Zuleide Faria de Melo: uma vida Ano 01 -...

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Julho \ Agosto 2015 - Ano 01 12 mobilizações pela construção de creche e pelo direito à energia elétrica e à água encanada. Dedicou-se à causa internacionalista, ocupando cargos no Instituto Cultural Brasil-União Soviética, no CONDEPAZ (Conselho Brasileiro de Defesa da Paz), criado para combater o acirramento da Guerra Fria e da corrida armamentista provocado pelo imperialismo, e na Associação Cultural José Marti, de solidariedade a Cuba, da qual participa até hoje, como presidente. Zuleide entrou para o Comitê Central do PCB em 1987, no VIII Congresso. Fez parte do Movimento em Defesa do PCB, em 1992, cedendo sua casa para reunir o comando central da resistência à tentativa de liquidar o Partidão. No processo de Reconstrução Revolucionária, dividiu os trabalhos de direção nacional do Partido com Ivan Pinheiro, ocupando a Presidência, em sucessão ao camarada Horácio Macedo, até o ano de 2008. É dirigente do Comitê Central e mantém firme sua dedicada militância comunista, acreditando que as propostas do marxismo-leninismo são as únicas capazes de salvar a humanidade da barbárie imposta pelo capitalismo. casa militantes perseguidos pela ditadura, desde membros das Ligas Camponesas a quadros comunistas como Jayme Miranda. Nos anos 1970, integrou a assessoria do Comitê Central, ficando responsável por datilografar e imprimir textos e jornais do Partido, como o Voz Operária. Em 1974, juntamente com José Sales e Marly Vianna, membros do Comitê Central, participou da viagem de carro a São Paulo para trazer para um aparelho no Rio todo o acervo do Arquivo de Astrojildo Pereira. Em 1977, a documentação foi para a Itália, passando a compor, com o Arquivo de Roberto Morena e outras obras, o Archivio Sociale della Memoria Operaia Brasiliana, o que garantiu a preservação de mais de três décadas da memória das lutas dos trabalhadores brasileiros. Em 1978, Zuleide integrou o CEBRADE, Centro Brasil Democrático, entidade criada por Oscar Niemeyer para aprofundar a luta contra a ditadura e, no período, recebeu a incumbência de trabalhar para o Comitê Central, cumprindo tarefas partidárias. Na década de 1980, atuou na favela do Morro dos Macacos, em Vila Isabel, organizando Em noite de muita emoção na Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro, a histórica dirigente comunista Zuleide Faria de Mello recebeu a Medalha Pedro Ernesto, concedida pelo Vereador Renato Cinco (PSOL), em evento que contou com a presença de Ivan Pinheiro, Secretário Geral do PCB, Muniz Ferreira, da Fundação Dinarco Reis, Milton Temer (dirigente do PSOL) e vários militantes de organizações de esquerda. A homenagem coroa uma trajetória de extrema coerência política e dedicação à luta pelo socialismo no Brasil. Professora aposentada do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Zuleide nasceu em Limoeiro, Alagoas, e veio para o Rio de Janeiro, onde começou a trabalhar, a partir de 1965, na Editora Civilização Brasileira, dedicando-se a edição, revisão e tradução de livros. Casou-se aos vinte anos de idade e teve duas filhas. Entrou oficialmente para o PCB no dia 25 de março de 1965, mas começou de fato sua militância logo após o golpe de 1964, quando, após agir para liberar da prisão um primo seu de Alagoas, Jurandir Bóia, diretor da UNE, abrigou em sua Zuleide Faria de Melo: uma vida dedicada à causa comunista JORNAL Um jornal a serviço da revolução socialista. Edição 04 Ano 01 jul ago 2015 \ \ UNIDADE PARA ENFRENTAR OS ATAOUES DO CAPITAL pcb.org.br [email protected] Acesse o conteúdo através do seu aparelho móvel. EDITORIAL PAG.02 Ajustes neoliberais e contrarreforma política: Novos desafios para a classe trabalhadora.

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mobilizações pela construção de creche e pelo direito à energia elétrica e à água encanada . Ded icou-se à causa internacionalista, ocupando cargos no Instituto Cultural Brasil-União Soviética, no CONDEPAZ (Conselho Brasileiro de Defesa da Paz), criado para combater o acirramento da Guerra Fria e da corrida a r m a m e n t i s t a p r o v o c a d o p e l o imperialismo, e na Associação Cultural José Marti, de solidariedade a Cuba, da qual participa até hoje, como presidente.

Zuleide entrou para o Comitê Central do PCB em 1987, no VIII Congresso. Fez parte do Movimento em Defesa do PCB, em 1992, cedendo sua casa para reunir o comando central da resistência à tentativa de liquidar o Partidão. No processo de Reconstrução Revolucionária, dividiu os trabalhos de direção nacional do Partido com Ivan Pinheiro, ocupando a Presidência, em sucessão ao camarada Horácio Macedo, até o ano de 2008.

É dirigente do Comitê Central e mantém firme sua dedicada militância comunista, acreditando que as propostas do marxismo-leninismo são as únicas capazes de salvar a humanidade da barbárie imposta pelo capitalismo.

casa militantes perseguidos pela ditadura, desde membros das Ligas Camponesas a quadros comunistas como Jayme Miranda.

Nos anos 1970, integrou a assessoria do Comitê Central, ficando responsável por datilografar e imprimir textos e jornais do Partido, como o Voz Operária. Em 1974, juntamente com José Sales e Marly Vianna, membros do Comitê Central, participou da viagem de carro a São Paulo para trazer para um aparelho no Rio todo o acervo do Arquivo de Astrojildo Pereira. Em 1977, a documentação foi para a Itália, passando a compor, com o Arquivo de Roberto Morena e outras obras, o Archivio Sociale della Memoria Operaia Brasiliana, o que garantiu a preservação de mais de três décadas da memória das lutas dos trabalhadores brasileiros.

Em 1978, Zuleide integrou o CEBRADE, Centro Brasil Democrático, entidade criada por Oscar Niemeyer para aprofundar a luta contra a ditadura e, no período, recebeu a incumbência de trabalhar para o Comitê Central, cumprindo tarefas partidárias. Na década de 1980, atuou na favela do Morro dos Macacos, em Vila Isabel, organizando

Em noite de muita emoção na Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro, a histórica dirigente comunista Zuleide Faria de Mello recebeu a Medalha Pedro Ernesto, concedida pelo Vereador Renato Cinco (PSOL), em evento que contou com a presença de Ivan Pinheiro, Secretário Geral do PCB, Muniz Ferreira, da Fundação Dinarco Reis, Milton Temer (dirigente do PSOL) e vários militantes de organizações de esquerda. A homenagem coroa uma trajetória de extrema coerência política e dedicação à luta pelo socialismo no Brasil.

Professora aposentada do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Zuleide nasceu em Limoeiro, Alagoas, e veio para o Rio de Janeiro, onde começou a trabalhar, a partir de 1965, na Editora Civilização Brasileira, dedicando-se a edição, revisão e tradução de livros. Casou-se aos vinte anos de idade e teve duas filhas.

Entrou oficialmente para o PCB no dia 25 de março de 1965, mas começou de fato sua militância logo após o golpe de 1964, quando, após agir para liberar da prisão um primo seu de Alagoas, Jurandir Bóia, diretor da UNE, abrigou em sua

Zuleide Faria de Melo: uma vidadedicada à causa comunista

JORNAL

Um jornal a serviço da revolução socialista.

Edição 04

Ano 01

jul ago 2015\\

UNIDADE PARAENFRENTAR OSATAOUES DOCAPITAL

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.02 Ajustes neoliberais e contrarreforma política:

Novos desafios para a classe trabalhadora.

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suas próprias leis, a fim de intensificar a violência, a repressão estatal e a restrição às liberdades políticas e sindicais.

O imperialismo contemporâneo tenta apagar a contribuição do movimento comunista com a finalidade de ocultar as conquistas do sistema socialista.

Tenta manipular as gerações mais jovens com a falsa propaganda que esconde o fato de que as guerras de partilha não são causadas por alguns maníacos, como apresentam Hitler e Mussolini. Ao contrário, a União Soviética depois de ter erradicado a propriedade capitalista, aboliu também o incentivo à divisão e nova partilha do mundo. Por esta razão a URSS foi o único dos estados participantes que levava a cabo uma guerra justa.

Esconde ainda o fato de que a Segunda Guerra Mundial foi considerada inicialmente uma grande oportunidade para restaurar o capitalismo na URSS e de que crimes de lesa humanidade foram cometidos não apenas pelas potências do Eixo (Alemanha, Itália e Japão), mas também pelos governos dos Estados burgueses “democráticos”. O maior, massivo e mais terrível crime deles foi cometido pelos EUA quando, sem que existisse necessidade militar, lançaram as bombas de Hiroshima e Nagasaki em 6 e 9 de agosto de 1945.

H o j e , a s c a u s a s q u e possibilitaram o surgimento do fascismo ainda se encontram vivas. No momento de recrudescimento da crise capitalista mundial, aprofunda-se o estímulo de guerra pelas potências capitalistas, com o aumento de contingentes militares, a reativação de frotas na América Latina e as leis internacionais que buscam reprimir qualquer tentativa dos povos em não se submeter aos interesses do imperialismo.

Nesse quadro de acirramento das disputas interimperialistas, de retomada das ideias fascistas e de ataques sistemáticos aos trabalhadores e aos povos em todo o mundo, é preciso que a luta em defesa dos direitos e das conquistas populares não seja separada da luta contra os monopólios, contra a exploração capitalista e seu poder, apontando-se para a necessidade e real possibi l idade de construção do socialismo.

Trata-se de uma das páginas mais brilhantes da história dos povos o dia em que a bandeira da União Soviética foi levantada triunfante no Reichstag pelo Exército Vermelho. A vitória contra a Alemanha nazista representou o fim do regime responsável pela tortura e morte de milhões em campos de concentração, onde a exploração do homem pelo homem chegou a seu ponto mais baixo com a degradação absoluta da existência humana.

O fascismo nasce nas entranhas do sistema capitalista, como uma forma utilizada pelos monopólios para exercer o poder em condições de intensa crise e c o n ô m i c a , p o b r e z a e x t r e m a , desemprego e decadência dos partidos b u r g u e s e s t r a d i c i o n a i s . O ultranacionalismo é explorado para manipular ideologicamente grande parte das massas desorganizadas, dos desempregados e setores pequeno-burgueses arruinados. A burguesia e o Estado capitalista anulam ou abandonam a d e m o c r a c i a b u r g u e s a , o parlamentarismo e a legitimidade política que eles mesmos criaram. Quando seus interesses exigem, levam a cabo golpes de estado militares e políticos, suspendem

Os 70 anos da vitória contra o fascismo

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EDITORIAL

O Poder Popular, um jornal a serviço da Imprensa Popular.

Órgão o?cial do Partido Comunista Brasileiro (PCB).

Comissão Nacional de Comunicação: Ricardo Costa, Ivan Pinheiro, Edmílson Costa, Otávio Dutra, Roberto

Arrais (jornalista responsável - 985/DRT - FENAJ).

Endereço eletrônico: www.pcb.org.br. Contato: [email protected].

Sede Nacional do PCB: Rua da Lapa, 180, Gr. 801 - Centro - Rio de Janeiro - RJ - CEP.: 20.021-180.

Telefax.: (21) 2262-0855 e (21) 2509-3843.EX

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institucional, condenados a não ter presença no parlamento.

Neste episódio causou espécie a atitude dos deputados do PSOL, que votaram a favor da medida restritiva, demonstrando que este partido hoje prioriza a agenda eleitoral em detrimento da formação de uma frente política da esquerda soc ia l i s ta . Se a lguns agrupamentos de esquerda e movimentos sociais chegaram a apostar numa reforma política que beneficiasse o campo popular, o ato arbitrário da Câmara dos Deputados não surpreendeu os comunistas, pois nenhuma ilusão alimentamos quanto à possibilidade de obter mudanças junto às instituições b u r g u e s a s , n u m q u a d r o d e aprofundamento do conservadorismo. Em 93 anos de vida, o PCB sobreviveu a ditaduras, perseguições, torturas, assassinatos, dedicando-se à luta clandestina, quando não havia outro caminho. Por isso jamais nos curvaremos o u r e t r o c e d e r e m o s d i a n t e d a s adversidades impostas pelos partidos burgueses. Nosso compromisso é manter acesa a luta ao lado da classe trabalhadora, pela construção do Poder Popular, no rumo do socialismo e do comunismo no Brasil.

com os impostos. Mais um pacote de bondades ao

grande empresariado é anunciado com a nova fase do Programa de Investimento em Logística, que vai privatizar aeroportos, rodovias, ferrovias e portos.

A pauta conservadora do Congresso Nacional ameaça agora a vida de comunidades indígenas e quilombolas, com a PEC da demarcação das terras indígenas, assim como da juventude brasileira, com a redução da maioridade penal, além de outros ataques aos direitos sociais. No âmbito da “democracia burguesa”, os partidos da ordem querem impedir a sobrevivência de qualquer representação política voltada a combater o capitalismo. A Câmara dos Deputados deu o primeiro passo para impor a contrarreforma eleitoral brasileira, numa aliança forjada entre os maiores partidos (PMDB, PT e PSDB) e aqueles com menor representação parlamentar. Foi aprovada a cláusula de barreira, dispositivo que nega aos partidos sem parlamentares eleitos o acesso à propaganda eleitoral gratuita e ao fundo público de manutenção partidária. Os partidos comprometidos com as lutas dos trabalhadores, como o PCB, PSTU e PCO, serão excluídos do jogo

Diante da crise econômica mundial, com reflexos cada vez mais visíveis no Brasil, os capitalistas aprofundam os ataques aos direitos sociais e políticos historicamente conquis tados, apl icando ajustes neoliberais, cujas consequências recaem sobre as costas dos trabalhadores e das camadas populares, que sofrem diretamente com demissões em massa, arrocho salarial, precarização do trabalho, alta da carestia, piora das condições de vida.

No governo Dilma, o discurso desenvolvimentista usado pelo PT nos últimos anos deu lugar à rendição inconteste aos interesses e necessidades d o s o r g a n i s m o s f i n a n c e i r o s i n t e r n a c i o n a i s e d a b u rg u e s i a monopolista. Enquanto os cortes orçamentários retiram direitos e atingem programas sociais, a Previdência, a Saúde e a Educação, as multinacionais continuam remetendo bilhões de dólares em lucros para o exterior sem pagar um tributo sequer, inúmeras facilidades são concedidas a banqueiros e grandes empresas . No campo , 1% dos proprietários detêm 43% das terras, mas o imposto territorial rural recolhe míseros 0,04% de todo o montante arrecadado

Ajustes neoliberais, ataques aosdireitos e contrarreforma política: novosdesafios para a classe trabalhadora

Diagramação: Mauricio Souza.

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povo português em geral e nos operários em particular, mas que também destes recebe grandes demonstrações de confiança.

Em diversos momentos, Cunhal teve a sabedoria de não tratar algumas fórmulas como eternas, sabendo adaptá-las à situação concreta de cada período, ainda que isso não significasse abrir mão de princípios basilares de uma organização comunista, tais como sua natureza de classe e sua firmeza ideológica. O Partido com paredes de vidro, obra que na literatura comunista pode-se comparar, com as devidas proporções, a Que fazer?, de Lênin, guarda seguramente muitas linhas de r e f e r ê n c i a c o m e s t e ú l t i m o , principalmente ao elevar a discussão partidária à análise concreta da realidade concreta.

A simples leitura do livro não encerra todas as questões que hoje estão colocados para uma organização revolucionária, mas, sem dúvidas, é um passo fundamental para que possamos encará-las e resolvê-las.

comunista em nossa época. Escrevendo o livro para a sociedade portuguesa, no interior da qual alguns grupos acusavam o PCP de ser pouco transparente, Álvaro Cunhal apresentava seu partido de maneira cristalina, como se através de paredes de vidro estivesse sendo observado. No decorrer do livro, Cunhal abordou amplas questões, desde a conjuntura do movimento comunista daquela época e o programa do PCP para a Revolução de Abril, passando por temas referentes à vida do partido, como a democracia interna, o trabalho coletivo e a importância política de uma direção bem preparada e que soubesse dirigir o conjunto partidário.Foi a firmeza de seus princípios organizativos, calcados em sólida consciência de classe, que possibilitou ao PCP resistir heroicamente durante os anos da ditadura fascista de Salazar – ainda que a polícia política portuguesa constantemente anunciasse seu desmonte – e emergir ao fim daqueles tempos como uma das principais forças da Revolução de Abril. Assim manteve-se como principal organização operária do país, demonstrando que não é somente um partido que confia plenamente no

Poucas vezes na história do movimento comunista internacional t e o r i a e p r á t i c a r e v o l u c i o n á r i a combinaram-se tão plenamente em uma pessoa como no caso de Álvaro Cunhal. Nascido em 1913 e falecido em 2005, Álvaro Cunhal viveu grande parte de sua vida dedicando-se à luta pelo socialismo e à construção do Partido Comunista Português, organização na qual ingressou ainda jovem, nela permanecendo até a morte, ocupando por muitos anos o posto de Secretário Geral e assumindo papel de grande influência na política portuguesa durante a Revolução dos Cravos.

Dono de vasta cultura, Cunhal deixou às futuras gerações um grande legado no qual se incluem desde romances de notável valor literário, pinturas e, sobretudo, uma fecunda obra política que, mesmo pouco estudada em nosso país, pode servir aos trabalhadores como importante instrumento para os embates da classe.

Dentre suas obras destaca-se o livro mais famoso: O partido com paredes de vidro, uma rara peça de reflexão sobre a atuação do PCP e que muito nos ajuda a compreender o papel de um partido

O Partido de Álvaro Cunhal

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mais parasitário no sistema capitalista. A justificativa de que é necessário realizar o ajuste para retomar o crescimento é uma balela: cada ponto percentual de aumento da SELIC representa um pagamento de juros em torno de R$ 25 bilhões. Ou seja, só o aumento dos juros realizado após o início do segundo governo Dilma representa uma sangria de recursos muito maior do que aquilo que pretendem economizar com o ajuste. É como enxugar gelo no Ártico.

Além disso, essas medidas não irão resolver os problemas da crise. Pelo contrário, vão aprofundar a estagnação econômica, aumentar o desemprego, reduzir os salários dos trabalhadores e a renda das famílias, a exemplo do que já vem ocorrendo em outros países da Europa em que essas medidas foram adotadas. Por isso, os trabalhadores devem reagir de maneira firme a mais essa ofensiva contra seus direitos e garantias, organizando a resistência nos locais de trabalho, até reunir forças para desencadear a greve geral contra os ataques promovidos pelo capital e pelo governo que o representa.

c o n j u n t o d o s t r a b a l h a d o r e s , especialmente os mais pobres, pois o aumento do desemprego e a redução do acesso ao seguro-desemprego colocarão no desespero milhões de trabalhadores.

O projeto de terceirização aprovado na Câmara dos Deputados, caso seja confirmado no Senado, significa uma derrota histórica dos trabalhadores e um retrocesso na garantia dos direitos sociais, pois, na prática, extingue grande parte da legislação contida na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada há mais de 70 anos no primeiro governo Vargas. Caso seja confirmada, os empresários agora poderão terceirizar os trabalhadores não apenas nas atividades-meio, como já vinha acontecendo, mas também nas atividades-fim, o que r e p r e s e n t a u m a p r e c a r i z a ç ã o generalizada para o conjunto dos trabalhadores brasileiros. Tanto o ajuste fiscal quanto as terceirizações são parte de um movimento que o grande capital vem realizando para sair da crise e a prova definitiva de que o governo petista perdeu completamente a compostura e se coloca na linha de frente em defesa do que há de

Os trabalhadores brasileiros enfrentam neste momento uma ofensiva geral contra seus salários, direitos e garantias, expressos no ajuste fiscal e no projeto das terceirizações, recentemente aprovados pela Câmara dos Deputados, agora em discussão no Senado. O governo do Partido dos Trabalhadores, diante da crise econômica, resolveu rasgar de vez a máscara e liderar a guerra contra os trabalhadores, cumprindo assim a última etapa de degeneração política e ideológica típica das organizações sociais-democratas em todo o mundo.

O ajuste fiscal tem o objetivo de reduzir gastos em torno de R$ 70 bilhões. Para tanto, o governo colocou todo o ônus do ajuste na conta dos trabalhadores. Reduziu o acesso ao seguro-desemprego, ao abono salarial, às pensões das viúvas, dificultou o pagamento dos pescadores no período da desova dos peixes, vetou o reajuste do imposto de renda, aumentou os impostos e os preços da energia elétrica, dos combustíveis, dos telefones, dos transportes, dos produtos importados, além do encarecimento do crédito direto ao consumidor. Essas medidas atingem o

Ofensiva geral contra salários, direitose garantias dos trabalhadores

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fossem demarcadas. Esse quadro sombrio se soma à falta de recursos e de servidores na Fundação Nacional do Índio (Funai), órgão seguidamente sucateado.

O s g r a v e s p r o b l e m a s vivenciados pelas aldeias não serão resolvidos pelo desenvolvimento do mercado e da economia capitalista, uma vez que esse modo de produção possui, em sua essência, a lógica do lucro, a mercantilização da terra, a degradação ambiental, a homogeneização da cultura e a exploração do homem pelo homem. Os Povos Indígenas e as organizações que defendem sua causa não podem ter a ilusão de que a Conferência será suficiente para modificar a realidade dos índios no país. Serão necessárias luta permanente e pressão contínua para que o governo brasileiro garanta e amplie os direitos dos povos originários. Será por meio da luta pela construção do Poder Popular que conseguiremos politizar as demandas das comunidades indígenas, respeitando suas especificidades c u l t u r a i s e s e u d i r e i t o à autodeterminação, e articulá-las às diversas lutas dos trabalhadores e de outras identidades oprimidas.

garantido o direito à autodeterminação, pois a presença de posseiros, de madeireiras clandestinas, a mineração ilegal e a falta de políticas públicas adequadas são constantes.

O agronegócio é favorecido em detrimento da agricultura familiar e do uso coletivo dos recursos naturais, reforçando a concentração de terra e a destruição ambiental, via uso de transgênicos e agrotóxicos, com nefastos i m p a c t o s s o c i a i s e c u l t u r a i s , p r i n c i p a l m e n t e p a r a i n d í g e n a s , quilombolas, ribeirinhos e pequenos agricultores.

Nos últimos 11 anos, 616 indígenas foram assassinados no país, sendo 349 destas mortes ocorridas no Mato Grosso do Sul, onde a maioria das comunidades vive em situação precária. No parlamento burguês, a bancada ruralista vem pressionando para modificar as leis que tratam dos assuntos indígenas, inclusive com o desrespeito às normas internacionais. O exemplo mais claro é a PEC 215, que pretende transferir, do Executivo para o Legislativo, o poder de demarca r t e r r a s i nd ígenas , quilombolas e unidades de conservação ambiental, o que, na prática, impediria que mais áreas indígenas e quilombolas

A 1ª Conferência Nacional de Política Indigenista, convocada por decreto presidencial, está sendo realizada num momento de intenso ataque aos direitos indígenas praticado pelo governo federal, em benefício dos interesses do grande capital, principalmente do agronegócio. A política neoliberal efetivada pelos sucessivos governos tucanos e petistas intensificou a usurpação dos direitos dos povos originários. A criminalização dos seus movimentos políticos, a homogeneização de suas culturas e a invasão dos seus t e r r i t ó r io s ameaçam a p róp r i a sobrevivência destas comunidades. Os obstáculos para a demarcação das terras compõem o problema mais grave, pois o território, para os indígenas, possui significados muito além da economia e estão ligados à sustentabilidade, à memória, à cultura e à identidade, elementos vitais para a reprodução física e cultural desses povos.

O governo Dilma registrou a menor taxa de demarcação de terras indígenas na história recente do país desde o fim da ditadura. Das 1.047 terras indígenas reivindicadas atualmente, apenas 38% estão regularizadas. Nas terras demarcadas continua a não ser

Coletivo Gregório Bezerra: Apoio esolidariedade às lutas indígenas

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VII Congresso da UJC: crescer paraorganizar a rebeldia da juventude

Não é por acaso que está para ser votada no congresso a PEC 131, que diminui a maioridade penal no país.

D i a n t e d e s t a c o m p l e x a conjuntura, a UJC se apresenta como uma referência política que busca aliar a experiência prática das lutas das massas juvenis à formação comunista. Por isso as grandes decisões do VII Congresso se concentraram no tema da organização, visando ampliar a inserção política junto aos jovens trabalhadores, nas escolas secundaristas, nos cursos técnicos e universidades, nos movimentos urbanos e rurais e grupos culturais independentes, ao lado do feminismo classista, movimento negro e GLBT. Na certeza de que, para a grande maioria da juventude, o capitalismo só tem a oferecer uma vida com menos direitos, maior jornada de trabalho, educação privada e de baixa qualidade, acesso limitado à produção cultural, maior repressão por parte do Estado burguês, os jovens comunistas perceberam a necessidade de fazer crescer e popularizar a UJC, para que esta se torne uma grande escola de formação de revolucionários, voltados a organizar a rebeldia da juventude Brasil afora.

seminário “90 anos da Federação Mundial das Juventudes Democráticas e a luta Anti-imperialista hoje”, parte da programação do congresso, contou com a participação da Juventude Comunista Grega (KNE), da Liga dos Jovens Comunistas do México (LJC), da Juventude Comunista Paraguaia (JCP), da Marcha Patriótica-Colômbia, da Juventude Comunista Avançando (JCA-Brasil).

N o B r a s i l , e m m e i o à intensificação dos efeitos da crise do capitalismo e do pacto social firmado entre os governos do PT e seus aliados, a juventude convive com aumento do desemprego, precarização das relações de trabalho, corte de verbas na educação pública, falta de acesso à terra, péssimas condições de transportes, saúde e moradia. E sofre com o massacre policial: o Brasil é um dos países onde mais se matam jovens no mundo, em especial, pobres, negros e moradores de periferias nos centros urbanos. A política militar de segurança pública, tomando o “combate às drogas” como pretexto, recrudesce a onda de criminalização da juventude, através de leis mais duras e do encarceramento.

Entre os dias 17 a 21 de abril, reunida em Niterói-RJ, a União da Juventude Comunista consolidou importantes bases para sua construção revolucionária no VII Congresso Nacional. Seguindo o exemplo de João Saldanha, o “João Sem Medo”, e sob o l e m a “ O rg a n i z a n d o r e b e l d i a s , massificando lutas!”, os mais de duzentos delegados e observadores reafirmaram sua convicção na proposta de construção de uma alternativa revolucionária que seja capaz de envolver milhares de jovens, filhos da classe trabalhadora brasileira, num momento em que se estabelece novo patamar da luta de classes no Brasil e no mundo.

Em resposta à crescente ofensiva do imperialismo, cada vez mais agressivo em suas incursões contra os povos do m u n d o , a U J C r e f o r ç a o internacionalismo proletário como um princípio básico da organização, expresso na solidariedade militante à Venezuela, em repúdio à ingerência golpista do governo Obama, na luta pela paz com justiça social e pelo desmonte do Estado narcoterrorista na Colômbia, na permanente denúncia da guerra imperialista em todo o planeta. O

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não há dados consolidados sobre 2014, mas este também foi um ano de intensas mobilizações. Em muitos casos, as greves acontecem apesar, ou mesmo, contra as direções sindicais, possibilitando aos trabalhadores um novo ciclo de aprendizado e experiência na luta sindical e política, após duas décadas de h e g e m o n i a i n c o n t e s t á v e l d o colaboracionismo de classes.

Mas justamente quando é necessária ampla unidade da classe para enfrentar os ataques do patronato e do governo, as organizações que se dispõem a travar esse combate estão divididas. Por isso a Unidade Classista propõe a realização de um Encontro Nacional da Classe Trabalhadora (ENCLAT), construído de baixo para cima, a partir dos fóruns regionais de luta, para unificar a ação das organizações sindicais do campo da independência de classe e da luta anticapitalista. É preciso avançar na luta pela redução da jornada sem redução de salário, mais e melhores empregos, salário mínimo do DIEESE, fim do fator previdenciário e das terceirizações, reestatização das empresas privatizadas sob controle dos trabalhadores. Nenhum direito a menos, rumo a novas conquistas!

mais para a repressão, como se verificou no caso do massacre contra os professores e servidores públicos do Paraná. A tática de fechar o diálogo para as reivindicações dos trabalhadores em luta, forçando os movimentos ao limite de sua resistência, no velho estilo de Margareth Tatcher, Ronald Reagan e FHC, volta a ser utilizada pelos governos e patrões, a exemplo da forma como foi atacada a greve dos professores em São Paulo.

Em meio à crise do ciclo hegemônico do PT, no movimento sindical é possível verificar a perda de representatividade da CUT, que ainda nos anos 1990 iniciou seu processo de acomodação e, a partir de 2002, com o governo Lula, reforçou a estreita colaboração com o governo e a burguesia. Hoje o sindicalismo de resultados predomina no âmbito das centrais, as quais se distanciam cada vez mais das bases, mantendo a direção dos sindicatos e federações através de expedientes antidemocráticos, poder econômico e mesmo práticas do banditismo sindical. Em contrapartida, os trabalhadores mobilizam-se em todo o país, num movimento crescente de retomada das greves nos anos recentes : 446 paralisações em 2010; 554 em 2011; 873 em 2012 e cerca de 2.000 em 2013. Ainda

A Unidade Classista, corrente sindical ligada ao PCB, realizou, entre os dias 4 e 6 de junho, o seu I Encontro Nacional em São Paulo, com a presença de mais de 100 delegados de 18 Estados do país. Os militantes avaliaram que a crise econômica vai levar ao acirramento da luta de classes, com o recrudescimento da repressão contra os trabalhadores e dos ataques orquestrados pelos governos e donos do capital, unidos em torno do objetivo comum de despejar as consequências da crise nos ombros da classe trabalhadora.

Crescem as demissões em vários setores da economia, com destaque para a construção civil e o setor automobilístico, ao mesmo tempo em que empresas fecham suas portas. O Congresso Nacional aprova o projeto das terceirizações e as medidas provisórias do plano de ajuste fiscal. O governo Dilma busca superar o desgaste acumulado nos primeiros meses do mandato adotando iniciativas de corte neoliberal para conso l ida r o apo io do g rande empresariado nacional e internacional. A austeridade e o ajuste fiscal são perseguidos a qualquer custo, impondo o arrocho sobre a classe trabalhadora, exemplos que são seguidos pelos governos estaduais, que apelam cada vez

Unidade Classista:organizar, lutar, vencer!

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Julho \ Agosto 2015 - Ano 01 Julho \ Agosto 2015 - Ano 01

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KKE: “O movimento operário-popularprecisa organizar seu contra-ataque”

quem vai pagar é o povo. O governo também já declarou que manterá os acordos com a OTAN, a aliança estratégica com os Estados Unidos.

Que solução o KKE apresenta neste quadro de crise capitalista?

A solução é ficar fora da União Europeia, com o poder controlado pelo povo e o não pagamento da dívida. Todos os grandes meios de produção, a indústria, os serviços, a saúde e a educação, que tudo isso seja propriedade organizada pelo povo, mas não com objetivo de produzir lucro para os burgueses. Quando dizemos que a propriedade será do povo, não estamos falando desse Estado burguês. O que queremos, de forma científica e organizada, é ter uma economia baseada nas necessidades da população.

Quais as perspectivas para um futuro próximo?

Queremos ampliar as ações do Partido, promover e fortalecer os movimentos populares. Isso também inclui um esforço na reconstrução do movimento comunista internacional, para que, no futuro, a gente possa falar em um polo revolucionário internacional.

demonstra o grande descontentamento popular com os partidos tradicionais, Nova Democracia e Pasok, que condenaram o povo à pobreza e ao desemprego durante anos de crise econômica.

O Partido Comunista apóia o atual governo do partido Syriza?

Nosso partido, tanto antes das eleições como depois, decidiu não apoiar o Syriza, porque acreditamos que esse governo não tem uma política a favor do povo. Na atual situação o Syriza não tem condições de garantir os interesses populares. O povo deve traçar sua própria história. E o ponto de partida da luta deve ser a recuperação de todos os direitos que nos foram roubados durante a crise. O movimento operário-popular necessita organizar seu contra-ataque. Não temos nenhuma confiança ou ilusão em relação ao governo Syriza.

Quais são os pontos críticos desse governo?

O governo de coalizão entre o Syriza e o Anel (Partido Gregos Independentes), que é direitista, manterá as políticas antipopulares que a União Européia tem para o nosso país. O Syriza já concordou em pagar a dívida externa, mas claro que

De visita ao Brasil para participar do “VII Congresso da UJC: Organizando Rebeldias, Massificando Lutas”, o dirigente da Juventude Comunista da Grécia (KNE, sigla em grego), Aris Evangelidis, 30 anos, falou da difícil situação econômica da Grécia e seus desafios políticos.

Como você avalia sua visita ao Brasil?

Para nós essa visita ao Brasil é particularmente importante, pois o que queremos é fortalecer nosso vínculo e o intercâmbio entre nossos partidos e organizações, impulsionando assim a construção do Movimento Comunista Internacional. O KKE e o PCB estão do mesmo lado na luta, que tem como objetivo atrair os jovens para a batalha contra a barbárie capitalista e sua substituição por outra sociedade, sem a exploração do homem pelo homem.

Como as últimas eleições impactaram o Partido Comunista Grego (KKE)?

O KKE aumentou a porcentagem de votos e o número de deputados no Congresso, em relação às eleições de 2012. Em 2015 foram eleitos 15 deputados, três a mais que nas últimas eleições. Isso representa 6% dos votos e, no Parlamento, somos a quinta força política. O resultado eleitoral

Page 6: Zuleide Faria de Melo: uma vida Ano 01 - opp.dls.hol.esopp.dls.hol.es/O_Poder_Popular_04-IMPRESSAO.pdf · Popular, no rumo do socialismo e do comunismo no Brasil. com os impostos.

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Agricultura) e membro do CC, desapareceu em Belo Horizonte. José Montenegro de Lima, da Juventude Comunista, e Orlando Bonfim Júnior, Secretário Nacional de Agitação e Propaganda, foram sequestrados e mortos, sucessivamente, em setembro e outubro de 1975. Foram ao todo 10 membros do Comitê Central e três militantes com responsabilidades nacionais assassinados pela ditadura, além de muitas outras prisões e mortes de militantes de base.

N a s e q u ê n c i a , f o r a m desmanteladas, em São Paulo, as células dos jornalistas, dos estudantes e dos metalúrgicos, acompanhadas das mortes brutais de José Ferreira de Almeida (tenente da PM que distribuía Voz Operária entre militares), do jornalista Vlado Herzog e do metalúrgico Manoel Fiel Filho. Para os três, montou-se a farsa do suicídio nos cárceres onde foram assassinados por tortura.

A morte de Herzog catalisou o descontentamento de amplos setores sociais com a ditadura. Entraram em cena, no final da década de 1970, os movimentos sociais, com destaque para a reativação do movimento operário na região do ABC paulista. Mas a transição democrática se deu sob hegemonia dos interesses capitalistas. À frente dos t r aba lhadores , p reva leceu uma orientação socialdemocrata tardia, abraçada por “novos” sindicalistas, ex-guerrilheiros e grupos da Igreja. As pr inc ipa is l ideranças operár ias comunistas haviam sido dizimadas, e a maioria do Comitê Central do PCB voltaria do exílio com posições reformistas e extremamente cautelosas, pregando a unidade com forças do campo conservador. A estratégia da revolução socialista não constava do horizonte político das principais organizações de esquerda do período, o que pode ajudar a explicar a complexa conjuntura brasileira dos dias de hoje.

Grande do Sul, o médico Fued Saad (que havia tirado Prestes do país no ano anterior), foi assassinado e atirado do sétimo andar do 1º Distrito Naval no Rio de Janeiro, para dar a impressão de suicídio. Em 1973, foram capturados dirigentes estaduais paulistas e atacada a célula do PCB na Volkswagen. Em 1974, foram mortos David Capistrano da Costa e Walter Ribeiro, membros do Comitê Central, assassinados e esquartejados na Casa da Morte em Petrópolis; José Roman, militante que fora buscar Capistrano na fronteira com a Argentina; Luiz Inácio Maranhão Filho, responsável pelo diálogo com a Igreja Católica, torturado e morto com injeção de curare, mesmo método utilizado para assassinar João Massena de Melo, também do CC.

A repressão desativou a gráfica do PCB localizada em Campo Grande no Rio, onde era impresso o Voz Operária, justamente quando o jornal ia completar dez anos de clandestinidade. A ordem para acabar com o PCB vinha diretamente do ministro do Exército Sylvio Frota, no momento em que o ditador Ernesto Geisel falava cinicamente em “distensão lenta, segura e gradual” do regime. Em janeiro de 1975, foi preso Raimundo Alves de Souza, responsável pela gráfica. Foram mortos com requinte de crueldade os dirigentes nacionais Élson Costa (atearam fogo em seu corpo e lhe injetaram curare) e Hiram de Lima Pereira, que distribuía o Voz Operária em São Paulo e no sul do país. Marco Antônio Tavares Coelho, que cuidava das finanças, da confecção do jornal e de contatos no exterior, foi barbaramente torturado e ficou preso até dezembro de 1978.

Em fevereiro, Jayme Amorim de Miranda e Itair José Veloso, do S e c r e t a r i a d o N a c i o n a l , f o r a m sequestrados, torturados e mortos, com seus corpos lançados nas águas do rio Avaré, em São Paulo.

No mês de abril, Nestor Vera, antigo líder da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na

O golpe de 1964 não foi um mero golpe militar. Resultou de uma articulação dos setores maisdinâmicos da burguesia brasileira com os grupos conservadores, com vistas à repressão ao ascendente movimento popular e para garantir o pleno desenvolvimento do capitalismo monopolista no país. Prova dessa articulação foi a Operação Bandeirantes (Oban), nascida em São Paulo com financiamento de grandes empresas brasileiras e estrangeiras. O aparelho repressivo virou DOI/CODI (Destacamento de Operações e Informações do Centro de Operações de Defesa Interna) e, sob o comando direto do Ministro do Exército, unificou as ações das Forças Armadas, de delegacias estaduais e das polícias militares no combate àqueles que resistiam à ditadura. Tratava-se de uma máquina de matar. Uma a uma, as organizações que optaram pe la lu ta a rmada foram sendo aniquiladas, através de um trabalho profissional de perseguição aos militantes, infiltração nos grupos de esquerda, tortura e morte. Em seguida, deu-se a ofensiva contra o PCB, que passou a ser visto como inimigo maior do regime, pelo entendimento de que o Partido, com seu histórico de lutas e influência no movimento sindical e popular, tinha ramificações em vários setores da sociedade, inclusive na imprensa e no MDB, que adotava postura mais oposicionista. A linha adotada pelo PCB, de investir na luta pelas liberdades democráticas e na retomada do movimento de massas, era percebida, pelos órgãos de repressão, como a mais “inteligente” e perigosa, pois capaz de influir em futuras transformações políticas no país.

Já no início dos anos 1970, a ordem era desmantelar o Comitê Central do Partido e os setores que controlavam suas finanças, o jornal Voz Operária e as relações com os partidos comunistas e com militantes no exterior. Em agosto de 1972, Cél io Guedes , camarada encarregado de buscar, de carro, no Rio

40 anos depois: o massacredo PCB e a transição para a

democracia burguesa no Brasil

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