videoclipe e imperialismo
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8/8/2019 videoclipe e imperialismo
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IV ENECULT - Encontro de Estudos Multidisciplinares em Cultura
28 a 30 de maio de 2008Faculdade de Comunicao/UFBa, Salvador-Bahia-Brasil.
VIDEOCLIPE E IMPERIALISMO: O CORPO-PALIMPSESTO DE NANCY
AJRAM COCA-COLIZANDO SUBJETIVIDADES
Icaro Ferraz Vidal Junior
Resumo: O presente trabalho problematiza, a partir dos videoclipes de Nancy Ajram,artista pop libanesa e porta-voz da Coca-Cola nos Emirados rabes, as relaes que oformato cannico de videoclipe guarda com projetos polticos neoliberais. Em
primeiro lugar, o artigo apresenta uma breve reviso das tradies de anlise devideoclipe, que atuam tencionadas nos estudos contemporneos. Depois, parte para oestudo dos videoclipes de Nancy Ajram, trabalhados a partir de suas caractersticas maisgerais, norteado principalmente por algumas teses de Michael Hardt e Antonio Negri
em Imprio. Por fim, o artigo procura apontar para o locus onde o videoclipecannico pode estar servindo a projetos polticos mais libertrios, dentro do cenriocontemporneo.
Palavras-chave: videoclipe, imperialismo, consumo, subjetividade, corpo
i
Como fruto de uma tentativa de situar as reflexes que vm sendo desenvolvidas
acerca do videoclipe, chegamos a um n tencionado por dois movimentos, que precisaser desfeito. Um dos movimentos consiste no tratamento matriciado por um pensamento
que Umberto Eco (1978) nomeou apocalptico, que se volta para as produes da
cultura de massa embebido em certo elitismo que hierarquiza tais manifestaes a partir
de elementos da alta cultura, ignorando a circularidade entre massivo e erudito e
a funo distintiva que revestem as elevadas manifestaes culturais (BOURDIEU,
2007). O outro movimento tem a ver com o apagamento da noo de hegemonia e das
implicaes polticas inerentes configurao de todo e qualquer produto da indstriacultural, que toma corpo em estudos que se debruam sobre a natureza esttica ou de
entretenimento, compreendidos enquanto instncias supostamente apolticas e
autnomas, que operam junto a uma recepo soberana.
Os estudos sobre o videoclipe no interior do campo de estudo do audiovisual
ancoram-se, muito freqentemente, nos cdigos de linguagem elaborados pelo Cinema
Graduando em Estudos de Mdia pela Universidade Federal Fluminense, atuou como bolsista de
iniciao cientfica do CNPq no grupo de pesquisa Imagem, corpo e subjetividade, sob orientao daProfa. Dra. Maria Cristina Franco Ferraz. Atualmente colaborador no grupo de pesquisa Observatrioda Indstria Cultural, vinculado ao curso de Histria da Universidade Federal [email protected]
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Moderno, tal como postulado por Andr Bazin (2006), o que significa que os cinemas
de Orson Welles, Jean Renoir, o Neo-Realismo italiano e a Nouvelle Vague francesa
funcionam nessas abordagens como pontos, a partir dos quais, por proximidade ou
afastamento, os demais projetos audiovisuais so julgados, esttica e politicamente.
Contra tais abordagens, emerge uma outra perspectiva, que detecta certa positividade
nos produtos massivamente consumidos, no deduzindo desse consumo uma massa
consumidora necessariamente alienada, homognea e intelectualmente passiva.
Ambas as abordagens tm seus problemas, a primeira, ao conceber a
quantitativamente elevada recepo dos produtos da indstria cultural como passiva,
no consegue escapar arrogncia que este gesto encerra, alm de esvaziar a multido
de sua potncia. A segunda abordagem, por sua vez, totaliza a atividade da recepo,
desconsiderando que, esta atividade constantemente constrangida pela hegemonia, que
no se apresenta apenas nos sistemas de produo, mas toma corpo em determinados
cdigos de linguagem. Assim, entre a experincia anti-hegemnica do Cinema
Moderno que o primeiro grupo adota como projeto poltico progressista e a potncia
poltica da multido, que o segundo grupo considera, que tentaremos nos situar.
Esperamos assim, no apenas disputar com as perspectivas acadmicas
hegemnicas acerca do videoclipe, que se revestem de um elitismo incomodo, mas
tambm compreender que implicaes esto presentes no sistema de produo
audiovisual hegemnico, que videoclipa tudo.
ii
De onde ter vindo o preconceito com a relao ao videoclipe? Certamente, o
dualismo que se constri com essas duas abordagens, que atualizam as categorias
postuladas por Eco (apocalpticos e integrados), dificulta uma anlise de videoclipe quese afaste da maldio ou da celebrao excessivas e que d conta criticamente de um
produto que matricia muito da produo audiovisual contempornea.
H, suspeitamos, um outro aspecto que favorece abordagens preconceituosas e
infundadas do videoclipe: sua reduo ao conjunto de vdeos fragmentados e fugazes
veiculados pela MTV, atravs do uso de expresses comoLinguagem de Videoclipe. O
videoclipe enquanto objeto de anlise e crtica no como nenhum objeto
inquestionvel quanto sua natureza. Fica a impresso, aps assistirmos algunsvideoclipes, que falar emLinguagem de Videoclipe quase to estranho quanto falar em
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Linguagem de longa-metragem. Do fato de que videoclipe , por definio, um produto
audiovisual com funo predominantemente comercial e ligado ao universo musical,
assim como o longa-metragem , por definio, um produto industrial com funo
comercial no podemos reduzir os videoclipes produo fragmentada americana
veiculada pela MTV, como no podemos reduzir o cinema de longa-metragem ao
cinema clssico narrativo que teve em Griffith seu grande sistematizador.
Assim, ao falar em Linguagem de Videoclipe, laminamos a imensa pluralidade
que atravessa este produto e que coloca em xeque sua complexa natureza, suas
fronteiras com a video-arte e com o curta-metragem, por exemplo. Da podem emergir
questes fundamentais, relativas legitimao do videoclipe atravs das instituies
televisivas, por exemplo. Mas no abordaremos isto aqui. O que interessa, apontar o
local a partir do qual abordaremos a produo audiovisual da artista pop libanesa Nancy
Ajram: um local que no acredita na dominao cultural enquanto fato, mas que no a
desconsidera enquanto projeto poltico com concretas ressonncias no tecido social.
Este trabalho no vai na direo de uma defesa da linguagem hegemnica nos
videoclipes, mas no sentido de uma defesa do videoclipe, enquanto produto que
ultrapassa e subverte esta linguagem.
iii
Nancy Ajram descrita como tendo sido uma criana prodgio, de uma
sensualidade envolvente que parece ter sido uma inveno sua. Aos quatro anos, os
sinais da sensibilidade artstica teriam aparecido no rosto de Nancy a cada cano que
escutava no rdio ou na TV e mesmo diante da voz de seus pais. Aos 12 anos, ela
participou de um programa de TV chamado Noujoum Al Mostakbal e ganhou
medalha de ouro. Depois, comeou a fazer aulas de canto e teoria musical com osmelhores professores de msica do Lbano. Embora tivesse menos de 18 anos, o
sindicato dos artistas profissionais do Lbano aceitou-a como membro, porque a
acharam de um talento excepcional, que merecia render-lhe a qualificao de artista
profissional1.
Tendo lanado seu primeiro lbum Mouhtagalak em 1998 e o segundo Shil
Oyounak Ani, em 2001, foi com Ah W Noss, de 2004, que Nancy Ajram estourou
como estrela pop. No (Oscar video clips) Festival 2003, que aconteceu em Sharm El
1 Cf. http://www.nancyajramonline.com/, acessado em 15/12/2007.
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Sheikh, Egito, Nancy ganhou o prmio de melhor cantora rabe de 2003. Para o lbum
de 2004, foram produzidos trs videoclipes, referentes s musicasLoun Eyounak,Ah W
Noss eInta Eh. Seu ltimo lbum, lanado em 2006, intitulado Ya-tabtab Wa-Dallaa,
contou com dois videoclipes, das msicas Ya-tabtab Wa-Dallaa e Moogaba2.
A trajetria de cantora de Nancy Ajram, descrita como uma trajetria estelar
como outra qualquer3, atravessada pelo fato de ser ela porta-voz da Coca-Cola nos
Emirados rabes. Este acordo confere cantora o papel de protagonista em filmes
publicitrios da fbrica internacional de refrigerantes e a internacionalmente conhecida
logomarca em seu web site oficial4. Alguns dos filmes publicitrios da Coca-cola que
trazem Nancy como estrela principal dialogam diretamente com os videoclipes da
cantora, de tal modo que no chegamos a nenhuma concluso sobre a matriz a partir da
qual de produz o videoclipe ou a publicidade.
O texto estelar de Nancy Ajram dialoga intimamente, ento, com o projeto de
uma empresa multinacional articuladora de um projeto de globalizao, que se reflete
em sua produo audiovisual (tanto nos filmes publicitrios quanto nos videoclipes)
atravs da recorrncia de cones deslocados de seus contextos de produo e,
conseqentemente, desterritorializantes5, tais como Marilyn Monroe, uma cigana, uma
assistente de mgico mambembe, uma melindrosa Nova York dos anos 20. O corpo da
cantora libanesa mostra-se ento como um palimpsesto verstil sobre o qual se pode
inscrever qualquer identidade.
iv
Como enfatizamos no incio deste texto, o videoclipe um produto comercial
que surge atrelado ao mercado musical e contempla uma enormidade de formas, de
modo que se constitui como redutor fazer uma anlise genrica de sua linguagem.
2 Cf. http://www.lebanonlinks.com/society/nancy_ajram.html, acessado em 15/12/2007.3 curioso observar que no web site oficial da cantora apesar de a logomarca da Coca-Cola estarpresente, no esto disponveis os filmes publicitrios feitos por Nancy para a marca e nem consta em sua biografia o momento a partir do qual tornou-se porta-voz da Coca-Cola nos Emirados rabes. Sua biografia tem incio com a descrio de uma infncia configurada por uma sensibilidade artstica que prenunciaria o talento que a fez ultrapassar as regras relativas maioridade do sindicato dos artistasprofissionais do Lbano, o que atrela a legitimao da cantora, em um primeiro momento, s instituiesartsticas nacionais libanesas.4 Cf. http://www.nancyajramonline.com/, acessado em 15/12/2007.5 Merece destaque a natureza ocidentalizante dessa desterritorializao. A converso do discurso em
Universal no possvel, de fato, em funo das enormes diferenas scio-econmicas que atravessam oplaneta. Mas como na maioria das vezes, este discurso se articula a partir de pases ocidentais, capitalistase desenvolvidos que so os que detm os meios de produo , a tendncia que as marcas polticas ede classe se apaguem do discurso.
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Assim, um primeiro gesto de deteco dos cdigos constituintes da linguagem alvo da
crtica faz-se extremamente necessrio. Destacamos ento, como elementos recorrentes
nos videoclipes de Nancy Ajram, assim como nos videoclipes que podemos nomear
como hegemnicos ou cannicos: a fragmentao do corpo da artista, uma grande
descontinuidade espacial, a presena de cmeras lentas, uma grande estetizao obtida
atravs de imagens glamourizadas da pobreza, e um ritmo de montagem sincronizado
com a msica, seja ela lenta ou frentica.
Suspeitamos, a partir da mise-en-scne de Nancy, que um certo ethos que
atravessa a contemporaneidade encontra nestes cdigos de linguagem seus aliados
estticos. No queremos, contudo, pensar uma linguagem como causa de fenmenos
sociais, mas viabilizar uma crtica linguagem, que no cremos ser politicamente
desinteressada, a partir de suas recepes e apropriaes no tempo e num contexto
capitalista, balizado pelo consumo. Isto a que denominamos o ethos contemporneo
consiste no culto performance, eficcia, versatilidade, criatividade. Todos estas
qualidades, postas a servio de um projeto de consumo, tornam-se capazes de
conformar o que Suely Rolnik (2007) chamou subjetividade-luxo, por oposio s
subjetividades-lixo .
Fabricar esses dois tipos de territrio a tarefa bsica da mdia, ou melhor, fabricar oterritrio, pois s h um, e demarc-lo insistentemente do resto, o esgoto do mundo, ondesobrevive no limite tudo o que est fora dele. Imagens dessa demarcao saturam o visvel, dia enoite, num verdadeiro assdio cerebral: do lado de dentro, o glamour das identidades prt-- porter de uma subjetividade-luxo; do lado de fora, a abjeo das subjetividades-lixo em seuscenrios de horror feitos de guerra, favela, trfico, seqestro, fila de hospital, crianasdesnutridas, gente sem teto, sem terra, sem camisa, sem papel -boat people vagando no limbosem lugar onde ancorar (ROLNIK, 2007).
Pensaremos ento, os videoclipes de Nancy no como problemticos em si, mas
sob uma perspectiva que rebate seus efeitos no mundo poltico e que, portanto, pensa
estes vdeos em uma circulao que tem, como pano de fundo, um solo miditico que
conta com um projeto capitalista hegemnico que converge esteticamente com tais
produes. Assim, a radicalizao da descontinuidade espacial, por exemplo,
procedimento que foi amplamente utilizada nos projetos que se afastavam do projeto de
um cinema transparente e burgus articulado por Griffith (XAVIER, 1984), tem sua
potncia crtica deslocada na medida em j no produz o estranhamento no momento da
recepo e, ao contrrio, j mote de grande parte da produes que veiculam o tal
ethos de que falamos: videoclipes, comerciais, etc.
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Ser, ento, radical, dizer que estes cdigos que se arranjam produzindo o que as
MTVs veiculam esto embebidos em um projeto intencional e no-subjetivo6 que
sintomatizam, conformando o projeto capitalista neoliberal de incorporao da
criatividade e do que antes era tido como resistncia (ser diferente, ser autntico, ser
hedonista) e domesticao dos mesmos? Pode ajudar a responder esta pergunta, a
prpria veiculao desses produtos audiovisuais que estaria agora, mais do que nunca,
produzindo um espectador hiperestimulado e blas (SIMMEL, 1987). Atuando,
portanto, cognitivamente na desarticulao de projetos orientados para a ao no
mundo.
H, ainda, uma outra possibilidade de resposta para esta questo, que se ancora
na exportao desta linguagem que se configurou nos videoclipes, que aqui nomeamos
hegemnicos, para outro produtos miditicos. A cosmtica da fome, conforme
postulou Ivana Bentes (2002), constitui-se como um projeto internacional-popular ou
globalizado que junta um tema local, histrico ou tradicional do terceiro mundo a uma
linguagem desterritorializada (de videoclipes e filmes de ao). De, pelo menos, Cidade
de Deus para c para pensarmos no cinema brasileiro contemporneo, como Bentes
pensou vemos este projeto se tornando hegemnico atravs de um enorme volume de
filmes e produtos televisivos ancorados nesses pressupostos. Este fenmeno nos parece
sintomtico e, ao mesmo tempo, conformador de um contexto social em que o declnio
do poltico e do pblico convertem ideais revolucionrios em risveis e em que as
alegrias do marketing7 metabolizam muito rapidamente eventuais projetos contra-
hegemnicos que venham a irromper na sociedade.
Assim, o videoclipe nos moldes apresentados no incio deste tpico e suas
apropriaes internacionais populares se apresentam como grandes aliados sem
dvida no so a causa da lgica empresarial, na formatao desubjetividades coca-
colizadas.
v
6 Cf. FOUCAULT, Michel.Histria da sexualidade I: A vontade de saber. Rio de Janeiro: Edies Graal,1988. Ao postular seu conceito de poder, Michel Foucault o descreve como sendo intencional, na medidaem que no h poder que se exera sem uma srie de miras e objetivos e no subjetivo, pois no resulta daescolha ou da deciso de um sujeito, individualmente7 Cf. DELEUZE, Gilles. Post-scriptum sobre as sociedades de controle. In: Conversaes. So Paulo:Ed. 34, 2006. Pensamos que a expresso, as alegrias do marketing, de Gilles Deleuze, assim comosubjetividade-luxo, de Suely Rolnik se refere muito sagazmente ao imperativo contemporneo decultivo da criatividade e de sua colocao a servio do capital trans-fronteira.
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Em Imprio8, Michael Hardt e Antonio Negri descrevem a passagem do
imperialismo para o que eles chamam Imprio. Retomaremos brevemente algumas de
suas teses por acreditarmos que conferem consistncia ao nosso argumento de que a
produo de videoclipes nos moldes dos da cantora libanesa Nancy Ajram guarda
profundas controvrsias.
Em primeiro lugar, os autores de Imprio reconhecem, como um dos principais
argumentos da tradio de pensamento marxista sobre o imperialismo, a existncia de
uma relao intrnseca entre capitalismo e expanso, e que tal expanso toma
necessariamente a forma poltica do imperialismo. O que Karl Marx explicitou foi que o
capital opera constantemente reconfigurando as fronteiras entre interior e exterior. A
tendncia criao de um mercado mundial, segundo Marx, estaria implicada no
prprio conceito de capital, uma vez que todo limite se impe como barreira a ser
derrubada. As crises no indicariam o fim do capital, mas sua tendncia e seu modo de
operar.
Por um lado, se preciso que haja lucro, os trabalhadores precisam produzir
mais valor do que consomem. Por outro, se a acumulao se faz necessria, a classe
capitalista no pode consumir toda a mais-valia. Com os aumentos da produtividade,
contemporaneamente viabilizados pela crescente implementao de tecnologia nos
sistemas de produo, o salrio dos trabalhadores constitui uma parte cada vez menor
diante das mercadorias produzidas. Esse limite nada tem a ver com o poder absoluto de
produo ou de consumo de uma populao, mas diz respeito antes ao relativo poder de
consumo no interior das relaes capitalistas de produo.
a que a expanso da esfera de circulao entra, substituindo a desigualdade
desestabilizadora bsica do sistema capitalista. O exterior do capital essencial. A
procura constante de capital adicional impele o capital para um imperialismo que se
define por pilhagens e roubos. A novidade imperialista consiste, segundo RosaLuxemburgo, no interesse em expropriar do povo sua fora produtiva e destruir sua
organizao social. At a consolidao do capitalismo em sua forma imperialista, os
conquistadores tinham como projeto a dominao e explorao do pas, o que estava em
jogo no era a converso do no-capitalista em capitalista.
Michael Hardt e Antonio Negri fazem uma ressalva quanto aos crticos
marxistas do imperialismo que, no reconhecimento do projeto de internalizao do
exterior do capital, ignoram as profundas desigualdades do desenvolvimento e as8 Nesta passagem do trabalho, falaremos ancorados exclusivamente nas teses de Hardt e Negri, portanto,tomamos a liberdade de abolir as citaes formais.
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diferenas geogrficas que esto a implcitas. Cada ambiente no-capitalista sofre
diferentes transformaes, no sendo internalizados similarmente, mas como diferentes
rgos que fazem funcionar um sistema orgnico.
A contradio fundamental que o sistema encerra a confiana do capital no seu
exterior, que satisfaz a necessidade de realizao da mais-valia e a internalizao do
ambiente no-capitalista, exterior, que satisfaz a necessidade de capitalizao da mais-
valia realizada. Historicamente, os dois processos ocorreram em seqncia. Primeiro, a
exterioridade tornada acessvel, e depois metabolizada pelo modo de produo
capitalista.
Se capitalismo e imperialismo esto implicados um no outro, a luta
antiimperialismo deve necessariamente vir junto de uma luta contra o capitalismo. Hardt
e Negri retomam ainda o pensamento de Lnin que, segundo eles, props sua crtica do
imperialismo do ponto de vista subjetivo, vinculando-a a noo marxista de potencial
revolucionrio das crises. Lnin sustentava que o desenvolvimento capitalista em sua
fase monopolista seria afligido por inmeras contradies e, com base nestas
contradies, os comunistas deviam agir. O pensamento de Lnin contemplou ainda o
elemento intempestivo do imperialismo que, posto junto s prticas subjetivas da classe
operria, no apenas apontou para os obstculos potenciais para a soluo linear da crise
de realizao do capital, como tambm apontou para uma possibilidade existente e
concreta de que essas prticas destrussem o capitalismo.
Lnin, serve bem ao pensamento de Hardt e Negri porque, ao alicerar sua
crtica ao imperialismo enquanto conceito poltico, pde antever a transio para uma
nova fase do capital, alm do imperialismo, e identificar o lugar (ou melhor, o no-
lugar) da soberania imperial emergente. Atravs do imperialismo, o Estado moderno
exporta a luta de classes e a guerra civil para preservar a ordem e a soberania internas.
Mas as exclusividades comerciais e tarifas protetoras que o imperialismo impe aosterritrios nacionais e coloniais estabelece fronteiras muito rgidas que bloqueia os
fluxos econmicos, sociais e culturais.
Os autores a partir dos quais falamos aqui retomam Nietzsche, por fim, para
combater uma Histria que se ancore apenas nas matrizes econmicas. A Histria s
tem lgica quando regida por subjetividades, conforme Nietzsche explicitou. Somente
quando a emergncia de subjetividades reconfigura causas eficientes e causas finais em
seu desenvolvimento. O poder do proletrio reside a.
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a subjetividade da luta de classes que converter ento, o imperialismo em
Imprio. Hardt e Negri emImprio traaro a genealogia da ordem econmica Imperial,
revelando a natureza global da luta de classes proletria e sua habilidade em prefigurar
os desenvolvimentos do capital na direo de uma efetivao do mercado mundial.
Tendo alcanado o nvel global, o capital encontra-se face a face com a multido. Sem a
barreira do Estado-nao, capital e trabalho se colocam em um antagonismo direto,
nisto se baseia qualquer teoria poltica do comunismo.
O deslocamento que Imprio apresenta do imperialismo para o Imprio, est
embebido, antes de tudo, na deteco do poder da multido na configurao de uma
potente rede de resistncia ao capital globalizado. As estratgias para obteno de
consenso, tal como postulou Antonio Gramsci, no se fizeram ainda dispensveis, pelo
contrrio, dotaram-se de certa uniformidade na medida em que as hegemonias antes
nacionalmente delimitadas, desterritorializaram-se, ou ainda, americanizaram-se.
neste sentido que trouxemos estas discusses: porque acreditamos que a
emergncia de uma figura como Nancy Ajram no Lbano contemporneo diz muito
sobre o estgio atual do capitalismo globalizado em suas relaes com a cultura. E seus
videoclipes aparecem aqui como potentes instrumentos na implementao de um star-
system libans que articula desejos e domestica a to potente subjetividade das lutas de
classes, oferecendo um maravilhoso mundo de consumo, que no se realizar jamais,
como alternativa ao engajamento em projetos coletivos de resistncia.
vi
Se at aqui ficou a sensao de que os dois primeiros pontos do texto no
serviram de nada. Fao a ressalva de que a recepo popular dos produtos da indstria
cultural pode contradizer tudo o que aqui escrevemos. Temos plena certeza de que o queaqui apresentamos foi uma (1) leitura possvel, que privilegiou os efeitos rebatidos no
mundo poltico, que tais manifestaes podem ter. Para encerrar este artigo, gostaramos
de apontar para onde vemos a potncia do videoclipe se manifestando em prol da
resistncia das classes trabalhadoras: no conjunto de apropriaes que encontram na
Internet um eficaz meio de difuso.
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nos spoofs9, com a tenso que inauguram entre condies materiais toscas
de produo e a necessria adaptao dos cdigos de um mainstreamcoca-colizado a
estas condies, que as contradies que se encerram no que aqui chamamos videoclipe
cannico podem aparecer. Infelizmente, o fenmeno Nancy Ajram parece apenas
deslocar um modo de produo hegemnico e os discurso por ele veiculados para uma
realidade que at ento, somente figurara em Hollywood nos filmes de guerra.
Referncia Bibliogrfica:
BAZIN, Andr. Orson Welles. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2006.
BENTES, Ivana. O copyright da misria e os discursos sobre a excluso . Lugar
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XAVIER, Ismail.D. W. Griffith. So Paulo: Brasiliense, 1984.
9 Cf. FELINTO, Erick. Videotrash: o Youtube e a Cultura do "Spoof" na Internet. In: Cd-rom do XVIEncontro Anual da Associao Nacional dos Programas de Ps-Graduao em Comunicao. Curitiba :Comps, 2007.