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Page 1: Assessoria Mulheres est mudando a história …...Santo Antônio, zona rural da cidade de Barrado Mendes, centro-norte da Bahia. Opro-jeto da Flor do Sertão foi ela-borado em 2013,

Valdirene: doces deDuas Barras do Fojo

DOMSALVADOR20/12/2015

Mulheres estãomudando a históriado interior da Bahia

LAVRADORAS SE REÚNEM EM ASSOCIAÇÕES PARA PRODUZIR BISCOITOS, DOCES, REFEIÇÕES EARTESANATO COM O QUE TIRAM DO CAMPO. SOLIDARIEDADE MELHORA A VIDA NAS COMUNIDADES

NIASSA JAMENA

Aneli Rodrigues de Oliveira,58, é presidente e uma dasfundadoras da Associação deMulheres Camponesas de Cae-tité. Com 33 anos de trabalhona entidade, diz o que levou asmulheres da zona rural do mu-nicípio, no sudoeste da Bahia,a criarem uma cooperativaprópria. “Foi a morte de nossacompanheira Maria de Azeve-do, devido a conflitos de dis-puta de terra. Na hora em queela tomou o tiro, estávamossomente nós duas. Ela estavagrávidadequatromeses”, con-ta Lira, como é chamada pelosamigos e companheiros de tra-balho. Em homenagem à ami-ga que perdeu a vida, nasceua Meuryluta, marca dos pro-dutos comercializados pela as-sociação.

Assim como as companhei-ras de Maria de Caitité, outrasmulheres da zona rural baianaestão transformando as difi-culdades das regiões para bus-car dias melhores. No estado,já existem dezenas de coope-rativas femininas. Nesses gru-pos, que geralmente come-çam informais e, depois, sãooficializados por programasgovernamentais de incentivo,muitas mulheres pobres domeio rural estão conseguindogerar renda, exercer sua cida-dania e ajudar suas comuni-dades.

Geridas com base no con-ceito de economia solidária, asassociações de mulheres docampo produzem e comercia-lizam os mais variados produ-tos - frutas, verduras e hor-taliças, roupa, artesanato, bis-coitos, doces, geleias e refei-ções. Devido à produção co-laborativa e em pequena es-cala, integram o setor da agri-cultura familiar.

“Minha vida é um sonho. Euque já trabalhei na diária docacau, não tenho vergonha ne-nhuma de dizer, consegui meuteto para morar, que eu nãotinha, e hoje ando com minhaspróprias pernas”. Quando per-guntada sobre as mudançasque a Associação de Mulheresde Duas Barras do Fojo trouxepara a sua vida, D. AntôniaVicente, 43, ex-presidente dogrupo, tem uma resposta ime-diata: “Mudou muita coisa. Sefor contar tudo, vai levar é tem-po”, disse.

Duas Barras do Fojo é umacomunidade da zona rural deMutuípe, na região centro sulda Bahia. Antônia e mais 15colegas produzem chocolatenatural com cacau, açúcar eleite. Também fazem tortas,ovos de páscoa, achocolatado,bombons e fornecem refeiçõespara eventos. A agricultora

afirma que o início não foi fácil.“Começamos fazendo choco-late em barra e, depois, pas-samos a fazer as bolinhas. Noinício, perdia uns, aproveitavaoutros, mas a gente tocou pau.Cada uma deu cinco, dez reaise, assim, nós fomos compran-do os equipamentos e os ma-teriais”. O projeto foi iniciadoem 2011, mas a produçãomais efetiva começou nesteano, após a construção da se-de. O chocolate é vendido nafeira da cidade e de porta emporta. Toda a renda adquiridaé dividida igualmente entre to-das as associadas.

Cozinha comunitáriaAssim como as trabalhadorasde Mutuípe, as mulheres daMeuryluta se organizaram porconta própria e trabalham comcozinha comunitária. Atual-mente,são200associadas.Fa-bricam doces, compotas, lico-res e geleias de frutas comoacerola, umbu, goiaba e ja-buticaba. Começaram em2000. Quinze anos depois,inauguraram a cozinha peda-

gógica doada por uma empre-sa de energia eólica. Seus pro-dutos são vendidos na lancho-nete Meuryluta, na BR-030,nos mercadinhos de Caetité,em feiras e faculdades.

Além das atividades da as-sociação, Lira trabalha na Se-cretaria Municipal de Agricul-tura. “Consegui esse empregopor causa do trabalho que de-senvolvo lá na associação. Ain-da tenho uma roça onde euplanto mandioca, feijão e fru-tas para consumo próprio”,conta.

A Associação do Movimentode Mulheres de Caitité coor-dena projetos como o Semen-te Crioula, a Associação dosApicultores do Município deCaetité e o trabalho com co-munidades quilombolas. “Amaioria das mulheres tem pra-zer em participar do movimen-to. A gente se sente bem. An-tes,elassó sabiam pedirouchorar. Agora, elas con-seguem ter outrasoportunidades”, afir-ma Lira, em tom demulher ativista.

Flores do sertão desabrochamA Associação de Mulheres Flordo Sertão foi criada por causade D. Marina de Andrade. Den-tre as opções que suas inte-grantes tinham, escolheramcorte e costura porque a fun-dadora trabalhava no ramo.“Fui ensinando por grupos, eas meninas interessadasaprenderam rapidinho. As queainda não costuram fazem tra-balhoscomotirar linha,vendere embalar”, diz a fundadora.

A costureira de 47 anos épresidente da jovem institui-ção formada por 16 mulheres,localizada na comunidade deSanto Antônio, zona rural dacidade de Barra do Mendes,centro-norte da Bahia. O pro-jeto da Flor do Sertão foi ela-borado em 2013, mas o fun-cionamento começou em mar-ço deste ano. Elas confeccio-nam uniforme escolar, camisade festa, camisola, camisa detime de futebol, e também ar-tesanato, como jogo de ba-

nheiro e pano de prato.Dona Marina deixou o em-

pregodecostureiraparasejun-tar à associação. Mãe de trêsfilhos, um rapaz de 26 e duasadolescentes de 17 e de 18anos, ela ensina e supervisio-na o trabalho “das meninas”,como ela gosta de chamar, du-rante dois turnos. “São oito demanhã e oito de tarde, porquenão tem máquina suficientepara todas”. As mulheres de

Santo Antônio obtiveram re-cursosdoProgramadeFomen-to do governo federal, que visaa inclusão social de agriculto-res familiares e comunidadestradicionais em situação de ex-trema pobreza. Através da as-sistência técnica e extensão ru-ral voltada para mulheres, oprojeto Ater Mulher, cada umarecebeu R$ 2,4 mil – em duasparcelas disponibilizadas nocartão do Bolsa Família – paracomprar maquinário e maté-ria-prima.

Geração de rendaOs impactos econômico e so-cial provocados pela existênciadas associações são sentidosnascomunidadesondeelases-tão instaladas. “Há geração derenda e fortalecimento na eco-nomia local e regional. Na co-zinha, elas conseguem boaparte dos ingredientes nosseus quintais produtivos e nascomunidades vizinhas. Dos

produtos derivados damandioca, boa parte vemda comunidade. Já no arte-sanato e corte e costura, elascompram o tecido na cidade eprodutos como palhas de ár-vores nativas são encontradosnas roças delas ou dos vizi-nhos”, afirma Sirleide Sodré,técnica do CAA.

“Por meio da associação,nossa comunidade entrou noprojeto Cisternas para Todos,que a gente lutava e não con-seguia. O lugar passou a sermais conhecido, vai mais gen-te lá para fazer encomenda.Até a renda de quem tem ummercadinho, de quem vendeum pastel, melhorou. De certamaneira, estamos gerandorenda para a comunidade” fa-la, confiante, D. Marina. As as-sociações mudaram suas re-giões, inclusive na questão desaúde pública, a partir da me-lhora da alimentação ofereci-da em suas cidades.

16mulheres de SantoAntônio, na zonarural de Barra doMendes, fizeram cursono programa de inclusãosocial de agricultoresfamiliares do governofederal.

Das quatro associaçõesfemininas contatadas, duasforam iniciadas pelaspróprias mulheres dacomunidade e duas foramorganizadas porinstituições de capacitaçãotécnica. As produtoras dechocolate de Duas Barrasdo Fojo recebem assessoriatécnica da Federação deÓrgãos para AssistênciaSocial e Educacional (Fase),organização sem finslucrativos que elaboraprojetos dedesenvolvimentoeconômico paraagricultores familiares edesenvolve trabalhoespecífico com grupo demulheres rurais. O objetivoé otimizar a produção.“Trabalhamos com 14grupos de mulheres entreos territórios do Baixo Sul edo Vale do Jiquiriçá. Elesnão recebem verba, só aassessoria”, afirma JoelmaCunha, coordenadora daFase Bahia. Com o apoio daentidade, D. Antônia e suascolaboradoras esperamassim a verba para construira fábrica e comprar omaquinário e o carro paratransportar os produtos dazona rural para a cidade deMutuípe. ”Já a Meurylutanão conta com nenhumfinanciamento do governo.

Assessoriapara a comprade maquinárioe de um carro

Apesar dos ganhos, asassociações femininasrurais enfrentamdificuldades para tocar assuas produções. Como sãobaseadas na economiasolidária, ou seja, não hápatrões e empregados, olucro, muitas vezesincipiente, tem que serdividido entre todas e, porisso, ainda é difícil viver sódo trabalho nasassociações, até porque amaioria trabalha deacordo com a demanda.Todas as mulheres têmoutra fonte de renda – a

maioria é agricultora –,e grande parte das

lideranças não sabemensurar ofaturamentomensal dasinstituições. Emgeral, as sedes sãoconstruídas pormutirão e comdinheiro

conseguido emeventos ou com as

próprias integrantesdo grupo. Algumas

trabalham em locaisemprestados e semestrutura. “Ainda nãoconseguimos tirar nadapara a gente. O queganhamos vai para aconstrução do nossogalpão”, diz D. Marina,líder das costureiras deSanto Antônio.

Elas estãosempre prontaspara enfrentaras dificuldades

“A mulher temque trabalharno campo, sesustentar. Nadade viverdependente demarido. Lugarde mulher éonde ela quer”ANTÔNIA VICENTE, da Associação deMulheres de Duas Barras do Fojo

Zilda é chefe decozinha comunitária

288dos 417 municípios baianos

não cumpriram a lei queprevê a aquisição de 30% dos

alimentos da merenda escolarcom agricultores familiares,

em 2014. Os dados sãodo Fundo Nacional

de Desenvolvimento daEducação (FNDE)

Renda da Associaçãode Milagres aumentoucom sequilhos

Fotos: Niassa Jamena e Divulgação

Revezamento namáquina de costura

Flor do Sertão tevestand na Fenagro

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