ROSELI DA SILVA CORDEIRO RUIZ
AVALIAÇÃO E ALFABETIZAÇÃO:
UM INTERTEXTO
PUC – SP
2009
ROSELI DA SILVA CORDEIRO RUIZ
AVALIAÇÃO E ALFABETIZAÇÃO:
UM INTERTEXTO
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial
para obtenção do título de Mestre em Educação: Currículo.
Orientação: Prof.ª Dr.ª Isabel Franchi Cappelletti.
PUC – SP
2009
FICHA CATALOGRÁFICA
Alfabetização e Alfabetização: um intertexto / Produzido por Roseli da Silva Cordeiro
Ruiz – São Paulo: PUC – SP, 2009.
ROSELI DA SILVA CORDEIRO RUIZ
AVALIAÇÃO E ALFABETIZAÇÃO: UM INTERTEXTO
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em
Educação: Currículo.
Orientação: Prof.ª Dr.ª Isabel Franchi Cappelletti.
DATA DA APROVAÇÃO: _____/_____/_____
Membros da banca:
Prof.ª Dr.ª Isabel Franchi Cappelletti (Orientadora) ________________________
Pontifícia Universidade Católica – PUC-SP
Prof.ª Dr.ª Silvia Maria Gasparian Colello ________________________
Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo
Prof.ª Dr.ª Solange Vera Nunes de Lima D’Água ________________________
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - UNESP/ IBILCE
Dedicatória Ao meu pai, José, por me fazer enxergar a beleza que há na simplicidade. À minha mãe, Eulália, pela sabedoria, por me ensinar que é possível voar quando se acredita no sonho. Ao meu esposo, Francisco, por partilhar do meu sonho e não me deixar desistir. Aos meus filhos, Amanda, Beatriz e Matheus, por entenderem meu afastamento e pelo incessante desejo de me verem feliz. À amiga Maria da Graça, em memória, por ter me despertado para o desejo da pesquisa, tendo sido a grande instigadora para uma interrogação no fazer docente.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a todos que contribuíram para a realização
deste trabalho, especialmente:
À Prof.ª Dr.ª Isabel Franchi Cappelletti, por ter
estado ao meu lado em todos os momentos,
utilizando o ideal de avaliação que persegue como
princípio de suas ações.
Às professoras Dr.ª Silvia Maria Gasparian Colello e
Dr.ª Solange Vera Nunes de Lima D’Água, pelas
preciosas sugestões feitas durante o exame de
qualificação, as quais foram de extrema importância
à construção deste trabalho.
Aos alunos da Faculdade de Itapecerica da Serra,
pelas questões trazidas durante o momento em que
estavam sob minha orientação no Projeto Ler e
Escrever.
Aos amigos da Faculdade Nossa Cidade, em
especial à grande amiga Celiza Zachi, pelo carinho e
apoio para que eu seguisse adiante neste projeto.
Aos colegas da FITO e Fac – FITO, pelo apoio nos
diferentes momentos desta pesquisa.
À amiga Maria Helena Romeo Pereira, pelas falas
carregadas de incentivo.
A todos os alunos que durante esta trajetória
torceram por mim.
À colaboração carinhosa da amiga Esther Santos.
Às minhas irmãs, Maria e Adriana, pelo
companheirismo e apoio.
Às professoras que gentilmente me receberam e
contribuíram com a realização deste trabalho.
RESUMO
A presente dissertação buscou analisar uma prática curricular: avaliação no contexto da alfabetização, compreendendo o intertexto entre as ações de alfabetizar e avaliar. Teve como objetivo principal identificar na prática de professores que atuam na Escola Pública de São Paulo intervenções significativas à aprendizagem da leitura e escrita. Inicialmente, dedicou-se a uma explanação acerca das principais mudanças ocorridas no cenário da educação brasileira, atentando-se à política dos ciclos, às implicações relacionadas às avaliações institucionais, à compreensão do conceito de avaliação formativa e à formação do professor alfabetizador frente às mudanças propostas pelas políticas públicas. Procedeu com um histórico das principais concepções sobre alfabetização, intercalando em cada uma dessas concepções o ideal de avaliação pertinente. Após a explanação teórica, examinou os dados coletados em entrevista semiestruturada propiciando a interpretação das respostas dadas pelos professores entrevistados. A essência do conteúdo apresentado foi analisada à luz de incongruências entre conceitos e práticas, ao mesmo tempo em que foram propostas inovações no campo da avaliação, resguardando-se práticas de um ideal positivista. Dentre algumas das práticas correntes, evidenciou-se a realização da sondagem como instrumento de avaliação e o registro de evolução de escrita em portfólios. Encerrou-se o trabalho com indicação de alguns avanços na prática alfabetizadora, porém com uma crítica a uma ênfase exagerada em uma atividade mecanicista e reducionista como a sondagem. Apontou para a possibilidade de uma avaliação que deverá ser formativa a partir do momento em que assumir o papel libertador da aprendizagem.
Palavras-chave: avaliação; alfabetização; intertexto; sondagem; libertação.
ABSTRACT
The purpose of the present work was to analyze a curricular practice: the evaluation in the context of alphabetization, regarding the intertext between the actions of alphabetizing and evaluating. The main goal was to identify significant interventions in the learning of reading and writing in the teachers’ practice in São Paulo state public schools. First, there was an explanation about the main changes in Brazilian educational scenario, concerning the ‘cycles’ system, the implications related to institutional evaluations, the understanding of the concept of formative evaluation and the alphabetization teachers education facing the changes proposed by public policies. A historical approach of the main concepts about alphabetization was developed, and the ideal of evaluation of each period of time was described. Next, the data collected by semi structured interview provided the interpretation of the answers that had been given by the teachers. The essence of the content was analyzed in the light of controversy between concept and practice at the same time evaluation innovations were proposed under positivist ideal. Among the current practices, the ’sondage’ and the registration of writing ability evolution in portfolios were highlighted as evaluation tools. Finally, the work pointed some progress in alphabetization practice, but it also criticized the mechanicist and reductionist approach of ‘sondage’. It showed the possibility of an evaluation which must be formative from the moment it assumes the role of liberating learning.
Keywords: evaluation; alphabetization; intertext; sondage; liberation.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Quadro 1 – Objetivos propostos pelas avaliações SARESP/ SAEB e Prova Brasil.............................................................................
31
Quadro 2 – Prestação de contas sobre a política de bônus...................... 32
Quadro 3 _ Dados dos entrevistados ........................................................ 78
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CBA Ciclo Básico de Alfabetização
CENP Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas
EF Ensino Fundamental
INAF Indicador de Analfabetismo Funcional
INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MEC Ministério da Educação
PDE Plano de Desenvolvimento da Educação
SAEB Sistema de Avaliação da Educação Básica
SARESP Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo
SEE/SP Secretaria de Estado da Educação de São Paulo
Sumário
1 INTRODUÇÃO............................................................................ 11
1.1 Contextualizando a temática: o problema em questão.............................. 12
1.2 Objetivos e fontes da pesquisa ................................................................. 16
1.3 Sujeitos da pesquisa e universo pesquisado ........................................... 17
1.4 Estrutura do texto ..................................................................................... 18
2 PROCESSO DE AVALIAÇÃO DA LEITURA E ESCRITA NO CENÁRIO BRASILEIRO ............................. .........................
20
2.1 As políticas públicas de avaliação ............................................................ 27
2.2 Compreendendo o ato de avaliar ............................................................. 34
2.2.1 Currículo e Avaliação da Aprendizagem ............................................... 35
2.2.2 Avaliação Formativa: Ação Reguladora de Aprendizagem ................... 39
2.3 Formação do professor para a prática de uma avaliação formativa ........ 42
2.4 A Cultura avaliativa: reflexos nos programas voltados ao ensino da leitura e escrita..........................................................................................
45
3 DIFERENTES CONCEPÇÕES DE ALFABETIZAÇÃO: DA CONCEPÇÃO MECANICISTA À SOCIOPSICOLINGUÍSTICA .... .......
49
3.1 Concepção Mecanicista: compreensão da aprendizagem pautada por métodos ...............................................................................
49
3.1.1 Avaliação da aprendizagem da leitura e escrita a partir de um referencial mecanicista ..........................................................................
53
3.2 A consideração dos processos cognitivos de Aprendizagem: concepção pautada nas pesquisas psicogenéticas e psicolinguísticas ........................................................................................
55
3.2.1 Avaliação da aprendizagem da leitura e escrita a partir de uma concepção construtivista.........................................................................
58
3.2.2 A sondagem como prática avaliativa....................................................... 60
3.3 Compreendendo a aprendizagem da leitura e da escrita sob o prisma da sociopsicolinguística ..................................................................................
62
3.3.1 Alfabetização e Letramento ................................................................. 66
3.3.2 Avaliação como prática de libertação ................................................... 70
4 OS CAMINHOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA ........... .... 73
4.1 Proposta Metodológica.............................................................................. 73
4.2 Critério de seleção dos sujeitos ................................................................. 76
4.3 Procedimentos de coleta ........................................................................... 77
4.4 Questões propostas: relevância à pesquisa ............................................. 78
5 AVALIAÇÃO E ALFABETIZAÇÃO: ANÁLISE DO MATERIAL COLETADO.......................................... .......................................
81
5.1 Avaliando o percurso de aprendizagem: uma interpretação de práticas......................................................................................................
81
5.2 Analisando a prática da sondagem............................................................ 89
5.3 Os diferentes instrumentos de avaliação utilizados por professores alfabetizadores..........................................................................................
100
5.4 Avaliação e alfabetização: desvelando os sentidos de uma imbricada relação......................................................................................................
105
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................. ........................... 111
Referências...................................................................................................... 119
APÊNDICE A – QUADRO REFERENTE ÀS RESPOSTAS DAS PROFESSORAS ENTREVISTADAS....................................
125
ANEXO A - INEP / MEC Resultado SAEB....................................................... 141
ANEXO B - Mapa de avaliações...................................................................... 143
ANEXO C - Registros de avaliações............................................................ 148
ANEXO D - Páginas de portifólios ................................................................... 156
ANEXO E – Ficha de Registro de Avaliação................................................... 161
ANEXO F - Relatório de aluno pesquisador ..................................................... 163
11
1 INTRODUÇÃO
Afinal, o espaço pedagógico é um texto para ser constantemente ‘lido’, ‘interpretado’, ‘escrito’ e ‘reescrito’. Neste sentido, quanto mais solidariedade exista entre o educador e educandos no ‘trato’ deste espaço, tanto mais possibilidades de aprendizagem democrática se abrem na escola. (FREIRE, 1998, p.109)
O tema na trajetória pessoal da pesquisadora
A expressão de ideias que permeiam a história de vida das pessoas pode ser
representada por meio de palavras. As palavras ganham sentido pois se carregam
de vida. A exposição de uma temática significativa à presente investigação traz o
indicativo de referência a uma vida, uma vida em que o espaço pedagógico se
constitui como universo principal; sendo assim, a existência ganha sentido quando a
prática interrogativa se faz presente.
Os espaços pedagógicos me formaram como pessoa e como profissional. A
leitura desses espaços apontou para uma das questões que mais estiveram
presentes em minha história, a alfabetização.
Fui alfabetizada em uma escola pública, com palavras de um mundo que não
era o meu. Aquelas palavras deram conta de me alfabetizar; porém, hoje questiono
se as mesmas palavras conseguiram ensinar meus colegas. Todos nós formávamos
uma rica dimensão multicultural. Nesse contexto, a escola da década de setenta,
embasada por uma concepção de ensino tecnicista1,não se ocupou em perceber
que a diversidade humana merecia um modelo de escola diferente da escola
formatada para uma mesma realidade social.
A leitura crítica desse primeiro espaço pedagógico formador foi despertada
quando optei por cursar o Magistério. Durante os anos em que estive me ocupando
em construir os primeiros conceitos acerca da profissão docente, vivenciei, em
1 Por tecnicista, Saviani (2008) explica ser essa uma “pedagogia” planejada de modo a dotar-se de uma organização racional capaz de minimizar as interferências subjetivas que pudessem pôr em risco sua eficiência. Para tanto, era mister operacionalizar os objetivos e, pelo menos em certos aspectos, mecanizar o processo.
12
função do estágio obrigatório, situações de extremo desconforto. Visualizei
professores que atuavam nas séries iniciais com uma postura de desrespeito às
individualidades, definindo seus alunos como os que conseguiam aprender, ou seja,
que se alfabetizavam, e os demais, uma grande maioria, como os que não
conseguiam ultrapassar a barreira da não aprendizagem.
Durante os anos em que cursei o Magistério, mesmo sem ter uma melhor
abrangência teórica, fui movida por um desejo de investigar a prática presente na
alfabetização, principalmente no que se referia à definição sobre os que sabem e os
que não sabem. Não seria possível restringir essa questão apenas ao propósito de
identificação de quem aprendeu e de quem não aprendeu, mas principalmente por
que alguns aprendiam e outros não. Mais tarde, cursando Pedagogia, tive pela
primeira vez uma disciplina relacionada à avaliação. A aprendizagem nessa
disciplina esteve pautada na elaboração de bons instrumentos de avaliação. Mais
uma vez me interroguei sobre como ser possível um instrumento que atendesse ao
propósito de não somente saber medir quem aprendeu, quanto aprendeu, e
despertei para o desejo de compreender o porquê do não aprender.
Na vida profissional, outros textos pedagógicos foram acrescentados à
formação anterior. Como professora, debrucei-me sobre uma nova forma de ensinar
a partir da leitura de pesquisas pautadas por uma concepção de ensino cognitivista,
e vislumbrei a perspectiva de um ensino capaz de atender às diferenças, em que o
foco central passasse a ser o aluno com sua singularidade.
Nesse contexto, vale ressaltar a dificuldade presente para atender à mudança
proposta. Comecei minha trajetória profissional justamente no momento em que
essa nova forma de pensar o ensino estava sendo proposta nas escolas públicas do
Estado de São Paulo. Identifiquei professores perplexos, cheios de dúvidas,
descrentes do ensino da leitura e escrita sem o apoio de uma cartilha. Os alunos não
seriam reprovados, passariam de série para ciclo. Durante esse primeiro momento,
trabalhei com alunos em processo de recuperação. Eram diversos grupos, atendidos
em períodos diversificados, porém o trabalho era o mesmo, pois não sabíamos como
avaliar a aprendizagem desses alunos; logo, não sabíamos como ensiná-los.
Fiquei apenas um ano atuando com os grupos de reforço. Assumi como
professora do Ensino Fundamental em uma Fundação localizada no município de
Osasco; no mesmo período, fui aprovada como professora de Educação Infantil no
13
mesmo município. Durante duas décadas fui envolvida por um texto em que a
alfabetização se fez presente. Atuando como professora nos primeiros anos do
Ensino Fundamental e também na Educação Infantil, jamais deixei de me interrogar
sobre como fazer para a concretização de uma escola em que a aprendizagem da
leitura e escrita fosse garantida a todos os alunos, independente do contexto social.
Acompanhei o processo de democratização do ensino no que se referiu à abertura
das portas das escolas a todos; no entanto, esse ensino só seria democrático
quando a escola conseguisse cumprir seu papel principal, o de formar cidadãos
plenamente alfabetizados.
Em dois mil e quatro, tive a oportunidade de coordenar o Centro de Formação
dos Profissionais da Educação do Município de Osasco. Propus-me a ouvir as
queixas dos professores e suas principais dúvidas. Nesse momento, reconheci-me
em suas falas, pois a maior dúvida residia justamente na Alfabetização. Apesar da
mudança nas práticas, o problema se mantinha. Infelizmente, a interligação entre
teoria e prática não conseguia se concretizar.
Ouvindo os professores e retomando minha trajetória profissional, encontrei
para a compreensão deste texto elementos presentes na alfabetização e na
avaliação que não podem ser reconhecidos separadamente. Concomitantemente, as
leituras feitas, as discussões em diferentes contextos, o reconhecimento da
divulgação de resultados negativos de avaliações convergem para o propósito desta
pesquisa.
Alfabetização e Avaliação, nesse sentido, representam dois textos que devem
ser lidos e interligados. Que este trabalho possa contribuir com alguns dos
elementos existentes nesse elo de complexidades presentes nas duas temáticas.
1.1 Contextualizando a temática: o problema em questão
A partir das últimas décadas do século XX, estudos têm comprovado a
importância da avaliação no processo de ensino e aprendizagem. Muitos são os
autores que propõem um repensar sobre a prática avaliativa. No Brasil, através de
diferentes órgãos e diferentes instâncias administrativas, é lançada ao professor
14
uma série de propostas de alteração no trabalho pedagógico, transformando a
escola e, principalmente, trazendo um grande questionamento: o que fazer?
Em geral, o professor tem à sua disposição modelos teóricos de avaliação, evolução histórica das diferentes concepções, enfim, quadros conceituais que desestabilizam o seu credo, mas não orientam o seu fazer. Abalado em sua crença, deixa de praticar a avaliação que conhece e não tem nada para colocar no lugar. (CAPPELLETTI, 2005, p117)
Nesse sentido, a proposta deste trabalho, ao sugerir um intertexto entre
avaliação e alfabetização, será o levantamento de indicadores relacionados aos
problemas que enfrentam professores da rede pública ao fazerem uso da avaliação
para uma intervenção significativa à aprendizagem.
No que se refere à Alfabetização, compreende-se uma série de
condicionantes desse processo. Ensinar a ler e escrever representa muito mais do
que ensinar as letras, ensinar a técnica de juntá-las para formar as palavras. Envolve
compreender que tal processo se insere em uma situação plena de complexidade.
Conclui-se que, à natureza complexa do processo de alfabetização, com suas facetas psicológica, psicolinguística, é preciso acrescentar os fatores sociais, econômicos, culturais e políticos que condicionam. (SOARES, 2004, p23)
Soares (2004) explicita a importância de o professor assumir uma postura
política diante das implicações da alfabetização. Dessa forma, evidencia-se a
necessidade de se especificar uma intenção ao fazer pedagógico; com a clareza
dessa intenção é que se poderá tratar da avaliação a serviço da aprendizagem. O
entendimento da avaliação com o propósito de ajustar a aprendizagem representa
reconhecer, conforme cita Colello (2007), a teia presente no processo de construção
do conhecimento e nas relações com as metas educativas e a prática escolar.
Partindo do princípio de que o processo pedagógico educativo ocorre na
interação entre professor e aluno, cabe a esse profissional, ao reconhecer seu
“inacabamento”, desenvolver-se enquanto trabalhador social, não se colocando em
uma opção de pseudoneutralidade. “Não posso ser professor se percebo cada vez
melhor que, por não poder, ser neutra, minha prática exige de mim uma definição.
15
Uma tomada de posição Decisão. Ruptura” (FREIRE, 1998, p15). Ao professor
alfabetizador, tendo em vista o que coloca Freire (1998), cabe uma posição
ideológica. No caso da presente pesquisa, a posição tomada se refere à prática de
avaliação. A ética dessa avaliação deve ser condição para um trabalho diferenciado
em que se possa perceber o momento vivido pelos alunos na aprendizagem, e
então, oferecer situações significativas para a superação das dificuldades.
Como afirma Hadji (2001), a avaliação em um contexto de ensino tem o
objetivo legítimo de contribuir para o êxito do ensino, isto é, para a construção
desses saberes e competências pelos alunos.
Torna-se evidente que a prática de uma avaliação apenas formativa não
resolverá todos os problemas da atuação docente de professores alfabetizadores;
no entanto, este trabalho se ocupa em desvelar entraves colocados pela falta de
subsídios teóricos no processo de avaliar, principalmente quando a prática não se
remete concretamente com abordagens reflexivas de uma práxis transformadora.
Nesse sentido caminha a concepção batizada por Cortella (2006) de otimismo
crítico2. Por meio da compreensão dessa concepção, a escola, sem cair na noção de
neutralidade, é colocada como um instrumento de mudança que, através da prática
construída coletivamente, cria o novo espaço pedagógico.
Muitas dúvidas transitam no universo escolar; no entanto, a reflexão sobre
uma atuação competente que favoreça a dinâmica escolar torna-se cada vez mais
necessária em uma sociedade democrática na qual a apropriação da leitura e escrita
se configura como elemento principal na formação de um ser consciente e capaz de
ler o mundo.
A conscientização é, neste sentido, um teste de realidade. Quanto mais conscientização, mais se ‘desvela’ a realidade, mais se penetra na essência fenomênica do objeto, frente ao qual nos encontramos para analisá-lo. Por esta mesma razão, a conscientização não pode existir fora de práxis, ou melhor, sem o ato ação-reflexão. Esta unidade dialética constitui, de maneira permanente, o modo de ser ou de transformar o mundo que caracteriza os homens. Por isso mesmo, a conscientização é um compromisso histórico. É também consciência histórica: é a inserção crítica na história, implica que os homens assumam o papel de sujeitos que fazem e refazem o mundo. Exige que os homens criem sua própria existência
³ Otimismo Crítico é a concepção que indica a natureza contraditória da escola, em que tudo e nada poderá ser feito.
16
com um material que a vida lhes oferece (...). A conscientização não está baseada sobre a consciência, de um lado, e o mundo, de outro; por outra parte; não pretende uma separação. Ao contrário, está baseada na relação consciência-mundo. (FREIRE, 1980 Apud, SAUL, 2006, p.55)
Acreditar na educação é acreditar na possibilidade de construção de uma
escola em que se possam encontrar educadores capazes de avaliar para intervir, e
não apenas de tecer julgamentos sobre quem sabe e quem não sabe.
A escola como está, tendo toda uma trajetória histórica com indicação teórica
de construção de um currículo que atenda à aprendizagem de crianças oriundas de
diferentes camadas sociais com uma particular expressão linguística, não está
conseguindo alterar de forma significativa um cenário de fracasso.
Acompanha-se uma grande discussão acerca de mudanças no cenário do
ensino da leitura e escrita. Da mesma forma, em paralelo, as discussões são
também intensas sobre avaliação. Relacionar avaliação e alfabetização será o
grande desafio da presente pesquisa. A pesquisa envolve duas vertentes de
extrema relevância no campo educacional: alfabetização e avaliação.
Para tanto, tendo em vista a proposta de pesquisa relacionada anteriormente,
a problemática percebida para a presente investigação define-se a partir da seguinte
pergunta:
• A avaliação realizada por professores que atuam nas primeiras
séries do Ensino Fundamental está atendendo a um pr opósito
formativo, indicando intervenções significativas na aprendizagem da
leitura e escrita?
1.2 Objetivos e fontes da pesquisa
Esta pesquisa tem por objetivos discutir questões inter-relacionadas ao
universo da escola pública, compreendendo a ação do professor alfabetizador, tendo
em vista verificar como a avaliação realizada por esses professores tem favorecido,
ou não, a aprendizagem da leitura e escrita, bem como analisar criticamente a
17
prática da avaliação que permeia a prática alfabetizadora, tendo como critério de
análise a avaliação formativa.
Para o alcance dos objetivos descritos, dados foram coletados a partir de
pesquisa qualitativa realizada em três escolas da rede pública estadual. A
metodologia de pesquisa utilizada foi a entrevista semiestruturada.
Os eixos de relevância para esta investigação envolvem:
• Avaliações utilizadas durante o período de alfabetização.
• Intervenções realizadas durante o processo de ensino e aprendizagem.
• Mecanismos válidos no atendimento à diversidade dos grupos.
O referencial teórico tem como base a análise crítica e reflexiva de textos dos
autores que tratam da avaliação formativa, como Perrenoud (1999), Hadji (2001),
Capelletti (2001, 2002, 2005), Abramowicz (2001) e Saul (2006). Para os estudos da
alfabetização, necessários ao intertexto com a avaliação, são explorados textos de
autores, como Ferreiro (1989, 1993, 2001), Ferreiro; Teberosky (1999, 2000),
Mortatti (2000), Weisz; Sanches (2002), Colello (2004, 2007), Soares (2003, 2004),
Franchi (2008), pois são alguns dos autores que têm marcado a história da
alfabetização brasileira.
1.3 Sujeitos da pesquisa e universo pesquisado
No momento da realização da pesquisa, as escolas da rede pública do Estado
de São Paulo representavam um universo propício para a investigação. O período
coincidiu com a participação da pesquisadora, como professora orientadora no
Projeto Ler e Escrever3. Essa participação desencadeou relevantes análises para
ratificar a justificativa da pesquisa.
A relevância citada anteriormente se deveu ao contato com alunos do ensino
superior que atuam como pesquisadores nas escolas públicas estaduais,
3 Desde o início de 2007, formou-se na Secretaria da Educação de São Paulo um programa voltado à recuperação da aprendizagem das séries iniciais, o Programa Ler e Escrever.
18
acompanhando o trabalho de professores alfabetizadores. Participando como
professora orientadora em uma instituição de ensino superior, foi possível um
conhecimento maior acerca do propósito do referido projeto4.
O trabalho proposto aos alunos como pesquisadores, o qual necessitaria de
uma orientação específica, foi uma investigação didática. Para tal investigação, fora
indicado um referencial teórico embasado em teorias cognitivistas 5 .
Durante o período de orientação aos alunos pesquisadores, muitos relatos se
referiam à prática avaliativa dos professores alfabetizadores. Nesse sentido, a
temática em questão passou a se constituir como elemento primordial de
investigação, a qual poderia se pautar pela identificação na avaliação, realizada por
professores alfabetizadores, de elementos norteadores da ação que deveriam
desenvolver durante as intervenções ao processo de aprendizagem.
Participaram da presente pesquisa, por meio das respostas à entrevista semi-
estruturada, oito professoras de três escolas públicas estaduais de São Paulo,
localizadas nos municípios de São Paulo e Carapicuíba.
1.4 Estrutura do texto
A presente dissertação está organizada em seis seções. Na primeira,
Introdução, são apresentados os motivos que justificam a relevância da pesquisa.
Na seção dois, é apresentado o processo de avaliação da leitura e escrita no cenário
4 O histórico do Programa Ler e Escrever, apresentado pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo por meio da Fundação para o Desenvolvimento da Educação, indica que o programa está incluído entre as ações destinadas ao cumprimento, até 2010, das 10 metas do plano para a Educação lançado pelo governo paulista em agosto de 2007. O programa promove a capacitação de educadores conjugada às diretrizes, conceitos, formato e materiais de apoio que foram especialmente desenvolvidos para as ações da iniciativa, relacionados à 1ª, 2ª, 3ª e 4ª séries do EF. Para a 1ª série do EF, o Ler e Escrever instituiu o Projeto Bolsa Escola Pública e Universidade na Alfabetização, conhecido como Bolsa Alfabetização, que permite a atuação de um aluno pesquisador nessas classes. Além disso, há o material impresso de apoio específico para a série, e a constante formação dos educadores envolvidos. Os alunos pesquisadores são universitários dos cursos de graduação ou pós-graduação de Pedagogia e Letras, indicados por instituições de ensino superior conveniadas. Eles contribuem com os professores regentes das classes de 1ª série, auxiliando no atendimento às crianças em processo de alfabetização, na organização das aulas e na assistência aos alunos. (SÃO PAULO, 2008) 5 Teorias cognitivistas são teorias de ensino pautadas por um referencial teórico piagetiano. A aprendizagem obedece a diferentes etapas individuais. Para Mizukami (1986), a referida abordagem implica dentre outros aspectos, estudar a aprendizagem como sendo mais que um produto do ambiente, das pessoas ou de fatores que são externos ao aluno.
19
brasileiro – fazendo um registro da escola pública seriada e da transição para a
escola em ciclos. Nessa seção, abre-se a discussão sobre a progressão continuada,
principalmente por ter sua indicação originada nos ciclos de alfabetização. Outro
diálogo explorado com diferentes autores analisa a existência de um estado
avaliador e a implantação de algumas políticas públicas que não oferecem formação
ao professor para atuar como avaliador, tendo em vista uma prática de intervenções
significativas à aprendizagem da leitura e da escrita.
Na seção três, é apresentado o referencial teórico de avaliação e
alfabetização. São indicadas diferentes concepções de ensino da leitura e escrita,
identificando nos diferentes momentos o referencial teórico norteador da prática. Em
cada uma das concepções relatadas, são descritas as práticas avaliativas que
permeiam as ideias de ensino e aprendizagem. Essa descrição oferecerá ao leitor
um maior conhecimento sobre a tríade Avaliar – Ensinar – Aprender. O texto trará
uma ênfase à prática da sondagem, principal encaminhamento de avaliação
proposto aos professores da rede pública estadual de São Paulo.
Na seção quatro, são descritos os caminhos metodológicos da pesquisa. São
indicados os procedimentos para coleta dos dados analisados. Nessa seção, são
apontadas as dificuldades para a realização da investigação, além da descrição
pormenorizada da opção pela pesquisa qualitativa e a justificativa das questões
norteadoras que comporão o referencial de análise.
Na seção cinco, é realizada a análise do material coletado e categorizado à
luz da interpretação dos conteúdos existentes na fala das professoras entrevistadas.
O procedimento de análise será complementado com materiais coletados em campo
durante o período de investigação. Todos os dados e informações coletados e
organizados serão interpretados no diálogo com a teoria requerida pelas questões
problematizadas a partir da análise. Na seção seis, são tecidas as considerações
finais.
20
2 PROCESSO DE AVALIAÇÃO DA LEITURA E ESCRITA NO CENÁRIO BRASILEIRO
A questão que coloca a nós é lutar em favor da compreensão e da prática da avaliação enquanto instrumento de apreciação do que-fazer de sujeitos críticos a serviço, por isso mesmo. Da libertação e não da dominação. (FREIRE, 1998)
De sistema seriado à organização em ciclos
Na educação brasileira, o uso do termo “ciclo” designando a política de “não
reprovação” surgiu em 1984, com a implantação do Ciclo Básico de Alfabetização
(CBA) na rede estadual de São Paulo (MAINARDES, 2007).
O Ciclo Básico reunia os dois primeiros anos do ensino fundamental, eliminando a reprovação na passagem do 1º para 2º ano, com o objetivo de proporcionar aos alunos mais tempo para aprendizagem e ainda reduzir as taxas de reprovação e evasão. (MAINARDES, 2007, p.67)
Com o objetivo de proporcionarem mais tempo para a aprendizagem, os
ciclos foram adotados com o propósito de permitirem que cada aluno avançasse ao
seu ritmo, usando para tanto o tempo que lhe fosse necessário. Dessa forma, a ideia
de um ensino seriado, programado com tempo único, seria posta de lado.
Em um processo seriado, os diferentes ritmos são submetidos a um único
tempo para aprender. Durante esse tempo determinado, os estudantes devem
dominar o que é ensinado a eles, caso contrário, são reprovados, devendo iniciar
novamente a trajetória de aprendizagem, uma vez que os testes, provas, ou seja, as
avaliações propostas pela escola indicam o fracasso frente às expectativas do
ensino.
Fez-se necessário, então, contrapondo-se ao sistema seriado, o rompimento
com o padrão dessa sistemática de avaliação, como aponta Abramowicz (2001),
uma avaliação marcada pela injustiça da seletividade. O enfrentamento desse
21
desafio representou mudar o sistema para não permanecer na trilha da pedagogia
da reprovação.
A reprovação produzida sistematicamente é pensada para peneirar, selecionar, excluir, impossibilitando, aos alunos, avanços aos níveis mais elevados de escolaridade. Nesse sentido, uma sistemática de ciclos, intentando pôr fim à estruturação por séries, buscaria combater a trágica situação de reprovação que vivemos, em uma de suas vertentes. (ABRAMOWICZ, 2001, p37,38)
Vale nesse contexto apontar para o quadro apresentado anteriormente à
implantação dos ciclos. Até os anos 80 do século XX, só o aluno considerado
“alfabetizado” era promovido para a 2ª série. Os dados divulgados pelo Ministério de
Educação, conforme cita Soares (2004), indicam que no Brasil, de cada mil crianças
que ingressaram na 1ª série em 1963, apenas 449 passaram à 2ª série em 1964.
Em 1974, dez anos depois, de cada mil crianças que ingressaram na 1ª série,
apenas 438 chegaram à 2ª série em 19756.
Nesse sentido, a análise do fracasso escolar no que se refere à
aprendizagem da leitura e escrita em uma escola pública seriada indicava um alto
índice de reprovação e, consequentemente, um alto índice de evasão escolar.
A insustentável situação de fracasso escolar e as altas taxas de
analfabetismo, sobretudo, entre crianças pobres brasileiras, apontaram para a
necessidade de uma nova visão do papel da escola pública.
No final do regime militar, o Ciclo Básico emergiu como uma política
inovadora no contexto da redemocratização do país. Em dez dos Estados
brasileiros, com a vitória dos governos nos Estados como São Paulo, Minas Gerais e
Paraná, grupos políticos tidos como progressistas assumiram cargos nas instâncias
públicas; com isso, firmou-se a implantação de mudanças educacionais, como a
política de educação em ciclos.
6 Dados recentes apresentados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP, (BRASIL, 2007) mostram que a média do Brasil está abaixo do nível satisfatório que vem ocorrendo em todos os ciclos de avaliação. Em 1995, a média estava a 12 pontos distante dos 200 que se configuram como média mínima satisfatória na escala do SAEB. Em 2003, a 31 pontos. Em 2007, 2,1 milhões das crianças de 7 a 14 anos de idade frequentavam escola e não sabiam ler e escrever (ANEXO A). “Em 2007, o Inaf revela que entre a população brasileira de 15 a 64 anos, 32% são analfabetos funcionais”. (TODOS PELA EDUCAÇÃO, 2007)
22
Conforme cita Mainardes (2001), o Ciclo Básico nesses Estados constituía em
eliminar a reprovação no final da 1ª série, ampliando o período de alfabetização e
assegurando a continuidade desse processo; consequentemente, a mudança do
enfoque da avaliação deveria centrar-se no processo de aprendizagem, indicando o
percurso do aluno e dando informações sobre as necessidades de reforço e
atendimento de dificuldades específicas.
Além disso, visava oportunizar estudos complementares para alunos que
encontrassem dificuldades de apropriação dos conteúdos, capacitando os
professores que atuavam nessa proposta, alterando a concepção e a prática de
alfabetização pela incorporação de teorias mais avançadas da Psicolinguística,
Sociolinguística, Linguística e Psicologia. Dessa forma, a política dos ciclos
possibilitaria muito mais que a permanência dos alunos no interior da escola, mas
um tratamento pedagógico adequado. A avaliação, apesar de não constar nos
documentos oficiais, já se apresentava, em tese, de maneira mais formativa e
interativa.
O Ciclo Básico de Alfabetização tornou-se uma referência para a expansão do
ciclo para os demais anos do Ensino Fundamental nos anos 1990, bem como para a
incorporação dos ciclos como uma das modalidades de organização do ensino na
LDB de 1996 (MAINARDES, 2007). Os resultados obtidos a partir da implantação
dessa política, após análise de diferentes textos referentes ao resultado do
desempenho de alunos do Ciclo Básico, constataram que, apesar dos esforços, “a
reprovação não foi eliminada no final do ciclo, e a promoção automática trouxe
novas dificuldades, novos desafios a serem enfrentados” (MAINARDES, 2001, p.47).
Dados importantes são registrados e transcritos por Mainardes (2007):
Antes dessa política, a retenção que, na 1ª série, era de 45% e 50%, em São Paulo e Minas Gerais, respectivamente, caiu para 20% após a implementação da proposta No segundo ano do ciclo, a retenção que era de 30% subiu para 40 a 45% a sua implantação. (MAINARDES, 2007, p.84)
A necessidade de haver uma alteração no cenário da educação brasileira,
impulsionando medidas como a implantação do Ciclo Básico, requeria um maior
aprofundamento e reflexão sobre as possibilidades efetivas de sucesso escolar,
23
possibilidades estas dependentes das políticas públicas e das concepções de
educação que estavam na base dos ciclos.
Ao se pensar em uma proposta de ciclos e de progressão continuada, busca-se garantir uma aprendizagem significativa sem a sombra constante do medo da reprovação. Renuncia-se a fazer uma seleção excludente que mantém os alunos sob ameaça, em um contrato didático de relações conflituosas, de agressão, buscando-se uma relação de cooperação. (PERRENOUD, 1993, p.176)
A política de ciclos, contrariando a lógica da escola seriada e sua avaliação,
nem sempre poderia ser implantada atendendo a um desejo de mudança e
qualidade educacional. Mesmo sendo implementada com o objetivo transformador,
encontrou resistências e dificuldades na sua organização.
O Projeto Ciclos de Aprendizagem, implantado no município de São Paulo
pelo então secretário Paulo Freire, configurou-se como uma versão progressista dos
ciclos no Brasil. Mesmo com a intenção clara no atendimento às propostas de uma
educação progressista, sofreu entraves, como afirma Cortella (2005):
Quais foram os grandes entraves? Primeiro: dificílimo mudar na rede uma compreensão que estava já instalada. Num momento inicial, os próprios pais reagiam. Tal como fazem hoje, os pais chegavam e conversavam comigo também: ‘Professor, agora que não tem mais nota, como é que eu vou saber como meu filho está?’ Eu dizia: ’E antes, você sabia?’ Ele dizia: ‘Não. Eu sabia se era vermelha ou azul no boletim’. Eu: ‘Veja O boletim é como um termômetro. O termômetro só indica se você tem febre ou não. Ele não diz o que você tem. (CORTELLA 2005, p.55)
Quando se analisam esses entraves, pode-se constatar a dificuldade na
implementação de mudanças decorrentes das políticas educacionais.
A não constatação de um resultado positivo na aprendizagem da leitura e
escrita, a partir da desestruturação do sistema seriado convencional, remete a
identificar que as ações implementadas na organização do ensino em ciclos
requeriam das políticas públicas maiores investimentos: a valorização dos
profissionais da educação, financiamento de pesquisas, implementação de projetos
de formação contínua, procedimentos de avaliação dos processos e da organização
curricular dos resultados. Havia, portanto, a necessidade de um compromisso efetivo
por parte dos gestores em garantir as condições adequadas e necessárias.
24
No âmbito do sistema de ensino, a necessidade da avaliação permanente se
justifica a partir do momento em que os resultados possam servir para atuações
consistentes em um planejamento amparado por projetos governamentais. “O que
vale é que qualquer projeto que venha nessa direção não atire para fora da história
uma das ideias mais centrais que se deve ter no cotidiano do trabalho educacional”
(CORTELLA, 2005, p.57).
A implantação do Ciclo Básico de Alfabetização e sua expansão trouxeram
avanços para outros segmentos da escola ao romperem com o padrão de uma
sistemática de avaliação marcada pela injustiça da seletividade. No entanto,
acompanha-se no cenário brasileiro uma série de críticas da sociedade no que se
refere à aprendizagem da leitura e escrita pelos alunos das escolas públicas.
Nesse sentido, ressalta-se que mudanças na avaliação são mudanças na
escola. “Mudar a avaliação significa, provavelmente mudar a escola”, como afirma
Perrenoud (1993). Novas propostas devem ser lançadas na efetivação de uma
qualidade educacional. Estabelecer a continuidade no processo de aprendizagem
aponta para uma mudança na concepção de avaliação vigente na escola, que se
prende, fundamentalmente, a padrões de aprovação e reprovação. Mais que isso,
uma proposta que abre a possibilidade de flexibilização na organização curricular,
nos critérios de agrupamentos de alunos e nos métodos e conteúdos de ensino
exige uma avaliação de outro tipo, de dimensão educativa, capaz de valorizar os
progressos dos alunos, podendo permitir ao professor e à escola a observação e
atuação específica para garantia de aprendizagem.
Dessa forma, a crítica à proposta dos ciclos sobre uma não avaliação é
improcedente. O fato de a proposta ter como princípio a ideia de não reprovação
carrega a falsa concepção de que não deve haver também a avaliação, na cultura
da docimologia7, da medida que aprova / reprova, vigente em nosso sistema de
ensino.
Freitas (2003), em sua análise sobre ciclos, seriação e avaliação, aponta para
a necessidade de apoiar a implantação dessa política, uma vez que não elimina a
avaliação formal, muito menos a informal, mas redefine o seu papel e associa a
avaliação a ações complementares, como por exemplo, reforço ou recuperação
7 Docimologia se insere em um contexto de avaliação entendida como instrumento de medida. Baseia-se em um princípio não aparente de causalidade; é definida como o estudo dos exames.
25
paralela. “As possibilidades efetivas de maior sucesso dependem das políticas
públicas e das concepções que estão na base dos ciclos, as quais, por sua vez, são
limitadas pela realidade da organização social vigente” (FREITAS, 2003, p.51).
Ações complementares na implantação dos ciclos devem ser acompanhadas
da formação consistente de professores atuantes e diretamente responsáveis pelo
trabalho pedagógico, e de providências estruturais para que o professor seja
acompanhado nas suas dúvidas, inquietações, uma formação contínua. Além disso,
requerem uma gestão competente na condução de um projeto político pedagógico
compromissado com as necessárias mudanças educacionais.
A proposta pedagógica elaborada e apresentada ao conjunto de professores
como alternativa de alfabetização durante a década de 1980 em nosso contexto
pautou-se, principalmente, em um referencial teórico com formulações de Ferreiro e
Teberosky (1999), que na época causaram profundas resistências. Assim como uma
nova forma de avaliar os alunos, essa nova forma de conceber a alfabetização tinha
em vista promover uma ruptura qualificada nas práticas tradicionais, rompendo com
o uso das cartilhas, substituindo uma escrita escolar por uma escrita social.
A mudança de paradigma vinha de uma escola tradicional arcaica, em que a
reprodução mecânica imperava, para uma escola em que a proposta de
aprendizagem requeria uma mobilidade de saberes e fazeres, um tempo histórico,
político, social e cultural, exigindo predisposição dos envolvidos e um processo de
formação contínua.
A passagem do ensino seriado para os ciclos iniciados pela implantação do
Ciclo Básico de Alfabetização registra resultados poucos animadores.
O problema permanece, a diferença é apenas que, hoje, os alunos não rompem a barreira do 1º ciclo, que substituiu a 1ª série como etapa de alfabetização, ou no caso de sistemas que optaram pela progressão continuada, passam ao ciclo seguinte ainda não alfabetizados.(SOARES, 2004, p.14)
Por mais que os estudos divulgados pelo Sistema de Avaliação Básica do
Ministério de Educação (MEC) apontem para dados alarmantes, não se pode
concluir que isso se deva exclusivamente aos ciclos.
26
De fato, o que o ciclo (e a progressão continuada) faz é manter o aluno que não sabe ler na escola, enquanto no regime seriado ele é ‘expulso’. Dessa forma, na escola seriada ele não era detectado nas séries mais avançadas. Entretanto, agora, permanecendo na escola, esse aluno fica dentro do sistema denunciando a qualidade do mesmo. (FREITAS, 2003, p.79)
A cultura classificatória presente na escola brasileira resiste a uma
transformação. Vários estudos têm buscado a compreensão sobre a dificuldade na
implantação da política de ciclos. Sousa e Barreto (2004) fazem um estudo
detalhado dessa questão. Ao registrarem a análise acerca do tema, as
pesquisadoras evidenciam a transformação da avaliação como condição de tornar
realidade uma perspectiva de escola inclusiva, como está posta em uma política de
ciclos.
Tais mudanças devem ocorrer tendo em vista a existência de ações que se
mostrem capazes de promover a qualidade de ensino, como aponta Mainardes
(2001):
[...] sem o esforço conjunto dos gestores do sistema educacional, das unidades escolares educadores e demais profissionais envolvidos, vinculados aos esclarecimentos feitos aos pais e alunos, mudanças tão radicais como a organização em ciclos poderão fragilizar, ainda mais, a estrutura e o funcionamento das escolas, causando prejuízos muito sérios aos processos de aprendizagem e constituição de sujeitos. (MAINARDES, 2001, p.51)
A permanência da prática pedagógica da escola seriada reproduzida na
escola em ciclos faz acreditar em um distanciamento entre a real intenção da
implantação da política e a viabilização de elementos cruciais, como a prática
avaliativa. Há diversos aspectos que podem ser apontados justificando a dificuldade
na implantação de uma política de ciclos, embora a tendência dos estudos seja
evidenciar que pouco se caminhou na efetiva implantação da proposta. Há
referências de aspectos positivos, como a eliminação do rótulo de repetente ao
aluno, como também uma maior permanência desse aluno na escola.
O desafio de se construir uma escola em que o objetivo principal não seja
apenas o de aprovar ou reprovar continua, principalmente tornando uma verdade
colocar a avaliação a serviço da qualidade de ensino que esteja voltada à promoção
de todos.
27
2.1 As políticas públicas de avaliação
A leitura sobre a evolução que os alunos apresentam na educação brasileira
torna-se possível a partir do momento em que o Estado faz uso de instrumentos
coerentes de avaliação. Ressalta-se, no entanto, que o uso de uma política pública
de avaliação faz sentido quando diante do resultado apresentado, desenvolve-se um
programa de atendimento aos problemas que possam ser identificados. Partindo do
pressuposto de que avaliar indica o propósito de atender ao que se coloca no retrato
de uma aprendizagem, na política proposta pelo Estado não deveria ser diferente.
No final dos anos oitenta, teve início a preparação de um exame que tivesse
como foco conhecer melhor a educação brasileira. Foi a partir do ano de 1991 que o
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP) obteve informações
sobre o desempenho dos alunos brasileiros por meio do Sistema Nacional de
Avaliação da Educação Básica (BRASIL, 2007).
A cada dois anos, é realizado o levantamento de dados do SAEB, os quais
são obtidos com a aplicação de provas para os alunos e de questionários para
alunos, professores e diretores.
Em 1995, o SAEB passou por uma reestruturação metodológica possibilitando
a comparação dos desempenhos ao longo dos anos. Desde a primeira avaliação,
foram fornecidos dados sobre a qualidade dos sistemas educacionais do Brasil como
um todo, das regiões geográficas e das unidades federadas (Estados e Distrito
Federal).
O documento, divulgado a cada dois anos, apresentando os resultados
obtidos desencadeia a oferta de subsídios para a formulação, reformulação e
monitoramento de políticas públicas, contribuindo dessa maneira para a
universalização do acesso e a ampliação da qualidade e da equidade da educação
brasileira.
Vale ressaltar que tal publicação, apesar dos objetivos apontados pelo
instituto de pesquisa (INEP), desconsidera fatores importantes para a análise dos
resultados.
28
O SAEB publica basicamente as médias do desempenho dos alunos, estratificadas por diversos fatores, como, por exemplo, a rede de ensino. Esse tipo de análise realizada até o momento desconsidera o fato de que vários fatores agem ao mesmo tempo, e, portanto, esses deveriam ser estudados conjuntamente, para que o possível efeito de suas combinações seja detectado. (SOARES; CESAR; MAMBRINI, 2001, p.122)
No entanto, a leitura a ser feita no presente trabalho, apesar de não
considerar elementos conflitantes na análise dos resultados oficiais, encaminha-se
para a compreensão da situação em que se encontram hoje as escolas brasileiras
em relação às expectativas positivas à aprendizagem da leitura e escrita.
Pesquisas realizadas indicam uma diminuição da evasão dos alunos no
Ensino Fundamental e uma redução dos índices do analfabetismo no país.
Entretanto, a última pesquisa realizada pelo SAEB aponta números alarmantes de
indivíduos que não dominam os processos de leitura e escrita em situações reais.
As medidas do SAEB são apresentadas em escala de proficiência, que varia
entre 0 e 500. Ao se observar a tabela apresentada pela Assessoria de
Comunicação Social do INEP com o resultado do exame de proficiência de
Português dos alunos de escolas urbanas, é possível identificar uma média igual a
175,52, o que representa por volta de 35% na escala prevista para indicar a
proficiência em Língua Portuguesa (ANEXO A).
Gonçalves (2006), em seu artigo sobre a avaliação realizada pelo SAEB em
2001, apresenta elementos de extrema relevância sobre o estágio crítico do
aprendizado da leitura e escrita.
De acordo com os dados do SAEB, na avaliação realizada em 2001 (divulgada em 2003), apenas 4,48% dos alunos de 4ª série possuiriam um nível de leitura adequado ou superior ao exigido para continuar seus estudos no segundo segmento do Ensino Fundamental. Uma parte deles apresentaria um desempenho situado no nível intermediário: 36,2%. Segundo o SAEB, este percentual estaria “começando a desenvolver as habilidades de leitura, mas ainda aquém do nível exigido para a 4ª série”. A grande maioria se concentra, então, nos estágios mais elementares de desenvolvimento: 59% dos alunos da 4ª série apresentariam acentuadas limitações em seu aprendizado da leitura e escrita. Assim, percebemos que cerca de 37% dos alunos estariam no estágio crítico de construção de suas competências de leitura (dificuldades graves para ler) e 22% estariam abaixo desse nível, no estágio muito crítico (não saberiam ler). (GONÇALVES, 2006)
29
Comparando-se os dados citados por Gonçalves (2006) com os resultados
divulgados pelo INEP em 2005, percebe-se uma melhora insignificante dos
resultados para se acreditar em uma evolução da aprendizagem.
A análise do desempenho dos alunos também é realizada por meio da Prova
Brasil. A primeira edição desse exame foi realizada em novembro de 2005.
Atualmente, esse exame é considerado a principal avaliação do rendimento das
escolas públicas do país. A criação desse novo recurso de avaliação, conforme
consta em seu histórico, deveu-se à necessidade de tornar a avaliação mais
detalhada, um complemento à avaliação já feita pelo SAEB. A Prova Brasil é
aplicada a todos os alunos; por essa razão, expande o alcance dos resultados,
oferecendo dados a todos os Estados, Municípios e escolas participantes.
Prova Brasil e SAEB passaram a ser operacionalizados em conjunto desde
2007. O INEP, ao relatar o histórico dos dois instrumentos, afirma se tratarem de
duas avaliações complementares; uma não implicou a extinção da outra. As médias
do SAEB e da Prova Brasil não vão de zero a dez para não serem confundidas com
as avaliações tradicionais. As médias são apresentadas em uma escala de
desempenho que vale de 0 a 500, possibilitando a descrição, em cada nível, das
competências e habilidades que os estudantes de 4ª e 8ª séries do Ensino
Fundamental e 3ª série do Ensino Médio demonstram ter desenvolvido.
A Prova Brasil avalia o conhecimento de estudantes brasileiros em Língua
Portuguesa e Matemática. Até a sua última aplicação, a pontuação alcançada pelas
escolas que participaram dessa avaliação não foi adequada em nenhum dos itens
avaliados.
Com relação aos resultados apresentados pelo SAEB, a diferença é muito
pequena, comprovando que o país está longe de atingir padrões estipulados como
sendo de qualidade no que se refere à aprendizagem da leitura e da escrita.
Segundo as considerações de Azevedo (2007 p.8):
Daí as práticas de avaliações externas, com sistemas de avaliação em que os sujeitos que atuam no cotidiano das instituições transformam-se em objetos passivos, sendo os processos de trabalho ignorados, as especificidades dos conteúdos
30
desconhecidas. O que dá validade ao trabalho é o produto final, aferido, quase sempre, em limites quantitativos, concentrados, nos resultados, avaliados de fora para dentro.
Outro instrumento de avaliação proposto pelo MEC é a Provinha Brasil. De
acordo com as informações do INEP, a Provinha Brasil foi prevista no Compromisso
Todos pela Educação do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) do MEC. O
objetivo fundamental da realização dessa prova é o de ser oferecido aos gestores
públicos e professores informações sobre o nível de alfabetização dos alunos logo
no começo do processo de aprendizagem, com o propósito de diagnóstico.
A dúvida colocada, no entanto, é qual a necessidade de se institucionalizar
em forma de testagem a prática de avaliar a criança no início do processo de
alfabetização. Por meio dos exercícios propostos, serão apresentados todos os
elementos que permeiam a aprendizagem da leitura e escrita? Define-se então o
que o aluno de seis a oito anos precisa saber, entretanto o porquê não sabe,
indicadores fundamentais para ações construtivas de mudança não fazem parte de
tal aferição.
Indagações dessa ordem remetem a se questionar a prática da avaliação
proposta pelas políticas públicas. O conhecimento fica reduzido a dimensões
cognitivas, traduzidas em acúmulos quantitativos, mensuráveis, como se fosse
possível separá-los de todas as facetas que envolvem a instituição escolar.
Saul (2006) apresenta o propósito autoritário de avaliações realizadas
servindo a interesses exclusivamente formais, fazendo parte de uma rotina dos
órgãos que decidem os rumos dos programas educacionais. Os sistemas avaliativos,
com o propósito de divulgação desses resultados, não dão a transparência que a
maioria da sociedade deseja para entender a situação da educação em nosso país,
o que de fato é necessário para uma significativa mudança nas questões conflitantes
apresentadas.
O entendimento da situação exige a compreensão da instituição de um
currículo aliado às práticas avaliativas na própria dinâmica da sala de aula.
Como dar conta da diversidade de uma sala de aula, atender às exigências
instituídas e atingir níveis previstos para a escala proposta por uma avaliação
institucional?
31
Nas palavras de Cappelletti (2001), a constatação só tem sentido se for para
mudar para minimizar as consequências, para tentar reverter uma experiência até
então vivida como “paciente” da avaliação. A justificativa para uma prática avaliativa,
como a proposta pelas políticas públicas, respalda-se a partir do momento em que
possam ser corrigidos rumos para se traçarem estratégias que atenuem a situação
de fracasso educacional apresentada.
No Estado de São Paulo, desde o ano de 1996, a Secretaria de Educação
Estadual (SEE/SP) implantou a política de avaliação de sua rede de ensino através
do Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo –
SARESP. Além da aplicação do SARESP, o governo paulista participa também do
SAEB e da Prova Brasil. Para o presente trabalho, os dados de maior referência
serão oportunizados por meio dos relatórios apresentados pela Secretaria de
Educação do Estado de São Paulo, pois o estudo em questão aborda
essencialmente questões relativas a esse universo.
O quadro 1 abaixo, construído por meio de informações obtidas dos
documentos oficiais da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo e Ministério
da Educação, mais precisamente o Inep, apresenta os objetivos propostos para a
realização das avaliações utilizadas pelos órgãos oficiais do Estado de São Paulo,
representando instrumentos essenciais para o avanço da qualidade do ensino.
SARESP Prova Brasil e Saeb continua
Verificar o rendimento escolar dos alunos nos diferentes componentes curriculares;
Identificar os fatores que interferem nesse rendimento;
Fornecer ao sistema de ensino, às equipes escolares, às equipes pedagógicas das Diretorias de Ensino e às escolas informações que possam nortear programas de capacitação de professores;
Reorientar a partir dos resultados obtidos, a proposta pedagógica da escola;
Articular os resultados obtidos ao planejamento escolar;
Oferecer subsídios à formulação, reformulação e monitoramento de políticas públicas e programas de intervenção ajustados às necessidades diagnosticadas nas áreas e etapas de ensino avaliadas; Identificar os problemas e as diferenças regionais do ensino; Produzir informações sobre os fatores do contexto socioeconômico, cultural e escolar que influenciam o desempenho dos alunos; Proporcionar aos agentes educacionais e à sociedade uma visão clara dos resultados dos processos de ensino e aprendizagem e das condições em que são desenvolvidos;
32
SARESP Prova Brasil e Saeb
conclusão Estabelecer metas para o projeto de cada escola, principalmente ao que se refere à correção do fluxo escolar;
Estabelecer nas várias instâncias da SEE, as demais redes de ensino e as escolas para subsidiar a gestão
Desenvolver competência técnica e científica na área de avaliação educacional, ativando o intercâmbio entre instituições educacionais de ensino e pesquisa.
Quadro 1 – Objetivos propostos pelas avaliações SARESP/ SAEB e Prova Brasil Fonte: Elaborado pela autora com dados do Brasil (2007) e São Paulo (2009a)
No início do ano de 2009, após um balanço das medidas tomadas, foram
divulgados pela Secretaria de Educação os resultados apresentados pela educação
no Estado. O quadro 2 foi extraído da síntese descrita por Maria Helena Guimarães
de Castro, até então Secretária de Educação do Estado de São Paulo.
98% das crianças entre 7 e 15 anos estão matriculadas _ 86% dos adolescentes de 15 a 17 estão matriculados _ 74% dos adolescentes de 15 a 17 estão matriculados no Ensino Médio _ São Paulo está na 3a posição no ranking do IDEB/2007 para as redes estaduais. Problemas – Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (SARESP/ 2008) 4a. Série: 26.7% dos alunos no nível abaixo do básico em Português 39% dos alunos no nível abaixo do básico em Matemática 8a. Série: 26% dos alunos no nível abaixo do básico em Português 34,5% dos alunos no nível abaixo do básico em Matemática 3a. Série EM: 54,3% dos alunos no nível abaixo do básico em Matemática 32.9% dos alunos no nível abaixo do básico em Português
Conclusão: Segundo resultados do Ideb e Prova Brasil, a educação paulista está melhorando. Mas a
qualidade ainda é baixa; estamos longe de onde queremos chegar.
Quadro 2 – Prestação de contas sobre a política de bônus8 Fonte: Castro (2009)
De acordo com CASTRO (2000), a realização das avaliações dos sistemas
educacionais suscitaria ao país a consolidação, não só de mecanismos de
avaliação, mas de uma cultura avaliativa, entendendo ser essa a forma de o sistema
8 Lei complementar nº 1078, de 17 de dezembro de 2008, instituída de acordo com seu artigo 1º, para bonificação por resultados aos servidores em efetivo exercício na Secretaria da Educação, decorrente do cumprimento de metas previamente estabelecidas, visando à melhoria e ao aprimoramento da qualidade do ensino público.
33
de ensino e as escolas ganharem qualidade e oferecerem uma educação melhor
aos alunos.
Todavia, há mais de dez anos estão sendo realizadas tais avaliações. O
cenário visualizado por toda a sociedade não é dos melhores, o que se permite
questionar a forma como está sendo implantada a política de avaliação no país.
A criação de um “Estado Avaliador” para resolver a situação do fracasso
escolar deve ser tratada com cuidado. A constatação do grande número de crianças
que, ao final de um primeiro ciclo de aprendizagem, encontram dificuldades na
leitura e escrita não representa os avanços necessários na educação. Requer,
nesse sentido, que se faça uma ampla análise sobre o papel das avaliações,
colocando-se não a inexistência desses mecanismos, mas uma releitura do que se
avalia, como se avalia e por que se avalia.
A respeito do fracasso escolar, Sacristán (2007) expõe a seguinte
observação:
O fracasso não é senão o reconhecimento de uma falta de êxito, do ponto de vista de quem empreende as ações educativas, entre o referente não questionável do texto curricular e os significados que os alunos demonstram ter adquirido São considerados deficitários, transferindo a responsabilidade do déficit ao destinatário do ensino. (SACRISTÁN, 2007, p 122)
A ação do Estado em avaliar a real situação da educação, ao cumprir com os
objetivos inseridos nas diferentes práticas indicadas, pode se apresentar a favor de
uma mudança no cenário a partir do momento em que possa ser compreendido, no
ato de avaliar, o cumprimento maior do seu papel: utilizar os mecanismos
necessários para oferecer condições para que os alunos dominem as competências
e habilidades requeridas para a série em que estão matriculados. O currículo em que
se baseiam os diferentes instrumentos de avaliação são os propostos pela rede
estadual de São Paulo; no caso do SARESP e nos demais, a base é o currículo
proposto por diferentes redes estaduais e municipais.
Desse modo, uma leitura sobre a avaliação proposta pelas políticas públicas
requer a compreensão do significado de avaliar, principalmente inserindo-se nesse
contexto a relação entre currículo e avaliação e a formação do professor para uma
prática de avaliação que atenda à formação.
34
2.2 Compreendendo o ato de avaliar
Muitas são as concepções da ação de avaliar presentes na prática
pedagógica sem que os professores compreendam que tal ação representa uma
forma de existência humana. A compreensão de elementos presentes na prática
avaliativa propicia uma visão ampla de concepções norteadoras do fazer docente,
seja para reprodução de postura ou como possibilidade libertadora.
Ao se observar o panorama histórico da educação, a avaliação está presente
em cada momento, acompanhando a estrutura social e política, atendendo aos
propósitos de um tempo e cumprindo um sentido específico.
Em geral, a avaliação educacional assume diferentes concepções tendo em
vista o ideal de homem, de sociedade e de mundo que se pretende formar.
Encontra-se, assim, em diferentes abordagens de ensino, uma concepção própria
de avaliação. De acordo com Rodrigues (1994), podem ser identificados três
grandes tipos de posturas diferentes, podendo ser designadas como objetivista,
subjetivista e dialético-crítica.
Na abordagem objetivista, em que impera o modelo tradicional, a concepção
de avaliação é pautada por um controle externo. Os critérios de avaliação são
impostos e estabelecidos autoritariamente.
Na abordagem subjetivista, definida por meio de um modelo pedagógico
relativo à escola nova, a avaliação atua como um processo de autorregulação e
autocontrole. O sujeito é fonte de referencial de avaliação; participa ativamente do
processo e dos resultados.
A avaliação assume o papel de construção e reconstrução com o princípio de
transformação na abordagem dialético-crítica. Nessa abordagem, a posição de
avaliar assume um papel emancipador, libertador, com a intenção de regular
aprendizagens e fazer uma avaliação formativa.
Nas diferentes abordagens citadas acima de uma forma sintética, não se
pode restringir a ação de avaliar a um simples ato de verificação de
aprendizagens, e sim, de uma complexidade de ações em que a compreensão
35
dessa avaliação também requer um contexto curricular, uma vez que a avaliação
se apoia em conteúdos de relevância propostos em um sistema de ensino.
2.2.1 Currículo e avaliação da aprendizagem
Ao se penetrar na intimidade de uma escola, depara-se com a imagem de
alunos agrupados em classes, onde são encontrados em uma mesma sala alunos
provenientes de diversos contextos históricos e culturais. Essa diversidade muitas
vezes não recebe a devida atenção por parte da instituição, pois não há o
atendimento significativo a essas diferenças, não havendo condições para que a
aprendizagem de conceitos culturalmente relevantes aconteça. Além da definição de
conteúdos relevantes a um currículo multicultural, outra questão colocada é como
oferecer situações de aprendizagem significativas a esses educandos, ou seja, como
oferecer uma gama de conteúdos pertinentes, não apenas nos aspectos de um
currículo cultural, mas que oportunize o saber, contribuindo para a ampliação de
horizontes e perspectivas; para Torres (2001), a pertinência cultural sem o acesso à
ciência pode acabar em um isolamento que consolide o atraso e a dependência.
Uma análise sobre como selecionar esses conteúdos e proporcionar sua
aprendizagem por parte dos alunos indica a necessidade de se compreender o que
se valoriza no universo escolar, ou seja, o que se define como relevante no currículo.
Sobre essa definição é que se caminha para o sentido de avaliar, principalmente
quando o conceito de avaliar está diretamente relacionado ao diálogo presente entre
os processos de ensinar e aprender.
O termo “Currículo” deriva do verbo latim Currere (correr), que significa
pequena caminhada a percorrer. Percorrer uma caminhada, significando um passeio
recheado por ruas, alamedas, pedras impostas, ou selecionadas por uma cultura.
Traçar uma analogia entre um passeio e o currículo requer se pensar sobre os
saberes definidos pertinentes socialmente. Em que princípios é baseada a
supervalorização de algumas habilidades e não de outras? Como definir alguns
conhecimentos como relevantes e não outros?
As inquietações propostas ao se deter no conceito provavelmente da raiz do
termo Currículo são analisadas por curriculistas críticos que, partindo de ideias de
36
um currículo pré-ativo, identificam-no como o conhecimento válido a partir de um
interesse social de quem o legitima, surgindo da relevância de uma sociedade
dominante.
Goodson (1995), ao afirmar que Currículo está em constante construção, cita
que uma história do currículo ajuda a ver o conhecimento corporificado, não como
algo fixo, mas como um artefato social e histórico. Dessa forma, atendendo aos
interesses históricos, compreende-se que a prática de avaliar caminhou, e também
caminhou junto a construção de um currículo. “A avaliação é uma prática educativa
social que se integra a um conjunto de práticas, ela se afirma como ação política”
(ALBUQUERQUE, 2004, p.131).
Ao aliar prática e teoria, o professor deve ter clareza de que suas ações em
sala representam a seleção cultural, a predominância de elementos ideologicamente
superiores.
O currículo nunca é simplesmente uma montagem neutra de conhecimentos que de alguma forma aparece nos livros e nas salas de aula de um país. Sempre parte de uma tradição seletiva, da seleção feita por alguém, da visão que algum grupo tem do que seja o conhecimento legítimo. Ele é produzido pelos conflitos, tensões e compromissos culturais, políticos e econômicos que organizam e desorganizam um povo. (APPLE, 1999, p.55)
Conceituar currículo envolve entendê-lo a partir de uma ampla dimensão, não
só dos conteúdos privilegiados para o ensino, mas também aliar a isso diversas
situações envolvendo a realidade escolar. As experiências do indivíduo vão além de
uma sala de aula. Currículo é um organismo vivo, e sua não neutralidade, como fora
analisada por Apple (1999), em contrapartida, dá à avaliação sua dimensão política.
Quando se propõem modelos de reavaliar a avaliação, é preciso esclarecer as possibilidades reais de que os professores assimilem a seus esquemas práticos os mecanismos que implicam esses modelos de comportamento avaliador. (SACRISTÁN, 2000, p.334)
A ideia de um currículo crítico pressupõe compreendê-lo a partir de questões
sociológicas, políticas e epistemológicas. Nesse sentido, tratar a avaliação da
aprendizagem requer relacioná-la em um contexto também social e político no qual a
relação entre os atores envolvidos se configura em uma “não neutralidade”, em que
37
“a própria seleção de tarefas que os professores realizam e a forma que estas são
avaliadas refletem os saberes e habilidades que devem ser enfatizados e
valorizados” (SACRISTÁN, 2000).
Entretanto, o que vale ressaltar é: o que se pretende com o ato de avaliar?
Hadji (2001) coloca a avaliação como um ato de confronto entre uma situação
real e expectativas referentes a essa situação. O que vale nessa observação é que
ao avaliar, o professor é conduzido a uma leitura pré-definida por um sistema
escolar. As notas escolares reproduzem práticas e valores dominantes nesse
sistema. Dessa forma, ao proceder o ato de avaliar, quando o professor se depara
com resultados não satisfatórios aos objetivos propostos, fica, então, a expressão
dessa avaliação como o resultante de um fracasso escolar. Compreender apenas
que há um fracasso contraria o desafio existente no ato de avaliar, que é estar a
serviço da aprendizagem e não somente identificar erros, mas sim, através deles
ajudar o aluno a descobrir modos de progredir, tornando dessa forma um processo
dialógico e não apenas final.
Ressalta-se, nesse sentido, que a avaliação com o propósito de atender aos
objetivos pré-estabelecidos por um sistema de ensino assume o modelo de medição.
Tal modelo cumpre o papel de verificação de aprendizagem dos conceitos
selecionados por uma cultura dominante, expressos na elaboração dos planos pré-
definidos seguindo orientações de um currículo pré-determinado. O foco presente
em uma avaliação que satisfaça apenas a um princípio de medição não pode
atender ao propósito formativo de uma mudança.
Esse tipo de avaliação não satisfaz mais os avaliadores porque apresenta uma concepção mecanicista do mundo e inscreve-se na ideologia positivista, sobre tudo porque tende a transformar em dogma a idéia de mono causalidade linear: a causalidade não é mais a explicação suficiente de um fenômeno. Compreender não é mais procurar a causa. A constatação de que nas situações de vida e nas práticas sociais, a explicação pode ser pluricausal e não linear afetou a perenidade desse modelo e sugeriu a necessidade de outras avaliações. (BONNIOL; VIAL, 2001 p.53)
Apesar de a temática sobre a avaliação como medida estar sendo difundida e
questionada há décadas, sabe-se, como indica Sousa (2007), que a avaliação se
caracteriza como instrumento de controle e adaptação de condutas educacionais e
38
sociais dos alunos. Trabalha-se com os alunos em direção à adequação e
submissão aos padrões e às expectativas definidas pela escola, que não leva em
conta características do grupo social. Assim, a escola desconsidera elementos
presentes na cultura do aluno.
As concepções presentes na prática do professor avaliador relacionam-se à
avaliação precisa, que verifica a posse de conhecimentos acabados, sem relação
com a experiência, sem a presença de vida. Nesse sentido,
[...] as concepções dos professores adquirem um papel de primeira importância na modelação dos conteúdos e, em geral, todas aquelas perspectivas profissionais que se liguem mais diretamente com as decisões que o professor toma quando realiza uma prática, pois serão, em parte, responsáveis pelos significados que atribua aos componentes do currículo e às formas de desenvolvê-lo, seja qual for o grau de definição com que este lhe seja apresentado. (SACRISTÁN, 2000, p.181)
As teorias vivenciadas pelo professor durante sua formação estão
intimamente ligadas ao ato de avaliar. Há, no entanto, um aluno real em uma escola
real que, por sua vez, requer um professor consciente da sua prática enquanto ação
política, percebendo que tendências podem se reproduzir na educação. Com isso, é
necessária uma ação crítica e reflexiva.
Avaliar a aprendizagem não é o mesmo que avaliar o currículo. São objetos
diferentes do processo avaliativo. No entanto, o resultado do desempenho dos
alunos constitui uma vertente importante na avaliação do currículo. Desse modo,
repensar a avaliação da aprendizagem reflete na reorganização do currículo. O que
se quer com a educação escolarizada? Que saberes devem ser valorizados,
levando-se em conta as individualidades e o momento vivido pelos alunos em um
contexto histórico, político e social?
O caminho que a educação percorrerá, principalmente no que diz respeito à
avaliação, dependerá de onde se quer chegar.
Por isso, como afirma Cortella (2005), quando se trata de política educacional,
deve haver clareza para onde se deseja ir. É necessário repensar e rediscutir certas
questões.
39
Domingues (1988), em seu estudo sobre o cotidiano da escola de 1º Grau,
identificou a existência de uma relação autoritária entre professor e aluno nas salas
de aula. Na relação autoritária, em que a função reguladora do ensino está nas
mãos do professor, principalmente quando as práticas são expressas através de
uma determinação curricular previamente definida, é dado a esse professor o direito
de definir regras e de punir quando essas regras não são cumpridas. Nesse sentido,
avaliar caminha na direção da dominação.
Como se concebe o conhecimento, como se ordena, que papel se concebe para sua relação com a experiência do que se aprende, qual é sua transcendência social e sua relação com a vida cotidiana, qual é a sua origem, como se valida, como evolui, a ponderação de seus componentes, como se comprova sua posse, etc são aspectos cruciais sobre os quais se interrogar no modelo de ensino para analisar sua especificidade. (SACRISTÁN, 2000, p.188)
A questão da avaliação da aprendizagem requer uma ampla discussão e
ações voltadas ao desenvolvimento e crescimento do aluno. Se o currículo é
entendido como um organismo vivo, constantemente construído, e não se pensa a
avaliação da aprendizagem para significativas mudanças, está se obstaculizando a
oportunidade da construção de um currículo que atenda às diferenças e que cumpra
o papel na formação do ser integral.
2.2.2 Avaliação Formativa: Ação Reguladora de Aprendizagem
A formação do ser integral compreende, em uma visão educacional
libertadora e democrática, ensino de qualidade. Quando se pensa em qualidade na
ação educativa, não se pode ignorar a importância da prática avaliativa. Qual a
verdadeira intenção ao se proceder à avaliação nas escolas brasileiras?
Como já foi discutido anteriormente, avaliação pode se configurar como
medida, caracterizada como um instrumento de controle das condutas educacionais
dos alunos; no entanto, não indica a verdadeira intenção presente na necessidade
de avaliar, segundo estudos de Cappelletti (2002).
40
Avaliação constitui-se em uma investigação crítica de uma dada situação que permite, de forma contextualizada, compreender e interpretar os confrontos teóricos/práticos, as diferentes representações dos envolvidos e as implicações na reconstrução do objeto em questão. Esse processo desencadeia uma intervenção intencional de estudos, reflexões, re-leituras, gerando nas ações/decisões um movimento de problematização e ressignificação na direção de transformações qualitativas de relevância teórica e social (CAPPELLETTI, 2002, p.32).
Na concepção apontada por Cappelletti (2002), a ação avaliativa estaria
diretamente relacionada a uma proposta de intervenção intencional de estudos, e
nessa ação, não vale apenas o que foi aprendido ou não, mas a possibilidade de a
aprendizagem de fato ter sido efetivada.
A ação de ensinar exige a compreensão do compromisso legítimo de atuação.
Significa ter a verdadeira dimensão do que o aluno não aprendeu, visualizando a
real possibilidade do aprender, criando as mais diversas situações para que isso
possa ocorrer.
A mudança de uma prática avaliativa tão necessária na formação de um
professor não é tarefa fácil; ainda mais, quando em sua formação, seja ela
acadêmica ou através da prática, só houver o exercício rotineiro de uma avaliação
quantitativa e empírica baseada no conceito de medição.
A proposta de uma avaliação no sentido da ação significativa não é uma
discussão recente. Segundo Hadji (2001), a noção de avaliação formativa já fora
proposta em 1967, por Scriven. Nessa perspectiva avaliativa, o erro não seria uma
falta a ser reprimida, mas uma fonte de informação da situação do aluno para uma
significativa intervenção do professor.
Vista como uma forma de regulação contínua da aprendizagem, a avaliação
formativa favorece ação e interação contínuas na aprendizagem. Para tanto, para
Perrenoud (1999), requer um professor que compreenda como se dá esse processo,
sendo capaz de construir seu próprio sistema de observação, de interpretação e de
intervenção em função de sua concepção de ensino, dos objetivos, do contrato
didático, do trabalho escolar.
41
É formativa toda a avaliação que ajuda o aluno a aprender e a se desenvolver, ou melhor, que participa da regulação das aprendizagens e do desenvolvimento no sentido de um projeto educativo. (PERRENOUD, 1999, p.103)
Não há como desarticular a ideia de uma avaliação formativa com um
procedimento de ensino voltado para mudanças didáticas. A avaliação formativa
implica, por parte do professor, flexibilidade e vontade de adaptação, de ajuste
(Hadji, 2001).
Presente em toda a prática docente, a avaliação precisa cumprir com seu
verdadeiro papel; por isso, é importante a compreensão do que representa a
avaliação formativa.
A prática de uma avaliação formativa pressupõe uma atitude muito além da
verificação de erros, mas um caminho para ações, com o indicativo da superação
das dificuldades por parte do aluno. Segundo Hadji (2001), a análise dos erros não é
construir um fim em si; é um meio oferecido para tornar a avaliação mais informativa
e imaginar melhor a condição didática e/ou pedagógica adequada para a superação
do obstáculo revelado pelo erro.
Em um sistema seletivo como o nosso, a avaliação formativa encontra pouco
espaço. Para sua concretização, o essencial é a formação contínua do professor,
que favoreça uma ampla análise de sua função como agente da aprendizagem do
aluno.
Uma avaliação formativa digna deste nome não produz informações e verificações por simples espírito de sistema ou de equidade para fazer funcionar uma máquina avaliativa ou para tranquilizar quem quer que seja. Ela visa dar nem mais nem menos, informações de que ele necessita para intervir eficazmente na regulação das aprendizagens de seus alunos. (PERRENOUD, 1999, p.124)
O rompimento da prática de uma avaliação como medida para a concepção
formativa requer por parte do professor avaliador uma adequada formação que
deveria possibilitar ao docente uma postura mais democrática, crítica e solidária,
sendo o protagonista informado sobre os pressupostos presentes em uma ação
avaliativa libertadora. Sobre as condições necessárias a essa formação
(FELDMANN, 2004), faz-se necessário se estabelecerem políticas públicas que
42
garantam a participação ativa dos professores nas várias instâncias de decisões do
processo educativo, considerando-se a necessidade e o direito à formação
continuada, incluindo o desenvolvimento de melhores condições de vida e de
trabalho.
2.3 Formação do professor para a prática de uma avaliação formativa
A ampla discussão em torno da problemática da avaliação deixa escapar uma
análise acerca do papel do professor frente à possibilidade de uma avaliação
formadora. Identifica-se como formadora uma avaliação que resulte em uma
alteração de resultados, contribuindo para a evolução do aluno.
A alteração implicada na avaliação é também essa: a interferência de um outro (alter [lat] = outro). O resultado pretendido é paradoxal: o outro interfere (hetero-nomia [gr] = o outro é a norma) para que o sujeito seja mais capaz de reconhecer por si mesmo e de dirigir-se a si mesmo, ou seja, auto-determinar-se (auto-nomia). A avaliação heteronômica é um paradoxo também porque só pode efetivar-se na medida em que o sujeito avaliado reconhecer a si mesmo minimamente na representação feita pelo outro. (CASALI, 2007, p.18)
O professor, ao representar o outro na fórmula descrita anteriormente, precisa
se compreender como alguém caracterizado como um agente social, pois representa
concepções ideológicas dominantes em um currículo. Para tal compreensão, deve
ser instituída uma prática pedagógica reflexiva. O processo reflexivo pode acontecer
de diferentes maneiras, dependendo da capacidade de análise e da relação teoria e
prática que se consegue construir. Além disso, dependendo da maneira como se
realiza a reflexão na prática docente, resultados diferentes são alcançados. Schön
(2000) apresenta dois tipos de reflexão: a reflexão-sobre-a-ação e a reflexão-na-
ação.
A reflexão-sobre-a-ação acontece quando pensamos sobre o que fizemos, de modo a descobrir como nosso ato de conhecer-na-ação pode ter contribuído para um resultado inesperado. Podemos proceder dessa forma após o fato, em um ambiente de tranquilidade, ou podemos fazer uma pausa no meio da ação para [...] parar e pensar. (SCHÖN, 2000, p.32)
43
Uma ação reflexiva instituindo uma prática avaliativa formativa impõe que se
perceba um fazer pedagógico relativado por uma postura crítica, em que se possa detectar
o propósito relativo à ação, tendo como princípio uma mudança de postura. Nada poderá ser
feito se não houver por parte do professor a competência para retomar trajetos a partir de
uma leitura crítica do seu espaço de ação, indo além do que seja colocado como caminho
único de condução.
O professor não decide sua ação no vazio, mas no contexto da realidade de um local de trabalho, numa instituição que tem suas normas de funcionamento marcadas às vezes pela administração, pela política curricular, pelos órgãos de governo de uma escola, ou pela simples tradição que se aceita sem discutir. (SACRISTÁN, 2000, p.166-167)
Nesse sentido, a mudança na postura do professor, favorecendo a prática da
avaliação formativa, deve ocorrer no contexto da formação docente. A compreensão
dessa formação não pode ficar reduzida a um simples processo de acúmulo de
conhecimentos, desconectados de um contexto histórico, político e social. Para
Feldmann (2004), esse processo deve estar vinculado à concepção e à análise dos
contextos sociais que produzem um conjunto de valores, saberes e atitudes, os
quais imprimem significados ao fazer educativo.
O rompimento de uma prática avaliativa excludente, meritocrática e seletiva
não ocorrerá se os professores continuarem com raízes tão fincadas em uma
concepção reprodutora de diferenças sociais.
No entanto, vale acrescentar a essa afirmação que além de ser um problema
de concepções avaliativas, mais grave ainda é saber que esses professores
iniciaram sua formação antes mesmo da universidade, ou seja, já representam a
consequência de uma educação que sofreu e sofre pelos reflexos de um modelo
excludente de desenvolvimento econômico, modelo esse que nega o sucesso
escolar para todos os cidadãos.
Essa análise requer um pensamento não apenas de consternação, mas,
como cita Sousa (2007), enfrentar o desafio histórico de democratizar a educação
supõe, necessariamente, olhar criticamente a escola. Para além dos condicionantes
de natureza estrutural do Estado brasileiro, o fracasso escolar, há muito evidenciado
e denunciado, é também expressão do modo como a escola está organizada, o que
44
impõe olhar criticamente suas regras, rituais, práticas, enfim, o conjunto de relações
e interações que nela se estabelecem.
O professor, como agente em um processo social, teria que ter condições
para o olhar criterioso e crítico de uma situação da qual ele faz parte. A capacidade
de leitura crítica de uma situação não pode ocorrer sem elementos teóricos e
tampouco sem a condição reflexiva para efetivar uma mudança significativa.
A educação conduzida reflexivamente deve capacitar o sujeito para `sair da cultura´, poder estudá-la, refazê-la e melhorá-la, ou seja, distanciar-se para ter perspectiva e poder adotar uma das múltiplas direções possíveis e seguir seu desenvolvimento. (SACRISTÁN, 2002, p.212)
Nessa perspectiva, antes de uma maior discussão sobre a formação do
professor para um redirecionamento na prática avaliativa, faz-se necessária uma
explicitação sobre o conceito de formação.
Mizukami et al.(2002) apresenta dois paradigmas de formação: racionalidade
técnica e racionalidade prática. Pelo modelo de racionalidade técnica compreende-
se a formação adquirida por meio da transmissão de um aparato de conteúdos e
técnicas. O modelo da racionalidade prática indica o desenvolvimento de uma
prática reflexiva.
A mesma autora aponta para a necessidade de o processo de formação ser
contínuo; no entanto, evidencia a necessidade de haver a fomentação dos
processos reflexivos sobre a educação e a realidade social por meio de diferentes
experiências, despertando para a certeza das constantes mudanças e da
provisoriedade do saber científico. No entanto, no que se refere ao saber oriundo de
uma formação inicial, a autora registra:
Assim, se é verdade que a formação inicial sozinha não dá conta de toda tarefa de formar os professores, como querem os adeptos da racionalidade técnica, também é verdade que ocupa um lugar muito importante no conjunto do processo total dessa formação, se encarada na direção da racionalidade prática. (MIZUKAMI, 2002, p.23)
Em se tratando da formação do professor para avaliar, Cappelletti (2007)
aponta para um quadro preocupante: após análise de pesquisas recentes, verificou
45
que o tema avaliação educacional raramente tem o espaço necessário na formação
de professores nos cursos de Pedagogia: ou fica restrito a um módulo instrucional,
ou como um tema da disciplina da didática.
A formação que tem sido oferecida aos professores não inclui os saberes necessários para interpretação dos resultados obtidos e principalmente dos erros cometidos pelos alunos. A interpretação envolve um quadro teórico sobre aspectos cognitivos, afetivos e sociais da aprendizagem. Envolve a compreensão de como o aluno aprende e como o professor ensina. (CAPPELLETTI, 2007, p.53)
A criação de um espaço de formação para o professor repensar a avaliação
requer criticidade a uma cultura instalada no sistema de ensino. Não há formação
distanciada de uma profunda análise da configuração da escola como instituição
social.
A instituição escolar é um mecanismo pensado para servir à inserção cultural compartilhando uma série de traços culturais, que se centram no que, em outro momento denominávamos como o núcleo estável e mais valorizado de uma cultura. (SACRISTÁN, 2002, p.223)
Negar a reprodução de uma cultura de avaliação docimológica requer, a
princípio, a compreensão por parte do professor do seu papel como agente de
transmissão e de criação, sendo instrumento de reprodução e, possivelmente, de
mobilização e mudança.
2.4 A Cultura Avaliativa: reflexos nos programas voltados ao ensino da leitura e escrita
A implantação dos ciclos nas escolas brasileiras, como foi apontado
anteriormente, teve na sua fundamentação o propósito de ser uma alternativa de
reorganização do Ensino Fundamental, prevendo a organização do trabalho escolar
em novas bases, supondo o tratamento ao conhecimento como processo em que o
aluno, como sujeito da ação, estivesse continuamente sendo formado, construísse
significados com base nas relações estabelecidas com o mundo e com outros seres
humanos. Conforme cita Sousa (2007),
46
O horizonte que se impõe com ciclos é a construção de uma escola de qualidade para todos, para o que também se impõe uma nova organização do trabalho escolar, capaz de provocar uma transformação na cultura classificatória e seletiva dominante no sistema escolar. (SOUSA, 2007, p.35)
O propósito de se retomar a análise referente à questão dos ciclos se deve à
necessária compreensão da mudança nas propostas de Alfabetização que não
foram acompanhadas de uma proposta reflexiva sobre o ato de avaliar.
A primeira proposta concreta apresentada para uma nova organização do
trabalho escolar foi o projeto do Ciclo Básico em São Paulo, no início dos anos de
1980.
O Ciclo Básico de alfabetização (CB) foi a principal medida de um elemento de projetos pedagógicos voltados para a melhoria da qualidade do ensino, ampliação das oportunidades de acesso e permanência na escola pública e busca de maior aproveitamento da comunidade escolar (pais, professores, e alunos) no sistema educacional. Concebido e implantado num cenário sombrio, vinha, todavia, iluminado por grandes esperanças de transformação da realidade escolar brasileira. Pretendia-se, por intermédio dele e à luz das novas concepções a respeito do processo de ensino e aprendizagem, vencer a barreira da repetência logo no início da escolarização, promovendo uma profunda, ainda que gradual mudança no modo de atuar na escola. (MORTATTI, 2000, p.262)
Com o objetivo de romper com a prática do ensino mnemônico da leitura e da
escrita, uma nova teoria respaldou a base dessa mudança, a teoria construtivista
pautada pelo referencial piagetiano. Essa nova compreensão do ensino da
linguagem buscou explicar a aquisição da língua escrita pela criança como um
processo psicogenético que se inicia antes da escolarização e que segue uma linha
regular através de diversos meios culturais de diversas situações educativas.
As pesquisas que embasaram mudanças no ensino brasileiro foram sendo
discutidas ao longo das décadas que se seguiram após a implantação do ciclo
básico, ou seja, dessa nova concepção de aprender a ler e escrever quando se
pensa no processo de construção.
A discussão que se apresenta no momento se refere à trajetória da avaliação
que acompanhou as mudanças metodológicas propostas.
47
Sobre a problemática da avaliação, duas décadas após a publicação das
suas pesquisas, as práticas de avaliação continuam autoritárias como a prova,
sendo ainda um instrumento predominante na escola (FERREIRO; TEBEROSKY,
2000).
Aos questionamentos realizados, as estudiosas afirmaram que os professores
não estão conscientes de que avaliação da leitura e escrita deve atender às
diversidades culturais. Outra observação trazida por elas foi a de que as instituições
escolares devem enfrentar o problema da avaliação com uma ampla discussão.
Constataram também um treino dos professores para avaliação, indicando-a não
como avaliação de aprendizagem, mas como objetivo de ensino.
De acordo com o relato, a avaliação não acompanhou certo avanço ocorrido
com relação às propostas metodológicas, tampouco, segundo elas, não se pode
supor que, porque se deu um curso de capacitação ao professor, no ano seguinte
ele tem que ser diferente e, ainda por cima, ter resultados diferenciadores em seus
alunos.
Os aspectos elencados pelas pesquisadoras sobre a problemática da
avaliação indicaram um descompasso entre a metodologia proposta para o ensino
da leitura e escrita e o modo como está sendo realizada a avaliação.
Desde a década de 1980, os professores, no Estado de São Paulo, através
dos diversos programas propostos, estão sendo acompanhados pelos órgãos da
Secretaria de Educação para uma constante atualização das ações didáticas e
metodológicas9.
9 No início da década de oitenta, foi publicado pela Cenp, órgão ligado à Secretaria de Estado da Educação de São Paulo, um conjunto de materiais impressos com o propósito de discutir, dentre outras questões, as principais concepções de alfabetização, suscitando como princípio a reflexão como elemento de transformação. A Cenp valeu-se, nesse primeiro momento, do discurso e do modelo usado na formação acadêmica, reproduzindo até mesmo textos já publicados em livros e periódicos educacionais. Outros materiais foram produzidos durante a época com o propósito de auxiliar os professores para atuarem sob o contexto de uma nova prática: Isto se aprende com o ciclo básico (São Paulo, 1986); Ciclo Básico em jornada única: uma nova concepção de trabalho pedagógico (1988-1990); Por trás das letras (1992) e Ler e escrever, um grande prazer! (1993). (SÃO PAULO, 2009b)
48
Fica, porém, a dúvida sobre os impasses existentes para uma maior
qualidade nos processos de ensinar e aprender a leitura e escrita. Até que ponto
uma alteração metodológica se reverte em uma prática libertadora da avaliação? Há,
de fato, uma alteração metodológica do professor para compreensão e aceitação, ou
há ainda uma série de dúvidas, desencontros, impossibilitando uma ação com
intervenções significativas?
Esse contexto que por ora se apresenta requer uma visão criteriosa acerca
das concepções de ensino que embasam a prática de professores alfabetizadores,
assim como a prática proposta de avaliação presente em cada uma das concepções.
49
3 DIFERENTES CONCEPÇÕES DE ALFABETIZAÇÃO: DA CONCEPÇÃO MECANICISTA À SOCIOPSICOLINGUÍSTICA
Quando analisamos a prática pedagógica de qualquer professor vemos que, por trás de suas ações, há sempre um conjunto de idéias que orienta. Mesmo quando ele não tem consciência dessas idéias, dessas concepções, dessas teorias, elas estão presentes. (WEISZ; SANCHES, 2002, p.55)
Durante o percurso histórico da educação brasileira, tem-se acompanhado a
existência de diferentes concepções acerca da alfabetização.
A compreensão do processo de avaliação da alfabetização nesses diferentes
períodos implica uma visão de homem, de sociedade, uma opção teórica sobre a
natureza da linguagem, de sua aquisição e, consequentemente, de intervenções
realizadas em um processo complexo envolvendo o ensinar e o aprender.
3.1 Concepção Mecanicista: compreensão da aprendizagem pautada por métodos
A discussão que se estabelece há muito tempo por educadores nas diversas
partes do mundo se refere à metodologia usada para ensinar a criança a ler e
escrever. Nesse caso, a pauta principal se relaciona a encontrar um melhor caminho
de ajudar a criança a internacionalizar padrões regulares de correspondência entre
som e soletração. Conforme citam Ferreiro e Teberosky (1999):
Tradicionalmente, conforme, uma perspectiva pedagógica, o problema da aprendizagem da leitura e da escrita tem sido exposto como uma questão de métodos. A preocupação dos educadores tem-se voltado para a busca do ´melhor´ ou ´mais eficaz´ deles, levando-se assim, uma polêmica em torno de dois tipos fundamentais: métodos sintéticos, que partem de elementos menores que a palavra, e métodos analíticos, que partem da palavra ou de unidades maiores. (FERREIRO; TEBEROSKY, 1999, p.21)
Um contexto mecânico de ensinar pressupõe uma aprendizagem realizada
por sujeitos passivos receptores. A ação reflexiva nesse processo é
descaracterizada, tanto para professores, que devem seguir passo a passo o
50
previsto pelas referidas propostas, como para alunos, que são submetidos a uma
aprendizagem mecânica, descontextualizada e vazia de sentido.
Mortatti (2000), ao delimitar seu estudo em escolas brasileiras, mais
precisamente no Estado de São Paulo, no período entre 1876 a 1994, apresenta a
concepção mecanicista em três momentos cruciais para análise de posturas
assumidas por professores.
No primeiro momento, sobressaiu a disputa entre os partidários do novo e
revolucionário “Método João de Deus” para o ensino da leitura, baseado na
palavração, e os partidários dos então tradicionais métodos sintéticos que utilizavam
a soletração e silabação, presentes nas primeiras cartilhas brasileiras.
O “Método João de Deus” – português – passou a ser divulgado no Brasil na
década de 1880, por Antonio da Silva Jardim, professor de Português da Escola
Normal de São Paulo, e teve como base o positivismo, que dava suporte às
reformas políticas praticadas até aquele momento. O pensamento de Silva Jardim
representou a primeira geração de novos educadores. Expandiu e divulgou a ideia
de educação positivista, aplicada especialmente à língua materna (MORTATTI,
2000).
Com isso, a divulgação do “Método João de Deus”, contido na Cartilha
Maternal, representou um marco revolucionário para o ensino da língua. Em seu
prefácio,
[...] o autor diz que o aluno, ao aprender por letras ou por sílabas, conduzindo através de elementos inertes do pensamento, reduzi-se a oposição de repetidor de uma cambulhada de miudezas trivialíssimas que não o divertem, nem o instruem, atrofia-lhe o espírito e deixam nele impresso o hábito da leitura mecânica, senão, muitas vezes o selo do idiotismo. (BARBOSA, 1994, p.57)
Apesar de as propostas de “João de Deus” não terem tido acolhimento oficial
num primeiro momento, o combate aos métodos sintéticos e a importância social e
política atribuída ao ensino da leitura fundaram uma tradição que envolvia
necessariamente uma questão de métodos.
No método sintético, a língua é um objeto de conhecimento externo ao
aprendiz que realiza uma análise puramente racional de seus elementos. A
51
aprendizagem se dá da seguinte forma: aprende-se, primeiro, letras, depois as
sílabas, as palavras, frases e, finalmente, o texto completo. Há uma regra geral: não
se deve avançar no processo sem que todas as dificuldades da fase anterior estejam
dominadas. No início, a aprendizagem se dá por repetição em coro, soletrando as
letras. Não há preocupação com o valor fonético ou a grafia, só a repetição. Após
esse período, depois da memorização da grafia das letras, o alfabeto é apresentado
e, numa primeira síntese, apresentam-se as sílabas sistematicamente e em ordem
alfabética. Em seguida, são introduzidas as palavras mais simples (monossílabas), e
depois, as mais longas, aquelas que têm a pronúncia considerada mais difícil.
Esse método progride lentamente. O aprendiz demora cerca de quatro anos
para começar a ler um texto completo; após esse período, ele inicia a aprendizagem
da escrita.
Deve ser feita uma observação de que esse método estabelece uma
confusão entre a análise, a língua e o ato de ler.
O referencial para a aprendizagem é a língua oral. A estrutura da matéria
ensinada corresponde a uma lógica adulta e não a uma lógica da criança.
As cartilhas sintéticas - “soletração ou silabação” - partem de elementos não
significantes da língua (a-e-i-o-u; ai-ou-ei-uai).
Combinam-se vogais, trabalham-se os ditongos e tritongos.
Passa-se a seguir para a combinação das vogais com as consoantes,
dirigindo-se o ensino das famílias silábicas (b+a = ba; b+e = be; b+i = bi; b+o = bo;
b+u = bu).
As palavras surgem da combinatória das famílias já conhecidas, passando
para a fase de fixação por meio de exercícios repetitivos. Combinam-se as palavras
até surgirem os textos. As cartilhas sintéticas são as mais tradicionais da
alfabetização.
No início do século XIX, o método sintético mudou a ênfase do seu ensino
pautado no nome das letras para o ensino do seu som. Assim, foi iniciado o método
fônico ou fonético.
A mudança fez com que os mestres conduzissem alunos a associarem o som
das letras a palavras conhecidas juntando gravuras que a ilustravam. Também
52
conhecido como psicofônico ou psicofonético, alguns estudiosos recortavam o
alfabeto em massa de biscoito para que as crianças o deglutissem por completo,
reforçando sua aprendizagem pelo estímulo do paladar, ou recortavam em madeira
para acentuarem os efeitos de apelação tátil.
Cita-se como exemplo o método Castilho para o Ensino Rápido e Aprazível
do ler Impresso e numeração do Escrever, proveniente de Lisboa, utilizado no Brasil,
e pautado no método sintético acrescido dessas inovações.
A Revista Pedagógica, distribuída gratuitamente aos professores da rede
pública do ensino primário e aos estabelecimentos públicos de instrução, dentre
outras disposições, continha os atos oficiais relativos à instrução primária. Funcionou
como um dispositivo para padronização administrativa e pedagógica do sistema de
instrução pública no início da República, pautada pelos princípios positivistas: a
construção da ordem e o alcance do progresso no setor da instrução pública.
A história caminhou e as normatizações foram sendo impostas por meio da
adoção oficial de cartilhas, agora, do método analítico. Há relatos de professores
apontando essa obrigatoriedade (TENCA, 1985 apud DEMARTINI; TENCA; TENCA,
1985).
Ah era obrigatório. Tinha que ser o método analítico para alfabetizar E é um método difícil, principalmente para as crianças da roça. Mas era obrigado. Era obrigado seguir uma cartilha analítica. A cartilha analítica era assim: começa com a sentença em vez de começar com a silabação. Em vez de aprender sílabas, tinha que aprender, um tempão, só sentenças Custava para entrar na sílaba, sabe. Então precisava a gente ter muita paciência e muito cuidado Agora, na primeira escola que eu fui ainda não era obrigado, aí eu ainda usava silabação. Aí, eu comecei como analítico, que começava do seguinte modo: Dava-se uma sentença e escrevia-se no quadro-negro. Decompunha-se em palavras e depois em sílabas, depois em letras. Vou dar um exemplo de uma frase que se escrevia no quadro-negro e mandava a criança acompanhar com o ponteiro, que era perigoso, porque o professor às vezes se esquecia e batia na cabeça das crianças: O bebê bebe leite. Então a criança lia: O bebê bebe leite. A professora depois apontava para a frase: o bebê, depois leite, que era decorado. Depois ia para as letras b e l, já são duas letras do alfabeto, que hoje esta diminuindo. Já não tem o Y ou o W e assim foi o método analítico, que ensinou uma geração de brasileiros. Era fácil, ainda mais saindo da Escola Normal que a gente estudava a metodologia, em poucas horas, à noite, até sair para a roça e então desenvolvia o que aprendeu. (TENCA APUD DEMARTINI, TENCA TENCA, 1985, p.69)
53
Essa situação perdurou oficialmente até 1920, quando foi implantada a
Reforma Sampaio Dória (Lei nº 1750, de 1920). Dentre outros aspectos, garantia
autonomia didática aos professores. Um avanço para a época.
O segundo momento se caracterizou por uma acirrada disputa entre os
partidários do então novo e revolucionário método analítico para o ensino da leitura
e os que continuavam a defender os, agora, tradicionais métodos sintéticos.
Surgiram novas cartilhas, como expressaram os professores no relato anterior.
No terceiro momento, meados da década de 1920, houve uma disputa inicial
entre defensores do método misto (analítico-sintético ou sintético-analítico) e os
partidários do, agora tradicional, método analítico.
O método misto caracterizava-se por explorar todo o significado e as partes
simultaneamente:
a) da palavra, passando para a frase, formando um texto, retirando
novamente a palavra para decompô-la em sílabas;
b) da frase, retirando a palavra para chegar à sílaba;
c) da história, retirando a palavra-chave para depois destacar a sílaba.
Destacou-se naquele momento, e por longos anos, a Cartilha Caminho
Suave, de Branca Alves de Lima.
3.1.1 Avaliação da aprendizagem da leitura e escrita a partir de um referencial mecanicista
A leitura e escrita em uma concepção mecanicista são tratadas como mera
aquisição da técnica de ler e escrever, com ênfase no componente grafofônico da
língua como um fim em si mesma, circunscrita às quatro paredes da sala de aula.
Esses pressupostos irão pautar a prática do professor no processo de avaliação. A
ênfase maior será dada ao produto, o qual deverá reproduzir modelos definidos
externamente ao sujeito aprendente.
54
No processo de aprendizagem da alfabetização, o erro é visto como falta
grave; sendo assim, é sempre corrigido com a ideia de que tal correção oportunizará
a progressão da aprendizagem.
A tradição escolar normalmente vê a correção que o professor realiza fora da sala de aula, longe dos olhos dos alunos, como a principal. Compete-lhe marcar no trabalho realizado aquilo que o aluno errou, para que o erro seja corrigido e não fique presente no produto do trabalho do aluno (WEISZ; SANCHES, 2002, p.84).
A teoria empirista, com ênfase na mudança de comportamento, embasa a
ação do professor ao definir aprendizagem como substituição de respostas erradas
por respostas certas. Em tal concepção, o conhecimento está fora do sujeito, sendo
possível definir o que pode ou não se apresentar como produção.
Há de se convir que a avaliação codificada pelo professor sofre um controle
de procedimentos didáticos visando a uma adaptação do professor às regras que
garantam a eficácia ou a regulação do ensino na sala de aula.
Poder-se-ia dizer que a escola define o fracasso e o êxito de modo unívoco porque quer tomar, de maneira unilateral, decisões legítimas. Assim, ela explicita, critérios de êxito e de fracasso que supostamente se aplicam de modo uniforme a todos os alunos que se encontram em uma situação comparável. (PERRENOUD, 1999, p.39)
Avaliar, em uma concepção mecanicista, representa ignorar uma ação
singular, pois a previsão válida passa a ser o que pode ser (considerado)
generalizado. Indicam-se erros e acertos com o pressuposto de que o conhecimento
é externo, dependendo de métodos acertados para a garantia da aprendizagem.
A validação de uma concepção mecanicista por professores alfabetizadores
indica a existência de critérios postos em consonância de uma formatação de
aprendizagem.
55
3.2 A consideração dos processos cognitivos de Aprendizagem: concepção pautada nas pesquisas psicogenéticas e psicolinguísticas
Uma nova concepção acerca da aprendizagem da leitura e escrita surgiu a
partir de pesquisas realizadas por Emília Ferreiro com a colaboração de Ana
Teberosky, as quais se pautaram principalmente no entrecruzamento de dois marcos
conceituais - a teoria da linguagem de Chomsky e a teoria da inteligência de Piaget.
Chomsky adotou uma concepção racionalista para explicar os dados
linguísticos. Tal concepção sobre a aquisição da linguagem é proposta em oposição
à noção de imitação proposta pelos behavioristas.
Chomsky ressalta o papel da “criatividade”: a capacidade que as crianças têm de produzir e entender um número indefinidamente grande de enunciados, com os quais não tiveram experiência anterior, dado o caráter produtivo das línguas humanas Ou seja, a capacidade de operar com a língua independentemente de estímulos, a qual se manifesta, todavia, dentro dos limites estabelecidos pela produtividade do sistema lingüístico, regido por regras de adequação gramatical, cujas propriedades formais seriam características da estrutura da mente humana. (BRAGGIO, 2002, p.17)
Ao admitirem para suas pesquisas as teorias de Chomsky, Ferreiro e
Teberosky (1999) trouxeram o foco para a distinção entre competência e
desempenho. Essa distinção representa um caminho contrário ao condutismo, pois
identifica “o saber” a partir de um domínio particular com seu desempenho efetivo
numa situação particular. O fato de alguém não ser capaz de repetir uma palavra
desconhecida não quer dizer que seja incapaz de compreender e de produzir as
distinções fonemáticas próprias de sua língua.
Ferreiro e Teberosky afirmam no capítulo introdutório da Psicogênese da
Língua Escrita não terem sido as primeiras a assinalarem a necessidade de revisão
de algumas ideias sobre aprendizagem da leitura e escrita; no entanto, referem-se à
originalidade de suas pesquisas ao vincularem as perspectivas da psicolinguística de
Chomsky ao desenvolvimento cognitivo, como é visto na teoria da inteligência de
Piaget (FERREIRO; TEBEROSKY, 1999).
Observa-se nos estudos de Piaget que em nenhum momento de suas
pesquisas, interessou-se por analisar a aprendizagem da linguagem; no entanto,
56
seus trabalhos apontam para a existência de um sujeito cognoscente que busca
adquirir conhecimento. Conforme afirmam Ferreiro e Teberosky:
O sujeito que conhecemos através da teoria de Piaget é aquele que procura ativamente compreender o mundo que rodeia e trata de resolver as interrogações que este mundo provoca. Não é um sujeito o qual espera que alguém que possui um conhecimento o transmita a ele por um ato de benevolência. É um sujeito que aprende basicamente através de suas próprias ações sobre os objetos do mundo e que constrói suas próprias categorias de pensamento ao mesmo tempo em que organiza seu mundo. (FERREIRO; TEBEROSKY, 1999, p.29)
Ao se tratar o sujeito como um ser ativo em busca da compreensão do
mundo, faz-se necessário que haja uma atividade estruturante em que seja possível
uma ação sobre o objeto de conhecimento. Apesar de não terem tratado das
questões relacionadas à escrita, as teorias de Piaget foram válidas para que Ferreiro
se ocupasse em utilizá-las para desvelar um processo vivido por um sujeito durante
a aprendizagem da leitura e escrita. Como a própria teoria piagetiana indica a
necessidade de haver uma ação sobre o objeto de conhecimento, para a
aprendizagem da escrita é também necessário ação sobre o objeto a ser conhecido,
pois a escrita não existe no vazio. Segundo Ferreiro (2001),
As superfícies que a cultura construiu para serem portadoras de marcas escritas têm nome e função: chamam-se jornais, livros, calendários, documentos de identidade, dicionários, anúncios, embalagens de alimentos ou remédios, placas com nomes de ruas, indicações para veículos e pedestres, propaganda comercial. A lista é muito longa. (FERREIRO, 2001, p.11)
Compreendendo a existência de um sujeito cognoscente, em uma concepção
psicolinguística, a análise da aprendizagem precisa se desenvolver na atenção às
transformações ocorridas pelos sistemas de assimilação do sujeito e não admitir que
estímulos externos possam controlar as respostas, como acreditam os adeptos de
uma concepção mecanicista.
A partir dessa leitura, Ferreiro (2001) admitiu que a concepção da
aprendizagem (entendida como um processo de obtenção de conhecimento)
inerente à psicologia genética supõe que existam processos de aprendizagem do
sujeito que não dependem dos métodos (processos que, poderia se dizer, passam
57
necessariamente pelos métodos). A estratégia enquanto ação específica do meio
pode ajudar ou frear, facilitar ou dificultar, porém, não pode criar aprendizagem.
A aprendizagem entendida pela pesquisadora corresponde a um processo
complexo de construção, sendo a psicogenética o referencial explicativo,
representando uma constante reestruturação de esquemas. A investigação desse
processo complexo trouxe alguns indicativos de extrema importância para a análise
dos erros das crianças; esses, durante o processo de construção, passaram a ser
compreendidos a partir de uma análise pessoal, tendo em vista a singularidade de
tal processo. Assim,
Em uma visão construtivista o que interessa é a lógica do erro: trata-se às vezes de idéias que não são erradas em si mesmas, mas aparecem como errôneas porque são sobregeneralizadas, sendo pertinentes apenas em alguns casos, ou de idéias que necessitam ser diferenciadas ou coordenadas, ou, às vezes, idéias que geram conflitos que por sua vez desempenham papel de primeira importância na evolução. (FERREIRO, 2001, p.82)
Ferreiro, com a participação de Teberosky, construíram o projeto de
experiência com o propósito de descobrir qual era o processo de construção da
escrita, procurando situações em que a criança colocasse em evidência a escrita tal
como ela a visse, a leitura tal como ela a entendesse e os problemas, como fossem
propostos. Suas conclusões apontaram para quatro etapas básicas pelas quais a
criança passa em seu processo de construção e reconstrução da escrita:
a) Nível pré-silábico: caracterizado por uma busca de diferenciação entre as
escritas produzidas, sem a preocupação com as propriedades sonoras da
escrita. Nesse nível, a criança explora tanto os critérios quantitativos
(variar a quantidade de letras de uma escrita para outra para obter escritas
diferentes) quanto os critérios qualitativos (variar o repertório das letras ou
a posição das mesmas sem alterar a quantidade);
b) Nível silábico: caracteriza-se pela correspondência entre representação
escrita das palavras e as suas propriedades sonoras É a descoberta de
que a quantidade de letras com que se vai escrever uma palavra pode ter
58
correspondência com a quantidade de partes que se reconhece na
emissão oral;
c) Nível silábico-alfabético: a criança escreve parte da palavra, aplicando a
hipótese silábica de que para se escrever uma sílaba é necessária apenas
uma letra, e parte da palavra analisando todos os fonemas da sílaba;
d) Nível alfabético: caracteriza-se pela correspondência entre fonemas e
grafias. Existe a compreensão de que uma sílaba pode ter uma, duas ou
três letras.
A análise dos resultados coletados pelas pesquisadoras não indicou
procedimentos pedagógicos com que os professores deveriam se ocupar. Em
nenhum momento da pesquisa houve a preocupação em apresentar um suposto
“Método Construtivista”; no entanto, os resultados obtidos conduziram para uma
prática pedagógica pautada por uma compreensão do processo cognitivo de
aprendizagem, pela afirmação de Colello (2004):
As sucessivas hipóteses na conquista da escrita revelam, antes de tudo, o caráter essencialmente criativo da construção do saber. Por trás de cada produção incorreta e aparentemente aleatória, existe uma infinidade de concepções já formadas, de critérios inteligentes e de tentativas tão fecundas que, de algum modo, promovem a evolução. (COLELLO, 2004, p.31)
Pode-se afirmar que as pesquisas pautadas pelo entrelaçamento da
psicolinguística e da psicologia do desenvolvimento, desenvolvidas por Emília
Ferreiro e outros estudiosos da linguagem, representaram um marco divisor na
história da Alfabetização a partir do momento em que a aprendizagem da escrita
pôde ser compreendida como uma construção indicando um processo dinâmico, e
não linear.
3.2.1 Avaliação da aprendizagem da leitura e escrita a partir de uma concepção construtivista
A presença do erro em uma aprendizagem fundamentada pelas teorias
piagetianas passa a ser analisada de uma forma diferente. Ao invés de um
59
referencial externo, o que deve ocorrer é a compreensão de que o erro faz parte de
um processo de reconstrução de hipóteses, ou seja, de reconstrução de esquemas
interpretativos.
Quando se estabelece a existência de um saber próprio, construído de forma
individual, acredita-se que o conhecimento possa existir independente da
experiência escolar, principalmente ao ser reconhecida a possibilidade de a
construção da leitura e escrita ocorrer antes mesmo de a criança frequentar uma
instituição de ensino.
Partindo desse princípio, a avaliação consiste em acompanhar um processo,
investigando e explorando ideias e representações presentes durante o jogo da
construção da escrita, conforme explica Colello:
No jogo da construção da escrita, os dados convencionais (aquilo que os professores consideravam como sendo o correto) tornam-se mais ou menos significativos (possíveis), relevantes ou indispensáveis (necessários), ou até contraditórios (impossíveis) à medida que se chocam com imposições de caráter puramente pessoal. (COLELLO, 2004, p.37)
A necessidade existente no reconhecimento de concepções e hipóteses
presentes durante tal processo representa a possibilidade de intervenções do
professor; sendo assim, “avaliar a aprendizagem do aluno é também avaliar a
intervenção do professor, já que o ensino deve ser planejado e replanejado em
função das aprendizagens conquistadas ou não” (WEISZ; SANCHES, 2002, p.95).
Para Weisz e Sanches (2002), o primeiro passo para uma avaliação, dentro
de uma visão construtivista, consiste em saber que conhecimentos os alunos já
possuem; no seu entendimento, trata-se do mapeamento prévio dos alunos. Além
desse instrumento, há a necessidade de o professor buscar outro instrumento para
verificação, reconhecendo que o conhecimento não é construído igualmente, ao
mesmo tempo, e da mesma forma por todos.
Esse instrumento é a avaliação de percurso – formativa ou processual, como muitos a chamam feita durante o processo de aprendizagem Ela serve para verificar se o trabalho do professor está sendo produtivo e se os alunos estão, de fato, aprendendo com situações didáticas propostas. (WEISZ; SANCHES, 2002, p.94)
60
Weisz é uma referência para uma nova concepção de aprendizagem da
leitura e escrita no Brasil. Ao lado de outros autores, ajudou a elaborar orientações
didáticas ao professor alfabetizador, além de assessorar diversos programas de
ensino da língua, como o projeto atualmente implantado pela Secretaria de
Educação do Estado de São Paulo, o Projeto Ler e Escrever.
A autora, no entanto, enfatiza haver uma distinção clara entre situações de
aprendizagem e situações de avaliação.
[...] por que é tão importante ter claras as diferenças entre situações de aprendizagem e situações de avaliação? Porque, quando não há essa clareza, os professores acabam propondo atividades formatadas como de avaliação pensando que estão ensinando. Dessa forma, não fazem nem uma coisa nem outra. (WEISZ; SANCHES, 2002, p.95)
Uma observação acerca das afirmações anteriores remete a uma crítica a
partir da forma que fora expressa, pois a referência à necessidade de uma avaliação
formativa contraria seu distanciamento às questões didáticas. Tendo como base o
referencial teórico oferecido por diferentes autores, entre eles, Perrenoud (1999),
Hadji (2001), Saul (2006), Cappelletti (2001) e Abrecht (1994), a avaliação formativa
deveria ser pensada no âmbito da didática, pois dissociar avaliação formativa da
didática representa destituí-la do seu verdadeiro papel, ou seja, de acompanhar
aprendizagens para qualificá-la. Ensinar – Aprender – Avaliar fazem parte de um
mesmo processo de ensino e aprendizagem.
3.2.2 A sondagem como prática avaliativa
Um dos recursos indicados para avaliação em uma perspectiva construtivista
é a sondagem. Assim é chamada a prática de identificação de hipóteses que alunos
não alfabetizados possuem sobre a escrita alfabética e o sistema de escrita de uma
forma geral. De acordo com as orientações para essa prática, esse momento
representa uma oportunidade de os alunos refletirem sobre aquilo que escreveram.
A sondagem é realizada periodicamente; configura-se como atividades de
escrita envolvendo, num primeiro momento, a produção espontânea pelos alunos de
61
uma lista de palavras sem apoio de outras fontes escritas, podendo, ou não,
envolver a escrita de frases. São situações de escrita que devem ser seguidas pela
leitura do aluno daquilo que ele escreveu. Por meio da leitura, o professor observa
se o aluno estabeleceu ou não relações entre o que escreveu e o que leu em voz
alta, ou seja, entre a fala e a escrita.
As sondagens avaliativas, pelas orientações propostas, devem ocorrer no
início do ano letivo e ao final de cada bimestre.
O princípio da sondagem avaliativa, de acordo com teóricos que a colocam
como uma prática pedagógica distanciada da didática, não representa a
possibilidade de o professor, a partir da compreensão do que sabe um aluno,
oferecer situações propícias à aprendizagem.
Nesse sentido, avaliar passa mais uma vez a se caracterizar como
certificação e não como indicação de trajeto. A sondagem apenas reproduz uma
prática realizada por uma pesquisa que foi válida para compor um raciocínio
analítico. A análise dos percursos de aprendizagem, tendo em vista um referencial
cognitivo, está distante, no entanto, de se configurar como prática avaliativa,
conforme colocam Weisz e Sanches:
O conhecimento prévio é o conjunto de idéias, representações e informações que servem de sustentação para essa nova aprendizagem, ainda que não tenham, necessariamente, uma relação direta com o conteúdo que se quer ensinar. Conhecer essas idéias e representações prévias ajuda muito na hora de construir uma situação na qual o aluno terá de usar o que já sabe para aprender o que ainda não sabe. (WEISZ; SANCHES, 2002, p.93)
O resultado da sondagem, como a realizada pelos professores da rede
pública do Estado de São Paulo, reflete em um mapeamento das turmas. Nesse
mapeamento, os níveis vivenciados pelos alunos são indicados por cores, conforme
os registros apresentados em anexo. Ao mapear as turmas, a avaliação não atinge o
seu propósito maior de estar a serviço da aprendizagem. Pode-se ver a proposta de
um mapeamento refletindo resultados e não processos (ANEXO B).
Outra consideração a ser feita é sobre a dimensão do que se percebe em
uma sondagem. Há diversos elementos presentes em um processo de
aprendizagem da leitura e escrita que escapam ao ato de verificação de níveis de
62
escrita. Ao expressar um pensamento a partir da escrita de palavras ditadas por um
professor, a criança pode limitar seu conhecimento, ou até mesmo bloqueá-lo, em
função do propósito de uma atividade pré-concebida socialmente como parâmetro
de reconhecimento dos níveis adquiridos de aprendizagem por uma turma, uma
escola, uma diretoria de ensino.
A sondagem enfatiza a suposta evolução da escrita, mas não consegue
visualizar questões referentes às várias faces da comunicação, como a linguagem
oral, a interpretação de textos e a utilização de outros recursos linguísticos
envolvidos nesse processo. Muito além do reconhecimento do estágio de evolução
no processo de construção da escrita, o alfabetizador precisa reconhecer
possibilidades de intervenções; para tanto, há de compreender que a aprendizagem
plena não se escreve apenas com as mãos, mas com todo o corpo, com a história
pessoal, com as experiências vividas. Infelizmente, a sondagem não dimensiona
todas as situações envolvidas no jogo do aprender.
3.3 Compreendendo a aprendizagem da leitura e escrita sob o prisma da sociopsicolinguística
A aprendizagem da leitura e escrita entendida a partir de uma concepção
baseada em um modelo sociopsicolinguístico requer compreender o entrelaçamento
das ideias de Vygotsky, Luria, Bakhtin e Freire, como registram os diversos trabalhos
publicados.
O homem é um ser histórico e convive em uma relação social. Nessa
convivência, a linguagem assume papel primordial, não sendo possível
descaracterizá-la do seu contexto sócio-histórico-cultural.
Vygotsky e Luria atuaram em busca da construção de uma psicologia dialética
coerente com os conceitos marxistas. Aliás, a dialética permeia as pesquisas dos
autores citados no início do texto, as quais são referência ao estudo da linguagem
em uma concepção sociopsicolinguística. Nesse sentido, a linguagem, para ser
compreendida, requer pensar no seu significado. Jobim e Souza (2001), ao se
referirem a Vygotsky, registram que por trás de cada pensamento há desejos,
necessidades, interesses e emoções, fazendo com que a compreensão do que se
diz dependa substancialmente da interação do ouvinte com essa base afetivo-
63
volutiva, sendo a compreensão o resultado do nível de interação que os indivíduos
conseguem estabelecer entre o verbal e o extraverbal, entre a palavra e o afetivo-
emocional.
Dessa forma, a escrita e a leitura passam a representar um alto grau de
complexidade; a escrita representando o universo oral expressa problemas para sua
aprendizagem, pois a apropriação de seu uso deve compreender as relações
existentes entre o sistema e o mundo. Vygotsky enfatiza que para tal compreensão a
única abordagem possível é a observação da própria história do desenvolvimento
dos signos10.
Luria, inspirado por essa perspectiva de Vygotsky, tem como questão central
a compreensão de como a criança opera por meio dos signos, por uma leitura de
Azenha:
O próprio conceito de signo utilizado por Luria foi cunhado por Vygotsky e mostra a existência de uma dupla face nos signos: uma face externa, materialmente constituída, e uma face interna, de ação sobre o próprio usuário do signo Assim, signo é todo elemento possuidor de significado que artificialmente serve ao sujeito como apoio para funções psicológicas. (AZENHA, 1997, p. 64-65)
A investigação de Luria buscou explicar a face interna do signo, o seu
requisito principal para a utilização da escrita como recurso simbólico. Os signos não
são brotados na consciência; no entanto, a consciência é o resultado da existência
deles. Para Vygotsky, a palavra representa a gênese social da consciência; portanto,
a ideia de consciência passa a ser analisada como um contato do sujeito com ele
mesmo, sendo os signos ferramentas capazes de operar transformações
proporcionadas pela cultura.
Através da mediação existente nas relações humanas, os signos como
instrumentos culturais e sociais organizam processos mentais superiores no
indivíduo. Desse modo, admite-se a função simbólica da palavra. Dessa forma,
10 Entende-se por signo, de forma genérica, toda unidade de texto portadora de sentido, como por exemplo, a palavra. São instrumentos de comunicação.
64
O significado é fenômeno do pensamento apenas quando o pensamento ganha corpo por meio da fala, e só é fenômeno da fala na medida em que a palavra está ligada ao pensamento, sendo iluminada por ele. Portanto, a união palavra e pensamento é um fenômeno do pensamento verbal e da fala significativa. (FREITAS, 1994, p.94)
A relação entre pensamento e linguagem estudada por Vygotsky
dimensionaliza a existência do pensamento a partir da existência das palavras.
Especifica para a fala interior uma atividade intelectual afetivo-volutiva, difícil de ser
investigada, sendo operacionalizada pela semântica e não pela fonética. O contexto
dá à palavra um novo conteúdo. Já a fala exterior representa a tradução do
pensamento em palavras. A linguagem é identificada como o mais importante
esquema de mediação do comportamento humano.
Isto tudo significa que o desenvolvimento semântico da palavra está diretamente relacionado ao desenvolvimento da consciência, já que a palavra é o elemento através do qual o homem reflete a sua realidade, nos seus enlaces e relações. Logo, à medida que a palavra evolui, muda também a estrutura da consciência, seu caráter sistêmico, evoluindo, pois é a forma como o homem reflete a sua realidade. (BRAGGIO, 2002, p. 88)
A questão do significado não aparece apenas em Luria e Vygotsky, mas
também em Bakhtin. A análise feita por Bakhtin relaciona-se ao discurso ideológico
das palavras. Representa um questionamento a um contexto sócio-histórico e
ideológico. Na leitura de Freitas (1994):
Toda palavra procede de alguém, como também se dirige para alguém, constituindo o produto da interação do locutor e do ouvinte. Nesse sentido, toda palavra serve de expressão de um em relação a um outro Ao definir-me em última análise, estarei me definindo em relação à coletividade. (FREITAS, 1994, p.140)
Segundo Braggio (2002), Vygotsky, Luria e Bakhtin, a ideia de sentido é
ressaltada ao significado constituído às palavras pelos homens e entre os homens.
Tal concepção de significado conduz à existência de um leitor crítico e homem
consciente.
65
A análise que se pode fazer a partir de uma concepção sociopsicolinguística
representa admitir a existência de palavras presentes em relações sociais. Vale
ressaltar que em um contexto educacional, essa concepção prima pela construção
de mecanismos que favoreçam a aprendizagem da leitura e escrita. A ação de ler e
escrever palavras não pode acontecer distante do sentido e de significado.
Nesse aspecto, trazer Freire para esse contexto de discussão, conforme
fizera Braggio (2002), tem grande relevância, pois para o autor, o homem por meio
da palavra muda a si mesmo, dá outra dimensão à sua consciência, justamente
(porque é o homem) porque é capaz de discernir, de reconhecer que não existe um
mundo pronto e acabado, mas que por ele é continuamente criado e recriado. A
palavra é o veículo pelo qual o educando lê o mundo, reflete sobre ele, conscientiza-
se de seu papel.
Dentro da perspectiva sociopsicolinguística, a linguagem do aluno em um
contexto escolar deve ser respeitada. Sua cultura, seu meio social são incorporados
à instrução através da discussão oral ou de atividades escritas. Respeita-se o nível
de desenvolvimento de cada aluno, além de incentivá-lo a usar o que ele já sabe
sobre a linguagem escrita. Para Freire (1996):
Conhecer, na dimensão humana, que aqui nos interessa, qualquer que seja o nível em que se dê, não é o ato através do qual um sujeito, transformado em objeto, recebe, dócil e passivamente, os conteúdos que outro lhe dá ou impõe. O conhecimento, ao contrário, exige uma presença curiosa do sujeito em face do mundo. Requer sua ação transformadora sobre a realidade. Demanda uma busca constante. Implica em invenção e em reinvenção. Reclama reflexão crítica de cada um sobre o ato mesmo de conhecer, pelo qual se reconhece conhecendo e, ao reconhecer-se assim, percebe o “como” de seu conhecer e os condicionamentos a que está submetido seu ato. (FREIRE, 1996, p.27)
Reconhecer o direito da aprendizagem da leitura e escrita representa
oportunizar a inserção do indivíduo em uma sociedade em que possa se identificar
como sujeito de direitos e com capacidade de leitura de mundo, com possibilidade
de interpretação e reestruturação do mesmo.
66
3.3.1 Alfabetização e Letramento
Como foi descrito anteriormente, o processo da língua escrita está vinculado a
uma condição cognitiva e cultural. Há uma estreita relação entre a palavra com
representação social e a compreensão do sentido dessa palavra; para tanto, as
relações sociais favorecem tal compreensão, pois indicam valores presentes a um
contexto.
Nesse sentido, a discussão acerca do letramento torna-se imprescindível para
se analisar a aprendizagem da leitura e escrita em uma concepção social.
Atualmente, há uma grande discussão envolvendo as temáticas de alfabetizar
e letrar. Vários são os autores que discorrem sobre a temática, assim como são
vários os conceitos explorados. No presente trabalho, serão abordados estudos das
autoras Magda Soares, Ângela Kleiman e Silvia Colello. Em seus trabalhos, há
questões que registram pontos de referência para a análise desta pesquisa.
Segundo Soares (1999), as ações de alfabetizar e letrar se completam e
necessitam serem compreendidas separadamente, pois em cada uma dessas
situações, há particularidades que devem ser observadas na ação docente. Dessa
forma:
[...] teríamos alfabetizar e letrar como duas ações distintas, mas não inseparáveis, ao contrário: o ideal seria alfabetizar letrando, ou seja: ensinar a ler e a escrever no contexto das práticas sociais da leitura e da escrita, de modo que o indivíduo se tornasse, ao mesmo tempo alfabetizado e letrado. (Soares, 1999, p.47)
A autora discorre sobre a origem da palavra, definindo-a como uma tradução
para o português da palavra inglesa literacy, “o que significa o estado ou condição
daquele que não só sabe ler e escrever, mas também faz uso competente e
frequente da leitura e escrita” (SOARES, 1999, p.36).
Complementando o seu pensamento:
67
[...] a pessoa que aprende a ler e a escrever – que se torna alfabetizada – e que passa a fazer uso da leitura e da escrita, a envolver-se nas práticas sociais de leitura e de escrita – que se torna letrada – é diferente de uma pessoa que não sabe ler e escrever – é analfabeta – ou, sabendo ler e escrever, não faz uso da leitura e da escrita – é alfabetizada, mas não é letrada, não vive no estado ou condição de quem sabe ler e escrever e pratica a leitura e escrita. (SOARES, 1999, p. 36)
O simples fato de dominar o código da escrita não significa ler no seu sentido
mais amplo. O desafio posto nesse sentido remete ao fato de a escola se preparar
para a efetivação das duas vertentes analisadas: alfabetizar e letrar.
A aprendizagem do código é extremamente importante em uma sociedade
como a nossa, grafocêntrica; no entanto, como aplicar esse aprendizado? Como
fazer do seu uso condição para a leitura da “palavramundo”, como disse Paulo
Freire? A aprendizagem da leitura e escrita como busca de libertação não encontra
representatividade pelas instituições escolares.
Para Kleiman (1995), por sua vez, letramento pode ser entendido “como um
conjunto de práticas sociais que usam a escrita, enquanto sistema simbólico e
enquanto tecnologia, em contextos específicos, para objetivos específicos”. A autora
questiona a prática presente no contexto escolar ao privilegiar uma única forma de
expressão como sendo a percorrida, com o intuito de obtenção de sucesso. Afirma-
se nesse contexto:
Pode se afirmar que a escola, a mais importante das agências de letramento, preocupa-se não com o letramento, prática social, mas com apenas um tipo de prática de letramento, a alfabetização, o processo de aquisição de códigos (alfabético, numérico), processo geralmente concebido em termos de uma competência individual necessária para o sucesso e promoção na escola. (KLEIMAN, 1995, p.20)
Kleiman (1995) cita as pesquisas de Street sobre duas concepções de
letramento: letramento como modelo autônomo e letramento como modelo
ideológico.
O “modelo autônomo” de letramento explicitado pela autora representa a
lógica presente em uma escola tradicional. Nessa escola, o fracasso é de
68
responsabilidade do indivíduo que pertence ao grupo dos pobres e marginalizados
nas sociedades tecnológicas. Desconsideram-se, dessa forma, as linguagens
próprias, singulares do sujeito, pois o que se admite é a inserção num padrão único
de linguagem, elitista, em que sua não aprendizagem indica a não aquisição de um
padrão linguístico dominante. A linguagem oral passa a ser desprestigiada por uma
supervalorização do texto escrito. Todos esses fatores desqualificam esse modelo
por ser discriminatório.
Em oposição ao modelo autônomo de letramento, o “Modelo Ideológico”
oferece uma visão menos preconceituosa e mais crítica, destacando o fato de as
práticas de letramento representarem não apenas aspectos da cultura, mas das
estruturas de poder numa sociedade. Tem como base a natureza social e considera
a leitura e escrita como práticas sociais. Kleiman (1995) considera que a leitura e a
escrita fazem parte de atividades sociais, tais como ler um manual ou pagar contas.
Daí a importância de se encarar a leitura e a escrita não só como atividades com um
fim em si mesmas.
Em uma sociedade, encontram-se crianças que ao nascerem se deparam
com um universo rico de estímulos textuais. As manifestações referentes à aquisição
de leitura e escrita são encorajadas pelos seus familiares. Paralelo a esse grupo,
identifica-se outro, contrário, que não se reconhece como portador de identidade,
não é encorajado a inventar histórias ou contá-las. São crianças limitadas na
exploração dos estímulos de leitura e escrita. Quando as crianças de ambos os
grupos chegam à escola, percebe-se a existência de uma grande divisão; no
entanto, essa divisão deve ser compreendida no que se refere aos estímulos
recebidos; por outro lado, devem-se reconhecer nos dois lados quais as
possibilidades existentes para se desencadear a aprendizagem da leitura e escrita
para o encantamento da descoberta do mundo das palavras. Conforme aponta
Colello (2004):
Ao permitir que as pessoas cultivem os hábitos de leitura e escrita e respondam aos apelos da cultura grafocêntrica, podendo inserir-se criticamente na sociedade, a aprendizagem da língua escrita deixa de ser uma questão estritamente pedagógica para alçar-se à esfera política, evidentemente pelo que representa o investimento na formação humana. (COLELLO, 2004, p. 114)
69
A proposta de separar as análises sobre alfabetização e letramento
representa a possibilidade de se compreenderem algumas das razões do fracasso
escolar no ensino da língua escrita. Para tanto, a indicação de hipóteses a partir
desses estudos é apresentada por Colello (2004) em três vertentes de análise. A
primeira se refere às práticas letradas de diferentes comunidades, em que
experiências vividas pelos alunos são muitas vezes distantes do enfoque que a
escola costuma dar ao processo de aquisição da leitura e escrita. A segunda
considera a relação do aprendiz com as propostas pedagógicas muitas vezes
autoritárias, artificiais e pouco significativas. A terceira representa o mecanismo de
resistência por parte do aluno ao exercer um processo de negação de um mundo
que para ele não é o seu.
Nesse sentido, pode-se compreender que:
Na prática, a desconsideração dos significados implícitos do processo de alfabetização – o longo e difícil caminho que o sujeito pouco letrado tem a percorrer, a reação dele em face da artificialidade das práticas pedagógicas e a negação do mundo letrado – acaba por expulsar o aluno da escola, um destino cruel, mas evitável se o professor souber instituir em classe uma interação capaz de medicar as tensões, negociar significados e construir novos contextos de inserção social. (COLELLO, 2004, p.118)
Explorar as dimensões presentes na ação pedagógica, compreendendo a
existência das ações de alfabetizar e letrar como intrinsecamente ligadas, respalda a
necessária reflexão no ato de avaliar. Avaliação como ação dialógica representa um
elemento presente na busca de coerência de intervenções significativas.
Franchi (2008) narra em seu livro, “A redação na escola: e as crianças eram
difíceis”, uma experiência ocorrida na década de 1980, em que especifica uma
prática de letrar e alfabetizar quando na época ainda não se propagava, como nos
dias de hoje, esse desafio.
A primeira atitude tomada pela professora foi descobrir quem eram seus
alunos. Nesse momento, confirmou-se a existência de um grupo marcado por um
estereótipo de linguagem desconsiderado pelo universo escolar. A esse aspecto, a
autora relata:
70
Como entender a completa ausência de espontaneidade e de originalidade que os fazia quase voltar ao balbucio e os amarrava a esquemas estereotipados, preenchidos por uma dúzia de oraçõezinhas vazias de qualquer conteúdo expressivo? Entre as condições dessa decadência certamente estava a escola, com seus mecanismos repressivos, disciplinadores [...]. Vítimas dos padrões de avaliação dessa escola, os próprios alunos já não valorizam a si próprios: colocavam-se à margem da escola, mesmo dentro dela, sem qualquer estímulo para uma atividade criativa ou produtiva; eles já sabiam que eram “incapazes” ou “casos perdidos” e certamente rejeitavam interagir num sistema que não era para eles e que não tinha qualquer relação com a vida real. (FRANCHI, 2008, p.46)
Ao entender melhor o grupo, a referida professora buscou intervir de forma
significativa, não descaracterizando um modelo característico de linguagem,
tampouco indicando quem aprendia ou não aprendia; ela encontrou possibilidades
de atuar tendo em vista o modelo de aprender de seus alunos.
Neste ponto, devo extrair uma lição para mim mesma. Foi de importância decisiva para meu trabalho ter evitado, mesmo como base para atividades relativas ao desenvolvimento da linguagem escrita, um diagnóstico inicial estritamente (ou estreitamente) linguístico. Em outros termos, foi muito importante para mim não limitar a observação prévia, para o planejamento específico de atividade de linguagem, a uma pesquisa puramente estrutural, seja descrevendo, contrastivamente, diferenças lingüísticas. (FRANCHI, 2008, p.138)
A compreensão acerca da narrativa da professora denota o valor na crença e
na possibilidade do fazer pedagógico transformador, em que avaliar combine melhor
com libertar, libertar o poder de aprender.
3.3.2 Avaliação como prática de libertação
Uma concepção de ensino pautada por fundamentação sócio-histórica requer
se pensar uma prática avaliativa que esteja a serviço da aprendizagem, e que esta
se apresente em um espaço de construção dialógica. Durante a exposição feita até
o momento, o propósito maior foi o de contextualizar a prática de uma avaliação
formativa. Para tanto, tal prática deve ser compreendida como uma ação libertadora,
com o sentido emancipador. Para Saul (2006):
71
A avaliação emancipatória caracteriza-se como um processo de descrição, análise e crítica de uma dada realidade, visando transformá-la. Destina-se à avaliação de programas educacionais ou sociais. Essa está situada numa vertente político-pedagógica cujo interesse primordial e emancipador, ou seja, libertador visa provocar a crítica, de modo a libertar o sujeito de condicionantes deterministas. O compromisso principal desta avaliação é o de fazer com que as pessoas direta ou indiretamente envolvidas em uma ação educacional escrevam a sua “própria história” e gerem as suas próprias alternativas de ação. (SAUL, 2006, p. 61)
A palavra transformação presente na explicação acerca da avaliação
emancipatória representa o desejo maior dentro de uma concepção que entende o
homem como um ser social, capaz de uma leitura crítica e consciente de seu mundo.
A discussão sobre a possibilidade de transformação não distancia a avaliação
de uma ação pedagógica intencional. Acompanhar o processo de aprendizagem da
leitura e escrita requer que esse acompanhamento seja significativo, que a ação
dialógica presente do ato pedagógico seja constituída do sentido do que fazer. Para
essa discussão, uma concepção teórica valiosa sobre um princípio pautado por uma
atuação pedagógica consciente é encontrada em Cappelletti (2002):
Avaliação constitui-se em uma investigação crítica de uma dada situação que permite, de forma contextualizada, compreender e interpretar os confrontos teóricos/práticos, as diferentes representações dos envolvidos e as implicações na reconstrução do objeto em questão. Esse processo desencadeia uma intervenção intencional de estudos, reflexões, re-leituras, gerando nas ações, decisões um movimento de problematização e re-significação na direção de transformações qualitativas de relevância teórica e social. (CAPPELLETTI, 2002, p.32-33)
Trata-se de não se assistir “de braços cruzados” ao processo de construção
do sujeito aprendente, pois, por vezes, esse processo requer estímulos oferecidos
em uma relação mediatizada por estímulos presentes em uma ação pedagógica
significativa.
Para tanto, o avaliador não deve ser alguém distante de um processo, mas
deve indicar, quando necessário, possíveis caminhos que favoreçam a
aprendizagem. Segundo Calkins (1989):
72
É a coisa mais natural do mundo que um professor fique ao lado de um aluno, enquanto este trabalha, para a observação do que o aluno faz e não faz, com o material oferecido Ainda assim, a maioria dos professores é mais capaz de focalizar sua atenção sobre os produtos escritos finais do que sobre sua produção. (CALKINS, 1989, p.176)
A separação de ações como ensinar e avaliar não oferece as condições
necessárias para que professores deixem de apenas focalizar produtos finais. Saber
em que momento do processo de aprendizagem da leitura e escrita o aluno está de
nada adiantará se não se compreender o porquê desse aluno estar em um momento
ou outro; portanto, “como ação educativa inserida no projeto educacional, a
avaliação deixa de ser instrumento de fiscalização e passa a ser problematizadora
da própria ação” (CAPPELLETTI, 2001, p. 26).
A avaliação em uma concepção sociopsicolinguística não pode ser concebida
se não for relacionada a uma prática libertadora.
Nesse sentido, a ação do ensinar não pode estar distanciada do avaliar, e o
avaliar requer a compreensão ampla do como se aprende e, principalmente, o que
fazer para que se concretize de fato o aprender.
73
4 OS CAMINHOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA
A realização de uma pesquisa atende ao propósito de oferecer a uma
comunidade o resultado obtido por meio de uma criteriosa seleção de passos
compreendidos pelo pesquisador como necessários para desvelar a situação
indicada como problema. Até o momento, a exposição feita nas seções anteriores
objetivou a contextualização da problemática, envolvendo-a na temática da
educação brasileira, mais precisamente, referindo-se à prática de avaliar ocorrida
nas escolas públicas do Estado de São Paulo durante o período de alfabetização.
O referencial teórico abordado embasa a análise realizada atendendo à
referida investigação que foi pautada pela interpretação do conteúdo obtido por meio
dos dados coletados a partir da realização de entrevista semiestruturada.
Os dados interpretados têm como base desvelar na avaliação feita por
professores que atuam nas primeiras séries do Ensino Fundamental as intervenções
realizadas, identificando se tal prática suscitou, ou não, uma ação significativa para a
aprendizagem da leitura e escrita.
4.1 Proposta Metodológica
Com o propósito de uma análise reflexiva da prática de avaliação realizada
por professores alfabetizadores, o presente trabalho foi pautado pelo
desenvolvimento de uma pesquisa qualitativa. O que faz um trabalho interpretativo
ou qualitativo é questão de enfoque e intenção substantivos, e não de procedimento
na coleta de dados, isto é, uma técnica de investigação não constitui um método de
investigação (ERICKSON, 1989, p. 2-3).
A opção por essa categoria de pesquisa representa a possibilidade de
compreensão acerca da ação docente no que se refere ao ato de avaliar. Para tanto,
a simples leitura do que ocorre em uma sala de aula não registra o desvelamento de
ações e o porquê dessas ações.
74
Se, de outro lado, o pesquisador supõe que o mundo deriva da compreensão que as pessoas constroem no contato com realidade nas diferentes interações humanas e sociais, será necessário encontrar fundamentos para uma análise e para a interpretação do fato que revele o significado atribuído a esses fatos pelas pessoas que partilham dele. Tais pesquisas serão designadas como qualitativas, termo genérico para designar pesquisas que, usando ou não quantificações, pretendem interpretar o sentido do evento a partir do significado que as pessoas atribuem ao que falam e fazem. (CHIZZOTTI, 2006, p.27-28)
O ato de avaliar permeia qualquer ação docente; no entanto, a investigação
proposta requer a compreensão do uso da avaliação como possibilidade de
intervenções significativas à aprendizagem.
A sala de aula configura-se como um espaço mágico, um dinamismo
constituído através das interações humanas. Não há, portanto, razão para o
pesquisador optar por uma prática de pesquisa que não tenha o propósito de
interpretação dos dados, e esses devem ser coletados a partir da comunicação entre
pesquisador e professor alfabetizador por meio da sua prática pedagógica. Para
tanto, o suporte teórico apontado como referencial para subsidiar a avaliação como
prática libertadora e coerente com ações pedagógicas significativas norteará a
leitura a ser efetuada a partir da pesquisa.
A opção por uma pesquisa qualitativa reforça a ideia de uma relação viva
entre o pesquisador e o universo pesquisado. Os dados coletados estarão
carregados de manifestações emocionais, que deverão ser cuidadosamente
reconhecidas pelo pesquisador em suas análises; “esta relação viva e participante é
indispensável para se apreender os vínculos entre as pessoas e os objetos, e os
significados que são construídos pelos sujeitos” (CHIZZOTTI, 2006, p.84).
Uma prática de pesquisa qualitativa configura-se como uma prática válida e
necessária; de outro modo, seria difícil ao pesquisador encontrar elementos
representativos de ações humanas. Para Chizzotti (2006), os pesquisadores que
optam pela pesquisa qualitativa, ao se decidirem pela descoberta de novas vias
investigativas, não pretendem furtar-se ao rigor e à objetividade, mas reconhecem
que a experiência humana não pode ser confinada aos métodos nomotéticos por
não serem fatores regulares de uma análise sistêmica, tal como ocorre nas ciências
naturais.
75
A presente pesquisa envolveu a busca pela descoberta de significados no
fazer pedagógico, tendo em vista ações de avaliar e alfabetizar. A efetiva leitura
acerca de tais ações procedeu a partir da análise de conteúdo, ferramenta utilizada
como uma forma de interpretação dos dados presentes no texto obtido por meio da
entrevista realizada.
Para explicitação dessa leitura ressaltam-se as observações de Chizzotti
(2006):
[...] um texto contém sentidos e significados, patentes ou ocultos, que podem ser apreendidos por um leitor que interpreta a mensagem contida nele por meio de técnicas sistemáticas apropriadas. A mensagem pode ser apreendida, decompondo-se o conteúdo do documento em fragmentos mais simples, que revelam sutilezas contidas em um texto. Os fragmentos podem ser palavras, termos ou frases significativas de uma mensagem. (CHIZZOTTI, 2006, p.115)
Dessa forma, o procedimento utilizado para a interpretação teve como
objetivo extrair o sentido do texto por meio das ideias centrais que transitaram no
universo da investigação. Nesse sentido, a interpretação das respostas remeteu a
uma leitura aprofundada da mensagem emitida pelos sujeitos da investigação, não
se restringindo apenas ao que expressava o texto dito, mas também a partir de uma
leitura subjacente do mesmo, em que elementos de análise puderam ser
compreendidos na composição das categorias identificadas.
A seleção das categorias ocorre com base no entrelaçamento das respostas;
para tanto, vale ressaltar que ela não parte de posições sequenciais, mas envolve
uma teia de possibilidades, principalmente, pela ferramenta de interpretação,
fundamentando-se por uma prática em que o significado extraído resulta de uma
leitura atenta e criteriosa. A opção por uma proposta de pesquisa interpretativa, na
explicação de Erickson (1989), dá-se por três razões: pela abrangência possível, por
evitar a simples conotação quantitativa ou qualitativa e, principalmente, por centrar o
interesse da investigação no significado humano na vida social.
76
4.2 Critério de seleção dos sujeitos
O procedimento proposto para a presente investigação buscou a reflexão a
partir das respostas apresentadas pelos entrevistados. Nesse sentido, os
informantes deveriam encontrar liberdade e espontaneidade para expressarem
inquietações a partir de suas próprias práticas. Sendo assim, a entrevista foi pautada
por questões relacionadas ao foco presente na explanação teórica apresentada;
dessa forma, como aponta Triviños (1987),
É útil esclarecer, para evitar qualquer erro, que essas perguntas fundamentais que constituem, em parte, a entrevista semi-estruturada, no enfoque qualitativo, não nasceram a priori. Elas são resultados não só da teoria que alimenta a ação do investigado, mas também de toda a informação que ele já colheu sobre o fenômeno social que interessa, não sendo menos importantes seus contatos, inclusive, realizados na escolha das pessoas que serão entrevistadas. (TRIVIÑOS, 1987, p.146)
Tendo em vista a importância dos entrevistados, a coleta de dados realizou-
se em escolas públicas do Estado de São Paulo, na região que compreende os
municípios de Carapicuíba e São Paulo. Das três escolas escolhidas, foram
entrevistados oito professores que atuam na primeira série do Ensino Fundamental.
A opção por esse universo de análise se deu pelo projeto que embasa o
trabalho dos professores da rede pública do Estado de São Paulo, o Programa Ler e
Escrever.
O Programa Ler e Escrever teve início em 2007. Consta do seu histórico a
capacitação de educadores conjugada às diretrizes, conceitos, formato e materiais
de apoio que foram desenvolvidos para ações da iniciativa.
Sua implantação foi justificada pelo resultado apresentado por diferentes
avaliações realizadas11.
11 Dados obtidos em sistemas de avaliação, como os do Saresp 2005, indicaram que cerca de 20% dos alunos ainda não sabiam ler ao final do Ciclo I do Ensino Fundamental. Outros indicadores, como Inaf ou Pisa, mostraram que os alunos que conseguiram concluir o Ciclo II do Ensino Fundamental apresentavam dificuldades na leitura e compreensão de textos. Intervindo diretamente no cotidiano das escolas e das salas de aula, o Programa Ler e Escrever veio oferecer os instrumentos necessários para a mudança desse cenário (SÃO PAULO, 2008).
77
Vale ressaltar que a análise do projeto “Ler e Escrever” não constitui objeto da
presente investigação. O objeto do estudo é o trabalho realizado por professores
alfabetizadores e o modo como esses profissionais estão usando a avaliação como
parte integrante do trabalho pedagógico.
Para uma maior precisão no campo da análise proposta, os entrevistados
deveriam ter um tempo de docência superior a cinco anos; desse modo, poderia ser
explorada de forma mais precisa a dimensão de concepções de ensino e avaliações
realizadas.
As entrevistas ocorreram de forma individual, evitando assim
constrangimentos, e também para que o informante se sentisse à vontade para
expressar seu pensamento referente à avaliação que realiza.
Por se tratar de entrevista semiestruturada, as questões propostas deveriam
desencadear falas espontâneas, sendo extremamente necessário o uso responsável
da entrevista, possibilitando o comprometimento com o retorno aos entrevistados do
material que fora coletado, como também a análise acerca da coleta dos dados à luz
das teorias estudadas. Para o procedimento de análise, coube a classificação,
caracterização, compilação dos dados obtidos por meio do conteúdo expresso na
fala dos professores.
4.3 Procedimentos de coleta
O término do ano letivo é um período em que são realizadas as avaliações
finais. Nesse momento, os professores fazem uma leitura do trabalho realizado. Na
maioria das escolas, esse é um momento para o replanejamento. Partindo desse
pressuposto, talvez fosse esse o melhor momento para a realização da pesquisa,
pois o pesquisador partilharia um momento de reflexão docente. Após contato com
direções de várias escolas públicas localizadas nos municípios citados, apenas três
escolas mostraram-se abertas à realização da pesquisa. Ressalta-se que as
professoras investigadas possuem formação superior, trabalham em escolas com
resultados positivos e estão envolvidas com uma formação contínua.
78
O quadro 3 descreve o universo característico da pesquisa:
Quadro 3 – Dados dos entrevistados Fonte: Elaborado pela autora
4.4 Questões propostas: relevância à pesquisa
A entrevista semiestruturada, instrumento escolhido para coleta de dados,
envolveu uma relação pessoal entre pesquisadora e professora. Apesar de se
configurar como uma ação mais livre, não deixou de se pautar por cinco questões
básicas para análise. Ressalta-se, no entanto, que em algumas situações, pela
liberdade na exposição das ideias, outras questões poderiam ser objeto de análise;
porém, para uma melhor interpretação e configuração de um conjunto de ideias, as
questões norteadoras na entrevista foram as seguintes:
A) Como você avaliou seus alunos durante este ano?
A referida questão inseriu-se no contexto maior da pesquisa, quando o
pesquisador teve a concepção de avaliação presente nas ações pedagógicas e as
dimensões linguísticas exploradas pelas práticas.
PROFESSORA TEMPO DE DOCÊNCIA FORMAÇÃO
Professora 1 Mais de 18 anos Pedagogia
Professora 2 3 anos Cursa Pedagogia
Professora 3 Mais de 3 anos Pedagogia
Professora 4 Mais de 20 anos Pedagogia
Professora 5 21 anos Pedagogia
Professora 6 19 anos Superior (PEC)
Professora 7 23 anos Pedagogia
Professora 8 15 anos Pedagogia
79
B) Sendo a sondagem uma das formas utilizadas como instrumento de avaliação, como ela pode ser explicada por você?
C) Como são utilizados os resultados da sondagem?
Ao se falar sobre a avaliação aos professores alfabetizadores da rede pública
estadual, de imediato surge a palavra sondagem, pois se trata de uma indicação
metodológica proposta pelos dirigentes; sendo assim, boa parte da entrevista
configurou-se por essa conceituação.
D) Além da sondagem, que outras formas são usadas p ara avaliar?
Os dados coletados através dessa questão serviram como um referencial
valioso para identificação da atitude do professor alfabetizador e de situações de
intervenção que podem ser significativas ou não.
E) O que é avaliar?
A questão foi colocada com o pretexto de estabelecer uma comparação entre
a prática e a concepção teórica que a envolve. A partir das respostas foi possível a
interpretação do fazer pedagógico como um cumprimento de regras ou uma ação
consciente e reflexiva.
A análise das informações recolhidas através das entrevistas realizou-se a
partir da organização das respostas, por questão, na busca por fatos que
desencadearam interpretações discutidas, tendo em vista os objetivos propostos
para a investigação. Para tanto, foram extraídas as ideias centrais das respostas
dadas; logo em seguida, essas ideias foram agrupadas em diferentes categorias de
análise possibilitando a interpretação na intersubjetividade com a teoria.
Alguns documentos coletados durante as entrevistas foram utilizados como
um referencial a mais de análise:
• Mapa de Avaliações ( ANEXO B)
80
• Registros de avaliações (ANEXO C);
• Páginas de portfólios (ANEXO D);
• Ficha de Registro de Avaliação (ANEXO E);
• Registro de aluna pesquisadora (ANEXO F).
81
5 AVALIAÇÃO E ALFABETIZAÇÃO: ANÁLISE DO MATERIAL COLETADO
Em razão do término do ano letivo, os professores preparam seus relatórios
finais e fazem o balanço do trabalho realizado; em algumas situações, mostram-se
satisfeitos ou não com os resultados, tornando-se positiva a retomada do percurso.
Sobre essa retomada, vale ressaltar que é do interesse da pesquisa a prática
avaliativa dos professores alfabetizadores, de acordo com o universo explicitado
anteriormente, na seção que descreve a metodologia utilizada.
Em entrevistas semiestruturadas (APÊNDICE A), houve a coleta dos dados a
partir dos quais foi possível a interpretação de alguns aspectos significativos para o
intertexto: avaliação e alfabetização.
Como foi descrito anteriormente, a interpretação do conteúdo presente nas
falas não obedece a uma única ordem. Muitas vezes, encontram-se respostas em
diferentes situações que se cruzam, propiciando um universo amplo de
interpretação, oferecendo a possibilidade de uma análise crítica e favorecendo a
compreensão maior de uma mensagem por uma linguagem polifônica.
5.1 Avaliando o percurso de aprendizagem: uma interpretação de práticas
Como você avaliou seus alunos durante o ano?
As respostas a essa questão ofereceram três categorias para interpretação:
• avaliação como processo;
• avaliação como objeto de intervenção;
• sondagem como instrumento de avaliação.
A interrogação sobre como foi realizada a avaliação dos alunos resultou em
uma resposta comum: avaliar requer analisar o processo. Compreender avaliação
82
como processo pode indicar uma possível prática formativa quando se coloca a
avaliação a serviço da aprendizagem.
P 3 - Eu avaliei o processo, todo o processo, os avanços que os alunos têm
no decorrer do ano, sempre procurando fazer intervenções que achava necessário
naquele momento para ele avançar.
P 6 - Pra mim, avaliação é tudo isso. No dia-a-dia, em cada atividade que
você vai dando, à medida que você vai trabalhando, interagindo e ir dando um passo
à frente.
Ao se efetuar uma interpretação mais atenta acerca do discurso da prática de
uma avaliação contínua, deve-se pontuar que o simples fato de a prática de
avaliação ser contínua, não viabiliza a intenção de avaliação com o propósito de
intervenções significativas.
P 1 - Procuro avaliar sempre meus alunos, verificando se o que eu ensinei,
tentei transmitir, foi passado de uma forma que eles compreendessem.
P 4 - Avaliação tem que ser contínua.
Quando as professoras relatam uma forma contínua de avaliar, podem
registrar uma mudança de paradigma sobre avaliação; para tanto, essa ação não
pode se resumir em um momento específico, como um controle técnico, atendendo a
uma definição seletiva.
A avaliação educativa deve ser contínua. Os sistemas avaliativos convencionais acomodaram-se aos ritmos periódicos de avaliação em consequência da racionalidade programática e previsível própria dos sistemas de controle. As avaliações periódicas pressupõem a realidade previsível e programável em toda sua extensão. Por isso perdem o contato e o acesso às imprevisibilidades que, quase sempre, são o que melhor caracterizam os sujeitos, os grupos, as
83
instituições. O princípio da avaliação contínua não separa um tempo avaliável de outro não avaliável. (CASALI, 2007, p.20)
A indicação de uma prática contínua de avaliação na alfabetização representa
o rompimento com o “tempo” escolar, priorizando o tempo do sujeito aprendente. A
esse tempo não se estabelecem limites; no entanto, há um saber contínuo e é esse
justamente o que se pode avaliar.
P 3 - Tudo que o aluno faz para mim é progresso, é avanço.
P 6 - Eu avalio assim, eu não vejo o aluno pela prova.
As respostas discutidas até o momento apontam para a direção de uma
avaliação em que o percurso da aprendizagem é considerado. A essa afirmação,
vale à presente discussão uma observação sobre a forma de registro realizada.
Nesse sentido, o uso do portfólio de aprendizagem deve ser trazido ao presente
contexto, pois há um grande contentamento por parte das professoras ao
apresentarem o resultado nessa forma de registro, passando a ser este um recurso
válido para a leitura das aprendizagens.
O termo portfólio deriva do verbo latino portare (transportar) e do substantivo foglia (folha) e tem vindo a designar a pasta que contém desenhos, fotos, textos, pautas de música, seja de profissionais diversos ou de aluno. Emprestado do portfólio do artista, o conceito tem vindo a ser aprofundado e adotado no ensino elementar, secundário e superior. (NUNES; MOREIRA, 2005, p. 53)
Nos portfólios apresentados, há uma sequência de atividades realizadas
durante o ano, as sondagens.
P 6 - Como é o comportamento dele, como é que ele está progredindo. Eu
tenho isso muito firme comigo, então eu faço meu portfólio.
P 6 - Na última reunião, eu pego meu portfólio e dou as folhinhas para os pais
e falo: “Olha, quando a criança nasce, ela passa por vários estágios; ela primeiro
engatinha, depois ela anda, depois começa a andar de bicicleta”.
84
Ao ser introduzido o portfólio como instrumento de registro, vê-se a intenção
de acompanhar a evolução de uma aprendizagem; ressalta-se a essa consideração
o fato de os documentos observados apresentarem os resultados encontrados
através das sondagens.
Por meio do portfólio os docentes podem verificar os avanços significativos e as dificuldades; os alunos têm pontos de referência para localizar onde estão, onde podem chegar e como farão para conseguir isto; os pais e a sociedade podem compreender o que se passa na escola para então colaborar e aprender com a instituição. Documentando o que as crianças e os adultos fazem conjuntamente desenvolve-se a consciência e as consequências de suas próprias ações. (SILVA; LORIZOLA, 2007, p.128)
O caminho para uma avaliação formativa inicia-se quando avaliar está
diretamente ligado ao ensinar. A identificação de um processo faz sentido a partir do
momento em que se realizam intervenções significativas.
O segundo elemento extraído das respostas dadas relaciona-se ao sentido da
avaliação como possibilidade de intervenções.
P 1 - Quando eu percebo que a aprendizagem não foi de acordo com o que
eu queria, eu retomo aquilo que eu queria passar para poder avançar.
P 3 - Sempre procurando fazer intervenções que achava necessário naquele
momento para ele avançar.
P 5 - E a partir de observações você pode fazer as intervenções necessárias
no momento certo. Às vezes, você consegue fazer as intervenções com o aluno e
ele acaba entendendo.
Avaliar um processo de aprendizagem na alfabetização precisa ser
acompanhado de um fazer pedagógico que suscite aprendizagem, evolução.
O resultado de uma aprendizagem deve expressar mais do que um registro
periódico, mas um o que fazer diante do resultado. Para Perrenoud (1999), o
diagnóstico será inútil se não der lugar a uma ação apropriada. Uma verdadeira
avaliação formativa é necessariamente acompanhada de uma intervenção
85
diferenciada, que pressupõe meios de ensino, de organização do grupo aula, até
mesmo de transformações radicais das estruturas escolares.
P 8 - Os alunos trabalhavam em duplas de acordo com o estágio que se
encontravam: alfabético com alfabético e pré-silábico com pré-silábico.
A mudança na dinâmica das aulas foi favorecida pela avaliação, e por trás
disso, uma intenção clara de se concretizar a aprendizagem.
P 8 - É lógico que é um trabalho árduo, mas desde o princípio, quando recebi
essa sala da coordenação, é que começou o processo (o processo de ensino da
leitura e escrita).
Analisando-se o registro anterior, encontra-se no relato a dificuldade na
realização de uma avaliação formativa, ou melhor, no desdobramento de ações
significativas, tendo em vista os resultados encontrados em uma avaliação. Vale
lembrar que a questão posta nesse momento diz respeito a como se avaliou,
conduzindo algumas respostas diretamente ao avaliar e intervir. A prática em uma
opção de avaliar a serviço da aprendizagem traz dúvidas; encontram-se inúmeras
dificuldades para tal realização:
[...] a avaliação formativa constitui, em si mesma, uma problematização de numerosos e fecundos aspectos do sistema escolar estabelecido. Para poder ser praticada, deve gozar de um certo espaço resultante, por um lado, de uma tomada de consciência, por parte das instituições, da necessidade de certo “jogo” dentro do sistema, indispensáveis à sua própria existência, pois implica pessoas muito diversas; e por outro lado, dispor de iniciativa individual, gosto pela experiência e, poderia até dizer-se, de certa audácia aventureira. Mas tudo isto, para ser realista, à partida que tenhamos perfeita consciência do contexto em que nos encontramos. (ABRECHT, 1986, p.142-143)
Encontrar dificuldades na ação pedagógica representa configurá-la de uma
maneira reflexiva. Propor que aos alunos seja dado o direito de agir a partir do
86
objeto de conhecimento pode se caracterizar como um compromisso com uma
educação permitindo uma ação transformadora.
O mérito das práticas que tentam uma mudança na ação pedagógica não
pode impedir que se faça uma análise sobre a ênfase dada à aprendizagem da
escrita. Avaliar aprendizagem durante o processo de alfabetização requer uma
compreensão mais complexa dessa ação.
De qualquer forma, o que fica evidente é a complexidade da construção da escrita que, longe de ser um processo monolítico, de progressão linear, previsível e controlável pela ação pedagógica, constitui-se num emaranhado de funções cognitivas, que avançam sob diferentes aspectos da língua com base em concepções, hipóteses, erros construtivos, conflitos e a assimilação (total, parcial ou mesmo deturpada) de informações. Na progressão erigida pelo fazer e refazer, construir e reconstruir, agir e refletir, o jovem aprendiz é sempre convidado a considerar novos pontos de vista e novas possibilidades de produção ou de interpretação oferecidas pelo desequilíbrio cognitivo e pelo aprendizado. (COLELLO, 2007, p.32)
Definir a aprendizagem da leitura e escrita como um processo natural, como
mostra P8, indica um desconhecimento das complexas estruturas elaboradas
durante a aprendizagem.
P 8 - Eles se autoalfabetizaram. Veja bem que a partir de uma lista, eles
descobriram que conseguiam escrever outras palavras. Muitas vezes, eles nem
precisavam de mim, muitos deles. Eles mesmos olhavam e procuravam o nome dos
colegas. Queriam escrever fruta, “fru”, eu não trabalhei o “fru”, eu dei um texto, eu li
um texto para eles, a gente tem uma coletânea de textos.
O que existe por trás da percepção de uma criança sobre o universo da
aquisição da leitura e escrita? Tal complexidade deve ser compreendida para uma
ação que atenda às diversidades de aprendizagem.
87
No universo investigado, uma das professoras fez menção à oralidade; no
entanto, não foi identificado o registro dessa observação nos documentos
apresentados (ANEXO C).
P 7 - O Projeto, esse Projeto Ler e Escrever foi uma coisa que ajudou muito,
porque deu liberdade para estarmos trabalhando com as crianças aquela oralidade,
histórias e muita variedade de textos, foi onde as crianças tiveram aquela
desenvoltura para se expressar.
O documento curricular citado pela professora prevê a inserção de um
trabalho pedagógico que vá além de um modelo de ação apenas circunscrito ao
escrever, ou a uma escrita descontextualizada; a professora relaciona ação de
oralidade aos textos presentes do mundo infantil. Sabe-se, no entanto, que uma
proposta curricular, conforme cita Lerner (2002), supõe tomar decisões que afetarão
muitas escolas – todas as que pertencem a uma jurisdição. Nesse sentido, fazer
propostas que serão colocadas em prática em instituições muito diversas apresenta
problemas diferentes dos que se apresentam ao se orientar o trabalho de uma
escola ou de uma classe específica, já que é inevitável perguntar pela validade das
propostas para essa diversidade de situações, cujas especialidades nem sempre é
possível conhecer de perto.
Acompanhando o raciocínio anterior, tendo como apoio a exposição de Lerner
(2002), observa-se a citação do material de orientação pedagógica como um
avanço; ressalta-se, entretanto, a diversidade de ações a partir do documento
proposto como referência. Um item foi comum em todas as falas, cumprindo com o
proposto pelas orientações curriculares: a avaliação realizada pelos professores
alfabetizadores liga-se à prática da sondagem12.
12 De acordo com o Guia de Planejamento e Orientações Didáticas do programa Ler e Escrever, das Secretarias Estadual e Municipal de São Paulo, a sondagem é descrita como uma atividade que envolve, num primeiro momento, a produção espontânea de uma lista de palavras sem apoio de outras fontes e pode ou não prever a escrita de algumas frases simples. Essa lista deve ser lida pelo aluno assim que terminar de escrevê-la (SÃO PAULO, 2008).
88
A prática de avaliação realizada pelos professores envolve a prática da
sondagem. Ao contexto da presente discussão essa ação foi categorizada, pois não
se concebe, de acordo com a proposta indicada, avaliar durante o período de
alfabetização sem a realização da sondagem.
P 2 - Inicialmente, adotamos sondagem mensalmente. As crianças fazem a escrita
de um ditado de palavras e uma frase.
P 4 - Avaliação tem que ser contínua, por quê? Nós damos no mínimo quatro
sondagens por ano. Aquela sondagem obrigatória, para ver como o aluno se
encontra.
Um contraponto no que foi descrito anteriormente relaciona-se ao fato de a
sondagem ter dia e hora marcados, contrariando assim uma prática formativa.
Estabelecer como princípio de ação avaliativa um ritual marcado para identificar
hipóteses de escrita contraria uma ação formativa. Duas questões merecem
atenção: uma é a importância de uma atitude que mostre aprendizagens individuais,
e a outra mostra que só poderá ser efetuada uma leitura de aprendizagens se
houver um procedimento para tal.
P 6 - A cada dois meses tem uma avaliaçãozinha que é minha, eu e ele, cara a cara.
A gente chega, eu dou as palavras pra eles, e eles não têm como copiar de
ninguém, eu e ele, fala para mim como se escreve felicidade. Eu vou saber em que
hipótese a criança está; você começa a trabalhar em cima da hipótese dele.
A sondagem, partindo da exposição anterior, passa a se configurar como um
momento especial para a avaliação. Hadji (2001), ao expor obstáculos à emergência
de uma avaliação formativa, relaciona o fato da presença da certificação como uma
atividade de triagem científica, confirmando o modelo de uma prática pautada por
um propósito operatório. Nesse caso, o essencial é poder determinar tipos de erro; a
análise dos resultados será mais rica e útil se as informações retidas durante a
observação forem capazes de alimentar uma interpretação dos itens, dos erros ou
acertos dos alunos.
89
5.2 Analisando a prática da sondagem
Os relatos das professoras entrevistadas registraram a tendência de
privilegiar a prática da realização da sondagem como uma forma acertada de indicar
o aprendizado do aluno.
Curioso nessa questão é que as entrevistadas consideram o instrumento de
avaliação como um avanço, algo que trouxe enriquecimento aos professores
alfabetizadores; percebe-se nas falas uma satisfação por poderem visualizar, por
meio da ação, um crescimento profissional. Dessa forma, tornou-se imprescindível a
identificação de categorias rigorosas para a investigação e a interpretação.
Ao se proceder ao mapeamento das ideias centrais presentes no conteúdo
das respostas, foi possível estabelecer as seguintes categorias de análise:
• realização da sondagem com um formato único: ditado de quatro palavras
e uma frase;
• ação proposta com um propósito de construção;
• utilização dos resultados da sondagem como parâmetro para estratégias
de ensino;
• visualização dos resultados em registros formais: portfólio e mapas com
cores.
Os professores que atuam como professores alfabetizadores nas escolas
públicas do Estado de São Paulo são orientados a realizarem periodicamente uma
atividade avaliativa intitulada sondagem. O Guia de Planejamento e Orientações
Didáticas do programa Ler e Escrever, material publicado pela Secretaria de
Educação do Estado de São Paulo, considera a sondagem como uma espécie de
retrato do processo do aluno em um determinado momento. As explicações para se
proceder à atividade são colocadas da seguinte maneira:
• As palavras devem fazer parte do vocabulário cotidiano dos alunos, mesmo que eles ainda não tenham tido a oportunidade de refletir sobre a representação escrita dessas palavras. Mas não devem ser palavras cuja escrita tenham memorizado.
• A lista deve contemplar palavras que variam na quantidade de letras, abrangendo palavras monossílabas, dissílabas etc.
90
• O ditado deve ser iniciado pela palavra polissílaba, depois pela trissílaba, pela dissílaba e, por último, pela monossílaba. Esse cuidado deve ser tomado porque, no caso de as crianças escreverem segundo a hipótese do número mínimo de letras, poderão recusar-se a escrever se tiverem de começar pelo monossílabo.
• Evite palavras que repitam vogais, pois isso também pode fazer com que as crianças entrem em conflito – por causa da hipótese da variedade – e também se recusarem a escrever.
• Após o ditado da lista, dite uma frase que envolva pelo menos uma das frases da lista, para poder observar se os alunos voltam a escrever essa palavra de forma semelhante, ou seja, se a escrita dessa palavra permanece estável mesmo no contexto de uma frase. (São Paulo, 2008, p.34)
Toda essa orientação para a realização de uma sondagem com o fim de
avaliação transforma essa prática em uma ação mecânica. Citar o ditado de quatro
palavras e uma frase para explicar o propósito da atividade de avaliação desloca o
papel principal que permeia uma prática para uma simples situação corriqueira a
qual precisa cumprir o papel de revelar as hipóteses linguísticas definidas pelo
pensamento de um grupo de crianças.
Observando alguns dos relatos sobre a prática de aplicação da sondagem,
cabem algumas considerações referentes à raiz da sua aplicação, ou seja, como
ocorreu em uma pesquisa científica a tarefa primeira proposta por Ferreiro e
Teberosky de descobrir as hipóteses que a criança põe em jogo quando é desafiada
a pensar sobre sua produção de escrita.
P 1- [...] eu estou chamando cada aluno e verificando dentro de um grupo
semântico de palavras o quanto ele avançou no aprendizado.
P 3 - [...] a gente procura um campo semântico, brincadeiras, aniversário. A
última foi Natal. São palavras polissílabas, trissílabas, dissílabas e
monossílabas.
P 4 - [...] Então nós escolhemos quatro palavras: uma dissílaba, monossílaba,
trissílaba e polissílaba.
P 6 - A sondagem é assim, a gente pensa em quatro palavras. A gente não
pode falar as palavras de forma separada, por exemplo: fe-li-ci-da-de. A gente
fala a palavra no geral para eles e eles têm que escrever uma polissílaba,
91
uma trissílaba, uma dissílaba e monossílaba e uma frase com alguma palavra
que eu ditei.
P 7 - Essa sondagem, a gente costuma fazer, por exemplo, assim, um ditado
com o mesmo campo semântico.
Ao serem questionadas sobre a sondagem que realizam, as professoras
frisaram algumas questões julgadas importantes. Por que o campo semântico? Por
que as palavras diferentes na quantidade de sílabas? O que compreendem acerca
das aprendizagens com execução da tarefa? Essas indagações reforçaram a
afirmação sobre a forma mecânica presente nessa ação.
Percebe-se o cuidado das professoras em exporem a regra proposta na
atividade; contudo, não fica claro, pelos relatos apresentados, quanto tal rigor pode
suscitar em significados ao professor para compreender o pensamento de uma
criança frente ao objeto de conhecimento. Outra questão oferecida pelo formato
único da atividade é sua limitação para reconhecer o universo de aprendizagem
necessário para que a sondagem se constitua como uma proposta pedagógica
significativa.
A limitação percebida por meio desta pesquisa justifica-se no momento em
que uma avaliação se restringe a uma atividade formatada de escrita, ignorando, por
exemplo, o que pensa uma criança sobre a relação entre imagem e texto. Colello
(2004), ao definir as sucessivas hipóteses na conquista da escrita, expressa com
propriedade a existência de um caráter criativo presente na construção do saber.
Ainda afirma que:
Por trás de cada produção ‘incorreta’ e aparentemente aleatória, existe uma infinidade de concepções já formadas, de critérios inteligentes e de tentativas tão fecundas que, de algum modo, promovem a evolução. (COLELLO, 2004, p.31)
Qual o propósito de levar uma criança a uma situação especial e lhe pedir
para que proceda à escrita de quatro palavras e uma frase? Como pode pensar um
professor a partir de tal produção desprovida de desejo e magia?
Em nenhum dos relatos foi possível identificar a preocupação das professoras
em perceberem por meio da sondagem a concepção presente em uma produção. Ao
92
procederem às suas pesquisas, Ferreiro e Teberosky foram guiadas pela hipótese
de que todos os conhecimentos supõem uma gênese, ou seja:
[...] nos preocupamos em averiguar quais são as formas iniciais de conhecimento da língua escrita e os processos de conceitualização resultantes de mecanismos dinâmicos de confrontação entre as idéias próprias do sujeito, de um lado, e entre as idéias do sujeito e a realidade do objeto de conhecimento, de outro. (FERREIRO, TEBEROSKY, 1999, p.262)
Como foi pontuado anteriormente, não houve a intenção das estudiosas em
apresentar um roteiro de prática ao professor; todavia, suas pesquisas propiciaram o
deslocamento de como se ensina para quem aprende. Sobre quem aprende é o foco
principal da presente pesquisa. Neste momento da análise realizada sobre a prática
da sondagem, a primeira constatação válida como referencial de reflexão crítica é a
limitação da referida atividade de sondagem.
Ferreiro (1993) alerta sobre a utilização de instrumentos que possam refletir
de forma inadequada uma pseudonecessidade institucional de encontrar maneiras
que possam classificar crianças. Em nota de rodapé, a autora fez o seguinte registro:
A utilização dos resultados de pesquisa como ‘testes’ escapa à responsabilidade do pesquisador: eu não fabriquei nenhum teste de ‘quatro palavras e uma frase´; nem de análise das partes de uma oração escrita e, mesmo assim, usam-se no Brasil essas expressões para designar provas com fins diagnósticos. (FERREIRO, 1993, p.75)
O contexto ao qual se referiu Ferreiro (1993) na citação acima não remete à
prática da sondagem avaliativa como a proposta à rede pública do Estado de São
Paulo; porém, sua excessiva ênfase passou a ser questionada neste trabalho,
usando-se assim Ferreiro, por meio de sua citação, para respaldar uma análise.
O propósito de construção permeia a fala das entrevistadas; isso permite
reconhecer na prática de avaliação indicada pela sondagem uma postura
construtivista em que são apontados processos individuais no avanço das
aprendizagens.
P 1 - Todo mês eu faço um diagnóstico da minha sala para saber como anda
o aprendizado deles, no sentido de saber que avanço eles tiveram dentro da
93
proposta da Emília Ferreiro, o construtivismo, que é saber onde estão os
níveis de aprendizagem.
As pesquisas realizadas por Ferreiro e Teberosky (1999) tentaram elucidar
um processo singular de construção. Apoiadas pelas teorias piagetianas, elas de
fato apresentaram não simplesmente níveis diferenciados de escrita, mas a
complexidade relacionada a esse processo de construção. Deve-se levar em
consideração, compreendendo-se o processo cognitivo presente nessa construção,
que:
No desenvolvimento da leitura e escrita, considerado como um processo cognitivo, há uma construção efetiva de princípios organizadores que, não apenas não podem ser derivados somente da experiência externa, como também são contrários a ela; são contrários, inclusive, ao ensino escolar sistemático e às informações não-sistemáticas. Uma teoria completa do desenvolvimento infantil da escrita não pode deixar estes problemas sem solução. São exatamente estes problemas que adquirem um significado preciso e definido dentro do marco teórico da teoria de Piaget. (FERREIRO, 1989, p.21)
O valioso na compreensão da aprendizagem como um processo de
construção é justamente transformar a avaliação, ou a sondagem, ou outro nome
que possa ser dado, na possibilidade de entender o que há por trás de uma não
aprendizagem, que situações internas estão desencadeando os entraves da
evolução para a aprendizagem da leitura e escrita. A mesma professora que afirmou
a importância do trabalho como construção, apresentou um relatório em que são
pontuados apenas os níveis de conhecimento da escrita (ANEXO D).
A busca pela compreensão da aprendizagem individual indica, como se
percebe em P 4, um avanço no ensino da leitura e escrita, e é isso que a presente
pesquisa tem como dever pontuar.
P 4 - A sondagem é a que você descobre onde o aluno, em que ele está mais precisando. Por isso é importante a sondagem. Essa sondagem foi o que nos enriqueceu. Através dela, nós descobrimos a necessidade de cada aluno. Por isso, a sondagem é importante, porque através dela, eu sei o que meu aluno está precisando.
Cabe, entretanto, no relato acima, que se façam algumas observações acerca
da sondagem. Como foi visto, a sondagem representa a identificação de níveis
linguísticos diferenciados que as crianças de uma classe apresentam; portanto, as
94
marcas de escrita colocadas em uma sala não representam a ampla possibilidade
individual de uma criança. Nas palavras de Ferreiro (1993):
Algo que parece importante ressaltar é que, para mim em particular, e para outros colegas, o dado com o qual trabalhamos não é nunca a página que ficou marcada pelo ato de escrita de uma criança; o dado com que nos parece adequado trabalhar é um dado múltiplo que compreende: as condições de produção, b) a intenção do produtor, c) o processo de produção, d) o produto e e) a interpretação que o autor do produto dá a esse produto, uma vez produzido. [...] Geralmente não se pode dizer quase nada frente a uma única só escrita; é preciso cotejar uma série de produções escritas... (FERREIRO, 1993, p.82)
Quando se depara com a afirmação de Ferreiro (1993), pode-se perceber a
necessidade de ampliar as possibilidades avaliativas da sondagem. A discussão
sobre uma forma individual presente nos trajetos de aprendizagem deve ser
ampliada para outros elementos que não se reduzam apenas à identificação das
hipóteses de escrita, conforme os registros de P 5 e P 6:
P 5 - Os ganhos são que você verifica muito bem em qual hipótese seu aluno está, dentro das hipóteses que você criou a respeito dele através das observações. P 6 - Eu vou avaliar a hipótese dela, se ela está silábica, se está silábica alfabética [...]. Observando-se os registros em anexo (ANEXOS B, C e D), comprova-se uma
visão individual, porém simplificada, de observações. Retomando-se os relatos e
observando-se os registros, é possível encontrar uma avaliação reduzida à
identificação de hipóteses silábicas, o que pode ser visto sob um prisma individual
de avaliação, pois, apoiando-se na fala de uma das professoras entrevistadas, a
leitura realizada sobre a aprendizagem é muito individual; depende da observação
do professor.
P 5 - A sondagem é muito boa num caso desses, para o professor que trabalha ali observando. O professor que trabalha sem essa observação pode errar no conceito. Dessa forma, além de se reconhecer na sondagem sua limitação, pode-se
também encontrar disparidades sobre os resultados demonstrados. Mais uma vez, é
necessário certo cuidado ao se levantar uma posição única acerca da leitura feita
95
sobre o resultado apresentado em um mapa ou em um relatório simplificado
(ANEXOS C e E).
Um referencial de análise da construção individual ultrapassa os limites de
caracterização dos níveis de escrita. Nesse sentido, vale insistir para o cuidado de
rever os paradigmas dessa observação, principalmente quando se percebe uma
enorme confusão na definição desses níveis para caracterização de alunos:
P 7 - Aqueles alfabéticos vão fazer brincando, agora aqueles que estão pré-silábico e silábico, eles vão omitir algumas letras. P 8 - Então, geralmente, com os pré-silábicos e com os sem valor, eu ficava uma vez por mês, uma vez a cada quinze dias, eu estava fazendo a sondagem pra ver se eles vão evoluindo.
O aluno não pode ser considerado alfabético ou silábico; é preciso entender
que a expressão cabe à hipótese aceita por uma criança em um determinado
período.
A terceira categoria a ser analisada sobre a prática da sondagem como
instrumento de avaliação refere-se ao fato de as professoras compreenderem a
importância da utilização do resultado dessa prática como elemento precursor para
a organização e reorganização de estratégias de ensino. A definição de que é
possível, a partir da identificação das aprendizagens do grupo, formular atividades
para propiciar os avanços, deve ser entendida como um progresso proveniente da
prática da sondagem, apesar dos indícios de limitação e simplificação, como fora
afirmado anteriormente. Para uma melhor fundamentação nesta análise, vale
conferir fragmentos dos relatos validando um aprofundamento em seus méritos.
P 4 - Através dela, nós descobrimos a necessidade de cada aluno. A partir dali, eu vou trabalhar com meu aluno. Eu não vou chegar ao final do ano e falar assim: “passaram tantos, tantos conseguiram alfabetizar e tantas não conseguiram”, porque agora, com a sondagem, eu sei por que não conseguiram. Por isso, a sondagem é importante, porque através dela, eu sei o que meu aluno está precisando. Eu posso trabalhar.
Pelo relato anterior, fica a certeza de não se separar a avaliação da Didática,
ou seja, o propósito maior de uma situação de avaliação é justamente refletir sobre
uma prática que favoreça a aprendizagem do aluno. No que se refere à
alfabetização, não há uma receita que possa indicar qual o melhor procedimento a
ser adotado; porém,
96
[...] considerar os processos cognitivos envolvidos na construção da língua, buscando uma sintonia na relação entre o ensino e a aprendizagem, significa colocar o aluno como centro (meio e meta) da prática pedagógica. (COLELLO, 2007, p.34)
O reconhecimento da possibilidade de um trabalho diferenciado, suscitando a
aprendizagem de um aluno com uma hipótese de ensino mais primitiva, para os
professores entrevistados, só passa a acontecer por admitirem a sondagem como
fator principal na tomada da decisão.
P - 1 Ela serve para mim, para eu estar verificando como anda o aprendizado dentro da minha sala e que tipo de atividade eu tenho que passar, que estar propondo para eles, para poder suprir o que está sendo necessário naquele momento. A supervalorização a partir da realização da sondagem reflete na existência
de uma proposta concreta de ação. Quando a professora relata ser a sondagem dos
conhecimentos do aluno o fator principal para a realização de uma situação de
ensino diferenciada, atendendo às diferenças do grupo, essa situação pode ser
entendida como uma reorganização de funções em uma concepção de ensino
pautada pela construção.
Presencia-se a mudança na concepção de ensino na Escola Pública estadual;
porém, os professores compreendem ser o momento atual, por meio dos cursos e
orientações que recebem, o que está garantindo a aprendizagem para a
compreensão de uma prática que não despreza saberes, mas os respeita com
situações significativas às particularidades existentes.
P 6 - Tem um trabalho diversificado sendo realizado, atende a todos, mas não da mesma forma; cada um vai ao seu passo. Alguns precisam apenas de um tranquinho para ir, mas tem criança que ainda penou, mas teve uma evolução. P 4 - Há uns anos atrás, eu não conseguiria fazer essa sondagem. Hoje, a partir dos cursos que nós temos, dos encontros, das palestras, essa sondagem tornou-se muito importante para mim, para nós professores.
97
A dúvida que fica, pela consideração realizada anteriormente, é se realmente
foi a sondagem que mudou o trabalho dos professores ou se foi o entendimento
acerca de uma concepção de ensino.
Os professores são unânimes em afirmar a dificuldade existente no trabalho
que contemple as diferenças do grupo; apesar disso, estavam empolgados com os
registros que mostravam. Sobre tais registros, é que se encontrará mais um
elemento no conteúdo a ser analisado.
Outra mostra de satisfação do trabalho realizado encontra-se na
apresentação dos portfólios. O que contêm esses portfólios? As diversas sondagens
realizadas durante o ano letivo. As sondagens são apresentadas em uma ordem de
datas em que se pode perceber a evolução ou não dos níveis de escrita pelas
crianças.
A maior satisfação encontra-se no fato de se efetivar o registro de ações. A
prática do registro, infelizmente, não contempla o cotidiano das práticas pedagógicas
brasileiras. Professores alegam ser trabalhoso, que também possuem muitas outras
atribuições, não concebendo a ação de registrar; no entanto, ao se depararem com
o registro, pelo menos por meio das sondagens, há uma mostra de satisfação.
P 6 - Aqui eu vou vendo a evolução da criança. Olha que show este aqui!
Todas as professoras entrevistadas citaram os portfólios como mostra de
seus trabalhos. Algumas páginas estão anexadas a esta pesquisa pois representam
elementos valiosos ao presente trabalho. A este ponto, a pesquisa encontrou não na
sondagem o elemento de satisfação, mas na ideia de ver o resultado de um trabalho
ser registrado.
P 8 - Um outro cuidado que eu tinha era escrever como eles estavam; eu tive treze crianças que relacionei no meu relatório final; falta-me entregar o portfólio (para a coordenação); dessas treze crianças, foram essas três que me preocuparam. Quando eu fui olhar bem, com a vivência deles em casa... Um deles, em casa, era imaturidade total; ele acabou de fazer sete anos, então a mãe tem todo aquele mimo com ele, porque o pai acabou abandonando, foi embora, morar com outra pessoa. Ele sai às cinco horas da manhã, volta às nove. Dez horas da noite, ele já está dormindo. Então, ela não tem o contato, ela não tem aquele tempo hábil para poder estar com ele. Então ele ficava o dia inteiro na rua, quando dava meio dia e meia, ele colocava a roupa para vir para a escola.
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Essa fala da professora não aparece em seu registro; tais informações sobre
a criança se perderão. Em seu portfólio, consta um aluno que vivenciou uma
determinada hipótese silábica. No mapa da sala, aparece o nome de uma criança e
uma caracterização de cor. Sobre a prática da professora, a partir de sua
observação, os registros apresentados não poderão se materializar. Weffort (1996),
sobre a importância do registro, faz considerações de extrema importância:
Mediados pelo registro deixamos nossa marca no mundo. Há muitos tipos de registro, em linguagens verbais e não verbais. Todas quando socializadas historificam a existência social do indivíduo. Mediados por nossos registros, reflexões, tecemos o processo de apropriação de nossa história, a nível individual e coletivo. (WEFFORT, 1996, p.41)
Outra observação acerca dos registros se refere ao seu propósito primeiro, ou
seja, comunicar a outro uma informação, porém, que o outro possa ser interlocutor
em um diálogo. Como é bom saber que se mantém uma relação dialógica a partir de
observações, ao contrário de simplesmente se mapearem as informações, utilizando
cores diferentes e encaminhando as informações para a coleta de dados gerais que
podem não ser fidedignos.
P 3 - Eu acredito nessa diferença, você faz a sondagem, você fala, ele está silábico com valor, outro vem e dá outro nível. Eu acho delicado. Não existe uma camuflagem.
A professora, no relato acima, questiona a avaliação feita por considerar
possíveis interpretações a uma mesma produção. Apesar disso, como parte de uma
exigência das políticas públicas do Estado de São Paulo, os professores entregam
os resultados que seus alunos obtiveram à coordenação da escola, que se
encarrega de informar o resultado dos mapeamentos à Diretoria Regional de Ensino,
que, por sua vez, envia os resultados aos órgãos da SEE/SP.
P 6 - Aqui está o mapa da turma, este mapa é meu, mas o que vai pra secretaria é outro. Porque esse é o meu, fica comigo, o outro, eles são iguais. Quem está com a cor vermelha, é pré-silábico, quem está com a cor roxa ele é silábico sem valor, quem está na cor laranja ele é silábico com valor, azul é silábico alfabético e amarelo é alfabético. Como eu sei disso? No primeiro mês eu dei as palavras, ele escrevia... P 7 - [...] nós temos assim registrado (mostra do portfólio). Os alunos, em vermelho, não conseguiram ser alfabetizados. Por quê? Porque não me
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mostraram, não conseguiram memorizar as letrinhas, até as do próprio nome. Por exemplo, a Talita, eu pergunto: “Talita, seu nome começa com o quê?” E foi trabalhado. Foi trabalhado o alfabeto, foram trabalhadas as histórias, parlendas, cantigas, músicas e tudo que você pode pensar. Então, o que aconteceu com ela, ela não conseguiu memorizar as letrinhas, ela não deu valor para essas letrinhas, entendeu?
Não pode ser tão simples apresentar os alunos em vermelho apenas por uma
mostra de cores. O mapeamento por cores restringe a leitura da aprendizagem do
aluno, impedindo o reconhecimento de um pensamento que poderia ser superior ao
que está sendo mostrado, pois simplesmente a utilização do instrumento da
sondagem, na dimensão em que é adotado, não consegue exercer tal
reconhecimento.
Quando a professora tenta tecer uma justificativa para a não aprendizagem
de uma aluna, o registro feito mostra-se ineficiente, pois não consegue o registro
reflexivo de retomadas que poderiam ser realizadas. A simples observação de que
tudo foi feito para que a aluna aprendesse, mas ela não conseguiu memorizar as
letrinhas, mostra uma enorme confusão sobre o processo de construção dessa
criança, que não poderá ser elucidado por simplesmente estar reduzido a um mapa
de cores, fruto de algumas sondagens realizadas por solicitação de uma equipe
gestora. A validade de um documento de classe como instrumento de trabalho
significativo faz sentido quando:
A realização de um documento de classe leva o professor a: perceber quais são os seus critérios de avaliação; perceber que tipo de intervenção dirige a cada criança ou em cada situação (se estimula, facilita, observa o que ocorre etc.); constatar o que vê e conceitualizar (a partir do que sabe sobre as crianças). (TEBEROSKY; CARDOSO, 1993, p.64)
Durante o período em que esta pesquisa foi conduzida, algumas falas das
professoras entrevistadas contrastaram com o relato feito por escrito por uma aluna
pesquisadora13 (ANEXO F). No relato, a aluna registra o momento tenso envolvido
13 Aluno pesquisador é a designação feita aos alunos universitários que participam do Projeto Ler e Escrever. Durante um período, os alunos ficam envolvidos com a situação didática ocorrida em diferentes salas de aula das primeiras séries. Os alunos registram observações que julgam ser relevantes e apresentam ao professor orientador. Vale ressaltar não ser o propósito das investigações didáticas a pesquisa relacionada à avaliação.
100
na realização da atividade. O fato de a professora não perceber, pela sondagem
realizada, o progresso de seus alunos, fez com que ela se desesperasse, no caso
apresentado, chegando até mesmo a alterar o resultado para não mostrar um
resultado negativo numa escala que fora citada anteriormente.
O que podem representar os registros utilizados pelos professores
alfabetizadores tendo em vista as sondagens realizadas?
Pela exposição feita com base na leitura atenta do conteúdo presente nos
relatos referentes às questões três e quatro, houve o apontamento de outra situação
a ser analisada: a sondagem não representa o único instrumento de avaliação;
porém, quando as professoras são questionadas a respeito de como avaliaram seus
alunos, a primeira fala presente em todos os relatos é a sondagem.
No decorrer das falas, compreendem-se outras situações nas quais se
apoiam as professoras para suas avaliações; sobre essas formas será a próxima
análise a ser proferida. Para tanto, a questão da sondagem discutida amplamente
até o momento remete a um pensamento crítico acerca de uma prática travestida de
uma concepção de construção; no entanto, como está sendo realizada, pode ser
caracterizada como mecanicista e reducionista. Quanto aos registros, eles podem
ser caracterizados como um avanço, principalmente se forem válidos como
instrumentos de reflexão; registros que serão utilizados para se efetuar um diálogo
construtivo, e não constatações e aferições. Além disso, a ação individualizada em
que se caracteriza a prática de avaliação, seu processo contínuo, denota também
indícios de avanço.
5.3 Os diferentes instrumentos de avaliação utilizados por professores alfabetizadores
A questão norteadora para a presente análise foi obtida a partir das
indagações anteriores. Ao serem questionadas sobre como avaliaram os alunos
durante o ano, as professoras de imediato relacionaram a avaliação realizada com a
prática da sondagem, como fora discutido anteriormente. Apesar de a afirmação ter
sido direcionada principalmente a uma prática em que a sondagem se configura
como instrumento principal, foi necessário o questionamento acerca de outras
formas utilizadas para avaliar, além da sondagem. Com o propósito de identificar, na
101
prática avaliativa, questões referentes às intervenções pedagógicas, fez-se
necessário um desvelar de práticas envolvendo o cotidiano da escola pública do
Estado de São Paulo, no caso, nas classes de alfabetização.
As respostas à pergunta sobre outros instrumentos de avaliação utilizados
suscitaram um conteúdo de análise em que podem ser categorizados dois
elementos principais:
• utilização de provas como instrumento de avaliação;
• uso de provas como prestação de contas às famílias.
A primeira das questões levantadas relaciona-se à presença das provas no
cenário das escolas, nas turmas de alfabetização.
Pelos relatos, as professoras apresentaram a aplicação das provas como
sendo um momento necessário à prática pedagógica. Trata-se de uma elaboração
coletiva em que o grupo de professoras reunido pensa nas questões que comporão
a atividade.
P 1 - Fazemos outras atividades elaboradas pela equipe. P 2 - Também fazemos a avaliação bimestral que contempla os conteúdos do bimestre, usamos um texto de memória. P 3 - Nós fazemos uma prova bimestral, fazemos um provão. Nos reunimos, as colegas e montamos. P 4 - [...] tem também as provinhas, todos nós professores sentamos ali, montamos também essa provinha. A gente nem conta muito, porque é primeira. P 6 - A provinha é mais pra mostrar pra comunidade, o que interessa pra gente não é aquela provinha. P 8 - Não há provas, até teve, mas foi uma questão assim, como teve o SARESP; eu não faço, mas tenho colegas que fazem. Elas fazem questão de fazer a avaliação bimestral.
Os motivos podem não ser os mesmos; no entanto, a primeira análise a ser
feita diz respeito à importância que ainda assume o momento da prova durante o
período de avaliação. O que se cobra nessa atividade? Pelo relato de uma das
professoras, todo o conteúdo do bimestre. As mesmas professoras que
anteriormente citaram a sondagem como uma prática de construção aceitam a ideia
da realização das provas com muita naturalidade.
102
A lógica presente em uma escola que insiste na utilização de uma prova como
momento de avaliação é a mesma lógica proveniente do ambiente conservador em
que são perpetuadas práticas que remontam à história da educação. Como afirmam
Ronca e Terzi (1991):
Inserida neste monótono processo, a prova é, sem dúvida, um dos exemplos que temos. Ainda insistentemente vista como cobrança, ela passa a ser ocasião em que o professor, exercendo o papel de ‘dono’ de determinado conteúdo dado, vai simplesmente verificar o que o aluno aprendeu. Tal processo ocorre assim: o professor [...] dá o conteúdo durante o mês... o aluno o recebe... e na hora da prova o ‘devolve’ ao professor. Pronto, ponto final! Um fragmentado momento, sempre isolado e, principalmente, indicador do final de um processo. (RONCA; TERZI, 1991, p.15)
Ao se realizarem as provinhas, como afirmam as professoras, fica clara a
necessidade de um instrumento capaz de realizar a verificação de aprendizagem. A
questão maior não é a realização dessa atividade, mas por que, diante de tantas
mudanças, ainda prevalecem práticas que pouco contribuem para uma mudança na
concepção do aprender. Persiste nas escolas a imagem de que avaliação deva estar
contemplando um momento privilegiado no contexto das aulas. Apesar de não ser
colocada como prioridade, as professoras entrevistadas sentem a necessidade de
reunir o grupo para pensar nessas atividades. Para Perrenoud (1999), “o sistema
tradicional de avaliação oferece uma direção, um parapeito, um fio condutor;
estrutura o tempo escolar, mede o ano, dá pontos de referência, permite saber se há
um avanço na tarefa, portanto, se há cumprimento de seu papel”.
Confirmando-se a presença das provas como um momento privilegiado dentro
do período letivo, serão identificados, por meio dos relatos, os motivos presentes nas
justificativas das professoras: a prestação de contas às famílias e, em um deles, a
exigência colocada pelos exames do SARESP. Apesar de não ter permeado todas
as falas das entrevistadas, esse modelo de prova é um dos testes que atende aos
propósitos de avaliação indicados pelas políticas públicas; configura-se com uma
das preocupações para elaboração das provas como uma forma de treinar os alunos
para tal prática, como registra P 8:
Nós fizemos um simulado para o SARESP, eu fiquei apavorada. Faz de conta... Não viu a prova do SARESP? Então nós ficamos em cima do que contém o SARESP do ano passado, nós pegamos o conteúdo e pedimos para eles em forma de um simulado, de uma avaliação. Nós fizemos
103
exatamente a troca dos alunos, um com o outro. A professora A ficou na minha sala, a professora B na outra, etc. Na hora da avaliação teve aluno que chorou e não queria fazer. Veja bem, se for avaliar só por aquele aluno que ficou nervoso, porque a professora dele não estava ali, não tem como avaliar.
Como mudar uma prática, repensar uma ação, se há uma pressão imposta ao
professor causando uma ansiedade capaz de pensar na hipótese de treino para
realização de uma prova, a qual se traduzirá em um resultado que será mapeado
juntamente a outros instrumentos e, por último, irá se constituir em um gráfico
colocando a escola e, por sua vez, seus professores, em um ranking. Perrenoud
(1999) atrela a mudança da avaliação à mudança da escola; segundo ele,
transformar a avaliação radicalmente é questionar um conjunto de equilíbrios frágeis,
os quais não podem ser mexidos, pois se corre o risco de se desestabilizarem
práticas e funcionamentos, ocasionando para muitos uma confusão pedagógica.
Entre esses “muitos” citados por Perrenoud (1999) estão os professores; por
se sentirem presos aos fios de uma trama pedagógica histórica, apoiam suas ações
na ação de avaliar como sendo uma justificativa que devem aos pais.
P 4 - A gente nem conta muito, porque é primeira série, mas é bom porque a mãe gosta de ver como está na escrita, na produção na leitura, o que ele conseguiu aprender, a mãe gosta disso. Se a mãe chegar e achar uma provinha do aluno, é maravilhoso. As provas estão presentes na história de cada um, e não seria diferente com
as famílias. Uma prestação de contas sobre o trabalho realizado. Configura-se, para
muitos professores, como um tranquilizante aos pais sobre o trabalho realizado. No
entanto, fica muito claro que, se para os professores se trata de uma prática
necessária, como não seria para os pais. P 8 encontra uma forma diferenciada para
tratar o momento de reunião de pais:
Como eu vou avaliar só naquela prova? Não é desnecessário, mas eu não a uso como meio de avaliação, jamais usei, mesmo em uma terceira ou quarta série, nunca usei. Eu conto trabalhos, atividades que você está fazendo em sala de aula, como o aluno está desenvolvendo em sala de aula. Eu vou desse lado.
A professora, ao romper uma prática, não rompe o diálogo com as famílias,
mas busca uma mudança dentro do que considera ser um sentido que favoreça a
construção formativa da avaliação. Esse sentido pleno da avaliação da
104
aprendizagem, como afirma Luckesi (1998), “só será possível na medida em que se
estiver efetivamente interessado na aprendizagem do educando, ou seja, há que se
estar interessado em que o educando aprenda aquilo que está sendo ensinado”.
Outras situações presentes na ação de avaliar também devem ser
consideradas nesta análise; porém, as situações citadas não aparecem nos registros
de avaliação; fazem parte de uma fala que tende a supervalorizar a prática da
sondagem ou até as provas, e não expõe tão claramente a avaliação que possa
ocorrer nas discussões sobre as histórias, nos desenhos e gestos em que se
expressam conhecimentos além de letras, ou nas palavras soltas.
P 4 - Tem outras situações, por exemplo, contamos uma história, eles falam oralmente, então fazemos uma avaliação. Por exemplo, tem aluno com um vocabulário maravilhoso, inventa história, enriquece, expõe as idéias bem claras pra turma, ele sabe guardar os mínimos detalhes da história. Tem também as produções que nós pedimos para eles fazerem, as produções de texto, eles produzem.
Há produções dos alunos, como a professora afirma: “eles produzem”. As
produções não devem ser distanciadas da avaliação. Separar a didática da
avaliação deixa a impressão de que o fazer diário pouco ou nada vale para se
reconhecer o processo de aprendizagem dos alunos. Insistir em um período
privilegiado de avaliação representa a lógica.
Por muito tempo, a didática foi entendida como a “arte de ensinar”.
Compreendendo-se o processo de construção presente na ação de aprender, tendo
em vista a diversidade com a qual o professor tem que trabalhar, a didática deixa de
ser a simples arte de ensinar para se compreender como a “arte de ensinar e
aprender”. Para tanto, atender ao princípio de uma prática pedagógica em que
ensinar e aprender estejam interligados requer que uma lógica positivista14 de
avaliar seja ultrapassada. Para que essa prática seja ultrapassada, os professores
devem não apenas atender às decisões das políticas públicas de avaliação, mas
agir em conformidade com a crença de avaliar para ensinar, e não avaliar para
apenas efetuar um registro atendendo a um formato hierarquicamente definido por
uma instância superior.Como deixar de atender à lógica presente em uma política de
avaliação que insiste em caminhar na contramão de uma prática formativa, em que
14 Para Ronca e Terzi (1991), o positivismo admite unicamente o critério de verdade cientificamente provado, da experiência, dos fatos positivos, visíveis, sensíveis. Enredada nesse processo, surge a necessidade de prova objetiva, clara, mensurável ou quantificável.
105
os resultados são superiores ao processo; atendendo a essa lógica, professores
insistem em acreditar num processo com o pressuposto de eliminação de
camuflagens:
P 6 - Eu tenho que chegar para a criança e não posso falar para classe inteira. “Gente, vamos fazer a sondagem e cada um, pegue um papelzinho e vamos escrever o que eu falar”. Desta forma, eu não tenho o controle, não vou saber se o João copiou da Maria. Eu não vou saber. Eu tenho o controle se eu checar.
A análise feita sobre outros instrumentos utilizados pelas professoras
entrevistadas, além da sondagem, traz questões conflitantes, como a necessidade
de fazer uso de instrumentos com o pretexto de apenas verificar; há, no entanto,
indícios de uma prática diversificada caminhando para além da sondagem; porém,
uma forte pressão de diversas ordens impõe um constante retorno ao uso de provas
e outras formas de checagem. Nas palavras de Cappelletti (2005), “é preciso ir além
refletindo com os professores aspectos avaliativos da própria atividade e do
processo de aprendizagem”.
5.4 Avaliação e alfabetização: desvelando os sentidos de uma imbricada relação
A última questão feita às professoras entrevistadas foi como definir
avaliação, depois de todas as observações feitas. Pode parecer estranho que,
depois de outros questionamentos sobre como se avaliou, os instrumentos
utilizados, a pesquisadora ainda busque mais uma vez ouvir das entrevistadas uma
fala sobre avaliação. Na presente pesquisa, a questão permeia o interesse por
desvendar concepções presentes em uma ação muito imbricada aos processos de
ensino e aprendizagem envolvidos na alfabetização, independente da postura
tomada, mas o que está envolvido entre o acreditar e o fazer.
É indiscutível a presença da avaliação no contexto de sala de aula; porém,
por que e como se avalia? Qual a dimensão possível identificada pelos professores
ao procederem a essa ação? Avaliar, na medida em que se propõe um julgamento
sobre um fazer, não se distancia de um posicionamento singular. Não há
106
neutralidade nessa ação, nas palavras de Casali (2007): “em todo processo
avaliativo o sujeito avaliador está implicado, e com inevitável poder de indução”.
Para uma maior compreensão acerca do ideário de avaliação, perpassam
dois elementos de análise:
• avaliação como reavaliação de trabalhos;
• avaliação para certificação de aprendizagens.
Para Weisz e Sanches (2002), “avaliar a aprendizagem do aluno é também
avaliar a intervenção do professor, já que o ensino deve ser planejado e replanejado
em função das aprendizagens conquistadas”. Quando as autoras tecem tal
afirmação, colocam na atuação do professor a responsabilidade por administrar sua
proposta de ensino e dar conta de viabilizar a aprendizagem dos alunos.
Vale ressaltar que o professor, ao assumir certa postura frente à avaliação,
não o faz de forma individual, tendo em vista seu próprio desejo. Por trás de uma
ação pedagógica há uma série de questões que devem ser levantadas, ou seja, em
que contexto histórico e político se dá determinada ação. Sem contar que uma ação
pedagógica, incluindo a ação de avaliar, está ligada a crenças, ideias concebidas
por um professor ao longo de sua história. Em síntese, prever uma avaliação com o
foco voltado a uma análise de posturas de ensino requer um entendimento muito
além do que possa estar sendo mostrado. Analisando o relato abaixo, é possível um
melhor esclarecimento sobre essa questão:
P 1 - Avaliar para retomar o que não foi atingido dentro dos meus objetivos. Avaliar o trabalho que faço, uma avaliação do que meu aluno aprendeu para verificar o que eu não consegui passar da forma que deveria ter sido passado. Não aprenderam da maneira que eu gostaria, às vezes, optar por um determinado conteúdo, vejo o que a sala não pegou, vou ter que refazer isso, de uma outra forma para poder atingir os meus objetivos.
A palavra objetivos aparece várias vezes no relato. Infelizmente, não está
claro a que objetivos a professora está se referindo. Trabalhar avaliação tendo em
vista objetivos pode ser visto como um modelo que fora proposto por Tyler. Para
esse autor, conforme relatam Boniol e Vial (2001), a avaliação consiste
essencialmente em determinar em que medida são alcançados os objetivos do
currículo. Os objetivos gerenciam o que se quer, o visível esperado, atendendo
dessa forma a uma visão comportamentalista. Entretanto, identifica-se na fala da
107
professora um pensamento próximo a uma ação formativa. Há uma reflexão sobre o
fazer pedagógico, sobre o dever de ajudar na aprendizagem do aluno. Há o
reconhecimento de que a escolha por um procedimento de ensino pode ser revista
quando estiver equivocada. Os objetivos que são transcritos pela fala certamente
acompanham o ideal de um alfabetizador, ou seja, a aprendizagem competente da
leitura e escrita.
Caminhou-se muito para se entender que a aprendizagem ocorre de forma
individualizada para o cumprimento de um determinado planejamento tendo em vista
uma e que a medida tomada para ensinar pode não ser a mais assertiva; nesse
sentido caminha o desejo da professora em questão. No entanto, o conteúdo do
relato a seguir apresenta uma forte tendência proposta curricular ideal. A professora
querer rever seu trabalho não é o problema, mas sim, a cultura pedagógica que foi
introjetada por um modelo em que a garantia do ensino se efetiva quando são
alcançados os mínimos previstos por valores culturais dominantes expressos em um
planejamento.
P 7- Saber se ele aprendeu a ler, escrever e interpretar toda a linguagem nossa que a gente fala, os textinhos, ler e escrever, não fluentemente, mas o aluno saber interpretar aquilo que você propôs pra ele, você não elaborou uma proposta curricular? Um planejamento? Poxa vida, ele atingiu aquilo, às vezes ele tem o mínimo, ele não vai sair de uma primeira série sem escrever o nome, o nome da mãe, o próprio nome: “Eu sou fulano”.
Observando-se a fala de P 7 sobre seu conceito de avaliação, entende-se
bem o que representa avaliar para uma cultura pedagógica dominante, atingir um
mínimo. Mínimo de qual referencial? Para que sociedade esse aluno está sendo
formado? Encontra-se na fala uma boa vontade, porém, acenando para um
propósito de continuidade, e não de transformação, em que seja possível uma
investigação crítica, como propõe Cappelletti (2002), desencadeada por uma
compreensão e interpretação de uma situação problema, propiciando uma
intervenção intencional de estudos, reflexões, releituras.
P 2 - Avaliar não é bicho de sete cabeças, faz parte do processo de ensino, serve para reavaliar nosso trabalho.
A fala incisiva de P 2 remete a avaliação ao ato de ensinar, eliminando a ideia
de complexidade que a avaliação possa ter. A complexidade pode existir a partir do
108
momento em que se enxerga a avaliação relacionada à aprendizagem humana. A
esse respeito, como cita Perrenoud (1999):
[...] quando se fala de aprendizagens humanas:- não se dispõe nem de mapas completos, nem de teorias suficientemente fundamentadas para descrever o equivalente de uma ‘trajetória’, - menos ainda para calculá-la com precisão; não se sabe muito bem quem é o piloto: o aluno? O professor? Sempre há um piloto? – o objetivo está longe de ser sempre claro e estável, por não ser com freqüência objeto de consenso; - é raro perseguir um único objetivo de cada vez; [...] não é tão simples quanto em Astronáutica saber se o objetivo está verdadeiramente próximo, nem mesmo demonstrar que foi atingido... (PERRENOUD, 1999, p. 91-92)
Avaliar pode não se configurar como algo provido de certa dificuldade; no
entanto, para se reavaliarem as práticas, é preciso ter clareza do que representa
uma ação capaz de se inserir em uma complexa teia representada pela natureza
humana.
P 8 - Avaliar para mim é isso. Eu diria na questão da continuidade, no desenvolvimento da atividade que eu vou estar inserindo os três em um só, por exemplo, como eu vou ver se ele aprendeu. Quando eu estou avaliando.
A relação entre a ação de avaliar e a de ensinar pode ser percebida na fala
das entrevistadas. Na análise processada até o momento, a partir da quinta
interrogação feita durante esta pesquisa, ficou clara essa relação. Contraria um
pouco se a essa afirmação forem ligadas falas anteriores que previam um momento
especial, como no caso da sondagem. A possibilidade de se reverem práticas na
ação de avaliar, conforme cita Freire (1998), “implica numa prática docente crítica,
resultante do pensar certo, envolvendo o movimento dinâmico, dialético, entre o
fazer e o pensar sobre o fazer”.
O pensar sobre o fazer pedagógico na ação de avaliar a aprendizagem da
leitura e escrita apresenta um desejo por conhecer o que o aluno aprendeu, como
mostra P 2:
Nós gostamos de avaliar, a gente quer saber quando os alunos aprendem. Acabamos fazendo antes, pela ansiedade. Avaliar é você observar a criança no dia-a-dia, para você saber o que deu certo, o que deu errado. Não tem um dia.
109
A professora admite a importância de avaliar a todo o momento, afirmando
que o faz antes pela ansiedade, o que representa a necessária ligação entre avaliar
e ensinar, contrapondo o modelo de uma avaliação com data prevista. A professora,
em sua ansiedade, admite que avalia a todo o momento, independente do que é
previsto pela instituição. Por que avaliar? Não para mapear simplesmente, mas para
ensinar.
A leitura feita pela análise dos conteúdos expressos pelos relatos denota um
desejo de acompanhar a aprendizagem dos alunos, conseguindo ajustar as
aprendizagens para que de fato elas possam se constituir:
P 5 - Tem muito a ganhar com avaliação, você descobre como seu aluno aprende, como você tem que chegar junto dele, onde você garanta que ele aprende, isso é muito valioso para mim. Eu acho muito fantástico isso, porque eu sei como eu vou ensinar, quando eu quero atenção dele. Como minha avaliação é assim contínua, direta, então, por exemplo, eu falo “Gui”, presta atenção na comanda que a professora vai dar. Pelo olhar dele eu já entendi se ele conseguiu ou não. P 8 - Avaliar é o dia-a-dia, é poder ver o que o aluno está conseguindo desenvolver.
Em qual ponto ele está com dificuldade? A partir daí poder ajudá-lo. Avaliar para mim é isso. Eu diria na questão da continuidade, no desenvolvimento da atividade que eu vou estar inserindo os três em um só, por exemplo, como eu vou ver se ele aprendeu. Quando eu estou avaliando. Mas eu vou avaliar só uma vez? Não. Eu vou avaliando constantemente. Todo dia, qualquer tipo de atividade que eu dou, estou avaliando o aluno. Eu acho, tenho quase certeza que eu faria dessa forma. Avaliação, ensino, aprendizagem, um complementa o outro, eles não podem ficar separados.
Questionar o sentido da avaliação em uma prática pedagógica propicia uma
aproximação entre o querer e o fazer. Pode-se sentir a vontade expressa em uma
das falas citadas pensando avaliação com pretensão de acompanhar o
desenvolvimento do aluno; porém, a avaliação pode ser reduzida a uma prática
corrente no processo de alfabetização, a sondagem, quando esta deve ser um dos
instrumentos que poderão ser utilizados durante a avaliação, e não um sinônimo de
avaliar:
P 6 - Para me nortear no que vou fazer, pra saber como é que eu vou agir com aquela criança, essa sondagem pra mim é fundamental. Se eu não tiver essa sondagem como eu vou saber se a criança progrediu no próximo mês?
110
A referência à sondagem como sentido da avaliação mais uma vez denota um
reducionismo por não ser possível um pensar que vá além de um ditado de quatro
palavras e uma frase. O que é o mundo do sujeito que aprende? Desvelar diferentes
situações refletidas pela produção de alguém requer em primeiro lugar:
Respeitar a leitura de mundo do educando significa tomá-la como ponto de partida para a compreensão do papel da curiosidade, de modo geral, e da humana, de modo especial, como um dos impulsos fundantes da produção do conhecimento. (FREIRE, 1998, p.139)
O respeito à leitura de mundo do educando não se distancia da avaliação
refletida por uma prática reflexiva e transformadora. Foi justamente a compreensão
de como a avaliação pode se aliar a uma prática transformadora na alfabetização
que a presente pesquisa com base nos dados coletados tentou desvelar. Algumas
ponderações acerca da análise realizada serão pontuadas nas considerações finais.
111
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Foi convencido disto que, desde jovem, sempre marchei de minha casa para o espaço pedagógico onde encontro os alunos, com quem comparto a prática educativa. Foi sempre como prática de gente que entendi o que fazer docente. De gente inacabada, de gente curiosa, inteligente, de gente que, não podendo passar sem ética se tornou contraditoriamente capaz de transgredi-la. Mas, se nunca idealizei a prática educativa, se em tempo algum a vi como algo que, pelo menos, parecesse com um que-fazer de anjos, jamais foi fraca em mim a certeza de que vale a pena lutar contra os descaminhos que nos obstaculizam de ser mais. (FREIRE, 1998, p. 164)
O espaço pedagógico, o texto...
Ao iniciar este trabalho, chamei a atenção para a leitura de um texto
pedagógico. O procedimento para a realização de tal leitura teve como pressuposto
compreender e interpretar duas situações presentes a esse contexto: avaliação e
alfabetização.
O texto pedagógico é um organismo vivo; para entendê-lo, é necessário que
se entenda a formação humana. A formação humana que constrói esse texto não
sobrevive ao imobilismo, sofre pelo dinamismo desenfreado; mesmo sem a plena
percepção do movimento, há uma construção que se acomete pelas mudanças, sem
poder freá-las.
Sendo assim, o texto formado e que teve seus elementos desvelados
envolveu o cenário da prática de avaliação ocorrida durante o processo de
alfabetização. O entendimento sobre ações relacionadas às intervenções realizadas
teve em vista a avaliação da aprendizagem.
Retomando o que fora descrito anteriormente, esse texto se forma com
humanos, no caso, os professores, que, em suas atuações, são invadidos por um
processo que se impõe frente a uma engrenagem que teima em não parar. Por não
parar, surpreende, assusta; porém, por ser viva, não para.
112
O espaço pedagógico: lendo e compreendendo o texto. ..
Para se proceder à leitura do texto formado, foi necessário um
aprofundamento em questões de relevância teórica para dar sustentação à
interpretação e reflexão crítica que fora sendo conduzida por meio de uma pesquisa
de campo.
Nada teria sido possível sem o referido procedimento investigativo teórico,
pois não há compreensão no vazio. A leitura deve ser precedida de um mergulho
pleno em palavras traduzidas de sentido, para que possa servir de referência para
se proceder à ação dialógica. O diálogo entre a teoria e a pesquisa de campo
ofereceu sustentação para responder à seguinte indagação:
• A avaliação realizada por professores que atuam nas primeiras séries
do Ensino Fundamental está atendendo a um propósito formativo
indicando intervenções significativas na aprendizagem da leitura e escrita?
O primeiro passo a ser dado quando se está diante de um texto é
compreendê-lo. O referido texto foi compreendido a partir de um levantamento das
questões principais envolvidas na sua constituição. Essas questões ratificam a
ordem de movimento que persegue a realidade educacional, seja qual for a temática
proposta. De uma escola seriada, passou-se a uma escola em ciclos. De uma escola
de reprovação, passou-se a uma escola de progressão continuada. De um trabalho
cômodo no universo de uma sala de aula, passou-se a ver um “Estado Avaliador”
que impõe uma política pública que, dentre outras questões, ocupa-se em analisar
índices de aprendizagens.
Acompanhando essas mudanças, outras tantas foram apresentadas. Ensinar
a ler e escrever deixou de ter o apoio de uma cartilha com métodos mnemônicos
para se formar um ambiente alfabetizador, devendo este ser rico em possibilidades
de construção. Nesse percurso, em que foram propostas tantas mudanças,
encontra-se a avaliação. O que de novo pode oferecer uma prática tão necessária à
aprendizagem? A reconstrução de uma prática de avaliação redefiniu-se a partir do
dinamismo presente no contexto social, o que, para Franco (1993):
113
A redefinição da avaliação educacional deve ter como unidade de análise o vínculo indivíduo-sociedade numa dimensão histórica. Para isso, em primeiro lugar, é necessário conhecer a realidade social, e em especial a realidade brasileira; isso significa partir da descrição e identificação das desigualdades sociais decorrentes das diferenças de equilíbrio, nas quais se apresentam tanto para a totalidade de nossa estrutura sócio-econômica como para um de seus setores.(FRANCO, 1993, p.22)
Qualquer questão interpretada nesse texto deve ser analisada tendo o viés da
inserção de uma mudança no cenário da educação, no caso, na alfabetização.
Nesse cenário está o professor que, diante de tantas mudanças, exerce seu papel
com o desafio da concretização de um ensino de qualidade, com o pleno domínio de
competências envolvidas na leitura e escrita. Sem esquecer o dever de atentar às
questões inseridas em um universo da diversidade social, ele deve entender a
escola para a formação humana em um contexto que atenda às diferenças.
A realização da pesquisa de campo se deu em escolas públicas do Estado de
São Paulo. A escolha desse universo de análise validou-se por representar o cenário
de uma proposta pedagógica que se norteia por um Projeto que fora instituído tendo
em vista a “urgência em solucionar as dificuldades apresentadas pelos alunos de
Ciclo I com relação às competências de ler e escrever, expressas nos resultados do
SARESP 2005”, o Programa “Ler e Escrever”.
Deflagraram-se, por meio das avaliações institucionais, resultados negativos
de aprendizagem. O professor, um dos atores nesse processo, vê-se diante das
exigências colocadas para que os problemas possam ser resolvidos.
A leitura do texto formado mostrou professores com um discurso de avanço no
campo educacional, porém com práticas que, em algumas situações, transgrediam a
essência da teoria.
A proposta pedagógica apresentou aos professores uma ação alfabetizadora
que respeitasse as individualidades na aprendizagem, oferecendo o instrumento da
sondagem como prática de avaliação. Os professores atenderam exatamente ao
solicitado; realizaram o ditado de quatro palavras e uma frase. Ficaram felizes por
apresentar um registro, mostraram satisfeitos seus portfólios. Esse foi o texto, objeto
da leitura proposta.
114
O espaço pedagógico: interpretando o texto...
Utilizando-se o referencial teórico citado no início desta pesquisa,procedeu-se
à interpretação do texto formado pela prática docente envolvendo alfabetização e
avaliação.
A interpretação dessa leitura desencadeou o registro de uma situação em que
há uma confusão entre o que se quer fazer, o que se sabe fazer, o que se deve
fazer. Foi possível identificar o reconhecimento de uma prática alfabetizadora
embasada por uma tendência de construção. Quando os professores referem-se à
aprendizagem, a palavra processo é muito citada; no entanto, há uma ênfase
exagerada no contexto da escrita; são desprezadas, para efeito de avaliação,
situações relacionadas a outros elementos linguísticos, como leitura e oralidade. Há
um desconhecimento das diversas faces da alfabetização. O mais importante é
aplicar uma sondagem de escrita para mapear estágios de sua evolução.
Nessa situação, a fala que registra a aprendizagem processual limita a
possibilidade de entender a abrangência que permeia o processo. Não se registram,
por exemplo, situações que possam mostrar o desconhecimento ou conhecimento
dos alunos sobre a palavra, seu sentido, os possíveis desdobramentos ao se
aplicarem essas palavras em uma situação textual.
Fala-se muito em uma avaliação contínua; contudo, existe um momento
especial reservado ao ditado bimestral, assim como há o momento das provas
periódicas. Sendo assim, foi possível entender que para a concretização da prática
de uma avaliação formativa, é necessário entender melhor o sentido dessa
avaliação. Prega-se uma avaliação contínua; porém, nas palavras de Casali (2007):
Os sistemas avaliativos convencionais acomodaram-se aos ritmos periódicos de avaliação em conseqüência da racionalidade programática e previsível própria dos sistemas de controle. As avaliações periódicas pressupõem a realidade humana como realidade previsível e programável em toda sua extensão. Por isso perdem o contato e o acesso às imprevisibilidades que, quase sempre, são o que melhor caracterizam os sujeitos, os grupos, as instituições. O princípio da avaliação contínua não separa um tempo ‘avaliável’ de outro ‘não avaliável’. (CASALI, 2007, p.19-20)
115
Sobre o tempo avaliável, fica clara a sua existência, ao mesmo tempo em que
também se prioriza o elemento avaliador para uma autoavaliação do professor, que
teria sua importância se não fosse tão grande o receio de um resultado negativo por
parte do mesmo, por entender a presença do Estado Avaliador com seus indicativos
desencadeando medidas limitativas, como a própria premiação pelos resultados.
Mapeia-se o resultado do desempenho dos alunos após a realização da
sondagem, porém os mapas oferecem uma leitura não muito verdadeira. A verdade
sobre um estágio de evolução de escrita pode ser contestada; não há como, a partir
da realização de uma sondagem, ter um referencial exato para essa definição.
A sondagem, “vedete” da prática avaliativa, pode ser caracterizada como uma
prática reducionista e mecanicista nos moldes em que ela é realizada pelos
alfabetizadores das escolas públicas do Estado de São Paulo. A crítica não pode ser
entendida como a necessária realização da avaliação como diagnóstico de
aprendizagem, nem dos registros que devem ser procedidos, mas da forma como
está sendo desencadeada essa atividade.
A importância nessa prática de avaliação reside no fato de o professor
compreender o momento da aprendizagem do sujeito aprendente, identificando qual
a melhor atitude pedagógica a ser tomada a partir de tal compreensão. No entanto,
se a prática se configura como reducionista na leitura sobre as aprendizagens, não
suscitará situações que sejam de fato significativas.
A aprendizagem conseguirá ser significativa quando atender ao propósito do
reconhecimento de trajetórias individuais. Nesse aspecto,
A avaliação no contexto de uma aprendizagem significativa deveria ocorrer no próprio processo de trabalho dos alunos, no dia-a-dia da sala de aula, no momento das discussões coletivas, da realização de tarefas em grupos ou individuais. É nesses momentos que o professor pode perceber se os alunos estão ou não se aproximando dos conceitos e habilidades que considera importantes, localizar dificuldades e auxiliar para que elas sejam superadas através de intervenções, questionamentos, complementando informações, buscando novos caminhos que levem à aprendizagem. (SMOLE, 2009)
A interpretação do texto em que avaliação e alfabetização se fazem presentes
ofereceu a possibilidade da identificação de elementos primordiais que permeiam a
116
prática dos professores; porém, esses elementos precisam ser utilizados como
princípios de alteração, favorecendo a ação em consonância com o desejo e a
compreensão.
Escrevendo e reescrevendo o espaço pedagógico
Após a interpretação do texto proposto, algumas considerações devem ser
tecidas para a concretização de sua reescrita.
Em primeiro lugar, cabe explicitar o ideal de avaliação previsto pela presente
pesquisa, ou seja, o ideal de uma avaliação formativa. A presença de uma avaliação
que se suponha ser formativa deve ser emancipatória, libertadora. A prática de
libertação é possível quando é defendido o direito de aprender, aprender como
prática de transformação, de compreensão dos sentidos.
Os sentidos são diferenciados; dessa forma, para se compreender a
necessidade de uma avaliação libertadora, deve ser ampliada a dimensão da
aprendizagem da leitura e escrita. É necessário que a prática de uma sondagem
seja ampliada para além de quatro palavras e uma frase. Que essa atividade não se
restrinja a alguns momentos privilegiados no universo da ação docente. Que possa
ser concretizada a situação dialógica da aprendizagem. O diálogo pedagógico deve
ocorrer entre o sujeito que ensina e o sujeito que aprende a partir do momento em
que o âmbito de aprendizagem é formado por um encontro em que se reconhece no
outro o próprio ser, o ser pleno de possibilidades, reconhecendo no outro as
diferenças que possam torná-lo pleno na dimensão humana.
A segunda consideração se refere à identificação do desejo dos professores
de registrarem as aprendizagens dos alunos através dos portfólios que exibem com
tanta satisfação. Cabe à existência desse registro seu aspecto relevante; no entanto,
precisam ser redimensionados para um papel de intercâmbio de práticas; que as
marcas deixadas sobre as possibilidades do aprender sejam colocadas em um
formato mais reflexivo para a retomada de fato das práticas que suscitem um fazer
progressista.
117
Em terceiro lugar, requer-se entender o texto da avaliação como um intertexto
para a alfabetização. São textos que não se separam; um está diretamente
imbricado no outro. A separação dos dois contextos empobrece a prática docente,
transformando-a em uma prática esvaziada de sentido, como se pudesse orquestrar
uma série linear de ações, desprezando a rede existente nas relações de ensinar e
aprender.
A reconstrução desse texto poderá se concretizar com a verdadeira
compreensão do para que se aprende a ler e escrever.
O cotidiano da sala de aula representa um cenário em que se apresenta uma
diversidade cultural significativa para ser analisada pedagogicamente. Questionar o
ensino da leitura e escrita nesse contexto significa compreender o que se faz, para
quem se faz. A singularidade existente no ato de aprender indica o dever docente de
aproximar a aprendizagem da leitura e escrita ao encantamento, pelo fato de ser
desveladora dos muitos mundos existentes.
Quando se pensa um tempo da aprendizagem de uma criança, pensa-se em
um tempo para o professor repensar suas concepções, refletir sua ação à luz de
estudiosos que oferecem a possibilidade na formação do ser-leitor, escritor, que se
descobre, cria, retroage, interage com um mundo. Mundo que poderá ser lido por um
universo superior aos privilegiados do sistema escolar.
Aos olhos de muitos, essa é uma utopia. Ao se pensar a escola como a
possibilidade de ensinar a ler e escrever pela magia da linguagem, arquitetando uma
escola aberta aos desafios de um novo tempo, não se pode pensar que será utopia.
Acreditar na possibilidade do docente de aprender a enxergar o outro como alguém
que vive um processo único ao efetuar suas produções de leitura, escrita e tantas
outras.
Enquanto se acredita na incompletude do humano, visualiza-se a ação
docente com a propositura da criação de uma ação dialógica no ato de ensinar, em
que ensinar a ler e escrever não representará tão somente o ensino de regras que
poderão ser medidas por um avaliador; ler e escrever representará a possibilidade
de entender o mundo, desvendando o movimento das palavras vivas.
As marcas deixadas em um papel sob o formato de letras, palavras, textos, só
terão valor a partir do momento em que representarem marcas vivas. O que são
118
marcas vivas? A expressão manifesta de alguém. Transportar a outro algo que se
configura como o próprio autor por ser parte dele.
Entender a alfabetização como experiência significa oportunizar ao aluno o
direito de se representar como sujeito vivo, encontrando espaço através das
palavras, podendo trazer palavras para além de um artificialismo sem sentido.
Partindo desse princípio, é possível reconhecer na aprendizagem da leitura e
escrita um diálogo vivo. A ocorrência desse diálogo se deve ao fato de o homem se
constituir como um ser de encontros, estando num mundo em contato constante com
diversos elementos carregados de sentidos. A descoberta desses sentidos favorece
um crescimento pessoal. Não se pode existir em um mundo sem se interrogar sobre
ele, sobre si, sobre o outro.
A interpretação das interrogações é favorecida a partir das experiências
reversíveis, o ir e vir humano. A busca por uma verdade, desvelada a partir de um
encontro que possa se constituir com a prática de uma avaliação formativa,
libertadora. O reconhecimento no outro do ser de quem avalia.
Ensinar e aprender são processos vivos. A relação estabelecida através
dessa complexa rede de significações pressupõe oferecer o direito ao ser
aprendente da compreensão dos sentidos presentes em um uma realidade social,
histórica e cultural. Para tanto, há de se compreender nessas realidades a
possibilidade de uma vida plena, em que o direito de existir signifique um pensar
consciente sobre a presença do outro, sobre a existência do outro, a importância na
existência do outro, o reconhecimento da própria existência a partir da existência do
outro. O olhar o outro como um olhar de plenitude, de autorreconhecimento, de
alfabetização e de libertação.
119
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125
APÊNDICE A - QUADRO REFERENTE ÀS RESPOSTAS DAS PROFESSORAS
ENTREVISTADAS E RESPECTIVAS INTERPRETAÇÕES
Questão 1: Como você avaliou seus alunos durante o ano?
RESPOSTA IDEIA CENTRAL
P 1 - Procuro avaliar sempre meus alunos, verificando se o que eu
ensinei, tentei transmitir, foi passado de uma forma que eles
compreendessem. Quando eu percebo que a aprendizagem não
foi de acordo com o que eu queria, eu retomo aquilo que eu queria
passar, para poder avançar.
P 2 - Inicialmente, adotamos sondagem mensalmente. As crianças
fazem a escrita de um ditado de palavras e uma frase. A lista deve
pertencer ao mesmo campo semântico, uma polissílaba, trissílaba,
dissílaba, e monossílaba.
Durante as primeiras sondagens, as crianças ficam inseguras, nas
próximas elas ficam mais confiantes, não se sentem pressionadas,
ficam livres, não fazem a atividade sob pressão.
P 3 – Eu avaliei o processo, todo o processo, os avanços que os
alunos têm no decorrer do ano, sempre procurando fazer
intervenções que achava necessário naquele momento para ele
avançar. À medida que eu fazia a sondagem, eu observava que
ele ainda não tinha atingido, ou que faltava, se ele tivesse alguma
dúvida, quanto à escrita dele. A sondagem me dá condições pra
fazer novas intervenções, pra que eu programe algumas
sequências didáticas, para que ele possa estar avançando.
Sempre assim, indo e vindo, buscando passar, voltando, fazendo
novas intervenções, eu ia avaliando nesse ir e vir. Tudo que o
aluno faz para mim é progresso, é avanço.
P 4 - Avaliação tem que ser contínua por quê? Nós damos, no
mínimo, quatro sondagens por ano. Aquela sondagem obrigatória,
para ver como o aluno se encontra.
P 5 - Avaliação consiste em muitas coisas; primeiro, não só como
você está trabalhando com eles, verificando se eles deixam de
fazer uma certa atividade que você dá para eles, e sim,
Sempre verifica se o aluno aprendeu.
Retoma o que não foi aprendido.
Adota uma sondagem mensal.
Escrita de um ditado de quatro palavras
e uma frase.
Nas primeiras sondagens, as crianças
ficam inseguras; com o tempo, sentem-
se confiantes.
Avalia todo o processo.
Faz intervenções quando acha serem
necessárias.
Utiliza o procedimento de sondagem,
pois consegue condições para
intervenções e para programar
sequências didáticas.
Tudo que o aluno faz é considerado
progresso e avanço.
Avaliação contínua.
No mínimo, quatro sondagens por ano obrigatórias.
Avaliação consiste em muitas coisas:
• Como o professor trabalha
126
fazer uma certa atividade que você dá para eles, e sim,
observando e muito o desenvolvimento deles durante o ano todo.
Analisar questões como: se eles têm memorização, ou se eles
conseguem entender o que você está explicando. Cada aluno é
muito particular. Eu até comento com as meninas que professor da
1ª série é um professor fenomenal, pois tem que estar antenado
sempre, o tempo todo. Por exemplo, se eu explico uma atividade,
eu vou observar como vão esses alunos, porque hoje você tem
que observar uns e amanhã outros. De acordo com as atividades,
do que eu vou propor a eles, você vai observando se eles estão
entendendo, se estão interagindo, se está difícil, se não está. E a
partir de observações você pode fazer as intervenções
necessárias no momento certo. Às vezes, você consegue fazer as
intervenções com o aluno e ele acaba entendendo.
Pra mim, avaliação é tudo isso. No dia-a-dia, em cada atividade
que você vai dando, à medida que você vai trabalhando,
interagindo e ir dando um passo à frente.
P 6 - Eu avalio assim, eu não vejo o aluno pela prova. A gente dá
uma avaliaçãozinha pra ele, para mostrar para o pai, para
comunidade, pra mostrar pra escola que a gente trabalhou aquilo
naquele bimestre. Mas avaliar a criança é no dia-a-dia. Tanto é,
que a nota da prova não significa nada pra mim; aquele dia que
ele veio fazer a prova, podia ou não estar bem, com dor de
barriga, passando mal. Eu vou dar nota por aquela prova? Não. Eu
avalio diariamente. Como é o comportamento dele, como é que ele
está progredindo. Eu tenho isso muito firme comigo, então eu faço
meu portfólio. A cada dois meses tem uma avaliaçãozinha que é
minha, eu e ele, cara a cara. A gente chega, eu dou as palavras
pra eles, e eles não têm como copiar de ninguém, eu e ele, fala
para mim como se escreve felicidade. Eu vou saber em que
hipótese a criança está; você começa a trabalhar em cima da
hipótese dele. Tanto é, que eu estava com um alfabético no
começo do ano; no final do ano, eu tava com vinte e oito
alfabéticos e nenhum pré-silábico. Eu gosto dessa evolução, de eu
perceber o que antes eu não percebia, eu chegava no final do ano,
eu via que eles estavam bem, aí eu falava: “Meu Deus, como é
que eu vou fazer pra saber como foi a evolução? É como uma
mulher que está grávida: percebe a barriga crescer, mas não sabe
como está a criança. Comecei então a pensar e tive a idéia de
fazer um portfólio”.
Na última reunião, eu pego meu portfólio e dou as folhinhas para
os pais e falo: “Olha, quando a criança nasce, ela passa por vários
• Como o aluno trabalha
A partir das observações você pode
fazer intervenções.
Avaliação é no dia-a-dia, a cada
atividade que está sendo trabalhada, na
interação.
O aluno não é visto pela prova.
Avaliar é no dia-a-dia.
Uso do portfólio como registro de
aprendizagem.
Avaliação cara a cara, evitando o risco
de cópia dos outros.
Saber a hipótese de escrita do aluno.
Identificar evolução.
Apresentação do portfólio aos pais.
127
estágios; ela primeiro engatinha, depois ela anda, depois começa
a andar de bicicleta. Não tem os estágios que ela passa? Tem
criança que passa do primeiro estágio para o terceiro, tem criança
que segue todos à risca. Eu estou mostrando para vocês como é
que a criança chegou aqui e como é que ela está saindo”. O pai
tem uma visão clara de como é isso. Minha avaliação com relação
à criança é diariamente, principalmente nessa época de
sondagem.
P 7 - O Projeto, esse Projeto Ler e Escrever foi uma coisa que
ajudou muito, porque deu liberdade para estarmos trabalhando
com as crianças aquela oralidade, histórias e muita variedade de
textos; foi onde as crianças tiveram aquela desenvoltura para se
expressar. Aqueles textos que eles fazem de memória, as
cantigas.
P 8 - Eu avalio como nota dez, se não fosse nota dez, que nota eu
daria para eles? Porque eles se autoalfabetizaram. Veja bem que
a partir de uma lista eles descobriram que conseguiam escrever
outras palavras. Muitas vezes eles nem precisavam de mim,
muitos deles. Eles mesmos olhavam e procuravam o nome dos
colegas. Queriam escrever fruta, “fru”, eu não trabalhei o “fru”, eu
dei um texto, eu li um texto para eles, a gente tem uma coletânea
de textos. Se ele queria escrever, ele ia até o texto, na lista, se ele
não achasse na listinha dos nomes dos colegas, ele ia olhar na
lista de frutas, então automaticamente, se você olhar na sala, tem
os cartazes. Automaticamente, eles iam olhar na lista, eles
memorizavam onde estava a sílaba “cho”, por exemplo, a lista de
frutas, a lista dois. Eles iam lá e começavam: “lista de frutas”, eles
já sabiam como iam escrever as palavras. É lógico que é um
trabalho árduo, mas desde o princípio, quando recebi essa sala da
coordenação, é que começou o processo. Nós saíamos roucas,
você fala o tempo todo com eles, é o tempo todo falando, o tempo
todo, eles em duplas, eles não fazem atividades sozinhos, aquela
questão da atividade produtiva, ou seja, não adianta pegar um pré-
silábico e colocá-lo com um alfabético. O alfabético não tem
paciência, ele vai fazer, pra falar: “vai lá e leva pra professora ver
que está pronto”.Então, os pré-silábicos eu deixava juntos.
Avaliação é realizada diariamente.
Projeto Ler e Escrever oferece condições
para as crianças desenvolverem a
oralidade.
Uso de histórias, textos, cantigas.
Alunos se autoalfabetizaram.
Os alunos têm liberdade de procurar
fontes com palavras que querem
escrever.
Um trabalho árduo.
Atividade produtiva.
Os alunos trabalhavam em duplas de
acordo com o estágio em que se
encontravam: alfabético com alfabético
e pré-silábico com pré-silábico.
128
Questão 2: A sondagem é uma das formas utilizadas c omo instrumento de
avaliação. Como ela pode ser explicada por você?
RESPOSTA IDEIA CENTRAL
P 1 -Todo mês eu faço um diagnóstico da minha sala para saber como
anda o aprendizado deles, no sentido de saber que avanço eles
tiveram dentro da proposta da Emília Ferreiro, o construtivismo, que é
saber onde estão os níveis de aprendizagem.
É um trabalho individual, entre professor e aluno, eu elaboro a
atividade pra sala no geral e vou pegando um por um. Naqueles
momentos em que eles estão fazendo uma cópia, alguma coisa que os
mantenham ocupados, eu estou chamando cada aluno e verificando
dentro de um grupo semântico de palavras o quanto ele avançou no
aprendizado.
É um diagnóstico.
P 2 - A sondagem não tem o sentido de avaliação; é um momento
especial. Também fazemos a avaliação bimestral que contempla os
conteúdos do bimestre, usamos um texto de memória.
P 3 - É individual, são palavras, a gente procura um campo semântico,
brincadeiras, aniversário. A última foi Natal, tem um campo semântico.
São palavras polissílabas, trissílabas, dissílabas e monossílabas.
P 4 - Na maioria das vezes, nós seguimos um roteiro que a gente deve
trabalhar com os alunos. Então nós escolhemos quatro palavras: uma
dissílaba, monossílaba, trissílaba e polissílaba. Não importa se o aluno
sabe escrever ou não. Ele sabe que já tem que estar dominando
alguma coisa. Depois uma frase com uma das palavras. Nós vamos
ver; fazemos a primeira avaliação.
A sondagem é a que você descobre onde o aluno, em que ele está
mais precisando. Por isso é importante a sondagem. Essa sondagem
foi o que nos enriqueceu.
Há uns anos atrás, eu não conseguiria fazer essa sondagem. Hoje, a
partir dos cursos que nós temos, dos encontros, das palestras, essa
sondagem tornou-se muito importante para mim, para nós professores.
Através dela, nós descobrimos a necessidade de cada aluno. A partir
dali, eu vou trabalhar com meu aluno. Eu não vou chegar ao final do
ano e falar assim: “passaram tantos, tantos conseguiram alfabetizar e
Diagnóstico mensal.
Saber níveis de aprendizagem.
Proposta de Emília Ferreiro,
construtivismo.
Trabalho individual entre aluno e
professor.
Atividade geral para sala.
Verificação dentro de um campo
semântico.
Diagnóstico.
Sondagem não tem sentido de
avaliação.
Também faço avaliação bimestral com
texto de memória.
Atividade individual entre aluno e
professor.
Palavras polissílabas, trissílabas,
dissílabas e monossílabas.
Sigo um roteiro e escolho quatro
palavras.
Não importa se o aluno sabe escrever.
Depois uma frase com uma das
palavras.
A sondagem é importante porque você
descobre o que o aluno está precisando.
Nos enriqueceu.
Aprendi a realizar a sondagem com
cursos, encontros, palestras.
Descobrimos a necessidade de cada
aluno.
129
tantas não conseguiram”, porque agora, com a sondagem, eu sei por
que não conseguiram. Por isso a sondagem é importante, porque
através dela, eu sei o que meu aluno está precisando. Eu posso
trabalhar. É mais complicado, é mais difícil? É. Mas eu acho assim,
educador não é só a nota da prova. Tem que dar uma atividade, ver o
que pode ser melhorado. Educador é estar somando tudo que veio a
partir do aluno, tudo que o aluno consegue aprender. Para nós é um
presente, porque no final do ano a gente fica com um sorriso assim.
Quase todos terminaram o ano alfabetizados. A sala tem trinta e seis
que foram. Tenho o caso de inclusão, é impossível, impossível assim,
tenho de trabalhar mais alguns anos. Assim de imediato, ele conseguiu
avançar. Por isso que eu estou feliz, porque eu descobri a necessidade
dele, onde buscar o recurso pra que ele avançasse, então trinta e dois
ficaram alfabetizados, com esse caso de inclusão, e dois casos que
vieram transferidos agora de fora, que fiquei impossibilitada e de...
lógico, eles melhoraram, mas é isso, por isso a gente fala que a
sondagem é fundamental. Para o professor é cansativo porque você
tem que pegar uma criança, levá-la para sua mesa e falar para ela:
“Olha, presta atenção! Você vai escrever do jeito que sabe, não precisa
achar que está, do jeito que você está”. Aí você percebe que a criança
tem confiança, ela coloca o eu dela pra fora e escreve. A partir dali,
você vai usar sua estratégia pra que ela chegue ao final alfabetizada.
P 5 - Os ganhos são que você verifica muito bem em qual hipótese seu
aluno está, dentro das hipóteses que você criou a respeito dele através
das observações. Eu acredito muito que essa sondagem não é
suficiente para você avaliar se o seu aluno é bom ou não.
Eu comento muito com as meninas que nós fazemos a sondagem
individual de um aluno; então o aluno está lá, não faz nada na sala,
brinca não quer fazer nenhuma atividade mesmo você estando lá
trabalhando com ele. Aí, você chama o pai, chama a mãe, conversa e
explica, fala das regras dentro da sala de aula, as normas que tem e
diz que o aluno insiste em não fazer as atividades propostas. Na hora
da sondagem, este aluno se apresenta alfabético, ele lê e escreve,
mas não faz nada. Quando você apresenta seu mapa, dá a entender
que é uma criança alfabetizada, porém isso não condiz com o
comportamento dele em sala de aula.
Às vezes, existem alunos assim, são excelentes alunos observadores.
Tudo o que você propõe ele desenvolve. O professor trabalha como
eu, observando. A gente sabe se esse aluno só copiou, se faz uma
Com a sondagem sei por que não
conseguiram.
Educador não é só nota da prova.
Dar atividade, ver o que pode ser
melhorado.
É um presente.
Quase todos terminaram o ano
alfabetizados.
Tenho um caso de exclusão. Estou feliz
porque descobri a dificuldade dele.
Para o professor é cansativo, tem que
pegar uma criança e falar para ela:
escreva do jeito que sabe.
A criança coloca o eu dela para fora.
Você vai usar sua estratégia pra que ela
chegue ao final alfabetizada.
Você verifica em qual hipótese seu aluno
está.
A sondagem não é suficiente para você
avaliar se o seu aluno é bom ou não.
O aluno insiste em não fazer nada na
hora da sondagem; este aluno se mostra
alfabético, ele lê, escreve, mas não faz
nada.
Você apresenta seu mapa, dá a
entender que é uma criança
alfabetizada, mas não condiz com o
comportamento em sala.
O professor trabalha como eu,
observando.
130
letra bonita, porém, na questão dele estar ele mesmo mostrando, ele
não consegue. A sondagem é muito boa num caso desses, para o
professor que trabalha ali observando. O professor que trabalha sem
essa observação pode errar no conceito.
No meu caso não, porque eu sei exatamente. Como eu falo na reunião
de pais, não é porque o caderno do seu filho está lindo que ele é um
excelente aluno, porém se ainda está nessa fase, precisa melhorar. Eu
acompanho muito e acho muito bom porque você pode observar, eu
faço gráfico das minhas atividades.
P 6 - A sondagem é assim, a gente, pensa em quatro palavras. A gente
não pode falar as palavras de forma separada, por exemplo: fe-li-ci-da-
de. A gente fala a palavra no geral para eles e eles têm que escrever
uma polissílaba, uma trissílaba, uma dissílaba e monossílaba e uma
frase com alguma palavra que eu ditei. Eu tenho que chegar para a
criança e não posso falar pra classe inteira. “Gente, vamos fazer a
sondagem e cada um, pegue um papelzinho e vamos escrever o que
eu falar”. Desta forma, eu não tenho o controle, não vou saber se o
João copiou da Maria. Eu não vou saber. Eu tenho o controle se eu
checar. Demoro uma semana fazendo isso; cada dia eu pego três ou
quatro, vou chamando: “Vem cá, Beatriz” e a Beatriz vai e eu digo:
“Escreve seu nome para mim”, ela pega e escreve. “E a data, como é
que é?” Ela pega e coloca, então eu dito brigadeiro, coxinha, ela vai e
escreve, a outra não lembro, a última é pão, ela vai e coloca. Eu vou
avaliar a hipótese dela, se ela está silábica, se está silábica alfabética,
então a partir dessa eu começo a planejar como é que eu vou trabalhar
com isso daqui até a próxima sondagem. Tem crianças que dão pulos
enormes, que estavam pré-silábicas na primeira sondagem e na
segunda, já estavam alfabéticas. Uma coisa deliciosa de ver.
P 7 - Essa sondagem, a gente costuma fazer, por exemplo, assim, um
ditado com o mesmo campo semântico. Todos os alunos participam.
Aqueles alfabéticos vão fazer brincando, agora aqueles que estão pré-
silábicos e silábicos, eles vão omitir algumas letras.
P 8 - Veja bem, eu procuro chamar um por um quando eu quero
avaliar. Então, enquanto eles estão fazendo um outro tipo de
observando.
A sondagem é boa para o professor que
trabalha ali observando. O professor que
trabalha sem observação pode errar no
conceito.
Eu acompanho muito bem meus alunos,
faço gráfico das minhas atividades.
A gente pensa em quatro palavras. Não
pode falar as palavras de forma
separada.
A gente fala uma polissílaba, uma
trissílaba, uma dissílaba e uma
monossílaba e uma frase.
Não posso falar para classe toda. Desta
forma eu não tenho o controle. Eu tenho
o controle se eu checar.
Demoro uma semana fazendo isso, cada
dia eu pego três ou quatro.
Eu vou avaliar a hipótese dela, se ela
está silábica, se ela está silábica
alfabética. Eu começo a planejar como é
que eu vou trabalhar até a próxima
sondagem.
Têm crianças que dão pulos enormes;
estavam pré-silábicas na primeira
sondagem e na segunda, estavam
alfabéticas.
Ditado com o mesmo campo semântico.
Alfabéticos vão fazer brincando, aqueles
que estão pré-silábicos e silábicos vão
omitir algumas letras.
131
avaliar. Então, enquanto eles estão fazendo um outro tipo de
atividade...o que ajuda bastante é o aluno pesquisador. Enquanto eles
estão fazendo uma atividade de cantiga, ou poema, que eles vão pegar
num textinho, ou mesmo de banco de palavras, eu dou banco de
palavras para terminar a cruzadinha. Enquanto eles estão fazendo
isso, eu estou fazendo a sondagem separada, do mesmo campo
semântico, com eles lá. Então, geralmente, com os pré-silábicos e com
os sem valor, eu ficava uma vez por mês, uma vez a cada quinze dias,
eu estava fazendo a sondagem pra ver se eles vão evoluindo. Um
outro cuidado que eu tinha era escrever como eles estavam; eu tive
treze crianças que relacionei no meu relatório final, falta-me entregar o
portfólio (para a coordenação); dessas treze crianças, foram essas três
que me preocuparam. Quando eu fui olhar bem, com a vivência deles
em casa, um deles em casa, um era imaturidade total, ele acabou de
fazer sete anos, então a mãe tem todo aquele mimo com ele, porque o
pai acabou abandonando, foi embora, morar com outra pessoa. Ela sai
às cinco horas da manhã, volta às nove, dez horas da noite, ele já está
dormindo. Então, ela não tem o contato, ela não tem aquele tempo
hábil para poder estar com ele. Então ele ficava o dia inteiro na rua,
quando dava meio dia e meia, ele colocava a roupa para vir para a
escola.
Eu procuro chamar um por um quando
eu quero avaliar.
Enquanto eles estão fazendo uma
atividade, eu estou fazendo a sondagem.
Com os pré-silábicos e com os sem valor
eu ficava uma vez por mês, uma vez a
cada quinze dias, eu estava fazendo a
sondagem para ver se eles estavam
evoluindo.
Outro cuidado que tinha era escrever
como eles estavam.
Relacionei em meu portfólio.
Quando fui olhar bem, com a vivência
em casa: um era imaturidade total, a
mãe não tem tempo para ficar com o
aluno.
132
Questão 3: Como são utilizados os resultados da son dagem?
RESPOSTA IDEIA CENTRAL
P 1 - Esse ano, esse resultado foi mensal; antes eram passadas as
minhas anotações para a escola. Agora eu faço isso, anteriormente à
escola pedir. O ano passado, não era pedido mensalmente, mas eu
faço mensalmente. Na outra escola que eu trabalho, que é da
prefeitura, é pedido semestralmente, mas eu faço mensalmente. Ele
serve para mim, para eu estar verificando como anda o aprendizado
dentro da minha sala e que tipo de atividade eu tenho que passar,
que estar propondo para eles, para poder suprir o que está sendo
necessário naquele momento.
P 2 - Mesmo se não houvesse a solicitação da SE, nós faríamos,
pois dá uma visão de avanço.
Os pais ficam inseguros, eu posso apresentar o resultado aos pais,
oriento os pais para fazer o trabalho.
P 3 - Eu acredito nessa diferença, você faz a sondagem, você fala:
ele está silábico com valor, outro vem e dá outro nível. Eu acho
delicado. Não existe uma camuflagem
No geral, na sala 95% de tudo. Todos avançam, alguns mais
lentamente outros mais rápidos. Avaliação serve para refletir a
prática. Seguimos o material “ler e escrever” orientações pra avaliar.
P 4 - É muito importante você trabalhar com agrupamento. Você faz
dupla, escolhe a dupla adequada. Tento colocar uma hipótese
silábica próxima da outra para que o aluno desenvolva. Muita leitura,
roda de conversa, roda de biblioteca. Avaliação da primeira série,
você está sempre ao lado. Não tem aquela avaliação específica. Não
existe. Na primeira série, eles estão vindo de um mundinho que é
brincar, brincar e brincar. O que a gente procura fazer? Sempre
ensinar, prepará-los para ir para uma série sequente, nunca
Esse ano o resultado foi mensal.
O ano passado, não era pedido
mensalmente, mas eu faço.
Ele serve para eu verificar como anda o
aprendizado dentro da minha sala e que
tipo de atividade eu tenho que propor para
eles, para suprir o que está sendo
necessário...
Senão houvesse a solicitação, nós
faríamos.
Apresento o resultado aos pais.
Eu acredito nessa diferença.
Você faz a sondagem e fala: ele está
silábico com valor, outro vem e dá outro
nível.
Todos avançam.
Avaliação serve para refletir a prática.
Seguimos as orientações pra avaliar do
material “Ler e Escrever”.
Trabalhar agrupamento. Hipótese silábica
próxima da outra para o aluno desenvolver.
Avaliação da primeira série você está
sempre ao lado.
Não tem avaliação específica. Eles vêm de
um mundinho só de brincar.
133
esquecer aquele lado que a gente deve ter: é babá, é mãezona, é
professora, psicóloga, porque você tem que analisar um por um, nós
fazemos as avaliações assim, as diagnósticas.
P 5 - Quando eu vou aplicar uma atividade que contempla cinco tipos
de atividades, a primeira atividade eu aplico para todo mundo, a
segunda, a terceira, a quarta e a quinta. Quando eu vou corrigir eu
anoto, fico pontuando para mim mesma, quantos conseguiram e
quantos não conseguiram.
Quem conseguiu, quem não conseguiu, pra onde eu poder retomar,
entendeu? Dali para frente tem a um, a dois e a três e eu tenho que
retomar. É complicado. Eu trabalho variação de atividade, o mesmo
objetivo, mas com várias propostas de atividades, eu sei
exatamente, o “fulano” ia conseguir, o beltrano também, às vezes eu
achei que o fulano não ia, o fulano melhorou e eu falei nossa, que
bom. Que bom! Dentro disso eu vou entendendo o processo.
P 6 - Aqui está o mapa da turma; este mapa é meu, mas o que vai
pra secretaria é outro. Porque esse é o meu, fica comigo, o outro,
eles são iguais. Quem está com a cor vermelha, é pré-silábico, quem
está com a cor roxa, ele é silábico sem valor, quem está na cor
laranja, ele é silábico com valor, azul é silábico alfabético e amarelo
é alfabético. Como eu sei disso? No primeiro mês, eu dei as
palavras, ele escrevia.
(apresentação do portfólio)
Aqui eu vou vendo a evolução da criança. Olha que show esse aqui!
(anexo)
A maioria das crianças veio pré-silábica e eu comecei a trabalhar
conteúdos que dessem mais ênfase no pré-silábico, e como ele foi
mais além (um aluno apresentado), ele foi por conta própria.
Tem um trabalho diversificado sendo realizado, atende a todos, mas
não da mesma forma, cada um vai ao seu passo. Alguns precisam
apenas de um tranquinho para ir, mas tem criança que ainda penou,
mas teve uma evolução.
É gratificante chegar depois de um mês. Se eu não tivesse o
registro, eu iria chegar no próximo mês, mas como essa criança
estava, não ia saber.
P 7 - A gente tem um portfólio. Eu faço uma sondagem daquele
aluno que está silábico, do silábico alfabético, porque numa sala, ela
Você tem que analisar um por um.
Aplico atividades variadas que contemplam
cinco dificuldades, com o mesmo objetivo.
Quando eu vou corrigir, eu anoto, pontuo
para mim mesma, quantos conseguiram e
quantos não conseguiram.
Quem conseguiu, quem não conseguiu,
pra onde eu vou retomar.
Dentro disso eu vou entendendo o
processo.
Este mapa é meu, o que vai para secretaria
é outro. Eles são iguais.
Quem está com a cor vermelha é pré-
silábico, quem está com a cor roxa é
silábico sem valor, quem está na cor
laranja é silábico com valor, azul, silábico
alfabético e amarelo é alfabético.
Conteúdos com ênfase aos pré-silábicos.
Um aluno foi além por conta própria.
Trabalho diversificado que atenda a todos.
Se eu não tivesse o registro, não ia saber
como essa criança estava.
A gente tem um portfólio.
Faço sondagem porque a sala é
heterogênea.
134
é heterogênea, você vai ter aqueles que estão com mais
dificuldades, tem uns cinco ou seis alunos que não vão acompanhar,
um por outro motivo qualquer, eles têm mais dificuldade; às vezes,
ele não tem sete anos completos, então ele vai ficar defasado.
Exatamente, nós temos assim registrado (mostra do portfólio). Os
alunos em vermelho não conseguiram ser alfabetizados. Por quê?
Porque não me mostraram, não conseguiram memorizar as letrinhas,
até as do próprio nome. Por exemplo, a Talita, eu pergunto: “Talita,
seu nome começa com o quê?” E foi trabalhado. Foi trabalhado o
alfabeto, foram trabalhadas as histórias, parlendas, cantigas,
músicas e tudo que você pode pensar. Então, o que aconteceu com
ela, ela não conseguiu memorizar as letrinhas, ela não deu valor pra
essas letrinhas, entendeu? Para o tipo de som que ela produz, como
é que começa cachorro? Começa com CA; qual o outro nome que
também começa com CA, nome de pessoa, nome próprio CAIO,
nome do coleguinha de classe. Então, você vai puxando com o
aluno, indagando com ele.
Mesmo assim, a criança não conseguiu.
Essa criança e esse outro, ele ficou silábico, uma hora ele está
silábico, outra hora ele está pré. Ele também tem dificuldade em
memorizar.
heterogênea.
Os alunos em vermelho não conseguiram
ser alfabetizados porque não conseguiram
memorizar as letrinhas.
Ela não deu valor pra essas letrinhas, para
o tipo de som que elas produzem.
Você vai puxando com o aluno, indagando
com ele; mesmo assim, ele não conseguiu.
135
Questão 4: Além da sondagem, que outras formas são usadas para avaliar?
P 1- Fazemos outras atividades elaboradas pela equipe.
P 2 - Avaliamos com letras móveis, atividades em dupla.
A sondagem não tem o sentido de avaliação, é um momento especial.
Também fazemos a avaliação bimestral que contempla os conteúdos
do bimestre; usamos um texto de memória.
P 3 - Nós fazemos uma prova bimestral, fazemos um provão. Nos
reunimos, as colegas e montamos.
Ele tem oportunidade de pôr em jogo tudo que ele sabe. É uma
oportunidade; tudo que a gente dá para alguns, é avaliado. Tem os
projetos.
P 4 - Tem outras situações, por exemplo, contamos uma história, eles
falam oralmente, então fazemos uma avaliação. Por exemplo, tem
aluno com um vocabulário maravilhoso, inventa história, enriquece,
expõe as idéias bem claras pra turma, ele sabe guardar os mínimos
detalhes da história. Tem também as produções que nós pedimos para
eles fazerem, as produções de texto, eles produzem. A todo instante
nós temos que estar avaliando; além das produções de textos, tem
também as provinhas; todos nós professores sentamos, ali montamos
também essa provinha. A gente nem conta muito, porque é primeira
série, mas é bom porque a mãe gosta de ver como está na escrita, na
produção na leitura, o que ele conseguiu aprender, a mãe gosta disso.
Se a mãe chegar e achar uma provinha do aluno, é maravilhoso. Mas a
nossa avaliação tem que ser nos fragmentos do dia-a-dia do aluno, por
exemplo, olha ele leu tal livro na biblioteca; agora, na roda de leitura,
na roda da biblioteca, você vai explicar assim o que entendeu desse
livro, o foi a história que você leu, lógico, não pode.Tem a aula de
Informática que está muito rica, foi uma idéia formidável que o governo
fez, porque ajudou bastante, porque também serviu como uma
avaliação, pra gente avaliar, porque tem aluno que não consegue
escrever, não consegue fazer as coisas e através da aula de
Informática, ele foi se desenvolvendo. Eu tenho um aluno que ele é
Utiliza atividades realizadas pela
equipe.
Avalia com atividades em dupla.
As avaliações bimestrais contemplam
os conteúdos do bimestre.
Faz uma prova bimestral reunida com
colegas.
Tudo que é dado para alguns é
avaliado.
Avalia através da oralidade, após as
histórias contadas.
Utiliza as produções escritas.
A todo instante tem que estar
avaliando.
Tem também as provinhas que são
elaboradas pelos professores.
Pra a mãe é maravilhoso achar uma
provinha.
Avaliação nos fragmentos do dia-a-dia.
Aula de Informática também serviu
como avaliação.
136
incluso e eu percebi que na aula de Informática ele se desenvolvia. O
que eu fiz? Eu falei para a mãe olhar como ele está ótimo na aula de
Informática.
Ele estava:
- Professora, falta isso aqui, professora.
Aí eu falei: - Já sei! Se esse menino tivesse um laptop, poderia ser de
brinquedo, ele iria se desenvolver.
A prova que entreguei para coordenadora já mostrou avanços deste
aluno. Ele melhorou bastante, enriqueceu, ajudou. Eu falei pra mãe
“você tem condições?” Ela falou: “lógico que tenho, professora”. Esse
menino era incluso.
Avaliação tem que ser contínua, esta, se feita lado a lado com o aluno,
é só ganho. Ela dá mais ganhos do que a que você faz por
determinações. Você descobre no dia-a-dia o aluno e o crescimento
dele.
P 5 - Eu faço atividade para os alunos, de todas as atividades. Eu
ponho no caderno para o pai poder acompanhar. Quando chega a
época de fazer reuniões, eu faço algumas atividades para o pai
observar porque existem pais que não olham para o caderno de jeito
nenhum. Então, na minha reunião de pais, os pais vão, eu falo sobre
todas as atividades que eu propus a eles nesses quinze dias e vou
falando com eles, nessa atividade a proposta era essa... Os pais da
minha sala são pais muito diferenciados, eles gostam que você mostre
o que você trabalhou e ver se seu filho conseguiu. Eu não dou nota,
então eu falo para eles, mas você já sabe que seu filho está
acompanhando ou não está acompanhando, se ele teve dificuldade ou
não.
P 6 - A provinha é mais pra mostrar pra comunidade, o que interessa
pra gente não é aquela provinha. A gente sabe como o aluno está, a
gente sabe quando o aluno vai bem e no dia da prova, de repente, ele
não vai bem. Eu tenho que fazer essa provinha, mas para o pai chegar
à reunião e a gente mostrar para ele. Só que na minha reunião, não é
assim. Na minha reunião, eu pego a minha prova, eu leio a prova
todinha com os pais. Eu pergunto para eles como seus filhos foram em
tal questão. Pergunto também o que seus filhos deixaram de fazer.
Explico para eles quais são as hipóteses silábicas, onde que o filho
dele está pra no final do ano ele chegar e saber cobrar do professor.
Então, eu chego e falo pra eles, se os filhos estão saindo silábicos
alfabéticos e que no ano que vem eles devem perceber se as crianças
estão andando ou não. Devem ver se há alguma coisa errada. Não
Tem aluno que na aula de Informática
se desenvolve.
A prova que mostrou para a diretora
apresenta os avanços do aluno de
inclusão.
Avaliação feita ao lado do aluno é só
ganho, dá mais ganhos do que a que
fazer por determinações.
Quando chega época de reunião, faz
atividades para mostrar aos pais.
Não dá nota.
A provinha é para mostrar para a
comunidade.
Lê a prova toda para os pais e os
questiona sobre o desempenho dos
filhos.
Explica aos pais as hipóteses
silábicas.
137
estão andando ou não. Devem ver se há alguma coisa errada. Não
pode matar o trabalho do professor da primeira na segunda. Na
segunda, o professor chega de repente, a gente sabe que é até feio
falar, mas existe. Chega no fim do ano, a professora chega lá e passa
textos, textos e textos. A gente sabe que o silábico alfabético vai só
copiar.
P 7 – Essa avaliação não é uma coisa, como posso falar pra você,
rígida, entendeu? Que nem no tradicional. Sabe, sabe, não sabe, não
aprendeu. A nota dele é assim, eu vou dar uma nota um. Não porque
ele vai ver ainda esse ciclo; primeira, segunda, ele vai deslanchar. Não
vai? A primeira e a segunda não são dois anos, ele não tem um prazo.
Se ele conseguiu dominar isso daí, por exemplo, colocando qualquer
coisinha que ele sabe de cor: “batatinha quando nasce, esparrama pelo
chão”, são coisas do dia-a-dia, não é? A mãe sempre ensina, se ele tá
conseguindo isso, imagina na segunda, ele vai deslanchar. Só ficaram
dois alunos porque têm problemas! Estão fazendo fono e psicólogo.
Não é um problema meu, eles não conseguiram memorizar, alguma
coisa tem com eles que eu não estou conseguindo detectar, os outros
não mesmo os silábicos. Ele não deslanchou agora aquela parte da
escrita fluentemente todinha, mas ele tem a 2ª série, na 2ª série ele vai
desenvolver, quando menos se espera, qualquer tipo de texto, de
parlenda. Aquela revista recreio, eles pegam aquilo lá e leem de cabo a
rabo, o texto. Então tem toda uma diversidade de texto, eu falo rígido
pra você, é assim, aquela nota, nota, entendeu?
P 8 – A oral, atividade oral. Quando eu dava a atividade oral, se ele
estava participando. Não há provas, até teve, mas foi uma questão
assim, como teve o SARESP; eu não faço, mas tenho colegas que
fazem. Elas fazem questão de fazer a avaliação bimestral. Eu pego
todas as atividades que eles foram fazendo durante o mês, coloco tudo
junto na pastinha e dou para os pais.
Nós fizemos um simulado para o SARESP, eu fiquei apavorada. Faz
de conta... Não viu a prova do SARESP? Então nós ficamos em cima
do que contém o SARESP, do ano passado, nós pegamos o conteúdo
e pedimos pra eles em forma de um simulado, de uma avaliação. Nós
fizemos exatamente a troca dos alunos, um com o outro. A professora
A ficou na minha sala, a professora B na outra, etc. Na hora da
avaliação teve aluno que chorou e não queria fazer. Veja bem, se for
avaliar só por aquele aluno que ficou nervoso, porque a professora
dele não estava ali, não tem como avaliar.
O aluno X, na hora, ficou tão nervoso que ele quebrou o lápis em
várias partes e não ia fazer. Como eu vou avaliar só naquela prova?
Os pais devem perceber se no
próximo ano vai ocorrer alguma coisa
errada. O trabalho do professor da
primeira não pode ser morto na
segunda.
Avaliação não é rígida como a
tradicional, com nota.
A primeira e segunda séries não são
dois anos.
Considera qualquer coisinha que o
aluno saiba de cor, pois na segunda
série, ele deslancha.
Ficaram dois alunos, pois têm
problemas, não considera ser culpada.
Tem toda uma diversidade de texto
para o aluno se desenvolver.
Avalia atividades orais a partir da
participação do aluno.
Não há provas, mas já teve. Outras
colegas fazem, porém a professora
opta por colocar as atividades que os
alunos fizeram e colocá-las em uma
pasta para entregar aos pais.
Ficou apavorada com a simulação
realizada para o SARESP.
A prova não é desnecessária, mas não
138
várias partes e não ia fazer. Como eu vou avaliar só naquela prova?
Não é desnecessário, mas eu não a uso como meio de avaliação,
jamais usei, mesmo em uma terceira ou quarta série, nunca usei. Eu
conto trabalhos, atividades que você está fazendo em sala de aula,
como o aluno está desenvolvendo em sala de aula. Eu vou desse lado.
usa como avaliações; nunca usou.
Avalia atividades realizadas em sala.
139
Questão 5: Como você define avaliação?
RESPOSTA IDEIA CENTRAL
P 1 – Avaliar para retomar o que não foi atingido dentro dos
meus objetivos. Avaliar o trabalho que faço, uma avaliação do
que meu aluno aprendeu para verificar o que eu não consegui
passar da forma que deveria ter sido passado. Não aprenderam
da maneira que eu gostaria; às vezes, optar por um determinado
conteúdo, vejo que sala não pegou, vou ter que refazer isso, de
uma outra forma para poder atingir os meus objetivos. Então,
algumas vezes, eu faço duas vezes, a mesma coisa, porque na
verdade, avaliação é mais minha, porque eu preciso saber se o
que estou ensinando está realmente sendo absorvido pelos
alunos. É uma retomada.
Ao final do ano, observa-se que você está com quase todos
alfabéticos.
Todos, alguns com questões de ortografia.
P 2 – A avaliação, quando acontece todo o dia, a gente sabe
como os alunos estão e quais as atividades são para contemplar
as deficiências dos alunos; em cima disso, preparo as próximas
atividades.
Não senti dificuldade em avaliar.
Avaliar não é bicho de sete cabeças, faz parte do processo de
ensino, serve para reavaliar nosso trabalho.
Nós gostamos de avaliar, a gente quer saber quando os alunos
aprendem. Acabamos fazendo antes, pela ansiedade.
Avaliar é você observar a criança no dia-a-dia, para você saber
o que deu certo, o que deu errado. Não tem um dia.
P 5 – Tem muito a ganhar com avaliação; você descobre como
seu aluno aprende, como você tem que chegar junto dele, onde
você garanta que ele aprende, isso é muito valioso para mim. Eu
acho muito fantástico isso, porque eu sei como eu vou ensinar,
quando eu quero atenção dele. Como minha avaliação é assim
contínua, direta, então, por exemplo, eu falo “Gui, presta
Avaliação para retomada de objetivos.
Avaliação do próprio trabalho.
Para saber se o que ensina está sendo
absorvido pelos alunos.
Ao final do ano quase todos alfabetizados.
Avaliação acontece todos os dias.
Avaliar não é um bicho de sete cabeças; faz
parte do processo de ensino; serve para
reavaliar trabalhos.
Faz avaliação antes para ver se os alunos
aprendem.
Observar a criança no dia-a-dia.
Há muitos ganhos.
Saber se o aluno aprendeu.
Saber como ensinar.
140
atenção na comanda que a professora vai dar”. Pelo olhar dele
eu já entendi se ele conseguiu ou não. Para mim é desgastante,
porque você tem trinta e seis alunos e todos aprenderem, do
mesmo jeito, da mesma forma. Quando eu aplico uma atividade
e atinjo a metade da sala eu já estou satisfeita, porque no
restante eu tenho que trabalhar um por um.
P 6 – Para me nortear no que vou fazer, pra saber como é que
eu vou agir com aquela criança, essa sondagem pra mim é
fundamental. Se eu não tiver essa sondagem, como eu vou
saber se a criança progrediu no próximo mês?
P 7- Saber se ele aprendeu a ler, escrever e interpretar toda a
linguagem nossa que a gente fala, os textinhos, ler e escrever,
não fluentemente, mas o aluno saber interpretar aquilo que você
propôs pra ele, você não elaborou uma proposta curricular? Um
planejamento? Poxa vida, ele atingiu aquilo, às vezes ele tem o
mínimo, ele não vai sair de uma primeira série sem escrever o
nome, o nome da mãe, o próprio nome: “Eu sou fulano”.
P 8 - Avaliar é o dia-a-dia, é poder ver o que o aluno está
conseguindo desenvolver.
Em qual ponto ele está com dificuldade? A partir daí, poder
ajudá-lo. Avaliar para mim é isso. Eu diria na questão da
continuidade, no desenvolvimento da atividade que eu vou estar
inserindo os três em um só, por exemplo, como eu vou ver se
ele aprendeu. Quando eu estou avaliando. Mas eu vou avaliar
só uma vez? Não. Eu vou avaliando constantemente. Todo dia,
qualquer tipo de atividade que eu dou, estou avaliando o aluno.
Eu acho, tenho quase certeza que eu faria dessa forma.
Avaliação, ensino, aprendizagem, um complementa o outro, eles
não podem ficar separados. Não há somente uma vez.
Pelo olhar sei se o aluno aprendeu.
É desgastante.
Quando atinge a metade da sala fica satisfeita.
Outra metade deverá ser trabalhada
individualmente.
Para nortear.
Sem a sondagem como saber se o aluno
progrediu no próximo mês.
Saber se o aluno aprendeu a ler, a escrever e
interpretar toda linguagem.
Atingir a proposta curricular.
Avaliar é o dia-a-dia.
Verificar o ponto que o aluno apresenta
dificuldade.
Avaliar constantemente.
Em qualquer atividade está avaliando.
Avaliação, ensino e aprendizagem, um
completa o outro.
141
ANEXO A – INEP / MEC
Assessoria de Comunicação Social
Tabela 1 - Proficiência de Português dos alunos de escolas urbanas, sem federais – 1995 – 2005
1995 1997 1999 2001 2003 2005
Continua
Brasil 191,57 187,81 172,34 168,34 173,13 175,52
Norte 174,96 172,00 160,21 156,87 161,71 163,79
Rondônia 175,28 173,46 162,53 160,46 162,18 166,63
Acre 167,95 163,25 154,24 148,66 159,64 172,50
Amazonas 178,34 176,91 169,02 162,36 163,27 163,00
Roraima 181,71 161,83 166,55 156,99 165,19 165,90
Pará 174,52 171,12 158,22 156,54 160,73 163,49
Amapá 167,90 167,82 164,37 155,83 156,31 159,59
Tocantins 174,32 172,78 151,08 147,63 165,02 162,12
Nordeste 182,59 179,53 159,71 151,67 157,95 159,08
Maranhão 167,71 176,14 158,61 150,31 152,24 155,67
Piauí 191,69 182,17 156,59 155,77 160,59 156,86
Ceará 185,46 186,09 158,73 152,78 160,41 163,76
Rio Grande do Norte 182,24 174,13 156,28 144,96 150,06 150,82
Paraíba 185,13 180,57 169,53 158,56 158,01 158,59
Pernambuco 181,40 176,56 158,43 151,50 161,41 162,32
Alagoas 178,11 171,31 157,27 153,18 154,75 154,53
Sergipe 186,26 176,80 160,82 155,19 160,52 163,84
Bahia 186,38 181,30 160,66 149,48 158,99 159,06
142
1995 1997 1999 2001 2003 2005
Conclusão
Sudeste 197,10 194,46 180,40 179,68 182,46 185,24
Minas Gerais 204,93 213,19 181,00 179,65 185,08 190,54
Espírito Santo 184,21 177,45 173,77 170,22 176,79 180,44
Rio de Janeiro 194,66 183,61 182,46 179,81 183,43 183,69
São Paulo 196,19 191,01 179,90 180,35 181,36 183,72
Sul 195,85 192,41 179,10 175,95 179,95 182,53
Paraná 200,42 195,04 179,55 173,11 175,80 183,78
Santa Catarina 193,43 197,71 180,86 176,56 182,46 181,18
Rio Grande do Sul 191,65 186,78 177,65 178,72 182,97 181,97
Centro Oeste 195,51 184,59 170,74 165,21 174,02 176,75
Mato Grosso do Sul 194,06 187,65 173,04 160,57 166,82 172,80
Mato Grosso 176,87 172,78 159,37 152,21 161,18 167,38
Goiás 198,63 187,83 174,10 167,29 176,33 176,34
Distrito Federal 205,93 186,96 174,09 185,65 194,12 193,58
Fonte: Elaboração com base nos dados do Saeb – Inep/MEC
143
ANEXO B - Mapa de avaliações
144
145
146
147
ANEXO C - Registros de avaliações
148
149
150
151
152
153
154
155
156
ANEXO D - Páginas de portfólios
157
158
159
160
161
ANEXO E – Ficha de Registro de Avaliação
162
163
ANEXO F - Relatório de aluno pesquisador
164
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