Matheus Curado Ferreira
A Física das Extensões Autoadjuntas : Partícula na
Caixa.
Niterói
2019
Matheus Curado Ferreira
A Física das Extensões Autoadjuntas : Partícula na Caixa.
Trabalho de monografia apresentado
ao curso de graduação em Física -
Bacharelado, da Universidade Federal
Fluminense, como requisito parcial à
conclusão do curso.
Universidade Federal Fluminense
Orientador: Prof. Dr. Rubens L.P.G. do Amaral
Niterói
2019
Matheus Curado Ferreira
A Física das Extensões Autoadjuntas : Partícula na Caixa.
Trabalho de monografia apresentado
ao curso de graduação em Física -
Bacharelado, da Universidade Federal
Fluminense, como requisito parcial à
conclusão do curso.
Prof. Dr. Rubens L.P.G. do AmaralUniversidade Federal Fluminense - UFF
Prof. Dr. Nivaldo A. LemosUniversidade Federal Fluminense - UFF
Prof. Dr. Marco MoriconiUniversidade Federal Fluminense - UFF
Niterói
2019
Scanned by CamScanner
Ficha catalográfica automática - SDC/BIFGerada com informações fornecidas pelo autor
Bibliotecário responsável: Mario Henrique de Oliveira Castro - CRB7/6155
F383f Ferreira, Matheus Curado A Física das Extensões Autoadjuntas : Partícula na Caixa./ Matheus Curado Ferreira ; Rubens Luis Pinto Gurgel doAmaral, orientador. Niterói, 2019. 43 f.
Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Física)-Universidade Federal Fluminense, Instituto de Física,Niterói, 2019.
1. Extensões Autoadjuntas. 2. Partícula na Caixa. 3.Interações tipo Delta de Dirac. 4. Física Matemática. 5.Produção intelectual. I. Amaral, Rubens Luis Pinto Gurgeldo, orientador. II. Universidade Federal Fluminense. Institutode Física. III. Título.
CDD -
O mistério da beleza é descrito pelas curvas que
compõem o indivíduo, assim como a Física de
um problema, que se encontra nas condições de
contorno.
Resumo
Neste trabalho faremos uso de técnicas desenvolvidas em Física Matemática, para
tentar esclarecer algumas questões sobre um dos problemas mais elementares
abordado em cursos de graduação em Física, normalmente na disciplina de Mecânica
Quântica. Quando sujeitamos uma partícula confinada em uma dimensão a condições
de contorno mais gerais possíveis, surgem estados de energia negativa. O que seriam
esses estados? Já que não há interação com nenhum potencial tipo poço, qual
é a sua origem? Apresentamos um estudo da Física das extensões autoadjuntas
de operadores simétricos, e por consequência desenvolvemos uma proposta para
explicar tal fenômeno.
Palavras-chave: Extensões Autoadjuntas, Partícula na Caixa, Interação
tipo Delta de Dirac, Estabilidade das Condições de Contorno, Física
Matemática.
Abstract
In this paper we will use techniques developed in Mathematical Physics, to try to
clarify some questions about one of the most elementary problems addressed in
undergraduate Physics courses, usually in the discipline of Quantum Mechanics.
When we subject a one dimensional confined particle to the most general boundary
conditions possible, negative energy states arise. What are these states? Since
there is no interaction with any potential wells. We show a study about the physics of
self-adjoint extensions of symmetric operators, and in consequence develop a proposal
to explain such phenomenon.
Keywords: Self-Adjoint Extensions, Particle in a Box, Dirac Delta type
interaction, Boundary Conditions Stability, Mathematical Physics.
Sumário
1 Introdução 10
2 Operadores Simétricos e Autoadjuntos em Mecânica Quântica 13
2.1 Operadores Simétricos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
2.1.1 Operador Momento confinado em 1D . . . . . . . . . . . . . . . 14
2.2 Adjunto de um Operador . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
2.3 Operador Autoadjunto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
2.4 Indices de deficiência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18
2.4.1 Operador Momento confinado em 1D . . . . . . . . . . . . . . . 18
3 Operador H confinado em 1D 21
4 Operador H com interações tipo Delta de Dirac 26
4.1 Delta de Dirac na Origem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
4.1.1 Operador Adjunto de H . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
4.2 Operador H no domínio D(R̊)
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
4.2.1 Formas de Assimetria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
4.3 Funções Delta de Dirac . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
5 E.A.A num intervalo a partir de funções Delta de Dirac 34
5.1 Transmutação das condições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34
5.1.1 Casos especiais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
5.2 Autovalores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
6 Conclusão 39
Apêndice A -- Condições de contorno a partir das funções teste 40
Referências Bibliográficas 43
10
1 Introdução
A mecânica quântica trouxe grandes inovações, marcando uma nova era
na ciência, onde o homem passa a acessar escalas atômicas, podendo assim
desenvolver novos materiais como transistores, semicondutores, prever a existência
de novas partículas, estudar efeitos de magnetização, supercondutividade e
superfluidez dentre outros fenômenos. Ela traz a tona o caráter discreto da natureza,
baseada em seis postulados e com uma matemática própria regida pela álgebra linear,
mas com algumas sutilezas.
Com um Nobel em 1932 [7], W. Heisenberg Formaliza essa teoria, que vinha
emergindo de grandes resultados como o efeito fotoelétrico [5] e o trabalho de Max
Planck para com a catástrofe ultravioleta [6]. Em 1933 fica irrefutável a eficácia
da mecânica quântica, quando Dirac e Schrödinger, dividem o Prêmio Nobel pela
descoberta de novas formas produtivas da teoria atômica [8]. Essencialmente, Erwin
Schrödinger com sua célebre equação, traz à tona o caráter ondulatório da matéria, e
sua relação direta com a óptica, já Paul A.M. Dirac, cria uma formulação relativística
para o elétron, e em consequência prevê a existência do pósitron, a antipartícula do
elétron, ou seja, sua antimatéria.
Nos cursos de graduação em física é comum o estudo de tal disciplina, mas
pouco se fala sobre os bastidores dessa teoria, de fato, os grandes nomes citados
anteriormente tiveram um protagonismo essencial em cada um de seus trabalhos,
mas nenhuma teoria que leva décadas para se desenvolver, pode se dar luxo de ter
somente alguns nomes, muitas foram as contribuições. John von Neumann foi um
dos grandes matemáticos que notou que a estrutura lógica de sistemas quânticos era
diferente da de sistemas clássicos. Em 1929 ele lança um trabalho sobre operadores
Hermitianos não limitados [3], trazendo à tona o importante trabalho de David Hilbert,
que gerou os então conhecidos espaços de Hilbert, que é uma generalização do
espaço euclidiano que não precisa estar restrita a um número finito de dimensões.
O objetivo dessa monografia é apresentar o conceito de operador autoadjunto, e
1 Introdução 11
discutir sua importância para uma interação delta de Dirac, definida em um domínio
finito. Usamos como referência trabalhos publicados recentemente, e alguns livros
destinados a cursos de pós-graduação em física. A compreensão da noção sobre
as famílias de extensões autoadjuntas de operadores simétricos é cada vez mais
importante. A relação entre essas famílias e as condições de contorno está na raiz
de diversas aplicações modernas, dado que um observável mensurável é descrito por
um único operador autoadjunto. Em [1] M.Asorey, mostra que tanto para uma teoria
bosônica, quanto para uma teoria fermiônica, o princípio fundamental da conservação
de carga, está fortemente relacionado ao fato do Hamiltoniano ser autoadjunto.
Agora peço a atenção do leitor para um trabalho muito interessante que ilustra a
importância dos operadores em mecânica quântica. Que se encontra em [2] e mostra
um "aparente paradoxo". Vamos considerar a seguinte situação, uma partícula num
poço infinito unidimensional, ou seja,
V (x) = 0, x ∈ [−L2,L2]; V (x) = ∞, |x| ≥ L
2. (1.1)
Onde os estados estacionários são dados por Hψ = Eψ, e H é definido da seguinte
forma,
H ≡− h̄2d2
2mdx2 , D(H) =
{φ , Hφ ∈ L2(−L
2,L2), φ(±L
2) = 0
}. (1.2)
Dados os seguintes autoestados,
Ψn(x) =
√2L
cos[(2n−1)πx
L
], E ′n =
h̄2
2m
((2n−1)π
L
)2
, (1.3)
que representam as autofunções normalizadas de paridade par, para uma partícula
de massa m confinada em [−L2 ,+
L2 ] por um poço de potencial infinto unidimensional
com a condição de contorno Ψ(±L2 ) = 0, podemos tomar um estado definido, tal que
Ψ =−√
30L5 (x
2− L2
4), |x| ≤ L
2; Ψ(x) = 0, |x| ≥ L
2. (1.4)
Fazendo uma expansão nas autofuncões dadas em (1.3), encontramos
Ψ(x) = ∑bnΨn(x), bn = (Ψn,Ψ) =(−1)n−1
(2n−1)38√
15π3 . (1.5)
1 Introdução 12
Quando tomamos 〈E2〉, temos 1
〈E2〉= ∑ |bn|2(En)2 =
240h̄4
m2π2L4 ∑1
(2n−1)2 =30h̄4
m2L4 . (1.6)
Mas por outro lado,
〈E2〉= (Ψ,H2Ψ) = 0, (1.7)
ou seja, aqui reside um paradoxo, será que toda a mecânica quântica foi por água
baixo? A resposta é não! As funções φ possuem uma restrição segundo a definição
do operador (1.2), mas HΨ não, o que nos leva à
(HΨ,HΨ) 6= (Ψ,H2Ψ). (1.8)
Mas como assim?! O que ocorre aqui é que a função HΨ não vai a zero nos extremos,
não há restrição para HΨ, ou seja, HΨ não pertence ao domínio do operador H. Em
muitos livros-texto a nível de graduação, a definição de operador envolve somente a
ação que esse operador realiza. Mas uma definição mais rigorosa, deveria explicitar
também o domínio em que ele atua. Afinal queremos encontrar observáveis, ou seja,
operadores que estejam de acordo com as leis fundamentais da Mecânica Quântica.
Como foi dito anteriormente eles devem ser autoadjuntos. E como saber se são, ou
não? Abordaremos algumas técnicas para isso no Capítulo 2.
Começaremos a monografia revisando alguns conceitos que não são usualmente
abordados em um curso de graduação, apresentaremos o teorema de von Neumann
sobre os índices de deficiência, onde ele determina se um operador é ou não um
operador autoadjunto, e se não for, se existe uma extensão sua que seja.
Neste trabalho estamos interessados em estudar operadores autoadjuntos
que descrevem situações em que a partícula esteja confinada em um intervalo.
Discutiremos o que ocorre quando descontinuidades na função são geradas por um
potencial delta de Dirac e/ou sua primeira derivada adicionado ao Hamiltoniano livre.
Para o capítulo 2 os livros que ajudaram o desenvolver este trabalho foram [12] e
[14]. Já os capítulos três e quatro tivemos como referência [2], [9] e [10]. E o último
capítulo, foi a proposta apresentada por nós para explicar os fenômenos abordados
nos capítulos anteriores, mas o trabalho [11] foi de grande ajuda.
1A soma ∑1
(2n−1)2 pode ser obtida calculando a norma da função |x| através do teorema de Parsevalaplicado à sua série de Fourier calculada entre −π e π.
13
2 Operadores Simétricos eAutoadjuntos em MecânicaQuântica
Neste Capítulo discutiremos o teorema dos índices de deficiência de John von
Neumann, para isso é preciso revisar e aprender alguns conceitos sobre operadores
lineares autoadjuntos. Tomaremos como ponto de partida os operadores simétricos.
2.1 Operadores Simétricos
Comecemos definindo um operador linear.
Definição: Um operador A no espaço de Hilbert H é uma aplicação
x 7→ y = Ax , x ∈ D(A) , y ∈H
definida no subconjunto D(A) de H . O operador A é Linear se D(A) é um espaço
vetorial e
A(αx1 + βx2) = αAx1 + βAx2 , ∀ x1 , x2 ∈ D(A) ; ∀ α , β ∈ C .
Aqui D(A) é o domínio de A e y = Ax, é o conjunto de suas imagens. A partir daqui
podemos definir os operadores simétricos, ou Hermitianos.
Definição: Um operador linear B definido num domínio denso1 do espaço de Hilbert
é chamado simétrico se
(Bx,y) = (x,By) ∀x,y ∈ D(B) . (2.1)
1O leitor pode estar se perguntando, porque estamos falando de operadores densos? Ao invés deoperadores definidos em todo o espaço de Hilbert. A maioria dos operadores de interesse físico sãoilimitados, logo são no máximo densos em H . Isso é bem explicado no capítulos 11 e 12 de [12].Sugestão: faça a leitura sobre o teorema Hellinger-Toeplitz.
2.1 Operadores Simétricos 14
Equivalentemente, veremos, B é simétrico se e somente se D(B)⊂D(B†) e se Bx=B†x,
para todo x ∈ D(B). Vejamos a seguir um exemplo de uma partícula em 1D confinada
entre [0,L], para ilustrar a importância dos conceitos até aqui abordados.
2.1.1 Operador Momento confinado em 1D
Vamos considerar operador momento linear, P = −ih̄ ddx (onde por convenção
adotaremos h̄ = 1), agindo em um espaço de funções2 definidas no intervalo fechado
[0,L]. Seu domínio é inicialmente definido por,
D(P) = {φ ,φ ′ ∈ L2([0,L]);φ(0) = φ(L) = 0}. (2.2)
Se ele é simétrico deve valer que,
(Pφ ,ψ) = (φ ,Pψ) ∀φ ,ψ ∈ D(P) . (2.3)
Onde,
(Pφ ,ψ) =∫ L
0−i
dφ(x)dx
ψ(x)dx . (2.4)
De fato, integrando por partes,
(Pφ ,ψ) = iφ(x)ψ(x)|L0− i∫ L
0φ
dψ(x)dx
dx, (2.5)
ou seja,
(Pφ ,ψ)− (φ ,Pψ) = −i[φ(L)ψ(L)−φ(0)ψ(0)] = 0 . (2.6)
P será simétrico pois devido a (2.2), a última equação será satisfeita.
Tentemos resolver a equação de autovalores para esse operador:
−iddx
ψp(x) = pψp(x),
tem por solução única
ψp(x) = eipx,
que não pertence ao domínio do operador P, descrito em (2.2). Assim não
há autovetores (nem no sentido generalizado de funções não normalizáveis) e a
interpretação de P como observável é problemática.
Uma solução é definir condições menos restritivas, como por exemplo, uma
2é preciso especificar os requerimentos de "suavidade"para as funções φ e φ ′. Não discutiremosesse detalhe aqui.
2.2 Adjunto de um Operador 15
condição de contorno periódica
D0(P) = {φ ,φ ′ ∈ L2([0,L]);φ(L) = φ(0)}, (2.7)
que permitirá obter soluções da equação de autovalores para o operador e mais, os
autovalores definam um conjunto discreto.
Entretanto, poderíamos escolher condições mais gerais ψ(L) = eiθ ψ(0), e definir
um novo domínio Dθ (P) para P que será,
Dθ (P) = {φ ,φ ′ ∈ L2([0,L]);φ(L) = eiθφ(0)}, (2.8)
com θ ∈ [0,2π]. O que está acontecendo aqui? Cada valor diferente de θ dentro do
intervalo [0,2π], corresponderá a um operador distinto e a uma situação física diferente.
Um exemplo seria tomarmos θ = 0, e então cairíamos na situação usualmente
associada a uma partícula com condições periódicas numa caixa unidimensional, ou
uma partícula em um circulo. Agora se a partícula estiver carregada e imersa em um
campo magnético, a periodicidade da função pode ser modificada, e teremos θ 6= 0.
Concluímos que esse problema, operador momento em uma caixa unidimensional,
admite infinitas condições de contorno parametrizadas por θ . Dizemos que P tem
infintas extensões autoadjuntas(E.A.A’s), e que cada extensão dessa vai representar
uma física diferente.
2.2 Adjunto de um Operador
Assim como na seção anterior, aqui temos de rever alguns conceitos que
certamente foram estudados durante o curso de álgebra linear e que precisam de
um certo cuidado. Antes de definirmos o que é um operador autoadjunto, precisamos
definir o adjunto de um operador. Se B é um operador densamente definido, então o
adjunto de B, B† é único3.
Definição: Seja B : D(B) ⊆ H → H um operador linear densamente definido. Por
definição:
v ∈ D(B†) ,
3Se B não é denso em H , então B não admite um adjunto, pois haverá mais de um B† associado aB.
2.2 Adjunto de um Operador 16
se existe um vetor w ∈H , tal que
(v,Bu) = (w,u), ∀u ∈ D(B), (2.9)
e definimos:
B†v = w.
Assim, obtemos o operador adjunto B† : D(B†) ⊆H →H . Para que essa definição
faça sentido e w esteja univocamente definido, D(B) deve ser denso em H . De fato,
se a relação (2.9) é verdadeira, quando trocarmos w por w′ , então , teremos:
(w−w′,u) = 0, ∀u ∈ D(P) . (2.10)
Uma vez que D(B) é denso em H , concluímos que w = w′. Assim o adjunto B† está
univocamente definido.
Aqui devemos recobrar a atenção, uma vez que é fácil confundir os conceitos de
operador adjunto, autoadjunto e simétrico, vejamos a diferença definindo o operador
auto-adjunto. Vamos nos restringir a operadores B, que sejam simétricos, ou seja
que satisfazem à condição (2.1). Assim, para tal operador, qualquer elemento v do
seu domínio, permite definir um w = B†v, de tal modo que o par {v,w} satisfaz a (2.9)
levando a que v ∈ D(B†) e B†v = Bv. A questão é que em geral, os vetores do domínio
de B podem não esgotar o domínio de B†. Nesses casos o adjunto B† será uma
extensão do operador simétrico B, dizemos que B ⊂ B†. Como exemplo, aplicaremos
essa definição ao caso do operador momento linear (2.2), onde φ(0) = φ(L) = 0.
Seu adjunto é dado por,
(η ,φ) = (ψ,Pφ), ∀φ ∈ D(P), ∀ψ ∈ D(P†). (2.11)
Integrando por partes, temos
(ψ,Pφ) =−iψ(x)φ(x)|L0−∫ L
0(−i
dψ(x)dx
)φ(x)dx. (2.12)
Como o primeiro termo do lado direito da equação acima é nulo , devido a φ(0) =
φ(L) = 0, fica definido que η = Pψ, mas note que D(P) 6= D(P†).
2.3 Operador Autoadjunto 17
2.3 Operador Autoadjunto
Vejamos agora como é definido um operador autoadjunto, e a sutil diferença entre
ele, o adjunto e o operador simétrico.
Definição: Um operador T : D(T )→H densamente definido em H é dito ser um
operador autoadjunto se T = T †. Assim, um operador T : D(T )→ H densamente
definido é autoadjunto se D(T ) = D(T †) e T ψ = T †ψ para todo ψ ∈ D(T ) = D(T †).
Naturalmente, tem-se também (φ ,T ψ) = (T φ ,ψ) para todos φ ,ψ ∈ D(T ). É evidente
também que todo operador autoadjunto é simétrico.
A recíproca da última afirmação não é verdadeira! Como vimos em (2.1),
um operador pode ser simétrico, mas não necessariamente autoadjunto e isso
fica evidente quando calculamos seu adjunto (2.11). Em algumas literaturas,
principalmente as que são voltadas para a graduação, os operadores autoadjuntos
e simétricos (ou Hermitianos) são usados como sinônimos. Operadores simétricos,
mas não autoadjuntos, podem não ter um espectro real. Um exemplo simples de um
operador autoadjunto é o operador posição x̂ em H , é fácil ver que ele é simétrico,
pois ele satisfaz diretamente a relação (2.1),
(x̂φ ,ψ) =∫
∞
−∞
xφ(x)ψ(x)dx =∫
∞
−∞
φ(x)xψ(x)dx = (φ ,x̂ψ) . ∀ φ ,ψ ∈ D(x̂)⊆H . (2.13)
Já seu adjunto, ficará definido da seguinte forma : ∀ φ ∈ D(x̂†), ∃ ζ ∈H ; (ζ ,ψ) =
(φ ,x̂ψ) ∀ψ ∈ D(x̂), logo∫∞
−∞
ζ (x)ψ(x)dx =∫
∞
−∞
φ(x)xψ(x)dx =∫
∞
−∞
xφ(x)ψ(x)dx (2.14)
donde, ∫∞
−∞
ζ (x)− xφ(x) ψ(x)dx = 0 =⇒ (ζ − xφ ,ψ) = 0 ∀ψ ∈ D(x̂). (2.15)
Como D(x̂) é denso em H , e a equação acima diz que xφ = ζ ∈H , isso implica que
φ ∈ D(x̂), o que nos leva à D(x̂†) = D(x̂), ou seja, x̂ é autoadjunto.
Dessa forma, fica clara a sutil diferença entre os operadores e a necessidade de
se definir o domínio no qual eles atuam.
2.4 Indices de deficiência 18
2.4 Indices de deficiência
A técnica desenvolvida por von Neumann e 1929 [3], nos permite saber se um
operador simétrico pode ser estendido ou não, a um operador autoadjunto, além disso
existe uma sistemática para construir as diversas extensões autoadjuntas (E.A.A’s).
Nosso intuito aqui é fazer uso dessa ferramenta, deixaremos a referência de um artigo
mais recente onde se faz uma revisão deste teorema, de uma forma mais rigorosa em
[4]. Na teoria de von Neumann dois subespaços associados a um operador, serão
chamados de subespaços de deficiência, dados por
N+ = {ψ ∈ D(A†), A†ψ =+iλψ λ > 0},
N− = {ψ ∈ D(A†), A†ψ =−iλψ λ > 0},
e os índices de deficiência (n+,n−) serão definidos por
n+ = dimN+ ,
n− = dimN− .
Teorema: Para um operador A com índices de deficiência (n+,n−) existem três
possibilidades:
1. Se n+ = n− = 0, então, A é essencialmente4
2. Se n+ = n− = n ≥ 1, então, A admite infinitas extensões autoadjuntas,
parametrizadas pela matriz unitária n×n (n2 parâmetros reais).
3. Se n+ 6= n−, então A não tem extensões autoadjuntas.
Uma vez encontrado o domínio em que P é simétrico, devemos a partir das
definições e usando o teorema acima, determinar os índices de deficiência, daí
descrever o domínio de todas as extensões autoadjuntas. A seguir apresentaremos
alguns exemplos que serão úteis para a discussão do próximo capítulo.
2.4.1 Operador Momento confinado em 1D
Aplicando o teorema dos indices de deficiência ao caso (2.2), dado que seu
adjunto já foi calculado em (2.11), temos que a dimN± é encontrado a partir das4Se um operador é essencialmente adjunto, então A† é uma extensão de A , de tal forma que A† atua
no limite de qualquer sequência convergente definida no domínio de A.
2.4 Indices de deficiência 19
soluções linearmente independentes de,
P†ψ±(x) = (−i
ddx
)†ψ±(x) =±iλψ±(x) . (2.16)
Onde são soluções,
ψ±(x) = Be∓λx. (2.17)
Como estamos em um intervalo finito [0,L] , ambas as soluções ψ±(x) = Be∓λx são
de quadrado integrável, ou seja, os índices de deficiência são (1,1). Sabemos pelo
teorema de von Neumann, que essas extensões autoadjuntas são parametrizadas por
U(1), o que está de acordo com o que vimos anteriormente em (2.1.1). Vamos denotar
essas extensões por Pθ = (P,Dθ ), que são dadas por,
Dθ (P) = {φ ,φ ′ ∈ L2([0,L]);φ(L) = eiθφ(0)} . (2.18)
A partir dessas novas condições de contorno, podemos encontrar os autovalores e os
autovetores,
Pθ φn(x,θ) =2π
Lvφn(x,θ), v = n+
θ
2π, n = 0,±1,±,2,... (2.19)
φn(x,θ) =1√L
e2iπv xL , (φm,φn) = δ[mn . (2.20)
Qual a importância disso? Para ilustrar, voltemos ao problema abordado na introdução
deste trabalho (1.3). Aqui faremos uma translação para que a função de onda se
adéque ao domínio que estamos trabalhando, ou seja x→ x+ L2 , que nos leva à
Ψ =
√30L5 x(x−L). (2.21)
Sua expressão em autofunções é dada por,
Ψ = ∑cn(θ)ψn(x,θ) , (2.22)
com coeficientes
cn(θ) =−√
306
[cos(
θ
2)−
sin(θ
2 )
πv
]e−i θ
2 . (2.23)
Aqui podemos observar que a probalibildade de encontrar uma partícula de momento2πv
L irá depender de θ , ou seja para cada θ haverá uma física diferente.
Um outro caso interessante que ilustra a importância do teorema de John von
Neumann, é o operador momento definido no eixo real, ou seja de (−∞,+ ∞), as
soluções (2.15) nesse caso não serão de quadrado integrável, assim os índices de
2.4 Indices de deficiência 20
deficiência passam a ser (0,0) e o operador é autoadjunto. Entretanto, se definirmos o
operador apenas no semi-eixo real (0,∞), é fácil ver que uma das soluções de (2.15)
é de quadrado integrável, e a outra não! O que nos leva a concluir que os índices de
deficiência são (1,0), ou seja, não existem extensões autoadjuntas (E.A.A’s) para o
operador momento definido no semi-eixo real.
21
3 Operador H confinado em 1D
Seguindo os mesmos passos da seção anterior, agora faremos o caso para
operador hamiltoniano definido como H = − 12m
d2
dx2 (por conveção faremos m = 12 ).
Estamos trabalhando no espaço de Hilbert L2(a,b), ou seja, buscamos autofunções
que sejam de quadrado integrável num domínio D(a,b). Primeiramente vamos
considerar o operador (H,D0(H)), tal que
D0(H) = {φ ∈ Dmax(0,L) ∈ L2([0,L]) , φ(0) = φ(L) = φ′(0) = φ
′(L) = 0}; (3.1)
seja densamente definido. O termo Dmax simboliza o conjunto de funções que são
duplamente diferenciáveis, tal que a derivada segunda seja de quadrado integrável.
É fácil ver que H é simétrico, pois satisfaz
(Hψ,φ) = (ψ,Hφ), ψ,φ ∈ D0(H) . (3.2)
Assim, o adjunto de H é definido da seguinte forma, H†ψ = ψ̃, com a igualdade a
seguir válida para qualquer φ ∈ D0
(ψ̃,φ) = (ψ,Hφ), D(H†) = Dmax(0,L) . (3.3)
Mas,
(ψ,Hφ) =∫ L
0ψ(x)(−d2φ(x)
dx2 )dx (3.4)
integrando por partes, temos
−ψ(x)φ′(x)|L0 +
∫ L
0ψ′(x)φ
′(x)dx . (3.5)
Integrando por parte novamente o último termo, encontramos que
(ψ,Hφ) =−ψ(x)φ′(x)|L0 +ψ
′(x)φ(x)|L0−
∫ L
0(d2ψ(x)
dx2 )φ(x)dx , (3.6)
3 Operador H confinado em 1D 22
mas os dois primeiros termos são nulos devido a condição (3.1), ou seja,
(ψ,Hφ) =∫ L
0(−d2ψ(x)
dx2 )φ(x)dx≡ (H†φ ,ψ) . (3.7)
Concluímos então que ψ̃ = H†ψ =−d2ψ(x)dx2 , que define o adjunto de H.
Para encontrar os índices de deficiência, resolveremos
(− d2
dx2 )†ψ(x) =±ik2
0ψ(x), (3.8)
com k0 > 0 e que nos levará à,
− d2
dx2 ψ(x)∓ ik20ψ(x) = 0, (3.9)
que é parecida com a equação de um oscilador harmônico simples. Suas soluções
são dadas por,
φ± = a±ek±x +b±e−k±x, k± =(1∓ i)√
2k0 . (3.10)
Agora estejamos atentos ao caso que corresponde o kernel deste trabalho. Como não
há restrição nos valores das funções ψ(x) nos extremos, todas as soluções de (3.9)
pertencem a L2(0,L) e ambas são linearmente independentes, temos que os índices
são n+ = n− = 2, ou seja, as E.A.A’s são parametrizadas pelas matrizes U(2). Para
descrever essas matrizes e consequentemente as condições de contorno, faremos uso
da forma sesquilinear "B(φ ,ψ)", que pode ser construída a partir do produto interno
B(φ ,ψ)≡ 12i((H†
ψ,φ)− (ψ,H†φ)), (3.11)
(H†φ ,ψ) =−φ
′(x)ψ(x)|L0 +
∫ L
0φ′(x)ψ
′(x)dx . (3.12)
(φ ,H†ψ) =−φ(x)ψ
′(x)|L0 +
∫ L
0φ′(x)ψ
′(x)dx . (3.13)
(H†φ ,ψ)− (φ ,H†
ψ) = φ(L)ψ′(L)−φ
′(L)ψ(L)−φ(0)ψ
′(0)+φ
′(0)ψ(0) . (3.14)
Mas estamos em dívida com o leitor! Pois nada falamos sobre essa nova ferramenta
apresentada em (3.11), isso será devidamente esclarecido no próximo capítulo.
Voltando ao problema, como definimos que o estado φ pertence ao domínio em
que estamos avaliando este operador H, faremos ψ =⇒ φ para que B(φ ,ψ) =⇒B(φ ,φ) e num Dmax(0,L) vamos exigir que B(φ ,φ) seja identicamente nulo. Assim
conseguiremos construir nossas condições de contorno,
(H†φ ,φ)− (φ ,H†
φ) = φ(L)φ′(L)−φ
′(L)φ(L)−φ(0)φ
′(0)+φ
′(0)φ(0) . (3.15)
3 Operador H confinado em 1D 23
que nos leva à,
B(φ ,φ) =12i((φ(L)φ
′(L)−φ
′(L)φ(L)−φ(0)φ
′(0)+φ
′(0)φ(0))) . (3.16)
Dada a identidade,12i(xy− xy) =
14(|x+ iy|2−|x− iy|2), (3.17)
e aplicando x= Lφ′(L) e y= φ(L) de um lado e x= Lφ
′(0) e y= φ(0) de outro, chegamos
em um soma de termos positivo definidos com outros negativos
4LB(φ ,φ) = |Lφ′(0)− iφ(0)|2 + |Lφ
′(L)+ iφ(L)|2−|Lφ
′(0)+ iφ(0)|2−|Lφ
′(L)− iφ(L)|2 .
O domínio que admite a extensão autoadjunta é um subespaço de Dmax(0,L) onde
B(φ ,φ) é identicamente nulo. Assim conseguimos as condições de contorno que
estendem o operador H e ao mesmo tempos restringem o operador H† para que
fiquem iguais. De fato o lado direito da equação anterior se anula se montamos as
condições de contorno da seguinte forma,(Lφ
′(0)− iφ(0)
Lφ′(L)+ iφ(L)
)=U
(Lφ
′(0)+ iφ(0)
Lφ′(L)− iφ(L)
). (3.18)
Aqui aparece a matriz unitária U . Cada escolha de U define um operador HU = H†U . O
conjunto de todas as matrizes U define a família de E.A.A,s.
Para analisar U façamos a seguinte parametrização,
U = eiψM, detM = 1, =⇒ detU = e2iψ , ψ ∈ [0,2π] . (3.19)
E para construir M usaremos as matrizes de Pauli,
τ1 =
(0 1
1 0
), τ2 =
(0 −i
i 0
), τ3 =
(1 0
0 −1
). (3.20)
introduzindo as quatro coordenadas mµ a matriz M será,
M =
(m0− im3 −m2− im1
m2− im1 m0 + im3
)= m0I− i~m.~τ . (3.21)
A condição de detM = 1 é obtida com as coordenadas m = (m0,~m) restringidas por
m20 +~m.~m = 1, ⇐⇒ m ∈ S3 . (3.22)
Então, tomando como ponto de partida (3.18) podemos calcular o espectro do
3 Operador H confinado em 1D 24
Hamiltoniano numa caixa.
Soluções propostas:
φ(s,x) = AeisxL +Be
−isxL , Φ =
(A
B
). (3.23)
Substituindo em (3.18), podemos definir duas novas matrizes,(Lφ
′(0)− iφ(0)
Lφ′(L)+ iφ(L)
)= iR(s)Φ,
(Lφ
′(0)+ iφ(0)
Lφ′(L)− iφ(L)
)= iT (s)Φ . (3.24)
Onde,
R(s) =
(s−1 −s−1
(s+1)eis −(s−1)e−is
), T (s) =
(s−1 −s+1
(s−1)eis −(s+1)e−is
). (3.25)
Enfim, chegamos a duas equações
(R(s)−UT (s))Φ = 0 , (3.26)
det(R(s)−UT (s)) = 0 . (3.27)
E é a segunda equação na qual estamos interessados, pois ela nos fornece o espectro
do Hamiltoniano. A partir dela, um cálculo direto usando a seguinte identidade (válida
para matrizes 2×2),
det(A−B) = detA+detB+ tr(AB)− trA× trB , (3.28)
leva às descrições dos autovalores
E =s2
L2 > 0, 2s[sin(ψ)cos(s)−m1] = sin(s)[cos(ψ)(s2 +1))−m0(s2−1))] (3.29)
E = 0, s =⇒ 0 ↔ 2sin(ψ)− cos(ψ) = 2m1 +m0 (3.30)
E =− r2
L2 < 0, s = ir ↔ 2r[sin(ψ)cosh(r)−m1] = sinh(r)[−cos(ψ)(r2−1))+m0(r2+1)]
(3.31)
Aqui observamos que os autovalores não dependem dos parâmetros m2 e m3. O
resultado mais interessante descrito por esse espectro são as possíveis soluções de
energia negativa E < 0, que não são comuns em casos de partícula em um poço.
Mas então, o que está acontecendo aqui? Será que para uma partícula confinada
numa caixa, existem possíveis estados de energia negativa? O que eles representam
fisicamente? E porquê não são soluções quando sujeitamos a partícula a condições
3 Operador H confinado em 1D 25
de contorno mais "triviais"? (exemplo 2.1.1).
Um caso curioso que ressalta a importância do estudo de E.A.A,s é apresentado
no livro Problems Solutions in Nonrelativistic Quantum Mechanics de Anton Z. Capri
[13]. No exercício 6.8 do capítulo 6, ele propõe que encontremos os índices de
deficiência e todas as E.A.A’s para o operador Hamiltoniano num intervalo finito (o
mesmo problema abordado nesta seção). Porém ao resolver o problema, Capri faz
uma escolha em sua solução que limita suas condições de contorno, logo ele não
mapea todas as E.A.A,s pois a condição de contorno que ele calcula, não é a mais
geral1.
1A condição de contorno mais geral para esse problema foi calculada neste trabalho, e se encontraem (3.18)
26
4 Operador H com interações tipoDelta de Dirac
Com o objetivo de responder as questões que surgiram no capítulo anterior,
faremos uma análise no caso em que o operador hamiltoniano para uma partícula
livre no espaço infinito, é acrescido de um potencial delta de Dirac ou derivada da
delta de Dirac.
4.1 Delta de Dirac na Origem
Aqui devemos ter muita cautela, pois não sabemos como as funções ψ e φ ,
respondem ao acoplamento da delta no hamiltoniano. Dado isso, façamos a seguinte
suposição: Iniciamos com um operador H definido em L2(R) exceto em algum intervalo
na origem, ou seja
DH = D(R̊)= D(−∞,0)∪D(0,+∞),R̊= (−∞,0)∪ (0,+∞), (4.1)
onde todas as funções ψ são absolutamente contínuas e elas e suas derivadas, vão a
zero em vizinhanças próximas da origem (x = 0). Esse comportamento na vizinhança
de x = 0 caracteriza uma possível singularidade induzida por interações tipo delta. O
subespaço D(R̊)
é denso em L2(R).
Nosso operador ficará definido como,
H :
{DH = D
(R̊),
Hψ =−d2ψ
dx2
∀ψ ∈ D(R̊). (4.2)
É fácil observar que esse operador é simétrico, pois
(Hψ,φ) = (ψ,Hφ) ∀ψ ∈ DH .
Agora devemos encontrar o adjunto deste operador.
4.1 Delta de Dirac na Origem 27
4.1.1 Operador Adjunto de H
Sendo H densamente definido num espaço de Hilbert H , D(H†) é o conjunto de
vetores ψ ∈H para os quais existem ψ̃ ∈H tal que
(ψ̃,φ) = (ψ,Hφ) ∀φ ∈ DH (4.3)
Resolver o lado direito da equação acima, seria repetir a mesma conta já realizada no
capítulo anterior (3.6) , que nos leva à
(ψ,Hφ) =−ψ(x)φ′(x)|
′∞−∞ +ψ
′(x)φ(x)|
′∞−∞−
∫∞
−∞
(d2ψ(x)
dx2 )φ(x)dx (4.4)
Como estamos lidando com um domínio que não inclui a origem, as duas primeiras
equações do lado direito de (4.4) se reescrevem da seguinte maneira,
−ψ(x)φ′(x)|
′∞−∞ =−ψ(x)φ
′(x)|∞0 −ψ(x)φ
′(x)|0−∞ (4.5)
e
ψ′(x)φ(x)|
′∞−∞ = ψ
′(x)φ(x)|∞0 +ψ
′(x)φ(x)|0−∞ (4.6)
Como as funções vão a zero no infinito, nos sobra a seguinte expressão,
−ψ(0+)φ′(0+)+ψ(0−)φ
′(0−)+ψ
′(0+)φ(0+)−ψ
′(0−)φ(0−) (4.7)
Observe que todos os termos da equação acima são nulos, pois φ é nulo na origem,
o que reduz a expressão (4.4), para a seguinte forma
(ψ,Hφ) =−∫
∞
−∞
(d2ψ(x)
dx2 )φ(x)dx (4.8)
em outras palavras,
(ψ,Hφ) = (H†ψ,φ) = (−d2ψ(x)
dx2 ,φ(x)), (4.9)
que define o adjunto do operador H. A seguir faremos uma breve reflexão em cima de
um resultado que a priori, pode parecer um tanto redundante,
(H†ψ,φ)− (ψ,Hφ) = 0 , (4.10)
o que significa dizer que,
ψ(+0)φ′(+0)−ψ
′(−0)φ(−0)−ψ(+0)φ
′(+0)+ψ
′(−0)φ(−0) = 0 . (4.11)
4.2 Operador H no domínio D(R̊)
28
A equação acima nos diz que H† é o adjunto de H , mas, ela também nos diz que H
não é autoadjunto. Tudo isso deve-se ao fato de que ψ não precisa estar definida
num domínio que exclua a origem (nada falamos sobre ψ(0)), logo o domínio de
H† não coincide com o de H. Vimos no capítulo anterior, como construir as E.A.A,s
identificando equações análogas a (4.11) como uma forma sesquilinear. Aqui temos
uma situação em que os domínios diferem, ou seja, a equação (4.11) tem algumas
informações implícitas que serão exploradas nas próximas seções.
4.2 Operador H no domínio D(R̊)
O operador H definido em (4.2) , nos levará à mesma equação (3.10) do caso finito
realizado no capítulo anterior. Todavia, aqui o domínio do operador H é diferente, de
forma que em algum intervalo na origem as funções em ψ ∈DH se anulam. O domínio
de H† não requer continuidade da função e de sua derivada na orígem, como veremos
em seguida. Com isso, podemos procurar soluções para a equação que define os
índices de von Neumann em duas regiões: No semi-eixo negativo tendendo a zero
pela esquerda, e no semi-eixo positivo tendendo a zero pela direita.
As soluções são,
ψ1±(x) =
{a±e−
√k (1∓i)√
2x, x > 0.
0, x < 0.ψ2±(x) =
{0, x > 0.
b±e√
k (1∓i)√2
x, x < 0.
(4.12)
Assim, para cada semi-eixo temos duas soluções diferentes. Os índices são
(n+,n−)=(2,2). O que nos levá a seguinte pergunta: Se existem E.A.A,s deste operador,
como encontra-las? Sabemos pelo teorema, que as mesmas são soluções rotuladas
pelo grupo U(2). Uma maneira de encontrar a matriz U é fazendo uso da forma
sesquilinear, mas o que significa essa forma? No capítulo anterior, fez-se necessário
o uso de tal ferramenta. Agora precisamos justificar e explicar sua utilização.
4.2.1 Formas de Assimetria
Pela definição (2.1), um operador simétrico A é um operador densamente definido
que satisfaz a condição,
(ψ,Aφ)− (Aψ,φ) = 0, ∀ψ,φ ∈ D(A) . (4.13)
4.2 Operador H no domínio D(R̊)
29
O critério de simetria de um operador A densamente definido, é de que todos os
elementos da matriz sejam reais, isto é
(φ ,Aφ)− (Aφ ,φ) = (φ ,Aφ)− (Aφ ,φ) = 2iIm(φ ,Aφ) = 0, ∀φ ∈ D(A) . (4.14)
É natural introduzirmos duas formas definidas para o operador adjunto A† em seu
domínio D(A†) : a forma sesquilinear BA†(η ,ϕ) dada por,
BA†(η ,ϕ) = (η ,A†ϕ)− (A†
η ,ϕ), ∀η ,ϕ ∈ D(A†) . (4.15)
E sua forma quadrática CA†(ϕ), que é uma restrição de BA†(η ,ϕ) para o caso diagonal
ϕ = η
CA†(ϕ) = BA†(ϕ,ϕ) = 2iIm(ϕ,A†ϕ), ∀ϕ ∈ D(A†) . (4.16)
A forma BA† é anti-Hermitiana, enquanto a forma CA† é puramente imaginária:
BA†(η ,ϕ) =−BA†(η ,ϕ) , CA†(ϕ) =−CA†(ϕ) . (4.17)
Podemos determinar BA† a partir de CA†, com a seguinte expressão
BA†(η ,ϕ) =14
{[CA†(η +ϕ)−CA†(η−ϕ)
]− i[CA†(η + iϕ)−CA†(η− iϕ)
]}(4.18)
que também é chamada de formula de polarização.
Cada uma destas formas mede a assimetria do operador adjunto A†, isto é, uma
medida do quanto a extensão de A se desvia de um operador simétrico. Portanto,
chamamos BA† e CA†, respectivamente de a forma de assimetria sesquilinear e a
forma de assimetria quadrática. Se BA† = 0, ou equivalentemente, CA† = 0, então A†
é simétrico e A é essencialmente autoadjunto. Fazendo uma análise mais profunda
com respeito a essas formas aqui apresentadas, é possível mostrar que, para um
operador linear densamente definido de subespaços de deficiência finitos, sempre
haverá uma forma assimétrica. Uma abordagem mais rigorosa sobre esse assunto é
feita por D.M. Gitman em [9].
Voltando ao problema da adjunticidade do operador H inicialmente definido.
Queremos identificar um domínio estendido para o operador simétrico (4.2) tal
que a forma sesquilinear (4.11) se anule para ψ e φ pertencentes a esse domínio.
Dada a equivalência com a forma quadrática temos de exigir que nesse domínio
CA†(φ′) = φ(+0)φ
′(+0)−φ
′(−0)φ(−0)−φ(+0)φ
′(+0)+φ
′(−0)φ(−0). (4.19)
4.3 Funções Delta de Dirac 30
Podemos reescreve-la como,
φ(+0)φ′(+0)−φ
′(−0)φ(−0)−φ(+0)φ
′(+0)+φ
′(−0)φ(−0) =
i2k0
(a†a−b†b) (4.20)
onde
b =
(k0φ(+0)− iφ
′(+0)
k0φ(−0)+ iφ′(−0)
), a =
(k0φ(+0)+ iφ
′(+0)
k0φ(−0)− iφ′(−0)
). (4.21)
O que nos leva às seguintes condições de contorno,(k0φ(+0)− iφ
′(+0)
k0φ(−0)+ iφ′(−0)
)=U
(k0φ(+0)+ iφ
′(+0)
k0φ(−0)− iφ′(−0)
). (4.22)
ou seja,
b =Ua , ∀U ∈U(2) (4.23)
A equação (4.22) mostra que existe uma E.A.A para cada escolha da matriz U em
U(2). O questionamento que o leitor deve estar se fazendo nesse momento é : Como
relacionar a matriz U e as condições de contorno associadas a ela (4.22), com a Delta
de Dirac? Isso foi bem respondido por P. Kurasov em [10], e será o tema da próxima
seção.
4.3 Funções Delta de Dirac
Com um rigor necessário, Kurasov faz uso da teoria de distribuições, e reescreve
as condições de contorno mais gerais determinadas em (4.22) em termos de relações
entre o valor da função de onda e de sua derivada primeira em cada lado da
singularidade. (φ(0+)
φ ′(0+)
)=V
(φ(0−)
φ ′(0−)
). (4.24)
a partir daí ele constrói um único operador definido com funções delta e sua derivada
que induz essa condições, caracterizando a origem física de todas as E.A.A’s, para o
caso mais geral de uma interação singular na origem.
Esse operador é dado por,
Lx =−D2x(1+X4δ )+ iDx(2X3δ − iX4δ
1)+X1δ +(X2− iX3)δ1 . (4.25)
Aqui δ ≡ δ (x) e δ 1 ≡ ddxδ (x). Assim Lx apresenta singularidades em x = 0.
4.3 Funções Delta de Dirac 31
Cada termo dessa expressão deve ser entendido no contexto de teoria de
distribuições1. Lx atuando em ψ é uma soma de termos, cada termo dessa soma é
entendido como distribuição, somente a soma total desses termos deve fazer sentido
como função. A derivada vista como distribuição2 é tal que dada uma função teste φ ,
temos que
(φ ,Dxψ)≡∫ +∞
−∞
(−∂xφ)ψdx =∫ 0
−∞
(−∂xφ)ψdx+∫ +∞
0(−∂xφ)ψdx . (4.26)
Kurasov, mostra que podemos extrair as condições de contorno mais gerais, partindo
do operador (4.25) aplicado a uma função de onda
Lxψ(x) = ψ̃(x) (4.27)
e coletando os termos proporcionais a função delta e a sua derivada no lado esquerdo.
Como a ação do operador na função de onda deve resultar em outra função de
onda e não em uma distribuição singular, cada um desses termos deve ser nulo.
Alternativamente para qualquer função teste φ , deve ser válida a equação
(φ ,Lxψ(x)) = (φ ,ψ̃(x)) (4.28)
Todavia, queremos entender o que acontece na região da descontinuidade, motivados
a compreender o efeito que essa interação causa nas soluções, usaremos duas
funções teste especiais, para construir as condições de contorno encontradas por
Kurasov.
As funções teste são:
φ1(x) =
{0, |x|> 2ε.
1, |x|< ε.φ2(x) =
{0, |x|> 2ε.
x, |x|< ε.(4.29)
φ1(x) é a função degrau "esmerilhada"(i.e. interpolada suavemente) entre ε ≤ |x| ≤ 2ε
e φ2(x) é a função rampa, também "esmerilhada" entre ε ≤ |x| ≤ 2ε. Aplicando as
funções teste no operador (4.25) separadamente3, e tomando ε =⇒ 0, chegamos às
seguintes condições de contorno:
ψ′(+0)−ψ
′(−0)+X1ψM(0)+(X2− iX3)ψ
′M(0) = 0 (4.30)
1Explicar a construção deste operador e o surgimento de cada termo associado a ele, foge dosescopo deste trabalho, mas caso o leitor se sinta curioso encontrará essa explicação em [10]
2Uma outra referência sobre teoria de distribuições pode ser encontrar no capítulo 9 de [12]3Essa conta está explicitada no apêndice.
4.3 Funções Delta de Dirac 32
e
ψ(−0)−ψ(+0)+(X2 + iX3)ψM(0)+X4ψ′M(0) = 0 . (4.31)
Onde ψM(0) = 12(ψ(+0)+ψ(−0)). Isso nos leva às mesmas condições de contorno
encontradas por Kurasov:
(ψ(+0)
ψ′(+0)
)=
(2+X2)2−X1X4+X2
3(2−iX3)2+X1X4−X2
2
−4X4(2−iX3)2+X1X4−X2
24X1
(2−iX3)2+X1X4−X22
(2−X2)2−X1X4+X2
3(2−iX3)2+X1X4−X2
2
×( ψ(−0)
ψ′(−0)
), (4.32)
onde X = (X1,X2,X3,X4) ∈ R4, com seu domínio definido por ψ ∈ L2(R\{0}), para
todas as funções ψ que sejam são absolutamente contínuas. Até aqui, encontramos
as condições de contorno mais gerais para uma interação "tipo" delta na origem,
(4.25), entretanto, ainda não relacionamos essas condições de contorno (4.32) com
as E.A.A,s vistas na seção anterior, ou seja, com a matriz U que é parametrizada por
m = (m1,m2,m3,m4) e Ψ (3.21) .
Para não ter de fazer sempre um algebrismo cansativo toda vez que busquemos
determinar U , iremos reescrever a matriz U em termos dos parâmetros X =
(X1,X2,X3,X4) , encontrados na condição de contorno (4.32).
Primeiramente façamos,
2α ≡(2+X2)
2−X1X4 +X23
(2− iX3)2 +X1X4−X22,
2iβk0≡ −4X4
(2− iX3)2 +X1X4−X22,
e
2θ ≡(2−X2)
2−X1X4 +X23
(2− iX3)2 +X1X4−X22
2iγk0 ≡4X1
(2− iX3)2 +X1X4−X22.
O que nos leva à,
(ψ(+0)
ψ′(+0)
)=
(2α
2iβk0
2iγk0 2θ
)×
(ψ(−0)
ψ′(−0)
). (4.33)
Não é difícil traduzir para a forma,(k0φ(+0)− iφ
′(+0)
k0φ(−0)+ iφ′(−0)
)=U
(k0φ(+0)+ iφ
′(+0)
k0φ(−0)− iφ′(−0)
).
4.3 Funções Delta de Dirac 33
E com um pouco de algebrismo, chegamos em
U =
α+γ+β−θ
α−γ+β+θ
4(γβ+αθ)α−γ+β+θ
1α−γ+β+θ
−α+γ+β+θ
α−γ+β+θ
(4.34)
Como exemplo façamos o caso de somente uma interação Delta, que equivale a fazer
X1 6= 0 e X2 = X3 = X4 = 0, ou seja
α =12, β = 0 , θ =
12, γ =
X1
2ik0.
Substituindo em (4.34) chegamos em,
U =1
2ik0−X1
(X1 2ik0
2ik0 X1
)(4.35)
Por outro lado, se escolhêssemos X2 6= 0 e X1 = X3 = X4 = 0, ou seja
α =2+X2
2(2−X2), β = 0 , γ = 0 , θ =
2−X2
2(2+X2).
Substituindo em (4.34) , temos
U =12
(−X2
14
14 X2
)(4.36)
Dada as condições de contorno (4.22) , uma vez que calculemos U teremos toda
a informação sobre o comportamento da interação "tipo" Delta, ou seja, U + (4.22)
nos da toda a física que envolve o problema. Até aqui, conseguimos definir todas
as ferramentas necessárias para finalmente, tentarmos entender o que significa o
surgimento de um estado ligado, para uma partícula confinada em uma dimensão.
34
5 E.A.A num intervalo a partir defunções Delta de Dirac
Vimos que o Hamiltoniano para uma partícula livre em uma dimensão num
intervalo de [0,L] pode ser associado a várias extensões autoadjuntas de um operador
simétrico inicial. Nesse capítulo vamos mostrar como as interações singulares, tipo
delta de Dirac, podem gerar várias E.A.A’s e como isso está relacionado ao surgimento
de um estado de energia negativa.
5.1 Transmutação das condições
Partindo da equação (3.18) faremos a escolha
U =
(e−i2α0 0
0 ei2αL
). (5.1)
Aqui as condições de contorno ficaram separadas, a direita e a esquerda do intervalo
independentemente. O que nos leva às chamadas condições de Robin:
φ(0) = L tanα0φ′(0) e φ(L) = L tanαLφ
′(L). (5.2)
O argumento também vale no sentido contrário, ou seja, a condição (5.2) implica na
descrição com a matriz U em (5.1).
A questão que nos propomos analisar é: qual é o efeito da introdução de uma
interação singular tipo delta de Dirac na proximidade de cada extremidade do intervalo.
Assim, inicialmente acrescentamos uma interação com uma função delta de Dirac e
sua derivada primeira, descrita da seguinte forma
∆0H = X1δ (x− ε)+X2δ1(x− ε),
5.1 Transmutação das condições 35
localizadas no ponto x = ε. Ora, chamando x′ = x− ε, já vimos em (4.32) como essa
interação afeta as condições de contorno no entorno do ponto x = ε (ou x′ = 0). Nesse
caso particular X3 = X4 = 0, a equação (4.32) assume a forma(φ(ε+)
φ ′(ε+)
)=
2+X22−X2
04X1
4−X22
2−X22+X2
( φ(ε−)
φ ′(ε−)
)(5.3)
Agora vamos supor que a evolução da função de onda entre o ponto x = 0 e o
ponto x = ε seja suave. Isto é supomos que φ(ε−) = φ(0)+O(ε) e que φ ′(ε−) = φ ′(0)+
O(ε). Assim, a primeira das condições (5.2), referente ao lado esquerdo, pode ser
identificada como uma restrição para os valores da função de onda de (5.3)
φ(ε−) = L tanα0φ′(ε−)+O(ε). (5.4)
Substituindo a equação acima em (5.3) e fazendo o limite ε =⇒ 0 , concluímos que
φ′(0+) =
[4X1
(2+X2)2 +
(2−X2
2+X22
)2 cotα0
L
]φ(0+)
≡cotα ′0
Lφ(0+). (5.5)
Vemos então que as funções delta em x = ε −→ 0 transmutaram uma condição de
Robin com α0 em uma nova condição de Robin com α ′0. Escolhendo X1 e X2 pode-se
escolher o valor de α ′0.
Um tratamento análogo e independente pode ser reproduzido no extremo oposto
do intervalo com perturbações em x = L− ε, acrescentando ao Hamiltoniano o termo
∆LH =−X1δ (x−L+ ε)−X2δ′(x−L+ ε).
Aqui os sinais de X1 e X2 foram invertidos por conveniência. De fato a troca dos sinais
leva a matriz V −→V−1 em (5.3). Assim podemos trocar os papeis dos lados esquerdo
e direito da singularidade, isto é(φ((L− ε)−)
φ ′((L− ε)−)
)=
2+X22−X2
04X1
4−X22
2−X22+X2
( φ((L− ε)+)
φ ′((L− ε)+)
)≡V
(φ((L− ε)+)
φ ′((L− ε)+)
). (5.6)
Isso significa que repetindo a argumentação anterior teremos, após ε −→ 0 ao invés
5.1 Transmutação das condições 36
da segunda das condições (5.2), a equação
φ′(L−) =
[4X1
(2+X2)2 +
(2−X2
2+X2
)2 cotαL
L
]φ(L−)
≡[
cotα ′LL
]φ(L−). (5.7)
Poderíamos mudar as condições de contorno independentemente em cada extremo
do intervalo ajustando os parâmetros Xi de maneira independente para cada caso.
Após tomar o limite ε −→ 0 a função de onda estará definida entre 0 e L e será
contínua nesse intervalo. Não há mais singularidade no Hamiltoniano para 0 < x < L.
Toda a referência às funções delta terá sido levada às novas condições de contorno.
5.1.1 Casos especiais
Voltemos a analisar a condição em x = ε. Há dois casos particulares que devem
ser observados. Quando a condição inicial (5.2) corresponde a α0 = π/2 a tangente é
infinita e temos a condição de Neumann
φ′(0−) = 0.
Nesse caso a introdução da perturbação, ou seja, a condição de contorno transmutada
(5.5) resultará numa condição de Robin genérica
φ′(0+) =
4X1
(2+X2)2 φ(0+),
no caso de X1 6= 0. Isto é, na presença da função delta independentemente da
presença da derivada da delta temos cotα ′0L = 4X1
(2+X2)2 . O mesmo ocorre se fizermos
a análise no extremo oposto αL = π/2.
Entretanto, se α0 = 0, ou αL = 0 temos a condição inicial de Dirichlet
φ(0−) = 0.
Nesse caso a perturbação mantém a condição
φ(0+) = 0.
E o mesmo ocorre para o caso em que x = L− ε,
φ(L−) = 0.
5.2 Autovalores 37
Aqui a perturbação também mantém a condição
φ(L+) = 0.
Isso mostra que há uma estabilidade nas condições de contorno de Dirichlet, mas não
nas de Neumann, esse comportamento havia sido observado no trabalho precursor
de H.Englisch e P.Šeba [11].
Na nossa presente análise essa estabilidade não se deve propriamente a algo
peculiar da condição inicial. Olhando para a matriz em (5.3) vemos que é o elemento
nulo dessa matriz que é responsável por essa limitação. Isso sugere, tendo em vista
o trabalho de Kurasov, tratar, para o caso da condição de Dirichlet, com a perturbação
bem simples dada por
H0 =−D2x −→−D2
x (1+X4δ (x− ε))+X4Dxδ1(x− ε). (5.8)
Nesse caso, invés de (5.3), teremos
(φ(ε+)
φ ′(ε+)
)=
(1 −X4
0 1
)(φ(ε−)
φ ′(ε−)
)≡V
(φ(ε−)
φ ′(ε−)
). (5.9)
A condição inicial de Dirichlet será transmutada na condição de Robin
φ′(0+) =−X4φ(0+).
Vemos assim que a condição de Dirichlet não é totalmente estável. Observamos
adicionalmente que também o caso que tratamos inicialmente, particularizado para
X2 = 2 poderia ser objeto de investigação.
5.2 Autovalores
Queremos analisar o impacto das perturbações no espectro dos Hamiltonianos.
Os autovalores do Hamiltoniano são descritos pelas condições dadas nas equações
(3.29). Vamos tomar o caso αL = α0. A matriz U é da forma
U =
(e−2iα0 0
0 e2iα0
)=
(cos2iα0− isin2iα0 0
0 cos2iα0 + isin2iα0
). (5.10)
5.2 Autovalores 38
Na notação do capítulo 3, em termos da matriz identidade e da matriz de Pauli,
U = cos2α01− isin2α0σ3.
Temos m0 = cos2α0 e m3 = sin2iα0, com m1 = m2 = 0.
Nesse caso, para −1 < m0 < 1, as energias positivas são dadas, usando (3.29),
por
En = nπ
e há um estado com energia negativa, (3.31), dada por
E =− 1L2
1+m0
1−m0=− 1
L21+ cos2α0
1− cos2α0.
Assim a introdução das interações tipo delta de Dirac, que equivale a fazer α0 −→ α ′0
em (5.2) e portanto em (5.1), tem um impacto mudando os valores das energias. Como
é possível ter energias negativas para uma partícula livre em uma caixa?
No caso particular de condições de Neumann, α0 = π/2 temos m0 = −1 e m3 = 0
e não há energia negativa. Nesse caso testemunhamos a origem da energia negativa
associada a condição de Robin obtida após a introdução da interação com δ e δ 1.
Após tomar ε −→ 0 as funções delta "ficam escondidas" no limite da barreira de
potencial infinita responsável por limitar a partícula ao intervalo 0 < x < L. Mas elas
deixam como herança a mudança da condição de contorno de Neumann para Robin.
E com isso emerge a energia negativa
No caso particular de condições de Dirichlet, α0 = 0, temos m0 = 1 e m3 = 0 e
novamente não há energia negativa. Nesse caso a perturbação com X1δ +X2δ 1 não é
suficiente para introduzir o estado com energia negativa. Mas a perturbação adicional
X4 6= 0 descrita em (5.8) é sim suficiente para mudar esse panorama e introduzir o
estado com energia negativa.
39
6 Conclusão
Vimos a importância de uma definição mais rigorosa de operadores em Mecânica
Quântica, mostramos a diferença entre operadores simétricos(ou Hermitianos) e
operadores autoadjuntos, dado que muitos livros-texto de cursos de graduação
acabam passando a "ideia" de que basta a um operador ser hermitiano para
representar um observável. No capítulo 2 deixamos claro que isso pode não ser
verdade! A partir da introdução das definições dos operadores, fizemos uso do
Teorema de von Neumann (2.4) para o caso de uma partícula confinada. Constatamos
a existência de estados de energia negativa, o que não é uma característica "usual"
desse tipo de sistema. Como o estudo de famílias de E.A.A,s não é um tema muito
difundido, tanto em graduações quanto em cursos de pós graduação, não é de se
espantar que situações como a apresentada no capítulo 3, gerem no mínimo um
desconforto. Isso fica evidente no exemplo citado ao final do capítulo 3, onde A.Z.Capri
acaba sendo "infeliz" em sua solução para o problema proposto. Para explicar a
origem desse estado de energia negativa, apresentamos e fizemos uso de várias
ferramentas importantes, como o operador construído por Kurasov (4.25) a partir de
teoria de distribuições e as formas de assimetria (4.2.1) descritas por Gitman em [9].
Por fim, mostramos no capítulo 5 que esse estado de energia negativa, emerge da
inter-relação de algumas condições de contorno nos extremos com as condições de
contorno devido a interações tipo funções delta e sua derivada. O efeito da delta
e de sua derivada se escondem no limite da barreira de potencial infinito e sempre
que tomamos o limite ε → 0, o que "representava"a função delta, será levado em
novas condições de contorno. Com relação a estabilidade das condições de contorno,
concluímos que tal propriedade depende do tipo de interação proveniente de (4.25).
Sempre haverá um tipo de interação, para qualquer condição de contorno que seja
capaz de modificá-la e eventualmente faça emergir um estado de energia negativa, ou
seja, não há estabilidade nas condições de contorno para o caso aqui estudado.
40
APÊNDICE A -- Condições de contorno apartir das funções teste
Dadas a seguintes funções teste,
φ1(x) =
{0, |x|> 2ε,
1, |x|< ε,e φ2(x) =
{0, |x|> 2ε,
x, |x|< ε,
construiremos as condições de contorno
ψ′(+0)−ψ
′(−0)+X1ψM(0)+(X2− iX3)ψ
′M(0) = 0 ,
ψ(−0)−ψ(+0)+(X2 + iX3)ψM(0)+X4ψ′M(0) = 0 .
Exigiremos a validade de Lxψ = Eψ , onde
Lx =−D2x(1+X4δ )+ iDx(2X3δ − iX4δ
1)+X1δ +(X2− iX3)δ1
como distribuição. Aplicaremos essa condição às duas funções teste anteriores.
Para a primeira função teste,
Lψ(φ1) = Eψ(φ1)≈ O(ε).
Temos que
Lxψ(φ1) = ψ(−∂2x φ1)+X4δ (−ψ∂
2x φ1)+ i2X3δ (−ψ∂xφ1)+
+X4δ′(−ψ∂xφ1)+X1δ (ψφ1)+(X2− iX3)δ
′(ψφ1).
Integrando termo a termo da expressão anterior, e tomando o limite em que ε → 0,
temos
1) ψ(−∂ 2x φ1):
ψ(−∂2x φ1)≡−
∫ −ε
−∞
ψ∂2x φ1dx−
∫ +∞
ε
ψ∂2x φ1dx =−
∫ −ε
−∞
∂x(ψ∂xφ1)dx+∫ −ε
−∞
∂xψ∂xφ1dx+
Apêndice A -- Condições de contorno a partir das funções teste 41
−∫
∞
ε
∂x(ψ∂xφ1)dx+∫ +∞
ε
∂xψ∂xφ1dx≈∫ −ε
−∞
∂x(∂xψφ1)dx+∫ +∞
ε
∂x(∂xψφ1)dx=(ψ ′(0−)−ψ′(0+)) .
2) X4δ (−ψ∂ 2x φ1):
∂2x φ1(0) = 0 =⇒ X4δ (−ψ∂
2x φ1) = 0 .
3) i2X3δ (−ψ∂xφ1):
∂xφ1(0) = 0 =⇒ i2X3δ (−ψ∂xφ1) = 0 .
4) X4δ ′(−ψ∂xφ1):
∂xφ1(0) = 0, ∂2x φ1(0) = 0 =⇒ X4δ
′(−ψ∂xφ1) = 0 .
5) X1δ (ψφ1):
X1δ (ψφ1) = X1ψM(0) ,
onde do lado direito figura o valor médio na origem.
6) (X2− iX3)δ′(ψφ1):
(X2− iX3)δ′(ψφ1) =−(X2− iX3)(ψ
′φ +ψφ
′)M =−(X2− iX3)ψ′M(0) .
Somando as equações acima, chegamos na primeira das condições de contorno,
ψ′(+0)−ψ
′(−0)+X1ψM(0)+(X2− iX3)ψ
′M(0) = 0 .
Analogamente para a segunda função teste, teremos
Lxψ(φ2) = ψ(−∂2x φ2)+X4δ (−ψ∂
2x φ2)+ i2X3δ (−ψ∂xφ2)+
+X4δ′(−ψ∂xφ2)+X1δ (ψφ2)+(X2− iX3)δ
′(ψφ2).
Novamente integrando termo a termo e tomando o limite ε → 0
1) ψ(−∂ 2x φ2):
ψ(−∂2x φ2) =−
∫ −ε
−∞
ψ∂2x φ2dx−
∫ +∞
ε
ψ∂2x φ2dx =−ψ(0−)+ψ(0+) .
2) X4δ (−ψ∂ 2x φ2):
∂2x φ2(0) = 0 =⇒ X4δ (−ψ∂
2x φ2) = 0 .
3) i2X3δ (−ψ∂xφ2):
i2X3δ (−ψ∂xφ2) =−i2X3ψM(0) .
4) X4δ ′(−ψ∂xφ2):
X4δ′(−ψ∂xφ2) = X4(ψ
′φ′+ψφ
′)M = X4ψ′M(0) .
Apêndice A -- Condições de contorno a partir das funções teste 42
5) X1δ (ψφ2):
φ2(0) = 0 =⇒ X1δ (ψφ2) = 0 .
6) (X2− iX3)δ′(ψφ2):
(X2− iX3)δ′(ψφ2) =−(X2− iX3)(ψ
′φ +ψφ
′)M =−(X2− iX3)ψM(0) .
Somando os resultados encontrados acima, encontramos a segunda condição de
contorno,
ψ(−0)−ψ(+0)+(X2 + iX3)ψM(0)+X4ψ′M(0) = 0 .
43
Referências Bibliográficas
[1] M.Asorey. Boundary Effects in Bosonic and Fermionic Field Theories. InternationalJournal of Geometric Methods in Modern Physics, vol. 12, no. 06, 1560004 (2015).arXiv:1501.03752v1.
[2] Guy Bonneau, Jacques Faraut, Galliano Valent. Self-adjoint extensions ofoperators and the teaching of quantum mechanics. Am.J.Phys. 69 (2001) 322.arXiv:quant-ph/0103153v1.
[3] J. von Neumann. Allgemeine Eigenwerttheorie Hermitischer Funktional operatoren.Math. Ann. vol. 102 , 49-131, 1929.
[4] B.L. Voronov, D.M. Gitman, I.V. Tyutin. Self-adjoint differential operatorsassociated with self-adjoint differential expressions. Publicacao IFUSP-1619/2006.arXiv:quant-ph/0603187v2, 2006.
[5] Planck, M.(1900) Zur Theorie des Gesetzes der Energieverteilung imNormalspectrum Verhandlungen der Deutschen Physikalischen Gesellschaft 2,237–45, English translation by D. ter Haar 1967 The Old Quantum Theory(PergamonPres).
[6] Einstein, A. Concerning an Heuristic Point of View Toward the Emission andTransformation of Light. Annalen der Physik 17 , 132-148 , 1905.
[7] https://www.nobelprize.org/prizes/physics/1932/summary/
[8] https://www.nobelprize.org/prizes/physics/1933/summary/
[9] D.M. Gitman, I.V. Tyutin, B.L. Voronov. Self-adjoint Extensions in QuantumMechanics (Birkhäuser, Basiléia), 2012.
[10] P. Kurasov. Distribution Theory for Discontinuous Test Functions and DifferentialOperators with Generalized Coefficients. Journal of Mathematical Analysis andApplications 201, 297-323 (1996) Article NO. 0256.
[11] H. Englisch , P.Šeba. The stability of the Dirichlet and Neumann boundaryconditions. Reports on Mathematical Physics, Volume 23, Issue 3, p. 341-348 (1986).
[12] Lemos, Nivaldo A. Convite à Física Matemática (Livraria da Física, São Paulo)2013.
[13] Anton Z. Capri. Problems Solutions in Nonrelativistic Quantum Mechanics (WorldScientific) 2002.
[14] Anton Z. Capri. Nonrelativistic Quantum Mechanics (World Scientific) 2002.
Top Related