DESAFIOS PARA O DESENVOLVIMENTO| 0
BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento
Desafios para o desenvolvimento: SANEA-
MENTO
DESAFIOS PARA O DESENVOLVIMENTO| 1
FICHA TÉCNICA
DIRETORA
Joisa Campanher Dutra Saraiva
COORDENAÇÃO
Fernanda Almeida Fernandes de Oliveira
EQUIPE TÉCNICA
Denise Teixeira
Fernanda Baldim Jardim Nobre
Gregório Costa Luz de Souza Lima
Juliana Jerônimo Smiderle
Morganna Werneck Capodeferro
Patricia Naccache Martins da Costa
ESTAGIÁRIO
Brenno Sá Gonçalves
EQUIPE ADMINISTRATIVA
Lana Cristina de Melo Nabuco [email protected]
Marcia Marcos Ramos
DESAFIOS PARA O DESENVOLVIMENTO| 2
INTRODUÇÃO
O presente documento faz parte de uma iniciativa do Centro de Estudos em Regulação e Infra-
estrutura da Fundação Getulio Vargas (FGV CERI) e do Banco Interamericano de Desenvolvi-
mento (BID) para orientar, de forma estruturada, a estratégia de investimentos do BID no Brasil
nos anos de 2019 a 2023.
Nesse contexto e, sendo a região Nordeste do Brasil um local estratégico para o BID, o presente
relatório tem como objetivo apresentar um panorama regional dos três setores de infraestrutura
alvos do Workshop Regional “Desafios para o Desenvolvimento: Infraestrutura Sustentável” – a
saber, água e saneamento, mobilidade urbana e energia.
Assim, o relatório é conformado por quatro seções. Na primeira, aborda a Transposição do Rio
São Francisco, projeto de suma importância na Região Nordeste do Brasil. Em seguida, trata da
Mobilidade Elétrica e Inovação como Forma de Infraestrutura, trazendo iniciativas no setor de
mobilidade urbana implementados no Nordeste do país. Na terceira seção, apresenta o tema
da geração de energia por fontes alternativas e seu potencial na região. Por fim, o documento
propõe questionamento para pautarem a discussão que terá lugar no dia 05 de abril de 2018,
na cidade de Fortaleza – Ceará.
DESAFIOS PARA O DESENVOLVIMENTO| 3
1 A TRANSPOSIÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO
A região Nordeste do Brasil, em especial o Semiárido1, convive há anos com cenários de escas-
sez hídrica. De acordo com dados da Agência Nacional de Águas (ANA), a disponibilidade
hídrica2 varia consideravelmente entre as bacias hidrográficas do país, sendo a situação mais
crítica observada justamente na região Nordeste – bacias Atlântico Nordeste Ocidental, Leste
e Oriental e Parnaíba (Tabela 1).
TABELA 1: DISPONIBILIDADE HÍDRICA POR BACIA HIDROGRÁFICA
Bacia Hidrográfica Disponibilidade hídrica (m³/s)
Amazônica 65.617
Paraná 4.390
Tocantins-Araguaia 3.098
Atlântico Sudeste 1.325
Paraguai 1.023
São Francisco 875
Uruguai 550
Atlântico Sul 513
Atlântico Nordeste Ocidental 397
Parnaíba 325
Atlântico Leste 271
Atlântico Nordeste Oriental 218
FONTE: CONJUNTURA DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL - ANA, 2017
1 O Semiárido brasileiro é definido pela Lei n° 7.827/1989, alterada pela Lei Complementar n° 125/2007, como sendo a região inserida na área de atuação da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), autarquia especial vinculada ao Ministério da Integração Nacional. De acordo com Resolução SUDENE n° 115/2017, o Semiárido compreende 1.262 municípios em 10 estados: Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia e Minas Gerais. A delimitação desta região foi feita levando em consideração os critérios de percentual diário de déficit hídrico, índices pluviométrico e de aridez.
2 Em trechos de rio, a disponibilidade hídrica corresponde a vazão que passa no rio em pelo menos 95% do tempo. Já em trechos sob influência de reservatórios e em seus lagos, a disponibilidade é estimada de forma específica. Para detalhes, ver Conjuntura dos Recursos Hídricos no Brasil - ANA, 2017.
DESAFIOS PARA O DESENVOLVIMENTO| 4
A bacia do São Francisco, que também abrange estados nordestinos, não apresenta quadro
tão preocupante como as demais. Esta bacia é, portanto, a principal e mais próxima fonte de
água na região.
Cerca de 22 milhões de pessoas vivem na região do semiárido brasileiro e sofrem com a falta
de água para o abastecimento. A escassez também impacta o desenvolvimento social e econô-
mico, sendo um fator limitante para o avanço da agropecuária, indústria e demais setores pro-
dutivos na região. Tais impactos podem ser verificados, por exemplo, pelo índice de desenvol-
vimento humano (IDH) dos estados do Nordeste, que se mostram abaixo do IDH nacional – o
IDH brasileiro é de 0,727 enquanto o dos estados da região variam de 0,684 no Rio Grande
do Norte a 0,631 em Alagoas. Dada a situação alarmante do semiárido, em 2007 o governo
federal, através do Ministério da Integração Nacional (MI), deu início à construção da transpo-
sição do Rio São Francisco, visando garantir a oferta hídrica no Nordeste Setentrional.
O Projeto de Integração do Rio São Francisco (PISF) consiste na transposição das águas deste
rio a partir de dois pontos de captação entre as barragens de Sobradinho e Itaparica – ambas
em Pernambuco. A água é então bombeada e escoada por dois canais, Eixos Norte e Eixo
Leste, que totalizam 477 km de extensão. A adução de água bruta do São Francisco abastecerá
as bacias e sub-bacias receptoras nos Estados do Ceará, Paraíba, Pernambuco e Rio Grande
do Norte (Figura 1). Estima-se que a entrada em operação do PISF beneficiará 430 municípios
nos quatro estados, o que corresponde a uma população de cerca de 12 milhões de pessoas.
FIGURA 1: TRANSPOSIÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO - EIXOS NORTE E LESTE
FONTE: RELATÓRIO DE IMPACTO AMBIENTAL DO PISF, 2004
DESAFIOS PARA O DESENVOLVIMENTO| 5
O investimento total previsto para o empreendimento é de cerca de R$ 8,2 bilhões3. Hoje, o
Eixo Norte está em fase de conclusão, com cerca de 95% das obras finalizadas. O Eixo Leste
foi entregue em abril de 2017 e passa pelo período de pré-operação, ainda sob responsabi-
lidade do Ministério da Integração Nacional.
A entidade reguladora do PISF é a Agência Nacional de Águas. Além da função de aprovar
as tarifas quando iniciada a operação comercial do sistema, cabe à ANA a definição de as-
pectos sensíveis do projeto como a outorga do uso da água. Nesse tema, a agência reguladora
outorgou uma vazão firme para bombeamento de 26,4 m³/s nos dois eixos, a qualquer tempo4.
Esta vazão refere-se à demanda projetada para o ano de 2025 relativa aos usos prioritários
da água, consumo humano e dessedentação animal. Conforme estudos elaborados pela própria
ANA, a vazão autorizada não comprometeria os usos múltiplos da água, por mostrar-se bas-
tante inferior à disponibilidade hídrica média para uso, que seria igual a 263 m³/s em 2025
no rio São Francisco.
A definição do modelo de gerenciamento do PISF foi alvo de discussões. A possibilidade de
criar a CHESF Águas com a finalidade de operar o PISF foi avaliada, assim como estudos
consideraram a constituição de Parceria Público Privada (PPP). Por fim, o Decreto 5.995/2006,
modificado pelo Decreto nº 8.207/2014, estabeleceu que a operação e manutenção da trans-
posição seriam feitas pela Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do
Parnaíba (CODEVASF).
Embora a CODEVASF esteja se preparando para iniciar a operação comercial do PISF até 31
de dezembro de 2018, a questão da estruturação de uma PPP ganhou força novamente com a
criação do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI). Apesar da Transposição não ter sido
incluída na lista de empreendimentos do PPI, a modelagem de uma PPP para o PISF está sendo
conduzida pelo BNDES.
Com relação às despesas operacionais, o custo com a energia elétrica utilizada para o funcio-
namento das bombas é o preponderante frente ao total da operação. Neste custo estão inclu-
ídos, ainda, encargos setoriais, como a conta de desenvolvimento energético (CDE), além do
pagamento de indenizações às transmissoras. Neste sentido, a análise do potencial de auto
geração, através da implantação de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) ou do aproveita-
mento de energia solar, se faz necessária para a redução dos custos de energia e garantia da
3 Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão. 4 Resolução ANA n° 411/2005, alterada pela Resolução ANA n° 1133/2016.
DESAFIOS PARA O DESENVOLVIMENTO| 6
sustentabilidade financeira do empreendimento. Destaca-se que há previsto no projeto a gera-
ção de energia através das usinas hidrelétricas de Jati e Atalho, com capacidades nominais de
49 MW e 18,5 MW, respectivamente.
Apesar de já possuírem infraestrutura instalada, as usinas ainda não contam com unidades ge-
radoras. Esse potencial de geração combinado, ainda que não garanta a autossuficiência do
sistema – cujo consumo médio é de 100 MW, ao menos permite reduzir os custos da operação
do projeto. Ademais, outras tecnologias de geração de eletricidade podem ser empregadas,
tais como solar e eólica. A vocação da região Nordeste nesse contexto é inegável.
Muito embora as obras de infraestrutura do PISF estejam em fase de finalização, o alcance
dos objetivos do projeto depende da conclusão das obras nos ramais associadas e das estrutu-
ras de distribuição da água nos municípios beneficiados (capilaridade). Em ambos os casos, a
construção, operação e manutenção são de responsabilidade dos estados receptores.
A Transposição do Rio São Francisco é projeto de suma importância para a região Nordeste
do país e representa vetor de desenvolvimento ao garantir segurança hídrica no semiárido.
Não se pode ignorar, no entanto, que a efetividade e a sustentabilidade da iniciativa depen-
dem da implantação de infraestrutura adequada nos estados, da redução dos custos de ener-
gia, bem como do fortalecimento institucional dos gestores de recursos hídricos e prestadores
de abastecimento de água do Nordeste.
DESAFIOS PARA O DESENVOLVIMENTO| 7
2 ENERGIAS RENOVÁVEIS
O processo de planejamento e expansão do parque gerador de energia elétrica do Brasil vem
sofrendo pressão para seu aprimoramento. Um dos vetores de transformação são as recentes
negociações internacionais a respeito dos níveis de emissões de carbono. Após apresentar suas
intenções em contribuir para a redução dos Gases de Efeito Estufa (GEE) no Acordo de Paris,
em 2015, a posição nacional foi ratificada por meio das Contribuições Nacionalmente Deter-
minadas (NDC), em setembro de 2016. Assim, o país se comprometeu a reduzir as emissões de
GEE, até 2025, em 37% abaixo dos níveis de 2005, e até 2030, em 43% abaixo dos níveis
de 2005.
Para cumprir com este compromisso, algumas diretrizes quanto à formação da matriz elétrica
foram estabelecidas, dentre as quais a ampliação da participação de fontes renováveis para
28%, além da energia hídrica. Atualmente, a energia eólica é a fonte renovável com maior
participação na matriz energé-
tica brasileira, representado
7,9% da capacidade insta-
lada, e a região Nordeste é a
que possui maior vantagem
comparativa para instalação
de parques eólicos no país. Nos
últimos oito anos, existe predo-
minância relevante da instala-
ção de parques de geração de
energia eólica e solar na re-
gião Nordeste, conforme apre-
sentado na Figura 1.
Além da necessidade de descarbonização, outros fatores como mudanças climáticas, crise hi-
drológica e mudança no padrão de vazões – as quais se colocam como impeditivo para cons-
trução de novas hidrelétricas –, apresentam-se como motores para maior inserção de fontes
FIGURA 2 - POTÊNCIA INSTALADA PARA GERAÇÃO EÓLICA E FOTOVOLTAICA (KW)
FONTE: BIG/ANEEL. ELABORAÇÃO: FGV CERI. *ACUMULADO ATÉ MARÇO.
DESAFIOS PARA O DESENVOLVIMENTO| 8
renováveis. Os desafios do planejamento para a integração dessas fontes no Brasil guardam
semelhança com aqueles observados em outros países.
O aumento da penetração de fontes renováveis intermitentes motiva mudanças no mercado. Em
um sistema de geração com predominância de usinas hidrelétricas com grande capacidade de
armazenamento, essas mudanças não eram urgentes. A crescentemente penetração da energia
eólica e, um futuro próximo, de solares, somada à integração de usinas hidrelétricas de grande
porte e sem capacidade de armazenamento tornam necessário buscar soluções para tais ques-
tões.
Nesse aspecto, a título exemplificativo, o despacho definido pelos algoritmos considera a pro-
dução média mensal de cada submercado de energia, de forma que não é considerada a
intermitência de cada fonte. Se não for levada em conta a variação horária das fontes eólicas,
os sinais podem ser muito díspares e, consequentemente, ocasionarem o despacho fora da or-
dem de mérito de geradores com custo mais alto. A energia eólica não tem condições de ga-
rantir o suprimento sozinha, sendo necessária uma complementação. Atualmente, essa comple-
mentação vem sendo garantida por termelétricas, muito embora a geração de energia fotovol-
taica revele ter grande potencial como fonte alternativa para complementar o crescimento da
utilização de fonte eólica (Figuras 2 e 3).
FIGURA 3 - COMPLEMENTAÇÃO SAZONAL E DIÁRIA NO ESTADO DA BAHIA (2015)
FONTE: ENGENHO PESQUISA E CONSULTORIA.
DESAFIOS PARA O DESENVOLVIMENTO| 9
FIGURA 4 – DINÂMICA ANUAL A LONGO PRAZO NO ESTADO DA BAHIA (1984-2017)
FONTE: ENGENHO PESQUISA E CONSULTORIA.
A digitalização também abre caminho para soluções inovadoras relacionas a recursos distribu-
ídos, como aplicações para a Resposta da Demanda. Nesse sentido, para os consumidores in-
dustriais localizados nos submercados Nordeste e Norte, teve início, em janeiro de 2018, o
programa piloto de Resposta da Demanda. A iniciativa, desenvolvida pelo Operador Nacional
do Sistema (ONS) em parceria com a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE),
prevê a redução do consumo dos consumidores industriais que tiverem previamente se habili-
tado, como recurso alternativo ao despacho termelétrico fora da ordem de mérito. Todavia, em
razão de não haver consumidores que se habilitaram a participar do programa, até o momento
não há resultados a serem divulgados. Assim, apesar da digitalização possuir potencial de
gerar impacto, ainda não foi possível mensurá-lo.
Por sua vez, a micro e mini geração distribuída têm ganhado espaço, ainda que não exista uma
política pública claramente articulada para fomentar recursos. Os elevados preços de energia
elétrica incentivam esse movimento. Muito embora existam incentivos no sentido de minimizar
barreiras e reparar efeitos indesejados, a falta de articulação entre objetivos de política e
mecanismos regulatórios fragilizam o pleno desenvolvimento dos recursos distribuídos.
A maior inserção de fontes renováveis também se depara com riscos e incertezas institucionais
e regulatórios. Um exemplo recente é a Proposta da Emenda Constitucional 97/2015 que de-
termina a cobrança de royalties para geração de energia eólica e energia solar. A iniciativa,
cuja última movimentação na Câmara dos Deputados ocorreu de dezembro de 2017, apresenta
um mecanismo que aumentaria o custo de produção de energia proveniente de fontes não-
poluidoras e renováveis.
Em vista do exposto, a inserção de fontes renováveis e recursos distribuídos é realidade no
Brasil e a região Nordeste é protagonista nesse processo. Todavia, existem desafios que pre-
cisam ser pensados e enfrentados para que tenha lugar uma integração eficiente dessas fontes,
coerente com objetivos de desenvolvimento sustentável.
DESAFIOS PARA O DESENVOLVIMENTO| 10
3 MOBILIDADE ELÉTRICA E INOVAÇÃO COMO INFRAESTRUTURA
A maneira como vivemos, trabalhamos e nos relacionamos vem sofrendo grande mudança nos
últimos anos. Conhecida como a quarta revolução industrial, essa mudança é marcada pela
digitalização – elemento marcante das cidades inteligentes, que se diferem das cidades tradi-
cionais por possuírem, para além das camadas de infraestrutura e serviços, a “camada digital”.
A chamada “camada digital” pode ser dividida, essencialmente, em geração, conexão e análise
de dados. Os dados são gerados a partir de diferentes fontes e dispositivos, tais como smar-
tphones, GPS, sensores, Radio-frequency identification (RFIDS) e satélites. A conexão é feita pela
internet – conhecida como Internet of Things (Internet das Coisas), que funciona como infraestru-
tura onde todos esses dados estão disponíveis e acessíveis. Por fim, a análise de dados se refere
à capacidade de processar e analisar grande quantidade de dados a fim de torná-los úteis.
Para isso, novas ferramentas como inteligência artificial, big data e machine learning estão sendo
desenvolvidas.
A possibilidade de gerar, conectar e analisar dados transformou radicalmente o papel das
infraestruturas urbanas. Enquanto as infraestruturas físicas continuam a existir, estas foram du-
plicadas ou espelhadas pelo layer de dados, responsável por armazenar informações sobre o
estado e a utilização das mesmas.
A digitalização, então, tem efeito direto em quatro setores: (i) indústrias de informação intensiva,
uma vez que a informação pode ser coletada, armazenada e analisada mais eficientemente;
(ii) indústrias sem ganhos de escala – como o transporte individual de passageiros – permitindo-
as desenvolver novos serviços para capitalizarem; (iii) indústrias fragmentadas, como logística,
uma vez que contribui para conectar diferentes atores; (iv) setores onde existe assimetria de
informação – como o governo (Finger, 2017).
Assim, percebe-se que a digitalização nas cidades tem o potencial de gestão inteligente das
infraestruturas urbanas, aumentando a eficiência e otimizando as cadeias de valor, além de
contribuir para o desenvolvimento de serviços inteligentes e novos modelos de negócios. Em um
DESAFIOS PARA O DESENVOLVIMENTO| 11
momento de conjuntura econômica desfavorável, a digitalização e a inovação tecnológica como
parcelas da infraestrutura se apresentam como possibilidades interessantes a governos que
buscam soluções de baixo custo quando comparadas às convencionais.
Neste contexto, o governo do Ceará anunciou recentemente a criação do Centro de Análise de
Dados. O intuito do centro é criar o “Big Data Ceará”, reunindo informações sobre o Estado e
armazenando-as nas nuvens. A ideia do projeto é compartilhar recursos de tecnologia da infor-
mação e de análise de dados para a sua utilização pelos órgãos do governo, além de evitar
duplicidade de ações e esforços na execução dessas tarefas. Junto a isso, o Estado do Ceará e
a Prefeitura de Fortaleza estão investindo na instalação de cabos de fibra ótica de alta velo-
cidade – são nove cabos instalados e mais dois novos cabos previstos para os próximos dois
anos, que somarão 16 mil quilômetros – com o objetivo de serem a referência em conectividade
no Brasil.
Com relação ao impacto da digitalização no transporte urbano, observa-se a utilização cres-
cente de aplicativos de planejamento de viagem, tais como Google Maps e Moovit; comparti-
lhamento, como Uber e Cabify; e de informações sobre o tráfego, a exemplo do Waze.
As possibilidades de utilização dos recursos digitais e de inovação, entretanto, vão além. A
cidade de São Paulo, por exemplo, implementou em 2016 o sistema “Zona Azul Digital”, que
substituiu a necessidade dos antigos talões de papel pela validação do estacionamento digi-
talmente através de aplicativos. Tal solução para a questão dos estacionamentos foi desenvol-
vida por meio de um chamamento público com custo bastante inferior à solução anteriormente
cogitada (instalação de sensores nas quase 40 mil vagas da cidade).
A capital paulista também acaba de lançar um chamamento público para a modernização da
rede semafórica. A proposta de modernização prevê a utilização de um sistema de controle em
tempo real, que permite a abertura e o fechamento dos semáforos e envia dados para uma
central. Através do controle dinâmico do tráfego permitido pela digitalização, é possível otimi-
zar os fluxos na cidade, reduzindo os tempos de viagem e emissões de gases poluentes.
Movimento similar é observado também em Pernambuco. Através da ação coordenada entre
governo, academia e empresas, foi criado em Recife o Porto Digital, um dos principais parques
tecnológicos e ambientes de inovação do Brasil. Com atuação principalmente na área de Tec-
nologia da Informação e Comunicação (TIC) e Economia Criativa, o Porto Digital tem desenvol-
vido como área estratégica, desde 2015, atividades no setor de tecnologias urbanas. Dentre
DESAFIOS PARA O DESENVOLVIMENTO| 12
elas, pode-se destacar o projeto Porto Leve, que busca promover serviços inovadores e ecolo-
gicamente sustentáveis no campo da mobilidade urbana, incluindo carros elétricos, estaciona-
mentos inteligentes, zona azul, transporte público, informações de estacionamento e bicicleta
pública.
É preciso destacar, no entanto, que a inovação como forma de infraestrutura vai além dos
efeitos da digitalização. Movimentos simples como alteração nas regras existentes e comparti-
lhamento de serviços também são parte dessa revolução. A iniciativa “Bicicleta Integrada”, em
Fortaleza, é um bom exemplo de inovação pautado na alteração das regras tradicionais, com
grande efeito prático. O sistema se diferencia dos outros modelos de bike sharing por permitir
que qualquer usuário que possua o bilhete único de transporte público utilize e fique em posse
da bicicleta por 14 horas ininterruptas, de forma gratuita. Ao mudar as regras dos sistemas
tradicionais de compartilhamento de bicicletas – nos quais usuários pagam para utilizar a bici-
cleta, com limite de 60 minutos ininterruptos –, o sistema promove uma maior integração com
outros modos de transporte e permite ao cidadão vencer a primeira e a última milha mais
facilmente.
Os carros elétricos também vêm ganhando espaço no cenário de modos compartilhados nas
cidades. Fruto de uma parceria da Prefeitura de Fortaleza com a Enel Distribuição Ceará, foi
desenvolvido o “Vamo”, o primeiro sistema de carros elétricos compartilhados do Brasil, em
consonância com a tendência mundial de redução de emissões poluentes e estímulo à mobilidade
verde.
A mobilidade elétrica, por sua vez, transcende o setor de transporte urbano e é elemento chave
para o desenvolvimento das energias renováveis. Uma vez que o pico da geração das energias
renováveis, principalmente a fotovoltaica, pode não coincidir com o pico do consumo, são ne-
cessários dispositivos de armazenamento. O veículo elétrico apresenta, assim, potencial de ocu-
par a posição de armazenador e trazer maior flexibilidade à rede de energia.
Nesse contexto em que a inovação permite o desenvolvimento novas soluções para problemas
de infraestrutura, em especial, na mobilidade urbana, o poder público possui o importante pa-
pel de articulador ativo, promovendo iniciativas como o chamamento público e buscando novos
modelos de negócios nos diversos setores de infraestrutura. Encarar a inovação como uma forma
de infraestrutura abre a possibilidade para o desenho de políticas públicas mais assertivas,
integradas e ambientalmente corretas.
DESAFIOS PARA O DESENVOLVIMENTO| 13
QUESTÕES PARA DISCUSSÃO
A Transposição do São Francisco
Como potencializar a capacidade do PISF promover desenvolvimento socioeconômico
na região, atendendo a sua vocação de garantia de sustentabilidade hídrica?
Como otimizar os custos com energia elétrica do PISF para que, consequentemente, a
tarifa cobrada aos Estados receptores seja reduzida?
Como garantir que os objetivos da transposição do Rio São Francisco sejam alcançados?
Energias Renováveis
Considerando que existe uma reforma de mercado de eletricidade em adiantado está-
gio de discussão, quais os aperfeiçoamentos legais e regulatórios capazes de incentivar
investimentos em geração de eletricidade
Como garantir uma adequada integração de geração renovável intermitente (solar e
eólica) na região? Como viabilizar expansão em transmissão de eletricidade para es-
coar essa produção?
Como selecionar fontes e tecnologias com base em lógica econômica e em planejamento
com visão integrada de temas estratégicos para o desenvolvimento socioeconômico?
Quais os mecanismos de mercado capazes de introduzir melhor alocação de riscos e
indução de comportamento eficiente dos agentes? Como avaliá-los?
Mobilidade Elétrica e Inovação como Infraestrutura
Como a regulação e os contratos devem se adaptar para que a transformação dos
setores provocada pela digitalização gere valor para diferentes stakeholders – usuários
e investidores?
Como governos podem estimular o desenvolvimento de novas soluções para problemas
de infraestrutura através de tais inovações tecnológicas?
Como os governos devem se antecipar para que esta transição ocorra de forma ade-
quada?
Qual o papel das empresas de eletricidade diante de uma crescente penetração de
veículos elétricos?
Top Related