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Page 1: Web viewGIANNETTI, Eduardo. VÍCIOS PRIVADOS, BENEFÍCIOS PÚBLICOS? Capítulo 3: Moralidade cívica e moralidade pessoal. Introdução . Eduardo Giannetti

GIANNETTI, Eduardo. VÍCIOS PRIVADOS, BENEFÍCIOS PÚBLICOS?

Capítulo 3: Moralidade cívica e moralidade pessoal

Introdução

Eduardo Giannetti introduz o capítulo apresentando um problema de “emergência”. Na presença de um perigo o ser humano fica mais “alerta e atento a mudanças no ambiente e estimula ações impulsivas de respostas ao perigo” (pag. 99). O autor nos mostra dois tipos de “emergências”:

Emergência individual: o comportamento instintivo aumenta as chances de sobrevivência.

Emergência coletiva: o comportamento instintivo diminui as chances de sobrevivência.

Para exemplificar a definição de emergência coletiva, Giannetti utiliza-se de um incêndio em um cinema. Para fugir da morte “os espectadores buscam de modo atabalhoado escapar o mais depressa possível” (pag. 99), fazendo que no fim o “saldo de mortos e feridos é maior do que poderia ter sido” (pag.100). Ou seja, o problema de coordenação entre os espectadores e a falta de uma liderança que pudesse orientá-los fez com que houvesse fins indesejáveis para a sociedade como um todo. A ordem social portanto tem exatamente a ver com a definição de emergência coletiva. É necessário restrição e liderança para que haja ordem social.

Essa importância no “valor de sobrevivência da obediência às normas sociais e aos governantes” (pag. 101) que o autor vai definir como moralidade cívica. O exemplo do cinema mostra que a ausência de moralidade cívica naquele contexto trouxe “resultados nefastos para os envolvidos” (pag. 100). Porém o excesso de moralidade cívica parece estratificar uma sociedade. Está posto portanto o problema principal do capítulo: Até que ponto vale à pena abrir mão da liberdade individual em detrimento de uma convivência harmoniosa?

Giannetti apresenta a partir desse problema a tese de seu capítulo: “se o fogo queima e destrói, o gelo paralisa e petrifica. Duas ameaças simétricas. Se o individualismo sem peias leva à anarquia suicida, o coletivismo leva à apatia, ao conformismo e à estagnação” (pag.103) , ou seja, o excesso de moralidade cívica é uma ameaça tão real quanto sua ausência.

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Ele vai desenvolver seu argumento em base em duas vertentes, a filosófica e econômica, para provar que o equilíbrio entre moralidade cívica e moralidade pessoal é o melhor caminho para o sucesso de uma nação.

Desenvolvimento

[A] Vertente filosófica

Eduardo Giannetti apresentará argumentos que mostram o perigo do coletivismo.

1. Nietzsche “... lançou um protesto vigoroso e incisivo contra a submissão do indivíduo à pressão castradora da moralidade cívica” (pag.103). Nietzsche dizia que em excesso a ordem social transforma os seres humanos em ovelhas de um rebanho.

2. John Stuart Mills “defendeu a importância da diversidade de opinião, da experimentação moral e da liberdade de escolha como valores essenciais da existência humana” (pag. 104). Ele categorizou os “inimigos da liberdade individual” em três tipos:

a) a tradição b) o abuso do legislativoc) a pressão da maioriaMills dizia que a tendência moderna é a expansão de b) e c), ou seja, a

autoridade política utiliza-se das leis para domesticar uma sociedade e o todo mina a liberdade das partes.

3. Tocqueville “a análise de Tocqueville privilegia não tanto a pressão da opinião pública ou a tirania da maioria sobre o indivíduo, mas a expansão insidiosa de uma autoridade estatal ... restringe a autonomia e amolece a vontade individual” (pag. 105). Tocqueville analisa o efeito de um estado controlador e que intervêm demasiadamente nos assuntos de interesse privado. Analise feita a partir de um contexto de um estado controlador francês, ele mostra como isso é prejudicial para a sociedade francesa como um todo.

4. Bertrand Russell analisa também o estado totalitário: o “bem-estar deve estar subordinado a uma totalidade mística que é simples disfarce para o interesse dos dominadores” (pag.106). O excesso de autoridade não é uma aberração na história humana, basta olhar regimes totalitários como a Alemanha nazista ou o império espartano.

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O autor faz uma digressão baseada na “proposta de Huxley discutida na introdução” (pag. 108) do livro: “Por que não trocar a liberdade falível de cada indivíduo pelo automatismo infalível do todo? Por que não optar por uma ordem social controlada e dirigida de cima sem falhas?” (pag. 108)

A resposta depende de um juízo de valor:

Se o valor do todo independe do valor das partes, então tudo bem uma sociedade diri- gida de cima.1 dilema

Se o valor do todo é idêntico ao das partes então uma sociedade de autômatos não tem valor.

Os argumentos de cunho filosófico ajudam em muito em teorizar o sentido da moralidade cívica. Porém falta-lhes praticidade. “Quais são, afinal, as conseqüências praticas do coletivismo? Até que ponto se poderia esperar que a maior ou menor extensão da autoridade política e da moralidade cívica seja favorável a promoção do conforto e bem-estar material? A resposta, seja ela qual for,dependerá de um argumento econômico” (pag. 111). Giannetti vai apresentar premissas de vertente econômica para chegar na conclusão de sua tese.

[B] Vertente econômica

1. Adam Smith o grande problema em sociedades complexas é a coordenação entre produtores e consumidores. Há duas soluções: um estado controlador ou um sistema de preços;

Ineficiência e redução “mão-invisível”. Aloca do bem-estar social, os recursos de maneira gerando uma escalada onde os compradores eintervencionista. vendedores ficam suscetíveis a preços e tem suas liberdades de escolha garantidas.

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Lembrando que Smith nunca rejeitou a presença do Estado. Ele é necessário para que seja assegurado o mínimo legal, o direito à propriedade e a justiça.

O argumento de Adam Smith sobre o livre mercado se encaixa perfeitamente na tese de Giannetti sobre moralidade cívica e moralidade pessoal.A liberdade deve ser coordenada por um livre mercado com um Estado minimamente intervencionista, que cuide apenas do bem-estar social.

“O argumento filosófico contra o coletivismo afirma o valor moral do indivíduo e opõe-se aos excessos de autoridade e da moralidade cívica. O argumento econômico contra o dirigismo afirma a ordem espontânea e opõe-se às distorções e ineficiência causadas pela ingerência da autoridade estatal no funcionamento da economia ... O que falta analisar agora é a questão da qualidade dos jogadores que atuam dentro dessas regras” (pag. 124). Ou seja, como se portam e quais são as características dos indivíduos que pertencem ao jogo econômico. Giannetti vai demonstrando a partir de argumentos filosóficos que o homem é um ser racional que sempre buscou melhorar de vida e um certo conforto material.

Giannetti antes de concluir o capítulo faz uma reflexão sobre a validade e o cumprimento da justiça: é a “condição mínima de existência da ordem social” (pag.135). Sem ela os indivíduos não têm incentivos para investir no processo produtivo pois tem receio que a propriedade, por exemplo, não esteja segurada. “Sem justiça, em suma, não há ordem social na qual se possa existir, ganhar a vida ou tentar amar, criar e ser bom” (pag. 135). A justiça é algo que deve ser assegurado pelo Estado. Voltamos ao ponto de dosagem de moralidade cívica em uma certa sociedade. Na ausência de uma autoridade que coordene cairimos na “fogueira hobbesiana”, na anarquia social. No extremo oposto, o excesso moldaria a sociedade fazendo com que seus indivíduos sejam apenas peças de um tabuleiro e sacrificando a liberdade pessoal.

Conclusão

“A vida comunitária organizada possui exigências próprias. A ordem social requer a adesão a normas que estabeleçam as regras mínimas da justiça”

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(pag.135). Para que possa haver coordenação na sociedade deve haver um mínimo de moralidade cívica para que não ficarmos sujeitos ao exemplo do cinema: a falta de ordem trouxe efeitos que poderiam ser evitados. Porém acertar na dosagem é algo que está suscetível ao erro. Ainda não foi encontrado o equilíbrio entre a moralidade cívica e pessoal. É uma questão de tentativa e erro que permeia e permeará a história humana. “A tensão entre moralidade cívica e pessoal- entre as normas de convivência pacífica e os desejos e valores de cada indivíduo- é um traço permanente da existência humana” (pag. 136).

O autor mostra partindo do que ele apresentou no desenvolvimento de seu capítulo a lógica de seu argumento e conseqüentemente de sua tese. A vertente filosófica mostrou que o abuso de autoridade em busca de uma coordenação social é uma falácia na qual torna os indivíduos um “rebanho”. A vertente econômica apresentou as “regras do jogo e a qualidade dos jogadores” (pag.137). Quanto às regras do jogo o Estado, fazendo uma analogia a um juiz de futebol, deve apenas cuidar e manter justo o jogo, “sem tentar decidir os lances pelos jogadores ou impor o resultado da partida” (pag. 137). Já em relação à qualidade dos indivíduos, Giannetti diz: “o auto-interesse é o econômico é o combustível da mão invisível e o motor do crescimento” (pag. 137) , porém tal discussão sobre os jogadores será tratada no capítulo 5.