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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),
Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X
AS CONTRADIÇÕES SOBRE A POSIÇÃO DAS MULHERES EM
ENCENAÇÕES DE A VIDA DE GALILEU: JEITOS DE FAZER GÊNERO
COM BRECHT NO BRASIL
Lúcia R. V. Romano1
Resumo: O ensaio estabelece a trama entre encenações brasileiras de A Vida de Galileu, de Bertolt
Brecht, observando as transformações nos nossos palcos do discurso sobre a posição social das
mulheres no arco histórico dos últimos 60 anos, através do exame das demarcações de gênero
feminino no tecido composto pelo texto dramático, encenação e o contexto da montagem, nas
direções de José Celso Martinez Corrêa, em 1968, e Cibele Forjaz, em 2015. O exame da
personagem feminina em Brecht é cotejado à bibliografia baseada na crítica feminista, cujas
propostas inspiram a atenção da teoria feminista no teatro, em especial Lennox (1978), Pollock
(1989), Diamond (1988) e Dollan (2012), a fim de tratar da relação entre dramaturgia e cena teatral,
sob a luz da historicização brechtiana, ainda que com posições divergentes a respeito do legado do
dramaturgo, diretor, poeta e pensador do teatro. A comparação entre algumas soluções encontradas
nas duas montagens permite explorar os temas da “cegueira de gênero” e da “consciência de
gênero” nas produções cênicas, espelhando os desdobramentos das hierarquias de gênero em
território nacional.
Palavras-chave: teatro brasileiro, feminismo, Bertolt Brecht, gênero feminino.
A Vida de Galileu foi escrito por Bertolt Brecht em três versões integrais. A primeira delas, iniciada
em 1937, foi finalizada em 1938. A segunda, data de 1946-47 e a última, trabalhada ao longo de três anos,
teve conclusão em 1956. Entre as razões da obra A Vida de Galileu ter atravessado quase duas décadas de
vida do autor alemão, estão a personagem luminosa de Galileu, figura muito admirada por Brecht, ao lado
dos temas que a peça explora: o peso da ideologia nos grandes discursos do ocidente – a religião e a ciência -
, e a autonomia da ação no traçado do destino humano individual, em contraste à ordem social.
A produção escrita do próprio Galileu, em especial o Diálogo concernente aos dois principais
sistemas do mundo, de 1632, serviu a Brecht como inspiração para a redação de A Vida de Galileu, além de
A Compra do Latão (às vezes traduzido como A Compra do Cobre, concebido entre 1939 e 1955), que
Brecht definu em seus diários como: “(...) Um bocado de teoria em forma de diálogo em Der Messingkauf [A
Compra do Cobre] (estimulado a usar essa forma pelos Diálogos de Galileu) (Brecht, 1977, p. 24)”.
A Vida de Galileu no Brasil teve duas montagens marcantes, entre outras versões encenadas do texto,
que não serão comentadas aqui. A primeira delas estreia no dia em que o AI-5 é decretado, em 1968, quando
o Teatro Oficina de São Paulo apresenta a peça, com direção de José Celso Martinez Corrêa (retornada em
cartaz em 1971). Anos depois, em 1974, o Oficina é invadido pela polícia e Zé Celso, entre outros membros
do grupo, são presos. Ao fim de noventa e três dias preso e após ser torturado, Zé Celso se auto-exila em
Portugal, onde volta a encenar A Vida de Galileu (1975-78), agora assinado como “encenação coletiva”,
1 Docente do DACEFC do Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho- Unesp/SP.
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segundo o próprio Oficina2. Cibele Forjaz encabeça a segunda montagem aqui discutida, em 2015,
retomando a experiênica de dirigir o texto de 1998 (com Renato Borghi no papel-título, que já havia
substituído Cláudio Correa e Castro, numa das versões de Zé Celso), mas com outra roupagem e em
dimensão de produção diversa à da década anterior, agora com Denise Fraga como protagonista e produtora.
No arco histórico desses 60 anos (considerando o período de meados de 1960 à década em curso), o
Brasil passou por transformações marcantes. O trauma do Golpe Civil-Militar e a distensão que, pelos fatos
mais recentes, mostra-se ainda infinda; o ingresso do país no capital global; a ascensão e derrubada de um
governo de origem nos movimentos de esquerda são alguns dos eventos em nível das instituições políticas
que determinaram a transformação nas condições socioeconômicas e na vida dos cidadãos. Na educação, na
saúde e no mercado de trabalho, por exemplo, áreas centrais para a avaliação dos impactos das ações das
políticas no campo social, os indicadores nas maiores cidades brasileiras demonstram a superação de
condições antes muito precárias, notáveis nos últimos 15 anos (Marques et alli, 2010).
Não apenas em decorrência das ações do Estado e sua agências, mas também pela intervenção de
outros tipos de governança, através de grupos da sociedade civil, os movimentos sociais encontraram nova
expressão no período. O feminismo nacional, em gradual retomada desde 1975, data celebrada como
importante pelos próprios movimentos de mulheres (com a criação do Movimento Feminino pela Anistia, só
consolidada em 1979, e reuniões e atos de comemoração ao Ano Internacional da Mulher), vê a partir de
2013 demonstrações públicas de seu novo fôlego.
De que modo esse contexto foi absorvido pelo teatro nacional? A questão é bastante ampla e
necessitaria de recursos diversos, que abrangessem os inúmeros desdobramentos do diálogo entre a
manifestação coletiva das mulheres no país e a politização da cena teatral no aspecto de gênero. Entretanto, é
possível afirmar que certa reação contra o protagonismo do sujeito homem-branco-heterossexual-de classe
dominante foi deflagrada também nas peças teatrais. Em termos do debate de gênero, os temas sobre a
realidade das mulheres ganham destaque, enquanto mais artistas mulheres passam a ocupar o espaço da
criação, não apenas como atrizes, lugar já consagrado às mulheres em décadas anteriores. Vale lembrar que a
defesa de mudanças nas hierarquias de gênero beneficia-se do elemento interseccional, ou seja, do
entendimento da atuação funesta do binarismo de gênero mesmo quando a luta tem como foco o combate às
hierarquias de classe e raça-etnia.
O exame das duas montagens de A Vida de Galileu, nas concepções de José Celso e de Cibele
Forjaz, separadas por quase meio século, pode auxiliar na observação das transformações no modo como o
teatro brasileiro vem tratando a questão do papel social das mulheres, em relação ao estado de sua luta
política no campo social. Interessante notar que a peça não tem por tema a condição feminina, nem a autoria
2 Disponível em: em http://www.teatroficina.com.br/menus/51/posts/175
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de uma dramaturga mulher. Desse modo, as montagens não representam, a princípio, objetos favoráveis à
visibilidade das preocupações concernentes ao feminismo. Entretanto, é na comparação entre elas e seus
contextos que se evidenciam elementos simbólicos que aportam condições para o questionamento da
cegueira de gênero, só possível com o destaque na cena das relações moldadas pelo binarismo de gênero.
No sistema criado por Brecht para a história de Galileu, o grande matemático é o motor, o centro em
torno do qual giram as demais personagens e a própria narrativa. Ao sabor do seu movimento, revolvem as
personagens do núcleo familiar, Andrea, Dona Sarti (mãe de Andrea) e Virginia (filha do astrônomo), os
amigos próximos, Sagredo, Federzoni e o pequeno monge, o povo e os poderosos da Igreja, da Universidade
e da realeza. Galileu desloca-se por Pádua, Florença e Roma, sendo dada a ele a prerrogativa da mudança
não só de endereço, mas de qualidade; enquanto que às demais personagens, fazendo circo-evoluções muito
mais tímidas, são permitidas poucas escolhas. O resultado é que deles e delas, sabemos sempre menos. Dos
quinze quadros da peça, Galileu está em quase todos e é a partir de sua capacidade de visão e de sua cegueira
que antevemos que “o tempo antigo acabou, e começou um tempo novo”.
As personagens femininas de A Vida de Galileu, portanto, não são protagonistas, mas satélites, ao
contrário do que ocorre em Mãe Coragem, A Alma Boa de Setsuan, ou Santa Joana dos Matadouros. Trata-
se, assim, de uma peça problemática para pensarmos sua potência em termos da reversão de preesupostos de
gênero. Além disso, era no cientista italiano que Brecht divisava o exemplo do herói, segundo seus princípios
dialéticos, nutrindo por ele evidente fascínio, de tal forma que as mulheres da peça deslizam entre pouca
oportunidade de ação e um desenho de traçado grosso (o que poderia ser considerado fruto de uma visão
exterior dos dilemas da condição feminina). No perfil dessas mulheres, não há espaço para a exploração de
alternativas aos estereótipos de gênero, uma vez que estão submetidas e submissas aos contrangimentos
impostos pelo patriarcado e aos valores mais tradicionais da igreja. Trata-se de um mundo de homens, em
que a personalidade luminosa e absoluta de Galileu obscurece outras estrelas.
Na literatura feminista, a visão sobre a obra brechtiana não é unânime quanto aos traços sexistas em
seus escritos (e mesmo na vida ordinária do autor), assim como à sua compreensão do peso dos estereótipos
na construção do imaginário sobre a mulher, ou da importância do teatro para a desnaturalização das
hierarquias de gênero (Lennox, 1978). No texto de Brecht em quadro, a diferença entre homens e mulheres é
francamente reproduzida pelo mestre italiano, por exemplo, no contraste gritante entre o tratamento dado por
ele à filha e ao menino Andrea, que cria como tutor. Mas essa diferença de proporção não é fruto da paixão
de Brecht pela figura do astrônomo, nem é indício seguro do machismo do autor alemão, visto a
complexidade da personagem título, bem ao gosto da perspectiva de Brecht sobre o teatro.
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Na personagem de Galileu, Brecht projeta a missão de questionar e transformar a sociedade de seu
tempo, tomando para si a tarefa de inventar meios de transmissão para as novas verdades sobre o mundo, que
sejam amplamente acessíveis. É a mesma missão que apresenta o trecho do Diálogos Sobre o Latão:
Filósofo – As experiências no Teatro Globe, como as de Galileu, que tinha sua
maneira de tratar o globo, correspondiam a uma transformação do próprio globo. A
burguesia dava os seus primeiros passos hesitantes (...)
Actor – Detesto todas estas conversas sobre a arte como servidora da sociedade.
Temos aí a sociedade toda-poderosa, e a arte não faz parte dela, só lhe pertence, é
sua criada de mesa. Temos todos de ser criados? Não podemos ser todos senhores?
A arte não pode ser uma senhora? Acabemos com os criados, também na arte!
(BRECHT, 1999, p. 61-62).
O Galileu de Brecht espelha a função do artista, que deve dispor-se a procurar não apenas maneiras
de desvendar o que segue oculto aos homens e mulheres, mas de levar “às praças do mercado”, de maneira
simples e objetiva, condições para o nascimento de um outro entendimento. Isso, contudo, é tarefa inglória:
ao mesmo tempo que dá sentido maior aos nossos gestos (que, mesmo imbuídos da chama revolucionária,
estão sempre circunscritos às forças históricas), vai além da existência histórica de cada indivíduo. Por isso,
no discurso brechtiano, a história de Galileu não supera a da coletividade, de tal forma que sua disposição
frente aos impasses vividos em sua época não seria modelar, mas sim um exemplo notório, que serve para
aprendermos “a ver todas as coisas a partir da perspectiva do conflito, da transformação, da separação, da
alteração” (Didi-Huberman, 2008, p. 234).
O Galileu desenhado por Brecht é um homem afeito aos prazeres da carne e às vaidades do intelecto.
Através de seus qualitativos e defeitos, conhecemos os limites da nossa liberdade moral, de acordo com
nossa atuação no mundo, em que pesem as determinações sociais e do capital, forças desmontadas frente aos
nossos olhos através dos recursos da forma épica, que busca “tratar os elementos do real no sentido de um
arranjo experimental”. O mesmo poderia ser dito das personagens femininas e de sua aquiescência para com
a situação de dominação. Na “maquinaria dialética de Brecht”, parodiando a leitura de Huberman, o que se
mostra na cena adquire importância pedagógica, porque toma posição e, assim, nos convida também a
examinar duas vezes, considerando a relatividade de qualquer ponto de vista.
O autor alemão, demonstrando esse entendimento sobre os acontecimentos da fábula e a necessidade
de confrontá-los seguidamente com seu significado e com outras formulações sobre a realidade, retornou
inúmeras vezes ao seu material, propondo por fim uma estrutura em que as personagens são colocadas em
perspectiva, ou seja, através de sua relação com o mundo que as rodeia. Nos termos de Brecht, a
compreensão sobre os seres humanos só pode ocorrer através dos processos em que participa e por via deles.
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Através da forma épica, chegamos à “a essência humana” tratada “como o conjunto de todas as relações
sociais” (Brecht apud Garcia, tradução nossa).”
Há que se considerar que, ainda que o legado de Brecht o aproxime de uma dimensão clássica,
apresentando um “certo fôlego trans-histórico” (Pasta, 2010, p. 159), seu conjunto de referências acompanha
suas influências poéticas, estéticas e filosóficas, bem como uma análise sobre as realidades da Alemanha, da
Europa e do mundo a ele contemporâneas. Além disso, seu impulso de estalecimento de um teatro
internacional, cujo arco projeta-se para o futuro, ainda segundo Pasta (2010), a partir de uma consciência
política que o direciona a determinados temas em torno da “miséria alemã” (nas variantes inúmeras, que vão
dos assuntos de ordem econômica, ao nazismo e à Guerra), a questão da problemática de gênero é sobreposta
pela de classe.
Sabemos que a disposição do autor alemão em relação tanto aos temas quanto aos modelos formais
da tradição dramática não foram imutáveis no decorrer de sua produção, tampouco a visão sobre as
personagens femininas e as interações entre homens e mulheres e entre as próprias mulheres exposta nas
peças. Na última versão de A Vida de Galileu, constata Jones (1995), as personagens Galileu e Virginia
surgem modificadas. Na Cena III, quando Virginia demonstra preocupar-se com o bem estar do pai, a jovem
ganha tintas mais negativas, parecendo menos inteligente do que na primeira versão. Se antes, através do
diálogo da dupla, a relação parecia ser positiva e quase amorosa, na versão de 1956, a troca entre os dois é
mais seca e formal. O ajuste não atende a uma aproximação com as fontes históricas, uma vez que é sabido
que a filha natural do astrônomo italiano, Virginia Galilei (Sóror Maria Celeste), manteve com o pai
correspondência constante e fraternal. O retrato da submissão de Virginia serve, portanto, a outros objetivos:
na visão de Jones, Brecht dá a ver ao publico da peça as consequências de “se ignorar as necessidades das
mulheres”, uma vez que a opressão da filha irá refletir-se em seu comportamento opressor para com o pai, na
prisão domiciliar em que Galileu viverá seus últimos dias.
Como já dito anteriormente, se em Santa Joana dos Matadouros Joana assume o lugar da heroína,
materializando a visão de Brecht sobre o herói negativo, aquele que “expõe pelo avesso” nosso próprio
comportamento de classe, em A vida de Galileu, as personagens da filha, Virginia, e da criada Dona Sarti
soam menos contraditórias. Elas parecem estar ali nem tanto com a função de demonstrar o espaço
inferiorizado destinado às mulheres na sociedade da época, mas o tratamento preconceituoso de Galileu para
com elas, somando às contradições humanas do cientista o sexismo e a inconsciência sobre o valor humano
daquelas que lhe são mais próximas. O sentido dessa forma de exposição, conclui-se, é consciente: Jones
(1995) reforça que Virginia sumariza a estrutura social, na medida em que é a imagem completa do modelo
de socialização da criança menina e da filha, tão devotada aos demais que mal dispõe de traços de identidade
próprios. Sua “limitação intelectual”, da maneira como Brecht a desenha, decorre diretamente de uma
criação alienante, do cerceamento de todos os planos de atuação no mundo a que estaria destinada (o
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casamento sendo o principal deles) e do contato desigual com a genialidade e vaidade paternas. Ela é,
portanto, um produto histórico e de seu meio que, por fim, ocupará o lugar de algoz, tornando-se espiã do
próprio pai. Segundo Jones:
Quando Virginia o trata como uma criança em seus anos finais, prescrevendo suas
escolhas de comida e monitorando suas atividades diárias, nós somos lembrados do
tratamento que recebeu dele durante sua adolescência (JONES, 1995, p. 264).
Também Dona Sarti tem semelhante dependência do que há de terrivelmente magnético em Galileu,
ainda que seja tratada por ele com mais respeito do que o dispensado à própria filha. Sarti, uma representante
do povo iletrado, é dona da inteligência prática que falta ao cientista, sendo a responsável pela organização
da casa e pela solução dos impasses da vida cotidiana. Ela age sobre Galileu com independência e sente-se à
vontade para criticá-lo, numa intimidade que deixa entrever a existência de algum laço sexual ou amoroso
entre eles. Virginia e Sarti servem, portanto, para demonstrar a atitude discrimatória do cientista, ao lado de
uma crítica potencial à natureza desigual das relações entre homens e mulheres à época. Como resume
Jones, o sexismo de Galileu teria função géstica.
Pollock (1989), comentando a forma de tratamento do autor alemão para com as personagens
femininas em suas peças posteriores, localiza na disposição contraditória entre amor e poder social a solução
de Brecht para superar o modelo patriarcal que reduzia as mulheres da dramaturgia expressionista à divisão
polarizada entre interesses idealistas e materialistas, que as enredava em duas possibilidades de interação
dramática, a subserviência romântica e a rejeição anti-romântica. Entretanto, pondera a autora, Brecht as
libera da dominação, mas não do ideal de regeneração social que a pertença à família representa. Segundo a
autora:
Ele projeta uma mulher que é, em virtude de sua capacidade de resposta deveras humana,
socialmente progenitora. Essa mulher é não mais positivamente expressa que em O Círculo
de Giz Caucasiano. Na personagem de Grusha, a dialética irônica cede à formação de um
tipo maternal que não apenas sintetiza interesses materialistas e idealistas, mas dá nova vida
ao sonho expressionista de uma Nova Família de homens (POLLOCK, 1989, p. 86, tradução
nossa).
Para a autora, se nas primeiras peças o papel das mulheres era complementar ao do ideal de “Novo
Homem” (que devia a elas o aprendizado do amor fraterno e da lealdade, ainda que sem compartilhar sua
posição ativa, restrita ao masculino), as personagens vão adquirindo qualidades menos emblemáticas de sua
função geratriz e traços de identidade mais autônomos, para além de sua relação com os homens. O desenho
“chapado” das filhas, mães e esposas abnegadas e salvadoras, de peças como Retorno a Damascus, de
Strindberg (um exemplo da visão do proto-expressionismo sobre a mulher), irá desembocar primeiro na
personagem feminina desiludida com a maternidade e com a possibilidade de satisfação de seus desejos,
encarcerada pela misoginia e pelo incesto, refletindo o colapso do projeto de transformação social de final
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dos anos 1910. Uma década será necessária para que surjam exemplares de dramaturgia em que a mulher
possa assumir posição ativa, superando a romantização masculina sobre ela e tornando-se por si mesma a
força revolucionária. Ainda assim, em meados da década de 1920, sua posicão na trama não será de
protagonismo e seu destino terá por marca a infelicidade.
Brecht, da mesma forma, inicia sua produção retratando a mulher de maneira solitária, por escolha
ou força, e com traços críticos. É o caso das personagens femininas em Baal e Tambores da Noite, peças em
que examina o lugar de objeto sexual, no padrão burguês. Ainda assim, defende a autora, há nas “mulheres
de Brecht” a capacidade da maternidade, característica que surge contraposta ou a outro elemento em sua
própria identidade, ou presente em outra personagem – como uma “outra versão dela mesma” (Pollock,
1989, p. 95). Dessa forma, Shen The e Shui Ta, em A Alma Boa de Setusan, Mãe Coragem e Katrin, em Mãe
Coragem, e Grusha e a Mulher do Governador, em O Círculo de Giz Caucasiano, não são duas partes do
uma só unidade, mas metades “refratárias”, que causam estranhamento e reflexão (Smith, 1991). Essa
duplicidade provoca a plateia a decidir sobre o modelo de ação que caberia às mulheres, examinando as
consequências de suas preocupações, entre os limites do publico e do privado. Em Groucha, por fim, a
própria maternidade atravessa a barreira do universo privado, tornando-se “maternagem”, uma reversão
simbólica desse papel social, agora independente do laço biológico. Essa quebra na ordem familiar
tradicional anuncia a transformação da sociedade, através das mudanças de qualidade da personagem
feminina e na dimensão de seu papel “típico”.
A revisão das personagens femininas em Brecht pela crítica feminista soma-se ao emprego da
dialética brechtiana e dos recursos de seu teatro épico como ferramentas do teatro feminista, exatamente por
oferecerem a possibilidade de exposição do fator de construcão das convenções sociais de gênero, abrindo
caminho à transformação de padrões e valores dominantes. Dollan (2012) defende o gestus como uma
potente estratégia para aquelas formas teatrais que desejam oferecer um “re-enquadro” para o papel da
mulher, em especial, o teatro feminista lésbico. Diamond (1988), por sua vez, partindo do feminismo
materialista, vê no gestus brechtiano material para a formulação de um criticismo géstico, em que o modelo
de visualidade praticado no teatro pode ser corrompido, dando fim à dominação do olhar masculinista que
embasa a relação tradicional entre personagem-atriz-espectadora e determina a objetualização do corpo da
mulher. O voyeurismo, que domina a economia visual nos sistemas signicos baseados na representação
ilusionista, encontra no no teatro épico uma alternativa para a prática “de ser olhado” (looked-at-ness),
graças ao investimento num certo caráter presentacional, que permite o “olhar de volta” (looking-ness). Para
Smith (1991), a convenção explícita típica do teatro brechtiano, que serve para denunciar que os signos da
cena não são auto-suficientes nem universais, oferecendo visibilidade às alternativas daquilo que se expõe,
também servem como formas de desmonte da lógica sexista.
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Na leitura de Smith, o ciclo de reprodução dos estereótipos de gênero do teatro brechtiano será
rompido quando as espectadoras puderem, através do prazer, engajar-se a esses papéis de gênero, como um
estágio anterior à desfamiliarização. Aparentemente, a autora entende ser necessário uma “aproximação”,
antes da total “separação”. Em seus termos, a síntese apropriada não se processa porque Brecht não “fez
justiça às complexidades dos gêneros da vida cotidiana” (Smith, 1991, p. 496), no que diz respeito à
dimensão do desejo da mulher: nesse aspecto, a dominância da imagem de uma maternidade ideal, vivendo
dilemas masculinos, obscurece (conforme descreve Kristeva) outras “dobras” da psiquê feminina. Segundo a
autora:
O que parece bloquear esse prazer em peças como Mãe Coragem, em que
poderíamos esperar novas formulações de gênero, é a tradicional, talvez mesmo
essencialista, dicotomia mãe/puta que as dialéticas de apresentação em curso
falharam em endereçar (SMITH, 1991, p. 495, tradução nossa).
Por outro lado, é possível considerar que parte importante do jogo entre aproximação e separação
ocorre no processo de encenação e na própria performance das peças breshtianas. Pasta (2010) ressalta o
quanto o aprendizado de distância de Brecht norteou o tratamento dado por ele ao material dramático. Assim,
seu processo deflagrador, baseado na autocrítica e na crítica da sociedade, empregando “dados históricos
performados esteticamente” (PASTA, 2010, p. 300), modela a matéria histórica. O que se vê nas peças,
portanto, é o trabalho de Brecht que nasce do deslocamento entre sociedade e obra, num curto-circuito que
contrapõe a matéria/conteúdo da obra à matéria histórica de sua época. Dessa forma, não seria errado dizer
que encenar seus textos significa refazer a apreciação crítica não apenas sobre a obra e os temas, mas sobre a
relação tensionada, “limite”, entre matéria e forma ali apresentada.
Pasta (2010) ressalta a função modelar da perspectiva brechtiana, lembrando que: “Onde esta
atividade modelizante de Brecht melhor se explicita é justamente no domínio da encenação teatral, onde a
imitabilidade e a reprodutibilidade pretensamente se chocam com o proverbial hic et nunc do espetáculo
(Pasta, 2010, p. 335). Interessante notar que, ainda que as diferentes montagens de A Vida de Galileu não
partam das preocupações feministas, elas expõe uma experiência sociológica (na leitura de Benjamin,
analisada por Pasta) em que se apresentam também as tensões entre os gêneros. Não apenas aquelas previstas
pela análise “científica” de Brecht, ou permitidas apesar da ênfase na luta de classes, mas outras que
emergem da contradição entre o conteúdo da obra e sua atualização coletivizada, estabelecendo atritos entre
realidades históricas e produzindo, a partir das resultantes, outras variáveis. Cabe dizer que a historicização,
que é defendida por Brecht enquanto fundamental para muitos aspectos e etapas do processo de composição
cênica e de montagem de um texto, deveria abranger a partir de 1960 a consciência das transformações na
nossa visão sobre homens e mulheres e, em especial, sobre o patriarcado e a revolução feminista. Isso,
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evidentemente, se o projeto de encenar Brecht focar de fato do desejo de intervenção na história da cultura,
enfrentando a difícil síntese entre estética e política, num contexto em que as lutas das mulheres ganharam
corpo e projeção, em especial, a partir da segunda onda feminista.
No Teatro Oficina, em 1968, Martha Overbeck atuou como Virginia, personagem também
defendida, em substituições, por Ester Góes, Ítala Nandi e Cecília Thumin. Cecilia Rabelo criou Dona Sarti,
substituida por Ileana Kwasinski e Liana Duval. Outras atrizes participaram da produção, tanto em papéis
masculinos (Andrea Sarti chegou a ser interpretado por Margot Bairdi e por Sonia Goldfeder,
provavelmente, em substituição a Fernando Rabelo), quanto em papéis femininos menores (uma Monja,
Camareira do Papa, Senhora Vanni e Dama da Corte de Florença) e corais (Mascarada e Coro). É preciso
destacar que na versão escrita em 1938-39 e traduzida por Roberto Schwarz, usada na montagem, inexistem
algumas das personagens (a mulher de Vanni e a Camareira do Papa) desenvolvidas pelo grupo. Lima (2001)
recorda outras soluções da encenação, tornadas notórias: ao lado das grades que circundam o espaço cênico,
remetendo ao perigo do estado vigiado de Galileu, e da nação pós-AI-5, a cena da paramentação do Papa e o
Carnaval do Povo (Cena X) representam a assinatura “antropofágica” da versão de José Celso, que mistura
Brecht, Artaud e o aprendizado então recente do Oficina, em Roda Viva. Segundo Lima:
Ele põe em cena o ritual da "roda" ou "corrente", prática usual de nosso sincretismo religioso
que junta pessoas de mãos dadas em concentração profunda para produzir energia mental,
transmitida aos intérpretes e espectadores. Ao mesmo tempo, ele procura carrear para a cena
do Carnaval de Florença a mesma força cinética e sensual que vê emanar dos corpos
explodindo nos terreiros de macumba, nas quadras das escolas de samba e nos desfiles das
grandes avenidas, durante o Carnaval (LIMA, 2001, s.n.).
É importante destacar a eloquência da presença dos corpos de homens e mulheres na montagem de
1968, em confronto à falta de liberdade vivida pela nação no periodo e, na exposição de suas pulsões,
denunciando ainda os “lugares de gênero”, através da participação das atrizes no coro e em personagens
secundárias. Mas, voltemos ao exame das duas personagens mulheres que possuem “nome próprio” no texto
e a maneira como foram retratadas na monategm. Lima (apud Ribeiro, 2004) comenta os figurinos de
Virgínia, um vestido branco, denotando ingenuidade, com estilo característico da época de Galileu. Ítala
Nandi comenta o impacto da personagem, na cena da abjuração:
Virgínia, a filha de Galileu, é interessantíssima. Invariavelmente a cena [em que os
sinos tocam porque Galileu abjurou] era aplaudida: no centro do palco (uma rampa
branca inclinada sobre a platéia), Vírginia, já de freira, ajoelhada rezando a Ave
Maria em latim, bem baixinho, e ao lado, em outro foco de luz, os amigos de Galileu
torcem para que ele seja forte e não renegue (NANDI, 1989, p. 122).
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Em artigo publicado em 1978, a atriz discute seu próprio aprendizado feminista através do estudo e
criação da personagem Virginia, que a levou a considerar o espaço fundamental das mulheres nas
transformações sociais: se não se alinham à frente revolucionária, acabam por somar-se às forças mais
conservadoras. É provável que a experiência da participação feminina nos eventos que apoiaram a Ditadura
Civil e Militar tenham iluminado a leitura da atriz para a personagem criada por Brecht. Contudo, Nandi vai
além da constatação do reacionarismo de certas mulheres, quando afirma que essa disposição resulta da
alienação delas sobre sua própria condição de dominadas, e que essa alienação é promovida pelo machismo
da sociedade.
Nandi (apud Ribeiro, 2010) comenta a mudança na posição das mulheres no Brasil de maneira
positiva:
Conquistei minha liberdade sexual, as mulheres a conquistaram, e por isso
já não se fala desse assunto. O que não está resolvido é a hipocrisia, a
corrupção, essa olimpíada da violência em que vivemos, os estragos no
ambiente, na biodiversidade da natureza (NANDI, apud Ribeiro, 2010, s.n.).
Foi neste novo panorama que Denise Fraga escolheu encabeçar a montagem encabeçada de A vida
de Galileu que circulou por dois anos pelas principais capitais do país, merecendo destaque nas mídias de
comunicação de massa e publicações de divulgação e críticas várias e extensas. Muito embora a inversão de
gênero da personagem de Galileu, representada por Fraga, fosse evidente (inclusive, com a atriz retirando a
peruca masculina diante do publico e dirigindo-se à plateia com a própria voz, sem a caracterização da
personagem, por diversas vezes), as implicações do rompimento no alinhamento entre o sexo da atriz e da
personagem não foram tratadas, ao menos nos textos publicados em revistas e jornais de maior circulação.
É difícil afirmar se a criação da atriz foi tão magistral, “desviando” a atenção da platéia da “ousadia”
de casting; se o fato de Fraga ser ela mesma uma figura midiática naturalizou sua ocupação da posição de
protagonista (na divulgação oficial, o release da Morente Forte Assessoria afirmava em letras garrafais
“Denise Fraga é Galileu Galilei”)3, ou se jornalistas e críticos especializados simplesmente não estavam
preparados para observar relações de gênero como relevantes na recepção da obra cênica, deixando de lado o
aparente “detalhe”. Menezes (2015) tece o único comentário divulgado num grande veículo que se aproxima
de um olhar atento aos demarcadores de identidade, muito embora não pontue diretamente as políticas de
gênero:
O papel de um homem que envelhece diante dos espectadores não parece, a
princípio, servir perfeitamente a uma atriz reconhecida por seu talento cômico.
“Obviamente, não era um papel para mim. Mas, se estamos fazendo teatro, o fato de
ser parecido com o personagem é completamente secundário”, crê a atriz. “O que
3 http://www.morenteforte.com/galileu-galilei/
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me interessa é o potencial revolucionário dessa história. Tudo isso alcançado por
meio do humor.” (MENEZES, 2015, s.n.)
Enquanto não faltam elogios ao trabalho da protagonista, inexistem avaliações mais profundas sobre
as sobreposições de sentido em virtude do trânsito de gênero da versão de 2015 que, além de um Galileu
“feito” por uma atriz, trazia também mulheres nos papéis de Cosme (Jacquie Obrigon) e do Cardeal
Berlarmino, depois ordenado Papa (Maristela Chelala). Do ponto de vista da grande mídia, “ser” mulher e
“representar” um homem é tão pouco notável, quanto as relações de opressão vividas por Virgínia, ou por
Dona Sarti. Ainda assim, pode-se afirmar que a encenação de Cibele Forjaz reforçou algumas linhas de
tensão favoráveis ao debate sobre os papéis sexuais.
O Galileu de Denise Fraga continuava inclemente para com as mulheres, proclamando um sexismo
explícito, que se desenhava como um traço de caráter permitido e aplaudido pela construção cultural. Ao
mesmo tempo, à Dona Sarti e à Virgínia, a direção abriu espaços de expressão, através de ações, pequenas
cenas sem texto e até inserções de trechos falados, a fim de destacar alguma dimensão de suas
subjetividades, dando às personagens maior contorno e autonomia, com a escuta para suas vontades
singulares. Na conslusão da cena em que Sarti procura defender Virgínia da iminência de um rompimento
com o noivo, acusando Galileu de estragar o futuro da filha, a personagem não apenas proclama seu
desagravo, ameaçando o patrão com as palavras de Brecht “Mas é o sr. que vai dizer isso à ela”, como
aparece carregando uma mala, que concretiza o final do seu “relacionamento” com o cientista. Se no original
o “sumiço” da personagem das cenas seguintes, até o final da peça, apenas denunciava sua pouca
importância para o desdobramento da fábula, aqui a partida de Dona Sarti adquire significado semelhante à
fuga de Nora, ao final de “Casa de Bonecas”.
Virginia, por sua vez, ao saber da partida do noivo, irrompe vestida com a roupa do seu casamento e,
numa cena em que o texto original oferece apenas um desolador desmaio como desfecho, na encenação
proclama as seguintes palavras, diretamente à plateia: “Esses tempos andei construindo castelos no ar,
pensando comigo mesma, que talvez ser livre não passe de sonho, hipótese. Mas, mesmo assim… No
entanto, tudo vai mal. Uma mulher de nada vale: ela deve obedecer seu pai, para obter um marido. Deus não
vai gostar do que sinto, mas eu vou dizer ao Sr. Galileu que estou mesmo triste mesmo, com raiva!
(confrontando Galileu) Pai, eu… (cambaleia e desmaia).” A ampliação do texto, assinada pela atriz, reuniu
trechos de cartas de Sóror Virginia endereçadas ao pai e frases cuja função seria demonstrar a consciência da
personagem para com sua situação de submissão. Face a isso, o desmaio deixou de ser a manifestação de um
espírito frágil e ligeiramente histérico, para constituir o protesto mudo de alguém que, por ser mulher
naquela sociedade, não teria condições de rebelar-se abertamente contra a altoridade máxima, seu pai.
Sendo assim, na perspectiva de uma encenação preocupada com as hierarquias de gênero, como
entendemos a montagem de A Vida de Galileu dirigida por Cibele Forjaz, “(…) a atriz/personagem, a
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espectadora feminista, e o signo teatral trabalharam juntos para atingir o Verfremdungseffekt (estranhamento
ou "distanciamento") (Smith, 1991, p. 498, tradução nossa)”. Mais do que a caracterização de um gestus de
síntese dos aspectos de classe, sustentou-se na cena a indeterminação da significação, trazendo aspectos de
gênero. As imagens de gênero foram construidas a partir não de signos integrados, mas de camadas
sobrepostas, sem que se escondesse suas partes concorrentes. Assim, a potência de revelação das
personagens femininas pode emergir “por interrupção dos desenvolvimentos”, se não pela “reprodução dos
estados de coisas” (Pasta, 2010, p. 71-72). Além disso, a economia da visualidade, estabelecendo trocas
ativas de olhares entre atriz, personagem e espectadora, logrou multiplicar as maneiras de expor os sujeitos e
as relações, permitindo que uma platéia também múltipla encontrasse entradas e saidas do texto no que
concerne também aos papéis sociais de gênero.
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https://kuscholarworks.ku.edu/bitstream/handle/1808/16482/Iris_theatre_journal.pdf;sequence=1
The contradictions in the position of women in theatrical performances of The Life of Galileo:
ways of making gender with Brecht in Brazil
Abstract: The essay establishes the web between Brazilian theatrical performances of Bertolt
Brecht's The Life of Galileo, observing the transformations in our stages of the discourse on the
social position of women in the historic arch of the last 50 years, through the examination of the
feminine gender demarcations in the tissue composed by the dramatic text, staging and the context
of the performance, in the stage directions of José Celso Martinez Corrêa, in 1968, and Cibele
Forjaz, in 2015. The examination of the female character in Brecht is compared to the bibliography
based on the feminist critique, whose proposals inspire the attention of feminist theater theory,
especially Lennox (1978), Pollock (1989), Diamond (1988) and Dollan (2012), for the relationship
between dramaturgy and theatrical scene, in the light of Brechtian historicization, albeit with
divergent positions about the legacy of the playwright, director, poet and thinker of the theater. The
comparison between some solutions found in the two montages allows exploring the themes of
"gender blindness" and “gender consciousness” in scenic productions, mirroring the unfolding of
gender hierarchies in the national territory.
Keywords: Brazilian theater, feminism, Bertolt Brecht, female gender.
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