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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
Pós-Graduação Strictu Sensu
Mestrado em Direito Político e Econômico
VANESSA CORDEIRO DE CARVALHO
ASPECTOS JURÍDICOS DA ATIVIDADE DE FOMENTO DO BNDES PARA O
FINANCIAMENTO DO SETOR DE SANEAMENO BÁSICO
SÃO PAULO
2012
VANESSA CORDEIRO DE CARVALHO
ASPECTOS JURÍDICOS DA ATIVIDADE DE FOMENTO DO BNDES PARA O FINANCIAMENTO DO SETOR DE SANEAMENTO BÁSICO
Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Direito Político e Econômico da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Direito Político e Econômico. Orientador: Prof. Dr. Alessandro Serafin Octaviani Luís.
SÃO PAULO
2012
VANESSA CORDEIRO DE CARVALHO
ASPECTOS JURÍDICOS DA ATIVIDADE DE FOMENTO DO BNDES PARA O FINANCIAMENTO DO SETOR DE SANEAMENTO BÁSICO
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Gradação, em Direito Político e Econômico da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Direito Político e Econômico
Aprovada em 08/02/2013 Banca Examinadora _______________________________________________________ Prof º. Drº Alessandro Serafin Octaviani Luís- Orientador Universidade Presbiteriana Mackenzie _______________________________________________________ Profº. Drº Vicente Bagnoli Universidade Presbiteriana Mackenzie _______________________________________________________ Prof º. Drº José Maria Arruda de Andrade Universidade de São Paulo
C331a Carvalho, Vanessa Cordeiro de Aspectos jurídicos da atividade de fomento do BNDES para o
financiamento do setor de saneamento básico. / Vanessa Cordeiro de Carvalho. – 2013.
153f.il ; 30 cm Dissertação (Mestrado em Direito Político e Econômico) –
Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2013. Orientador: Alessandro Serafin Octaviani Luís Bibliografia: f. 136 - 153 1. Instituiçőes de Desenvolvimento 2. BNDES 3. Fomento
4. Saneamento básico 5. Resíduos sólidos I. Título
AGRADECIMENTOS
Agradeço à Marli Marlei Trape, minha mãe, pelo apoio incondicional.
Agradeço também a uma amiga especial, Tatiane Coutinho Ferreira, por ter
dividido comigo as angústias e descobertas dessa fase de amadurecimento
acadêmico.
Agradeço ainda ao meu Orientador, Dr. Alessandro Octaviani, pela paciência
que demonstrou na missão de ensinar.
SIGLAS E ABREVIAÇÕES
ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental
ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas
ADI - Ação Direta de Inconstitucionalidade
AFRMM - Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante
ANA - Agência Nacional de Águas
ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento
BASA - Banco da Amazônia Sociedade Anônima
BC - Banco Central
BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento
BIRD - Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento
BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento
BNDESPAR - BNDES Participações S.A
BNH - Banco Nacional de Habitação
BDMG - Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais
BRDE - Banco Regional de Desenvolvimento do Rio Grande do Sul
CBO - Classificação Brasileira de Ocupações
CMN - Conselho Monetário Nacional
CNS - Conselho Nacional de Saúde
CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Esgoto
CEF - Caixa Econômica Federal
CODEFAT - Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador
CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente
CNPQ - Conselho Nacional de Pesquisa Científica e Tecnológica
DASP - Departamento Administrativo do Serviço Público
DESP - Departamento de Epidemiologia e Saúde Pública
DNOS - Departamento Nacional de Obras de Saneamento
EMBRAPA - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
EMBRAMEC - Mecânica Brasileira S.A.
FAE - Fundo Estadual de Água e Esgoto
FAT - Fundo de Amparo ao Trabalhador
FCP-SAN -Programa de Financiamento a Concessionários Privados de Saneamento
FGTS - Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
FIBASA - Insumos Básicos S.A., Financiamento e Participações
FINAME - Fundo de Financiamento para Aquisição de Máquinas e Equipamentos
Industriais
FINANSA - Programa de Financiamento para o Saneamento
FINEP - Financiadora de Estudos e Projetos
FISANE - Fundo de Financiamento para Saneamento
FMM - Fundo da Marinha Mercante
FND - Fundo Nacional de Desenvolvimento
FNOS –Fundo Nacional de Obras de Saneamento
FNSA - Frente Nacional pelo Saneamento Ambiental Básico
FPS - Fundo de Participação Social
FRP - Fundo de Reaparelhamento Econômico
FSESP - Fundação Serviços de Saúde Pública
FUNDEB - Fundo Nacional de Valorização da Educação Básica
FUNASA - Fundação Nacional de Saúde
IBAM - Instituto Brasileiro de Administração Municipal
IBRASA - Instituto Brasileiro de Aprendizagem Profissional
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INPI - Instituto Nacional de Propriedade Industrial
IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
IPTU- Imposto sobre a Propriedade Territorial Urbana
LOA - Lei Orçamentária Anual
MDS - Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome
MIN - Ministério da Integração Nacional
MMA - Ministério do Meio Ambiente
OEA - Organização dos Estados Americanos
OGU - Orçamento Geral da União
OMS - Organização Mundial de Saúde
ONU - Organização das Nações Unidas
PAC - Programa de Aceleração do Crescimento
PASS - Programa de Ação Social em Saneamento
PCPP - Programa de Crédito Produtivo Popular
PLANASA - Plano Nacional de Saneamento
PMSS - Programa Modernização de Setor de Saneamento
PND - Plano Nacional de Desenvolvimento
PNSB - Pesquisa Nacional de Saneamento Básico
PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
PROEMPREGO- Programa de Expansão do Emprego e Melhoria da Qualidade de
Vida do Trabalhador
PROGER - Programa de Geração de Emprego e Renda
PRONAF - Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar
PRONURB - Programa de Saneamento para Núcleos Urbanos
PROPAR- Programa de Assistência Técnica à Parceria Público-Privada de
Saneamento
PROSAB - Programa de Pesquisa em Saneamento Básico
PROSANEAR - Programa de Saneamento para População de Baixa Renda
PROSEGE - Programa Social de Emergência e Geração de Empregos em Obras de
Saneamento
RDH - Relatório de Desenvolvimento Humano
SEBRAE - Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
SELIC - Sistema Especial de Liquidação e Custódia
SENAC - Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial
SENAI - Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
SENAR - Serviço Nacional de Aprendizagem Rural
SEPURB - Secretaria de Política Urbana
SINE - Sistema Nacional de Emprego
SINIMA - Sistema Nacional de Informação sobre Meio Ambiente
SINIR - Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão de Resíduos Sólidos
SINISA - Sistema Nacional de Informações em Saneamento Básico
SFS - Sistema Financeiro de Saneamento
SMC- Superintendência da Moeda e do Crédito
SNSA - Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental
SNSB - Sistema Nacional de Saneamento Básico
SNIS - Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento
SUDAM - Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia
SUDECO - Superintendência de Desenvolvimento do Centro-Oeste
SUDENE – Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste
SUFRAMA – Superintendência da Zona Franca de Manaus
TJLP – Taxa de Juros de Longo Prazo
TRMM – Taxa de Renovação da Marinha Mercante
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO........................................................................................................................13
CAPÍTULO 1 - INTERVENÇÃO DO ESTADO BRASILEIRO SOBRE O DOMÍNIO
ECONÔMICO: A ATIVIDADE DE FOMENTO ............................................................................. .17
1.1 A REALIZAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO ECONÔMICA .................................................... .17
1.2 INTERVENÇÃO ESTATAL NA ECONOMIA POR ABSORÇÃO OU PARTICIPAÇÃO,
DIREÇÃO E INDUÇÃO ................................................................................................................ 25
1.3NORMAS DE INDUÇÃO E A ATIVIDADE DE FOMENTO ............................................... 35
1.4 A INSTRUMENTALIZAÇÃO DA ATIVIDADE DE FOMENTO ......................................... 42
CAPÍTULO 2 - O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL E AS INSTITUIÇÕES
FINANCEIRAS DE DESENVOLVIMENTO- O BNDES .............................................................. .50
2.1 PANORAMA GERAL DO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL ..................................... 50
2.2 COMPOSIÇÃO E ATRIBUIÇÕES DOS ÓRGÃOS E INSTITUIÇÕES DO SISTEMA
FINANCEIRO NACIONAL ........................................................................................................... 53
2.3 AS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS DE DESENVOLVIMENTO- O BNDES A GESTÃO DE FUNDOS PARAFISCAIS DE POUPANÇA COMPULSÓRIA E A ATIVIDADE DE
FOMENTO ...................................................................................................................................... 60
2.4 O PLANEJAMENTO ESTATAL E A ATIVIDADE DE FOMENTO DO BNDES- DO PLANO DE METAS AOS PROBRAMAS DE ACELERAÇÃO DO CRESCIMENTO (PACs)
.......................................................................................................................................................... 76
CAPÍTULO 3 - FOMENTO AO SETOR DE SANEAMENTO BÁSICO NO BRASIL .............. 82
3.1 A IMPORTÂNCIA DO SANEAMENTO BÁSICO PARA O DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL ............................................................................................................................. 82
3.2 SANEAMENTO BÁSICO: SERVIÇO PÚBLICO OU ATIVIDADE ECONÔMICA ......... 87
3.3 BREVE HISTÓRICO DO SANEAMENTO BÁSICO NO BRASIL - O FINANCIAMENTO
DO SETOR: DO SÉCULO XIX AOS DIAS ATUAIS ................................................................ 94
CAPÍTULO 4 - A POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS E A ATIVIDADE DE
FOMENTO DO BNDES ................................................................................................................... 113
4.1 CRESCIMENTO ECONÔMICO E PRESERVAÇÃO AMBIENTAL: A QUESTÃO DOS
RESÍDUOS SÓLIDOS ................................................................................................................ 113
4.2 A ATUAÇÃO DE FOMENTO DO BNDES PARA O SETOR DE RESÍDUOS SÓLIDOS
........................................................................................................................................................ 123
4.3 FOMENTO AO ASSOCIATIVISMO PARA OS CATADORES DE MATERIAIS RECICLÁVEIS ............................................................................................................................. 130
CONSIDERAÇÕES FINAIS........ .................................................................................................. 133
BIBLIOGRAFIA. ............................................................................................................................... 135
RESUMO
CARVALHO, Vanessa Cordeiro de. Aspectos Jurídicos da Atividade de Fomento do BNDES para o Financiamento do Setor de Saneamento Básico. 2012. Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Direito, Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2012.
A presente dissertação intenta descrever e analisar as formas de intervenção
do Estado sobre o domínio econômico, com destaque para a modalidade de
indução, através da atividade de fomento estatal do BNDES, para os serviços
públicos de saneamento básico. Partiu-se da análise inicial relativa à realização da
Constituição Econômica na Constituição de 1988, a fim de evidenciar o alcance do
modelo atual de intervenção voltado ao desenvolvimento econômico através da
efetivação das políticas públicas que em comparação com as regras interventivas de
períodos anteriores, destinadas a alguns grupos oligárquicos específicos,
demonstram a evolução do tema. Em seguida apreciou-se detidamente os aspectos
jurídicos da atividade de fomento do Estado, incluindo a intervenção estatal no
sistema financeiro por regulação e por participação, com a criação de uma
instituição financeira de desenvolvimento, o BNDES. Posteriormente o tema de
saneamento básico foi tratado de modo específico com um exame histórico do
segmento e da relevância que tem no aspecto social, sanitário e ambiental,
avaliando-se as atividades do BNDES voltadas especificamente ao setor, incluindo-
se análise à parte sobre o tema de resíduos sólidos à luz da lei nº12.305/2010, que
traz a Política Nacional de Resíduos Sólidos com previsão expressa para a atividade
administrativa de fomento.
Palavras Chave: Desenvolvimento. Fomento. Instituições de Desenvolvimento.
BNDES. Saneamento Básico. Resíduos Sólidos.
ABSTRACT
CARVALHO, Vanessa Cordeiro de. Legal Aspects of the BNDES Fomentation Activity for the Financing of the Water and Sanitation Sector. 2012. Monograph (Master’s Degree) - Faculdade de Direito, Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2012.
This dissertation tries to describe and analyze the forms of state intervention on
the economic domain, with emphasis on the mode of induction, through the activity of
the BNDES state development, to implement services for public sanitation. It starts
with the initial analysis on the implementation of the Economic Constitution based in
the 1988 Constitution, in order to show the scope of the current model of intervention
geared to economic development through public policy, compared with that of
previous periods interventional procedures aimed at some specific oligarchic groups.
Then the legal aspects of the activity of the state fomentation were appreciated,
including state intervention in the financial system, by regulating and involvement
with the creation of BNDES, a development finance institution. Later the issue of
sanitation is treated in a specific way, with a historical examination of the action and
the relevance it has on the social, health and environmental aspects, especially with
the enactment of Law nº11.445/2007, evaluating the BNDES activities specifically
aimed the sector, including the analysis of the portion of the segment with solid
waste, under the light of Law nº 12.305/2010, which brings the national policy on
solid waste with express provision of administrative activity promotion.
Keywords: Development. Fomentation. Development Institutions. BNDES. Sanitation.
Solid Waste.
INTRODUÇÃO
A presente dissertação tem a pretensão de analisar a atuação interventiva do
Estado na economia através da atividade de fomento estatal para o setor de
saneamento básico sob aspectos jurídicos. Mais especificamente trata-se de
identificar e expor os mecanismos normativos à disposição do Poder Público para
promover o financiamento do setor a fim de alcançar a almejada universalização-
expansão dos serviços de saneamento e, consequentemente, o desenvolvimento
sustentável do país.
Com a edição da lei nº 11.445/2007 que estabelece diretrizes nacionais para
o saneamento básico, o setor ganhou regulamentação específica e uma política
nacional para a sua expansão, passando a englobar quatro conjuntos de serviços,
infraestruturas e instalações operacionais: sistema de abastecimento de água
potável, sistema de esgotamento sanitário, sistema de limpeza urbana e manejo de
resíduos sólidos e por fim, o sistema de drenagem e manejo das águas pluviais
urbanas. Restringiu-se a análise aos três primeiros segmentos.1
Ninguém olvida da importância do setor de saneamento básico para o
desenvolvimento sustentável do país, tanto com a criação e expansão de
infraestrutura voltada ao setor, como a prestação dos serviços em si.
Os dados do Censo 2010 divulgados pelo IBGE e pelo Sistema Nacional de
Saneamento Básico apontam que a maior carência do país na área de serviços
públicos e infraestrutura continua a ser em saneamento básico: apenas 55,4% dos
57,3 milhões de domicílios estavam ligados à rede geral de esgoto, outros 11,6%
utilizavam fossa séptica, forma de saneamento também considerada adequada pelo
instituto de pesquisa. A título de menção, os sistemas de abastecimento de água e
coleta e tratamento de esgotos são os dois primeiros itens que compõem o conjunto
dos serviços e obras de saneamento.2
1 CARVALHO, Vinícius Marques de. O Direito do Saneamento Básico, São Paulo: Quartier Latin,
2010, p.101. Para o autor as atividades de drenagem e manejo de águas pluviais, a rigor, não poderiam ser chamadas de serviço púbico no sentido técnico jurídico, principalmente porque a operação desse sistema envolve recursos e habilidades sensivelmente diferentes daquelas necessárias à operação do sistema de distribuição de água e coleta e tratamento de esgoto. 2 IBGE, Censo 2010. Disponível em <http://www.ibge.gov.br/censo2010saneamento>. Acesso em:
23/04/2012.
Não só no cenário nacional o tema é relevante, pois a universalização sob
uma perspectiva sustentável dos serviços de saneamento básico é também pauta
internacional das metas do milênio da ONU a serem atingidas pelos países
membros até o ano de 2015.
A intervenção estatal na economia deve ser analisada a partir da concepção
de uma Constituição Econômica no bojo da Constituição de 1988, assim a
determinação de planejamento e execução das políticas públicas para o setor de
saneamento ganha destaque e característica de compromisso nacional, garantindo-
se que a finalidade da intervenção estatal em uma economia capitalista leve o
desenvolvimento econômico a todos.
O atual modelo jurídico traçado de intervenção do Estado na economia já não
é mais aquele anterior que mais se prestava ao apadrinhamento servil de alguns
grupos oligárquicos do país, do que ao planejamento voltado ao desenvolvimento
integrado da Nação. A realização da Constituição Econômica traz o
comprometimento com efetivação das políticas públicas e a transformação da
realidade socioeconômica, através do alcance dos objetivos previstos no art. 3º da
Constituição de 1988.
Para chegar a essa conclusão foi preciso estudar detalhadamente o modelo
de fomento adotado com a intervenção do Estado na economia através de normas
de direção, com a regulação sistêmica e prudencial do sistema financeiro nacional
por meio da criação de um órgão e de uma autarquia específica, e das instituições
financeiras que compõem o sistema financeiro nacional.
Com ênfase nas normas de indução passa-se a analisar juridicamente o
fenômeno de fomento, suas origens, seu alcance, os mecanismos previstos para
concretização da atividade e a importância para o desenvolvimento específico do
setor de saneamento básico.
O setor de saneamento básico, em si, já necessita de altos investimentos em
infraestrutura e tecnologia principalmente no segmento relativo ao tratamento de
esgoto, mais ainda em um país de dimensões continentais como o Brasil
especialmente no que tange à expansão das obras de infraestrutura.
Diferentemente de outros setores como energia elétrica e transportes, o
financiamento do setor de saneamento, mesmo com crescente demanda pelos
serviços, diante da exigência de altos investimentos e retorno demorado não
desperta grande interesse na iniciativa privada.
Situação essa que justifica a intervenção do Estado no setor tanto com a
dispensa de tratamento jurídico da atividade na qualidade de serviço público, como
também na destinação específica de recursos através da atividade de fomento,
principalmente na modalidade de financiamentos diretos aos segmentos que
compõem o setor e por meio de recursos disponibilizados às instituições financeiras
de desenvolvimento, ou mesmo do aporte de recursos orçamentários do Tesouro
Nacional.
Sob esse aspecto ganha relevância o papel do Banco Nacional de
Desenvolvimento-BNDES, instituição financeira de desenvolvimento criada ainda na
década de 1950 com a finalidade de gerir fundos financeiro-contábeis e promover o
desenvolvimento de segmentos econômicos considerados estratégicos para o país,
principalmente no setor industrial.
Fez-se necessário o estudo detalhado do sistema financeiro nacional com a
identificação de uma figura comum nos países em desenvolvimento, a criação de
instituições financeiras voltadas a promover o crescimento econômico do país, com
destaque para o BNDES, com uma pesquisa orgânica detalhada de suas funções e
atribuições principalmente como órgão gestor dos fundos parafiscais de poupança
compulsória como o FGTS e o FAT.
O BNDES consolidou-se no cenário nacional como a principal instituição
financeira de desenvolvimento, principalmente após a edição da Constituição de
1988 que previu o aporte de recursos fixos de percentual do FAT- Constitucional, um
dos principais fundos parafiscais de poupança compulsória. Avaliou-se então se o
setor de saneamento básico ao mirar a universalização foi contemplado com a
destinação de recursos específicos da instituição financeira.
O estudo do setor de saneamento básico nacional comumente é dividido em
três ciclos, sendo que o primeiro ciclo engloba desde as primeiras obras de
infraestrutura financiadas pela iniciativa privada ainda no século XIX, prática comum
em outros setores que demandavam altos investimentos, como energia elétrica, por
exemplo.
O segundo período onde o segmento era tratado de modo integrado à
questão sanitária, passando pelo PLANASA na década de 1970, com a previsão de
aporte de recursos públicos para o setor, e mais recentemente, com a nova
regulamentação e previsão de uma política nacional para o setor, com a
promulgação da lei nº 11.445/2007.
Por fim, diante da inovadora legislação relativa a um dos segmentos dos
serviços de saneamento, com a instituição de uma política pública nacional para os
resíduos sólidos com a edição da lei nº 12.305/2010, ponderou-se um paradoxo bem
contemporâneo: a determinação legal de não geração e redução de resíduos versus
crescimento econômico, através da perspectiva realista de Cristiane Derani.3
Ao tratar da política nacional de resíduos sólidos a lei nº 12.305/2010
consagrou juridicamente a atividade de fomento. O legislador foi pródigo ao prever
incentivos e financiamentos aos vários atores envolvidos na execução do serviço
público como Estados, Municípios, indústrias de reciclagem e, principalmente, a
categoria dos catadores de materiais recicláveis, com a promoção ao associativismo.
3 DERANI, Cristiane. Direito Econômico Ambiental, São Paulo: Saraiva, 2008.
CAPÍTULO 1 - INTERVENÇÃO DO ESTADO BRASILEIRO SOBRE O DOMÍNIO
ECONÔMICO: A ATIVIDADE DE FOMENTO
1.1 A REALIZAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO ECONÔMICA
A Constituição de 1988 traz no artigo 1704 e seguintes as diretrizes de
intervenção do Estado Brasileiro no campo da Economia, ou na consagrada
expressão acadêmica, as normas que estabelecem uma Constituição Econômica.5
Mas não se pense que as normas constitucionais relativas à ordem
econômica tenham surgido magicamente no discurso dos bem intencionados
legisladores constituintes de 1988.
Ao contrário, a previsão e a positivação de normas de conteúdo econômico,
na tentativa de regulamentar minimamente o setor, desenhar o perfil
desenvolvimentista a ser seguido e trazer estabilidade e segurança jurídica às
relações de cunho econômico, fazem parte de um processo de evolução histórica.
Portanto a presença do Estado Brasileiro na economia não é nenhuma
novidade no país. Gastão Alves de Toledo6 analisando a atuação interventiva estatal
nesse setor narra episódios históricos anteriores à década de 1930, como o do
“protecionismo” para economia cafeeira no início do século XX, com o convênio de
Taubaté7 entre os Estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo, no qual se
4Título VII da Constituição de 1988, da Ordem Econômica e Financeira: Capítulo I – dos Princípios
Gerais da Atividade Econômica, Capítulo II - da Política Urbana, Capítulo III - da Política Agrícola e Fundiária e da Reforma Agrária e Capítulo IV- do Sistema Financeiro Nacional. 5 GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 14ª ed. São Paulo:
Malheiros, 2010, p.77. Para o autor a noção de Constituição Econômica ganhou corpo na doutrina alemã, no século XX, a partir da consideração do quanto disposto na Constituição de Weimar de 1919, com a adoção da ideologia do desenvolvimento impulsionado pelo Estado, a comparação entre o texto Constitucional Brasileiro atual e o texto da Constituição de Weimar, no que se refere à estrutura dos títulos e capítulos, guarda muitas similaridades. 6 TOLEDO, Gastão Alves. Direito Constitucional Econômico e sua Eficácia, São Paulo: Renovar,
2004, p. 93 e 128. O autor afirma que esse protecionismo passa a definir, na teoria econômica, o processo iniciado de intervenção que consistia em retirar do mercado mediante compra, certa quantidade de café reputada suficiente para manter um preço adequado pela consequente normalização da oferta e da procura. As parcelas do produto assim retiradas seriam posteriormente vendidas na medida em que se sucedessem safras menos volumosas, com o objetivo de manter o equilíbrio entre oferta e procura. 7 MANTEGA, Guido. Celso Furtado e o pensamento econômico brasileiro, Revista de Economia
Política, São Paulo, nº 9, outubro-dezembro de 1989. O autor afirma que o convênio de Taubaté,
estabeleceu uma política econômica de valorização artificial das safras agrícolas do
produto.
Alberto Venâncio Filho8 analisou detalhadamente a política econômica
intervencionista e protecionista do Estado para o setor agroexportador em sua obra,
exemplificando com a atuação estatal direcionada a incentivar diversos setores, ora
agrícolas ora extrativistas, por exemplo, segmentos econômico de café, açúcar,
trigo, erva-mate, pinho e sal.9
A intervenção estatal na economia nesse período da história brasileira não
consagrou uma política pública nacional voltada ao desenvolvimento econômico
geral do país, pois sempre esteve diretamente vinculada ao suprimento e à proteção
setorizada de interesses específicos de determinados grupos econômicos
detentores de riqueza, que procuravam se aproximar do Poder Público para utilizá-lo
exclusivamente a favor de interesses próprios.
A dependência de alguns setores da intervenção estatal para privilegiá-los
com medidas econômicas era patente, a regulação econômica do Estado se fez
sentir nesse período, com particular veemência, no comércio e na indústria.
assinado em 26/02/1906, entre os representantes dos Estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, nos tempos da então República Velha, representa expoente da política protecionista estatal direcionada ao setor cafeeiro e pode ser considerada como responsável pelo lançamento das bases da economia industrial brasileira. Na medida em que soube mobilizar em empreendimentos de envergadura os recursos disponíveis no país desde o início do século XIX, como as terras e a mão de obra criando um mercado de manufaturas na esteira da monetarização causada pela introdução da mão de obra livre e assalariada na economia cafeeira, esse mercado foi inicialmente alimentado pelas importações e gradativamente foi suprido pela produção local. Uma vez estabelecido um certo núcleo urbano industrial, ocupado nas atividades manufatureiras e demais serviços subsidiários da comercialização e exportação de café, que mobilizavam somas consideráveis, a industrialização passa a prosperar não apenas diante da acumulação cafeeira, mas principalmente em face das suas crises, devido sobretudo às políticas de valorização do café e suas consequências na economia brasileira. Os governos da época empenhados em defender os interesses das classes dominantes agroexportadores e em equilibrar o balanço de pagamento do país, enfrentavam a queda de preços internacionais do café, fazendo estoques reguladores ou depreciando o valor da moeda nacional, o que implicou na sustentação da renda e das atividades cafeeiras. 8VENÂNCIO FILHO, Alberto. A Intervenção do Estado no Domínio Econômico, Rio de
Janeiro:Renovar,1968. 9IDEM p.105, 167, 169 e 171, segundo o autor, o decreto estadual do Estado do Paraná, 28 de
02/12/1927 criou uma sobretaxa por quilo de erva mate exportado e a lei estadual nº 559 de 02/04/1929, conhecida como Lei Fontana, autorizava o Poder Executivo Estadual a criar um Instituto de Propaganda e Defesa da Erva-Mate. O Decreto-lei nº 3124 de 19/3/1994 criou o Instituto Nacional do Pinho. O Decreto lei nº 2300 de 10/06/1940 tratava de medidas protecionistas para a indústria do sal e na década de1930 é assinado decreto 20.401, adotando medidas para defesa da indústria e comércio de açúcar.
Praticamente tudo dependia do Governo, com autorizações, favores, tarifas
protecionistas e concessões.10
A farta legislação protecionista da época foi dirigida a incentivar setores
específicos sob o pretexto de intervenção do Estado na economia, contudo resta
claro que a verdadeira intenção política do Estado era de financiar ou incentivar,
através de mecanismos jurídicos, determinados segmentos sociais detentores de
poder econômico, mas sem visar o interesse público ou a pretensão de um
planejamento global destinado ao desenvolvimento articulado de todo país.
Em termos de normas constitucionais a primeira positivação relativa à
intervenção estatal na economia remonta à década de 1930. Contudo mesmo antes
da República, ainda na época do Império, na Carta de 1824 aparecem os primeiros
esboços de normas relativas à ordem econômica com uma previsão rudimentar de
livre iniciativa no art. 179, inc. XXIV e XXV e da garantia ao direito de propriedade no
inc. XXII.11
A Constituição de 1934 pode ser considerada a primeira “Constituição
Econômica do Brasil” ao trazer no capítulo IV, nos artigos 115 a 140, título referente
à Ordem Econômica e Social. Seu texto foi idealizado com inspiração em menor
escala na Constituição do México e na Constituição da República Espanhola de
1939, em maior escala na Constituição de Weimar de 1919.12
Em breve retrospecto histórico observamos na Constituição de 1937 a
presença de normas relativas à economia, mesmo outorgada em plena ditadura do
10
FAORO, Raimundo. Os Donos do Poder, Rio de Janeiro: Globo, 2001, versão digital. Disponível
em <http://www.4shared.com/get/4369973/72e22f42/raymundofaoro-osdonosdopoderdocrev.html>
Acesso em: 07/04/2012 11
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 14ª ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p.17. 12
BERCOVICI, Gilberto. Constituição Econômica e Desenvolvimento. São Paulo: Malheiros, 2005, p.47. O autor explica que a Constituição de Weimar era dividida em duas partes, uma versando sobre a organização do Estado e a outra sobre os direitos e deveres dos alemães. Nesta segunda parte estavam prescritos, ao lado dos direitos individuais, os direitos sociais, com seções dedicadas à educação, cultura e atividade econômica. Os direitos relativos à ordem econômica da referida Constituição estariam divididos em três níveis, o primeiro seria o nível relativo aos direitos fundamentais sociais e econômicos, como o direito ao trabalho e a sua proteção, previstos no art. 157 e 163, além do direito a assistência social, art. 161 e direito a sindicalização, art. 159. O segundo nível estaria representado pelas normas relativas ao controle da ordem econômica capitalista, como por exemplo, a garantia da função social da propriedade prevista no art. 153. Já o terceiro nível estaria revelado pelas normas que garantiriam a colaboração entre trabalhadores e empregadores, por meio de conselhos representativos, previsto no art. 165.
Estado Novo, a intervenção do Estado no domínio econômico mantinha nítido
caráter subsidiário e sua legitimidade estava vinculada ao suprimento das
deficiências da iniciativa privada e á coordenação dos fatores produtivos da
sociedade brasileira.13
A Constituição de 1946 nessa mesma esteira também trouxe nos artigos 145,
146 e 14814 regras específicas sobre a intervenção do Estado na economia.
Na Constituição de 1967 e a sua emenda de 1969, em época de regime de
exceção, a ordem econômica ganhou previsão sucinta no art. 157, com a elencação
de princípios como liberdade de iniciativa, valorização do trabalho, função social da
propriedade, desenvolvimento econômico e repressão ao abuso do poder
econômico.15
Examinando a ordem constitucional vigente à época é possível identificar os
instrumentos colocados à disposição do Estado para cumprimento de suas funções,
a fim de garantir a livre iniciativa e promover o desenvolvimento econômico as
competências constitucionais legislativas e materiais da União e dos Estados
Membros sobre a economia já demonstram o modelo estatal de intervenção que
passava a desenhar um perfil de promoção do desenvolvimento integrado do país:
(...) À União foi atribuído o controle administrativo da economia com a competência para fiscalização das operações de crédito, capitalização e seguros, prerrogativa de concessão de acesso a determinados setores, estabelecimento de monopólios de exploração direta de determinados serviços e produtos, ainda a competência legislativa de controle sobre a economia outorgada à União e, supletivamente, aos Estados-membros no que concerne à produção e consumo, estabelecimento de critérios de
13
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 10 de novembro de 1937. Disponível em <http.www.planalto.gov.br//cccivil>. Acesso em: 21/09/2011. No art. 135 era claro o papel da intervenção econômica do Estado, nesses termos: Na iniciativa individual, no poder de criação, de organização e de invenção do indivíduo, exercido nos limites do bem público, funda-se a riqueza e a prosperidade nacionais. A intervenção do Estado no domínio econômico só se legitima para suprir as deficiências da iniciativa individual e coordenar os fatores da produção, de maneira a evitar ou resolver seus conflitos e introduzir no jogo das competições individuais o pensamento dos interesses da Nação representados pelo Estado. A intervenção no domínio econômico poderá ser imediata e mediata, revestindo forma de controle, do estímulo ou da gestão direta”.grifo próprio. 14
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 18 de setembro de 1946. Disponível em <http.www.planalto.gov.br//cccivil>. Acesso em: 21/09/2011. O art.145 dispunha sobre os princípios da justiça social, liberdade de iniciativa, valorização do trabalho humano como norteadores da ordem econômica, o art. 146 trazia normas relativas a previsão específica sobre intervenção direta do Estado na economia através do regime de monopólio e no art. 148, regras sobre repressão ao abuso ao poder econômico. 15
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 15 de março de 1967. Disponível em <http.www.planalto.gov.br/qcccivl>. Acesso em: 23/09/2011.
economicidade na partição federativa das rendas públicas, na organização e exploração direta da atividade econômica pelo Estado e para preços dos serviços de empresas concessionárias de serviços públicos, adoção da figura jurídica da empresa pública e da sociedade de economia mista em alguns setores estratégicos, prerrogativa da intervenção do Estado na economia através de critérios de convívio mercadológico entre entidades econômicas públicas, concessionárias e privadas, estabelecimento de disposições sobre o desenvolvimento econômico, definição de competências exclusiva ou supletiva do Estado quanto à exploração da infraestrutura econômica, criação de meios de intervenção do Estado no mercado financeiro e de capitais visando o programa de desenvolvimento econômico, instituição de práticas extrafiscais objetivas pela adoção de critérios seletivos de produção, faculdade da União de instituir contribuições sobre a importação de produtos estrangeiros tendo em vista, dentre outros interesses o da intervenção no domínio econômico, estabelecimento de competência ao Poder Legislativo para apreciar a execução da política econômica, atribuição à União de competência para organizar e coordenar o Plano Econômico Nacional, atribuição ao Poder Legislativo de competência para dispor sobre planos e programas nacionais e regionais de desenvolvimento e estabelecer os respectivos orçamentos plurianuais de investimentos, instituir critérios de vinculação e aplicação de recursos orçamentários na execução de planos econômicos nacionais e regionais.
16
Ainda na década de 1960, em âmbito mundial, a intervenção estatal na
economia passa pela ótica do direito internacional dos direitos humanos que tem sua
fase convencionalmente identificada como uma fase legislativa17 agora os direitos
econômicos, sociais e culturais passam a ter previsão jurídica positivada, fazendo
parte de diversos tratados e declarações internacionais.
Nesse primeiro momento os instrumentos internacionais trazem uma previsão
programática de inserção formal dos direitos econômicos, sociais e culturais, já sua
eficácia concreta ou materialização demandará árdua tarefa para muito além do
mero formalismo, inclusive com a previsão de mecanismos jurídicos para sua
efetivação, e mesmo com a adoção de um núcleo sistemático com normas
específicas sobre intervenção estatal na economia.
16
CARVALHOSA, Modesto. Direito Econômico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1973, p.285. 17
WEISS, Carlos. Direitos Humanos Contemporâneos. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 34. A expressão “fase legislativa” do direito internacional dos direitos humanos é comum na doutrina, e se identifica com a positivação dos direitos econômicos em declarações e tratados após o ano de 1966, como por exemplo, o pacto internacional de direitos econômicos, sociais e culturais no âmbito da ONU, inicia-se uma discussão quanto à eficácia desses direitos, anteriormente os tratados e declarações previam apenas os direitos civis e políticos, é emblemático o texto do Pacto de San José da Costa Rica, ao trazer um único artigo sobre direitos econômicos, sociais e culturais, no art. 26, que compõe o capítulo III do Tratado, com referência aos direitos de desenvolvimento progressivo, nessas regras internacionais são considerados na categoria de direitos econômicos aqueles relacionados à produção, distribuição e consumo da riqueza, visando especialmente disciplinar as relações trabalhistas.
Pode-se considerar que houve uma evolução histórica, uma mudança de
paradigma na concepção dos direitos econômicos, que passam a ser vistos como
um reflexo subjetivo do modelo de intervenção do Estado na economia.
As normas relativas ao direito ao trabalho e a sua proteção, a garantia da livre
iniciativa por exemplo, expressam limites jurídicos ao Poder Econômico e passam a
ser concebidos sob uma perspectiva institucional, voltados ao resguardo do
interesse público, e não mais somente de alguns setores oligárquicos específicos
como as regras anteriores de intervenção estatal na economia.
As normas que regulamentam o direito econômico, trazendo os contornos da
intervenção estatal na economia, ganham maior importância e autonomia ao ponto
de integrarem um núcleo normativo específico dentro da Constituição denominado
por alguns autores de “Constituição Econômica”.
Vital Moreira identifica o surgimento do conceito de Constituição Econômica,
com a necessidade de previsão de um sistema jurídico-normativo delimitador do
sistema econômico:
“Ela (a constituição econômica) está fundamentalmente ligada ao fim da representação liberal da ordem natural do sistema econômico, e ao desencanto que esse fim provocou. A intervenção do Estado, tornada necessária, quebra aquela representação liberal e faz substituí-la por uma outra em que ao político se vão fazer exigências sobre o econômico. Essas exigências dão entrada no texto constitucional e é sobre esse sistema normativo programático de uma ordem econômica a realizar-se que vai se erigir o conceito de constituição econômica. Precisamente são os princípios, regras ou instituições jurídicas que “traduzem juridicamente” os elementos determinantes do econômico, isto é, uma determinada estrutura de relações de produção, são eles que hão de ser elevados à qualidade unificante do material jurídico-econômico, isto é, hão de construir a ordem econômica. As normas jurídicas portadoras do sistema econômico são, pois, o núcleo fundamental da constituição econômica.
18
Contudo a mera previsão constitucional de normas jurídicas instituidoras de
um sistema econômico, trazendo regras específicas de intervenção estatal na
economia bem como sua previsão em tratados de âmbito internacional, não
garantem por si só a implementação dos direitos subjetivos ou mesmo a
concretização do desenvolvimento que se quer ver na sociedade.
18
MOREIRA, Vital. Economia e Constituição: para o Conceito de Constituição Econômica. Coimbra: Editora Coimbra, 1979, p.57.
Pois a questão relativa à realização concreta do desenvolvimento e à
transformação social passa pela análise da eficácia das normas que tratam do
direito econômico.
A mera formalização constitucional, ou seja, a previsão de normas relativas
ao direito econômico com status constitucional e eficácia programática, não garante
por si só o desenvolvimento nacional tampouco a transformação social. De fato
somente com o surgimento do constitucionalismo social (Constituição Dirigente) em
que se procurará atribuir o máximo de eficácia através de instrumentos jurídicos19
que garantam a efetivação das normas da Constituição Econômica é que as
mudanças podem ocorrer.
A diferença portanto entre a concepção meramente formal de normas
relativas à ordem econômica no bojo da Constituição e a concepção dessas
mesmas regras como uma Constituição Econômica20 se refere à eficácia meramente
programática de suas normas, presente no primeiro caso.
A Constituição Econômica positiva tarefas e políticas a serem realizadas no
domínio social para atingir certos objetivos, sua característica essencial é a de
estabelecer normas diretivas, ou seja, uma constituição dirigente. Disposições
normativas sobre a economia sempre existiram nos textos constitucionais, mas a
concepção de uma Constituição Econômica traz mais que a previsão de meras
19
Instrumentos jurídicos que podem garantir o controle e a execução de políticas públicas, tanto por parte do legislador como do administrador público como por exemplo ação civil pública, a ação popular, a ação direta de inconstitucionalidade por omissão o mandado de injunção, a obrigação de prestar contas, controle de constitucionalidade das leis orçamentárias, etc. 20
BASTOS, Celso Ribeiro e MARTINS, Ives Gandra, Comentários à Constituição do Brasil, Saraiva: São Paulo, 1997. Para autores como Celso Ribeiro Bastos a sistematização da ordem econômica, não traz em si, necessariamente a autonomia especifica normativa de uma constituição econômica. Afirmam ainda que a expressão constituição econômica tornou-se doutrinariamente polêmica. Isso se deu em função da não coincidência das opiniões em torno da resposta à seguinte pergunta: existiria uma Constituição Econômica, da mesma forma que como existiria uma Constituição Social, uma Constituição Política. Os autores colocam que somente a partir deste século as Constituições passaram a conter dispositivos relativos à organização da economia, porém isso não autoriza a afirmação de que só então teria surgido uma Constituição Econômica, pois tão somente tornaram-se explícitas as normas relativas ao setor econômico. Contudo a previsão constitucional normativa especifica de normas relativas à ordem econômica não deve conduzir a afirmações ousadas no sentido de configuração de uma Constituição autônoma dentro do texto Constitucional. A Constituição econômica existiria sim, mas concebida como um sistema jurídico, tendo como critério unificador a regulação da economia, sem contudo possuir autonomia, pelo contrário só ganharia sentido e funcionalidade se embutida dentro da Constituição em sentido amplo.
normas, ela quer uma nova ordem econômica, quer alterar a ordem econômica
existente.21
Por certo que a eficácia das normas de cunho econômico positivadas no texto
constitucional demanda muito mais comprometimento político e social do que sua
mera positivação, contudo somadas e conjugadas à ideologia constitucional,
surgirão os instrumentos jurídicos que se encontram à disposição do legislador e do
administrador para implementar os objetivos sociais de desenvolvimento,
alvissareiramente trazidos, com tanta retórica no preâmbulo e no art. 3º da
Constituição de 1988.
O art. 3º da Constituição de 1988 indica, por assim dizer, uma conotação de
transformação da realidade social do país através da ordem constitucional,
implicando na obrigação do Estado de promover a transformação da estrutura
econômico-social ao prever a construção de uma sociedade justa e solidária, a
garantia do desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e a redução das
desigualdades sociais e regionais e o bem comum como os objetivos fundamentais
do País.22
Analisando o fenômeno da Constituição Econômica dentro do contexto
político de um país, autores como Américo Luís Martins da Silva distinguem as
noções de sistema econômico e regime econômico da noção de Constituição
Econômica, essa seria reservada ao aspecto jurídico-institucional das normas
constitucionais relativas à ordem econômica.23
Nesse sentido o sistema econômico seria o conjunto coerente de estruturas
econômicas, institucionais, jurídicas, sociais e mentais organizadas em vista de
assegurar a realização de certo número de objetivos de natureza econômica como o
equilíbrio, o desenvolvimento, o crescimento e a repartição de riquezas por toda a
sociedade. O regime econômico decorreria da organização econômica de um país,
que pode se caracterizar como um conjunto mais ou menos coerente de estruturas,
advindas da aplicação concreta do sistema econômico adotado e a Constituição
21
BERCOVICI, Constituição Econômica e Desenvolvimento, São Paulo: Malheiros, 2005, p.33-34. 22
Ibid., p.166. 23
SILVA, Américo Luís Martins da .A Ordem Constitucional Econômica, Rio de Janeiro:Lume Iuris, 1996.
Econômica, concebida como um conjunto de preceitos e instituições jurídicas que
garantindo os elementos definidores de um determinado sistema econômico,
instituem uma determinada forma de organização e funcionamento da economia
constituindo assim, uma determinada ordem econômica.
A par do dissenso doutrinário sobre a existência de uma Constituição
Econômica dentro do bojo da Constituição da República, ou não, a opção jurídica
pela nomenclatura deixa entrever nessa hipótese um maior grau de
comprometimento com a efetivação dos objetivos fundamentais da Constituição.24
1.2 INTERVENÇÃO ESTATAL NA ECONOMIA POR ABSORÇÃO OU
PARTICIPAÇÃO, DIREÇÃO E INDUÇÃO
O Estado contemporâneo Brasileiro é um Estado Democrático de Direito,
inserido em uma ordem econômico-produtiva capitalista. O modo de produção
desenvolvido é o modo de produção capitalista, explicitado e garantido pela
Constituição Federal. A economia de mercado é garantida constitucionalmente, pois
seus elementos formais estão resguardados na Constituição da República, na forma
de capitalismo social, previsto expressamente nos incisos do art. 5º e no art.170.25
A função do Estado na intervenção sobre o domínio econômico é a de
garantir a higidez e o crescimento de uma economia de mercado, através da
atividade normativa-legiferante, representada pelo Direito, concebido como
24
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988, 14. ed. São Paulo, Malheiros, 2010.p. 13,77-88. O autor afirma que a expressão “Constituição Econômica” equivalente a um conjunto amplo de normas voltadas a organização econômica por normas de caráter socioeconômico e de cunho diretivo, é uma noção ultrapassada, concluindo que a teorização da Constituição Econômica morreu. Exemplifica com a atual Lei Fundamental da Alemanha, que não contém senão uma Constituição Econômica implícita, não opera a consagração de um determinado sistema econômico, e as normas específicas relativas à ordem econômica não assumem caráter diretivo. Contudo o autor coloca que a contemplação de um conjunto de normas compreensivo de uma ordem econômica, ainda que como tal não formalmente referido, é expressiva de marcante transformação que afeta o direito, operada no momento em que deixa de meramente prestar-se à harmonização de conflitos e à legitimação do poder, passando a funcionar como instrumento de implementação de políticas públicas, grifo próprio. 25
DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico, São Paulo: Saraiva, 2008, p.08-09.
instituição e instrumento para conservação mútua da equação Estado-Economia de
Mercado Capitalista.26
Desse modo não há uma dicotomia Estado versus mercado, pois a função
estatal serve para regular a economia através da criação de mecanismos para
garantir a própria organização e manutenção de uma economia de mercado.27
Na manifestação de Eros Grau, durante a relatoria do julgamento da ADIN nº
3512-ES perante o Supremo Tribunal Federal, esse posicionamento de que a
autorregulação do mercado é um mito e de que a produção de mercado precisa do
Estado e do Direito é bem esclarecido:
“O fato é que, ao deixarmos a economia de mercado desenvolver-se de acordo com suas próprias leis, ela criaria grandes e permanentes males. “Por mais paradoxal que pareça – dizia Karl Poliany – não eram apenas os seres humanos e os recursos naturais que tinham que ser protegidos contra os efeitos devastadores do mercado autorregulável, mas também a própria organização da produção capitalista”. O mercado, nota ainda IRTI, é uma ordem, no sentido de regularidade e previsibilidade de comportamentos cujo funcionamento pressupõe a obediência, pelos agentes que nele atuam, de determinadas condutas. Essa uniformidade de condutas permite a cada um desses agentes desenvolver cálculos que irão informar as decisões a serem assumidas, de parte deles, no dinamismo do mercado. Ora, como o mercado é movido por interesses egoísticos- a busca pelo maior lucro possível - e a sua relação típica é a relação de intercâmbio, a expectativa daquela regularidade de comportamentos é que o constitui como uma ordem. E essa regularidade, que se pode assegurar somente na medida em que critérios subjetivos sejam substituídos por padrões objetivos de conduta – padrões definidos no direito posto pelo Estado - implica sempre a superação do individualismo próprio ao atuar dos agentes do Estado.
28
A função estatal de intervenção na economia, portanto, está a serviço da
manutenção da própria ordem econômica de produção capitalista, e não só como
coadjuvante na correção de eventuais falhas de mercado, mas também e
26
DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. São Paulo: Saraiva, 2008, p .205. Para a autora, o direito tem a função de garantir e reproduzir o sistema em que está inserido. Historicamente sua atuação adquire diferentes dimensões, passando de organizador da sociedade burguesa com o inicio do capitalismo para coordenador das relações Estado e sociedade civil, sequência da Revolução Francesa, atingido um papel constitutivo de relações para a solução de conflitos e finalmente, superando a dissociação Estado e sociedade civil e impondo a implementação de atividades para a integração social. 27
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 14ª ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p.19. A expressão “intervenção na economia” traz, às vezes, uma carga semântica equivocada, já que teria como pressuposto a concepção da existência de uma cisão entre Estado e sociedade civil, e o ato estatal de intervir teria a conotação de ingressar em campo estranho às atividades estatais, campo reservado pela ordem econômica e social à sociedade civil, ou seja, ao mercado. Ocorre que, como frisa o autor, família, sociedade civil e Estado são manifestações de uma mesma realidade, a realidade do homem se associando a outros homens. 28
Disponível em <http.www.stf.jus.br//adin3512>. Acesso em: 28/11/2011.
principalmente na atuação ativa como agente apto a corrigir as desigualdades e a
promover o desenvolvimento.
Ao Estado estariam reservadas, através do sistema jurídico, as funções de
garantir a existência e a continuidade das instituições, de complementar o mercado,
de substituí-lo quando necessário e ainda de promover compensações à sociedade
quando externalidades do processo de acumulação tiverem de ser contidas ou
corrigidas.
A função estatal de intervir na economia para constituir e preservar o modo de
produção capitalista pode ser reconhecida em quatro categorias, assim a atuação do
Estado pode ter função garantidora, de complementação, de substituição e de
compensação, como bem explica Eros Roberto Grau:
Na primeira função de garantir é possível observar que o Estado garante o sistema de direito civil, com as instituições básicas da propriedade e da liberdade de contratar; protege o sistema de mercado contra efeitos de mercado autodestrutíveis, limitando o poder econômico através de institutos jurídicos como o direito do trabalho, com a legislação antitruste, estabilização do sistema monetário. O Estado assegura ainda as premissas de produção dentro da economia global, assegurando a prestação de serviços públicos como educação, transporte e comunicação, promove a capacidade da economia nacional para competir internacionalmente, através da política comercial e aduaneira, e ainda o Estado se reproduz mediante a conservação da integridade nacional no exterior com meios militares e, no interior, mediante a eliminação paramilitar dos inimigos do sistema. Para a segunda função de complementar o mercado o Estado trata de criar um sistema jurídico adequado a novas formas de organização empresarial, de concorrência e de financiamento (por exemplo, através da criação de novas instituições no direito bancário e empresarial e da manipulação do sistema fiscal sem porém, conturbar a dinâmica do processo de acumulação. Para a terceira função de substituição, o Estado apresenta reação frente a debilidade das forças motrizes econômicas, reativa a fluência do processo de acumulação, que já não resta então, abandonado a sua própria dinâmica, criando novas situações econômicas (seja proporcionando ou melhorando possibilidades de inversão-demanda estatal de bens de uso improdutivo, seja através da criação de novas formas de produção de mais valia, organização estatal do progresso técnico-científico, qualificação profissional dos trabalhadores, aí a afetação do princípio de organização da sociedade, como o demonstra o surgimento do setor público estranho ao sistema. Finalmente, o Estado procura compensar as disfunções do processo de acumulação, que se manifestam no seio de certas parcelas do capital, da classe operária o de outros grupos organizados, produtoras de reações que se procuram impor pelas vias políticas. Aí o Estado por um lado, assume efeitos externos da economia privada- v.g., danos ecológicos; assegura, através de políticas estruturais, a capacidade de sobrevivência de setores ameaçados -v.g., mineração e economia agrícola; e de outro lado, implementa regulações e intervenções reclamadas pelos sindicatos e pelos partidos reformistas, tendo em vista a
melhoria da situação social dos trabalhadores- os “gastos sociais” e o “consumo social”.
29
Nesse sentido o Estado passa também a garantir direitos e a intervir na
economia através da prestação de serviços públicos, em lugar da identificação
conservadora da função estatal passiva de garantir apenas a livre iniciativa e coibir
os abusos no setor concorrencial.30
A partir da previsão das disposições relativas à intervenção estatal na
economia no título da ordem econômica na Constituição de 1988 através das quatro
categorias identificadas, quais sejam função de garantir, complementar, substituir e
de compensar, é possível distinguir duas grandes formas de o Estado brasileiro
intervir na economia: a intervenção prestacional e a intervenção não prestacional, na
primeira a atuação se dá “sobre o domínio econômico” e na segunda “no domínio
econômico”.
Na atuação prestacional o Estado intervém na economia diretamente através
da exploração de uma atividade econômica, já na atuação não prestacional o Estado
atuará sobre a atividade econômica não desenvolvendo ele próprio,qualquer
atividade direta de cunho econômico.
Dessa classificação pode-se extrair três modalidades de intervenção do
Estado na economia: intervenção por absorção ou participação, por direção e por
indução.31
Nas hipóteses em que a Constituição prevê que o Estado deve intervir no
domínio econômico diretamente, como agente ou sujeito econômico, tem-se a
intervenção por absorção ou participação. Nas palavras de Eros Roberto Grau:
29
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988, 14ª ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p.18. 30
OLIVEIRA, Francisco. O Surgimento do antivalor: capital, força de trabalho e fundo público, Novos Estudos, CEPRAP, nº 22. Brasília, 1998. 31
GRAU, Eros Roberto. A Ordem ... p.. 68 e 90. A previsão da ordem econômica na Constituição de 1988 é identificada pelo autor como mundo do ser, dado o caráter jurídico e não econômico da abordagem, eis que a ordem econômica é uma parcela da ordem jurídica. Na intervenção por absorção as normas jurídicas preveem que o Estado intervenha no domínio econômico, desenvolvendo ações como sujeito econômico. Na intervenção por direção ou indução o Estado intervirá sobre o domínio econômico, desenvolvendo sua ação como regulador ou indutor de determinada atividade econômica.
“(...) quando o faz por absorção, o Estado assume integralmente o controle dos meios de produção ou troca em determinado setor da atividade econômica em sentido estrito; atua em regime de monopólio”. É possível diferenciar a atuação interventiva estatal direta no campo da atividade econômica em sentido estrito, em intervenção por absorção e intervenção por participação. Na atuação por absorção o Estado assume integralmente o controle dos meios de produção, já na intervenção por participação, o Estado assume o controle de parcela dos meios de produção ou troca em determinado setor da atividade econômica em sentido estrito, atua em regime de competição com empresas privadas que permanecem a exercitar suas atividades nesse mesmo setor.
32 Grifo próprio.
A atuação estatal direta na economia por absorção pode ser também
classificada em três modalidades: a atuação por absorção exclusiva, a atuação por
absorção completa e atuação por absorção parcial. A atuação estatal direta por
participação também pode ser objeto de classificação, em atuação direta por
participação concorrencial e atuação direta por participação impositiva:
“Exclusiva é a exploração estatal de toda uma atividade por completo, e não apenas um segmento ou parte da atividade, a qual normalmente é instrumentalizada pela nacionalização, estatização ou socialização de determinada atividade. Na exploração completa a exploração estatal é equivalente a monopolização ou o privilégio exclusivo de determinado segmento da atividade, não se tratando de uma completa atividade, mas sim de um segmento inteiro dentro de uma atividade. Já a exploração por absorção parcial, é a reserva de mercado de determinada parte do segmento de certa atividade econômica. Já na forma participativa, o Estado intervém de duas formas: em regime de competição com empresas privadas travando uma disputa em determinado setor, é a participação concorrencial, ou por uma imposição constitucional-legal, atuando em determinada atividade paralelamente com a iniciativa privada, é a participação impositiva”.
33
Na Constituição de 1988 no artigo 17734, tem-se exemplo de norma de
intervenção direta na economia por absorção, tratando-se de hipótese de monopólio
32
GRAU, Eros Roberto. A Ordem . . . p.147-148. 33
SADDY, André. Atividade não prestacional do Estado na economia e as distintas funções regulatórias (normativa, política, jurisdicional e administrativa). Boletim de Direito Administrativo: NDJ, nº11, novembro de 2012. 34
Art. 177. Constituem monopólio da União: I- A pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos
fluídos; II- A refinação do petróleo nacional ou estrangeiro; III- A importação e exportação dos produtos e derivados básicos resultantes das atividades
previstas nos incisos anteriores; IV- O transporte marítimo do petróleo bruto de origem nacional ou de derivados básicos de
petróleo produzidos no país, bem assim o transporte, por meio de conduto, de petróleo bruto, seus derivados e gás natural de qualquer origem;
V- A pesquisa, a lavra, o enriquecimento, o reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios e minerais nucleares e seus derivados, com exceção dos radioisótopos cuja produção, comercialização e utilização poderão ser autorizadas sob regime de permissão, conforme as alíneas b e c do inciso XXIII do caput do art. 21 desta Constituição Federal.
da União. Há uma presunção constitucional de interesse público ou segurança
nacional a legitimar a atuação do Ente Público diretamente no domínio econômico
nas atividades elencadas em regime de monopolização ou privilégio exclusivo.35
Já quando o Estado intervém no domínio econômico através das normas de
participação, a atuação se dá sob o mesmo regime de direito privado destinado às
empresas privadas, sem privilégios decorrentes de seu status, a fim de não
comprometer a livre concorrência nos termos do art. 173, parágrafo 1º, inc. II da
Constituição de 1988.36
Na forma de intervenção estatal na economia não prestacional o Estado
intervirá sobre o domínio econômico através da edição de normas de direção e
indução.
Nessas duas formas de intervenção estatal por direção e indução,
diferentemente da intervenção estatal direta por absorção ou por participação, o
Estado apenas regula, orienta ou direciona a atividade econômica de relevante
interesse social através da função normativa e regulatória da atividade econômica
que encontra fundamento expresso no caput do art. 174 da Constituição de 1988.37
É possível diferenciar ainda as normas relativas à intervenção estatal na
economia por direção das normas relativas à intervenção por indução, com base no
critério relativo à cogência, ou seja, as normas de direção têm observância
obrigatória pelos agentes econômicos, o Estado exerce o controle da economia
moldando determinados comportamentos desejáveis dos sujeitos econômicos:
35
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988, São Paulo, Malheiros, 2010, p.151. A Constituição Federal de 1988 adota os termos “atividade econômica” em dois sentidos diversos. Em alguns dispositivos, o texto constitucional refere-se à atividade econômica em sentido estrito (art. 173, caput), mas em outras ocasiões, alude à atividade econômica em sentido amplo, gênero que abrange atividade econômica em sentido estrito e serviços públicos. 36
Art. 173. Ressalvados os casos previstos nessa Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos de segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. Parágrafo 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: (...) II- a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários; 37
Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.
Nas normas por direção o Estado exerce pressão sobre à economia estabelecendo mecanismos e normas de comportamento compulsório para os sujeitos da atividade econômica em sentido estrito. Nas normas de intervenção na economia por direção temos a atividade regulatória como uma função típica da Administração Pública, e tem sua gênese no poder de polícia administrativa estamos diante de comandos imperativos dotados de cogência, impositivos de certos comportamentos a serem necessariamente cumpridos pelos agentes que atuam no campo da atividade econômica.
38
Já quando se observa o fenômeno relativo à intervenção estatal por indução a
cogência das normas regulatórias é substituída pela natureza dispositiva, procura-se
estimular ou incentivar determinados segmentos da economia considerados de
interesse público para a coletividade:
No caso das normas de intervenção por indução defrontamo-nos com preceitos que, embora prescritivos (deônticos), não são dotados da mesma carga de cogência que afeta as normas de intervenção por direção. Trata-se de normas dispositivas. Não, contudo, no sentido de suprir a vontade dos seus destinatários, porém na dicção de Modesto Carvalhosa, no de “levá-lo a uma opção econômica de interesse coletivo e social que transcende os limites do querer individual”. Nelas, a sanção tradicionalmente manifestada pelo comando é substituída pelo expediente do convite, ou como averba Washington Peluso Albino de Souza, de incitações, dos estímulos, dos incentivos de toda ordem, oferecidos pela lei a quem participe de determinada atividade de interesse geral e patrocinada ou não, pelo Estado. Ao destinatário da norma resta aberta a alternativa de não se deixar por ela seduzir, deixando de aderir à prescrição nela veiculada. Se adesão a ela manifestar, no entanto, resultará juridicamente vinculado por prescrições que correspondem aos benefícios usufruídos em decorrência dessa adesão. Penetramos aí no universo do direito premial. A sedução à adesão ao comportamento sugerido é, todavia, extremamente vigorosa, dado que os agentes econômicos por ela não atingidos passam a ocupar posição desprivilegiada nos mercados. Seus concorrentes gozam, porque aderiram a esse comportamento, de uma situação de donatário de determinado bem (redução ou isenção de tributo, preferência a obtenção de credito, subsídio, v.g) o que lhes confere melhores condições de participação naqueles mesmos mercados.Dois aspectos devo no entanto, ainda pontualizar. O primeiro respeita ao fato de nem sempre a indução manifestar-se em termos positivos. Também há normas de intervenção por indução quando o Estado, v.g. onera por imposto elevado o exercício de determinado comportamento, tal como no caso da importação de determinados bens. A indução então é negativa. A norma não proíbe a importação desses bens, mas a onera de tal sorte que ela se torna economicamente proibitiva. O segundo aspecto, ao fato de que outras tantas vezes determinados comportamentos econômicos são induzidos não em razão da dinamização, pelo Estado, de normas de intervenção por indução, mas sim em decorrência da execução por ele, de obras e serviços públicos de infraestrutura que tendem a otimizar o exercício da atividade econômica em sentido estrito em certos setores e regiões. Essa prática, de resto, é que
38
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988, 14ª ed. São Paulo: Malheiros, 2010,p.145.
também, inúmeras vezes, permite ao Estado, nos quadrantes da legalidade, pôr-se a serviço de interesses privados.
39
Portanto, as disposições constitucionais relativas à ordem econômica trazem
normas de intervenção do Estado na economia das três modalidades: absorção e
participação, direção e indução, desenhando os contornos do atual Estado Brasileiro
de Direito Social e Democrático.40
Não se erra ao afirmar que os contornos atuais do Estado, principalmente
após as emendas constitucionais da década de 1990, que desestatizaram vários
serviços públicos ou de utilidade pública, superaram a dicotomia Estado de bem-
estar social versus Estado liberal traçando um perfil estatal que privilegia a
intervenção estatal na economia através da forma não prestacional, pela edição de
normas de direção e indução.
Nessa mesma década de 1990, em que se identifica o fenômeno da reforma
do Estado e da Administração Pública41 consolidou-se a tendência de diminuição da
intervenção estatal direta na economia por absorção ou participação, vários serviços
públicos ou de interesse público, passaram a ser prestados por concessionárias de
serviços públicos em regime de direito privado.
39
Ibid., p.149. 40
MEDAUAR,Odete. O Direito Administrativo em Evolução, 2ª. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003,p.49. 41
BRASIL. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado-MARE, 1995. Disponível em <http.www.mare.gov.br>//marcoreformadoestado. Acesso em: 28/06/2011. A reforma do Estado tem como marco o ano de 1995, a Emenda Constitucional nº05/1995 possibilitou aos Estados concederem às empresas privadas a exploração dos serviços públicos de distribuição de gás encanado; A EC nº06/1995, suprimiu o art. 171 da Constituição que diferenciava as empresas brasileiras e as empresas brasileiras de capital nacional, em que estas possuíam benefícios e privilégios, não extensíveis àquelas, e alterou ainda o art. 176 para admitir a pesquisa e lavra de recursos minerais e aproveitamento dos potenciais de energia hidráulica mediante autorização ou concessão da União, no interesse nacional, por empresas com sede e administração no Brasil, mas sem a exigência de controle do capital nacional; A Emenda Constitucional nº08/1995, alterou o inciso XI e a alínea a do inciso XII do art. 21 da Constituição Federal; A Emenda Constitucional nº09/1995 facultou à União a contratação de empresas privadas para desempenhas as atividades de pesquisa e lavra de jazidas de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos, a refinação de petróleo nacional ou estrangeiro, a importação, exportação e transportes dos produtos e derivados de petróleo; A Emenda Constitucional nº19/1998, em que se almejou, em especial, atingir o princípio da eficiência, com redução do tamanho da máquina pública que a essa altura mostrava-se ineficiente para suprir serviços de interesse público, como por exemplo, o serviço de telefonia e energia elétrica. Em termos de legislação infraconstitucional, foi promulgada a lei nº 8.031/1990, que instituiu o Programa Nacional de Desestatização e dá outras providências e a lei nº 8.987/1995, que dispõe sobre regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos previstos no art. 175 da Constituição e dá outras providências.
O Estado passa a intervir mais para assegurar as premissas de produção
dentro da ordem econômica e implementar medidas regulatórias42 na economia,
agregando o princípio da eficiência entre as normas relativas à Administração
Pública e ainda traçando regras sobre controle de despesas e finanças públicas.
Para alguns autores esse período de reforma do Estado e da Administração
Pública brasileira pode ser compreendido em duas etapas: a primeira visou
racionalizar os recursos fiscais, sendo direcionada para a abertura de mercados,
desregularização e privatização, tendo como principal executor o governo federal.
A segunda etapa teve como objetivo a construção e reconstrução da estrutura
administrativa e institucional do Estado, na busca do aumento da capacidade
administrativa para o exercício da governabilidade e a busca de instrumentos
voltados à melhoria dos serviços públicos.
Nesse contexto passa a ter lugar no cenário jurídico brasileiro a figura das
agências reguladoras, consideradas como autarquias de regime especial destinadas
a regular prestação de serviços públicos e setores específicos da economia com
maior autonomia de gestão e técnica, do que a conferida à figura tradicional das
autarquias.
A figura das agências reguladoras, a própria reforma do Estado e da
Administração Pública com o crescimento da intervenção estatal na economia
através das normas de direção é consequência do processo pelo qual todos os
países capitalistas passaram, e embora seu conceito não seja estritamente
jurídico43, convencionou-se chamar de globalização da economia mundial:
A abertura da economia, com a extinção e a flexibilização de monopólios, o fim das restrições ao capital estrangeiro em setores relevantes, os programas de desestatização dos quais decorrem privatizações,
42
DI PIETRO, Maria Silvia Zanella. Parcerias na Administração Pública, São Paulo: Atlas, 2011, p.197. A autora encontra dois sentidos para a palavra “regulação”, um como sinônimo de regulamentação e outro como um novo tipo de direito. Nessa última hipótese, trata-se de direito resultante de negociação, de consenso, de participação dos interessados. 43
MENDES, Conrado Hubener. SUNDFELD, Carlos Ari. (Coord.). Direito Administrativo Econômico, São Paulo: Malheiros, 2006. O autor alerta que o termo globalização costuma não ser bem visto, especialmente entre juristas, porque a dogmática jurídica superestima a segurança das normas postas em prejuízo da realidade social. O termo globalização tem uma alta carga de indeterminação semântica, com significados diversos nas várias ciências do conhecimento humano, como na política, na cultura, na economia, preferindo-se a expressão reforma do Estado por entendê-la mais objetiva.
concessões, permissões, terceirizações e outras parcerias abrem espaço a novos negócios. Por esta última via, também se substituiu a intervenção monopolística ou concorrencial do estado no setor privado pela intervenção regulatória, a cargo de colegiados técnicos denominados agências reguladoras, que exercem a modelagem e o controle não politizados da eficiência do setor privado em segmentos relevantes.
44
A intervenção estatal através da função regulatória representa “a pedra de
toque” do novo modelo de intervenção pública na economia e nos mercados,
surgindo como instrumento por excelência de efetivação da responsabilidade do
Estado de garantir e assegurar a realização do interesse público e da proteção de
grupos mais vulneráveis e até mesmo, a realização dos direitos dos cidadãos.45
A responsabilidade pública na função regulatória comprova, por conseguinte,
que o Estado continua a ser portador de uma relevante e indeclinável missão a se
desenvolver na economia e em geral nas atividades privadas sem contudo, olvidar
que a intervenção estatal prestacional por absorção completa ou parcial, bem como
a intervenção estatal por participação concorrencial ou impositiva, subsiste
principalmente em setores estratégicos para o desenvolvimento do país, ou nos
quais o interesse público recomende a maior intervenção estatal.
O Estado brasileiro contemporâneo tem, portanto, características de Estado
regulador, incitador e subsidiário46 nesse sentido especificamente, as características
relativas à atuação estatal de incitar e fomentar a economia e, por conseguinte, as
normas referentes à intervenção estatal por indução serão analisadas com detença
a seguir.
44
SOUTO, Marcos Juruena Villela. Desestatização, Privatização, Concessões, Terceirizações e Regulação. Rio de Janeiro: Lumen Iuris, 2001, p.245. 45
GONÇALVES, Pedro. Direito Administrativo da Regulação. In MIRANDA, Jorge (Coord.). Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Marcello Caetano: No Centenário de seu Nascimento. Coimbra:Editora Coimbra, 2006. 46
MEDAUAR, Odete. O Direito Administrativo em Evolução. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.
1.3 NORMAS DE INDUÇÃO E A ATIVIDADE DE FOMENTO
A previsão de normas relativas ao fomento não é novidade nas Constituições
brasileiras.47 Nos mesmos moldes do exposto a respeito das normas relativas ao
que se convencionou chamar de Constituição Econômica remontarem à Constituição
de 1934, o art. 117 do seu texto já determinava que coubesse à lei regular o fomento
do crédito e da economia popular.
Luís Jordana de Pozas aponta ainda no século XVI, no reinado de Pedro de
Valencia, o uso de prêmios para incentivar determinadas condutas convenientes ao
interesse público:
En pleno siglo XVI, Pedro de Valencia emplea en varios de sus escritos a frase “premios y premios” para comprender sumariamente los dos modos que El Rey tiene de lograr que los súbditos obren como conviene al bien público. Más tarde, los monarcas absolutos templan siempre que pueden el uso de muchos de los medios que más adelante vamos a encontrar en nuestro derecho presente.”
48
Para Celia Cunha Mello na história econômica mundial é possível identificar
várias hipóteses de “embriões” das regras atuais de fomento que seriam normas
primitivas de indução, como bem aponta, com suas primeiras manifestações já na
Idade Média, ao prever vantagens de natureza honorífica ou premial a determinados
setores da sociedade.
Trata-se de uma forma absolutista de fomento. Apesar de estar presente a
finalidade incentivadora e promocional, esse comportamento não pode ser
considerado como atividade administrativa de fomento, porquanto a atividade
administrativa só pode ser concebida a partir do momento em que haja uma
desvinculação entre o Estado e a pessoa do príncipe além da submissão de toda a
organização estatal ao “império” da lei. De fato a aparição da administração
47
GRAU, Eros Roberto, A Ordem Econômica na Constituição de 1988, 14ª ed. São Paulo: Malheiros, 2010. O autor aponta na Itália com a Carta Del Lavoro, a inspiração para as normas indutivas de intervenção do Estado na economia, na modalidade encorajamento (fomento). 48
POZAS, Luís Jordana. Ensayo de una teoria del fomento em el derecho administrativo. Revista de Estudos Políticos, Madrid, 1949.
personificada e a primazia da lei surgem apenas com o advento do Estado de
Direito.49
A expressão semântica “fomento” tem o significado de proporcionar os meios
para o desenvolvimento de algo, sob a acepção jurídica. A origem etimológica da
expressão é oriunda do latim fomentum, contração de fovimentum, que significa
acalentar, abrigar.50
Escassa é a doutrina nacional sobre o assunto, a evidenciar que o tema
merece maior atenção dos autores nacionais apesar disso, a própria Constituição foi
pródiga em, expressa ou implicitamente, aludir à intervenção estatal na economia
através da prática indutiva.
Em textos de lei ordinária antes mesmo da Constituição de 1988 a figura do
fomento aparece na lei nº 4320/1964 que traz as diretrizes sobre orçamento público,
ainda na década de 1960, identificada com a figura das subvenções.51
Na Constituição de 1988, entre previsões explícitas da expressão fomento e
de expressões com significado similar observa-se o contido no art. 23, inc. VIII, ao
49
MELLO, Célia Cunha. Fomento da Administração Pública, Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p.18 50
Ibid., p.22. 51
Art. 12 ( . . .) parágrafo 3º. Consideram-se subvenções, para os efeitos desta lei, as transferências destinadas a cobrir despesas de custeio das entidades beneficiadas, distinguindo-se como: I - subvenções sociais, as que se destinam a instituições públicas ou privadas de caráter assistencial ou cultural, sem finalidade lucrativa; II - subvenções econômicas, as que se destinem a empresas públicas ou privadas de caráter industrial, comercial, agrícola ou pastoril. Art. 16. Fundamentalmente e nos limites das possibilidades financeiras a concessão de subvenções sociais visará a prestação de serviços essenciais de assistência social, médica e educacional, sempre que a suplementação de recursos de origem privada aplicados a esses objetivos, revelar-se mais econômica. Parágrafo único. O valor das subvenções, sempre que possível, será calculado com base em unidades de serviços efetivamente prestados ou postos à disposição dos interessados obedecidos os padrões mínimos de eficiência prèviamente fixados. Art. 17. Somente à instituição cujas condições de funcionamento forem julgadas satisfatórias pelos órgãos oficiais de fiscalização serão concedidas subvenções. Art. 18. A cobertura dos déficits de manutenção das empresas públicas, de natureza autárquica ou não, far-se-á mediante subvenções econômicas expressamente incluídas nas despesas correntes do orçamento da União, do Estado, do Município ou do Distrito Federal. Parágrafo único. Consideram-se, igualmente, como subvenções econômicas: a) as dotações destinadas a cobrir a diferença entre os preços de mercado e os preços de revenda, pelo Governo, de gêneros alimentícios ou outros materiais; b) as dotações destinadas ao pagamento de bonificações a produtores de determinados gêneros ou materiais. Art. 19. A Lei de Orçamento não consignará ajuda financeira, a qualquer título, a empresa de fins lucrativos, salvo quando se tratar de subvenções cuja concessão tenha sido expressamente autorizada em lei especial.
afirmar-se que é competência administrativa comum da União, dos Estados e dos
Municípios fomentar a produção agropecuária.
Sem a evidência solar da expressão fomento, porém com o mesmo propósito
de intervir na economia visando induzir determinados comportamentos à iniciativa
privada com a finalidade de reduzir as desigualdades regionais52 o Constituinte
determinou no parágrafo 2º do art. 43 da Constituição, que a União instituirá
incentivos regionais que compreenderão entre outros a igualdade de tarifas, fretes,
seguros e outros itens de custos e preços de responsabilidade do Poder Público, a
instituição de juros favorecidos para financiamento de atividades prioritárias, a
instituição de isenções, reduções ou deferimentos temporários de tributos federais
devidos por pessoas físicas ou jurídicas, além da prioridade para o aproveitamento
econômico e social dos rios e das massas de água represadas ou represáveis nas
regiões de baixa renda, com o incentivo à recuperação dessas áreas.
Nesse mesmo sentido, a fim de garantir o desenvolvimento e reduzir as
desigualdades regionais o art. 151, I, in fine, acentua que a União com a finalidade
de promover o desenvolvimento regional, deverá implantar e desenvolver
instrumentos fiscais de fomento.
No art. 165, parágrafo segundo, no capítulo referente às finanças públicas da
Constituição de 1988, ao dispor sobre o conteúdo da lei anual de diretrizes
orçamentárias há determinação dirigida aos Entes Públicos para inclusão na lei
orçamentária anual de cada Ente, os recursos financeiros necessários à execução
orçamentária destinados a “aplicação nas agências financeiras oficiais de fomento”.
Mais um exemplo de previsão constitucional de fomento vem com o
tratamento jurídico privilegiado destinado às pequenas e médias empresas, previsto
no art. 179 da Constituição, em evidente técnica de fomento jurídico. Criou-se um
estatuto com a consolidação das normas gerais relativas ao tratamento diferenciado
e favorecido, as pequenas empresas, atualmente regulamentado pela lei
complementar nº 123/2006.
52
Lei complementar nº 124/ 2007 cria a SUDAM e dá outras providências, lei complementar nº 125/ 2007, cria a SUDENE e dá outras providências, lei complementar nº 129/2009, cria a SUDECO e dá outras providências e lei complementar nº 134/2010, cria a SUFRAMA e dá outras providências. Disponível em <http.www.planalto.gov.br>. Acesso em: 18/01/2012.
Nos artigos relativos à ordem social, cultura e desporto, no art. 216, parágrafo
terceiro, o Estado deve “criar incentivos para a produção e conhecimento de bens e
de valores culturais por meio de lei”. A fim de promover o setor cultural, o parágrafo
sexto faculta ainda aos Estados e Municípios, vinculação de receita tributária aos
fundos de incentivo à cultura.
Ao referir-se aos desportos, o art. 217 da Constituição também traz
disposição relativa ao fomento do setor ao explicitar: “é dever do estado fomentar
práticas esportivas formais e não formais”.
Quando dispõe sobre ciência e tecnologia, no art. 218, parágrafo 3º, o “Estado
apoiará a formação de mão de obra nas áreas de ciência, pesquisa e tecnologia,
concedendo aos que a ela se dedicarem, condições especiais de trabalho”,
afirmando em seguida que “a lei incentivará empresas que invistam na pesquisa e
criação de tecnologia adequada ao país”.
Como se pode conferir, a Constituição de 1988 prodigamente utilizou-se de
expressões com conotação de indução, de fomento, como “incentivo”, “apoio”,
“estímulo”, “financiamento”, “tratamento diferenciado”, quando previu a função
administrativa de fomento, como forma de intervenção estatal em diversos setores
da economia.
Procurou-se identificar, casuisticamente, na Constituição de 1988 inúmeros
dispositivos sobre o tema, contudo é importante buscar uma definição doutrinária de
fomento, e encontramo-la em Luís Jordana Pozas:
Para lograr la satisfacción de las necesidades generales (frase equivalente a la del buen orden de la cosa pública) se utilizan una gran variedad de medios, que pueden agruparse en cuatro grupos o modos: legislación, policía, fomento y servicio público. […] La acción de fomento es una media entre la inhibición y El intervencionismo del Estado, que pretende conciliar La libertad con El bien un mediante La influencia indirecta sobre la voluntad Del individuo para que quiera lo que conviene para La satisfacción de La necesidad publica de que se trate. Podríamos definirla como la acción del la Administración encaminada a proteger o promover aquellas actividades, establecimientos o riqueza debidos a los particulares y que satisfacen necesidades públicas o se estiman de utilidades generales, sin usar de la coacción ni crear servicios públicos. Por consiguiente, el fomento se distingue perfectamente de la policía y del servicio público. Se distingue de la policía en que, mientras esta previene y reprime, el fomento protege y promueve, sin hacer uso de la coacción. Y se diferencia
del servicio público en que la Administración, con esa modalidad, realiza directamente y con sus propios medios el fin perseguido, mientras que en el fomento se limita a estimular a los particulares para que sean ellos los que, por su propia voluntad, desarrollando una actividad determinada, cumplan indirectamente el fin que la Administración persigue.
53
Para o autor a busca da realização do interesse público é finalidade máxima
do Estado, que tem, para isso à sua disposição uma generalidade de instrumentos
através da função administrativa, entre eles a atividade de fomento, destacando-a do
poder de polícia e do serviço público.
A principal diferença relativa à caracterização do fomento como atividade
administrativa estancada do poder de polícia é justamente a ausência dos elementos
materiais que caracterizam a atuação administrativa deste poder principalmente a
coercitividade estatal. A relação surgida em decorrência da norma indutiva não é
verticalizada como ocorre no exercício do poder de polícia do Estado.
A previsão doutrinária de outra função administrativa, além do poder de
polícia e dos serviços públicos, é pouco comum no direito administrativo brasileiro, à
exceção de uns poucos autores.54
Comumente a estrutura do estudo do direito administrativo brasileiro
apresenta como praxe a abordagem do tema relativo aos serviços públicos e ao
poder de polícia, incomum, portanto, encontrar o estudo destacado e autônomo da
atividade administrativa de fomento.
Mas ao que tudo indica, não é só a doutrina nacional que se ressente da
omissão quanto ao tratamento jurídico da atividade de fomento, são várias as
dificuldades para a submissão da atividade de fomento público ao mundo do direito,
como bem aponta José Vicente Santos Mendonça:
O primeiro entrave estaria justamente na questão abordada com relação à ausência de coercibilidade tão presente no exercício do poder de polícia administrativo, a problemática jurídica do fomento escapa ao binômio autoridade-liberdade, típico do direito público clássico, tratando-se de uma
53
POZAS, Luís Jordana. Ensayo de uma teoria . . . p. 22. 54
SUNDFIELD, Carlos Ari. Direito Administrativo Econômico, São Paulo, Malheiros: 2006. O autor propõe uma divisão moderna do direito administrativo: direito administrativo ordenador, que cuida dos limites e obrigações da sociedade e do indivíduo perante os demais e o Poder Público, o direito administrativo prestacional, envolvendo as ações concretas desenvolvidas pelo Estado para a sociedade, e o direito administrativo fomentador, pelo qual o Estado incentiva o desenvolvimento das atividades privadas de interesse geral.
sistemática de aplicação de privilégios direcionados aos agentes econômicos, não há uma relação autoridade-administrado, como no poder de polícia, logo as ferramentas publicísticas comuns, por vezes não se adéquam à aplicação do instituto. Em outro aspecto, na atividade de fomento a linha de separação entre o jurídico e o meta-jurídico não seria muito clara, sobressaindo-se e conjugando-se aspectos multidisciplinares, e não só de natureza jurídica, mas também de natureza política, econômica, social, histórica, que nem sempre conseguem uma acomodação exata dentro da seara jurídica. Em terceiro, como decorrência do item anterior, é possível identificar que há grande discricionariedade no exercício da atividade de fomento, tornando mais dificultoso o controle jurídico. Além do mais, haveria dificuldades metodológicas, pois ínsita à atividade de fomento está a questão da interdisciplinaridade, já que para sua aplicação devem-se congregar diversos ramos do direito (orçamentário, constitucional, administrativo, etc.). Finalmente, como decorrência de muitas e variadas técnicas de fomento há uma completa dispersão conceitual, fruto de uma parcial ausência de sistematização por parte dos ordenamentos jurídicos.
55
Contudo esse panorama tende a ser superado, pois a partir da Constituição
de 1988, e principalmente com a já citada reforma do Estado e da Administração
Pública da década de 1990, as normas relativas à intervenção estatal não
prestacional, na modalidade de normas indutivas deram relevo e importância à
atividade estatal de fomento.
Sem a intenção de repetir tópicos já tratados anteriormente com relação à
intervenção do Estado na economia, através das normas de direção, é preciso
pontuar que as normas de indução ganharam relevância a partir das mudanças no
perfil do Estado em decorrência da reforma e dos processos de privatização56 da
década de 1990.
Maria Sílvia Di Pietro bem investiga o fenômeno a partir das referências dos
autores latinos como Jaime Rodrigues Arana, José Villar Rojas e Roberto Dromi a
autora acentua que não há um conceito jurídico único e fechado desse processo,
concluindo que na realidade se trata de um conceito ou processo aberto que pode
assumir diferentes formas, todas se amoldando ao objetivo de reduzir o tamanho do
55
MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um
fomento público democrático, eficiente e não paternalista. Revista de Direito da Procuradoria Geral do Rio de Janeiro, n º 65. Rio de Janeiro, 2010. 56
SOUTO, Marcos Juruena Villela, Desestatização, Privatização, Concessões, Terceirizações e
Regulação, Rio de Janeiro: Lumem Iuris, 2001, p. 30. Fala-se em técnicas de privatização, com medidas de desestatização, que é a retirada da presença do Estado de atividades reservadas constitucionalmente à iniciativa privada, é o gênero do qual são espécies a privatização, a concessão, a permissão, a terceirização e a gestão associada de funções públicas.
Estado e fortalecer a iniciativa privada e os modos privados de gestão do serviço
público.57
A finalidade desse processo que engloba reforma estatal, privatização de
alguns setores, atuação do Estado na economia através de normas regulatórias e
indutivas é possibilitar que o Estado desenvolva um perfil subsidiário e possa se
concentrar nas atividades essenciais como segurança pública, justiça, poder de
polícia, etc., diminuindo-se os gastos com a “máquina administrativa” e mesmo
reduzindo a ineficiência de determinados serviços públicos ou de utilidade pública
que numa economia de mercado como a brasileira, ganham em qualidade quando
prestados pela iniciativa privada. É o exemplo das telecomunicações58 e mesmo da
energia elétrica.
É importante frisar que ao se mencionar a expressão equívoca de Estado-
subsidiário, não há referência aqui à noção de Estado mínimo, não interventor, típico
do liberalismo.59
Adota-se a expressão no sentido do que é posto pela doutrina de Odete
Medauar, segundo a qual a subsidiariedade indica a enunciação da ideia de que a
suplência aponta limite teórico fundado sobre a concepção do homem e da
sociedade, vinculado à ação do Estado. Nesse sentido o Estado, além da missão de
realizar certas tarefas, deve estimular a ação individual em função do interesse
geral, notadamente no que concerne a política econômica. A noção de suplência
não implica que exclusivamente, perante grande número de atividades necessárias,
os particulares ou os grupos deixem para o Estado tudo o que sua incapacidade ou
negligência deixou de executar.60
Com o delineamento de um Estado subsidiário cresce os chamados direitos
sociais e econômicos, como reflexo subjetivo da intervenção estatal na economia, e
a atividade de fomento ganha destaque para Maria Sílvia Di Pietro a função indutiva
57
DI PIETRO, Maria Sílvia Zanella, Parcerias ... p.6 58
Quem não se lembra de que até meados da década de 1990, as linhas de telefone eram consideradas bens de valor significativo, diante da escassez? 59
DI PIETRO, Parcerias . . . p.7. A autora frisa que ao referir-se a expressão “estado subsidiário” não há que se confundir com o Estado Mínimo decantado pelo liberalismo ou neoliberalismo. 60
MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno, 5ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.
é tipicamente administrativa e como tal, submetida ao regime jurídico de direito
administrativo:
Caracteriza-se este por ser uma forma de incentivar a iniciativa privada de interesse público. Difere do serviço público porque neste, o Estado assume como sua uma atividade de atendimento a necessidades coletivas, para exercê-las sob regras total ou parcialmente públicas; no fomento, o Estado deixa atividade na iniciativa privada e apenas incentiva o particular que queira desempenhá-la, por se tratar de atividade que traz algum benefício para a coletividade. O fomento é assim a atividade administrativa que ganha relevo no Estado contemporâneo, em razão do princípio da subsidiariedade, em que o mesmo atuando indiretamente na área econômica busca incentivar a prestação de serviços de interesse público por particulares. Com a assunção da importância do princípio da subsidiariedade do Estado, a sociedade civil ganha importância como ator social, e não se fala mais em interesse público de que é titular exclusivo o Estado, mas de vários interesses públicos, representativos dos vários setores da sociedade civil. A proteção do interesse público deixou de ser prerrogativa do Estado, que não mais tem condições de assumir todas as novas atividades de interesse geral. Como consequência, há uma necessidade de ampliação da atividade administrativa de fomento, significando, como uma das aplicações do princípio da subsidiariedade, o incentivo à iniciativa privada de interesse público. O Estado deve ajudar, estimular, criar condições para que os vários grupos de interesses representados por entidades particulares partam à busca de seus próprios objetivos mais em condições de assumir todas as novas atividades de interesse geral.
61 Grifo próprio.
Como foi possível observar a intervenção estatal por normas indutivas e a sua
equivalência jurídica através de uma atividade jurídica específica, que é o fomento,
ao lado do poder de polícia e dos serviços públicos, pode se manifestar por diversas
“modalidades”, esclarecendo desde já que não há uma sistematização doutrinária a
respeito de suas manifestações, desse modo, os instrumentos de concretização das
normas de fomento serão identificados a seguir.
1.4 A INSTRUMENTALIZAÇÃO DA ATIVIDADE DE FOMENTO
Diante da ausência de sistematização do tema relativo à instrumentalização
da atividade administrativa de fomento, a tarefa de classificar as suas modalidades é
árdua.
61
DI PIETRO, Maria Silvia Zanella. Parcerias na Administração Pública, São Paulo: Atlas, 2011.
Partindo dessa premissa, decerto que a classificação teleológica que leva em
conta a finalidade em resguardar o interesse público na atuação administrativa de
fomento, a partir do propósito de convencer o particular a fazer ou deixar de fazer
algo, com enfoque no critério volitivo do sujeito fomentado, é uma das mais comuns
entre os autores que tratam do tema. Nesse sentido, a atividade estatal de fomento
pode ser considerada positiva e negativa.
Na atuação de fomento positiva o Estado, visando o interesse público,
intervém na economia através da concessão de prestações, bens, vantagens,
privilégios, títulos, e mesmo da isenção ou redução de alíquotas tributárias, visando
incentivar a conduta dos agentes econômicos de determinado segmento.
Na atuação de fomento negativa, o Estado pretende desestimular
determinadas condutas que tragam prejuízo à coletividade, que impliquem em
condutas legais mas social ou economicamente indesejáveis, como por exemplo
aumento momentâneo das alíquotas de IPI sobre determinados produtos
industrializados importados, a fim de resguardar a fabricação nacional e a geração
de empregos, ou mesmo a intenção de desestimular o consumo de determinados
produtos que causem prejuízos à saúde e dependência química com
desdobramentos econômicos no âmbito da saúde pública, como as alíquotas de IPI
elevadas incidentes sobre a indústria do fumo.
Com relação às técnicas de fomento negativas é importante ponderar a
respeito da presença ou não do elemento de coercibilidade na conduta estatal, e
isso justamente porque a sua presença é capaz de romper um tênue limite que
separa as atividades administrativas de fomento do poder de polícia.
Se a medida de fomento negativo apresentar natureza eminentemente
persuasória, no exemplo da alíquota aumentada de IPI para os produtos
industrializados importados, essa característica parece bem ressaltada, já que não
haverá proibição de importação. Se for vontade do agente adquirir o produto
internacional o fará, sob preço mais elevado. A oneração elevada não se confunde
com a proibição de importar, tão somente a aquisição se tornará economicamente
inviável, ou “economicamente proibitiva”.62
Contudo, é importante frisar que se a medida de caráter negativo não for
meramente desestimulante e trouxer a previsão de uma sanção, de natureza
coativa, por consequência, não estará diante de uma norma indutiva de fomento
negativa e sim diante de típica atividade administrativa de poder de polícia do
Estado.
A classificação das modalidades de fomento entre positivas e negativas traz
entre as primeiras uma das mais relevantes formas de atuação estatal na atividade:
os meios econômicos que configuram a maior e mais importante gama das
hipóteses de fomento, e implicam na transferência de vantagem econômica ao
agente fomentado.
Além da classificação em fomento positivo ou negativo, alguns autores
indicam a classificação das técnicas63 de fomento em meios honoríficos, jurídicos e
econômicos.
Na técnica de fomento econômico o Estado passa a ser impulsionador da
iniciativa privada. Os meios de fomento econômico consistiriam na entrega de
vantagem patrimonial ou pecuniária aos particulares, para execução direta das
atividades de interesse público que o Estado quer incentivar, além da concessão de
empréstimos e financiamentos.
A título de exemplificação de fomento econômico patrimonial, estaria a
concessão ou permissão gratuita do uso de bem público com exclusividade para
62
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988, 14. ed. São Paulo: Malheiros, 2010 p.148. 63
DI PIETRO. Maria Silvia. Parcerias . . .p. 20. É comum a expressão “meios de fomento, modalidades e técnicas de fomento”. Citando o autor argentino Roberto Dromi, a autora afirma que no caso do sistema jurídico latino tem-se como classificação diversa das formas de fomento: 1 - promoção industrial: isenção, redução, suspensão, prorrogação de tributos por períodos determinados, de forma total ou parcial; isenção ou redução de direitos de importação sobre bens de capital, facilidades para a compra, locação ou comodato de bens de domínio do Estado; estabelecimento de restrições temporárias à importação de bens similares aos que se trata de produzir no país; determinação, modificação ou isenção parcial ou total dos direitos de importação para os insumos dos bens a produzir; 2-inversões estrangeiras: regulamentação e promoção da entrada e saída do capital estrangeiro na economia interna, mediante a aquisição de bens ou direitos localizados no território nacional; na atual legislação com vistas à reestruturação do Estado, a matéria está disciplinada na Argentina, de forma a assegurar igualdade de tratamento para o capital nacional e estrangeiro; 3-transferência de tecnologia: cessão, licença, assistência ou ajuda técnica, know-how, informação técnica.
determinada entidade prestadora de serviços de interesse público. A lei nº 4.320/64
trata da subvenção, no art. 12 identificando-a como um instrumento de atuação
subsidiária à atuação estatal, nos artigos 12, parágrafo 3º, 16 e 19, dividindo-se em
subvenções de natureza social e econômica.
No fomento honorífico pode-se citar a concessão de títulos, condecorações e
prêmios pela prática de atividades de relevância social.
Já na modalidade de fomento jurídico, alguns autores incluem a concessão de
títulos “jurídicos” que atribuem privilégios a determinadas entidades64 diante da
importância que assumem no contexto social e econômico do país, como a outorga
de títulos de utilidade pública, trazida pela lei nº91/1935, os títulos de organização
social, conforme lei nº 9.637/1996, e a titulação de organização social de interesse
público, as oscips, conforme lei nº 9.790/1999.
Insta observar-se a classificação de Celia Cunha Mello ao apresentar
modalidades de fomento estatal classificadas como meios psicológicos, meios
honoríficos e meios econômicos.65
Por meios de fomento psicológicos teria-se a difusão de determinado
comportamento incentivado ou sugerido. Quanto à possibilidade de utilização da
propaganda pela Administração Pública para controlar posturas, sugerir condutas ou
comportamentos que vão ao encontro do interesse público, há bastante controvérsia
se esse meio utilizado pode ser entendido como atividade de fomento ou se o que
há é a mera publicidade institucional do Estado.
64
MODESTO, Paulo. Reforma do marco legal do terceiro setor no Brasil, Revista de Direito Administrativo, nº 214, 1998. A concessão caso a caso de títulos jurídicos especiais a entidades do terceiro setor parece atender a, pelo menos, três propósitos. Em primeiro lugar, diferenciar as entidades qualificadas, beneficiadas com o título, relativamente às entidades comuns, destituídas dessa especial qualidade jurídica. Essa diferenciação permite inserir as entidades qualificadas em um regime jurídico específico. Em segundo lugar, a concessão do título permite padronizar o tratamento normativo de entidades que apresentem características comuns relevantes, evitando o tratamento legal casuístico dessas entidades. Em terceiro lugar, a outorga de títulos permite o estabelecimento de um mecanismo de controle de aspectos das atividades das entidades qualificadas, flexível por excelência, entre outras razões, porque o título funciona como um instrumento que admite não apenas concessão, mas também suspensão e cancelamento. A realização desses propósitos, necessariamente inter-relacionados, em princípio pode ser vista como vantajosa e reveladora das funções desempenhadas pelos títulos jurídicos, em especial as funções de certificação, padronização e controle jurídico. Sem dúvida, as entidades que recebem o título são vistas como entidades certificadas, que possuem uma qualidade jurídica específica, o que usualmente lhes garante um regime de benefícios e apoios especiais previstos na lei apenas para as entidades qualificadas. Grifo próprio. 65
MELLO. Celia Cunha. Fomento da . . .
A se considerar essa hipótese o conceito de fomento ganharia contornos
muito amplos pois a mera sugestão de um comportamento desejável como por
exemplo, uma propaganda institucional que incentivasse a sociedade a fazer coleta
seletiva de resíduos sólidos, seria considerada atividade de fomento.
Não há dúvidas de que a mera publicidade institucional revestida de
campanha é educativa e visa estimular, incentivar a conduta responsável dos
cidadãos, mas classificar como fomento na acepção jurídica do termo seria
realmente, “alargar” muito seu conceito, extrapolando seus contornos constitucionais
que tem a finalidade de política pública de promoção material do desenvolvimento
econômico-social.
Portanto, a percepção estendida da atividade de fomento acabaria por
descaracterizá-la porque não haveria outorga de vantagem, benefício ou privilégio,
apenas a mera sugestão de um comportamento ambientalmente adequado.66
Como observado nas diversas classificações apresentadas, os meios
honoríficos aparecem como modalidade de fomento para muitos autores67 e trazem
a noção de reconhecimento pelo mérito, pela honra, atividades particulares que no
contexto social ganham relevância e reconhecimento, pela benemerência, pelo
desvelo desinteressado de retribuição material ou pecuniária.
Dentro dos meios honoríficos, é importante frisar a questão relativa à
possibilidade de considerar a outorga de títulos como espécie de fomento diante da
ausência de atuação persuasiva anterior do Estado:
Seria, no mínimo, duvidoso, então, considerar como fomento público a outorga de honras, títulos ou troféus a pessoas ou empresas que já prestaram um serviço ou atividade - ainda que o Estado reconheça, posteriormente, que tal atuação tenha atendido ao interesse público - se não houve persuasão, ou seja, se o Estado não convenceu outrem a agir no interesse público, não houve atuação estatal indireta. O particular, por sua própria vontade, satisfez o interesse público, e nada impede que o Estado reconheça publicamente a relevância dessa atuação. Não terá sido, contudo, fomento público.
68
66
DEL ALCAZAR, Mariano Baena. Sobre el concepto de fomento.Revista de Administración Publica, Madrid, 1967. O autor ensina que necessariamente a atividade de fomento dependeria da presença de estímulo, benefício, ajuda, já a mera a propaganda tem cunho de política pública educacional. 67
Maria Silvia Di Pietro, Celia Cunha de Mello, Diogo Moreira Figueiredo. 68
MELLO, Celia Cunha de . Fomento da . . .p.88.
Observa-se que a concessão de títulos de utilidade pública, filantropia, etc.
tem natureza diferenciada já ela é anterior à prática dos atos de interesse público, e
justamente proporciona um regime jurídico especial, com alguns “privilégios”,
indicando meio positivo de fomento.
Cabe observar que além da ausência de sistematização doutrinária a respeito
da classificação das modalidades de fomento, as leis que tratam do tema também
não seguem critérios técnicos. A própria expressão fomento por vezes não é
empregada.
No direito positivo, não raro se utiliza a expressão “incentivo” em vez fomento
a lei de responsabilidade fiscal, lei complementar nº101/2000, em seu art. 1469 trata
de “incentivos” tributários que impliquem redução de receita. Por certo que se está
diante de um meio ou modalidade de fomento econômico, bem como as regras
previstas no parágrafo 1º e 2º do art. 26 da mesma lei.
Os principais meios de intervenção do Estado na economia através das
normas indutivas ocorrem pela modalidade de fomento econômico. Identificada
muitas vezes pela expressão estímulos econômicos70 podem ocorrer também por
69
Art. 14 A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa de impacto-orçamentário financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a, pelo menos, uma das seguintes condições:
I- Demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do artigo 12, e de que não alterará as metas de resultados fiscais previstos no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias;
II- Estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.
III- A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota e modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado;
Art. 26 A destinação de recursos, para direta ou indiretamente cobrir necessidades de pessoas físicas ou déficits de pessoas jurídicas, deverá ser autorizada por lei especifica, atender as condições específicas da lei de diretrizes orçamentárias estar prevista no orçamento ou em seus créditos adicionais. Parágrafo 1º O disposto no caput aplica-se a toda a administração indireta, inclusive fundações públicas e empresas, as instituições e precípuas as estatais, exceto no exercício de suas atribuições precípuas, as instituições financeiras, e o Banco Central do Brasil. Parágrafo 2º Compreende-se incluída a concessão de empréstimos, financiamentos e refinanciamentos, inclusive as respectivas prorrogações e composições de dívidas, a concessão de subvenções e a participação em constituição ou aumento de capital. 70
FALLA , Garrido. Tratado de Derecho Administrativo, 10ª ed. vol. 2, Madrid: Tecnos, 1992. O autor classifica os meios econômicos de fomento em vantagens de caráter real e vantagens de caráter financeiro.
meio de benefícios e incentivos tributários tais como isenções ou reduções de
tributo.71 Mas não só.
O oferecimento de garantia, no caso de empresa privada necessitar recorrer
ao mercado de capitais para obter condições de desempenhar atividades de
interesse público, valendo-se do compromisso da Administração de responsabilizar-
se pela dívida em caso de inadimplemento. Além disso, o subsídio ou subvenção,
que é a destinação de receita orçamentária a determinados agentes que
desempenhem atividades de interesse público desde que autorizados por lei, sem
obrigação de reembolso as aberturas de linhas de crédito ou empréstimos públicos
em condições favoráveis de atividades que mereçam apoio oficial72 o financiamento
de bens o oferecimento de assistência técnica dada por entidades da Administração
Pública às atividades de produção e comercialização das empresas privadas,
também são hipóteses de fomento econômico.73
Outras medidas como o protecionismo à produção nacional de determinados
segmentos da economia também podem ser classificadas como fomento econômico
como por exemplo: tarifas aduaneiras, imposto de importação, regime de cotas de
importação, reserva de mercado e exigência de controle acionário para empresas
domiciliadas no país, os privilégios especiais, prêmios, contingenciamentos,
realização de obras destinadas a servir a uma exploração determinada- acordo
programa, direito ao uso de títulos de qualidade oficialmente conhecidos - marcas
nacionais, “garantias de genuinidade” e “selos”.74
As políticas de estímulo à produção para determinados setores, como o
desenvolvimento do mercado financeiro de títulos que colocam à disposição das
empresas meios para atrair capital, a criação de polos industriais, comerciais e
zonas de processamento de exportações que recebem do governo incentivos fiscais
71
Um exemplo de fomento através da redução de tributos está previsto constitucionalmente com o tratamento tributário diferenciado contido no artigo 179 da Constituição para as pequenas e médias empresas. 72
Podem ser feitos diretamente pelo Tesouro Nacional ou pelos tesouros estaduais, podem ser créditos facultados por fundos especiais, podem ser concedidos por empresas públicas ou sociedades de economia mista de natureza bancária, como o BNDES, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal. 73
Serviços praticados pela EMBRAPA, INPI, IBGE, SEBRAE, CNPQ e CAPES além de entidades privadas financiadas por contribuições para-fiscais, como o SENAI, SENAC e SENAR. 74
MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de Direito Administrativo. 15ª ed. São Paulo: Forense, 2006, p.118.
e investimentos em infraestrutura como por exemplo, a zona franca de Manaus, são
exemplos da atividade estatal de fomento.
Além disso, outras hipóteses de atividade de fomento estatal econômico que
não impliquem na concessão direta de financiamentos ou subvenções, como a
criação de sociedades de capital de risco para participar temporariamente e sem
controle do capital social de empresas com potencial de expansão e viabilidade, de
modo a dinamizar o mercado de capitais.
É possível perceber uma miríade de classificações a respeito das formas de
fomento, dificultando inclusive a sua sistematização jurídica, dentre todos esses
mecanismos de atuação da atividade estatal sobre o domínio econômico através das
normas de indução por certo que os empréstimos ou financiamentos em condições
especiais, com juros subsidiados, ou mesmo até sem previsão de reembolso,
ganham maior relevância.
Em primeiro, por se tratar de aporte de recursos de origem pública e do
financiamento de determinados setores com base em fundos públicos, muitas vezes
formado pela poupança compulsória de recursos arrecadados. Em segundo porque
o Estado a fim de aplicar esses recursos para o financiamento público cria e
desenvolve órgãos específicos da Administração por meio da descentralização,
priorizando-se a gestão privada do fomento, o que atende ao princípio da livre
iniciativa e da economicidade.
Nesse sentido a criação de empresas estatais para a instrumentalização da
atividade de fomento, sob regime de direito administrativo, visa a consecução do
interesse público, pois o Estado não as cria para investir buscando simples lucros,
mas sim, para implementar políticas públicas, o desenvolvimento regional,
construção de moradias populares, desenvolvimento agrícola.75
É isso que será objeto de pesquisa no capítulo seguinte, a atividade de
fomento desenvolvida pelo BNDES, através de fomento econômico representado
pela concessão de empréstimos e financiamentos, voltados ao setor de saneamento
básico.
75
SUNDFIELD, Carlos Ari. Direito Administrativo Ordenador. São Paulo: Malheiros, 1997.
CAPÍTULO 2 - O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL E AS INSTITUIÇÕES
FINANCEIRAS DE DESENVOLVIMENTO- O BNDES
2.1 PANORAMA GERAL DO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL
A Constituição de 198876 traz, entre as normas relativas à Ordem Econômica
e Financeira, no capítulo IV, as diretrizes do sistema financeiro nacional77 contudo a
estruturação e a constituição orgânica do setor estão previstas em lei.
O sistema financeiro nacional pode ser dividido em dois: o sistema financeiro
público, que envolve as questões relativas às finanças públicas e aos orçamentos
públicos, previstos nos artigos 163 e 169 da Constituição, e o sistema financeiro
“para-público”, no qual se procura regular o funcionamento das instituições
financeiras creditícias, públicas ou privadas, de seguro, previdência privada e
capitalização. A regulação desse último setor é feita pelo Banco Central,
considerado “um elo entre as duas ordens financeiras”.78
A atividade financeira é um setor da economia de fácil exemplificação prática
sobre a intervenção do Estado na economia, diante da relevância extrema que tem
em um mundo complexo como o atual.
É fácil concluir que ao tratar do sistema financeiro nacional, o legislador
Constituinte previu uma dupla função ao Estado. De um lado ele atua como órgão
regulador, através de uma complexa estrutura formada pelo Conselho Monetário
Nacional e por uma autarquia especialmente criada para tanto, o Banco Central do
Brasil, em nítida hipótese de intervenção estatal não prestacional por direção. E de
76
Artigo 21 e incisos VII e VIII da Constituição de 1988, no que se refere à competência material da União, em relação ao sistema financeiro, estão, respectivamente, emitir moeda e administrar reservas cambiais do país e fiscalizar as operações de natureza financeira, especialmente as de crédito, câmbio e capitalização, bem como as de seguro e previdência privada. Já com relação à competência legislativa, nos termos do art. 22, compete privativamente à União, nos termos do inciso VI, legislar sobre sistema monetário e de medidas, titulo e garantias de metais, inciso VII - política de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores, inciso VIII - comércio exterior e interestadual, inciso XIX - sistema de poupança, captação e garantia e de poupança popular e inciso XX- sistema de consórcios e sorteios; 77
O artigo 192 da Constituição de 1988, em seu caput, com a redação que foi dada pela emenda constitucional 40/2003, dispõe que o sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do país e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram. 78
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 34ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008.
outro, o Estado atua em atividade econômica em sentido estrito, na modalidade de
intervenção prestacional por participação concorrencial.
Com evidente cunho de atividade econômica a atividade financeira pode ser
explorada diretamente pelo Estado, por imperativos de segurança nacional ou de
relevante interesse coletivo79 nas hipóteses previstas na própria Constituição, ou
conforme critérios definidos em lei, pois o regime jurídico constitucional permite a
atuação direta do Estado no sistema financeiro, com personalidade jurídica de direito
privado, através das empresas estatais ou governamentais.80
Portanto quando houver atuação estatal direta na exploração de atividade
econômica em sentido estrito, nas hipóteses previstas na constituição ou na lei,
estará diante de uma norma de intervenção na economia por participação
concorrencial, ou seja, a atuação estatal é permitida, porém sem privilégios e
prerrogativas de um ente público, sob o mesmo regime jurídico destinado às
empresas do setor privado, no que se refere às obrigações e direitos de natureza
civil, comercial, trabalhista e tributário.81
A atividade financeira é certamente uma das atividades econômicas mais
reguladas pelo Estado. A atuação interventiva é generalizada inclusive no direito
comparado, e isso se deve á necessidade de controlar a capacidade das instituições
financeiras de criar títulos representativos de capital, de aumentar a base tributária
do Estado e de promover a expansão do acesso ao crédito, e ainda pela
necessidade do Estado de resguardar a estabilidade financeira e de garantir
financiamentos de longo prazo para setores com pouca rentabilidade ou mesmo o
acesso a crédito pelos pequenos produtores.82
79
O art. 173 da Constituição de 1988, prevê ao Estado a possibilidade de participar do sistema financeiro diretamente, através de empresas públicas ou sociedades de economia mista, em regime de competição e de direito privado idêntico ao das empresas privadas, ao afirmar que será permitido ao Estado a exploração direta da atividade econômica, nas hipóteses de imperativo da segurança nacional ou relevante interesse coletivo, conforme definição legal. 80
DI PIETRO, Maria Silvia Zanella. Parcerias na Administração Pública, São Paulo: Atlas, 2011, p.393 A autora cita como exemplos de empresas governamentais o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, o Banco da Amazônia e o Banco do Nordeste. 81
GRAU. Eros Roberto. A Ordem . . . 82
TURCZYN, Sidnei. O Sistema Financeiro Nacional e a Regulação Bancária, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p.41.O autor cita mecanismos de controle e regulação da atividade financeira bancária, como por exemplo, licenciamento de instituições financeiras regras prudenciais de funcionamento das instituições financeiras, fiscalização, janela de redesconto, saneamento do
A intervenção estatal no setor financeiro bancário através de órgãos estatais
que promovam a regulação prudencial e sistêmica se justifica pela necessidade de
controlar ainda que minimamente o mercado financeiro a fim de proteger os
consumidores e cidadãos do risco de uma eventual crise bancária que pode se
alastrar pela economia e comprometer, por exemplo, pequenos poupadores da
caderneta de poupança, consequentemente desestabilizar toda a sociedade.
A atuação estatal sistêmica por direção no setor através de mecanismos
como redução dos custos das transações bancárias, garantia de informação aos
usuários-consumidores, garantia de inibição de práticas concorrenciais predatórias
ou desleais, visam garantir a eficiência, a higidez e a solidez do sistema financeiro
como um todo, levando ao aumento da transparência nas operações bancárias.83
Esse modelo de intervenção estatal regulatória no setor bancário, de proteção
prudencial e sistêmica do setor, está expressamente consignado no caput do art.
192 da Constituição ao prever que o sistema financeiro tem a função de promover o
desenvolvimento equilibrado do país e servir aos interesses da coletividade, em
todas as partes que o compõem, afirmando-se ainda que será regulado por leis
complementares.
A nova redação do art. 192 da Constituição trazida pela Emenda Constitucional
nº 40/2003, na qual se revogaram todos os parágrafos e incisos do art. 192, ficou a
cargo do legislador ordinário, através de lei complementar, a tarefa de dispor sobre
as especificidades do sistema financeiro nacional.
A atual lei que trata do sistema financeiro nacional é anterior à atual
Constituição, é a lei ordinária nº4.595/1964, contudo foi recepcionada como lei
complementar principalmente após a nova redação do art. 192 da Constituição.
A seguir será analisado detalhadamente o sistema financeiro a fim de
identificar quais são as atribuições de uma instituição financeira de desenvolvimento,
responsável pela execução da atividade de fomento do Governo Federal com
destaque para o BNDES.
sistema financeiro nacional, com um sistema específico de falência, que são as intervenções, liquidações e seguro de depósito. 83
SADDI, Jairo. Crise e Regulação Bancária. São Paulo: Texto Novo, 2001.
2.2 COMPOSIÇÃO E ATRIBUIÇÕES DOS ÓRGÃOS E INSTITUIÇÕES DO
SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL
A lei nº 4.595/1964 estabelece a constituição orgânica do Sistema Financeiro
Nacional, do qual fazem parte o Conselho Monetário Nacional, o Banco Central do
Brasil, o Banco do Brasil S.A, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico-
BNDES84 e as demais instituições financeiras públicas e privadas.
Para uma melhor compreensão do sistema financeiro para-público, é
necessário uma análise descritiva da lei nº 4.595/1964, a fim identificar o papel dos
agentes que compõem o sistema financeiro, especialmente aqueles responsáveis
pela atividade de fomento.
O Conselho Monetário Nacional-CMN está na cúpula do sistema financeiro,
como órgão de controle e regulação, nos termos da lei nº 9.649 de 1998, com
redação dada pela Medida provisória nº 2.216/2001, que dispõe sobre a organização
da Presidência da República e dos Ministérios. O CMN está previsto no art. 16, inc.
VII, como um órgão que faz parte da estrutura do Ministério da Fazenda, e suas
atribuições legais incluem a fiscalização do setor financeiro, da política monetária,
abrangendo a política de crédito, controle e fiscalização das instituições financeiras,
regulação das instituições financeiras que atuam nos segmentos de capitalização,
poupança popular, seguros privados e previdência aberta, e ainda detém a
atribuição de exercer função judicante, na esfera regulatória administrativa.
No campo da política monetária o CMN tem a função de autorizar a emissão
de papel moeda destinado ao financiamento direto, pelo Banco Central, das
operações de crédito com o Tesouro Nacional, hipótese essa em que além da
autorização do CMN, depende também de autorização legislativa, com nítida função
de fomento econômico. A lei garante entre as atribuições do CMN o dever de
84
Nos termos do art. 23 da lei nº 4.595/1964, o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico é o principal instrumento de execução de política de investimentos do Governo Federal.
assegurar taxas favorecidas aos financiamentos que se destinem a promover o setor
agropecuário.85
Ainda no campo da política monetária e também no setor da política cambial o
CMN tem a função de estabelecer condições para o Banco Central emitir papel-
moeda, aprovar orçamentos monetários preparados pela autarquia, fixar diretrizes e
normas da política cambial, para a compra e venda de ouro e operações em moeda
estrangeira.
No segmento de política de crédito cabe ao CMN disciplinar à concessão de
crédito em todas as suas modalidades e as operações creditícias em todas as suas
formas, limitar as taxas de juros, coordenar sua política com a política de
investimentos do governo federal, assegurando crédito subsidiado a determinadas
atividades que devam receber incentivos, em típica execução de fomento a
determinado segmento, além de determinar percentual dos recolhimentos
compulsórios das instituições financeiras do Banco Central sobre os depósitos à
vista dessas instituições.
Na competência de regulação fiscalizatória do CMN é possível elencar as
atribuições de regulamentar genericamente a constituição, funcionamento e
fiscalização das instituições que exercem atividades subordinadas à lei nº
4.595/1964, incluída a função de aplicar as penalidades previstas, quando houver
descumprimento das normas regulamentares.
Outras atribuições legais são destinadas ao CMN, como determinar a
porcentagem máxima de recursos que as instituições financeiras poderão emprestar
a um mesmo cliente ou grupo de empresas, estipular índices e outras condições
técnicas sobre encaixes, mobilizações e outras relações patrimoniais a serem
observadas, expedir normas gerais de contabilidade e de estatística obrigatórias
para as instituições financeiras; delimitar no máximo a cada dois anos o capital
mínimo das instituições financeiras, estabelecer as operações de redesconto e de
empréstimos efetuadas com quaisquer instituições financeiras públicas e privadas.
85
O art. 4º, inc. IX, in fine, da lei nº4595/1964, (. . .) O CMN assegurará taxas favorecidas aos financiamentos que se destinem a promover a recuperação e fertilização do solo, reflorestamento, combate a epizootias e pragas, nas atividades rurais, eletrificação rural, mecanização, irrigação e investimentos indispensáveis às atividades agropecuárias.
Ao CMN também são previstas atribuições específicas quanto a operações
financeiras envolvendo bancos públicos, dentre eles as instituições de
desenvolvimentos pode-se citar a emissão de títulos públicos, estabelecendo
normas a serem observadas pelo Banco Central na sua negociação, autorizar o
Banco Central e as instituições financeiras públicas federais a efetuarem a
subscrição, compra e venda de ações e outros papéis emitidos por sociedades de
economia mista e empresas do estado, disciplinar as atividades das bolsas de
valores e de corretores de fundos públicos e a instituição de normas regulamentares
para as operações das instituições financeiras públicas a fim de preservar sua
liquidez.
Cabe ainda na função fiscalizatória do CMN, fixar limites a partir dos quais
devem ser recolhidos excedentes de depósitos ao Banco Central, fixar as condições
para operações de bancos estrangeiros e determinar ao Banco Central que recuse
autorizações para o funcionamento de novas instituições financeiras.
Na competência judicante administrativa86 pode-se citar as funções de
conhecer recursos de decisões do Banco Central, de modo geral e dos recursos
contra decisões do Banco Central em relação à pena de multa, suspensão ou
inabilitação temporária ou permanente para exercícios de cargos de direção nas
instituições financeiras.
Entre as atribuições regulatórias do CMN estão as funções de decidir a
organização interna, com a possibilidade de elaboração do seu regimento interno,
decisão sobre a estrutura técnica e administrativa do Banco Central e fixação de seu
quadro de pessoal, aprovar o regimento interno e as contas do Banco Central,
expedir normas regulamentares para as designações de membros e funcionamento
das diversas comissões consultivas que funcionam junto ao Conselho.
Após apontar o papel e as atribuições do CMN no sistema financeiro nacional,
cabe avaliar o papel do Banco Central e suas atribuições regulatórias.
Diferentemente do CMN, que é um órgão do Ministério da Fazenda, o Banco Central
86
Em razão do principio constitucional da inafastabilidade do Poder Judiciário, previsto no art. 5º XXXV, as atribuições judicantes dos órgãos reguladores, não afastam as questões do conhecimento pelo Judiciário.
tem personalidade jurídica própria e é organizado como uma autarquia federal87
portanto está subsumido ao regime de direito público, e sua função principal é atuar
como órgão executor das normas expedidas pelo CMN.
O Banco Central tem também função regulatória normativa no sistema
financeiro. Além da função de executor das normas do CMN, conta com regime
jurídico específico, pois funciona como o “banco dos bancos”, já que lhe é vedado
manter relações bancárias com pessoas de direito público ou privado que não sejam
instituições financeiras, salvo expressa disposição legal em contrário, isso para
garantir sua autonomia e isenção técnica.
A lei atribui ainda à autarquia funções na esfera monetária88 fiscalizatória, de
banqueiro do governo federal e mesmo funções genéricas de fomento para setores
considerados de importância estratégica para o desenvolvimento econômico do
país.89
Dentre as atribuições referentes à política monetária pode-se citar a emissão
de papel moeda e moeda metálica, nas condições e limites pré-fixados pelo CMN, à
exceção dos serviços de meio circulante ainda o recolhimento e a custódia dos
percentuais compulsórios efetuados pelas instituições financeiras, a realização de
operações de redesconto e de empréstimos a instituições financeiras, controle
integral da política de créditos, execução financeira dos serviços da dívida pública,
operações de compra e venda de ouro e moeda estrangeira, operações de crédito
no exterior e operação de mercado de câmbio, com a finalidade de regular e
estabilizar a política cambial, compra e venda de títulos de sociedades de economia
mista e empresas estatais, emissão de títulos de responsabilidade própria.
87
DI PIETRO, Maria Sílvia Zanella. Parcerias na Administração Pública, São Paulo: Atlas, 2011. A autora observa que a figura da autarquia corresponde à descentralização por serviços, técnica ou funcional, é a que se verifica quando o poder público (União, Estados ou Municípios) cria uma pessoa jurídica de direito público ou privado e a ela atribui a titularidade e a execução de determinado serviço público. 88
Com a promulgação da lei nº 9.069/95 que instituiu o plano real, houve atribuição expressa para o BC da função de estabelecer diretrizes da política monetária brasileira. 89
Como a atividade de redesconto seletivo consistente em incentivos com crédito subsidiado pelo próprio Banco Central, contemplando principalmente os setores de agricultura, pecuária e de exportações e secundariamente o industrial, podendo-se mencionar, dentre diversos planos e programas com essas características o FINEX, Fundo de Financiamento à Exportação, o programa de refinanciamento à produção de manufaturados exportáveis e o programa especial de estímulos à exportação. Disponível em <http.www.bc.gov.br>. Acesso em: 22/07/2012.
Dentre as atribuições de natureza fiscalizatória, o BC tem a função de
fiscalização das instituições financeiras e aplicação das penalidades, com exceção
das reservadas ao CMN, concessão de autorização de instalação e funcionamento
das instituições financeiras, estabelecimento de regras e condições para a posse e
exercício de cargos de gestão e exercício de funções em órgãos consultivos, fiscais
e semelhantes das instituições financeiras, a regulação dos serviços de
compensação de cheques e de outros papéis, vigilância permanente no mercado
financeiro, de capitais e sobre empresas que direta ou indiretamente interfiram
nesses mercados, e ainda a fixação de limites para o capital estrangeiro.
Já no campo regulatório-concorrencial90 o Banco Central tem uma polêmica
função de autorizar a transformação, fusão, incorporação e encampação de
instituições financeiras e de regular as condições de concorrência entre instituições
financeiras, coibindo-lhes os abusos.91
Como banqueiro da União, tem ainda as funções de manter entendimento
com instituições financeiras estrangeiras e internacionais, alocar empréstimos
internos e externos e atuar como depositário das reservas oficiais de ouro e de
moeda estrangeira.
Após a descrição das atribuições do CMN e do BC, órgão e autarquia,
respectivamente com as principais funções de organização e controle do sistema
financeiro nacional, podendo-se inclusive verificar que dentre essas atribuições
algumas são típicas de atividade de fomento. Cabe agora verificar, dentre as demais
entidades que compõem a estrutura do sistema financeiro nacional, o papel das
instituições financeiras públicas federais, principalmente daquelas que têm função
legal de fomentar o desenvolvimento nacional.
Na estrutura do sistema financeiro nacional pode-se identificar a presença das
instituições financeiras públicas federais com suas atividades, capacidades e
90
Essa atuação é considerada polêmica porque a função de resguardo ao princípio da livre concorrência seria atribuição do CADE, nos termos da lei nº 8.888/1994, que trouxe as sanções para abuso de poder econômico. 91
VERÇOSA, Haroldo Malheiros Duclerc. Bancos Centrais no Direito Comparado: O Sistema Financeiro Nacional e BACEN, São Paulo: Malheiros, 2005.
modalidades operacionais reguladas pelo CVM, caracterizadas na lei nº 4.595/1964,
como órgãos auxiliares da execução das políticas de crédito do Governo Federal.92
Cabe ressaltar que as instituições financeiras públicas não estão previstas
apenas na esfera federal. Aos demais entes públicos, também, é facultado atuar no
sistema financeiro, mas em regime exclusivamente de direito privado, por expressa
disposição legal.93
A mesma lei traz, no parágrafo único do art. 24, dispositivo pelo qual se
equiparam as caixas econômicas estaduais às instituições financeiras públicas,
sendo que é preciso interpretá-lo com a restrição do artigo imediatamente anterior,
ou seja, quando se tratar de caixas econômicas estaduais sua atuação é exclusiva
em regime de direito privado.
É importante pontuar que os bancos regionais como o Banco do Nordeste do
Brasil S.A. e o Banco da Amazônia S.A são instituições financeiras públicas, têm
função específica de promoção do desenvolvimento regional, e gestão financeira de
fundos de incentivos de natureza eminentemente fiscal.94
92
Art. 22. As instituições financeiras públicas são órgãos auxiliares da execução da política de crédito do Governo Federal. Parágrafo 1º. O Conselho Monetário Nacional regulará as atividades, capacidade e modalidade operacionais das instituições financeiras públicas federais, que deverão submeter à aprovação daquele órgão, com a prioridade por ele prescrita, seus programas de recursos e aplicações, de forma que se ajustem à política de crédito do Governo Federal. Parágrafo 2º. A escolha dos Diretores ou Administradores das instituições financeiras públicas federais e a nomeação dos respectivos Presidentes e designação dos substitutos observarão o disposto no art. 21, parágrafos 1º e 2º, desta lei. Parágrafo 3º. A atuação das instituições financeiras públicas será coordenada nos termos do art. 4º desta lei. 93
Art. 24. As instituições financeiras públicas não federais ficam sujeitas às disposições relativas às instituições financeiras privadas, assegurada a forma de constituição das existentes na data da publicação desta lei. 94
Os bancos regionais operam fundos de natureza fiscal destinados à captação de parcela do imposto de renda, nos termos da alínea c, do inc. I, do art. 159, da Constituição de 1988, que determina que do produto da arrecadação dos impostos sobre renda e proventos de qualquer natureza e sobre produtos industrializados, três por cento, do total de quarenta e oito por cento, serão destinados a aplicação em programas de financiamento ao setor produtivo das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, através de suas instituições financeiras de caráter regional, de acordo com os planos regionais de desenvolvimento, ficando assegurado ao semiárido do Nordeste a metade dos recursos destinados à Região, na forma que a lei estabelecer. A lei nº 7.827/1989 disciplinou a matéria.
Após a edição da lei nº 4.595/1964 treze bancos de desenvolvimento foram
criados, atualmente apenas quatro estão em funcionamento, nos Estados do Espírito
Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.95
Dentre as instituições financeiras públicas que compõem o sistema financeiro
nacional, o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal e o BNDES devem ser
analisados, com destaque para o último.
O Banco do Brasil, junto com a Caixa Econômica Federal, são instituições
financeiras de grande relevância para o desenvolvimento econômico do país, com
funções de fomento para vários segmentos. O primeiro, organizado sob regime de
direito privado é uma sociedade de economia mista, tem a função, nos termos da lei
nº4. 595/1964, de ser o instrumento de execução da política creditícia e financeira do
governo federal. É considerado o agente financeiro do Tesouro, incumbindo-lhe
receber tributos e créditos, realizar pagamentos previstos no orçamento da União,
executar política de preços mínimos, executar serviços bancários de interesse do
governo federal e do Banco Central, atuando também como arrecadador de
depósitos compulsórios, executor de compra e venda de moeda estrangeira, por
conta própria ou do Banco Central, executor da política de comércio exterior,
financiador das atividades industriais e rurais, difusor e orientador do crédito,
suplementando a rede bancária privada.
Já a Caixa Econômica Federal é organizada como uma empresa pública, com
personalidade jurídica de direito privado tem entre suas atribuições as de receber
depósitos sob garantia da União, incentivando a poupança popular, conceder
empréstimos e financiamentos em típica atividade de fomento, além de operar no
sistema habitacional como sociedade de crédito imobiliário, sendo considerado o
principal agente do sistema financeiro de habitação, podendo ainda explorar com
exclusividade serviços de prognósticos e operações de penhor civil.
Com a desativação e posterior extinção do Banco Nacional de Habitação a
Caixa Econômica Federal, nos termos do decreto-lei nº 2.291/1986, assumiu função
95
BRASIL,Banco Central. Disponível em <http.www.bcb.gov.br\\instituicaodedesenvolvimento>. Acesso em: 21/06/2012. Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), criado em 1960 e Banco Regional de Desenvolvimento do Rio Grande do Sul (BRDE), criado em 1961.
específica de executora do programa de habitação do governo federal, e de gestora
dos recursos do fundo de garantia por tempo de serviço- o FGTS.96
Antes de analisar as atribuições do BNDES, cabe ressaltar a lei nº 4.595/64
referindo-se à composição do sistema financeiro, além dos órgãos e entidades já
citados, fazem parte as instituições financeiras bancárias organizadas como bancos
comerciais, múltiplos e caixas econômicas e as instituições financeiras não
bancárias, organizadas como bancos estaduais de desenvolvimento, bancos de
investimentos, sociedades de crédito, financiamento e investimento, sociedades de
arrendamento mercantil, cooperativas de crédito, sociedades de crédito imobiliário e
as associações de poupança e empréstimos, além das sociedades ou agências de
fomento e das sociedades de crédito ao microempreendedor.97
2.3 AS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS DE DESENVOLVIMENTO- O BNDES A
GESTÃO DE FUNDOS PARAFISCAIS DE POUPANÇA COMPULSÓRIA E A
ATIVIDADE DE FOMENTO
Como se pode perceber com a descrição das atribuições dos principais
agentes que compõem o sistema financeiro nacional, vários desses agentes têm,
ainda que de modo subsidiário, uma função típica de fomento a determinados
setores da sociedade. Contudo, apenas as instituições financeiras de
96
PINHEIRO, Mauricio Mota Saboya. O Papel dos fundos parafiscais no fomento: FGTS e FAT, IPEA- Texto Para Discussão, Brasília, junho de 1997. Disponível em <http.www.ipea.gov.br\\textosdiscussaofundosparafiscais>. Acesso em: 24/07/2011. O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, é um fundo parafiscal de poupança compulsória, ao lado do FAT, que será pormenorizadamente analisado adiante. Através do art. 15 da lei nº 8.036/90, os empregadores são obrigados a depositarem mensalmente o correspondente a 8% da remuneração paga ou devida ao trabalhador em uma conta vinculada, que desde 1986, é gerida de modo centralizado pela CEF. O FGTS custeia indenização por despedida imotivada dos empregados celetistas, além disso, os recursos do fundo são utilizados para compor e financiar habitação popular, saneamento básico e infraestrutura urbana. 97
VERÇOSA, Haroldo Malheiros Duclerc. Bancos Centrais no Direito Comparado- O Sistema Financeiro Nacional e o BACEN, São Paulo: Malheiros, 2005, p.88. O critério utilizado pela lei nº 4.595/1964 para classificação das instituições financeiras é o bancário ou não bancário, caracterizado pela captação ou não de depósitos em moeda à vista. São instituições financeiras captadoras de depósitos a vista, os bancos comerciais, bancos múltiplos com carteiras comerciais, caixas econômicas e cooperativas de crédito, por outro lado são instituições financeiras não bancárias as que levantam fundos para outras formas que não o depósito a vista, como por exemplo, os bancos de investimento e sociedades de crédito.
desenvolvimento foram criadas por lei para exercer especialmente a atividade de
fomento econômico.
A principal área de atuação das instituições de desenvolvimento é o
financiamento de projetos que requerem recursos de médio e longo prazo para
investimentos em setores como indústria, agricultura, serviços e infraestrutura.
As instituições financeiras de desenvolvimento são figuras comuns no
mercado de crédito de vários países, e podem ainda ter características de órgãos
supranacionais, com âmbito de atuação internacional, como o BID98 e o BIRD.99
No século XX, após as duas grandes guerras mundiais, os países
componentes da ONU aprovaram na Conferência de Bretton Woods, a criação do
Fundo Monetário Internacional-FMI100 e o Banco Interamericano de Reconstrução e
Desenvolvimento.101
98
BID, Banco Interamericano de Desenvolvimento. Disponível em <http.www.iadb.org\pt\banco-interamericano-de-desenvolvimento2837.html>. Acesso em: 15/06/201. O Banco Interamericano de Desenvolvimento, pessoa jurídica de direito internacional, que financia obras de infraestrutura para a América Latina e o Caribe, existe desde 1959, é formado por 48 países “acionistas”, 26 deles são membros mutuários, com 50,02% de poder de voto, 22 são membros não mutuários, eles entram com capital e têm poder de voto na Diretoria do Banco. Os membros não mutuários do BID são Estados Unidos, Canadá, Japão, Israel, República da Coréia, República Popular da China e 16 países europeus: Alemanha, Áustria, Bélgica, Croácia, Dinamarca, Eslovênia, Espanha, Finlândia, França, Italia, Noruega, Países aixos, Portugal, Reino Unido, Suécia e Suiça, os membros mutuários são: Belize, Bolívia, Colômbia, Costa Rica, El Salvador, Equador, Guatemala, Guiana, Haiti, Honduras, Jamaica, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana, Suriname, Argentina, Bahamas, Barbados, Brasil, Chile, México, Trinidad e Tobago, Uruguai e Venezuela. 99
BIRD. Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento. Disponível em <http.www.bird.com\\>.Acesso em: 15/06/2011. O Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento, também conhecido como Banco Mundial, faz, junto com a Associação Mundial para o desenvolvimento, empréstimos para países pobres e em desenvolvimento, surgiu após a segunda guerra mundial para reconstrução dos países envolvidos. É composto pelo Banco Mundial, a Internacional Finance Corporation, cujo objetivo é financiar através de empréstimos o setor privado dos países em desenvolvimento, a Internacional Development Association (IDA), e a Agência Multilateral de Garantia de Investimentos, os recursos do BIRD têm origem primeira nas ações subscritas pelos países membros, há ainda receitas com emissão de títulos e contratação de empréstimos, tem como órgão superior o Conselho de Governadores constituído dos representantes dos países membros, que delega funções a uma diretoria executiva de vinte e quatro membros, existem ainda vice-presidências regionais, divididas em departamentos, nestes há divisões setoriais como energia, saneamento básico, recursos hídricos, etc. 100
BLANCO, Sandra. The functions of the IMF and the World Bank, Global money, the good life and you: understanding the local impact of international financial institutions.1998 <http://www.uiowa.edu/erclog/webdex/Part%20one/One-III.html>. Acesso em: 24/04/2012. Em termos simples pode-se afirmar que o FMI tem atribuições relativas à política macroeconômica mundial. 101
SOUTO, Marcos Juruena Villela. Desestatização, Privatização, Concessões, Terceirizações e
Regulação. Rio de Janeiro: Lumem Iuris, 2001.
Décadas mais tarde a Organização dos Estados Americanos-OEA, à
semelhança da ONU, criou em 1989 o BID, para financiar projetos de
desenvolvimento econômico para a América Latina.
As instituições financeiras de desenvolvimento são instituições financeiras
públicas e podem ser classificadas em instituições federais de desenvolvimento com
atuação nacional, federais com atuação regional, instituições interestaduais,
estaduais, exclusivamente de desenvolvimento e estaduais de desenvolvimento na
forma de banco múltiplo com carteira especializada.
Em âmbito nacional foi a partir da década de 1950 que surgiram as primeiras
instituições de desenvolvimento no país como o Banco da Amazônia102 e o Banco do
Nordeste, além do próprio BNDES.
O BNDES é a mais importante instituição financeira de desenvolvimento do
país, é o principal mecanismo utilizado para possibilitar o desenvolvimento nacional
e a aplicação da política de investimentos do Governo Federal.103
Mesmo como instituição financeira voltada ao papel de fomento ao
desenvolvimento nacional, o BNDES está submetido à regulação e fiscalização do
Banco Central, aplicando-se à Instituição todas as regras pertinentes às demais,
relativas aos mecanismos prudenciais e aquelas decorrentes dos acordos da
Basiléia.104
102
CENTRAL, Banco. Disponível em <http.www.bc.gov.br\\basa>. Acesso em: 16/06/2011.O Banco Amazônia S.A (BASA) foi criado em 1966 e tem o objetivo de desenvolver a área conhecida como Amazônia legal, constituída de parte dos Estados do Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima e partes do Maranhão, Mato Grosso e Tocantins. 103
FINEP, Financiadora de Estudos e Projetos. Disponível em <http.www.finep.gov.br>.Acesso em: 17/07/2011. A FINEP- Fundação Pública Federal de Desenvolvimento Tecnológico, criada em 1965, e a instituição de desenvolvimento empresarial, SEBRAE, criada em 1972, também podem ser consideradas como instituições de desenvolvimento e com atividade típica de fomento, a FINEP é a principal agência de financiamento a projetos tecnológicos do país, foi organizada sob a forma de empresa pública e tem como principal meta a execução de estudos, projetos e programas de desenvolvimento econômico, social, cientifico e tecnológico de instituições públicas e privadas 104
SOBREIRA, Rogério; MARTINS, Noberto Montani. Os Acordos de Basiléia e os bancos de desenvolvimento no Brasil: uma avaliação do BNDES e do BNB. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, nº45, mar-abril, 2011. O acordo da Basiléia, do qual o Brasil é signatário, trazem regras específicas para o setor bancário, com aplicabilidade obrigatória para os países acordantes, em síntese as regras previstas nos acordos internacionais buscam trazer mecanismos prudenciais de regulação, visando garantir a solvência das instituições financeiras, Resolução 2099-1994 do Banco Central, traz os valores mínimos de patrimônio líquido a serem observados pelas instituições financeiras.
Originariamente o BNDES foi constituído como uma autarquia federal no ano
de 1952, pela lei nº1.628 com a finalidade de financiar, em longo prazo, a formação
de infraestrutura essencial ao aprofundamento do processo de industrialização
brasileiro.105
As instituições públicas de desenvolvimento tiveram um papel determinante
no modelo brasileiro de financiamento da industrialização após a década de 1950. A
criação do BNDES na década de 1950 teve papel decisivo no processo de
industrialização nacional com a oferta de crédito público para o fomento de diversos
setores,nas décadas de 1950 e 1960, com destaque para o desempenho da
instituição no apoio ao plano de metas (1956-1961), no período do “milagre
econômico” (1968-1973) e do II plano nacional de desenvolvimento (1974-1979),
representando mais de 50% da oferta de crédito público.106
Com a criação do BNDES a principal fonte de receita à época inicial era de
natureza estritamente fiscal, destinou-se em princípio o adicional restituível de 15%
cobrado sobre o imposto de renda, introduzido em 1951, com o objetivo de constituir
o Fundo de Reaparelhamento Econômico – FRE, para financiar o crescimento e o
desenvolvimento econômico do país.
Entre 1965 e 1966, o adicional ao imposto de renda foi substituído por um
mecanismo automático de crédito, destinado diretamente ao BNDES, no percentual
de 20% da arrecadação efetiva do imposto de renda.
A partir de 1968 as fontes de recurso do BNDES foram diversificadas,
inclusive através de captação de recursos no mercado financeiro internacional. Até
1973 a maior parcela dos novos recursos que ingressaram nas receitas do BNDES
originou-se principalmente, de reservas monetárias, dotações orçamentárias do
governo federal e captações externas, com tais fontes de recurso e dependendo de
orçamento governamental, o que limitava a atuação do Banco.
Na visão desenvolvimentista de então, a prioridade para a aplicação dos
recursos destinava-se ao financiamento de alguns setores da indústria nacional. Não
105
SANTOS, Viviam Machados dos. Por dentro do FAT. Revista do BNDES, Rio de Janeiro, nº26. Disponível em <http.www.bndes.gov.br\\revistapordentrodofat>. Acesso em: 18/03/2012. 106
HERMANN, Jennifer. Vetores do Desenvolvimento. Revista Rumos, maio de 2012. Disponível em <http.www.abde.or.br\\uploadsreflexao>.Acesso em: 15/05/2012.
havia, por assim dizer, uma vinculação evidente entre a atuação de fomento do
BNDES e o financiamento de setores da sociedade que também careciam de
investimentos, principalmente em termos de infraestrutura, como por exemplo, para
o segmento de saneamento básico.
Essa postura da Instituição voltada especificamente para a intervenção no
setor industrial da economia resta claro, ao analisar-se a constituição original do
BNDES.
Em princípio, o BNDES foi formado por um microssistema a partir de quatro
empresas públicas subsidiárias que atuavam em subáreas específicas, voltadas à
concretização de uma política desenvolvimentista que pretendia financiar alguns
setores da indústria nacional, considerados estratégicos.
Isso fica claro ao se observar que as quatro instituições subsidiárias que o
compunham eram voltadas especificamente para a área industrial e de insumos à
indústria, como a FINAME- agência especial de financiamento industrial, voltada
para o financiamento de máquinas industriais para as empresas nacionais.
Além dela havia a EMBRAMEC- Empresa Mecânica Brasileira S.A, que tinha
como objetivo fundamental impulsionar o processo de substituição de importações
de bens de capital ampliando como consequência, a capacidade de produção
instalada no país; a FIBASA: insumos básicos S.A financiamentos e participações,
com o objetivo de desenvolver empreendimentos nacionais voltados à produção de
insumos básicos; e a IBRASA: Investimentos Brasileiros S.A, visando reforçar a
capitalização das empresas nacionais, atuando como acionista minoritário do capital
social de várias empresas.
Posteriormente essa configuração sofreu alterações e houve a fusão da
EMBRAMEC, FIBASA e IBRASA, originando a BNDES Participações S.A-
controlada pelo BNDES, dando a feição atual da instituição. Hoje é composta pelo
próprio Banco de desenvolvimento e suas duas empresas, a agência especial de
financiamento industrial FINAME e a BNDES Participações S.A (BNDESPAR).
Com a lei nº 5.662/1971, o BNDES passou à forma de empresa pública107
atualmente subordinada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio
Exterior. Já nessa época, com o II Plano Nacional de Desenvolvimento (PNDI-II), as
arrecadações do PIS e do PASEP passaram a fazer parte de modo permanente e
regular das receitas da instituição financeira para aplicação em investimentos e
financiamentos em consonância com as diretrizes aprovadas pelo governo federal.
A Constituição de 1988 sacramentou a função de fomento do
desenvolvimento nacional da instituição ao prever no art. 239, a destinação de pelo
menos 40% do FAT para integração das receitas do banco, destinados ao fomento
de vários setores da economia e da sociedade.
Sob a ótica da especialização a política de investimentos, cuja execução foi
cometida ao BNDES, pode ser definida como sendo de fomento e de financiamento
de médio e longo prazo, voltada ao desenvolvimento do país, através da
operacionalização de fundos sociais parafiscais.108
Os fundos sociais ou parafiscais são mecanismos financeiros e contábeis, de
poupança compulsória, utilizados para captação interna de recursos vinculados a
uma função, normalmente de seguro social, e também destinados ao fomento do
desenvolvimento econômico.
Os maiores fundos sociais do país são o FGTS, instituído pela lei nº
5.107/1966, que tem notória função de seguro social ao prever indenização aos
trabalhadores dispensados sem justa causa, e ainda o financiamento do setor de
habitação, e o FAT, criado pela lei nº 7.998/1990, responsável pelo custeio de
programas sociais como o seguro desemprego e alimentação subsidiada ao
trabalhador.
107
DI PIETRO, Maria Silvia Zanella. Parcerias na Administração Pública, São Paulo: Atlas, 2011, p.148. Nas empresas públicas, o capital é inteiramente público. A figura foi concebida como descentralização por serviços, em que o Poder Público cria, por lei, a pessoa jurídica, e a ela outorga titularidade de determinado serviço público. Em vez de se instituir autarquias ou fundação pública que tem regime jurídico semelhante ao da administração direta, dá-se preferência às formas empresariais, precisamente pelo fato de que seu regime jurídico de direito privado e sua forma de organização e funcionamento são mais compatíveis com o caráter industrial ou comercial de determinados serviços públicos. 108
TURCZIN, Sidnei. O Sistema Financeiro Nacional e a Regulação Bancária. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2005, p.165.
A gestão dos dois fundos, tanto o FGTS como o FAT, fica a cargo de
instituições financeiras públicas que compõem o sistema financeiro nacional, o
primeiro é gerido pela Caixa Econômica Federal e o segundo pelo BNDES, no caso
do percentual de 40%, denominado de “FAT-Constitucional”, previsto no art. 239 da
Constituição.
No caso do percentual do FAT-Constitucional, as receitas não são somente
geridas pelo BNDES, na verdade esse percentual passa a compor os recursos
ativos do BNDES como receita destinada ao cumprimento dos fins institucionais do
banco.109
Esses dois fundos sociais, o FGTS e o FAT, têm natureza parafiscal, sendo
bom destacá-los dos fundos de poupança compulsória de natureza fiscal. Nessa
hipótese os recursos que compõem os fundos fiscais são oriundos diretamente da
arrecadação dos impostos por meio da vinculação de certos percentuais.
Na Constituição de 1988, o art. 159, inciso I, alínea c, previu a formação de
fundos fiscais para desenvolvimento da região norte, nordeste e centro-oeste, em
cumprimento aos objetivos previstos no art. 3º, inc. III, de reduzir as desigualdades
regionais. Esses fundos de natureza fiscal, conforme se destacou anteriormente,
também têm destinação específica, que pode ser de fomento a determinadas
atividades de relevância regional.
Já os fundos sociais de natureza parafiscal aqui tratados têm seus recursos
originados na cobrança de contribuições sociais ou de contribuições de intervenção
no domínio econômico, especialmente criadas por lei com esta finalidade.
Com a destinação constitucional dos recursos oriundos dos fundos
parafiscais, o BNDES ganha mais relevância no cenário econômico e social,
sobressaindo a característica de Instituição Financeira voltada ao desenvolvimento
do país na ampliação do financiamento de políticas públicas, e não mais só de
109
SANTOS, Viviam Machado dos. Por dentro do FAT. Revista do BNDES, Rio de Janeiro, nº26. Disponível em <http.www.bndes.gov.br\\revistapordentrodofat>. Acesso em: 18/03/2012. A lei complementar nº 19/1974 determina que as arrecadações relativas ao PIS/PASP passassem a figurar como fonte de recursos para o BNDES, porém a fixação do percentual de 40% do FAT, só veio com a Constituição de 1988. A Lei complementar nº 26/1975 determinou a unificação das contribuições do PIS/PASEP, sob a denominação de FUNDO PIS/PASEP.
alguns setores da economia, como foi no passado, em que a atividade de fomento
destinava-se quase exclusivamente ao setor industrial.
Decerto que a gestão de recursos financeiros constituídos por fundos sociais,
como o caso do FGTS e do FAT-Constitucional tem grande relevância, pois se trata
da gestão de um patrimônio nacional e coletivo. Já que toda a população é
poupadora, por certo que a destinação dos recursos deve corresponder às
expectativas da sociedade, com aplicação destinada aos segmentos com maior
demanda social, capazes de promover o desenvolvimento do país e alcançar os
objetivos de erradicação da pobreza, redução das desigualdades sociais e regionais
e promoção do bem comum.
O FAT como fundo parafiscal de poupança compulsória se originou da
necessidade de regulamentar os direitos sociais previstos no art. 7º da Constituição
de 1988 que estabeleceu o seguro desemprego como direito social dos
trabalhadores, no caso de despedida sem justa causa, e previu no art. 239 a fonte
de custeio com as contribuições do PIS/PASEP.
É importante analisar detalhadamente o FAT-Constitucional por se tratar da
principal fonte de receita do BNDES, o Fundo de Amparo ao Trabalhador - FAT110 é
um fundo especial, de natureza contábil-financeira, vinculado ao Ministério do
110
BRASIL, Ministério do Trabalho e Emprego. Disponível em<http. www.mte.gov.br\\fatlegislacao>. Acesso em: 20/10/2012. Legislação aplicável ao FAT: art. 239 da Constituição Federal, que dispõe sobre a arrecadação decorrente do programa de integração social, LC nº07/1970, institui programa de integração social, LC nº 08/1970, institui programa de patrimônio do servidor público, a LC nº19/1974, dispõe sobre a aplicação dos recursos gerados pelo Programa de Integração Social (PIS) e pelo Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PASEP). A LC nº 25/1974 unificou os programas do PIS-PASEP, a lei nº 7.998/1990 regula o Programa do Seguro-Desemprego, o Abono Salarial Institui o Fundo de Amparo ao Trabalhador - FAT, e dá outras Providências, a lei nº8.019/1990 destina a arrecadação para o PIS e o PASEP integralmente ao FAT e dispõe sobre a remuneração dos recursos do FAT recebidos pelo BNDES. A lei nº8.352/1991 dispõe sobre as disponibilidades financeiras do Fundo de Amparo ao Trabalhador - FAT, e dá outras providências. A lei nº 9.365/1990, institui a Taxa de Juros de Longo Prazo e dispõe sobre as remunerações do FAT e de outros fundos. A lei nº 11.786/2008 autoriza a União a participar do Fundo de Garantia para a Construção Naval - FGCN para a formação de seu patrimônio; altera as Leis nº 9.365/1996, nº5.662/1971, nº9.019/ 1995, nº11.529/2007, nº6.704/1979, e nº 9.818/1999 e dá outras providências. O decreto nº 6.827/2009 dispõe sobre a composição do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador - CODEFAT e do Conselho Curador do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - CCFGTS e dá outras providências. A lei nº11.933/2009 altera a Medida Provisória nº 2.158/35, de 24 de agosto de 2001, as leis nº 10.637/2002, nº10.833/2003, nº8.383/1991,nº 11.196/2005, nº8.212/1991,nº 10.666/2003, e nº11.907/2009, revogando ainda dispositivos das leis nº 11.033/2004, nº11.488/2007, e nº8.850/1994, para alterar o prazo de pagamento dos impostos e contribuições federais que especifica, reduzir a base de cálculo da contribuição do produtor rural na venda dos produtos que especifica e efetuar ajustes na tributação do cigarro; e dá outras providências.
Trabalho e Emprego - MTE, tem característica de seguro social já que percentual
dele é destinado ao custeio do seguro desemprego, do abono salarial e de
alimentação subsidiada para o trabalhador, e percentual dele é destinado ao
financiamento de projetos de desenvolvimento econômico para o país.
A principal fonte de recursos do FAT é composta pelas contribuições para o
PIS, criado por meio da LC n° 07/1970, e para o PASEP, instituído pela LC nº 08/
1970.
O fluxo básico de entrada de recursos no PIS/PASEP é a arrecadação das
contribuições, sendo estas divididas em contribuições para o PIS (contribuintes do
setor privado) e contribuições para o PASEP (contribuintes do setor público). Os
contribuintes são, necessariamente, empregadores.
O PIS/PASEP passou gradativamente a ter grande importância no orçamento
do BNDES, com um fluxo de receita seguro e previsível com isso a dependência de
repasses orçamentários do orçamento geral da União diminuiu, aumentando a
capacidade financeira e a autonomia da Instituição.
E essa é a principal vantagem na gestão de recursos formados pelas
contribuições do PIS/PASEP, o fato de ser uma fonte de recursos desvinculada do
orçamento geral da União, o que preserva o BNDES das disputas correntes pelos
recursos da arrecadação dos impostos federais, assim os recursos disponíveis para
os investimentos da Instituição Financeira contam com fonte fixa e previsível. Já
quando os recursos são oriundos do orçamento geral da União e estão disponíveis
através de outras Instituições Financeiras públicas, como a Caixa Econômica
Federal, estes recursos orçamentários estão sujeitos inclusive a emendas
parlamentares, o que diferencia substancialmente a atuação do BNDES como vetor
do desenvolvimento econômico.
Além dos anteriores, o fato de possuir uma fonte de recursos estável
viabilizava a abrangência, por parte do BNDES, das crescentes demandas por
financiamento em longo prazo, principalmente para os setores que demandam altos
investimentos e imobilização de ativos, como os setores de infraestrutura.
As regras atuais que especificam as contribuições do PIS/PASEP foram
estabelecidas pelo decreto-lei nº 2.445/1988, e são contribuições do PIS: 1% da
folha de pagamento nos casos de cooperativas, condomínios e outras instituições
sem fins lucrativos, e 0,65% da receita operacional bruta no caso das demais
pessoas jurídicas de direito privado; e para as contribuições do PASEP 1% das
receitas correntes arrecadadas somadas as transferências recebidas de outras
entidades da Administração Pública, no caso da União para os Estados e
Municípios, o percentual é de 0,65% para as autarquias o percentual é 0,65% das
receitas orçamentárias e para as empresas públicas 0,65% da receita operacional
bruta.
O principal fluxo de saída das contribuições do PIS/PASEP é a transferência
ao FAT, já que as despesas com os pagamentos dos saques e abonos pagos à
conta do PIS e do PASEP são custeados com os recursos acumulados no Banco do
Brasil e na Caixa Econômica Federal.111
O FAT é administrado pelo Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao
Trabalhador - CODEFAT, órgão colegiado de caráter tripartite e paritário, composto
por representantes dos trabalhadores, dos empregadores e do governo, que atua
como gestor do FAT. Dentre as funções mais importantes do órgão estão as de
elaborar diretrizes para programas e para alocação de recursos, de acompanhar e
avaliar seu impacto social e de propor o aperfeiçoamento da legislação referente às
políticas públicas de emprego e renda, bem como de fiscalização da administração
do FAT.
O CODEFAT estabeleceu por meio das Resoluções nº 63 e nº 80, que
tiveram pequenas e sucessivas alterações, critérios para o reconhecimento das
comissões de emprego estaduais, distritais ou municipais, que representam a
consubstanciação da participação da sociedade organizada na administração do
sistema público de emprego.
111
SANTOS, Viviam Machado dos. Por dentro... . Observa-se que essas duas instituições financeiras públicas assumiram o passivo correspondente aos direitos de saques e retiradas dos participantes do Fundo, representados pelo valor principal acrescido de correção monetária e juros sobre os saldos das contas individuais dos beneficiários.
Além da arrecadação das contribuições para o PIS/PASEP, que é a fonte
básica de recursos do FAT e também o principal fluxo de financiamento da carteira
de desenvolvimento econômico do BNDES (40% FAT) e dos pagamentos dos
benefícios (seguro-desemprego e abono salarial), o FAT conta com os retornos do
agente aplicador (BNDES) sobre o saldo das transferências constitucionais do
Fundo.
O BNDES devolve ao FAT, semestralmente, o correspondente à taxa de juros
de longo prazo aplicada sobre o saldo dos recursos depositados. A devolução do
principal só é efetuada em casos excepcionais, para cobrir eventuais necessidades
extraordinárias de pagamento dos benefícios.
Compõe ainda o fluxo de recursos do FAT a remuneração dos depósitos
especiais nas instituições financeiras oficiais federais. Tal remuneração é variável,
segundo os convênios firmados entre o FAT — via Conselho Deliberativo do FAT
(CODEFAT) e as instituições federais, entretanto a remuneração mínima é dada
pela TJLP.112 Além disso o FAT conta com a remuneração das disponibilidades
financeiras depositadas no Banco Central as disponibilidades de curto prazo do
Fundo são aplicadas no BACEN e rendem o correspondente à taxa selic.113
A saída dos fluxos de receita do FAT pode ser discriminada em sete itens114
os mais relevantes para o objeto da presente pesquisa se referem às transferências
112
A lei nº 9.365/1996 instituiu a TJLP- taxa de juros de longo prazo. 113
A lei nº 9.250/1995 instituiu a SELIC- Sistema Especial de Liquidação e Custódia, como taxa de remuneração dos tributos federais. 114
SANTOS, Viviam Machado dos. Por dentro ... Além das transferências relativas ao fluxo de receitas para compor o ativo do BNDES, os recursos do FAT destinam-se às prestações do seguro-desemprego, com previsão constitucional, art. 7º, inc. II, é o principal benefício pago aos trabalhadores com recursos do FAT. A regulamentação está em lei, a grosso modo os empregados demitidos sem justa causa que preencherem uma série de condições de habilitação terão direito ao seguro, pago em determinado número de parcelas que pode variar de três até sete, e cujo valor médio tem sido em torno de 1,6 salário-mínimo. Além disso, o pagamento do abono salarial, com previsão constitucional no parágrafo 3º do art. 239, os trabalhadores que recebem até dois salários-mínimos e que participam do PIS/PASEP há pelo menos cinco anos têm direito a receber um salário mínimo anualmente. Depois existem as despesas com o Sistema Nacional de Emprego (SINE) composto pelos custos com a atividade de intermediação, entre trabalhadores desempregados e empresas interessadas em contratação, despesas com cursos de reciclagem e qualificação profissional de trabalhadores e pesquisas na área de emprego; ao contrário dos depósitos especiais. Os gastos com o SINE não representam aplicações financeiras, não gerando, por isso, qualquer retorno financeiro. Ainda, como item relativo ao fluxo de saída de recursos do FAT, pode-se indicar as despesas operacionais: trata-se de gastos indiretos com o pagamento dos benefícios e outras despesas meramente administrativas e por fim, a reserva mínima de liquidez, é composta pela reserva técnica do Fundo e, à semelhança do fundo de liquidez do FGTS, existe para garantir o pagamento dos benefícios em curto prazo. O saldo da reserva mínima de liquidez só pode ser
que irão compor o ativo dos bancos de desenvolvimento, a mais importante sem
dúvida é o percentual correspondente aos 40% da arrecadação das contribuições
para o PIS/PASEP destinados ao BNDES, com previsão em sede constitucional,
conforme já explanado.
Mas a lei nº 8.352/1991 prevê também a saída de recursos do FAT em razão
das aplicações nos depósitos especiais. Esses recursos são uma forma de aplicação
remunerada das disponibilidades financeiras do Fundo e, pelo menos em regra, têm
liquidez imediata. Os recursos são depositados em várias instituições financeiras
oficiais federais (BNDES, BB, CEF, FINEP) e, mediante convênios firmados com a
anuência do CODEFAT, financiam vários programas de geração de emprego e
renda115 como o PROGER, PRONAF, o PROEMPREGO e o PCPP, são executados
pelo BNDES.
Vale ressaltar que são dois os tipos de recursos que compõem o orçamento
do BNDES, e se originam nos recursos do FAT, primeiro o chamado “FAT-
Constitucional”, que tem caráter permanente e destinação compulsória ao Banco,
sendo também denominado de recurso ordinário.116
Esse fluxo de receita é considerado uma fonte permanente e segura de
aporte de recursos, os custos são compatíveis para a execução da atividade de
fomento do BNDES através de financiamentos que demandam longo prazo de
investimentos.
Sendo assim uma de suas principais características é o fato de seu prazo de
exigibilidade ser indefinido, motivo pelo qual seu saldo é denominado dívida
subordinada, em que não há previsão de devolução do principal, mas apenas o
pagamento semestral de juros. Como definido em resolução do Banco Central, por
aplicado no BC em títulos públicos, e seus fluxos de saída são calculados pela soma de metade das despesas do ano anterior ao de referência com o seguro-desemprego e o abono salarial. 115
MONTE, Paulo Aguiar; ARAÚJO, Tarcísio Patrício. Distribuição dos Recursos do PROGER: qual a racionalidade? Disponível em: <http :www.bnb.gov.br\contentaplicacaoETENE\anaisdocs\distribucao\pdf>. Acesso em: 04/01/2012. 116
SALLES, Ana Beatriz Tomas; DE PAULA, Paulo Breda; PINTO, Marco Aurélio Cabral. A Revitalização do sistema público de fomento como canal para acesso financeiro das MPEs. Revista do BNDES, Rio de Janeiro. v. 14, nº 27, jun.2007. Disponível em <http.www.bndes.gov.br\\revistarevitalizacaosistema>.Acesso em: 18/05/2012.
ser dívida subordinada, parte do saldo do “FAT-Constitucional” pode ser computado
para efeito de cálculo do patrimônio de referência do BNDES.117
Outra característica dos recursos do “FAT-Constitucional” é o fato de o
BNDES ter livre decisão sobre a aplicação dos seus recursos, desde que seja em
programas de desenvolvimento econômico, como determinado na Constituição
Federal, e desde que sejam respeitadas as normas definidas na política operacional
da Instituição Financeira.
Além do “FAT-Constitucional” de natureza compulsória, existem os recursos
oriundos dos depósitos especiais para o fundo, é o “FAT-DE”, para atender
programas e linhas de crédito específicas. Essa modalidade de recursos constitui
parte do patrimônio do FAT e resulta do excesso da arrecadação em relação aos
dispêndios previstos na legislação, ocorrido em exercícios anteriores.
Os depósitos especiais configuram uma modalidade de recurso destinado à
atividade de fomento das instituições financeiras oficiais federais, na modalidade
financiamento, eles têm origem nas disponibilidades do FAT quando excedentes às
reservas mínimas do fundo previstas em lei, com prazos de devolução
predeterminados.
Os recursos captados dessa forma são aplicados em setores e programas
específicos previamente determinados e aprovados pela Secretaria Executiva do
Conselho Deliberativo do FAT, ou seja, se os recursos que serão aplicados pelas
instituições financeiras públicas tiverem origem no FAT-DE, a instituição financeira
oficial deve submeter os planos de trabalho do projeto que irá receber os recursos
financeiros também à aprovação da secretaria do FAT.
Portanto, diferentemente do FAT - Constitucional tais recursos não são de
livre aplicação pelo BNDES, mas têm destinação específica normatizada através de
resoluções expedidas pelo CODEFAT.
117
SOBREIRA, Rogério; MARTINS, Norberto Montani. Os Acordos da Basiléia e os bancos de desenvolvimento no Brasil: uma Avaliação do BNDES e do BNB. Revista de Administração Pública, nº45. Rio de Janeiro, mar-abril, 2011.
Atualmente o BNDES tem no FAT-DE uma fonte extra de captação de
recursos para pelo menos cincos programas voltados ao fomento de setores da
indústria nacional e ao desenvolvimento da infraestrutura do país.
Para o setor de saneamento básico não há um programa específico, contudo
o FAT-DE Infraestrutura é um programa de financiamento a projetos de
infraestrutura econômica para diversos setores como energia, transporte,
telecomunicações e logística, e a projetos de infraestrutura industrial, nos setores de
papel e celulose, siderurgia, petroquímica e bens de capital e também saneamento
básico.118
O FAT-DE Proemprego é um projeto de expansão do emprego e melhoria da
qualidade de vida do trabalhador, contempla investimentos em infraestrutura
econômica e social. Os setores apoiados pelo programa são energia, transportes
urbanos, telecomunicações, exportações, comércio e serviços, turismo,
infraestrutura viária, desenvolvimento urbano, construção naval, educação, saúde,
projetos multissetoriais integrados e modernização da administração tributária de
estados e municípios e apoio a micro, pequenas e médias empresas. Aqui os
recursos destinados a desenvolvimento urbano podem contemplar projetos de
saneamento básico.119
Além dos dois programas citados, os demais projetos a serem financiados
com recursos do FAT-Depósitos Especiais são o FAT-DE Fomentar constituído de
um programa que visa dar apoio financeiro para implantação, ampliação,
recuperação e modernização de empresas de todos os portes e setores da
economia, de modo a estimular a geração de emprego e renda e o aumento da
competitividade das empresas brasileiras.120
O FAT-DE Exportar que é um programa de financiamento ao exportador na
fase pré-embarque de bens para exportação. Seu objetivo é oferecer custos e
prazos de financiamento diferenciados ao exportador brasileiro, para possibilitar
118
BRASIL, Ministério do Trabalho e Emprego, FAT. Disponível em <http.www.mte.gov.br\\fatlegislacao>.Acesso em: 10/10/2012. Resolução nº 438/2005 CODEFAT. 119
Ibid.Resolução nº 103/1996 do CODEFAT. 120
Ibid. Resolução nº 345/2003 CODEFAT.
melhor inserção de seus produtos no concorrido mercado mundial e,
consequentemente, agregar valor à pauta exportadora brasileira.121
O FAT-DE-Pronaf Investimento que se trata de um projeto de fortalecimento
da agricultura familiar tem a finalidade de promover o desenvolvimento sustentável
do segmento constituído pelos agricultores familiares, para melhorar o desempenho
produtivo do setor e possibilitar que tais agricultores permaneçam em sua atividade
produtiva, considerado também um projeto de segurança alimentar.122
Além da gestão dos fundos parafiscais como o FAT, o BNDES administrava
também o Fundo de Marinha Mercante - FMM e o Fundo Nacional de
Desenvolvimento - FND123 que foi recentemente extinto pela medida provisória nº
517, de 30/12/2010, convertida na Lei 12.431, de 27/06/2011.
Atualmente subsiste a gestão do FPS, criado pelo decreto nº 79.459/1977,
como subconta do Fundo PIS/PASEP, destinado à realização de investimentos sob
a forma de ações ou debêntures conversíveis.
O FMM foi criado pela lei nº 3.381/1958, junto com a TRMM, Taxa de
Renovação da Marinha Mercante, arrecadada junto às companhias de navegação
estrangeiras, oficiais e armadores nacionais que operavam navios estrangeiros
afretados. Depois na década de 1980 foi transformada em AFRMN- Adicional de
121
Ibid. Resolução nº 344/2003 CODEFAT 122
Ibid. Resolução nº108/1996 CODEFAT. 123
O Fundo Nacional de Desenvolvimento - FND foi criado em 23 de julho de 1986 pelo decreto lei nº 2.288 (alterado pelo Decreto Lei nº 2.383, de 17 de dezembro de 1987) e regulamentado pelo Decreto nº 193, de 21 de agosto de 1991 (alterado pelo Decreto 3.211 de 18 de outubro de 1999 e pelo Decreto 4.981 de 06 de fevereiro de 2004). Tinha natureza autárquica e personalidade jurídica de direito público. O FND tinha por finalidade prover recursos para realização, pela União, de investimentos de capital necessários à dinamização do desenvolvimento nacional, bem como apoiar a iniciativa privada na organização e ampliação de suas atividades econômicas. Os recursos captados pelo FND originavam-se, basicamente, do lançamento de Obrigações do Fundo Nacional de Desenvolvimento (OFNDs), de longo prazo. O FND concedia, anualmente, empréstimos aos três agentes financeiros - BNDES, FINEP e Banco do Brasil - para aplicação em empresas do setor de ciência e tecnologia, exclusivamente através da FINEP; para os setores de insumos básicos e bens de consumo, via BNDES; e para pequenas e médias empresas, através do BNDES e do Banco do Brasil. O orçamento do FND integrava o Orçamento Geral da União, votado pelo Congresso Nacional. Disponível em: <http.www.bndes.gov.br/ptinstitucional/BNDES_Transparente>. Acesso em:12/06/2012.
Frete para a Renovação da Marinha Mercante, com a intenção óbvia de expandir a
política de construção naval.124
Na década de 1990, após a edição da lei nº 9.432/1997, que trouxe um novo
regime jurídico para a navegação nacional, findou a política de subsídios do BNDES
para o setor e consequentemente a gestão desse fundo parafiscal.
Além desses recursos internos vinculados, oriundos dos fundos parafiscais de
poupança compulsória já detalhadamente analisados, o BNDES recebe
subsidiariamente recursos do orçamento geral da União - OGU e também faz
captação de recursos externos, abrangendo linhas de crédito em organismos
financeiros internacionais, como o BIRD, o Eximbank do Japão e o BID.
A captação de recursos da Instituição Financeira envolve ainda o lançamento
de bônus no mercado, nas operações de capitalização de empresas por intermédio
de sua subsidiária, a BNDESPAR.
Durante o período militar, os recursos do BNDES foram muitas vezes
utilizados para aportar recursos a empresas privadas em situação de insolvência,
fazendo com que o BNDES se tornasse controlador de uma grande quantidade de
empresas no setor industrial que foram privatizadas no final da década de 1980
através de leilão em bolsas de valores.
Além disso, a partir da década de 1990 o BNDES passou a atuar como gestor
do Fundo Nacional de Desestatização fornecendo suporte financeiro, administrativo
e técnico para o Programa Nacional de Desestatização.
O BNDES tem ainda, sem sombra de dúvida, papel de integração
desenvolvimentista nacional como principal agente para concessão de empréstimos
e financiamentos, inclusive para entes públicos, como Municípios e Estados que de
outra sorte diante da divisão orçamentária e das competências tributárias da
Constituição Federal, não teriam recursos econômicos para o custeio e implantação
nas áreas de serviços públicos, como por exemplo saneamento básico, transporte
urbano, etc.
124
GOULART FILHO, Alcides. A Trajetória da marinha mercante brasileira: administração, regime jurídico e planejamento. Pesquisa e Debate, São Paulo, v. 21, nº2, 2010.
Mais um setor a receber investimentos através do BNDES foi instituído com
Fundo de Estruturação de Projetos - FEP, em 2008, constituído com parte dos lucros
anuais do BNDES. Os recursos do FEP são destinados ao apoio financeiro não
reembolsável da instituição às pesquisas científicas ou técnicas relacionadas ao
desenvolvimento econômico e social do Brasil e da América Latina que possam
orientar a formulação de políticas públicas.
No setor de saneamento básico, conforme será mais bem detalhado no
capítulo seguinte, somente com a instituição do FGTS em 1967 e do PLANASA em
1968, definindo um plano de investimento em escala nacional para o saneamento
básico, é que houve direcionamento programado de recursos para o setor, pois até
então a maioria dos recursos investidos eram oriundos do orçamento geral dos
Entes Públicos, complementados com recursos externos do BIRD.
2.4 O PLANEJAMENTO ESTATAL E A ATIVIDADE DE FOMENTO DO BNDES- DO
PLANO DE METAS AOS PROGRAMAS DE ACELERAÇÃO DO CRESCIMENTO
(PACS)
Na Constituição de 1988, o art. 174 prevê que o Estado tem função de
agente normativo e regulador da atividade econômica exercendo, nos termos da lei,
as funções de fiscalização, incentivo e planejamento125 sendo este determinante
para o setor público e indicativo para o setor privado.
Para autores como Luís Cabral Moncada o planejamento econômico pode ser
definido como ato jurídico administrativo que define e hierarquiza objetivos de
política econômica de determinado governo, com a conjugação de prazo e medidas
adequadas à sua execução.126
125
CARDOSO JUNIOR, José Celso, Planejamento governamental e gestão pública no Brasil: elementos para ressignificar o debate e capacitar o Estado, Texto para Discussão, IPEA, março de 2011. Disponível em <http.www.ipea.gov.br\\textoparadiscussaocardoso>. Acesso em: 19/12/2012.No contexto brasileiro a função de planejamento estatal tem contornos próprios e que a estruturação das instituições, das organizações, dos instrumentos e dos procedimentos, necessárias à administração e à gestão pública cotidiana do Estado, atividades estas tão cruciais quanto às de planejamento para o movimento de desenvolvimento das nações, padeceu no Brasil de grande atavismo, a despeito de iniciativas deflagradas na época de Getúlio Vargas e mesmo dos governos militares. 126
MONCADA, Luís S. Cabral. Direito Econômico. 6ª ed. Coimbra: Ed. Coimbra, 2002, p.144.
Para autores nacionais como José Afonso da Silva o planejamento pode ser
identificado com uma ação articulada e sistemática do Estado:
O processo de planejamento passou a ser um mecanismo jurídico por meio do qual o administrador deverá executar sua atividade governamental na busca da realização das mudanças necessárias à consecução do desenvolvimento econômico-social.
127
A atuação estatal integrada para a consecução de determinados objetivos se
dá em duas etapas, envolvendo a setorização e ação estatal articulada. A primeira
etapa visa o diagnóstico do setor econômico, no qual se procura detectar e retratar
as carências, expectativas e anseios da sociedade, contabilizando-se os dados
globais, regionais e setoriais da atividade econômica que se visa intervir, e a
segunda etapa se refere ao prognóstico no qual, observando-se os recursos
efetivamente disponíveis, propõem-se medidas e metas para atacar as carências e
atender às expectativas e anseios da sociedade.128
No ordenamento jurídico infraconstitucional, o decreto-lei nº 200/1967 tratou
da reforma administrativa federal, mencionando o planejamento em seu art. 6º e 7º
como o primeiro princípio a ser observado no desempenho das atividades
administrativas, demonstrando que a expressão planejamento muitas vezes
identifica-se mais com o sentido de gestão pública orçamentária do que realmente
de instrumento de implementação de políticas públicas.129
É preciso consignar que a disposição constitucional do parágrafo 1º do art.
174 da Constituição prevê a função de planejamento visando ao desenvolvimento
nacional, e não à intervenção na economia com a finalidade de planificação, nesse
sentido o planejamento não se confunde com intervenção estatal na economia:
127
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 34ª ed. São Paulo:Malheiros, 2011, p.88. 128
SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito Administrativo Econômico. Rio de Janeiro: Lumem Iuris, 2003. p.173. 129
Decreto-lei nº 200/1967. Art. 7 ( . .. ) a ação governamental obedecerá ao planejamento que vise promover o desenvolvimento econômico-social do país e a segurança nacional, norteando-se segundo planos e programas elaborados na forma do título III, e compreenderá a elaboração e atualização dos seguintes instrumentos básicos: I-Plano Geral de Governo
a) Programas gerais, setoriais e regionais, de duração plurianual; b) Orçamento programa-anual; c) Programação financeira de desembolso;
Quando referida atuação em relação à atividade econômica em sentido estrito – intervenção - apenas a qualifica; não configura modalidade de intervenção, mas simplesmente um método mercê de cuja adoção ela se torna sistematizadamente racional. É forma de ação racional caracterizada pela previsão de comportamentos econômicos e sociais futuros, pela formulação explícita de objetivos e pela definição de meios de ação coordenadamente dispostos. O planejamento, portanto, apenas qualifica a intervenção no domínio econômico na medida em que esta, quando consequente ao prévio exercício dele, resulta mais racional. Como observei em outro texto, forma de ação racional caracterizada pela previsão de comportamentos econômicos e sociais futuros, pela formulação explícita de objetivos e pela definição de meios de ação coordenadamente dispostos, o planejamento, quando aplicado à intervenção, passa a qualificá-la como encetada sob padrões de racionalidade sistematizada. Decisões que vinham sendo tomadas e atos que vinham sendo praticados, anteriormente, de forma aleatória, ad hoc, passam a ser produzidos, quando objeto de planejamento, sob um novo padrão de racionalidade. São inconfundíveis, de um lado, o planejamento da economia-centralização econômica, que importa a substituição do mercado como mecanismo de coordenação do processo econômico, pelo plano de outro o planejamento técnico de ação racional, cuja compatibilidade com o mercado é absoluta. Quem não sabe que o planejamento é uma técnica corrente de administração empresarial. É verdadeiramente incompreensível, nestas condições, que tantas vezes se atribua a essa técnica de atuação estatal caráter socializante, o que só pode ser creditado à ignorância da noção de planejamento.
130
Tampouco há que se entender o planejamento previsto na Constituição de
1988 no pré-citado art. 174 com a identidade de signos semânticos, relativo aos
“planos” de estabilização monetária praticados comumente nas décadas de 1980 e
1990, que visavam primordialmente afastar o “fantasma” da inflação, como o “plano
Cruzado”, “plano Bresser”, “plano Verão”. Pois eles são, precisamente, expressões
de não planejamento, ou seja, de atuação estatal improvisada sem prévia definição
de objetivos, visando estancar momentaneamente dificuldades financeiras e
orçamentárias da economia.131
Não há dúvidas de que no atual estágio de desenvolvimento e complexidade
do Estado contemporâneo, o planejamento é necessário como mecanismo objetivo e
seguro de racionalizar a atuação estatal, em qualquer setor. Aliás nos últimos anos
assistiu-se a uma tendência política de legislar através de “planos” nos mais
diversos segmentos. Como será visto a seguir há uma lei que institui a política
nacional de saneamento básico, a lei 11.445/2007, que impõe a necessidade de que
Estados e Municípios elaborem “plano” municipal-estadual de saneamento básico. 130
GRAU, Eros Roberto. A Ordem . ..p. 149 e 318. 131
BNDES, Banco Nacional de Desenvolvimento. BNDES e o plano de metas. Departamento de Relações Institucionais. Brasília, 1996. Disponível em <http.www.bndes.gov.br\\planodemetas>. Acesso em: 30/11/2012.
Na lei que instituiu a política nacional de resíduos sólidos, a lei 12.305/2010, há a
mesma exigência132 só para citar os itens afetos ao tema da pesquisa.
A previsão constitucional do planejamento econômico busca definir e
identificar os segmentos que devem ser objetivo de aporte de recursos estatais ou
mesmo de políticas integradas para Paulo Henrique Rocha Scott o planejamento
deve permitir:
Escolha dos agentes ou setores econômicos que deverão figurar como destinatários do incentivo, quanto a isso, considerando o modelo socioeconômico ambicionado pela Constituição vigente, é correto afirmar a impossibilidade total de se proceder à efetiva distribuição de recursos financeiros e serviços públicos de modo geral, abstrata e sem critérios; antes pelo contrário, tal distribuição deve atender aos mais necessitados, deve voltar-se aos que não podem desaparecer do ambiente econômico e que se prestam efetiva ou potencialmente, para o seu crescimento e desenvolvimento. A função de incentivo, além de viabilizar a efetivação dos papéis atribuídos ao Estado brasileiro quando diante da atividade econômica, instrumentaliza a função estatal do planejamento.
133
O planejamento estatal deve estar de acordo com a ideologia constitucional
adotada, destina-se a propiciar a coordenação e a racionalização de investimentos e
metas para a atuação do Estado, deve estar orientado pela busca da transformação
do status quo econômico e social.134
Durante a década de 1950 a função estatal de planejamento econômico teve
um dos mais importantes expoentes, o plano de metas, implementado por meio de
uma combinação de fundos financeiros com empresas e autarquias governamentais
a coordenação do plano e a captação de recursos internos através de empréstimos
subsidiados ficou a cargo do BNDES.
A importância de sua análise não se refere somente ao fato de ter marcado
verdadeiramente a história do Governo Kubistchek, como um ideal 132
Esses planos citados são hipóteses típicas da atividade de planejamento estatal, pois são formalmente leis, só que de conteúdo técnico, há necessidade de um diagnóstico detalhado do segmento e a previsão de medidas destinadas ao setor, em ambas há ainda determinação de participação e controle social. 133
SCOTT, Paulo Henrique Rocha. Direito Constitucional Econômico: Estado e Normalização da
Economia, Porto Alegre: SAFE, 2000 134
BERCOVICI, Gilberto. Constituição Econômica e Desenvolvimento, São Paulo: Malheiros, 2005, p. 69 e 79. Antes da Constituição de 1988 o plano de metas (1956-1961), o plano trienal (1962-1963) e o II plano nacional de desenvolvimento PND-II (1975-1979), são exemplos de experiência nacional de planejamento. O primeiro, previsto durante o Governo de João Goulart, diante da instabilidade política e a interrupção do governo democrático deixou de ser aplicado. Durante o regime militar foram dois os planos, o PND I para o período de 1972-1974 e o PND II para o período de 1975 a 1979, ambos não obtiveram sucesso.
desenvolvimentista, e a ambição consagrada no jargão de promover 50 anos de
desenvolvimento em 5 anos, e sim porque foi o primeiro plano em que a captação e
gestão dos recursos financeiros ficou a cargo da então recente instituição financeira
de desenvolvimento criada com a finalidade de fomentar diversos setores nacionais,
e primordialmente o setor industrial.135
Em termos gerais, os elementos que compuseram o plano de metas podem
ser divididos em duas grandes linhas de suporte ao processo de industrialização. Na
primeira estão alinhados os investimentos governamentais em infraestrutura em
setores estratégicos como energia elétrica, executados diretamente pelo governo
federal ou através de empresas estatais e, na segunda, um extenso conjunto de
projetos voltados para a instalação, ampliação e modernização do setor secundário,
de equipamentos e insumos, que dispunha de vários tipos de incentivos creditícios e
cambiais.
Quanto aos recursos que compuseram as fontes de financiamento para
implementação dos projetos, não havendo na época fundos parafiscais de poupança
compulsória, o orçamento geral da União contribuiu com a maior parcela para o
Plano de Metas, cerca de 40% do total, mas este volume incluía os valores
destinados aos fundos especiais de investimentos, com fontes tributárias próprias e
aplicação administrada por agências específicas. Além da União os Estados, as
empresas estatais e o Banco do Brasil e o BNDES aportaram recursos.
Algumas décadas depois o BNDES se consolidou como a principal instituição
financeira de desenvolvimento nacional. Em 2008 assumiu a função de agente do
governo para o financiamento dos programas de aceleração do crescimento- PACs,
especialmente no que se refere aos setores de infraestrutura.
Os programas ou planos de aceleração do crescimento PAC1 e PAC2,
criados em 2007 através do decreto federal nº 6.025/2007, podem ser considerados
como ações de planejamento estatal através de políticas públicas de fomento,
instrumentalizadas pelo aporte de recursos via financiamentos a determinados
135
BNDES, Banco Nacional de Desenvolvimento. BNDES e o plano de metas, Departamento de Relações Institucionais, Brasília, 1996. Disponível em <http.www.bndes.gov.br\\planodemetas>.Acesso em : 30/11/2012.
setores, com ênfase em infraestrutura, visando o desenvolvimento e o crescimento
econômico do país.
O PAC 1 foi de 2007 a 2010, com ênfase no setor de infraestrutura urbana
como a construção-manutenção de estradas, portos, aeroportos, ampliação e
desenvolvimento do setor energético, saneamento básico e habitação. Os recursos
têm origem no orçamento geral da União, orçamento das empresas estatais
federais, orçamento dos Estados através de renúncia fiscal do fundo de participação
dos Estados, composto pela receita de arrecadação do imposto sobre produtos
industrializados- IPI e do imposto de renda-IR, além da previsão de recursos do
setor privado.136
O PAC 2 que abrange o período de 2011 a 2014 parece indicar um viés mais
social, com investimentos maiores em políticas públicas que visam diminuir as
desigualdades os setores priorizados englobam infraestrutura em transportes,
energia, saneamento ambiental, educação, saúde, desportos, cultura, habitação.
O BNDES tem um papel central na execução do planejamento econômico
atual previsto nos planos de aceleração do crescimento, incluindo a redução de
spreads137 básicos nas linhas de financiamento para segmentos estratégicos, tais
como energia elétrica, logística e desenvolvimento urbano, a criação de grupos de
trabalho internos para monitorar, acompanhar e responder a órgãos de controle
externo sobre os projetos do PAC na carteira do Banco e um programa específico de
financiamento para os projetos abrangidos pelo PAC no âmbito das linhas de
infraestrutura de operações com estados e municípios, e de leilões do tipo menor
tarifa.138
136
BRASIL, PAC,Plano de Aceleração do Crescimento. Disponível <http.www.pac.goc.br>. Acesso em: 25/10/2012. 137
DIAS,Victor Pina; ICHIKAVA Eduardo, Uma analise empírica entre a relação spread e risco.Revista do BNDES, nº 22, Disponível <http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/export/sites/default/bndes_pt/Galerias/Arquivos/conhecimento/revista/Rev3605.pdf>. Acesso em: 12/07/2012. O spread bancário pode ser conceituado de diferentes formas. O conceito mais difundido, baseado na clássica relação depositante banco pode ser definido como a diferença entre a taxa cobrada dos que tomam empréstimos e a taxa com a qual o banco remunera os depósitos. Outro conceito, menos restritivo, define o spread bancário como a diferença entre o custo de captação do banco e o custo cobrado pelo banco na concessão de crédito. 138
BNDES, Planos de Aceleração do Crescimento. Disponível <http.www.bndes.gov.br//execucaopac>. Acesso em: 12/07/2012.
CAPÍTULO 3 - FOMENTO AO SETOR DE SANEAMENTO BÁSICO NO BRASIL
3.1 A IMPORTÂNCIA DO SANEAMENTO BÁSICO PARA O DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL
Recentemente a Assembléia Geral das Nações Unidas aprovou uma
resolução139 afirmando o direito universal à água e ao saneamento básico.
A medida não é de cumprimento obrigatório, foi apresentada pela Bolívia e
afirma que o direito à água potável e ao saneamento básico é um direito essencial
ao pleno desfrute de uma vida digna.
A questão do saneamento básico já é objeto de análise da ONU, nos
relatórios de desenvolvimento humano, do PNUD que apresenta índices sobre as
condições econômicas e sociais dos países membros, e busca responder aos
desafios específicos e às demandas de cada país, através de uma visão integrada
de desenvolvimento.140
Os temas centrais de atuação do PNUD-Brasil são a modernização do
Estado, o combate à pobreza e à exclusão social, a conservação ambiental e uso
sustentável de recursos naturais.
O Relatório de Desenvolvimento Humano, RDH de 2006, intitulado “Além da
escassez: poder, pobreza e a crise mundial da água”, que apresenta índices sobre
139
PNUD. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Disponível em <http.www.pnud.org.br>. Acesso em: 02/03/2012. Em 2000, líderes mundiais assumiram o compromisso de alcançar os objetivos de desenvolvimento do milênio que incluem reduzir a pobreza extrema pela metade até 2015. No PNUD Brasil, há um enfoque especial para encontrar e compartilhar soluções em três áreas principais: governança democrática, redução da pobreza e energia, e meio ambiente. Mas desde a década de 1990, várias declarações sobre meio ambiente já abordavam o tema do saneamento, atribuindo à água e ao esgotamento sanitário, característica de indispensabilidade para o desenvolvimento econômico e social de qualquer país, como a “agenda 21, do Rio de Janeiro em 1992, a Carta de Montreal de 1990, a Declaração de Dublin de 1992, a Declaração de Strasbourg de 1992, Declaração de Paris de 1998, e a Declaração de Haia, sobre segurança Hídrica de 2000. 140
PIOVESAN, Flavia. Direitos Humanos e Direito Constitucional Internacional. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008. O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento atua no Brasil regulado pelo Acordo Básico de Assistência Técnica, que embasa a prestação da cooperação técnica pelas Nações Unidas no Brasil, desde sua regulamentação pelo decreto legislativo nº 11/1966 e promulgado pelo decreto executivo nº 59.308/1966.
desenvolvimento econômico e social dos países membros, apontou que no Brasil há
43,5 milhões de brasileiros sem acesso a saneamento básico e que dificilmente
chegará a cumprir a meta do milênio de levar saneamento a 85% da população até
2015.141
Para a Organização Mundial da Saúde, o saneamento básico é o controle de
todos os fatores do meio físico do homem que exercem ou podem exercer efeitos
nocivos sobre o bem-estar físico, mental e social.
Nos países pobres e em desenvolvimento as condições deficitárias nesse
segmento, causadas pela pobreza e falta de investimentos maciços, são causa
primária de elevado número de mortes e variadas patologias.142
Os dados do Censo de 2010 divulgados pelo IBGE143 e pelo Sistema Nacional
de Saneamento Básico-SNSB144 de 2008, confirmam o relatório internacional da
ONU de 2006 e apontam que a maior carência do país, na área de serviços públicos
e infraestrutura continua a ser em saneamento básico: apenas 55,4% dos 57,3
milhões de domicílios estavam ligados à rede geral de esgoto, outros 11,6%
utilizavam fossa séptica, forma de saneamento considerada adequada pelo instituto
de pesquisa.
Doenças decorrentes das más ou inexistentes condições de saneamento não
são recentes, ao contrário, a historiografia nos ensina que tais patologias
141
ABES, Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental- ABES, 2003, RS. Disponível em <http. www.abes.org.br>. Acesso em: 21/03/2012. Em 1995, cerca de três milhões de pessoas morreram em razão de doenças diarreicas (80% dessas eram crianças menores de cinco anos); o índice de internações hospitalares por doenças de origem hídrica nos países em desenvolvimento corresponde a 65%, e a mortalidade de crianças com menos de 01 ano de idade em razão dessas doenças corresponde a 30%; mais ainda: desde 1991 foram registrados 391 mil novos casos de cólera somente na América Latina e no Caribe, sendo que desse montante 19.295 foram fatais. 142
PIOVESAN, Flavia, Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional, 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008. A autora citando Paul FARMER, indica que “(...) de acordo com os dados do relatório Sinais Vitais do Worldwatch Institute (2003), a desigualdade de renda se reflete nos indicadores da saúde: a mortalidade infantil é 13 vezes maior nos países pobres do que nos países ricos; a mortalidade materna é 150 vezes maior nos países em desenvolvimento com relação aos países altamente industrializados. A falta de água limpa e saneamento mata 1,7 milhão de pessoas por ano, 90% de crianças. 143
IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Censo de 2010. Disponível em <http.www.ibge.gov.br\\censobrasileiro2010>. Acesso em: 05/05/2012. 144
SNSB. Sistema Nacional de Saneamento Básico. Disponível em: <http.www.snis.gov.br>. Acesso em: 28/05/2012. Consiste de um banco de dados administrado na esfera federal com informações sobre a prestação dos serviços de água e esgotos de caráter operacional, gerencial, financeiro, de balanço contábil e de qualidade dos serviços, aí incluídos dados sobre resíduos sólidos urbanos.
acompanharam a história da humanidade no Brasil a própria colonização europeia
foi marcada por doenças decorrentes da precariedade sanitária.145
Nesse sentido o saneamento básico deve ser examinado sob a perspectiva
do direito ambiental, mas não só, ou melhor, deve ser admitido sob a perspectiva do
direito ao desenvolvimento sustentável. As normas de preservação da natureza não
são positivadas como uma finalidade em si, pois a razão do direito ambiental como
limite jurídico à produção econômica, está na busca de uma prática produtiva social
compatível com a manutenção das bases naturais e com a melhoria da qualidade de
vida.146
Nos últimos anos, cumprindo a determinação constitucional de planejar as
políticas públicas de investimentos de modo setorizado, foi editada a lei nº
11.445/2007, que estabelece as diretrizes nacionais e a política nacional de
saneamento básico.
No art. 3º da referida lei está disposto que saneamento básico abrange
abastecimento de água potável, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo de
resíduos sólidos, drenagem e manejo das águas pluviais urbanas.147
145
GURGEL, Cristina. Doenças e Curas: O Brasil nos Primeiros Séculos, São Paulo: Contexto, 2010, p. 70. Lançar-se ao mar para trazer riquezas tinha seu preço. E ele foi alto. Incluiu uma companhia indesejada nas embarcações que deveriam transportar apenas as sonhadas fortunas: as moléstias infectocontagiosas. Essas enfermidades atravessavam oceanos e encontravam em Lisboa além da fome e da desnutrição e um número excessivo de imigrantes, o precário saneamento básico da época. O fracasso nas ações governamentais portuguesas para conter a sujeira e os dejetos jogados na rua remontavam há séculos e estava longe de ser exceção, numa esfaimada Europa cujas vilas e cidades mantinham estrutura medieval, sobretudo na falta de qualquer sistema de esgotos. Ruas estreitas, aglomeração demográfica, casas sombrias e mal ventiladas, urina e fezes correndo nas valas abertas, as populações de ratos,camundongos e incontáveis insetos. Um espaço urbano prestes a explodir a qualquer momento, como palco de um espetáculo de horror e morte. Assim, as grandes navegações se desenrolaram tendo miséria, doenças e morte como pano de fundo. 146
DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. São Paulo: Saraiva, 2008.
147 Para os efeitos desta Lei, considera-se: I - saneamento básico: conjunto de serviços,
infraestruturas e instalações operacionais de: a) abastecimento de água potável: constituído pelas atividades, infraestruturas e instalações necessárias ao abastecimento público de água potável, desde a captação até as ligações prediais e respectivos instrumentos de medição; b) esgotamento sanitário: constituído pelas atividades, infraestruturas e instalações operacionais de coleta, transporte, tratamento e disposição final adequados dos esgotos sanitários, desde as ligações prediais até o seu lançamento final no meio ambiente; c) limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos: conjunto de atividades, infraestruturas e instalações operacionais de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destino final do lixo doméstico e do lixo originário da varrição e limpeza de logradouros e vias públicas; d) drenagem e manejo das águas pluviais urbanas: conjunto de atividades, infraestruturas e instalações operacionais de drenagem urbana de águas pluviais, de transporte, detenção ou retenção
Com a discriminação dos serviços que compõem a atividade de saneamento
básico, insta observar que alguns dos itens contam com legislação própria ou
correlata. Como é o caso do sistema de abastecimento de água potável sendo
necessária breve digressão a respeito do regime jurídico específico de águas no
Brasil.148
A legislação nacional sobre águas é prolífera e esparsa, temos a codificação
mais antiga representada pelo Código de Águas, decreto-lei nº 24.643/1934149, a lei
nº 6.938/81 que traz a Política Nacional do Meio Ambiente, o Código Civil, lei nº
10.426/2002, e a lei nº 9.433/1997, que traz a Política Nacional de Recursos
Hídricos, apenas para elencar as mais importantes.
Na Constituição de 1988 algumas regras a respeito da competência dos
Entes Federados também indicam normatização a respeito das águas. No art. 20,
inc. III da Constituição de 1988 os lagos, rios e quaisquer correntes de águas em
terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com
outros países ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como
os terrenos marginais e as praias fluviais, pertencem à União.
Já aos Estados, residualmente, estão todas as águas superficiais,
subterrâneas, fluentes, emergentes e dormentes, que não pertencerem à União, por
determinação do art. 26 da Constituição.
Na lei nº 9.433/1997, no seu art. 1º, inc. I, a água é considerada como bem de
domínio público, deixando claro que a água pertence aos Entes Públicos (União e
Estados), não na categoria de bem dominial, e sim, na categoria de bem de uso
comum. Os Entes Públicos são meros gestores desses bens, para exclusivamente
realizar e garantir o interesse público.
para o amortecimento de vazões de cheias, tratamento e disposição final das águas pluviais drenadas nas áreas urbanas.
148 O serviço de abastecimento de água através de rede geral caracteriza-se pela retirada da água
bruta da natureza, adequação de sua qualidade, transporte e fornecimento à população através de rede geral de distribuição. 149
CARVALHO, Vinícius Marques de. O Direito do Saneamento Básico, São Paulo: Quartier Latin, 2010, p. 137. A regulamentação do Código de Águas se baseou nas práticas interventivas do governo norte-americano do Governo Roosevelt, no qual houve a transferência para as estruturas governamentais de poderes regulamentares do setor com o objetivo de controlar e incentivar o aproveitamento industrial das águas, principalmente dos potenciais hidráulicos, para o setor de geração de energia elétrica.
Tratando-se dos serviços de saneamento básico a questão do regime jurídico
da água ganha relevância, mesmo com a previsão expressa do art. 4º da lei nº
11.445/2007, de que os recursos hídricos não integram os serviços de saneamento
básico.
Essa importância advém da necessidade de universalização dos serviços de
saneamento, principalmente levando-se em consideração que a lei de Política
Nacional de Recursos Hídricos trouxe um paradigma a ser considerado: a água é
um bem de uso comum, limitado e dotado de valor econômico.150
Nos termos do art. 11 da lei de recursos hídricos, está prevista a outorga de
uso da água como um instrumento destinado a assegurar o controle quantitativo e
qualitativo de seu uso e o efetivo direito de acesso à água. No art.19 a mesma lei
instituiu a cobrança pelo uso da água a fim de reconhecê-la como bem econômico e
dar ao usuário uma indicação do seu valor real.
O art. 4º, parágrafo único da lei n º11.445/2007, afirma que a utilização de
recursos hídricos nos serviços de saneamento básico, inclusive para disposição ou
diluição de esgotos e outros resíduos líquidos, é sujeita a outorga de direito de uso,
nos termos da lei nº 9.433/1997.
A partir dessas características, toda e qualquer utilização da água deve levar
em consideração um imperativo: o uso sustentável desse bem.
Esse paradigma de sustentabilidade ganha relevo nos serviços de
saneamento por razões óbvias, já que a água é, por assim dizer, o objeto principal
no serviço de abastecimento.
150
DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico, São Paulo:Saraiva, 2008, p. 94-95. Ao discorrer sobre economia ambiental e o valor monetário da natureza, com base na teoria dos property rights de Ronald Coase, afirma que se procura estimar um valor para o uso dos recursos naturais, acertado pelo mercado. Assim a monetarização e a regulamentação da natureza otimizam os modos de utilização econômica e procura enquadrar o objetivo de lucro empresarial dentro de uma política empresarial ambientalmente sustentável. Contudo a autora afirma que essa atribuição de valor econômico a bens da natureza faz surgir uma nova forma de exclusão da concorrência no mercado, pois o aumento do custo da produção permite maior concentração de capital, numa clara tendência monopolista. A concorrência é paulatinamente reduzida e o mercado torna-se um oligopólio de grandes grupos, o que ocorre é a sumária transferência de uso da natureza para faixas cada vez mais estreitas da sociedade, um instrumento que seria para afastar a poluição, afasta a concorrência e concede privilégios de poluir.
Mas há ainda uma circunstância a ser considerada, e a reafirmar a relevância
econômica e social do setor de saneamento básico: a água é insumo para a
produção de alimento, logo a garantia de abastecimento ganha relevância diante da
constitucionalização do direito social à segurança alimentar e nutricional.151
Quanto ao serviço de coleta e tratamento de esgoto, a questão da
sustentabilidade ganha mais importância ainda, pois a realidade nos mostra que a
mera coleta, o afastamento e despejo in natura dos esgotos nos corpos d’água
constituem uma das mais graves fontes de contaminação e poluição hídrica.152
Outro dos itens elencados no art. 3º da lei nacional de saneamento básico a
ganhar regulação legal à parte é a questão relativa ao manejo dos resíduos sólidos,
com a recente edição da lei nº 12.305/2010, que trata da política nacional de
resíduos sólidos e dá outras providências.
A gestão adequada e ambientalmente correta dos resíduos sólidos é questão
de suma importância para garantir a proteção ao meio ambiente sadio, a nova
legislação traz explicitamente a previsão de fomento ao setor, merecendo análise
em capítulo próprio.
3.2 SANEAMENTO BÁSICO: SERVIÇO PÚBLICO OU ATIVIDADE ECONÔMICA
Após frisar a relevância do saneamento básico, que é quase intuitiva, é
preciso delimitar o contexto de aplicação dos institutos incidentes a fim de explicitar
se saneamento básico pode ser classificado como serviço público ou como uma
atividade meramente econômica, pois essa diferenciação implicará em regimes
jurídicos e planejamento de políticas públicas distintos pelo Estado.
151
A Emenda Constitucional nº 64, de 04/02/2010 introduziu o direito social a alimentação no art. 6º da Constituição de 1988, passando a vigorar com a seguinte redação: são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância,à assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. Grifo nosso. 152
IBGE, 2008. Disponível em <http.www.ibge.gov.br\\pnsb>. Acesso em: 14/05/2012. A Pesquisa do Plano Nacional de Saneamento- PNSB-2008 do IBGE aponta que apenas 28,5% dos municípios brasileiros fizeram tratamento de seu esgoto, provocando impacto muito negativo na qualidade de nossos recursos hídricos.
Allaôr Café Alves observa que a distinção entre atividade econômica e serviço
público não reside em fácil conclusão de “natureza das coisas”, e sim depende do
modo como se consideram as necessidades coletivas a serem satisfeitas em
determinadas conjunturas históricas, oriundas de conflitos de interesse entre capital
e trabalho.153
Haverá por assim dizer uma “escolha” do legislador constituinte pelo regime
de serviço público ou atividade econômica, moldada pelos avanços e mesmo pelos
anseios da sociedade em busca de desenvolvimento.
Quando uma determinada atividade é considerada serviço público, o regime
jurídico a que está afeto é diferenciado do regime jurídico de uma atividade
econômica.
Como bem preleciona o autor, ao elencar as características do regime de
direito público a que se submetem os serviços públicos, destaca:
O serviço é público e não mera atividade econômica porque está sob regime de direito público, isto é, não sujeito às regras de mercado. Ele se diferencia da atividade econômica quanto ao modo de prestação, aos fins a que está vinculado, à relação entre controle e prestação, às obrigações fiscais, à supremacia sobre o interesse particular, à adequabilidade e universalidade da prestação, ao regime de retribuição pela prestação, à forma de transferência de seu exercício para terceiros, à continuidade e qualidade do serviço, à legalidade das atividades que o compõem etc.
154
Não há uma definição constitucional de serviço público ou mesmo de
atividade econômica, portanto há um espaço político para definir determinada
atividade como serviço público ou como atividade econômica, mas a interpretação
deve ser guiada pelas normas e princípios da Constituição.
Dentre os princípios que podem orientar a definição de uma atividade como
serviço público, por certo que o princípio da dignidade da pessoa humana, senão o
mais relevante de todos os princípios constitucionais deve prevalecer na exegese
interpretativa.
153
ALVES, Alaôr Café. Saneamento Básico. São Paulo:EDIPRO, 1998. 154
Ibid., p.21.
Para Celso Antonio Bandeira de Mello, a diferenciação entre as atividades
econômicas e as atividades consideradas como serviço público, são decorrentes do
regime jurídico de direito público afeto a este último:
“A atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada à satisfação da coletividade em geral, mas fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus deveres e presa por si mesmo ou por quem lhe faça às vezes, sob um regime de direito público, portanto, consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais- instituído em favor dos interesses definidos como públicos no sistema normativo. Ao erigir-se uma atividade em serviço público, bem relevantíssimo da coletividade, quer-se também impedir, de um lado, que terceiros os obstaculem e, de outro, que o titular deles, ou quem haja sido credenciado a prestá-los, procedam por ação ou omissão, de modo abusivo, quer por desrespeitar direitos dos administrados em geral, quer por sacrificar direitos ou conveniências dos usuários dos serviços. Portanto, a principal característica diferenciadora de uma atividade considerada como serviço público e uma atividade meramente econômica, é o substrato material da atividade e o regime de direito público a que está submetida sua prestação. Esta unidade normativa, o regime de direito público, é formada por princípios e regras caracterizados pela supremacia do interesse público sobre o interesse privado e por restrições especiais, firmados uns e outros em função da defesa de valores especialmente qualificados no sistema normativo.
155
O autor deixa claro que esse conceito de serviço público é restrito, frente à
relevância do tema, principalmente se comparado com o direito francês que o
desenvolveu amplamente.
A França tem enorme importância na construção jurídica da noção de serviço
público nos países latino-americanos e no Brasil, a teoria do serviço público
expressa, em grande parte, a doutrina desenvolvida nesse país. Leon Duguit é um
dos exponenciais da doutrina francesa (2001 apud ARAGÃO, 2008) a definição
sociológica do jurista francês para serviço público é útil para entender a necessidade
de classificação da atividade de saneamento como serviço público:
Serviço público é toda atividade cujo cumprimento deve ser regulado, assegurado e fiscalizado pelos governantes, por ser indispensável á realização e ao desenvolvimento da interdependência social, e de tal natureza que só possa ser assegurado plenamente pela intervenção da força governante.
156
155
MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008. 156
ARAGÃO, Alexandre dos Santos. Direito dos Serviços Públicos. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p.45.
Além de Duguit, a definição do professor francês Gaston Jeze (1914 apud
ARAGÃO 2008) também contribui para justificar a sistemática nacional de definir
formalmente o serviço público através de um regime jurídico de direito público:
“Para satisfazer regular e continuamente determinada categoria de necessidades de interesse público, há um regime jurídico especial, que sempre pode ser modificado pelas leis e pelos regulamentos. Todas as vezes que se está diante de um serviço público propriamente dito se constata a existência de regras jurídicas especiais, que têm por objeto facilitar funcionamento regular e contínuo do serviço público, de dar a mais rápida e completa possível satisfação às necessidades de interesse público; e essas regras, justamente por essas razões são modificáveis a qualquer instante [...]. Em suma, o serviço público é um mecanismo - e não apenas o único mecanismo para a satisfação das necessidades de interesse público, o que significa que teorias e regras especiais são aplicáveis, que há um regime jurídico especial, regime jurídico esse que é legal e regulamentar”.
157
Com base na atual Constituição, principalmente após as reformas da década
de 1990 que privatizaram vários serviços que eram prestados pelo Estado, diga-se
de passagem de modo sabidamente ineficiente, como por exemplo o setor de
comunicação e dentre eles a telefonia, é simples concluir que há um ponto de
interligação indissociável entre atividade econômica e serviço público.
A questão do serviço público apresenta uma faceta econômica na medida em
que envolve uma alocação de recursos materiais (escassos) para satisfação de
certas necessidades humanas. Como esses recursos materiais comportam
diferentes destinações, impõe-se escolher um destino para eles, dentre os diversos
possíveis.
Considerando o tema sob o prisma da opção por determinada destinação
para os recursos materiais, é forçoso reconhecer que o serviço público apresenta
certamente uma manifestação de cunho econômico.158
Portanto, sob esse enfoque não haveria maior diferenciação entre serviço
público e atividade econômica. Em ambos os casos depara-se com uma situação
comum: recursos materiais escassos e fins potencialmente excludentes entre si a
satisfazer.
157
ARAGÃO, Alexandre dos Santos. Direito dos ... p.47. 158
JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria Geral das Concessões de Serviços Públicos. São Paulo: Dialética, 2003.
Nesse mesmo sentido o serviço público é uma espécie de atividade
econômica, segundo Eros Roberto Grau: “(...) inexiste em um primeiro momento
oposição entre atividade econômica e serviço público, pelo contrário, na segunda
expressão está subsumida a primeira”.159
A Constituição atribuiu ao Estado o desempenho da atividade econômica, e o
serviço público é uma espécie de exercício dessa atividade:
No que concerne ao art. 170, caput, a ordem econômica pressupõe o exercício de atividade econômica enquanto gênero. O que afirma o preceito é que toda atividade econômica, inclusive a desenvolvida pelo Estado, no campo dos serviços públicos, deve ser fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tendo por fim (fim dela, atividade econômica repita-se) assegurar a todos existência digna conforme os ditames da justiça social, etc.
160
Contudo o saneamento básico tem características específicas, não é um
serviço de utilidade pública comum pois se está diante de uma meta, garantir o
desenvolvimento econômico e atingir a universalização. Logo as tarifas cobradas no
fornecimento desses serviços devem ser suficientes para cobrir os custos do
prestador de serviços, garantir novos investimentos e manutenção adequada, além
de assegurar que toda a população seja atendida, inclusive as famílias de baixa
renda que, porventura, não tenham condições de pagar o serviço, afinal de contas é
um serviço essencial à dignidade humana.
A importância de caracterização do saneamento básico como serviço público
e da relevância do tratamento específico do tema pode ser bem resumida:
O saneamento básico que trabalha com um bem da vida, não um bem individualizado, é um bem da sociedade. Estamos trabalhando com doenças hidrotransmissíveis, com barreira sanitária. Não estamos trabalhando com venda de água ou coleta de esgoto. Estamos trabalhando com algo que só é possível se construir dentro da sociedade se todos fizerem direito. Por isso tem de ser universalizado. O saneamento não aceita excluídos. O gás e o telefone aceitam excluídos; o saneamento não. Eu não posso dizer que você não me interessa do ponto de vista econômico, e por isso, não vou abastecer a sua casa. Que você não dá lucratividade no consumo de água, por que você é carente. É um setor que absolutamente não aceita excluídos por ser uma questão de saúde pública, ou seja, todo mundo tem direito.
161
159
GRAU, Eros Roberto. A Ordem . . .p.28. 160
Ibid. p.134. 161
BNDES, Série Modernização do Setor de Saneamento, v. 7, 2002. Disponível em <http.www.bndes.gov.br\\seriemodernizacao> . Acesso em: 27/07/2012.
A caracterização do setor de saneamento básico como serviço público não é
meramente formal, a inserção no regime jurídico especial ganha relevância material
para o desenvolvimento econômico e social do país. Através do serviço público
como modo de intervenção estatal na economia, o Estado pode buscar a realização
da redistribuição de bens de maior relevância social, eliminando as desigualdades e
garantindo o desenvolvimento econômico.162
Diante dessas considerações a conclusão relativa à atividade de saneamento
básico, máxime pela evidente relevância para a saúde, desenvolvimento e
sustentabilidade ambiental e principalmente para a efetivação do princípio da
dignidade da pessoa humana, é a de que a atividade deve ser considerada como
serviço público.163
Superada a questão relativa à classificação da atividade de saneamento
básico, é o caso de verificar quais serviços públicos têm titularidade exclusiva164
estatal e qual o Ente Público com a competência para a prestação do serviço.
A Constituição quando trata de algumas hipóteses de serviço público já traz
expressamente a titularidade do serviço como por exemplo, o serviço de transporte
público.165 Em outros casos já afirma que a iniciativa privada pode prestá-los, como
é o caso da educação,166 da saúde,167 e da previdência social complementar.168
Quanto ao serviço público de saneamento básico, ele pode ser prestado pelo
Ente Público titular diretamente de modo centralizado ou descentralizado, através da
criação por lei de outro ente com a finalidade administrativa específica, podendo ser
uma autarquia169 ou uma fundação, que o executará sob regime de direito público
162
CARVALHO, Vinícius Marques de. O Direito do Saneamento Básico. São Paulo: Quartier Latin, 2010. 163
DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico, São Paulo: Saraiva, 2008, p. 99 e 137. A proteção dos recursos naturais não se esgota na vontade de proteger a natureza, mas objetiva a manutenção de uma prática econômica socialmente desenvolvida, envolvendo-se com a melhoria da qualidade de vida. 164
Mesmo com titularidade do Poder Público, o serviço pode ser prestado de modo direto ou indireto, através dos instrumentos jurídicos à disposição do Administrador, como por exemplo: concessão, permissão, parceria público-privada, etc. 165
Art. 30, inc. V da Constituição da República de 1988. 166
Art. 209 da Constituição da República de 1988. 167
Art. 199 da Constituição da República de 1988 168
Art. 202 da Constituição da República de 1988. 169
Decreto federal nº 200/1967 Art. 14. Autarquia é o serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receitas próprios, para executar atividades típicas da
gozando de todas as prerrogativas e sujeições da Administração Pública
centralizada.
É possível também que o Ente Público opte por fazer a prestação do serviço
direta e descentralizadamente, através da autorização por lei para a criação de uma
empresa pública,170 de uma sociedade de economia mista171 e até mesmo de uma
fundação de direito privado.172 Nessas hipóteses o regime jurídico a que se está
subordinado é um regime híbrido de direito privado parcialmente derrogado por
normas de direito público.173
Além da prestação dos serviços de saneamento diretamente é possível fazê-
lo indiretamente delegando-se a execução do serviço através de licitação ou caso
não haja possibilidade de acorrerem vários interessados, através de lei autorizativa
específica para dar o serviço em concessão ou permissão a uma entidade
prestadora dos serviços, bem como é possível a prestação indireta dos serviços
através de consórcio público174 ou convênio de cooperação, a partir de um contrato
de programa.
Administração Pública, que requeiram para seu melhor funcionamento gestão administrativa e financeira descentralizada. 170
Decreto federal nº200/1967. Art.22. Empresa pública é a entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, com patrimônio próprio e capital exclusivo da União, criada por lei para a exploração de atividade econômica que o governo seja levado a exercer por força de contingência ou de conveniência administrativa, podendo se revestir de qualquer das formas admitidas em direito. Contudo, posteriormente a legislação determinou que desde que a maioria do capital votante permaneça de propriedade da União, será admitida no capital de empresa pública a participação de outras pessoas de direito público interno, bem como de entidades da Administração indireta da União, Estados e Municípios. Além disso, o decreto estipula que as empresas públicas são voltadas à exploração de atividade econômica tão somente,ocorre que é permitido no ordenamento jurídico a criação de empresas públicas voltadas a prestação de serviços públicos. 171
Ibid. Art. 24. Sociedade de economia mista é a entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, criada por lei para a exploração de atividade econômica, sob a forma de sociedade anônima, cujas ações com direito a voto pertençam em sua maioria à União ou à entidade da Administração Indireta”.Vale aqui o mesmo comentário acima quanto à possibilidade de as sociedades de economia mista prestarem serviços públicos, além da exploração de atividade econômica. 172
Muito embora seja possível a criação por lei de fundações públicas o decreto federal nº 200/1967 traz a definição de fundação privada somente. 173
MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 199. Tanto as empresas públicas como as sociedades de economia mista quando concebidas para prestar serviços públicos ou desenvolver quaisquer atividades de índole pública propriamente, é natural que sofram influxo mais acentuado de princípios e regras de direito público, ajustados portanto ao resguardo de interesses dessa índole. 174
Lei nº11.107/2005, dispõe sobre normas gerais de contratação de consórcios públicos e dá outras providências.
Já quanto à titularidade dos serviços de saneamento, se estadual ou
municipal, ainda não há unanimidade no ordenamento jurídico diante da própria
evolução histórica do serviço, conforme se verá adiante.
Mesmo com a edição da lei nº11.445/2007, que foi omissa não dispondo
expressamente a respeito da titularidade do serviço, mas impondo aos Municípios a
necessidade de elaborar plano municipal de saneamento básico para ter acesso a
recursos financeiros do orçamento da União ou mesmo de suas empresas públicas,
é possível concluir pela titularidade municipal.
Porém a questão ainda não está totalmente pacificada, eis que se encontram
pendentes de julgamento perante o Supremo Tribunal Federal duas ações diretas de
inconstitucionalidade, a ADI 1.842-RJ e a ADI 2.077-BA175 nas quais se discute se a
titularidade é municipal ou estadual dos serviços de saneamento, principalmente nas
regiões metropolitanas, diante do disposto no art. 25, parágrafo 3º da Constituição
de 1988.176
3.3 BREVE HISTÓRICO DO SANEAMENTO BÁSICO NO BRASIL- O
FINANCIAMENTO DO SETOR: DO SÉCULO XIX ATÉ OS DIAS ATUAIS
No caso do saneamento básico, em retrospecto histórico foi com a vinda da
família real portuguesa em 1808 que se iniciam as primeiras obras de saneamento
no país.
O Brasil ainda era um império, vários setores de infraestrutura eram
custeados pela iniciativa privada voltada exclusivamente às necessidades de
escoamento da produção, com a instalação de ferrovias por particulares e a
eletrificação para determinadas áreas.
175
Disponível em <http.www.stf.jus.br\\adin>. Acesso em: 26/10/2011. 176
O parágrafo 3º do art. 25 da CF de 1988 dispõe que os Estados poderão, mediante lei complementar, instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamentos de Municípios limítrofes para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum.
A história do saneamento básico no Brasil possui semelhanças com os países
desenvolvidos, creditando ao fenômeno da industrialização e urbanização o
surgimento das políticas públicas nesse setor. As primeiras obras de infraestrutura
tanto na Europa como nos EUA e mesmo aqui, foram levadas a cabo pela iniciativa
privada:
De modo geral o desenvolvimento inicial das redes de abastecimento de água nas cidades dos países desenvolvidos da Europa e da América do Norte foi ordenado por um movimento liberal ou privatista, segundo o qual os serviços públicos, como qualquer outra mercadoria, deveriam ser deixados a cargo da iniciativa privada, considerada como intrinsecamente mais eficiente, dinâmica e confiável que as instituições estatais. Este modelo predominou sem contestação na Inglaterra, na França e nos Estados Unidos durante toda a metade do século XIX, dando origem a companhias privadas de distribuição de água, de pequeno a médio porte, que operavam nas cidades maiores e mais prósperas, limitando-se com raras exceções a atender as áreas mais nobres, onde trabalhavam e residiam as elites e as camadas médias da população. Com o crescimento urbano acelerado pelo desenvolvimento industrial nestes países, a situação ficou insustentável, na medida em que as grandes cidades tornavam-se ambientes insalubres onde proliferavam epidemias de cólera e outras doenças contagiosas que não respeitavam fronteiras sociais ou de classes. Uma ampla reação social não demorou a surgir entre as elites da época, na forma de um movimento articulado de reforma sanitária, reivindicando a atuação do Estado na regulação dos serviços prestados por operadores privados, na provisão de água limpa e moradia digna para as camadas mais pobres da população, assim como na promoção de campanhas de educação popular para incentivar práticas de higiene pessoal. Nesse contexto a partir da metade do século XIX, os serviços de abastecimento de água foram paulatinamente municipalizados nos EUA e na Europa, e ao mesmo tempo em que sistemas de esgotamento sanitário, relegados pelas companhias privadas, foram implantados por iniciativa do poder público. Em todos esses países a primeira expansão capilar da infraestrutura de saneamento básico foi largamente subsidiada pelo Estado, sendo que as tarifas sequer mal cobriam os custos operacionais do serviço. A partir dessa evolução se constata que a recente mudança na direção de estratégias pró-mercado, envolvendo diferentes modalidades de privatização e desregulamentação, iniciada no final dos anos 70 com a crise do estado de bem estar social, a ascensão do neoliberalismo e da globalização dos mercados, representa tão somente um estágio particular no ciclo de privatização-estatização-desestatizaçao dos serviços de utilidade pública que se observa em diversos países e regiões em diferentes momentos históricos.
177
No Brasil com acontecimentos bastante parecidos com a narrativa
reproduzida, a evolução dos serviços públicos de saneamento pode ser dividida em
três fases: o período anterior a 1970, o período compreendido entre 1970 e 1990, e
177
CARVALHO, Vinicius Marques de. O Direito ... p.102.
o período posterior a 1990, sistemática essa utilizada por muitos autores ao tratar do
tema.178
Antes da década de 1970, com o marco da planificação do setor através do
PLANASA, a flexibilidade na prestação dos serviços de saneamento básico
caracterizou o período do século XIX até a metade do século XX. À similaridade do
que ocorria na Europa e nos EUA, o Estado Brasileiro permitia que os serviços
fossem prestados por empresas concessionárias estrangeiras não só na área de
saneamento, como também em outros serviços públicos como de energia elétrica e
transportes urbanos.179
Sob a égide do Estado Novo na década de 1930 o país passa por significativo
crescimento industrial e a necessidade de implementação das áreas de
infraestrutura, principalmente nas regiões urbanas, pressionou a intervenção estatal
no setor.
Os recursos destinados a obras de infraestrutura e a prestação dos serviços
passam a ter previsão no orçamento do governo federal, criam-se órgãos
específicos para o setor como o Departamento Nacional de Obras de Saneamento-
DNOS e o Departamento de Saúde Pública, o DESP, transformada posteriormente
na atual FUNASA.
Nas décadas de 1950 e 1960 com a conjuntura internacional do início da
guerra fria e a criação da “aliança para o progresso” do governo americano
engendrou a assinatura de vários convênios para a construção e financiamento de
sistemas sanitários com vários municípios do país, o governo federal intermediava a
relação e repassava os recursos aos municípios, que à época não gozavam da
mesma autonomia na gestão e administração como atualmente.180
178
Vinícius Marques de Carvalho, Karine Silva Demoliner, Andrea Freire de Lucena, entre outros. 179
LUCENA, Andrea Freire de. As Políticas públicas de saneamento básico no Brasil: reformas institucionais e investimentos governamentais. Revista Plurais. Goiás, v.1, nº4, 2006. 180
PEREIRA, Henrique Alonso. Criar Ilhas de Sanidade: os Estados Unidos e a Aliança para o Progresso na América Latina. Tese Doutorado em História, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2005. No início da década de 1960, a América Latina tornou-se a primeira prioridade da agenda externa dos Estados Unidos, que formularam e engendraram a criação da “Aliança para o Progresso”. Criada oficialmente no Encontro Extraordinário do Conselho Econômico e Social Interamericano, realizado em Punta del Este, no Uruguai, no período de 5 a 17 de agosto de 1961, a "Aliança para o Progresso" pretendia ajudar e acelerar o desenvolvimento econômico na América Latina. Na tentativa de garantir o estabelecimento de governos "plenamente democráticos"
Diferentemente de setores como energia e telecomunicações, a União não
constituiu grandes empresas estatais responsáveis pelo setor, não seguiu os
ditames de industrialização dos demais setores produtivos estatais, mesmo assim o
setor de saneamento básico passou a ser visto como uma “questão nacional”
principalmente a partir da década de 1930.
A concepção do setor de saneamento básico como uma “questão nacional” se
confirma historicamente pelo primeiro estágio de expansão da atividade, nas
primeiras décadas do século XX. As ações de saneamento tanto nas obras de
infraestrutura como na execução dos serviços públicos se expandiram graças a uma
política sanitarista nacional, que visava recuperar e integrar o país e via no setor de
saneamento um motivo e ao mesmo tempo um instrumento de realização dessa
política.
Essa inter-relação entre saúde pública e saneamento básico foi decisiva para
a implantação das redes de saneamento básico no Brasil, em um primeiro momento.
Somente após a década de 1950 o setor de saneamento caminhou para uma maior
autonomia, com modelos de gestão independentes de órgãos sanitários e através da
criação de autarquias e empresas públicas estaduais específicas para a gestão da
atividade.
Na década de 1960 o DESP foi transformado em uma fundação, a
organização dos serviços se consolidava sob as atribuições dos Municípios com
financiamentos advindos do orçamento federal e de empréstimos estrangeiros,
principalmente do Banco Interamericano de Desenvolvimento, em razão da citada
“aliança para o progresso” porém a execução dos serviços foi cometida às empresas
públicas ou sociedades de economia mista de âmbito estadual, que detinham
capacidade técnica e operacional para receber apoio financeiro.
foi produzida uma carta de intenções que propunha uma série de melhorias na distribuição de renda do continente latino-americano, reforma agrária e o desenvolvimento de planejamentos econômicos e sociais. Os países latino-americanos (com exceção de Cuba) comprometeram-se com um programa de investimentos da ordem de 80 bilhões de dólares por 10 anos. Os Estados Unidos da América concordaram em fornecer cerca de 20 bilhões de dólares. Se oficialmente o objetivo dos EUA era promover o progresso econômico da América Latina através de uma aliança com todos os países do continente, oficiosa e veladamente tratava-se do processo de enfrentamento do "perigo" comunista no
continente.
Entre as décadas de 1950 e 1960 esse modelo integrado de saneamento e
saúde sofreu modificações: as políticas de saúde e saneamento passam a ser vistas
de modo apartado, o setor de saneamento ganha mais autonomia, a execução dos
serviços passa em um primeiro momento pela desconcentração, através de
autarquias e depois para empresas públicas estaduais.
Na época, é bom frisar que os Municípios não detinham constitucionalmente
status de ente federado, tampouco tinham a autonomia que hoje têm, em termos de
organização administrativa. A manutenção, gestão econômico-financeira e mesmo a
execução de infraestrutura e serviços de saneamento básico passaram então para
as companhias estaduais, inclusive como condição para obtenção de
financiamentos.
Nessa mesma década de 1960, para aumentar os investimentos no setor,
principalmente de infraestrutura, foi criado o BNH-Banco Nacional de Habitação,
pela lei 4380/1964, e pela lei nº5318/1967 o Conselho Nacional de Saneamento,
além da previsão de um fundo de financiamento que reunia recursos do fundo
nacional de obras de saneamento e do fundo rotativo de águas e esgoto.
O Conselho Nacional de Saneamento tinha a função de planejar, coordenar e
controlar a política de saneamento, que deveria ser formulada em consonância com
a política de saúde, consolidando a prestação dos serviços de saneamento básico
entre as companhias estaduais com uma dimensão e um regime jurídico de direito
privado, já que as prestadoras de serviço na maioria dos casos ganharam status
jurídicos de sociedades de economia mista, sedimentando os contornos atuais da
política econômica para o setor, com a necessidade de cobertura dos custos e
retorno dos investimentos.
Em 1966 foi criado o FGTS, fundo de garantia por tempo de serviço, pela lei
nº 5.107/1966. Inicialmente utilizado como fonte de recurso para política
habitacional, cresceu de importância e em 1969, por meio do decreto-lei nº 949/69, o
BNH passou como gestor a aplicar os recursos do FGTS nas operações de
financiamento para infraestrutura urbana. Também no setor de saneamento básico,
à semelhança do que ocorreu depois com o BNDES, o fluxo regular de recursos não
dependente de receitas fiscais do orçamento geral da União propiciou maiores
investimentos no setor.
O Sistema Financeiro de Saneamento- SFS, gerido pelo BNH, inaugura ainda
na década de 1960 os contornos da atual sistemática de criação e gestão de fundos
parafiscais de poupança compulsória para o fomento de determinados setores
sociais ou econômicos, como hoje são o FAT e o próprio FGTS.
Em 1971 foi lançado o PLANASA, Plano Nacional de Saneamento, a partir do
plano de metas e bases para ação do governo lançado pelo então Presidente da
República, Garrastazu Médici. É considerado o primeiro tratamento sistemático com
abrangência nacional em termos de políticas públicas para o setor de saneamento,
com disposições prevendo fontes de custeio, racionalização das aplicações a fundo
perdido, redução de custos operacionais, sistema de tarifas que possibilitassem a
operação, a manutenção e o crescimento dos serviços de água e esgoto e até
mesmo a participação do setor privado.
O PLANASA, ainda que não tenha conseguido a universalização dos serviços
de abastecimento de água e coleta de esgoto, meta muito ambiciosa para à época181
teve relevante importância para o setor, tanto porque previu a regularidade de fluxo
de receita através de fundos parafiscais de poupança compulsória como porque
organizou a equação custo-tarifa-investimento.
O setor de saneamento básico, desde o distanciamento dos serviços de
saúde pública até a estruturação do PLANASA, foi visto com importância secundária
na formulação de políticas públicas e destinação de recursos em comparação com
outros setores:
(...) o setor de saneamento não teve a mesma atenção daqueles outros privilegiados, porque a prioridade dada pelo Estado foi a criação de condições gerais para a produção, que apresentava visíveis estrangulamentos para o crescimento da economia. O setor de saneamento era vinculado à reprodução da força de trabalho, e esta não apresentava maiores estrangulamentos à reprodução do capital. Por isso, o setor foi relegado a um segundo plano nas prioridades do Estado.
182
181
O PLANASA pretendia garantir até o ano de 1980 que 80% da população urbana pudesse ter acesso ao abastecimento de água potável e 50% acesso ao esgotamento sanitário. 182
JORGE, Wilson Edson. A Política Nacional de Saneamento Pós-64. Tese de Doutorado. Faculdade de Arquitetura da Universidade de São Paulo. São Paulo, 1987.
É importante frisar que diferentemente da atual política nacional de
saneamento básico, trazida pela lei nº 11.445/2007, que incluiu entre os serviços de
saneamento as atividades de manejo de águas pluviais urbanas e manejo de
resíduos sólidos, para o PLANASA apenas os serviços de abastecimento de água,
coleta, transporte e “destinação final adequada” ao esgoto estavam incluídos, ou
seja, não havia uma preocupação em termos de políticas públicas com a visão
integrada de todos os segmentos que compõem o serviço de saneamento básico.
Não há erro em afirmar que à época, a relevância do tratamento do esgoto e
da sustentabilidade ambiental era secundária, por isso a mera coleta e afastamento
do esgoto eram considerados como suficientes, em termos sanitários, para
aumentar os níveis de salubridade sanitária e diminuir índices de mortalidade.
Herança colhida até os dias de hoje, pois segundo informações de 2008 do
sistema nacional de saneamento básico183 o índice médio de atendimento urbano
mostrava valores relativamente elevados em termos de abastecimento de água, com
um índice médio nacional de 93,1%. Porém, em termos de esgotamento sanitário, o
atendimento urbano com coleta e tratamento era muito escasso, tendo um índice
médio nacional de 48,3% e um índice médio nacional de apenas 32,2% para o
tratamento desse esgoto coletado.
Ainda assim o PLANASA foi um avanço para o setor de saneamento em
termos de planejamento e execução de políticas públicas para o setor. Previa como
objetivos permanentes a autossustentação financeira do setor de saneamento,
através da eliminação do déficit de saneamento básico no menor tempo e com custo
mínimo, tendo por base planejamento, programação e controle sistematizados do
estabelecimento de equilíbrio entre demanda e oferta dos serviços, atendimento
183
IBGE. Disponível em <http.www.ibge.gov.br\|pnsb>. Acesso em: 23/11/2011. As informações coletadas pela Pesquisa Nacional de Saneamento Básico - PNSB 2008 sobre abastecimento de água revelam aspectos relevantes da cobertura deste serviço no País. Dos 5.564 municípios brasileiros existentes em 2008, 5.531 (99,4%) realizavam abastecimento de água por rede geral de distribuição em pelo menos um distrito ou parte dele. Segundo a Pesquisa Nacional de Saneamento - PNSB 2008, pouco mais da metade dos municípios brasileiros (55,2%) tinham serviço de esgotamento sanitário por rede coletora, que é o sistema apropriado, marca pouco superior à observada na pesquisa anterior, realizada em 2000, que registrava 52,2%. Em 2008, a proporção de municípios com rede de coleta de esgoto foi bem inferior à de municípios com rede geral de distribuição de água (99,4%), manejo de resíduos sólidos (100,0%) e manejos de águas pluviais (94,5%). É importante ressaltar que a estatística de acesso à rede coletora de esgoto refere-se apenas à existência do serviço no município, sem considerar a extensão da rede, a qualidade do atendimento, o número de domicílios atendidos, ou se o esgoto, depois de recolhido, é tratado.
indiscriminado a todas as cidades brasileiras, adoção de uma política tarifária com
equilíbrio entre receita e despesa, com a adequação dos níveis tarifários às
possibilidades dos usuários, a minimização de custos operacionais, incentivos à
pesquisa, treinamento e assistência técnica.
A sistemática do PLANASA consistia na coordenação do plano a cargo do
BNH.184 A prestação dos serviços à conta das companhias estaduais, os recursos
financeiros provinham do FGTS, dos fundos de água e esgoto estaduais e das
tarifas cobradas pelos usuários-administrados.185 Esse sistema ocasionou a
centralização na figura da União para as funções de planejamento, coordenação,
controle e apoio financeiro, através do BNH.
Em um país de dimensões continentais como o Brasil a expansão dos
serviços de saneamento é tarefa hercúlea, principalmente com relação à expansão
das obras de infraestrutura e à execução dos serviços, os investimentos são muito
altos. Para alcançar esse objetivo foi implantada a política dos subsídios cruzados,
uma administração única das várias receitas, oriundas de subsídios FGTS e dos
184
O art. 2º do decreto nº 82.587/1978 que regulamentava a lei nº6.528/1978, dispunha que são serviços públicos de saneamento básico integrados ao PLANASA aqueles administrados e operados por companhias de saneamento básico, constituídas pelos Governos Estaduais que, em convênio com o Banco Nacional de Habitação, estabelecem as condições de execução do Plano, nos respectivos Estados, observados os objetivos e metas fixados pelo Governo Federal. De acordo com o art. 7º do decreto, o BNH fazia parte de uma política nacional de saneamento básico bastante centralizadora, com o acúmulo de atribuições no sistema financeiro de saneamento que implicava sua condição de órgão central e normativo, incluindo o dever de analisar e provar os planos estaduais de saneamento básico, integrante do PLANASA, exercer a fiscalização técnica, contábil, financeira e do custo dos serviços das companhias estaduais, analisar os planos, estudos e propostas tarifárias elaborados pelas companhias estaduais com vistas às autorizações de reajustes, coordenar, orientar e fiscalizar a execução dos serviços de saneamento e estabelecer as normas relativas ao sistema financeiro de saneamento, entre outras. 185
O art. 2º da lei nº6.528/1978, que dispôs sobre as tarifas dos serviços de saneamento básico e dá outras providências, previa que os Estados, através das companhias estaduais de saneamento básico, realizariam estudos para fixação de tarifas, de acordo com as normas que foram expedidas pelo Ministério do Interior. No parágrafo segundo dispunha que as tarifas obedeceriam ao regime do serviço pelo custo, garantindo ao responsável pela execução dos serviços a remuneração de até 12% ao ano sobre o investimento reconhecido, além de garantir a remuneração pelo serviço, e ainda expandir o serviço a fim de alcançar a população com menor poder aquisitivo. O art. 4º dispunha que a fixação tarifária levaria em conta a viabilidade do equilíbrio econômico-financeiro das companhias estaduais de saneamento básico e a preservação dos aspectos sociais dos respectivos serviços de forma a assegurar o adequado atendimento dos usuários de menor consumo, com base em tarifa mínima.
fundos estaduais186 empréstimos do BIRD e das tarifas dos usuários, a fim de
permitir a expansão dos serviços às regiões do país com menor poder aquisitivo.
No início da década de 1980 o modelo PLANASA começou a apresentar
indícios de esgotamento. Vários fatores puderam ser carreados como causa, desde
o modelo rígido e excessivamente centralizado na União, desconhecimento das
peculiaridades regionais e locais, pois os Municípios que não aderiam ao plano
ficavam à margem diante da impossibilidade de aporte de recursos, aumento da
população, ineficiência das operadoras estaduais que refinanciam as dívidas,
aumento da inflação e crise econômica da década.187
Com esses fatores os investimentos no setor de saneamento tornaram-se
escassos, o BNH foi incorporado à Caixa Econômica Federal-CEF, que passou a ser
gestora do FGTS, e o PLANASA foi formalmente extinto em 1992.
Apesar de gestora do FGTS, a CEF, como banco público, não manteve a
atribuição de fomento do setor de saneamento básico. As décadas de 1980 e 1990
trouxeram uma crescente crise com aumento da inflação diminuindo
significativamente o fluxo de recursos do FGTS. O setor de saneamento perdeu
investimentos e fonte de recursos com a estagnação do setor, a política nacional de
saneamento básico passou então para o Ministério do Planejamento e Orçamento,
através da Secretaria de Política Urbana (SEPURB).
No final da década de 1980 o país passa por um processo de democratização
e abertura política que culminaram com a Constituição de 1988. Agora os Municípios
são expressamente considerados como entes federados, gozam de autonomia para
organização administrativa, possuem competência para instituir seus tributos, e com
institucionalização das leis orgânicas municipais a tendência é descentralizar,
setorizar e incentivar a participação popular na formulação e execução das políticas
públicas, como por exemplo na área da saúde com a edição da lei nº8.080/90 e da
assistência social, com a lei nº 8.742/98. No setor de saneamento não poderia ser
diferente, a tendência foi também a municipalização do serviço público.
186
À época havia o MI-Ministério do Interior, com a atribuição de propor ou destinar recursos a fundo perdido para os investimentos na área do PLANASA, nos termos do art. 6º do decreto 6.528/1978. 187
BRASIL, MPO, Ministério do Planejamento e Orçamento, SEPURB, 1995. Disponível em <http.www.mpo.gov.br\\sepurb>. Acesso em: 14/08/2012.
Nesse cenário da década de 1990, já após a promulgação da Constituição de
1988 o setor de saneamento básico careceu de uma política nacional integrada. A
Constituição de 1988 já fora promulgada e os recursos do FAT-Constitucional já
tinham destino para o BNDES, bem como os recursos do FGTS, operados pela CEF;
contudo na década de 1990 houve uma tentativa de privatização do setor de
saneamento. Leoneti, Prado e Oliveira188 elencam 12 projetos de financiamento ao
setor de saneamento básico apontando a origem dos recursos, comprovando que o
setor de saneamento básico passou por um período de diminuição de recursos do
orçamento. As fontes de custeio, em grande parte, se restringiram ao financiamento
de bancos internacionais de desenvolvimento e alguns tiveram recursos oriundos
dos fundos de poupança compulsória do FGTS e do FAT.
Ainda na década de 1990 foram editados dois planos ou programas de
modernização do setor de saneamento básico, o PMSS I (1993-1994) e o PMSS II
(1998-2003), os planos de modernização do setor foram elaborados pelo IPEA e
pela equipe técnica do PNUD da ONU.
No PMSS-I a estratégia para expandir os serviços e atingir a tão almejada
universalização previa aumento da participação do setor privado da economia na
188
LEONETI, Alexandre; PRADO Eliana; OLIVEIRA,Sonia Vale Walter Borges de. Saneamento Básico no Brasil: considerações sobre investimento e sustentabilidade para o século XXI. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, nº45, mar-abril 2011. Nesse período podemos indicar: a) Projeto Pronurb - período: 1990-1994. Fonte de recursos: FGTS e contrapartida do Ente Público. Beneficiários: população urbana em geral, com prioridade à população de baixa renda; b) Projeto Pró-saneamento - período: 1995. Fonte de recursos: FGTS e contrapartida do Ente Público. Beneficiários: preponderantemente áreas com famílias com renda de até doze salários mínimos; c) Projeto PASS- período: 1996. Fonte de recursos: orçamento geral da União (OGU) e contrapartida, Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e Banco Mundial (BIRD). Beneficiários: população de baixa renda em municípios com maior concentração de pobreza; d) Projeto PROSEGE- período: 1992-1999. Fonte de recursos: BID e contrapartida do Ente Público. Beneficiários: População de baixa
renda, privilegiando comunidades com renda de até sete salários mínimos; e) Projeto Funasa – SB -
período 1994. Fonte de recursos: OGU e contrapartida. Desdobramentos: apoio técnico e financeiro no desenvolvimento de ações com base em critérios epidemiológicos e sociais; f) Projeto PMSS I - período: 1992. Fonte de recursos: BIRD e contrapartida. Desdobramentos: Estudos e assistência técnica aos estados e municípios em âmbito nacional; investimentos em modernização empresarial e aumento de cobertura dirigida à Casan, Embasa e Sanesul; g) Projeto PMSS II - período: 1998-2004. Fonte de recursos: BIRD e contrapartida do Ente Público. Desdobramentos: passa a financiar companhias do Norte, Nordeste e Centro-Oeste e estudos de desenvolvimento institucional; h) Projeto PNCD - período1997. Fonte de recursos OGU e contrapartida. Desdobramentos: uso racional de água em prestadores de serviço de saneamento, fornecedores e segmentos de usuários; i) Projeto FCP/SAN- período 1998. Fonte de recursos FGTS, BNDES e contrapartida. Beneficiários: concessionários privados em empreendimentos de ampliação de cobertura em áreas com renda de até doze salários mínimos; j) Projeto PROPAR - período: 1998. Fonte de recursos: BNDES. Beneficiários: Estados, municípios e concessionários contratando consultoria para viabilização de parceria público-privada; k) Projeto PROSAB, período: 1996. Fonte dos recursos: FINEP, CNPq, Capes. Desdobramentos:desenvolvimento de pesquisa em tecnologia de saneamento ambiental.
exploração dos serviços de saneamento, mediante a ampliação das concessões,
novas regras contratuais e mecanismos concorrenciais de mercado.
A intenção de aumentar a participação do setor privado nos serviços públicos
em geral, e no caso do saneamento básico, área que demanda altos investimentos
em obras de infraestrutura, fez com que a lei nº 8.987/1995 trouxesse mecanismos
jurídicos como o previsto no art. 28 da lei, que possibilitassem a captação de
recursos no mercado de crédito através de financiamentos, permitindo às
concessionárias que oferecessem em garantia os direitos decorrentes dos contratos
administrativos de concessão até determinado limite, desde que não houvesse
comprometimento da operacionalização do sistema e fosse garantida a continuidade
da prestação do serviço concedido.
Tantos outros setores relativos a serviços públicos ou de utilidade pública
foram nesse período desestatizados, como por exemplo telefonia, energia elétrica,
etc. No setor de saneamento básico foram feitas várias tentativas, passando pela
privatização das empresas públicas estaduais ou mesmo com a abertura de capital
nas bolsas de valores.189
Como afirmado no capítulo 01, o BNDES teve atuação na década de 1990
como órgão executivo do programa nacional de desestatização, além da sua função
típica de fomento aos setores público e privado.
Nessa época, o BNDES criou um programa com uma linha de crédito
específica para financiar parcialmente empreendimentos privados em saneamento,
através de um convênio com a CEF, o PROPAR- programa de fomento à parceria
público-privada, voltado à prestação de serviço de abastecimento de água e de
esgotamento sanitário.
A finalidade do PROPAR era a de financiar os Estados e Municípios que
desejassem contratar os serviços de consultorias especializadas para a realização
de estudos técnicos, jurídicos, econômicos e financeiros para fundamentar a
desestatização dos serviços de saneamento básico.
189
SABESP. Disponível <http.www.sabesp.gov.br>. Acesso em: 18/07/2012. A Sabesp é a maior companhia prestadora de serviços de saneamento básico do país, atendendo 25 milhões de pessoas, tem ações na bolsa de valores de São Paulo desde 1997.
Na década de 1990 o interesse estatal era o de privatizar o setor de
saneamento básico atendendo a uma política internacional severa de contenção de
gastos do setor público, com empréstimos e financiamentos. A partir de 1998 os
recursos do BNDES, antes disponíveis para as companhias estaduais, nesse
momento só poderiam ser tomados se houvesse compromisso de privatização:
“Associada à política de ajuste fiscal e respondendo aos interesses dos bancos multilaterais, o Governo Federal colocou em prática uma estratégia voltada à privatização da gestão dos serviços. A lógica era de recorrer a investimentos privados para suprir o déficit do setor, cabendo ao Estado apenas regular e fiscalizar serviços prestados por empresas privadas. Dentro desta estratégia, em 1997 o Conselho Curador do FGTS aprovou a criação do Programa de recurso Financiamento a Concessionários Privados de Saneamento (FCP/SAN) e disponibilizou pela primeira vez recursos do referido fundo para a iniciativa privada. Assim, ao mesmo tempo em que os recursos para as empresas públicas escasseavam, se criava uma nova linha voltada para estimular a participação de empresas privadas no setor. Em 1998 nova resolução do Conselho Monetário Nacional
190 estabelecida a
partir de acordo com o FMI, reafirma o contingenciamento de crédito ao setor público, e em 1999 outra resolução consolida e define regras para esse contingenciamento. O resultado foi à suspensão de novas operações de financiamento em habitação, saneamento e infraestrutura por órgãos públicos”
191
Como medida para facilitar a privatização dos serviços de saneamento
básico, passou-se a cogitar sobre a questão da titularidade dos serviços de
saneamento básico nas regiões metropolitanas, antiga controvérsia acirrada pelo art.
25, parágrafo 3º da Constituição, que dispõe que os Estados poderão, mediante lei
complementar, instituir regiões metropolitanas e microrregiões constituídas por
agrupamento de municípios limítrofes para integrar a organização, o planejamento e
a execução de funções públicas de interesse comum.
O interesse em atribuir a titularidade dos serviços de saneamento básico para
os Estados seria facilitar o processo de desestatização tornando-o mais simples e
com menos oposição numérica, como serviço estadual seriam apenas 26 os Entes
Públicos a contestar uma eventual privatização, perto dos mais de 5.000 Municípios
no país.
190
CMN. Conselho Monetário Nacional. Disponível <http.ww.cmn.gov.br\\legislação>. Acesso em: 26/04/2012. As resoluções do CMN citadas são nº 2.521/98, nº2.668/98 e nº2.682/99. 191
BRITTO, Ana Lucia. Gestão de serviços de saneamento em áreas metropolitanas:as alternativas existentes diante da necessidade de universalização dos serviços e preservação da qualidade ambiental. Disponível em <http.www.anppas.org.br/encontroanual2GTGT11/anabrito.pdf>. Acesso em: 25/04/2012.
A questão da titularidade dos serviços de saneamento foi omitida na atual lei
nº 11.445/2007, mas todo o sistema trazido pela regulamentação deixa a entender
que a titularidade dos serviços é municipal, mesmo nas regiões metropolitanas.192
O movimento de oposição aos governos e aos projetos de lei que permitiriam
a privatização do setor de saneamento foi intenso e culminou com a criação em
Brasília, da Frente Nacional pelo Saneamento Ambiental- FNSA, na Comissão de
Desenvolvimento Urbano e Interior da Câmara dos Deputados, composta por
entidades da sociedade civil, representantes das entidades prestadoras do serviço
de saneamento, entidades representantes dos trabalhadores do setor e dos
consumidores.
A privatização do setor de saneamento básico encontrou forte resistência
política: o projeto de lei do Senado nº266/1996, estabelecendo diretrizes gerais para
os serviços de saneamento básico e para o exercício do poder concedente não foi
aprovado, tampouco o substitutivo, nº 4.147/2001, enviado pela Presidência da
República, com conteúdo similar.
Nesse período, os financiamentos destinados ao setor de saneamento
tiveram intensa diminuição. A lei de responsabilidade fiscal, lei complementar nº
101/2000 também trouxe limites para o endividamento público, restringindo o acesso
ao crédito pelos titulares dos serviços e prestadores.
Esse panorama nada promissor na década de 1990 e começo dos anos 2000
começou a sofrer algumas alterações, diante da necessidade de se criar um órgão
nacional para coordenar as políticas públicas urbanas.
192
IBGE. Disponível em <http.www.ibge.gov.br\\pesquisa>. Acesso em: 13/05/2012. Pesquisa do IBGE de 2008 demonstra que com relação à execução do serviço, observa-se uma diversificação muito grande, de acordo com o tipo de serviço prestado. Nos municípios com serviço de abastecimento de água através de rede geral, existe maior descentralização do serviço com relação às prefeituras, e somente em 17% dos municípios houve prestação do serviço de forma exclusiva, ficando a prestação do mesmo, em maior medida – em 58,2% dos municípios – com outras entidades (Estaduais) ou de forma combinada (24,7%). No entanto, quando se trata do serviço de coleta de esgotamento sanitário observou-se situação inversa, pois a pesquisa mostra que em 55,6% dos municípios as prefeituras executaram o serviço de forma exclusiva, e 41,6% dos municípios tinham a execução desse serviço sob a responsabilidade de outras entidades. Nesse ponto merecem destaque dois aspectos: na Região Centro-Oeste essa forma de execução foi praticada em 81,1% dos municípios, enquanto na Região Nordeste a oferta exclusiva das prefeituras foi superior, atingindo 69,3% dos municípios. O serviço de manejo de águas pluviais foi executado quase que exclusivamente pelas prefeituras (98,6% dos municípios), sendo as outras formas de execução eminentemente residuais.
Em 2002 foi instituído o Ministério das Cidades e o setor de saneamento foi
contemplado com uma secretaria específica para coordená-lo a SNSA,Secretaria
Nacional de Saneamento Ambiental, além da criação do Conselho das Cidades,
criado pelo decreto nº 5.031 de 2004, com a previsão específica de um Comitê
Técnico de Saneamento Ambiental.
A finalidade de criar um órgão específico dentro da estrutura do Ministério das
Cidades foi a de organizar e coordenar as várias ações relativas ao setor, evitando-
se a superposição de competências. Ao Ministério das Cidades, por meio da
Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental coube além da coordenação da
formulação das políticas públicas e a articulação das ações, o atendimento dos
municípios com população superior a 50 mil habitantes, integrantes de regiões
metropolitanas e das regiões integradas de desenvolvimento, equivalente a 847
municípios.
O setor passou a ser organizado com a cooperação de vários outros órgãos
na esfera federal a fim de dinamizar a formulação das políticas públicas, outros
Ministérios passaram a desempenhar atividades específicas relacionadas à sua área
de atribuição, como o Ministério da Saúde, o Ministério da Integração Nacional, o
Ministério do Meio Ambiente, Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à
Fome e o Ministério do Trabalho e Emprego.193
193 BRASIL, Ministério da Saúde, FUNASA. Disponível em
<http.www.saude.gov.br\\funasa>.Acesso em: 09/08/2012. Algumas atribuições no setor de saneamento passaram novamente a ser do Ministério da Saúde por meio de seu órgão executivo, a Fundação Nacional de Saúde/FUNASA, contudo a autonomia das políticas públicas de saneamento básico foi mantida. À FUNASA coube atender os municípios com população total de até 50 mil habitantes, num montante de 4.717 municípios, com ações de saneamento em áreas especiais como comunidades indígenas, quilombolas, reservas extrativistas e assentamentos da reforma agrária, bem como em áreas de relevante interesse epidemiológico e ações de saneamento em áreas rurais. Ao Ministério da Integração Nacional (MIN) coube atuar especialmente em infraestrutura hídrica (adutoras, barragens e açudes) para o abastecimento de água no Nordeste e particularmente nas ações de integração dos rios São Francisco e Parnaíba. No setor de saneamento o MIN atua por meio da Secretaria de Infraestrutura Hídrica e dos seus órgãos vinculados, o Departamento de Obras Contra a Seca (DNOCS) e a Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco (CODEVASF). O Ministério do Meio Ambiente, por meio da Secretaria de Recursos Hídricos e Ambientes Urbanos (RSU) coordena os programas de resíduos sólidos urbanos e desenvolvimento integrado, especialmente na região do semiárido brasileiro. Por meio da Agência Nacional das Águas (ANA), coordena-se questão relativa ao abastecimento de água e esgotamento sanitário com programas de despoluição de bacias hidrográficas. Já ao Fundo Nacional de Meio Ambiente cabe ação de fomento a projetos de gerenciamento e disposição de resíduos sólidos.O Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome coordena o projeto de construção de cisternas para armazenamento de água, indicando a relevância do setor de saneamento básico para o direito social
A política de fomento estatal ao setor de saneamento, diante da necessidade
de acelerar a concessão de recursos, prosseguiu em 2006 com a unificação das
linhas de crédito representadas pelos recursos oriundos dos fundos parafiscais
como o FGTS e o FAT, destinados a financiar obras públicas e privadas em
saneamento, é o projeto “saneamento para todos” do Ministério das Cidades.
Especialmente quanto aos recursos do FGTS para o setor de saneamento
básico havia uma divisão em quatro programas diferentes, três voltados ao setor
público (Pró-Saneamento, Pró-Sanear e Pró-Comunidade) e um voltado ao privado
(FCP/SAN, Programa de Financiamento a Concessionários de Saneamento).
Recentemente em 2007 o setor de saneamento básico ganha nova
regulamentação com a edição da lei nº11.445/2007, que estabelece as diretrizes
nacionais para a prestação dos serviços de saneamento e para a política federal de
saneamento básico.
Desde a extinção do PLANASA na década de 1980 o setor não tinha
regulamentação específica, os avanços no segmento prosseguem, o financiamento
do setor foi contemplado expressamente com o lançamento do PAC 1, Plano de
Aceleração do Crescimento, destinando recursos financeiros ao setor de
saneamento básico, considerado junto com o setor de habitação, recursos hídricos,
transporte de massa um dos eixos de desenvolvimento do país, junto com matriz
energética e estrutura logística.194
A nova lei determina que o planejamento, a regulação, a fiscalização e o
controle social são fundamentais para a execução das ações de saneamento. Além
disso estimula a solidariedade e a cooperação entre os entes federados, estabelece
entre outros, os princípios da universalização do acesso, integralidade, articulação
com outras políticas públicas, eficiência e sustentabilidade econômica, transparência
à segurança alimentar e nutricional. O Ministério do Trabalho e Emprego coordena a ação de apoio para organização e desenvolvimento de cooperativas atuantes na coleta e reciclagem de resíduos sólidos.
194 BRASIL, Ministério das Cidades. Disponível em <http.www.cidades.gob.br\\pac>. Acesso em:
18/10/2012. Segundo informações do Ministério das Cidades a Programação de Investimentos do PAC Infraestrutura 2007 2008 2010 Eixos Infraestrutura Logística 13,4 44,9 58,3 Infraestrutura Energética 55,0 219,8 274,8 Infraestrutura Social e Urbana 3,6 127,2 170,8 TOTAL PAC Infraestrutura 112,0 391,9 503,9
das ações e o controle social, segurança, qualidade e regularidade e integração das
infraestruturas e serviços com gestão eficiente dos recursos hídricos.
Em âmbito federal a Política de Saneamento Básico195 traz expressamente
uma política de fomento para o setor, além de estabelecer os princípios da equidade
social e territorial no acesso aos serviços, a promoção da salubridade ambiental e
maximização da relação benefício/custo, a promoção do desenvolvimento
institucional do saneamento básico, o fomento ao desenvolvimento científico e
tecnológico, a minimização dos impactos ambientais advindos da implantação e
desenvolvimento das ações, obras e serviços, bem com condicionantes da alocação
de recursos públicos federais e dos financiamentos com recursos da União ou com
recursos operados pela União.
O legislador manteve a atividade de saneamento básico caracterizada no
regime de serviços públicos e afeta ao regime de direito público, como se
evidenciam das regras legais que privilegiam a função social do setor em detrimento
de uma atividade meramente econômica, geradora de dividendos.
Não que o lucro e a recuperação de investimentos não tenham previsão
expressa, ao contrário, a lei nº11.445/2007 previu as formas de financiamento para o
setor de saneamento com vistas à expansão da infraestrutura e universalização dos
serviços, através da cobrança direta dos usuários com a taxa ou tarifa.196
Contudo ao tratar dos aspectos econômicos e sociais a lei determina que a
instituição das tarifas, preços públicos e taxas para os serviços de saneamento
básico observará a necessidade de ampliação do acesso aos cidadãos e localidades
de baixa renda, indicando ainda que poderão ser adotados subsídios tarifários e não
tarifários para os usuários e localidades que não tenham capacidade de pagamento
ou escala econômica suficiente para cobrir o custo integral do serviço.
195
BRASIL. Ministério das Cidades, Secretaria de Saneamento. Disponível <http.www.cidades.gov.br\\concidades>. Acesso em: 17/12/2012. Resolução nº 62 do Conselho das Cidades estabelece o pacto pelo saneamento básico. 196
BRASIL Código Tributário Nacional, lei nº 5.172 de 1966. Art. 77. A taxa tem como fato gerador o exercício de regular poder de polícia ou a utilização efetiva ou potencial de serviço público específico e divisível prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição, logo o tratamento jurídico de taxa deve ser deixado para a prestação dos serviços públicos de saneamento quando se der direta e centralizadamente pelo ente público e tarifa quando se trata de serviço público concedido.
A fim de garantir a universalização dos serviços, a lei traz também
subvenções ou subsídios públicos através da previsão orçamentária de receita
específica para cobrir os custos dos serviços nos orçamentos dos Entes Públicos.
A depender das características dos beneficiários e da origem dos recursos a
serem aplicados, os subsídios públicos podem ser classificados em subsídios diretos
e indiretos, tarifários, fiscais e internos. Os subsídios diretos são aqueles destinados
a usuários-consumidores determinados, e os subsídios indiretos quando destinados
ao prestador dos serviços.
A política de subsídios visa garantir o acesso universal ao serviço, admite-se
uma transferência monetária de recursos para a entidade prestadora dos serviços a
fim de garantir que a população menos favorecida, sem condições de pagar a tarifa
pelo seu uso possa usufruir dos serviços de abastecimento de água e coleta de
esgoto.
Os subsídios tarifários são aqueles que integram a estrutura tarifária, e os
fiscais são aqueles decorrentes da alocação de recursos orçamentários, inclusive
por meio de subvenções públicas orçamentárias.
O subsídio pode ser direto, mas também se pode dar indiretamente através
de incentivos fiscais. É bastante comum que os Municípios isentem as
concessionárias do setor de saneamento de impostos sobre serviços – ISSQN e
mesmo de taxas, sem a necessidade de contribuir com os tributos em tese, as
concessionárias teriam condições de expandir o serviço e aumentar os
investimentos no setor visando principalmente a implantação e expansão dos
serviços de esgoto, incluindo o tratamento.
Na hipótese de prestação de serviços associada ou regional, haveria ainda a
categoria de subsídios internos de cada titular ou entre os titulares de serviços
prestados através de consórcios públicos.197
197
A lei nº 11.107/2005 permite à União, Estados e Municípios, a gestão associada de serviços públicos no caso do saneamento básico o instrumento é bastante útil, porque permite a utilização de rede comum de infraestrutura, cuja criação ou manutenção únicas aumentariam o custo da obra-serviço.
Além dessas hipóteses o financiamento do setor pode ser feito através de
empréstimos captados no exterior ou mesmo de bancos públicos e de bancos de
desenvolvimento, como o BNDES, com recursos oriundos do FGTS e do FAT,
conforme amplamente demonstrado.
Após a edição da lei nº11.445/2007 e da instituição de uma política nacional
para o setor, pode-se identificar os investimentos oriundos de subvenções públicas
da União para o saneamento básico em duas fontes: recursos do orçamento Geral
da União198 previstos na lei orçamentária de cada ano, com a previsão de recursos
livres e recursos vinculados a emendas parlamentares, além dos recursos oriundos
dos fundos parafiscais como o FGTS199 e o FAT.200
Os recursos do OGU são considerados “não onerosos” pois não preveem
retorno financeiro direto dos investimentos, ou seja, os agentes beneficiados não
precisam ressarcir os cofres da União.
Já os recursos que têm como fonte os fundos parafiscais financiadores, quais
sejam o FGTS e o FAT, são considerados recursos onerosos pois se tratam de
empréstimos de longo prazo concedidos a taxas de juros especialmente reduzidas e
voltadas para esse segmento específico.
No mercado de crédito comum201 os recursos onerosos à disposição de
mutuários, como Estados, Municípios e concessionárias de serviço de saneamento
não teriam as mesmas condições favorecidas, as taxas de juros seriam mais altas,
198
BRASIL, Ministério das Cidades. Disponível em:<http.www.cidades.gov.br>. Acesso em: 28/08/2012. A operacionalização dos programas e ações no setor quando os recursos são do OGU, cabem à Caixa Econômica Federal. Definido em Contrato de Prestação de Serviços e portarias, tendo a Caixa as seguintes atribuições: analisar a documentação apresentada pelos proponentes; celebrar contratos de repasse e Termos de Compromisso em nome da União; zelar para que os requisitos para contratação das iniciativas, estabelecidos pelo Gestor, sejam fiéis e integralmente observados; acompanhar e atestar a execução físico-financeira dos objetos contratuais, entre outras. 199
No caso do FGTS a gestão do fundo e o repasse dos recursos para as entidades tomadoras fica a cargo da CEF. 200
No caso do FAT a gestão do percentual de 40% e repasse para as entidades tomadoras fica a cargo do BNDES. 201
BANCO CENTRAL. Disponível em:<http.www.bc.gov.br>. Acesso em: 28/08/2012.Como exemplos de captação de recursos no mercado de crédito privado é possível citar estruturas de corporate finance (empréstimos sindicalizados, securitizações ou emissão de títulos através de operações de mercado de capitais); estruturas de project finance (financiamentos lastreados em fluxos de caixa de um projeto isolado). Os credores baseiam-se na performance dos projetos como fonte de repagamento do empréstimo.
haveria exigência de garantia, etc. Já com o fomento público do setor os recursos
destinados ao financiamento têm condições especiais.
No caso dos recursos onerosos, é importante a adoção de medidas pelos
gestores que garantam gastos eficientes202 e mesmo assegurem a transparência na
aplicação dos recursos, através de critérios objetivos, como seleção pública, com
regras predeterminadas.
Quanto aos recursos não onerosos do OGU previstos na LOA, é importante
frisar que podem ser objeto de emendas parlamentares203 nessa hipótese também
haverá seleção objetiva de projetos e o cumprimento de condições mínimas
predeterminadas, contudo essa sistemática perde em controle social e
transparência.
Com as diretrizes trazidas pela lei nº 11.445/2007 os recursos destinados ao
fomento estatal pelo BNDES para o setor de saneamento, classificados como
recursos onerosos, ficam à disposição dos mutuários públicos, das companhias
estaduais ou de concessionárias privadas, mediante seleção pública para projetos
apresentados.
202
CARVALHO,Vinícius Marques de. O Direito .... p. 130. O autor indica seis medidas, como a exigência de realização da escolha das iniciativas apoiadas ou financiadas por meio de processo de seleção pública das propostas, com divulgação prévia dos requisitos e dos critérios e com transparência na aplicação do regulamento, a adoção de critérios técnicos para a escolha dos projetos apoiados ou financiados pelo governo como o condicionamento do aporte de recursos à regularização da concessão, a exigência da cobrança de taxa ou tarifa específica para o serviço e a exigência de um grau de institucionalização mínimo para que o proponente possa acessar os recursos, exigência de comprovação do pleno andamento das obras anteriormente financiadas como condição para o acesso a novos recursos, focalização dos gastos em áreas mais adensadas e com maiores possibilidades de exploração de economia de escala e de escopo e, no caso dos recursos não onerosos, em pequenos municípios e em áreas rurais, condicionamento do acesso aos recursos a formalização de Acordos de Melhoria de Desempenho (AMD), especificando um conjunto de indicadores de eficiência e eficácia na prestação dos serviços e estabelecendo metas a serem atingidas pelo prestador e introdução de mecanismos que promovam a redução da taxa de juros dos empréstimos destinados ao cumprimento de metas de eficácia e eficiência dos empreendimentos. 203
MOREIRA, Terezinha. A infraestrutura urbana, Revista do BNDES, nº12, Rio de Janeiro, 2002. Disponível em <http.www.bndes.gov.br\\revistainfraestrutura>. Acesso em: 08/10/2012. Há severa crítica de vários setores da sociedade diante da possibilidade de utilização dos recursos do OGU para emendas parlamentares, porque comprometeria a transparência e permitiria a utilização política dos mesmos, a destinação dos recursos não contemplaria um plano nacional e se daria de modo pulverizado com pouca eficácia. A autora afirma “haver um forte componente político que cerca o recurso não oneroso tornando-o fracionado, dificultando o seu uso como um dos componentes de um projeto financiado com recursos onerosos o que permitiria a otimização”. Grifo nosso.
CAPÍTULO 4 - A POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS E A ATIVIDADE
DE FOMENTO DO BNDES
4.1 CRESCIMENTO ECONÔMICO E PRESERVAÇÃO AMBIENTAL: A QUESTÃO
DOS RESÍDUOS SÓLIDOS
A lei nº 12.305/2010 que dispõe sobre a Política Nacional de Resíduos
Sólidos204 chega ao ordenamento jurídico brasileiro cerca de 05 anos após a edição
da lei que trata e institui a Política Nacional de Saneamento Básico, a lei
nº11.445/2007, e representa um significativo avanço na esfera jurídica para tratar a
questão relativa à geração e descarte ambientalmente adequado dos resíduos
sólidos.
A lei nacional de resíduos sólidos tem assento constitucional na competência
concorrente da União, prevista no art. 24 da Constituição Federal, no inc. VI que
afirma ser de competência da União e dos Estados dispor sobre florestas, defesa do
solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição. A
União deve trazer as normas gerais e aos Estados cabe suplementar a legislação,
quando necessário.
Na esfera internacional a resolução nº 44/228 da Assembleia Geral da ONU
de 22/12/1989, no seu parágrafo 12, afirma que o manejo ambientalmente correto de
resíduos se encontra entre as questões mais relevantes tanto para a manutenção da
qualidade do meio ambiente como para alcançar um desenvolvimento sustentável
de todos os países.
204
BRASIL, Senado Federal. Câmara dos Deputados. Disponível em:<http.www.senado.gov.br> e <http.www.camara.gov.br>. Acesso em: 29/09/2012. A origem do projeto de lei baseou-se no anteprojeto nº 354 do Senador Francisco Rollemberg do final da década de 1980, dispondo sobre acondicionamento, a coleta, o tratamento, o transporte e destinação final dos resíduos de saúde, na Câmara de Deputados, em 1991, passou a tramitar como projeto nº 203/1991, e por força de emendas passou a dispor sobre toda a espécie de resíduos sólidos e também a veicular a política nacional voltada para o setor.
Para a ONU o manejo ambientalmente sustentável desses resíduos205 deve ir
além do simples acúmulo, depósito ou mesmo do mero reaproveitamento das
matérias, impondo-se a busca pela solução da causa fundamental da geração de
resíduos, através da mudança dos padrões não sustentáveis de produção e
consumo.
Em uma sociedade de mercado que almeja o crescimento econômico a
propagação de uma ideologia que fala em padrões sustentáveis de produção e
consumo pode gerar um aparente conflito, pois “padrões sustentáveis de consumo”
podem implicar em uma dimensão de diminuição da produção e do consumo de
bens.
O crescimento da economia está diretamente relacionado à expansão do
consumo de bens e serviços, esse crescimento em si não pode ser visto como algo
deletério para o meio ambiente, pois com o crescimento econômico o
desenvolvimento da economia e da sociedade gera, com políticas públicas
adequadas, o próprio aumento de mecanismos de proteção ambiental através do
205
BRASIL, Ministério da Saúde, FUNASA. ABNT, Associação Brasileira de Normas Técnicas. Disponível em <http.www.funasa.gov.br> e <http.www.abnt.org.br>. Acesso em: 22/09/2012. O manual de saneamento básico da FUNASA define resíduos sólidos como materiais heterogêneos (inertes, minerais e orgânicos) resultantes das atividades humanas e da natureza, os quais podem ser reutilizados gerando, entre outros aspectos, proteção à saúde pública e economia dos recursos naturais. A questão dos resíduos sólidos também é objeto de normatização técnica pela associação brasileira de normas técnicas - ABNT, aplicáveis, dispõe sobre o tema nas normas técnicas a seguir: NBR 10.004, nela os resíduos sólidos podem ser assim classificados quanto ao risco: Resíduos classe I - perigosos: são resíduos ou mistura de resíduos, que em função de características como inflamabilidade, corrosividade, reatividade,toxicidade e patogenicidade podem apresentar riscos à saúde pública e que apresentam riscos ao meio ambiente quando não manejados corretamente. Resíduos classe II – não inertes: são aqueles que não se enquadram na classe I ou na classe III. Podem ser incluídos os resíduos combustíveis, biodegradáveis e soluções em água. Resíduos classe III - inertes: são aqueles que submetidos ao ensaio de solubilização (nos termos da NBR10.006: “solubilização de Resíduos”), não apresentam quaisquer de seus constituintes solubilizados a concentrações superiores aos padrões de potabilidade de água, conforme a listagem nº 8 da NBR 10.004, excetuando-se os padrões de aspecto, cor, turbidez e sabor. Além da classificação quanto ao risco, a norma da NBR traz classificação quanto à origem, em resíduos domésticos ou residenciais, que são os resíduos gerados nas atividades diárias das diversas edificações residenciais, como casas, apartamentos e condomínios, resíduos comerciais, que são aqueles resíduos gerados em estabelecimentos comerciais, com características próprias à atividade ali desenvolvida, subdivididos entre pequenos geradores e grandes geradores. Ainda quanto à origem temos os resíduos públicos que são aqueles resíduos presentes nos logradouros públicos, resultantes da natureza ou do descarte indevido pela população, os resíduos chamados de domiciliares especiais, constituídos pelo grupo que compreende os entulhos de obras, pilhas e baterias, lâmpadas fluorescentes e pneus, que em função de suas características peculiares, merecem cuidados especiais quanto ao manuseio, estocagem, transporte e disposição final. Estes resíduos especiais podem ter origem não domiciliar, sendo oriundos de uso industrial, radioativo, provenientes de portos, aeroportos e terminais rodoferroviários, agrícola e de serviços de saúde. Os resíduos urbanos são formados por resíduos domiciliares, públicos, entulhos e os de serviços de saúde.
desenvolvimento de novas tecnologias que podem contribuir para o aumento da
sustentabilidade ambiental.
A equação relativa ao aumento da produção e consumo com o necessário
aumento da poluição e esgotamento do meio ambiente e dos recursos naturais, e a
simplista solução de que a redução dos níveis de crescimento econômico com a
diminuição da produção e do consumo implica em preservação ambiental, é
desmistifica da por Cristiane Derani:
Não procedem os argumentos de que proteção ambiental implica diminuição do crescimento econômico, como também são questionáveis os argumentos opostos de que só o crescimento econômico pode garantir proteção ambiental. Um crescimento negativo pode consistir numa diminuição da preocupação ideológica para minimizar efeitos danosos de dejetos finais da produção. Se a paralisação do crescimento econômico dificulta um tratamento com a última palavra em técnica de limpeza ambiental (tratamento dos outputs indesejáveis), o aquecimento da produção econômica leva necessariamente à quantidade de recursos a serem apropriados (input para o crescimento da produção). De qualquer forma, o problema do esgotamento dos recursos naturais está diretamente comprometido com a forma em que se dá a sua apropriação pela sociedade. A quantidade de transformação de matéria em energia não depende do crescimento econômico, mas das características da atividade econômica.
206
Contudo o crescimento econômico e a expansão da produção e consumo
obviamente geram aumento na produção de resíduos, e a consequente poluição207
ambiental, caso não se invista em políticas públicas que prevejam a adoção de
medidas de manejo ambientalmente adequadas.
Diante desse confronto entre expansão da economia e proteção ambiental e a
fim de promover a integração entre preservação dos recursos naturais e economia
de mercado, a expressão “economia ecológica social de mercado” trazido por Rolf
Stober (1989 apud DERANI 2008) procura conciliar, em sete proposições,
crescimento econômico e proteção ambiental como um mecanismo de convivência
entre essas duas realidades indissociáveis:
206
DERANI, Cristiane. Direito... p.88. 207
A lei nº 6.938/1981, no art. 3º inc. III identifica o fenômeno da poluição como a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: a)prejudiquem a saúde, a segurança e o bem estar da população; b)criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c) afetem desfavoravelmente a biota; d)afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos.
“Precaução contra danos ecológicos consiste em orientar uma prática econômica que tenha como pressuposto uma atitude de precaução concentrada numa prática de avaliação e planejamento, de modo à integridade do ambiente onde necessariamente terá de influir; Efetividade ecológica consiste na avaliação e planejamento que tragam um efeito positivo ao equilíbrio dos ambientes naturais e uma melhora efetiva da qualidade de vida da sociedade. (...), voltado sobretudo à produção normativa, orientando sua formação, procurando edificar uma estrutura capaz de identificar em “direito ambiental”. Uma vez que é imprescindível a uniformidade de comportamento, a efetividade ecológica tem como instrumento fundamental o asseguramento normativo da execução das atividades que buscam a otimização do uso dos recursos naturais; Reversibilidade e flexibilidade, os danos ambientais que eventualmente ocorram ou os prejuízos advindos ao ambiente pela prática econômica devem ser reversíveis, ou seja, passíveis de reparação; Praticabilidade é indispensável ao início de determinadas atividades econômicas uma avaliação de custo-benefício social, onde se relaciona o grau de impacto ambiental de uma atividade com os seus benefícios sociais, trazendo à discussão à própria necessidade e utilidade social de uma determinada pratica econômica. Eficiência econômica, os custos das atitudes preventivas e minimizadoras de impactos ambientais não devem retirar da atividade a sua lucratividade; Conformidade ao sistema, todas as medidas a serem adotadas não devem levar a uma modificação estrutural do sistema produtivo capitalista; Justiça distributiva (para as presentes e futuras gerações) a proteção dos recursos naturais é indissociável e, mesmo, é parte do objetivo de bem- estar dos integrantes de uma sociedade. As vantagens advindas do modo de agir das atividades econômicas devem aproveitar a todos. Os benefícios sociais devem ser justamente distribuídos.
208
Quando se fala em conciliação da dicotomia crescimento econômico versus
proteção ambiental a tarefa é árdua, principalmente se a intenção for escapar de
teorias simplistas que imputam a solução para a preservação do meio ambiente na
mera redução do consumo.
A lei 12.305/2010 parece em um primeiro momento não ter escapado a isso,
pois definiu como objetivo da política nacional de resíduos sólidos a “não geração, a
redução, reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos sólidos, bem como a
disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos” Grifo próprio.
Decerto que a mera recomendação de não geração e redução da produção
dos resíduos sólidos tem duvidosa efetividade em termos de contribuir para a
preservação dos recursos naturais e da diminuição da degradação ambiental
envolvida no saneamento ambiental.
208
DERANI, Cristiane. Direito . . . p.239.
Contudo a lei avança à mera teoria simplista e busca na atividade
administrativa de fomento, os avanços relativos à efetividade ecológica209 ao prever,
ainda entre os objetivos da política nacional de resíduos sólidos, a atividade de
fomento à indústria de reciclagem que utilize insumos decorrentes de materiais
reciclados e recicláveis, prioridade nas aquisições e contratações governamentais
para estes produtos, estímulo à implementação da avaliação do ciclo de vida do
produto, incentivo ao desenvolvimento de sistemas de gestão ambiental e
empresarial voltados para a melhoria dos processos produtivos e ao
reaproveitamento dos resíduos sólidos.
A lei traz ainda dispositivos que visam incluir a recuperação e o
aproveitamento energético com adoção, desenvolvimento e aprimoramento de
tecnologias limpas como forma de minimizar impactos ambientais, a articulação
entre setor público e setor privado, com vistas à cooperação técnica e financeira
para a gestão integrada de resíduos sólidos.
É possível perceber na lei nº12.305/2010, a intenção de implementar não só
medidas saneadoras para o meio ambiente, mas também de promover uma
mudança de paradigma no tratamento do tema atinente aos resíduos sólidos.
Antes reconhecido como um problema apenas, e semanticamente identificado
de modo depreciativo o “lixo”, a geração e descarte de resíduos sólidos deve
assumir agora um papel de relevância incontestável na esfera econômica e
ambiental.
Os contornos jurídicos e o tratamento legal expresso a partir da legislação
relativa a saneamento em 2007, no qual o segmento de resíduos sólidos é
considerado como serviço público de saneamento ambiental com regime jurídico
específico, deu mais visibilidade ao tema.
Por longo tempo o tratamento jurídico dispensado ao segmento relativo aos
resíduos sólidos se resumia ao aspecto referente à contratação administrativa, para
a execução indireta dos serviços de titularidade municipal.
209
Termo cunhado por Rolf Stober,( 1989 apud DERANI 2008), e ora reproduzido.
Essa perspectiva reducionista, deixando de lado a questão relativa ao impacto
econômico e ao impacto ambiental, não mais se coaduna com os princípios do
direito ambiental tampouco do direito econômico.
A questão dos resíduos sólidos segundo pesquisa do IBGE no plano nacional
de saneamento básico de 2008, demonstra bem os resultados dessa perspectiva
reducionista no tratamento jurídico do lixo.210
Nas últimas décadas, os vazadouros a céu aberto conhecidos como “lixões”,
ainda são o destino final dos resíduos sólidos na maioria dos municípios brasileiros
(50,8%). Houve uma expansão no destino dos resíduos para os aterros sanitários,
solução mais adequada que passou de 17,3% dos municípios em 2000 para 27,7%
em 2008, conforme tabela a seguir:
RESÍDUOS SÓLIDOS: “Lixões” ainda são destino final em metade dos
municípios
Fonte: IBGE, Pesquisa Nacional de Resíduos Sólidos, 2008.
As consequências ambientais da geração de resíduos sólidos começaram a
ser apontadas, timidamente, na década de 1980 com a lei nº 6.938/81, que traz a
Política Nacional de Meio Ambiente. A racionalização do uso do solo, do subsolo, da
210
IBGE.Disponível em <http.www.ibge.gov.br\\pnsb2008>. Acesso em: 14/02/2012. PNSB 2008 aponta uma melhora significativa em termos quantitativos, nos últimos 20 anos: em 1989, eles representavam o destino final de resíduos sólidos em 88,2% dos municípios. As regiões Nordeste (89,3%) e Norte (85,5%) registraram as maiores proporções de municípios que destinavam seus resíduos aos lixões, enquanto as regiões Sul (15,8%) e Sudeste (18,7%) apresentaram os menores percentuais.
água e do ar, impondo aos Entes Públicos a necessidade de formulação de políticas
públicas para o meio ambiente, foi positivada.211
A geração de resíduos sólidos tem nítida importância para a questão
ambiental e econômica pois o mero depósito de resíduos é uma verdadeira “bomba
relógio” para o meio ambiente, já que o tratamento inadequado é capaz de gerar a
contaminação do solo, subsolo e lençol freático.
A questão relativa aos trabalhadores e à localização para o descarte dos
resíduos sólidos sempre trouxe um estigma social junto a si. O descarte em lixões ou
aterros locais de grande extensão, preferencialmente nas grandes periferias sempre
pareceu à solução mais pontual e fácil para o assunto. 212
A novel legislação afinada com as declarações internacionais a respeito do
tema, a fim de alcançar os objetivos já referidos propõe vários instrumentos, alguns
inovadores no sistema jurídico brasileiro e outros já previstos em outras legislações
que tratam do meio ambiente.213
211
Art. 1º, inc. I da lei nº6.938/1981. 212
CONAMA, Resolução 408/2008. Disponível em: <http.www.mma.gov.br/conama>. Acesso em: 28/08/2012. Segundo a resolução 408/2008 existe o Aterro Controlado, o Lixão e o Aterro Sanitário. Um lixão é uma área de disposição final de resíduos sólidos sem nenhuma preparação anterior do solo. Não tem nenhum sistema de tratamento de efluentes líquidos - o chorume (líquido preto que escorre do lixo). Este penetra pela terra levando substâncias contaminantes para o solo e para o lençol freático. Moscas, pássaros e ratos convivem com o lixo livremente no lixão a céu aberto e, pior ainda, crianças, adolescentes e adultos catam comida e materiais recicláveis para vender. No lixão, o lixo fica exposto sem nenhum procedimento que evite as consequências ambientais e sociais negativas. Já o aterro controlado é uma fase intermediária entre o lixão e o aterro sanitário. Normalmente é uma célula adjacente ao lixão que foi remediado, ou seja, que recebeu cobertura de argila, e grama (idealmente selado com manta impermeável para proteger a pilha da água de chuva) e captação de chorume e gás. Esta célula adjacente é preparada para receber resíduos com uma impermeabilização com manta e tem uma operação que procura dar conta dos impactos negativos tais como a cobertura diária da pilha de lixo com terra ou outro material disponível como forração ou saibro. Tem também recirculação do chorume que é coletado e levado para cima da pilha de lixo, diminuindo a sua absorção pela terra ou eventualmente outro tipo de tratamento para o chorume como uma estação de tratamento para este efluente. Mas a disposição adequada dos resíduos sólidos urbanos é o aterro sanitário que antes de iniciar a disposição do lixo teve o terreno preparado previamente com o nivelamento de terra e com o selamento da base com argila e mantas de PVC, estas extremamente resistentes. Desta forma, com essa impermeabilização do solo, o lençol freático não será contaminado pelo chorume. Este é coletado através de drenos de PEAD, encaminhados para o poço de acumulação de onde, nos seis primeiros meses de operação é recirculado sobre a massa de lixo aterrada. Depois desses seis meses, quando a vazão e os parâmetros já são adequados para tratamento, o chorume acumulado será encaminhado para a estação de tratamento de efluentes. A operação do aterro sanitário, assim como a do aterro controlado prevê a cobertura diária do lixo, não ocorrendo a proliferação de vetores, mau cheiro e poluição visual. 213
BRASIL. MMA, Ministério do Meio Ambiente. Disponível em <http.www.mma.gov.br\\declaraçõesinternacionais>.Acesso em: 01/12/2012. Convenção de
Dentre os vários instrumentos214 trazidos pela lei para o alcance dos louváveis
objetivos pode-se destacar os planos de resíduos sólidos, em corolário do princípio
constitucional do planejamento estatal, com a previsão expressa de planos
nacionais, estaduais e municipais, inclusive condicionando-se o acesso aos recursos
financeiros federais à elaboração de leis técnicas que instituam esses planos.
Todos os Entes Públicos têm de elaborar os planos de resíduos sólidos,
mesmo que a titularidade do serviço seja considerada municipal: a União, os
Estados e Distrito Federal, os Municípios. Além disso, a lei determina planos
microrregionais e planos específicos para regiões metropolitanas ou aglomerações
urbanas.
Estocolmo, Protocolo de Kioto, Convenção da Basiléia sobre Movimentos Transfronteiriços de Resíduos perigosos e seus Depósitos, a Agenda Global 21, entre outros. 214
Art. 8º São Instrumentos da Política Nacional de Resíduos Sólidos, entre outros: I- Os planos de resíduos sólidos; II- Os inventários e o sistema declaratório anual de resíduos sólidos; III- A coleta seletiva, os sistemas de logística reversa e outras ferramentas relacionadas à
implementação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos; IV- O incentivo à criação e ao desenvolvimento de cooperativas ou de outras formas de
associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis; V- O monitoramento e a fiscalização ambiental, sanitária e agropecuária; VI- A cooperação técnica e financeira entre os setores público e privado para o
desenvolvimento de pesquisas de novos produtos, métodos, processos e tecnologias de gestão, reciclagem, reutilização, tratamento de resíduos e disposição final ambientalmente adequada de rejeitos;
VII- A pesquisa científica e tecnológica; VIII- A educação ambiental; IX- Os incentivos fiscais, financeiros e creditícios; X- O fundo nacional do meio ambiente e o fundo nacional de desenvolvimento cientifico e
tecnológico; XI- O sistema nacional de informações sobre a gestão dos resíduos sólidos (Sinir); XII- O sistema nacional de informações em saneamento básico (Sinisa); XIII- Os conselhos de meio ambiente e no que couber de saúde; Os órgãos colegiados municipais destinados ao controle social dos serviços de resíduos sólidos; XIV- O cadastro nacional de operadores de resíduos perigosos; XV- Os acordos setoriais; XVI- No que couber os instrumentos da política nacional de meio ambiente, entre eles:
a) Os padrões de qualidade ambiental b) O cadastro técnico federal de atividades potencialmente poluidoras ou utilizadoras de recursos ambientais; c) O cadastro técnico federal de atividades e instrumentos de defesa ambiental; d) A avaliação de impactos ambientais; e) O sistema nacional de informação sobre meio ambiente (Sinima); f) O licenciamento e a revisão de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras;
XVIII- Os termos de compromisso e os termos de ajustamento de conduta; XIX- O incentivo à adoção de consórcios ou de outras formas de cooperação entre os entes
federados, com vistas à elevação das escalas de aproveitamento e à redução dos custos envolvidos.
Mas não só ao Poder Público a lei impôs obrigações decorrentes do princípio
do planejamento, diante da relevância do tema à iniciativa privada, composta por
empresas atuantes nesse segmento, também tem o dever de elaborar plano de
gerenciamento de resíduos sólidos.
A obrigação de elaborar os planos de gerenciamento de resíduos sólidos tem
em vista, além do cumprimento do princípio do planejamento, a aplicabilidade da
responsabilidade objetiva em face da prática de atividades poluidoras à iniciativa
privada, ao determinar a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do
produto215 que envolve todos os atores sociais que de algum modo contribuem para
a geração de resíduos: fabricantes, importadores, distribuidores, comerciantes, o
Ente Público titular dos serviços de limpeza e os consumidores.
A lei nº12.305/2010 consagra, definitivamente, a intervenção estatal na
economia através das normas de indução. A atividade administrativa de fomento
estatal é amplamente mencionada, a lei foi pródiga ao se referir às expressões
semânticas “estímulos” e “incentivos”, “medidas indutoras”, “linhas de
financiamento”, em óbvia intervenção na economia através do fomento.
Ressalte-se,dentre as várias hipóteses de fomento, a intenção do legislador
de criar mecanismos para o desenvolvimento das indústrias de reciclagem que
utilizem como insumo as matérias primas e derivados de materiais recicláveis e
reciclados, e que desenvolvam mecanismos limpos de energia.
Nessa hipótese o fomento a esse segmento da economia pode ser
identificado com a proposição referente à eficiência econômica e praticabilidade,
trazidas por Rolf Stober (1989 apud DERANI 2008), bem como o princípio da
ecoeficiência, afinado com as declarações internacionais do meio ambiente como a
Conferência Rio 92 no World Business Council for Sustainable Development216
mediante o qual o desenvolvimento econômico deve trazer também
desenvolvimento tecnológico a serviço da melhora, conservação ou recuperação do
meio ambiente.
215
Art. 36 da lei nº 12.305/2010. No âmbito da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, cabe ao titular dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, observado, se houver, o plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos. 216
Disponível em: <http.www.agenda21empresarial.com.br>. Acesso em: 14/09/2012.
A partir dos princípios da eficiência e praticabilidade econômica, a legislação
procurou mudar o estigma que acompanha a questão relativa ao lixo reconhecendo-
o como um bem econômico e de valor social, retirando-lhe a conotação negativa de
“lixo” de “imprestabilidade” dos resíduos sólidos217
Os resíduos sólidos devem ser percebidos agora não mais como lixo, como
algo deletério a ser simplesmente afastado dos domicílios,há uma determinação
para reconhecer nos resíduos sólidos valor econômico de insumo e matéria prima
para a indústria, com a função de poupar os recursos naturais e consequentemente
de resgatar, dando visibilidade e reconhecimento social aos operadores finais da
cadeia do ciclo produtivo de bens: os catadores.
Nesses termos a lei determina que caiba ao Poder Público, na função de
titular dos serviços públicos de limpeza e manejo de resíduos sólidos, a
responsabilidade de articular com os agentes econômicos e sociais medidas para
viabilizar o retorno ao ciclo produtivo dos resíduos sólidos reutilizáveis e recicláveis,
através de ações e programas para a participação dos grupos interessados, em
especial das cooperativas ou associações de catadores de materiais recicláveis e
reutilizáveis, formadas por pessoas de baixa renda, com a previsão de mecanismos
para a criação de fontes de negócios, emprego e renda.
A previsão de normas indutivas através de instrumentos econômicos vem
expressa no capítulo V da lei, assim o poder público poderá instituir medidas
indutoras e linhas de financiamento para atender, prioritariamente, às iniciativas de
prevenção e redução da geração de resíduos sólidos no processo produtivo, o
desenvolvimento de produtos com menores impactos à saúde humana e à qualidade
ambiental em seu ciclo de vida.
Além disso, medidas indutoras e linhas de financiamento voltadas à
implantação de infraestrutura e aquisição de equipamentos para cooperativas ou
outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis
formadas por pessoas físicas de baixa renda e para o desenvolvimento de projetos
de gestão dos resíduos sólidos de caráter intermunicipal ou regional, têm papel de
destaque.
217
ARAUJO, Suely Mara Vaz Guimarães de; JURAS. Ilidia da Ascenção Garrido Martins. Comentários à Lei de resíduos Sólidos. São Paulo: Pillares, 2011.
A atividade administrativa de fomento também está destinada a projetos de
estruturação de sistemas de coleta seletiva e de logística reversa, de projetos de
descontaminação de áreas contaminadas incluindo as áreas órfãs, de projetos de
pesquisa voltados para tecnologia limpa e aplicável e de projetos de sistemas de
gestão ambiental e empresarial voltados para a melhoria dos processos produtivos e
ao reaproveitamento dos resíduos.
Além das regras de fomento positivas principalmente através de
financiamentos, a lei nº 12.305/2010 permite que União, Estados, Distrito Federal e
Municípios instituam cada qual no seu âmbito de competência, isenções fiscais e
incentivos financeiros e creditícios para as indústrias e entidades dedicadas à
reutilização, ao tratamento e à reciclagem de resíduos sólidos produzidos no
território nacional, a projetos relacionados à responsabilidade pelo ciclo de vida de
produtos com prioridade para as formas associativas de catadores de material
reciclável e ainda para empresas dedicadas à limpeza urbana.
4.2 A ATUAÇÃO DE FOMENTO ESTATAL NO SETOR DE RESÍDUOS SÓLIDOS-
O BNDES
A Constituição de 1988 conferiu aos Municípios competência para legislar
sobre assunto de interesse local e consequentemente para organizar e prestar os
serviços públicos afins. Os serviços de saneamento básico, referentes à distribuição
de água e coleta e tratamento de esgoto, tendem a ser considerados municipais.
Quanto aos serviços relativos à coleta e o manejo de resíduos sólidos são
considerados de interesse local, sem haver qualquer controvérsia quanto a essa
competência, mesmo nas regiões metropolitanas e aglomerações urbanas.
Como os demais serviços públicos de saneamento básico a prestação dos
serviços de coleta e manejo de resíduos sólidos pode ser realizada diretamente pelo
Município ou indiretamente através de licitação para concessão ou permissão, ou
ainda através de consórcios públicos.218
Normalmente o financiamento desses serviços é feito através de subvenção
pública prevista no orçamento geral do Município. Poucos Entes Públicos preveem
uma taxa específica e individualizada para cobrir os serviços de coleta e manejo,
normalmente o custeio vem da arrecadação do imposto sobre propriedade territorial
e predial, o IPTU, previsto no art. 156, inc. I da Constituição e implantado por lei
ordinária de cada Município.
Em que pese a titularidade municipal diante da mecânica relativa ao manejo e
descarte de resíduos sólidos, a nova legislação trouxe com ela a noção de prestação
de serviços de modo regionalizado e descentralizado.
Nesses termos, também os Estados devem passar a elaborar sua própria
legislação interna através do planejamento integrado do setor, bem como a
necessidade de planos específicos quando se tratar de Municípios que integrem
microrregiões, aglomerações urbanas e regiões metropolitanas, prevendo que os
consórcios públicos constituídos nos termos da lei nº 11.107/2005 com o objetivo de
viabilizar a descentralização e a prestação de serviços públicos que envolvam
resíduos sólidos, têm prioridade na obtenção dos incentivos instituídos pelo Governo
Federal.
A partir daí para que os Estados tenham acesso a recursos da União ou por
ela controlados, destinados a empreendimentos e serviços relacionados à gestão de
resíduos sólidos, ou para serem beneficiados por incentivos ou financiamentos de
entidades federais de crédito ou fomento para tal finalidade, devem elaborar, a partir
de dois anos da entrada em vigor da lei nacional, o plano geral estadual de resíduos
sólidos219 e também quando houver microrregionais, regiões metropolitanas ou
aglomerações urbanas, planos específicos.
É bom frisar que nessa última hipótese os planos estaduais específicos
destinados à gestão dos resíduos sólidos em microrregiões, aglomerações urbanas
218
Artigo 45 da lei nº 12.305/2010. 219
O art. 17 da lei 12.305/2010. O plano estadual de resíduos sólidos será elaborado para vigência por prazo indeterminado, abrangendo todo o território do Estado, com horizonte de atuação de 20 anos e revisões a cada quatro anos.
e regiões metropolitanas, devem contar com a participação obrigatória dos
Municípios envolvidos.
A lei estabelece mais uma diretriz aos Estados trazendo o conteúdo mínimo
que deve estar presente no plano estadual de resíduos sólidos, englobando o
diagnóstico, com a identificação dos principais fluxos de resíduos e seus impactos
socioeconômicos e ambientais localizados dentro do território do Estado.
Preocupado com a diminuição da quantidade de resíduos para a disposição
final e com o crescimento dos mecanismos de desenvolvimento limpos, o plano
estadual deve prever projetos, programas e ações visando alcançar metas definidas
de redução, reutilização, reciclagem, metas para o aproveitamento energético dos
gases liberados nas unidades de disposição final dos resíduos sólidos, além de
metas para a eliminação e recuperação de lixões associadas à inclusão social e
emancipação econômica de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis.
O plano estadual tem de trazer também normas e condicionantes técnicas
para o acesso a recursos do Estado, para a obtenção de seu aval ou para o acesso
de recursos administrativos, direta ou indiretamente, por entidade estadual, quando
destinados a ações e programas de interesse dos resíduos sólidos.
Além dos planos Estaduais a lei nacional determina a mesma regra a cada
um dos Municípios brasileiros, além do Distrito Federal, frisando que a mera
instituição dos planos estaduais nas microrregiões, aglomerações urbanas e regiões
metropolitanas, não é suficiente para eximir os Municípios de sua responsabilidade
em planejar detalhadamente o serviço, no âmbito de seu território.
Para que os Municípios também tenham acesso a recursos da União, por ela
controlados ou de instituições federais de crédito ou fomento destinados aos
empreendimentos e serviços, devem, no mesmo prazo reservado aos Estados,
elaborar seus planos municipais de gestão integrada de resíduos sólidos.
Além disso a lei privilegia a gestão associada dos serviços220 eis que
beneficia com prioridade no acesso a incentivos e recursos financeiros os Municípios
220
A lei indica que nos termos do regulamento, decreto nº7.404/2010, aos municípios que optarem por soluções consorciadas intermunicipais para a gestão dos resíduos sólidos, desde que o plano
que optarem por soluções consorciadas intermunicipais, a partir da elaboração e
implementação de plano intermunicipal ou da inserção voluntária nos planos
microrregionais de resíduos elaborados pelos Estados, bem como aos que optarem
pela implantação de coleta seletiva com a participação de cooperativas ou outras
formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis,
integradas por pessoas de baixa renda.
Do mesmo modo que dispôs sobre o conteúdo mínimo dos planos estaduais
de resíduos sólidos, trouxe alguns itens de observância obrigatória para todos os
Municípios, com exceção dos que contem com menos de 20 mil habitantes, os quais
terão um procedimento simplificado desde que não integrem áreas de especial
interesse turístico, ou que não estejam inseridos em área de influência de
empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental de âmbito
regional ou nacional, ou cujo território abranja total ou parcialmente unidades de
conservação, segundo o disposto no art. 2, inc. I da lei n º9.985/2000.
A lei que instituir o plano municipal de resíduos sólidos é uma lei de cunho
eminentemente técnico, pois deve ser elaborada através de levantamentos
específicos a respeito do diagnóstico, contendo a origem, o volume, a caracterização
e as formas de destinação e disposição final dos resíduos sólidos gerados dentro do
território do Município, com a indicação específica da presença de resíduos sujeitos
ao plano de gerenciamento específico ou aos sistemas de logística reversa, além da
identificação de seus geradores.
Após o diagnóstico inicial, conjugando-se com o plano diretor do Município em
vigência, o plano municipal de resíduos deve indicar soluções ambientalmente
adequadas para o manejo e a disposição final dos resíduos, com a indicação de
áreas favoráveis à disposição final no seu próprio território ou a indicação de
possibilidade de implantação de soluções consorciadas ou compartilhadas com
outros Municípios, tendo em vista os critérios de economia de escala, principalmente
a proximidade dos locais estabelecidos e as formas de prevenção dos riscos
ambientais.
intermunicipal preencha os requisitos da lei nacional, a dispensa da elaboração do plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos.
O plano municipal de resíduos deve trazer ainda os procedimentos e
indicadores de desempenho operacional e ambiental, além das regras mínimas para
a execução dos serviços e disposição final dos resíduos, regras para o transporte
com a observância da legislação federal estadual sobre o tema, definição das
responsabilidades, programas e ações de capacitação técnica e programas e ações
de educação ambiental para a operacionalização e implementação do plano,
identificação das áreas de passivos ambientais, incluindo áreas contaminadas, com
as respectivas medidas saneadoras, com os meios para controle e fiscalização.
Na mesma esteira em que a lei procura incentivar a prestação regionalizada e
descentralizada dos serviços de limpeza e manejo de resíduos sólidos, é possível
perceber certa tendência à centralização dos recursos destinados aos investimentos
no setor de saneamento básico e principalmente para o segmento em questão.
Isso porque diferentemente de outros serviços públicos como a educação ou
saúde, que contam com fundos nacionais próprios com repasses vinculados à
quantidade de usuários, como o FUNDEB221 na questão relativa aos resíduos
sólidos o custeio dos serviços, e mesmo o alcance de todos os objetivos trazidos
pela lei, dependem em grande parte dos orçamentos fiscais de cada um dos
Municípios Brasileiros.
Em que pese a previsão legal de um sistema de cálculo dos custos da
prestação do serviço público, bem como a forma de cobrança desses serviços a fim
de incentivar que a população saiba o custo e as consequências efetivas do
consumo em termos econômicos com a previsão de metas de redução, reutilização,
coleta seletiva e reciclagem, entre outras, a descrição das formas e dos limites de
participação do poder público local na coleta seletiva e na logística reversa, com
vistas a reduzir a quantidade de rejeitos encaminhados para a disposição final
ambientalmente adequada, por certo que a implementação dos objetivos legais,
somente com recursos fiscais dos Municípios não tem chances de êxito.
221
Conforme lei nº 11.494/2007 que institui o Fundo Desenvolvimento da Educação- FUNDEB,
congregando recursos fiscais da União,Estados e Municípios para financiar a educação, o repasse dos valores aos Municípios e Estados é proporcional ao número de alunos matriculados na rede pública de ensino, contudo outros serviços públicos como saneamento básico não contam com fundos nacionais para custeio.
Por certo que a busca de investimentos para o setor tornou-se centralizada
junto à União através do OGU, via projetos do Ministério das Cidades, das
instituições financeiras federais e dos bancos de desenvolvimento222 que
administram os fundos parafiscais de poupança compulsória, quais sejam a Caixa
Econômica Federal, o Banco do Brasil e o BNDES, eis que com o grande número e
a diversidade dos Municípios brasileiros, poucos seriam aqueles com condições de
investir recursos pujantes no setor.
Assim, no OGU é possível identificar recursos disponíveis para fomentar o
segmento através de financiamentos não reembolsáveis destinados aos Estados e
Municípios, mediante contrapartida para elaboração dos planos de gestão de
resíduos sólidos e a elaboração de projetos básicos de engenharia destinados a:
desativação de lixões, implantação de unidades de disposição final (aterros
sanitários ou aterros controlados), infraestrutura para a coleta seletiva pelos
catadores; unidades de tratamento (triagem e compostagem) e unidades de
transferência intermediária (estações de transbordo).
Os recursos da União podem ser utilizados ainda para incentivar a redução da
geração e a maximização da reutilização e da reciclagem de resíduos sólidos
urbanos, ampliar a cobertura e aumentar a eficiência e eficácia da prestação dos
serviços de limpeza pública, incluindo as etapas de coleta, transporte, tratamento e
destinação final adequada dos resíduos sólidos urbanos, promover a inclusão social
dos catadores, tornando-os agentes relevantes de todo o sistema de manejo
integrado dos resíduos, erradicar o trabalho infantil nos lixões e em qualquer etapa
do sistema de limpeza pública e para encerrar os lixões223 e promover a
recuperação ambiental das áreas degradadas por disposição inadequada dos
resíduos sólidos urbanos.
Nos mesmos moldes dos recursos do OGU, destinados aos demais
segmentos do setor de saneamento básico, é importante frisar que o acesso aos
222
Contudo, somente os recursos do orçamento geral da União são não reembolsáveis, os recursos buscados junto a Instituições Financeiras são financiamentos sujeitos a reembolso e aos limites de endividamento dos Entes Públicos, para efeitos de responsabilidade fiscal, da lei complementar nº 100/2001. 223
Caso os recursos da União se destinem ao encerramento de um lixão, o atendimento é condicionado à execução simultânea da recuperação da área degradada e da disposição final adequada em aterro sanitário.
recursos depende do cumprimento das determinações da lei de responsabilidade
fiscal, e ainda de que os recursos da OGU podem sofrer emendas parlamentares
comprometendo a eficácia e transparência da execução das políticas nacionais no
setor.224
Quanto aos órgãos que operam no sistema de resíduos sólidos com recursos
do OGU, identificou-se o compartilhamento de atribuições entre o Ministério do Meio
Ambiente, que é o coordenador do programa, ficando as ações a cargo da
Secretaria de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano e do Fundo Nacional de Meio
Ambiente além do Ministério das Cidades, FUNASA e o Ministério do Trabalho e
Emprego.225
Além dos recursos da União via OGU as instituições financeiras federais, com
destaque para o BNDES têm linhas de créditos específicas para o financiamento do
setor226 destinadas tanto aos Entes Públicos (Estados e Municípios) como à
entidades privadas que atuem na prestação de serviços e às indústrias que
prevejam produção a partir de insumos e matéria prima oriunda da reciclagem ou
reutilização.
Na esfera de atuação do BNDES há uma preocupação não só com a
execução da política nacional de resíduos, mas também com os instrumentos legais
disponíveis para sua implementação, daí a previsão do Programa de Capacitação e
Treinamento em Gestão Integrada de Resíduos Sólidos Urbanos – modalidade
Ensino à Distância (EAD) que tem por objetivo o treinamento de técnicos e gestores
224
MOREIRA,Terezinha. Infraestrutura Urbana. Revista do BNDES, Rio de Janeiro, 2002.Disponível em <http.www.bndes.gov.br>. Acesso em:15/06/212. 225
Ao Ministério das Cidades cabe a coordenação dos programas de desenvolvimento institucional para a gestão integrada de resíduos sólidos urbanos em Municípios com população superior a 250 mil habitantes ou integrantes de Regiões Metropolitanas. O Ministério da Saúde, por meio da Funasa também prevê programas de fomento ao setor, bem como o Ministério do Trabalho e Emprego, responsável pelo aspecto relativo ao trabalho executado pelos catadores de material reciclável. 226
Em que pese não ser a única modalidade, a maioria dos mecanismos de fomento prevista na li, refere-se ao fomento financeiro, como forma de viabilizar financiamentos destinados às empresas prestadoras de serviços no setor, à Administração Pública e as indústrias que atuarem com insumos e matéria prima de materiais recicláveis e reutilizáveis, é importante ressaltar que os financiamentos do BNDES, normalmente são total ou parcialmente reembolsáveis, para os Entes Públicos tomadores, há ainda as restrições contidas na lei de responsabilidade fiscal, segundo o disposto no art. 46 da lei 12.305/2012.
municipais e outros profissionais que atuam na área, em corolário do
princípio da educação ambiental.
Como a lei determina a necessidade de adequação da legislação de todos os
Entes Públicos envolvidos, com a edição de leis técnicas torna-se relevante a
atuação do BNDES para os projetos de financiamentos destinados à elaboração dos
planos municipais e estaduais de resíduos sólidos.
A própria execução dos serviços também foi contemplada, com a finalidade
de proporcionar à população acesso aos serviços de limpeza urbana, coleta,
tratamento e destinação final adequada de resíduos sólidos urbanos. A Instituição
Financeira prevê linha de apoio à implantação e ampliação dos sistemas públicos de
manejo de resíduos sólidos em municípios com população acima de 50 mil
habitantes ou integrantes de regiões metropolitanas por meio da implantação,
ampliação ou melhoria do sistema de coleta, tratamento e destinação final de
resíduos sólidos para prevenção e controle de agravos.227
Por certo que em atendimento à determinação constitucional de promover a
sustentabilidade ambiental, privilegiando a extinção dos lixões e a criação de aterros
sanitários com estrutura adequada, com a geração de energias alternativas e com a
inibição de ações altamente deletérias como contaminação de lençol freático e
cursos de rios próximos, a iniciativa privada também pode ter acesso aos recursos
do BNDES, nesse segmento.
4.3 FOMENTO AO ASSOCIATIVISMO PARA OS CATADORES DE MATERIAIS
RECICLÁVEIS
Além da óbvia importância em matéria ambiental, a lei nacional de resíduos
sólidos traz um estímulo ao associativismo228 dos profissionais da reciclagem,
valorizando e dando visibilidade a uma função social de suma importância, como
objetivo e instrumento da política nacional de resíduos sólidos.
227
BNDES, 2006. 228
O art. 174, parágrafo 2 da Constituição determina que a lei estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo.
Sob aspecto social a atividade de coleta de resíduos sólidos destinados à
reciclagem é das mais árduas e estigmatizantes229 a tarefa do catador ou coletor não
raramente é prestada em condições subumanas:
Muitas vezes ultrapassa doze horas ininterruptas; um trabalho exaustivo, visto as condições a que estes indivíduos se submetem, com seus carrinhos puxados pela tração humana, carregando por dia mais de 200 quilos de lixo (cerca de 4 toneladas por mês), e percorrendo mais de vinte quilômetros por dia, sendo, no final, muitas vezes explorados pelos donos dos depósitos de lixo (sucateiros) que, num gesto de paternalismo, trocam os resíduos coletados do dia por bebida alcoólica ou pagam-lhes um valor simbólico insuficiente para sua própria reprodução como catador de lixo.
230
Desde 2002 a atividade de coletor de material reciclável é regulamentada e
classificada na Classificação Brasileira de Ocupações - CBO, como de nº 5.192, mas
a formalização das relações de trabalho ainda está distante, condições precárias,
crianças e adolescentes trabalhando e morando em lixões ainda são uma realidade
no país, mesmo com a bem intencionada proibição da lei231 dados do IBGE de 2008
corroboram essa lamentável situação.232
No art. 7º inc. XII, entre os objetivos da lei está a integração dos catadores de
materiais reutilizáveis e recicláveis nas ações que envolvam a responsabilidade
compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos.
O associativismo dos catadores de material é ainda previsto como
instrumento da política nacional de resíduos sólidos, através de incentivos à criação
e ao desenvolvimento de cooperativas ou de outras formas de associação de
catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis.
229 IBGE, 2012. O PNSB 2008 aponta que tal atividade é exercida, basicamente, por pessoas de um segmento social marginalizado pelo mercado de trabalho formal, que têm na coleta de materiais recolhidos nos vazadouros ou aterros uma fonte de renda que lhes garante a sobrevivência. Contudo não se tem conhecimento, dentro da escala de valores das categorias profissionais, de nenhuma outra atividade que seja tão estigmatizada e desprestigiada socialmente como o trabalho dos catadores. 230
MAGERA, Marcio. Os Empresários do Lixo: Um paradoxo da modernidade. Campinas: Átomo,2003, p.34. 231
Art. 48. São proibidas, nas áreas de disposição final de resíduos ou rejeitos, as seguintes atividades: I - utilização dos rejeitos dispostos como alimentação; II - catação, observado o disposto no inciso V do art. 17; III - criação de animais domésticos; IV - fixação de habitações temporárias ou permanentes; V - outras atividades vedadas pelo poder público. 232
Em todo o país, aproximadamente 26,8% dos municípios que possuíam serviço de manejo de resíduos sólidos sabiam da presença de catadores nas unidades de disposição final de resíduos sólidos. A maior quantidade estava nas regiões Centro-Oeste e Nordeste: 46% e 43%, respectivamente. Destacavam-se os municípios do Mato Grosso do Sul (57,7% sabiam da existência de catadores) e de Goiás (52,8%), na região Centro-Oeste, e na região Nordeste, os municípios de Pernambuco (67%), Alagoas (64%) e Ceará (60%).
A inclusão social da categoria de catadores vem expressa como meta para o
plano nacional de resíduos sólidos e para os planos estaduais, no art. 15, inc. V e
17, inc. V, ao dispor pela obrigatoriedade de eliminação e recuperação de lixões,
associadas à inclusão social e à emancipação econômica de catadores de materiais
reutilizáveis e recicláveis.
O acesso aos recursos federais da União e das Instituições Financeiras, como
por exemplo o BNDES, também está condicionado à implantação da coleta seletiva
e à previsão de programas e ações voltados para associação de catadores pelos
Municípios.
A lei reserva também um papel atuante para as associações de catadores de
material reciclável no sistema de logística reversa233 através de parcerias com as
empresas que agora têm a responsabilidade pelo ciclo de vida dos produtos como
os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de agrotóxicos seus
resíduos e embalagens, pilhas e baterias, pneus, óleos lubrificantes seus resíduos e
embalagens, lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista e
de produtos eletroeletrônicos e de seus componentes.
A prioridade para financiamento de implantação de infraestrutura física e
aquisição de equipamentos para cooperativas ou outras formas de associação de
catadores, inclusive com a previsão de incentivos de natureza fiscal, coloca o
segmento em posição alvo das políticas públicas, procurando-se resgatar uma
dívida social com este segmento representado pelos catadores de materiais
recicláveis e reciclados.
233
Logística reversa, segundo o art. 3º, inc. XII da lei 12.305/20120, é o instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento em seu ciclo ou outros ciclos produtivos, ou outra destinação ambientalmente adequada.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A atividade de fomento foi prevista na Constituição de 1988 como modalidade
de intervenção do Estado sobre o domínio econômico na categoria de normas de
indução.234 Essa função em grande parte foi cometida às instituições financeiras de
desenvolvimento, com destaque para o BNDES.
O fomento estatal pode ser direcionado a vários setores da economia e
também setores de relevância social, como é o serviço público de saneamento
básico. Não há dúvidas que a expansão e/ou a universalização dos serviços de
saneamento básico é um imperativo nacional.
A importância dos serviços de saneamento para o desenvolvimento
sustentável235 é incontroversa. Além disso, saneamento deve ser avaliado sob
critérios de sanitários, e mesmo de garantia da dignidade humana236 o objetivo da
universalização dos serviços deve ser considerado no momento de destinação de
recursos, formulação e execução das políticas públicas para o setor.
Não há dúvidas de que a inexistência ou precariedade dos serviços de
saneamento básico é um retrato da exclusão social, a desafiar os administradores
públicos.
E os desafios para universalização dos serviços não são poucos, o setor de
saneamento básico, principalmente com relação à rede de infraestrutura carece de
altos investimentos237 e o retorno é de longo prazo, justificando a previsão
constitucional de fundos parafiscais de poupança compulsória, com recursos
vinculados e geridos por instituições financeiras de desenvolvimento, como é o caso
do BNDES e da gestão do FAT-Constitucional.
234
GRAU, Eros Roberto. Constituição e Serviço Público: Estudos em Homenagem a Paulo Bonavides, São Paulo: Malheiros, 2001, p.147. 235
Principalmente quando consideramos o abastecimento de água potável e a poluição hídrica decorrente do descarte de esgoto sem tratamento nos cursos de água. 236
A água é insumo para a preparação de alimentos, e a Emenda Constitucional nº 64/2010, coloca o direito à segurança alimentar e nutricional como direito social. 237
BRASIL, Ministério das Cidades, Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental, (Série Panorama do Saneamento no Brasil, v.4), Brasília, 2011. Disponível em <http.www.cidades.gov.br\\ >.Acesso em: 22/04/2012. Segundo o plano de modernização do setor de saneamento básico seriam necessários R$ 178 bilhões para universalizar os serviços de abastecimento de água e de esgotamento sanitário até o ano de 2020.
Ainda assim os recursos não têm se mostrado suficientes e o Brasil está
longe de cumprir as metas do milênio previstas no PNUD, principalmente quanto ao
serviço de tratamento de esgoto.
Além dos recursos oriundos dos fundos parafiscais de poupança popular o
setor de saneamento conta com recursos orçamentários, na esfera federal advindos
do OGU, e classificados como não onerosos.
Essa situação tem maiores reflexos no segmento relativo aos resíduos sólidos
já que enquanto nos serviços de distribuição de água e coleta de esgoto
normalmente o serviço é prestado através de concessões - permissões pelas
companhias estaduais, com maior fôlego para investimentos, já no segmento de
resíduos sólidos, o serviço é prestado diretamente ou indiretamente pelos
Municípios através de receita orçamentária.
A política nacional de resíduos sólidos trazida pela lei nº12.305/2010 e as
novas providências a cargo dos Entes Públicos prometem trazer alterações para o
setor. Contudo em razão das restrições da lei de responsabilidade fiscal para
endividamento, os titulares do serviço, quais sejam os Municípios tenderão a
depender cada vez mais de recursos federais.
Nesse sentido, é fácil concluir que a atual política nacional de investimentos
no setor carece de melhor articulação. A lei nacional de saneamento é recente, foi
editada há cerca de cinco anos e sua aplicação deve levar em conta a grande
diversidade de situações dos Municípios brasileiros, desde os mais ricos da
federação com possibilidade de maior endividamento e, portanto, de acesso a
recursos onerosos, como os Municípios mais pobres da federação com pouca ou
nenhuma condição de endividamento, dependente, portanto dos repasses não
onerosos somente.
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autoriza a emissão de obrigações da Dívida Pública Federal; cria o Banco Nacional
do Desenvolvimento Econômico; abre crédito especial e dá outras providências.
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relacionadas com a execução do Plano de Desenvolvimento Econômico previstas
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dá outras providências.
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