Vivências musicais

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REV. BRAS. GERIATRIA E GERONTOLOGIA; 2006; 8(1); 9-20 341 A A A RTIGOS RTIGOS RTIGOS RTIGOS RTIGOS O O O O O RIGINAIS RIGINAIS RIGINAIS RIGINAIS RIGINAIS / O / O / O / O / O RIGINAL RIGINAL RIGINAL RIGINAL RIGINAL A A A A A RTICLES RTICLES RTICLES RTICLES RTICLES Palavras-chave: Musicoterapia. Equipamentos de auto-ajuda. Melhora- mento Biomédico. Voz. Idoso fragilizado. Doença de Parkinson. Jequié (BA) Tecnologia Assistiva de Vivências Musicais na recuperação vocal de idosos portadores de Doença de Parkinson* Assisted Technology in musical life experiences for vocal recovery of aged people carrying Parkinson’s Disease Resumo A tecnologia de vivências musicais desenvolvida e testada teve o objetivo de avaliar sua efetividade em termos de recuperação vocal de idosos parkinsonianos. A metodologia desenvolvida em Jequié (BA), no campus da UESB, envolveu uma amostra de 12 idosos selecionados por conveniência e que se submeteram aos procedimentos de teste e avaliação da tecnologia por um período de dois semes- tres de 2007. A tecnologia foi avaliada aplicando-se, no pré e pós-vivências musi- cais, instrumentos de avaliação de aprimoramento vocal. A tecnologia se consti- tuiu de teste da voz, cujo treinamento incluía atividades rítmicas corporais, técnicas vocais de aquecimento vocal, técnica de respiração diafragmática e intercostal, práti- ca de canto em grupo. Resultados: a maioria dos idosos demonstrou melhoras na emissão vocal. Metade demonstrou melhoras na dinâmica respiratória, no aumen- to do número de notas cantadas em uma inspiração e articulação nos vocalizes. Outros demonstraram melhoras na performance vocal, seja no desenvolvimento da postura na emissão da voz, seja na articulação dos vocalises. Mesmo os que não obtiveram melhoras, conservaram-se em seu estado anterior sem progressão da doença por um ano, enquanto praticavam as vivências. Os achados levaram-nos a concluir pela efetividade da dita tecnologia de vivências musicais como promotora da inclusão social dos idosos parkinsonianos. Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia Departamento de Saúde Jequié, BA, Brasil Correspondência / Correspondence Edméia Campos Meira UESB/DS Rua Gonçalves da Costa, 128 - Jequiezinho 45200-000 – Jequié, BA, Brasil E-mail: [email protected] * Parte do projeto interinstitucional de pesquisa: Tecnologia Assistiva para Autonomia e Inclusão Social de Idoso Portador da Doença de Parkinson – TAIP. Convênio UFSC-PEN/GESPI x UESB-DS/GREPE, Ref. 2183/05, subvencionado pela FINEP – Financiadora de Estudos e Projetos, Ministério da Ciência e Tecnologia (Chamada Pública MCT/FINEP/AT – Tecnologias Assistivas - 09/2005). Edméia Campos Meira a Edite Lago da Silva Sena b Andréa dos Santos Souza c Virgínia Maria Mendes Oliveira Coronago d Lucia Hisako Takase Gonçalves e Elienai Teixeira dos Santos f Ana Alice da Silva Bôa Sorte g Lorena Teixeira Santos h

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Gerontologia

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Palavras-chave:Musicoterapia.Equipamentos deauto-ajuda. Melhora-mento Biomédico.Voz. Idoso fragilizado.Doença de Parkinson.Jequié (BA)

Tecnologia Assistiva de Vivências Musicais narecuperação vocal de idosos portadores de Doença deParkinson*

Assisted Technology in musical life experiences for vocal recovery ofaged people carrying Parkinson’s Disease

ResumoA tecnologia de vivências musicais desenvolvida e testada teve o objetivo de avaliarsua efetividade em termos de recuperação vocal de idosos parkinsonianos. Ametodologia desenvolvida em Jequié (BA), no campus da UESB, envolveu umaamostra de 12 idosos selecionados por conveniência e que se submeteram aosprocedimentos de teste e avaliação da tecnologia por um período de dois semes-tres de 2007. A tecnologia foi avaliada aplicando-se, no pré e pós-vivências musi-cais, instrumentos de avaliação de aprimoramento vocal. A tecnologia se consti-tuiu de teste da voz, cujo treinamento incluía atividades rítmicas corporais, técnicasvocais de aquecimento vocal, técnica de respiração diafragmática e intercostal, práti-ca de canto em grupo. Resultados: a maioria dos idosos demonstrou melhoras naemissão vocal. Metade demonstrou melhoras na dinâmica respiratória, no aumen-to do número de notas cantadas em uma inspiração e articulação nos vocalizes.Outros demonstraram melhoras na performance vocal, seja no desenvolvimento dapostura na emissão da voz, seja na articulação dos vocalises. Mesmo os que nãoobtiveram melhoras, conservaram-se em seu estado anterior sem progressão dadoença por um ano, enquanto praticavam as vivências. Os achados levaram-nos aconcluir pela efetividade da dita tecnologia de vivências musicais como promotorada inclusão social dos idosos parkinsonianos.

Universidade Estadual do Sudoeste da BahiaDepartamento de SaúdeJequié, BA, Brasil

Correspondência / CorrespondenceEdméia Campos MeiraUESB/DSRua Gonçalves da Costa, 128 - Jequiezinho45200-000 – Jequié, BA, BrasilE-mail: [email protected]

* Parte do projeto interinstitucional de pesquisa: Tecnologia Assistiva para Autonomia e Inclusão Social de Idoso Portadorda Doença de Parkinson – TAIP. Convênio UFSC-PEN/GESPI x UESB-DS/GREPE, Ref. 2183/05, subvencionado pelaFINEP – Financiadora de Estudos e Projetos, Ministério da Ciência e Tecnologia (Chamada Pública MCT/FINEP/AT– Tecnologias Assistivas - 09/2005).

Edméia Campos Meiraa

Edite Lago da Silva Senab

Andréa dos Santos Souzac

Virgínia Maria Mendes Oliveira Coronagod

Lucia Hisako Takase Gonçalvese

Elienai Teixeira dos Santosf

Ana Alice da Silva Bôa Sorteg

Lorena Teixeira Santosh

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Key words: MusicTherapy. Self-helpdevices. BiomedicalEnhancement. Voice.Frail elderly. ParkinsonDisease. Jequié city(BA)

AbstractThe technology of musical experiences developed and tested aimed to evaluate itseffectiveness in terms of vocal recovery of senior Parkinsonians. Methodologywas developed in Jequié, Bahia State, at the UESB campus. It involved a sampleof 12 seniors selected by convenience who underwent test procedures andevaluation of the technology for a period of two semesters in 2007. The technologyhas been evaluated through application, on pre and post musical experiences,instruments to evaluate vocal improvement. It consisted of voice testing andincluded: corporal rhythmic activities, vocal techniques for vocal warm up,diaphragmatic and intercostal breathing techniques, singing practice in groups.Results: most seniors showed improvements in vocal emissions. Half of themshowed improvements in breathing dynamics, increased the number of singingnotes in an inspiration and vocalizes articulation. Others demonstratedimprovements in vocal performance, not only in postural development in voiceemission but also in their vocalizes articulation. Even those who did not obtainany improvement kept their previous state without disease progression for oneyear, while they practiced the experiences. The discoveries made us think about theeffectiveness of musical experiences technology in promoting social inclusionfrom senior Parkinsonians.

INTRODUÇÃO

O crescimento da população idosa nos úl-timos anos reflete um aumento significativona prevalência de doenças crônico-degenera-tivas, o que tem interferido na morbidade emortalidade da população. Dentre as doen-ças que acompanham a velhice, está a Doen-ça de Parkinson (DP), que apresenta alta pre-valência. Calcula-se, para o mundo inteiro, 10milhões de pessoas portadoras. No Brasil essenúmero está em torno de 300.000 pessoas,ou seja, uma prevalência de 150 a 200 casospor 100.000 habitantes, com surgimento de20 novos casos por ano.1

A DP é uma afecção crônica e progressi-va do sistema nervoso cuja evolução dos sin-tomas é usualmente lenta. Envolve os gângli-

os da base, resultando em perturbações notônus, posturas anormais e movimentos in-voluntários, caracterizando-se clinicamente porrigidez, bradicinesia e tremor. Tal manifesta-ção tem supostamente origem neuroquímicacausada pela deficiência de dopamina, pro-vocada por uma degeneração dos neurôniosda substância negra.2-4

A voz e a fala também sofrem disfunçõesem decorrência da doença. Essas alteraçõesconstituem, em conjunto, o que se denominadisartria hipocinética ou disartrofonia, carac-terizada por monotonia, redução da intensi-dade da voz, articulação imprecisa e distúr-bio de ritmo, os quais decorrem de três fato-res principais: restrições da freqüência e inten-sidade, redução da intensidade e alteração dequalidade.5,6

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Assim, as dificuldades decorrentes na co-municação e expressão por alterações da fala,na deambulação e instabilidade de postura cos-tumam ocasionar aumento no nível de ansie-dade do paciente e, reforçada pelo estigma doenvelhecimento, dificulta a manutenção de auto-estima satisfatória. Em vista disto, observa-sea necessidade de instrumentos como de tecno-logia assistida em vivências musicais para amanutenção e/ou aprimoramento da quali-dade vocal dos parkinsonianos.

As práticas musicais contribuem na gera-ção de atributos para a obtenção de uma auto-estima satisfatória, despertando sentimentosde competência, confiança e de adequação àvida, com o desenvolvimento de uma me-lhor capacidade de compreensão, estimulan-do a auto-aceitação, pelo paciente, do pro-cesso natural do envelhecimento associado àDP. As vivências musicais realizadas em gru-po proporcionam também o restabelecimen-to do equilíbrio emocional do indivíduo, umavez que promovem ganhos na qualidade e rit-mo da voz, melhoria da força motora e apri-moramento da capacidade de concentração,possibilitando independência intelectual, alémde reinserção no meio social.7

No idoso portador de doença crônico-progressiva, como a DP, a comunicação apre-senta instabilidade, que podem ser decorren-te de ajuste ao medicamento, frustração, ansi-edade, depressão, cansaço e situações estres-santes. Em vista disso, os indivíduos se utili-zam da comunicação não-verbal aprendidaao longo da vida, como “expressões faciais, docorpo, da postura física, a distância mantida entre aspessoas; a capacidade e o jeito de tocar; da roupa que

usa”.8 Essa comunicação não-verbal pode sertraduzida em emoções musicais que propor-cionam a integração social em determinadacultura, melhorando o bem-estar geral. Amúsica, com seus efeitos fisiológicos, age emdeterminadas áreas do cérebro, a exemplo dosistema límbico, que atua preferencialmente nocontrole das atividades emocionais e compor-tamentais.8

A música tem sido utilizada como recursopromotor de bem-estar e qualidade de vida,permeando diferentes culturas e gerações.Associada à medicina, era uma das alternati-vas de tratamento durante os rituais de cura,além de estar presente em outros rituais, comoo de fecundidade, nascimento e até de morte.Ela pode condicionar o indivíduo a um esta-do de prazer, saudosismo e introspecção, agin-do nas suas faculdades intelectuais e emocio-nais. Isto pode ser decorrente das semelhan-ças existentes entre os sons emitidos pelo cor-po humano, como aqueles produzidos porinstrumentos musicais.9,10

Assim, a música se caracteriza como umalinguagem universal, ela tem importância te-rapêutica e estimula a saúde mental do in-divíduo, desviando sua atenção da proble-mática em que se encontra.11,12 Por meio deatividades musicais, é possível evitar e/oureduzir fatores estressantes, haja vista a efi-ciência da música não apenas no alívio dador, como também de distúrbios psicos-somáticos, físicos e espirituais, graças à li-beração de substâncias químicas cerebraisque podem atuar na regulação do humor,redução da agressividade, depressão e me-lhora do sono.9,13,14

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A partir das considerações apresentadas,este estudo teve como objetivo geral desen-volver, adaptar e testar uma tecnologia assis-tiva/cuidada, valendo-se dos preceitos musi-cais específicos, visando ao aprimoramentoda dicção e expressão oral; à coordenaçãomotora e habilidade rítmica; ao aumento dapercepção auditiva; à dinâmica respiratória eà oportunização de momentos de descontra-ção, criatividade e socialização.

METODOLOGIA

A tecnologia de vivências musicais desen-volvida neste estudo, para a recuperação vocalde pacientes idosos parkinsonianos, teve fun-damento no referencial teórico adotado a par-tir da compreensão de tecnologia assistiva/cui-dada como sendo toda e qualquer experiênciade atendimento profissional sistematizado, in-ventada para situação de serviços novos, oureinventada para serviços que requerem adap-tação e atualização. O entendimento de tecno-logia assistida aqui adotada é a concepção detecnologias leve e leve/dura,15 as quais diferemdas convencionais, do tipo produção de equi-pamentos e máquinas. Trata-se de produçãode tecnologia que expressa de modo exclusivoo trabalho vivo em ato – neste caso, as vivênci-as musicais idealizadas e implementadas.

Procedimentos metodológicos

Conforme previsto no projeto, a imple-mentação do estudo se deu a partir das se-guintes etapas: desenho da tecnologia assisti-da de vivências musicais; teste-piloto para

aprimoramento do desenho construído; im-plementação propriamente dita da tecnolo-gia. Para avaliar a efetividade da tecnologiatestada, foi aplicado um instrumento próprioelaborado com base nos elementos musicaisestruturados, para verificar o desempenho davoz falada e da voz cantada. Quanto ao quefoi construído para a avaliação da voz, inclu-íram-se itens como a emissão vocal, conside-rando o volume e o ritmo de voz falada ecantada, a dinâmica respiratória baseada emnúmero de notas musicais cantadas a uma sóinspiração e articulação nos vocalizes, a perfor-mance vocal associada ao desenvolvimento dapostura na emissão da voz.

Campo do estudo

O estudo de natureza interinstitucional teveseu projeto aplicado em dois contextos: Flo-rianópolis-SC (sede UFSC/PEN/GESPI) eJequié-BA (UESB/DS/GREPE). O presen-te relatório refere-se ao realizado em Jequié,BA, no campus universitário da UniversidadeEstadual do Sudoeste da Bahia, Departamentode Saúde - UESB/DS.

O município de Jequié localiza-se no su-deste da Bahia, a 360 km da capital, com ter-ritório de 3.035 km² e 148.186 habitantes.Destes, 13.178 são idosos, o que representa9,5% da população total, sendo que 7.193estão entre as idades de 60 e 69 anos, 4.462entre 70 a 79 anos e 2.523 com idade superi-or a 80 anos.16

Em se tratando de idoso portador deDoença de Parkinson, as ações eram pratica-

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mente inexistentes no contexto estudado. Essepúblico começou a integrar-se em grupo ereceber atenção a partir do projeto interinstitu-cional de pesquisa “Tecnologias Assistidas paraa Autonomia e Inclusão Social de Idoso Porta-dor da doença de Parkinson – TAIP”, sob aforma de projeto de extensão universitária de-nominado Grupo de Ajuda Mútua – GAM,do qual participaram pessoas portadoras deDP localizadas a partir de uma lista de pacien-tes que recebiam medicação específica para adoença, dispensada na Diretoria Regional deSaúde (13ª, correspondente à Grande Jequié-BA) e entre aqueles pacientes que freqüenta-vam a Clínica de Fisioterapia da UESB/DS. OGAM se constituiu no lócus da pesquisa ao reu-nir potenciais participantes do estudo.

População alvo e amostra

A população-alvo se constituiu naquelaformada por pacientes idosos portadores deDP localizados para a formação do GAM,anteriormente relatado. A amostra, de natu-reza intencional, foi composta de doze ido-sos que espontaneamente se apresentaram paraparticipar do estudo assinando o Termo deConsentimento Livre e Esclarecido e que fo-ram assíduos na participação das atividadesgrupais de vivencias musicais por dois semes-tres consecutivos no ano de 2007, com en-contros semanais de duas horas.

Desenvolvimento do desenho datecnologia de vivências musicais

As vivências musicais foram idealizadas etestadas compondo um conjunto de proce-

dimentos técnicos baseados em um protoco-lo de avaliação a partir de referenciais da áreada música testando a voz falada e cantada, eem cujo treinamento incluía: atividades rítmi-cas corporais; técnicas vocais com aquecimentovocal; técnica de respiração diafragmática eintercostal; pratica de canto em grupo; leiturade textos e letras de canções; prática de ins-trumento de sopro, sendo a flauta o instru-mento adotado. Inicialmente foi necessárioconhecer os interesses musicais dos participan-tes, compondo uma lista de gêneros de músi-cas preferenciais dos idosos. A seguir, apre-sentavam-se os procedimentos desenvolvidosjunto aos portadores de DP em cada ativida-de indicada.

• Atividades rítmicas e corporais: exer-cícios de pulsação rítmica, observando as cons-tâncias e inconstâncias dos andamentos musi-cais associados aos movimentos corporais.Observação das categorias de movimentos,visando a compará-los: o ritmo do andar, dofalar, do cantar e do tocar. Observação dasvariantes rítmicas das músicas, associando-as aoritmo dos movimentos corporais. Aplicaçãode exercícios rítmicos a partir de percussãocorporal. Aplicação de exercícios rítmicos cominstrumentos musicais de percussão.

• Atividades de técnicas vocais: au-toconhecimento da voz – alcance, potenci-ais expressivos, o som mais agudo, maisgrave, mais leve, mais forte mais interrom-pido. Aplicação de vocalizes com as vogais,com pequenas frases musicais e notas mu-sicais. Repetição de frases musicais com oacompanhamento do instrumento, utilizan-do sons ascendentes e descendentes da es-

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cala musical. Exercícios de dicção e impos-tação vocal: utilização de trava-línguas e tex-tos rítmicos a partir de ditados populares.Exercícios cantados, utilizando a dinâmicada música: FF (forte), mF (meio forte), P(piano), mP (meio piano), pp (pianíssimo).Exercícios cantados para expansão dos li-mites vocais: entoação de diversas frasesmusicais em diferentes tonalidades. A fona-ção no canto: vibração (cordas vocais: ata-que e finalização), articulação (emprego idealdos fonemas), ressonância (variedades deressonâncias da voz), saúde vocal.

• Atividades técnicas de respiração:exercícios respiratórios para emissão vocal,utilizando a respiração diafragmática e inter-costal. Exercícios para aumentar o controleda respiração: inspiração e retenção do ar,contando mentalmente, seguido de expiraçãogradativa. Entoação de sons e notas musicaisa uma só inspiração.

• Práticas de canto em grupo: execu-ção de canções simples predeterminadas ede livre escolha pelo grupo. Estimulação damemória por meio de canções. Escuta detrechos musicais para identificação de vari-antes rítmicas e suas implicações no com-portamento humano. Exercícios melódicosde concentração, sensibilidade auditiva, ma-nutenção do volume e operacionalização davoz falada/cantada.

• Práticas do instrumento de sopro -flauta doce: conhecimento do instrumento esuas possibilidades. Exercícios de posturas paraemissão do som. Exercícios rítmicos associa-dos a exercícios respiratórios. Aplicação de

técnicas de respiração para sons curtos e lon-gos. Conhecimento das figuras musicais: re-presentação da nota musical. Exercícios decoordenação motora para a emissão do somno instrumento. Dinâmicas na execução dossons: FF (forte), mF (meio forte), P (piano),mP (meio piano), pp (pianíssimo).

Implementação da tecnologia deVivências Musicais

Considerando os passos adotados, a im-plementação da tecnologia propriamente ditase deu no campo, junto dos idosos portado-res de DP, somente quando as etapas anterio-res haviam sido cumpridas – ou seja, a tecno-logia desenhada testada e revista, e a definiçãoda amostra, composta de 12 participantes, aser acompanhada no decorrer da implementa-ção. Assim, as vivências musicais se realizarampor dois semestres do ano de 2007, com fre-qüência de duas horas semanais, sempre emum mesmo local planejado para a prática dasvivências no campus da UESB/DS.

Procedimentos de avaliação devivências musicais

Cada idoso participante da amostra foisubmetido individualmente à aplicação doinstrumento de avaliação da voz falada eda voz cantada, antes e depois da imple-mentação da tecnologia de vivências musi-cais. Os dados foram pareados em antes edepois, para a avaliação comparativa do de-sempenho de cada um, diante da prática devivências musicais desenvolvidas ao longodos dois semestres.

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Seguem os procedimentos de aplicação doinstrumento de avaliação:

1. Para avaliação da emissão vocal quantoà amplitude do volume da voz falada/canta-da, foi solicitado que cada idoso respondessea um questionário com perguntas-padrão re-lativas a informações sociodemográficas e deidentidade sociocultural (nome, endereço, ida-de, sexo, estilo musical de preferência, entreoutros). Em outro momento foi solicitada aexecução da canção “Mariquinha foi embo-ra”. Essa canção, vivenciada anteriormente, éintercalada de trechos recitativos, e proporci-ona a comparação entre as curvas melódicasda fala às da canção. A análise da qualidadevocal fez parte da avaliação perceptivo-audi-tiva, com a aferição subjetiva da voz exigindosomente o ouvido humano como instrumen-to de avaliação. Chama-se de dinâmica o graude intensidade (volume, força) com o qualdeterminado som é emitido. Entre diversasformas de representar a dinâmica, foi adota-da a mais usual em música para definir ospadrões de amplitude do volume, a saber: mF(meio forte) indica uma voz com sonoridadeampla em toda a sua extensão; P (piano) indi-ca uma voz fraca, com baixa intensidade, su-ave e branda; pp (pianíssimo) indica uma vozmuito baixa com pouca expressão. Para ava-liar o ritmo da fala e do canto, era solicitadoque cada idoso recitasse o provérbio popu-lar: “Água mole em pedra dura, tanto bateaté que fura”, seguindo uma pulsação fixa deapoio, utilizando a figura rítmica da colcheiacomo unidade de tempo, variando apenas oandamento. O idoso falava o texto acompa-nhando as variações de velocidade da pulsa-

ção, o que permitia classificar o ritmo da suavoz falada em regular, lento ou muito lento.Para avaliação do ritmo do canto, foi solicita-do que cada idoso cantasse uma canção delivre escolha, seguindo uma pulsação rítmicamarcada e fixa, alternando apenas a velocida-de da marcação rítmica escolhida.

2. Com o objetivo de avaliar a dinâmicarespiratória com base no número de notasmusicais cantadas a uma só inspiração e ar-ticulação nos vocalizes, foi solicitado quecada idoso emitisse a seqüência da escalamusical ascendente e descendente, no mes-mo tom apresentado pelo teclado, inician-do-se em dó 3 para as mulheres e dó 2 paraos homens, primeiramente em direção àsfreqüências agudas e, em seguida, em dire-ção às graves, sempre de acordo com a es-cala musical (ascendente e descendente). Ainstrução dada a cada sujeito foi que emi-tisse cada nota até o limite. Em seguida,contava-se o número total de notas atingi-das para obter a média de sons articulados,considerando o padrão de regularidade dototal de 15 notas cantadas a uma só inspira-ção, tendo como base a figura rítmica dasemínima, já que a execução dessa seqüên-cia melódica com notas musicais pode serrealizada com um mínimo de esforço. Oitonotas cantadas caracterizam um movimen-to irregular no padrão respiratório, obser-vando-se o nível de esforço exigido para aemissão. O maior grau de comprometimen-to poderá ser identificado com o padrãodois, que equivale ao mínimo de cinco no-tas cantadas a uma só inspiração, significan-do diminuição na atividade respiratória.17

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A avaliação da qualidade vocal foi obtidapor meio de um teclado Yamaha. Para verificara articulação nos vocalizes, foram utilizadas se-qüências de notas compondo intervalos de se-gundas e terças (a exemplo de dó-ré e dó-mi) equartas e quintas (a exemplo de dó-fá e dó-sol).

3. Para avaliação da performance vocal as-sociada ao desenvolvimento da postura naemissão da voz falada/cantada e articulação nosvocalizes, foi sugerido ao idoso que interpre-tasse canções de livre escolha, sendo orientadoa desativar excessos de contração da muscula-tura posterior do pescoço, procedimento quecontribuiria para a diminuição da tensão mus-cular de braços e pernas, aspectos comumenteobservados ao portador de DP. O idoso foiorientado, partindo da compreensão de que oenrijecimento ou encolhimento do tronco di-minuiria o potencial da voz e a capacidade res-piratória. A performance vocal é uma atividadeprática e a aplicação de canções e vocalises per-mite a decodificação dos sons em sílabas, for-mando uma estrutura que pôde ser inteligível,acessível e menos estressante para a compre-ensão da emissão da voz humana. Essa análisetambém fez parte da avaliação perceptivo-au-ditiva, com a aferição subjetiva da voz exigin-do somente o ouvido humano como instru-mento de avaliação.

O teste foi aplicado sempre por um pro-fissional licenciado em música, considerando oaspecto subjetivo e específico dessa avaliação eutilizando como recursos o teclado, o micro-system e os instrumentos de percussão.

Cuidados éticos com os participantesda pesquisa

O projeto foi submetido e aprovado peloComitê de Ética em Pesquisa da Universida-de Federal de Santa Catarina/UFSC, cujosdocumentos se encontram arquivados sob oprotocolo nº 350/2005. Todos os procedi-mentos de respeito humano para com os par-ticipantes da pesquisa foram cumpridos se-gundo diretrizes da Resolução nº 196/96 doCNS do Ministério da Saúde.18

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A amostra estudada se constituiu de umacasuística de 12 idosos portadores de DP, novehomens e três mulheres, os quais se submete-ram à tecnologia de vivências musicais pordois semestres de 2007 e avaliações devidasantes e depois da experiência, nos aspectosdo desempenho da voz falada e cantada.

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Idoso Avaliação Amplitude dovolume da voz

falada

Amplitude dovolume da voz

cantada

Ritmo dafala

Ritmo docanto

Pré 0 0 0 001

Pós 0 0 0 0

Pré 1 2 1 102

Pós 1 1 1 1

Pré 0 1 1 103

Pós 0 0 1 0

Pré 1 2 2 204

Pós 1 2 2 2

Pré 0 1 1 105

Pós 1 1 1 1

Pré 1 1 1 106

Pós 0 0 0 0

Pré 1 1 1 107

Pós 0 0 1 0

Pré 0 1 0 108

Pós 0 0 0 0

Pré 2 2 2 209

Pós 0 1 0 1

Pré 0 0 0 110

Pós 0 0 0 0

Pré 1 1 1 111

Pós 1 1 1 1

Pré 1 1 1 112

Pós 1 1 1 1

Os resultados expressos no quadro 1apontam para uma melhoria na efetividadeda emissão vocal, falada ou cantada, com aprática das vivências musicais em sete ido-sos. Apenas um idoso teve diminuição daamplitude do volume da emissão de voz fa-

Quadro 1 - Avaliação pré e pós-desenvolvimento da Tecnologia Assistiva de Vivências Musicais junto aidosos portadores de Doença de Parkinson quanto à emissão vocal, considerando volume e ritmo de vozfalada e cantada. Jequié - BA, 2007.

Legenda:Avaliação da amplitude do volume da voz falada/cantada:0 = mF (meio forte)1 = P (piano)2 = pp ( pianíssimo)

lada. Os demais quatro mantiveram-se emtodos os aspectos de volume e ritmo deemissão da voz, seja falada ou cantada, sig-nificando a manutenção do estado de emis-são vocal mesmo passada a evolução de umano da doença.

Avaliação do ritmo do canto e da fala:0 = regular1 = lento2 = muito lento

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Observando-se os dados de ritmo da falae do canto, a maioria dos idosos na medidapré-experiência de vivências musicais apresen-tava um ritmo lento ou muito lento. Isto po-deria estar relacionado com a evolução da do-ença nos idosos, uma vez que a DP desenca-deia alterações vocais, acarretando maior agra-vamento na coordenação motora da fala, taiscomo dificuldade respiratória, diminuição dosuporte aéreo e menor amplitude de movimen-to da musculatura facial, dificultando ou mes-mo impedindo a produção vocal.19 Contudo,observou-se que na medida pós-experiência,esses idosos apresentaram melhora no ritmoda fala e do canto, o que indica estar relaciona-do com a prática das vivências musicais.

Assim como o ritmo, as alterações no vo-lume de voz estão relacionadas com o com-prometimento do aparelho da fonação, comorouquidão e qualidade do sopro, com evidenteredução de intensidade, além de imprecisãoarticulatória e gama tonal reduzida, associadoainda ao processo de envelhecimento vocal ea cronicidade da doença.19 Também foramobservadas nos dados tais alterações de vo-lume da voz. Entretanto, na medida pós-ex-periência de vivências musicais, observou-seque esses idosos mantiveram seu quadro eoutros apresentaram melhora no volume davoz, concluindo que a adoção de tal tecnolo-gia representa um recurso preventivo de evo-lução precoce da DP.

Os dados de avaliação de padrões respi-ratórios (quadro 2) fundamentaram-se na prá-tica de respiração vivenciada por meio de ati-vidades musicais, como a articulação de no-tas cantadas a uma só inspiração utilizando a

pulsação da semínima (figura rítmica) comounidade de tempo, e a execução de vocalizespara expansão das zonas de ressonância. Opadrão de regularidade refere-se à respiraçãonasal com um ritmo regular, considerando queas alterações físicas (de posturas) e emocio-nais contribuem para a apresentação de umpadrão respiratório alterado.

Ao avaliar a dinâmica respiratória dos ido-sos na etapa anterior à experiência, observa-se que quanto ao número de notas cantadasa uma só inspiração, a maioria se encontravaem um padrão respiratório irregular (ampli-tude torácica maior que a abdominal duran-te a inspiração), o que foi visto também naarticulação de vocalises, a qual apresentavaum padrão baixo ou muito baixo. Mesmoapós a prática de vivências musicais, o nú-mero de idosos que obteve melhoria na di-nâmica respiratória foi mínimo; no entanto,ter mantido o quadro representa um fatoimportante, uma vez que não houve progres-são dos comprometimentos do aparelhofonador na evolução de um ano da doença.

Esses comprometimentos estão diretamenterelacionados com a incompetência glótica fre-qüente no portador de DP, pois a adução glóticae o fluxo aéreo são responsáveis pelo controle dapressão aérea subglótica. Com a evolução dadoença, as disfunções no campo laríngeo de de-sequilíbrio de pressão provocam uma limitaçãodo suporte respiratório e conseqüente reduçãoda intensidade vocal O equilíbrio entre o suporterespiratório e os mecanismos laríngeos permite amanutenção da vibração das pregas vocais, e oaumento da intensidade vocal depende diretamen-te do aumento da pressão aérea subglótica.3,6

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Idoso Avaliação Nº de notasmusicais cantadas auma só inspiração

Articulaçãonos vocalizes

Desenvolvimento deexercícios associados

a vocalizesPré 1 0 001

Pós 1 0 0

Pré 1 1 102

Pós 1 1 1

Pré 1 0 003

Pós 1 0 0

Pré 2 2 104

Pós 2 2 2

Pré 1 1 105

Pós 1 1 1

Pré 1 0 006

Pós 0 0 1

Pré 1 1 007

Pós 1 0 1

Pré 1 0 008

Pós 0 0 0

Pré 2 2 209

Pós 2 1 1

Pré 1 0 010

Pós 1 0 1

Pré 1 1 111

Pós 1 1 1

Pré 1 1 112

Pós 1 1 1

Quadro 2 - Avaliação pré e pós-desenvolvimento da Tecnologia Assistiva de Vivências Musicais junto aidosos portadores de Doença de Parkinson quanto à dinâmica respiratória, com base em número de notasmusicais cantadas a uma só inspiração, articulação nos vocalises e desenvolvimento de exercícios associadosàs mesmas. Jequié/BA, 2007.

• Número de notas cantadas a uma só respiração: 0 = >15 notas 1 = 8 notas 2 = < de 5 notas Unidade de tempo = semínima*Articulação nos vocalizes 0 = regular 1 = baixa 2 = muito baixaExercícios respiratórios associados a vocalizes 0 = normal 1 = tenso 2 = muito tenso• Em relação a unidade de tempo utilizada como referência faze-se necessário compreender a representação das figurasrítmicas e seus valores proporcionais.As figuras rítmicas representadas abaixo nos ajudam a compreender a unidade de tempo utilizada. A semibreve vale quatrotempos, a mínima vale dois tempos que representa a metade da semibreve, e unidade de tempo utilizada na avaliação foi asemínima que equivale e metade da mínima ou a ¼ da semibreve.

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O desenvolvimento da performance vocal nosistema da voz cantada visa a uma série derelações estabelecidas entre a convivência doindivíduo e sua relação com a música.

Neste sentido, uma postura equilibradacom um movimento coordenado na hora detocar um instrumento ou cantar pode ser

Quadro 3 - Avaliação pré e pós-desenvolvimento da Tecnologia Assistiva de Vivências Musicais junto aidosos portadores de Doença de Parkinson, segundo a performance vocal associada ao desenvolvimento dapostura na emissão da voz falada/cantada e articulação nos vocalises. Jequié/BA, 2007.

Idoso Avaliação Desenvolvimento postural naemissão voz falada/cantada

Articulação nosvocalizes

Pré 0 001

Pós 0 0

Pré 1 102

Pós 1 1

Pré 1 103

Pós 1 0

Pré 1 204

Pós 2 2

Pré 1 105

Pós 1 1

Pré 0 106

Pós 1 0

Pré 1 107

Pós 0 0

Pré 1 108

Pós 0 0

Pré 2 209

Pós 1 1

Pré 1 010

Pós 1 0

Pré 1 111

Pós 1 1

Pré 1 112

Pós 1 1

Legenda:0 = regular1 = tenso2 = muito tenso

obtida, quando isso faz parte do universocotidiano do indivíduo, aspecto não apresen-tado pelos sujeitos da pesquisa no início daimplementação da tecnologia. Embora existaa busca de uma atitude física eficiente para umbom desempenho da emissão vocal, não épossível uma abordagem direta de uma ima-gem predeterminada de “postura certa”. Cada

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corpo é único e com características próprias,podendo ou não se encaixar em um padrãoestereotipado. Corroborando os princípios datécnica, foram considerados aspectos subjeti-vos para utilização do padrão regular, tenso emuito tenso, considerando tempo de evoluçãoda DP, a maneira de andar, sentar, levantar e aperformance durante a emissão da voz cantada/falada. Portanto, a performance torna visíveis osatores, definem-se identidades e ajuda na cons-trução de auto-imagem.

Considerando todos os aspectos formais esubjetivos da avaliação, no que tange à convi-vência e história musical e a condição física e depostura de cada idoso participante, observou-se, conforme o quadro 3, que a condição dapostura na emissão da voz cantada foi qualifica-da como tensa na maioria dos idosos. Apenasum apresentou padrão de normalidade. Con-tudo, na medida pós-experiência de vivênciasmusicais, observou-se uma evolução positiva detensa para normal em três pacientes. Os demais,em sua maioria, mantiveram seu estado anteri-or. Já na articulação dos vocalises, observou-seque dois pacientes apresentaram articulação nor-mal, considerando os movimentos necessáriosa hábitos motores corretos de emissão da vozcantada, partindo de movimentos primários pos-teriormente reorganizados de acordo com ascondições físicas de cada um. Cinco idosos de-monstraram avanço na segunda etapa da avalia-ção, presumivelmente beneficiados pela práticada tecnologia aplicada.

Ao avaliar a postura dos idosos no mo-mento da emissão da voz, constatou-se mai-or tendência de postura tensa (postura des-confortável, com certa rigidez e tensão mus-

cular) justificáveis, de uma parte, por possíveltimidez, e de outra, por corresponder às alte-rações de posturas características do porta-dor de DP. O desenvolvimento de uma fixa-ção de postura anormal caracterizada tipica-mente numa postura flexionada ou recurva-da (cifótica) está relacionado com os múscu-los flexores e adutores que se tornam seleti-vamente mais contraídos tanto nos membrossuperiores quanto nos inferiores, associadoainda à rigidez do tronco,2 interferindo assimna performance vocal do indivíduo.

As melhoras, por menores que pareces-sem, observadas durante as práticas de vivên-cias musicais junto aos idosos com DP, sedeveram ao desvio da tensão, quando o focoda tarefa era a expressão artística, afastandopadrões e normas predeterminadas de co-municação. O desafio de cantar uma canção/vocalise afastava a insegurança, tensão e alte-ração no comportamento motor, e fazia comque o paciente desviasse a atenção de sua li-mitação, ao se concentrar sobre o que ouvia ecantava, e não sobre a maneira como se pro-cessava a emissão do som. Tal fato corrobo-ra o estudo anteriormente realizado.20

A DP desencadeia uma série de crisesemocionais a seu portador, devido às perdasque nunca sofreram antes e que estão associa-das à patologia, além do processo de enve-lhecimento acompanhado de cronicidade.Afeta sobremaneira o paciente, ocasionandodesvios na auto-imagem e auto-estima, pelafalta da manutenção de atitude positiva acer-ca de si mesmo e de aceitar-se, o que exigeesforço orientado para a reestruturação davida. Por isso estudos continuados são ainda

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demandados, tendo em vista encontrar tec-nologias leves, assistivas/cuidadas e outrosrecursos que beneficiem o viver cotidiano emcondição de cronicidade dos idosos porta-dores de DP.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A implementação de tecnologia assistivapelas vivências musicais durante dois semes-tres se mostrou eficiente pelos resultados ob-tidos nos parâmetros avaliados:

a) a maioria dos portadores de DP apre-sentou melhorias na emissão vocal, tantoem volume quanto em ritmo; e outrosconservaram o estado anterior, significan-do que não perderam esse atributo, ape-sar de terem passado pela evolução deum ano da doença;

b) alguns portadores demonstraram melho-rias na dinâmica respiratória, principalmen-te no aumento do número de notas can-tadas em uma só inspiração e articulaçãonos vocalises. Contudo, muitos se manti-veram no seu estado anterior, não só nasduas categorias citadas anteriormente,como também no desenvolvimento deexercícios associados aos vocalises, consi-derando a não-progressão do quadro,passado o tempo de um ano da doença;

c) alguns idosos demonstraram melhoriasna performance vocal, seja do desenvolvi-mento de postura na emissão da voz, sejana articulação dos vocalises. Já a maioriase conservou no seu estado anterior, sig-nificando a não-progressão da doençadurante o período de um ano. O prepa-ro técnico vocal realizado nessas vivênci-as certamente influiu nas emissões, favo-

recendo a projeção tanto na voz cantadacomo na voz falada.

Dos resultados obtidos, pôde-se inferir queos idosos participantes da tecnologia assistivade vivências musicais se beneficiaram no sen-tido de se manterem incluídos socialmentecom seus familiares acompanhantes, ao sedescobrirem com capacidades e possibilida-des dentro dos limites que sua doença impu-nha, participando dessas atividades musicais. Os resultados positivos obtidos no presenteestudo estão delimitados a uma casuística de12 participantes acompanhados por apenasum ano, levando-nos a admitir a necessidadee importância de testes, em larga escala, deaplicação da dita tecnologia na assistência aosportadores de Doença de Parkinson, tendoem vista a manutenção da melhor qualidadede vida e inserção social dos envolvidos. Averificação de sua viabilidade técnica e finan-ceira nos programas sociais e de saúde é tam-bém de fundamental importância.

NOTAS

a Docente do Curso de Enfermagem da UESB/DS.Coordenadora do subprojeto do TAIP: Tecnologiaassistiva por meio de vivencias musicais na recupera-ção vocal de idosos portadores de Doença de Parkinson.

b,c Docentes de Enfermagem da UESB/DS. Membros daequipe de pesquisadores.

d Analista Universitária da UESB – Coordenadora Técni-ca de Música. Mestranda em Ciências Sociais – PUC/SP

e Docente de Enfermagem da UFSC/PEN – Florianópolis,SC. Coordenadora do projeto TAIP, convenio: UFSC/PEN/ GESPI x UESB/DS/ GREPE, Ref. 2183/05, sub-vencionado pela FINEP – Financiadora de Estudos e Pro-jetos, Ministério da Ciência e Tecnologia (Chamada Públi-ca MCT/FINEP/AT – Tecnologias Assistivas – 09/2005).

f Licenciada em Música. Bolsista ATP/CNPq, 2006-2008.g,h Bolsistas de Iniciação científica da UESB. Financiada

pela FAPESB-BAHIA

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Recebido em: 25/4/2008Reapresentado: 28/7/2008Aprovado: 15/8/2008