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ZONEAMENTO DE RISCOS CLIMÁTICOS PARA CULTURA DO ALGODOEIRO HERBÁCEO NO ESTADO DE PERNAMBUCO * José Américo Bordini do Amaral (Embrapa Algodão / [email protected] ) , Madson Tavares Silva (UFCG), Aurelir Nobre Barreto (Embrapa Algodão) RESUMO - O principal objetivo desse trabalho foi definir, de forma temporal e espacial, as melhores épocas de plantio do algodoeiro herbáceo para o Estado de Pernambuco. Foram utilizados dados de retenção de água dos solos; dados de planta, ou seja, ciclo, coeficientes culturais e estádios de desenvolvimento; evapotranspiração. Os resultados mostraram que as datas de menores riscos variam com o tipo de solo. Os teores de água disponível nos solos foram fixados em 40 mm e 50 mm. Uma vez feito o balanço de água, a relação entre evapotranspiração real e a evapotranspiração de referencia (ETr/ETm) foi espacializada em mapas onde duas classes de freqüência a 80% foram identificadas: ETr/ETm > 0,55 , considerada favorável, 0,45 ≤ ETr/ETm < 0,55, considerada intermediária e ETr/ETm < 0,45, considerada desfavorável. Palavras-chave: Gossypium hirsutum L.r. latifolium Hutch., clima INTRODUÇÃO O zoneamento e a definição da época de plantio para a cultura do algodão herbáceo (Gossypium hirsutum) são realizados no intuito de identificar as regiões e períodos mais propícios ao desenvolvimento das cultivares, reduzindo os riscos de inviabilidade econômica e ecológica. Um dos fatores ambientais que mais interferem no crescimento e no desenvolvimento é a temperatura, por afetar significativamente a fenologia, a expansão foliar, a alongação dos internós, a produção de biomassa e a partição de assimilados em diferentes partes da planta, sendo ótima para produção entre 20 e 30° C (REDDY et al., 1991). A cultura necessita de precipitação pluviométrica anual entre 500 e 1500 mm, bem distribuída segundo Instituto de Desenvolvimento de Pernambuco (1987). Precipitações intensas podem causar o acamamento das plantas o que, durante a floração, provoca queda dos botões florais e das maçãs jovens, enquanto chuvas contínuas durante a floração e a abertura das maçãs comprometem a polinização e reduz a qualidade da fibra. A identificação de regiões com condições edafoclimáticas que permitam a cultura externar o seu potencial genético em termos de produtividade torna-se necessário para o sucesso da agricultura. Através de estudos que relacionam a interação solo - planta - clima, é possível definir áreas que apresentam aptidão, viabilizando a exploração agrícola das plantas, ecologicamente e economicamente. Esse trabalho teve o objetivo identificar por intermédio de simulações de balanço hídrico os riscos climáticos do cultivo do algodão herbáceo no estado de Pernambuco. MATERIAL E MÉTODOS * FINEP

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ZONEAMENTO DE RISCOS CLIMÁTICOS PARA CULTURA DO ALGODOEIRO HERBÁCEO NO ESTADO DE PERNAMBUCO*

José Américo Bordini do Amaral (Embrapa Algodão / [email protected]), Madson Tavares Silva

(UFCG), Aurelir Nobre Barreto (Embrapa Algodão)

RESUMO - O principal objetivo desse trabalho foi definir, de forma temporal e espacial, as melhores épocas de plantio do algodoeiro herbáceo para o Estado de Pernambuco. Foram utilizados dados de retenção de água dos solos; dados de planta, ou seja, ciclo, coeficientes culturais e estádios de desenvolvimento; evapotranspiração. Os resultados mostraram que as datas de menores riscos variam com o tipo de solo. Os teores de água disponível nos solos foram fixados em 40 mm e 50 mm. Uma vez feito o balanço de água, a relação entre evapotranspiração real e a evapotranspiração de referencia (ETr/ETm) foi espacializada em mapas onde duas classes de freqüência a 80% foram identificadas: ETr/ETm > 0,55 , considerada favorável, 0,45 ≤ ETr/ETm < 0,55, considerada intermediária e ETr/ETm < 0,45, considerada desfavorável. Palavras-chave: Gossypium hirsutum L.r. latifolium Hutch., clima

INTRODUÇÃO

O zoneamento e a definição da época de plantio para a cultura do algodão herbáceo (Gossypium hirsutum) são realizados no intuito de identificar as regiões e períodos mais propícios ao desenvolvimento das cultivares, reduzindo os riscos de inviabilidade econômica e ecológica. Um dos fatores ambientais que mais interferem no crescimento e no desenvolvimento é a temperatura, por afetar significativamente a fenologia, a expansão foliar, a alongação dos internós, a produção de biomassa e a partição de assimilados em diferentes partes da planta, sendo ótima para produção entre 20 e 30° C (REDDY et al., 1991). A cultura necessita de precipitação pluviométrica anual entre 500 e 1500 mm, bem distribuída segundo Instituto de Desenvolvimento de Pernambuco (1987). Precipitações intensas podem causar o acamamento das plantas o que, durante a floração, provoca queda dos botões florais e das maçãs jovens, enquanto chuvas contínuas durante a floração e a abertura das maçãs comprometem a polinização e reduz a qualidade da fibra. A identificação de regiões com condições edafoclimáticas que permitam a cultura externar o seu potencial genético em termos de produtividade torna-se necessário para o sucesso da agricultura. Através de estudos que relacionam a interação solo - planta - clima, é possível definir áreas que apresentam aptidão, viabilizando a exploração agrícola das plantas, ecologicamente e economicamente. Esse trabalho teve o objetivo identificar por intermédio de simulações de balanço hídrico os riscos climáticos do cultivo do algodão herbáceo no estado de Pernambuco.

MATERIAL E MÉTODOS

* FINEP

O estado de Pernambuco esta localizado na porção oriental da Região Nordeste do Brasil, situando-se entre os meridianos de 34º48‘15“ e 41º21‘22“W de Greenwich e os paralelos de 7º18‘17“ e 9º28‘43“S. Limitando-se ao norte com o estado da Paraíba e Ceará; ao sul com os estados de Alagoas e Bahia; ao oeste com o estado do Piauí; e ao leste com o Oceano Atlântico, a Figura 1 ilustra a área.

A definição do risco climático e da época de plantio foi realizada por intermédio de um modelo de balanço hídrico da cultura, realizado em duas partes. Na primeira, objetivou-se a determinação do balanço hídrico, por intermédio da simulação da época de semeadura, utilizando-se o Sistema de Análise Regional dos Riscos Agroclimáticos, o software SARRAZON (BARON et al., 1996), em seguida, os resultados da simulação foram espacializados pela utilização do software SPRING versão 4.2 (CÂMARA et al., 1996).

Figura 1 - Localização da área em estudo

Variáveis de entrada do modelo: - Precipitação pluvial diária - Registrados durante 25 anos em estações pluviométricas disponíveis no Estado de Pernambuco. Os dados de precipitação utilizados se originam do Banco de Dados Hidrometeorológico da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste - SUDENE, publicados na série “Dados Pluviométricos Mensais do Nordeste - Pernambuco”- (SUDENE, 1990). - Solo - Levantamentos Exploratórios – reconhecimento de solos dos Estados do Nordeste (BRASIL, 1972). Foram considerados três tipos de solo com diferentes capacidades de armazenamento de água: • Tipo 1 - baixa capacidade de armazenamento de água • Tipo 2 - média capacidade de armazenamento de água • Tipo 3 - alta capacidade de armazenamento de água - Evapotranspiração real (ETr) - O modelo estima a evapotranspiração real (ETr) por uma equação de terceiro grau, proposta por Eagleman (1971), que descreve a evolução da ETr, em função da evapotranspiração máxima - ETm e da umidade do solo - HR, expressa na equação (1):

ETr = A + B HR - C HR2+ D HR3 (1)

onde: A= 0,732 - 0,05 ETm, B= 4,97 ETm - 0,66 ETm2, C= 8,57 ETm - 1,56 ETm2 , D= 4,35 ETm - 0,88 ETm2 e HR = umidade do solo

- Evapotranspiração máxima (ETm) - Foi estimada pela equação (2), conforme Doorenbos e Kassam (1994):

ETm = ETp x kc (2)

- Coeficientes decendiais do cultivo (kc) - Determinados por médias decendiais para cada fase e gerados pela interpolação dos dados para o período semanal e para as fases fenológicas definidas por Doorenbos e Kassam (1994), equação (3): Kc = ETc / ETo (3)

- Evapotranspiração potencial - Foi estimada pela equação de Penman (1963) e calculada para cada dez dias do ano, gerando 36 dados de evapotranspiração, equação (4):

ETp = {[s/(s + у )] Rn + [у /(s + у )] Ea} (4)

Sendo ETp - evapotranspiração estimada (mm dia-1), Rn - saldo de radiação convertido em (mm dia-1) de evaporação equivalente, Ea - termo aerodinâmica (mm dia-1), у - constante psicométrica = (0,66 mb/ºC) e s - tangente à curva de pressão de saturação de vapor d’água (mb/ºC). - Ciclo das cultivares - Considerou-se uma cultivar de ciclo médio (140 dias) em que o período crítico (floração-enchimento dos caroços) é de 60 dias (entre os 41o e 100o dia). - Capacidade de Água Disponível (CAD) - Determinou-se a CAD, segundo Reichardt (1987), a partir da curva de retenção de água, densidade do solo e profundidade do perfil, pela equação (5):

CAD = [(CC- PMP) / (10xDsxh)] (5)

em que:CAD - Capacidade de água disponível no solo (mm m-1); CC - Capacidade de campo (%); PMP - Ponto de murchamento permanente (%); Ds - Densidade do solo (g cm-3) e h - Profundidade da camada do solo (cm). Foram estabelecidas duas classes de CAD: • Tipo 1 - média capacidade de armazenamento de água (CAD= 40 mm) • Tipo 2 - alta capacidade de armazenamento de água (CAD= 50 mm)

Variáveis de saída do modelo:

- Índice de Satisfação da Necessidade de Água para a cultura (ISNA) - Definido como a relação entre a evapotranspiração real e a evapotranspiração máxima (ETr/ETm) ao longo do ciclo, para um determinado ano, numa certa data, num tipo de solo, para a algodoeiro herbáceo de ciclo médio. Como o ciclo da cultura está dividido em quatro fases fenológicas e a fase de enchimento dos caroços é o período mais determinante da produtividade final, estima-se o valor de ISNA nesta fase. Em seguida, passa-se então para o ano dois, data um, solo um, ciclo médio, e assim, sucessivamente, até o último ano. A partir deste cálculo, estabelece-se a função de freqüência do ISNA e seleciona-se a data onde o valor calculado é maior ou igual ao critério de risco adotado (ISNA > 0,55), em 80 % dos casos. Os ISNA’s foram espacializados pela utilização do software SPRING, versão 4.2 (CÂMARA et al., 1996). Para a caracterização do risco climático obtido ao longo dos períodos de simulações foram estabelecidas três classes de ISNA, conforme Steinmetz et al. (1985):

• ISNA ≥ 0,55 - a cultura está exposta a um baixo risco climático • 0,45 ≤ ISNA < 0,55 - a cultura está exposta a um risco climático médio • ISNA < 0,45 - a cultura está exposta a um alto risco climático

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Nas Figuras de 2 a 4, que referem-se ao plantio em fevereiro, observa-se a existência de

muitas áreas situadas entre os paralelos 8°S e 9°S e meridianos 38°W e 36°W (Região Leste), em condição de alto risco climático. Localidades como Inajá (8º4’S e 37º34’W) e Manari (8º58’S e 38º04’W) apresentam condições de alto risco climático devido, principalmente, ao baixo índice pluviométrico característico da região.

A Figura 4 apresenta duas áreas entre os paralelos 8° e 9°S e meridianos 38° e 37°W e 41° e 40°W (Região Sul) com alto risco climático, porém cerca de 70% da área apresenta baixo risco climático. Entretanto, essas áreas, onde estão localizados os municípios de Lagoa Grande (8°39' S e 40°12'W) e Santa Maria da Boa Vista (8°36'S e 39°53' W), apresentam baixo risco climático caso o plantio seja realizado em 15/02 (Fig. 3).

Comparando as Figuras 2, 3, 4, 5, 6 e 7 em relação a uma área localizada no paralelo 9°S e meridianos 38° a 37° W, observa-se que em 5/02 esta região apresenta alto risco climático (Fig. 2). Entretanto, na Figura 5 (plantio em 5/03) e Figura 6 (plantio em 15/03), as condições nesta mesma área é de médio risco climático. Logo após dez dias, no entanto, para plantio em 25/03, a mesma área apresenta-se com baixo risco climático (Fig. 7). Seqüencialmente, na Figura 8 (plantio em 5/04), esta área apresenta alto risco climático. Portanto, observa-se que em algumas regiões do Estado de Pernambuco ocorre grande variabilidade na distribuição pluvial.

Nas regiões situadas nos paralelos 7° a 8°S e meridianos 36° a 35°W (região Norte), as Figuras 8, 9 e 10 retratam algumas áreas que apresentam baixo risco climático pelo fato desta região do estado de Pernambuco apresentar proximidade com o Oceano Atlântico, fazendo com que o índice pluvial de norte a sul tenha uma pequena variação ao longo do período analisado. O município de Frei Miguelinho (7°56'S e 35°53'W) inclui-se nesta região, indica-se que o melhor período para plantio é de 5 de abril a 15 de maio. No plantio no mês de abril (Figs. 8 a 10), as situações de risco climático ficam mais comprometidas, apresentando maior número de regiões com alto risco climático, comparando com os meses de fevereiro e março, principalmente para região do sertão do estado. As Figuras 8 a 10

retratam que, em localidades situadas nos paralelos 8° a 9°S e meridianos 37° a 41°W, o algodão herbáceo de sequeiro está exposto a alto risco climático; a Figura 8 apresenta risco climático médio. Já nas Figuras 9 e 10 observa-se que esta mesma região apresenta alto risco climático para a cultura do algodão herbáceo de sequeiro. Os municípios de Parnamirim (8°04'S e 39°43' W) e Salgueiro ( 8°

9'S e 39°9'W), nesta região, o mês de fevereiro apresenta-se como o mais apropriado, considerando que na fase de maior necessidade para cultura do algodão herbáceo de sequeiro será satisfeita.

CONCLUSÕES

Observamos que a variação espaço-temporal da precipitação é fator limitante na determinação

de regiões climaticamente favoráveis a implementação da cultura do algodoeiro herbáceo no estado de Pernambuco. Podemos atribuir essas variações de riscos climáticos em acordo com a época do ano, pois os sistemas efetivos na produção de precipitação atuam de forma isolada.

As épocas de semeadura com menor risco climático situam-se entre os meridianos 41º a 38º W e são inseridas no período de 21-dezembro a 21-janeiro, devido as características fenológicas da cultura, para que não ocorra a perda total ou parcial da produção. Para as regiões situadas entre os meridianos 38º a 37º W, o período de semeadura segue de 1 a 21-fevereiro. Para as demais regiões temos o período de 11-abril a 21-maio, sendo importante ressaltar que a cultura é extremamente sensível às regiões de alta umidade relativa.

CONTRIBUIÇÃO PRÁTICA E CIENTÍFICA DO TRABALHO

Definição de épocas e locais onde existe o menor riscos climáticos para implantação da cultura

do algodoeiro no estado de Pernambuco. Pelo conhecimento destas áreas e das épocas onde o risco de frustração de culturas é menor espera-se melhorias na qualidade de vida, menor impacto ambiental negativo e melhoria econômica para a região.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARON, C. ; PEREZ, P. ; MARAUX, F. Sarrazon: Bilan hidrique applique au zonage. Paris: CIRAD, 1996. 26p. BRASIL. Ministério da Agricultura. Equipe de Pedologia e Fertilidade do Solo (Rio de Janeiro, RJ). Levantamento exploratório: reconhecimento de solos do Estado da Bahia. Rio de Janeiro, 1972. 2v CÂMARA, G.; SOUZA, R.C.M.; FREITAS, U.M.; GARRIDO, J. SPRING: Integrating remote sensing and GIS by object-oriented data modeling. Computers and Graphies, v. 20, n. 3, p. 395-403, 1996. CUNHA, R.G.; ASSAD, E.D. Uma visão geral do número especial da RBA sobre zoneanto agrícola no Brasil. Revista Brasileira de Agrometeorologia, Santa Maria, v. 9, n. 3, p. 377-385, 2001. DOORENBOS, J.; KASSAM, A. H. Efeito da água no rendimento das culturas. Campina Grande: UFPB, 1994.306p. (FAO. Irrigação e Drenagem, 33). EAGLEMAN, A.M. An experimentaly derived model for actual evapotranspiration. Agricultural Meteorology, Amsterdam, v.8, n.4/5, p.385-409, 1971. INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO DE PERNAMBUCO. Zoneamento pedoclimático do Estado de Pernambuco: relatório de dados básicos. Recife: IPA/SUDENE, 1987.183p. v1. PENMAN, H. L. Vegetation and hydrology. Harpenden: Commonwealth Bureau of Seils, 1963.125p. Techinical Communication,n.53, REDDY, V. R.; REDDY, K. R.; BAKER, D. N. Temperature effect on growth and development of cotton during the fruiting period. Agronomy Journal, v. 83, p. 211-217, 1991.

REICHARDT, K. O solo como reservatório de água. In: REICHARDT, K. A água em sistemas agrícola. [S.l.:s.n.], 1987. p. 27- 69 STEINMETZ, S. R. F. N., FOREST, F. Evaluation of the climatic risk on upland rice in Brazil, In: STEINMETZ, S. R. F. N., FOREST, F. Colloque “resistence a la secheresse en millieu intertropicale:quelles recherches pour le moyen terme?” Paris:CIRAD, 1985. 43-54 p. SUDENE.(Recife,PE). Dados pluviométricos mensais do Nordeste: Bahia. Recife, 1990. p.747. v.1/3