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    CARTA DE JUDASCOMENTRIO ESPERANA

    autor

    Werner de Boor

    Editora Evanglica Esperana

    Copyright 2008, Editora Evanglica EsperanaPublicado no Brasil com a devida autorizao e com todos os direitos reservados pela:

    Editora Evanglica EsperanaRua Aviador Vicente Wolski, 35382510-420 Curitiba-PR

    E-mail: [email protected]: www.esperanca-editora.com.br

    Editora afiliada ASEC e a CBLTtulo do original em alemoDer Briefe des Petrus und der Brief des JudasCopyright 1983 R. Brockhaus Verlag

    Dados Internacionais da Catalogao na Publicao (CIP)(Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Boor, Werner deCartas de Tiago, Pedro, Joo e Judas / Fritz Grnzweig, Uwe Holmer, Werner de Boor / traduo WernerFuchs. -- Curitiba, PR : Editora Evanglica Esperana, 2008.Ttulo original: Der Briefe des Jakobus, Die Briefe des Petrus und der Brief des Judas, die Briefe des Johannes.

    ISBN 978-85-7839-004-4 (brochura)ISBN 978-85-7839-005-1 (capa dura)

    1. Bblia. N.T. Joo - Comentrios 2. Bblia. N.T. Judas - Comentrios 3. Bblia. N.T. Pedro - Comentrios 4.Bblia. N.T. Tiago - Comentrios I. Holmer, Uwe. II. Boor, Werner de. III. Ttulo.08-05057 CDD-225.7

    ndice para catlogo sistemtico:1. Novo Testamento : Comentrios 225.7

    proibida a reproduo total ou parcial sem permisso escrita dos editores.O texto bblico utilizado, com a devida autorizao, a verso Almeida Revista e Atualizada (RA) 2 edio, da Sociedade Bblicado Brasil, So Paulo, 1993.

    Sumrio

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    ORIENTAES PARA O USURIO DA SRIE DE COMENTRIOSNDICE DE ABREVIATURAS

    Introduo segunda carta de Pedro e carta de JudasIA questo da autenticidadeIIpoca de redao, destinatrios, motivo da carta, tradio eclesisticaIIIA carta de JudasIVIndicaes bibliogrficas

    Saudao IntrodutriaJd 1sMotivo e objetivo da cartaJd 3sTrs exemplos de juzo no ATJd 5-7A caracterizao dos sedutoresJd 8-16Conselho e instruo para a igrejaJd 17-23Doxologia finalJd 24s

    ORIENTAESPARA O USURIO DA SRIE DE COMENTRIOS

    Com referncia ao texto bblico:O texto de Judas est impresso em negrito. Repeties do trecho que est sendo tratado tambm esto impressas em

    negrito. O itlico s foi usado para esclarecer dando nfase.

    Com referncia aos textos paralelos:A citao abundante de textos bblicos paralelos intencional. Para o seu registro foi reservada uma coluna

    margem.

    Com referncia aos manuscritos:Para as variantes mais importantes do texto, geralmente identificadas nas notas,foram usados os sinais abaixo, que

    carecem de explicao:

    TM O texto hebraico do Antigo Testamento (o assim-chamado Texto Massortico). A transmisso exata do textodo Antigo Testamento era muito importante para os estudiosos judaicos. A partir do sculo II ela tornou-seuma cincia especfica nas assim-chamadas escolas massorticas (massora = transmisso).Originalmente o texto hebraico consistia s de consoantes; a partir do sculo VI os massoretasacrescentaram sinais voclicos na forma de pontos e traos debaixo da palavra.

    Manuscritos importantes do texto massortico:

    Manuscrito: redigido em: pela escola de:Cdice do Cairo (C) 895 Moiss ben AsherCdice da sinagoga de Aleppo depois de 900 Moiss ben Asher(provavelmente destrudo por um incndio)Cdice de So Petersburgo 1008 Moiss ben AsherCdice n 3 de Erfurt sculo XI Ben NaftaliCdice de Reuchlin 1105 Ben Naftali

    Qumran Os textos de Qumran. Os manuscritos encontrados em Qumran, em sua maioria, datam de antes de Cristo,portanto, so mais ou menos 1.000 anos mais antigos que os mencionados acima. No existem entre elestextos completos do AT. Manuscritos importantes so:

    O texto de Isaas O comentrio de Habacuque

    Sam O Pentateuco samaritano. Os samaritanos preservaram os cinco livros da lei, em hebraico antigo. Seusmanuscritos remontam a um texto muito antigo.

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    Targum A traduo oral do texto hebraico da Bblia para o aramaico, no culto na sinagoga (dado que muitos judeusj no entendiam mais hebraico), levou no sculo III ao registro escrito no assim-chamado Targum (=traduo). Estas tradues so, muitas vezes, bastante livres e precisam ser usadas com cuidado.

    LXX A traduo mais antiga do ATpara o grego chamada de Septuaginta (LXX = setenta), por causa da histriatradicional da sua origem. Diz a histria que ela foi traduzida por 72 estudiosos judeus por ordem do reiPtolomeu Filadelfo, em 200 a.C., em Alexandria. A LXX uma coletnea de tradues. Os trechos maisantigos, que incluem o Pentateuco, datam do sculo III a.C., provavelmente do Egito. Como esta traduo

    remonta a um texto hebraico anterior ao dos massoretas, ela um auxlio importante para todos ostrabalhos no texto do AT.

    Outras Ocasionalmente recorre-se a outras tradues do AT. Estas tm menos valor para a pesquisa de texto, porserem ou tradues do grego (provavelmente da LXX), ou pelo menos fortemente influenciadas por ela (oque o caso da Vulgata):

    Latina antiga por volta do ano 150 Vulgata (traduo latina de Jernimo) a partir do ano 390 Copta sculos III-IV Etope sculo IV

    NDICE DE ABREVIATURAS

    I. Abreviaturas gerais

    AT Antigo Testamentocf confiracol colunagr Gregohbr Hebraicokm Quilmetroslat LatimLXX SeptuagintaNT Novo Testamentoopr Observaes preliminarespar Texto paralelop. ex. por exemplopg. pgina(s)qi Questes introdutriasTM Texto massorticov versculo(s)

    II. Abreviaturas de livros

    Bl-De Grammatik des ntst Griechisch, 9 edio, 1954. Citado pelo nmero do pargrafoCE Comentrio EsperanaKi-ThW Kittel: Theologisches WrterbuchNTD Das Neue Testament DeutschRadm Neutestl. Grammatik, 1925, 2 edio, RademacherSt-B Kommentar zum Neuen Testament aus Talmud und Midrasch, vol. I-IV, H. L. Strack, P. BillerbeckW-B Griechisch-deutsches Wrterbuch zu den Schriften des Neuen Testaments und der frhchristlichen Literatur, Walter

    Bauer, editado por Kurt e Barbara Aland

    III. Abreviaturas das verses bblicas usadas

    O texto adotado neste comentrio a traduo de Joo Ferreira de Almeida, Revista e Atualizada no Brasil, 2 ed.(RA), SBB, So Paulo, 1997. Quando se fez uso de outras verses, elas so assim identificadas: BLH Bblia na Linguagem de Hoje (1998)BJ Bblia de Jerusalm (1987)BV Bblia Viva (1981)

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    NVI Nova Verso Internacional (1994)RC Almeida, Revista e Corrigida (1998)TEB Traduo Ecumnica da Bblia (1995)VFL Verso Fcil de Ler (1999)

    IV. Abreviaturas dos livros da Bblia

    ANTIGO TESTAMENTO

    Gn Gnesisx xodoLv LevticoNm NmerosDt DeuteronmioJs JosuJz JuzesRt Rute1Sm 1Samuel2Sm 2Samuel1Rs 1Reis2Rs 2Reis1Cr 1Crnicas2Cr 2CrnicasEd EsdrasNe NeemiasEt EsterJ JSl SalmosPv ProvrbiosEc EclesiastesCt Cntico dos CnticosIs IsaasJr JeremiasLm Lamentaes de JeremiasEz EzequielDn DanielOs OsiasJl JoelAm AmsOb ObadiasJn Jonas

    Mq MiquiasNa NaumHc HabacuqueSf SofoniasAg AgeuZc ZacariasMl Malaquias

    NOVO TESTAMENTO

    Mt MateusMc MarcosLc LucasJo JooAt AtosRm Romanos1Co 1Corntios

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    2Co 2CorntiosGl GlatasEf EfsiosFp FilipensesCl Colossenses1Te 1Tessalonicenses 2Te 2Tessalonicenses 1Tm 1Timteo2Tm 2TimteoTt TitoFm FilemomHb HebreusTg Tiago1Pe 1Pedro2Pe 2Pedro1Jo 1Joo2Jo 2Joo3Jo 3Joo

    Jd JudasAp Apocalipse

    OUTRAS ABREVIATURAS

    O final do livro contm indicaes de literatura.(A 25) Apndice (sempre com nmero)

    Tradues da Bblia (sempre entre parnteses, quando no especificada, traduo prpria ou Revista de Almeida(A) L. Albrecht(E) Elberfeld(J) Bblia de Jerusalm(NVI) Nova Verso Internacional(TEB) Traduo Ecumnica Brasileira (Loyola)(W) U. Wilckens(QI 31) Questes introdutrias (sempre com nmero, referente ao respectivo item)Past cartas pastoraisZTK Zeitschrift fr Theologie und KircheZNW Zeitschrift fr neutestamentliche Wissenschaft und die Kunde der lteren Kirche

    [ver: Novo Dicionrio Internacional de Teologia do NT (ed. Gordon Chown), Vida Nova.]

    INTRODUO SEGUNDA CARTA DE PEDRO E CARTA DE JUDAS

    IA QUESTO DA AUTENTICIDADE1) Ser mesmo que a carta, que nos propomos a ler em conjunto, representa como diz o ttulo do presente volume

    um escrito do discpulo e apstolo Pedro? Atualmente isso contestado pela maioria dos telogos. As razes dissopodem ser melhor expostas por algum como o Dr. A. Schlatter, de cuja submisso crente Bblia ningum podeduvidar. Ele no questiona a autenticidade da carta por prazer em criticar a Bblia. Com liberdade e franqueza eleexpe aos leitores da Bblia, para os quais interpreta todos os escritos do NT em suas Erluterungen zum NT(Elucidaes do NT), logo nos dois versculos iniciais de 2Pe, o seguinte: Pela maneira como essa carta repete aepstola de Judas, e pela diferena na linguagem que a separa da primeira carta de Pedro, resulta nitidamente que aquino Pedro quem fala pessoalmente igreja, mas outro cristo. Ele escreveu para dizer aos cristos em que consiste overdadeiro cristianismo, e escolheu essa forma para sua exortao porque no se trata de sua prpria opinio einteno pessoal, mas daquilo que os apstolos legaram igreja e que torna slida sua participao na graa de Deus,

    e correto seu servio a Deus. No precisamos admitir a suposio de que, procedendo assim, o autor tivesse uma mconscincia e pretendesse incorrer em uma fraude qualquer. Escolheu essa forma para falar aos cristos porque seempenha com sinceridade e convico para que a igreja no se desvie da trajetria que os apstolos lhe indicaram,mas para que preserve o que deles recebeu. Por isso tambm no escreveu no topo da carta o nome de outro apstolo,mas o de Pedro, porque Jesus fez de Pedro o primeiro de seus mensageiros e porque a igreja surgiu a partir do

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    testemunho dele. Por isso ela permanecer no caminho de Jesus, tal como lhe foi mostrado desde o comeo, se noperder o que Pedro lhe anunciou.

    O que nos cabe dizer diante disso?

    2) A diferena na linguagem e no estilo entre as duas epstolas de Pedro chamar ateno de todo leitor atento.Ser possvel que a mesma pessoa escreva de maneiras to diversas? Pois bem, para ns , em qualquer ponto, semprearriscado dizer que isso ou aquilo no pode ser. Algum como o apstolo Paulo capaz de falar de muitas maneirasdistintas, como em sua carta aos Romanos e em 2Co! A razo simples para isso reside na diversidade das pessoas a

    que o apstolo se dirigia com as cartas, e na considervel diferena dos temas de que era preciso tratar. No entanto,no seria esse tambm o caso das duas cartas de Pedro? Uma carta de consolo e encorajamento a cristos perseguidos algo muito diferente da spera e irritada defesa contra perigosos falsificadores e sedutores que, no sem xito, seintroduziram em igrejas. Ademais, cumpre recordar mais uma vez que Pedro escreve a primeira carta expressamentepor meio de Silvano, o fiel irmo. Esse destaque explcito da fidelidade de Silvano me parece ser um claro indciode que Silvano no foi mero escrevente que ouviu um ditado, mas que, aps dialogar com Pedro e de acordo com asinstrues do apstolo, tinha certa liberdade estilstica para confeccionar a carta. No presente caso a carta seria decerto modo muito antes um escrito do prprio apstolo, uma vez que em seu final falta qualquer referncia a umautor. A aspereza e dureza na condenao e rejeio dos hereges seriam condizentes com o pescador singelo, com ohomem do povo, que Jesus escolheu e convocou de acordo com a orientao do Pai.

    3) Nesse caso tambm seria menos marcante a forte semelhana de vrios trechos em 2Pe e da carta de Judas.

    Homens como Pedro e Judas esto muito prximos no que tange origem e ao contexto humano. Considerando que otelogo crtico da Bblia freqentemente bastante ousado ao levantar hipteses e construes, ns talvez tambmpossamos s-lo aqui. No seria possvel que Pedro e Judas falassem com preocupao comum sobre a invaso defalsos mestres em igrejas apostlicas, afinando sua avaliao conjunta e combinando uma ajuda epistolar para aigreja? Agora ressoam nas duas cartas muitos pontos que marcaram seus dilogos.

    A exegese detalhada das duas cartas evidenciar que no se pode afirmar que uma carta foi copiada da outra. Aspassagens e frases semelhantes das duas cartas tambm apresentam diferenas to caractersticas que um escritoindependente com base em dilogos conjuntos de fato ofereceria a melhor explicao para esse quadro. Ento aobjeo de que algum como o apstolo Pedro no poderia ter se baseado na carta de uma pessoa menos significanteperder sua fora.

    4) Mas, ento, ser que a pergunta a respeito da autenticidade, ou seja, da autoria importa tanto assim? Vimos

    que Schlatter comenta 2Pe, a qual no considera autntica, com a mesma seriedade e a mesma dedicao e atenocom que teria analisado uma carta autntica de Pedro. Ser que no importa simplesmente o contedo do escrito emsi?

    Entretanto, como fica a questo da delimitao do NT? A igreja antigaainda que depois de um tempo deindecisoacolheu a carta no cnon do NT porque a considerou uma carta do apstolo Pedro. Esse fato no alteradoem nada pela observao, sem dvida correta, de que na Antigidade a redao de escritos sob o nome de uma pessoafamosa pode ser observada em vrios casos como forma admitida de literatura. De maneira alguma isso era entendidocomo desonesto ou at mesmo como fraude. Apesar disso ningum pode duvidar de que seguramente noteramos 2Pe em nosso NT se a igreja antiga tivesse reconhecido em seu autor um cristo de poca posterior, queapenas falava s congregaes em nome do apstolo Pedro. Afinal, h uma considervel diferena entre algumescrever sob o codinome de um homem famoso ou ento desempenhar, at mesmo em toda a vida pessoal, a funode um apstolo determinante. Apesar de um entendimento diverso na Antigidade, as igrejas certamenteconsideravam isso uma usurpao inadmissvel. Tambm o apstolo Paulo d mxima importncia ao fato de quesomente cartas realmente originrias dele mesmo tenham prevalncia nas igrejas ( 2Ts 2.2).

    5) Entretanto, no podemos deixar de indagar se o Esprito Santo, o Esprito da verdade, teria concedido suaorientao e sua autoridade a uma pessoa que falava s igrejas expressamente como Pedro, sem contudo de fato serPedro? Por mais honesta que tivesse sido a inteno desse homem, buscando preservar as igrejas na doutrina de Pedroatravs dessa carta, seu procedimento sempre carecer de uma retido ltima e de lmpida transparncia, que oapstolo Paulo valorizava de forma to determinada. O Esprito Santo no diz sim a algo assim.

    Nesse caso, porm, a pergunta a respeito do autor desta carta muito importante. No cristianismo primitivoexistiram muitas obras boas e instrutivas, redigidas com a iluminao do Esprito Santo, mas isso no as qualificoupara serem acolhidas na Bblia. No presente captulo, leremos 2Pe como uma carta do prprio apstolo, sabendo que,

    com isso, estamos em sintonia com a igreja primitiva.IIPOCA DE REDAO, DESTINATRIOS, MOTIVO DA CARTA, TRADIO ECLESISTICA

    1) A poca da redao

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    Somos informados pela prpria carta sobre a poca da redao de 2Pe, a saber, que ela foi escrita no melhor tempode vida do apstolo, antes de sofrer o martrio na perseguio dos cristos pelo imperador Nero.

    2) Os destinatrios

    Os destinatrios so caracterizados apenas pelo estado de sua f, no segundo o local de moradia. Obviamentetambm so destinatrios da primeira carta. Mas igualmente 1Pe tem a forma de uma carta circular, queprovavelmente tambm chegou a outras igrejas que no faziam parte das regies da sia Menor. a esse crculo maisamplo de igrejas que os apstolos se dirigem em 2Pe.

    3) O motivo

    O motivo que levou tanto Pedro como Judas a escrever evidenciado com muita clareza nas prprias cartas. Houveuma investida sobre as congregaes por parte de hereges e sedutores, que conquistavam cada vez mais influnciasobre a igreja. Estaremos corretos ao incluir essas novas pessoas no grande movimento do gnosticismo, que naquelapoca se alastrava como forte enxurrada, e por isso incontrolvel, por todas as regies, tentando penetrarconsistentemente nas religies e nos sistemas de pensamento. Existia o gnosticismo gentlico no judasmo e havia,como vemos nestas duas cartas, fortes investidas gnsticas no sentido de apoderar-se tambm do jovemcristianismo. No sabemos muito sobre o gnosticismo. As pessoas que haviam penetrado nas igrejas sem dvidadesejavam ser crists, do contrrio nem teriam conseguido exercer influncia. Sim, pretendiam trazer umcristianismo superior, mais livre. Isso j ficara patente em Corinto (1Co 5.6).

    Na presente Introduo no tentaremos oferecer uma viso geral do gnosticismo. O TheologischesBegriffslexikon descreve o gnosticismo dessa forma:

    Gnosticismo (do grego gnsis = conhecimento) uma designao genrica para movimentos religiosos quefazem a redeno e libertao do ser humano depender do conhecimento sobre natureza, origem e destino domundo, da vida humana e das esferas divinas. Por gnosticismo e gnose em sentido estrito entende-se uma linhano judasmo, helenismo e cristianismo do sc. I a.C. at o sc. IV d.C. (auge no sc. II d.C.), que tentava chegara um conhecimento de Deus e cujo alvo era a divinizao das pessoas espirituais (pneumticas) pelacontemplao da divindade e, com freqncia, pela unificao com ela pelo xtase.

    Fazem parte do sistema doutrinrio gnstico o dualismo teolgico entre criao e redeno, teoriasemanatistas sobre o fluir do divino sobre o mundo, conceitos de redeno que asseveram a libertao do cristo

    da matria, e o retorno ptria divina de origem, bem como a doutrina sobre a eficcia fsica dos sacramentoscomopharmaka athanasias, remdios que conduzem imortalidade. No gnosticismo cristo a f dissociadade sua contextualizao histrica, nega-se a encarnao real de Cristo (docetismo) e restringe-se a obedinciade f. Os adeptos desse movimento so chamados de gnsticos, e os conceitos correlatos so adjetivados comognsticos (op. cit., p. XVIII).

    Quem desejar obter mais informaes encontrar material suficiente em qualquer compndio de HistriaEclesistica e tambm na coletnea de J. Leipoldt/W. Grundmann, Umwelt des Urchristentums (vol. I, 2 ed., Berlim1967, especialmente p. 371-415). No comentrio assinalaremos os respectivos pontos, que pareciam to perigosos aosapstolos e aos quais combatiam com muita dureza e determinao. Essa situao tambm permite compreender aveemncia de seu linguajar nas cartas.

    4) A tradio eclesisticaA presente carta disseminou-se aos poucos na igreja, at ser reconhecida como escrito do apstolo Pedro e acolhida

    no cnon. Orgenes (185-254) atesta-a, Jernimo (340-420) considera-a autntica, e ela pertence ao cnon desde a 39carta pascal de Atansio no ano de 367 d.C.

    IIIA CARTA DE JUDAS

    1) O autorse apresenta como Judas, um escravo de Jesus Cristo e irmo de Tiago (v. 1). Com isso apontaindubitavelmente para Tiago, irmo do Senhor. Ele prprio, portanto, tambm um dos irmos de sangue de Jesus,citados em Mc 6.3. Sobre sua vida no h maiores informaes. Provavelmente ele tambm no fazia parte do grupode seguidores quando Jesus era vivo.

    2) A poca de redao da carta pode ser situada no ltimo tero do sc. I. Do contedo da carta depreende-se queJudas escreveu em uma poca em que o gnosticismo estava invadindo a igreja, que ainda no a detectava nemexpelia como uma heresia comumente reconhecida.

    3) Nada sabemos sobre o lugar da redao.

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    4) A autenticidade da carta foi vrias vezes questionada. Para isso recorre-se sobretudo aos v. 17s, dos quais sedepreende que os apstolos j anunciavam tempos em que surgiriam zombadores. Tambm Judas fazia parte dessesapstolos. O autor estaria se ocultando por trs desse Judas, a fim de para combater, recorrendo a tradiesapostlicas, os hereges gnsticos e sua influncia.

    Essa concepo, no entanto, no passa de mera suposio, incapaz de ser realmente compromissiva (a esserespeito, cf. o comentrio aos v. 17s).

    5) A tradio da primeira igreja (Tertuliano, cnon Muratori) j conhece a carta e em momento algum questiona a

    autoria de Judas.IVINDICAES BIBLIOGRFICAS

    Schlatter, A. Die Briefe des Petrus, Judas, Jakobus, der Brief an die Hebrer, Erluterungen zum NT, vol. 9.

    Hauck, F. Die Kirchenbriefe,NTD, vol. 10.

    Schelkle, K. H. Die Petrusbriefe, der Judasbrief, Benno-Verlag Leipzig e Herder-Verlag Freiburg.

    COMENTRIO

    SAUDAO INTRODUTRIAJD 1S

    1Judas, servo de Jesus Cristo e irmo de Tiago, aos chamados, amados em Deus Pai eguardados em Jesus Cristo:

    2a misericrdia, a paz e o amor vos sejam multiplicados!

    1 Tambm a presente pequena carta observa a forma epistolar antiga. Por isso cita-se primeiro o nomede quem nos fala atravs da carta. Judas, escravo de Jesus Cristo, porm irmo de Tiago. PorJudas ser um nome muito freqente entre o povo judeu, o autor imediatamente se apresenta demaneira mais especfica. Faz isso de forma peculiar. Inicialmente acrescenta uma definio decargo, que obviamente soa muito estranha para ns: Judas, escravo de Jesus Cristo. Os leitores dacarta percebiam essa expresso de forma muito mais objetiva que ns. Havia escravos em grandenmero, e estavam tambm entre os membros da igreja. Um escravo um ser humano cujo corpo evida, com todas as foras e capacidades produtivas, pertencem a outra pessoa, a seu senhor. Judas dizisso igreja repleto de alegria, assim como tambm Paulo se define como escravo de Jesus Cristo(Fp 1.1) em sua carta mais cordial e alegre. Judas pertence a ele, o Senhor que o adquiriu,arrancando-o assim do mbito de poder das trevas (Cl 1.13), do poder de Satans (At 26.18), doprncipe deste mundo, pagando por isso com seu sangue e sua vida. Judas pertence a Jesus Cristo

    por gratido e amor. Em consonncia com passagens do AT, esse nome era assumido por pessoasque de modo singular se encontram no servio de seu Senhor, muito embora todos que de fatoseguiram ao chamado de Jesus no pertenam mais a si mesmos, porm, comprados por alto preo,tm o privilgio de enaltecer a Deus com o corpo e a vida (1Co 6.19s). Judas no um apstolo.Mas os leitores de sua epstola tampouco devem consider-lo um homem qualquer do cristianismo,que expressa sua opinio pessoal por meio desse escrito. Ele escreve em supremo servio e supremaincumbncia.

    No entanto, visa sublinhar ainda mais a relevncia de sua palavra e tornar-se particularmenteconhecido dos destinatrios de sua carta, de modo que acrescenta, com um porm enftico: pormirmo de Tiago. Esse nome possui boa fama em todo o primeiro cristianismo, at mesmo nas igrejasde cunho cristo gentio. No relato sobre o conclio dos apstolos Paulo o cita em primeiro lugar,

    antes de Pedro e Joo (Gl 2.9). O nome tambm ocorre em At 21.18ss como personagem decisiva:era irmo de sangue de Jesus, o qual depois da ressurreio lhe concedeu um encontro pessoal,conduzindo assim f o homem que antes era descrente. Quem escreve como irmo de Tiago podeestar seguro da ateno dos leitores.

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    Tiago e Judas so irmos do prprio Jesus! Contudo ambos conscientemente evitam apontar paraesse fato em suas cartas. No passado realmente eram irmos de sangue de Jesus, que no criamnele, mas o corrigiam de forma mais ou menos fraterna (Jo 7.3 -5). Agora, porm, crem em Jesus,e precisamente assim Jesus se torna para eles o kyrios, o Senhor diante do qual j no podemaparecer como irmos, mas unicamente como escravos. Assim, de sua parte, rejeitam qualquerligao terrena e por parentesco, externada pelo prprio Jesus com toda a aspereza (Jo 2.4; Mt 12.46-50). Como todas as demais pessoas, so a partir de baixo e, conseqentemente, totalmenteseparados daquele que a partir de cima. Aqui cessa qualquer parentesco.

    nomeao do remetente segue-se a indicao dos destinatrios da carta. Sem qualquerreferncia ao local de residncia, so descritos somente segundo sua natureza interior. Por essa razono podemos saber com certeza para onde Judas enviou a carta. Resulta do contedo apenas que foidirigida a uma igreja (ou igrejas),porque ceias de amor s acontecem em igrejas.Independentemente de onde essas igrejas se localizavam, devem ter sido igrejas nas quais o nomeTiago tinha uma forte aceitao, ou seja, devem ter tido uma conexo especial com a primeira igrejaem Jerusalm. verdade que tambm uma pessoa como Paulo conhecia e reconhecia a fama deTiago, contudo difcil que Judas tenha se dirigido a uma igreja paulina destacando, ao faz -lo,seu relacionamento com Tiago. Ao ler a carta de Judas devemos situar os destinatrios entre igrejascrists judeus do Oriente.

    No contedo, porm, no preciso dar um passo muito grande. Judas no considera uma igrejade Jesus de forma diferente de Paulo. Sua caracterizao teocntrica, centralizada em Deus. Oque se destaca na igreja no so suas qualidades ou realizaes. Ela o que pelo agir de Deus. unicamente sobre isso que se fixa o olhar. Seus membros so chamados. Entraram na congregaodo Messias no por obras e mritos, mas pelo chamado de Deus, que implicava, com certezana mesma intensidade para Judas e para Paulo, a eleio e o ordenamento de Deus (Rm 8.30).Da mesma forma como Paulo escreve (1Ts 1.4), tambm para Judas essa eleio e vocao divinas seoriginam do amor de Deus: esses chamados so amados em Deus Pai. Tambm aqui o Esprito deDeus eficaz at nas formulaes especficas. Os membros da igreja no so apenas amados porDeus. Poderia haver a conotao, na conexo com sua realidade de chamados, de que o amor deDeus somente existiria no comeo da existncia crist. No, so constante e continuamente amados

    em Deus. Como isso consolador para igrejas que passam por grandes aflies e tribulaes!Ao mesmo tempo podem ter a certeza de que em todas as dificuldades sero preservadosparaJesus Cristo. Quem de ns chegaria ao grande alvo se a fidelidade e pacincia preservadora deDeus no segurasse nossa vida com mo firme? Neste aspecto, porm, importante captarintegralmente o teor da palavra. No se trata somente da nossa preservao em si e de quecheguemos ao alvo pessoalmente. Somos preservados para Jesus Cristo! Portanto, tambmnessa preservao consoladora e pessoal podemos nos esquecer de ns mesmos e nos liberar de todoegosmo devoto. Tambm nisso Jesus Cristo o centro. Deus nos preserva para que a reivindicaodele sobre ns atinja o objetivo e o salrio de seu rduo trabalho em ns no se perca. evidente queisso constitui simultaneamente proveito para ns mesmos, porque nossa vida consiste em estar disposio de Jesus Cristo. Ao mesmo tempo a afirmao preservados para Jesus Cristo tem foco

    escatolgico. No dia do retorno de Jesus deveremos estar preservados para ele. Assim, incio e fimda carta se sobrepem. O v. 24 tornar a apontar expressamente de forma escatolgica para o ser

    preservados de qualquer tropeo e, conseqentemente, para o derradeiro grande alvo de Deus.2 Na seqncia, segundo um belo costume da poca, o remetente se une aos destinatrios da carta

    atravs do anncio da bno: Misericrdia vos seja dada, e paz e amor em rica medida. Para umhomem como Judas isso era mais do que um desejo piedoso. De acordo com a Bblia, abenoar narealidade acontece na certeza de que Deus concede aquilo que prometido a pessoas que elevam osolhos para ele em orao. Aqui a ddiva da bno no descrita mediante duas, mas trs palavras,sendo que a misericrdia consta enfaticamente no incio. Ela a dedicao fundamental de Deus ans, no apenas uma simpatia da parte dele mas inteno redentora de Deus que se tornou ao,realmente histrica, na morte sacrificial de Jesus por ns. A palavra paz recuperou para ns cristosatuais algo de seu contedo original e abrangente desde que recomeamos a nos saudar com o termohebraico shalomcomo voto de bno. Experimentamos assim que a rigor no possvel traduzir

    palavras. Para ns paz, devido a uma longa histria, facilmente mera paz sentimental do corao.Shalom tem um sentido muito mais palpvel e real. Diante da meno do amor poderamos indagar

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    se a inteno destacar o amor de Deus por ns ou se a referncia a nosso amor ao Senhor e entrens. No modo de pensar do NT os dois esto estreitamente ligados. Amor sempre indivisvel! Amora Deus no real sem amor ao irmo; este, porm, nem mesmo possvel sem o amor a Deus. Cf.1Jo 4.7,11.

    O voto de bno em si j revela que no temos os grandes bens, citados por ele, simplesmentecomo propriedade. Boa parte do cristianismo fenece porque ignora isso. verdade, tudo nosso,ns somos pessoas ricas. Contudo somente somos ricos enquanto isso nos for concedidorenovadamente. O ter genuno no nos permite satisfazer-nos conosco mesmos, mas nos leva a umcrescimento vivo, no qual desejamos possuir, e tambm receber, em medida muito mais abundante,aquilo que fundamentalmente j foi propiciado. De qualquer maneira, no h como duvidar dadisposio de Deus em nos presentear em rica medida. Em consonncia, tambm Paulo associou oalegre e grato reconhecimento daquilo que a igreja j possui com a insistente solicitao de se tornarainda mais completo (1Ts 4.10) e sempre progredir (1Co 14.12). Esses so tambm os desejos deJudas para a igreja qual escreve, e assim foi previsto para ela pelo Senhor.

    MOTIVO E OBJETIVO DA CARTAJD 3S

    3Amados, quando empregava toda a diligncia em escrever-vos acerca da nossa comum

    salvao, foi que me senti obrigado a corresponder-me convosco, exortando-vos abatalhardes, diligentemente, pela f que uma vez por todas foi entregue aos santos.

    4Pois certos indivduos se introduziram com dissimulao, os quais, desde muito, foramantecipadamente pronunciados para esta condenao, homens mpios, que transformamem libertinagem a graa de nosso Deus e negam o nico Soberano e nosso Senhor, JesusCristo. (ou: nosso nico Soberano e Senhor Jesus).

    3 Judas declara imediatamente aos destinatrios da carta por que, afinal, lhes escreve, com queseriedade o faz e qual o objetivo do escrito: Amados, enquanto dedico todo o empenho em vosescrever a respeito de nossa salvao comum, obtive a necessidade de vos escrever. Nainterpelao amados comprova-se o que acabamos de afirmar acerca do carter indivisvel doamor. So amados primeiramente porque Deus os incluiu em seu amor (v. 1). Mas por isso vale paraeles tambm o que Paulo disse aos tessalonicenses em 1Ts 2.8: tornaram -se amados tambm paraos mensageiros. Podem ter certeza de que Judas lhes escreve com sincero amor, no obstante toda agravidade de suas palavras.

    No entanto, esse amor no a nica razo pela qual Judas escreve a carta. Ele no escreve porcritrio pessoal ou por qualquer disposio de humor. Sua carta tem uma fundamentao muito maissria: obtive a necessidade de (literalmente, vi-me forado a) vos escrever. Essa palavranecessidade tambm consta em 1Co 9.16 com vistas a todo trabalho de proclamao do apstoloPaulo: uma necessidade interior pesa sobre ele; por isso precisa evangelizar. Situao anloga a deJudas: ele precisa escrever a carta. Esse precisa pesa, no Antigo e Novo Testamentos, sobre todos

    os homens e mulheres com quem nos deparamos no servio de Deus. Pesa com gravidade mximatambm sobre Jesus, e no significa refutao, mas exatamente confirmao e consumao de suaverdadeira filiao divina.

    Judasprecisaescrever. Como, ento, deve ser entendida a declarao anterior? Ser que, com umvivo desejo, pretendia de fato escrever igreja algo bem diferente, uma carta doutrinria, um tratadosobre nossa salvao comum? Ser que foi interrompido nisso porque foi impulsionado por umanecessidade totalmente diferente? Ou ser que a salvao comum se refere ao contedo da presentecarta, com a carta apenas passando a ter outro objetivo em vista de uma necessidade recebida? Aforma lingstica da frase no nos permite chegar a uma concluso. Judas pode fundamentar aaplicao de todo o empenho no escrito justamente pelo fato de que se tornou cada vez mais ntidapara ele a necessidade que o impelia a escrever. Afinal, cumpre considerar que na primeira parte da

    frase constapoimenos e nopoiesmenos= ou seja: enquanto dedico, e no dedicava, todo oempenho.Trata-se de nossa salvao comum. A salvao = a redeno o mais importante que pode existir

    para ns. Est em jogo nosso futuro eterno. Enfaticamente dito: a nossa salvao conjunta. Logono se trata do interesse particular de um indivduo ou da doutrina peculiar de um grupo ou

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    tendncia. A salvao, a redeno dos humanos diz respeito igualmente a todos. Nisso Judas estcompletamente de acordo com todos os apstolos, assim como com a prpria igreja. Essaconcordncia constitui o fundamento para a boa compreenso entre o autor da carta e osdestinatrios.

    Essa salvao, porm, est ameaada, no por algo de fora, mas algo de dentro da prpria igreja.Por essa razo a igreja precisa ser convocada, exortada, acordada e fortalecida para a luta. Esse oalvo da carta: para vos exortar a lutar pela f, que foi entregue aos santos de uma vez por todas.No pela salvao em si que a igreja tem de lutar. A salvao foi conquistada pelo Filho de Deusquando, ao morrer, fez soar seu grito de vitria Est consumado. Cont udo, trata-se da mensagemda salvao e de sua vigncia, da f que foi entregue aos santos. Nessa formulao evidentementefoi fortemente destacado o aspecto objetivo da f. Somente o contedo da f em si que pode serentregue. Fundamentalmente, agarrar esse contedo, apropriar-se dele e vivenciar a f tm deacontecer dia a dia na vida de cada cristo e na vida crist. Contudo, isso pressupe a existncia docontedo e fundamento da f. Por isso justifica-se plenamente a valorizao do contedo da f e suapreservao e comunicao fiel e correta. Na presente passagem constitui um sinal de que a cartaprecisa ser datada historicamente em um perodo tardio, situando-se em uma poca de estruturaoeclesistica e tradicionalismo. Tambm Paulo chegou a falar da f como um dado consolidadoque veio na hora preestabelecida por Deus (Gl 3.23; Rm 3.21). E tambm ele conhecia a tradio

    lmpida do contedo da f, na qual no h nada para pr nem tirar (1Co 11.23; 15.1- 4). Por quem af nesse sentido entregue aos santos? Inicialmente pelos apstolos. Em ltima anlise, porm, cf. 1Co 11.23o prprio Deus que nos prepara e concede o fundamento e contedo da f. Comooutrora na histria de Israel, Deus agiu agora de forma definitiva no envio messinico de seu Filho.Com validade de uma vez por todas, aconteceu o que ele consumou na cruz para ns, como a cartaaos Hebreus salienta repetidamente. Portanto a f foi entregue aos santos de uma vez por todascomo testemunho dos grandes feitos de Deus.

    Obviamente essa f objetiva precisa ser aceita subjetivamente e preservada. Somente assimobteremos a redeno e nos tornamos santos que pertencem a Deus e atingem a salvao. Essesegurar firme a f passa a ser, em determinadas situaes, uma luta. Porque, segundo a experincia,essa f freqentemente posta de lado no mbito da igreja, e at mesmo negada e rejeitada. Por

    essa razo tambm encontramos em Paulo as grandes epstolas polmicas, sobretudo a carta aosGlatas e a segunda aos Corntios. Em meio carta da alegria, a carta aos Filipenses, conclama-se emFp 3.17-19 com grande seriedade para a luta. Um apelo desses, portanto, tambm se tornounecessrio nas igrejas s quais Judas se dirige.

    4 Porque se infiltraram algumas pessoas que h muito foram de antemo anotadas para estasentena: mpios que pervertem a graa de nosso Deus em devassido e renegam o nicoSoberano e nosso Senhor (ou: nosso exclusivo Soberano e Senhor) Jesus Cristo. Como Judas estprximo de autores como Paulo e Joo! Exatamente como esses apstolos, Judas no cita nomes deadversrios. Ele usa apenas o termo indefinido, mas muito caracterstico tines= alguns ou certas

    pessoas (Lutero traduziu para diversos), que tambm est em 1Co 4.18; 15.12; 2Co 10.2; Gl 1.7.Eles se infiltraram, como tambm Paulo afirma acerca de seus oponentes em Gl 2.4. Evidentementeas pessoas que Judas tem em mente no apresentaram suas novas opinies imediatamente de formaaberta e franca perante a igreja, mas inicialmente se deixaram acolher como irmos autnticos, paraaos poucos granjear influncia e fazer propaganda de suas concepes. Talvez venham em parte daprpria igreja, e vale para eles o que Joo viu em 1Jo 2.13 e Paulo referiu em seu discurso aosancios de feso em At 20.31. A princpio aquilo de que essas pessoas precisam ser acusadas expresso em uma frase fundamental, sumria. Uma clara sentena sobre eles certa: so mpios.Quase todos os tradutores explicam o termo como pessoa sem Deus, mas isso questionvel.Afinal, de modo algum se trata de negadores de Deus. Esto no seio da congregao crist eacreditam at mesmo que conduziro o cristianismo ao auge. Aqui tampouco se tratapredominantemente de teorias e idias, mas de sua vida prtica, de sua devoo, de sua pietas. Aacusao contra sua forma de viver : pervertem a graa de Deus em devassido. No so semDeus, visto que confirmam a seu modo a mensagem da graa de Deus. Ocorreu, porm, da partedeles uma perverso dessa mensagem, algo a que ela, alis, sempre est sujeita. Paulo formulouessa perverso e distoro interpretativa de forma spera em Rm 6.1: Que diremos, pois?Permaneceremos no pecado, para que seja a graa mais abundante? Tambm os apsto los da

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    liberdade em Corinto, com o lema Todas as coisas me so lcitas (1Co 6.12), consideravam que arealizao plena da vida acontece somente pela graa, somente pela f, sem obras, justamenteno fato de que a vida corporal, em especial na esfera sexual, estava entregue ao inteiro dispor do serhumano. De que importava a sublimes pessoas espirituais o que fazia seu corpo transitrio? Quesatisfizesse sua pulso! O mesmo acontece com a devassido, que se remete graa de Deus,pensando dessa forma dar especial destaque a essa livre graa.

    Judas constata com flagrante dureza que todas essas idias representam uma perigosa perversoda graa de nosso Deus. Certamente ele nosso Deus, o Deus que se volta a ns com toda a suamaravilhosa graa. Mas trata-se do Deus real e vivo, do qual Hb 12.29 afirma expressamente quetambm nosso Deus um fogo consumidor. No deixa de ser o Santo, que odeia o pecado, tambmem sua graa. por isso que sua graa no propicia liberdade para o pecado, mas de cididamenteliberdade do pecado.

    Ela realiza isso ao se vincular a Jesus Cristo, que carregou e expiou nosso pecado, e ao nosremeter, assim, igualmente a ele como nosso Senhor. A graa de nosso Deus no nos libera parauma liberdade em que no h um senhor e a conseqente presuno autocrtica, mas nos deixalivres pela entrega ao senhorio de Jesus Cristo. Por isso aqueles que pervertem a graa de Deusrenegam simultaneamente ao nico Soberano e nosso Senhor Jesus Cristo. No constituidiferena significativa se vemos no nico Soberano a Deus, o Pai, distinguindo-o de nosso Senhor

    Jesus Cristo ou se sintetizamos os dois ttulos, designando a Jesus como nosso nico Soberano eSenhor. Em 2Pe 2.1 o termo despotes inequivocamente relacionado a Jesus Cristo. algo quetambm ter de ser ponderado aqui. A essncia se reconhecemos voluntariamente nossasubordinao a esse Soberano e Senhor com gratido ou se a negamos e nos esquivamos dele.

    Novamente no est tanto em questo uma negao intelectual, dogmtica, mas muito mais anegao do senhorio de Jesus na prtica da vida vivenciada.

    Qui Judas, com essa frase, tambm aponte de maneira particular para o gnosticismo, ao definirDeus e Jesus Cristo enfaticamente como nosso nico Soberano. O gnosticismo falava deemanaes divinas, eflvios ou tambm entes divinos intermedirios entre Deus e o mundo. Issoconvinha religiosidade do mundo helenista, que apregoava, atravs de mltiplos cultos e santurios,muitos kyrioi, muitos deuses esenhores, deixando-os valer lado a lado. Por isso possvel que

    tambm os grupos modernos nas igrejas se tenham voltado contra a estreita e unilateralreivindicao de que Deus absoluto da proclamao apostlica, renegando assim o verdadeirodireito de senhorio de Jesus Cristo. Para os novos mestres Jesus Cristo no realmente o Senhorque determina sua vivncia, no configura nem preenche sua existncia. Neles, em sua palavra, obrae modo de agir no se consegue ler exclusivamente Jesus e nada mais.

    Como, porm, esses destruidores da igreja foram h tempo de antemo anotados para essasentena? Vrios comentaristas que defendem que 2Pe foi escrita antes da carta de Judas opinam queJudas esteja recorrendo a 2Pe 2.1 e considere cumprida agora a profecia ameaadora dessa passagem.Outros pensam que ele se refere a exemplos tpicos do pecado e de sua condenao na histria daantiga aliana, como em seguida passar a citar nos v. 5-11. Aqui h muito tempo teria sido anotadade antemo na Bblia a sentena dos atuais falsos mestres. Em funo disso seria chamada essa

    sentena. A rigor, porm, Judas no diz que sentena e juzo foram anotados para os hereges, mas,pelo contrrio, que os prprios hereges h tempo j estariam anotados para a sentena. Tanto noAT como no NT a anteviso divina ilustrada por meio das anotaes em livro. Judas utiliza aquiessa metfora familiar para fortalecer a igreja na luta contra os hereges. No se contrape sozinha eabandonada a essas pessoas. Deus conhece esse pessoal e j os anotouh tempo em seu livro,precisamente para essa sentena.

    TRS EXEMPLOS DE JUZO NO ATJD 5-7

    5Quero, pois, lembrar-vos, embora j estejais cientes de tudo uma vez por todas, que o

    Senhor, tendo libertado um povo, tirando-o da terra do Egito, destruiu, depois, os que nocreram.6E a anjos, os que no guardaram o seu estado original, mas abandonaram o seu prprio

    domiclio, ele tem guardado sob trevas, em algemas eternas, para o juzo do grande dia.

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    7Como Sodoma, e Gomorra, e as cidades circunvizinhas, que, havendo-se entregado prostituio como aqueles, seguindo aps outra carne, so postas para exemplo do fogoeterno, sofrendo punio.

    5 Quero, pois, recordar-vos, que sabeis de tudo de uma vez por todas. Ao pesquisarmos o verbeterecordar, qualquer concordncia nos mostrar a importncia que o lembrar-se tinha j no AT. Arazo disso a revelao de Deus em feitos histricos. deles que vive a f. Por isso ela precisarecordar-se constantemente desses feitos, para tornar a esperar tais realizaes segundo as promessas

    de Deus. Por isso encontramos recordar e lembrar tambm no NT. Na instruo apostlica trata-se muitas vezes de uma recordao de coisas h muito aprendidas e sabidas. Tal recordar importante e necessrio, porque coisas conhecidas e familiares facilmente perdem a influncia sobrens e deixam de ter importncia em nosso ntimo. Membros da igreja, qual Judas escreve, sabemtudo de uma vez por todas, naturalmente no no sentido de quaisquer tipos de conhecimentosgerais, mas o conhecimento de tudo que essencial na proclamao veterotestamentria e apostlica.Entretanto, o que est em jogo que agora apliquem seu conhecimento em uma situao singular, naluta contra tendncias e pessoas desencaminhadoras, usando-o como arma. Por essa razo, comoconsta textualmente, Judas quer que eles se lembrem, para que tudo o que sabido volte ainfluenciar a atualidade.

    do conhecimento bblico que devem se lembrar. Prope-lhes trs histrias bblicas, nas quais setorna explcita toda a seriedade de Deus. Trata-se de sua seriedade diante daqueles que haviam sidoricamente presenteados e agraciados por ele, mas que perverteram essa graa e por isso setornaram alvos de juzo. No ajuda os desencaminhadores que, afinal, tambm eram cristos,viviam na igreja dos santos e experimentaram a graa de Deus. Pelo contrrio, precisamente issotornou sua responsabilidade muito maior e sua culpa muito mais grave.

    O primeiro exemplo disso nitidamente bblico e encontra-se em Nm 14. 20-25. Os destinatriosda carta sabem que o Senhor certamente resgatou o (seu) povo do Egito, mas ento aniquilouaqueles que no creram. Ou seja, mesmo aqueles que experimentaram o ato salvador fundamentalde Deus na antiga aliana, a libertao do Egito, ainda podem perecer no juzo, sem chegar terraprometida. a esse ponto que chega a seriedade de Deus. A f est sempre em jogo. A recordao do

    acontecido naquele tempo devia estimular a igreja a, com empenho mximo, lutar pela f e apegar-se f que lhes foi transmitida (v. 3).6 Segue-se um segundo exemplo: E anjos, que no conservaram sua esfera de domnio, mas

    abandonaram seu prprio domiclio, ele os mantm guardados com correntes eternas sobtrevas para o juzo do grande dia. Isso tem um fundamento bblico na breve narrativa de Gn 6.1-4.Obviamente no depreenderamos sem mais nem menos dessa passagem da Bblia aquilo que Judasafirma. Judas a entende segundo determinada interpretao, conhecida a partir do chamado livro deEnoque.. Havia no judasmo daquela poca grande nmero de escritos edificantes, que se baseavamem personagens ou eventos bblicos para, a partir deles, desenvolver determinados pensamentosreligiosos. No deve ser nenhuma surpresa que tais escritos fossem lidos com simpatia, sendoacolhidos em todo o modo de pensar do judasmo. Afinal, ns tampouco lemos somente a Bblia em

    si, mas possumos uma extensa literatura de edificao. Em todo caso, naquela poca fazia parte daerudio oficial nas Escrituras interpretar significativamente frases e palavras do AT. Passagensobscuras, aluses breves e enigmticas, prestavam-se particularmente a isso. Foi assim que Judastambm enfocou a passagem de Gn 6.1-4 sob a luz da conhecida interpretao do livro de Enoque.Segundo ela, os filhos de deuses em Gn 6 so anjos. So entes particularmente agraciados que tmdomiclio no mundo celestial e aos quais confiada uma esfera de domnio. Mas tambm anjospodem cair, por mais alta que tenha sido sua posio diante de Deus. Esses anjos, portanto, noconservaram sua esfera de domnio e abandonaram seu prprio domiclio. Por qu? A partir dov. 7 a resposta inevitvel : Entregaram-se prostituio e correram atrs de carne alheia. Isso atestado pela prpria Escritura em Gn 6.2. Contudo, enquanto essa passagem bblica usa apenasaluses genricas para falar a respeito de um juzo contra as pessoas daqueles dias, Judas mencionaalgo sobre a gravidade das medidas de Deus contra os anjos culpados, algo que a prpria Bblia norelata. De qualquer modo eles no conservaram o que lhes havia sido confiado pela graa de Deus,mas buscaram sua liberdade. Agora so guardados para isso, a saber, para o juzo do grande dia.Sua sorte corresponde dos cristos renegados, conforme Hb 10.26s. A sentena final e definitiva

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    ser pronunciada por Deus somente no grande dia, mas uma severa punio j teve incio. J agoraesses anjos, que habitavam as alturas do difano cu, encontram-se em correntes eternas, sobtrevas ou embaixo nas trevas. Novamente Judas deseja alertar: to santo Deus que nenhumademonstrao de sua graa nos proteger contra seu juzo quando pervertermos essa graa emdevassido. A igreja jamais poder relevar o pecado que ocorre em seu seio alegando graa deDeus.

    7 O terceiro exemplo, que a igreja evidentemente conhece, mas tem de considerar novamente,

    Sodoma e Gomorra e as cidades circunvizinhas (Gn 18.16-19,23). Obviamente a Bblia no relatauma clemncia especial para essas cidades por parte de Deus, e por isso tampouco mencionadaaqui. Mas poderamos encontr-la em Gn 13.10, assim como no fato de que, afinal, vivia em seumeio um homem que conhecia o Deus vivo. Os pecados de Sodoma tornaram-se proverbiais. Trata-se de uma prostituio particularmente terrvel: os homens de Sodoma corriam atrs de carnealheia, conforme descrito em Gn 19.5-14 e que ainda hoje chamada de sodomia. Agorajazemcomo exemplo. Todo olhar sobre o estranho Mar Morto fazia lembrar a runa de Sodoma e Gomorrapor meio de fogo e enxofre cados do cu. A Bblia na realidade fala somente do fogo histrico deento que destruiu as cidades. Mas fogo do cu, fogo de Deus simultaneamente fogo eterno,sofrido por essas cidades como castigo. Logo no se trata apenas de uma histria sobejamenteconhecida de tempos antigos, mas de um exemplo que a igreja de hoje deve ter diante de si ao correr

    o risco de ser desencaminhada. Na doutrina e prtica da nova tendncia evidentemente a liberdadesexual tinha grande relevncia. Na medida em que se tratava de pessoas gregas, era possvel que atmesmo o erotismo homossexual, amplamente difundido no helenismo, tenha sido consideradoinofensivo e includo nessa liberdade. A igreja, porm, no deve se deixar enganar. Qualquerprostituio, e especialmente correr atrs de carne alheia traz inevitavelmente o castigo do fogoeterno sobre os culpados.

    A CARACTERIZAO DOS SEDUTORESJD 8-16

    8Ora, estes, da mesma sorte, quais sonhadores alucinados, no s contaminam a carne, como

    tambm rejeitam governo e difamam autoridades superiores.9Contudo, o arcanjo Miguel, quando contendia com o diabo e disputava a respeito do corpode Moiss, no se atreveu a proferir juzo infamatrio contra ele; pelo contrrio, disse: OSenhor te repreenda (ou: puna)!

    10Estes, porm, quanto a tudo o que no entendem, difamam; e, quanto a tudo o quecompreendem por instinto natural, como brutos sem razo, at nessas coisas secorrompem.

    11Ai deles! Porque prosseguiram pelo caminho de Caim, e, movidos de ganncia, seprecipitaram no erro de Balao, e pereceram na revolta de Cor.

    12Estes homens so como rochas submersas (ou: como mculas), em vossas festas defraternidade, banqueteando-se juntos sem qualquer recato, pastores que a si mesmos se

    apascentam; nuvens sem gua impelidas pelos ventos; rvores em plena estao dos frutos,destes desprovidas, duplamente mortas, desarraigadas,13ondas bravias do mar, que espumam as suas prprias sujidades; estrelas errantes, para as

    quais tem sido guardada a negrido das trevas, para sempre.14Quanto a estes foi que tambm profetizou Enoque, o stimo depois de Ado, dizendo: Eis

    que veio o Senhor entre suas santas mirades,15para exercer juzo contra todos e para fazer convictos todos os mpios, acerca de todas as

    obras mpias que impiamente praticaram e acerca de todas as (palavras) insolentes quempios pecadores proferiram contra ele.

    16Os tais so murmuradores, so descontentes, andando segundo as suas paixes. A sua bocavive propalando grandes arrogncias; so aduladores dos outros, por motivos interesseiros.

    Aps a breve sentena sumria sobre as pessoas que ameaavam a igreja de dentro dela (v. 4), eaps a meno da seriedade dos juzos de Deus (v. 5-7), Judas passa a fornecer uma descrio dessesdesencaminhadores nos v. 8-16. Tudo o que foi dito at aqui vale para eles, porque agem da mesmamaneira. Neste caso no feita uma exposio de suas doutrinas e opinies. Desde a Reforma temos

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    um interesse unilateral na doutrina, enquanto para Judas e Pauloe no fundo tambm para Joo ePedroimporta a conduta prtica de vida, que obviamente, na maioria das vezes, est estreitamentevinculada a ensinamentos errados. Os versculos sobre os quais nos debruaremos agoradesenvolvem as duas condenaes fundamentais do v. 4.

    8 Da mesma maneira tambm esses sonhadores conspurcam a carne, porm pem de lado asoberania e blasfemam contra glrias. A recordao dos juzos de Deus no passado atual paracertas pessoas na igreja, chamadas por Judas de sonhadoras. A expresso vem de Dt 13.1-6, que

    caracteriza os falsos profetas que colocam seus prprios sonhos no lugar da palavra de Deus. Issoera uma blasfmia que tinha de ser punida com a morte. disso que a igreja deve se lembrar quandoos hereges em seu meio se apresentam com reivindicao proftica, colocando as suas vises esonhos acima da proclamao apostlica. Eles sobrepem seus pensamentos e opinies gnsticos realidade, especialmente seriedade de Deus e de seus juzos. Quem se desvia da sbria nitidez damensagem bblica sempre tambm um sonhador, por maior que seja sua pose de superioridade.

    Essa transgresso contra Deus e sua santa palavra manifesta-se na vida prtica. Enquanto, segundoa mensagem apostlica, a carne merece a morte (Rm 8.13; Gl 5.24), os inovadore s conspurcam acarne e consideram isso sua liberdade e superioridade. Contudo, podem faz-lo unicamente porquepem de lado a soberania. A soberania (kyrites) no singular deve referir-se ao senhorio do nicoque o Senhor (o kyrios) para a igreja: Jesus Cristo. No se importam com ele e suas claras

    instrues e mandamentos. Ambos os aspectos so correlatos quando recorremos a 1Jo 4.2s paraelucidao. Para os gnsticos o Jesus que veio na carne era indiferente, e at mesmo motivo deescndalo. Seu Cristo-Esprito no tinha nada a ver com a carne. Por isso, como pessoasespirituais tambm no era preciso que tivessem cuidados com a carne. Ela poderia sertranqilamente entregue s suas pulses naturais. De qualquer modo, no haveria o que temer daparte de um Messias que no veio na carne.

    Ao mesmo tempo Judas constata: blasfemam contra glrias. No conseguimos identificar oobjeto concreto a que Judas se refere. Seja como for, a frase subseqente sobre Miguel, que no seatreveu a pronunciar um juzo insultante contra o diabo, sugere que as doxai= glrias sejamentendidas como poderes de espritos transcendentes. Talvez grupos gnsticosmuito ao contrrioda sbria convocao de Paulo em Ef 6.10ss imaginassem ter como incumbncia atacar os maus

    poderes espirituais com blasfmias. A frase seguinte de imediato torna essa concepo plausvel.Independentemente de como tenha sido: blasfemar jamais constitui incumbncia de um discpulode Jesus!

    9 Judas constata uma perigosa soberba nesse blasfemar. Que espritos arrogantes so esses, que ousamalgo a que nem mesmo um dos maiores prncipes de anjos se viu autorizado? No entanto, Miguel, oarcanjo, quando, contendendo com o diabo, teve uma discusso com ele acerca do corpo deMoiss, no se atreveu a pronunciar um juzo insultante contra ele, mas declarou:Que oSenhor te repreenda (ou: puna)! Miguel tem de travar a luta vitoriosa contra Satans porincumbncia do Senhor (Ap 12.7-9). Por isso tanto mais significativo que Miguel, na ocasiopassada em que disputava o corpo de Moiss, no se dirigiu ao diabo com uma sentena

    blasfemadora, mas deixou a repreenso totalmente por conta do Senhor, que como repreensodivina possui mxima eficcia (Sl 18.15; 104.7; 106.9) e por isso tambm pode ser traduzido porpunir. Como, ento, seres humanos ousariam blasfemar glrias, ainda que sejam cadas e hostis aDeus?

    Neste ponto novamente se explicita que Judas convivia com interpretaes do AT que ns j noconhecemos, mas que devem ter sido bastante disseminadas e reconhecidas em sua poca. Ainterpretao da igreja antiga aponta aqui para um escrito apcrifo, a Assumptio Mosis [Assuno deMoiss]. Dispomos somente de um fragmento dela, no qual, porm, no consta a passagem a queJudas se refere. A narrativa da Bblia sobre a morte e o sepultamento de Moiss em Dt 34.5s , em si,simples e sbria. Contudo, justamente por sua brevidade, podia dar margem a melhores ilustraes.

    10 Todavia para Judas no est em jogo o evento passado em si. Afinal, preciso enfrentar os hereges

    de agora. Seu blasfemar de glrias parece revelar um conhecimento preciso do mundo invisveltranscendente que supera em muito as parcas aluses da proclamao apostlica. Por isso Judas osacusa: Esses, porm, blasfemam o que no conhecem. Paulo adverte a igreja em Colossos:Ningum se faa rbitro contra vs outros, pretextando humildade e culto dos anjos, baseando -seem vises, enfatuado, sem motivo algum, na sua mente carnal, (Cl 2.18). Assim tambm Judas

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    imputa aos gnsticos que eles adentram reas que na verdade nem sequer conhecem. Nasexperincias dos hereges, aparentemente de esprito to elevado, Paulo via a mentalidade carnal.Da mesma forma Judas constata a notria contradio. As pessoas contra as quais ele adverte comtanta insistncia escalam alturas falsas e concomitantemente vivem uma vida a respeito da qual preciso constatar: no que, porm, entendem de maneira natural como viventes irracionais, nissose corrompem. Tambm animais conhecem a vida sexual com seus prazeres. Contudo, quando o serhumano simplesmente se entrega a pulses a que o animal apenas obedece por fora das slidasordens naturais, ele se corrompe. A associao da liberao da sensualidade ao esplendor deespiritualidade e religiosidade especialmente elevadas tem um poder terrivelmente sedutor. Aquiespritos livres parecem rebelar-se contra a estreiteza e o atraso da vida eclesial apostlica.Como sedutor quando se pode penetrar, por meio de experincias, no mundo dos anjos e ao mesmotempo, de s conscincia, reivindicar para si o direito sexualidade desenfreada! Judas somenteconstata com brevidade e dureza: nisso se corrompem.

    11 No entanto, Judas no se limita a constatar. Acrescenta um lamento que no menos real do queuma bem-aventurana. Ai deles! Porque andam pelo caminho de Caim, e, por causa derecompensa, se entregaram cabalmente ao engano de Balao, e perecem na revolta de Cor! Notexto grego todas essas afirmaes esto no aoristo: andaram e se precipitaram e pereceram.De fato, porm, de forma alguma pereceram. Significam um perigo muito premente para a igreja,

    em cujo seio vivem e exercem grande influncia. A igreja precisa ser conclamada a lutar contra eles.Mas Judas est to convicto de sua causa que ele olha em retrospecto como se o juzo j tivesse sidoexecutado, proferindo a condenao derradeira.

    A sentena de fato j foi proferida, a saber, sobre Caim e Balao e Cor, aos quais os sedutores daigreja se assemelham. Andam pelo caminho de Caim. Obviamente no mataram de fato nenhumirmo da igreja, mas se tornam assassinos de irmos em um sentido muito diverso: seduzem paramaus caminhos, privando os membros da igreja da vida eterna. Arrastam irmos e irms para longeda verdadeira salvao na cruz de Jesus, confundindo sua f por meio de discursos inteligentes esuperiores. Disputas e cises na igreja causam tribulao a muitos. Ou Judas podia opinar como oapstolo Joo: Todo aquele que odeia seu irmo assassino (1Jo 3.15). Os inovadores podiamexpressar livremente seu desprezo e seu dio contra aqueles que lhes resistiam na igreja.

    Tambm na missiva a Prgamo (Ap 2.14) Balao o typos de um falso profeta cuja seduo to perigosa porque a princpio de fato era um homem a quem foram abertos os olhos (Nm 24.3).Que gloriosa verdade ele pronunciou sobre Israel! Mas ento no deseja perder a recompensa, arecompensa tilintante que Balaque lhe oferecera, e por isso ensinou Balaque a seduzir os filhos deIsrael, de modo que estes comeram carne ofertada a dolos e praticaram devassido (Ap 2.14).Judas julga que os hereges se entregaram inteiramente ao engano de Balao por causa derecompensa. Porventura engano deve ser entendido de forma ativa ou passiva? Ser que osdesencaminhadores se deixam enganar como Balao ou agem eles mesmos de forma enganosa eenganadora como ele? Provavelmente esta segunda a idia implcita, visto que tambm Balao agiuexatamente como enganador ardiloso. Deve-se aceitar que com isso se tornam enganadoresenganados, mas o fazem por obsesso. Esse seu aspecto perigoso. O termo grego na realidade diz:

    eles se derramaram para esse engano. Busca expressar a intensidade da entrega de modo tangvel.Nessa atitude vem luz a mesma coisa que aconteceu com Balao: uma vontade escravizada queambiciona a vantagem palpvel e que aparentemente emprega foras celestiais para assegurarvantagens para si (Schlatter).

    Todo o falar e agir dessas pessoas era necessariamente ao mesmo tempo revolta contra a igreja esua direo, por ltimo, porm, contra os apstolos e a proclamao e ordem de vida apostlicas.Mas uma insurgncia assim contra os lderes e sua reivindicao de aceitao j acontecera antes emIsrael. Para Judas no gratuitamente que o texto de Nm 16 conste na Sagrada Escritura. Tampoucoesse captulo uma mera narrativa interessante de uma poca pregressa, mas tpico e,conseqentemente, uma palavra ilustradora e julgadora para a atualidade. A igreja, que atravs dessarevolta ficou consternada e insegura, deve ver com clareza: a revolta de Cor, de forma que noprecisa ficar perplexa. Ela pode conferir na Escritura para onde leva esse tipo de rebeldia. Quem seinsurge com Cor contra a autoridade divina tambm h de perecer com Cor.

    12 Depois dessa condenao Judas torna a caracterizar as pessoas, contra as quais se posiciona. Notrata de suas doutrinas e opinies especficas. Talvez recorde a palavra de seu Senhor acerca dos

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    falsos profetas: Em seus frutos os reconhecereis (Mt 7.15s). Afinal, a igreja pode constatar com osprprios olhos: So eles que em vossas refeies fraternas, como manchas (ou: como recifes) comcomilanas sem pudor, to-somente apascentam a si mesmos.

    Nas igrejas a que Judas escreve os gapes, as refeies fraternas, que haviam surgidoespontaneamente na primeira igreja, ainda eram preservados. Alis, no passado a refeio conjuntano Oriente era, muito mais do que entre ns, expresso de ntima comunho. Em razo disso a crticacontra a comunho de Jesus com os publicanos e pecadores, quando afirmava que ele at mesmocome com eles! possua a mxima contundncia. Em consonncia, a comunho de mesa com seuSenhor estava totalmente inserida na vida dos discpulos. A renovao dessa comunho de mesa apsa Pscoa constituiu um selo especial da ressurreio de seu Senhor e de seu pleno perdo para eles(Lc 24.30s; Jo 21.3-13; At 10.40s). Tambm a instituio da ceia do Senhor na realidade aconteceuno contexto de uma refeio. Por isso, para a primeira igreja era um acontecimento muito natural queeles no apenas estivessem diariamente unnimes no templo, mas que tambm partissem o po decasa em casa e recebessem o alimento com alegria e simplicidade de corao (At 2.46s). Eracomunho de mesa, refeio fraterna, na qual ao mesmo tempo se celebrava a ceia do Senhor. Essecostume provavelmente foi acolhido pelas igrejas. Os novos mestres e seus seguidores, porm,participavam sem pudor nas refeies fraternas. Consideram-se perfeitamente integrados na igreja,na qual desejam conquistar influncia determinante. Contudo, na realidade so manchas ou recifes.

    As duas acepes so possveis para o termo grego que consta aqui. A comunho ntima ao comereme beberem em conjunto tornava imprescindvel uma conduta disciplinada em relao aos outros. Aliberdade, conforme passou a ser propagada agora a partir das novas concepes, levava libertinagem. O singelo comer torna-se comilana, e usufruir ganha tanto destaque que tambmPaulo se v forado a alertar contra isso com expresses duras (Rm 13.13; 14.17; Gl 5.21). Nessaliberdade transpem-se limites necessrios ao convvio. Entra sujeira onde deveria prevalecer umclima lmpido e santificado. Assim esses participantes dos gapes se tornam recifes, nos quais osmembros da igreja podem soobrar, uma vez que com isso os gnsticos obtinham uma oportunidadeespecial para proferir heresias. Tambm aqui podemos perceber a caracterstica bsica que Paulocombate com igual seriedade nos apstolos da liberdade em Corinto: pensam somente em si mesmose no se importam com o irmo (cf. 1Co 8.9-11; Rm 15.1s; 1Co 11.21s). Judas declara isso em

    adeso palavra de juzo de Deus em Ez 34.2,8,10: esto apenas apascentado a si mesmos.Conseqentemente, so nuvens sem gua, impelidas por ventos. Os orientais ansiavam muitopela gua! Pois eis que surgem nuvens; ser que traro a almejada chuva? No, o vento as tange aolargo, no refrigeram os campos sedentos. assim que os novos homens se projetam grandiosamentecomo lderes para novas alturas, mas na verdade no tm nada para realmente presentear igreja erefrescar coraes sedentos. Uma segunda ilustrao descreve a mesma situao: so rvores dofinal do outono sem fruto, duplamente mortas, desenraizadas. No outono esperamos que a rvoreapresente frutos nutritivos. J outono tardio, mas eis que a esto rvores sem fruto. NovamenteJudas recorda palavras de seu Senhor em Mt 7.9,19; 21.18s; Lc 13.6-8. Verdadeiros cristos esto naigreja como rvores frutferas, ainda mais quando se destacam com ensino e liderana. Aquelaspessoas, porm, certamente tinham a aparncia de rvores, sim, no passado de fato devem ter sido

    rvores, mas agora se procura nelas em vo por frutos. Esto duplamente mortas. Haviam sidoresgatadas da morte da existncia natural para a vida; mas agora morreram pela segunda vez,precisamente pelo fato de que esto desenraizadas. J no esto, como Paulo declara aoscolossenses, enraizadas no Senhor Jesus Cristo (Cl 2.7; tambm Ef 3.17). Agora conseguemproduzir to poucos frutos quanto ramos separados da videira.

    13 verdade, tm uma aparncia singularmente viva. Afinal, so muito ativos e querem movimentarmuitas coisas, mas nisso no passam de ondas bravias do mar que espumam suas prpriasignomnias. A mar pode parecer muito vigorosa e eficaz, mas o que ela produz no passa deespuma sem qualquer proveito, e ainda mais espuma que traz lixo para a praia. Um exemplopalpvel aquele homem em Corinto que se casou com a esposa de seu pai, para demonstrar sualiberdade, e do qual provavelmente uma parcela da igreja parece ter-se orgulhado (1Co 5.1s).Manifestaes semelhantes da nova liberdade talvez tambm tenham se tornado conhecidas paraJudas nas igrejas a que dirige sua sria exortao. Sob grande agitao somente vir luz o que infame para o olhar puro.

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    Judas acrescenta mais uma ilustrao: os sedutores so estrelas errantes, para os quais aescurido das trevas est preservada eternamente. Tambm ns conhecemos a designaoestrela (astro) para caracterizar desempenhos especiais. Os representantes da nova orientao

    pensam ser estrelas brilhantes na igreja e qui tenham aplicado particularmente a si mesmos aprofecia de Dn 12.3, de que aqueles que ensinam brilharo como as estrelas sempre e eternamente.Contudo levam ao descaminho, como estrelas que deixaram a trajetria ordenada por Deus. Eenquanto pensam brilhar de forma especial e difundir luz, a escurido das trevas eternamente o lugar de seu fim.

    14s Mais uma vez Judas passa a falar do livro de Enoque, que o impressionara profundamente. O quese lia ali referente ao futuro, ele agora v cumprido na atualidade. Era importante para ele que jEnoque, como o stimo desde Ado, havia prenunciado o juzo. Ou seja, estava estabelecido desde oincio, por isso sua concretizao muito mais infalvel. Entretanto profetizou tambm para esseso stimo desde Ado, Enoque, dizendo: Eis que vem o Senhor com suas mirades, para exercer

    juzo sobre todos os mpios por causa de todas as obras de sua impiedade que praticaramimpiamente. O Senhor que retorna como Juiz universal no vem sozinho. Acompanham-no assantas mirades, poderosos exrcitos de anjos. O juzo no acontece s escondidas e em silncio,mas de forma totalmente pblica. Incontveis seres brilhantes so testemunhas da culpa e davergonha daqueles que agora se portam to grandiosa e arrogantemente diante dos singelos membros

    da igreja. Que impresso terrvel isso ser para todos os que tm de comparecer diante desse juiz!Judas acumula nesta frase a palavra asebs= mpio. Pessoas so julgadas os no-devotosnopor causa de equvocos intelectuais em si, mas por causa de todas as obras de sua impiedade quepraticaram impiamente. Obviamente nosso pensar constitui a fonte de nossos atos, assim comoinversamente nossa atitude prtica na vida tambm deturpa nosso pensamento. Contudo no juzo deDeus esto em questo as obras, as concretizaes, impossveis de serem negadas ou declaradasinofensivas, de sua impiedade e pecaminosidade, pelas quais os atos se deixam determinar. Isso particularmente grave para aqueles que viviam na igreja de Jesus, conheciam a graa de Deus eapesar disso no se deixaram salvar e transformar por ela, mas pervertem a graa de nosso Deus emlibertinagem (v. 4).

    Contudo, das obras tambm fazem parte as palavras, assim como o prprio Jesus atribua a cada

    palavra proferida pelas pessoas uma importncia decisiva para o juzo: Mt 12.36s; Lc 19.22.Conseqentemente, tambm Judas acrescenta: os mpios so julgados por causa de todas as(palavras) duras que proferiram contra ele como mpios pecadores. A dimenso disso no precisaser elucidada, porque os destinatrios da carta j a conhecem. bem possvel que grupos gnsticostenham contraposto cristologia apostlica algumas declaraes sobre Jesus que foram percebidascomo ridculas. Para eles Jesus era um dado irrelevante, com o qual o verdadeiro Cristo-Esprito sehavia ligado apenas transitoriamente. Ou ento j existia entre os novos mestres aquela opinio quemais tarde se desenvolveu de forma mais ampla, p. ex., pelo gnstico Marcio. Segundo ela o Deusdo AT o fazedor deste mundo terrvel e sofrido, a ser completamente rejeitado por todos quereconheceram o verdadeiro Deus do amor em Cristo. Nesse caso pode ser que palavras durastenham sido levantadas contra aquele que para a proclamao apostlica era santo, Criador do

    mundo e Deus de Israel, o mesmo conhecido tambm como o Pai de Jesus Cristo. Por isso para osinovadores os mandamentos que o severo demiurgo ou fazedor dos mundos, como designavampejorativamente a Jav, o Deus de Israel, havia imposto aos humanos como tortura e opresso novaliam nada.

    16 A frase seguinte ainda pode fazer referncia a essa nova orientao frente ao Deus do AT, inclusivese estiver revelando simultaneamente uma nova faceta da natureza das pessoas que pem a igreja emrisco. Esses so murmuradores, zangando-se com sua sorte, andando segundo suas paixes. Seeste mundo com seus sofrimentos e angstias era feitura de um infausto demiurgo, justificava -se

    plenamente a murmurao contra o estado atual da vida. Era lcito zangar-se descontroladamentecom sua sorte e voltar-se indignado contra o construtor deste pior dos mundos. Ao que parece, os

    novos mestres e seus adeptos faziam isso de sobra. Afinal, era algo que o corao do ser humanonatural assimilava facilmente. Mas que perigo havia nisso para a igreja! A murmurao e zangacom Deus foi a forma peculiar com que Israel pecou na travessia do deserto aps sua milagrosalibertao pela vigorosa e misericordiosa mo de Deus (x 16.1-8; Nm 14.26-30; 20.13,24). Aqui semostram incredulidade e ingratido! Ser que a igreja da nova aliana, que experimentou o amor

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    redentor de Deus de forma ainda muito melhor, cair no mesmo pecado? Judas v nitidamente o quefundamenta murmurao e zanga. algo que vem do corao daqueles que andam segundosuas paixes. A configurao deste mundo, com suas carncias, apertos e durezas, coloca limitesintransponveis para nossas paixes. Mas elas so atrapalhadas, acima de tudo pelos mandamentos deDeus. O ser humano est impedido de vivenciar desinibidamente seus desejos, razo pela qual sezanga com sua sorte e xinga a Deus, que seria culpado dessa m sorte. Nesse caso o amor de Deus naentrega do prprio Filho por pessoas perdidas foi completamente esquecido ou desprezado.

    Sua boca profere arrogncias. Novamente surge uma repercusso do livro de Enoque, que dizno cap. 5: E vs injuriastes sua majestade atravs de palavras teimosas e arrogantes vindas devossos lbios impuros. Nos inovadores de fato e com certeza se podia constatar a rejeio propositaldaquela atitude que encontramos em todas as personagens bblicas e que Pedro sintetiza na palavra:Humilhai-vos, pois, sob a poderosa mo de Deus (1Pe 5.6). Abaixo essa miservel humildade esse era o novo lema, semelhante ao que tambm Paulo encontrara em certos grupos de Corinto. Aisso se acrescenta a desenvoltura verbal e a esplndida riqueza de idias, contra o que a proclamaoapostlica podia parecer estreita e precria. Mesmo Paulo teve de ouvir em Corinto que suaapresentao pessoal era fraca e seus discursos no tinham peso (2Co 10.10). Sim, em comparaoaos grandes detentores do Esprito ele parecia carnal a muitos (2Co 10.2). Judas no se deixaconfundir e tambm exorta a igreja a no se deixar impressionar falsamente, mas a reconhecer com

    nitidez: Sua boca profere arrogncias.Mais um aspecto parece ser caracterstico: admiram pessoaspor causa da vantagem. Nainstruo apostlica isso havia sido excludo expressamente (Tg 2.1-4), porque perante Deus noexiste acepo da pessoa (Rm 2.11). Mas evidente, quem anda segundo suas paixes e visavantagem pessoal, cuidar de obter contato com pessoas influentes e abastadas, mostrar a elas suacorrespondente admirao e as bajular. Todo o pensamento e vida gnsticos representavam umaforma de cristianismo que era acolhida com aplauso nos segmentos superiores da populao.Raciocnios espirituais interessantes, sem compromisso, e por isso com a simultnea liberdade paravivenciar as pulses naturais, era ideal para pessoas que alm de seu nvel de vida material tambmdemonstravam certos interesses intelectuais e religiosos. Gostam que os representantes na novatendncia os admirem neste ponto e, em troca, destinam-lhes diversas vantagens.

    Entretanto, talvez a frase tambm aponte para a admirao e o reconhecimento que como costume em grupos sectrios e fanticosso dedicados a personalidades lderes isoladas. Ressoamnomes, e pessoas so celebradas. vantajoso participar disso e alistar-se no grupo de adeptosdessas celebridades. Mas isso constitui exatamente o oposto do que Jesus deu sua igreja como regraessencial: Mt 20.25-27; Jo 13.1-7; Mt 23.8-12.

    CONSELHO E INSTRUO PARA A IGREJAJD 17-23

    17Vs, porm, amados, lembrai-vos das palavras anteriormente proferidas pelos apstolosde nosso Senhor Jesus Cristo,

    18os quais vos diziam: No ltimo tempo, haver escarnecedores, andando segundo as suasmpias paixes.19So estes os que promovem divises (ou: que se separam), sensuais (psquicos), que no

    tm o Esprito.20Vs, porm, amados, edificando-vos na vossa f santssima, orando no Esprito Santo,21guardai-vos no amor de Deus, esperando a misericrdia de nosso Senhor Jesus Cristo,

    para a vida eterna.22E compadecei-vos de alguns que esto na dvida,23salvai-os, arrebatando-os do fogo; quanto a outros, sede tambm compassivos em temor,

    detestando at a roupa contaminada pela carne (ou: E convencei alguns que brigam quebrigam consigo mesmos, os que duvidam. Aos demais salvai, arrancando-os do fogo. Dos

    terceiros compadecei-vos com temor, odiando at mesmo a veste contaminada pela carne).

    Pela reiterao esses nos v. 8-16 Judas caracterizara os perturbadores da igreja com umadescrio rica em ilustraes, mas sem citar nomes. Exclamou seus ais sobre eles e anunciou o

    juzo certo de Deus sobre eles. Porm, o que a igreja deve fazer? Como deve se portar? Em que

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    consiste sua tarefa? dessas questes que a carta passa a tratar com um Vs, porm, amados,depois de j ter resumido, no incio, a tarefa da igreja como luta em prol da f no sentido datradio apostlica (v. 3).

    17 Vs, porm, amados, lembrai-vos das palavras anteriormente proferidas pelos apstolos denosso Senhor Jesus Cristo. A arma mais importante na luta a lembrana consciente, como jvimos no v. 5. Nessa situao em que novas tendncias penetraram na igreja, propagando um novocristianismo, a igreja ajudada no com coisas novas, mas com a recordao daquilo que os

    membros sabem de uma vez por todas (v. 5). Somente renovando o posicionamento em cima doantigo alicerce de f ela ser capaz de uma inequvoca rejeio. Nisso constitui seu slido respaldo,as palavras anteriormente proferidas pelos apstolos de nosso Senhor Jesus Cristo.

    18 Isto acontece de maneira muito peculiar. Certamente podia significar um profundo susto e desnimopara os coraes que a perturbao da vida eclesial viesse no de fora, mas de dentro da prpriaigreja. Afinal, o cristianismo enaltecia a Jesus como libertador do mal, a f como sua justia, aigreja como lugar do Esprito Santo, sua comunho como mtodo pelo qual o ser humano eraconvertido do mal e santificado, e agora o mal aflorava em suas prprias fileiras com tamanha

    perniciosidade (Schlatter, Erluterungen zum NT, p. 78). Ser que diante disso no era preciso ficarperplexo e cair na dvida? No! Porque tudo isso no acontece de forma inesperada, mas foraexpressamente prenunciado na proclamao dos apstolos: No tempo do fim haver

    escarnecedores que andam segundo suas prprias paixes da impiedade. A revelao bblica noentende o tempo como um ciclo contnuo de nascer e morrer, mas como um curso cronolgico emdireo de um alvo e fim. Desde a vinda de Jesus j nos encontramos no tempo do fim. Estecontudo no um tempo de vitrias para o cristianismo, mas conduz ao reino do anticristo. Por isso omal, que sempre existiu na histria da humanidade, se destaca de forma cada vez mais aberta.Escrnios sobre assuntos divinos j puderam ser ouvidos no passado. Agora, porm, osescarnecedores se levantam no seio da igreja de Deus. Nesse caso a expresso escarnecedorpossui maior gravidade que a princpio concebemos hoje. Nas profecias do padecimento de Jesus enos relatos da paixo destaca-se com seriedade o ser escarnecido. Representa a rejeio irnicadaquilo que vem de Deus, com a disposio para tambm expressar essa rejeio de forma brutal.Nesse contexto se destaca mais uma vez o andar segundo as prprias paixes. A expresso

    paixes da impiedade pode se referir a desejos que tm como raiz toda a atitude mpia. Masigualmente pode dizer que aqui se dirigem a muitas coisas (plural!), o que incompatvel com adevoo autntica. A lembrana de tudo isso propicia grande tranqilidade igreja! Essasmanifestaes aterradoras, que ela mesma entendia como expresso de uma devoo especial emoderna, j haviam sido anunciadas pelos apstolos. A partir dessa verdade, como pode ser sensata eclara sua atitude!

    19 Personagens previamente j anunciadas apresentam-se agora na igreja: Esses so os que causamseparao (ou: que se separam), anmicos (psquicos) que no tm o Esprito. A breve frasereveste-se de relevncia decisiva para entendermos corretamente os adversrios. Ignoraramos agravidade da situao e a intensidade das controvrsias se simplesmente considerssemos os novos

    pregadores e seus adeptos como pessoas sem Deus, que vivem em grosseira imoralidade e noquerem saber absolutamente nada da doutrina crist. A igreja certamente teria sabido lidar com taispessoas, porque dificilmente teriam exercido uma influncia sedutora. No, no novo movimento se

    propagava um cristianismo superior, livre, perante o qual pensamento e vida apostlicosforosamente pareciam antiquados, retrgrados, estreitos e precrios. Isso se expressava emdeterminadas palavras de ordem. O novo movimento chamava-se gnosticismo = conhecimento. Oscristos de todos os tipos no passavam de psticos, porque tinham apenaspistis = f. Os novosmestres, porm, traziam conhecimento, sistemas de viso religiosa do mundo, nos quais tudo

    parecia explicado, todo enigma solucionado, e tudo imerso em uma radiante luz. Como tudo issoera interessante! Diante disso, o que representava a proclamao que somente remetia f e no sedesprendia do tema perdio e redeno?

    Ainda se causava uma separao de outra maneira. Distinguiam-se trs classes de pessoas. Amaioria hlica, ou seja, aqueles que se dissolvem totalmente na hyle= matria, sero tomadospela perdio. Depois havia um nvel superior: os psquicos, que no se deixam determinar pelamatria, mas pelapsych= alma. Por isso j apresentam certa forma de cristianismo, emboraalcancem apenas estgios inferiores da bem-aventurana. Fazem parte deste nvel os cristos de todos

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    os tipos, os psticos, e so simultaneamente psquicos. Muito acima deles esto aqueles daterceira e principal categoria: os pneumticos, as pessoas repletas dopneuma= Esprito. Osnovos mestres e os que aderiam a eles se orgulhavam pelo fato de supostamente viverem sob overdadeiro Cristo a partir do Esprito. Sentiam-se livres de toda a moral estreita, livres da lei doDeus dos judeus, assim chamados filhos livres do Pai, que podiam ceder s pulses da vidatransitria sem que isso os atingisse nas alturas de sua vida espiritual. Porventura no seria sedutordeixar-se chamar para uma vida assim? No era esse o cristianismo de que o mundo modernoprecisava?

    Na seqncia Judas comete uma grande ousadia: inverte totalmente esse universo de concepes!Precisamente os adeptos do novo cristianismo so na verdade anmicos (psquicos) que no tm oEsprito! Isso se evidencia na separao que causam entre as pessoas. Para eles Zaqueu e a grande

    pecadora teriam sido hlicos, com os quais no valia a pena se preocupar. Ao menosprezar ossingelos crentes, introduziam uma ruptura na igreja, ignorando assim a obra mais importante doEsprito Santo, que consiste em despertar e aprofundar a f e em reunir a igreja dos fiis em amvelunidade e concrdia. Que contradio com o Esprito de Deus que os pneumticos se coloquemcom tamanha arrogncia acima dos demais, enquanto o fruto do Esprito na verdade amor ehumildade! Soberbos detentores do Esprito, que ao mesmo tempo reclamam para si uma liberdadedesregrada, evidenciam-se assim como psquicos, como pessoas que so determinadas somente

    pelas pulses psquicas naturais de influncia e prazer, por mais que o prazer consista de umaplenitude de pensamentos e sentimentos religiosos. Sim, so psquicos e religiosos, contudocarecem do Esprito!

    20s Novamente Judas se dirige igreja, mostrando-lhe agora, de forma positiva, o caminho que eladeve seguir apesar de sua consternao. Vs, porm, amados, edificando-vos na vossa fsantssima, orando no Esprito Santo, guardai-vos no amor de Deus, esperando a misericrdiade nosso Senhor Jesus Cristo, para a vida eterna. Isso representa um contraste claro contra tudo oque os adeptos da nova tendncia dizem e praticam em sua vida. A igreja no deve separar edilacerar, mas edificar. A metfora muito usual no NT, da construo, tudo, menos edificante,mas tem um sentido ainda bem original e singelo da palavra. A edificao da igreja deve avanar

    pelo encaixe de uma pedra viva na outra. O alicerce, porm, sobre o qual se constri, o nico sobre

    o qual se pode edificar, a f menosprezada pelos modernos. O fato de Judas defini-la aquicomo vossa f santssimano um sinal de tradicionalismo e ortodoxia, embora o contedoobjetivo da f esteja em primeiro plano. O que os novos mestres desprezam e consideram no mximoum estgio inferior, precisamente isso constitui o verdadeiro fundamento, ddiva de Deus porintermdio de sua revelao e, portanto, santssimo, intocvel. A igreja deve defender essefundamento e basear-se nele com toda alegria e convico.

    Ao mesmo tempo a metfora do edificar aponta para o fato de que o contraste com o novomovimento no significa estagnao nem mero repouso sobre a f de uma vez por todas entregueaos santos (v. 3). Edificar no repouso e contemplao, mas constante progresso no empenho eno trabalho. A igreja no local de visitas, mas de obras.

    Em que, porm, consiste seu servio essencial nessa construo? Na circunstncia de que os

    membros da igreja estejam orando no Esprito Santo, cuja atuao no se mostra em coisasexcntricas nem em acontecimentos chamativos. Por meio de Zacarias Deus havia prometido:Derramarei o Esprito da graa e da orao (Zc 12.10). Orar pode parecer insignificante e noobstante a ao mais importante e sublime que um ser humano pode realizar na face desta terra.Porm unicamente no Esprito Santo que se pode orar verdadeiramente. Igrejas, casas,organizaes e tambm cristos individualmente, nos quais a orao ocupa o centro da vida, mostramcom isso que esto cheios do Esprito.

    21 Guardai-vos no amor de Deus. No v. 1 Judas interpelou os membros da igreja como amados deDeus Pai. A nova tendncia, por sua vez, exaltava o conhecimento, referindo -se a uma srie denovos e audaciosos raciocnios sobre Deus e o mundo. Judas encoraja os membros da igreja a

    considerar a magnitude muito diversa do que possuem. Experimentaram o amor de Deus, assimcomo ele se revelou de forma extraordinria no sacrifcio do Filho de Deus por pessoas perdidas.Essa experincia infinitamente mais que toda a gnose. isso que a igreja precisa preservar, nodevendo deixar-se confundir pela soberba exaltao dos novos mestres. Como a vida e a condutaseriam diferentes se eles fossem vencidos pelo amor de Deus, a ponto de poderem tambm amar! O

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    amor de Deus, porm, no um conhecimento que simplesmente pudesse ser possudo comooutros conhecimentos e idias. Ele uma torrente de vida do corao de Deus, na qual temos depreservar-nos a ns mesmos. Quem se entrega a especulaes sobre Deus distancia-se dessatorrente de vida. A construo da frase no grego, com os trs gerndios edificando, orando,esperando, aponta para a circunstncia de que guardar-se no amor de Deus, para o que Judasconvoca a igreja, acontece precisamente nessas trs atividades. Judas evidencia assim que ele pensade forma evanglica e no legalista. O amor de Deus, propiciado da parte de Deus, o quedecide. Permanecer nele - disso que tudo depende. Contudo perseveramos nele quandoconstruirmos nossa vida sobre o alicerce sagrado da f, quando orarmos no Esprito Santo e quandoaguardarmos com esperana genuna a parusia do Senhor.

    Ao mesmo tempo Judas sabe que a vida crist agora apenas um comeo, algo parcial, comodiz Paulo em 1Co 13. Por isso a esperana viva pela parusia faz parte da tarefa da igreja. Tambmisso contraria a nova tendncia, que facilmente se esvaa na exaltao de alturas alcanadas.Esperando pela misericrdia de nosso Senhor Jesus Cristo para a vida eterna. J no v. 2 amisericrdia era a primeira coisa que Judas assegurara aos ouvintes da carta. Agora a misericrdiade nosso Senhor Jesus Cristo citada como aquilo pelo que a igreja espera. Mas exatamente essa a atitude de todo o NT. Tudo j est presente nos alicerces, e no obstante ainda est nossa frente.Conseguimos realmente esperar ardentemente pela misericrdia porque j a degustamos.

    Entretanto a formulao dessa frase muito notria tambm por um segundo aspecto. Judas faloumuito dos juzos de Deus. Ser que agora ele no deveria exortar tambm: Aguardai com temor etremor o Juiz universal? No, a igreja, que se encontra em meio a tanta aflio e tribulao e queprecisa lutar em prol da f, pode aguardar seu Senhor com alegre esperana. Sua misericrdia,demonstrada na cruz e comprovada pela redeno experimentada pelos crentes, consumar sua obracom a nova vinda de Jesus e conduzir vida eterna os que esperam por ele. Por ora ainda fazemparte da vida da igreja incompletude, imperfeio, muita aflio e luta. Porm justamente por isso ela um grupo que espera com toda a seriedade e que aspira pela graa de seu Senhor, que a tudoconsumar.

    22s Ser, no entanto, que Judas no tem nada a dizer igreja sobre seu comportamento diante dosadeptos da nova tendncia, que ainda convivem com suas fileiras, at mesmo participam de seus

    gapes e de forma alguma pensam em desligar-se da igreja? Uma palavra a esse respeito eraindispensvel, sendo, pois, acrescentada nos v. 22s. O entendimento correto desses versculos dificultado por variaes na traduo dos manuscritos. base da edio grega de Nestle pode-sedelimitar seu contedo em dois segmentos. Contudo, tambm possvel que Judas tenha distinguidotrs grupos de inovadores, recomendando, consistentemente, trs tipos de atitudes igreja.

    De alguns que esto em conflito consigo mesmos, compadecei-vos. Nessa acepo da frase aidia seria de que h membros da igreja em conflito ntimo, ainda indecisos sobre a quem devemseguir. Para eles deve valer a compaixo da igreja. No devemos interpretar de forma equivocada asduras frases, speras expresses e ameaas de juzo por parte de Judas. Justamente por ser to grave o

    juzo de Deus, a misericrdia tambm pode ser to grande em pessoas que vivem de forma exclusivapela compaixo redentora de Deus. Essa compaixo obviamente no consiste em desprezar a

    importncia, mas somente na salvao decidida e interveniente: Salvai-os, arrebatando-os dofogo! Pode ser que Judas tenha lembrado o fogo do juzo divino. Mas tambm pode ser umametfora genrica da salvao necessria, urgente e no isenta de riscos, como quando se arrancaalgum de uma casa em chamas.

    Todavia, no h certeza de que o termo grego diakrinomai aqui deva significar: estar em conflitoconsigo mesmo, ou seja, duvidar ou estar indeciso. Tambm pode simplesmente ter o sentido debrigar. Ento se trataria de adeptos da nova tendncia que ainda se encontram discutindo commembros da igreja. Em lugar de compadecei-vos preferiramos neste caso a variante, igualmentebem documentada, argi-os. Ento o primeiro destes trs grupos ficaria conhecido por meio dessabreve frase, e a igreja estaria sendo encorajada a tentar, a partir de seu claro alicerce de f, com vistasao amor redentor de Deus, a argio dos errantes e discutidores. A exortao de argir tambmcaberia no caso de que tenhamos de imaginar esse primeiro grupo como os indecisos, em conflitoconsigo mesmos.

    O v. 23 iniciaria um segundo grupo se acompanhssemos a subdiviso em trs segmentos: Aosoutros salvai, arrebatando-os do fogo. Nesse caso, nada muito especfico estaria sendo dito sobre