PAULO BRETAS VILARINHO JUNIOR
A FORMAO DA CLASSE OPERRIA NA ERA DA
EMPREGABILIDADE: AS EXPERINCIAS DO COLGIO
METALRGICO RJ
(A FORMAO PROFISSIONAL EM TEMPOS DE
NEOLIBERALISMO, NOVA LDB E REESTRUTURAO
PRODUTIVA)
Dissertao apresentada ao Mestrado
em Educao da Universidade Federal
Fluminense, como requisito parcial para
obteno do ttulo de Mestre em Educao.
ORIENTADOR: PROF. DRA. SONIA MARIA RUMMERT
Niteri
2004
2
PAULO BRETAS VILARINHO JUNIOR
A FORMAO DA CLASSE OPERRIA NA ERA DA
EMPREGABILIDADE: AS EXPERINCIAS DO COLGIO
METALRGICO RJ
(A FORMAO PROFISSIONAL EM TEMPOS DE
NEOLIBERALISMO, NOVA LDB E REESTRUTURAO
PRODUTIVA)
Dissertao apresentada ao Mestrado em Educao
da Universidade Federal Fluminense, como requisito
parcial para obteno do ttulo de Mestre em Educao.
Aprovada em 01/03/2004
Banca Examinadora
______________________________________________________________
Prof. Dra. Sonia Maria Rummert Orientadora
_____________________________________________________________
Prof. Dr. Gaudncio Frigotto - UFF
_____________________________________________________________
Prof. Dr. Paulo Srgio Tumolo - UFSC
Niteri
2004
3
Ao Movimento Popular e Sindical
do Rio de Janeiro e do Brasil,
em especial ao Movimento Estudantil, onde tudo comeou,
que me ensinou que o mundo redondo,
mas no o meu umbigo.
4
O conhecimento dialtico da realidade
no deixa intactos os conceitos no ulterior caminho do conhecer;
no uma sistematizao dos conceitos que procede por soma,
sistematizao essa fundada sbre uma base imutvel
e encontrada uma vez por tdas:
um processo em espiral de mtua compenetrao e elucidao dos conceitos,
no qual a abstratividade (unilateralidade e isolamento)
dos aspectos superada em uma correlao dialtica,
quantitativo-qualitativa, regressivo-progressiva.
A compreenso dialtica da totalidade
significa no s que as partes se encontram em relao
de interna interao e conexo entre si e com o todo,
mas tambm que o todo no pode ser petrificado
na abstrao situada por cima das partes,
visto que o todo se cria a si mesmo na interao das partes.
Karel Kosik Dialtica do Concreto
5
AGRADECIMENTOS
Encaminho meus agradecimentos a todos, e a cada um que, direta ou indiretamente se
envolveram na construo desta Dissertao. E em especial:
minha me, a quem devo as possibilidades que me permitiram vir a ser tudo que sou;
minha esposa Rita: amor-companheira-camarada, pelo carinho, apoio e pacincia;
minha filha Helena, pelas horas roubadas ao seu convvio;
Professora Sonia Maria Rummert, minha orientadora, por suas crticas e orientaes,
todas de grande valor e por ter sobrevivido ao meu ritmo pessoal/poltico/sindical, nem
sempre adequado ao necessrios prazos acadmicos;
Aos Professores Gaudncio Frigotto e Paulo Srgio Tumolo, por participarem da banca
examinadora, contribuindo para as reformulaes necessrias;
Aos professores e alunos do Curso de Mestrado, pela colaborao e discusso de muitas
das idias aqui contidas, em especial a minha turma: Adriane, Alexandre, Antnio, Carla,
Ceclia, Helder e Luciane;
Ao Colgio Metalrgico Elpdio Evaristo dos Santos, seus funcionrios, professores e
alunos, por ser meu campo de pesquisa, mas fundamentalmente por ser mais um dos meus
campos de experincia ... de vida;
Ao Sindicato dos Metalrgicos do Rio de Janeiro, seus Diretores, em especial aos
camaradas da Corrente Sindical Classista, pelo acolhimento e confiana com que
forneceram os dados solicitados, inclusive o manuseio de fontes histricas do Sindicato, e
participaram das entrevistas, todos de fundamental importncia. Suas vozes ajudaram a
reconstruir esse perodo da histria. Portanto, agradeo a vocs pela co-autoria;
6
Lia Tiriba e Marcos Antnio Ribeiro da Costa, que antes de mim, trilharam esse
caminho, deixando pegadas a serem seguidas;
Editora Anita Garibaldi, por publicar as revistas Princpios e Debate Sindical, fontes
bibliogrficas imprescindveis construo da anlise da realidade;
Meus sinceros agradecimentos.
7
Resumo
O objetivo desta Dissertao analisar o funcionamento atual do Colgio
Metalrgico Elpdio Evaristo dos Santos (CMEES). Os procedimentos metodolgicos
utilizados articularam trs movimentos simultneos que possibilitaram uma maior
apreenso da totalidade estudada: A - Reviso de literatura visando estruturar uma base de
anlise da realidade atual, nas suas dimenses conjunturais e estruturais, abordando os
seguintes temas: Globalizao e neoliberalismo; Papel do Banco Mundial na definio
das polticas educacionais no Brasil; Nova LDB e a Educao Profissional e, o Decreto
2.208/97; A terceira revoluo industrial e a reestruturao produtiva e gerencial; Os
desafios do Movimento Sindical nos anos neoliberais; Os condicionantes histricos das
mudanas de rumo do Movimento Sindical na dcada de 1990; A diminuio da indstria
no Rio de Janeiro; A nova direo do Sindicato dos Metalrgicos do Rio de Janeiro;
Conceituao do Colgio Metalrgico Elpdio Evaristo dos Santos: histrico, Proposta
Pedaggica, situao atual. B - Levantamento de fontes primrias acerca do tema no
acervo do Sindicato: programa das chapas eleitas, resolues dos congressos da categoria,
jornais e boletins. C - Realizao de entrevistas semi-estruturadas com a Equipe Tcnico-
Pedaggica, funcionrios, professores do CMEES e Diretores do Sindicato dos
Metalrgicos do perodo 1996-2002, a fim de obter mais dados sobre a poltica
implementada pelas Diretorias no perodo e levantamento atravs de questionrios, com
alunos que j exercem funes tcnicas na sua prtica cotidiana de trabalho, visando
conhecer a percepo acerca da relao teoria-prtica dos contedos ministrados no
Colgio. Conclu que as polticas implementadas pelas Diretorias do Sindicato no perodo
1996-2002 no contriburam para o esvaziamento do CMEES, muito pelo contrrio. As
entrevistas foram unnimes em revelar que, em que pesem as deficincias no processo,
sem o apoio dado at aqui pelo Sindicato, o CMEES provavelmente j teria sido fechado.
O quadro atual de crise fruto da combinao dos vrios condicionantes estudados ao
longo deste trabalho.
8
Abstract
The objective of this Dissertation is to analyze current functioning of the
Colgio Metalrgico Elpdio Evaristo dos Santos (CMEES). The used methodological
procedures had articulated three simultaneous movements that make possible a bigger
apprehension of the studied totality: A - Revision of literature aiming at to structuralize a
base of analysis of the current reality, in its conjunctural and structural dimensions,
approaching the following subjects: Globalization e neoliberalism; Responsability of the
World Bank in the definition of the educational politics in Brazil; New LDB and the
Professional Education and Decree 2.208/97; The third industrial revolution and the
productive and managemental reorganization; The challenges of the Syndical Movement in
the neoliberalist years; The historical conditions of the changes of route of the Syndical
Movement in the decade of 1990; The reduction of the industry in Rio de Janeiro; The new
direction of the Union of the Metallurgist of Rio de Janeiro; Conceptualization of the
Colgio Metalrgico Elpdio Evaristo dos Santos: pedagogical description, proposal,
current situation. B - Survey of primary sources concerning the subject in the quantity of
the Union: program of elect plates, resolutions of the congresses of the category,
periodicals and bulletins. C - Accomplishment of interviews half-structuralized with the
Technical-Pedagogical Team, employees, professors of the CMEES and directors of the
union of the Metallurgist of period 1996-2002, in order to get more given on the politics
implemented for the Directions in the period and survey through questionnaires, with
students who already exert functions techniques in daily practical its of work, aiming at to
know its perception concerning the theory-practical relation of the contents given in the
CMEES. I conclude quite to the contrary that the politics implemented for the directions of
the Union in period 1996-2002 had not contributed for the emptiness of the CMEES. The
interviews had been unanimous in disclosing that, where they weigh the deficiencies in the
process, without the support given until here for the Union, the CMEES probably already
would have been closed. The current crisis is caused by the combination of the some
conditions studied to the long one of this Dissertation.
9
SUMRIO
LISTA DE TABELAS........................................................................................................12
LISTA DAS SIGLAS UTILIZADAS...............................................................................13
INTRODUO..................................................................................................................20
1 - SITUANDO O NOSSO RIO: AS MARGENS QUE NOS OPRIMEM...................32
1.1 - A IDEOLOGIA DA GLOBALIZAO.............................................................34
1.1.1 - A Esfinge Moderna...................................................................................................34
1.1.2 - Neoliberalismo: De Teoria Marginal Poltica Marginalizadora.............................42
1.2 - BANCO MUNDIAL: ESPECIALISTA EM EDUCAO?!?!?!?!?!...................48
1.2.1 - De Mecenas a Cavalo de Tria.................................................................................49
1.2.2 - E o Brasil Fez o Seu Dever de Casa..........................................................................55
1.3 - NOVA LDB E A EDUCAO PROFISSIONAL..................................................58
1.3.1 - Pequeno Histrico da Educao Profissional no Brasil............................................59
1.3.2 - Nova LDB: Da Luta Popular ao Golpe Palaciano....................................................64
1.3.3 - Decreto 2.208: Da Educao Profissional Certificao.........................................67
1.4 - TERCEIRA REVOLUO INDUSTRIAL E REESTRUTURAO
PRODUTIVA......................................................................................................................74
1.4.1 - O Que Fazer e Como Fazer: Dois Movimentos que se Interpenetram.....................76
1.4.2 - Taylor e o Homem Boi..............................................................................................80
1.4.3 - Ascenso e Queda do Fordismo................................................................................83
1.4.4 - E Tudo Comeou Com Uma Vlvula ... ..................................................................93
1.4.5 - Vamos Vestir a Camisa da Empresa... Mas Quem vai Vestir a Nossa?.................101
1.4.6 - Dialogando Com a Realidade. Ou Penso, Logo Resisto!.......................................112
10
2 - O MOVIMENTO SINDICAL NAVEGANDO EM CORREDEIRAS..................122
2.1 OS DESAFIOS DO MOVIMENTO SINDICAL NOS ANOS
NEOLIBERAIS................................................................................................................125
2.2 MUDANAS DE RUMO.......................................................................................139
2.2.1 - Imperialismo e Aristocracia Operria.....................................................................145
2.2.2 - Um Breve Fio de Histria.......................................................................................149
2.2.3 - A Social-Democracia Tardia...................................................................................154
2.3 DIMINUIO DA INDSTRIA NO RIO DE JANEIRO..................................160
2.4 NOVA DIREO NO SINDICATO DOS METALRGICOS.........................166
3 - O COLGIO METALRGICO ELPDIO EVARISTO DOS SANTOS.............173
3.1 - HISTRICO DO COLGIO METALRGICO.................................................173
3.2 - PROPOSTA PEDAGGICA.................................................................................185
3.2.1 Justificativa.............................................................................................................185
3.2.2 Fundamentando os Objetivos.................................................................................187
3.2.2.1 Objetivo Geral.....................................................................................................187
3.2.2.2 Objetivos Especficos..........................................................................................188
3.2.3 Fundamentao da Proposta...................................................................................189
3.2.3.1 Uma Educao Democrtica...............................................................................189
3.2.3.2 Uma Formao Geral..........................................................................................191
3.2.3.3 - Uma Construo Social do Conhecimento..........................................................191
3.2.4 Linha Crtico-Social dos Contedos.......................................................................193
3.2.4.1 Caractersticas Bsicas........................................................................................193
3.2.4.2 Relao Aluno-Professor.....................................................................................193
3.2.4.3 Relao Ensino-Aprendizagem...........................................................................194
11
3.2.5 Orientaes, de Acordo com a Proposta Pedaggica Para.....................................194
3.2.5.1 O Planejamento...................................................................................................194
3.2.5.2 O Plano de Ensino...............................................................................................195
3.2.5.3 A Avaliao.........................................................................................................195
3.3 - ENTRE O DISCURSO E A PRTICA.................................................................197
3.3.1 - Caractersticas do Colgio......................................................................................198
3.3.2 - Integrao Entre o Colgio e o Sindicato................................................................206
3.3.3 - As Polticas Implementadas Pelas Gestes 1996-2002 e a Crise do CMEES........211
3.3.4 - Perspectivas Sobre o Futuro do CMEES................................................................214
CONCLUSO..................................................................................................................217
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS...........................................................................224
12
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Tabela 1 Presidentes, Tesoureiros e Diretores/Secretrios de Formao do
Sindicato dos Metalrgicos do Rio de Janeiro no perodo 1996-2002.........26
Tabela 2 Esquema das trs revolues industriais do capitalismo..............................73
Tabela 3 Taxas de Desemprego Aberto no Brasil, no Estado do Rio e na Indstria no
Estado do Rio 1996-2002........................................................................150
Tabela 4 Total de Admisses e Desligamentos na Regio Metropolitana do Rio de
Janeiro 1997-2002 - Grande Setor de Atividade Econmica segundo o
IBGE (6 categorias) Indstria..................................................................152
Tabela 5 Total de Admisses e Desligamentos na Regio Metropolitana do Rio de
Janeiro 1997-2002 - Sub-setor de Atividade Econmica segundo o IBGE
(26 categorias) Indstria Metalrgica......................................................152
Tabela 6 Total de Admisses e Desligamentos na Regio Metropolitana do Rio de
Janeiro 1997-2002 - Sub-setor de Atividade Econmica segundo o IBGE
(26 categorias) Indstria Mecnica..........................................................153
Tabela 7 Total de Admisses e Desligamentos na Regio Metropolitana do Rio de
Janeiro 1997-2002 - Sub-setor de Atividade Econmica segundo o IBGE
(26 categorias) Material Eltrico e Comunicaes..................................153
Tabela 8 Taxa de crescimento anual da indstria extrativa mineral e de
transformao, segundo as classes e gneros - Estado do Rio de Janeiro -
1996-2001...................................................................................................154
Tabela 9 Indicadores conjunturais da indstria, segundo as classes e gneros
Pessoal ocupado na produo - Estado do Rio de Janeiro - 1997-2000.....154
Tabela 10 Estabelecimentos industriais, por classes - Indstria de transformao -
Segundo as Regies de Governo e municpios - Estado do Rio de Janeiro -
1998-2000...................................................................................................155
Tabela 11 Distribuio das turmas do CMEES conforme o turno, o curso e a
modalidade de ensino - 1999......................................................................172
13
LISTA DAS SIGLAS MENCIONADAS
5S Cdigo comportamental baseado em cinco palavras japonesas que
comeam com a letra S: Seiri Organizao; Seiton Arrumao;
Seiso Limpeza; Seiketsu Sade e Higiene; Shitsuke
Autodisciplina
ABC/ABCD Regio do Estado de So Paulo que compreende os municpios de
Santo Andr, So Bernardo do Campo, So Caetano e Diadema
AC Acre
ACO Ao Operria Catlica
AEPET Associao dos Engenheiros da Petrobrs
AFL-CIO American Federation of Labor - Congress of Industrial
Unions/Federao Sindical Americana - Congresso de Organizaes
Industriais
AGIN Agncia de Garantia de Investimentos
AI Ato Institucional
AID Associao Internacional de Desenvolvimento
ANPEd Associao Nacional de Ps-Graduao e Pesquisa em Educao
ANPUR Associao Nacional de Ps-Graduao e Pesquisa em Planejamento
Urbano e Regional
AP Ao Popular
AP-ML Ao Popular Marxista-Leninista do Brasil
ArtSind Articulao Sindical
BA Bahia
BID Banco Interamericano de Desenvolvimento
BIRD Banco Internacional para a Reconstruo e o Desenvolvimento
BM Banco Mundial
BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social
BRADESCO Banco Brasileiro de Descontos S. A.
CAD/CAM Computer Aided Design/Computer Aided Manufacturing Projeto
Assistido por Computador/Manufatura Assistida por Computador
CAGED Cadastro Geral de Empregados e Desempregados
14
CAPINA Cooperao e Apoio a Projetos de Inspirao Alternativa
CATs Comunicaes de Acidentes de Trabalho
CBE Conferncia Brasileira de Educao
CCQ Crculos de Controle da Qualidade
CD ROM Compact Disc Read Only Memory/Disco Compacto Somente de
Leitura
CDAPH-IFAN Centro de Documentao e Apoio Pesquisa em Histria da
Educao Instituto Franciscano de Antropologia da Universidade
So Francisco
CE Cear
CEB Cmara de Educao Bsica do Conselho Nacional de Educao
CEDAE Companhia Estadual de guas e Esgotos do Rio de Janeiro
CEDES Centro de Estudos Educao e Sociedade
CEDI-NETS Ncleo de Estudos sobre Trabalho e Sociedade do Centro
Ecumnico de Documentao e Informao
CEFET/RJ Centro Federal de Educao Tecnolgica Celso Suckow da Fonseca
CEFETs Centros Federais de Educao Tecnolgica
CEHOG Centro de Estudos Honestino Guimares
CES Centro de Estudos Sindicais
CESIT Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da
UNICAMP
CFI Corporao Financeira Internacional
CGT Confederao Geral dos Trabalhadores
CIDE Centro de Informaes e Dados do Rio de Janeiro
CIOSL Confederao Internacional de Organizaes Sindicais Livres
CIPA Comisso Interna de Preveno de Acidentes
CIRD Centro Internacional Para a Resoluo de Disputas sobre
Investimentos
CLACSO Conselho Latino Americano de Cincias Sociais
CLPs Controladores Lgicos Programveis
CLT Consolidao das Leis do Trabalho
CMEES Colgio Metalrgico Elpdio Evaristo dos Santos
15
CNC Comando Numrico Computadorizado
CNE Conselho Nacional de Educao
CNEC Campanha Nacional de Escolas da Comunidade
CNI Confederao Nacional da Indstria
CNM/CUT Confederao Nacional dos Metalrgicos da CUT
COMLURB Companhia Municipal de Limpeza Urbana do Rio de Janeiro
CONCUT Congresso Nacional da Central nica dos Trabalhadores
COPPE/UFRJ Instituto Alberto Luiz Coimbra de Ps-Graduao e Pesquisa em
Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro
CQI Continuous Quality Improvement/Melhoria Contnua da Qualidade
CRP-05 Conselho Regional de Psicologia - 5 Regio
CSC Corrente Sindical Classista
CUT Central nica dos Trabalhadores
CVRD Companhia Vale do Rio Doce
DECEC Departamento de Capitais Estrangeiros e Cmbio do Banco Central
do Brasil
DES Departamento de Emprego e Salrio do Ministrio do Trabalho e
Emprego
DF Distrito Federal
DIEESE Departamento Intersindical de Estatsticas e Estudos Scio-
Econmicos
DIFEL Difuso Editorial S. A.
DORT Distrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho
Ed. Editora
EdUFF Editora da Universidade Federal Fluminense
EISA Estaleiro Ilha S. A.
EJA Educao de Jovens e Adultos
EMBRAER Empresa Brasileira de Aeronutica S. A.
ENIAC Eletronic Numeric Integrator And Calculator
ETP Equipe Tcnico-Pedaggica
EUA Estados Unidos da Amrica
FAETEC Fundao de Apoio Escola Tcnica do Estado do Rio de Janeiro
16
FAPERJ Fundao Carlos Chagas Filho de Amparo Pesquisa do Estado do
Rio de Janeiro
FAPESP Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de So Paulo
FASE Federao de rgos Para Assistncia Social e Educacional
FAT Fundo de Amparo ao Trabalhador
FENAPSI Federao Nacional dos Psiclogos
FGV Fundao Getlio Vargas
FHC Fernando Henrique Cardoso
FIAT Fabbrica Italiana Automobili Torino
FIRJAN Federao das Indstrias do Estado do Rio de Janeiro
FMI Fundo Monetrio Internacional
FNDE Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educao
FNT Frente Nacional do Trabalho
FS Central Fora Sindical
G-8 Grupo dos sete pases capitalistas mais desenvolvidos do mundo
(Alemanha, Canad, EUA, Frana, Inglaterra, Itlia, Japo) mais a
Rssia
HSBC Hong Kong and Shangai Banking Corporation
IBASE Instituto Brasileiro de Anlises Sociais e Econmicas
IBGE Fundao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
INAE Instituto Nacional de Altos Estudos
INPC ndice Nacional de Preos ao Consumidor
INSS Instituto Nacional do Seguro Social
IPA/OG ndice de Preos por Atacado/Oferta Global
ISHIBRS Ishikwajima do Brasil Estaleiro S. A.
JOC Juventude Operria Catlica
JUC Juventude Universitria Catlica
LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional
LER Leses por Esforo Repetitivo
LPP-UERJ Laboratrio de Polticas Pblicas da Universidade do Estado do Rio
de Janeiro
LRF Lei de Responsabilidade Fiscal
17
MEC Ministrio da Educao
MG Minas Gerais
MIT Massachussets Institute of Technology/Instituto de Tecnologia de
Massachussets
MP Medida Provisria
MTb Ministrio do Trabalho
MUT Movimento de Unificao dos Trabalhadores
N. Nmero
NEDDATE Ncleo de Estudos, Documentao e Dados sobre Trabalho e
Educao da Faculdade de Educao da UFF
NETE Ncleo de Estudos sobre Trabalho e Educao da Faculdade de
Educao da UFMG
O. N. Organizao e Normas do Trabalho
OCDE Organizao para a Cooperao e o Desenvolvimento Econmico
OIT Organizao Internacional do Trabalho
ONGs Organizaes No-Governamentais
ONU Organizao das Naes Unidas
Org./Orgs. Organizador(a)/Organizadores
OSM Oposio Sindical Metalrgica
OTAN Organizao do Tratado do Atlntico Norte
PC do B Partido Comunista do Brasil
PCB Partido Comunista Brasileiro
PCP Planejamento e Controle da Produo
PCUS Partido Comunista da Unio Sovitica
PDT Partido Democrtico Trabalhista
PE Pernambuco
PEA Populao Economicamente Ativa
PEC Proposta de Emenda Constitucional
PETROBRS Petrleo Brasileiro S. A.
PFL Partido da Frente Liberal
PIB Produto Interno Bruto
PIPMO Plano Intensivo de Preparao de Mo-de-Obra
18
PL Projeto de Lei
PLR Participao nos Lucros e Resultados
PMDB Partido do Movimento Democrtico Brasileiro
PNAD Pesquisa Nacional de Amostragem de Domiclio
PR Paran
PROEP Programa de Expanso da Educao Profissional
PROMEC Programa de Extenso e Melhoria do Ensino Mdio
PSB Partido Socialista Brasileiro
PSDB Partido da Social-Democracia Brasileira
PT Partido dos Trabalhadores
PTB Partido Trabalhista Brasileiro
PUC-SP Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo
R$ Real
RAIS Relao Anual de Informaes Sociais
REDUC Refinaria Duque de Caxias
RGPS Regime Geral de Previdncia Social
RJ Rio de Janeiro
S/d. Sem data
SEADE Fundao Sistema Estadual de Anlise de Dados de So Paulo
SEFOR Secretaria de Formao e Desenvolvimento Profissional do
Ministrio do Trabalho e Emprego
SENAC Servio Nacional de Aprendizagem Comercial
SENAI Servio Nacional de Aprendizagem Industrial
SENAR Servio Nacional de Aprendizagem Rural
SENAT Servio Nacional de Aprendizagem do Transporte
SENEB Secretaria Nacional de Educao Bsica do Ministrio da Educao
SESC Servio Social do Comrcio
SESI Servio Social da Indstria
SEST Servio Social do Transporte
SETRAS Secretaria de Estado de Trabalho e Ao Social do Rio de Janeiro
SINDIPETRO-RJ Sindicato dos Trabalhadores na Indstria do Petrleo do Rio de
Janeiro
19
SINTERGIA/RJ Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas de Energia do Rio de
Janeiro e Regio
SINTSAMA-RJ Sindicato dos Trabalhadores em Saneamento Bsico e Meio
Ambiente do Rio de Janeiro e Regio
SIVAM Sistema de Vigilncia da Amaznia
SMED Single Minute Echange Die/Troca Rpida de Ferramental
SP So Paulo
TELEBRS Telecomunicaes Brasileiras S/A
TQC Total Quality Control/Controle Total da Qualidade
UBES Unio Brasileira dos Estudantes Secundaristas
UCAM Universidade Candido Mendes
UCG Universidade Catlica de Gois
UECE Universidade Estadual do Cear
UERJ Universidade do Estado do Rio de Janeiro
UFF Universidade Federal Fluminense
UFG Universidade Federal de Gois
UFMG Universidade Federal de Minas Gerais
UFRGS Universidade Federal do Rio Grande do Sul
UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro
UFSC Universidade Federal de Santa Catarina
UNB Universidade de Braslia
UNE Unio Nacional dos Estudantes
UNESP Universidade Estadual Paulista
UNICAMP Universidade Estadual de Campinas
UNIOESTE Universidade Estadual do Oeste do Paran
UNITRABALHO Rede Interuniversitria de Estudos e Pesquisas sobre o Trabalho
US$ Dlar
20
O materialismo dialtico uma filosofia radical porque no se detm nos produtos humanos
como numa verdade de ltima instncia, mas penetra at as razes da realidade social,
isto , at o homem como sujeito objetivo,
ao homem como ser que cria a realidade social. Karel Kosik Dialtica do Concreto
INTRODUO
A poca em que vivemos apresenta uma srie de desafios e novidades, que se
impem ao nosso cotidiano e atravessam os modos de ser, produzir e (re)produzir nossa
existncia (material, social, emocional, educacional, espiritual, afetiva, sexual, ...).
Aprendemos desde a mais tenra idade que vivemos numa aldeia global, onde
tudo e todos esto interligados. Tudo acontece e pode ser acompanhado por ns em tempo
real: as guerras, as catstrofes, os crimes, a violncia urbana; as vitrias, as derrotas; o
que crnico e banal, as excees que so apregoadas como regra; as agruras e amores de
pessoas comuns confinadas em um paraso ecolgico ou dentro de uma casa ...
a vida sem causa e sem conseqncia. Tudo porque . O futuro assistir ao
programa de televiso da noite ou da semana seguinte.
Vivemos aquilo que FRIGOTTO (2002: 1) denominou de espcie de
sndrome do fim: fim da histria, fim das classes sociais, fim do proletariado e o
surgimento do cognitariado1, fim das grandes utopias, fim das ideologias, fim da razo,
fim do emprego, fim do conflito. Fim das respostas, mas no das perguntas. Agora tudo
novo. Tudo novidade.
As novidades no explicam a realidade que mostra DREIFUSS (1996: 12-13):
(...) mais de trs milhes de pessoas morrem por ano de doenas evitveis, como tuberculose, disenteria ou malria. Nos pases menos
1 Que se origina, segundo FRIGOTTO (2001a: 35) a partir da (...) tese da sociedade do conhecimento de Toffler e a partir dela o fim das classes e, sobretudo, do proletariado, sendo este substitudo pelo
cognitariado (...) Toffler deduz o fim da diviso do trabalho e das prprias classes sociais, em decorrncia
das mudanas do contedo e reorganizao do processo de trabalho (...).
21
desenvolvidos, mais de 95 milhes de crianas menores de 15 anos trabalham
para ajudar seus familiares; mais de um milho de crianas (...) obrigadas a
prostituir-se; cerca de um milho e meio foram mortas em guerras, e perto de cinco milhes esto vivendo em campos de refugiados ou similares. Quase cem
milhes so consideradas crianas de rua, das quais doze milhes no tem famlia nem lar, e a cada minuto nascem 47 bebs na pobreza. Cerca de 120
milhes se encontravam oficialmente desempregadas em 1995, enquanto os refugiados polticos e vtimas de conflitos tnicos que eram oito milhes na dcada de 70 chegavam a vinte milhes somente dez anos depois.
Realidades (...) de um planeta onde, segundo dados da ONU de 1994, o quinto superior da populao mundial percebia em 1960, setenta por
cento dos ingressos, passando a 83% em 1989, enquanto que o quinto inferior
caa no mesmo perodo, de 2,3% a 1,4%. A populao em extrema pobreza (ou
desesperadamente pobre) chegava, segundo informe das Naes Unidas, a um bilho e trezentos milhes de pessoas em 1995 (dos quais dois teros so
mulheres), quadruplicando as j dramticas cifras de 1990. A maioria vive em
48 pases menos desenvolvidos: no sul da sia se concentram 21% do total de pessoas em extrema pobreza; a frica responde por 16% dos miserveis, dos
quais 60% vivem em reas rurais dos pases subsaarianos. Uma em cada cinco
pessoas sofre de pobreza extenuante e sobrevive com menos de um dlar dirio; mais de um bilho de pessoas carecem de servios bsicos; uma em
cada 100 pessoas imigrante ou refugiada, e em cada quatro adultos se conta
um analfabeto. (...) a cada dia um quinto da populao no tem o que comer,
enquanto que oitocentos bilhes de dlares equivalentes renda da metade da populao mundial so gastos anualmente em programas militares.
No nosso Pas, vivemos a sndrome da desconstruo. Tudo deve ser destrudo
em nome da modernidade, do progresso, da insero do Brasil no primeiro mundo.
A educao um campo de experimentao privilegiado, onde as boas novas
do mundo desenvolvido podem se tornar acessveis. Mergulhado nessa realidade adversa
est o Colgio Metalrgico Elpdio Evaristo dos Santos (CMEES).
O objetivo do presente trabalho analisar o seu funcionamento atual.
A escolha do CMEES como campo para a realizao desta pesquisa justificou-
se pelas especificidades de seus objetivos educacionais, principalmente, conforme TIRIBA
(1989: 175): o de contribuir para a formao da conscincia de classe do operrio-
estudante, estimulando sua organizao poltico-sindical.
Auxilia tambm a compreender a sua pertinncia, a singularidade da situao
atual: as particularidades da organizao poltico-sindical do proletariado, fruto dos efeitos
da implantao do neoliberalismo no Brasil na ltima dcada; as profundas mudanas no
22
mundo do trabalho; na organizao da educao brasileira em geral e da Educao
Profissional em particular e a situao de virtual fechamento de uma experincia de
educao vinculada a um dos mais antigos Sindicatos da rea fabril do Brasil.
Tais fatores esto aliados a minha trajetria poltica: a militncia no
Movimento Estudantil Secundarista e Universitrio; a participao nas instncias internas
da Universidade: Departamento, Colegiado de Curso, Conselho Universitrio; a atuao no
Movimento Sindical e Popular; no Conselho Profissional (Conselho Regional de
Psicologia - 5 Regio - CRP-05) e desde 1987 como militante e dirigente de Partido
Poltico.
Tomei conhecimento da experincia pedaggica que estava sendo desenvolvida
no CMEES atravs do artigo de TIRIBA (1988)2, que inclusive utilizei durante a minha
experincia na monitoria da disciplina de Didtica em 1990 na Universidade Federal
Fluminense (UFF). Aprofundei a minha relao com o Colgio atravs da participao de
atividades l promovidas e aproximao com integrantes da Equipe Tcnico-Pedaggica
(ETP). Em 1999, fui contratado como professor, para ministrar a disciplina de Organizao
e Normas do Trabalho, experincia extremamente enriquecedora e particularmente
prazerosa. No mesmo ano, concomitantemente, cursei o Curso de Especializao em
Administrao Escolar e Docncia Superior, tendo apresentado a Monografia: Colgio
Metalrgico: O futuro de um projeto.
A realizao do Mestrado se apresentou como uma oportunidade de
aprofundamento da temtica do CMEES, que no havia sido suficientemente desenvolvida
na Especializao.
A hiptese de trabalho partiu de trs premissas bsicas:
1. As mudanas crescentes verificadas na base tcnica da produo, oriundas dos reflexos
da terceira revoluo tcnico-cientifca e do advento dos novos mtodos de
gerenciamento da produo, alteraram profundamente as exigncias do perfil dos
2 TIRIBA, Lia Vargas. A Formao Profissional dos Trabalhadores. Revista Princpios, So Paulo: Ed.
Anita Garibaldi, (15): 45-48, maio, 1988.
23
operrios do setor industrial, em especial do setor metalrgico e as formas para sua
formao;
2. As alteraes introduzidas pelo Decreto 2.208/97 na forma de organizao da
Educao Profissional pulverizaram a perspectiva de oferta de cursos e iniciativas
educacionais em diferentes Entidades da sociedade;
3. O enfraquecimento poltico das Entidades Sindicais causado pela implantao do
neoliberalismo no Brasil a partir de 1990, combinado com a diminuio da categoria
metalrgica na base do Sindicato dos Metalrgicos do Rio de Janeiro (falncia do setor
naval; fechamento das indstrias pela crise econmica ou por mudana para outras
regies do Pas, fruto da guerra fiscal; diminuio dos postos de trabalho pela
reestruturao produtiva e gerencial), que levou ao enfraquecimento material,
ocasionaram a crise financeira crnica do Sindicato, tornando-o incapaz de continuar a
cumprir a sua funo de Entidade Mantenedora.
A partir da, parti da hiptese de que a perspectiva de escolarizao que restou
ao proletariado em geral e classe operria em particular aps a proibio da oferta
concomitante dos Ensinos Mdio e Profissional no turno da noite, os cursos seqenciais,
para quem j possui o Ensino Mdio, ou, cursar a Educao de Jovens e Adultos (EJA) em
dois anos e depois o curso seqencial em um ano e seis meses, colocam o CMEES em
desvantagem na competio com outras escolas congneres, alm das centenas de
alternativas que surgem a partir da mudana da legislao. A falta de uma fonte de
financiamento permanente que garanta a manuteno do nvel do ensino antes oferecido,
levou o Colgio a se posicionar na disputa do mercado de educao de uma forma
absolutamente desfavorvel e a se defrontar como uma dupla contradio: o preo de suas
mensalidades o tornaram proibitivo sua clientela principal e esta passou a contar com
alternativas de escolaridade que mais se adequam as expectativas e necessidades atuais:
exames supletivos, cursos nas empresas, opes de Educao Profissional de Nvel Bsico.
Os objetivos da pesquisa foram:
Averiguar em que medida a poltica implementada pelas Diretorias do Sindicato no
perodo 1996-2002 contribuiu para o quadro atual de esvaziamento do CMEES;
24
Analisar as possibilidades de manuteno de um Colgio de formao de Tcnicos
Industriais como o CMEES por uma Entidade Sindical, considerando-se as
modificaes por qual passa o mundo do trabalho nos dias atuais.
O perodo de abrangncia da pesquisa foi determinado, tendo em vista a
existncia dos estudos anteriores acerca da experincia pedaggica do CMEES feitos por
TIRIBA (1989) e COSTA (1995) e por ser o perodo de incio da hegemonia poltica da
Corrente Sindical Classista - CSC na direo do Sindicato.
Os procedimentos metodolgicos utilizados articularam trs movimentos
simultneos que possibilitaram uma maior apreenso da totalidade3 estudada:
1. Reviso de literatura visando estruturar uma base de anlise da realidade atual, nas suas
dimenses conjunturais e estruturais, abordando os seguintes temas:
Globalizao e neoliberalismo;
Papel do Banco Mundial (BM)4 na definio das polticas educacionais no Brasil;
A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDB) e a Educao
Profissional e o Decreto 2.208/97;
A terceira revoluo industrial e a reestruturao produtiva e gerencial;
Os desafios do Movimento Sindical nos anos neoliberais;
Os condicionantes histricos das mudanas de rumo do Movimento Sindical na dcada
de 1990;
A diminuio da indstria no Rio de Janeiro;
A nova direo do Sindicato dos Metalrgicos do Rio de Janeiro;
3 Nesta pesquisa foi utilizado o conceito de totalidade como foi definido por KOSIK (1976). Na sntese feita por KUENZER (2002: 310): Nesta concepo, evidencia-se que conhecer a totalidade no dominar todos os fatos, mas as relaes entre eles, sempre reconstrudas no movimento da histria.. 4 Isso se deve ao fato do BM ser na atualidade, segundo FRIGOTTO (2002: 1): (...) o intelectual coletivo (no sentido gramsciano) da nova pedagogia do capital globalizado e dos mecanismos de ajuste nova
(des)ordem mundial..
25
Conceituao do Colgio Metalrgico Elpdio Evaristo dos Santos: histrico, Proposta
Pedaggica, situao atual.
Os movimentos iniciais de apreenso do real visam, nas palavras de KOSIK
(1976: 12): Captar o fenmeno de determinada coisa (...) descrever como a coisa em si se
manifesta naquele fenmeno, e como ao mesmo tempo nle se esconde. (...) atingir a
essncia..
Cada momento deve representar um salto qualitativo em relao
compreenso dos fenmenos estudados. Buscar refletir os objetos de investigao atravs
da compreenso de suas relaes internas, numa perspectiva dialtica de partir do emprico
para o abstrato e da para o concreto pensado. Procurar a todo momento sintetizar os
elementos fundamentais que daro o norte para a compreenso do novo modo de regulao
da formao profissional nas suas determinaes histrico-concretas. Conforme KOSIK
(1976: 30):
Para que o pensamento possa progredir do abstrato ao concreto, tem de mover-se no seu prprio elemento, isto , no plano abstrato, que
negao da imediatidade, da evidncia e da concreticidade sensvel. A ascenso do abstrato ao concreto um movimento para o qual todo incio
abstrato e cuja dialtica consiste na superao desta abstratividade. O
progresso da abstratividade concreticidade , por conseguinte, em geral movimento da parte para o todo e do todo para a parte; do fenmeno para a
essncia e da essncia para o fenmeno; da totalidade para a contradio e da
contradio para a totalidade; do objeto para o sujeito e do sujeito para o objeto. O processo do abstrato ao concreto, como mtodo materialista do
conhecimento da realidade, a dialtica da totalidade concreta, na qual se
reproduz idealmente a realidade em todos os seus planos e dimenses.
2. Levantamento de fontes primrias acerca do tema no acervo do Sindicato: programa
das chapas eleitas, resolues dos congressos da categoria, jornais e boletins.
Foram utilizados como fontes primrias documentos do Sindicato que
abrangessem o perodo estudado: quatro nmeros do jornal de campanha da chapa 1 (um
de 1999 e trs de 2002), seis nmeros do Jornal META, rgo Oficial do Sindicato (um de
1996, dois de 2001, trs de 2002) e um boletim Informe META de 2002.
Nos jornais de campanha da chapa 1 (gestes 1999-2002 e 2002-2005) no h
nenhuma referncia ao Colgio Metalrgico, embora tenha sido tema recorrente nas portas
26
das fbricas nas duas campanhas, alm da campanha da chapa 2 (gesto 1996-1999), das
quais participei como ativista sindical.
Nos seis nmeros do Jornal META e no boletim Informe META, a meno ao
CMEES aparece em quatro deles. Em trs na forma de propaganda das atividades do
Colgio. No jornal de 1996, O CMEES citado como mais um exemplo do estado de
completo abandono que a gesto anterior (1993-1996) deixou o Sindicato e como mais um
item do projeto de reconstruir o Sindicato na luta. Conforme SINDICATO DOS
METALRGICOS DO RIO DE JANEIRO (1996: 1): O nosso colgio, que funciona em
estado precrio, ter suas salas renovadas e aparelhadas, capazes de oferecer o conforto
necessrio aos alunos e professores..
Tentei consultar as resolues dos dois Congressos do Sindicato que ocorreram
no perodo, um por mandato (gestes 1996-1999 e 1999-2002). O 4 Congresso foi
realizado em 1997. O 5 Congresso ocorreu entre os dias 24 e 26 de agosto de 2001. As
resolues aprovadas ainda no foram publicadas. Em conversas informais, Diretores do
Sindicato informaram que no 5 Congresso foi aprovada uma resoluo especfica em
defesa da manuteno do CMEES. Porm, no foi possvel ter acesso aos textos, mesmo
que sob a forma de rascunho.
3. Realizao de entrevistas semi-estruturadas com a Equipe Tcnico-Pedaggica,
funcionrios, professores do CMEES e Diretores do Sindicato dos Metalrgicos do
perodo 1996-2002, a fim de obter mais dados sobre a poltica implementada pelas
Diretorias no perodo e levantamento atravs de questionrios, com trs alunos que j
exercem funes tcnicas na sua prtica cotidiana de trabalho, visando conhecer a sua
percepo acerca da relao teoria-prtica dos contedos ministrados no CMEES.
Foram realizadas doze entrevistas semi-estruturadas: com a Diretora do
CMEES, a ex-Assessora Pedaggica, dois funcionrios e trs professores que trabalham no
Colgio desde 1996 e com cinco Diretores do Sindicato dos Metalrgicos do perodo 1996-
2002, ativistas da CSC (majoritria na Diretoria no perodo), para obter mais dados sobre a
poltica implementada pelas Diretorias no perodo.
Os Diretores entrevistados foram os Presidentes, Tesoureiros e responsveis
pelo Departamento/Secretaria de Formao. A escolha se deu em funo de serem os que
27
estatutariamente so responsveis pelo ordenamento das despesas (no caso dos dois
primeiros) e pelo acompanhamento do CMEES (o terceiro).
A Tabela 1 apresenta os Diretores do Sindicato que exerceram as funes que
interessavam pesquisa. De oito possveis entrevistas, foram realizadas cinco. Porm, tal
fato no representou perda de informaes relevantes, j que foram entrevistados os que
estiveram efetivamente frente das funes e por mais tempo, conforme as trs
observaes ao final da tabela. Alm disso, o Presidente de 1996 a 2002, tambm foi
Diretor de Formao nas gestes 1990-1993 e 1993-1996, que embora estejam fora do
perodo estudado, trouxeram informaes que ajudam a entend-lo.
Tabela 1 Presidentes, Tesoureiros e Diretores/Secretrios de Formao do Sindicato dos Metalrgicos do Rio de Janeiro no perodo 1996-2002
Cargo Gesto
1996-1999 1999-2002 2002-2005
Presidente Luiz Alberto Albuquerque Chaves
Luiz Alberto Albuquerque
Chaves
Maurcio de
Mendona Ramos
Tesoureiro Admir de Souza Amorim Admir de Souza Amorim Jlio Cosme Castilho Teixeira
Diretor/Secretrio
de Formao
Edson de Souza
Wallace Paz de Arago (1)
Mnica Cristina da Silva
Custdio Wallace Paz de Arago (2)
Rosngela Paiva (3)
(1) - Na gesto 1996-1999 o Diretor Executivo oficial do Departamento era Edson de Souza, que assumiu
durante um tempo a Tesouraria. Por divergncias polticas, o roque com o Tesoureiro foi desfeito e Edson de
Souza voltou para o Departamento de Formao, ficando aproximadamente seis meses. Com o agravamento
da situao poltica e sua conseqente sada da CSC, ele terminou por ser afastado da Executiva do Sindicato
e quem assumiu o Departamento de Formao foi Wallace Paz de Arago.
(2) - Na gesto 1999-2002 o Departamento de Formao foi transformado em Secretaria de Formao e a
nova Secretaria foi dividida em duas: Formao Sindical e Formao Profissional e Cultural. O Colgio ficou ligado a Secretaria de Formao Profissional, cujo Diretor era Mnica Cristina da Silva Custdio. No incio
de 2000, Mnica foi eleita para a Direo Nacional da Central nica dos Trabalhadores (CUT) e Wallace Paz
de Arago assumiu a Secretaria de Formao Profissional. A Diretora de Formao Sindical era Rosngela
Paiva.
(3) - Na gesto 2002-2005, a Secretaria de Formao foi reunificada e a Diretora Executiva da Secretaria
Rosngela Paiva. Porm, ela no tem nenhum envolvimento com o CMEES. Quem cuida na prtica das
questes relacionadas ao Colgio o Presidente e o Diretor Executivo da Secretaria de Comunicao
Wallace Paz de Arago.
A exposio da pesquisa foi organizada em trs captulos.
O primeiro captulo SITUANDO O NOSSO RIO: AS MARGENS QUE
NOS OPRIMEM, trata da caracterizao da conjuntura atual nos aspectos que
condicionam a anlise: globalizao e neoliberalismo; as polticas do Banco Mundial
para a educao no Brasil; a Educao Profissional no Brasil, a nova LDB e o Decreto
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2.208/97; as mudanas na base tcnica e gerencial da produo que produzem as
modificaes no mundo do trabalho. Est dividido em quatro partes:
1.1 - A ideologia da globalizao, faz a caracterizao da chamada
globalizao e o que o conceito realmente esconde: o neoliberalismo. Est subdividido
em dois sub-itens:
1.1.1 - A esfinge moderna - Explicitao dos motivos pelos quais o termo
considerado uma construo ideolgica (no sentido de conjunto de idias que uma classe
social se utiliza para explicar a realidade) e portanto ser sempre utilizado no trabalho entre
aspas. Ser chamado de ideologia da globalizao;
1.1.2 - Neoliberalismo: De teoria marginal poltica marginalizadora -
Histrico do surgimento das teses neoliberais, de sua implantao como poltica de Estado
dominante em dois teros do planeta e discusso acerca de seus efeitos em nossa realidade.
1.2 - Banco Mundial: Especialista em educao?!?!?!?!?!, apresenta como o
Banco Mundial se transformou de financiador do crescimento econmico em agncia
internacional de formulao de polticas pblicas. Est subdividido em dois sub-itens:
1.2.1 - De mecenas a cavalo de Tria - Histrico da criao do Banco Mundial,
as mudanas na sua estratgia poltica ao longo do tempo e sua transformao em agncia
de formulao de polticas pblicas para a sade e a educao para os pases dependentes;
1.2.2 - E o Brasil fez o seu dever de casa - Discusso sobre as medidas tomadas
pelo governo brasileiro para se adequar as receitas preconizadas pelo Banco Mundial.
1.3 - Nova LDB e a Educao Profissional, discute a Educao Profissional
no Brasil, a nova LDB e o Decreto 2.208/97. Est subdividido em trs sub-itens:
1.3.1 - Pequeno histrico da Educao Profissional no Brasil -
Contextualizao do surgimento da Educao Profissional no Brasil;
1.3.2 - Nova LDB: Da luta popular ao golpe palaciano - Trajetria da
aprovao da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional: lutas, vicissitudes,
acordos e golpes;
29
1.3.3 - Decreto 2.208: Da Educao Profissional certificao - Explicitao
do contedo e anlise dos desdobramentos e resultados do Decreto.
1.4 - Terceira revoluo industrial e reestruturao produtiva, faz um
histrico das mudanas na base tcnica e gerencial da produo e de como elas se
relacionam com as transformaes no mundo do trabalho que influem diretamente na
Educao Profissional. Est subdividido em seis sub-itens:
1.4.1 - O que fazer e como fazer: Dois movimentos que se interpenetram
Caracterizao das mudanas implementadas na base tcnica da produo pelo capitalismo
no curso de seu desenvolvimento;
1.4.2 - Taylor e o homem boi Conceituao dos estudos acerca da
organizao cientfica do trabalho fabril, do engenheiro Frederick Winslow Taylor, pai
da chamada Administrao Cientfica;
1.4.3 - Ascenso e queda do Fordismo Discusso acerca do sistema de
produo e gesto que Henry Ford implantou, baseado no princpio da linha de montagem;
1.4.4 - E tudo comeou com uma vlvula ... Trajetria das mudanas na base
material que possibilitaram a mudana do paradigma produtivo;
1.4.5 - Vamos vestir a camisa da empresa... mas quem vai vestir a nossa?
Como o toyotismo/ohnismo se transformou de soluo criativa para a mudana da
organizao da produo e adaptada realidade japonesa em modelo para o mundo;
1.4.6 - Dialogando com a realidade. Ou penso, logo resisto! Quais foram os
desdobramentos da importao do novo paradigma produtivo na nossa realidade.
O segundo captulo O MOVIMENTO SINDICAL NAVEGANDO EM
CORREDEIRAS, trata da contextualizao do Movimento Sindical a partir da relao
Sindicalismo/Sindicato dos Metalrgicos/Conjuntura. Est dividido em quatro partes:
2.1 - Os desafios do Movimento Sindical nos anos neoliberais, conceitua a
crise do Movimento Sindical na dcada de 1990, em especial no perodo de 1994 a 2002.
30
2.2 - Mudanas de rumo, apresenta o debate poltico e ideolgico que o
sindicalismo cutista viveu no perodo, e a guinada que a corrente majoritria da CUT
empreendeu. Est subdividido em trs sub-itens:
2.2.1 - Imperialismo e aristocracia operria Apresenta os dois conceitos,
derivados da obra de Lnin;
2.2.2 - Um breve fio de histria Apresenta um pequeno histrico do
Movimento Sindical no Brasil at o final da dcada de 1970;
2.2.3 - A social-democracia tardia Descreve as condies histricas de
formao da corrente social-democrata de esquerda no Pas e sua relao com a guinada
poltica da CUT.
2.3 - Diminuio da indstria no Rio de Janeiro, apresenta o reflexo das
polticas industriais implementadas entre 1996 e 2002 pelos governos Federal e Estadual,
na economia do Estado do Rio de Janeiro.
2.4 - Nova direo no Sindicato dos Metalrgicos, faz um histrico do
retorno dos sindicalistas Classistas direo do Sindicato dos Metalrgicos do Rio de
Janeiro at sua consolidao como Corrente Poltica hegemnica.
O terceiro captulo O COLGIO METALRGICO ELPDIO EVARISTO
DOS SANTOS, trata de como a relao explicitada no captulo anterior repercute e
direciona a prtica educativa do CMEES e do prprio Sindicato. Est dividido em trs
partes:
3.1 - Histrico do Colgio Metalrgico, traz o histrico da criao do
CMEES at a crise atual. As contradies da relao Sindicato-Escola e a contextualizao
do perodo estudado (1996/2002).
3.2 - Proposta Pedaggica, apresenta a Proposta Poltico-Pedaggica do
CMEES.
31
3.3 - Entre o discurso e a prtica, traz a articulao e os desdobramentos dos
cruzamentos das informaes entre as entrevistas, as propostas e resolues contidas nos
documentos e a prtica verificada. Est subdividido em quatro sub-itens:
3.3.1 - Caractersticas do Colgio;
3.3.2 - Integrao entre o Colgio e o Sindicato;
3.3.3 - As polticas implementadas pelas gestes 1996-2002 e a crise do
CMEES;
3.3.4 - Perspectivas sobre o futuro do CMEES.
3.3 - Entre o discurso e a prtica, traz a articulao e os desdobramentos dos
cruzamentos das informaes entre as entrevistas, as propostas e resolues contidas nos
documentos e a prtica verificada. Est subdividido em quatro sub-itens:
3.3.1 - Caractersticas do Colgio;
3.3.2 - Integrao entre o Colgio e o Sindicato;
3.3.3 - As polticas implementadas pelas gestes 1996-2002 e a crise do
CMEES;
3.3.4 - Perspectivas sobre o futuro do CMEES.
32
A rvore que no d frutos xingada de estril.
Quem examina o solo? O galho que quebra
xingado de podre, mas
No haveria neve sobre ele?
Do rio que tudo arrasta Se diz que violento,
Ningum diz violentas
As margens que o cerceiam. Bertold Brecht
1 SITUANDO O NOSSO RIO: AS MARGENS QUE NOS OPRIMEM
No primeiro captulo, iremos nos familiarizar com os aspectos da realidade que
iro condicionar o objeto de estudo:
Explicitao dos motivos pelos quais o termo globalizao considerado uma
construo ideolgica (no sentido de conjunto de idias que uma classe social se
utiliza para explicar a realidade) e portanto ser sempre utilizado no trabalho entre
aspas. Ser chamado de ideologia da globalizao;
Histrico do surgimento das teses neoliberais, de sua implantao como poltica de
Estado dominante em dois teros do planeta e discusso acerca de seus efeitos em
nossa realidade;
Anlise de como o Banco Mundial se transformou de financiador do crescimento
econmico em agncia internacional de formulao de polticas pblicas: histrico de
sua criao, as mudanas na sua estratgia poltica ao longo do tempo, sua
transformao em agncia de formulao de polticas pblicas para a sade e a
educao para os pases dependentes e, discusso acerca das medidas tomadas pelo
governo brasileiro para se adequar as receitas preconizadas pelo BM;
Contextualizao do surgimento da Educao Profissional no Brasil;
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Trajetria da aprovao da nova LDB e a explicitao do contedo, anlise dos
desdobramentos e resultados do Decreto 2.208/97;
Caracterizao das mudanas implementadas na base tcnica e gerencial da produo
pelo capitalismo no curso de seu desenvolvimento e de como elas se relacionam com
as transformaes no mundo do trabalho que influem diretamente na Educao
Profissional. Em especial dos estudos acerca da organizao cientfica do trabalho
fabril, de Taylor; do sistema de produo e gesto que Henry Ford implantou, baseado
no princpio da linha de montagem; a trajetria das mudanas na base material que
possibilitaram a mudana do paradigma produtivo; a transformao do
toyotismo/ohnismo em modelo para o mundo e quais foram os desdobramentos da
importao do novo paradigma produtivo na nossa realidade.
34
Este mundo globalizado, visto como fbula, erige como verdade um certo nmero de fantasias,
cuja repetio, entretanto, acaba por se tornar uma base aparentemente slida de sua interpretao.
Maria da Conceio Tavares Destruio No Criadora
1.1 - A IDEOLOGIA DA GLOBALIZAO
1.1.1 - A ESFINGE MODERNA
A globalizao se tornou um termo impreciso que pretende exprimir muita
coisa, mas que acaba no dizendo nada. A atualidade da discusso merece que se faa um
pequeno detour para explicitar os motivos pelos quais tal termo no passa de uma
construo ideolgica (no sentido de conjunto de idias que uma classe social se utiliza
para explicar a realidade) e portanto ser sempre utilizado neste trabalho entre aspas. Irei
cham-lo de ideologia da globalizao.
Segundo BATISTA JUNIOR (1997: 7), a ideologia da globalizao cumpre
duas funes bsicas: (1) divulgar a idia de que existe um processo em curso de forma
natural e inexorvel na economia mundial e (2) que nada mais resta sociedade,
Sindicatos, Partidos, Estados nacionais que no se adaptar a esse movimento comandado
pelo grande capital atravs das corporaes transnacionais.
CASTRO (2003) acrescenta:
Assim, a louvao da globalizao funciona como anestesiante ideolgico para desarmar qualquer resistncia ao absolutismo do mercado
(leia-se: capital) e impedir-nos de enxergar a natureza real (a rigor, nada
original) da ofensiva do capital contra os trabalhadores - sobretudo contra os
trabalhadores dos pases perifricos que so os mais flexibilizados (precarizados) economicamente e os mais desprotegidos, social e
politicamente.
SANTOS et al. (1997: 19) completa:
Hoje, o que federativo ao nvel mundial no uma vontade de
35
liberdade, mas de dominao, no o desejo de cooperao mas de
competio, tudo isso exigindo um rgido esquema de organizao que
atravessa todos os rinces da vida humana. Com tais desgnios, o que globaliza falsifica, corrompe, desequilibra, destri.
Por que se utilizar do termo globalizao? A experincia demonstra que a
palavra traz em si conotaes positivas. Como professor da disciplina de Organizao e
Normas do Trabalho do Colgio Metalrgico Elpdio Evaristo dos Santos, abordava o tema
no programa do curso. O primeiro item era sobre globalizao e neo liberalismo. No
incio da aula fazia um inventrio com os alunos dos significados que eles atribuam ao
termo, pensando apenas no sentido etimolgico da palavra e os resultados eram sempre
muito parecidos: unio, fim das barreiras, fim das fronteiras, confraternizao, diminuio
das distncias e assemelhados. apenas um pequeno exemplo da potncia positiva que o
termo carrega. Tambm por tal motivo to explorado pelos apologistas da suposta
novidade.
Mas o quo novo o processo de globalizao? J se enraizou no senso
comum a idia de que um fenmeno associado diminuio das distncias entre os
pases em virtude do avano das tecnologias de produo, comunicao e informao, ou
seja, algo que filho direto da terceira Revoluo Tcnico-Cientfica. A inveno do chip e
o advento da microinformtica e da robtica so a base material para a profunda revoluo
na maneira do homem dominar a natureza e se utilizar dos seus recursos.
Porm, se globalizao significar aumento do mundo conhecido, diminuio
ou alargamento das fronteiras nacionais, e principalmente, a formao de um mercado
mundial, tal movimento no se inicia na dcada de 70 do Sculo XX, mas nas chamadas
grandes navegaes empreendidas pelo povos da Pennsula Ibrica nos Sculos XV e XVI.
Ou at se quisermos retroceder mais alguns sculos, na poltica expansionista do Imprio
Romano ou de outros povos da Antigidade Clssica. Portanto, a globalizao no tem
nada de novidade, muito pelo contrrio, pode inclusive ser considerada como algo inerente
ao movimento dos grupos humanos sobre o planeta.
A idia corrente de que estaramos vivendo hoje uma poca sem precedentes de
integrao do mercado mundial no resiste avaliao de nenhum dos indicadores que
poderiam comprovar tal tendncia: a integrao internacional das economias
36
(participao do comrcio exterior na produo mundial); ndices de investimentos
internacionais; a migrao internacional.
Com relao a este particular, chama a ateno que os ndices de
movimentao de mo-de-obra entre os pases eram muito mais favorveis no final do
Sculo XIX e incio do Sculo XX do que atualmente, onde supostamente estaramos
vivendo uma poca de integrao, de fim das fronteiras. Na verdade o que houve foi
um refluxo5. Os pases desenvolvidos no querem nem ouvir falar em receber imigrantes
dos pases da Amrica Latina, sia e frica. Os Estados Unidos da Amrica do Norte,
antes terra das oportunidades, onde a Esttua da Liberdade colocada na entrada da Baa de
Nova Iorque virou sinnimo de boas vindas aos visitantes, hoje os recebe a tiros no muro
da vergonha da fronteira com o Mxico.
MORAES (2001: 34) nos traz a dimenso da tragdia:
O democrata global Clinton encontrou soluo ainda mais eficaz para defender o nvel de emprego na matriz imperial. Sob o rtulo
prevention through deterrence, mandou reforar e completar uma barreira de 3.140 quilmetros cobrindo a fronteira dos Estados Unidos com o Mxico.
Muros blindados, patrulhas permanentes, algumas formadas por fazendeiros
armados (que se divertem, nos fins de semana, caando chicanos que lograram atravessar vivos a fronteira), foram responsveis, somente nos trs primeiros anos de aplicao do plano Clinton (94/97) pela morte de pelo menos
1.185 mexicanos. Vinte e cinco vezes mais, em mdia anual, do que os mortos
no Muro de Berlim.
Na Europa, os imigrantes se tornaram os bodes expiatrios do aumento do
desemprego e surgem com fora movimentos racistas e neonazistas que perseguem e
assassinam imigrantes.
Os dados e ndices que comprovam tais tendncias esto publicados, so de
domnio pblico, de acesso relativamente fcil, mas raramente chegam ao conhecimento da
opinio pblica, da sociedade em seu conjunto. Porm, segundo CASTRO (2003): (...) os
fatos e os nmeros no falam; eles permanecem mudos at serem corretamente
5 Para citar apenas um dos exemplos utilizados por BATISTA JUNIOR (1997: 9): Recentemente, o governo dos Estados Unidos divulgou o resultado de um censo da populao nascida no exterior e residente naquele
pas. Em maro de 1996, um pouco menos de 10% da populao dos EUA era nascido no exterior, de pais
no-americanos. Em 1910, a proporo era de 14,7% de moradores nascidos no exterior..
37
interrogados (ordenados e analisados) com auxlio de uma teoria consistente com o
conjunto da realidade social capitalista..
O conceito de globalizao como novidade, como uma etapa indita de
desenvolvimento na histria humana aparece ento como o que realmente : uma
sistemtica manipulao da realidade que visa escond-la, embora esteja vista de todos.
Outra verdade que se quer construir, a noo de que a expanso das
atividades internacionais, capitaneada pelas empresas multinacionais, agora apelidadas de
transnacionais, levaria ao fim das fronteiras e dos estados nacionais. Apesar da expanso
ter aumentado enormemente nos ltimos vinte anos, o peso dos mercados internos continua
sendo preponderante. Novamente, BATISTA JUNIOR (1997: 10) vem demonstrar:
aproximadamente 80% do produzido na economia mundial se destina ao consumo dos
mercados internos dos pases onde ocorre a produo. A gerao de empregos para atender
a demanda interna responde por 90% do mercado mundial e 95% dos investimentos so
financiados com poupana interna. Tais dados no deixam muito espao para dvidas
sobre o contedo meramente ideolgico das formulaes que sustentam que j estaramos
vivendo uma poca da vigncia de um mercado global fortemente integrado, onde a fora e
a participao dos mercados internos e Estados nacionais seriam irrelevantes.
Sobre o mercado global, SANTOS (2000: 41), ainda acrescenta:
O fato que apenas trs praas, Nova Iorque, Londres e Tquio, concentram mais da metade de todas as transaes e aes; as empresas
transnacionais so responsveis pela maior parte do comrcio dito mundial; os
47 pases menos avanados representam juntos apenas 0,3% do comrcio
mundial, em lugar dos 2,3% em 1960.
Os investimentos estrangeiros diretos, to festejados em nosso pas como
indispensveis e nicos alavancadores do nosso desenvolvimento, embora tenham crescido
nos pases dependentes nos anos 90, representam apenas 4% da formao bruta de capital
fixo na economia mundial, segundo dados de rgo da Organizao das Naes Unidas
(ONU) sediado em Genebra. Mesmo no conjunto dos pases dependentes, a relao entre a
participao dos investimentos diretos estrangeiros e a formao bruta de capital fixo
correspondeu a apenas 7,5%. Seja sob que perspectiva que se queira analisar, os ndices
38
provam que o investimento nacional o principal motor de crescimento da economia da
maioria dos pases6.
Mesmo se considerarmos as transaes de comrcio exterior, como ndice de
um suposto aumento da integrao entre os pases, ela acontece somente entre os pases
ricos. HOBSBAWM (2001: 550) colabora com dados incontestveis:
No se percebe em geral que todos os pases desenvolvidos, com exceo dos EUA, mandavam uma parte menor de suas exportaes para o
Terceiro Mundo na dcada de 1990 que em 1938. Os ocidentais (incluindo os
EUA) mandaram para l menos de um quinto de suas exportaes em 1990.
Ainda sobre os investimentos estrangeiros diretos, CHESNAIS (1996: 63)
destaca que eles vem cada vez mais se concentrando entre Estados Unidos, Europa e Japo
e demais pases da OCDE7. As aquisies e fuses de empresas existentes representaram a
modalidade predominante de investimento entre os pases da OCDE.
Outro forte mito associado ideologia da globalizao o de que os Estados
nacionais estariam perdendo sua fora e razo de ser, o que os levaria a estarem
encolhendo em todos os pases do mundo. Nos pases dependentes pode at ser, mas nos
pases desenvolvidos ocorreu justamente o oposto. Os dados da OCDE8 de 1996, portanto
do auge da aplicao do receiturio neoliberal no mundo, inclusive nos pases ricos,
demonstra que na comparao entre os perodos de 1978-1982 (incio da hegemonia
neoliberal) e 1991-1995, os gastos pblicos como proporo do Produto Interno Bruto
(PIB), a carga tributria, o dficit pblico e a participao do emprego pblico como
proporo do emprego total aumentaram no ltimo perodo nos pases membros do Grupo
dos sete grandes (G-8)9. A poltica econmica brasileira tem se adaptado no s
tendncias da economia mundial, mas a uma srie de mitos que transitam nos crculos de
poder dos pases centrais, sendo consumidos por nossas classes dominantes como plulas
6 Citado por BATISTA JUNIOR (1997: 10). Segundo FERNANDES (1998: 81): O valor dos fluxos externos de capital dos principais pases investidores, (...) no ultrapassam, hoje, 2% do valor dos seus
PIBs reunidos, contra uma mdia de 4 a 6% no incio do sculo (com a Inglaterra atingindo o pico de 9% nessa poca).. 7 Organizao para a Cooperao e o Desenvolvimento Econmico. Rene os 26 pases mais desenvolvidos
do mundo. 8 Citados por BATISTA JUNIOR (1997: 11). 9 O grupo dos sete pases capitalistas mais desenvolvidos do mundo (Alemanha, Canad, Estados Unidos da
Amrica (EUA), Frana, Inglaterra, Itlia, Japo) passou a ser chamado de G-8 por conta da participao da
Rssia, mas notrio que isso s acontece pelo poderio militar que (ainda) lhe resta.
39
mgicas que iro salv-las de suas prprias atitudes de subservincia frente ao grande
capital.
Cabe ainda uma nota acerca do mito das empresas transnacionais. Tal
construo se articula fortemente com o mito do declnio dos Estados nacionais. Se esses
deixam de ter papel relevante na cena econmica internacional, as empresas deixam
tambm de possuir uma estreita vinculao com suas bases ou origens nacionais, tornando-
se empresas transnacionais. Somente algumas poucas empresas poderiam se encaixar em
tal denominao por serem de pases desenvolvidos muito pequenos, como Blgica,
Holanda e Sua, tecnicamente adiantados, mas com um mercado interno limitado. Em tais
casos encontram-se algumas grandes corporaes que geram uma elevada proporo de
empregos e vendas nas filiais do exterior e/ou que mantm um percentual elevado de seus
ativos fora do pas de origem. Os dados disponveis10
demonstram que as grandes
corporaes multinacionais continuam sendo empresas nacionais, que mantm pesadas
restries presena de estrangeiros em seus conselhos de administrao (ou seja, o centro
decisrio encontra-se vinculado origem nacional) e estreitos laos com os governos de
seus pases na busca de subsdios e na disputa de mercados. Por exemplo, a Nestl, uma
das empresas mais transnacionalizadas do mundo, que tem somente 5% dos seus ativos e
empregados na Sua, limita os direitos de voto de estrangeiros no conselho de
administrao a apenas 3% do total.
BOITO JUNIOR (1999: 48-49) vem confirmar tais afirmaes:
Estudos de economistas e historiadores ingleses e franceses mostram que as chamadas empresas globais, que teriam investimento, pesquisa, produo e consumo difundidos indistintamente por diversos pases so, acima de tudo, um mito criado pela teoria da globalizao. As firmas ditas globais concentram pesquisa, produo, consumo, lucros e venda de aes nos pases desenvolvidos e possuem um enraizamento nacional.
Exemplos recentes de disputa de mercado, como a presso direta exercida pelo
governo dos EUA para que os pases dependentes aprovassem Legislao sobre patentes
que interessavam diretamente as grandes empresas monopolistas estadunidenses; o
10 Citados por BATISTA JUNIOR (1997: 12). Ainda: Em 1991, apenas 2% dos membros dos conselhos de administrao de grandes empresas americanas eram estrangeiros. Segundo a revista inglesa The Economist, diretores estrangeiros nas companhias japonesas so to raros quanto lutadores britnicos de sum..
40
envolvimento dos governos e servios secretos para que as empresas de seus pases,
Estados Unidos (Raytheon) e Frana (Thompson), ganhassem a concorrncia para fornecer
os equipamentos para o Sistema de Vigilncia da Amaznia SIVAM ou o
comportamento do governo do Canad no caso da Empresa Brasileira de Aeronutica
(EMBRAER) x Bombardier, que se transformou em retaliao comercial louca contra o
Brasil, demonstram que o alardeado distanciamento das grandes empresas com a questo
nacional s existe nos manuais de propaganda ideolgica para os pases dependentes.
A bela sntese descrita por SANTOS (2000: 18-19), de um realismo quase
potico, auxilia a remover o vu:
Este mundo globalizado, visto como fbula, erige como verdade um certo nmero de fantasias, cuja repetio, entretanto, acaba por se tornar
uma base aparentemente slida de sua interpretao.
A mquina ideolgica que sustenta as aes preponderantes da atualidade feita de peas que se alimentam mutuamente e pem em
movimentos os elementos essenciais continuidade do sistema. Damos aqui
alguns exemplos. Fala-se por exemplo, em aldeia global para fazer crer que a difuso instantnea de notcias realmente informa as pessoas. A partir desse
mito e do encurtamento das distncias para aqueles que realmente podem viajar tambm se difunde a noo de tempo e espao contrados. como se o mundo se houvesse tornado, para todos, ao alcance da mo. Um mercado avassalador dito global apresentado como capaz de homogeneizar o planeta
quando, na verdade, as diferenas locais so aprofundadas. H uma busca de
uniformidade, ao servio dos atores hegemnicos, mas o mundo se torna menos unido, tornando mais distante o sonho de uma cidadania verdadeiramente
universal. Enquanto isso, o culto ao consumo estimulado.
Fala-se, igualmente, com insistncia, na morte do Estado, mas o
que estamos vendo seu fortalecimento para atender aos reclamos da finana e de outros grandes interesses internacionais, em detrimento dos cuidados com
as populaes cuja vida se torna mais difcil.
Esses poucos exemplos, recolhidos numa lista interminvel, permitem indagar se, no lugar do fim da ideologia proclamado pelos que
sustentam a bondade dos presentes processos de globalizao, no estaramos,
de fato, diante da presena de uma ideologizao macia, segundo a qual a realizao do mundo atual exige como condio essencial o exerccio de
fabulaes.
A explicitao da ideologia da globalizao deixa claro que um termo
encharcado de conotaes ideolgicas. MORAES (2001: 35) nos ajuda a compreender o
porque da sua difuso como verdade pelos quatro cantos do planeta:
Como uma to grotesca e odiosa impostura ideolgica logrou obter tanto xito? O marxismo oferece o princpio de explicao: as idias
dominantes so, normalmente, e sobretudo em perodos de refluxo das esperanas revolucionrias como o atual, as idias das classes dominantes. A
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verdade sempre revolucionria, mas a fora de uma idia depende muito da
fora dos que a sustentam. A fragilidade dos dados pseudocientficos em que se
fundamentava a idia hitleriana da superioridade racial dos povos arianos no a impediu de receber apoio macio na Alemanha civilizada. A idia de globalizao, at por no se apoiar em doutrinas intrinsecamente odiosas como o nazismo, difundiu-se com mais facilidade. Mas em termos de poderio
militar, de capacidade de destruio e de amplitude territorial, o Eixo nazi-fascista pouca coisa se comparado mquina blica da OTAN.
A sua repetio exausto, como sendo o somatrio de uma srie de novidades
inerentes ao mundo moderno, encobre na verdade outro termo que no goza de muito
prestgio e que evitado at por aqueles que aplicam suas orientaes: neoliberalismo.
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O sistema burgus tornou-se demasiado estreito para conter as riquezas criadas em seu seio.
De que maneira consegue a burguesia vencer essas crises? De um lado, pela destruio violenta de grande quantidade de foras produtivas;
de outro lado pela conquista de novos mercados
e pela explorao mais intensa dos antigos.
A que leva isso? Ao preparo de crises mais extensas e mais destruidoras e diminuio dos meios de evit-las.
Karl Marx e Friedrich Engels Manifesto do Partido Comunista
1.1.2 - NEOLIBERALISMO: DE TEORIA MARGINAL POLTICA
MARGINALIZADORA
O neoliberalismo nasce depois da II Guerra Mundial, na Europa e Amrica do
Norte. Foi uma reao terica e poltica implementao das teses keynesianas11
, que
preconizavam a maior interveno do Estado da economia de modo a regular as disputas
de mercado, atenuando os efeitos da desigualdade social inerente a dinmica da disputa
monopolista no sistema capitalista de produo. Seu idelogo principal o austraco
Friedrich A. Hayek, que em 1944 escreveu: O caminho da servido,12
com objetivo de
isolar o nazismo e o socialismo (que ele tenta de forma abertamente ideolgica identificar
como iguais), combater a interveno do Estado na economia e defender a liberdade sem
limites para o capital. Foi um dos continuadores da Escola Austraca, cujos fundamentos
tericos se baseiam no subjetivismo e no individualismo metodolgico. No prefcio da
edio inglesa de 1944, Hayek diz claramente que O caminho da servido um livro
poltico. Nem tenta esconder, sob o manto de um falso cientificismo, suas posies.
Em 1947, Hayek fundou a Sociedade de Mont Plerin, em conjunto com
Milton Friedman13
, Karl Popper, Lionel Robbins, Ludwig Von Mises, Walter Lipman,
11 Nome dado ao conjunto de polticas macroeconmicas inspiradas nas idias de John Maynard Keynes. A
base central de tais polticas a ativa interveno do Estado, tanto na regulao das atividades econmicas,
como na formulao e garantia de execuo de polticas pblicas de proteo e seguridade social. 12 O histrico sobre Friedrich Hayek e suas posies polticas e ideolgicas baseia-se no trabalho de
ARANTES (2001a, b e c). 13 Segundo ARANTES (2001a): Friedrich Hayek e Milton Friedman so considerados os dois maiores representantes da corrente de pensamento neoliberal. (...) Friedman dedicou seus trabalhos importncia
da poltica monetria. totalmente contra qualquer medida governamental de natureza fiscal ou monetria
para contrabalanar os ciclos econmicos. (...) O sentido geral de sua obra, assim como a de Hayek um
retorno ao liberalismo do laissez-faire..
43
Michael Polanyi, Salvador Madriaga entre outras personalidades de diversos pases que
compartilhavam de sua orientao ideolgica. Durante vinte e cinco anos as atividades da
Sociedade, apesar da sua dedicao e organizao, inclusive com reunies internacionais a
cada dois anos, no passaram de pregao ideolgica marginal. Suas idias ficaram
confinadas ao meio acadmico, vistas com desdm, consideradas como uma coisa meio
extica, embora durante esse perodo tenham travado vrias polmicas contra o
keynesianismo e o marxismo. A idia central a de que qualquer limitao dos
mecanismos de mercado por parte do Estado, se tornaria ameaa liberdade econmica.
Para os neoliberais a esfera do mercado a da liberdade e a esfera do Estado a da coao.
A interveno do Estado na economia e a regulao social eram os temas que eram objetos
de seu mais ferrenho combate. Qualquer tipo de planejamento da economia classificado
como totalitarismo, porque ao levar em conta os interesses da coletividade, entra em
conflito com os interesses individuais, que so os nicos que realmente existem e
interessam.
Tal viso identifica os interesses coletivos como o mero somatrio de
interesses individuais idnticos de muitos indivduos. Por esta razo, o Estado somente
pode atuar numa esfera em que no limite a liberdade individual, ou seja, a garantia da
propriedade privada e do livre mercado, o que leva a concluso inevitvel que somente
no capitalismo possvel a liberdade. A liberdade colocada no campo essencialmente
econmico e no poltico. Hayek defendia que o novo igualitarismo promovido pelo
Estados de Bem-Estar Social, destruiria a liberdade dos cidados e a vitalidade da
concorrncia, fato que logo viria a abalar a sade econmica da sociedade. Afirmava que a
desigualdade era um valor positivo e at imprescindvel, sem o qual o desenvolvimento do
esprito empreendedor dos indivduos ficaria comprometido e viria a refletir no
desenvolvimento econmico. A produo de desigualdades pelo Estado de Direito no
seriam criadas intencionalmente, pois no visariam atingir a uma pessoa determinada. No
caberia ao Estado promover uma igualdade substantiva, material, apenas a igualdade
formal, porque isto afetaria o Estado de Direito e a liberdade individual.
Com os elementos de crise econmica que comeam a germinar e vo
anunciando o fim dos trinta gloriosos anos do capitalismo (1945-1975), as idias
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neoliberais vo tomando a cena poltica e conseguem reunir fora material para se
transformarem em polticas de governo.
Na base dessa crise econmica, est a crise do padro de acumulao fordista,
com o enfraquecimento da produtividade, por um lado, e o crescente aumento da
composio orgnica do capital, por outro, levando a uma diminuio constante da taxa
mdia de lucro e, conseqentemente, a crise de rentabilidade do sistema como um todo.
Nos pases mais desenvolvidos, pressionados pelo crescente dficit fiscal,
conjugado com os dois choques do petrleo (1973 e 1979), cresce a presso econmica,
ideolgica e poltica para a implementao de solues alternativas ao keynesianismo.
Porm, a primeira experincia a cu aberto, o primeiro laboratrio de
implantao das teses neoliberais, aconteceu no Chile. Em 1973, com o golpe militar
liderado por Pinochet, aparecem as condies polticas ideais para tal. Foram chamados
para assumir o controle da economia chilena, economistas da Universidade de Chicago, os
Chicago Boys, sob a direo do prprio Milton Friedman. A especificidade da
experincia Chilena que alm do ineditismo, foi possvel tambm comprovar na prtica
as convices de Hayek, que achava que a liberdade e a democracia poderiam se tornar
incompatveis com o desenvolvimento econmico, se a maioria democrtica decidisse
interferir com os direitos incondicionais de cada agente econmico de dispor de sua renda
e de sua propriedade como quisesse. Dito de outra forma: a democracia pode ser o melhor
regime poltico para que o projeto neoliberal se desenvolva, mas se no for possvel ... far-
se- da mesma maneira.
A partir da chegada ao poder de Margareth Thatcher (de quem Hayek foi
conselheiro), na Inglaterra, em 1979 e de Ronald Reagan nos Estados Unidos, em 1980, o
mundo desenvolvido vai conhecer o remdio amargo que advm da aplicao do projeto
econmico neoliberal. A responsabilidade pela crise do modelo keynesiano de
desenvolvimento, foi atribuda pelos neoliberais s reivindicaes do Movimento Sindical,
que ao serem atendidas geraram desequilbrios com gastos maiores que as receitas, levando
os estados capitalistas a viverem uma dramtica crise fiscal. A partir da, o neoliberalismo
ganha fora poltica para se transformar em credo social, que comea a se espalhar pelo
mundo. Depois dos pases desenvolvidos, comea a tomar conta dos pases dependentes, e
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ajudado pela debacl do chamado campo socialista na Europa Oriental e Unio Sovitica,
hoje se tornou a orientao dominante em dois teros do mundo, embora no sem
resistncias e combates. Tal razo de natureza poltica foi fundamental para a consolidao
do neoliberalismo como ideologia poltica e programa econmico dominante: no existiria
mais o risco do comunismo e a burguesia no necessitava mais se preocupar em atender
as reivindicaes do proletariado. Voltava ordem do dia a possibilidade de um
capitalismo sem controle, como na Primeira Revoluo Industrial.
Segundo JOFFILY (1999: 11-13), o neoliberalismo uma ofensiva geral do
grande capital, especialmente norte-americano, num clima de crise econmica. Ofensiva,
porque com a derrota momentnea da experincia socialista sovitica, o capitalismo que
est no ataque com toda agressividade, obrigando o Movimento Sindical a adotar uma
estratgia defensiva, de resistncia. Geral, porque atinge o planeta inteiro e porque
transborda do campo econmico, para o poltico, militar, diplomtico, ideolgico, artstico,
cultural, educacional. Do grande capital, porque o neoliberalismo tem um claro sentido de
classe, burgus. Norte-americano, pois nem todas as burguesias tem o mesmo interesse no
projeto neoliberal, que um mecanismo para os Estados Unidos se tornarem o grande
globalizador, no s dos pases dependentes, mas avanando sobre as demais metrpoles
capitalistas. Crise, pois o neoliberalismo, alm de socialmente perverso fracassou
economicamente, em especial nos pases dependentes como o Brasil.
CASTRO (2003) acrescenta:
(...) remercantilizao das relaes capitalistas de trabalho uma decorrncia lgica da ofensiva poltica neoliberal e tambm o principal
trao social do novo tipo de desenvolvimento capitalista: acumulao concentradora sob o comando do capital financeiro mundializado.
Subordinao mais completa do trabalho ao capital significa, obviamente,
controle pleno do capital sobre os processos (diretos e indiretos) de produo e distribuio de riqueza e, igualmente, perda daquele grau de relativa
autonomia social e poltica que a classe operria tinha conquistado no ltimo
meio sculo de luta de classes.
Porm, os prprios arautos do capitalismo, por vezes deixam escapar
comentrios acerca da sua verdadeira essncia. HOBSBAWM (2001: 552) cita um
editorial do Financial Times de 24 de dezembro de 1993:
Continua sendo, no entanto, uma fora imperfeita (...) Cerca de dois teros da populao mundial ganharam pouca ou nenhuma vantagem com
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o rpido crescimento econmico. No mundo desenvolvido, o mais baixo quartil
de assalariados testemunhou mais um respingar para cima que um respingar
para baixo.
Novamente JOFFILY (1999: 13-15), vem nos ajudar a explicitar os efeitos da
aplicao de tal poltica nos pases dependentes, onde a implementao do projeto
neoliberal se articula a partir de uma frmula-padro: desproteo, desregulamentao,
desestatizao, desnacionalizao e desemprego.
A desproteo atinge em especial as relaes trabalhistas. No tempo em que
existia o campo socialista como uma alternativa, a economia crescia e o Movimento
Sindical tambm, a burguesia assustada concordou em entregar alguns anis. Hoje nenhum
dos trs fatores existe e os anis esto sendo tomados de volta com juros. O mercado deve
decidir tudo, a nova verdade do momento. O resultado: terceirizao, contrato
temporrio, desregulamentao de direitos, inchao do mercado informal, livre
negociao...
A desregulamentao significa total liberdade para o capital estrangeiro pilhar
os pases. Os Estados nacionais deixam de exercer a funo de defenderem suas
economias. Reservas de mercado ou Leis de proteo indstria nacional viraram tabus.
No Brasil, a prpria distino entre empresa nacional e estrangeira foi cortada da
Constituio. Sem qualquer tipo de barreira ou proteo para a economia nacional, a
abertura indiscriminada das importaes destruiu ramos industriais inteiros.
A desestatizao a transferncia do patrimnio pblico para os capitais
privados. Alm dos ganhos financeiros, por tabela se manieta a capacidad
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