007, após, retornada ao Senado
Federal, passou a tramitar como PEC nº 113/2015; (2) a PEC nº 40/2011, originada
no Senado Federal, registrada na Câmara dos Deputados sob o nº 14/2015 e
examinada em conjunto com a PEC nº 182/2007, posteriormente devolvida ao
Senado Federal e tramitada como PEC nº 113/2015.
A PEC nº 23/2007 foi protocolizada pelo Senador Marco Maciel em 21 de
março de 2007. Visava a alteração dos arts. 17 e 55 da Constituição Federal,
requerendo-se que aos partidos políticos fosse assegurada a titularidade dos
mandatos parlamentares. Em razão disso, recebeu o codinome de “PEC da
Fidelidade Partidária”.
Pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, foi aprovada com
três emendas que propunham a alteração do seu escopo, abrangendo-se a perda
dos mandatos dos membros do Poder Legislativo e do Poder Executivo que se
desfiliassem dos partidos políticos pelos quais tivessem sido eleitos, quando assim
declarados pela Justiça Eleitoral. Em 17 de outubro de 2007, foi aprovada e
encaminhada à Câmara dos Deputados, onde também mereceu parecer por sua
aprovação, com alterações, retornando ao Senado Federal em 03 de setembro de
2015.
Discorrendo sobre sua tramitação na Câmara dos Deputados, verifica-se
nos registros parlamentares que a “PEC da Fidelidade Partidária” (PEC nº 23/2007)
teria sido recebida em 23 de outubro de 2007 e registrada sob nº 182/2007. Pela
180
identidade de objetos, várias outras PECs foram apensadas em 06 de março de
2015414, seguindo para exame conjunto da Comissão Especial de Reforma Política.
Nesse ínterim, chega à Câmara dos Deputados outra proposta de
emenda constitucional apresentada pelo Senado Federal, a PEC nº 40/2011,
tratando da restrição das coligações eleitorais às eleições majoritárias, sem que
obrigado fosse a vinculação das candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital
ou municipal. Foi recebida em 27 de março de 2015, registrada sob nº 14/2015 e,
também, apensada à PEC nº 182/2007 em 07 de abril do mesmo ano.
Em 12 de maio, a Comissão Especial de Reforma Política, sob relatoria
do Deputado Marcelo Castro (PMDB-PI), emitiu seu relatório conclusivo, concluindo,
in verbis, pela:
1) aprovação, na íntegra, da Proposta de Emenda à Constituição nº
14, de 2015, do Senado Federal, e, em parte, das Propostas de
Emenda à Constituição de nºs 42/95; 51/95; 60/95; 85/95; 90/95;
108/95; 137/95; 142/95; 211/95; 251/95; 337/96; 541/97; 542/97;
10/99; 23/99; 24/99; 26/99; 27/99; 119/99; 143/99; 158/99; 242/00;
267/00; 279/00; 294/00; 362/01; 444/01; 19/03; 67/03; 133/03;
149/03; 151/03; 246/04; 249/04; 273/04; 312/04; 390/05; 402/05;
520/06; 539/06; 586/06; 4/07; 11/07; 15/07; 51/07; 65/07; 72/07;
77/07; 103/07; 105/07; 123/07; 124/07; 131/07; 147/07; 160/07;
164/07; 182/07; 199/07; 220/08; 297/08; 311/08; 314/08; 27/11;
414
Proposições apensadas: “PEC-128/2011, PEC-169/2012, PEC-258/2013, PEC-344/2013, PEC-384/2014, PEC-60/2011, PEC-168/2012, PEC-224/2012, PEC-334/2013, PEC-356/2013, PEC-3/2015, PEC-16/1999, PEC-153/2012, PEC-221/2012, PEC-322/2013, PEC-345/2013, PEC-430/2014, PEC-10/1995, PEC-24/1999, PEC-27/2011, PEC-159/2012, PEC-222/2012, PEC-328/2013, PEC-352/2013, PEC-444/2014, PEC-10/1999, PEC-26/1999, PEC-43/1995, PEC-70/1999, PEC-90/1995, PEC-137/1995, PEC-168/1995, PEC-190/1994, PEC-202/2000, PEC-251/1995, PEC-283/2000, PEC-337/1996, PEC-624/1998, PEC-444/2001, PEC-19/2003, PEC-115/2003, PEC-151/2003, PEC-273/2004, PEC-402/2005, PEC-519/2006, PEC-578/2006, PEC-586/2006, PEC-11/2007, PEC-41/2007, PEC-77/2007, PEC-124/2007, PEC-160/2007, PEC-223/2008, PEC-297/2008, PEC-322/2009, PEC-23/1999, PEC-28/1995, PEC-60/1995, PEC-79/1999, PEC-108/1995, PEC-143/1999, PEC-179/1995, PEC-195/2000, PEC-212/2000, PEC-267/2000, PEC-291/1995, PEC-541/1997, PEC-362/2001, PEC-485/2002, PEC-67/2003, PEC-133/2003, PEC-249/2004, PEC-378/2005, PEC-430/2005, PEC-523/2006, PEC-583/2006, PEC-4/2007, PEC-20/2007, PEC-65/2007, PEC-105/2007, PEC-147/2007, PEC-199/2007, PEC-257/2008, PEC-311/2008, PEC-404/2009, PEC-42/1995, PEC-64/1999, PEC-85/1995, PEC-119/1999, PEC-158/1999, PEC-181/1995, PEC-196/2000, PEC-242/2000, PEC-279/2000, PEC-294/2000, PEC-542/1997, PEC-408/2001, PEC-6/2003, PEC-77/2003, PEC-149/2003, PEC-262/2004, PEC-390/2005, PEC-434/2005, PEC-539/2006, PEC-585/2006, PEC-6/2007, PEC-25/2007, PEC-72/2007, PEC-123/2007, PEC-155/2007, PEC-220/2008, PEC-280/2008, PEC-314/2008, PEC-27/1999, PEC-51/1995, PEC-75/1999, PEC-99/1999, PEC-142/1995, PEC-170/1999, PEC-191/1994, PEC-211/1995, PEC-262/2000, PEC-289/1995, PEC-492/1997, PEC-628/1998, PEC-476/2001, PEC-46/2003, PEC-127/2003, PEC-246/2004, PEC-312/2004, PEC-409/2005, PEC-520/2006, PEC-580/2006, PEC-587/2006, PEC-15/2007, PEC-51/2007, PEC-103/2007, PEC-131/2007, PEC-164/2007, PEC-228/2008, PEC-308/2008, PEC-365/2009”.
181
60/11; 224/12; 344/13; 345/13; 352/13 e 3/15, tudo nos termos do
substitutivo ora anexado;
2) admissibilidade e aprovação, no todo ou em parte, das emendas
de nºs 2, 4, 5, 13, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 25, 27, 28, 30, 31, 34
e 43, nos termos do substitutivo ora anexado;
3) rejeição das PECs de nºs 190/94; 191/94; 10/95; 28/95; 43/95;
168/95; 179/95; 181/95; 289/95; 291/95; 492/97; 624/98; 628/98;
16/99; 64/99; 70/99; 75/99; 79/99; 99/99; 170/99; 195/00; 196/00;
202/00; 212/00; 262/00; 279/00; 408/01; 476/01; 485/02; 6/03; 46/03;
115/03; 127/03; 225/03; 262/04; 306/04; 361/05; 378/05; 409/05;
430/05; 434/05; 519/06; 523/06; 578/06; 580/06; 583/06; 585/06;
587/06; 20/07; 25/07; 142/07; 148/07; 155/07; 221/08; 223/08;
228/08; 241/08; 257/08; 280/08; 308/08; 322/09; 365/09; 404/09;
128/11; 151/12; 153/12; 159/12; 168/12; 169/12; 198/12; 199/12;
221/12; 222/12; 258/13; 322/13; 326/13; 328/13; 334/13; 356/13;
384/14; 430/14; 444/14; 7/15;
4) admissibilidade, no todo ou em parte, e rejeição das emendas de
nºs 1, 3, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 23, 24, 26, 29, 32, 33, 35, 36, 37, 40,
41 e 42;
5) inadmissibilidade formal das emendas de nºs 14, 38 e 39, por
insuficiência de assinaturas; e finalmente
6) prejudicialidade das PECs de nºs 283/00, 6/07 e 41/07, cujas
disposições, destinadas a produzir efeitos em anos passados,
perderam a oportunidade de ser apreciadas nesta Casa415.
Enfim, após fundamentalmente o exame das matérias apresentadas no
quadro ilustrativo abaixo, a redação final da PEC nº 182/07, renumerada como PEC
nº 182-J/07416, seguiu ao Senado Federal em 13 de agosto de 2015, passando a
tramitar como PEC nº 113/2015 a partir de 03 de setembro do mesmo ano.
Com onze artigos, novo tratamento foi conferido ao financiamento eleitoral
e partidário417, à reeleição418, ao recurso do fundo partidário e acesso gratuito ao
415
Parecer da Comissão Especial destinada a proferir parecer à Proposta de Emenda à Constituição nº 182, de 2007, do Senado Federal, e apensadas (Comissão Especial da Reforma Política). Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra; jsessionid=4CBF34E2FB11FADE633CCBCEF967367A.proposicoesWeb2?codteor=1332561&filename=Tramitacao-PEC+182/2007>. Acesso em: 10-jan-2015.
416 Ementa reformulada com seguinte redação: “Reforma as instituições político-eleitorais, alterando os arts. 14, 17, 57 e 61 da Constituição Federal, e cria regras temporárias para vigorar no período de transição para o novo modelo, acrescentando o art. 101 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias”.
417 Recebimento de doações financeiras de pessoas físicas pelos partidos políticos e pelos candidatos e de pessoas jurídicas, exclusivamente, pelos partidos políticos, com sinalização à lei para dispor sobre os limites máximos de arrecadação e gastos de recursos para cada cargo eletivo (art. 1º).
418 Propõe sua vedação, retornando-se ao texto original da Constituição Federal de 1988, com regra transitória apenas aos Prefeitos eleitos em 2012 e Governadores eleitos em 2014, que poderão
182
rádio e à televisão419, à idade para se eleger420, ao mínimo de assinaturas para a
proposição de lei de iniciativa popular421, à composição dos membros das Casas
Legislativas422 e à candidatura de policiais e bombeiros militares423. E, de outro lado,
constitucionalizadas passaram a ser matérias como a fidelidade partidária424, o
poder regulamentar da Justiça Eleitoral425, a “janela partidária”426 e a impressão do
voto na urna eletrônica427.
concorrer novamente ao mesmo cargo desde que eleitos, anteriormente, para o exercício de primeiro mandato (art. 2º).
419 Exclusivamente aos partidos políticos que concorram à eleição geral para a Câmara dos Deputados com candidato próprio e elejam pelo menos um representante para qualquer das Casas do Congresso Nacional (art. 3º).
420 Autoriza a redução da idade para se concorrer ao cargo de Senador (de 35 para 29 anos), assim como de Governador e Vice-Governador (de 30 para 29 anos), de Deputados Federal, Estadual e Distrital (de 21 para 18 anos), mantendo-se as idades mínimas para os demais cargos eletivos: Presidente e Vice-Presidente da República (de 35 anos); Prefeito, Vice-Prefeito e Juiz de Paz (de 21 anos) e Vereador (de 18 anos) (art. 5º).
421 A subscrição mínima de 1% (um por cento) do eleitorado nacional, distribuída em pelo menos 5 (cinco) Estados, com até 0,3% (três décimos por cento) de eleitores em cada um deles para a apresentação de projeto de lei de iniciativa popular na Câmara dos Deputados, passa a ser de quinhentos mil eleitores, com pelo menos 0,1% (um décimo por cento) dos eleitores em pelo menos 5 (cinco) Estados (art. 6º).
422 Veda a recondução dos membros da Mesa para os mesmos cargos na eleição subsequente, independentemente da legislatura em que foram inicialmente eleitos (art. 10).
423 Passaria a ser autorizada a sua agregação desde a candidatura até dez dias após as eleições, com remuneração garantida e equivalente a, no máximo, três meses e possibilidade de retorno ao posto de trabalho ao final do mandato se, evidentemente, não reeleito (art. 11).
424 Confere status constitucional às hipóteses de perda do mandato eletivo por quem se desligar do partido pelo qual foi eleito, exceto se decorrente de grave discriminação pessoal, modificação substancial ou desvio reiterado do programa praticado pelo partido político ou, ainda, criação, fusão ou incorporação do partido político, na forma da lei (art. 4º). Fundamentalmente, constitucionaliza tratamento já aplicado por força da Resolução nº 22.610, de 25 de outubro de 2007, do Tribunal Superior Eleitoral, reconhecida como legitimamente constitucional pelo próprio Supremo Tribunal Federal. Pela conveniência do tema, reputa-se conveniente registrar apenas que por esta Suprema Corte já há decisão exarada no sentido de que as hipóteses de fidelidade partidária só não incidem sobre os cargos majoritários (ADI nº 5081-DF).
425 Determina um período de vacância à aplicabilidade das resoluções e demais atos normativos editados pelo Tribunal Superior Eleitoral de dezoito meses, contados da data de vigência da norma, definida a partir de sua publicação (art. 7º).
426 Autoriza ao detentor de mandato eletivo o desligamento do partido político pelo qual foi eleito nos trinta dias seguintes à promulgação da presente Emenda à Constituição, “sem prejuízo do mandato, não sendo essa desfiliação considerada para fins de distribuição dos recursos do Fundo Partidário e do acesso gratuito ao tempo de rádio e televisão” (art. 8).
427 Prevê a impressão do voto pela urna eletrônica, possibilitando a conferência e confirmação do voto pelo eleitor em sigilo e seu depósito automático e sem contato manual do eleitor desse voto em local lacrado (art. 9º).
183
Tabela 7 - PEC 182/2007 aprovada em primeiro turno da Câmara dos Deputados
DATA JULGAMENTO
MATÉRIA SIM NÃO POSIÇÃO
26/05
Adoção do Sistema Proporcional de lista
preordenada nos Estados e Distrito Federal
(EMA nº 4, Dep. Leonardo Picciani – PMDB/RJ)
21 402
94,6%
rejeitada
Sistema Distrital Misto (majoritário uninominal e
proporcional de lista)
(EMA nº 2, Dep. Marcus Pestana – PMDB/MG)
99 369
78,5%
rejeitada
27/05
Sistema eleitoral majoritário distrital - ”Distritão”
(SBT -1 da Comissão Especial)
210 267
55,4%
rejeitada
Financiamento de Campanha: doações aos
partidos e candidatos por pessoas físicas ou
jurídicas, no limite da lei
(EMA nº 22, Dep. Sergio Souza – PMDB/PR)
264
55,6%
207
rejeitada428
Financiamento de Campanha: pelos partidos
políticos, com recurso público e/ou doações de
pessoas físicas, e valores e doadores amplamente
divulgados
(EMA nº 10, Dep. Jandira Feghali – PCdoB/RJ)
164 240
51,1%
rejeitada
Financiamento de Campanha: recursos
exclusivamente públicos, vedadas as doações de
pessoas físicas ou jurídicas
(EMA nº 32, Dep. Leonardo Picciani – PMDB/RJ)
56 343
75,1%
rejeitada
27/05
Financiamento de Campanha: doações aos
partidos por pessoas físicas ou jurídicas e aos
candidatos por pessoas físicas, ambos no limite da
lei
(EMA nº 28, Dep. Celso Russomanno- PRB/SP)
330
69,9%
141 aprovada
Fim da reeleição
(Art. 3º do SBT-1, Dep. Rodrigo Maia – DEM/RJ)
452
95,8%
19 aprovada
28/05
Fim das coligações nas eleições proporcionais
(Art. 1º da PEC 14/2015)
206 236
52,8%
rejeitada
Cláusula de Desempenho: direito a recursos do
fundo partidário e acesso gratuito ao rádio e à
televisão pelo partido com candidato próprio à
eleição geral na Câmara dos Deputados e um
representante no Congresso Nacional
(Art. 5º do SBT-1, Dep. Rodrigo Maia – DEM/RJ)
369
89,3%
39 aprovada
(“continuar”)
428
Sessão Extraordinária nº 126. Julgamento disponível em: <http://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/plenario/chamadaExterna.html?link=http://www.camara.gov.br/internet/votacao/mostraVotacao.asp?ideVotacao=6354&tipo=partido>. Acesso em: 10-jan-2015.
184
Tabela 7 - PEC 182/2007 aprovada em primeiro turno da Câmara dos Deputados
(“continuação”)
DATA JULGAMENTO
MATÉRIA SIM NÃO POSIÇÃO
10/06
Voto Facultativo
(Art. 8º do SBT-1, Dep. Rodrigo Maia – DEM/RJ)
134 311
69,4%
rejeitada
Tempo de Mandato de 5 anos para Presidente da
República, Senadores, Deputados Estaduais,
Governadores e Vices, Prefeitos e Vices,
Vereadores, exceto para as eleições de 2018 que
permanece nove anos apenas para os dois
senadores e quatro anos para os demais.
Coincidência Escalonada das Eleições.
(EMA nº48, Dep. Manoel Junior – PMDB/PB)
348
75,5%
110 aprovada
Coincidência das Eleições: eleições gerais e
simultâneas em todo o país, para todos os cargos
eletivos
(EMA nº 54, Dep. Fernando Coelho Filho –
PSB/PE)
220 225
50,2%
rejeitada
Tempo de Mandato: de quatro anos aos Prefeitos,
Vices e Vereadores eleitos em 2016
(EMA nº 53, Dep. Leonardo Picciani – PMDB/RJ)
419
97,2%
8 aprovada
11/06
Limite mínimo de idade: reduz para 21 anos a
elegibilidade para Prefeito, Vice e Juiz de Paz e 18
anos para Deputados Federal, Estadual ou Distrital
e Vereador
(Emenda nº 1/15, apresentada na Comissão)
337
81,8%
73 aprovada
Limite mínimo de idade: 35 anos para Presidente
da República e Vice; 29 anos para Governador
Estadual e Distrital, Vice e Senador
(Art. 10 do SBT-1, Dep.Rodrigo Maia – DEM/RJ)
363
88,1%
48 aprovada
Posse do Presidente e dos Governadores
(Art. 7º do substitutivo do Relator da Comissão
Especial, alterando art. 28, 78 e 82 da C.F.429)
386
95,3%
10 aprovada
(“continuar”)
429
Para Governador e Vice-Governador, no dia 4 (grafado à mão sobre a data digitada, dia 5) de janeiro do ano seguinte ao da eleição, com mandato de cinco anos; Para o Presidente e Vice-Presidente da República, no dia 5 de janeiro do ano seguinte ao da eleição, com mandato de cinco anos.
185
Tabela 7 - PEC 182/2007 aprovada em primeiro turno da Câmara dos Deputados
(“continuação”)
DATA JULGAMENTO
MATÉRIA SIM NÃO POSIÇÃO
16/06
Cota para Mulheres
(EMA nº 57, Dep. Elcione Barbalho – PMDB/PA)
293
65,5%
101 rejeitada430
Fidelidade Partidária, Iniciativa Popular, Atos
Normativos do TSE, Voto Impresso e Mandato das
Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado
Federal
(EMA nº 60, Dep. Eduardo Picciani – PMDB/RJ)
433
98,0%
7 aprovada
Federação Partidária: bloco parlamentar formado
para a disputa eleitoral deverá permanecer até o
final da legislatura correspondente
(Art. 14 do SBT-1, Dep. Rodrigo Maia – DEM/RJ)
157 277
62,8&
rejeitada
Perda de Mandato em virtude de investidura de
Deputado ou Senador em cargo político do Poder
Executivo, incluindo chefe de missão diplomática
temporária
(Emenda nº 8/15 da Comissão Especial)
60 357
85,0%
rejeitada
16/06
Senador Vitalício, que constitui o cargo de
ascensão do Presidente da República assim que
concluído o seu mandato, e Voto em Trânsito para
qualquer cargo eletivo, desde que requerido,
exceto militares em serviço
(EMA nº 56, Dep. Leonardo Picciani – PMDB/RJ)
-- 404
97,8%
rejeitada
Elegibilidade de policial ou bombeiro militar:
agregado desde o registro da candidatura até 10
dias após as eleições, com remuneração até o
limite máximo de 3 meses. Não sendo reeleito,
retornará à atividade.
(Art. 1º da PEC 7/2015, Dep. Capitão Augusto –
PR/SP)
392
87,1%
43 aprovada
(“continuar”)
430
Sessão Extraordinária nº 157. Julgamento disponível em: <http://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/plenario/chamadaExterna.html?link=http://www.camara.gov.br/internet/votacao/mostraVotacao.asp?ideVotacao=6377&tipo=partido>. Acesso em: 10-jan-2015.
186
Tabela 7 - PEC 182/2007 aprovada em primeiro turno da Câmara dos Deputados
(“continuação”)
DATA JULGAMENTO
MATÉRIA SIM NÃO POSIÇÃO
17/06
Exceção à Perda de Mandato – “Janela”, se nos 30
dias subsequentes à promulgação da Emenda
Constitucional
(EMA nº 29, Dep. Jovair Arantes – PTB/GO)
317
68,6%
139 aprovada
Registro de Proposta Eleitoral pelos candidatos na
Justiça Eleitoral, vendando sua reeleição se não
cumpri-las no mandato
(Emenda nº 7/15 da Comissão Especial)
89 230
70,1%
rejeitada
Candidaturas Simultâneas para qualquer cargo
eletivo majoritário ou proporcional
(EMA nº 59, Dep. Leonardo Picciani – PMDB/RJ)
4 334
98,2%
rejeitada
Fonte: Câmara dos Deputados, 2016 (elaborada pela autora)
Apenas o art. 8º da proposta foi aprovado nos dois turnos, referente à
“janela partidária”, que aguarda nova convocação da Presidência para a instalação
de sessão solene do Congresso Nacional destinada à promulgação da Emenda
Constitucional respectiva. Com relação aos demais itens, a deliberação do Plenário
seguiu no sentido de se constituir proposta autônoma para debate em apartado, nos
termos da sugestão apresentada pelo Senador Eunício Oliveira, o que foi
prontamente atendida com a autuação da PEC nº 113-A/2015.
187
6. CONCLUSÃO
No espectro da representação política e em ambiente democrático, o que
pudemos diagnosticar com a pesquisa realizada foi que, de fato, os partidos políticos
assumiram papel de relevo ao longo da história, consolidando o instrumento
mediador necessário à fluidez do exercício do poder político.
Assumiram viço próprio e único à bandeira de uma governabilidade
democrática plena, justificando a razão da assertiva de que não há democracia sem
partidos políticos, sem a legitimação de um sistema partidário que lhe dê suporte.
Aliás, até o governo de base autocrática reclamou, do partido político, força para a
sua prospecção, ainda que sob o viés de uma base unipartidária, pré-estabelecida e
altamente fortalecida.
A ligadura que conquistaram com o sistema eleitoral vigente perpassa a
ideia de que, por mais que existam outras formas de expressão política, quer
individuais, quer por grupos de pressão, numa democracia o processo de eleições
implica na existência de partidos políticos, sendo deles também dependentes,
justamente porque bem desempenham o papel de intermediários no jogo político,
promovendo a busca por um equilíbrio entre os diversos interesses e forças que se
coexistem aos olhos dos atores políticos envolvidos: eleitores, candidatos, eleitos e
governantes.
A nosso ver, enxergar o retorno das candidaturas avulsas neste cenário
como mecanismo capaz de se alcançar mesmo engendramento de forças e de
eficácia de resultados é bastante diminuta, ao menos frente à experiência brasileira.
Como bem destacado por PANEBIANCO, visto ao longo da pesquisa,
antes mesmo da formação dos necessários partidos políticos, os vetores que o
precedem – por ele denominados de “recursos do poder” – exigem harmonia
contínua entre a competência do especialista de bem manejar as relações político-
organizativas internas e externas (político-parlamentar qualificado) e o ambiente de
um modo geral, notadamente institucional e parlamentar em si, controlando suas
importantes zonas de incerteza, com, inclusive, capacidade plena à definição de
estratégias eleitorais suficientes a suportar todas as relações ambientais diretas.
Dependem, portanto, de uma estrutura composta por uma cadeia de filiados e
simpatizantes para que o almejado poder de decisão fosse obtido.
188
No Brasil, verificamos que a candidatura avulsa foi admitida a partir do
Código Eleitoral de 1932 e pouquíssima ressonância, no polo da representação
política, tiveram os seus candidatos. Para o Governo Central, por exemplo, todos os
Presidentes da República ou eram filiados diretamente a partidos políticos, ou
dependeram da impulsão de uma base partidária para que alcançassem o poder.
Daí a razão, certamente, para que os partidos políticos figurassem tema
unânime de estudo pelos juristas à época, notadamente quando de sua dissolução
pelo Decreto-Lei nº 37, de 2 de dezembro de 1937. Uma dissolução, vale ponderar,
sentida pelo próprio Presidente Getúlio Vargas ao sinalizar a necessidade de criação
de uma organização nacional capaz de dar suporte e sustentação ao seu regime
autoritário de governo, como se partido único, verdadeiramente, fosse.
As agremiações partidárias, diferentemente das candidaturas avulsas,
conseguiram se restabelecer em 1945, com o Decreto-Lei nº 7.586, de 28 de maio, o
novo Código Eleitoral batizado como “Lei Agamenon”.
Observada por outro ângulo, no que tange à formação e organização do
sistema partidário, a democracia brasileira consolida um ambiente bastante rico para
análise.
NUNES LEAL já havia adiantado tal importância e, de fato, em matéria
eleitoral-partidária, o Brasil viu de tudo um pouco. Os partidos políticos, quando
autorizados a existirem pelo regime jurídico da ocasião, tiveram de conviver lado a
lado com as diversidades dos inúmeros sistemas eleitorais implantados, como o voto
distrital, o majoritário de um e dois turnos, o proporcional com lista aberta e fechada,
causando-lhes inúmeras instabilidades quando das suas formações, quer sejam
bipartidaristas ou multipartidaristas, de característica regionalizada ou nacional.
Assim, com razão, JEHÁ, na assertiva de que o sistema partidário se
desenvolveu de modo absolutamente irregular e descontinuado, consoante quadro
dos inconstantes sobressaltos da vida das instituições políticas nacionais431. De fato.
O fator negativo que parece ter preponderado nessa formação tem
relação com a cultura da oligarquização imposta pelas elites tanto na busca quanto
na permanência do poder político. O arranjo eleitoral e, logo, partidário, se voltava a
estabelecer reino seguro a seu favor.
431
JEHÁ, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos Partidos Políticos no Brasil. 2009. Tese (Doutorado em Direito do Estado) – Universidade de São Paulo: Faculdade de Direito, São Paulo, 2009. p. 34.
189
Relendo a história, notamos que a extrema oligarquização do poder
preponderou de forma indireta por quase toda a República. O sistema eleitoral
censitário e restrito lhe dava guarida no Império, assim como a imposição de
cláusulas de desempenho – as reconhecidas cláusulas de barreira sobre a atuação
partidária no cenário político – ajudava a limitar o poder, cerceando a livre criação e
organização das agremiações partidárias na República. Adicionava-se a isso a
forçosa implantação do bipartidarismo no governo militar de 1964 a 1985 ou a
própria aniquilação das instituições políticas e, consequentemente, dos partidos
políticos, seus atores principais.
Enfim, poucos foram os momentos de ocorrência de um pluralismo
político no sistema eleitoral-partidário brasileiro, como o experimentado na
atualidade, por advento e consagração da atual Constituição Federal.
Pensamos, por isso, que as diversas restrições impostas ao livre exercício
das opções políticas pelo destinatário do poder – o povo – podem permanecer
culturalmente impregnadas nos modelos já experimentados se reimplantados,
obstando a eficácia plena da livre expressão democrática conquistada com o atual
ordenamento jurídico-constitucional.
Tomando-se, por exemplo, o sistema distrital, embora não tivesse
configurado tema objeto central desta pesquisa, os efeitos causados sobre a
organização partidária, melhor dizendo, sobre o processo eleitoral como um todo, se
evidenciaram significativamente maléficos.
Silenciosamente, promovia-se a seletividade das forças políticas a favor
das oligarquias locais que se formavam por dependência dos benefícios que o poder
central lhes garantia auferir, reafirmando a veracidade da máxima defendida por
ARISTÓTELES de que o mau governo só é mau porque feito por poucos e
influenciando muitos. A confiança na pessoa do “chefe” ou do “candidato popular”,
movido por um impulso personalístico ou patriarcal, de confiança do eleitorado nos
coronéis era muito superior do que os programas dos partidos políticos432. O partido
se apresentava como mero figurante e não como o lócus apropriado para se filiar e
concorrer, livremente, como candidato nos pleitos eleitorais.
432
“O povo do interior ainda confia mais na ação dos chefes próximos do que na promessa dos oradores distantes”, conforme ARINOS DE MELO FRANCO. Afonso. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1980, p. 84.
190
Assim, com otimismo, verifica-se o tratamento cauteloso que vem sendo
adotado à atuação dos partidos políticos em sede de reforma política, inclusive
quando da alteração do sistema eleitoral. As ponderações de valores que se tem
firmado, certamente, não cooperam apenas pela garantia das conquistas de uma
representação política plena, livre de interferências no amplo direito de escolha do
eleitor pelo seu candidato, mas, sobretudo, homenageia o princípio do pluralismo
político agasalhado por nossa Constituição Federal atual.
Afinal, é o partido político no cenário político-eleitoral mundial, quiçá
brasileiro, que se coloca como o instrumento essencial para que a representação
política seja efetivada, respaldando mais e mais o vigor e o brilho das democracias.
Criticados ou não, através dos partidos é que o jogo de poder, em clima
de beligerância, se sustenta. Recebem do ambiente social a árdua tarefa de
“autodeterminá-lo”, contribuindo tanto com a formação da opinião pública quanto
com a realização de uma vontade geral que se consolida a partir das múltiplas
vontades particulares vivificadas no dia a dia. E assim, permitem que a fraqueza do
ser humano de realizar, sozinho, a tarefa do bem comum seja suprida433.
Em razão de todo o exposto, portanto, mais do que justo, merecidas são a
existência, organização e funcionalidade de toda e qualquer agremiação partidária,
pelo regime jurídico que se edifica a lhe garantir plena e constante oxigenação,
sempre.
433
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Os Partidos Políticos nas Constituições Democráticas: o Estatuto Constitucional dos Partidos Políticos no Brasil, na Itália, na Alemanha e na França. Imprensa da Universidade de Minas Gerais: Revista Brasileira de Estudos Políticos; Estudos Sociais e Políticos, vol. 26, 1966. p. 55-56.
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