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231 REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 56(4): 231-236, out. dez. 2003 Valmir da Silva Souza et al. Resumo O complexo granítico de Massangana, localizado na região central de Rondônia, sudoeste do Cráton Amazô- nico, Brasil, é um importante exemplo da Província Esta- nífera de Rondônia. Esse complexo possui dimensões batolíticas, marcantes estruturas anelares relacionadas às sucessivas fases magmáticas e hospeda mineraliza- ções de Sn, W, Nb, Ta, topázio e berilo associadas a peg- matitos. Esse trabalho apresenta a composição química e as condições mínimas de aprisionamento dos fluidos nos cristais de topázio encontrados no complexo granítico estanífero de Massangana. O topázio, de cor azul, apre- senta qualidade gemológica e possui cinco grupos de inclusões fluidas de natureza H 2 O-NaCl, cuja salinidade equivalente varia de 3,4 a 11,7% em peso de NaCl, densi- dade em torno de 0,75g/cm 3 e temperatura de homogenei- zação total (Th) entre 320 e 350 o C. Devido à íntima asso- ciação do topázio com cassiterita, wolframita e columbi- ta-tantalita nos corpos pegmatíticos, admite-se que esse intervalo de Th também corresponda ao intervalo mínimo de cristalização desses outros minerais metálicos. Consi- derando que os pegmatitos no complexo granítico de Massangana estão associados às últimas fases magmáti- cas, é provável que a profundidade de posicionamento desses corpos pegmatíticos seja inferior a 3 km e a uma pressão estimada entre 1 e 1,5 kbar. Palavras-chave: complexo granítico de Massangana, to- pázio gemológico, inclusões fluidas, Roraima. Abstract The Massangana granitic complex, located in the central region of the State of Rondônia, State, southwestern of the Amazon craton, Brazil, is an important example of the Rondônia Tin Province. The complex represents a batholitic body with conspiscuous ring structures related to successive intrusion events hosting Sn, W, Nb, Ta, topaz and beryl mineralizations associated to pegmatite. In this paper we determine the chemical composition and the minimal conditions of capture of the fluids in topaz from the Massangana granitic complex. The blue topaz has gemological quality and presents five groups of H 2 O-NaCl fluid inclusions, with salinity between 3,4 to 11,7% weight % NaCl equivalent, density about 0,75g/cm 3 and homogenization temperature between 320 to 350 o C. The close association of topaz with cassiterite, wolframite and columbite-tantalite in pegmatites suggests the same minimal homogenization temperature for the crystallization of the mentroned metalic minerals. The pegmatitic bodies in the Massangana Complex are associated with the last magmatic phases and their probable emplacement depth is less than 3 km corresponding to an estimated pressure between 1 to 1,5 kbar. Keywords: Massangana granitic complex, gemological topaz, fluid inclusions, Roraima. Inclusões fluidas em topázio do Complexo Granítico Estanífero de Massangana (RO) Valmir da Silva Souza Professor do Departamento de Geociências da Universidade do Amazonas E-mail: [email protected] Rodrigo Malheiros Pontes Bolsista do Programa de Iniciação Científica do CNPq do Curso de Geologia da Universidade de Brasília E-mail: [email protected] Márcia Abrahão Moura Professora do Instituto de Geociências da Universidade de Brasília E-mail: [email protected] Geociências

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Valmir da Silva Souza et al.

ResumoO complexo granítico de Massangana, localizado na

região central de Rondônia, sudoeste do Cráton Amazô-nico, Brasil, é um importante exemplo da Província Esta-nífera de Rondônia. Esse complexo possui dimensõesbatolíticas, marcantes estruturas anelares relacionadasàs sucessivas fases magmáticas e hospeda mineraliza-ções de Sn, W, Nb, Ta, topázio e berilo associadas a peg-matitos. Esse trabalho apresenta a composição química eas condições mínimas de aprisionamento dos fluidos noscristais de topázio encontrados no complexo graníticoestanífero de Massangana. O topázio, de cor azul, apre-senta qualidade gemológica e possui cinco grupos deinclusões fluidas de natureza H

2O-NaCl, cuja salinidade

equivalente varia de 3,4 a 11,7% em peso de NaCl, densi-dade em torno de 0,75g/cm3 e temperatura de homogenei-zação total (Th) entre 320 e 350oC. Devido à íntima asso-ciação do topázio com cassiterita, wolframita e columbi-ta-tantalita nos corpos pegmatíticos, admite-se que esseintervalo de Th também corresponda ao intervalo mínimode cristalização desses outros minerais metálicos. Consi-derando que os pegmatitos no complexo granítico deMassangana estão associados às últimas fases magmáti-cas, é provável que a profundidade de posicionamentodesses corpos pegmatíticos seja inferior a 3 km e a umapressão estimada entre 1 e 1,5 kbar.

Palavras-chave: complexo granítico de Massangana, to-pázio gemológico, inclusões fluidas, Roraima.

AbstractThe Massangana granitic complex, located in the

central region of the State of Rondônia, State,southwestern of the Amazon craton, Brazil, is animportant example of the Rondônia Tin Province. Thecomplex represents a batholitic body with conspiscuousring structures related to successive intrusion eventshosting Sn, W, Nb, Ta, topaz and beryl mineralizationsassociated to pegmatite. In this paper we determine thechemical composition and the minimal conditions ofcapture of the fluids in topaz from the Massanganagranitic complex. The blue topaz has gemologicalquality and presents five groups of H

2O-NaCl fluid

inclusions, with salinity between 3,4 to 11,7% weight% NaCl equivalent, density about 0,75g/cm3 andhomogenization temperature between 320 to 350oC. Theclose association of topaz with cassiterite, wolframiteand columbite-tantalite in pegmatites suggests the sameminimal homogenization temperature for thecrystallization of the mentroned metalic minerals. Thepegmatitic bodies in the Massangana Complex areassociated with the last magmatic phases and theirprobable emplacement depth is less than 3 kmcorresponding to an estimated pressure between 1 to1,5 kbar.

Keywords: Massangana granitic complex, gemologicaltopaz, fluid inclusions, Roraima.

Inclusões fluidas em topázio do ComplexoGranítico Estanífero de Massangana (RO)

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Geociências

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Inclusões fluidas em topázio do Complexo Granítico Estanífero de Massangana (RO)

1. IntroduçãoO complexo granítico estanífero de

Massangana está localizado na regiãocentral de Rondônia, distante cerca de220km ao sul da capital Porto Velho (Fi-gura 1). Essa região abriga os principaisdepósitos de estanho da Província Esta-nífera de Rondônia e foi alvo de intensaatividade de mineração por cerca de 40anos (Dall’Igna, 1996). Atualmente, de-

vido ao baixo preço do estanho no mer-cado internacional, apenas poucos ga-rimperiros atuam na área do complexogranítico de Massangana, extraindo prin-cipalmente topázio e um pouco de cassi-terita ao longo de pequenos aluviões. Otopázio é comercializado como gema eseu jazimento primário está associado acorpos pegmatíticos, os quais foram, emgrande parte, erodidos e transportadospara os aluviões.

Esse trabalho objetiva caracterizara composição química e as condiçõesmínimas de aprisionamento dos fluidosnos cristais de topázio encontrados nocomplexo granítico estanífero de Mas-sangana. A metodologia de trabalho en-volveu estudos petrográfico e microter-mométrico em quatro seções polidas emambas as faces. No estudo microtermo-métrico utilizou-se a platina Chaixmecamodelo 871 do Laboratório de Inclusões

Figura 1 - Distribuição dos principais depósitos de estanho na Província Estanífera de Rondônia, destacando o mapa geológico doComplexo Granítico de Massangana (Bettencourt & Dall’Agno, 1995).

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Fluidas do Instituto de Geociências daUniversidade de Brasília (IG-UnB). Oequipamento foi calibrado utilizando-seinclusões fluidas sintéticas, com preci-são variando de ±1ºC para resfriamentoaté -100ºC e de ±5ºC para aquecimentoaté 350ºC, com velocidade de aquecimen-to de cerca de 1ºC por minuto. Duas in-clusões fluidas foram ainda submetidasà análise por espectroscopia micro-Ra-man no Instituto de Física da Universi-dade Federal de Minas Gerais.

2. Contextogeológico

O complexo granítico de Massan-gana é um dos principais representantesdos chamados Granitos Jovens de Ron-dônia (Kloosterman, 1967 e 1968). Pos-sui dimensões batolíticas e se destacanas imagens de satélite e fotografias aé-reas pelo seu formato elíptico e alonga-do na direção ESE-WNW, contendo es-truturas anelares relacionadas às suces-sivas fases magmáticas que constituema história evolutiva desse batólito(Kloosterman, 1967 e 1968; Warghorn,1974; Isotta et al., 1978). Romanini (1982)caracterizou quatro fases magmáticas,denominando-as de Massangana, BomJardim, São Domingos e Taboca (Figura1). A fase Massangana é a principal emais antiga, com idade U-Pb em zircãode 991±14Ma (Bettencourt et al., 1999),sendo constituída por um biotita granitocálcio-alcalino a alcalino, de cor rosa-cla-ro, com textura porfirítica média a grossae contendo megacristais de feldspatopotássico. As fases Bom Jardim e SãoDomingos são intrusivas na fase Mas-sangana, apresentam idade Rb-Sr em ro-cha total da ordem de 956±9Ma, com ra-zão inicial 87Sr/86Sr de 0,7104±0,0056(Priem et al., 1989), sendo representadaspor dois stocks de biotita granito de com-posição alcalina, exibindo cor rosa-cla-ro, textura inequigranular fina a média econtendo xenólitos de diferentes tiposde rochas. A fase Taboca é consideradamais jovem, pois é intrusiva na fase BomJardim e é representada por apófises sie-níticos a quartzo-sieníticas, com texturainequigranular fina a média, também con-tendo xenólitas das rochas encaixantes.

Os depósitos de estanho no com-plexo granítico Massangana estão rela-cionados às fases Bom Jardim e SãoDomingos, com a cassiterita associada aveios de quartzo, greisens e corpos peg-matíticos, normalmente contendo wolfra-mita, berilo, topázio e columbita-tantali-ta (Romanini, 1982; Bettencourt &Dall’Agnol, 1995; Bettencourt et al.,1997). Os cristais de topázio comerciali-zados como gemas ocorrem nas zonasintermediária e central dos corpos peg-matíticos heterogêneos, normalmenteassociados a berilo, cassiterita, wolfra-mita e columbita-tantalita. Esses cris-tais de topázio são euédricos, de hábi-to prismático com terminações pirami-dais, com tamanho entre 3 e 12cm, sãopouco fraturados, transparentes atranslúcidos e apresentam cor varian-do de azul, amarelo a incolor.

3. Inclusões fluidasO estudo de inclusões fluidas foi

realizado em cristais de topázio azul, de-vido ao seu maior interesse comercialcomo uso gemológico (Figura 2A) e porapresentar um número mais representa-tivo de grupos de inclusões fluidas (Fi-gura 2B a 2F).

A observação petrográfica à tem-peratura ambiente (±25ºC), com base namorfologia, número e volume de fasesenvolvidas no sistema fluido, permitiuidentificar cinco grupos de inclusões flui-das de natureza aquosa, sendo quatrogrupos com características de inclusõesfluidas primárias e um grupo com carac-terística de inclusões fluidas pseudo-se-cundárias. Os grupos de inclusões flui-das primárias (L

1, L

2, S

1 e S

2) ocorrem,

normalmente, nas partes mais centraisdos cristais de topázio, distribuídos em

Figura 2 - Amostras de cristais de topázio gemológico (A) e característicasmorfológicas das suas diferentes famílias de inclusões fluidas: família L1 (B), família L2

(C), família L3 (D), família L4 (E) e família L5 (F).

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grupos e/ou alinhados ao longo de pla-nos de crescimento do cristal, enquantoque as inclusões fluidas pseudo-secun-dárias (L

3) tendem a ocorrer nas bordas

dos cristais, distribuídas de modo alea-tório.

O grupo L1 é do tipo bifásico, pois

apresenta uma fase líquida e uma fasegasosa, exibe formato em bastonete comtamanho entre 20 e 40µm, é transparentea levemente rosada, com contornos fi-nos e o volume da fase gasosa (Vg) emrelação à fase líquida variando de 40 a50% (Figura 2B). Ocasionalmente, con-tém uma fase sólida de cor preta, hábitogranular e tamanho inferior a 1µm, a qualé interpretada como provável agregadomineral capturado durante a formação dacápsula hospedeira de fluidos e gases.

O grupo L2 é do tipo bifásico e é o

mais freqüente. Apresenta formato elíp-tico a levemente prismático, ocasional-mente como cristal negativo, seu tama-

Figura 3 - Espectros de Raman para a fase aquosa (A) e gasosa (B) do sistema H2O-NaCl-(KCL). Histograma com o intervalo detemperatura de fusão do gelo (C) e com o intervalo de tempertura de homogeneização total (D).

nho varia de 2 a 8µm, é transparente atranslúcido, com contornos mais gros-sos e bem definidos, e Vg variando de 40a 50% (Figura 2C).

O grupo S1 é raro, apresenta a mes-

ma morfologia e Vg das inclusões flui-das do grupo L

1, porém é constituído de

inclusões fluidas trifásicas, pois apre-sentam uma terceira fase representadapor um sólido de saturação incolor, dehábito cúbico e isótropo, interpretadocomo um sal do tipo halita, o qual ocupaum volume (Vs) em torno de 3% da in-clusão fluida (Figura 2D).

O grupo S2 é do tipo trifásico e é o

mais raro, apresenta formato elíptico alevemente prismático, tamanho entre 4 e8µm, um Vg entre 50 e 60% e uma fasesólida de saturação com Vs inferior a 3%(Figura 2E).

O grupo L3 é constituído por inclu-

sões fluidas bifásicas e é pouco freqüen-

te. São consideradas como inclusões flui-das pseudo-secundárias por exibir for-mato irregular e tamanho variando de 40a 90µm. Essas inclusões fluidas sãotransparentes, com contornos finos e Vgentre 20 e 30% (Figura 2F).

A observação microtermométricapermitiu caracterizar esse sistema fluidocomo do tipo H

2O-NaCl, o que foi com-

provado por meio da espectroscopia mi-cro-Raman (Figuras 3A e 3B). Durante oresfriamento das inclusões fluidas (até-120ºC), o sistema fluido apresenta umintervalo de congelamento total entre-70 e -80ºC. Já durante o processo deaquecimento (até +360ºC), esse sistemafluido apresenta a primeira mudança defase entre -24,2º e -18,6ºC, correspondenteà temperatura do eutético (Te), a qual éuma medida pouco precisa e muitas ve-zes de difícil observação. SegundoShepherd et al. (1985), o intervalo de tem-peratura do eutético para o sistema flui-

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do H2O-NaCl varia de -21,2º a -20,8ºC. A

segunda mudança de fase, correspon-dente à temperatura de fusão do gelo(Tfg), ocorre no intervalo de -8º a -2ºC(Figura 3C), sendo que para as inclusõesfluidas L

3 a Tfg = -3,8º a -2ºC, para L

1 a

Tfg = -6,8 a -3,6oC e para L2 a Tfg = -8

a -5,3ºC . A temperatura de homogenei-zação total (Th) nas inclusões fluidas L

1,

L2 e L

3 ocorre para a fase líquida no inter-

valo de 320 a 350ºC, porém com maiorfreqüência entre 330 e 340º C (Figura 3D).Nos casos das inclusões fluidas conten-do sólidos de saturação (S

1 e S

2), a fase

sólida apresenta temperatura de disso-lução (Tds) logo após a temperatura dehomogeneização das fases líquida-gaso-sa (L+G=L), ou seja, no intervalo entre345 a 350ºC (Figura 3D).

A salinidade do sistema H2O-NaCl,

para as inclusões fluidas bifásicas (L1, L

2

e L3), foi calculada com base na tempera-

tura de fusão do gelo (Tfg), aplicando-se a equação proposta por Bodnar (1993),onde se obteve um intervalo de salinida-de equivalente de 3,4 a 11,7% em pesode NaCl, distribuído no seguinte modo:inclusões fluidas L

3 entre 3,4 e 6,1%, L

1

entre 6 a 10,2% e L2 entre 8,3 e 11,7% em

peso de NaCl equivalente. Para as rarasinclusões fluidas trifásicas (S

1 e S

2), a

salinidade foi calculada com base na tem-peratura de dissolução da fase sólida(Tds), aplicando-se a equação propostapor Sterner et al. (1988), onde se obteveuma salinidade equivalente entre 42 e42,5% em peso de NaCl. A densidadedas inclusões fluidas mais comuns (L

1 e

L2), estimada com base no diagrama que

relaciona salinidade por temperatura dehomogeneização total (Shepherd et al.1985), apresenta um valor entre 0,65 e0,75 g/cm3.

4. Consideraçõesfinais

Em geral, nos corpos graníticosportadores de pegmatitos com minerali-zações de Sn, W, Nb, e Ta e gemas, ossistemas fluidos são aquosos a aquo-carbônicos, apresentam baixa a modera-da salinidade, baixa densidade e tempe-ratura mínima de aprisionamento entre

350 e 500ºC (Campbell & Panter, 1990;Linnen & Williams-Jones, 1994; Lu &Lottermoser, 1997). Estudos de inclusõesfluidas em quartzo, topázio, fluorita ecassiterita nos sistemas de veios e grei-sens de outros depósitos de Sn e W naregião central de Rondônia demonstramque a temperatura mínima de aprisiona-mento desses fluidos varia de 270 a 420ºC(Souza & Botelho, 2002; Leite Júnior,2002).

No complexo granítico estanífero deMassangana, o sistema fluido no topá-zio, com características gemológicas, éde natureza essencialmente aquosa(H

2O-NaCl). Entretanto esse sistema

apresenta salinidade variando de baixa aalta, ou seja, nas inclusões fluidas bifá-sicas (L

1, L

2 e L

3) a salinidade equivalen-

te varia de 3,4 a 11,7% em peso de NaCl,enquanto que nas raras inclusões flui-das trifásicas (S

1 e S

2) a salinidade equi-

valente varia de 42 a 42,5% em peso deNaCl. Essa variação no valor da salini-dade é indicativa da provável mistura defluidos de diferentes naturezas (por exem-plo, magmático e meteórico) durante aascensão do sistema fluido associado àsfases Bom Jardim e São Domingos, mo-dificando desse modo a salinidade dosfluidos mais primordiais, provavelmenterepresentados pelas inclusões fluidas S

1

e S2. Entretanto o modo de distribuição

dos grupos de inclusões fluidas no inte-rior dos cristais de topázio sugere umavariação nos valores de salinidade, detemperatura de homogeneização (Th) ede cronologia das inclusões fluidas, re-flexo dos estágios progressivos de cres-cimento dos cristais. Nesse sentido, osprimeiros grupos de inclusões fluidasformados apresentam os maiores valo-res de salinidade e Th (L

1, L

2, S

1 e S

2) e

ocupam as partes mais centrais dos cris-tais, ao contrário do grupo de inclusõesfluidas pseudo-secundário (L

3) conside-

radas mais jovens e apresentando valo-res mais baixos de salinidade e Th. To-davia, o contraste entre os valores deTh para os grupos de inclusões fluidasprimárias e pseudo-secundárias não étão marcante, o que sugere que a tempe-ratura no interior dos corpos pegmatíti-cos permaneceu elevada por um consi-derável período de tempo.

Com base nos critérios propostospor Van den Kerkhof e Hein (2001), essesistema fluido apresenta característica deaprisionamento homogêneo, pois seuvolume Vg varia muito pouco, tanto nasinclusões fluidas primárias, como naspseudo-secundárias, o que demonstratambém baixa variação na densidade des-se fluido. Logo, a temperatura de ho-mogeneização total aqui apresentada(Tht = 320 e 350ºC) pode ser considera-da como a temperatura mínima de aprisi-onamento desse fluido. Devido à íntimaassociação nos corpos pegmatíticos dotopázio com cassiterita, wolframita e co-lumbita-tantalita, admite-se que o inter-valo de temperatura entre 320 e 350ºCtambém corresponderia ao intervalo mí-nimo de cristalização desses outros mi-nerais metálicos. Assim, é provável queo principal intervalo mínimo de tempera-tura de precipitação da cassiterita nosdepósitos de estanho de Rondônia os-cile na faixa de 300 a 400ºC.

Os complexos graníticos com estru-turas anelares são, normalmente, aloja-dos em níveis crustais rasos e ao longode falhamentos transcrustais (Johson etal., 2002). Segundo Okida (2001), os Gra-nitos Jovens de Rondônia foram aloja-dos em estruturas de alívio ao longo delinhas de fraquezas crustais, através daatuação de movimentos progressivostranspressivos-transtensivos. Conside-rando que os corpos pegmatíticos por-tadores de minerais de Sn, W, Nb, e Ta egemas no complexo granítico estaníferode Massangana estão associados às úl-timas fases magmáticas (Bom Jardim eSão Domingos), é provável que a pro-fundidade de posicionamento dessescorpos seja inferior a 3 km e a uma pres-são estimada na ordem de 1 a 1,5kbar.

5. AgradecimentosÀ Companhia de Pesquisa e Recur-

sos Minerais (CPRM-RO), através dosgeólogos Rommel da Silva Sousa, Mar-cos Quadros, Jânio Leite de Amorim (inmemorian) e Antônio Vieira, pelo apoioe discussões durante as atividades decampo. Ao Prof. Dr. Kazuo Fuzikawa (La-boratório de Inclusões Fluidas do CDTN-CNEN) pelo apoio e discussões duran-tes as análises de micro-Raman.

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Inclusões fluidas em topázio do Complexo Granítico Estanífero de Massangana (RO)

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Artigo recebido em 10/04/2003 eaprovado em 02/12/2003.

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