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Entidades do terceiro setor e o descaso legislativo com o título de declaração
de utilidade pública: análise comparativa do marco legal da União, do
Estado de Minas Gerais e do Município de Belo Horizonte
Vinícius Nascimento Cerqueira
Cristina Gomes Martins Froede
Third Sector entities and the negligence of the Legislativein the granting of Licenses for
a Public Utility Organization:a comparative analysis of the legal framework of the
Union, the State of Minas Gerais and the city of Belo Horizonte.
Sumário – 1 Introdução – 2 Breve Histórico do Terceiro Setor – 3 A Declaração de Utilidade Pública – 4 Legislação Declaração Utilidade Pública (Federal – Estadual – Municipal) – 4.1 Declaração de utilidade pública federal – 4.2 Declaração de utilidade pública estadual (Minas Gerais) 4.3 – Declaração de utilidade Pública municipal (Belo Horizonte) – 5 Quadro Comparativo – 6 Análise do Quadro Comparativo – 6.1 Similaridades entre as legislações Federal, Estadual (Minas Gerais) e do Município de Belo Horizonte – 6.2 Diferenças entre as legislações Federal, Estadual (Minas Gerais) e do Município de Belo Horizonte – 7 Conclusão – 8 Referências.
Resumo
O objetivo deste artigo é investigar as similitudes e diferenças da legislação federal,
estadual e municipal que instituem e regulam a titulação das entidades sociais declaradas de
utilidade pública. O objetivo do texto é averiguar se existiu aprimoramento na legislação
pertinente aos títulos de declaração de utilidade pública no Estado de Minas Gerais e
Município de Belo Horizonte. Será realizada análise comparativa entre os três modelos
legislativos, federal, estadual e municipal, para analisar o conteúdo de cada um e apontar as
diferenças entre as respectivas legislações. Os parâmetros comparativos serão retirados da
legislação federal, que é mais antiga e ainda vigente, e delimitado o campo de estudo na
esfera estadual ao Estado de Minas Gerais, e na esfera municipal, Belo Horizonte/MG. A
análise dos modelos legislativos de concessão de título de utilidade pública federal, estadual e
2
do município de Belo Horizonte/MG demonstrou fragilidade da legislação federal, e uma
aguda deficiência da legislação estadual e municipal, que além de não demonstrar
aperfeiçoamento em relação à legislação federal, ainda deixa ausente algumas exigências que
são encontradas na legislação federal. O estudo deixou claro que não existe preocupação
legislativa em nenhuma das três esferas federativas para com a regulamentação da declaração
de utilidade pública conferida às entidades do Terceiro Setor.
Palavras-chave: Terceiro Setor, Declaração de Utilidade Pública, legislação.
Abstract
This article investigates the similarities and differences of federal, state and municipal laws
that constitute and regulate the licensing of Public Utility Organizations, inquiring as to
whether laws at state and municipal levels have improvements in comparison to the federal
level. The comparative analysis of the three legal models — federal, state, and municipal —
analyzes the performance of each and identifies the differences between each group of laws.
The comparative parameters are taken from the federal legislation as it is the oldest and is still
in force; the state and municipal levels are delimited to the State of Minas Gerais and the mu-
nicipality of Belo Horizonte.
The analysis of federal, state, and the municipal laws of Belo Horizonte pertaining to the li -
censing of public utility entities demonstrates fragility at federal level and an acute deficiency
at state and municipal levels; these last two levels not only show no improvement in relation
to the older federal laws but also leave out some requirements which are found at the federal
level. The study clearly shows that there is no legislative concern in any of the three govern-
mental levels for the regulation of Licenses for a Public Utility Organization granted to the
Third Sector.
Keywords: Third Sector, Licenses for a Public Utility Organization, legislation.
1 Introdução
3
O presente trabalho pretende averiguar os modelos de concessão de título de
declaração de utilidade pública para entidades do terceiro setor, nas esferas da União, estadual
e municipal, restringindo-se o estudo comparativo entre as legislações do Estado de Minas
Gerais e do Município de Belo Horizonte/MG. A pretensão é verificar se os modelos
legislativos de declaração de utilidade pública do estado de Minas Gerais e do município de
Belo Horizonte trouxeram aperfeiçoamento ao sistema de titulação em comparação com o
modelo da União, já que esta legislação é bem mais antiga e ainda encontra-se vigente.
O texto trará breve histórico do surgimento das entidades de utilidade pública e o
início do terceiro setor, em alguns países e no Brasil, passando pela exposição do estudo da
legislação federal de concessão do título de utilidade pública federal (UPF) instituído pela Lei
n. 91, de 28 de agosto de 1935á poucos anos, entretanto, as organizações da sociedade sem
fins lucrativos tiveram quase sempre um papel marginal, vistas ou como forma de movimento
e caridade, associada, sobretudo à religião, ou como forma de movimento político, associado
à organização não governamental, ou ainda, defesa dos interesses corporativos relacionados a
sindicatos e associações1.
No Brasil somente, nas ultimas décadas, em decorrência da luta por direitos humanos
civis e sociais é que esse trabalho de assistência social começou a ser visto, em algumas
esferas da sociedade civil, como possibilidade de ação cívica, bem como de ação voltada para
o bem estar alheio ou público.
Surgiu então a Lei do Terceiro Setor visando atender a uma das orientações
estratégicas do Plano Plurianual, definidas pelo Governo FHC, que é a de que “o novo padrão
de relacionamento entre Estado e sociedade impõe a participação, a formação de parcerias e o
senso de responsabilidade social”. A atuação de entidades privadas viria “complementar” a
atuação estatal, “em lugar do Estado como único responsável e paternalista”, abrindo espaços
para “o fortalecimento da democracia” por meio da abertura “à participação da sociedade na
construção do bem-estar coletivo”. Essa visão do Terceiro Setor é coincidente com a
abordagem de RODRIGUES2
1 OLIVEIRA, Aristeu de; ROMÃO, Valdo. Manual do terceiro setor e instituições religiosas: trabalhista, previdenciária, contábil e fiscal. São Paulo: Atlas, 2008, páginas 43,44.
2 RODRIGUES, M. C. P. Demandas sociais versus crise de financiamento: o papel do terceiro setor no Brasil. Revista de Administração Pública nº 32, set-out 1998. Citado no artigo de Santo, Luiz Alberto Agencificação Publicização, Contratualização e Controle Social. Disponível em: http://www.anesp.org.br/userfiles/file/estudos/agencificacao_publicizacao.pdf Acesso: 18/01/2012.
4
Até meados dos anos 90, estávamos longe de ter no Brasil esta visão do terceiro setor como agente social de desenvolvimento, em parceria formal com o setor público. (...) Ressalte-se que o novo papel social que o terceiro setor vem assumindo, de parceiro formal do Estado, deve ser entendido à i luz do Estado reformado que se está configurando no Brasil, a partir da segunda metade dos anos 90. Não mais um Estado onipresente e produtor de bens/serviços econômicos e sociais, mas, sobretudo, voltado agora para suas funções-fins de regulação e coordenação. Não mais uma estrutura de administração pública burocratizada e com o foco no controle de processo, mas, sim, uma estrutura do serviço público gerencial e com o foco nas necessidades dos cidadãos e no controle de resultados. (...) É importante entender que o papel cada vez mais relevante do terceiro setor, como coadjuvante do poder público na promoção do desenvolvimento social, explica-se pelo fato de, em geral, sua ação tender a ser mais eficaz e eficiente na aplicação dos recursos públicos, além da credibilidade de que goza junto aos organismos internacionais de financiamento.
3 A declaração de utilidade pública
O título de declaração de utilidade pública concedido às entidades sociais foi pela
primeira vez instituído na esfera da União pela Lei n. 91/1935, no primeiro governo Vargas
(1930-19453 e teve por objetivo oferecer reconhecimento às entidades sociais que prestavam
serviços de cunho assistencial ou social sem fins lucrativos, os atendimentos que essas
entidades prestam são para a sociedade em geral, realizando serviços de relevância social4.
Segundo informações de Maria Tereza Dias,
Em pesquisa feita nos antigos decretos de utilidade púbica, Damião Alves de Azevedo afirma que, mesmo antes de 1935, quando foi editado a lei geral sobre o tema, já existiam algumas entidades declaradas de utilidade pública e o objetivo principal do título de utilidade pública era reconhecer oficialmente o ensino ministrado por escolas particulares e estabelecer uma cooperação entre estas e o estado, sobretudo para fins de reconhecimento público dos diplomas expedidos nessas instituições de ensino5 .
Com a previsão de isenção da contribuição previdenciária, por força da Lei nº 3.577,
de julho de 19596, a declaração de utilidade pública, de mera honraria, foi transformada em
3 Observa PAES (2006) que a relação entre filantropia e utilidade pública começa a ser esboçada na Constituição de 1934 ao dizer que: possivelmente, é este adjetivo idôneo que irá exigir a regulamentação da utilidade pública em legislação específica um ano após, 1935. E aqui se insinua uma primeira inter-relação entre utilidade pública, filantropia e ausência de fins lucrativos. (PAES, José Eduardo Sabo. Fundações, associações e entidades de interesse social: aspectos jurídicos, administrativos, contábeis, trabalhistas e tributários. Brasília: Brasília Jurídica, 2006.p.637). O adjetivo idôneo era utilizado para referir-se aos entes que prestavam serviços de educação de forma grauita.
4 BOUDENS, Emile; BRASIL. Câmara dos Deputados. Consultoria Legislativa. Utilidade Pública Federal. 2000. Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/documentos-e-pesquisa/publicacoes/estnottec/pdf/000068.pdf.> Acesso em 23/01/2012.p. 6.
5 DIAS, Maria Tereza Fonseca. Terceiro Setor e Estado: Legitimidade e Regulação: Belo Horizonte: Editora Fórum, 2008 página 182
5
pré-requisito para obtenção de benefícios fiscais, situação que perdura até os dias de hoje na
legislação federal.
Nesse sentido, as entidades sociais atuam em complemento às funções do Estado ao
oferecer aos cidadãos serviços ou atividades que antes eram tipicamente desenvolvidas pelo
Estado (primeiro setor) ou pela iniciativa privada/mercado (segundo setor). Eduardo Sabo
Paes assevera que “[...] trata-se na verdade, a declaração de utilidade pública como o
reconhecimento de que determinadas entidades cumprem uma função que deveria ser exercida
pelo Poder Público7.”
A entidade social agraciada com o título de utilidade pública federal, por esse simples
fato, não atrai para si nenhum benefício explícito na legislação. Contudo, com o passar do
tempo, o título de utilidade pública federal transformou-se em requisito para outros
benefícios, principalmente fiscais/tributários. Alguns deles são: a) possibilidade de receber
doações da União; b) possibilidade do doador (pessoa física) deduzir da renda bruta no
imposto de renda; c) imunidade fiscal (art. 150, VI, c, CR/88); d) isenção da contribuição da
cota patronal para o sistema previdenciário8.
Contudo, a entidade detentora do título de utilidade pública atrai para si a credibilidade
de ser entidade de prestígio e que teve suas atividades reconhecidas como relevantes pelo
poder público, o que pode facilitar no momento de angariar doações, recursos materiais,
voluntários etc. São vantagens indiretas que não agregam valores materiais imediatamente
para a entidade declarada de utilidade pública, mas adicionam valores que podem ser
considerados imateriais9.
6 BRASIL. Lei n. 3577, de 4 de julho de 1959. Isenta da taxa de contribuição de previdência aos Institutos e Caixas de Aposentadoria e Pensões as entidades de fins filantrópicos, reconhecidas de utilidade pública, cujos membros de suas diretorias não percebam remuneração.. Disponível em: http://www81.dataprev.gov.br/sislex/paginas/42/1959/3577.htm. Acesso em: 29/03/2012.
7 PAES, José Eduardo Sabo. Fundações, associações e entidades de interesse social: aspectos jurídicos, administrativos, contábeis, trabalhistas e tributários. Brasília: Brasília Jurídica, 2006. p. 638.
8 BOUDENS, Emile; BRASIL. Câmara dos Deputados. Consultoria Legislativa. Utilidade Pública Federal. 2000. Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/documentos-e-pesquisa/publicacoes/estnottec/pdf/000068.pdf.> Acesso em 23/01/2012. p. 4.
9 BOUDENS, Emile; BRASIL. Câmara dos Deputados. Consultoria Legislativa. Utilidade Pública Federal. 2000. Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/documentos-e-pesquisa/publicacoes/estnottec/pdf/000068.pdf.> Acesso em 23/01/2012. p. 4.
6
A Constituição Federal de 1988, art. 150, VI, c), veda à União, aos Estados, ao
Distrito Federal aos municípios instituir impostos sobre patrimônio, renda ou serviços dos
partidos políticos, inclusive suas fundações, das instituições de educação e de assistência
social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei.
E no art. 204 da Constituição Federal de 1988, são estabelecidas como bases da
organização das ações governamentais na área de assistência social, a) descentralização
político-administrativa, cabendo a coordenação e a execução dos respectivos programas às
esferas estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e de assistência social, e, b)
participação da população por meio de organizações representativas, na formulação das
políticas e no controle das ações em todos os níveis.
Assim, a Constituição Federal em vigor não só reconhece a importância da
colaboração da iniciativa privada na execução de tarefas consideradas eminentemente
públicas – porque destinadas à coletividade como tal -, mas também consolida uma
relativamente longa tradição de incentivos às associações que, de forma desinteressada e sem
visar lucro, se dedicam a causas, digamos, humanitárias10.
Assim, um dos principais benefícios que as entidades sociais podem obter é a isenção
de recolhimento da contribuição da empresa para o sistema de seguridade social (Lei nº
8.212/199111) que dispõe sobre a organização da seguridade social e seu plano de custeio,
concedido para as entidades beneficentes que atuem na área de assistência social, saúde ou
educação. Conforme a Lei n. 12.101/2009, que dispõe sobre a certificação das entidades
beneficentes e regulamenta a isenção de contribuições para a seguridade social, apresenta os
requisitos para a isenção da contribuição da empresa para o custei da seguridade social nos
seguintes artigos:
Art. 29. A entidade beneficente certificada na forma do Capítulo II fará jus à isenção do pagamento das contribuições de que tratam os arts. 22 e 23 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, desde que atenda, cumulativamente, aos seguintes requisitos:
10 Disponível em: http://dc196.4shared.com/doc/OYoDvujc/preview.html Acesso em: 20/02/2012.
11 BRASIL. Lei n. 8.212, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre a organização da Seguridade Social, institui Plano de Custeio, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8212compilado.htm. Acesso em: 29/03/2012.
7
I - não percebam seus diretores, conselheiros, sócios, instituidores ou benfeitores, remuneração, vantagens ou benefícios, direta ou indiretamente, por qualquer forma ou título, em razão das competências, funções ou atividades que lhes sejam atribuídas pelos respectivos atos constitutivos;
II - aplique suas rendas, seus recursos e eventual superávit integralmente no território nacional, na manutenção e desenvolvimento de seus objetivos institucionais;
III - apresente certidão negativa ou certidão positiva com efeito de negativa de débitos relativos aos tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil e certificado de regularidade do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS;
IV - mantenha escrituração contábil regular que registre as receitas e despesas, bem como a aplicação em gratuidade de forma segregada, em consonância com as normas emanadas do Conselho Federal de Contabilidade;
V - não distribua resultados, dividendos, bonificações, participações ou parcelas do seu patrimônio, sob qualquer forma ou pretexto;
VI - conserve em boa ordem, pelo prazo de 10 (dez) anos, contado da data da emissão, os documentos que comprovem a origem e a aplicação de seus recursos e os relativos a atos ou operações realizados que impliquem modificação da situação patrimonial;
VII - cumpra as obrigações acessórias estabelecidas na legislação tributária;
VIII - apresente as demonstrações contábeis e financeiras devidamente auditadas por auditor independente legalmente habilitado nos Conselhos Regionais de Contabilidade quando a receita bruta anual auferida for superior ao limite fixado pela Lei Complementar no 123, de 14 de dezembro de 2006.
Art. 30. A isenção de que trata esta Lei não se estende a entidade com personalidade jurídica própria constituída e mantida pela entidade à qual a isenção foi concedida12.
Já o Decreto n. 7.237/201013, que regulamenta o processo de certificação das entidades
como beneficentes, apresenta os quesitos obrigatórios para que a entidade possa obter a
certificação e a isenção da contribuição. E, certamente, o reconhecimento de uma entidade
social como de utilidade pública auxilia no momento de conseguir benefícios fiscais, mas não
é critério único ou determinante. Daí a importância da legislação de títulos de declaração de
utilidade pública, analisada a seguir.
12 BRASIL. Lei n. 12.101, de 27 de novembro de 2009. Dispõe sobre a certificação das entidades beneficentes da assistência social; regula os procedimentos de isenção de contribuições para a seguridade social. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12101.htm. acesso em: 29/03/2012.
13 BRASIL. Decreto n. 7237, de 20 de julho de 2010. Regulamenta a Lei n. 12.101/2009, para dispor sobre o processo de certificação das entidades beneficentes de assistência social para obtenção da isenção das contribuições para a seguridade social. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/Decreto/D7237.htm. acesso em: 29/03/2012.
8
4 As legislações sobre declaração de utilidade pública
4.1 Declaração de utilidade pública federal
A Lei n. 91/1935 que instituiu a declaração de utilidade pública federal e o Decreto n.
50.517/1961 para regulamentação da lei vieram como a primeira legislação sobre declaração
de utilidade pública. Alguns pontos sobre a legislação são: a forma de concessão do título,
benefícios, obrigações e manutenção do título, dentre outros.
Dissecando a legislação federal sobre declaração de utilidade pública, ela inicia-se
pelas entidades que podem obter o título, que são, na dicção da lei: as sociedades civis, as
associações e as fundações constituídas no país com fim de servir desinteressadamente a
sociedade e que não remunere seus cargos de diretoria (art. 1º, Lei n.91/1935). O título é
requerido atualmente no Ministério da Justiça.
No âmbito federal, o art. 1º da Lei nº 91 de 28 de agosto de 1935, estabelece os
requisitos para concessão do título de utilidade pública, dispondo ser necessário: a)
constituição da entidade no país; b) personalidade jurídica; c) comprovar efetivo
funcionamento nos últimos 3 (três) anos; d) não remuneração dos dirigentes ou distribuição de
lucros; e) relatório circunstanciado comprovando que nos 3 (três) últimos anos exerce
atividade de pesquisa científica, cultural, artística ou filantrópica, ou promove a educação, de
caráter geral; f) diretores de moral comprovada; g) publicar anualmente os demonstrativos de
receita e despesa quando contempladas por verba da União (art. 2º).
Uma das obrigações da entidade declarada de utilidade pública é declarar junto ao
Ministério da Justiça relatório circunstanciado dos serviços prestados à comunidade, assim
como demonstrativo de receitas e despesas, ainda que não tenha recebido subvenção da União
(art. 5º). A entidade tem seu título cassado nos casos em que não apresente seus relatórios
circunstanciados por 3 (três) anos consecutivos, não cumpra as atividades constantes no
estatuto ou retribua, remunere, distribua lucros, bonificações ou congêneres aos seus diretores,
mantenedores ou associados.
4.2 Declaração de utilidade pública estadual (Minas Gerais)
No âmbito do Estado de Minas Gerais a matéria é disciplinada pela Lei nº 12.972, de
27 de julho de 1998. Os requisitos necessários para a entidade ser considerada de utilidade
9
pública estão enumerados no art. 1º da referida Lei nº 12.972 (na redação que lhe foi dada
pelo art. 1º da Lei nº 15.430, de 03/01/2005), segundo o qual:
Art. 1º - As associações e fundações constituídas no Estado com o fim exclusivo de servir desinteressadamente à coletividade podem ser declaradas de utilidade pública mediante a comprovação de que: I - adquiriram personalidade jurídica; II - estão em funcionamento há mais de um ano; III - os cargos de sua direção não são remunerados; IV - seus diretores são pessoas idôneas. Parágrafo único. O atestado do cumprimento das exigências previstas nos incisos II, III e IV do caput deste artigo poderá ser firmado pelo Presidente do Conselho Municipal de Assistência Social, por Juiz de Direito, Promotor de Justiça, Juiz de Paz, Prefeito, Presidente da Câmara Municipal, Delegado de Polícia, ou por seus substitutos legais, do Município ou da comarca em que a entidade for sediada14.
Na esfera estadual, o benefício é conferido por lei e o pedido pode ser feito à
Assembléia Legislativa, por meio de um deputado estadual, mediante requerimento escrito,
contendo a documentação necessária constante do art. 1º acima reproduzido.
A Lei Estadual nº 12.972, de 27 de julho de 1998, dispõe sobre o reconhecimento de
pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos como entidades de utilidade pública.
Esta norma faz parte de um arcabouço jurídico a fim de reconhecer entidades complementares
à ação do Estado. Contudo, a mera existência da organização ou a validade da sua causa não é
suficiente para justificar doações ou isenções por parte do Estado. O que pode ocorrer é o
Estado repassar diretamente recursos a essas instituições a título de subvenção social ou por
intermédio de convênios firmados com objetos específicos. No entanto, as entidades de
utilidade pública não são obrigadas a prever em seus estatutos, planos e metas ou sequer
provar a eficiência em sua gestão nem sempre alcançando resultados positivos ou superando
as adversidades do meio.
Assim, o primeiro critério refere-se ao requisito da finalidade - não ter fins lucrativos e
desenvolver atividades de interesse geral da coletividade. A lei exige, também, seja
comprovada a aquisição da personalidade jurídica. É o que está claramente estabelecido no
caput do seu art. 1º. Sabemos que essa aquisição decorre da inscrição dos atos constitutivos da
entidade no Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas e deve ser comprovada por meio
da apresentação do estatuto com o devido ato de inscrição, representado pelo registro no
cartório ou por certidão por ele expedida.
14 MINAS GERAIS. Lei n. 12.972, de 28 de julho de 1998. Dispõe sobre a declaração de utilidade pública e dá outras providências. Disponível em: http://www.almg.gov.br/consulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=LEI&num=12972&comp=&ano=1998. Acesso em: 29/03/2012.
10
A Lei nº 12.972, de 1988, exige, ainda, que a entidade comprove estar em
funcionamento há mais de um ano e as pessoas de sua diretoria devem idôneas e não ser
remuneradas por seu múnus. Tais quesitos devem constar em atestado firmado por uma das
autoridades que menciona. A expressão “servir desinteressadamente à coletividade”, inscrita
na lei, refere-se, no nosso entender, às entidades que se dispõem a abordar os complexos
problemas sociais, sem privilegiar um determinado campo, e desenvolver uma teia de relações
entre indivíduos, grupos e setores. São aquelas que se articulam com segmentos diversos da
sociedade, por meio da formação de alianças, parcerias e coalizões, e cuja atuação tem um
impacto considerável na sociedade, todos esses quesitos podem ser observados no artigo 1º da
Lei estadual.
Deve-se ressaltar que, embora a norma não preveja expressamente a existência de
determinadas cláusulas no estatuto da organização, acredita-se que nele devem constar não
apenas a natureza jurídica da entidade, mas também que ela é sem fins lucrativos, suas
finalidades e a forma pela qual se dedica a elas, indicando se é por meio de execução direta de
projetos, programas ou planos de ação, doação de recursos físicos, humanos ou financeiros.
É considerada sem fins lucrativos a pessoa jurídica de direito privado que não
remunera seus diretores e não distribui lucros, excedentes operacionais, dividendos,
bonificações, participações ou parcelas do seu patrimônio, auferidos mediante o exercício de
suas atividades, e os aplica integralmente na consecução do respectivo objetivo social.
A lei em comento não define as áreas de atuação das entidades a serem declaradas de
utilidade pública e muito menos arrola as que podem ou não obter o título, a fim de que se
possa identificar, de maneira segura, aquelas que servem desinteressadamente à coletividade e
não têm fins lucrativos. Entretanto, acredita-se que devem estar asseguradas no estatuto
práticas de gestão administrativa e patrimonial que garantam e preservem o interesse público,
afastados os eventuais interesses pessoais e de grupos, entre eles a não-remuneração dos
membros dirigentes e a não-distribuição de lucros.
A primeira razão da existência das entidades de utilidade pública é o fato de serem
orientadas pelos valores e crenças de seus membros, o que possibilita a mobilização de
pessoas sem motivação econômica ou administrativa, motivações filantrópicas e altruístas,
crenças, confissões, ativismo político interesses e causas de várias ordens dão origem às
entidades declaradas de utilidade pública.
11
4.3 Declaração de utilidade pública municipal (Belo Horizonte – MG)
Por fim, no âmbito municipal, cabe a cada município legislar sobre a matéria. No caso
específico do Município de Belo Horizonte, o assunto é regulado pela Lei nº 6.648, de 26 de
maio de 1994, cujo art. 1º estabelece os requisitos necessários para a concessão da declaração
de utilidade pública, prevendo em seu art. 1º:
Art. 1º - As sociedades civis, as associações e as fundações sediadas no Município podem ser declaradas de utilidade pública se atenderem cumulativamente aos seguintes requisitos: I - estarem legalmente constituídas com personalidade jurídica há pelo menos 2 (dois) anos; II - não terem fins lucrativos; III - não remunerarem os cargos de sua diretoria15.
Além disso, a legislação municipal exige a comprovação anual da entidade de que está
em pleno funcionamento executando as atividades de seu estatuto e esta comprovação é feita
perante órgão competente. Contudo, a lei não especifica o órgão e não existe ainda legislação
específica que regule essa norma. (art. 3º). Ademais, a lei prevê as hipóteses de cassação do
título que são duas: a) não comprovar funcionamento regular por três anos consecutivos e b)
remunerar cargos de diretoria ou deixar de ser entidade sem fins lucrativos.
5 Quadro comparativo das legislações sobre declaração de utilidade pública
Com intuito de facilitar a visualização e comparação das disposições legislativas da
legislação federal, composta pela lei 91/1935 e Decreto 50.517/1961, Lei Estadual nº 12.972,
de 27 de julho de 1998, e da legislação municipal, Lei nº 6.648/1994, segue o quadro abaixo:
QUADRO 1
Quadro com os requisitos da declaração de utilidade pública federal, do Estado
de Minas Gerais e do Município de Belo Horizonte/MG
ENTIDADES DECLARADAS DE UTILIDADE PÚBLICA
Legislação Federal Legislação Estado MG Legislação Município BH
Requisitos estatutários
Previsão de que promovam a educação ou exerçam
Não define área de atuação apenas tem de servir
Não existe. Sem critérios para definir
15 BELO HORIZONTE. Lei n. 6648, de 26 de maio de 1994. Dispõe sobre a concessão de títulos declaratórios de utilidade pública. Disponível em: http://www.cmbh.mg.gov.br/leis/legislacao. Acesso em: 29/03/2012.
12
atividade de pesquisa científica, cultura, artística ou filantrópica, de caráter geral ou indiscriminado, predominantemente.
desinteressadamente a coletividade.
atividade. Art. 1.
Possuir no estatuto cláusula de que não remunera, por qualquer forma, os cargos da diretoria e não distribui lucros, bonificações ou vantagens a dirigentes, mantenedores ou associados, sob nenhuma forma ou pretexto.
Não menciona o estatuto das entidades. Mas proíbe a remuneração de seus dirigentes conforme
art. 1º - As associações e fundações constituídas no Estado com o fim exclusivo de servir desinteressadamente à coletividade podem ser declaradas de utilidade pública mediante a comprovação de que:
III - os cargos de sua direção não são remunerados;
Proíbe remuneração da diretoria, mas não menciona empregados, etc. art. 1.
Deve conter uma cláusula que afirme não haver remuneração, por qualquer forma, dos cargos de diretoria e não distribuição de lucros, bonificações ou vantagens a dirigentes, mantenedores ou associados, sob nenhuma forma ou pretexto.
Proíbe a remuneração da diretoria, mas não menciona nada quanto a distribuição de lucros, bonificações ou vantagens de seus mantedores ou associados
Art. 1, não remuneração da diretoria. Sem mencionar outros cargos, funções, etc.
Requisitos relativos à governança da entidade sem fins lucrativos
Ter estado em efetivo e contínuo funcionamento, nos três anos imediatamente anteriores, com a exata observância dos estatutos.
Não possui a mesma exigência da legislação federal.Apenas tem que estar constituída ha mais de um ano.
Art. 1º, legalmente constituída há 2 anos.
Apresentação de relatórios circunstanciados dos três anos antecedentes à formulação do pedido
Não faz qualquer menção a relatórios.
Não exige. Art. 3, comprovar funcionamento anualmente.
Ocorrendo eleição de nova diretoria ou alterações no estatuto da entidade, o representante legal deve
Não menciona qualquer disposição sobre a eleição da diretoria ou estatuto da
Não exige. Não menciona eleição de diretoria. Somente em caso de alteração para
13
enviar à Secretaria Nacional de Justiça a documentação comprobatória original ou cópia autenticada das alterações.
entidade remunerar os diretores, ou para fins lucrativos da entidade. Art. 3
Requisitos relativos às atribuições da diretoria da entidade
Atestado de idoneidade moral dos diretores.
Sim a Lei 12972 Art. 1º
- As associações e fundações constituídas no Estado com o fim exclusivo de servir desinteressadamente à coletividade podem ser declaradas de utilidade pública mediante a comprovação de que:
IV - seus diretores são pessoas idôneas.
Parágrafo único. O atestado do cumprimento das exigências previstas nos incisos II, III e IV do caput deste artigo poderá ser firmado pelo Presidente do Conselho Municipal de Assistência Social, por Juiz de Direito, Promotor de Justiça, Juiz de Paz, Prefeito, Presidente da Câmara Municipal, Delegado de Polícia, ou por seus substitutos legais, do Município ou da comarca em que a entidade for sediada.
Não exige.
Vedação da realização de despesas com remuneração e vantagens de qualquer natureza a dirigentes e empregados das entidades exercício de suas funções
Não cita qualquer regra ou faz menção a remuneração dos empregados, só proíbe a remuneração de seus dirigentes
Somente proíbe a remuneração dos diretores. Art. 1
Declaração do representante legal da entidade, que se obriga a publicar, sob as penas da lei, anualmente, a demonstração da receita e da
Não exige qualquer demonstração de receita e nem mesmo exige a publicidade de suas despesas.
Não exige. Mas precisa comprovar funcionamento regular, art. 3
14
despesa realizadas no período anterior, desde que contemplada com subvenção por parte da União.
Obrigatoriedade de apresentação de três relatórios, acrescidos de balanço patrimonial, demonstrativo de receitas e despesas e notas explicativas.
Não exige apresentação de nem um relatório de balanço patrimonial, demonstrativo de receitas, despesas ou qualquer nota explicativa de seus gastos
Não exige.
Características da relação de fomento e parceria
A declaração de utilidade pública não acarreta qualquer favor do Estado, conforme o art. 3º, da Lei nº 91/35. Atualmente o título serve como pré-requisito exigido pelos órgãos concessores de benefícios e/ou vantagens.
Não acarreta nenhum favor do Estado de Minas Gerais
Art. 2º - Nenhum favor do Estado decorrerá do título de utilidade pública
Não concede vantagens. Somente preferência em caso de firmar convênio. Art. 6. Contudo, parece ser exigência para conseguir outros benefícios (principalmente fiscais).
Elementos essenciais dos convênios (UF - IN STN nº 1/1997)
Programa de trabalho ----------------- Não estipula o convênio, mas indica que será o instrumento. Art. 6. Prevê único benefício para entidades com título, pois terão preferência caso haja empate na celebração de convênio.
Metas -----------------
Indicadores -----------------
Prazos ------------------
Critérios de avaliação vide : Resolução Conjunta SEPLAG e AUGE nº 5958/2006 os critérios específicos para celebração de convênios, nos termos do Decreto Estadual nº. 43.635,
15
de 20 de outubro de 2003;II - o Cadastro Geral de Convenentes - CAGEC, nos termos do art. 5º, do Decreto nº. 44.293, de 2006.
-----------------
Dispositivos gerais
Obrigação de publicar, anualmente, a demonstração da receita e despesa realizadas no período anterior, desde que contemplada com subvenção por parte da União, neste mesmo período.
Não há obrigatoriedade de publicar anualmente as demonstrações de receitas ou despesas
Não exige.
As entidades declaradas de utilidade pública salvo por motivo de força maior devidamente comprovada, a critério da autoridade competente, ficam obrigadas a apresentar, até o dia 30 de abril de cada ano, ao Ministério da Justiça, relatório circunstanciado dos serviços que houverem prestado à coletividade no ano anterior, devidamente acompanhado do demonstrativo da receita e da despesa realizada no período ainda que não tenham sido subvencionadas.
Não há obrigatoriedade de relatório circunstanciado ou qualquer outro tipo de relatório
Não exige.
Cassação da declaração de utilidade pública da entidade que:
a) deixar de apresentar, durante três anos consecutivos, o relatório a que se refere o artigo procedente; b) se negar a prestar serviço compreendido em seus fins estatuários; c) retribuir por qualquer forma, os membros de sua diretoria, ou conceder lucros,
Sim no art. 3º - Qualquer cidadão ou entidade poderá requerer, mediante representação fundamentada, a revogação do ato declaratório de utilidade pública da entidade que:
I - deixar de cumprir as finalidades para as quais foi constituída;
II - deixar de preencher qualquer dos requisitos
Cassação em 3 casos: a) deixar de comprovar funcionamento regular, por 3 anos consecutivos. b) deixar de preencher os requisitos do art. 1 por 2 anos consecutivos (regular constituição, sem fins lucrativos e não remunerar os dirigentes.). art. 4.
16
bonificações ou vantagens a dirigentes, mantenedores ou associados.
mencionados no art. 1º desta Lei.
Para renovar o título as entidades declaradas ficam obrigadas a apresentar à Secretaria Nacional de Justiça, até o dia 30 de abril de cada ano, relatório circunstanciado dos Utilidade Pública Federal (UPF) dos serviços que prestou à coletividade no ano anterior, acompanhado do demonstrativo de receita e despesa realizada no período, ainda que não tenham sido subvencionadas, isto é, recebido verba do Governo Federal.
A lei não faz qualquer menção quanto a renovação do título de utilidade pública. A entidade apenas perderá seu Título de utilidade pública nos casos do art. 3º desta lei
Não exige. Somente comprovar que está em funcionamento. Art. 3.
6 Análise do quadro comparativo
É possível observar pela leitura atenta do quadro de comparação entre a legislação
federal, estadual e municipal alguns pontos importantes, tais como similaridades e diferenças.
Como será possível demonstrar pelas anotações extraídas da análise do quadro a legislação
brasileira no que concerne ao Terceiro Setor é extremamente vaga, abstrata e sem conteúdo
objetivo que dê preferência aos resultados das atividades prestadas pelas entidades sociais
tituladas, e sim, apenas fazendo uma série de exigências formais16.
O que se observa é uma completa displicência do legislador quando o assunto é
relativo ao Terceiro Setor, que apresenta sistematicamente problemas quanto ao fomento,
regulamentação, fiscalização e controle concreto dos resultados obtidos ou que deveriam ser
obtidos pelas entidades que são fomentadas pelo Poder Público. Esse cenário caótico de
legislação é derivado da ausência de critérios da legislação o que permite diversos acertos
(contratos de gestão, termos de parceria ou convênios) ineficientes, como pode ser observado
16 TOURINHO, Rita. Terceiro Setor no ordenamento jurídico brasileiro: constatações e expectativas. In: MODESTO, Paulo (coord.). Nova organização administrativa brasileira. 2. ed. rev. e ampl. Belo Horizonte: Fórum, 2010. p. 321-340.
17
pelas situações fáticas deficientes das Organizações Sociais (OS) e das Organizações de
Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP).17 Essa situação preocupante pode, sem
margem de erro, ser transportada para as entidades declaradas de utilidade pública.
6. 1 Similaridades entre as legislações, Federal, Estadual (Estado de Minas
Gerais) e do Município de Belo Horizonte
Tanto a legislação da União como a do Estado de Minas, tem como requisito para
declarar uma entidade como sendo de utilidade pública a filantropia, ou seja, servir
desinteressadamente à coletividade. Outro ponto em comum entre as duas legislações é a não
distribuição de lucros e a não remuneração dos dirigentes das entidades declaradas de
utilidade públicas.
Assim como a lei federal, a declaração de utilidade pública não acarreta qualquer favor
do Estado, conforme o art. 2º da Lei 12.972/1998, servindo este título apenas como pré-
requisito exigido pelos órgãos concessores de benefícios e/ou vantagens conforme Resolução
Conjunta SEPLAG e AUGE nº 5958/2006 os critérios específicos para celebração de
convênios, nos termos do Decreto Estadual nº. 43.635, de 20 de outubro de 2003 seguido
pelos Decretos nºs. 44.083, de 10 de agosto de 2005, 44.173, de 19 de dezembro de 2005,
44.293, de 10 de maio de 2006, e 44.631, de 05 de outubro de 2007, que alteraram vários
dispositivos do Decreto nº 43.635/2003.
A lei estadual identificou as entidades que compõem o setor privado com finalidades
de interesse público, sendo um ato vinculado do gestor público, ou seja, desde que presentes
todos os requisitos legais e entregues toda a documentação exigida, a entidade será
qualificada.
Quanto ao quesito fomento e parceria as duas leis não prevêem nenhuma espécie de
benefício ou vantagem para a entidade declarada de utilidade pública. A única previsão na lei
municipal, que pode ser considerada benefício, é a vantagem para entidade declarada para
firmar convênio com o Município caso haja empate com outras entidades sociais. Inclusive, a
lei municipal não determina a forma legal de estabelecer relação entre o ente municipal e a
entidade social, mas com essa preferência, indica que o mais adequado é o convênio.
17 TOURINHO, Rita. Terceiro Setor no ordenamento jurídico brasileiro: constatações e expectativas. In: MODESTO, Paulo (coord.). Nova organização administrativa brasileira. 2. ed. rev. e ampl. Belo Horizonte: Fórum, 2010. p. 321-340.
18
No item dispositivos gerais de comparação, a lei municipal quando muito, contém os
mesmos requisitos da lei federal. Isso porque, algumas exigências da legislação federal não
são encontradas na legislação municipal, que é omissa quanto aos pontos comparados,
apresentando uma completa ausência de requisitos de controle das atividades das entidades
sociais. Inclusive quanto a critérios de fiscalização da entidade social.
6.2 Diferenças entre as legislações Federal, Estadual (Estado de Minas Gerais) e
do Município de Belo Horizonte
Diferentemente da legislação Federal, a Legislação do Estado de Minas Gerais não faz
qualquer menção a requisitos estatutários da entidade beneficiada pela declaração de utilidade
pública. Basicamente as únicas exigências estão previstas no art 1º e seus incisos I, II, III e IV.
Muito embora a lei mineira não preveja cláusulas estatutárias garantindo não haver
remuneração de qualquer forma dos membros de sua diretoria, o inciso III da referida lei
proíbe a remuneração da diretoria destas entidades.
Contudo, a lei é omissa quanto a previsão de distribuição de lucros, limitando-se
apenas, no art. 1º, caput, a afirmar que tais entidades tem o fim exclusivo de servir
desinteressadamente à coletividade.
Inicialmente a Lei nº 12.972, de 27 de julho de 1998, previa em seu art. 1º inciso II,
que a entidade deveria estar em funcionamento a pelo menos 2(dois) anos, mas teve este
prazo alterado para apenas um ano de funcionamento pela redação do art. 1º da Lei nº 15.430
de 31/01/2005, diferentemente da legislação federal que prevê no mínimo 3 anos de efetivo
funcionamento.
Quanto aos demais requisitos de governança da entidade declarada de utilidade pública
e atribuições de sua diretoria, a Lei nº 12.972/98 é totalmente omissa, pois apenas prevê a
necessidade de emissão de atestado de cumprimento das exigências previstas nos incisos II,
III e IV do caput do art 1º desta lei, emitidas pelas autoridades previstas em seu parágrafo
único. Diferente da lei federal a lei mineira não faz qualquer menção ao controle das despesas
realizadas por estas entidades e sequer exige a publicação de quaisquer relatórios
patrimoniais.
Já na esfera municipal é possível observar pela leitura atenta do quadro de comparação
entre a legislação federal e a legislação municipal alguns pontos importantes a partir dos
19
critérios de comparação. No item que versa sobre os requisitos estatutários para concessão do
título, a legislação municipal não apresentou nenhum ponto de aprimoramento, inclusive não
contém requisitos que estão presentes na lei federal, como por exemplo, a descrição das áreas
de atividade.
Quanto aos requisitos de governança corporativa, novamente a legislação do
município de Belo Horizonte/MG é extremamente vaga, principalmente na questão de
comprovação do funcionamento da entidade social, não apresentando nenhuma exigência
quanto ao cumprimento de atividades, relatórios de atividades exercidas, ou algo semelhante.
Portanto, nesse ponto é inferior à lei federal.
No ponto dos requisitos da diretoria da entidade social, a lei municipal, novamente, é
extremamente imprecisa e obscura, não contendo em seu texto sequer os mesmos requisitos
da lei federal. Além de não apresentar aperfeiçoamento quanto as exigências da lei federal.
Em resumo, a legislação referente à declaração de utilidade pública do Município de
Belo Horizonte/MG constitui verdadeiro vazio legal, isso porque veio apenas para instituir a
concessão do título, sem preocupação com as formas de manutenção e fiscalização das
entidades detentoras do título. A legislação municipal que é 50 anos mais recente que a
legislação federal, simplesmente não trouxe qualquer aperfeiçoamento para as questões
legislativas do título de utilidade pública.
A busca por uma legislação mais precisa é fundamental, porque só em Belo Horizonte,
são constatadas mais de 3.000 entidades do terceiro setor, sendo que para aproximadamente
40% o principal parceiro é o Estado e para cerca de 20% dessas a fonte principal de recursos é
o fomento governamental, conforme pesquisas realizadas entre 2006 e 2008.18
18 MINAS GERAIS. Ministério Público de Minas Gerais. Centro Operacional de Apoio ao Terceiro Setor. Disponível em: http://www.mp.mg.gov.br/portal/public/interno/arquivo/id/3164. Acesso em: 27/03/2012.
20
8 Referências
BRASIL. Lei n. 91, de 28 de agosto de 1935. Determina regras pelas quais são as sociedades declaradas de utilidade pública. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1930-1949/L0091.htm. Acesso em: 29/03/1012.
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21
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7 CONCLUSÃO
Embora a legislação federal seja anterior às legislações do estado de Minas Gerais e do
Município de Belo Horizonte/MG, essas leis não apontaram aperfeiçoamento ou
22
aprimoramento nos quesitos seja para concessão do título de utilidade pública, seja para
definição das atividades a serem desenvolvidas, controle e ou monitoramento das mesmas.
As legislações, seja estadual ou municipal, não trazem em suas redações qualquer
previsão de controle sobre as receitas e administração das entidades declaradas de utilidade
pública. A legislação federal ainda se apresenta mais completa que as legislações do Estado e
do Município.
É de suma importância que as legislações estaduais e municipais procurem o
refinamento do modelo federal de declaração de utilidade pública, mas com atendo-se
principalmente, aos quesitos e exigências que possam impor às entidades sociais uma maior e
mais objetiva forma de controle e exigência de resultados nas atividades prestadas, buscando
sempre a eficiência que se espera das entidades sociais.
As legislações Estadual e Municipal são ainda menos rigorosas do que a legislação
federal. Ou seja, oferecem um amplo espectro de fuga dos resultados da prestação da
atividade por parte da entidade declarada, pois não existem critérios objetivos para definição,
aferição, fiscalização ou controle das atividades que são realizadas, da forma como são
realizadas, ou mesmo dos resultados que deveriam apresentar.
Portanto, o cenário legislativo da declaração de utilidade pública no Estado de Minas
Gerais e no Município de Belo Horizonte, é desolador. Totalmente vazio quanto à critérios
objetivos que afetem as entidades declaradas de utilidade pública.
8 Referências
BRASIL. Lei n. 91, de 28 de agosto de 1935. Determina regras pelas quais são as sociedades declaradas de utilidade pública. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1930-1949/L0091.htm. Acesso em: 29/03/1012.
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23
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