Videoarte: Do conceito às experiências

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VIDEOARTE: DO CONCEITO ÀS EXPERIÊNCIAS Delandro e Silva Melo* Faculdade de Artes Visuais- ICA/UFPA RESUMO: A imagem em toda sua transitoriedade pela pelo campo digital na arte é algo que sempre impressionou e continua intrigando os estudiosos e até mesmos os que apenas a apreciam como propostas artísticas. O presente artigo tem por objetivo traçar um panorama das experiências em videoarte nacional fazendo um paralelo com a produção em Belém que vêm se destacando na cena contemporânea local e nacional. Tratando desde os conceitos internacionais e sua contaminação no vídeo brasileiro às experimentações de uma linguagem relativamente recente como é a arte digital contemporânea em nossa região. PALAVRAS-CHAVE: Videoarte; Arte Contemporânea; Arte Conceitual. ABSTRACT: The picture across the field by its transience in digital art is something that has always impressed and intrigued scholars and continues until the same as that just appreciate artistic proposals. This article aims to give an overview of national experiences on video art by drawing a parallel with the production in Bethlehem that have gained prominence in the contemporary scene locally and nationally. Being from international concepts and their contamination in the Brazilian video trials of a language is relatively recent as contemporary digital art me our region. KEYWORDS: Videoart; Contemporary Art; Conceptual Art. A inserção e o amplo uso das novas tecnologias na arte, como o vídeo, por exemplo, parece ser algo recente, porém as primeiras experiências com o suporte não são tão novas, sendo que as primeiras experiências remontam há mais de sessenta anos com o surgimento da televisão e os meios de comunicação de massa. O advento da televisão nos lares foi instigador de experiências com o vídeo no mundo todo, principalmente na cena artística do Brasil. O vídeo surgira inicialmente como uma tentativa de reagir à massificação da

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VIDEOARTE: DO CONCEITO ÀS EXPERIÊNCIAS

Delandro e Silva Melo*

Faculdade de Artes Visuais- ICA/UFPA

RESUMO:

A imagem em toda sua transitoriedade pela pelo campo digital na arte é algo

que sempre impressionou e continua intrigando os estudiosos e até mesmos os

que apenas a apreciam como propostas artísticas. O presente artigo tem por

objetivo traçar um panorama das experiências em videoarte nacional fazendo

um paralelo com a produção em Belém que vêm se destacando na cena

contemporânea local e nacional. Tratando desde os conceitos internacionais e

sua contaminação no vídeo brasileiro às experimentações de uma linguagem

relativamente recente como é a arte digital contemporânea em nossa região.

PALAVRAS-CHAVE: Videoarte; Arte Contemporânea; Arte Conceitual.

ABSTRACT:

The picture across the field by its transience in digital art is something that has

always impressed and intrigued scholars and continues until the same as that

just appreciate artistic proposals. This article aims to give an overview of

national experiences on video art by drawing a parallel with the production in

Bethlehem that have gained prominence in the contemporary scene locally and

nationally. Being from international concepts and their contamination in the

Brazilian video trials of a language is relatively recent as contemporary digital

art me our region.

KEYWORDS: Videoart; Contemporary Art; Conceptual Art.

A inserção e o amplo uso das novas tecnologias na arte, como o vídeo,

por exemplo, parece ser algo recente, porém as primeiras experiências com o

suporte não são tão novas, sendo que as primeiras experiências remontam há

mais de sessenta anos com o surgimento da televisão e os meios de

comunicação de massa.

O advento da televisão nos lares foi instigador de experiências com o

vídeo no mundo todo, principalmente na cena artística do Brasil. O vídeo

surgira inicialmente como uma tentativa de reagir à massificação da

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comunicação, gerada pela televisão, mais do que uma nova linguagem, sendo

amplamente utilizado por artistas em suas poéticas, numa busca reacionária às

políticas sociais impostas pela sociedade da época.

O vídeo surge em um momento que a arte encontrava-se novamente em

ruptura com o meio. Estamos na metade do século XX, o conceitualismo,

ampliaria os limites da arte, e naquele momento havia uma necessidade de

discutir novas propostas, novos meios de expressão dariam fôlego necessário

as discussões em ascensão que estavam surgindo.

Em meados dos anos de 1950 começam as primeiras experiências com

o vídeo nas produções artísticas de Nam June Paik, artista coreano

naturalizado nos EUA, que já tinha um histórico de atuação no Grupo Fluxus,

quando o mesmo filma uma visita do Papa à Nova York. Paik já possuía um

trabalho na Arte Conceitual voltado para a instalação e para a performance e

usou o vídeo como extensão de seu trabalho. Daí surgiu experiências que

fizeram com que Paik adota-se o vídeo como linguagem.

Já em finais da década de 1960 percebemos as primeiras utilizações do

vídeo em proposições artísticas. Essas primeiras empreitadas com o novo meio

surgiram da necessidade de avançar as discussões sobre papel da própria arte

e sua relação com o sujeito. Nota-se que o vídeo surge como extensão do

trabalho artístico dos autores. Por isso, não é raro o surgimento primeiro de

uma vídeo-instalação, de uma videoperformance do que um trabalho em

videoarte propriamente dito. Num certo sentido, é possível compreender a

primeira videoarte fora desse movimento de expansão das artes plásticas ou

de reapropriação dos processos industriais [...]1”(MACHADO, 2007).

É bem provável que o vídeo tenha surgido no Brasil com uma década de

atraso da cena artística mundial, a situação, porém, não se diferia muito da

brasileira. As primeiras experiências concretas, do vídeo como expressão

artística, remontem há 1974 com o incentivo de Walter Zanini, então curador do

Museu de Arte Contemporânea de São Paulo, o MAC/SP, aos Artistas, que

disponibilizou um equipamento de gravação de vídeo para experimentações

com vídeo.

1 MACHADO, Arlindo (org.). Made in Brasil: Três Décadas do Vídeo Brasileiro. São Paulo:

Iluminuras: Itaú Cultural, 2007, p. 17.

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Após o incentivo patrocinado por Walter Zanini2, os primeiros gravadores

de áudio e vídeo são disponibilizados aos artistas. Essa primeira geração de

artistas brasileiros do vídeo ficou conhecida como geração dos pioneiros3.

Sobre as dificuldades de consolidação do vídeo devemos considerar que,

“nos anos 1970, os recursos tecnológicos de que dispunham os artistas brasileiros para trabalhar com vídeo eram mínimos. Entre outras coisas, não havia possibilidade de edição: editava-se diretamente na câmera durante a gravação ou com lâmina de barbear e fita adesiva posteriormente, ou ainda concebia-se o trabalho num único plano contínuo, tomado em tempo real, para que não houvesse necessidade de edição. [...]

4”

Mesmo com estas e outras tantas dificuldades, muitas carreiras

artísticas bem sucedidas desse primeiro momento aparecem graças ao

patrocínio de Zanini. As propostas artísticas surgidas nessa época dialogavam

diretamente com poéticas pessoas e políticas. Não podemos dissociar desse

contexto a ditadura militar que vivia o Brasil desde 64, este fato foi sem dúvida

foi “alimento” que fortaleceu idéias e suscitou ações na arte desse período,

além de nortear propostas de caráter genuinamente brasileiras, como é o caso

de Letícia Parente, que borda na própria pele a frase “Made in Brasil”, título da

obra, mais precisamente na borda dos pés, frase esta que já demonstra a

atitude crítica com relação ao próprio corpo, a política e a própria arte.

Em seguida temos uma dissolução das propostas artísticas com o

surgimento da segunda geração do vídeo a partir da década de 1980.

Conhecidos como geração dos independentes, esses artistas, então

atravessados pelas questões e avanços conquistados pelos pioneiros, vão

focar suas ações nas extremidades e nos limites de contaminação do vídeo. É

nesse momento, em que a linguagem televisiva ganha destaque, que as

propostas visuais voltadas à técnica do vídeo surgem com grande força.

Veremos aqui uma tentativa de subversão do meio televisivo mais como uma

tentativa de se inserir nele do que modificá-lo. Destaca-se aqui a atuação dos

2 Walter Zanini (São Paulo, 1925-) historiador, crítico de arte e curador. Foi o diretor do Museu

de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, entre 1963 e 1978. 3 Alguns artistas dessa primeira geração: Anna Bella Geiger, Carmela Gross, Donato Ferrari,

Gabriel Borba Filho, Fernando Cocchiarale, Gastão de Magalhães, Ivens Machado, José Roberto Aguilar, Julio Plaza, Letícia Parente, Marcello Nitsche, Miriam Danowski, Paulo Herkenhoff, Regina Silveira, Regina Vate, Roberto Sandoval entre outros. 4 MACHADO, Arlindo (org.). Made in Brasil: Três Décadas do Vídeo Brasileiro. São Paulo:

Iluminuras: Itaú Cultural, 2007, p. 22.

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grupos TVDO (TV TUDO) e Olhar Eletrônico5, que modificaram a experiência

frente a TV. O formalismo e tradicionalismo televisivo fora enfrentado por

produções descontraídas e inteligentes, mas não menos críticas a situação do

Brasil e da própria televisão.

Segundo Arlindo Machado (2007), entretanto,

“[...] foi somente no decorrer da década de 1990 que as proposições estéticas passaram a dialogar com o circuito das artes visuais. A aproximação – tardiamente percebida no Brasil em relação ao contexto internacional – se deve essencialmente a uma miscigenação das práticas criativas, nas quais os artistas passam a transitar por meios e suportes menos ortodoxos, como a computer art, a fotografia digital, as instalações interativas e o próprio vídeo, que se transforma numa ferramenta cada vez mais acessível em função de seu extraordinário desenvolvimento tecnológico. [...]

6”

É nessa perspectiva que se constrói e se consolida uma videoarte

genuinamente brasileira, as conquistas das gerações passadas são

aproveitadas e recriadas, apontando em direção de experimentações voltadas

principalmente ao sujeito e do que nele surge de reverberação. O artista, que já

no surgimento das experiências com vídeo, volta-se para questões do eu

enquanto proposição artista, engajamento político foi se “diluindo” durante os

percursos das gerações de vídeo makers, as poéticas visuais a partir da

década de 1990, pouco a pouco, começam a dialogar com o corpo, a memória

afetiva, sujeito-sociedade. Isso não significa que houve um desaparecimento

da interdisciplinaridade arte-política, é quase impossível dissociarmos esses

conhecimentos, já que podemos entender política mais do que crítica social. O

vídeo consolidava-se como proposta visual que representa a arte

contemporânea, pela própria característica mutacional do meio e das

propostas, linguísticas e visuais, dele surgido.

A arte paraense, assim como o a própria história do vídeo, não é uma

arte que se possa considerar nova, entretanto, as experiências com o vídeo

nesta primeira década do séc. XXI na cena belenense ainda eram tímidas, em

relação a cena nacional, as ações regionais parecem tardias, não podemos

esquecer que em finais da década de 1990 havia se avançado muito,

5 Mais detalhes da produção e dos integrantes destes e demais grupos ver: MACHADO,

Arlindo. Made in Brasil:Três Décadas do Vídeo Brasileiro. São Paulo: Iluminuras: Itaú Cultural, 2007; MACHADO, Arlindo. A arte do vídeo. São Paulo: Brasiliense, 1988. 6 MACHADO, Arlindo (org.). Made in Brasil: Três Décadas do Vídeo Brasileiro. São Paulo:

Iluminuras: Itaú Cultural, 2007, p. 11.

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tecnologicamente, com relação ao vídeo, produção de vídeos se barateou,

possibilitando a realização de vídeos com recursos mínimos. Podemos

perceber que há uma linguagem comum as empreitadas das anteriores.

Sendo assim, chegamos à primeira década dos anos 2000, novas

tecnologias e novas linguagens aparecem. Em momento onde a diluição visual

e linguística da informação é recorrente a videoarte paraense vislumbra com

novos entusiastas, enquanto novas poéticas vão surgindo alguns artistas, já

consagrados do na cena artística regional, voltam-se para realizações com o

vídeo.

Artistas como Armando Queiroz, Melissa Barbery, Victor De La Rocque,

Dirceu Maués, Maria Christina entre outros trazem discussões distintas sobre o

que que é fazer arte na Amazônia e o que isso implica enquanto proposta e

ação artística. É interessante pensarmos que é uma arte que não se difere dos

questionamentos universais da arte contemporânea como um todo, mas traz

em sua perspectiva regional uma visão universal de questionamentos.

O panorama regional de Belém vem constantemente modificando e se

expandindo dentro da arte brasileira, e no vídeo, acabam nos revelando novos

caminhos que aos poucos se desbravam na contemporaneidade. Orlando

Maneschy em seu artigo Amazônia, arte e utopia define algumas

características visuais e defende a singularização poética encontrada nas

obras regionais, uma constatação da potência artística amazônica.

“Nas obras de vários desses artistas, apresentam-se diversos dramas regionais. Todavia, os discursos contundentes que tomam forma por meio da arte se diferem do lamento da perda. Estes se constroem como tomada de posição, estética e política, e irradiam processos de singularização, apontando para outras estratégias relacionais diante de falidos modelos que não cabem mais ali, nem em um mundo que deseja permanecer. Tampouco estes artistas vivem ensimesmados, já que suas compreensões de territorialidade são atravessadas pela mobilidade do trânsito cultural, do contato com situações que mudam, propiciando ambientes instáveis, e é nesse fluxo caudaloso que lançam, por vezes momentaneamente, suas âncoras.”

7

A videoarte tomou força nas últimas décadas em Belém. As artes digitais

de modo geral na região tem tomado grande parte do circuito artístico e apesar

e ser uma linguagem relativamente recente vem demonstrando ações

7 Artigo em premente a publicação: MANESCHY, Orlando. Amazônia, arte e utopia. Belém, 2011, p. 12.

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genuinamente novas, ações que imprimem na história da arte contemporânea

e que nos instigam a investigar mais e mais o seu papel nas artes visuais.

Percebemos que produção de vídeo paraense é atravessada por fatos

diretamente ligados a história e a política local, sem desligar-se da produção

nacional ou internacional. Podemos afirmar que a videoarte paraense, assim

como a brasileira, trata das extremidades, das bordas de situações relacionais

da sociedade e do homem enquanto potência artística.

* Delandro e Silva Melo é graduando do curso de Artes Visuais da Universidade Federal do Pará. REFERÊNCIAS

CANTON, Kátia. Do moderno ao contemporâneo. São Paulo: Editora WMF

Martins Fontes, 2009. (Coleção: Temas da arte Contemporânea)

FREIRE, Cristina. Arte Conceitual. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2006.

MACHADO, Arlindo. A Arte do Vídeo. São Paulo: Brasiliense, 1988.

MACHADO, Arlindo (org.). Made in Brasil: Três Décadas do Vídeo Brasileiro.

São Paulo: Iluminuras: Itaú Cultural, 2007.

MANESCHY, Orlando. Amazônia, arte e utopia. Belém, 2011, p. 12. MELLO, Christine. Extremidades do Vídeo. São Paulo: Editora SENAC são

Paulo, 2008.