FACULDADE SÃO LUÍS DE FRANÇA Aracaju-SE, Brasil, 24 e 25 de novembro de 2012
A INTERDEPENDÊNCIA NAS RELAÇÕES SINTÁTICAS: A CORRELAÇÃO NO
CONTINUUM ENTRE A DEPENDÊNCIA E A INDEPENDÊNCIA1
José Marcos de FRANÇA (PROLING/UFPB/CAPES)
“Defender a classificação de orações como
correlatas implica considerar a correlação um
procedimento sintático diferente, e não
simplesmente uma variante da coordenação e da
subordinação.” (RODRIGUES, 2008, p. 231)
RESUMO: Neste artigo, temos por objetivo discutir e apresentar a correlação como um
processo sintático que deveria figurar junto à coordenação e à subordinação, dentro de um
continuum entre a independência e a dependência, que se caracteriza pela interdependência e
que a classificação das orações vão além daquela apresentada pelas gramáticas normativas.
Sob os aportes de estudos funcionalistas, mais precisamente a partir do princípio da marcação
(CUNHA; COSTA; CEZARIO, 2003), após defender a correlação como um processo
sintático independente, procuramos mostrar que as orações correlativas se mostram mais
marcadas no contexto semântico-pragmático que as coordenadas e as subordinadas e essa
marcação lhes confere um maior poder argumentativo. Nosso trabalho se sustenta em Módolo
(2009; 2005), Rodrigues (2008), Castilho (2010) e outros.
Palavras-chave: Correlação; Interdependência; Princípio da marcação; Argumentação
Introdução
Neste artigo, discutiremos a legitimidade da correlação como um outro processo
sintático, com base em estudos de bases funcionalistas, que se encontra em um continuum
entre a coordenação e a subordinação. Esse tipo de oração, no entanto, não foi agraciada pela
NGB2 como um processo sintático pertinente aos períodos compostos. Em geral, as
gramáticas normativas, tradicionalmente, tratam apenas da coordenação e da subordinação
como os únicos processos sintáticos da língua ligados à oração. Contudo, defenderemos aqui
1Artigo apresentado à disciplina Tópicos em Sintaxe, do Programa de Pós-Graduação em
Linguística, da Universidade Federal da Paraíba, ministrada pelo Prof. Dr. Camilo Rosa Silva,
no período 2011.2, como pré-requisito parcial de avaliação. Doutorando em Linguística pela Universidade Federal da Paraíba com projeto de pesquisa
voltado para a formação do professor de língua materna no curso Letras português da UFS. E-
mail: [email protected]. 2 Assim como as correlativas, alguns autores apontam que as justapostas também ficaram de
fora. Ambas foram incorporadas às coordenadas e às subordinadas.
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que a correlação figura como um processo sintático que se caracteriza por ser
interdependente, embora, quando mencionada, nas gramáticas, é em relação à coordenação ou
à subordinação, como um subtipo desses processos.
Na literatura linguística, o termo figura, inclusive, como verbete de dicionários
especializados de linguística, o que comprova a sua existência como um termo linguístico,
embora, ainda, ligado aos outros dois processos. Segundo Rodrigues (2008) e Macambira
(1999) esse reconhecimento da existência da correlação já estava presente nas discussões de
importantes gramáticos como José Oiticica e Rocha Lima, dois dos grandes gramáticos da
Língua Portuguesa e notórias autoridades do estudo da língua portuguesa. Já Mattoso Camara
Jr. apesar de reconhecer a existência das relações correlativas não as aceita como um processo
distinto da coordenação e da subordinação, alegando não haver necessidade desta
classificação já que elas apresentam características de uma e de outra, assim elas seriam
subtipos daquelas.
É justamente a partir desses autores que o tema é retomado pelos estudos da
sintaxe pelo viés da Linguística. Castilho (2010) traz a correlação, assim como Rodrigues
(2008) e Módolo (2005, 2009), como um processo que se distingue da coordenação e da
subordinação. A coordenação se caracteriza por ser independente; a subordinação, por ser
dependente; e a correlação, por ser interdependente.
Nesse passo, também defenderemos que as orações correlativas, em comparação
com as orações coordenadas e as subordinadas correspondentes, são marcadas naquilo que o
princípio da marcação aponta como características próprias de uma estrutura marcada. Além
disso, o fato de serem marcadas, faz com que elas sejam usadas em contextos bem marcados
de uso formal implicando um maior poder de argumentação que as suas correspondentes, ou
seja, os aspectos argumentativos e semântico-pragmáticos aí implicados vão além de uma
equivalência sintática e semântica como pregam as gramáticas normativas.
Em nossa discussão, num primeiro momento, apresentamos os termos correlação
e correlativo como verbetes de dicionário. Em seguida, discutiremos o fenômeno da
correlação como um processo sintático intermediário entre a coordenação e a subordinação
dentro de um continuum. Por fim, discutiremos a correlação à luz do princípio da marcação,
procurando mostrar que as orações correlativas são marcadas e argumentativamente mais
fortes que as suas correlatas coordenadas e subordinadas.
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Os Verbetes Correlação/Correlativo
Comecemos este tópico com a seguinte afirmação de Rosário (2012, p. 2)
É marcante, em nossos compêndios, a polêmica quanto à existência e à
caracterização da correlação, entendida como processo sintático distinto da
coordenação e da subordinação. A maioria dos gramáticos tradicionais, por
influência da Nomenclatura Gramatical Brasileira, não incluiu em suas obras
a correlação, apesar de esta apresentar especificidades bem particulares em
relação aos processos mais canônicos de estruturação sintática.
Neste tópico, apresentamos os termos correlação/correlativo como verbetes de
dois dicionários especializados e os seus sentidos em um dicionário comum. Com isso
queremos mostrar que tais termos tem entrada nos dicionários especializados de linguística,
portanto, são termos que adquirem certa autonomia na terminologia da ciência da linguagem.
Nesse sentido, veremos como no Dicionário de Lingüística e Gramática, de
Mattoso Camara Jr., o verbete correlação é definido como:
Construção sintática de duas partes relacionadas entre si, de tal sorte que a
enunciação de uma, dita prótase, prepara a enunciação de outra, dita
apódose. A correlação se estabelece – a) por coordenação, ou b) por
subordinação, conforme o conectivo utilizado e a noção de seqüência ou de
sintagma, respectivamente, que daí decorre; a construção condicional, em
português, é uma correlação de subordinação; da mesma sorte o é a
comparação e o símile.
Na estruturação das formas lingüísticas, dentro da língua (paradigma),
considera-se como correlação a associação das formas por semelhança ao
lado da oposição por seus contrastes. (CAMARA JR., 1988, p. 87)
Na definição de Mattoso Camara há uma relação com a coordenação e a
subordinação, o que nos diz que o autor não reconhece a correlação como um processo ao
lado dos outros dois, mas sim como uma construção que se dá ou pode ocorrer em ambos os
processos, em casos específicos, como os mencionados. Diferentemente de Mattoso Camara,
vimos a correlação como um processo que se situa num continuum entre a coordenação e a
subordinação, em vista disso, defendemos que ela apresenta características de ambas, mas não
se confundem com elas.
Contudo, é pertinente observar que o autor recorre a aspectos semântico-
pragmáticos e morfossintáticos para definir a correlação. Ao definir prótase e apódose entra
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no campo semântico-discursivo desses termos. Ao dizer que “a enunciação de uma, dita
prótase, prepara a enunciação de outra, dita apódose” ele remete ao sentido e à relação
estabelecida entre as duas orações, que não é nem de dependência nem de independência e
sim de interdependência. Isso a caracterizaria como um processo que apresenta características
de ambas, mas não se confundiria com elas.
Já no dicionário de Jean Dubois, o verbete correlativo é assim definido: “1. Diz-se
que dois termos são correlativos quando indicam uma relação de dependência entre a oração
principal (ou matriz) e a oração subordinada” (DUBOIS, 2006, p. 160). Vemos em Dubois
uma certa divergência com relação ao definido por Mattoso Camara. Aqui não encontramos
uma referência à relação de interdependência, mas sim de dependência, o que remete à
subordinação e nenhuma ligação com a coordenação. Por inferência, podemos afirmar que
para Dubois não há relação de correlação no processo sintático da coordenação nem tampouco
reconhece como um processo sintático, seja em um continuum seja à parte dos dois outros
processos.
Em um dicionário comum, ou seja, não especializado, de sinônimos, como o Novo
Dicionário da Língua Portuguesa, o verbete correlação apresenta os seguintes significados:
“1. Relação mútua entre dois termos. 2. Qualidade de correlativo. 3. Correspondência”
(FERREIRA, 1986, p. 483). Aqui o sentido de correlação na entrada 1 fala em relação entre
dois termos de forma mútua, esse sentido é o que temos de mais próximo com o sentido
apresentado por Mattoso Camara, pois a relação de mutualidade implica uma relação de
“correspondência”, como está na entrada 3.
Macambira (1999) ressalta para as conjunções subordinativas consecutivas e
comparativas como sendo as únicas que resistem à inversão, pois, diz o autor, que a
possibilidade de inversão na ordem das orações é uma característica que marca e diferencia a
oração coordenada, que não admite tal inversão, da subordinada. Sendo assim, o autor expõe
alguns pontos de vista sobre a questão em tela e apresenta em seguida a sua posição assumida:
Por esta e outras causas, escreve Carreter (19) que às vezes as consecutivas e
as comparativas são incluídas entre as coordenativas (1962, 92). José Oiticica
(64) e Rocha Lima (50) vão mais avante, e criam, a par das coordenativas e
das subordinativas, a categoria das conjunções correlativas.
“Introduzem uma frase em que se exprime um pensamento preso, não à ação
principal com que apenas se coordena, mas a um termo intensivo, claro ou
oculto. São: que e às vezes como:
a) Subi tanto, que perdi o fôlego;
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b) Esforçou-se de maneira tal, que adoeceu.” (OITICICA, 64, p. 66)
“Não há interdependência das orações componentes, como na coordenação,
nem subdependência como na subordinação. Existe, a rigor,
paradependência.” (ROCHA LIMA, 50, p. 69)
Não negamos a natureza um tanto híbrida que ressumbra [se revela, deixa
transparecer] das consecutivas e comparativas, mormente [principalmente,
sobretudo] como; parece-nos entretanto mais simples incluí-las entre as
subordinativas, do que abrir a subclasse das correlativas, categoria mista –
nem coordenativa, nem subordinativa. (MACAMBIRA, 1999, p. 71)
Sobre a posição assumida por Oiticica, Rosário (2012, p. 5) faz a seguinte
ponderação:
O estudo do autor, contido na célebre Teoria da Correlação (1952), advoga a
existência da correlação como um mecanismo de estruturação sintática ou
procedimento sintático em que uma sentença estabelece uma relação de
interdependência com a outra no nível estrutural. Assim, a distinção entre a
correlação e os outros processos de estruturação poderia ser atestada por meio
do critério da dependência sintática.
Rosário cita ainda o posicionamento de Gladstone Chaves de Melo que é em favor
de uma classificação que inclua a correlação como um terceiro processo sintático. Segundo
Rosário, Melo (1978) “também considera a correlação como um terceiro processo de
estruturação sintática, distinto da subordinação e da coordenação” (2012, 6). Citando Melo,
afirma o referido autor:
(A correlação) é um processo sintático irredutível a qualquer dos outros dois
(subordinação ou coordenação), um processo mais complexo, em que há, de
certo modo, interdependência. Nele, dá-se a intensificação de um dos membros
da frase, ou de toda a frase, intensificação que pede um termo. (MELO, 1978, p.
152 apud ROSÁRIO, 2012, p. 6)
O termo aparece nas gramáticas normativas sempre associado ou à coordenação ou
à subordinação. Mesmo em autor de assumida postura linguística como Azeredo (2000), fala-
se apenas em coordenação correlativa. Diz o autor que ela
Realiza-se por meio dos pares ‘ou…ou’, ‘ora…ora’, ‘quer…quer’,
‘não…nem’ – exprimem disjunção – ‘não só…mas também’, ‘não só…senão
também’, ‘não apenas…mas ainda’, ‘tanto…como’ – que exprimem união –
‘senão…ao menos’, ‘não…mas’, ‘mas…não’, – que exprimem
preferência/compensação. (AZEREDO, 2000, p. 118)
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Em Kury (2006) aparece o termo “correlatas” quando o autor aborda as orações
subordinadas consecutivas em que ele classifica-as como “orações consecutivas correlatas” da
seguinte forma: “mais comuns são as orações consecutivas encabeçadas pela conjunção que
em correlação com um termo intensivo (tão, tanto, cada, tamanho, etc.) da oração principal”
(KURY, 2006, p. 98); e quando se refere às proporcionais, em que as correlatas figuram como
um tipo dessas, assim exposto: “correlatas, em que o termo intensivo que introduz a oração
subordinada (quanto mais, quanto menos, quanto melhor, quanto pior) se acha em correlação
com outro que introduz a chamada oração principal (mais, menos, tanto mais, tanto menos,
etc.)” (KURY, 2006, p. 104).
Vimos até aqui que os autores preferem colocar a correlação como um subtipo das
orações coordenadas e das subordinadas, quando isso acontece, pois a maioria dos gramáticos
desconsidera ou simplesmente ignoram-na como um processo sintático independente.
A Correlação como Processo Sintático numa Proposta Funcionalista: entremeio
Em Rodrigues (2008) encontra-se a seguinte explanação: “a correlação é o
mecanismo sintático diferente da coordenação e da subordinação, embora normalmente seja
considerada ora um subtipo da subordinação, ora um outro procedimento sintático, ou sequer
seja mencionado” (p. 225) para em seguida dar a definição: “entende-se por correlação o
mecanismo de estruturação sintática ou o procedimento sintático em que uma sentença
estabelece uma relação de interdependência com a outra no nível estrutural” (idem). Diz ainda
a autora que “na correlação, nenhuma das orações subsiste sem a outra, porque, na verdade,
elas são interdependentes” (idem).
O que caracteriza a correlação principalmente é o fato de que ela “tem sua conexão
estabelecida por elementos formais, expressões que compõem um par correlativo, estando
cada um de seus componentes em orações diferentes” (RODRIGUES, 2008, p. 225). A partir
desse estabelecimento marcado pela característica estrutural, é que se pode falar das
possibilidades de correlação dentre a classificação tradicional das orações coordenadas e
subordinadas: correlação aditiva, correlação alternativa, correlação comparativa, correlação
proporcional e correlação consecutiva. Saliente-se que aqui não se fala em oração principal ou
coordenada sindética, mas, apenas, em orações correlativas.
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A autora traz a lume a discussão sobre parataxe e hipotaxe, em que a primeira
inclui todos os tipos de justaposição e a segunda, todos os tipos de dependência, e a
subordinação. Diante disso, Rodrigues (2008, p. 227) faz a seguinte consideração distintiva:
Parataxe implicaria independência relativa, ou seja, o vínculo entre orações depende
apenas do sentido e da relevância da relação entre elas.
Hipotaxe implicaria dependência entre um núcleo e margens, mas não encaixamento
da margem em um constituinte do núcleo.
Subordinação implicaria dependência completa entre núcleo e margem(ns) e, portanto,
encaixamento de toda a margem em um constituinte do núcleo.
Para esta última, diz a autora que ela se divide em três tipos:
1. aquelas que funcionam como sintagmas nominais – completivas;
2. aquelas que funcionam como modificadores de nomes – adjetivas;
3. aquelas que funcionam como modificadores de sintagmas verbais ou de orações inteiras –
adverbiais.
A autora apresenta as seguintes características das orações correlatas, no sentido
de deixar claro o porquê da distinção entre aquelas e as coordenadas e subordinadas: a) a
correlação apresenta conjunções que vêm aos pares, cada elemento do par em uma oração; b)
no período composto por correlação, as orações não podem ter sua ordem invertida, isto é,
não apresentam a mobilidade posicional típica das subordinadas adverbiais; c) as correlatas
não podem ser consideradas parte constituinte de outra, como ocorre com as substantivas, as
adverbiais e as adjetivas.
Citando Oiticica, Rodrigues (2008, p. 231) diz que ele “[…] propõe uma tipologia
para as orações, em que distingue quatro processos sintáticos: coordenação, subordinação,
correlação e justaposição.” Rodrigues acrescenta ainda que para o referido gramático “[…]
nem todas as orações subordinadas adverbiais funcionam como adjuntos; para ele,
consecutivas e comparativas são correlatas” (idem). Vemos que Oiticica propõe uma
classificação que coloca a correlação e a justaposição como processos sintáticos distintos da
coordenação e da subordinação, no entanto, como sabemos, a NGB não considerou a
correlação como um dos processos sintáticos e a justaposição foi incluída na coordenação
como orações coordenadas assindéticas (aquelas que vêm sem a presença de conjunção,
justapostas por meio de sinal de pontuação).
Em Castilho (2010) encontramos a seguinte afirmação:
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A criação das conjunções correlatas é, portanto, mais uma consequência do
processo de redobramento.
O arranjo sintático que daí resultou recebeu o nome de correlação, que
significa “relacionamento simultâneo”. Aparentemente, Oiticica (1952: 22-40)
foi o primeiro a destacar que as relações de coordenação e de subordinação
não captam todas as possibilidades de relacionamento intra ou intersentencial.
Castilho nos coloca, fazendo referência também a Oiticica, que os processos
sintáticos da coordenação e da subordinação não são suficientes para explicar todos os casos
de relações sintáticas que impliquem duas orações. A correlação viria preencher o vazio
deixado pela insuficiência das outras duas relações, posto que não haveria, necessariamente,
uma relação de coordenação ou de subordinação em toda e qualquer situação.
É pertinente para esta discussão o que observa Módolo:
Uma proposta mais coerente é substituir a dicotomia
coordenação e subordinação por um continuum, assim como já o
propuseram Susumu Kuno (1973) e Talmy Givón (1990), entre
outros. Nesse sentido, a correlação é entendida como uma
etapa intermediária recortando esse continuum e dividindo
propriedades ora com as coordenadas, ora com as subordinadas.
(MÓDOLO, 2005, p. 171)
É seguindo nessa esteira, junto com Módolo, que defendemos a correlação
como um processo intermediário, de entremeio num continuum entre a coordenação e a
subordinação. Módolo (2009) apresenta pelo menos oito tipos de correlação: aditiva,
alternativa, comparativa, consecutiva, proporcional (já citadas pelas gramáticas), equiparativa,
hipotética e diferençativa (estas últimas são novidades, até então).
Em seguida o autor aponta que há duas formas de se construir, numa perspectiva
funcionalista, os pares correlativos:
Correlatas espelhadas: correlação formada pela repetição do mesmo elemento
conjuntivo.
Correlatas não-espelhadas: correlação formada pela repetição de elementos
conjuntivos distintos.
O autor diz que as correlativas estão em uma posição intermediária entre
coordenação e subordinação, seguindo um continuum, pois “a correlação é entendida como
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uma etapa intermediária recortando esse continuum e dividindo propriedades ora com as
coordenadas, ora com as subordinadas” (MÓDOLO, 2009, p. 3). A proposta de um contínuo é
fruto dos estudos funcionalistas que apontam para uma relação que não é de independência ou
de dependência, mas sim, de interdependência, ou seja, “a estrutura das duas orações que se
correlacionam está estreitamente vinculada por expressões conectivas” (MÓDOLO, 2009, p.
6).
A Correlação e o Princípio da Marcação: Implicações Semântico-Pragmáticas
Neste tópico discutiremos a correlação a partir do princípio da marcação, em
relação à coordenação e à subordinação, defendendo que aquela se mostra mais marcada que
estas. Aqui seguiremos o que nos diz Cunha, Costa e Cezario (2003, p. 34):
O princípio de marcação, herdado da lingüística estrutural desenvolvida pela
Escola de Praga, estabelece três critérios principais para a distinção entre
categorias marcadas e categorias não-marcadas, em um contraste gramatical
binário:
a) complexidade estrutural: a estrutura marcada tende a ser mais complexa
(ou maior) que a estrutura não-marcada correspondente;
b) distribuição de freqüência: a estrutura marcada tende a ser menos
freqüente do que a estrutura não-marcada correspondente;
c) complexidade cognitiva: a estrutura marcada tende a ser cognitivamente
mais complexa do que a estrutura não-marcada correspondente.
Incluem-se, aqui, fatores como esforço mental, demanda de atenção e
tempo de processamento.
É a partir dessas características que colocamos em confronto as seguintes
estruturas:
a) O bom aluno estuda e cumpre o que é necessário.
b) O bom aluno não só estuda mas também cumpre o que é necessário.
De acordo com a gramática normativa, essas duas sentenças são sintática e
semanticamente equivalentes. Confrontando as duas estruturas, verificamos, no entanto, que a
sentença b apresenta uma estrutura mais complexa, maior que a sentença a; que é menos
frequente na fala/uso dos falantes do que a sentença a; que é mais complexa cognitivamente,
pois requer um esforço mental, atenção e tempo maiores para o processamento, ou seja, o
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processo da compreensão é mais complexo.
No entanto, como observa Givón (apud CUNHA; COSTA; CEZARIO, 2003), é
preciso admitir que a marcação é dependente do contexto, por isso, uma estrutura marcada em
um contexto pode não ser em outro, portanto, deve “[…] ser explicada com base em fatores
comunicativos, socioculturais, cognitivos ou biológicos” (p. 34). Isso implica dizer,
necessariamente, no caso das orações correlatas, que se deve levar em conta o contexto em
que foram empregadas porque isso implica a relação de sentido estabelecida, ou seja, o
aspecto semântico-pragmático é fundamental no estabelecimento de um sentido. Nos
exemplos acima, não é possível afirmar que ambas as sentenças dizem a mesma coisa, têm o
mesmo sentido. A estrutura marcada, a nosso ver, apresenta-se com um poder argumentativo
bem mais forte que a estrutura não marcada. O falante que usa a estrutura b, quer dizer,
transmitir bem mais que uma simples enumeração de atos atribuídos ao bom aluno.
Esses mesmos aspectos podem ser observados em relação às sentenças a seguir:
c) Esta menina é bonita como a mãe.
d) Esta menina é tão bonita quanto a mãe.
e) Esta menina é mais bonita (do) que a mãe.
Essas sentenças não apresentam do ponto de vista semântico-argumentativo a
mesma implicação de sentido. A sentença d é mais enfática que a sentença c, embora ambas
apresentem uma relação semântica de comparação, mas a presença do elemento intensificador
do par “tão…quanto” faz com que a ênfase a essa beleza seja dada com maior intensidade,
como a dizer que não se trata de uma simples beleza e que a beleza da menina em nada fica
devendo a da mãe. E na sentença e o par “mais…(do)que” do ponto de vista argumentativo e
da marcação se mostra mais forte enfaticamente que a relação estabelecida pelo o como.
Neste ponto, cabe o que nos diz Módolo sobre a relação de correlação
conjuncional e o seu emprego quando se quer estabelecer ‘uma coesão forte’ em textos
enfáticos:
Assim, a correlação conjuncional pode ser caracterizada como um
tipo de conexão sintática de uso relativamente freqüente,
particularmente útil para emprestar vigor a um raciocínio,
estabelecendo uma coesão forte entre sentenças ou sintagmas, e
aparecendo principalmente nos textos apologéticos e enfáticos.
A correlação exerce aí um papel importante, pois concorre para
que se destaquem as opiniões expressas, a defesa de posições, a
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busca de apoio, mais do que apenas informar com objetividade os
acontecimentos. (MÓDOLO, 2005, p. 174)
A pertinência dessa colocação está no fato de o autor apontar a relevância da
correlação conjuncional em contextos/textos semântico-pragmaticamente marcados pelos
gêneros discursivos argumentativos.
Considerações Finais
Diante do que expomos acima, é necessário uma revisão na NGB que inclua a
correlação como um processo que não se confunde com a coordenação ou a subordinação.
Não concordamos com os argumentos apresentados pelos autores que defendem a atual
classificação ou que colocam a correlação como um subtipo das coordenadas e das
subordinadas, pois, defendemos, assim, como Rodrigues e Módolo, que elas apresentam
características que, apesar de ora se aproximarem de uma e de outra, não se confundem com
elas, assim, preferimos colocar as orações correlatas num continuum entre as orações
coordenadas e as orações subordinadas. Ou seja, a relação de interdependência é o que marca
as orações correlatas.
Além disso, elas são marcadas em relação às suas equivalentes coordenadas e
subordinadas. Isto é, são mais complexas sintática e cognitivamente e de menos frequência,
porém, do ponto de vista semântico-pragmático e argumentativo são mais fortes e enfáticas,
dependendo do contexto em que foram empregadas.
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