Vidas secas

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Vidas secas Vidas secas - - 1938 1938 Graciliano Graciliano Ramos Ramos Retirantes (1944), Cândido Portinari Prof. Jorge

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Vidas

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Vidas secas Vidas secas - - 19381938

Graciliano Graciliano RamosRamos

Retirantes (1944), Cândido Portinari

Prof. Jorge

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CONTEXTO HISTÓRICO MUNDIALCONTEXTO HISTÓRICO MUNDIAL

Século XX:Século XX:

• Primeira Grande Guerra (1914-18) Primeira Grande Guerra (1914-18) – crise humana que ativa os – crise humana que ativa os

negócios e prenuncia outras crises próximas.negócios e prenuncia outras crises próximas.

• Revolução Russa de 1917 – abalou o mundo com uma nova proposta – abalou o mundo com uma nova proposta

política (socialismo/comunismo).política (socialismo/comunismo).

• Crise econômica de 1929 Crise econômica de 1929 – provocou desemprego e desajustes sociais em – provocou desemprego e desajustes sociais em

escala global.escala global.

• A crise de 29 é uma crise do próprio liberalismo econômico – o Estado A crise de 29 é uma crise do próprio liberalismo econômico – o Estado

deve intervir?deve intervir?

• Fascismo/Hitlerismo e comunismo Fascismo/Hitlerismo e comunismo – surgem como alternativas.– surgem como alternativas.

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CONTEXTO BRASILEIROCONTEXTO BRASILEIRO Início do século XX: Início do século XX: incipiente industrializaçãoincipiente industrialização..

Até 1930, o Brasil viveu a Até 1930, o Brasil viveu a República Velha República Velha – domínio das oligarquias cafeeiras que – domínio das oligarquias cafeeiras que

defendem interesses particulares.defendem interesses particulares.

Em 1922: tentativa de tomada do forte de Copacabana (primeira manifestação do Em 1922: tentativa de tomada do forte de Copacabana (primeira manifestação do

tenentismo), tenentismo), fundação do Partido Comunista Brasileiro e Semana de Arte Moderna.fundação do Partido Comunista Brasileiro e Semana de Arte Moderna.

Em 1929, o café é fortemente atingido pela Em 1929, o café é fortemente atingido pela crise.crise.

Em 1930, Em 1930, Getúlio Vargas dá um golpe de Estado Getúlio Vargas dá um golpe de Estado que instaura a República Nova e que instaura a República Nova e

substitui o Estado oligárquico.substitui o Estado oligárquico.

Década de 30: abalada por intensas crises no plano político, intervenção nos sindicatos e Década de 30: abalada por intensas crises no plano político, intervenção nos sindicatos e

opressão do proletariado.opressão do proletariado.

1937: Estado Novo – endurece ainda mais o regime.1937: Estado Novo – endurece ainda mais o regime.

No Nordeste, de 1919 até 1938, Lampião e seu bando faziam “justiça com as próprias No Nordeste, de 1919 até 1938, Lampião e seu bando faziam “justiça com as próprias

mãos”.mãos”.

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Graciliano Ramos

(1892-1953)

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MODERNISMO – GERAÇÃO DE 30MODERNISMO – GERAÇÃO DE 30

Semana de 22Semana de 22: : profunda renovação na literatura brasileira.profunda renovação na literatura brasileira.

Geração de 30: Geração de 30:

Não mantém o experimentalismo dos vanguardistas.Não mantém o experimentalismo dos vanguardistas.

Porém, considera irreversíveis conquistas como:Porém, considera irreversíveis conquistas como:

1.1. O interesse por temas nacionais;O interesse por temas nacionais;

2.2. A busca de uma linguagem mais brasileira; eA busca de uma linguagem mais brasileira; e

3.3. O interesse pela vida cotidiana.O interesse pela vida cotidiana.

NOVA QUESTÃO: NOVA QUESTÃO: Como o artista pode participar concretamente das Como o artista pode participar concretamente das

transformações sociais com sua obra?transformações sociais com sua obra?

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PROSA: O Movimento NeorrealistaPROSA: O Movimento Neorrealista

Os escritores lançam um olhar crítico sobre a sua realidade imediata.Os escritores lançam um olhar crítico sobre a sua realidade imediata.

Literatura regionalista, caracterizada pela denúncia social.Literatura regionalista, caracterizada pela denúncia social.

Captam o universal no particular.Captam o universal no particular.

Recuperam e transformam características do Realismo-Naturalismo do Recuperam e transformam características do Realismo-Naturalismo do

século XIX.século XIX.

O determinismo do meio e das circunstâncias históricas e sociais aponta a O determinismo do meio e das circunstâncias históricas e sociais aponta a

humanidade como responsável pela sua trajetória.humanidade como responsável pela sua trajetória.

Preocupação em dar uma amostra do real sensível, sob a perspectiva da luta Preocupação em dar uma amostra do real sensível, sob a perspectiva da luta

de classes, mas com um de classes, mas com um lirismolirismo que atenua o clima de opressão. que atenua o clima de opressão.

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Características do Características do romanceromance

Único livro do autor em terceira pessoa – Único livro do autor em terceira pessoa – ONISCIÊNCIA ABSOLUTA que permite ONISCIÊNCIA ABSOLUTA que permite mergulhar na alma das personagens;mergulhar na alma das personagens;

capítulos relativamente independentes – gênero capítulos relativamente independentes – gênero intermediário entre o romance e o conto - intermediário entre o romance e o conto - QUADROS;QUADROS;

o romance surge a partir de um conto que se o romance surge a partir de um conto que se transformaria no capítulo “Baleia”;transformaria no capítulo “Baleia”;

característica circular, cíclica dos retirantes – característica circular, cíclica dos retirantes – começa em “Mudança” e termina em “Fuga”.começa em “Mudança” e termina em “Fuga”.

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TemasTemas O principal tema é, sem dúvida, O principal tema é, sem dúvida, a secaa seca. Esse fenômeno climático é a . Esse fenômeno climático é a

fonte principal das preocupações das personagens, que lutam contra o fonte principal das preocupações das personagens, que lutam contra o meio agreste e procuram a sobrevivência.meio agreste e procuram a sobrevivência.

Vidas Secas Vidas Secas – interior de homens que reproduz o exterior do ambiente.– interior de homens que reproduz o exterior do ambiente. Impõe o fatalismo do destino.Impõe o fatalismo do destino.

Outros temas são: Outros temas são: • • A problemática da marginalização social (a miséria e o êxodo rural). A problemática da marginalização social (a miséria e o êxodo rural). • • Opressão versus submissão. Opressão versus submissão. • • A incomunicabilidade e a incompreensão nas relações familiares.A incomunicabilidade e a incompreensão nas relações familiares.

• A desumanização das personagens.• A desumanização das personagens.• A impotência do homem.• A impotência do homem.• A revolta contra as injustiças.• A revolta contra as injustiças.• A solidão do homem.• A solidão do homem.

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História - CapítulosHistória - Capítulos

1. Mudança1. Mudança Condição de retirantes;Condição de retirantes; Incompreensão entre pais e filhos – ausência de comunicação;Incompreensão entre pais e filhos – ausência de comunicação; Chegam a uma fazenda abandonada;Chegam a uma fazenda abandonada; Sonho de uma vida melhor:Sonho de uma vida melhor:

[…] A catinga ressuscitaria, a semente do gado voltaria ao curral, ele, […] A catinga ressuscitaria, a semente do gado voltaria ao curral, ele, Fabiano, seria o vaqueiro daquela fazenda morta. Chocalhos de badalos Fabiano, seria o vaqueiro daquela fazenda morta. Chocalhos de badalos de ossos animariam a soli- dão. Os meninos, gordos, vermelhos, de ossos animariam a soli- dão. Os meninos, gordos, vermelhos, brincariam no chi- queiro das cabras, sinha Vitória vestiria saias de brincariam no chi- queiro das cabras, sinha Vitória vestiria saias de ramagens vistosas. As vacas povoariam o curral. E a catinga ficaria ramagens vistosas. As vacas povoariam o curral. E a catinga ficaria toda verde.toda verde.

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2.Fabiano

“Viera a trovoada. E, com ela, o fazendeiro, que o ex- pulsara. Fabiano fizera-se desentendido e oferecera os seus préstimos, resmungando, coçando os cotovelos, sorrindo aflito. O jeito que tinha era ficar. E o patrão aceitara- o, entregara-lhe as marcas de ferro.”

— Você é um bicho, Fabiano. […] — Um bicho, Fabiano. Vivia longe dos homens, só se dava bem com animais. Os seus

pés duros quebravam espinhos e não sentiam a quentura da terra. Montado, confundia-se com o cavalo, grudava-se a ele. E falava uma linguagem cantada, monossilábica e gutural, que o companheiro entendia. A pé, não agüentava bem. Pendia para um lado, para o outro lado, cambaio, torto e feio.

- Você é um homem, Fabiano!

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3. Cadeia

“Sabia perfeitamente que era assim, acostumara-se a todas as violências, a todas as injustiças”.

“Os meninos eram uns brutos, como o pai. Quando crescessem, guardariam as reses de um patrão invisível, seriam pisados, maltratados, machucados por um sol- dado amarelo.”

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4. SinhaVitória

“Provavelmente não havia perigo, a seca devia estar longe. Sinha Vitória constata que só falta a cama para serem quase felizes. Seus pensamentos se voltam para a galinha pedrês, a mais gorda, que foi comida pela raposa. Deseja vingança. Colocaria uma armadilha perto do poleiro. Era melhor esquecer o nó e pensar numa cama igual à de seu Tomás da bolandeira. Seu Tomás tinha uma cama de verdade, feita pelo carpinteiro, um estrado de sucupira alisado a enxó, com as juntas abertas a formão, tudo embutido direito, e um couro cru em cima, bem esticado e bem pregado. Ali podia um cristão estirar os ossos.”

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5. O Menino Mais Novo

6. O Menino Mais Velho

7.Inverno

“A família estava reunida em torno do fogo, Fabiano sentado no pilão caído, sinha Vitória de pernas cruzadas, as coxas servindo de travesseiros aos filhos. A cachorra Baleia, com o traseiro no chão e o resto do corpo levanta- do, olhava as brasas que se cobriam de cinza. Estava um frio medonho, as goteiras pingavam lá fora, o vento sacudia os ramos das catingueiras, e o barulho do rio era como um trovão distante.”

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8.Festa

• A família vai para uma festa de Natal na cidade.• Sentem-se “estrangeiros”.• Fabiano bebe e ganha coragem:

“— Cadê o valente? Quem é que tem coragem de dizer que eu sou feio? Apareça um homem.”

• Fabiano dorme e sonha com muitos soldados amarelos.

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9. Baleia

A cachorra Baleia estava para morrer. Tinha emagreci- do, o pêlo caíra-lhe em vários pontos, as costelas avulta- vam num fundo róseo, onde manchas escuras supuravam e sangravam, cobertas de moscas. As chagas da boca e a inchação dos beiços dificultavam-lhe a comida e a bebida.

“Não poderia morder Fabiano: tinha nasci- do perto dele, numa camarinha, sob a cama de varas, e consumira a existência em submissão, ladrando para juntar o gado quando o vaqueiro batia palmas”.

“Escutou, ouviu o rumor do chumbo que se derramava no cano da arma, as pancadas surdas da vareta na bucha. Suspirou. Coitadinha da Baleia.”

“Baleia queria dormir. Acordaria feliz, num mundo cheio de preás. E lamberia as mãos de Fabiano enorme. As cri- anças se espojariam com ela, rolariam com ela num pátio enorme, num chiqueiro enorme. O mundo ficaria todo cheio de preás, gordos, enormes”.

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10. Contas

•Consciência da exploração do patrão;

•Resigna-se com a sua condição.

“Aí Fabiano baixou a pancada e amunhecou. Bem, bem. Não era preciso barulho não. Se havia dito palavra à-toa, pedia desculpa. Era bruto, não fora ensinado. Atrevimento não tinha, conhecia o seu lugar. Um cabra. Ia lá puxar ques- tão com gente rica? Bruto, sim senhor, mas sabia respeitar os homens. Devia ser ignorância da mulher. Até estranha- ra as contas dela. Enfim, como não sabia ler (um bruto, sim senhor), acreditara na sua velha. Mas pedia desculpa e jurava não cair noutra.”

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11. O Soldado Amarelo

• O Soldado Amarelo está perdido e Fabiano o encontra.

• Oportunidade de vingança.

• Fabiano ensina o caminho para o Soldado Amarelo.

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12. O mundo coberto de penas

O Mulungu do bebedouro cobria-se de arribações. Mau sinal, provavelmente o sertão ia pegar fogo. Vinham em bandos, arranchavam-se nas árvores da beira do rio, descansavam, bebiam e, como em redor não havia comida, seguiam viagem para o sul. O casal agoniado sonhava desgraças. O sol chupava os poços, e aquelas excomungadas levavam o resto da água, queriam matar o gado.

Chegou-se à casa, com medo. Ia escurecendo, e àquela hora ele sentia sempre uns vagos terrores. Ultimamente vivia esmorecido, mofino, porque as desgraças eram muitas. Precisava consultar sinha Vitória, combinar a viagem, livrar-se das arribações, explicar-se, convencer-se de que não praticara injustiça matando a cachorra. Necessário abandonar aqueles lugares amaldiçoados. Sinha Vitória pensaria como ele.

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13. Fuga

A vida na fazenda se tornara difícil. SinhaVitória benzia-se tremendo, manejava o rosário, mexia os beiços rezando rezas desesperadas. Encolhido no banco do copiar, Fabiano espiava a catinga amarela, onde as folhas secas se pulverizavam, trituradas pelos redemoinhos, e os garranchos se torciam, negros, torrados. o céu azul as últimas arribações tinham desaparecido. Pouco a pouco os bichos se finavam, devorados pelo carrapato. E Fabiano resistia, pedindo a Deus um milagre.

Não sentia a espingarda, o saco, as pedras miúdas que lhe entravam nas alpercatas, o cheiro de carniças que empestavam o caminho. As palavras de Sinha Vitória encantavam-no. Iriam para diante, alcançariam uma terra desconhecida. Fabiano estava contente e acreditava nessa terra, porque não sabia como ela era nem onde era. Repetia docilmente as palavras de sinha Vitória, as palavras que sinha Vitória murmurava porque tinha confiança nele. E andavam para o sul, metidos naquele sonho. Uma cidade grande, cheia de pessoas fortes. Os meninos em escolas, aprendendo coisas difíceis e necessárias. Eles dois velhinhos, acabando-se como uns cachorros, inúteis, acabando-se como Baleia. Que iriam fazer? Retardaram-se, temerosos. Chegariam a uma terra desconhecida e civilizada, ficariam presos nela. E o sertão continuaria a mandar gente para lá. O sertão mandaria para a cidade homens fortes, brutos, como Fabiano, SinhaVitória e os dois meninos.

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EspaçoEspaço

Caatinga, fazenda, cidade, cadeia.Caatinga, fazenda, cidade, cadeia. O espaço é indeterminado – caráter O espaço é indeterminado – caráter

universal da experiência da seca no universal da experiência da seca no sertão;sertão;

relação entre paisagem hostil e vida relação entre paisagem hostil e vida humana miserável;humana miserável;

determinismo (naturalismo) - influência determinismo (naturalismo) - influência do meio sobre o homem que o habita;do meio sobre o homem que o habita;

espaço hostil = homem animalizado.espaço hostil = homem animalizado.

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“A catinga estendia-se, de um vermelho indeciso salpicado de manchas brancas que eram ossadas. O vôo negro dos urubus fazia círculos altos em redor de bichos moribundos (…) Na planície avermelhada os juazeiros alargavam duas manchas verdes. Os infelizes tinham caminhado o dia inteiro, estavam cansados e famintos.”

“Mudança”

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TempoTempo Indeterminado – confere caráter universal à Indeterminado – confere caráter universal à

narrativa;narrativa; A ação decorre entre dois períodos de estiagem;A ação decorre entre dois períodos de estiagem; história em ciclo, espiral – inicia-se com a fuga de história em ciclo, espiral – inicia-se com a fuga de

uma seca e termina com a fuga de outra;uma seca e termina com a fuga de outra; caráter incessante dos tormentos da seca sobre a caráter incessante dos tormentos da seca sobre a

vida do sertanejo, como se ela (a seca) fosse eterna;vida do sertanejo, como se ela (a seca) fosse eterna; o tempo predominante não é cronológico, os fatos o tempo predominante não é cronológico, os fatos

não ocorrem na ordem em que são narrados;não ocorrem na ordem em que são narrados; tempo psicológico tempo psicológico – os fatos se desenrolam a partir – os fatos se desenrolam a partir

da memória e da interioridade das personagens.da memória e da interioridade das personagens.

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LinguagemLinguagem

Linguagem das personagens: enxuta e seca, como a Linguagem das personagens: enxuta e seca, como a realidade retratada;realidade retratada;

vocabulário pobre e mirrado como a realidade morta do vocabulário pobre e mirrado como a realidade morta do sertão;sertão;

economia de linguagem, dizer o mínimo necessário – economia de linguagem, dizer o mínimo necessário – dificuldade de comunicação das próprias personagens.dificuldade de comunicação das próprias personagens.

Linguagem do narrador: alterna objetividade e lirismo.Linguagem do narrador: alterna objetividade e lirismo.

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Capacidade comunicativaCapacidade comunicativa Personagens carentes de linguagem, quase Personagens carentes de linguagem, quase

mudos – aproximam-se dos bichos;mudos – aproximam-se dos bichos; desprovidos de linguagem e pensamento – desprovidos de linguagem e pensamento –

deixam de ser seres racionais;deixam de ser seres racionais; busca pela linguagem – meio de compreender a busca pela linguagem – meio de compreender a

realidade que os cerca (a natureza hostil e a realidade que os cerca (a natureza hostil e a autoridade injusta);autoridade injusta);

Seu Tomás da Bolandeira – poder Seu Tomás da Bolandeira – poder

Page 25: Vidas secas

PersonagensPersonagens Duplamente vitimados – pela seca e pela Duplamente vitimados – pela seca e pela

exploração econômica;exploração econômica; ignorância, incapacidade verbal e falta de ignorância, incapacidade verbal e falta de

autoconsciência – animalização;autoconsciência – animalização; carência total – não têm direito nem à terra nem carência total – não têm direito nem à terra nem

à linguagem;à linguagem; desumanização – tornam-se seres brutos, desumanização – tornam-se seres brutos,

coisificados, reificados (do latim coisificados, reificados (do latim resres, coisa);, coisa); perambulam por um mundo incompreensível, em perambulam por um mundo incompreensível, em

busca unicamente da sobrevivência;busca unicamente da sobrevivência; suas trajetórias oscilam do nada ao nada – ao suas trajetórias oscilam do nada ao nada – ao

invés de do nada ao ser;invés de do nada ao ser; indivíduos fechados, semimudos, presos à indivíduos fechados, semimudos, presos à

ignorância e ao analfabetismo.ignorância e ao analfabetismo.

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“—“— Você é um bicho, Fabiano.Isto para ele era motivo de orgulho. Sim senhor, um bicho,capaz de vencer dificuldades.Chegara naquela situação medonha —— e ali estava, forte, atégordo, fumando o seu cigarro de palha.—— Um bicho, Fabiano.Era. Apossara-se da casa porque não tinha onde cair morto,passara uns dias mastigando raiz de imbu e sementes demucunã. Viera a trovoada.”

“Fabiano”

Page 27: Vidas secas

FabianoFabiano Representa o sertanejo sofredor e explorado;Representa o sertanejo sofredor e explorado; Apesar de embrutecido, é capaz de analisar a si Apesar de embrutecido, é capaz de analisar a si

mesmo;mesmo; identifica-se com os animais – bicho;identifica-se com os animais – bicho; coisa, escravo – não possui terra e é obrigado a coisa, escravo – não possui terra e é obrigado a

trabalhar para os outros;trabalhar para os outros; sente-se mal perante outras pessoas – vive isolado do sente-se mal perante outras pessoas – vive isolado do

mundo, acostumado à incomunicabilidade dos mundo, acostumado à incomunicabilidade dos animais (choque de civilizações);animais (choque de civilizações);

interage com o mundo por meio da experiência interage com o mundo por meio da experiência sensitiva;sensitiva;

incapaz de se comunicar verbalmente – utiliza uma incapaz de se comunicar verbalmente – utiliza uma linguagem gestual e onomatopéica. linguagem gestual e onomatopéica.

Explorado pelo poder de autoridade do Soldado Explorado pelo poder de autoridade do Soldado Amarelo.Amarelo.

Explorado economicamente pelo Patrão.Explorado economicamente pelo Patrão.

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“Não possuíam nada: se se retirassem, levariam a roupa, a espingarda, o baú de folha e troços miúdos. Mas iam vivendo, na graça de Deus, o patrão confia neles — e eram quase felizes. Só faltava uma cama. Era o que aperreava Sinhá Vitória.”

“Sinha Vitória”

Page 29: Vidas secas

Sinha VitóriaSinha Vitória Ironia do nome – “vitória” aponta Ironia do nome – “vitória” aponta

para uma existência feliz;para uma existência feliz; Sinha Vitória – vencida pelo meio Sinha Vitória – vencida pelo meio

natural e pelo meio humano;natural e pelo meio humano; ambições pequenas e limites estreitos ambições pequenas e limites estreitos

– sua aspiração maior era ter uma – sua aspiração maior era ter uma cama;cama;

Esperança: apega-se a sonhos como Esperança: apega-se a sonhos como válvula de escape para sua realidade válvula de escape para sua realidade miserável.miserável.

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Criança morta (1944), Cândido Portinari

Page 31: Vidas secas

Os meninosOs meninos Os meninos não têm nome – são chamados Os meninos não têm nome – são chamados

apenas de “menino mais velho” e “menino mais apenas de “menino mais velho” e “menino mais novo”;novo”;

desumanização total – são coisas, não precisam desumanização total – são coisas, não precisam de nomes;de nomes;

por serem meninos, ainda não “produzem”;por serem meninos, ainda não “produzem”; por não produzirem, nada significam.por não produzirem, nada significam. MENINO MAIS NOVO: sonha em ser como o pai.MENINO MAIS NOVO: sonha em ser como o pai. MENINO MAIS VELHO: sonha em ter um amigo MENINO MAIS VELHO: sonha em ter um amigo

e quer “entender coisas que os pais não podiam e quer “entender coisas que os pais não podiam explicar”.explicar”.

Page 32: Vidas secas

BaleiaBaleia Função de guia, companheira e responsável Função de guia, companheira e responsável

pela sobrevivência do grupo ao caçar;pela sobrevivência do grupo ao caçar; seu nome é o contrário de si mesma – seu nome é o contrário de si mesma –

franzina e habitante de um local árido e seco;franzina e habitante de um local árido e seco; mais capaz de se comunicar que os seres mais capaz de se comunicar que os seres

humanos;humanos; apresenta sentimentos e pensamentos;apresenta sentimentos e pensamentos; animal humanizado (antropomorfização) x animal humanizado (antropomorfização) x

seres humanos animalizados (zoomorfização).seres humanos animalizados (zoomorfização).

Page 33: Vidas secas

“Olhou-se de novo, aflita. Que lhe estaria acontecendo? O nevoeiro engrossava e aproximava-se.Sentiu o cheiro bom dos preás que desciam do morro, mas o cheiro vinha fraco e havia nele partículas de outros viventes. Parecia que o morro se tinha distanciado muito.”

“Baleia”

Page 34: Vidas secas

Soldado AmareloSoldado Amarelo

Simboliza a autoridade do Governo e a Simboliza a autoridade do Governo e a injustiça contra os mais fracos e oprimidos.injustiça contra os mais fracos e oprimidos.

Page 35: Vidas secas

PatrãoPatrão

Simboliza a opressão dos poderosos eSimboliza a opressão dos poderosos e o poder o poder da exploração do trabalho alheio. da exploração do trabalho alheio.

Ele engana Fabiano nas contas. Ele engana Fabiano nas contas.

Page 36: Vidas secas

Seu Tomás da BolandeiraSeu Tomás da Bolandeira

Não chega a aparecer na história. Não chega a aparecer na história. É apenas sugerido nas falas e pensamentos de É apenas sugerido nas falas e pensamentos de

Fabiano e Sinha Vitória. Fabiano e Sinha Vitória. Simboliza o desejo de ascensão social e Simboliza o desejo de ascensão social e

econômica da família: fala com perfeição, tem econômica da família: fala com perfeição, tem muitos livros e uma cama de madeira e couro. muitos livros e uma cama de madeira e couro.

Page 37: Vidas secas

Narração - Discurso Narração - Discurso indireto livreindireto livre

Narrador em terceira pessoa que Narrador em terceira pessoa que revela o interior das personagens;revela o interior das personagens;

meio-termo – objetividade do meio-termo – objetividade do narrador em terceira pessoa e narrador em terceira pessoa e subjetividade do narrador em subjetividade do narrador em primeira pessoa;primeira pessoa;

atmosfera de imobilidade – pouca atmosfera de imobilidade – pouca ação, predomínio da análise ação, predomínio da análise psicológica;psicológica;

revelação do universo mental revelação do universo mental fragmentado das personagens.fragmentado das personagens.

Page 38: Vidas secas

Discurso indireto livreDiscurso indireto livreFabiano também não sabia falar. Às vezes largava nomes Fabiano também não sabia falar. Às vezes largava nomes

arrevesados, por embromação. Via perfeitamente que tudo arrevesados, por embromação. Via perfeitamente que tudo era besteira. Não podia arrumar o que tinha no interior. era besteira. Não podia arrumar o que tinha no interior. Se pudesse... Ah! Se pudesse, atacaria os soldados Se pudesse... Ah! Se pudesse, atacaria os soldados amarelos que espancam as criaturas inofensivas. amarelos que espancam as criaturas inofensivas. Bateu na cabeça, apertou-a. Bateu na cabeça, apertou-a. Que faziam aqueles Que faziam aqueles sujeitos acocorados em torno do fogo? Que dizia sujeitos acocorados em torno do fogo? Que dizia aquele bêbado que se esgoelava como um doido, aquele bêbado que se esgoelava como um doido, gastando fôlego à toa?gastando fôlego à toa?

Sentiu vontade de gritar, de anunciar muito alto que eles Sentiu vontade de gritar, de anunciar muito alto que eles não prestavam para nada. Ouviu uma voz fina. Alguém no não prestavam para nada. Ouviu uma voz fina. Alguém no xadrez das mulheres chorava e arrenegava as pulgas. xadrez das mulheres chorava e arrenegava as pulgas. Rapariga da vida, certamente, de porta aberta. Essa Rapariga da vida, certamente, de porta aberta. Essa também não prestava para nada. também não prestava para nada. Fabiano queria berrar Fabiano queria berrar para a cidade inteira, afirmar ao doutor juiz de direito, ao para a cidade inteira, afirmar ao doutor juiz de direito, ao delegado, a seu vigário e aos cobradores da prefeitura que delegado, a seu vigário e aos cobradores da prefeitura que ali dentro ninguém prestava para nada. Ele, os homens ali dentro ninguém prestava para nada. Ele, os homens acocorados, o bêbado, a mulher das pulgas, tudo era uma acocorados, o bêbado, a mulher das pulgas, tudo era uma lástima, só servia para agüentar facão. Era o que ele lástima, só servia para agüentar facão. Era o que ele queria dizer. queria dizer.