1 Protocolos de Decisão Médica – Um dos Pilares do Projeto ACERTO
José Eduardo de Aguilar-Nascimento
Introdução
A distância entre a teoria e a prática baseada em evidências é grande e já foi anteriormente descrita e quantificada.1 Na práti-ca clínica, três fatores parecem ser os principais determinantes no dia a dia do profissional de saúde:
1. Nível da evidência científica (pelo menos aquilo que o profissional julga ser a melhor conduta).
2. Sistema de saúde e contexto da prática profissional (acadêmico versus não acadêmico).
3. Presença de facilitadores de adesão à boa prática.
Os dois primeiros determinantes exigem, respectivamente, pesquisa em boa base de informação e hospitais com exce-lente qualidade de aparelhamento. São objetivos de médio ou longo prazos, pois exigem educação médica e investimentos na área de saúde. Por outro lado, facilitadores locais de adesão às boas práticas (protocolos e diretrizes) são mecanismos im-plementados para assegurar que condutas reconhecidamente benéficas, associadas à redução da morbidade e da mortali-dade em bons estudos (estudos randomizados e controlados,
ACERTO | Acelerando a Recuperação Total Pós-Operatória2
revisões sistemáticas e metanálises), não sejam esquecidas pelos profissionais de saúde no dia a dia da prática clínica.2
Atualmente, várias sociedades médicas, inclusive a Associação Médica Brasi-leira, estão engajadas no desenvolvimento de diretrizes e protocolos clínicos que assegurem melhoras na qualidade de atendimento no Brasil.
Seguir os protocolos e basear-se em estudos científicos são uma exigência defendida como forma de tentar padronizar a prática e torná-la mais segura em benefício do paciente e do próprio médico.3 Contudo, o que é científico para os médicos tem diferentes referências. Muitos se reportam a expressões como “protocolos”, “literatura”, “rotinas”, “livros-texto” e “estudos científicos” para conceituar uma boa prática clínica. Uchoa & Camargo Jr. (2006)3 relatam, em interessante estudo sobre uso de protocolos com médicos intensivistas, frases como as que seguem:
[...] pode-se dizer que alguns médicos, embora procurem ser criteriosos no sentido de se guiar pelas evidências de trabalhos, consensos e literatura, não abrem mão, não devem abrir mão de suas experiências porque na litera-tura não tem consenso. E se o serviço não tem experiência [...]
Não é recomendável se fazer algo que não tem evidência na literatura, no protocolo, mas se faz porque o que mais importa é a melhora do paciente.
O fato é que muitas vezes as decisões são baseadas em conhecimentos que o médico aprendeu com outro médico (residente mais idoso, professor, entre outros), em uma variação de tempo que pode chegar a 10 a 30 anos atrás. A subjetividade é um campo farto que muitas vezes é rotulado como “experiência” ou “bom-senso”. Há de tudo, porém muitas vezes há pouca evidência. Defesas de um ponto de vista às vezes são anedóticas, e expressões do tipo “sempre fiz assim e deu certo”, “nunca tive complicações com essa prescrição”, “olha, vamos esperar que surjam mais trabalhos sobre isso”, ou ainda “já tive um caso em que fiz assim e não deu certo”, são frequentemente utilizadas em discussões médicas.
A Tabela 1.1 mostra os paradigmas tradicionais e os da medicina baseada em evidências. Os principais problemas que dificultam que cirurgiões sigam protocolos estão apresentados na Tabela 1.2.
Protocolos de Decisão Médica – Um dos Pilares do Projeto ACERTO 3
Imaginário e realidade
Um problema sério na subjetividade e na conduta médicas, não baseada em proto-colos, é o imaginário sobre o que se faz no dia a dia. Há alguns anos, antes do Pro-jeto ACERTO, realizamos uma pesquisa entre 12 cirurgiões do serviço de Cirurgia Geral do Hospital Universitário Júlio Müller (HUJM) sobre o uso de antibióticos em
Tabela 1.1 Paradigma tradicional e o da medicina baseada em evidências para a terapia médica
Paradigma tradicional
Experiência do cirurgião
Número de casos
Conduta do professor
Paradigma atual (medicina baseada em evidências)
Tipo de informação Grau de recomendação
Ensaios clínicos randomizados A
Metanálises A
Revisões sistemáticas A
Experiência de expert C
Tabela 1.2 Principais problemas encontrados pelos cirurgiões para seguirem protocolos4
Fragmentação da equipe
Falta de comunicação e de reuniões de serviço
Grande energia gasta em outras funções e pouca em cuidados médicos
Personalidade autossuficiente dos cirurgiões
Alta complexidade de técnica e cuidados cirúrgicos
Sistema de informação defasado
Pouco retorno financeiro nos empregos ou convênios em que atuam
Reco
men
daçõ
es d
o Pr
otoc
olo
ACER
TO6 Terapia Nutricional
Perioperatória
José Eduardo de Aguilar-Nascimento Diana Borges Dock-Nascimento Rosalia Bragagnolo Fernanda Stephan Caporossi Letícia Perdomo Francine Perrone Márcia Carolina de Siqueira Paese
Todo paciente deve ser triado na internação e avaliado do ponto de vista nutricional. Essa avaliação deve fazer parte das informações contidas no prontuário
A avaliação subjetiva global é uma boa ferramenta para essa avaliação, mas pode ser usada apenas como triagem
A intervenção nutricional imediata (INTERNUTI) após a in-ternação, no período pré-operatório, está indicada por um período de 7 a 14 dias no paciente sob risco nutricional grave e candidato a operações eletivas de médio e grande portes. Entende-se por risco nutricional grave a situação em que existe pelo menos um dos quatro itens a seguir:
Perda de peso >10% em 6 meses ou 5% em 30 dias Índice de massa corporal (IMC) <18,5kg/altura² (m) Avaliação subjetiva global (ASG) = C Albumina sérica <3mg/dL
Em operações de grande porte para pacientes com câncer, mesmo não havendo desnutrição grave, a terapia nutricio-nal pré-operatória com suplementos que contenham imu-nonutrientes, durante 5 a 7 dias, está indicada e também deve continuar no pós-operatório
Top Related