MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
PRÓ-REITORIA DE ENSINO DE PÓS-GRADUAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA
CACILDO ALVES NASCIMENTO
AS MIGRAÇÕES E A CONSTITUIÇÃO DAS IDENTIDADES
GAÚCHAS, COXIM – MS (1970 A 2012)
CUIABÁ-MT
2013
CACILDO ALVES NASCIMENTO
AS MIGRAÇÕES E A CONSTITUIÇÃO DAS IDENTIDADES
GAÚCHAS, COXIM – MS (1970 A 2012)
Dissertação apresentada junto ao Programa de Pós-Graduação em História do Instituto de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal de Mato Grosso, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em História.
Orientador: Prof. Dr. Ely Bergo de Carvalho.
CUIABÁ - MT
2013
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO PRÓ-REITORIA DE ENSINO DE PÓS-GRADUAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA
Avenida Fernando Corrêa da Costa, 2367 - Boa Esperança - Cep: 78060900 - CUIABÁ/MT Tel: (65) 3615-8493 - Email: [email protected]
FOLHA DE APROVAÇÃO
TÍTULO: “AS MIGRAÇÕES E A CONSTITUIÇÃO DAS IDENTIDADES GAÚCHAS, COXIM – MS (1970 A 2012)”.
AUTOR: Mestrando CACILDO ALVES NASCIMENTO
Exame de qualificação em 09/11/2012
Defesa em 28/06/2013
Composição da Banca Examinadora:
Presidente Banca / Orientador: Doutor Ely Bergo de Carvalho Instituição: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
Examinador Externo: Doutora Eunice S. Nodaria Instituição: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
Examinadora Interna: Doutora Ana Maria Marques Instituição: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
Examinador Suplente: Doutor Vitale Joanoni Neto Instituição: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
CUIABÁ, 27/06/2013.
DEDICATÓRIA
A todos os que se fizeram presente nas minhas
maiores alegrias e angústias que passei ao longo
deste quase dois anos e meio...
Dedico, especialmente, aos meus pais José e
Aldenora pelo dom da vida, a minha esposa Larissa
que sempre me apoiou nas decisões positivas que
tomei nessa trajetória, aos meus filhos Sophia e Davi
que tem alegrado os meus dias de preocupações.
AGRADECIMENTOS
Após esta etapa da vida, é razoável que haja um grandioso número de
pessoas que contribuíram direta e indiretamente para o sucesso da pesquisa e que
merecem os meus agradecimentos. É sempre tão difícil agradecer, pois nem sempre
as palavras conseguem expressar o carinho e gratidão que sentimos ao chegar
neste estágio da dissertação.
Agradeço ao Criador pela vida e por ter permitido que concluísse mais uma
etapa da formação acadêmica e humana.
Agradeço aos meus pais José Felix Nascimento Neto e Aldenora Alves de
Souza, que compreenderam a minha ausência nesses dois anos. Também agradeço
a minha amada companheira, conselheira e amiga Larissa Escobar Bueno Beltrão
Alves, que de sua dedicação e espontaneidade tirei forças para continuar levando
esta pesquisa adiante.
Aos meus filhos, Sophia que esteve literalmente ao meu lado nesses dois
anos, sempre nos momentos de grande tensão e stress, pois vinha com um sorriso
meigo e desarmava toda aquela situação de desespero, e ao Davi que veio para
coroar esse trabalho e revigora o entusiasmo para continuar a batalha.
Agradeço ao meu orientador, Professor Doutor Ely Bergo de Carvalho, que
sem ele esse trabalho não seria capaz, pois a sua extrema competência teórica e
rigor metodológico deu sustentação para dar prosseguimento à pesquisa.
O meu agradecimento aos amigos Marques Sandro e Tiago de Jesus que me
apoiaram durante esses dois anos, amigos do tempo de graduação. Tiago foi com
quem já dividi república nos tempos de UFMS e nos tempos de UFMT, “dividimos
orientador”, como ele mesmo diz.
Ao Senhor Chico e a Dona Ana pela acolhida em Coxim, pois sempre
estiveram à disposição em minhas estadias, para realizar a pesquisa de campo.
O meu muito obrigado a Gisele Gutierrez que se dispôs a fazer as correções
ortográficas desde o pré-projeto, ainda quando estava tentando entrar no mestrado e
agora nessa fase de finalização.
A equipe da Escola FUNLEC Coxim, que sempre esteve apoiando esse
projeto desde a época do pré-projeto, a Prof.ª Rasane (in memoriam), a Prof.ª Sara,
as secretárias Marcela e a Neide, mesmo depois de ter deixado a escola não
mediram esforços para me ajudar, telefonando e agendando entrevistas com
pessoas ligadas ao CTG Sentinela do Pantanal de Coxim.
Ao meu compadre Edward, o popular Jota Cabral que esteve sempre disposto
a ouvir histórias chatas em nossos churrascos e, claro, trazendo a cerveja para
espairecer o ambiente, meu muito obrigado!
À Dona Ana, minha sogra, pelo apoio e pela paciência, sem essa ajuda as
coisas poderiam ser bem mais difíceis, meu muito obrigado!
Agradeço a Professora Doutora Maria Neusa da UFMS, uma grande amiga,
sempre disposta a ler o meu trabalho e dar sua contribuição, além de ser uma
grande incentivadora, desde os tempos da graduação.
A todos os colegas de mestrado, pelo aprendizado contínuo em todos os
espaços de convivência, ao Júlio Cesar pelo empréstimo do equipamento de
gravação, e ao Charles, amigo que partilhamos várias discussões, meus
agradecimentos.
O meu muito obrigado aos Professores Thereza Martha e Marcus Cruz por
permitir que fizesse estágio de docência nas suas disciplinas, foi um momento ímpar
de aprendizagem.
Àqueles que se dispuseram a serem entrevistados por mim e que
contribuíram muito com o trabalho realizado.
A Valdomira (Val), secretária do PPGHIS pela sua presteza e bom humor,
sempre disposta a ajudar um mestrando desesperado.
Agradeço também ao Programa de Pós-Graduação em História da UFMT e
toda estrutura proporcionada durante meu curso, bem como, a CAPES por meio do
programa de bolsa de estudos, trouxe condições fundamentais para a elaboração
deste trabalho.
Como diz um provérbio grego “as coisas belas são difíceis”. Meu muito
obrigado a todos!
Todo Dever de memória passa em
primeiro lugar pela restituição de nomes
próprios. Apagar o nome de uma pessoa
de sua memória é negar sua existência;
reencontrar o nome de uma vítima é
retirá-la do esquecimento, fazê-la
renascer e reconhecê-la conferindo-lhe
um rosto, uma identidade.
Candau (2011).
RESUMO
NASCIMENTO, Cacildo Alves. As migrações e a constituição das identidades
gaúchas, Coxim – MS (1970 a 2012). 116 fls. Dissertação (Mestrado em História).
Instituto de Ciências Humanas e Sociais. Universidade Federal de Mato Grosso,
Cuiabá, MT, 2013.
Este trabalho busca estudar e refletir sobre as identidades gaúchas em Coxim, Mato
Grosso do Sul, e como elas foram constituídas a partir das redes etnorregionais
gaúchas e dos movimentos migratórios da segunda metade do século XX, o recorte
cronológico é de 1970 a 2012. A metodologia utilizada é a de construção e
interpretação de fontes orais, realizando entrevistas com grupos de gaúchos
participantes do CTG Sentinela do Pantanal e, também, revisões bibliográficas e de
discussões acerca dos temas fronteira, identidade, etnicidade, migração e poder. Os
estudos sobre os fluxos migratórios na história recente do país apresentam um
quadro social e político que permite um melhor entendimento sobre a identidade, a
partir do processo migratório e das relações de poder. A investigação feita busca
compreender as práticas e representações que foram selecionadas pelo gaúcho,
como protagonista, aquele capaz de negociar sua identidade nesse espaço e
influenciar as relações socioculturais dos migrantes, sob o viés da apropriação e de
introduzir uma organização social própria e observação das possibilidades
relacionais com o outro.
Palavras-chave: Identidade. Migração. Gaúcha. Poder. Coxim.
ABSTRACT
NASCIMENTO, Cacildo Alves. Migration and the formation of identities gaucho,
Coxim - MS (1970-2012). 116 fls. Dissertation (Master in History). Institute of
Humanities and Social Sciences. Universidade Federal Mato Grosso, Cuiabá, MT,
2013.
This work seeks to study and reflect on the identities gaúcha on Coxim, Mato Grosso
do Sul, and how they were formed from the ethno-regional networks gaucho and
migration of the second half of the twentieth century, the chronological cut is 1970-
2012. The methodology used is the construction and interpretation of oral sources,
conducting interviews with groups of participants gaúchos CTG Sentinela Pantanal
and literature review and discussions about the border issues, identity, ethnicity,
migration and power. Studies on migration flows in recent history have a social and
political framework which allows a better understanding of the identity from the
migratory process and relations power. The investigation by seeking to understand
the practices and representations that were selected by taking the gaucho as the
protagonist, who is able to negotiate their identity in that space and sociocultural
relations influence migrants under the bias of ownership and introduce a social
organization itself and observing the relational possibilities with each other.
Keywords: Identity - Migration - Gaúcho - power - Coxim.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 - Mapa ilustrativo da ocupação do atual Estado de Mato Grosso..... 38
Figura 2 - Rota das Monções de Porto Feliz (SP) - Coxim (MS) - Cuiabá
(MT).................................................................................................
44
Figura 3 - Mapa do Mato Grosso do Sul - Coxim em destaque....................... 48
Figura 4 - Imagem aérea da cidade de Coxim as margens do rio Taquari...... 49
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Evolução populacional de Coxim entre os anos 1950 a 2010.... 50
Tabela 2 - População residente em Mato Grosso do Sul, por lugar de
nascimento, segundo a Unidade da Federação de residência –
Brasil – 2008...............................................................................
53
Tabela 3 - Composição da Imigração Interestadual – Estado de Mato
Grosso do Sul – 1970 a 1996......................................................
53
Tabela 4 - Composição da Imigração Interestadual segundo
Microrregiões Estado de Mato Grosso do Sul – 1970/1980 e
1981/1991 – ALTO TAQUARI.....................................................
54
Tabela 5 - Centro de Tradições Gaúchas por Unidade da Federação......... 66
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
BASA Banco da Amazônia
BR Rodovia Brasileira
CAND Colônia Agrícola Nacional de Dourados
CAN Colônias Agrícolas Nacionais
CAT Colônia Agrícola Taquari
CBTG Confederação Brasileira do Tradicionalismo Gaúcho
CPT Comissão Pastoral da Terra
CTG Centro de Tradição Gaúcha
CTN Centro de Tradições Nordestinas
DTC Departamento de Terras e Colonização
EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
FBC Fundação Brasil Central
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INDECO Integração, desenvolvimento e Colonização
INIC Instituto Nacional de Imigração e Colonização
INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
MS Mato Grosso do Sul
MT Mato Grosso
MTG Movimento do Tradicionalismo Gaúcho
PIB Produto Interno Bruto
PIN Programa de Integração Nacional
PND Plano Nacional de Desenvolvimento
PRODECER Programa de Cooperação Nipo-Brasileiro para o
Desenvolvimento dos Cerrados
POLOCENTRO Programa de Desenvolvimento dos Cerrados
PRODOESTE Programa de Desenvolvimento do Centro-Oeste
PRODEGRAN Programa de Desenvolvimento da Região da Grande Dourados
PRODEPAN Programa de Desenvolvimento do Pantanal
SINOP Sociedade Imobiliária Noroeste do Paraná
SMT Sul de Mato Grosso
SP São Paulo
SOMECO Sociedade de Melhoramento e Colonização
SUDECO Superintendência de Desenvolvimento do Centro-Oeste
SUDAM Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia
TDR Territorialização-Desterritorialização-Reterritorialização
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO........................................................................................ 16
2 MODERNIZAÇÃO, COLONIZAÇÃO E MIGRAÇÃO: A EXPANSÃO
DA FRONTEIRA AGRÍCOLA E COXIM.................................................
23
2.1 UMA BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO DA COLONIZAÇÃO DIRIGIDA
NO BRASIL.............................................................................................
25
2.2 A COLONIZAÇÃO EM MATO GROSSO NO CONTEXTO DA
MARCHA PARA O OESTE.....................................................................
26
2.3 COLONIZAÇÃO E MIGRAÇÃO: A NOVA FRONTEIRA AGRÍCOLA
PÓS-1964................................................................................................
33
2.4 COXIM E AS MIGRAÇÕES.................................................................... 43
2.4.1 Formação de Coxim.............................................................................. 43
2.4.2 Consolidação do povoamento de Coxim e as elites locais.............. 45
2.4.3 Coxim no século XX: do fim da navegação à nova fronteira
agrícola...................................................................................................
47
3 O QUE SE LEVA NA ARCA DA MEMÓRIA: A INVENÇÃO DA
IDENTIDADE E TRADIÇÃO GAÚCHA EM COXIM...............................
55
3.1 A INVENÇÃO DO GAÚCHO................................................................... 57
3.2 MEMÓRIA E IDENTIDADE: O CTG........................................................ 63
3.3 A REDE ETNORREGIONAL GAÚCHA.................................................. 69
3.4 COXIM GAÚCHA?: A CONSTRUÇÃO DE UMA ELITE REGIONAL...... 77
4 MEMÓRIA, MIGRAÇÃO E IDENTIDADE: A NEGOCIAÇÃO DA
IDENTIDADE GAÚCHA EM COXIM......................................................
85
4.1 HISTÓRIA ORAL, IDENTIDADE E MEMÓRIA....................................... 85
4.2 NEGOCIAÇÃO DA IDENTIDADE........................................................... 88
4.3 A CONSTITUIÇÃO DA IDENTIDADE GAÚCHA EM COXIM................. 92
4.4 A IDENTIDADE GAÚCHA, CTG SENTINELA DO PANTANAL E O
ESTABLISHMENT..................................................................................
97
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................... 104
REFERÊNCIAS....................................................................................... 107
16
1 INTRODUÇÃO
Esta pesquisa busca investigar como as identidades gaúchas, a partir da
migração, ocorrida entre as décadas de 1970 e 2012, foram constituídas no
município de Coxim. Tal investigação surge da observação acerca dos traços
multiculturais da cidade dessa cidade. É possível notar, neste contexto, a
diversidade de sotaques, comportamentos e práticas culturais, entre elas, a
presença da cultura gaúcha se sobressai, como um grupo de certa relevância social,
econômica e cultural.
Pesquisar a construção da identidade gaúcha em Coxim tende a contribuir
com a temática identidade e migração na segunda metade do século e início do
século XXI. Sabendo da vasta produção acadêmica acerca do assunto, porém, a
produção referente à migração e a tal identidade em Mato Grosso do Sul é bem
reduzida. Isso se incluirá a rede etnorregional no contexto do projeto de
modernização brasileira, com ênfase ao processo de colonização e migração como
forças motrizes desta pesquisa. Outro aspecto relevante que se buscou evidenciar
são as relações de poder estabelecidas no processo de construção da identidade, a
partir do contato ou convivência de gaúchos com aqueles que já estavam
anteriormente morando no local.
A relevância social desta pesquisa está em tentar mostrar como a identidade
gaúcha foi construída no contexto da colonização e migração, ocorridas na segunda
metade do século XX. E, neste sentido, de que maneira se coloca em posição
“superior” aos demais, mesmo sendo minoria. Sendo assim, busca-se apontar a
relação entre os gaúchos e demais grupos, pois de maneira geral, as relações entre
os vários grupos que constituem a sociedade coxinense, parecem harmoniosas. Ao
realizar a pesquisa de campo, o grupo de referência investigativa, revela-se em
posição de superioridade. É importante ressaltar que “o culto às tradições gaúchas”,
nas décadas de 1980 e 1990, foram de grande expressividade, pois o CTG local,
Sentinela do Pantanal, congregava de certa forma, a elite ou, pelo menos, a nova
elite coxinense.
A pesquisa parte da ideia de que os reflexos dos movimentos migratórios na
sociedade local possibilitaram a constituição de várias identidades, entre eles, a
17
gaúcha. Além de possibilitar a coesão desse grupo investigado, evidenciou-se uma
relação de poder entre os grupos existentes, repercutindo na afirmação de que a
identidade gaúcha em Coxim fosse constituída.
Com esse intuito, buscou-se observar a situação da identidade gaúcha não só
nos migrantes oriundos do Rio Grande do Sul, mas naqueles adeptos ou “adotados”
como gaúchos. Para tanto, as entrevistas e os dados oficiais do Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE) ofereceram a possibilidade de traçar o perfil
socioidentitário do gaúcho, bem como o jogo de relação de poder entre os mesmos
e os demais grupos.
Quanto ao recorte cronológico, justifica-se por concluir que as décadas de
1970 a 1980 foram o momento de ápice do processo migratório aqui abordado.
Sendo que as análises das fontes orais obrigaram a fazer algumas considerações
para além do recorte principal, que é até 2012 entrando já no século XXI.
Neste momento, torna-se necessário situar o recorte espacial, para qualificar
a visualização do objeto de pesquisa.
A cidade de Coxim está localizada na região norte do Estado de Mato Grosso
do Sul, com 32.933 habitantes (IBGE, 2009), surgiu no século XVIII como ponto de
apoio aos monçoeiros que iam para a exploração das minas de Cuiabá/MT
(FERREIRA NETO, 2004, p. 150). Coxim é uma cidade marcada pela presença de
migrantes, pois inicialmente foram os paulistas que se aportaram por essas terras
nos tempos das monções, depois os goianos e mineiros, através da rota boiadeira,
que buscavam o gado bovino para o abate em Uberaba, Minas Gerais. Já na década
de 1950, segundo Spengler (1998), nasce a Colônia Agrícola Taquari (CAT), com a
forte presença de migrantes oriundos do nordeste brasileiro. Na década de 1970,
com a expansão da fronteira agrícola, principalmente com a modernização do
campo, Coxim entra em uma nova fase da migração, marcada notadamente pela
presença de sulistas, entre eles, os gaúchos.
Um exemplo da importância de tal fluxo migratório é dado pela importante
participação política dos gaúchos na região. Cita-se o gaúcho, ou melhor, sul-rio-
grandense eleito por duas vezes prefeito de Coxim, o Engenheiro Agrônomo Moacir
Kohl1 que é também empresário e migrante gaúcho, eleito pela primeira vez para a
1 Moacir Kohl, tem 59 anos (em 2013), é Engenheiro Agrônomo, Político, Empresário e produtor rural
em Coxim.
18
gestão do período de 1993 a 1996 e segunda vez para a gestão de 2005 a 2008.
Também foi vice-governador de Mato Grosso do Sul.
Moacir Kohl chegou a Coxim na década de 1970, com a abertura da nova
fronteira agrícola. É esse o momento cronológico que a investigação se concentrará,
com a migração incentivada pelo governo federal, em que uma parcela de sul-rio-
grandenses migrou para colonizar a região centro-oeste, sobretudo, o Estado de
Mato Grosso e a Amazônia meridional e, também, com significativa presença em
Mato Grosso do Sul.
O Estado de Mato Grosso do Sul, ou melhor, o Sul de Mato Grosso foi foco de
migração em muitos momentos de sua história. Porém, o maior movimento
migratório, em termos absolutos, ocorre a partir da década de 1970, com os
governos militares. Nesse momento, era preciso diminuir os riscos de conflitos
sociais no sul do país, então, o governo federal disponibilizou terras às margens da
BR-163 para aqueles migrantes que haviam sido expropriados no processo de
industrialização e da modernização da agricultura na região sul (WEINGARTNER,
2005).
A maioria dos migrantes gaúchos veio com alguns recursos próprios,
venderam o que tinham no Rio Grande do Sul para comprar terras em Mato Grosso.
Outros também receberam terras do governo federal, e quase todos se dedicaram à
agricultura. A região de Mato Grosso foi sempre motivo de preocupação para a
soberania do Estado, nos debates dos dirigentes portugueses e, posteriormente, do
Estado nacional brasileiro. Preocupava-os a distância da região com o centro político
do território. A reocupação dessa região, por meio de uma colonização dirigida era
importante para o governo, pois, ora era uma válvula de escape para minimizar
problemas internos como os conflitos sociais, ora os problemas internacionais como
as delimitações da fronteira nacional, pois apresentava um suposto “vazio
demográfico” nessa região.
Uma questão importante refere-se ao quadro de migração em Mato Grosso
do Sul. De acordo com Martins (2000, p. 83), apresentava dados superiores à média
nacional que, na década de 1980, apresentava o seguinte dado, a taxa de migração
era de 36,08%, enquanto a taxa média nacional de migração era de apenas 15,29%.
Na mesma década, o município de Coxim apresentava dados migratórios bem mais
acentuados, isto é, 52,14%, e na década de 1990, de 44,42%.
19
Muitos migrantes sulistas têm nos Centros de Tradições Gaúchas uma forma
de “manutenção da sua cultura”. Questiona-se até que ponto essa identidade é
mantida? Sabe-se que há uma interação entre o migrante e o habitante/sujeito local,
que também sofreu influências na sua identidade. Essa pesquisa enfatizará o
processo de construção, ou melhor, de reelaboração da identidade gaúcha que
perpassa por relações de poder. (HALL, 1997).
Bauman (2005) apresenta uma perspectiva útil de discussão, acerca da
identidade, certamente, isso enriquece bastante a pesquisa, principalmente pelo
recorte do trabalho de investigação ser um período contemporâneo. Para Bauman
(2005, p. 26), assim como para a maioria dos autores que tratam da questão, a
identidade é uma experiência humana e que se dá na fronteira entre o EU e o
OUTRO.
A identidade, conforme dito anteriormente, é algo que se dá na relação entre
indivíduos ou grupos sociais em dados espaços geográficos, portanto, é relacional,
assim como a etnicidade, conforme Poutignat e Streiff-Fernart (1998, p. 124), “a
etnicidade não se manifesta nas condições de isolamento, é, ao contrário, a
intensificação das interações características do mundo moderno e do universo
urbano que torna saliente as identidades étnicas”, pois,
[...] a etnicidade é uma forma de organização social, baseada na atribuição categorial que classifica as pessoas em funções de sua origem suposta, que se acha validada na interação social pela ativação de signos culturais socialmente diferenciadores. (POUTIGNAT; STREIFF-FERNART, 1998, p. 141).
Para Falcão (2007), a identidade se fortalece mesmo fora do espaço
geográfico de origem:
[...] aos espaços construídos historicamente onde foi se produzindo, a cada instante, a diferença cultural, não apenas pelo concurso de interferências específicas ou pelas combinatórias peculiares que ensejou, mas sobretudo por designar os pontos de inflexão tecidos em grades ou redes apoiadas, superpostas, tangenciadas e atravessadas por outras grades, num amálgama que se modifica a cada movimento em decorrência de relações assimétricas de poder (e não de mera imposição) instituídas pela contraposição hierárquica entre culturas hegemônicas e culturas subalternas (FALCÃO, 2007, p. 205).
Além de questões acerca de identidade tem-se, ainda, dentro do quadro
teórico que dá suporte à pesquisa, a conceituação de memória e identidade de
20
Candau (2011), que mostra o papel fundamental da memória no processo de
construção da identidade, pois “apagar o nome de uma pessoa de sua memória é
negar sua existência; reencontrar o nome de uma vítima é retirá-la do esquecimento,
fazê-la renascer e reconhece-lhe conferindo-lhe um rosto, uma identidade”
(CANDAU, 2011, p. 68). Esse excerto deixa explícito o quanto à memória é
relevante no processo de construção da identidade.
Além de questões sobre a memória e identidade, discute-se, também, a
relação de poder, e dentre as fontes trabalhadas na fundamentação da pesquisa
estará, para discutir a relação de poder que é estabelecida entre os migrantes
gaúchos e a população autóctone2, a obra de Elias e Scotson (2000), intitulada “Os
Estabelecidos e os Outsiders”, que, apesar de não tratar de questões da migração,
trata da constituição de relações de poder, a partir do caso da relação entre pessoas
que estão há mais tempo em determinado local e outras que chegaram
recentemente em relação às primeiras. Essa relação é feita entre o migrante e a
população residente anteriormente.
Para o desenvolvimento da pesquisa e de questões sobre a relação de poder
no processo de construção da identidade gaúcha, a história oral foi fundamental.
Significa que no trabalho de entrevistas busca-se apresentar parte do elenco
participante do processo de construção de uma identidade e memória gaúcha em
Coxim. Utilizada, dessa forma, como aparato de comprovação de algumas
perspectivas sobre o processo identitário-migratório.
Em se tratando da utilização da metodologia da história oral, o embasamento
teórico pode ser encontrado em autores como Portelli (1997):
[...] as fontes orais históricas são fontes narrativas: daí a análise dos materiais da história oral deve se avaliar a partir de algumas categorias gerais desenvolvidas pelas teorias narrativas na literatura e no folclore [...] o único e precioso elemento que as fontes orais têm sobre o historiador e que nenhuma outra fonte possui em medida igual, é a subjetividade do expositor. [...] o trabalho histórico que se utiliza de fontes orais é infindável, dada à natureza das fontes; o trabalho histórico que exclui fontes orais (quando válidas) é incompleta [sic] por definição [...] a história oral não tem sujeito unificado; é contada de uma multiplicidade de ponto de vista, e a imparcialidade tradicionalmente reclamada pelos historiadores é substituída pela parcialidade do narrador. (PORTELLI, 1997, p. 29-39).
2 Nesse caso, quando se refere à população autóctone em Coxim, se está falando da população que
estava estabelecida anterior a década de 1960, incluindo os remanescentes das monções paulistas, indígenas e migrantes, oriundos de Minas Gerais e Goiás.
21
Conforme o texto citado, muitas vezes, utilizam-se fontes orais, entende-se
que para utilizar esse instrumental, se deve ter o cuidado e sensibilidade na análise
dos materiais coletados.
Esse rigor com as entrevistas, sem fugir do foco, deve-se ao fato de lidar com
um elemento tão complexo e plural: a identidade. Principalmente, porque ocorreu
após o processo migratório e será preciso recorrer à memória dos migrantes
gaúchos.
Nas entrevistas realizadas com migrantes gaúchos, sobretudo, àqueles
ligados ao movimento tradicionalista e com os que não são originários do Rio
Grande do Sul, mas que adotam o tradicionalismo como parte da sua identidade,
nota-se que há uma interação cultural entre a população local e os migrantes e seus
descendentes. Observa-se que há um grande sentimento de preservação da cultura
de origem, sobretudo, por meio dos CTGs. Pois o migrante carrega consigo seus
referenciais socioculturais e, quase sempre, se reportando ao Rio Grande do Sul
como seu território de origem, sendo que esta origem torna-se “símbolo maior dentro
da cartografia das identidades étnicas possíveis no universo gaúcho”. (KAISER,
1999; ROCHA, 2006).
O presente trabalho está dividido em três capítulos os quais são intitulados:
O Capítulo 2 trata da Modernização, colonização e migração: a expansão da
fronteira agrícola e Coxim. Nesse capítulo, buscam-se discutir aspectos da
colonização dirigida fundamentalmente a partir da década de 1930, com os
movimentos migratórios internos como processo de colonização dos relativos
“espaços vazios”, buscando, também, um projeto de modernização no Brasil, que vai
de fato se consolidar a partir da década de 1960 com os governos militares. E,
nesse contexto de colonização, migração e modernização, busca-se situar Coxim,
como o espaço da pesquisa.
O Capítulo 3 abordará o que se leva na arca da memória: a migração e a
invenção da identidade gaúcha em Coxim. Buscou-se debater o processo de
formação do gaúcho quanto grupo etnicorregional, com destaque para a formação
histórica do gaúcho e a rede etnorregional formada, a partir dos movimentos
migratórios, o CTG como espaço de recriação da memória e da identidade gaúcha e
como esse grupo constitui-se como elite regional em Coxim.
22
Já o Capítulo 4, intitulado Memória, migração e identidade: a negociação da
identidade gaúcha em Coxim, concentra o estudo do processo de construção da
identidade gaúcha e como a memória é usada nesse processo. Buscaram-se
subsídios para essa identidade na constituição da rede etnorregional gaúcha, bem
como, no processo de territorialização – desterritorialização – territorialização do
gaúcho e a renegociação da identidade.
23
2 MODERNIZAÇÃO, COLONIZAÇÃO E MIGRAÇÃO: A EXPANSÃO DA
FRONTEIRA AGRÍCOLA E COXIM
Historicamente, a colonização dirigida no Brasil foi utilizada como estratégia
oficial de povoamento, uma maneira organizada para indicar a ocupação dos
relativos “vazios demográficos” e, também, como forma de expansão capitalista em
novos territórios (SOUZA, 2008). Esse processo de colonização, nos últimos dois
séculos, atende ao projeto de modernização do Brasil. Para entender a forma como
o objeto desta pesquisa está inserido em tal processo, é necessário atentar para a
tríade: colonização; modernização; e migração.
No Brasil, segundo Custódio (2010), foi praticado três tipos de colonização de
terra: 1) a colonização espontânea, sendo aquela realizada pelos camponeses; 2) a
colonização dirigida ou oficial realizada pelo Estado; e 3) a colonização privada, que
é quando o Estado deixou a colonização a cargo de empresas particulares de
colonização, que também é uma forma de colonização dirigida.
O termo colonização possui diversas definições, porém, no período do regime
militar ela pode ser definida como:
[...] toda atividade oficial ou particular destinada a dar acesso à propriedade de terra e a promover seu aproveitamento econômico, mediante o exercício de atividade agrícola, pecuárias, através da divisão de lotes ou parcelas, dimensionadas de acordo com as regiões definidas da regulamentação do Estatuto da Terra, ou através de cooperativas de produção nela prevista (BECKER et al., 1990, p. 65 apud CUSTÓDIO, 2010, p. 108).
Existe também outra definição para o conceito de colonização, segundo
definição etimológica, a colonização é uma palavra que tem a mesma raiz que
outras duas palavras: cultura e culto, como explica o seguinte trecho:
[...] verbo latino colo, cujo particípio passado é cultus e o particípio futuro e culturus [...] colo é a matriz de colônia enquanto espaço que se está ocupando, terra ou povo que se pode trabalhar e sujeitar. [...] a colonização é um projeto totalizante cujas forças motrizes poderão sempre buscar-se no nível do colo: ocupar um novo chão, explorar os seus bens, submeter os seus naturais (BOSI, 1992, p. 11 e 15).
24
A partir da ideia de colonização de Bosi (1992), não se pode esquecer os
agentes desse processo que, segundo o autor, [...] “não são apenas suportes físicos
de operações econômicas” (BOSI, 1992, p. 15), mas os migrantes trazem consigo,
uma grande bagagem, seja ela cultural, tradicional e identitária. O processo de
colonização é acompanhado por um conjunto de práticas, técnicas, símbolos e
valores transmitidos às gerações seguintes, para a reprodução de um estado de
coexistência social (BOSI, 1992, p. 16).
Ainda segundo o autor supracitado, a colonização é um processo que não se
exaure no seu efeito modernizante de circunstancial impulsionador do capitalista,
[...] quando estimulado, aciona ou reinventa regimes arcaicos de trabalho, começando pelo extermínio ou a escravidão dos nativos nas áreas de maior interesse econômico. Quando é aguçado o móvel da exploração a curto prazo, implantam-se nas regiões colonizáveis estilos violentos de interação social. (BOSI, 1992, p. 20-21).
Esse modelo é recorrente no processo de colonização brasileira e se mostra
como um processo que deixa algumas categorias à margem (marginalizadas), como
exemplo, as populações indígenas e os sertanejos, em que se considera somente o
colonizador. Para Bosi (1992), a colonização é sempre um processo que coloca em
campos antagônicos o colonizador sobre o colonizado pelo domínio da natureza, no
qual ele chama de processo civilizatório. Neste sentido:
Acentua-se a função da produtividade que requer um domínio sistemático do homem sobre a matéria e sobre outros homens. Aculturar um povo se traduziria, afinal, em sujeitá-lo ou, no melhor dos casos, adaptá-lo tecnologicamente a um certo padrão tido como superior. (BOSI, 1992, p. 16).
Para o autor supracitado, a dominação ecológica e populacional é algo
inerente na colonização, denunciadas ao longo do processo de colonização do
Brasil. Sendo que todos os projetos de colonizador impuseram determinadas
situações, que acabaram destruindo ou expulsando determinados grupos sociais à
degradação ambiental e, isso continua sendo reatualizado, principalmente, nos
projetos expansionistas dos anos 70 e 80, “[...] em nada menos cruenta do que
foram as incursões militares e econômicas dos tempos coloniais” (BOSI, 1992, p.
27).
25
2.1 UMA BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO DA COLONIZAÇÃO DIRIGIDA NO
BRASIL
Tratando da questão colonização dirigida e da migração, no caso brasileiro, a
colonização dirigida é definitivamente vinculada ao trabalho livre, principalmente,
depois da promulgação da Lei de Terras e da Lei Eusébio de Queiros (SEYFERTH,
2002). Para o pensamento imigrantista do século XIX, os negros são relegados
como categorias que desqualificam o processo de colonização, consideravam
“inaptos para o trabalho livre na condição de pequenos trabalhadores rurais”.
(SEYFERTH, 2002, p. 120).
A colonização dirigida brasileira está estabelecida, segundo alguns princípios
que podem ser entendidos:
[...] na legislação imigratória, tendo a modernidade como parâmetro, e nela não cabe a escravidão. Para muitos imigrantistas, o tráfico era incompatível com a imigração, mas não a escravidão, fadada, necessariamente, ao desaparecimento na configuração do país moderno e capitalista. (SEYFERTH, 2002, p. 120).
O discurso imigrantista de modernização do país está assentado na escolha
do colono agricultor tido como eficiente, principalmente, o de origem alemã, depois
os italianos e essa prática vai perdurar até o Estado Novo (SEYFERTH, 2002, p.
137).
Assim, para Seyferth (2007), a colonização dirigida inicia com a chegada de
imigrantes europeus, inicialmente, os suíços e, em seguida, os alemães e italianos.
Também após o “Tratado de Colonização”, assinado por Dom João VI em 1818,
fixando, principalmente, no sul do país e depois com os movimentos migratórios
internos ocorridos no decorrer do século XX.
A política de colonização do Estado Novo, segundo Seyferth (2002), é
marcada pela orientação de utilizar elementos nacionais, possibilitando, assim, um
caldeamento étnico, evitando a aglomeração de determinados grupos étnicos,
assim, o Estado busca, nesse processo de colonização, além de povoar os relativos
“vazios demográficos”, integrar, em especial, as regiões centro-oeste e Amazônia
aos centros econômicos e financeiros do país (São Paulo e Rio de Janeiro).
26
Nesse momento, a industrialização brasileira ganha mais atenção do governo,
considerando que há alterações econômicas na produção de bens de consumo e,
também, na de setores básicos. (PONCIANO, 2001). E, então, as regiões centro-
oeste e Amazônia precisam se modernizar para oferecer matéria-prima para as
regiões industrializadas. Essa política tem continuidade com os governos militares
pós-1964, porém, ocorre em ritmos mais acelerados e não tem a preocupação
voltada para questões identitárias, e sim, para a resolução de conflitos sociais.
A colonização e a (i)migração são dois processos que estão intimamente
ligados. No Brasil sempre voltado como condição tida como necessária para
construir uma nação moderna. E no “[...] caso brasileiro, o que se coloca em disputa
são projetos de nação, Estado e sociedade que se forjam no hibridismo que nos
caracteriza e que torna possível que o moderno e o atraso convivam juntos, nem
sempre sem conflitos” (DANIEL, 2011, p. 14).
2.2 A COLONIZAÇÃO EM MATO GROSSO NO CONTEXTO DA MARCHA PARA O
OESTE
A década de 1930 é, de certa forma, um marco na colonização brasileira.
Com a chegada de Getúlio Vargas ao poder, esse processo colonizador passa por
uma reorientação.
Até 1930, a colonização era marcada pela forte presença de imigrantes
europeus e, a partir de então, a colonização passa a ser orientada pela migração
interna. Será o princípio de nacionalidade o que vai nortear essa nova política de
colonização, afirmado pela política varguista, que possui o objetivo de “promover a
heterogeneidade étnica, para evitar aglomerações de estrangeiros nos locais de
colonização” (ROCHA, 2006, p. 20). Então [...] “a partir de 1937 foram tomadas
medidas coercitivas visando a atingir as organizações comunitárias étnicas
produzidas pela imigração, em nome da tradição de assimilação e mestiçagem
demarcadoras da nacionalidade”. (SEYFERTH, 1999, p. 199). O Estado considerava
os indivíduos portadores de identidade étnica incompatível com pertencimento à
27
nação, sob o entendimento de que, até a década de 1930, esses grupos não
estavam totalmente integrados à comunidade nacional. Isso, a partir de que:
As medidas efetivadas entre 1937 e 1945 vinham sendo preconizadas desde o século XIX, mas só um Estado autoritário poderia criar uma legislação impositiva da assimilação e do caldeamento e propor, por decreto, estudos científicos que dessem diretrizes eugênicas (raciais), sociais e culturais para erradicar as diferenças étnicas que faziam dos imigrantes cidadãos incompatíveis com a nação (SEYFERTH, 1999, p. 225).
Havia, também, outras preocupações do governo Vargas em querer expandir
a “fronteira” no sentido oeste, pela possibilidade de ordem geopolítica, isto é, a
mudança da capital do país era tema presente desde o período imperial, bem como
a nacionalização dos limites fronteiriços.
Nesse contexto político, em 1937, Getúlio Vargas anunciava o seu programa
de colonização, denominado Marcha para Oeste e convocava os brasileiros a
fazerem parte dessa saga de conquistar o oeste em busca de oportunidades e a de
descobrir um novo Brasil que, “outrora desbravado pelos bandeirantes, encontrava-
se esquecido” (TRUBILIANO; MARTINS JUNIOR, 2008, p. 02).
As dificuldades de ligação e as questões fronteiriças a oeste, principalmente,
Mato Grosso preocupavam o governo central, estabelecido no Rio de Janeiro até a
década de 1960. Sabe-se que uma das principais vias de acesso à capital federal,
até o início do século XX, era por meio da navegação pelo Rio Paraguai. Acesso que
facilitava a entrada de empresas e vários grupos de imigrantes estrangeiros na
região, principalmente, nas cidades de Ponta Porã, Corumbá e Cuiabá, tornando a
fronteira vulnerável.
O governo Vargas, preocupado com a proteção da fronteira, incentivou a
migração para essa região e a nacionalização da comunicação. Em 1943, criou-se a
Colônia Agrícola Nacional de Dourados (CAND), no também recém-criado Território
Federal de Ponta Porã3. (QUEIROZ, 2006).
3 O Território Federal de Ponta Porã foi um território federal brasileiro criado em 13 de
setembro de 1943, conforme o Decreto-Lei n.° 5 812, do governo de Getúlio Vargas. Após a entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial, o governo decide desmembrar seis territórios estratégicos de fronteira do país para administrá-los diretamente: Amapá, Rio Branco, Guaporé, Ponta Porã, Iguaçu e o arquipélago de Fernando de Noronha. O Decreto-Lei n.° 5 812, que criou o Território Federal de Ponta Porã, estabeleceu que o mesmo fosse formado pelos municípios de Ponta Porã (onde foi instalada a capital) e mais seis outros: Porto Murtinho, Bela Vista, Dourados, Miranda, Nioaque e Maracaju. A capital foi transferida para Maracaju em 31 de maio de 1944 (Decreto-Lei n.° 6 550), voltando a Ponta Porã em virtude de Decreto de 17 de
28
Nesse aspecto, o Sul de Mato Grosso (SMT) trazia, ainda, algumas
preocupações ao Governo Federal: ser uma região de fronteira com baixa densidade
demográfica e por possuir empreendimentos que ligava ao mercado platino. Além do
mais, a Companhia Mate Laranjeira, que contava com a forte presença de
trabalhadores paraguaios nos ervais, facilitava a disseminação do idioma guarani na
região. A partir do final da década de 1930, o Governo Federal passa a dificultar as
concessões para a Companhia Mate Laranjeira, a fim de “nacionalizar a fronteira”. E,
dessa maneira, para que a nacionalização acontecesse, o governo injetou grandes
quantidades de investimentos nessa área e, consequentemente, apresentou um
rápido crescimento demográfico e desenvolvimento, algo tipicamente presente nas
“frentes pioneiras” (QUEIROZ, 2006), incorporando e revigorando a região à
economia de mercado.
A política varguista buscou a integração regional do Brasil e, nesse sentido, a
política de colonização [...] “passou a ser tratada como uma questão que diz respeito
ao desenvolvimento nacional como todo e a ter como linha mestra a expansão das
relações capitalistas mediadas pela ação do Estado” (SOUZA, 2001, p. 47).
Pós-década de 1930, a industrialização brasileira ganha mais atenção do
governo, havendo alterações econômicas na produção de bens de consumo e,
também, na de setores básicos (PONCIANO, 2001). E juntamente com essa
proposta de modernização, vinham os projetos de colonização de regiões como
Amazônia, Mato Grosso e Goiás. Nesse sentido, a “Marcha para Oeste” era a
bandeira do governo para integrar as referidas regiões aos centros econômicos mais
avançados do país. Com isso provoca, nessas regiões, mudanças nas relações de
produção.
O projeto de modernização do Brasil, pós-década de 1930, é encampado pelo
governo por meio de políticas e projetos que buscavam desenvolver o interior do
país, principalmente no aspecto econômico. Tendo em vista uma maior integração
nacional ao explorar os potenciais e recursos que não poderiam ser desperdiçados,
entendidos como fundamentais para a garantia da prosperidade da nação, Vargas
definia da seguinte maneira:
junho de 1946. O território foi extinto em 18 de setembro de 1946 pela Constituição de 1946, e reincorporado ao então Estado de Mato Grosso. Atualmente a área do antigo território de Ponta Porã faz parte do Estado de Mato Grosso do Sul.
29
O verdadeiro sentido de brasilidade é a marcha para oeste. No século XVIII, de lá jorrou a caudal de ouro que transbordou na Europa e fez da América o continente das cobiças e tentativas aventurosas. E lá teremos de ir buscar: os vales férteis e vastos, o produto das culturas variadas e fartas; das estradas de terra, o metal com que forjara os instrumentos da nossa defesa e de nosso progresso industrial. (VARGAS, 1938, p. 124 apud GALVÃO, 2011, p. 01).
Preocupação do governo em expandir para oeste, com projetos de
colonização dos “espaços vazios”, estava ligada a expansão das relações
capitalistas de produção, pois a colonização era vista como um acréscimo do
mercado interno para indústria e:
Nessa perspectiva, o governo do Estado Novo procurou mostrar que a efetiva construção do país só se faria por meio da união entre governo e sociedade, do funcionamento perfeito entre o campo político e o econômico, o que facilitaria a implantação da política de colonização estadonovista que visava ao desbravamento de áreas vazias por migrantes, sobretudo por aqueles oriundos de regiões onde a grande concentração de mão-de-obra poderia manifestar tensões sociais e braços desocupados em demasia. (PONCIANO, 2001, p. 98).
Mas como Mato Grosso se situa nesse processo? É a partir de 1930 que
Mato Grosso entra em uma nova fase econômica. Nesse período, a prioridade passa
a ser a pequena propriedade na política de colonização, contrastando com os
latifúndios existentes, principalmente, os que estavam em mãos estrangeiras.
Entendia-se que a pequena propriedade era sinônimo de defesa e segurança
nacional (LENHARO, 1985 apud CASTRO et al., 2002, p. 61).
O território de Mato Grosso teve um dos primeiros momentos de ocupação
para atender esse projeto de colonização em 1943, com a Expedição
Roncador/Xingu. Essa expedição tinha como objetivo chegar a Santarém no Estado
do Pará, projeto este subordinado à Fundação Brasil Central (FBC), criada também
pelo governo federal com o intuito de colonizar a região centro-oeste. Esses dois
organismos criados pelo governo federal tinham algumas atribuições: a Expedição
Roncador/Xingu, a de entrar em contato com os poucos núcleos de populações não
índias que estava no interior do Brasil, denominados na época de “mancha branca”
(VILLAS BÔAS; VILLAS BÔAS, 2012, p. 34) e, também, de estabelecer canais de
comunicação pelo interior do Brasil até a Amazônia, [...] “além de povoar e explorar
as regiões do Brasil central (GALVÃO, 2011). A segunda instituição, a Fundação
Brasil Central, tinha a função de orientar e administrar os trabalhos da expedição,
30
bem como implantar núcleos populacionais em locais ideais e estratégicos,
marcados pela expedição (VILLAS BÔAS; VILLAS BÔAS, 2012, p. 34). Inicialmente,
no atual município de Nova Xavantina (MT) às margens do Rio das Mortes, estão
instaladas cerca de 200 famílias vindas do Maranhão e Goiás. Porém, essa tentativa
fracassou, pois a região não representava o que chamavam de “espaço vazio”, já
que estava ocupada, além dos índios, por cerca de 30 mil garimpeiros e havia
conflitos com os indígenas, além do mais, o perfil do colono não atendia os objetivos
de colonização, que era produzir com “mentalidade empresarial”. (CASTRO et al.,
2002, p. 62).
Com “fracassos” como em Xavantina, houve uma redefinição da política de
colonização de Mato Grosso, isso ocorreu a partir de 1950 (CASTRO et al., 2002).
Merece destaque, ainda, sobre a Marcha para Oeste, no Estado Novo, em
território mato-grossense, a Colônia Nacional de Dourados (CAND), de 1943, região
sul do Estado, pois essa colônia marcou a expansão da atividade agrícola comercial
e favoreceu os grandes fluxos migratórios para a região.
A criação de Colônias Agrícolas Nacionais como a de Dourados atendia a
proposta do governo em colonizar e industrializar o país, pois esses dois aspectos
eram fundamentais para a modernização do Brasil (LENHARO, 1986, p. 23). O
processo de colonização, principalmente a colonização dirigida à industrialização, é
uma preocupação desde o século XVIII. Conforme já mencionado anteriormente, a
industrialização já é de um período mais recente, início do século XX. A crise do
café, levou Vargas a criar, em 1931, o Departamento Nacional de Povoamento, que
estava subordinado ao Ministério do Trabalho, e, em 1938, foi criada a Divisão de
Terra e Colonização que era ligada ao Ministério da Agricultura, responsável pela
implantação das Colônias Agrícolas Nacionais (CAN), via Decreto-Lei nº 3.059.
Segundo Ponciano (2001), o objetivo da política do Estado Novo por
intermédio do Decreto-Lei nº 3.059 de 1941, além de implantar as Colônias
Agrícolas, era também o de fixar o indivíduo no campo, por meio da pequena
propriedade voltada para a produção agrícola para atender demandas de mercado,
além de produzir para sua autossuficiência. Desse modo, as Colônias Agrícolas
Nacionais eram planejadas para serem potenciais cidades-industriais, em áreas
tidas como “vazias”.
31
Para a fixação de indivíduos nas Colônias Agrícolas, os cidadãos deveriam
atender a alguns requisitos preestabelecidos, da seguinte maneira:
Somente poderiam receber os lotes de terras os cidadãos brasileiros acima de 18 anos „que não forem proprietários rurais e reconhecidamente pobres‟. Estrangeiros, só os de conhecimentos agrícolas qualificados. Ficava vedada a concessão de lotes a funcionários públicos federais, estaduais e municipais. Os lotes, de 20 a 50 hectares, mais as casas e outras benfeitorias seriam concedidos gratuitamente. Além disso, oferecia-se ao colono: trabalho a salário ou empreitada em obras ou serviços da colônia, pelo menos durante o primeiro ano; assistência médica e farmacêutica e serviços de enfermagem, até a emancipação da colônia; (LENHARO, 1986, p. 52).
A política varguista apoiou-se na ideia de que os brasileiros deveriam ocupar
os “espaços vazios”, para contribuir no processo de ocupação, principalmente, nas
áreas de fronteiras e favorecer para a transformação econômica de áreas atrasadas
economicamente. (LENHARO, 1986).
A política de colonização da Era Vargas foi oficializada em fevereiro de 1941
e a Colônia Agrícola Nacional de Dourados (CAND), fundada em 1943, por meio do
Decreto-Lei nº 5.941. Nesse momento, começam as atividades fundiárias na região,
em terras da União, no Território Federal de Ponta Porã. Entretanto, segundo
registros, somente em 1948 os limites da CAND foram demarcados, pelo então
Presidente Eurico Gaspar Dutra. Considerando os mesmos registros, segundo
Ponciano (2001, p. 99), o governo Vargas não teve grandes sucessos na instalação
de trabalhadores na região Sul de Mato Grosso. A região era “inóspita”, os colonos
enfrentavam problemas como doenças, intempéries climáticas, acessibilidade ruim –
inexistência de rodovia, entre outros fatores que dificultava o trabalho de medição e
demarcação dos lotes pelo Instituto Nacional de Imigração e Colonização (INIC).
A Colônia Agrícola Nacional de Dourados, a partir da década de 1950,
recebeu grandes levas de migrantes vindos de várias regiões do Brasil,
principalmente, da região nordeste que vinham em busca de terras férteis no Sul de
Mato Grosso. A CAND abrangia uma área, hoje denominada região da Grande
Dourados, composta pelos municípios de Dourados, Fátima do Sul, Vicentina, Jateí,
Douradina, Glória de Dourados e Deodápolis.
O considerável fluxo migratório para o Sul de Mato Grosso (SMT) alterou o
quadro demográfico, modificou as estruturas produtivas, consolidando a agricultura e
tornando a região mais dinâmica no contexto da economia nacional de mercado.
32
Também houve mudanças no quadro sociocultural e nas relações entre os sujeitos
históricos, que se tornaram mais complexas (MENEZES, 2011, p. 04), pois
aumentaram os conflitos entre índios e não índios. Sendo que os indígenas não
foram considerados no processo de colonização, assim como os trabalhadores
ervateiros da Companhia Mate Laranjeira, mesmo não estando no seu auge, “[...]
assim, na região do SMT têm-se dois mundos distintos, formando um complexo
universo de vários elementos históricos (trabalhadores ervateiros, índios e novos
migrantes) que conviveram por algum tempo em um mesmo espaço”.
(FERNANDES, 2008 apud MENEZES, 2011, p. 04).
A partir da metade do século XX, o processo de colonização no Estado de
Mato Grosso passa por algumas mudanças, como já mencionado anteriormente,
principalmente, devido à redefinição da política de ocupação e de colonização que
visa a incorporação da fronteira agrícola da região à economia nacional. Durante as
décadas de 1950 e 1960, foram implantadas 29 colônias oficiais, as quais
receberam cerca de 68.920 habitantes. Mas a colonização oficial não foi capaz de
acompanhar o fluxo migratório e, menos ainda, a demanda de terra que era exigida
pela colonização não dirigida (CASTRO et al., 2002).
A década de 1950 foi marcada também pelas irregularidades na política de
vendas de terras, pois segundo o “Diagnóstico geral da situação fundiária do Estado
de Mato Grosso” (1979, p. 49 apud CASTRO et al., 2002, p. 63-64), explica que
A falta de discriminação das terras do Estado, a inexistência de cartas geográficas precisas [...] pelas quais pudesse o estado reconhecer suas terras, a falta de preparo e atualização permanente de plantas cadastrais das terras tituladas e pertencentes a particulares, a fim de controlar as vendas, bem como a falta de idoneidade dos profissionais que procederam às demarcações de áreas sem se afastarem de seus escritórios,
contribuíram para que o Estado expedisse títulos de terras inexistentes.
As irregularidades na política de vendas de terras levaram o governo estadual
a fechar o Departamento de Terras e Colonização (DTC), em 1966. Nesse momento,
o governo federal tomava medidas como abrir a Amazônia e o centro-oeste para os
grandes projetos de colonização e com incentivos subsídios fiscais (CASTRO et al.,
2002). Como se sabe, a partir da década de 1960, a região centro-oeste e Amazônia
passam a ter papéis mais efetivos nos projetos de modernização e industrialização
nacional, conforme discutido no item a seguir.
33
2.3 COLONIZAÇÃO E MIGRAÇÃO: A NOVA FRONTEIRA AGRÍCOLA PÓS-1964
Busca-se abordar o processo migratório no contexto da Nova Fronteira
Agrícola, a partir do período que se delimita pós-década de 1960, principalmente
com a política dos governos militares que está alicerçada no tripé: Fronteira Política;
Fronteira Demográfica; e Fronteira do Capital (CUSTÓDIO, 2010).
Ainda, segundo Custódio (2010), a fronteira política refere-se ao povoamento
das áreas de abrangências dos limites fronteiriços do Brasil e seus vizinhos,
consideradas fronteiras mortas e, portanto, era preciso conquistar a região
Amazônica como forma de exercer o poder e a soberania brasileira nas faixas de
fronteiras. Quanto à fronteira demográfica refere-se ao processo de povoamento da
região Amazônica com “excedentes populacionais” da região nordeste e centro-sul
do Brasil. Sendo assim, para que esse projeto fosse colocado em prática, era
preciso à construção de algumas vias de acesso e ligação aos locais de
colonização, como as rodovias Belém-Brasília, Cuiabá-Santarém e Transamazônica.
Por último, tem-se a Fronteira do Capital que era transformar a região denominada
de Amazônia Legal como polo de atração a grandes investimentos nacionais e
internacionais, para atender projetos voltados para a agropecuária, mineração e
indústrias.
Essa ideia de abertura da fronteira agrícola pós-1960 está na política que visa
dar continuidade ao projeto modernizador do Brasil, combinando colonização e
industrialização, mas esse projeto ganha força e destaque com os governos militares
pós-1964.
A partir da década de 1960, o Brasil passa por mudanças profundas, não só
políticas, mas também econômicas e sociais, principalmente, diante do processo de
modernização do país.
Esse processo de modernização pós-1964 traz alguns aspectos que são
necessários observar, como a modernização da agricultura. Com a industrialização
tornava-se cada vez maior a exigência de transformar a agricultura tradicional em
34
uma agricultura moderna, adequado diante da expansão industrial e a necessidade
de produção de matéria-prima4.
Segundo Teixeira (2009), o aumento da população urbana foi um dos fatores
que pressionou esse processo de modernização, mas que a modernização só não
era suficiente para suprir as necessidades vigentes de produção de alimentos. A
estrutura fundiária era um fator que não ajudava, pois, quem produzia em larga
escala, estava mais preocupado em atender ao mercado externo e à indústria,
garantido lucros maiores.
Nessa conjuntura, a colonização do centro-oeste e da Amazônia passa a ter
relevância no processo de modernização, sendo o “portão de escape para os
problemas fundiários dos agricultores familiares do sul do Brasil, onde ocorria a
modernização da agricultura”. (CARDOSO; MULLER, 1977 apud BARROZO, 2010,
p. 14).
Segundo Barrozo (2010), o governo oferecia, por meio de propagandas
oficiais, aos agricultores do sul, a possibilidade de adquirir lotes com 100 ou 200
hectares já com toda infraestrutura em núcleos do INCRA e, para os empresários,
oferecia grandes extensões de terras a preços baixos, crédito, juros baixos e
incentivos fiscais, por intermédio da Superintendência da Amazônia (SUDAM),
Banco da Amazônia (BASA) e Banco do Brasil.
Os projetos de colonização e desenvolvimento na região eram geridos e
subsidiados, em grande parte, pela Superintendência da Amazônia (SUDAM), que
“transformou a Amazônia em um expressivo cenário de investimentos de recursos
públicos e privados. Os projetos privados viabilizavam-se por meio de mecanismos
de renúncia tributária e concessão de empréstimos subsidiados” (CUSTÓDIO, 2010,
p. 107).
No contexto da política expansionista, da segunda metade do século XX, o
Estado de Mato Grosso integra a lógica da valorização política da Amazônia que,
segundo Rocha (2006), tinha respaldo na doutrina de segurança, integração e
desenvolvimento dos governos militares, sintetizada no slogan “integrar para não
entregar”.
4 Uma questão que cabe ressaltar é a pressão que a indústria de equipamentos e insumos agrícolas
fizeram para que se modernizasse o setor, sob a alegação que o atraso no setor agrícola seria um empecilho para o desenvolvimento econômico. Segundo Teixeira (2009), [...] “o argumento central para essa questão era que a exportação não aumentava satisfatoriamente, a agricultura não produzia alimentos e matérias-primas suficientes à demanda urbana – industrial”.
35
A colonização de Mato Grosso, a partir da década de 1950, é marcada pela
presença de colonizadoras privadas, que vão configurar o controle do espaço rural
mato-grossense (TANNURE, 2003, p. 63 apud ROCHA, 2006; CASTRO et al., 2002,
p. 63), provocando algumas mudanças na forma e meios de utilização da terra. A
primeira mudança está relacionada a três fatores: 1) o perfil fundiário do Estado
assentado numa base latifundiária; 2) a escolha da cultura para essas áreas
preferencialmente a soja; e 3) o tipo de colono ideal para as novas áreas,
preferência pelo sulista.
Outra mudança é quanto à criação de mecanismos legais, como o Estatuto da
Terra, que regulamenta a ocupação do espaço rural e, como desdobramento, a
seleção daqueles produtores que teriam acessibilidade ao crédito por meio do
cooperativismo. O governo federal, segundo Rocha (2006), priorizou medidas que
visavam à interferência na agricultura. Isso por acreditar que as transformações no
campo poderiam levar ao desenvolvimento econômico e, com esse objetivo, o
Estatuto da Terra, promulgado em 30 de novembro de 1964, buscava controlar os
conflitos agrários. No fim da década de 1960, cita-se que:
[...] a ação do estado oscilou entre uma política de reforma agrária e de colonização, a partir dos anos de 1970 a última prevaleceu sobre a primeira e nesta direção, a parceria entre órgão público (via governo federal e estadual) e iniciativa privada (via colonizadoras) consolidou no começo dos anos 1970 um sistema de colonização que serviu aos objetivos do regime militar (ROCHA, 2006, p. 22).
Nesse contexto, o Estado de Mato Grosso dispunha de terras equivalentes às
áreas do Estado de São Paulo ou Paraná, situadas em áreas de transição entre a
região Amazônica e o Cerrado. Sendo assim, essa região no norte do Estado
passou a ser o escopo de colonização do Estado Brasileiro. Segundo Barrozo
(2010), Mato Grosso, pós-década de 1960, serviu como “portão de escape” para
solucionar problemas fundiários e, a partir da colonização dirigida, principalmente,
com a iniciativa privada, o Estado criou condições para a expansão e acumulação na
fronteira5, apoiando principalmente, os projetos de colonização privada.
5 A fronteira no Brasil, segundo Martins (2009), é caracterizada pela situação de conflito social. “A
fronteira é essencialmente o lugar da alteridade”. O conflito faz com que a fronteira seja a um só tempo, um lugar de descoberta do outro e de desencontro. O desencontro na fronteira é o desencontro de temporalidades históricas.
36
Nessa perspectiva, vai se pautar o projeto colonizador de Mato Grosso, pós-
1960. Inicialmente, a responsabilidade pelos projetos de colonização era do
Departamento de Terras e Colonização (DTC) e, posteriormente, após a década de
1970, era do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). E,
assim, como era previsto pelo próprio Estatuto da Terra de 1960, a partir da década
de 1970, o INCRA disponibilizou áreas para a colonização privada na Amazônia, por
meio das cooperativas e empresas colonizadoras.
Ainda na década de 1970, o governo do General Médici criou o Programa de
Integração Nacional (PIN) e, a partir desse programa, iniciou-se a construção das
principais rodovias, que facilitaria o processo de colonização, como as Rodovias
Cuiabá Santarém e Transamazônica. Foi delimitada uma faixa de 10 km,
inicialmente e, em seguida, passou-se para 100 km de cada lado das rodovias,
visando o processo de colonização e reforma agrária. Sabe-se, pois, que a intenção
do governo era promover o assentamento de 100 mil famílias próximo a essas
rodovias no período de 10 anos (CASTRO, 2002, p. 66; SCHAEFER, 1985 apud
ROCHA, 2006, p. 23).
Inicialmente, a ocupação das margens das rodovias era coordenada pelo
INCRA e este órgão resistia à colonização espontânea, estimulando sempre a
colonização dirigida e estatal. A partir de 1974, a preferência do governo passou a
ser pela colonização privada, entendendo-a como possibilidade para um melhor
aproveitamento econômico da terra, elevando a produção agrícola nacional que
também atendia aos interesses do capital privado (IANNI, 1979 apud ROCHA,
2006).
Os projetos de colonização buscavam por fim questão da baixa densidade
populacional ao norte de Mato Grosso. Algo que chamava bastante atenção pode
ser observado no mapa a seguir (figura 1). Apesar de até fim da década de 1970, o
Estado6 não ter essa configuração territorial apresentada no referido mapa, é uma
boa ilustração do processo de ocupação, tanto demográfica quanto do capital em
Mato Grosso, que busca mostrar a real dimensão da ocupação no norte do Estado.
Na época, existiam somente os municípios de Aripuanã, Diamantino, Chapada dos
Guimarães e Barra do Garças. Esses municípios eram de grandes extensões de
6 As Unidades Federativas de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, era uma única unidade até 1977,
com a Lei Complementar nº 71 de outubro de 1977, o Presidente da República, Ernesto Geisel, criou o Estado de Mato Grosso do Sul, mas a instalação se deu no dia 1º de janeiro de 1979.
37
terras povoadas por povos indígenas, populações extrativistas, agricultores
tradicionais e pequenos fazendeiros, até meados da década de 1960 (BARROZO,
2010, p. 15).
Os mapas constantes da Figura 01, a seguir, podem demonstrar com clareza
a criação de municípios, tanto no leste quanto no norte de Mato Grosso, como já
mencionado anteriormente. O norte foi povoado nas proximidades da BR-163 –
Cuiabá-Santarém, essa via de acesso, além de ser o principal corredor de entrada
de migrantes no Estado, foi também o de entrada do capital, pois vários empresários
se instalaram nessa região, por meio dos projetos de colonização. Enquanto na
região leste, denominado também de Vale do Araguaia, já contatada no período da
Marcha para Oeste, não houve grandes progressos de colonização. Somente na
década de 1970, a partir da entrada de colonos, vindos de outras regiões do Brasil e
a instalação dos mesmos às margens do que se tornaria a BR-158, foi que a região
passou a ser ocupada efetivamente por não índios, principalmente, nos [...] “núcleos
de colonização de Canarana, Água Boa, Querência, onde foram assentados
agricultores minifundiários do Rio Grande do Sul” (SCHWANTES, 1989 apud
BARROZO, 2010, p. 16-17).
38
FIGURA 1 - Mapa ilustrativo da ocupação do atual Estado de Mato Grosso. FONTE: Barrozo (2005).
O processo de expansão da Nova Fronteira Agrícola que se dá a partir da
década de 1960 com os governos militares, como já mencionado, grandes avanços
ocorreram no início da década de 1970, pois o governo de Emílio Garrastazu Médici
implantou o Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), que tinha como meta fazer
grandes investimentos para o desenvolvimento do país. E, nesse sentido, pretendia
“criar e assegurar condições para um crescimento econômico acelerado. Consolidar
o sistema capitalista no país; aprofundar a integração da economia brasileira no
sistema capitalista internacional; transformar o Brasil em potência mundial”
(WEINGARTNER, 2005, p. 35), e nesse “pacote” foi incluído o incentivo de migração
para as regiões da Amazônia meridional e, também, para outras localidades, mesmo
que não tivessem projetos oficiais de colonização, mas que acabou sendo
subsidiado indiretamente pelo governo federal.
39
Dentro da lógica do PND, o governo lançou, em 1972, o Programa de
Desenvolvimento do Centro-Oeste (PRODOESTE), que tinha como principal objetivo
o término e pavimentação da rodovia BR-163, trecho que liga Campo Grande a
Cuiabá. Essa obra possibilitaria o escoamento da produção do norte de Mato Grosso
com destinos aos portos do sudeste e sul, Santos e Paranaguá, respectivamente.
Nesse mesmo contexto, houve também o lançamento de outros programas, como o
Programa de Desenvolvimento da Região da Grande Dourados (PRODEGRAN), o
Programa de Desenvolvimento do Pantanal (PRODEPAN), o Programa de
Desenvolvimento dos Cerrados (POLOCENTRO) e o Programa de Cooperação
Nipo-Brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados (PRODECER). Portanto, o
Estado de Mato Grosso e toda a região centro-oeste, possuía programas que
buscavam atender a todas as suas diversas microrregiões.
Com todos esses programas instituídos pelo governo federal, a fim de
promover o desenvolvimento e a integração do Brasil, houve a possibilidade dos
movimentos migratórios e do processo de constituição de novas identidades.
Os movimentos migratórios ocasionados pela abertura da Fronteira Agrícola
pós-1960, vão promover mudanças profundas, não só no norte de Mato Grosso,
como o surgimento de novos municípios, conforme fora apresentado anteriormente.
Mudanças percebidas, também, no Sul de Mato Grosso, apesar de não ser o grande
foco do processo de expansão, fazia parte de Mato Grosso, e a referida região
passou por alterações econômicas, socioculturais e ambientais e será, a partir disso,
que se direcionará o foco da pesquisa.
O Sul de Mato Grosso, atual Mato Grosso do Sul, foi cenário de muitas
mudanças ocorridas no centro-oeste, pois até o início da década de 1970, a principal
atividade econômica do Sul de Mato Grosso era a pecuária extensiva, sendo 75% do
seu território ocupados por pastagens naturais ou plantados, todavia no final da
década de 1970 e início de 1980, esse percentual foi reduzido com o aumento das
lavouras, principalmente a de soja (TEIXEIRA, 2009).
A partir da década de 1980, a produção de soja ganhou destaque em Mato
Grosso do Sul, pois houve grandes investimentos na mecanização intensiva do
cultivo e na exploração de extensas áreas, pois nesse período aumentaram também
as pesquisas, principalmente, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
(EMBRAPA), que visava melhorar a qualidade e produtividade, e segundo Teixeira
40
(2009), esse crescimento da soja deve-se, também, as isenções fiscais que atraíram
indústrias de beneficiamento.
Com todos esses incentivos governamentais para a ocupação econômica do
centro-oeste, também se intensificou o movimento migratório motivado, em parte,
pela propaganda. O governo pós-década de 1960 fazia “propaganda enganosa”7, de
que os camponeses vindos do sul poderiam adquirir lotes com 100 ou 200 hectares,
com infraestrutura, estrada, entre outras coisas, divulgando assim, sem risco de
contestação ou crítica, nem pela imprensa, além de órgãos públicos federais na
região sob o comando de militares de confiança. (BARROZO, 2010, p. 18-19).
Segundo Weingartner (2005), seduzidos por essas propagandas, muitos brasileiros
saíram de suas regiões rumo a esse eldorado, acreditando que a prosperidade
econômica estava próxima e, imbuídos do espírito de que o Estado os encorajava,
grupos migratórios acreditavam na potencialidade de desbravar essas novas áreas,
antes ocupadas por indígenas e agricultores tradicionais, pois era um ato de
brasilidade, e estavam a construir um Brasil melhor e, com essa perspectiva, é que
muitos migrantes vieram explorar o centro-oeste.
Vale ressaltar que em meio ao processo de expansão da Nova Fronteira
Agrícola pós-1960, o Sul de Mato Grosso foi também palco de colonização e
migração, com essa intenção:
[...] é possível citar empresas colonizadoras, como a Companhia Viação São Paulo - Mato Grosso, que atuou em Bataiporã, Anaurilândia e Bataguassu; a Companhia Moura Andrade, que loteou áreas nas altas bacias dos rios Samambaia, São Bento e Inhanduí-Guaçu e a Sociedade de Melhoramento e Colonização (SOMECO), que atuou em Ivinhema e Glória de Dourados, para destacar as mais expressivas (ABREU, 2001, p. 60).
No contexto das políticas desenvolvimentistas do Brasil da segunda metade
do século XX, o programa que mais atingiu o SMT, o atual Mato Grosso do Sul, foi o
PRODOESTE, pois o programa envolvia o SMT, Goiás e o Distrito Federal num
projeto de interligação rodoviária, além de erguer uma rede de silos, armazéns e
usinas de beneficiamento e frigoríficos, e obras de saneamento e recuperação de
terras (ABREU, 2001, p. 66).
7 O termo “propaganda enganosa” é usado para explicar as ações do governo em atrair migrantes
para essas regiões, pois era oferecida uma série de benefícios e estrutura para assentá-los, mas ao chegar às áreas destinadas à colonização, não era encontrado aquilo que foi propagado nas regiões sul e sudeste do país.
41
Foi por meio do PRODOESTE, no início da década de 1970, que o Estado de
Mato Grosso passou a ligar-se por pavimentação asfáltica, ao Estado de São Paulo,
interligando Campo Grande a malha rodoviária do Oeste Paulista, nos limites dos
municípios de Presidente Epitácio (SP) e Bataguassu (MS), também foi por meio
desse programa que Cuiabá passou a ter ligação por vias pavimentadas a todas as
capitais brasileiras. Como se pode afirmar que:
As vias de comunicação, sobretudo as rodovias, traçaram uma nova participação do Oeste brasileiro no cenário econômico nacional. Os núcleos urbanos expandiram-se em função das suas ligações com São Paulo embora permanecessem sem conexão interna na própria região. Nesse sentido, é possível destacar no início dos anos de 1970, quando Campo Grande e Cuiabá, no espaço mato-grossense, como centros coletores e distribuidores dos produtos que demandavam aos mercados paulistas, principalmente (ABREU, 2001, p. 69).
No atual Mato Grosso do Sul, as mudanças espaciais vieram acompanhadas
das mudanças nas matrizes econômicas, conforme mencionado anteriormente,
segundo Abreu (2001). A pecuária não era mais a principal atividade econômica, já
que passava a concorrer com a introdução da policultura, por meio da produção de
feijão, amendoim e milho, nas áreas de mata; e de soja, milho e arroz, em áreas de
campos e cerrados. Mesmo a criação de gado de forma extensiva passava por
melhoramento genético e estudos de pastagens para um melhor aproveitamento.
Segundo Abreu (2001), a ocupação do centro-oeste foi parte de uma política
de racionalização da economia como forma de atender as demandas capitalistas, na
perspectiva da acumulação e valorização do capital em nível interno e externo. E,
para tanto, era necessário estabelecer algumas prioridades, como a integração da
região ao restante do país, as migrações internas e a criação dos corredores de
exportação.
Com os avanços da fronteira agrícola, as características demográficas do
centro-oeste foram se transformando ao longo desse período, pois 20% do total de
migrantes do país se dirigiam para o centro-oeste (IBGE, 1970), pois a migração era
induzida, sobretudo para o Estado de Mato Grosso, onde tinha o INCRA como
grande articulador dos assentamentos dessas famílias às margens das rodovias.
Segundo Abreu (2001), o principal grupo de migrantes que vinha era de sulistas,
nesse caso, se inclui os gaúchos (sul-rio-grandenses).
42
Dentre esses grupos de migrantes, estão os gaúchos, mesmo não sendo
maioria numérica, mas o seu estereótipo sobrepôs aos demais migrantes sulistas.
Há um entendimento generalista em Mato Grosso, que paranaense e catarinense
são denominados de “gaúchos”. Uma possibilidade interpretativa para esse
entendimento se dá pelo fato de que a população do oeste de Santa Catarina e
sudoeste do Paraná descendem, em sua maioria, de sul-rio-grandenses e por eles
terem afinidade com os elementos culturais gaúchos. Segundo Carvalho (2012), isso
não é o suficiente e “não explica por que tal população minoritária passou a
identificar uma população bem maior, originaria de outros Estados”.
As migrações para Mato Grosso, nas décadas de 1970 e 1980, tiveram maior
crescimento, apesar de ter crescido na década de 1990 acima da média nacional,
porém, com um ritmo menos acelerado. Segundo dados do IBGE de 1970, a
população de Mato Grosso era de 612.887 habitantes e, na década de 1980, chegou
a 1.138.691 habitantes, tendo um crescimento em 525.804 habitantes. Embora se
leve em conta, neste caso, o crescimento vegetativo, grande parte dessa população
era oriunda de outras regiões do Brasil, que vieram por meio dos incentivos da
política de migração, fomentados pelo governo.
Esse processo de colonização está arraigado na ideia de dominação, não só
da natureza, mas também, do próprio ser humano em um projeto civilizador, e na
lógica de trazer a civilidade a esse novo espaço econômico. Segundo Rocha (2006),
o principal grupo de migrantes privilegiados são os colonos do sul, devido a sua
experiência no processo de colonização no sul do Brasil e, também, a sua bagagem
cultural, principalmente, ligada ao trabalho e a sua capacidade em transformar as
suas atividades realmente lucrativas. A partir da lógica da reprodução social de
grupos de migrantes gaúchos em outros locais, bem como em Coxim, pretende-se
buscar o escopo, para compreender o processo de construção da identidade gaúcha
do migrante, que adote tal identidade, dado as relações de poder estabelecidas, a
partir do processo de migração.
Isso posto, faz-se necessário descrever algumas características sócio-
históricas do espaço específico da pesquisa, o município de Coxim-MS. Pois inserir
a migração do final do século XX em Coxim, no projeto de modernização e de
colonização, que é um contexto fundamental para entender a reelaboração da
identidade gaúcha.
43
2.4 COXIM E AS MIGRAÇÕES
As pessoas que visitam e observam a cidade de Coxim, logo percebem que
um de seus traços característicos é a multiplicidade cultural. Tal diversidade é fruto,
principalmente, da migração interna nacional. Por isso, a importância de traçar de
forma restrita a migração para Coxim, para entender o processo de "desconstrução
e construção" da identidade dos migrantes na sociedade local, em especial a
migração gaúcha.
2.4.1 Formação de Coxim
A cidade de Coxim é uma cidade advinda da corrida do ouro para as minas de
Cuiabá, pois a cidade estava na rota das monções paulistas que saíam de
Araritaguaba, atualmente Porto Feliz (SP) para a Vila Real de Bom Jesus de Cuiabá.
Coxim é uma das cidades mais antigas de Mato Grosso do Sul, a mais antiga
da região norte do Estado, porém, não se sabe com exatidão a data que se deu o
início do povoamento de origem europeia na localidade, onde hoje está a cidade de
Coxim. Dados levantados, principalmente por memorialistas, dão conta de que não
há uma data precisa de quando monções iniciaram a passagem pelo rio Taquari, na
confluência do rio Coxim, onde hoje é a sede do município. Segundo Guimarães
(1998, p. 15), a data provável do povoamento foi a partir do ano de 1725, época dos
ataques dos índios Paiaguás aos faiscadores do ouro. Estes últimos navegavam
para as minas de Cuiabá descendo o rio Taquari.
Pode-se observar, no mapa (Figura 2) a seguir, onde está localizado o
município de Coxim na rota das monções paulistas (FERREIRA NETO, 2004).
Segundo Guimarães (1998), Coxim foi um entreposto importante das monções, pois
nessa localidade encerravam os perigos que os rios apresentavam aos monçoeiros
com suas cachoeiras, corredeiras, pedras e saltos.
44
O local onde hoje está Coxim foi ponto de convergência de monçoeiros que
iam para Cuiabá, ou para os que vinham pelo rio Taquari e, também, daqueles que
utilizavam o caminho por terra.
Figura 2 - Rota das Monções de Porto Feliz (SP) - Coxim (MS) - Cuiabá (MT) Fonte: FERREIRA NETO (2004, p. 84).
O primeiro núcleo urbano que deu origem a cidade de Coxim nasceu às
margens do rio Taquari, a duas léguas abaixo da foz do rio Coxim, com um
conglomerado de casas cobertas de palhas que era denominado de Belliago, em
1727. No período da corrida do ouro em Cuiabá, o Arraial do Belliago se tornou
importante ponto de parada para os viajantes, pois era um local em que se
protegiam dos índios cavaleiros (Guaicurus) e dos índios canoeiros (Paiaguás).
Segundo Ferreira Neto (2004), os espanhóis trouxeram para a planície
pantaneira o cavalo e, a partir disso, os índios Guaicurus passaram a aprisionar e
domesticar cavalos, colocando-os a seu serviço e, também, como instrumento de
guerra. Já os Paiaguás eram senhores das águas do rio Paraguai e passaram a
atacar as monções, provocando perdas do ouro que era para ser levado para a
45
Coroa Portuguesa. E quem estimulava esse tipo de saque eram os espanhóis, que
depois compravam o ouro dos índios canoeiros.
Os conflitos ligados à população nativa indígena foram fundamentais para a
formação de Coxim. “Em 1758, Belliago foi atacado e incendiado pelos guaicurus,
sendo grande parte dos seus habitantes mortos, além de terem seus ranchos
incendiados. O Sertanista Domingos Gomes Belliago foi uma dessas vítimas”.
(FERREIRA NETO, 2004, p. 99).
A partir de 1850, a região do atual município de Coxim entra em uma nova
fase, a da criação, às margens direita do rio Piquiri, de um destacamento militar que
tinha como “objetivo de tentar consolidar uma base de colonização na região”
(FERREIRA NETO, 2004, p. 101), mas esse núcleo de povoamento não deu certo,
devido à insalubridade do local, pois foram registrados vários casos de malária e
beribéri. Isso levou a fundação de um novo núcleo de povoamento, agora à margem
direita do Rio Taquari, datado em 1862, com a denominação de “Núcleo Colonial do
Taquari, transformado em freguesia, com o nome de São José de Herculânea – hoje
cidade de Coxim”. (GUIMARÃES, 1998, p. 23).
2.4.2 Consolidação do povoamento de Coxim e as elites locais
Coxim foi ponto de apoio à “rota boiadeira”, pois o gado criado no pantanal
era levado para comercialização em Uberaba, Minas Gerais. Isso fez com que
alguns migrantes viessem se estabelecer na região, principalmente, mineiros e
goianos, vindos do Sertão dos Garcias, fixando-se na região nordeste do Estado de
Mato Grosso do Sul.
No início do século XX, Coxim contava com muitos migrantes devido as
fazendas de gado na região e o garimpo no rio Jauru, principalmente, pessoas de
origem nordestina. Nesse período, foi instalada em Coxim, uma empresa de
mineração por nome Coxim Gold Dredging Co., mas mesmo com grandes
investimentos não obteve sucesso (GUIMARÃES, 1998, p. 29). Nesse período, a
economia da região estava baseada na criação de gado e na exploração do látex da
mangabeira e o comércio era totalmente dependente de Corumbá.
46
Segundo obras memorialistas, o final do século XIX e início do XX foram
marcados pela formação dos “clãs” na elite coxinense. Especificamente eram três
clãs, que estão representados pelos senhores Antônio Luiz da Silva Albuquerque,
conhecido também por Totó Albuquerque, Pedro Mendes Fontoura, apelidado de
Pedro Peró e por Pedro Severo dos Santos.
Totó de Albuquerque nasceu em Cuiabá, em 1838, era de família influente e
foi Tenente da Guarda Nacional, por influência do tio se tornou comerciante e sócio
de Manoel Cavassa, comerciante importante de Corumbá que havia sido preso
pelas forças paraguaias. Em pouco tempo, Totó desmembrou a sociedade
comercial, comprou a parte do seu sócio, tornando-se um dos maiores comerciantes
de Corumbá e o mais importante de Coxim.
[...] usando a influência dos Albuquerque de Cuiabá [...] tornou-se poderoso na região, ostentando uma posição financeira de destaque e exercendo várias outras funções como: prefeito, juiz de paz, vereador, e delegado, além de comerciante e pecuarista. (FERREIRA NETO, 2004, p. 128).
Totó de Albuquerque faleceu em Coxim em 1901, com 63 anos, e não deixou
herdeiros diretos, pois não teve filhos. Seus herdeiros foram os irmãos e a sua
esposa Anna Damásia. Registrou alguns sobrinhos, filhos de sua irmã Amélia, com o
nome de Albuquerque, para dar continuidade ao tronco da família Albuquerque.
O segundo clã foi formado por Pedro Mendes Fontoura, o Pedro Peró, filho de
José Pantaleão Fontoura que nasceu no Rio Grande Sul, e que participou da
Revolução Farroupilha. Com a rendição dos revolucionários, Fontoura partiu para a
região do Triângulo Mineiro, mais especificamente Uberabinha, atual Uberlândia.
Passou na região de Coxim, com o seu primo João Lopes Fontoura e observaram
que havia pastagens abundantes na região.
Segundo Ferreira Neto (2004), os primos Fontoura trabalharam muito no
triângulo mineiro para comprar suas terras na região de Coxim, mas quando
efetivaram a compra das propriedades, José Pantaleão veio a falecer, deixando três
filhos, fruto do seu casamento com Eugênia Cândida Mendes. Seus filhos foram
Pedro Mendes Fontoura, o Pedro Peró, Emília Mendes Fontoura e Francisca
Mendes Fontoura. Pedro Peró foi o destaque da família, casando-se duas vezes,
mas tendo ficado viúvo da primeira esposa e com a segunda teve doze filhos.
47
Pedro Peró foi vice-Intendente no triênio 1915 a 1918, juntamente com
membros da família Albuquerque. Peró, com sua mãe, eram os donos da balsa que
fazia a travessia do rio Taquari, foi um exímio negociante de gado, que lhe rendeu
grande parte do patrimônio deixado para os seus herdeiros.
Pedro Severo dos Santos foi responsável pela formação do terceiro clã, era
natural do Maranhão, chegou às minas de Cuiabá por volta de 1895 e encontrou
Rondon que estava na empreitada de instalar a linha de telégrafo. Pedro integrou-se
ao grupo de Rondon inicialmente como barbeiro, em seguida, passou para
fornecedor de postes para a linha. E, segundo Ferreira Neto (2004), chegou a Coxim
em 1902 junto com o telégrafo. Deixou a comitiva e, com o dinheiro da venda de
postes, montou um comércio, evitou confrontar com os comerciantes já
estabelecidos, implantando um sistema diferente de atendimento, o atendimento
noturno. Em pouco tempo Pedro Severo adquiriu várias propriedades rurais dos
Albuquerque.
É importante mencionar essas três famílias, pois deram origem a outras
famílias tradicionais em Coxim, como os Ferreira, os Rocha, os Santana, os Garcia,
os Lopes Fontoura, os Mourão, os Bandeira e os Spengler. As famílias Albuquerque,
Fontoura e Severo, de certa forma, representam a “gênese” da formação da elite
tradicional de Coxim, pois constituíram e constituem uma rede muito grande na
região, mas aos poucos essas famílias foram perdendo espaço, representação do
exercício de poder, com a chegada de outros migrantes, principalmente de sulistas,
esses, de certa forma, mudaram as características econômicas e políticas na região.
2.4.3 Coxim no século XX: do fim da navegação à nova fronteira agrícola
O município de Coxim está localizado na região norte de Mato Grosso do Sul,
a 250 km da capital, Campo Grande, conforme pode ser conferido no mapa e
imagem a seguir (Figuras 3 e 4). Com extensão territorial de 6.409,232 km² às
margens da rodovia BR-163, trecho que liga Campo Grande a Cuiabá, a sua
população é de 32.159 habitantes (IBGE, 2010). Coxim tem como limites os
municípios de Corumbá, Sonora, Pedro Gomes, Alcinópolis, Camapuã, São Gabriel
48
do Oeste e Rio Verde de Mato Grosso. O município de Coxim apresenta solos
variados, está em dois biomas, cerrado e pantanal – sendo a região do pantanal
com solos heteromórficos diversos e na região de cerrado apresenta solos litólicos e
luvissolos de baixa fertilidade natural e em outras regiões apresenta a
predominância de podzólicos e latossolos.
Coxim é o maior município da região norte do Estado de Mato Grosso do Sul,
já foi conhecido nacionalmente como a capital do peixe, devido seus rios piscosos.
O município tem o 17º maior Produto Interno Bruto (PIB) do Estado, estimado em R$
400 milhões (IBGE, 2008), e possui um dos maiores rebanhos bovinos de Mato
Grosso do Sul. Quanto à área dedicada à agricultura, parte é destinada à agricultura
familiar, e outra, a maior parte do seu território, é ocupada por grandes
propriedades.
Figura 3 - Mapa do Mato Grosso do Sul - Coxim em destaque. Fonte: IBGE (2008)
49
Figura 4 - Imagem aérea da cidade de Coxim as margens do rio Taquari. Fonte: Prefeitura Municipal de Coxim (2012).
Historicamente, Coxim sempre foi ponto de passagem, tanto de mercadorias
quanto de pessoas migrando. Os “tempos áureos” economicamente foram com a
navegação fluvial na rota Corumbá-Coxim. No período da navegação, que se
localiza até as duas primeiras décadas do século XX, a região recebeu muitos
migrantes. E, no contexto da época, era um centro comercial de certa importância,
devido principalmente pela sua ligação com Corumbá, um grande polo comercial
também pela ligação com o Estado de Goiás, por meio dos carros de bois que
vinham buscar sal e outras mercadorias, vindas via Corumbá. Segundo Spengler
(1998), a década de 1940 não foi nada boa para Coxim, devido a acontecimentos
nacionais e internacionais, a região acabou passando por períodos críticos de
estagnação econômica e de comunicação com cidades como Cuiabá e Campo
Grande, pois nesse período a navegação estava quase extinta.
Porém, o “ressurgimento” de Coxim aconteceu na década de 1950, período
em que seus administradores, juntamente com algumas políticas federais,
50
principalmente ligadas ao Ministério da Agricultura (SILVEIRA, 1995), buscavam
transformar o município em uma região produtora no setor agrícola, incentivando a
pequena propriedade. Nesse período, inicia-se o boom da migração para Coxim,
que tem o seu auge nas décadas de 1970 e 1980, conforme a Tabela 1 a seguir,
pois muitos vieram para a Colônia Taquari, a primeira colônia agrícola na região, em
que os migrantes eram [...] “representados pela quase totalidade de nordestinos,
notadamente pernambucanos”. (SPENGLER, 1998, p. 64).
Tabela 1- Evolução populacional de Coxim entre os anos 1950 a 2010
Ano População
1950 8.613
1960 12.537
1970 18.537
1980 27.627
1991 33.431
1996 32.6398
2000 30.866
2010 32.159 Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 1950, 1960, 1970, 1980, 1991, 2000, 2010 e Contagem da População de 1996.
O sucesso da Colônia Taquari colocou Coxim novamente na rota produtiva do
Estado e a cidade sofreu várias transformações importantes, pois o comércio antigo
revigorava e outros surgiam, fazendo circular muito dinheiro na cidade e
aumentando o poder aquisitivo da população. Isso fez com que fossem implantadas
algumas agências bancárias, entre elas a do Banco do Brasil, principal responsável
pelos financiamentos agrícolas de pequenos a grandes produtores.
O Banco do Brasil foi o órgão do Estado responsável por financiar a
agricultura na região e no ritmo do desenvolvimento da agricultura, principalmente,
com o novo modelo econômico e pela forma de aproveitamento dos campos e
cerrados, por intermédio da mecanização. Coxim vai passar, mais uma vez, por
transformações profundas. As transformações ocorreram em todos os setores:
8 O município de Coxim, por ser o mais antigo município da região norte de Mato Grosso do Sul (O
distrito foi criado em 6 de novembro de 1872 pela Lei n.° 1 e o Município, em 11 de abril de 1898, pela Resolução n.° 202), sofreu ao longo da história vários desmembramentos formando outros municípios ou parte deles, e isso fez com que houvesse decréscimos da população do município, principalmente na década de 1990, com a criação do município de Alcinópolis. Os municípios que foram desmembrados do município de Coxim foram: Rio Verde de Mato Grosso (1954); Pedro Gomes (1965); Costa Rica (1980); São Gabriel do Oeste (1981); Sonora (1989); Alcinópolis (1993); e Figueirão (2005).
51
econômico; político; social; e cultural. A partir da década de 1970, o período em que
está o recorte temporal deste estudo, é representado por uma forte corrente
migratória vinda de diversas regiões do país, (SPENGLER, 1998, p. 65). Na referida
década, o município de Coxim teve um expressivo crescimento no seu contingente
populacional, pois saltou de 18.537 para quase 28 mil habitantes.
Na década de 1970, como já foi mencionado, o Brasil estava passando uma
explosão de investimentos e crescimento nessa região, o crescimento econômico
estava vinculado, principalmente, com a expansão da fronteira agrícola em Mato
Grosso. Para melhor visualizar tal fato, nesta época, o Brasil chegou à década de
1980, como o segundo maior exportador de alimentos e o atual Mato Grosso do Sul
também seguiu o mesmo ritmo. A área plantada em 1975 era de apenas 14,5% do
seu território e, na década posterior, mais especificamente em 1985, já era de 62,3%
de áreas plantadas (TEIXEIRA, 2009). Coxim acompanhou essa tendência e
continuou a ampliar a sua área de agricultura.
Esse período foi muito importante para o desenvolvimento econômico do
município de Coxim, pois os investimentos dos governos militares chegavam à
região, como a primeira usina hidrelétrica da região – a “Usina do Salto” – e a
implantação da “usina dieselétrica de Coxim”, subsidiada com recursos da SUDECO.
(FERREIRA NETO, 2004). Essas duas obras foram essenciais para alavancar o
desenvolvimento econômico de Coxim.
Observa-se que Coxim, na década de 1970, passou a ser um ponto de
convergência migratória, pois vieram muitos migrantes. Estes acabaram ficando em
Coxim e desenvolvendo a agricultura em áreas que antes estava ocupada pela
pecuária ou áreas de cerrados livres de atividades econômicas. Isso ocorreu devido
a sua localização geográfica: o município está entre Campo Grande e Cuiabá ou
entre a região centro-sul e a Amazônia Legal. Algumas vezes, os migrantes tinham
outro destino, mas acabaram ficando na região e isso foi detectado nas entrevistas
realizadas com migrantes estabelecidos em Coxim: “a princípio o destino era Rio
Verde de Goiás ou Cristalina, mas chegando a Coxim se encantaram, não sei a
princípio no que, por que no início era bem precário a coisa aqui e ficou por aqui
mesmo” (ANDRADE, 2012). Assim também, outros entrevistados estavam com
destino ao norte de Mato Grosso, região que era o principal foco dos projetos de
colonização.
52
É importante ressaltar que a razão de muitos migrantes se estabelecerem em
Coxim estava ligada a agricultura, sendo que, nesse período, consolidava-se a
concentração fundiária na região, com incentivos do governo e, também, devido ao
preço da terra. Aliado a exploração da agricultura está a mecanização das lavouras.
A agricultura mecanizada foi iniciada com o plantio de arroz e depois a soja, que se
tornou a principal cultura na região, apesar da pecuária ser significativa, pois Coxim
sempre teve um dos maiores rebanhos bovinos do Estado, com 473.077 cabeças
(IBGE, 2010), já a área do plantio de soja representa uma área pequena, que
corresponde a 10.908 hectares (ressaltando que esses dados são do ano de 2010).
Entre as décadas de 1970 a 2000, o município de Coxim perdeu parte considerável
de seu território, pois houve emancipação de Pedro Gomes, Sonora, Alcinópolis e
Figueirão. A principal área de plantio de soja está localizada atualmente no
município de Sonora, com 57.000 hectares (IBGE, 2010), quase seis vezes mais do
que a área de soja no município de Coxim.
Cabe ressaltar que Mato Grosso do Sul, assim como Mato Grosso, também
recebeu grande número de migrantes de outros Estados, principalmente oriundos de
São Paulo, pois historicamente a região esteve muito ligada aos paulistas, mesmo
antes da divisão do Estado. Pode-se observar a seguir, nas Tabelas 3 e 4, que nas
últimas três décadas do século XX houve um predomínio de paulistas e o grupo de
paranaenses e mato-grossenses foram os que mais cresceram, enquanto a Tabela 2
traz números já consolidados do processo de migração.
53
Tabela 2 - População residente em Mato Grosso do Sul, por lugar de nascimento, segundo a Unidade da Federação de residência – Brasil – 2008.
Unidade da Federação População (1000 pessoas)
01 São Paulo 246
02 Paraná 127
03 Minas Gerais 53
04 Rio Grande do Sul 35
05 Bahia 31
06 Mato Grosso 31
07 Pernambuco 24
08 Alagoas 21
09 Goiás 20
10 Ceará 18
Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por amostra de domicílio, v. 29, 2008.
Os municípios que mais receberam migrantes em Mato Grosso do Sul foram
Campo Grande e Dourados9, mas em geral os municípios sul-mato-grossenses
apresentaram taxas positivas, e o mesmo quadro é apresentado no município de
Coxim, localizado na microrregião Alto Taquari, pois o município apresenta o
seguinte dado: nos anos de 1980, a população migrante era de 52,14%; já em 1991,
a população de migrantes passou para 44,42% da população local (MARTINS, 2000,
p. 170). E as taxas médias da entrada de migrantes eram de 4,61% entre os anos de
1986 a 1991 e de 1,78% entre os anos de 1996 a 1997.
É possível observar que nas Tabelas 3 e 4, a seguir, que a região onde está
Coxim não segue a mesma lógica quanto ao recebimento de migrantes, enquanto o
maior grupo são os paulistas no Estado; na região de Coxim (Alto Taquari), o maior
grupo são de paranaenses.
Tabela 3 - Composição da Imigração Interestadual – Estado de Mato Grosso do Sul – 1970 a 1996. Unidade da Federação 1970/1980 1981/1991 1991/1996
São Paulo 43% 29% 30%
Mato Grosso 17% 29% 26%
Rondônia/Goiás 17% 13% 8%
Paraná 9% 14% 17%
Rio Grande do Sul 1% 3% 3%
Outros 13% 12% 16% Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 1980, 1991 e Contagem da População de 1996 apud NEPO/UNICAMP 1999.
9 Os municípios Campo Grande e Dourados, aqui são considerados já municípios do novo Estado –
Mato Grosso do Sul.
54
Tabela 4 – Composição da Imigração Interestadual segundo Microrregiões Estado de Mato Grosso do Sul – 1970/1980 e 1981/1991 – ALTO TAQUARI.
Unidade da Federação 1970/1980 1981/1991
Paraná 31% 25%
São Paulo 18% 18%
Rio Grande do Sul/Santa Catarina 13% 20%
Pernambuco/Ceará/Bahia 11% 7%
Goiás 10% 2%
Mato Grosso 9% 18%
Outros 8% 10%
Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 1980 e 1991 apud NEPO/UNICAMP, 1999.
Ao observar a Tabela 3, é possível perceber que o predomínio de migrantes
paranaenses para a microrregião, onde está situado o município de Coxim, com
ênfase nos períodos de 1970/1980, permanece no período seguinte, situado de
1981/1991. O que chama a atenção é o aumento de 7% de migrantes oriundos do
Rio Grande do Sul e Santa Catarina para a região, pois os demais grupos
decresceram ou mantiveram o mesmo percentual, com exceção de Mato Grosso e o
grupo sem denominação (outros).
Diante dos fatos apresentados, há evidências de que Coxim passou por
vários processos migratórios ao longo de sua história e isso influenciou diretamente
na formação sociocultural da população local, com indícios de que existe uma
mistura de culturas, provenientes de diferentes lugares do país, vindas em diversos
períodos. Esse fenômeno é muito significativo. E, partir dessa multiplicidade cultural,
buscar-se-á, nos próximos capítulos, tratar mais especificamente da construção da
identidade gaúcha em Coxim.
55
3 O QUE SE LEVA NA ARCA DA MEMÓRIA: A INVENÇÃO DA IDENTIDADE E
TRADIÇÃO GAÚCHA EM COXIM
Ao se discutir a formação etno-histórica do gaúcho é preciso se ater a
questões da relação entre migração e identidades10, sendo que, no caso de
identidade, constituirá a investigação histórico-científica em dois planos, o da
construção da identidade regional gaúcha e da etnorregional gaúcha. Para
fundamentar a questão, buscaram-se elementos da historiografia que trata dos
temas.
A identidade gaúcha, ou melhor, identidades gaúchas são aquelas articuladas
a partir dos Centros de Tradições Gaúchas (CTG). Dado a centralidade de tal
instituição é preciso esclarecer alguns pontos de como essa entidade foi estruturada.
De acordo com Oliven (1999a, p. 52-53 apud ROCHA, 2006, p. 69), o termo
“gaúcho”, do ponto de vista histórico, está ligado a um tipo humano, habitante do Rio
Grande do Sul. No século XVIII, era um termo de conotação pejorativa, pois eram
mencionados como guasco ou gaudério sinônimo de malandro, ladrão, vagabundos
vadio etc. Com o passar do tempo, essa conotação mudou, sobretudo, nos períodos
pós-conflitos – Revolução Farroupilha (1835-1845), Guerra do Paraguai (1865-1870)
e Revolução Federalista (1893-1895). Então, gradativamente, o termo gaúcho foi
deixando a sua conotação pejorativa para uma conotação heroica, na qual
valorizava, a sua bravura, força e virilidade.
O conflito foi um dos elementos que, tradicionalmente, esteve associado à
identidade gaúcha, sobretudo, o “gaúcho primitivo”, mas há outros elementos, como
a prática de atividades ligada à área rural, mais especificamente, as estâncias de
gado na região do pampa ou campanha, sendo que esse gaúcho se dividiu em duas
categorias analíticas: o gaúcho peão e o gaúcho estancieiro, a isto, explica-se que:
[...] tanto o “gaucho peão” quanto o gaúcho “estancieiro” estão associados ao universo da Campanha sendo diferenciados pela sua condição social. O “gaúcho peão” era o responsável pela lida no campo, na captura do gado, mestre em domar os animais xucros e, em épocas de conflitos era
10
Usa-se identidades no plural e não no singular, pois se parte da perspectiva de Bauman (2005, p. 22), acerca de que a identidade deve ser pensada no plural, pois “atualmente, é mais fácil esconder essa verdade do que no início da era moderna. A fragilidade e a condição eternamente provisória das identidades estão mais explícitas na atual modernidade líquida.
56
convocado a empunhar armas e lutar pelos interesses do “gaúcho estancieiro”, seu patrão e dono das estâncias. (ROCHA, 2006, p. 70).
É válido lembrar que o “gaúcho primitivo”, segundo Rocha (2006), serve de
inspiração para o movimento tradicionalista e para a invenção da identidade gaúcha.
É preciso esclarecer alguns pontos acerca da invenção da identidade gaúcha.
Primeiro, é uma construção relacional que se deu ao longo do processo histórico de
formação do Rio Grande do Sul. Segundo, é a identidade que se estás discutindo,
sendo aquela que emerge na década de 1940 para, entre outras coisas, atender a
demandas ideológicas/sociais de uma elite. Segundo Kaiser (1999, p. 71), o
isolamento político e econômico de [...] “frações da classe dominante do Rio Grande
do Sul encontram na retomada das raízes culturais gaúchas um apoio extremamente
conveniente para manterem sua influência junto ao poder regional”.
Vários autores partilham da perspectiva analítica de que o tradicionalismo é
uma ideologia “[...] destinada a submeter às camadas populares, rurais e urbanas,
aos seus princípios, que enfatizam a harmonia social, o bem coletivo, a cooperação
com o Estado, o respeito à lei, etc.” (JACKS, 1998, p. 37). Portanto, segundo a
citada autora, o tradicionalismo é instrumento de dominação da elite sul-rio-
grandense. Isso representa dizer que:
Desta diferença de associados resulta a diferença de atuação interna e externa do CTG no que se refere às promoções sociais e culturais. Ainda nesta segmentação de público, foram fundados CTGs por negros, devido à existência de preconceito racial que barra a sua entrada nos Centros frequentados por brancos, em cidades como Caçapava do Sul, Bagé e Santana do Livramento, todas na região da Campanha. (JACKS, 1998, p. 37).
Portanto, a estrutura organizacional do Movimento Tradicionalista Gaúcho
(MTG), quanto do CTG, mantém uma hierarquia social dentro do movimento, ao criar
CTGs para classes menos abastadas, pelos menos no Rio Grande do Sul, mas essa
hierarquia mantém-se na própria estrutura interna dos CTGs.
57
3.1 A INVENÇÃO DO GAÚCHO
É preciso compreender a migração, no contexto da identidade etnorregional
gaúcha, compreender não pelo simples fato de transposição demográfica, mas todo
o contexto em que este movimento está inserido. Para entender a complexidade da
identidade etnorregional gaúcha, em que está centrada esta discussão, é preciso
remeter ao processo de construção e ocupação do Rio Grande do Sul. Essa região
foi ponto de conflito entre as coroas portuguesas e espanholas, mas com o fim da
missão jesuítica, os portugueses dominaram definitivamente a região, tornando-a
como ponto estratégico para conservação do domínio luso no Prata, no fim do
século XVII e início do XVIII, sendo que a “Coroa começou a distribui sesmarias aos
tropeiros e militares que se afazendaram, criando assim as estâncias de gado”
(FERREIRA; CORSO, 2008, p. 4).
A disputa entre portugueses e espanhóis fez com que a Coroa Portuguesa
elevasse a região, onde hoje é o atual Estado do Rio Grande do Sul, à condição de
Capitania de São Pedro, em 1760. Segundo Oliven (1992 apud FERREIRA;
CORSO, 2008, p. 5), essa região que, inicialmente, pertencia à América Espanhola
esteve, por quase dois séculos, isolado do resto do Brasil, pois o escoamento da sua
produção era feita por Buenos Aires ou Sacramento. A importância econômica foi
dada a partir do século XVII, devido a seu mercado de mineração e ao rebanho que
também ganha conotação em nível nacional.
O Rio Grande do Sul tem as suas particularidades, principalmente, devido as
suas características geográficas e o seu processo de ocupação. O fator que
favorece essa consolidação da identidade etnorregional gaúcha, refere-se ao seu
povoamento, pois foi colonizado, entre outros, por açorianos, alemães e italianos.
Esses grupos atendiam claramente os objetivos dos governantes que, inicialmente,
no século XVIII, era formar uma ação geopolítica para garantir o território e,
posteriormente, já no século XIX, com o objetivo de branquear a raça e, também,
devido o Brasil estar à beira da abolição da escravidão, poder-se-ia realizar a
apropriação do conhecimento e o trabalho relacionado a atividades rurais.
(NADALIN, 2001 apud FERREIRA; CORSO, 2008, p. 5).
58
Conforme mencionado anteriormente, a identidade regional gaúcha, segundo
Kaiser (1999) e Rocha (2006), foi estabelecida a partir do “discurso da diferença”
baseado na ênfase das particularidades do Rio Grande do Sul. E, assim, pode ser
compreendida a partir da trilogia analítica: fronteira; conflitos; e colonização.
Primeiramente, conforme mencionado, a região do Rio Grande do Sul esteve,
por longo tempo, isolada do restante do território que hoje é o Brasil, bem como a
sua inserção no território brasileiro foi um tanto tardia, pois [...] “são diversas
singularidades que, reunidas, dão suporte para a construção de um poderoso
sistema de práticas e representações que adquirem força na imagem de um tipo
humano positivo, capaz de grandes feitos: o homem da fronteira”. (KAISER, 1999, p.
39).
O segundo elemento está relacionado aos conflitos que fazem parte do
imaginário social do gaúcho. Essa representação pode ser vista e está expressa na
bandeira do Rio Grande do Sul, entre as faixas verde e amarela, a faixa vermelha,
que representa o sangue dos gaúchos derramado em inúmeras batalhas, guerras e
revoluções em que esteve envolvido (OLIVEN, 1992 apud KAISER, 1999, p. 40) e,
por isso, o autor afirma que “politicamente o gaúcho é um produto da guerra”.
O terceiro elemento está ligado ao processo de colonização organizada pelos
portugueses. O processo migratório e colonizador do Rio Grande do Sul resultou no
recorrente discurso da diferença e o amálgama étnico, sendo que alguns elementos
diacríticos são bastante pertinentes na formação da identidade regional gaúcha
como “[...] a presença do elemento espanhol na formação do tipo regional e, mais
recente, as correntes imigratórias de colonização europeia, especialmente alemã e
italiana, estas últimas compartilhadas, em parte, com Santa Catarina e Paraná”
(KAISER, 1999, p. 47).
Após discutir elementos do processo de formação do Rio Grande do Sul, bem
como mencionar o processo de construção do “gaúcho típico”, passa-se a expor a
construção do “gaúcho atual” ou gaúcho moderno. Mas quem é esse gaúcho atual?
Para Rocha (2006, p. 71), “o gaúcho atual é o gentílico utilizado para designar as
pessoas nascidas no Rio Grande do Sul, portador de uma miscigenação étnica
decorrente do processo de colonização do Estado fundamentado na imigração
europeia”.
59
Até agora se procurou mostrar como essa identidade gaúcha está pautada
em diferentes elementos da história do Rio Grande de Sul. Entretanto, sabe-se que
não é tarefa fácil, pois esse processo não ocorreu tão simples, para chegar a essa
representação identitária presente atualmente é preciso passar por outros caminhos,
como o do Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG) e a criação dos Centros de
Tradições Gaúchas (CTG). O tradicionalismo gaúcho é a instituição que dá
sustentação, de certa forma, a identidade gaúcha e a ressignificação da palavra
gaúcho.
Segundo Kaiser (1999), a versão que se conhece da identidade gaúcha é
resultado do Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG) que se iniciou na década de
1940 do século XX. Óbvio que não se trata de algo monolítico, também há que se
levar em conta que a identidade não é algo sólido, é um processo em constante
estado de construção (BAUMAN, 2005).
Bauman (2005, p. 26) aponta que a identidade é uma experiência humana e
que se dá na fronteira entre o EU e o OUTRO. A identidade é revelada como algo a
ser inventado e não descoberto; alvo de um esforço; “um objetivo” construído, pois o
campo de batalha é o lar natural da identidade (BAUMAN, 2005, p. 83), assim,
sempre se pode observar que as identidades se constroem em campos de
oposições.
Bauman (2005) aponta diversas situações em que é possível perceber a
liquidez do mundo moderno, pois, com o advento da globalização e a massificação
dos meios de comunicação, a identidade se tornou algo muito volúvel. Em todo o
tempo é capaz de se ter uma identidade nova e isso é uma das principais
características do mundo moderno e líquido. Para o autor, as inseguranças e
incertezas, trazidas pela modernidade líquida são as principais responsáveis pelas
transformações contemporâneas das identidades. E quando o autor se refere a
identidades no plural é porque concebe que estas não são perenes, mas
diversificadas frente a várias situações sociais.
Ao se falar de “gaúcho atual” ou gaúcho moderno, não se pode esquecer os
três elementos que são inspiradores e constituidores da identidade gaúcha que são:
fronteira, conflitos e colonização, pois a formação do gaúcho se dá a partir da
dialética entre o moderno e o tradicional, entre o velho e novo, entre o passado e o
presente. É latente, na construção da identidade gaúcha, a evocação do passado
60
para construir a identidade do gaúcho moderno, pois a materialidade desse sujeito
se constitui da “invenção da tradição”, que se baseia em um
[...] conjunto de práticas, normalmente reguladas por regras, tácita ou abertamente aceitas; tais práticas, de natureza ritual ou simbólica, visam insuflar certos valores e normas através da repetição, o que implica, automaticamente, uma continuidade em relação ao passado (HOBSBAWM; RANGER, 1997, p. 9).
Ainda nessa perspectiva, da formação do gaúcho atual, nota-se que essa
identidade se baseia na eficiência da tradição como meio de legitimar uma prática
social, pois “o fortalecimento do tipo social „gaúcho‟ se vale de um discurso étnico
regional como diacrítico fundamental na construção da identidade” (KAISER, 1999,
p. 31), sustentado pela invenção de uma tradição, a partir do momento em que a
tradição do “gaúcho típico” tornou-se obsoleta, ou seja, a tradição é inventada, em
geral, a partir de práticas tradicionais que já não são mais tradicionais.
(HOBSBAWM; RANGER, 1997).
Segundo Rocha (2006), a compreensão da invenção do tradicionalismo
gaúcho, está constituída a partir de três instituições que são: Parthenon Literário, o
Grêmio Gaúcho de Porto Alegre e o Centro de Tradições Gaúchas, pois essas
instituições foram os principais elementos difusores do tradicionalismo, sendo que o
Centro de Tradição Gaúcha (CTG) foi o principal veículo de difusão do
tradicionalismo em outros Estados brasileiros e no exterior eficiente em tal propósito.
Segundo dados do sítio da Confederação Brasileira Tradição Gaúcha (CBTG, 2012)
existem, atualmente, CTGs espalhados por todas as unidades da federação e
também em vários países do mundo.
Quando se menciona identidade etnorregional gaúcha (KAISER, 1999) é
possível falar também do MTG e CTGs fora do Rio Grande do Sul como instituições
que dão suporte a “rede etnorregional,”11 que, segundo Haesbaert (1998), forma-se
a partir da migração gaúcha para outros Estados ou países, ou a chamada “rede
social”, que de acordo com Fazito (2002), são as estruturas dos movimentos
migratórios. Nessa discussão cabe uma ressalva acerca da identidade etnorregional
gaúcha, pois para Kaiser (1999), essa identidade se refere àquela que está fora do
Rio Grande do Sul, enquanto que a identidade regional gaúcha é aquela situada
dentro do Estado.
11
Discute-se esse tema no item: A rede etnorregional gaúcha.
61
A identidade etnorregional gaúcha é, em parte, consequência do processo
migratório e da difusão do tradicionalismo. Esses dois fatores são primordiais para o
surgimento de muitos estudos sobre a questão, como pode ser observado no
trabalho de Haesbaert (1998), que trata dos gaúchos no nordeste brasileiro,
propondo uma análise do fluxo migratório sulista para o interior do Brasil, em
especial para o sul da Bahia e Piauí. E, também, de como foram formadas as redes
de migração gaúchas, assim como a identidade gaúcha fora do Rio Grande do Sul.
Na perspectiva de que os movimentos migratórios são também uma condição
para a formação da identidade etnorregional gaúcha, é que Haesbaert (1998) aponta
o conceito, mesmo que metaforicamente, de “diáspora”12, para explicar o processo
migratório e os seus vínculos com a identidade de origem. Esse processo, cujas
bases históricas e geográficas estão na região de Campanha no Rio Grande do Sul,
responsável pela formação da “rede regional”, tendo como consequência a
construção de uma identidade gaúcha, explicitando um claro destaque em relação a
outras identidades regionais. Existem elementos fundamentais que consolidam a
rede e articulam entre determinados pontos ou de valor estratégico em seus
microterritórios – como o CTG, os programas de rádio e TV entre outros – sendo
eles, segundo Haesbaert (1998, p. 68), “[...] agentes aglutinadores e/ou
fomentadores dos laços de identificação que mantêm coeso os grupos”.
Para explicar o que é rede regional, Haesbaert (1998) aponta o conceito de
“des-re-territorialização”, pois os elementos da rede regional são fundamentais para
consolidar a identidade gaúcha em outros territórios. Os estereótipos como sendo os
descendentes de alemães e italianos, além de serem luteranos e participar do CTG
(Centro de Tradição Gaúcha), os distinguem das populações autóctones, no caso do
estudo de Haesbaert (1998), mas, há também, outro elemento diacrítico da
identidade gaúcha que é a sua relação com o trabalho e, consequentemente, com o
sucesso econômico. (ROCHA, 2006; CARVALHO, 2012).
O processo migratório gaúcho para outras regiões brasileiras como Santa
Catarina, Paraná, centro-oeste e norte do Brasil e, mesmo para países sul-
americanos como Paraguai e Bolívia, deram-se em um contexto de expansão do
12
Haesbaert (1998, p. 55) usa de forma metafórica o conceito de diáspora para “[...] os fluxos migratórios e seus vínculos com uma identidade cultural cujas bases históricas e geográficas (o espaço apropriado simbolicamente para sua construção, a estância latifundiária da “Campanha” gaúcha) [...]”.
62
capitalismo e investimento do Estado brasileiro, com a modernização do setor
agrícola, por meio de financiamentos públicos, principalmente no período pós-1964.
A principal discussão que permeia os fatos apontados está ligada a questão
do território e rede regional, pois para Haesbaert (1998), o território está ligado às
questões de relação de poder e podem ser configurados em espaços contínuos ou
fragmentados e o seu controle pode ser amplo ou restrito. As redes regionais são
constituintes do território, pois são os laços mantidos por um determinado grupo com
a sua região de origem e fora dela e para que possam se manter coesas é preciso
algumas instituições sejam parceiras, como CTG, Igreja, cooperativas, entre outras.
Um exemplo de rede regional de migração gaúcha é o trabalho sobre Lucas
do Rio Verde no Estado de Mato Grosso, realizado por Rocha (2006), que busca
mostrar como as práticas culturais gaúchas foram impressas nesse novo território
tão distante do Rio Grande do Sul – que é a proposta de re-territorialização, estudo
desenvolvido por Haesbaert (1995 apud ROCHA, 2006, p. 11), onde os migrantes
gaúchos criam novos territórios.
Rocha (2006) busca mostrar em seu trabalho, parte do processo de
construção do tradicionalismo gaúcho, conforme já citado, bem como a construção
da rede social estabelecida pelos migrantes gaúchos, até chegar a Mato Grosso e,
também, o processo de ocupação ou construção de uma nova territorialidade que se
deu por intermédio do processo de colonização da Amazônia Legal. A isso, pode-se
acrescentar que:
[...] a rede regional gaúcha, tal como se apresenta em Lucas do Rio Verde é, ao mesmo tempo, um território no sentido tradicional expresso na sua horizontalidade, extensões formadas de pontos que se agregam sem descontinuidade numa lógica aerolar (SANTOS, 2004, p. 284): é uma rede reticular percebida nas ligações e conexões materiais e imateriais dos fluxos de intercâmbio, circulação, cooperação e de controle que unem espaços fragmentados como é o caso dos múltiplos elos entre “gaúchos” de Lucas com a sua região de origem, o sul do país. (ROCHA, 2006, p. 140).
Até o momento, buscou-se fazer um apanhado de alguns elementos que
constituem a identidade gaúcha na historiografia etnorregional, tratando de como a
identidade e a tradição gaúcha foram construídas em outras regiões do Brasil. É
importante ter ciência de que todos os elementos não foram elencados,
considerando os mais diversos trabalhos e perspectivas a respeito da construção da
63
rede etnorregional gaúcha, pois, em cada localidade, as identidades gaúchas
guardam suas especificidades.
Dessa forma, os elementos, que apontaram a construção da identidade
gaúcha, serão fundamentais para o entendimento do processo de constituição da
identidade etnorregional gaúcha, no município de Coxim.
3.2 MEMÓRIA E IDENTIDADE: O CTG
Anteriormente, buscou-se mostrar a construção histórica do gaúcho e para
isso fez-se necessário abordar mais detidamente elementos fundamentais na
construção da identidade gaúcha como o Centro de Tradição Gaúcha (CTG) e o
Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG). Essas instituições estão no contexto que
se pode considerar como as inventoras da tradição e das identidades gaúchas, a
partir de elementos históricos e sociais do Rio Grande do Sul.
Como já citado, a figura do gaúcho foi construída ao longo do processo de
ocupação e construção do território sul-rio-grandense e incorporou várias
significações para chegar à denominação de gentílico aos nascidos no Rio Grande
do Sul. O termo gaúcho, no sentido de identidade, passou por um processo de
construção relacionado a “personalidade dos indivíduos” e outro “com o espaço
físico que ocupam” (FIALHO, 2005 apud ROCHA, 2006, p. 69). Vale ressaltar que a
ressignificação do termo gaúcho “através do qual um tipo social que era considerado
desviado e marginal foi apropriado, reelaborado e adquiriu um novo significado
positivo, sendo transformado em símbolo de identidade regional” (OLIVEN, 1999, p.
73 apud ROCHA, 2006, p. 70).
Segundo Rocha (2006), a identidade gaúcha perpassa pela inspiração do
movimento tradicionalista que está alicerçada em dois tipos sociais, sendo o primeiro
no passado heroico do gaúcho, também denominado de “gaúcho primitivo”, e o
segundo no “gaúcho atual”, que é um tipo social, associado ao gentílico do Rio
Grande do Sul, fruto da miscigenação étnica.
A invenção do tradicionalismo gaúcho, conforme discutido anteriormente,
recorre a três instituições que foram, de certa forma, as mantenedoras do
64
tradicionalismo gaúcho, como o Parthenon Literário que foi fundado em 1868 por
intelectuais que exaltavam as temáticas regionais, sobretudo, as qualidades do
gaúcho (JACKS, 1998).
A segunda instituição é o Grêmio Gaúcho de Porto Alegre que, para Rocha
(2006), é a precursora do tradicionalismo gaúcho no Rio Grande do Sul. Fundada
por pessoas que buscavam cultuar e manter as suas tradições, mas também, não
excluía os costumes presentes, pois há dois aspectos nessa instituição que devem
ser levados em conta, segundo Oliven (1999 apud ROCHA, 2006), o fato de os
fundadores não serem pessoas detentoras de terras e capital e pelas diretrizes
dessa instituição, que era o antagonismo entre o passado e o presente ou entre o
tradicional e o moderno. Este último aspecto é que vai dar sustentação a
constituição, da terceira instituição, o Centro de Tradições Gaúchas.
O enfoque maior da discussão é para o CTG que, posteriormente, foram
aglutinados no Movimento Tradicionalista Gaúcho. A versão desse movimento que
se conhece atualmente – ou pelo menos mais recentemente – teve o seu início,
segundo Kaiser (1999), em meados da década de 1940 do século XX, na cidade de
Porto Alegre, no Colégio Júlio de Castilhos, a partir da iniciativa dos alunos
secundaristas ao criar um Departamento de Tradições Gaúchas no grêmio estudantil
da escola.
Paralelamente, ao movimento em que estavam fazendo os alunos do Colégio
Júlio de Castilhos, liderados por Carlos Paixão Cortês e Barbosa Lessa, havia
também outro grupo liderado por Hélio Moro e Glaucus Saraiva que tinha ligações
com um grupo de escoteiros com praticamente o mesmo objetivo. Em 03 de janeiro
de 1948 foi realizada a primeira reunião formal para a fundação do primeiro CTG
denominado: 35 – Centro de Tradições Gaúchas, mas a fundação, efetivamente,
deu-se em 24 de abril do mesmo ano, sob o lema “em qualquer chão sempre
gaúcho” (KAISER, 1999, p. 67-68).
O primeiro CTG fundado em 1948 tinha lá as suas particularidades, pois os
seus idealizadores eram estudantes ligados ao meio rural, “[...] eram filhos de
pequenos proprietários rurais de áreas pastoris onde predominava latifúndio ou de
estancieiros em processo de descenso social” (OLIVEN, 1991, p. 42 apud ROCHA,
2006, p. 73).
65
A “invenção do tradicionalismo” gaúcho é pautada na memória e nas práticas
de relação de poder de uma elite regional, pois é perceptível na estruturação do
próprio CTG, tanto é que desde o primeiro, 35 CTG foi criado como símbolo de
orgulho, isto é:
[...] em homenagem à Revolução de 1835, foi estruturado com bases idênticas às que hierarquizam a estância, propriedade rural de grande extensão, ou seja, com patrão, capataz, sota-capataz, agregados, posteiros, correspondendo aos títulos de presidente, vice-presidente, secretário, tesoureiro e diretor. Os conselhos consultivos ou deliberativos foram chamados de Conselho de Vaqueanos e os departamentos de Invernadas. (JACKS, 1998, p. 33).
A organização do tradicionalismo gaúcho está estruturada da seguinte forma,
os CTGs são integrantes do Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG), fundado em
1961, o MTG é um movimento com representações administrativas regionais que
coordena os polos sociais e culturais denominados CTGs. A administração regional,
que é o MTG, está ligada a uma instância nacional que é a Confederação Brasileira
de Tradicionalismo Gaúcho (CBTG).
O CTG, atualmente, é uma instituição presente em todos os Estados
brasileiros, conforme se pode observar nas Tabelas a seguir, e em várias partes do
mundo como Estados Unidos da América, em vários países da Europa e no Japão.
Esses CTGs são guiados, segundo Rocha (2006), pelos mesmos princípios e lema
do 35 CTG, que são os princípios cívicos, filosóficos, associativos, éticos e
recreativos, tendo em seu núcleo básico, as seguintes significações:
1) o ritual do mate, como escola da cordialidade; 2) a invernada campeira através da recuperação do cavalo em prática desportivas; 3) a invernada artística, que através da dança tradicionalista transmite as noções básicas de sociabilidade sendo dividida entre mirim, juvenil e adulta; e (4) o fandango, baile tradicional gaúcho que promove o encontro de gerações. (LESSA, 1998; OLIVEN, 1991 apud ROCHA, 2006, p. 76).
O tradicionalismo, representado pelo CTG, é um agente de convergência da
identidade gaúcha “inventada” e assimilada por todos aqueles sujeitos que tenham o
sentimento de pertença ao tradicionalismo, mesmo que não sejam nascidos no Rio
Grande do Sul ou descendentes de gaúchos. (ROCHA, 2006, p. 76). E essa ideia é
bastante importante para o caso que se está discutindo acerca da identidade gaúcha
em Coxim, pois nem todos os indivíduos que participam do CTG Sentinela do
66
Pantanal são nascidos no Rio Grande do Sul ou têm suas origens no referido
Estado, mas são “adeptos” dos princípios do tradicionalismo gaúchos.
CENTRO DE TRADIÇÕES
GAÚCHAS NO BRASIL (1993 e 1994)
CENTRO DE TRADIÇÕES
GAÚCHAS NO BRASIL (2011 e 2012)
Unidades da Federação Nº por UF Nº por UF
Rio Grande do Sul 1. 616 1.768
Santa Catarina 254 586
Paraná 222 255
Mato Grosso do Sul 15 19
Mato Grosso 63 23
Goiás 07 11
Distrito Federal 02 04
São Paulo 51 28
Rio de Janeiro 01 07
Espírito Santo -- 01
Minas Gerais 01 02
Rondônia 05 33
Acre -- 01
Amazonas 02 03
Roraima -- 01
Pará 01 ----
Tocantins 02 01
Maranhão 01 01
Rio Grande do Norte 01 01
Pernambuco 01 02
Bahia 03 05
Paraíba 01 -------
Fontes: CBTG - Confederação Brasileira de Tradição Gaúcha e MTG - Movimento Tradicionalista Gaúcho no Brasil. Anos de 1993 e 1994. In: HAESBAERT. Rogério. A noção de rede regional: reflexões a partir da migração “gaúcha” no Brasil. Território, v. 3, n. 4, p. 55-71, jan./jun. 1998. Disponível em: <ftp://146.164.23.131/terr/N_04/04_5_haesbaert.pdf>. Acesso em: 10 mar. 2010. E dados de 2012. Disponível no site da CBTG - Confederação Brasileira da Tradição Gaúcha. Disponível em: <http://www.cbtg.com.br/_sitio/ctgs/mapa.php>. Acesso em: 16 jun 2012.
É através da referência de pertença que se busca a definição de grupo étnico,
que é usado na perspectiva barthiana para o gaúcho que se tem em Coxim. Isso
significa que “um grupo étnico é uma das formas de organização social em
populações, cujo membro se identifica e são identificados como tais pelos outros”
(BARTH, 1976 apud VILLAR, 2004). Pensando como grupo étnico, a partir dessa
ideia, os mesmos só podem ser caracterizados pela diferença que eles percebem
Tabela 5 – Centro de Tradições Gaúchas por Unidade da Federação
67
entre si e com os outros grupos no qual interagem. Sendo assim, a identidade étnica
passa a ser definida em termos de adstrição para exemplificar a situação: é gaúcho
aquele que se considera gaúcho e que é considerado pelos outros do grupo como
tal e, acrescenta-se, o reconhecimento por outros grupos também. Portanto,
compartilhar uma cultura é uma consequência da etnicidade e não a sua explicação.
(BARTH apud VILLAR, 2004, p. 171).
A partir da perspectiva barthiana de identidade étnica, não se pode deixar de
apontar que a mesma também pode ser pensada como uma invenção, assim como
a tradição13.
Essa visão de “tradição inventada” vai ao encontro com o que se tem
postulado acerca da construção do tradicionalismo gaúcho e, consequentemente, do
processo de construção da identidade gaúcha.
Em depoimentos realizados por pessoas ligadas ao tradicionalismo em
Coxim, foi possível fazer essa observação como: “ah, ele adorava, se sentia o
gaúcho, se vestia com a pilcha, com a bota e tudo, colocava a bombacha, [...] até
hoje acho que ele tem, está guardada, o lenço, a bombacha ele ainda guarda, [...]”
(ANDRADE, 2012). Nesse relato, a depoente retrata o caso do seu marido que é sul-
mato-grossense, mas ao conhecer o tradicionalismo por intermédio de sua família,
passou a “adotar” a identidade gaúcha e também foi “adotado” pelo grupo de
gaúchos, mesmo não tendo suas raízes ligadas ao Rio Grande do Sul.
Acredita-se que é possível observar, até o momento da discussão proposta,
que o CTG é um espaço de recriação da memória e da identidade, pois é possível
dizer que ele não é somente o espaço de recriação, mas de invenção do próprio
gaúcho, por isso seja necessário que se debata um pouco mais sobre a memória e
identidade.
Primeiramente, são necessárias algumas inferências acerca da memória.
Para Pollak (1992), a memória é um fenômeno que está ligado ao íntimo individual,
ressalta a ideia de Maurice Halbwachs de que a memória deve ser entendida como
um fenômeno social que sofre mudanças constantemente, que pode ser socialmente
interpretado a partir dos “quadros sociais” (POLLAK, 1992, p. 02).
13
Tradição “que muitas vezes se inventem tradições não porque os velhos costumes não estejam mais disponíveis nem sejam viáveis, mas porque eles deliberadamente não são usados, nem adaptados” (HOBSBAWM, 2008, p. 16).
68
Nessa discussão acerca de como a memória é constituída, Pollak (1992)
aponta alguns aspectos que são relevantes como os “acontecimentos vividos
pessoalmente” e “acontecimentos vividos por tabela”, que são aqueles vivenciados
pelo grupo ao qual a pessoa julga pertencer. Esses acontecimentos podem levar a
uma “memória herdada”, que é aquela em que o indivíduo não participou, mas
devido à socialização, seja ela histórica ou política, leva-o à identificação, como se
fosse vivida por ele.
Aspectos como esses são indispensáveis, no processo de compreensão do
discurso do gaúcho que ocupa a região de fronteira, pois a memória, nesse caso,
torna-se um fator aglutinador de uma identidade, sobretudo, relacionado a aspectos
de como era a região quando eles chegaram sobre as suas regiões de origem, pois
sabe-se que nem todos chegaram no mesmo período, muitos vivenciam esses fatos
por tabela ou por meio da memória dos outros.
No caso em estudo, o lugar formador do gaúcho está ligado ao movimento
tradicionalista, mais especificamente a sua representação no CTG e às práticas de
atividades do “típico gaúcho”, que não são as dos gaúchos que se tem em Mato
Grosso ou Mato Grosso do Sul. Muitos desses nem sequer nasceram no Estado do
Rio Grande do Sul e, em grande parte, são descendentes de alemães, italianos etc.
A manutenção de vários elementos da identidade gaúcha, adquire feições
diferentes, de acordo com o espaço que se relaciona (HAESBAERT, 1998), pois a
identidade é relacional. Então, tem-se o gaúcho, o elemento social que busca
constituir uma identidade por meio das memórias dos “gaúchos típicos”, ou melhor,
do estereótipo de um gaúcho idealizado, tendo como referência de lugar, o Estado
do Rio Grande do Sul e as suas práticas sociais.
Na perspectiva de Pollak (1992), sobre o processo de construção da
memória, há uma ligação com o processo de construção ou reconhecimento de uma
identidade. O sentido de identidade que Pollak (1992) apresenta diz muitas coisas,
pois se constitui com:
[...] o sentido da imagem de si, para si e para os outros. Isto é, a imagem que uma pessoa adquire ao longo da vida referente a ela própria, a imagem que ela constrói e apresenta aos outros e a si própria, para acreditar na sua própria representação, mas também para ser percebida da maneira como quer ser percebida pelos outros. (POLLAK, 1992, p. 05).
69
Observando a citação acima pode-se buscar associar essa noção de
identidade ao gaúcho, pois no processo de construção da sua identidade, os
mesmos buscam essa “imagem de si para si e para os outros”, acredita-se que os
CTGs desempenham bem essa função.
Ainda, nessa discussão, de que a identidade é a imagem de si para si e para
os outros, há um elemento que está fora da realidade do indivíduo, que é o outro,
nesse sentido, cita-se que:
Ninguém pode construir uma auto-imagem [sic] isenta de mudança, de negociação, de transformação em função dos outros. A construção da identidade é um fenômeno que se produz em referência aos outros, em referência aos critérios de aceitabilidade, de admissibilidade, de credibilidade, e que se faz por meio da negociação direta com outros. (POLLAK, 1992, p. 05).
Ao se tratar de terceiros é necessária certa negociação, pois sem essa
negociação é impossível construir uma imagem de si, já que o outro é a referência.
Pode-se inferir que “a identidade e a memória são fenômenos negociáveis, porém
não deve ser entendido como essências do indivíduo ou do grupo”. (POLLAK, 1992,
p. 05).
Portanto, o que se tem buscado mostrar, nessa discussão, é que o CTG é um
espaço de recriação e invenção ou de reavivamento da identidade gaúcha fora dos
“pagos”, pois os seus integrantes buscam construir uma memória e identidade de si
e para si e para os outros. Nessa perspectiva, é evidente que a identidade é
relacional, pois segundo Oliveira (2006), o “Outro” tem um papel fundamental na
configuração da identidade. Posto isso, buscar-se-á discutir de forma mais
acentuada essa questão a seguir, sendo a identidade gaúcha construída ou
reinventada a partir da relação entre o migrante gaúcho e os outros grupos em dado
espaço geográfico.
3.3 A REDE ETNORREGIONAL GAÚCHA
Após ser discutida a formação etno-histórica regional do gaúcho e do CTG,
seu espaço privilegiado, mas não o único de recriação e invenção da memória e da
70
identidade. Busca-se, então, discutir a relação da identidade gaúcha com o projeto
de colonização do período de 1964 a 2012 e, consequentemente, a migração para a
cidade de Coxim na formação da rede etnorregional gaúcha.
No Brasil, após a segunda metade do século XX, o processo migratório
interno foi intensificado por ações do governo, principalmente, para algumas regiões
como o centro-oeste do país, esse movimento migratório se situa no contexto de
expansão da Fronteira Agrícola e modernização da agricultura no Brasil.
A partir da década de 1960, período dos governos militares, surge um novo
projeto de colonização do centro-oeste e da Amazônia. O tom da política era
“integrar para não entregar” e, nesse contexto, o gaúcho tem um papel fundamental,
isto é, nesse processo de colonização das fronteiras agrícolas brasileiras. Esse
processo teve início um pouco antes, nos anos de 1950, com a construção de
Brasília, no Planalto Central em que vários projetos de colonização foram
implantados no Estado de Mato Grosso (ABREU, 2003).
O processo de colonização, nesse período, tentou solucionar vários
problemas brasileiros, para melhor explicar o processo, cita-se que:
[...] representaria uma válvula de escape, na medida em que tinha como um dos objetivos, absorverem os excedentes demográficos das áreas rurais mais valorizadas do Sul e Sudeste do país. Ao mesmo tempo, contribuía para preservar a antiga estrutura agrária nacional e esvaziar a discussão em torno da reforma agrária, ao conduzir os trabalhadores rurais sem-terras e/ou expropriados para as terras de ninguém [sic.]. (ABREU, 2003, p. 279).
Essa colonização atendia a um projeto da classe política brasileira da época.
Representa manter a desigualdade da estrutura fundiária regional e nacional e
conter a exaltação dos conflitos sociais em dadas regiões. Dessa forma, buscou-se
garantir uma legião de trabalhadores formados por pessoas como ex-colonos e ex-
agricultores para as empresas colonizadoras que se instalavam na região, com
incentivo do governo e megaprojetos de exploração do centro-oeste.
Alguns fatores são apontados para tal movimento migratório, como conflitos
agrários na região sul do Brasil (SOUZA, 2001, p. 30; BARROZO, 2010) e a
expansão capitalista efetiva no Estado de Mato Grosso e região da Amazônia Legal.
Na década de 1970, segundo Castro et al. (2002), os conflitos agrários e os
movimentos sociais no campo no Rio Grande do Sul se avolumavam, sobretudo,
intermediado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), que exigiam reforma agrária
71
no próprio Rio Grande do Sul. Os agricultores sem-terras estavam sendo vítimas da
modernização da agricultura e concentração de terras (ROCHA, 2006).
Esses conflitos agrários na região sul, aliados a outras causas, tornaram um
dos fatores de expulsão de vários pequenos agricultores, é bom que se evidencie
que esses conflitos não ocorreram somente na região sul ou, mais especificamente,
no Rio Grande do Sul, mas em outras regiões do Brasil. Porém, fatores ocorridos no
Estado do Rio Grande do Sul estão ligados ao processo migratório e a construção
da identidade gaúcha que se está discutindo.
Nas entrevistas realizadas foi possível perceber que muitos migrantes vieram
para Coxim, em busca de novas oportunidades, pois o Rio Grande do Sul passava
por conflitos sociais no campo, modernização da agricultura e falta de espaço para a
reprodução do seu modo de vida e, também, havia o incentivo do governo para vir
para o centro-oeste e Amazônia Legal.
Esse movimento migratório para a região centro-oeste modificou as
características demográficas e econômicas da região e isso é sentido ao longo dos
anos, segundo Lisboa:
[...] fator associado às migrações no Brasil é a variação quanto aos aspectos naturais e a heterogeneidade da economia brasileira, associada a herança histórica de ocupação do território brasileiro, o que contribui para a concentração da população no espaço. As desigualdades econômicas espaciais impulsionam significativamente a população a buscar locais com maior desenvolvimento, desenvolvendo o interesse dos migrantes pelas áreas e setores mais dinâmicos. (LISBOA, 2008, p. 88).
Esse fato é recorrente no movimento migratório nordeste/sudeste e também
no chamado êxodo rural, que nesse momento, há uma grande concentração
populacional nas grandes cidades brasileiras como São Paulo e Rio de Janeiro, já o
movimento migratório pós-1960 ocorre numa dinâmica diferente, sobretudo, na
década de 1980. Nesse período, o movimento migratório passa por uma
reorientação, devido, principalmente, ao deslocamento da economia brasileira,
momento em que as cidades médias passam a serem alvos dos migrantes e por
terem um crescimento econômico atrativo (LISBOA, 2008).
Segundo Lisboa (2008), o fator principal que levou as pessoas a migrarem no
Brasil foi os fatores econômicos e uma melhor ascensão social, também, há outras
causas, segundo a autora, que não podem ser negligenciadas, como as “culturais,
72
paisagísticas, familiares, psicológicas, pessoais etc.” (LISBOA, 2008, p. 89), porém
são fatores difíceis de determinar.
Na “arca da memória”, os migrantes gaúchos levam certa mitologia, que os
exalta e os favorece no processo migratório. Nesse sentido:
São muito conhecidas a ‟tradição (i) migrante„ que muitos sulistas dizem ‟levar no sangue„ („europeu„, ou seja, de descendentes de italianos e alemães) e características que, interna e/ou externamente difundidas, fazem deste migrante um ‟pioneiro„, um „desbravador„ e até mesmo um ‟novo bandeirante„ que tem expandido nas ultimas décadas parte da ‟modernização„ (agrícola basicamente) do interior brasileiro. (HAESBAERT, 1998, p. 56).
Segundo o autor supracitado, essa ideia se tornou um mito e funciona como
elemento diacrítico da identidade gaúcha em relação às populações autóctones, pois
em muitos casos podem levar a segregação socioespacial, como é caso abordado
por ele de bairros gaúchos em Barreiras na Bahia, Balsas no Estado do Maranhão
(HAESBAERT, 1998, p. 56), Chapada dos Gaúchos e Buritis em Minas Gerais
(KAISER, 1999), e Sorriso em Mato Grosso (CUSTÓDIO, 2010). As relações entre
esses grupos geram situações típicas de fronteiras, que são os conflitos, pois em
alguns casos, até mesmo a proposta para emancipação de regiões de Mato Grosso
e Bahia são alimentadas por ideias de distinção identitárias.
A presença de gaúchos fora do Rio Grande do Sul intensificou nas últimas
décadas do século XX. Esse processo migratório ganhou dimensão transnacional e
visibilidade nacional e é chamado de “diáspora gaúcha”, que começou no final do
século XIX, “[...] quando os primeiros colonos partiram do Rio Grande do Sul rumo
ao centro-oeste do país em busca de terras. A maioria saiu das regiões coloniais,
onde não havia grandes propriedades e, com o crescimento das famílias, as terras
se tornavam insuficientes” (KAISER, 1999, p. 51). Amplia-se, a partir de então, os
conflitos agrários na região, pois o “incremento populacional registrado nas colônias
mais antigas, aliado à escassez crescente de terras cultiváveis, propiciaram o
surgimento de inúmeros conflitos no campo” (SOUZA, 2001, p. 30), provocando a
“diaspora gaúcha”, ou melhor, o “êxodo gaúcho” em direção ao centro-oeste, e
nesse contexto, Mato Grosso. (BARROZO, 2010, p. 14).
Segundo Kaiser (1999), os principais protagonistas da migração gaúcha são
os descendentes de europeus, que haviam adotado a identidade gaúcha para se
73
identificarem como brasileiros, e também é preciso explicitar em que contexto essa
“diáspora” se liga. Somado a isto:
É importante observar que a migração dos gaúchos quase sempre esteve ligada à expansão agrícola. Na maior parte das vezes, gaúchos buscam terras preferencialmente em grandes extensões, e boas oportunidades de negócio. Este é um dos diacríticos do discurso da diferença na diáspora – eles contrapõem-se a migrantes de outras regiões do país, que teriam como objetivo do deslocamento a busca de emprego, a inserção no mercado de trabalho. (KAISER, 1999, p. 52).
Esses migrantes correspondem a um projeto civilizador do Brasil, no início da
colonização, para o Rio Grande do Sul, o tipo ideal de colono era o europeu e,
posteriormente, no processo de expansão da fronteira agrícola brasileira para o
oeste catarinense e paranaense e no centro-oeste e sul da Amazônia, são os
sulistas, o colono ideal, (GUIMARÃES NETO, 2002) em grande parte os
descendentes de alemães, italianos e eslavos, entre outros.
No Rio Grande do Sul do século XIX, os imigrantes europeus tiveram o papel
de tentar modernizar a agricultura, principalmente, no que se refere a produção de
alimentos e, para isso, tiveram que adequar às suas condições técnicas à nova
terra, que eram áreas de florestas e relevo irregular. Ora, também, quando migraram
para o centro-oeste se depararam com situações parecidas, com um ambiente
diferente no qual esperavam que fossem agentes de modernização.
No contexto da diáspora gaúcha, a lógica se assemelha em relação aos
demais processos de colonização. O colonizador justifica sua condição com uma
autorepresentação de superioridade: “os gaúchos se veem como empreendedores
que levam a civilização e o desenvolvimento onde se instalam, criando empregos e
novas oportunidades.” (KAISER, 1999, p. 51) Segundo Carvalho (2012), isso é um
elemento recorrente nos processos de colonização e, também, muito presente no
discurso dos colonizadores e na disputa pela terra, por exemplo, no caso gaúcho,
autorrepresentam-se como trabalhadores, enquanto se referem ao Outro como
preguiçosos. Acrescenta-se a isso, pelo seguinte trecho:
De tal forma, os membros do establishment têm reforçado um controle social para manter sobre si uma dada conduta, voltada para o trabalho; e para os outsiders (ELIAS; SCOTSON, 2000), a deslegitimação e a superioridade de poder econômico dos estabelecidos forçavam em direção a adoção de uma dada ética do trabalho. (CARVALHO, 2012, p. 23).
74
Essa perspectiva de discurso está presente no gaúcho, principalmente
àquelas ligadas ao CTG, como se pode conferir nos trechos a seguir:
[...] então nos 1970, 1980 a terra aqui pra cima era mais acessível, então quem tinha um sítio no sul, vendia, chegava aqui e comprava uma quantidade maior de terra e veio fazer a vida, veio criar os filhos, veio procurar uma vida melhor, veio trabalhar, então o gaúcho arregaçou as mangas, veio trabalhar, ele veio fazer a vida [...] (MIRANDA, 2012). [...] não se pode é deixar de frisar é que com a chegada do gaúcho a evolução foi grande, o gaúcho veio aqui, o gaúcho começou a abrir fronteira, abrir áreas [...] o pessoal ficava muito de olho, até muita gente fala assim: esses gaúchos querem ser os tais. É que na verdade o povo, o povo daqui de Coxim tem muita mistura, é nordestino, é baiano, é paranaense e eles quando viram os gaúchos chegarem aqui, [...] e sai às 04 horas da manhã para ir a fazenda e voltar para trabalhar às 08 horas, isso aí era inadmissível os caras fazerem isso, os caras são loucos, então sempre nossa meta foi vê o dia de amanhã, e depois enxergar mais longe [...] (CENTENARO, 2012).
As pessoas citadas são ligadas ao tradicionalismo gaúcho, porém, a primeira
é paulista de Itápolis e foi casado com descendente de gaúcho, já o segundo é
gaúcho de São José do Ouro e ambos migraram para Coxim na década de 1980 e,
assim como Rocha (2006) e Carvalho (2012), destacam acerca da ascese do
trabalho como elemento diacrítico do gaúcho, no processo migratório em relação
aos demais, pois “[...] ele é um modernizador que carrega entre seus valores a
crença e a atitude do teor do trabalho e estas características exacerbadas na sua
auto-definição [sic] faz dele um „posseiro-empreendedor‟” (ZART, 1998, p. 212 apud
ROCHA, 2006, p. 36). E, nessa perspectiva, também referenda que o trabalho é um
dos elementos diferenciadores do gaúcho em Coxim. Sendo que:
[...] independente de serem patrões ou empregados, a adoção do trabalho como uma característica para demarcar a fronteira entre o Nós e o Outro contribui para impelir tanto aos gaúchos como aos Outros em direção de uma ascese do trabalho, na qual tempo é dinheiro, e trabalho é igual a produção de riqueza pecuniária. (CARVALHO, 2012, p. 125-126).
Essa ideia que Carvalho (2012) expõe, em seu trabalho, como um dos
elementos diacríticos da identidade gaúcha, também é presente no caso de Coxim,
é presente no discurso de gaúchos que chegaram no período pós-1964, estes
buscam demonstrar suas habilidades como empreendedores e como elemento
modernizante e civilizador, conforme pode-se observar a seguir:
75
[...] com a nossa chegada começou melhorar muita coisa, aí o gaúcho começou a fazer, começou a adquirir capital e botar coragem nas coisas, fazer isso, fazer aquilo e muita gente começou a se espelhar no gaúcho e o gaúcho passou a ser um incentivo para eles e não só a região de Coxim, mas se nós pegarmos todo Mato Grosso do Sul, Maracaju hoje é gaúcho, Chapadão do Sul é gaúcho, São Gabriel (do Oeste) é região de gaúcho, quer dizer tudo foi alavancado em função que veio gente de fora com uma visão diferente da deles. (CENTENARO, 2012).
Acompanhada a essa ideia de que o gaúcho é um indivíduo trabalhador, entra
a questão da ocupação, modernização e expansão capitalista no Cerrado e
Amazônia. Sabendo que os gaúchos não foram os únicos sulistas, existem
paranaenses e catarinenses denominados, muitas vezes, genericamente, de
gaúchos, principalmente, pelos autóctones. Como no caso estudado por Haesbaert
(1998, p. 57), “muitos capitalistas de outros Estados como São Paulo e Minas, e
mesmo do próprio nordeste, também atuam na difusão dessa modernização, alguns
tão “pioneiro” (ou “invasores” como diziam muitos baianos) quanto os “gaúchos”.
Ainda segundo o autor supracitado, os motivos que levaram a “diáspora
gaúcha” não foram motivos relacionados a questões políticas e culturais, como é
comum em alguns casos (judeus, ciganos entre outros), mas por questões
econômicas, pois o migrante gaúcho é movido pela lógica de acumulação de capital.
O gaúcho carrega consigo o estereótipo, o mito do “imigrante” europeu que é a
dominação e propagação de inovações em novos espaços. Mas Haesbaert (1998)
faz uma ressalva, de que esse movimento migratório ou diáspora gaúcha não é
simplesmente uma grande “rede do capital” em escalas regionais, nacional e global,
que podem explicar a ordenação da sociedade e do território no qual os migrantes
reproduzem suas representações sociais, culturais, políticas e econômicas, mas é
uma rede etnorregional.
Essa diáspora ajuda na manutenção da identidade gaúcha e, segundo
Haesbaert (1998), é um complicador das relações sociais e muitos gaúchos se veem
diferentes do restante dos brasileiros, conforme já mencionado. Isso valida à
perspectiva acerca da herança cultural revivida, por meio do CTG, fazendo com que
muitos se julguem “o povo mais tradicionalista do Brasil” (HAESBAERT, 1998, p. 58).
Fato que se pode verificar nos estudos realizados em Coxim, como a seguir: “[...]
eles tem muito arraigado essa questão cultural, trouxe também, não ia deixar de
formar o CTG, isso é inerente do gaúcho, [...] então eles dizem que gaúcho é estado
de espírito” (MIRANDA, 2012).
76
Para Kaiser (1999, p. 98),
[...] os gaúchos fora do Rio Grande do Sul formam uma rede etnorregional transnacional, cujo vértice é a região conhecida como pampa gaúcha. Essa rede é visível por meio de um regionalismo militante, que reforça a afirmação de identidade e o culto a tradição.
As redes etnorregionais, nesse caso, são os laços mantidos pelo grupo com a
sua região de origem e fora dela; e para que elas se mantenham coesas é preciso
que algumas instituições desempenhem essa função como o CTG, Igreja,
cooperativas, entre outras.
Vale fazer uma ressalva, Coxim não é uma cidade que tem o predomínio da
cultura gaúcha como é apontado em algumas cidades como Sapezal, Lucas do Rio
Verde, São Gabriel do Oeste, Chapadão do Sul, mas a rede social formada pelos
migrantes gaúchos, com o apoio do CTG, criou uma visibilidade para identidade
gaúcha na cidade. Esse grupo étnico recebeu adesão, não apenas de sul-rio-
grandenses e descendentes, mas de outros grupos como paulistas, paranaenses,
mato-grossenses, sul-mato-grossenses e nordestinos. A identidade gaúcha em
Coxim não está somente associada ao acúmulo de capital, mas a suas
possibilidades, como em Mato Grosso, a identidade gaúcha está associada ao
establishment14, mesmo que não com total exclusividade.
Dessa forma, o projeto de modernização e expansão capitalista no interior do
Brasil e, mais especificamente, no centro-oeste brasileiro foi atendido a contento,
tendo sua realização na migração e colonização, pois, segundo o discurso gaúcho
corrente na região, é que os gaúchos acordaram a potência que estava adormecida,
que é Mato Grosso (CARVALHO, 2012), e isso vale também para Mato Grosso do
Sul.
No entanto, foi possível mostrar, pelos menos em parte, como Coxim está
inserida na lógica da formação da rede etnorregional gaúcha. Este município é um
ponto a que se liga diversos pontos dessa grande rede e reforça as identidades,
que são construções sociais formuladas a partir da diferença, mas indispensável
como ponto de referência, a partir da vivência do cotidiano.
14
Sobre o conceito de establishment ver: ELIAS, Norbert; SCOTSON, John L. Os estabelecidos e os Outsiders: sociologia das relações de poder a partir de uma pequena comunidade. Tradução Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Zahar, 2000.
77
3.4 COXIM GAÚCHA?: A CONSTRUÇÃO DE UMA ELITE REGIONAL
Após discutir sobre a rede etnorregional gaúcha, buscar-se-á apresentar a
identidade gaúcha a partir da autorrepresentação da elite gaúcha coxinense e dos
gaúchos que migraram no período pós-década de 1970. Esse momento representa
o da abertura da fronteira agrícola por parte dos governos militares, no qual se
buscou estabelecer um projeto de colonização e modernização da região.
Os gaúchos que migraram para Coxim, na sua grande maioria, são pessoas
ligadas a atividades agrárias e suas cidades de origens são cidades de pequeno
porte. Esse processo de diáspora é percebido em entrevistas com migrantes
gaúchos, realizadas no ano de 2009, pois quando interrogados acerca dos motivos
que os trouxeram a Coxim, respondem que vieram “motivados pelas oportunidades
de trabalho, pois Coxim na época era terra de oportunidades” (VIEIRA, 2009). E
também em outro momento desse estudo, já em 2012, podem-se observar
respostas semelhantes como: “Meu pai já estava aqui, meu pai veio com os irmãos,
todos procurando uma vida melhor, veio pra trabalhar mesmo, nós viemos trabalhar
mesmo, porque Mato Grosso era a busca” (MIRANDA, 2012).
Por conseguinte, é possível perceber que a intenção do migrante gaúcho é
buscar uma melhor condição de vida, ter trabalho, preservar e/ou reproduzir o seu
modo de viver em outra região, como é caso de Coxim. E, de uma forma geral, a
região centro-oeste e Amazônia. Portanto, um dos fatores estruturais da migração
gaúcha era a necessidade de sobrevivência, uma vez que no Rio Grande do Sul, o
espaço físico, estava se reduzindo paulatinamente, ao contrário dos “sertões” ou
florestas mais ao norte do país, que ainda tinham terras “livres”, para o
desenvolvimento de projetos de colonização, sendo que o governo não levava em
consideração as áreas habitadas por povos indígenas e populações extrativistas.
Ao tratar de questões identitárias, a partir de movimentos migratórios
associados à Nova Fronteira Agrícola das décadas de 1970 e 1980, buscou-se
estabelecer a relação da identidade do migrante com aqueles que já estavam
fixados em Coxim. Também, busca-se analisar, com base em Elias (2000), alguns
comportamentos sociais desse grupo de migrante que se tornou established,
enquanto que os autóctones que se pode denominá-los outsiders, pois:
78
As categorias estabelecidas e outsiders se definem na relação que as nega e que as constitui como identidades sociais. Os indivíduos que fazem parte de ambas estão, ao mesmo tempo, separados e unidos por um laço tenso e desigual de interdependência. [...] Superioridade social e moral, autopercepção e reconhecimento, pertencimento e exclusão são elementos dessa dimensão da vida social que o par estabelecidos-outsiders ilumina exemplarmente: as relações de poder. (NEIBURG apud ELIAS; SCOTSON, 2000, p. 08).
O processo de formação da identidade coxinense e a identidade do migrante
perpassam por relações de poder, que se expressam na análise das entrevistas com
os migrantes, realizadas nesse trabalho. Boa parte dos entrevistados entende que:
“O estado deve muito a migração, pois a migração trouxe a modernização da
agricultura. Pecuária, pecuária é mais ligada aos paulistas” (KOHL, 2009). Outro
entrevistado assevera:
[...] o gaúcho contribuiu com a pecuária, a agricultura e a abertura de empresas e também a modernização do campo de modo geral, pois muitas coisas não existiam aqui e com a chegada dos gaúchos passaram a existir como empresas que vende máquinas agrícolas e o próprio setor secundário. (VIEIRA
15, 2009).
Esse sentimento de dívida/cobrança extrapola, muitas vezes, para outro de
superioridade em relação a outros elementos componentes do amálgama social
coxinense, isto é:
Os gaúchos que vieram para cá vieram com capital, são especializados na agricultura, pois na minha geração tem 66 netos só 2 não são formados, com nível superior, eu sou agrônomo, meu irmão, [...] é agrônomo, tem outros que são também, outros são veterinários, médicos, dentistas, etc. já os nordestinos são retirantes, não tinham capital, são a maioria analfabeto ou semi-analfabetos [sic], vivem da exploração da terra, pois enquanto a terra tá dando alguma coisa estão lá, como retirada da madeira, são extrativistas (KOHL, 2009).
O elemento nordestino aparece carregado de estereótipos e estigmatizado,
em oposição à “superioridade” dos forasteiros gaúchos. Segundo Elias (2000), essas
relações de poder e de sentimento de superioridade se expressam não apenas por
questões materiais. Em geral, o grupo que se coloca numa posição de superioridade
atribui a seus membros características humanas superiores; portanto, exclui todos
os membros do outro grupo do contato social não profissional com seus próprios
15
O Sr. Dorvalino Vieira é migrante gaúcho, tem como atividade econômica a agropecuária e chegou à cidade de Coxim em 1980.
79
membros. O tabu em torno desses contatos é mantido por meio de controle social
como fofoca elogiosa [praise gossip], no caso dos que observavam, e a ameaça de
fofoca depreciativa [blame gossip] contra os suspeitos de transgressão (ELIAS;
SCOTSON, 2000, p. 20).
Não se afirma, contudo, que essa relação tenha se dado em termos tão
nevrálgicos de separação, como na análise de Elias e Scotson (2000) de uma aldeia
inglesa. Porém, não restam dúvidas de que o binômio estabelecido/outsiders pode
ser percebido no âmbito das relações sociais dos migrantes gaúchos com os
elementos ditos “coxinenses” (pantaneiros/nativos, nordestinos e descendentes).
Entretanto, na análise de Elias e Scotson (2000), os estabelecidos fincavam
bases de poder na questão da antiguidade, em outras palavras, eram “os que
chegaram primeiro ou sempre estiveram ali”. Em Coxim, essa relação se dá de
forma inversa, os migrantes sul-rio-grandenses, ou pelo menos aqueles que são
ricos, tornaram-se parte do establishment local, assim os migrantes gaúchos
imbuídos de valores simbólicos ditos superiores (origem étnica, origem geográfica) e
alicerçado por uma rede regional que se formou ao longo do processo migratório, se
colocaram em posição de superioridade em relação aos demais, como se pode
observar a seguir no trecho da entrevista:
Essas colônias aí, Paredes, São Romão, Cearense, Planalto eram de nordestinos e quando elas param de dar alguma coisa eles vieram todos para a cidade e aí surgiu o Grilo. Em 1981 fiz muitos ProAgro [seguro agrícola], pois nessas colônias tinham plantações de algodão, o algodão só em falar em frio ele já cai. Mas os gaúchos têm mais tradição agrícola e modernizou a agricultura e os nordestinos não; então essas colônias voltaram a ser fazendas novamente. (KOHL, 2009).
As respostas dos migrantes vão, em geral, ao encontro das assertivas de
Elias e Scotson (2000), pois é possível notar sempre um tom de superioridade na
fala dos entrevistados em relação ao migrante nordestino. Os atributos que os
distinguem positivamente em suas autorrepresentações aparecem invariavelmente:
poder econômico; formação acadêmica; origem sulina; e se acrescentaria também, a
disponibilidade para o trabalho e acumulação de capital.
É explícito, considerando as afirmações de Elias e Scotson (2000) e das
entrevistas, como se dá a relação entre esses dois grupos na cidade de Coxim: os
detentores de melhores condições econômicas e formação acadêmica que se
sobrepõem ao restante, usando de generalizações para com o outro. Isso se dá,
80
sobretudo, no aspecto social, conforme se pode perceber, quando imputam – quase
como algo inato – aos nordestinos, o fato de não conseguiram cultivar a terra e
virem à cidade formar as regiões periféricas, chamadas popularmente de grilos ou
mesmo quando relaciona a população autóctone como descansada e que não pensa
na acumulação do capital como eles.
O establishment reforça o seu controle a partir das estruturas de coesão de
grupo. A superioridade se solidifica, por meio da coesão do grupo social, pois em
Coxim o grupo social visivelmente mais coeso é dos gaúchos; esses tem um próprio
código de relacionamento que se materializa no CTG (Centro de Tradições
Gaúchas), onde se reúnem para cultivar os costumes do tradicionalismo, um centro
de convivência cultural, e porque não, de manutenção de sua distinção social.
Quanto maior o grau de coesão, mais tendência tem o grupo em se colocar
em posição superior (ELIAS, 2000). Portanto, aqueles que aqui estavam antes dos
gaúchos (maioria), quanto àqueles que chegaram à mesma época, vindos de outras
regiões, não possuem o mesmo grau de coesão social do que os sulistas ou o seu
poderio econômico não é tão expressivo em relação aos demais.
Os gaúchos estabelecidos em Coxim, provavelmente se tornaram coesos a
partir de questões como a origem geográfica, bem como as suas atividades
econômicas desenvolvidas pós-migração. Esses aspectos mencionados podem ter
contribuído sim, para a coesão do grupo, mas também, deve ser considerada o
papel da rede regional que é concretizada no CTG e no movimento tradicionalista.
Essa coesão do grupo social pode ser notada nas entrevistas, quando se trata
do assunto do CTG. Sobre sua fundação:
Surgiu da necessidade de se ter um local de encontro em Coxim, e em 1988 em uma reunião na Área de Lazer do 47 BI reuniram vários segmentos da sociedade e foi fundado o CTB (Centro Brasileiro de Tradições) que iria abranger toda a sociedade, porém no fim fundamos o CTG, devido aos interesses dos demais segmentos que não deram prosseguimento a proposta inicial. (KOHL, 2009).
Tradicionalmente, os clubes sociais em cidades pequenas reúnem a “boa
sociedade”, o establishment local. Essa tentativa de criar uma agremiação que reúna
“os coxinenses” em geral, em torno de um “tradicionalismo” genérico, fracassa. A
coesão dos imigrantes sul-rio-grandenses e a existência previam uma rede mais
ampla, os CTGs e o tradicionalismo gaúcho, levaram a criação de uma organização
81
com uma identidade específica, a gaúcha, em torno da qual os demais, em grande
parte, acabariam por se reunir.
Os autóctones, entre eles nordestinos, que tem um fluxo migratório anterior,
possuem um estilo de vida em comum e se conhecem há mais de duas décadas, se
sentem de forma semelhante ao estudo de Elias e Scotson (2000) que:
[...] o afluxo de recém-chegados a seu bairro [...] como uma ameaça a seu estilo de vida já estabelecido, embora os recém-chegados fossem seus compatriotas. Para o grupo nuclear da parte antiga de Winston Parva, o sentimento do status de cada um e da inclusão na coletividade estava ligado à vida e às tradições comunitárias (ELIAS; SCOTSON, 2000, p. 25).
Pode ser que os autóctones ou nordestinos mais antigos tiveram essa reação
no momento da proposição de fundação do “Centro de Tradições Brasileiras”, que
nunca saiu do papel, pois é possível observar, a partir da perspectiva do gaúcho,
que os demais, de certa forma, se fechavam aos recém-chegados, com isso
protegendo sua identidade grupal (ELIAS; SCOTSON, 2000).
Os “estabelecidos” em Coxim afirmam que “[...] o CTG se descaracterizou
muito a partir da introdução de outras culturas, pois hoje já não se realiza os bailes
sociais do CTG [sic]” (KERN16, 2009). Nota-se a repulsa do grupo que se manteve
coeso em aceitar a cultura do outro; no exemplo de Elias e Scotson (2000), a cidade
de nome fictício, Winstom Parva, o grupo coeso e “moralmente superior” via a
introdução do outro em seus espaços como elemento descaracterizador e
ameaçador da própria sobrevivência da identidade.
O que deve ficar claro é que o migrante gaúcho se tornou “estabelecido” por
meio de sua coesão grupal e de sua superioridade econômica. Sobrepôs-se aos
demais segmentos da sociedade coxinense, mesmo sendo minoria numericamente.
As suas tradições são mais visíveis e a construção local da identidade gaúcha foi
realizada a partir do momento em que é configurado um ponto de encontro para o
cultivo e invenção dos hábitos e tradições em comum, o CTG Sentinela do Pantanal.
Ao entrevistar os migrantes gaúchos foi possível notar a sua identificação com
o local, porém, algumas ressalvas, já que os costumes e o meio social são
diferentes, mas “o melhor local de se viver é o lugar que se ganha dinheiro, que cria
seus filhos, onde se vive” (VIEIRA, 2009).
16
Carmo Kern é gaúcho, chegou em Coxim na década de 1980 e desenvolve como atividade econômica o comércio na cidade de Coxim.
82
O gaúcho é um migrante que carrega os valores culturais consigo, em parte
graças a essa posição de establishment, que tem um papel fundamental na
construção da identidade etnorregional gaúcha nas regiões de fronteira e tendo
como principal instrumento o CTG, que é:
[...] antes de tudo uma ‟instância simbólica‟ [...] que procura integrar ao indivíduo (seja migrante ou não) uma agremiação com as mesmas características do grupo local que ele perdeu ou teme perder: o pago. [...] existe um poder simbólico que legitima a „integração fictícia da sociedade' através de um arsenal ideológico produzido pelas classes dominantes ou hegemônicas. (ROCHA, 2006, p. 80).
Esse símbolo para os gaúchos migrantes é muito forte, pois eles se unem por
intermédio do CTG para matar a saudade, pois a criação de um local de convivência
cultural facilita que os gaúchos se adaptem a qualquer região, pois segundo Kaiser
(1999, p. 31),
Os gaúchos formam um grupo social que se vale do discurso étnico regional [sic] como diacrítico fundamental na construção de sua identidade. [...] E é através do culto a valores éticos, morais e práticas sociais consideradas seletas e o estabelecimento de tradições que justifiquem e glorifiquem as características étnico-regionais [sic] da cultura que os gaúchos geram e mantêm o sentido de sua identidade.
Todavia, apesar da coesão do grupo, o “gaúcho” é um grupo identitário
relativamente aberto. Afinal não ter nascido no Rio Grande do Sul que é o que define
ser um gaúcho, como revela o seguinte comentário:
[...] sentimento de pertencimento ao gauchismo está vinculado ao conhecimento e domínio da cultura gaúcha. Não apenas o fato de ter nascido no Rio Grande do Sul ou andar pilchado que torna um indivíduo ‟gaúcho‟. Nesse sentido acredito que ser gaúcho é um estado de espírito. (ROCHA, 2006, p. 79).
As identidades surgem em contextos concretos de interação (KAISER, 1999,
p. 33), pois a identidade é algo que se dá nas relações sociais entre um determinado
grupo e os demais grupos em dados espaços. Não há como descartar a ideologia
que o migrante carrega consigo e tenta reproduzir no novo espaço em que se
estabelece. Isso é visível na fala das pessoas que se entrevistou. Acrescenta-se,
assim, que:
83
Os CTGs surgiram no Rio Grande do Sul, para preservar a tradição e os costumes. Pois é um local onde se aprende a respeitar os mais velhos, a dançar é um centro de convivência cultural. [...] foi um movimento cultural contra a revolução americana e o objetivo era resgatar os costumes gaúchos, quem cultuava essa cultura eram os grossos, e o gaúcho em contraposição a cultura de massificação norte americana resgata os costumes e a cultura gaúcha através dos CTGs, e a partir de 1970 surgem a gurizada, uma nova geração que continua com esses objetivos (KOHL, 2009).
Por conseguinte, ao final dessa discussão, é bem perceptível a constatação
do estabelecimento do migrante gaúcho, de tal forma que a elite local passou a girar
em torno de tal identidade. Mesmo que se coloque como um grupo minoritário de
migrantes, manteve, entre outras questões, o que Elias e Scotson (2000) afirmam, a
coesão de grupo. Isso também fez com que se reproduzisse uma dada identidade
gaúcha, mesmo longe de seu espaço geográfico original, houve a construção de
certos elementos culturais diacríticos, a partir da relação com o outro.
Por que esses migrantes gaúchos não deixam de praticar as suas
diferenciações identitárias ou as reinventam? Na tentativa de explicar de maneira
mais coerente essa questão, buscaram-se subsídios nas teorias sociológicas das
migrações. Entendendo o conceito de migração como um fato social, em que os
seus atores migram em geral em grupos familiares e articulados em rede de
interações sociais que facilita a sua interação ao novo espaço geográfico (DUHRAM,
1984 apud BRITO, 2009, p. 11). E no caso das migrações gaúchas, as redes de
interações sociais podem ser chamadas de redes etnorregionais gaúchas que foram
se formando ao longo do processo de modernização, colonização e expansão da
fronteira agrícola, na segunda metade do século XX.
Portanto, essa discussão buscou apresentar a identidade gaúcha em Coxim,
bem como sua invenção. Buscou-se, sobretudo, reconhecer o valor de conhecer a
identidade de um grupo social da população pelo processo migratório e, também, as
transformações sociais e identitárias ocorridas ao longo do tempo analisado, e de
como esses migrantes se relacionam com os demais grupos, pois “[...] do ponto de
vista do desenvolvimento capitalista ou da modernização da sociedade, a migração
é parte da cultura brasileira, como caminho para a mobilidade social do indivíduo”.
(BRITO, 2009, p. 10). E, no caso dos migrantes gaúchos, tornaram-se a “elite
econômica” de Coxim, pois a identidade gaúcha em Coxim está associada e é
compreendida como parte da constituição do processo de colonização/migração da
84
metade do século XX, e está ligada intimamente a expressão de elite econômica nas
regiões de fronteiras agrícolas do Brasil.
85
4 MEMÓRIA, MIGRAÇÃO E IDENTIDADE: A NEGOCIAÇÃO DA IDENTIDADE
GAÚCHA EM COXIM
Neste capítulo busca-se esclarecer alguns elementos constitutivos de como a
identidade gaúcha foi constituída em Coxim. Para isso foi necessário fazer uma
discussão acerca de questões metodológicas quanto ao uso da História Oral. A
interpretação da identidade gaúcha em Coxim, desenvolvida nesta pesquisa, está
pautada em tal metodologia.
4.1 HISTÓRIA ORAL, IDENTIDADE E MEMÓRIA
Alguns elementos de metodologia do trabalho devem ser explicitados,
especificamente, a metodologia da História Oral. Isto porque (ou recurso que) dá
sustentação para as entrevistas que se realizou com o grupo de gaúchos ligados ao
CTG Sentinela do Pantanal e sócios que não tem a “origem gaúcha”.
A partir de várias leituras sobre a história oral, é que houve o entendimento
sobre essa metodologia usada em vários campos do conhecimento. Nota-se que
não há consenso geral entre os principais teóricos quanto a sua aplicação, pois
segundo Alberti (1997,p. 206), “[...] qualquer pessoa que queira entender um pouco
de história oral não escapa às discussões de ordem teórico-metodológica e ao
reconhecimento de que são várias as correntes e possibilidades dentro daquele
campo”.
A História Oral é um recurso utilizado, muitas vezes, para “criar” fontes
históricas quando não há. Quando, também, para elucidar uma tese, mas sua
abordagem deve partir de objetivos precisos da pesquisa que se está realizando e
esse é o procedimento entendido na perspectiva de Freitas (2002) e também na de
Bom Meihy (2000).
Alguns teóricos consideram que o uso da história oral e da memória pode
revelar possibilidades acerca da experiência social de determinados grupos ou
indivíduos, muitas vezes, negligenciados e abandonados pelos cientistas sociais.
Para Freitas (2002), o papel do pesquisador é fundamental na história oral, já que
86
sem a sua mediação não existiria nenhum depoimento, mas cabe ressaltar que, a
partir da “[...] metodologia da História Oral produz-se uma documentação
diferenciada e alternativa à história, realizada exclusivamente com fontes escritas”.
(FREITAS, 2002, p. 28). Porém, não foi à única fonte ou recurso de uma pesquisa,
pois o uso do maior número de material pode enriquecer muito a pesquisa
(ALBERTI, 1997, p. 12).
Outro ponto importante na história oral é quanto à subjetividade, pois ela está
presente também nos depoimentos, pois este representa uma visão parcial do fato.
Há uma discussão, na história oral, quanto ao “peso” dos depoimentos, já que
uma entrevista pode não ser a opinião da maioria ou representar a memória da
coletividade, porém, alguns autores abordam essa questão de maneira contrária. A
memória individual não é fechada completamente, pois quando o indivíduo busca
um determinado fato passado, ele precisa reportar às lembranças dos outros, busca
“referências que existem fora dele e que são fixadas pela sociedade”.
(HALBAWCHS, 1990 apud PEREIRA, 1991, p. 114).
A crítica à História Oral talvez seja em relação à própria memória, pois a
memória muitas vezes pode ser falha e distorcer, “já que os homens reconstituem o
passado com o que eles sabem do presente” (DUVIGNAUD, 1990 apud PEREIRA,
1991, p. 114).
Nessa perspectiva, de que a memória é falha, às vezes ela pode ser
reveladora, segundo Pollack (1992) e Alberti (1997), no momento que há certas
distorções nos depoimentos, isso não significa que seja um dado negativo, mas
cabe ao entrevistador refletir e buscar explicações para tal.
Pollak (1992) levanta a questão acerca das distorções e gestão da memória,
pois uma história de vida pode apresentar pontos sólidos como pontos não sólidos e
a partir daí é que se identifica o “verdadeiro” ou, pelos menos, se aproxima dele,
apesar de não existirem verdades absolutas. Como foram levantados problemas de
interpretação, é necessário, que esse cuidado e observação, deva-se ter ao analisar
o processo de constituição das identidades. Isso é sentido quanto ao uso da
entrevista como fonte. Segundo Pollak (1992, p. 15), é preciso dar a devida
importância e observar o emprego dos pronomes pessoais nas entrevistas, pois são
os indicadores linguísticos que servem para aproximar ou distanciar os fatos ou
pessoas. Segundo o autor, essa possibilidade é “um indicador muito fidedigno do
87
grau de domínio da realidade” e aponta pontos sólidos ou não da construção da
memória.
Mesmo tendo as suas distorções, a memória é mais uma fonte para se
averiguar o porquê de dados eventos, isto se deve ao fato de que:
[...] „peculiaridades da história oral„ podem ser mais uma fonte do que um problema. Ouvindo os mitos, as fantasias, os erros e as contradições da memória, e prestando atenção às sutilezas da língua e da forma narrativa, podemos entender melhor os significados subjetivos da experiência histórica (THOMSON, 2002, p. 355).
Por exemplo, para entender algumas questões como o silêncio dos gaúchos,
quando procurados para falar acerca do CTG e identidade gaúcha em Coxim, pode
ser um indício de como algumas questões, como conflitos sociais, podem estar por
trás da não revelação da memória e do silenciamento dos próprios integrantes do
grupo.
Discutindo memória e identidade, busca-se mostrar que a memória é
estruturada na identidade do grupo e a identidade do grupo é estruturada na
memória. (FENTRESS; WICKHAM, 1994).
Segundo Fentress e Wickham (1994), parte da memória é fato social, pois
parte dela são recordações privadas e pessoais. Isso leva a pensar na divisão da
memória em social e pessoal. A memória em si e por si tem o caráter subjetivo, mas,
quando estruturada pela linguagem e que são compartilhadas por uma coletividade,
torna-se uma memória social. A memória é parte integrante do ser, pois se é aquilo
que se recorda, podendo identificar seja individualmente ou coletivamente, pois
segundo os autores, isso está estruturado nas memórias.
Para o tema memória tem-se, também, o entendimento a partir da perspectiva
de Candau (2011), que discute o processo de transformação da memória individual
em memória coletiva e, consequentemente, a identidade.
O objetivo principal da obra do citado autor é analisar as formas de
passagem “[...] de formas individuais a formas coletivas da memória e identidade”.
(CANDAU, 2011, p. 11).
O autor apresenta algumas ideias que estariam presentes “ad nauseam” em
várias publicações relacionadas aos temas memória e/ou identidade. Estes
conceitos de memória e identidade são fundamentais nas ciências humanas, pois,
segundo o próprio autor, existe, de certa forma, consenso de que a identidade é uma
88
construção social, constante e redefinida em uma relação com o outro (CANDAU,
2011, p. 09).
Candau (2011) dedica parte da sua obra ao mapeamento de conceitos e
questões ontológicas acerca da memória. O autor estabelece a abordagem da
memória em três níveis: sendo o primeiro denominado de memória de baixo nível ou
protomemória, composta pelo saber e pela experiência mais profundos. O segundo
nível é a memória de alto nível ou memória de lembranças (ou de reconhecimento),
que incorpora vivências, saberes, crenças, sentimentos e sensações; e o terceiro
nível é a metamemória que é a representação que o indivíduo faz da sua memória, é
a ligação entre o indivíduo e o seu passado.
O citado autor discute as diferentes formas de construção e reconstrução da
memória e identidade mostrando o papel fundamental da memória no processo de
construção da identidade. A memória é fundamental no processo de construção da
identidade, mas para ela existir é necessário estar em relacionamento com o outro,
pois, segundo Candau (2011), o trabalho da memória é sempre coletivo, assim como
é impossível dissociar “[...] os efeitos ligados às representações da identidade
individual daqueles relacionados às representações da identidade coletiva”.
(CANDAU, 2011, p. 77).
Portanto, esta pesquisa parte de tais parâmetros acerca de memória e
identidade e da metodologia da História Oral para entender a identidade gaúcha em
Coxim.
4.2 NEGOCIAÇÃO DA IDENTIDADE
As migrações internas no Brasil ocorridas na segunda metade do século XX,
são compreendidas pelos deslocamentos inter-regionais e intrarregionais que
aconteceram, possivelmente, a partir da necessidade de melhores condições
socioeconômicas e familiares. E, nesse contexto, o migrante se configurou como
agente transformador de determinados espaços sociais, pois eles são capazes de
evidenciar as características da identidade local e pela sua condição de migrantes
são, muitas vezes, obrigados a negociar sua identidade. Nesse sentido:
89
As migrações redesenham o perfil das cidades e afetam as concepções de pertencimento, alteridade e identidade, mas a juventude é possivelmente mais capaz de dialogar com a identidade tradicional e migrante por estar permeada pelos valores da modernidade ou do mundo hodierno, o que provavelmente acontece em menor incidência com as gerações mais velhas (ALMEIDA 2010, p. 150).
Situação como essa é bem visível, quando se fala da identidade gaúcha em
Coxim, pelo fato de que, quando perguntado para os migrantes oriundos do Rio
Grande do Sul ou aqueles que são participantes do CTG Sentinela do Pantanal: a
que eles atribuem o declínio do CTG na cidade? Os migrantes atribuem, de certa
forma, ao que se chama de negociação da identidade que os seus filhos fizeram
com a população local, muitas vezes porque seus filhos foram crescendo e
adquirindo hábitos ou misturando com os da população já existente ou, até mesmo,
saindo da cidade, como se pode conferir em trechos das entrevistas a seguir:
[...] chimarrão os meninos já não gostam, os meus filhos já não tomam muito, eles gostam do tereré sul-mato-grossense (ANDRADE
17, 2012).
[...] tinha grupos de danças, mirim, adulto, e eram contratados professores de dança para dá aula para gurizada, então Coxim chegou a sediar um encontro nacional, sediou um FEGMS, também que é o estadual e era muito forte mesmo. Agora o problema é o seguinte, a gurizada se não tiver o incentivo dos pais vão abandonando, então hoje a gurizada mais jovem não cultua mais e os mais velhos devido à ocupação, infelizmente (MARQUES
18, 2012).
Portanto, a segunda geração de gaúchos ou do que seriam gaúchos optaram
por uma negociação da sua identidade, acabaram se integrando aos hábitos da
sociedade local. Mesmo porque a cidade não oferece estrutura em formação e é por
esse motivo que muitos deixaram a cidade para estudar na capital Campo Grande
ou em outros centros. Alguns casaram com pessoas da cidade ou que vieram de
outro lugar e não tinha ligação com a identidade gaúcha, pois a cidade de Coxim
recebeu migrantes de várias partes do Brasil.
Os “migrantes são novos agentes sociais que, na medida em que se
mobilizam ao ‟lugar de destino', apropriam-se e integram o território ao longo do
17
Neide Salete Cervieri de Andrade é filha de gaúchos nasceu em Santa Catarina, chegou em Coxim em 1975, é bacharel em turismo e pós-graduada (lato sensu) em Educação a Distância e trabalha na Fundação Educacional de Coxim. 18
Maurílio Macir Martins Marques ou simplesmente Maurílio Santiago é natural de Santiago no Rio Grande do Sul é formado em jornalismo, locutor de rádio, empresário e chegou em Coxim em 1989.
90
tempo” (ALMEIDA, 2010, p. 154). Os migrantes gaúchos ao se consolidarem
socialmente e economicamente interferiram nas relações sociais até então
estabelecidas. Em muitos casos, essa relação pode ser de difícil inserção –
outsiders –, mas em Coxim, a situação foi um tanto diferente, não foi
necessariamente preciso da afirmação geracional para que se tornassem
estabelecidos, conforme foi discutido nos capítulos anteriores. Muitos migrantes
atribuem esse fato a hospitalidade da população com os migrantes, pois nenhum
dos entrevistados se queixou da recepção ao chegar a Coxim, ao contrário,
elogiaram bastante a forma que a população os acolheu.
Ao longo do tempo os gaúchos negociaram com a identidade local, pois
mantiveram as suas tradições e foram acrescentado elementos da cultura local,
conforme o relato de uma entrevistada quando faz referência ao churrasco:
O churrasco daqui é diferente do Rio Grande do Sul, o churrasco do Rio Grande do Sul tem acompanhamento de saladas, maionese, mandioca, cuca, aqui o churrasco é a carne, a mandioca, o arroz, o empamonado e o vinagrete, não é dessa forma que é o churrasco lá, então eu noto hoje que tem uma interação muito boa e que cada tradição contribui para o desenvolvimento de Coxim, eu acho que não existe essa rivalidade de que eu sou isso, ou sou aquilo, eu vejo que há uma convivência muito boa, lógico que cada qual procura preservar a sua tradição. (CARLING MARTINS
19, 2012).
Assim como é citado por Nodari (2009, p. 107) de que o processo de
pertencimento gerou uma dupla lealdade aos teutos que migraram para o oeste
catarinense, pode-se usar esse exemplo para comparar ao caso de Coxim em
relação gaúcho. A renegociação da identidade gaúcha fez com que surgisse uma
nova redefinição para a identidade gaúcha. A redefinição dessa identidade gaúcha é
sentida, sobretudo, na segunda geração de gaúchos (filhos dos migrantes oriundo
do Rio Grande do Sul), pois como afirma um entrevistado: “A minha filha até os 12,
13 anos não aceitava que era coxinense, falava que ela queria ser gaúcha e nós
insistíamos que não, que ela era coxinense, por ela, dizia que era matucha, mato-
grossense com gaúcha, hoje ela ri, ela fala que ela é pantaneira” (CARLING
MARTINS, 2012).
Ao analisar esse trecho da entrevista é possível remeter à discussão, tanto
acerca da identidade regional quanto da questão etnicidade, tratado por Nodari
19
Inez Carling Martins chegou em Coxim em 1987, é gaúcha de Campina das Missões no Rio Grande do Sul, é professora da rede pública e particular de Coxim.
91
(2009). A etnicidade significa que o indivíduo pertence e é reconhecido pelos outros
como integrante de um grupo étnico. Isso transforma em conceito-chave na análise
de integração do migrante e de seus descendentes. No caso da filha de gaúcho
citada, ser gaúcho não é um “estado de espírito”, mas uma identidade regional que
rivaliza e é excludente com outras, como a de pantaneiro.
Os grupos étnicos não se definem simplesmente por elementos culturais ou
tradicionais, mas como grupo de interesses, pois a etnicidade serve, nesses casos,
como meio de mobilização de determinadas populações, sobretudo, quando se
refere a questões de posições socioeconômicas na sociedade como um todo
(NODARI, 2009, p. 108).
No relato de Carling Martins (2012), a sua filha passa por essa situação, pois,
inicialmente, queria ser gaúcha e com o passar do tempo ela aceitou ser “matucha”
que é parte do resultado da renegociação da identidade gaúcha com a identidade
local. Enquanto que, atualmente, ela se reconhece como de identidade pantaneira20
que é uma identidade que passou por várias renegociações e que parte da
sociedade sul-mato-grossense se intitula como sendo dessa identidade pantaneira,
que possui um forte clamor popular no Estado de Mato Grosso do Sul. Essas
negociações podem ser entendidas:
Os limites dos grupos étnicos, por exemplo, precisam ser repetidamente negociados, e os símbolos ou tradições étnicas precisam ser repetidamente reinterpretados. O conceito de invenção permite o aparecimento, a metamorfose, o desaparecimento e o reaparecimento das etnicidades (CONSEN et al., 1992, p. 5 apud NODARI, 2009, p. 109).
A renegociação da identidade gaúcha, principalmente, dos mais jovens ou
dos filhos de migrantes sul-rio-grandenses depende dos espaços ou territórios, os
quais frequentam, pois “[...] inserem-se nos espaços citadinos, negociam sua
identidade outsider com a identidade dos estabelecidos” (ALMEIDA, 2010, p. 158).
De acordo com o que foi relatado na pesquisa de campo e nas observações
acerca da identidade gaúcha, os mais jovens renegociaram a sua identidade em
20
“[...] termo sujeito pantaneiro, este se refere a homens e mulheres que vivem na região do Pantanal, que tenham nascido ou não nesse espaço ou, ainda que já o tenham deixado, ainda mantêm algum tipo de vínculo com ele” (DELAMO; EDDINE; URT, 2012, p. 112). Existe também no Estado de Mato Grosso uma corrente de intelectuais, políticos, artistas e outros seguimentos sociais que buscam o reconhecimento e adesão, tanto dentro, quanto fora do Estado para que os indivíduos sul-mato-grossenses sejam reconhecidos como pantaneiros. Houve também no passado uma movimentação para que o Estado se chamasse Estado do Pantanal.
92
detrimento da identidade gaúcha e a favor da identidade sul-mato-grossense –
pantaneira. Esta renegociação da identidade remete a projetos de vida e aos
campos de possibilidades como casamentos, negócios e política.
Esses indivíduos que renegociaram a sua identidade vivem, de certa forma,
um papel duplo, pois, conforme já mencionado anteriormente, de acordo com a
necessidade, é acionada as suas identidades, seja ela pantaneira ou gaúcha. Essa
dupla etnicidade possibilita uma maior adaptabilidade e solidariedade (dos filhos de
migrantes sul-rio-grandenses) aos grupos locais e aos grupos migrantes. Dessa
forma, seria um exemplo de como nesses tempos, para setores cada vez mais
amplos da sociedade, a identidade é líquida (BAUMAN, 2005).
4.3 A CONSTITUIÇÃO DA IDENTIDADE GAÚCHA EM COXIM
[...] o gaúcho é hospitaleiro e ainda mais longe da querência, uma que faz com que inclusive que se reúne, existe até uma piada que um gaúcho sozinho não é nada, dois começa uma roda de chimarrão, três gaúchos fundam um CTG e quatro quebra o Banco do Brasil. (MARQUES, 2012).
Para entender a identidade gaúcha em Coxim é fundamental compreender a
rede de migração gaúcha e o papel da identidade gaúcha, como fez Haesbaert
(1998) ou, em outras palavras, o que Kaiser (1999) menciona, pois se denomina de
“rede étnico-regional transnacional, cujo vértice é a região conhecida como pampa
gaúcho”. (KAISER, 1999, p. 98). O conceito de rede é fundamental para que se
entenda a constituição da identidade gaúcha em Coxim, pois não foram as
migrações, o fator principal para que ela acontecesse, mas as redes que foram
estabelecidas a partir dela.
A rede possui uma característica muito importante que é a de nunca conseguir preencher de forma contínua o espaço geográfico. Uma rede que se tornasse uma malha tão compacta a ponto de preencher todo um espaço deixaria de ser rede. É por isso que o uso do termo se disseminou com tanta rapidez nos últimos anos, num mundo em que a lógica ‟tradicional„ dos domínios territoriais (que BERQUE, 1985, denominou de lógica ‟areolar„) é cada vez mais suplantada por uma nova lógica ‟reticular„, onde uma espécie de ‟territorialidade pós-moderna„ é pautada pela fragmentação e sobreposição de territórios (HAESBAERT, 1998, p. 63).
93
As redes sociais no processo migratório ocupam certa relevância como a
construção de base sólida de segurança, confiança, apoio e sociabilidade e, ainda,
informações. A rede social de familiares e conhecidos é a principal fonte de
informação para os novos egressos, assim como o grupo de espectadores que
permanece nos espaços por onde a trajetória perpassa, pois, percebe-se que:
O conceito de redes enfatiza que essas duas esferas entram em contato e se concretizam no interior de uma trama de relações pessoais, através das quais fluem as informações sobre trabalho disponível. São as relações pessoais que determinam quem partirá e tomará tal trabalho. A informação não é concebida como um bem livre: os indivíduos compartilham e dispõem de informações limitadas, sempre dependentes de sua rede de relações (TRUZZI, 2008:210 apud DESCONSI, 2011, p. 183).
Portanto, as redes reforçam a constituição de identidades étnicas, a partir da
relação que se tem com diversos outros grupos, pois, segundo Kaiser (1999), as
pessoas mantêm seus vínculos com os lugares de origem e suas tradições, mas
sem a pretensão de retorno, como é o caso de um entrevistado:
Quando eu me mudei pra cá, eu disse pra minha família lá no Paraná, eu disse pra minha mulher que eu estava escolhendo um lugar onde eu deixaria meus ossos e pelo menos até agora a ideia fixa ainda é essa, porque eu não pretendo me mudar daqui, não pretendo sair, pretendo continuar aqui até terminar. (MESSIAS
21, 2012)
Para Fazito (2002), as redes sociais são instituições invisíveis, no qual o
migrante se contextualiza, pois elas influenciam os grupos ou indivíduos a se
adequar a sistemas específicos, sobretudo, em uma análise relacional no processo
migratório. A abordagem sistêmica das redes sociais, no contexto migratório, torna
essas redes em conexão do sistema migratório, combinado com a possível análise
estrutural dos locais de expulsão e atração. Não cabe aqui efetuar toda essa análise
do processo migratório, basta indicar a existência da rede, como expresso no
excerto a seguir:
Eu tinha um irmão aqui, tenho até hoje que mora, e ele havia me feito um convite pra vir trabalhar com ele, pois ele tinha uma revenda, e me chamou atenção e em 1978 eu vim conhecer o Mato Grosso do Sul, vim até Rio Brilhante e Campo Grande e em 1980 eu vim a Coxim, olhei
21
Irajá Pereira Messias é natural de Ivair no Paraná, é advogado criminalista e chegou em Coxim em 1980, é sócio remido do CTG Sentinela do Pantanal de Coxim.
94
Coxim, cidade feia e em 1984 resolvi largar mão de ser bancário e vim enfrentar uma vida diferente, daí vim parar aqui (CENTENARO
22, 2012).
A partir do trecho da entrevista, observa-se a rede que foi estabelecida, pois,
inicialmente, veio o irmão para, em seguida, vir para Coxim, mesmo sendo uma
cidade “feia” que não oferecia nada na época. O contato que esse migrante tinha foi
por meio do irmão e isso possibilitou a sua vinda para Coxim. Outro fator importante,
nesse processo de constituição das redes, é a aplicação da mesma.
As Redes Sociais e a sua aplicação é possível por intermédio de dois
caminhos, sendo o primeiro que os fluxos migratórios acontecem entre duas ou mais
regiões e a relação dos indivíduos com a região. O segundo caminho é o da
interação entre os migrantes, não migrante e “instituições”. Este último é aquele que
constitui as redes sociais, pois a rede é um instrumento de avaliação das estruturas
e a sua relação com os atores (FAZITO, 2002, p. 14).
O autor supracitado coloca que rede social na migração é diferente de rede
migratória, pois a primeira está ligada ao conteúdo da rede social e suas relações
sociais, já a segunda é um tipo de rede social.
Segundo Tilly (1990 apud FAZITO, 2002), as categorias são moldadas no
destino, mas pode ser que não seja somente no destino, mas no processo de
estabelecimento em determinados espaços, e, principalmente, a partir da relação
com o outro, por isso, é importante saber sobre a necessidade da rede, como que é
estabelecida antes, durante e depois do processo migratório, conforme se observa
em relatos dos migrantes em Coxim:
Eu até me dei muito bem, pois a gente tem um pouco de facilidade em ter amizade [...] eu gostava muito de jogar futebol, cheguei aqui, já comecei a jogar futebol, então você começa a ter entrosamentos um pouco mais assíduos, e nos tínhamos uma turma de gaúchos que morávamos aqui, apesar de poucos, mas praticamente todos os finais de semana, se iam no almoço estava todo mundo, era bem maior o convívio dessa turma, o entrosamento, do que hoje, hoje cada um vive pra si, uns saíram, outros ficaram, cada um na sua casa, uma coisa bem diferente, naquela época não, todos os fins de semana você ia no restaurante, tava toda a gauchada lá, então... dias de semana vinham esses produtores que moravam em Sonora, moravam na fazenda, pessoal vinham pra cá, ah... vamos almoçar todo mundo junto e nisso a gente se ia almoçar lá e se reunia 10, 20 pessoas lá no próprio dia de semana, então essas coisas foram facilitando o convívio e estamos aí até hoje (CENTENARO, 2012).
22
Ademir Centenaro e natural de São José do Ouro no Rio Grande do Sul, é comerciante e pecuarista e chegou em Coxim em 1984.
95
Nota-se que a rede aqui foi construída após a chegada desse migrante e que
é composta por uma elite fazendeira. Percebe-se que o ponto de convergência
desse grupo está em um determinado espaço geográfico, idealmente, ao Rio
Grande do Sul e na prática a espaços de sociabilidade ou atrelado a algumas
atividades sociais como o futebol e o ato de ir ao restaurante nos fins de semana.
Mantendo a relação de entendimento, afirma-se que:
1) Rede social consiste no conjunto de pessoas, organizações ou instituições sociais que estão conectadas por algum tipo de relação. Uma rede social, em virtude do processo em torno do qual ela se organiza, pode abrigar várias redes sociais; 2) Rede pessoal representa, então, um tipo de rede social retida que se funda em relações sociais de amizade, parentesco etc. (SOARES, 2002, p. 12).
Em Coxim, a rede social dos gaúchos é marcada pela amizade e pelo
entrelaçamento de algumas famílias e o CTG, pois inicialmente o migrante gaúcho
tem como ponto de convergência o Estado do Rio Grande do Sul e, aos poucos,
outros elementos vão integrando essa rede, que é o espaço de representação,
nesse caso, a instituição CTG, pois junto com os migrantes também se deslocam as
suas relações, ou parte delas (DESCONSI, 2011, p. 180).
O migrante sul-rio-grandense carrega consigo o “mito Gaúcho” como homem
da fronteira, pois o discurso do gaúcho, os conflitos e revoluções, a formação étnica
do gaúcho e diáspora e o seu relacionamento com os outros são pontos que
agregam e ajudam a formar a sua rede social, não somente a social, mas uma rede
etnorregional gaúcha, conforme indica o seguinte autor:
Os gaúchos fora do Rio Grande do Sul partilham um conjunto de práticas e representações expressas no „ser gaúcho‟. Este sistema é baseado em valores de pertencimento comuns fincados no tipo regional de homem da fronteira e em costumes e valores ligados à região da Campanha. Ou seja: quando constroem uma identidade social em comparação com a população local de seus novos locais de moradia, é recorrente o uso do passado rural do Rio Grande do Sul e da figura mítica do gaúcho como diacrítico para estabelecer distinções. (KAISER, 1999, p. 60).
Portanto, a partir de observações feitas nas entrevistas realizadas com
migrantes, que são reconhecidos e se reconhecem como gaúchos e do
entendimento do que são as redes sociais e a rede etnorregional, pode-se afirmar
que os gaúchos, em Coxim, são um grupo que conseguiu estabelecer uma rede
social e se porta como um grupo étnico, sendo que os elementos diacríticos da
96
formação da identidade gaúcha em Coxim, não fogem daquilo que tem apontado em
outros estudos já realizados. Como exemplo desses elementos diacríticos, retoma-
ser a discussão sobre o “trabalho”.
Como já se argumentou, o trabalho é um elemento tomado como
diferenciador entre o gaúcho e os demais, “pois dos vários elementos diacríticos
para a identidade gaúcha, que marcam a fronteira entre Nós e o Outro, o trabalho é
um elemento central” (CARVALHO, 2012, p. 126). A questão do trabalho é um
elemento que está presente em várias pesquisas acerca da identidade gaúcha fora
do Rio Grande do Sul, pois pesquisas como a de Rocha (2006) realizadas na cidade
mato-grossense de Lucas do Rio Verde, mostra esse elemento de identidade
gaúcha como empreendedores e são legitimados pelos seus pares. A pesquisa de
Carvalho (2012) também aponta para a mesma questão:
Que, enquanto grupo étnico, recebe adesões não apenas de sul-rio-grandenses e seus descendentes, mas de outros grupos. Apesar de nem todos os gaúchos serem fazendeiros, bem pelo contrário, a identidade gaúcha no Estado de Mato Grosso é associada ao establishment. Mas, independente de serem patrões ou empregados, a adoção do trabalho como uma característica para demarcar a fronteira entre o Nós e o Outro contribui para impelir tanto aos gaúchos como aos Outros em direção de uma ascese do trabalho, na qual tempo é dinheiro, e trabalho é igual a produção de riqueza pecuniária (CARVALHO, 2012, p. 125).
Gaúcho é o grupo que se autorrepresenta como trabalhadores e, em grande
parte, os demais como preguiçosos como se pode observar, a seguir, na entrevista
com um migrante sul-rio-grandense:
O que não se pode é deixar de frisar é que com a chegada do gaúcho a evolução foi grande, o gaúcho veio aqui, o gaúcho começou a abrir fronteira, abrir áreas e onde o pessoal ficava muito de olho [...] eles quando viram os gaúchos chegarem aqui, um gaúcho sair às 04 horas da manhã para ir à fazenda pra voltar e trabalhar as 08 horas isso aí era inadmissível, os caras fazer isso, os caras são loucos, então sempre nossa meta foi vê o dia de amanhã, depois, enxergar mais longe... a mentalidade do pessoal daqui, a deles é viver hoje, o que interessa é o hoje, se ganhar mil reais hoje e gastar mil reais hoje tá de bom tamanho, e para nós gaúcho é diferente, sabemos se ganharmos mil hoje, amanhã ou depois, podemos ficar três dias que não vamos ganhar e nós vamos manter isso aí, porque futuramente vai fazer falta pra nós, então essas disparidades é que tem muito aqui, com a nossa chegada começou coalhar muita coisa, aí o gaúcho começou a fazer, começou a adquirir capital e botar coragem nas coisas, fazer isso, fazer aquilo e muita gente começou a se espelhar no gaúcho, que viram que no gaúcho passou a ser um incentivo para eles e não só a região de Coxim, mas se nós pegarmos todo Mato Grosso do Sul, Maracaju hoje é gaúcho, Chapadão do Sul é gaúcho, São Gabriel (do Oeste) é região
97
de gaúcho, quer dizer tudo foi alavancado em função que veio gente de fora com uma visão diferente da deles (CENTENARO, 2012).
A associação de trabalho e gaúcho é algo muito presente e relevante na
identidade gaúcha em Coxim, pois as entrevistas levam a essa conclusão: de que o
trabalho é um elemento diacrítico da identidade gaúcha. O que, segundo Carvalho
(2012), é uma forma de deslegitimar o Outro na tentativa de implantar uma lógica
produtivista, típica da sociedade industrial. Essa ideia é também exposta por Kaiser
conforme se pode observar:
Os gaúchos se veem como empreendedores que levam a civilização e o desenvolvimento onde se instalam, criando empregos e novas oportunidades. Sua presença em regiões fora do Rio Grande do Sul intensificou-se nas últimas décadas. Ganhou dimensão transnacional e visibilidade nacional. Recentes reportagens publicadas na imprensa brasileira registram a presença gaúcha em quase todos os Estados brasileiros, seja pela sua participação social e econômica, seja pela criação de CTGs em outras localidades no Brasil e exterior, como nos Estados Unidos, Japão e América do Sul (KAISER, 1999, p. 51).
O trabalho é o elemento no qual está alicerçado a identidade gaúcha,
principalmente, o trabalho ligado à agricultura, “[...] e onde existir um chapadão e
terras agricultáveis pode ter certeza que lá vai ter um gaúcho” (MARQUES, 2012). O
trabalho é um elemento delimitador da fronteira entre o Gaúcho e o Outro.
Para tanto, buscou-se mostrar como a identidade gaúcha está estabelecida
em Coxim, sem a pretensão aqui de fazer um inventário de elementos diacríticos. No
item a seguir, buscar-se-á retomar alguns elementos da negociação da identidade
gaúcha em Coxim, agora a partir do CTG Sentinela do Pantanal.
4.4 A IDENTIDADE GAÚCHA, CTG SENTINELA DO PANTANAL E O
ESTABLISHMENT
A identidade gaúcha em Coxim foi permanentemente renegociada. O CTG
que simbolizava a expressão máxima dessa identidade é um bom lugar para
perceber isso. Como já citado, antes da fundação do CTG Sentinela do Pantanal,
em 30 de outubro de 1988,houve a proposta de criação de um Centro de Tradições
98
Brasileira, portanto, com uma proposta mais ampla e não vinculada diretamente a
identidade gaúcha.
Ao analisar a questão, como já argumentado, pode-se buscar algumas
explicações para a identidade gaúcha em Coxim. O fato de ter sido fundada uma
instituição abrangente, mas, no entanto, não se consolidou, já que, segundo o
entrevistado a seguir, o grupo denominado genericamente de gaúchos estava mais
organizado e isso pode associar a ideia, principalmente, de uma rede etnorregional
consolidada. Outra possibilidade de não ter consolidado a ideia inicial do Centro
Brasileiro de Tradições Brasileiras é a relação desse grupo com os demais, que
apesar de ser lembrada como harmoniosa, implicava em confrontos.
Entre alguns exemplos de uma situação de confronto, relatada por muitos
participantes do CTG Sentinela do Pantanal, relaciona-se a sua inauguração. Neste
momento, os dirigentes haviam se organizado para que o idealizador do CTG em
Coxim pudesse arrematar a primeira dança do salão, mas, em meio ao leilão,
apareceu um participante do baile, um advogado nordestino e arrematou a dança.
No entanto, quando chegou ao final do baile, o participante que arrematou a dança
tinha que acertar o pagamento, mas não teve dinheiro para bancar tal dança. Então,
reuniram-se vários sócios do CTG e alguns amigos do advogado para resolverem a
situação. No desfecho, os amigos e sócios do advogado fizeram uma “vaquinha”
para pagar o débito da primeira dança do salão do CTG de Coxim.
Outro exemplo de como o confronto com o Outro é constituidor da identidade
é o próprio nome do CTG, como apresentado no relato que segue:
[...] o nome do CTG de Coxim de CTG Sentinela do Pantanal, devido o gaúcho ser acusado de destruir, sobretudo os de São Gabriel do Oeste, o nome tenta conscientizar a gurizada a respeitar o pantanal, as questões ambientais, por isso o nome Sentinela do Pantanal (KOHL, 2009).
Esclarece-se que:
[...] os gaúchos não são os gafanhotos das florestas, [...] as identidades étnicas não são os fatores que explicam a relação que se tem com a natureza, mas os fatores a serem explicados, de como distintas configurações sociais constroem identidades étnicas e relações diferenciadas com a natureza. (CARVALHO, 2012, p. 126).
Isso aponta que nem todos concordavam ou aceitavam, como positiva, as
características atribuídas ao gaúcho, como colonizador ideal.
99
O gaúcho é um elemento que está associado ao processo de expansão da
fronteira agrícola brasileira e do desenvolvimento do agronegócio, conforme se
buscou evidenciar em vários pontos da discussão proposta é que, nesse processo,
procurou-se, inicialmente, na figura do gaúcho, o colonizador ideal, a essa afirmação
acrescenta-se que:
O fluxo migratório que se estendeu, das regiões sulinas para outros estados, desde o final do século XIX, pode ser assim sintetizado: o fluxo inicia dentro do Rio Grande do Sul, das denominadas “colônias velhas” para as “colônias novas”. Depois, o deslocamento alcança, nas três primeiras décadas do século XX, o Oeste de Santa Catarina; e desde a década de 1940, atinge o Sudoeste do Paraná. [...] Contudo, na década de 1970, o fluxo migratório ultrapassa os limites da região Sul, deslocando-se diretamente para as regiões Norte e Centro-Oeste, principalmente para os estados que constituem a Amazônia Ocidental: Mato Grosso, Tocantins, Rondônia e Acre (TAVARES DOS SANTOS, 1993, p. 74-75 apud KAISER, 1999, p. 90).
Segundo Kaiser (1999), esses colonos são elementos resultantes do
processo de Territorialização-Desterritorialização-Reterritorialização (TDR), pois
esses “[...] gaúchos fora do Rio Grande do Sul se autodenominam „colonos‟,
construindo uma identidade social que recorre a um componente étnico vinculado à
colonização europeia na região sul do Brasil” (KAISER, 1999, p. 90).
Na análise da entrevista com outro gaúcho, foi possível observar aspectos já
mencionados por outro entrevistado, bem como alguns aspectos que mostravam a
importância e relevância do grupo e da identidade gaúcha, conforme se percebe
pelo que segue:
O CTG Sentinela do Pantanal foi criado em 1988, surgiu de uma reunião dos gaúchos, [...] e foram umas reuniões e vamos construir o CTG e no embalo saiu, acho que saiu um dos maiores CTG [...] até na época quando foi inaugurar esse CTG vieram os Monarcas e os Garotos de Ouro, eles até falaram que ainda que se tivesse 04 CTGs no nível do nosso em nível de Brasil seria muito. Hoje as coisas mudaram bastante, porque o CTG vai com o passar do tempo, aquela época era época das “vacas gordas” tudo era fácil pra fazer, se fosse fazer hoje não se faria 20% do que foi feito, trouxe boas lembranças e tudo, mas hoje já está difícil administrar, porque sobraram os caudilhos, os mais velhos, e os mais novos não está muito ligados nesse sentido, nós tivemos aí bocha como um dos grandes esportes de destaque aqui no Mato Grosso do Sul, hoje nós temos o laço que é na verdade o que está em evidência hoje no CTG, tivemos um futebol society, danças tradicionais aqui foi muito forte, os meus filhos dançaram e se criaram lá dentro, acho que foi uma das melhores coisa que o CTG teve foi as escolas de danças, mas hoje já está muito dificultoso para você conseguir manter uma estrutura, é muito grande e tem pouca gente que possa tocar aquilo lá. Hoje o pessoal, nós apesar de ser sulista, mas com o
100
pessoal daqui hoje, hoje o pessoal é mais ligado a violada, mais ligado a outras coisas, além disso, vem muitas exigências, é corpo de bombeiro que exige isso, exige aquilo e tudo isso são gastos altíssimos, então começa a dificultar a promoção do CTG e hoje o nosso aqui tá vivendo mais a nível de aluguel, mas de promoções não estão conseguindo a não ser a campeira que nos disputamos uma fase de laço pela federação estadual de Mato Grosso do Sul, agora dia 18, 19 e 20 nós vamos ter um evento aqui, sempre foi uma das maiores festas do Estado, entre as 08 últimas nós temos 05 que nós somos a melhor festa [...] (CENTENARO, 2012)
O que se pode analisar, a partir dessa entrevista, é que o entrevistado faz
comparações entre o CTG no século XX, quando foi fundado, e o do momento atual,
primeiras décadas do século XXI. Também, no trecho da entrevista, aparece a
importância da instituição CTG na memória individual e na memória para o grupo
revela-se pelo comentário corrente na cidade acerca do CTG, não só dos sócios,
mas de outros grupos sociais. A memória é um elemento constituinte da identidade,
tanto individual como coletiva, na medida em que ela é também um fator
extremamente importante do sentimento de continuidade e de coerência de uma
pessoa ou de um grupo em sua reconstrução de si (CANDU, 2011).
Por intermédio da memória do gaúcho, pode-se observar o quão forte foi esta
identidade, principalmente, quando se remete ao CTG, do século XX. Essa
instituição simbolizava o ápice da representação da identidade gaúcha, conforme foi
analisado, pois não só agregava os migrantes sul-rio-grandenses, paranaenses e
catarinenses, chamados genericamente de gaúchos, mas toda a elite local. Quando
perguntados, aos participantes, a respeito de como foi à recepção ao CTG Sentinela
do Pantanal, responderam quase de forma unânime:
Nossa, foi muito bem, no início eles foram bem recepcionado, até teve muita participação, o pessoal até inclusive tinha muita gente daqui que se pilchava, usava aquele traje [...], porque no começo do CTG eles estipularam que era obrigatório o uso da pilcha, o traje, mas com o tempo, [...] foi a mistura de costumes e tudo, acabou caindo um pouco a tradição, diminuiu bastante, então os últimos bailes, até inclusive que eu participei já não iam mais pilchado eram tudo normal, bailão mesmo (ANDRADE, 2012).
O discurso dos gaúchos é carregado de saudosismo em relação ao CTG, pois
foi uma instituição de grande relevância social, reconhecida não só pelos sul-rio-
grandenses, mas pelos demais grupos sociais. No fim da década de 1980 e durante
a década de 1990, evidenciava todo um glamour e clamor, sendo que ali estava a
“boa sociedade” coxinense.
101
O que foi possível observar durante as entrevistas e a convivência em Coxim
é que, possivelmente, os gaúchos de Coxim se dividem em dois grupos, sendo o
primeiro formado por pessoas que tem algum tipo de ligação com o Estado do Rio
Grande do Sul. São filhos ou netos de pessoas que migraram do Rio Grande do Sul
para os Estados de Santa Catarina ou Paraná e que recorrem a elementos culturais
da identidade gaúcha fundamentada no tradicionalismo para se estabelecer,
enquanto grupo hegemônico na cidade. Já o segundo grupo de gaúcho não tem, em
sua maioria, ligação com o Rio Grande do Sul, apenas relações sociais com os
migrantes oriundo da região. Esses se aproveitaram do contexto social da época
para se estabelecer. É o caso dos paulistas, mineiros e nordestinos de maneira
geral. Outra possível razão do vínculo desse último grupo é para se reafirmar como
integrantes da elite local, pois ser gaúcho era sinônimo de status, a exemplo disso é
o caso citado por uma entrevistada em relação ao seu marido que diz: “ah, (ele)
adorava, se sentia o gaúcho, se vestia com a pilcha, com a bota tudo, colocava a
bombacha, tinha, até hoje acho que ele tem e tá guardado, o lenço, a bombacha ele
ainda guarda, gostava muito” (ANDRADE, 2012).
Muitos migrantes enxergaram em elementos da identidade gaúcha, a
possibilidade de aceitação, ascensão e estabelecimento social, conforme pode ser
inferido em trechos das entrevistas a seguir:
[...] um povo que aprendi a respeitar pela tradição, pela cultura, pelo respeito aos pais, e eles tinham um slogan muito bonito na época ‟um povo sem tradição morre a cada geração„ porque cada geração adquire, perde um pouco da tradição, você sabe que a história do Rio Grande do Sul foi feita de muito sangue, muita tradição ele tem esse orgulho de ter mantido a terra, então eles diz que gaúcho é estado de espírito [...] (grifo nosso) (MIRANDA, 2012).
O CTG Sentinela do Pantanal, além de ser um espaço de sociabilidade, foi
também o local onde, de certa forma, despertou a identidade ou que alguns
migrantes sul-rio-grandenses passaram a adotar a identidade gaúcha,
[...] eu já fui conhecer o CTG com uma idade bem avançada, depois dos 15 anos, se eu falar em CTG, aí vai ter um baile com os Serranos era um evento que tinha na cidade, aí que a gente começou a gostar de tradicionalismo de um par de coisas, eu mesmo adoro música, sou um sanfoneiro aí (risos) de pequeno porte, gosto demais da música gaúcha, gosto de qualquer tipo de música, mas principalmente da música gaúcha (CENTENARO, 2012).
102
No trecho da entrevista, foi possível perceber que o migrante sul-rio-
grandense assumiu a sua identidade de gaúcho, mas não nasceu tradicionalista, já,
nos trechos a seguir, foi possível observar a importância do CTG enquanto espaço
de sociabilidade.
[...] o CTG é uma instituição aberta a todos os públicos, sempre teve um trabalho social que é o de ensinar a gurizada a dançar, respeitar, preservar os costumes gaúchos, mas a maioria dos sócios não são gaúchos em Coxim, e para associar ao CTG o cidadão tem que adquirir um título de 60 salários mínimos. (grifo nosso) (VIEIRA, 2009).
O CTG, além de ser um local de encontros sociais e culturais, é também um
local da elite, considerando que esses valores correspondem, em 2013, a R$
40.680,00 (Reais), um valor altíssimo para a maioria da população coxinense, então,
o CTG é um espaço aberto a todos, mas seletivo.
Então, buscou-se historicizar os relatos colhidos durante a pesquisa acerca
do papel do CTG na identidade gaúcha em Coxim, pois é uma instituição que teve
relevância para a construção de tal identidade, mas que chega ao século XXI
cambaleando, segundo depoimentos dos seus próprios sócios, como se observa no
relato abaixo:
[...] depende dos patrões, pois alguns são mais agressivos outros menos, e o CTG descaracterizou muito a partir da introdução de outras culturas, pois hoje já não se realiza os bailes sociais do CTG, devido ao custo de trazer um grupo gaúcho para esses bailes, porém, mantêm atividades como a bocha, futebol, canastra e o tiro de laço. [...] a situação financeira do clube, pois é o único clube em Coxim que as pessoas se reúnem nos fins de semana, é o único em atividade constante apesar das dificuldades, pois o CTG de Coxim já foi campeão brasileiro, campeão estadual de bocha e campeã de tiro de laço comprido. (KERN, 2009).
Alguns fatores são apontados como possibilidades para a crise do CTG
Sentinela do Pantanal em Coxim, como o surgimento de novos espaços de
sociabilidade da elite coxinense. Atualmente, existe o Centro de Tradições
Nordestinas (CTN), as famílias mudaram com os filhos para cidades maiores ou,
outro fator pode ser a divisão territorial do município de Coxim. Conforme dito
anteriormente, algumas áreas de intensa atividade agrícola, juntamente com os
fazendeiros proprietários das terras, deixaram de pertencer ao município, em virtude
da formação de novos municípios.
103
De qualquer forma, independente das causas dessa redução de ênfase da
identidade gaúcha em Coxim, o que se pode enfatizar, a partir desta pesquisa, é que
a identidade gaúcha em Coxim foi constituída a partir do momento de euforia da
expansão da fronteira agrícola pós-década de 1960. Nesse período, o migrante
precisava de elementos que os fizessem diferentes em relação aos demais, o que foi
potencializado com a adesão de parte da elite e classe média local e, ainda, com a
rede etnorregional gaúcha, associada ao processo de modernização e colonização.
As entrevistas citadas, durante a discussão, corroboram com a ideia da
presença gaúcha em Coxim pela via do trabalho, comércio, empresas, agricultura e
laços de parentescos. Nesse sentido, costurados pelos conceitos de identidade e
memória, a qual chama-se de rede etnicorregional gaúcha. Em vários momentos da
investigação, foi possível observar que a identidade gaúcha foi renegociada em
Coxim, ou que ela também foi usada para determinar um grupo dominante da
sociedade local.
Faz-se necessário mencionar acerca da migração e identidade gaúcha em
Coxim, que os depoimentos de seus descendentes não foram contemplados,
mesmo que representem um recurso que pode trazer bons frutos para pesquisas
futuras. Porém, houve um silenciamento por parte de um número considerável de
pessoas ligadas a tal identidade.
Portanto, a identidade gaúcha em Coxim existe, mas com roupagem bem
diferente daquilo que é visto em outras cidades ditas “gaúchas”, principalmente, do
Estado de Mato Grosso e mesmo do Mato Grosso do Sul. A identidade gaúcha em
Coxim parece ser mais uma representação de poder de um dado grupo social e
econômico, que de um grupo ligado a uma dada região, nesse caso, o Rio Grande
do Sul, pelo recorte temporal, com maior evidência, nas décadas de 1980 e 1990.
104
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Analisar a constituição da identidade gaúcha em Coxim, a partir do
movimento migratório e do processo de colonização da segunda metade do século
XX foi, sem dúvida, um exercício árduo. Isso por considerar a tarefa exploratória de
observar os movimentos de renegociação de tal identidade, tendo em vista a relação
entre os grupos de migrantes e os grupos ali estabelecidos. Esta relação, aqui
compreendida, a partir da configuração de um projeto de colonização e
modernização da nação. A isto se pode afirmar:
Este projeto de colonização pressupõe a domesticação do outro – e da natureza, como já vimos. Esta domesticação não é pacífica: a colonização da fronteira agrícola brasileira é uma guerra, talvez a continuidade das guerras travadas pelos ancestrais dos gaúchos desde os tempos do Império e da República Velha. [...] Para enfrentar esta guerra, os gaúchos exacerbam sua identidade e seus diacríticos em relação ao outro – o sertanejo, o nordestino [...]. (KAISER, 1999, p. 145).
Notou-se, durante a pesquisa, que os gaúchos buscaram ao longo do
processo de migração e estabelecimento em Coxim, evidenciar os seus elementos
diacríticos da identidade gaúcha, principalmente, àqueles relacionados à questão da
memória, origem, cultura, trabalho e civilidade.
Buscando entender como se configurou a identidade gaúcha no Município de
Coxim e a sua relação com o processo migratório e de colonização, reporta-se aos
elementos que se estabeleceram nas estruturas nacionais do Brasil contemporâneo.
E, para entender como fixa o processo de “ocupação” das fronteiras brasileiras,
necessário foi compreender como o Estado-Nação atuou sobre a questão territorial
do país, sobretudo, nas questões fronteiriças e na expansão capitalista.
Relevante, também, realizar a análise da política de ocupação e povoamento
que se fizeram presentes na formação territorial e identitária do centro-oeste
brasileiro ao considerar necessária a observação sobre a maneira como o poder
político atuou nesse processo de ocupação e formação da identidade nacional.
Incluir, também, a necessária percepção das diferentes formas que o governo
federal brasileiro se fez presente, no que se refere à questão agrária brasileira,
atuando por meio de várias políticas de incentivos. E de como essas políticas se
105
aplicaram no sentido de modificar a estrutura social e acelerar e fortalecer o
desenvolvimento do capitalismo nos rincões deste país.
Dessa maneira, foi possível uma discussão a partir do ponto de vista histórico
e sociológico de identidade. Na análise sobre os migrantes gaúchos ficou evidente
que, a despeito da mobilidade geográfica, há uma manutenção de elementos
culturais, sobretudo, por intermédio dos Centros de Tradições Gaúchas (CTGs).
Elementos que sustentam uma unidade grupal, mesmo longe de seu espaço
geográfico de origem. Esta escolha não se trata de uma permanência por inércia, a
identidade é algo relacional e metamórfico, o “Outro” é fundamental para
constituição dessa identidade. Será o “outro” que funciona como elemento capaz de
acionar a outros, determinados elementos que remetam a identidade desse gaúcho,
independente da origem geográfica, mas, certamente, do posicionamento social
perante a sociedade local.
A cidade de Coxim apresenta um grande número de migrantes, entre eles, os
gaúchos e nordestinos, porém, são os gaúchos que mais se destacam. Os gaúchos,
mesmo um grupo numericamente pequeno, formam um dos grupos que tem muita
força política, econômica e cultural dentro da sociedade coxinense – parte da elite,
conforme discutido anteriormente.
Tendo observado acerca da colonização e migração, a discussão sobre
identidade foi fundamental para a concretização desta pesquisa. A identidade
gaúcha foi marcada pelo contraste cultural nas relações com os demais grupos,
sendo a identidade gaúcha (re)constituída nas redes regionais gaúchas e
consolidada no Centro de Tradições Gaúchas (CTG), instituição organizativa e
militante do tradicionalismo.
Em alguns aspectos a identidade gaúcha chegou ao centro do establishment
coxinense.
Para entender tal fenômeno, o caminho escolhido, para além do conceito
abstrato de identidade, foi sua especificação, a partir do
[...] conceito de identidade em sua formulação mais abstrata, como nas matemáticas ou na lógica, não é objeto de experiência e, assim, tem status estritamente teórico, como mera relação, tal não significa que o termo devidamente adjetivado – como identidade étnica – deixe de expressar um conceito dotado de claro referencial empírico. (OLIVEIRA, 2006, p. 27).
106
Todavia, a perspectiva acerca da identidade, conforme Bauman (2005), foi
também fundamental para o embasamento das discussões da identidade gaúcha em
Coxim. A ideia de pertencimento a determinadas identidades não são definitivas e
nem sólidas, mas são metamórficas, negociáveis e revogáveis. E que, ainda,
depende do indivíduo e da sua relação com os demais, pois se buscou evidenciar
que a identidade não é o simples fato de escolher tal identidade, mas é o
reconhecimento do grupo que você está escolhendo e dos demais grupos
participantes nesse processo de construção identitária. Tudo depende do caminho
que percorrem e do modo como agem, uma vez que “as identidades flutuam no ar,
algumas das próprias escolhas, mas outras infladas e lançadas pelas pessoas à
volta, e é preciso estar em alerta constante para defender as primeiras em relação
às últimas”. (BAUMAN, 2005, p. 19).
No decorrer da pesquisa, foi necessário, em alguns momentos, adjetivar o
conceito de identidade para entender a construção da identidade estudada – para
identidade étnica (POUTIGNAT; STREIFF-FERNART, 1998, p. 86).
Etnicidade é um conceito difícil de uma definição exata, apesar das várias
teorias acerca do assunto, mas o importante é que a relação entre o “Nós” e os
Outros está sempre em destaque e que vários grupos étnicos se formam a partir dos
interesses individuais, que sozinhos não são capazes de atingi-los (POUTIGNAT;
STREIFF-FERNART, 1998, p. 100). Essa foi uma das realidades encontradas
durante a pesquisa, o grupo conhecido como gaúcho em Coxim é composto, em
grande parte, não por migrantes sul-rio-grandenses, mas por indivíduos que se
reuniram em torno de alguns elementos diacríticos da identidade gaúcha, sobretudo,
aquela divulgada e pregada pelo tradicionalismo.
Portanto, a identidade gaúcha em Coxim foi constituída a partir das relações
entre gaúchos e os demais grupos e, também, pelos interesses de um grupo social
que, em grande parte, não tinham a mesma origem geográfica (Rio Grande do Sul),
mas os mesmos interesses individuais o fizeram coesos para atingir um determinado
objetivo, sobretudo, através da rede gaúcha – esse grupo tornou-se o establishment
(ELIAS; SCOTSON, 2000) da cidade de Coxim.
107
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