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Projeto de Pesquisa de Pós-Doutorado
Vozes performáticas: dissolvendo fronteiras
Wânia Mara Agostini Storolli Resumo: Este projeto pretende estudar o aspecto performativo da voz, especificamente no
âmbito de processos de criação musical gerados a partir de estratégias experimentais, nos
quais a exploração dos recursos vocais tem gerado novas estéticas assim como novas
possibilidades de escuta. O enfoque do estudo é na qualidade performática da voz, propondo-
se uma reflexão sobre sua natureza e capacidade de transitar por diferentes meios, criando
novos espaços e interpenetrando culturas. O estudo concentra-se na voz feminina, trazendo
exemplos de mulheres (tais como Meredith Monk e Fátima Miranda), que têm na voz seu
principal elemento de expressão artística e que tenham desenvolvido processos de
experimentação com a voz como um instrumento capaz de gerar uma linguagem musical e
artística própria. Ressalta-se como estratégia a improvisação, refletindo-se também sobre a
influência que a introdução de novas mídias e tecnologias tem exercido sobre os processos de
criação com a voz e sua consequente transformação.
1. Introdução
Durante todo o século XX, as mudanças nos critérios estéticos e o surgimento de
novos parâmetros, no que diz respeito à voz, ocorrem simultaneamente em diversas
linguagens artísticas, na música, no teatro, na poesia experimental, em processos que se
contaminam mutuamente. Essas mudanças cooperam para o surgimento de uma voz que
abandona os padrões de uma impostação tida até então como ideal, do Bel Canto, e se deixa
povoar por gritos, sussurros, gemidos, sons guturais, assobios, estalos de língua, e muitas
outras possibilidades do aparelho fonador. Para essa nova situação são inicialmente
determinantes o movimento dos futuristas e dadaístas, ainda no início do século, movimentos
que denunciam uma nova paisagem sonora, a paisagem urbana-industrial. A presença cada
vez mais constante de máquinas e a revolução tecnológica transforma a paisagem sonora,
nossos ouvidos e nossas vozes... O dadaísmo herda alguns procedimentos típicos do
movimento futurista, como por exemplo o bruitismo. Criado em 1913 pelo compositor
futurista Luigi Russolo, o termo bruitismo refere-se a uma concepção musical que tem como
material o ruído típico do espaço urbano-industrial, fazendo uso de sons tidos até então como
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não musicais.1 A idéia do bruitismo desempenha papel fundamental no desenvolvimento de
uma poesia experimental, principalmente pelos representantes do movimento Dada em
Zurique2, uma forma que conduz ao surgimento de gêneros como a poesia fonética e a poesia
sonora3, e que tem seus desdobramentos até os dias atuais. O ruído passa a ser incorporado,
tornando-se também parte da linguagem musical. O próprio conceito de ruído vai se
transformando. O compositor Arnold Schoenberg, por exemplo, faz uso do Sprechgesang,
uma espécie de “canto falado”, trazendo assim “para o domínio melódico toda a gama de
ruidismos dos timbres da voz e das entoações” (Wisnik, 1999: 45).
Pararelamente ao desenvolvimento desta idéia de poesia experimental, a prática
teatral, principalmente a partir das idéias de Antonin Artaud (1896-1948), passa a pesquisar
novas maneiras de se fazer uso da voz. Artaud propõe formas de resgatar a linguagem teatral,
que para ele havia se perdido quando o teatro passou a funcionar a serviço do texto. Sendo
assim, propõe “romper a sujeição do teatro em relação ao texto e reencontrar a noção de uma
espécie de linguagem única a meio caminho entre o gesto e o pensamento” (Artaud, 1984:
114). Nesse teatro a sonorização deve ser constante, “sons, ruídos, gritos são buscados
primeiro por sua qualidade vibratória e, a seguir, pelo que representam” (Artaud, 1984: 106).
Trata-se, portanto, de redescobrir a possibilidade sonora da voz, que deve atingir todo o
organismo e atuar sobre os sentidos. Na sua visão de uma nova arte, Artaud pretendia o
retorno ao gesto, a exploração dos sentidos, abarcando então a possibilidade sonora da voz, a
voz além da palavra.
Na segunda metade do século XX intensificam-se os processos de investigação e
descoberta dos recursos da voz, trajetória estimulada inicialmente pela atuação de
1 Para sua arte dos ruídos, Luigi Russolo criou os Intonarumori, novos instrumentos que faziam muito barulho e passaram a ser utilizados nos eventos provocativos, típicos dos futuristas (http://www.ears.dmu.ac.uk, acessado no dia 07.10.08).
2 “Os primeiros experimentos dadaístas podem ter sido alguns poemas de Tristan Tzara, que foram inspirados por versos africanos que haviam sido traduzidos. O resultado desta atividade foi a produção de “poèmes nègres”, construídos a partir de uma lingua africana fictícia. A qualidade de som gutural destas “palavras” levaram ao conceito de “poème des voyelles” e existem alguns poemas escritos entre 1913 e 1916 que enfatizam o aspecto acústico da lingua”(http://www.ennostahl.de, acessado em 22.05.07).
Outro representante do dadaísmo que desenvolve uma poesia experimental, provavelmente influenciado por Tzara, é Hugo Ball, fundador do Cabaret Voltaire. Surge aí o conceito de uma poesia fonética. Hugo Ball usa palavras enquanto som nas suas poesias. Esta idéia aparece também na Ursonate – Sonata primordial (1922-1932) de Kurt Schwitters. 3 “A poesia fonética, ou sonora, é aquela poesia que evita usar a palavra como mero veículo de significado, e a composição do poema ou texto fonético está estruturado em sons que requerem uma realizacão acústica. No entanto, diferencia-se da poesia declamada ou recitada tradicional através da introdução de técnicas fonéticas, ruídos e por seu caráter experimental. Nos poemas fonéticos, desenvolvem-se elementos básicos da música como intensidade, dinâmica, ritmo, cor timbrística, duração, etc. Não se trata de palavras e música, mas música das palavras através da mídia voz (Becker, 2008: 63).
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compositores como John Cage, Karlheinz Stockhausen e Pierre Boulez, entre outros. Nas
décadas de 60 e 70, o compositor Dieter Schnebel transforma o processo de investigação dos
recursos da voz e do aparelho fonador em tema de várias de suas obras. A voz distancia-se
cada vez mais da língua e do texto e novos parâmetros vocais são pouco a pouco
estabelecidos. Nos anos 70 surge um novo gênero artístico, conhecido como Performance Art,
que se caracteriza pela mixagem de diversas linguagens artísticas, deixando suas fronteiras
indefinidas e tendo a performance como sua principal forma de expressão. O corpo ocupa um
lugar de destaque nessas performances, organizadas muitas vezes a partir de pesquisa e
experimentação. O novo gênero transita entre as artes e revela compositores-performers, tais
como Meredith Monk, que explora o movimento do corpo e sua relação com a voz em ações
capazes de gerar suas criações e performances musicais. Meredith Monk consegue com muita
clareza definir sua estratégia de trabalho, ao dizer que opera entre as divisas, “onde a voz
começa a dançar, onde o corpo começa a cantar...” (Meredith Monk apud Jowitt, 1997: 2).
O corpo é investigado detalhadamente, desempenhando papel fundamental na geração
de vários eventos artísticos. A voz, como possibilidade do corpo, permanece em muitos casos
como elemento propulsor do processo criativo. A experimentação é fundamental nos
processos de criação com a voz. É quando as possibilidades da voz humana, por vezes
inusitadas, podem ser investigadas. A compreensão de que a voz tambem é um movimento do
corpo tem como consequência o fato de que a ação vocal deixa de se organizar a partir de
critérios estéticos pré-definidos, tais como afinação, passando a incorporar toda e qualquer
possibilidade de emissão sonora, já que esta é certificada pela estreita ligação com a
corporeidade. Podem então surgir sons diversos, assim como distintas formas de emissão
vocal. A improvisação vocal é uma das estratégias que se desenvolvem fortemente no âmbito
dos processos experimentais, configurando-se não apenas como estratégia de criação, mas
também como forma para descoberta das possibilidades da voz.
São muitos os que se dedicaram à pesquisa sistemática dos recursos vocais. Artistas
como, por exemplo, Demetrio Stratos e David Moss, desenvolveram linguagens próprias ao
percorrer uma trajetória de descoberta e exploração dos recursos da voz. Vozes femininas,
como as de Meredith Monk e Fátima Miranda, conseguiram chegar, a partir de processos
experimentais que exploram também a relação da voz com o corpo, a linguagens musicais
singulares. Além disso, o contato com outras culturas e tradições, facilitado pelo intenso
trânsito de informações da contemporaneidade, e a introdução constante de novas mídias e
tecnologias também influenciam os processos de criação, sendo fatores que podem resultar
em transformações significativas da voz no âmbito das manifestações artísticas.
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2. Tema da pesquisa
A partir do século XX, a voz passa a ser explorada com mais intensidade além do
canto e da palavra, tornando-se em alguns casos elemento fundamental para o
desenvolvimento de uma linguagem artística própria. O tema desta pesquisa é a natureza da
voz, especialmente sua qualidade performativa, examinando-se o papel especial que a voz tem
desempenhado no desenvolvimento de linguagens musicais singulares, constituídas a partir da
exploração sistemática de seus recursos intrínsecos, dando-se atenção especial à voz feminina.
É através do processo de investigação das possibilidades da voz que algumas mulheres
conseguem firmar-se como artistas criadoras. Tem-se como exemplo os processos de
Meredith Monk e Fátima Miranda, que embora se caracterizem por suas performances
multimídia, utilizam a voz como principal elemento propulsor de seus processos criativos.
Além dos caminhos que a própria voz oferece, a incorporação de elementos de outras culturas
passou a ser usual nesses processos de criação, assim como a influência cada vez mais
presente de novas tecnologias, transformando também a voz no âmbito da expressão artística,
fato que merece ser tema de reflexão.
3. Justificativa e Síntese da bibliografia fundamental
Com o advento dos meios eletrônicos e surgimento de inúmeras possibilidades de
registro, criação e transmissão sonora, a separação entre o som e sua fonte passou a ser um
fato cada vez mais frequente na nossa vida cotidiana. 4 Nas sociedades contemporâneas, o
som parece ganhar algo como uma vida própria, podendo ser ampliado, empacotado e enviado
para o outro lado do mundo, assim como ouvido repetidamente, inúmeras vezes. Embora essa
situação seja bastante comum na atualidade, não significa que passamos a ignorar as origens
dos sons. Ser capaz de detectar a fonte responsável pelos sons que ouvimos parece ser algo
valioso para nossa própria sobrevivência. No caso da voz humana, é comum remetê-la ao
corpo que supostamente a produz. Mesmo na era digital não deixamos de relacionar a voz a
uma corporeidade. Ao conectar a voz humana à sua fonte, tentamos constatar, entre outras
características, gênero e faixa etária de quem a produz. Tentamos reconhecer e procuramos
identificar “de quem é essa voz”. Tal qual uma impressão digital, ela pode ser uma marca do
4 Algo que foi denominado de “esquizofonia”, termo criado pelo compositor M. Schafer para designar especialmente a situação de separação entre o som e sua fonte de origem (Schafer, 1991: 172).
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indivíduo, de seu caráter único e singular. Timbre, tessitura, formas de emissão da voz são
características que, entre outras, determinam a expressão particular de cada indivíduo. Para
além desta natureza que confere singularidade, a voz carrega em si outras possibilidades, que
podem se expressar a partir de diferentes formas de emissão vocal, da investigação dos
inúmeros sons que é capaz de realizar e mesmo através da habilidade de imitação. A
descoberta de suas inúmeras facetas e de sua riqueza sonora permite ao indivíduo exercitar
sua habilidade de criar. A investigação a que tem sido submetida pelos mais diversos artistas,
sobretudo a partir do século XX, revela antes de mais nada a voz enquanto som, a voz além da
palavra. Supõe-se que nos processos de experimentação seja possível redescobrir a enorme
gama de sons vocais, reconquistando-se assim uma propriedade natural da voz humana,
adormecida pelas limitações das línguas faladas no cotidiano. A voz como material sonoro a
ser transformado, incorporando influências do meio e de outras culturas, transforma o
indivíduo num ser habitante dos “espaços entre”, ocupa e dissolve as fronteiras entre seu
corpo e o entorno. A voz é possibilidade de auto-conhecimento, mas também de encontro,
interação e troca. Ela é o próprio espaço de fronteira, as do corpo que a origina e entre pessoas
e povos. Por seu caráter performativo também habita as fronteiras entre as artes. Está na
música, na poesia, no teatro, no cinema … Voz é canto, texto, letra, fonema, mas antes que
tudo isso … é som, espécie de movimento do corpo. Forma do corpo entrar em ação, vibrar,
ressoar, projetar-se (a voz que “corre”), ocupar e criar espaço. Forma de se estar onde nosso
corpo não está. A voz implica em presença. Nos faz presentes. Pela sua qualidade sonora
representa a possibilidade de fusão de culturas, suas línguas, seus cantos, seus sons. A
redescoberta das possibilidades sonoras intrínsecas da voz gera desdobramentos junto aos
processos de criação artística, influenciando continuamente o surgimento de novas estéticas,
que merecem ser examinadas mais detalhadamente. Examinar os desdobramentos gerados
pela investigação da voz nos processos de criação de linguagens artísticas singulares é um
tema relevante e atual, visto o lugar especial que a voz ocupa nesse processo, pois mesmo
com a introdução de novas tecnologias que podem interferir na ação vocal, a voz relaciona-se
diretamente a uma corporeidade, promovendo o trânsito entre corpo e tecnologia.
Nas últimas décadas, performance e performatividade têm se transformado em novos
paradigmas para os estudos culturais, inaugurando um campo de pesquisas que pouco a pouco
vai se estabelecendo. Estudos sobre a performatividade da voz, sua qualidade e natureza são
ainda mais recentes. A reflexão sobre o caráter performativo da voz intenciona revelar a
importância desta especificamente junto a processos de criação musical, localizando-se
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também sua relação com o corpo, sua qualidade enquanto movimento do corpo responsável
pela criação de uma atmosfera de experimentação. Neste panorama destacam-se algumas
vozes femininas, que desenvolvem processos experimentais com corpo e voz e que vem se
afirmando como criadoras de linguagens musicais singulares. A escolha de Meredith Monk e
Fátima Miranda dizem respeito a essa relação do corpo com a voz nos processos criativos.
Embora construindo performances multimídia, essa relação continua a desempenhar papel
fundamental nas suas criações. Além disso são duas artistas contemporâneas, existindo a
possibilidade de um contato direto, que pode interferir positivamente na pesquisa.
Para iniciar a reflexão sobre a voz O Teatro e seu duplo de Antonin Artaud continua a
ser uma obra fundamental, trazendo o conceito da voz além da palavra, da palavra enquanto
som, uma voz que deve prioritariamente atingir os sentidos. Para pensar essa relação com os
sentidos e com o espaço pretende-se trazer o conceito de atmosfera, apresentado por Bernot
Böhme em Atmosphäre (1995) e Michael Hauskeller em Atmosphären erleben:
philosophische Untersuchungen zur Sinneswahrnehmung (1995). Este conceito será
introduzido para se pensar a voz como criadora de uma atmosfera de criação, assim como de
troca e interação.
Estudos sobre a performatividade da voz têm sido sistematicamente realizados na
Alemanha por um grupo liderado pela profa. Doris Kolesch no Institut für
Theaterwissenschaft da Freie Universität Berlin. Assim, a bibliografia básica relacionada à
performatividade da voz é proveniente deste grupo de estudos e de publicações da própria
Doris Kolesch.
Além de diversos trabalhos que abordam a performatividade da voz, Doris Kolesch
editou em 2004, juntamente com Jenny Schrödl, uma coletânea de artigos de diversos autores.
Com o título Kunst-Stimmen, estes têm como principal foco a relação da voz com a mídia e a
tecnologia. Outra publicação pertinente, editada por Doris Kolesch e Sybille Krämer em 2006
é Stimme, cujos artigos contemplam o fenômeno vocal a partir de enfoques diferenciados,
provenientes de diversas disciplinas.
A publicação Medien/Stimmen, editada por Epping-Jäger e Linz em 2003, é outra
obra, que traz diversos artigos sobre a voz, revelando sua crescente importância no contexto
dos debates sobre performatividade da atualidade, observando como esta tem atraído atenção
especial e se constituido em novo parâmetro também para os estudos teóricos.
Entre as obras que se dedicam à voz especificamente na criação musical, destacam-se:
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Stimme, uma série de trabalhos sobre voz, apresentados inicialmente na Conferência sobre
Voz, realizada em 2002 pelo Institut für Neue Musik und Musikerziehung Darmstadt e
publicada em 2003. Alguns artigos versam especificamente sobre a voz na improvisação e na
música experimental. Palestras e encontros com compositores como Dieter Schnebel também
estão aí documentados.
No Brasil destacam-se os trabalhos de Janete El Haouli sobre o cantor grego Demetrio
Stratos (2002) e de Heloísa de Araújo Duarte Valente sobre a musicalidade da voz (1999).
Sobre a trajetória de Meredith Monk existe o livro editado por Deborah Jowitt de
1997, que contém também depoimentos da própria artista. Sobre Fátima Miranda existem
alguns artigos, destacando-se a entrevista concedida a Theda Weber-Lucks, publicada na
revista Musik Texte em 2003. As duas artistas possuem websites, onde são atualizadas
informações sobre suas atividades, produção musical, performances e bibliografia.
Além da bibliografia específica sobre a voz, obras sobre improvisação musical
também fundamentam a pesquisa, podendo-se citar aqui Improvisation: its nature and
practice in music de Derek Bayle (1980), Klangspuren: Wege improvisierter Musik de Bert
Noglik (1990), assim como uma publicação especial do Institut für Neue Musik und
Musikerziehung Darmstadt, com o título Improvisation – Performance – Szene (1997),
coletânea de trabalhos apresentados em conferências e Generative Processes in Music: The
Psychology of Performance, Improvisation and Composition, editado por John Sloboda.
Outra obra importante nesta área é a tese de doutorado de Rogério Costa O músico enquanto
meio e os territórios da livre improvisação (2003).
4. Objetivos:
4.1. Objetivo Geral:
Refletir sobre a natureza da voz e seu aspecto performativo, especificamente no
âmbito dos processos experimentais de criação musical, apontando para a voz como uma
possibilidade de se promover a dissolução de fronteiras, seja do próprio corpo que a origina,
seja entre as diferentes linguagens artísticas.
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4.2. Objetivos específicos:
Desenvolver um laboratório de experimentação vocal, onde devem ser criadas
condições para o desenvolvimento de um processo improvisacional com a voz, tendo como
estímulos principais a ação física e a vivência de processos fundamentais, tais como a
respiração. Prática e teoria devem permear-se aqui na tentativa de estabelecer um espaço de
criação, conduzindo à reflexão sobre questões que o próprio fazer prático suscita.
Detalhamento dos objetivos:
• Investigar o processo de geração de um espaço de criação, no qual a improvisação com a
voz possa se desenvolver.
• Investigar o estado de contaminação e a eventual presença de processos miméticos no fazer
improvisacional com a voz.
• Explorar as possibilidades criativas da voz enquanto instrumento a partir de improvisações
estimuladas por ações físicas e pela vivência de processos fundamentais, tais como a
respiração.
• Pesquisar processos de desconstrução através da voz, assim como desenvolver práticas que
possam conduzir a voz a um processo criativo no âmbito da criação musical.
• Realizar registros sobre o processo sonoro.
• Refletir sobre o aspecto performático da voz e sua relação com os processos criativos.
• Refletir sobre a experimentação prática enquanto processo de criação.
• Refletir sobre as relações estabelecidas entre improvisação e espaço, improvisação e
inter(ação).
5. Plano de Trabalho e Cronograma
Primeiro Semestre Pesquisa bibliográfica.
Formação de um grupo de estudos para discussões teóricas e investigação prática sobre
improvisação e criação vocal.
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Segundo Semestre
Eventual estágio no exterior para complementação de pesquisa bibliográfica e coleta de dados
a partir da realização de entrevistas.
Continuação do trabalho com o grupo.
Terceiro Semestre
Continuidade do trabalho com o grupo de discussão e investigação prática.
Trabalho de redação: capítulo 1 e 2
Quarto Semestre Redação do capítulo 3
Revisão final do texto
6. Sumário Inicial da Pesquisa
I- Voz e Performatividade
1) A performatividade da voz: um debate atual
2) Voz: dimensão espacial e temporal
3) Ressonância e eco
4) A atmosfera e os sentidos (percepção auditiva e tátil)
5) Voz e respiração: o dentro e o fora (sopro / interação / material sonoro)
II- Vozes performáticas e processo de criação: experimentalismo e improvisação
1) A (re)volta da voz: expandindo limites, transgredindo códigos
2) Sopros, sussurros, berros e gritos: novos materiais, novas escutas
3) Corpo e Voz: improvisação e experimentação
4) O corpo cantante: Meredith Monk
5) As vozes da voz: Fátima Miranda
6) Voz e instalação sonora
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III- Voz e dissolução das fronteiras
1) O rastro da voz: entre presença e não-presença, entre público e privado
2) Mídia e novas tecnologias (digitalização, internet, celular): transformação e
perspectivas
3) Interpenetrando mundos, culturas e tradições: a voz globalizada
7. Procedimentos Metodológicos
A metodologia deste projeto de investigação apoia-se principalmente na pesquisa
bibliográfica. Como metodologia complementar pretende-se, na medida do possível, colher
depoimentos, viabilizar conversações e entrevistas com as artistas escolhidas, o que deve
gerar um rico material, completando assim a pesquisa bibliográfica e possivelmente
levantando outros aspectos do tema abordado.
Paralelamente deve ser organizado um grupo de estudos, a fim de se discutir questões
relativas à voz e aos processos de criação musical que se orientam a partir da voz. Neste
sentido pretende-se também propor uma investigação prática com o grupo, por se entender
que prática e teoria se interpenetram todo o tempo. Para tal deve ser criado um laboratório de
criação vocal, onde serão colocadas em prática diversas estratégias de improvisação e
experimentação vocal, que devem gerar uma documentação sonora do processo de
investigação proposto. A partir da prática, alguns aspectos e questões específicas podem ser
levantados e originar uma reflexão mais completa. Neste grupo de trabalho as obras das
artistas escolhidas, Meredith Monk e Fátima Miranda, também serão objeto de apreciação e
análise, assim como de outros artistas que também orientam seu processo criativo a partir da
voz.
8. Forma de análise dos resultados
A reflexão sobre a informação bibliográfica das questões e temas propostos deve
orientar a redação final, assim como incluir a apreciação dos eventuais depoimentos e
questões surgidas através da prática. A proposta é que este texto, produto final da pesquisa,
possa ser publicado como livro.
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9. Bibliografia Fundamental
ARTAUD, Antonin. O teatro e seu duplo. São Paulo: Max Limonad, 1984.
BAILEY, Derek. Improvisation: its nature and practice in music. Ashbourne; Derbyshire, Great Britain: Moorland Publishing, 1980. BECKER, Susie. A Voz Contemporânea. São Paulo: ECA, 2008. 213 p. Dissertação apresentada à ECA / USP. Mestrado. 2008. BIAL, Henry. (ed.) The Performance Studies Reader. New York: Routledge, 2007. BÖHME, Gernot. Atmosphäre. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1995. BRINKMANN, Reinhold. (Hg.) Improvisation und Neue Musik. Veröffentlichungen des Instituts für Neue Musik und Musikerziehung Darmstadt, Band 20. Mainz: Schott, 1979. CARRETON, Vicente. Fátima Miranda, las voces del mundo, un mundo de voces. In: Arte Contexto, Madrid, verano 2004, N.3, pp. 32-43. COOK, Nicholas. Analysing Musical Multimedia. New York: Oxford, 2004. COSTA, Rogério Luiz Moraes. O músico enquanto meio e os territórios da livre improvisacão. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2003. 178 p. Tese apresentada ao Programa de Comunicação e Semiótica / PUC. Doutorado. 2003. DERRIDA, Jacques. A Escritura e a diferença. São Paulo: Perspectiva, 2005. DUCKWORTH, William. Talking Music: conversations with John Cage, Philip Glass, Laurie Anderson, and five generations of American experimental composers. New York: Da Capo Press, 1999. EL HAOULI, Janete. Demetrio Stratos: em busca da voz-música. Londrina, PR: J.E.HAOULI, 2002. EMMERSON, Simon. (ed.) Music, Electronic Media and Culture. Aldershot, England: Ashgate, 2000. EPPING-JÄGER, Cornelia. LINZ, Erika. (Hg). Medien / Stimmen. Köln: Dumont, 2003. FÜRST-HEIDTMANN, Monika. Stimme(n) des ich des lebens der welt. In: Neue Zeitschrift für Musik. Mainz, März 2001, pp. 58-59. HAUSKELLER, Michael. Atmosphären erleben: philosophische Untersuchungen zur Sinneswahrnehmung. Berlin: Akademie Verlag, 1995. HEILGENDORFF, Simone. Experimentelle Inszenierung von Sprache und Musik: vergleichende Analysen zu Dieter Schnebel und John Cage. Freiburg im Breisgau: Rombach, 2002.
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