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1 Trago na memória ... O Instituto Metodista de Santo Amaro Romilde dos Santos Sant’Ana Orientador: Prof. Dr.Elias Boaventura UNIMEP- Universidade Metodista de Piracicaba - SP Foram dias e noites vivendo sob as rígidas regras do internato. Como aluna me lembro de cada lição de etiqueta, cada aula de música ou doutrina, de como deveria arrumar a cama, sentar- me á mesa, esperar para ser servida e sem dúvida, também me lembro de cada professora, de cada aluna, dos funcionários e em especial do psicólogo que fazia as análises projetando nosso futuro ao sucesso ou fracasso profissional. A todo momento estávamos sob a vigilância e orientação da diretora. Neste ambiente, conheci muitas pessoas e muitas histórias foram vividas. A Igreja Metodista, instalada no Brasil desde 1867, sempre procurou dar ênfase ao trabalho na área de educação. Inúmeros Colégios espalhados por algumas regiões do país confirmam essa vocação. Ao mesmo tempo em que havia essa preocupação com a educação oferecida à sociedade, também havia um cuidado muito especial com a formação de seus quadros internos, voltados para o trabalho religioso e social nas comunidades. Em 1941 o Instituto Metodista em Ribeirão Preto abre suas portas para o Curso de Ensino Religioso , o qual objetiva capacitar leigas para o trabalho social da Igreja e da comunidade. Mais tarde, com o sentido de oficializar o trabalho da mulher, o Concílio Geral da Igreja Metodista de 1946 cria a Ordem das Diaconisas, um corpo de obreiras leigas vocacionadas para o trabalho educacional, social e evangelizante da Igreja Metodista, preparando também moças que desejavam se dedicar a Enfermagem e Música e outras atividades nas comunidades locais independente do diaconato. Em 1950 esta Instituição é transferida para Santo Amaro S. Paulo, em sede própria. Em fins da década de 50 e início da de 60, há uma mudança qualitativa importante. As alunas chegam à Instituição mais politizadas , fazem mais exigências e já não aceitam as antigas regras de convivência sem questionamentos. Não há mais possibilidade de impedir o desencadeamento do processo. Em 1966, o Instituto Metodista anuncia a criação da Faculdade de Educação Cristã que substituiria o curso de Ensino Religioso e se cogita a transferência das alunas para a Faculdade de Teologia em Rudge Ramos, São Bernardo do Campo. Ali , de preparo leigo passa a ser clérigo e se inicia uma nova etapa na Educação da Mulher Metodista Brasileira. Trago na memória ... O Instituto Metodista de Santo Amaro Romilde dos Santos Sant’Ana Orientador: Prof. Dr.Elias Boaventura UNIMEP- Universidade Metodista de Piracicaba - SP “Moças crentes, fiéis, destemidas há trabalho esperando. O Senhor pede vidas, precisa de vidas consagradas ao Santo labor. O Instituto é sagrada montanha Onde vemos um rosto a brilhar Mas lá em baixo a agonia é tamanha precisamos descer e curar” ( 1ª estrofe do Hino do Instituto, letra do Rev. Nelson Godoy Costa)

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Trago na memória ... O Instituto Metodista de Santo Amaro

Romilde dos Santos Sant’AnaOrientador: Prof. Dr.Elias Boaventura

UNIMEP- Universidade Metodista de Piracicaba - SP

Foram dias e noites vivendo sob as rígidas regras do internato. Como aluna me lembro de cadalição de etiqueta, cada aula de música ou doutrina, de como deveria arrumar a cama, sentar- me ámesa, esperar para ser servida e sem dúvida, também me lembro de cada professora, de cada aluna,dos funcionários e em especial do psicólogo que fazia as análises projetando nosso futuro aosucesso ou fracasso profissional. A todo momento estávamos sob a vigilância e orientação dadiretora. Neste ambiente, conheci muitas pessoas e muitas histórias foram vividas. A IgrejaMetodista, instalada no Brasil desde 1867, sempre procurou dar ênfase ao trabalho na área deeducação. Inúmeros Colégios espalhados por algumas regiões do país confirmam essa vocação. Aomesmo tempo em que havia essa preocupação com a educação oferecida à sociedade, também haviaum cuidado muito especial com a formação de seus quadros internos, voltados para o trabalhoreligioso e social nas comunidades. Em 1941 o Instituto Metodista em Ribeirão Preto abre suasportas para o Curso de Ensino Religioso , o qual objetiva capacitar leigas para o trabalho socialda Igreja e da comunidade. Mais tarde, com o sentido de oficializar o trabalho da mulher, o ConcílioGeral da Igreja Metodista de 1946 cria a Ordem das Diaconisas, um corpo de obreiras leigasvocacionadas para o trabalho educacional, social e evangelizante da Igreja Metodista, preparandotambém moças que desejavam se dedicar a Enfermagem e Música e outras atividades nascomunidades locais independente do diaconato. Em 1950 esta Instituição é transferida para SantoAmaro S. Paulo, em sede própria. Em fins da década de 50 e início da de 60, há uma mudançaqualitativa importante. As alunas chegam à Instituição mais politizadas , fazem mais exigências ejá não aceitam as antigas regras de convivência sem questionamentos. Não há mais possibilidade deimpedir o desencadeamento do processo. Em 1966, o Instituto Metodista anuncia a criação daFaculdade de Educação Cristã que substituiria o curso de Ensino Religioso e se cogita atransferência das alunas para a Faculdade de Teologia em Rudge Ramos, São Bernardo do Campo.Ali , de preparo leigo passa a ser clérigo e se inicia uma nova etapa na Educação da MulherMetodista Brasileira.

Trago na memória ... O Instituto Metodista de Santo Amaro

Romilde dos Santos Sant’AnaOrientador: Prof. Dr.Elias Boaventura

UNIMEP- Universidade Metodista de Piracicaba - SP

“Moças crentes, fiéis, destemidashá trabalho esperando. O Senhor

pede vidas, precisa de vidasconsagradas ao Santo labor.

O Instituto é sagrada montanhaOnde vemos um rosto a brilhar

Mas lá em baixo a agonia é tamanhaprecisamos descer e curar”

( 1ª estrofe do Hino do Instituto, letra do Rev. Nelson Godoy Costa)

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Trago na memória o Instituto Metodista (IM) da Chácara Flora onde vivi por três anos. Não falosobre a instituição, mas dela. Da experiência de dezenas de moças que como eu, em algummomento de suas vidas fez a opção de estudar ali se preparando para desenvolver um trabalhovoltado para o Ensino Religioso e o trabalho social na comunidade onde viviam.. Falo como portavoz da Associação das Ex-alunas e Ex-professoras do IM, a qual foi fundada em 1971 pelaprofessora Dina Rizzi sua ex-diretora, e que se reúne anualmente com regularidade em sua sede, aantiga casa onde funcionou o internato. Este grupo tem sentido a necessidade de divulgar o trabalhoali realizado por um quarto de século. Falo destas “moças crentes, fiéis, destemidas”, moçascrédulas que acreditaram em poder mudar um sistema social injusto e colaborar com a Igrejacooperando em seu ministério, mesmo como leigas.Em um dos últimos encontros, enquanto ouvíamos as narrativas da caminhada de cada uma após aformatura, suas lutas, decepções e esperanças, uma participante do grupo comentou: “minha filhame disse que gostaria de ter estudado no IM”. Esta colocação nos fez pensar no que levou cadauma a optar por este internato em especial, a deixar sua casa, sua família, e ficar interna numainstituição que se ocupava na formação de moças. Ao analisar a proposta educacional destainstituição descobri que quase nada sabíamos sobre ela apesar de ter participado de seu cotidianopor três anos. Que escola era esta? Que forças mantinham aquele grupo coeso em forma deAssociação mesmo após tantos anos desde o seu fechamento em 1966?Alguns historiadores Metodistas contam esta História que se inicia no final do século XIX com achegada, no Brasil, de alguns missionários norte americanos preocupados especialmente com aeducação da mulher brasileira. Neste período alguns colégios foram abertos com esta finalidade ecomo exemplo citaremos apenas dois, o Colégio Piracicabano (1881) e o Colégio Metodista deRibeirão Preto (1899). Ambos contaram, em seu início, com verbas oriundas do movimento dasMulheres Norte- Americanas. Estas missionárias chegaram trazendo na bagagem a ideologia liberalamericana e a prática do Metodismo do sul dos Estados Unidos. Sua metodologia tem forteinfluência dos Jesuítas1 em nosso período colonial e também uma postura do positivismo europeu,conforme o comentário de SOARES 2001, “a ênfase no individualismo que se concretizava noapelo à responsabilidade pessoal e na afirmação da liberdade pessoal” (1) o que fez de suaestrutura um colégio americano-brasileiro.As missionárias vieram com a missão de evangelizar através da educação, pois acreditavam queeducar seria um excelente método para que o evangelho chegasse dando vida plena2 a um povo tãocarente de fé e “bons costumes”. Tinham uma prática diferenciada de olhar o educando como umindivíduo ao qual propunham uma educação integral, onde o ser humano é visto em suasdimensões: espiritual, física e intelectual, acompanhada de uma disciplina rígida, cheia de zelo.Esta postura abre caminho para o que seria mais tarde um curso de capacitação leiga para mulherespreparando-as para atuar nas áreas educacionais e sociais tendo como base o curso de EnsinoReligioso do IM criado em 1941. Inicia não apenas com o cuidado de formar para a catequese, mashabilitando-as para enfrentar novos desafios. Tinha também como objetivo preencher uma lacunaexistente na Igreja Metodista que era a formação de mulheres leigas para um trabalho específico deEducação Cristã para as Igrejas e seus Colégios. O curso de Ensino Religioso foi criado dentro de uma estrutura já existente. Em 1934 o ColégioMetodista em Ribeirão Preto encerrou o curso Primário e Ginasial, iniciando um trabalho maisvoltado ao Serviço Social com uma biblioteca, parque infantil e curso de alfabetização para adultoscom diversas atividades. Em 1935 deixa de ser Colégio e inicia sua trajetória como InstitutoMetodista desenvolvendo a visão mais social que o momento exigia, sem com tudo deixar de sepreocupar também com a educação como um todo. O aumento de escolas públicas na cidade fez

1 A educação jesuítica tem como norma disciplinar o Ratio Studiorum e seu objetivo é a aquisição, peloestudante de uma ciência sólida.2 Vida plena é um termo usado entre os evangélicos significando uma vida justa onde as necessidades básicassão contempladas e a pessoa está em harmonia com seu Deus e seu próximo.

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com que a procura de alunos diminuísse. O curso Ginasial foi fechado no Colégio Metodista emuitas escolas particulares também encerraram suas atividades. Diante desta realidade eranecessário mudar o foco do trabalho. A proposta da Igreja Metodista para a Educação Religiosa nasce a partir da preocupação com oindivíduo inteiro. Isto significa que o conflito e a dialética se dão nas dimensões históricas,biológica, política e religiosa do indivíduo como um todo. Com este propósito é que este Curso foipensado. Formar quadros para o trabalho nas igrejas, nas escolas, periferias e campo.As alunas vinham de lugares distantes, às vezes de lares e escolas pobres, por isso o IM procurouoferecer o melhor possível com boa variedade de disciplinas.Para oficializar o trabalho destas mulheres, o Concílio Geral da Igreja Metodista3 de 1946 cria aOrdem das Diaconisas formalizando-a nos Cânones4 de 1955. “Art. 76 - A Ordem das Diaconisas,criada pelo Concílio Geral de 1946, é o corpo de obreiras leigas vocacionadas para o trabalhocristão e, mediante voto, consagradas pela imposição das mãos de um bispo para a obra educativa,social e evangelizante da Igreja.”(2) Esta formalização do trabalho das leigas na Igreja Metodista,seria uma forma de reconhecimento de seu trabalho? Anos mais tarde, este mesmo artigo quepermanece na lei maior da igreja é acrescido de um novo critério, clericalizando5 o ministériofeminino na Igreja Metodista.

“Art. 157 – As ordens da Igreja Metodista são duas: presbiteral ediaconal, constituídas respectivamente de presbíteros e diáconos,sem distinção de sexo.Parágrafo único – Na ordem presbiteral, a igreja acolhe homens emulheres que reconhece vocacionados para a plenitude doministério ordenado e na diaconal acolhe homens e mulheres que,por voto, prometem servir à Igreja de acordo com sua capacidadee dons.”(3)

Em 1949, a Igreja Metodista em Ribeirão Preto, SP, decide reiniciar o curso Ginasial que havia sidofechado em 1940, quando o Colégio foi transformado em Instituto. Após uma longa discussãodecidiram desmembrar o Colégio do Instituto e este é transferido para a Chácara Flora – SantoAmaro, SP. “...muda-se o curso de Educação Religiosa para outro lugar, deixando à igreja local oJardim da Infância, o Curso Primário para que ela tudo dirigisse e organizasse o ginásio.”(4) Em1950 a instituição é transferida para Santo Amaro, município de São Paulo, em sede própria, ondecontinuou capacitando leigas para o trabalho religioso e social da Igreja.

“Dia 20 de Setembro, por ocasião da reunião central, foraminauguradas as novas instalações e o prédio do Instituto Metodista,em São Paulo, bairro de Santo Amaro, num belo recanto daChácara Flora. (...) A sua transferência foi aprovada pelo ConcílioRegional do Centro, Conselho Central e 6º Concílio Geral.A propriedade adquirida em Santo Amaro custou-nos Cr$1.000.000,00, e com aumento, reformas e valorização hoje está odobro. O dinheiro que veio da Igreja Mãe para se adquirir estapropriedade já estava em caixa reservada para construção de maisum prédio em Ribeirão Preto. Como se resolveu a mudança delocalidade para o Instituto, a importância foi aplicada na aquisição

3 O Concílio Geral faz parte da administração superior da Igreja Metodista.4 Os Cânones representam o conjunto de Leis que regem a Igreja Metodista no Brasil5 Clericalizando - O ministério feminino se iguala à Ordem Maior concedida aos Homens, dentro da IgrejaMetodista –O Presbiterato.

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da propriedade, com a recomendação do Conselho Superior daInstituição e aprovada da "Woman Mission".O Instituto Metodista possui agora dois patrimônios - um em SãoPaulo e outro em Ribeirão Preto, sujeitos à administração doConselho Superior, eleito pelo Conselho Central e 6º ConcílioGeral, ao qual cabe a administração dos respectivospatrimônios.”(5)

A mudança para São Paulo dá nova vida ao curso. O IM se instalou na Chácara Flora, um lugartranqüilo, afastado do movimento e barulho da cidade, rodeado com pinheiros altos. Além disso, acapital paulista era o lugar ideal para os estágios nas igrejas grandes e pequenas, novas e antigas, docentro e da periferia. Um lugar ideal para as moças colocarem em prática o conhecimentoadquirido.

A PROPRIEDADE EM SÃO PAULO E O INTERNATO

“O Instituto é sagrada montanha,onde vemos um rosto a brilhar, mas lá em baixo a agonia é tamanha, precisamos descer e curar.”(2ª estrofe do Hino do Instituto)

Silêncio! Moças, entre 16 e 25 anos de idade, chegavam sobriamente vestidas e iam entrando norecinto meticulosamente construído para meditação. Na parede do fundo uma grande vidraçatransparente, por onde uma gigantesca cruz de concreto cinza que, diante dos olhos, se mistura comos galhos dos pinheiros que balançam suavemente embalados pelo vento. Assim é a capela do IM.Um ambiente de convite à meditação. Saindo da capela, à direita, um bosque com árvorescentenárias que desemboca em um grande galpão onde três vezes por semana as alunas reuniamcrianças da periferia próxima para aulas de reforço escolar. Voltando à capela, ao lado esquerdo, emconstrução com tijolinho à vista, as salas da Diretora e Reitora por onde passei algumas vezes “paraser disciplinada”. Seguindo na mesma direção, estão as salas de aulas onde as alunas passavam boaparte do dia em companhia dos professores cursando diversas disciplinas dentre elas, psicologia dacriança e do adolescente, música, doutrinas cristãs, história da Igreja cristã, enfermagem, serviçosocial e muitas outras que objetivavam o preparo das alunas para facilitar o trabalho em qualquercomunidade.Anexo às salas de aula, havia uma grande sala onde se instalava a Biblioteca. Ali, obrigatoriamentetodas tinham espaço para os estudos individuais das 19h30 às 21h30. Por fim a casa, umaconstrução estilo português, tijolinho à vista. No pavimento superior os dormitórios coletivos,alojando entre dez e doze pessoas por quarto, os banheiros, as salas para treino individual de pianoe a enfermaria. No pavimento inferior um grande refeitório com móveis em jacarandá escuro, salasde visita e estar, copa e uma grande cozinha com fogão industrial à lenha o que possibilita águaquente nas torneiras através de serpentinas.Tudo no internato funcionava como um relógio. Os afazeres domésticos faziam parte do “treino” eaprendizagem diária através de tarefas semanais e quinzenais. A turma do café se levantava às 6hda manhã, preparava e o arruma nas mesas “à moda francesa”. As outras poderiam dormir umpouco mais, até 6h40 e ao sair do quarto as camas deveriam estar impecavelmente arrumadas, poisàs 7h em ponto, o sino chamava para o café. Até 9h todo o trabalho doméstico deveria estarrealizado. Das 9h às 11h as aulas. Das 11h às 12h o horário era livre e o almoço servidopontualmente. As ajudantes de cozinha usavam este tempo no preparo das saladas arrumamdo-asartisticamente nas travessas. Após o almoço, que não deveria passar de meia hora, entrava em cenaa equipe da louça. Para as demais, descanso obrigatório até as 13h30 quando começavam as aulas

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da tarde que iriam normalmente até as 16h. Neste horário o grupo se reunia sob algumas árvorespara o “chá da tarde” com horário livre até as 18h, quando se encontravam na capela para asorações do crepúsculo. Aos domingos o grupo se dividia em duplas para a prática nas igrejas ecomunidades da grande São Paulo. As alunas do primeiro ano desciam juntas pela manhã e noite,por dois quilômetros, até a parada Deodoro onde pegavam o bonde para Santo Amaro. Para issocontavam com a companhia das professoras Dina ou Sarah. Esta rotina do Instituto acontecia emRibeirão Preto e continuou em São Paulo sob os olhos atentos e vigilantes das diretoras.Como parte da rotina, uma vez por semana, as alunas recebiam um missionário agrônomo que asorientava sobre o trabalho com a terra no preparo de hortas onde trabalhavam em duplas. Como esteespaço ficava entre a casa principal e a casa das professoras, cada canteiro era observadocuidadosamente pela diretora. As hortaliças representavam uma participação direta na economia dointernato.Á esquerda da casa, entrando pelo portão nº 01 da chácara, havia uma quadra onde sob a orientaçãode Francês Barnes as alunas praticavam esportes e faziam exercícios físicos.Mas esta rotina foi quebrada no início dos anos 60 quando algumas mudanças começam a serpercebidas. Houve crise no sistema político, a ditadura chegou e a crise na estrutura socialdesarticulou o país com as perseguições aos sindicatos e às organizações estudantis. A igreja sofreuum grande impacto, pois muitos de seus jovens foram perseguidos e mortos. Em meio às crisesinúmeros educadores discutiam as reformas da educação no Brasil. Crescia a consciência social daIgreja, especialmente entre a juventude.Houve mudanças no Ensino Superior que se voltou para o Ensino Profissionalizante transformando-se em preparação de mão de obra especializada. Esta era a grande necessidade empresarial domomento e para isso as escolas precisaram se adaptar. O IM não se adaptou e enfrentou umaconvulsão interna. As alunas desejavam um curso reconhecido pelo Mec e a possibilidade decontinuar estudando. Além disso, a Igreja Metodista passou por um momento de questionamentosquanto ao modelo americanizado de ensino. O IM continuava mantendo em sua direção uma norte-americana e isto foi duramente contestado. As alunas se posicionaram claramente contra estemodelo administrativo e a crise se tornou insustentável. A queda da matrícula inviabilizou ointernato. Neste contexto, o curso de Educação Religiosa precisava ser repensado e o caminhoencontrado pelo Conselho Superior da Instituição foi transforma-lo em Faculdade de EducaçãoCristã6. E, sem nenhuma explicação para o grupo interno, aparece um anúncio na Revista VozMissionária, periódico da Igreja Metodista, dizendo que o curso seria extinto em três anos e o IMfecharia suas portas.Em 1966, o internato recebeu 9 alunas com o secundário as quais ingressaram na recem-abertaFaculdade de Educação Cristã. Em 1967, 4 jovens e em 1968 apenas 2. Neste mesmo ano umagrave crise no país e na Igreja provocou o fechamento da Faculdade de Teologia e,conseqüentemente a Faculdade de Educação Cristã aberta nas dependências do IM enquantoespaço de preparação de mulheres que serviriam a Igreja e à comunidade também foi encerrada.Trago na memória o passado recente desta Instituição e percebo através dos periódicos, revistas ejornais da igreja, que seu fechamento não foi bem explicitado. Há muitas suspeitas: O trabalhorealizado pelas diaconisas formadas pelo Instituto, realmente conseguia atender às exigênciasreclamadas pela Igreja e Instituições? É possível que a informalidade do curso, seu nãoreconhecimento pelo MEC, tenha tido algum peso nesta decisão? Em que medida fatores políticosda época influenciaram nesta descontinuidade? Que tipo de formação/educação era ministrada àsalunas? O currículo oferecia espaços para uma visão mais crítica da sociedade? Fechou por haver

6 O Instituto Metodista anuncia que será a última matrícula regular e que, formada esta turma, o Institutoencerrará suas atividades. Na mesma propaganda também há a notícia da criação da Faculdade de EducaçãoCristã, a ser iniciado no ano de 1966.

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se isolado da corrente cultural do momento, pela posição machista de uma igreja, viciada a entregaras melhores tarefas aos homens?Nesta pesquisa tentarei esclarecer estes questionamentos diante da igreja e da comunidade. Minhaintenção é levantar uma história que está se perdendo à medida em que as ex-alunas e ex-professoras vão morrendo, por ser um grupo que não se renova, a mais nova hoje está completandosessenta anos. Além disso, esta história está registrada apenas informalmente na vida e nalembrança das pessoas, pouca coisa se encontra nos documentos pois muitos se perderam quandoda transferência do acervo do IM para a Faculdade de Teologia em São Bernardo do Campo, SãoPaulo.É possível que a Igreja ainda possa fazer empreendimentos nesta linha para a educação da mulherleiga, uma vez que após o fechamento do curso no Instituto Metodista em Santo Amaro, ficou umalacuna na prática do Ensino Religioso na Igreja, e esta história documentada servirá como umareflexão.

Bibliografia:1- SOARES, Magda. Metamemória-Memórias travessia de uma educadora, 2ª ed. S.Paulo:

Cortez, 20012- CÂNONES – Colégio Episcopal da Igreja Metodista, Imprensa Metodista, 19553- CÂNONES – Colégio Episcopal da Igreja Metodista, Imprensa Metodista, 19714- Expositor Cristão 01.09.49 - Jornal periódico da Igreja Metodista5- "INSTITUTO METODISTA" (Artigo). Expositor Cristão, 28 DE DEZEMBRO DE 1950,

p.5.