Zoneamento Ambiental de Um Seto - Dimas Antonio Da Silva

254
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA PROGRAMA DE GEOGRAFIA FÍSICA ZONEAMENTO AMBIENTAL DE UM SETOR DO PARQUE ESTADUAL DA CANTAREIRA E ENTORNO SECCIONADO PELA RODOVIA FERNÃO DIAS (BR 381) Dimas Antônio da Silva São Paulo 2005

description

ZONEAMENTO AMBIENTAL DE UM SETO - Dimas Antonio da Silva.p

Transcript of Zoneamento Ambiental de Um Seto - Dimas Antonio Da Silva

  • UNIVERSIDADE DE SO PAULO

    FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CINCIAS HUMANAS

    DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA

    PROGRAMA DE GEOGRAFIA FSICA

    ZONEAMENTO AMBIENTAL DE UM SETOR DO PARQUE ESTADUAL DA CANTAREIRA E ENTORNO SECCIONADO PELA RODOVIA

    FERNO DIAS (BR 381)

    Dimas Antnio da Silva

    So Paulo

    2005

  • UNIVERSIDADE DE SO PAULO

    FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CINCIAS HUMANAS

    DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM GEOGRAFIA FSICA

    ZONEAMENTO AMBIENTAL DE UM SETOR DO PARQUE ESTADUAL

    DA CANTAREIRA E ENTORNO SECCIONADO PELA RODOVIA FERNO DIAS (BR 381)

    Dimas Antnio da Silva

    Tese apresentada ao Programa de Ps-graduao em Geografia Fsica do Departamento de Geografia, da Faculdade de Filosofia, Letras e Cincias Humanas, da Universidade de So Paulo, para obteno do ttulo de Doutor em Cincias.

    Orientadores: Prof. Dr. Felisberto Cavalheiro (In Memoriam)

    Prof. Dr. Jos Bueno Conti

    So Paulo

    2005

  • AAGGRRAADDEECCIIMMEENNTTOOSS

    Agradeo a todos aqueles que direta ou indiretamente contriburam para a

    elaborao deste trabalho.

    memria do Prof. Dr. Felisberto Cavalheiro pela amizade e orientao tanto no

    Mestrado quanto na fase inicial do Doutorado.

    Ao Prof. Dr. Jos Bueno Conti e Prof. Dr. Jurandyr Luciano Sanches Ross pela

    adoo, apoio e orientao na fase final da tese.

    Agradecimento especial a Cludia Harumi Yuhara pelo incentivo, apoio e amor.

  • ZZOONNEEAAMMEENNTTOO AAMMBBIIEENNTTAALL DDEE UUMM SSEETTOORR DDOO PPAARRQQUUEE EESSTTAADDUUAALL DDAA

    CCAANNTTAARREEIIRRAA EE EENNTTOORRNNOO SSEECCCCIIOONNAADDOO PPEELLAA RROODDOOVVIIAA FFEERRNNOO DDIIAASS ((BBRR

    338811))

    RREESSUUMMOO

    Este estudo apresenta o zoneamento ambiental de um setor do Parque Estadual da

    Cantareira e entorno seccionado pela Rodovia Ferno Dias (BR 381). Foi realizado

    com base em uma abordagem sistmica, considerando-se a integrao das

    informaes referentes ao meio fsico-bitico, uso da terra e aspectos legais, obtidas

    por meio de levantamentos bibliogrfico e cartogrfico, interpretao de produtos de

    sensores remotos e trabalhos de campo. A rea de estudo apresenta trs setores

    bem distintos: na face norte observa-se uma ocupao esparsa entremeada por

    remanescentes florestais expressivos; na face sul ocorre uma maior diversidade de

    classes de uso da terra, caracterizada por reas urbanas consolidadas e em processo

    de urbanizao, atividades hortifrutigranjeiras, pedreiras, aterros sanitrios,

    reflorestamentos e cobertura florestal mais fragmentada; separando estas duas faces,

    destaca-se o Parque Estadual da Cantareira coberto, em quase sua totalidade, pela

    floresta nativa. Verificou-se que os instrumentos de planejamento urbano e a

    legislao ambiental incidentes na rea no foram eficientes no controle da expanso

    da mancha urbana em direo ao Parque, ocasionando a ocupao de setores

    frgeis do ponto de vista geomorfolgico e a degradao ambiental. A proposta de

    zoneamento ambiental e as recomendaes apresentadas procuram subsidiar a

    reviso do plano de manejo do Parque, colaborar para definio de sua zona de

    amortecimento, de modo a reverter a tendncia crescente de isolamento desta

    unidade de conservao no contexto urbano, e contribuir para sua preservao,

    contribuindo para a melhoria da qualidade ambiental da Regio Metropolitana de So

    Paulo.

    Palavras-chave: Unidade de Conservao, Uso da Terra, Fragilidade Ambiental,

    Instrumentos de Planejamento, Zoneamento Ambiental.

  • EENNVVIIRROONNMMEENNTTAALL ZZOONNIINNGG OOFF AA SSEEGGMMEENNTT OOFF PPAARRQQUUEE EESSTTAADDUUAALL DDAA

    CCAANNTTAARREEIIRRAA ((CCAANNTTAARREEIIRRAA SSTTAATTEE PPAARRKK)) AANNDD IITTSS BBOORRDDEERRSS CCRROOSSSSEEDD BBYY

    FFEERRNNOO DDIIAASS HHIIGGHHWWAAYY ((BBRR 338811))

    AABBSSTTRRAACCTT

    This study presents the zoning considering a segment of Cantareira State Park

    (Parque Estadual da Cantareira). This segment is crossed by Ferno Dias Highway

    (BR 381). This research was conducted based on a systematic approach, considering

    the integration of information related to the physical and biotic environment, land use,

    and law aspects, gathered via literature review, cartographic materials, interpretation

    of the remote sensing outcomes and fieldwork. The studied area presents three well

    defined segments: the north-facing segment allows observation of sparse occupation

    with expression of forest remainders, the south-facing segment presents a higher

    diversity of categories of land use, characterized by urban areas and areas in process

    of urbanization, horticultural activities, stone extraction areas, sanitary waste dump

    area, reforestation and a fragmented forest. The Cantareira State Park (Parque

    Estadual da Cantareira) separates these two areas, and it is almost entirely covered

    by the native forest. I could verify that urban planning instruments and environmental

    legislation in the studied area were not efficient in controlling the urban expansion

    directed to the park, allowing the urbanization of fragile segments from a

    geomorphologic standpoint and, also, environmental degradation. The purpose of

    environmental zoning and the recommendations presented here aim at subsidizing

    the park management plan review, supporting the definition of its buffer zone, as a

    way of reverting the increasing trend of isolation of this urban conservation unit, and

    contributing to its conservation, providing for the improvement of the environmental

    quality within the metropolitan area of Sao Paulo.

    Keywords: Conservation Areas, Land Use, Environmental Fragility, Assessment of

    Planning, Environmental Zoning.

  • LLIISSTTAA DDEE FFIIGGUURRAASS

    Figura 1 Esboo terico do Geossistema....................................................... 18

    Figura 2 Fluxo da relao sociedade/natureza.............................................. 25

    Figura 3 Interaes entre planejamento e gerenciamento ambiental............ 27

    Figura 4 Classificao taxonmica do relevo................................................. 34

    Figura 5 Mapa de localizao da rea de estudo........................................... 52

    Figura 6 Imagem de satlite IKONOS II da rea de estudo........................... 53

    Figura 7 Grfico do balano hdrico mensal da rea de estudo, segundo Thornthwaite; Mather (1955)............................................................ 55

    Figura 8 Mapa geolgico da rea de estudo.................................................. 57

    Figura 9 Mapa hipsomtrico da rea de estudo ............................................ 60

    Figura 10 Mapa clinogrfico da rea de estudo............................................... 62

    Figura 11 Mapa de morfologia de vertentes da rea de estudo....................... 63

    Figura 12 Relevo sombreado da rea de estudo............................................. 64

    Figura 13 Mapa de compartimentao morfolgica da rea de estudo........... 65

    Figura 14 Mapa de solos da rea de estudo.................................................... 68

    Figura 15 Mapa da rede de drenagem da rea de estudo............................... 72

    Figura 16 Mapa de zoneamento do Parque Estadual da Cantareira............... 81

    Figura 17 Enquadradamento das zonas por graus de interveno.................. 97

  • Figura 18 Zoneamento do uso do solo dos municpios de So Paulo, Guarulhos e Mairipor anterior ao ano de 2004............................... 110

    Figura 19 Macrozoneamento do uso do solo dos municpios de So Paulo,

    Guarulhos e Mairipor...................................................................... 112

    Figura 20 Zoneamento do uso do solo dos municpios de So Paulo, Guarulhos e Mairipor posterior ao ano de 2004............................. 115

    Figura 21 Representao espacial do artigo 2, alnea a do Cdigo Florestal

    e artigo 3, alnea b, inciso II e III da Resoluo CONAMA n

    004/85 e transgresses.................................................................... 143

    Figura 22 Representao espacial do artigo 3, alnea b, inciso V da Resoluo CONAMA n 004/85 e transgresses............................ 145

    Figura 23 Representao espacial do artigo 2, pargrafo nico do Cdigo Florestal e transgresses................................................................. 147

    Figura 24 Mapa sntese da rea de estudo...................................................... 148

    Figura 25 Representao espacial do artigo 2, incisos II, III, IV, V e VII da Lei de Proteo aos Mananciais (Lei Estadual n

    1.172/76).......................................................................................... 150

    Figura 26 Representao espacial do artigo 3, pargrafo nico, inciso III da Lei de Parcelamento do Solo Urbano (Lei Lehmann) e

    transgresses................................................................................... 154

    Figura 27 reas das classes de uso da terra da rea de estudo - ano de

    1962................................................................................................. 159

    Figura 28 Mapa de uso e ocupao da terra da rea de estudo - ano de 1962................................................................................................. 160

  • Figura 29 reas das classes de uso da terra da rea de estudo - anos de 1980/81............................................................................................ 164

    Figura 30 Mapa de uso e ocupao da terra da rea de estudo - anos de 1980/81............................................................................................ 165

    Figura 31 reas das classes de uso da terra da rea de estudo - ano de 2004................................................................................................. 172

    Figura 32 Mapa de uso e ocupao da terra da rea de estudo - ano de 2004................................................................................................. 173

    Figura 33 Evoluo da mata - perodo de 1962 a 2004................................... 182

    Figura 34 Evoluo dos reflorestamentos - perodo de 1962 a 2004............... 183

    Figura 35 Evoluo das atividades hortifrutigranjeiras - perodo de 1962 a

    2004................................................................................................. 183

    Figura 36 Evoluo dos campos antrpicos/pastagens - perodo de 1962 a 2004................................................................................................. 184

    Figura 37 Evoluo dos bairros de mdio padro - perodo de 1962 a 2004.. 184

    Figura 38 Evoluo das casas autoconstrudas - perodo de 1962 a 2004..... 185

    Figura 39 Evoluo das reas residenciais parcialmente ocupadas - perodo de 1962 a 2004................................................................................ 185

    Figura 40 Evoluo dos condomnios de alto padro e chcaras residenciais com baixa densidade de ocupao - perodo de 1962 a 2004........ 186

    Figura 41 Evoluo dos loteamentos desocupados - perodo de 1962 a 2004................................................................................................. 186

    Figura 42 Evoluo das indstrias na - perodo de 1962 a 2004..................... 187

  • Figura 43 Evoluo das pedreiras ativas - perodo de 1962 a 2004................ 187

    Figura 44 Evoluo das olarias - perodo de 1962 a 2004............................... 188

    Figura 45 Evoluo dos clubes - perodo de 1962 a 2004............................... 188

    Figura 46 Evoluo das reas institucionais - perodo de 1962 a 2004........... 188

    Figura 47 Evoluo dos movimentos de terra/solo exposto - perodo de 1962 a 2004..................................................................................... 189

    Figura 48 Tendncia de crescimento das reas urbanas ou em processo de urbanizao e das reas florestadas para o perodo de 1962 a

    2004................................................................................................. 189

    Figura 49 Mapa de evoluo da ocupao urbana na rea de estudo para o perodo de 1962 a 2004................................................................... 190

    Figura 50 Mapa de evoluo da cobertura florestal natural na rea de estudo para o perodo de 1962 a 2004............................................ 191

    Figura 51 Mapa de fragilidade ambiental da rea de estudo........................... 197

    Figura 52 Mapa de zoneamento ambiental da rea de estudo........................ 205

  • LLIISSTTAA DDEE TTAABBEELLAASS

    Tabela 1 rea do setor do Parque Estadual da Cantareira e entorno

    seccionado pela rodovia Ferno Dias ............................................ 51

    Tabela 2 reas dos municpios no setor do Parque Estadual da Cantareira e entorno seccionado pela rodovia Ferno Dias.............................. 51

    Tabela 3 Balano hdrico da rea de estudo, segundo Thornthwaite; Mather (1955)............................................................................................... 54

    Tabela 4 reas (ha e %) das classes de uso da terra da rea de estudo - ano de 1962..................................................................................... 158

    Tabela 5 reas (ha e %) das classes de uso da terra da rea de estudo - anos de 1980/81............................................................................... 163

    Tabela 6 reas (ha e %) das classes de uso da terra da rea de estudo - ano de 2004..................................................................................... 171

    Tabela 7 Declividades e classes de fragilidade morfodinmica...................... 193

    Tabela 8 Declividades, solos e litologias dominantes e classes de fragilidade......................................................................................... 194

    Tabela 9 Tipos de uso da terra, graus de proteo ao solo e classes de fragilidade......................................................................................... 196

  • LLIISSTTAA DDEE QQUUAADDRROOSS

    Quadro 1 Diviso taxonmica do Geossistema............................................... 3

    Quadro 2 Classificao taxonmica da paisagem........................................... 17

    Quadro 3 Classificao taxonmica dos fatos geomorfolgicos...................... 31

    Quadro 4 Esquema geral de classificao do relevo da Terra........................ 32

    Quadro 5 Aplicao dos critrios de zoneamento e identificao da vocao de uma rea..................................................................................... 98

    Quadro 6 Categorias de uso e rea mnima de lote permitidas na zona de uso Z8-100, segundo o Decreto Municipal n 11.106/74................. 106

    Quadro 7 Categorias de uso e reas mnimas de gleba e lote permitidas na

    zona rural (Z8-100), segundo a Lei Municipal n 9.412/81.............. 108

    Quadro 8 Zonas de uso ocorrentes na rea de estudo e a dimenso mnima

    de lote, segundo a Lei Municipal n 13.885/04................................ 116

    Quadro 9 Categorias de uso e rea mnima de lote permitidas nas zonas

    ocorrentes na rea de estudo, segundo a Lei Municipal n

    2.360/80 .......................................................................................... 118

    Quadro 10 Categorias de uso e rea mnima de lote permitidas nas zonas

    ocorrentes na rea de estudo, segundo a Lei Municipal n

    3.733/90........................................................................................... 120

    Quadro 11 Categorias de uso e rea mnima de lote permitidas nas zonas

    ocorrentes na rea de estudo, segundo a Lei Municipal n

    4.818/96........................................................................................... 121

    Quadro 12 Classes de uso da terra da rea de estudo..................................... 156

  • LLIISSTTAA DDEE FFOOTTOOGGRRAAFFIIAASS

    Fotografia 1 Obras de duplicao da rodovia Ferno Dias paralisadas no interior do Parque Estadual da Cantareira............................... 138

    Fotografia 2 Depsito de lixo e entulho ao lado da avenida Coronel Sezefredo Fagundes, no interior do Parque Estadual da

    Cantareira................................................................................ 151

    Fotografia 3 Jardim das Pedras situada ao lado da pedreira Cachoeira e remanescentes florestais, municpio de So Paulo................. 167

    Fotografia 4 Plancie fluvial do rio Cabuu de Cima ocupada por plantao de chuchu e mata secundria recobrindo Morros

    Baixos, municpio de Guarulhos.............................................. 176

    Fotografia 5 Casas autoconstrudas situadas ao lado da rodovia Ferno Dias, municpio de So Paulo.................................................. 178

    Fotografia 6 Condomnio de alto padro e chcaras residenciais com

    baixa densidade de ocupao situada em relevo de Serras e

    Escarpas, municpio de Mairipor............................................ 179

    Fotografia 7 Aterro sanitrio de Guarulhos e, ao fundo, aterro sanitrio de

    So Paulo em rea da pedreira FIRPAVI................................ 181

    Fotografia 8 Setor do Parque Estadual da Cantareira de Fragilidade

    Potencial Alta (13). Ao fundo avista-se a cidade de So

    Paulo coberta com densa camada de poluio....................... 198

    Fotografia 9 Loteamento em terreno de Fragilidade Emergente Alta (33)

    no municpio de So Paulo. Notar os processos erosivos

    originados pelo escoamento concentrado das guas pluviais. 201

  • Fotografia 10 - Zona Histrico-Cultural (Barragem do Engordador) e, ao

    fundo, Zona Intangvel do Parque Estadual da Cantareira...... 208

    Fotografia 11 - Zona de Uso Conflitante representada pela rodovia Ferno

    Dias. Notar a cicatriz de escorregamento na margem desta

    rodovia..................................................................................... 210

  • SSIIGGLLAASS

    AEU rea de Expanso Urbana

    APA rea de Proteo Ambiental

    APP rea de Preservao Permanente

    APRM rea de Proteo e Recuperao dos Mananciais

    BID Banco Interamericano de Desenvolvimento

    CASC Congregao das Associaes da Serra da Cantareira

    CECAP Conjunto Habitacional Zezinho de Magalhes Prado

    CETESB Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental

    CINP Coordenadoria de Informaes Tcnicas, Documentao e

    Pesquisa Ambiental

    COGEP Coordenadoria Geral de Planejamento

    COHAB Companhia Metropolitana de Habitao

    CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente

    CONDEPHAAT Conselho de Defesa do Patrimnio Histrico, Arqueolgico,

    Artstico e Turstico do Estado de So Paulo

    DAEE Departamento de guas e Energia Eltrica

    DER Departamento de Estradas de Rodagem

    DNER Departamento Nacional de Estradas de Rodagem

  • DNIT Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes

    EIA Estudo de Impacto Ambiental

    EIA/RIMA Estudo de Impacto Ambiental/Relatrio de Impacto Ambiental

    EMPLASA Empresa Metropolitana de Planejamento da Grande So Paulo

    SA.

    ETA Estao de Tratamento de gua

    ETEL Estudos Tcnicos Ltda.

    FAO Organizao das Naes Unidas para a Agricultura e

    Alimentao

    FEAM/MG Federao Estadual para o Meio Ambiente de Minas Gerais

    FEHIDRO Fundo Estadual dos Recursos Hdricos

    FFLCH Faculdade de Filosofia, Letras e Cincias Humanas

    GEGRAN Grupo Executivo da Grande So Paulo

    IAC Instituto Agronmico de Campinas

    IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais

    Renovveis

    IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    ICMS Imposto sobre Circulao de Mercadorias e Prestao de

    Servios

    IGC Instituto Geogrfico e Cartogrfico

    INCRA Instituto Nacional de Colonizao e Reforma Agrria

  • INMET Instituto Nacional de Meteorologia

    INPE Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais

    IPT Instituto de Pesquisas Tecnolgicas do Estado de So Paulo

    MDEU Macrozona de Dinamizao Econmica e Urbana

    MMA Ministrio do Meio Ambiente

    MNT Modelo Numrico de Terreno

    MPA Macrozona de Proteo Ambiental

    MUC Macrozona de Urbanizao Consolidada

    MUD Macrozona de Urbanizao e Desenvolvimento

    MUR-U Macrozona de Uso Rural-Urbano

    PDDI-SP Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado de So Paulo

    PDE Plano Diretor Estratgico do Municpio de So Paulo

    PDPA Plano de Desenvolvimento e Proteo Ambiental

    PMDI Plano Metropolitano de Desenvolvimento Integrado

    PNMA Poltica Nacional do Meio Ambiente

    PREs Planos Regionais Estratgicos

    PUB Plano Urbanstico Bsico

    RBCV Reserva da Biosfera do Cinturo Verde da Cidade de So Paulo

    RIMA Relatrio de Impacto Ambiental

    RMSP Regio Metropolitana de So Paulo

  • RPPN Reserva Particular do Patrimnio Natural

    SA Sociedade Annima

    SAAE Servio Autnomo de gua e Esgoto de Guarulhos

    Sabesp Companhia de Saneamento Bsico do Estado de So Paulo

    SEADE Fundao Sistema Estadual de Anlise de Dados

    SIG Sistema de Informao Geogrfica

    SISNAMA Sistema Nacional do Meio Ambiente

    SMA Secretaria do Meio Ambiente

    SNUC Sistema Nacional de Unidades de Conservao

    UGRHI Unidade de Gerenciamento de Recursos Hdricos

    UNESCO Organizao das Naes Unidas para Educao, Cincia e

    Cultura

    USP Universidade de So Paulo

    ZEE Zoneamento Ecolgico-Econmico

    ZEH Zona de Uso Estritamente Habitacional

    ZEIS Zona Especial de Interesse Social

    ZEP Zona Especial de Preservao

    ZEPAG Zona Especial de Produo Agrcola e Extrao Mineral

    ZEPAM Zona Especial de Preservao Ambiental

    ZEPEC Zona Especial de Preservao Cultural

  • ZERp Zona Exclusivamente Residencial de Proteo Ambiental

    ZH Zona de Uso Habitacional

    ZLT Zona de Lazer e Turismo

    ZMp Zona Mista de Proteo Ambiental

    ZPDS Zona de Proteo e Desenvolvimento Sustentvel

    ZPH Zona de Uso Predominantemente Habitacional

    ZRA Zona de Reserva Ambiental

    ZRD Zona de Uso Rural Diversificado

    ZUD Zona de Uso Diversificado

    ZUM Zona de Uso Misto

    ZUR Zona de Uso Rural

  • SSUUMMRRIIOO

    CAPTULO 1 - APRESENTAO...................................................................... 1

    1.1 Introduo.............................................................................................. 1

    1.2 Justificativa............................................................................................ 2

    1.3 Objetivos................................................................................................ 4

    1.3.1 Geral...................................................................................................... 4

    1.3.2 Especfico.............................................................................................. 4

    CAPTULO 2 - FUNDAMENTOS TERICOS......................................................... 6

    2.1 Abordagem Geossistmica como Suporte Anlise Geogrfica

    Integrada................................................................................................ 6

    2.2 Anlise Geogrfica Integrada Aplicada ao Planejamento Ambiental.... 22

    2.3 Geomorfologia Aplicada na Anlise Integrada...................................... 29

    2.3.1 Taxonomia das Formas de Relevo........................................................ 31

    2.3.2 Cartografia Geomorfolgica................................................................... 36

    2.3.3 Anlise da Fragilidade Ambiental.......................................................... 38

    CAPTULO 3 - METODOLOGIA ADOTADA E PROCEDIMENTOS TCNICO -

    OPERACIONAIS..................................................................... 41

    3.1 Definio da rea de Estudo................................................................. 41

    3.2 Procedimento Metodolgico.................................................................. 41

    3.3 Procedimentos Tcnico-Operacionais................................................... 45

    3.3.1 Os Componentes da Paisagem............................................................. 45

    3.3.2 Mapa Hipsomtrico................................................................................ 46

    3.3.3 Mapa Clinogrfico.................................................................................. 46

    3.3.4 Mapa de Morfologia de Vertentes.......................................................... 47

    3.3.5 Representao Espacial da Legislao Ambiental e Lei de

    Parcelamento do Solo Urbano (Lei Lehmann)...................................... 48

    3.3.6 Mapa de Fragilidade Ambiental............................................................. 49

  • 3.3.7 Mapa de Zoneamento Ambiental........................................................... 49

    3.4 Materiais Utilizados................................................................................ 49

    3.4.1 Documentos Cartogrficos.................................................................... 49

    3.4.2 Produtos de Sensores Remotos............................................................ 50

    3.5 Atividades de Campo............................................................................. 50

    CAPTULO 4 - A REA DE ESTUDO................................................................ 51

    4.1 Localizao............................................................................................ 51

    4.2 Clima...................................................................................................... 51

    4.3 Geologia................................................................................................ 56

    4.4 Geomorfologia....................................................................................... 59

    4.5 Solos...................................................................................................... 67

    4.6 Vegetao.............................................................................................. 70

    4.7 Rede de Drenagem............................................................................... 71

    CAPTULO 5 - O PARQUE ESTADUAL DA CANTAREIRA....................................... 73

    5.1 O Parque Estadual da Cantareira.......................................................... 73

    5.2 Consideraes sobre o Plano de Manejo do Parque Estadual da

    Cantareira.............................................................................................. 87

    5.2.1 Metodologia........................................................................................... 78

    5.2.2 Zonas de Manejo................................................................................... 80

    5.2.3 Programas de Desenvolvimento............................................................ 83

    5.2.4 Entorno.................................................................................................. 84

    CAPTULO 6 - CRITRIOS E NORMAS PARA GESTO DE UNIDADES DE

    CONSERVAO................................................................... 86

    6.1 Sistema Nacional de Unidades de Conservao.................................. 86

    6.2 Zona de Amortecimento........................................................................ 87

    6.3 Roteiro Metodolgico de Planejamento voltado para Parques

    Nacionais, Reservas Biolgicas e Estaes Ecolgicas....................... 94 6.3.1 Zoneamento........................................................................................... 94

  • 6.3.2 Critrios para Identificao da Zona de Amortecimento........................ 98

    6.3.2.1 Critrios para Incluso de reas na Zona de Amortecimento............... 99

    6.3.2.2 Critrios para No-Incluso de reas na Zona de Amortecimento....... 100

    6.3.2.3 Critrios de Ajuste................................................................................. 100

    CAPTULO 7 - AVALIAO DOS INSTRUMENTOS DE PLANEJAMENTO E

    GESTO TERRITORIAL......................................................... 101

    7.1 Plano Diretor e Lei de Zoneamento do Solo.......................................... 101

    7.1.1 Municpio de So Paulo......................................................................... 101

    7.1.2 Municpio de Guarulhos......................................................................... 116

    7.1.3 Municpio de Mairipor.......................................................................... 124

    7.2 Leis de Proteo aos Mananciais da Regio Metropolitana de So

    Paulo...................................................................................................... 125

    7.3 EIA/RIMA da Duplicao da Rodovia Ferno Dias (BR 381)................ 129

    CAPTULO 8 - REPRESENTAO ESPACIAL DA LEGISLAO AMBIENTAL E DA LEI

    DE PARCELAMENTO DO SOLO URBANO (LEI LEHMANN)................. 140

    8.1 Representao Espacial da Legislao Ambiental Cdigo Florestal

    e Resoluo CONAMA n 004/85 e Transgresses.............................. 140

    8.2 Representao Espacial da Legislao Ambiental Lei de Proteo

    aos Mananciais da Regio Metropolitana de So Paulo e

    Transgresses....................................................................................... 149

    8.3 Representao Espacial da Lei de Parcelamento do Solo Urbano (Lei

    Lehmann) e Transgresses................................................................... 152

    CAPULO 9 - USO E OCUPAO DA TERRA...................................................... 156

    9.1 Uso e Ocupao da Terra - ano de 1962.............................................. 157

    9.2 Uso e Ocupao da Terra - anos de 1980/81....................................... 162

    9.3 Uso e Ocupao da Terra - ano de 2004.............................................. 171

    9.4 Evoluo do Uso e Ocupao da Terra no perodo de 1962 a 2004.... 182

  • CAPTULO 10 - CARACTERIZAO DA FRAGILIDADE AMBIENTAL........................ 192

    10.1 Mapa de Fragilidade Ambiental............................................................. 192

    10.2 Fragilidade Ambiental da rea de Estudo............................................. 196

    CAPTULO 11 - ZONEAMENTO AMBIENTAL...................................................... 203

    11.1 Zoneamento de um setor do Parque Estadual da Cantareira,

    seccionado pela Rodovia Ferno Dias.................................................. 204

    11.2 Zona de Amortecimento do entorno do Parque Estadual da

    Cantareira seccionado pela Rodovia Ferno Dias................................ 211

    CONSIDERAES FINAIS.............................................................................. 217

    REFERNCIAS............................................................................................ 219

  • CCAAPPTTUULLOO 11 AAPPRREESSEENNTTAAOO

    1.1 Introduo

    No ano de 2000, defendi a minha Dissertao de Mestrado intitulada Evoluo do

    uso e ocupao da terra no entorno dos Parques Estaduais da Cantareira e Alberto

    Lfgren e impactos ambientais decorrentes do crescimento metropolitano.

    No ano de 2001, ingressei no Curso de Doutorado da Faculdade de Filosofia, Letras

    e Cincias Humanas (FFLCH) da Universidade de So Paulo (USP). Como tema de

    pesquisa decidi continuar os estudos referentes ao Parque Estadual da Cantareira

    em virtude da importncia ambiental desta unidade de conservao para a Grande

    So Paulo e do grande nmero de informaes levantadas na elaborao do

    Mestrado.

    Com o trabalho Zoneamento ambiental de um setor do Parque Estadual da

    Cantareira e entorno seccionado pela rodovia Ferno Dias (BR 381) proponho

    aprofundar as discusses sobre planejamento ambiental, ecologia urbana e

    conservao dos recursos naturais. Tentarei responder s indagaes j

    apresentadas no Mestrado e no totalmente esclarecidas, ou seja:

    Como manejar uma unidade de conservao dentro de um contexto

    metropolitano?

    Como o Poder Pblico e a comunidade tm atuado na conservao deste reduto

    de rea natural?

    possvel controlar o uso e a ocupao do solo por meio da criao de uma

    zona de amortecimento ao redor desse Parque, uma vez que, por exemplo, o

    Cdigo Florestal e as Leis de Proteo aos Mananciais no so respeitados?

    Como reverter a degradao ambiental no entorno desses parques e preserv-

    los?

    O Plano de Manejo para o Parque Estadual da Cantareira, elaborado em 1974,

    foi um instrumento eficiente para a sua proteo?

    Como foi realizado o manejo do Parque Estadual da Cantareira desde ento?

    1

  • Essas perguntas nortearo o desenvolvimento do trabalho e, como caracterstico

    de toda pesquisa cientfica, outras surgiro. Todavia, apresentarei consideraes e

    recomendaes com o intuito de colaborar com a conservao do Parque Estadual

    da Cantareira e seu entorno.

    1.2 Justificativa

    O Parque Estadual da Cantareira localiza-se em rea altamente urbanizada e

    fundamental para a manuteno da qualidade ambiental da Regio Metropolitana

    de So Paulo.

    A relevncia dessa rea evidenciada pela Resoluo n 18 do Conselho de

    Defesa do Patrimnio Histrico, Arqueolgico, Artstico e Turstico do Estado

    (CONDEPHAAT), de 4 de agosto de 1983, que tomba os Parques Estaduais da

    Cantareira e Alberto Lfgren em virtude do seu grande valor geolgico,

    geomorfolgico, hidrolgico e paisagstico; da sua condio mltipla de banco

    gentico de natureza tropical dotada de ecossistemas representativos em termos de

    flora e fauna; e de sua atuao como espao serrano regulador para a manuteno

    do equilbrio e das qualidades ambientais e dos recursos hdricos da regio

    metropolitana de So Paulo.

    AbSaber (2004) comenta que no Planalto Paulistano, a Serra da Cantareira

    constitui o exemplo maior em termos de exigncias defensivas integradas e

    estratgicas. Afirma tambm que a Serra um edifcio geolgico, um patrimnio

    geomorfolgico, e um grande reduto de florestas tropicais de planaltos, at h

    pouco tempo intocado; mas, vem sofrendo fortes presses socialmente paradoxais:

    os ricos ocupando loteamentos clandestinos a partir dos morros de Mairipor para

    os reveses da Serra, e os pobres pressionando para invadir a base da serrania

    florestada, nos municpios de So Paulo e Guarulhos.

    Silva (2004) acrescenta ainda que, a floresta da Serra da Cantareira abriga, na face

    norte, as nascentes que alimentam o reservatrio Paiva Castro, pertencentes ao

    Sistema Produtor Cantareira. J na face sul, protege as nascentes das duas

    principais bacias da margem direita do rio Tiet, a do Cabuu de Cima e a do

    2

  • Cabuu de Baixo. Nesse sentido, a vegetao que resguarda essa drenagem

    fundamental no apenas para garantir a produo da gua, bem como contribui

    para a absoro e a reteno das guas pluviais direcionadas bacia hidrogrfica

    do Alto Tiet, retardando seu afluxo para as reas urbanizadas situadas jusante e

    diminuindo o problema de enchentes. A floresta atua tambm na reteno da

    poluio atmosfrica e na atenuao da temperatura metropolitana. Caracteriza-se

    como um verdadeiro celeiro de recursos naturais, resguardando nos seus domnios

    importantes representantes da fauna e da flora brasileiras. Por fim, a sua

    importncia tambm se associa ao imenso potencial voltado ao desenvolvimento de

    atividades de lazer e educao ambiental.

    Apesar de sua importncia ambiental, como destacado anteriormente, essa unidade

    de conservao e sua rea envoltria no possuem um planejamento de uso da

    terra, considerando-se os condicionantes dos meios fsico-bitico e scio-

    econmico, e a legislao incidente. Para que a conservao de uma rea natural

    seja completa fundamental o uso adequado da terra ao seu redor, pois certas

    atividades realizadas fora do seu domnio, podem repercutir negativamente em seu

    interior, degradando-a (SILVA, 2000). Portanto, necessrio verificar quais

    medidas mitigadoras precisam ser implementadas para que haja um melhor

    desempenho da unidade de conservao e assim, possa cumprir com as suas

    funes ecolgicas, sociais e paisagsticas.

    Conforme Morsello (2001), a constatao de que as reas protegidas no podem

    ser tratadas como ilhas leva, conseqentemente, concluso de que estas fazem

    parte de estratgias de manejo em escala maior. Dentre essas estratgias, uma das

    mais importantes, a criao da zona de amortecimento que pode ser definida

    como a poro adjacente rea protegida e na qual o uso da terra parcialmente

    restringido para incorporar uma camada a mais de proteo para a unidade de

    conservao.

    Vio (2001) afirma que a criao e a manuteno das zonas de amortecimento so

    necessrias em virtude das crescentes presses que a zona rural vem sofrendo

    para instalao de indstrias, atividades de servios, centros de lazer e recreao e

    ocupao urbana, todos implantados sem qualquer diretriz e no local de interesse

    exclusivo de cada empreendedor. Como exemplo, a autora destaca a abertura de

    3

  • loteamentos de diversos padres no limite com o Parque Estadual da Cantareira.

    Estes loteamentos situados em encostas instveis so implantados com o aval dos

    municpios adjacentes ao Parque que incluem as reas de entorno da unidade de

    conservao no permetro urbano e as consideram zona de expanso urbana.

    Desta forma, Oliva (2003), comenta que o estabelecimento de zonas de

    amortecimento para unidade de conservao limtrofes a reas urbanizadas ou em

    processo de expanso urbana complexo e deve ser agilizado em virtude da

    dinmica e velocidade da ocupao do territrio.

    Com base nesses pressupostos, prope-se a elaborao do zoneamento de um

    setor do Parque Estadual da Cantareira e seu entorno seccionado pela rodovia

    Ferno Dias, de modo a contribuir para o planejamento do uso e ocupao da terra,

    promovendo assim a reduo das presses antrpicas e a degradao ambiental

    da rea de estudo.

    A definio de uma zona de amortecimento e o controle das atividades a

    desenvolvidas tm o intuito de preservar as reas florestais remanescentes e

    recuperar os ambientes alterados, revertendo-se o quadro progressivo de

    isolamento desta unidade de conservao.

    1.3 Objetivos

    1.3.1 Geral

    Estudar a conservao de uma rea natural no contexto de uma regio

    metropolitana.

    1.3.2 Especficos

    Mapear e caracterizar a rea d estudo quanto aos seus aspectos fsico-biticos,

    uso da terra e legais;

    Mapear e atualizar o uso da terra ao redor do setor do Parque Estadual da

    Cantareira seccionado pela rodovia Ferno Dias;

    4

  • Identificar as presses antrpicas geradas pelas atividades humanas no interior

    e no entorno dessa unidade de conservao;

    Avaliar o Plano de Manejo elaborado para o Parque Estadual da Cantareira;

    Avaliar o Roteiro Metodolgico de Planejamento Parque Nacional, Reserva

    Biolgica, Estao Ecolgica (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos

    Recursos Naturais Renovveis, 2002) como instrumento para a elaborao do

    zoneamento de unidades de conservao;

    Avaliar a eficincia dos instrumentos de planejamento e gesto territorial no

    controle do uso do solo e conservao ambiental;

    Analisar as transgresses legislao incidente (Cdigo Florestal, Leis de

    Proteo aos Mananciais da Regio Metropolitana de So Paulo, Lei de

    Parcelamento do Solo Urbano, Planos Diretores municipais, dentre outros);

    Identificar e mapear a fragilidade das unidades da paisagem, observando-se

    suas limitaes e potenciais de uso;

    Estabelecer critrios para a definio da Zona de Amortecimento do Parque

    Estadual da Cantareira;

    Propor um novo zoneamento para o setor do Parque Estadual da Cantareira e

    seu entorno seccionado pela rodovia Ferno Dias, valendo-se da legislao

    incidente na rea de estudo e dos mapeamentos temticos produzidos por esta

    pesquisa.

    5

  • CCAAPPTTUULLOO 22 FFUUNNDDAAMMEENNTTOOSS TTEERRIICCOOSS

    2.1 Abordagem Geossistmica como Suporte Anlise Geogrfica

    Integrada

    Na realizao deste trabalho utilizou-se a abordagem geossistmica como base

    para a anlise integrada dos diferentes componentes naturais e scio-econmicos

    analisados, o que permite compreender a organizao e funcionamento do espao

    territorial e avaliar a sua qualidade ambiental. Valoriza-se a importncia desse

    referencial terico nos estudos geogrficos, assim como, no planejamento e gesto

    ambiental. Procura-se tambm, com base nessa abordagem, avaliar a eficincia

    das polticas pblicas e os correspondentes instrumentos legais na conservao do

    Parque Estadual da Cantareira e de sua rea de entorno.

    So apresentados, a seguir, alguns fundamentos tericos relativos aos conceitos

    de paisagem e geossistemas, e suas evolues. Percebe-se que no h um

    consenso entre a opinio dos diversos autores analisados e ressalta-se as

    controvrsias e os confrontos.

    Destacam-se, neste captulo, principalmente os trabalhos de gegrafos e

    biogegrafos como V. Sotchava, Georges Bertrand, Jean Tricart e Carlos Augusto

    de Figueiredo Monteiro, dentre outros, que procuram na Geografia Fsica, conforme

    Vale (2004), maior integrao entre os componentes naturais e antrpicos, por

    meio da concepo geossistmica.

    Beck (1973 apud TROPPMAIR, 2000) comenta que atualmente est em voga

    estudar o espao geogrfico de forma integrada. Todavia, essa viso vem desde a

    Antigidade e recebeu ateno especial no sculo XIX, na poca do gegrafo e

    naturalista Alexander von Humboldt . Conforme Rodrigues (2001), uma das fontes

    de inspirao da teoria geossistmica, bem como de outros modelos que visam

    integrao do meio fsico e bitico, foi escola dos naturalistas do sculo XIX.

    6

  • Segundo Moraes (1987), Humboldt entendia a Geografia como a parte terrestre da

    cincia do cosmos, isto , como uma espcie de sntese de todos os

    conhecimentos relativos Terra. Desta forma, a Geografia seria uma disciplina

    eminentemente sinttica, preocupada com a conexo entre os elementos e

    buscando, por meio dessas conexes, a causalidade existente na natureza.

    Com o passar dos anos, a viso total e integrada da Geografia cedeu lugar a

    divises: primeiro Geografia da Natureza e Geografia da Sociedade e,

    posteriormente, ao surgimento de subdivises especficas, tais como, Climatologia,

    Geomorfologia, Hidrografia, Geografia Urbana e Geografia Econmica. Essas,

    apesar de fazerem parte da Cincia Geogrfica, quando vistas de forma isolada

    no so Geografia, so disciplinas ou ramos independentes (TROPPMAIR, 2000),

    adotadas para organizar o ensino ou a pesquisa.

    Por sua vez, Delpoux (1974) comenta que historicamente os estudos geogrficos

    tm consistido em estudos analticos setoriais, no considerando, em geral, outros

    componentes dos conjuntos estudados.

    No incio do sculo XX, Ludwig von Bertalanffy props a Teoria Geral dos Sistemas

    como base analtica e prtica para todas as cincias (GREGORY, 1992). Ross

    (2001a) comenta que essa teoria foi desenvolvida a partir dos princpios fsicos,

    mais especificamente da termodinmica.

    Segundo Gregory (1992), a Teoria Geral dos Sistemas prope que os sistemas

    podem ser definidos como conjuntos de elementos com variveis e caractersticas

    diversas, que mantm relaes entre si e entre o meio ambiente. A anlise pode

    ser dirigida para a estrutura do sistema, seu comportamento que envolve

    transferncia de energia, seus limites, seu ambiente, seu estado, seja de

    transmisso ou de equilbrio, e seus parmetros.

    Para Rodrigues (2001), at meados do sculo XX, a Teoria Geral dos Sistemas

    permaneceu pouco difundida, mas uma srie de apropriaes em diversos ramos

    cientficos ocorreu a partir de ento. Troppmair (2000), acrescenta que na dcada

    de 1930 ressurgiu, com os bilogos, o pensamento integrado e sistmico,

    valorizando-se a viso de relao, de contexto e de dinmica, culminando na

    formalizao do conceito de ecossistema.

    7

  • Conforme Tricart (1977), o conceito de ecossistema foi proposto por Tansley, no

    ano de 1935. Mas isso no representou uma revoluo, pois essa idia de

    ecossistema j existia. Todavia, seu mrito foi sistematizar esse conceito,

    definindo-o como um conjunto de seres vivos mutuamente dependentes uns dos

    outros e do meio ambiente no qual vivem. A adoo de sistema pela ecologia, com

    a elaborao da noo de ecossistema, permitiu a integrao dos conhecimentos

    isolados e dispersos nos livros de botnica e zoologia.

    Klink (1981) destaca que por meio do estudo da estrutura e das feies funcionais

    dos ecossistemas, a geografia criou uma oportunidade para se integrar no campo

    da anlise dos sistemas.

    A Teoria dos Sistemas veio reforar a corrente naturalista da Geografia alem, com

    as contribuies de Carl Troll (ROSS, 2001a). Segundo Troppmair (2001), foi na

    publicao do trabalho Fotointerpretao e Pesquisa Ecolgica, de 1938, que

    esse biogegrafo empregou pela primeira vez o termo Ecologia da Paisagem ou

    Geoecologia.

    Para Lorini; Persson (2001) essa nova cincia teria como objetivo o estudo da

    paisagem, que na concepo de Troll seria entendida como uma entidade integral,

    espacial e visual, congregando a geosfera (esfera dos elementos e fenmenos

    abiticos), a biosfera (esfera dos elementos e fenmenos biofsicos) e a noosfera

    (esfera dos elementos e fenmenos antrpicos).

    Segundo os mesmos autores, para as cincias ambientais a combinao de

    princpios ecolgicos com uma fundamentao geogrfica, modeladora do

    desenvolvimento da Ecologia da Paisagem, representou um grande avano em

    relao ao paradigma ecolgico biocntrico e carente de espacializao.

    Para Troll, o nascimento da Ecologia da Paisagem significou a ligao mais

    importante entre a Geografia (paisagem) e a Biologia (ecologia). A perspectiva do

    gegrafo inclua, alm das paisagens naturais, as paisagens antrpicas. Essa

    perspectiva implicava que as paisagens culturais e os aspectos scio-econmicos

    deveriam tambm ser considerados nas anlises dos fatores componentes da

    superfcie terrestre (CHRISTOFOLLETI, 1999).

    8

  • A viso sistmica tambm foi um importante acontecimento para a Geografia. Os

    estudos voltam a considerar o meio ambiente de forma integrada e dinmica, em

    que seres vivos, entre eles o homem, vivem, conectam-se e desenvolvem suas

    atividades (TROPPMAIR, 2000).

    Segundo Monteiro (1995), como reao tendncia especializante verificada na

    Geografia Fsica surge com Sotchava, em 1960, uma proposta de abordagem mais

    integradora formulada como Geossistema. Esse novo paradigma no visava

    apenas aproximar as diferentes esferas do natural mas, facilitar o entrosamento

    com os fatos sociais ou humanos. Rodrigues (2001) acrescenta que embora tenha

    sido formulado pela escola russa, a teoria geossistmica foi difundida no mundo

    ocidental pela escola francesa e por iniciativa de G. Bertrand em 1968.

    Monteiro (1995) destaca que o surgimento dessa proposta de sistema era

    perfeitamente natural, pois embora surgida nas cincias naturais a formalizao em

    uma Teoria Geral dos Sistemas passou para os mais diferentes ramos do

    conhecimento e no poderia ficar ausente da Geografia.

    A perspectiva sistmica retardou, ou talvez reverteu, a tendncia para a grande

    especializao e separao dos ramos da Geografia Fsica e da Geografia Humana

    (GREGORY, 1992).

    Conforme observaes de Tricart (1977), um sistema um conjunto de fenmenos

    que se processa mediante fluxos de matria e energia. Esses fluxos originam

    relaes de dependncia mtua entre os fenmenos. Como conseqncia, o

    sistema apresenta propriedades que lhes so inerentes e diferem da soma das

    propriedades dos seus componentes. Uma delas ter dinmica prpria, especfica

    do sistema.

    Ross (2001a) acrescenta que o objeto da Geografia , ento, o entendimento

    desses fluxos. Do lado da Geografia da Natureza surgem os conceitos de

    Geossistemas, enquanto na Geografia da Sociedade, os Sistemas e Subsistemas

    de cidades.

    O conceito de sistema , atualmente, o melhor instrumento lgico de que se dispe

    para estudar as relaes entre os diversos componentes do meio ambiente. Ele

    9

  • permite adotar uma atitude dialtica entre a necessidade de anlise e a

    necessidade, contrria, de uma viso de conjunto, contribuindo, portanto, para

    atuao eficaz no enfrentamento dos problemas ambientais. Alm disso, o

    conceito de sistema , por natureza, de carter dinmico e por isso adequado para

    fornecer os conhecimentos bsicos para a atuao e ordenamento do meio

    ambiente (TRICART, 1977).

    De acordo com Rodrigues (2001), com base na Teoria Geral dos Sistemas

    surgiram para a Geografia Fsica diversas propostas de modelos conceituais,

    morfolgicos e de classificao dos sistemas. A noo de paisagem, a abordagem

    ecodinmica de Tricart (1977), os esquemas de classificao propostos por

    Sotchava (1977, 1978) e por Bertrand (1972), assim como os preceitos de Hack

    (1960) na Geomorfologia, tm como suporte lgico essa teoria que persiste at

    hoje como idia precursora de vrias referncias relevantes na Geografia Fsica.

    A mesma autora destaca que a teoria geossistmica faz parte de um conjunto de

    formulaes terico-metodolgicas da Geografia Fsica, surgidas em funo da

    necessidade da Geografia lidar com os princpios de interdisciplinaridade, sntese,

    com a abordagem multi-escalar e com a dinmica, incluindo-se a, as prognoses

    geogrficas.

    Sotchava (1977) acrescenta que a Geografia Fsica baseada nos princpios

    sistmicos pode contribuir para o planejamento scio-econmico e indicar medidas

    para o desenvolvimento e reconstruo de um pas. Nesse sentido, importante

    estudar, no somente os componentes da natureza, mas a conexo entre eles; no

    se deve restringir a morfologia da paisagem e suas subdivises, mas de

    preferncia considerar a sua dinmica e estrutura funcional, dentre outros.

    Para Tricart (1982), nas ltimas dcadas do sculo XIX, os gegrafos alemes

    deram palavra paisagem (Landschaft) uma conotao cientfica. Esse significado

    adicional foi tambm adotado na Rssia. Para eles a paisagem compunha-se de

    diversos elementos concretos do ambiente: relevo, plantas, solos. Havia distino

    entre a paisagem natural e a paisagem humanizada, que no poderia ter nada de

    natural. A definio descritiva continuou, entretanto, a ser usada pelos gegrafos.

    Na Frana, pouco antes da Segunda Guerra Mundial, A. Cholley usou a descrio

    10

  • da paisagem como ponto de partida para discusso dos problemas regionais.

    Neste caso, a abordagem era sistmica, mas a palavra sistema no era utilizada,

    ao contrrio do que fez Tansley.

    Tricart (1982) adota com pequenas modificaes a definio de paisagem

    elaborada por J. P. Deffontaines, em 1973:

    Uma paisagem uma poro perceptvel a um observador onde se inscreve uma combinao de fatos visveis e invisveis e interaes as quais, num dado momento, no percebemos seno o resultado global (TRICART, 1982, p. 18).

    Bertrand (1972) considera que Paisagem um termo pouco usado e impreciso,

    ao qual, na maioria das vezes, anexa-se um qualificativo de restrio que altera o

    seu sentido, por exemplo, paisagem vegetal.

    O mesmo autor define que:

    A paisagem no simples adio de elementos geogrficos disparatados. , numa determinada poro do espao, o resultado da combinao dinmica, portanto instvel, de elementos fsicos, biolgicos e antrpicos que reagindo dialeticamente uns sobre os outros, fazem da paisagem um conjunto nico e indissocivel, em perptua evoluo (BERTRAND, 1972, p. 2).

    Conforme explica Delpoux (1974), a paisagem um objeto concreto, materialmente

    palpvel e diretamente perceptvel no terreno. Apresenta estrutura complexa

    diversificada e dinmica, e pode ser descrita de forma objetiva. Esse autor

    distingue dois componentes fundamentais da paisagem, o suporte e a cobertura,

    cada um deles integrando a ao com fatores prprios:

    o suporte liga-se s caractersticas geolgicas (orognese, estratigrafia,

    litologia), climticas e antrpicas (barragens, grandes obras), e

    a cobertura materializa a influncia dos parmetros climtico, pedolgico,

    biolgico e antrpico (presso humana atual ou passada, reflexo das atividades

    scio-econmicas).

    Troppmair (2000) destaca pelo menos seis significados para o termo paisagem:

    para alguns, paisagem possui apenas significado visual ou artstico;

    o espao vivenciado;

    representa o espao limitado com determinadas caractersticas;

    11

  • apenas o que foi criado pela prpria natureza, sem interferncia do homem

    moderno;

    o espao criado pela ao do homem, e

    h ainda, aqueles que consideram a paisagem no sentido empregado por

    Humboldt, o carter integrado (nico) do espao. Este ltimo enfoque da

    paisagem aceito por gegrafos.

    Troppmair (2000) acrescenta que a estrutura, as inter-relaes e a dinmica que

    ocorrem em determinada rea formando um Geossistema do a feio daquele

    espao, que a prpria paisagem vista como sistema, como unidade real e

    integrada. Desta forma, no se emprega o termo paisagem para um pomar, alguns

    hectares de terra cultivada ou para uma pequena microbacia, mas quando o

    espao abrange rea ampla. Em seguida, o autor sintetiza a sua definio

    afirmando que a paisagem fisionomia do prprio Geossistema.

    A paisagem um conjunto heterogneo de formas naturais e artificiais, que num

    dado momento, exprime as heranas que representam as sucessivas relaes

    entre o homem e a natureza. A rigor, a paisagem apenas a poro da

    configurao territorial que possvel abarcar com a viso (SANTOS, 2002).

    Segundo Nucci (1996), o conceito de paisagem mais utilizado atualmente nos

    estudos integrados dos componentes do ambiente o do Prof. Dr. Carlos Augusto

    de Figueiredo Monteiro, que a define como:

    Entidade espacial delimitada segundo o nvel de resoluo do pesquisador, a partir dos objetivos centrais da anlise, de qualquer modo sempre resultado de integrao dinmica e, portanto, instvel dos elementos de suporte e cobertura (fsico, biolgico e antrpico), expressa em partes delimitveis infinitamente, mas individualizadas atravs das relaes entre elas que organizam um todo complexo (sistema) verdadeiro conjunto solidrio em perptua evoluo (MONTEIRO (1986) apud NUCCI, 1996, p. 9).

    De acordo com Leite (1983), os enfoques geogrficos de paisagem apesar de

    apresentarem estruturas diferentes, possuem um denominador comum: as

    interaes esto colocadas ao centro do conceito e so assim seu elemento

    organizador.

    12

  • Lorini; Persson (2001) destacam que a paisagem no um conceito unificado, mas

    uma noo cientfica polivalente e pluridimensional. Considerado ambguo pela

    maior parte dos pesquisadores, o termo paisagem extremamente polissmico,

    tendo sido objeto de diferentes definies que no foram unificadas. Ao contrrio,

    existe uma grande polivalncia e diversidade de usos da noo paisagem como

    ferramenta de aquisio de conhecimento ou da construo de problemticas de

    pesquisas.

    Bertalanffy (1973 apud SOTCHAVA, 1977) destaca que os geossistemas so uma

    classe peculiar de sistemas dinmicos abertos e hierarquicamente organizados.

    Sotchava (1977) define geossistema como fenmenos naturais, considera, todavia

    que os fatores econmicos e sociais, influenciando sua estrutura e peculiaridades

    espaciais so avaliados durante o seu estudo. Acrescenta que as paisagens

    antropognicas so estados variveis de primitivos geossistemas naturais,

    contribuindo para o estudo da dinmica da paisagem.

    Sotchava (1978) apresenta uma classificao bilateral para os geossistemas,

    sistematizando as interconexes entre gemeros (rea homognea elementar) e

    gecoros (rea de diferenciao elementar). Essas classes (gemeros e gecoros)

    alinhadas em duas fileiras, ao mesmo tempo em que so independentes, em

    pontos definidos so interdependentes (Quadro 1).

    FILEIRA DOS GEMEROS ORDEM DIMENSIONAL FILEIRA DOS GECOROS

    Perspectiva dos tipos do meio natural (perspectiva dos tipos landschafts) Zona fsico-geogrfica

    Grupo de regies fsico-geogrficas Tipos do meio natural (tipos de landschafts)

    Planetrio

    Subcontinentes

    Classe de Geomas Regies fsico-geogrficas

    Subclasse dos Geomas Com latitudes zonais Com zoneamento vertical

    Grupo dos Geomas

    Subgrupo dos Geomas

    Regional

    Subzona natural Provncia

    Provncia

    Geoma Distrito okrug (macrogecoro) Classe fcies Topogecoro (zonas)

    Grupo fcies Mesogecoros (zonas)

    Fcies Microgecoros (grupos determinados)

    reas homogneas elementares (biogeocenose)

    Topolgico

    reas diversificadas elementares

    Quadro 1 - Diviso taxonmica do Geossistema.

    Fonte: Sotchava (1978).

    13

  • Os gemeros e gecoros em sua totalidade caracterizam a estrutura da paisagem

    (SOTCHAVA, 1977).

    Para Sotchava (1978), uma das finalidades para classificao de geossistema a

    revelao de leis do meio natural. O mesmo autor conclui que um geossistema no

    se subdivide ilimitadamente, pois as unidades espaciais dependem de uma

    organizao geogrfica.

    Monteiro (2001) comenta que o artigo de Sotchava intitulado O Estudo de

    Geossistemas, publicado no Brasil em 1977, teve ampla repercusso, embora

    tenha parecido bastante confuso. Isso decorre no tanto da concepo geral do

    geossistema, mas de sua classificao. A adoo das categorias de Gemeros e

    Gecoros, como unidades superiores e as subdivises de geossistema, constitu-

    se na sua maior dificuldade. Apesar das dificuldades e possveis limitaes,

    Monteiro destaca mritos na contribuio de Sotchava. Por exemplo, o

    geossistema e sua anlise uma tentativa de melhoria na investigao da

    Geografia Fsica. Alm disso, a modelizao dos geossistemas base de sua

    dinmica espontnea e antropognica e do regime natural objetiva promover uma

    maior integrao entre o natural e o humano. Um outro mrito corresponde aos

    esforos dirigidos para o entendimento da dinmica dos geossistemas como meio

    de se atingir a prognose geogrfica.

    Monteiro (2001) salienta tambm, a precisa distino que Sotchava faz entre os

    conceitos de ecossistema e geossistema. Enquanto o conceito de ecossistema

    biolgico, os geossistemas abrangem complexos biolgicos, possuem uma

    organizao de sistemas mais complicada e tm capacidade vertical mais ampla,

    incluindo a ao antrpica.

    Para Tricart (1982), a taxonomia de geossistemas apresentada por Sotchava, para

    servir de base sua cartografia, apresenta vrios txons, os quais, contudo, no

    so definidos com preciso. Os princpios de classificao tambm no so

    explicados e os exemplos fornecidos so reduzidos e pouco demonstrativos. O

    mesmo autor acrescenta que em outro trabalho, Sotchava apresenta uma definio

    de geossistema que d nfase s interaes entre os diversos componentes e

    preconiza a abordagem sistmica. Para Tricart a posio metodolgica de

    14

  • Sotchava ento claramente expressa, e coincide com a sua, isto , utilizar a

    abordagem sistmica, adotada por ecologistas, para espacializar a noo do

    ecossistema, tornando possvel a sua cartografao.

    Troppmair (2000) acrescenta que o termo Geossistema, formulado por Sotchava

    bastante vago e flexvel. Por esse motivo, vrios gegrafos empregaram o termo

    com contedo, metodologia, escala e enfoques diferentes.

    Ao criar esse termo, Sotchava o fez com base em suas pesquisas no amplo espao

    geogrfico da ex-Unio Sovitica, portanto Geossistema abrange reas com

    centenas e mesmo milhares de quilmetros quadrados; funciona em escala

    regional. Transferindo essas escalas para o Brasil, pode-se exemplificar

    Geossistema como as Plancies Costeiras, o Planalto Meridional ou o Planalto

    Central. Dentro desses, as superfcies plainas, mais o conjunto de encostas e

    vales, com centenas de quilmetros quadrados, formam gefacies. Estas

    novamente subdivididas, como fundo de vale ou uma encosta formam os getopos,

    abrangendo at dezenas de quilmetros quadrados. Desta forma, uma rea

    restrita, como um pequeno vale, uma vertente, ou outro elemento geomorfolgico,

    no forma um Geossistema (TROPPMAIR, 2000).

    Conforme Ross (2001a), as dificuldades para o entendimento dos conceitos

    introduzidos por Sotchava (1977, 1978) devem-se a vrios fatores:

    os exemplos tratados foram apresentados de forma mais terica do que prtica;

    esses exemplos so do territrio russo que no nos familiar;

    o trabalho foi originalmente escrito em russo, traduzido para o ingls e para o

    portugus, em um momento da histria brasileira desfavorvel introduo do

    pensamento russo-sovitico em nosso pas.

    Com a proposio terica, metodolgica e prtica apresentada por Sotchava e

    demais gegrafos da ex-URSS passa-se da posio passiva de uma Geografia

    analtica descritiva, para uma Geografia preocupada com o desenvolvimento e a

    conservao da natureza, o que atualmente se constitui em um dos pressupostos

    do desenvolvimento sustentvel (ROSS, 2001a).

    15

  • Para esse mesmo autor, na Frana, nas dcadas de 60 e 70, do sculo XX, o

    biogegrafo G. Bertrand e o geomorflogo J. Tricart inspiraram-se nas concepes

    geoecolgicas de C. Troll e, provavelmente, nos gegrafos russo-soviticos para

    desenvolverem suas proposies terico-metodolgicas. Nessa linha surge a

    concepo de geossistema apresentada por G. Bertrand em 1968, quando publica

    o trabalho Paysage et Geographie Physique Globale: Esquisse Methodologique e

    editado no Brasil em 1972. Em 1977, J. Tricart publica pelo Instituto Brasileiro de

    Geografia e Estatstica (IBGE), o livro Ecodinmica, sintetizando a concepo

    geoecolgica, que serve de base para a sua abordagem geomorfolgica. Essa

    concepo evolui em uma outra obra do incio da dcada de noventa, denominada

    de EcoGeografia e Manejo Rural, que amplia o entendimento da relao

    sociedade-natureza e desenvolve o conceito de EcoGeografia.

    Para Monteiro (2001), o artigo de Bertrand de 1972 teve tambm grande

    repercusso em todo o Brasil. Apresenta, pela primeira vez em nosso pas, o

    conceito de Geossistema que emerge como novo paradigma.

    Segundo Ross (2001a), para inserir esse novo conceito Bertrand partiu da

    construo do conhecimento sobre a cincia da paisagem. Desta forma, procurou

    demonstrar que o estudo da paisagem deve apoiar-se no conceito e mtodos de

    geossistema.

    Ao tratar da questo da demarcao das unidades de paisagem, Bertrand (1972)

    comenta que as delimitaes geogrficas so arbitrrias, mas possvel esboar

    uma taxonomia das paisagens com dominncia fsica, o que permite, desde o

    incio, fixar os seus limites. Essa taxonomia possibilita classificar as paisagens em

    funo da escala, situando-as na dupla perspectiva do tempo e do espao.

    Com base nessas premissas, esse autor apresenta um sistema de classificao de

    paisagem que comporta seis nveis temporo-espaciais: a zona, o domnio e a

    regio (unidades superiores) e geossistema, gefacies e getopo (unidades

    inferiores). Destaca que os elementos climticos e estruturais so bsicos nas

    unidades superiores enquanto os elementos biogeogrficos e antrpicos os so

    nas unidades inferiores (Quadro 2).

    16

  • UNIDADES ELEMENTARES

    UNIDADES DA PAISAGEM

    ESCALA TEMPOROESPACIAL

    (A. CAILLEUX

    ; J. TRICART

    EXEMPLO TOMADO NUMA MESMA SRIE DE PAISAGEM

    RELEVO CLIMA BOTNICA BIOGEO-GRAFIA

    UNIDADE TRABALHA-

    DA PELO HOMEM

    ZONA Grandeza I Temperada Zonal Bioma Zona

    DOMNIO Grandeza II Cantbrico Domnio estrutural Regional Domnio Regio

    REGIO NATURAL

    Grandeza III-IV

    Picos da Europa

    Regio estrutural Andar Srie

    Quarteiro rural ou urbano

    GEOSSISTEMA

    Grandeza IV V

    Geossistema atlntico montanhs (calcrio sombreado com faia higrfila a Asperula ado rata em terra fusca)

    Unidade estrutural Local

    Zona equipo-tencial

    GEOFCIES Grandeza VI

    Prado de ceifa com Molinio-Arrhenatheretea em solo lixiviado hidromrfico formado em um depsito morinico

    Estdio Agrupa-mento

    Explorao ou quarteiro parcelado (pequena ilha em cidade)

    GETOPO Grandeza VII

    Lapis de dissoluo com Aspidium Lonchitsa Sw em microsolo mido carbonato em bolsas

    Micro-clima Bitopo Bioce- nose

    Parcela (casa em cidade)

    Quadro 2 - Classificao taxonmica da paisagem.

    Fonte: Bertrand (1972)

    Quanto s unidades superiores, Ross (2001a) comenta que a zona representa a

    primeira ordem de grandeza e corresponde, por exemplo, ao escudo da zona

    tropical. O domnio, segunda ordem de grandeza, constitui divises dentro de uma

    determinada zona e, no caso, pode ser representado pelos Cerrados do Brasil da

    Zona Tropical. A regio natural compreende a terceira e a quarta ordens de

    grandeza, constituindo uma rea bem delimitada no interior de um domnio, como

    por exemplo, o Pantanal Matogrossense.

    17

  • Conforme Bertrand (1972), o Geossistema situa-se entre a quarta e quinta ordens

    de grandeza tmporo-espacial, correspondendo, portanto, a uma unidade

    dimensional compreendida entre alguns quilmetros quadrados e algumas

    centenas de quilmetros quadrados. Constitui-se em uma boa base para os

    estudos de organizao do espao porque ele compatvel com a escala humana.

    O Geossistema, para o mesmo autor, define-se por um Potencial Ecolgico

    (geomorfologia, clima e hidrografia), Explorao Biolgica (vegetao, solo e fauna)

    e pela Ao Antrpica. O geossistema, portanto, acentua o complexo geogrfico e

    a dinmica de conjunto (Figura 1).

    (geomorfologia + clima + hidrologia) (vegetao + solo + fauna)

    Figura 1- Esboo terico do Geossistema.

    Fonte: Bertrand (1972).

    Bertrand (1972) classifica, ento, os geossistemas em funo de sua evoluo,

    englobando assim todos os aspectos da paisagem. Essa tipologia dinmica

    inspirada na teoria de bio-resistasia de H. Erhart. So distinguidos dois conjuntos

    dinmicos diferentes: os geossistemas em biostasia e os geossistemas em

    resistasia. No primeiro caso a atividade geomorfogentica fraca ou nula,

    enquanto no segundo ela domina a dinmica global da paisagem.

    POTENCIAL ECOLGICO EXPLORAO BIOLGICA

    GEOSSISTEMA

    AO ANTRPICA

    18

  • Monteiro (2001) faz vrias observaes e crticas a esse artigo de Bertrand.

    Comenta que a noo de geossistema composta por um potencial ecolgico,

    explorao biolgica e ao antrpica aceitvel, porm pouco esclarece a

    conjuno e difere muito pouco dos termos abitico, bitico e antrpico. A

    utilizao das ordens de grandeza, segundo a taxonomia de Cailleux e Tricart, para

    enquadrar o geossistema, o geofcie e o getopo (unidades inferiores) no tem

    sustentao e no pode ser universalizado. Bertrand estava habituado ao

    escalonamento vertical da cadeia dos Pirineus, horizontalmente projetado em

    espaos restritos, mas seu conceito no poderia persistir quando transportado para

    outras regies e continentes. O mesmo autor finaliza, afirmando que a

    classificao dinmica do geossistemas, considerando os conceitos de biostasia e

    resistasia, apresentam aspectos positivos, todavia no h a preocupao em

    considerar a noo habitual dos regimes vigentes num dado geossistema.

    Troppmair (2000) acrescenta que Bertrand, ao aplicar a teoria de Geossistema para

    a realidade francesa, provavelmente o fez considerando as dimenses e escalas

    daquele pas. Desta forma, quando define geossistema, geofcie e getopo refere-

    se a reas relativamente pequenas, variando entre alguns quilmetros quadrados

    (geossistema) a poucos metros quadrados (getopo). O mesmo autor conclui que

    Geossistema um sistema natural, complexo e integrado onde h circulao de

    energia e matria e onde ocorre explorao biolgica, inclusive a praticada pelo

    homem. A ao antrpica poder ocasionar pequenas alteraes no sistema,

    afetando algumas de suas caractersticas. Essas alteraes sero perceptveis

    apenas em micro-escala e nunca em intensidade a ponto de transformar o

    Geossistema.

    Para Ross (2001a), ao se tentar aplicar e representar a proposta de Bertrand,

    torna-se difcil estabelecer o que seria um geossistema, um geofcie ou um

    getopo, alm disso, dependendo da escala de representao, pode-se confundir

    geossistema com domnio, regio natural e assim por diante.

    Venturi (no prelo) comenta que Bertrand estabelece uma classificao em que a

    paisagem territorializada em seis nveis de grandeza, com dimenses j pr-

    estabelecidas. Por outro lado, Monteiro (2001) universaliza o conceito de paisagem

    ao propor que a delimitao do dimensionamento da paisagem seja uma deciso

    19

  • exclusiva do pesquisador, e contextualizada segundo as necessidades de sua

    pesquisa.

    Segundo Troppmair (2000), nos ltimos anos o estudo de geossistema conquistou

    importncia e aplicao crescentes, buscando a conservao, uso racional dos

    recursos naturais e o desenvolvimento do espao geogrfico. Na literatura

    geogrfica brasileira h vrios artigos sobre geossistemas que tratam, em geral,

    apenas de aspectos tericos. Todavia, so poucos os trabalhos que aplicam a

    abordagem geossistmica organizao do espao.

    A teoria geossistmica, proposta no incio dos anos sessenta, do sculo XX, pode

    ainda ser considerada pouco conhecida, aplicada ou testada no territrio brasileiro,

    onde apresentada inicialmente nos peridicos do extinto Instituto de Geografia da

    Universidade de So Paulo. Os Cadernos de Cincias da Terra publicam o texto

    de Bertrand (1972) e, posteriormente, os cadernos Biogeografia e Mtodo em

    Questo, apresentam a traduo dos artigos de Sotchava (1977, 1978).

    (RODRIGUES, 2001). Nessa mesma linha, acrescenta-se tambm a publicao

    dos textos de Delpoux (1974) e Klink (1981).

    Ross (2001a) comenta que no Brasil algumas contribuies dentro da perspectiva

    da anlise integrada tambm surgiram no final da dcada de sessenta e ao longo

    da dcada de setenta. Entre elas, cita-se a de AbSaber (1969) que, com base na

    anlise geomorfolgica, publica o trabalho de cunho terico-metodolgico

    denominado Um Conceito da Geomorfologia a Servio das Pesquisas sobre o

    Quartenrio.

    Para Monteiro (2001), AbSaber, nessa obra, preconiza a caracterizao de trs

    nveis, intimamente relacionados, na anlise da paisagem, a saber:

    compartimentao, estrutura superficial e fisiologia da paisagem. Enquanto o

    primeiro nvel se ligava ao plano horizontal, o segundo revelava, no plano vertical, a

    estrutura; o terceiro abrangia todos os processos, dinamizadores da paisagem,

    indicando-se a a ao antrpica.

    Essas postulaes, conforme Ross (2001a), tm a ver com a concepo sistmica

    que comeava a reinar no campo da cincia como um todo e, sobretudo, nas da

    natureza. A preocupao com a forma, estrutura e processo, o que define e

    20

  • caracteriza um sistema natural, ou geossistema, ou geocomplexo, ou sistema de

    terras.

    Rodrigues (2001) afirma que, por iniciativa do Prof. Dr. Carlos Augusto Figueiredo

    Monteiro, a experincia da aplicao da concepo geossistmica foi levada

    adiante em nosso pas. Alm de utiliz-la como referencial terico, pde test-la e

    adapt-la a algumas situaes particulares de nosso territrio promovendo estudos

    voltados ao planejamento ambiental, valorizando a dinmica dos ambientes.

    Monteiro (1995) aponta trs grandes conjuntos de problemas na abordagem dos

    geossistemas: dificuldades em antropizar o geossistema; necessidade de prtica

    interdisciplinar e a limitao das tcnicas de representao dos resultados

    analticos e sintticos da investigao. Em relao ao primeiro problema apontado,

    o autor destaca que, isso se deve ao fato de que os pesquisadores tendem a

    trabalhar em reas naturais ou pouco modificadas pelo homem, onde os impactos

    antrpicos so menos expressivos. Todavia, nas reas ocupadas, sobretudo as

    urbano-industriais, onde os problemas ambientais so mais graves, ser

    necessrio incorporar as aes antropogenticas na definio dos geossistemas.

    Segundo Ross (2001a), o Prof. Dr. Helmut Troppmair contribui de forma

    significativa para os estudos de anlise integrada, j pelo vis biogeogrfico,

    publicando vrios trabalhos sobre Geossistema. Entre eles destaca-se o

    mapeamento e classificao dos Geossistemas do Estado de So Paulo, publicado

    nos Cadernos de Biogeografia do Instituto de Geografia da Universidade de So

    Paulo, em 1983.

    Conforme observaes de Conti (2002), evolumos cada vez mais para os estudo

    integrados, baseados no Estruturalismo e na Teoria Geral dos Sistemas,

    valorizando-se, portanto, a prtica da interdisciplinariedade. Por outro lado, a

    concepo geossistmica deu unidade Geografia Fsica, ao incorporar a ao

    antrpica, o potencial ecolgico e a explorao biolgica, ao mesmo tempo que

    atuou para diluir as fronteiras entre esta e a Geografia Humana.

    Apesar das dificuldades de aplicao da abordagem sistmica na Geografia Fsica,

    ela abrangente e consistente para, a longo prazo, contribuir para a sntese dos

    21

  • conhecimentos sobre os diversos componentes do meio fsico terrestre

    (COLNGELO, 1997).

    Monteiro (2001) comenta que mais de trinta anos se passaram sem que houvesse

    um consenso sobre o conceito de geossistema que, continua abstrato e irreal,

    disputando lugar com vrios outros termos similares: ecossistema,

    geoecossistema, paisagem, unidade espacial homognea, dentre outros.

    Todavia, o conceito de geossistema continua em progresso. O seu

    aprimoramento um pr-requisito necessrio compreenso da qualidade

    ambiental, ponto de partida para avaliaes quantitativas e diagnsticos mais

    precisos, possibilitando prognoses ambientais (MONTEIRO, 1995).

    2.2 Anlise Geogrfica Integrada Aplicada ao Planejamento Ambiental

    Conforme Ross (1995), a pesquisa ambiental na geografia tem como objetivo

    entender as relaes das sociedades humanas de um determinado territrio

    (espao fsico) com a natureza, dentro de uma perspectiva dinmica quanto aos

    aspectos culturais, sociais, econmicos e naturais.

    A abordagem geogrfica na pesquisa ambiental, para o mesmo autor,

    representada por meio de mapas, cartogramas, grficos e tabelas que so

    produzidos a partir da interpretao de dados numricos estatsticos, observao

    de produtos de sensores remotos e levantamentos de campo. Esses produtos

    cartogrficos e tabulares fornecem informaes scio-econmicas e do meio

    natural que podem ser trabalhadas tanto pelos sistemas de informao geogrfica

    (SIG) ou por processos convencionais da cartografia temtica e da estatstica de

    dados geogrficos.

    Segundo Ross (1995), nas pesquisas ambientais h dois procedimentos

    metodolgicos operacionais para a gerao de produtos analtico-sintticos. O

    primeiro, conhecido como Land Systems, vale-se da interpretao de produtos de

    sensores remotos, para definio de Unidades de Paisagem, que so apresentadas

    em uma abordagem integrada como informaes sintetizadas, referentes ao meio

    22

  • natural e scio-econmico. O segundo procedimento metodolgico operacional,

    denominado multitemtico, caracterizado por gerar produtos analticos em uma

    primeira fase e, posteriormente, de sntese.

    A seguir, so caracterizadas mais detalhadamente as pesquisas ambientais

    multitemticas, conforme Ross (1995).

    Os produtos temticos analticos, gerados na primeira fase, tratam de temas da

    natureza e da sociedade. Assim, no mbito da natureza, os estudos devem

    abranger os campos disciplinares da geologia, geomorfologia, pedologia,

    climatologia, recursos hdricos, flora e fauna. J no campo da sociedade, as

    pesquisas devem considerar os temas do processo de ocupao, da demografia,

    condies/qualidade de vida, uso da terra, economia, legislao, estruturao do

    espao regional e urbano entre outros.

    Del Prette (1996) acrescenta que embora os sistemas naturais e as formaes

    scio-econmicas sejam aprendidos segundo lgicas distintas, sua integrao

    efetiva ocorre no territrio. Desta forma, o reconhecimento deste territrio, por

    meio das pesquisas e das representaes grficas e cartogrficas, permite o

    estabelecimento e regulao do seu uso.

    Nota-se, assim, que a pesquisa ambiental deve ser realizada por uma equipe multi-

    disciplinar. Todavia, esses estudos setoriais devem gerar conhecimentos que

    interessam especificamente ao projeto a ser desenvolvido e colaborar para a

    compreenso da paisagem como um todo, o que fundamental para o

    planejamento ambiental (ROSS, 1995).

    Na fase seguinte, os produtos de sntese dentro da abordagem geogrfica so

    espacializados no territrio objeto da pesquisa, e seus contedos devem

    apresentar, de forma sinttica, as informaes multitemticas produzidas na fase

    inicial do trabalho.

    Ross (1995) comenta que, em suas pesquisas desenvolvidas segundo essa

    perspectiva, se geram cinco tipos de produtos sntese, resultados das pesquisas

    multi e interdisciplinares. Esses produtos so cartogrficos e acompanhados de

    textos com contedos tcnico-cientficos. So eles: Unidades dos Sistemas

    23

  • Naturais, Unidades dos Sistemas Scio-Econmicos, Unidades Integradas dos

    Sistemas Naturais e Scio-Econmicos, Unidades das Fragilidades Potenciais e

    Emergentes, e das Derivaes Ambientais e Transgresses Ambientais. Esses

    produtos, analticos e de snteses, constituem a abordagem geogrfica dos

    diagnsticos ambientais que do suporte para estabelecer prognsticos scio-

    econmicos e ambientais. Tais prognsticos contribuem para a definio de

    instrumentos de gesto, tais como o estabelecimento de Zoneamento Ecolgico-

    Econmico, de legislao especfica e a determinao de diretrizes voltadas ao

    desenvolvimento econmico e social e preservao do meio ambiente.

    A concepo terica que embasa os trabalhos dentro dessa abordagem, conforme

    Ross (1995), a Teoria Geral dos Sistemas. Portanto, os fluxos de matria e

    energia entre os diferentes componentes, quer seja por meio de processos

    espontneos ou ativados pelo homem, so sempre regidos pelas leis da fsica e da

    qumica, que definem uma funcionalidade em equilbrio dinmico (estvel) ou em

    desequilbrio temporrio (instvel).

    Nesse contexto, Grigoriev (1968 apud ROSS, 1991) procura explicar a

    funcionalidade da natureza e das relaes da sociedade com esta, definindo o

    conceito de Estrato Geogrfico da Terra, como uma estreita faixa compreendida

    entre a parte superior da litosfera e a baixa atmosfera, correspondendo ao

    ambiente em que possvel a vida dos seres humanos e dos demais elementos

    biticos da natureza.

    A Figura 2 sintetiza os fluxos de energia e matria entre os componentes da

    natureza e sociedade. As relaes interdependentes de troca energtica no

    permitem, por exemplo, o entendimento da dinmica e da gnese dos solos sem

    que se conhea o clima, o relevo, a litologia ou ainda, a anlise de fauna sem

    associ-la flora que lhe d suporte, que por sua vez no pode ser entendida sem

    conhecimento do clima, da dinmica das guas, dos tipos de solos e assim

    sucessivamente (ROSS, 1994).

    24

  • Figura 2 - Fluxo da relao sociedade/natureza.

    Fonte: Modificado de Ross (1994). Elaborao: Carlos A. de Freitas S. Desenho SCTC - IF, 2005.

    As sociedades humanas no devem ser vistas como elementos estranhos

    natureza. Devem ser, portanto, entendidas como parte fundamental dessa

    dinmica. Entretanto, as alteraes dos componentes naturais provocadas pela

    ao antrpica afetam a funcionalidade do sistema, comprometendo o ambiente

    natural e a prpria sociedade humana. Por isso, importante que as inseres

    humanas sejam compatveis com a potencialidade dos recursos naturais e com a

    fragilidade dos ecossistemas (ROSS et al., 1995).

    No contexto alterado das cidades, Cavalheiro; Andrade; Cardoso (1983) destacam

    que os problemas urbanos so enfocados por especialistas que tentam sanar os

    problemas de modo tecnicista, sem tentar entender como funciona os

    ecossistemas. necessrio, portanto, que a paisagem urbana seja encarada como

    um sistema complexo, em que os seus diferentes componentes so

    interdependentes.

    SOCIEDADES HUMANAS

    SOLOS

    RELEVOGUAS

    ESTRUTURA ROCHOSA SUPERIOR

    LITOSFERA

    ENERGIA DA TERRA(ativa e passiva)

    CLIMA

    ATMOSFERA

    ENERGIA SOLAR

    BIOSFERAIN

    TERF

    ACE

    ATM

    OSF

    ERA /

    LITO

    SFER

    A

    ESTRATO G

    EOG

    RFIC

    O

    25

  • Ross (2001a) comenta que esse entendimento integrativo, sociedade e natureza,

    consiste em obter um conjunto de informaes elaborado e organizado de forma

    que se constitua em um documento bsico, a partir do qual possvel desenvolver

    um planejamento, com a finalidade de conservar, preservar e recuperar a natureza,

    e ao mesmo tempo, promover o desenvolvimento econmico e social em bases

    sustentveis.

    Segundo Santos (2004), o planejamento um processo contnuo que envolve a

    coleta, a organizao e anlise sistematizadas das informaes, por meio de

    procedimentos e mtodos, para chegar a decises acerca das melhores

    alternativas para o aproveitamento dos recursos disponveis. Sua finalidade

    atingir metas especficas no futuro, levando melhoria de uma determinada

    situao e ao desenvolvimento das sociedades.

    O processo de planejamento de um territrio tem por finalidade estabelecer uma

    certa ordem, ainda que provisria e precria, na distribuio espacial da

    organizao social para, a partir da, definir linhas de ao relativas a planos e

    metas estratgicas (DEL PRETTE, 1996).

    Os planejadores, de forma geral, procuram entender o espao em todo o seu

    contexto. De acordo com a natureza do escopo, ou das atividades preponderantes,

    o planejamento pode ser qualificado como scio-econmico, agrcola, arquitetnico,

    de recursos naturais ou ambiental (SANTOS, 2004).

    Para a mesma autora, o planejamento ambiental surgiu, nas trs ltimas dcadas,

    em razo do aumento de competio por terras, gua, recursos energticos e

    biolgicos, que gerou a necessidade de organizar o uso da terra, de compatibilizar

    este uso com a proteo de ambientes ameaados e de melhoria da qualidade de

    vidas das populaes. No Brasil, a partir da dcada de 1980, o planejamento

    ambiental foi incorporado pelos rgos governamentais, sociedades ou

    organizaes. Hoje, o planejamento ambiental incorpora a perspectiva de

    desenvolvimento sustentvel, preocupando-se com a manuteno dos recursos

    naturais, qualidade de vida e uso adequado do solo e a conservao dos sistemas

    naturais. Nessa direo, o planejamento ambiental visto como o estudo que visa

    adequao do uso, controle e proteo ao ambiente, alm do entendimento das

    26

  • aspiraes sociais e governamentais, expressas ou no, em uma poltica

    ambiental. As demandas sociais devem ter prioridade sobre as demandas

    econmicas. Por sua vez, as restries do meio devem ter prioridade sobre as

    demandas sociais ou econmicas.

    Conforme Milar (1995), o planejamento ambiental isolado do planejamento

    econmico e social irreal. O meio ambiente um bem essencialmente difuso e

    engloba todos os recursos naturais, bem como a fauna e a flora e suas relaes

    entre si e com o homem. Desta forma, o planejamento de uso desses recursos

    deve considerar todos os aspectos envolvidos: os econmicos, os sociais e os

    ambientais. No possvel planejar o uso desses recursos sob o prisma

    econmico e social ou somente sob o aspecto da proteo ambiental.

    Conforme Santos (2004), s vezes, o planejamento ambiental chamado

    erroneamente de gerenciamento ambiental; enquanto, o planejamento ambiental

    predomina nas primeiras fases do processo, o gerenciamento figura nas fases

    posteriores do ordenamento, ligadas aplicao, administrao, controle e

    monitoramento das alternativas propostas no planejamento (Figura 3). O mesmo

    se d com a gesto ambiental, algumas vezes entendida como planejamento,

    outras como gerenciamento, e outras como a soma de ambos. Todavia, a gesto

    ambiental interpretada como a integrao entre o planejamento, o gerenciamento

    e a poltica ambiental.

    Gesto Ambiental

    diagnstico e prognstico sobre o territrio

    con hecimento das realidades, tendncias e evoluo

    execuo, administrao e monitoramento das propostas

    gerenciamento ambientalplanejamento ambiental

    propostas para consol idao e/ou al terao parcial e /ou

    total das realidades

    Figura 3 - Interaes entre planejamento e gerenciamento ambiental.

    Fonte: Santos (2004).Elaborao: Carlos A. de Freitas - S. Desenho -SCTC - IF, 2005.

    27

  • Por sua vez, para Santos (2004), o zoneamento uma estratgia metodolgica que

    representa uma etapa do planejamento. O zoneamento define