Visão apurada na leitura das ondas

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Balneário Camboriú, 10 de dezembro de 2011 1 Especial Visão apurada na leitura das ondas 3 Pelo segundo ano consecutivo Figue Diehl viajou a El Salvador atrás das ondas. No final de novembro, quando chegou em casa, na Praia Brava, em Itajaí, trouxe satisfação e cansaço: a rotina de três quedas diárias, -a do meio da manhã num sol de rachar o côco que só os latinos aguentavam, causou um empapuço: nos últimos 5 dias dos 15 que ficou, não aguentava mais ir pra água. Com os amigos Cairo Murillo e Bruno, que o ajudavam a escolher as ondas certas, Figue ficou espaçoso na água e no final já estava constrangido de pegar tanta onda num pico disputado por surfistas de todos os lugares. Faz calor, e em volta só tem floresta. Não tem mais nada pra fazer na pequena vila, que tem algumas poucas pousadas para abrigar quem vai pra trip.

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O surfista Figue Diel, local da Praia Brava, fala sobre como foi surfar El Salvador pela segunda vez; e ressalta a importância de enxergar as experiências apenas como experiências e "não como um fim em si mesmo".

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Visão apuradana leitura das ondas

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Pelo segundo ano consecutivo Figue Diehl viajou a El Salvador atrás das ondas. No fi nal de novembro, quando chegou em casa, na Praia Brava, em Itajaí, trouxe satisfação e cansaço: a rotina de três quedas diárias, -a do meio da manhã num sol de rachar o côco que só os latinos aguentavam, causou um empapuço: nos últimos 5 dias dos 15 que fi cou, não aguentava mais ir pra água. Com os amigos Cairo Murillo e Bruno, que o ajudavam a escolher as ondas certas, Figue fi cou espaçoso na água e no fi nal já estava constrangido de pegar tanta onda num pico disputado por surfi stas de todos os lugares. Faz calor, e em volta só tem fl oresta. Não tem mais nada pra fazer na pequena vila, que tem algumas poucas pousadas para abrigar quem vai pra trip.

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Por Caroline Cezar

Segunda vez é mais tranquilo e além dele já conhecer a onda, os nativos já conheciam ele; que na primeira vez causou espanto geral por um pequeno detalhe da sua condição física; na realidade, dois: seus globos ocula-res não funcionam, ele é cem por cento cego, não tem nem um por cento de visão, apesar de perceber alguma mínima claridade.Até então, em 2010, aqueles nativos elsalvadorenhos nunca tinham visto nem um cego tomar banho de mar, quem dirá descer as ondas no estilo kamikaze do Figue deScER. As aparências enganam, ele sabe exata-mente onde está surfando, às vezes até mais que os ilu-didos visualmente pelas lindas paisagens mundanas.“Dessa vez fiquei à vontade, mais que da outra quando senti um pouco mais essa coisa do cara ficar incomo-dado achando que ‘pô, como que o cara vai surfar aqui, vai atropelar alguém’. Mas são poucos, a maioria fica amarradão... c’est la vie né, se for ele sai da frente, não é porque corre o risco de atropelar alguém que não vai pode estar ali... tá louco... abre o olho, mergulha, acomoda, isso é um exercício pra todo mundo. Teve uns gringos que ficaram meio assim, mas a gente tava muito em casa, confiante, com o respaldo da galera, e muita gana de pegar onda”, contou Figue, afirmando que percebe que cada vez mais acontece a quebra dessa diferença, dessa separação, afastamento, que fazia com que as pessoas ficassem isoladas, ou fossem julgadas diferentes pela questão social ou financeira, cultural ou física, ou por isso ou aquilo.

“Não tem essa de ‘ele vai me atropelar, mergulha, sai

da frente... c’est la vie...”Divulgação

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Nesse mundo a passeioFigue sempre foi surfista. Deu um tempo de uns 17 anos -dos 16 aos 33, porque bateram o carro e ele era o carona que encontrou uma árvore no caminho. Seus olhos foram invadidos por estilhaços de vidro e ele não viu mais nada. A prancha ficou encostada, e depois de enxergar-se além, ele passeou pelas caminhadas, jiu jitsu, escaladas, yoga, que de uma forma ou outra, ainda estão todas presentes em sua rotina atual.

Faixa marrom de jiu jitsu, volta e meia puxa o tapete pra dar um treino. A escalada foi seu esporte por quase duas décadas, esteve em lugares ímpares por esse hábito, como no Dedo de Deus e alguns cumes patagônicos argentinos; sua ligação ainda é forte, prin-cipalmente pelas amizades que nutre com pessoas que vivem isso permanentemente. Tem uma escola de yoga onde pratica e esina diariamente, está há 15 anos estu-dando esse estilo de vida. É meio ridículo ficar enu-merando “faz isso, faz aquilo, faz aquele outro”, mas a título de composição de personagem, cabe mencionar que ele é dono de casa, cozinha, faz chimarrão, cuida dos cachorros, e todas essas coisas de dia a dia. Para os vizinhos da Brava isso é corriqueiro, e ninguém mais se espanta de ver o cara descendo onda atrás de onda no quintal de casa, mas os elsavadorenhos fica-ram chocados. E os americanos, e chilenos, e perua-nos, e argentinos e outros brasileiros que estavam no pequeno recanto do Pacífico com o mesmo objetivo, também. Além de El Salvador, Figue já surfou no Peru, no Chile, Cabo Verde na África e pretende continuar buscando novas ondas.

Além do surfe, Figue tem intimidade com as escaladas, jiu jitsu e yoga: usando o corpo para conhecer a mente.

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EL SALVADOR Duas vezes no mesmo lugar, diferenças

“Sempre é diferente, como numa prática de ashtanga, que repete religiosamente a sequência e nunca é igual, porque a gente muda todo dia, a praia, o lugar, ontem não tá igual a hoje, nunca. Chegar foi diferente, na primeira vez ficaram com aquela coisa, não é desconfiança, uma insegurança, o que vai acontecer, o cara vai morrer ali na praia... e nessa o que eu senti foi a quebra disso, já me conheciam, sem essa coisa de ser diferente, claro que ainda assim os moleques iam lá na pedra, ficavam gritando, depois me rodeavam na praia, perguntavam, porque impressiona, mas foi bem mais tranquilo dessa vez”.

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A ONDAÉ forte, mas não perigosa, tem fundo de areia e apesar de quebrar bem na frente, não oferece risco de te jogar nas pedras. É bastante rápida a primeira sessão, na frente do costão, e quebra sempre no mesmo lugar. Ela logo abre, e a vantagem é de quem está bem posicionado, no lugar certo. “Na hora que entrava a série era descer pra direita aquele paredão e saber que ia estar aberto, surfar a onda toda até a beira, com convicção. É quase um minuto de onda, são uns 400 metros, quase da ilha até a praia em BC. Quando acabava dava dois joelhinhos e já estava no canal remando de volta. VENDO TUDO que estava acontecendo. Eles perguntavam como eu conseguia ler ela assim, fluir mesmo. É da experiência, de entender como a onda quebra, de como fazer esse processo de estar sempre na energia da onda, ali do lado da espuma, sem perder velocidade mas sem ir pra frente e sair da onda. Sentir mesmo”.

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É legal, mas e daí?Enquanto Figue fala sobre a viagem -tem o dom da narrativa e é excelente contador- traz pro chão o tempo inteiro a idealização da sua figura, uma forma de não se deixar “atrapalhar” pelas dualidades das experi-ências. “A gente que convive junto aqui vê que é nor-mal, tenho uma vida normal, não tem isso de super poder, sair viajando pelo cosmos sideral, estamos aqui todo dia, pessoas reais, que têm suas neuras, buscas, batalhas de objetivos como todo mundo. Vai saber até quando vamos estar aqui; então é como o Pedro (Kupfer, um dos seus professores) fala, “não leva a prá-tica tão a sério, porque nada mais é, você vai ali, senta, faz o om, o suryanamaskar, a postura em pé, postura no chão, fica de cabeça pra baixo, relaxa, senta de novo e sai andando.É só uma experiência. E assim é com a vida também, essas experiências são legais, mas é só isso, tem começo, meio e fim, não é ela que vai trazer alguma coisa, a felicidade pra gente”.Ele diz que não se incomoda com a admiração e entende que também é normal que as pessoas se impressio-nem, porque é fácil cair diante dos obstáculos. “Mas o monstro dentro da cabeça é a gente que constrói, nas relações, com os outros, nas nossas internas. Porque ali fora tá tudo certo, tudo fluindo naturalmente, no seu processo”.Ele usa como exemplo o americano Joe Thomas, 63 anos, um legendário do surf, da primeira geração, morou nos anos 60 no Hawaii e que surfou vários dias junto com ele em El Salvador. “O Joe falava pra mim, ‘it’s unbelievable, you’re my hero’, queria descer onda comigo, ficava ali pirando, ia até a beira e voltava no canal, muito feliz, dizendo que com toda trajetória de surfe nunca viu nada tão inspirador na vida... Ao mesmo tempo estava tomando café da manhã um dia

na pousada, chega um local e fala, “tava surfando é, que lástima, que lástima”. Com qual eu vou me identi-ficar?”, sugere ele numa reflexão sobre as projeções que estão sempre fazendo ao nosso redor. “Estamos sem-pre achando que é bom, é ruim, bonito, feio, aí começa a confusão. Esse é o movimento da vida, na verdade as experiências não tem um valor, elas servem pra te mostrar quem tu é. Se você não enxerga a experiên-cia como experiência, vai estar sempre pensando que é um super herói, e depois que é um coitado, e não é uma coisa nem outra. Só mais um vivendo”.

“Estamos sempre achando que é bom, ruim, bonito, feio, e aí começa a confusão”

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