ANÁLISE FRACTOGRÁFICA DE FRATURA EM FADIGA DO COMPÓSITOS NC2/RTM6
Marcos Y. Shiino1*, Maria O. H. Cioffi1, Herman C. J. Voorwald1, Mirabel C. Rezende2
1*
Universidade Estadual Paulista - UNESP, Campus de Guaratinguetá, Guaratinguetá-SP-
2 Divisão de Materiais/Instituto de Aeronáutica e Espaço, AMR/IAE/CTA – Comando-Geral de Tecnologia
Aeroespacial – São José dos Campos-SP
RESUMO
A realização deste trabalho foi feita em parceria com a indústria aeronáutica nacional e com o grupo de compósitos da divisão de materiais do CTA. O objetivo foi avaliar o comportamento em fadiga e identificar o limite de resistência a fadiga do compósito NC2/RTM6 para aplicação aeroespacial, com posterior análise fractográfica das falhas. Os ensaios de fadiga foram conduzidos com perfil de tensão senoidal, do tipo tensão-tensão, e freqüência de 10 Hz, as fraturas foram analisadas com auxilio de microscópio eletrônico de varredura (MEV). As fractografias e os resultados quantitativos foram relacionados para verificar a qualidade das peças produzidas por RTM. A dispersão dos resultados do ensaio de fadiga foi alta, principalmente para altos valores de tensão, as fractografias revelaram pontos de interface fraca, locais de inicio de delaminação. Palavras-chave: fadiga, tensão senoidal, MEV, fractografia
Fractography Analysis of Fatigue Fracture in NC2/RTM6 Composites
This work was conducted in collaboration with the Brazilian aircraft Industry and the composites research group of AMR/CTA. The aim was to evaluate fatigue behavior and identify the NC2/RTM6 ultimate fatigue life for aerospace application, and also analyses the fractograph failures. Fatigue tests were conducted with senoidal tensile profile, tension-tension type, and 10 Hz frequency, the fractures were analised with scanning electronic microscopy (SEM) aid. The fractographs and the quantitative results were compared to verify the quality of the samples manufactured by RTM. The scattering of the fatigue test results was high, mainly for high tensile values, fractographs reveled localized weak interface, where delamination start takes place. Keywords: fatigue, senoidal tensile, SEM, fractography Introdução Ensaios de fadiga em compósitos são de extrema importância para peças estruturais de aviões as
quais estão submetidas a carregamentos cíclicos com diferentes amplitudes e cargas. Estes ensaios
elucidam o comportamento do material em condições críticas de trabalho, como meios corrosivos e
variações de temperatura. É necessário tempo e otimização de processo para identificar o modo de
carga que o compósito estrutural é susceptível a dano fadiga, e também um modelo para previsão da
vida em fadiga [1].
Os materiais compósitos acumulam danos não localizados, diferente de materiais isotrópicos que
acumulam num único ponto, portanto a fratura ocorre por múltiplas trincas macroscópicas [3].
Realizando-se uma análise microscópica, o acúmulo de danos, que inclui ruptura da matriz, ruptura
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da fibra, delaminação e ruptura transversal da lamina, pode ocorrer de forma independente ou por
meio da interação fibra/matriz [3,4].
O mecanismo de fadiga em compósitos fibrosos consiste em quatro estágios: nucleação do dano
local devido à carga cíclica (geralmente em locais de alta intensidade de tensão), nucleação de
microtrincas, propagação estável da trinca devido à carga cíclica e propagação local da trinca, que
depende da orientação da fibra, da ductilidade da matriz e do grau de adesão interfacial. A
propagação no último ciclo de carga é comparável à falha no teste de tração [4]. Usualmente o início
da trinca por fadiga começa em uma fissura microscópica ou a partir de pequenas inclusões e vazios
provenientes do processamento [4].
Os parâmetros utilizados para o ensaio de fadiga são definidos de acordo com o histórico de
carregamento monitorados eletronicamente para testar o material nas condições mais próximas
possíveis das reais. No entanto os testes em laboratórios são normalmente conduzidos em condições
com freqüência constante e perfil de tensão constante (senoidal) [3]. Usa-se uma razão de carga
constante(R), conhecida como razão de tensão, equação A.
Fmin σmin
Fmax σmax
R = =
(A)
Os carregamentos podem ser combinações dos modos de tensão e compressão, mostrados na figura
1. Sendo que a maior parte dos ensaios em compósitos são realizados no modo tensão-tensão com
razão de tensão igual a 0.1 [2,3].
Figura 1 – Modos de ensaio de fadiga [3]
No gráfico de tensão por número de ciclos (S-N) pode ser observado três estágios, de acordo com a
figura 2, no comportamento em fadiga do compósito: no estágio I (baixo ciclo) a vida em fadiga é
constante e a tensão aplicada é alta (S > 80%σR); no estágio II, chamado ciclo médio, a tensão
aplicada decresce e a vida em fadiga é mais sensível a mudança de tensão aumentando
significativamente e no estágio III, chamado de alto ciclo, o nível de tensão é mais baixo e o ciclo é
alto (N > 106). Na transição do estágio II para o III ocorrem a maioria das falhas, chamada zona
critica, tornando-se uma área importante para o projeto do compósito [5].
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Figura 2 – Modos de ensaio de fadiga [9]
Um dos fatores que afeta significativamente a vida em fadiga é o tratamento superficial da fibra de
carbono. Foi reportado um razoável aumento de resistência à fadiga em fibras tratadas, esse aumento
é mais pronunciado quando se aplicam tensões mais altas. Goutianos e Peijis relataram que fibras
sem tratamento sofrem processos de delaminação diminuindo a interação entre fibra-matriz[3].
Para investigação das causas acima citadas, muitos autores utilizam a análise fractográfica, que
auxilia no entendimento dos mecanismos de falha [6]. Por exemplo, é possível deduzir o mecanismo
de propagação de danos, como a delaminação, e com isso prever o crescimento, direção de
propagação e falha final da estrutura [7,8]. A formação de cusps e cristas de galo podem indicar
danos por cisalhamento e também direção de propagação da trinca. A formação de cusps é
característico em materiais frágeis e a sua nucleação ocorre em microtrincas, a inclinação delas pode
ser tanto no sentido de propagação como oposto a ela. Quando há interação entre dois planos de
fratura adjacentes, o aspecto da superfície é marcado pelo encontro de duas marcas de rio, sendo a
fronteira entre as fraturas é conhecida como escarpas [8].
O tipo de fratura em compósitos multidirecionais é um dos mecanismos estudados neste trabalho.
Nesses compósitos a principal fonte de danos é a transferência de tensão entre laminas com
orientações diferentes, podendo, como resultado, conduzir a falha por delaminação. A fonte de
danos por delaminação é gerada por tensões de cisalhamento que surgem da rotação individual da
lamina. A distorção das laminas pode ser reduzida usando-se um empilhamento de laminas
balanceadas ou simétricas [9]. A propagação da trinca em múltiplas laminas não ocorre
essencialmente na direção do defeito, mas fora dela, migrando na direção das fibras [9].
Experimental O material fornecido pela HEXCEL Composites é a fibra de carbono IM7 em tecido não costurado
(NCF) e a resina o sistema epóxi RTM6, a confecção dos corpos de prova de fadiga foi realizada na
divisão de materiais do Comando Tecnológico de Aeronáutica.
As placas com configuração quadriaxial [45/0-45/90]2S foram obtidas pelo processo de moldagem
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por transferência de resina(RTM). Durante os 8 primeiros minutos a pressão da injeção foi de 1 bar
e o tempo remanescente de injeção foi realizada a pressão de 3 bar e a cura realizada a temperatura
de 180º C durante 120 minutos. Essa configuração de tecido permitiu a obtenção de 60% em volume
de fibras.
Os ensaios de fadiga axial tração-tração foram realizados em uma máquina universal de ensaios
INSTRON 880, figura 3, com a utilização de carregamento cíclico.
Figura 3– Máquina universal de ensaios
Para os ensaios de fadiga axial foram usados corpos de prova do mesmo modelo indicado na figura
4, ASTM 3039[10], o qual foi ensaiado de acordo com a norma ASTM D 3479 [11], pela qual uma
carga cíclica senoidal com freqüência de 10 Hz e razão de carga R = 0.1 foi empregada para os
ensaios. Na foto da figura 3 está ilustrada a montagem da amostra no dispositivo.
Figura 4 – Dimensão do corpo-de-prova e esquema de ensaio de tração
Os ensaios fornecerão a curva SxN, a qual indicará intervalo de fadiga do material desde 75% até o
limite de resistência a fadiga.
A microscopia eletrônica de varredura foi realizado no Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais
(INPE) de São José dos Campos com o equipamento JEOL JSM5310, com filamento de tungstênio
operando á 15 kV. Foi empregada a técnica de baixo vácuo, sendo os parâmetros ajustados de forma
a se obter maior quantidade de elétrons secundários, com a finalidade de fornecer informação
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topográfica. A amostra foi revestida com uma película de ouro com espessura menor que 20 nm,
realizado em metalizador Sputtering.
Resultados e Discussão Ensaio de Fadiga
Foram analisados 10 corpos de prova, provenientes da mesma placa, com diferentes porcentagens da
tensão de ruptura, como mostrado na tabela 1. Houve grande dispersão dos resultados quando
solicitado a tensões próximo do limite de resistência (72% σR) do compósito, figura 5. Além disso
não foi possível definir estágios de transição, conforme visto na figura 2. O valor para o limite de
resistência de fadiga encontra-se próximo a 233 MPa.
104
105
106
250
300
350
400
450
Ten
são
(MP
a)
Ciclos
Figura 5 – Curva SxN para o compósito NC2/RTM6
Observou-se o fenômeno de delaminação na maioria das amostras, figura 6, no entanto para tensões
mais altas (450MPa) o compósito apresentou menos resistência a danos, que causou um maior
espalhamento dos resultados de ruptura.
103
104
105
106
200
250
300
350
400
450
Ten
são
(MP
a)
Ciclos
Delaminação
Ruptura
Figura 6 – Curva SxN da vida de delaminação e ruptura
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A presença de delaminação nos corpos de prova diminuiu significativamente a vida em fadiga,
devido à distribuição heterogênea da carga cíclica, favorecendo a propagação da trinca em diversos
pontos. Na tabela 1 pode-se observar melhor essa relação.
Tabela 1 – Dados de delaminação e ruptura das amostras
%σ%σ%σ%σR σσσσ (MPa) Delaminação (N) Fratura (N)
37 233 n 1000000
62 390 22500 71405
62 390 18500 85341
62 390 21000 93544
67 420 n 48370
67 420 14200 31135
67 420 6500 17663
72 450 3891 192984
72 450 1700 16800
72 450 8200 17229
O evento da delaminação prematura é mais pronunciado quando não ocorre um controle adequado
dos parâmetros de processo, por exemplo: vazios, distribuição de resina, ou incompatibilidade do
sistema fibra/matriz.
Análise Fractográfica
Para a investigação das causas dos eventos observados durante o ensaio de fadiga, foram realizadas
análises das fraturas por microscopia eletrônica de varredura (figura 7). A delaminação ocorreu,
principalmente, devido a pontos de baixa tenacidade da matriz, ocorrendo o cisalhamento da matriz
com poucos ciclos. No processo final de ruptura é possível observar ruptura coesiva(figura 7 b), e na
figura 7 a é possível verificar a baixa tenacidade da matriz, com nucleação da trinca na superfície da
fibra.
Figura 7 – Imagens obtidas em MEV: a) aspecto da delaminação; b) fibra rompida
Como os esforços são predominantemente por tração, é possível observar intensa formação de
cristas de galo, figura 8, devido ao efeito de cisalhamento entre fibra e matriz, principalmente entre
a) b)
Cristas de galo
Trinca na matriz
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as laminas com orientações diferentes.
Figura 8 – Imagem obtidas em MEV: formação de cristas de galo
Conclusões Sob carregamentos acima de 50% do limite de resistência à tração os compósitos tiveram pouca
resistência aos esforços cíclicos, explicado pela baixa tenacidade da matriz.
Com base na análise fractográfica, foi possível identificar as causas da grande dispersão dos
resultados, assim como os mecanismos de propagação de trincas e tensões envolvidas durante o
ensaio. As análises mostraram pontos de heterogeneidade na interface, essa característica teve mais
influencia para tensões maiores. A formação de cristas de galo indica ação de tensões de
cisalhamento, essa característica foi observada em todos os corpos de prova.
Agradecimentos Os autores agradecem o suporte financeiro fornecido pela FAPESP através dos processos nº
2007/03182-1 e 2006/02121-6.
Referências Bibliográficas 1. M. Kawai; M. Koizumi. Nonlinear constant fatigue life diagrams for carbon/epoxy laminates at
room temperature. Composites: Part A 38 (2007) 2342–2353. 2. S. Suresh. Fatigue of Material. Second Edition, Cambridge University Press, United Kingdom,
2003, p.200. 3. H. Bryan. Fatigue in Composites. First Edition, CRC, Cornwall – England, 2003, pág. 4. 4. A. Gagel; D. Lange; K. Schulte. On the relation between crack densities, stiffness degradation,
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8. A. D. Kelkar; J. S. Tate; R. Bolick. Structure integrity of aerospace textile composites under fatigue load. 2006, 78-84.
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Anais do 10o Congresso Brasileiro de Polímeros – Foz do Iguaçu, PR – Outubro/2009
10. ASTM D3039 - 06. Standard Test Methods for Tensile Properties of Polymer Matrix Composite Material.
11. ASTM D3479 - 07. Standard Test Methods for Tension-Tension Fatigue of Polymer Matrix Materials.
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