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Josep Gardenyes

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NOVASTECNOLOGIAS,a exploraçãoextraterrestree o futuro docapitalismo

Traduzido do espanhol colaborativamente por Editora Subta.Publicado originalmente na Espanha em 2015.

Publicação livre de direitos autorais. POR FAVOR COPIE E REDISTRIBUA.Copyleft

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Um dos assuntos mencionados em “Uma aposta para o futuro”, que foirecebido com ceticismo ou inclusive com risos, foi a afirmação de que acolonização do espaço sideral poderia ser a única forma para o capitalismosair das crises que tem gerado.

Gostaríamos de começar 2017 dedicando um pouco de atenção a essaafirmação.

Em 2017 será a entrega do Prêmio Lunar X, da Google. A corporaçãoestadunidense (tão importante para o capitalismo do século XXI como eraa Ford para o do século XX) oferece $20 milhões de dólares à primeira em-presa que conseguir enviar uma nave à Lua, conduzi-la por 500 metros so-bre sua superfície e transmitir imagens de alta definição para a Terra.Porém, isso tem que acontecer neste ano. Existem diversas equipes que es-tão trabalhando para conseguir realizar o desafio.

Uma delas é a Moon Express, que já conseguiu uma permissão legal dogoverno dos EUA para realizar explorações comerciais na superfície daLua. Se chegar a ela – e já possui o financiamento necessário e um calendá-rio de lançamentos de teste – não apenas ganharia o prêmio, como tam-bém levaria uma carga comercial que representaria o primeiro passo parainiciar um serviço de entregas de equipamentos à Lua, o que tornaria fac-tível a mineração na superfície lunar de hélio-3 (um combustível valiosopara os reatores nucleares).

Outra empresa, a Planetary Resources, diz que a mineração de metais eágua em asteroides poderia ser um negócio de trilhões de dólares. Para ela,a água (e seu hidrogênio, que pode servir de combustível para naves espa-

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ciais) “é o petróleo do espaço sideral”. Essas não são palavras vazias. Ela émais uma empresa com planos de negócios e a tecnologia necessária paracomeçar a realizar as explorações imaginadas.

Em 14 de janeiro de 2017, a Space X voltou ao espaço. Ela é uma dasempresas de Elon Musk (aquele que também está preparando veículos au-tônomos – ou seja, robóticos ou autoconduzidos – para venda comercial; atecnologia já funciona sendo que o único obstáculo são as regulamentaçõeslegais), o bilionário que tem como cruzada pessoal a colonização de Martenas próximas décadas. A empresa consertou um erro no desenho de seusfoguetes e no dia 14 empreendeu um lançamento bem-sucedido. Lançou 10satélites comerciais de um mesmo foguete, o qual, posteriormente, voltouà Terra automaticamente, aterrissando em um navio-drone da Space X queo esperava – com uma tripulação totalmente robótica – no meio do oceanoPacífico. Os foguetes autônomos e reutilizáveis (daria para dizer, ecológi-cos) são um dos fundamentos do plano de Musk para chegar em Marte. Elejá traçou um plano de negócios para desenvolver a tecnologia e conseguiros recursos para cumprir a missão.

Essas não são empresas isoladas ou insignificantes. O Estado também es-tá prestando atenção à colonização extraterrestre. O Tratado do Espaço Si-

"De volta à lua. Para sempre." — anúncio publicitário do Google.

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deral da ONU de 1966, que diz que não se poderia armar nem apropriar comoterritório o espaço nem os objetos espaciais, e que qualquer atividade eco-nômica teria que ser pacífica e para o bem de toda a humanidade. Em 2015,na Lei sobre a Competitividade de Lançamento Comercial Espacial (Commer-cial Space Launch Competitiveness Act), o governo dos EUA deu forma à questãolegal, estabelecendo o direito legal para empresas privadas explorarem aLua, os asteroides e outros objetos espaciais. A lei cede às entidades privadaso direito de explorar e vender o produto de tais objetos, mas não de se apro-priar do objeto em si. Com efeito, se poderia minerar a Lua até esvaziá-la,mas as empresas privadas com suas fábricas robóticas não poderiam se con-siderar as proprietárias.

As bolhas

A bolha dos dotcom*, que estourou no ano 2000, demonstra que se podeinvestir um capital imenso em empresas que não geram nenhum lucro du-rante vários anos antes que a bolha estoure (nesse caso, foram seis anos).De fato, ela não estourou até o momento em que novas corporações mos-traram a capacidade de tornarem-se rentáveis e produtivas, corporaçõesque hoje em dia estão entre as mais poderosas do mundo, como Google,Amazon e Facebook. Estamos no começo de uma fase de investimento ecrescimento massivos no novo setor de transporte e exploração extrater-restre. Os empreendedores capitalistas deste setor possuem a vantagem deque a base logística para seu sonho (tudo o que está ligado com lançamen-to de satélites, com seus imprescindíveis usos militares e comerciais) já es-tá corrente e rentável. De forma parecida, Colombo não teve que inventar

* N.d.T.: A bolha da Internet ou bolha das empresas ponto com foi uma bolha especulativa criada no fi-nal da década de 1990, caracterizada por uma forte alta das ações das novas empresas de tecnologiada informação e comunicação (TIC) baseadas na Internet. Essas empresas eram também chamadas“ponto com” (ou “dot com”), devido ao domínio de topo “.com” que consta no endereço de muitasdelas na rede mundial de computadores.

No auge da especulação, o índice da bolsa eletrônica de Nova Iorque, a Nasdaq, chegou a alcançarmais de 5000 pontos, despencando pouco tempo depois. Considera-se que o auge da bolha tenhaocorrido em 10 de março de 2000. Ao longo de 2000, ela se esvaziou rapidamente, e, já no início de2001, muitas empresas “ponto com” já estavam em processo de venda, fusão, redução ou simples-mente quebraram e desapareceram. Fonte: wikipedia.org.

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os barcos de longas travessias nem os instrumentos de navegação (os quaisjá haviam sido desenvolvidos pelos portugueses nos luxuosos circuitos decomércio do Oriente Hindu), mas simplesmente dar-lhes um uso mais ex-tremo.

Elas têm alguns anos para produzir lucro com a exploração extrater-restre antes de que a bolha estoure. Se conseguirem, o capitalismo voltaráa experimentar um crescimento intensivo e o momento de máxima vulne-rabilidade das instituições e de máxima raiva popular terão passado.

A colonização extraterrestre não é mais um tópico da ficção científica.Mas falando em ficção científica, temos que assinalar também a grandeprodução de imaginários feita por Hollywood e outros centros de trabalhocultural, que joga nossa atenção para a colonização do espaço. Desde o sé-culo XIX, de vez em quando tem aparecido obras que concebem viagenspara fora da Terra, mas a atual produção cultural frenética não é qualitati-va nem quantitativamente comparável. Ela tem como efeito não apenas a

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normalização da atividade extraterrestre mas também nos acostuma aimaginar como seriam os primeiros passos para levar nossa civilização e aeconomia capitalista para além da força de gravidade da Terra.

Estamos no ápice de um acontecimento tão importante para o avançodo capitalismo e para a guerra contra a vida como foi a colonização dasAméricas. Como Bob Richards, chefe da Moon Express, disse “agora esta-mos livres para zarpar como exploradores do oitavo continente da Terra –a Lua – em busca de novos conhecimentos e recursos para expandir a esfe-ra econômica da Terra para o bem de toda a humanidade.”

Diante dessa nova realidade em construção, o que temos que fazer?A fetichização das novas tecnologias, muito comum em certos círculos de

antagonistas sociais, é a auto-traição mais cruel possível, comparável à cele-bração racista e míope do colonialismo brindado por Marx e seus aduladores.

Luddismo

O luddismo* não tem que ser uma recusa de “toda a tecnologia” (enten-dida como toda ferramenta que os seres humanos têm desenvolvido nos úl-timos cem mil anos) e, de fato, os primeiros ludditas, tergiversados por Marxe outros progressistas, não rechaçaram as técnicas artesanais que lhes per-mitiam manter o controle sobre sua atividade produtiva, mas rechaçaram asimposições tecnológicas que beneficiaram os proprietários e que mudaramviolentamente suas formas de vida. E rechaçaram também o poder policialque possibilitava aquelas imposições. Piratear, hackear e reapropriar tecno-logias é uma corrente vital que poderia existir num conflito fértil com as

* N.d.T.: O ludismo (ou luddismo) foi um movimento que ia contra a mecanização do trabalho propor-cionado pelo advento da Revolução Industrial. Adaptado aos dias de hoje, o termo ludita (do inglêsluddite) identifica toda pessoa que se opõe à industrialização intensa ou a novas tecnologias, geral-mente vinculadas ao movimento operário anarcoprimitivista.O neo-ludismo é um movimento sem lideranças formado por grupos sem afiliação que resistem às tecno-logias modernas e pregam o retorno de algumas ou todas as tecnologias para um estágio mais primitivo.As pessoas neo-luditas são caracterizadas por uma ou mais das seguintes práticas: abandono passivo douso da tecnologia, ataque àqueles que produzem tecnologia, defesa de uma vida simples, ou sabotagem detecnologia. O movimento neo-ludista moderno possui conexões com o movimento anti-globalização, oanarco-primitivismo, o ambientalismo radical e a Ecologia Profunda (Deep Ecology). Fonte: Wikipedia.org.

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correntes mais naturistas. Mas a adulação populista de toda nova tecnologiaque poderia ser-nos de qualquer forma útil é um gesto de apoio acrítico aoEstado e ao capitalismo.

Um primeiro passo é a elaboração de uma crítica, e sobretudo de umaprática subversiva, com respeito às novas imposições tecnológicas sobre nos-sas vidas.

Também nos enfrentamos com a tarefa teórica de conceber como estasmudanças afetarão o capitalismo. Como afirmamos nas “23 teses”*, o regi-me de propriedade que define a sociedade de classes já está caducando. Oespaço sideral – por exemplo, uma Lua sem proprietário, mas com muitosexploradores – poderia ser o terreno ideal para dar início a um novo regi-me de exploração, baseado no uso e acesso e não na propriedade (uma re-lação demasiado estável para o gosto do Estado e dos financistas).

As reclamações contra as máquinas e a sua substituição em relação àmão de obra humana, já eram normais. Mas foi em 1811, na Inglaterra, queo movimento operário estourou, ganhando uma dimensão significativa.

Trabalhos e robôs

Outro assunto é o do trabalho. Diversos socialistas do século XIX con-fundiram-se e fizeram a previsão de que os avanços tecnológicos significa-riam a estreia de uma sociedade de ócio e abundância. Que não cometamoso mesmo erro teórico agora. O Estado inventa trabalho para nos ocupar. Arentabilidade é uma necessidade secundária. O trabalho produtivo no es-paço sideral será sobretudo robótico. Isso faz parte da mesma tendência derobotização do trabalho industrial na Terra. Mas essa robotização não sig-nificou absolutamente uma redução na mão de obra humana em escalaglobal. Significa, ao contrário, uma ampliação do trabalho assalariado hu-mano nos setores de serviços, cuidados, trabalho sexual, engenharia e proje-to. Os últimos dois serão o terreno dos trabalhadores privilegiados, o capitalintelectual pelo qual competirão os Estados, os produtores de mercadoriasetéreas da nova economia (estamos pensando nos empregados da Google eda Apple, das corporações antigas que se adaptaram à nova economia ou daspequenas startups, que produzem programas, estéticas e sistemas).

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Os outros – serviços, cuidados, trabalho sexual – são tarefas geralmentede mulheres e que agora irão se tornar mais generalizadas. Qual será oefeito, para o patriarcado, da monetização e generalização das tarefas queantes não eram remuneradas e que definiam o que vinha a ser uma mulhere a segregação patriarcal? Deixamos a respostas às companheiras maisperspicazes, mas, de passagem, podemos apontar por um lado as novas leisem diversos países democráticos que cedem certos direitos às pessoastrans e, por outro, o contra-ataque das instituições patriarcais dentro doamplo auge da direita.

O primeiro acontecimento reconhece, de forma estritamente limitada,a mutabilidade do gênero, contradizendo assim uma das bases do patriar-cado. Atualmente, a ala progressista do Estado apresenta o gênero comomais uma opção consumista, desativando assim os elementos mais confli-tivos da transgressão de gênero. Mas é uma contradição que não pode semanter permanentemente. Portanto, é diferente da vitória do feminismoreformista que ganhou direitos políticos laborais para “a mulher” ao custoda perda dos espaços femininos autônomos, um quid pro quo* que preser-vou o poder das instituições. Naquela mesma linha, podemos anotar que,contra o progresso atrasado da igualdade de salários, apoiado minima-mente pelas instituições, as novas tarefas bem remuneradas estão todas nosetor firmemente masculino da informática.

Escravidão

O capitalismo sempre dependeu da escravidão, mas a posição da escra-vidão dentro dos processos produtivos e reprodutivos vai mudando, mui-tas vezes como resposta à nossa resistência (abolição da escravidão visíveldentro das democracias, movimentos feministas pela valorização do tra-balho reprodutivo, lutas autônomas dentro das fábricas automobilísti-cas…). Aquilo que ontem era uma esfera de trabalho não remunerado,amanhã será assalariado e vice-versa. A tarefa feminina entra no mercado

* N.d.T.: Quid pro quo é uma expressão latina que significa “tomar uma coisa por outra”. Refere, no usodo português e de todas as línguas latinas, uma confusão ou engano. wikipedia.org)

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laboral e a tarefa produtiva volta a ser um trabalho não remunerado. Masdesta vez, os escravos são robôs e sua atividade é 100% legível†, racionali-zada e vigiada: estão sob o controle do Estado. A transição não será nemimediata nem homogênea. Seguramente, se passarão décadas antes que ossetores da madeira, do chocolate e outros nos países mais pobres tornem-se rentáveis para que se substituam escravos humanos por robôs.

A tendência da robotização tornará inquestionável tanto nossa incapa-cidade de tomar os meios de produção quanto a impossibilidade dessaproposta. A maioria dos trabalhadores produtivos serão robôs e os outrosformarão a camada mais privilegiada de explorados. Essa realidade já seassentou em grande parte da produção automobilística, o processo indus-trial que definia a época anterior do capitalismo. As empresas automobi-

† N.d.T: O termo “legível” parece se referir à forma como o poder no topo de uma hierarquia conseguever ou ler os processos da sua base e alterá-los ou cooptá-los.)

Montadora da BMW, altamente robotizada.

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lísticas mais modernas e as empresas de equipamentos informáticos jápossuem fábricas majoritariamente robotizadas, fabricando produtos ide-alizados por engenheiros e projetistas bem remunerados, os trabalhadorescom formação de alto nível mediante múltiplas carreiras, que entendemsua tarefa como a materialização do seu ser, gente ligada aos meios deprodução e leal ao capitalismo.

Entretanto, isso será mais acentuado no espaço sideral, onde quase100% da força de trabalho será robótica, empregada na mineração de com-bustíveis (energia verde como as células de hidrogênio e a nuclear) quepropulsionarão o próximo ciclo de acumulação do capital. E aquele ciclo sedefinirá como a extensão dos circuitos produtivos a um novo território: aLua, o cinturão de asteroides e Marte. Assim, o terreno será preparado pa-ra o ciclo seguinte de acumulação, no qual, este sim, poderá envolver maismão de obra humana: a terraformação ou povoamento de Marte (seguindoo padrão identificado por Arrighi, um ciclo de expansão geográfica e insti-tucional, seguido de outro ciclo que intensifica a exploração e o controledentro do terreno anteriormente colonizado).

Os meios de produção são e sempre foram uma máquina de devastação.Não os queremos e agora nem poderíamos propor sua expropriação. Noséculo XXI, não nos resta nenhum outro meio ao não ser reivindicar e pra-ticar a recuperação dos conhecimentos e capacidades artesanais que colo-cam a vida e a sobrevivência, numa escala sã e natural, ao alcance de todomundo. Mas, esse caminho de luta, como qualquer outro, já está cheio dearmadilhas. A principal delas é a comercialização. Com mais consumidoresprivilegiados – os projetistas, programadores, arquitetos de sistemas -, po-de-se sustentar mais produtores artesanais, sobretudo quando os gostosdaqueles demonstram uma marcada preferência pelo “eco” e o local.

Agricultura

Consideremos o exemplo da agricultura. Num futuro próximo, é factí-vel que a eficiência energética (quantas calorias de energia são necessáriaspara produzir uma caloria de alimento) se converta numa medida para dar

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valor ao uso do capital. Uma agricultura mais sustentável, mas eficientequanto ao uso energético, teria que substituir as máquinas e o petróleo pormais mão de obra humana. Perante o perigo de uma população sem em-prego, os capitalistas – e por que não, o Estado – sempre têm que inventarnovas formas de trabalho. E a crise ecológica se mostra cada vez mais gra-ve. Uma possível solução seria que o capitalismo fomentasse a agriculturalocal, aproveitando-se de suas novas capacidades de descentralização.Desse modo, daria grandes passos à frente para solucionar a crise ecológica(criada em grande parte pela agricultura industrial), daria emprego a maispessoas, ofereceria aos consumidores privilegiados um produto-fetiche ecolonizaria a agricultura de pequena escala, transformando-a em uma ati-vidade legível e comercial quando antes sempre foi uma fonte de resistên-cia e autonomia.

Nos países mais pobres, na ausência de muitos consumidores privilegi-ados e um Estado forte, as ONG poderiam administrar o processo, e na ver-dade, já estão o fazendo. Nos EUA, onde a população envolvida numaagricultura hiper-industrializada já havia caído abaixo de 1%, esta mudan-ça para o crescimento agrícola mediante a produção em pequena escala jáestá se produzindo. Feiras de Produtores, sobretudo nas zonas de muitaprodução informática, já saíram do esquecimento e estão fazendo cada vezmais parte do cotidiano.

Ludismo

O novo artesanato, para ser subversivo, teria que ser ludita, baseado empráticas de sabotagem e em redes ilegíveis (quer dizer, opacas vistas de cima), detrocas qualitativas (quer dizer, economias de dádivas, como nas coletivizaçõesmais radicais durante a Guerra Civil Espanhola). Mas hoje em dia, as máquinasmais relevantes para serem sabotadas não são os teares mecânicos, mas asmáquinas sociais, as que mediam a comunicação, produzem e controlam as re-des de socialização e sociabilidade, e definem uma maneira de ser no mundo.

Não podemos continuar utilizando argumentos de conveniência. O capi-talismo também é mau nos momentos de bonança; a tecnologia capitalista

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também é má quando funciona bem e não provoca nenhum desastre espe-cífico. O único caminho de ataque discursivo que nos resta é o enfrentamen-to direto com a espiritualidade cristã que tanto a ciência como o socialismoherdaram: o mundo, o universo, não existem para a nossa exploração. Nãoexiste nenhum argumento racionalista (nem dentro dos parâmetros da cor-rente mais radical do liberalismo, que é o veganismo) contra a mineração daLua. Nenhum ser humano será ferido, ou outro animal, e segundo o raciona-lismo, todo o resto é matéria morta. Os únicos argumentos sólidos contra asnovas atrocidades são espirituais. São argumentos que afirmam que a Terraé nossa mãe e que deveríamos nos adaptar aos processos naturais em vez demodelá-los segundo nossos caprichos arrogantes; que encher a Terra ou aLua de buracos em busca de minerais valiosos é tão imperdoável como mas-sacrar um povo inteiro. Aqueles que se aproveitaram de argumentos cien-tíficos para justificar o genocídio, a escravidão, a mineração e o corteindiscriminado de florestas inteiras são os mesmos, e suas instituições são asmesmas, que aqueles que hoje em dia estão celebrando a iminente conquistada Lua e de Marte. E as tecnologias que nos levarão até lá (os foguetes) foramdesenvolvidas pelos nazistas no curso do mesmo Holocausto que o liberalis-mo tão hipocritamente repudia, sem nunca repudiar seus frutos. Mas temosacatado o humanismo durante tanto tempo que já não podemos levantarnossas vozes em protesto contra uma atrocidade onde não haverá vítimashumanas. Mas nem as pessoas desgraçadas que não acham ruim em si a mi-neração da Lua podem negar que qualquer introdução de novos recursos àmaquinaria capitalista irá acelerar os processos que estão criando uma soci-edade-prisão aqui na Terra.

A escolha é entre o ecocentrismo e o totalitarismo.

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