ANO 3 | N 1 | JANEIRO 2011
DIREITO ADMINISTRATIVO | Artigo
No dia 15 de dezembro de 2010 foi promul- objeto do contrato, admitindo apenas,
gada a Lei n. 12.349, que fruto da conver- como critrio de desempate em igualdade
1
so da Medida Provisria n. 495/2010 , e de condies a preferncia, sucessivamente,
altera, dentre outras, a Lei n. 8.666/93 ("Lei aos bens e servios: (a) produzidos ou pres-
de Licitaes"), principalmente o art. 3 tados por empresas brasileiras de capital
desta lei. nacional; (b) produzidos no Pas; (c) produ-
zidos ou prestados por empresas brasileiras; Na verso original, o art. 3 da Lei de
e (d) produzidos ou prestados por empresas Licitaes proibia a adoo, previso, inclu-
que invistam em pesquisa e no desenvolvi-so ou tolerncia, nos atos de convocao, 2
mento de tecnologia no Pas .de clusulas ou condies que comprome-
tessem, restringissem ou frustrassem o seu A nova redao dada pela Lei n.
12.349/2010 passou a possibilitar margem de carter competitivo e, ainda, que estabele-
preferncia nas licitaes pblicas para produ-cessem preferncias ou distines em razo
tos manufaturados e para servios nacionais da naturalidade, da sede ou domiclio dos 3
que atendam a normas tcnicas brasileiras , licitantes ou qualquer outra circunstncia
visando promoo do desenvolvimento naci-impertinente ou irrelevante para o especfico
Principais mudanas na Lei de Licitaes trazidas pela
Lei n. 12.349, de 15 de dezembro de 2010
1 Foram feitas crticas poca ao fato de tais alteraes terem sido feitas, a princpio, por meio de Medida Provisria, por no ser a matria tratada revestida de rele-
vncia e urgncia.
2 O direito brasileiro j contemplava o favorecimento de uma determinada categoria de licitantes, as empresas de pequeno porte e as microempresas, na Lei
Complementar n 123/06:
"Art. 44. Nas licitaes ser assegurada, como critrio de desempate, preferncia de contratao para as microempresas e empresas de pequeno porte.
1. Entende-se por empate aquelas situaes em que as propostas apresentadas pelas microempresas e empresas de pequeno porte sejam iguais ou at 10%
(dez por cento) superiores proposta mais bem classificada.
2. Na modalidade de prego, o intervalo percentual estabelecido no 1o deste artigo ser de at 5% (cinco por cento) superior ao melhor preo.
Art. 45. Para efeito do disposto no art. 44 desta Lei Complementar, ocorrendo o empate, proceder-se- da seguinte forma:
I - a microempresa ou empresa de pequeno porte mais bem classificada poder apresentar proposta de preo inferior quela considerada vencedora do certame,
situao em que ser adjudicado em seu favor o objeto licitado;
II - no ocorrendo a contratao da microempresa ou empresa de pequeno porte, na forma do inciso I do caput deste artigo, sero convocadas as remanescentes
que porventura se enquadrem na hiptese dos 1o e 2o do art. 44 desta Lei Complementar, na ordem classificatria, para o exerccio do mesmo direito;
III - no caso de equivalncia dos valores apresentados pelas microempresas e empresas de pequeno porte que se encontrem nos intervalos estabelecidos nos
1o e 2o do art. 44 desta Lei Complementar, ser realizado sorteio entre elas para que se identifique aquela que primeiro poder apresentar melhor oferta.
1. Na hiptese da no-contratao nos termos previstos no caput deste artigo, o objeto licitado ser adjudicado em favor da proposta originalmente vencedora
do certame.
2. O disposto neste artigo somente se aplicar quando a melhor oferta inicial no tiver sido apresentada por microempresa ou empresa de pequeno porte.
3. No caso de prego, a microempresa ou empresa de pequeno porte mais bem classificada ser convocada para apresentar nova proposta no prazo mximo de
5 (cinco) minutos aps o encerramento dos lances, sob pena de precluso. "
3 A instituio de margem de preferncia vem por fim s discusses que proliferavam, em especial nos tribunais de contas, com relao vedao constante dos edi-
tais de licitaes quanto possibilidade de oferta de produtos estrangeiros, como, por exemplo, a relativa aquisio de pneus, que foi considerada ilegal em deci-
ses dos Tribunais de Contas dos Estados de So Paulo e de Minas Gerais, luz da redao antiga do art. 3 da Lei de Licitaes.
onal sustentvel, que passa a ser um dos obje- servios nacionais, estabelea as margens 4
tivos das licitaes pblicas . representadas por ndices de preferncias,
levando em considerao a efetiva disponibi-Tal margem de preferncia ser estabelecida
lidade desses bens em quantidade suficiente com base em estudos revistos periodicamen-
para atender demanda, por meio de estu-te, em prazo no superior a 5 (cinco) anos, 5
dos j mencionados acima . Segundo, que os que levem em considerao: I - gerao de
instrumentos convocatrios prevejam essa emprego e renda; II - efeito na arrecadao
possibilidade e fixem os respectivos ndices de tributos federais, estaduais e municipais;
de preferncia.III - desenvolvimento e inovao tecnolgica
realizados no Pas; IV - custo adicional dos pro- Conforme 9 do art. 3 da Lei de Licitaes,
dutos e servios e V - em suas revises, anlise no poder ser aplicada margem de prefe-
retrospectiva de resultados. rncia aos bens e servios cuja capacidade de
produo ou prestao no Pas seja inferior Alm disso, para os produtos manufaturados
(a) quantidade a ser adquirida ou contrata-e servios nacionais resultantes de desenvol-
da; ou (b) ao quantitativo fixado com funda-vimento e inovao tecnolgica realizados
mento no 7 do art. 23 da Lei de Licitaes, no Pas, poder ser estabelecida margem de
quando for o caso.preferncia adicional.
Tal margem de preferncia poder ser esten-Porm, as margens de preferncia por pro-
dida, total ou parcialmente, aos bens e servi-duto, servio, grupo de produtos ou grupo
os originrios dos Estados Partes do de servios sero definidas pelo Poder
Mercado Comum do Sul - Mercosul.Executivo Federal, no podendo a soma
delas ultrapassar o montante de 25% (vinte e Ademais, os editais de licitao para a con-
cinco por cento) do preo dos produtos tratao de bens, servios e obras podero,
manufaturados e servios estrangeiros. mediante prvia justificativa da autoridade
competente, exigir que o contratado pro-Portanto, a efetivao da margem de prefe-
mova, em favor de rgo ou entidade inte-rncia depender de dois fatores. Primeiro,
grante da administrao pblica ou daque-que o Poder Executivo Federal, vista das
les por ela indicados a partir de processo iso-caractersticas dos bens manufaturados e dos
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4 Conforme mencionado na Exposio de Motivos da Medida Provisria n 495/10 (E.M.I. N 104/ MP/MF/MEC/MCT), essa forma de tornar os produtos e ser-
vios mais competitivos, com o consequente aquecimento da economia local, tem sido praticada constantemente por outros pases: "Com efeito, observa-se
que a orientao do poder de compra do Estado para estimular a produo domstica de bens e servios constitui importante diretriz de poltica pblica. So
ilustrativas, nesse sentido, as diretrizes adotadas nos Estados Unidos, consubstanciadas no "Buy American Act", em vigor desde 1933, que estabeleceram pre-
ferncia a produtos manufaturados no pas, desde que aliados qualidade satisfatria, proviso em quantidade suficiente e disponibilidade comercial em bases
razoveis. No perodo recente, merecem registro as aes contidas na denominada "American Recovery and Reinvestment Act", implementada em 2009. A
China contempla norma similar, conforme disposies da Lei n 68, de 29 de junho de 2002, que estipulada orientaes para a concesso de preferncia a bens
e servios chineses em compras governamentais, ressalvada a hiptese de indisponibilidade no pas. Na Amrica Latina, cabe registrar a poltica adotada pela
Colmbia, que instituiu, nos termos da Lei n 816, de 2003, uma margem de preferncia entre 10% e 20% para bens ou servios nacionais, com vistas a apoiar a
indstria nacional por meio da contratao pblica. A Argentina tambm outorgou, por meio da Lei n 25.551, de 28 de novembro de 2001, preferncia aos pro-
vedores de bens e servios de origem nacional, sempre que os preos forem iguais ou inferiores aos estrangeiros, acrescidos de 7% em ofertas realizadas por
micro e pequenas empresas e de 5%, para outras empresas.
5 Considerando que a norma inserida pelo art. 3, 6 da Lei de Licitaes, principalmente a constante do inciso II, que diz respeito ao efeito na arrecadao dos
tributos estaduais e municipais, no constitui norma geral de licitaes e contratos como previsto no inciso XXVII do art. 22 da Constituio, a matria poder
ser concorrentemente disciplinada por estados e municpios face ao disposto no art. 24, I da Carta Maior.
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nmico, medidas de compensao comerci- Alm disso, a Lei n. 12.349/2010 alterou o
al, industrial, tecnolgica ou acesso a condi- critrio de desempate previsto no pargrafo
es vantajosas de financiamento, cumulati- 2 do art. 3 da Lei de Licitaes, eliminado o
vamente ou no, na forma estabelecida pelo primeiro deles, que favorecia os bens e servi-
Poder Executivo Federal. os produzidos ou prestados por empresas 6
brasileiras de capital nacional , passando a Por fim, nas contrataes destinadas
adotar como primeiro critrio de desempate implantao, manuteno e ao aperfeioa-
o que favorece bens e servios produzidos mento dos sistemas de tecnologia de infor-
no Pas, depois os produzidos ou prestados mao e comunicao, considerados estra-
por empresas brasileiras e por ltimo os pro-tgicos em ato do Poder Executivo Federal, a
duzidos ou prestados por empresas que licitao poder ser restrita a bens e servios
invistam em pesquisa e no desenvolvimento com tecnologia desenvolvida no Pas e pro-
de tecnologia no Pas. duzidos de acordo com o processo produti-
vo bsico de que trata a Lei n. 10.176, de 11 Uma outra alterao advinda da Lei n.
de janeiro de 2001, considerando que o 12.349/2010 e que tambm merece desta-
domnio dessas tecnologias fundamental que a garantia da participao de coopera-
para garantir a soberania e a segurana naci- tivas em licitaes dada pelo art. 3, 1, inci-
onais. so I, colocando fim discusso levantada
pelo Decreto n. 55.938, de 21/06/2010, do A grande crtica que se faz s alteraes 7
Governador do Estado de So Paulo , que acima elencadas consiste no fato de o gover-
impedia a participao de cooperativas de no, maior comprador do Brasil, passar a dis-
trabalho e de transporte em licitaes da por de um enorme grau de arbtrio para sele-
administrao pblica direta e indireta e cionar os vencedores de licitaes, sob o
pelo acrdo 1815/2003 do Plenrio do vasto guarda-chuva da "promoo do 8
Tribunal de Contas da Unio , que recomen-desenvolvimento nacional". Isso se d j que
dava a proibio da participao de coope-o Poder Executivo Federal ser responsvel
rativas em licitaes para a contratao de pela determinao dos critrios de prefern-
servios.cia.
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6 Com a revogao do art. 171 da Constituio pela EC n. 6/95, a qual cunhara essa expresso, o dispositivo ficou sem fundamento constitucional de validade, de modo
que restou esvaziado de contedo o at ento vigente inciso I do 2 do art. 3 da Lei de Licitaes.
7 No dia 10/09/2010, foi ajuizada no Supremo Tribunal Federal ("STF"), uma ao direta de inconstitucionalidade ("ADIN") n. 4444, proposta pela Confederao
Nacional das Cooperativas de Transporte - CONFETRANS e pela Federao das Cooperativas de Transporte do Estado de So Paulo - FECOOTRANSP, na qual se
impugnava o mencionado Decreto 55.938, de 21/06.2010, do Governador do Estado de So Paulo, que vedava a participao, em licitaes, de cooperativas em casos
especficos. Contudo, no dia 03 de setembro de 2010, foi negado seguimento ADIN pela Deciso Monocrtica Final proferida pela Relatora, Ministra Ellen Gracie, sob
o argumento de que o ato atacado, de natureza secundria, seria nitidamente regulamentar, pois retiraria todo o seu fundamento de validade da legislao infraconsti-
tucional vigente, e o STF tem rechaado, sistematicamente, as tentativas de submeter ao controle concentrado de constitucionalidade o de legalidade do poder regula-
mentar.
8 De acordo com o mencionado acrdo: "Nos editais de licitao, seja definida a natureza dos servios e a forma como sero prestados, para os seguintes fins:
- se, pela natureza da atividade ou pelo modo como usualmente executada no mercado em geral, houver a necessidade de subordinao do trabalhador ao contrata-
do, assim como de pessoalidade e habitualidade no trabalho, deve ser vedada a participao de cooperativas no certame, pela impossibilidade de vnculo de emprego
entre essas entidades e os seus associados;
- se o servio licitado for incompatvel com o objeto social da cooperativa, esta dever ser considerada inabilitada para a execuo; (...)".
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Tambm foi acrescida mais duas hipteses do art. 57 da Lei de Licitaes, relativo a ser-
ao sempre crescente rol do art. 24 da Lei de vios continuados que a Administrao con-
Licitaes, que trata das hipteses de dis- trate.
pensabilidade de licitao, (a) para a aquisi- Por fim, deve-se ressaltar que, de acordo
o de bens e insumos destinados exclusiva- com o disposto no art. 2 da Lei n.
mente pesquisa cientfica e tecnolgica 12.349/2010, o disposto nesta lei aplica-se
com recursos concedidos pela Capes, pela modalidade licitatria prego
Finep, pelo CNPq ou por outras instituies
de fomento a pesquisa credenciadas pelo
CNPq para esse fim especfico; e (b) nas con-
trataes visando ao cumprimento do dis-
posto nos arts. 3, 4, 5 e 20 da Lei n. 9
10.973, de 2 de dezembro de 2004 , obser-
vados os princpios gerais de contratao
dela constantes.
Faz-se mister salientar a incluso do inciso V
no art. 57 da Lei de Licitaes, inaugurando
um prazo absolutamente indito para con-
tratos regidos pela Lei de Licitaes, de at
120 meses (ou seja, 10 anos), nas hipteses 10
ali elencadas , quando o prazo anterior mais 11
longo (expresso e predeterminado ) era de
6 anos (60 meses mais 12 meses), resultante
da combinao do inciso II com o 4, todos
n
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9 Esta lei dispe sobre incentivos inovao e pesquisa cientfica e tecnolgica no ambiente produtivo e seus artigos 3 a 5, entre outras previses, estabe-
lecem regras para que os entes pblicos estimulem a constituio de alianas estratgicas e o desenvolvimento de projetos de cooperao, alm de fixar que
as Instituies Cientficas e Tecnolgicas podero compartilhar seus laboratrios e participar de outras medidas nesse sentido e, ainda, autoriza a Unio a
participar minoritariamente do capital de Sociedades de Propsito Especfico com objeto cientfico e tecnolgico.
10 Art. 57. (...)
V - s hipteses previstas nos incisos IX, XIX, XXVIII e XXXI do art. 24, cujos contratos podero ter vigncia por at 120 (cento e vinte) meses, caso haja inte-
resse da administrao."
11 Isto porque pode ocorrer que contratos cujo prazo seja regido pelo inciso I do art. 57 da Lei de Licitaes durem mais de 10 anos, na hiptese de serem pror-
rogados por mais tempo que isso, na medida em que o seu objeto corresponda a alguma meta que seja sucessivamente prorrogada no plano plurianual da
respectiva pessoa jurdica de direito pblico interno.
Autores:
Sandra Gama
Rafaella Ferraz
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48 ANOS