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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Jorge Luiz Comparim O CONTRATO E A SUA FUNÇÃO SOCIAL CURITIBA 2012

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

Jorge Luiz Comparim

O CONTRATO E A SUA FUNÇÃO SOCIAL

CURITIBA

2012

O CONTRATO E A SUA FUNÇÃO SOCIAL

CURITIBA

2012

Jorge Luiz Comparim

O CONTRATO E A SUA FUNÇÃO SOCIAL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito Orientador: Prof. Doutor Sérgio Said Staut Junior.

CURITIBA

2012

TERMO DE APROVAÇÃO

Jorge Luiz Comparim

O CONTRATO E A SUA FUNÇÃO SOCIAL

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado e aprovado para obtenção do título de Bacharel no curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, 27 de abril de 2012.

Prof. Doutor Eduardo de Oliveira Leite Coordenador do Núcleo de Monografias

Universidade Tuiuti do Paraná Orientador: Prof. Doutor Sérgio Said Staut Junior

Universidade Tuiuti do Paraná

Prof. __________________________________

Universidade Tuiuti do Paraná

Prof. __________________________________

Universidade Tuiuti do Paraná

AGRADECIMENTOS

Inicialmente a Deus, por dar-me a oportunidade, força e perseverança para

alcançar mais este sonho em minha vida.

A meus pais, que me propiciaram o alicerce e souberam indicar o caminho

correto, sempre me ensinando os valores indispensáveis à formação do caráter; meu

eterno amor e gratidão.

Aos meus amigos e familiares que muito incentivaram e, especialmente

àqueles poucos que desdenharam minha opção de retornar à Universidade depois

dos quarenta anos de idade, obrigado.

A todos os professores, funcionários e principalmente aos queridos colegas

de turma, obrigado pelo carinho, companheirismo e pelos momentos agradáveis de

convívio, certamente eu os levarei no coração por toda minha vida.

Ao meu orientador, Prof. Doutor Sérgio Said Staut Junior, que prontamente

aceitou este encargo, pelas horas a mim dedicadas, e sobretudo pela paciência para

que eu pudesse inicialmente entender, para depois conseguir concretizar este

trabalho.

Por fim e especialmente, à minha adorada esposa Simone e queridas filhas

Mariana e Camila, pela tolerância em minhas ausências e principalmente nos muitos

momentos difíceis que surgiram durante esse longo percurso, dedicando-me o seu

amor incondicional, sempre compreendendo e respeitando a importância de todo o

tempo que dediquei, e que certamente continuarei dedicando aos estudos. Vocês,

mais do que ninguém, sabem o significado dessa conquista, que certamente abrirá

caminho a novos horizontes.

O contrato é um elo que, de um lado, põe o valor do indivíduo como aquele que o cria, mas, de outro lado, estabelece a sociedade como o lugar onde o contrato vai ser executado e onde vai receber uma razão de equilíbrio e medida.

Miguel Reale

RESUMO

Este trabalho de pesquisa e revisão bibliográfica pretende dissertar sobre o contrato e a função social que este desempenha, abordando de maneira sucinta, breves delineamentos sobre a doutrina contratual brasileira; e concentrando-se posteriormente no exame minucioso do art. 421 do atual diploma civil que trata da função social dos contratos. Com isso espera-se demonstrar as várias situações que permitem a intervenção judicial nas estipulações contratuais, as diversas formas de controle das cláusulas abusivas e as consequências destas mudanças na criação e execução dos contratos. Palavras-chave: contrato – função social – aplicação – execução – intervenção

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO...................................................................................................... 2 CONSIDERAÇÕES ACERCA DOS CONTRATOS.............................................. 2.1 TEORIA CONTRATUAL TRADICIONAL........................................................... 2.1.1 Princípio da Autonomia da Vontade................................................................ 2.1.2 Princípio da Força Obrigatória do Contrato..................................................... 2.1.3 Princípio da Relatividade dos Efeitos do Contrato.......................................... 2.1.4 Princípio da Intagibilidade do Contrato........................................................... 2.2 TEORIA CONTRATUAL CONTEMPORÂNEA.................................................. 2.2.1 Princípio do Dirigismo Contratual.................................................................... 2.2.2 Princípio da Revisão Contratual...................................................................... 2.2.3 Princípio do Intervencionismo Estatal............................................................. 2.2.4 Princípios Sociais do Contrato........................................................................ 3 A FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO................................................................. 3.1 Conceito e Origem da Função Social do Contrato............................................. 3.2 Função Social do Contrato como Princípio Constitucional................................ 3.3 Função Social do Contrato no Código de Defesa do Consumidor.................... 3.4 Função Social do Contrato no Código Civil de 2002.......................................... 3.5 Precauções e Critérios para Aplicação da Função Social do Contrato.............. 4 A APLICAÇÃO FÁTICA DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO...................... 5 CONCLUSÃO....................................................................................................... REFERÊNCIAS ....................................................................................................... ANEXO I................................................................................................................... ANEXO II..................................................................................................................

8 11 12 13 13 14 15 15 17 18 18 18 20 20 22 24 25 26 28 34 36 38 45

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1 INTRODUÇÃO

O contrato é um instituto de direito privado. Ele é um dos elementos que

delineiam o complexo ordenamento das relações jurídicas entre os sujeitos privados.

Para entender sua função, cabe analisá-lo de forma comparativa com outros

institutos, uma vez que sua análise isolada não permitiria uma correta e apurada

compreensão.

Tudo tem início na propriedade. Desde o princípio da relação traçada entre o

contrato e a propriedade é possível verificar uma relação de subordinação e

instrumentalidade do contrato em relação à propriedade. A propriedade era vista

como o instituto principal, o único que detinha uma real importância. Já o contrato,

como dito, tinha uma função simplesmente instrumental e subsidiária. O contrato era

visto como uma mera ferramenta através da qual se transferia a titularidade de um

bem para outro sujeito. Como nas palavras de Enzo Roppo “o contrato, pois, não

criava riquezas, antes se limitava a transferi-la”. (2009, p.64)

Entretanto, com a evolução do modo de produção capitalista, surgem novas

relações jurídicas, e se tornam cada vez mais complexas. Assim, surge um processo

chamado de “mobilização e desmaterialização das riquezas” (ROPPO, 2009, p.64).

Desta maneira, a riqueza deixa de se identificar unicamente com coisas materiais e

com o direito de usá-las, mas também com coisas imateriais, e que não sejam

necessariamente fixas, mas mutáveis. Aqui, surge a necessidade de salientar que

estas formas de riqueza imaterial têm, na maioria das vezes, sua fonte contida em

um contrato.

Por este motivo, dentro de um sistema capitalista avançado, o contrato se

torna o instrumento fundamental da gestão de recursos e na propulsão da economia,

e não mais a propriedade.

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A evolução do pensamento jurídico contratual rompe com o pensamento

individualista e liberal da concepção clássica de contrato, representando uma maior

visão social das negociações, que valoriza a função do direito como ativo garantidor

do equilíbrio, como protetor da confiança e das legítimas expectativas das partes nas

relações.

O legislador, atendendo aos anseios da maioria e a evolução dos negócios

jurídicos criou o novo Código Civil pautado nos princípios da eticidade, da

operabilidade e da sociabilidade. Sua interpretação está fundamentada nos valores

éticos, morais e sociais consagrados pela Constituição Federal. Jamais se poderá

esquecer que foi através desta nova função que o contrato passou a controlar o

enriquecimento ilícito (art. 884 a 886 do CC) e o exercício abusivo de direitos (art.

187 do CC).

Humberto Theodoro Junior explica que: “A função social do contrato consiste

em abordar a liberdade contratual em seus reflexos sobre a sociedade (terceiros) e

não apenas no campo das relações entre partes que estipulam (contratantes)”

(2004, p.29).

Diante disso, pode-se entender que o contrato é instrumento não apenas

gerador e assegurador de relações jurídicas particulares, mas também desempenha

o importante papel na promoção de uma sociedade mais justa e digna quando limita

a autonomia da vontade em face de interesses preferenciais que coincidem com os

interesses sociais.

Bem verdade que o disposto no artigo 421 não tem o condão de eliminar o

princípio da autonomia contratual, mas atenua ou reduz o alcance desse princípio

quando presentes interesses metaindividuais ou interesse individual relativo à

dignidade da pessoa humana.

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Superou-se então, a tese pela qual o contrato visa principalmente a

segurança jurídica. Na realidade, o contrato tem a principal função de atender à

pessoa e aos interesses da coletividade, diante da personalização do direito privado.

Essa é então, a real função dos contratos.

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2 CONSIDERAÇÕES ACERCA DO CONTRATO

O vocábulo contrato deriva da palavra “contractus” que, de acordo com o

Minidicionário Houaiss da língua portuguesa significa: “Ato ou efeito de contratar;

Acordo ou convenção entre duas ou mais pessoas, para a execução de alguma

coisa, sob determinadas condições; Acordo, ajuste, combinação; Promessa aceita”

(2010, p.197).

Nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves, “o contrato é a mais comum e a

mais importante fonte de obrigação, devido às suas múltiplas formas e inúmeras

repercussões no mundo jurídico” (2010, p.21).

A idéia de contrato é tão antiga como a própria humanidade, na medida em

que os serem humanos sempre buscavam viver em sociedade. Originou-se assim

como forma de perpetuação da espécie, ou seja, os negócios jurídicos surgem como

necessidade de preservação da vida humana no planeta.

Pode-se dessa maneira, compreender o contrato através da definição dada

por Caio Mário da Silva Pereira, como “um acordo de vontades, na conformidade da

lei, e com a finalidade de adquirir resguardar, transferir, conservar, modificar ou

extinguir direitos” ou mais sucintamente, “acordo de vontades com a finalidade de

produzir efeitos jurídicos” (2009, p.7).

Então o contrato pode ser definido como um negócio jurídico bilateral ou

plurilateral gerador de obrigações para uma ou todas as partes, às quais

correspondem o direito titulados por esta ou por terceiros. Assim, os negócios

jurídicos como a promessa de recompensa e a gestão de negócios, não são

contratos. Dessa maneira chega-se à conclusão que: nem todo negócio jurídico é

contrato, pois negócio jurídico é toda ação ou omissão humana cujos efeitos

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jurídicos acarretam a criação, modificação, conservação ou extinção de direitos, que

derivam essencialmente da manifestação de vontade.

O contrato cria o efeito obrigacional, que vem a ser o liame jurídico entre os

contratantes, pelo qual uma das partes pode exigir da outra a prestação

correspondente.

Essa espécie de negócio jurídico é regida por diversos princípios, alguns

tradicionais como a autonomia da vontade ou a força obrigatória dos contratos, e

outros contemporâneos, entre os quais se pode destacar: a relatividade dos efeitos

contratuais, o dirigismo contratual e a FUNÇÃO SOCIAL.

2.1 TEORIA CONTRATUAL TRADICIONAL

No século XVIII, com a ascensão da burguesia ao poder ante o

destronamento da monarquia, tomou corpo a reforma liberal do estado, passando-se

do regime feudal ao regime capitalista. A teoria tradicional do contrato foi

desenvolvida no contexto histórico do Estado moderno (liberal), e seu auge coincide

com o domínio do capitalismo industrial da segunda metade do século XIX, quando

se elaborou a teoria do negócio jurídico.

Essa concepção clássica do contrato influenciou todo o pensamento jurídico

brasileiro, tendo sido recepcionada no Brasil pelo Código Civil de 1916, o qual era

voltado estritamente à propriedade. Nessa visão, a chamada liberdade de contratar

tem caráter essencialmente capitalista, na qual o que predomina é a autonomia da

vontade. Nesse momento ocorre a formação dos princípios contratuais clássicos,

que também são conhecidos como princípios contratuais liberais.

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Esse entendimento se extrai das palavras de Paulo Luiz Neto Lôbo (1986

p.15), quando afirma que: “A liberdade de contratar está estreitamente entrelaçada

com a liberdade de propriedade”.

O contrato, inegavelmente, foi nessa época, fundamental ao grande

progresso econômico mundial, em especial dos países ocidentais, ao possibilitar

mais segurança nos negócios, incrementando a lei da oferta e da procura, embora

não tivesse protegido os socialmente mais fracos, o que se verifica das acentuadas

diferenças sociais e econômicas. O liberalismo fez do contrato o mais importante dos

negócios jurídicos realizados entre pessoas, vinculando as partes juridicamente, mas

nem sempre de forma equânime, justa e ética.

2.1.1 Princípio da Autonomia da Vontade

O princípio da autonomia da vontade dos contratantes ocorre quando esta for

declarada de forma livre, em que as partes discutem as condições do contrato em

situação de igualdade. A vontade é a grande fomentadora das relações contratuais.

Sem a vontade, inexistente é o contrato.

Segundo Paulo Luiz Neto Lôbo, a autonomia da vontade poderia traduzir-se

“na possibilidade, oferecida e assegurada aos particulares pelo ordenamento

jurídico, de regular suas relações mútuas dentro de determinados limites, por meio

de negócios jurídicos, em especial mediante contratos” (1986, p.29).

2.1.2 Princípio da Força Obrigatória do Contrato

Também como princípio tradicional estava a pacta sunt servanda, ou a força

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obrigatória dos contratos. O que foi contratado é o que deverá ser cumprido. Esse

princípio ignorava totalmente o princípio da igualdade entre as pessoas.

Há que se ressaltar que o princípio da força obrigatória dos contratos somente

passa a reger as convenções se todos os requisitos de existência, validade e

eficácia dos contratos tiverem sido observados; isto é, se os agentes forem capazes,

o objeto for lícito, possível e determinado ou determinável, a forma for prescrita ou

não-defesa em lei, e a vontade das partes for real, ou seja, a obrigação tiver sido

pactuada de forma livre e espontânea.

Conforme explica Sílvio Rodrigues:

[...] o contrato vai construir uma espécie de lei entre as partes, adquirindo força vinculante igual à do preceito legislativo, pois vem munido de uma sanção que decorre da norma legal, representada pela possibilidade de execução patrimonial do devedor. (2004, p.19)

Os que defendiam esse princípio alegavam a necessidade da segurança

jurídica nos negócios, que deixaria de existir se os contratantes pudessem deixar de

cumprir a palavra dada, gerando o caos.

2.1.3 Princípio da Relatividade dos Efeitos do Contrato

Pelo princípio da relatividade dos efeitos do contrato, segundo Carlos Roberto

Gonçalves, os efeitos “só se produzem em relação às partes, àqueles que

manifestaram sua vontade, vinculando-os ao seu conteúdo, não afetando terceiros

nem seu patrimônio” (2010, p.47).

Esse entendimento se torna lógico, uma vez que, como negócio jurídico, em

que há manifestação espontânea da vontade para assumir livremente obrigações, as

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disposições do contrato, a priori, somente interessa às partes, não dizendo respeito

a terceiros estranhos à relação jurídica.

Assim, somente serão passíveis de expropriação os bens pertencentes ao

patrimônio do contratante inadimplente e nunca os bens de propriedade de terceiros.

Como no caso da dívida de uma pessoa falecida, que ultrapassa os limites da

herança, o credor jamais poderá ingressar no patrimônio do herdeiro para receber

integralmente a dívida. Caso o herdeiro queira quitar tal dívida, o fará por vontade

própria e não por obrigação legal, tendo em vista a vigência do princípio da

relatividade dos efeitos do contrato.

Esse princípio é a imagem natural da vida em sociedade, na qual

cada um responde por seus próprios atos.

2.1.4 Princípio da Intangibilidade do Contrato

Finalmente, o princípio da intangibilidade do contrato, ou seja, o contrato não

poderá ser modificado ou alterado sem que haja consentimento expresso das

partes. Não se admite uma liberalidade unilateral e nem mesmo uma ordem Estatal.

Este princípio é intrínseco ao da força obrigatória.

2.2 TEORIA CONTRATUAL CONTEMPORÂNEA

As transformações sociais e econômicas ocorridas no decorrer do século XX

tornaram a teoria contratual tradicional inadequada ou insuficiente. Durante o

liberalismo “o contrato exerceu uma função individual, em conformidade com a

ideologia dominante.” (LÔBO, 1986, p.17).

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O Estado liberal, que se fundamentou na liberdade do homem, e foi marcado

pelo rompimento do poder absoluto dos nobres, transferiu o poder aos novos

detentores da classe econômica, qual seja, a classe burguesa. Essa, com a intenção

de criar uma nova forma de controle de poder, faz com que outra classe acabe por

surgir, a classe dos trabalhadores, a classe operária, que necessita do capital e da

proteção do Estado.

Se o liberalismo, em se tratando dos contratos, por um lado garantiu ao

indivíduo a ampla possibilidade de desenvolver sua livre iniciativa, por outro,

configurou um instrumento funcionalizado para a operação do modo de produção

capitalista, realizando, conseqüentemente, o interesse da classe econômica, o que

significa que interesses particulares de uma classe se sobressaíram em relação ao

interesse geral da sociedade.

A liberdade plena de todo ser humano e, conseqüentemente, a declaração de

que todos os homens são livres e iguais, acabou chocando com a necessidade de

se evitar conflitos pelo abuso desta plena liberdade que gerava injustiças.

Políticos e economistas começaram a abandonar a idéia do liberalismo,

apesar de que muitos juristas ainda continuavam apegados à idéia de autonomia

plena da vontade, por força do modelo tradicional de contrato. E é neste contexto

que, no final do século XIX e começo do século XX, nasce o chamado Estado social.

O Estado social representa, efetivamente, uma mudança superestrutural do

Estado liberal. Busca dominar a divergência entre a igualdade política e a

desigualdade social. O velho liberalismo não dava nenhuma resposta às

contradições sociais, principalmente às das pessoas à margem da vida,

desapossadas de quase todos os bens.

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Porém no Brasil, somente com a Constituição Federal de 1988 é que se

consolida o Estado social, com o objetivo de preservar e garantir a dignidade da

pessoa humana e os seus direitos sociais, refletindo no direito privado, já que haverá

uma interferência nos setores da vida privada.

A denominada “Constituição Cidadã” (nas palavras do ilustre Ulisses

Guimarães) trouxe inovações, tendo como centro não mais a propriedade, mas a

pessoa e o social democrático.

É inquestionável que a socialização da propriedade culminou por se refletir na

seara contratual, tornando o contrato não apenas instrumento de manifestação

privada da vontade, mas também como elemento socialmente agregador.

2.2.1 Princípio do Dirigismo Contratual

A atividade privada dos contratantes passa a ser regulamentada, direcionada

e principalmente dirigida pelo Estado. O Poder Legislativo desenvolve especialmente

uma regulamentação legal para, interferindo na simples autonomia da vontade

delimitar os contratos.

Um grande exemplo de dirigismo contratual é o Contrato de Trabalho, onde

existe toda uma regulamentação pela Consolidação das Leis do Trabalho para dar

proteção ao trabalhador em relação ao empregador.

Outro exemplo a ser citado é o Código de Defesa do Consumidor, cujas

relações jurídicas anteriormente regulamentadas pelo Código Civil, passa a ser

dirigida por legislação própria. Neste Código há a responsabilidade objetiva e

solidária, independentemente de culpa, cujo intuito é de proteger o consumidor,

vulnerável e hipossuficiente.

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2.2.2 Princípio da Revisão Contratual

Esse princípio opõe-se ao princípio da força obrigatória, conforme explica

Carlos Roberto Gonçalves, “pois permite aos contratantes recorrem ao Judiciário,

para obterem alteração da convenção e condições mais humanas, em determinadas

situações” (2010, p.51).

Pelo princípio da Revisão Contratual, em alguns casos é possível relativizar a

pacta sunt servanda, desde que se respeitem alguns requisitos. O contrato poderá

ser revisto ou revisado, reequilibrando-se ou até mesmo, extinguindo-se em caso de

onerosidade excessiva.

2.2.3 Princípio do Intervencionismo Estatal

O intervencionismo Estatal se dá especialmente através do Poder Judiciário,

que poderá interferir, alterar e até extinguir contratos, respeitados certos parâmetros.

Através desse princípio, a Teoria Contratual Contemporânea relativiza a

intangibilidade dos contratos.

2.2.4 Princípios Sociais do Contrato

Os “princípios sociais do contrato”, conforme explica Paulo Luiz Neto Lobo,

surgem a partir da nova perspectiva, denominada pala doutrina contemporânea de

“constitucionalização do direito civil” (LÔBO, 2002, p.02). Esta concepção é vista

pela aplicação dos preceitos e garantias constitucionais ao Direito Civil.

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O citado autor ressalta que, “a constitucionalização é o processo de elevação

ao plano constitucional dos princípios fundamentais do direito civil” (LÔBO, 2002,

p.02), tendo em vista que a própria Constituição traz e disciplina as normas de direito

privado, fazendo uma unificação do sistema jurídico. Destaca ainda que o Estado

social percorreu um caminho inverso daquele que fora trilhado pelo Estado liberal,

inclinando o pêndulo do interesse individual para o interesse social e o da vontade

individual para o da vontade do grupo ou da coletividade (LÔBO, 1986, p.85)

A Carta Magna regula a ordem econômica, a qual se realiza mediante

contratos, condicionando assim, os interesses individuais. Desta forma, o direito

contratual distancia-se da visão individualista para assumir uma visão social e

solidária às relações contratuais.

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3 A FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO

3.1 Conceito e Origem da Função Social do Contrato

A princípio, cabe entender o que vem a ser função social. Conforme traz o

Minidicionário Houaiss da língua portuguesa, função significa “obrigação a cumprir,

papel a desempenhar, pelo indivíduo ou por uma instituição” (2010, p.376). Já social,

a mesma obra considera que é “o que pertence a todos, público, coletivo; o que diz

respeito ao bem-estar das massas, esp. as menos favorecidas” (2010, p.721).

Maria Helena Diniz, que afirma que a função social é: “atividade e papéis

exercidos por indivíduos ou grupos sociais, com escopo de obter o atendimento de

necessidades específicas” (1998, p.613). Pode-se entender então função social,

como sendo o conjunto de ações de indivíduos, que atendam as necessidades da

sociedade.

Nos séculos XVIII e XIX, os juristas entendiam que a satisfação de um

interesse próprio significava a procura pelo bem individual, na medida em que a

soma de todos os bens individuais representaria o bem comum da sociedade. Estes

juristas estavam fortemente influenciados pelo individualismo liberal e positivismo

jurídico, retomando o apego à forma como elemento caracterizador da validade do

contrato. A verificação do consenso, alheio à condição sócio-econômica–cultural das

partes, levou a concepção de contrato, segundo Orlando Gomes, como “uma

categoria que serve a todos os tipos de relações entre sujeitos de direitos e a

qualquer pessoa independentemente de sua posição ou condição social” (2002,

p.06).

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Após a segunda guerra mundial os ordenamentos jurídicos começaram a

perceber que a todo direito individual deveria necessariamente corresponder uma

função social. Inicia-se então uma nova ordem jurídica, que se afasta da teoria

clássica em decorrência de transformações históricas intangíveis, uma nova

concepção acerca dos contratos privados, levando o Estado a criar mecanismos de

intervenção nos negócios individuais.

Em obra datada de 1973, Jefferson Daibert (citado por Mariana Ribeiro

Santiago, 2006, p.77) se referia a uma “função social do contrato”, numa concepção,

entretanto, que não a identificava como uma limitação da autonomia privada, como é

agora encarada. Segundo esse autor, da mesma forma que o “direito tem uma

função eminentemente social” por disciplinar a vida em sociedade, dando-lhe as

normas de direito positivo, o contrato também tem função social similar e de alta

relevância, a partir do momento em que aproxima os homens para que transijam

harmonicamente, sendo fator preponderante no comércio e na vida privada.

Orlando Gomes, a esse respeito assevera que, pelo princípio da função social

do contrato, entende-se dever ser o contrato socialmente útil, o qual gera interesse

público na sua tutela, de maneira que, os contratos que regem interesses sem

utilidade social, que não sejam produtivos ou simplesmente fúteis, não merecem

proteção jurídica, complementando que “atribuição de função social ao contrato,

alarga a esfera da responsabilidade para apanhar as situações nas quais, em razão

de ter sido concluído, prejudica terceiros” (2002, p. 23).

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3.2 Função Social do Contrato como Princípio Constitucional

Em nosso ordenamento jurídico, a função social do contrato aparece como

fundamento para os pactos, na Constituição Federal de 1988 e está amparada entre

outros direitos fundamentais, na dignidade da pessoa humana, e como tal diz

respeito à sociedade como um todo.

Flávio Tartuce, em sua obra Função Social dos Contratos, explica que:

A função social do contrato, preceito de ordem pública encontra fundamento constitucional no princípio da função social da propriedade lato sensu (art. 5º, XXII e XXIII), bem como no princípio maior de proteção da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III), na busca de uma sociedade mais justa e solidária (art. 3º, I) e na isonomia (art. 5º, caput). (2007, p.415)

A consolidação da função social do contrato deu-se com o Código Civil de

2002, onde o seu artigo 421 assim dispõe: “A liberdade de contratar será exercida

em razão e nos limites da função social do contrato”.

Tal artigo atrelou o princípio da autonomia da vontade ao da socialidade, uma

vez que a liberdade de contratar é limitada pela função social, restringindo o livre

arbítrio dos contratantes e criando condições para o equilíbrio econômico-contratual.

Flávio Tartuce conceitua função social do contrato como um “regramento

contratual de ordem pública (art. 2.035, parágrafo único, do Código Civil), pelo qual o

contrato deve ser, necessariamente, analisado e interpretado de acordo com o

contexto da sociedade” (2007, p.248), e explica que não se pode afastar o

fundamento constitucional deste preceito, pois está intimamente ligado à dignidade

da pessoa humana.

Dessa maneira, os contratos precisam ser interpretados de acordo com a

visão do meio social em que está inserido, de forma que não represente

onerosidade excessiva para as partes contratantes, nem tampouco, gere situações

de injustiças, de modo que a igualdade das partes seja respeitada, tendo em vista

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que o contrato possui eficácia interna e externa. Interna porque gera efeitos entre as

partes e externa porque os efeitos do contrato vão além dos contraentes, pois se um

contrato for maléfico para as partes, de maneira indireta, será prejudicial para a

comunidade, na medida em que não atendeu a sua finalidade social.

Porém, conforme destaca Humberto Theodoro Junior:

[...] a lei prevê função social do contrato, mas não a disciplina sistemática ou especificamente. Cabe à doutrina e à jurisprudência pesquisar sua presença difusa dentro do ordenamento jurídico e, sobretudo, dentro dos princípios informativos da ordem econômica e social traçada pela Constituição. (2003, p. 93)

Já sob a ótica de Miguel Reale (2003, on line), a função social limita o

contrato, para que este não possa ser transformado em um instrumento para

atividades abusivas, causando dano à parte contrária ou a terceiros, uma vez que,

nos termos do artigo 187 do Código Civil Brasileiro, “também comete ato ilícito o

titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos

pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.

E segue o mesmo autor, dizendo que não há razão alguma para sustentar

que o contrato deva atender tão somente aos interesses das partes que o estipulam,

porque ele, por sua própria finalidade, exerce uma função social inerente ao poder

negocial que é uma das fontes do direito, ao lado da legal, da jurisprudência e da

consuetudinária.

A Constituição de 1988, em seu artigo 173 no §4º, não admite negócio jurídico

que implique abuso do poder econômico visando à dominação dos mercados, à

eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.

O ato de contratar corresponde ao valor da livre iniciativa, elevada pela

Constituição de 1988 a um dos fundamentos do Estado Democrático do Direito,

assim sendo é natural que se atribua ao contrato uma função social, a fim de que

seja concluído em benefício dos contratantes sem conflito com o interesse público.

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Dessa forma, segundo a função social, o contrato deve assumir uma função

de circulação equânime de riquezas. O que se deve tutelar é o equilíbrio social no

processo de circulação de bens e serviços, cada vez mais massificados.

3.3 Função Social do Contrato no Código de Defesa do Consumidor

O legislador brasileiro, ao criar o Código de Defesa do Consumidor - CDC (Lei

8.078/90) cumpriu os exatos termos da Constituição Federal, que no art. 170

estabelece como princípio constitucional, a defesa do consumidor.

Com efeito, os contratos de massa, celebrados entre consumidores e

fornecedores, antes do advento do CDC, tinham um tratamento inadequado do

Código Civil de 1916, que tratava as partes segundo uma igualdade formal,

realizando uma evidente função individual. A moderna lei consumerista modificou os

princípios da autonomia da vontade, da força obrigatória e da relatividade dos

contratos, criando uma verdadeira revolução doutrinária, provocando a alteração de

verdadeiros dogmas do Direito Civil, além de criar novos símbolos e uma nova

linguagem.

O CDC limitou a autonomia da vontade, evitando, assim, os abusos que eram

cometidos pela parte mais forte na relação contratual, tratando, ainda, as partes com

evidente desigualdade, atingindo uma isonomia real. A imutabilidade contratual

também sofreu transformações, na medida em que foi relativizada, além de se

tornarem expressos os princípios da boa-fé e da eqüidade, o que possibilita a

revisão do contrato se este for celebrado sem a observância desses princípios.

Paulo Luiz Neto Lôbo avalia que, ao contrário do Código Civil de 2002, o

Código de Defesa do Consumidor optou por internalizar o princípio da função social

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sem explicitá-lo, mesmo porque “não havia necessidade porquanto ele é a própria

regulamentação da função social do contrato nas relações de consumo” (2002, on

line).

O contrato de consumo, inegavelmente, tem uma função social clara, visto

que tem finalidades que vão ao encontro da aspiração da coletividade, numa relação

que busca, antes de tudo, o equilíbrio, a boa-fé objetiva, a transparência e a

realização da justiça contratual.

3.4 Função Social do Contrato no Código Civil de 2002

A atribuição de uma função social ao contrato reflete o ideal do Estado social

ao determinar a supremacia dos interesses da coletividade em relação aos

interesses individuais, o que significa que o contrato deve ter repercussão social,

promovendo os interesses particulares em conformidade com o bem comum.

Compreende-se a aplicação do princípio da função social do contrato, em

virtude da nova concepção social do contrato trazida pela Constituição Federal de

1988, buscando amenizar o individualismo das relações contratuais na época do

Estado liberal.

A Constituição Federal não faz expressa referência à função social do

contrato, porém a faz indiretamente, através da propriedade, em seu artigo 170,

quando dispõe que a atividade da ordem econômica e financeira deve ser observada

à luz do princípio da função social da propriedade, afetando assim, o contrato, tendo

em vista o seu objetivo primaz de circulação de riquezas.

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A função social do contrato é um cláusula geral, de conteúdo aberto e vago,

que visa à imposição de limites a liberdade de contratar a favor do bem comum,

submergindo a noção individualista do contrato. Nas palavras de Paulo Nalin:

São amplas, e logo imprecisas, as bases conceituais da função social do contrato, ora amarradas à quebra do individualismo, ora â cláusula geral de solidariedade, tendo em vista a igualdade substancial, a tutela da confiança dos interesses envolvidos e do equilíbrio das parcelas do contrato. [...] Mas os valores constitucionais privados, dos quais destaco a solidariedade e boa-fé objetiva, o segundo fundado no primeiro, se apresentam como âncora teórica segura para se descrever a função social do contrato. (2002, p.55-56)

As cláusulas gerais importam em avançada técnica legislativa de enunciar,

através de expressões semânticas relativamente vagas, princípios e máximas que

compreendem e recepcionam a mais variada sorte de hipóteses concretas de

condutas tipificáveis, já ocorrentes no presente ou ainda por se realizarem no futuro

– são os chamados conceitos jurídicos indeterminados.

Neste contexto, derivando do preceito constitucional que confere função

social à propriedade e afeta necessariamente o contrato, o princípio da função social

do contrato é expressamente previsto no artigo 421 do Código Civil: “a liberdade de

contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”.

3.5 Precauções e Critérios para Aplicação da Função Social do Contrato

A fim de evitar que a aplicação desse princípio, o da função social do

contrato, possa-se revelar injusta ainda que bem intencionada, é preciso refletir

sobre o alcance dos efeitos da função social do contrato.

A aplicação do conceito de função social do contrato sem qualquer critério

poderá fazer com que esse instituto se converta em responsabilidade social dos

contratantes. É um fato que poderia convir ao Estado, pois esse, por meio do uso de

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um termo carregado de significado poderá deixar de cumprir com suas obrigações,

no sentido de não disponibilizar determinados serviços públicos.

Seria possível estabelecer um critério para a aplicação da função social do

contrato em sentido amplo: quando um dos contratantes obtiver vantagens

injustificadas em um contrato, que implicar uma má circulação dos direitos de

propriedade, e não houver um instituto jurídico próprio para a correção dessa

anomalia, aí sim se aplica a função social do contrato. Do contrário, a aplicação da

função social do contrato implicará enriquecimento sem causa para a outra parte.

Já, em sentido estrito, a aplicação da função social do contrato seria a

seguinte: a liberdade de contratar deve atender à função social do contrato, somente

quando o contratante estiver obtendo vantagens injustificadas, porém lícitas, ou à

custa da produção de externalidades. Assim, para compensar a sociedade pelas

perdas que sofre, a função social do contrato impõe deveres no exercício dessa

liberdade contratual, a fim de compensar a sociedade dos efeitos que sofre

decorrentes do contrato.

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4 A APLICAÇÃO FÁTICA DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO

Os contratantes, embora livres para ajustar os termos do contrato, devem agir

sempre dentro dos limites necessários para evitar que a sua atuação negocial se

torne fonte de prejuízos injustos e indesejáveis para terceiros. Esse entendimento

embasou-se nas palavras de Humberto Theodoro Junior, onde cita:

[...] é bastante nítida a preocupação social do legislador ao se afastar do princípio da relatividade dos contratos, quando impõe a responsabilidade pelo dano causado ao consumidor não apenas ao fornecedor que com ele contratou, mas a todos os integrantes da cadeia de produção e circulação (CDC, art. 12); e também quando estende a proteção contra defeitos do produto, responsabilizando o fornecedor perante qualquer vítima que o tenha consumido, e não apenas em face daquele com quem contratou o fornecimento (CDC, art. 14). No mercado de consumo, exige-se amplamente um comportamento social adequado, que vai muito além dos limites tradicionais ditados pela relatividade das obrigações contratuais. (2004, p.33)

O Estado social não poderá estar alheio aos problemas que o abuso da

iniciativa contratual pode gerar no meio social em que os efeitos do contrato irão

repercutir. Se algum dano indevido a terceiro ou à sociedade for detectado, a

autonomia contratual terá sido exercitada de forma injurídica. O resultado danoso

não poderá prevalecer, invalidando desde logo o contrato, ou o contratante nocivo

responderá pela reparação dos prejuízos eventualmente causados a terceiros.

Nessa esteira, Antonio Jeová Santos, manifesta-se dizendo que:

[...] o contrato será passível de modificação se não observar os critérios de justiça, equidade, sociabilidade e paridade. Que o forte não se aproveite da credibilidade do mais fraco e abuse da confiança depositada, obrigando-o a efetuar contratos que contenham cláusulas leoninas e abusivas, que venham a acarretar danos inclusive a terceiros e à coletividade. (2004, p127)

O mesmo autor ressalta, porém, que essa possibilidade de revisão do

contrato por força de sua função social, causa enorme descontentamento em uma

parcela dos contratantes. A esse respeito, cita:

[...] sempre que se fala nessa ampla possibilidade de o contrato perder aquele caráter de pacta sunt servanda, porque objeto de espoliação a ser

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aberto ao prejudicado o caminho do recurso ao Poder Judiciário para a revisão ou resolução dos contratos, os ortodoxos que ainda não conseguiram se desprender do liberalismo econômico, brandem com o argumento de que a segurança e a certeza jurídicas se desvanecem quando o legislador confere poderes ao juiz para alterar o que as partes aceitaram, celebraram e quiseram. [...] Qualquer perspectiva de o contrato ser objeto de revisão e colocado em seu rumo de justiça, equidade e sociabilidade, faz surgir corifeus do neoliberalismo que atendem interesses econômicos de grandes grupos privados, para afirmar que a segurança jurídica está morta. Para eles, “a estabilidade quer dizer segurança para as classes mais altas e as grandes companhias estrangeiras, cuja prosperidade deve ser preservada”. Bresser Pereira, economista que já serviu ao poder, não perdeu a visão crítica quando assinalou que “o problema da América Latina não é o populismo, mas a subordinação do Estado aos ricos”. (2004, p.127-128)

O que a função social do contrato garante, então, é a socialização dos

contratos, submetendo o direito privado a novas transformações e garantindo a

estabilidade das relações contratuais, sensível ao ambiente social em que esse

contrato foi celebrado e está sendo executado, e não, apenas, a submissão às

regras de um mercado perverso. Prega, desta forma, o equilíbrio entre direitos

individuais e interesses sociais, permitindo a obtenção de uma relação jurídica que,

de fato, seja justa.

Fortes nessa orientação, e em conformidade com a perfil intrínseco da função

social, foram aprovados na I Jornada de Direito Civil do Centro de Estudos de

Justiça Federal, vinculado ao Conselho de Justiça Federal, os seguintes enunciados,

de nº 22 e 23:

22. A função social do contrato prevista no artigo 421 do novo Código Civil constitui cláusula geral, que reforça o princípio de conservação do contrato, assegurando trocas úteis e justas. 23. A função social do contrato prevista no artigo 421 do novo Código Civil não elimina o princípio da autonomia contratual, mas atenua ou reduz o alcance desse princípio, quando presentes interesses metaindividuais ou interesse individual relativos à dignidade da pessoa humana.

Posteriormente, a IV Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal

aprovou o enunciado nº 360 que dispõe: “art. 421. O princípio da função social dos

contratos também pode ter eficácia entre as partes contratantes”.

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Recorrentes em nossa jurisprudência são os julgados que versam sobre

revisão judicial do contrato, por conta do desajuste do contrato com sua função

social. Por ser o art. 421 do CC uma cláusula geral, o juiz pode revisar e modificar

cláusulas contratuais que coloquem as partes em veemente desequilíbrio. Conforme

se pode observar nas ementas que se encontram no anexo.

Episódio célebre a ser comentado é o bastante conhecido “caso Zeca

Pagodinho”. Cantor famoso não somente por suas músicas, mas principalmente por

sua preferência em bebidas fermentadas, foi contratado por uma empresa para fazer

uma campanha publicitária de determinada marca de cerveja por certo período.

Pouco tempo depois, o mencionado cantor foi procurado por outra empresa do

mesmo ramo, ainda na vigência do contrato, para que fosse o protagonista de sua

mais nova campanha publicitária. Conforme cita o Prof. Flávio Tartuce em seu blog:

CASO ZECA PAGODINHO. BRAHMA X NOVA SCHIN. TUTELA EXTERNA DO CRÉDITO E FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO. VISTOS. PRIMO SCHINCARIOL INDÚSTRIA DE CERVEJAS E REFRIGERANTES S/A, empresa qualificada na inicial, ajuizou a presente ação de indenização por danos morais e materiais, pelo procedimento ordinário, em face da COMPANHIA DE BEBIDAS DAS AMÉRICAS – AMBEV e COMPANHIA BRASILEIRA DE BEBIDAS S/A – CBB, igualmente qualificada nos autos. Alega, em resumo, que é empresa que atua no ramo de industrialização e comercialização de bebidas e celebrou contrato de prestação de serviços e uso de imagem com o conhecido cantor Zeca Pagodinho, para veiculação, com exclusividade, de seu produto a cerveja Nova Schin. Entretanto, ainda na vigência do contrato, as requeridas ilicitamente aliciaram o cantor e utilizaram sua imagem e voz em campanha publicitária da cerveja Brahma, veiculando propaganda comparativa e aviltante à cerveja comercializada pela autora. Acrescenta que outras ações foram ajuizadas para impedir a veiculação da propaganda e, uma vez que tal conduta ilícita das rés feriu princípios éticos, constitucionais e legais, causando prejuízos à autora, pede a procedência do pedido para que seja condenada ao pagamento de indenização por danos materiais, consistente no ressarcimento de todos os investimentos com as campanhas do produto Nova Schin que envolveram a participação do cantor – a serem apurados em liquidação de sentença – além de morais pela indevida e maliciosa exposição do produto e imagem da empresa requerente. Juntou os documentos de fls. 38/979. Determinada a emenda à inicial (fls. 980), a requerente aditou o pedido para postular a condenação das rés ao pagamento de cem milhões de reais por danos materiais e outros cem milhões de reais a título de danos morais (fls. 981/983). Recebida a emenda à inicial, as rés foram regularmente citadas (fls. 1000/1001) e apresentaram a contestação de fls. 1.050/1.087. Inicialmente informam que a co-ré CBB foi extinta e incorporada à Ambev e, no mérito, rebatem os argumentos expostos na inicial. Afirmam que eventual direito à indenização já foi objeto de demanda ajuizada pela autora perante

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o juízo da 36ª Vara Cível da Capital e julgada procedente, com a condenação do cantor Zeca Pagodinho ao pagamento de indenização que atingiu cerca de 2 milhões de reais, de sorte que não há como postular nova condenação da AmBev. Acrescentam que não participaram do contrato e, por isso, se não intervieram no acordo de vontade, os acontecimentos não podem atingi-las, pois apenas aqueles que participaram do contrato devem observar os seus termos. Finalizam a contestação com o argumento de que a concorrência foi lícita e, portanto, não existe dano material ou moral a ser indenizado, mesmo porque a própria inicial indica que a campanha foi um sucesso, o que torna desnecessário o ressarcimento dos gastos efetuados com ela. Juntaram os documentos de fls. 1.088/1.155. Réplica a fls. 1.160/1.172. As partes expressamente dispensaram a realização de audiência de conciliação, postulando o julgamento antecipado da lide (fls. 1.176/1.179). É O RELATÓRIO. FUNDAMENTO E DECIDO. Cuida-se de ação de indenização por danos morais e materiais, pelo procedimento ordinário, ajuizada por Primo Schincariol Indústria de Cervejas e Refrigerantes Ltda. em face da Companhia de Bebidas das Américas – AMBEV e Companhia Brasileira de Bebidas – CBB. Pretende a requerente a condenação das requeridas ao ressarcimento de tudo aquilo que gastou com a propaganda de lançamento da cerveja Nova Schin que contou com a participação do cantor conhecido como Zeca Pagodinho. O feito prescinde de outras provas, pois bastam aquelas existentes nos autos para a formação da convicção do julgador. Assim, remanescendo apenas questões de direito, passo ao julgamento da lide no estado em que se encontra o processo (art. 330, inciso I, do Código de Processo Civil). Não há preliminares ou irregularidades a serem enfrentadas, motivo pelo qual passo, desde logo, à análise do mérito do pedido. Em sua essência os fatos são incontroversos, eis que por todos admitidos. Aliás, a situação colocada nos autos é do conhecimento geral, já que todos tiveram acesso, inclusive através de matérias divulgadas pela imprensa, aos fatos que envolveram a campanha publicitária das duas grandes marcas de cerveja, ou seja, Schincariol e Brahma, pois ambas utilizaram o mesmo personagem em suas campanhas, o cantor Zeca Pagodinho. Também se tornou incontroverso – as requeridas jamais contestaram esse ponto – que o referido cantor, em um primeiro momento, celebrou contrato com a autora que realizou ampla e conhecida campanha publicitária informando a “mudança” de marca de cerveja, para depois de algum tempo, veicular campanha da concorrente – ora rés – informando aos consumidores que havia “voltado” para a cerveja que consumia antes. Isto considerado, segundo penso, é evidente que, a despeito da argumentação das requeridas sobre a necessidade de se observar os limites do contrato apenas entre os participantes, se a atuação de um terceiro estranho causa prejuízo a um dos contratantes surge o dever de indenizar pelo ato ilícito. Nos termos do art. 186, do Código Civil, todo aquele que por ação ou omissão voluntária viola direito de outrem e lhe causa prejuízo, comete ato ilícito passível de indenização. Afinal, “é sabido que os contratos interessam à sociedade. É inconcebível crer que, no momento atual, se possam plagiar os oitocentistas, alegando que a relação contratual é res inter alios acta (ou seja, que apenas concerne às partes, e não a terceiros). Os bons e maus contratos repercutem socialmente. Ambos os gêneros produzem efeito cascata sobre a economia. Os bons contratos promovem a confiança nas relações sociais. Já os contratos inquinados por cláusulas abusivas resultam em desprestigio aos fundamentos da boa-fé e quebra de solidariedade social. Daí a necessidade de oponibilidade externa dos contratos em desfavor dos interesses dos contratantes... Porém, da mesma forma que podem ser afetados por contratos alheios, terceiros também podem agir de forma a violar uma relação contratual em andamento...” e, em decorrência disso, serem condenados a responder pelos danos emergentes a partir da indevida influência na relação existente entre outras

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pessoas (Código Civil Comentado, Nelson Rosenvald e outros, Editora Manole, 2007, pág. 313). Nesse sentido já se dirigia a doutrina antes mesmo do advento do novo Código Civil, pois como ensina Antonio Junqueira Azevedo, “a responsabilidade do terceiro é, pois aquiliana. Efetivamente, se um contrato deve ser considerado como fato social, como temos insistido, então a sua real existência há de impor-se por si mesma, para poder ser invocada contra terceiros, e, às vezes, até para ser oposta por terceiros às próprias partes. Assim é que não só a violação de contrato por terceiro pode gerar responsabilidade civil desde (como quando terceiro destrói a coisa que devia ser prestada, ou na figura da indução ao inadimplemento do negócio jurídico alheio), como também terceiros podem opor-se ao contrato, quando sejam por ele prejudicados (o instituto da fraude contra terceiros é exemplo típico disto)” (Revista dos Tribunais nº 750, pág. 119, grifei). É exatamente esta a hipótese que se coloca nos autos, pois se as requeridas tivessem contribuído para que um dos contratantes descumprisse aquilo que havia sido acordado, seria indiscutível o dever de indenizar pelos prejuízos materiais decorrentes da indevida rescisão operada unilateralmente por um dos participantes do negócio jurídico. Entretanto, por outro motivo – também lembrado na contestação – o pedido deve ser julgado improcedente. É que a indenização pretendida pela autora em relação aos danos materiais se restringe ao ressarcimento das despesas que teve com a campanha publicitária, pois afirma que a conduta ilícita das rés causou inequívoco prejuízo, tornando imprestável o investimento nas campanhas da cerveja Nova Schin. Acontece que, neste ponto, seria mesmo imprescindível que viesse aos autos prova indiscutível de que a atuação das rés prejudicou de alguma forma a campanha publicitária a ponto de gerar o dever de ressarcir todos os investimentos realizados. Vale dizer, para aplicação da teoria consagrava no art. 421, do Código Civil – função social do contrato – a intervenção do terceiro estranho, capaz de influenciar o contrato, deveria ficar bem comprovada nos autos. Nos termos do art. 333, inciso I, do Código de Processo Civil, incumbe ao autor o ônus de provar o fato constitutivo de seu direito. O não atendimento do ônus de provar coloca a parte em desvantajosa posição para a obtenção do ganho de causa. A produção probatória, no tempo e na forma prescrita em lei, é ônus da condição de parte”. Isto porque “o juiz, na sentença, somente vai socorrer-se das regras relativas ao ônus da prova se houver non liquet quanto à prova, isto é, se o fato não se encontrar provado. Estando provado o fato, pelo princípio da aquisição processual, essa prova se incorpora ao processo, sendo irrelevante indagar-se sobre quem a produziu. Somente quando não houver a prova é que o juiz deve perquirir quem tinha o ônus de provar e dele não se desincumbiu” (Código de Processo Civil Comentado, Nelson Ney Junior e Rosa Maria Andrade Nery, 9ª Edição, Editora Revista dos Tribunais, 2006, pág. 531). Entretanto, essa prova não veio aos autos a ponto de justificar a pretensão inicial. Ao contrário, a própria inicial afirma o sucesso da campanha, que contou com a participação de outros artistas e gerou considerável aumento nas vendas do produto e também da participação da autora no segmento de cervejas. Nas suas próprias palavras “...o produto tornou-se um enorme sucesso... fenômeno poucas vezes presenciado em todo o mundo” (fls. 5). Assim, ainda que possa ser tida como indevida a intromissão das requeridas no contrato que havia entre a autora e o cantor para divulgação da cerveja, não se vê demonstrado nos autos o prejuízo alegado com a ruptura do contrato a ponto de justificar a condenação ao total ressarcimento de todo o investimento na campanha publicitária. Afinal, repita-se, a campanha foi um sucesso e, portanto, o investimento gerou o retorno esperado, trazendo evidente benefício para a autora – fato por ela própria confessada – de sorte que não vejo como reconhecer, neste particular, responsabilidade das rés por prejuízos decorrentes do investimento, se a campanha não fracassou, ao contrário, elevou as vendas do produto. Por isso, incabível a indenização pelos prejuízos materiais invocados na inicial. Também não vislumbro,

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outrossim, o direito à indenização pelos danos morais. Primeiro porque, neste ponto, o prejuízo moral já foi objeto de apuração e fixação em processo diverso, dirigido contra o apontado autor do ato – o cantor Zeca Pagodinho – este sim, que seria o responsável direto por eventuais prejuízos à imagem da autora. É que foi ele quem divulgou, em um primeiro instante, a mudança para a marca de cerveja distribuída pela autora para, depois, afirmar ao público em geral que preferia a concorrente. Como bem observou a decisão proferida pelo MM. Juiz da 36ª Vara Cível Central da Capital, nos autos do processo nº 109.435-2/04 e nº 27.913-8/04, “Aí fica clara a ocorrência dos danos morais, pois o comportamento deletério do Réu Jessé ofendeu a imagem da Autora, inicialmente do ponto de vista subjetivo e certamente também do ponto de vista objetivo...” (fls. 1.099). E depois porque não se vislumbra na conduta das requeridas a necessária intenção de prejudicar a imagem da autora. Se investiram e conseguiram aliciar o “garoto propaganda” eleito pela requerente para de divulgação do produto concorrente, deveriam arcar com os prejuízos decorrentes dessa atuação, mas não é possível antever que essa conduta tivesse causado prejuízo à boa imagem da empresa que o fabricava a cerveja. À requerente, então, cumpria o dever de demonstrar o fato constitutivo de seu direito e como não se desincumbiu desse ônus, não há como reconhecer que a intervenção das rés tivesse tornado imprestável todos os investimentos da autora (fls. 25), se outros elementos de convicção conduzem à conclusão oposta, ou seja, que a propaganda atingiu seu objetivo principal. Bem por isso, no meu sentir, só restaria à autora buscar indenização por prejuízos que tivesse sofrido com, por exemplo, a redução de vendas após a ruptura do contrato e veiculação do comercial que fazia referência à cerveja, mas buscar o ressarcimento de todos os gastos com a campanha que, bem ou mal, atingiu seu objetivo de alavancar a venda da Nova Schin, sem prova efetiva do dano, impossível acolher a pretensão da autora. Em suma, a improcedência do pedido inicial é medida que se impõe à correta solução do caso em questão. Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido e condeno a requerente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que fixo, por equidade, em R$ 5.000,00. P. R. I. São Paulo, 10 de julho de 2007. ALEXANDRE CARVALHO E SILVA DE ALMEIDA JUIZ DE DIREITO

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5 CONCLUSÃO

Ao final desse estudo, o que se pode concluir é que através das diversas

mudanças ocorridas ao longo tempo, o contrato sofreu inúmeros reflexos, muitos

deles visando o respeito e a dignidade da pessoa humana que é alvo de uma

sociedade exploradora e massificada, repleta de abusos cometidos pelos fortes

contra os fracos que são prejudicados constantemente pela ausência de condições

favoráveis, em virtude de sua precariedade financeira.

Em decorrência da limitação imposta pelo Estado, os contratantes devem

obedecer às normas de ordem pública, que fixam os interesses da coletividade e as

bases jurídicas fundamentais da ordem econômica e moral da sociedade e os bons

costumes relativos a moralidade social, deixando para trás o individualismo.

O princípio da força obrigatória dos contratos, o pacta sunt servanda, passou

a ser entendido no sentido de que o contrato obriga as partes contratantes nos

limites do equilíbrio dos direitos e deveres entre elas, ou seja, este princípio que

dizia anteriormente, que o contrato fazia lei incondicional entre as partes,

formalmente iguais, pouco importando o abuso ou a exploração da mais fraca pela

mais forte, sofreu uma releitura, uma vez que se tornou possível a intervenção

judicial no contrato.

A função social identifica-se como “cláusula geral”, porquanto dotada de

vagueza semântica, e dessa forma, deve sempre atender às exigências ético-

sociais, incorporando valores, princípios e regras de conduta internalizadas pela

sociedade.

Constatou-se então ser possível a revisão judicial dos contratos motivada pela

função social, sempre que os efeitos externos do contrato prejudiquem injustamente

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os interesses da outra parte, da comunidade ou de terceiros, estranhos ao vínculo

contratual.

Cabe dessa forma ao magistrado, intervir tomando medidas no sentido de

equilibrar as partes, podendo proclamar a inexistência ou nulidade do contrato,

convalidar contrato anulável, reduzir a prestação de uma das partes quando

entender ser esta exacerbada ou determinar a resolução do contrato.

Conclui-se assim, que a função social do contrato é um instituto jurídico

destinado à realização de justiça ao caso concreto. Trata-se de uma limitação à

liberdade de contratar, quando constatado que o seu exercício provocar

externalidades à sociedade.

Colocada como princípio de direito contratual no Código Civil, deve ser

aplicada com cautela, pois a falta de critérios de sua aplicação pode implicar

responsabilidade social do indivíduo e das pessoas jurídicas, a qual, do ponto de

vista jurídico, compete ao Estado, bem como enriquecimento sem causa para quem

da aplicação desse artigo se beneficiar.

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REFERÊNCIAS

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________. Jurisprudências, disponível em http://www.flaviotartuce.adv.br/index2. php?sec=jurisprudencia&id=202, - Acesso em 21 mar. 2012. THEODORO JUNIOR, Humberto. O contrato e sua função social. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. VENOSA, Silvio da Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

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ANEXO I JURISPRUDÊNCIA SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA: · RECURSO ESPECIAL Nº 691.738 - SC (2004/0133627-7) · RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI · RECORRENTE: ADMINISTRAÇÃO, CONSTRUÇÃO E INCORPORAÇÕES DE

IMÓVEIS LTDA - SANT'ANA · ADVOGADO: EVERALDO LUÍS RESTANHO E OUTRO · RECORRIDO: BESC S/A CRÉDITO IMOBILIÁRIO · ADVOGADO: IVO MULLER EMENTA RECURSO ESPECIAL. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. IMPUGNAÇÃO. EXCLUSIVAMENTE AOS DISPOSITIVOS DE DIREITO MATERIAL. POSSIBILIDADE. FRACIONAMENTO DE HIPOTECA. ART. 1488 DO CC/02. APLICABILIDADE AOS CONTRATOS EM CURSO. INTELIGÊNCIA DO ART. 2035 DO CC/02. APLICAÇÃO DO PRINCIPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS. Se não há ofensa direta à legislação processual na decisão do Tribunal que revoga tutela antecipadamente concedida pelo Juízo de Primeiro Grau, é possível a interposição de Recurso Especial mencionando exclusivamente a violação dos dispositivos de direito material que deram fundamento à decisão.. – O art. 1488 do CC/02, que regula a possibilidade de fracionamento de hipoteca, consubstancia uma das hipóteses de materialização do princípio da função social dos contratos, aplicando-se, portanto, imediatamente às relações jurídicas em curso, nos termos do art. 2035 do CC/02. - Não cabe aplicar a multa do art. 538, § único, do CPC, nas hipóteses em que há omissão no acórdão recorrido, ainda que tal omissão não implique a nulidade do aresto. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por maioria, conhecer em parte do recurso especial e, nessa parte, dar-lhe provimento. Votou vencido o Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito. Os Srs. Ministros Castro Filho e Humberto Gomes de Barros votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro. Sustentou oralmente o Dr. Túlio Kavalazi Filho, pelo recorrente. Brasília (DF), 12 de maio de 2005(data do julgamento). MINISTRA NANCY ANDRIGHI Presidente e Relatora Documento: 1838396 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJ: 26/09/2005 (sem grifos no original)

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PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DECISÃO PROFERIDA SINGULARMENTE PELO RELATOR. POSSIBILIDADE. ART. 557 DO CPC. ENSINO SUPERIOR. CONTRATO DE CRÉDITO EDUCATIVO. FINALIDADE SOCIAL. EXEGESE PECULIAR DAS SUAS DISPOSIÇÕES. MULTA CONTRATUAL DE 10% NOS CASOS DE INADIMPLEMENTO. PERCENTUAL DEMASIADAMENTE ONEROSO. EXCESSO. POSIÇÃO DOMINANTE. INFRINGÊNCIA DE REGRAS PADRONIZADAS DO SISTEMA DE PROTEÇÃO DO EQUILÍBRIO NAS RELAÇÕES DE CRÉDITO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Nos termos do art. 557, é facultado ao Relator negar seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior. Assim, atendida uma das condições previstas, pode o julgador negar seguimento ao recurso, em apreço à celeridade dos julgamentos e ao princípio da efetividade do processo. 2. Ademais, eventual impropriedade processual da decisão monocrática fica superada, uma vez instado o órgão colegiado a se pronunciar em sede de Agravo Regimental. 3. O Contrato de Crédito Educativo, dada a elevada finalidade nitidamente social da sua instituição, não deve ser interpretado sem levar-se em conta a sua especificidade, como se fosse uma relação financeira comum, por isso que a sua compreensão assimila as regras que servem de padrão ao sistema de proteção ao equilíbrio das relações de crédito, em proveito da preservação de sua teleologia. 4. Embora a jurisprudência desta Corte Superior seja no sentido da não-aplicação do CDC aos Contratos de Crédito Educativo, não se deve olvidar a ideologia do Código Consumerista consubstanciada no equilíbrio da relação contratual, partindo-se da premissa da maior vulnerabilidade de uma das partes. O CDC, mesmo não regendo diretamente a espécie sob exame, projeta luz na sua compreensão. Neste caso, o CDC foi referido apenas como ilustração da orientação jurídica moderna, que valoriza o equilíbrio entre as partes da relação contratual, porquanto essa diretriz está posta hoje em dia, no próprio Código Civil. 5. Vale dar destaque as normas insertas nos arts. 421 e 422 do CC,as quais tratam, respectivamente, da função social do contrato e da boa-fé objetiva. A função social apresenta-se hodiernamente como um dos pilares da teoria contratual. É um princípio determinante e fundamental que, tendo origem na valoração da dignidade humana (art. 1o. da CF), deve determinar a ordem econômica e jurídica, permitindo uma visão mais humanista dos contratos que deixou de ser apenas um meio para obtenção de lucro. 6. Da mesma forma, a conduta das partes contratantes deve ser fundada na boa-fé objetiva, que, independentemente do subjetivismo do agente, as partes contratuais devem agir conforme o modelo de conduta social, geralmente aceito (consenso social), sempre respeitando a confiança e o interesse do outro contratante. 7. Tratando-se no caso dos autos de Contrato de Crédito Educativo e levando-se em conta a elevada finalidade social da sua instituição, mostra-se desarrazoada uma multa contratual no valor de10%. 8. Agravo Regimental desprovido. Acordão Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas

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a seguir, por unanimidade, negar provimento ao Agravo Regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Benedito Gonçalves, Francisco Falcão e Teori Albino Zavascki votaram com o Sr. Ministro Relator. Licenciado o Sr. Ministro Arnaldo Esteves Lima. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. · RECURSO ESPECIAL Nº 803.481 - GO (2005/0205857-0) · RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI · RECORRENTE: CARGILL AGRÍCOLA S/A · ADVOGADO: ADILIO EVANGELISTA CARNEIRO E OUTRO · RECORRIDO: LUIZ FERREIRA LIMA · ADVOGADO: RENATO MENDONÇA SANTOS EMENTA DIREITO CIVIL E AGRÁRIO. COMPRA E VENDA DE SAFRA FUTURA A PREÇO CERTO. ALTERAÇÃO DO VALOR DO PRODUTO NO MERCADO. CIRCUNSTÂNCIA PREVISÍVEL. ONEROSIDADE EXCESSIVA. INEXISTÊNCIA. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO, BOA-FÉ OBJETIVA E PROBIDADE. INEXISTÊNCIA. - A compra e venda de safra futura, a preço certo, obriga as partes se o fato que alterou o valor do produto agrícola não era imprevisível. - Na hipótese afigura-se impossível admitir onerosidade excessiva, inclusive porque a alta do dólar em virtude das eleições presidenciais e da iminência de guerra no Oriente Médio – motivos alegados pelo recorrido para sustentar a ocorrência de acontecimento extraordinário – porque são circunstâncias previsíveis, que podem ser levadas em consideração quando se contrata a venda para entrega futura com preço certo.- O fato do comprador obter maior margem de lucro na revenda, decorrente da majoração do preço do produto no mercado após a celebração do negócio, não indica a existência de má-fé, improbidade ou tentativa de desvio da função social do contrato. - A função social infligida ao contrato não pode desconsiderar seu papel primário e natural, que é o econômico. Ao assegurar a venda de sua colheita futura, é de se esperar que o produtor inclua nos seus cálculos todos os custos em que poderá incorrer, tanto os decorrentes dos próprios termos do contrato, como aqueles derivados das condições da lavoura. - A boa-fé objetiva se apresenta como uma exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe o poder-dever de que cada pessoa ajuste a própria conduta a esse modelo, agindo como agiria uma pessoa honesta, escorreita e leal. Não tendo o comprador agido de forma contrária a tais princípios, não há como inquinar seu comportamento de violador da boa-fé objetiva. Recurso especial conhecido e provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Castro Filho, Humberto Gomes de Barros, Ari Pargendler e Carlos Alberto Menezes Direito votaram com a Sra. Ministra Relatora. Documento: 3139936 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJ: 01/08/2007

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Brasília (DF), 28 de junho de 2007 (data do julgamento). MINISTRA NANCY ANDRIGHI - RELATORA (sem grifos no original) · RECURSO ESPECIAL Nº 783.404 - GO (2005/0158134-4) · RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI · RECORRENTE: CARGILL AGRÍCOLA S/A · ADVOGADO: ADILIO EVANGELISTA CARNEIRO E OUTRO(S) · RECORRIDO: RICARDO ALVES RESENDE · ADVOGADO: HENRIQUE ALVES DE ARAÚJO E OUTRO EMENTA DIREITO CIVIL E AGRÁRIO. COMPRA E VENDA DE SAFRA FUTURA A PREÇO CERTO. ALTERAÇÃO DO VALOR DO PRODUTO NO MERCADO. CIRCUNSTÂNCIA PREVISÍVEL. ONEROSIDADE EXCESSIVA. INEXISTÊNCIA. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO, BOA-FÉ OBJETIVA E PROBIDADE. INEXISTÊNCIA. CLÁUSULAS ACESSÓRIAS ABUSIVAS. IRRELEVÂNCIA. A compra e venda de safra futura, a preço certo, obriga as partes se o fato que alterou o valor do produto agrícola não era imprevisível. - Na hipótese afigurase impossível admitir onerosidade excessiva, inclusive porque chuvas e pragas motivos alegados pelo recorrido para sustentar a ocorrência de acontecimento extraordinário – são circunstâncias previsíveis na agricultura, que o produtor deve levar em consideração quando contrata a venda para entrega futura com preço certo.- O fato do comprador obter maior margem de lucro na revenda, decorrente da majoração do preço do produto no mercado após a celebração do negócio, não indica a existência de má-fé, improbidade ou tentativa de desvio da função social do contrato. - A função social infligida ao contrato não pode desconsiderar seu papel primário e natural, que é o econômico. Ao assegurar a venda de sua colheita futura, é de se esperar que o produtor inclua nos seus cálculos todos os custos em que poderá incorrer, tanto os decorrentes dos próprios termos do contrato, como aqueles derivados das condições da lavoura. - A boa-fé objetiva se apresenta como uma exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe o poder-dever de que cada pessoa ajuste a própria conduta a esse modelo, agindo como agiria uma pessoa honesta, escorreita e leal. Não tendo o comprador agido de forma contrária a tais princípios, não há como inquinar seu comportamento de violador da boafé objetiva. - Nos termos do art. 184, segunda parte, do CC/02, “a invalidade da obrigação principal implica a das obrigações acessórias, mas a destas não induz a da obrigação principal”. Portanto, eventual abusividade de determinadas cláusulas acessórias do contrato não tem relevância para o deslinde desta ação. Ainda que, em tese, transgridam os princípios da boa-fé objetiva, da probidade e da função social do contrato ou imponham ônus excessivo ao recorrido, tais abusos não teriam o condão de contaminar de maneira irremediável o contrato, de sorte a resolvê-lo. Recurso especial conhecido e provido. Documento: 3139396 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJ: 13/08/2007

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ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Castro Filho, Humberto Gomes de Barros, Ari Pargendler e Carlos Alberto Menezes Direito votaram com a Sra. Ministra Relatora. Brasília (DF), 28 de junho de 2007 (data do julgamento). MINISTRA NANCY ANDRIGHI – Relatora · EDcl no RECURSO ESPECIAL Nº 951.553 - RJ (2007/0090881-0) · RELATOR: MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA · EMBARGANTE: EDENEA WAGNER AGUIEIRAS · ADVOGADO: DENIELLE CORRÊA MARIANO DE CAMPOS · EMBARGADO: GEORGINA VIEIRA NICOLAU · ADVOGADO: JOSÉ WANDER GOMES E OUTRO EMENTA DIREITO CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS NO RECURSO ESPECIAL. OMISSÃO, OBSCURIDADE OU CONTRADIÇÃO. INEXISTÊNCIA. LOCAÇÃO. PRORROGAÇÃO AUTOMÁTICA. FIANÇA. VALIDADE. CLÁUSULA PREVENDO A RESPONSABILIDADE DO FIADOR ATÉ A EFETIVA ENTREGA DAS CHAVES DO IMÓVEL. EXISTÊNCIA. EMBARGOS REJEITADOS. O princípio do pacta sunt servanda, embora temperado pela necessidade de observância da função social do contrato, da probidade e da boa-fé, em seu prisma objetivo, ainda continua plenamente válido em nosso ordenamento jurídico. Assim, têm os contratantes plena liberdade de pactuar normas a gerarem efeitos entre si, desde que estas não venham a ofender interesses sociais previstos na Constituição. O fato de o contrato de locação ter sido celebrado sob a vigência da Lei 6.649/79, por si só, não afasta a responsabilidade da fiadora pelos débitos locatícios posteriores ao vencimento do contrato de locação, tendo em vista a existência de cláusula expressa em que concordou em garantir a locação até a efetiva entrega das chaves do imóvel locado. Precedente da Terceira Seção. Embargos de declaração rejeitados. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, rejeitar os embargos. Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Jorge Mussi, Felix Fischer e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília (DF), 26 de agosto de 2008(data do julgamento) MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA Relator

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· RECURSO ESPECIAL Nº 1.034.702 - ES (2008/0043541-5) · RELATOR: MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA · RECORRENTE: GRANLIMA INDUSTRIA E COMERCIO DE GRANITOS LTDA ME

MICROEMPRESA · ADVOGADO: MILTRO JOSÉ DALCAMIN E OUTRO(S) · RECORRIDO: AGEO LTDA. · ADVOGADO: JOSÉ FRANCISCO CUNHA FERRAZ FILHO E OUTRO(S) · RECURSO ESPECIAL Nº 1 . 0 3 4 . 7 0 2 - ES ( 2 0 0 8 / 0 0 4 3 5 4 1 - 5 ) EMENTA CIVIL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ONEROSIDADE EXCESSIVA. CLÁUSULAS ABUSIVAS. ILEGALIDADE DA CLÁUSULA PENAL. SÚMULAS NS. 5 E 7 DO STJ. CUMULAÇÃO DE PEDIDOS. INDENIZAÇÃO E MULTA DA CLÁUSULA PENAL. SÚMULA N. 211 DO STJ. VIOLAÇÃO DO ART. 410 DO CC NÃO CARACTERIZADA. SÚMULA N. 284 DO STF. REDUÇÃO DO QUANTUM DA MULTA COMPENSATÓRIA. SÚMULA N. 7 DO STJ. ART. 460 DO CC. SÚMULA N. 211 DO STJ. 1. Os requisitos para caracterização da onerosidade excessiva são: o contrato de execução continuada ou diferida, vantagem extrema de outra parte e acontecimento extraordinário e imprevisível, cabendo ao juiz, nas instâncias ordinárias, e diante do caso concreto, a averiguação da existência de prejuízo que exceda a álea normal do contrato, com a conseqüente resolução do contrato diante do reconhecimento de cláusulas abusivas e excessivamente onerosas para a prestação do devedor. O reexame dessa matéria na instância especial enseja a aplicação das Súmulas ns. 5 e 7 do STJ. 2. Inviabiliza-se o conhecimento de recurso especial fundado na aferição da legalidade de cláusula penal, quando o reconhecimento da quebra da exclusividade pela Corte a quo, que gerou a multa contratual considerada ilegal pelo recorrente, foi firmado com base no conjunto fático-probatório dos autos. Incidência das Súmulas ns. 5 e 7 do STJ. 3. A ausência de prequestionamento de tese acerca da cumulação de pedidos de indenização e multa relativa à cláusula penal impede o conhecimento do apelo especial, a teor da Súmula n. 211 do STJ. 4. Em sede de recurso especial, é inadmissível a revisão do quantum fixado a título de multa compensatória, tendo em vista o disposto na Súmula n. 7 do STJ, na medida em que cabe ao magistrado das instâncias ordinárias, atento às circunstâncias do caso em apreço e à realidade dos fatos, a redução proporcional ao valor do pagamento já realizado, a fim de evitar o enriquecimento sem causa do devedor. 5. Recurso especial não-conhecido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUARTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso especial nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Fernando Gonçalves e Aldir Passarinho Junior votaram com o Sr. Ministro Relator. Sustentou oralmente Dr. JOSÉ FRANCISCO CUNHA FERRAZ FILHO, pela parte · RECORRIDA: AGEO LTDA. · Documento: 3905111 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJe: 19/05/2008 Página 1 de 2

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· Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Fernando Gonçalves. · Brasília, 15 de abril de 2008 (data do julgamento). · MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA · Relator

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ANEXO II TRIBUNAIS ESTADUAIS TJ/MS · Processo nº 2006.013731-2/0001.00 · Julgamento: 24/07/07 · Órgão: 4º Turma CIVIL · Classe: Agr. Regimental em Apelação Civil · Rito: Ordinário · Quarta Turma Cível Relator - Exmo. Sr. Des. Paschoal Carmello Leandro. Agravante - Unimed - Campo Grande/MS - Cooperativa de Trabalho Médico Ltda. Advogados - Paula Coelho Barbosa Tenuta e outro. Agravada - Romilda Aparecida Miotto Fernandes. Def. Públ. 1ª Inst. - Guilherme Cambraia de Oliveira. EMENTA AGRAVO REGIMENTAL EM APELAÇÃO CÍVEL – DECISÃO MONOCRÁTICA DENEGATÓRIA DE SEGUIMENTO – RECURSO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – PLANO DE SAÚDE – CLÁUSULA ABUSIVA – RELATIVIZAÇÃO DO PACTA SUNT SERVANDA – ART. 51, CDC – APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ OBJETIVA E DA FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS – RECURSO IMPROVIDO. Mantém-se a decisão denegatória de seguimento a recurso de apelação, quando esta encontra-se estritamente fundamentada em entendimento pacífico e dominante do respectivo Tribunal e da Corte Superior. De acordo com o Código de Defesa do Consumidor, bem como dos princípios da boa-fé objetiva e da função social dos contratos, o princípio do pacta sunt servanda deve ser relativizado para declarar nulas as cláusulas abusivas previstas nos contratos de adesão. É vedada a interpretação extensiva de cláusula contratual limitativa de direitos, prevista em contratos de adesão de plano de saúde. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os juízes da Quarta Turma Cível do Tribunal de Justiça, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, negar provimento ao agravo regimental. Unânime. Campo Grande, 24 de julho de 2007. Des. Paschoal Carmello Leandro – Relator RELATÓRIO O Sr. Des. Paschoal Carmello Leandro Unimed Campo Grande – Cooperativa de Trabalho Médico Ltda. –, inconformada com a decisão (f. 155-158) que negou seguimento ao recurso de apelação cível por ela interposto em face de Romilda Aparecida Miotto Fernandes, agrava regimentalmente a este Tribunal.

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Em suas razões recursais (f. 160-163), a agravante alega, em apertada síntese, que discorda da decisão, uma vez que a demanda em questão não versa unicamente a respeito da necessidade de atendimento médico hospitalar ao qual a recorrida foi submetida, mas, sobretudo, à existência de dever jurídico oponível contra a recorrente, para que se procedesse ao custeio daquele stent farmacológico não previsto contratualmente, por ser importado, o qual foi pago pela própria recorrida por mera liberalidade. Afirma que o próprio CDC, em seu art. 22, preserva a continuidade da prestação dos serviços, mediante o pagamento do preço justo, previamente ajustado no contrato. Sustenta, ainda, que no caso em exame é impossível o atendimento pleiteado pela recorrida porque não há previsão contratual para o custeio de materiais importados, conforme cláusula expressa no contrato celebrado entre as partes litigantes. Ao final, requer provimento ao regimental, pugnando pela reconsideração ou remessa para o Colegiado. Campo Grande, 30 de maio de 2006. Des. Horácio Vanderlei Nascimento Pithan – Relator RELATÓRIO O Sr. Des. Horácio Vanderlei Nascimento Pithan Trata-se de apelação cível interposta por Lauro Veloso Malaquias, Marisa Silveira Malaquias, Daltro Fiúza e Rosi Mari dos Santos Fiuza, contra a parte dispositiva da sentença que julgou procedente os pedidos na ação ordinária exemplo, intentada pelos dois primeiros recorrentes, condenando os réus ao pagamento da diferença constatada na área adquirida, concernente a 60,2327 há nos termos do contrato de compra e venda do imóvel rural e julgou parcialmente procedente a reconvenção para o fim de declarar rescindida a letra 'e' da cláusula 2ª do aludido contrato de compra e venda de imóvel rural. Os apelantes, Lauro Veloso Malaquias e Marisa Silveira Malaquias, alegam: 1- que o magistrado procedeu com desnecessário e ilegal açodamento ao julgar antecipadamente a lide principal, ferindo os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa; 2- que os apelados carecem de interesse de agir na reconvenção, já que os próprios apelantes, desde a inicial da ação principal admitem dever aos apelados os valores do apartamento do edifício Mont Serrat, de 75 vacas e de suas rendas, sendo inclusive, objeto do pedido na letra 'd' do pedido inicial; 3- que a área faltante é muito superior à definida na sentença e que o limite é à base da serra; 4- que o perito judicial nunca foi ao local da perícia judicial e que a referida área é inapta para a exploração de pecuária ou agricultura e pertence a terceiros ou é devoluta. Postulam, ao final, em pedidos alternativos: 1- seja decretada a nulidade da sentença, retornando o processo a origem para que se conclua a produção das provas requeridas fundamentadamente e que seja proferida uma nova sentença; 2- ou, que seja indeferida a petição inicial da reconvenção, por carecerem os apelados de interesse processual; 3- ou ainda, que seja reformada parcialmente a sentença para que sejam respeitados os limites do título original, conforme os levantamentos procedidos pelo Idaterra.

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Em contra-razões, os apelados postulam pela manutenção da sentença. Os recorrentes Dautro Fiúza e Rosi Mari dos Santos Fiuza, réus no feito principal, interpuseram recurso de apelação alegando: 1- que a sentença merece ser reformada na parte em que deixa de anular a cláusula contratual de número 3.1., haja vista que referida disposição viola a função social do contrato, gerando o enriquecimento sem causa dos apelados; 2- que o magistrado não considerou o mandamento contido no artigo 1.136 do Código Civil de 1916, já que determinou a indenização pela área faltante conforme previsto no contrato e não como a lei determina, e, ainda, condenou os apelantes a indenizar os apelados em valor muito superior que o previsto para o abatimento proporcional no preço do negócio. Pedem alternativamente: I- seja dado provimento ao recurso para reformar parte da sentença, anulando-se a cláusula 3.1 do contrato, II- ou, que seja aplicada cláusula 3.1 para a apuração do valor devido aos apelantes, levando-se em consideração a área de 203.53 hectares da qual não houve adimplemento, acrescida de juros anuais de 25% (vinte e cinco) por cento. Os apelados em contra-razões batem-se pelo improvimento do recurso. (...) Como consta na ata, a decisão foi a seguinte: POR UNANIMIDADE, REJEITARAM AS PRELIMINARES E NO MÉRITO, POR MAIORIA, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DOS APELANTES LAURO VELOSO MALAQUIAS E SUA MULHER, VENCIDO O VOGAL. EM DECISÃO UNÂNIME, DERAM PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO POR DALTRO FIÚZA E ROSI MARI DOS S. FIUZA. Presidência da Exma. Sra. Desª. Tânia Garcia de Freitas Borges. Relator, o Exmo. Sr. Des. Horácio Vanderlei Nascimento Pithan. Tomaram parte no julgamento os Exmos. Srs. Desembargadores Horácio Vanderlei Nascimento Pithan, Tânia Garcia de Freitas Borges e Luiz Carlos Santini. Campo Grande, 30 de maio de 2006. TJ/CE 2008.0006.4412-5/1 APELAÇÃO CÍVEL Relator: DES. LINCOLN TAVARES DANTAS Orgão Julgador : 4ª CÂMARA CÍVEL APELANTE : BANCO ITAU S/A EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. RECONVENÇÃO. REVISÃO DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO GARANTIDO COM CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Sendo o crédito fornecido ao consumidor pessoa física para a sua utilização na aquisição de bens no mercado como destinatário final, o dinheiro funciona como produto, implicando o reconhecimento da instituição bancária/financeira como fornecedora para fins de aplicação do CDC, nos termos do art. 3º, parágrafo 2º, da Lei nº 8.078/90. Entendimento referendado pela Súmula 297 do STJ, de 12 de maio de 2004. DIREITO DO CONSUMIDOR À REVISÃO CONTRATUAL.

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O art. 6º, inciso V, da Lei nº 8.078/90 consagrou de forma pioneira o princípio da função social dos contratos, relativizando o rigor do "Pacta Sunt Servanda" e permitindo ao consumidor a revisão do contrato em duas hipóteses: por abuso contemporâneo à contratação ou por onerosidade excessiva derivada de fato superveniente (Teoria da Imprevisão). Hipótese dos autos em que o desequilíbrio contratual já existia à época da contratação uma vez que o fornecedor inseriu unilateralmente nas cláusulas gerais do contrato de adesão obrigações claramente excessivas, a serem suportadas exclusivamente pelo consumidor. DECLARAÇÃO DE OFÍCIO DA NULIDADE DAS CLÁUSULAS ABUSIVAS. O art. 168, parágrafo único, do novo Código Civil (mera repetição do art. 145, parágrafo único da codificação revogada), permite ao Juiz declarar de ofício a nulidade de negócio jurídico que lhe tenha sido submetido a exame. TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS. Ausente qualquer justificativa por parte do fornecedor para a imposição ao consumidor de taxa de juros excessiva como obrigação acessória em contrato de consumo, o restabelecimento do equilíbrio das obrigações exige a redução da taxa de juros remuneratórios fixada em contrato de adesão. Juros reduzidos para 12% (doze por cento) ao ano, com fundamento exclusivamente no disposto no art. 52, inciso II c/c os arts. 39, inciso V e 51, inciso IV, todos da Lei nº 8.078/90. Desnecessário examinar argumentos constitucionais sobre o tema. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. No caso concreto trata-se de contrato de financiamento firmado já na vigência do Novo Código Civil. Assim, havendo autorização expressa em lei, a incidência da capitalização dos juros remuneratórios contratados não vai afastada, sendo, entretanto, permitida apenas em periodicidade anual. TERMO INICIAL DA MORA. Estando "sub judice" a liquidez e, em via de conseqüência, a própria exigibilidade do crédito oriundo do contrato revisando, é de ser afastada com efeitos "ex tunc" a mora decorrente do inadimplemento de obrigações declaradas abusivas até que se apure o valor real do eventual débito ainda existente. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. Obrigação acessória que vai afastada, na esteira de jurisprudência consolidada. A correção monetária é suficiente, e mais confiável, para servir como fator de recomposição da perda do valor real da moeda, corroída pela inflação. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. Mantido o IGP-M/FGV como índice de correção monetária, eis que a jurisprudência indica ser o que melhor reflete a real perda inflacionária. JUROS MORATÓRIOS. Mantidos em 1% (um por cento) ao mês. MULTA MORATÓRIA. Mantida em 2% (dois por cento), porém, sobre o valor da parcela em atraso, nos termos do art. 52, parágrafo 1º, da Lei nº 8.078/90. Disposição de ofício. COBRANÇA DE TARIFA E/OU TAXA NA CONCESSÃO DO FINANCIAMENTO. ABUSIVIDADE. Encargo contratual abusivo, porque evidencia vantagem exagerada da instituição financeira, visando acobertar as despesas de financiamento inerentes à operação de outorga de crédito. Inteligência do art. 51, IV do CDC. Disposição de ofício. IOF. ABUSIVIDADE QUANTO À FORMA DE COBRANÇA. A cobrança do tributo diluído nas prestações do financiamento se afigura como condição iníqua e desvantajosa ao consumidor (CDC, art. 51, IV). Disposição de ofício. DIREITO À COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS E À REPETIÇÃO DE INDÉBITO. Sendo apurado a RELATÓRIO Cuidam-se de Apelações Cíveis em Ação Revisional de Cláusulas Contratuais, esta aforada por ANTONIETA SILVA CAMPOS contra o BANCO ITAÚ S/A; e em ação de

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Busca e Apreensão interposta pelo mesmo BANCO ITAÚ S/A, contra ANTONIETA SILVA CAMPOS. O douto juízo de origem julgou pela procedência parcial da revisional, determinando o recálculo do débito, a contar da data da celebração do contrato firmado entre as partes, de modo a aplicar o CDC, possibilitando a revisão do mesmo, vedando a capitalização de juros em qualquer periodicidade, manter a comissão de permanência conforme taxa de mercado, proibindo sua cumulação com juros moratórios, aplicar a taxa de juros pactuada, mas de forma simples, limitar os juros de mora a 1% ao ano, afastar a exigibilidade dos encargos moratórios, em razão da descaracterização da mora debendi, estabelecer que a multa pactuada de 2% só pode incidir sobre as parcelas em atraso, possibilitando a compensação dos valores, de forma simples. Em relação à busca e apreensão, o julgador monocrático decretou sua extinção, com base no art. 267, VI, CPC, por considerar que a existência de cláusulas abusivas descaracterizam a mora. Nas razões recursais concernentes à revisional, defende o banco recorrente, em síntese, a legalidade dos termos livremente pactuados, devendo prevalecer o princípio da pacta sunt servanda, defendendo incabível a sua revisão. A título de prequestionamento, defende que o julgador de origem contrariou o princípio da pacta sunt servanda; contrariou o disposto no art. 46 e 6º, inciso V, do CDC, pois admitiu a alteração das cláusulas contratuais que eram de conhecimento prévio do apelado, redigidos de forma clara e precisa; contrariou, também, o art. 126, CPC, ao não aplicar o art. 5º, da Medida Provisória nº 2.170-36, a Lei nº 4.595/97 e demais normas pertinentes; contrariou o disposto na Medida Provisória nº 1.963-17, que autoriza definir a taxa de juros mediante capitalização mensal, pugnando pela apreciação desses pontos pelo colegiado. Contra-razões às fls. 99/102, reiterando a existência de cláusulas abusivas no contrato firmado, contrárias às normas de regência, passíveis de revisão, nos termos do art. 421, CCB, defendendo a manutenção da peça de desate. Em relação ao apelo interposto na busca e apreensão, o banco recorrente prequestiona a aplicação do art. 267, VI, CPC, em confronto com o Decreto-Lei 911/69, defendendo que o julgador dera entendimento diverso ao dispositivo legal deixando de aplicar a lei no caso, tanto que a sentença foi baseada no dispositivo citado, sem, contudo, aplicar a íntegra do dispositivo. Defendendo presente os pressupostos legais concernentes, pede pelo provimento do apelo, com a reforma sentença extintiva. Não havendo contraditório, foi determinada a imediata subida dos autos à instância superior. Esses os relatos. Sigam à análise

TJ/RS SEGURO DE VIDA. RENOVAÇÃO DO CONTRATO. IMPOSIÇÃO DE REAJUSTE DO PRÊMIO POR FAIXA ETÁRIA. IDOSO. 1. A discussão das condições renovação do contrato propostas pela seguradora é direito do segurado. Inteligência do art. 6º, V, do Código de Proteção e Defesa do Consumidor. 2. Caso em que a readequação proposta pela seguradora, ao invés de proporcionar a diluição do risco coberto entre os segurados, suavizando seus efeitos sobre o patrimônio do consumidor, desnatura o contrato, porque o torna demasiado custoso, onerando o patrimônio do segurado ao invés de proporcionar-lhe uma garantia. 3. Consiste prática comercial desleal a

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imposição de condições de renovação contratual que oneram excessivamente o consumidor. 4. A liberdade de contratar é um instituto delimitado pela função social do contrato. Art. 421 do Código Civil de 2002. 5. Em contratos que não previam inicialmente o reajuste do prêmio em razão da mudança de faixa etária, é abusiva a conduta da seguradora que; em razão da alegada redução de sua margem de lucro causada pelo envelhecimento de seu cliente, eleva o preço da renovação do contrato do consumidor idoso, que certamente encontrará dificuldades insuperáveis para contratar um seguro similar com outra companhia. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70024546962, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo Sérgio Scarparo, Julgado em 18/06/2008) APELAÇÃO-CÍVEL. AÇÃO DE ADIMPLEMENTO CONTRATUAL. SOCIEDADE ANÔNIMA. COMPLEMENTAÇÃO DE AÇÕES SUBSCRITAS. VALORES INTEGRALIZADOS EM 02/08/1994. PEDIDO DE EMISSÃO DA DIFERENÇA ACIONÁRIA. CRT E CELULAR CRT. RENDIMENTOS. - Preliminar de ilegitimidade passiva afastada. - Prescrição da pretensão principal. Inocorrência. Aplicável o prazo ordinário da lei civil. Artigos 177 do CC de 1916 e 205 do CC vigente. Inocorrente ainda a prescrição da pretensão de receber dividendos. Art. 206, §3º, inc. III, do NCC. Esta é prestação acessória ao reconhecimento do direito à complementação de ações. Antes disso, não é possível à parte pleiteá-los. - Ainda que amparada por norma administrativa, ao agir contra os interesses da parte adquirente e em exclusivo interesse próprio, escolhendo melhor momento para realizar a subscrição e emissão das ações, a companhia não agiu em conformidade com os ditames do Princípio da Boa-fé. - Contrato tipicamente de adesão. Desequilíbrio. A análise da relação contratual existente entre as partes, bem como da conduta de cada uma nesse âmbito, necessariamente deve ser norteada pelos ditames da concepção da ciência jurídica contratual marcada pelas noções de boa-fé objetiva e função social do contrato. - Reconhecido o direito da parte demandante às diferenças acionárias segundo o valor patrimonial vigente na data da integralização do capital. - Mantida a condenação da ré a indenizar a parte autora pelo equivalente às diferenças acionárias da CRT e Celular CRT. Mantidos os critérios indenizatórios por ausência de insurgência específica. - Conseqüência inafastável da presente decisão é a afirmação do direito aos correspondentes rendimentos (dividendos e juros sobre o capital próprio). - Honorários. Aplicável o art. 20, §3º, do CPC. Preliminar afastada. Negado provimento ao apelo. (Apelação Cível Nº 70023571573, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Dálvio Leite Dias Teixeira, Julgado em 19/06/2008) AGRAVO DE INSTRUMENTO. SEGUROS. PLANO DE SAÚDE. PEDIDO DE AUTORIZAÇÃO PARA REALIZAÇÃO DE EXAMES TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA DINÂMICA E TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA DE CRÂNIO. PRESENÇA DA VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES E NECESSIDADE DE URGÊNCIA NA CONCESSÃO DO PROVIMENTO. 1. Mesmo que a via processual eleita seja imprópria, mas observados os pressupostos justificadores da providência de urgência, deve-se analisar o pedido de tutela pleiteado, seja antecipatório ou cautelar. Fungibilidade das tutelas de urgência. 2. Os planos ou seguros de saúde estão submetidos às disposições do Código de Defesa do Consumidor, enquanto relação de consumo atinente ao mercado de prestação de

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serviços médicos. Isto é o que se extrai da interpretação literal do art. 35 da Lei 9.656/98. 3. O objeto do litígio é o reconhecimento da cobertura pretendida, a fim de que a parte agravada possa efetuar os exames necessários à averiguação da extensão da lesão presente na paciente, uma vez que há evidências de AVC isquêmico em evolução. 4. No caso em exame, estão presentes os requisitos autorizadores da tutela concedida, consubstanciado no risco de lesão grave e verossimilhança do direito alegado, não se podendo afastar o direito da parte agravada de discutir acerca da abrangência do seguro contratado, o que atenta ao princípio da função social do contrato. 5. Tutela que visa à proteção da vida, bem jurídico maior a ser garantido, atendimento ao princípio da dignidade humana. Negado seguimento ao agravo de instrumento. (Agravo de Instrumento Nº 70023432164, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luiz Lopes do Canto, Julgado em 24/06/2008) SEGURO DE VIDA. RENOVAÇÃO DO CONTRATO. IMPOSIÇÃO DE REAJUSTE DO PRÊMIO POR FAIXA ETÁRIA. IDOSO. 1. A discussão das condições renovação do contrato propostas pela seguradora é direito do segurado. Inteligência do art. 6º, V, do Código de Proteção e Defesa do Consumidor. 2. Caso em que a readequação proposta pela seguradora, ao invés de proporcionar a diluição do risco coberto entre os segurados, suavizando seus efeitos sobre o patrimônio do consumidor, desnatura o contrato, porque o torna demasiado custoso, onerando o patrimônio do segurado ao invés de proporcionar-lhe uma garantia. 3. Consiste prática comercial desleal a imposição de condições de renovação contratual que oneram excessivamente o consumidor. 4. A liberdade de contratar é um instituto delimitado pela função social do contrato. Art. 421 do Código Civil de 2002. 5. Em contratos que não previam inicialmente o reajuste do prêmio em razão da mudança de faixa etária, é abusiva a conduta da seguradora que; em razão da alegada redução de sua margem de lucro causada pelo envelhecimento de seu cliente, eleva o preço da renovação do contrato do consumidor idoso, que certamente encontrará dificuldades insuperáveis para contratar um seguro similar com outra companhia. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70024546962, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo Sérgio Scarparo, Julgado em 18/06/2008) TJ/SC REINTEGRAÇÃO DE POSSE – ARRENDAMENTO MERCANTIL – VALOR RESIDUAL GARANTIDO – COBRANÇA ANTECIPADA, CONCOMITANTE ÀS PRESTAÇÕES LOCATÍCIAS – DESCARACTERIZAÇÃO DO CONTRATO PARA COMPRA E VENDA A PRAZO – RECONHECIMENTO DE OFÍCIO – PUBLICIZAÇÃO DO CONTRATO – DESCABIMENTO DO INTERDITO POSSESSÓRIO – CARÊNCIA DE AÇÃO – AUSÊNCIA DO INTERESSE DE AGIR NA MODALIDADE ADEQUAÇÃO – EXTINÇÃO DO PROCESSO – A cobrança antecipada do VRG desfigura o contrato de leasing, transmudando-o em uma compra e venda a prazo, uma vez que, ao arrendatário, não resta alternativa ao final do contrato senão a aquisição do bem. A descaracterização do contrato de arrendamento mercantil pode ser feita de ofício pelo órgão julgador, consoante a teoria da função social do contrato, proclamada pela doutrina e jurisprudência modernas, permitindo ao Estado a intervenção naquele para assegurar a ordem pública através da igualdade entre os contratantes. Uma vez reconhecido o

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desvirtuamento do contrato de leasing para uma compra e venda a prazo, inadequado é o ajuizamento da ação de reintegração de posse pelo arrendante para reaver o bem. Faltando-lhe a posse da coisa, ausente está um dos requisitos para o manejo do interdito, impondo-se a extinção do feito sem julgamento do mérito, com fulcro no art. 267, VI, do CPC, por falta de interesse de agir na modalidade adequação. (TJSC – AC 96.007266-7 – 4ª C.Cív. – Rel. Des. Alcides Aguiar – J. 08.02.2001)

REINTEGRAÇÃO DE POSSE - ARRENDAMENTO MERCANTIL - VALOR RESIDUAL GARANTIDO - COBRANÇA ANTECIPADA, CONCOMITANTE ÀS PRESTAÇÕES LOCATÍCIAS - DESCARACTERIZAÇÃO DO CONTRATO PARA COMPRA E VENDA A PRAZO - RECONHECIMENTO DE OFÍCIO - PUBLICIZAÇÃO DO CONTRATO - DESCABIMENTO DO INTERDITO POSSESSÓRIO - CARÊNCIA DE AÇÃO - AUSÊNCIA DO INTERESSE DE AGIR NA MODALIDADE ADEQUAÇÃO - EXTINÇÃO DO PROCESSO - A cobrança antecipada do VRG desfigura o contrato de leasing, transmudando-o em uma compra e venda a prazo, uma vez que, ao arrendatário, não resta alternativa ao final do contrato senão a aquisição do bem. A descaracterização do contrato de arrendamento mercantil pode ser feita de ofício pelo órgão julgador, consoante a teoria da função social do contrato, proclamada pela doutrina e jurisprudência modernas, permitindo ao Estado a intervenção naquele para assegurar a ordem pública através da igualdade entre os contratantes. Uma vez reconhecido o desvirtuamento do contrato de leasing para uma compra e venda a prazo, inadequado é o ajuizamento da ação de reintegração de posse pelo arrendante para reaver o bem. Faltando-lhe a posse da coisa, ausente está um dos requisitos para o manejo do interdito, impondo-se a extinção do feito sem julgamento do mérito, com fulcro no art. 267, VI, do CPC, por falta de interesse de agir na modalidade adequação. (TJSC - AC 96.007266-7 - 4ª C.Cív. - Rel. Des. Alcides Aguiar - J. 08.02.2001).

TJ/PR DECISÃO MONOCRÁTICA- AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO- CAPITALIZAÇÃO E COMISSÃO DE PERMANÊNCIA- MATÉRIAS JÁ PACIFICADAS- RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. VISTOS e examinados estes autos de Apelação Cível nº 876743-1, do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba - 22ª Vara Cível, em que é Apelante AYMORÉ CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO SA e Apelado JOÃO PAULA PEREIRA GOMES. I Trata-se de recurso de apelação interposto em face de sentença proferida nos autos de Ação de Revisão de Contrato, nº 512/2009 (fls. 117-126), mediante a qual o magistrado de primeiro grau julgou procedente o pedido inicial, para afastar a capitalização dos juros, bem como excluir a incidência cumulativa da comissão de permanência, a ser repetida de forma simples, cujos valores deverão ser apurados em liquidação de sentença, corrigidos monetariamente pelo índice INPC/IGPDI a partir de cada pagamento e acrescido de juros de 1% ao mês, contados a partir da citação. Inconformado, o réu interpôs recurso de apelação às folhas 128, em cujas razões alega, em síntese: a) não existem irregularidades no contrato, não havendo que se falar em revisão de suas cláusulas; b) somente as leis podem restringir a liberdade de contratar; c) é legal a capitalização de juros; d) é legal a cobrança da comissão de permanência, ainda que cumulada com outros

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encargos de mora; e) não há que se falar em repetição do indébito; f) as verbas de sucumbência devem ser revistas. Às folhas 141 o recurso foi recebido em ambos os efeitos, intimando-se a parte contrária, que não apresentou contrarrazões. É o relatório. Decido. II- A sistemática processual vigente estabelece que o Relator poderá dar provimento a recurso quando a decisão estiver em confronto com a jurisprudência de Tribunal Superior, ou mesmo negar seguimento ao recurso, quando este for manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou Jurisprudência dominante de Tribunal Superior, independentemente de manifestação de órgão colegiado (art. 557, caput, e § 1º-A do CPC). É o que se verifica no presente caso. Preliminarmente, no tocante à possibilidade de revisão contratual, e da relativização do princípio do pacta sunt servanda, oportuno observar que o contrato firmado entre as partes é de adesão, ou seja, as cláusulas são previamente redigidas, não oportunizando ao contratante nenhuma discussão sobre seu teor. Por isso, não existe espaço para o consumidor sequer manifestar sua vontade. Portanto, a tese da impossibilidade de revisão dos contratos, não possui respaldo. Assim se manifesta esta Corte: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO GARANTIDO POR ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DFESA DO CONSUMIDOR. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. IMPOSSIBILIDADE DE COBRANÇA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL. SUCUMBÊNCIA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NEGADO SEGUIMENTO (...) a vontade das partes não é mais a única fonte de interpretação que possuem os juizes para interpretar um instrumento contratual. A evolução doutrinária do direito dos contratos já pleiteava uma interpretação teleológica do contrato, um respeito maior pelos interesses sociais envolvidos, pelas expectativas legítimas das partes, especialmente das partes que só tiveram a liberdade de aderir ou não aos termos pré - elaborados." Cabe ponderar no entanto, que o contrato realizado continua vigendo entre as partes, contudo, cada vez que a desigualdade e o desequilíbrio se fizerem presentes, deve o Judiciário agir para estabilizar a relação contratual. Assim, deve o princípio da "pacta sunt servanda" ser relativizado para que se alcance a função social do contrato, com sua efetiva estabilização, permitindo a nulidade das cláusulas entendidas como abusivas. (...) Desse modo, considerando que não há previsão no pacto entabulado entre as partes, a sentença recorrida não merece reparos, vez que nessas condições, não é possível a capitalização de juros, quer mensal, quer anual. Neste sentido decisão desta Corte: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO C/C NULIDADE DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. 1. (...). 2. JUROS CAPITALIZADOS. COBRANÇA. POSSIBILIDADE, EM CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO, DESDE QUE PACTUADA. ART. 28, §1º, DA LEI Nº 10.931/04. 3. (...) (TJPR - 18ª C.Cível - AC 0655104-0 - Ponta Grossa - Rel.: Des. Mário Helton Jorge - - J. 28.04.2010. - Da aplicação do Código de Defesa do Consumidor Dando continuidade, cabe salientar que o caso envolve relação de consumo, conforme jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça, como se observa de sua Súmula n° 297: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras." Assim, considerando que o artigo 6.º, inciso V, do Código de Defesa do Consumidor permite a revisão e modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais entre as partes, relativiza-se, pois, o princípio da pacta sunt servanda a fim de assegurar a real concretização dos conceitos norteadores do equilíbrio da relação contratual. Dessa maneira, havendo qualquer situação que deixe o consumidor em desvantagem perante as instituições

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financeiras, não só pode como deve o Poder Judiciário intervir nessa relação, anulando as cláusulas tidas por abusivas, desde que a parte tenha se insurgido em relação ao contrato. E, de fato, tendo em vista que os contratos de financiamento foram firmados única e exclusivamente com a finalidade de saldar débitos da apelada, não há como se admitir que não exista, entre as partes, relação amparada pelo CDC, já que o a empresa apelada não buscou crédito junto à instituição financeira porque pretendia utilizar do financiamento para incremento de sua atividade, muito antes pelo contrário. "(...) I - A relação de consumo existe apenas no caso em que uma das partes pode ser considerada destinatária final do produto ou serviço. Na hipótese em que produto ou serviço são utilizados na cadeia produtiva, e não há considerável desproporção entre o porte econômico das partes contratantes, o adquirente não pode ser considerado consumidor e não se aplica o CDC, devendo eventuais conflitos serem resolvidos com outras regras do Direito das Obrigações. Precedentes. II - Não configurada a relação de consumo, não se pode invalidar a cláusula de eleição de foro com base no CDC. III - Recurso Especial improvido. (REsp 836.823/PR, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/08/2010, DJe 23/08/2010). AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE. EMBARGOS Á EXECUÇÃO. PESSOA JURÍDICA. CONSUMIDOR EQUIPARADO. APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. POSSIBILIDADE DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJPR - 14ª C.Cível - AI 853878- 1 - Foro Regional de Campina Grande do Sul da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba - Rel.: Celso Jair Mainardi - Unânime - J. 01.02.2012) . Assim, resta comprovada a existência de relação de consumo entre as partes, já que os valores buscados pela apelada não tiveram a finalidade de fomentar sua atividade laboral, mas sim regularizar sua situação financeira. O recorrente, em suas razões, alega a legalidade da cobrança de juros capitalizados. Entretanto, equivoca-se o apelante. A constitucionalidade da MP a qual se refere o advogado, em suas argumentações, não pode servir como supedâneo jurídico, já que está sendo discutida na ADIn sob nº 2.316-1/DF. E, não obstante a medida cautelar pleiteada na ADIn ainda esteja pendente de julgamento, a colenda Corte Especial do extinto Tribunal de Alçada do Estado do Paraná já havia se manifestado em um caso concreto sobre a inconstitucionalidade da Medida Provisória que autorizou a capitalização mensal de juros. Confira-se: "INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. APELAÇÃO CÍVEL. RELATORIA. ARGUIÇÃO EX OFFICIO. ORGÃO FRACIONÁRIO DA 10.ª VARA CÍVEL. MEDIDA PROVISÓRIA N.º 2087-30/01. EDITADA PARA PERMITIR CAPITALIZAÇÃO DE JUROS NOS CONTRATOS DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS COM PERIODICIDADE INFERIOR A UM ANO. ACÓRDÃO DE ACOLHIMENTO. CONTROLE INCIDENTAL OU DIFUSO. CORTE ESPECIAL. JULGAMENTO COMPLEXO POR DOIS ÓRGÃOS JURISDICIONAIS. MEDIDA PROVISÓRIA. REQUISITOS. URGÊNCIA E RELEVÂNCIA. INOCORRÊNCIAS. APRESSAMENTO E INTERESSE PÚBLICO RELEVANTE NÃO CONFIGURADOS. ACOLHIMENTO DO INCIDENTE (MAIORIA) PARA DECLARAR, EM TESE, A INCONSTITUCIONALIDADE DO ATO PRESIDENCIAL PARA O CASO CONCRETO, SEM EFICÁCIA ERGA OMNES." (Incidente de Inconstitucionalidade 264940-7/01. Relator: Des. Edson Vidal Pinto. Publicado no Diário da Justiça em 26/08/2005). Ressalte-se que, afora isso, se exige previsão expressa, notória e clara da incidência da capitalização mensal de juros, de modo a garantir que o contratante tenha plena ciência do encargo contratado, sendo insuficiente, para tanto, a mera referência à taxa mensal e anual de juros. Confira-se,

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nesse sentido, os seguintes julgados do Superior Tribunal de Justiça: "Não é suficiente que a capitalização mensal de juros tenha sido pactuada, sendo imprescindível que tenha sido de forma expressa, clara, de modo a garantir que o contratante tenha a plena ciência dos encargos acordados; no caso, apenas as taxas de juros mensal simples e anual estão, em tese, expressas no contrato, mas não a capitalizada." (AgRg no REsp nº 895.424/RS, Relator Ministro Hélio Quaglia Barbosa, 4ª Turma, j. 07.08.07) "A capitalização de juros deve ser prevista de modo expresso no contrato, porque em relação ao consumidor não valem as cláusulas implícitas." (AgRg no Ag nº 875.067/PR, Relator Ministro Ari Pargendler, 3ª Turma, j. 06.12.07). Com efeito, é direito básico do consumidor "a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem" (CDC, art. 6º, III). No caso, inexiste cláusula contratual prevendo a cobrança de juros remuneratórios capitalizados. Portanto, a prática do chamado anatocismo é vedada no nosso ordenamento pátrio, e deve ser expurgada do contrato, devendo os juros serem aplicados na forma simples. Assim sendo, a sentença recorrida não merece reforma neste tópico. Sustenta o apelante que a comissão de permanência não é ilícita quando cumulada com outros encargos de mora. Contudo, não lhe assiste razão. Sobre a cobrança da comissão de permanência, realmente consolidou-se entendimento de que é válida a cláusula que a prevê para o período de inadimplência, porém, desde que não cumulada com juros remuneratórios ou moratórios, correção monetária ou multa contratual, sob pena de caracterizar-se verdadeiro bis in idem (Súmulas 30 e 296, do STJ), conforme inteligência da Súmula nº 294, do STJ, in verbis: "Não é potestativa a cláusula contratual que prevê a comissão de permanência, calculada pela taxa medida de mercado apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada à taxa do contrato." Este Tribunal segue a orientação: "APELAÇÕES CÍVEIS - AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL - ARRENDAMENTO MERCANTIL. APELAÇÃO Nº 01 - PRETENSÃO DO BANCO DE SER POSSÍVEL A COBRANÇA CUMULADA DA COMISSÃO DE PERMANÊNCIA COM OUTROS ENCARGOS DA MORA - DESCABIMENTO - MATÉRIA SUMULADA PELO STJ. RECURSO DESPROVIDO APELAÇÃO Nº 02 - CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS INOCORRENTE - CONTRATO QUE PREVÊ O PAGAMENTO DE CONTRAPRESTAÇÕES FIXAS - PRETENSÃO DE DESCARACTERIZAÇÃO DO LEASING PELA COBRANÇA DO VRG - DESCABIMENTO - MATÉRIA JÁ SUMULADA PELO STJ - COBRANÇA ABUSIVA DE TAXAS EVIDENCIADA - EXPURGO DAS MESMAS, COM REALIZAÇÃO DE CÁLCULO DO VALOR DAS PARCELAS E RESTITUIÇÃO DO VALOR COBRADO A MAIOR, OU COMPENSAÇÃO COM EVENTUAL DÉBITO - RECONHECIMENTO DA SUCUMBÊNCIA RECIPROCA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO". (TJPR Apelação Cível nº 733.382-2 18ª Câmara Cível Relator: Roberto de Vicente Julgamento: 23/03/2011). "(...) APELAÇÃO Nº 2: COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. COBRANÇA ADMITIDA DESDE QUE NÃO CUMULADA COM OUTROS ENCARGOS MORATÓRIOS. LETRA DE CÂMBIO. VIOLAÇÃO AO ART. 51, IV, CDC. DISTRIBUIÇÃO DA SUCUMBÊNCIA MANTIDA. APELO Nº1 DESPROVIDO. APELO Nº 2 PARCIALMENTE PROVIDO. (...) 3. As Súmulas 30 e 296 do STJ vedam a cobrança cumulativa da comissão de permanência com outros encargos moratórios. 4. É nula a cláusula contratual em que o devedor autoriza o credor a sacar, para cobrança, título de crédito representativo de qualquer quantia em atraso. Isto porque tal cláusula não se coaduna com o contrato de mandato, que pressupõe a inexistência de conflitos entre

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mandante e mandatário. Precedentes (REsp 504.036/RS e AgRg Ag 562.705/RS)". (TJPR Apelação Cível 731.563-9 17ª Câmara Cível Relator Lauri Caetano da Silva Julgamento: 09/03/2011). Contudo, esta Corte adotou recentemente a orientação da 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça que consolidou o entendimento no sentido de que o valor cobrado a título de comissão de permanência não poderá exceder a somatória dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato. Assim, com o intuito de preservar a vontade das partes no momento da celebração do contrato, deverá ser mantida a cobrança da comissão de permanência, desde que limitada à somatória dos valores acima mencionados. Neste sentido confira-se: (...) 3. A importância cobrada a título de comissão de permanência não poderá ultrapassar a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato, ou seja: a) juros remuneratórios à taxa média de mercado, não podendo ultrapassar o percentual contratado para o período de normalidade da operação; b) juros moratórios até o limite de 12% ao ano; e c) multa contratual limitada a 2% do valor da prestação, nos termos do art. 52, § 1º, do CDC. 4. Constatada abusividade dos encargos pactuados na cláusula de comissão de permanência, deverá o juiz decotá-los, preservando, tanto quanto possível, a vontade das partes manifestada na celebração do contrato, em homenagem ao princípio da conservação dos negócios jurídicos consagrado nos arts. 139 e 140 do Código Civil alemão e reproduzido no art. 170 do Código Civil brasileiro. 5. A decretação de nulidade de cláusula contratual é medida excepcional, somente adotada se impossível o seu aproveitamento. 6. Recurso especial conhecido e parcialmente provido". (destaquei). (STJ - REsp 1.058.114/RS Relator Ministro João Otávio de Noronha - Publicação: DJe 16/11/2010). "APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. RECURSO ESPECIAL. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. ART. 543-C, § 7, II, DO CPC. LEGALIDADE. CUMULAÇÃO DE JUROS REMUNERATÓRIOS, MORATÓRIOS E MULTA. EXCLUSÃO DOS DEMAIS ENCARGOS. STJ. QUESTÃO REPETITIVA. RESP 1.058.114/RS. RECURSO PARCIALMENTE ACOLHIDO. 1. No exame do REsp 1.058.114/RS, submetido ao rito do art. 543-C, do Código de Processo Civil, julgado em 12/08/2009 (DJe de 16/11/2010), a Segunda Seção do STJ, definiu que a comissão de permanência quanto pactuada, deve ser mantida no contrato, excluindo-se apenas eventuais excessos verificados por conta de cumulações indevidas, primando-se pelo aproveitamento da estipulação das partes. 2. A incidência da comissão de permanência fica limitada pela somatória: 1) da taxa dos juros remuneratórios pactuados, para o período de normalidade, quando não, calculados pela taxa média de mercado, inclusive quando aqueles se mostrarem abusivos; 2) com juros moratórios, no limite legal; e 3) multa moratória, incidente sobre o capital (prestação) (REsp 1.058.114/RS). 3. Apelação parcialmente provida em sede de retratação, frente a Recurso Especial interposto". (destaquei). (TJPR Apelação Cível nº 519.272-5 17ª Câmara Cível Relator Francisco Jorge Julgamento: 15/06/2011). Portanto, é possível a cobrança da comissão de permanência durante o período do inadimplemento contratual, como forma de remunerar o capital e atualizar o seu valor, desde que não cumulada com correção monetária, juros remuneratórios, juros moratórios ou multa contratual e, ainda, desde que limitada à somatória dos encargos moratórios e remuneratórios previstos no contrato, devendo a sentença de primeiro grau ser reformada apenas nesta parte. No tocante ao tópico da sentença que condenou a instituição à restituição dos valores pagos a mais, tal determinação deve prosperar. Conveniente enfatizar que é admissível a repetição do indébito/compensação de valores pagos, em virtude de cláusulas ilegais, em razão

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do princípio que veda o enriquecimento injustificado do credor. Apenas a título de argumentação, cumpre frisar que se o autor pretendesse que a instituição financeira fosse condenada a restituir em dobro o que foi pago indevidamente, tal pretensão não possuiria amparo legal, tendo em vista que não há que se falar em má fé por parte da apelante, tendo em vista que efetuou cobranças baseadas em contrato pactuado de livre e espontânea vontade pelas partes. A regra disposta no parágrafo único, do art. 42, do Código de Defesa do Consumidor, com efeito, trata-se de preceito inspirado no então art. 1.531 do Código Civil/16 (repetido no art. 940 do atual Código Civil), vigente quando da edição da Súmula nº 159, pelo Supremo Tribunal Federal: "Cobrança excessiva, mas de boa-fé, não dá lugar às sanções do art. 1.531 do Código Civil." A respeito, preconiza WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO (Curso de Direito Civil. v. 5, São Paulo: Saraiva, 2.003, p. 478): "Há expressiva jurisprudência pela qual a vítima deve provar a malícia ou dolo do autor da ação, sob pena de não serem aplicadas as penas naqueles dispositivos cominadas, tendo sido editada a Súmula n. 159 do Supremo Tribunal Federal, pela qual a cobrança excessiva, se de boa-fé, não dá lugar às sanções previstas no atual art. 940, correspondente ao art. 1531 do Código Civil de 1916." Destarte, eventual restituição/compensação em dobro não se justifica, tendo em conta a falta de comprovação da má-fé do apelado, até porque os encargos, que decorriam de expressa previsão contratual, foram considerados ilegais após serem objeto de controvérsia judicial. Confira-se, nesse sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: "A repetição será na forma simples quando não existir má-fé do credor ou o encargo tenha sido objeto de controvérsia judicial." (AgRg no Ag nº 947.169/RJ, Relator Ministro Humberto Gomes de Barros, 3ª Turma, j. 03.12.07) Oportuno salientar, que, merecendo diminuta reforma a sentença de primeiro grau, não há que se falar em alteração do ônus da sucumbência. III - Em face do exposto, com fundamento no artigo 557 caput, e § 1º A do Código de Processo Civil, dou provimento ao recurso interposto apenas para determinar que a comissão de permanência seja aplicada de forma isolada, limitada à somatória dos encargos moratórios e remuneratórios previstos no contrato, excluindo-se os demais encargos de mora, negando-lhe seguimento nos demais tópicos. IV - Intimem-se. Curitiba, 04 de abril de 2012. JOSÉ CARLOS DALACQUA Relator