UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
Faculdade de Direito
Direito Público das Relações Internacionais
Professor Evandro de Carvalho
Monitor Pedro Sloboda
Direito Internacional Público
Niterói
2012
Sumário
1. Direito e Poder ...................................................................................................................... 3
2. Sujeitos de Direito Internacional Público ............................................................................... 5
3. Fontes de Direito Internacional Público ............................................................................... 13
4 Solução pacífica de controvérsias internacionais .................................................................. 19
5 Direito diplomático .............................................................................................................. 21
6 Direito da Integração ........................................................................................................... 24
7 Recomendações de leitura ................................................................................................... 30
1. Direito e Poder
Direito Internacional Público e Relações Internacionais: Direito Público das
Relações Internacionais.
A ciência do Direito é indissociável da ciência política. As leis são elaboradas e
aplicadas por Poderes da República. Não é possível entender a seletividade do Direito
sem compreender as lógicas sociais de poder. O mesmo se aplica ao direito
internacional. No âmbito externo, direito e poder influenciam-se mutuamente; ambos
regem o comportamento dos Estados. A ciência das Relações Internacionais tem por
objeto de estudo o poder; sendo, portanto, complementar ao estudo de Direito
Internacional Público.
As Relações Internacionais, enquanto disciplina acadêmica, surgiram após o
final da Primeira Guerra Mundial, em países anglo-saxões. Seu principal tema de
análise era a segurança. Até hoje, teóricos da disciplina foram responsáveis por 4
grandes debates acadêmicos:
1) Realismo Vs idealismo – Esta corrente, influenciada por Kant,
acreditava na cooperação entre Estados (Angell, Wilson); aquela, influenciada
por Maquiavel e Hobbes, apenas na anarquia internacional, que exigiria dos
Estados preocupação máxima com sua sobrevivência, podendo contar apenas
consigo mesmos (Morgenthau, Carr, Aron).
2) Tradicionalismo Vs cientificismo – Debate metodológico. A
primeira corrente preza pela análise histórica, a segunda pelos métodos
científicos incorporados às ciências sociais pelo behaviorismo.
3) Debate Interparadigmático – Neorrealismo de Waltz, que preza
pela interpretação sistêmica das lógicas de poder internacional; Vs
Neoliberalismo (Pluralismo) de Keohane e Nye, que conferem menos
importância ao tema segurança, asseverando existir pluralidade de temas (meio
ambiente, direitos humanos) e de atores (Estados, organizações internacionais,
indivíduo) no âmbito internacional; Vs Globalismo marxista, que inclui o
sistema-mundo de Wallerstein, a teoria da dependência de Fernando Henrique e
as teses da CEPAL.
4) Positivimo (racionalismo) Vs Pós- positivismo (Reflexivismo) –
Esta corrente comporta o construtivismo de Wendt, a Teoria crítica de Robert
Cox, e o pós-modernismo de Walker. Em comum, todos afirmam não existir
uma única verdade internacional objetiva a ser apreendida, senão diferentes
interpretações de uma mesma realidade.
Paralelamente ao segundo debate, importantes autores desenvolveram trabalhos
de tradição grociana1, compondo o que ficou conhecido como Escola inglesa de
Relações Internacionais, ou realismo racionalista. O principal expoente dessa escola é
Hedley Bull. Em sua principal obra, A Sociedade Anárquica, reconhece a existência de
uma sociedade internacional, formada por Estados que compartilham valores e
interesses comuns, e consideram-se ligados por um conjunto de regras comuns a serem
respeitadas; há, portanto, organização. Para o autor, o Direito Internacional é uma das
instituições fundamentais da sociedade de Estados, vez que garante os três interesses
básicos de todo Estado: segurança, propriedade e cumprimento dos acordos.
O título da obra pode parecer contraditório; afinal, se existe uma sociedade
organizada, regida por sistema de normas comuns, como pode ela ser anárquica? O
termo anarquia deve aqui ser compreendido como simples ausência de superestado. A
anarquia é elemento muito caro aos teóricos das Relações Internacionais, mas não deve
ser interpretado em seu sentido hobbesiano. Há sim uma ordem internacional regida
pelo direito. Talvez a expressão mais feliz seja a de Celso Mello, quando afirma que a
sociedade internacional é institucionalmente imperfeita. Existe organização; existem
órgãos judiciários, “legislativos” e executivos internacionais, mas, em comparação com
a estrutura de um Estado, são descentralizados e imperfeitos. Anarquia significa isto:
não há um poder supranacional universal a reger o comportamento dos Estados. Estes
são soberanos.
Todos os teóricos das Relações Internacionais prestam homenagem ao Direito
Internacional, como fazemos agora a eles. Os dois campos do saber são
complementares. Não é possível compreender o comportamento dos Estados, sem estar
atento às lógicas de poder que os movem, e ao quadro jurídico internacional que os
guia. Não se trata de conferir mais importância ao poder ou ao direito, trata-se apenas de
opção por objetos de estudo. Aqui nos dispomos a abordar a ciência jurídica,
salientando que a sociedade internacional é mais complexa do que possa pretender o
Direito.
Os termos Direito das Relações Internacionais e Direito Internacional Público
são tratados como sinônimos ao longo do texto.
1 O holandês Hugo Grócio, que viveu no século XVII, é considerado um dos fundadores do Direito
Internacional.
2. Sujeitos de Direito Internacional Público
Sujeito de direito internacional público é toda entidade jurídica que goza de
direito e deveres no âmbito internacional, com capacidade para exercê-los. Encaixam-se
nessa definição:
1) Estado;
2) Organizações internacionais (de caráter intergovernamental);
3) Homem;
4) Santa Sé;
5) Comitê Internacional da Cruz Vermelha.
Estados
Estado é poder soberano constituído sobre população e território. São esses os
três elementos que caracterizam o Estado. A soberania inclui os aspectos interno –
monopólio da força - e externo – capacidade de se relacionar com outros Estados. A
Corte Internacional de Justiça assevera em parecer consultivo de 1949 que:
“os sujeitos de direito, em determinado sistema jurídico não são
necessariamente idênticos, quanto à sua natureza ou à extensão
de seus direitos.”2
O Estado é o sujeito de Direito Internacional Público por excelência. Embora os
cinco entes supracitados sejam reconhecidos como sujeitos, existe diferença qualitativa
e quantitativa na personalidade jurídica gozada por eles. Os Estados são os únicos
sujeitos de DIP soberanos. Jean Bodin desenvolveu concepção de soberania estatal
outrora aceita pela sociedade internacional, segundo o qual a soberania estatal seria una,
indivisível, absoluta, imutável, eterna, infinita. Hodiernamente, a soberania é concebida
dentro de determinados limites. Os Estados possuem responsabilidades internacionais,
não gozam de imunidade jurisdicional absoluta no interior de outros Estados e estão
ainda sujeitos a normas imperativas de Direito Internacional, as quais devem respeitar
independentemente de manifestação de consentimento.
2 Corte Internacional de Justiça, parecer consultivo de 11 de março de 1949 sobre reparações por danos
sofridos a serviço das Nações Unidas.
Reconhecimento de Estado
Ato unilateral, irrevogável, discriminatório e retroativo mediante o qual um
Estado soberano reconhece outro como seu par. O reconhecimento pode ser tácito ou
expresso. Este consubstancia-se em tratado, em nota diplomática, em declaração de
ministro de Estado, ou em qualquer outro meio que o exteriorize. O reconhecimento
será tácito quando um Estado tratar outro como seu semelhante. Tratado celebrado entre
Brasil e Portugal, em 1825, expressamente reconhecia o primeiro como Estado; de toda
forma, caso não o fizesse, o reconhecimento da independência brasileira dar-se-ia
tacitamente, pelo fato de Portugal celebrar tratado com o país.
Parte da doutrina entende ser constitutivo o reconhecimento de Estado. Assim,
um Estado somente seria considerado como tal, uma vez que reconhecido pela
sociedade internacional. Outros doutrinadores entendem que o ato é meramente
declaratório: a existência política de um Estado independe do seu reconhecimento. Na
prática, ambas as doutrinas aplicam-se parcialmente, com prevalência desta. Entidades
como a Palestina e Kosovo são reconhecidas como Estados apenas por parte da
sociedade internacional. Pode-se dizer que, para o Brasil, o primeiro é um Estado, o
segundo não; para os Estado Unidos, ao contrário, Kosovo é Estado, a Palestina não.
O Brasil adquiriu personalidade jurídica internacional em 1815, quando deixou
de ser colônia, com a criação do Reino Unido de Brasil, Portugal e Algarves. O
primeiro Estado a nos reconhecer como tal foi os Estados Unidos, em 1824. Em 1825,
Portugal nos reconheceria, por meio de tratado de concessão de soberania do Rei D.
João VI a seu filho, já coroado Imperador do Brasil, com o título de D. Pedro I; em
seguida, as principais potências da época, Inglaterra (1825), França (1825), Áustria
(1825) e Rússia (1927) reconheceriam a independência do novo Estado.
Reconhecimento de governo
Trata-se de reconhecimento de novo governo, após mudança institucional, o que
não afeta o reconhecimento de Estado. A mudança institucional de governos, como a
eleição de novo presidente da República, não suscita maiores problemas; as relações
diplomáticas com os demais Estados não são afetadas. A situação é outra quando há
revolução e ruptura da ordem constitucional. Em 2011, a Líbia passou por guerra civil
que culminou com o assassinato do então presidente Muamar al Kadafi, e com a
assunção de grupo rebelde ao poder. O reconhecimento desse novo governo foi feito de
maneira expressa por países como Estados Unidos e França, em conferência com esse
objetivo. O reconhecimento brasileiro do governo da Junta de Transição foi tácita3:
quando da votação na Assembleia Geral da ONU acerca da aceitação das credenciais do
representante do governo rebelde, o Brasil pronunciou-se a favor.
Como o reconhecimento de Estado, é ato unilateral, irrevogável, discriminatório
e retroativo. Requisitos: efetividade do governo (mais importante); cumprimento das
obrigações internacionais (por força do princípio da continuidade do Estado);
legitimidade. Quanto este último requisito, é importante mencionar duas doutrinas, a
Estrada e a Tobar. De acordo com a primeira, reconhecimento de governo significa
ingerência em assuntos internos; não cabe aos Estados deliberar sobre a legitimidade de
um governo. Nos termos da doutrina Tobar, por outro lado, os Estados não deveriam
reconhecer governos ilegítimos, o que implica em juízo de valor acerca dos dirigentes
de determinado país. Hodiernamente, prevalece a doutrina Estrada, a legitimidade de
um governo é concebida como assunto interno.
Sucessão de Estados
Pelo princípio da continuidade do Estado, a área habitada por uma comunidade
humana deve continuar sendo gerida por entidade estatal, ainda que com outra
roupagem política. São modalidades de sucessão:
1) Fusão (agregação) de Estados – Dois ou mais Estados passam a constituir um
único. Subespécies: I- novo Estado é soma igualitária das soberanias pré-
existentes (unificação italiana [1860-70]); II - bases de agregação não são
exatamente igualitárias (unificação alemã [1871] sob hegemonia da Prússia); III-
anexação (reunificação da Alemanha, em 1990, sob o nome, bandeira e ordem
jurídica da República Federal Alemã). O Estado resultante de agregação é
responsável pelo cumprimento dos tratados e pelo pagamento das dívidas de
seus integrantes.
2) Secessão (desmembramento) de Estados – Uma única soberania divide-se em
dois ou mais Estados. Em 1991, a União Soviética dissolveu-se, dando origem a
15 Estados Independentes. No que concerne à divida externa do antigo soberano,
costuma-se aplicar o princípio da repartição ponderada da dívida, atentando-se
ao proveito que tenha sido feito do empréstimo.
3) Transferência territorial – Caso em que nenhuma soberania surge ou desaparece.
Em 1903, o território do atual estado do Acre foi transferido, mediante
indenização, da Bolívia para o Brasil.
3 O Brasil sempre reconhece governos tacitamente. O discurso oficial é de que o Brasil não reconhece
governos, reconhece Estados.
Duas convenções internacionais regulam os efeitos jurídicos das sucessões:
Convenção sobre sucessão de Estados em matéria de tratados (1978); e Convenção
sobre sucessão de Estados em matéria de bens, arquivos e dívidas (1983). No que
concerne à nacionalidade, os habitantes do território costumam adotar imediatamente a
do novo Estado, ressalvado eventual direito de escolha. O Estado(s) sucessor possui a
propriedade dos bens públicos do(s) antigo(s). A Rússia, considerada sucessora da
União Soviética, herdou mesmo o assento permanente no Conselho de Segurança das
Nações Unidas, sem que houvesse alteração na Carta constitutiva da organização.
Determina a Convenção de Viena sobre sucessão de Estados em matéria de
tratados que acordos de limites, que determinam as fronteiras territoriais dos Estados,
sempre serão mantidos. Um Estado recém-independente encontra-se diante do princípio
da tábula rasa, o que o exime da obrigação de ser parte de tratados em vigor para seu
território quando de sua independência4. A referida convenção ressalva ao novo Estado
o direito de emitir nota a depositários de tratados multilaterais, externando sua vontade
de participar do tratado. O novo Estado tem, portanto, o direito, não o dever de
participar dos tratados multilaterais até então em vigor para seu território. Tratados
bilaterais são normalmente renegociados. Nos demais casos de sucessão prevalece o
efeito automático, com manutenção dos tratados em vigor.
No que concerne à matéria, assevera Alberto do Amaral Júnior:
“Os Estados de recente independência não se sentem obrigados a
respeitar os tratados vigentes ao tempo da sucessão. Assiste-lhes,
entretanto, o direito de pleitear, mediante notificação da sucessão, a
qualidade de parte nos tratados multilaterais. (...) A transmissão dos
direitos e obrigações prevalece nas hipóteses de unificação e
separação de Estados.”
Imunidade de Jurisdição
Antiga regra costumeira determina que um Estado soberano não pode ser
submetido, contra sua vontade, à condição de parte, perante foro doméstico de outro
Estado. Durante muito tempo, vigorou no direito brasileiro o preceito da imunidade
jurisdicional absoluta de Estado estrangeiro, o que gerava certa celeuma, vez que
funcionários brasileiros de missões diplomáticas e de repartições consulares não se
encontravam resguardados pelas normas trabalhistas nacionais. A possibilidade de
prestação jurisdicional encontrava-se no território do próprio Estado estrangeiro, o que,
4 Tal dispositivo não exime o novo Estado de respeitar os costumes internacionais em vigor quando de
sua independência. Os costumes são, usualmente, gerais; enquanto participante da sociedade internacional, o novo Estado deve, portanto, respeitá-los.
se era possível a grandes empresas, deixava desamparados os trabalhadores, ex-
funcionários das repartições estrangeiras.
Com a alteração no costume internacional sobre a matéria, diversos países
começaram a estabelecer distinção entre atos de império e atos de gestão, com base na
qual se sedimentou entendimento restritivo da imunidade estatal, aplicável somente às
atividades relacionadas à diplomacia ou ao serviço consular. Em 1989, o Supremo
Tribunal Federal assentou que Estado estrangeiro não possui imunidade jurisdicional
em causa de natureza trabalhista, entendida como ato de gestão. Há, no entanto,
imunidade de execução, o que significa que não poderá haver execução forçada. Essa
imunidade pode ser renunciada pelo próprio Estado; pode também ser relativizada com
relação a bens não afetos aos serviços diplomático e consular. De todo modo, a prática
revela que o Estado condenado não tende a criar objeções à execução.
Organizações Internacionais
Possuem três elementos básicos: permanência; estrutura institucional; e
personalidade jurídica de Direito Internacional Público distinta daquela dos Estados que
a compõem. Possuem sede e orçamento próprios; têm origem em um tratado
internacional. A estrutura básica das organizações internacionais é formada por uma
Assembleia Geral, composta por todos os Estados-membros, e por uma Secretaria
permanente, órgão de administração.
As organizações internacionais podem ser de abrangência universal, (OIT, FAO,
FMI) ou regional (OEA, MERCOSUL, EU). Podem ainda possuir finalidades políticas
(ONU), comerciais (OMC), ou técnicas (União Internacional de Telecomunicações).
As organizações não governamentais, apesar de possuir grande
institucionalização, de corresponderem a mais de 90% do número de organizações
internacionais existentes, e de possuírem grande poder de mobilização da sociedade
civil mundial, não são dotadas de personalidade jurídica internacional.
Organização das Nações Unidas
Criada em após a Segunda Guerra Mundial, tem como principal objetivo a
manutenção da paz e da segurança internacionais. Teve como predecessora a Sociedade
das Nações, criada em 1919 pelo Pacto da Sociedade das Nações, primeira parte do
Tratado de Paz de Versalhes. A Conferência de São Francisco, de 1945, contou com a
presença de 51 Estados, fundadores da ONU. Atualmente, a organização possui 193
membros. Seus órgãos principais, conforme estipulado na Carta de São Francisco são:
1) Assembleia Geral – formada por todos os membros da organização, que
possuem direito a voz e a voto. O Brasil tradicionalmente abre a Assembleia
Geral da ONU.
2) Conselho de Segurança – único órgão com poder decisório (artigo 25), é o
principal responsável pela manutenção da paz e da segurança internacionais.
Formado por 15 membros: 5 permanentes – Estados Unidos, Reino Unido,
França, China e Rússia – e 10 membros não permanentes, que ocupam o
Conselho por mandatos de 2 anos, não renováveis de imediato. O presidente dos
Estados Unidos, Franklin Delano Roosevelt, havia sugerido, na Conferência de
Dumbarton Oaks, em 1944, a inserção do Brasil entre os membros permanentes.
A proposta foi mal recebida pela União Soviética, e não se consumou. O Brasil é
o país que, juntamente com o Japão, mais vezes esteve no Conselho de
Segurança como membro rotativo – 10 vezes. As resoluções não procedimentais
do Conselho são aprovadas por maioria de 9 votos afirmativos, incluídos os dos
membros permanentes – procedimento que lhes confere poder de veto. Na
prática, uma abstenção de membro permanente não impede a aprovação da
resolução. Utiliza-se assim, o princípio do consenso, não o da unanimidade5.
3) ECOSOC – Conselho Econômico e Social, composto por 54 membros eleitos
pela Assembleia Geral. É o órgão responsável pela elaboração de estudos e
relatórios a respeito de assuntos internacionais de caráter econômico, social,
cultural, educacional e sanitário, devendo fazer recomendações à Assembleia
Geral, aos Estados-membros da ONU e a entidades especializadas. Administra
as agências funcionais da ONU – OIT, OMS, FMI, FAO, etc.
4) Secretariado – Órgão administrativo permanente. Chefiado pelo Secretário-
Geral, nomeado pela Assembleia Geral mediante recomendação do Conselho de
Segurança para mandato renovável de 5 anos.
5) Conselho de Tutela – Destinado a supervisionar Estados que administravam os
territórios tutelados existentes em 1945, com vistas a promover sua
independência. O Conselho não atua desde 1994, quando o último território
tutelado, Palau, tornou-se independente.
6) Corte Internacional de Justiça – órgão judiciário da organização, com sede em
Haia, é composta por 15 juízes. Possui competências contenciosa e consultiva.
No exercício da primeira, resolve controvérsias surgidas entre Estados que
reconheçam a sua jurisdição, proferindo decisões inapeláveis, no da segunda,
emite pareceres consultivos não vinculativos. O reconhecimento da jurisdição da
Corte não é obrigatório e poderá ser feito caso a caso, ou ipso facto, sem acordo
especial, em relação o qualquer outro Estado que reconheça a jurisdição da
Corte, consoante cláusula facultativa de jurisdição obrigatória, elencada no
artigo 36 de seu Estatuto.
5 No consenso, nenhum Estado pode votar contra; na unanimidade, todos devem votar a favor. A Carta
da ONU prevê este procedimento, mas para evitar inércia do órgão, realiza-se interpretação contra legem para adotar a regra do consenso.
Reforma da ONU
A Organização das Nações Unidas encontra-se em processo de reforma. Em
2006, a Comissão de Direitos Humanos, vinculada ao ECOSOC foi extinta, e
substituída pelo Conselho de Direito Humanos, vinculado à Assembleia Geral6
.
Também em 2006 foi criada a Comissão de Construção da Paz7.
Os debates acerca da continuação do processo de reforma envolvem dois
aspectos: financeiro e institucional. A reforma financeira visa a solucionar as
dificuldades orçamentárias enfrentadas pela instituição; a institucional engloba diversos
órgãos da ONU. Quanto à Assembleia Geral, novas regras devem ser estabelecidas para
evitar a repetição de temas. Atualmente, cerca de 150 temas são discutidos na
Assembleia, muitos deles já tratados em reuniões anteriores. As atuais regras de
procedimento engessam sua atuação. No que concerne ao ECOSOC, é ele pouco eficaz
para administrar as diversas agências funcionais que operam na ONU, vez que não
possui ascendência hierárquica sobre elas.
No que tange ao Conselho de Segurança, carece ele atualmente de legitimidade,
o que reduz significativamente sua eficácia. Sua estrutura reflete as lógicas de poder do
fim da Segunda Guerra mundial, não as atuais. Os assentos permanentes são ocupados
pelos vencedores do conflito bélico, e o órgão mostra-se hoje em dissonância nítida com
a realidade internacional; continentes como a América Latina e a África – onde opera
grande parte das missões de paz da ONU – estão sub-representados no Conselho.
O Conselho de Segurança passou por reforma em 1963, em função do
expressivo aumento do número de membros da ONU, a partir do processo de
descolonização das colônias na África e na Ásia. O número de membros não
permanentes subiu de 6 para 10. No início da década de 1990, os Estado Unidos
sugeriram aprovar uma reforma que contemplasse Japão e Alemanha como membros
permanentes (Quick Fix). A proposta não foi adiante, em boa medida devido à atuação
de Brasil e Índia, que reivindicavam maior representatividade para os países
emergentes.
A partir do final da Guerra Fria, diversas propostas foram negociadas, dentre
elas as do grupo Unidos pelo Consenso, que reivindica a inclusão de 10 membros não
permanentes; e a da União Africana (que representa 25% da Assembleia Geral), que
reivindica a inclusão de 6 membros permanentes e de 4 não permanentes com mandatos
renováveis de 4 anos. Em 2004, o Secretário-Geral, Kofi Anan convocou painel de Alto
Nível para discutir a matéria, que resultou em duas propostas, que, todavia, não
chegaram a ser votadas.
6 O Conselho é composto por 47 membros, e pode criar grupos de trabalho temáticos ou geográficos, a fim de investigar violações de direitos humanos ao redor do mundo. Há a possibilidade de que um de seus membros seja suspenso do Conselho, como ocorreu com a Líbia em 2011. 7 O Brasil preside o grupo de trabalho para a Guiné Bissau no âmbito da referida Comissão.
A mudança na distribuição do poder mundial torna inevitável uma reforma mais
profunda na ONU, que envolva uma reforma do Conselho de Segurança. Nessa reforma,
os países emergentes deverão ser contemplados com assentos permanentes e não
permanentes. O candidato mais forte para representar os 33 países da América Latina é
o Brasil. O país é a sexta maior economia do planeta, o quinto maior país em população
e em território, possui diplomacia profissionalizada, histórico de pacificidade externa,
respeito interno às diferenças culturais e é um ator reconhecido internacionalmente
como amante da paz e do direito internacional. O Brasil mantém boas relações com os
mais variados países do mundo e é chamado a atuar em prol da paz. O país foi chamado
a exercer papel mais ativo no Oriente Médio e na África, e sua atuação tem sido
construtiva.
O Brasil formalizou sua candidatura ao um assento permanente no Conselho de
Segurança da ONU durante o governo Itamar Franco. Atualmente, compõe o G-4,
juntamente com Índia, Japão e Alemanha. A proposta do grupo é a de incluir 6
membros permanentes sem poder de veto, bem como 4 não permanentes no Conselho.
A questão do veto seria discutida em conferência a ser realizada 15 anos após a entrada
em vigor da reforma. Para que a proposta seja aprovada, ela deve receber os votos
favoráveis de dois terços da Assembleia Geral da ONU, devendo posteriormente ser
ratificada por dois terços dos países, incluindo os cinco membros permanentes do
Conselho de Segurança. A proposta é realista porque não interfere de imediato no poder
de veto, tema sensível para os membros permanentes. A entrada do Brasil no Conselho
como membro permanente é oficialmente apoiada pela França, pela Rússia e pelo Reino
Unido. Em 2008, a Assembleia Geral aprovou a resolução 62.557, que deu início a
negociações no plenário informal da assembleia. O tema continua na pauta de discussão.
Indivíduo
O indivíduo encaixa-se na definição de sujeito de Direito Internacional, ainda
que haja vozes dissonantes (Rezek). Possui direitos garantidos em inúmeros
documentos internacionais, como o Pacto Internacional sobre Direito Civis e Políticos;
o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais; e a Convenção
Americana de Direitos Humanos. Possui deveres elencados na ordem jurídica
internacional: o Tribunal Penal Internacional, criado pelo Estatuto de Roma (1998),
processa e julga indivíduos acusados de crimes de guerra, crimes de genocídio e crimes
contra a humanidade. Possui ainda capacidade para exercer seus direitos no âmbito
internacional: os protocolos 14 e 18 à Convenção Europeia de Direitos Humanos
conferem ao indivíduo capacidade para recorrer à Corte Europeia de Direitos Humanos,
a fim de fazer valer direito violado.8
8 No sistema americano de Direitos Humanos, o indivíduo é representado perante a Corte pela Comissão
Interamericana de Direitos Humanos.
Santa Sé
A Santa Sé é a cúpula governativa da Igreja Católica. Possui território,
população e governo, independente daquele do Estado italiano; não possui, contudo, a
dimensão pessoal da nacionalidade, nem os fins para os quais se orienta todo Estado
soberano. Apesar de possuir natureza jurídica internacional sui generis, não podendo ser
considerada como Estado, é amplo o reconhecimento de que possui personalidade
jurídica internacional, consubstanciada nos acordos de Latrão, de 1929, mediante os
quais teve assegurada sua soberania sobre o território que ocupa.
A Santa Sé celebra não apenas concordatas – compromissos entre a Igreja
católica e o Estado signatário -, mas também tratados como as convenções de Viena
sobre relações diplomáticas (1961), sobre relações consulares (1963) e sobre direito dos
Tratados (1969).
Comitê Internacional da Cruz Vermelha
Outro caso de personalidade jurídica internacional anômala é o do Comitê
Internacional da Cruz Vermelha, fundado em 1863 pelo suíço Henry Dunan, com
objetivos de assistência humanitária aos feridos de guerra. O Comitê Internacional, com
sede em Genebra, não se confunde com as seções nacionais da Cruz Vermelha, nem
com o Crescente Vermelho, desmembramento da organização que atua nos países
islâmicos. Apenas o Comitê Internacional possui personalidade jurídica internacional,
sendo parte nas quatro Convenções de Genebra sobre Direito Humanitário, celebradas
em 1949, em sua sede.
3. Fontes de Direito Internacional Público
Fontes de Direito Internacional Público são os documentos e pronunciamentos
mediante os quais o Direito Internacional manifesta-se, gerando direitos e obrigações
aos diferentes sujeitos de direito. São elas:
1) Tratado;
2) Costume;
3) Princípios gerais do direito;
4) Decisões de Organizações Internacionais;
5) Atos unilaterais;
6) Normas de jus cogens.
A doutrina distingue as fontes formais das materiais. Destas emana o conteúdo
da norma; aquelas o comprovam. As fontes materiais são os princípios gerais do direito;
as fontes formais são os tratados e o costume internacional. Não há hierarquia entre elas.
O artigo 38 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça (1945), repetindo a
redação do Estatuto da Corte Permanente de Justiça Internacional (1920), dispõe:
“1. A Corte, cuja função é decidir de acordo com o direito
internacional as controvérsias que lhe forem submetidas,
aplicará:
a) as convenções internacionais, quer gerais, quer
especiais, que estabeleçam regras expressamente
reconhecidas pelos Estados litigantes;
b) o costume internacional, como prova de uma prática
geral aceita como sendo o direito;
c) os princípios gerais de direito, reconhecidos pelas
nações civilizadas;
d) sob ressalva da disposição do Artigo 59, as decisões
judiciárias e a doutrina dos juristas mais qualificados
das diferentes nações, como meio auxiliar para a
determinação das regras de direito.
2. A presente disposição não prejudicará a faculdade da
Corte de decidir uma questão ex aequo et bono, se as
partes com isto concordarem.”
O rol elencado no artigo transcrito não é taxativo; as outras três fontes
supracitadas devem ser consideradas como tais. Em contrapartida, nem todos os
instrumentos jurídicos elencados no artigo são considerados fonte de direito
internacional: a jurisprudência, a doutrina e a equidade são apenas meios auxiliares para
a determinação do direito.
Tratado
O artigo 2º da Convenção de Viena sobre direito dos tratados define-o como
“acordo internacional concluído por escrito entre Estados e regido
pelo Direito Internacional, quer conste de um instrumento único, quer
de dois ou mais instrumentos conexos, qualquer que seja sua
denominação específica”(Grifo nosso).
“entre Estados”
Organizações Internacionais, a Santa Sé e o Comitê Internacional da Cruz
Vermelha também podem celebrar tratados; essa convenção, no entanto, apenas regula
tratados celebrados entre Estados.
“quer conste de um instrumento único, quer de dois ou mais instrumentos conexos”
O texto de um tratado pode conter cláusulas preambulares e dispositivas, bem
como anexos.
“qualquer que seja sua denominação específica”
Os tratados podem ter denominações específicas: estatutos, protocolos, pactos,
cartas, concordatas. Em geral, estatutos estabelecem a estrutura institucional de uma
organização ou de um órgão internacional; protocolos são acréscimos a acordos-quadro;
concordatas são acordos celebrados pela Santa Sé.
Os Estados são formados e representados por indivíduos. O artigo 7º da
Convenção de Viena estabelece os legitimados para celebrar tratado em nome do
Estado:
“1. Uma pessoa é considerada representante de um Estado para a
adoção ou autenticação do texto de um tratado ou para expressar o
consentimento do Estado em obrigar-se por um tratado se:
a)apresentar plenos poderes apropriados; ou
b)a prática dos Estados interessados ou outras circunstâncias
indicarem que a intenção do Estado era considerar essa pessoa seu
representante para esses fins e dispensar os plenos poderes.
2. Em virtude de suas funções e independentemente da apresentação
de plenos poderes, são considerados representantes do seu Estado:
a)os Chefes de Estado, os Chefes de Governo e os Ministros das
Relações Exteriores, para a realização de todos os atos relativos à
conclusão de um tratado;
b)os Chefes de missão diplomática, para a adoção do texto de um
tratado entre o Estado acreditante e o Estado junto ao qual estão
acreditados;
c)os representantes acreditados pelos Estados perante uma
conferência ou organização internacional ou um de seus órgãos, para
a adoção do texto de um tratado em tal conferência, organização ou
órgão.” (Grifo nosso).
O tratado possui por fundamento de validade o princípio pacta sunt servanda,
segundo o qual os acordos devem ser cumpridos.
Assinatura de tratado
Encerra o processo de negociação. Acordos executivos entram em vigor após a
assinatura, nos termos estabelecidos no tratado. Ato consumado por um dos legitimados
supramencionados.
Ratificação de tratado
Ato de confirmação da assinatura, realizado pelo presidente da República, nos
termos do artigo 84 VIII da Constituição de 1988. Entre o ato de assinatura e de
ratificação, ambos exercidos pelo Poder Executivo, há a manifestação do Poder
Legislativo. Cabe a este “resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos
internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio
nacional” consoante artigo 49 I da constituição brasileira.
Aprovado o texto do tratado pelo Congresso, por meio de decreto legislativo, o
presidente da República poderá ratificar o acordo, ato que exerce efeitos no âmbito
internacional. Se o tratado já estiver em vigor internacionalmente, passará a viger para o
Brasil; caso contrário, aguardar-se-á sua entrada em vigor, nos termos estabelecidos
pelo próprio tratado. O presidente da República em seguida promulga o texto do tratado
por meio de decreto executivo, e publica-o no Diário Oficial da União. A partir da
publicação, o tratado tem efeito de lei, e passa a viger no âmbito interno. Observa-se
que há defasagem de tempo entre a entrada em vigor internacional (quando da
ratificação), e a vigência interna (publicação no DOU).
Hierarquia de tratados no direito brasileiro
A regra geral é a de que os tratados internacionais possuem hierarquia de lei
federal, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal (RE 80.004, de 1977); os
tratados que versam sobre direitos humanos, contudo, não se adequam a esse
entendimento.
A Emenda Constitucional 45, de 2004, inseriu o § 3º no artigo 5 º da constituição
que determina que:
“Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que
forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois
turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão
equivalentes às emendas constitucionais”.
Tratados aprovados nessas circunstâncias equivalem-se a emenda constitucional,
e entram em vigor quando de sua aprovação pelo Congresso, são normas material e
formalmente constitucionais, portanto. Tratados de direitos humanos que não forem
aprovados com o referido quórum – o que inclui todos os tratados aprovados antes da
EC 45 – possuem valor supralegal, estando acima da legislação ordinária, mas abaixo da
constituição, conforme entendimento jurisprudencial consubstanciado pelo STF
(466343/SP, julgado em 2008).
Costume
Predispõe o artigo 38 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça ser a norma
costumeira a que resulta de “uma prática geral aceita como sendo direito”, de onde se
aferem os dois elementos do costume: o material, qual seja, a prática reiterada; e o
subjetivo, a opinio juris, a convicção de que assim se age não sem motivo, mas por ser
juridicamente necessário. Não existe exigência de prazo específico de duração de uma
prática para que seja considerada costume. Existem costumes regionais, como é o caso
do latino-americano asilo político. Não há hierarquia entre costume e tratado.
Princípios gerais do direito
O Comitê de juristas que elaborou o projeto do Estatuto da Corte Permanente de
Justiça Internacional, tinha em mente os princípios de direito civil aplicáveis às relações
internacionais. Considerando que os princípios de direito são providos de
normatividade, o item foi incluído no Estatuto da Corte com vistas a provê-la de mais
um meio de aplicação do Direito Internacional. Interpretação extensiva inclui nesse rol
os grandes princípios gerais de direito internacional, como o da autodeterminação dos
povos, o da não agressão e o da solução pacífica de controvérsias.
Decisões de Organizações Internacionais
Emitidas por órgãos com competência decisória, devem ser respeitadas pelos
Estados-membros da organização. Devem ainda ser internalizadas no ordenamento
jurídico nacional, possuindo valor de lei. É o caso das resoluções do Conselho de
Segurança das Nações Unidas, das decisões do Conselho do Mercado Comum, das
resoluções do Grupo Mercado Comum e das diretrizes da Comissão de Comércio do
MERCOSUL. A competência decisória do órgão deve estar prevista no tratado
constitutivo da organização.
Atos unilaterais
Não figuram no rol do artigo 38 do supratranscrito estatuto. Sua natureza de
fonte de direito internacional, pela diversidade dos atos unilaterais, ainda é controversa.
Alguns autores afirmam não serem os atos unilaterais normas, senão meros atos
jurídicos; não obstante, os atos unilaterais produzem consequências jurídicas, muitas
vezes criando obrigações, como acontece na ratificação de tratado, ou na denúncia.
Em 1933, a Corte Permanente de Justiça Internacional, no caso do Estatuto
Jurídico da Groenlândia Oriental, que o reino da Noruega estava obrigado
juridicamente, ante a Dinamarca, por uma declaração oral feita por seu ministro das
relações exteriores. A declaração teve efeito de promessa, tornada irretratável face sua
pronta aceitação pelo destinatário.
Para serem fontes de DIP devem preencher dois requisitos: serem públicos; e
haver intenção do Estado em se obrigar por eles.
Normas de jus cogens
São normas imperativas de direito internacional. Grande celeuma é criada pela
tentativa de determinar quais seriam essas normas. Atualmente, há consenso quanto à
proteção dos direitos humanos, e quanto à proibição de agressão. Assim, ainda que um
Estado não seja parte de nenhum tratado ou costume que proíba a comercialização de
escravos, e ainda que não possua qualquer limitação constitucional para isso, não poderá
fazê-lo, porquanto a vedação da escravidão constitui, indubitavelmente, norma de
direito internacional cogente.
Não há hierarquia entre as fontes de DIP; todavia, pode haver hierarquia entre as
normas emanadas dessas fontes. Por isso, uma norma de jus cogens prevalecerá sobre as
advindas de outras fontes, por serem normas imperativas gerais.
Meios interpretativos
O artigo 38 do Estatuto da CIJ também elenca a jurisprudência, a doutrina e a
equidade como instrumentos dos quais o juiz dispõe para aplicar o direito internacional;
não são, contudo, fonte de direito. Juntamente com a analogia, são considerados meios
interpretativos, subsidiários na aplicação do direito. Vale lembrar que a equidade só
pode ser utilizada mediante autorização de ambas as partes.
4 Solução pacífica de controvérsias internacionais
Conflito ou litígio internacional é todo “desacordo sobre certo ponto de direito ou
de fato”, toda “contradição ou oposição de teses jurídicas de interesses entre dois
Estados”.9 As controvérsias internacionais devem ser solucionadas por meios pacíficos,
conforme determina o artigo 33 da Carta da ONU; in verbis:
“1. As partes em uma controvérsia, que possa vir a
constituir uma ameaça à paz e à segurança internacionais,
procurarão, antes de tudo, chegar a uma solução por
negociação, inquérito, mediação, conciliação, arbitragem,
solução judicial, recurso a entidades ou acordos regionais,
ou a qualquer outro meio pacífico à sua escolha.”(Grifo
nosso).
Os meios pacíficos de solução de controvérsias internacionais dividem-se
em diplomáticos, políticos e jurisdicionais. Os meios diplomáticos incluem:
1) Negociações diretas – Não há qualquer intervenção de terceiros.
As negociações podem ser entabuladas oralmente ou por troca de notas.
2) Bons ofícios – Há intervenção de terceiro, que simplesmente
estabelece contato entre as partes, oferecendo espaço neutro para negociações. O
terceiro exerce função instrumental, não cabendo a ele propor soluções para o
conflito. A solução da controvérsia dar-se-á por entendimento direto entre os
contentores.
3) Mediação – Há envolvimento substancial de terceiro, que propõe
solução para o conflito; a proposta, no entanto, não vincula as partes, e só será
aceita se julgada satisfatória por ambas.
4) Conciliação – Possui matizes de mediação e de inquérito,
esclarece os fatos e faz sugestões; é caracterizada por maior aparato formal; é
coletivo seu exercício: não há um único conciliador, mas comissão de
conciliação, que propõe solução por meio de relatório, que não vincula as partes,
mas, espera-se, seja acolhida.
5) Inquérito – Sua função é meramente apurar os fatos; em geral
realizado por comissão.
9 Conceito proferido pela CPIJ, em 1924, no caso Mavrommatis.
6) Sistema de consultas – Entendimento direto programado; não há
intervenção substancial, ou sequer instrumental de terceiro. As partes consultam-
-se mutuamente sobre seus desacordos por assim terem estabelecido
previamente.
São meios políticos os que recorrem a organizações internacionais. O Conselho
de Segurança e a Assembleia Geral das Nações Unidas são dois foros políticos
comumente usados para dirimir controvérsias internacionais. Os conflitos só deverão ser
levados a essas instâncias se forem de gravidade tal que constituam ameaça à paz. As
partes em litígio pode ainda recorrer a esquemas regionais especializados. A Liga dos
Estados Árabes e a Organização dos Estados Americanos dispõem de mecanismos para
solução pacífica de controvérsias.
Os meios jurisdicionais de solução de controvérsia são exercidos em foros
especializados e independentes, que examinam as lides à luz do Direito Internacional, e
proferem decisões obrigatórias. São eles a arbitragem e os meios propriamente judiciais,
representados pelos diversos tribunais internacionais.
A arbitragem pode ser voluntária ou obrigatória, conforme haja ou não tratado
geral de arbitragem entre as partes. Pode ser exercida por árbitro ou por tribunal arbitral.
A competência do juízo arbitral, bem como o direito aplicável, é estabelecida por
tratado. Ao final das diligências, o juízo emite laudo inapelável de cumprimento
obrigatório. A arbitragem é via jurisdicional ad hoc; uma vez solucionada a lide, o juízo
desfaz-se. A Corte Permanente de Arbitragem não é uma verdadeira corte; é antes uma
lista de árbitros com secretaria permanente.
O Brasil fez uso dessa forma de solução de controvérsia em algumas ocasiões.
Foi o caso da lide territorial em torno da região de Palmas, com a Argentina (1893); da
questão do Amapá (1895) com a França (Guiana Francesa); e da questão do Pirara
(1904), com a Inglaterra (Guiana Inglesa). Nas duas primeiras, fomos representados
pelo Barão do Rio Branco; ambos os laudos foram-nos inteiramente favoráveis. Na
questão do Pirara fomos representados por Joaquim Nabuco, e o laudo do Rei Victor
Emmanuel III, da Itália, nos garantiu apenas 40% do território disputado, resultado
considerado insatisfatório, vez que a Inglaterra nos havia oferecido 60% do território
antes do arbitramento.
Outro meio jurisdicional de solução de conflitos é o exercido pelos diversos
tribunais internacionais, ad hoc e permanentes, dentre os quais é possível citar a Corte
Internacional de Justiça, e o Tribunal Internacional do Direito do Mar.
Da ilegalidade da guerra
A guerra já foi instituição internacional legítima; atualmente, é ilegal. O Pacto
da Liga das Nações estabelecia prazo moratório de 3 meses para que os Estados
pudessem fazer uso da força armada para dirimir controvérsias internacionais. Por meio
do Pacto Briand-Kellog, assinado em 1928, e rapidamente ratificado pela quase
totalidade dos Estados da época, os Estados renunciaram à guerra como meio de solução
de conflitos. Em 1945, a Carta da ONU finalmente proscreveu a guerra do sistema
jurídico internacional, estabelecendo em seu artigo 2 §4:
“Todos os Membros deverão evitar em suas relações
internacionais a ameaça ou o uso da força contra a
integridade territorial ou a dependência política de qualquer
Estado, ou qualquer outra ação incompatível com os
Propósitos das Nações Unidas.”(Grifo nosso).
O artigo não utiliza o termo “guerra”, sendo ainda mais amplo, ao tratar da
“ameaça ou o uso da força”. Atualmente, só existem duas possibilidades de uso legal da
força: em legítima defesa, individual ou coletiva, conforme assegurado pelo artigo 51 da
Carta da ONU; ou mediante autorização do Conselho de Segurança das Nações Unidas,
nos termos do capítulo VII da mesma Carta. O uso da legitima defesa deve pautar-se
pelos princípios da necessidade e da proporcionalidade.
A proibição de uso da força fora dessas circunstâncias é assegurada não apenas
pelo direito convencional, mas também pelo direito costumeiro e pelo direito cogente
internacional.
5 Direito diplomático
Há muito que a inviolabilidade dos embaixadores e dos arautos é norma
costumeira de direito internacional. Há autores que citam exemplos desde a
Antiguidade. O direito diplomático, que garante privilégios e imunidades aos
representantes de Estados soberanos perante outros Estados foi objeto do primeiro
tratado multilateral de que se tem notícia: o Règlement de Viena, de 1815. Atualmente,
é regido por duas convenções internacionais, celebradas em Viena, uma sobre relações
diplomáticas (1961), outra sobre relações consulares (1963). O chefe da missão
diplomática será admitido em suas funções mediante recebimento de autorização do
Estado acreditado (aquele onde se encontra a missão diplomática, ou repartição
consular), denominada agrément; a autorização concedida ao chefe da repartição
consular recebe o nome de exequatur. O Estado acreditado não é obrigado a justificar
os motivos pelos quais se recuse a conceder as referidas autorizações aos agentes que o
Estado acreditante (de origem da missão) pretendia nomear; pode ainda declarar
persona non grata agente inaceitável que já tenha sido nomeado, caso em que o Estado
acreditante deve chamá-lo de volta. Os diplomatas, diferentemente do chefe da missão
diplomática, não necessitam do agrément; quanto a eles, basta que o Estado acreditante
notifique o Estado acreditado quanto a sua nomeação, bem como quanto à data de
chegada no território deste.
O chefe da repartição consular, por sua vez, não necessita do agrément para que
possa desempenhar suas funções. Deverá, todavia, receber exequatur do Estado
acreditado. Da mesma forma, deve haver o envio de uma carta-patente ao estado
receptor qualificando o chefe da missão, e contendo informações sobre a sede da
repartição e a área geográfica onde o chefe da missão desempenhará suas funções.
As relações diplomáticas não se confundem com as relações consulares. Estas
tratam de interesses privados no território do Estado acreditado, enquanto aquelas dizem
respeito às relações públicas entre os dois soberanos. O diplomata representa o Estado
de origem no tocante ao trato bilateral de assuntos de Estado; o cônsul representa o
Estado de origem a fim de cuidar dos interesses de particulares – compatriotas – que ali
se encontrem, e de elementos locais que tencionem visitar o país, ou estabelecer
relações comerciais. Nada impede que embaixada exerça funções consulares; o
contrário, no entanto, não é possível.
A Convenção de Viena sobre relações diplomáticas estabelece privilégios e
imunidades muito mais acentuados que a convenção sobre relações consulares. No
Brasil, carreiras diplomática e consular são unificadas. O Direito Internacional é
indiferente a isso; a função desempenhada pelo agente no exterior determinará as
imunidades e os privilégios aplicáveis. O Itamaraty possui 5 divisões em sua estrutura
institucional, sendo uma delas a consular, o que significa que o profissional da
diplomacia transita constantemente entre as funções diplomática e consular.
Privilégios diplomáticos
Conforme a Convenção de Viena sobre Relações diplomáticas (1961), tanto os
membros do quadro diplomático de carreira, quanto os membros do quadro técnico e
administrativo gozam de ampla imunidade de jurisdição civil e penal; são fisicamente
invioláveis; em caso algum podem ser obrigados a depor como testemunhas; e gozam
de imunidade tributária. Exceções quanto à jurisdição civil: feito sucessório em que o
agente esteja envolvido a título privado; ação relativa a imóvel particular. Exceções
quanto à imunidade tributária são os impostos indiretos, normalmente incluídos no prelo
dos produtos e serviços. Em matéria civil, penal e tributária, os privilégios estendem-se
à família do agente. A imunidade penal não exime o agente da jurisdição de seu Estado
de origem, onde deverá ser processado e julgado. Em consonância com a assertiva, o
Código penal brasileiro, em seu artigo 7 II b, sujeita à lei brasileira crimes cometidos
por brasileiros no exterior.
São fisicamente invioláveis os locais da missão diplomática, os bens ali
localizados, e os locais residenciais utilizados pelo quadro diplomático e pelo quadro
administrativo. Os documentos e arquivos da missão diplomática são invioláveis onde
quer que se encontrem, assim como a bagagem diplomática.
Importante desfazer equívoco do senso comum. Os locais da missão diplomática
encontram-se em território do Estado acreditado – o local da missão. Assim, embaixada
do Brasil na Argentina é parte do território argentino. Não há aplicação do princípio da
extraterritorialidade; há, sim, imunidades diplomáticas, conforme disposto no artigo 22
da Convenção de Viena:
“1. Os locais da Missão são invioláveis. Os Agentes do
Estado acreditado não poderão neles penetrar sem o
consentimento do Chefe da Missão.
2. O Estado acreditado tem a obrigação especial de adotar
todas as medidas apropriadas para proteger os locais da Missão
contra qualquer intrusão ou dano e evitar perturbações à
tranquilidade da Missão ou ofensas à sua dignidade.
3. Os locais da Missão, em mobiliário e demais bens nêles
situados, assim como os meios de transporte da Missão, não
poderão ser objeto de busca, requisição, embargo ou medida de
execução.”
Privilégios consulares
Cônsules e funcionários consulares gozam de inviolabilidade física e de
imunidade civil e penal apenas no tocante aos atos de ofício. Tais privilégios não se
estendem aos membros de suas famílias, nem às instalações residenciais. Os membros
das repartições consulares são obrigados a depor como testemunhas, se convocados; a
prisão preventiva é permitida, mediante autorização de juiz, em casos de crimes graves.
Os locais consulares são invioláveis na estrita medida de sua utilização
funcional, e gozam de imunidade tributária. Arquivos e documento consulares são
invioláveis onde quer que se encontrem. É possível a desapropriação dos bens da
missão consular em caso de utilidade pública, mediante o pagamento de indenização
apropriada.
O Estado acreditante poderá, se julgar conveniente, renunciar às imunidades
civil e penal de que gozam seus representantes diplomáticos e consulares. Os referidos
agentes, ainda que dotados de privilégios e imunidades, não se eximem de estarem
obrigados a respeitar as leis e regulamentos do Estado territorial, conforme disposto no
artigo 41 da Convenção sobre relações diplomáticas e no artigo 55 da convenção sobre
relações consulares. Dessa forma, embora imune a eventuais processos, os agentes
devem respeitar as leis locais.
6 Direito da Integração
Ramo do direito que estuda os processos de integração política e econômica
entre Estados nacionais. Em ordem crescente de intensidade, os principais modelos de
integração são:
1) Área de livre comércio: há livre circulação de mercadorias entre as partes. É o
caso do Nafta.
2) União aduaneira: além da livre circulação de mercadorias há tarifa externa
comum (TEC) para produtos que entram no bloco. É o caso do MERCOSUL.
3) Mercado comum: para além das características da união aduaneira, há livre
circulação de fatores produtivos (capital e trabalhadores). Benelux é exemplo.
4) União econômica e monetária: há unificação de políticas e instituições
econômicas monetárias. A União Europeia é o único exemplo.
Os modelos de integração podem ser caracterizados pela
intergovernamentabilidade ou pela supranacionalidade. Neste caso, há concessão de
soberania, por parte dos Estados, em alguns assuntos, ao órgão supranacional. As
decisões deste órgão terão aplicabilidade imediata no direito interno dos membros do
processo integracionista. Ao mesmo tempo, os Estados mantêm sua soberania em
assuntos de maior sensibilidade. A UE é exemplo clássico de modelo integrador
supranacional.
Integração europeia
Após a Segunda Guerra Mundial, Alemanha e França, por iniciativa desta,
iniciariam processo de integração que possuía dois objetivos principais, um de ordem
política, neutralizar a histórica rivalidade teuto-francesa; e outro de ordem econômica,
estabelecer mercado comum entre as indústrias de base dos dois países.
Em 1947, Bélgica, Holanda e Luxemburgo formaram um mercado comum que,
conhecido como BENELUX. Em 1951, a primeira comunidade europeia, a Comunidade
Europeia do Carvão e do Aço (CECA) é criada pelo Tratado de Paris. França e
Alemanha como motores da integração, Itália e os três componentes do BENELUX
eram os Estados-parte. O tratado entra em vigor em 1952, e um mercado comum para o
carvão e o aço tem início em 1953. A supranacionalidade esteve presente na
integração europeia desde o início. A CECA incluía a Alta Autoridade Europeia para
Carvão e Aço, que definia as políticas macroeconômicas do setor. Criada para durar 50
anos, a CECA foi extinta em 2002.
Em 1957, são assinados os tratados de Roma, que criam duas novas
comunidades europeias: a Comunidade Econômica Europeia (CEE) e a Comunidade
Europeia de Energia Atômica (Euratom). Esta comunidade não possuía órgão
supranacional; consistia em mecanismo de cooperação intergovernamental no setor de
energia atômica. As comunidades eram compostas pelos mesmos seis países. A CEE
visava à criação de um mercado comum amplo no prazo de 12 anos. Tal mercado só
seria implementado em 1992. A CEE seria extinta em 2009, com a entrada em vigor do
Tratado de Lisboa. A Euratom é a única comunidade ainda existente, à margem da EU.
A principal falha institucional, apontada desde o início fora a criação de órgãos
equivalentes e paralelos, com as mesmas instituições básicas. Tal correção foi feita pela
unificação dos executivos das três comunidades, em 1965, pelo Tratado de Bruxelas.
Assim, as duas Comissões e os três Conselhos de Ministros foram substituídos por uma
única Comissão e um único Conselho. As três comunidades foram administrativamente
unificadas pelo tratado em questão, contudo, as comunidades continuavam separadas. A
partir do Tratado de Bruxelas passou-se a usar a expressão “comunidades europeias”.
O Ato Único Europeu de 1986, celebrado em Luxemburgo modificou e
completou os tratados de Paris e de Roma, bem como reformou instituições, ampliou
competências e consagrou a cooperação política entre os membros na área externa.
A União Europeia (UE) é criada pelo Tratado de Maastricht, de 1992,
configurando-se como união econômico-monetária, que zela pela segurança comum,
bem como trata da política externa, negociada em bloco, e da cooperação no campo da
justiça e dos assuntos internos. Possui como princípios fundamentais a democracia, a
liberdade econômica, o primado do direito comunitário e a pós-nacionalidade10
. A UE
só ganhou personalidade jurídica em 2009, com a entrada em vigor do Tratado de
Lisboa. O Tratado de Maastricht possuía três pilares: comunitário supranacional;
política externa e de segurança comum; cooperação policial e judiciária.
O Tratado de Amsterdã, de 1997, reformou os tratados das comunidades
europeias e da UE; ampliou as competências do Parlamento; revogou o Tratado de
Bruxelas (1965) e incorporou o Acordo Schengen de abolição do controle de fronteiras
às normas comunitárias. Ainda em 1997, o Pacto de Estabilidade estabeleceu as metas
macroeconômicas para a adoção do euro, que passaria a circular e 2002. Em 2001, o
Tratado de Nice promoveu ajustes no processo decisório, com vistas à entrada do leste
europeu.
A constituição da UE foi assinada em 2004, mas rejeitada em referendo popular
na França e na Holanda; não entrou em vigor, portanto. Em seu lugar, os Estados
10 Cidadania europeia.
celebraram o Tratado de Lisboa em 2007, que entrou em vigor em 2009, após referendo
na Irlanda. O Tratado de Lisboa concedeu personalidade jurídica à UE; eliminou a
linguagem comunitária; criou a iniciativa legislativa popular; previu a possibilidade de
denúncia do tratado da UE; criou o cargo de presidente da UE, e o de alto representante
da UE para política externa e de segurança, com mandatos de 2,5 anos, atualmente
ocupados por Catherine Asthon e Von Rompuy, respectivamente; conferiu mais poderes
ao Parlamento; eliminou os pilares da UE e em seu lugar estabeleceu competências
exclusivas, partilhadas e de apoio; e mudou o critério de maioria qualificada, que a
partir de 2014 deverá abranger mais de 55% dos Estados e mais de 65 da população da
UE.
Adesões
As comunidades europeias, e posteriormente a UE receberam as seguintes
adesões: Irlanda e Reino Unido11
(1973); Grécia (1981); Portugal e Espanha (1986);
Suécia, Áustria e Finlândia (1995); Polônia, Hungria, República Tcheca, Eslováquia,
Eslovênia, Lituânia, Letônia, Estônia, Malta e Chipre (2004); Romênia e Bulgária
(2007). Atualmente, a UE possui 27 membros; a zona do euro, 17. A adesão da Croácia
já está acertada para 2013; as da Macedônia e da Turquia estão em pauta.
Estrutura institucional
As principais instituições que compõem a União Europeia são:
1) Conselho Europeu: fornece as diretrizes políticas e expressa a posição comum
nas questões de relações exteriores; formado pelos chefes de Estado e de
governo, reúne-se a cada seis meses. Suas resoluções e declarações não são
obrigatórias.
2) Conselho da União Europeia: órgão decisório por excelência; composto por 27
ministros de Estado, cuja pasta varia de acordo com o tema tratado.
3) Parlamento: Atualmente composto por 751 deputados, representa os povos;
eleito por sufrágio universal direito a cada cinco anos desde 1979, possui
poderes decisórios desde a década de 1990. Bicameral; a iniciativa legislativa
cabe à Comissão Europeia e aos cidadãos europeus. A filiação é político-
partidária, o que significa que um deputado não precisa, necessariamente, ser
11
Retirou-se do EFTA (European Free Trade Agreement) para participar das comunidades europeias. Sua entrada havia sido vetada duas vezes por De Gaulle.
eleito pelo país do qual é nacional. Sua sede é em Estrasburgo. Dois terços dos
temas são deliberados em co-decisão12
.
4) Comissão Europeia: órgão supranacional na parte executiva, formado por 17
comissários que representam a UE, completamente independentes dos Estados-
membros.
MERCOSUL
O Mercado Comum do Sul (MERCOSUL) teve sua concretização advinda da
aproximação entre Brasil e Argentina. A relação histórica de rivalidade entre os dois
países converteu-se em cooperação principalmente a partir da metade da década de
1980, período em que as duas nações viviam situação em muito semelhante, no que
tange ao processo de redemocratização, após longo período de ditadura militar, à
questão da dívida externa, e à instabilidade econômica vivida por ambos. Já em 1979, a
solução da controvérsia Itaipu - Corpus, em muito viabilizou a aproximação dos dois
vizinhos. Outro marco fundamental bilateral foi a celebração, por Sarney e Alfonsín, da
Ata de Iguaçu, em 1985, documento que expressou a intenção de integrar os dois países,
bem como trouxe segurança para o continente na medida em que preconizou a
utilização pacífica da tecnologia nuclear.
Um Programa de Integração e Cooperação Econômica (PICE) foi estabelecido
pela Ata de Integração Braso - Argentina, em 1986, e posteriormente (1988) os dois
países assinaram o Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento, prevendo a
criação de um espaço comum no prazo de 10 anos. Tal prazo foi encurtado pela metade
por ocasião da Ata de Buenos Aires, em 1990, quando Brasil e Argentina previram o
estabelecimento de um mercado comum bilateral até 31 de dezembro de 1994. É
também de 1990 o Acordo de Complementação Econômica n° 14 (ACE14), entre Brasil
e Argentina, que traçou as principais diretrizes e estabeleceu os principais órgãos
intergovernamentais de integração.
Em 1991, Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai celebraram o Tratado de
Assunção, que prevê o estabelecimento de um mercado comum entre os quatros países
até 31 de dezembro de 1994. Consoante artigo 20, podem aderir ao bloco membros da
Aladi. A entrada depende da aprovação de todos os membros do MERCOSUL.
12 “O início do procedimento se verifica quando a Comissão envia a proposta normativa ao Parlamento e ao Conselho, que deverão analisá-la por duas vezes consecutivas. Na ausência de acordo, caberá ao Comitê de Conciliação, constituído por representantes do Conselho e do Parlamento, em igual número, examinar o mérito da proposta em causa. A aprovação pelo Comitê exigirá o envio do texto ao Conselho e ao Parlamento para que ambos se manifestem, requisito indispensável para que o processo legislativo se complete. Os deputados europeus podem, por maioria absoluta de votos, rejeitar o acordo obtido pelo Comitê.” Amaral Jr.
O MERCOSUL não é, apesar do nome, um mercado comum; é uma união
aduaneira imperfeita. Não é mercado comum, porque não há livre circulação de fatores
entre seus membros; é união aduaneira, porque possui, desde 1995, TEC; é imperfeita
em função das enormes listas de exceção à TEC. O Itamaraty classifica o MERCOSUL
como “uma zona de livre comércio e uma união aduaneira em fase de consolidação,
com matizes de mercado comum.”13
A organização institucional do MERCOSUL se aperfeiçoou a partir do
Protocolo de Ouro Preto, assinado em dezembro de 1994, que entraria em vigor em
fevereiro de 1996. Foram estabelecidos os seguintes órgãos: Conselho do Mercado
Comum (CMC); Grupo Mercado Comum (GMC); Comissão de Comércio do Mercosul
(CCM); Comissão Parlamentar Conjunta (CPC); Secretaria Administrativa do Mercosul
(SAM); e o Foro Consultivo econômico e Social (FCES), tendo os três primeiros
capacidade decisória de natureza intergovernamental, consoante o artigo 2 do referido
diploma legal.
O Conselho do Mercado Comum é o órgão superior, formado pelos ministros
das relações exteriores e pelos ministros da economia ou equivalentes de cada Estado.
Exerce a titularidade da personalidade jurídica do MERCOSUL, pode, portanto,
negociar e celebrar tratados em nome do bloco. Manifesta-se por decisões. O Grupo
Mercado Comum é o órgão executivo do bloco e suas atribuições são explicitadas no
artigo 14 do protocolo. Manifesta-se por meio de resoluções. A Comissão de Comércio
do MERCOSUL assiste o GMC e vela pela aplicação dos instrumentos de política
comercial comum acordados pelos Estados-parte para o funcionamento da união
aduaneira. Manifesta-se através de diretrizes ou propostas. A Comissão Parlamentar
Conjunta representa os parlamentos dos Estados Membros, e competia a ela agilizar os
procedimentos internos de aplicação das normas emanadas pelos órgãos do
MERCOSUL, bem como harmonizar as legislações, nos moldes requeridos pela
integração. Manifestava-se por recomendações. Foi extinta com a criação do Parlamento
do MRCOSUL, em 2006. O Foro Consultivo Econômico e Social também se manifesta
por recomendações, representando os setores econômicos e sociais do bloco. A
Secretaria Administrativa do MERCOSUL funciona dando apoio operacional aos
demais órgãos e sua sede é em Montevidéu.
O Protocolo de Ouro Preto também confere personalidade jurídica ao
MERCOSUL, em seu artigo 34 e reafirma, no artigo 37, a tomada de decisão por
consenso, estabelecendo ainda, no artigo 41 as fontes jurídicas do bloco, quais sejam, o
Tratado de Assunção, seus protocolos e instrumentos adicionais, os acordos celebrados
em seu âmbito e as Decisões do CMC, as Resoluções do GMC e as Diretrizes da CCM.
Em 2002, foi assinado o Protocolo de Olivos para a Solução de Controvérsias no
MERCOSUL, tratado que revoga o Protocolo de Brasília e cria o Tribunal Permanente
de Revisão (TPR). No que tange às divergências entre Estados, estes deverão buscar
resolvê-las por meio de negociações diretas no prazo máximo de 15 dias, caso não logre
13 Disponível em www.mercosul.gov.br
resultados tal procedimento, a controvérsia poderá ser opcionalmente submetida às
recomendações do GMC, ou encaminhada diretamente ao procedimento arbitral ad hoc.
O laudo obrigatório do Tribunal Arbitral será emitido em no máximo 60 dias. Cabe
pedido de recurso ao Tribunal Permanente de Revisão, que poderá confirmar, modificar
ou revogar as decisões do Tribunal ad hoc. O laudo do TPR será então inapelável e
obrigatório, tendo força de coisa julgada. As partes na controvérsia têm ainda a opção
de submeter-se diretamente ao TPR, sem passar pela instância do Tribunal Arbitral ad
hoc, ressalte-se, contudo, que neste caso não caberá revisão do laudo. Os Estados
possuem a faculdade de fazer um requerimento de esclarecimento dos laudos de
qualquer dos tribunais. Caso um Estado não cumpra o estabelecido em um laudo, a
outra parte poderá aplicar medidas compensatórias temporárias, objetivando o
cumprimento total do laudo. O Protocolo criou, assim, segunda instância de solução de
controvérsias, aprofundando a estrutura institucional do MERCOSUL.
O Protocolo de Olivos prevê a possibilidade de apreciação da controvérsia
perante a Organização Mundial do Comércio ou qualquer outro esquema internacional
de comércio do qual sejam partes os Estados envolvidos. Contudo, a controvérsia
deverá ser encaminhada a um ou outro foro de solução, não podendo ser submetida a
mais de um, como havia sido feito anteriormente por Brasil e Argentina.
Em 2006, foi constituído o Parlamento do MERCOSUL. O órgão não possui
poderes legislativos, funcionando como harmonizador das legislações do bloco. Com
base no critério da representação cidadã, os parlamentares deverão ser eleitos por voto
secreto, universal e direto. O Paraguai já elegeu seus representantes dessa forma em
2008. O Brasil deverá fazê-lo nas eleições de 2014. Em 2011 começou a valer o critério
da proporcionalidade atenuada, mediante o qual o número de representantes de cada
Estados será proporcional à sua população.
Em 2005, foi criado o FOCEM, Fundo de Convergência Estrutural do
MERCOSUL, que visa a reduzir as assimetrias entre os membros do bloco. O fundo
conta com orçamento anual de 100 milhões de dólares, dos quais o Brasil fornece 70
milhões, a Argentina 27, o Uruguai 2 e o Paraguai 1. O critério de distribuição é
inverso: o Paraguai recebe 48% dos recursos, enquanto o Uruguai recebe 32%, e Brasil
e Argentina recebem 10%.
Em 2012, após ruptura democrática no Paraguai, o país foi suspenso, até as
novas eleições, em abril de 2013, dos órgãos decisórios do MERCOSUL. A suspensão
tem por fundamento jurídico o Protocolo de Ushuaia sobre a cláusula democrática no
MERCOSUL. O Paraguai continua, no entanto, a receber os recursos do Focem, e
mantém seus deputados no Parlamento; continua sendo Estado-parte do bloco, portanto.
Mediante a suspensão do país, a Venezuela, que havia assinado protocolo de adesão ao
MERCOSUL em 2006, que dependia apenas da ratificação paraguaia para entrar em
vigor, ingressou no bloco como membro pleno. Também em 2012, a Bolívia assinou
protocolo de adesão ao bloco.
7 Recomendações de leitura
Tratados
Carta da Organização das Nações Unidas, 1945;
Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, 1961;
Convenção de Viena dobre Relações Consulares, 1963;
Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, 1969.
Livros
ACCIOLY, Hildebrando. Manual de Direito Internacional Público. São Paulo:
Saraiva, 2009.
BROWNLIE, Ian. Princípios de Direito Internacional Público. Lisboa: Fundação
Calouste Gulbenkian, 1997.
CERVO, Amado Luiz; BUENO, Clodoaldo. História da política exterior do Brasil.
Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2011.
DINH, Nguyen; DAILLIER, Patrick e PELLET, Alain; Direito Internacional Público.
2°ed. Fundação Calouste Gulbenkian. Lisboa: 2003.
FONSECA Jr; Gelson. A Legitimidade e outras Questões Internacionais. São Paulo:
Editora Paz e Terra, 2004.
MELLO, Celso de Albuquerque; Curso de Direito Internacional Público. Rio de
Janeiro: Renovar, 2004.
REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público. São Paulo: Saraiva, 2005.
SHAW, Malcolm. International Law. New York: Cambridge University Press, 2008.
Top Related