1ª Vara Criminal de JacarepaguáProcesso n° 2009.203.042424-51º Réu: Bruno Fernandes das Dores de Souza2º Réu: Luiz Henrique Ferreira Romão
SENTENÇA
O Ministério Público ofereceu denúncia em face dos
acusados Bruno Fernandes das Dores de Souza e Luiz Henrique
Ferreira Romão, sendo certo que, segundo a denúncia, os fatos
ocorreram da seguinte maneira:
“No dia 13 de outubro de 2009, por volta das 03:30
horas, na Avenida Lúcio Costa, nº 5800, no bairro da
Barra da Tijuca, nessa cidade, os ora denunciados, livre
e conscientemente, em comunhão de desígnios e ações
entre si e com dois outros elementos ainda não
identificados, mediante violência e grave ameaça,
seqüestraram a gestante Eliza Silva Samudio, que se
encontrava no 5º mês de gestação.
Consta do incluso procedimento que o primeiro
denunciado e a vitima tiveram um relacionamento sexual,
sendo que Elisa ficou grávida e passou a atribuir a Bruno
Processo nº 2009.203.042424-51
a paternidade da criança, situação com a qual este não
se conformou e passou a ameaçar e tentar convencer a
vitima a abortar.
Conforme restou apurado, os denunciados e os outros
dois elementos se ajustaram para tentar convencer a
vítima a abortar e não prejudicar a carreira de Bruno.
Para tanto, no dia dos fatos, por volta das 02:00 horas,
nas proximidades da Rua Brigadeiro João, nº 158,
Tanque, em Jacarepaguá, o primeiro denunciado atraiu a
vítima para o interior de seu veículo, sendo certo que,
quando esta ingressou no carro, foi surpreendida pelos
demais. Ante a negativa da vítima em fazer um aborto, os
denunciados e os demais, livres e conscientemente,
privaram-na de sua liberdade, seqüestrando-a.
Dentro do veículo, a vítima foi agredida pelo primeiro
denunciado com tapas no rosto, o que causou as lesões
corporais descritas no laudo de fls. 42.
Alem de agredida, a vítima foi ameaçada com uma arma
de fogo pelo primeiro denunciado, enquanto os demais a
ofendiam, a ameaçavam de morte, maltratando-a e a
impedindo de desembarcar.
Após, por volta das 03:30 horas, os denunciados e os
dois outros elementos levaram a vítima para a residência
do primeiro denunciado, localizada na Avenida Lúcio
Costa, nº 5800, no bairro da Barra da Tijuca, local onde,
ajustados entre si, a fizeram ingerir vários comprimidos e
Processo nº 2009.203.042424-52
um líquido, sendo certo que assim, sem que a vítima
soubesse e contra a vontade desta, lhe ministraram uma
substância que entendiam ser abortiva.
A vítima foi mantida no local, contra a vontade, até o dia
seguinte, quando os denunciados, acreditando que o
aborto logo se realizaria, liberaram-na. Ocorre que as
substâncias que lhe foram ministradas não eram aptas a
produzir o resultado.
Durante todo o tempo em que detiveram a vítima, os
denunciados e os outros dois elementos fizeram várias
ameaças e ofensas, causando-lhe sofrimento moral”.
RELATÓRIO
Denúncia a fls. 02A/02D. Registro de ocorrência a fls.
04/06. Cópia do registro de ocorrência a fls. 09/10. Cópia do termo
circunstanciado a fls. 11/15. Declarações de Milena Baroni Fontana
a fls. 26/27. Declarações de Eliza Silva Samudio a fls. 28/32.
Registro de ocorrência aditado a fls. 35/38. Laudo de exame de
alcoolemia, substância tóxica ou entorpecente a fls. 42/43. Laudo de
exame de lesão corporal a fls. 44/45. Declarações de Leandro
Carlos da Conceição Freitas a fls. 47/48 e 49/50. Declarações de
Elzineide de Souza Vanderley Moraes a fls. 51/53. Declarações de
Mateus Laguer Dantas a fls. 54/56. Declarações de Romildo Silva
Processo nº 2009.203.042424-53
de Souza a fls. 57/59. Declarações de Luiz Carlos Figueiredo a fls.
60/61. Declarações de Mauro José de Oliveira a fls. 62/64.
Declarações de Bruno Fernandes das Dores de Souza a fls. 76/78.
Declarações de Luiz Henrique Ferreira Romão a fls. 85/87. Laudo
de exame de corpo de delito (lesão corporal) a fls. 104/105. Laudo
de exame de corpo de delito (alcoolemia, substância tóxica ou
entorpecente) a fls. 106/107. Cópia do laudo de exame de corpo de
delito (pesquisa indeterminada de substância tóxica) a fls. 118/119.
Cópia do laudo de exame de corpo de delito (alcoolemia, substância
tóxica ou entorpecente) a fls. 122/125. Cópia do laudo de exame de
corpo de delito (lesão corporal) a fls. 126/127.
Promoção do Ministério Público trazendo a denúncia e
requerendo a decretação das prisões preventivas dos réus a fls.
128/130. Decisão recebendo a denúncia e decretando as prisões
preventivas dos réus Bruno Fernandes das Dores de Souza e Luiz
Henrique Ferreira Romão a fls. 132/138. Cópia da decisão proferida
nos autos do processo nº 0218696-49.2010.8.19.0001 que teve
curso na 38ª Vara Criminal a fls. 144/145. Cópia do laudo de exame
de corpo de delito (pesquisa indeterminada de substância tóxica) a
fls. 158/159. Cópia do laudo de exame de corpo de delito
(alcoolemia, substância tóxica ou entorpecente) a fls. 162/165.
Cópia do laudo de exame de corpo de delito (lesão corporal) a fls.
166 e 167. Resposta preliminar dos réus Bruno Fernandes das
Dores e Luiz Henrique Ferreira Romão com requerimento de
revogação da prisão preventiva a fls. 191/194. Promoção ministerial
Processo nº 2009.203.042424-54
opinando contrariamente ao pedido defensivo a fls. 197/227.
Requerimento de revogação da prisão preventiva dos réus a fls.
228/244. Promoção ministerial opinando contrariamente ao pedido
defensivo a fls. 266/269. Decisão indeferindo o pedido de
revogação da prisão preventiva dos réus e designando data para a
realização da AIJ a fls. 276/286. FAC do réu Bruno Fernandes das
Dores de Souza referente ao Estado de Minas Gerais a fls. 316/318.
FAC do réu Luiz Henrique Ferreira Romão referente ao Estado de
Minas Gerais a fls. 319/321. FAC do réu Bruno Fernandes das
Dores de Souza a fls. 358/361. Requerimento de habilitação da mãe
da vitima como assistente de acusação a fls. 368. Promoção
ministerial opinando favoravelmente ao pedido a fls. 368. Decisão
deferindo a habilitação a fls. 368. Declarações de Maria Aparecida
Salgado Mallet a fls. 372/375. Declarações de Mauro José de
Oliveira a fls. 376/377. Declarações de Mateus Languer Dantas a
fls. 378/379. Declarações de Milena Baroni Fontana a fls. 380/383.
Decisão designando data para a continuação da AIJ a fls. 394/397.
Pedido de habeas corpus a fls. 415/419 e 430/435. FAC do réu
Bruno Fernandes das Dores de Souza a fls. 470/473. Ofício da 7ª
Câmara Criminal do Tribunal de Justiça informando que o habeas
corpus do réu Bruno Fernandes das Dores de Souza foi denegado a
fls. 475. Declarações de Patrícia Amorim Sihman a fls. 477/478.
Declarações de Arthur Antunes Coimbra a fls. 479/480.
Declarações de Leonardo da Silva Moura a fls. 481/482.
Declarações de Rodrigo Alvim a fls. 483/484. Declarações de Paulo
Victor Mileo Vidotti a fls. 485/487. Declarações de Álvaro Luiz
Processo nº 2009.203.042424-55
Maior de Aquino a fls. 488/489. Declarações de Christian Chagas
Tarouco a fls. 490. Interrogatório do réu Bruno Fernandes das
Dores de Souza a fls. 491/492. Interrogatório do réu Luiz Henrique
Ferreira Romão a fls. 493/494. Alegações finais ministeriais a fls.
499/517. Ofício da 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça
informando que o habeas corpus do réu Luiz Henrique Ferreira
Romão foi denegado a fls. 518. Ofício da 7ª Câmara Criminal do
Tribunal de Justiça informando que o pedido de habeas corpus
impetrado em favor do réu Bruno Fernandes das Dores de Souza
teve negado seguimento a fls. 533. Decisão declarando indefesos os
réus e aplicando pena de multa aos advogados dos réus a fls.
539/541. Alegações finais dos réus Bruno Fernandes das Dores de
Souza e Luiz Henrique Ferreira Romão a fls. 555/570. Decisão
reconsiderando a decisão que declarou os réus indefesos a fls. 571.
Em apenso, constam os autos do processo nº
2009.203.040967-0, oriundo do 3º Juizado de Violência Doméstica
e Familiar contra a Mulher, com decisão declinando da competência
para uma das Varas Criminais da Regional de Jacarepaguá, a fls.
12.
FUNDAMENTAÇÃO
Processo nº 2009.203.042424-56
Considerando as diversas questões a serem enfrentadas
nestes autos, convém examiná-las de maneira separada para a
melhor visualização das mesmas.
O descabimento da chamada Lei Maria da Penha
Neste ponto, convém destacar a decisão proferida pela
MM. Juíza Titular do 3º Juizado de Violência Doméstica e Familiar
contra a Mulher, Dra. Ana Paula Delduque Migueis Laviola de
Freitas, a fls. 12 dos autos em apenso de nº 2009.203.040967-0.
Na referida decisão, Sua Excelência afirmou o seguinte.
“(...) Considerando que a vítima informa que apenas
“ficou” com o agressor, com ele não mantendo qualquer
tipo de relação afetiva, familiar ou doméstica, não pode a
virago, sob pena de banalizar a finalidade da Lei Maria
da Penha, socorrer-se das medidas protetivas e tentar
“punir” o agressor com o agravamento da pena (...)”
Tal argumento ensejou o declínio de competência.
Processo nº 2009.203.042424-57
Na avaliação deste Magistrado, a decisão mencionada é
irretocável, já que efetivamente o caso em exame não propicia a
aplicação da chamada Lei Maria da Penha.
Veja-se que a própria vítima Eliza Silva Samúdio, quando
depôs em sede policial a fls. 27/32, afirmou a superficialidade da
relação que manteve com o réu Bruno Fernandes das Dores de
Souza.
“(...) que, de fato, apenas teve relações sexuais com
Bruno por três vezes (...)”
O próprio réu Bruno Fernandes das Dores de Souza,
quando foi ouvido em sede policial, conforme exposto a fls. 76/78,
fez afirmação no mesmo sentido.
“(...) que não são verdadeiras as imputações constante
neste I.P. e que, na realidade, acredita que esteja sendo
vítima de uma tentativa de extorsão por parte da
comunicante de nome Eliza, com quem jamais teve
qualquer relacionamento afetivo que pudesse ser
rotulado como namoro ou algo assim; que a conheceu em
uma situação bastante delicada e que prefere não
declinar neste momento para não denegrir a imagem da
moça e que teve relação sexual com ela apenas uma vez,
mantendo, depois disso, somente contatos verbais (...)”
Processo nº 2009.203.042424-58
Neste ponto, é até compreensível o inconformismo
externado, à época em que foi proferida a decisão em destaque, pela
imprensa e pela opinião pública, muitas vezes com o argumento de
que “toda mulher merece proteção”.
Entretanto, na verdade, a Dra. Ana Paula Delduque
Migueis Laviola de Freitas apenas examinou a questão sob a ótica
técnica, cumprindo regularmente o seu dever constitucional, sendo
certo que a sua conclusão, afastando a aplicação da chamada Lei
Maria da Penha, encontra amparo na melhor jurisprudência,
inclusive do egrégio Superior Tribunal de Justiça, como se vê
abaixo.
“(...) Conflito negativo de competência. Violência
doméstica. Ex-namorados. Não aplicação da Lei
11340/06. Competência do Juizado Especial Criminal. 1.
Apesar de ser desnecessária à configuração da relação
íntima de afeto a coabitação entre agente e vítima,
verifica-se que a intenção do legislador, ao editar a Lei
Maria da Penha, foi de dar proteção à mulher que tenha
sofrido agressão decorrente de relacionamento amoroso,
e não de ligações transitórias, passageiras (...)” (STJ,
Terceira Seção, Relator Ministro Jorge Mussi, Conflito
de Competência nº 95.057-MG, julgado em 29/10/2008)
Processo nº 2009.203.042424-59
Assim, aderindo integralmente à fundamentação exposta
na decisão já mencionada, este Magistrado deixou de suscitar o
conflito negativo de competência e, dessa maneira, reconheceu a
competência deste juízo.
As teses sustentadas pelas partes
Vê-se que, em suas alegações finais trazidas a fls.
499/517, o Ministério Público sustentou o seguinte: (a) os fatos
narrados na denúncia ficaram comprovados; (b) ficou caracterizada
a prática do crime do art. 148, § 2º, do CP, porque os denunciados
privaram a liberdade da vítima e submeteram-na a grave sofrimento
moral, já que a vítima foi agredida e vilipendiada pelos réus,
tomando conhecimento da sua pretensão de exterminar a criança
que ela trazia no ventre; (c) ficou caracterizada a prática do crime
do art. 146, § 1º, do CP, já que a vítima foi obrigada a ingerir
remédios e um líquido amargo; (d) ficou caracterizada a prática do
crime do art. 129, § 9º, do CP, já que o réu Bruno Fernandes das
Dores de Souza praticou a lesão corporal valendo-se das relações de
convívio anterior que tinha com a vítima; (e) a pena deve ser fixada
de maneira rigorosa.
Processo nº 2009.203.042424-510
A Assistente de Acusação foi regularmente intimada para
apresentar alegações finais, mas ficou inerte, o que provocou a
aplicação do art. 271, § 2º, do CPP, conforme consignado a fls. 536.
Em suas alegações finais de fls. 555/570, que foram
subscritas pelo Dr. Márcio Carvalho de Sá, OAB/RJ 156.115, a
Defesa dos réus Bruno Fernandes das Dores de Souza e Luiz
Henrique Ferreira Romão sustentou o seguinte: (a) após os fatos
narrados na denúncia, a vítima deixou claro o seu propósito de não
ver os réus processados, razão pela qual houve decadência do
direito de representação; (b) as ligações telefônicas referidas nos
autos não amparam a tese acusatória; (c) as declarações da vítima
não merecem credibilidade; (d) os réus têm conduta ilibada; (e) o
auto de exame de corpo de delito não revela as lesões que a vítima
alega ter sofrido; (f) o laudo de exame de alcoolemia, substância
tóxica ou entorpecente desmente a afirmação da vítima no sentido
de que tenha sido obrigada a ingerir comprimidos e a beber um
líquido que a fez dormir; (g) a prova testemunhal produzida em
juízo não é capaz de embasar o decreto condenatório; (h) descabe a
tese relativa ao crime previsto no art. 146, § 1º, do CP, porque a
respectiva conduta não foi narrada na denúncia, o que importa
violação à ampla defesa; (i) não houve qualquer forma de privação
da liberdade da vítima; (j) considerando que também é imputada
aos réus a prática do crime de lesão corporal, o seqüestro deve ser
considerado em sua forma simples, para que não haja dupla
valoração da mesma conduta; (k) a prova é frágil para embasar a
Processo nº 2009.203.042424-511
condenação também com relação ao crime de lesão corporal; (l)
descabe a tipificação da lesão corporal com base no art. 129, § 9º,
do CP, porque não comprovada a convivência entre o réu Bruno
Fernandes das Dores de Souza e a vítima; (m) mesmo havendo
condenação, deve ser revogada a prisão cautelar.
Cabe registrar que as alegações finais defensivas acima
mencionadas foram trazidas aos autos no dia 25 de novembro de
2010, consoante consignado a fls. 571.
Ocorre que, no dia 26 de novembro de 2010, veio a
petição de fls. 572/573, encaminhando o documento de fls. 574,
através do qual o réu Bruno Fernandes das Dores de Souza destituiu
o Dr. Márcio Carvalho de Sá, OAB/RJ 156.115, constituindo como
seu patrono o Dr. Claudio Dalledone Junior, OAB/PR 27.347.
Assim, sendo a comunicação da destituição do patrono
que subscreveu as alegações finais defensivas posterior à
apresentação da mencionada peça, é claro que o petitório referido
produziu o efeito desejado e, dessa forma, há de ser enfrentado
neste momento.
Registre-se, para não haver dúvida quanto ao máximo
respeito à ampla defesa, que o novo patrono, na petição de fls.
572/573, consignou que atuaria a partir daquele momento, ou seja,
após a apresentação das alegações finais, tendo havido, por esse
Processo nº 2009.203.042424-512
motivo, preclusão consumativa capaz de inviabilizar a apresentação
de novas alegações finais.
A alegada decadência do direito de representação
Nas alegações finais de fls. 555/570, a Defesa dos réus
Bruno Fernandes das Dores de Souza e Luiz Henrique Ferreira
Romão insiste na tese exposta na assentada de fls. 368/371.
Segundo a Defesa, ainda que seja considerada a
manifestação inicial da vítima Eliza Silva Samúdio como
representação, a mencionada vítima, após ter providenciado o
registro policial deixou claro o seu propósito de não ver
processados os réus Bruno Fernandes das Dores de Souza e Luiz
Henrique Ferreira Romão.
Em verdade, quanto à manifestação inicial da vítima,
cabe a este Magistrado apenas ratificar o que expôs na assentada de
fls. 368/371.
“(...) Contudo, embora haja divergência quanto ao tema,
este Magistrado se posiciona ao lado do entendimento
majoritário, tanto em sede doutrinária quanto em sede
jurisprudencial, no sentido de que a representação da
Processo nº 2009.203.042424-513
vítima não exige formalismo. De fato, as declarações
prestadas em sede policial pela vítima deixam inequívoco
o seu propósito de ver o réu processado, de modo que
não se pode falar em ilegitimidade ativa do Parquet (...)”
Registre-se que a vítima Eliza Silva Samúdio, em seu
extenso depoimento de fls. 28/32, narrou em detalhes todo o
ocorrido, deixando realmente evidente a sua intenção no sentido de
que alguma atitude fosse tomada contra os réus.
Destaque-se, que no vídeo trazido aos autos pelo Jornal
Extra, a vítima Eliza Silva Samúdio, de forma expressa, afirma que
pretende que o réu Bruno Fernandes das Dores de Souza seja preso,
conforme fls. 310.
Tal propósito fica ainda mais evidente quando se percebe
que a vítima formulou o pedido de medidas protetivas exposto a fls.
02, dos autos do processo nº 2009.203.040967-0, oriundo do 3º
Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, em
apenso.
A alegação defensiva no sentido de que as declarações da
amiga da vítima revelaram que Eliza Silva Samúdio não pretendia
processar o réu Bruno Fernandes das Dores de Souza não encontra
qualquer amparo nos autos.
Processo nº 2009.203.042424-514
Ademais, a afirmação de que a vítima Eliza Silva
Samúdio teria externado, em maio de 2010, o propósito de não ver
os réus processados igualmente não encontra eco nos autos.
Portanto, o que se tem de concreto nestes autos é o
depoimento prestado pela vítima Eliza Silva Samúdio, em sede
policial e através de vídeo, incriminando ambos os réus, o qual
demonstra, sem deixar qualquer dúvida, o exercício do direito de
representação.
Além disso, tem-se o pedido feito pela própria vítima no
sentido de que fossem aplicadas medidas protetivas, o que reforça
ainda mais a certeza quanto ao seu objetivo, não deixando qualquer
margem para o acolhimento da tese defensiva, a qual agora é
afastada.
As provas orais produzidas na delegacia de polícia
As provas que foram colhidas em sede policial, embora
não tenham sido evidentemente submetidas aos princípios do
contraditório e da ampla defesa, devem ser examinadas porque
revelam de que forma a investigação foi procedida.
Processo nº 2009.203.042424-515
A testemunha Milena Baroni Fontan, amiga da vítima
Eliza Silva Samúdio, foi ouvida a fls. 26/27, no dia 13/10/2009,
sendo certo que afirmou o seguinte.
“(...) que a declarante ligou para Eliza por volta das
03:00h para saber se tudo corria bem e que Eliza
respondera que estava tudo bem e que ela estava com
Bruno, dizendo que ligaria de volta; que por volta das
07:00h a declarante tentou entrar em contato com Eliza,
entretanto não conseguiu e que por volta das 11:00h
Eliza passou um rádio para a declarante dizendo que
tudo estava bem; que por volta das 14h30min Eliza
telefonou para a declarante dizendo que chegaria em 20
minutos; que às 15h52min Eliza entrou em contato com a
declarante e pediu chorando que esta se encaminhasse
para a delegacia; que ao chegar na delegacia a
declarante ficou sabendo por Eliza que Bruno havia
pedido que ela entrasse dentro do carro dele; que,
segundo a declarante, Eliza ao entrar no carro constatou
que havia mais uma pessoa dentro do veículo e que esta
encontrava-se deitada no banco de trás; que Bruno no
início conversava tranquilamente com Eliza quando dois
homens armados entraram no veículo dizendo seguinte:
“ganhou, ganhou”, quando Bruno arrancou com o carro
e foi em direção ao Rio Centro; que, segundo a
declarante, Eliza lhe contou que Bruno desferiu dois
Processo nº 2009.203.042424-516
tapas contra o seu rosto e apontou uma arma contra a
cabeça dela, ameaçando em relação ao filho que Eliza
espera, filho este, segundo Eliza, dela e de Bruno; que o
pneu do carro furou, indo Bruno até o seu apartamento;
que, segundo a declarante, Eliza lhe contou que Bruno
lhe obrigara a tomar alguns comprimidos, querendo
também que ela tomasse remédio abortivo; que, segundo
a declarante, Eliza disse que na hora concordou com
Bruno em realizar um aborto para retirar seu filho e que
o faria na sexta-feira (...)”
Em seguida, a própria vítima Eliza Silva Samúdio foi
ouvida em sede policial, a fls. 28/32, ainda no dia 13/10/2009,
oportunidade em que afirmou o seguinte.
“(...) que nesse churrasco havia umas 15 (quinze)
pessoas e, em lá chegando, Bruno logo se interessou pela
declarante e comunicou a Fabiana que “estava a fim de
ficar” com a declarante, sendo que Fabiana comunicou
essa pretensão de Bruno à declarante e, então, a
declarante foi conversar com Bruno; que a declarante lá
mesmo no churrasco “ficou” com Bruno; que,
perguntada o que significava “ficar”, a declarante
respondeu que significa ter relações sexuais; (...) que
Bruno levou a declarante até o Hotel Barrabella, onde a
declarante estava hospedada, trocou telefone com ela e
Processo nº 2009.203.042424-517
foi embora; que a declarante no dia 25 de maio retornou
para São Paulo, pois residia lá, não encontrando-se mais
com Bruno até o início de julho (não recordando a data),
entretanto, falavam-se por telefone diariamente; que,
durante essas ligações telefônicas, a declarante em data
que não se recorda comunicou a Bruno que suspeitava
que estava grávida e Bruno então mandou que a
declarante viesse para o Rio de Janeiro para
conversarem, no que a declarante fez, retornando no
início de julho, onde se viram novamente; (...) que,
quando a declarante chegou no RJ no início de julho,
Bruno foi encontrar-se com ela no Hotel Royalte, na
Barra da Tijuca, onde a declarante ficou hospedada por
aproximadamente 15 dias, cuja despesa ficou a cargo de
Bruno; que, neste segundo encontro, Bruno avisou a
declarante que não desejava esta gravidez e propôs um
acordo financeiro para a declarante realizar um aborto,
no que a declarante negou; que no dia Bruno esteve
novamente neste mesmo Hotel e, desta feita, estava
amável com a declarante, tiveram relações sexuais e
ficou com a declarante por várias horas, porém sempre
falando que não desejava a gravidez; que, depois de
quinze dias que a declarante estava neste Hotel Royalte
da Barra, foi se hospedar no Hotel Barrabella, ficando
neste local por aproximadamente 10 dias, sendo que
Bruno apareceu por lá apenas uma vez e ainda para
Processo nº 2009.203.042424-518
ameaçar a declarante, dizendo: “Eu não quero esse filho
e sou capaz de tudo para você não ter essa criança. Você
não me conhece e não sabe o que eu sou capaz, pois eu
venho da favela”; que depois deste dia, na data que não
se recorda exatamente, porém acredita ter sido no dia 20
de julho, a declarante saiu do Barrabella e foi hospedar-
se no Hotel Transamérica, também na Barra da Tijuca,
ficando neste local até o dia 09 de setembro; que em
todos esses hotéis em que se hospedou Bruno pagou as
despesas; (...) que, em data que não se recorda, Bruno
esteve no Hotel Transamérica e discutiu com a
declarante, pegando em seus cabelos e puxando, fazendo
ameaças de causar-lhe mal, caso não concordasse em
fazer o aborto; (...) que, neste dia, a declarante foi até o
Hospital Leila Diniz, pois estava sangrando e, então,
telefonou para Bruno comunicando o fato, no que ele
respondeu: “Eu quero que você morra e se foda, pois
você é um problema só seu”; (...) que nesta data, por
volta das 02:00h, Bruno telefonou para a declarante a
chamando de “Bebê” e pedindo que queria vê-la, sendo
que a declarante estranhou o horário, no que Bruno disse
que estava perto de sua casa e queria conversar; que a
declarante está morando na casa de uma amiga Milena,
uma casa de vila; que a declarante concordou e foi até o
portão da vila quando viu o veículo dele estacionado
umas cinco casas abaixo do portão; que foi até lá e
Processo nº 2009.203.042424-519
entrou no banco da frente e viu que havia uma pessoa,
um homem negro, deitado no banco de trás, o que a
declarante estranhou e perguntou quem seria, quando
Bruno disse que era seu irmão; que, durante uns quinze
minutos, ficaram conversando e Bruno pedia que queria
entrar na casa e a declarante negava; que depois disso
apareceram dois elementos e entraram no carro, cada
um por uma das portas e disseram “ganhamos,
ganhamos”, momento em que Bruno desferiu um tapa no
rosto da declarante e os elementos começaram a xingar a
declarante de “vagabunda”; que um deles se chama
“Macarrão”, pois a declarante ouviu chamá-lo por este
vulgo e outro trata-se de “Russo”, elemento que a
declarante conheceu em uma das ocasiões em que Bruno
esteve nos hotéis Transamérica e Royalte e Bruno
apresentou como seu amigo de infância; (...) que Bruno
pegou uma arma e colocou na cabeça da declarante, uma
pistola, saindo com o carro em direção a casa onde ele
mora, na Barra da Tijuca; que Bruno mandou a
declarante ir para o banco de trás e “Macarrão” foi
para a frente; que, durante o trajeto, Bruno falava que
iria matar a declarante e que queria que a declarante
tomasse o remédio Citotec para abortar a criança; que
chegaram no prédio dele por volta das 03:30h e
entraram pelo estacionamento, acreditando a declarante
que há câmeras gravando; que primeiro Bruno subiu
Processo nº 2009.203.042424-520
sozinho e a declarante, Macarrão, Russo e o outro de cor
negra ficaram no estacionamento do prédio, fora do
carro; que logo depois Bruno desceu com um vidro de
álcool e uma toalha e ainda uns 10 comprimidos de cor
rosa e azul, mandando que a declarante tomasse um copo
d’água; que a declarante obedeceu; que logo subiram
todos e a declarante também; que chegando na casa de
Bruno deram um bebida de gosto muito forte e a seguir a
declarante dormiu e não viu mais nada; que por volta das
14:00h a declarante despertou na sala e tinha uma
mulher (funcionária), Macarrão, Russo e ainda o homem
de cor negra; que Macarrão mandou a declarante ligar
para Marcelo Silva do seu próprio rádio de nº 80*23959,
cujo nº de telefone é 011 78609110, para dizer que havia
decidido fazer aborto e que este informasse o fato a
Bruno; (...) que Macarrão falou que ligaria para a
declarante para fazer o aborto na sexta-feira próxima, ou
seja, dia 16 de outubro, dizendo ainda que, se fosse na
delegacia, mataria a declarante e suas amigas todas; que
a declarante veio para a delegacia e quando estava vindo
Macarrão telefonou de um nº 24340130 para novamente
ameaçar a declarante pelo telefone; (...) que de fato
apenas teve relações com Bruno por três vezes; que a
declarante está grávida de 05 meses e foi ao médico do
Postinho de Saúde do Tanque; que durante esse período,
Processo nº 2009.203.042424-521
ou seja, de maio até hoje, somente teve relações sexuais
com Bruno (...)”
A testemunha Leandro Carlos da Conceição Freitas,
recepcionista do condomínio Varandas da Barra, foi ouvida a fls.
47/48, no dia 16/10/2009, oportunidade em que afirmou o seguinte.
“(...) que o declarante encontrava-se trabalhando na
portaria do referido prédio, na data dos fatos, ou seja,
madrugada do dia 13/10/2009, porém não viu passar
nesse período qualquer pessoa para ir até a residência de
Bruno, deixando bem claro que o seu serviço é na
recepção, funcionando como porteiro que faz anunciar
aos moradores a presença de qualquer visita (...)
A testemunha Elzineide de Souza Wanderley Moraes,
gerente do condomínio Varandas da Barra, foi ouvida a fls. 51/53,
no dia 17/10/2009, oportunidade em que afirmou o seguinte.
“(...) que os garagistas também trabalham no mesmo
esquema dos porteiros na recepção; que no dia dos fatos,
ou seja, 12/10/2009, durante a madrugada, quem estava
de serviço na portaria chama-se Leandro e o que estava
na garagem chama-se Matheus; que no dia 13/10/2009
não lembra exatamente quem ficou na portaria ou na
garagem; que se compromete em trazer outros nomes que
Processo nº 2009.203.042424-522
estavam de serviço no dia 13/10/2009; que o trabalho do
garagista é, além de abrir o portão para o morador,
verificar as condições gerais da garagem e dos carros ali
estacionados; que o garagista fica sentado dentro da
garagem observando toda a movimentação; (...) que não
há circuito interno ou câmeras que filmem a
movimentação no prédio ou na garagem (...)”
A testemunha Matheus Laguer Dantas, porteiro do
condomínio Varandas da Barra, foi ouvida a fls. 54/56, no dia
19/10/2009, oportunidade em que afirmou o seguinte.
“(...) que, perguntado se estava de serviço do dia
12/10/2009 para o dia 13/10/2009, o mesmo respondeu
que sim; (...) que, perguntado se viu Bruno adentrar no
condomínio entre o dia 12/10/2009 e o dia 13/10/2009,
no seu plantão, o declarante disse que sim, por volta das
(03) três horas da madrugada, e que o mesmo estava
acompanhado de “Macarrão” que estava sentado no
banco dianteiro, indo Bruno para a garagem do subsolo,
não dando pra ver se havia ou não mais alguém no
interior do veículo de Bruno, saindo do foco de visão do
declarante; que, perguntado se viu Bruno e “Macarrão”
saírem do prédio pelo portão da garagem, afirmou que
até as 07 h não viu mais Bruno e nem “Macarrão” e
quem substituiu o declarante após esse horário foi o
Processo nº 2009.203.042424-523
porteiro Mauro, que assumiu o turno do plantão
subseqüente (...)”
A testemunha Romildo Silva de Souza, zelador do
condomínio Varandas da Barra, foi ouvida a fls. 57/59, no dia
19/10/2009, oportunidade em que afirmou o seguinte.
“(...) que o declarante entrou de serviço no dia
12/10/2009 às 08h da manhã e largou do serviço no dia
13/10/2009 às 08h da manha; (...) que declara que da
recepção, onde trabalham duas recepcionistas, de nome
Alexandra e Rafaela, em dias alternados, não tem visão
de quem entra e quem sai da garagem; (...) que declara
que entrou de plantão no dia 12/10/2009 às 08h e saiu no
dia 13/10/2009 às 08h e quem o substituiu foi o zelador
patrimonial de nome Marcelo; que declara que no
honorário da janta do porteiro (23h a 01h da
madrugada) o declarante é quem substituiu o mesmo e
que, quando perguntado se nesse horário alguém chegou
ou saiu do apartamento de Bruno (1203), declara que
nesse horário não entrou e nem saiu ninguém do
apartamento 1203 que é alugado por Bruno (...)”
A testemunha Luiz Carlos Figueiredo, mensageiro do
condomínio Varandas da Barra, foi ouvida a fls. 60/61, no dia
19/10/2009, oportunidade em que afirmou o seguinte.
Processo nº 2009.203.042424-524
“(...) que, perguntado se trabalhou no dia 12/10/2009,
respondeu que sim e informou que deixou de fazer seus
serviços de mensageiro, em virtude da recepcionista
Rafaela ter faltado, por estar enferma, ficando então no
posto de recepcionista, até as 17h, ocupando o seu lugar
o mensageiro Márcio, ficando este até findar o horário
da recepcionista Rafaela; que, ao ser perguntado se
trabalhou no dia 13/10/2009, respondeu que sim,
entretanto, na parte da manhã, ficou na recepção até a
chegada da recepcionista Alessandra e, após sua
chegada, voltou a ocupar sua função de mensageiro; que,
perguntado se conhece Bruno, respondeu que sim,
entretanto, não tem contato com o mesmo, dizendo que só
viu Bruno uma ou duas vezes, passando pela recepção e
nada mais (...)”
A testemunha Mauro José de Oliveira, porteiro do
condomínio Varandas da Barra, foi ouvida a fls. 62/63, no dia
19/10/2009, oportunidade em que afirmou o seguinte.
“(...) que, ao ser perguntado se trabalhou ente os dias
12/10 e 13/10/2009, declarou que assumiu o seu posto de
porteiro garagista no dia 13/10/2009 às 07h e saindo às
19h, declarando que sua carga horária é de 12h por 36h;
que no horário de suas refeições sempre é rendido por
Processo nº 2009.203.042424-525
um mensageiro; que perguntado se conhece Bruno o
declarante disse que sim e que Bruno sempre está com o
mesmo carro, uma Ranger (Land Rouver) de cor verde,
insulfilmado nos vidros laterais e traseiro e no dianteiro
é mais claro; que, perguntado se viu Bruno entrar no
condomínio, o declarante disse que não, entretanto disse
que viu como também abriu a porta da garagem para
Bruno sair com seu carro (Ranger verde), por volta das
08h da manhã do referido dia 13/10/2009, afirmando que
Bruno não estava acompanhado, ou seja, Bruno estava
saindo sozinho; que disse que nunca viu Bruno adentrar
pela garagem acompanhado por mulheres; que, ao ser
perguntado se conhece “Macarrão” e “Russo”, o
declarante disse que “Macarrão” sim, pois o mesmo, às
vezes, está junto com Bruno; (...) que, ao ser perguntado
se no período em que esteve trabalhando, ou seja, das
07h às 19h, viu ou soube se “Macarrão” saiu do prédio,
o qual respondeu que sim; que “Macarrão” saiu pela
garagem e sozinho, a qual tem saída também para
pedestre; que o horário que “Macarrão” saiu foi
aproximadamente por volta das 13h, logo após o
declarante ter retornado de seu almoço (...)”
O réu Bruno Fernandes das Dores de Souza, então
indiciado, ao depor em sede policial a fls. 76/78, no dia 04/11/2009,
afirmou o seguinte.
Processo nº 2009.203.042424-526
“(...) que não são verdadeiras as imputações constantes
deste I.P. e que, na realidade, acredita que esteja sendo
vítima de uma tentativa de extorsão por parte da
comunicante de nome Eliza, com quem jamais teve
qualquer relacionamento afetivo que pudesse ser
rotulado como namoro ou algo assim; que a conheceu em
uma situação bastante delicada e que prefere não
declinar neste momento para não denegrir a imagem da
moça e que teve relação sexual com ela apenas uma vez,
mantendo depois disso somente contatos verbais; (...) que
não a seqüestrou nem a forçou a tomar qualquer tipo de
remédio e que nada daquilo que consta no termo de
declarações dela aconteceu; que é amigo pessoal do
homem a quem ela chamou de “Macarrão” e que o
conhece desde a infância, sendo ele pessoa de confiança
do declarante que cuida de alguns de seus negócios; (...)
que mais tarde, após deixar a festa e seus parentes em
casa, o declarante seguiu até a localidade conhecida
como “Cebolão” na Barra da Tijuca para encontrar seu
amigo “Macarrão” que chegava de Belo Horizonte e, aí
sim, resolveu telefonar para a jovem Eliza para saber o
que ela queria; que, após breve contato telefônico, seguiu
para a residência dela e logo que chegou percebeu que a
moça não estava em seu estado normal, apresentando
evidente descontrole emocional; que, visando preservar a
Processo nº 2009.203.042424-527
imagem de ambos e notando que ela estava ficando cada
vez mais nervosa, sugeriu que fossem para a casa do
declarante, para onde ela seguiu, aceitando a idéia
proposta, mas ainda com um desconfortável
comportamento agressivo; que fez de tudo para acalmá-
la, porém sem muito sucesso, principalmente por que,
sempre que falava em “mais dinheiro”, o declarante
respondia com o pedido de exame de DNA para
confirmar a paternidade; que sempre que ela ouviu tal
expressão (DNA), Eliza ficava muito nervosa e
inconformada e, diante disso, resolveu ir dormir, para
tentar encerrar aquela discussão; que, antes de se deitar,
o declarante pediu a Macarrão que levasse Eliza até um
ponto de táxi, assim que ela acordasse, visto que ela já
havia “apagado” e dormido no sofá onde estavam
conversando; que não deseja afirmar que a moça
estivesse sob efeito de qualquer substância suspeita, mas
declara, sem dúvida nenhuma, que ela estava bastante
fora de seu comportamento habitual; que, no dia
seguinte, seu amigo Macarrão cumpriu o que foi pedido
pelo declarante, deixando Eliza com alguma quantia em
um ponto de táxi e mais tarde, para surpresa do
declarante, ficou sabendo que ela havia estado nesta
delegacia para comunicar os crimes que jamais
aconteceram (...)”
Processo nº 2009.203.042424-528
O réu Luiz Henrique Ferreira Romão, então indiciado, ao
depor em sede policial a fls. 85/87, no dia 11/11/2009, afirmou o
seguinte.
“(...) que, após ter pegado a sua bagagem, fez contato
telefônico com o amigo Bruno, avisando onde estava e
recebendo a informação de que ele mesmo iria pegá-lo
no terminal rodoviário do “Cebolão” na Barra, para
juntos irem para casa; que logo no primeiro instante que
entrou no carro ouviu o “alarme” do rádio de seu amigo
que tocava insistentemente e que nem mesmo
conseguiram se cumprimentar direito, devido ao toque
quase que permanente do “Nextel” de Bruno; que
perguntou ao seu amigo quem era a pessoa que chamava
tanto por ele e ouviu então ele dizer que era a garota de
nome Eliza e que ela havia passado todo o dia tentando
falar com ele; que ainda perguntou porque ele não a
tinha atendido e então ele contou que havia passado o
dia em companhia da esposa e das filhas e, por isso, não
atendeu aos insistentes chamados da moça; que sugeriu
ao seu amigo Bruno que atendesse logo o telefone para
ver o que ela queria e por volta de 01:30h, já do dia
13/12/2009, tomaram a decisão de irem juntos até a casa
dela para ver o que ela queria; que logo que chegaram o
declarante viu a jovem se aproximar tranquilamente do
carro de Bruno para em seguida, já bem perto da janela
Processo nº 2009.203.042424-529
do veículo, começar a fazer um escândalo para chamar o
máximo de atenção; que ficaram surpresos com a aquela
mudança repentina de comportamento e dos gritos e
gestos que Eliza começou a fazer e então Bruno decidiu
convidá-la para ir ao seu apartamento com o objetivo de
tentar acalmá-la; que, devido ao estado emocional
desequilibrado apresentado por Elisa, nem mesmo
permitiu que ela se sentasse no banco dianteiro, temendo
que fosse possível ela fazer alguma bobagem enquanto
Bruno dirigia; que em poucos minutos chegaram ao
apartamento e lá em cima viu seu amigo tentar acalmá-la
de todas as formas, porém sem sucesso imediato; que
Bruno cedeu a cama para a declarante que estava muito
cansada e ficou com a jovem na sala até que o
nervosismo dela melhorasse; que, por causa do avançado
das horas e do treino do dia seguinte, Bruno resolveu ir
dormir, deixando Eliza descansando no sofá depois dela
ter se acalmado; que, por volta das 07:00h, Bruno saiu
para treinar, chamando antes o declarante e pedindo a
ele que levasse Eliza até um ponto de táxi assim que ela
acordasse; que um pouco mais tarde, já por volta das
13:00h, deixou a jovem com uma certa quantia em
dinheiro onde pudesse tomar a condução e, de lá pra cá,
não mais tornou a vê-la ou ter outra notícia, além
daquela que saiu na imprensa; que naquela noite ouviu a
jovem fazer várias ameaças ao seu amigo Bruno e falar
Processo nº 2009.203.042424-530
coisas sobre como ela iria destruir a carreira dele e se
lembra mais ainda que ela ficava muito nervosa quando
tocavam no pedido de DNA; que nada mais do que ela
disse sobre ameaças, seqüestro, remédios tomados à
força aconteceu e que a agressão contada por ela é uma
grande mentira (...)”
As provas orais produzidas em juízo
Analisadas acima as provas orais produzidas em sede
policial, é conveniente, então, examinar as provas orais que foram
produzidas em juízo, com a necessária observância dos princípios
do contraditório e da ampla defesa.
Vejamos.
Por indicação do órgão do Ministério Público, foram
ouvidas as testemunhas Maria Aparecida Salgado Mallet, Mauro
José de Oliveira, Matheus Langer Dantas e Milena Baroni Fontana,
todas ouvidas em audiência realizada no dia 26 de agosto de 2010.
A testemunha Maria Aparecida Salgado Mallet, delegada
de polícia que tomou o depoimento da vítima Eliza Silva Samúdio
em sede policial, a fls. 372/375, disse o seguinte.
Processo nº 2009.203.042424-531
“(...) que, no dia 13 de outubro de 2009, a depoente saia
da delegacia por volta das 18 horas, quando foi
comunicada que havia uma moça acompanhada da
imprensa, sendo certo que a mesma também se fazia
acompanhada de uma amiga, cujo nome a depoente não
se recorda; que a depoente retornou à delegacia e colheu
as declarações da moça, ora vítima, Eliza Samúdio; que
Eliza contou ter conhecido um rapaz de nome Bruno, o
qual seria guarda-redes de um time de futebol; que Eliza
disse que o conheceu num churrasco, momento em que
tiveram relações sexuais; que Eliza disse que, a partir
daí, passou a ter outros encontros telefônicos e pessoais
com Bruno, até quando soube que estava grávida; (...)
que Eliza narrou que, ao comunicar a gravidez para
Bruno, passou a ser coagida a fazer um aborto; que Eliza
disse que se negava a fazer o aborto; que Eliza afirmou
que, na noite que antecedeu ao seu depoimento na
delegacia, foi procurada por volta das 2 horas da
madrugada por Bruno; que Bruno pediu que Eliza
descesse até o seu carro, no que foi atendido; que, pelo
que a depoente se lembra, já havia uma pessoa armada
no banco de trás do carro e, depois, ingressaram outras
duas pessoas no veículo; que, segundo Eliza, tanto o réu
Bruno quanto o réu Luiz Henrique determinavam que
fosse providenciado o aborto, sob ameaça de que, caso
Processo nº 2009.203.042424-532
Eliza não o fizesse, eles a matariam; que Eliza afirmou
que, ao entrar no carro de Bruno, o mesmo arrancou,
dirigindo-se à casa de Bruno; que Eliza esclareceu que o
réu Luiz Henrique foi no banco do carona da frente,
enquanto o réu Bruno dirigia o veículo; que Eliza disse
que, na garagem do prédio do réu Bruno, foi obrigada a
ingerir um líquidos e comprimidos com gosto estranho;
que a depoente ouviu também a testemunha Milena, a
qual morava com Eliza à época dos fatos; que Milena
confirmou a notícia de que Eliza descera de madrugada
para falar com o réu Bruno; que Eliza disse que, após
ingerir o líquido e os comprimidos, esteve na casa do réu
Bruno, na qual dormiu, salvo engano, até a parte da
tarde do dia seguinte; que esta informação também foi
confirmada pela testemunha Milena, quando a mesma
depôs para a depoente; que a depoente teve a
oportunidade também de ouvir o porteiro Mateus, do
prédio em que o réu Bruno morava; que Mateus
esclareceu ter visto o réu Bruno ingressar no prédio por
volta das 3 horas da manhã, confirmando eu estava no
carona o réu Luiz Henrique; que a depoente indagou a
Mateus se viu a vítima Eliza ingressar no prédio, tendo
Mateus respondido que não viu quem pudesse estar no
banco de trás do carro, até porque o veículo tinha
insulfim nas laterais, só não o tendo no vidro da frente;
que não se recorda se Eliza apresentava alguma lesão
Processo nº 2009.203.042424-533
aparente quando depôs em sede policial; (...) que Eliza,
salvo engano, chegou a narrar que em outra
oportunidade o réu Bruno a coagiu a fazer o aborto; (...)
que se recorda que Eliza narrou que, em certa
oportunidade, telefonou para o réu dizendo que estava
tendo um sangramento, o qual disse que queria que ela
morresse; (...) que não se recorda se Eliza esclareceu se
teve relação sexual com o réu Bruno apenas no dia em
que se conheceram ou se teve também em outras
oportunidades; que Eliza disse que Bruno a teria
chamado para conversar naquela madrugada, a fim de
que fizessem um acordo quanto à criança que Eliza
esperava; que não se recorda se Eliza disse ter sido
ameaçada por Macarrão em outras oportunidades; (...)
que Eliza esclareceu que trabalhava em alguma coisa
relativa a eventos; que Eliza em nenhum momento
afirmou ser garota de programa; (...) que Eliza se
mostrava muito assustada com um possível mal que
Bruno e os demais envolvidos pudessem causar nela
própria ou em seu filho; (...) que Eliza esclareceu que
entrou pela porta da frente do carro do réu Bruno e que o
réu Macarrão já estava no banco de trás; que Eliza disse
que Bruno determinou que ela fosse para o banco de trás,
não esclarecendo à depoente se ela foi por dentro do
carro ou se saiu pela porta dianteira e entrou pela porta
traseira; que Eliza disse que, quando estava no banco de
Processo nº 2009.203.042424-534
trás, ingressaram no veículo os outros dois indivíduos
(...)”
A testemunha Mauro José de Oliveira, porteiro do
condomínio Varandas da Barra, a fls. 376/377, disse o seguinte.
“(...) que o depoente fica lotado na garagem; que existem
duas entradas para veículos e uma recepção; que da
garagem o depoente não visualiza as pessoas que entram
pela recepção; que tem quase certeza que não viu os réus
Bruno e Luiz Henrique saírem do prédio no dia seguinte
aos fatos da denúncia; que não se recorda o inteiro teor
do seu depoimento na delegacia mas prevalece o que o
depoente disse na delegacia porque, naquela
oportunidade, o depoente se limitou a dizer a verdade;
que o depoente também está dizendo a verdade hoje,
apenas não se recordando do inteiro teor de suas
declarações em razão do tempo decorrido e em razão do
grande número de carros que entram e saem do prédio;
que reconhece como suas as assinaturas de fls. 63/64
(...)”
A testemunha Matheus Languer Dantas, porteiro do
condomínio Varandas da Barra, a fls. 378/379, disse o seguinte.
Processo nº 2009.203.042424-535
“(...) que no dia dos fatos o depoente estava de serviço;
que o réu Bruno morava no prédio; que se recorda que
naquela madrugada o réu Bruno ingressou no prédio
com seu veículo, uma Land Rover; que os vidros laterais
e traseiro do veículo têm insulfilm; que não sabe
esclarecer se o vidro dianteiro tem insulfilm; que Bruno
dirigia o veículo, trazendo Macarrão na carona; que o
depoente largou o serviço às 7 horas da manhã; que, até
então, os réus Bruno e Luiz Henrique, vulgo Macarrão,
não saíram do prédio; que o réu Luiz Henrique
costumava freqüentar o apartamento do réu Bruno; que
não pode afirmar que Eliza estava no veículo quando os
réus Bruno e Luiz Henrique ingressaram no prédio (...)”
A testemunha Milena Baroni Fontana, amiga da vítima
Eliza Silva Samúdio, quando ouvida a fls. 380/383, disse o
seguinte.
“(...) que, na época em que os fatos narrados na
denúncia ocorreram, Eliza estava na casa da depoente;
que Eliza estava grávida de Bruno e disse que queria
resolver a situação com ele; que Bruno ficou pagando o
hotel e “enrolando” Eliza, na expectativa de resolver a
questão da gravidez; (...) que Bruno sabia que o filho de
Eliza era seu; que Eliza queria que Bruno ajudasse no
pré-natal e reconhecesse a paternidade; que Bruno
Processo nº 2009.203.042424-536
pagava o hotel e a alimentação de Eliza, mas não a
auxiliou durante o pré-natal, o qual foi feito em posto de
saúde; que, quando a criança nasceu, Bruno passou a
dar uma ajuda em dinheiro, salvo engano, mil reais; que,
antes dos fatos da denúncia, Bruno e Eliza discutiram a
respeito da gravidez porque Eliza veiculou a notícia da
gravidez na imprensa; que nessa oportunidade Bruno e
Marcelo estiveram no hotel Transamérica; que a
depoente estava com Eliza quando Bruno e Marcelo
chegaram; que Eliza pediu que a depoente saísse do
quarto para conversar com Bruno; que a depoente
chegou a ver Bruno empurrar Eliza em cima de uma
cama; (...) que, dois dias antes dos fatos da denúncia,
Eliza recebeu ligação de Marcelo dizendo que Bruno
faria um acordo que teria uns papéis para ela assinar
que beneficiariam a criança; que, diante dessa notícia,
foi passado para Marcelo o endereço em que Eliza
estaria; que, no dia dos fatos, a depoente e Eliza estavam
em casa, quando Eliza recebeu um telefonema, por volta
de duas horas da manhã, informando que Bruno estaria
num churrasco e passaria para conversar com ela; que,
posteriormente, Eliza narrou para a depoente o que
ocorreu; que Eliza disse que, ao sair da casa da
depoente, foi ao encontro do réu Bruno; que Bruno
dirigia seu carro e, quando Eliza nele ingressou, ela viu
que havia uma pessoa no banco de trás; que não se
Processo nº 2009.203.042424-537
recorda se Eliza identificou quem seria essa pessoa; que
em seguida, segundo Eliza, chegou uma terceira pessoa e
ingressou no carro, dizendo “perdeu, perdeu”; que
esclarece a depoente que uma das duas pessoas que
acompanhavam Bruno era o réu Macarrão, não sabendo
a depoente se era a pessoa que estava no banco de trás
ou se era a pessoa que entrou em seguida; que Eliza
disse que Bruno dirigiu o carro na direção do Rio Centro
e no caminho foi agredida; que Eliza disse que puxaram
o seu cabelo e lhe apontaram uma arma; que Eliza disse
que lhe chamaram de “piranha”; (...) que Eliza disse
que, depois de ser levada no caminho do Rio Centro, foi
levada para o condomínio Varandas, local em que
morava o réu Bruno; que Eliza disse que, ainda na
garagem, foi obrigada a ingerir remédios das cores azul
e rosa; que Eliza disse que ficou sonolenta; (...) que não
sabe ao certo, mas acredita que Eliza tenha dito que
acabou dormindo na casa de Bruno; que no dia seguinte,
cedo pela manhã, começou a ligar para Eliza mas não
logrou êxito; que, por volta das 11 horas, Eliza ligou
para a depoente e disse que estava com uma amigo de
Bruno e que estava tudo bem; que, posteriormente, Eliza
disse que foi acordada pela manhã em razão dos
telefonemas da depoente e que foi obrigada a telefonar
para a depoente para afirmar que estava tudo bem; (...)
que por volta das 13 horas a depoente ligou para Eliza, a
Processo nº 2009.203.042424-538
qual atendeu chorando e pediu que a depoente fosse ao
seu encontro na delegacia; que a depoente se encontrou
com Eliza na 32ª DP, mas ambas foram encaminhadas
para a DEAM de Jacarepaguá; que a depoente
presenciou o depoimento prestado por Eliza na DEAM;
que no caminho para a DEAM Eliza foi narrando para a
depoente o que tinha ocorrido; que, na DEAM, Eliza
narrou para a delegada o que já havia contado para a
depoente; que Eliza disse que Bruno havia apontado a
arma contra ela e havia dado um tapa na sua cara; que,
inclusive, a depoente viu a marca do tapa no rosto de
Eliza; (...) que Bruno disse para Eliza não contar nada à
polícia nem para a imprensa; que foi justamente isso que
Eliza fez, uma vez que se dirigiu à delegacia e contactou
o repórter do jornal Extra; que Eliza gravou um vídeo na
porta da DEAM; que não houve qualquer coação no
momento em que Eliza gravou o vídeo, uma vez que ela
disse espontaneamente o que queria dizer (...)”
Cabe destacar que, na mesma audiência em que foram
ouvidas as testemunhas acima destacadas, o órgão ministerial, a fls.
368/371, desistiu da oitiva da testemunha Leandro Carlos da
Conceição Freitas.
De outro lado, por indicação da Defesa, foram ouvidas as
testemunhas Patrícia Amorim Sihman, Arthur Antunes de Coimbra,
Processo nº 2009.203.042424-539
Leonardo da Silva Moura, Rodrigo Alvim, Paulo Victor Mileo
Vidotti, Álvaro Luiz Maior de Aquino e Christian Chagas Tarouco,
todas ouvidas em audiência realizada no dia 17 de setembro de
2010.
A testemunha Patrícia Amorim Sihman, presidente do
Clube de Regatas Flamengo, a fls. 477/478, disse o seguinte.
“(...) que conhece o réu Bruno desde 04 de janeiro de
2010, quando a depoente assumiu a presidência do Clube
de Regatas Flamengo; que o réu era goleiro do time de
futebol profissional, sendo capitão da equipe; que o réu
Bruno sempre cumpriu as determinações do clube; que o
réu Bruno, quando eventualmente fazia alguma coisa que
desagradava o clube, era repreendido pela depoente e
atendia a sua determinação; que a depoente se refere a
alguma coisa que desagradava o clube como, por
exemplo, declarações que o réu Bruno dava à imprensa;
(...) que, se o réu Bruno for absolvido, ele não voltará a
jogar no Flamengo; (...) que, diante da declaração às fls.
100, pela depoente foi dito que o repreendeu em razão de
sua afirmação naquela reportagem; que o réu Bruno se
desculpou pelo ocorrido e publicamente se retratou (...)”
Processo nº 2009.203.042424-540
A testemunha Arthur Antunes de Coimbra, diretor de
futebol do Clube de Regatas Flamengo, a fls. 479/480, disse o
seguinte.
“(...) que, no aspecto profissional, o depoente só teve
contato com o réu Bruno por cerca de dez dias, que foi o
período que decorreu desde que o depoente assumiu sua
função até o momento em que o réu foi preso; que nesse
período o réu Bruno teve uma conduta normal
participando normalmente dos treinos; que o depoente
não pode esclarecer quanto ao comportamento do réu
Bruno no período anterior àquele em que o depoente
assumiu como diretor de futebol porque o depoente
estava trabalhando na Grécia, não tendo contato com o
ambiente que havia no Flamengo (...)”
A testemunha Leonardo da Silva Moura, jogador de
futebol profissional, a fls. 481/482, disse o seguinte.
“(...) que conhece o réu Bruno há quatro anos, que é o
período em que ambos jogam juntos no Flamengo; que
apenas pode falar sobre o aspecto profissional do réu
Bruno, afirmando que o mesmo sempre foi uma pessoa
muito tranqüila; que sabe que dentro de campo o réu
Bruno tinha bom relacionamento com os jogadores
Wagner Love e Adriano; (...) que, pelo que o depoente se
Processo nº 2009.203.042424-541
lembra, os jogadores do Flamengo não souberam dos
fatos da denúncia logo que eles ocorreram; que o técnico
do time à época, Andrade, não teve qualquer iniciativa de
afastar o réu Bruno da equipe em razão dos fatos da
denúncia; que conheceu o réu Luiz Henrique, Macarrão,
quando ele acompanhava o réu Bruno nos treinos; que
nada pode esclarecer quanto ao comportamento do réu
Luiz Henrique; (...) que tomou conhecimento da
reportagem de fls. 100, mas nada conversou com o réu
Bruno a respeito; que desconhece qualquer envolvimento
dos jogadores Adriano e Wagner Love com traficantes de
drogas (...)”
A testemunha Rodrigo Alvim, jogador de futebol
profissional, a fls. 483/484, disse o seguinte.
“(...) que o depoente voltou da Alemanha em janeiro de
2010; que a partir de então o depoente passou a ter
contato com o réu Bruno durante os treinos do
Flamengo; (...) que o depoente tinha apenas o convívio
profissional com o réu Bruno, podendo afirmar que o
mesmo era sempre o primeiro a chegar e o último a sair
(...)”
A testemunha Paulo Victor Mileo Vidotti, jogador de
futebol profissional, a fls. 485/487, disse o seguinte.
Processo nº 2009.203.042424-542
“(...) que conheceu a vítima através de um amigo; que
tem conhecimento que o réu Bruno conheceu Eliza numa
orgia, a qual se realizou no apartamento do depoente;
que o depoente estava no apartamento, mas não
participou da orgia; (...) que tomou conhecimento na
mídia que Eliza seria garota de programa e teria
participado de filmes pornográficos; (...) que, como
profissional, o depoente nem tem palavras para falar do
réu Bruno porque ele era o melhor possível; que, como
pessoa, o réu Bruno é uma pessoa maravilhosa; (...) que
o réu Bruno é um homem normal, sendo mulherengo e
uma pessoa tranqüila; que não se lembra se ele
costumava sair com garota de programa; (...) que o
apartamento é duplex, razão pela qual o depoente pôde
estar no apartamento e não participar da orgia; que o
depoente viu pessoas peladas naquela oportunidade,
razão pela qual concluiu que estava havendo uma orgia;
(...) que não sabe se o réu Bruno já participou de alguma
outra orgia; que o depoente nunca teve relação sexual
com Eliza; que o depoente desconhece qualquer outro
jogador que tenha tido relação sexual com Eliza (...)”
A testemunha Álvaro Luiz Maior Aquino, jogador de
futebol profissional, a fls. 488/489, disse o seguinte.
Processo nº 2009.203.042424-543
“(...) que conhece o réu Bruno há um ano porque
jogaram juntos no Flamengo; (...) que o depoente já
ouviu comentários de que o réu Bruno era mulherengo;
que nunca ouviu falar se o réu Bruno tinha o hábito de
sair com garotas de programa; que o depoente ouviu
falar da reportagem em que o réu Bruno teria dito à
revista Veja que conheceu a vítima Eliza numa orgia; que
o depoente não participou da suposta orgia; que sabe
que os réus Bruno e Luiz Henrique são amigos, sendo
certo que Luiz Henrique tinha o hábito de acompanhar os
treinos; (...) que já ouviu falar na vítima Eliza, a qual é
conhecida de muitos jogadores; que o depoente quase
não teve contato com a vítima Eliza; que não sabe se
alguns jogadores já saíram ou tiveram relação sexual
com Eliza; que só tomou conhecimento que Eliza
participou de filmes pornográficos após serem noticiados
os fatos da denúncia; que o depoente tem um irmão que
conhecia Eliza, desconhecendo o depoente se seu irmão
já teve relação sexual com ela; que sabia que Eliza era
conhecida em muitos clubes, mas desconhece que a
mesma seja garota de programa; (...) que o depoente
jogou no Internacional, Atlético Mineiro, Goiás, entre
outros clubes; que a vítima Eliza esteve nestes clubes;
que atualmente o depoente não está jogando em qualquer
clube; que o depoente já jogou na Europa, no Saragoza
Processo nº 2009.203.042424-544
da Espanha, clube em que também ouviu falar de Eliza
(...)”
A testemunha Christian Chagas Tarouco, jogador de
futebol profissional, a fls. 490, disse o seguinte.
“(...) que o depoente nunca teve relação sexual com a
vítima Eliza; que só conhece Eliza de ouvir falar; que o
depoente não participou de qualquer orgia que contou
com a participação de Eliza (...)”
Cabe registrar que, além das testemunhas acima
destacadas, em sua resposta preliminar de fls. 191/194, a Defesa
também requereu as oitivas da vítima Eliza Silva Samúdio e das
testemunhas Jorge Luís Andrade da Silva, Adriano Leite Ribeiro,
Vagner da Silva de Souza, Luiz Carlos Samúdio, Fabiana
Albuquerque, Cíntia Moraes e Amanda Zampierre.
Por motivo óbvio, através da decisão de fls. 276/286 –
diante da notícia de seu desaparecimento divulgada pela imprensa
em rede nacional –, foi indeferida a realização de qualquer
diligência buscando o endereço da vítima Eliza Silva Samúdio,
facultando-se à Defesa trazê-la em juízo para ser ouvida, o que não
ocorreu.
Processo nº 2009.203.042424-545
Ainda na decisão de fls. 276/286, foram indeferidas as
oitivas das testemunhas Adriano Leite Ribeiro e Vagner da Silva de
Souza, uma vez que ambos são jogadores de futebol profissional
que atuam fora do país, sendo certo que a Defesa não demonstrou a
imprescindibilidade de seus depoimentos, consoante determina o
art. 222-A do CPP.
Nem se cogite ter havido violação ao princípio à ampla
defesa, como conseqüência do indeferimento de tais oitivas,
conforme ensina a melhor jurisprudência.
“(...) A expedição de cartas rogatórias para oitiva de
testemunhas residentes no exterior condiciona-se á
demonstração da imprescindibilidade da diligência e ao
pagamento prévio das respectivas custas, pela parte
requerente, nos termos do art. 222-A do Código de
Processo Penal, ressalvada a possibilidade de concessão
de assistência judiciária aos economicamente
necessitados (...)” (STF, Tribunal Pleno, Relator
Ministro Eros Grau, AP 470 QO4 / MG, julgado em
10/06/2009)
Além disso, na decisão de fls. 394/397, foram indeferidas
as oitivas das testemunhas Jorge Luiz Andrade da Silva, Luiz
Carlos Samúdio, Fabiana Albuquerque, Cíntia Moraes e Amanda
Processo nº 2009.203.042424-546
Zampierre, já que a Defesa não se dignou em trazer seus endereços
aos autos.
Também neste ponto não se pode cogitar de qualquer
violação à ampla defesa, na medida em que não cabe ao juízo
diligenciar até o encontro dos endereços das testemunhas que a
parte pretende ouvir.
Não custa lembrar a seguinte lição.
“(...) Considerando que cabe às partes fornecer,
corretamente, o endereço das testemunhas que
arrolaram, aliado ao fato de que o denunciado Henrique
Pizzolato, por três vezes, informou erroneamente o
endereço da testemunha Adézio de Almeida Lima, impõe-
se o indeferimento da oitiva dessa testemunha, sob pena
de conferir-se ao acusado o poder de perpetuar a
instrução processual, mediante a indicação sucessiva de
outros endereços igualmente incorretos. Questão de
ordem resolvida no sentido do indeferimento da oitiva da
testemunha, com a declaração de encerramento da
colheita da prova testemunha (...)”(STF, Tribunal Pleno,
Relator Ministro Eros Grau, AP 470 QO6 / MG, julgado
em 12/08/2010)
Processo nº 2009.203.042424-547
Dessa forma, esgotada a prova testemunhal na forma
acima apontada, ainda na audiência realizada no dia 17 de setembro
de 2010, foram realizados os interrogatórios do acusados.
Mas, a rigor, só foi possível efetivar o chamado
interrogatório subjetivo, limitando-se este Magistrado a qualificar
ambos os réus.
Isso porque, a fls. 491/492, quanto aos fatos que lhe
foram imputados, o réu Bruno Fernandes das Dores de Souza
exerceu o seu direito constitucional de ficar calado.
Da mesma forma, a fls. 493/494, também quanto aos
fatos que lhe foram imputados, o réu Luiz Henrique Ferreira Romão
optou pelo silêncio.
As ligações telefônicas dos réus
Por oportunidade do oferecimento da denúncia, em sua
promoção de fls. 128/130, dentre outras diligências, o Ministério
Público requereu a quebra do sigilo telefônico das linhas (011)
7860-9110 (ID 80*23959) e (021) 7842-4351 (ID respectivo).
Processo nº 2009.203.042424-548
O pedido foi deferido na decisão de fls. 132/138, o que
ensejou a expedição do ofício de fls. 173, sendo certo que a reposta
de fls. 295 trouxe o CD de fls. 299v.
Vê-se, então, o seguinte.
A linha (21) 7842-4351 (ID 55*32*6693) consta em
nome de Brazil Soccer Sports Management Ltda.
A linha (21) 7860-9110 (ID 80*23959) consta em nome
de Bruno Henrique Nascimento.
Em verdade, as listagens das ligações telefônicas feitas
pelas linhas acima descritas não incriminam os réus, até porque –
como é óbvio – não se noticia o teor de qualquer conversa
telefônica estabelecida pela vítima com quem quer que seja.
Não houve no caso em exame a interceptação telefônica,
mas apenas a quebra do sigilo de dados e a vinda das listagens das
ligações relativas àquelas linhas.
Portanto, ainda que tais listagens comprovassem, de
forma inquestionável, que os réus telefonaram ou mesmo receberam
algum telefonema da vítima, tal informação seria absolutamente
desimportante para o julgamento do caso.
Processo nº 2009.203.042424-549
Não cabe, portanto, supor que os réus tenham utilizado
outra linha telefônica, como também não cabe desmerecer a versão
da vítima porque não constatada a ligação porventura indicada pela
mesma.
A verdade é que tal diligência, requerida pelo Parquet e
deferida por este Magistrado, se mostrou inócua, devendo, por isso,
o conflito ser julgado à luz das demais provas trazidas aos autos.
O depoimento filmado da vítima
Veio aos autos, por iniciativa da Defesa dos réus Bruno
Fernandes das Dores de Souza e Luiz Henrique Ferreira Romão, o
vídeo gravado pelo Jornal Extra, juntado a fls. 310, no qual a vítima
apresenta a sua versão dos fatos.
Descabe transcrever as palavras da vítima.
Estando absolutamente convencido de que o feito seguirá
para a segunda instância, por força de recurso de uma das partes ou
mesmo de ambas as partes, este Magistrado tem certeza que os
Desembargadores que participarão do julgamento em segundo grau
examinarão também esta importante prova.
Processo nº 2009.203.042424-550
Por isso, este Magistrado, neste momento, apenas
registrará os pontos exibidos no vídeo que considera mais
importantes.
Vejamos.
* A vítima Eliza Silva Samúdio permitiu que o Jornal
Extra gravasse as suas declarações em frente à delegacia de polícia
no mesmo dia em que noticiou à Autoridade Policial os fatos
narrados da denúncia.
* Na ótica deste Magistrado, a vítima Eliza Silva
Samúdio participou da filmagem com relativa tranquilidade, não
deixando transparecer qualquer trauma decorrente dos fatos
ocorridos.
* Ficou evidente que, embora a vítima Eliza Silva
Samúdio, não tenha inicialmente se recusado a ingressar no veículo
do acusado Bruno Fernandes das Dores de Souza, a sua
permanência do veículo foi efetivada contra a sua vontade.
* Não é razoável concluir que a vítima Eliza Silva
Samúdio tenha concordado em ficar no veículo no interior do qual
estavam os réus Bruno Fernandes das Dores de Souza e Luiz
Henrique Ferreira Romão, além dos indivíduos por ela nominados
como “Russo” e “Negão”.
Processo nº 2009.203.042424-551
* Não é possível que a vítima Eliza Silva Samúdio tenha
concordado em ficar no veículo, mesmo sendo agredida com “dois
bofetões enormes na cara” desferidos pelo réu Bruno Fernandes das
Dores de Souza e mesmo sendo ameaçada com uma arma de fogo.
* Em nenhum momento, a vítima Eliza Silva Samúdio
alega ter sido agredida ou ameaçada pelo réu Luiz Henrique
Ferreira Romão.
* É evidente que a vítima Eliza Silva Samúdio foi
obrigada a se dirigir à casa do réu Bruno Fernandes das Dores de
Souza, também contra a sua vontade, diante daquelas
circunstâncias.
* A vítima Eliza Silva Samúdio, ao afirmar que o réu
Bruno Fernandes das Dores de Souza lhe “deu um monte de
remédios para dormir e uma bebida horrorosa” para ingerir, deixou
claro que a ingestão também foi contra a sua vontade, inclusive
porque afirmou que sequer sabia que bebida era aquela que lhe foi
dada.
* Em nenhum momento, a vítima Eliza Silva Samúdio
alega ter sido obrigada pelo réu Luiz Henrique Ferreira Romão a
tomar remédios ou qualquer bebida.
Processo nº 2009.203.042424-552
As provas periciais
O laudo de exame de alcoolemia, substância tóxica ou
entorpecente de fls. 42/43 (nº IMLRJCMD0343452009), relativo à
vítima Eliza Silva Samúdio, apresenta a seguinte descrição.
“(...) Ao exame dirigido para lesão corporal apura-se:
Equimose violácea localizada no terço médio da face
posterior do antebraço esquerdo, bem como escoriação
linear em região mandibular esquerda medindo 4mm de
comprimento. (...) Colhido 20 ml de urina para exame
toxicológico (...)”
O 3º quesito do referido laudo tem o seguinte teor.
“3) Há vestígios de que a pessoa examinada utilizou, de
alguma forma, álcool, substância tóxica ou entorpecente
de efeitos análogos ? Em caso positivo, de que espécie
(resposta especificada) ?
Depende de exame laboratorial / indeterminado de
tóxicos.”
Processo nº 2009.203.042424-553
O laudo de exame de lesão corporal de fls. 44/45 (nº
IMLRJCMD0343462009), relativo à vítima Eliza Silva Samúdio,
apresenta a seguinte descrição.
“(...) Ao exame dirigido para lesão corporal apura-se:
Equimose violácea localizada no terço médio da face
posterior do antebraço esquerdo, bem como escoriação
linear em região mandibular esquerda medindo 4mm de
comprimento. (...) Colhido 20 ml de urina para exame
toxicológico (...)”
O 1º quesito do referido laudo tem o seguinte teor.
“1) Há vestígios de lesão à integridade corporal ou à
saúde da pessoa examinada com possíveis nexos causal e
temporal ao evento alegados ao perito ?
Sim.”
O 2º quesito do referido laudo tem o seguinte teor.
“1) Qual foi o instrumento ou meio que produziu a lesão?
Ação contundente.”
O laudo de exame de corpo de delito – pesquisa
indeterminada de substância tóxica de fls. 118/119 (nº
Processo nº 2009.203.042424-554
IMLRJCMD0238082010), relativo à vítima Eliza Silva Samúdio,
apresenta os seguintes quesitos.
“4) Foram detectadas substância exógenas na amostra
analisada ? Em caso afirmativo, especifique.
Foi possível detectar, no Laboratório de Toxicologia, a
presença de pelo menos duas substâncias por
cromatografia em camada delgada, em diferentes
condições metodológicas, após revelação colorimétrica
pelo reagente de Draggendorff. A reação positiva com
este reativo é sugestiva da presença de alcalóides e
outros componentes orgânicos nitrogenados. As
substâncias detectadas não foram compatíveis com os
padrões de medicamentos e drogas disponíveis no
Laboratório de Toxicologia.
A fim de maior esclarecimento, as mesmas amostras
foram enviadas para o Instituto de Criminalística Carlos
Éboli (ICCE) para pesquisa de medicamentos,
entorpecentes e substâncias bioativas por Cromotografia
em Fase Gasosa acoplada a Espectrometria de Massas
(CG-EM), conforme relatório técnico em anexo.
Pelas informações técnicas descritas pelo ICCE, foi
possível detectar substâncias exógenas (2-Piperidinona e
1-Acetil-Piperidina), mas não foi possível a identificação
inequívoca da estrutura química destes compostos, pela
Processo nº 2009.203.042424-555
ausência de padrões analíticos de referência para
comparação.”
Percebe-se, diante dos laudos acima revelados, que é
inquestionável o fato de a vítima Eliza Silva Samúdio ter sofrido a
lesão corporal por ela noticiada à Autoridade Policial.
Da mesma forma, restou obviamente comprovado que a
vítima Eliza Silva Samúdio ingeriu remédios e líquido no dia dos
fatos, muito embora a perícia não tenha logrado especificá-los.
Portanto, ao contrário do sustentado pela Defesa, as
provas periciais não vão de encontro com as demais provas, mas
sim ao encontro das mesmas, tornando coerente todo o acervo
probatório.
Os fatos inquestionavelmente comprovados
Diante de todo o material probatório acima referido, é
preciso reconhecer a absoluta comprovação da seguinte dinâmica
dos fatos.
O réu Bruno Fernandes das Dores de Souza, dois dias
antes dos fatos da denúncia, por intermédio de seu amigo Marcelo,
Processo nº 2009.203.042424-556
com o argumento de que existiam papéis para a vítima Eliza Silva
Samúdio assinar em benefício da criança que esperava, conseguiu o
endereço da casa de Milena Baroni Fontana, local em que a vítima
se encontrava.
No dia dos fatos, por volta das duas horas da madrugada,
o réu Bruno Fernandes das Dores de Souza telefonou para a vítima
Eliza Silva Samúdio, dizendo que passaria na casa de Milena
Baroni Fontana, o que de fato ocorreu.
A vítima Eliza Silva Samúdio, então, foi ao encontrou do
veículo em que acreditava estar apenas do réu Bruno Fernandes das
Dores de Souza.
Entretanto, a vítima Eliza Silva Samúdio encontrou o réu
Bruno Fernandes das Dores de Souza, mas também foi surpreendida
com as presenças do réu Luiz Henrique Ferreira Romão e dos
indivíduos que chamou de “Russo” e de “Negão”.
Então, a vítima Eliza Silva Samúdio teve privada a sua
liberdade pelos réus Bruno Fernandes das Dores de Souza e Luiz
Henrique Ferreira Romão e pelos indivíduos “Russo” e “Negão”.
A vítima Eliza Silva Samúdio, enquanto foi obrigada a
ficar no interior do veículo, foi agredida fisicamente pelo réu Bruno
Processo nº 2009.203.042424-557
Fernandes das Dores de Souza, não tendo o réu Luiz Henrique
Ferreira Romão agredido a vítima.
Posteriormente, a vítima Eliza Silva Samúdio foi levada
para a residência do réu Bruno Fernandes das Dores de Souza, o
qual a obrigou a ingerir alguns remédios e um líquido, não tendo o
réu Luiz Henrique Ferreira Romão obrigado a vítima a ingerir algo.
Na ótica deste Magistrado, é esse o panorama fático sobre
o qual devem incidir as normas de Direito Penal.
Dessa forma, considerando que o Ministério Público
pretende a condenação de ambos os réus pela prática de três crimes,
cabe examiná-los de maneira separada, consoante abaixo exposto.
O crime de sequestro
O Ministério Público requer a condenação dos réus Bruno
Fernandes das Dores de Souza e Luiz Henrique Ferreira Romão
pela prática do crime de seqüestro, que foi tipificado à luz do art.
148, § 2º, do CP.
O fato restou inquestionavelmente comprovado.
Processo nº 2009.203.042424-558
Entretanto, cabe um reparo quanto à sua tipificação.
É que o art. 148, § 2º, do CP, exige que a vítima seja
privada de sua liberdade e, além disso, exige que, em razão de
maus-tratos ou da natureza da detenção, a vítima experimente grave
sofrimento físico ou moral.
Ora, no caso em exame, o sofrimento físico imposto à
vítima limitou-se aos dois bofetões que o réu Bruno Fernandes das
Dores de Souza desferiu em seu rosto.
Os mencionados golpes resultaram em lesão corporal de
natureza leve, conforme a prova pericial já exposta, não se
podendo, portanto, falar em grave sofrimento físico.
Além disso, consoante será abaixo exposto, o réu Bruno
Fernandes das Dores de Souza também merece condenação pela
prática do crime de lesão corporal leve, de modo que considerar os
dois bofetões mais de uma vez – para qualificar o crime de
seqüestro e para tipificar o crime de lesão corporal – representaria
inaceitável bis in idem.
Talvez por isso, o Ministério Público, na denúncia, tenha
procurado qualificar o sequestro pelo sofrimento moral, e não pelo
sofrimento físico.
Processo nº 2009.203.042424-559
Aliás, é necessário reconhecer que, a bem da verdade, a
narrativa constante na denúncia sequer se adequa à norma do art.
148, § 2º, do CP.
Veja-se o terceiro parágrafo de fls. 02C.
“(...) Durante todo o tempo em que detiveram a vítima, os
denunciados e os outros dois elementos fizeram várias
ameaças e ofensas, causando-lhe sofrimento moral (...)”
Repare-se que a denúncia não se refere ao “grave
sofrimento moral” exigido pelo legislador, utilizando apenas a
expressão “sofrimento moral”, sem mencionar a sua gravidade.
Ocorre que, na avaliação deste Magistrado, a dinâmica
dos fatos também não revela que a vítima tenha experimentado
grave sofrimento moral.
É evidente que a própria privação da liberdade, por si só,
configura sofrimento moral, diante da inegável angústia que invade
a pessoa sequestrada.
Mas, para que incida a qualificadora exposta na denúncia,
o legislador não se conforma com o simples sofrimento moral,
exigindo, ao contrário, que haja prova de sua efetiva gravidade.
Processo nº 2009.203.042424-560
Anotem-se os exemplos trazidos pelos tribunais.
“(...) Faz-se presente a qualificadora do sequestro, pela
“natureza da detenção” (§ 2º do art. 148 do CP), se a
vítima fica confinada, durante horas, no porta-malas do
automóvel dos sequestradores, portanto em lugar sem
ventilação, agravando-se os sofrimentos, em excesso à
forma simples do crime (...)” (RT 752/567)
“(...) O crime de cárcere privado, com grave sofrimento
(físico ou moral) para a vítima está plenamente
configurado pela circunstância de ter o agente prendido
a amásia com correntes, algemas e cadeado, infligindo-
lhe sofrimento (...)” (RJTJESP 53/318)
Portanto, a conduta dos réus Bruno Fernandes das Dores
de Souza e Luiz Henrique Ferreira Romão é reprovável e, por isso,
merece punição.
Mas a punição há de ser adequada ao caso concreto, não
havendo nenhuma justificativa para que haja verdadeiro excesso
condenatório.
Registre-se que a filmagem trazida aos autos a fls. 310,
que já foi abordada nesta sentença, demonstra que a vítima Eliza
Processo nº 2009.203.042424-561
Silva Samúdio, aparentemente, não sofreu qualquer trauma
psicológico como decorrência do ocorrido.
Pelo contrário, o seu depoimento filmado revela que a
vítima narrou os fatos com segurança e coerência – o que constitui
importante prova para o convencimento deste Magistrado –, mas
em nenhum momento a vítima Eliza Silva Samúdio demonstrou
estar traumatizada, aterrorizada, amedrontada ou, de qualquer
forma, psicologicamente abalada.
Basta ver o vídeo para chegar-se a tal conclusão.
Portanto, réus Bruno Fernandes das Dores de Souza e
Luiz Henrique Ferreira Romão merecem a condenação pelo
sequestro simples, ou seja, pela prática do crime previsto no art.
148, caput, do CP.
O crime de lesão corporal simples
A materialidade veio aos autos pelo laudo já referido.
A autoria, da mesma forma, restou esclarecida, sendo
certo que a própria vítima Eliza Silva Samúdio afirmou, no vídeo e
Processo nº 2009.203.042424-562
no depoimento que prestou em sede policial, que o réu Bruno
Fernandes das Dores de Souza lhe desferiu dois bofetões no rosto.
A vítima, de outro lado, não afirmou ter sido agredida
pelo réu Luiz Henrique Ferreira Romão.
Talvez por isso, o Ministério Público optou por imputar
apenas ao réu Bruno Fernandes das Dores de Souza a autoria do
crime em exame, tipificando a conduta do réu Luiz Henrique
Ferreira Romão com base no art. 129, caput, do CP, c/c art. 29,
caput, do CP.
Quanto à autoria imputada ao réu Bruno Fernandes das
Dores de Souza, inexiste qualquer reparo a ser feito à denúncia.
Mas, na avaliação deste Magistrado, a participação que
foi imputada ao réu Luiz Henrique Ferreira Romão há de ser
examinada com a máxima cautela.
Vejamos.
Segundo a narrativa da denúncia, ao que parece, o
Ministério Público acredita ter imputado ao réu Luiz Henrique
Ferreira Romão a participação no crime de lesão corporal leve no
último parágrafo de fls. 02B.
Processo nº 2009.203.042424-563
“(...) Além de agredida, a vítima foi ameaçada com uma
arma de fogo pelo primeiro denunciado, enquanto os
demais a ofendiam, a ameaçavam de morte, maltratando-
a e a impedindo de desembarcar (...)”
Ocorre que eventual ofensa, ameaça ou maus-tratos que o
réu Luiz Henrique Ferreira Romão tenha praticado contra a vítima
não se relaciona, necessariamente, com o crime de lesão corporal
leve cometido pelo réu Bruno Fernandes das Dores de Souza.
Para que o réu Luiz Henrique Ferreira Romão fosse
responsabilizado pela participação no crime de lesão corporal leve
seria necessário que o Parquet comprovasse que a sua conduta no
interior do veículo buscava concorrer para a prática do mencionado
delito.
Na ótica deste Magistrado, a conduta do réu Luiz
Henrique Ferreira Romão foi suficiente para demonstrar o seu
envolvimento no crime de sequestro, mas não no crime de lesão
corporal leve.
Até porque seria plenamente viável que os réus e os
indivíduos conhecidos como “Russo” e “Negão” praticassem o
crime de sequestro sem desferir qualquer bofetão na vítima Eliza
Silva Samúdio.
Processo nº 2009.203.042424-564
Na verdade, o fato de o réu Luiz Henrique Ferreira
Romão estar no interior do veículo, no qual o réu Bruno Fernandes
das Dores de Souza agrediu a vítima Eliza Silva Samúdio, não o
vincula necessariamente ao crime de lesão corporal leve.
Cabia à acusação provar o indispensável nexo psicológico
entre os réus também com relação ao mencionado delito.
Vejam-se as seguintes lições.
“(...) Se há prova da prática do crime por uns e da não-
participação de outro réu na realização do tipo, decreta-
se a absolvição deste, pois não há participação sem
adesão subjetiva de um na conduta do outro (...)” (RT
597/344)
“(...) Para a caracterização da co-autoria não basta a
simples presença física do agente, sendo imprescindível
que, subjetivamente, tenha ele plena consciência de que
está auxiliando o comparsa na prática do crime, pois não
basta que uma conduta seja condição sine qua non do
fato delituoso para surgir sua punibilidade, exigindo-se,
ainda, a cooperação voluntária e consciente, e um nexo
psicológico com a ação típica do delinqüente principal
(...)” (RJDTACRIM 28/66)
Processo nº 2009.203.042424-565
Frise-se o entendimento deste Magistrado para que não
haja dúvida: a conduta do réu Luiz Henrique Ferreira Romão deixa
claro o seu propósito de sequestrar a vítima, mas não o seu objetivo
de vê-la agredida por quem quer que seja.
Quanto ao crime em foco, cabe uma última consideração.
A denúncia tipificou a conduta em apreço com base no
art. 129, caput, do CP, mas as alegações finais ministeriais são no
sentido de que tal conduta mereça a tipificação com base no art.
129, § 9º, do CP.
A rigor, tal distinção não tem muito efeito prático porque
a pena mínima prevista nos mencionados dispositivos é a mesma:
três meses de detenção.
A variação ocorre na pena máxima: enquanto o art. 129,
caput, do CP, prevê o máximo de um ano de detenção, o art. 129, §
9º, do CP, prevê o máximo de três anos de detenção.
Mas a questão, sob o aspecto técnico, é interessante.
Veja-se que o art. 129, § 9º, do CP, só tem aplicação
quando a lesão é praticada contra ascendente, descendente, irmão,
cônjuge ou companheiro ou com quem conviva ou tenha convivido,
Processo nº 2009.203.042424-566
ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de
coabitação ou de hospitalidade.
Segundo o órgão do Parquet, houve entre o réu Bruno
Fernandes das Dores de Souza e a vítima Eliza Silva Samúdio “uma
relação de convívio, de hospitalidade e até mesmo doméstica”.
Mas tal não ocorreu.
Convém, por mais uma vez, reforçar que a própria vítima
Eliza Silva Samúdio, quando depôs em sede policial a fls. 27/32,
afirmou a superficialidade da relação que manteve com o réu Bruno
Fernandes das Dores de Souza.
“(...) que, de fato, apenas teve relações sexuais com
Bruno por três vezes (...)”
O próprio réu Bruno Fernandes das Dores de Souza,
quando foi ouvido em sede policial, conforme exposto a fls. 76/78,
fez afirmação no mesmo sentido.
“(...) que não são verdadeiras as imputações constante
neste I.P. e que, na realidade, acredita que esteja sendo
vítima de uma tentativa de extorsão por parte da
comunicante de nome Eliza, com quem jamais teve
qualquer relacionamento afetivo que pudesse ser
Processo nº 2009.203.042424-567
rotulado como namoro ou algo assim; que a conheceu em
uma situação bastante delicada e que prefere não
declinar neste momento para não denegrir a imagem da
moça e que teve relação sexual com ela apenas uma vez,
mantendo, depois disso, somente contatos verbais (...)”
Por isso, quanto ao delito em apreço, na avaliação deste
Magistrado, a medida justa no caso concreto é a condenação do réu
Bruno Fernandes das Dores de Souza, pela prática do crime do art.
129, caput, do CP, e a absolvição do réu Luiz Henrique Ferreira
Romão.
O crime de constrangimento ilegal
Neste contexto, o primeiro ponto a ser imediatamente
afastado refere-se à alegação defensiva no sentido de que a tese
ministerial exposta em alegações finais representaria violação à
ampla defesa.
Isso porque o art. 383, caput, do CPP, autoriza, sem
deixar qualquer dúvida, que o Magistrado – sem modificar a
descrição do fato contida na denúncia – atribua à conduta imputada
ao réu a definição jurídica que entender adequada.
Processo nº 2009.203.042424-568
É a chamada emendatio libelli.
Lembre-se a seguinte lição.
“(...) É pacífica a jurisprudência desta Corte Superior de
Justiça no sentido de que o réu defende-se dos fatos
narrados na denúncia, não da capitulação legal a eles
atribuída pelo Ministério Público (...)” (STJ, Sexta
Turma, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis
Moura, HC 89232/SP, julgado em 31/08/2010, DJ de
13/09/2010)
A peça acusatória atribui a conduta própria do crime de
constrangimento quando afirma o seguinte:
“(...) Após, por volta das 03:30 horas, os denunciados e
os dois outros elementos levaram a vítima para a
residência do primeiro denunciado, localizada na
Avenida Lúcio Costa, nº 5800, no bairro da Barra da
Tijuca, local onde, ajustados entre si, a fizeram ingerir
vários comprimidos e um líquido, sendo certo que assim,
sem que a vítima soubesse e contra a vontade desta, lhe
ministraram uma substância que entendiam ser abortiva
(...)”.
Processo nº 2009.203.042424-569
Cabe, então, examinar se tal fato efetivamente ocorreu e,
havendo resposta positiva, de que forma se desenvolveu a citada
dinâmica.
Considerando as provas exaustivamente expostas no
corpo desta sentença, com destaque para o vídeo de fls. 310, não há
qualquer dúvida quanto ao fato de a vítima Eliza Silva Samúdio ter
sido obrigada a ingerir alguns remédios e um líquido.
Ocorre que tal ingestão foi provocada, determinada,
forçada pelo réu Bruno Fernandes das Dores de Souza, e não pelo
réu Luiz Henrique Ferreira Romão.
Basta ver o vídeo para chegar-se a tal conclusão.
Logo, é inquestionável o acerto da tese ministerial no que
se refere ao réu Bruno Fernandes das Dores de Souza.
Cabe a lembrança no sentido de que a imputação atribui
ao réu Luiz Henrique Ferreira Romão a autoria do crime em exame,
sendo esta a conduta a ser examinada neste momento por força do
princípio da congruência.
Mas, a alegação acusatória de que o réu Luiz Henrique
Ferreira Romão tenha feito a vítima Eliza Silva Samúdio ingerir
Processo nº 2009.203.042424-570
vários comprimidos e um líquido restou negada pelas palavras da
própria vítima.
Há, ainda, um último ponto a ser abordado.
O Ministério Público entende que a conduta em exame
deve ser tipificada com base no art. 146, § 1º, do CP, o qual se
refere à reunião de mais de três pessoas para a execução do crime e
ao emprego de armas.
Contudo, conforme já noticiado, a vítima Eliza Silva
Samúdio limitou-se a afirmar que o réu Bruno Fernandes de Souza
determinou a ingestão dos remédios e do líquido, o que afasta o
envolvimento de outras pessoas na execução.
E, além disso, embora a narrativa da vítima quanto ao
ocorrido dentro do veículo do réu Bruno Fernandes das Dores de
Souza mencione a presença de arma de fogo, a vítima Eliza Silva
Samúdio nada mencionou quanto à presença de arma no momento
da ingestão referida.
Portanto, na concepção deste Magistrado, cabe no caso
em exame a condenação do réu Bruno Fernandes das Dores de
Souza pela prática do crime do art. 146, caput, do CP, e a
absolvição do réu Luiz Henrique Ferreira Romão.
Processo nº 2009.203.042424-571
Os crimes configurados
Assim, apenas para que se organize o raciocínio até aqui
desenvolvido, é preciso reconhecer que a resposta penal a ser
imposta é a seguinte:
* Os réus Bruno Fernandes das Dores de Souza e Luiz
Henrique Ferreira Romão devem ser condenados pela prática do
crime seqüestro porque privaram a liberdade da vítima Eliza Silva
Samúdio, mantendo-a no interior do veículo e levando-a para o
Condomínio Varandas.
* O réu Bruno Fernandes das Dores de Souza deve ser
condenado pela prática do crime de lesão corporal leve porque
agrediu a vítima Eliza Silva Samúdio, dando-lhe dois bofetões no
rosto, mas o réu Luiz Henrique Ferreira Romão deve ser absolvido
neste aspecto porque não a agrediu.
* O réu Bruno Fernandes das Dores de Souza deve ser
condenado pela prática do crime de constrangimento ilegal porque
obrigou a vítima Eliza Silva Samúdio a ingerir alguns remédios e
um líquido, mas o réu Luiz Henrique Ferreira Romão deve ser
absolvido neste aspecto porque não a obrigou.
Processo nº 2009.203.042424-572
CONCLUSÃO
Isso posto, julgo procedente, em parte, a pretensão
punitiva estatal para CONDENAR O RÉU BRUNO
FERNANDES DAS DORES DE SOUZA, pela prática dos
crimes previstos no art. 148, caput, do CP, no art. 129, caput, do
CP, e no art. 146, caput, do CP, na forma do art. 69, caput, do
CP, e para CONDENAR O RÉU LUIZ HENRIQUE
FERREIRA ROMÃO, pela prática do crime do art. 148, caput,
do CP, absolvendo-o no mais, a teor do art. 386, VII, do CPP.
A pena do réu Bruno Fernandes das Dores de Souza
Considerando as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP,
verifico que a pena base deve ser fixada acima do mínimo legal.
A culpabilidade é exorbitante na medida em que se
percebe que é absolutamente reprovável a conduta do réu, já que
praticou os crimes que ensejaram a sua condenação com o propósito
de se ver livre do status de pai que não desejava desempenhar. Ora,
se o réu optou por uma aventura amorosa inconsequente, cabia-lhe
arcar com as responsabilidades que dela decorreram, e não agir
Processo nº 2009.203.042424-573
como de fato agiu. Ao conhecer a vítima em determinado evento
(uma orgia na versão do réu ou um churrasco na versão da vítima) e
optar pelo sexo irresponsável, não lhe cabia fazer o papel que fez ao
saber da gravidez da vítima. A sua covardia, pois, impõe resposta
penal adequada.
É certo que o réu não tem maus antecedentes.
Mas a sua personalidade, diante do que ficou apurado,
revelou-se criminosa. O réu juntou-se a supostos “amigos” e, então,
foram fazer pressão para que a vítima provocasse aborto. Não é tal
conduta que se espera de um cidadão de bem. Quis o destino que o
réu se destacasse em sua profissão, mas o mesmo destino se
incumbiu de trazê-lo ao banco dos réus. Diante da personalidade do
réu, lamenta-se que crianças e amantes do futebol já tenham
admirado o acusado. Isso porque o réu não é digno de qualquer
admiração, consideradas as circunstâncias reveladas nestes autos.
A conduta social do réu, quase blindada pela sua fama, se
melhor investigada, revela-se criticável. Há registro nos autos
relativo à agressão praticada pelo réu contra um torcedor. Há notícia
de que o réu seja dado a frequentar orgias. Há registro de que, então
atleta profissional de futebol, ingeria bebida alcoólica e fumava
maconha.
Processo nº 2009.203.042424-574
As circunstâncias dos crimes também são reprováveis
porque o réu se uniu a “amigos” para questionar, pressionar, agredir,
coagir a vítima que dele esperava um filho.
As consequências dos crimes, a bem da verdade, não
exacerbam ao que normalmente se impõe pelos tipos penais, de
modo que tal circunstância não deve repercutir na pena.
O motivo dos crimes, por sua vez, impõe o aumento da
pena porque tudo decorreu do propósito do réu de evitar o
nascimento do filho que não desejava.
Por fim, o comportamento da vítima também merece
atenção. Seria hipocrisia fingir que os autos não revelam que a
vítima também tinha comportamento desajustado. Há registro nos
autos de que a vítima procurava envolvimento com muitos
jogadores de futebol. Neste ponto, não se define bem quem é vítima
de quem. Se os jogadores de futebol, embriagados pelo dinheiro e
pela fama, são vítimas de mulheres que os procuram com toda a
sorte de interesses. Se as mulheres que procuram os jogadores de
futebol, embriagados pelo dinheiro e pela fama, são vítimas deles.
Nessa relação, ninguém é muito inocente. Todos têm culpa. Um
quer enganar o outro. Mas, na verdade, ambos enganam a si
próprios. Não há nada de sincero em tais relações. Apenas interesses
que, às vezes contrariados, geram processos criminais como este.
Processo nº 2009.203.042424-575
De toda forma, o que se precisa dizer é que as
circunstâncias expostas acima impõem o aumento da pena,
considerando este Magistrado razoável aplicar a reprimenda base no
dobro do mínimo legal.
Assim, com relação ao crime do art. 148, caput, do CP,
fixo a pena base em dois anos de reclusão. De outro lado, com
relação ao crime do art. 129, caput, do CP, fixo a pena base em seis
meses de detenção. Por fim, com relação ao crime do art. 146,
caput, do CP, fixo a pena base em seis meses de detenção.
Considerando a inexistência de circunstância atenuante e
considerando a presença das circunstâncias agravantes previstas no
art. 61, II, a e h, vê-se que a reprimenda merece majoração.
É que o réu praticou os crimes por motivo torpe, já que
demonstrado o seu inequívoco propósito de ver interrompida a
gravidez da vítima.
Além disso, as informações trazidas aos autos, até como
consequência da própria dinâmica dos fatos, não deixam dúvida
quanto ao estado gravídico da vítima.
Neste aspecto, este Magistrado entende razoável acrescer
a pena, mostrando-se verdadeiramente adequada ao caso em exame
a majoração na proporção de metade.
Processo nº 2009.203.042424-576
Assim, com relação ao crime do art. 148, caput, do CP,
fixo a pena intermediária em três anos de reclusão. De outro lado,
com relação ao crime do art. 129, caput, do CP, fixo a pena
intermediária em nove meses de detenção. Por fim, com relação ao
crime do art. 146, caput, do CP, fixo a pena intermediária em nove
meses de detenção.
Considerando a inexistência de causa de diminuição de
pena e considerando a inexistência de causa de aumento de pena, a
reprimenda há de ser mantida.
Assim, com relação ao crime do art. 148, caput, do CP,
fixo a pena definitiva em três anos de reclusão. De outro lado, com
relação ao crime do art. 129, caput, do CP, fixo a pena definitiva em
nove meses de detenção. Por fim, com relação ao crime do art. 146,
caput, do CP, fixo a pena definitiva em nove meses de detenção.
Considerando o concurso material de crimes, impõe-se a
aplicação cumulativa das reprimendas, por força do que dispõe o art.
69, caput, do CP.
Assim, com relação ao réu Bruno Fernandes das Dores
de Souza, fixo a pena privativa de liberdade total em quatro
anos e seis meses, sendo três anos de reclusão e um ano e seis
meses de detenção.
Processo nº 2009.203.042424-577
Considerando as normas do art. 33, caput, do CP, fixo o
regime fechado para o início do cumprimento da pena privativa de
liberdade, diante das circunstâncias judiciais desfavoráveis ao réu,
conforme indicado na fixação da pena base.
Registro que o total da reprimenda agora fixada
inviabiliza a substituição da pena privativa de liberdade pelas penas
restritivas de direitos, a teor do art. 44, I, do CP.
A pena do réu Luiz Henrique Ferreira Romão
Considerando as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP,
verifico que a pena base deve ser fixada acima do mínimo legal.
A culpabilidade é exorbitante na medida em que se
percebe que é absolutamente reprovável a conduta do réu, já que
praticou o crime que ensejou a sua condenação com o propósito de
ver seu “amigo”, ora corréu, livre do status de pai que não desejava
desempenhar.
É certo que o réu não tem maus antecedentes.
Processo nº 2009.203.042424-578
Mas a sua personalidade, diante do que ficou apurado,
revelou-se criminosa. O réu juntou-se a supostos “amigos” e, então,
foram fazer pressão para que a vítima provocasse aborto. Não é tal
conduta que se espera de um cidadão de bem. Na verdade, o réu
agia para garantir a suposta “amizade” do ora corréu e, assim,
continuar usufruindo os benefícios que a fama e o dinheiro
concediam àquele.
A conduta social do réu, a bem da verdade, não restou
muito esclarecida nos autos, salvo a sua “profissão” de ajudante de
jogador de futebol, a qual, embora não mereça qualquer elogio,
verdadeiramente não se mostra criminosa.
As circunstâncias do crime também são reprováveis
porque o réu se uniu a “amigos” para questionar, pressionar, agredir,
coagir a vítima que esperava um filho de seu “amigo”, ora corréu.
As consequências do crime, a bem da verdade, não
exacerbam ao que normalmente se impõe pelo tipo penal, de modo
que tal circunstância não deve repercutir na pena.
O motivo do crime, por sua vez, impõe o aumento da pena
porque tudo decorreu do propósito do réu de evitar o nascimento do
filho não desejado de seu “amigo”, ora corréu.
Processo nº 2009.203.042424-579
Por fim, o comportamento da vítima também merece
atenção. Seria hipocrisia fingir que os autos não revelam que a
vítima também tinha comportamento desajustado. Há registro nos
autos de que a vítima procurava envolvimento com muitos
jogadores de futebol. Neste ponto, não se define bem quem é vítima
de quem. Se os jogadores de futebol, embriagados pelo dinheiro e
pela fama, são vítimas de mulheres que os procuram com toda a
sorte de interesses. Se as mulheres que procuram os jogadores de
futebol, embriagados pelo dinheiro e pela fama, são vítimas deles.
Nessa relação, ninguém é muito inocente. Todos têm culpa. Um
quer enganar o outro. Mas, na verdade, ambos enganam a si
próprios. Não há nada de sincero em tais relações. Apenas interesses
que, às vezes contrariados, geram processos criminais como este.
De toda forma, o que se precisa dizer é que as
circunstâncias expostas acima impõem o aumento da pena,
considerando este Magistrado razoável aplicar a reprimenda base no
dobro do mínimo legal.
Assim, com relação ao crime do art. 148, caput, do CP,
fixo a pena base em dois anos de reclusão.
Considerando a inexistência de circunstância atenuante e
considerando a presença das circunstâncias agravantes previstas no
art. 61, II, a e h, vê-se que a reprimenda merece majoração.
Processo nº 2009.203.042424-580
É que o réu praticou o crime por motivo torpe, já que
demonstrado o seu inequívoco propósito de ver interrompida a
gravidez da vítima.
Além disso, as informações trazidas aos autos, até como
consequência da própria dinâmica dos fatos, não deixam dúvida
quanto ao estado gravídico da vítima.
Neste aspecto, este Magistrado entende razoável acrescer
a pena, mostrando-se verdadeiramente adequada ao caso em exame
a majoração na proporção de metade.
Assim, com relação ao crime do art. 148, caput, do CP,
fixo a pena intermediária em três anos de reclusão.
Considerando a inexistência de causa de diminuição de
pena e considerando a inexistência de causa de aumento de pena, a
reprimenda há de ser mantida.
Dessa forma, com relação ao crime do art. 148, caput, do
CP, fixo a pena definitiva em três anos de reclusão.
Assim, com relação ao réu Luiz Henrique Ferreira
Romão, fixo a pena privativa de liberdade total em três anos,
todos de reclusão.
Processo nº 2009.203.042424-581
Considerando as normas do art. 33, caput, do CP, fixo o
regime fechado para o início do cumprimento da pena privativa de
liberdade, diante das circunstâncias judiciais desfavoráveis ao réu,
conforme indicado na fixação da pena base.
Embora a natureza do crime em exame e o total da pena
fixada, em tese, autorizem a substituição da pena privativa de
liberdade pelas penas restritivas de direitos, deixo de proceder a tal
substituição porque as circunstâncias judiciais são desfavoráveis ao
réu, conforme indicado na fixação da pena base, razão pela qual
deve ser observada a vedação prevista no art. 44, III, do CP.
A manutenção da prisão cautelar dos réus
Considerando que os réus Bruno Fernandes das Dores de
Souza e Luiz Henrique Ferreira Romão tiveram a sua prisão cautelar
decretada por este Magistrado a fls. 132/138 e considerando que
persiste a fundação lançada naquele decisum, ambos devem ser
mantidos no cárcere.
Lembre-se o que constou naquela decisão.
“(...) Vê-se que os acusados têm acentuada
periculosidade, diante das circunstâncias que envolveram
Processo nº 2009.203.042424-582
os fatos narrados na denúncia e também os fatos
subseqüentes que acabaram por culminar no
desaparecimento da vítima Eliza Silva Samúdio (...)”
Sendo assim, neste momento, de maneira expressa, este
Magistrado ratifica o teor da decisão de fls. 132/138, obviamente no
que se refere à necessidade da prisão cautelar para garantia da
ordem pública.
Isso porque, já encerrada há muito a produção probatória,
a prisão cautelar dos réus mostra-se desnecessária por conveniência
da instrução criminal.
Entretanto, persiste a necessidade da segregação como
garantia da ordem pública, de modo que, ao contrário do esperado
pela Defesa, soltar os réus neste momento processual – após o
decreto condenatório – representaria flagrante desrespeito ao bom
senso e evidente afronta ao princípio da razoabilidade.
Convém destacar, por último, que a decisão de fls.
132/138 foi submetida à inteligência da egrégia Sétima Câmara
Criminal que, em sessão realizada no dia 21 de setembro de 2010,
ensinou o seguinte.
“(...) O paciente e o corréu foram denunciados por terem
sequestrado a vítima, grávida, supostamente, de um filho
Processo nº 2009.203.042424-583
de um deles, além de terem agredido-a e ministrado
substância abortiva. Não há que se falar em carência de
fundamentação ou fundamentação genérica, pois a
decisão aponta os motivos que justificam a manutenção
da prisão do paciente. No caso presente, o juízo
monocrático justificou a necessidade da custódia cautelar
pela periculosidade do paciente, diante das
circunstâncias que envolveram os fatos narrados na
denúncia, além dos acontecimentos posteriores, que
culminaram no desaparecimento da vítima, bem como
pela conveniência da instrução criminal, que ainda está
em curso. Por outro lado, condições pessoais
eventualmente favoráveis, como primariedade, bons
antecedentes e residência fixa no distrito da culpa, não
têm o condão de, por si só, garantirem a revogação da
prisão preventiva, se há nos autos elementos hábeis a
recomendar a manutenção da custódia cautelar
(Precedentes do STJ). Ausência de constrangimento
ilegal. Denegação da ordem (...)” (TJRJ, Sétima Câmara
Criminal, Relator Desembargador Alexandre H. P.
Varella, HC nº 0040804-59.2010.8.19.0000).
Por todos esses motivos, nego aos réus Bruno
Fernandes das Dores de Souza e Luiz Henrique Ferreira Romão
a possibilidade de recorrer em liberdade porque a prisão cautelar
Processo nº 2009.203.042424-584
é imprescindível para garantir a ordem pública, a teor do art. 312 do
CPP.
Condeno os réus ao pagamento das despesas processuais.
Dou a presente por publicada em mãos do Escrivão.
Registre-se. Intimem-se. Com o trânsito em julgado, lancem-se os
nomes dos acusados Bruno Fernandes das Dores de Souza e Luiz
Henrique Ferreira Romão no rol dos culpados e expeçam-se cartas
de sentença à Vara de Execução Penal. Após, arquivem-se.
Rio de Janeiro, 06 de dezembro de 2010.
MARCO JOSÉ MATTOS COUTOJuiz de Direito
Processo nº 2009.203.042424-585
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