Whitepaper Blockchain e IoT - aplicações e iniciativas v0.7 · Blockchain e Iinternet das coisas:...
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Sumário1 Introdução .................................................................................... 1
2 Tendências ................................................................................... 6
2.1 Aplicações de Blockchain em IoT 5..................................... 6
2.2 Iniciativas ................................................................................ 12
3 Desafios ........................................................................................ 21
4 Comentáriosfinais..................................................................... 29
5 Autores.......................................................................................... 31
6 Referências.................................................................................. 32
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 2
IntroduçãoA Internet das Coisas (IoT) nasce da interconexão entre dispositivos
dotados de computação embarcada e unicamente identificados através
da infraestrutura existente da Internet, oriunda da oferta de conectividade
avançada de dispositivos, sistemas e serviços que vai além da comunicação
M2M, atendendo uma variedade de protocolos, domínios e aplicações
(Höller et al., 2014).
A IoT exige um novo mindset para os atores, uma vez que (i) seus recursos
proprietários (ex.: sensores e atuadores) deixariam de estar confinados
ao seu próprio negócio, (ii) os dados gerados por esses recursos seriam
livremente disponibilizados para terceiros e (iii) eles poderiam cooperar
entre si para aumentar a produtividade, evitando duplicação de recursos e
investimentos associados (Oliveira, 2015).
A tecnologia Blockchain pode ser entendida como “um sistema distribuído
de base de dados em log, mantido e gerido de forma compartilhada e
descentralizada (através de uma rede peer-to-peer, P2P), na qual todos os
participantes são responsáveis por armazenar e manter a base de dados.
01
BLOCKCHAIN E INTERNET DAS COISAS:
Aplicações e iniciativas.Rodrigo Lima Verde Leal
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 3
A tecnologia foi construída tendo em mente quatro principais
características arquiteturais: segurança das operações, descentralização
de armazenamento/computação, integridade de dados e imutabilidade de
transações”(Formigoni et al., 2017).
Por um lado, essas tecnologias ainda estão numa fase de grande entusiasmo
e com projeções que provavelmente não são realistas. Ambas as tecnologias
estão sob os holofotes da mídia especializada devido à grande expectativa
do mercado nas suas respectivas capacidades de suportar a criação de
novos modelos de negócio a partir da combinação de novas tecnologias.
A Figura 1 mostra que tanto Blockchain, quanto IoTestão no que a empresa
de assessoria Gartner chama de “pico das expectativas infl acionadas”. De
fato, o interesse por ambos os tópicos tem crescido nos últimos anos em
todo o mundo (Gráfi co 1).
Figura 1 Hype Cycle de Tecnologias Emergentes. Fonte: Gartner (2016)
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 4
Gráfico1 Interesse ao longo do tempo dos tópicos IoT e Blockchain no Brasil. Fonte: elaboração própria a partir do Google Trends
Por outro lado, tanto IoT quanto Blockchain são parte de uma revolução
dos conceitos de como as plataformas são defi nidas e utilizadas, passando
de uma infraestrutura técnica para um habilitador de ecossistemas, criando
a fundação para novos modelos de negócio que criarão as pontes entre
humanos e tecnologias (Gartner, 2016b).
Dentro desses ecossistemas dinâmicos, as organizações precisam entender
e redefi nir suas estratégias de forma proativa para criar modelos de negócio
baseados em plataformas, fazendo com que (i) as tecnologias sejam parte
integral dos funcionários, de seus parceiros e da experiência de seus
clientes, bem como (ii) os objetos inteligentes façam cada vez mais parte da
experiência humana e dos ecossistemas digitais (ibid).
Este whitepaper é parte de uma série planejada pelo CPqD e tem por objetivo
específi co apresentar qual é a relação entre Blockchain e IoT. Está dividido
da seguinte forma. A seção “Tendências” mostra as principais aplicações
potenciais de Blockchain na IoT e algumas iniciativas relacionadas a isso.
Gráfico1 Interesse ao longo do tempo dos tópicos IoT e Blockchain no Brasil.
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 5
A seção “Desafios” mostra os principais pontos de atenção que devem ser
levados em consideração no desenho e na implementação de soluções que
integrem as duas tecnologias. Finalmente, a seção “Comentáriosfinais”
apresenta as conclusões.
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 6
TendênciasAplicações de Blockchain em IoT
Na IoT, independente do setor da economia, a tecnologia Blockchain pode
proporcionar uma forma de rastrear a história única de cada dispositivo,
registrando a troca de dados entre ele e outros dispositivos, serviços web
e usuários humanos. Pode também permitir que dispositivos inteligentes
se tornem agentes independentes que conduzem de forma autônoma
uma variedade de transações. Vários exemplos de aplicação podem ser
identificados, tais como:
— monitoramento remoto de ativos de elevado valor para verificar, por exemplo, se estes estão sendo usados corretamente;
— monitoramento, controle e autorização de solicitação de determinado equipamento para reposição de alguma peça ou matéria prima (máquina de lavar solicitando sabão, por exemplo); e
— controle de identidade dos dispositivos IoT para registro e controle de acesso lógico à diferentes aplicações.
Outros exemplos de aplicação envolvendo mais de um setor também
podem ser pensados. A tecnologia Blockchain pode ser aplicada em projetos
estruturantes, que envolveriam diferentes atores de uma cadeia de valor,
tais como:
— monitoramento e rastreamento de uma cadeia de produção (p.ex.: fabricação de automóveis, produção de vinhos, produção de equipamentos de informática, dentre outros);
— sistema de gestão de logística reversa de diferentes produtos (p.ex.: produção de medicamentos, produtos eletroeletrônicos e seus resíduos); e
— sistemas de gestão e controle da distribuição de venda de produtos sob regime regulatório forte (p.ex.: medicamentos de uso controlado, procedência de carne e alimentos orgânicos).
022.1
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 7
Em suma, as aplicações para IoT tem potencial para usufruir dos benefícios
que a tecnologia Blockchain traz consigo, resumidos na Tabela 1.
Benefício DescriçãoTransações confiáveis, rápidas e sem intermediário
Reduz ou mesmo elimina o risco da desconfiança entre as partes e custos de transação.
Usuários com poderes Usuário controla todas as suas transações e informações
Dados de alta qualidade Os dados da Blockchain intrinsecamente são completos, consistente, precisos e amplamente disponíveis no momento que forem necessários.
Duráveis, confiáveis e amplamente disponíveis
Ausência de ponto único de falha.
Processos íntegros Confiança que tudo será executado conforme as regras pré-definidas sem intermediários.
Transparência e imutabilidade Todas as transações podem estar disponíveis publicamente e não podem ser alteradas ou ainda apagadas dos registros.
Simplificação do ecossistema Um único livro de registro é criado, reduzindo a desordem e complicações.
Tabela 1 Benefícios potenciais da Blockchain na IoT
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À medida que o número de dispositivos conectados cresce de milhões para
bilhões, e governos e corporações correm para melhor controlar dispositivos
e dados, uma nova estratégia tecnológica será necessária para construir
soluções de baixo custo que levem em consideração
privacidade e autonomia.
Como mostra a Figura 2, novos modelos de negócio guiarão estas soluções
na direção de economias digitais efi cientes e na criação de valor de forma
colaborativa, ao mesmo tempo em que serão criados experiência de
usuários e produtos melhorados
Figura 2 Regras, diretrizes e princípios da IoT (IBM Institute of Business Value, 2015)
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 9
No nível mais abstrato, as próprias redes podem se tornar autônomas
suplantando sistemas já estabelecidos e que hoje dependem de uma
autoridade centralizadora, como, por exemplo, a troca de informação
sensível e serviços de auto-instalação e auto-updatede de software em
dispositivos (ibid). Nesse sentido, qualquer solução IoT descentralizada
deveria suportar: (i) mensagens P2P confi áveis, (ii) comunicação
intrinsecamente confi ável e (iii) autonomia descentralizada.
Numa visão de IoT descentralizada com sequência evolutiva (Figura
3), a Blockchaindeverá ser considerado o arcabouço que suportará o
processamento e coordenação das transações entre dispositivos. Neste
contexto, cada dispositivo gerencia seus próprios papéis e comportamentos,
resultando na Internet of Decentralized, Autonomous Things (ibid).
Figura 4 Características do gerenciamento e da computação dos serviços de compartilhamento baseados em Blockchain numa Cidade Inteligente (elaborado a partir de Sun et al., 2016)
Em linha com essa perspectiva evolutiva da IoT, uma Cidade Inteligente
é um bom exemplo de como combinar IoT e Blockchain. Os serviços de
compartilhamento baseados em Blockchain podem contribuir para as
cidades inteligentes.
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 10
A economia compartilhada,nesse caso, é um modelo econômico-social que
diversos setores da população podem utilizar para fazer uso compartilhado
de ativos subutilizados (Sun, 2016). Os cidadãos,objetos e utilities se
conectariam de forma transparente para compartilhar o status e a troca
desses ativos (Figura 1).
Nesse paradigma, as pessoas buscam confiança, ter acesso ao invés
de ter propriedade, confiabilidade dos serviços compartilhados e
segurança e privacidade.
As Instituições precisam de uma comunidade inteligente com governo
inteligente, parcerias, networking e governança transparentes, interconexão
dinâmica com as partes interessadas e estar protegidas de fraudes,
responsabilidades e prestadores de serviço desqualificados.
A computação precisa garantir acessibilidade e disponibilidade dos sistemas,
recursos de bases de dados inteligentes; sistemas de controle; interface,
computação inteligente; habitantes em rede e ciência em tempo real e
analíticos avançados.
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 11
Há seis elementos que que Blockchain ajudaria nos relacionamentos entre
pessoas, tecnologia e organizações: não depender da confi ança entre
os atores, transparência e privacidade, democratização, automação, ser
distribuído e segurança (ibid).
Figura 4 Características do gerenciamento e da computação dos serviços de compartilhamento baseados em Blockchain numa Cidade Inteligente (elaborado a partir de Sun et al., 2016)
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 12
Iniciativas
A Tabela 2 a seguir elenca, em primeiro lugar, um conjunto de propostas,
protótipos e provas de conceito apontadas na literatura como casos de uso
de Blockchain na IoT.
Como seria de se esperar, pesquisadores do assunto e desenvolvedores de
tecnologia remetem a gerenciamento de armazenamento de dados, gestão
de identidade e comércio de bens e dados.
A tabela apresenta também uma lista não exaustiva de ofertas comerciais
de plataformas de desenvolvimento de aplicações para IoT baseadas em
Blockchain, bem como de aplicações de negócio específicas.
2.2
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 14
Tabela 2 Usos de Blockchain na IoT
Um desses usos de Blockchain merece destaque por ter demonstrado
um aplicação prática ao mesmo tempo em que envolveu dois gigantes de
tecnologia, IBM e Samsung. Trata-se do projeto ADEPT, o qual resultou
em um sistema de mensageria peer-to-peer numa rede trust-less que
permite compartilhamento distribuído de dados e coordenação
autônoma entre dispositivos.
O sistema demonstrou competição por recursos em tempo real, acordos
entre dispositivos, pagamentos diretos entre eles ou apenas a permuta de
serviços e recursos dos mesmos.
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 15
Sua arquitetura envolveu TeleHash, BitTorrent e Ethereum e foi testada
em transações autônomas entre os seguintes atores: máquina de lavar
roupa, varejista, serviço de pós-venda e outros eletrodomésticos. A máquina
de lavar autônoma (i) solicitava e pagava o varejista pelo detergente, (ii)
notificava o dono e solicitava serviços de pós-venda e (iii) checava os termos
de garantia do equipamento.Esse projeto foi concluído e a IBM passou
a voltar seus esforços para o desenvolvimento e disseminação de outra
plataforma: Hyperledger (Allison, 2016).
Na categoria de produtos comercializados no mercado, a empresa
Blockchain of Things criou uma plataforma de software denominada
Catenis Enterprise™ que disponibiliza interfaces de serviços para construção
de aplicações de infraestrutura de ativos e mensagens em Blockchain.
Já a Chronicled oferece produtos para identificação de dispositivos IoT
e logs de dados (chips com criptografia embarcada para registro de
identidade, temperatura,vedação/violação e procedência). Estes dispositivos
são conectados na Blockchain pelo aprovisionamento com firmware e
identidade criptográficos, funcionando em plataformas públicas ou privadas,
incluindo Quorum, Ethereum e Hyperledger para o desenvolvimento de
aplicações de IoT e supply chain.
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 16
A eciotify cria contratos inteligentes que são a base de markeplaces
descentralizados para transações financeiras M2M por meio de
autenticidade dos dados, integridade do processamento e
segurança da transação.
A startup norte-americana Filament desenvolveu um sistema baseado em
hardware e software integrados que permite a formação autônoma de redes
mesh sem fio de longo alcance. Para substituir o papel de um ator central
que faz a resolução de endereços, como ICANN e servidores DNS, a empresa
utiliza um protocolo no qual “tabeliões” públicos ou privados podem atestar
a autenticidade dos nomes publicados dentro do sistema.
Seu sistema executa contratos inteligentes que tornam possível a
especificação das condições particulares sob as quais um dispositivo irá
interagir com outras entidades, como preço, prazo para ter acesso ou
cobrança por uso de determinada funcionalidade, sem precisar acionar um
serviço específico na nuvem.
A assinatura criptográfica e os headers do contrato inteligente são colocados
na rede Blockchain, pública ou privada, criando assim os recibos verificáveis
para atender obrigações contratuais.
A Guardtime possui um sistema denominado KSI que faz autenticação em
larga escala sem autoridade central. Seu foco está na garantia da integridade
dos dados nos dispositivos IoT, como seu sistema operacional.
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 17
Para a IoT, a IBM oferece a plataforma Hyperledger na forma de uma
infraestrutura baseada em Blockchain para que pares distribuídos
repliquem seus dados e validem as transações por meio de contratos
inteligentes seguros.
Para isso, une a plataforma Watson IoT para traduzir os dados para o
formato das APIs de contratos baseados em Blockchain, filtrando eventos e
enviando somente os dados solicitados nos contratos.
A alemã Modum é uma startup focada na combinação entre IoT e
Blockchainespecificamente para processos de supply chain. Para isso,
desenvolve sensores IoT que gravam condições ambientais
durante os embarques.
Quando há troca de propriedade entre os atores da cadeia logística, os
dados são coletados e checados com as condições estabelecidas nos
contratos inteligentes na plataforma Ethereum, sejam de clientes ou de
órgãos reguladores.
A riddle&code foca na identificação física e autenticação digital dos objetos
físicos. No primeiro caso, é feita validação de procedência e propriedade dos
objetos. No segundo caso é feita a garantia dos contratos não terem sido
manipulados, da origem dos mesmos e da sua validade, representando a
autoridade correta do signatário.
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 18
Para isso oferece a combinação de um tag embarcado em determinado
produto do cliente com um tokenmantido pelo proprietário, de forma a
garantir prova de procedência, propriedade e cumprimento de contratos.
Posicionam-se como agnósticos à plataforma Blockchain, podendo ser
Ethereum, Bitcoin ou qualquer outra.
A startup Stampery utiliza a infraestrutura tecnológica do Bitcoin e da
plataforma Ethereumpara garantir existência, integridade e atribuição
dos dados de seus clientes. Para isso, disponibiliza uma API para uso em
aplicações que permitam aos próprios dispositivos IoTterem seus firmwares
certificados e então provar sua integridade para seus pares, com o objetivo
de prevenir o sequestro de nós de redes mesh.
Outra empresa startup, a alemã Slock.it, comercializa diferentes aplicações
baseadas em objetos conectados que precisam ser identificados, receber
pagamentos e participar de acordos complexos, tais como fechaduras de
imóveis e tomadas de carga de veículos elétricos.
Seu sistema executa contratos inteligentes e está baseado na plataforma
aberta Ethereum. Um ponto interessante, não é somente querer posicionar-
se como uma forma das pessoas monetizarem seus ativos físicos e virtuais,
mas trazer junto uma visão de futuro no qual os ativos subtilizados – como
um apartamento fechado ou um computador ocioso durante a noite -
possam ser compartilhados com outros atores e, assim, ter uma
sociedade mais sustentável.
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 19
A Tieron é uma startup que oferece a desenvolvedores de aplicações
a possibilidade de ancorarem seus dados na Blockchain para provar
integridade e registrar data/hora de qualquer dado, arquivo ou processo. Os
dados capturados dos diferentes dispositivos conectados recebem prova de
registro na cadeia de blocos.
A startup tilepay oferece uma plataforma de software que permite aos seus
usuários o cadastro de seus dispositivos IoT e o controle do acesso aos
dados dos mesmos por terceiros. Trata-se de um marketplace sobre Bitcoin
que oferece micropagamentos, troca de dados e segurança e privacidade.
A lista apresentada não é exaustiva e combina atores com diferentes
posicionamentos, graus de maturidade e tamanho.
Há atores que focam apenas no hardware, outros no desenvolvimento de
aplicações de software ou na oferta de plataformas de desenvolvimento
de aplicações, outros na oferta de aplicações específicas já empacotadas
para determinado nicho e outros que atuam em todas as camadas
simultaneamente, com componentes próprios ou de terceiros.
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 20
A grande maioria dos atores ainda são startups, seja testando algum
conceito, ou já em rodadas mais avançadas de investimento. Há apenas uma
grande multinacional. Issodemonstra que há uma janela de oportunidade e
quanto o mercado ainda está aprendendo acerca das formas de combinar
os dois assuntos, o que corrobora o texto da Introdução.
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 21
DesafiosApesar de toda a expectativa da mídia especializada e da literatura técnico-
científica em torno da combinação de IoT e Blockchain, os benefícios
potenciais já mencionados trazem consigo uma série de desafios que
precisam ser corretamente endereçados.
A simplificação do ecossistema a partir de um único livro de registro traz
consigo um desafio anterior que não está relacionado a tecnologias.
A substituição de uma lógica de um ecossistema existente, formado por um
conjunto de atores, processos e sistemas legados, por outra lógica baseada
em Blockchain requer uma capacidade de articulação entre esses atores, e
eventualmente novos entrantes, que por sua vez deve estar baseadanuma
clara e inequívoca capacidade de gerar valor.
Em outras palavras, é preciso haver muita “desordem e complicações” no
ecossistema atual para justificar a criação de um novo. Caso contrário,
dificilmente esse novo ecossistema terá chance de sequer ser testado
no mercado. Não por acaso, a maioria das empresas listadas na seção
anterior são startups.
03
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 22
Outros benefícios potenciais são as transações confiáveis e a criação
de processos íntegros sem intermediários, visando reduzir o risco da
desconfiança entre as partes e custos de transação.
Novamente, aqui há um desafio de como criar na prática as novas regras
de consenso e garantir que as mesmas não possuam falhas (First
Partner, 2016). Se tudo será executado conforme regras pré-definidas
sem intermediários, que ator(es) do ecossistema cria(m) as regras e a partir
de que processo?
Uma rede IoTbaseada em Blockchain e completamente autônoma é uma
faca de dois gumes (Christidis e Devetsikiotis, 2016). Antes de implementar
um contrato inteligente na rede, a lógica precisa passar por uma verificação
cuidadosa e seu código precisa conter mecanismos seguros contra falha
para prevenir “ruas sem saída”, uma vez que nada pode ser
desfeito na rede (ibid).
Esses e os demais benefícios potenciais ainda estarão, no curto
prazo, contrabalançados por riscos, típicos de uma nova onda tecnológica,
como o fato de Blockchain ainda não ser uma tecnologia comprovada
no mercado para aplicação em casos de uso de IoT ou pré-IoT em larga
escala, por desconfianças técnicas em torno da escalabilidade, capacidade
e velocidade de validação de transações dos sistemas baseados em
Blockchain (FirstPartner, 2016).
Vale citar que questões de escalabilidade e desempenho tem sido alvo de
avanços, como pode ser verificado nos trabalhos de desenvolvedores de
Bitcoin-NG e Ethereum (Christidis e Devetsikiotis, 2016).
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 23
Há inda os riscos associados a ambientes regulatórios incertos ou restritivos
a determinado modelos de negócio inovadores e à volatilidade da
criptomoeda em ecossistemas que se baseiam em uma (First Partner, 2016).
Por exemplo, se ocorrer um erro na execução de um contrato inteligente
dentro de uma rede autônoma sem intermediários – como uma rede
Blockchain não permissionada – quem seria acionado juridicamente? Ou
então, se um ecossistema IoT estiver baseado numa criptomoedaaberta,
como Bitcoin ou Ether, e esta mesma sofrer uma grande variação no câmbio
para a moeda corrente, por exemplo, Reais, os valores das transações desse
ecossistema IoTtambém seriam afetados, mas não pela lógica do negócio
que originou o ecossistema, mas sim por variações externas.
É preciso haver legitimidade legal dos contratos inteligentes, o que por
sua vez exige integração dual, isto é, uma relação direta entre contratos
inteligentes e contratos do mundo real (ex.: CommonAccord e Legal
Markdown) e, além disso, o valor esperado dos ativos “tokenizados” precisa
ter alguma garantia no mundo real (Christidis e Devetsikiotis, 2016).
A proliferação de dispositivos IoT, conectados e fazendo transações
em diferentes ambientes em tempo real, traz desafios para os dados
em termos de segurança, privacidade, resiliência, armazenamento e
centralização (Atzori, 2017).
Tem surgido recomendações técnicas e legais para reduzir os efeitos
nocivos: (i) privacy-by-policy (proteger dados de divulgação acidental ou de
mau uso e promover escolhas informadas para o consumidor) e (ii) privacy-
by-desing (implementar privacidade ao longo do processo de engenharia de
forma proativa e preventiva).
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 24
Disso surge uma controversa (Atzori, 2017). Por um lado, o grande alcance
da IoT requer salvaguardas legais ao longo de qualquer fronteira geográfica.
Por outro lado, os reguladores ainda não harmonizaram suas diferenças
judiciais no nível global e não conseguem acompanhar o desenvolvimento
tecnológico e mercadológico. Por isso, há urgência em desenvolver novas
práticas de privacidade e arquiteturas distribuídas (Atzori, 2017).
A maioria das plataformas IoT estão baseadas num modelo centralizado
no qual agem como um broker ou hub controlador da interação entre
dispositivos, mas não é prático quando os dispositivos precisam trocar
dados entre eles de forma autônoma (Crosby et al., 2015). Esse requisito tem
levado a esforços na direção de plataformas descentralizadas e a tecnologia
Blockchain facilita isso com troca de dados confiável e segura ao mesmo
tempo em que guarda todos os registros.
Nessa arquitetura, Blockchain serve como um ledger geral, mantendo
os registros seguros de todas as mensagens trocadas entre dispositivos
inteligentes numa topologia IoT descentralizada, mas alguns riscos
permanecem (Crosby et al., 2015):
(i) mudança de comportamento de atores que precisam se acostumar com
o fato de que todas as transações eletrônicas estão seguras e completas –
os intermediários de hoje (como Visa e Mastercard no caso de cartões de
crédito) também mudaram seus papéis e responsabilidades, mantendo a
prestação de serviços relacionados a relacionamento com clientes;
(ii) escalar os serviços em estágios iniciais atualmente baseados em
Blockchain será um desafio;
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 25
(iii) esforço de bootstrapping para mover todos os contratos, documentos
e processos atuais para uma metodologia baseada em Blockchain envolve
tempo e custo;
(iv) regulação governamental num mundo de transações baseadas em
Blockchain, no qual os atores governamentais podem retardar a adoção
com a introdução de novas leis para monitorar e regular a indústria mirando
compliance;
(v) atividades fraudulentas devido ao uso de pseudônimos nas transação
baseadas em Blockchain, junto com a facilidade de movimentar valores, o
que requer mecanismos de monitoramento e ação contrária;
(vii) computação quântica poderia quebrar as chaves criptográficas
por força bruta em tempos razoáveis, minando uma força da tecnologia
Blockchain, que é a dificuldade de um único ator conseguir ter o poder
computacional para controlar o comportamento da rede.
Ainda na abordagem de aplicações descentralizadas e intensivas em dados,
sendo executadas em bilhões de dispositivos, a garantia da privacidade
permanece um desafio da IoT, uma vez que as “coisas” espalham dados
pessoais sensíveis e revelam comportamentos e preferências de seus donos.
Um estudo sobre esse tipo de abordagem descentralizada (Conoscenti et
al., 2016), conclui que há desafios em três aspectos: integridade, anonimato
e adaptabilidade. No primeiro deles, em redes novas, com poucos nós,
mineradores desonestos poderiam tomar conta da rede, caso consigam
uma parcela grande da capacidade computacional dessa rede (isto é, eles
seriam os principais executores de PoW e poderiam adulterar os dados).
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 26
Os autores sugerem que a abordagem mais segura é desenvolver
aplicações IoT sobre um Blockchain existente e estável, onde o PoW e uma
grande quantidade de mineradores honestos garantiriam a integridade e
impediriam que mineradores desonestos obtenham uma parcela grande da
capacidade computacional da rede.
O segundo aspecto, anonimato, não é garantido, mas apenas o
“pseudonimato”, o que pode não ser suficiente. Deve-se evoluir na direção
de soluções que reduzam a possibilidade de ligar dispositivos IoT aos seus
usuários a partir da identificação de padrões no comportamento dos dados.
Finalmente, o terceiro aspecto, adaptabilidade, traz consigo dois desafios.
Um deles é o fato de que à medida que o número de transações aumenta,
a Blockchain também aumenta, tornando custoso armazená-lo em
dispositivos IoT com recursos limitados.
Isso pode ser remediado separando a Blockchain da camada de aplicação,
assim os dispositivos IoT só precisam armazenar suas próprias transações.
O segundo desafio é o baixo throughput de transações devido à dificuldade
de fazer o PoW e ao tamanho máximo de um bloco, o que gera um tradeoff
entre escalabilidade e segurança. Isso pode ser remediado separando
aBlockchain da camada de aplicação, assim nem todas as operações da
camada de aplicação exigem uma transação na Blockchain. Entretanto, no
mundo IoT de bilhões de dispositivos, o ideal seria utilizar uma plataforma
escalável (ibid).
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 27
Outro estudo (Christidis e Devetsikiotis, 2016) sugere que as complicações
relacionadas à manutenção da privacidade podem ser mitigadas com chaves
para cada transação ou para cada contraparte, visando assim dificultar a
identificação de padrões de comportamento ou criar Blockchains específicos
para cada conjunto de transações em que há permissão dos pares verem, o
que aumenta os custos de coordenação.
Adicionalmente, a privacidade da transação em si (confidencialidade)
poderia usufruir de novos métodos, como criptografia homomórfica,
entretanto estes são intensivos em recursos, o que é complicado em
ambientes IoT com dispositivos com poucos recursos.
Em suma, quaisquer atores que desejem usufruir dos benefícios potenciais
que a combinação de Blockchain e IoT podem trazer, há diversos desafios
técnicos e não técnicos que precisam ser corretamente abordados em
qualquer projeto de implantação.Esses desafios podem ser colocados em
três categorias, conforme Tabela 3: tecnológicos, operacionais e
regulatórios, sendo que este último diz respeito a aspectos legais e de
conformidade (Bennett, 2016).
Categoria DesafiosTecnologia Escalabilidade, segurança (do
dispositivo, da Blockchain, das interfaces entre dispositivos e a Blockchain e entre a Blockchain e outros sistemas etc) e comportamento previsível conforme requerimento do caso de uso.
Operação Clareza do modelo de negócio, desejo e capacidade para redesenhar processos de negócio, acordo em torno de definições comuns acerca dos dados. Interface entre mundo real e mundo virtual.
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 28
Legal / conformidade Definição de responsabilidade sobre ações automáticas tomadas por dispositivos inteligentes. Definição de jurisdição em blockchains que cruzam fronteiras. Combinação entre advogados, criação de regras e qualidade da programação.
Tabela 3 Desafios de Blockchain e IoT
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 29
04 Comentários finaisEste documento mostrou que tanto a academia quanto as iniciativas
de mercado mostram que há diversas iniciativas que procuram testar e
aproveitar os benefícios do uso de Blockchain no contexto da IoT.
Benefícios como transações confiáveis, rápidas e sem intermediário,
usuários com poderes, transparência e imutabilidade e simplificação do
ecossistema, apenas para citar alguns, podem indicar um cenário futuro
em que IoT evolua para uma rede descentralizada em que cada dispositivo
gerencia seus próprios papéis e comportamentos.
Há propostas, protótipos e provas de conceito sendo testadas e diversas
plataformas de desenvolvimento e aplicações que combinam Blockchain
e IoT, entretanto há inúmeros desafios para comprovar os benefícios
esperados em larga escala. Esses desafios passam por desconfianças
técnicas em torno da escalabilidade e desempenho das redes IoT
baseadas em Blockchain, da garantia de segurança e privacidade das
pessoas, das “coisas” e das transações e também por aspectos regulatórios,
dentre outros.
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 30
Face os benefícios potenciais e os desafios técnicos e de negócio, uma
iniciativa que deseje combinar as duas abordagens deveria passar por
etapas: (i) um correto diagnóstico do modelo de negócio que se deseja
transformar, ou criar, para então, a partir do (ii) uso correto dos conceitos
de Blockchain e do mapeamento de pessoas, processos e tecnologias
existentes e novos, (iii) criar protótipos que testem o conceito em fases
de complexidade crescente, até (iv) atingir escalas maiores. Isso buscaria
reduzir o risco de realizar grandes investimentos, sem antes ter
certeza dos benefícios esperados, da complexidade para consegui-los e das
diferentes formas de combinar todos os elementos do ecossistema que se
deseja transformar.
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 31
05 AutoresRodrigo Lima Verde Leal
Possui graduação em Engenharia Elétrica pela UNICAMP (1995),
especialização em Administração pela FGV-SP (2002) e mestrado em Política
Científica e Tecnológica pela UNICAMP (2007). Atualmente é especialista
da Fundação CPqD responsável pela formulação de propostas de projetos
de inovação tecnológica com parceiros industriais e governamentais.
Tem experiência na área de gestão da inovação e marketing de produto,
atuando principalmente nos seguintes temas: tecnologias de informação e
comunicação, modelos de negócio, design thinking, gestão de portfólio de
produtos e roadmaps tecnológicos.
Blockchain e Iinternet das coisas: Aplicações e Iniciativas 32
06 ReferênciasAllison, Ian (2016). Filament evolving entire IoT space using Bitcoin blockchain. Disponível em: http://www.ibtimes.co.uk/filament-evolving-entire-iot-space-underwhelming-use-blockchain-1579096. 2016.
Atzori, Marcella (2017). Blockchain-based Architectures for the Internet of Things: A Survey. 1st draft: May, 2016. Last revision: Jan, 2017. 2017.
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