Download - ano 7, nº 9, 2Ed. 2013comunicacao.unaerp.br/images/inrevista/09.pdf · ano 7, nº 9, 2Ed. 2013 Sumário A liga alemã de cantores do Rio Grande do Sul - Brasil Uma web musical no

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ano 7, nº 9, 2Ed. 2013

inRevista - ano 7, nº 9, 2ª Edição 2013ISSN: 1980-6418

EXPEDIENTE

ReitoraProfª. Elmara Lúcia de O. Bonini

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Pesquisas de Processos e Produtos MidiáticosProfa. Dra. Maria Nazareth Ferreira - ECA-USP/Celacc – Centro de Estudos Latino-Americano

sobre Cultura e Comunicação/Cbela – Centro de Estudos Latino-AmericanosProfª. Dra. Martha Maria dos Santos - UnaerpProfª. Drª. Naiá Sadi Camara – Centro Universitário Barão de Mauá/UnaerpProf. Me. Renato Márcio Martins de Campos - Unaerp/Uniara Prof. Dr. Sebastião Geraldo - Unaerp/Celacc Prof. Dr. Silas Nogueira CUML - Centro Universitário Moura Lacerda/CelaccProfa. Dra. Soledad Galhardo Centro Universitário Sennac/Celacc Profª. Dra. Vera Lúcia Rodella Abriata - Unaerp/Unifran

EditoraçãoProf. Me. João de Assis Soares

Editoração WEBManassés José Crocceti FerreiraMaria Amélia Binati Gallo

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Sumário

A liga alemã de cantores do Rio Grande do Sul - Brasil Uma web musical no século XIX

Werner Ewald

As mudanças na relação entre a publicidade e os consumidoresAline Rebeca Amorim Rodrigues da Cunha

Clássicos do cinema: O panorama atual da relação entre a juventude e os filmes clássicos

Márcio Ferreira Martinele Lígia Beatriz Carvalho de Almeida

O mídia training e seus impactos para o uso eficaz do direito à informação jornalística

Erika dos Santos Zuza Humberto Antonio Martins Sobrinho

José Albenes Bezerra Júnior

Economia criativa nos países BRICS: cenários e perspectivasCaroline Taveira Gonçalves

Marcel Antonio Verrumo

As portas abertas da Web: a internet como alternativa viável para a divulgação e publicação de histórias em quadrinhos

Rafael Corrêa LealRaul Zaniratto Giunta

O comportamento de compra e consumo de leitura não acadêmica entre os futuros profissionais de comunicação

Bruna Michelin Pinto Carlos Marcelo Ardigó

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72inRevista: co-autoria / graduação

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Resumo

O espírito associativo na trajetória de comunidades que se deslocam de um lugar para outro, na contemporaneidade ou no passado, foi sempre uma constante, seja pelo desejo de pertencimento social, de reivindicação de direitos, de celebração de memória compartilhada, de perpetuação de

herança, quando não por simples questão de sobrevivência ou como estratégia para se inserir na sociedade de destino. Como explica Seyferth “...a singularidade elege seus símbolos estes quase sempre evocam pertencimentos primordiais e experiências compartilhadas...” (SEYFERTH, 2000:

A liga alemã de cantores do Rio Grande do Sul - Brasil

Uma web musical no século XIX*

Palavras-Chave: música e imigração; mediação-cultural; instituições musicais

de imigrantes; comunidades Teuto-Brasileiras.

Werner Ewald Etnomusicólogo, doutor, pesquisador e Professor nos Bacharelados em

Música da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) – Centro de Artes. * Este trabalho está vinculado ao Projeto de Pesquisa “Práticas Musicais de Imigrantes de Fala Germânica” desenvolvido na UFPel e coordenado pelo autor. Trata-se de uma versão revista e significativamente ampliada de uma comunicação apresentada no XII Seminário da Associação de Pesquisadores das Comunidades Teuto-Brasileiras ocorrido nas Faculdades Integradas de Taquara – FACCAT- na cidade de Taquara/RS em abril de 2012.

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Werner Ewald

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O artigo discorre sobre a Liga Alemã de Cantores do Rio Grande do Sul (Deutscher Sängerbund von Rio Grande do Sul), uma instituição de canto e música fundada em 1896. Centra especial interesse em torno do termo Bund, palavra alemã para Liga e aventa o surgimento desta instituição musical no seio das comunidades teuto-brasileiras como rede (web) simbólica de representação e interação musical através de pessoas que se uniam para cantar em coro, resignificando não apenas suas paridades mas também suas diferenças e conflitos e performatizando a comunidade como um todo através da união das vozes no canto em coro.

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152). No grupo em foco neste trabalho, os imigrantes de fala germânica no Brasil , o espírito corporativo político, econômico, educacional, esportivo, religioso e cultural foi historicamente cultivado e é considerado marca identitária, basta para isto se ter em conta o número de associações como cooperativas, escolas, igrejas, clubes esportivos e associações culturais de todos os tipos fundadas e mantidas até os dias de hoje entre os membros de tal comunidade étnica. Como observa o padre jesuíta Theodor Amstad: “No Brasil como em outros países onde se encontram alemães confirma-se sua lendária inclinação ao associativismo. Diante desta constatação, não poucos falam em “mania associativa”

(AMSTAD, 1924-1999: 301). O Deutscher Sängerbund von

Rio Grande do Sul (a Liga Alemã de Cantores do Rio Grande do Sul- daqui em diante indicada pela sigla LACRGS) foi precisamente uma destas iniciativas, uma associação de cunho musical organizada por imigrantes de fala germânica em 1896

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Figura 1. Inscrição abaixo da foto: “Primeira reunião dos delegados da Liga Alemã de Cantores do RGS em 23 de novembro de 1896 [ano de sua fundação] em Hamburgo Velho”.

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como uma web por ser uma agremiação a nível estadual, relacionando em teia grupos e indivíduos que viviam a grandes distâncias uns dos outros em vilarejos ou em regiões rurais as mais remotas, consideradas obviamente as precárias e difíceis condições de comunicação e deslocamento no sul do Brasil em fins do século XIX. Encontros musicais locais entre este grupo imigrante eram recorrentes e já vinham sendo realizados muito antes da última década do século XIX. De acordo com um autor anônimo escrevendo sobre os 50 anos de uma sociedade de canto teuto-brasileira, a “Gesangverein Frohsinn” de Hamburgo-Velho –RS-, encontros de grupos de cantores no RGS eram promovidos pelo menos desde os anos de 1860. Ele escreveu o seguinte:

Certamente o ano de 1863 foi de suma importância para a história da canção alemã no Rio Grande do Sul. Os senhores Karl von Koseritz, Wilhelm Ter Brïcken e Josef Gertum, sugeriram a realização de uma grande festa de corais (cantores) e se esforçaram sobremaneira para que esta festa se tornasse uma grandiosa manifestação popular. A festa realizou-se em São Leopoldo de 31 de janeiro a 2 de fevereiro de 1863. ((FEST-SCHRIFT:1938, 11).

O que é inédito na criação da LACRGS então? A novidade em jogo e o diferencial da Liga, está no fato de que pelos anos de 1890 o número de grupos nas comunidades teuto-brasileiras devotados à música na região sul do Brasil aumentou e se fortaleceu o suficiente para forjar uma rede de cantores a nível estadual, a Sängerbund, isto é, uma Liga de Cantores de interconexão e englobamento das diversas iniciativas musicais que surgiam.

Este é justamente o ponto focal deste trabalho, destacar a terminação Bund, ou seja o termo alemão para a palavra Liga. A

Liga é precisamente o elemento ideológico que expressa a busca por interatividade, a relação e conexão entre pessoas, o associativismo de um grupo social mediado pela música, mais especificamente pela canção coral, onde precisamente o cantar de forma conjunta e relacional mais o uso da língua memorial (neste caso o alemão) tem função simbólica basilar. Segundo autores que escreveram memoriais de encontros da Liga, entre os principais objetivos da mesma estava promover e divulgar a canção alemã e fomentar intercâmbios musicais e integração social entre os diversos grupos que se dedicavam à música nesta comunidade étnica (SEHR, 1938:18-19). Foi neste espírito, o de promover a congregação da comunidade étnica de fala germânica de forma mais ampla que se desenvolveu esta instituição, lançando mão e fortalecendo ainda mais uma atividade a ela cara e que representava metaforicamente o grupo étnico, o canto em coro.

Que a música sempre foi uma atividade importante no seio deste grupo é tema corrente entre seus pesquisadores. É comum ouvir que a música é parte valiosa da herança dos imigrantes germânicos, símbolo de representação e identificação destas comunidades. Não vou me alongar no assunto, mas sim perseguir a questão de como e através de que mecanismos e canais a atividade musical encontrou espaço para suas manifestações comunitárias no seio destes grupos nos locais onde se estabeleceram no Brasil.

Dois canais institucionais se destacam concorrendo para o florescimento das suas realizações musicais locais: 1) a Igreja (a religião) com suas atividades musicais voltadas aos rituais litúrgicos e encabeçadas pelos coros mistos (vozes masculinas e femininas) e, 2) as Sociedades

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Culturais de Canto, em geral uma atividade exclusivamente masculina, devotada ao canto folclórico, patriótico e à música de salão. Enquanto os lideres religiosos (padres ou pastores) ou professores das escolas comunitárias imigrantes dirigiam as atividades musicais da primeira instância, a segunda foi promovida e encabeçada por imigrantes afiliados à Legião Germânica ou os “homens de 1848”, chamados ainda também de Brummers. Segundo a descrição de um desses imigrantes que viveu em Porto Alegre- RS, o controvertido intelectual-jornalista Karl von Koseritz “a Legião Germânica consistia... de indivíduos inteligentes, cultos, liberais que não tinham mais a mentalidade de súditos dos primeiros colonos” (WILLEMS, 1946: 206). Von Koseritz denominou-os de “o fermento das colônias” (TELLES, 1974: 19), preconizando com isso que era um novo grupo de imigrantes que disseminavam uma mentalidade e uma atitude que demandava, pressionava e lutava pelos direitos dos Teuto-Brasileiros, suas idéias e sua participação na arena pública. Este grupo de imigrantes, que era formado por diversos segmentos de indivíduos e que incluía desde intelectuais e profissionais liberais até soldados, constituiu-se em um importante núcleo no estabelecimento das Sociedades de Canto, uma vez que estavam especialmente interessados na difusão da cultura de cunho folk e da integração e fortalecimento da comunidade germânica através das manifestações da cultura popular muito em especial o canto e a música, mas também a dança, o teatro, a literatura e as associações esportivas. Como escreveu Jean Roche “Foram [os Brummers], a títulos diversos, os fundadores dessas associações que progrediram, e os iniciadores das que, posteriormente, proliferaram nas colônias” (ROCHE, 1969: 644). Também Theodor

Amstad, S.J., descreve cuidadosamente o aumento de associações culturais, diz ele: “De então para cá [1850] as coisas melhoraram sob todos os aspectos. Existem associações em praticamente todas as localidades coloniais de algum porte, que se dedicam ao lazer de nível mais elevado ...São sociedades de canto, orquestras, sociedades de teatro, círculos de leitura, etc. (AMSTAD, 1924-1999: 302).

No entanto, é preciso ressaltar que estas duas instituições associativas basilares na vida destas comunidades, a Igreja (religião) e as Sociedades Culturais, não apenas agremiavam indivíduos. Com o mesmo vigor elas representavam uma acirrada divisão entre a comunidade étnica, rachada em blocos que viam a religião como elemento de valor primordial para o grupo e aqueles que viam na religião um fator de submissão e retrocesso, uma divisão entre as esferas sacra e secular freqüentemente trazida a baila no grupo através do cultivo da música representativas destes domínios, e representadas e difundidas nas instâncias associativas supracitadas.

É justamente neste sentido, segundo depoimentos de indivíduos que efetivamente chegaram a tomar parte das atividades da Liga, que a mesma cumpria um importante papel de fortalecimento social no grupo. Não somente suas freqüentes e grandiosas promoções musicais impactavam o grupo, mas mais precisamente porque a Liga representava uma espécie de balanço que justapôs as esferas musicais sacras e seculares, servindo de ponte e união a rede de indivíduos destas comunidade neste delicado plano ideológico de discórdia e conflitos intra-grupo. Este aspecto revela-se também no repertório entoado nestes encontros e que reflete o sacro e o secular dividindo o mesmo espaço geográfico e sônico. Isto

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(liga de cantores) agremiava os grupos religiosos, não importava quais, nele e no canto em união as rixas e diferenças desapareciam.” A Srª Hedwig Toni Müller, cantora, participante ativa nestes encontros de canto (1909-2002) declarou: “Os protestantes e católicos alemão [sic] não se gostavam, tinha sempre tanto ‘fala fala’, mas nos encontro dos corais cantavam e no final ensaiavam e cantavam unidos, juntos

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esta ilustrado no programa para um destes eventos, de outubro de 1905, que justapõe peças musicais de cunho religioso e de cunho folclórico como Tag des Herrn (o dia do Senhor) e Mein Heimatal (meu vale natal) (SEHR, 1905: 9-10,), e do repertório da “Associação Masculina de Cantores de São Leopoldo e Arredores” uma Fest March (marcha festiva) e Dank Dir, o Vater (te agradecemos, oh Pai) (EWALD, 2011: 268). As canções selecionadas para estes eventos, não importando se religiosas ou seculares, freqüentemente desposavam a afeição e o orgulho de uma música que dava voz à grandeza da terra natal (Heimatland) e a qualidade do jeito de ser germânico.

A Liga preenchia ainda outros sentidos de fortalecimento e congraçamento nos “círculos internos” do grupo. Não somente o repertório sacro e secular ocupava o mesmo espaço nestes eventos musicais. Também as diferenças confessionais, que dividiam a comunidade teuto-brasileira, maiormente entre católicos e protestantes, estes especialmente luteranos, tendiam a desaparecer durante estes eventos que congregavam a comunidade através do canto. Este aspecto foi expresso por um bom número de indivíduos que entrevistei em minhas pesquisas sobre a música e as comunidades teuto-brasileiras. Cito, a título de exemplo, o Rev. Bertholdo Weber (1919-2002), que até mesmo chegou a participou de alguns destes eventos. Disse ele: “Os coros, e não interessa se católicos ou luteranos, vinham de todos os lados, às vezes sob condições difíceis e precárias para se reunir e cantar” e “as brigas nas colônias, muitas vezes encabeçadas pelos padres ou pastores, encontravam nestes encontros de canto trégua e paz”. O historiador, professor, museólogo e escritor Telmo Lauro Müller (1926-2012), destacou em duas entrevistas: “O Sängerbund

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Figura 2. Anúncio com a programação de um festival de cantores promovido pela Liga Alemã de Cantores do RGS em Hamburger Berg (atual Hamburgo Velho –RS-) 1916. O anúncio em cores (uma raridade para a época), atesta a importância dispensada ao evento.

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mesmo no coro grande dos Sänger-Fest, era bonito.” Estes depoimentos apontam para a função simbólica institucional que a Liga desempenhava na comunidade amenizando suas disparidades internas, ampliando-a e fazendo soar mais forte a sua voz através da noção do grande coro de vozes em eventos chamados Bundes Sänger-Fest (festivais de cantores da Liga). Fundamental é entender a Liga e as vozes do grande Coro como uma metáfora para a comunidade ampliada simbolicamente por todo o estado do Rio Grande do Sul. Esta função metafórica era desempenhada através da união de pessoas que não apenas se agremiavam mas cantavam em conjunto, traduzindo a voz e o ato de cantar em um símbolo de vinculo, de afeto e de fortalecimento do grupo através de uma atuação resignificada em uma função memorial e identitária.

Muito além de ser uma ampla estrutura musical, a LACRGS foi aquela instância que providenciou um espaço formal, real e simbólico, que esquecia cisões e desacordos, ao menos festiva e temporariamente, em nome da germanidade, possibilitando que os diversos grupos musicais interagissem e representassem a si mesmos, via suas

performances, como parte da comunidade teuto-brasileira ampliada, simbolizada na instituição do canto. Mas se a Liga agia, por um lado, como representação da identidade da comunidade como um todo, servia também como ilustração de suas partes, da diversidade interna desta comunidade, uma diversidade que se entrelaçava metaforicamente através da performance musical. A música animava a comunidade pois trazia simbolicamente a comunidade à existência enquanto cantava, num vivo e inequívoco exemplo de como mecanismos sociais, neste caso uma instituição musical, e a música ela mesma enquanto performatizada podem construir e simbolicamente representar uma comunidade (BOHLMAN, 2002: p.128).

As atividades destas associações étnicas, entre elas a LACRGS, enfrentaram grandes obstáculos e marcadas dificuldades no período da Primeira Guerra Mundial, exacerbadas ainda mais durante a Segunda Grande Guerra e a política impositiva de nacionalização Getulista. Grande parte destas associações simplesmente encerrou suas atividades pressionadas pela situação

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Figura 3. Fachada do prédio de uma antiga Sociedade de Canto em São Leopoldo/RS. O local esta em funcionamento hoje como sede para bailes e eventos étnicos e como restaurante.

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Referências Bibliográficas

AMSTAD, Theodor (0rg.).Cem Anos de Germanidade no Rio Grande do Sul (1824-1924). Tradução de Arthur B. Rambo, São Leopoldo: Unisinos, 1999.

BOHLMAN, Philip V. “Ethnic Music/Religious Identities: Toward a Historiography of German-American Sacred Music”. In: BOHLMAN, P. V.; HOLZAPFEL,O. (eds.) Land without Nightingale. Music in the making of German-America. Madison: Studies of the Max Kade Institute for German American Studies, 2002.

EWALD, Werner. “Walking and Singing and Following the Song.” Musical Practice in the Acculturation of German Brazilians in South Brazil –Ethnomusicological and Historical Perspectives. Saarbrücken: VDM Verlag Dr. Müller GmbH & Co. KG, 2011.

FEST-SCHRIFT zum 50 Järigen Jubiläum des Gesangvereins ‘Frohsinn” 1888-1938. Hamburgo Velho, 1938.

ROCHE, Jean. A Colonização Alemã e o Rio Grande do Sul. Tradução de Emery Ruas, v. 2. Porto Alegre: Globo, 1969.

SEHR, H. “Deutscher Sängerbund Rio Grande do Sul”. In: Gedenk-Blatt für das III. Deutsche Sängerfest. Hamburgerberg 7.8.9 de oktober, 1905.

SEYFERTH, Giralda. As Identidades dos Imigrantes e o Melting Pot Nacional. In: Horizontes Antropológicos, Relações Interétnicas, Porto Alegre, v. 14, p. 143-76, novembro 2000.

TELLES, Leandro. Do deutscher Hilfsverein ao Colégio Farroupilha, 1859-1974. Porto Alegre, Globo, 1974.

adversa, outras buscaram novos rumos para dar seguimento ao seu funcionamento. Como herança contemporânea advinda desta história musical existe um expressivo número de grupos corais no estado bem como uma forte web de encontros locais e regionais de coros e música, bem como as

atividades de performance e de educação e aperfeiçoamento musical desenvolvidas pela Federação de Coros do Rio Grande do Sul (FECORS) com sede em Nova Petrópolis/RS, região de acentuada colonização germânica. Mas estes são assunto para outra investigação.

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WILLEMS, Emilio. A Aculturação dos Alemães no Brasil. Estudo Antropológico dos Imigrantes Alemães e seus Descendentes no Brasil. São Paulo & Porto Alegre: Companhia Editora Nacional, 1946.

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Resumo

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As mudanças na relação entrea publicidade e os consumidores

Desde seu surgimento, a publicidade utiliza suas ferramentas e modifica-se, ao longo do tempo, para atingir o consumidor. O surgimento de novas mídias sempre trouxe consigo grandes modificações na relação entre a publicidade e o público. Com o surgimento da internet e dos meios digitais houve maior possibilidade de posicionamento e ação dos consumidores frente à propaganda e às marcas. A propaganda, dessa forma, passa a adaptar-se não só por sua linguagem, mas também na forma de distribuição nas mídias.

Palavras-Chave:publicidade, consumidor, internet, mídias

Introdução

A propaganda tem por objetivo atingir o consumidor. Para isso, precisa adaptar-se a ele, conhecendo-o e atentando-se às suas mudanças. Com as transformações sociais e tecnológicas, a publicidade passa a ganhar mais possibilidades. Ao mesmo tempo, o maior volume de informações, a

maior liberdade e facilidade de expressão faz com que o consumidor se torne mais crítico aceitando menos o que a publicidade comunica.

Há modificações também no que se refere à transmissão e recepção das mensagens publicitárias. A atenção do consumidor tornou-se bastante disputada. Cappo (2003) considera que, no futuro,

Aline Rebeca Amorim Rodrigues da Cunha Faculdade dos Guararapes

Universidade Católica de Pernambuco

Aline Rebeca Amorim Rodrigues da Cunha

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a propaganda irá lutar pela atenção do consumidor, o que já vem ocorrendo.

Este trabalho busca compreender melhor as mudanças na relação entre o público e a publicidade. E, assim, refletir sobre o que as maiores possibilidades midiáticas têm trazido aos consumidores e a que a propaganda deve estar atenta para atingi-los da forma mais eficaz possível.

1. Propaganda:da origem ao século XX

No cenário mundial, a palavra “propaganda” foi utilizada, inicialmente, no século XVII, como propagação da fé católica. No final desse século, as propagandas passaram a ser utilizadas nos periódicos da Inglaterra, vendendo livros, jornais, e remédios. Os anúncios de medicamentos eram comuns, devido à ocorrência de várias doenças na Europa nessa época.1 Posteriormente, no século XIX, elas tiveram grande aumento, causado pela expansão da economia.2 Dessa forma, a propaganda passou a ter um caráter ainda mais comercial, atendendo às necessidades da época. No entanto, a linguagem apresentava-se com características apenas informativas já que não haviam ainda profissionais especializados na área propagandística.

Durante a Primeira Guerra Mundial, segundo Severino, Gomes e Vicentini, “a propaganda foi utilizada para persuadir a opinião pública a favor da Inglaterra, com seu ponto forte na promoção do ódio.” Na Segunda Guerra Mundial, as propagandas tiveram crescimento, sendo utilizadas como forma de manipulação inglesa e americana aos seus soldados. Por parte dos alemães, as propagandas deram ênfase à demonstração da superioridade ariana.3 Com a intenção de persuadir, a propaganda passou a utilizar-se

de uma mensagem diferenciada, buscando a compreensão e o convencimento do público a quem se destinava.

Percebe-se que, a partir da industrialização, houve também uma necessidade maior de divulgação dos produtos (além de estratégias de guerra ou políticas) o que levou a um aperfeiçoamento na elaboração das mensagens publicitárias. Passou-se a utilizar textos cada vez mais persuasivos, deixando a ênfase no sentido puramente informacional. Com o aumento da concorrência, a publicidade passou a ser mais agressiva, o que só foi controlado a partir da regulamentação desse setor.4

O surgimento da propaganda no Brasil deu-se através da chegada do jornalismo, no século em 1808. A partir de então, os modelos europeus de venda de espaços em periódicos foram rapidamente aderidos. Os primeiros anúncios utilizavam uma linguagem simples e informativa, vendendo ou buscando capturar escravos, divulgando hotéis, casas, medicamentos, entre outros produtos ou serviços. Ex: “Vende-se um creoulo de 22 anos sem vício e muito fiel: bom e aceado cozinheiro, copeiro, bolieiro... Para tratar: a ladeira de S. Francisco n. 4.” Em 1875 passaram a ser criados, em jornais, os anúncios com ilustrações (Martins; 2008, p. 23-24).

Os outdoors, vistos atualmente, derivaram-se de antigos painéis, feitos nos tapumes das construções, onde continham anúncios de produtos ou serviços. Estes passaram a apresentar, posteriormente, linguagem apropriada e ilustrações. (Martins; 2008, p. 24)

De acordo com Martins, em

1- Disponível em: http://periodicos.unifacef.com.br/index.php/rec/issue/view/73 [ consultado a 19 de Março de 2013]2- ibdem3- ibdem

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1891 fundou-se a primeira agência de propaganda, destinada à venda de anúncios em forma de corretagem. Estes anúncios eram denominados reclames e negociados para os periódicos (2008, p. 24). Em 1900, as revistas chegaram ao Brasil e passaram a incluir anúncios ilustrados de página inteira.5 A linguagem da propaganda foi sendo aprimorada e chamando mais a atenção do público.

Os reclames, no início do século XX, já possuíam uma linguagem mais rebuscada, criativa e persuasiva. Um exemplo de anúncio publicado em 20-04-1914, na revista A Cigarra foi :“ ...Ponde a vossa reclame ao nível da vossa época e consulte a EMPRESA MODERNA DE RECLAME, à Rua Formoza nº 36.” (Martins; 2008, p. 24-25).

Martins cita que, após a fase dos reclames, os anúncios passaram a ser elaborados por escritores, jornalistas e artistas que prestavam serviços para as agências criando textos, jingles, ilustrações. Por último, as agências passaram a vincular profissionais preparados para atuar com anúncios, afim de “exercerem ação psicológica sobre o público-alvo.” (2008, p. 31).

Rocha trata que, no período da Ditadura Militar, com as taxas de juros e lucros protegidas e a diminuição dos salários, a renda se acumulou nas mãos da elite. Representando esta uma pequena parcela da população, coube à publicidade a luta pelo consumo de um público restrito, para a movimentação do capital. Houve, então a necessidade de uma proteção legal para a publicidade, através da Lei 4.680, que auxiliou no seu desenvolvimento .

Os anúncios possuíam forte apelo para o status.6

Conforme cita Rocha, na década de 90, a publicidade perdeu a proteção legal e perdeu seus 20% de comissão, antes obrigatórios. Contudo, essa comissão já não estava mais sendo utilizada na prática, sendo efetuadas negociações entre agências e anunciantes a fim de baixar os custos com propaganda. O governo exigiu a autorregulamentação publicitária. O CENP (Conselho Executivo das Normas-padrão) auxiliou nesse âmbito. A publicidade, neste período, passou a ter que enfrentar um consumidor “mais cético para com as promessas de felicidade associadas ao crescimento econômico e ao consumo de mercadorias vendidas como símbolo de status.7

Notoriamente, no século XX as propagandas, a nível nacional e mundial, passaram a ganhar grande força, impulsionadas pelas mudanças no mercado e pela necessidade de persuasão do público-alvo. Isso trouxe consigo grandes transformações na forma de expressão da publicidade, que passou a buscar cada vez mais aproximar-se do receptor da mensagem, através de estudos, pesquisas e técnicas. A publicidade abandonou, então, a característica de mensagem informativa, advinda do jornalismo e tomou uma identidade própria. Além disso, ganhou respaldo legal e intenções econômicas bem definidas.

5- Disponível em: http://periodicos.unifacef.com.br/index.php/rec/issue/view/73 [ consultado a 19 de Março de 2013]

6- Disponível em: http://www.covaleski.com.br/blog/imagens/Texto_NC_01.pdf [consultado a 26 de Março de 2013]7- ibdem

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2. As transformações no discurso publicitário a partir do século XX:

as mídias e o consumidor A modificação da linguagem

publicitária sempre foi algo comum, para atender às necessidades sociais de cada período e atingir de forma eficaz seu objetivo de comunicação. Carvalho8 cita que “o discurso publicitário tem as características específicas da sociedade na qual se insere e é o testemunho autorizado dos imaginários sociais do contexto envolvente, revelando o funcionamento cultural.” Assim, há uma percepção de que a propaganda é um produto da sociedade e do momento em que se encontra. Isso ocorre devido à necessidade de que a mensagem seja identificada e compreendida pelo público.

As técnicas publicitárias, com o passar dos anos, foram fundamentais para a adaptação da publicidade no contexto em que se inseria, devido ao melhor conhecimento do consumidor e seus interesses. Com a latente necessidade de conquista dos consumidores, no século XX, abre-se uma forma de propaganda melhor elaborada visando convencê-los. Andrade e Cirelli9 comentam a respeito dos recursos utilizados pela publicidade, para “criar um mundo ideologicamente favorável e perfeito”:

[...]a mensagem trata a base informativa de forma manipulada, objetivando transformar a consciência do possível comprador. Para que isto aconteça, a propaganda utiliza todos os recursos disponíveis na língua portuguesa,

apropriando-se de signos verbais em conjunto com signos visuais, para dar maior impacto em suas peças.

Os textos publicitários passaram a ser mais argumentativos, focando nas características emocionais e racionais do produto ou serviço. O consumidor, devido ao crescente número de informações recebidas e a grande disputa das publicidades pela sua atenção, passou selecionar melhor as mensagens recebidas. Ries e Trout (1997, p. 2-5) citam a saturação da sociedade atual devido aos volumes de comunicação e enfatizam que o sucesso de uma empresa seria pelo modo como ela é percebida pelo cliente em potencial. Para isso, seria necessário “manipular o que está lá dentro da mente e realinhavar as conexões que já existem.” Tornou-se necessário aproximar-se do consumidor, conhecê-lo melhor para poder alcançar sua atenção.

Dentre as várias modificações ocorridas na relação consumidor/propaganda, a internet possui grande destaque, por permitir uma maior interação entre os usuários. Com o avanço cada vez maior, da tecnologia, os receptores das mensagens publicitárias tendem a ser mais ativos e participantes da comunicação. Possuem a liberdade de expor sua opinião, participar da propagação da mensagem ou transmitir ideias negativas a respeito da propaganda ou anunciante. Há, então, a necessidade de uma constante observação e modificação de atitudes por parte da empresa, a fim de compreender o consumidor a partir do contexto em que está inserido. A esse respeito, Vieira (2012, p.145) escreve:

Paralelamente às novas configurações das expressões comunicativas na internet, a publicidade tem tido a necessidade de alterar

8- Disponível em: http://piwik.seer.fclar.unesp.br/alfa/article/viewFile/4043/3707 [consultado a 20 de Março de 2013]9- Disponível em: http://www.letramagna.com/PolifoniaemSlogans.pdf [consultado a 20 de Março de 2013]

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consideravelmente suas práticas e estratégias na web 2.0, com o intuito de se adequar às transformações ocorridas na sociedade e nas mídias. Tais mudanças decorrem de constantes inovações tecnológicas, que ampliam a possibilidade do caráter interativo entre anunciante/consumidor e dos consumidores entre si.

A publicidade passou a utilizar a internet na aproximação do receptor. No entanto, não houve uma substituição de mídias, mas um acréscimo, considerando “as vantagens da internet, apesar dos riscos de instabilidade e velocidade naturais ao meio” (VIEIRA, 2012, p. 147). Os meios de comunicação massivos, embora não tenham perdido seu espaço, passaram a ser obrigados a dividir a atenção do consumidor. Giacomini (1991, p. 90-91) menciona os MCM como caracterizados por atingirem a todos os públicos indiscriminadamente. Assim, a TV e o rádio, por exemplo, possuem uma vantagem em relação ao alcance da mensagem.

A internet, por sua vez, tem grande possibilidade de segmentação do público, o que facilita o direcionamento das mensagens para grupos específicos, já interessados no produto, além da exclusão de outros grupos. De acordo com Carvalho:10

A mensagem é intencionalmente dirigida ao público-alvo escolhido e pode ignorar, diferente da TV, da mídia escrita ou do outdoor, aqueles que são clientes em potencial. A sua permanente mobilidade impede a memorização de slogans, além do que a imagem predomina sobre a linguagem como forma de sedução. Na verdade,

é mais uma estratégia de marketing, do que uma simples mensagem publicitária. Normalmente, ela permite o acesso à compra, trazendo preços, modelos, pontos de venda junto com as vantagens anunciadas, nas publicidades de produtos e de serviços. Além de tudo, há uma diferença formal: enquanto as peças publicitárias na internet apresentam mobilidade e mudança de ângulo de visão, podendo variar a cada consulta, as mesmas, nas mídias tradicionais, são permanentes na sua forma de apresentação e conteúdo.

A forma de apresentação das mensagens se modifica através dos meios. A internet possui como ponto forte a segmentação do público, no entanto dificulta a repetição e memorização das mensagens. Cappo (2003; p. 68) menciona que com a chegada de meios novos de comunicação ao mercado, há uma tendência de diluição dos meios antigos. Ele cita que há mais meios de comunicação à nossa disposição, do que há alguns anos e que “o único problema é que nenhum de nós tem mais tempo para assistir a eles, lê-los ou ouvi-los.”

Compreende-se, assim, que há uma maior dispersão do receptor em relação às mídias. Ou seja, além da diminuição da fixação da mensagem, devido ao consumo de meios digitais, o consumidor pode estar conectado a mais de um meio de comunicação ao mesmo tempo, o que justifica também a perda da memorização da publicidade. Ainda escreve Cappo (2003; p. 207):

É justo dizer que o dizer que o desafio do futuro será a batalha pela atenção do consumidor. Não haverá predominância de um meio isolado, como aconteceu com a televisão entre as décadas de 1960 e 1990. Sempre

10- Disponível em: http://www.hipertextus.net/volume1/artigo-nelly.pdf [ consultado a 9 de Maio de 2013]

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haverá mercados de massa, mas os anunciantes não poderão atingi-los pelas comunicações de massa, com exceção de alguns eventos que atraem uma enorme audiência.

Patriota (2012, p. 69) cita que a televisão, com a redução da audiência, percebendo o potencial das redes sociais, passou a buscar certa “parceria” com as mesmas. Assim, “os sites de redes sociais fortalecem a tevê e a tevê, em contrapartida, fortalece os sites de redes sociais.” Isso levou a uma nova construção na relação com o público alvo, onde este passa a comentar assuntos da televisão nas redes sociais e as emissoras “passaram a estabelecer links, por meio de suas páginas, com os telespectadores atuais e potenciais.”

Há, então, uma reconfiguração no que se entende por televisão. Abre-se espaço para uma maior interação a respeito do que se é assistido. Ainda, as redes sociais ampliam a quantidade de temas a serem debatidos e a televisão ganha uma expansão em sua influência e deixam de perder seu espaço, visto que o público passa a utilizar em paralelo esse meio massivo e a internet.

O discurso publicitário foi se adaptando ao novo cenário, onde os consumidores ganharam mais autonomia e voz. A abertura para um feedback do público ficou maior, o que se torna uma “via de mão dupla”, pois, ao mesmo tempo em que o consumidor pode dar ideias de melhora para o produto ou serviço, ou elogiá-lo, pode também propor intenções e movimentos contrários ao anunciante.

Embora haja diversos ganhos para a publicidade, no que se refere ao foco da mensagem a públicos específicos, há certa perda na memorização das publicidades pela perceptível divisão da atenção dos receptores. A partir do uso da internet,

o espectador escolhe o que quer ver ou pesquisar, podendo, a seu critério, assistir ou não à publicidade.

3. A relação entre a publicidade e o consumidor na era da internet

Lèvi (1999) menciona o ciberespaço como um ambiente que não necessita de estrutura física e substitui o deslocamento. Há, então, a facilidade de contato com comunidades e indivíduos do mundo todo. Assim, o autor diz que, na cibercultura, todo o espaço seria um canal de interatividade, apontando para uma “civilização da telepresença generalizada.” Compreende-se que, embora os integrantes de uma comunidade virtual não estejam em um mesmo espaço físico, possuem grande facilidade de comunicação e não haveria barreiras para o contato entre indivíduos e grupos. Lèvi (1999) cita a importância da conjugação das inteligências e imaginações humanas pelos instrumentos digitais de comunicação. Ele dá destaque à inteligência coletiva, como direcionadora dos recursos de grandes coletividades para os indivíduos e grupos menores, o que traria um caráter humanístico. Conforme Lima e Souza:11

O ciberespaço necessita de tecnologias que auxiliam diversas funções cognitivas humanas tais como: memória, imaginação, percepção e raciocínios. As tecnologias intelectuais possibilitam novas formas de acesso à informação, novos estilos de raciocínio e conhecimento. Dessa maneira, o ciberespaço impacta profundamente nas relações do fluxo do saber, da transação de conhecimento e nas

11- Disponível em: http://www.anpad.org.br/diversos/trabalhos/EnANPAD/enanpad_2010/ADI/ADI2028.pdf [consultado a 9 de maio de 2013]

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novas tecnologias de inteligência individual e coletiva.

Percebe-se, dessa forma, que o novo consumidor possui maior possibilidade de mobilização, acesso à informação, desenvolvimento de raciocínio e do conhecimento, o que o torna mais crítico e atuante frente ao consumo.

Assim, com a liberdade de feedback, facilitada pelos meios digitais, o consumidor deixou de ser receptor para ser também emissor de mensagens, o que deve ser bem analisado pelos anunciantes. Maya e Otero12 dizem que os profissionais de marketing e vendas “deverão se adaptar a novas regras para conquistar a lealdade dos clientes”, diante dos efeitos do” surgimento de comunidades virtuais que agrupam pessoas com interesses comuns e singular poder de barganha.” As empresas, observando a modificação na relação entre mercado e consumidores, precisam estar atentas às novas oportunidades. Vieira (2012, p. 148) descreve três novos enfoques midiáticos que devem ser utilizados pelas empresas: o consumo, a produção e o compartilhamento. Dessa forma, o incentivo aos consumidores deixaria de ser focado somente no consumo, mas também no incentivo a produção e compartilhamento de conteúdos favoráveis à empresa, marca ou produto.

A partir desse novo conceito de consumidor, bastante participante na comunicação, nasce o termo prosumer, ou prosumidor. Prosumer, segundo explicam Juenemann e Fischer,13 define o “usuário

consumidor que se manifesta online a respeito de produtos e serviços, expondo as suas sugestões e expectativas, com o intuito de co-criá-los e co-produzi-los.” O consumidor passa a participar da produção de conteúdos, que podem ser positivos ou negativos à empresa. Compreende-se, então, que o prosumer através dos meios virtuais ganha grande força, passando a fazer parte do processo de comunicação da empresa, influenciando no surgimento de novas tendências. Isso deve ser tratado com cautela, pois a internet, por ser um espaço global, pode difundir conceitos equivocados ou prejudiciais à marca ou produto em amplo alcance e com muita rapidez. As oportunidades de compreensão do ponto de vista do consumidor também devem ser levadas em consideração, pois são de grande valia para melhor conquistá-lo.

Figueira14 faz um paralelo entre a publicidade tradicional e a interativa, onde a segunda se caracteriza e diferencia da primeira no que diz respeito ao conceito de que o consumidor passa a ser reconhecido como principal disseminador e potencializador da publicidade, deixando de ser um simples receptor. Ele afirma:

A propaganda interativa busca provocar no consumidor a formulação de opinião e dar condições para que ele possa distribuir e compartilhar a sua interpretação e experiência. A mensagem passa a ter um caráter muito especial, deixando de ser só um anúncio de convencimento para dar lugar à opinião de alguém que vivenciou uma experiência e tem algo a dizer sobre isso.12- Disponível em: http://www.unifae.br/publicacoes/

pdf/revista_da_fae/fae_v5_n1/a_influencia_do_consumidor.pdf [consultado a 9 Maio de 2013]13- Disponível em: http://caepmblog.espm.br/EVENTOS/IVSimposio/Artigos/O%20PROSUMER%20COMO%20CONTRIBUINTE.pdf [consultado a 9 de Maio de 2013. 20]

14- Disponível em: http://www.arteccom.com.br/webdesign/downloads/29/3.pdf [consultado a 15 de Maio de 2013.

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Dessa forma, torna-se imprescindível à propaganda atual, dar espaço para a opinião consumidora, em lugar de ter medo dela. O consumidor já adquiriu voz diante do mercado. Não há como fugir a essa realidade, apenas fazer disso uma ferramenta favorável aos seus objetivos.

Considerações Finais A propaganda surgiu com o intuito

de propagação da fé e, posteriormente, informação de venda de escravos e produtos. Como o objetivo era apenas divulgar, e não haviam profissionais voltados à propaganda, exigia-se pouco da mesma, que utilizava somente uma linguagem informativa e seca. Algum tempo depois, houve a necessidade de uma publicidade melhor elaborada aumentou, para conseguir a atenção e o convencimento do público-alvo. Assim, há consideráveis alterações na mesma, tanto na linguagem quanto na apresentação visual.

Com o acirramento da concorrência, a publicidade foi se aprimorando. Surgiram profissionais especializados e a quantidade de estratégias para seduzir o consumidor foi crescendo. Os meios de comunicação trouxeram consigo diversas possibilidades de divulgação e maior alcance do público. Inicialmente, as propagandas eram publicadas em jornais, depois, criaram-se os outdoors, que deram maior visibilidade aos anúncios e outra perspectiva.

O surgimento dos MCM (rádio e televisão) possibilitou a expansão das mensagens maior número de pessoas e de diferentes locais. O recurso audiovisual facilitou bastante a assimilação da publicidade pelos receptores. Primeiramente, o rádio chamou a atenção dos ouvintes através de seus recursos auditivos, contudo, perdeu

sua força para a televisão. Nesse período, o consumidor era apenas o receptor das mensagens publicitárias, com pouca, ou nenhuma voz ativa.

Após anos de domínio da TV, a internet aparece com uma perspectiva de interatividade e produção de conteúdo por parte dos consumidores. O consumidor deixa de ser apenas receptor para tornar-se também emissor. Ele passa a ter acesso facilitado à informação e à tecnologia, o que o torna mais crítico e ativo na hora de opinar a respeito da propaganda, produtos e serviços, além de transformá-los.

Essa nova face do consumidor traz uma responsabilidade imensa aos publicitários e anunciantes, que precisam estar atentos não somente ao que os consumidores pensam, mas também ao que produzem, pois podem referir-se à marca, empresa ou produto tanto de forma positiva como negativa. E, considerando que a internet é um ambiente global, a repercussão do posicionamento do consumidor em mídias sociais possui um alcance também global.

Quando o público possui uma visão negativa em relação ao produto ou marca e divulga nas redes sociais, caso a empresa não saiba como lidar com isso, pode sofrer prejuízos. A ausência da empresa nas redes sociais não impede que ela seja alvo de comentários. O publicitário e o anunciante devem compreender que a liberdade de expressão do consumidor na internet pode abrir diversos leques de possibilidades, visto que se torna mais fácil o acesso à compreensão da mente consumidora. As opiniões do público, inclusive as negativas, podem ser bastante úteis, quando bem aproveitadas. Os pontos de vista positivos do consumidor, retratados na internet são importante para o alcance de novos clientes. Estimular a divulgação dos pontos de vista

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positivos possui grande importância.Estar sempre atento às possibilidades

que a tecnologia fornece é importante para a conquista do consumidor. Contudo, mais importante que o uso da tecnologia é aproveitá-la para conhecer melhor o

público, relacionando-se com ele, de forma a fidelizá-lo. O consumidor mudou. Cabe à publicidade utilizar esse fato a seu favor e não tentar, em vão, andar na contramão do progresso.

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Resumo

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Diante de um mercado filmográfico em expansão, juntamente com a incessante produção da indústria cultural que caminha de acordo com o avanço tecnológico provocando novos comportamentos, costumes e até culturas, observamos a qualidade dos antigos clássicos cinematográficos cada vez mais esquecidos nos sebos, canais televisivos considerados alternativos e estantes de seletos admiradores do cinema antigo. Questionamos nesta pesquisa os motivos que levam a juventude atual a desconhecer tais obras: a falta de incentivo, a influência midiática, o preconceito, a incompatibilidade de época e outros fatores que puderam ser identificados com um trabalho focado em uma escola estadual de Bauru, interior de São Paulo. Tal temática merece destaque em uma sociedade em que a cultura é, aos poucos, transformada em mercadoria, tornando-se, como identificado nesta pesquisa, tão elitizada ao ponto de ser raro encontrar informações sobre filmes clássicos em um local em que deveria ser abrigo de conhecimento cultural: as escolas.

Palavras-chave: Cinema. Clássicos. Jornalismo Cultural. Filmes. Crianças

Clássicos do cinema:O panorama atual da relação entre a

juventude e os filmes clássicos

Márcio Ferreira Martinele Graduado do Curso de Jornalismo USC

Lígia Beatriz Carvalho de AlmeidaDoutora, Professora e Orientadora Universidade Sagrado

Coração, Bauru, SP

Márcio Ferreira Martinele Lígia Beatriz Carvalho de Almeida

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A ausência de uma cultura de valorização do conhecimento dos clássicos do cinema é a temática central desta pesquisa. Rever filmes que sintetizam todo o passado cinematográfico é atualmente algo feito somente para pessoas “cinéfilas”, mas essa postura pode ter como problemática alguns fatores, tais como: a falta de incentivo, o preconceito, a incompatibilidade com a época etc. “Um filme clássico é um filme que não se pode perder, que foi fundamental para a evolução da história do cinema, que influenciou outros filmes e que serve de fonte para outros trabalhos” (BORDWEEL, 1985, p. 5).

Inicialmente, sobre o desenvolvimento metodológico do trabalho, foi realizada uma pesquisa de cunho teórico, com consulta a livros, artigos, trabalhos científicos e a endereços eletrônicos, como destaca Gil (1996) “a pesquisa bibliográfica é desenvolvida a partir do material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos” (GIL, 1996, p. 48).

O objetivo da pesquisa foi descobrir quais são os fatores intervenientes na relação entre os jovens e o não consumo de filmes clássicos, além de uma parcial contribuição cultural para um pequeno grupo de uma escola da rede estadual no município de Bauru, São Paulo. Para alcançar este objetivo é preciso especificá-lo aplicando pesquisas de caráter qualitativo e quantitativo para análise dos dados, exibindo um filme clássico promovendo a reflexão das crianças, e consequentemente verificando se houve alguma mudança no comportamento.

Este pesquisador esteve presente nesta escola estadual, com duas turmas do 6° ano, pelo período de seis semanas, onde realizou diversas atividades averiguando as intenções dos jovens ao selecionarem um

filme para assistir, se há interesse em algum estilo específico, quais os favoritos e os últimos filmes que assistiram etc. Através de um acompanhamento rigoroso, juntamente com estratégias de incentivo por parte do pesquisador, o progresso foi analisado semanalmente, com a expectativa de que os filmes clássicos fossem instrumentos de mudança no comportamento das crianças.

Pesquisa na Escola

Com o intuito de traçar um panorama sobre a atual visão das crianças em relação aos filmes, principalmente os clássicos, este pesquisador esteve presente em uma escola durante seis semanas. A escola estadual Prof.ª Carolina Lopes de Almeida, localizada no Jardim Godoy, na cidade de Bauru, foi a escolhida para a pesquisa em função da cordialidade oferecida pela diretora da escola e pela professora de artes, que cedeu algumas aulas para a realização das atividades, tendo também acompanhado as mesmas.

Grupo Focal

Alunos do 6° ano A e 6° ano B. Cada turma continha por volta de 30 alunos e ambas tinham um equilíbrio entre a quantidade de participantes do gênero masculino e feminino. Em cada dia as atividades duraram em torno de 1h40 minutos.

Metodologia

Algumas técnicas da pesquisa-ação nortearam a aproximação entre o pesquisador e a comunidade estudada. O tempo que limita o desenvolvimento do trabalho acadêmico não permitiu o aprofundamento no uso da técnica, dessa

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forma, não se pode afirmar que se trate de uma pesquisa-ação em si, utilizou-se, entretanto, uma metodologia inspirada no método.

Imprescindível para o sucesso da pesquisa foi a metodologia de grupo focal. O pesquisador agiu como moderador em um ambiente em que os participantes se sentiram a vontade e não foram reprimidos em sua liberdade de expressão. Tudo isso, objetivando a identificação das atitudes e das idéias dos participantes em relação ao cinema clássico. A abordagem permitiu ainda, que o pesquisador conseguisse obter detalhes e o habilitou a fazer livremente suas observações. Tais observações contribuem grandemente no progresso da pesquisa qualitativa em ciências sociais aplicadas.

Outra forma adotada para o desenvolvimento do trabalho foi a pesquisa descritiva explicativa, que observa, registra, analisa e correlaciona fatos sem manipulá-los. Cervo e Bervian (1996) já disseram, em Metodologia Científica, que a pesquisa descritiva procura classificar, explicar e interpretar os fenômenos que ocorrem, enquanto a pesquisa experimental pretende dizer que de modo ou por que causas o fenômeno é produzido. Foi necessário utilizar-se desse método, pois alguns registros obtidos a partir dele não se encontram facilmente em documentos, como é o caso de dados retirados da observação contemporânea de uma sala de aula.

Passa-se agora a descrever as ações realizadas:

Pesquisa Prática

Primeira semana6° ano A (06/03/2012) e B (08/03/2012):

Apresentação

A primeira semana foi de reconhecimento. Como forma de descontração, este pesquisador lançou perguntas básicas para ambas as salas, como: Quem gosta de filmes? Quem gosta de ir ao cinema? Quem já assistiu “O Homem Aranha”? Etc. As respostas para tais indagações tiveram a intenção principal de conquistar a atenção das crianças. Ao final desta aula, foi lançada a seguinte pergunta:

Alguém sabe dizer qual foi o filme vencedor do Oscar 2012 (O Artista)?

Nenhum aluno soube responder corretamente. Foram feitas algumas tentativas aleatórias de resposta por parte das crianças como Transformers, Homem de Ferro e Titanic, mas o que realmente se pôde perceber foi uma grande vontade em participar da aula, juntamente com uma total desinformação de todos os alunos. Estavam presentes na sala 28 alunos. No 6º ano B apenas uma aluna soube responder corretamente.

Atividade: Ao final da aula, em ambas as salas, este pesquisador pediu para que, na semana seguinte, os alunos trouxessem como tarefa uma pesquisa contendo nome e ano de filmes dos consagrados diretores Stanley Kubrick e Quentin Tarantino, desconhecidos por todos eles. O objetivo desta tarefa foi verificar a quantidade de alunos que se interessavam pela temática, pois a atividade foi claramente apresentada como não-obrigatória, portanto conclui-se que somente os interessados fariam tal pesquisa.

Segunda semana6° ano A (13/03/2012) e B (15/03/2012):

Recolhimento

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Na segunda semana de atividades foram recolhidas as pesquisas dos alunos.

Análise: No 6º ano A nenhum dos alunos realizou a pesquisa. No 6º ano B, dos 31, 8 realizaram. Todas as pesquisas do 6º ano B foram feitas corretamente; algumas trazendo mais de dez nomes de filmes de cada diretor. Questionados sobre o que mais chamou atenção nos filmes dos diretores pesquisados, uma aluna respondeu o filme Spartacus, de 1960, do diretor Stanley Kubrick. O motivo da resposta se deve ao fato de que o canal a cabo FX Brasil exibe, desde 2011, uma nova versão da obra de Kubrick, totalmente adaptado para os tempos modernos com gráficos 3D, qualidade digital e novos atores, ou seja, a aluna “descobriu” que o seriado que acompanhava era uma obra clássica dos anos 60.

Terceira semana6° ano A (27/03/2012) e B (29/03/2012):

Questionário

Na terceira semana de atividades foi entregue aos alunos um questionário elaborado por este pesquisador. O questionário continha seis perguntas, abertas e fechadas, sobre a frequência em que os alunos assistiam a filmes, entre outras indagações que podem ser conferidas na sequência, juntamente com as respostas e as análises.

Pergunta N° 1: Por onde costuma assistir filmes?

Obs: Era possível marcar mais de uma alternativa, indicando o local.

6° ano A – 29 alunos presentes:Canais Abertos – 23 votosAlugo – 14 votos

TV a Cabo – 9 votosCinema – 5 votos

6° ano B – 33 alunos presentes:Canais Abertos – 18 votosCinema – 13 votosAlugo – 11 votosTV a Cabo – 11 votos

Análise dos dados: Podemos observar com destaque a supremacia da televisão aberta no cotidiano das crianças, atingindo quase 80% do 6° ano A e 63% do 6° ano B. Baseando-se neste dado podemos realizar algumas análises. O maior canal televisivo do país, a Rede Globo, não tem como tradição em seus mais famosos quadros de filmes (Tela Quente, Temperatura Máxima e Super Cine) a exibição de clássicos do cinema, o que certamente contribui para a ampliação e diversificação do repertório cultural dos telespectadores. A própria emissora, no começo do ano, divulga a lista de filmes que serão exibidos. Na seqüência seguem os filmes programados para 2012:

Avatar – 2012 - Lua Nova - Wall-E - O Rei Leão (lançamento em blu-ray no ao de 2011) - A Era do Gelo 3 - A Princesa e o Sapo – Watchmen - Bolt-Supercão - O Dia Em Que A Terra Parou (2009) - Uma Noite No Museu 2 - Monstros vs. Alienígenas - Dragon Ball Evolution - X-Men Origens: Wolverine - O Exterminador do Futuro: A Salvação - Transformers 2 - Distrito 9 - Força-G - Alvin e os Esquilos 2 – Bruno - Anjos & Demônios - Ensaio Sobre a Cegueira - Hannah Montana - O Filme – Cloverfield - (500) Dias Com Ela - G.I. JOE - A Origem da Cobra - Star Trek (2009)

Figura 5 - ProgramaçãoFonte: Rede Globo (c2012).

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Com exceção de O Rei Leão, considerado um clássico dos anos 90 por inaugurar uma nova era das animações da Walt Disney Pictures, e Star Trek, ficção da década de 60, não há previsão de veiculação de nenhum outro clássico.

Pergunta n° 2: Com que frequência vai ao cinema?

6° ano A – 29 alunos presentes:Uma vez por semana – 5 votosUma vez por mês – 3 votosDuas vezes por mês – 4 votosA cada dois meses – 4 votosRaramente – 12 votosNunca – 1 voto

6° ano B – 33 alunos presentes.Uma vez por semana – 1 votoUma vez por mês – 4 votosDuas vezes por mês – 4 votosA cada dois meses – 1 votosRaramente – 20 votosNunca – 3 votos

Análise dos dados: Podemos observar, com destaque, o grande número de alunos em ambas as salas que raramente vão ao cinema. Tal fato pode ser justificado pela classe social – C e D – dos alunos que, geralmente, estudam em escolas estaduais, local da pesquisa.

Pergunta n° 3: Escreva o nome dos três últimos filmes vistos.

Obs: O resultado demonstra somente os filmes que mais vezes foram citados.

6° ano A – 29 alunos presentes.O Palhaço – 10 citaçõesTransformers – 6 citaçõesO Homem de Ferro – 6 citaçõesNanny Macphee: A Babá Encantada – 6 citaçõesVelozes e Furiosos – 5 citações

Alvin e os Esquilos – 4 citaçõesRio – 4 citaçõesRei Leão – 3 citações

6° ano B – 33 alunos presentes.O Palhaço – 7 citaçõesVelozes e Furiosos – 7 citaçõesTransformers – 5 citaçõesHarry Potter – 3 citaçõesNanny Macphee: A Babá Encantada – 3 citações

Análise dos dados: O filme Transformers, com onze citações ao todo, e Alvin e os Esquilos, com quatro citações, foram recentemente exibidos pela Rede Globo, o que confirma a programação divulgada pela emissora, tal fato justifica os números no gráfico. Já O Rei Leão (relançado nos cinemas em 3D), Rio e O Homem de Ferro foram uns dos mais recentes sucessos nas telas dos cinemas, o que justifica as outras citações. Curiosamente o filme nacional O Palhaço surge como majoritário no gráfico do 6° ano A e com sete citações no 6° ano B. Intrigado com tal aparição, pois apesar da grande divulgação, filmes nacionais usualmente não se adequam ao perfil de crianças com idade de 9 e 10 anos, este pesquisador descobriu que tal fato se deveu à influência da professora de artes da escola, que pediu aos alunos que assistissem o filme para a realização de uma atividade. O mesmo aconteceu com Nanny Mcphee – A Babá Encantada, que não foi exibido nos cinemas e nem na televisão. Ambos os filmes, indicados pela professora de artes, obtiveram ótimas referências de todos os alunos. Outro dado curioso aconteceu com as respostas de uma das alunas, do 6° ano A.

Diferentemente dos outros que citavam lançamentos e filmes com atrativos tecnológicos, ela citou o filme A Invenção de

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Hugo Cabret (baseado no livro de 2007 do homônimo Brian Selznick), reproduzido em 2012 por Martin Scorsese. Indagada sobre este fato, pois apesar de aparentemente ser um filme infantil, ele tem um conteúdo complexo para a compreensão nessa faixa etária, a aluna respondeu que foi um DVD comprado pela mãe.

Pergunta n° 4: Qual o nome de seu filme favorito.

Obs: No resultado constam somente os filmes citados mais de uma vez.

6° ano A – 29 alunos presentes.Velozes e Furiosos – 6 citaçõesCrepúsculo – 2 citaçõesHarry Potter – 2 citaçõesAnjos da Noite – 2 citaçõesRio – 2 citações

Outros filmes citados:High School Music – O Abominável

Hulk – O Rei Leão – Tropa de Elite – De repente 30 – O Grito – O Bicho vai Pegar – Percy Jackson e o Ladrão de Raios – Marley e Eu – Sempre ao seu Lado – A Ponte para Terabitia.

6° ano B – 33 alunos presentes.Velozes e Furiosos – 3 citaçõesCrepúsculo – 2 citaçõesHarry Potter – 2 citaçõesAs Crônicas de Nárnia – 2 citaçõesO Homem de Ferro – 2 citações

Outros filmes citados:Avatar, X-Men, O Rei Leão, High

School Music, A Noiva de Chuck, Rio, Homem Aranha, Motoqueiro Fantasma, Lanterna Verde, Carros, Pânico no Deserto, O Gato de Botas, Toy Story, Se Meu Fusca Falasse, As Aventuras de Tim-Tim, Os Smurfs, Cowboys e Aliens, Transformers.

Análise dos dados: A princípio, as informações obtidas em ambas as salas parecem não ter relevância na análise, pois o único dado de destaque no primeiro gráfico, do 6° ano A, são as seis citações (20%) do filme Velozes e Furiosos, que em um total de 29 alunos acaba sendo irrelevante, assim como no gráfico do 6° ano B, que obteve apenas três citações para o mesmo filme em uma sala com 33 alunos (9%).

Digno de menção é o fato de nos “outros filmes” citados pelo 6° ano A, figurar A Ponte para Terabitia. Tal filme, descrito por uma aluna, é uma obra clássica americana da literatura infantil, publicada pela primeira vez em 1977, obtendo um sucesso tão grande que se tornou filme no ano de 2007. A aparição deste filme se torna relevante para o cruzamento de dados quando se percebe que esta foi a mesma aluna que citou As invenções de Hugo Cabret como um dos últimos filmes vistos, conforme exposto na questão número três. Outro dado peculiar foi a menção única, em um universo de 62 alunos, do filme Se meu Fusca Falasse, citado por um aluno do 6° ano B. Tal destaque se deve pelo ano em que o filme foi produzido, 1968, e mesmo assim parece ainda provocar a atenção de uma criança.

Pergunta n° 5: Marque com um X nos filmes que você já assistiu.

Obs: Foram expostos nesta questão quatorze nomes de filmes, dos quais os cinco sublinhados são considerados clássicos.

6° ano A – 29 alunos presentes.(25) O Homem Aranha(0) E o Vento Levou(4) Os Infiltrados(3) O Poderoso Chefão(25) Toy Story

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(1) Onde Os Fracos Não Tem Vez(3) A Lagoa Azul(23) O Rei Leão(0) Era Uma Vez No Oeste(20) O Máskara(25) Harry Potter(1) Laranja Mecânica(22) O Homem de Ferro(17) O Senhor dos Anéis

6° ano B – 33 alunos presentes.(26) O Homem Aranha(2) E o Vento Levou(0) Os Infiltrados(3) O Poderoso Chefão(27) Toy Story(2) Onde Os Fracos Não Tem Vez(6) A Lagoa Azul(28) O Rei Leão(1) Era Uma Vez No Oeste(23) O Máskara(23) Harry Potter(0) Laranja Mecânica(21) O Homem de Ferro(16) O Senhor dos Anéis

Análise dos dados: O objetivo desta questão foi verificar se poderia ocorrer alguma surpresa em relação aos filmes assistidos pelos alunos. Confirmam-se a partir deste gráfico que os filmes clássicos são realmente pouco vistos. É válido ressaltar que estes filmes clássicos foram marcados praticamente pelos mesmos alunos, ou seja, o mesmo que já assistiu ao filme O Poderoso Chefão também já viu E o Vento Levou, e assim por diante.

Pergunta n° 6: Marque com um X nos filmes que você, ao menos, já ouviu falar.

Obs: Foram expostas nesta questão oito nomes de filmes clássicos.

6° ano A – 29 alunos presentes.Frankenstein – 6 marcações

Casablanca – 2 marcaçõesO Nascimento de Uma Nação – 2 marcaçõesPsicose – 1 marcaçãoApocalipse Now – 1 marcaçãoTempos Modernos – 0 marcaçãoCidadão Kane – 0 marcaçãoLaranja Mecânica – 0 marcaçãoNenhum – 22 marcações

6° ano B – 33 alunos presentes.Frankenstein – 3 marcaçõesPsicose – 2 marcaçãoLaranja Mecânica – 1 marcaçãoCidadão Kane – 0 marcaçãoCasablanca – 0 marcaçõesApocalipse Now – 0 marcaçãoO Nascimento de Uma Nação – 0 marcaçõesTempos Modernos – 0 marcaçãoNenhum – 25 marcações

Análise dos dados: Para ampliar o campo da investigação sobre a familiaridade dos alunos com os filmes clássicos, este pesquisador optou por formular uma questão que não tivesse como pré-requisito o fato de o jovem ter assistido o filme, bastando apenas ter “ouvido falar” sobre ele. Nota-se que o desconhecimento total sobre esses filmes ocorreu em 75% de ambas as salas.

Quarta semana6° ano A (10/04/2012) e B (12/04/2012):

Revisão

Para que houvesse uma pesquisa com resultados comprometidos e precisos, foi resguardada uma semana para a revisão das respostas do questionário, visando eliminar o fator “equívoco” que alguns alunos poderiam ter praticado. Para isso, este pesquisador questionou individualmente

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cada aluno a partir da questão número três, que pedia o nome dos três últimos filmes vistos. Aqueles que descreviam nomes de filmes considerados improváveis, ou seja, filmes que dificilmente crianças de nove anos assistiriam, eram questionados por este pesquisador. Por exemplo, se o aluno respondesse o filme Os Infiltrados, mas não soubesse descrever nada sobre ele, a resposta era desprezada e era solicitada a ele uma nova resposta, desta vez sem falso juízo. O mesmo aconteceu com a questão número quatro, cinco e seis.

Obs. Todos os dados da terceira semana (gráficos e análises) descritos nesta pesquisa retratam os resultados obtidos após esse processo de revisão.

Quinta semana6° ano A (17/04/2012) e B (19/04/2012):

Exibição do filme

Com o objetivo de identificar o grau de interesse dos alunos por um filme clássico, mas em acordo com o perfil deles, este pesquisador exibiu para ambas as turmas o filme O Mágico de Oz, de 1939. O filme foi veiculado na própria sala de aula, com equipamentos adequados para a exibição, como tela branca de tamanho grande e audiovisual, proporcionando conforto para as crianças.

Fator tempo: Como descrito no início deste capítulo, o tempo proporcionado pela direção da escola a este pesquisador para realizar as atividades era de 1h40 minutos por dia, ou seja, as duas últimas aulas da professora de artes. O tempo de duração do filme O Mágico de Oz também é de 1h40 minutos, o que praticamente impossibilitava o pesquisador de exibir o filme na íntegra para os alunos, pois era necessário, no mínimo 10 minutos, para

montagem do equipamento de audiovisual, além da acomodação das crianças na sala. Como forma de se adequar às circunstâncias, respeitando os objetivos deste trabalho, o pesquisador exibiu apenas os primeiros 40 minutos do filme e, depois, entregou para todos os alunos um DVD contendo o filme na íntegra. Essa foi a maneira encontrada para contornar o desafio da exigüidade do tempo e auxiliou ainda mais na coleta de dados da pesquisa.

A princípio, havia sido planejada a exibição do filme na íntegra, e depois seria solicitado, como tarefa, um relato de cada aluno dizendo se havia gostado ou não do filme, justificando seu posicionamento. Tudo isso para que o pesquisador pudesse analisar se o filme antigo atrairia a atenção das crianças, assim como outros dados. A nova proposta, em que cada aluno poderia assistir voluntariamente o final do filme em casa, permitiu ao pesquisador avaliar o real interesse dos jovens por ele. É válido ressaltar que, independentemente do aluno ter realizado ou não a tarefa de assistir ao restante do filme em casa, o que não era obrigatório, o relatório deveria ser feito por todos dizendo se o filme o agradou ou não.

Sexta semana6° ano A (24/04/2012) e B (26/04/2012):

Recolhimento/encerramento

6° ano A:Fizeram o relatório – 11Não fizeram o relatório - 18

6° ano B:Fizeram o relatório – 16Não fizeram o relatório - 17

Análise dos dados: Nota-se que, dos 62 alunos (somadas ambas as salas), apenas 27 realizaram o relatório, o que representa

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43% do universo pesquisado. Interessante ressaltar que todos estes 43% forneceram ótimas referências do filme, o que leva a crer que o fato do filme ter sido produzido há mais de 70 anos, não interferiu na aceitação por esses jovens. Muitos dos relatos afirmavam que, a princípio, quando o pesquisador exibiu o filme na sala de aula, eles não se interessaram, mas que depois, com o desenvolver da história, acabaram entendendo a mensagem.

Considerações Finais

Este trabalho procurou, de forma teórica e prática, buscar os elementos intervenientes no relacionamento entre crianças que determinam o relativamente inexistente consumo de filmes clássicos. Antes de inserir as conclusões obtidas a partir dos dados retirados da pesquisa, cabe ressaltar que a principal preocupação deste pesquisador advém do receio de desaparecimento de tais obras e principalmente do esquecimento desse legado cultural por parte da nova geração. Porém, é válido lembrar que o resultado deste estudo não pode ser generalizável, não só pelo quesito quantitativo trabalhado, que abordou apenas uma irrisória parte da sociedade, mas pelo subjetivismo que permeia a área do saber e proporciona uma gama rica em definições e reflexões.

Durante os dias dedicados ao envolvimento com as crianças na escola, notou-se que o ensino fundamental é, contraditoriamente, um dos influenciadores no desconhecimento de filmes clássicos; não em função da falta de preparo dos educadores, mas pela estrutura escolar, que pouco espaço prevê nas grades para atividades de análise e apreciação da cultura fílmica. Tal afirmação pôde ser comprovada por meio da pergunta feita por este

pesquisador na primeira semana trabalhada, que questionava o filme vencedor do Oscar 2012. Dos 61 alunos analisados, apenas um soube a resposta, demonstrando que tal notícia não foi abordada em sala de aula. Caberia, para maior aprofundamento do trabalho, um estudo que analisasse as disciplinas escolares que trabalham com a reflexão do aluno, comparando-as com as matérias tradicionais que visam somente um pensamento cartesiano.

Esta questão da influência dos educadores vai além dos muros escolares. Na pergunta número três do questionário aplicado na terceira semana, que solicitava o nome dos três últimos filmes vistos, percebe-se que a família também faz parte dos elementos que podem determinar o tipo de filme que a criança assiste. Essa afirmação se deve aos dados que indicaram a supremacia de alunos que assistem apenas aos últimos lançamentos, enquanto apenas uma aluna citou um filme alternativo (As Invenções de Hugo Cabret) justificando que a mãe havia comprado o DVD para ela. Essa mesma aluna inseriu na questão número quatro, que pedia o nome do filme favorito, a Ponte para Terabitia; obra clássica americana de 1977, utilizando o mesmo argumento do incentivo materno.

A influência midiática também está presente na pesquisa. Observa-se que os filmes que já foram e que deverão ser transmitidos pela Rede Globo, no ano de 2012, não se enquadram na categoria clássicos. Ao cruzar a grade fílmica da emissora com os dados dos três últimos filmes vistos pelos alunos percebe-se que em diversas vezes eles se assemelham, ou seja, a criança limita-se em assistir apenas o que a televisão aberta oferece, influenciando no desconhecimento de filmes clássicos e consequentemente na educação cultural. Outro dado que corrobora com a

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conclusão é o gráfico da pergunta número um, indicando que 66% delas usam a TV aberta para assistirem aos filmes.

A afirmação de que a criança não procura alternativas de fontes para filmes é reforçada pelo baixo número que freqüentam o cinema. Dos 62 alunos, 51% relatam que raramente vão ao cinema, enquanto mais 8% vão somente uma vez a cada dois meses e 6% nunca vão. Neste quadro pode-se considerar como forma de interferência o fator econômico. Diante de uma escola em que o público geralmente pertence às classes C e D, os pais destas crianças podem não ter as condições ideais de estarem contribuindo com este panorama, levando os filhos ao cinema. Com uma simples análise podemos definir esta situação da seguinte forma: a entrada para o cinema atualmente tem o custo de R$6,00 para estudantes e R$12,00 para não estudantes. Se pai, mãe, e filho fizerem parte deste entretenimento, soma-se R$30,00, mais a provável alimentação que integra o passeio, como pipocas e refrigerantes, e sem levar em consideração o fato de se ter mais de um filho, ou seja, os valores alcançam um patamar que está fora do padrão de consumo para a classe social.

Outra relação que podemos verificar é que, se estas crianças não são passivas face às mensagens midiáticas, ela não desfruta de autonomia e independência para a escolha do que vai assistir, permanecendo dependente daquilo que lhe é ofertado pela mídia. Isso demonstra o quanto é necessário à educação e a implantação de políticas públicas educacionais para ampliar o patrimônio cultural dos brasileiros.

Um dos fatores considerado, antes da realização do trabalho por este pesquisador, como um dos mais influentes para o desconhecimento dos clássicos pelas crianças, era a ausência de atrativos

tecnológicos nestes filmes, como efeitos explosivos e as chamadas imagens em terceira dimensão. Porém, esta hipótese caiu por água abaixo depois de exibir O Mágico de Oz aos alunos. Durante a atividade, mesmo com o filme contendo imagens em cores desgastadas e sem nenhum atrativo igual aos atuais, percebeu-se uma extrema atenção, com direito a reclamações no momento da interrupção do filme, conforme descrito na página 59.

Nos relatórios apresentados pelos alunos sobre o filme, notou-se uma semelhança em quase todos os textos. Em vários deles foi descrito que no início o filme era aparentemente chato, sem ação, mas conforme a história foi se desenvolvendo tudo foi mudando. Na seqüência segue um exemplo do relatório de uma aluna:

“Eu gostei porque achei o filme interessante, a música de fundo é o que mais gostei, e aquele ciclone, o cenário, é a coisa mais perfeita. Eu também gostei da frase no começo do filme que dizia assim: “O filme é uma filosofia que dedicamos aos jovens que tem coração”. Mas falando a verdade, no começo do filme eu não achei muito interessante! Mas tudo que eu falei lá em cima é verdade. Eu acho que eu não achei interessante porque eu não tinha entendido até lá! Eu tinha achado chato! Mas depois eu entendi o filme, mas entendi tanto que eu posso até dar uma moral para ele. A moral é ‘nunca deixe alguém te dizer que você não pode fazer alguma coisa, pois você pode sim’...”.

Podemos concluir a partir de dados como este, repetido por outros alunos, que a rejeição é um dos elementos determinantes para o problema, principalmente no caso deste trabalho no qual o pesquisador avisou previamente aos alunos que a o filme a ser exibido seria antigo, o que pode ter gerado um preconceito antecipado. Provavelmente

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uma exibição surpresa a estes alunos, sem previamente avisá-los qual o tipo de filme a ser passado, poderia ter gerar textos com dados diferentes. Ainda sobre os relatórios, é válido ressaltar que todos eles trouxeram ótimas referências, com a maioria contendo frases do tipo: “eu gostei porque tem muita imaginação”, “eu gostei porque tem muita música e cores”, “eu gostei das danças e da magia do filme” etc, ou seja, a provável incompatibilidade de época entre filme e geração não aconteceu.

Por fim, este pesquisador salienta

que a falta de divulgação por parte da imprensa em geral pode ser um dos maiores agravantes neste sistema, porém que não pôde ser estudado com mais precisão. Conforme descrito em capítulos anteriores, a indústria de massa se alimenta de lucro, e não abre espaço para o velho. O jornalismo, apesar de estar sempre ligado aos acontecimentos mais atuais, correndo em busca de furos, necessita também de reflexão, principalmente das obras imperecíveis pelo tempo; os clássicos.

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Resumo

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Este artigo foi gerado a partir de reflexões realizadas durante cursos ministrados sobre mídia training (treinamento de mídia) em Natal, no Rio Grande do Norte e em João Pessoa, na Paraíba, sobre o direito de todos os cidadãos em se comunicar através da mídia, no contexto da convergência digital, pluralidade de veículos e público híbrido. As discussões ocorreram com estudantes de graduação e de pós – graduação lato sensu de áreas ligadas à comunicação social, notadamente jornalismo, assessoria de imprensa e publicidade e propaganda, além de cursos de treinamento de mídia ministrados para estudantes de comunicação social, empresários e profissionais autônomos que são fontes de notícias em Natal. Na perspectiva dos estudos de história da mídia, tendo por base a comunicação institucional, este trabalho propõe reflexões interdisciplinares que abrangem os estudos sobre assessoria de comunicação, com foco em um de seus serviços, o mídia training, assim como visa iniciar um diálogo com a área do direito, através dos estudos referentes ao direito à informação jornalística, passando pela liberdade de expressão e os direitos de informação e de comunicação. Trata-

O mídia training e seus impactos para o uso eficaz do direito à

informação jornalística

Erika dos Santos ZuzaAutora principal; Jornalista DRT/RN 968 - graduada pela UFRN;

Mestre em Televisão Digital pela UNESP; Professora substituta do Departamento de Comunicação Social da UFRN

Humberto Antonio Martins Sobrinho Co-autor; Empresário do setor imobiliário; Estudante do curso de

Direito da UNPJosé Albenes Bezerra Júnior

Co-autor; Advogado; Mestre em Direito pela UFRN; Professor da graduação e pós-graduação da Universidade Potiguar (UnP) e

Centro Universitário do Rio Grande do Norte (UNI-RN)

Erika dos Santos Zuza Humberto Antonio Martins Sobrinho

José Albenes Bezerra Júnior

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1. Introdução

“Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social (...)” Art 220, § 1º Constituição Federal

O artigo 220 da atual Constituição Federal Brasileira (1988) é considerado o mais específico dispositivo constitucional de proteção da informação jornalística

(JUNIOR, 2011). Através dele é possível se estabelecer reflexões acerca do que afirma a carta federal sobre a liberdade de expressão e os direitos referentes à comunicação social no Brasil.

Já no campo da assessoria de comunicação (atividade jornalística cada vez mais difundida no Brasil e que tem como função básica, construir e manter o relacionamento adequado entre assessorado e a imprensa) temos como um dos serviços prestados por empresas de comunicação e por assessores autônomos, o mídia training (treinamento de mídia), cuja atividade principal é o preparo das pessoas,

Palavras-chave: mídia training, comunicação, direito, história, assessoria de comunicação

se de uma pesquisa inicial cuja metodologia é alicerçada pelos estudos de autores referências da comunicação empresarial no Brasil, como Jorge Duarte, Rivaldo Chinem e Heródoto Barbeiro, assim como pelas análises de leituras da área jurídica, tendo como base a Constituição Federal Brasileira de 1988 e os estudos de Vidal Serrano Nunes Junior sobre jornalismo e direito. Através desta reflexão, os autores chegam a conclusões iniciais de que o mídia training vem se consolidando no Brasil porque as empresas e os respectivos assessorados, assim como os que possuem cargos públicos e os profissionais autônomos que se veem diante da imprensa, estão percebendo cada vez mais a importância de estarem preparados para as entrevistas jornalísticas, tendo condições de exercerem o direito de informar com qualidade e segurança. Para escreve as histórias do nosso cotidiano, os jornalistas aproveitam diversas fontes: jornais, internet, livros, documentos, porém as pessoas são as principais fontes para a construção das notícias numa sociedade democrática. O artigo também serviu para deixar evidente a relevância de lançar o desafio a classe jornalística de se estudar e pesquisa mais sobre o campo jurídico, enquanto balizador dos direitos a informação e a comunicação, sendo as ações de treinamento de mídia uma das maneiras eficazes de se colocar em prática um direito que é considerado fundamental e pertencente a todos os brasileiros.

1- Trabalho apresentado no GT de História da Publicidade e da Comunicação Institucional, integrante do 9º Encontro Nacional de História da Mídia, 2013.

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consideradas fontes de notícias, para o uso mais adequado dos espaços espontâneos gerados pelas entrevistas jornalísticas.

O caminho traçado por este artigo científico visa contextualizar o direito à informação jornalística com a importância do treinamento de mídia, no sentido de consolidar através dos direitos fundamentais de todos os brasileiros, a utilização eficaz dos meios de comunicação de massa para a difusão de informações jornalísticas, ou seja, para a divulgação de fatos relevantes para a sociedade, bem como para a correta aplicação dos direitos de resposta em momentos de gestão de crise do assessorado, ou da empresa/instituição assessorada.

Neste contexto, a metodologia deste trabalho está alicerçada pelos estudos de autores referências da comunicação empresarial, como Jorge Duarte, Rivaldo Chinem e Heródoto Barbeiro, assim como pelas análises de leituras do campo jurídico, tendo como base a atual Constituição Federal e os estudos de Vidal Serrano Nunes Junior sobre jornalismo e direito.

Além de se configurar como uma pesquisa teórica e transdisciplinar, este artigo é resultado de reflexões feitas durante aulas ministradas pela Professora Erika Zuza em cursos de treinamento de mídia em Natal, no Rio Grande do Norte e em João Pessoa, na Paraíba, para estudantes de graduação e de pós – graduação lato sensu, em áreas do jornalismo e publicidade, além de oficinas de mídia training realizadas com empresários e profissionais autônomos que são fontes de notícias em Natal.

2. Mídia Training: capacitação de fontes e porta-vozes

No Brasil a atividade de assessoria de comunicação ganhou espaço no mercado

de trabalho, sobretudo a partir da década de 70, quando empresas multinacionais se instalaram no país e trouxeram do exterior o serviço de comunicação empresarial, cujas atividades eram voltadas para comunicação interna entre gestores, diretores e funcionários, além do relacionamento entre empresa e veículos de comunicação de massa.

As primeiras mudanças ocorrem pouco antes da informatização das redações [meados dos anos 70 – grifo nosso] quando as empresas jornalísticas passam a utilizar-se de ‘estratégias de comunicação e persuasão’ nos noticiários informativos, aceitando a mediação das assessorias de imprensa no fazer jornalístico. CHINEM (2006, p. 20)

A partir dos anos 80, com a informatização das empresas jornalísticas e sobretudo em pleno período de redemocratização política, aliado ao processo de enxugamento das redações com a redução dos postos de trabalhos para os jornalista nos veículos tradicionais, muitos profissionais acostumados a lidar com as atividades de produção de notícias, passaram a trabalhar em empresas dos setores públicos e privados, em departamentos de comunicação social, relações públicas e assessoria de imprensa, onde os objetivos eram produzir conteúdos que reforçassem a imagem positiva da empresa - ou do gestor - perante a sociedade, através da mídia, assim como divulgar materiais que minimizassem situações negativas provocadas por crises e problemas no contexto empresarial.

Antes de focarmos no treinamento de mídia, é importante ressaltar que para pensar e aplicar estratégias de relacionamento empresarial com a imprensa, é necessário o entendimento da importância dos

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primeiros clientes foi o empresário John D. Rockefeller, o mais impopular homem de negócios dos EUA naquela época. “Contratado pela Pennsylvania Railroad para assessorar no caso grave de acidente, Lee anunciou para surpresa de todos, que se empenharia em ajudar os repórteres” CHAPARRO (apud CHINEM, 2006, p. 24).

A Pennsylvania Railroad sumir das manchetes escandalosas. A transparência no trato com a imprensa e a confissão honesta das dificuldades técnicas da ferrovia em prestar um serviço sem falhas, acalmaram o ímpeto sensacionalista dos jornais, que passaram a tratar os acidentes com mais respeito e compreensão. (CHINEM, 2006, p. 24)

No Brasil, uma das ações que marcam o início dos serviços de media training ocorre nos anos 80, quando a filial brasileira da multinacional de indústria química Rhodia, lança seu plano de comunicação integrada: “um documento que pregava a implantação de uma política de comunicação, alinhada à jovem democracia brasileira e que integrava na empresa, ações de imprensa, relações públicas e de comunicação de marketing”, CHINEM (2006, p. 21).

Neste ambiente da nova república, a comunicação empresarial ganhou novos reforços, a Rhodia e outras empresas brasileiras incluíram em seus planejamentos estratégicos diversas ferramentas jornalísticas de comunicação, entre elas o mídia training, “com o objetivo de treinar a alta direção para o relacionamento adequado com a imprensa”. CHINEM (2006, p. 21).

Atualmente o mídia training está consolidado e é um dos serviços mais importantes na composição das atividades

mais variados serviços de assessoria de comunicação, como o planejamento e organização do Mailing list, a lista com os contatos atualizados dos jornalistas; o envio de notícias aos veículos, através da edição de releases, texto jornalísticos que ressaltam as informações que o assessorado deseja informar ao público; o Clipping, serviço que compreende a seleção, catalogação e arquivamento de todas as matérias publicadas/transmitidas ligadas direta e/ou indiretamente a pessoa/empresa assessorada; bem como o serviço destacado neste artigo: o Mídia Training, o treinamento das pessoas consideradas fontes de notícias e/ou porta-vozes sobre como lidar com a imprensa.

Falar com os jornalistas costuma ser um desafio para o qual a maior parte das pessoas, na condição de fontes de informação, não se sente preparada. É uma atividade que envolve a perspectiva de exposição pública, profundos sentimentos relacionados à autoestima e a incerteza de que as informações serão veiculadas segundo suas expectativas. DUARTE (2011, p. 345)

O serviço de treinamento de mídia originalmente é denominado Media Training e tem seus primórdios nos EUA no início do século XX, com o surgimento das relações públicas. CHINEM (2006) cita o jornalista americano Ivy Lee - considerado fundador das relações públicas, berço da assessoria de comunicação - como o profissional que primeiro compreendeu a importância de se trabalhar um bom relacionamento com a imprensa utilizando atividades de comunicação empresarial.

Em 1906, Lee deixou o jornalismo e abriu o primeiro escritório de relações públicas em Nova York. Um de seus

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de assessoria de comunicação. No Brasil, esta capacitação é realizada tanto por empresas de assessoria comunicacional, quanto por jornalistas que atuam no mercado (em emissoras de tv e rádio) e promovem cursos para treinar pessoas sobre como divulgar suas mensagens durante uma entrevista jornalística, quais as posturas corretas diante do vídeo e como trabalhar suas falas de maneira eficaz e objetiva. Segundo Duarte (2011, p. 360) nos últimos anos a capacitação de fontes e porta-vozes é um dos instrumentos de assessoria de imprensa que mais se popularizou.

Aperfeiçoar continuamente os assessorados em compreender a imprensa, interagir com jornalistas, atender adequadamente suas demandas, ser proativo e aproveitar as oportunidades para transmitir mensagens de maneira eficiente, tornou-se uma estratégia prioritária para as equipes de comunicação. DUARTE (2011, p.360)

Alguns autores brasileiros utilizam uma junção do português e inglês e o serviço de mídia training, termo adotado neste trabalho por entendermos que melhor se enquadra metodologicamente às reflexões acerca de técnicas originalmente americanas, mas que ganham perspectivas e aplicações inerentes ao contexto brasileiro.

Assim como a melhor maneira de enfrentar crises é gerenciar riscos e preparar-se para evitar que não aconteçam, capacitar fontes e porta-vozes para compreender a dinâmica da mídia e interagir com jornalistas são investimentos de retorno certo para criar e fortalecer uma cultura de comunicação e obter resultados mais efetivos. DUARTE (2011, p. 360).

Através do treinamento de mídia, o indivíduo, seja ele profissional autônomo ou vinculado a uma empresa, recebe orientações sobre como aproveitar da melhor maneira a oportunidade de divulgar suas mensagens em um espaço midiático, considerado espontâneo, já que não são anúncios, e sim espaços jornalísticos que existem na imprensa conforme a confiança, audiência e credibilidade depositada pela sociedade.

Saber divulgar as informações através de uma comunicação verbal e não – verbal adequadas, ter condições de lidar com imprevistos no local da entrevista, responder a perguntas inesperadas e, por vezes, capciosas, assim como conseguir controlar a tensão, são prerrogativas primordiais para qualquer entrevistado considerado fonte de notícia.

As orientações pertencentes ao treinamento de mídia evidenciam como qualquer pessoa pode aproveitar de forma mais eficiente o direito fundamental à informação jornalística, tanto no contexto de se informar e de ser informado, como, e principalmente, sob o aspecto de informar, de ter o direito de repassar informações através dos meios de comunicação.

Neste sentido, conhecer seus direitos, e entender como a mídia contemporânea funciona, contribuem para a redução das tensões durante os processos de entrevistas, sejam gravadas ou realizadas ao vivo, conduzidas por um jornalista, ou por vários em uma coletiva de imprensa.

3. Direito à Informação Jornalística: breves reflexões

Considera-se informação jornalística todo fato que é noticiado pelos meios de comunicação de massa (jornal impresso, revista, rádio, TV e internet) e que se

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configura como notícia. Através do artigo 220 da Constituição Federal (1988) são apresentados os dispositivos referentes à comunicação social e a informação jornalística, que configuram, segundo Nunes Júnior (2011), uma estrutura complexa, na qual se encontram, de um lado, a notícia, e de outro, a crítica. Crítica jornalística aqui entendida não somente no sentido negativo, mas sim enquanto “juízo de valor que, impregnado à notícia ou recaindo separadamente sobre ela, formaliza um conceito, positivo ou negativo, acerca de um fato ou opinião”. NUNES JÚNIOR (2011, p. 91)

A liberdade de informação jornalística não é um assunto recente. É assunto discutido desde o século XIX. Em 1880, Thomas Cooley (apud NUNES JÚNIOR, 2011) já preconizava nos Estados Unidos, a ideia de que a imprensa funcionava como um meio de comodidade pública que registra os acontecimentos do dia, para apresentá-los aos leitores.

sob o ponto de vista constitucional a importância capital [da imprensa – grifo nosso] consiste em facilitar ao cidadão o ensejo de trazer perante o tribunal da opinião pública qualquer autoridade, corporação ou repartição pública e até mesmo o próprio governo em todos os seus ramos com o fim de compeli-los, uns e outros, a submeterem-se a um exame e a uma crítica sobre sua conduta, as suas medidas e os seus intentos, diante todos, tendo em vista obter a prevenção ou a correção dos males; do mesmo modo serve para sujeitar a idêntico exame e com fins idênticos, todos aqueles que aspiram a funções públicas. COOLEY (apud NUNES JÚNIOR, 2011, p. 51 - 52)

Já no século XX, em 1948, o artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos

Humanos, prescreve:

Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferências, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras”. (UNESCO, 1998)

Já na contemporaneidade, Nunes Júnior (2011, p. 51) afirma que o desenvolvimento tecnológico, com o surgimento e consolidação dos sistemas de radiodifusão (notadamente o rádio e a TV), assim como a informática e o surgimento da internet, passaram a oferecer “meios de difusão mais sofisticados, fazendo com que a antiga liberdade de imprensa assumisse também uma nova e mais moderna forma: a liberdade de informação jornalística”.

Para uma reflexão eficaz sobre o conteúdo do direito à informação jornalística, é importante observar o que estabelece a Constituição Federal do Brasil (1988) sobre a comunicação social, sobretudo o que afirma no artigo 220:

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§ 1.º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art.5.º, IV, V, X, XIII e XIV. (Constituição Federal)

Neste contexto, também se faz relevante observarmos o artigo 5º e seus respectivos incisos citados no parágrafo primeiro do artigo 220:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei,

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variáveis: o direito de informar, o direito de se informar e o direito de ser informado. Sendo o primeiro, foco deste artigo.

O direito de informar consiste basicamente na faculdade de veicular informações, ou, assumindo outra face, no direito a meios para transmitir informações, como, verbi gratia, o direito a um horário no rádio ou na televisão. O direito de se informar consiste na faculdade de o indivíduo buscar as informações desejadas sem qualquer espécie de impedimento ou obstrução. Por fim, o direito de ser informado remete à faculdade de ser mantido integral e corretamente informado. (NUNES JUNIOR, 2011, p. 44) b. Direito de comunicação: “é o conjunto das normas gerais e cogentes que regulam a existência e a atuação dos meios de comunicação.” COSTELLA (apud NUNES JUNIOR, 2011, p. 43) Neste sentido, o direito de comunicação respeita a preservação da opinião, da expressão e da informação, através dos meios de comunicação. Por outro lado, “se refere à integração jurídica da existência e do funcionamento desses meios de comunicação” (NUNES JUNIOR, 2011, p. 43)

Na Constituição Federal, esse direito de informar, assume uma feição de permissão, “é permitido a todo indivíduo veicular informações que julgar pertinentes, desde que possua os meios necessários para tanto”, NUNES JÚNIOR (2011, p.43). Assim, um indivíduo considerado fonte de notícias que queira transmitir conteúdos que sejam de interesse público, tem todo o aval para buscar espaços espontâneos nos meios de comunicação social, com ou sem apoio da assessoria de comunicação.

sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)

IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; (...)

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; (...)

XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;

XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;

Assim é possível enfatizar o fato de que juridicamente qualquer pessoa, seja profissional do jornalismo ou não, tem a liberdade de expressão do pensamento, das opiniões e o direito de informar conteúdos através dos meios de comunicação, sendo essa pessoa ligada direta ou indiretamente a esses veículos.

O direito à informação jornalística no Brasil, segundo interpretação da Constituição Federal, é um direito fundamental de todos os indivíduos. Neste sentido, cabe aqui diferenciar os direitos de informação e o de comunicação:

a. Direito de informação: O direito de informação contempla três

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sociedade. Ela ajuda a construir a admirabilidade da marca, porque tem grande influência na opinião pública. (BARBEIRO, 2011, p. 13)

No jornalismo situações imprevistas são comuns em entrevistas, por isso quem vivencia o treinamento de mídia, recebe orientações para ter a consciência e a capacidade de encarar os obstáculos e transformá-los em oportunidades, para reforçar opiniões, decisões ou defender posições da empresa/organização em situações de crises.

“A comunicação na crise deve ser ágil, direcionada a diminuir as incertezas, atenuar as expectativas, criar padrões de entendimento e cordialidade, a fim de que a empresa possa passar pela crise sem grandes impactos.” CHINEM (2006, p. 47)

O próprio ambiente da captação e registro das informações, pode representar empecilhos ao exercício jornalístico, como locais não adequados para gravações, problemas climáticos ou mesmo, falhas ou falta de equipamentos. O treinamento de mídia também envolve orientações sobre o uso de roupas, acessórios e maquiagens adequadas, além de como lidar com jornalistas bem preparados, inteligentes, atualizados, assim como com aqueles desinformados e, por vezes, sensacionalistas.

O direito à informação jornalística pertence a todos os brasileiros e estrangeiros que moram no Brasil, independente de estarem ligados diretamente a um veículo de comunicação, ou não. Embora sejam informações registradas pela lei, via de regra, é possível inferir que muitas pessoas não tem conhecimento disso, e portanto, proliferam opiniões que viram senso comum, como por exemplo o fato de que poucos tem acesso aos meios de

4. O uso do direito à informação jornalística no contexto do mídia

training

“A notícia é a matéria prima do jornalista e assumir o papel de fonte significa se submeter a riscos e oportunidades” BARBEIRO (2011, p. 12)

Através da capacitação de fontes de notícias e porta-vozes, o mídia training gera bases sólidas para o entendimento acerca das capacidades de cada pessoa em colocar em prática os direitos à informação jornalística, concedendo entrevistas e aproveitando da melhor maneira as linguagens específicas e as potencialidades de cada veículo de comunicação, bem como conduzindo a conversa, controlando a tensão e sendo coerente na transmissão das mensagens chaves que são planejadas antes do momento da entrevista com o apoio do assessor de imprensa.

O mídia training aborda o aperfeiçoamento da postura e voz, reforça a importância do planejamento de conteúdos nos momentos que antecedem a entrevista jornalística e capacita o profissional para lidar com desenvoltura com todos os obstáculos que podem surgir durante o contato com os jornalistas. Falar com a imprensa requer planejamento, pois o entrevistado tem a responsabilidade de divulgar informações para a sociedade, e deve ter firmeza e equilíbrio para se posicionar e declarar as mensagens que sejam de interesse público, mas que também estejam alinhadas com sua função profissional ou com os interesses da empresa/organização representada.

A imprensa pode contribuir para que sua organização obtenha o atributo de credibilidade. Não é o único caminho, mas é um dos mais percebidos pela

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comunicação tradicionais, ou mesmo a dificuldade encontrada pelos assessores de comunicação em inserir pessoas “novatas” no hall dos ‘escolhidos/selecionados’ como fontes de notícias pela imprensa local, nacional ou internacional.

Estima-se que 95 por cento de todo o noticiário jornalístico são relatos e comentários de fatos programados por instituições interessadas, ou revelações e falas controladas por fontes organizadas. Ou seja, é cada vez maior o número de pessoas que rompem a barreira do mutismo e se tornam fontes de notícias. BARBEIRO (2011, p. 17)

O jornalismo brasileiro é organizado por empresas de comunicação que compõem, num contexto capitalista, uma indústria de notícias, regida por regras de negócios que por diversas vezes, podem impedir o acesso da população a esses meios. Diante deste cenário, este artigo propõe que a vivência do treinamento de mídia pode contribuir para que a fonte de noticia passe a exercer com mais qualidade o direito à informação jornalística, já que o profissional toma consciência sobre o funcionamento da imprensa, sobretudo nos dias de hoje, marcados pela convergência digital, em que há uma integração cada vez maior entre os veículos de comunicação de massa.

A sociedade da era digital está passando por um processo de transição e crescimento exponencial de uma linguagem híbrida jornalística, o que vem ampliando os desafios dos que são e dos que querem ser Fontes de notícias. Nesta era digital, marcada pela compartilhamento instantâneo de dados, interatividade com os usuários e mídias sociais, uma pessoa convidada para uma entrevista em uma

emissora de rádio, por exemplo, também deve estar preparada para o vídeo, isso porque a tecnologia permite - e muitas emissoras tem colocado isso em prática - que a entrevista transmitida a princípio ao vivo via rádio, também estará ao vivo via web tv ou será gravada em vídeo e transmitida posteriormente pela internet.

Outro exemplo, são as entrevistas para jornal impresso, em que o entrevistado conversa com o jornalista, que por sua vez grava áudio para podcasts no site de notícias, pode também registrar tudo em vídeo para compor os extras de uma reportagem que originalmente estará nas páginas impressas de um jornal. Com a banda larga e a mobilidade, é possível afirmar que nos dias de hoje, qualquer pessoa tem mais espaços para exercer seu direito à informação jornalística, tanto para informar notícias de interesse público, quanto para se informar, devido a multiplicidade de canais de divulgação, bem como exercer adequadamente o direito de ser informado por outros através da liberdade de expressão dos veículos de comunicação de massa.

Considerações Finais

Este artigo constitui uma tentativa de alinhar duas áreas do conhecimento de extrema importância para a sociedade: o jornalismo, através da assessoria de comunicação, com foco no serviço mídia training, e o Direito, pelo viés dos dispositivos referentes ao direito à informação jornalística, presentes na Constituição Federal (1988).

O treinamento de mídia vem se consolidando no Brasil porque as empresas e os respectivos assessorados estão percebendo cada vez mais a importância de estarem preparados para as entrevistas,

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tendo condições de exercerem o direito de informar com qualidade e segurança.

O jornalismo é constituído por pessoas. As notícias só são notícias se estiverem construídas baseadas em depoimentos dos entrevistados, caso contrário, estaremos tratando de outro tipo de texto. Para escreve as histórias do nosso cotidiano, os profissionais da comunicação social utilizam diversas fontes: jornais, internet, livros, documentos, são fontes de informação, mas são as fontes humanas as ferramentas essenciais na construção das notícias numa sociedade democrática.

É intenção deste paper, ressaltar a importância de conhecermos brevemente a história jurídica que nos permite ter acesso à informação jornalística, assim

como sermos fontes de notícias. Neste contexto, o mídia training pode significar o instrumento mais eficaz para o melhor aproveitamento de um direito fundamental, pertencente a todos os cidadãos.

Em síntese, destacamos que as reflexões aqui empreendidas são iniciais e que por isso necessitam de novos embasamentos. Consideramos que nossas metas foram alcançadas através da fixação e divulgação de conhecimentos transdisciplinares, bem como a geração de incentivos para a construção de novos significados e novos trabalhos que possam aprofundar esta temática e contribuir para a divulgação científica e acadêmica.

Referências Bibliográficas

BARBEIRO, Heródoto. Mídia Training – como usar a mídia a seu favor. São Paulo: Saraiva, 2012.

CHINEM, Rivaldo. Comunicação Empresarial – Teoria e o dia a dia das Assessorias de Comunicação. São Paulo: Horizonte, 2006.

Constituição Federal – art 220. Disponível em http://w w w. s e n a d o. g ov. b r / l e g i s l a c a o / c o n s t / c o n 1 9 8 8 /CON1988_02.04.2013/art_220_.shtm Acesso em 18 de abril de 2013

Constituição Federal – art 5. Disponível em http://www.senado.gov.br/legislacao/const/con1988/CON1988_02.04.2013/art_5_.shtm#inc_IV_ Acesso em 18 de abril de 2013.

Constituição Federal – Vade Mecum com a colaboração de Luiz Roberto Curia, Livia Céspedes e Juliana Nicoletti. 15. ed. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2013.

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UNESCO. Declaração Universal dos Direitos humanos - 1948. Disponível em http://unesdoc.unesco.org/images/0013/001394/139423por.pdf Acesso em 25 de abril de 2013. UNESCO, 1998.

DUARTE, Jorge (org) Assessoria de comunicação e o relacionamento com a imprensa. São Paulo: Atlas, 2011.http://www.senado.gov.br/legislacao/const/con1988/CON1988_02.04.2013/art_220_.shtm Acesso em 18 de abril de 2013.

NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Direito e Jornalismo. São Paulo: Editora Verbatim, 2011.

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Resumo

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Economia criativa nos países BRICS:cenários e perspectivas

BRICS é um anacrônico econômico que se refere às cinco nações emergentes que, desde 2009, reúnem-se em fóruns internacionais para discutir uma agenda de desafios e caminhos para se desenvolverem: Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. O objetivo deste artigo é apresentar como esses países estão unindo economia e criatividade para tornar seus produtos competitivos no mercado cultural global, ou seja, expor um panorama da economia criativa neles. Longe de traçar como seria um plano de desenvolvimento econômico baseado na criatividade para esses países, o que se pretende aqui é apresentar o cenário das indústrias criativas nessas nações e qual o potencial econômico da união entre criatividade e indústria.

Palavras-chave: Economia Criativa; Indústrias Criativas; BRICS e desenvolvimento

Caroline Taveira Gonçalves Marcel Antonio Verrumo

Introdução

Mesmo com a recente crise econômica e com as transformações verificadas no cenário geopolítico global, sobretudo no norte-americano e no europeu, a economia mundial parece ainda se apoiar

Caroline Taveira Gonçalves Mestranda em Comunicação na FAAC/Unesp.

Graduada em História pela Unesp. Marcel Antonio Verrumo

Mestrando em Comunicação na FAAC/Unesp.Graduado em Comunicação Social (Jornalismo) pela Unesp.

em paradoxos antigos, como a convivência entre os países que detêm e os que não detêm capital. Os países desenvolvidos – ainda, em sua maioria, localizados ao norte da Linha do Equador – são marcados por avanços tecnológicos. Enquanto isso, ao Sul, países em desenvolvimento são

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caracterizados por uma má distribuição de riquezas, a qual resulta em desigualdades sociais que impõem limites às parcelas mais pobres da população, à margem da sociedade.

De acordo com o Trade and development report, 2012,1 relatório mais recente sobre desenvolvimento da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento, órgão ligado à Organização das Nações Unidas (ONU), a economia mundial deve crescer 2,3% nesse ano – contra os 2,7% registrados em 2011. Uma das críticas do relatório aos modelos econômicos vigentes – e que pretende pôr fim à desaceleração de crescimento econômico verificado em 2012 – é que os países não estão fazendo investimentos domésticos, o que faz com que não haja demanda interna de produtos em algumas nações e, consequentemente, o consumo seja menor. Ademais, o cenário desenhado pelo relatório é o clássico: países em desenvolvimento, como o Brasil que deve crescer 2,0%, continuam desenvolvendo-se abaixo da média; enquanto países desenvolvidos, mesmo tendo enfrentado uma recente desaceleração em seu crescimento, ainda detêm grande parcela da riqueza mundial.

Diante desses dados, tão recentes e, simultaneamente, clássicos, fica às nações em desenvolvimento o desafio de driblar as barreiras econômicas e desenvolver-se. Porém, como fazê-lo? Um dos caminhos que, nos últimos anos, vêm sendo sugeridos por economistas, governos e acadêmicos é a chamada Economia Criativa.

O termo foi cunhado há mais de uma década, em 2001, e intitulava um livro de

John Howkins, The Creative Economy: how people make Money from ideas.2 Na obra, o autor calculou quanto valia uma economia apoiada na criatividade e concluiu que ela equivalia a US$ 2,2 trilhões em 2000 e crescia, anualmente, a 5%. Para o autor, existiam duas abordagens de criatividade: uma é um valor pessoal relacionado a uma característica da humanidade e que pode ser visualizado em qualquer sociedade; a segunda já é restrita a sociedades mais industriais, onde se desenvolvem produtos relacionados à inovação e à ciência. Mas, afinal, o que é a Economia Criativa?

A economia criativa aparece como uma mudança das estratégias de desenvolvimento mais convencionais centradas nas determinantes dos termos de comércio e com foco nas commodities primárias e na fabricação industrial, para uma abordagem holística multidisciplinar, que lida com a interface entre a economia, a cultura e a tecnologia, centrada na predominância de produtos e serviços com conteúdo criativo, valor cultural e objetivos de mercado. (SANTOS-DUISENBERG, 2008, p. 58)

Como se depreende, a Economia Criativa é um modelo econômico que valoriza a união entre Economia e Criatividade, no qual o trabalho criativo assume o primeiro plano. Segundo a Unctad, esse novo modelo teria o potencial de fomentar o crescimento econômico, criar empregos e ganhos de exportação, além de promover a inclusão social, a diversidade cultural e o desenvolvimento humano. Afinal, trata-se de um modelo de negócio que abrange diversas áreas culturais: artesanato, cinema, moda,

1- Trade and Development report, 2012 [Relatório de desenvolvimento e comércio, 2012], Unctad, Genebra: Unctad, 2012.

2- Howkins, John. The Creative Economy: how people make Money from ideas. Londres: Penguin Press, 2001.

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1 Panorama das indústrias criativas nos países BRICS

O termo BRICS é um anacrônico econômico que se refere às cinco nações emergentes que, desde 2009, reúnem-se em fóruns internacionais para discutir uma agenda de desafios e caminhos para se desenvolverem: Brasil, Rússia, Índia,

China e África do Sul. Não se trata de um bloco econômico como a União Europeia, mas sim de países em desenvolvimento que, anualmente, buscam, na troca de experiências, caminhos para planejar novas políticas públicas. Embora portadores de muitas diferenças locais, os cinco países aproximam-se quando se menciona o grau de desenvolvimento e, talvez, a riqueza cultural. Nas próximas páginas, será

apresentado o cenário cultural de cada um deles e como as Indústrias Criativas estão sendo pensadas nessas nações.

1.1 O mercado criativo brasileiro

A discussão sobre a Economia Criativa no país despertou em 2004, no painel “High Level Panel on Creative Industries and Development” em um encontro da Unctad em São Paulo. Os debates foram tão férteis que, quando analisou o impacto do evento na cultura nacional, o então Ministro da Cultural, Gilberto Gil, fez uma declaração que, talvez, tenha fomentado as conversas sobre o tema no país:

Estamos conscientes de que a maior garantia das vantagens mútuas que

música, dança, teatro, ópera, circo, pintura, fotografia, cinema, games, literatura, arquitetura, design e até áreas mais ligadas às tecnologias de inovação, como as novas mídias e aos softwares. Só para se ter uma ideia da dimensão das Indústrias Criativas, a Unctad (2008) estabeleceu a seguinte classificação para sistematizá-las em Setores Criativos:

Por ser uma opção de modelo que se debruça sob um bem simbólico, a criatividade, que gera emprego, renda e valoriza a cultura local – além de inseri-la em um mercado de negócio mais amplo –, a Economia Criativa apresenta-se como uma alternativa de desenvolvimento para os países em desenvolvimento.

Nesse artigo, apresenta-se como o cenário criativo está desenhado nas cinco nações que compõem o BRICS e qual seu potencial para fomentar a inclusão social e a diversidade cultural nesses territórios. Trata-se de uma discussão importante, afinal, como será exposto, esses dois resultados da Economia Criativa – inclusão social e diversidade cultural – são pressupostos fundamentais para o exercício da cidadania.

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possamos ter advém da natureza da matéria-prima que está em jogo: a criatividade das pessoas, comunidades e povos, a essência do nosso patrimônio imaterial, expressando-se a partir do precioso lastro da nossa diversidade cultural.Gilberto Gil, disponível em:www.cultura.gov.br/foruns_de_cultura/economia_da_cultura/i n d u s t r i a s _ c r i a t i v a s / i n d e x .php?p=9269&more=1&c=1&pb=1

Desde então, uma série de congressos e discussões políticas e acadêmicas começaram a tratar do assunto. Dois governos depois e após a Unctad e a Unesco (Organização da Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultural) divulgarem mais relatórios a respeito das Indústrias Criativas, o Ministério da Cultura, sob comando de Ana de Holanda, inaugurou em 1º de junho de 2012 a Secretaria de Economia Criativa.

É missão da SEC [Secretaria de Economia Criativa] “conduzir a formulação, a implementação e o monitoramento de políticas públicas para o desenvolvimento local e regional, priorizando o apoio e o fomento aos profissionais e aos micro e pequenos empreendimentos criativos brasileiros”. São, ainda, premissas da nova Secretaria a inovação, a inclusão, a sustentabilidade e a diversidade cultural. Diversidade cultural que não se limita a ser compreendida somente como um patrimônio digno de valorização, mas que, para nós, é recurso fundamental para um novo desenvolvimento, um alicerce sólido para uma nova economia.Discurso da Secretária de Economia Criativa, Cláudia Leitão, durante o lançamento do Plano da SEC, em 26 de setembro de 2011. Disponível em: http://www.cultura.gov.br/site/2011/09/26/plano-da-

secretaria-da-economia-criativa/

Perante um assunto novo e com definições imprecisas, um dos principais desafios do Plano foi definir o que era Economia Criativa e quais os setores criativos brasileiros para estabelecer as diretrizes das políticas públicas nacionais. De acordo com o documento:

Os setores criativos são aqueles cujas atividades produtivas têm como processo principal um ato criativo gerador de um produto, bem ou serviço, cuja dimensão simbólica é determinante do seu valor, resultando em produção de riqueza cultural, econômica e social.Plano da Secretaria da Economia Criativa: políticas, diretrizes e ações, 2011 – 2014, 2011, p. 22.

Partindo dessa definição, o governo

Escopo dos Setores Criativos no Brasil (Ministério da Cultura-2011)

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definiu quais eram os setores criativos brasileiros aos quais seriam destinadas as políticas de cultura. Aliás, até 2011, os setores culturais contemplados pelo Minc eram aqueles de natureza tipicamente cultural (patrimônio, expressões culturais, artes de espetáculos, audiovisual e livro, leitura e literatura). A partir desse momento, também passaram a ser beneficiadas áreas criativas com aplicabilidade funcional: moda, design, arquitetura e artesanato.

No entanto, mesmo contando com um órgão destinado a tratar desse assunto, as Indústrias Criativas no Brasil ainda enfrentam uma série de desafios para se estruturarem. A SEC ainda enfrentou uma série de barreiras, como o levantamento de informações e dados da Economia Criativa, a articulação e estímulo ao fomento de empreendimentos criativos, a educação para competência criativa, a criação de infraestrutura de criação, produção, distribuição/circulação e consumo/fruição de bens e serviços criativos e a criação de marcos legais para os setores criativos.

1.2 O caso russo

Em relação ao poder de compra, a Rússia é sexta maior economia mundial e possui uma forte tradição tecnológica. Desde o seu surgimento, com o colapso da União Soviética no fim de 1991, o país vem enfrentando uma série de desafios para criar um sistema político após 75 anos de governação soviética, além de ter esbarrado em uma forte crise econômica em 1998. Após esse incidente, a economia russa cresceu vem crescendo e se recuperando, mas um novo problema passou a atormentar o país: a inflação. Uma das explicações para a inflação é a alta dos preços internacionais dos alimentos, os quais que são o item mais importante da importação russa.

Ao apresentar o panorama das indústrias criativas no país, Pomeranz (2009: 336) destaca que o Estado precisa criar condições e estímulos para o desenvolvimento dos negócios russos, para que sua economia possa crescer. Algumas das opções para viabilizar esse crescimento seria o desenvolvimento de parcerias privado-estatais com vistas à redução dos riscos empresariais e de investimento, especialmente nas esferas de pesquisa, e difusão de novas tecnologias e desenvolvimento da infraestrutura energética e de transportes.

Nessa linha, as indústrias criativas também seriam uma alternativa, pois seriam um incentivo para que os pequenos empresários investissem em maneiras criativas de gerar receita. A própria redução dos riscos empresariais e de investimento abriria uma porta para aqueles que buscam na economia criativa uma forma de desenvolvimento econômico. A discussão aberta por Pomeranz tange o assunto:

A Rússia precisa deixar de ser um país cujo desenvolvimento econômico-social baseia-se exclusivamente na exploração e exportação de produtos energéticos- petróleo e gás natural e matérias-primas, para trilhar um caminho de desenvolvimento que tem por base um modelo de sociedade pós-industrial, baseada no conhecimento, na inovação e no potencial humano de que dispõe. (Pomeranz, 2009, p. 337)

Um dos desafios ao se pensar a economia criativa na Rússia é que o assunto ainda é pouco discutido no país e ainda existe uma ausência de uma definição explícita para as indústrias criativas na legislação russa. Assim, as autoridades têm poucas oportunidades de direcionar o apoio para este setor.

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Como complementam Elena Zelentsova e Elena Melvil (2011: 12), quando se trata de incentivo e investimento ao crescimento da economia no país, eles são tradicionalmente entendidos como financiamento de indústrias tradicionais como mineração, produção atacado e varejo. Dessa forma, os setores inovadores da economia acabam recebendo financiamento escasso.

A Rússia ainda possui muitos desafios para desenvolver sua indústria. Os únicos lugares do país onde se pode notar uma presença maior das indústrias criativas está em Moscou e São Petersburgo. Nas outras regiões, a procura de produtos culturais – assim como sua indústria – ainda é insuficiente. Nas regiões em que o mercado criativo é mais arrojado, ainda existe uma falta de produtos de alta qualidade criativa. Uma das explicações pode ser na falta de apoio a jovens talentos locais e uma educação deficiente: é mais fácil – e, inicialmente, rendoso – comprar produtos importados do que investir na cultura local e na educação. O pesquisador Päivi Karhunen argumenta nessa direção:

Há uma grande diferença entre as estratégias de desenvolvimento para a economia e para a cultura. Por um lado, as indústrias culturais e criativas não são percebidas como fatores que contribuem para o desenvolvimento econômico, e, por outro lado, estratégias de desenvolvimento cultural centram-se, principalmente, nos tradicionais valores e tradições culturais sem ver a criatividade como atividade econômica. P. 6

De acordo com o relatório da UNCTAD, das Nações Unidas, houve uma contribuição das indústrias criativas para o emprego e o PIB nacional em 2005, mas, quando essa contribuição é comparada aos

países da Europa do Norte, o aumento não é muito significativo. O setor privado ainda possui muitas dificuldades para obter apoio e empréstimos governamentais e as políticas de incentivo são muito rigorosas – sem contar o fato de a Rússia ser marcada por um sistema de corrupção e burocracia que desaminam os produtores do setor criativo.

Apesar das deficiências e desafios, existe uma esperança no futuro das indústrias criativas russas. Em São Petersburgo, por exemplo, o governo já esta incluindo as indústrias de criação como estratégia de desenvolvimento para a região. A iniciativa é de suma importância para incentivar políticas que favoreçam a economia criativa em outras regiões do país.

1.3 Economia criativa na Índia

A Índia é o segundo país mais populoso do mundo e, apesar da extrema pobreza que o país apresenta, possui um grande potencial de crescimento econômico baseado nas indústrias criativas, graças ao sofisticado sistema de representação política que remete à colonização do país. Apesar de os ingleses terem impedido a liberdade de comércio e indústria nesse período, a Índia conseguiu preservar sua cultura, pois os ingleses não alteraram a vida privada das pessoas. Como resultado, a herança cultural indiana é vista e apreciada até os dias hoje. Ela possui uma arte, literatura e artesanato muito expressivo e é reconhecida em tudo o mundo.

A Índia é um dos países do BRICS com a mais expressiva pobreza e, apesar do crescimento do PIB ter se acelerado nos últimos anos, a inflação declinou e as exportações se acentuaram, como menciona Patrícia Mello em sua obra

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Índia- Da miséria a potencia, de 2008. Mas muito ainda há do que se fazer para esse país se tornar uma potencia econômica. De acordo com essa autora, o primeiro passo seria o investimento educacional, já que grande parte da população não tem acesso à educação.

O país vem se desenvolvendo a cada dia, mas é necessário pensar como usar todo esse potencial cultural que a Índia possui para desenvolver essa nação economicamente.

É aí, novamente, que entram as ideias criativas, mais precisamente a economia criativa. A economia criativa é vista como uma solução para os problemas econômicos de uma cidade ou até mesmo de um país. Pensar a Índia como um espaço onde a criatividade pode gerar renda é algo extremamente interessante. É agregar valor cultural à economia e fazer com que o país alcance o desenvolvimento fora dos moldes tradicionais de economia, como agricultura e comércio varejista por exemplo.

Rodríguez apresenta algumas soluções econômicas para o crescimento de países como a Índia e o Brasil. Uma delas seria aumentar a economia ligada ao comércio varejista para a promoção de mais empregos: “enquanto a cadeia de supermercados Wall-Mart gera US$ 20 bilhões da China, na Índia as grandes redes mundiais de varejo compram apenas US$ 4 bilhões em produtos.” (Rodrígues, 2010, p. 13). No entanto, essas soluções já foram intensamente discutas, então, questiona-se: porque não pensar no desenvolvimento econômico indiano a partir de uma nova perspectiva, como a de valorizar o potencial cultural que o país possui, agregar valor financeiro ao artesanato, por exemplo?

Aliás, Sharada Ramanathan, 2008, discute a economia criativa na Índia e coloca o artesanato como uma das soluções para o

crescimento econômico do país:

Só o artesanato indiano tem o potencial de empregar 25% da sua população. Por exemplo, Manipur, um estado indiano montanhoso no nordeste do país, que está sendo industrializado a um alto custo devido à sua topografia, sofre com a desapropriação cultural que levou a uma insurgência no estado. O setor de artesanato poderia ser revitalizado como a espinha dorsal do desenvolvimento de Manipur, já que o seu solo é propício à plantação de bambu, que tradicionalmente produziu mestres artesãos de produtos feitos de bambu. p. 201

O exemplo mostrado acima pela autora mostra que o artesanato, além de empregar grande parte da população indiana, poderá não só contribuir com os problemas geográficos do local, como alavancar a economia de Manipur. Exemplo semelhante pode ser adaptado a diversas regiões indianas onde o potencial artesanal é expressivo – e também pode ser ampliado para outros produtos culturais intensamente produzidos por comunidades locais do país.

1.4 Indústria criativa chinesa

A situação das indústrias criativas na China carece de estudos na área. Aqui, trataremos do tema com base em um dos únicos documentos disponíveis “Tendências atuais da Indústria Cultural chinesa: Introdução e reflexão”, de Xiong Chengyu. De acordo com o texto, o termo “indústria cultural” aparece pela primeira vez em um documento chinês em outubro de 2000 durante a 5ª Sessão Plenário do 15º Comitê Central do Partido Comunista da China, afirmando que “seria

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necessário aperfeiçoar as políticas das indústrias culturais, fortalecer a construção e a gestão de um mercado cultural, bem como fomentar as indústrias criativas relacionadas”. A partir desse momento, o governo chinês passou a se atentar mais à temática e a definiu como “uma atividade que oferece produtos e serviços de entretenimento cultural ao público, juntamente com outras atividades a ele relacionadas”.

O cenário criativo chinês é semelhante ao das indústrias tradicionais do país. O volume de produtos criados nos últimos anos tem aumentado de forma expressiva: em 2006, o valor agregados dessas indústrias correspondia a US$ 62,4 bilhões (US$ 20,5 bilhões a mais do que em 2004). O número de pessoas empregadas também aumentou, o que mostra que o setor criativo também é importante na geração de empregos. É muito interessante notar que o layout de distribuição das indústrias criativas chinesas é semelhante ao da sua economia: a região oriental sendo mais desenvolvida que a ocidental. No entanto, Xiong Chengyu (2008) deixa claro que o país ainda necessita enfrentar uma série de desafios para que sua cultura seja comercializada, como a maior abertura para a produção e distribuição de bens culturais.

1.5 África do Sul e economia criativa

Em abril de 2011, a África do Sul passou a fazer parte do bloco chamado BRIC e, após sua entrada, o termo começou a ser chamado BRICS.

A África do Sul é conhecida por sua diversidade cultural, linguística e religiosa e, assim como os outros países que compõem a sigla, grande parte de sua população não tem acesso à educação e vive na miséria.

De antemão, é preciso afirmar que

pensar a economia criativa como algo aplicável na África é algo desafiador, pois, apesar de toda sua diversidade cultural, a promoção do potencial criativo dos seus povos e das indústrias culturais não recebe a devida prioridade.

Kovács menciona em seu artigo (2008) um documento “Plano de Ação de Nairóbi para as Indústrias Culturais na África”, que trata de algumas dificuldades para se desenvolver as indústrias criativas em território africano:

Entre os principais desafios, ele menciona a dificuldade de acesso dos artistas e produtores ao crédito e aos mercados de exportação, a alta tributação sobre os bens culturais, o baixo status social dos artistas e o acondicionamento inadequado dos bens culturais africanos. p. 97

O Plano mencionado propõe os recursos culturais como forma de lutar contra a pobreza e incrementar o desenvolvimento sustentável. As necessidades são urgentes, pois têm se agravado, na África, as desigualdades sociais e o aumento do nível de pobreza da população. Os processos de globalização, com a alta competitividade e a própria história colonial, fizeram com que muito de sua cultura se perdesse.

Essas grandes mudanças afetam intensamente a vida cultural na África. Os modos de vida, os valores ancestrais, as formas endógenas de solidariedade e expressão, o conhecimento e o know-how tradicionais estão marginalizados, ou até perdidos. Grandes ameaças também pesam na rica diversidade das culturas locais, das tradições orais e das línguas, bem como no patrimônio africano, cultural e natural. Kovács, 2008, p 99.

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A falta de apoio aos valores culturais africanos fez com que esses se perdessem cada vez mais. Os jovens, dessa forma, estão cada vez menos interessados nas culturas tradicionais e a população, de forma geral, está perdendo suas raízes e identidades culturais, menciona Kovács. Para que esses problemas se resolvam, é necessário haver políticas culturais para o incentivo dessa população e vontade política para que mudanças aconteçam. O Nepad – Nova Parceria para o Desenvolvimento da África – menciona essas questões ao dizer que o país só ira de desenvolver com o apoio cultural. Se houver apoio cultural, a economia criativa poderá ser desenvolvida.

Joffe (2011) coloca alguns exemplos de cidades criativas na África e cita a Cidade Do Cabo como local de produção criativa:

A Cidade do Cabo Criativa é responsável pela elaboração das estratégias voltadas a transformar o centro da cidade em uma área líder de conhecimento, inovação, criatividade e cultura na África e no Sul, por fortalecer a capacidade de produção das empresas criativas locais, corpos educativos e sem fins lucrativos e também por aumentar o consumo de produtos e serviços criativos de produção local. p. 64.

A produção cinematográfica, a televisão e a propaganda também são o cerne das indústrias criativas, podendo oferecer emprego a diversas áreas ligadas a esses setores. Estimular a produção desses campos contribuirá para o desenvolvimento da economia na África e ajudará a erradicar a pobreza, além de contribuir com a cultura local.

Joffe (2011: 67) também cita alguns pontos para que a economia criativa se desenvolva com sucesso na África como:

oferecer incentivos para o crescimento e o êxito, para garantir que as empresas criativas possam atingir padrões internacionalmente competitivos; envolver todos os cidadãos na geração de ideias e garantir que possam se manifestar, pois isso ajudará a defender a ideia, a participação de toda a população e a revelar os potenciais líderes de projetos e programas.

Os pontos colocados pela autora mostram que a principal característica para que as indústrias criativas se desenvolvam, em território africano, é o incentivo governamental, para fazer com que as pessoas enxerguem o seu potencial criativo e reconheçam o valor de sua cultura.

Ainda há um longo caminho a ser percorrido para que as indústrias criativas ganhem força na África, mas os primeiros passos já foram dados, como o Plano de Ação de Nairóbi, discutido anteriormente. Aliás, só o fato de a África do Sul ser componente dos BRICS mostra que ela tem potencial de desenvolvimento econômico. Como nas outras nações, sua cultura e criatividade poderão ser a chave para esse progresso.

2 Considerações finais e perspectivas

A partir desse panorama geral, é possível depreender que, se por um lado os países BRICS estão voltando suas atenções para a área da Economia Criativa (criando secretarias, apoiando pequenos, médios e grandes produtores culturais e dando os primeiros passos para a abertura do mercado cultural), por outro os desafios que eles encontrarão pela frente ainda são grande. Nas cinco nações, fica latente uma imprecisão de qual o melhor caminho a se trilhar na hora de elaborar as políticas públicas culturais: os conceitos são novos, a bibliografia teórica e a experiência

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prática também são recentes e pouco aprofundadas. Pensar as indústrias criativas parece pressupor olhar muito mais para o futuro do que se voltar ao passado.

Simultaneamente, como se pode observar a partir de uma série de dados mostrados ao longo dessas páginas, muitas são as oportunidades criadas por esse setor: a economia se desenvolve, novos postos de trabalho são criados, produtores culturais têm seu trabalho valorizado e podem ganhar dinheiro com o que fazem, enfim, toda uma cadeia produtiva começa a se movimentar de modo mais dinâmico e efetivo. Para desenvolver-se em um território em que a criatividade é cada vez mais valorizada, não dá para ignorar esse assunto.

Assim sendo, encerramos essa discussão refletindo sobre três pontos que talvez devessem nortear as políticas públicas dos países do BRICS que, além de em comum terem o fato de serem nações em desenvolvimento, são áreas onde a riqueza cultural é intensa: diversidade cultural, inovação e inclusão social.

A Diversidade Cultural deve ser um aspecto valorizado pelos governantes desses cinco países, os quais devem buscar valorizar, promover e proteger as expressões culturais nacionais para garantir sua originalidade. Trata-se de um item que, inclusive, consta na Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, da Unesco (2007) “A diversidade cultural cria um mundo rico e variado que aumenta a gama de possibilidades e nutre as capacidades e valores humanos, constituindo, assim, um dos principais motores do desenvolvimento sustentável das comunidades, povos e nações.” Buscar e valorizar a diversidade cultural do país é dar valor ao que há de mais nacional na região.

O segundo ponto que deveriam nortear as políticas públicas vem do próprio Plano da Secretaria da Economia Criativa: políticas, diretrizes e ações, da SEC do Brasil:

O conceito de inovação está essencialmente imbricado ao conceito de economia criativa, pois o processo de inovar envolve elementos importantes para o seu desenvolvimento. A inovação exige conhecimento, a identificação e o reconhecimento de oportunidades, a escolha por melhores opções, a capacidade de empreender e assumir riscos, um olhar crítico e um pensamento estratégico que permitam a realização de objetivos e propósitos.Plano da Secretaria da Economia Criativa: políticas, diretrizes e ações, 2011, p. 34

Pensar na inovação ligada aos produtos culturais é refletir sobre como, por exemplo, integrar cultura e tecnologia e novas mídias. Também é, em um sentido estético, romper com as barreiras artísticas pré-estabelecidas e produzir conteúdos culturais novos, autorais e que reflitam as características identitárias nacionais.

Finalmente, o terceiro aspecto que deve ser levado em consideração é a inclusão social. Os países do BRICS são nações onde as desigualdades sociais são claras, os índices de violência são altos e as taxas de desemprego tampouco são baixas. Diante desse cenário, esses países devem buscar desenvolver políticas que ofereçam oportunidades e tirem sua população da margem e a coloquem no centro do desenvolvimento. Oferecer oportunidades de inclusão social – e, aqui, inclusão não significa apenas acesso a emprego, mas também à cultura e a bens simbólicos – é um

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pressuposto básico para o fortalecimento do exercício da cidadania e da democracia.

E, assim sendo, deve configurar entre as prioridades de qualquer política pública.

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Resumo

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assistindo a conteúdos oferecidos – a uma posição ativa na qual puderam interagir com o conteúdo presente e se transformar em produtores de seu próprio conteúdo.

Nas últimas décadas tornou-se possível para a maioria dos internautas manter um blog, canal de vídeos no Youtube ou outro canal de comunicação usado para se expressar de maneira livre e

As portas abertas da Web: a internet como alternativa viável para a divulgação e publicação de histórias em quadrinhos

Rafael Corrêa LealRaul Zaniratto Giunta

Rafael Corrêa LealUniversidade do Sagrado Coração, Bauru - SP

Raul Zaniratto GiuntaUniversidade do Sagrado Coração, Bauru - SP

O presente artigo pesquisa e tece considerações acerca da utilidade e as vantagens do uso da internet como meio principal para a publicação de quadrinhos por autores, iniciantes ou não, que ao encontrar dificuldades ou divergência de interesses junto a editoras, optam por publicar sua obra de forma independente. Os autores realizaram uma pesquisa qualitativa e exploratória a fim de proporcionar uma visão geral acerca do assunto, através de livros, artigos científicos e websites, além de entrevistas quadrinistas.

Palavras chaves: Comunicação. Internet. Mercado Editorial. Quadrinhos.

1 Introdução

Na primeira década do século XXI, a popularização da internet,especialmente amparada pelo fenômeno da web 2.0,1 que deixou a rede mundial mais dinâmica e aberta à participação do público, possibilitou que os usuários passassem de uma posição passiva de receptor – recebendo, lendo ou

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de baixo custo ou mesmo gratuita.Com a popularização de diversas

redes sociais como o Facebook, a produção e, especialmente o compartilhamento e divulgação de conteúdo, passou a ser ainda mais comum e assíduo, pois o próprio perfil ou conta em uma rede social passou a ser um canal de comunicação, com a possibilidade de divulgar qualquer tipo de mensagem de interesse do usuário, seja por publicação de textos, imagens ou vídeos e até mesmo a convergência de mais de um formato de mídia.

Essas novas possibilidades foram muito úteis para artistas dos quadrinhos que já produziam conteúdo, mas encontravam dificuldades ou mesmo limitações para publicar seu material por editoras ou conseguir divulgação para seus materiais feitos de maneira independente. A partir da criação de blogs, páginas pessoais ou perfis em redes sociais, se tornou possível que diversos artistas publicassem seu material e conseguissem atenção do público e da mídia sem ter vínculos ou apoio de editoras ou outras empresas.

Essa forma de publicação foi muito vantajosa para diversos autores, que acabaram ganhando grande popularidade. A sistemática de uso da internet e redes sociais para divulgação de trabalhos próprios se tornou uma alternativa viável para os autores e muitas vezes chegou a ser até mesmo mais rentável, eliminando a sistemática do meio editorial que envolve impressão e distribuição pelas editoras, conhecida como a forma “tradicional” de publicação.

O objetivo deste artigo foi estudar a

viabilidade e a funcionalidade da internet como ferramenta de publicação de quadrinhos para novos autores, tendo como escopos específicos avaliar se a internet é a melhor maneira de ingressar no cenário de autores do país, se ela serve como porta de entrada para o mercado editorial tradicional e ainda se ela serve como ferramenta de divulgação eficaz para autores que já atuam com o quadrinho impresso.

A metodologia utilizada foi uma pesquisa qualitativa e exploratória de cunho bibliográfico com o método histórico, pois através de levantamento bibliográfico, entrevistas e análises de exemplos, a pesquisa exploratória busca constituir hipóteses para aprimorar a ideia inicial deste estudo. Assim, sua função principal é proporcionar uma visão geral de um determinado fato, a fim de encontrar padrões e hipóteses. Segundo Gil (1999, p. 43) este tipo de estudo visa proporcionar um maior conhecimento para o pesquisador acerca do assunto pesquisado.

Para a pesquisa, foram utilizados livros, artigos científicos e websites das áreas de história em quadrinhos, editoração, publicação e tecnologia, como princípio básico de uma pesquisa bibliográfica. A principal vantagem da pesquisa bibliográfica reside no fato de permitir ao investigador a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar diretamente, conforme Gil (2007, p. 65).

Foram também realizadas entrevistas exclusivas com autores de quadrinhos e examinados exemplos de outros autores inseridos no contexto da pesquisa.

A respeito do método histórico:

[...] consiste em investigar acontecimentos, processos e instituições do passado para verificar

1- Termo utilizado para descrever a segunda geração da WorldWide Web, como conceito de troca de informações e colaboração dos internautas com o conteúdo e funcionamento de sites e serviços virtuais.

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publicadas com certa regularidadeno Brasil. Segundo Rodrigues (2005), uma figura de destaque foi o editor Adolfo Aizen, pioneiro no estilo, que mais tarde, nos anos 1940, fundou a Editora Brasil-América Limitada, a Ebal que,com diversos títulos de aventura nacionais e internacionais, foi líder nos anos 1950 e 1960, vendendo milhões de revistas anualmente.

Dos anos 1960 em diante, o mercado brasileirofoi dominado pelos quadrinhos infantis, com aEditora Abrilse destacando com os personagens criados por Walt Disney, que começou a publicar desde a fundação da editora em 1950,e também com os quadrinhos da “Turma da Mônica”, os mais famosos do país. Neste período são dois os autores que mais se destacam, sendo reconhecidos ainda nos dias atuais. O primeiro é Ziraldo, escritor e desenhista que publicava em revistas e jornais desde os anos 1950 e lançou diversos trabalhos com personagens próprios e grande sucesso, como a revista “A Turma do Pererê” (1960) e os livros “Flicts” (1969) e “O Menino Maluquinho” (1980). O outro autor de grande sucesso foi Maurício de Sousa. O desenhista começou a publicar tiras em jornal no ano de 1959, com o personagem “Bidu”, e com o sucesso continuou a criar outros personagens, como “Cebolinha” (1960), “Cascão” (1961) e “Mônica” (1964) que mais tarde se tornou sua principal personagem. Depois de fundar os “Estúdios Maurício de Sousa”, o desenhista passou a distribuir suas tiras a mais de 200 jornais e, mais tarde, lançou revistas mensais. Em 1970, segundo informações de Cruz (2008), foi lançada a primeira revista “Mônica”.

Uma publicação que, apesar de não ser exclusivamente de quadrinhos, marcou a época, foi “O Pasquim”, o primeiro e, até a década de 1980, o mais influente jornal de oposição ao regime militar. O semanal,

a influência na sociedade de hoje, pois as instituições alcançaram sua forma atual através de alterações de suas partes componentes, ao longo do tempo, influenciadas pelo contexto cultural particular de cada época. (MARCONI e LAKATOS, 1991, p. 106)

Portanto, para analisar se a internet é um meio útil e eficaz de publicação de quadrinhos perante o mercado editorial tradicional, a utilização desta metodologia se torna justificável.

2 Referencial Teórico

2.1 Quadrinhos no Brasil

É incerto descobrir quando nasceu a primeira história em quadrinhos, entretanto alguns estudiosos defendem que a arte pré-histórica em cavernas já é um início deste tipo de comunicação. Porém, segundo Jarcem (apud MELO, 2010), as primeiras aparições das HQs,em um formato similar ao que conhecemos hoje, ocorreram no início do século XX, com o avanço da imprensa que possibilitou novas formas de comunicação.

No país, em meados do século XIX, o precursor foi Ângelo Agostini, cartunista italiano radicado no Brasil, que utilizava cortes gráficos que viriam a ser um dos elementos determinantes na criação dos quadrinhos.

A primeira história em quadrinhos brasileira foi “As Aventuras de Nhô Quim”, publicada pela revista Vida Fluminense em 1869. Agostini também criou uma segunda série, intitulada “Aventuras de Zé Caipora”, que foi publicada na Revista Ilustrada , conforme Cruz (2008).

A partir dos anos de 1930, revistas de quadrinhos de aventura passaram a ser

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criado pelo cartunista Jaguar e pelos jornalistas Tarso de Castro e Sérgio Cabral, teve em sua equipe de colaboradores nomes como Millôr Fernandes, Ziraldo, Laerte, Paulo Caruso e Chico Caruso. Foi publicado de 1969 a 1991 (CRUZ, 2008).

A partir dos anos 1980, segundo Ramos (2012, p. 491), com o fim da ditadura, ganharam espaço os quadrinhos adultos de autores como Laerte, Angeli e Glauco, com um humor mais livre, lançando revistas como “Chiclete com Banana”, “Piratas do Tietê” e “Geraldão” e servindo de base para muitos autores da geração seguinte.

Cruz (2008) afirma que, na última década do século XX, com a exceção das séries publicadas por grandes editoras e já consolidadas, os quadrinhos nacionais têm uma queda na popularidade, com os remanescentes dos anos 1980 perdendo aos poucos o espaço conquistado e o mercado volta-se para quadrinhos estrangeiros.

No fim da década de 1990 e início da de 2000, um dos destaques nacionais, tanto pelo sucesso como pela inovação, foi a série “Combo Rangers”2 do auto Fábio Yabu, um dos primeiros quadrinhos feito especificamente para a internet no Brasil, que mais tarde se tornaria também uma publicação impressa.

Outro destaque da época é André Dahmer que também surgiu na internet com o site “Malvados”.3 No meio impresso independente, os irmãos gêmeos Fábio Moon e Gabriel Bá, lançaram a revista independente “10 pãezinhos”.4 Hoje, os três autores estão entre os artistas mais reconhecidos do país, tendo inclusive vencido prêmios internacionais como o “EisnerAwards”.5

2.2 Webcomics:Quadrinhos para Internet

A origem dos quadrinhos feitos para publicação na internet, ou webcomics, é pouco documentada e as prováveis publicações pioneiras foram feitas ainda nos anos 1980 nos Estados Unidos, como “WitchesandStitches” (1985) e “T.H.E. Fox” (1986), publicados por CompuServe6 e Quantum Link,7 serviços online que caminhavam para a internet que conhecemos, conforme o site Especial (c2010).

Segundo o site Especial (c2010),nos anos 1990, com o avanço da tecnologia facilitando a digitalização, produção e publicação, surgiram novas séries, algumas ainda existentes, como “SlowWave”8 (1995), “Penny Arcade”9 (1998) e “PvP”10 (1998).

No Brasil, dois artistas já citados se destacam nos primórdios dos webcomics, Fábio Yabu e André Dahmer, ainda hoje lembrados e ativos, publicando na internet e também no meio impresso.

O primeiro movimento foi a criação de quadrinhos que usavam recursos de outras linguagens, como as animações e os games. Foram batizados pelo pesquisador Edgar Franco de HQtrônicas e tiveram no Combo Rangers, de Fábio Yabu,

2- http://comborangers.com.br/sobre/3- http://www.malvados.com.br/4- http://www2.uol.com.br/10paezinhos/

5- Premiação americana considerada a mais prestigiosa no cenário dos quadrinhos.6- Um dos primeiros serviços online a disponibilizar conexão à Internet em nível internacional e também responsável pela popularização de troca de figuras.7- Também conhecido como “Q-Link”, foi um serviço online americano/canadense, usado entre 1985 e 1995.8- http://www.slowwave.com/9- http://www.penny-arcade.com/10- http://pvponline.com/

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um de seus principais produtores nacionais (RAMOS, 2012, p. 469).

Nas décadas de 2000 e 2010, o uso da internet cresce largamente, chegando a 2.1 bilhões de usuários no mundo e 50 milhões no Brasil,segundo o site Internet (c2012). Com essa grande popularização, a rede passa a fazer parte do cotidiano das pessoase o caminho da comunicação passa a ser diferente. As pessoas, antes consumidores de informação, passam a ser geradoras de conteúdo, interagindo e mesmo concorrendo com os veículos de comunicação ditos tradicionais.

No Facebook, todos podem ser editores, criadores de conteúdo, produtores e distribuidores. Os clássicos papéis da velha mídia estão sendo desempenhados por todos. O Efeito Facebook pode criar uma repentina convergência de interesses em torno de uma notícia, uma música ou um vídeo do Youtube (KIRKPATRICK, 2011, p. 17).

O público, diante dessas novas possibilidades tecnológicas, tem a possibilidade de passar a produzir e divulgar conteúdo, e artistas que antes tinham dificuldade em divulgar seu trabalho, encontraram na internet um meio de propagar suas ideias e conseguir público sem a necessidade obrigatória de um editor, empresário ou figura semelhante que era responsável em facilitar o processo de publicação e de tornar público um material inédito.

O quadrinista Pedro Hutsch Balboni, autor das tiras “Joãos e Joanas”,11 conta que

se sentiu atraído pela web quando percebeu que tinha muito conteúdo guardado que, segundo ele próprio, estavam “presos em papel” e descobriu que um blog o permitiria expor esse conteúdo gratuitamente e sem intermediários (ESPECIAL...c2010).

Com esse recurso para expor sua produção, diversos autores iniciantes foram encorajados a criar seus próprios canais de divulgação (blogs ou mesmo web sites próprios), o que resultou em um grande número de blogs formando um novo cenário de quadrinhos, superando em número os quadrinistas publicados em jornais e muitas vezes tendo a qualidade reconhecidamente superior.

O que se viu na segunda metade da década foi uma proliferação de blogs de autor, que usavam o suporte para expor seus trabalhos. Houve uma volta aos formatos tradicionais usados em papel, com particular proeminência das tiras. Estas encontraram na internet seu principal meio de exposição e, no final da década, superavam as impressas nos jornais em quantidade e qualidade. Mesmo autores dos diários reproduziam os trabalhos, depois, na internet (RAMOS, 2012, p. 469).

Dessa forma, os quadrinhos produzidos na internet passaram a ter tanto respeito e destaque na mídia especializada quanto os produzidos no mercado editorial tradicional.

2.2.1 A relação entre quadrinhos e redes sociais

Uma das principais dificuldades dos autores de quadrinho é fazer com que suas obras cheguem ao público pretendido. Com o produto impresso ou mesmo disponibilizado em blogs, o leitor precisava 11- http://www.joaosejoanas.com/

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ser encontrado e convidado a conhecer a obrapara assim,havendo interesse, voltar a consumi-la com certa regularidade. Dessa mesma maneira,o consumidor interessado em quadrinhos precisava frequentar locais ou sites que disponibilizem o tipo de leitura.

O problema fundamental do editor não é colocar o seu produto no mercado, mas encontrar o leitor certo para cada um de seus títulos. O problema fundamental do consumidor é encontrar os livros que o interessam em meio à multiplicidade de títulos produzidos. Juntando a oferta fácil com a demanda difícil, temos de fazer com que os editores e os compradores de livros se encontrem mutuamente. Há um risco crônico de superprodução. É por isso que o problema do livro é, acima de tudo, de distribuição, que depende, sobretudo, de informação – que é ainda mais importante em uma sociedade (que se pretende) da informação (EARP; KORNIS, 2005 p. 18).

A relação de interação entre editores/autores e o público sempre foi um dos pontos cruciaisno processo de publicação. Os autores produziam conteúdo, mas muitas vezes esse conteúdo não estava realmente ao alcance de possíveis leitores dado os empecilhos de divulgação e distribuição que a mídia impressa usualmente gerava, o autor independente poderia ser ignorado e, com isso, sua obra não atingiro público-alvo.

Dentro desse contexto, as redes sociais foram usadas como um instrumento de divulgação e serviram para contornar essa dificuldade de encontrar o leitor.

Publicar envolve tanto produzir quanto distribuir um trabalho. Primeiro você tem de apresentar seu conteúdo de uma forma física que

as pessoas possam entender, e então precisa possibilitar que as pessoas o encontrem. (Se você tem 5 mil cópias impressas de um livro guardadas em sua casa, ele não está realmente disponível ao público; foi produzido, mas não distribuído.) Antes, livros e revistas só podiam ser encontrados em bibliotecas e livrarias, e era difícil introduzir publicações independentes naqueles lugares. Hoje, existem maneiras de esses pequenos formadores de conteúdo alcançarem o mercado (LUPTON, 2008, p. 12)

Nas redes sociais, autores passaram a ter um público maior e mais facilmente localizável. O poder de alcance de uma postagem servia para encontrar novos leitores a partir dos contatos do próprio autor, que divulgam para outros amigos, que posteriormente enviavam para outros amigos e assim sucessivamente. O quadrinista Marco Oliveira, criador do blog “Overdose Homeopática”,12 segundo informações de Ramos (2012), comenta que “no twitter por exemplo, vejo quando uma pessoa acaba de descobrir o ‘Overdose’ e já sai indicando a vários amigos, que também se identificam e indicam a outros”. Cafaggi (2013), do blog “Puny Parker”13 conta que teve um começo parecido, publicando suas tiras no site de relacionamentos Orkut, e que as redes foram muito importantes para o trabalho:

Eu não precisei fazer nenhum tipo de propaganda direta das minhas tiras. Meus amigos no Orkut mostravam as tiras para os amigos deles e assim por diante.Com o Facebook e suas opções de compartilhamento é até mais fácil (CAFAGGI, 2013).

12- http://www.overdosehomeopatica.com/13- http://punyparker.blogspot.com.br

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O Facebook, a maior e mais populosadas redes sociais, que, segundo Sbarai (2013), em 2013 alcançou 73 milhões de usuários somente no Brasil, é especialmente útil pela capacidade de compartilhamento de informação de forma rápida, uma característica chamada por Kirkpatrick (2011) de “o efeito Facebook”, quando a rede põe as pessoas em contato em torno de algo que tenham em comum, como interesses ou experiências.

As ideias no Facebook têm a capacidade de se espalhar pelos grupos e fazer com que um grande número de pessoas tome conhecimento de algo quase simultaneamente, propagando-se de uma pessoa para outra e para muitas com uma facilidade rara – como um vírus ou meme (KIRKPATRICK, 2011, p. 15-16).

A facilidade de propagação de mensagem inerente às redes se mostrou uma arma para os quadrinistas. Compartilhando o conteúdo nas redes, os interessados interagem com o autor e a obra consegue alcançar um grande número de pessoas.

Com as redes sociais, os quadrinhos que conquistaram uma boa base de fãs engajados, que comentam e compartilham as postagens, passaram a alcançar diariamente uma grande parte do público, aparecendo em suas atualizações como qualquer postagem de seus amigos. Através dessa facilidade, a publicação de webcomics atingiu níveis de intensidade e popularidade nunca alcançados, com exemplos como páginas sendo lançadas e conseguindo milhares de seguidores em poucos meses.

2.3. Da Internet para o papel

O século XXI se iniciou com dúvidas

sobre o impacto da internet em diferentes setores da sociedade, inclusive para os quadrinhos.

Na área de quadrinhos, havia prognósticos tanto apocalípticos quanto integrados. Alguns viam na rede mundial uma revolução completa na forma de produção dos quadrinhos, mudança que incluiria o fim do papel. Outros já enxergavam na nova ferramenta tecnológica um passo além da produção nacional, inclusive com a criação de novos gêneros. (Ramos, 2012, p. 469)

O que se confirmou no fim da primeira década de 2000 e início da década de 2010 foi a popularidade das webcomics e o fato de que a facilidade de acesso aos quadrinhos pela internet não extinguiu o interesse do público por consumir quadrinhos sob a forma impressa. Diversos autores de webcomics conseguiram contratos com jornais e editoras, ou publicaram livros/álbuns e coletâneas de forma independente com grande sucesso, alguns inclusive tendo financiamento antecipado por parte do público.

Eles abordam temas diversificados, trazem inovações no uso da linguagem dos quadrinhos no limitado espaço físico da tira e ganham maior projeção após compilarem as histórias, geralmente feitas na internet, em edições impressas. Foi o caminho seguido por André Dahmer e Allan Sieber, para ficar em dois exemplos (RAMOS, 2012, p. 470).

O autor Estevão Ribeiro, do blog “Os Passarinhos”,14 é um exemplo de quadrinista da internet que conseguiu viabilizar a coletânea impressa de seu blog dividindo

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14- http://www.ospassarinhos.com.br/

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os custos com o público. A estratégia foi oferecer a compra antecipada. Cada leitor foi convidado a fazer um depósito entre R$8 e R$9,50 (variando de acordo com o frete de envio). Segundo Ramos (2012), os patrocinadores, em troca, além de receber o livro, tiveram seus nomes impressos no livro. O financiamento coletivo, ou crowdfunding15 também foi uma estratégia para quadrinistas. Tokumoto (2013), do site “Ryotiras”,16 recorreu à pratica através de um site e arrecadou mais que o dobro da quantia inicialmente pedida. O que resultou em benefício ao leitor, com o aumento de páginas do projeto.

Com as novas possibilidades geradas pela internet, a mentalidade e as intenções de muitos autores iniciantes também se transformaram, com o sucesso na internet se tornando um caminho para o objetivo de publicar no meio impresso. Segundo Krepp (2012?), o melhor caminho para entrar no ramo era investir em tiras para jornais e revistas, mas com as mudanças, os quadrinistas da geração dos anos 2000 já pensam em ser vendidos em livrarias, tendência que tem como maior responsável a internet, onde é possível se tornar conhecido antes mesmo de ter algo publicado.

Ramos (2012, p. 469) complementa esse assunto ao mostrar que a produção virtual no fim da década teve exemplos suficientes para dizer que um dos interesses da produção virtual era ser convertida em papel, seja na forma de coletâneas ou

convites surgidos a partir do trabalho na rede.

O quadrinista Rafael Koff é um exemplo que usa a internet como ferramenta para formar o público de seus produtos impressos. Em entrevista disponível no Youtube (2013) ele explica que particularmente, usou a web para construir o público para depois lançar o material impresso que vende. Toda a parte de web foi feita para a construção de público, que depois financiousua produção off-line.

Alguns artistas, inclusive,optaram por trabalhar de maneira independente, mesmo recebendo ofertas para publicar por editoras, por motivos diversos, como a liberdade artística, e a facilidade de vender diretamente ao consumidor, a internet e a publicação independente mostrou-se como um caminho bastante atraente.

A produção independente, muitas vezes pode gerar um status e maior identificação com um determinado público. “Na música, no cinema, na arte e no jornalismo, a ideia de mídia ‘independente’ agora é aceita e até mesmo celebrada por artistas que também querem ser empreendedores e desejam trabalhar fora da indústria convencional” (LUPTON, 2008, p. 12).

A liberdade artística, citada por Tokumoto (2013) como uma das principais vantagens de se publicar na internet, éobjeto de desejo da maioria dos artistas em diversos meios (que com editoras ou empresas envolvidas pode ser tolhida ou ter condições impostas), e também é um grande atrativo de trabalhar de maneira independente. Segundo Lupton (2008, p. 12-13) ao se tornar seu próprio editor, o autor ganha muita liberdade.

Cafaggi (2013) defende que o contato

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15- Termo usado para designar iniciativas de financiamento colaborativas. Em tradução livre para o português seria algo próximo a “financiamento pela multidão”. No modelo, várias pessoas contribuem com pequenas quantias para viabilizar uma ideia, negócio, ou projeto através de um website especializado.16- http://ryotiras.com/

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direto com o leitor também é uma vantagem importante artisticamente, gerando uma facilidade para conseguir um feedback e aprender sobre seu próprio trabalho.

McCloud (2006, p. 79) complementa a ideia de Cafaggi ao defender que a conexão entre artista e leitor é e sempre será a parte indispensável da indústria de quadrinhos.

A proximidade com o leitor pode ter resultados positivos também em outro momentoe é considerada como uma vantagem que contribui para a produção de material independente: a facilidade para se realizar vendas através da internet. Seja através de ferramentas de venda ou diretamente ao consumidor, diversos autores conseguem vender seus álbuns e livros de quadrinhos pela internet com sucesso.

Se você ou sua empresa tem um site, é fácil montar sua própria “loja” on-line usando serviços como a Paypal. Você pode vender seu livro diretamente a clientes e evitar as dificuldades de encontrar um distribuidor.Mesmo uma página em Myspace ou no Facebook pode ser uma ferramenta de vendas para seus títulos. Você não precisa de um ISBN17 para vender seu livro em seu site; simplesmente precisa apresentá-lo a compradores potenciais de uma forma atraente – e enviá-lo imediatamente! (LUPTON, 2008, p. 24).

O cartunista Bennet,18 em entrevista a Ramos (2012), defende que a venda pela internet é a saída, explicando que uma tiragem menor evita encalhes, vendendo

para pessoas certas.As vendas realizadas pelo autor

diretamente ao público também podem se mostrar financeiramente vantajosas para as duas partes. Segundo McCloud (2006), na indústria de impressão é possível ver como cada passo no processo leva sua fatia até o valor de três dólares de uma revista vire trinta centavos na mão do criador. Um criador online hipotético que consiga um método de pagamento com dez por cento de custo de transação, por exemplo, poderia ganhar noventa por cento em cada venda, ou ainda cobrar um preço mais próximo do que teria obtido no mercado impresso.

Alguns autores contam que a internet também apresenta algumas desvantagens em relação à midia impressa. Cafaggi e Tokumoto (2013) citaram que na internet o autor está mais exposto, podendo receber um feedback negativo de maneira direta e por vezes até agressiva.

O quadrinista Bá (2013) (que faz dupla com o irmão Fábio Moon), considera a internet a porta mais fácil para o mercado, mas não necessariamente a melhor, e diz que o meio funciona muito bem para trabalhos curtos como tiras, mas que para narrativas longas, ainda é melhor publicar impressos.

Já para os autores que migram da internet para a mídia impressa de maneira independente, as dificuldades podem derivar da falta de uma equipe para cuidar de outras etapas da produção além da arte em si, como a logística de vendas. Segundo Lupton (2008, p.12), ao se tornar editor de seu próprio trabalho, o autor assume também um risco financeiro e a responsabilidade por todos os detalhes da produção e da distribuição.

Ricardo Tokumoto (2013) obteve tanto sucesso com seu projeto de crowdfundingque teve dificuldades com

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17- Um ISBN (International Standard Book Number) é um número de treze dígitos que constituem um endereço único para sua publicação, identificando seu editor bem como seu título e origem geográfica (LUPTON, 2008, p. 12).18- ttp://blogdobenett.blog.uol.com.br/

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a preparação e envio do material. O autor conta que o envio de tantos livros necessitava que ele estivesse totalmente disponível, mas por falta de pessoal para ajudar no processo, teve que dividir a tarefa com sua profissão fixa. Entretanto, apesar de algumas dificuldades existirem, as vantagens da internet são maiores e compensadoras para a maior parte da geração de quadrinistas que surgiu no século XXI, sendo considerada por muitos a melhor porta de entrada para o mundo dos quadrinhos.

2.4 Quadrinistas que conseguiram visibilidade por meio da Internet

Diversos quadrinistas conseguiram entrar no circuito do quadrinho nacional ou mesmo no mercado editorial ganhando projeção através da internet. André Dahmer, por exemplo, começou um site próprio em 2001. Em 2013, além do site, publica a série Malvados em jornais e já lançou coletâneas por editoras.

A série surgiu num site, criado pelo desenhista em 2001 e mantido até hoje. O boca a boca, ou o link a link, ajudou a difundir as piadas feitas por ele.A tira migrou para o impresso – é publicada no “Jornal do Brasil” – e ganhou uma primeira coletânea em 2005, pela Editora Gênese (RAMOS, 2012, p. 474).

Na ocasião do lançamento do livro “Malvados”, um dos exemplos bem-sucedidos de tira que migrou do meio virtual para o impresso, Dahmer concedeu uma entrevista ao jornalista Paulo Ramos, onde defendeu a importância da internet na produção das tiras brasileiras:“Acho que a internet foi fundamental para toda essa geração de novos quadrinistas, gente que

ainda não está no tal mercado, jovens com poucas opções para divulgar seus trabalhos na mídia impressa” (RAMOS, 2012, p. 474).

Beck (2013), dono da fanpage “Armandinho” publicava suas tiras em jornais de Santa Catarina, atingindo apenas o público local. Iniciada em 29 de novembro de 2012, a página do Facebook que mostra as tiras do autor tem 205 mil seguidores19 e ganhou destaque nacional, atingindo um público muito maior e sendo assunto de diversas matérias em veículos de comunicação.

Cafaggi (2013), através de seu blog, iniciado em 2008, recebeu três propostas de trabalhos. Fez histórias para os álbuns “MSP 50 – Maurício de Sousa por 50 artistas” e “Pequenos Heróis” e recebeu o convite para produzir uma tira semanal em “O Globo”. Em 2013 irá lançar um álbum completo pela MSP Graphic, selo da Maurício de Sousa Produções e já publicou duas coletâneas de tiras e uma revista de maneira independente.

2.5 O mercado editorial

As mudanças que a popularização da internet e o fenômeno da web 2.0 provocaram no meio alternativo de publicações também geraram efeitos no mercado tradicional, facilitando o processo de publicação, divulgação e localização do público para os autores independentes,mas também para editoras menores que perceberam a utilidade e eficácia da internet para o segmento.

A indústria editorial costumava ser uma comunidade fechada e

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19- Número baseado em acesso na fanpage Armandinho. Disponível em <http://www.facebook.com/tirasarmandinho>. Acesso em 23 de maio 2013.

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controlada por um pequeno grupo de elite. Hoje, embora algumas poucas editoras grandes dominem o ramo editorial, empresas de menor porte estão começando a aparecer por toda parte, graças a novas tecnologias e maneiras de fazer, comprar e vender livros. Cada vez mais os editores estão criando trabalhos dirigidos para segmentos do mercado (de beatlemaníacos a designers),e eles estão usando a internet para alcançar os leitores diretamente (LUPTON, 2008 p. 12).

Dentro do mercado, surgiram segmentos diversos. Parte das editoras passou a apostar nas livrarias como posto de vendas, lançando graphicnovels20 nacionais e internacionais, versões encadernadas de séries e coletâneas de tiras ou mesmo de webcomics, um segmento que tem como alvo o leitor que está disposto a gastar um pouco mais em itens colecionáveis e com qualidade de acabamento superior.Teixeira (2010) acredita que os quadrinhos no Brasil deixaram de ser artigo de bancas para tomar as estantes das livrarias com suas versões encadernadas e graphicnovels.

Os quadrinhos publicados por grandes editoras continuam mais fortes, principalmente nas bancas,sendo quea maioria dos títulos disponíveis ainda é os quadrinhos infantis, dominantes há décadas, e as republicações de quadrinhos estrangeiros. Conforme Gusman (2013), editor da Maurício de Sousa Produções em entrevista para o programa Pauta Aberta, a indústria de quadrinhos do Brasil mais importa quadrinhos que produz, e apesar de existirem muitos artistas de qualidade

(diversos artistas trabalhando no mercado estrangeiro e outros explorando o pequeno nicho dos quadrinhos autorais), não há mercado para outros tipos de produção, e o máximo que se consegue é vender quadrinhos em livrarias.

Em contrapartida à Gusman, Afonso Andrade (2013), coordenador do FIQ,21 defende que o mercado nacional está em crescimento, com espaçossendo abertos principalmente para trabalhos autorais, para os quadrinhos por encomenda (editoras que contratam o autor para um projeto específico) e também pelo caminho da internet, onde o autor ganha espaço e público e tem a facilidade de contato e comercialização direta com seus leitores.

McCloud (2006, p. 174) complementa esta ideia ao defender que a natureza interativa da internet já começou a influenciar mudanças, inclusive em regras comerciais. Por outro lado, quando o produto oferecido não é mais tangível, ele não precisa ser entregue como objeto, e essa transformação pode reescrever todas as regras. Sendo assim, a difusão digital é uma genuína revolução.

Já Ramos (2012) acredita que a internet se tornou uma rica janela virtual para expor trabalhos em quadrinhos de graça, pois não se ganha para produzir tiras e histórias num site ou num blog, então o lucro precisa vir de ganhos indiretos.

Os quadrinhos feitos para a internet geram diversas vantagens para seus autores, mas dificilmente conseguem gerar benefícios financeiros diretos, uma vez que cobranças por conteúdo não costumam ter sucesso. Todos os dias a

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20- Termo atribuído ao quadrinista Will Eisner para designar um “romance gráfico”, normalmente usado para livros de quadrinhos com histórias longas e com o gênero indefinido.

21- Festival Internacional de Quadrinhos, o maior evento de quadrinhos nacional. Informação retirada do site oficial, disponível em: <http://fiqbh.com.br/>. Acesso em 03 jun. 2013..

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web difunde conteúdo para milhões de pessoas e, sempre que alguém tenta cobrar pelo privilégio, seu tráfego despenca, pois a maioria das pessoas jamais pagará pelo conteúdo (McCloud, 2006, p.181).

Ainda segundo McCloud (2006, p. 197), “o destino de editoras individuais dependerá de sua disposição para abraçar este novo mercado sem abandonar o antigo”.

Jenkins (2008, p. 32) acredita que ao contrário do paradigma da revolução digital que presumia que as novas mídias substituiriam as antigas, o paradigma emergente da convergência presume que novas e antigas mídias irão interagir entre si de maneiras complexas.

Enquanto os quadrinhos web desenvolvem seus próprios meios de funcionamento e recompensas e o mercado editorial busca novas alternativas para se manter forte, os dois coexistem sem representar necessariamente uma ameaça um ao outro, mas sim se complementando.

6 Considerações finais

O presente trabalho buscou analisar a internet e aspossibilidades geradas por suas ferramentas com o objetivo de verificar sua eficiência como veículo de publicação e divulgação de quadrinhos e também sua utilidade para os autores e os caminhos que podem ser seguidos a partir de seu uso. A partir disso elevando em conta os dados levantados bem como os depoimentos pessoais de alguns autores, foi possível concluir que a chegada da internet teve um impacto significativo e positivo no processo de produção de quadrinhos no país, facilitando e incentivando toda uma geração de autores e construindo um público novo e maior para esse novo quadrinho.

Foi possível ainda verificar que a internet apresenta algumas desvantagens em relação ao meio impresso, também conhecido como tradicional, que são ofuscadas pelas diversas vantagens oferecidas, estas especialmente relevantes para autores iniciantes ou que passem por algumas dificuldades editoriais.

Avaliou-se que as redes sociais têm papel fundamental no crescimento da geração de quadrinistas surgidos na internet, sendo o veículo inicial e principal de divulgação para muitos autores, sendo uma das principais responsáveis pelo crescimento da produção e do público, levando em conta que, desde seu surgimento, os quadrinhos de internet não sofreram alterações significativas em sua estrutura e linguagem.

O novo cenário dos quadrinhos brasileiros apresenta diferentes segmentos e mentalidades, com caminhos diversos, e observou-se que a internet é uma ferramenta comum em praticamente todas as correntes. Ainda que com finalidades diferentes, a internet e as redes sociais são ferramentas úteis e importantes para os autores e leitores de quadrinhos.

Entre as possibilidades oferecidas, as mais utilizadas são a facilidade de divulgação e o contato direto com o público, servindo aos autores iniciantes como porta de entrada para o cenário, para a divulgação e crescimento de autores de todos os tipos e por autores conhecidos e consagrados como canal de comunicação direta com fãs e leitores.

A internet também se revela uma importante alternativa comercial, apresentando opções de comercialização de material a custos baixos e processos mais simples, gerando maior probabilidade de resultado positivo e menos riscos.

Apesar das vantagens mostradas ao

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longo deste artigo, a internet ainda não é uma etapa obrigatória na publicação de quadrinhos. As publicações impressas, sejam elas independentes ou não, ainda são consideradas – por vários autores – como o melhor caminho a ser trilhado.

A situação do mercado editorial de quadrinhos no país também foi observada, bem como os efeitos da internet sobre esse mercado, avaliando que apesar do crescimento constante do meio web, o meio impresso continua forte e cresce em alguns segmentos,sinalizando que um meio não veio para substituir o outro, mas somar conteúdo e possibilidades. É possível,

dessa maneira, concluir que a internet apresenta-se como um meio eficaz e válido para publicação de quadrinhos, seja como um degrau para se alcançar um patamar mais alto, nesse caso, o meio impresso, seja para alcançar o público através da própria ferramenta, senão como uma alternativa viável ao meio impresso, como forma de complementá-lo, abrindo possibilidades de interação entre os dois e expandindo os horizontes da publicação de quadrinhos nacionais, com maiores oportunidades artísticas e comerciais a serem exploradas.

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Resumo

Artigo [72-84]

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1 Introdução

A leitura pode ser considerada a chave da porta que abre um mundo do

O comportamento de compra e consumo de leitura não acadêmica entre os futuros

profissionais de comunicação

Bruna Michelin Pinto Carlos Marcelo Ardigó

Considerando a importância da leitura para o futuro profissional de Comunicação, o presente estudo teve como objetivo conhecer os hábitos de consumo e leitura não acadêmica presentes entre os alunos de Comunicação Social da Univali – SC, bem como o comportamento de compra destes e as influências recebidas no processo de compra. Para isso realizou-se uma pesquisa quantitativa descritiva, através do procedimento survey, sendo o questionário a ferramenta de coleta de dados primários. A amostra definida foi a não probabilística por conveniência com 143 acadêmicos matriculados em agosto de 2012. Após a análise dos dados obtidos, verificou-se que há limitado interesse na leitura entre os acadêmicos de Comunicação, e que as ações de comunicação de marketing possuem pouco nível de impacto na decisão de compra dos mesmos.

Palavras-chave:Consumo. Modelo de Estímulo e Resposta. Comunicação

de marketing.

Bruna Michelin Pinto Estudante de Graduação do Curso de Publicidade e Propaganda da

Univali.Carlos Marcelo Ardigó

Orientador do trabalho. Doutorando do Programa de Pós Graduação em Engenharia de Produção (PPGEP) da UFSC e professor de Marketing

e Logística da Univali.

conhecimento, mas nem todos têm acesso ou interesse a ela. Os desafios que se apresentam para o Brasil ainda são enormes, retrato da distância entre o número de

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de comportamento do consumidor “o estudo dos processos envolvidos quando indivíduos ou grupos selecionam, compram, usam ou dispõem de produtos, serviços, ideias ou experiências para satisfazer necessidades e desejos”. Kotler e Keller (2006) ampliam o pensamento ao afirmar que o estudo do cliente auxilia na melhora ou no lançamento de produtos e serviços, no planejamento do preço e do canal de distribuição, na elaboração da mensagem, entre outros. Compreender o comportamento do consumidor possibilita aos profissionais de marketing a elaboração de estratégias que satisfaçam as necessidades do seu público.

Justamente são nestes processos de escolha, compra e fatores de influência na aquisição de livros não acadêmicos que se estabelece o presente estudo e dirigem o objetivo geral para a condição de analisar o comportamento de compra de livros não acadêmicos, presentes entre os alunos dos cursos de Comunicação da Univali. Especificamente para atender a este propósito buscou-se descrever o perfil de leitura e compra de livros entre os acadêmicos; identificar os fatores de influência externa e características psicológicas, culturais, sociais e pessoais dos acadêmicos; e descrever ações do processo de decisão de compra.

Para a coleta de dados, delimitou-se o universo de 175 acadêmicos dos cursos de graduação em Comunicação Social, habilitação em Publicidade e Propaganda, Jornalismo e Relações Públicas da Universidade do Vale do Itajaí – SC (UNIVALI), do campus localizado na cidade de Itajaí, os quais cursam o período noturno no segundo semestre de 2012. Considera-se essa pesquisa como quantitativa descritiva e para a coleta de dados o instrumento adotado foi o

livros lidos per capita no País e os lidos por portugueses e espanhóis, por exemplo, que chega a ser mais que o dobro. Essa situação também é refletida nos resultados da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, realizada pelo Instituto Pró-Livro (2012), que demonstra redução no hábito de leitura dos brasileiros considerados leitores, passando de 95,6 milhões para 88,2 milhões comparados os anos 2007 e 2011. Leitores, segundo o estudo, são aqueles que leram ao menos um livro nos últimos três meses da data anterior à pesquisa. De acordo com o estudo, um dos motivos para essa redução deve-se ao fato de as crianças não terem os exemplos de pais leitores e verem os livros como uma obrigação escolar e, não como uma atividade prazerosa, já que o hábito de leitura caiu da quarta para a sétima posição no ranking de hobbies do brasileiro nos últimos quatro anos.

A leitura pode ser realizada por diferentes plataformas, e o acesso pode ser por meio da aquisição ou empréstimos em distintas fontes. A compra, portanto, é uma delas. Esse, inclusive, foi o principal elemento de interesse deste estudo, e que levou a definição do propósito do mesmo. Contudo, é nítida a dificuldade de separar a compra do ato da leitura, o que faz com que esses comportamentos muitas vezes estejam correlacionados, portanto, são aqui analisados conjuntamente.

O estudo do comportamento do consumidor já é foco de estudos há cerca de 160 anos e diversas teorias que tentam explicar as relações de troca já foram lançadas. De forma contemporânea, Engel et al. (2005), Sheth, Mittal e Newman (2008), Solomon (2002), Kotler e Keller (2006), Limeira (2008) e Karsaklian (2004), (as duas últimas no contexto brasileiro), têm se dedicado ao tema. Solomon (2002, p.24) estabelece como conceito

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questionário. A realização deste estudo encontrou

justificativa na contribuição ao tema “comportamento do consumidor”, bem como no âmbito acadêmico de forma a investigar a qualidade do hábito de leitura dos mesmos, dado de suma importância para a área, servindo como possível direcionador a políticas pedagógicas, já que nos cursos de comunicação as interações aos diversos temas de leitura são um elemento enriquecedor da cultura e da formação do profissional da área.

A organização deste artigo encontra-se estruturada inicialmente com a apresentação desta introdução; seguida pela breve discussão do tema “comportamento do consumidor”, refletindo a área de conhecimento, os fatores de influência e o processo de decisão de compra. Posteriormente apresentam-se o delineamento metodológico, os resultados do estudo e, por último, as considerações

finais.

2 Necessidades, motivações e estímulos

Para entender o comportamento do consumidor é necessário, antes, compreender o conceito de consumidor. O conceito apresentado por Karsaklian (2004) é direto: ser consumidor é ser vivo. Para Limeira (2008, p.7), consumidor também pode ser chamado de cliente e possui a seguinte definição: “conjunto de indivíduos, grupos ou organizações que desempenham diferentes papéis ao longo do processo de compra e uso de produtos e serviços”. Assim, o consumo faz parte da natureza humana, e compreender como o indivíduo age nesse processo torna-se necessário para uma ação mais efetiva por parte das organizações.

A compreensão inicial para entender o comportamento do consumidor parte,

Figura 1: Modelo do comportamento do consumidor

Fonte: Kotler e Keller (2006, p.183).

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segundo Kotler e Keller (2006), do modelo de estímulo e resposta apresentado na Figura 1, que procura explicar e organizar o comportamento do consumidor e o processo de decisão, diante de diferentes fatores de influência. Parte-se do princípio que o indivíduo, dotado dos elementos psicológicos, junto a certas características pessoais, sociais e culturais, está sujeito a diferentes estímulos ambientais e de marketing, que o levará ao processo de decisão de compra, ou seja, dará uma resposta a essas combinações. O profissional de marketing deve perceber o que ocorre no consciente do consumidor quando ele recebe o estímulo externo e decide a compra. A partir disso pode também concluir diferentes formas de provocar esses estímulos.

Diante do fato que o estudo do comportamento do consumidor requer uma compreensão do comportamento humano em geral, os pesquisadores da área se apoiam na psicologia e na sociologia, fato que leva à análise das influências sobre o comportamento de compra.

3 Os fatores de influência pessoais, interpessoais e externos

Em todas as questões na qual é preciso fazer uma escolha o indivíduo sofre influências, seja pelas pessoas que estão ao seu redor, seja pela bagagem que adquire ao longo da vida. Sendo assim analisam-se as influências pessoais, interpessoais e externas no comportamento do consumidor. Para Kotler e Keller (2006), o comportamento de compra do consumidor é influenciado por quatro fatores inerentes ao mesmo, descritos como: psicológicos (motivação, percepção, aprendizagem, memória, crenças e atitudes); pessoais (idade, estágio no ciclo de vida, ocupação,

circunstâncias econômicas, estilo de vida, valores, personalidade e autoimagem); sociais (grupos de referência, família, papéis e status); e culturais (cultura, subcultura e classe social).

Os fatores psicológicos influenciam na maneira como os consumidores percebem e interagem com o ambiente; dentre deles está a motivação, estabelecida à medida que “uma necessidade passa a ser um motivo quando alcança determinado nível de intensidade” (KOTLER; KELLER, 2006, p.183). Dentre os fatores psicológicos está a aprendizagem, que é a mudança no comportamento do consumidor de acordo com suas experiências, podendo ser imediata ou esperada. Além desse, inclui-se nos fatores psicológicos a percepção, descrita por Boone e Kurtz (1998) como o processo pelo qual as sensações são selecionadas, organizadas e interpretadas sobre as informações recebidas, criando uma imagem significativa do meio.

Entre os fatores pessoais, há os valores, que “representam as crenças dos consumidores sobre a vida e os comportamentos aceitáveis” (ENGEL et al., 2005, p.223). Há também as influências recebidas em ambiente familiar e social, a partir das quais as pessoas formam sua personalidade. Karsaklian (2004, p.39) define personalidade como “a referência a um atributo ou característica da pessoa que causa alguma impressão nos outros”.

Entre os culturais, a cultura é a que oferece maior influência no comportamento no consumidor e compreende, segundo Sheth, Mittal e Newman (2008, p.151), “tudo o que a pessoa aprende e compartilha com membros de uma sociedade, inclusive ideias, normas, moral, valores, conhecimentos, habilidades, tecnologia, ferramentas, objetos materiais e comportamentos”. Outra determinante

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são as influências sociais, a qual pertence os grupos de referência. Para os autores (p. 165) grupo pode ser definido como duas ou mais pessoas que compartilham de um interesse comum, e que podem se destacar com referência. O primeiro grupo de referência que uma criança participa é a sua família, que a orienta sobre religião, política, noção de ambição pessoal entre outros, exercendo influência direta em suas atitudes e comportamento.

Todas essas experiências vividas e informações acumuladas pelas pessoas ao longo da vida podem ficar armazenadas em sua memória de longo prazo, essa definida por Limeira (2008, p.109), como “uma série de nós (representando conceitos) e ligações (que representam as associações sobre os conceitos). Quando combinados, têm-se unidades de conhecimento mais complexas”.

Além dos fatores internos, que são intrínsecos, os consumidores sofrem influência dos fatores externos, que são forças globais e incontroláveis e alteram as necessidades e desejos dos mesmos. Kotler e Keller (2006) ressaltam a importância de monitorar seis forças: a sociocultural, a econômica, a tecnológica, a político-legal, a natural e a demográfica. A variável sociocultural representa os valores e as crenças que moldam a sociedade. Os principais valores culturais das pessoas são vistos em seu estilo de vida e a concepção que elas têm da sociedade, delas mesmo e do ambiente. Já a variável econômica diz respeito ao poder de compra dos consumidores e isso depende de tendências como inflação, disponibilidade de crédito, dentre outros. Outra força é a tecnológica, pois o avanço tecnológico permite aos consumidores mais controle sobre a informação, novas gerações de produtos e automação e transições para o cliente ter

acesso a alguns produtos personalizados (SHETH; MITTAL; NEWMAN, 2008). A força político-legal, quarta força, é aquela em que “os profissionais devem trabalhar respeitando as muitas leis que regulamentam as práticas de negócio e em harmonia com os vários grupos de interesses sociais” (KOTLER; KELLER, 2006, p.93). Há também a variável natural, composta dos recursos naturais que influenciam diretamente no ramo da empresa, como escassez de matéria-prima, aumento da poluição, etc. Por fim, no ambiente demográfico obtém-se indicadores confiáveis em curto e médio prazo e analisa-se, dentre outras, as questões do crescimento populacional, distribuição da faixa etária e composição étnica, etc. Sujeito a essas movimentações, o consumidor pode alterar consciente ou inconscientemente seu comportamento de consumo.

Sendo influenciado pelas características que moldam a pessoa, e também por forças externas e incontroláveis, o consumidor tomará suas decisões de compra. Tendo conhecimento da forma que cada fator atinge o consumidor, é possível direcionar o marketing para que atinja de maneira mais efetiva o público. Isso é o que as empresas fazem na medida em que direcionam seus esforços ao composto de marketing e influenciando a percepção e a escolha do consumidor (KOTLER; KELLER, 2006; SOLOMON, 2002).

4 Fases do processo de compra

Os modelos de processo de compra têm o intuito de explicar quais as fases que ocorrem no momento que se vai adquirir um produto/serviço. O processo se inicia com reconhecimento do problema ou necessidade. Segundo Sheth,

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Mittal e Newman (2008), o problema do consumidor é um estado de privação, físico ou emocional e o seu reconhecimento é o momento que ele nota que precisa comprar algo para voltar a seu estado normal. Para reconhecê-lo a pessoa sofre estímulos, sendo os internos as percepções de desconforto e os externos as informações que o mercado utiliza para que o cliente o perceba.

O segundo estágio é a busca por informações, classificadas em: atenção elevada, que é quando a pessoa busca informações em nível moderado; e a outra, quando buscam ativamente informações em literaturas, opinião de amigos, pesquisas na internet e visitas às lojas. A quantidade de informação buscada varia de acordo com o tipo de produto ou serviço e também conforme as características do comprador (KOTLER; KELLER, 2006). A decisão de compra resulta da avaliação das alternativas encontradas na busca por informações novas, que comparadas às que já estão armazenadas na memória, induzirão à escolha do produto pretendido (ENGEL et al., 2005). O estágio seguinte é a compra propriamente dita, que na visão de Limeira (2008), implica na escolha de onde, quanto e quando comprar, ou seja, é a tomada de decisão. Depois de realizada a compra, o consumo pode ser de imediato ou não, conforme a sua categoria.

A avaliação pós-compra transcorre em níveis de satisfação, pois essa deriva da proximidade entre suas expectativas e o desempenho percebido do produto. O último estágio do processo é o descarte, no qual o consumidor dispensa o produto comprado, seja trocando-o, revendendo-o ou descartando-o totalmente (ENGEL et al. 2005). A partir do momento que o consumidor se movimenta por esses estágios, os profissionais de marketing

podem observar qual o melhor momento para influenciar e reagir com estratégias que afetam diretamente cada uma das etapas. Para a realização do presente estudo utilizou-se de processos metodológicos detalhados na sequência.

5 Metodologia

A presente etapa aborda os procedimentos necessários que estruturaram a fase de busca de dados empíricos pertinentes à pesquisa. Primeiramente quanto à natureza dos dados, o estudo é classificado como quantitativo. Essa escolha reflete os tipos de dados obtidos, passíveis de quantificação e análise estatística. Sua aplicação no contexto do estudo do comportamento do consumidor, segundo Karsaklian (2004, p.20) é útil, já que “visam à compreensão de tais comportamentos a fim de contribuir de maneira eficaz com as decisões estratégicas empresarias”.

Quanto aos objetivos a pesquisa assume a característica descritiva, pois busca determinar percepções e critérios sobre os hábitos de leitura e compra. Malhotra (2006, p.102) a conceitua como “um tipo de pesquisa conclusiva que tem como principal objetivo a descrição de algo – normalmente características ou funções do mercado”. Sendo assim, essa pesquisa estimou o comportamento de compra de livros não didáticos da população de acadêmicos de Comunicação Social da Univali, apresentando características sobre o hábito de leitura e associações feitas entre as variáveis pertinentes às descrições da amostra. Por fim, seu procedimento é o levantamento, ou survey, que de acordo com Gil (2002) aplica-se em estudos do comportamento do consumidor, já que levanta opiniões e atitudes.

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Para a coleta de dados, delimitou-se o universo dos acadêmicos dos cursos de graduação em Comunicação Social, habilitação em Publicidade e Propaganda, Jornalismo e Relações Públicas da Universidade do Vale do Itajaí – SC (UNIVALI), do campus localizado na cidade de Itajaí, matrículados no período noturno no semestre II/2012. O estudo não considerou os acadêmicos do período matutino pelo fato de apenas o curso de Publicidade e Propaganda ter acadêmicos matriculados nesse período.

Do total da população, 474 acadêmicos, a pesquisa foi realizada com uma amostra não probabilística por conveniência com os 143 acadêmicos entrevistados. Essa técnica de amostragem consiste em o pesquisador escolher de acordo com seus próprios critérios quais unidades entrevistar (MALHOTRA, 2006). Justifica-se essa técnica pela facilidade de alcance à esses acadêmicos no local em que a pesquisa foi aplicada. O tamanho da amostra representa 30% em relação ao total de matriculados.

Para a coleta de dados primários foi utilizado o instrumento questionário, sendo utilizadas perguntas da pesquisa “Retratos da Leitura no Brasil” (2011) como referência para sua construção. Após seu desenvolvimento, na fase de pré-testagem foram aplicados onze questionários para a identificação de problemas potenciais no instrumento de coleta (MATTAR, 2006). Após ajustes mínimos foi reaplicado a esses e aplicado aos demais integrantes da amostra. Para a análise utilizou-se a estatística descritiva por distribuição de frequência e tabulação cruzada, bem como medidas de tendência central por meio da média (AAKER; KUMAR; DAY, 2004, p. 449).

6 Resultados do estudo

Considerando o indivíduo como um ser consumidor (KARSAKLIAN, 2004), nas suas várias fases de seu ciclo de vida, diferentes produtos e serviços são considerados para satisfazer suas necessidades e desejos. O livro e o hábito da leitura certamente permeiam essas diferentes fases, contudo, é de se esperar que o momento em que o mesmo passa por um processo de formação acadêmica, a leitura e a compra de livros possam estar presentes em maior intensidade.

Na Tabela 1 é apresentado sinteticamente o perfil do hábito de leitura do grupo estudado. Destaca-se que os respondentes poderiam citar mais de uma opção nas questões feitas, o que fez com que os resultados em alguns casos superassem os 100%. A média de livros lidos nos últimos seis meses entre os acadêmicos é 3,3. Biografia e históricos estão entre os gêneros mais lidos, seguido de romance e poesia, e a casa é o local de preferência para realização a leitura. A maioria declararou ler menos quando comparado ao que já leu no passado. A compra é o principal acesso aos livros e além desses, revistas e textos na internet são os principais materiais lidos.

Para compreender esse resultado, analisou-se no grupo as diferentes fases do

processo de compra, incluindo os estímulos e o complexo sistema de fatores internos

Tabela 1: Perfil do hábito de leitura da amostra

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que podem influenciar este comportamento. Na sequência os resultados são organizados seguindo o modelo de estímulo e resposta apresentado por Kotler e Keller (2006).

Inicialmente, considerando as forças macroambientais, a econômica e os fatores que afetam a renda e o poder de compra dos consumidores são determinantes (KOTLER; KELLER, 2006). Sendo assim, observou-se que entre o grupo entrevistado, a renda familiar mensal média é superior à R$ 3.589,00, condição que pode elevar a capacidade de compra para além do essencial, inclusive investindo em cultura e lazer.

Analisando os avanços tecnológicos no campo do comércio de livros, observa-se que a internet é um canal de vendas importante, ampliando o acesso aos livros. Isso se confirma já que a mesma apresenta-se como o segundo canal mais utilizado pelos acadêmicos, citado por 47% do total de respondentes. Quanto ao e-book, boa parte dos entrevistados já teve acesso, sendo que 45,5% dos acadêmicos já leram no computador. Os que não tiveram acesso a ele representam 35% do total de respostas. Ainda, observa-se que o grupo de idade entre 15 e 19 anos que nunca tiveram acesso a essa plataforma de leitura representam 49% do total de respostas, porcetangem considerável vista a idade relativamente jovem dos entrevistados. A internet também é relevante à medida que 78% dos acadêmicos declaram ler com frequência textos por meio dela e 54,5% a utilizam como atividade de lazer. Esses resultados demonstram que tanto no e-commerce quanto nos e-books, os resposdentes estão significativamete sujeitos às influências dessas tecnologias. Além disso, a conexão em rede possibilitou o surgimento das mídias sociais, ambiente utilizado ocasionalmente (3,1 de média, em

uma escala de cinco pontos) para a busca por informações sobre livros.

Esses progressos no ambiente tecnológico possibilitaram, portanto, o avanço das editoras em termos de desenvolvimento de produtos, de redução de preços, ampliação dos canais de vendas e de comunicação, ou seja, suas estratégias do composto mercadológico1 assumiram consistentemente esse meio. Porém, destaca-se que as ações de comunicação desenvolvidas por editoras e livrarias, como publicidade e anúncios, segundo a pesquisa, exercem influência de pouco ou baixo impacto na decisão da compra de livro. Dentre outras ações mensuradas no estudo estão a participação em promoções para ganhar livros, participação em eventos de lançamentos e feiras, recebimento de e-mail marketing com indicações de livros, divulgação em mídias massivas e ações de relançamentos de livros após terem sido adaptados ao cinema. Observou-se que em praticamente todas, a situação é de baixa incidência de influência no interesse dos acadêmicos relativas à compra de livros. Na distribuição, a livraria é o local de preferência para a compra entre o total de entrevistados com 74% das respostas.

O consumidor é dotado de diferentes características psicológicas que o tornam um ser único e podem diferir dependendo do que está comprando e do momento que está vivendo. A leitura, a qual pode originar a compra de livros entre os acadêmicos, apesar de parecer o contrário, não é considerada uma atividade essencial como forma de lazer, já que a mesma ocupa apenas

1- O composto mercadológico são as ferramentas utilizadas pelos gestores de marketing com a intenção de satisfazer as necessidades e desejos dos consumidores além de auxiliar a empresa a atingir seus objetivos planejados (KOTLER; KELLER, 2006).

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a quinta posição entre as atividades no total dos acadêmicos pesquisados. As atividades que se destacam como prioritárias são navegar na internet (54,5%) e ficar com os amigos e família (52%).

Entre os aspectos sociais identificados que influenciam nesse hábito e que pode também levar ao consumo (compra), está a influência dos grupos de referência familiar, ou seja, os pais, sendo esses os principais indicados pelos acadêmicos com 38,5% do total de respostas. É no seio familiar que muitos dos comportamentos são assimilados e aprendidos, relacionando-se inclusive com o aspecto psicológico de aprendizagem (SHETH; MITTAL; NEWMAN, 2008). É importante também observar que muitos dos alunos entrevistados mencionaram que o hábito da leitura surgiu deles próprios (31%), e que amigos e professores pouco os influenciaram. Essa característica está inclusa nas influências socioculturais, indicativa aos grupos de referência. Esses também podem ser grupos indiretos, como é o caso das ocorridas em dicas e críticas em revistas expostas por especialistas, que se mostrou como de expressividade média (2,96 pontos de média).

Entre os fatores psicológicos há a motivação, na qual se identifica pela compra de livros não didáticos a necessidade de uma atividade de lazer e distração. Cita-se ainda nesses fatores a percepção pelo fato de que as pessoas escolhem o que querem ouvir, podendo assim não ser atingidas com as mensagens que a empresa quer passar. Entre a variável cultura, a classe social é uma das determinantes e é identificada entre os entrevistados como renda, ocupação e grau de instrução (KOTLER; KELLER, 2006). No grau de instrução familiar, mais de 80% possuem pais com ensino médio completo.

Nas características pessoais observou-

se a predominância de mulheres. A média de idade presente entre os acadêmicos é 22 anos, sendo que 61,5% estudam e trabalham, e 17% estudam e fazem estágio, ou seja, 78,5% do total de entrevistados desenvolvem alguma atividade além do curso.

Reunindo-se os fatores externos e as características dos consumidores, esses dependendo do tipo de compra poderão passar por cinco diferentes fases chaves no processo de decisão de compra: o reconhecimento do problema, a busca de informações, a avaliação, a compra e o pós-compra (SHETH; MITTAL; NEWMAN, 2008; KOTLER; KELLER, 2006; LIMEIRA, 2008). O reconhecimento do problema é algo que ocorre tanto influenciado por fatores externos (marketing, macroambiente, outras pessoas) quanto do próprio consumidor. No estudo, isso estava presente em vários fatores já destacados e podem ter sido motivadores que levaram o consumidor à ação para atender as suas necessidades.

Quanto à fase da busca por informações, oriundas da fonte pessoal (KOTLER; KELLER, 2006), está a influência das dicas de outras pessoas sendo a terceira mais citada para a escolha do livro no total de entrevistados, com 34%. Entre as fontes comerciais, a indicação do vendedor é pouco relevante, representando apenas 23% das respostas. Entre as avaliações das alternativas, incluindo a escolha do local de compra, os principais motivos levados em consideração são o preço mais barato (49%) e comodidade/variedade (47%).

Na decisão de compra os fatores que mais influenciam na escolha do produto (livro) são tema e autor, com 66% e 42% do total de respostas respectivamente. Entre a escolha do revendedor os motivos que fazem os entrevistados decidir

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onde comprar é a disponibilidade dos lançamentos (45%), seguido pela exposição do livro na vitrine (37%) e as promoções (31%).

Já na fase do comportamento pós-compra, 75% dos acadêmicos entrevistados costumam guardar seus livros. Há também situações em que emprestam seus livros, já que 47% do total afirmaram fazer isso esporadicamente. Outro tipo de comportamento presente é a dica sobre os livros aos amigos, referente às leituras que fizeram ou estão fazendo.

Recuperando o modelo de estímulo e resposta mencionado por Kotler e Keller (2006), e inferindo neste os resultados do estudo discutidos até aqui concernentes aos estímulos externos, às características e ao processo de decisão de compra, na Figura 2 é proposto de forma sintética uma configuração do modelo que relaciona

o comportamento dos acadêmicos dos cursos de comunicação da Univali. Importante destacar que essa análise está sendo desenvolvida na perspectiva do consumidor, incluindo elementos externos do macroambiente e do mix de marketing das empresas, os quais não estão sob seu controle, e que potencialmente podem influenciá-lo.

7 CONSIDERAÇÕES FINAISVisto a necessidade de discorrer

sobre o hábito de leitura ao estudar o comportamento de compra de livros não didáticos e considerando a importância desse hábito específico aos estudantes de Comunicação Social, foi possível identificar entre a a amostra estudada quais são os hábitos de leitura e consumo e quais as influências externas recebidas no processo de decisão. Primeiramente ao perfil do

Figura 2: Modelo de estímulo e resposta conforme estudo realizado entre acadêmicos

Fonte: Dados da Pesquisa.

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hábito de leitura, os acadêmicos declararam ler a mesma quantidade do que no passado, e a casa é o lugar de preferência para se realizar predominantemente a leitura de gêneros como biografias/históricos.

Notou-se que a compra é a principal forma de acesso aos livros não didáticos e no que competem às influências nas diferentes fases de compras, os fatores mais expressivos na escolha do livro são o tema, o autor e as dicas de outras pessoas, tendo sido pouco citada a influência da publicidade/anúncio. No perfil de compra, identificou-se que o preço mais barato, seguido da comodidade/variedade, são os principais decisores para a escolha do local. Os lançamentos também são predominantes na escolha da loja física, sendo a livraria o principal local de compra. Pelo fato da internet ter sido elencada em segundo lugar no local de compra e pelos acadêmicos optarem por lugares onde o preço seja mais em conta, infere-se que os mesmos talvez prefiram a internet por essa facilitar a busca e comparação de preços. Em relação ao pós-consumo, os acadêmicos costumam guardar o livro após a leitura. Deduz-se por esses dados, que a busca por novidades e com preço acessível em livrarias com diversidade de títulos conduz a compra no ambiente físico. A qualidade na mercadoria, no atendimento, o preço praticado, a atmosfera, a publicidade e também as promoções são perceptíveis na escolha da loja.

Ao analisar a influência da comunicação de marketing exercida sobre esses consumidores, observou-se que entre as ações mensuradas, a participação em feiras de livros, a divulgação de livros em mídias massivas e eventos de lançamentos, são as que menos influenciam na decisão de compra. A participação em promoções para ganhar livros, ações de relançamento

de livros após esses terem ganhado versão cinematográfica e o recebimento de e-mail marketing com indicação acontecem raramente, tendo pouco efeito entre os acadêmicos. A busca por dicas e críticas em redes sociais ou revistas são as que aparecem como maiores influenciadoras.

Constatou-se que as estratégias de marketing mensuradas no presente trabalho, incluindo as de comunicação, não atingem eficazmente o público estudado. Além disso, aparentemente supõe-se que as ações de marketing são direcionadas para a divulgação e venda de produtos, e pouco para expandir o público leitor e comprador, principalmente entre aqueles que não demonstram pré-disposição à procura desse produto, ampliando assim a base do mercado consumidor. Acredita-se que as estratégias de marketing devem explorar todos os canais de acesso a esses últimos, inserir o produto em situações inusitadas convidando-as a conhecerem mais sobre esse, possibilitando o acesso aos livros de forma interativa. Estimular os acadêmicos que por diversos motivos se mostram resistentes é a alternativa, pois a inovação estimula a mudança e a demanda por novos produtos. Pelo fato da publicidade e de anúncios terem influência pouco considerável comparado às dicas de outras pessoas conhecidas, mostra-se interessante o uso de estratégias nas mídias sociais, por essas terem se apresentado com forte presença na vida dos entrevistados. Essas devem estimular e incentivar o compartilhamento de ações relativas à compra de livros por aqueles que têm interesse e já buscam por isso, mas também devem ser direcionadas para aqueles que não se mostram predispostos à compra de livros, procurando evidenciar fatores de estímulo ao próprio hábito. Além disso, no ambiente acadêmico, inclusive,

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a leitura genérica aparentemente tem sido pouco estimulada pelos docentes. A cultura e a capacidade profissional devem ser ampliadas para além do texto acadêmico.

Considerado, portanto, o propósito do estudo, conclui-se que a leitura e o comportamento de compra de livros não acadêmicos presentes entre os alunos dos cursos de Publicidade e Propaganda, Jornalismo e Relações Públicas da Univali, de mogo geral demostra limitado interesse.

Apesar dos resultados não possibilitarem diretamente uma conclusão nesta linha de raciocínio, infere-se a isso o fato de mais da metade dos acadêmicos estarem concomitantemente trabalhando, implicando em menos tempo para a leitura

como prazer. Ao descrever as limitações desta pesquisa, considera-se fato do instrumento de coleta ter sido aplicado no período de aula, levando-se em conta a distração por parte dos entrevistados ao responderem o mesmo, e a ausência de alguns alunos no dia da aplicação.

Como sugestão para futuras pesquisas, aconselha-se ampliar a população da pesquisa, com a intenção de fazer um comparativo entre outros centros acadêmicos da Univali, bem como de outros cursos e instituições de ensino. Sugere-se também, pesquisar qual a relação entre os acadêmicos e a Livraria Universitária, tipo de literatura vendida, quais os títulos mais procurados, editoras parceiras, entre outros.

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