Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho a Casa Do Penhasco(1)

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A casa do penhascoEste livro foi digitalizado por Katia Oliveira, e corrigido em Maro de2002.Se voc gosta de obras no mesmo estilo, escreva [email protected] prazer em atende-lo se possvel.]Vera Lcia Marinzeck deCarvalhoII editoraRua Atua, 383 -Vila Esperana/PenhaCEP 03646-000 - So Paulo - SPFone: (0XX11) 6684-6000Endereo para correspondncia:Caixa Postal 67545 - Ag. Almeida Lima03 102.970 - So Paulo - SPwww.petit.com.br [email protected] do EspritoAntnio CarlosPsicografado pela mdiumOutros livros psicografados pela mdium Vera Lcia Marinzeck de Carvalho:Com o esprito Antnio Carlos- Reconciliao- Cativos e Libertos- Copos que Andam- Filho Adotivo- Reparando Erros- A Manso da Pedra Torta- Palco das Encarnaes- Aconteceu- Muitos so os Chamados- O Talism Maldito- Aqueles que Amam- O Dirio de Luizinho (infantil)- Novamente Juntos Com o esprito Patrcia- Violetas na Janela- Vivendo no Mundo dos Espritos- A Casa do Escritor- O Vo da GaivotaCom o esprito Rosngela- Ns, os Jovens- A Aventura de Rafael (infantil)O Sonho de Patrcia (infantil) Com o esprito Jussara- CaboclaCom espritos diversos- Valeu a Pena!- Perante a Eternidade- Deficiente Mental: Por que Fui Um?Livros em outros idiomas- Violetas eu la Ventana- Violets by my Window- ReconciliacinA Vanessa, minha filha, com todo meu amorde me.Vera.Primavera de 2000.sumrio1 A Mudana 92 Osvaldo 223 Apavorando Henrique 324 Acontecimentos Desagradveis 445 A Histria Real 566 Orientando 687 A Histria de Anglica 818 A Brincadeira do Copo 929 Carmelo 10810 Uma Histria Interessante 11711 Com os Filhos 130Anglica olhou as caixas, malas e roupas que estavam em cima da cama e suspirou."Como mudana d trabalho!"Teve vontade de cobrir o enorme espelho da penteadeira,mas no o fez."Posso no me ver no espelho, mas as pessoas me vem"- pensou.Preferia lembrar de sua imagem antes, com os cabeloslouros avermelhados, lisos, macios e compridos. Balanoua cabea."Eles crescero de novo!" - Falou baixinho.Escutava muito isso e ansiava por t-los novamente. Mas o que importava, o que doa, eraque naquele momento ela no os tinha. A peruca a incomodava, por isso usava leno nacabea, tinha-os de diversas cores, sua me os comprara. Mas, mesmo muito vaidosa, estarsem cabelos no era o pior. No podia nem lembrar dos enjos, vmitos, da fraqueza terterrvel que sentia aps o medicamento."Ficarei curada! Ser?" - Balbuciou, estranhando a prpriavoz."R, r, r, moa careca! Que feio!"Disse rindo algum que era invisvel mocinha, mas elasentiu a vibrao, passou a mo pela cabea e sussurrou:"Se algum me vir assim ir rir."AMudana9Colocou o leno. Teve a impresso de que tinha algumatrs dela e virou-se, no viu ningum. Uma gaveta queacabara de fechar estava aberta."Que coisa! Fechei-a, tenho certeza!" - E a fechoucom fora."R, r, r..."Teve a impresso de que algum rira.- Anglica! - Gritou seu irmo, Henrique, entrando no quarto.- Voc me assustou! Isso so modos de entrar no quarto? - Resmungou a mocinha.- Desculpe-me, no queria assust-la. Vim ver se precisa de ajuda. Gostou da casa? Dosmveis novos? Seu quartoest bonito!- Gostei de tudo! Sempre quis ter um quarto s para mim - expressou Anglica.- Esta casa tem muitos quartos, todos grandes. A sute para papai e mame, o quarto daFabiana, o seu, ainda outro para hspede e o meu, que tambm grande e bonito. Foi umachado esta casa, voc no acha?- E ainda no longe da cidade - falou Anglica.- So quinze quilmetros. Na outra cidade em que morvamos a escola ficava a trintaquilmetros. Voc vai gostar daqui, maninha, O ar to puro! Mas voc resmungavaquandoentrei. O que foi?- Tinha a certeza de que fechei a gaveta, virei e ela estava aberta.- Xi, no sei no, no queria falar, mas... - Henrique fez uma cara de suspense.-Agora fale!- Fantasmas, creio que nesta casa tem fantasmas.- Ora, Henrique! No venha com besteira. Voc acredita nisso?- No sei! No acreditava, mas agora j no sei. Anglica, vamos analisar. Papai alugouesta bela casa, neste lindo lugar, perto da cidade e do mar, s descer o morro e temospraias lindas dos dois lados, por um preo baixo. A imobiliriaalegou que o dono queria uma famlia para morar e no para temporada, como sealugam muitas casas por aqui. No d para desconfiar de que tem algo estranho? Desde queviemos para c tenho visto e ouvido coisas inexplicveis, barulhos esquisitos, pareceronco, no sei explicar o que seja. Bem, deixemos isso para l, estou contente porque vocveio e gostou daqui, eu tambm estou gostando. A escola boa e j fiz amigos. E olhe aminha cor, de ir praia.Anglica olhou para o irmo enquanto ele falava. Henrique era bonito, tinha quatorze anos,era forte e alto para sua idade, mas ainda o sentia como criana, seus cabelos eram como osdela, avermelhados, olhos grandes e olhar esperto. Ele viera antes com o pai, Roberto; ame, Dinia, tinha ficado com ela no hospital. Quando teve alta ficou na casa da av e ame veio. S quando sentiu-se bem que veio, isso na tarde anterior. Estava arrumando seuspertences no enorme quarto.- De fato a casa bonita! A Casa do Penhasco! - Exclamou Anglica.- Como sabe o nome dela? - Indagou Henrique.- Li a placa da entrada - disse rindo a mocinha.- Vamos descer, Anglica, deixe para arrumar isso depois, quero lhe mostrar os doiscachorros que papai comproupara mim.- Ento ganhou cachorros? Realizou seu sonho - falou rindo a irm.- Aqui perfeito, ou quase, espero que o fantasma noatrapalhe.Henrique pegou na mo da irm e saram rindo. Algumque os observava resmungou:"No quero ningum nesta casa, se tenho de ficar aqui,que seja sozinho!"E a porta do quarto bateu com fora.- o vento! - Exclamou Anglica.- Mas no est ventando... - Falou Henrique.- Vamos ver seus cachorros!Anglica arrepiou-se, tentou continuar sorrindo, no quis dar ateno ao fato de a porta terbatido nem aos arrepios,queria participar do entusiasmo do irmo e foi com ele veros cezinhos.Henrique havia feito um cercado do lado direito da casa,fez um canil para os dois filhotes. Anglica os achou lindos,pegou-os.- Que bonito, Henrique! Que animais lindos!Levantou a cabea e olhou, a casa era to majestosa, no meio das pedras e da vegetao.Era um sobrado pintado recentemente de branco e azul, com vrias janelas pequenas sembeirais, algumas com vitrais coloridos, no tinha nenhuma sacada, era uma construoantiga, bem feita, dessas de resistir ao tempo."Deve guardar muitas histrias..." - Pensou a mocinha,continuando a observar a casa.Os quartos e banheiros ficavam no andar superior, em baixo as salas e cozinha, a entradadava para um hall onde ficavam as diversas portas para as salas e a escada. A casa era bemrepartida, os cmodos grandes e arejados. Sentiu que algum a observava e teve aimpresso de ver um vultonuma das janelas. Quando olhou de novo, no viu mais nada. Anglica manteve umcachorrinho nos braos e Henriquepegou o outro, eram animaizinhos fofos, brancos com pintaspretas. Foram para a cozinha.- Bom dia, Nena! - Exclamou a mocinha.- Bom dia, estou fazendo o doce que gosta, vou aliment-la bem e voc logo estar comoantes.- No exagere, quero voltar ao meu peso, mas no engordar. E a, dona Filomena, gostoudaqui?- Menina, no me chame assim, seno adeus doce - riu a empregada.Filomena, que todos chamavam de Nena, estava com eleshavia muito tempo, era uma mulata bondosa, trabalhadeira,era como se fosse da famlia. Quando mudaram ela foi junto.- E ento, gostou daqui, Nena? - Insistiu Anglica.- Gostei! O clima muito bom: mar, montanha e sol. Venha ver meu quarto!Da cozinha saram por um corredor e l estava o apartamento de Nena, grande e arejado.12- Que bonito! - Exclamou Anglica. - Est bem insta lada. Nena, o servio deve ter aumentado muito, voc temdado conta? Mame tem ajudado?- Dona Dinia recebeu muitas encomendas. Est trabalhando bastante. Senhor Roberto contratou uma faxineirada cidade, ela vem todas as segundas-feiras.- Ser que ela vir de novo? - Intrometeu-se Henrique. - Ela est com medo das coisas estranhas que acontecem por aqui. Ouvi-a resmungar, quis que eu ficasse na sala da frente com ela enquanto limpava. Deu graas a Deus quando terminou o trabalho e mame a pagou.- Henrique, pare com isso! No se deve ter medo de alma penada - falou Nena."No sou alma penada!" - Falou o vulto.- No alma penada - repetiu Henrique -, e simfantasma.- Por qu? - Indagou Nena.- Sei l, penada quem tem pena. E esse fantasma no pssaro.- Penada, porque devemos ter d, pena, porque o morto no encontrou seu lugar - insistiu Nena.- Que complicado! - Exclamou Anglica. - Deixem essa histria para l. Vou ver mame.Henrique foi guardar os cezinhos e Anglica foi ao estdio da me. Numa das salas, Dinia fez seu local de trabalho.- Anglica! - Exclamou a me, contente. Veja como ficou bonita minha sala. Nem acredito que tenho agora um lugars para eu trabalhar, sem ser incomodada ou incomodar.- Nena me falou que voc tem muitos pedidos.- Como nunca tive! Trs lojas da cidade interessaram-se pelas minhas bijuterias e meus antigos clientes fizeram pedidosgrandes. Veja, estas pedras so aqui da regio."Minha me uma artista - pensou Anglica. - Seu trabalho delicado, perfeito, faz bem feito porque ama faz-lo.- So lindas, mame! Estas peas novas so maravilhosas. Este lugar deve ter lhe dadomais inspirao. Esto perfeitas! Parabns!13Uma caixa que estava em cima de um mvel caiu. Diniapegou as peas que se espalharam.- Que estranho! Como cau? - Indagou Anglica.- Ora, devo ter colocado em falso."Que coisa! - Exclamou o vulto, aborrecido. - No consigo assustar esta mulher. Paratudo ela tem explicao. Tive de ir rpido at o menino, pegar no sei o qu* dele paraderrubar a caixa, foi um trabalho, e ela diz que a colocou em lugar errado. Nunca viningum mais distrada".Anglica deixou a me trabalhando e saiu procura doirmo. Encontrou-o brincando com os ces.- Henrique, por que no foi escola?- Ia ter uma reunio dos professores. Venha, Anglica,vou lhe mostrar o terreno em volta da casa. Deste lado, direita, tem um declive com rvores, creio que no sonativas, que foram plantadas, pois h muitas plantas damesma espcie; no fundo um pequeno pomar, na frenteo jardim que mame est cultivando, dever ficar lindo, e esquerda a mata.- Daqui no se avista o mar? - Indagou a garota.- S se subir nesta rvore alta. A casa fica no morro, a estrada passa logo ali; indo emfrente por este caminho vamos chegar nela, e seguindo uma trilha pela mata, depois daspedras, o mar lindo e maravilhoso, onde as guas batem nas pedras, e andando um poucomais temos uma bela praia. Descendo pela estrada esquerda temos a cidade.- Vou para o quarto, acho que cansei - falou Anglica, despedindo-se do irmo.Entrou e, curiosa, se ps a olhar tudo, aquela casa despertou seu interesse. Tinha trs salasgrandes, uma pequena e nica varanda frente da porta principal. Havia numa das salasuma lareira de pedras muito bonita.* Pegar no sei o qu: Quando o esprito deseja movimentar um objeto usa umacombinao de seus prprios fluidos com os de um mdium, com ou sem seuconhecimento, e por um determinado tempo impregna o objeto, podendo ento, pelavontade, dar-lhe movimento. Os espritos podem chegar a conhecer, inde pendentemente desua evoluomoral, a maneira de manipular essa energia. Veja O Livro dos Mdiuns,captulos 1 e 4 da segunda parte (Nota do Editor).14"Ficamos todos bem acomodados" - pensou.Entrou no seu quarto, sentou-se numa poltrona, olhou asroupas para pr no lugar, resolveu deixar para depois e descansar. Estava cansada, um simples passeio a deixou prostrada.O vulto a olhou e riu, achou-a muito engraada careca. Ela se ps a pensar e ele se sentou perto e ficou escutando."J se passaram meses, quase dois anos, tudo era todiferente... Isso sim foi uma grande mudana!Eu tinha acabado de completar dezessete anos, estvamos no comeo do ano letivo, cursava o terceiro ano do segundo grau, queria continuar os estudos, estava em dvida entre psicologia e farmcia. Namorava Csar, achava que est vamos apaixonados. Tinha muitas amigas, ia a festas, boates, gostava de passear.Minha menstruao desregulou, comecei a ter muito sangramento. Fui ao mdico, que colheu material para exame e, quando pronto, o mdico chamou pelos meus pais. Fui junto, se tinha problema era melhor saber logo. E teve. Doutor Lcio rodeou, explicou muito, dizendo que eu tinha que procurar um especialista, talvez tivesse de fazer uma cirurgia, etc.'Por favor, doutor, fale logo o que minha filha tem' - pediu mame.Num impulso peguei o papel, o resultado do exameda escrivaninha e li. Os trs silenciaram, olharam para mim.Balbuciei:'Clulas cancerosas. Estou com cncer...'Demorou uns segundos para o mdico voltar a falar.'Atualmente temos tido bons resultados com esta doena. Por isso recomendo irem logo a um especialista. Vocir se curar!''Como pode ter tanta certeza?' - Indagou mame.'Bem, creio que descobrimos logo e'Irei morrer?' - Interrompi.'Desta doena, com certeza, no! Voc jovem, lutar e vencer. Como j disse, muitos saram e voc tambm sarar.'S chorei em casa, sozinha no quarto. No queria morrer. Tinha tantos sonhos, tantas coisas que queria fazer. Era15jovem, bonita e feliz. No queria ficar doente. Sabia pouca coisa dessa doena, s que ela fazia sofrer muito. No queria ter dor. Chorei at adormecer.No outro dia, ningum em casa comentou nada, papai e mame pareciam normais, como se nada tivesse acontecido. Resolvi agir como eles. Em vez de ir escola, fui a uma biblioteca pesquisar sobre a doena; o que li me deixou desanimada, no contive as lgrimas; s que chorei baixinho para no atrapalhar outros leitores. Achando que isso me fez mal, fui embora para casa, no li mais nada e procurei no conversar sobre essa doena. Tentei me animar e pensar nos dizeres do mdico amigo, na possibilidade de me curar. Tinha de ter esperanas. Orei muito pedindo a Deus minha cura. Compreendi que no era s eu que sofria, meus pais tambm estavam sofrendo muito, por eles me esforcei e acei tei fazer o que decidiram.Novas consultas, diagnstico confirmado e foi feita a cirurgia, na qual foram extrados um ovrio e o tero. Foi tudo to rpido, fui to mimada e tudo transcorreu bem. Csar me visitou no hospital, levou-me rosas, me fez companhia. As amigas revezavam. Tive dores, mas os dias passaram rpidos e a veio o pior: o tratamento. Tinha de me internar, ficava no hospital sem os familiares, num quarto com outras pessoas, pois o tratamento era caro e tinha de ser feito pelo plano de sade de papai. Passava muito mal ao tomar os remdios, vomitava muito, ficava deprimida e de mau humor, os cabelos caram, as amigas comearam a se ausentar e Csar comeou a diminuir as visitas.'Anglica, viram Csar numa festa e ele ficou com umagarota.'Chorei quando Fabiana me contou.'Ingrato! Idiota!' - Xinguei-o com raiva.Mame me consolou e entendi que Csar era jovem, vinte anos, estudava, era bonito, estava sendo difcil para ele ter de ficar em casa, ter uma namorada doente. E quando ele foi me visitar, terminei o namoro.'Csar, estive pensando, no certo voc se prender amim. Acho que no quero namorar voc e...'16' aquele mdico, no ? Voc gosta dele!'No tinha nada com o mdico, um jovem recm-formado que ia sempre me visitar quando estava no hospital. No desmenti, seria mais fcil. Resolvemos ser amigos e Csar foi embora, eu fiquei chorando, no s por ele, por tudo, estava cansada de remdios, mdicos e hospitais.Uma amiga da escola foi me visitar, falou dos preparativos da festa de formatura. Eu no ia mais escola, parara de estudar. No tinha nimo para nada, s vezes nem conseguia ler um livro, algo de que sempre gostei. Fiquei pensando, se no fosse a doena, tambm estaria contente pensando na festa de formatura. Passei uns dias muito triste, mas compreendi que meus pais e avs sofriam comigo e me esforcei para melhorar, para no ficar triste. Entendi que pior que a doena ter d de si mesma. Esforcei-me para expulsar a autopiedade.Foi muito ruim estar doente. Como aprendi a dar valor sade do corpo! Muitas vezes queria chorar e no conseguia faz-lo. No hospital havia outros doentes que choravam juntos ou os incomodava porque queria dormir, ler ou conversar, no era certo piorar o ambiente com minhas lstimas. Como desejei chorar no colo de mame, como fazia quando era criana! Mas ao v-la sofrida, at emagrecera, tentando me animar, esforando-se para sorrir, no queria entristec-la mais ainda. Papai dava uma de forte, mas muitas vezes, ao sair do quarto, o fazia chorando. Como entristec-lo mais? Em casa no me deixavam sozinha, repartia o quarto com Fabiana. Uma vez ela saiu, fora a uma festa, ia dormir na casa de uma amiga. Chorei at adormecer, me fez bem, as lgrimas pareciam me lavar, me limpar. Um dia, achando que minha irm estava dormindo, chorei baixinho.'Est chorando, Anglica?' - Indagou Fabiana.'No, claro que no!' - Respondi.'Por que esconde seu choro? O que h de mau em chorar quando se est com vontade? Voc tem motivos para isso.''Motivos? Acha que tenho motivos?'17'Claro! Est doente, tem dores, passa por esse tratamentoque lhe d muitos incmodos. Quer que eu lhe abrace? Querchorar junto a mim?''Quero!'Desde aquele dia, no chorei mais escondido, refugiava-me nos braos de vov, papai, mame e de Fabiana. S que choro repartido mais confortante, chorava menos recebendo o carinho de afetos. Deixei consolar e fui consolada.Via no hospital muitos doentes. Fiz amizade com Eunice,uma mulher doente que tinha trs filhos pequenos.'Ainda bem que no tenho filhos, seria bem pior morrer edeixar rfos' - falei alto e estranhei minha voz ressoar peloquarto.Voltei aos meus pensamentos, s minhas lembranas. Eunice era muito boa, otimista, tinha dores, no reclamava, s chorava quando os filhos iam embora nas rpidas visitas. O esposo era jovem, parecia cansado, trabalhava muito, cuidava dos filhos e estava endividado. Eunice foi piorando, ficou muito feia, magra e mesmo assim continuava sorrindo e animando a todos.'Animo, Anglica, seu cncer no do mesmo tipo domeu. Ser impossvel eu sarar, mas voc sim, ir se curar!''Eunice, que religio voc segue?' - Indaguei; curiosa.'Sou esprita! Sabe, Anglica, o Espiritismo nos d muita compreenso da vida, faz entender e aceitar os acontecimentos ruins, levando a compreender a bondade e justia de Deus. No uma religio de sofrimento, mas nos leva a entend-lo. Aproveito essa lio, sim, encaro minha doena como uma grande lio, me tornei mais humana, compreensiva, tenho meditado e sinto Deus em mim.''E seus filhos?' - Perguntei.'Precisam de mim, sei disso. Quem no necessita de me?Mas meu marido muito bom e eles tm duas avs maravilhosas, estaro protegidos.'Fiquei com tanto d de Eunice e de seus filhos que orei muito pedindo a Deus que ela sarasse, se quisesse que me levasse em vez dela, no me importaria de morrer no seu lugar. Ela com os filhos seria mais til do que eu.18Eunice ajudava a todos, dava consolo, orientava. Eu gostava dela, admirava-a. Sa do hospital dexando-a mal. Quando retornei, uma enfermeira me contou que ela havia falecido, serena como viveu. Chorei, senti falta dela.Mrcia ficara daquela vez no leito ao meu lado, tinha dezesseis anos e tambm estava com cncer. Recebeu s uma visita, a da assistente social do seu internato. Ela era rf, estava numa instituio para menores. Ficava mais tempo no hospital para receber os cuidados que no teria onde morava. Ouvi-a chorar baixinho, indaguei o porqu, ela respondeu:'Estou com medo!''Quer que eu aproxime minha cama da sua e segure suamo?' - Perguntei.'Quero!''No chore, Mrcia, voc ir sarar' - consolei-a, segurando sua mo.'Talvez sare, mas quem se alegrar com a minha recuperao? No tenho ningum.''Voc se alegrando no o suficiente? Ter ainda suafamlia.''Logo terei de sair da instituio, preocupo-me com o que fazer, com quem ficar. E se no tiver sarado? Mas a assistente social me afirmou que a instituio me abrigar at que eu sare. O hospital faz todo o tratamento' - falou ela.'No tem amigos? No conhece ningum fora de l?' - Perguntei.'S voc, as enfermeiras e os mdicos. Tenho amigas l, mas elas no tm como vir aqui. So sozinhas como eu. No importo em sarar, talvez seja melhor morrer. Voc tem medo da morte?''No sei, mas no quero morrer' - respondi.'Sabe, Anglica, s vezes a solido di mais do que otratamento.'Mrcia dormiu e eu fiquei pensando no que ela disse: 'asolido di mais...' dei graas por ter afetos.Morte, estranho voc pensar nela, pensar que essecorpo que cuidamos, higienizamos, ir ser p. No havia19pensado nessa possibilidade at me ver em perigo, ter uma doena que poderia ser fatal. E pensar que ir acontecer confuso, nisso invejava os espritas, eles pareciam ter esse entendimento. Resolvi no pensar nela, como se no pensar afastasse essa possibilidade. Mas tudo vida e comecei a fazer planos, projetos, coisas que iria fazer logo que sarasse.Lucinha estava com leucemia, tinha s oito anos, chorava, chamava pelos pais, no queria tomar injeo. Ao escut-la tinha vontade de chorar, tambm no queria tomar a injeo. Mas era adulta ou grande para fazer no valer minha vontade, chorava baixinho cobrindo o rosto com o lenol. Lucinha tambm morreu. E eu estava no hospital quando isso aconteceu. O choro dolorido de sua me me fez calar, era um choro to sofrido que fez silenciar a todos. Tinha muito que meditar ali, creio que todos os que esto internados tm motivos para pensar na vida e na morte.Uma vez, encontrei no hospital, na enfermaria ao lado, a masculina, um senhor que estava revoltado, dizia blasfmias, xingava, era mal-educado. Tinha cinqenta e quatro anos. Soube porque dizia:'S tenho cinqenta e quatro anos, como morrer? Maldita doena!'No aceitava conselhos e evitava a todos. Irm Beatriz, uma freira, pedia para que se calasse, ele s fazia quando ela ordenava. Quando ele quietava todos suspiravam aliviados. Irm Beatriz entrou na nossa enfermaria para uma visita, logo aps ter ordenado que se calasse; nos vendo assustadas, falou, animando-nos:'Vamos orar, por favor no entrem na vibrao de revolta desse senhor. Deus sabe o que faz! Depois temos tido muitas curas, mais da metade de nossos doentes tm se curado. Nada de desnimo! Pai nosso...,Fiquei pensando no que Irm Beatriz dissera, sabia queno era verdade, alguns saravam, mas a maioria morria.Vendo-me preocupada, ela carinhosamente veio at a mim.'A revolta contagia! No se deixe abater, minha filha. Seutratamento tem dado resultado.'20Ningum gostava de cuidar do senhor revoltado, faziamporque eram obrigados. Conclu: ele sofre mais.Orava muito, enquanto estive no leito no hospital e emcasa, a prece me confortava, esforcei-me para ser otimista eme queixar menos.No encontrei mais com aquele senhor, a enfermeira disse que ele voltara mais uma vez, queixou-se do atendimentoe foi para outro hospital.Cada pessoa doente que via no hospital parecia ser eu, identificava-me, sentia o que eles sofriam, uns mais que eu. Chorava junto, fiz amizades, tnhamos muito em comum para conversar, ramos esperanosos. E o tratamento no foi fcil. Lembrava de tudo, mas recordaes ruins no devem ser cultuadas, tinha de esquecer, porque o tratamento acabara, e segundo os mdicos, com xito. E eu no vou pensar mais sobre isso, minha doena ficou no passado e ele passou...Estava internada quando papai com meus irmos mudaram para c. Papai estava to contente, to entusiasmado!'O lugar lindo! Teremos o mar, as montanhas e sossego.Comprei mveis novos, a casa grande. E voc, minha filha,ter um quarto s para voc.'Gostei de ter mudado, no sentiria falta de nada, amigas estavam afastadas, Csar estava namorando outra, as colegas de escola haviam se formado no ano anterior, muitas passaram em cursos superiores, outras faziam cursinho e eu ainda teria de acabar o segundo grau. Depois, era sempre desagradvel encontrar conhecidos, que me olhavam com d, vendo-me como futura defunta ou, piedosos, tentavam me animar. A maioria queria saber do tratamento, de resultados. No entendiam que eu no queria falar sobre a doena. Pelo menos ali, ningum me conhecia e nem sabia o que acontecera comigo.Que mudana! Espero que esta, desta casa, seja altima!"Suspirou e se ps a arrumar seu quarto.21OsvaldoO vulto que sentara junto de Anglica e escutava seus pensamentos, suas lembranas, era Osvaldo, um desencarnado que vivia ali. Quando a mocinha levantou da poltrona, ele enxugou as lgrimas que corriam pelo rosto."Que coisa! Que tristeza! A Carequinha assim por doena ou pelo tratamento dessa doena horrvel! Coitadinha! Olhando bem at que no feia! E eu ri dela! Est magra, mas bem feita de corpo, tem os lbios bem desenhados, o nariz pequeno e os olhos so lindos, so como duas jabutia bas, pretinhos. Essa eu no atormento! No assombro! No mesmo! Est doentinha! Pensa que sarou, mas dessa doena ningum sara. Ficar mais doente at morrer. A ser como eu! to estranho, morre-se to fcil!"Saiu do quarto, sentou-se num canto de uma das salas ese ps a pensar, a recordar:"Fique aqui! Fique para sempre!'Malditas palavras que me prendem, estou aqui h muitos anos, nem sei dizer quanto tempo, e no consigo sair. Gosto da solido, as pessoas me incomodam, reclamam demais, me perturbam. Se tenho de ficar aqui, que eu fique sozinho. Tenho de expulsar essa famlia daqui como fiz com as outras.Recebi os impactos, dois tiros certeiros, depois o pesadelo, demorei para sair daquela maldita madorna e me vi sozinho nessa casa, que parecia abandonada. Grande parte dos mveis sumiu, a decorao da casa era muito bonita,22tapetes vermelhos, estofados vistosos, muitos vasos com flores, cortinas de veludo, a casa sempre estava linda; Leda tinha bom gosto.O mato em volta da casa estava alto, o jardim desapare ceu, no tinha mais os canteiros floridos. Estava muito triste, abandonado daquele modo. Foi um perodo muito confuso, no sabia o que fazia ali sozinho, dormira muito, mas tinha horror em faz-lo, pois sonhava, ou melhor, tinha pesadelos com aquelas cenas trgicas que queria esquecer e no conseguia Andava pela casa e em sua volta com dificuldade e fui melhorando. Um dia, estava dormindo quando acordei com um barulho, eram uns trabalhadores carpindo o jardim.'At que enfim algum para limpar. Vou ajud-los!' - Ex clamei, animando-me.Mas quando comecei a ajudar, os ingratos saram cor rendo, largaram at as ferramentas.'Bando de preguiosos!'Isso ocorreu mais duas vezes, parecia que no queriamminha ajuda.'J sei - conclu -, eles devem pensar que eu tambmmatei a menina, a Fatinha, mas eu s assassinei a Leda, quemereceu. Todos sabiam que ela no prestava'.Tentei falar com eles, com os trabalhadores, explicar que no queria fazer mal a eles; mas foi pior. Fiquei com raiva, deveria ser como bicho ou monstro para eles terem medo assim de mim. Eles no acreditavam em mim, achavam e at hoje todos pensam que matei a garotinha. Mas no iria fazer isso, no fiz, era to bonita a filha de Leda.Quando os trabalhadores foram embora correndo, fizum juramento:'Ingratos! So uns ingratos! No os ajudo mais! Nomesmo.'E cumpri a palavra. Mas no era preguioso, sempre trabalhei, desde pequeno, e gostava, queria fazer alguma coisa e no conseguia. E o jardim estava um mato s. Por mais que tentasse, no conseguia carpir e nem fazer qualquer trabalho. Tantas vezes tentei varrer a casa, limp-la, e ela23continuava suja. Deveria ser praga do senhor Irineu, o dono da casa, que me ordenou ficar ali, e foi embora e nunca mais voltou.Fiquei tempo sem ver ningum, nenhuma pessoa veio aqui, aprendi a gostar da solido, s que pensava muito. Como mudei os acontecimentos, sempre achava um final feliz para mim, senhor Irineu morria, Leda dizia que me amava, ficava comigo e ramos felizes. Mas a realidade sempre me despertava de modo cruel, tudo aquilo aconteceu e eu estava ali, s e infeliz. No gostava de recordar, mas o fazia como um castigo, um terrvel e interminvel castigo.E os anos foram se passando, no sabia determinar quantos. Resolvi vigiar o local e estava sempre atento, at os garotos que vinham xeretar ou em busca de frutas do pomar eu enxotava, e era uma correria. Como ria e me divertia, queria que viessem mais vezes, mas eles se assustavam, tinham medo do assassino. Isso me irritava, no tinha matado a garota, s Leda, meu grande amor.Fiquei muito sozinho, os dias eram interminveis. Quando no se faz nada, o tempo demora a passar. Enquanto ficava recordando, pensando, sofria, sofro... Mas me acostumei e no queria compartilhar a casa com ningum.Lembro bem do dia em que dois homens vieram decarro, entraram no jardim e comentaram:'Essa histria de assombrao inveno! Com o as pecto desta casa, qualquer um se assusta.''Herdei do meu tio essa propriedade, vou arrum-la paraalugar. Amanh mesmo viro os homens que contratei, limparo o jardim, o pomar, e o melhor, aterraro o buraco.''Isso bom, do lado direito o penhasco perigoso!' - Comentou o primeiro que falara.'Modificando o local em que houve o crime da meninamudar o aspecto e o falatrio acabar. Comprei caminhesde terra para aterr-lo - falou o que herdara, o novo dono.'Ficar caro.''D pena ver isso abandonado.'Fiquei s ouvindo, curioso. Achei interessante aterrar aquele lugar perigoso, cheio de pedras, e havia s uma trilha24A Casa do Penhascopara passar. Aquele lugar me dava arrepios, quase no ia l, no gostava, mas s vezes era impulsionado a ir, de cima olhava o buraco, e foram muitas as vezes que chorei, parecia ainda ver Fatinha cada com seu pijama cor-de-rosa, l esti cada, morta. Achava aquele lugar horrvel e aprovei a idia de aterr-lo. Sem o buraco no iria mais ver aquela cena macabra. Resolvi s ficar observando, sem fazer nada.Mas foi a que percebi que as pessoas no me viam, elas passavam por mim ignorando-me, cheguei pertinho de umas e nada, realmente elas no me enxergavam e eu era a assombrao to falada. Por algum motivo que eu desconhecia estava invisvel e, dependendo da pessoa que estava ali na propriedade, eu conseguia fazer barulho, assustar. Fiquei muito triste, talvez tivesse morrido e nem percebido. Nunca soube direito o que acontecia quando a pessoa morria, no acreditava no inferno e achava muito boba a idia de no cu no ter de fazer nada, mas nunca pensei em morrer e ficar assim como fiquei, sem fazer nada e no estar no cu, ser um assassino e no ir para o fogo do inferno. De qualquer modo estava sendo castigado, fiquei ali preso no local do crime e muito infeliz.Os trabalhadores vieram, eram muitos, comearam a descarregar caminhes de terra, roaram o mato, tiraram a hera, a folhagem das paredes da casa; pintaram, consertaram, e eu quieto, s olhando.Achando muito chato todo aquele movimento, resolvi ir embora, mas no conseguia sair da propriedade. Embora nada me prendesse, sentia-me preso, no conseguia passar alm do jardim; com esforo dava uns passos pela estradinha, era atrado de novo para a casa. Todas as vezes que tentava, escutava a voz irada do senhor Irineu: 'Fique aqui para sempre!' Naquele dia tentei, como tentei! Queria ir mesmo, embora no soubesse para onde. Esforcei-me tanto que ca e me arrastei pelo cho. 'Fique! Fique!' Tive de voltar, aborrecido, chorei, mas nada adiantou. Tive de ficar.Escutei um dia a conversa de dois trabalhadores quepintavam a casa.25'Aqui aconteceu um crime brbaro, um empregado matou o casal, donos da propriedade, e depois se suicidou.'' mentira! mentira!' - Gritei irado.'Voc ouviu? Parece que algum disse que mentira' - disse um deles.'Ouvi, deve ser algum l fora. Vamos parar de falarnesse assunto. Isso atrai espritos. Vamos trabalhar!' - Falouo outro.' melhor mesmo! Trabalhem, bando de mentirosos' - resmunguei.Pensei em assustar todos e pr para correr aqueles homens insensveis, mas resolvi no fazer, queria o lado direito do penhasco aterrado. Aquele declive me causava terror. O trabalho terminou, ficou lindo, os banheiros modernos, tudo pintado, acabou o perigo, plantaram rvores no aterro, fiquei satisfeito, fiquei de novo sozinho, todos foram embora. A casa estava mais clara pela pintura, mais arejada.Fiquei pensando e conclu que morri realmente e estava ali por castigo, que era bem merecido, embora achasse que a culpa era tambm dos outros envolvidos. A nica inocente era Fatinha.Andava de um lado para outro, vigiava tudo, sabia at das teias de ranhas. Uma vida de ociosidade, mas castigo era castigo e este parecia interminvel, para sempre, como disse aquele maldito.Veio uma famlia olhar a casa.'Se essa casa foi assombrada no mais. O proprietrio disse que o falatrio porque estava abandonada; na reforma muitos homens trabalharam aqui e no viram nada' - disse o homem.'Tomara que no seja mesmo, no gosto dessas coisas.Para mim, morreu, deve ficar bem morto' falou a mulher.'O aluguel est bom, a casa grande e bonita' - comentou ele.'Grande demais, tenho de arrumar uma empregada' - resmungou ela.Examinei-os, O homem era gordo, a mulher mida emagra, achei graa e ri. 'Casal ci ou dez'.26Ela virou para ele e falou, brava:'No ri!''No estou rindo!'Mudaram. Tinha o casal dois filhos pequenos. No gostei deles, o homem era metido, orgulhoso, achando que resolvia tudo. E o mais interessante que quando eu me aproximava dele, recebia fora e fazia os objetos se mexerem, fazer barulho, e me divertia assustando-os.Agentei os homens trabalhando. A noite paravam e iam embora, mas aqueles moravam aqui, isso no, nessa casa quem morava era eu, s eu e no queria companhia. Ento fiz um plano para expuls-los daqui e comecei a atorment-los. Preferia a noite, que mais assustadora, para fazer barulho. S no mexia com as crianas, no sou covarde, elas eram pequenas. Depois tinha medo de que, assustadas, fizessem como a outra, a Fatinha. Mas tudo que acontecia naquela casa, a chata da mulher punha a culpa em mim. Se o menino chorava, se tinha dor, era eu. Um dia consegui puxar o cabelo dela; ri bastante, achando bem merecido.Era tardinha, estavam sentados na sala. Ela comentou:'No estou gostando dessa casa e quero me mudar. O aluguel barato, muita esmola, o santo desconfia. Por esse aluguel irrisrio, s podia ter algo atrapalhando. Ela real mente mal-assombrada. No h explicao para os barulhos, objetos carem e as risadas que so um horror. Deve ser o esprito do assassino.''Tambm no estou sentindo-me bem, nessa casa fico muito fatigado e triste. Eu, que sempre fui alegre. Tenho pensado se no mediunidade que falam que eu tenho. No quero mexer com isso, no sei por que essa faculdade no dada a quem quer. Dizem que eu sou sensitivo, que posso ajudar outras pessoas, mas no quero - falou ele.'Se sensitivo, ou se essa sua mediunidade forte, porque no manda nesse esprito? Deve ser um demnio esseassassino!' - Expressou ela.'Sou mais sensitivo mas no sei fazer isso! No aprendinem quero aprender. Que esse assassino pare de encher e vpara o inferno, que o lugar dele' - falou autoritrio.27Que desaforo! Resolvi dar uma lio naquele gordo inso lente. Olhei, concentrei-me norelgio que estava em cima de um mvel e ele foi mexendo, at que caiu. Ri, dei minhasgostosas gargalhadas. Os dois se assustaram e minha risada ecoou pela casa. O garotinhopediu:'Faz mais isso, papai, estou gostando.''Eu no fico aqui nem mais um minuto. No durmo maisnessa casa. Maldita mil vezes essa assombrao!' - Falou amulher.Pegou as crianas e o gordo foi atrs dela. Entraram no carro e foram embora apavorados.Achei graa e ri at cansar. Mas sem o gordo minha risada no era ouvida pelos quetinham o corpo de carne. Fiquei satisfeito, meu plano deu certo, expulsei os intrusos.Depois de dois dias o caminho de mudana veio buscar os objetos deles. Fiquei quietonum canto, afinal o casal fez o que eu queria, foi embora, e eu no quis atrapalhar o pessoalda mudana. Um dos carregadores comentou:'Nunca vi uma mudana assim. Parece que saram correndo, largaram at comida namesa.''Dizem por a que foram assustados por um fantasma, saram de tarde, foram para um hotelcom a roupa do corpo. Ningum aqui na cidade quis fazer a mudana, a nos contrataramde longe. Espero que o senhor fantasma, isto , se realmente ele existe, permita quefaamos a mudana em paz. Afinal estamos trabalhando!'Assim era mais fcil, gostava de respeito, e fiquei obser vando. E me livrara do casal*'oi' eera isso que importava.Novamente a casa ficou abandonada, o mato cresceue eu fiquei anos sozinho.Um dia, um senhor bateu palmas. Fui ver e me defronteicom um homem que olhou para todos os lados e disse alto:'Senhor... no sei como cham-lo, fantasma, assombrao... Desculpe eu vir assim. Vouexplicar: me chamo Olegrio, tenho famlia, mulher e trs filhos, estou desempregado eestamos passando necessidade. O nico emprego que arrumei foi na imobiliria para carpire arrumar esta casa.28Por isso peo permisso para fazer meu servio sem ser assombrado, pois tenho medo. Seno precisasse tanto, no viria, mas tenha d de mim, deixe-me trabalhar em paz.'O homem, o Olegrio, falou com sinceridade. Escutei, pensei e, j que pediu, resolvi deix-lo em paz e o fiz por dois motivos: porque fiquei com d dele e queria que o terreno fosse limpo. E assim Olegrio passou a trabalhar, limpou tudo, at plantou umas flores e depois passou a vir duas vezes por semana e at limpava a casa.Como lastimei por no ver o mar, ficava to perto... S o via de cima da rvore, a que o rapazinho, Henrique, descobrira. Quando estava com muita saudade, subia na rvore e o via de longe. Talvez de cima da casa tambm pudesse ver, mas nunca subi.Mar, como amava o mar! Desde pequeno gostei de sentar na areia e contempl-lo, observava as ondas desde sua formao at quando quebravam na areia. Depois, sempre que estava triste, ia para perto, tomava banho nas suas guas salgadas e me acalmava. Mas agora que sou morto, ser que conseguirei me banhar? Acho que no. Mas s o contemplar me bastaria. Como me divertia com os coleguinhas na praia, jogando bola, nadando! Amigos, tinha saudades deles; quan do pequenos, os meninos me aborreciam, bastava eu me de sentender com eles que escutava: 'Sua me o abandonou! Seu pai um bbado!' Isso me doa. Ah, se eu pudesse sair daqui! Agora que sei que posso assustar as pessoas, ia dar bons sustos neles. Como ser que est o Tampinha? E o Sonrisal? Gostava de dar apelidos. Eram bons garotos, estimava-os. Pensando bem, eu tambm os ofendia. No devo levar em conta brincadeiras de criana. Crescemos juntos e continuamos amigos. Sonrisal at que me aconselhou a sair do emprego, no ficar mais perto dela, eu que no o atendi. Ser que eles pensam em mim? Certamente no falam sobre mim, no interessante dizer que foram amigos do assassino da casa do penhasco.Novamente vieram me aborrecer, acabar com meu sossego. Mudou-se outra familia para minha casa: uma senhora29viva e cinco filhos. Que pessoal esquisito, no gostei deles! Falavam e comiam demais, resmungavam e brigavam, mas no havia ningum para me dar 'aquela fora' para que fizesse mover objetos ou me escutar. Mas percebi que podia prejudic-los de outra maneira: se ficasse perto de um deles, a pessoa se queixava. Incrvel, ela sentia o que eu estava sentindo! Podia deixar nervoso qualquer um, e agi assim para faz-los se mudar.'Que dor no peito! Desde que nos mudamos para c estou tendo essa dor. Aqui no tem assombrao, se tinha, deve ter ido embora. Assustou-se conosco!' - Falou um dos moos.'No gosto daqui, tenho tido sonhos estranhos, quealgum me d tiros no peito e fico com dor' - queixou-sea moa.'Vocs ainda saem, eu fico mais em casa e sinto muita tristeza. Tambm acho que no foi bom termos mudado para c. Que tal apressar a reforma de nossa casa? Quero voltar para l, sinto falta das minhas amigas e vizinhos, que no querem vir aqui me visitar, com medo da alma penada' - falou a senhora.Intensifiquei minha perseguio e os intrusos se mudaram, fiquei aliviado e eles tambm. Fiquei sozinho de novo, s Olegrio vinha duas vezes por semana. Era bom, tudo limpo e a casa em ordem.Agora, essa familia veio me incomodar! Primeiro veio o homem, Roberto, olhou tudo e dias depois voltou com a mudana. Percebi logo que o menino, Henrique, tem 'aquela for a' de que eu preciso e planejo expuls-los. S que agora fiquei com d da Carequinha, to jovem e to sofrida. Nem teve raiva do namorado que no a quis pela doena. Ajudou outros, quis morrer no lugar daquela me para que no deixasse filhos pequenos. Fazia tempo que no via ningum to bom assim, ou nunca tinha visto. Boa... Ser que minha me foi boa? Queria pensar que sim, mas certamente no o era. Ela me abandonou, no me quis, pelo menos era isso que papai falava: 'Sua me uma vadia, nos abandonou, foi30embora com outro, aquela safada!' Ela nunca mais deu notcias. Quando garoto, sonhava com seu retorno, ela voltaria rica, de carro, me levaria com ela... Mas mesmo pobre a queria ansiava por seus afagos, me chamando de filho. Mas ela nunca voltou...Morvamos com vov, me de meu pai. Ele bebia muito, trabalhava pouco, a vida era difcil. Vov s resmungava. Meu pai morreu num acidente, caiu na linha do trem; uns dizem que se suicidou, outros que caiu por estar bbado. Fiquei s com vov, que me tirou da escola e me ps para trabalhar. Era mocinho quando ela morreu, fiquei sozinho no mundo, trabalhei em muitos lugares, at que vim ser caseiro aqui e fiquei para sempre".31ApavorandoHenrique"Cansei de pensar, no tenho feito outra coisa nesta vidaa no ser recordar."Osvaldo levantou-se e foi at a cozinha. Observou Nena,a empregada, fazendo o almoo. Era esperta e trabalhadeira."Vou dar um susto nela!"Esforou-se para fazer cair a tampa das panelas que estavam em cima da pia. Nada. Foi at Henrique, que brincavacom os cezinhos, voltou rpido e pronto, derrubou as tampas.Nena olhou de um lado para outro. Osvaldo riu, divertin do-se. Ela pegou as tampas e, sem que ele esperasse, falouautoritria:- Sai de retro, satans! Por Deus, no me tente! Creio em Deus Pai...Fez o sinal da cruz e orou o Credo, uma orao catlica."Eu, hein! Credo, cruz! Que mulher! No precisa me enxotar assim... - Osvaldo saiu da cozinha resmungando. - No devo mexer com servial. Se ela for embora, arrumaro outra e a famlia ficar. uma empregada como eu fui. Pre ciso pensar num bom plano, colocarei essa famlia para correr. s ter pacincia e me organizar direito. Se eu conseguir apavorar um deles, unidos como so, se mudaro".Ouviu-se barulho de carro, era Roberto que vinha almoar e com ele estava Fabiana, que voltava da escola. Anglica e Henrique vieram correndo. Todos se sentaram mesa. Osvaldo se ps a espi-los de um canto da sala.32- Estou muito feliz em t-la conosco, Anglica. Aqui ir recuperar-se melhor. Gostou do lugar? - Perguntou o pai.- Sim, creio que sim, bonito. Mas no isolado?- perto da cidade, passa nibus a cada meia hora na estrada. Logo far amigos e poder convid-los para viraqui - respondeu Roberto.- Eu estou achando timo, trabalho sossegada, tenho espao - expressou-se Dinia.- Pois eu no sei, estou achando a casa esquisita - falouHenrique.- No venha voc de novo com a histria de barulhos e risadas - disse Fabiana. - Para mim aqui est timo, est me fazendo bem. Sabe, Anglica, no tenho tido mais aqueles sonhos ou pesadelos. E, desde que mudamos, parei com a terapia, com as sesses com a psicloga. Vocs sabem como eu sofria com aqueles sonhos, tinha pavor de dormir e t-los. E eles se repetem desde que eu era pequena. Sabem o que mais estranho? A casa com que sonho parece com esta. Verdade! Com algumas modificaes, poderia dizer que o lugar este.- Modificaes? Como? - Perguntou Anglica.- No sei bem, meus sonhos so confusos, me do medo, pavor mesmo, no gosto deles. Sonho com uma casa grande, s vezes deso uma escada como aqui, mas com tapetes vermelhos. Vejo uma porta entreaberta, no sei o que vejo l dentro, mas algo que me apavora e a corro. Algum malvado corre atrs de mim, passo por um caminho estreito, peri goso, beira de um precipcio. Olho para trs e vejo uma pessoa que eu sei que m quase me pegando, tento correr mais, tenho dor no p, caio no buraco e acordo aflita. As vezes desperto com meu prprio grito, outras coberta de suor. Em outros sonhos, chamo por minha me, s que a mame outra pessoa, ela no pode me acudir, estou sozinha com o malvado, tenho de fugir, corro e estou de novo beira do precipcio, do buraco que tanto medo me d, e caio. S que a casa tem heras na parede e o buraco muitas pedras, e eu sou uma menina pequena e lourinha. Sinto, ao correr, o movimento dos meus cabelos cacheados. Que Deus me d a graa de no sonhar mais com isso, de no ter mais esses pesadelos.33- Escutamos muitas explicaes: que Fabiana viu essas cenas num filme, que escutou uma histria que a impressionou. O fato que muitas vezes acordou gritando e chorando - falou a me.- Virgliio me disse que poderia ser lembrana de outra vida. Ele esprita e acredita em reencarnao - comentouRoberto.Osvaldo se encolheu todo num canto e balbuciou:"Lembranas de outra vida! Pode ser! S pode ser! Se morremos mas continuamos vivos, bem provvel que nosso esprito nasa de novo em outro corpo. Por isso que essa Fabiana me impressionou, sinto que a conheo, embora seja diferente fisicamente de Fatinha, parece com ela ou pode ser ela! Se no for isso, como se explica esta a sonhar com algo que aconteceu bem antes de ela nascer? Meu Deus! Que coisa! Com essa mocinha tambm no irei mexer, assombrar. E se ela for Fatinha? melhor eu ficar longe dessa garota!"Naquele dia, Osvaldo no teve nimo para mais nada. Achava mais fcil assustar mulheres. Estas, para ele, eram mais escandalosas, mas com as daquela famlia parecia mais complicado. Tinha d da Carequinha, a servial apelava, a dona da casa era distrada demais, para tudo tinha uma explicao: se conseguia, aps muito esforo, acender uma luz, ela nem notava e at achava que tinha sido ela; se apagava, estava a lmpada com defeito; se fazia barulho, dava expli cao; quando notava ou ouvia movimento de madeira ou animais correndo, as risadas, era algum da famlia ou bichos fora de casa, da mata. Com a Fabiana era impossvel; agora, ao olh-la, parecia que via Fatinha e isso lhe causava mal-estar. Restaram o dono da casa e o moleque. Ficou uns trs dias quieto, planejando, e concluiu que teria de atormentar, assustar os dois homens da famlia se quisesse ficar livre dela. Achando que dera "folga demais", resolveu agir e foi at eles, que estavam almoando.Roberto pediu a Anglica:- Filha, voc no faria um favor para mim? Tenho de levar uns papis na imobiliria e no tenho tempo. Venha34comigo para a cidade e aproveite para conhec-la, depois volte de nibus, que ele pra na estrada em frente ao caminho de nossa casa.Anglica entendeu que o pai queria que ela sasse, quepasseasse e resolveu ir. Arrumou-se."Com peruca fica melhor, coitada da Carequinha!" - Comentou Osvaldo.- No sei por que, papai, parece que algum tem d de mim e me chama de Carequinha - comentou Anglica.- Quem faria isso? Filha, no se impressione. Voc no careca, est sem cabelos temporariamente. Logo elescrescero lindos como sempre foram.Anglica entrou no carro com o pai, observou que havia prxima da casa uma estrada que atravessava o morro, um caminho de cascalho de uns duzentos metros. Esse caminho fora aterrado porque havia declives dos dois lados."Antes - pensou a mocinha - deveria ser uma rochaextensa como um ponto isolado apontando para o cu. Incrvel como algum teve a idia de construir uma casa aqui".Ela olhou para trs, observou a casa, parecia uma pintura."Se no fosse a parte direita ter tantas rvores, essa casapareceria construda num pico de pedra, e no por acasoque se chama Casa do Penhasco!"Entrando na estrada no avistava mais a casa, seu pai seguiu para a cidade. A estrada era uma via vicinal, cheia de curvas, com muitas rvores e pedras, somente em poucos lugares se via o mar, lindo e majestoso.Anglica gostou da cidade, era pequena, com muitaslojas, arborizada e com pessoas bronzeadas.- Na poca de temporada isso aqui fica movimentado - comentou o pai. - Vou deix-la aqui. V imobiliriae resolva essa questo para mim. Procure pelo Fbio.A garota desceu, andou pelas ruas olhando as vitrines efoi logo imobiliria.- Por favor, o senhor Fbio!E logo veio atend-la um moo que a olhou interessado.Anglica no pde deixar de observ-lo, era moreno, olhos35esverdeados, cabelos bem curtos e um sorriso franco e cativante. Por minutos trataram de documentos.- Esto gostando da casa? - Perguntou ele.- Sim, estamos. Ela confortvel e o lugar muito bonito - respondeu Anglica.- Ainda bem - falou sorrindo Fbio.- Por qu? - Perguntou ela.- Por nada. Est calor, aceita tomar um sorvete?A mocinha no soube o que responder, no o conhecia, mas no conhecia ningum ali. Achando que no tinha nadademais, respondeu:-Aceito!Saram da imobiliria, andaram poucos metros e entraram na sorveteria. Logo vieram atend-los.- Muito bem! Aqui se bem atendido - falou ela.- Claro, sou o dono! - Exclamou ele sorrindo.Conversaram saboreando devagar o sorvete e logo j sabiam o que interessava: eram solteiros, no tinham com promisso.- Como vai voltar para casa? - Perguntou Fbio.- De nibus - respondeu Anglica.- Permita que lhe d uma carona? Tenho de ir praia do outro lado do morro.Anglica aceitou, e quando chegaram, Henrique foi cumpriment-lo e ficaram conversando sobre o lugar, as belezasda regio.- Vocs conhecem a gruta do morro? No! Pois precisam ir l! Vamos combinar um passeio, levo vocs at agruta - falou Fbio, entusiasmado."Xi, esse a est interessado na Carequinha. Mas se ele estiver mal-intencionado, que no se aproxime dela. Resolvi defend-la! - Osvaldo observou bem Fbio. - O cara parece ser boa pessoa. Bem, ele que no se meta a engraadinho".O moo foi embora e os irmos entraram. Osvaldo pensou, satisfeito, que seu plano estava dando certo. Que a presena do menino, do Henrique, com a fora que tirava dele, conseguia fazer barulho e mexer objetos. E dias passaram e36Osvaldo conseguia assombrar os dois, Roberto e Henrique. Assustava o mocinho e causava arrepios no pai, divertin do-se com isso. Henrique comeou a ficar impressionado.- Pai, aqui lindo, gosto da escola, j fiz amigos, mas no estou gostando da casa. No poderamos mudar? - Queixou-se o garoto.- Filho, voc est impressionado pelos boatos de que esta casa assombrada. Todos gostam daqui, o aluguel est bom, voc pode ter at cachorros, estamos acomodados. Depois, se nos mudarmos, a multa alta.- Pai, no impresso, aqui no me sinto bem, tenho uma sensao de solido que di. Depois escuto risadas e fico apavorado. Se o senhor no quer se mudar, deixe ento que eu v para a casa da vov. No acredita em mim? Tenho ouvido coisas estranhas...- Acredito em voc, sei que no mente. Vamos ter um pouco mais de pacincia, isso deve ter explicao.Roberto no quis dizer ao filho que tambm estava impressionado com aquela casa, que ouvia as risadas que o apavoravam. Tentava achar explicao para os barulhos que escutava. J achava que alugar aquela casa no tinha sido um bom negcio.Passados uns dias, Henrique foi abrir a janela da sala. Ela estava difcil, dura. Quando puxou-a com fora, Osvaldo a empurrou e a janela abriu, batendo nos lbios do mocinho, cortando-os. No vidro da janela, Henrique viu por segundos o rosto de Osvaldo. Apavorou-se tanto que no conseguiu nem falar, ficou parado. Depois tentou ver mexendo na ja nela, se era reflexo de algum quadro a imagem que vira, mas nada, no havia explicao. Tremendo ainda, foi atrs de Nena para que ela fizesse um curativo.- Henrique, precisa ter cuidado! Machucou, poderia ter quebrado os dentes.- Nena, voc j teve a sensao de ver uma pessoa onde no tem ningum?- Nunca tinha sentido, mas aqui j. Por vezes sinto como se algum estivesse espionando. uma sensao ruim.Henrique ficou horas pensativo.37Fbio queria ver Anglica, ficou interessado, atrado por ela. Tirou uma cpia de um documento j entregue e foi l lev-lo. Conversou com os jovens e os convidou para lev-losno domingo gruta. Henrique aceitou, contente.No domingo tarde foram ao passeio. O lugar era muitobonito, de uma rocha mais alta se avistava o mar batendonas pedras.- Como aqui bonito! - Exclamou Fabiana.Ela e Henrique foram para o outro lado, e Fbio sentou-se perto de Anglica. Ela arrumou o leno na cabea. Como ele estava caindo, tirou-o; seus cabelos estavam nas cendo, estavam bem curtinhos.- Anglica, voc muito bonita! - Disse Fbio, sincero.- Mesmo com os cabelos curtos assim?- Sim - ele sorriu e pegou na mo dela.- Fbio, meus cabelos esto assim pelo tratamento de quimioterapia, estou sarando de um cncer - falou a mocinha retirando a mo da dele.Ela olhou para ele, que pareceu indiferente, como se notivesse escutado. Nisso os dois irmos chegaram e o passeiodecorreu agradvel.Em casa, Fabiana comentou:- Fbio est interessado em voc. Vai namor-lo?- No quero namorado! - Exclamou Anglica.- S porque Csar agiu daquele modo, voc pensa que outros iro fazer igual? - Falou Fabiana.- No penso mais em Csar, nem acho que agiu errado, muito novo para ficar namorando algum doente. S vounamorar de novo quando tiver a certeza de que estou curada.- Mas voc est! - Afirmou Fabiana.- Ai, ai, no agento mais! - Gritou Henrique.O irmo subiu correndo a escada. As duas irms, que estavam no quarto de Anglica, foram ao encontro dele.- O que aconteceu, Henrique? - Indagaram a duas ao mesmo tempo.- Estava quieto na sala quando recebi um tapa com fora nas costas.- Quem bateu em voc? - Perguntou Anglica.38- No sei! S que bateram...Ele levantou a camisa e as duas se espantaram, havianas costas dele uma marca avermelhada de uma mo grande.- Henrique, pare com isso! - Exclamou Fabiana. - No invente! Voc quer mudar e est usando os boatos para isso.- Que boatos? - Perguntou Anglica.- Que esta casa assombrada - respondeu Fabiana.- Mas por que quer mudar, Henrique? - Indagou a irm mais velha.- Gostava daqui. No queria que nos mudssemos da cidade, gosto dela, da escola, dos amigos, s que verdade. Anglica, acredite em mim, tenho sido atormentado por uma coisa que no sei o que . Estou com medo!Roberto e Dinia, que estavam no quarto deles, vieramver o que acontecia.- Papai, no durmo no meu quarto! - Falou o mocinho determinado e apavorado.- Vou colocar um colcho no nosso quarto, voc dormirconosco.Eo pai foi no quarto do filho, pegou o colcho e colocouao lado da cama do casal.- Pronto, filho, dormir aqui at que no tenha maismedo.As trs acharam estranha a atitude de Roberto, ele que sempre ensinara a no ter medo, a no alimentar esse sentimento e enfrent-lo para vencer, agora no falava nada, concordava com o filho. Mas elas nada comentaram."Logo estaro mudando!" - Osvaldo vangloriou-se e riu.Henrique acomodou-se e se ps a pensar:"Meu Deus, ser que estou louco? Devo estar doente. Deve ser grave. Ser que imagino isso tudo? O que ser queeu tenho?"Ao ver que os pais ressonavam, chorou. Seu choro foisentido, lgrimas escorreram abundantes pelo seu rosto."Prefiro achar que existe mesmo esse fantasma e que ele, por algum motivo, esteja fazendo objetos se mexerem e que eu oua suas risadas macabras. E se for assombrao, por que eu? Por que ele implicou comigo? No tenho nada com ele.39No posso continuar assim. J sou grande para ter medo a ponto de no dormir sozinho. Eu, o homem da casa! As meninas esto l dormindo cada uma no seu quarto e eu aqui, com meus pais. Tenho vergonha, mas meu medo maior. No meu quarto a luz acende, apaga, portas do armrio se fecham e se abrem. J senti puxar meu lenol. No durmo mais sozinho Queria mudar dessa casa, ir embora daqui. Mas se mudarmos e no adiantar? Se estou doente, o problema comigo! Ele ir para onde eu for. Preciso pensar. Alm do mais, todos esto acomodados, gostando, no justo que se mudem por minha causa, porque eu quero. Fabianaj acha que eu invento tudo isso. Ainda bem que papai acredita em mim. Depois existe a multa, eles no tm dinheiro para pag-la. Estou sendo um problema para todos. Tenho de dar um jeito!"Acabou adormecendo. Acordou cedo para ir escola e no intervalo foi biblioteca e se ps a pesquisar sobre doenas mentais; identificou em seu caso semelhanas com esquizofrenia*."Isso grave! Ser que tenho essa enfermidade? No quero ter isso. Ser que imagino tudo, objetos no mexem nada, luz no apaga nem acende e eu acho que vejo? Que doena estranha e como faz o doente sofrer!"Teve vontade de chorar, mas se esforou para parecernatural e voltou para a classe.Pensou muito e resolveu evitar de falar, de pensar sobredoenas e achar mesmo que era um fantasma e se queixar omenos possvel, no queria ser internado como louco.Henrique j estava se afastando das pessoas, os amigos se reuniam, conversavam e ele preferia escutar, s dava alguns palpites. Tambm no conseguia prestar ateno nas aulas. Estava tenso e nervoso.No outro dia, Roberto conversou cedo com Olegrio, quecontinuava a vir duas vezes por semana cuidar do jardim.* Esquizofrenia: termo que engloba vrias formas clnicas de psicopatia e distrbios mentais. Sua caracterstica fundamental a dissociao das funes psquicas, disso decorrendo a fragmentao da personalidade e perda de contato com a realidade (N.E.).40- Senhor Olegrio, trabalha h muito tempo nessa casa?- Sim, senhor, trabalho h anos.- Nunca ouviu ou viu nada de estranho? - Indagou Roberto.O senhor quer dizer assombrao? No, senhor, nunca vi ou ouvi nada de estranho -respondeu o jardineiro.- Voc sabe o que ocorreu aqui? L no banco o pessoal j me avisou que esta casa assombrada e que ningummorava aqui h muito tempo.- Se assombrada eu no sei - respondeu Olegrio -, mas desde que ocorreu o crime, isso h muito tempo, ningunl mora aqui por muito tempo.- O crime? O que sabe sobre isso? - Perguntou Roberto.- No sei bem o que aconteceu, mas sei quem sabe.A Rita, que foi empregada da casa na poca do crime. Elaera mocinha quando tudo aconteceu, agora j uma se nhora, ela mora l do outro lado. Se o senhor quiser, lhe douo endereo.Roberto anotou o nome da empregada, onde morava edecidiu ir at l, queria saber o que ocorrera na casa.Henrique, tarde, conversou com Nena.- Voc acredita em mim? Vejo a assombrao. Bem, no sei o que realmente.- Menino, no sei se acredito em alma penada - falou a empregada.- Seria engraado se o fantasma tivesse pena como as galinhas - expressou o garoto, rindo.Osvaldo no achou graa."Quem tem pena sua av!"- Quem tem pena a av!Henrique falou, parou e olhou para Nena, que tambm largou o que fazia e olhou assustada para ele.- Por que disse isso, Henrique?- No sei, falei sem perceber. Que estranho!"R, r, r! O moleque repete o que eu digo. Maravilha! Agora estou no caminho certo, esse garoto ir fazer a famliase mudar, ah, se vai!"41Henrique foi brincar com os cachorros e Nena continuouseu trabalho, pensativa."Esse menino no est normal. O que ser que ele tem?Est estranho!"O mocinho estava triste, pegou os cezinhos, acariciou-os, depois os colocou no cercado. Um deles correu para um lado, ento Henrique escutou um barulho e um rudo esquisito. Quis correr, mas resolveu investigar."Preciso ter coragem, parar com isso, de ter tanto medo,e ver o porqu do barulho."Percebeu ento que um dos ces chorava, uma tbuacara em cima dele. O garoto suspirou aliviado, tirou a tbuae agradou o filhote."Quando estamos com medo, gato vira ona."Ficou tempo arrumando o canil, brincando com os cachorros, distraiu-se, mais aliviado, pensou:"Creio que devo enfrentar o medo e verificar a procedncia dos barulhos que escuto, talvez ache explicao paratudo isso. Bem, pelo menos nem tudo inexplicvel." Roberto estava inquieto, em casa parecia que estava sempre vendo vultos, parecia ouvir risadas, como tambm tinha visto objetos se mexerem. Aquela casa deveria ter algo e resolveu procurar a dona Rita, que Olegrio recomendara para saber o que de fato acontecera ali.Foi tarde, achou fcil a casa e foi recebido por umasenhora que o olhou fixamente. Por momentos ele no soubeo que dizer, tossiu e por fim falou:- Senhora, desculpe-me se a incomodo, que moro na Casa do Penhasco e estou tendo algumas dificuldades l. Sei que a casa tem uma histria e que a senhora talvez possa me ajudar me contando.Dona Rita o olhou novamente, ficou quieta por segundose aps falou:- Quem no tem histria? No sei se posso ajud-lo, mas posso falar o que sei. Era moa e trabalhava para o casal, o senhor Irineu e a dona Leda, eles moravam naquela casa. Trabalhava l tambm Osvaldo, que era caseiro e jardineiro. Quanto ao crime, ningum sabe o que ocorreu realmente42naqueles dois dias trgicos, me desculpe, mas nem eu sei, s posso falar o que ouvi. Trabalhei no sbado pela manh e quando voltei na segunda-feira, encontrei-os mortos. Ftima, a garotinha de cinco anos, caiu do penhasco, no buraco do lado direito da casa, onde agora tem as rvores, que l foi aterrado. Ela estava l cada, morta, a pobrezinha. Na sala da frente os trs mortos, o casal e o empregado. Foi muito triste! Gostava muito deles, dona Leda era muito boa comigo. Os comentrios foram diversos, cogitou-se que algum estranho entrou l e assassinou todos, mas a polcia afirmou que dona Leda e a menina morreram no sbado, e os dois homens no domingo, e tudo indicava que o senhor Irineu se matou. O pai do meu patro veio enterrar os trs juntos. Os valdo foi sepultado como indigente. Tiraram todos os mveis da casa e a trancaram. Ouvi dizer que a casa ficou para o irmo do senhor Irineu. Ele at tentou alugar, reformou, mas todos tm medo. E isso aconteceu h tanto tempo!- Dona Rita, existia na casa trepadeira, uma planta que cobre as paredes de fora da casa? - Perguntou Roberto.- Sim, senhor, a casa tinha nas paredes heras verdes e estavam sempre podadas e bonitas - respondeu dona Rita,saudosa.- A senhora acha que a casa ficou assombrada?- Que tem assombraes? Bem, no sei, nunca mais fui l, s escutei comentrios, mas em cidade pequena fala-se muito. Mas l aconteceu esse fato to triste, talvez um dos mortos no tenha encontrado paz e esteja l perturbando - respondeu dona Rita.- Encontrar paz? Como se faz para ajud-los a ter paz?- Indagou Roberto.- Quem sabe? Talvez aquela religio que conversa com eles, os espritas.- Sim. Obrigado, senhora.- Espero que resolva esse problema. Se ele ou alguns deles estiverem vagando na casa, j tempo de terem so sego - disse dona Rita.Roberto foi embora e ento se lembrou do seu amigoVirgilio.43AcontecimentosDe&Quando Roberto chegou em casa tarde, encontrouFbio conversando com a famliia. Aps os cumprimentos,ele explicou ao dono da casa.- Senhor Roberto, vim aqui para ver se quer colocar telefone em sua casa. A linha passar na frente, se quiser s puxar os fios e poder ter telefone.- Aceite, papai, ser to bom! - Pediu Fabiana.- No sei, vou pensar.Roberto no queria assumir compromisso, talvez tivessem que se mudar. Era hora do jantar e a visita foi convidada e aceitou. Fbio olhava muito para Anglica, que se sentia incomodada. Aps foram para a sala, conversaram. Ao se despedir, Fbio pediu:- Anglica, voc me acompanha?Ela foi, estava inquieta. Ele falou:- Anglica, no sei mais que desculpa dar para vir aqui e lhe ver. Deve ter percebido que estou interessado em voc.Tenho chance?- que... - Anglica encabulou.- J entendi, desculpe-me.- Fbio, no isso, que estive doente, talvez nem tenha sarado e...- J disse, esteve doente, no est mais - falou ele.- Como pode ter certeza? - Balbuciou ela.44- Eu sinto que est curada e a doena no desculpa para mim.- Tive cncer no tero, que foi extrado - falou Anglica, baixinho.- Por que diz isso para mim? - Indagou o moo. Anglica entendeu, ele s estava pedindo para namor-la, e no para se casarem. - Sorriu. Ele pegou na modela e a beijou.- Estamos namorando?- Estamos!Quando entrou na sala, todos a olharam por causa da demora e por ela estar to contente.- O que aconteceu, Anglica? - Perguntou Fabiana.- que Fbio e eu estamos namorando.- Legal, gosto dele! - Exclamou Fabiana.- Eu tambm, e ele parece apaixonado por voc. s observar a cara dele de bobo enamorado - comentouHenrique rindo.Todos riram, at Osvaldo ficou satisfeito ao ver a mocinha contente.- Falei a ele de minha doena - falou Anglica.- De sua ex-doena - corrigiu a me. - Mas, filha, por que fez isso?Haviam combinado que l no iam comentar com ningum sobre a doena, para evitar comentrios que j a fizeram sofrer: "Ser que ir sarar?" "E to nova!" "No poder ter filhos!" "O cabelo crescer!", etc.- Senti vontade de contar tudo ao Fbio - disse a mocinha, suspirando.- Espero que ele no conte a ningum - expressou Dinia. Foram dormir e Osvaldo ficou na sala, murmurou:"Hoje no assusto ningum, estou emocionado com a alegria da Carequinha."No outro dia, Henrique ia subir a escada quando colocoua mo no corrimo e sentiu como se tivesse colocado a moem outra muito gelada, grande e peluda; arrepiou-se, tiroua mo, teve vontade de gritar, mas s gemeu. Assustou-se,45ficou parado por segundos e aps subiu a escada correndo, sem colocar a mo novamente no corrimo. Fabiana estava no seu quarto. Henrique, no querendo ficar sozinho, foi para o quarto dela.- Oi, Fabiana, o que est fazendo?- Arrumando o quarto - respondeu, sem prestar aten o nele.- Fabiana, como voc est na escola? J se acostumou mesmo?- No comeo senti falta de minhas amigas, mas agora me acostumei, as meninas so bem legais. E tem o Leco, que o mximo.Henrique teve de ouvir a irm falar do Leonardo, o Leco, por quem estava interessada, tudo era prefervel a ficar sozinho. S de pensar naquela mo, arrepiava-se. Ficou l com a irm at serem chamados para o jantar.Todos foram dormir, Roberto pegou o jornal para ler. Ficou pensando: "Tenho de tomar uma atitude, no gostaria de mudar dessa casa e ter de falar a todos que ficamos com medo dos fenmenos estranhos que aqui ocorrem. Estou com d do meu filho, o coitado est apavorado. Ser pai no fcil, ter de tomar decises da famliia parece s vezes complicado. O fato que eu tambm tenho me sentido mal nesta casa. As vezes me sinto exausto, como se algum absorvesse minha energia. Outras, sinto tristeza, como se estivesse sozinho, engraado isso, eu, sozinho! A sensao de no ser amado to forte que di; outras vezes sinto dor no peito, como a que Henrique diz sentir. As risadas so aterrorizadoras. J pensei muito e concluo que no impresso. Li h tempos que existe a possibilidade de ler na energia que envol ve objetos ou lugares os acontecimentos marcantes ocorridos com ou neles. Parece que se chama psicomefria*... isso mes mo. Mas se aqui aconteceu um crime, no isso que vemos*psicometria: mediunidade segundo a qual o mdium, posto em contato com objetos, pessoas ou lugares relacionados com acontecimentos passados, sintoniza se de tal maneira com o clima psicolgico em que esses acontecimentos ocorreram que se torna capaz de descrev-los (N.E.).46ou ouvimos. Ento no deve ser isso. Henrique tem medo de estar doente, no creio, vejo e ouo tambm. Mas se falar isso, vou apavorar todos. Acho que pelo bem da famlia devemos nos mudar, tentar negociar a multa do contrato, afinal no aluguei casa com fantasmas. Se meus amigos souberem disso, iro rir pareo um menino com medo. Se pelo menos tivesse certeza de que esse fenmeno no nos prejudica. Prejudicando? Claro que est! Meu filho est apavorado e isso comea a me preocupar. Pensei que aqui iramos ter o sossego to almejado. Sofremos tanto com a doena de Anglica, gastei muito, fiz dvidas, comprei os mveis prestao e estou pagando o emprstimo. E aqui Dinia est ganhando bem. O que fazer?"De repente pareceu ver a caixa de charutos se mover. Eleno fumava, havia ganhado de um cliente aquela caixa e adeixou em cima da mesinha."Fume! Fume! Quero desfrutar do fumo, faz tempo queno trago!" - Insistiu Osvaldo.Roberto pegou a caixa, teve vontade de acender umcharuto, mas se conteve."No fumo e no agora que o farei. Que vontadeestranha!"Apreensivo, foi dormir sem acabar de ler o jornal.Na escola os amigos de Henrique insistiram com ele paraserem convidados a visitar sua casa.- Gostaramos de ir l, nunca fomos.- Prometemos no bagunar. Fala-se tanto dessa casa que estamos curiosos. Ento, podemos ir? -- Henrique, ela assombrada ou no? E verdade que a alma penada do criminoso est l? Ele matou uma meninabem pequena.- No tem nada, uma casa como outra qualquer - respondeu Henrique.- Se no tem nada a esconder, nos convide.- Est bem, espero vocs hoje tarde. Podem ir de nibus, ele pra na estrada - concordou Henrique.Os meninos se entusiasmaram e Henrique ficou preocupado. Voltou para casa pensativo.47"E se o fantasma assustar meus amigos? Como expli car? Bem, posso dar algumasexplicaes. Se uvirem risadas, digo que uma gravao que fiz para assust-los, se virem objetos se mexerem, falo que amarrei com linha e puxei. Posso falar quefiz paraanimar. isso mesmo!"Mas ficou apreensivo. No almoo falou a todos que osamigos vinham. Dinia pediu empregada:- Nena, faa um lanche para eles. Que sejam bem-vin dos, gosto da casa cheia, podempassear por a com eles.Vieram doze, estavam curiosos, observaram tudo com ateno, foram ao pomar, comeramfrutas, brincaram com os cachorros, riram e conversaram, animados. Henrique fi cou tensoo tempo todo, tentando parecer normal. Nena ser viu um lanche saboroso, os garotosgostaram.- Puxa, Henrique, que casa gostosa! Lugar bonito! Vocs esto bem acomodados aqui.Que sorte!- Parece tudo to normal! A histria da assombrao falatrio de cidade pequena.- Queria morar aqui!Henrique sorriu ao escutar os amigos, suspirou aliviado.Quando foram embora, pensou: "Ainda bem que o fantasmano os assombrou."Osvaldo ficou olhando tudo aborrecido e quieto. "No me importo com essa molecada, elesno moram aqui. No sou palhao para dar espetculo. Quero assombrar os da casa. Aindabem que esses pestinhas foram embora. Como so alegres!"Naquela semana, como todo primeiro domingo do ms, era o da visita que Nena fazia aoirmo, que estava preso. Osvaldo ficou na cozinha observando-a, e quando ela se ps apensar ele ficou escutando."Antonio logo ser solto. J sofremos tanto separados, justo que fiquemos juntos. Comoiremos fazer? Ser que terei de ir embora daqui? J no sou to nova para arrumar outroemprego, depois de todos esses anos, tenho-os como minha famlia, faz onze anos quetrabalho para eles. Como me aven turar por a sem emprego? Sei que para ele ser maisdifcil,48ningum quer dar emprego para ex-presidirio. E eu quero tanto ficar com o Antonio.Como dizer aos meus pafres que menti esse tempo todo? No comeo achei, quando vimtra balhar para eles, que seria mais um emprego, e para que me aceitassem menti, dizendoque Antonio era meu irmo, como tambm inventei o motivo de ele estar preso. Se nofizesse isso, naquela poca, ningum me daria emprego. Eles acre ditaram e no checaramse era verdade, e o tempo foi passando, eu fui gostando deles cada vez mais, eram, sominha famlia, porque a minha mesmo nem conheci, meus pais me abandonaram. Fui bempequena para uma instituio, quan do sa, me arrumaram emprego de domstica, mas lum dos moos, filho dos meus patres, tentou estuprar-me, tive de sair e foi nesse momentodifcil que conheci Antonio e nos apaixonamos, a aconteceu aquela desgraa, fugi com ele,at que foi preso e j est h treze anos na priso. Ainda bem que ele logo ir serbeneficiado com a liberdade condicional. J estivemos muito tempo separados, agora queroficar com ele. Mas como? Quero tanto continuar aqui, com essa famlia. Como farei parame desmentir? Ser que vo conti nuar confiando em mim? Meu Deus! O que fao? E todifcil contar a verdade!""Mas que empregada mentirosa! - Exclamou Osval do. - Enganou a todos, diz que oirmo que visita mas o amante! Isso no fica assim!"No domingo, cedinho, Roberto levou Nena at a rodovi ia. Ela foi cheia de sacolas comroupas, doces, bolo, etc. Osvaldo ficou olhando, quis ir junto para ver o que a empre gada iafazer, mas no conseguiu sair, o mximo que ia era at o caminho."Que maldio! Queria tanto ir com ela. Nena vai visitarum preso, queria ver como uma priso. Antonio est presocomo eu, s que ele recebe visita e eu no!"Dias se passaram e Osvaldo estava impaciente, no era sempre que conseguia fazerbarulho, assustar os dois. Tentava e, quando dava certo, se divertia. Queria que eles semudassem para ficar s naquela casa, sua priso, embora s vezes achasse que no era toruim assim ter companhia.49Estavam todos almoando, Nena tomava as refeies com eles, era tratada como ummembro da famlia. Roberto tirou do bolso uma carta. Como a correspondncia demoravapara ser entregue, ali o correio passava uma vez por semana, ia ento para o endereo dobanco.- Chegou uma carta para voc, Nena, do seu irmo."E agora que desmascaro esta mentirosa!" - Afirmou Os valdo. Se aproximou deHenrique, que falou o que ele queria.- Deixe-me ver! Engraado, Nena, seu irmo no tem o mesmo sobrenome seu! Por queisso? Voc pode nos expli car? Ser que no seu namorado? Pelo seu jeito, ! Vocmentiu! Este Antonio seu namorado!Nena viu sua mentira descoberta, levantou-se e pegoutremendo a carta.- E verdade isso, Nena? - Perguntou Dinia.Fez silncio por segundos. Nena comeou a chorar.- E verdade! Antonio como se fosse meu marido. - Fa lou Nena, saindo da sala.- Eu sinto muito... - Balbuciou Henrique, comeando a chorar, e saiu tambm.O pai foi atrs, a me o acompanhou, o almoo termi nou. O garoto sentou-se no sof echorou sentido, Roberto oabraou.- Papai, no agento mais isso! Nunca ia ofender Nena, gosto dela. Fui indelicado, grosso,a fiz chorar. Estou sendo sincero, no sei por que falei. No sabia nada daquilo. E isso estocorrendo, falo coisas que no quero, vem forte, parece que estou impulsionado e falo.Fez silncio, at que Dinia falou:- Que coisa! Primeiro foi com Fabiana, os pesadelos, o tratamento; depois a doena deAnglica, agora voc. Devemos lev-lo a um psiclogo ou psiquiatra!- Leve-me aonde quiser, eu topo! Fao qualquer coisa para ficar livre disso. Por Deus,papai, vamos mudar! E vergo nhoso eu dormir no quarto de vocs, estou cansado, nervoso, s chegar em casa sinto como se tivesse dois buracos no peito, escuto barulho, vejoobjetos mexer. Eu estou sofrendo!50- Meu filho, entendo voc. Vamos ajud-lo - consolouRoberto.Henrique saiu, foi para seu quarto triste e aborrecido. Osvaldo resmungou:"Ser que exagerei? Estou com d do garoto; depois, aempregada est se desmanchando em lgrimas."- Roberto, Henrique est me preocupando. Ser que adolescncia? - Indagou Dinia.- No creio, Henrique sempre foi um bom menino. Dinia, eu tambm tenho visto eouvido coisas estranhas nesta casae, como ele, no tenho me sentido bem aqui.- Por que no me disse? - Perguntou a esposa, preocupada- Para no a assustar. Que voc acha de pedir ajuda ao Virglio? Ele esprita, nos ajudoucom a doena deAnglica.- Ele orou por ela, nos visitava sempre nos animando, mas agora diferente. Vou falarcom o padre da cidade, es pere, Roberto, deixe primeiro eu pedir ajuda ao proco. Vou hojemesmo.Roberto concordou. Dinia foi trocar de roupa para ir cidade junto com o marido. Eleficou pensando no amigo. Conhecia Virgiio desde criana, cresceram juntos, moravamperto, gostavam um do outro, freqentaram a mesma escola, ele era leal e bondoso. Quandomoo passou a freqentar o Centro Esprita, tornou-se religioso.Roberto no gostava defalar sobre o assunto e o amigo no insistia, mas sabia que ele via pessoas que morreram,conversava com elas e, segun do ele, o Espiritismo o ajudou muito. Virgiio era tranqilo,confiava nele.Dinia foi igreja, observou tudo, era simples, pequena e muito bonita. Lugares de oraosempre lhe davam calma; ajoelhou-se e orou, sentiu-se melhor. Viu uma senhoraarrumando o altar, foi at ela e pediu para falar com o padre. Esperou meia hora. A mesmasenhora a convidou.- Por aqui, o padre ir receb-la.Aps os cumprimentos, Dinia foi logo ao assunto.51- Senhor, sou catlica, moro na Casa do Penhasco, l no morro, e estamos passando pordificuldades. Meu filho e meu esposo tm visto e ouvido coisas estranhas por l, o meninoest apavorado. Gostaria que o senhor fosse l benzer, sei l, exorcizar a casa. O senhor ir,no ? Porque, se no for, meu esposo vai chamar um amigo dele que esprita.- Na Casa do Penhasco... Mas a senhora j mudou h um bom tempo e no veio missa.- que tenho estado muito ocupada - justificou-se Dinia.- Senhora - falou o padre -, no sei se posso ajud-la. J estive l a pedido de umaoutra famlia. No h nada de errado com a manso, impresso, talvez pelo tipo, pelolugar em que est a casa ou pela tragdia que ocorreu l.- Ento o senhor no vai me ajudar? - Indagou Dinia, indignada.- Acho que melhor seu esposo chamar o amigo esprita, afinal o Espiritismo mexe como demnio. Desculpe-me, se nhora, estou muito ocupado, espero v-los domingo na missa.Dinia deu um sorrisinho forado, despediu-se e pensou:"No quer nos ajudar e convida para a missa."Outras pessoas aproximaram-se e ela se afastou, sen tida. Voltou de nibus para casa.Nena no sabia como agir, fez seu servio normalmente aps ter chorado por tempo. Queriatanto contar a verdade! Imaginou muitas maneiras de faz-lo e sentiu ter sido daquele jeito.No entendia Henrique, era to educado, amava os trs como se fossem filhos dela, cuidavadeles, Dinia sempre trabalhou e as crianas ficavam por conta dela. Agora o me ninoHenrique estava mudado, desde que mudaram para aquela casa estava estranho, calado,quase nem brincava com os cachorros. Algo estava errado, pensou ela.Ningum tocou no assunto. Foi como se no tivessemdescoberto, cada um estava envolvido em seus problemas,que eram muitos.Anglica s pensava em Fbio. Estava muito entusias mada com ele, o namorado toatencioso, carinhoso. Quanto mais o conhecia mais o achava inteligente, simples e, o maisimportante, ele parecia tambm enamorado. As vezes tinha52a impresso de conhec-lo h muito tempo, riam quando des cobriam interesses emcomum, gostavam das mesmas coi sas. S que j no era indiferente morte como algunsmeses atrs, queria sarar para estar sempre perto dele. Estava preo cupada. "Ser que sareiou no?" - Indagava a si mesma. Mesmo no querendo pensar na sua doena o fazia.Queria muito estar curada. Tambm a mocinha estava preocupada com o irmo, queriatodos bem e Nena estava includa nesse desejo, gostava dela.Fabiana no queria dar palpite, achava que se o problema era aquela casa, deveriam semudar. Achava-a estranha; de pois no gostava de pensar que ali houve um crime brbaro.Quanto a Nena, entendia-a por ter mentido, o fizera por medo de ser mandada embora. Noqueria separar-se dela, que considerava uma segunda me.Diriia estava com uma encomenda grande, tinha que trabalhar e estava preocupada com ofilho. No sabia o que fazer, se o levava ou no para a casa de sua me. Mas se o fizesse eleperderia o ano letivo. Ser que ele estava doente? Seria srio? Sofrera tanto com a doenade Anglica, ainda tinha medo de que o cncer surgisse em outro rgo, nem bem passara apreocupao com um, vinha o outro.Esperava resolver esse problema com Nena, no sabia por que ela mentira. Algo muitosrio deveria ter ocorrido para ela esconder a verdade esses anos todos. No queria perd-la, gostava dela, estava com eles havia tantos anos, sempre leal, trabalhadeira. Se ela fosseembora, teria mais um problema, ainda mais que a faxineira avisara que no vinha mais, eraa terceira que desistia.Mesmo preocupada, Dinia concentrou-se no trabalho.Roberto no pensou mais no assunto, achou que Nenapoderia explicar, tinha muito o que fazer e estava muito preo cupado com Henrique.Quando Roberto chegou para jantar, encontrou Henriqueparado, de p ao lado de uma janela, no sof livros abertos.- Papai, amanh tenho prova e no consigo estudar, acho que estou doente.53- No, filho, voc no est doente, para tudo isso que est acontecendo deve terexplicao. Reaja, no se deixeabater. Vamos confiar, tudo voltar ao normal.O jantar foi servido e Nena no se sentou a mesa. Robertoindagou:- Nena, por que no se senta conosco? No quer jantar?- que... No sei se devo - respondeu Nena, encabulada.- Sente-se, por favor - insistiu Roberto.Ela se sentou e Henrique falou:- Desculpe-me, Nena, no quis ofend-la. No quis mesmo.-Estamos com muitos problemas, que fique tudo como antes, depois resolveremos o seu,est bem, Nena? - DisseDinia.Jantaram em silncio. Logo aps vieram Fbio e os ami gos de Fabiana, conversaramanimados na sala. Henrique ficou quieto, estava triste. Quando as visitas foram embora, asduas os levaram at os carros. Fbio indagou namorada:- Est acontecendo alguma coisa com vocs? Henrique est to quieto.- Acho que esta casa, Henrique insiste em dizer que v e ouve coisas.- E voc, v ou escuta? - Indagou o moo.- No, mas s vezes tenho sensaes estranhas, como se algum me chamasse deCarequinha e risse de mim.- Anglica, se seus pais quiserem mudar eu tiro a multa e arrumo outra casa boa paraVocs.Quando ela entrou em casa, os quatro estavam aindana sala, e Anglica comentou o que Fbio dissera. Henriquefalou, triste:- Tudo por minha causa! Vou superar isso! Se todos gos tam daqui e se esto bem, voume adaptar. Tudo pode serimpresso ou estou doente. Hoje vou dormir no meu quarto.- No, filho, eu acredito em voc, no quero que sofra com medo. Dormir conoscO, seinsistir eu irei para seu quar to, vou junto - disse o pai.- Roberto - falou Dinia -, telefone, por favor, para seu amigo Virglio, pea ajuda aele, convide-o para vir aqui. Creioque ele pode nos auxiliar.54- Boa idia - expressou Anglica. - Ele me ajudou tanto quando eu estava doente, meanimava, eu me sentia bemquando ele me dava passe.- Tambm aprovo, gosto dele, acho a Doutrina Esprita muito fraterna e verdadeira ateoria sobre reencarnao. muito triste e injusto pensar que se vive uma vez s aqui naTerra - opinou Fabiana.- Vou fazer isso. Amanh mesmo telefonarei do bancopara ele.Foram dormir mais esperanosos.55Pela manh, Roberto tentou falar com seu amigo Virglio e no conseguiu, porque este nose encontrava em casa; estava aflito para faz-lo. Achava que ele, com seu conheci mento ebondade, os ajudaria. S o fez tarde. Contou sem entrar em detalhes o que ocorria e pediu:- Por favor, nos ajude novamente, venha nos fazer uma visita com a Silze. Aproveitarpara conhecer o local, descansar um pouco. Aqui pacato e tem um clima muito bom, vercomo bonito e como estamos com problemas.- Daqui a vinte dias teremos um feriado que poderei emendar. Vou conversar com Silze,telefono avisando se der para ir. Roberto, ore mais e pea para todos em casa orarem. Euvou fazer minhas preces daqui e pedir aos bons espritos para ajud-los.E Virglio o fez, na reunio daquela noite, da qual partici pava com outros companheiros noCentro Esprita que fre qentava; orou e pediu auxlio para os amigos.Carmelo era um desencarnado trabalhador do bem e amigo de Virglio, estava no planoespiritual j havia algum tempo. Tinha ajudado Anglica quando ela estava doente,aprendera a am-la e queria bem a todos da famlia. Ao sa ber do problema, pediu aomentor espiritual da casa para ver o que ocorria e tentar ajud-los. Foi dada a permisso eCarmelo foi para l visit-los.Logo que chegou, Carmelo entendeu o que estava acon tecendo. Viu Osvaldo, mas este noo viu. Osvaldo tinha56poucos conhecimentos do plano espiritual, via e agia como se estivesse encarnado, s veriaum outro desencarnado se fosse como ele ou se um bom abaixasse sua vibrao. Carmelopreferiu no ser visto por ele, isso facilitaria, por enquanto, seu trabalho.Analisou o que estava acontecendo e traou um plano de ajuda, se organizou e tomoualgumas providncias. Orou e incentivou os moradores da Casa do Penhasco a faz-lo.Conseguiu, todos passaram a orar. E no domingo, quando reunidos, noite, Roberto osconvidou:- Virglio nos recomendou que orssemos mais. Vamos fazer uma prece juntos?Isso melhorou os fluidos do lugar. Enquanto oravam, Car melo deu passe em todos,acalmando-os, concentrou sua ajuda em Henrique, no deixando mais que Osvaldo sugasseas energias; com isso ele no pde mais mexer objetos nem fazer barulho. Vigiava Osvaldode perto, tambm lhe dando energias benficas que o faziam dormir. Ele passou a adormecermuito. Com sono ia para um canto da sala e dormia. Resmungava sem entender o queacontecia:"Que preguia, at parece que estou encarnado. Estou com muito sono, se estivesse nocorpo fsico diria que estava doente. Que moleza! Pior que no consigo fazer nenhumassombro. Desse jeito eles iro desistir de se mudar. Vou dor mirde novo!"nena estava quieta, conversava s o essencial e comeou, a pedido de Roberto, a orarmais. Estava mais calma, porm muito preocupada, sabia que logo iria ter que contar averdade e temia a reao de seus patres.As garotas tambm passaram a fazer mais preces. Henri que sentiu-se melhor, maisdisposto e se ps a estudar, estava atrasado na escola e queria se recuperar. O casalaguardava esperanoso a chegada do casal amigo.Para melhor ajudar, Carmelo soube de tudo, quem eram os envolvidos nos acontecimentosocorridos ali no penhasco, onde estavam e o porqu de Osvaldo estar ali. Assim ficouconhecendo a histria real dos ex-moradores da Casa do Penhasco.57Irineu, o antigo proprietrio, era jovem quando conhe ceu Leda e apaixonou-se por ela. Eleera de uma famlia rica, seus pais tinham uma fbrica de produtos agrcolas e ele viajavapara vend-los. Sentia-se feliz. Conheceu Leda quan do foi a trabalho quela cidade ecomearam a namorar. A famlia dele no queria o namoro, acharam-na vulgar e tambmfalavam muito mal dela na cidade. Mas ele teimou e, quando ela ficou grvida, eles secasaram. Alugaram uma casa na cidade, onde passaram a residir. Irineu preferiu morarlonge de sua famlia, j que eles no gostavam de sua esposa, e continuou com seu trabalhode viajante.Ele comprou as terras do penhasco no morro, amou o lugar assim que o viu. Leda nogostou, achou que ali ficaria isolada, mas acabou concordando e a casa foi construda,demorou para ficar pronta, foram trs anos e meio de cons truo, mas ficou como elesplanejaram, uma casa grande e muito bonita.Quando se mudaram, a filha, Mana de Ftima, a Fatinha,j era grandinha. Irineu queria mais filhos; Leda no, achavaque davam trabalho e que deformaria seu corpo."Tenho medo desse penhasco, perigoso o lado direitoda casa, vou ter de vigiar bem a menina" - dizia Leda."Realmente perigoso, vamos proibi-la de ir l" - falouIrineu.De fato, do lado direito da casa havia um declive com muitas pedras. Irineu mandou fazeruma trilha, um estreito caminho que o contornava. Achava perigoso, mas muito lindo.Quando construiu a casa, quis preservar o penhasco. Andava muito por ali admirando apaisagem. Conversou com a filhinha pedindo que no fosse l e a garotinha, obe diente,realmente no ia. Irineu continuava apaixonado pela esposa, fazia tudo para agrad-la,gostava de ficar em casa, era carinhoso, s vezes ficava aborrecido por ela gastar mui to,mas tentava justificar pensando que ela era jovem, que fora pobre e tinha vontade depossuir objetos. Para atend-la trabalhava muito.Leda foi uma jovem rebelde e independente, deu muitosaborrecimentos aos seus pais. Muito volvel, ficou grvida58por trs vezes e abortou. Quando Irineu se interessou por ela,ambiciosa, tudo fez para conquist-lo. Pensou:"E a oportunidade de acertar minha vida. Ele rico epoder me tirar dessa pobreza."Ficou grvida e contou a ele, chorando."Irineu, me entreguei a voc por amor e estou grvida. Case-se comigo! No abortarei,nunca faria isso com um filho seu, j o amo como amo voc. Vai me deixar ser mesolteira?""Casaremos. Amo voc e o nosso filho!" - Decidiu Irineu.No comeo foi novidade, ela curtiu o casamento, a gravi dez e a filhinha, depois comeou a ficar entediada; frvola,logo teve amantes.Osvaldo foi uma criana que sofreu muito. Quando era pequeno, a me foi embora, no agentou o marido bbado a surr-la e ele nunca mais soube dela. Osvaldo passou a morar com a av, me de seu pai, que no lhe tinha amor nem pacincia, estava sempre o xingando e dizendo que a me o abandonara; isso o fazia chorar, sentido. O pai lhe tratavacom indiferena, mas mesmo assim ele o temia e o evitava. Um dia seu pai, bbado, caiu na linha do trem e desencarnou num triste acidente. A av tornou-se mais amar gurada, tirou-o da escola e o ps para trabalhar. Passou por muitos empregos. Quando foi trabalhar para Irineu, a casa ainda estava em construo. Fez de tudo por l, ajudante de pedreiro, carpinteiro e por fim cuidou do pomar e do jardim."Osvaldo - disse Irineu -, venha morar no penhasco, va mos arrumar este cmodo de madeira e dormir aqui, assimimpedir que me roubem material de construo".Achou bom, ali no pagaria aluguel nem gua e luz, teria seu ordenado livre. Arrumou o cmodo da melhor maneira e ficou satisfeito, estava bem acomodado. E para defender o local ou para assustar os ladres, Irineu comprou um revlver e o deixou com ele."Use s se for necessrio, para assustar."Osvaldo se sentiu mais tranqilo, guardou a arma epassou a fazer seu servio, contente. Ambos, patro e em pregado, estavam satisfeitos.59Via pouco Leda, sua patroa. Achou-a linda, mas ela nem o olhava, mal respondia aocumprimento. Quando a casa ficou pronta, eles mudaram e ele continuou no seu quartinho."Fique conosco, Osvaldo - falou Irineu. Continuar no quartinho mas poder tomar as refeies na cozinha, facilitando sua vida. Assim se alimentar melhor e sobrar mais doseu ordenado. Far o servio mais pesado da casa, cuidar do pomar e do jardim""Aceito sim, senhor, elhe agradesceu- respondeu Osvaldo, contente."Voc sabe que viajo muito e ficando por aqui terei maissossego, a casa isolada. Vou guardar o revlver na gavetadesse movel, pegue-o se necessario.Irineu gostava do empregado e este dele. Leda dava-lhe ordens, sorria alegre e quando percebeu que o empregado a olhava admirado, ela comeou a provoc-lo, embora no querendo nada com ele, nem para amante. Osvaldo, encan tado, comeou a achar que ela estava interessada por ele e logo estava apaixonado.Fatinha era uma graa, obediente, meiga, amava muitoo pai, que lhe dava muita ateno e carinho.Rita era a empregada da casa, gostava muito da patroa,que lhe dava muitos presentes.Osvaldo, muito apaixonado, comeou a seguir Leda e logo descobriu que ela tinha dois amantes. Um deles era um jovem da cidade que fora seu namorado antes de ela se casar. E o outro, de uma cidade prxima, era mais velho e casado, os dois eram apaixonados por ela como o marido e Osvaldo.O amante, que era casado, quis abandonar a famlia por ela, o pai dele interferiu, foi visit-la e implorou paraque abandonasse o filho."Do seu filho eu no largo at que eu enjoe. Mas no sepreocupe, no vou abandonar meu lar por ele."Osvaldo, que estava escondido, ouviu tudo. Tinha cimedela e estava vivendo um tormento.Mas Leda logo enjoou desse amante. Ele, apaixonado,queria que ela fosse embora com ele. Osvaldo, que tudo60sabia, apavorava-se, no queria que sua amada fosse embora. Leda terminou tudo com ele, mas este homem, apaixona do, tentou se matar, ficou doente, largou a famlia e ela voltou aser sua amante.Osvaldo sabia tudo que acontecia com Leda, pois a vigiava e sofria com cime. Resolveu conquist-la sendo agradvel, dando-lhe flores, present