A LEITURA FOCANDO O LETRAMENTO E A HUMANIZAÇÃO1
Maria de Fátima Caldeira2
Maria Aparecida de Fatima Miguel3
RESUMO
O artigo apresenta o trabalho desenvolvido com os alunos da 5ª Série/6º Ano. O Projeto foi baseado no Método Recepcional de Bordini e Aguiar, cujas etapas são: Determinação do horizonte de expectativas, Atendimento do horizonte de expectativas, Ruptura do horizonte de expectativas, Questionamento do horizonte de expectativas e Ampliação do horizonte de expectativas visando à humanização e à inserção dos alunos na sociedade letrada por meio da leitura. O trabalho foi realizado dentro de uma perspectiva interacionista de linguagem: o aluno, a língua e o ensino, pois o domínio da língua é condição necessária para que o aluno participe das relações sociais em que se está inserido. Enfatizou-se o lúdico das fábulas com o objetivo de desenvolver a criatividade, a intuição, a sensibilidade e a imaginação de forma divertida associada a outros gêneros textuais, como: a contra fábula, o conto, o provérbio, a poesia, a letra de música... promovendo o interacionismo sócio-discursivo. Uma leitura compreensiva, crítica, transformadora, interativa, dialógica, de sentidos, com entonação e também incentiva o desenvolvimento do hábito de leitura.
PALAVRAS-CHAVE: Leitura; Interação; Humanização; Letramento.
____ 1Trabalho de conclusão do Programa de Desenvolvimento Educacional- PDE/2010.
2Professora efetiva da Rede Pública Estadual de Ensino do Estado do Paraná. NRE de Cornélio
Procópio.
3Professora orientadora – UENP.
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Introdução
A formação do aluno é muito importante e a escola tem essa difícil tarefa a
cumprir no âmbito educacional. A leitura pode ser um dos instrumentos que torna
possível uma sociedade de pessoas conscientes e letradas. Motivo pelo qual se
trabalhou a leitura visando à formação do educando.
Como o título do projeto refere-se ao letramento, cabem aqui alguns
esclarecimentos. Letramento é uma palavra considerada nova no uso da Educação
e das Ciências Linguísticas, mas seu uso se tornou frequente no discurso escrito e
falado. Segundo Magda Soares (1988, p.19), “[...] novas palavras são criadas, ou a
velhas palavras dá-se um novo sentido, quando emergem novos fatos, novas ideias,
novas maneiras de compreender os fenômenos”. Para a autora (1998, p. 20), “[...]
não basta apenas saber ler e escrever, é preciso também saber fazer uso do ler e do
escrever, saber responder às exigências de leitura e de escrita que a sociedade faz
continuamente – daí o surgimento do termo letramento [...]”.
A fábula, o gênero escolhido, em especial, para o desenvolvimento do projeto,
transmite um conceito moral, uma norma de convivência, é uma narrativa curta,
mostra como os homens/animais agem de um jeito bem criativo, por isso
considerou-se adequada para os alunos da 5ª série do Colégio Estadual Papa Paulo
VI. Por apresentar semelhança com os desenhos animados em se tratando de
histórias relacionadas a personagens animais, é muito difícil, ou pouco provável, que
uma criança não goste. Foi com esta intenção que se realizou o trabalho/leitura.
Visando realizar um trabalho dialógico entre as várias modalidades textuais e
enriquecer as atividades, incluíram-se pequenos contos, provérbios, poesia, letras
de música, contra fábula, pois o método pressupõe uma leitura contínua que
dialogue entre si com a finalidade de desenvolver a percepção crítica acerca de
determinado assunto. Um texto não se esgota em si mesmo, está, pois sempre em
contato com outro, seja negando, confrontando, reafirmando a sua ideologia, visto
que as palavras vêm sempre carregadas de valores implícitos ou explícitos de forma
que cumpre oferecer ao educando sempre cada vez mais possibilidade de adentrar
os meandros do texto.
Boa parte dos alunos “não gosta de ler”, porém a leitura alimenta o cérebro.
Um cérebro “bem alimentado”, certamente, deixará de ser um problema para a
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escola e para a sociedade. Em geral, um ser educado não agride porque dispõe de
outros recursos. Uma pessoa que pratica a leitura é mais sensível e compreensiva.
Pensando em melhorar a convivência no ambiente escolar e na sociedade, o projeto
de leitura foi de certo modo ambicioso. Ele teve como objetivo a valorização do “Eu”,
do “Outro” e a sua transformação. Percebeu-se que cada aluno incluso no projeto,
no seu tempo e a seu modo, apresentou melhoria no comportamento e na
aprendizagem. Mesmo que de modo fragmentado e de pouca repercussão, as
conquistas alcançadas, com a turma, podem ser consideradas como avanços na
caminhada educacional. O simples fato de observar o aluno tentando realizar a
atividade já compensa todo o trabalho.
A escola, como lugar de socialização do conhecimento, possibilita a prática
pedagógica fundamentada em diferentes metodologias, valorizando concepções de
ensino, de aprendizagem permitindo uma transformação.
Observando as dificuldades dos alunos da 5ª série, no que se se refere à
leitura, buscou-se o desenvolvimento de atividades priorizando a leitura.
Normalmente, estas turmas se constituem de alunos de diferentes escolas, os da
cidade e os da zona rural. Muitos têm dificuldade de realizar a leitura com
compreensão. Leem “gaguejando”, sem entonação e fluência. Isso se percebe no
tempo que levam para ler, no modo como realizam a leitura dos textos, tanto
silenciosa quanto oral. A escrita também apresenta muitos problemas. Alguns, os
casos mais críticos, até participam da sala de apoio duas vezes por semana em um
horário especial programado para atendê-los. Um recurso utilizado na rede pública
que vem beneficiando os alunos da 5ª série/6º ano e também os da 8ª série/ nono
ano.
Além disso, observa-se também um sentimento de preconceito quanto ao
modo de ser de alguns alunos. Eles são tratados com certa diferença “pelos
colegas”. A conscientização e a humanização podem acontecer por meio da leitura,
reflexão, questionamentos e apresentação da realidade social. É importante e
necessário trabalhar o respeito com mais frequência na sala de aula e a leitura,
certamente, possibilita este exercício.
A turma leu para familiarizar com os textos. Como os alunos têm dificuldades
para ler, o texto mais longo dificultaria o trabalho levando o aluno a desistir da leitura
alegando que não quer ler, ou que não gosta de ler, como já acontece nas aulas de
Língua Portuguesa. Alguns alunos não leem nem de um ponto até o outro para que
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os outros não percebam as dificuldades que têm, mesmo com muita insistência e
incentivo. Não conseguem ler com fluência e desistem com essas desculpas. A
verdade é que sentem vergonha de participar das atividades de leitura por não
acompanhar os colegas da classe ou para não ser o motivo do riso na turma. É
complicado porque a participação do aluno é imprescindível para a promoção do
conhecimento. Sente-se que a pouca participação do aluno também se dá por vários
fatores: a “educação” imposta pela própria sociedade que estigmatiza o aluno, a
classe social, a cor, a raça, o credo... motivos que levam o aluno a ter uma
autoestima baixa, daí a seu pouco rendimento, pelo fato de sentir-se à margem da
sociedade. Desenvolver um trabalho com a leitura se torna profícuo, pois esta
desencadeia um processo de crescimento e de tomada de atitudes por parte do
educando.
A prática de leitura propicia o desenvolvimento de uma atitude crítica,
responsiva que pode resultar em uma melhoria na escrita, na compreensão, no
modo de ser, pensar e agir dos educandos. Para Zilberman (1986, p. 16) “[...] a
conquista da habilidade de ler é o primeiro passo para a assimilação dos valores da
sociedade”. Sendo assim, é importante que a leitura norteie todo o trabalho no
processo educacional.
Como a sociedade é desigual e os interesses também, a oferta de vários
textos podem despertar o senso crítico do educando no momento em que este se
identificar com as vozes presentes nos enunciados apresentados e atribuir- lhes
sentidos tanto para si quanto para os outros, realizando o diálogo entre as várias
fontes oferecidas, porque a leitura de um texto não se esgota na decodificação da
palavra escrita, ao contrário, ela amplia o horizonte de expectativa do leitor levando
conforme já mencionado, a um processo de leitura crítica, onde não somente
absorva o aparente, mas também possa interagir com este de forma a questioná-lo.
Cumpre ressaltar que a leitura se dá a todo instante em textos escritos ou não, e,
principalmente, é repassada pela mídia de modo contundente, de forma a impor a
ideologia da classe dominante e a tornar o leitor um sujeito passivo diante da
imposição de valores que diminuem a sua possibilidade de desenvolver a sua
cidadania.
Não basta saber ler é preciso ir mais longe. O desenvolvimento de um sujeito
crítico, por meio da leitura, resulta na transformação do mesmo. Essa mudança do
ser propicia a sua independência social. Ele passa a fazer parte da sociedade como
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um ser ativo que constrói conhecimento, tem noção dos seus direitos de cidadão,
tem condições para se posicionar diante do que se lê e da realidade. Essa é a leitura
emancipadora: o leitor atribui sentidos, realiza os diálogos, age, interage,
compreende, contextualiza e o sujeito se torna crítico por meio do letramento.
Analisando as ações realizadas, que são muitas, visando à melhoria do
ensino, percebe-se que os resultados não são os esperados. É “comum” um aluno
chegar à quinta série lendo e escrevendo mal. Também apresentando um
comportamento agressivo sem se preocupar com o outro, ameaçando os colegas e
profissionais da educação.
Está difícil encontrar meios para a efetivação de uma educação eficiente.
Quem está dentro do ambiente escolar, na sala de aula, vive esta dura realidade. O
estudante por meio da ideologia que lhe é incutida age de forma autômata, porque
pensa que sabe o que é certo e o que é errado, o que é permitido e o que não é. Na
verdade, repercute apenas comportamentos prontos que assimilam, na maioria das
vezes, em meios de comunicação ou dentro da estrutura familiar. Desta forma,
prefere fazer o que lhe convém, sem se preocupar com as consequências, pois não
possui um senso crítico que o leve a pensar com ética, com respeito em relação a si
mesmo e aos outros. Por isso o trabalho realizado com a leitura teve como objetivo a
humanização e a inserção do aluno na sociedade letrada. A leitura crítica torna
possível o conhecimento para uma sociedade menos desigual, mais justa e
harmoniosa. É importante ler para apreender, compreender, contextualizar,
interpretar e perceber os vários ambientes em que o sujeito está inserido. Utilizou-se
a leitura com o intuito de envolver o aluno com as práticas discursivas buscando
demonstrar a necessidade de intensificar a leitura em razão dos benefícios que ela
proporciona. A leitura foi trabalhada de forma prazerosa incentivando a interação e a
formação do estudante.
Fundamentação teórica
As atividades foram realizadas dentro de uma perspectiva interacionista de
linguagem: o aluno, a língua e o ensino porque o domínio da língua é condição
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necessária para que o aluno participe das relações sociais nas quais se está
inserido.
Mesmo com tanta informação e tecnologia, convive-se com o baixo
desempenho dos alunos em relação à compreensão/interação dos textos que leem.
O desenvolvimento do projeto no colégio foi baseado no Método
Recepcional. O Método, segundo Bordini e Aguiar (1993, p. 86), “é eminentemente
social ao pensar o sujeito em constante interação com os demais, através do
debate, e ao atentar para a atuação do aluno como sujeito da História”. Essa
interação, para os alunos da 5ª série do Colégio Estadual Papa Paulo VI, realizou-se
entre aluno/texto/contexto e as possibilidades de diálogo com os textos postos em
contato com os alunos. Esse trabalho interativo foi realizado, segundo o método de
desenvolvimento, em etapas: Determinação do horizonte de expectativas
(receptividade); Atendimento do horizonte de expectativas (concretização); Ruptura
do horizonte de expectativas (ação crítica); Questionamento do horizonte de
expectativas (revisão) e Ampliação do horizonte de expectativas (assimilação).
Alicerçado na Estética da Recepção, o Método Recepcional preocupa-se com
o ponto de vista do leitor, com a relação autor/leitor e a realidade circundante. Por
isso se dedica a explorar os textos e contextualizá-los. A preocupação com o leitor
possibilita o ensino da leitura. Foi nessa perspectiva de interação dos horizontes dos
textos e dos alunos que a leitura foi para a sala de aula. Esse trabalho propôs ao
estudante a formação para a transformação da realidade social, uma formação
humanista e tecnológica atendendo ao princípio das diretrizes curriculares. Uma
abordagem contextualizada com o aluno e a leitura que visou ao conhecimento e à
formação de sujeitos que constroem sentidos múltiplos em relação a um objeto, a
um acontecimento, a um significado ou a um fenômeno.
Conforme Zilberman (org.1986, p.131) em Leitura em crise na escola: as
alternativas do professor:
[...] no processo educacional, ler é humanizar-se, reconhecer-se, uma vez que o escritor é aquele que, “mais do que ninguém, ausculta o seu povo; que renuncia a muitas coisas, impulsionado por uma necessidade profunda de expressão; que sonda as possibilidades vivas da língua; que encara o ato de viver como algo de grave e procura, para isto, cercar-se de um silêncio criador, onde é possível escutar mais claramente a sua própria voz e a voz de seus irmãos”. Por isso, a leitura que efetivamente penetre um texto só pode ser participante e rica, a nível individual e social. E é esta
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leitura que deve ser tomada como imperativo de uma educação humanizante e emancipadora.
Assim, é na escola que o educador e educando têm a oportunidade de
dialogar com os textos, com os outros, de ouvir as vozes implícitas no discurso,
refleti-las, conhecê-las, reconhecê-las, aprendê-las e desta forma sensibilizar-se,
apropriando-se deste discurso intertextual, ambíguo, polifônico que o conduz ao
reconhecimento das variações linguísticas ligadas ao discurso com intuito de
aprimorar o conhecimento, num processo gradativo que o dirija a um processo de
leitura crítica do texto, onde haja um reconhecimento das várias possibilidades de
leitura inerentes às produções textuais, com as quais este leitor entre em contato.
A prática efetiva de leitura abre espaço para o desenvolvimento da
compreensão/entendimento (letramento) do aluno, melhorando o ser, sua cidadania,
sua livre escolha, num processo de tomada de posições resultando na inserção
social com vistas a uma atitude emancipatória.
Para Zilberman, essa é a leitura a ser trabalhada no processo educacional e
as teorias de Bakthin confirmam esse modo de se trabalhar porque o contexto sócio-
histórico, segundo Bakhtin, estrutura-se no interior do diálogo da corrente da
comunicação verbal entre os sujeitos históricos e os objetos do conhecimento. É um
dialogismo que se articula por meio da construção dos sentidos que são intrínsecos
nas estruturas sociais, edificando a linguagem de uma comunidade historicamente
situada. As ações desses sujeitos produzem linguagens que podem levar à
compreensão dos confrontos entre conceitos e valores de uma sociedade. Desse
confronto é possível acontecer as mudanças necessárias para a transformação dos
sujeitos. Uma pequena alteração no meio educacional, da relação entre os sujeitos
com a leitura crítica e sua inter-relação com o outro, pode ser considerado como
avanço no processo ensinoaprendizagem.
A leitura, segundo as diretrizes, é vista como um ato dialógico, interlocutivo. O
leitor tem papel ativo no processo da leitura e isso se dá pela efetivação como
coprodutor que procura pistas formais, formula e reformula hipóteses, aceita ou
rejeita conclusões, usa estratégias com base no seu conhecimento linguístico, nas
suas experiências e na sua vivência sociocultural propiciando o desenvolvimento da
atitude crítica, levando o aluno a perceber o sujeito presente nos textos e a tomada
de uma atitude responsiva diante da realidade.
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A promoção da prática de leitura como um processo de produção de sentido,
a partir das interações sociais ou relações dialógicas que acontecem entre leitor,
texto, interlocutor e autor é imprescindível para o desenvolvimento do trabalho com a
leitura. Com o aprofundamento da leitura, o aluno pode perceber os elementos
implícitos, as reais intenções dos textos e os modos de manipulação da linguagem.
A experiência, os conhecimentos prévios do leitor são importantes porque lhe
permite fazer previsões e inferências sobre o texto. Ele constrói e não apenas
recebe um significado geral do texto possibilitando a ampliação das leituras.
Os gêneros discursivos e as fábulas
O trabalho desenvolvido com a leitura envolveu vários gêneros do discurso.
Nas palavras de Bakhtin (2000, p. 279), os gêneros do discurso são:
Todas as esferas da atividade humana, por mais variadas que sejam, estão sempre relacionadas, com a utilização da língua. Não é de surpreender que o caráter e os modos dessa utilização sejam tão variados como as próprias esferas da atividade humana, o que não contradiz a unidade nacional de uma língua. A utilização da língua efetua-se em forma de enunciados (orais e escritos), concretos e únicos, que emanam dos integrantes duma ou doutra esfera da atividade humana. O enunciado reflete as condições especificas e as finalidades de cada uma dessas esferas, não só por seu conteúdo (temático) e por seu estilo verbal, ou seja, pela seleção operada nos recursos da língua – recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais -, mas também sobretudo, por sua construção composicional. Estes três elementos (conteúdo temático, estilo e construção composicional) fundem-se indissoluvelmente no todo do enunciado, e todos eles são marcados pela especificidade de uma comunicação. Qualquer enunciado considerado isoladamente é, claro, individual, mas cada esfera de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, sendo isso que denominamos gêneros do discurso.
Conforme a citação, a fábula é uma das muitas esferas que compõem o
gênero discursivo.
Fábula (latim fari + falar e grego Phaó + dizer, contar algo). Segundo as
leituras realizadas, essa modalidade textual é uma narrativa curta em prosa ou
verso, significa narrar, tem como personagens animais e é de caráter alegórico.
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Acredita-se que esse tipo de texto tenha nascido na Suméria, no século XVIII a.C.
Há registros de fábulas egípcias e hindus, mas atribui-se à Grécia a criação efetiva
desse gênero narrativo. Surgiu no Oriente, foi desenvolvido por um escravo
chamado Esopo no século V a.C. que por meio dos diálogos entre os bichos e das
situações que os envolviam, procurava transmitir sabedoria de caráter moral ao
homem. Aperfeiçoado, séculos mais tarde, pelo escravo romano Fedro no século I
a.C. que o enriqueceu estilisticamente, mas foi no século X que começaram a ser
conhecidas as fábulas latinas de Fedro. O francês Jean La Fontaine (1621/1692)
deu a forma definitiva ao texto introduzindo-a na literatura ocidental. Monteiro Lobato
escreveu muitas histórias adaptadas de Fontaine. Millôr Fernandes é um grande
escritor de fábulas da atualidade.
Algumas associações entre animais e características humanas mantiveram-se
fixas em várias histórias e ainda permanecem:
Leão - poder real
Lobo - dominação do mais forte
Raposa - astúcia e esperteza
Cordeiro – ingenuidade
Formiga – trabalho
Essa produção faz parte da tradição oral e, apesar de ter surgido há quase
dois mil anos, essa literatura é bastante atual. Muitos escritores recriaram velhas
fábulas dando-lhes novos finais ou novos significados. E ainda, novos gêneros.
De acordo com Bakhtin,
[...] As mudanças históricas dos estilos da língua são indissociáveis das mudanças que se efetuam nos gêneros do discurso. A língua escrita corresponde ao conjunto dinâmico e complexo constituído pelos estilos da língua, cujo peso respectivo e a correlação, dentro do sistema da língua escrita, se encontram num estado de contínua mudança (BAKHTIN, 2000, p.285).
Por esse caminho, a fábula pode ser tratada de um modo diferente. Com o
tempo, novas histórias foram escritas, reinventadas em novos gêneros com outros
finais. Por isso é possível trabalhar o texto dispensando este lado moralizante. O
exercício com a leitura por si só pode cumprir o papel da humanização. A prática de
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leitura pode desenvolver bons hábitos, sem a necessidade de cobrança ou
ensinança. De forma lúdica é possível o desenvolvimento de muitas atividades com
os alunos da quinta série/sexto ano que ainda apresentam características da
infância. É importante combinar com os alunos/crianças os trabalhos, sem
imposições, para que eles aprendam gostando do que fazem. É preciso muita
sensibilidade para perceber o que está sendo significativo para cada turma.
A proposta principal da fábula é a fusão de dois elementos: o lúdico e o
pedagógico.
O projeto desenvolveu um trabalho voltado para o lúdico provocando o
desenvolvimento da criatividade, da intuição, da sensibilidade e da imaginação de
forma divertida associada a outros gêneros, como: as contra fábulas, os contos, os
provérbios, a poesia, a letra de música, etc. promovendo o interacionismo sócio-
discursivo.
Com este gênero narrativo foi possível trabalhar a leitura com entonação
visando à compreensão. Os elementos da narrativa foram explorados: o narrador, as
personagens, o tempo e o espaço. As questões gramaticais foram abordadas, tais
como: a paragrafação, o início das orações em maiúscula, os espaços que
compõem os parágrafos, o uso do travessão para a introdução do discurso direto,
enfim, é um texto que permite realizar muitas atividades. No entanto, o objetivo
primeiro foi o contexto com as malhas do texto, sua natureza ideológica, evitando o
uso deste apenas como pretexto para o ensino da gramática, como também a
utilização do ponto de vista da teoria estruturalista.
Um educando consciente tem competência para dialogar, compreender,
resolver as dificuldades apresentadas pela vida, conviver socialmente e, o mais
importante, tem a consciência da importância de seguir aprendendo para ser cada
vez melhor. Esse trabalho propiciou, sem imposição, mudanças significativas na
formação do aluno/leitor por meio do diálogo estabelecido entre leitor/texto/autor
visando ao letramento.
Metodologia
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Motivação para a formação do aluno leitor na busca incessante de demonstrar
os benefícios da leitura que são muitos: ampliação do vocabulário, desenvolvimento
crítico, integração social, humanização, letramento, aprendizagem, ampliação de
horizontes, conhecimento, fortalecimento de ideias e ações.
Tendo em vista a necessidade de um método para a aplicação das atividades,
o trabalho foi desenvolvido com base no Método Recepcional, como já mencionado,
desenvolvido por Bordini e Aguiar:
1- Determinação do horizonte de expectativas:
Nessa etapa, os alunos praticaram a leitura como objetivo de melhorar a
entonação e a compreensão.
Preocupou-se em trabalhar a receptividade com a intenção de envolver os
alunos com a leitura e o contato com diversos gêneros textuais, como: conto,
poema, fábula e diálogo. Os textos foram selecionados a partir da realidade dos
alunos respeitando a série, a turma, o grau de dificuldade e o possível interesse que
a seleção pudesse provocar: Ciça, Bichos, bicho!; José Paulo Paes, Emprego; Luís
Fernando Veríssimo, Os preguiçosos e Luís da Câmara Cascudo, A preguiça. Todas
as leituras referiram-se à preguiça de modo engraçado, sutil e leve explorando o
lúdico das histórias e os sentidos da palavra preguiça tendo em vista a recepção e a
ruptura dos horizontes de expectativas.
2- Atendimento do horizonte de expectativas:
Nessa etapa de desenvolvimento, também explorando o lúdico dos textos
com a intenção de motivar a turma, definir o tema e propiciar experiências, as
atividades foram direcionadas ao atendimento do horizonte de expectativas.
Praticou-se a leitura oral, individual e coletiva dos textos escolhidos com o objetivo
de melhorar a fluência e a compreensão.
Definiu-se o gênero e as características da fábula.
Leituras realizadas: Fábula, A cigarra e a formiga, atribuída a Esopo,
adaptada por Joseph Shafan; o provérbio bíblico 20,4; A fábula da preguiça, de autor
desconhecido, encontrada na internet. O texto narra a história de quatro pessoas
com preguiça. Tinha um trabalho para ser realizado, mas... O interessante desta
narrativa são os nomes dos personagens: Todo Mundo, Alguém, Qualquer Um e
Ninguém. Como os textos relatam a “dureza” da preguiça e a falta de compreensão
em relação aos porquês de cada um, concluiu-se a etapa com a leitura do texto, “A
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ciência da preguiça”, que de um modo bem engraçado, trata a preguiça como uma
habilidade criativa. Essa história é do livro Fábulas Italianas e foi escrita por Ítalo
Calvino, segundo fonte da internet.
3- Ruptura do horizonte de expectativas:
A terceira etapa de desenvolvimento teve como objetivo a ação crítica.
Momento em que os alunos ficaram surpresos com a direção do tema porque eles
assistiram a um vídeo do YouTube que apresentou a fábula da cigarra e da formiga
com um final diferente da leitura realizada na etapa anterior. Nesse vídeo, a cigarra
é acolhida pelas formigas, tratada de forma carinhosa e o trabalho que ela realizava,
foi reconhecido e valorizado. Com a mesma intenção, trabalhou-se o poema Sem
barra, escrito por José Paulo Paes. Os alunos perceberam a valorização atribuída ao
trabalho da cigarra apresentada no poema. Modos diferenciados de
comportamentos, atitudes e sentidos também foram perceptíveis na música: Viver e
não ter a vergonha de ser feliz, de Gonzaguinha que num ritmo alegre, canta a vida
apresentando os modos de viver. Para uns, maravilha, alegria; para outros,
sofrimento, lamento... assim, buscou-se a ruptura por meio da inversão, pois as
atividades desenvolvidas apontam novas possibilidades, olhares, posturas...
4- Questionamento do horizonte de expectativas:
Nessa etapa de desenvolvimento/questionamentos as atividades com as
leituras visaram à introdução de novos textos.
Os alunos leram e reproduziram “A fábula da preguiça” reforçando as ideias
do tema proposto. Analisaram as questões abordadas no filme e no poema: preguiça
ou diferenças? Contrastaram o final da preguiça da fábula de Esopo com o filme e o
poema. A música, A paz, de Zizi Possi foi introduzida nessa etapa apontando a
importância da paz com ou sem a preguiça. Houve a retomada das leituras para a
realização do diálogo entre os textos, os alunos e a contextualização.
Como já mencionado, nessa etapa de desenvolvimento, os alunos
reproduziram “A fábula da preguiça” que segundo pesquisa realizada é de autoria
desconhecida. Os alunos substituíram, a seu critério, os nomes dos personagens
por outros nomes ou... que eles mesmos escolheram. Uma das produções, de aluno
não identificado, ficou assim:
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De quem é a tarefa?
Está é uma história sobre quatro pessoas...
Nathan, José, Fernando e Gustavo.
Havia um grande trabalho a ser feito e Nathan tinha certeza que José o faria.
Fernando poderia tê-lo feito, mas Gustavo o fez. José se zangou porque era um
trabalho de Nathan. Nathan pensou que Fernando poderia fazê-lo, mas Gustavo
imaginou que Nathan deixasse de fazê-lo. Ao final Nathan culpou José quando
Gustavo fez o que Fernando poderia ter feito.
Aparentemente, realizar essa atividade é muito simples, mas exige atenção,
compreensão... para perceber que a história se modifica. E não é só isso, para
realizar a atividade, o aluno precisa ter noção de inicial maiúscula, de parágrafo...
5- Ampliação do horizonte de expectativas:
Nessa etapa final de desenvolvimento do trabalho, os alunos leram o livro “A
formiguinha e a neve”, da coleção literatura em minha casa, adaptada por João de
Barro (Braguinha). A leitura foi trabalhada com os alunos de modo diversificado:
primeiro, eles assistiram ao filme “A formiguinha e a neve”, segundo, assistiram ao
filme com narração e legenda; terceiro, realizaram a leitura do livro; e quarto, fizeram
a leitura dramatizada.
Material para a realização do trabalho: Livro da série literatura em minha casa
e mídias disponíveis.
Implementação
A implementação dessa proposta realizou-se no decorrer do segundo
semestre do ano de 2011, no Colégio Estadual Papa Paulo VI – Ensino
Fundamental e Médio, localizado no município de Nova América da Colina, com os
alunos da 5ª série do Ensino Fundamental. O trabalho foi realizado em seis ações:
1ª- Apresentação do Projeto de Intervenção Pedagógica para a direção,
equipe pedagógica, professores, funcionários e alunos da 5ª série “B” do Colégio
Estadual Papa Paulo VI – Ensino Fundamental e Médio;
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2ª- Início das atividades com os alunos da 5ª série “B”, 2011. Primeira etapa
de desenvolvimento das atividades baseado no Método Recepcional: determinação
do horizonte de expectativas. A leitura foi trabalhada com o objetivo de explorar a
receptividade;
3ª- Leitura atendendo ao horizonte de expectativas, 2ª etapa de
desenvolvimento, concretização;
4ª- Ruptura do horizonte de expectativas, 3ª etapa de desenvolvimento do
Método, ação crítica;
5ª- Questionamento do horizonte de expectativas, 4ª etapa de
desenvolvimento, revisão das leituras;
6ª- Leitura do livro “A formiguinha e a neve”, 5ª etapa de desenvolvimento,
ampliação do horizonte de expectativas, assimilação.
Os alunos se sentiram valorizados por participarem do projeto desenvolvido
pelo PDE. Isso foi observado nos comentários que eles faziam durante as atividades
realizadas na sala de aula.
GTR (Grupo de trabalho em Rede)
O GTR faz parte do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE. É a
interação virtual entre os professores PDE e os professores da Rede Pública
Estadual que foi realizada na terceira etapa do curso PDE, 2010. É uma
oportunidade de trocar ideias e experiências das atividades desenvolvidas no
cotidiano escolar. Também é o momento de apresentar aos professores
participantes do GTR todos os trabalhos desenvolvidos no PDE sob a orientação do
Professor Orientador da IES:
1º Projeto de Intervenção Pedagógica na Escola:
O Projeto é elaborado a partir da intenção manifestada pelo professor PDE e
do diagnóstico realizado na escola de atuação porque visa ao desenvolvimento de
ações que possam contribuir com o ensino e a aprendizagem dos alunos.
2º Produção Didático-Pedagógica na Escola
É o material didático-pedagógico elaborado para a utilização durante o
processo de implementação do Projeto de Intervenção Pedagógica na Escola. Essa
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produção pode ter a forma de: Caderno Pedagógico, Caderno Temático, Unidade
Didática, Material Multimídia, Produção de Softwares Educativos, Atlas, Mapa, Artigo
Científico e Outras.
3º Implementação do Projeto na Escola.
É o resumo das ações desenvolvidas durante a aplicação do material
didático-pedagógico e a apresentação dos resultados pretendidos/alcançados.
Segundo as professoras que participaram do GTR, o tema “A leitura e a
inserção do aluno no âmbito da sociedade letrada” é bastante pertinente para os
alunos da 5ª série porque os textos selecionados são interessantes, curtos, é uma
leitura rápida e envolvente. Como os alunos da 5ª série têm “muita energia”, são
“elétricos”, impacientes, as atividades foram adequadas e convenientes.
Assim como as professoras participantes do GTR, os alunos da 5ª série “B”,
turma escolhida para o desenvolvimento das atividades do PDE, também gostaram
do projeto que foi elaborado para eles. Sentiram-se importantes e valorizados, pois
realizavam com satisfação as atividades propostas. Quando se trabalha sem
imposição, a contribuição e o resultado são melhores.
Conclusão
As fábulas são narrativas interessantíssimas. Os personagens são animais,
mas as ações são típicas dos seres humanos. Como o projeto propôs melhorar a
leitura, a escrita e os hábitos dos alunos, esse gênero contemplado para a
realização do trabalho foi muito importante para a quinta série, pois após a
conclusão das atividades, constatou-se que os resultados foram alcançados dentro
do proposto. A classe, de modo geral, foi melhorada. Por isso o trabalho com a
formação do aluno é uma necessidade permanente na escola. O educador precisa
levar para a sala de aula textos que motivem a aprendizagem, despertem o
interesse e mantenham a atenção. Se há a necessidade de alunos leitores, que
interajam, leiam as entrelinhas, gostem de realizar as atividades, também é
necessário o desenvolvimento desse trabalho. É importante observar e perceber o
que é apropriado em cada turma para que se alcance os resultados pretendidos. A
leitura possibilita ao educando o conhecimento de seus direitos, de seus deveres, a
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visão de seu eu, do outro e do mundo. Em uma sociedade onde não é mais possível
o “rigor”, é imprescindível pensar em estratégias que possibilitem a existência de
pessoas melhores. A realização das atividades com a leitura demonstrou que é
possível modificar o perfil da sociedade por meio da leitura. É preciso acreditar na
educação do alunado. Foi uma ação singela, aplicada em uma turma de quinta série,
com muitos problemas, já relatados na justificativa do projeto, mas os alunos
apresentaram melhoria no comportamento e no desempenho. No final, eles já
estavam tão habituados com atividades diferenciadas que as aulas tiveram que
continuar no ritmo da implementação. Para muitos, o que falta é o incentivo e a
valorização, o ser tratado com amor.
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