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Módulo Convergência de Mídias e Web 2.0.Atividade 3 (ref. Etapa 4).

Atualmente, os projetos didáticos procuram promover noções de “autonomia” e “interdisciplinaridade”, mudanças nas formas de “ensinar e aprender” e modernização do “currículo”. As possibilidades que as mídias colaborativas apresentam, bem como as práticas derivadas da convergência midiática, podem favorecer estas questões? Por quê?

Adrian Corbó

Já em oportunidades anteriores tenho defendido uma categoria de escola que eduque de maneira democrática, livre e cooperativa. O ensino chamado de “tradicional”, muito mais preocupado com a simples transmissão de conhecimento, parece-me cada vez mais obsoleto, passível de imediata releitura e substituição. Entretanto, quando o assunto a ser tratado é o uso de quaisquer tipos de artifícios educativos, a dificuldade na qual se esbarra é justamente o arcaísmo de diversas instituições de ensino hoje existentes em nosso país.

Muitas vezes vistas como inimigas do processo de aprendizagem, as tecnologias são logo barradas, proibidas, simplesmente impedidas ao uso dos estudantes e professores. Contrariamente ao empreendimento de análises, pesquisas, investigações de possibilidades de uso tecnológico, dentro e fora de sala de aula, as instituições de ensino baixam normas que, de modo muitas vezes autoritário, tão somente as vetam, ao invés de regulá-las.

Deste modo, possibilidades de crescimento da autonomia, ou seja, a produção do conhecimento pelos próprios alunos, hoje inseridos em uma lógica a que chamamos de “rede social”, fica limitada ao sabor das normas restritivas. Para muito além do debate entre o modelo tecnicista e o espontaneísta, devemos refletir sobre a escola como um espaço que não se adapta às mudanças que, após a Revolução Industrial, estabelecem-se de modo cada vez mais acelerado. Hoje, em uma sociedade pós-Moderna, a transformação não é mais uma exceção (ou mera seção da realidade vivida), é justamente o estado das coisas, o modo de operação da realidade, ou sua própria manifestação.

Claro, não defendemos aqui uma perspectiva na qual a escola deve girar sempre conforme a corrente, aceitando em seu interior tudo aquilo que se oferece como viável, ou simplesmente como desejável, na sociedade hodierna. É a escola precipuamente um espaço de debate, discussão, resistência, crítica, reflexão. Todavia, ao não indagar acerca das inovações tecnológicas e seus possíveis papeis educativos, a escola, igualmente, imiscui-se de sua função essencial desde o Iluminismo, a saber, a ação social.

Território educativo por excelência, é da escola que deveriam partir as reflexões acerca do mundo, não o inverso. Em muitas das entrevistas com meus alunos (executo-as de modo rotineiro, apesar da ausência de material de registro), é comum a aparição de comentários que se referem à escola como jurisdição do impedimento, da ausência de diálogo, da opressão.

A título de exemplo, cito uma conversa que empreendi recentemente com uma de minhas alunas de Ensino Médio. O assunto girava em torno do comportamento que a juventude atual possui nas redes sociais, em específico, assim como na internet, de modo geral. O público alvo de nossa discussão se referia às chamadas gerações Y e do Milênio. Toda a reflexão se deu fora do âmbito da sala de aula, e uma frase dita por ela, tipificando toda a ansiedade própria da juventude presente, destacou-se:

“Existe algum curso que só estude o comportamento na web? Eu largaria tudo e estudaria só isso para o resto da vida!”

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Não deveria ser a escola justamente a avenida para a discussão do presente? Como empreender tal reflexão sem fazer uso das linguagens mais acessadas e manipuladas pelos seus públicos alvos?

É neste sentido que abarcamos a noção do uso tecnológico como promotor de:

1. Autonomia: Se utilizamos em sala, ou fora dela, dependendo do contexto, a linguagem midiática mais familiar ao aluno, promovemos um espaço democrático de discussão. Ao sairmos no nosso território tradicional do giz e da lousa, criamos desconforto para nós mesmos, propiciando ao estudante uma vantagem de inserção, de execução e de criação do próprio conhecimento.

2. Multidisciplinariedade: A convergência midiática possibilita o rompimento tradicional da estrutura da sala de aula. É possível abandonar as quatro paredes que costumam cercear o compartilhamento de ideias entre profissionais de diferentes áreas do conhecimento. As mídias atuais são essencialmente instantâneas, permitindo o compartilhamento quase que infinito de informações. Por que não usar a ferramenta de modo racional e educativo?1

3. Novas formas de ensinar e aprender: Não pensamos a educação como um instrumento que reproduza irrefletidamente a instantaneidade e efemeridade da juventude hodierna. Porém, dentro de nossa expectativa educativa, a escola não pode se afastar da sociedade, muito menos da juventude, deve ir ao encontro dela, de suas linguagens, de seus instrumentos de comunicação. A partir dessa navegação é que deve questionar ou perpetuar seus paradigmas. Os métodos escolares de ensino não são um a priori, que devem ser mantidos como quem guarda uma torre, ou marca um território. A escola deve aprender com o que muda, justamente para ensinar como lidar com as mudanças. A educação não deveria ser apenas curricular, sim plena, orgânica. Como lidariam, por exemplo, as escolas atuais com o problema posto na citação a seguir, caso insista em ignorar a geração atual?

“O excesso de informações e possibilidades está fazendo essa jovem geração ter ansiedade crônica. Está se tornando mais necessário que eles escolham os filtros certos, para organizarem suas experiências, com tanto conteúdo e pessoas em suas vidas”.2

4. Currículo: Se partimos do pressuposto de que as escolas atuais, em sua maioria, defendem a noção tecnicista de ensino, segundo a qual o professor é um transmissor de conhecimentos, quase que onisciente, a montagem do currículo dos discentes é organizada de modo a prepará-lo para o ingresso em uma faculdade de renome, assim como imputa ao aluno as regras da sociedade do trabalho, essencialmente corporativa e agenciadora de compromissos. Mas, por outro lado, o que se abandona, geralmente, é justamente o arranjo para a vida universitária em si, assim como as novas realidades mercadológicas, elas mesmas em franca mutação.

“É possível ser surfista, DJ, roqueiro, nerd, cinéfilo, designer, ao mesmo tempo. Estamos falando da mais plural geração jovem da

1 Poderíamos citar, como exemplo do que já deu certo, o trabalho integrado realizado por dois professores de uma escola particular em São Paulo. Um deles é este que vos escreve, a outra é a Professora Ana Carolina. Séries de seminários que relacionam Biologia e Geografia foram empreendidos pelos alunos, em aulas completamente multidisciplinares. As proposições destes trabalhos podem ser lidas em: http://aulaimpressa.wordpress.com/trabalhos-integrados-biologia-e-geografia/ e http://professoraanacarol.wordpress.com/ (nas abas “1º Mèdio”; “2º Médio” e “3º Médio”).2 Filme: "We All Want to Be Young". Roteiro: Maciel, Lena; Liedke, Lucas; Rodrigues, Rony. Em: http://www.youtube.com/watch?v=ZidBmzFFSyk.

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história. (...) Isso também é visível em seu trabalho, onde tradicionais planos de carreira e sistemas hierárquicos estão perdendo força. Cada vez mais, eles querem unir trabalho com prazer”.3

Destarte, qual o papel da escola aqui? Sejam quais forem as possibilidades, não acreditamos que elas estejam na insistente autoproteção dos métodos que já deram certo no passado. É o momento de a escola se restaurar. Não somente seguindo a maré das mudanças, mas refletindo sobre elas, dialogando com uma linguagem que muda a cada ponteiro do relógio.

3 Filme: Filme: "We All Want to Be Young". Op. cit.