Voto Final

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ESTADO DE PERNAMBUCO TRIBUNAL DE CONTAS GABINETE DO CONSELHEIRO MARCOS LORETO VOTO DO RELATOR SESSÃO ORDINÁRIA DA SEGUNDA CÂMARA Relator: Conselheiro Marcos Loreto Processo TC nº 0605226-5 Tipo: Auditoria Especial (exercícios de 2006 e 2007) Origem: Câmara Municipal de Recife Interessados: Josenildo Sinésio da Silva e Outros Advogados: Márcio José Alves de Souza (OAB/PE nº 5.786) Leucio Lemos Filho (OAB/PE nº 5.807) Liliane Cavalcanti Barreto Campello (OAB/PE nº 20.773) Fernando R. Beltrão (OAB-PE nº 7.077) RELATÓRIO O processo em apreciação trata da Auditoria Especial instaurada na Câmara Municipal de Recife, por determinação do outrora Relator, Auditor Ruy Ricardo Harten, em resposta à CI nº 095/2006, de 20/10/2006 – que, na oportunidade, narrava “irregularidades encontradas durante a auditoria de acompanhamento da gestão orçamentária, financeira, contábil e patrimonial dos exercícios de 2006 e 2007, especificamente no que se refere às verbas de gabinete – atualmente denominadas verbas indenizatórias” –, assim como à demanda de Ouvidoria nº 6547, de 25/10/2006, que materializa a indignação de certo cidadão, como segue: “(...) é a olhos vistos como todos os responsáveis pelo suprimento de cada gabinete ficam atrás de notas para justificar essa verba e assim fechar as contas, para isso vale tudo.” Integram os presentes autos: o Relatório de Auditoria (fls. 2475 a 2547), com os Anexos I, II e III (fls. 2549 a 2590); a Defesa Escrita dos interessados, os Srs. Vereadores (fls. 2696 a 4249), bem como os membros da Comissão de Controle Interno da Câmara Municipal do Recife (fls. 4252 a 4274), com a juntada da documentação comprobatória das alegações feitas na Defesa Escrita; 1

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GABINETE DO CONSELHEIRO MARCOS LORETO

VOTO DO RELATOR

SESSÃO ORDINÁRIA DA SEGUNDA CÂMARARelator: Conselheiro Marcos LoretoProcesso TC nº 0605226-5Tipo: Auditoria Especial (exercícios de 2006 e 2007)Origem: Câmara Municipal de RecifeInteressados: Josenildo Sinésio da Silva e OutrosAdvogados: Márcio José Alves de Souza (OAB/PE nº 5.786)

Leucio Lemos Filho (OAB/PE nº 5.807)Liliane Cavalcanti Barreto Campello (OAB/PE nº 20.773)Fernando R. Beltrão (OAB-PE nº 7.077)

RELATÓRIO

O processo em apreciação trata da Auditoria Especial instaurada na Câmara Municipal de Recife, por determinação do outrora Relator, Auditor Ruy Ricardo Harten, em resposta à CI nº 095/2006, de 20/10/2006 – que, na oportunidade, narrava “irregularidades encontradas durante a auditoria de acompanhamento da gestão orçamentária, financeira, contábil e patrimonial dos exercícios de 2006 e 2007, especificamente no que se refere às verbas de gabinete – atualmente denominadas verbas indenizatórias” –, assim como à demanda de Ouvidoria nº 6547, de 25/10/2006, que materializa a indignação de certo cidadão, como segue:

“(...) é a olhos vistos como todos os responsáveis pelo suprimento de cada gabinete ficam atrás de notas para justificar essa verba e assim fechar as contas, para isso vale tudo.”

Integram os presentes autos: o Relatório de Auditoria (fls. 2475 a 2547), com os Anexos I, II

e III (fls. 2549 a 2590); a Defesa Escrita dos interessados, os Srs. Vereadores (fls.

2696 a 4249), bem como os membros da Comissão de Controle Interno da Câmara Municipal do Recife (fls. 4252 a 4274), com a juntada da documentação comprobatória das alegações feitas na Defesa Escrita;

o Laudo de Exame Documentoscópico (Grafoscópico) emitido pelo Setor Técnico Científico da Superitendência Regional do Departamento de Polícia Federal no Estado de Pernambuco (Laudo Pericial nº 380/2008 – SETEC/SR/DPF/PE (fls. 4278 a 4400).

A análise preliminar foi realizada pelos Auditores das Contas Públicas Adriana Arantes, Fábio Pedrosa, Rafaella B. M. de Andrade e Rogério Fernandes, conforme a seguinte ordem lógica das questões suscitadas.

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De início, a equipe de auditoria faz considerações gerais sobre a representatividade da verba indenizatória, contextualizando-a na atual ordem constitucional, legal e regulamentar, como segue:

Representatividade da Verba Indenizatória (ITEM 2.1 DO RELATÓRIO):

“(...) os valores despendidos com esta verba, nos exercícios de 2006 e 2007, alcançam, respectivamente, R$ 6.205.680,00 e R$ 4.298.591,21. Ou seja, mais de R$ 10 milhões de reais destinados a atender os vereadores da capital.

(...)Em outras palavras, excluindo-se os gastos de pessoal, do

orçamento restante, nos exercícios de 2006 e 2007, a verba de representação consome 51% e 34%, respectivamente (...).”  

Contextualização da Verba de Gabinete após a CF de 1988 e aplicação conferida pela Câmara de Vereadores (ITEM 2.2 DO RELATÓRIO):

“(...) É fato a intenção do legislador em controlar os gastos das Câmaras Municipais, e o resultado foi a imposição de diversos limites, com destaque, no caso deste relatório, para a Emenda Constitucional nº 25/00 promovendo mudanças profundas com a introdução do art. 29–A da Constituição Federal que estabeleceu uma base de cálculo para o repasse feito a Câmara e que desse repasse, não poderia ser gasto mais de 70% com folha de pagamento.

Tendo em vista que os dispêndios do Poder Legislativo são majoritariamente de natureza remuneratória, (...) não tendo atribuições de construir escolas, hospitais, estradas - nem tão pouco, gastos com a manutenção destas espécies de serviços públicos - a Câmara Municipal do Recife passou a instituir as chamadas verbas de gabinetes ou verbas indenizatórias de apoio ao exercício parlamentar, com o fito de não “desperdiçar” parcela dos 30% restantes do seu repasse, promovendo aquisições das mais variadas. Algumas delas, como será apresentado, desrespeitam princípios elementares de gestão pública; já outras nem sequer aconteceram e são acobertadas pela utilização de documentos fiscais inidôneos.

A verba em questão corresponde a um valor prefixado, pago mensalmente aos Membros do Legislativo, e destina-se - ao menos em tese - ao custeio de manutenção dos gabinetes parlamentares.

(...)A partir de 1º de janeiro de 2006, com o advento da Lei

Municipal nº 17.159/2005 (fls.15), foram mantidos os valores mas a sistemática do suprimento individual, prevista até então como forma de descentralizar tais recursos, foi alterada, passando-se a ter caráter de indenização. Em outras palavras, o vereador realiza, repita-se, em tese, os gastos com a manutenção do seu gabinete e requisita o ressarcimento/reembolso destas despesas mediante documentação comprobatória no valor de até R$ 14.365,00.

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(...)A partir de janeiro de 2007, por meio da Resolução N.º

702/2006 (fls.17), de 23/12/2006, a Câmara Municipal do Recife reduziu o valor desta verba para R$ 6.685,00. Esse valor vigorou apenas por quatro meses (janeiro a abril/07), tendo em vista que ao final do mês de abril, a Câmara Municipal editou uma outra resolução (Resolução N.º 233/2007, fls.18) majorando o valor da verba para R$ 10.090,00 (...).” Grifo no original  

Em seguida, nossos técnicos adentram nos achados de auditoria, relacionando as irregularidades e deficiências verificadas na amostragem trabalhada, que seguem sumariamente:

o Notas fiscais inidôneas Notas fiscais de estabelecimentos diversos preenchidas pela

mesma pessoa Notas fiscais irregulares Notas fiscais de estabelecimentos fechados e/ou inexistentes

o Gastos com combustíveiso Gastos indevidos com alimentaçãoo Despesas irregulares com promoção pessoalo Atuação ineficiente do Controle Internoo Descentralização orçamentária e financeira indevida dos recursos

para manutenção dos gabinetes

Destarte, vejamos o relato dos auditores:

Notas Fiscais Inidôneas (ITEM 3.1 DO RELATÓRIO):

“Do total da amostra analisada, esta auditoria identificou 553 Notas Fiscais (fls. 63 a 638) inidôneas que, somadas, totalizam R$ 976.492,12. As irregularidades se prenderam aos seguintes aspectos: notas fiscais “clonadas”; notas de estabelecimentos fechados ou inexistentes; notas com numeração repetida; notas de estabelecimentos diversos preenchidas com a mesma grafia, dentre outras. As modalidades acima foram identificadas, de forma isolada ou cumulativa, nas prestações de contas de 26 gabinetes de vereadores.

(...) é comum a utilização, pela Câmara Municipal do Recife, de notas fiscais falsas para simular a aquisição de bens e serviços que não foram realizados, fato que se tornou ainda mais evidente quando da visita in loco desta equipe de auditoria a 10 (dez) estabelecimentos que declararam não reconhecer e não ter emitido as notas fiscais apresentadas pelos auditores (fls.639 a 781).”

Neste item, as notas fiscais classificadas como inidôneas apresentam características variáveis (mas têm a mesma natureza das notas analisadas, no exercício de 2002, pela Secretaria da Fazenda do Estado de Pernambuco, que as reputou “inidôneas para qualquer fim”), como demonstram o Relatório de Auditoria e conforme segue:

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o Notas fiscais de estabelecimentos diversos preenchidas por uma mesma pessoa (ITEM 3.1.1 DO RELATÓRIO):

“A análise sistemática das Notas Fiscais juntadas pelos gabinetes de vereadores do Recife demonstra grafias visualmente idênticas e outras similitudes, como erros ortográficos iguais, descrições e valor de produtos idênticos, que se somam à existência de irregularidades específicas a cada nota fiscal vista individualmente.

Esta auditoria, na amostra de 2006 e 2007, pode agrupar 498 notas fiscais em 23 grupos [A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, L, M, N, O, P, Q, R, S, U, V, X1, X2, X3] (fls.63 a 580) cujo preenchimento foi feito pela mesma pessoa. Apesar de ainda encontrar-se pendente o laudo pericial grafotécnico – que, sob a perspectiva técnica, poderá confirmar a origem comum das grafias encontradas –, é notória a semelhança entre grafias de notas fiscais emitidas por estabelecimentos diferentes, em momentos distintos.”

Em nota de rodapé, a auditoria ainda informa que:

“As outras 55 notas fiscais não foram agrupadas pela grafia, mas encontram-se no final das tabelas, haja vista possuírem irregularidades individuais.”

o Notas fiscais irregulares (ITEM 3.1.2 DO RELATÓRIO):

“Com o auxílio do Sistema Integrado de Informações sobre Operações Interestaduais com Mercadorias e Serviços – SINTEGRA – constatamos a “clonagem” de diversas notas fiscais porquanto suas AIDFs referem-se a outras empresas ou não apresentam formato válido. Os selos fiscais, ora reutilizados, ora falsificados, também foram autorizados para outras empresas e não àquelas que, supostamente, emitiram as notas. Quanto às notas ficais de serviços pertencentes a empresas sediadas em Recife, foi realizada circularização com a Prefeitura do Recife (fls.918 a 938), tendo sido constatadas as mesmas irregularidades - AIDF de outra empresa ou com formato inválido.”

Noutra parte, a auditoria acrescenta:

“Como se não bastassem tais fatos, foi selecionada por esta equipe de auditoria uma amostra de notas fiscais de 10 estabelecimentos que mais venderam mercadorias e/ou prestaram serviços aos gabinetes de diversos vereadores e que possuíam diversos indícios de irregularidades, tais como: mesma grafia, AIDF de outra empresa, selo falso etc. Esta amostra contemplou gráficas, papelarias, restaurantes e postos de combustível. O intuito da visita in loco, realizada no período de 11/02/08 a 15/02/08, foi confrontar as informações presentes nas 1ª vias das notas fiscais apresentadas na prestação de contas da verba indenizatória percebida pelos vereadores com as 2ª vias presentes nos estabelecimentos, bem como verificar se, de fato, as mercadorias foram fornecidas e/ou os serviços foram prestados.”

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Dos trabalhos de campo, constatou-se 160 notas fiscais falsas apresentadas pelos parlamentares pertencentes aos 10 estabelecimentos visitados, somando o montante de R$ 271.014,00 (duzentos e setenta e um mil e quatorze reais), pelas razões descritas abaixo, mormente associadas:

o layout da nota apresentada pelos vereadores era diferente da nota utilizada pela empresa (Galeteria Alvorada, Bar e Restaurante Prestígio, Valgráfica, TGS Formulários, WR Gráfica e Editora, Papelaria Brasil, Gráfica Angelim, Danielle Crhistine Silva Mascarenhas – ME [restaurante], Posto Paraíso do Norte);

a grafia das 2as vias das notas eram diferentes das notas fiscais apresentadas pelos vereadores com numeração correspondente (Galeteria Alvorada, Bar e Restaurante Prestígio, Valgráfica, TGS Formulários, WR Gráfica e Editora, Papelaria Unimax);

os valores, as quantidades e a data não correspondiam com as notas apresentadas pelos vereadores (Galeteria Alvorada, Bar e Restaurante Prestígio, Valgráfica, TGS Formulários, WR Gráfica e Editora, Papelaria Unimax);

a descrição do produto/serviço era diferente da nota apresentada pelos vereadores – no caso das refeições, comumente, na via fornecida pelo estabelecimento os produtos são discriminados (galeto, picanha etc.), enquanto nas vias dos vereadores as discriminações são genéricas: “refeição completa” (Galeteria Alvorada, Bar e Restaurante Prestígio, Valgráfica, TGS Formulários, TGS Formulários, WR Gráfica e Editora, Papelaria Unimax);

o proprietário não reconheceu as vias apresentadas pela equipe de auditoria, declarando não ter emitido tais notas fiscais (Galeteria Alvorada, Bar e Restaurante Prestígio, Papelaria Brasil, Valgráfica, TGS Formulários, Gráfica Angelim, WR Gráfica e Editora, Danielle Crhistine Silva Mascarenhas – ME [restaurante], Posto Paraíso do Norte, Papelaria Unimax);

as notas falsas não guardam coerência lógica entre a numeração e a data em que foram emitidas (Galeteria Alvorada, Bar e Restaurante Prestígio, Papelaria Brasil, TGS Formulários, Gráfica Angelim, WR Gráfica e Editora, Papelaria Unimax);

os valores das notas falsas são muito superiores aos das notas verdadeiras, chegando a ser 111.000% maior, não condizentes com a movimentação de venda do estabelecimento, segundo o proprietário (Galeteria Alvorada, Bar e Restaurante Prestígio, Papelaria Brasil, Valgráfica, TGS Formulários, Gráfica Angelim, WR Gráfica e Editora, Danielle Crhistine Silva Mascarenhas – ME [restaurante], Papelaria Unimax);

as notas fiscais apresentadas pelos parlamentares não correspondem às notas emitidas pela empresa no período, pois a numeração é de talonários utilizados há mais de 5 anos (Papelaria Brasil);

a gráfica que produz os talonários para a empresa não correspondia com a constante na nota apresentada pelos vereadores (Papelaria Brasil);

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o estabelecimento não possui talonários no modelo (“Modelo 1 – Série 1”) apresentado pelos vereadores (Papelaria Brasil);

o número da autorização para emissão de notas fiscais não coincidia com a nota apresentada pelos vereadores (Valgráfica, Papelaria Brasil, TGS Formulários, Gráfica Angelim, WR Gráfica e Editora, Danielle Crhistine Silva Mascarenhas – ME [restaurante], Posto Paraíso do Norte);

algumas notas com numeração duplicada foram emitidas para vereadores diferentes (Valgráfica, Danielle Crhistine Silva Mascarenhas – ME [restaurante]);

o estabelecimento, até a data da visita, não possuía ainda talonário com a numeração das notas fiscais apresentadas pelos vereadores (TGS Formulários, Posto Paraíso do Norte);

as notas fiscais com numeração correspondente à numeração das notas apresentadas pelos vereadores ainda não tinham sido emitidas (Gráfica Angelim, WR Gráfica e Editora, Danielle Crhistine Silva Mascarenhas – ME [restaurante], Posto Paraíso do Norte).

o Notas fiscais de estabelecimentos fechados e/ou inexistentes (ITEM 3.1.3 DO RELATÓRIO):

“Diante das irregularidades expostas acima, foram selecionados 15 estabelecimentos a visitar com o fim de apenas verificar a existência dos mesmos. Constatou-se que um estabelecimento estava fechado e sete eram inexistentes.” (Grifo no original)

Vejamos os resultados das visitas realizadas pela equipe de auditoria e as razões da conclusão exposta no relatório:

O LAVAJATO & LANCHONETE 48 LTDA. (situado na R. Quarenta e Oito, 785 – Encruzilhada), quando da visita da equipe (em junho de 2006) encontrava-se fechado, com um anúncio de aluguel e, segundo uma pessoa da localidade, já havia algum tempo (o estabelecimento teve o seu ativo cancelado no dia 15/03/2006, conforme dados do SINTEGRA). Não obstante a inexistência constatada do estabelecimento, o gabinete do vereador Daniel Pires Coelho continuou a adquirir refeições no local não só nos demais meses de 2006, como também ao longo do exercício de 2007. Os gastos totalizaram R$ 3.580,00 (três mil, quinhentos e oitenta reais).

O estabelecimento COMERCIAL SETTE não existia no endereço indicado (R. Esmeraldas, 65 - Casa Amarela/Bomba do Hemetério), pois no local se encontrava apenas uma residência. Ainda assim 12 notas fiscais – que, inclusive, apresentam grafia idêntica com notas de diversas outras empresas – totalizando R$ 44.100,90 (quarenta e quatro mil, cem reais e noventa centavos), foram apresentadas nas prestações de contas de diversos vereadores: Gilvan Cavalcanti da Silva, Luiz Helvécio, Valdir Facioni, Romildo Gomes, Silvio Costa Filho e Eduardo Marques.

A empresa PAPEL MAIS - V. F. DA SILVA PAPELARIA não funcionava no endereço indicado na nota fiscal (R. Frei Onofre, 53 - Água Fria) – pois não havia atividade comercial no local (era uma residência) –, mas constou na

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prestação de contas do vereador Marcos Antônio de Souza Menezes fornecendo mercadoria no valor de R$ 3.295,40 (três mil, duzentos e noventa e cinco reais e quarenta centavos).

A PAPELARIA CONTATO não existia na sala indicada na nota fiscal (R. da Aurora, 295/1309 - Boa Vista). No local, na verdade, funcionava uma firma de crédito bancário. Apesar disso, teve duas notas fiscais incluídas na prestação de contas do vereador Marcos Antônio Menezes – que, ademais, apresentam os selos fiscais visivelmente reaproveitados de outros documentos fiscais – no valor R$ 3.196,20 (três mil, cento e noventa e seis reais e vinte centavos).

A empresa HIPER PAPELARIA – EDNA MARINHO DA SILVA – ME. não atuava no endereço indicado na nota fiscal (Olinda - Rio Doce - R. Leão, 87), o apartamento nº 301 de um prédio situado num conjunto habitacional – inclusive porque não habilitada à época, conforme dados do SINTEGRA –, mas comercializou R$ 13.865,54 (treze mil, oitocentos e sessenta e cinco reais e cinqüenta centavos) com o gabinete do vereador Osmar Ricardo Cabral, em notas fiscais seqüenciadas emitidas num intervalo de um mês (de um para outra).

A firma S & S COMÉRCIO E SERVIÇOS LTDA. não funcionava no local indicado nas notas fiscais (Olinda - Bairro Novo - Av. Getúlio Vargas, 856 - Sala 01), pois – quando da visita da equipe de auditoria (em outubro de 2006) –, no endereço havia um comércio de gêneros alimentícios (e ao fundo um salão de beleza) e as pessoas da localidade desconheciam a existência do estabelecimento (a Receita Federal, também, não reconhecia sua regularidade fiscal). Constatada a inexistência do estabelecimento no local, os gabinetes dos vereadores Liberato Costa Júnior e Luiz Carlos Pires continuaram a contratar com a empresa durante todo o primeiro semestre de 2007 – algumas notas com numeração repetida e outras sem qualquer coerência cronológica. Os gastos totalizaram R$ 31.505,00 (trinta e um mil, quinhentos e cinco reais).

A empresa SUCESSO LOCADORA não foi encontrada no endereço indicado no documento (Av. Mal. Mascarenhas de Moraes, 6347 – Imbiribeira), apesar de diversas diligências realizadas nas proximidades do Aeroporto, mas forneceu nota fiscal ao gabinete do vereador Gustavo Vasconcelos Negromonte, no valor de R$ 1.800,00 (mil e oitocentos reais) – inclusive, com autorização da Prefeitura inválida e apresentando a mesma grafia de notas fiscais de outros estabelecimentos.

A empresa COMERCIAL LOURENÇO, apesar de ter sua inscrição cancelada por declarações inexatas em documentos apresentados à SEFAZ e por obtenção de inscrição estadual por meio de fraude, dolo e simulação (a suposta proprietária do estabelecimento declara nunca ter aberto a referida empresa e que foi informada da existência da mesma por um auditor fiscal que esteve em sua residência para constatar o endereço da empresa), emitiu 58 notas fiscais para diversos gabinetes de vereadores (Fred Oliveira, Liberato Costa Júnior, João Alberto de Freitas, Valdir Facioni, Eduardo Marques, Silvio Costa Filho, Elediak Cordeiro, Luiz Helvécio, Gilvan Cavalcanti da Silva, Henrique José Leite, Osmar Ricardo

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Cabral, Romildo Gomes, Luiz Eustáquio Ramos Neto, Luiz Vidal e Júnior Lu [Mandacaru]), somente na amostra referente ao exercício de 2007 (7 meses), que totalizaram R$ 168.108,75 (cento e sessenta e oito mil, cento e oito reais e setenta e cinco centavos).

A equipe de auditoria, ao final das visitas, concluiu:“(...) estabelecimentos fechados ou inexistentes, reutilização

de selo fiscal recortado de outros documentos fiscais, notas cuja grafia coincide com a grafia de notas fiscais de outros estabelecimentos são fatos que reforçam que houve aquisição/produção de notas fiscais com o fito de simular a aquisição de matérias e serviços. Tais fatos suscitam apuração penal por parte do Ministério Público.

E, ainda, acrescentou:

“Diante das irregularidades acima narradas - notas fiscais de estabelecimentos diversos preenchidas por uma mesma pessoa, notas fiscais irregulares e notas fiscais de estabelecimentos fechados e/ou inexistentes – conclui-se que a conduta dos vereadores pode ser enquadrada no art. 9º, XI da Lei nº 8.429/92

(...) O montante apurado por esta auditoria foi de R$

976.492,12, cabendo a devolução aos cofres públicos por cada gabinete (...). Deve, ainda, ser aplicada multa aos vereadores nos termos da Lei nº 12.600/04, art. 73, inciso II.”

Gastos com combustíveis (ITEM 3.2 DO RELATÓRIO):

“(...) uma média de 50 mil litros de gasolina por mês para os 36 vereadores, o suficiente para rodar 500.000 km. Por gabinete, o consumo mensal médio é de R$ 3.847,61, ou seja, 1.425 litros de gasolina/mês, o suficiente para rodar 14.250 km.

Apenas a título ilustrativo, 14.250 km correspondem a 2.035 vezes a distância entre os municípios de Olinda e Recife e 750 vezes a distância entre os municípios de Recife e Jaboatão dos Guararapes.

(...)Há gabinete com até 11 (onze) veículos cadastrados

(fls.939) e outro com dispêndio mensal de aproximadamente R$ 7.000,00 (fls.940 a 941), que corresponde a quase 2.600 litros de gasolina.

(...)Fazendo-se uma projeção dessas despesas para todo o

exercício de 2006, com base nos valores encontrados até então, obter-se-ia mais de R$ 1.500.000,00 com gastos, exclusivamente, de combustíveis utilizados pelos vereadores da Câmara do Recife.” (Grifo no original)

Diante desses dados, a equipe técnica deste Tribunal vê a restituição de despesas com combustíveis como “um subsídio indireto”, que “não é moral, nem razoável”, relembrando, ademais, os “indícios de notas fiscais calçadas” e a “existência de notas fiscais falsas junto às prestações de contas dos vereadores”. Por fim, conclui, com base em deliberações dos

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Tribunais de Contas dos Estados de Roraima (Prejulgado nº 19), Minas Gerais (Consulta nº 682.162 e 677.255) e Santa Catarina (Decisão nº 3314/02), que:

“(...) a Câmara Municipal da Cidade do Recife somente pode custear as despesas com combustível dos vereadores, no caso do deslocamento deste, em missão oficial, para localidade diversa daquela em que exerçam suas atividades. Ademais, faz-se necessário o controle desses gastos de modo que se evidencie o percurso transcorrido, data e finalidade.” (Grifo no original)

Gastos indevidos com alimentação (ITEM 3.3 DO RELATÓRIO):

“Como regra geral, a lei veda a aquisição de gêneros alimentícios e estabelece como ressalva a alimentação não preparada, em nome do vereador, para uso exclusivo do gabinete (art. 4º) a exemplo de café, açúcar, chás, entre outros, assim como é oferecido nos diversos órgãos ou setores públicos.

(...) o que se verifica, na prática, é que os gastos com alimentação não preparada para os gabinetes são mínimos, não chegam a 2%. Os dispêndios concentram-se maciçamente em refeições em bares e restaurantes (...)

(...) pode-se chegar a uma média de R$ 50.000,00/mês sendo gastos com alimentação em bares e restaurantes. Se forem analisados individualmente, é fato que os gastos carecem de legitimidade, cuja destinação atende a todo e qualquer fim, exceto ao público.” (Grifo no original)

Seguem alguns exemplos coletados pela auditoria, que ainda cuida de esclarecer: “Tais fatos se repetem nos demais meses e não se resumem apenas aos vereadores citados”.

Vereador Gilberto Luna – “303 refeições em um único mês (janeiro)”; Vereador Severino Ramos – “três notas fiscais de uma churrascaria (R$

9.603,67). São 150 rodízios a R$ 41,00, 325 refrigerantes, 311 águas minerais e sobremesas (maio, junho e julho de 2006)”;

Vereador Francismar Mendes – “164 pratos em janeiro/06 (R$ 4.204,00) e 135 em fevereiro/06 (R$ 3.500,00), de picanha, carne de sol, galeto e costela, consumidos no Restaurante Tábua de Carne” e “437 pratos (R$ 12.404,60) realizados no mesmo estabelecimento (Churrascaria Cumpim Grill). Tais gastos correspondem respectivamente a 40%, 53% e 47% da verba indenizatória dos meses de janeiro, fevereiro e março de 2007”;

Vereador Augusto Carreras – “de janeiro e fevereiro/06, apenas do fornecedor José Dias Barbosa, são apresentadas sete notas fiscais que trazem 402 produtos dos mais variados (lagosta, camarão, salmão, escondido de charque, maminha importada, pão de alho, camarão, ensopados, filé com fritas, bolinhos de queijo e bacalhau, caldinhos, lingüiça de bode, coração de galinha, casquinha de caranguejo, brigadeiro, cartola, codorna, bubballo fruttili [chicletes], picolés da Kibon, refrigerantes e água de coco, entre outros)” e “várias das refeições

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entram pela madrugada e outras são realizadas em sábados e domingos”;

Vereador Roberto Teixeira – “aos sábados e domingos”; Vereador Marco Antônio Menezes – “nota fiscal do estabelecimento Bate

Sela Comércio de Artigos Eqüinos, localizado na Estrada de Aldeia, município de Camaragibe, no valor de R$ 401,50, datada de 21/02/2007 (quarta-feira de cinzas)”;

Vereador Nildo Rezende – “nota fiscal do estabelecimento Restaurante Delícia da Serra, localizado em Gravatá, no valor de R$ 203,00, datada de 04/03/2007 (domingo)”;

Vereador André Ferreira – “34 cupons fiscais do estabelecimento Fênix Empreendimentos Ltda, ou seja, ele foi mais de uma vez ao dia durante o mês de janeiro ao referido estabelecimento. Somente no sábado, 20/01/2007, ele apresentou 3 cupons de R$ 139,57, R$ 92,95, R$ 62,98, pagos respectivamente às 15:39:58, 18:37:18 e 22:34:57” e “em fevereiro/07, do gasto total com a verba indenizatória (R$ 6.685,00), R$ 2.526,32 foram gastos no estabelecimento Fênix Empreendimentos (38%);

Vereador Osmar Ricardo – “Das 27 notas fiscais apresentadas em janeiro/07, 15 foram do Restaurante Ta San Yuen Ltda. (nos três primeiros meses de 2007, R$ 3.441,87);

Vereador Mozart Sales – “três notas fiscais seqüenciadas (NF nº 5, 6, 7), uma em cada mês (janeiro a março de 2007), da Churrascaria e Pizzaria Fama do Bode, em que constam o consumo de 1.097 refeições ao valor unitário de R$ 10,00”.

Sendo assim, amparados nas Decisões TC nº 915/96 e 213/97 deste Tribunal, os auditores concluem que:

“(...) os gastos com alimentação em bares e restaurante, de forma indiscriminada, são gastos ilegítimos, sem qualquer finalidade pública, que não apenas estão desamparadas pela Lei Municipal nº 17.159/05, como também não encontram respaldo junto ao princípio da Moralidade. Em outras palavras, não possuem amparo em nosso ordenamento a utilização de recursos públicos para finalidades privadas.”

E, ainda, suscitam o enquadramento da conduta no art. 10, XI, da Lei nº 8.429/92 (liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para sua aplicação irregular), bem como rogam pela devolução de R$ 253.784,94 aos cofres municipais (não computados os valores já relacionados no item 3.1 – notas fiscais inidôneas) e conseguinte aplicação de multa, nos termos do art. 73, II e III da Lei nº 12600/04.

Despesas irregulares com promoção pessoal (ITEM 3.4 DO RELATÓRIO):

“A amostra considerada corresponde aos meses de janeiro a junho e setembro de 2007. Nessa amostra, foram encontrados jornais

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informativos (fls.2369 a 2452) produzidos pelos vereadores André Ferreira, Augusto Carreras, Daniel Coelho, Josenildo Sinésio, Luiz Carlos Pires e Priscila Krause, cujos conteúdos são visivelmente de promoção pessoal, pois tais jornais contêm primordialmente informações sobre a atuação dos vereadores, além de constar diversas fotos dos citados vereadores em eventos, inaugurações, visitas a instituições de caridade, obras, comunidades etc. Percebe-se também que todos os jornais destacam os nomes dos edis ao longo de toda a publicação, assim como suas logomarcas. Além disso, todos os jornais fazem menção aos sites pessoais dos mesmos, exceto o do vereador André Ferreira..”

No Relatório, a equipe de auditoria, primeiramente, realça aqueles fatos que considera evidências da promoção pessoal dos vereadores, consoante leitura da Constituição Federal (art. 37, parágrafo único) e da Resolução TC nº 05/91 deste Tribunal (arts. 1º, caput e parágrafo único, e 4º, parágrafo único), para, a seguir, sugerir o “ressarcimento ao erário dos valores despendidos irregularmente por cada vereador”, a aplicação de multa nos termos do art. 73, II e III da Lei nº 12.600/04 e o enquadramento da conduta como ato de improbidade administrativa (art. 9º, XII, da Lei nº 8.429/92). Vejamos tais evidências:

Vereador Daniel Coelho – “símbolos (desenho de um coelho com a camisa do Partido Verde)”, “fotos do vereador em diversos eventos” e referência ao nome do vereador na chamada “os principais destaques do mandato”;

Vereador Josenildo Sinésio – “fotos do vereador em diversos eventos”, “avaliação de políticos sobre a atuação do vereador” e “editorial do vereador (‘neste número fotos e textos fazem um painel de nossas atividades...’)”;

Vereador Caio Pires – “perfil do vereador”, com foto e referência ao nome (‘Este é Caio Pires’), “discurso de posse do vereador” e “atuação legislativa e nas comunidades”;

Vereador Augusto Carreras – “divulgação da mudança de marca e slogan”, “trajetória política” e “atuação legislativa”;

Vereadora Priscila Krause – “editorial da vereadora (‘breve resumo daquilo que foi realizado em 2006’)”, com destaque para a “participação da vereadora nas ações divulgadas” e “apelo visual à sua imagem”;

Vereador André Ferreira – “ênfase à sua atuação legislativa e imagem”.

Atuação ineficiente do Controle Interno (ITEM 3.5 DO RELATÓRIO):

“(...) verificou-se a existência de diversos documentos com irregularidades, inclusive nos aspectos fiscais, evidenciando a deficiência do controle interno por não ter sequer impugnado uma única nota fiscal.

O ponto que merece destaque é a restrição que a resolução estabelece, quando afirma que a fiscalização das despesas se fará apenas quanto aos aspectos de regularidade formal, fiscal e contábil da documentação comprobatória, atribuindo responsabilidade individual ao vereador nos demais aspectos.

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As atribuições do controle interno são inúmeras, muito mais amplas que a singela verificação formal, fiscal e contábil e encontram-se inseridas na Constituição Federal (...).

Decorridos dezenove anos da promulgação da Carta Magna de 1988, o sistema de controle interno existente na Câmara Municipal do Recife não vem cumprindo seu papel constitucional. Do início ao fim deste relatório, são elencados inúmeros gastos ilegais, ilegítimos e até mesmo antieconômicos, sem que se tenha verificado qualquer intervenção do Controle Interno, nem sequer a verificação fiscal da documentação, mesmo diante da exigência expressa em lei e resolução.”

No presente tópico, o relatório de auditoria sugere “a aplicação de multa (art. 73 da Lei Orgânica do TCE-PE) ao Presidente da Câmara Municipal pela não instituição adequada do controle interno” e “à Comissão de Controle Interno pela omissão do dever de verificar os aspectos fiscais da documentação comprobatória, conforme determinação de lei [Lei N.º 17.092/2005, art. 7º] e resolução [Resolução N.º 678/2005, art. 5º]”.

Descentralização orçamentária e financeira indevida dos recursos para manutenção dos gabinetes (ITEM 3.6 DO RELATÓRIO):

“O que se tem, na verdade, é a transferência da gestão administrativo-financeira da Casa, que deveria ser irrenunciável, para a administração – pessoal e desprovida de controle – dos seus membros. Em outras palavras, independente do nome que se queira dar a essa verba, o que ocorre é a ruptura do orçamento da Câmara para as mãos dos vereadores como se unidade orçamentária fossem.

(...)Tanto o modelo anterior, regime de adiantamento, bem como

o atual, na forma de indenização, não encontram respaldo na legislação, até porque – na prática – significam a mesma coisa.”

Neste sentido, são as deliberações do TCE-MG (consulta nº. 643.657, 612.637, 66.029, 470.273) e do TCM-BA (Parecer Normativo nº 09/2005), bem como o Parecer Técnico do TCM-CE (Consulta nº 16/03) e o Parecer PROGE TC 016/2001 do Ministério Público de Contas da Paraíba, todos colacionados pelos auditores, quando sustentam:

“(...) as despesas de custeio do Poder Legislativo Municipal são privativas do presidente da Câmara, devendo ser por ele centralizadas e somente a ele cabe a atribuição de ordená-las, respeitando o ordenamento jurídico em vigor, as regras da licitação, da execução das despesas, fruto de uma ação planejada, conforme determina a Lei de Responsabilidade Fiscal.

(...) vê-se que o modelo de gestão da Câmara atual não convive em harmonia com a regra constitucional da licitação. Contrata-se com quem quer, não se verifica se o fornecedor encontra-se com débito na Fazenda, não se tem uniformidade nas aquisições, preços abusivos são verificados com freqüência (...).”

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A título apenas de um exemplo, numa série de produtos constantes das notas fiscais apresentadas pelos vereadores, mas com o fito de demonstrar que a licitação, além de evitar direcionamentos, “garante maior transparência e, acima de tudo, a economicidade”, os auditores – “supondo que todas as notas fossem idôneas” – realizaram um breve estudo sobre a aquisição do item “resma de papel” pelos gabinetes, durante quatro meses de 2006, do qual se extraiu as seguintes conclusões:

As notas fiscais revelaram que “o produto teve uma variação de preço entre R$ 9,80 e R$ 25,00 (155%)”, expondo, ademais, alguns fatos inusitados, onde se destaca “uma nota fiscal com o valor de 01 (uma) resma de papel a R$ 11,50 (janeiro/06), enquanto que em outra nota fiscal, da mesma papelaria, são apresentadas 100 (cem) resmas a um custo unitário de R$ 25,00 (maio/06), constante da prestação de contas do vereador Antônio Luiz Neto”;

Em 2006, os gabinetes adquiriram diretamente, no período de apenas quatro meses, “4.866 resmas”, quando este Tribunal, por meio de licitação (Tomada de Preços nº 01/2005) planejou a aquisição de 3.000 resmas, para todo exercício, ao preço de R$ 9,17;

Se todas as aquisições tivessem sido feitas pelo “menor preço encontrado nas notas (R$ 9,80)”, a Câmara teria economizado “R$ 22.592,43 (32% a menos)”.

Ao final, o relatório pede a aplicação de multa ao Presidente da Câmara (art. 73, II e III da Lei nº 12.600/04), “pelo descumprimento das Leis nº 8.666/93, 4.320/64 e Lei Complementar 101/00” e no campo das determinações, demonstra graficamente que “embora tenha se reduzido o valor da verba em mais da metade [para o exercício de 2007], a proporção de despesas irregulares aumentou [de 61% para 75%]”, razão pela qual assevera:

“(...) não se mostra suficiente apenas a recomendação de redução do seu valor, pois como ficou demonstrado, qualquer que seja o limite estabelecido, a verba será utilizada de forma irregular. Conclui-se que essa verba é absolutamente desnecessária, e sua suspensão imediata não causará problemas às atividades do Poder Legislativo Municipal, haja vista que 75% dos recursos foram destinados a atividades que não se relacionam ao interesse público, muito menos às atividades da Câmara e grande parte se destinam à falsificação de documentos fiscais.” (Grifo no original)

Regularmente notificados, os Srs. Vereadores e os integrantes da Comissão de Controle Interno (nos exercícios de 2006 e 2007), considerando as irregularidades e deficiências apresentadas no Relatório, apresentaram, diretamente ou por meio de procurador regularmente constituído nos autos, defesa escrita às fls. 2696 usque 4249 e fls. 4252 usque 4274 – com a qual foram trazidos à colação os documentos que fundaram as devidas contra-razões.

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Didaticamente, apresentarei, na mesma seqüência dos pontos apontados pela auditoria, os argumentos da defesa de cada vereador ou membro da Comissão de Controle Interno, informando que algumas peças expressam o mesmo teor, mas antes trarei as considerações introdutórias apresentadas pelos advogados Márcio José Alves de Souza (OAB-PE nº 5.786), Leucio Lemos Filho (OAB-PE nº 5.807) e Liliane Cavalcanti Barreto Campello (OAB-PE nº 20.773) sobre a natureza e finalidades da verba de gabinete, bem como a legislação aplicável à espécie.

Considerações introdutórias da Defesa Escrita:

o Natureza e Finalidades da Verba de Gabinete:

“Primeiramente, cumpre-se registrar que a verba de gabinete alcança despesas que são necessárias, auxiliares ou complementares, não ao funcionamento do gabinete em si (estas custeadas pela própria Câmara), mas ao exercício da atividade parlamentar, que demanda, muitas vezes, assistência, apoio, incentivo e assessoria às comunidades.

(...)Para desenvolver esse trabalho, o parlamentar tem que

dispor de estrutura (administrativa, técnica e de pessoal). Com efeito, a atividade parlamentar não se limita aos trabalhos internos na Câmara (de elaboração de discursos e proposições legislativas, trabalhos em comissões, etc.) mas se desenvolve e se estende fora do gabinete, nas diversas comunidades, bairros ou regiões administrativas onde atua na defesa dos cidadãos, ouvindo e verberando suas necessidades (de saneamento, posto de saúde, escola, creche, segurança, pavimentação ou outros serviços essenciais), organizando entidades para defendê-los, fomentando e participando de reuniões (no mais das vezes à noite e nos finais de semana), prestando orientação ou assessoria com serviços realizados por sua equipe de gabinete, que para lá se desloca.

(...) os encargos decorrentes da manutenção do gabinete do Vereador podem ser feitos de duas formas: (a) através da administração centralizada; ou (b) por meio da concessão de verbas de gabinete, mediante atribuição ou destinação de recursos orçamentários, que passam a ser administrados e de responsabilidade do próprio Gabinete, na forma que dispuser a legislação.

Quanto à forma, trata-se de opção administrativa, de decisão política, que não comporta qualquer censura ou questionamento técnico por parte da auditoria desta Corte, pois isso equivaleria a tolher o Poder Político na sua competência ou capacidade de decidir pela alternativa administrativa que lhe parecer mais conveniente ou oportuna. Questionar essa opção, além de resultar numa ‘capitis diminutio’ do Poder Legislativo, implicará em adentrar nas questões de mérito do ato, as quais não podem ser objeto de exame.

Aliás, desse mesmo entendimento comunga este Tribunal de Contas [Decisões TC nº 1737/98, 0493/01, 1316/01 e 1238/02].”

o Legislação Aplicável:

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“(...) Com o advento da Lei nº 17.159/2005, o sistema de suprimento ou adiantamento de verba para posterior prestação de contas foi extinto, adotando-se o sistema vigente na Câmara Federal, onde o parlamentar efetua o dispêndio com recursos próprios e particulares, nos itens de despesa previstos na Lei, e depois solicita o ressarcimento ou reembolso dessas despesas por ele já efetivadas.

A Verba foi transformada em sua natureza, passando a ter conteúdo indenizatório.”

Notas Fiscais Inidôneas (ITEM 3.1 DO RELATÓRIO):

a) vereadores ANDRÉ FERREIRA RODRIGUES, ANTÔNIO LUIZ DA SILVA NETO, AUGUSTO JOSÉ CARRERAS CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, CARLOS FREDERICO GOMES FRED OLIVEIRA, DANIEL PIRES COELHO, EDUARDO AMORIM MARQUES DA CUNHA, ELEDIAK FRANCISCO CORDEIRO, FRANCISMAR MENDES PONTES, GILVAN CAVALCANTI DA SILVA, GUSTAVO VASCONCELOS NEGROMONTE, HENRIQUE JOSÉ LEITE DE MELO, JOÃO ALBERTO DE FREITAS MARINS, JOSÉ ERIBERTO MEDEIROS DE OLIVEIRA, LIBERATO PEREIRA DA COSTA JÚNIOR, LUIZ CARLOS CAVALCANTI PIRES, LUIZ EUSTÁQUIO RAMOS NETO, LUIZ HELVÉCIO DE SANTIAGO ARAÚJO, LUIZ VIDAL SILVA, MARCOS ANTÔNIO DE SOUZA MENEZES, MOZART JÚLIO TABOSA SALES, OSMAR RICARDO CABRAL BARRETO, ROMILDO JOSÉ FERREIRA GOMES FILHO, SEVERINO GABRIEL BELTRÃO, SÍLVIO SERAFIM COSTA FILHO, VALDIR FACIONE e VICENTE MANOEL LEITE ANDRÉ GOMES:

Os vereadores destacados neste tópico, por intermédio de seus procuradores – Márcio José Alves de Souza (OAB-PE nº 5.786), Leucio Lemos Filho (OAB-PE nº 5.807) e Liliane Cavalcanti Barreto Campello (OAB-PE nº 20.773) – trataram, preliminarmente, de suscitar a incompetência do Tribunal de Contas para fiscalizar o recolhimento de tributos, a par de demonstrar a ausência de responsabilidade dos parlamentares pela inidoneidade das notas fiscais. E, ainda, procuraram comprovar a existência ou regularidade dos estabelecimentos cujas notas foram questionadas pela auditoria.

o Incompetência do TCE:

Ab initio, os vereadores levantaram a preliminar de incompetência do TCE para tratar de questão tributária, com base em pronunciamento do STF:

“(...) a fiscalização ou cobrança de impostos estaduais não está prevista dentre as competências do TCE, elencadas no art. 2º, da Lei n 12.600/2004.

(...)Esse é o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal

Federal:‘(...) o Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação

direta proposta pelo Governador do Estado do Paraná para declarar a inconstitucionalidade do § 3º do art. 78 da Constituição estadual que estabelece que as decisões fazendárias de última instância contrárias ao erário serão apreciadas, em grau de recurso, pelo Tribunal de Contas

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estadual. Entendendo-se não competir ao legislativo apreciar recursos interpostos contra decisões tomadas em processos administrativos em que se discute questão tributária, nada justificando a atuação, neste campo, do Tribunal de Contas (CF, art. 71). Precedente citado: ADI 461/BA (DJU de 6.9.2002)” (ADI 523/PR, rel. Min. Eros Grau, 3.4.2008).

Sendo assim, não cabe a esta Corte fiscalizar a sonegação fiscal supostamente praticada por empresas que contrataram com o Defendente. O que importa é que as despesas foram comprovadas e o Defendente agiu de boa-fé.” (Grifo no original)

o Ausência de responsabilidade pela inidoneidade das notas fiscais:

Neste ínterim, os vereadores, utilizando-se de deliberações do TCU (Acórdão nº 69/1999 – Segunda Câmara e Acórdão nº 79/2001 – Plenário), alegaram a presunção de boa-fé na aquisição de mercadorias sem regular documentação fiscal, pois “os vícios existentes em notas fiscais de empresas (...) são de inteira responsabilidade do emitente” (Decisão TC nº 0273/99):

“Inicialmente, cumpre-se esclarecer que, no exercício de 2006, a Câmara Municipal do Recife não dispunha de sistema informatizado que permitisse acesso a todas as informações fiscais das empresas junto à SEFAZ, conforme faz prova a declaração em anexo.

Ademais, mesmo que as citadas notas fiscais pudessem ser consideradas inidôneas, ainda assim, serviriam para comprovar a despesa, vez que trazem de forma completa a identificação dos credores, da operação realizada e o valor pago.

(...) qualquer pessoa ou instituição pode receber notas fiscais inidôneas sem ter conhecimento deste fato, pois um estabelecimento comercial pode estar com situação irregular perante o Fisco, mas continuar realizando operações comerciais.

(...)Ora, a boa-fé se presume, mas a má-fé deve ser provada.

Sendo assim, a auditoria não pode, simplesmente, deduzir que as compras foram fictícias. Os materiais adquiridos foram devidamente entregues e não houve superfaturamento, donde se conclui que não houve prejuízos ao erário.

Em resumo, ainda que se possa acoimar vícios nos documentos fiscais, esses vícios se restringem ao documento. Mas o documento, mesmo inservível para finalidades fiscais, pode servir para comprovar a operação ou o pagamento. Para que esse vício tenha reflexo na situação enfocada pelo relatório de auditoria, se faz imprescindível demonstrar, de forma cabal, que o vício decorreu de atuação, participação ou pelo menos com anuência do defendente; em seguida que desse vício decorreu prejuízo à entidade. Tais elementos não se afiguram presentes no caso concreto, seja porque não comprovação cabal, seja porque os recursos eram de origem privada, seja ainda porque uma vez detectada a falha, houve devolução.”

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o Comprovação da existência ou regularidade dos estabelecimentos:

No mérito, alguns vereadores, em situações específicas, trouxeram aos autos documentos, com vistas a comprovar a existência ou regularidade dos estabelecimentos questionados pela auditoria, conforme segue:

a) vereadores ANTÔNIO LUIZ DA SILVA NETO, EDUARDO AMORIM MARQUES DA CUNHA, ROMILDO JOSÉ FERREIRA GOMES FILHO e SÍLVIO SERAFIM COSTA FILHO:

Tais vereadores contrataram os trabalhos de auditoria independente (Raul Pereira Neto – Auditor Independente, sob a inscrição CRC-PE nº 011.150/T-RN-S-PE e CNAI/CRC-CFC nº 519), que afirma:

“(...) foi possível reunir documentação comprobatória da existência e regularidade das empresas examinadas, nos cadastros da JUCEPE, da SEFAZ, da Receita Federal e em alguns casos, fisicamente foi possível detectar empresas reputadas como irregulares ou inidôneas funcionando e operando normalmente com o público consumidor.

Portanto, improcede a glosa consignada no relatório de auditoria, uma vez que se baseia em informações parciais, extraídas de uma base de dados considerada apenas no momento em que a auditoria foi realizada e não analisando o histórico das empresas e sua regularidade no momento em que efetivamente realizou a operação objeto de reembolso.

(...)A alegação que consta do relatório – quando a aidf’s que

seriam de outra empresa – era um dado que, consoante se comprovou pela declaração do serviço de controle interno da Câmara, não estava disponível nos serviços da Câmara naquele exercício. Portanto esse vício não poderia ser detectado na ocasião.

O fato é que o Defendente adotou todas as providências dentro do critério da razoabilidade, que era esperado de um consumidor normal, nas circunstâncias, não se podendo exigir cautela acima do padrão.

(...)Registre-se ainda que a defesa fica prejudicada em relação

alguns itens ou empresas, porquanto não foram fornecidos elementos que possibilitassem exame pelo auditor independente, restringindo o contraditório e o exercício do direito de defesa na forma ampla como assegurado constitucionalmente. A violação ao disposto no art. 5º, incisos LIV e LV da Constituição da República constitui vício insanável de nulidade que contamina o processo e a prova nele produzida.”

O vereador Sílvio Costa Filho, ainda, trata dos estabelecimentos citados no Relatório de Auditoria:

“(...) as empresas existem e têm registro perante o fisco e a Jucepe, como comprovam os documentos anexados com a defesa. O posto Leão da Ilha, por exemplo, está ativo; caso também da W. R. Gráfica Ltda. (Top Gráfica e Editora) e Danielle Cristine Silva Mascarenhas – ME,

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Comercial Lourenço Ltda., Comercial Sette Ltda., a Churrascaria e Pizzaria Mansão do Matuto Ltda. – ME. e a Papelaria Baraúna Ltda. – ME, o Posto Lupp Ltda. e a Valgráfica Ltda. – ME.”

b) vereador AUGUSTO JOSÉ CARRERAS CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE:

O vereador busca comprovar que as empresas “Praça da Picanha” (Silvestre e Alves Ltda.) e “Oitão Bar – José Dias Barbosa Júnior – ME efetivamente prestaram os serviços e que ele “adotou todas as providências dentro do critério da razoabilidade, que era esperado de um consumidor normal”, conforme segue:

b.1) “Praça da Picanha” (Silvestre e Alves Ltda.):

“(...) o quadro do relatório não especifica ou destaca nada em relação às mesmas.

O restaurante existe e o fornecimento das refeições foi devidamente atestado, não havendo qualquer outro questionamento.

A defesa fica prejudicada em relação a esse item. (...) não pode a decisão do TCE versar, sob pena de ela também implicar em nulidade, o que aqui é argüido como matéria de ordem preliminar a ser objeto de exame obrigatório por essa Colenda Corte de Contas.

Nada obstante, em demonstração da lisura e regularidade do comportamento do Defendente, faz juntar ao presente, como anexo, documentação que comprova e atesta a existência regular do estabelecimento, seu ato constitutivo, extrato de situação fiscal regular perante a Fazenda Federal, informativo oficial da SEFAZ sobre o enquadramento do mesmo e sua inscrição e ainda documento que confirma a autorização para impressão do talonário fiscal. Culminando a documentação com a exibição de declaração do responsável, atestando a regularidade da emissão dos documentos fiscais relacionados pela auditoria, comprovando que os itens ali discriminados foram servidos, pelo preços de tabele vigente na época e que a via fixa do talonário está conferindo com a examinada pelos auditores.”

b.2) “Oitão Bar – José Dias Barbosa Júnior – ME:

“(...) o estabelecimento ainda na atualidade encontra-se em funcionamento, e no endereço indicado.

Da mesma forma, o Defendente, diligenciando obteve documentação completa sobre a empresa e o fornecimento questionado, consistente de ato de registro na JUCEPE; extrato da situação fiscal na Receita Federal; situação cadastral fiscal na SEFAZ; detalhamento sobre a aidf para impressão do talonário fiscal; por fim, declaração do responsável pelo estabelecimento, atestando o fornecimento das mercadorias, pelas notas fiscais ali indicadas, nos valores discriminados, que correspondem aos da tabela de preços do estabelecimento e sua final conferência com as mesmas notas destacadas pelo relatório de auditoria.”

c) vereador CARLOS FREDERICO GOMES FRED OLIVEIRA:

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O vereador assevera que “não procede a afirmação da auditoria de que a AIDF do Restaurante Ilha da Kosta era inexistente”, porquanto “analisando-se o Detalhamento da Autorização para Impressão de Documentos Fiscais expedido pela Secretaria da Fazenda (doc. 04), percebe-se que as notas emitidas pelo mencionado estabelecimento foram válidas.”

d) vereador DANIEL PIRES COELHO:

O vereador procura demonstrar que as empresas “Lavajato & lanchonete 48”, “José Cunha Dantas – Carne do Sol do Cunha”, “Savoury Restaurante (Maria Mackl Moraes Monteiro)” e “A. J. R. Informática Ltda. (Meta Informática)” efetivamente prestaram os serviços ou venderam os produtos e os entregaram, como também “adotou todas as providências dentro do critério da razoabilidade, que era esperado de um consumidor normal”, conforme segue:

d.1) “Lavajato & lanchonete 48”:

“(...) o estabelecimento efetivamente forneceu refeições ao pessoal de gabinete, no sistema ‘delivery’. As refeições eram encomendadas e entregues sem qualquer percalço ou problema, razão pela qual jamais se questionou sobre a regularidade do estabelecimento. (...) A auditoria não provou que, na época do fornecimento da refeição, o estabelecimento já não mais estava operando.

O Defendente apurou que, na atualidade, o estabelecimento de fato já não mais funciona, o que todavia, não autoriza nem confirma a informação de que na data da emissão das notas questionadas ele não mais estivesse funcionando: até porque o serviço ou as refeições foram fornecidas e com relação a esse aspecto não há contradição.

(...)Por fim, registre-se, a título de comprovação da regularidade

do que se atesta no documento utilizado para reembolso, que o próprio sistema de informações da SEFAZ (o Sintegra), ainda na atualidade, consigna que o citado estabelecimento, contradizendo a informação da auditoria, funcionou, ou pelo menos esteve com sua situação regular perante o fisco estadual até a data de 10.01.2007, consoante se pode comprovar com o documento anexo, extrato de consulta realizada na data de 19.08.2008 (doc. 04).”

d.2) “José Cunha Dantas – Carne do Sol do Cunha”:

“(...) o quadro do relatório não especifica ou destaca nada em relação às mesmas.

O restaurante existe e o fornecimento das refeições foi devidamente atestado, não havendo qualquer outro questionamento.

A defesa fica prejudicada em relação a esse item. (...) não pode a decisão do TCE versar, sob pena de ela também implicar em nulidade.”

d.3) “Savoury Restaurante (Maria Mackl Moraes Monteiro):

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“(...) o estabelecimento ainda na atualidade encontra-se em funcionamento, e no endereço indicado, embora somente funcione para almoço, conforme placa indicativa constante no local.

O fato da empresa estar inabilitada (se é que está mesmo nessa condição), só produz efeitos na órbita fiscal. (...) Os consumidores, no caso, são os lesados pelo comerciante e não aqueles que devem ser responsabilizados.”

d.4) “A. J. R. Informática Ltda. (Meta Informática)”:

“(...) A circunstância de haver uma indicação errada na AIDF não pode ser imputada à responsabilidade do Defendente, que é adquirente e consumidor do produto que lhe foi entregue. Sobre a entrega do produto não dissertou o relatório de auditoria, limitando-se a fazer uma presunção que não está amparada em situação concreta comprovada.

A alegação que consta do relatório – quando a aidf’s que seriam de outra empresa – era um dado que, consoante se comprovou pela declaração do serviço de controle interno da Câmara, não estava disponível nos serviços da Câmara naquele exercício. Portanto esse vício não poderia ser detectado na ocasião.”

e) vereador JOSÉ ERIBERTO MEDEIROS DE OLIVEIRA:

O vereador afirma que “a empresa questionada (a DECISÃO COMÉRCIO E SERVIÇOS LTDA.) reputada como inidônea pela auditoria e que (...) não estaria habilitada, não só existe e está regular, como confirmou toda sua situação através de declaração escrita”, nos seguintes termos:

“O Defendente logrou reunir documentação, fornecida pela própria empresa, por onde se comprova que o documento foi emitido pela empresa e a venda realizada, com o preço recebido. Com efeito, consta do anexo extrato de cadastro da empresa, extraído na época da operação (20.07.2006) – quando a mesma encontrava-se ativa e regular; na verdade a inabilitação somente ocorreu após essa data (em 07.11.2006) conforme outro extrato aqui anexado. No âmbito estadual a irregularidade somente passou a ocorrer a partir de 05.10.2007, pois em 20.03.2007 a empresa ainda era reputada pelo cadastro estadual como regular e apta. A declaração do titular, aqui também anexada esclarece todo o assunto e comprova que a operação de compra realizada pelo Defendente foi normal e regular.”

f) vereador MARCOS ANTÔNIO DE SOUZA MENEZES:

O vereador tenta confirmar que “as empresas fornecedoras de produtos ou serviços – reputadas como inidôneas ou até inexistentes pela auditoria – não só estão regulares perante o fisco, como existem e estão em atividade, inclusive contratando com o Poder Público”, especificamente sobre:

f.1) “Papel Mais”:

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“(...) a empresa não só existe fisicamente, ao contrário que consignou o relatório de auditoria, como está regular e em atividade, inclusive vendendo (e evidentemente entregando mercadoria) para a Prefeitura da Cidade do Recife, para a ONG ‘Tortura Nunca Mais’.

Além disso, o Defendente logrou reunir documentação, fornecida pela própria empresa por onde se comprova que ela existe e está com cadastro ativo perante a Receita Federal; perante a JUCEPE; a Prefeitura do Recife; e a Fazenda Nacional, que emitiu, com data de 25.03.2008, certidão conjunta negativa de tributos federais e da dívida ativa da União, inclusive do INSS.”

f.2) “Papelaria Contato”:

“O Defendente pode obter, em pesquisa por ele realizada, que a empresa existe e é igualmente regular, como demonstram as notas fiscais de venda para a Prefeitura do Recife e para a Escola Técnica SENAI.

Além disso, obteve documentação comprobatória de empresa, extratos de situação fiscal, extratos bancários, certidões negativas (de 07.08.2008) de contribuições previdenciárias; a documentação da empresa gráfica que imprimiu os talonários de notas fiscais da empresa; certidões de situação cadastral perante a Receita Federal; e até mesmo a documentação relativa à constituição da empresa.”

g) vereador MOZART JÚLIO TABOSA SALES:

O vereador procurou justificar os documentos fiscais glosados como inidôneos, como segue:

“Pela documentação aqui anexada como elemento de prova, se pode confirmar, por exemplo, que um documento de uma das empresas questionadas (a CHURRASCARIA E PIZZARIA FAMA DO BODE – O. A. M. PEREIRA DA SILVA – ME) reputada como emitente de documento fiscal inidôneo pela auditoria, além de existir e funcionar regularmente, confirmou o fornecimento de refeições descritas na nota fiscal, a regularidade de sua emissão e o valor recebido, o que foi documentado através de declaração escrita aqui anexada.

(...) o Defendente, no pequeno tempo que dispôs para rebater o relatório de auditoria, logrou reunir documentação, fornecida pela própria empresa, por onde se comprova que as notas, embora de numeração seqüenciada se explicam pelo fato de não serem de emissão freqüente (pelo menos não naquele tipo de nota, a completa). Um fato, todavia, é certo, o documento foi emitido pela empresa e a venda realizada, com o preço recebido.”

h) vereador SEVERINO GABRIEL BELTRÃO:

O vereador, através da juntada de documentos fiscais/declarações, tratou de confirmar as operações questionadas pela auditoria:

h.1) “Papelaria Unimax Ltda. – ME”:

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“(...) a empresa não só existe fisicamente, como está regular e em atividade.

(...) o Defendente logrou reunir documentação, fornecida pela própria empresa por onde se comprova através de declaração anexa, que reconhece a operação, a nota fiscal e o valor nela estampado, confirmando que o documento foi emitido pela empresa e a venda realizada, com o preço recebido.”

h.2) “Tipografia Oseias Lima Ltda. – ME”:

“(...) o Defendente pode obter, em pesquisas por ele realizada, que a empresa existe e está igualmente regular, como demonstra o extrato de cadastro em anexo. Além disso, consta o recibo de pagamento em poder do Defendente a caracterizar a efetividade da operação.”

i) vereador VICENTE MANOEL LEITE ANDRÉ GOMES:

O vereador afirma ter chegado a resultados diversos do constante no Relatório:

“(...) os documentos em anexo demonstram que as empresas ALEXGRAF GRÁFICA EDITORA LTDA., PITTY COMERCIAL LTDA. e AVANÇO COMERCIAL LTDA. encontram-se habilitadas perante a Secretaria da Fazenda do Estado. Já a empresa DECISÃO COMÉRCIO E SERVIÇOS LTDA. encontrava-se habilitada na data em que as compras foram realizadas, vez que as notas datam do ano de 2006 e de janeiro de 2007, ao passo que a empresa foi inabilitada em outubro de 2007.”

o Devolução dos valores considerados pagos indevidamente:

Os vereadores que estiveram envolvidos com notas fiscais consideradas inidôneas e/ou falsificadas pelo Relatório – com exceção de VICENTE MANOEL LEITE ANDRÉ GOMES e HENRIQUE JOSÉ LEITE DE MELO (que comprovou a restituição de apenas R$ 27.000,00 de um total devido de R$ 102.682,49) –, inobstante todas as considerações relatadas acima, recolheram integralmente os valores impugnados pela auditoria à conta única do Poder Executivo Municipal (Banco do Brasil, Agência nº 3234-4, Conta nº 84.011-4), conforme guias de recolhimento e comprovantes de depósito bancário anexados às fls. 2829, 2863, 2946, 3009, 3058, 3118, 3173, 3267, 3231, 3324, 3356, 3414, 3472, 3580, 3641, 3686, 3718, 3756, 3794, 3847, 3951, 4030/4031, 4087, 4154 e 4194. Em preliminar, alegam a perda do objeto deste ponto da auditoria, porquanto a jurisprudência deste Tribunal “tem considerado que, sendo o débito parcelado ou recolhido antes do trânsito em julgado, a irregularidade deve ser desconsiderada e as contas aprovadas.” (com as transcrições das Decisões TC nº 1334/07, 0228/07, 4239/04, 1958/03, 0614/00, 0107/04, 1140/97 e 0256/03).

Gastos com combustíveis (ITEM 3.2 DO RELATÓRIO):

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a) vereador CARLOS ALBERTO GUEIROS:

O vereador Carlos Alberto Gueiros, neste ponto, confessa que os comentários do relatório acerca de seu gabinete [“Há gabinete com até 11 veículos cadastrados”] “atingiram o íntimo do parlamentar”, revelando toda a sua indignação, pois “as despesas realizadas atenderam ao fim institucional a que se destinaram, legitimadas pelo interesse público”:

“Onde está a irregularidade para merecer citação em destaque?

O vereador Carlos Gueiros, como os demais vereadores, tem 23 (vinte e três) servidores vinculados ao seu Gabinete, somando-se a esses os que se encontram legalmente colocados à disposição desse mesmo gabinete por cessão temporária de vários órgãos públicos já que desenvolve, além das atribuições inerentes à vereança, as de Presidente da Comissão de Finanças e Orçamento e Vice-Presidente da Comissão de Meio Ambiente, Transporte e Trânsito.

Destaque caberia se o número de veículos cadastrados superasse o número de servidores vinculados ao seu Gabinete.

Destaque caberia se os auditores houvessem constatado não serem os veículos cadastrados de propriedade e/ou posse e uso dos servidores vinculados ao seu Gabinete.

(...)Embora com conceitos difusos, é unânime o entendimento de

que a moralidade a que se referem os auditores não é a moralidade comum, não é a moralidade deles, emitentes do Relatório, não é a moralidade do vereador auditado, mas deve ser moralidade institucional, da Administração Pública.”

b) vereadores ANTÔNIO SOUZA DE OLIVEIRA, ANDRÉ FERREIRA RODRIGUES, AUGUSTO JOSÉ CARRERAS CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, CARLOS FREDERICO GOMES FRED OLIVEIRA, DANIEL PIRES COELHO, DILSON DE MOURA PEIXOTO FILHO, EDUARDO AMORIM MARQUES DA CUNHA, ELEDIAK FRANCISCO CORDEIRO, FERNANDO ANTÔNIO DO NASCIMENTO, GUSTAVO VASCONCELOS NEGROMONTE, FRANCISMAR MENDES PONTES, GILBERTO ALVES DE LUNA, GILVAN CAVALCANTI DA SILVA, JOÃO DE ANDRADE ARRAES, JOÃO ALBERTO DE FREITAS MARINS, JOSÉ ALVES DEOLIVEIRA, JOSÉ ERIBERTO MEDEIROS DE OLIVEIRA, JOSENILDO SINÉSIO DA SILVA, JURANDIR PEREIRA LIBERAL, LIBERATO PEREIRA DA COSTA JÚNIOR, LUCIANA VIEIRA DE AZEVEDO, LUIZ CARLOS CAVALCANTI PIRES, LUIZ VIDAL SILVA, MOZART JÚLIO TABOSA SALES, MARCOS ANTÔNIO DE SOUZA MENEZES, NILDO ALBUQUERQUE RESENDE, OSMAR RICARDO CABRAL BARRETO, ROBERTO SÉRGIO RIBEIRO COUTINHO TEIXEIRA, ROMILDO JOSÉ FERREIRA GOMES FILHO, SEVERINO GABRIEL BELTRÃO, SEVERINO RAMOS DE SANTANA, VALDIR FACIONE e SÍLVIO SERAFIM COSTA FILHO:

Os vereadores em epígrafe, pelos seus advogados – Márcio José Alves de Souza (OAB-PE nº 5.786), Leucio Lemos Filho (OAB-PE nº 5.807) e Liliane Cavalcanti Barreto Campello (OAB-PE nº 20.773) – refutam os

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questionamentos da auditoria (exorbitância dos gastos com combustível, elevado número de veículos cadastrados, inidoneidade das notas fiscais e ilegitimidade das despesas fora dos limites territoriais do município), com base em deliberações anteriores desta Casa, como segue:

“(...) a legislação que disciplina a matéria não exige, para o ressarcimento das despesas com combustíveis, que os deslocamentos sejam realizados para fora dos limites municipais (...)

Sendo assim, se os valores gastos estiverem dentro do limite estabelecido no art. 9º, III da Resolução nº 678/05, não cabe à auditoria desta Corte alegar que os montantes foram excessivos ou que só poderiam ter sido custeadas despesas com deslocamento para além dos limites do Município.

(...) o exercício da atividade parlamentar demanda constantes deslocamentos do Vereador e dos seus assessores, principalmente dentro dos limites territoriais do Município.

(...) determinar que só são passíveis de ressarcimento despesas com deslocamentos para fora dos limites municipais é tolher a atividade parlamentar na sua essência, que é a proximidade do parlamentar e dos seus assessores com as comunidades e com os cidadãos dos Município que representam.

(...) esta Corte [Decisões TC º 0448/08 e 0608/08] vem admitindo a utilização de verba de gabinete para fazer face a despesas com combustíveis, sem a exigência de que os deslocamentos tenham sido feitos para além dos limites municipais, e sem questionar os valores gastos.

(...) Tal norma [Resolução nº 2.326/00] não prevê um número mínimo ou máximo de veículos que podem ser cadastrados (...). Cabe ao Parlamentar, verificando suas necessidades, disponibilizar tantos automóveis quantos entenda necessários ao desempenho de suas atividades.

(...) este Tribunal [Decisão TC nº 1.779/01] entendeu que a verba de gabinete pode ser utilizada para suprir gastos com combustíveis de veículos não pertencentes à Câmara, mas a seu serviço, sem estabelecer nenhuma limitação quanto ao número de automóveis.

Por fim, convém esclarecer que as notas fiscais de combustível, mesmo que não atendam à legislação estadual, servem para comprovação da despesa, sem qualquer dano ao erário estadual, porque o ICMS incidente na circulação de combustível é pago antecipadamente.”

Gastos indevidos com alimentação (ITEM 3.3 DO RELATÓRIO):

a) vereador DANILO JORGE DE BARROS CABRAL:

O vereador Danilo Jorge de Barros Cabral destaca que “o relatório técnico emitido pela equipe de auditoria omitiu, por completo, a previsão contida no Art. 3º da Lei Municipal da Lei Municipal nº 17.159/2005. (...) esquiva-se de interpretar a norma de forma sistêmica, limitando-se a literalidade de um dos dispositivos – artigo 4º - da mesma Lei. Tal interpretação

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de forma isolada, induz a equivocada análise da impossibilidade legal dos referidos gastos”. E segue com seguinte linha de raciocínio, pontuando:

“1. A vedação que trata o artigo 4º refere-se exclusivamente à aquisição de gêneros alimentícios. Há uma nítida distinção entre despesas com alimentação, que consiste na aquisição de gêneros alimentícios já manipulados e processados para o consumo imediato, são refeições disponibilizadas, em sua maioria, por restaurantes; e, gêneros alimentícios, que são alimentos em seu estado natural, ainda sem a manipulação para consumo imediato, muito destes, de longa conservação, encontrados principalmente em supermercados (...).

2. Ainda, o Art. 3º, inciso VII da Lei municipal nº 17.159, prevê, taxativamente, a autorização de ressarcimento de despesas com alimentação, desde que cumpra os seguintes requisitos: a – tal despesa seja efetivamente paga pelo parlamentar, e b – que a despesa haja sido relacionada ao exercício do mandato parlamentar. Havendo, ainda, a necessidade de se observar o limite mensal de gastos (...).

3. (...) os gastos com alimentação apontados pelos técnicos no valor de R$ 2.842,95 foram realizados entre 29.06.06 a 25/07/2006, a qual justifica-se em virtude da realização de avaliações de planejamento estratégico do exercício de 2006 e prestação de contas das ações desenvolvidas no exercício do mandato parlamentar durante o primeiro semestre daquele ano (Doc. 01). Ao longo do período supramencionado foi organizado amplo processo de debate e discussão com a equipe que compõem o gabinete e os diversos colaboradores que atuam juntos aos vários seguimentos da população recifense.”

A defesa do Sr. Danilo Jorge de Barros Cabral cita ainda a Decisão TC nº 0777/08, que, segundo o defendente, “assevera a regularidade das despesas com refeição desde que haja a devida comprovação e detalhamento necessário à sua identificação, fato este que foi reiteradamente observado em nossas prestações de contas”, e transcreve trechos das notas taquigráficas do voto da Conselheira Relatora do Processo TC nº 0703302-3 (auditoria especial na Câmara de Jaboatão dos Guararapes), que, por sua vez, remete ao Relatório Prévio ao Processo TC nº 9901564-0 (prestação de contas da Câmara do Recife, 1998).

b) vereador JOSÉ ANTONIO DA SILVA:

O vereador José Antonio da Silva, por meio de seu advogado, Dr. Fernando R. Beltrão (OAB-PE nº 7.077), apresentou – a par de estranhas considerações [“a prática imputada ao requerente, se verdadeira, (...) poderia ser denominada crime funcional (...) carece de dolo de seu agente” e “em questões que envolvem orçamento e contabilidade pública (...) as distinções são muito sutis e complexas. Não é empresa simples a se precisar se esta ou aquela despesa, em meio a tantas, está conforme as normas financeiras, que são muitas”] – defesa com o seguinte questionamento:

“Não obstante, compulsando os autos, desde fl. 03 do Relatório de Auditoria, (fls. 2.477 do processo), até a fls. 45 (fls. 2.519 do

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processo), não se vê descrito em que se constituiu a irregularidade supostamente cometida pelo requerente; nem se encontra, igualmente, qualquer prova material do alegado, aos moldes em que se detectou irregularidades cometidas por outros parlamentares, inclusive com a identificação do ‘modus operandi‘ de cada qual deles (...).

(...) o requerente não cometeu nenhum ato atentatório à dignidade de seu cargo. As despesas que realizou estavam previamente autorizadas e, por conseguinte, protegidas pelo manto da legalidade. Não custa lembrar que despesa não é pura e simplesmente gasto; é gasto previsto no orçamento, onde se encontram os programas ou projetos em que serão despendidos os recursos públicos municipais. As despesas realizadas estavam previamente autorizadas.”

c) vereador CARLOS ALBERTO GUEIROS:

O vereador Carlos Alberto Gueiros busca, de logo, em sua defesa, desqualificar o trabalho de auditoria, por considerar o relatório “superficial e desprovido de juridicidade”. Não obstante a “retórica de suposições” acusada aos auditores, que “em momento algum demonstra qual dispositivo foi infringido”, o defendente apresenta a sua interpretação da legislação aplicável:

“É imprescindível analisar em conjunto e não separadamente, o que dispõem os diplomas legais que norteiam a questão em conformidade com a cronologia das Leis de regência da matéria, quais sejam as Municipais de nº 17.092/2005 (publicada em 21.05.2005) e 17.159/2005 (publicada em 01.01.2006).

(...)(...) a expressão ‘exceto alimentação não preparada para uso

exclusivo do gabinete’ como consta na redação do Art. 4º da Lei nº 17.159/2005 não se coaduna com o espírito daquela e da anterior Lei, pois a ‘exceção’ pretendida pelo legislador é na realidade o ressarcimento das despesas realizadas ‘com alimentação preparada’, concluindo-se, portanto que erroneamente foi incluído o ‘não’ na expressão que define a exceção pretendida, porquanto a modificação da Lei nº 17.092/2005 feita pela Lei nº 17.159/2005, restringe-se apenas (...) a modificar a forma de pagamento dos gastos.”

d) vereadores ANTÔNIO SOUZA DE OLIVEIRA, ANDRÉ FERREIRA RODRIGUES, AUGUSTO JOSÉ CARRERAS CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, CARLOS FREDERICO GOMES FRED OLIVEIRA, DANIEL PIRES COELHO, DILSON DE MOURA PEIXOTO FILHO, EDUARDO AMORIM MARQUES DA CUNHA, ELEDIAK FRANCISCO CORDEIRO, FERNANDO ANTÔNIO DO NASCIMENTO, GUSTAVO VASCONCELOS NEGROMONTE, FRANCISMAR MENDES PONTES, GILBERTO ALVES DE LUNA, GILVAN CAVALCANTI DA SILVA, JOÃO DE ANDRADE ARRAES, JOÃO ALBERTO DE FREITAS MARINS, JOSÉ ALVES DEOLIVEIRA, JOSÉ ERIBERTO MEDEIROS DE OLIVEIRA, JOSENILDO SINÉSIO DA SILVA, JURANDIR PEREIRA LIBERAL, LIBERATO PEREIRA DA COSTA JÚNIOR, LUCIANA VIEIRA DE AZEVEDO, LUIZ CARLOS CAVALCANTI PIRES, LUIZ VIDAL SILVA, MOZART JÚLIO TABOSA SALES, MARCOS ANTÔNIO DE SOUZA MENEZES, NILDO ALBUQUERQUE RESENDE, OSMAR RICARDO CABRAL BARRETO, ROBERTO SÉRGIO RIBEIRO COUTINHO TEIXEIRA,

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ROMILDO JOSÉ FERREIRA GOMES FILHO, SEVERINO GABRIEL BELTRÃO, SEVERINO RAMOS DE SANTANA, VALDIR FACIONE e SÍLVIO SERAFIM COSTA FILHO:

Os vereadores referidos, através dos advogados Márcio José Alves de Souza (OAB-PE nº 5.786), Leucio Lemos Filho (OAB-PE nº 5.807) e Liliane Cavalcanti Barreto Campello (OAB-PE nº 20.773), trazem em sua guarida a mesma intelecção normativa já exposta na defesa do vereador Danilo Jorge de Barros Cabral. Vejamos:

“(...) a glosa do reembolso de despesas com refeições foi feita pela auditoria com base na interpretação isolada e equivocada do art. 4º, que menciona, como exceção, a impossibilidade de ressarcimento de despesas com gêneros alimentícios, no sentido de ‘alimentação não preparada’. O auditor entendeu, a partir daí, que as despesas com alimentação (refeição) não poderiam ser objeto de ressarcimento, o que é falso, pois expressamente admitido pela lei (...).

Com efeito, a norma tem que ser interpretada como um todo harmônico, não artigo por artigo, isoladamente.

Está claro, portanto, que a mens legis é a seguinte: admite-se o reembolso de despesas com alimentação (entendendo-se ‘alimentação’ no sentido de ‘refeições prontas’) e não se admite o ressarcimento de despesas com gêneros alimentícios isolados (entendendo-se por ‘gêneros alimentícios’, ‘alimentação não preparada’), exceto aqueles de uso exclusivo do gabinete (açúcar, café, chá, etc.).”

Ademais, afirmam que tais “despesas com refeição ou alimentação atenderam rigorosamente aos ditames da regulamentação”, pelo que segue:

“(...) Não são ‘desarrazoadas’ nem deixaram de atender o interesse público. Não serviram para ‘financiar gastos com restaurantes’ como pretendeu o Relatório. Ela, em primeiro lugar, é legal, porque prevista e autorizada por lei, conforme demonstrado acima. Em segundo lugar, custeou o fornecimento de refeições quando da execução de tarefas ou serviços inerentes à atividade parlamentar e apenas quando demandavam jornada de trabalho estendida pela noite (em reuniões nos centros e comunidades atendidos), seja nos finais de semana.

Repita-se: o desempenho da atividade parlamentar não se limita ao gabinete e ao horário comercial. O Vereador precisa estar perto das comunidades em que atua, participando de reuniões, ouvindo as reivindicações dos cidadãos, participando de eventos. Muitas vezes esses eventos e essas reuniões acontecem nos finais de semana ou em datas comemorativas, não podendo do parlamentar se furtar a comparecer e a exercer suas atribuições institucionais.”

Em seu auxílio, transcrevem as Decisões TC nº 0832/01, 1246/02, 0346/07 e 0609/08, as quais julgaram regulares com ressalvas as contas do Gabinete do Governador (prestação de contas, 1998), da Câmara de Surubim (prestação de contas, 2001), da Assembléia Legislativa do Estado (auditoria especial) e da Câmara de Jaboatão dos Guararapes (auditoria especial), respectivamente.

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Os vereadores Luciana Vieira de Azevedo e Luiz Vidal Silva, apesar das considerações acima, devolveram os valores impugnados pela auditoria, conforme comprovantes anexados às fls. 3610 e 3756, razão pela qual requerem que a irregularidade seja desconsiderada e as contas aprovadas, pois a jurisprudência deste Tribunal (transcrevem as Decisões TC nº 1334/07, 0228/07, 4239/04, 1958/03, 0614/00, 0107/04, 1140/97 e 0256/03) assim tem procedido quando o “débito é parcelado ou recolhido antes do trânsito em julgado”.

Despesas irregulares com promoção pessoal (ITEM 3.4 DO RELATÓRIO):

a) vereadores ANDRÉ FERREIRA RODRIGUES, AUGUSTO JOSÉ CARRERAS CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, DANIEL PIRES COELHO, JOSENILDO SINÉSIO DA SILVA, LUIZ CARLOS CAVALCANTI PIRES e PRISCILA BORGES KRAUSE VASCONCELOS:

Os vereadores supracitados, por meio de seus advogados Márcio José Alves de Souza (OAB-PE nº 5.786), Leucio Lemos Filho (OAB-PE nº 5.807) e Liliane Cavalcanti Barreto Campello (OAB-PE nº 20.773), neste item, assim como fizeram os auditores alhures, se socorrem de manifestações do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul (Recurso de Reconsideração 006744-02.00/98-0, Prestação de Contas 003622-02.00/98-0, Prestação de Contas 007872-02.00/97-7, Prestação de Contas 005595-02.00/99-6, Recurso de Reconsideração 005137-02.00/99-8, Recurso de Embargos 005189-02.00/00-3, Prestação de Contas 004034-02.00/99-4 e Prestação de Contas 004446-02.00/00-5) para contestar o entendimento exposto no Relatório de Auditoria. Segue a leitura feita pelos defendentes das deliberações daquela egrégia Corte de Contas:

“Inicialmente, convém observar que a Lei nº 17.159/2005 prevê a utilização da verba de gabinete para o custeio de serviços de publicidade, nos termos do seu art. 3º, V.

(...) O fato de nas divulgações se fazer referência ao nome do

Defendente não viola o princípio da impessoalidade. Os homens são investidos no Poder de vários modos. E imprimem no governo, marcas, características e rumos, fazendo história. Ainda não são robôs ou computadores que governam.

Nenhuma ilegalidade há na menção aos nomes dos titulares dos cargos em matérias. Aliás, o Diário Oficial do Estado traz fotografias de Desembargadores, Juízes, do Governador, de Secretários de Estado. O próprio Jornal do Tribunal de Contas também não é diferente: traz retratos de auditores e Conselheiros. O do Tribunal de Justiça da mesma forma. O do Ministério Público também traz fotografias e nomes de promotores, exaltando suas realizações. A simples referência aos nomes, ou a fotografia, não quer dizer promoção pessoal (...).

Caso prevaleça esse entendimento, o Diário Oficial do Estado será o primeiro a ter sua edição suspensa e a CEPE, Governo do Estado,

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Presidente do Tribunal de Justiça, do TCE e o Procurador Geral de Justiça, Deputados e Senadores, todos serão processados por improbidade administrativa.”

Atuação ineficiente do Controle Interno (ITEM 3.5 DO RELATÓRIO):

Os membros da Comissão de Controle Interno da Câmara Municipal do Recife, por meio dos advogados Márcio José Alves de Souza (OAB-PE nº 5.786), Leucio Lemos Filho (OAB-PE nº 5.807) e Liliane Cavalcanti Barreto Campello (OAB-PE nº 20.773), procuraram, em sua defesa, justificar a sua atuação, caracterizando-a como “boa e regular”, nos termos da Lei nº 17.092/05 e da Resolução nº 678/05, pois “apesar das diversas despesas impugnadas pelo relatório, quando aos aspectos materiais – defeito da documentação trazida – quando ao trabalho desenvolvido pela Comissão não se verifica nenhuma despesa que tenha sido acolhida que não estivesse prevista em lei, pelo seu tipo, elemento ou finalidade”. Observemos:

“Ora, se a lei específica, ao tratar da atribuição da Comissão de Controle Interno, estabelece quais os seus limites, como justificar sejam eles ultrapassados?

(...)Se há um descompasso entre a lei que define as atribuições

do Controle Interno e normas de hierarquia superior, tais questões, evidentemente, são superiores à Comissão, que deve se pautar pela norma existente.

Há uma evidente confusão conceitual (...) o controle é dogma constitucional; a comissão é órgão operacional. Se o controle não está sendo exercido de forma eficaz ou eficiente, isso não decorre de uma comissão e sim da ineficiência institucional, ao não criar um sistema adequado.

(...) A responsabilidade pode até ser da Câmara – ao não instituir

um sistema de controle adequado – mas não da Comissão, que executa sua tarefa dento do espectro de atribuições que lhes foram outorgadas pelas normas existentes.

(...) Ao longo desse tempo diversas foram as despesas glosadas

pela Comissão de Controle Interno; muitos foram os documentos por ela rejeitados por irregularidades ou inidôneos (alguns até mesmo pelas mesmas falhas apontadas no relatório de auditoria).

(...) a Comissão executava seu trabalho na forma prevista em lei e devolvia ao parlamentar para correção ou substituição.

(...) De outra parte, sempre que instruída pelo TCE, a Comissão

tem adotado providências para aperfeiçoar sua atuação (...). A partir de então [Ofício TCE/DP 481/2007], acolhendo as observações do TCE, fez gestões junto à Secretaria da Fazenda do Estado e à Prefeitura da Cidade do Recife, para implantar programa que permitisse proceder a verificações quanto a validade de notas e outros documentos fiscais com maior eficiência.

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Cumpre lembrar que a tarefa de verificação da idoneidade e regularidade de documentos fiscais é dos órgãos de Fazenda (estadual ou municipal), e somente de modo supletivo ou complementar deve ser verificado pela Comissão de Controle Interno.”

Descentralização orçamentária e financeira indevida dos recursos para manutenção dos gabinetes (ITEM 3.6 DO RELATÓRIO):

a) vereadores ANDRÉ FERREIRA RODRIGUES, ANTÔNIO LUIZ DA SILVA NETO, ANTÔNIO SOUZA DE OLIVEIRA, AUGUSTO JOSÉ CARRERAS CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, CARLOS FREDERICO GOMES FRED OLIVEIRA, DANIEL PIRES COELHO, DILSON DE MOURA PEIXOTO FILHO, EDUARDO AMORIM MARQUES DA CUNHA, ELEDIAK FRANCISCO CORDEIRO, FERNANDO ANTÔNIO DO NASCIMENTO, FRANCISMAR MENDES PONTES, GILBERTO ALVES DE LUNA, GILVAN CAVALCANTI DA SILVA, GUSTAVO VASCONCELOS NEGROMONTE, HENRIQUE JOSÉ LEITE DE MELO, JOÃO ALBERTO DE FREITAS MARINS, JOÃO DE ANDRADE ARRAES, JOSÉ ALVES DEOLIVEIRA, JOSÉ ERIBERTO MEDEIROS DE OLIVEIRA, JOSENILDO SINÉSIO DA SILVA, JURANDIR PEREIRA LIBERAL, LIBERATO PEREIRA DA COSTA JÚNIOR, LUCIANA VIEIRA DE AZEVEDO, LUIZ CARLOS CAVALCANTI PIRES, LUIZ EUSTÁQUIO RAMOS NETO, LUIZ HELVÉCIO DE SANTIAGO ARAÚJO, LUIZ VIDAL SILVA, MARCOS ANTÔNIO DE SOUZA MENEZES, MOZART JÚLIO TABOSA SALES, NILDO ALBUQUERQUE RESENDE, OSMAR RICARDO CABRAL BARRETO, PRISCILA BORGES KRAUSE GONÇALVES, ROBERTO SÉRGIO RIBEIRO COUTINHO TEIXEIRA, ROMILDO JOSÉ FERREIRA GOMES FILHO, SEVERINO GABRIEL BELTRÃO, SEVERINO RAMOS DE SANTANA, SÍLVIO SERAFIM COSTA FILHO, VALDIR FACIONE e VICENTE MANOEL LEITE ANDRÉ GOMES:

Os vereadores que se fizeram representar pelos advogados Márcio José Alves de Souza (OAB-PE nº 5.786), Leucio Lemos Filho (OAB-PE nº 5.807) e Liliane Cavalcanti Barreto Campello (OAB-PE nº 20.773) cuidaram de defender a descentralização de recursos para a manutenção dos gabinetes e/ou as atividades parlamentares, lembrando a natureza e a finalidade de tais verbas, bem como a inviabilidade de realização de licitação, como se vê:

“De acordo com os auditores, as despesas de custeio do Poder Legislativo deveriam ser centralizadas pelo Presidente da Câmara, obedecendo-se as regras de licitação e de ordenação das despesas.

(...) esta Corte de Contas estabeleceu, através de várias decisões (mencionadas no item 1.1), que a adoção da verba de gabinete é uma decisão política da Câmara, desde que obedecidos os requisitos formais.

Posto isto, cumpre-se esclarecer que a realização de licitação é inviável por duas razões:

(a) porque as verbas de gabinete não são pagas sob a forma de suprimentos individuais, mas como ressarcimento por despesas feitas com dinheiro particular;

(b) porque não há como realizar licitação para um gasto particular.

Ademais, esta Corte de Contas já firmou jurisprudência [Decisões TC nº 1617/07, 0481/07, 1666/07, 1692/07, 1695/07, 0007/08 e

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1639/07] no sentido de que a ausência de licitação na aplicação dos recursos da verba de gabinete, inclusive para aquisição de combustíveis, é causa de recomendação, não de rejeição de contas.”

Eis, detalhadamente, o relatório.

 VOTO

De logo, após a suspensão da sessão realizada em 16 de dezembro último para notificação aos interessados do teor do Laudo de Exame Documentoscópico (Grafoscópico), emitido pelo Setor Técnico Científico da Superitendência Regional do Departamento de Polícia Federal no Estado de Pernambuco (Laudo Pericial nº 380/2008 – SETEC/SR/DPF/P, retomo o voto, apreciando os argumentos apresentados pela defesa dos vereadores representados pelos seus advogados, conforme segue:

a) Preliminar de nulidade do laudo pericial

A defesa alega que o laudo foi “elaborado unilateralmente, sem qualquer conhecimento e participação dos interessados para, querendo, indicarem assistente técnico, a fim de acompanharem os trabalhos periciais e, inclusive, formularem quesitos”, o que “fere o devido processo legal e o princípio do contraditório, pelos quais nenhum ato processual, ou diligência, pode ser realizada sem o conhecimento prévio dos interessados”, razão pela qual requer que “seja o laudo desconsiderado e desentranhado dos autos”.

Não procede! Já no Relatório de Auditoria, datado em 02 de abril de 2008, todos os notificados foram informados da solicitação de laudo pericial por esta relatoria – o qual na oportunidade encontrava-se em elaboração pela Polícia Federal –, porquanto este corpo julgador, dada a ausência de conhecimento técnico especializado, induvidosamente, não se mostrava suficientemente apto para realizar a verificação do fato suscitado pela equipe de auditoria, como se vê:

“Esta auditoria, na amostra de 2006 e 2007, pode agrupar 498 notas fiscais em 23 grupos (fls. 63 a 580) cujo preenchimento foi feito pela mesma pessoa (vide tabela no subitem 3.1.4 deste relatório). Apesar de ainda encontrar-se pendente o laudo pericial grafotécnico – que, sob a perspectiva técnica, poderá confirmar a origem comum das grafias encontradas –, é notória a semelhança entre grafias de notas fiscais emitidas por estabelecimentos diferentes, em momentos distintos.” (grifei)

Os vereadores, portanto, poderiam ter apresentado, em sua defesa, laudo elaborado por perito de sua escolha ou poderiam ter solicitado prazo para juntá-lo aos autos, pois se garantiu, durante toda a tramitação processual,

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o direito de vista dos autos, inclusive após a produção da prova pericial. Nada disso, todavia, foi feito! Os defendentes – e, mesmo assim, apenas os vereadores ANTÔNIO LUIZ DA SILVA NETO, EDUARDO AMORIM MARQUES DA CUNHA, ROMILDO JOSÉ FERREIRA GOMES FILHO e SÍLVIO SERAFIM COSTA FILHO – limitaram-se a apresentar parecer de auditoria independente (Raul Pereira Neto – Auditor Independente, sob a inscrição CRC-PE nº 011.150/T-RN-S-PE e CNAI/CRC-CFC nº 519).

Ademais, este Tribunal já se manifestou, por mais de uma oportunidade, sobre a improcedência desta preliminar, porque a ausência de participação de representante dos interessados nas inspeções e/ou nas perícias realizadas nos procedimentos usuais de auditoria de contas públicas, durante a instrução processual, não induz à nulidade, haja vista a natureza inquisitória dos trabalhos de auditoria. Em outras palavras, as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa estão resguardadas com a notificação dos responsáveis pelas irregularidades levantadas, concedendo-lhes oportunidade de defesa ao relatório/laudo produzido pelo Tribunal de Contas (no presente processo, inclusive do laudo de natureza técnica lavrado por perito de órgão especializado, que encerra observações relativas a uma auditoria de controle externo de contas públicas). Vejamos:

“A empresa pede, além da nulidade da decisão, a nulidade da instrução processual, reabrindo-a para assegurar o direito de defesa, inclusive novas vistorias nas obras, com prévia intimação e direito de indicar assistente técnico e formular quesitos.  

Neste ponto, quanto à nulidade de toda a instrução processual a partir das vistorias, discordo das alegações da empresa.  

 Acredito que os princípios do contraditório e da ampla defesa estarão assegurados com a abertura de prazo para apresentação de defesa ao Laudo produzido. A ausência de participação de representante da empresa nas vistorias realizadas pela Equipe de Auditoria do Núcleo de Engenharia não induz à nulidade.    

A natureza do Laudo produzido pela equipe de engenheiros deste Tribunal é inquisitória. Pode-se perfeitamente traçar um paralelo com os trabalhos produzidos durante um inquérito policial. O Laudo de Engenharia, de natureza preparatória, investigatória, equivale ao inquérito policial na atividade judiciária. Da mesma forma, o Relatório de Auditoria, produzido pela Equipe de Auditores, após a análise de uma prestação de contas, também possui a mesma natureza. Até mesmo porque se pode chegar à conclusão de que não houve qualquer irregularidade. Entender que a presença de representante da empresa contratada nas vistorias das obras é obrigatória, sob pena de nulidade, equivale a dizer que haveria necessidade da indicação de um representante de cada um dos credores na fiscalização da Equipe de Auditoria contábil e financeira.” (Processo TC nº 0300525-2. Recurso interposto pelo Sr. Augusto César Elihimas de Carvalho, ex-Prefeito do Município de Serra Talhada, ao Acórdão TC nº 2047/02. Rel. Auditor Luiz Arcoverde Filho, Conselheiro em exercício) Grifei 

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“Preliminarmente, invoca o defendente a existência de falhas no procedimento adotado nos trabalhos de auditoria e elaboração do Relatório. Alega que este deveria ter sido precedido de uma perícia comprobatória contábil, notadamente em razão de que os fatos a ele imputados já haviam sido explicados quando da apresentação da prestação de contas.  

Alega, ainda, com base em procedimento previsto no CPC, que a ele deveria ter sido dada a oportunidade de indicar perito e, depois de elaborado o Relatório Preliminar de Auditoria, ter sido realizada uma audiência para apreciação do mesmo com apresentação de resposta aos quesitos, se fosse necessário.  

Por fim, conclui que, em assim não se procedendo, estar-se-á violando os Princípios Constitucionais do Contraditório e da Ampla Defesa.

Cumpre esclarecer que a peça produzida pelos Auditores das Contas Públicas, no exercício de suas funções, tem caráter informativo, não representando o juízo dos membros do Tribunal de Contas, o qual só pode ser emitido em sessão pública de suas Câmaras ou do Pleno, conforme dispõe o artigo 103, inciso IV, e 101, incisos II a V e XI a XVI, da Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado de PE (Lei Estadual nº 12.600/04).  

Por essas razões, não vislumbro erro de procedimento e nem atentado ao direito de contraditório e ampla defesa, uma vez que o interessado foi regularmente notificado do conteúdo do Relatório Preliminar, tanto que apresentou peça de defesa.” (Processo TC nº 0470039-9. Prestação de Contas da Mesa Diretora da Câmara Municipal de Tuparetama, relativa ao exercício financeiro de 2003. Rel. Auditor Marcos Flávio Tenório de Almeida, Conselheiro em exercício) Grifei

Encaminhado ao Ministério Público de Contas, o presente Recurso foi objeto do Parecer MPCO nº 666/07. (...) Esclarece o Parecer referenciado que a diligência foi realizada previamente ao relatório preliminar de auditoria, “ou seja, antes de estabelecido o contraditório” e que “o processo administrativo perante às Cortes de Contas não poderá se revelar mais rígido que o processo penal, onde o que está em questão é a própria liberdade da parte”; na seqüência, informa que “no processo penal, na fase inquisitorial, dispensável é a audiência da defesa para perícias, segundo abonançada jurisprudência do Judiciário” e que “o mesmo silogismo deve ser feito no processo perante a Corte de Contas”. Por fim, conclui que “antes de intimado o interessado do relatório preliminar não se formou o contraditório, sendo imprópria a exigência do direito de defesa. O mesmo poderia, estabelecido o contraditório, ter requerido nova perícia ou quaisquer outras diligências para contestar o laudo, a exemplo do que é feito no processo penal sobre provas em inquéritos policiais”. (Processo TC nº 0703662-0. Recurso Ordinário interposto pelo Sr. Joaquim Pinto Lapa Filho, ex-Prefeito do Município de Carpina, contra o parecer prévio emitido sobre as contas referentes ao exercício financeiro de 2002, e à Decisão TC nº 0426/07. Rel. Auditor Luiz Arcoverde Filho, Conselheiro em exercício) Grifei

Ante o exposto, VOTO pelo não conhecimento da preliminar.

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b) Preliminar de incompetência da Polícia Federal

A defesa, ainda, argúi a nulidade da diligência pericial, por “incompetência da Polícia Federal em razão da matéria, nos termos do art. 144, § 1º, da Constituição Federal”, indagando: “Ora, por que solicitar Laudo da Polícia Federal quando a matéria em exame não se enquadra em nenhuma daquelas previstas na CF/88?”

Eis, a resposta:

A uma, porque esta relatoria solicitou à Secretaria de Defesa Social do Estado de Pernambuco, através do Ofício TC/GC05 nº 0151/2007, de 06/12/2007, laudo pericial sobre documentos “separados em grupos que, supostamente, apresentavam a mesma grafia”, em face de “indícios de fraude quanto ao seu preenchimento”, tendo recebido em resposta o Ofício nº 2838/2008-GAB-EXC-SDS, de 15/10/2008, emitido pelo Secretário Executivo de Defesa Social, com o Laudo Pericial nº 380/2008-SETEC/SR/DPF/PE elaborado pelos peritos da Polícia Federal.

A duas, porque a Polícia Federal é instituição inserida na Carta de 1988 como um dos órgãos encarregados de exercer a segurança pública “para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio” (art. 144, caput, CF).

A três, porque as atribuições de polícia judiciária dos órgãos de segurança pública e as regras de competência jurisdicional – e analogamente dos Tribunais de Contas – são independentes, podendo a Polícia Federal atuar, em colaboração com a Secretaria de Defesa Social dos Estados, na feitura de laudos técnicos, que, em face do princípio de veracidade dos documentos expedidos pelas diversas esferas governamentais (art. 19, II, CF), gozam de fé pública (presunção relativa de legitimidade).

A quatro, porque a Polícia Federal é órgão permanente, organizado e mantido pela União (art. 144, § 1º, CF), para, entre outras atribuições, “apurar infrações penais contra a ordem política e social” (art. 144, § 1º, CF).

A cinco, porque a colheita de provas no processo administrativo de contas (inclusive, perícia realizada por órgão especializado, expert no assunto, que se pronuncia sobre questões submetidas à sua apreciação), com vistas a subsidiar o relatório de auditoria e a deliberação do órgão julgador, constitui apenas uma peça de informação ao Ministério Público para promoção de possível ação na esfera judicial.

Portanto, VOTO pelo não conhecimento de mais essa preliminar.

c) Outros aspectos e questões que tornam inservível o laudo

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A defesa, alfim, desqualifica o laudo pelas seguintes razões: 1) “A perícia (...) não aborda questão relevante que é a integral restituição ao erário municipal dos valores impugnados no relatório do TCE, fazendo desaparecer qualquer eventual prejuízo”; 2) “O laudo não examinou nenhum dos documentos acostados nas defesas apresentadas e que demonstram a regularidade de empresas impugnadas pela auditoria. E em alguns casos a confirmação da operação que foi questionada”

No caso em exame, nenhum reparo a fazer! O perito ateve-se à matéria prefixada, restringindo seu pronunciamento – de forma clara, objetiva e circunstanciada – às questões propostas pelo julgador e submetidas à sua apreciação imparcial, com vistas a esclarecer o que estava oculto: a identidade da grafia aposta em notas fiscais emitidas por empresas diversas, ora atestada tecnicamente, por quem de direito. Não caberia ao perito, por óbvio, num exame grafoscópico, abordar o efeito da restituição de valores glosados, da existência declarada da operação ou da regularidade fiscal da empresa contratada.

As conclusões de um laudo pericial, pois, no seu sentido próprio, deverão ser, oportunamente, cotejadas com as demais informações constantes do processo, com vistas a formar a convicção do julgador e, assim, firmar a denominada verdade formal – que há de ser a mais próxima possível da verdade real – sujeitando-se, a exemplo dos outros elementos probantes, à livre apreciação do julgador, que pode, sim, enfrentá-los e negar-lhes validade, mas – como nos ensina o jurista português Figueiredo Dias (in Direito Processual Penal, vol. I, p. 209) – “somente poderá contestar o juízo científico se puder proferir crítica igualmente material e científica”.

Neste ponto, uma questão nos parece relevante: os próprios defendentes não puderam contestar o juízo científico trazido pelos peritos!

Destarte, VOTO pelo não conhecimento da preliminar.

d) Cerceamento de defesa

Vencidas as questões relativas ao laudo pericial, cumpre-me agora afastar a preliminar suscitada por alguns vereadores de restrição ao contraditório e ao direito de ampla defesa, que teria ficado prejudicada “em relação a alguns itens ou empresas, porquanto não foram fornecidos elementos que possibilitassem exame pelo auditor independente” contratado por eles ou pelos próprios. Neste ínterim, deve-se esclarecer que: (a) todos os interessados foram regularmente notificados, por via postal ou pessoalmente; (b) os autos sempre estiveram à disposição deles e de seus advogados em meu gabinete; (c) os vereadores tiveram acesso ao processo, em sua inteireza, porquanto deferi a solicitação de cópias realizada pelo 1º Secretário da Câmara, João de Andrade Arraes, em nome de seus pares. Demais disso, ao contrário do que afirma os defendentes, o Relatório de Auditoria é “claro e preciso”. Uma leitura

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mais atenta do corpo principal e de todos os seus anexos é suficiente para a identificação da glosa ou irregularidade, com os respectivos responsáveis.

Assim , mais uma vez, VOTO pelo não conhecimento da preliminar.

Dito isto, convém agora esclarecer, considerando as argumentações da defesa, a natureza jurídica da verba de gabinete e sua sucedânea “verba indenizatória”, a par da descentralização orçamentária e financeira dos recursos da Câmara.

1. Natureza jurídica das verbas de gabinete (e das verbas indenizatórias) e a descentralização orçamentária e financeira dos recursos da Câmara de Vereadores:

Seria uma das espécies de adiantamento ou suprimento de

fundos previstas na Lei nº 4.320/64?

A Lei nº 4.320/64, em seu art. 1º, estabelece explicitamente o alcance das normas gerais de direito financeiro definidas no estatuto pátrio que cuida do disciplinamento, fiscalização e controle dos atos e fatos administrativos da gestão orçamentária, financeira, patrimonial e operacional da administração pública:

“Esta lei estatui normas gerais de Direito Financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal (...).” (grifo nosso)

Considerando, pois, que aos Municípios aplica-se a norma geral definidora do sistema de adiantamento ou suprimento de fundos previsto nos artigos 65, caput, 68 e 69 do referido diploma legal, temos dois requisitos indispensáveis a sua definição legal, a saber: a) a excepcionalidade da despesa; b) a impossibilidade da realização da despesa mediante o processamento normal de aplicação.

“Art. 65. O pagamento da despesa será efetuado por tesouraria ou pagadoria regularmente instituídas, por estabelecimentos bancários credenciados e, em casos excepcionais, por meio de adiantamento.

Art. 68. O regime de adiantamento é aplicável aos casos de despesas expressamente definidos em lei e consiste na entrega de numerário a servidor, sempre precedida de empenho na dotação própria, para o fim de realizar despesas que não possam subordinar-se ao processamento normal de aplicação.

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Art. 69. Não se fará adiantamento a servidor em alcance nem a responsável por 2 (dois) adiantamentos.” (grifei)

Logo, a despeito de algumas deliberações emitidas por esta Casa, a exemplo da Decisão TC nº 0368/02 - "Verba de gabinete é destinada a despesas não subordinadas ao processo normal de aplicação, processando-se como suprimento individual ou adiantamento" (Segundo AGUIAR, Afonso Gomes. Direito Financeiro: a lei nº 4.320 – comentada ao alcance de todos. 3ª ed. Belo Horizonte: Fórum, 2004, p. 365: “O regime de Adiantamento ou Suprimento de Fundos é um procedimento excepcional de gestão de recursos financeiros destinado a atender apenas as despesas cujos pagamentos não comportam subordinar-se ao processamento normal do pagamento das despesas em geral, sendo necessário que lei específica indique quais os gastos que podem ser atendidos por essa forma de pagamento.”) –, não se afigura possível a concessão de verba de gabinete por meio do regime de adiantamento previsto na Lei nº 4.320/64, pois, consoante Acórdão TC nº 1198/02 proferido no pedido de rescisão relativo à Decisão TC nº 0660/01, "o repasse de verbas destinadas à manutenção dos gabinetes dos Vereadores não poderá ser feito sob a forma de suprimentos individuais, devendo seu processamento ser alterado para que se adaptem às normas legais", nos termos contidos na Decisão TC nº 0158/02, (prestação das contas da Assembléia Legislativa do Estado de Pernambuco, exercício de 1998), que, em suas notas taquigráficas, reza:

Em relação às verbas de gabinete, o Relatório Preliminar de Auditoria centraliza a sua análise na impossibilidade de as mesmas continuarem a ser processadas pelo regime de suprimento individual. Isto porque a Lei nº 7.741/78 é bastante restritiva em relação às despesas que podem ser processadas por meio de suprimentos individuais, o que torna, sob o aspecto formal, irregular boa parte das despesas realizadas com as verbas de gabinete.

Dessa maneira, faz-se necessário que o processamento das despesas das verbas de gabinetes seja realizado de outra forma.

Neste sentido, sendo as verbas de gabinete, como explicado pela própria Mesa da Assembléia, utilizadas para agilizar a realização das despesas dos gabinetes dos Senhores Deputados, com intuito de garantir-se o melhor funcionamento das atividades parlamentares, faz-se necessário que tais objetivos estejam plenamente refletidos na peça orçamentária anual.

Para este fim, deve ser criado, quando da elaboração do próximo orçamento anual, programa-atividade específico na peça orçamentária da Assembléia Legislativa do Estado, avaliando-se, ainda, a possibilidade da criação de uma unidade orçamentária para cada um dos gabinetes dos Deputados, a fim de que, desta forma, a responsabilidade pela aplicação das verbas destinadas para este Programa não recaia sobre a Mesa Diretora, mas sim, sobre aqueles que efetivamente são os responsáveis pela aplicação dos recursos. (grifei)

Neste contexto, esta Corte de Contas já consagrou, em mais de

uma ocasião, que é possível a instituição de verba de gabinete para os

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Vereadores, inclusive o Presidente da Casa, a qual se justifica como forma de agilizar a realização das despesas dos gabinetes e, assim, garantir o melhor funcionamento das atividades parlamentares, desde que:

(a) Não se constitua em regime de adiantamento, pois a verba de gabinete não preenche o pressuposto básico de despesa excepcional que não pode ser processada normalmente (Acórdão TC nº 1198/02);

(b) Esteja prevista em lei de iniciativa da Câmara Municipal (Decisão TC nº 0707/01), que estabeleça as despesas processáveis pelo gabinete (“manutenção e custeio das finalidades ligadas ao seu funcionamento regular, vedada a utilização em quaisquer outros fins” – Decisão TC nº 1278/01), a previsão dos responsáveis designados como ordenador de despesa por ato administrativo fundamentado e a forma de prestação de contas ao órgão de controle interno;

(c) Haja dotação específica na Lei Orçamentária, pois "a Câmara Municipal [...] deverá ter tantas unidades orçamentárias quantos são os gabinetes dos Vereadores, os quais, por seu turno, deverão indicar os Ordenadores de Despesas, encaminhando, anualmente, quando da prestação de contas anual da Câmara, a prestação de contas de cada uma das unidades orçamentárias." (tomada de contas da Mesa Diretora da Câmara Municipal de Jaboatão dos Guararapes, exercício de 2000 - Decisão TC nº 0523/02);

(d) Dê-se a completa instalação física dos gabinetes e a sua entrada em funcionamento (Decisão TC nº 1278/01);

(e) As despesas realizadas pelos gabinetes observem às normas de licitação, considerando as necessidades do Poder Legislativo como um todo e não de cada um dos Vereadores individualmente (Decisão TC nº 0368/02), sob pena de configurar burla a exigência do processo licitatório e inobservância aos princípios basilares da administração pública, em especial o preceito da economicidade;

(f) As prestações de contas sejam encaminhadas ao Tribunal de Contas (Decisão TC nº 1278/01), após o término do exercício financeiro, devidamente acompanhadas do relatório do respectivo órgão de controle interno ou responsável institucional, para análise e julgamento dos responsáveis pela aplicação das verbas de gabinete.

Por oportuno, entendo que é hora deste Tribunal rever sua posição, acompanhando entendimento de diversas outras Cortes de Contas do país (a exemplo do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia), conforme segue:

“Quanto ao mérito, esclarecemos que esta Corte de Contas já decidiu, em resposta a consultas anteriores versando sobre o mesmo teor, pela impossibilidade da pretensão de dotar cada vereador de

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verba própria para manutenção de seus respectivos gabinetes, incluindo gastos com gasolina, viagens, frequência a cursos, correspondências, pesquisas, contratação de assessores, etc.” (TCE-MG, Consultas de nºs. 612.637, 66.029, 470.273) (grifei)

“Desta forma, entende-se que não é permitido à Câmara Municipal estender para o domínio do gabinete do Vereador a gestão dos recursos necessários à sua manutenção, nem conferir a esse gabinete a natureza de repartição administrativa com autonomia financeira para a execução de despesas, tais como concessão de diárias a servidor ou pagamento decorrente de contratação de assessores.

 A receita da Câmara, consistente nos duodécimos repassados pela Prefeitura, deverá ser mantida centralizada escrituralmente numa única tesouraria, em respeito ao princípio da unidade de caixa, centralizando-se, também, na tesouraria ou pagadoria, o regime ou a forma de aplicação desses recursos.

 Ressalte-se que o regime descentralizado de aplicação de recursos poderá, em alguns casos, comprovar-se anti-econômico e atentatório ao princípio constitucional da economicidade, sabendo que a centralização do regime de compras constitui fator de redução de custos, possibilita a instituição do regime de registro de preços previsto em lei e racionaliza os procedimentos burocráticos, gerando economia de serviços, sem falar que afasta os vícios dos fracionamentos de despesas, dentre outros frequentemente detectados pelos órgãos de controle interno e externo”. (TCE-MG, Consulta nº 643.657) (grifei) Assim penso porque não é dado à Mesa Diretora da Câmara

renunciar às suas competências institucionais, enquanto órgão diretivo do Legislativo Municipal, tampouco à Presidência da Casa delegar atribuições privativas do Chefe do Poder aos demais vereadores, a quem não cabem exercer tarefas diretivas ou disciplinares, mas sim funções legislativas (normatizando o interesse local), fiscalizadoras (controlando os atos do Executivo) e judicantes (julgando as infrações político-administrativas do Prefeito Municipal e de seus pares), como nos ensina Hely Lopes Meirelles:

“A administração financeira, a contabilidade e a elaboração e execução do orçamento da Câmara, que irá integrar o do município, são de responsabilidade do presidente.

(...) o vereador não age individualmente, senão para propor medidas à Câmara a que pertence.” (Hely Lopes Meirelles, in Direito Municipal Brasileiro) (grifei)

Esta também é a doutrina do professor José Afonso da Silva ( in Manual do vereador):

“Além das atribuições da Mesa, cada um de seus membros tem as próprias. O Presidente da Mesa, que é também o Presidente da Câmara, tem atribuições mais amplas. A ele é que cabe efetivamente dirigir os trabalhos da Câmara. Entre outras atribuições podem ser discriminadas as seguintes: (...) II – dirigir, executar e disciplinar os trabalhos legislativos e administrativos da Câmara.

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(...)O Tesoureiro responde pelos assuntos financeiros da Câmara;

efetiva os pagamentos em consonância com o Presidente; assina, com este, cheques de pagamento; dirige, enfim, a tesouraria da Câmara, e superintende a elaboração da proposta orçamentária da Câmara.” (SILVA, José Afonso da. Manual do vereador. 5ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004, p. 47-48) (grifei)

Outrossim, mister se faz demarcar uma distinção fundamental entre o da “verba de gabinete”, objeto de diversas deliberações nesta Casa, da recém instituída “verba indenizatória”, visto que a primeira se destina ao custeio do gabinete, enquanto a segunda se refere à pessoa do Vereador.

Esta verba indenizatória, como a própria defesa fez questão de ressaltar, exsurge na Câmara Municipal do Recife, “com o advento da Lei nº 17.159/2005”, quando “o sistema de suprimento ou adiantamento de verba para posterior prestação de contas foi extinto – em face das críticas deste Tribunal à aplicação do regime de adiantamentos –, adotando-se o sistema vigente na Câmara Federal [no Senado Federal e na Assembléia Legislativa do Estado], onde o parlamentar efetua o dispêndio com recursos próprios e particulares, nos itens de despesa previstos na Lei, e depois solicita o ressarcimento ou reembolso dessas despesas por ele já efetivadas. A Verba foi transformada em sua natureza, passando a ter conteúdo indenizatório”.

Entretanto, não podemos olvidar que o exercício da vereança em muito se difere do exercício dos mandatos legislativos estaduais e federais, pois o parlamentar municipal reside no mesmo local de seu eleitorado (ou melhor, na comunidade local), não está sujeito a despesas de locomoção e hospedagem (a ser custeada por diárias) e não tem que arcar com quaisquer outras despesas inerentes às atividades parlamentares, o que somente ocorre com deputados federais (que representam o povo que se espraia por todo o Estado, onde está o seu eleitorado), deputados estaduais (que têm eleitorado espalhado por todo o Estado) e senadores (que têm colégio eleitoral em Estado-membro que dista da Capital Federal, mas representa).

Destarte, entendo que não basta a simples criação desta verba indenizatória por lei municipal – como ventila a defesa – para afastar qualquer questionamento, pois a aplicação do princípio da legalidade, no que concerne à execução orçamentária, impõe duas conseqüências lógicas:

(a) É indispensável a autorização legislativa – lei orçamentária, ou lei que institui créditos suplementares ou especiais, e lei específica (em sentido material e formal) aprovada segundo o processo legislativo comum ou ordinário (sub-princípio da reserva da lei) – para a aplicação de recursos públicos. A própria Constituição Federal (art. 167, I e II) reafirma o princípio da legalidade ao estabelecer as seguintes vedações: “o início de programas ou projetos não incluídos na lei orçamentária anual” e “a realização de despesas ou a assunção de obrigações diretas que excedam os créditos orçamentários

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ou adicionais”. O administrador público, pois, não pode dispor do patrimônio público livremente, pois este não pertence a ele, mas a coletividade, sendo o princípio da indisponibilidade das receitas públicas, um claro desdobramento do princípio da legalidade; e

(b) A aplicação dos recursos orçamentários deverá observar todas as normas jurídicas que regulam a gestão pública, ou seja, a Administração Pública, na execução da despesa pública, somente pode atuar nos limites legais (Constituição Federal, Lei nº 4.320/64, LRF), havendo, pois, necessária subordinação da lei municipal às normas constitucionais e às normas gerais (de caráter nacional) que versam sobre a despesa pública

Outrossim, afirmo que não se mostra razoável a transferência habitual de determinado valor (mensalmente), ainda que limitado por lei, aos vereadores, com vistas a indenizá-los pela realização de prévias e discricionárias despesas de custeio, porquanto a ordenação de despesas (imprescindíveis ao funcionamento do Poder e indispensáveis à consecução das condições necessárias ao pleno exercício do mandato parlamentar) é competência privativa do Presidente da Câmara.

Demais disso, a instituição de tais verbas indenizatórias contraria outros princípios basilares (desta feita, expressos) da Administração Pública brasileira, quais sejam: economicidade e eficiência administrativa. Senão, vejamos:

A eficiência na Administração Pública significa que, tanto no modo de se organizar como no modo de atuação dos seus agentes, deve-se buscar os melhores resultados na prestação do serviço público, agindo com presteza, perfeição e rendimento funcional. A utilização das verbas indenizatórias pela Câmara de Vereadores, inelutavelmente, como veremos alhures, mesmo que pretenda – ao menos em tese – a satisfação pronta das demandas da coletividade (aos seus representantes no Legislativo), através de uma estrutura não-burocrática, não garante o menor dispêndio para a realização do melhor resultado possível. Mais uma vez, o insigne Hely Lopes Meirelles:

“Dever da eficiência é o que impõe a todo agente público realizar suas atribuições com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros.” (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 14. ed. São Paulo: RT, 1989, p. 86) (grifei)

Por tudo isso, deixo a lapidar lição do professor Celso Antônio Bandeira de Mello (in Curso de Direito Administrativo):

“Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica

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ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra.” (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 772) (grifei)

Quanto à economicidade do ato, cabe ao gestor público aplicar a despesa pública de modo mais econômico atendendo, por exemplo, a uma adequação de custo-benefício. Um ato pode ser legal, isto é, conforme com dispositivos legais; ser legítimo, vale dizer, estar de acordo com valores fundamentais da sociedade, mas ser praticado ineficientemente, anti-economicamente, o que significa dizer, com desperdício. Não há dúvidas de que a forma como estão sendo processadas essas despesas no âmbito do legislativo municipal, ou seja, de forma descentralizada, caracteriza aplicação anti-econômica e ineficiência, sem falar que fere a CF na medida em que a fragmentação das despesas por gabinetes implica a não realização do devido processo licitatório.

Resta, pois, a este TCE, amparado no disposto na Lei Maior, artigos 71, IX e 75 (CF, art. 71, IX – “assinar prazo para que o órgão ou entidade adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, se verificada ilegalidade), determinar à Câmara de Vereadores do Recife que, no prazo máximo de 90 (noventa) dias, contados desta deliberação, SUSTE todos os pagamentos de verbas indenizatórias de apoio aos gabinetes dos vereadores, nos moldes disciplinados pelas Leis Municipais nº 17.092/2005 e 17.159/2005 e, por conseguinte, adote medidas administrativas e legais com vistas à manutenção centralizada dos duodécimos recebidos e do regime de aplicação dos recursos numa única tesouraria, ressalvados tão-só os adiantamentos para despesas excepcionais, miúdas e de pronto pagamento, que refogem ao processamento normal da despesa, nos estritos termos da Lei Federal nº 4.320/64, da Lei Estadual nº 7.741/78 e da legislação municipal específica.

Feita estas considerações iniciais, cumpre-me, agora, adentrar no mérito das questões sustidas por esta auditoria especial: comprovação de gastos pelos gabinetes dos vereadores com a apresentação de notas fiscais inidôneas, realização de despesas com alimentação sem respaldo legal, excesso de dispêndios com combustível, utilização de recursos para promoção pessoal e atuação ineficiente do controle interno.

2. Comprovação de despesas com documentação fiscal inidônea

De pronto, a defesa apresentada pelos vereadores, por meio de seus advogados, alega a incompetência do Tribunal de Contas para tratar de questão tributária, utilizando-se em seu socorro um pronunciamento do STF (ADI 523/PR, rel. Min. Eros Grau, 3.4.2008), a qual não se aplica a questão em

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exame. O que a nossa Suprema Corte fez, no caso, foi declarar inconstitucional a criação, pela Carta Estadual do Paraná, de uma instância recursal, no âmbito dos Tribunais de Contas, para as decisões fazendárias de última instância contrárias ao erário.

Ora, não se está aqui a falar dos Tribunais de Contas passarem a fiscalizar o recolhimento dos tributos (em substituição aos trabalhos realizados pelos auditores da Secretaria da Fazenda), tampouco deste Tribunal rejulgar as decisões dos “tribunais administrativo-tributários”. O que se tem aqui é um Tribunal de Contas, sim, atuando no campo de suas competências constitucionais – como a defesa transcreveu, mas não se deteve. Este Tribunal, assim como todos os demais existentes neste país, deve realizar as inspeções e auditorias de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, por iniciativa própria, da Casa Legislativa ou de Comissões técnicas ou de inquérito (art. 71, IV, CF e art. 30, IV, CE), com vistas ao julgamento das contas dos administradores e demais responsáveis (incluindo as Organizações Não- Governamentais e os entes qualificados na forma da lei para a prestação de serviços públicos) por dinheiros, bens e valores públicos das unidades dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e das entidades da administração indireta, incluídas as fundações, fundos e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público (inclusive as Agências Reguladoras e Executivas), e das contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte dano ao erário (art. 71, II, CF e art. 30, II, CE), precipuamente no que toca à renúncia de receitas (art. 70, caput, CF e art. 29, § 1º, CE).

Quanto à ausência de responsabilidade pela inidoneidade das notas fiscais, os vereadores alegam que, como qualquer cidadão, agiram de boa-fé ao adquirir mercadorias de empresas irregulares, pois à época “a Câmara Municipal do Recife não dispunha de sistema informatizado que permitisse acesso a todas as informações fiscais das empresas junto à SEFAZ”, razão pela qual não podem ser responsabilizados por vícios de inteira responsabilidade do emitente das notas, pois não participaram das falhas, as despesas foram efetivamente realizadas (porquanto os auditores não podem simplesmente deduzir que as despesas foram fictícias, é necessário provar o alegado) e, ademais, os recursos utilizados têm caráter privado.

De fato, encontramos precedentes tanto no Tribunal de Contas da União (a exemplo dos Acórdãos nº 69/1999 – Segunda Câmara e 79/2001 – Plenário) como neste Tribunal (entre outras, a Decisão TC nº 0273/99 citada pela defesa) que sustentam não caber o ressarcimento dos valores relacionados às despesas comprovadas por documentos fiscais inidôneos, quando não comprovada a inexistência das mesmas (apesar da determinação pelo encaminhamento de peças ao Ministério Público para a promoção da devida ação penal). Tais decisões revelam, entretanto, posicionamentos isolados e superados por esta Casa. Vejamos algumas das recentes manifestações deste Tribunal sobre a matéria, inclusive sob a relatoria de alguns dos nobres colegas que ainda defendem entendimento contrário ao

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esposado neste voto, mas que se rendem diante de situações concretas e graves, como as aqui analisadas:

“Via de regra, este Tribunal delibera que a responsabilidade pela idoneidade das notas fiscais é das firmas emissoras das notas. E que o mais importante para comprovação das despesas é a efetiva entrega dos produtos/mercadorias. Não havendo provas de que as mercadorias não foram entregues, não deve haver imputação de débito. Via de regra, também entendo dessa forma. Todavia, no caso desta prestação de contas, a conclusão a que chego, à vista dos documentos presentes nos autos, é de que não houve a realização das despesas. Com efeito, se fosse uma ou poucas notas fiscais inidôneas, seria verossímil acreditar que a entidade subvencionada não tivesse nada a ver com as irregularidades. Contudo, mais de 70% das notas fiscais utilizadas como comprobatórias das despesas apresentam graves irregularidades, tornando-as inidôneas. Não há como chegar à conclusão diferente: tais despesas não foram realizadas.

(...)JULGO IRREGULARES as presentes contas (...). E, ainda,

determino a remessa de cópia dos autos ao Ministério Público de Contas para fins de representação ao Ministério Público Estadual, diante das graves irregularidades detectadas. (Processo TC nº 0404854-4, Prestação de Contas Especial de Subvenção Social concedida pela Prefeitura Municipal do Jaboatão dos Guararapes ao Centro Social Nossa Senhora das Graças. Rel. Conselheiro, em exercício, Luiz Arcoverde Filho. 22ª sessão ordinária da segunda câmara realizada em 25/03/08)

“É cediço que, dentre as fases da despesa orçamentária, tem-se a liquidação, que consiste, basicamente, em verificar se a despesa está em condições de ser paga.

(...)Assim, verifica-se que não houve o atendimento dos

comandos exigidos para a regular execução da despesa, que requer documento idôneo para comprovar o recebimento da mercadoria.

Desponta, como evidente, a irregular quitação das despesas, pois as notas fiscais comprobatórias foram emitidas após o cancelamento da inscrição dos emitentes junto ao Órgão Fazendário. O que denota o falecimento da idoneidade dos documentos.

(...)Ora, é cediço que o Administrador Público está obrigado a

pautar-se dentro dos estritos ditames da lei, não lhe sendo facultado atuar sem outorga legal ou de forma contrária a ela. No caso em tela, exsurge não somente a obrigatoriedade de exigir notas fiscais em consonância com os requisitos exigidos no artigo 95, do Decreto Estadual nº 14.876/91, mas, também, prova da regularidade de seus fornecedores para com a Fazenda Federal, Estadual e Municipal do domicílio sede do licitante. Não o fazendo, age o administrador de forma contrária à lei, devendo, portanto, ser responsabilizado por sua conduta ilegítima.

(...)Por fim, não procede o argumento de que inexiste

responsabilidade do Administrador Público quando não se verifica dano ao erário. É que as decisões desta Corte seguem a mesma lógica dos atos de

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improbidade administrativa, previstos na Lei nº 8.429/92, de que não se faz necessária a existência de dano ao erário para se caracterizar a responsabilização do gestor, desde que verificado que este agiu de forma contrária aos Princípios da Administração, mormente o da Legalidade.

As razões acima expendidas são suficientes para demonstrar o acerto da decisão hostilizada, devendo ela ser mantida, na íntegra.

(...)Conheço do presente Recurso Ordinário, por atender aos

pressupostos de admissibilidade e, no mérito, nego-lhe provimento.” (Processo TC nº 0704696-0. Recurso Ordinário interposto pela Sra. Gisélia Vitória de Lima, Ordenadora de despesas do Fundo Municipal de Saúde de Ibimirim, contra Decisão TC nº 0694/07. Rel. Conselheiro Carlos Porto. 17ª sessão ordinária do Tribunal Pleno realizada em 07/05/2008)

“A linha argumentativa é vazia e retórica, restringe-se a negar as falhas comprovadas, sustentando teses já pacificamente refutadas por esta Corte de Contas. Apenas para exemplificar, aduz o recorrente: que não há obrigatoriedade do Município checar a regularidade fiscal das empresas.

(...)Ao invés de repetir tudo que já foi aduzido pelos Auditores e

Inspetores da Casa, bem como cotejado no brilhante voto do Nobre Relator, o MPCO acredita que prestará maior serviço se evidenciar a gravidade das irregularidades apontadas, mostrando que, em tese, são enquadráveis como crimes ou atos de improbidade administrativa.

A primeira delas é a grande quantidade de despesas comprovadas com notas fiscais inidôneas. Saltam aos olhos que em um Município tão pequeno exista tamanha quantidade de Notas Fiscais, de Pernambuco e da Paraíba, sem o menor valor probante. Tratava-se de talões não autorizados; notas com autenticação falsificadas; empresas que constam como canceladas; empresa não encontrada no endereço cadastrado. Tudo com pagamento em dinheiro, feito diretamente pelo caixa da tesouraria.

Tudo isto foi desnudado graças ao trabalho reconhecidamente minucioso dos técnicos desta Casa, com informações levantadas junto aos órgãos fazendários do Estado de Pernambuco e da Paraíba.

A falta de comprovação dos gastos levou a 1ª Câmara a decidir pela devolução do valor de R$ 153.503.75 ao erário municipal, reconhecendo os indícios de ato criminosos, votou por enviar a documentação ao Ministério Público de Contas.

Têm razão os julgadores ao indicar a remessa da documentação para que sejam apurados os indícios de crime e improbidade administrativa. A despesa comprovada maciçamente com notas inidôneas pode representar crime de Peculato, artigo 312 do Código Penal (...) ou pode representar, no mínimo, improbidade administrativa prevista na Lei 8.429/92.

(...)Considerando, em parte, os termos do Parecer MPCO nº

302/08, do Ministério Público de Contas,Conheço do presente recurso ordinário como pedido de

rescisão e, no mérito, nego-lhe provimento, mantendo a decisão atacada.” (Processo TC nº 0800366-0. Recurso Ordinário interposto pelo Sr. José

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Lopes da Silva Sobrinho, ex-Prefeito do Município de Itapetim, ao Parecer Prévio, deste Tribunal, que recomendou à Câmara do citado Município a rejeição das contas do Prefeito, referentes ao exercício financeiro de 2004, e à Decisão TC nº 1.431/07. Rel. Conselheiro Fernando Correia. 18ª sessão ordinária do Tribunal Pleno realizada em 14/05/2008)

“(...) apenas a questão da invalidade da nota fiscal inviabilizaria uma opinião concreta sobre o assunto. Este dado, entretanto, é analisado juntamente com dois outros achados de auditoria, como a inexistência da empresa Kelma Bezerra de Arruda e o fato da empresa Edmilson Alves de Oliveira – ME não comercializar o objeto licitado. De fato e de direito, as duas situações inviabilizam qualquer discussão sobre a validade das respectivas despesas. Como a empresa Kelma Bezerra de Arruda poderia ser “convidada” a participar de um processo licitatório quando a mesma sequer existia no endereço registrado na Prefeitura? Que motivo levou a administração a convidar uma empresa que não comercializava o objeto licitado?

Outro argumento igualmente descaracterizado é aquele em que a defesa afirma que os bens foram entregues. Como pode ter certeza de tal procedimento se, conforme afirma a auditoria em sua Nota Técnica de Esclarecimento, “não existe controle interno na Prefeitura para atestar a entrada e saída de mercadorias, não ficando provado nos autos a entrada física dos bens adquiridos, apenas evidenciando que a comprovação das despesas tinham sido realizadas através de notas de empenhos, notas fiscais (sem validade fiscal) e recibos”.

(...)CONSIDERANDO a gravidade dos fatos relativos às despesas

executadas com as empresas Kelma Bezerra de Arruda e Edmilson Alves de Oliveira – ME, onde, além de estarem com seus registros cancelados junto à Secretaria da Fazenda do Estado de Pernambuco - SEFAZ/PE, a primeira inexistia fisicamente no endereço registrado pela Administração Municipal, enquanto que a segunda não comercializava o objeto dos certames instaurados, impondo-se a devolução de R$ 118.915,70;

(...)Julgo IRREGULARES as contas do Ordenador de Despesas.(...)DETERMINO:Remessa de cópia das principais peças deste processo ao

Ministério Público de Contas, para representação junto à Procuradoria Geral de Justiça, principalmente em função da contratação das empresas Kelma Bezerra de Arruda e Edmilson Alves de Oliveira – ME, assim como em razão da caracterização do disposto no art. 168-A do Código Penal Brasileiro;

(...)Que o atual Prefeito do Município de Jataúba, com base no

disposto no art. 69 da Lei Estadual nº 12.600/2004, adote as providências, a seguir relacionadas, a partir da data de publicação desta Decisão, sob pena de aplicação da multa prevista no inciso XII do art. 73 do citado Diploma legal:

(...)Ao convidar interessados para participar de certames

licitatórios, dar execução a sua fase de habilitação ou contratar despesas

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verificar a existência física dos interessados, assim como seu interesse no objeto pretendido pela administração e sua regularidade junto aos fiscos Federal, Estadual ou Municipal, evitando-se, consequentemente, a aquisição de bens ou mercadorias e contratação de serviços com empresas inidôneas.” (Processo TC nº 0540068-5. Prestação de Contas da Prefeitura Municipal de Jataúba, relativa ao exercício financeiro de 2004. Rel. Conselheiro em exercício Luiz Arcoverde Filho. 52ª sessão ordinária da Segunda Câmara realizada em 24/07/07)

“Entendo, digna Corte, que não reside razão ao defendente. Reiteradas decisões desta Corte, a exemplo das de nºs 1610/06, 1540/06, 0456/07, 0542/07, 0426/07 e 1440/06 se manifestaram no sentido que Notas Fiscais inidôneas, assim caracterizadas pela Legislação Tributária com as irregularidades expostas pelo Relatório de Auditoria, tais como contribuinte com inscrição cancelada, empresa que apresentou GIAM’s sem movimento ou não apresentou nenhum movimento de entrada e saída de mercadorias, não podem comprovar despesas. Na realidade, as referidas notas inidôneas comprovam que despesa pública não houve.

Outrossim, data vênia, parece-nos absurda a alegação do Recorrente com relação às empresas inidôneas ao afirmar que compete a esta Corte comprovar que as mercadorias não foram entregues ou os serviços não foram prestados. Ora, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é enfática ao afirmar que tal responsabilidade é do gestor [MS 20.335].

(...)Conheço do presente Recurso Ordinário e, no mérito, nego-

lhe provimento, mantendo os termos da Decisão atacada.” (Processo TC nº 0700955-0. Recurso Ordinário interposto pelo Sr. José Teixeira Gomes, Presidente da Câmara Municipal de Manari, à época, contra a Decisão TC nº 0021/07, que julgou irregulares as contas da Mesa Diretora da citada Câmara, relativas ao exercício financeiro de 2004. Rel. Conselheiro Marcos Loreto. 27ª sessão ordinária do Tribunal Pleno realizada em 30/07/08)

Noutra parte, urge esclarecer, na linha consagrada pelo STF e pelo próprio TCU, que não cabe ao Tribunal de Contas o ônus da prova da boa e regular aplicação dos recursos públicos, mas sim ao gestor da coisa púbica, e por uma simples e irrefutável razão: “A sociedade tem o direito de pedir conta a todo agente público de sua administração” (Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789) porquanto os recursos não são próprios, não são do administrador público, são do povo, são de todos, e a estes deve ser demonstrada sua regularidade por quem recebeu a atribuição de bem administrá-los.

Toda pessoa que gere ou administre bens alheios tem a obrigação de prestar contas (gestor de negócio, curador, tutor, síndico, comissário, inventariante, mandatário, tesoureiro, representante legal, gerente, diretor, sócio, etc.). Quem gere dinheiro público ou administra bens ou interesses da comunidade, pois, deve contas ao órgão competente para a fiscalização. Neste sentido as palavras do Conselheiro do TCE-PB, Flávio Sátiro Fernandes:

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“Se ao Poder Público não pertence o dinheiro que ele utiliza e do qual é mero gestor, nasce para os seus titulares o dever de informar ao povo a maneira como os recursos a este arrecadados foram empregados, durante o exercício para o qual foi legalmente autorizada a sua utilização. (...) embora o administrador da coisa pública esteja obrigado a informar como usou o dinheiro do povo, tal obrigatoriedade não representa de maneira alguma uma desconfiança em relação aos procedimentos por aquele adotados, mas apenas uma oportunidade que se concede ao povo de conhecer a destinação dada ao seu dinheiro e se esta destinação se pautou pelos ditames legais pertinentes.”

E, de igual modo, nos lembra nosso órgão de cúpula no Judiciário:

“Em direito financeiro, cabe ao ordenador de despesas provar que não é responsável pelas infrações, que lhe são imputadas, das leis e regulamentos na aplicação do dinheiro público” (STF, MS 20335).

Sem esquecer, naturalmente, do respeitável Tribunal de Contas da União, quando adverte – uma vez provocado por um agente que solicitou que a Corte diligenciasse juntos aos outros órgãos a fim de recolher provas – que “não cabe ao TCU laborar na produção de provas em favor das partes, competindo, sim, o ônus da prova ao gestor dos recursos públicos, na forma do Decreto-lei nº 200/67, em seu art. 93.” (TCU, Tomada de Contas Especial. Acórdão nº 155/1998 – Plenário. Processo nº TC-549.008/1991-8. Relator: Ministro Adhemar Paladini Ghisi. DOU, 06 nov. 1998)

Neste sentido, apoiado na jurisprudência do TCU (Acórdão nº 11/1997 – Plenário, Acórdão nº 200/1993 – Segunda Câmara e Acórdão nº 545/1992 – Plenário), também são as esclarecedoras palavras de Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, na mais completa obra sobre a função de controle, a estrutura e composição dos tribunais de contas, sua jurisdição e competências (in Tribunal de Contas do Brasil: jurisdição e competência):

“Nesse momento, vem à baila a questão de saber se o tribunal de contas tem a obrigação de provar, se está sujeito ao ônus da prova. A questão constitui ponto angular da ação de controle, pois se está sujeito ao dever de provar, não poderá, em tese, ter o direito de julgar, posto que se inserem em órbitas distintas os deveres de quem acusa e os daqueles que devem ter isenção para julgar. De forma tópica, cabe destacar:

a) o ônus da prova em relação à boa e regular aplicação dos recursos públicos incumbe a quem os recebe, posto que é inerente à função de administrar coisa alheia, o dever de prestar contas;

b) a regra geral, mesmo com o advento da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, permanece inalterada: em caso de contas, a prova da correta aplicação é do recebedor do recurso, harmonizando-se o preceito com a regra do art. 36 desta Lei;

c) é comum, nos tribunais de contas, destacarem pontos para defesa, considerando já suficientemente provado determinado indício de irregularidade. Quando o fazem, visam sobretudo aclarar pontos para a

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defesa neles se concentrar, dada a complexidade da temática que é intrínseca a tema contas;

d) os denominados ‘achados em auditoria’ constituem fatos que merecem ser esclarecidos, não possuindo natureza de libelo acusatório;

e) um ponto basilar da jurisdição do controle é o princípio do impulso oficial, segundo o qual cabe ao julgador determinar a apuração dos fatos e movimentar o processo na busca da verdade;

f) na execução judicial de decisão condenatória dos tribunais de contas, seus agentes, se regularmente notificados, comparecem em juízo na condição de peritos do juiz e não como auxiliares da acusação, posto que continuam preservando a imparcialidade que fez a corte firmar o direito e o débito pertinentes à conta julgada.

(...)Desse modo, além da cabal prova de aplicação regular das

receitas ingressadas na entidade, ainda deverá haver comprovação da gestão orçamentária (aplicação do recurso de acordo com a dotação prevista), financeira (segundo os ditames das normas de arrecadação, guarda e aplicação dos recursos públicos) e patrimonial (pertinente à aquisição, manutenção, e alienação de bens móveis e imóveis). Assim, o julgamento das contas anuais não mais se adstringe à honestidade da guarda e aplicação de dinheiros públicos, mas implica em avaliar a eficiência da gestão, tornando cada vez mais impermeável ao controle judicial o julgamento dos tribunais de contas, porque mais inerente ao mérito.

Logo, em havendo qualquer indício de irregularidade, deverá a corte determinar notificação da autoridade jurisdicionada, com vistas a que apresente a prova da regularidade das contas, delineando com clareza o âmbito da controvérsia.” (FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunal de Contas do Brasil: jurisdição e competência. Belo Horizonte: Ed. Forum, 2003, p. 183, 185-186).

Quanto à alegação feita pela defesa de que “as despesas são privadas” (pois os recursos são dos próprios vereadores), convém esclarecer, de logo, que não haveríamos de estar aqui a tratar delas se tivessem sido realizadas às expensas dos representantes do povo; não caberia, sem qualquer sombra de dúvida, aos Tribunais de Contas acompanhar o que os gestores públicos fazem com seu dinheiro, ainda que no exercício do mandato e para fins públicos. A situação, todavia, aqui apresentada é outra: agentes públicos realizam despesas com recursos seus, mas buscam posteriormente recuperá-los, indenizando-se pela realização de tais despesas (públicas) com recursos privados, sob o manto de uma legislação específica. Quem custeia, em última análise, as realizações dos vereadores são recursos públicos. E, como tais, devem observar rigorosamente a legislação que trata da sua regular aplicação (Lei Federal nº 4.320/64, Lei Estadual nº 7.741/78 e legislação específica, inclusive o Código de Administração Financeira Municipal) – em face da competência legislativa concorrente –, cumprindo todos os estágios da despesa pública, notadamente a exigência da prévia licitação, como já se disse alhures.

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"Art. 58 - O empenho de despesa é o ato emanado de autoridade competente que cria para o Estado obrigação de pagamento pendente ou não de implemento de condição.

Art. 59 - O empenho da despesa não poderá exceder o limite dos créditos concedidos.

(...) Art. 60 - É vedada a realização de despesa sem prévio

empenho. (...) Art. 62 - O pagamento da despesa só será efetuado quando

ordenado após sua regular liquidação. Art. 63 - A liquidação da despesa consiste na verificação do

direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito.

§ 1º - Essa verificação tem por fim apurar: I - a origem e o objeto do que se deve pagar; II - a importância exata a pagar; III - a quem se deve pagar a importância, para extinguir a

obrigação. § 2º - A liquidação da despesa por fornecimentos feitos

ou serviços prestados terá por base: I - o contrato, ajuste ou acordo respectivo; II - a nota de empenho; III - os comprovantes da entrega de material ou da

prestação efetiva do serviço. Art. 64 - A ordem de pagamento é o despacho exarado por

autoridade competente, determinando que a despesa seja paga. Parágrafo único. A ordem de pagamento só poderá ser

exarada em documentos processados pelos serviços de contabilidade.Art. 65 - O pagamento da despesa será efetuado por

tesouraria ou pagadoria regularmente instituídos por estabelecimentos bancários credenciados e, em casos excepcionais, por meio de adiantamento.

Art. 66 - As dotações atribuídas às diversas unidades orçamentárias poderão quando expressamente determinado na Lei de Orçamento ser movimentadas por órgãos centrais de administração geral.

(...) Art. 68 - O regime de adiantamento é aplicável aos

casos de despesas expressamente definidos em lei e consiste na entrega de numerário a servidor, sempre precedida de empenho na dotação própria para o fim de realizar despesas que não possam subordinar-se ao processo normal de aplicação.

Art. 69 - Não se fará adiantamento a servidor em alcance nem a responsável por dois adiantamentos.

Art. 70 - A aquisição de material, o fornecimento e a adjudicação de obras e serviços serão regulados em lei, respeitado o princípio da concorrência.” (Lei Federal nº 4.320/64) (grifei)

As normas gerais supratranscritas (as quais foram recepcionadas pela atual ordem constitucional), portanto, são de observância obrigatória pelos Estados e Municípios, em função do complexo modelo de “federalismo de equilíbrio” ou “federalismo de cooperação” adotado pelo legislador

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constituinte brasileiro ao distribuir competências legislativas às entidades federativas, notadamente as competências concorrentes sobre o direito financeiro (art. 24, I, da CF):

A Constituição Federal estabeleceu, expressamente, competências concorrentes não-cumulativas (verticais) entre União, Estados-Membros e Distrito Federal (art. 24, CF), com o objetivo de uniformizar o “essencial sem cercear o acidental, peculiar das unidades federadas” [Cf. MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Competência concorrente limitada. O problema da conceituação das normas gerais. Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 25, n. 100, out./dez. 1988, p. 158], através da definição do campo de atuação de cada esfera, que exercerá seus poderes com exclusividade, sem subordinação hierárquica, dentro dos limites definidos, conforme segue:

União: fixar normas gerais (art. 24, § 1º, CF), ou seja, “declarações principiológicas que cabe à União editar, no uso de sua competência concorrente limitada, restrita ao estabelecimento de diretrizes nacionais sobre certos assuntos, que deverão ser respeitadas pelos Estados-Membros na feitura das suas legislações, através de normas específicas e particularizantes que as detalharão, de modo que possam ser aplicadas, direta e imediatamente, às relações e situações concretas a que se destinam, em seus respectivos âmbitos políticos” [MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Competência concorrente limitada. O problema da conceituação das normas gerais. Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 25, n. 100, out./dez. 1988, p. 159]

Estados-Membros e Distrito Federal: exercer competência suplementar, isto é, estabelecer normas particularizantes (competência complementar) ou suprir lacunas na legislação federal para atender às suas peculiaridades (competência supletiva):

o Competência complementar: especificação de prévia lei federal de caráter nacional;

o Competência supletiva: exercício temporário de competência plena, diante da inércia da União, por meio da edição de normas gerais (que prevalecerão apenas no âmbito do território do Estado/Distrito Federal) e, a partir delas, das normas específicas.

Demais disso, a Carta Maior autorizou os Municípios a suplementarem a legislação federal e estadual (art. 30, II, CF), estabelecendo as normas específicas e as normas gerais (se for o caso), quando for necessário ao exercício de competências materiais (comuns ou privativas), no que couber (assuntos de interesse local, inclusive as matérias previstas no art. 24 da Constituição Federal).

Destarte, o Município poderá especificar as normas gerais da União, não contrariando, entrementes, as normas estaduais de complementação (ajustando-as às peculiaridades locais).

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Não há dúvida, pois, da aplicabilidade da Lei Federal nº 4.320/64 e da Lei Estadual nº 7.741/78 aos Municípios pernambucanos, por expressa determinação constitucional (art. 30, II, c/c art. 24, § 2º, CF), como se vê, ademais, em diversos precedentes desta Corte, que se seguem:

“Considerando que na Prestação de Contas da Mesa Diretora da Câmara Municipal de São Benedito do Sul, exercício financeiro de 1995, o Ordenador de Despesa, Sr. Cícero Marcionilo da Silva, na qualidade de Presidente daquele Poder Deliberativo, realizou despesas com documentação fiscal inidônea, ferindo o disposto no artigo 62, da Lei Federal nº 4320/64, e na Lei Estadual nº 7741/78, artigo 173, bem como no Decreto Estadual nº 14.876/91.” [Decisão TCE nº 0419/97. Rel. Conselheiro Fernando Correia. Processo TC nº 9630046-2. PRESTAÇÃO DE CONTAS DA MESA DIRETORA DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO BENEDITO DO SUL, relativa ao exercício financeiro de 1995, j. 25.03.1997]

“Considerando que a Prefeitura realizou despesa sem a devida comprovação fiscal, exigida pelo art. 63 da Lei Federal nº 4320/64 e pelo art. 173 da Lei Estadual nº 7741/78.” [Decisão TCE nº 0270/99. Rel. Conselheiro Roldão Joaquim. Processo TC nº 9590047-0. PRESTAÇÃO DE CONTAS DA PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO BENTO DO UNA, relativa ao exercício financeiro de 1994, j. 11.03.1999]

“Atentar para a legalidade da documentação comprobatória, à luz da Lei Estadual nº 7741/78 ou da Lei Municipal Específica.” [Decisão TCE nº 1266/99. Rel. Conselheiro em exercício Valdecir Pascoal. Processo TC nº 9801823-1. PRESTAÇÃO DE CONTAS DA PREFEITURA MUNICIPAL DE GAMELEIRA, relativa ao exercício financeiro de 1997, j. 05.10.1999]

“Atentar para a legalidade da documentação comprobatória, à luz da Lei Estadual nº 7741/78.” [Decisão TCE nº 1138/03. Rel. Conselheira Teresa Duere. Processo TC nº 0380041-6. PRESTAÇÃO DE CONTAS DA PREFEITURA MUNICIPAL DE MOREILÂNDIA, relativa ao exercício financeiro de 2002, j. 21.08.2003]

“É obrigação do Ordenador de Despesas comprovar a realização dos gastos públicos no exercício financeiro em que foram efetuados. A não-observância desse mandamento legal contraria princípios norteadores da Administração Pública, quais sejam o da legalidade, publicidade, impessoalidade e eficiência, presentes no art. 37, caput, da Constituição Federal, e ainda, os impositivos dos arts. 62 e 63 da Lei 4.320/64, confrontando diretamente o que ordena o art. 173 da Lei Estadual 7741/78. (...) Ante o exposto, pela não comprovação legal das despesas, posiciona-se pela obrigação de ressarcimento ao erário no valor de R$ 13.340,45, constituindo Ato de Improbidade Administrativa conforme art. 10, I da Lei 8.429/92. [Decisão TCE nº 1195/07. Rel. Conselheiro em exercício Ruy Ricardo W. Harten Júnior. Processo TC nº 0602749-0. RECURSO ORDINÁRIO INTERPOSTO PELO SR. ELANE VIEIRA DA SILVA, EX-PREFEITO DO MUNICÍPIO DA ALIANÇA, contra a Decisão nº 0487/06, j. 07.03.2007]

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No caso em apreço, vê-se, entretanto, que as verbas indenizatórias não se subsumem aos estágios da despesa (especialmente, a fase da liquidação da despesa, que corresponde a verificação da regular prestação do serviço ou do recebimento do bem ou da execução da obra, conforme o caso, cuja constatação passa necessariamente pelo atesto de autoridade competente responsável do recebimento dos produtos/serviços, prévio ao pagamento, a ser realizado pela tesouraria, ou órgão equivalente, diretamente ao credor da despesa) tampouco se enquadram ao excepcional e taxativo regime de adiantamentos (como já se teve a oportunidade de demonstrar anteriormente).

Por fim, analisemos os documentos e/ou informações trazidos aos autos pela defesa, visando à comprovação da existência ou regularidade dos estabelecimentos cujas notas foram questionadas pela auditoria:

a) vereador AUGUSTO JOSÉ CARRERAS CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE:

O defendente junta aos autos os seguintes documentos: b.1) ato constitutivo; extrato de situação fiscal regular perante a Fazenda Federal; b.2) informativo oficial da SEFAZ sobre o enquadramento do mesmo e sua inscrição; b.3) autorização para impressão do talonário fiscal; e b.4) declaração do responsável (Sr. Laércio Ribeiro Alves), atestando a regularidade da emissão dos documentos fiscais relacionados pela auditoria, comprovando que os itens ali discriminados foram servidos, pelo preços de tabela vigente na época e que a via fixa do talonário está conferindo com a examinada pelos auditores (em relação à empresa Silvestre Alves da Silva – ME ou Praça da Picanha); e b.5) ato de registro na JUCEPE; b.6) extrato da situação fiscal na Receita Federal; b.7) situação cadastral fiscal na SEFAZ; b.8) detalhamento sobre a AIDF para impressão do talonário fiscal; b.9) declaração do responsável pelo estabelecimento, atestando o fornecimento das mercadorias, pelas notas fiscais ali indicadas, nos valores discriminados, que correspondem aos da tabela de preços do estabelecimento e sua final conferência com as mesmas notas destacadas pelo relatório de auditoria (em relação à empresa José Dias Barbosa Júnior – ME ou Oitão Bar). Nestas declarações, os Srs. Laércio Ribeiro Alves e José Dias Barbosa Júnior, em nome das empresas Silvestre Alves da Silva – ME (conhecida como Praça da Picanha) e José Dias Barbosa Júnior – ME (conhecida como Oitão Bar), afirmam que “as Notas Fiscais (...) foram emitidas nas datas constantes das mesmas e seu preenchimento efetuado nas dependências deste Estabelecimento Comercial”, a defesa não justifica a identidade de grafia entre as notas fiscais das citadas empresas (as NF nº 11229, 11232 e 11235, da Praça da Picanha; e as NF nº 2598, 2603, 2611, 2616, 2624, 2628, 2631 e 2643, do Oitão Bar e Restaurante) relacionadas no grupo X3 do Anexo I do Relatório (fls. 569 a 580).

b) vereador CARLOS FREDERICO GOMES FRED OLIVEIRA:

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O defendente anexa aos autos detalhamento da consulta feita na página da Secretaria da Fazenda do Estado sobre a AIDF do Restaurante Ilha da Kosta Ltda., na qual consta os documentos fiscais (NFVC Mod. 2 – Série D1, com numeração de 10501 a 13000). No entanto, não apresenta considerações sobre a identidade da grafia aposta nas notas fiscais expedidas pelo Restaurante Ilha da Kosta (NF nº 10973, 10976, 10978, 10983 e 10987, às fls. 906) com a encontrada nas notas fiscais das empresas José Robson Pereira Brito Restaurante (Receita Pronta), A. C. F. Soares (Bar e Restaurante do Tonhão) e Lavajato & Lanchonete 48 (todas relacionadas no grupo S do Anexo I do Relatório), e com a letra do cabeçalho do documento referente ao reembolso da refeição feita no Bar e Restaurante do Tonhão (sob a responsabilidade do gabinete do vereador Fred Oliveira), consoante conclusões do laudo de exame documentoscópico (grafoscópico) da Polícia Federal.

c) vereador DANIEL PIRES COELHO:

O defendente informa que, segundo consulta realizada no sistema SINTEGRA, a empresa “Lavajato & lanchonete 48” funcionou ou, pelo menos, esteve com sua situação regular perante o fisco estadual até 10.01.2007 e questiona a realização da visita da equipe de auditoria ao local em junho de 2006, pois a auditoria especial somente foi autorizada em outubro de 2006. Na verdade, o vereador desconsiderou que a presente auditoria foi uma resposta à CI nº 095/2006, de 20/10/2006, encaminhada pelo Departamento de Controle Municipal/Divisão de Contas da Capital, em função das irregularidades encontradas durante a auditoria de acompanhamento realizada durante todo o exercício de 2006, olvidando, inclusive, que não se pode simplesmente recusar fé aos documentos públicos, em face do princípio de veracidade dos documentos expedidos pelas diversas esferas governamentais (no caso o Relatório de Auditoria), os quais gozam de presunção relativa de legitimidade (presunção juris tantum). Ademais, o Sr. Daniel Coelho, ao afiançar que “o estabelecimento efetivamente forneceu refeições ao pessoal de gabinete, no sistema ‘delivery’” não explicou a identidade da escrita constante nas notas fiscais emitidas pelo Lavajato & Lanchonete 48 (fls. 907/908) com a observada em documentos de diversas empresas relacionadas no grupo S [Restaurante Ilha da Kosta, José Robson Pereira Brito Restaurante (Receita Pronta) e A. C. F. Soares (Bar e Restaurante do Tonhão)] – no caso NF nº 402 e 403, no valor de R$ 375,00 e R$ 380, respectivamente – e no grupo X2 [José Cunha Dantas (Carne de Sol do Cunha) e Maria Mackl Moraes Monteiro (Savoury Restaurante)] – no caso NF nº 399, 400, 422, 434, 445 e 446, no valor de R$ 485,00, R$ 540,00, R$ 350,00, R$ 550,00, R$ 400,00 e R$ 500,00, respectivamente –, conforme laudo grafoscópico da Polícia Federal.

O defendente afirma, em relação às empresas “José Cunha Dantas – Carne do Sol do Cunha” e “Savoury Restaurante (Maria Mackl Moraes Monteiro), que “os restaurantes existem e o fornecimento das refeições foi devidamente atestado”, mas não refuta a identidade da grafia

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exarada nas notas destes restaurante (inclusive entre eles) com documentos fiscais expedidos por outras empresas que formam o grupo X2 (no caso, NF nº 5664, no valor de R$ 4.500,00), conforme dito acima.

O defendente, quanto à empresa “A. J. R. Informática Ltda. (Meta Informática)”, repete o argumento da irresponsabilidade pela inidoneidade das notas fiscais (no caso NF nº 7301, de 26.05.2006, no valor de R$ 3.597,00, e NF nº 7302, de 29.06.2006, no valor de R$ 3.532,70) para isentá-lo da glosa (AIDF de outra empresa e notas seqüenciadas em longo intervalo temporal), escusa esta já afastada neste voto.

d) vereador JOSÉ ERIBERTO MEDEIROS DE OLIVEIRA:

O defendente traz, em sua defesa, junto com documentos que comprovam a regularidade fiscal da empresa Decisão Comércios e Serviços Ltda., declaração do Sr. Rivaldo Lázaro da Silva (não reconhecida a firma), que afirma: “[a empresa] teve início de funcionamento em 01/01/1998 no endereço Edifício Arnaldo Bastos na Avenida Guararapes, nº 210, sala 49, Santo Antônio, Recife, PE, tendo permanecido em plena atividade até o ano de 2004, quando mudou-se para o endereço Avenida Guararapes, nº 154, sala 207, Santo Antônio, Recife, PE, em seguida para o Edifício Vieira da Cunha na Rua Floriano Peixoto, nº 85, sala 332, Santo Antônio, Recife, PE, não tendo (...) feito as devidas comunicações a SECRETARIA DA FAZENDA ESTADUAL o que ocasionou a inabilitação da referida empresa. Que ao tomar conhecimento do fato em 2007 requereu a sua reabilitação perante o referido órgão, tendo a empresa continuado com suas atividades até o final de 2007.” Da mesma forma como os anteriores, deixou de trazer considerações sobre a identidade verificada na grafia aposta nas notas fiscais das empresas “Decisão Comércios e Serviços Ltda.” (no caso NF nº 801 e 822, no valor de R$ 4.300,70 e R$ 1.939,00, respectivamente), “Alexgraf Gráfica e Editora” e “Avanço Comercial” que compõem o grupo I do Anexo I do Relatório, confirmada pelo laudo grafoscópido da Polícia Federal.

e) vereador MARCOS ANTÔNIO DE SOUZA MENEZES:

O defendente, como prova da existência das empresas “Papel Mais” e “Papelaria Contato”, anexa aos autos, entre outros, documentos que atestam a regularidade fiscal e a atividade da empresa, inclusive notas fiscais que comprovam a contratação com o poder público e com organizações não-governamentais (apesar da localização dos estabelecimentos comerciais, uma funcionando em residência e a outra em sala situada no 13º andar de um prédio – na qual aparentemente se encontra uma firma de crédito bancário). Não trata, entretanto, do reaproveitamento de selos fiscais de outras empresas em notas da empresa “Papelaria Contato” (NF nº 509 e 514, no valor de R$ 1.635,70 e 1.560,50, respectivamente).

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f) vereador MOZART JÚLIO TABOSA SALES:

O defendente, equivocadamente, apresenta a seguinte defesa: “(...) uma das empresas questionadas (a CHURRASCARIA E PIZZARIA FAMA DO BODE – O. A. M. PEREIRA DA SILVA – ME) reputada como emitente de documento fiscal inidôneo pela auditoria, além de existir e funcionar regularmente, confirmou o fornecimento de refeições descritas na nota fiscal, a regularidade de sua emissão e o valor recebido”. Na verdade, a empresa citada não se encontra no ponto “notas fiscais inidôneas”, mas sim “gastos indevidos com alimentação”, quando a auditoria revela estranheza com a situação apresentada: “O vereador Mozart Sales apresentou, nas prestações de contas dos meses de janeiro a março de 2007 (fls. 2279 a 2281), três notas fiscais seqüenciadas (NF nº 5, 6, 7), uma em cada mês, da Churrascaria e Pizzaria Fama do Bode, em que constam o consumo de 1.097 refeições ao valor unitário de R$ 10,00, totalizando R$ 10.970,00.”

g) vereador SEVERINO GABRIEL BELTRÃO:

O defendente apresenta declaração assinada pela Sra. Marcela Renata Silva Rodrigues (não reconhecida a firma), em nome da empresa “Papelaria Unimax Ltda. – ME”, que atesta as operações, as notas fiscais (NF nº 5492, 5493 e 5655) e os valores nelas estampados, desautorizando, assim, a informação da auditoria de que o proprietário anteriormente não as reconhecera, por serem notas fiscais clonadas;

O defendente informa que a empresa “Tipografia Oseias Lima Ltda. – ME” existe (conforme comprovante de inscrição e de situação cadastral ativa, datado de 03/11/2005) e está regular. Junta certidão de regularidade fiscal emitida pela SEFAZ-PE em 22/08/2008 (e não na época das transações – maio e junho de 2006), mas não se refere ao achado de auditoria: NF de serviço com autorização de NF de produto (NF nº 330 e 333, no valor de R$ 5.500,00 e R$ 2.325,00, respectivamente).

h) vereador VICENTE MANOEL LEITE ANDRÉ GOMES:

O defendente demonstra que as empresas “Alexgraf Gráfica Editora Ltda.” (desde 03/08/2005), “Pitty Comercial Ltda.” (06/05/2005) e “Avanço Comercial Ltda.” (desde 27/02/2008) encontram-se habilitadas perante a Secretaria da Fazenda do Estado, mas esquece do fundamental: “a convergência de punhos entre o material gráfico aposto nas notas fiscais” das empresas inseridas no grupo I (no caso, NF nº 867, 909 e 1135, no valor de R$ 3.469,50, R$ 6.785,00 e R$ 2.725,00, respectivamente, da Alexgraf Gráfica e Editora; e NF nº 2, no valor de R$ 5.590,00, da Avanço Comercial) e no grupo X1, que indica “terem sido produzidos pelo mesmo punho escriturador”, segundo o laudo grafoscópico da Polícia Federal. Além disso, não afasta a outra

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irregularidade relatada sobre o documento fiscal emitido pela empresa “Avanço Comercial Ltda.”: Empresa não-habilitada e AIDF inexistente;

O defendente alega que a empresa “Decisão Comércio e Serviços Ltda.” encontrava-se habilitada na data em que as compras foram realizadas, mas não justifica a identidade da escrita aposta nas notas fiscais emitidas pela referida empresa (no caso NF nº 802, 813, 824 e 850, no valor de R$ 5.460,00, R$ 6.854,00, R$ 1.818,48 e R$ 4.819,79, respectivamente) com a observada nos documentos das outras empresas que formam o grupo I e X1 (dentro de cada agrupamento) do Anexo I do Relatório, conforme laudo grafoscópido da Polícia Federal.

i) vereador SÍLVIO SERAFIM COSTA FILHO:

O defendente informa que o Posto Leão da Ilha Ltda. está com registro ativo na JUCEPE (fls. 4208), mas nada fala sobre a utilização do AIDF de outra empresa, sobre a Inscrição Estadual inválida e sobre a reutilização do selo (vide fls. 896/897), tampouco sobre “a convergência de punhos entre o material gráfico aposto nas notas fiscais” de diversas empresas inseridas no grupo O (no caso, NF nº 213, no valor de R$ 4.000,00), que indica “ter sido produzido pelo mesmo punho escriturador”, segundo o laudo grafoscópico da Polícia Federal;

O defendente também afirma em sua defesa a situação ativa, na JUCEPE, de W. R. Gráfica Ltda. (Top Gráfica e Editora), Danielle Cristine Silva Mascarenhas – ME, Comercial Lourenço Ltda., Comercial Sette Ltda., a Churrascaria e Pizzaria Mansão do Matuto Ltda. – ME., a Papelaria Baraúna Ltda. – ME, o Posto Lupp Ltda. e a Valgráfica Ltda. – ME. No entanto, deixou de apresentar considerações sobre;

o A empresa W. R. Gráfica Ltda. (Top Gráfica e Editora) tem nota fiscal clonada (NF nº 656, no valor de R$ 3.500,00), constante do grupo D que ainda apresenta convergência de punhos entre o material gráfico aposto nas notas de diversas empresas (nos termos do laudo grafoscópico da Polícia Federal), cuja numeração não corresponde ao intervalo autorizado pela AIDF, e que o próprio estabelecimento não a reconhece (fls. 920 e 938);

o A empresa Danielle Cristine Silva Mascarenhas – ME tem notas fiscais clonadas (NF nº 388 e 393, no valor de R$ 341,00 e R$ 261,00, respectivamente), produzidas pelo mesmo punho escriturador de diversas empresas (grupo N), segundo o laudo grafoscópico da Polícia Federal, que o próprio estabelecimento não as reconhece;

o A empresa Comercial Lourenço Ltda. não estava habilitada à época da emissão da nota (NF nº 407, de 23.01.2007, no valor de R$ R$ 4.515,00), o estabelecimento não existia (no local foi encontrada residência) e há clara convergência de punhos entre o material gráfico aposto nas notas fiscais/ recibos de diversas empresas constante do grupo N apontada no laudo grafoscópico da Polícia Federal;

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o A empresa Comercial Sette Ltda. não existia (encontrada residência no local) e as grafias das notas fiscais de diversas empresas do grupo N (no caso NF nº 1332, de 20.07.006, no valor de R$ 3.500,00, às fls. 782) apresentam convergência de punhos, conforme laudo grafoscópico da Polícia Federal;

o A Churrascaria e Pizzaria Mansão do Matuto Ltda. – ME tem notas fiscais de diversas empresas insertas no grupo N, as quais foram preenchidas pelo mesmo punho escriturador (NF nº 969 e 974, no valor de R$ 1.200,00 e R$ 1.110,00, respectivamente), consoante laudo grafoscópico da Polícia Federal;

o A Papelaria Baraúna Ltda. – ME apresenta notas com AIDF de outra empresa e com a reutilização de selo fiscal (vide fls. 826/827), havendo ainda convergência de punhos entre a grafia dos documentos de diversas empresas relacionados no grupo N (no caso, NF nº 5664, no valor de R$ 4.500,00), conforme laudo grafoscópico da Polícia Federal;

o A empresa Posto Lupp Ltda. tem nota fiscal (NF nº 1127, no valor de R$ 1.800,00, às fls. 825) com AIDF de outra empresa, cuja numeração não corresponde ao intervalo autorizado, relacionada no grupo D que apresenta convergência de punhos entre o material gráfico de diversas empresas (conforme laudo grafoscópico da Polícia Federal);

o A empresa Valgráfica Ltda. – ME apresenta notas fiscais com AIDF de outra empresa, cuja numeração não corresponde ao intervalo autorizado, com dados incongruentes com as informações fornecidas pela PCR, além de notas com numeração repetida, notas clonadas, que o estabelecimento não as reconhece, e preenchidas pelo mesmo punho escriturador de diversas empresas (grupo N), segundo o laudo grafoscópico da Polícia Federal (vide NF nº 4318 e 4331, no valor de R$ 3.780,00 e R$ 3.500,00, respectivamente, às fls. 920, 936 e 2469).

Há de se registrar que irregularidades semelhantes às descritas acima, pelos Vereadores que apresentaram defesas escritas, também aconteceram em relação aos Vereadores Henrique Leite, André Ferreira Rodrigues, Antônio Luiz da Silva Neto, Eduardo Amorim Marques da Cunha, Elediak Francisco Cordeiro, Francismar Mendes Pontes, Gilvan Cavalcanti da Silva, Gustavo Vasconcelos Negromonte, João Alberto de Freitas Marins, Liberato Pereira Costa Júnior, Luiz Carlos Cavalcanti Pires, Luiz Eustáquio Ramos neto, Luiz Helvécio de Santiago Araújo, Luiz Vidal Silva, Osmar Ricardo Cabal Barreto, Romildo José Ferreira Gomes Filho, Severino Gabriel Beltrão, Valdir Facioni. Estes, não apresentaram quaisquer contra-razões atinentes ao mérito dos dispêndios, limitando-se a questionar a competência desse Tribunal de Contas.

Com efeito, tratam-se de provas irrefutáveis. Afinal, são notas

fiscais “clonadas”; notas de estabelecimentos fechados ou inexistentes; notas com numeração repetida; notas de estabelecimentos diversos preenchidas com

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a mesma grafia; notas grosseiramente falsificadas, dentre tantas outras irregularidades.

Quanto ao dano provocado ao erário, de fato, quase todos os vereadores devolveram os respectivos recursos aos cofres da Prefeitura Municipal, como já comentamos no relatório, e, assim, solicitam a perda do objeto, neste ponto da auditoria, em face da jurisprudência deste Tribunal, que tem decidido: “sendo o débito parcelado ou recolhido antes do trânsito em julgado, a irregularidade deve ser desconsiderada e as contas aprovadas.” (Decisões TC nº 1334/07, 0228/07, 4239/04, 1958/03, 0614/00, 0107/04, 1140/97 e 0256/03, entre outras).

Não obstante tais precedentes, entendo que aqui se impõe a presunção legal de veracidade do alegado, porquanto, assim como o pedido de parcelamento do débito implica a confissão da dívida, a devolução voluntária dos recursos significa reconhecimento da irregularidade cometida. Não há, pois, que se falar em irregularidade ilidida, mas tão simplesmente em impossibilidade de imputação do débito, porque não mais existente o dano. Débito, entretanto, que se mantém em relação ao vereador Vicente Manoel Leite André Gomes, no valor de R$ 44.093,27. Informo, por oportuno, que o vereador Henrique Leite de Melo fez acostar aos autos, na tarde de ontem, comprovação do recolhimento aos cofres municipais dos valores imputados pelo relatório técnico, relativos às notas fiscais inidôneas.

Acato, portanto, o posicionamento técnico deste Tribunal pela devolução dos recursos ao erário, no que toca ao vereador Vicente Manoel Leite André Gomes, com aplicação da multa prevista no art. 73, II, da Lei Orgânica deste Tribunal (ato de gestão ilegal, ilegítimo ou antieconômico de que resulte injustificado dano à Fazenda), no valor de R$ 9.000,00 (nove mil reais). Quanto aos demais vereadores que “prestaram contas” a partir de notas fiscais de estabelecimentos diversos preenchidas por uma mesma pessoa, notas fiscais irregulares e notas fiscais de estabelecimentos fechados e/ou inexistentes, sou pela aplicação da multa prevista no art. 73, III, da Lei Orgânica deste Tribunal (ato praticado com grave infração a norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional ou patrimonial), em valores que variam entre R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) e R$ 5.500,00 (cinco mil reais) – discriminados ao final do voto.

Outrossim, não posso deixar de reconhecer que a “aquisição/produção de notas fiscais com o fito de simular a aquisição de materiais e serviços” (como fartamente demonstrado pela auditoria) configura ato de improbidade administrativa previsto no art. 9º, XI, da Lei Federal nº 8.429/92, in verbis:

“Art. 9º - Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função,

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emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1º desta Lei, e notadamente:

(...)

XI – incorporar, por qualquer forma, ao seu patrimônio bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta Lei.”

3. Despesas indevidas com alimentação:

Neste item, os vereadores – afora a defesa apresentada pelo vereador José Antonio da Silva (por meio do advogado Fernando R. Beltrão) - utilizam basicamente dois argumentos para a defesa da legalidade das despesas: (a) o vereador Carlos Alberto Gueiros alega erro na redação do texto legal a contrariar o espírito da lei: “a ‘exceção’ pretendida pelo legislador é na realidade o ressarcimento das despesas realizadas ‘com alimentação preparada’, concluindo-se, portanto que erroneamente foi incluído o ‘não’ na expressão que define a exceção pretendida”; e (b) os vereadores Danilo Jorge de Barros Cabral (em defesa própria) e os demais vereadores citados neste ponto do relatório (através dos advogados Márcio José Alves de Souza, Leucio Lemos Filho e Liliane Cavalcanti Barreto Campello), em nome de uma interpretação “harmônica” e “não artigo por artigo”, fazem o seguinte exercício interpretativo das normas (art. 3º, VIII e art. 4º, da Lei nº 17.159/2005): “admite-se o reembolso de despesas com alimentação (entendendo-se ‘alimentação’ no sentido de ‘refeições prontas’) e não se admite o ressarcimento de despesas com gêneros alimentícios isolados (entendendo-se por ‘gêneros alimentícios’, ‘alimentação não preparada’), exceto aqueles de uso exclusivo do gabinete (açúcar, café, chá, etc.)”

Sendo assim, transcrevo o texto legal in litteris:

“Art. 3º - Somente serão ressarcidas as despesas efetivamente pagas pelo parlamentar e relativa a:

(...)VIII – alimentação, exclusivamente em nome do Vereador,

não podendo exceder ao valor que vier a ser estabelecido em Resolução.

Art. 4º - Não serão objeto de ressarcimento as despesas efetuadas com aquisição de gêneros alimentícios, exceto alimentação não preparada para uso exclusivo do gabinete, e de material permanente, assim considerados aqueles de vida útil superior a dois anos.”

Cabe-nos elucidar a intentio leges do legislador municipal ao editar a Lei nº 17.159/2005, dentre duas correntes de interpretação que exsurgem:

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A uma, a auditoria defende que a regra geral é a vedação de aquisição de gêneros alimentícios, ressalvada a alimentação não preparada, em nome do vereador, para uso exclusivo do gabinete.

A duas, os vereadores distinguem alimentação de gêneros alimentícios e afiançam que a lei autoriza o reembolso de despesas com alimentação (refeições prontas) e somente não admite o ressarcimento de despesas com gêneros alimentícios isolados (alimentação não preparada), exceto aqueles de uso exclusivo do gabinete.

É forçoso reconhecer que o legislador municipal não foi feliz quando disciplinou a matéria por meio da Lei 17.159/05. Há, com efeito, manifesta incongruência, contradição, antinomia, nas disposições dos seus artigos 3º e 4º. Um, permitindo; o outro, aparentemente, vedando tais despesas. Não há dúvidas de que caberá à nova Mesa Diretora da Câmara tomar medidas legais e administrativas com vistas a corrigir essas ambigüidades. Mas faço aqui uma ponderação no sentido de, nesse caso, levar em conta, em nome da segurança jurídica e da presunção de legalidade, o fato de que este TCE, desde a vigência da referida lei, nunca havia externado uma interpretação que vedasse completamente a realização das ditas despesas com alimentação. Havia, por parte dos Edis, uma situação de confiança e expectativa de que a aplicação daqueles recursos, se plenamente comprovadas, não seria glosada pelo TCE. Foram acostadas diversas decisões sobre a questão.

Não resta dúvida de que qualquer cidadão, no exercício do seu controle social, pode até discordar da existência desses gastos, achá-los excessivos, mas não me sinto autorizado - repito: nesse caso - à luz das regras disciplinadoras e dos precedentes dessa Casa, partir, desde já, para uma determinação de ressarcimento geral dessas despesas. Entendo que estando devidamente comprovadas, com documentação idônea e válida, devamos aceitá-las até o prazo de 90 dias da presente deliberação, tempo mais do que suficiente para que a atual Mesa Diretiva adote todas as medidas legais e administrativas visando à correção das imprecisões, incongruências, ambigüidades e falhas, bem como com a fixação de critérios transparentes e impessoais, ao tempo em que adote mecanismos de controle mais efetivos para evitar abusos.

Aplico, nesse caso, o disposto na CF, artigos 71, IX e 75, que autoriza os TCs a “assinar prazo para que o órgão ou entidade adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, se verificada ilegalidade. Deixo registrado, contudo, que não obstante tenha acatado, em parte, as ponderações da defesa, nesse ponto, todos os dispêndios pertinentes a alimentação “comprovados” com documentos inidôneos já foram devidamente impugnados por mim, quanto tratei aqui da questão das “notas fiscais”.

4. Gastos com combustível:

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Neste tópico, a crítica da auditoria recai sobre a razoabilidade e/ou proporcionalidade dos gastos com combustível, considerando a desnecessidade de verbas indenizatórias custearem despesas com deslocamentos realizados, dentro do próprio município, e o excesso verificado: “Por gabinete, o consumo mensal médio é de R$ 3.847,61, ou seja, 1.425 litros de gasolina/mês, o suficiente para rodar 14.250 km”, que significa “2.035 vezes a distância entre os municípios de Olinda e Recife e 750 vezes a distância entre os municípios de Recife e Jaboatão dos Guararapes”. Entende a equipe de auditoria que o pagamento de tais despesas, por meio das denominadas verbas indenizatórias, constitui verdadeiro “subsídio indireto” e viola o princípio da moralidade administrativa.

Os vereadores, por seu turno, firmam sua defesa na existência de autorização legislativa para a realização dos gastos – que “não prevê um número mínimo ou máximo de veículos que podem ser cadastrados”, inclusive de veículos não pertencentes à Câmara, mas a seu serviço, consoante Decisão TC nº 1.779/01 – e que se “as despesas realizadas atenderam ao fim institucional a que se destinaram, legitimadas pelo interesse público” (vereador CARLOS ALBERTO GUEIROS), o que tentam demonstrar, inclusive com a citação de decisões anteriores deste Tribunal que autorizam a utilização da verba de gabinete com gastos com combustível sem as exigências da auditoria (Decisões TC º 0448/08 e 0608/08), “não caberia à auditoria desta Corte alegar que os montantes foram excessivos ou que só poderiam ter sido custeadas despesas com deslocamento para além dos limites do Município” (os demais vereadores citados no Relatório).

Na linha já definida neste voto (e que ficou patente quando tratei no intróito da natureza de tais verbas), estou convicto de que a utilização de verbas indenizatórias para o pagamento de combustíveis não se mostra uma via adequada, econômica e racional. Com a devida urgência, a atual Mesa Diretora deverá adotar medidas legais e administrativas com vistas a centralizar as referidas despesas na unidade de tesouraria geral do Poder Legislativo. Como muito bem dito no Relatório Técnico, essa medida possibilitará maior economicidade, exigirá a realização de um procedimento licitatório, que permitirá maior concorrência, trazendo como conseqüência a diminuição dos preços e dos custos, sem esquecer que os controles sobre esses dispêndios passarão a ser mais eficientes e efetivos, especialmente se considerarmos que a atual Mesa também adotará medidas fortes com vistas à estruturação e efetividade do seu sistema de controle interno.

Da forma como vem procedendo, a Câmara de Vereadores optou pela realização de diversos serviços e/ou aquisição de bens de natureza idêntica, periodicamente, sem proceder à prévia licitação, renovando o objeto ao longo do exercício através do mesmo elemento de despesa. Tal procedimento caracterizou fragmentação de despesas para adoção de dispensa de licitação, em contrariedade ao disposto no art. 8º da Lei nº 8.666/1993, que

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reza “a execução das obras e dos serviços deve programar-se, sempre, em sua totalidade, previstos os custos atual e final e considerados os prazos de sua execução”. A título de ilustração, seguem alguns esclarecedores julgados do egrégio Tribunal de Contas da União, que versam sobre a indispensabilidade do planejamento na Administração Pública e o fracionamento de despesas como burla à exigência do prévio procedimento licitatório:

“Atente para o fato de que, atingido o limite legalmente fixado para dispensa de licitação, as demais contratações para serviços da mesma natureza deverão observar a obrigatoriedade da realização de certame licitatório, evitando a ocorrência de fracionamento de despesa.”[Acórdão TCU 73/2003 – Plenário]

“Planeje adequadamente as aquisições e/ou contratações a fim de evitar o fracionamento da despesa, em observância ao art. 23, § 5º, da Lei nº 8.666/1993.” [Acórdão TCU 740/2004 – Plenário]

“Fracionamento que decorre da falta de planejamento é ato irregular suficiente para gerar a imputação de multa.” [Decisão TCU 120/1996 – Plenário]

“Evite a fragmentação de despesas, caracterizada por aquisições freqüentes dos mesmos produtos ou realização sistemática de serviços da mesma natureza e processos distintos, cujos valores globais excedam o limite previsto para dispensa de licitação a que se referem os incisos I e II do art. 24 da Lei 8.666/1993.” [Acórdão TCU 1386/2005 – Segunda Câmara]

Não obstante todas essas nuances, procederei nesse item da mesma forma que procedi no ponto atinente às despesas com alimentação. A previsão legal, aliada à existência de precedentes deste Tribunal, me conduzem, em nome da segurança jurídica, a concluir que este TCE deverá aceitar os referidos dispêndios, desde que devidamente comprovados, até o prazo de 90 dias da presente deliberação. Neste ínterim, a atual Mesa Diretora deverá adotar medidas legais e administrativas com vistas, como já mencionei, a centralizar as referidas despesas na unidade de tesouraria geral do Poder Legislativo.

Na mesma linha adotada no item anterior, deixo registrado, contudo, que não obstante tenha acatado, em parte, as ponderações da defesa, todos os dispêndios pertinentes a combustíveis “comprovados” com documentos inidôneos já foram devidamente impugnados por mim, quanto tratei aqui da questão das “notas fiscais”.

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Faz-se necessário clarear uma questão. Poder-se-ia indagar: por que não se valer do argumento dos precedentes e do princípio da segurança jurídica e da boa fé em relação às “notas fiscais” (item 3.1 do Relatório Técnico)? Simplesmente porque não há precedentes que pudessem gerar nos Vereadores a expectativa e a presunção de que tais dispêndios seriam acatados por este TCE. De fato, em algumas prestações de contas passadas, foram detectados documentos fiscais inidôneos, todavia num percentual mínimo, pouco significativo em relação ao montante dos valores aplicados. A grave situação detectada no relatório técnico em relação à i(ni)doneidade dos documentos fiscais supostamente comprovadores das despesas é inédita. Nunca vista! Revela, como já ficou claro na leitura do meu voto, atinente ao respectivo item, uma situação de total precariedade do processamento da despesa, da sua forma de comprovação e de seu controle, sem falar do grave prejuízo causado aos cofres públicos do Município do Recife. Trata-se, com efeito, de uma situação gravíssima que não encontra precedente e que exige, tanto deste TCE, como da atual mesa Diretiva, medidas duras, urgentes e efetivas para coibir definitivamente situações como tais.

5. Despesas irregulares com promoção pessoal:

Quando à alegada promoção pessoal dos vereadores à custa do erário, a argumentação dos vereadores citados no Relatório, neste tópico, limita-se a transcrever diversas decisões do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul, ponderando que: (a) a lei do Município autoriza o custeio de serviços de publicidade; (b) a referência a nomes não viola o princípio da impessoalidade; e (c) o caderno do diário oficial dos poderes/órgãos autônomos estaduais, na divulgação de suas ações, traz matérias com fotografias e nomes.

Neste diapasão, antes de qualquer coisa, mister se faz novamente sobrepesar três princípios básicos que devem nortear a Administração Pública, os quais se encontram descritos na Constituição (art. 37, caput) – a legalidade, a publicidade e a impessoalidade –, considerando para tanto as sábias palavras de HUMBERTO ÁVILA sobre a correta aplicação dos princípios jurídicos diante de possíveis conflitos de conteúdo normativo:

“(...) há incorreção quando se enfatiza que os princípios possuem uma dimensão de peso. A dimensão de peso não é algo que esteja incorporado a um tipo de norma. As normas não regulam sua própria aplicação. Não são, pois, os princípios que possuem uma dimensão de peso: às razões e aos fins aos quais eles fazem referência é que deve ser atribuída uma dimensão de importância. A maioria dos princípios nada diz sobre o peso das razões. É a decisão que atribui aos princípios um peso em função das circunstâncias do caso concreto.

(...)A terceira hipótese concerne ao fato de que a realização do

fim instituído por um princípio leve apenas à realização de parte do fim estipulado pelo outro. Isso ocorre no caso de princípios parcialmente

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imbricados. Nesse caso ocorrem limitação e complementação recíprocas de sentido na parte objeto de imbricamento.

(...) Tanto as regras quanto os princípios possuem o mesmo conteúdo de dever-ser. A única distinção é quanto à determinação da prescrição de conduta que resulta da sua interpretação: os princípios não determinam diretamente (por isso prima-facie) a conduta a ser seguida, apenas estabelecem fins normativamente relevantes, cuja concretização depende mais intensamente de um ato institucional de aplicação que deverá encontrar o comportamento necessário à promoção do fim.” (ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 51, 54-55) (grifei)

Seguem tais conteúdos:

O princípio da LEGALIDADE previsto no art. 5º, II, da Constituição Federal, que se aplica, na Administração Pública, de forma mais rigorosa: enquanto o particular pode fazer tudo que não estiver vedado em lei, o administrador público somente pode fazer o que a lei expressamente autoriza. É a aplicação do brocardo “patere legem quam fecisti” (suporta a lei que fizeste).

A PUBLICIDADE, que impõe que os atos praticados pela Administração Pública devem ter ampla divulgação, ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas em lei (a exemplo da segurança nacional), como mecanismo de fiscalização por parte da sociedade e forma de evitar escusas de ignorância.

E a IMPESSOALIDADE, que encontra na doutrina dois significados (igualdade no tratamento dos administrados e finalidade pública da Administração): (a) a Administração Pública não pode atuar com o fito de prejudicar ou beneficiar pessoas determinadas, pois o interesse público deve sempre nortear o comportamento do administrador; (b) o administrador público é o agente responsável pela manifestação estatal, mas não se confunde com o órgão ou entidade da Administração Pública, razão pela qual as realizações administrativo-governamentais não são do funcionário ou autoridade, mas da entidade pública em nome de quem as produzira.

Destarte, cumpre-me, fazer algumas ponderações conceituais sobre este ponto. Primeiramente, afastar o argumento simplista da existência de lei autorizativa da despesa, pois a prévia previsão legal é necessária à realização da despesa, mas não suficiente para certificá-la regular, devida. Vejamos, neste sentido, pronunciamento do Ministro Gilmar Ferreira Mendes, ao tratar de situação similar a que atualmente se encontra em discussão, quando o STF indeferiu, por unanimidade, pedido de habeas corpus:

“Em primeiro lugar, considero incabível o argumento de que a autorização orçamentária não permitiria falar em aplicação indevida. Consta a inicial:‘Em verdade, a aplicação de verba específica de publicidade, prevista orçamentariamente em todos os níveis da

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administração (federal, estadual ou municipal) é corolário lógico da obrigação constitucional de informar. Por isso, sua aplicação não pode ser considerada indevida, uma vez que a verba é aplicada exatamente na finalidade prevista em orçamento.’A previsão abstrata do orçamento por certo não inviabiliza a utilização indevida de recursos públicos. Fosse correta a formulação dos impetrantes, jamais haveria aplicação indevida de recursos públicos, haja vista que a aplicação de verbas deverá sempre atender a uma exigência legal ou constitucional, e mais, tal aplicação também deverá corresponder a uma previsão orçamentária. O que se discute na ação penal instaurada para apurar a prática de crime por utilização indevida de recursos públicos, nos termos do art. 1º, II, do DL 201, de 1967, é justamente se o prefeito aplicou verba pública segundo as leis vigentes, onde está incluída, evidentemente, a lei orçamentária.Também não considero pertinente o argumento contido na conclusão da inicial, que possui o seguinte teor:‘Pretender tornar indevida a aplicação regular de verba de publicidade, tão-só porque, na matéria publicada, a par do seu conteúdo informativo, há promoção pessoal de autoridade, é, sem dúvida, confundir aplicação indevida de verba com promoção pessoal indevidamente inserida em publicidade permitida. E a inserção desta, em tipo penal relativo àquela, constitui, induvidosamente, desrespeito a o princípio da reserva legal.’Os próprios impetrantes não refutam a eventual ilegitimidade da conduta do Prefeito em esferas não penais. O que é impugnado na inicial é a tipificação penal da conduta.O tipo penal contido no art. 1º, III, do DL 201, de 1967, refere-se à aplicação indevida de bens, rendas ou serviços públicos. O orçamento municipal prevê a aplicação de recursos em publicidade. A acusação é a de que o Prefeito teria utilizado tais recursos em publicidade e, além disso, aproveitado para realizar promoção pessoal.Afirmam os impetrantes que não poderia ser confundida a ‘aplicação indevida de verba com promoção pessoal indevidamente inserida em publicidade permitida’. Invertendo essa formulação, poder-se-ia indagar o seguinte: quando há ‘promoção pessoal indevida inserida em publicidade’ oficial , ainda se pode falar em ‘publicidade permitida’?(...)Meu voto, portanto, é no sentido do indeferimento da ordem.” (STF, HC nº 82.426-9/RS – Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 19 nov. 2004) (grifei)

Noutra parte, é cediço que a Administração Pública – além de divulgar todos os atos oficiais de governo (que produzirão efeitos externos), para que os mesmo tenham validade – deve expor de forma clara, precisa e

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simples, para o conhecimento público, as ações governamentais. Não resta dúvida que os atos relacionados à execução do orçamento devem ser amplamente divulgados pela imprensa oficial, pela internet e pelos demais veículos de comunicação, razão pela qual a própria Lei de Responsabilidade Fiscal, em seu art. 48, realçou a transparência como princípio aplicável aos orçamentos públicos.

É direito do cidadão, portanto, conhecer todas as etapas da aplicação dos recursos por ele disponibilizado ao Estado (do planejamento ao controle). A Administração Pública, decerto, deve cumprir o princípio da publicidade, mas sem descuidar (nunca!) da observância do princípio da impessoalidade como decorrência natural do princípio republicano (dever de zelar pela coisa pública, sujeitando-se todo e qualquer cidadão investido de função pública, ou que simplesmente manuseie recursos públicos, à responsabilização), porquanto a população precisa ser informada sobre o que o Estado (lato sensu) faz, ou deixa de fazer, com os recursos que foram carreados de seus bolsos para os cofres públicos (e que devem retornar sob a forma de prestação de serviços de qualidade).

A publicidade deve ser sempre institucional, porquanto assim

regulou a Constituição de 1988, em seu art. 37, § 1º, que transcrevo:

“Art. 37. (...) § 1º. A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e

campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.”

Chamo à atenção, contudo, para o fato de que em se tratando da divulgação da atuação parlamentar, que, por sua própria natureza, não poderá se furtar a fazer menção às iniciativas, aos projetos e proposições apresentados e aprovados, às conseqüências positivas para a população da atuação parlamentar, a interpretação do texto constitucional não deve ser demasiadamente literal e cartesiana. Há que ser temperada pelo princípio da razoabilidade, sob pena de, no limite, restar inviabilizada qualquer campanha publicitária em quaisquer dos Poderes da República. Excessos podem e devem ser combatidos e impugnados. No caso em apreço, salvo uma ou outra publicidade dotada de um tom mais afeito às performances, às marcas e símbolos pessoais de alguns Edis - cujos valores, vale registrar, são de pequena monta -, regra geral os dispêndios se pautaram dentro dos contornos da razoabilidade.

Porém, nunca é demais recomendar aos senhores Vereadores que, na divulgação de sua atuação, limitem ao máximo o uso de nomes ao contexto da informação institucional, que restrinja a divulgação de imagens ao estrito exercício das funções típicas do Legislativo e que se utilize tão-somente de símbolos oficiais. Outra recomendação que faço é no sentido de que a publicidade do Parlamentar seja centralizada num setor único do Poder

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Legislativo Municipal, numa espécie de departamento de comunicação, que, a exemplo de outros Poderes e Órgãos constitucionais, teria o papel de elaborar tanto as peças publicitárias oficiais do Legislativo, como a divulgação da atuação de cada parlamentar. Decerto que poderia o Parlamentar ofertar pauta e temas para os encarregados do referido setor de comunicação, mas, em assim procedendo, ou seja, centralizando a elaboração, o risco de desvios de finalidade e de excessos na divulgação seria sobremaneira diminuído.

6. Atuação ineficiente do controle interno

Quanto à inexistência de um controle adequado e efetivo da execução das despesas, por via das verbas indenizatórias, caracterizada por irregularidades diversas já descritas ao longo deste voto, a defesa assevera que nenhuma despesa foi acolhida pela Comissão de Controle Interno que não estivesse prevista em lei e questiona, em tom de desafio: “Ora, se a lei específica, ao tratar da atribuição da Comissão de Controle Interno, estabelece quais os seus limites, como justificar sejam eles ultrapassados?”

A própria Comissão responde: “Se o controle não está sendo exercido de forma eficaz ou eficiente, isso não decorre de uma comissão e sim da ineficiência institucional, ao não criar um sistema adequado.”

Neste ponto, a tese da defesa não prospera!

A uma, porque os defendentes distorcem a concepção de controle interno, ao esquecer-se do seu papel (da Comissão) dentro do sistema de controle interno delineado na Constituição Federal, o que impele destacar, aqui, as palavras esclarecedoras de FLÁVIO DA CRUZ e JOSÉ OSVALDO GLOCK sobre o controle interno nos Municípios:

“(...) o controle interno de um Município não é exercido por uma pessoa ou mesmo por um departamento integrante da estrutura organizacional, mas, por todos aqueles que respondem pelas diversas operações, em especial os que têm funções de comando.

Assim, não existe a figura do responsável pelo controle interno, pois todos são responsáveis, cada um em relação a sua área de atuação. Existe, sim, a figura do responsável pelo órgão central do sistema de controle interno ou pela unidade de coordenação do controle interno, formalmente constituída, a qual, por imposição legal, deverá assumir, também, o exercício de alguns controles relevantes.

(...) Sua missão institucional básica será a de exercer alguns controles essenciais e de avaliar a eficiência e eficácia dos controles internos do Município. A finalidade básica é assegurar o fiel cumprimento dos dispositivos constitucionais, da Lei de Responsabilidade Fiscal e demais legislações e a fidedignidade das informações constantes nos instrumentos de transparência da gestão fiscal, definidos no art. 48 da Lei Complementar nº 101/00.

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(...) entre as obrigações e responsabilidades do gestor público, está a de exercer o controle dos controles, ou seja, de assegurar-se de que existem controles suficientes e adequados para garantir [a salvaguarda do patrimônio; a confiabilidade dos sistemas contábeis, financeiros e operacionais; a otimização no uso dos recursos; a eficiência operacional; e a adesão às políticas e normas internas, à legislação e às demais orientações dos órgãos de controle governamental], e essa missão é exercida, por delegação, através da unidade referida.

A simples existência, na organização, da função (atuante) de coordenação do controle interno, incluindo procedimentos de auditoria interna, contribui decisivamente para redução de situações de irregularidades ou ilegalidades, além de, gradativamente, haver um aprimoramento dos controles internos.” [CRUZ, Flávio; GLOCK, José Osvaldo. Controle interno nos municípios: orientação para a implantação e relacionamento com os tribunais de contas. São Paulo: Atlas, 2003, p. 26/28] (grifei)

A duas, porque os defendentes ora alegam, mas não juntam documentos que comprovem a alegação (“muitos foram os documentos por ela – Comissão – rejeitados por irregularidades ou inidôneos – alguns até mesmo pelas mesmas falhas apontadas no relatório de auditoria), ora apresentam justificativas que não se sustentam diante dos seus poderes-deveres (os limites impostos pela legislação específica, a incompetência da Comissão para a verificação da idoneidade e regularidade de documentos fiscais e a inexistência de um sistema informatizado para o controle das empresas contratadas), como se vê nas Normas Brasileiras para o Exercício da Auditoria Interna consolidadas pelo Instituto dos Auditores Internos do Brasil (Audibra), em 1991, que entre outras orientações estabelece:

“Os auditores são responsáveis não só perante a administração da organização a quem prestam serviços, mas também perante muitos usuários das atividades dessas organizações. Esses usuários manifestam sua fé no auditor, individualmente, assim como na profissão do auditor. Os que atuam nessa área, por sua vez, devem conduzir-se de modo a justificar essa confiança.” (grifei)

“O que um auditor faz, individualmente, sendo ou não uma atitude típica dos auditores em geral, às vezes é a única coisa que chama a atenção da organização, de parte do público ou mesmo de comunidades inteiras.” (grifei)

“Embora mantenha vinculo empregatício com a organização para qual presta serviços, o auditor prestará obediência aos princípios de ética e observará normas técnicas e os padrões de auditoria, como norma de conduta profissional. No desempenho de suas atividades de auditoria, agirá sempre com absoluta independência e, em quaisquer circunstâncias e sob pretexto algum, conveniência própria ou de terceiros, condicionará seus atos, suas atividades, suas decisões

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ou pronunciamentos a preceitos outros que não os postulados da sua profissão.” (grifei)

(...) sobre qualquer pretexto, condições ou vantagens, tomar partido na interpretação dos fatos, na disputa de interesses, nos conflitos de partes ou em qualquer outro evento. O auditor deve condicionar o seu comportamento profissional à evidência da verdade quando, no seu melhor juízo, convenientemente apurada.” (grifei)

Por outra via, o Poder Legislativo não deve descurar que – entre outras funções fundamentais extraídas da Constituição Federal (arts. 23, 29, 29-A, 30, 31 e 182) e que se encontram descritas na Lei Orgânica Municipal – a ele cabe o controle interno de seus atos e o controle externo das contas municipais, por meio de diversos instrumentos de fiscalização, dentre os quais cresce de relevo a tomada de contas especial que deveria ter sido instaurada, em cada caso, pela direção da Casa para apurar as várias irregularidades tratadas neste voto, porquanto a tomada de contas especial, nos termos do art. 4º, parágrafo único, da Resolução TC nº 09/2005 – que possui rito próprio e objetiva apurar a responsabilidade daquele que der causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte dano ao Erário – deve ser instaurada, no prazo regulamentar, depois de esgotadas as providências administrativas internas para a recomposição do Tesouro ou regularização da situação, com vistas à elaboração de demonstrativo pela autoridade competente, através dos seus serviços contábeis, encerrando-se o procedimento em qualquer fase, e comunicando ao Tribunal de Contas do Estado para sustação da determinação legal de encaminhamento da tomada de contas especial ao TCE – após apuração dos fatos, identificação dos responsáveis e quantificação do dano – para formalização da prestação de contas especial quando, antes da sua conclusão, houver ressarcimento integral do dano, inclusive gravames legais, ou reposição do bem pelos responsáveis, em perfeito estado de conservação; ou reaparecimento ou recuperação do bem extraviado ou danificado (art. 12, I e II, da Resolução TC nº 09/2005).

Destarte, impende ressaltar que a omissão do gestor público, ao lado da atuação precária e deficiente da Comissão de Controle Interno, in casu, configura ato de improbidade administrativa previsto no art. 11, II, da Lei Federal nº 8.429/92, oportunidade em que trago a lume as palavras ilustrativas de PRADO, FAZZIO JÚNIOR e PAZZAGLINI FILHO:

"A hipótese assemelha-se à figura típica da prevaricação (art. 319 do CP), diferenciando-se apenas pela inexigência da motivação específica, que na figura criminosa consiste no propósito de satisfazer interesse ou sentimento pessoal. Para a configuração do ato de improbidade basta o retardamento ou a omissão indevidos, ou seja, sem motivo ou razão plausível. (...) só se poderá cogitar de improbidade quando o retardamento ou a omissão violarem um ou mais deveres enumerados pelo caput do art. 11. O mero atraso, ainda que derivado da negligência, não se erige em ato de improbidade administrativa. (...) Com efeito, para que se possa cogitar de retardamento o referencial será a determinação de um momento em que a prática do ato seria exigível. Já,

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no que concerne à omissão, estão só se verifica em face de um dever de praticar o ato num dado momento. Isso não significa, no entanto, que a infração seja impossível em relação a atos discricionários. (...) pode suceder que o agente, embora dispondo de um grau de liberdade para a escolha do momento oportuno para a prática de dado ato, exaura sua discricionariedade ao reconhecer, por qualquer meio, a conveniência e oportunidade de praticar o ato em dado instante e, não obstante, se omita ou retarde a ação reconhecidamente necessária.” [PRADO, Francisco Octavio de Almeida. Improbidade administrativa. São Paulo: Malheiros, 2001, pp. 128/129.]

"(...) se o prefeito, desprezando os deveres que o cargo lhe impõe, sobretudo o de efetivar os atos oficiais, sem qualquer motivo escusável, protela-os, ou, o que é pior, não os pratica, ainda que não mire qualquer vantagem ou interesse, está cometendo esta espécie de ato de improbidade. O dispositivo em pauta não requer, para sua configuração, o ânimo específico de satisfazer interesse pessoal ou de atender aos propósitos de qualquer pessoa. Satisfaz-se com a delonga ou a abstenção. É suficiente o protrair ou não agir, injustificadamente. É forçoso convir que, na prática, o elemento subjetivo apresenta-se com freqüência, até porque ninguém age ou se omite sem motivo. Por outro lado, se o motivo da demora ou omissão for de relevância juridicamente, o que também não é raro, claro que a improbidade não se caracteriza. (...) Na hipótese concreta, deverá ser mensurada a motivação exposta para a conduta do prefeito, no sentido de se avaliar se é ou não caso em que a oportunidade e/ou conveniência justificam seu proceder. (...) De tal sorte que não se encaixa, aqui, o descumprimento do dever a que está obrigado o prefeito em razão do cargo, por indolência ou simples desleixo. Essa ação negligente poderá carrear-lhe uma ação civil de ressarcimento. O agir ímprobo supõe intento de violar a ordem jurídica, com plena consciência da ilicitude do resultado que vai obter.” [FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Improbidade administrativa e crimes de prefeitos: comentários, artigo por artigo, da Lei nº 8.429/92 e DL 201/67, 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2003, pp. 188/189.]

"O agente público que, sem relevante razão de direito, protrai ou se abstém de praticar ato que se lhe impõe por dever inserto em sua esfera de atribuições realiza a figura do inciso II, desnecessária a intenção de obter vantagem pessoal ou proporciona-la a outrem. (...) Tanto na forma de retardar como na de deixar de praticar, a lei acrescenta o advérbio ‘indevidamente’, elemento normativo a denotar que o agente público deve ter conhecimento de que está agindo irregularmente. A lei não reclama, para constituição do ato de improbidade, que o agente público tenha por meta satisfazer interesse ou sentimento pessoal, como o reclama a lei penal (art. 319, do CP).” [PAZZAGLINI FILHO, Marino, ROSA, Márcio Fernando Elias, FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Improbidade administrativa: aspectos jurídicos da defesa do patrimônio público, 4ª ed. São Paulo: Atlas, 1999, p. 126.]

Sendo a falha grave – uma vez enquadrada como ato de improbidade administrativa – propicia, neste ponto, um entendimento desfavorável às contas, sujeitando, pois, o Presidente da Câmara e os

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membros da Comissão de Controle Interno à aplicação da multa prevista no art. 73, I, da Lei Orgânica deste Tribunal (ato de gestão ilegal que não seja de natureza grave e que não represente injustificado dano ao Erário), no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

Elevo, ademais, ao campo das determinações, a advertência da necessidade da direção da Casa estruturar uma verdadeira unidade de coordenação do controle interno, com quadro próprio de pessoal efetivo (recrutado mediante concurso público), num prazo de 180 (cento e oitenta) dias, a partir da data de publicação desta Decisão, sob pena de aplicação da multa prevista no inciso XII do art. 73 da Lei Estadual nº 12.600/2004, nos moldes descritos por Jorge Ulisses Jacoby Fernandes:

“É, assim, obrigatória a existência de órgão de controle interno nos três poderes da União, na forma estabelecida na Constituição Federal. Mais que isso: como o art. 75 estende as regras pertinentes ao controle realizado pelos tribunais de contas aos Estados e, tendo o controle interno a função de apoiar o externo, em homenagem à simetria que deve nortear a estrutura do controle, é correto assentar que também as unidades federadas devem possuir sistema de controle interno.

Não é suficiente, porém, estatuir. Indispensável estruturar os órgãos de modo a que possam cumprir adequadamente as funções que lhes são reservadas. Aliás, não faria sentido que o constituinte houvesse se preocupado em definir o amplo leque de atribuições e responsabilidade se, no cotidiano da administração pública, não fosse o mesmo dotado dos recursos necessários e suficientes à atuação requerida para o cumprimento do elevado mister.” (FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunal de Contas do Brasil: jurisdição e competência. Belo Horizonte: Ed. Forum, 2003, p. 85-86)

Ante todo o exposto, passo às considerandas e à decisão.

CONSIDERANDO os termos do Relatório de Auditoria (fls. 2475 a 2547), com os Anexos I, II e III (fls. 2549 a 2590), e da Defesa Escrita dos Srs. Vereadores (fls. 2696 a 4249) e os membros da Comissão de Controle Interno da Câmara Municipal do Recife (fls. 4252 a 4274), bem como a documentação comprobatória dos pontos de auditoria e das alegações feitas na peça de defesa, notadamente o Laudo de Exame Documentoscópico (Grafoscópico) emitido pelo Setor Técnico Científico da Superintendência Regional do Departamento de Polícia Federal no Estado de Pernambuco (Laudo Pericial nº 380/2008 – SETEC/SR/DPF/PE (fls. 4278 a 4400);

CONSIDERANDO que a ausência de participação de representante dos interessados nas inspeções e/ou nas perícias realizadas nos procedimentos usuais de auditoria de contas públicas, durante a instrução processual, não induz à nulidade, haja vista a natureza inquisitória dos trabalhos de auditoria, sendo as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa resguardadas com a

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notificação dos responsáveis pelas irregularidades levantadas, concedendo-lhes oportunidade de defesa ao relatório/laudo produzido pelo Tribunal de Contas (no presente processo, inclusive do laudo de natureza técnica lavrado por perito de órgão especializado, que encerra observações relativas a uma auditoria de controle externo de contas públicas);

CONSIDERANDO que as atribuições de polícia judiciária dos órgãos de segurança pública e as regras de competência jurisdicional – e analogamente dos Tribunais de Contas – são independentes, a Polícia Federal – órgão permanente, organizado e mantido pela União (art. 144, § 1º, CF), para, entre outras atribuições, “apurar infrações penais contra a ordem política e social” (art. 144, § 1º, CF), mormente, desrespeitada pela banalização de irregularidades no uso do dinheiro público – pode atuar, em colaboração com a Secretaria de Defesa Social dos Estados, na feitura de laudos técnicos, que, em face do princípio de veracidade dos documentos expedidos pelas diversas esferas governamentais (art. 19, II, CF), gozam de fé pública (presunção relativa de legitimidade);

CONSIDERANDO que o perito federal ateve-se à matéria prefixada, restringindo seu pronunciamento – de forma clara, objetiva e circunstanciada – às questões propostas pelo julgador e submetidas à sua apreciação imparcial, com vistas a esclarecer o que estava oculto: a identidade da grafia aposta em notas fiscais emitidas por empresas diversas, ora atestada tecnicamente, por quem de direito;

CONSIDERANDO que as verbas indenizatórias não se subsumem aos estágios da despesa, tampouco se enquadram ao excepcional e taxativo regime de adiantamentos descrito na Lei Federal nº 4.320/64, que visa atender apenas as despesas cujos pagamentos não se podem subordinar ao processamento normal;

CONSIDERANDO que a Administração Pública, na execução da despesa pública, somente pode atuar nos limites legais, havendo, pois, necessária subordinação da legislação municipal às normas constitucionais e às normas gerais (de caráter nacional) que versam sobre a despesa pública;

CONSIDERANDO que a Mesa Diretora da Câmara não pode

renunciar às suas competências institucionais, enquanto órgão diretivo do Legislativo Municipal, tampouco à Presidência da Casa delegar atribuições privativas do Chefe do Poder aos demais vereadores, a quem não cabem exercer tarefas diretivas ou disciplinares, mas sim funções legislativas (normatizando o interesse local), fiscalizadoras (controlando os atos do Executivo) e judicantes (julgando as infrações político-administrativas do Prefeito Municipal e de seus pares);

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CONSIDERANDO que a instituição das verbas indenizatórias de apoio ao gabinete contraria princípios basilares da Administração Pública brasileira (economicidade e a eficiência administrativa), porquanto a sociedade não espera de um bom administrador o uso ineficiente de tais verbas, precipuamente quando não cumprem a exigência do processo licitatório (art. 37, XXI, CF) e, o que é mais grave, não garantem o menor dispêndio para a realização do melhor resultado possível;

CONSIDERANDO que, no presente processo, este Tribunal de Contas não se substituiu à Secretaria da Fazenda (na fiscalização do recolhimento dos tributos estaduais), tampouco rejulgou as decisões administrativo-tributárias, mas, sim, atuou no campo de suas competências constitucionais, realizando as inspeções e auditorias de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, por iniciativa própria (art. 71, IV, CF e art. 30, IV, CE), com vistas ao julgamento das contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos, no âmbito do Poder Legislativo, e das contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte dano ao erário (art. 71, II, CF e art. 30, II, CE), precipuamente no que toca à renúncia de receitas (art. 70, caput, CF e art. 29, § 1º, CE);

CONSIDERANDO que não cabe ao Tribunal de Contas o ônus da prova da boa e regular aplicação dos recursos públicos, mas sim ao gestor da coisa púbica, porquanto os recursos não são próprios, mas do povo, e a este deve ser demonstrada sua regularidade por quem recebeu a atribuição de bem administrá-los;

CONSIDERANDO que foram utilizadas como comprovantes da despesa notas fiscais “clonadas”, notas de estabelecimentos fechados ou inexistentes, notas com numeração repetida, notas de estabelecimentos diversos preenchidas com a mesma grafia, notas grosseiramente falsificadas, dentre tantas outras irregularidades, o que configura o ato de improbidade administrativa previsto no art. 9º, XI, da Lei Federal nº 8.429/92;

CONSIDERANDO que, apesar de quase todos os vereadores responsáveis pela prestação de contas com base em notas fiscais inidôneas terem devolvido os respectivos recursos aos cofres da Prefeitura Municipal, as irregularidades subsistem, porquanto a devolução voluntária dos recursos significa reconhecimento da irregularidade cometida (presunção legal de veracidade do alegado);

CONSIDERANDO que as contradições e ambigüidades existentes nos dispositivos da lei Municipal 17.159/2005;

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CONSIDERANDO que foram realizados diversos serviços e/ou aquisição de bens de natureza idêntica, periodicamente, sem proceder à prévia licitação, renovando o objeto ao longo do exercício através do mesmo elemento de despesa, sem atentar que as necessidades do Poder Legislativo devem ser consideradas como um todo e não de cada um dos Vereadores individualmente, o que configura inobservância aos princípios basilares da administração pública, em especial o preceito da economicidade e o princípio da eficiência, e ato de improbidade administrativa previsto no art. 10, VIII, da Lei Federal nº 8.429/92;

CONSIDERANDO que não existe na Câmara de Vereadores um sistema de controle interno adequado e efetivo da execução das despesas, cuja omissão do gestor da Casa – inclusive pela inércia em relação ao dever de instaurar tomada de contas especial, em cada caso, nos termos da Resolução TC nº 09/2005 – ao lado da atuação relapsa da Comissão de Controle Interno, configura ato de improbidade administrativa previsto no art. 11, II, da Lei Federal nº 8.429/92;

CONSIDERANDO o disposto na CF, artigos 71, IX c/c 74, que estabelece a competência dos Tribunais de Contas para “assinar prazo para que o órgão ou entidade adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, se verificada ilegalidade”.

Julgo IRREGULARES as contas objeto da presente Auditoria Especial realizada nas verbas indenizatórias de apoio ao gabinete da Câmara Municipal do Recife, quando:

I. DETERMINO aos Vereadores abaixo referidos que restituam aos cofres municipais os valores relativos às despesas impugnadas, atualizados monetariamente, a partir do primeiro dia do exercício financeiro subseqüente ao das contas ora analisadas, segundo os índices e condições estabelecidos na legislação local para atualização dos créditos da Fazenda Pública Municipal, no prazo de 15 (quinze) dias do trânsito em julgado à presente deliberação, encaminhando cópia da Guia de Recolhimento a este Tribunal para baixa do débito. Não o fazendo, que seja extraída Certidão do Débito e encaminhada ao atual Prefeito do Município, que deverá inscrever o débito na Dívida Ativa e proceder a sua execução, sob pena de responsabilidade:

Notas Fiscais InidôneasVEREADOR VALOR (R$)

VICENTE MANOEL LEITE ANDRÉ GOMES 44.093,27

II. APLICO, aos vereadores e membros da Comissão de Controle Interno devidamente nominados abaixo, multa, nos termos do

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artigo 73, incisos I, II e III, da Lei Estadual n°12.600/04, pelas irregularidades citadas e nos valores descritos no corpo principal deste voto, em favor do Fundo de Aperfeiçoamento Profissional e Reequipamento Técnico do Tribunal, conta corrente nº 9500322, Agência nº 1016, Banco nº 356, Real S/A, valor a ser recolhido no prazo de 15 (quinze) dias do trânsito em julgado da presente decisão, oportunidade em que deverá ser encaminhada a este Tribunal a respectiva guia de quitação para baixa do débito:

Irregularidade: Notas Fiscais InidôneasHipótese Normativa: ato de gestão ilegal, ilegítimo ou antieconômico de que resulte injustificado dano à Fazenda (art. 73, II, da Lei Orgânica deste Tribunal)

VEREADOR VALOR (R$)VICENTE MANOEL LEITE ANDRÉ GOMES 9.000,00

Irregularidade: Notas Fiscais InidôneasHipótese Normativa: ato praticado com grave infração a norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional ou patrimonial (art. 73, III, da Lei Orgânica deste Tribunal)

VEREADOR VALOR (R$)ANDRÉ FERREIRA RODRIGUES 2.500,00ANTÔNIO LUIZ DA SILVA NETO 5.000,00AUGUSTO JOSE CARRERAS CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE 2.500,00CARLOS FREDERICO GOMES FRED OLIVEIRA 4.000,00DANIEL PIRES COELHO 3.000,00EDUARDO AMORIM MARQUES DA CUNHA 5.500,00ELEDIAK FRANCISCO CORDEIRO 2.500,00FRANCISMAR MENDES PONTES 3.000,00GILVAN CAVALCANTI DA SILVA 5.000,00GUSTAVO VASCONCELOS NEGROMONTE 5.500,00JOÃO ALBERTO DE FREITAS MARINS 3.000,00JOSE ERIBERTO MEDEIROS DE OLIVEIRA 2.500,00LIBERATO PERREIRA COSTA JUNIOR 5.500,00LUIZ CARLOS CAVALCANTI PIRES 3.000,00LUIZ EUSTÁQUIO RAMOS NETO 5.500,00LUIZ HELVÉCIO DE SANTIAGO ARAÚJO 5.500,00LUIZ VIDAL SILVA 5.500,00MARCOS ANTONIO DE SOUZA MENEZES 2.500,00MOZART JULIO TABOSA SALES 2.500,00OSMAR RICARDO CABRAL BARRETO 4.500,00ROMILDO JOSE FERREIRA GOMES FILHO 6.000,00SEVERINO GABRIEL BELTRÃO 2.500,00SILVIO SERAFIM COSTA FILHO 5.000,00VALDIR FACIONI 4.000,00

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HENRIQUE JOSÉ LEITE DE MELO 6.000,00

Irregularidade: Atuação Ineficiente do Controle Interno

Hipótese Normativa: ato de gestão ilegal que não seja de natureza grave e que não represente injustificado dano ao Erário (art. 73, I, da Lei Orgânica deste Tribunal)

VEREADOR VALOR (R$)JOSENILDO SINÉSIO DA SILVA 5.000,00

Irregularidade: Atuação Ineficiente do Controle Interno Hipótese Normativa: ato de gestão ilegal que não seja de natureza grave e que não represente injustificado dano ao Erário (art. 73, I, da Lei Orgânica deste Tribunal)

MEMBROS DA COMISSÃO VALOR (R$)GLADYS LANG CAUÁS 5.000,00JOSÉ AIRTON COSTA LEITE 5.000,00LINDALVA ALVES DO SACRAMENTO 5.000,00MALBA REJANE FARIAS LEITE 5.000,00SAMIR QUINTELLA FARAH 5.000,00

III – Em relação à imputação de débitos e aplicação de multas, DOU QUITAÇÃO aos demais vereadores que exerceram suas atividades na legislatura 2005-2008;

IV – DETERMINO, ainda, com base no disposto no art. 69 da Lei Estadual nº 12.600/2004, que a atual Mesa Diretora da Câmara Municipal adote medidas saneadoras das impropriedades e faltas identificadas, sob pena de, em caso de reincidência, as contas serem novamente julgadas irregulares, com aplicação de penalidade pecuniária acrescida em até 1/3 (um terço), nos termos do § 2º do art. 73 do citado Diploma legal:

1. A sustação, no prazo de 90 dias, contados desta deliberação, do pagamento de verbas indenizatórias de apoio aos gabinetes dos vereadores, nos moldes disciplinados pelas Leis Municipais nº 17.092/2005 e 17.159/2005 e, por conseguinte, adote medidas administrativas e legais com vistas à manutenção centralizada dos duodécimos recebidos e do regime de aplicação dos recursos numa única tesouraria, ressalvados tão-só os adiantamentos para despesas excepcionais, miúdas e de pronto pagamento, que refogem ao processamento normal da despesa, nos estritos termos da Lei Federal nº 4.320/64, da Lei Estadual nº 7.741/78 e da legislação municipal específica;

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2. A adoção de sistemático planejamento das aquisições e/ou contrações de serviços necessários aos gabinetes dos vereadores, com vistas à realização do devido certame licitatório (ressalvadas as hipóteses excepcionais previstas na legislação), efetuando, entre outros, os seguintes procedimentos:

a. Prever os serviços correspondentes ao necessário projeto básico;

b. Estimar o consumo e utilização prováveis;c. Verificar a adequação orçamentária e financeira, nos termos

da LRF;d. Efetuar cotações de empresas idôneas (jurídico, técnico,

econômico e fiscal), em quantidade representativa e proporcional às empresas existentes no mercado (qualidade, quantidade, marca, local de entrega, prazo de garantia e outras especificações e características), num intervalo de 30 dias;

e. Realizar consulta à licitação mais recente do órgão com objeto semelhante;

f. Promover consulta a banco de dados, comparando com outras aquisições praticadas por órgãos e entidades públicas;

g. Definir a modalidade e o tipo de licitação;h. Processar registro formal de preços (sistema de registro de

preços), sempre que possível (art. 15, II, Lei nº 8.666/93 e art. 11, Lei nº 10.520/02);

3. A realização de publicidade, exclusivamente, institucional (de cunho informativo, de orientação social ou educativa), admitindo-se tão-somente o uso de nomes restritos ao contexto da informação institucional, de imagens associadas ao exercício das funções típicas do Poder Legislativo e de símbolos oficiais;

4. A necessidade da direção da Casa estruturar uma verdadeira unidade de coordenação do controle interno, com quadro próprio de pessoal efetivo (recrutado mediante concurso público), num prazo de 180 (cento e oitenta) dias, a partir da data de publicação desta Decisão, a fim de que esta cumpra o papel que a Constituição Federal lhe conferiu (art. 74, CF/88), qual seja: fiscalização efetiva das despesas quanto aos aspectos de (a) regularidade formal, fiscal e contábil da documentação comprobatória; e (b) legitimidade dos gastos;

5. A consecução de adequada rotina de controle para a aquisição e utilização de combustíveis pelos gabinetes, garantindo o seu uso exclusivo em missão oficial.

V - DETERMINO o encaminhamento de cópia dos autos ao Ministério Público Estadual para adoção das medidas cabíveis;

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Ao final, determino que a Coordenadoria de Controle Externo, por meio de seus órgãos fiscalizadores, verifique, nas auditorias/inspeções que se seguirem, o cumprimento das presentes determinações, destarte zelando pela efetividade das deliberações desta Casa.

É o voto.

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